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A INTEGRAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO: UMA VISÃO CLINICA
A pluralidade da constituição humana não é captada completamente numa
avaliação psicológica. No texto, GORAYEB (2001) faz uma diferenciação da
avaliação clinica feita pela psicopatologia e a feita pela medicina. Enfatiza que para
um estudo psicopatológico é necessário que leve em consideração a questão
vivencial do sujeito, com o ambiente que está inserido, as pessoas com quem
convive, considerando a questão vivencial para aqueles que dela participam.
O desenvolvimento do sujeito dar-se-ia através das suas experiências
vivenciadas dentro do contexto que o contém, ou seja, do contexto onde está
inserido o indivíduo. Assim, a psicopatologia tem um interesse e um campo
especifico de aplicação, que não se confunde com o ideal médico da anatomia
patológica, que pretende detectar um distúrbio anatômico ou funcional para cada
manifestação clinica encontrada. A psicopatologia leva em consideração,
independentemente de alguma deficiência anatomopatológica, as vivências do
sujeito, pois é a partir daí que para a psicopatologia irá se constituir um sujeito
saudável ou não psicologicamente.
Para um desenvolvimento saudável de uma criança é necessário que o
ambiente e também sua interação com o mesmo seja saudável. O ambiente não
pode ser hostil, principalmente se esta criança possui uma deficiência
anatomopatológica. Esse ambiente deve lhe proporcionar a aceitação e a integração
com a sua dificuldade no convívio diário com as pessoas, e as pessoas também
precisam lhe proporcionar a mesma aceitação sem a presença de nenhum
preconceito. Assim na visão da psicopatologia essa criança irá se desenvolver com
um psiquismo saudável, independente da sua deficiência anatomopatológica, porque
ela desde pequena saberá conviver com esta diferença.
O autor afirma que o diagnóstico psicopatológico não pode ser o mesmo que
o da medicina, porque os diagnósticos médicos visam à identificação da doença,
desconsiderando a pessoa. Já na psicopatologia, o que se leva em conta é
justamente a pessoa e a suas experiências vivenciais. Pode-se dizer que há
tendência à integração do sujeito com o meio onde vive e com aqueles que o
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cercam, e a avalição psicopatológica deve levar em consideração esses pontos na
vida da pessoa, neste caso da criança.
A integração é um comportamento natural dos indivíduos no seu processo de
desenvolvimento. Nesse processo, há tendência na integração de diversos aspectos
fragmentados, de diversos sentimentos e impulsos, e por fim, uma tendência à
integração do indivíduo no meio em que ele vive e com aqueles que o cercam.
Essas tendências fazem parte do processo de desenvolvimento, quando ocorre
modificações neste rumo é um sinal de anormalidade.
Muitos indivíduos, na tentativa de alcançar o equilíbrio e manter sua tendência
à integração, apresentam atitudes que podem ser consideradas sintomas graves de
distúrbios mentais. Sendo assim, é mais adequado fazer uma investigação clínica
nos elementos que participam do processo de integração, tais como a organização
mental dos indivíduos.
As experiências vividas subjetivamente, na medida em que o tempo passa,
tornam-se elementos integrantes da estrutura mental, mesmo que
inconscientemente. Essas experiências podem ser revividas em algum outro
momento da vida. Uma pessoa que possui um comportamento regressivo, não quer
dizer que ela volta ao tempo, mas sim que, ela apresenta comportamento que antes
já havia predominado em sua vida, e foi integrado juntamente com outros elementos,
à sua estrutura mental.
Os instrumentos para o diagnóstico são fundamentais para facilitar a
comunicação entre profissionais bem para construir uma abordagem para
intervenção (PAOLIELLO, 2001). Contudo, uma redução do sofrimento humano as
tabelas classificatórias ou aos resultados obtidos com a aplicação dos instrumentos
favorece a criação ou manutenção de preconceitos (GORAYEB, 1985). A crítica
atual sobre a tendência na psiquiatria – e porque não dizer nas ciências – de reduzir
o homem aos dados coletados em processos cada vez mais tecnológicos procura
destacar a necessidade de voltar o olhar do psiquiatra para a pessoa enquanto ser
desejante e gozoso (PAOLIELLO, 2001), que, a sua frente, diz, fala, expressa seu
sintoma. Este por vezes não significa uma patologia, mas uma maneira de estar no
mundo e se adequar ao modus vivendi no qual está inserido. Essa tendência é bem
materializada na utilização quase hegemônica dos manuais de classificação, seja o
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DSM ou o CID. Sua utilização para diagnósticos em crianças é controvérsia, pois
como nem sempre leva “em consideração fatores básicos como as fases de
desenvolvimento, sua correlação com os sintomas e a resiliência. Também não
exploram as possíveis relações entre o sintoma, o ambiente familiar e outros
eventos de vida da criança” (KESROUANI & CELERI, 2007). Por isso, o trabalho
com crianças em psiquiatria dependerá da concepção teórica do profissional. Esse
embasamento teórico terá consequências na prática clínica tanto na escolha do
modelo diagnóstico a seguir como na abordagem terapêutica a ser usada.
Importa destacar que há concepções teóricas diferentes, por vezes,
divergentes. A psiquiatria baseada no modelo anatomopatológico considera o
sintoma como uma alteração em alguma parte orgânica que produz sintomas
específicos, identificáveis em quaisquer sujeitos, passíveis de regulação através de
medicação (GORAYEB, 1985). Esse modelo visa atender a um processo histórico
que buscou dar cientificidade a psiquiatria, almejando uma objetivação e
exteriorização da psiquiatria, reduzindo a atividade psíquica do homem a uma
atividade cerebral. De acordo com PAOLIELLO, essa redução é um ato ideológico
destituindo a psiquiatria de sua função de articuladora da complexidade dos
fenômenos humanos (2001). Ocorre com isso uma exclusão da subjetivação.
Segundo GORAYEB (2001), há dois motivos para se não seguir esse modelo
anatomopatológico: o primeiro, é que as doenças entendidas como alterações
dependem sempre da experiência vivencial do sujeito e nem sempre tem relação
estrita com alterações biológicas e, segundo, os modos de adoecimento psíquico
tem uma lógica própria que não é necessariamente igual a lógica fisiológica. O autor
considera que há a possibilidade de existir maneiras peculiares de adoecimento da
mesma forma que há modos próprios de uma vida saudável psiquicamente. Assim
sendo, pode-se afirmar que certas formas de manifestar a doença estão
relacionadas às etapas de desenvolvimento do sujeito. E para que esse processo
aconteça, a integração é fundamental. Há no ser humano uma tendência a
integração dos diversos aspectos fragmentados da vida do sujeito, dos sentimentos
e impulsos bem como a integração do indivíduo com o meio e com aqueles com
quem convive. É sob a ótica dessa tendência de integração que alguns sintomas
podem ser considerados como tentativas de adaptação e não como uma patologia.
Assim temos uma visão dinâmica e evolutiva do indivíduo permitindo-nos analisar os
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diversos fatores envolvidos nesse processo de desenvolvimento normal ou
patológico. Nessa tendência de integração, dois conceitos são importantes:
regressão e fixação. A regressão aqui é entendida como um retorno ao modo de
funcionamento mental que foi predominante em determinada época. Esse retorno
não é aleatório, mas sim ocorre regressão para uma época para a qual ocorreu uma
fixação do sujeito. A regressão funciona então “como mecanismo de defesa, ou seja,
tentativas do aparelho mental de lidar com certas situações angustiantes e
conflitivas” (GORAYEB, 1985). Destaca-se a regressão onde a fixação atua de tal
modo que a busca de uma solução para uma conflitiva atual se baseia em uma
solução anteriormente experimentada. Agregado a esses conceitos está também a
concepção de conflito psíquico, como um fato intrapsíquico, originado nas
tendências instintivas, por vezes contraditórias, existentes na vida emocional. Tudo
está presente na vida do indivíduo e desconsiderar tais característica em prol da
padronização de sintomas pode conduzir a erros diagnósticos e terapêuticos.
É com o olhar clínico, considerando a relação médico-paciente, que os
sintomas adquirem seu valor, sua significação. Citando Winnicott, KESROUANI &
CELERI (2007) afirmam que o sintoma deve ser entendido como “indicador para
uma avaliação completa da história do desenvolvimento emocional da criança em
relação ao seu ambiente e à cultura.” Por isso, podemos alegar que nem sempre um
sintoma aponta para uma patologia e nem sempre as patologias manifestar-se-ão
com sintomas classificados nos manuais. Mesmo assim, podemos considerar os
sintomas como sinal de alerta de irregularidade na vida da criança, como sinais de
falhas no ambiente, como uma tentativa de conciliação do psiquismo com a
realidade e como uma busca de equilíbrio para organização geral do psiquismo. É a
análise dos sintomas que permitirá uma compreensão dos aspectos dinâmicos
envolvidos na história da criança e não uma mera quantificação acordada com os
dados de manuais.
Concordamos com KESROUANI & CELERI (2007) quando afirma que
o diagnóstico de crianças é difícil e depende das reflexões do campo teórico. Por
isso mesmo, somos favoráveis a prática clínica compreendida como ambiente que
possibilita a escuta do sujeito, do seu desejo e de sua dinâmica psíquica.
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REFERÊNCIAS
GORAYEB, Raul. Psicopatologia infantil. São Paulo: EPU, 1985.
KESROUANI, Rosana; CELERI, Eloísa Helena Valler. Diagnósticos em psiquiatria
infantil: uma reflexão a partir da obra de WinnicottRevista Latinoamericana de
Psicopatologia Fundamental [On-line] 2007, 10 (Marzo-Sin mes) : [Data de consulta:
19 / octubre / 2014] Disponível em:<http://www.redalyc.org/articulo.oa?
id=233017474004> ISSN 1415-4714
PAOLIELLO, Gilda. O problema do diagnóstico em psicopatologiaRevista
Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental [On-line] 2001, IV (Marzo-Sin
mes) : [Data de consulta: 19 / octubre / 2014] Disponível
em:<http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=233018218008> ISSN 1415-4714
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