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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
SIOMARA REGINA CAVALCANTI DE LUCENA
A IMIGRAÇÃO E O IMIGRANTE NAS IMPRENSAS BRASILEIRA E ESPANHOLA: Exclusão /Inclusão Social
V. 1
Março 2008
SIOMARA REGINA CAVALCANTI DE LUCENA
A IMIGRAÇÃO E O IMIGRANTE NAS IMPRENSAS BRASILEIRA E ESPANHOLA: Exclusão /Inclusão Social
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Social da Universidade Federal da Paraíba, para
a obtenção do título de Mestre em Psicologia
Social.
Orientadora: Profª. Drª. Maria de Fátima
Fernandes Martins Catão
V. 1
Março2008
11
FOLHA DE APROVAÇÃO
Siomara Regina Cavalcanti de Lucena
A Imigração e o Imigrante nas Imprensas
Brasileira e Espanhola: Inclusão / Exclusão Social.
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Social da Universidade Federal da Paraíba
para a obtenção do título de Mestre em
Psicologia Social.
Aprovada em:
Banca Examinadora
Profª. Drª.Maria de Fátima Martins Catão
Instituição: Universidade Federal da Paraíba
Assinatura: _________________________________________________
Profª. Drª. Maria da Penha de Lima Coutinho
Instituição: Universidade Federal da Paraíba
Assinatura: _________________________________________________
Profª. Drª. Maria de Fátima Souza Santos
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco
Assinatura: _________________________________________________
12
Dedicatória
À minha família, com amor e gratidão, pela compreensão, carinho, presença e
incansável apoio no decorrer da realização deste trabalho.
13
AGRADECIMENTOS
A Deus, por permitir esta realização.
À Profª. Drª. Maria de Fátima Martins Catão, que, nos anos de convivência, muito
me ensinou, contribuindo para meu desenvolvimento científico e intelectual.
Aos professores Wellington Pereira, Derval Gomes Golzio, Josinaldo Malaquias,
Luiz Mousinho, Maria da Penha de Lima Coutinho e Ana Alayde Werba Saldanha,
pelo incentivo e ensinamentos.
Á Universidade Federal da Paraíba, pela oportunidade de realização deste curso de
Mestrado.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, responsável
pelo financiamento desta pesquisa.
Ao meu querido pai, em memória, pelos valiosos ensinamentos e pelas
maravilhosas lembranças que me fazem seguir mais feliz.
A Renan, meu filhinho, por existir e dar mais alegria à minha vida.
À minha mãe pela força e apoio incondicionais e atemporais.
À Danielle, irmã, companheira e amiga de todas as horas.
Ao meu marido, Felipe, pela dedicação imensurável e pelas palavras de incentivo.
A Eneida, Raphaele, Alexandra, Camila e Daniele por estarem presentes nas horas
difíceis e felizes com todo o carinho de uma amizade sincera.
A Thyanna, Otto Rodrigo e Danielle, pela viabilização do material da impressa
espanhola.
À Solange, por desempenhar sua função de forma tranqüila e amorosa, dando-me
estabilidade para seguir este trabalho científico.
A todos os professores que contribuíram de forma marcante para o meu
crescimento como estudante e, acima de tudo, como pessoa.
A todos os meus familiares, profissionais de apoio e amigos que participaram
comigo neste caminhada.
14
“Nem cidadão nem estrangeiro nem totalmente do lado do Mesmo, nem totalmente
do lado do Outro, o ‘imigrante’ situa-se nesse lugar ‘bastardo’, a fronteira entre o ser
e o não – ser social”.
Pierre Bordieu
15
RESUMO
O objetivo deste estudo é identificar e analisar os conteúdos veiculados à imigração
na imprensa brasileira e espanhola, refletir sobre a produção destes, sobre o
movimento histórico dessa produção, o contexto cultural que permeia a elaboração
de tais notícias, e que semelhanças e diferenças há em relação aos conteúdos
veiculados nas duas imprensas estudadas. Tal verificação baseia-se na
identificação e análise dos conteúdos representacionais de publicações dos jornais
brasileiros Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo, bem como nos espanhóis
El País e El Mundo. Compreende-se a construção de tais representações sociais
como fenômeno orientador das comunicações e dos comportamentos
representacionais. Para tanto, foi utilizado o método analítico descritivo com
exploração dos aspectos qualitativos e quantitativos. Procedeu-se uma análise
documental dos jornais mencionados, a fim de coletar o material a ser analisado.
Os dados foram submetidos à análise de conteúdo com apoio do programa
ALCESTE, sistema automático de análise de dados textuais. Os resultados obtidos
apontam para a emergência de doze classes temáticas nos dois corpus de análise,
sendo seis no material brasileiro e seis no material espanhol. Tais classes
apresentam significados distintos a respeito da temática estudada por parte dos
dois corpus. Evidencia-se que as Representações Sociais da imigração colocam-se
como possíveis traduções de informações, atitudes e imagens e possíveis
orientações de condutas em relação ao imigrante e o problema social da imigração.
Palavras-chave: Imigração – Exclusão/Inclusão - Imprensa - Representações
Sociais
16
ABSTRACT
The purpose of this study is to identify and analyze the contents connected to
immigration in Brazilian and Spanish press, reflect on their production, on the
historical movements of this production, the cultural context behind the making of
these news and what similarities and differences are observed in both studied
presses. All this checking is based on the identification and analysis of the
representational contents of the publications in Brazilian newspapers Folha de São
Paulo and O Estado de São Paulo as well as in the Spanish ones El País and El
Mundo. The construction of these social representations is understood as a
positioning phenomenon of the communications and the representational behaviors.
For this purpose the used method was the analytical descriptive, exploring the
quantitative and qualitative aspects. A documental analysis of the mentioned
newspapers was done in order to gather the desired material. The data were
submitted to content analysis with the support of the software ALCESTE, an
automatic system for textual data analysis. The obtained results points out to the
arising of twelve thematic classes in both analysis groups, six in Brazilian material
and six in Spanish material. Such classes present different meanings about the
studied subject matter in both analysis groups. It’s noticed that the immigration’s
Social Representations pose as possible translations of information, attitudes and
images, besides possible behavioral orientations in relation to the immigrant and the
social problem of immigration.
Keywords: Immigration – exclusion/inclusion – Press – Social Representations
17
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
RESUMO............................................................................................................. 16ABSTRACT......................................................................................................... 17APRESENTAÇÃO............................................................................................... 24CAPÍTULO IDelimitando a Questão Imigratória.................................................................. 27CAPÍTULO IIPerspectiva Conceitual do Estudo................................................................... 412.1 Imigração e Imigrantes.................................................................................. 412.2 Exclusão e Imigração.................................................................................... 482.3 Representações Sociais 592.3.1 Ancoragem e Objetivação 622.3.2 Tridimensionalidade das Representações Sociais 642.3.3 Taxonomia da Comunicação (Difusão, Propagação, Propaganda) 672.3.4 Psicologia, Representações Sociais e Meios de Comunicação 682.3.5 Meios de Comunicação e Representação do Outro 712.3.6 A Notícia e as Representações Sociais 74CAPÍTULO IIIProcedimentos Metodológicos........................................................................ 803.1 Procedimentos de Coleta de Dados.............................................................. 81
3.1.1 Amostra................................................................ 813.2 Caracterização dos jornais............................................................................ 843.2.1 Folha de São Paulo.............................................................................. 843.2.3 O Estado de São Paulo........................................................................ 873.2.4 El País.................................................................................................. 883.2.5 El Mundo.............................................................................................. 903.3 Procedimento e análise dos dados..................................................... 91
3.3.1 O sistema ALCESTE....................................................................... 943.3.1.1 Fundamentos e estrutura................................................... 943.3.1.2 O corpus............................................................................ 953.3.1.3 A análise do corpus........................................................... 983.3.1.4 Resultados produzidos pelo sistema ALCESTE............... 99
3.4 Plano de análise............................................................................................ 993.4.1 Constituição do corpus e leitura flutuante........................................ 1003.4.2 Preparação dos arquivos para utilização do sistema ALCESTE..... 1003.4.3 Processamento de dados pelo sistema ALCESTE.......................... 1003.4.4 Leitura em profundidade dos dados analisados pelo sistema
18
ALCESTE........................................................................................ 1003.4.5 Apresentação e interpretação dos resultados................................. 100
CAPÍTULO IVO Significado da Imigração e do Imigrante nas Imprensas Brasileira e
Espanhola...........................................................................................................
102
4.1 Detalhamento das Classes Apreendidas nas duas Imprensas
Pesquisadas........................................................................................................ 1064.2 Discussão dos Resultados por Classe.......................................................... 1094.3 O significado da imigração e do imigrante e sua relação
interclasses......................................................................................................... 1634.4 Considerações Finais.................................................................................... 173REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................. 176ANEXOS............................................................................................................. 183
19
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 – Proximidade / distância entre as classes da
Imigração / Imigrante apreendidas através dos artigos / notícias
de jornais brasileiros.....................................................................
164
Figura 02 – Proximidade / distância entre as classes da
Imigração / Imigrante apreendidas através dos artigos / notícias
de jornais espanhóis.....................................................................
165
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 – Dias de maior circulação e tiragem dos jornais da amostra....... 82
Tabela 02 – Artigos / notícias coletados nos jornais por seção (1ª e 2ª
semanas de setembro de 2006 e 3ª e 4ª semanas de novembro de 2006)... 84Tabela 03 – Distribuição das Unidades de Contexto Elementar (UCE) da
imigração / imigrante, apreendidas nos artigos / notícias dos jornais
brasileiros................................................................................................. 104Tabela 04 – Distribuição das Unidades de Contexto Elementar (UCE) da
imigração / imigrante, apreendidas nos artigos / notícias dos jornais
espanhóis................................................................................................. 105Tabela 05 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Inclusão / Exclusão social, apreendido mediante os artigos /
notícias de jornais brasileiros.......................................................................... 109Tabela 06 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal, apreendido mediante
os artigos / notícias de jornais brasileiros....................................................... 114Tabela 07 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto História e Modos de Vida do Imigrante, apreendido mediante os
artigos / notícias de jornais brasileiros............................................................ 118
20
Tabela 08 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Multiculturalismo e Violência, apreendido mediante os artigos /
notícias de jornais brasileiros.......................................................................... 123Tabela 09 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Institucionalização da Intolerância Étnica, apreendido mediante
os artigos / notícias de jornais brasileiros....................................................... 127Tabela 10 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Trabalho / Emprego / Desemprego, apreendido mediante os
artigos / notícias de jornais brasileiros............................................................ 132Tabela 11 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Desequilíbrio Social: Impactos Negativos / Desenvolvimento,
apreendido mediante os artigos / notícias de jornais
espanhóis............................................................
137
Tabela 12 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Ações Contra a Imigração Ilegal, apreendido mediante os artigos
/ notícias de jornais espanhóis........................................................................ 143Tabela 13 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Pacto Imigratório Nacional: Acordo e Desacordos, apreendido
mediante os artigos / notícias de jornais espanhóis....................................... 147Tabela 14 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Cooperação / Tensão Internacional, apreendido mediante os
artigos / notícias de jornais espanhóis............................................................ 151Tabela 15 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Identidade Falsificada e Trabalho, apreendido mediante os
artigos / notícias de jornais espanhóis............................................................ 155
21
Tabela 16 - Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante
enquanto Busca de Melhoria de Vida: crianças e adolescentes como
arrimo de família, apreendido mediante os artigos / notícias de jornais
espanhóis................................................................................................. 159Tabela 17 - Distribuição das Unidades de Contexto Elementar (UCE) da
imigração / imigrante por classe e exposição das subclasses apreendidas
nos artigos / notícias dos jornais brasileiros e espanhóis............................... 166
22
APRESENTAÇÃO
O desenvolvimento e a importância dos meios de comunicação na
contemporaneidade alertam para a necessidade da verificação e compreensão de
seus processos. A forma como os acontecimentos são veiculados, bem como o
conteúdo das publicações são hoje alvo de pesquisas em todo o mundo. Dessa
maneira acontecimentos recorrentes e considerados de grande importância se
tornam alvos dos meios de comunicação de massa, notadamente dos meios
impressos, os quais serão investigados neste estudo. A problemática da imigração
está no hall dos acontecimentos de destaque no mundo, tamanha sua capacidade
de afetar os países, as pessoas que vivem nele e também as que chegam. Sua
importância se dá também pelo fato de ser algo que denuncia a desigualdade entre
os povos, assim como a exclusão social dessas pessoas.
Em lugar de importância mundial, a imigração é uma questão-problema
difundida de forma ampla nos meios de comunicação. Em face disso se faz
premente estudar a maneira como o imigrante e a própria imigração estão sendo
abordados na mídia, já que esta é um elo bastante significativo entre os
acontecimentos e as pessoas, fazendo com que estas formem impressões, opiniões
e orientem suas condutas diante de algo. O coletivo imigrante e as imigrações em si
são postos em cheque quase que diariamente em meios de comunicação de todo o
mundo, o que incita indagações a respeito de até que ponto estão sendo afetados
positivamente ou negativamente por isso. Diante desta realidade o presente estudo
mostra sua importância quando aborda a questão da imigração no âmbito
23
comunicacional no sentido de suas representações sociais. Jovchelovitch (2000)
sugere, nesta mesma linha de pensamento, que, dadas as formas como a mídia
transforma, e de certa maneira, define a circulação de bens simbólicos em
sociedades contemporâneas, ela se torna uma fonte importante de reflexão para o
estudo das representações sociais. È é neste ensejo que este trabalho busca a
compreensão de seu objeto.
O interesse pela temática tão polêmica veio da convivência com a realidade
da construção de pensamento através da imprensa, tanto exercendo a função de
pesquisadora como também enquanto jornalista. Esta relação deixou clara a
importância do que é noticiado no sentido de institucionalizar verdades, realidades.
Este estudo está divido em quatro Capítulos, os quais serão pormenorizados
em seguida. Contextualizando a questão imigratória é que o primeiro capítulo se
lança, trazendo como introdução a delimitação do problema e toda a sua inserção no
mundo, no Brasil e na Espanha. Mostrando a importância destes dois países dentro
do contexto imigratório, o conteúdo do capítulo chama a atenção o fato de o Brasil
ter um histórico forte de imigração que hoje se encontra em decadência, ao mesmo
tempo em que está na lista dos dez com maior número de idosos, contabilizando 17,
6 milhões de pessoas com mais de 60 anos, o que diminui seu número de pessoas
em idade produtiva. A Espanha também é posta em evidência pelo seu histórico de
aumento abrupto de imigrantes, luta contra essa realidade e um prognóstico
negativo no que diz respeito ao número de idosos: a Espanha se tornará o país com
mais idosos do continente europeu e, provavelmente, um dos líderes em todo o
mundo com 36% dos espanhóis com mais de 65 anos em 2050. Neste ensejo,
24
indaga-se, no capítulo, sobre quais os significados dos conteúdos vinculados à
imigração na imprensa brasileira e espanhola, refletindo sobre a produção destes,
No referido capítulo também há a justificativa e relevância do tema junto à academia
e à sociedade.
O segundo capítulo trata da base conceitual usada no presente trabalho,
tratando da concepção de indivíduo, das Representações Sociais e a mídia, da
Exclusão Social e da Imigração. Neste capítulo se observa o olhar contextualizado e
suas características, bem como os fundamentos das Representações Sociais
necessários neste estudo. A exclusão/inclusão social e a imigração com vistas ao
saber erudito também são contempladas como bases fundamentais a esta
investigação.
O Terceiro capítulo traz os objetivos e procedimentos metodológicos desta
investigação. Tais objetivos estão divididos em objetivo geral e objetivos específicos.
O capítulo aborda, a coleta dos dados, a amostra, as notícias nos jornais, a
contextualização destes, bem como funcionamento do sistema ALCESTE.
Em seguida organiza-se o capítulo IV, que se estrutura e função da
identificação e análise da produção do sentido da imigração e do imigrante nos
jornais brasileiros e espanhóis, examinando as diferentes modalidades de
conhecimento, suas construções, simbolizações, ênfases, semelhanças, diferenças,
dimensões e articulações no que tange ou não à produção de subjetividades
relacionadas à inclusão / exclusão social. A reflexão é complementada com algumas
pontuações gerais da representação à ação e contribuições do estudo em
referência.
25
CAPÍTULO I
DELIMINTANDO A QUESTÃO IMIGRATÓRIA
Todos os dias, entramos em contato com realidades, contextos, pessoas e
grupos que servem de material para a formação de nossas Representações da
sociedade. A contemporaneidade, a globalização e a desigualdade trazem
mudanças de contexto e contato com novas realidades, os quais são fatores
preponderantes para o início de um novo ciclo de formação de representações
sociais.
A vida nos países subdesenvolvidos pode, por vezes, representar uma
sobrevida, ou seja, viver nos países ditos em desenvolvimento significa, para muitos,
travar lutas diariamente. Em diversos âmbitos se pode validar esta premissa. O
cidadão dos mundos subdesenvolvidos é carente das garantias básicas de sua
condição, sendo isento de educação, saúde e muitas vezes até de alimentação. Tal
realidade, sem previsão de mudança, põe o indivíduo a repensar seu projeto de vida
no sentido de buscar novas perspectivas de viver em uma sociedade da qual seja
participante de fato e na qual tenha mais oportunidades de ascensão. Este impulso
pela melhoria de vida reflete a condição social, econômica e cultural em que vive o
homem (Bock, 2001. p.22).
O desejo de uma vida melhor leva as pessoas a considerarem a emigração
como saída e esperança. A migração para outro país dá margem à configuração de
várias questões sociais passíveis de questionamentos. A exclusão, o desemprego,
26
ilegalidade etc. Além dessas questões mais práticas, a imigração também traz danos
subjetivos. De acordo com Lewis & Jungman (1986), em nível individual a
experiência intercultural também produz fenômenos como choque cultural, choque
de transição etc.
De acordo com o relatório do Seminário “Migrações: Exclusão ou
Cidadania?”, realizado em 2003, o contexto mundial contemporâneo atribuiu às
imigrações três adjetivos que definem adequadamente o panorama atual da
questão: intenso, diversificado e complexo. De acordo com o pesquisador, as
imigrações são atualmente intensas, já que a quantidade de migrantes que cruzam
as fronteiras no mundo inteiro tem tido um acréscimo de ano para ano. Isso tem
ocorrido por múltiplos fatores, entre eles podem ser destacadas as transformações
ocasionadas pela economia globalizada, como já entes citado, a qual leva à
exclusão dos povos dos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos. Guerras e
terrorismo também podem ser citados como fatores contribuintes para a
exacerbação do fenômeno migratório, bem como os movimentos marcados por
questões étnico-religiosas, a urbanização acelerada, especialmente nos países
periféricos.
Os deslocamentos humanos são também cada vez mais diversificados. O
relatório do referido seminário diz ainda que “Mudou o rosto das migrações. Verifica-
se, por exemplo, uma feminilização do fenômeno migratório em quase todos os
movimentos em curso. Dos países pobres para os países ricos, prevalece a
migração de jovens em busca de melhores condições de vida”. Além disso, embora
por motivações distintas, migram pessoas de todas as classes sociais. A viagem
27
pode ser para turismo ou a trabalho, no caso de trabalhos especializados, entretanto
a maioria parte por causa da busca pela sobrevivência.
Por fim, as migrações são cada vez mais complexas. Diversas dimensões de
fatores são responsáveis por essa nova característica da mobilidade humana em
âmbito mundial. Pode, ainda, ser sublinhado, entre outros, o fato de os fluxos
migratórios não terem mais origem e destino determinados. O que há muitas vezes é
a busca pela melhor qualidade de vida, e não pelo país em si.
Estimativas recentes da Organização Internacional para as Migrações (OIM),
contabilizam a existência de cerca de 150 milhões de migrantes internacionais em
todo o mundo (OIM, 2000 in Castles, 2005. p. 51). Este número representa entre 2%
e 4% da população mundial. Este volume é bastante significativo e a OIM prevê que
o número de migrantes poderá chegar a 250 milhões em 2050 (Castles, 2005. p.
51).
As migrações estão assumindo visibilidade tão relevante em virtude de sua
concentração em certas áreas onde representam um grande fator de transformações
sociais. Isso já vem acontecendo há algum tempo. Um estudo feito pelas Nações
Unidas em 1990 revela que 90% dos migrantes mundiais residem em apenas 55
países. Em nível absoluto 55% dos migrantes se deslocam entre países menos
desenvolvidos. Todavia, em termos relativos, os países desenvolvidos têm sido
muito mais afetados pela imigração.
À época da pesquisa, 4,6% da população do mundo desenvolvido eram
migrantes, ao passo que nos países em desenvolvimento esse número é de apenas
1,6%. Na Oceania, o índice de imigrantes era o mais elevado com 17,8%, seguida
28
pela América do Norte com 8,6% da população total e pela Europa Ocidental com 6,
1%. Na Ásia a parcela de imigrantes no total da população era muito mais baixa com
1,4%, na América Latina e nas Caraíbas era de 1,7% e na África 2,5% (Zlotnik,
1999).
Nesta pesquisa foca-se dois países, um em desenvolvimento e outro
desenvolvido, com vistas a investigar a respeito dos significados produzidos por
suas imprensas a respeito da imigração e do imigrante. Brasil e Espanha se fazem
presentes neste estudo contornando a questão imigratória cada qual com sua
cultura e contexto social, fazendo assim com que a temática seja abordada de forma
diversa em cada um desses mundos.
O mundo está globalmente vivendo a questão migratória, o que faz o tema
ser de interesse também do Brasil. Como dito anteriormente, múltiplos fatores são,
agora, constituintes do fenômeno da imigração/emigração, o que faz com que não
haja fronteiras a serem ultrapassadas. No Brasil o debate sobre imigração não é
novo, embora no passado as características do fenômeno tenham sido bem
diferentes das expostas há pouco, as quais configuram a situação atual de imigração
no mundo. Rever a história do Brasil é referir-se à imigração.
Durante o período colonial nosso país recebeu milhões de portugueses, os
quais chegavam ao Brasil para ocupar o território e colonizá-lo. Com um grande
território, a terra tupiniquim não foi facilmente povoada. Durante o governo de Dom
João VI, houve um grande incentivo à vinda de imigrantes ao Brasil, com o intuito de
criar colônias agrícolas fornecedoras de alimentos para abastecer a população da
cidade do Rio de Janeiro. (IBGE, 2000).
29
As primeiras levas de imigrantes chegaram em 1819, formada por suíços,
localizados na região serrana do Rio de Janeiro, fundaram Nova Friburgo. A partir
de então, na segunda metade do século XIX, foram ocorrendo as maiores ondas
migratórias para o Brasil. Era a tentativa de substituir a mão-de-obra escrava no
cultivo de café pela mão-de-obra imigrante. Os imigrantes também contribuíram no
que diz respeito ao desenvolvimento econômico necessário para a industrialização
do país naquele momento. Neste movimento cerca de quatro milhões de imigrantes
vindos da Europa e até do Japão vieram para terras brasileiras.
Após a década de vinte houve um declínio de imigração para o Brasil, isto se
deu por diversos fatores. O crescimento das migrações internas na Europa, a crise
de 1929 e desencorajamento da imigração por parte do governo brasileiro, como no
decreto que disciplinava a vinda de imigrantes em 1930, podem ser relacionados
como algumas das causas da diminuição imigratória para o Brasil.
Atualmente a imigração para o Brasil não possui mais a mesma roupagem
que no final do século XIX e no início do século XX. Os imigrantes já não são de
maioria européia como antes, e também não mais em grande quantidade como na
época colonial e logo após da abolição da escravatura. De acordo com o Ministério
da Justiça, hoje, o total de imigrantes regulares no Brasil chega a 836 mil, o que
configura o menor número nos últimos 25 anos. Já em situação irregular, calcula-se
que haja entre 150 e 200 mil pessoas. Os números relacionados à imigração atual
no Brasil não são muito precisos, já que não há estatística oficial e também existe
uma grande entrada de bolivianos nos últimos anos. As estimativas afirmam que só
em São Paulo há a presença de 60 mil pessoas do país vizinho residindo
30
irregularmente no estado, além de 10 mil em Mato Grosso. Diante desse contexto
um novo Estatuto do Estrangeiro foi elaborado a fim de regulamentar investimentos
de estrangeiros no Brasil. A lei foi elaborada pelo Ministério da Justiça em parceria
com outros órgãos da sociedade e será uma das mais modernas do mundo. O texto
deverá ser enviado ainda este ano ao Congresso Nacional.
O contexto espanhol traz novas questões a serem analisadas. O país em
questão foi eleito para fazer parte deste estudo por suas características, não só
relacionadas ao crescimento imigratório, mas por também apresentar dados
relacionados indiretamente à questão, como o envelhecimento da população. De
acordo com o relatório da Comissão Européia, divulgado em 2006, que versa sobre
o impacto do envelhecimento nas contas públicas dos 25 Estados Membros da
União Européia no que tange a gastos com pensões, cuidados em saúde, cuidados
em longo prazo e transferência de empregos, a Espanha será o país com a maior
porcentagem de idosos em toda a Europa no ano de 2050 e, provavelmente, um dos
líderes em todo o mundo. Segundo o documento, os espanhóis acima de 65 anos
somarão 36% da população total, ante 35% na Itália e 32% em Portugal, Grécia e
Alemanha. Luxemburgo, Holanda, Dinamarca e Suécia serão os com mais jovens,
mesmo assim com taxas acima de 20%.
Os fatores acima citados fizeram único este país no sentido de apreender
significados por meio da imprensa a respeito da imigração/imigrante, já que sua
realidade se mostra mundialmente uma das mais contundentes em matéria de
imigração e suas circunstâncias, sendo na Europa o país mais significativo.
31
Em virtude do novo contexto configurado pelo fenômeno da imigração as leis
espanholas ficaram rapidamente sem adequação à realidade. Tal fato fez com que o
país precisasse elaborar várias leis em um curto espaço tempo.
Na primeira mudança por esse novo entorno social ocorreu uma reforma na
lei orgânica sobre direitos e liberdades dos estrangeiros e sua integração social na
Espanha que havia sido publicada em 2000. Como relata a explicação na própria
reforma da lei, o contexto social da imigração no país se mostrou de tal forma que
lançou a necessidade de reformar uma lei ainda tão nova. Quatro meses após a
publicação da lei foi divulgada a sua reforma, acrescentando alguns artigos e
modificando outros. A dinâmica voraz da imigração na Espanha fez dessa a primeira
mudança através de leis orgânicas, das quatro que ocorreram ao todo, até,
finalmente, a formulação de um novo regulamento da Lei do Estrangeiro espanhola.
O caso da Espanha é bem diferente do Brasileiro, por exemplo. Em nosso
país, como já foi visto, a imigração é parte da história do país, porém vem
gradativamente decrescendo, já a população de emigrantes é estimada em quatro
milhões de pessoas. No país europeu a discussão da imigração é relativamente
nova. O crescimento de imigrantes na Espanha cresceu bastante rápido a partir dos
anos 90. De acordo com Díaz et all (2001), a Espanha tinha 600.000 imigrantes em
1996, o que perfazia 1,5% da sua população. Em cinco anos este número cresceu
para 1.200.000 imigrantes, é dizer, 3% da população do país. Já nas últimas
pesquisas realizadas em 2005 a Espanha tinha uma população de 43,97 milhões de
habitantes, sendo 3,69 milhões de estrangeiros, ou seja, 8,4% da população.
32
Em meio a tanto crescimento em pouco espaço de tempo certamente
problemas advieram juntamente com o fenômeno da imigração na Espanha. Desde
leis inadequadas à nova realidade, até a exclusão dos imigrantes, diversos fatos
foram convertendo tal evento em um problema para a Espanha.
A questão do envelhecimento populacional do país também incita
indagações. Como retrata o relatório da União Européia sobre finanças e economia,
a Espanha possui a maior expectativa de vida para homens (76,6 anos) e mulheres
(83,4 anos), também detêm a maior projeção para dependência dessa população.
Segundo os dados do referido relatório, em 2050 65,4% da população espanhola
dependerá da seguridade social.
A partir de então se configuram realidades que enquanto evento social atípico
passa a ser noticiado nos veículos de comunicação. Esse novo contexto propiciado
pela desigualdade entre países e pela exclusão/inclusão social passa a fazer parte
do nosso repertório social para a construção de textos jornalísticos e também de
representações. É a globalização e a contemporaneidade trazendo suas implicações
em forma de exclusão e representação.
Incitada pelo contexto inovador advindo da imigração em grande escala, a
questão dos direitos humanos dos imigrantes também é posta em cheque. A
Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pela ONU em 1948, no âmbito
da imigração garante ao cidadão, em seu artigo 15, o direito a ter direitos, ou seja,
de ter uma nacionalidade, não perdê-la e de poder trocar de nacionalidade. Já no
artigo 14, ela fala sobre o direito de procurar asilo em casos de perseguição, e no
artigo 13, parágrafo 2, o direito de deixar seu país de origem e voltar quando
33
vontade tiver. Esses direitos garantidos pela Declaração acabam, por vezes,
entrando em confronto com os países no que diz respeito a sua soberania e poder
de decisão em relação a quem pode entrar e sair de seu território. Nenhum país é
obrigado a aceitar ninguém, mesmo em caso de asilo político (Reis, 2004, p. 151).
A grande demanda de imigração no mundo e questões ambíguas sem
resolução fizeram com que a Organização das Nações Unidas se manifestasse
sobre a necessidade de maior regulamentação internacional a respeito do assunto.
Em 18 de dezembro de 1990, a ONU aprovou em Assembléia Geral a Convenção
sobre Direitos dos Imigrantes, a qual exige, além do tratamento igualitário dos
imigrantes legais e cidadãos nativos no âmbito laboral, a informação de seus direitos
em uma língua compreensível para eles, que possam recorrer ao judiciário em caso
de deportação, além de estabelecer regras para o recrutamento de estrangeiros
(Reis, 2004, p. 152).
Em sua interpretação mais tradicionalista, a Declaração dos Direitos
Humanos serviria para regulamentar somente a relação entre Estados e seus
cidadãos, todavia o aumento na imigração no mundo a cada dia torna mais comum
sua utilização como parâmetro regulador da relação: estado receptor – imigrantes.
As leis de imigração de cada país também tentam agora abarcar as questões
relacionadas aos Direitos Humanos, sendo um dos motivos pelos quais ocorrem as
mudanças e modernizações na legislação.
Porém as leis imigratórias não mudam de forma igualitária em cada país. As
peculiaridades do fenômeno no Brasil e na Espanha fazem com que a regulação da
34
imigração seja diferente em cada um deles em termos de aprofundamento,
abordagem de questões e interesses do próprio país.
O que se pode observar, dentre outras questões, nos dois contextos
imigratórios citados, do Brasil e da Espanha, são: a mudança em termos de números
com o passar do tempo e a mudança, conseqüente, em termos de legislação.
Apesar da observância destas questões comuns, qualitativamente elas são bastante
distintas. No Brasil ocorreu um decréscimo na quantidade de imigrantes no que se
relaciona à história da imigração neste país. Já a mudança na legislação brasileira
visa a modernizar seus pressupostos para atender à realidade mundial, bem como
garantir os direitos civis e fundamentais do estrangeiro no Brasil de forma mais ágil,
flexível e democrática. Contemplar a questão dos direitos humanos também é
interesse da nova lei. No que diz respeito à realidade imigratória da Espanha, houve
um acréscimo no número de entradas no país, o que ocorreu abruptamente,
causando uma rápida obsolescência das leis do país, que por sua vez já não eram
antigas. As mudanças na lei espanhola, diferentemente do Brasil, foram mudadas
principalmente pela realidade apresentada em virtude da grande chegada de
imigrantes, e não somente para uma modernização em nível de tendências
mundiais, como no caso brasileiro.
A diferença em números de entrada de imigrantes entre os dois países
apresentados é traduzida em conseqüências da imigração específicas para os
próprios países, para os imigrantes e também em relação à referência feita ao tema
na imprensa em geral, no caso específico deste trabalho, na imprensa escrita. As
conseqüências para o país podem ser interpretadas como conseqüências em termos
35
sociais, financeiros, humanitários, político etc. No que se trata das conseqüências
para os imigrantes podem ser elencados a exclusão social, até como resposta pela
má adaptação das políticas públicas à realidade imigratória, o sofrimento psíquico,
inclusão social, etc. E as conseqüências no tocante ao tratamento dado ao tema
pela imprensa são relacionadas ao número e recorrências de notícias, abordagem
política, número de publicações de gênero opinativo, entre outros.
Na mesma proporção do tamanho do fenômeno imigratório em cada país, há
a resposta das referidas conseqüências. Ou seja, quanto maior e mais forte o
fenômeno, maior e mais forte será o que por ele é gerado. No Brasil a imigração
parece trazer conseqüências menos visíveis do que na Espanha, dado a diferença
da magnitude do fenômeno nos referidos países. As políticas públicas brasileiras
não são tão afetadas pela entrada de pessoas de outros países, bem como o tema
da imigração não é tão recorrente na agenda noticiosa do país quanto na da
Espanha.
Observando as questões mencionadas nos parágrafos imediatamente
anteriores pode-se notar como a imprensa é permeada por seu contexto, entretanto
cabe aqui frisar que ela também é parte de todas essas questões discutidas. Ela é
parte do processo de mediação entre o fato, aqui a imigração, e as pessoas,
entretanto há um elo importante desta relação que precisa terminantemente ser
mencionado: o texto jornalístico.
Entre o fato em si, real, e a publicação jornalística existe o indivíduo que é
responsável pela produção do texto. A imparcialidade no jornalismo é um tema de
discussão antigo, entretanto sabe-se que a objetividade completa é uma utopia, já
36
que o ser humano carrega consigo suas opiniões, suas representações, suas
vivências e imagens construídas historicamente, o que, por sua vez orienta suas
condutas frente aos temas. Por mais que o jornalista tente se isentar, isso não se dá
completamente. O que não é necessariamente um demérito.
De acordo com Marcondes Filho (2002), profissional jornalista, como todas as
outras pessoas, faz uma seleção dos fatos novos e os classifica de acordo com suas
próprias convicções e estereótipos. “Assim eles (os jornalistas) se tornam atores
privilegiados na manutenção de idéias, verdadeiros agentes conservadores de
cultura, visto que têm acesso a meios de divulgação em massa de suas idéias (e
preconceitos)” (Marcondes Filho, 2002. p. 109).
O próprio Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros fala da verdade como o
compromisso primordial desse profissional. O Art. 7º do código diz “o compromisso
fundamental do jornalista é com a verdade dos fatos, e seu trabalho se pauta pela
precisa apuração dos acontecimentos e sua correta divulgação” (Lage, 2002. p. 92).
Mas nem sempre essa conduta é tomada, o que ocorre por diversos fatores, desde
pressões da empresa jornalística, até pelas próprias convicções do jornalista. Neste
ensejo, cabe indagar-se a respeito de como os textos sobre a imigração e o
imigrante são produzidos, até que ponto estão em acordo com a realidade e que
afetos podem ser despertados a partir dessas produções.
Conhecer o que se diz da imigração e do imigrante a partir da perspectiva dos
meios de comunicação escritos é atentar para uma das importantes ferramentas
dadas aos indivíduos para que eles tenham informações sobre o mundo, construam
suas imagens e orientem suas condutas frente a ele.
37
Portanto, será analisado o significado da imigração/imigrante produzido pela
imprensa à luz da inclusão/exclusão social. Não se busca, portanto, uma análise da
imprensa em si, mas da imprensa enquanto mediadora de produção de significados
da vida em sociedade. Nossa análise busca identificar as representações sociais
sobre imigrante/imigração e implicações com a questão da exclusão/inclusão social
que ela produz e põe em circulação.
Acredita-se, aqui, que o sentido da Imigração e do Imigrante na imprensa não
é construído pela subjetividade de quem elabora os textos jornalísticos, nem pelas
circunstâncias que permeiam as condições de tais produções textuais. Não é esse
sentido construído também pelo sistema social e pelas suas determinações, mas
sim, é tecido na interação entre sujeito e sociedade, a qual é produzida por meio da
articulação entre mundo e sujeito, que por sua vez, forma e transforma as visões de
mundo, ou seja, as representações sociais. Apreender o sentido da Imigração e do
Imigrante nos jornais pesquisados, é dizer, no senso comum, é construir a realidade
social do coletivo e dos meios em estudo.
Assim, o presente estudo propôs apreender a organização simbólica das
informações veiculadas nos jornais brasileiros e espanhóis sobre Imigração e
Imigrante, indagando-se sobre: Que informações, sobre Imigração e Imigrante, são
elaboradas pelos jornais do Brasil e da Espanha? Quais as atitudes, os afetos
despertados por tais informações veiculadas por estes jornais? Qual imagem está
sendo produzida a respeito da imigração e do imigrante a partir de tais informações
e tais afetos? Onde estão ancoradas as informações divulgadas nos jornais
brasileiros e espanhóis a respeito da Imigração e do Imigrante? Quais as
38
semelhanças e diferenças da organização simbólica dos artigos / notícias sobre
Imigração e Imigrante nesses diferentes jornais de diferentes países? Que tipo de
subjetividade é produzido a respeito da imigração e do imigrante em face do que é
veiculado?
Alguns estudos já abordaram questões semelhantes às que neste estudo são
apresentadas, o que os torna guias para o seguimento desta dissertação. Refere-se
à tese de Moscovici (1961), intitulada, “A Psicanálise, sua imagem e seu público”, ao
estudo de Ordaz & Vala (1997), “Objetivação e ancoragem das representações
sociais do suicídio na imprensa escrita” e à tese de doutorado de Sandra
Jovchelovitch (2000), “Representações Sociais e Esfera Pública: A construção dos
espaços públicos no Brasil”.
O três estudos mostram semelhanças no que diz respeito ao uso da imprensa
como “instrumento”, bem como o uso dos conceitos a respeito do fenômeno das
representações sociais. A mídia impressa foi o alvo dos três pesquisadores em seus
estudos. A análise de conteúdo também foi utilizada nos trabalhos de Moscovici e
Jovchelovitch. A questão do significado e dos sistemas de comunicação esteve
presente no estudo de Vala, assim como no de Moscovici, o qual elaborou a
taxonomia.
O presente trabalho tem metodologia e objetivos semelhantes aos relatados
acima. Proceder-se-á de modo semelhante na análise das notícias por meio de
análise de conteúdo, como também será feito o uso da taxonomia dos sistemas de
comunicação proposta por Moscovici. Os três trabalhos aqui descritos servirão de
expoentes para esta pesquisa em andamento.
39
CAPÍTULO II
PERSPECTIVA CONCEITUAL DO ESTUDO
2.1 Imigração e Imigrantes
De acordo com o Instituto de Migrações e Direitos Humanos, a migração
significa movimento de pessoas, grupos ou povos de um lugar para outro. Desde os
países em desenvolvimento, até os países desenvolvidos a preocupação com a
questão das migrações tem se tornado crescente sejam elas nacionais ou
internacionais. Nacionais quando se trata de fenômenos migratórios ocorrentes no
próprio país, e internacionais quando se tem as migrações de um país para outro, ou
seja, imigração e emigração. Vários aspectos podem contribuir para que ocorra a
migração. Crises econômicas, pobreza, desastres naturais, guerras, etc., são alguns
dos fatores contribuintes, os quais serão debatidos a seguir.
Neste trabalho será enfocada a imigração, em face disso tal conceito será
retratado com mais veemência, mesmo sabendo-se, entretanto, que o fenômeno
migratório existe hoje com tanta virulência que é complicado falar apenas sobre um
lado dele. Falar de imigração por um lado é falar de emigração pelo outro, sendo
mais lógico tratar de migrações internacionais.
A imigração ocorre, segundo o Instituto de Migrações e Direitos Humanos,
quando há um movimento de pessoas ou de grupos humanos, provenientes de
outras áreas, que entram em determinado país, com o intuito de permanecer
definitivamente ou por período de tempo relativamente longo. A definição incita a
40
pergunta: por que as pessoas o fazem? Afinal, sair de seu lugar de origem não é
algo simples, então o que ocorre na vida de determinados indivíduos para que eles
prefiram viver em outro país que não o seu?
O ato de imigrar é um fenômeno antigo que se repete ao longo dos tempos,
entretanto o contexto social de cada época evoca motivações distintas para que isso
ocorra. Em primeiro lugar, é preciso atentar para a questão complexa que envolve o
ato de imigrar. É dizer, várias dimensões estão envolvidas para desencadear o
processo imigratório. “São transformações econômicas, demográficas, políticas e
sociais que ocorrem no seio da sociedade que fazem com que as pessoas migrem”
(Castles, 2005. p. 7). De acordo com o mesmo autor, a emigração para as colônias,
a partir do século XVI, foi um elemento fundamental para a construção dos impérios
europeus. Já no século XIX, a imigração por motivo de trabalho para a América do
Norte, assim como no continente europeu, teve um importante papel nos processos
de industrialização. Em momentos mais recentes, podem ser citadas também as
migrações em grande escala da Europa do Sul para o norte da Europa Ocidental
como um fator essencial para o crescimento econômico no pós-guerra (Castles,
2005. p. 7).
A partir da década de 80, as migrações assumiram um caráter global, os
fluxos históricos de imigrantes inverteram-se, os antigos países de emigração
transformaram-se em novas áreas de imigração, os fluxos migratórios são agora
mais volumosos, rápidos e complexos do que no passado (Castles, 2005. p. 7).
Ao longo do tempo o processo imigratório passou por várias “fases”. Com
isso, foram surgindo também diversas explicações para as causas da imigração.
41
Serão citadas aqui algumas das vertentes explicativas do fenômeno, as quais em
sua maioria, mesmo tendo diferenças conceituais convergem para uma mesma
visão de futuro: o crescimento da imigração.
Existem as explicações demográficas, que destacam as diferenças estruturais
que se observam entre áreas com economias estagnadas e com altas taxas de
fertilidade, de um lado, enquanto que do outro há áreas com economias em rápido
crescimento e com declínio nas taxas de natalidade (Hugo, 1998). Destacam-se
nessa situação o Sul e o Ocidente da Europa, onde as taxas de fertilidade caíram
para 1,2 filhos por mulher, o que está abaixo do fator de reposição da população. O
que resulta dessa realidade são o rápido envelhecimento da população e a escassez
de pessoas em idade produtiva, levando à carência de mão-de-obra, sobretudo para
trabalhos de baixa qualificação.
A economia neoclássica também explica, a seu modo, as causas da
imigração, centrando-se nas expectativas individuais de salários mais altos e de
melhores oportunidades econômicas nas áreas-alvo da imigração em relação aos
lugares de origem. Essa perspectiva sinaliza para a condução, em longo prazo, de
uma convergência salarial entre os países receptores e emissores, o que, por
conseguinte, diminuiria a imigração. Esta explicação é bastante criticada, já que, de
acordo com Castles (2005) as disparidades salariais obviamente não diminuem, pelo
contrário, estão aumentando.
A nova economia das migrações e uma abordagem que dá maior relevância
aos elementos coletivos envolvidos na decisão de migrar. Esta explicação é vista
como parte das estratégias de sobrevivência familiar e de comunidades, sendo
42
estabelecida por considerações feitas a longo prazo em relação à segurança e à
sustentabilidade, assim como pelo papel das remessas e das oportunidades de
investimentos (Stark, 1999). Também de acordo com esta teoria a imigração tende a
aumentar, visto que o alto grau de insegurança em muitas áreas de origem torna
bastante lógico o envio de um membro da família para uma economia diferente e
teoricamente mais estável.
Já as abordagens histórico-institucionais falam sobre o papel das grandes
instituições, sobretudo as empresas e os Estados, no desencadeamento e na
modulação dos fluxos migratórios. Os grandes recrutamentos de mão-de-obra,
encorajados pelas autoridades econômicas e pelos agentes dos mercados de
trabalho foram decisivos para o surgimento dos fluxos de imigração rumo à Europa
Ocidental depois de 1945. As contratações também têm sido muito importantes no
que diz respeito às imigrações para os países produtores de petróleo do Golfo
Pérsico e para alguns países da Ásia como Taiwan, Malásia e Singapura (Castles,
2005).
Diante da posição importante dada ao Estado nessa abordagem, há margem
para que se pense que a mudança de rumo nas políticas estatais relacionadas à
imigração por si só já bastaria para diminuir ou acabar com as imigrações.
Entretanto, segundo Castles (2005) depois que é iniciado um processo imigratório,
ainda que seja por supervisão do Estado, ele toma rumos distintos, demonstrando
assim que possui uma dinâmica própria, não sendo facilmente detido.
Há também as explicações sociológicas das migrações, as quais se centram
na importância que os capitais cultural e social do homem assumem. Lê-se aqui por
43
capital cultural o conhecimento relativo a outras sociedades, assim como à
informação a respeito do modo concreto de se deslocar e de buscar trabalho em
outro lugar. Neste âmbito, torna-se claro o papel da globalização na aquisição desse
capital cultural aqui explicado, já que ela o disponibiliza com facilidade. Imagens
relativas a estilos de vida ocidentais para as mais distantes aldeias. A prosperidade
na educação das populações também facilita os movimentos. No que se refere ao
capital social entende-se os relacionamentos necessários para migrar de modo
seguro e eficiente no que diz respeito aos custos. De acordo com Castles (2005) os
caminhos dos imigrantes geralmente já foram trilhados por outros, o que facilita o
acesso ao país de destino e dá apoio para superar dificuldades de alojamento e
burocráticas. Este tipo de imigração, segundo o mesmo autor, vem ganhando força,
pois estão sendo potencializados por melhorias ocorridas nas tecnologias das
comunicações e dos transportes na era da globalização.
Em meio às possíveis causas, figura a dimensão da complexidade do
fenômeno imigratório e do quão importante significa a análise contextual dele.
Mesmo sendo de diferentes abordagens a causa da imigração aqui explicitada
percebe-se uma constante: a busca. Em todas as explicações existe uma busca,
seja do país receptor, seja do próprio imigrante. Sempre há a figura do que
possuidor e do despossuído. Neste âmbito, percebe-se que a questão imigratória é
perpassada pela exclusão/inclusão social e suas circunstâncias.
Assistimos freqüentemente às notícias relacionadas a problemas em virtude
da imigração. Entretanto, não há somente um tipo de imigração, existem vários,
cada um relacionado ao seu contexto histórico. Austrália desde 1946, visando ao
44
desenvolvimento e povoamento do país (Castles & Miller, 2003. p. 243- 244). A
Alemanha também é um exemplo no qual houve um planejamento para
trabalhadores-hóspedes, com o intuito de reforçar a economia no ano de 1945
(Castles & Miller, 2003. p. 244).
De acordo com Castles (2005), em meio a tantos razões para a imigração, no
século XX foram três os tipos predominantes de migrações primárias: as migrações
de fixação definitiva, as migrações laborais temporárias e os movimentos de
refugiados. Todavia, a tendência é de mescla destes tipos de fluxos e diversificação
deles, sempre tendo em vista a reunificação familiar.
Existem as migrações altamente qualificadas, as quais constituem atualmente
o tipo de migração mais procurada pelos governos dos países receptores. Países
como Estados Unidos, Canadá e Austrália, desde a década de 80, têm estabelecido
sistemas de entradas privilegiadas para atrair empresários, executivos, cientistas,
técnicos especialistas, etc.
Há também as migrações de trabalhadores com fracas qualificações. Este
tipo de migração foi crucial para o crescimento industrial após 1945 na maioria dos
países desenvolvidos, entretanto é comumente rejeitada atualmente, já que é
considerada socialmente perigosa e economicamente desnecessária. Nos países
recém-industrializados esse tipo de migração ainda ocorre para a indústria e
agricultura. O que ocorre, porém, é que há a utilização de pessoas ilegais ou em
busca de asilo nessas funções, o que, pela privação de direitos, facilita a exploração.
Cita-se ainda o termo bem abrangente “migração forçada”, antigamente mais
referida como migração de refugiados. De acordo com as Nações Unidas, no ano de
45
2000 havia cerca de 12 milhões de refugiados no mundo, o que supera todos os
números em relação aos outros tipos de migração forçada. Ou seja, pessoas em
busca de asilo, pessoas deslocadas internamente, retornados de situações de
conflito, pessoas deslocadas em virtude de catástrofes naturais e pessoas
deslocadas por causa da execução de projetos de desenvolvimento, como
barragens, etc.
O contexto globalizado trouxe, segundo Castles (2005), novos tipos de
migração, bem como a retomada forte de outros já existentes. O tipo de migração
denominado “fenômeno do astronauta” é um dos novos tipos de migração. Aqui,
famílias inteiras saem de seus países de origem para países como Canadá e
Austrália, em face do estilo de vida e segurança, enquanto o responsável
financeiramente pela família retorna ao país de nascença para trabalhar, o que o faz
viajar enorme distâncias com freqüência.
Figura também a migração de retorno, que mesmo não sendo nova, hoje em
dia toma fôlego, como resultado de tendências de imigração laboral temporária. Os
migrantes retornados mostram-se importantes agentes de mudança econômica,
social e cultural, tendo atraído uma atenção crescente em processos de
desenvolvimento (ONU, 1998; Castles, 2000a apud Castles, 2005).
As melhorias nas comunicações e nos transportes têm elevado o tipo de
imigração chamado “imigração de reformados”. Ele trata da migração de pessoas de
países ricos e clima pouco atraente que buscam aproveitar seus últimos anos em
ambientes mais agradáveis. Este fato traz impactos culturais e serve de base ao
surgimento de novas indústrias e serviços.
46
Por fim, deve-se falar da imigração póstuma. Tal fenômeno é reflexo da
complexidade cultural e psicológica da experiência migratória. Muitos migrantes
fazem planos para que seus corpos sejam enviados ao seu solo nativos, para lá
serem enterrados (Tribalat, 1995 apud Castles, 2005). Observa-se assim a
importância da melhoria nos transportes.
2.2 Exclusão e Imigração
A discussão a respeito da exclusão / inclusão social remete ao estudo do
indivíduo e das relações sociais em sua totalidade, assim como a uma reflexão da
realidade onde se encontram as contradições entre os movimentos em defesa da
inclusão social e as práticas exclusivas perpassadas pelas instituições sociais.
As formas de excluir e de comunicar a exclusão são onde residem algumas
mudanças de acordo com as realidades ao longo do tempo. As novas maneiras de
informar a exclusão trazidas pelas novas tecnologias fazem com que a idéia da
exclusão pareça nova, atual, mas não o é. O que ocorre é que a exclusão social
muda seu conceito a cada tempo, cada contexto, se transformando de acordo com a
realidade confrontada. Em face desta característica, não há conceito fechado para a
antiga problemática da exclusão. Em cada tempo há um conceito que mais se
aplica. Diante disso surgem as perguntas: o que realmente é exclusão social? E
como se dá a exclusão social?
O termo “exclusão social” pode referir-se à desigualdade social, à miséria e à
pobreza, à privação em geral, ao fato de estar à margem, enfim todos têm algo a
dizer, cientificamente ou não, sobre este tema. Para Catão (2005), a exclusão social
47
é negação da coesão social, é a degradação da identidade de cada indivíduo e
também dos grupos, é, por fim, a desintegração e desorganização das relações
sociais. E acrescenta “Trata-se de um atentado à dignidade humana, pois comporta
uma ofensa ao eu do excluído, produz significados nos indivíduos e grupos
implicados, traduz um pensamento e um sentimento de abandono. Orienta condutas
e ações no mundo, produz marginalização e delinqüência.” (Catão, 2005).
A mesma autora vê a exclusão social como um produto do sistema social,
político, econômico e cultural, portanto, não deve ser explicada pelas
características do indivíduo excluído ou das instituições sociais. Há uma relação
intrínseca entre os indivíduos e as instituições sociais que são constituídas por
normas e práticas com o intuito de preservar o instituído e/ou criar novas
instituições, no qual determina o processo de exclusão (Lourau; Catão, apud Catão,
2005). Percebe-se que o excluído está sempre ligado à realidade que o constrói e
para identificá-lo é necessário recorrer às seguintes indagações: Excluído por
quem? Excluído de quê? Excluído de onde? A questão excluído / incluído implica
uma relação dialética de afirmação / superação, na qual o sujeito excluído é o
afastado, o desviado, o retirado, enquanto o sujeito incluído é o envolvido, o
assimilado, o abrangido.
De acordo com Xiberras (1993), excluídas são todas as pessoas que não
participam dos mercados de bens materiais ou culturais. Já Castel (1997) lê a
exclusão como uma desafiliação, a qual representa uma ruptura de pertencimento e
de vínculos societais. Em face disso, o desafiliado é um sujeito que em cuja
48
trajetória é feita uma série de rupturas relacionadas a estados de equilíbrio
anteriores, que são estáveis ou instáveis.
Como analisa Sawaia (1999, p. 8) “a sociedade exclui para incluir e esta
transmutação é condição da ordem social desigual, o que implica o caráter ilusório
da inclusão”. Pode-se observar que todos os indivíduos estão incluídos de alguma
forma, mesmo que não seja de forma digna, apenas no sentido da insuficiência e
da privação destinada às minorias sociais. Ao invés de pensar a exclusão como
fato único, isolado, a autora compreende a dialética exclusão / inclusão, na análise
da desigualdade social, a partir de princípios éticos e da subjetividade humana e
nas interpretações legalistas da inclusão através da justiça social e do papel do
Estado nos mecanismos excludentes e no sofrimento do outro (Sawaia, 1999).
Mesmo tendo como cenário diferentes realidades sociais ao longo do tempo
e, por conseguinte, diferentes conceitos, na mesma linha de pensamento de Sawaia
(1999), de acordo com Catão (2005), a exclusão é fruto da interação entre dois
elementos constitutivos do sistema de exclusão, os indivíduos e as instituições
sociais. As diferentes sociedades através dos tempos produziram seus excluídos
dentro de suas características peculiares. (Catão, 2005).
Desde a época colonial já se podia verificar exemplos de exclusão social.
Mesmo em leis e declarações de direitos, em várias partes do mundo, não havia a
igualdade entre os indivíduos, dessa forma a exclusão era institucionalizada. Em sua
fase escravista o Brasil, ao mesmo tempo em que excluía o escravo, dependia dele,
em grande parte, para sustento de sua produção. Os escravos, as mulheres, os
pobres em geral foram durante muito tempo privados do direito de votar e da própria
49
liberdade (Tosi, 2004). As benesses da evolução e riqueza humanas não eram, e
não são, do direito de todos, só os homens adultos e ricos tiveram esse privilégio
durante alguns séculos.
Mesmo tendo a existência remontada há anos atrás, a exclusão nem sempre
teve sua noção amplamente difundida como atualmente é. Antes da década de 80
não se pensava a exclusão social fora da responsabilidade das instituições e da
própria política. A partir da década de 80 a noção de exclusão volta à cena com
outra roupagem. O contexto do momento contribuiu para isso. Várias pesquisas
relacionadas ao tema foram realizadas à época, além de a União Européia está
sendo estruturada, levantando a questão de exclusão e integração (Catão, 2005). O
termo passou a ser visto de outra forma, levando a crer, em última análise, que os
indivíduos excluídos são barrados de lugares sociais como resultado da crise
econômica, portanto, passa-se a pensar a exclusão social como um processo
subjetivo/objetivo em que a auto e hétero exclusão na vida pública e privada são
confundidas e re-alimentadas (Arent; Jovchelivitch, apud Catão, 2005).
A partir dos anos 90 a exclusão é retomada com enfoque não no conceito de
exclusão social em si, mas sim nos grupos que são vitimizados por ela e nos
próprios processos que poderiam levar à situação de exclusão. Atualmente existem
milhares de formas de exclusão, e novas formas surgem a cada dia a partir da
interação indivíduo sociedade.
Para Catão (2005) a problemática da exclusão precisa ser analisada como
processo social objetivo/subjetivo presente no cotidiano da população,
considerando-se as políticas públicas ineficazes e o papel da sociedade em mudar
50
esse quadro de exclusão e sofrimento. As marcas deixadas pelas práticas
exclusivas, que ainda manifestam-se em muitas esferas sociais, indicam a ausência
de compromisso ético com a Declaração Universal dos Direitos Humanos votado
pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948. Esta declaração divulgou o
princípio de que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos.
São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com
espírito de fraternidade”.
Entre outras normas internacionais de proteção dos direitos humanos
destaca-se a Conferência Mundial de Direitos Humanos (1993), realizada em Viena
e, em nível nacional pode-se destacar o Programa Nacional dos Direitos Humanos
(1995), em que o Brasil assume o compromisso com a proteção dos direitos
humanos de mulheres, crianças, idosos, minorias e excluídos (Catão, 2005).
Segundo Moscovici (2003) os indivíduos não são apenas construídos pelas
características do contexto social, mas especificamente mediante a forma como
apreendem este contexto, suas significações e significados. As representações
sociais auxiliam o ser humano no modo de ver o mundo a partir de questões da
sociedade, da história e processos psíquicos. “Uma representação funciona como
um suporte do saber que vai agir diretamente sobre as práticas e a forma de
relação do indivíduo com o outro e com o mundo” (Catão, 2005, p. 334). Neste
sentido, entende-se que através do sentido das representações sociais pode-se
compreender o quanto o sujeito internaliza o seu comportamento, em outras
palavras, o quanto o problema social da exclusão esta produzindo o “ser” e o
quanto esse problema da exclusão tem do “ser” humano (Catão, 2005).
51
Sawaia (1999) analisa o processo de exclusão a partir da afetividade e em
especial pelo sofrimento. Compreender a exclusão como sofrimento de diversas
formas recupera o indivíduo perdido nas análises econômicas e políticas sem
perder o coletivo, bem como conduz a uma reflexão da função do Estado para com
os cidadãos. A referida autora optou pelo sofrimento em sua qualificação ético-
político como categoria de análise da exclusão, bem como buscou uma unidade de
análise do comportamento humano que se incluem todas as manifestações
psicológicas. Para Vigotski, apud Sawaia (1999) essa unidade analítica é o
significado, capaz de interligar as diferentes funções psicológicas e destas com o
corpo e a sociedade. O significado é um fenômeno intersubjetivo, portanto, social e
histórico, que se traduz em ideologia e funções psicológicas distintas, porém com
raiz biológica.
O sofrimento ético-político abrange as múltiplas afecções do corpo e da alma
que se manifestam de diferentes formas na vida do sujeito. Este sofrimento
qualifica-se no modo como alguém é tratado, como se trata o outro na
intersubjetividade, cuja dinâmica e conteúdo são determinados pela organização
social. Sawaia (1999) esclarece ainda que as questões sociais dominantes em
cada momento histórico reproduzem o sofrimento ético-político, principalmente a
dor que surge da situação social de ser tratado como inferior, sem valor para a
sociedade. A análise do sofrimento ético-político revela uma falsa aparência de
integração social e as duas faces da exclusão/inclusão marcadas pelo problema da
desigualdade social, a injustiça e a exploração.
52
Ao optar-se pela expressão dialética exclusão / inclusão faz-se a distinção de
que ambas não são categorias em si, cujo significado é dado por suas qualidades
específicas, mas que são da mesma substância, formando um par indissociável,
constituído na própria relação. Trata-se de um processo no qual as duas, inclusão e
exclusão, coexistem (Sawaia, 1999).
Segundo Sawaia (1999), as pesquisas têm revelado que o sofrimento gerado
pelo estado de inferioridade do sujeito, sem valor social e pelo impedimento de
desenvolver, mesmo que seja apenas uma parte, do seu potencial, é um dos
sofrimentos mais verbalizados. No entanto, o mais relevante na origem desse
sofrimento está na consciência do sentimento de desvalor social, de
deslegitimidade e do desejo de ser reconhecido como cidadão e gozar de seus
direitos. Percebe-se que não basta definir as emoções humanas, é preciso também
conhecer o motivo que as originam e as direcionam e que determinam a relação do
sujeito com a situação que lhe emociona.
Sawaia (1999) crê que a maioria das análises sobre a exclusão baseia-se
em valores éticos universais, elegendo a humanidade como princípio regulador
capaz de minimizar os seus efeitos na sociedade. Espinosa, apud Sawaia (1999)
denominou este princípio de “potência de ação” e o contrapôs à “potência de
padecer”. O conceito de potência de ação é entendido como o direito que cada
indivíduo tem de ser, de se afirmar e se expandir, sendo o desenvolvimento a
condição necessária para se alcançar a liberdade. Por outro lado, a potência de
padecer (paixões tristes e alegrias passivas) gera a servidão ao outro, situação na
qual se coloca nas mãos de outro sujeito as idéias sobre as afecções do próprio
53
corpo. Enquanto a potência de ação impulsiona o indivíduo a agir, a superar os
problemas, a potência de padecer leva o indivíduo à passividade, não há estímulo
para que este enfrente a própria realidade.
Potencializar significa atuar construtivamente, pró - ativamente, realçando o
papel positivo das emoções na educação e conscientização, no modo de pensar e
agir racionalmente. A idéia de potência pressupõe o desenvolvimento de valores
éticos que são expressos através dos sentimentos, desejos e necessidades com o
intuito de superar o sofrimento ético-político (Sawaia, 1999).
A preocupação com a potencialização pessoal e coletiva rompe a barreira
artificial entre a universalidade ética e o desejo individual de cada um. Entende-se
que somente será possível desenvolver ao máximo a potência de ação quando o
objetivo pessoal implica a presença de outros, ninguém consegue realizar-se
plenamente sozinho, os benefícios de uma união organizada são relevantes a
todos. A ética só emerge no ser humano quando ele se conscientiza de que o maior
bem para si, está no fazer bem ao próximo (Sawaia, 1999).
Nesta perspectiva, pode-se pensar na sociedade moderna enquanto
ambiente de aproximação entre os povos, anulando as fronteiras geográficas e
raciais e estimulando a autotransformação e a transformação das coisas (Marshall,
1986). Uma sociedade formada por diferentes povos deveria estar preparada para
acolher a todos, independentemente de raça, religião e/ou condição social.
Segundo Werneck, apud Domingos (2000) na sociedade inclusiva os cidadãos são
responsáveis pelo bem-estar do próximo, por mais diferente que ele seja ou nos
pareça ser; a inclusão é primordialmente uma questão ética.
54
É neste ensejo que se pensa, como questão pertinente da atualidade em
termos de exclusão/inclusão, a temática da imigração. A própria imigração já
pressupõe uma forma de exclusão. A decisão de ausentar-se do seu ambiente tem
subjacente, na maioria das vezes, fatores de exclusão social e esperança de
inclusão. Efetivada a imigração novas formas de exclusão vêm à tona, já que o
indivíduo encontra-se em ambiente novo, estranho às suas peculiaridades. Tal
exemplo mostra claramente o movimento social constante que ocorre na relação
indivíduo-sociedade. Os dois se completam e se põe lacunas concomitantemente,
gerando relações contraditórias, rumo à transformação. Nesse cenário é que
“nascem” e jazem modalidades de exclusão/inclusão social.
Segundo Catão (2005), o paradigma individualista atualmente ainda permeia
o sentido da noção de exclusão social, ou seja, é atribuída ao excluído social essa
característica como se lhe fosse peculiar. Essa concepção vai de encontro à
perspectiva sócio-histórica, já que esta entende os fenômenos como produto da
história e contexto humanos. A exclusão social é uma produção sócio-histórica de
um grande número de elementos constitutivos da relação entre indivíduos e
instituições sociais (Catão, 2005). Nessa perspectiva, entende-se a imigração, na
maioria das vezes, como sendo encorajada por uma situação de desconforto e
infelicidade em sua terra de origem. Fazendo essa leitura o contexto social é
contemplado na discussão sobre a exclusão.
No cerne de várias pesquisas empreendidas no mundo e de diversas notícias
amplamente divulgadas na imprensa a problemática da imigração mostra sua
55
importância e seu viés de exclusão social. Toda essa atenção em direção ao tema
faz com que seja feito um exercício em busca de respostas relacionadas a ele.
A partir do momento em que se depara com uma realidade alheia à sua
conjuntura de costume, o imigrante sofre um choque cultural. Tal choque é produto
da chamada experiência intercultural. A assimilação de outra cultura é um processo
lento e nem sempre prazeroso, o que pode trazer frustrações e estresse (Lewis &
Jungman, 1986).
A França, por exemplo, nos anos 70 tentou conciliar esta diferença cultural
entre os imigrantes e os nativos franceses com a política de promoção da cultura
imigrante (Cuche, 1999). Segundo o mesmo autor, “gerir a diferença é, de certa
maneira, recusar a assimilação total dos imigrantes à nação francesa.”. Ou seja, é
não aceitar a diferença, é afirmar que as particularidades culturais dos imigrantes
são inassimiláveis. Cuche acrescenta ainda que vários países adotaram a “moda” da
política de promover a cultura dos imigrantes como forma de fazê-los regressar a
seus países. Esta seria uma forma de fechá-los em uma identidade imutável. Seria
uma tentativa de caricaturar as diferenças culturais.
Ademais dessas questões individuais e culturais que permeiam o ser humano
ao deparar-se com uma nova cultura, as questões sociais como um todo são
também bastante pertinentes. O imigrante é confrontado com o preconceito, às
vezes a ilegalidade e, por conseqüência, com a exclusão social. O imigrante chega
freqüentemente já com o estigma da própria imigração. É dizer, os fatos que o
fizeram migrar o marcam como necessitado, diminuído e até humilhado diante de
56
seu novo lar. Os subempregos, geralmente são os reservados aos coletivos
imigrantes.
“Os governos dos países de origem os estimulam a abandonar o país, já que
isso significará o envio de remessas ao exterior e um alívio da pressão social
interna. Os governos dos países receptores são cada vez mais radicais quanto a
admitir trabalhadores imigrantes não qualificados, se bem que fazem vista
grossa diante das permanências ilegais quando têm necessidade de mão-de-
obra.” (Castles, 1997).
Inseridos em uma realidade de exclusão social em sua nova casa o imigrante
passa ser um indivíduo excluído duas vezes. Ou seja, por tentar melhoria de vida e
de inclusão social em outro país confronta-se com um contexto social que acaba por
não comportá-lo como ele esperava, configurando assim uma nova forma de
exclusão, não mais em seu país de origem, mas sim em uma terra estranha às suas
representações.
Com tantas problemáticas relacionadas, a imigração se torna uma pauta
incansável de pesquisas científicas e jornalísticas. Não é em vão o fato de a
imigração ser alvo constante tanto da imprensa como da comunidade científica. Tal
feito mostra sua complexidade, a qual é bastante convidativa à curiosidade e ao
interesse dos pesquisadores. Isso ocorre pela pluralidade de fatores que é inerente
ao fenômeno.
57
Diante desse contexto há lugar para perguntas sobre a abordagem da
questão pela imprensa, especialmente aqui, brasileira e espanhola. A história e a
intensidade da imigração nos dois países influenciam a perspectiva dos conteúdos
veiculados? Esta é mais uma questão que surge das múltiplas faces do fenômeno
migratório.
Em face dessa conjuntura social não só o fenômeno migratório é importante,
mas sim como se fala dele, o que é associado a ele e como se faz as pessoas o
perceberem. O papel da mídia nessa questão é de fundamental importância, já que
ela é um elo potente entre a realidade e as pessoas, entre o fato e a opinião sobre
ele. Opinião esta que influencia comportamentos e orienta condutas. Entretanto, isto
não significa dizer que o conteúdo transmitido pela imprensa demonstra claramente
a realidade como ela é. Ou seja, o que é passado pela mídia pode influenciar
negativamente ou positivamente o indivíduo sobre um determinado assunto, fazendo
com que, dependendo do conteúdo, a certos coletivos, como o imigrante, sejam
associadas imagens, estereótipos, etc.
2.3 Representações Sociais
Falar de Representações Sociais (RS) é falar de um processo dinâmico, um
fenômeno psico-social que envolve cognição e práticas sociais. Dentro de um grupo
de pertença há compartilhamento de relações através da comunicação, as quais
permitem a “produção” das Representações Sociais.
A Teoria das Representações Sociais emerge em 1961 com vigor quando
Moscovici lança sua tese “La psychanalyse: son image et son public” tomando como
58
objeto de pesquisa a apropriação da psicanálise pelo público francês dos anos 50 e
observando como esse saber penetrou na vida cotidiana dos franceses. À época,
um longo debate em torno da Psicanálise mobilizou Paris, intelectuais e estudantes
universitários. A polêmica que nasceu a portas fechadas repercutiu na imprensa e
revistas não especializadas publicaram artigos sobre a psicanálise. Moscovici
encontra então nesta temática o objeto para observar como ocorreu a apropriação
desse novo saber na vida da sociedade francesa pós-guerra.
Moscovici (1961) em seu trabalho traz uma análise detalhada da imprensa
francesa, a partir desta, por meio da análise da relação entre diferentes setores da
imprensa da França e a psicanálise, que ele propôs uma taxonomia para os
sistemas de comunicação, notadamente da comunicação social, são eles: difusão,
propagação e propaganda, os quais serão explicados posteriormente.
Em sua tese Moscovici lança duas problemáticas. A problemática específica
diz respeito a como é consumida, transformada e utilizada pelo senso comum uma
teoria específica, ou seja, o homem como cientista. Já a questão geral faz referência
à analise do homem em interação social e como ele constrói teorias sobre os objetos
sociais, que determinam a comunicação e a organização do comportamento.
De acordo com Moscovici (1961) as Representações Sociais são um conjunto
de conceitos, proposições e explicações criado na vida cotidiana e no discurso da
comunicação interindividual. A clássica definição de Jodelet abrange uma produção
de sentido comum a todos os grupos sociais. Ela se refere às representações
sociais como uma modalidade de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada,
possuindo um objetivo prático ao contribuir para a construção de uma realidade
59
comum a um grupo social (Jodelet, 1989). A representação da sociedade exprime a
relação de um sujeito que é estabelecida com um objeto envolvendo atividade de
construção, modelação e simbolização (Vala, 2000).
Moscovici não separa o mundo interno do mundo externo. É importante
ressaltar aqui que uma representação é social na medida em que é compartilhada
por um conjunto de indivíduos; ela é produzida socialmente pela interação social;
tem seu critério genético, no sentido em que é coletivamente produzida e seu critério
da funcionalidade, quando oferece programas formadores e condutores da
comunicação e da conduta (Vala, 2000).
Sendo assim, Moscovici propõe que o comportamento dos grupos e
indivíduos seja enfocado em uma nova perspectiva, que em lugar de localizar o
“social” no comportamento, localize o comportamento no “social”. Deste modo, as
principais funções das RS são, segundo Moscovici (1961), a orientação dos
comportamentos e a comunicação entre os indivíduos. A estas, Abric (1994)
acrescenta outras duas funções: a identitária, referente à identidade social; e a
justificadora, referente à pertença grupal.
A primeira orienta modelos desejáveis de condutas, a segunda é onde estão
imersa as Representações Sociais, onde há circulação delas e seu processo
constante de renovação. A função identitária resguarda a imagem positiva do grupo
e sua especificidade, enquanto a justificadora permite aos atores manter ou reforçar
os comportamentos de diferenciação.
A Teoria das representações sociais encontra-se bastante desenvolvida e
usada e diversas áreas do conhecimento, entretanto, quando Moscovici construiu
60
sua teoria deixou livre a questão do indivíduo, ou seja, não deixou claro quem é o
sujeito que forma representações sociais. Neste âmbito, faz-se importante
contextualizar esse indivíduo, lê-lo historicamente. Sendo assim as questões
psicológica individual, sociológica e histórica precisam ser levadas em conta quando
se trata de estudar o indivíduo. Tal sujeito possui sua história, suas idiossincrasias,
seu contexto sócio-cultural e a partir daí forma suas representações sociais, é dizer,
ele faz suas objetivações e ancoragens, conceitos tais que serão descritos a seguir
como processos de formação das Representações Sociais.
Os processos sócio-cognitivos de ancoragem e objetivação compreendem a
imbricação e a articulação entre atividades cognitivas e condições sociais nas quais
são formadas as Representações Sociais.
2.3.1 Ancoragem e Objetivação
A ancoragem consiste, segundo Moscovici (2003), em tornar familiar o que
não é familiar. É a assimilação de um objeto novo através de objetos já antes
categorizados no sistema cognitivo. Tal processo precede ou não a objetivação. Na
verdade os dois processos ocorrem em um ciclo contínuo no qual não há ordem.
Segundo Catão e Coutinho (2003) entende-se que as representações sociais
não são simples reflexos da realidade, elas são uma organização sócio cognitiva,
que integram as características objetivas do objeto, as experiências anteriores do
grupo, seu contexto macro e micro-social, sua história e seu sistema de atitudes, de
normas e valores.”.
61
Nessa dinâmica constante ocorre a circulação das Representações e assim
há terreno fértil para indagações acerca de como se dão os processos de
objetivação e ancoragem, sendo estes responsáveis apreensão e simbolização das
informações que lhes são ofertadas pela imprensa. Nesse hall de informações está a
questão imigração. Tal problemática vem sendo amplamente divulgada em todos os
gêneros jornalísticos, seja ele opinativo ou investigativo. O conteúdo dessas
matérias veiculadas pelo jornalismo, com efeito, servem de material para a formação
das Representações Sociais dos indivíduos acerca do tema. Tendo como uma de
suas funções a orientação de conduta, as Representações Sociais, tornam-se ainda
mais imprescindíveis de serem investigadas.
A representação Social trabalha com o âmbito do coletivo e do individual,
considerando a mediação dos sujeitos (indivíduo e/ou grupo) com o mundo através
do contexto em que ocorre, utilizando como canal a linguagem e a comunicação.
Desta maneira, buscar a compreensão do fenômeno das representações sociais
dentro do jornalismo é contribuir para o aprimoramento dos conhecimentos acerca
dos mecanismos formadores de Representações Sociais e acerca do poder que
possui o jornalismo nesse sentido dentro do âmbito da temática Imigração.
Já a objetivação desenvolve-se em três momentos constituintes da
representação. No primeiro momento ocorre a construção seletiva, a qual se trata da
descontextualização e seleção que o objeto sofre no meio social. Depois ocorre a
esquematização, a qual dá significado próprio ao objeto e certos elementos são
esquecidos e outros desenvolvidos, então o objeto é organizado. Na última fase do
processo, a naturalização, o objeto se torna concreto (Catão & Coutinho, 2003).
62
O ato de objetivar significa dar qualidade icônica a uma idéia, ou seja, “é
reproduzir um conceito em uma imagem” (Moscovici, 2003). A objetivação é a
ligação de uma idéia a uma imagem concreta, ou seja, é a concretização do que
está no campo das idéias, na esfera abstrata. Quando se compara alguma idéia ou
conceito, por exemplo, a algo palpável, já é configurada uma representação por
meio de objetivação. Este processo, segundo Moscovici (2003), é mais ou menos
direcionado para o mundo exterior, formando imagens a partir do que já é
conhecido, diferentemente da ancoragem, a qual é direcionada para o interior do
indivíduo, impulsionando-o a refletir sobre alguma coisa que rotula de acordo com o
que já está presente em sua memória.
2.3.2 Tridimensionalidade das Representações Sociais
Com vistas a compreender qual a relação das representações com a
coletividade que as produz, como elas se refletem no sujeito social que as porta e
como ela se prevalece dele, Moscovici (1978), sinaliza que as representações
sociais se mostram como um conjunto de proposições, reações e avaliações. Estas
estão relacionadas a determinados pontos e emitidas em conversações, pesquisas
de opinião ou pela opinião pública, da qual, segundo ele, todos fazem parte.
O que se percebe é que essas proposições, reações ou avaliações estão
organizadas de forma muito diferente de acordo com as classes, grupos ou culturas
e constituem tantos universos de opinião quanto existem culturas, grupos etc. Sendo
assim Moscovici (1961) trata de observar conteúdo das representações sociais sob
três dimensões: Informação, Campo de representação ou Imagem e Atitude.
63
A tridimensionalidade das representações varia de grupo para grupo não só
no tocante ao grau de assimilação das dimensões relativas ao objeto de estudo,
mas também se pode dizer que sobre o mesmo objeto social, os grupos podem ter
diferentes organizações dos seus conhecimentos (informação), apresentar
diferentes orientações de comportamento (atitude) e incluir diferentes conteúdos no
modelo que representa o objeto (imagem) (Moscovici, 1961).
A dimensão informação - ou conceito - diz respeito à organização dos
conhecimentos que um grupo possui a respeito de um dado objeto social, em nosso
caso a imigração e o imigrante. Ou seja, o conhecimento que os jornais pesquisados
das imprensas brasileira e espanhola possuem sobre a imigração e o imigrante.
Alguns jornais podem conter mais informações relacionadas a imigração e
imigrantes que outros. Não havendo informações a esse respeito, pode-se afirmar
que não representação existente.
A dimensão Campo de representação ou Imagem relaciona-se ao conteúdo
concreto de um modelo social, ao conteúdo limitado das proposições que se referem
a um aspecto preciso do que se representa. Difere do que se tem por opinião no
momento em que esta possui elementos relacionados ao objeto de representação,
entretanto eles não são necessariamente estruturados, ordenados. Já quando se
trata da Imagem enquanto dimensão de representação tem-se obrigatoriamente a
idéia de organização, de unidade hierarquizada de elementos. Por exemplo: a
imagem da imigração como inclusão social: oportunidades e acolhimento. É
importante dizer também que o conceito de imagem ou campo de representação
64
está relacionado ao processo sócio-cognitivo de objetivação já explicado
anteriormente.
Tratando-se da dimensão Atitude, pode-se dizer que ela é a orientação global
em relação ao objeto que é representado socialmente, ou seja, afetos e sentimentos
positivos ou negativos, havendo também atitudes intermediárias (Moscovici, 1961).
Esta dimensão engloba as aproximações e afastamentos relacionadas ao objeto
social, aqui a imigração e o imigrante. Ela pode ser exemplificada como as menções
positivas, negativas e intermediárias relacionadas à imigração e ao imigrante
presentes nos textos jornalísticos pesquisados.
Observa-se que essas três dimensões fazem da representação social uma
noção complexa, a partir da qual nota-se que não é a vontade que constrói os
significados de mundo para os indivíduos e coletivos, e nem as circunstâncias, não
é o individuo com suas características individuais, nem a sociedade com suas
determinações, mas a relação indivíduo/sociedade produzida pelas construções
sócio-cognitivas-afetivas dos indivíduos com e no mundo, formando e
transformando assim suas representações sociais (Catão, 2001a).
Notadamente, neste estudo, a tridimensionalidade possui uma importância
peculiar. Trabalhando com a imprensa, é importante detectar qual informação que o
jornal veicula sobre determinado tema, entretanto a atitude que ele adota diante
desta informação faz toda a diferença. O veículo de comunicação pode divulgar um
conteúdo negativo sobre a imigração e o imigrante, por exemplo, e ao mesmo
tempo posicionar-se contra aquela informação, ou seja, mostrar que não
compartilha daquelas concepções negativas a respeito do tema. E é em face deste
65
posicionamento, ou seja, desta atitude do jornal, que as pessoas vão formar suas
imagens a respeito do tema imigração, ou qualquer outro. A posição do jornal sobre
determinada temática, o enfoque dado à informação, é que será importante para a
formação das imagens relacionadas a ela.
2.3.3 Taxonomia da comunicação (Difusão, Propagação, Propaganda)
Em sua tese, “La psychanalyse: son image et son public”, Moscovici traz uma
análise detalhada da imprensa francesa, e foi a partir desta, por meio da análise da
relação entre diferentes setores da imprensa da França e a psicanálise, que
Moscovici propôs uma taxonomia para os sistemas de comunicação, notadamente
da comunicação social, são eles: difusão, propagação e propaganda (Jovchelovitch,
2000).
Para Moscovici (1961) as Representações Sociais acontecem sob um
conjunto de mensagens que é organizado cognitivamente conforme diferentes
modalidades de comunicação. São as modalidades de deslocamento das
Representações Sociais. Como anteriormente citado, o autor classifica três sistemas
indutores de representações. Existem a difusão, a propagação e a propaganda.
Cada forma indutora tem como efeito a produção de Representações Sociais
específicas. Correspondem respectivamente à edificação de condutas de opinião,
atitudes e estereótipos.
O sistema de difusão tem a característica de direcionar-se não a um público
somente, mas sim a uma pluralidade desses. “As mensagens sobre um objeto
organizam-se com base numa multiplicidade de quadros de referencia, na medida
66
em que ignoram as diferenciações sociais e se dirigem a indivíduos intermutáveis.”
(Ordaz & Vala, 1997). Já no que diz respeito ao sistema de propagação pode-se
afirmar que é uma modalidade de comunicação que remete a um público específico,
dessa forma tem uma leitura mais bem organizada do mundo. Nesse tipo de sistema
está intrínseco um quadro de referência familiar ao grupo para o qual se destina.
Quando se trata do sistema de comunicação denominado propaganda se tem uma
perspectiva claramente direcionada do mundo. As relações de conflito são
encorajadas. Em tal sistema o objetivo mais claro é a persuasão. (Ordaz & Vala,
1997).
Diante das noções dos sistemas de comunicação de difusão, propagação e
propaganda e do poder e entrelaçamento sobre e com a vida social cabe
indagações a respeito de qual seriam os sistemas mais amplamente difundidos entre
os meios de comunicação de massa, notadamente, os meios impressos de
comunicação. A “vigilância” dos meios nesse sentido é de importância preciosa, já
que cada sistema de comunicação pressupõe uma dada intenção do veículo e
também nos faz pensar em que tipo de representações sociais cada dito sistema
geraria nos indivíduos.
2.3.4 Psicologia, representação social e meios de comunicação
Serge Moscovici desenvolveu seus trabalhos em psicologia social tendo como
um de seus mais importantes estudos a supracitada teoria. Ela por sua vez está
inserida em um projeto maior do investigador, no qual tinha o intuito de construir
uma psicologia social do conhecimento.
67
A psicologia social do conhecimento procura explorar como os seres
humanos, suas representações e como suas idéias se transformam em prática,
como frisa Moscovici:
Há numerosas ciências que estudam a maneira como as pessoas tratem,
distribuem e representam o conhecimento. Mas o estudo de como, e por que, as
pessoas partilham o conhecimento e desse modo constituem suas realidade
comum, de como eles transformam idéias em prática – numa palavra, o poder
das idéias – é o problema específico da psicologia social. (Moscovici, 2003, p.
164).
As investigações em psicologia social a esse respeito tratam de senso comum
o produto do que é transmitido pela mídia, ou seja, tamanha é a força do que é
veiculado que passa a ser senso comum. Como retrata Moscovici, as imagens do
mundo são passadas pelos meios de comunicação de forma veemente, já que o
último participa da vida do ser humano e o faz perceber o que ali é visto, lido ou
ouvido como parte da realidade.
Elas (as representações) entram para o mundo comum e cotidiano em que nós
habitamos e discutimos com nossos amigos e colegas e circulam na mídia que
lemos e olhamos. Em síntese, as representações sustentadas pelas influências
sociais da comunicação constituem as realidades de nossas vidas cotidianas e
68
servem como o principal meio para estabelecer as associações com as quais
nós nos ligamos uns aos outros. (Moscovici, 2003, p. 8).
Os meios de comunicação proliferam seu modo de representar a sociedade e
suas problemáticas o qual é absorvido na mente da maioria como legítimo. O senso
comum é, dessa forma, moldado pela mídia, ou seja, os meios de comunicação
interpretam o mundo para os indivíduos, os quais adotam tal forma de ver os fatos.
Moscovici (2003, p. 96) trata da questão tendo esse senso comum como
pensamento que domina: “[...] estudamos o problema dos meios de comunicação de
massa e seu papel no estabelecimento do senso comum. Nesse caso, o senso
comum pôde ser elevado à função de uma ideologia dominante”.
A mídia tem importante papel na formação desse senso comum que é
combustível para a sociedade comunicar-se.
Seu conteúdo (do senso comum), as imagens simbólicas derivadas da ciência
em que ele está baseado e que, enraizadas no olho da mente, conformam a
linguagem e o comportamento usual, estão constantemente sendo retocadas. No
processo, estocagem de representações sociais, sem a qual a sociedade não
pode se comunicar ou se relacionar e definir a realidade, é realimentada.
(Moscovici, 2003, p. 95).
69
Através da mediação de mais material para as representações elas vão
adquirindo mais importância e autoridade. Pode-se ter essa “mediação” como sendo
explicações de fenômenos, personalidades, analogias etc.
Levando em consideração que o que é veiculado pelos meios de
comunicação de massa é objeto de conversações informais e sendo estas
conversações informais, dentre outros fatores, materiais para a formação de um
pensamento social, pode-se afirmar a importância dos meios no processo de
representação social. Segundo Tarde (1910 citado em Moscovici, 2003, p.89),
“opiniões e representações são criadas no curso de conversações”.
2.3.5 Meios de comunicação e a representação do outro
Rossana Reguillo também observa a importância dos meios de comunicação
nas representações sociais. Para a autora os meios contribuem para a proliferação
da imagem inferiorizada, no caso específico estudado por ela, dos países da
América Latina. A autora afirma que os meios de comunicações são lugar de
interação na qual é mostrada a autorização, ou desautorização do outro.
Se é aceito que a comunicação midiática é fundamentalmente um espaço social
que autoriza o outro, as políticas de representação da crise latinoamericana
através desse espaço social chamado ‘meios de comunicação’, contribuiram
para fortalecer a idéia de perigo que constituem para cada país, os problemas
que afetam o outro. (Reguillo, 1996, p. 3).
70
Reguillo aponta ainda para a questão da visibilidade disponibilizada pelos
meios de comunicação, a qual oferece a reconfiguração de paradigmas e
configuração do que ainda não se conhece. Para a autora o que é mostrado produz
mecanismos “classificatórios” em relação aos acontecimentos na sociedade, o que
provoca a referida reconfiguração do outro.
Se os meios de comunicação podem ser pensados principalmente como
dispositivos sofisticados de produção de visibilidade, isso nos levaría a aceitar que
estamos diante de um mecanismo emergente de produção, acumulação e
distribuição de um ‘novo’ saber clasificatorio que se traduz em um poder capaz de
reconfigurar o pensamento do outro. O outro sempre fica interceptado pela força de
um imaginário global midiatizado que reedita e reelabora a produção da diferença.
(Reguillo, 1996, p. 7)
O poder dos meios de comunicação é comparado ao do poder político
institucionalizado, às vezes até maior, quando se trata de confiabilidade,
legitimidade etc. É dizer, o que é visto, lido ou ouvido é tomado como legítimo,
pela maioria, quase inquestionavelmente. “Lo importante aquí es argumentar que
verosimilitud, confiabilidad y legitimidad, tres elementos sustantivos para un
espacio público vigoroso y democrático, son hoy atributos de los medios y no de
la institucionalidad política.” (Reguillo, 1996, p. 10).
71
O avanço tecnológico da comunicação também é visto como forma de
expandir a representação sobre o outro. Tal evolução transmite para o mundo as
culturas diversas, os acontecimentos diversos etc. Isso faz com que o diferente, o
outro e sua cultura, tenham tratamento de desvio. É dizer, o que é diferente é tratado
como desvio e, portanto negativo. Esses fatos tornam-se verdade principalmente
quando se trata da comunicação em relação à cultura e acontecimentos do outro
proveniente de países “subdesenvolvidos”, pobres. Tal ação se caracteriza como
forma de repressão diante da diferença. Assim explica Reguillo (1996):
A paisagem midiática está cheia de exemplos que mostram que uma das
estratégias centrais para reprimir a diferença é mostrá-la em uma representação
caricaturada, processo que hoje adquire dimensões planetárias com as
tecnologias da comunicação. (p. 74).
Os meios de comunicação são transmissores das representações sociais,
porém também são produtores de representações sociais. Para Rossana Reguillo os
meios têm poder de criar classificação e com isso criam representações sociais. O
referido poder se dá, para a autora, pelo fato de os meios serem detentores de
grandes aparatos tecnológicos para divulgação das representações dominantes.
A “paisagem midiática” é criadora de um imaginário global, o qual tem o poder
de configurar e reconfigurar a produção de sentidos. Dessa maneira a interpretação
do outro passa pelo crivo desse universo midiático. “E assim na ‘paisagem midiática’
72
o OUTRO fica interceptado pela força de um imaginário global que reedita a
promoção da diferenta” (Reguillo, 1996, p. 77).
O que é transmitido através dos meios de comunicação não deve ser visto
como verdade absoluta, o que Reguillo chama de “fantasmas sociais”. Os últimos
são fatores que dificultam o livre pensamento e a livre interpretação.
[...] verdades irrefutáveis e nunca questionadas que, como ‘fantasmas sociais’,
estão aí sem serem vistas e são o principal obstáculo para o pensamento livre (e
complexo). No fundo a complexidade implica que tratar de compreender o poder
das representações a partir de uma lógica não disciplinar (e disciplinada) exige
compreender nossas próprias representações de poder. (Reguillo, 1996, p. 78).
2.3.6 A notícia e as representações sociais
Os recortes da realidade com os quais trabalha o jornalismo são peças para a
formação das Representações Sociais, neste caso acerca da questão da imigração
e da figura do imigrante. Segundo Pena (2005), o que é veiculado em um jornal
passa muitas vezes a ser considerado espelho da realidade, o que pode gerar nos
receptores opiniões, imagens do real, atitudes em relação a esse real e chegando às
vezes a configurar uma representação social. O jornalismo impresso, também
fazendo parte do contexto comunicacional citado, dá sua contribuição para a forma
de categorização do tema da imigração aqui em questão.
Como veículo e sistema de representações e atendendo à sua função social
de informar, o que de fato ocorre é que nem sempre os meios de comunicação
assumem com firmeza e rigor sua responsabilidade. Tal fato pode trazer
73
interpretações e representações das mais variadas a respeito de determinado
coletivo, aqui os imigrantes. Isso se dá pela importante fonte de representação sobre
a imigração que são os meios de comunicação em geral e particularmente o
jornalismo impresso.
Investigar como se dão os processos de formação das representações sociais
dentro do jornalismo impresso torna-se essencial para este estudo, pois através
deles têm-se a noção de como ocorre a apreensão das informações acerca da
temática aqui abordada e quais são essas informações e/ou representações, já que
“(...) considera-se Representação Social como o sentido atribuído a um dado objeto,
a partir das informações que, continuamente, lhe vêm de sua prática, de suas
relações” (Madeira, 2001).
Este estudo parte do pressuposto que “a comunicação social é hoje umas das
principais formas de construção de sentido e produção de realidades públicas,
objetivas e legitimadas” (Ordaz & Vala, 1997). Entretanto é importante deixar claro
que não se busca neste estudo uma análise da imprensa em si, mas da imprensa
enquanto mediadora de produção de significados da vida em sociedade. Nossa
análise busca identificar as representações sociais sobre imigrante/imigração e
implicações com a questão da exclusão/inclusão social que ela produz e põe em
circulação. Assim surgem indagações acerca da linha de direcionamento noticioso
na cobertura da temática da imigração, do significado da imigração e do imigrante
que é construído pela imprensa, notadamente a imprensa brasileira e a espanhola,
da contribuição da imprensa escrita para as representações sociais da imigração e
74
do imigrante bem como da relação dos significados produzidos pelos jornais
impressos com a exclusão do imigrante e seus direitos humanos.
A evolução da tecnologia da comunicação é uma das características mais
peculiares da contemporaneidade. As mudanças de hábitos e da percepção da
realidade estão quase sempre ligadas às novas tecnologias, notadamente à mídia. A
democratização da informação, a facilidade para obtê-la e para gerá-la fez com que
o conteúdo dos meios de comunicação e seus sistemas se transformassem em
alvos da atenção de vários segmentos da sociedade. Como acredita Jovchelovitch
(2000) quando afirma que
A emergência e desenvolvimento dos meios de comunicação de massa
constituem-se em uma das mais importantes características das sociedades
modernas. A intensidade de sua penetração, nos mais variados seguimentos, em
praticamente todos os domínios da vida social, associados a seu profundo
impacto nas sociedades contemporâneas, fez com que cientistas sociais das
mais variadas disciplinas se dedicasse a pesquisá-los sistematicamente e hoje,
estudos sobre a mídia constituem um campo próprio praticamente
institucionalizado na vida acadêmica européia e norte-americana. (p. 89)
O nível de envolvimento da vida cotidiana com a mídia é tão grande que não
se pode hoje conceber a realidade sem ela. Os jornais sejam eles impressos,
televisivos ou na internet, se converteram nos olhos das pessoas em todos os
lugares do mundo. Essa mediação dá aos meios de comunicação o poder de
75
interpretar o mundo em lugar dos indivíduos. A partir desta leitura do mundo
populações inteiras firmam conceitos de vida.
Os meios de comunicação se tornaram constitutivos da vida social, já que
alteraram modos de interação, transformaram o acesso a e o consumo de bens
simbólicos, reestruturaram a política institucional e mudaram as fronteiras entre
espaço público e privado. (Jovchelovitch, 2000).
A maneira contundente com a qual os meios de comunicação estão
intrincados na vida social e individual os faz ser instrumento importante para o
entendimento das formas que são elaborados os conceitos na mente dos indivíduos.
Segundo Jovchelovitch (2000), a mídia se torna uma fonte importante de reflexão
acerca do estudo das representações sociais, já que possui formas de definir e
transformar as maneiras como circulam os bens simbólicos. “De fato, o vínculo entre
a formação e a transformação das representações sociais e os meios de
comunicação de massa merecem atenção cuidadosa, e como Farr (1993) assinalou
é preciso estudar o conteúdo da mídia.” (Jovchelovitch, 2000).
Embora os meios de comunicação estejam em grande evidencia hoje eles já
eram entendidos como valiosas ferramentas de pesquisa no passado. Moscovici em
sua tese doutoral (1961/1976) fez um estudo aprofundado sobre as representações
sociais da psicanálise na imprensa francesa, no qual desenvolveu os conceitos dos
sistemas de comunicação de difusão, propaganda e propagação. Tal estudo mostra
a importância dessas noções para o desenvolvimento das representações sociais.
(Jovchelovitch, 2000).
76
Além dos próprios meios de comunicação e seu inegável poder de alcance
por conta da tecnologia, a notícia por si só também se mostra responsável pelas
representações na sociedade. Antes de observar o valor da notícia para as referidas
representações é preciso conceituá-la. Para Van Dijk (1990) no uso diário, o
conceito da notícia nos meios implica os seguintes conceitos:
1. Nova informação sobre fatos, objetos ou pessoas. 2. Um programa tipo (de
televisão ou de rádio) no qual se apresentam ítens jornalísticos. 3. Um ítem ou
informe jornalístico, como por exemplo um texto ou discurso na radio, na tevisão
ou no jornal impresso, no qual se ofrece uma nova informação sobre fatos
recentes. (p. 17).
No que diz respeito à importância da notícia nas representações sociais, o
conceito número três é o mais adequado.
Os grandes meios são notadamente responsáveis por tais representações,
como aqui já foi mostrado, em virtude da grandiosidade em relação ao potencial de
globalidade de seu conteúdo. Já o estudo da notícia nesse processo se dá em
relação ao próprio cunho cognitivo dela. Os processos de cognição e apreensão da
notícia são chaves no conhecimento e construção de crenças em geral. “Isto nos
permita fazer explícito o bem conhecido rol dos valores da noticia e as ideologías na
produção e entendimento de noticias.” (Van Dijk, 1990, p. 15).
77
A noticia é capaz de provocar a manutenção do pensamento dominante a
partir do momento em que parte de “fabricantes” suscetíveis a criar uma ilusão em
relação à sociedade e suas circunstancias. Os que produzem a notícia possuem,
de acordo com Van Dijk, uma espécie de rede que compartilha do pensamento
dominante que por sua vez é proliferado através dos meios.
Aprofundando mais sobre o possível produto destas práticas de fabricação
da notícia, Tuchman presta finalmente atenção à ‘rede de faticidade’ que se tece
entre os que elaboram as notícias com o fim de criar uma ilusão de credibilidade,
mas que em última instância legitima o status quo. (Van Dijk, 1990, p. 23)
Isso é demonstrado através das narrações feitas, as quais oferecem
representações diferentes sobre desastres, rebeliões e manifestações, por um lado,
e de líderes legitimados, por outro. Neste estudo, o discurso jornalístico é visto como
um ato social já que a notícia é usada em situações sociais, sendo assim uma
integração entre texto e contexto social. A notícia é também lugar de interação.
Partindo desse ponto de vista, se pode afirmar a participação do texto jornalístico na
formação do pensamento social e suas representações.
78
CAPÍTULO III
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa trata de um estudo descritivo, o qual se executa por meio da
exploração de aspectos quantitativos e qualitativos no discurso dos artigos/notícias
dos jornais abordados. Tais aspectos serão analisados sob o olhar dos conceitos
relacionados ao fenômeno das representações sociais, bem como da concepção
contextualizada de indivíduo.
Aqui se entende que a linguagem é socialmente construída (Berger &
Luckman, 1973), que é lugar de interação, espaço este encontrado nos textos
jornalísticos aqui pesquisados, que por sua vez têm posição importante na
configuração de um dado objeto (Moscovici 1979), neste estudo a imigração e o
imigrante. Sendo assim a análise por meio do programa ALCESTE (Reinert, 1987) e
a interpretação do que foi processado procederão a suas funções no sentido de
tratar quantitativamente dados qualitativos, os quais serão lidos a partir do
supracitado referencial conceitual.
Nesta linha de pensamento é que se concorda com direcionamento dado por
Gondim e Lima (2002), para o qual a natureza do objeto é que guia a escolha da
metodologia. A partir desse posicionamento mostra-se coerente neste estudo o uso
de dados qualitativos e quantitativos com a finalidade de apreender a complexidade
configurada no material coletado. Minayo (1993) também destaca que dados
79
qualitativos e quantitativos podem ser usados em uma pesquisa conforme as
exigências do objeto que se pretende estudar.
Na presente pesquisa, em face do objeto de estudo, pretende-se, enquanto
objetivo geral, verificar os significados da imigração/imigrante que as imprensas
brasileira e espanhola têm produzido e sua relação com a questão da
exclusão/inclusão social sobre o processo de imigração. Como objetivos específicos,
visa-se a Identificar os significados de imigração produzidos pelas imprensas
brasileira e espanhola, identificar os significados de imigrante produzidos pelas
imprensas brasileira e espanhola, identificar o tipo de sistema de comunicação,
propagação ou difusão, realizado pelas imprensas brasileira e espanhola na
produção de noticias sobre o imigrante/ imigração, verificar nos significados
produzidos sobre imigrante/ imigração pelas imprensas brasileira e espanhola a
presença /ausência de conteúdos sobre exclusão /inclusão social.
3.1 Procedimentos de Coleta de Dados
3.1.1 Amostra
A amostra foi constituída por artigos/notícias sobre imigração/imigrante,
veiculados nos dois dias de maior circulação semanal dos jornais diários brasileiros,
Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo e dos espanhóis El País e El Mundo.
A coleta se deu em dois períodos: da última semana de setembro/2006 à primeira
semana de outubro/2006, correspondendo ao primeiro período, e as duas últimas
semanas de novembro/2006, correspondendo ao segundo.
80
Tabela 01: Dias de maior circulação e tiragem dos jornais
Jornais Dias de maior circulação Tiragem
Folha de São Paulo Quinta-feira e domingo 350.000 e 400.000
Estado de São Paulo Sábado e domingo 263.366 e 340.381
El País Sábado e domingo 374.391 (média)
El Mundo Sábado e domingo 303.479 (média)
Fonte: Instituto Verificador de Circulação IVC / Oficina Para la Justificación
A seleção de artigos/notícias foi guiada pela presença da discussão temática
do fenômeno da imigração/imigrante. Foi identificado o artigo/noticia por seção
compreendida como a divisão editorial do jornal.
O conteúdo editorial dos jornais é dividido em seções de acordo com a
temática das notícias veiculadas. Como mostra Barbosa & Rabaça (2001) a seção é
parte de uma publicação, jornal ou revista, por exemplo, ou de um programa de TV,
rádio, etc., na qual se agrupam informações do mesmo gênero ou a respeito da
mesma temática. Pode-se também chamar as seções temáticas de caderno
temático, como faz a Folha de São Paulo, por exemplo (Manual da Redação, 2001).
Em alguns jornais os nomes que caracterizam as seções temáticas coincidem,
entretanto nem sempre isso acontece. Por essa razão, a nomenclatura das seções
81
dos jornais usados nesta pesquisa foi padronizada com vistas à uniformidade do
material, não afetando, entretanto, o conteúdo do mesmo.
Neste estudo optou-se por nomear as seções como “nacional”,
“internacional”, “cidades”, “cultura”, “economia”, “opinião” e “saúde” de acordo com
seu conteúdo temático. Os artigos/notícias a respeito do país de origem do jornal
foram enquadrados na seção “nacional”. Geralmente o conteúdo desta seção
engloba a política do país. Já as referentes a acontecimentos internacionais foram
postas sob a nomenclatura “internacional”. Os artigos/notícias relacionados a
acontecimentos locais (cidade onde é produzido o jornal) foram enquadradas na
seção “cidades”. A seção “cultura” foi reservada aos artigos/notícias relacionados ao
tema, como livros, filmes, peças de teatro e cultura em geral. Já os que tratavam de
economia e dinheiro foram enquadrados na seção “economia”. Os artigos/notícias
de gênero opinativo foram postas na rubrica “opinião”. Por fim, a seção “saúde” trata
de notícias a respeito de enfermidades, medicina e temas afins. A tabela seguinte
mostra a distribuição das notícias coletadas de acordo com as referidas seções.
82
Tabela 02: Artigos/notícias coletados nos jornais por seção (1ª e 2ª semana de setembro/2006 e 3ª e 4ª semana de novembro/2006)
Seções
Folha de São Paulo
Estado de São Paulo El País
El Mundo Total
Internacional 6 5 4 5 20
Nacional ----- ----- 12 12 24
Opinião ----- ----- ------ 1 1
Cultura ----- 3 ----- ----- 3
Economia ----- ----- ----- 2 2
Saúde ----- ----- ------ 1 1
Total 6 9 16 22 53
Fonte: Verificação da amostra
3.2 Caracterização dos Jornais
3.2.1 Jornal Folha de São Paulo
Desde seus primórdios o jornal Folha de São Paulo se propõe a ser “Um
jornal a serviço do Brasil” (Souza, 2003). A partir de 1962 o jornal dá inicio a
processos contínuos de transformações administrativas, tecnológicas e editoriais.
Alcançando o título de maior jornal em circulação no país em 1987, o que ocorre até
os dias atuais, a Folha delineia seu perfil como um jornal preocupado com os direitos
do cidadão e com os direitos que os grupos sociais têm de se organizar, preocupado
também em democratizar o Estado e em introduzir reformas sociais frente ao
capitalismo. O jornal coloca em prática essas premissas quando participa ativamente
na campanha das diretas já (Frias Filho, 1984).
A Folha de São Paulo, na visão de seus estrategistas, deveria adotar as
referidas posições para estar em sintonia com os desejos de seus leitores. Uma
83
posição mais doutrinária, que interferisse nos rumos dos acontecimentos, era o que
o público esperava do jornal. Desse modo, o diretor de redação justifica as opções
político-editoriais do jornal por uma sondagem “impressionística” da opinião de seus
leitores. A crença corrente no jornal, que consta de seu Manual de Redação (2001),
é de que cumpre um mandato concedido pelo leitor, o qual referenda as atitudes do
jornal a cada ato de compra.
Pelo que se lê no referido Manual, é o mercado do periódico que define a
“importância da notícia”. Diz-se que “(...) a Folha fala para o conjunto de seus
leitores, não para o conjunto da população” (Abramo, 1991). A mensagem depende
assim de uma percepção antecipada do consumidor padrão da Folha de São Paulo,
que deve ser absorvida por seus repórteres e redatores. O esclarecimento desse
aspecto é parte do treinamento dos iniciantes na redação. João Torres, antropólogo
e ex-aprendiz de jornalista na Folha de São Paulo, recorda-se das palavras do
diretor de redação ao receber os novatos, participantes de um teste de seleção no
início dos anos 90. Conta ele que Otávio Frias Filho:
...admitiu resolutamente que a Folha de São Paulo se destinava quase que
exclusivamente ao público-leitor paulistano, o que me deixou bastante perplexo,
pois contava que o horizonte do jornal alcançaria centros mais distantes como
tática de atração de consumo. Além de paulistano, a composição do conjunto de
seus leitores privilegiava os estratos sociais mais altos, os profissionais liberais,
estudantes universitários, e intelectuais; classes médias urbanas (Torres, 1994.
p. 32).
84
Junto com a delimitação dos consumidores da Folha de São Paulo em
termos de estratos sociais e de abrangência regional, a instituição de um formato
próprio de produção e apresentação da mensagem também comporia a identidade
do jornal. A norma é escrever no “padrão Folha”, ensinado tanto pelo manual
quanto pelos superiores da redação. Em síntese, a ordem é a seguinte: “numa
linguagem direta, objetiva e concisa, as frases, as orações, os parágrafos teriam
que ser elaborados com a maior neutralidade possível, aliados a uma necessária
apreciação crítica do assunto” (Frias Filho, 1984).
Opções jornalísticas feitas para obter determinados resultados na formação
da opinião pública e na transformação de formas sociais indesejáveis segundo os
parâmetros do próprio jornal. A “linguagem Folha” assim o é para gerar certos
resultados. Pelo projeto editorial que se instala a partir de 1984, “(...) a ideologia do
jornal se prestaria a melhor se adequar aos princípios da informação mais lúcida,
impessoal, honesta e democrática em favor da opinião pública” (Frias Filho, p. 32).
Apesar dessa posição que o jornal toma, faz-se necessário lançar um olhar
crítico rumo ao que nele é publicado, já que a impessoalidade total pregada pela
Folha é algo que vai de encontro à própria condição de ser humano, de estar no
mundo e estar implicado nele. Por outro lado o ideal de neutralidade até pode ser
perseguido, sabendo-se de antemão que não será atingido por completo, o que
necessariamente não significa perda de qualidade da informação.
85
3.2.2 Jornal O Estado de São Paulo
O jornal O Estado de São Paulo (OESP), além de questões atinentes à
imprensa em si, participou de embates dos mais importantes da vida nacional,
posicionando-se dentro de seu reconhecido liberalismo político, matizado, em boa
medida, pelas circunstâncias que desafiassem a ordem social.
Esta base liberal devidamente adaptada tanto à manutenção da ordem social
quanto à defesa de São Paulo no âmbito da Federação nacional, não impediu que
o jornal se posicionasse por um ideário marcado pela modernização da sociedade e
economia brasileiras. Como bem observam Capelato e Prado “o modelo político
defendido pelo periódico norteia-se pelos princípios liberais e consubstancia-se na
prática da democracia. Neste sentido é na teoria política exposta por Locke e no
Iluminismo francês que devemos buscar os fundamentos sobre os quais se assenta
o pensamento político de OES” (Capelato & Prado, 1979).
Colocada desta forma tão ampla, há que se qualificar que ser liberal tem
suas características quando exercido e aplicado no Brasil. Como lembra Faoro: “A
sociedade luso-brasileira contraiu, a partir da Revolução Portuguesa de 1820, o
achaque liberal. Contraiu é o termo: o liberalismo não seria mais que uma doença
importada, com a qual deveria conviver sem a ela ceder”.
Segundo Saretta (2004), a despeito da qualificação de liberal, não se pode
descurar que no caso de um jornal há as idiossincrasias de seus proprietários e
acionistas que, evidentemente incidem de maneira importante na formulação de
seu ideário e interesses. Não obstante, também deve ser considerado que estas
particularidades não podem ser superestimadas a ponto de não se focar o papel
86
político que teria a manifestação destes mesmos ideários e interesses. Apenas
como lembrança, para além de sua longa existência, o diário paulista, teve um
papel fundamental na criação da Universidade de São Paulo.
Cláudio Abramo, que foi secretário de redação do jornal na segunda metade
da década de 1950, observou que as posições políticas de OESP, expressas nos
seus editoriais eram “... medievais e defendiam os interesses da classe dominante
paulista em primeiro lugar e os interesses brasileiros em segundo. O Estado era
(como é) antiestatal, antigetulista, antitrabalhista, anticomunista e anticlerical”. Em
outras palavras, “na verdade, o conservadorismo, o elitismo e a postura de classe
dominante são a tônica das propostas do jornal” (Passeti, 2006).
3.2.3 Jornal El País
O Jornal El País foi fundado em quatro de maio de 1976, em meio a um
contexto de mudança social e política, na transição para a democracia. De acordo
com Molina (2007), trata-se do jornal espanhol de maior influência e circulação.
Mesmo não tendo iniciado sua trajetória com esse intuito, está no hall dos negócios
rentáveis da Europa e de acordo com seus dirigentes é o jornal mais lucrativo da
União Européia. (Molina, 2007).
O sucesso do jornal El País se dá por várias circunstâncias favoráveis que,
segundo Molina (2007), dificilmente se repetirão. Como o jornal foi considerado o
periódico da transição na Espanha, ele nasceu e cresceu junto com a democracia
espanhola. Foi fundado por José Ortega Spottorno, filho do maior filósofo Espanhol
no século XX, autor de La Rebelión de las Masas, e mentor intelectual de El Sol, o
87
mais sério e importante jornal de toda a imprensa espanhola, mas de vida curta.
(Molina, 2007). Quando o El País foi fundado, seus idealizadores tinham o objetivo
de resgatar o espírito do El Sol.
Desde seu início, o jornal El País mostrou-se liberal, assumindo a
responsabilidade de apresentar à população espanhola o que era viver em
democracia. Este posicionamento do jornal se refletiu em todos os aspectos dentro
da organização, tanto na parte gerencial, passando pelo projeto gráfico e chegando
até à linha editorial. El País possuía acionista de vários setores da sociedade, uns
eram políticos conservadores, já outros militantes comunistas. Como havia um
grande número de acionistas, nenhum chegava a possuir 10% do todo de ações.
Isso deu mais liberdade aos editores para colocarem em prática o que julgavam
mais apropriado, independentemente da linha de pensamento que seguia o tema
(Molina, 2007).
Seus primeiros diretores, como Jesús Polanco, afirmavam que o jornal El País
não era elitista nem popular, mas um jornal de qualidade e de grande circulação. A
direção prezava pelo ecletismo para atrair vários tipos de públicos. Dava atenção a
temas como ecologia, minorias, divórcio, aborto e chegou a ser definido como
liberal, levemente orientado para a esquerda, anticlerical e com certo ranço
antiamericanista. Molina (2007), coloca ainda que ele refletia ainda um terceiro-
mundismo romântico e algo ingênuo e tinha uma simpatia inicial mal-escondida em
relação à Cuba e à Nicarágua. Defendia o feminismo e, em economia, era a favor do
livro-mercado.
88
Quando o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) chegou ao poder em
1982, a imagem do jornal foi atrelada ao El País, o que foi prejudicial não só aos
profissionais, mas também para o próprio jornal, que ficou mal-visto na Espanha e
no Exterior. Entretanto seguiram crescendo suas vendas. A associação entre
Governo e El País se deu por que o PSOE colocou em prática em sua administração
muitos princípios que eram defendidos pelo jornal desde sua fundação, o que
tornava natural uma afinidade entre os dois.
Todos que esperavam uma postura complacente do jornal ficaram admirados,
já que El País chegou a criticar duramente e repetidamente o Governo Socialista,
mostrando-se decepcionado com ele. As críticas levaram Cebrian, o diretor do
jornal, aos tribunais, mandado pelo então ministro do interior.
Todas as ações do jornal El País fazem com que ele seja definido pelos
especialistas como um periódico com tendência a publicar opiniões de vários
colaboradores de várias orientações ideológicas, porém é considerado um jornal de
centro-esquerda em questões políticas, conservador na cobertura econômica e
radical em questões sociais.
3.2.4 Jornal El Mundo
Foi publicado pela primeira vez em 23 de outubro de 1989 e fundado por
Alfonso de Salas, Pedro J. Ramírez, Balbino Fraga y Juan González. Seguindo a
linha do antigo jornal dirigido por Ramírez, Diario 16, El Mundo se dedicou a
importantes esforços na investigação jornalística. Neste sentido, descobriram
escândalos de corrupção no governo de Felipe González, entre outras reportagens.
89
Hoje é o segundo maior jornal espanhol, perdendo apenas para o El País na versão
imprensa, já que na versão on line é o primeiro colocado.
O jornal El Mundo define sua linha editorial como liberal. É habitualmente
crítico do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e dos nacionalismos
periféricos e é próximo (sobretudo na política espanhola) ao Partido Popular (PP).
Ou seja, tem opiniões contrárias a seu concorrente, o jornal El País (Fuertes, 1989).
O jornal se coloca como tendo uma postura crítica, que se acentuou durante
o governo de José Luis Rodríguez Zapatero. Baseando-se em suas próprias
investigações jornalísticas, o jornal é o maior partidário das teorias de conspiração
sobre os atentados de 11 de março de 2005. Em certas questões de política
exterior e assuntos sociais, se mostra como mais próximo de posições de centro
esquerda. Não apoiou a guerra do Iraque e concordou, em partes, com medidas
como o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo. Entretanto, a opinião pública o
percebe como veiculo de direita (Fuertes, 1989).
Segundo Fuertes (1989), entre seus colunistas existe heterogeneidade e
ecletismo. Inclusive há profissionais que são discordantes entre si. Segundo a
jornalista Elena de Regoyos, o jornal El Mundo quer transformar-se no meio escrito
de referência da direita espanhola, desbancando assim o jornal de orientação
conservadora ABC.
3.3 Procedimento e Análise dos Dados
Para o estabelecimento do plano de análise dos dados coletados neste
estudo, tomou-se como referência a análise de conteúdo manual, no modelo de
90
Bardin (2002). Esta análise, contudo, foi feita por meio do software estatístico
ALCESTE- Analyse de lexémes coocurrent dans lês ennoncés simples d’un texte, de
Max Reinert (1987, 1993, 1997, 1998) citado em Catão (2001b).
A análise de conteúdo proporciona a freqüência com que certos objetos são
caracterizados de um modo particular, ou seja, equivale aproximadamente a uma
análise temática, dependendo do objetivo do trabalho (Krippendorff, 1997). A técnica
de Análise de Conteúdo é bastante utilizada em pesquisas quantitativas e
qualitativas. Seus princípios são baseados na própria essência humana, a qual traz
inerentemente questões relacionadas à inferência e significado de mensagens. Essa
inquietação é bem mais antiga que as próprias reflexões científicas acerca da
Análise de Conteúdo (A.C.). Tal técnica veio auxiliar os pesquisadores no sentido de
descrever conteúdos de mensagens e fazer inferências sobre elas. As condições de
produção e recepção da mensagem também são pontuadas.
Há autores que definem a Análise de Conteúdo de forma mais voltada à
quantificação, já outros dão às suas definições um trato mais qualitativo. A definição
de Berelson (1952) traz a A.C. como permitindo a “descrição objetiva, sistemática e
quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação”. Já Cartwright (1953) estende o
conceito a todo comportamento simbólico, enquanto Krippendorf (1997) dá à Análise
de Conteúdo o substantivo da inferência. Para ele a técnica nos permite fazê-la e
torná-la válida e replicável.
A Análise de Conteúdo é dita por alguns autores como exclusiva para tratar
objetivamente materiais tendo a finalidade apenas descritiva e classificatória.
Entretanto a prática da técnica não confirma esta ação. O que não desmerece a
91
orientação, já que pode “prevenir” o analista de fazer interpretações demasiadas e
infundadas teórico-metodologicamente. De acordo com Bardin (2002) é a inferência
que dá respaldo para que se passe do nível da descrição para o da interpretação.
Assim a análise de conteúdo propicia inferências a respeito da fonte, condições de
produção do material de análise e até sobre receptor de tal mensagem.
A análise de conteúdo da mídia se mostra uma poderosa ferramenta para o
estudo de representações sociais. De acordo com Jovchelovicth (2000), a mídia faz
uma conexão entre vidas individuais a partir do momento em que constrói uma
cadeia de códigos que são compartilhados e reconhecidos, os quais constituem as
representações sociais. Em face disso, pode-se perceber a importância de se
estudar o conteúdo da mídia, mostrando o seu valor enquanto fonte de pesquisa. O
estudo clássico de Moscovici sobre as representações sociais da psicanálise na
França (1961- 1976) é uma amostra do uso da análise de conteúdo da mídia no que
toca às representações sociais.
O diálogo de conceitos é de grande valia pelo fato de que mostra as
possibilidades trazidas pela técnica de Análise de Conteúdo, de acordo com o
trabalho no qual é aplicada. Além disso, Vala (1986) mostra os pontos positivos da
quantificação e da orientação qualitativa, mostrando que o rigor não é próprio da
primeira. A quantificação tem grande objetividade e sistematização, enquanto a
validade e replicabilidade, expressas por Krippendorf, fazem equivalência às
características primeiro citadas.
De acordo com Vala (1986), no que diz respeito à quantificação a análise de
conteúdo pode seguir três direções. Pode ser feita a análise de ocorrências, a
92
análise avaliativa e, por fim, a análise estrutural. “A análise de ocorrências pretende
revelar a atenção que o sujeito do discurso confere aos diferentes conteúdos, a
análise avaliativa põe em evidencia a valência de que são objeto estes mesmos
conteúdos, a análise estrutural, como o próprio nome indica, visa permitir inferências
sobre a organização do sistema de pensamento da fonte implicado no discurso que
se pretende estudar” (Vala, 1986).
3.3.1 O Sistema Alceste
3.3.1.1 Fundamentos e estrutura
O sistema ALCESTE é um instrumento informático para análise de dados
textuais, que foi criado por Max Reinert ao fim dos anos 70. Este programa utiliza a
análise das co-ocorrências das palavras nos enunciados que constituem um texto
para organizar e sumariar informações consideradas mais relevantes. A base
metodológica do sistema ALCESTE tem como referência o conceito de “mundos
lexicais e sua lógica” desenvolvido por Max Reinert (1993) citado em Catão (2001b).
A palavra “mundo” faz referência a uma organização psíquica coerente dentro
da multiplicidade de experiências sensoriais e motoras (Reinert, 1990) citado em
Catão (2001b). A noção de “mundo lexical” trazida por Reinert (1987) citado em
Catão (2001b) refere-se a instanciações, no discurso, de universos mentais nos
quais o expositor transita. Ainda acerca desses mundos lexicais, Lahlou (1998)
acrescenta que estes são lugares particulares da representação total do mundo.
Segundo a última autora a abordagem do ALCESTE está claramente no nível
semântico. Assim sendo, ele considera as bases lexicais das palavras plenas,
93
portadoras de sentido (substantivos, adjetivos, verbos), operando uma redução do
vocabulário por eliminação dos marcadores de sintaxe, das desinências de
conjugação, e alguns sufixos. Reduz também as palavras ferramentas (artigos,
preposições, pronomes, advérbios, conjunções) guardando somente as suas raízes
significantes.
Outro fundamento da lógica do programa é o procedimento estatístico de
Classificação Hierárquica Descendente (CDH), no qual, a partir do corpus de base,
um número de classes são definidas uma a uma com suas características de base,
apresentando o máximo de homogeneidade, tanto intraclasse como de oposição
entre classes. Obtêm-se, assim, uma ordem de classificação (dendograma), que é
constituída das divisões sucessivas e mais significantes do corpus (Reinert, 1997).
O corpus geral desta investigação divide-se em dois corpus analisados pelo
ALCESTE: corpus I (artigos/notícias coletados nos jornais brasileiros) e corpus II
(artigos/notícias coletados nos jornais espanhóis). Os respectivos corpus estão
sendo analisados individualmente, gerando um grupo de classes por corpus.
3.3.1.2 O corpus
O instrumento informático ALCESTE tem como finalidade classificar os
enunciados do texto em função das palavras contidas nesses enunciados. Ele tem
por objeto de análise o corpus, que pode ser composto por textos, discursos,
entrevistas, reportagens gerais, ou seja, relatos que façam sentido para um
investigador.
94
Serão apresentados a seguir os segmentos do método ALCESTE, tendo
como referência exemplos do presente estudo, como o que vem a seguir, um trecho
do corpus organizado no formato que requer o supracitado programa:
**** *elpa_es *art_03 *pub_sab *not_prin *seç_inter *ass_ext
“Nossos pais nos mandam para que lhes enviemos dinheiro.” “Meu pai me
disse: ‘Vá para a Espanha e mande dinheiro.’, Logo me levou para ver morabito
[líder religioso muçulmano], que me deu um gri_gri [amuleto] e adverteu:
‘Quando chegar a Espanha, não se esqueça sua religião e, sobretudo, lembre se
da pobreza que deixou aqui’. Eu não vim estudar, vim para trabalhar. Vim ganhar
dinheiro para mandar para meu pai e para o morabito”.
Na constituição do corpus deve-se utilizar como critério a homogeneidade na
sua apresentação e nas condições de produção dos textos. As unidades que os
constituem são denominadas Unidades de Contexto Elementar (UCE), as quais se
situam entre a frase e o parágrafo. Neste estudo emergiu um total de 895 UCEs nos
dois grupos, correspondentes a 430 UCEs no corpus de artigos/notícias brasileiros e
465 no corpus de artigos/notícias espanhóis.
Durante o processamento do texto, o programa transforma as formas
originais, mediante a utilização de dicionários apropriados, em formas reduzidas à
sua raiz. Assim, as flexões de um mesmo verbo reduzem-se ao modo infinitivo, por
exemplo: “estuda”, “estudar”, “estudou” reduzem-se todas à forma “estud+”, e as
flexões resultantes do verbo “começar” reduzem-se à forma “comec+”.
95
Também é possível distinguir no corpus, as palavras-plenas, palavras-
auxiliares e palavras-estrela. As palavras-plenas são as palavras que constituem o
vocabulário propriamente dito, podem ser substantivos, verbos e adjetivos. São elas
as palavras que vão dar sentido ao texto, e é sobre este vocabulário que o
ALCESTE baseará a análise do corpus. As palavras auxiliares são as palavras
necessárias à sintaxe. E as palavras-estrela são aquelas com as quais o usuário
pretende distinguir características nos elementos do corpus. Embora não interfiram
na análise efetuada, elas podem ser muito importantes na interpretação dos
resultados. Isto ocorre porque as palavras-estrela representam variáveis com
diferentes modalidades, constituídas por uma raiz que descreve a natureza e um
número que descreve a modalidade, conforme demonstrado no exemplo a seguir:
**** *elpa_es *art_03 *pub_sab *not_prin *seç_inter *ass_ext
No presente estudo foram consideradas como palavras-estrela as variáveis
relacionadas às características dos artigos/notícias, ou seja, nome e nacionalidade
do jornal, número atribuído ao artigo/notícia, dia da semana da publicação, se o
artigo/notícia foi principal (em posição de destaque na página do jornal) ou
secundário (em posição secundária na página do jornal), seção em que foi publicado
o artigo/notícia e se foi assinado por pessoa interna ou externa ao jornal.
96
3.3.1.3 A análise do corpus
A análise planificada do ALCESTE é composta por quatro etapas, cada qual
se divide em diferentes súbitas, que são reguladas por uma série de parâmetros.
As etapas são: Etapa A: Leitura do Texto e Cálculo dos Dicionários; Etapa B:
Cálculo das Matrizes de Dados e Classificação das UCE’s; Etapa C: Descrição das
Classes de UCE’s; Etapa D: Cálculos Complementares.
O plano de análise do corpus é o que define os parâmetros dessas etapas. É
possível adaptar este plano às necessidades específicas do utilizador, entretanto,
existe um plano de análise padrão, simplificado e mais adequado à maior parte dos
usos. Neste estudo foi utilizado o plano de análise padrão.
Acerca das etapas de análise mencionadas anteriormente, serão
apresentadas aqui de forma breve as características de cada uma delas.
A primeira etapa consiste no reconhecimento das UCI (unidades de contexto
inicial) e das palavras-estrela; preparação do corpus e reconhecimento das UCE;
produção do dicionário de formas originais e reduzidas; produção da lista de
palavras-chave e caracterização lexical do corpus.
A segunda etapa é uma etapa de cálculos; em que se procede a divisão do
corpus em unidades de contexto (UC) e a sua classificação descendente hierárquica
em função da distribuição de palavras por UC.
A terceira etapa permite diferentes cálculos auxiliares para interpretação e
descrição das classes, uma vez que já foi definida a divisão do texto em classes.
Efetua-se então a análise fatorial de correspondências, a qual fornece uma
representação global do campo semântico situando a posição das respectivas
97
classes e palavras nesse campo. Na quarta etapa são realizados cálculos
complementares no interior de cada classe.
A análise do ALCESTE tem duração variável, entre poucos minutos até
diversas horas, dependendo do volume do corpus e da velocidade do processador.
O tempo de análise de cada corpus componente do corpus geral deste estudo variou
entre dois e quatro minutos.
3.3.1.4 Resultados produzidos pelo sistema ALCESTE
O instrumento ALCESTE gera diversos arquivos com objetivos diferenciados,
como o arquivo de processamento do programa e os arquivos de resultado, que dão
informações detalhadas sobre cada subetapa da análise.
O arquivo de resultados que está sendo utilizado para efeito de análise deste
estudo é o arquivo Rapport d’analyse, síntese geral do resultado, arquivo que
contém, entre outras orientações, informações sobre o número de classes
analisadas, as classes, o vocabulário, as formas reduzidas, as formas associadas.
Para investigação desses dados é executado um plano de análise, o qual vem a
seguir.
3.4 Plano de Análise
3.4.1 Constituição do corpus e leitura flutuante
Como já foi dito anteriormente, o corpus foi construído pelos segmentos I (15
artigos/notícias dos jornais brasileiros) e II (38 artigos/notícias dos jornais
98
espanhóis), perfazendo dois corpus, analisados pelo ALCESTE e componentes do
corpus geral deste estudo.
A divisão do corpus do presente estudo está relacionada ao objetivo de obter-
se, na análise dos dados, resultados mais definidos dos dois grupos de
artigos/notícias.
3.4.2 Preparação dos arquivos para utilização do sistema ALCESTE
Foram abertos dois arquivos com terminação “txt” para que neles fossem
salvos os corpus. Estes foram colocados numa pasta aberta no diretório do
ALCESTE, prontos para serem analisados.
3.4.3 Processamento de dados pelo sistema ALCESTE
Foi efetuada a análise do corpus pelo ALCESTE, de acordo com o plano de
análise padrão do referido programa.
3.4.4 Leitura em profundidade dos dados analisados pelo ALCESTE
Os resultados principais foram colocados num arquivo de nome Rapport
d’anályse, gravado pelo ALCESTE, o qual passou por uma leitura em profundidade
para nomeação e interpretação das classes emergidas com apoio do programa.
3.4.5 Apresentação e interpretação dos resultados
Os resultados principais foram organizados para apresentação, sendo
realizada em seguida a interpretação dos mesmos à luz da base conceitual do
99
trabalho. Buscou-se identificar e analisar os campos contextuais, interpretando os
significados das classes e denominando os seus respectivos sentidos.
100
CAPÍTULO IV
SIGNIFICADOS DA IMIGRAÇÃO E DO IMIGRANTE NAS IMPRENSAS
BRASILEIRA E ESPANHOLA
Apresenta-se neste estudo a construção dos significados de imigração e
imigrante produzidos pelas imprensas brasileira e espanhola, entendendo que esta é
fruto das interações vivenciadas pelos veículos de comunicação estudados em seus
próprios contextos. As classes inter-relacionadas emergidas das duas imprensas
apresentam características de suas conjunturas sociais, mostrando a construção de
cada significado produzido.
A compreensão do sentido da Imigração e do Imigrante, neste trabalho,
embasa-se no modelo teórico construído na perspectiva do senso comum. Deste
modo, é importante evidenciar que a produção do significado de Imigração e
Imigrante, tem nos artigos notícias dos jornais brasileiros e espanhóis todo o
material de referência deste estudo.
Quanto aos resultados apreendidos e análises realizadas, buscou-se ao
longo deste estudo, numa relação dialética, refletir sobre as condições de produção
e circulação das Representações Sociais da Imigração e do Imigrante nos referidos
jornais.
Neste capítulo evidencia-se o que realmente significa, para a imprensa
estudada, a Imigração e o Imigrante. Em seguida apresenta-se as classes que
emergiram dos artigos / notícias coletados, sempre tendo a compreensão delas a
partir da interação entre indivíduo e sociedade. A análise realizada aponta para um
101
conjunto de classes relacionadas entre si, das quais emerge a construção do
significado da imigração e do imigrante nas duas imprensas estudadas.
No corpus de artigos / notícias dos jornais brasileiros foram apreendidas seis
classes temáticas: Inclusão / Exclusão Social; Ações / Reações Contra a Imigração
Ilegal; História e Modos de Vida do Imigrante; Multiculturalismo e Violência;
Institucionalização da Intolerância Étnica; Trabalho / Emprego / Desemprego.
No corpus de artigos / notícias dos jornais espanhóis foram apreendidas
também seis classes: Impactos Negativos / Desenvolvimento; Legislação
imigratória Nacional: Acordos e Desacordos; Imigração Ilegal e Contenção;
Cooperação / Tensão Internacional; Falsa Legalidade / Ilegalidade e Trabalho;
Busca de Melhoria de Vida: Crianças e Adolescentes Como Arrimo de Família.
102
Dos artigos / notícias brasileiros emergiram as seguintes classes:
Tabela 03 – Distribuição das Unidades de Contexto Elementar (UCE) da imigração / imigrante, apreendidas nos artigos / notícias do jornais brasileiros.
CLASSESJORNAIS BRASILEIROS
UCE(f) %
I Inclusão / Exclusão Social 44 11,86
II Ações / Reações contra a imigração Ilegal 66 17,79
III História e Modos de Vida do Imigrante 77 20,75
IV Multiculturalismo e Violência
38 10,24
V Institucionalização da Intolerância Étnica
72 19,41
VI Trabalho / Emprego / Desemprego 74 19,95
TOTAL 371 100
Percebe-se nos dados apresentados na Tabela 01 que os jornais brasileiros
pesquisados revelam um maior percentual na Classe III, História e Modos de Vida
do Imigrante, com 20, 75%, seguida da Classe VI, Trabalho / Emprego /
Desemprego com 19,95%. A próxima Classe de maior percentual é a V,
Institucionalização da Intolerância Étnica, com 19, 41%, seguida da Classe II,
Ações / Reações contra a Imigração Ilegal, percentual de 17, 79%. Em seguida
observa-se a Classe I, Inclusão / Exclusão Social, com 11,86%, acompanhada da
103
Classe IV, Multiculturalismo e Violência, com 10, 24% das UCE. Obteve-se da
análise do material brasileiro o total de 371 UCE.
De acordo com os dados mostrados, observa-se que a classe mais
significativa na construção do significado de imigração / imigrante para os jornais
Brasileiros estudados foi a referente à História e Modos de Vida do Imigrante, já
que esta possui o maior percentual de UCE. Em seguida, observa-se a distribuição
de UCE por classe dos jornais espanhóis.
Tabela 04 – Distribuição das Unidades de Contexto Elementar (UCE) da imigração / imigrante, apreendidas nos artigos / notícias dos jornais espanhóis.
CLASSESJORNAIS ESPANHÕIS
UCE(f) %
I Desequilíbrio Social: Impactos Negativos /
Desenvolvimento
63 15, 48
II Pacto Imigratório Nacional: Acordos e Desacordos 41 10, 07
III Ações Contra a Imigração Ilegal
50 12, 29
IV Cooperação / Tensão Internacional 137 33, 66
V Identidade Falsificada e Trabalho
26 6, 39
VI Busca de Melhoria de vida: Crianças e
Adolescentes Como Arrimo de Família
90 22, 11
TOTAL 407 100
104
Junto ao material espanhol analisado obteve-se um maior percentual de
UCE na classe IV, Cooperação / Tensão Internacional (33, 66%). Em seguida figura
a classe VI, Busca de Melhoria de Vida: Crianças e Adolescentes Como Arrimo de
família, com 22, 11% das UCE. O terceiro maior percentual de UCE dentre as
classes referentes aos jornais espanhóis é o da classe Desequilíbrio Social:
Impactos Negativos / Desenvolvimento com 15, 48%. Esta classe vem seguida da
classe III, Ações Contra a Imigração Ilegal, que comportou 12, 29% das UCE
apreendidas no estudo. Já a classe II, Pacto Imigratório Nacional: Acordos e
Desacordos obteve 10, 07% do total de UCE. O menor percentual de UCE
apreendido localizou-se na classe V, Falsa Identidade e Trabalho, com 6, 29%.
Obteve-se da análise do material deste grupo de jornais o total de 407 UCE.
Somando-se todas as UCE obtidas entre os jornais brasileiros e espanhóis deste
estudo, portanto, constata-se um total de 778 UCE analisadas.
4.1 Detalhamento das Classes Apreendidas nas Imprensas Pesquisadas
A análise realizada aponta para um conjunto de classes relacionadas entre si,
das quais emerge a construção do significado da imigração e do imigrante nas duas
imprensas estudadas. Como verificado anteriormente, no corpus de artigos /notícias
dos jornais brasileiros foram apreendidas seis classes temáticas. As classes
evocadas neste grupo são: Inclusão / Exclusão Social, Ações / Reações Contra a
Imigração Ilegal, História e Modos de Vida do Imigrante, Multiculturalismo e
Violência, Institucionalização da Intolerância Étnica e Trabalho / Emprego /
Desemprego.
105
No corpus de artigos / notícias dos jornais espanhóis foram apreendidas
também seis classes: Desequilíbrio Social: Impactos / Desenvolvimento, Pacto
imigratório Nacional: Acordos e Desacordos, Ações Contra a Imigração Ilegal,
Cooperação / Tensão Internacional, Identidade Falsificada e Trabalho e Busca de
Melhoria de Vida: crianças e adolescentes como arrimo de família.
Dos artigos / notícias brasileiros emergiram as seguintes classes:
Classe I – Inclusão / Exclusão Social : Esta classe refere-se à formas de inclusão
e exclusão social em países de imigração, relatada enquanto premência de uma
sociedade multicultural a fim de trazer mais coesão social frente ao fenômeno
imigratório, ao mesmo tempo em que a exclusão é retratada como dificuldade de
integração social e laboral e polarização da sociedade.
Classe II – Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal: Refere-se a ações postas
em prática contra a imigração e também à reação a elas. São abordadas ações de
controle fronteiriço, exigência de visto e deportação automática.
Classe III – História e Modos de Vida do Imigrante: Relata a trajetória de vida do
imigrante, processo de chegada, cotidiano e sofrimento ético-político vivenciado.
Classe IV - Multiculturalismo e Violência: Diz respeito à questão do
multiculturalismo relacionada à tensão vivenciada e a violência nas relações de
convivência.
Classe V – Institucionalização da Intolerância Étnica: A intolerância étnica
institucionalizada por segmentos da sociedade em um país europeu.
Classe VI – Trabalho / Emprego / Desemprego: O trabalho em evidência na
relação com escassez de trabalhadores provocada pelo envelhecimento
106
populacional dos países receptores e pela busca de melhoria de vida dos
imigrantes na saída de seus países de origem.
Dos artigos / notícias retirados dos jornais espanhóis emergiram as
seguintes classes:
Classe I – Desequilíbrio social: Impactos Negativos / Desenvolvimento:A
presente classe retrata a imigração como desequilíbrio social em termos de impacto
negativo no campo social e financeiro, ao mesmo tempo em que a relaciona com o
desenvolvimento econômico.
Classe II – Pacto Imigratório Nacional: Acordos e Desacordos:
Observa-se que esta classe mostra o debate político sobre a legislação
imigratória entre membros do governo espanhol e partidos opostos, observando as
concordâncias e discordâncias entre eles.
Classe III – Ações Contra a Imigração Ilegal: Faz referência a ações postas em
prática contra a imigração, as quais são perpassadas por questões não só de
segurança, mas também político-eleitorais.
Classe IV – Cooperação/Tensão Internacional: Diz respeito às relações de
cooperação e tensão entre os países da União Européia (UE) sobre imigração na
busca de concordância de posições acerca de uma política comum de imigração na
União.
Classe V – ldentidade Falsificada e Trabalho Processo de chegada e estada na
Espanha na condição ilegal de imigrante, relacionados à busca pelo trabalho e
várias formas de legalização.
107
Classe VI – Busca de Melhoria de vida: crianças e adolescentes como arrimo
de família: A presente classe busca da melhoria de vida por povos do continente
africano com foco nas crianças e adolescentes como arrimo de família via processo
imigratório, evidenciando a influência dos líderes religiosos e da família neste
encaminhamento.
4.2 Discussão dos Resultados por classe
Inclusão / Exclusão Social
Tabela 05 – Distribuição do vocabulário específico da Imigração e do Imigrante enquanto Inclusão / Exclusão Social, apreendido mediante artigos / notícias de jornais brasileiros.
Vocabulário Específico sobre Inclusão / Exclusão Social*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS18 30 60.00 72.36 cultur+ cultura16 18 88.89 107.39 Muçulmanos muçulmanos22 32 68.75 108.43 Sociedade+ sociedade08 08 100.00 60.76 Universidade universidade08 10 80.00 45.65 Argument+ Argumentar, argumento12 20 60.00 46.87 Britan+ Britânica, britânicos06 06 100.00 45.32 Coesa+ Coesa, coesas06 06 100.00 45.32 Diferenças Diferenças06 06 100.00 45.32 Polariz+ Polarizada, polarizam06 06 100.00 45.32 Raça Raça06 06 100.00 45.32 Racial Racial08 12 66.67 35.64 Multiculturalismo Multiculturalismo06 08 75.00 31.18 Racismo Racismo04 04 100.00 30.05 Radicaliz+ Radicalização,radicalizando02 04 100.00 5.31 Conservador+ conservadores
Podem-se observar na tabela 05 algumas palavras características da classe
Inclusão / Exclusão Social. Na primeira coluna verifica-se o número de ocorrências
das palavras nas classes. Na segunda, observa-se a freqüência em que essas
palavras ocorrem no corpus total. Na terceira coluna estão os percentuais de
ocorrência das palavras nas classes. Na quarta, o X2 das palavras. Na quinta e
108
sexta colunas encontram-se, respectivamente, a palavra ou sua raiz e as formas
associadas a ela. Pode-se citar como exemplo o vocábulo cultur+, o qual ocorre
dezoito vezes na classe, e trinta vezes no corpus total, sendo 60% de suas
ocorrências no interior da classe. Considerou-se esta a palavra mais típica da
classe.
Observa-se a ocorrência das palavras racismo (75%) e multiculturalismo
(66.67%) como algumas das mais significativas da classe. Os vocábulos
polarização, raça e radicaliz+ apresentam porcentagem de 100% nesta classe.
A imigração / imigrante enquanto Inclusão / Exclusão Social, conforme dados
obtidos, configura um campo contextual construído em torno de três subclasses:
Falta de Oportunidade, Multiculturalismo e Polarização Social, conforme
anteriormente exposto no quadro 01.
De acordo com dados obtidos, pode-se caracterizá-la como sendo uma
classe construída predominantemente por artigos / notícias da Folha de São
Paulo, publicados no domingo como artigos / notícias secundários na seção
Internacional e escritos por jornalistas externos. Os textos jornalísticos mais
representativos na construção desta classe, no que diz respeito aos sistemas de
comunicação, se assemelham à propagação, o que significa que utilizam
linguagem mais direcionada a públicos específicos (Ordaz & Vala, 1997).
Esta classe reflete o movimento dialético da exclusão / inclusão social do
imigrante. Em termos de informação, a classe mostra a busca pela inclusão em um
sistema mais organizado, ou seja, a emigração possibilita ao sujeito o
compartilhamento de outro contexto social que, embora seja mais organizado,
109
parece não ser projetado para o “estranho”, o “de fora”, leia-se o imigrante.
Observa-se nestas passagens que os jornais brasileiros contemplam o lugar
reservado ao imigrante na sociedade:
“Os imigrantes não têm a oportunidade de se integrar (...) eles ocupam
posição se subordinação na sociedade (...) ficam com os piores empregos (...)”
(FSP, artigo/notícia 05).
Enquanto informação, outra questão emergente nesta classe é a polarização
social, significando a separação, não-aceitação provocada por motivos religiosos,
que se traduz em passagens de texto como:
“Todas as evidências mostram que estamos nos tornando uma sociedade cada
vez mais polarizada pela identidade religiosa e de raça (...) É possível integrar
muçulmanos à cultura ocidental? (...) Os imigrantes, especialmente os
muçulmanos, são cada vez menos bem vindos no continente.” (FSP,
artigo/notícia 05).
Emerge também como informação exclusão / inclusão como debate a
respeito da necessidade de aceitação dos imigrantes, não só por parte do
próprio imigrante, mas também sendo uma demanda do país de acolhida. Os
textos jornalísticos formadores da classe trazem, como informação a respeito da
imigração e do imigrante, a premência da acolhida de novas culturas de forma
que estas não sejam esmagadas por outras, mas sim aceitas como são, visando
assim à não-polarização das sociedades.
110
Em outras palavras, pode-se verificar nesta classe a presença de uma
organização de conhecimento (informação) relacionada aos modos de incorporação
do imigrante na sociedade de acolhimento descritos em Castles (2005). Cada país
tem uma maneira particular de regular a situação dos imigrantes, entretanto pode-
se sintetizá-la em três formas principais de incorporação de imigrantes à sociedade.
A primeira forma seria a assimilação, que significa induzir os imigrantes a
aprender a língua nacional e a adotar as práticas sociais e culturais do país destino
(Castles, 2005). Espera-se do imigrante que ele abdique de sua cultura de origem e
que acabe por se diluir na população do país de acolhimento, ao menos na altura
da segunda geração. Observa-se a referência a este tipo de incorporação em
passagens de texto como: “em vez de serem forçados a largarem suas culturas,
línguas e identidades. (...) Como formar sociedades coesas a partir de culturas
distintas?” (Artigo/Notícia 05).
De acordo com Castles (2005), esse tipo de incorporação de imigrantes tem
sido utilizado em países tradicionalmente receptores, como os Estados Unidos,
Canadá e Austrália, sendo reforçada, neste último, com a facilitação da obtenção
de nacionalidade. Alguns países da Europa também usam esta prática para
incorporar imigrantes.
Percebe-se nos artigos / notícias que formaram a classe que esse tipo de
incorporação é posto em cheque, é visto como inviável. Este tipo de informação
alimenta o afastamento (atitude) dessa tomada de posição, já que, sobre ela, não
se tece algo aplicável ao problema da imigração.
111
Outro tipo de incorporação de imigrantes mencionado nos textos jornalísticos
é o multiculturalismo. Neste tipo de incorporação é abandonado o mito da
homogeneidade cultural e o direito à manutenção da cultura de origem e à
formação de comunidades é reconhecido, associando esses direitos à equidade
social e à proteção contra a discriminação. Nos textos jornalísticos formadores da
classe, este tipo de incorporação é encorajado, dando margem a atitudes e afetos
neste sentido. A seguinte passagem de texto contempla a questão:
“precisamos integrar essa sociedade multiétnica (...) O multiculturalismo
oferece a melhor solução para uma sociedade coesa em que as pessoas podem
escolher ser como quiserem em vez de serem forçados a largarem suas culturas,
línguas e identidades.”. (FSP, artigo/notícia 05).
De acordo com Moscovici (2003) para as Representações Sociais existem
suas questões que são fios condutores, são elas: a comunicação e a ideologia, do
ponto de vista da sua estrutura, da sua gênese e da sua função. Neste sentido, os
componentes ideológicos intrínsecos aos textos atinentes a esta classe temática
dão margem a um discurso que mostra as dificuldades do imigrante em âmbito
social, cultural e laboral, bem como as possíveis soluções à dificuldade de inclusão
dos imigrantes. As passagens de texto que formaram esta classe observaram
questões estruturais da imigração, não necessariamente perfazendo sua imagem
como positiva ou negativa, mas sim oferecendo um campo representacional que
alerta pra a situação real do imigrante e sua relação com a sociedade de
acolhimento, que nem sempre acolhe.
112
Em face do tipo de informação, atitude e imagem transmitidas a respeito da
imigração e do imigrante observa-se que, os artigos / notícias brasileiros
formadores da classe, tendem a produzir subjetividades relacionadas à estrutura do
fenômeno imigratório no que tange à resolução, ou amenização do sofrimento
ético-político do imigrante causado pela exclusão. Acredita-se nisto, já que este
sofrimento é explicitado e possíveis soluções são mostradas no discurso dos
jornais em forma de proposição de políticas neste sentido, como pôde ser visto nas
passagens de texto.
Classe II – Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal:
Tabela 06 – Distribuição do vocabulário específico da Imigração e do Imigrante enquanto Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal, apreendido mediante artigos / notícias de jornais brasileiros.
Vocabulário Específico sobre Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS12 12 100.00 57.31 American+ Americana, americanas (o)l16 20 80.00 55.94 Deport+ Deportação, deportar32 34 94.12 149.11 Fronteira+ Fronteira, fronteiras20 20 100.00 97.69 muro muro10 10 100.00 47.49 Alternativa+ Alternativa, alternativas10 10 100.00 47.49 Exigência+ Exigência, exigências14 18 77.78 46.55 Ilegal+ Ilegal, Ilegalmente22 38 57.89 46.56 Imigração Imigração12 18 66.67 30.90 Contru+ Construção, construir12 16 75.00 37.42 Ilegais ilegais08 12 66.67 20.26 Medida+ Medida, medidas08 12 66.67 20.26 Segurança Segurança06 08 75.00 18.30 Combat+ Combate, combater04 04 100.00 18.69 Detenção Detenção24 71 33.80 15.39 Imigrant+ Imigrante, imigrantes
Na distribuição do vocabulário da imigração e do imigrante enquanto Ações /
Reações Contra a Imigração Ilegal (tabela 06), destacam-se tanto pelo sentido
quanto pelo seu posicionamento estatístico na classe as seguintes palavras
113
características: fronteira (94,12%), muro (100%), ilegal (77, 78%), imigração (57,
89%), segurança (66.67%) e combate (75%).
A imigração e o imigrante são, nesta classe, apreendidos enquanto ações
políticas e sociais de contenção e reações políticas e sociais à contenção.
Esta classe, de acordo com as variáveis descritivas na linha – estrela, pode
ser caracterizada como construída principalmente por artigos / notícias da Folha de
São Paulo, publicados na quinta – feira como notícia secundária na seção
Internacional e redigidos por jornalistas internos ao periódico. Os artigos / notícias
como maior participação na construção desta classe aproximam-se do sistema de
comunicação denominado Difusão, ou seja, usam uma linguagem acessível à
maioria dos públicos, adotando quadros de referências mais comuns (Ordaz &
Vala, 1997).
A partir da apreensão destes conteúdos, a imigração e o imigrante
constituem-se na relação entre ações e reações de contenção à imigração ilegal.
Nesta classe, os textos dos jornais referem-se a várias formas de frear as formas
ilegais de imigração, seja por meio de leis específicas ou de grandes projetos de
engenharia, como é o caso de muro fronteiriço entre Estados Unidos e México.
Estes meios de contenção relacionam-se com reações a eles, ora favoráveis, ora
desfavoráveis.
Evidencia-se nesta classe, como informação sobre a imigração, a
ilegalidade, o que é feito diante dela pelos governos e a reação a essas políticas.
Tais informações estão ancoradas no conceito de imigração irregular e imigração
de trabalhadores com fracas qualificações. Como retrata Arango (2000) a
114
imigração irregular é um tipo relativamente novo de fluxo imigratório e que está em
crescimento. Embora o tipo de imigração mais procurado hoje pelos governos dos
países de acolhimento seja as migrações altamente qualificadas, que também
estão crescendo, a imigração de trabalhadores com fracas qualificações parece
crescer em maior velocidade (Castles, 2005). Este tipo de imigração vem, de
acordo com o autor, assumindo a forma de imigração ilegal ou de pessoas em
busca de asilo, cuja privação de direitos facilita sua exploração.
A opção pela construção de um muro divisório na fronteira com o México
denota a demarcação de território em detrimento das pessoas que habitam a
região, ou seja, essa separação também aparta pessoas, demarca pessoas como
pertencentes a um ou outro lugar. O que abre indagações a respeito do direito
internacional e os direitos humanos.
Os textos formadores da classe colocam as ditas informações a respeito da
imigração, entretanto se posicionam dando ênfase à busca de neutralizar ações
radicais, como a construção do muro fronteiriço entre México e Estados Unidos:
“Calderón busca apoio contra muro. (...) presidente eleito do México quer barrar
obra dos EUA na fronteira. (...)”.
Os artigos / notícias referentes à classe mostram ainda atitudes
relacionadas a alternativas às medidas radicais, dando ênfase a ações legislativas,
como se pode perceber na passagem: (...) para ativista, as medidas para coibir
entrada de brasileiros salvaram muitas vidas e mostram que há alternativas ao
muro. (...) brasileiros deixam de emigrar via México. (...) detenção de imigrantes
ilegais na fronteira com EUA caiu 95, 3 por cento, por causa de deportação
115
automática e exigência de visto. (...)”. Acredita-se que tais informações e atitudes
contribuam para a formação de um campo representacional sobre o imigrante
relacionado ao seu sofrimento, ao mesmo tempo em que mostra a imigração como
sendo algo difícil de ser realizado, além de perigoso.
Contraditoriamente, observa-se também na presente classe atitudes
relacionadas à concepção de que há ligação entre terrorismo, imigração e
segurança nacional, o que acaba por representar socialmente a imigração
enquanto foco de medo e insegurança. Como pode ser percebido na passagem:
“(...) Blair anuncia projetos contra imigração ilegal e terrorismo. (...) confirmando
seu foco na segurança e no combate ao crime.” Evidencia-se, nesta construção, a
imigração enquanto perigo neste sentido, mostrando em alguns momentos o
enrijecimento das leis como positivo para os imigrantes e para os países. Tais
atitudes em relação à imigração e ao imigrante acabam por contribuir para a
formação de uma imagem negativa a seu respeito, já que o associa ao medo, à
diminuição da paz. Tal associação pode produzir subjetividades que vão de
encontro ao imigrante e à imigração, contribuindo para o processo de exclusão
deste coletivo.
O texto dá voz também aos segmentos sociais que são contra ações radicais
contra a imigração, como a construção de um muro fronteiriço. O que mostra um
discurso contraditório, mas ao mesmo tempo, por se tratar de textos jornalísticos,
comum, já que a veiculação de todos os lados presentes na questão abordada é
um princípio básico de reportagem. Em relação a isto, esperava-se, então, alguma
116
posição de um dos mais envolvidos no tema: o imigrante. Porém, este não foi
contemplado.
Classe III – História e Modos de Vida do Imigrante:
Tabela 07 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante enquanto História e Modos de Vida, apreendida mediante artigos / notícias de jornais brasileiros
Vocabulário Específico sobre História e Modos de Vida do Imigrante*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS11 21 52.38 13.54 Cheg+ Chega, chegada, chegado06 08 75.00 14.63 Condições Condições 04 04 100.00 15.44 Derrot+ Derrota, 04 04 100.00 15.44 Dificuldade+ Dificuldade, dificuldades06 06 100.00 23.29 Distante+ Distante, distantes22 26 84.62 69.33 Família Família, familiar, famílias14 20 70.00 31.17 Histor+ História, Histórias 10 12 83.33 29.53 Japão Japão04 04 100.00 15.44 Lembranças Lembranças29 29 100.00 120.12 Massateru Massateru14 14 100.00 55.55 Okinaw+ Okinawa, okinawano06 06 100.00 23.29 Sobreviv+ Sobrevivência, sobreviver06 08 75.00 14.63 Sonho+ Sonho, sonhos14 14 100.00 55.55 Súdito+ Súdito, súditos 12 18 66.67 24.25 Vida+ vida
Pode-se observar na tabela 07 que o vocábulo histor+ ocorre nesta classe
14 vezes, com percentual de 70%. A palavra Japão, com freqüência de 10 e
percentual de 83.33%. Já o vocábulo vida+ ocorre 12 vezes com percentual de
66.67%. O vocábulo sobreviv+ ocorre 06 vezes com percentual de 100%, e o
vocábulo cheg+ ocorre 11 vezes na classe, o que equivale a um percentual de
52.38% das suas ocorrências nesta classe. Todos esses, portanto, são
representativos da mesma.
117
A imigração e o imigrante são configurados, na presente classe, na chegada
e trajetória de vida do imigrante. Segundo as variáveis descritivas postas na linha-
estrela pode-se dizer que a classe III foi predominantemente formada por artigos /
notícias do O Estado de São Paulo, veiculados no sábado, na seção de Cultura
como notícia principal, por profissionais internos ao jornal. Os artigos / notícias mais
significativos na construção da classe assemelham-se ao sistema de propagação,
ou seja, usam linguagem específica de determinados públicos (Ordaz & Vala,
1997).
Tem-se, nesta classe, a informação a respeito da Imigração / Imigrante como
chegada e trajetória de vida do imigrante, sempre relacionadas ao sofrimento ético-
político vivenciado. Sawaia (1999) analisa a exclusão social a partir do âmbito
afetivo, notadamente, do sofrimento. O sofrimento ético-político abrange as
múltiplas afecções do corpo e da alma que se manifestam de diferentes formas na
vida do sujeito. Este sofrimento qualifica-se no modo como alguém é tratado, como
se trata o outro na intersubjetividade, cuja dinâmica e conteúdo são determinados
pela organização social. Sawaia (1999) esclarece que as questões sociais
dominantes em cada momento histórico reproduzem o sofrimento ético-político,
principalmente a dor que surge da situação social de ser tratado como inferior, sem
valor para a sociedade. Pode-se perceber esse sentimento nas seguintes
passagens de texto da classe:
Tinha 13 anos quando foi mandado para o Brasil, acompanhando um jovem
casal de tios. Massateru partiu do porto de Kobe em 25 de abril de 1918,
espremido no compartimento de carga do navio Wasaka Maru, só chegou a
118
santos 49 dias depois, ao fim de uma viagem em que morreram 60 dos 1597
imigrantes a bordo. (OESP, artigo / notícia 13)
A análise do sofrimento ético-político revela ainda uma falsa aparência de
integração social e as duas faces da exclusão/inclusão marcadas pelo problema da
desigualdade social, a injustiça e a exploração. O que, no caso do imigrante, é
bastante visível na presente classe. Os conteúdos veiculados, os quais formaram
esta classe, representam um campo contextual composto pela sub-classe
denominada Sofrimento ético-político, já que este conceito abrange todas as formas
de sofrimento expostas na classe, como a tentativa de estar no mundo de forma
melhor, de manter a família e exercer de fato a cidadania. A idéia de imigração
figura como busca de melhoria que não deu certo, que trouxe o insucesso desde o
início e, por conseguinte, o sofrimento ético político do imigrante, como se percebe
a seguir:
“Um navio, um imigrante e seu sonho. (...) uma trajetória de percalços em todas
as profissões que experimentou depois de fugir, literalmente, da fazenda de
café no interior de são Paulo onde trabalhava, em condições medievais,”
(Artigo/Notícia 12, OESP).
Apesar de este relato fazer referência a uma época passada, segue atual, já
que as condições de vida retratam, até os dias de hoje, a situação de vários
imigrante no mundo, como é o caso dos imigrantes africanos que viajam rumo à
Espanha em condições subumanas, por exemplo.
119
A diferença entre a história da imigração japonesa no Brasil e o contexto
atual reside no fato de que àquela época, esse tipo de imigração era vista de forma
positiva, já que se tratava da imigração de trabalhadores com intuito de preencher
postos de trabalho e assim desenvolver o país de acolhimento (Arango, 2000).
Atualmente, o Brasil está em outro patamar de desenvolvimento ao passo que esse
tipo de imigração não se faz necessária.
Figura-se que na maioria das UCE da classe há a referência ao trabalho e à
família. Esse binômio aparece como importante na vida do imigrante retratado na
classe: “Nunca voltou ao Japão e nunca juntou dinheiro. Ao contrario, sempre teve
enormes dificuldades para sustentar a família que constituiu aqui, depois de casar
com a imigrante Fussako Asato” (OESP, artigo/ notícia 13).
Essa passagem de texto demonstra, em sua forma de colocar as
informações, a contradição entre o objetivo do imigrante, quando da saída de seu
país, e sua realidade no país de destino. Percebe-se pela expressão “ao contrário”
que esta relação é adversa, contraditória. Este confrontamento de informações
transmite o interesse do autor em explorar essa questão dual, o que sinaliza para
uma atitude crítica rumo ao que está sendo exposto, ou seja, rumo à situação do
imigrante. Acredita-se que tal posicionamento auxilia a construção da imagem do
imigrante enquanto ser que busca, mas ao mesmo tempo é um ser oprimido e
permeado de insucessos. Em face deste posicionamento, subjetividades neste
sentido são construídas.
Outra questão que precisa ser evidenciada é o choque cultural sofrido pelo
imigrante relatado na classe. A diferença entre a cultura ocidental e oriental, a qual
120
pertence, acaba por contribuir para a frustração e a dificuldade de adaptação do
imigrante.
“(...) as incríveis dificuldades de adaptação à língua estranha e à comida
desconhecida. (...) Entre os japoneses de Okinawa, as relações com os mortos e
antepassados estão ainda muito distantes dos hábitos ocidentais, quase sempre
limitados ao ritualístico feriado de finados. (...)” (OESP, artigo / notícia 12)
Tal texto, mais uma vez demonstra que a presente classe contribui para
formação de subjetividades em nível de informação da realidade do imigrante no
passado, perpassando a imagem do imigrante enquanto um ser oprimido pelas
frustrações e pelo sistema, tendo a imigração como fonte de sofrimento ético-
político. Sofrimento este que tem no contexto vivido sua fonte, o qual envolve os
imigrantes de modo a não mais permitir a escolha por algo, fazendo com que eles
cheguem a crer que “simplesmente se adaptaram para sobreviver”. (OESP, artigo /
notícia 12).
121
Classe IV - Multiculturalismo e Violência:
Tabela 08 – Distribuição do vocabulário específico da imigração / imigrante enquanto Multiculturalismo e Violência, apreendido mediante artigos / notícias de jornais brasileiros
Vocabulário Específico sobre Multiculturalismo e Violência*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS14 18 77.78 93.85 Holanda Holanda12 12 100.00 108.67 Tolerância Tolerância10 18 55.56 42.25 Assassin+ Assassinar, assassinato,10 16 62.50 49.67 Islam+ Islâmica, islamismo08 12 66.67 42.94 Mort+ Morte, morto04 04 100.00 35.43 Limites Limites04 04 100.00 35.43 Mohammed Mohammed04 04 100.00 35.43 Rigid+ Rígida, rigidez04 04 100.00 35.43 Toler+ Tolerar, tolerava04 06 66.67 21.12 Amsterd+ Amsterdam02 04 50.00 6.95 Fundamental+ Fundamentalista02 04 50.00 6.95 Hostil Hostil02 04 50.00 6.95 Liberdade Liberdade04 10 40.00 9.90 Muçulman+ Muçulmano02 04 50.00 6.95 Multiculturar+ Multicultural
A distribuição do vocabulário específico da imigração e do imigrante
ancorados no Multiculturalismo e Violência, que se apresenta na tabela 08,
evidencia nos jornais brasileiros a presença de palavras típicas desta classe, que a
representam: tolerância (100%), assassin+ (55.56%), fundamental+ (50.00%)
liberdade (50.00%), entre outras.
Dentro desta classe, os artigos / notícias formadores, apresentaram a
imigração e o imigrante como envoltos no questionamento acerca do
multiculturalismo como provocar de tensão em um caso específico.
Observando-se as variáveis de análise encontradas na linha – estrela,
afirma-se que esta classe teve predominância na construção de seu significado de
artigos / notícias de O Estado de São Paulo, publicados no domingo na seção de
122
Cultura como notícia principal, sendo redigidas por jornalistas externos ao
periódico. O sistema de comunicação mais associado à linguagem usada na
redação do texto é a propagação, sendo assim utilizada forma de escrita mais
homogênea e accessível a públicos mais restritos (Ordaz & Vala, 1997). O que
mostra compatibilidade com a seção de Cultura dos jornais.
Contempla-se nesta classe, em nível de informação, a discussão sobre
quais seriam os limites da tolerância nas sociedades multiculturais, ou seja,
sobre a forma de integrar os imigrantes. Ao mesmo tempo em que os grupos de
defesas de direitos humanos, grupos políticos e estudiosos defendem o
multiculturalismo como melhor forma de integrar imigrantes ao país de
acolhimento, abre-se o debate em relação a até que ponto a aceitação de uma
cultura diversa pode ser coerente, quando esta mesma cultura não tolera
nenhuma outra. Como afirma uma das UCE dos jornais, “como ser tolerante com
os intolerantes?” (OESP, artigo / notícia 10).
Destaca-se que da própria modernidade que nasce o multiculturalismo pode
vir também o que pode feri-lo, ou seja, “fatores inerentes à globalização, vêm a
enfraquecer os modos tradicionais de controle dos fluxos migratórios e das
mudanças socioculturais associadas” (Castles, 2005). O referido autor elucida que
à medida que os grupos imigrantes se instalam, as sociedades de acolhimento são
solicitadas por novas experiências de diversidade social e cultural. O que também
ocorre por parte do imigrante, que nem sempre está preparado para assimilar
costumes tão liberais, como mostra as seguintes UCE:
123
“(...) Mohammed Bouyeri, um jovem de 26 anos, muçulmano fervoroso,
holandês, sim, holandês, de origem marroquina,(...) chegou de bicicleta para
assassinar o cineasta, agitador cultural e critica profano do islamismo Theo van
Gogh.(...) Mohammed Bouyeri explicou que a lei divina não permitia que ele
vivesse em um país com liberdade de expressão.(...) nem ele nem aqueles que
usam e abusam desse direito, como era o caso de Theo van Gogh.(...)” (OESP,
artigo / notícia 10).
O sentido da não adaptação ao país de destino, e do avanço tecnológico
como papel-chave na busca da preservação da cultura de origem se completa na
seguinte passagem:
“Bouyeri, condenado à prisão perpétua pelo assassinato de Theo van Gogh,
habitava uma dish city, um subúrbio conectado à terra dos seus pais via
televisão por satélite, internet e telefone celular.” (Artigo/Notícia 10, OESP).
Nesta passagem observa-se a presença da ligação do descendente
imigrante com sua cultura primária, ou seja, ele cultivava os valores, de acordo com
o observado, intolerantes de sua cultura, não conseguindo, portanto, adaptar-se a
valores multiculturais vivendo em um país cosmopolita. Castles (2005), explica que
a globalização possui fatores que contribuem para ligar os imigrantes com seus
países de origem, fazendo com que sua cultura-materna seja fortalecida.
Percebe-se no conteúdo exposto nos textos formadores da classe a
presença de descrições acerca de acontecimentos que ilustram a problemática da
integração de imigrantes. Não se detecta, entretanto, posicionamentos contra ou a
124
favor do multiculturalismo ou da negação dos imigrantes, mas sim elementos
necessários à discussão a respeito da questão: até que ponto é possível integrar
imigrantes a partir de políticas multiculturais? O artigo / notícia não chega a
responder a questão, mostrando-se neutro, mas incita a polêmica sobre isto
quando coloca ao final do texto: “Pelas projeções, 52% da população de Amsterdã
em 2015 será de origem estrangeira, em sua maioria muçulmana. (...) afinal, quais
são os limites da tolerância?” (OESP, artigo / notícia 10).
No tocante à imagem do imigrante, figura-se um ser de adaptação difícil,
tendo arraigados na mente valores religiosos fundamentalistas, os quais pautam
suas ações frente à sociedade. Estas são as características descritivas do
imigrante na classe, entretanto o texto mais uma vez não sinaliza para o
posicionamento a favor ou contra essa concepção. Apesar disso, a análise isolada
do leitor sobre o assunto pode resultar em uma imagem negativa do imigrante,
embora não aja indução clara a isso por parte do posicionamento do jornal, pois a
informação em si mesma traz algo negativo sobre o imigrante, relatando um caso
específico. Castles (2005) elucida que apesar de a preocupação com segurança
está sendo associada aos imigrantes e aos muçulmanos, a maioria deles não tem
relação com extremistas. O autor afirma ainda que “O medo dos muçulmanos e das
diferenças culturais é resultado da falha em conseguir igualdade para os
imigrantes”.
Na presente classe, observa-se a contribuição para a discussão sobre as
políticas de integração de imigrante. O artigo / notícia formador da classe induz a
sociedade a pensar se há uma maneira ideal para integrar imigrantes. De acordo
125
com Buyum (2006) a melhor maneira de integrar imigrantes é o multiculturalismo.
Entretanto, diante do debate cultivado nesta classe, cabe a dúvida se as políticas
de integração embasadas em preceitos multiculturais devem realmente ser
aplicadas para todos os tipos de imigrantes. Na prática, não só o país de
acolhimento deve conceber a diversidade étnica, mas também o próprio imigrante,
já que se trata da sua própria integração.
Classe V – Institucionalização da Intolerância Étnica:
Tabela 09 – Distribuição do vocabulário específico da Institucionalização da Intolerância étnica, apreendida nos jornais brasileiros.
Vocabulário Específico sobre Institucionalização da Intolerância Étnica*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS14 14 100.00 60.42 Caucasianos Caucasianos12 12 100.00 51.50 Georgi+ Georgias, georgianos16 16 100.00 69.44 Russos Russos10 10 100.00 42.68 Neonazista+ Neonazista, neonazistas08 08 100.00 33.95 Ódio Ódio08 08 100.00 33.95 Ultranacionalista
+Ultranacionalista (s)
08 08 100.00 33.95 Xenófobo+ Xenófobo, xenófobos06 06 100.00. 25.33 Ataque+ Ataque, ataques04 04 100.00 16.79 Azerbaijano+ Azerbaijano, azerbainanos04 04 100.00 16.79 Choques Choques04 04 100.00 16.79 Ciganos Ciganos04 04 100.00 16.79 Eslava Eslava04 04 100.00 16.79 Não-eslavo Não-eslavo04 06 66.67 8.71 Viol+ Violência, violentos04 04 100.00 16.79 Intolerância Intolerância
A distribuição do vocabulário sobre Institucionalização da Intolerância Étnica,
apresentado na tabela 09, evidencia várias etnias e expressão de sentimentos
negativos frente à diversidade, o que pode ser observado em vocábulos como:
126
caucasianos (100%), georg+ (100%), russos (100%), eslava (100%), não-eslavo
(100%), ódio (100%), choques (100%), ataque+ (100%).
A presente classe compreende a imigração e o imigrante no processo de
violência física e social organizada. Recorrendo às variáveis descritivas pode-se
caracterizar esta classe como sendo mais fortemente construída a partir de
artigos / notícias da Folha de São Paulo, publicados no domingo, inseridos na
página Internacional como principais e redigidos por jornalistas externos à
redação da Folha. O tipo de sistema de comunicação dos referidos textos
assemelha-se à difusão, uma vez que usam linguagem acessível a uma
pluralidade de públicos (Ordaz & Vala, 1997).
A presente classe retrata informações sobre o mais alto grau de
intolerância étnica para com a diferença: a violência. Figura-se aqui o
enfretamento entre grupos sociais distintos, cujo motivo principal reside na
diferente pertença grupal. Como se verifica na seguinte passagem:
“(...) em maio, na cidade de Kharagun região de tchita, os choques étnicos
opuseram russos e azerbaijanos, com saldo de um morto (...) sua proposta
consiste em limpar a Rússia dos tchiornye,(...) dar prioridade aos russos étnicos
e expulsar os ilegais em 24 horas (...) (FSP, artigo / notícia 01).
A perpetuação dos antigos valores de Estado-Nação fica clara quando se
percebe informações sobre a busca de manutenção de homogeneidade cultural e
racial e também o fechamento a outros Estados. Assim sendo a sociedade
retratada na classe parece querer eliminar tudo o que diverge dessa premissa que,
de acordo com Castles (2005), é incompatível e ilusória no mundo dos fluxos em
127
todos os níveis. Para Castells (1996) a própria globalização está envolvida nesta
questão, visto que, segundo a explicação do autor, ela corrói muitas características
centrais do Estado-nação, significando assim, uma alteração na organização
espacial do mundo, de um espaço de locais para um espaço de fluxos. Em face
disto, as ações violentas em relação aos imigrantes e minorias étnicas descritas
nesta classe estão na contra-mão das tendências mundiais no tocante à imigração,
pois, como alerta Castles (2005), as migrações tendem a aumentar de volume e os
migrantes apresentam características sociais e culturais cada vez mais diversas.
Arango (2000) completa também sobre a questão que uma das maiores fraturas
sociais de uma sociedade é a que distingue estrangeiros de nacionais, já que, para
ele, as conquistas da democracia são negadas quando isso ocorre.
Enquanto atitudes, afetos descritos nos artigos / notícias da classe
destaca-se também o apoio institucional à intolerância, o que confirma as
questões relacionadas no parágrafo anterior. A imigração termina por ser
ancorada como abalo de antigos paradigmas relacionados ao conceito de
pertença e identidade, indo de encontro às mais modernas formas de
incorporação e até das leis mais recentes sobre imigração (Vertovec, 1999). A
xenofobia chega a ser colocada enquanto ação normal, tanto por organizações
da sociedade, como pela própria imprensa e por partidos políticos, como se
observa a seguir:
O clima da multidão foi atiçado por uma organização ultranacionalista, (...) o
movimento contra a imigração ilegal DPNI. (...) A imprensa, os políticos e os
ultranacionalistas em pouco tempo passaram a fazer a mesma análise dos
128
acontecimentos, se a situação saiu do controle em kondopoga, não foi devido a
intolerância étnica (...) A imprensa nacional atiçou o ódio. "A verdadeira razão de
tudo isso é que os lobisomens de uniforme permitiram que os recém chegados
se comportassem como ocupantes, sem nenhum respeito pela população local",
denunciou o "Izvestia” (FSP, artigo / notícia 01).
Cabe relembrar que, na discussão dos dados, se está analisando tanto a
informação transmitida pelo jornal como também a sua postura, seu
posicionamento referente à informação dada, e tanto o conteúdo, quanto a forma
que é passada esta informação produzem a imagem da imigração e do imigrante. É
neste ensejo que observamos nesta classe a diferença entre o conteúdo da
informação e o posicionamento do jornal. Mesmo sendo as informações veiculadas,
de teor xenófobo, como pôde ser visto, o jornal não apresenta características de
que compartilha desta posição. Ao contrário, descreve com detalhes os
enfrentamentos étnicos ocorridos, chamando a atenção para a violência, a
voracidade dos participantes dos ataques e as mortes, usando no texto falas
infladas proferidas nos ataques, o que confere realidade à notícia e provoca
reações em que a lê. Deixa claro também o apoio das organizações sociais e
políticas e da própria imprensa, o que denota o interesse de dar publicidade a
esses acontecimentos.
A revelação dos acontecimentos, a decisão de publicar a notícia, já
configura, neste caso, a não-concordância com o que foi veiculado, já que na
sociedade brasileira os acontecimentos descritos no artigo / notícia formador da
classe não são comumente aceitos pela população. Em face disto, acredita-se que
129
o conteúdo desta classe contribui para a formação de uma imagem do imigrante
como excluído da sociedade, percebido como sujeito não aceito e sem direitos,
inferiorizado. Sayad (1998) elucida que os emigrantes (que é a mesma pessoa que
é imigrante) se exclui ou é excluído pela sua ausência, pela sua deserção do
político do qual são provenientes, ao mesmo tempo em que quando imigrante se
exclui no país de acolhida, pois já sabe instintivamente do que será excluído, do
que não poderá desfrutar, e assim o faz para evitar a exclusão por parte dos outros.
Esta situação contraditória faz com que o imigrante se torne uma presença
ilegítima, visto que ele, como explica Sayad (1998),
foge às categorias de nosso entendimento político que repousa por inteiro na
distinção entre nacional e não-nacional, a presença do imigrante (que,
idealmente e para a realização completa da categoria de nação, não deveria
existir) traduz uma espécie de limite à perfeição esperada da ordem nacional, a
ordem da imigração alterada pela presença de não-nacionais e a ordem da
emigração que também sofre, por sua vez, pela ausência de seus nacionais –
ausência tão fundamentalmente ilegítima e da mesma ordem da ilegitimidade
que a presença do imigrante; (. p 269).
Desta maneira, a produção de subjetividade a respeito da imigração e do
imigrante, diante da configuração desta classe, tende a ser relacionada às questões
acima enumeradas.
130
Classe VI – Trabalho / Emprego / Desemprego:
Tabela 10 – Distribuição do vocabulário específico de Trabalho / Emprego / Desemprego, apreendido mediante artigos / notícias de jornais brasileiros.
Vocabulário Específico sobre Trabalho / Emprego / Desemprego*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS16 18 88.89 56.31 Européia+ Européia, européias12 12 100.00 49.77 Idosos Idosos12 12 100.00 49.77 Mão-de-obra Mão-de-obra08 08 100.00 32.82 Idade Idade08 08 100.00 32.82 Polonês+ Polonês, poloneses,
polonesa08 10 80.00 23.21 Trabalhadores Trabalhadores04 04 100.00 16.23 Desempregados Desempregados04 04 100.00 16.23 Desemprego Desemprego08 14 57.14 12.61 Estrang+ Estrangeira, estrangeiros16 36 44.44 14.99 Europ+ Europa, europeus04 04 100.00 16.23 Exterior Exterior12 22 83.33 31.20 Trabalh+ Trabalhando, trabalhar...04 04 100.00 16.23 Salários Salários04 08 50.00 4.63 Domestic+ Doméstica, domésticas08 20 40.00 5.32 Econom+ Economia, economias...
A distribuição do vocabulário sobre Trabalho / Emprego / Desemprego,
apresentado na tabela 10, evidencia a questão do trabalho relacionada a idade,
emigração de trabalhadores, desemprego, o que pode ser observado e palavras
como:: trabalh+ (83.83%), desemprego (100%), salários (100%), econom+ (40%),
trabalhadores (80%), mão-de-obra (100%) e idosos (100%).
Esta classe apreende o imigrante e a imigração na relação entre déficit de
trabalhadores e envelhecimento populacional, e entre déficit de trabalhadores e
busca de melhoria de vida. Levando em consideração as variáveis descritivas
inseridas na linha - estrela, figura-se na construção desta classe a predominância
de artigos / notícias pertencentes a O Estado de São Paulo, publicados no sábado
131
nas seções Internacional e Nacional, sendo produzidos por jornalistas externos ao
periódico.
Observa-se nesta classe a organização de conhecimentos (informação)
sobre a incoerência entre os prognósticos sobre déficit de trabalhadores na Europa
e as novas leis de imigração da maioria de seus países. Percebe-se que haverá
necessidade de trabalhadores, entretanto os governos travam verdadeiras lutas
contra a imigração, tendo seu significado como nocivo. Isto se comprova nos textos
a seguir:
(...) atualmente, 17 por cento da população européia tem mais de 65 anos, (...) o
que já é uma das taxas mais altas do mundo. (...) O impacto econômico dessa
tendência deverá ser significativo (...) A Europa poderá ter déficit de mão-de-
obra (...) Os dados surgem justamente no momento em que os governos
europeus incrementam leis contra imigração (OESP, artigo / notícias 07).
De acordo com esses dados, percebe-se o quão paradoxal é a discussão
acerca da temática imigratória. Ao mesmo tempo em que seria necessário um
planejamento populacional no sentido de evitar um déficit de trabalhadores no
futuro, a polêmica sobre a imigração é infinita e a legalização é permeada de
dificuldades. Hugo (1998), explica as migrações sob a ótica demográfica que nesta
classe se apresenta. Para o autor as disparidades estruturais que se observam
entre áreas com economias estagnadas e com elevadas taxas de fertilidade, por
um lado, e áreas com economias em rápido crescimento e com declínio de
fertilidade, por outro. Castles (2005) completa esse raciocínio quando afirma que a
situação mais dramática é a do sul e do ocidente da Europa, justamente a descrita
132
nesta classe, lugares onde as taxas de fertilidade caíram para 1,2 filhos por mulher,
valor esse abaixo do valor de reposição da população. O mesmo autor alerta ainda
que
O resultado é o rápido envelhecimento da população e a escassez de pessoas
em idade activa, o que conduz a graves carências de mão-de-obra, sobre tudo
para trabalhos de fracas qualificações. Na vizinhança imediata ao sul, cruzando
o Mediterrâneo, encontram-se os países do Norte de África, com os seus
elevados níveis de fertilidade, as suas altas taxas de crescimento de mão-de-
obra e escassez de empregos para os novos candidatos ao mercado de
trabalho (Castles, 2005).
De acordo com Hirano, Castles et al. (2000), com a necessidade de
trabalhadores estrangeiros para a prestação de cuidados à terceira idade pode ser
possível uma mudança a curto prazo no que tange às restrições à entrada de
imigrantes.
Alude-se também, no que toca à informação, ao fenômeno provocado pelos
imigrantes laborais poloneses, que por buscarem melhores empregos em outros
países da União Européia, estão causando um falta genuína de trabalhadores em
seu país de origem. Isto ocorre ao mesmo tempo em que a Polônia mostra um alto
número de desempregados. Como se verifica nas seguintes passagens:
Após entrada na união européia, em 2004, 800 mil poloneses deixaram país em
busca de melhores salários (...) mas se registram como desempregados para
133
receber benefícios. (...) A igreja católica na Irlanda vive um renascimento com o
forte comparecimento de poloneses aos domingos... (OESP, artigo / notícia 15).
Estes fatos demonstram o componente sistêmico do fenômeno imigratório e
destaca também a questão do transnacionalismo. Em relação a isto são abordadas
mudanças advindas desse movimento, tais como: déficit de trabalhadores na
Polônia e formação de espaços transnacionais nos países de acolhida. As
passagens de texto mostram que ao mesmo tempo em que os trabalhadores
poloneses buscam trabalho em outros países da EU, eles seguem tendo relação
com seu país de origem até para receber benefícios sociais, o que configura uma
experiência de transnacionalismo. Este se dá quando determinadas pessoas têm
sua existência crivada em dois ou mais países, mantendo assim relações
concomitantes fronteiriças, recorrentes, duradouras e de cunho comercial, cultural,
política, desportiva ou social (Portes, et al. 1999).
Enquanto atitude frente à imigração destaca-se a descrição do
endurecimento das leis por parte dos países europeus, no sentido de entrada de
estrangeiros, entretanto o posicionamento dos artigos / notícias formadores da
classe não demonstra estar favorecendo esta questão. Sobre isso se pode colocar
que nos textos observa-se a colocação da referida informação em contraposição ao
envelhecimento populacional, como se colocasse em cheque a decisão dos países
da Europa de evitar a entrada de imigrantes, é o que se pode ver a seguir:
Tiro no pé. Reformas em vários países já foram iniciadas, assim como estudos
sobre a necessidade de que certas economias contem com mão_de_obra
134
estrangeira. A Suíça, por exemplo, tem déficit de 5 mil engenheiros. As
empresas locais precisam contratar funcionários na Ásia e América Latina para
trabalhos especializados. Os dados ainda são um recado aos governos que
endurecem suas leis contra a imigração diante do crescente sentimento de
insegurança em algumas cidades. (OESP, artigo / notícia 07).
Segundo o que se pode verificar na passagem acima, o jornal demonstra
posicionar-se em favor da imigração, quando coloca que não aceita-la é um “tiro no
pé”, além de afirmar que os dados sobre o déficit de trabalhadores são “um recado
aos governos que endurecem suas leis”. Acredita-se que esse posicionamento
contribui para uma formação sobre a imigração e o imigrante relacionada à sua
necessidade, ao imigrante enquanto útil para a sociedade de acolhimento, e à
imigração como importante e saudável, sistemicamente, para os países que a
aceitam.
Infere-se então que os conteúdos representacionais sobre a imigração e o
imigrante nesta classe produzem subjetividades relacionadas à imigração como
solução, quando se pensa sobre déficit de trabalhadores, também ancorando a
imigração como fator sistêmico no qual o trabalho mostra-se como centro de
gravidade.
Em seguida observam-se as análises a respeito dos significados da
imigração na imprensa espanhola. Abaixo segue a distribuição das UCE por classe
emergida na imprensa espanhola.
135
Classe I – Desequilíbrio social: Impactos Negativos / Desenvolvimento:
Tabela 11 – Distribuição do vocabulário específico de Desequilíbrio Social: Impactos Negativos / Desenvolvimento, apreendido mediante artigos / notícias de jornais espanhóis.
Vocabulário Específico sobre Desequilíbrio Social: Impactos Negativos / Desenvolvimento
*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS10 10 100.00 55.98 Gasto+ Gasto, gastos07 08 87.50 32.35 Coletivo+ Coletivo, coletivos07 07 100.00 38.89 Crescimento Crescimento14 24 58.33 35.80 Serv+ Serviços, serviram, serviu04 04 100.00 22.06 Impostos Impostos10 16 62.50 28.15 Sociais Sociais04 04 100.00 22.06 Verba+ Verba, verbas06 11 54.55 13.19 Aument+ Aumentar, aumento,
aumentou04 06 66.67 12.20 Demand+ Demanda (s), demandar04 05 80.00 16.11 Ganhos Ganhos04 05 80.00 16.11 Impact+ Impactará, impacto04 10 40.00 4.71 Responsabilidad
eresponsabilidade
03 06 50.00 5.55 Acolhida acolhida06 13 46.15 9.66 Fenômeno+ Fenômeno, fenômenos21 86 24.42 6.66 Imigrante+ Imigrante, imigrantes
A distribuição do vocabulário de Impactos Negativos / Desenvolvimento,
apresentado na tabela 11, contempla vocábulos que expressam a ligação entre
imigração e finanças do país do acolhida, bem como questões sociais: fenômeno
(46. 15%), imigrante (24. 42%), acolhida (50%), gasto (100%), ganhos (80%),
crescimento (100%).
Esta classe retrata as conseqüências trazidas pela imigração em termos
de impacto negativo no campo social e financeiro, assim como em relação ao
desenvolvimento econômico advindo da imigração. Considerando as variáveis
inseridas na linha - estrela, observa-se na construção desta classe a predominância
de artigos / notícias pertencentes ao jornal El Mundo, publicados no domingo nas
136
seções Economia, Cidades e Saúde, sendo produzidos por jornalistas internos à
redação do periódico. O sistema de comunicação que mais se assemelha à forma
de escrita dos artigos / notícias formadores da classe é a difusão, posto que usam
linguagem simples e acessível a uma gama de públicos (Ordaz & Vala, 1997).
Com respeito à informação, a presente classe contempla questões
relacionadas aos impactos e desenvolvimentos trazidos pela imigração, sempre
permeadas por temas atinentes aos ganhos econômicos advindos do referido
coletivo, pela prostituição enquanto atividade laboral do imigrante, desequilíbrio
econômico e responsabilidade social para com o imigrante.
A essência das informações desta classe está nas contradições trazidas pela
imigração, que talvez já seja fruto de paradoxos também. Ao mesmo tempo em que
se afirma que a chegada do imigrante traz benefícios para as contas públicas, já
que este paga impostos. Coloca-se também que a imigração provoca gastos
demasiados em setores como saúde, educação, e com a responsabilidade social
como um todo que demanda o imigrante. Isto pode ser verificado em passagens de
texto como esta:
O saldo resultante do que traz e consome esta nova população, manifesta que
em 2005 os imigrantes geraram ganhos em matéria de impostos e de
seguridade social de 23... E suponho que aprenderá os problemas que a
pressão imigratória esta causando nos serviços sociais da capital... Uma enorme
escalada de gastos para integrar o incrível aumento de população que esta
ocorrendo... alcançarão os 6, 5 milhões, o que representa 14 por cento da
população da Espanha. ... (ELM, artigo / notícia 35).
137
O curioso nesta contradição é que surge uma dúvida em relação aos gastos a
que se referem os artigos / notícias formadores da classe. Os imigrantes são
“acusados” de demandarem mais gastos aos serviços sociais, ao mesmo tempo em
que pagam os impostos. Então, por que não podem usá-los? Os nacionais também
pagam seus impostos e usam os serviços públicos, entretanto não é remetido a
eles o peso de serem responsáveis por colocar pressão sobre tais serviços. O
lógico seria que, recebendo mais contribuições, de mais pessoas, os serviços
fossem realmente mais utilizados, todavia, o fato de este uso não ser feito por
“nacionais” parece fazer diferença, de acordo com o que visto no conteúdo da
classe.
Nesta classe não se evoca o imigrante ilegal, refere-se ao imigrante que cumpre
com suas obrigações de produzir para o país e de pagar seus impostos. Porém
mesmo assim ele parece incomodar. Encontramos em Sócrates citado em Sayad
(1998), elucidação sobre este olhar em direção ao imigrante, quando o autor coloca
que o imigrante é o atopos , sem lugar, deslocado, inclassificável. Tal gradação é
provocativa, no sentido de incitar a reflexão a respeita do ser complexo que é o
imigrante. Sayad (1998) também mostra este ser que nem é cidadão nem
estrangeiro, nem totalmente do lado do Mesmo, nem totalmente do lado do Outro,
para o autor, o imigrante situa-se nesse lugar “bastardo” do qual Platão falava, ele
está entre a fronteira do ser e o não–ser social. Verificam-se nas seguintes
passagens de texto, amostras desse contexto de indefinição sobre o imigrante,
afinal ele é útil ou não à sociedade de acolhimento? Ele é aceito ou não?
138
Sem dúvida, é certo que este fenômeno é vital para o crescimento da economia
do país, também é verdade que há mais pessoas que contribuem para a
seguridade social... 10% dos contribuintes são estrangeiros e pagam impostos.
Desequilíbrio entre gastos e ganhos em nível territorial pode terminar afogando
algumas regiões ou deteriorando severamente o nível de seus serviços... É certo
que existe maior demanda de serviços públicos por regiões... a Catalunha
recebeu 40, 2 milhões e os municípios da comunidade autônoma valenciana 22,
5 milhões, quantidades, de qualquer forma, insuficientes... serviços que têm uma
poderosa tendência expansiva no gasto e que são muito sensíveis ao
crescimento populacional... entretanto, os impostos que recebemos para
financiar a saúde, a educação e os serviços sociais são, sejam divididos ou não
com o estado... não evoluem de maneira tão favorável como as quantias
estáveis diretamente associadas a imigração, cotações sociais e
impostos....(ELM, artigo /notícia 35).
Em relação à atitude descrita na classe com respeito à imigração e ao
imigrante, figuram-se também contradições. Percebe-se que há ora o
favorecimento, ora desfavorecimento do coletivo. Como pode ser verificado em
seguida:
Prestamos aos imigrantes serviços públicos ao estarem transferindo as
competências dos serviços básicos que mais precisa o coletivo imigrante: saúde,
educação e serviços sociais... existe uma quantia de mais de 12. 000 milhões
dividida entre ambas as administrações... será quando este coletivo, hoje jovem
e trabalhador, comece a demandar massivamente assistência de saúde e
139
educação, o que impactara ainda mais nas contas autônomas e municipais....
575 milhões nem sequer supera o gasto nas políticas de integração que são de
605 milhões.... (ELM, artigo / notícia 35).
Em alguns momentos são colocadas as benesses trazidas pelos imigrantes,
em outros estes são vistos como fonte de desequilíbrio. São colocados em pauta
serviços prestados aos imigrantes e também o gasto que tais serviços geram para
as comunidades autônomas na Espanha, mesmo que o imigrante pague pelos
serviços prestados. Ao mesmo tempo em que essa Responsabilidade Social é
descrita como forma de posicionamento positivo frente ao imigrante, o desequilíbrio
visto como causado pelo imigrante demonstra um afastamento diante dele e a
desvantagem de ter-lo presente.
De acordo com a questão relatada na classe, ocorre um desequilíbrio
financeiro entre a administração estadual e municipal no tocante ao que se recebe
dos imigrantes. Segundo os artigos / notícias formadores da classe, 90% do que
pagam os estrangeiros em matéria de impostos fica com o estado, entretanto quem
fica com a maioria dos gastos com saúde, educação, etc. é o município, o que
termina provocando um verdadeiro colapso. A manchete de um dos artigos /
notícias envolvidos na formação da classe afirma: “Os imigrantes enriquecem o
estado e empobrecem os municípios”. Colocada desta forma a responsabilidade
sobre a questão é posta para o coletivo imigrante e não para o próprio Estado
espanhol. Ocorre que os imigrantes relatados na classe pagam seus impostos,
cumprindo assim com o seu dever, mas mesmo assim causam impactos nos
serviços. Observa-se então que o problema encontra-se na organização da
140
transferência do que é pago pelos imigrantes, e não no número imigrantes. De
acordo com Castles (2005), vários argumentos que colocam a imigração como
nociva, acabam por culpar a vítima, ou seja, o próprio imigrante. Percebe-se aqui
esta relação de transferência de responsabilidade para o imigrante, quando esta é
do próprio Estado, que deveria organizar de forma adequada suas finanças de
modo a não distribuir de maneira equivocada os numerários dos quais se apropria,
causando ele, o Estado, o desequilíbrio.
Face ao posicionamento do jornal sobre o imigrante, ancorando-o como
fonte de desequilíbrio em detrimento de seu fator positivo, acredita-se que a
imagem formada a seu respeito e a respeito da imigração como um todo seja
negativa. Isto é potencializado quando tal forma de posicionar-se sobre a imigração
é veiculada no contexto imigratório da Espanha, já que tal país atravessa um
momento muito intenso neste sentido, como pôde ser visto na fundamentação
teórica deste estudo. A formação de subjetividades sobre o coletivo imigrante e
sobre a imigração diante do posicionamento negativo do jornal acaba sendo
influenciada neste sentido, notadamente quando o contexto social vivenciado por
quem absorverá tais informações é perpassado de polêmicas e experiências em
todos os níveis envolvendo a imigração.
141
Classe II – Pacto Imigratório Nacional: Acordos e Desacordos:
Tabela 12 – Distribuição do vocabulário específico do Pacto Imigratório Nacional: Acordos e Desacordos
Vocabulário Específico sobre Pacto Imigratório Nacional: Acordos e Desacordos*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS11 14 78.57 75.09 Acord+ Acordado, acordo08 10 80.00 55.34 Executivo Executivo09 12 75.00 57.54 Fernandez fernandez10 12 83.33 73.25 Grupo+ Grupo, grupos11 13 84.62 82.37 Pacto+ Pactos, pacto12 24 50.00 44.88 Propost+ Propostas, proposta10 14 71.43 60.25 Vice-presidente Vice-presidente03 06 50.00 10.72 Fal+ Falar, falou02 05 40.00 5.00 Discurso+ Discurso, discursos03 03 100.00 26.98 Consenso+ Consenso, consensos02 04 50.00 7.11 Alternativa+ Alternativa03 06 50.00 10.72 Conferência+ Conferência06 09 66.67 32.52 Reform+ Reforma, reformas17 84 20.24 12.07 Imigração Imigração02 06 33.33 3.64 Plano+ Plano, planos06 18 33.33 11.25 Medida+ Medida, medidas05 07 71.43 29.60 Rejeit+ Rejeitou, rejeitar
A distribuição do vocabulário Legislação Imigratória Nacional: Acordos e
desacordos, apresentado na tabela 12, evidencia questões contraditórias em
relação à legislação Imigratória em vocábulos como: rejeit+ (71.43%), consenso+
(100%), acord+ (78.57%), pacto+ (84.62%).
A presente classe Mostra o debate político sobre a legislação imigratória
entre membros do governo espanhol e partidos opostos, observando as
concordâncias e discordâncias entre eles. Atentando para as variáveis descritivas
presentes na linha – estrela, observa-se na construção desta classe a maior
participação de artigos / notícias pertencentes ao jornal El Mundo, publicados no
sábado na seção Nacional, sendo produzidos por jornalistas internos à redação do
periódico. O sistema de comunicação que mais se assemelha a forma de escrita
142
dos artigos / notícias formadores da classe é a difusão, já que usam linguagem
simples e acessível a uma pluralidade de públicos (Ordaz & Vala, 1997).
Figura nesta classe, como informação sobre a imigração e o imigrante, a
busca de um pacto entre os segmentos políticos com vistas a diminuir a imigração
ilegal na Espanha. O que se informa é que o governo espanhol quer um “pacto de
todos” para uma reforma moderada da lei de imigração e outras medidas, sempre
com o objetivo de diminuir a imigração irregular. O que chama a atenção nesta
classe, em relação ao posicionamento (atitude) do jornal é o viés político que
adquire a temática em grande parte dos textos. Por vezes até parece que o tema
principal não é a discussão da imigração, a busca de soluções, mas sim a disputa
política entre os partidos e grupos. Isto pode ser verificado na seguinte passagem
de texto:
O PP não firmará o pacto de estado pela imigração que quer o governo até que
este assuma a responsabilidade pelo seu erro de sua política e a corrija.
Desconfia do interesse de entendimento de quem rejeitou no congresso suas
primeiras propostas. Na realidade, quase nenhum dirigente popular fez menção
expressa em seus discursos a esta operação política do executivo que
consideram mais propagandista do que real. (ELM, artigo / notícia 32)
Percebe-se no texto acima o forte espírito político com o qual é tratada a
questão. O foco de atenção parece está mais voltado para a discordância entre os
grupos políticos, neste caso o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), partido
do Governo, e o Partido Popular (PP). No artigo / notícias em questão o PP remete-
se a “propostas”, “operações políticas”, mas não se diz quais são essas propostas,
143
só é especificada a discordância, desconfiança, mostrando que o interesse não
está no conteúdo de tais operações políticas e em seus objetivos.
Cabe aqui resgatar que esta classe foi formada, em sua maior parte, por
artigos / notícias do jornal El Mundo. Fuertes (2006) coloca que o periódico é
habitualmente crítico do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e dos
nacionalismos periféricos e é próximo (sobretudo na política espanhola) ao Partido
Popular (PP). Ou seja, tem opiniões contrárias a seu concorrente, o jornal El País.
Em face desta informação pode-se compreender o motivo pelo qual, na passagem
de texto acima, tanta ênfase é dada à visão do Partido Popular.
Ainda no que se refere à atitude, observa-se a menção de propostas no
sentido de diminuir a imigração ilegal, tendo como meio para esse fim a reunião de
diversos grupos e opiniões. Como se percebe em seguida:
O governo convoca os partidos para pactuar uma reforma moderada da lei de
imigração. O executivo propõe o aumento máximo de dias de internamento e só
a IU ICV rejeita. A vice-presidente primeira vai falar com os grupos de forma
discreta sobre este assunto nas próximas semanas... de fato, já sondou alguns
nas ultimas semanas, dentro de uma serie de contatos que tinham como objetivo
fundamental a imigração ilegal. ... (ELP, artigo / notícia 09).
Neste trecho advindo do jornal El País, referente às atitudes diante da
imigração, percebe-se um maior detalhamento do que propõe o pacto sobre
imigração. Aqui, a parte política é, sim, contemplada, mas não parece perder o foco
real que é a resolução dos problemas da imigração ilegal. Tal problemática, nesta
classe, é também provocadora de esforços, por parte do governo espanhol e de
144
grupos parlamentares, no sentido de elucidar questões, mudar leis antigas e criar
novas e debater a respeito da imigração. Como se pode verificar nesta passagem:
Essa reunião está precedida de uma primeira reunião de contatos e de troca de
propostas entre governo e grupos parlamentares... já nesse encontro, a vice-
presidente reafirmou diretamente a Eduardo Zpana o interesse em alcançar um
pacto de estado.... (ELM, artigo / notícia 31).
A tentativa do governo de travar um pacto sobre imigração mostra a
importância do tema, tanto politicamente quanto socialmente. Além de mostrar o
quão multifacetada é a imigração, visto que afeta não só quem é protagonista dela
enquanto imigrante, mas também atinge as relações políticas como um todo, neste
caso a política nacional. Castles (1997) explica que a imigração é uma força
poderosa de mudanças posteriores e “seus impactos imediatos se manifestam em
nível econômico, embora também afetam as relações sociais, a cultura, a política
nacional e as relações internacionais.
As informações e atitudes descritas acima demonstram estar ancoradas no
conceito de imigração e imigrante irregular, também conhecidos com ilegais ou, em
espanhol, sin papeles. Sobre estes Castles (2005) explica que “são pessoas que
entram num país, normalmente à procura de emprego, sem os documentos ou as
autorizações necessárias. Muitos fluxos de imigração laboral são constituídos
predominantemente sem papéis” (p. 18).
A importância dada à imigração enquanto ilegal, enquanto premência de um
acordo entre todos, transmite a imagem de imigração como um problema para a
sociedade receptora. Acredita-se que tal imagem a respeito da imigração fornece
145
material para a produção de subjetividades relacionadas à não-aceitação do
imigrante, pois este é aqui colocado como fonte de problemáticas a serem
resolvidas.
Classe III – Ações Contra a Imigração Ilegal:
Tabela 13 – Distribuição do vocabulário específico Distribuição do vocabulário específico da Imigração / Imigrante como Ações Contra a Imigração Ilegal.
Vocabulário Específico sobre Ações Contra a Imigração Ilegal*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS11 18 61.11 41.67 Aprov+ Aprovou, aprovada09 09 100.00 65.71 Câmara+ Câmara, câmaras10 15 66.67 42.74 Constru+ Construir, construção08 10 80.00 43.62 Eleições Eleições15 19 78.95 82.19 Estados Estados22 22 100.00 166.06 Muro+ Muro, muros11 11 100.00 80.72 Republic+ Republicano, republicanos13 13 100.00 95.88 Senado senado08 08 100.00 58.27 Votos votos15 18 83.33 88.22 Unido+ unidos02 04 50.00 5.33 Possiblidade+ Possibilidade,
possibilidades05 06 83.33 28.53 Legislativ+ Legislativas, legislativo16 35 45.71 39.71 Fronteir+ Fronteira, fronteiriço,
fronteiras04 05 80.00 21.54 Frear Frear17 84 20.24 6.21 Imigração Imigração03 07 42.86 6.18 Nacion+ nacional12 30 40.00 23.09 Ilegal+ Ilegal
Na distribuição do vocabulário da Imigração e do Imigrante enquanto
Imigração Ilegal e Contenção (tabela 13) destacam-se tanto pelo sentido quanto
pelo seu posicionamento estatístico na classe as seguintes palavras
características: frear (80%), ilegal (40%), nacional (42.86%), muro (100%) e
eleições (80%). Os vocábulos aprov+ (61. 11%) e contru+ (66.67%) também
demonstram sua importância no sentido da classe.
146
Faz referência a ações postas em prática contra a imigração, as quais são
perpassadas por questões não só de segurança, mas também eleitorais.
Recuperando as variáveis descritivas inseridas na linha-estrela, verifica-se na
construção desta classe a maior participação de artigos / notícias pertencentes ao
jornal El Mundo, publicados no domingo na seção Internacional e de Opinião,
sendo produzidos por jornalistas externos à redação do periódico. O sistema de
comunicação que mais se adéqua à forma de escrita dos artigos / notícias
formadores da classe é a difusão, já que usam linguagem simples e acessível a
vários de públicos (Ordaz & Vala, 1997).
No tocante à informação, figura-se nesta classe a ligação entre segurança e
imigração. Esta relação se mostra coerente no texto, quando é colocada de modo a
conceber ações radicais contra a imigração. Isto se mostra no texto seguinte:
... a câmara de representantes aprovou em dezembro passado a polêmica lei
que criminaliza a imigração e só incluía medidas repressivas... A construção do
muro foi aplaudida pelo secretario de segurança nacional, Michao Chertof. ...
(ELM, artigo / notícia 27).
Na imprensa brasileira atitudes relacionadas às ações contra a imigração
ilegal também emergiram dos artigos / notícias, entretanto, concomitantemente
também eram expostas as reações às políticas radicais de contenção da imigração
também, fazendo-se um contraponto. Nos jornais espanhóis isso ocorre de forma
bastante tímida, sendo colocada, na maioria das vezes, apenas a posição do país
que admite a execução de ações severas contra a imigração.
147
A associação entre a segurança pública e as ações contra a imigração, está
ancorada na concepção de que há elo entre terrorismo e imigração. De Lucas
(2002), mostra que essa ligação nasceu quando o governo britânico aprovou, em
14 de dezembro de 2001, sua nova e dura lei antiterrorista. Esta lei permite a
detenção indefinida de estrangeiros suspeitos de terrorismo, sem que a polícia seja
obrigada a colocá-los à disposição do juiz antes de 72 horas, ou seja, rompe os
princípios do hábeas corpus que existe na Inglaterra desde 1679. Coloca ainda De
Lucas (2002) que para aprovação desta lei exigiu a suspensão do artigo 5º do
Convênio Europeu de Direitos Humanos, artigo este há apenas 13 meses
incorporado à legislação do país. Para o referido autor, esta lei de exceção será
destinada aos imigrantes que têm vínculo com o mundo árabe ou são
confessadamente islâmicos. O que nos Estados Unidos é ainda pior, pois esta
postura se estende a todos os estrangeiros residentes, inclusive os que têm a
condição de cidadãos. Na leitura de De Lucas (2002), estas pessoas, após esses
acontecimentos, passaram a estar na mira da estratégia da guerra antiterrorista,
que faz do ato de migrar uma condição suspeita.
Ainda no que se refere à atitude sobre imigração e imigrante, tem-se
novamente o envolvimento da temática imigratória com a questão eleitoral,
entretanto, desta vez a análise por parte do jornal neste sentido vem muito mais
direta, já que se trata dos Estados Unidos e não da própria Espanha, como no caso
da classe anterior. Nesta classe, a questão política e eleitoral relacionada à
imigração é analisada de forma mais impessoal, pois se trata de outro país
148
diferente do país de origem do jornal. Percebe-se a forma mais clara desta questão
no seguinte trecho:
As eleições para o congresso no dia 7 de novembro, nas quais os democratas
podiam exercer o controle de uma ou talvez duas câmaras do legislativo dos
Estados Unidos pesaram fortemente na decisão para ganhar votos. A luta contra
a imigração ilegal constitui um dos temas principais da campanha eleitoral... os
republicanos contavam com a aprovação do muro para manter sua maioria nas
duas câmaras do congresso....(ELM, artigo / notícia 27)
O posicionamento em relação à imigração visto acima, demonstra a falta de
compromisso da classe política para com a temática em si, com a resolução de
problemas relacionados a ela. O que ocorre é que a imigração torna-se um meio e
não um fim em si mesma. Ela transforma-se em ferramenta em poder dos políticos,
para que estes a usem a seu favor, sabendo que, por ser atualmente a imigração
associada à segurança pública, sensibilizará os eleitores, como pode ser verificado
a seguir:
Isto e algo que o povo americano leva muito tempo querendo que falemos, disse
o senador pelo Arizona John Kel depois da votação. Seu ponto de vista reflete o
de grande parte de seus colegas, tanto os democratas como os republicanos,
que são conscientes de que a imigração ilegal é um dos principais fatores de
preocupação dos estadunidenses.... (ELM, artigo / notícia 27).
Apreende-se também nesta classe a informação ancorada na imigração
irregular. Aqui é noticiado enquanto ato de imigrar, este tipo de imigração, todavia,
diferentemente da classe anterior, o enfoque são as medidas radicais, como a
149
construção de muros e valas, por exemplo, não sendo contemplado o debate
político a respeito disso.
Em face das informações e atitudes referidas nesta classe, acredita-se que a
formação da imagem do imigrante é possivelmente direcionada à idéia de ligação
entre esse e o terrorista, bem como de imigração irregular como instrumento
político eleitoral. Diante deste tipo de imagem coloca-se a produção de
subjetividades negativas direcionadas ao imigrante, o que contribui diretamente
para os processos de exclusão deste coletivo.
Classe IV – Cooperação / Tensão Internacional:
Tabela 14 – Distribuição do vocabulário específico da Imigração / Imigrante enquanto Cooperação / Tensão Internacional
Vocabulário Específico sobre Cooperação / Tensão Internacional*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS04 05 80.00 4.87 Advert+ Adverte, advertiu03 04 75.00 3.09 Asilo asilo14 20 70.00 12.44 Econom+ Economia, economicas26 26 100.00 54.74 Européia+ Européia, européias09 09 100.00 18.14 Exterior+ Exterior, exteriores16 35 45.71 2.49 Fronteir+ fronteira04 04 100.00 7.96 Frontex Frontex07 09 77.78 8.02 Cooperação cooperação12 21 57.14 5.47 Ilegais Ilegais06 09 66.67 4.49 Integr+ Integração, integral03 03 100.00 5.96 Legislação Legislação06 10 60.00 3.18 Sociedade+ Sociedade, sociedades04 04 100.00 7.96 Solidariedade Solidariedade19 20 95.00 35.44 União União10 11 90.91 16.59 Critic+ Criticada, criticou, criticas
150
Como pode ser observado na tabela 14, o campo lexical desta classe se
constitui de um vasto vocabulário. Mediante o que foi apreendido nos artigos /
notícias, destacam-se algumas das palavras típicas da classe, como cooperação
(77.78%), fronteira (45.71%), frontex (100%), sociedade (60%), solidariedade
(100%) e críticas (90.91%)
A presente classe traz o debate sobre a legislação imigratória entre os
países da União Européia, abordando as relações de cooperação e tensão entre
eles neste sentido. Vislumbra a busca de concordância de posições acerca de uma
política comum de imigração na UE, formas legais não-físicas para diminuição da
imigração e o debate sobre a pertinência de leis e ações em alguns países desse
mercado comum.
Recorrendo às variáveis presentes na linha-estrela, esta classe pode ser
caracterizada como classe construída predominantemente por artigos / notícias do
jornal El Mundo, publicados no sábado como matéria principal nas seções
Internacional, Nacional e de Opinião, sendo escritos por jornalistas internos à
redação do periódico. Os textos jornalísticos mais representativos na construção
desta classe, no que diz respeito aos sistemas de comunicação, se assemelham
sistema de difusão, o que significa que utilizam linguagem mais acessível a uma
diversidade de públicos (Ordaz & Vala, 1997).
Nesta classe, a dimensão informação, sobre o a imigração e o imigrante,
aparece relacionada às relações internacionais, pois chama a atenção para
necessidade de união política entre países que a imigração demanda. A
organização dos conhecimentos está em torno das tensões diplomáticas causadas
151
por algumas divergências entre os países, bem como relacionada à uma política
imigratória comum na União Européia. As referidas tensões podem ser observadas
a seguir:
Em relação à política de imigração, afirmou no congresso que não aceitará
lições da França neste assunto. E Sarkozy, duro entre os duros frente aos sem
documentos na campanha eleitoral, reagiu sem demora, afirmando que ele não
pretende dar lições a ninguém, entre outras coisas porque também não gosta de
recebê-las.... (ELM, artigo / notícia 22).
Embora o trecho acima cite os imigrantes indocumentados, etc., percebe-se
pelo contexto do parágrafo, que o foco está na tensão relacional entre os governos
dos países. Castles (2005) elucida que as migrações, o desenvolvimento e as
relações internacionais encontram-se intimamente ligados. Já as informações sobre
a busca de uma política imigratória comum verifcam-se na seguinte passagem de
texto:
... promoveria uma política européia comum e condicionaria as ajudas à
cooperação na luta contra as máfias... este fenômeno é novo em nosso pais e
da nossa sociedade, com a ajuda de todos que fazem parte dela, devem surgir
as respostas às perguntas feitas.... (ELM, artigo / notícia 22).
A organização de conhecimentos aqui demonstra a união dos países
europeus promovida pela busca de soluções acerca do “problema da imigração”.
Nestas informações, percebe-se atitudes negativas com relação à imigração, pois
ela é colocada como um problema ser resolvido, assim sendo exposta: ...disse que
a Franca tem experiência com o mesmo problema...(ELM, artigo/notícia 26). A
152
reunião dos países debate questões como regularizações em massa e efeito –
chamada de imigrantes e até a possibilidade de aceitação da imigração. Para tais
países, regularizar muitos imigrantes é algo perigoso, não só pelo número de
pessoas estrangeiras no país, mas também pelo efeito que pode ser ocasionado: a
vinda de mais e mais imigrantes, já que estes, para os países europeus, se
influenciam quando percebem que há regularizações periodicamente. A essa
suposta vinda de mais imigrantes por intermédio da influência das regularizações é
dado o nome de efecto llamada, para os espanhóis.
Percebe-se nesta classe a presença de conteúdos também relacionados a
efeitos positivos da imigração, tal posicionamento mostra-se como positivo em
relação à imigração, como pode ser visto neste trecho:
... é boa para o país a que vão e contribui para romper o equilíbrio de pobreza do
pais do qual vêm. O que foi um prestigioso economista se perguntava em
seguida: qual e a perversidade da alma humana que faz que o povo resista a um
bem tão óbvio?... (ELP, artigo / notícia 16).
Esta passagem de texto é a única de toda a classe que se posiciona
positivamente sobre a imigração. Em face da não-linearidade das atitudes expostas
nesta classe, percebe-se um discurso dúbio, variando entre a imigração ora como
positiva, ora como negativa. Porém é clara a predominância de conteúdos
descrevendo atitudes que formam uma imagem ancorada em aspectos negativos
da imigração. Tal posicionamento por parte do periódico, influencia a formação de
153
subjetividades negativas rumo ao imigrante e à imigração. Isto pode ser percebido
no contexto da classe exposto ao longo desta análise.
Classe V – ldentidade Falsificada e Trabalho:
Tabela 15 – Distribuição do vocabulário específico da Imigração / Imigrante enquanto Identidade Falsificada e Trabalho
Vocabulário Específico sobre Identidade Falsificada e Trabalho*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS03 08 37.50 13.21 Advog+ advogado08 09 88.89 104.75 Cobr+ Cobra, cobrado, combram04 05 80.00 45.87 Contratos contratos06 08 75.00 64.24 Documentação documentação07 10 70.00 69.37 Documentos Documentos05 05 100.00 74.18 Domestic+ Doméstica, doméstico03 06 50.00 19.37 Empresários empresários08 49 16.33 9.20 Espanha Espanha02 05 40.00 9.56 Fals+ falso02 04 50.00 12.85 Intermediários Intermediários12 31 38.71 58.62 Trabalh+ Trabalho, trabalhar,
trabalham02 05 40.00 9.56 Negoci+ negocio05 07 71.43 50.38 Permiss+ Permissão, permissões04 20 20.00 6.52 Regulariz+ Regularizar, regularizam03 04 75.00 31.80 Turista+ turista
Pode-se observar na tabela 15 que o vocábulo casa+ ocorre nesta classe 11
vezes, com percentual de 100%. A palavra documentos, com freqüência de 7 e
percentual de 70%. A palavra documentação ocorre 6 vezes com percentual de
75%, e a palavra contratos ocorre 4 vezes na classe, o que equivale a um
percentual de 80% das suas ocorrências no corpus. Todas essas, portanto, são
representativas da mesma.
Mostra as circunstâncias de chegada e estada na Espanha na condição
ilegal de imigrante, enfatizando a busca pelo trabalho e legalização e a existência
de máfias atuantes neste sentido. Esta classe, de acordo com as variáveis
154
descritivas inseridas na linha – estrela pode ser considerada como mais fortemente
formada por artigos / notícias do jornal El País, publicados no domingo como
matéria principal na seção Nacional, sendo escritos por jornalistas internos à
redação do periódico. Os textos jornalísticos mais representativos na construção
desta classe, no que diz respeito aos sistemas de comunicação, se assemelham
sistema de difusão, o que significa que utilizam linguagem mais acessível a uma
diversidade de públicos (Ordaz & Vala, 1997).
As informações veiculadas nesta classe a respeito da imigração e do
imigrante estão em torno da entrada ilegal e da atividade econômica e
regularização. A entrada do imigrante é aqui mostrada enquanto entrada ilegal de
diversas formas. São relatadas chegadas em embarcações clandestinas,
entradas com vistos falsos de turista e entradas legalizadas como turistas, mas
que depois expiram, deixando o imigrante em situação irregular. Esta realidade
pode ser percebida no trecho:
... quando chegou à Espanha em uma balsa vinda de El aaiun./ Emilia veio há
seis anos. Seu negócio na Romênia não saiu bem e decidiu experimentar na
Espanha. O falso visto de turista lhe custou uns 800 euros. Quando chegou,
ligou para seu contato, uma vizinha de seu irmão. Conseguiu-me uma cama em
uma casa com outras oito pessoas... Tenho um contato em uma construção....
(ELP, artigo / notícia 02).
Percebe-se nas informações a descrição de algumas formas de entrada na
Espanha. O que chama a atenção é a presença importante da rede de contatos,
pois esta ajuda o imigrante a efetivar seu projeto de permanecer no novo país. Esta
155
questão é interessante, pois traz que um imigrante pode significar outros, pois, no
texto acima, percebe-se que o papel do “contato” é fundamental quando da
chegada do imigrante. Ele é responsável pela estabilização do indivíduo que chega
ao país receptor.
A organização de conhecimentos nesta classe coloca de forma contundente
a imigração laboral, irregular e de fracas qualificações. Como é exposto na
passagem:
... quase todos começam com o serviço doméstico e a construção. Ninguém vai
inspecionar as casas e as construções. Sempre lhes dão postos de trabalho
pouco visíveis ou à noite, que não há inspeções, explica Dora Aguirre, de
Rumiiiahui, associacao de equatorianos. ... (ELP, artigo / notícia 02).
Castles (2002), afirma que as imigrações de trabalhadores com fracas
qualificações já foram bastante úteis no passado, pois a maioria dos países ricos,
após 1945, estava em fase de crescimento industrial, fazendo necessário o
aumento de trabalhadores. Todavia, “(...) hoje em dia, é normalmente rejeitada por
ser considerada economicamente desnecessária e socialmente perigosa” (Castles,
2002).
A busca por uma atividade remunerada e pela regularização de sua situação
faz o imigrante vulnerável a todo o tipo de pressões. Isto pode ser verificado na
passagem de texto que segue:
A operação começou em 13 de janeiro, quando os agentes souberam que a
assessoria cobrava até 9. 000 euros aos estrangeiros em troca de um trabalho
que nunca chegavam a exercer. Os falsos contratos só serviam para obter uma
156
permissão de trabalho e residência, tudo pago pelos estrangeiros. ... que
inclusive convenceram suas vitimas a vender ou hipotecar as casas de suas
famílias para conseguir um contrato para cumprir o sonho de entrar legalmente
na Espanha. Cobram-lhe e lhe dão esperanças quando não há. (ELP, artigo /
notícia 13).
Tais informações colocam atitudes negativas com relação à imigração, pois
denota sua forma irregular. Do ponto de vista mostrado, o imigrante tem a imagem
de vítima do sistema, vulnerável em face de sua situação de necessidade. O
coletivo imigrante é compreendido pela imagem de ofendido pelas máfias que
fazem da falsa regularização uma atividade lucrativa, ou seja, ele é oprimido de
todos os lados, pelo sistema institucionalizado, já que está em situação ilegal, e
pelo sistema não – oficial, que são as máfias. A formação de tal campo
representacional acerca da imigração mostra-se favorável à construção de
subjetividades negativas, pois é feita uma associação com o sofrimento, vitimização
e vulnerabilidade, sendo estes fatores sempre ligados a trabalho e legalização.
157
Classe VI – Busca de Melhoria de vida: crianças e adolescentes como arrimo
de família:
Tabela 16 – Distribuição do vocabulário específico da Imigração / Imigrante enquanto Busca de Melhoria de vida: crianças e adolescentes como arrimo de família
Vocabulário Específico sobre Busca de Melhoria de vida: crianças e adolescentes como arrimo de família
*OCC *OCCT % X2 VOCABULÁRIO FORMAS ASSOCIADAS02 03 66.67 3.48 Africana+ Africana, africanas04 06 66.67 7.02 Balsa+ Balsa, balsas11 14 78.57 26.83 Canoa+ Canoa, canoas04 05 80.00 9.85 Chegados Chegados 07 07 100.00 25.09 Embarcac+ Embarcação, embarcações12 25 48.00 10.36 Estrangeiro+ Estrangeiro, estrangeiros03 06 50.00 2.75 Expulso+ Expulso, expulsos04 06 66.67 7.02 Familiares familiares06 07 85.71 16.73 Repatriados repatriados06 06 100.00 21.45 Garoto+ Garoto, garotos04 04 100.00 14.23 Travessia travessia04 05 80.00 9.85 Idade+ idade18 19 97.74 61.03 Menores Menores10 10 100.00 36.11 Morabito+ Morabito, morabitos06 10 60.00 8.54 Religi+ Religião,religioso, religiões
A distribuição do vocabulário específico da Imigração e do Imigrante
ancorado na Busca de Melhoria de Vida: crianças e adolescentes como arrimo de
família, que se apresenta na tabela 16, evidencia nos jornais espanhóis a presença
de vocábulos típicos desta classe, que a representam: africana+ (66.67%), balsa+
(66.67%), embarcac+ (100%) menores (97.74%), repatriados (85.71), entre outros.
A classe em questão mostra especificamente a grande demanda de
imigrantes vindos do continente africano de forma ilegal, dando ênfase à imigração
de crianças e adolescentes, às más condições da viagem pelo mar, à influência dos
líderes religiosos e da família para a efetivação da imigração, como também à
158
sobrecarga sofrida pelos órgãos responsáveis pela repressão a este tipo de
imigração.
Recorrendo às variáveis descritivas postas na linha – estrela, esta classe
pode ser caracterizada como mais fortemente formada por artigos / notícias do
jornal El País, publicados no sábado como matéria principal na seção Nacional,
sendo escritos por jornalistas externos à redação do periódico. Os textos
jornalísticos mais representativos na construção desta classe, no que diz respeito
aos sistemas de comunicação, se assemelham sistema de difusão, o que
significa que utilizam linguagem mais acessível a uma diversidade de públicos
(Ordaz & Vala, 1997).
A informação sobre imigração / imigrante a que se tem acesso nesta classe
versa principalmente sobre questões relacionadas à influência religiosa e familiar
no que tange à imigração de crianças e adolescentes e ao percurso imigratório
dessas pessoas e a repressão a este tipo de imigração. Sendo assim, o imigrante
do qual se tem notícia nesta classe é a criança e o adolescente que é enviado por
seus familiares ou líderes religiosos para outro país com intuito de torná-los os
provedores das famílias ou das instituições religiosas. Observa-se no processo de
“convencimento” destes menores de idade, a presença muito forte do componente
afetivo, posto que é colocada sobre esse imigrante a responsabilidade de sustento
familiar. Isto pode ser verificado em seguida:
... nossos pais nos mandam para que lhes enviemos dinheiro. ... meu pai me
disse: vá para a Espanha e mande dinheiro, logo me levou para ver morabito -
líder religioso muçulmano -, que me deu um gri-gri ( amuleto ) e advertiu: quando
159
chegar a Espanha, não se esqueça sua religião e, sobretudo, lembre- se da
pobreza que deixou aqui. ... eu não vim estudar, vim para trabalhar.... (ELP,
artigo / notícia 03).
Observa-se nestas informações a obstinação que possui o imigrante, da qual
se torna refém, mostrando quão forte é a influência dos líderes religiosos e da
família. Mais uma vez ancora-se a imigração na idéia de imigração irregular vista
igualmente em outras classes, entretanto, nesta o foco é destinado à imigração
irregular de crianças e adolescentes, tendo também como peculiaridade o objetivo
desta imigração e a influência para sua efetivação. Importante também nesta
questão é o desenvolvimento de relações transnacionais estabelecidas entre o
imigrante e sua família ou grupo religioso, que de acordo com Castles (2002)
ocorrem quando há relações transfronteiriças que ligam os indivíduos, os grupos ou
famílias por questões econômicas, sociais ou culturais. O autor elucida sobre isto
que “os indivíduos ou grupos desenvolvem ligações transnacionais quando estas
são o melhor modo de lidar com as situações sociais e as estruturas de
oportunidades com que se deparam” (p. 88).
As informações sobre o percurso que fazem os referidos imigrantes, refletem
as condições subumanas numa viagem arriscada que eles enfrentam em nome do
ideal de prover a família e por outras vezes grupos religiosos. Como é percebido
neste trecho:
... também ontem, um barco mercante resgatou sete ilegais que viajavam em
uma balsa a 40 milhas ao sul de cabo de gata Almeria. ... outra canoa com 88
imigrantes irregulares a bordo, quatro deles previsivelmente, menores, chegou
160
as Canárias há uma semana, depois de uma acidentada travessia de 12 dias em
uma canoa vinda da região de casamance, ao sul do Senegal. ... foi resgatada
por uma embarcação de salvamento marítimo ata o porto de Los Cristianos, em
Tenerife.(ELM, artigo / notícia 17).
O aumento deste tipo de imigração mostra-se tão acentuado que é relatado,
à título de organização dos conhecimentos (informações), o colapso nos serviços
que atendem este tipo de ocorrência.
... a delegacia sofre um colapso tão grande que os agentes não podem deter
estrangeiros na rua por estada ilegal na Espanha. A autoridade de coordenação
das atuações para fazer frente à imigração ilegal nas Canárias será
desempenhada pelo general da guarda civil Cândido Cárdio, esta função já
existia, mas o conselho lhe deu ontem respaldo não-normativo e terá à sua
disposição guardas civis, policiais, sanitaristas, agentes do cadastro nacional de
identificação e de salvamento marítimo, entre outros. (ELM, artigo / notícia 23).
O trecho acima se refere não só à sobrecarga dos serviços relacionados ao
combate da imigração ilegal vinda da áfrica na espanha, mas também que serviços
são esses, tendo como objetivo a proteção da fronteira contra os imigrantes. Tais
informações mostram-se ancoradas no conceito de Estado- Nação por meio do
qual se faz uma ligação entre Estado, enquanto comunidade política territorial, e
Nação, enquanto comunidade cultural. Desta forma a cidadania corresponde ä
nacionalidade, tendo a pertença à nação como dependência para possuir a
cidadania (Catles, 2005).
161
As informações aqui elencadas sobre a imigração e o imigrante tomam
posicionamentos (atitudes) desfavoráveis à temática, já que ela é associada à
dificuldade, ao sofrimento e à falta de acesso, mostrando também o insucesso da
empreitada imigratória chamando atenção para o combate e o perigo de imigrar. O
imigrante aqui possui a imagem de desfavorecido e combatido pela sociedade
receptora. Tais informações, atitudes e imagem do imigrante acabam por contribuir
para a produção de subjetividades ligadas ao afastamento e negatividade da
questão imigratória.
4.3 O Significado da imigração e do imigrante e a relação interclasses
Dando continuidade à construção dos significados da imigração e do
imigrante, observa-se a Classificação Descendente Hierárquica (CDH) realizada
através do sistema ALCESTE, que evidencia a associação e dissociação entre as
classes nos níveis de proximidade e distância. A análise estatística das classes,
efetuada pelo já citado sistema, conforme consiste numa Classificação
descendente hierárquica (CDH) destinada a organizar as classes sob a forma de
uma figura (dendograma), estruturada a partir do corpus de base, que é
transformado em classes definidas com suas características próprias, que
apresentam um máximo de homogeneidade intra-classe e um máximo de oposição
inter-classes, obtendo-se desta forma uma ordem de classificação constituída de
divisões sucessivas do corpus.
Para a aglomeração de classes por proximidade, primeiramente,
constitui-se um grupo inicial com as duas classes mais próximas. Em seguida é
162
verificada qual a classe seguinte que se localiza o mais próximo possível do
primeiro grupo constituído. Forma-se então um novo grupo, e assim
sucessivamente, até que as classes sejam reunidas num grupo que comporte a
todas, conforme pode ser observado nos dendogramas apresentados a seguir (fig.
01 e 02), os quais evidenciam a relação proximidade/ distância entre as classes
que darão sentido ao presente objeto de estudo.
Distância Euclidiana 0----|----|----|----|----|----|----|----|----|---|25 Incl/Exc Social Cl. 1 ( 44uce) |--------------+ 15 Trab/Emp/ Dese|---------+ Cl. 6 ( 74uce) |--------------+ | 16 Hist. Modos d V. do Imi.|---------+ Cl. 3 ( 77uce) |------------------------+ | 17 Inst. da Intolerância Étnica |-------+ Cl. 5 ( 72uce) |----------------------------------+ | 18 Ações/Reações contra a Imigração Ilegal |--+ Cl. 2 ( 66uce) |------------------------------------------+ | 19 Multiculturalismo e Violência + Cl. 4 ( 38uce) |---------------------------------------------+
Figura 01 - Proximidade/ distância entre as classes da imigração/imigrante apreendidas através da análise de artigos/notícias de jornais brasileiros.
Observa-se na figura 01 a seguinte associação das classes: Inclusão /
Exclusão Social numa relação de maior proximidade com a classe Trabalho /
Emprego / Desemprego. Ligada a este aglomerado encontra-se a classe História e
Modos de Vida do Imigrante, que por sua vez liga-se à classe Institucionalização da
Intolerância Étnica. Situando-se numa posição de maior distanciamento, figura um
outro aglomerado, Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal numa relação um
pouco mais a próxima a Multiculturalismo e Violência.
163
Distância Euclidiana 0----|----|----|----|----|----|----|----|----|--|25 Impactos/Desenvolvimento Cl. 1 ( 63uce) |----------------------------+ 17 Pac.Imi.Acordos e Desacordos|------------+ Cl. 2 ( 41uce) |--------------------+ | | 16 Coop./Tens. Internac|-------+ | Cl. 4 ( 137uce) |--------------------+ | 18 Falsa identidade e Trabalho |---+ Cl. 5 ( 26uce) |------------+ | | 13 |----------------------------+ | 19 Cri/Ado:A.Fa| | Cl. 6 ( 90uce) |------------+ Im. Ilegal e Contenção | Cl. 3 ( 50uce) |---------------------------------------------+
Figura 02 - Proximidade/ distância entre as classes da imigração/imigrante apreendidas através da análise de artigos/notícias de jornais espanhóis.
Conforme a figura 02 observa-se uma maior proximidade entre a classe
Desequilíbrio Social: Impactos Negativos / Desenvolvimento e o aglomerado
formado pelas classes Pacto Imigratório Nacional: Acordos e desacordos e
Cooperação / Tensão Internacional. Estas classes citadas estão, por sua vez,
ligadas a outras duas que formam outro aglomerado, são elas Identidade
Falsificada e Trabalho ligada a Busca de Melhoria de Vida: Crianças e
Adolescentes Como Arrimo de família. Em maior distanciamento encontra-se a
classe Ações Contra a Imigração Ilegal.
A partir do processo de interpretação dos dados oferecidos pelo ALCESTE,
realizado pela pesquisadora, constatou-se o caráter multidimensional do sentido do
objeto em estudo para os dois corpus de análise (Brasil e Espanha), nas seis
classes da imprensa brasileira e outras seis da imprensa espanhola, o que pode ser
observado na tabela a seguir.
Tabela 17 – Distribuição das UCE por classe e exposição das subclasses das imprensas Br. E Esp.
164
BRASIL ESPANHAClasse uce (f) uce % Classe uce (f) uce %Inclusão / Exclusão Social*Falta de Oportunidade*MulticulturalismoPolarização Social
44 11,86
Desequilíbrio Social:Impactos / Desenvolvimento*Ganhos Econômicos*Prostituição e Imigração*Desequilíbrio Econômico*Responsabilidade Social
63 15, 48
Ações/Reações Contra a Imigração Ilegal*Ações Políticas e Sociais de contenção*Reações Políticas e Sociais à Conteção
66 17,79
Pacto Imigratório Nacional: Acordos e Desacordos*Discordância política*Conciliação política
41 10, 07
História e Modos de Vida do Imigrante*Sofrimento ético político
77 20,75
Ações Contra a Imigração Ilegal*Ações políticas e sociais de Contenção
50 12, 29
Multiculturalismo e Violência
38 10,24
Cooperação / Tensão Internacional*Tensões Diplomáticas*Política Imigratória Comum
137 33, 66
Institucionalização da Intolerância étnica*Violência Física e Social Organizada
72 19,41
Identidade Falsificada e Trabalho*Entrada Ilegal*Atividade Econômica e Regularização
26 6, 39
Trabalho / Emprego / Desemprego*Déficit de trabalhadores e envelhecimento populacional*Déficit de trabalhadores e Busca por melhoria de Vida
74 19,95
Busca de Melhoria de Vida: Crianças e Adolescentes Como Arrimo de Família*Influência Familiar e Religiosa*Percurso Migratório e Repressão
90 22, 11
TOTAL 371 100 TOTAL 407 100
165
Considera-se na tabela 17 a multidimensionalidade do sentido da imigração
e do imigrante, enquanto construção e fenômeno social, adotando-se a perspectiva
de Carvalho (1999), ao admitir que a definição de um maior número de dimensões
teórico-substantivas pode contribuir para a redução de algumas das insuficiências
registradas nas análises, referindo-se particularmente às dificuldades que se
apresentam quando se pretende apreender a complexidade característica da
estrutura dos fenômenos sociais de modo geral.
Observa-se na referida tabela, na primeira e quarta colunas, as classes
respectivamente da imprensa brasileira e da imprensa espanhola, com suas
respectivas sub-classes. Na segunda e quinta colunas figuram a quantidade de
UCE de cada classe. Já na terceira e sexta colunas observa-se o percentual das
UCES por classe. Apresenta-se em seguida a multidimensionalidade da imprensa
brasileira e espanhola, nesta ordem.
Na imprensa brasileira percebe-se a emergência da Inclusão / Exclusão
Social configurada sob a ótica da Falta de Oportunidade, do Multiculturalismo e da
Polarização Social. Dois artigos / notícias fizeram parte da formação desta classe,
sendo todos pertencentes ao jornal Folha de São Paulo. O número de UCE da
presente classe representa o segundo menor do corpus de jornais brasileiros.
As Ações / Reações Contra a Imigração Ilegal emergidas dos jornais são
apresentadas como: Reação Política e Social à Contenção e Ações Políticas e
Sociais de Contenção. Parte dessa classe emergiu nas duas imprensas
pesquisadas. Tanto os jornais brasileiros quanto os espanhóis contemplaram a
questão das Ações de Contenção da Imigração Ilegal, embora cada um aborde a
166
questão de forma distinta, já que se trata de contextos diferentes de produção de
informação. Esta classe foi formada pela contribuição de cinco artigos / notícias,
sendo três deles da Folha de São Paulo e dois de O Estado de São Paulo. Ela foi a
terceira classe em número de UCE.
A História e Modos de Vida do Imigrante são construídos a partir do
sofrimento ético-político do imigrante. Tal concepção coloca as dificuldades de
quem emigra, tanto no processo de vinda ao país como na permanência nele,
sempre enfocando a questão da busca de trabalho e renda como alavancadores do
processo emigratório. De acordo com a quantidade de UCE apresentadas por esta
classe, observa-se sua maior contribuição na formação do significado da imigração
e do imigrante. Salienta-se a esse respeito que apesar de a presente classe possuir
o maior número de Unidades de Contexto Elementar, ela apenas dois artigos /
notícias contribuíram para sua formação, são eles o doze e o treze, oriundos do
jornal O Estado de São Paulo.
O Multiculturalismo e a Violência, tema da imprensa brasileira, embasam sua
construção sobre questões a respeito dos limites da tolerância. A concepção de
multiculturalismo e violência, neste estudo, coloca a dúvida sobre até que ponto os
preceitos de incorporação de imigrantes embasados no multiculturalismo podem
ser postos em práticas quando esses imigrantes (e seus descendentes) são
radicais, inflexíveis. Sobre a formação da classe, figura-se que ela foi composta de
apenas um artigo / notícia do jornal O Estado de São Paulo, o que coincide também
com seu número de UCE, que foi o menor do corpus brasileiro, com 10,24%.
167
A concepção de Institucionalização da Intolerância Étnica, obtida na
imprensa brasileira, é configurada a partir da Violência Física, Social e Organizada,
da intolerância tanto na esfera social como na esfera institucional. Essas
subclasses atentam para o ponto culminante a que chegou a intolerância em nível
étnico, ou seja, a violência física, criminosa, também mostrando o apoio de
instituições nesse sentido. A presente classe contou, para sua formação, com dois
artigos / notícias, um do jornal Folha de São Paulo e outro de O Estado de São
Paulo. Seu número de UCE representou o terceiro maior do corpus do Brasil.
Trabalho / Emprego / Desemprego configura-se sobre a relação da escassez
com a fulga de trabalhadores que buscam melhores condições de vida em outros
países, e com o envelhecimento populacional. Sendo também uma classe da
imprensa brasileira. Esta classe teve a participação de cinco artigos / notícias na
sua formação, sendo um pertencente ao jornal Folha de São Paulo e quatro
oriundos de O Estado de São Paulo. A referida classe representou o segundo lugar
em número de Unidades de Contexto Elementar, diante da classe III, História e
Modos de Vida do Imigrante, que, mesmo formada por apenas dois artigos /
notícias, obteve o maior percentual de UCE.
A diferença entre o número de UCE e o número de artigos participantes na
formação da classe chama a atenção, já que é natural que se associe que a classe
que obteve, em sua formação, a presença do maior número de artigos /notícias
será a de maior percentual de Unidades de Contexto Elementar. A classe de maior
percentual no corpus brasileiro foi a que teve participação de apenas duas matérias
(Classe III), enquanto que as classes II e VI foram formadas, cada uma, por cinco
168
artigos / notícias e não a alcançaram. O dado apresentado faz com que se observe
que apenas dois, ou até um artigo / notícia - como na Classe IV - pode contribuir,
sim, fortemente para a formação e circulação de uma representação conforme suas
características. È importante observar que os textos participantes da classe III,
foram veiculados na página de cultura, cuja característica trivial é a presença de
detalhes, notadamente opinativos e descritivos, sendo, neste caso mais longos que
o observado em outras páginas dos jornais, como a Nacional, por exemplo, que
opta por textos mais diretos e mais informativos.
Na imprensa espanhola emergiu o Desequilíbrio social associado aos
Impactos Negativos / Desenvolvimento causados pela imigração configurados
como Ganhos Econômicos, Prostituição e Imigração, Desequilíbrio Econômico e
Responsabilidade Social. A referida classe teve a participação de seis artigos /
notícias em sua formação, sendo um do jornal El País e o restante advindos do El
Mundo. Esta classe foi a terceira em número de UCE.
A concepção de Legislação Imigratória Nacional: Acordos e Desacordos
aparece enquanto Discordância e Conciliação na imprensa da espanhola,
mostrando sempre o embate a esse respeito dentro da esfera político – partidária.
Tal fato aponta para a vivência real do contexto imigratório, indica aproximação
com as questões atinentes ao tema. A presente classe apresentou, em sua
formação, quatro artigos / notícias, sendo um do El País e três do jornal El Mundo.
A classe figura como a quarta em número de Unidades de Contexto Elementar.
A idéia de Ações Contra a Imigração Ilegal mostra-se nas duas imprensas,
entretanto na imprensa brasileira essa concepção vem acompanhada das reações
169
políticas e sociais a essas ações de contenção, o que não ocorre nos jornais
espanhóis. Nesta imprensa é mostrado apenas o lado da Ação Contra a Imigração
Ilegal, sem vislumbrar outras questões também relacionadas, como faz a imprensa
brasileira. Esta classe teve a participação de cinco artigos / notícias em sua
configuração, sendo dois do El País e três do El Mundo. Observou-se também que
ela representa a quarta maior em número de UCE.
O conceito de Cooperação / Tensão Internacional emerge como Tensão
Diplomática e Política Imigratória Comum. Observa-se que esta classe teve a
maior participação de artigos / notícias em sua formação, foram treze matérias
configurando o sentido da imigração e do imigrante, sendo seis referentes ao jornal
El País, e sete referentes ao El Mundo. A presente classe mostrou também ser a
mais forte em número de Unidades de Contexto Elementar.
Já a Identidade Falsificada e Trabalho mostra-se como Entrada Ilegal e
Atividade Econômica e Regularização. Houve a participação de dois artigos /
notícias, um do El País e outro do El Mundo, na formação da classe, sendo ela
também a apresentar o menor percentual de UCE.
Busca de Melhoria de Vida: Crianças e Adolescentes Como Arrimo de
Família tem sua significação baseada na Influência Familiar e Religiosa e no
Percurso Migratório e Repressão. Apesar de tratar-se de uma classe que emergiu
somente dos jornais da Espanha, é possível fazer um paralelo entre sua subclasse
Percurso Migratório e Repressão e a sublclasse Sofrimento ético-político, da classe
História e Modos de Vida do Imigrante, que emergiu da imprensa brasileira.
170
A subclasse Percurso Migratório e Repressão descreve a forma de entrada
dos imigrantes na Espanha de forma ilegal e altamente perigosa, por meio de
travessias marítimas em embarcações de péssimo estado, assim como a repressão
a esse tipo de entrada. Já na subclasse brasileira Sofrimento ético-político, entre
outras questões, é abordada a maneira sôfrega que os imigrantes japoneses
atravessavam o oceano para chegar a seu destino, dessa vez não de forma ilegal,
entretanto não menos desumana. Embora os textos formadores das classes se
refiram a épocas e locais distintos, uns relacionados aos dias atuais na Espanha e
outro relacionado ao início do século XX no Brasil, mostram-se bastante
semelhantes em seu conteúdo. Essa comparação mostra o referencial que se tem
da imigração e do imigrante em cada país (Brasil e Espanha). Na Espanha
concebe-se o imigrante da atualidade, como figura pertencente ao contexto social
do país. Já no Brasil, trata-se, neste caso, de um imigrante do passado, que se
encontra em outro espaço cronológico, distante.
Observa-se na classe VI a presença de sete artigos / notícias em sua
formação de sentido, sendo quatro do jornal El País e três do jornal El Mundo. A
presente classe foi a segunda maior em número de UCE e em número de
participação de artigos / notícias.
O corpus da imprensa espanhola comportou-se de maneira diferente do
corpus da imprensa brasileira, visto que apresentou correspondência perfeita entre
o número de artigos / noticias participantes na formação das classes e o percentual
de Unidades de Contexto Elementar, quando na imprensa brasileira ocorreu o
contrário, como pôde ser visto anteriormente.
171
4.4 Considerações Finais
Evidencia-se que sobre o objeto social Imigração / Imigrante, os jornais
apresentam semelhanças e diferenças referentes às organizações dos seus
conhecimentos (informação) no que diz respeito à uniformização do nível de
informação. Ao mesmo tempo podem-se identificar informações comuns
relacionadas à exclusão / inclusão social do imigrante e às suas circunstâncias de
modo geral.
Quanto à atitude, destaca-se a orientação global dos jornais no que se refere
à Representação Social da imigração e do imigrante, tendo sido possível observar
uma atitude negativa / positiva / neutra, nos conteúdos emergentes na classe
Ações / Reações à Imigração Irregular. Observa-se uma atitude crítica positiva em
relação ao significado de imigração / imigrante nas classes da imprensa brasileira:
Inclusão / Exclusão Social, Multiculturalismo e Violência, Intolerância Étnica e
Trabalho / Emprego / Desemprego. Na imprensa brasileira, cada jornal contribui
igualmente para a formação de três classes temáticas, sendo a Folha de São Paulo
responsável pelas classes I, II e V, e o Estado de São Paulo pela III, IV e VI. Pelos
conteúdos referendados nas referidas classes pode-se inferir que ambos os
periódicos contribuíram de forma próxima para a construção de significados acerca
da imigração / imigrante.
Na imprensa espanhola, evidencia-se que houve uma predominância da
contribuição do jornal El Mundo para a formação da maioria das classes.
Quanto ao campo representacional ou imagem, objetiva-se a imigração e o
imigrante em classes como Inclusão / Exclusão Social (Folha de São Paulo) e
172
História e Modos de Vida do Imigrante (Estado de São Paulo) que convergem em
relação ao imigrante como privado das benesses sociais construídas pelo homem
nas sociedades organizadas receptoras de imigrantes. Objetiva-se, entretanto,
como uma construção difícil e complexa, de acordo com ao que remete o texto da
Classe I (Inclusão / Exclusão Social). Tais objetivações perpassam também outras
classes que emergiram neste estudo.
Quanto ao sistemas de comunicação observou-se que houve a produção de
mais notícias semelhantes à difusão, posto que utilizaram linguagem com um quadro
de referência amplo, sendo assim mais acessível a uma diversidade de públicos.
Segundo Moscovici (1969) os sistemas de comunicação são indutores de
representações e cada forma indutora tem como efeito a produção de
Representações Sociais específicas. Difusão, propagação e propaganda
correspondem respectivamente à edificação de condutas de opinião, atitudes e
estereótipos. De acordo com esses conceitos, a maioria dos artigos / notícias
produzidos sobre imigração / imigrante, os quais foram coletados neste estudo, são
responsáveis pela formação de opinião acerca do fenômeno e do coletivo estudado,
já que foram semelhantes ao sistema de comunicação denominado difusão.
Sugere-se que este estudo possa, além de encorajar a leitura crítica dos
meios impressos de comunicação, subsidiar o conhecimento das teorias e
realidade a respeito da imigração e do imigrante. Podendo também auxiliar a
elaboração de políticas públicas e práticas sociais em direção a este coletivo, no
que diz respeito às informações específicas não só sobre o contexto imigratório,
173
seus meandros e seus atores, mas também a respeito da importância dos meios
impressos na formação de subjetividades.
174
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ANEXOS
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