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Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Direito do Ambiente
Regente: Professor Doutor Vasco Pereira da Silva
Assistente: Doutor João Pedro Oliveira Miranda
A Utilização de Algas
Para a Produção de
Biocombustíveis
Uma Oportunidade Para
Portugal
Andreia Patrícia Duarte da Costa
Nº. 18018 Subturma 9
20 de Maio de 2012
2
Índice
- Introdução…………………………………………………………………………….…….Página 3
- Os Princípios Jus-Ambientais em Jogo……………………………..…………………..Página 4
- Energia e Desenvolvimento Sustentável - As Falhas do Actual Paradigma de
Crescimento………………………………………………………………………………….Página 6
- A Alternativa das Energias Renováveis – Consciencialização a Nível
Internacional………………………………………………………………………………….Página 7
- A União Europeia na Dianteira da Promoção das Energias Renováveis - As Directivas
sobre Biocombustíveis………………………………………………………………………Página 8
- Quadro Normativo Actual a Nível Europeu……………………………..………………Página 9
- O Quadro Normativo Actual em Portugal…………………………………….………..Página 11
- As Alternativas dentro da Alternativa – As Fontes de Energia Renováveis
Existentes…………………………………………………………………………………...Página 13
- Potencialidades e Problemas da Utilização de Biocombustíveis……………..…….Página 15
- A Utilização de Algas como Alternativa para a Produção de Biocombustíveis…....Página 17
- Tipos de Algas com Potencial Energético e Questões Relativas à sua
Obtenção……………………………………………………………………………………Página 20
- Biomassa Algal versus Biomassa Terrestre – As Vantagens e as Desvantagens da
Utilização de Algas para a Produção de Biocombustíveis………………...…………..Página 21
- A Questão da Viabilidade Económica………………………………….………………Página 23
- Porque é que Portugal Deveria Investir na Produção de Biocombustíveis a partir das
Algas?........................................................................................................................Página 23
- Conclusão…………………………...…………………………………………………….Página 26
- Bibliografia………………………………………………………………………………...Página 27
3
Introdução
A procura de recursos limpos que permitam assegurar as necessidades energéticas futuras
constitui um dos maiores desafios da atualidade. O crescente preço dos combustíveis e o
foco internacional sobre o impacto ambiental das emissões de gases com efeito de estufa
têm conduzido a uma nova tendência. Trata-se de uma tendência verde, conducente à
procura de recursos renováveis e ao desenvolvimento de tecnologias limpas, que suportem
a indústria e as necessidades do mercado mundial.
Na União Europeia, o setor dos transportes é responsável por cerca de um quarto das
emissões de gases com efeito de estufa, pelo que é da maior importância procurar formas
de reduzir as emissões poluentes deste setor, quer através de veículos mais limpos e
eficientes, quer através da utilização de biocombustíveis que permitam reduzir a
dependência energética dos combustíveis fósseis. Os biocombustíveis constituem recursos
não-tóxicos, biodegradáveis e renováveis, estando associados à redução das emissões de
gases com efeito de estufa. Como tal, constituem os biocombustíveis uma alternativa
energética cada vez mais explorada.
Contudo, a utilização desta fonte de energia não é isenta de problemas, especialmente no
que toca à sua concorrência com os bens alimentares. Ora, o fabrico da atual geração de
biocombustíveis, com recurso a culturas alimentares (como a canola, o milho, a soja, a cana
de açúcar, o amendoim, entre outros…), tem conduzido a um aumento dos preços dos
alimentos, com graves repercussões ao nível das condições de vida de muitas populações.
Concomitantemente fala-se do problema do agravamento da desflorestação e das elevadas
emissões de gases com efeito de estufa geradas pelo seu cultivo nalgumas zonas,
nomeadamente em terrenos ricos em carbono.
Posto isto, na busca de alternativas para fornecer energia efectivamente mais verde, forte
entusiasmo tem vindo a gerar-se em torno do grande potencial oferecido pelas algas,
enquanto fonte energética renovável. Neste domínio, as algas afiguram-se como uma
alternativa promissora para a próxima geração de biocombustíveis, sendo de destacar o seu
potencial para a produção de biodiesel.
É esta temática que irei explorar na presente exposição, apresentando um conjunto de
argumentos pelos quais, em última análise, Portugal deveria apostar nesta alternativa
energética.
4
Os Princípios Jus-Ambientais em Jogo
O Princípio do Desenvolvimento Sustentável
A Constituição da República Portuguesa (CRP), no seu artigo 66º nº1, dita que todos têm
direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o
defender. Posto isto, consagra, no seu nº2, algumas incumbências do Estado, que, por
meio de organismos próprios e com o envolvimento dos cidadãos, deve assegurar o direito
ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável.
O desenvolvimento sustentável constitui um princípio jus-ambiental, tendo começado por
assumir um alcance meramente económico. Na verdade, começou por consistir numa
chamada de atenção para a necessidade de conciliação da preservação do meio ambiente
com o desenvolvimento socioeconómico. No entanto, este princípio assume hoje uma
dimensão jurídica, maxime na ordem constitucional, ao estabelecer uma exigência de
ponderação das consequências para o meio ambiente de qualquer decisão jurídica de
natureza económica tomada pelos poderes públicos. Concomitantemente, estabelece um
requisito de validade daquelas decisões, pelo que medidas insuportavelmente gravosas
para o ambiente ficarão feridas de inconstitucionalidade. Como tal, a máxima do
desenvolvimento sustentável obriga à fundamentação ecológica das decisões jurídicas de
desenvolvimento económico, estabelecendo a necessidade de ponderar, em cada caso,
tanto os benefícios de natureza económica como os prejuízos de ordem ambiental.
Este princípio coloca-se com especial acuidade na problemática das energias alternativas,
como melhor se explorará infra. Desde já fica a nota de que, não obstante a atual
dependência energética, a solução do problema não passa apenas pela garantia de fontes
primárias de energia que a forneçam de forma abundante, segura e economicamente
acessível. O princípio do desenvolvimento sustentável exige que tais fontes sejam,
concomitantemente, limpas, ou, pelo menos, o mais limpas possível.
Os Princípios da Prevenção e Precaução
Nos termos do artigo 66º nº2 a) da CRP, para assegurar o direito ao ambiente, no quadro
de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado (…) prevenir e controlar a poluição
e seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão.
Um dos princípios constitucionais fundamentais, que sem ser privativo do direito do
ambiente, aqui assume grande relevância e especificidade, é, pois, o princípio da prevenção
em sentido amplo (que abrange a prevenção em sentido estrito e a precaução), e que tem
como finalidade evitar lesões do meio ambiente. Tal implica a capacidade de antecipação
de situações potencialmente perigosas, de origem natural ou humana, capazes de pôr em
risco os componentes ambientais, de modo a permitir a adopção dos meios mais
adequados para afastar a sua verificação ou, pelo menos, minorar as suas consequências.
Posto isto, o que está aqui em causa é a tomada de medidas destinadas a evitar a
produção de efeitos danosos para o ambiente, e não a reação a tais lesões. Num sentido
estrito, a prevenção visa apenas evitar perigos imediatos e concretos, de acordo com uma
lógica imediatista e atualista. Por sua vez, o afastar de eventuais riscos futuros, mesmo que
não ainda inteiramente determináveis, de acordo com uma lógica mediatista e prospetiva,
cabe ao princípio da precaução. Tendo em conta a posição de VASCO PEREIRA DA
SILVA, seguirei, na presente exposição, a noção ampla do princípio da prevenção.
5
No que à matéria das energias renováveis respeita, é evidente, o peso deste princípio nas
opções tomadas. Sem prejuízo de uma análise mais aprofundada sobre este ponto, são
bem conhecidos os impactos ambientais inerentes ao atual paradigma energético, marcado
pela utilização massiva de combustíveis fósseis. Como tal, a opção por fontes de energia
alternativas visa, essencialmente, a minimização dessas lesões ao meio ambiente.
Princípio do Aproveitamento Racional dos Recursos Disponíveis
De acordo com o artigo 66º nº2 d) da CRP, para assegurar o direito ao ambiente, no quadro
de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado (…) promover o aproveitamento
racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a
estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações.
Este princípio ambiental, de um modo geral, vem chamar a atenção para a escassez dos
bens da natureza, proibindo a tomada de decisões públicas que conduzam ao
esbanjamento ou à delapidação dos recursos. Obriga, assim, à adopção de critérios de
eficiência ambiental na tomada de decisões no exercício dos poderes públicos (seja no
âmbito legislativo e político, seja a nível administrativo), de modo a racionalizar o
aproveitamento dos recursos naturais existentes, os quais são esgotáveis.
Ora, este princípio assume especial valia no domínio da energia, implicando a adopção de
estratégias de eficiência energética e de poupança de recursos. As medidas adotadas que,
neste ponto, não adotem critérios de eficiência, devem ser consideradas como
transgressoras dos padrões constitucionais e, como tal, inconstitucionais.
Princípio do Poluidor-Pagador
Dita o artigo 66º nº2 h) da CRP que, para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um
desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado (…) assegurar que a política fiscal
compatibilize o desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida.
A máxima do poluidor-pagador, que nasceu no quadro do direito internacional
(designadamente sob a égide da OCDE), decorre da consideração de que os sujeitos
económicos, que são beneficiários de uma determinada atividade poluente, devem
igualmente ser responsáveis no que respeita à compensação dos prejuízos que resultam
para toda a comunidade do exercício dessa atividade. Concomitantemente, os custos de
reconstituição da situação, assim como as medidas de prevenção necessárias para prevenir
ou minimizar comportamentos de risco para o ambiente, devem igualmente ser
compensados. Posto isto, trata-se de um princípio que assume três funções primordiais: a
de internalização/redistribuição, a de reparação e a de prevenção dos custos ambientais. E
aqui assume a maior importância a política fiscal adotada em cada momento, por um lado
como forma de penalizar e dissuadir certas condutas lesivas para o ambiente (através dos
impostos e taxas), por outro como instrumento de incentivo de boas práticas ambientais
(através dos benefícios fiscais, por exemplo).
No que à temática da energia respeita, este princípio assume grande importância. Não só
se manifesta ao nível da penalização e dissuasão de condutas (pense-se na tributação
automóvel e nos impostos especiais de consumo, com incidência sobre os produtos
petrolíferos), mas também ao nível do incentivo de práticas ecológicas. Como melhor
veremos infra, esta segunda vertente do princípio do poluidor-pagador assume a maior valia
6
para o incremento das energias renováveis. As fontes alternativas de produção de energia
dependem, regra geral, de caros investimentos em investigação e tecnologia, pelo que só
com a ajuda e incentivos estaduais, designadamente ao nível das subvenções e isenções
fiscais, é que se poderá estimular o investimento nestas energias.
Energia e Desenvolvimento Sustentável – As Falhas do Actual Paradigma de
Crescimento
A característica fundamental e dominante do período posterior ao início da revolução
industrial, em meados do século XVIII, foi a aceleração da utilização global da energia.
Neste período, a utilização de energia convertida a partir de combustíveis fósseis,
nomeadamente do carvão e petróleo, tornou-se líder, tendência que continuou, de modo
ascendente, durante os séculos XIX e XX. Ora, a revolução energética constitui um
notabilíssimo feito do engenho humano, tendo contribuído para uma melhoria decisiva da
qualidade de vida das populações. A maior capacidade de utilização de energia permitiu
suportar as aplicações da ciência moderna e da tecnologia aos mais diversos domínios da
atividade humana, desde a medicina, às engenharias e à produção agrícola. Em suma,
pode afirmar-se que a energia é a principal base de sustentação do atual paradigma de
crescimento económico, pelo que sem fontes primárias de energia abundantes e a custos
acessíveis não será possível continuar a assegurar o crescimento social e económico à
escala global das últimas décadas, tanto nos países desenvolvidos como nos países em
desenvolvimento.
Cerca de 80% das fontes primárias de energia a nível mundial são combustíveis fósseis e,
de acordo com os cenários de referência da Agência Internacional da Energia (AIE), esta
percentagem irá crescer 50% até 2030, a um ritmo médio anual de 1,6%. Os combustíveis
fósseis serão a fonte primária dominante, assegurando 83% do aumento da procura da
energia entre 2004 e 2030. Ainda de acordo com os cenários apontados pela AIE, temos
que, em termos absolutos, a maior procura será a de carvão, com a China e a Índia a
representar cerca de 80% dessa procura até 2030. Face a estas perspetivas, FILIPE
DUARTE SANTOS, afirma que a questão da sustentabilidade dos sistemas energéticos
para o desenvolvimento económico e social se manifesta de três formas distintas. A
primeira é a da segurança no acesso à energia, tendo em conta o profundo desequilíbrio
geográfico existente entre os principais países produtores e consumidores de petróleo e de
gás natural. Ora, os países mais desenvolvidos, onde o consumo de energia per capita é
maior, designadamente os EUA, o Canadá, o Japão, a Austrália e os países da Europa
Ocidental, estão a tornar-se cada vez mais dependentes da importação daqueles
combustíveis, sendo patente a vulnerabilidade do acesso à energia, especialmente em
situações de crise ou conflito.
A segunda componente da sustentabilidade dos sistemas energéticos é a acessibilidade
económica aos serviços de energia, sendo que esta está manifestamente em decréscimo,
face ao aumento brutal dos preços do petróleo e do gás natural nos últimos anos
(especialmente desde 2008), com consequências ao nível da subida da inflação nos países
importadores. Este aumento deve-se essencialmente à conflitualidade geoestratégica em
várias regiões do globo (especialmente no Médio Oriente), à especulação, ao crescente
7
aumento dos investimentos necessários para suportar os maiores custos de produção em
jazigos novos (de exploração mais difícil) e ao aumento da procura.
Finalmente, a terceira componente apontada é a da sua compatibilidade ambiental, que, na
minha ótica, deveria ser apontada em primeiro lugar. Não basta a garantia de fontes
primárias de energia que a forneçam de forma abundante, segura e economicamente
acessível. E imperativo que a utilização dessas fontes não provoque impactos negativos
sobre o ambiente e não ponha em perigo a saúde das populações. Na verdade, e
subscrevendo as palavras de VASCO PEREIRA DA SILVA, seja em que domínio for, (…) o
risco zero em matéria ambiental não existe, o que significa que os sistemas associados à
utilização de qualquer fonte primária de energia têm sempre algum impacto no ambiente.
Há, porém, exemplos manifestamente gravosos, como é especialmente o caso dos
combustíveis fósseis, cuja combustão em larga escala, ao longo de muitas dezenas de
anos, gera a acumulação na atmosfera dos gases emitidos, nomeadamente do dióxido de
carbono, gás com efeito de estufa. É hoje aceite pela comunidade científica que o aumento
da concentração atmosférica de dióxido de carbono e de outros gases nocivos está a
intensificar o efeito de estufa na atmosfera e, por conseguinte, a provocar alterações
climáticas no globo. Posto isto, e assumindo a dependência do atual paradigma de
desenvolvimento da utilização crescente de energia a nível global, é inevitável procurar gerir
e minimizar, na medida do possível, os impactos negativos da utilização de algumas formas
primárias de energia, assim como procurar alternativas sustentáveis, mais amigas do
ambiente.
A Alternativa das Energias Renováveis – Consciencialização a Nível Internacional
No seguimento do que foi dito supra, se é incontestável que os combustíveis fósseis tiveram
um papel decisivo no grande salto tecnológico ocorrido com a revolução industrial, também
é verdade que a Revolução Ecológica do final do século XX despertou os Estados e os
operadores económicos para a necessidade de apostar em fontes de energia renováveis,
em complemento ou mesmo em substituição das fontes que até então detinham o
protagonismo.
De facto, elas encontram-se hoje no centro das atenções políticas, económicas e
ambientalistas, desde logo no plano internacional. Os impactos ambientais da utilização de
certas fontes de energia e a escassez dos recursos energéticos não têm fronteiras, o que
força os Estados à cooperação internacional neste domínio. Logo na Declaração de
Estocolmo de 1972, afirmaram os Estados, no princípio 3, que a capacidade do Globo de
produzir recursos renováveis essenciais deve ser mantida e, sempre que praticável,
restaurada ou melhorada. Vinte anos depois, na Declaração do Rio, enfatizou-se, no
princípio 7, a necessidade de cooperação internacional no sentido da conservação,
protecção e restauração da qualidade dos ecossistemas terrestres, segundo um princípio de
responsabilidades comuns mas diferenciadas, de acordo com o nível de desenvolvimento
dos Estados. No entanto, foi seguramente o Protocolo de Quioto de 1997 que impulsionou o
tema da energia a partir de fontes renováveis, em virtude do imperativo de redução das
emissões de gases de efeito de estufa para a atmosfera e, por conseguinte, da diminuição
da utilização de combustíveis fósseis. Por sua vez, o Plano de Acção para a Energia,
forjado na Cimeira de Joanesburgo em 2002, fez um apelo ao concerto dos Estados no
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sentido da promoção da acessibilidade às fontes de energia, da eficiência energética e das
energias renováveis, entre outros objectivos. Dois anos depois, em Junho de 2004, realizou-
se em Bona a Conferência Internacional sobre as Energias Renováveis, na qual os Estados
acentuaram a necessidade de promoção da investigação científica e do financiamento de
projetos de produção de energia a partir de recursos renováveis (especialmente
determinantes no contexto da promoção do combate à pobreza e ao subdesenvolvimento),
mau grado não se ter alcançado um consenso quanto à fixação de um índice de produção
de energia a partir daquelas fontes no plano global.
Actualmente, está em preparação a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), a realizar nos dias 20 a 22 de Junho de 2012,
sendo que uma das temáticas em análise será, precisamente, a da utilização da ciência e
tecnologia para o desenvolvimento sustentável. Os temas da eficiência energética e do
incentivo às energias renováveis continuam, pois, na ordem do dia.
A União Europeia na Dianteira da Promoção das Energias Renováveis - As Directivas
sobre Biocombustíveis
Apesar da crescente consciencialização a nível internacional quanto ao problema
energético, curiosamente do texto do Tratado de Roma não constou, durante décadas,
qualquer referência à produção de energia, não havendo qualquer base habilitante em sede
de política energética. Essa ausência era tributária essencialmente da estreita aliança entre
exploração de recursos energéticos e soberania nacional, da qual os Estados não quiseram
abdicar. No entanto, este vazio habilitante não inibiu a Comunidade de ir produzindo algum
sedimento legislativo nesta matéria, especialmente após a alteração introduzida, com o
Tratado de Amsterdão, no então artigo 175º nº2 c) do Tratado de Roma, que abriu caminho
a, nas palavras de CARLA AMADO GOMES, uma via verde para a energia no ordenamento
eurocomunitário. Esta disposição constituiu, assim, base habilitante para a aprovação das
Directivas nº 2001/77 (green electricity directive) e nº 2003/30 (green fuels directive).
Cumpre relembrar que a aprovação destas directivas foi levada a cabo já no contexto do
compromisso assumido pela União Europeia junto da ONU, no quadro da Convenção sobre
Alterações Climáticas e o do Protocolo de Quioto, ratificado pela UE em 2002.
Procedendo a um pequeno apontamento sobre a green fuels directive, temos que esta
directiva pretendeu implementar a estratégia gizada no Conselho Europeu de Gotemburgo
(de Junho de 2001), tendente à adopção de medidas de promoção do desenvolvimento
sustentável, entre as quais o incremento da utilização de biocombustíveis. Ora, como se
afirma no considerando 4 da directiva, o sector dos transportes é responsável por mais de
30% do consumo final de energia da Comunidade e encontra-se em expansão, tendência
que, tal como acontece com as emissões de dióxido de carbono, deverá acentuar-se. No
seguimento, diz-nos o considerando 6: Uma utilização mais intensa de biocombustíveis nos
transportes faz parte do pacote de medidas necessárias para dar cumprimento ao protocolo
de Quioto e de qualquer pacote de políticas para o cumprimento de novos compromissos
nesta matéria. Posto isto, a directiva salientou a necessidade de promoção da investigação
e desenvolvimento tecnológico neste domínio, sendo que a questão dos custos não foi
ignorada (abriu-se a porta à criação de incentivos fiscais e outro tipo de apoios
mobilizadores da produção de biocombustíveis). No que ao conteúdo regulatório da green
9
fuels directive respeita, é de salientar essencialmente três pontos. Nos termos do artigo 3º
nº1, foi feito um apelo à colocação nos mercados de uma proporção mínima de
biocombustíveis e outros combustíveis renováveis, por parte dos Estados Membros. Em
segundo lugar, foi estabelecido, no artigo 3º nº4, um dever de avaliação de impactos
ambientais dos biocombustíveis introduzidos, tendo prioridade aqueles que revelassem
melhor relação custo/eficácia, sem prejuízo das vertentes da competitividade e da
segurança no abastecimento. Por fim, foi imposta a obrigação de rotulagem específica nos
postos de venda, sempre que a percentagem de biocombustível misturada com derivados
do petróleo excedesse determinado nível, nos termos do artigo 3º nº5. A directiva
estabeleceu ainda valores de referência, que correspondiam, designadamente, a uma quota
de mercado de 2% para os biocombustíveis em 2005 e de 5,75% para 2010. No entanto, a
Comissão constatou, em 2006, que a quota não fora além dos 1,4% na generalidade dos
Estados Membros, pelo que, na Estratégia da União Europeia no domínio dos
biocombustíveis – COM(2006), ponderou a revisão da green fuels directive.
Posto isto, o Conselho Europeu de Bruxelas, de Março de 2007, inaugurou a noção de
Política Energética Europeia, aliando soberania estadual e solidariedade na realização do
mercado interno. De acordo com as conclusões da presidência, a política energética
europeia orienta-se em função de três objectivos, nomeadamente o incremento da
segurança de abastecimento, o fortalecimento da economia europeia e a promoção do
desenvolvimento sustentável e do combate às alterações climáticas. Na verdade, foi nesta
reunião do Conselho Europeu que nasceu o famoso soundbyte dos 20%: 20% de produção
de energia a partir de fontes renováveis até 2020 (10% para biocombustíveis); 20% de
redução de emissões de gases com efeito de estufa até 2020; 20% de ganhos de eficiência
até 2020. O Plano de Acção para a Energia, que acolheu este objetivo dos três 20’s,
culminou na aprovação do Pacote Clima-Energia, o qual inclui, entre outras, a atual directiva
sobre energias renováveis e biocombustíveis (Directiva nº 2009/28).
A título de curiosidade, note-se que todos os diplomas incluídos neste Pacote Clima-Energia
foram aprovados ainda ao abrigo das bases de competência da política ambiental e da
consolidação do mercado interno, uma vez que só em Dezembro de 2009 é que a UE viu
formalmente consagrada, no TFUE, uma Política Energética Comum.
Quadro Normativo Actual a Nível Europeu
No que respeita à meteria das energias renováveis e, em especial, dos biocombustíveis,
vigora atualmente no quadro comunitário a Directiva nº 2009/28, que veio substituir as
directivas green electricity e green fuels, revogando a maior parte do articulado daquelas. O
sistema instituído por este instrumento normativo entrou plenamente em vigor a 1 de
Janeiro de 2012, nos termos do seu artigo 27º nº3.
De um modo geral, pode-se dizer que esta directiva trouxe várias inovações, não só de
carácter geral, mas também em matéria de biocombustíveis. No que toca às primeiras,
cumpre assinalar a fixação de uma quota mínima de 20% de energia produzida a partir de
fontes renováveis para 2020, a qual deixa de ser meramente indicativa (como era nos
termos dos artigos 3º da Directiva nº 2001/77 e 3º da Directiva nº 2003/30) e passa a ser
vinculativa, nos termos do artigo 3º e Anexo I/B da atual directiva (embora não se cominem
10
sanções para os Estados que não consigam cumprir os objectivos); o entrelaçamento entre
a produção de energia a partir de fontes renováveis e a promoção de medidas de eficiência
energética (de acordo com os considerandos 17 e 18 e com o artigo 13º nº4); a criação de
um mercado europeu de certificados verdes, a partir da identificação do volume de energia
renovável produzida por garantias de origem, a implementar, nos termos dos artigos 6º e 7º,
através de transferências estatísticas controladas pelos Estados; e o apelo à cooperação
entre Estados Membros entre si, e entre estes e terceiros Estados, com vista à aquisição de
energia produzida a partir de fontes renováveis, a consumir na UE (artigos 7º a 10º).
Relativamente às inovações em sede de biocombustíveis, é de salientar a fixação, pelo
artigo 3º nº4, de uma quota mínima de 10% de biocombustíveis utilizados pelo sector
rodoviário de cada Estado Membro; a diferenciação entre biocombustíveis e biolíquidos
(sendo que não todos produzidos a partir da biomassa e têm fins energéticos, mas só os
primeiros são adstritos ao sector dos transportes e, como tal, só eles são considerados para
o cômputo dos 10%), nos termos do artigo 2º h) e i); a fixação de regras especiais para o
sector da aviação, definidas no artigo 5º, relativamente à contagem do consumo final bruto
de energia, que passa por uma indexação geral a um valor de 4, 12%; o estabelecimento de
um método de cálculo do impacto ambiental do uso de biocombustíveis, que pondera tanto
a redução de emissões derivada da substituição de combustíveis fósseis, como o eventual
acréscimo de emissões decorrente da alteração do uso dos solos agrícolas, previsto no
artigo 19º; e a definição de critérios de sustentabilidade dos biocombustíveis, para efeitos
de cômputo da quota de 10%, quer sejam produzidos na UE, quer em Estados não
membros, nos termos dos artigos 5º nº1, 17º e 18º.
A par destas medidas, é de salientar o carácter inovatório da Directiva nº 28/2009 na parte
em que conjuga as várias políticas comunitárias. Com efeito, e na sequência da Estratégia
da União Europeia no domínio dos biocombustíveis, temos que a questão da reconversão
energética no sector dos transportes envolve, simultaneamente, a política agrícola comum
(PAC), a política ambiental, a protecção dos direitos fundamentais das pessoas
(designadamente direito à saúde e direitos dos trabalhadores) e as relações externas da UE
(muito especialmente, mas não exclusivamente, no quadro do Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo, criado pelo Protocolo de Quioto). Merece um pequeno
apontamento a conexão existente entre a matéria dos biocombustíveis e a política
ambiental da UE, que constitui, nas palavras de CARLA AMADO GOMES, o cordão
umbilical das energias renováveis. Esta conexão implica, desde logo, a sujeição da opção
de produção e utilização de biocombustíveis à filtragem necessária da Avaliação de Impacto
Ambiental, nos termos das Directivas nºs 85/337 e 97/11 (relativas à avaliação dos efeitos
de determinados projetos públicos e privados no ambiente), ou da Avaliação de Incidências
Ambientais, nos termos da Directiva nº 92/43 (sobre conservação de habitats naturais de
fauna e flora). Tais projetos poderão sujeitar-se, concomitantemente, ao regime da
Informação em Matéria de Ambiente, previsto no Regulamento nº 1367/2006 (relativo *a
aplicação das disposições da Convenção de Aarhus sobre o acesso à informação,
participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de
ambiente).
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O Quadro Normativo Actual em Portugal
Estando aqui em causa um sector regulado pelo direito da União Europeia, o regime vigente
em matéria de biocombustíveis na ordem jurídica portuguesa é, em larga medida,
semelhante àquele que consta das directivas. Neste sentido, temos desde logo o artigo 1º
do DL 117/2010, de 25 de Outubro, que abre com a enumeração dos instrumentos
comunitários que transpõe, nomeadamente a Directiva nº 28/2009.
À semelhança da Directiva nº 28/2009, o artigo 3º deste diploma começa por enumerar
critérios de sustentabilidade que os biocombustíveis devem respeitar, os quais são
concretizados nos artigos 4º a 8º. Posto isto, o primeiro critério de sustentabilidade consiste
no respeito dos critérios para a redução dos gases com efeito de estufa, nos termos dos
artigos 3º nº1 a) e 4º, sendo que os biocombustíveis e biolíquidos consideram-se
sustentáveis quando a redução mínima de emissões de gases com efeito de estufa
resultantes da sua utilização, em comparação com o combustível que visam substituir,
corresponda a 35 % até 31 de Dezembro de 2016; 50 % para os provenientes de
instalações que entrem em funcionamento após a entrada em vigor do presente diploma; 50
% a partir 1 de Janeiro de 2017; e 60 % a partir de 1 de Janeiro de 2018, para os
biocombustíveis provenientes de instalações cuja produção tenha tido início a partir de 1 de
Janeiro de 2017. Por sua vez, o segundo critério de sustentabilidade visa os
biocombustíveis ou biolíquidos produzidos a partir de matérias-primas agrícolas, cultivadas
em territórios dos Estados-Membros, os quais devem cumprir os requisitos enumerados no
artigo 6º (por remissão do artigo 3º nº1 b) do diploma). Este preceito, por sua vez, remete
para requisitos estabelecidos em instrumento comunitário (nomeadamente a Directiva nº
73/2009). Em terceiro lugar, encontramos o critério de sustentabilidade do artigo 3º nº1 c)
referente ao uso dos solos. Desdobrando-se em dois subcritérios, este implica, não só a
proibição da produção de biocombustíveis a partir de matérias-primas provenientes de
terrenos ricos em biodiversidade (nos termos do artigo 7º), como a proibição da produção
daqueles combustíveis a partir de biomassa vegetal cultivada em terrenos com alto teor de
carbono ou em turfeiras, tal como definidos nos nºs 2 e 4 do artigo 8º. Posto isto, temos
que, conforme dita o artigo 9º nº1, cabe o ónus da prova do cumprimento destes requisitos
aos operadores económicos que pretendam comercializar biocombustível. Nos termos do
nº4 deste preceito, caso os biocombustíveis ou as matérias-primas utilizadas sejam
provenientes de Estado Membro da UE, devem os mesmos ser acompanhados da
certificação do cumprimento dos critérios de sustentabilidade emitida pela entidade
competente desse Estado membro, devendo os operadores económicos apresentá-la à
entidade coordenadora do cumprimento dos critérios de sustentabilidade nacional. Por outro
lado, se aqueles produtos provirem de Estados terceiros que tenham celebrado acordos
com a União Europeia para fins de reconhecimento da sustentabilidade desses materiais,
nos termos dos artigos 4.º, 7.º e 8.º, os operadores económicos têm de demonstrar a sua
origem e o cumprimento do acordo. A entidade coordenadora mencionada nestes artigos é
o Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), cujas competências são
estabelecidas pelo artigo 20º.
No que respeita à comercialização dos biocombustíveis, é esta admitida pelo artigo 10º,
considerando-se produtores de biocombustíveis quaisquer entidades que produzam
biocombustíveis e que sejam reconhecidos como entreposto fiscal de transformação (EFT)
nos termos do Código dos Impostos Especiais de Consumo (artigo 10º nº3). Estas
entidades (também designadas incorporadores), nos termos do artigo 11º nº1, estão
12
obrigadas a contribuir para o cumprimento das metas de incorporação, nas seguintes
percentagens de biocombustíveis, em teor energético, relativamente às quantidades de
combustíveis rodoviários por si colocados no consumo, com exceção do gás de petróleo
liquefeito (GPL) e do gás natural: 5% em 2011 e 2012; 5,5% em 2013 e 2014; 7,5% em
2015 e 1016; 9% em 2017 e 2018; e 10% em 2019 e 2020. O cumprimento desta obrigação
deve ser por elas comprovado, nos termos do artigo 13º ex vi artigo 11º nº2. É que,
conforme consta do artigo 13º nº1, a incorporação no mercado de biocombustíveis tem de
ser comprovada por títulos de biocombustíveis, os quais têm a validade de dois anos e são
emitidos nos termos do artigo 14º. De facto, foi criado um sistema de emissão de títulos de
biocombustíveis (TdB), para verificação do cumprimento das metas de incorporação,
atribuindo-se uma valorização adicional aos biocombustíveis produzidos a partir de resíduos
ou de matéria-prima com origem lenho-celulósica, bem como os que sejam produzidos a
partir de matérias endógenas, de forma a privilegiar o valor acrescentado nacional e em
concordância com a ENE 2020. Este sistema de TdB permite que os mesmos sejam
transacionáveis entre agentes económicos, dando a cada incorporador, como forma de
comprovação do cumprimento da sua meta, a opção entre obter os TdB necessários
através da incorporação de biocombustíveis ou adquirir esses títulos a agentes que os
tenham em excesso. Este regime consta dos artigos 13º a 18º.
Para além da obrigação de contribuição para o cumprimento das metas de incorporação
estabelecida no artigo 11º, há que ter em conta ainda a obrigação que consta do artigo 28º
nº1, de âmbito mais restrito. Dita esta preceito que, sem prejuízo do disposto no artigo 11º,
os incorporadores ainda estão obrigados, até ao final do ano de 2014, a incorporar um valor
mínimo de 6,75% em volume de biodiesel no gasóleo utilizado no sector dos transportes, o
que vai claramente de encontro às metas estabelecidas pela União Europeia. Note-se que o
incumprimento desta obrigação, assim como o incumprimento da de contribuição para o
alcançar das metas estabelecidas, é cominado com o pagamento de uma compensação,
nos termos do artigo 24º nº1.
Este diploma estabelece ainda um regime contra-ordenacional, pelo que, nos termos do
artigo 25º nº1 a), o incumprimento da obrigação de contribuição, tal como estabelecida no
artigo 11º nº1, constitui contra-ordenação grave, punível com coima de 500 a 3740 euros,
no caso de pessoas singulares, ou de 2500 a 44891 euros, quando se trate de pessoas
coletivas. Nos termos do artigo 27º nº2, o produto destas coimas reverte a favor do Estado
(60%), da entidade instrutora (20%) e da entidade que aplica a coima (20%). Nos termos do
nº2 do artigo 25º, podem ainda ser aplicadas sanções acessórias, dependendo da
gravidade da infração e da culpa do infrator.
Por fim, cumpre mencionar o regime dos Pequenos Produtores Dedicados, previsto no
artigo 19º. Nos termos do nº1 deste preceito, são considerados pequenos produtores
dedicados (PPD) os reconhecidos nos termos do artigo 7º do DL nº 62/2006 (alterado pelo
DL nº 89/2008 e pelo DL nº 206/2008), com um aproveitamento de resíduos igual ou
superior a 60%, em massa, da matéria-prima consumida na instalação para a produção de
biocombustíveis, na instalação para projetos de aproveitamento de resíduos ou detritos.
Estes PPD têm direito a um benefício fiscal, nomeadamente isenção do Imposto sobre os
Produtos Petrolíferos, nos termos do Código dos Impostos Especiais de Consumo (nº2 do
artigo 19º). Em suma, trata-se aqui de um incentivo à produção e utilização de
biocombustíveis, em especial pelos pequenos produtores que adotam métodos eficientes.
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No fundo, encontramos aqui uma verdadeira manifestação do princípio do poluidor-pagador,
nomeadamente na sua vertente de incentivo e compensação por boas práticas ambientais.
De um modo geral, são estas as grandes linhas do regime jurídico em matéria de produção
e comercialização de biocombustíveis em Portugal. Por fim, cumpre assinalar que este
diploma foi promulgado no seguimento da Resolução do Conselho de Ministros nº 29/2010,
de 15 de Abril, que aprovou a Estratégia Nacional para a Energia 2020 (ENE 2020). A ENE
prevê, no âmbito da aposta nas energias renováveis, que os biocombustíveis continuarão a
ser um contributo para que Portugal cumpra as suas metas relativamente ao uso de
energias renováveis no consumo final do sector dos transportes. Posto isto, comprometeu-
se o Governo, no âmbito da ENE, a definir critérios de sustentabilidade dos
biocombustíveis, a fomentar a utilização de recursos endógenos na produção desta fonte de
energia, a incrementar a ligação entre o fabrico de biocombustíveis e a agricultura nacional.
Concomitantemente, assumiu o Governo o objetivo de incorporar estes combustíveis nos
transportes terrestres, em substituição dos derivados do petróleo. Isto de modo a alcançar a
meta de 31% do consumo de energia em Portugal respeitar a energias de origem renovável,
meta esta que tem como fins últimos o reforço da segurança do abastecimento energético
no nosso país e, acima de tudo, o cumprimento dos compromissos assumidos no seio da
União Europeia, no âmbito do Protocolo de Quioto.
As Alternativas dentro da Alternativa – As Fontes de Energia Renováveis Existentes
As energias renováveis são aquelas que são obtidas a partir de fontes naturais,
regeneráveis e, por conseguinte, perenes. Opõem-se às energias não renováveis, que são
aquelas cujas fontes existem em quantidades limitadas na Natureza, extinguindo-se com a
sua utilização. Consideram-se fontes de energia não renováveis os combustíveis fósseis
(designadamente o carvão, o petróleo bruto e o gás natural) e o urânio, sendo que todas
elas apresentam reservas finitas, porquanto é necessário muito tempo para as repor
(milhares de anos). São comummente chamadas energias sujas, uma vez que a sua
utilização é causa direta de importantes danos para o meio ambiente e para a saúde
pública. Por oposição, as energias renováveis são consideradas energias limpas, dado o
muito menor impacto ambiental que a sua exploração e utilização implicam. Procedendo a
um levantamento das fontes renováveis existentes, podemos apontar as seguintes:
- Sol: a energia solar é praticamente inesgotável, podendo ser usada para a produção de
calor e eletricidade através de painéis solares e células fotovoltaicas. A principal vantagem
da utilização desta fonte energética é a da quase total ausência de poluição, sendo das
mais limpas. No entanto, a grande limitação daqueles dispositivos é o seu baixo rendimento,
a par dos elevados custos inerentes à sua produção (devido à pouca disponibilidade de
materiais semicondutores).
- Vento: a energia eólica é utilizada há anos através de moinhos de vento, podendo
igualmente ser canalizada pelas modernas turbinas eólicas. A energia cinética, resultante
do deslocamento das massas de ar, pode ser transformada em energia mecânica ou
elétrica. Trata-se de uma fonte muito pouco poluente. Não obstante, uma grande restrição
ao seu maior aproveitamento é a questão do espaço físico, uma vez que as turbinas são
instalações mecânicas de grande porte e que ocupam áreas extensas.
14
- Água: a energia hídrica é aquela que usa a força cinética das águas de um rio ou do mar,
convertendo-a em electricidade, através da rotação de uma turbina hidráulica. De facto,
trata-se de uma fonte pouco poluente. No entanto, não é de ignorar o impacto ambiental
que lhe está subjacente, designadamente ao nível dos ecossistemas, que são muitas vezes
afetados com a construção de centrais hidroelétricas. Aliás, há hoje uma preferência pela
instalação de pequenas centrais hidroelétricas, as chamadas mini-hídricas, precisamente
pelo seu menor impacto ambiental.
- Biomassa: a biomassa é a matéria orgânica, de origem vegetal ou animal, que pode ser
utilizada como fonte de energia. Existem vários tipos de biomassa que podem ser utilizados
neste processo, designadamente a fracção biodegradável de resíduos florestais, de
resíduos agrícolas e das indústrias agroalimentares, de excrementos de animais e águas de
lavagem provenientes das explorações pecuárias, de resíduos sólidos urbanos, de esgotos
urbanos e de culturas energéticas. Posto isto, a bioenergia é a energia obtida a partir
daquela matéria, da qual é exemplo o biocombustível.
Os biocombustíveis são, como o nome indica, os combustíveis, líquidos ou gasosos,
produzidos a partir da biomassa, existindo vários tipos. De facto, são considerados
biocombustíveis pelo menos dez tipos de produtos, designadamente:
- O Bioetanol, que é o etanol produzido a partir de biomassa e/ou da fracção biodegradável
de resíduos, para utilização como biocombustível;
- O Biodiesel, que o éster metílico e/ou etílico, produzido a partir de óleos vegetais ou
animais, com qualidade de combustível para motores diesel, para utilização como
biocombustível;
- O Biogás, que é o gás combustível produzido a partir da biomassa e/ou da fracção
biodegradável dos resíduos, podendo ser purificado até à qualidade do gás natural, para
utilização como biocombustível ou gás de madeira;
- O Biometanol, que é o metanol produzido a partir da biomassa, para utilização como
biocombustível;
- O Bio-ETBE (bioeteretil-terc-butílico), que é o combustível produzido com base no
bioetanol, sendo a percentagem em volume de bio-ETBE considerada como biocombustível
igual a 47%;
- O Bio-MTBE (bioetermetil-terc-butílico), que é o combustível produzido com base no
biometanol, sendo a percentagem em volume de bio-MTBE considerada como
biocombustível de 36%;
- Os Biocombustíveis Sintéticos, que são os hidrocarbonetos sintéticos ou misturas de
hidrocarbonetos sintéticos produzidos a partir da biomassa;
- O Bio-Hidrogénio, que é o hidrogénio produzido a partir de biomassa e/ou da fracção
biodegradável de resíduos, para utilização como biocombustível;
- O Oléo Vegeral Puro produzido a partir de plantas oleaginosas, que é o óleo produzido por
pressão, extração ou processos comparáveis, a partir de plantas oleaginosas, em bruto ou
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refinado, mas quimicamente inalterado, quando a sua utilização for compatível com o tipo
de motores e os respetivos requisitos relativos a emissões.
Potencialidades e Problemas da Utilização de Biocombustíveis
As alterações climáticas, o aumento do preço do petróleo e a segurança do abastecimento
energético conduziram, como supra se referiu, ao crescente interesse sobre o potencial de
utilização dos biocombustíveis como substitutos dos carburantes derivados do petróleo. Na
verdade, as vantagens inerentes a esta fonte de energia são várias, nomeadamente no
plano ambiental, económico e energético. Em primeiro lugar, trata-se de uma fonte mais
limpa que o petróleo, na medida em que o seu consumo implica a emissão de muito menos
gases com efeito de estufa para a atmosfera. Isto aliado ao facto de a sua produção
implicar, quando se trate de biocombustíveis provenientes da biomassa vegetal, o cultivo de
plantas que acabam por absorver o gás carbónico do ar, compensando aquele que será
emitido. Concomitantemente, a produção de biocombustíveis a partir da biomassa animal e
vegetal é uma forma eficiente de aproveitamento dos mais variados tipos de resíduos. Ao
nível da suficiência e segurança energética, a opção pelos biocombustíveis assume a maior
valia, uma vez que se trata de energia produzida a partir de fontes renováveis. O petróleo,
existindo em reservas no subsolo e nos fundos marítimos, torna-se cada vez mais raro e,
por conseguinte, mais caro. Pelo contrário, a produção de biocombustíveis não levanta
semelhantes problemas, podendo mesmo a sua produção ser controlada (por exemplo,
cultivando-se mais plantas oleaginosas em situações de maior procura, ou menos em casos
de maior oferta). Do prisma económico, os biocombustíveis têm potencial competitivo. Em
especial, o biodiesel pode vir a substituir o tradicional diesel, que hoje é utilizado por grande
fracção do sector dos transportes. Concomitantemente, e em especial quanto aos
combustíveis provenientes da biomassa vegetal, a sua produção em larga escala pode
gerar um incremento de postos de trabalho no campo (necessidade de mão de obra para o
cultivo de matérias primas), ajudando ao desenvolvimento das zonas rurais. Por fim, sempre
se pode dizer que o uso comercial dos biocombustíveis impulsiona a investigação e
desenvolvimento científico-tecnológico.
No entanto, não se pode ignorar a componente ecologicamente adversa desta forma de
produção de energia. Na verdade, e como salienta CARLA AMADO GOMES, parece haver
aqui um paradoxo: então as energias renováveis podem constituir alternativas nocivas para
o ambiente? A resposta impõe-se, obviamente, positiva, uma vez que no estádio
civilizacional em que vivemos é impensável conceber formas de atuação humana que
deixem impoluto e intocado o meio natural. Relembrando o ensinamento de VASCO
PEREIRA DA SILVA, seja em que domínio for, (…) o risco zero em matéria ambiental não
existe, o que significa que os sistemas associados à utilização de qualquer fonte de energia
têm sempre algum impacto no ambiente. Ora, constituindo bens ambientais, embora
regeneráveis, os recursos renováveis não deixam de estar sujeitos ao princípio do
aproveitamento racional. Tal é reconhecido pela comunidade internacional, nomeadamente
na Declaração de Estocolmo (princípio 3). Este princípio não deve, aliás, ser considerado
apenas da perspetiva do recurso em si, mas também da sua inserção no ecossistema e da
interdependência da sua utilização com a integridade de outros bens, ambientais e de outra
natureza. Por outras palavras, há que cuidar que da utilização de energias renováveis não
resultem danos graves, nem para o bem ambiental que é utilizado, nem para outros bens.
16
Aqui está em causa, não só o princípio do aproveitamento racional dos recursos, mas
também o da prevenção lato sensu, uma vez que se impõe a avaliação, com base nos
conhecimentos científicos disponíveis, de quais as implicações da adopção de novas
técnicas de aproveitamento de energia a partir de fontes renováveis, de modo a evitar ou
minimizar os impactos negativos sobre outros bens, naturais e humanos.
No que aos biocombustíveis respeita, são vários os impactos ambientais que sua a
produção em larga escala (que costuma operar através da plantação de culturas
energéticas, geradoras de biomassa vegetal) pode suscitar, nomeadamente a grande
pressão sobre o espaço e os recursos hídricos, a erosão do solo, a perda de nutrientes do
solo, a destruição de ecossistemas e, nalgumas situações, a emissão de dióxido de carbono
para a atmosfera. Como tal, são várias as preocupações aqui presentes, em especial
quanto aos dois últimos pontos. No que toca à preservação dos ecossistemas e
biodiversidade, são de salientar as preocupações europeias, expressas no artigo 17º nº3 da
Directiva nº 28/2009, que estabelece algumas proibições de proveniência de matérias-
primas, quando impliquem a transformação de terrenos ricos em biodiversidade. Como tal, é
vedada, para produção de espécies vegetais afetas ao fabrico de biocombustíveis, o cultivo
em florestas primárias e em terrenos arborizados, em zonas designadas para protecção de
espécies ou ecossistemas raros, ameaçados ou em risco de extinção (a menos que se
prove que a produção das referidas matérias-primas não afetou os referidos fins de
protecção da natureza) e em terrenos de pastagem ricos em biodiversidade. O presente
regime foi integralmente transposto para a ordem jurídica portuguesa pelos artigos 3º nº1 c)
e 7º do DL nº 117/2010. Quanto à questão das emissões de dióxido de carbono para a
atmosfera, tem aqui interesse citar MAE-WAN-HO, professora da Universidade de Hong
Kong e especialista em genética e bioquímica: Os biocombustíveis têm sido
propagandeados e considerados erroneamente como neutros em dióxido de carbono, como
se não contribuíssem para o efeito de estufa na atmosfera (…). Ignoram-se assim os custos
das emissões de CO2 e de energia de fertilizantes e pesticidas utilizados nas colheitas, dos
utensílios agrícolas, do processamento e refinação, do transporte e da infra-estrutura para
distribuição. Continuando, explica que não foi levada em consideração a enorme libertação
de carbono orgânico provocada pela cultura intensiva de cana de açúcar, que substitui
florestas e terras de pastagem que, se fossem regeneradas, poupariam mais de sete
toneladas de dióxido de carbono por hectare por ano do que o bioetanol poupa. Posto isto,
temos que o cultivo de matérias-primas para a produção de biocombustíveis não deve ser
levado a cabo em terrenos ricos em carbono, como tal se considerando as antigas zonas
húmidas, as antigas zonas continuamente arborizadas e os terrenos que, com extensão
superior a um hectare, antes tinham árvores de mais de 5 metros de altura e um coberto
florestal entre 10% e 30%. Tal é determinado pela Directiva nº 28/2009, que no seu artigo
17º nºs 4 e 5, pretende evitar que culturas que visam reduzir emissões provoquem, pela sua
implantação em terrenos ricos em carbono, a libertação deste para a atmosfera e,
consequentemente, um contra-efeito. O mesmo regime consta dos artigos 3º nº1 c) e 8º do
DL nº 117/2010, o qual procedeu à transposição da directiva.
Concomitantemente, deparamo-nos com impactos sociais e económicos, dos quais o mais
grave é o aumento do preço das matérias-primas para a produção de biocombustíveis, que
geralmente são também recursos alimentares (como o milho, a soja, a mandioca, o
amendoim, o coco, entre outros). Quanto a este último ponto, está mesmo em causa a
dignidade da pessoa humana, sendo que, em 2008, JEAN ZIEGLER (relator especial da
17
ONU para o direito à alimentação) condenou veementemente o incentivo à produção de
biocombustíveis, por esta estar a provocar reflexamente um aumento inusitado do preço
dos cereais para alimentação, bem como a suprimir terras aráveis à produção agrícola para
alimentação humana. Falou mesmo num crime contra a humanidade, tendo elaborado um
relatório em que pediu a suspensão da produção de etanol durante 5 anos, prazo que os
governos dos vários Estados deveriam usar para avaliar os impactos sociais, ambientais e a
ao nível dos direitos humanos que aquela produção em massa implicaria. Estas
preocupações foram acolhidas pelos vários ordenamentos jurídicos. A nível comunitário,
encontramos na Directiva nº 28/2009 o artigo 17º nº7, que estabelece um critério de
sustentabilidade. Com efeito, o preceito dispõe sobre a necessária monitorização do
impacto da procura destas matérias-primas nos planos social e económico, quer da União
Europeia, quer dos países com quem convenciona o fornecimento, devendo ser avançadas
medidas corretivas se existirem elementos que atestem que a produção de biocombustíveis
tem um impacto considerável sobre o preço dos géneros alimentícios. A nível nacional,
idêntico critério de sustentabilidade se encontra consagrado nos artigos 3º nº1 b) e 6º do DL
nº 117/2010.
Posto isto, verificamos que a utilização de biocombustíveis como alternativa aos
combustíveis fósseis (o que implica a sua produção em massa), tal como é levada a cabo
atualmente, não é isenta de problemas. Como tal, urge procurar novas soluções,
nomeadamente soluções de energias mais limpas, mais eficientes e consentâneas aos
direitos fundamentais.
A Utilização de Algas como Alternativa para a Produção de Biocombustíveis
A utilização de algas como matéria-prima para a produção de biocombustíveis tem sido,
cada vez mais, apontada como uma possível alternativa no processo de substituição dos
combustíveis fósseis. As razões para tal vão desde características fisiológicas e
bioquímicas favoráveis das espécies de algas a serem utilizadas, a uma significativa menor
necessidade de áreas disponíveis para o cultivo quando comparadas com a biomassa
terrestre.
Na verdade, é de assinalar o trabalho da Faculdade de Ciências da Universidade de
Coimbra quanto a esta matéria, que, tirando partido da sua algoteca (que constitui a maior
coleção de algas do mundo, com 4000 estirpes de algas de água doce, mais de 300
géneros e 1000 espécies isoladas de uma vasta gama de habitats), entrou em 2009 na
corrida global para a descoberta da estirpe com maior capacidade para a produção de
biodiesel. Portugal seguiu a tendência dos EUA e do Japão, que encetaram as
investigações sobre as potencialidades das algas como fonte de energia alternativa na
década de 70 do século passado.
A biomassa algal tem variadas aplicações, sendo o biodiesel derivado das algas aquela que
tem recebido maior atenção, dada a sua elevada potencialidade para substituir a
dependência dos combustíveis fósseis, principalmente no domínio dos transportes. No
entanto, diversas formas alternativas de energia podem ser obtidas a partir desta matéria-
prima, nomeadamente o etanol, o hidrogénio, o metano, a biomassa para combustão e
gaseificação e outras variantes de hidrocarbonetos combustíveis.
18
O etanol pode ser obtido a partir das algas através da conversão do amido e da celulose.
Uma vez que as algas são ricas em polissacáridos e possuem paredes celulares finas, são
a fonte ideal para a produção de bioetanol de segunda geração. A problemática atual
prende-se apenas com o facto de existirem diversos produtos de elevado valor que podem
adicionalmente ser obtidos a partir desta matéria-prima, como o carrageno e o agar, pelo
que a obtenção de um produto de baixo valor como o etanol não é prioritário.
Alternativamente, o bioetanol poderá também ser produzido a partir de algas após extração
do seu conteúdo oleaginoso (note-se que as algas são ricas em hidratos de carbono,
proteínas e lípidos), pelo que depois de extraídos aqueles lípidos para a produção de
biodiesel é possível aproveitar o remanescente. Ora, os hidratos de carbono existentes no
bolo vegetal sobrante podem ser utilizados como substrato de fermentação para a produção
de etanol, o que permite uma otimização da biomassa potencialmente energética das algas.
Adicionalmente, o dióxido de carbono resultante do processo de fermentação pode, por sua
vez, alimentar a produção de nova biomassa, o que permite o funcionamento de um sistema
fechado, pelo que a produção combinada de biodiesel e bioetanol se apresenta como uma
alternativa com elevado potencial de eficiência.
A partir das algas é também possível produzir hidrogénio, a chamada energia do futuro,
uma vez que, para além de renovável, não contribui para o efeito de estufa, liberta grandes
quantidades de energia por unidade de peso na combustão e é facilmente convertida em
energia eléctrica. Existem três métodos de produção de hidrogénio a partir das algas,
nomeadamente processos bioquímicos, gaseificação e reformação a vapor de metano.
Por sua vez, o metano é outra das formas de energia suscetíveis de produção a partir de
algas. O metano é importante para a geração de energia elétrica em turbinas a gás ou
caldeiras a vapor, sendo que a sua queima gera menos dióxido de carbono por unidade de
calor libertado e produz mais calor por unidade de massa do que outros hidrocarbonetos.
Na verdade, o metano é, em muitas cidades, canalizado para residências com vista ao
aquecimento doméstico e para cozinhar, contexto no qual é geralmente conhecido como
gás natural, sendo também utilizado, na forma de gás natural comprimido, como
combustível para veículos. Teoricamente, este gás pode ser produzido a partir de qualquer
um dos componentes das algas (hidratos de carbono, proteínas ou lípidos), apresentando
grandes virtualidades.
Por fim, cumpre mencionar o biodiesel, aplicação da biomassa algal com maior potencial
económico e energético. O biodiesel refere-se a qualquer biocombustível equivalente ao
diesel obtido a partir de materiais biológicos renováveis (tais como óleos vegetais ou
gorduras animais), consistindo em hidrocarbonetos saturados de cadeia longa. Este
combustível pode ser utilizado na sua forma pura ou pode ser misturado com diesel (em
qualquer concentração).
Culturas como a soja, o milho, a soja, o amendoim, o coco ou a mandioca são consideradas
matérias-primas de primeira geração, visto terem sido as primeiras culturas utilizadas na
produção de biodiesel. Como supra se referiu, a maior parte destas matérias-primas de
primeira geração podem igualmente ser utilizadas como culturas alimentares. No entanto,
uma vez que este tipo de culturas, quando utilizadas na produção de biodiesel, estão
associadas a um rendimento baixo, muito dificilmente atingirão uma produtividade suficiente
sem que haja uma alocação exclusiva de grandes extensões de terra arável para as
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culturas destinadas à produção de combustíveis. Por sua vez, as matérias-primas de origem
biológica mas não alimentar são utilizadas na produção de biodiesel de segunda geração,
sendo que as suas maiores virtualidades são a eliminação da concorrência face aos
recursos alimentares, a redução da utilização de terra cultivável e a possibilidade do
reaproveitamento dos subprodutos obtidos noutros processos químicos ou para a geração
de calor e energia. Contudo, tal como no caso dos biocombustíveis de primeira geração,
estas matérias-primas oferecem modestos resultados relativamente ao uso de combustíveis
fósseis. Posto isto, a biomassa proveniente das algas, constituindo a terceira geração de
biocombustíveis, apresenta-se, teoricamente, como a única fonte energética que pode vir a
substituir a dependência do petróleo no futuro de uma forma limpa, económica e
socialmente viável.
Uma das principais razões pelas quais as algas são cada vez mais exploradas como
matéria-prima, particularmente para a produção de biodiesel, é o seu elevado grau de
rendimento. É que a produção de combustível a partir das algas gera trinta vezes mais
energia por hectare do que as culturas terrestres. Em especial, as microalgas representam
os organismos unicelulares fotossintéticos com crescimento mais acelerado, podendo
completar um ciclo de crescimento em poucos dias. Do anexo 1 consta uma tabela que
procede à comparação entre fontes de biodiesel, quer quanto à área cultivável necessária,
quer quanto à produção de óleo por cada uma delas.
Anexo I – Comparação entre fontes de Biodiesel
Ora, dos dados constantes da tabela resulta clara a diferença entre as algas e as matérias-
primas de primeira geração. Estas ocupam muito mais área cultivável produzindo muito
menos óleo. Comparando o milho com as microalgas, temos que enquanto a primeira
matéria-prima consegue atingir uma produção de 172 litros de óleo por hectare por ano, a
segunda consegue render uma produção de 136900 litros de óleo por hectare no mesmo
período. Isto uma vez que algumas espécies de algas (principalmente microalgas) têm um
alto teor de óleo. Como é possível constatar da análise da tabela do anexo 2, algumas
espécies de microalgas podem ter até 80% de óleo por peso seco, o que permite produzir
até 137000 litros de óleo por hectare por ano, em condições ótimas.
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Anexo II – Conteúdo Oleaginoso de Algumas Espécies de Microalgas
Posto isto, temos que embora no que diz ao teor lipídico (percentagem de lípidos
relativamente ao peso seco) as algas sejam equivalentes à biomassa de outras culturas
oleaginosas, a grande vantagem da sua utilização reside efectivamente na elevada
produtividade, sendo que o aumento do teor de óleo por unidade de área obtido a partir das
algas constitui um dos temas mais pesquisados.
Tipos de Algas com Potencial Energético e Questões Relativas à sua Obtenção
O cultivo tem sido considerado a forma mais viável de obtenção de biomassa algal para a
produção de biocombustíveis. No que respeita aos métodos de cultivo empregados, estes
dependem principalmente dos tipos de algas utilizados.
De um modo geral, pode dizer-se que são macroalgas aquelas que são visíveis a olho nu,
podendo ser unicelulares ou pluricelulares. Nos últimos anos a quantidade de macroalgas
obtidas a partir dos stocks naturais tem vindo a diminuir, tendência que tem sido
acompanhada por um aumento da produção de macroalgas através do seu cultivo. Entre
1997 e 2006, o total destas algas obtido por meio do cultivo dobrou, atingindo os 15 milhões
de toneladas em peso fresco em 2006. Na verdade, o cultivo de macroalgas não é recente,
sendo que os países asiáticos já o vêm fazendo há vários anos. Os métodos de cultura
comerciais podem variar conforme a espécie utilizada, sendo que, em geral, as algas são
presas a redes, cordas ou linhas de nylon no próprio ambiente marinho, para que aí
beneficiem dos nutrientes e luz solar disponíveis e cresçam naturalmente. Vários tipos de
sistemas de cultivo em larga escala foram projectados e testados para utilização em mar
aberto, durante um programa de utilização de biomassa marinha para produção de
biocombustíveis, desenvolvido pelo governo americano nas décadas de 70 e 80. No
21
entanto, problemas de engenharia dos sistemas de cultivo foram considerados como um
dos obstáculos à produção, sendo, portanto, encarados como um dos factores a ser melhor
desenvolvido. A este propósito, é de salientar um projeto recentemente realizado na
Holanda, em que se investigou a possibilidade de se utilizar a infraestrutura de parques
eólicos marinhos como suporte para o cultivo. Bons resultados foram obtidos nesse estudo,
principalmente com a utilização de uma estrutura em forma de anel como suporte para as
algas. Porém, ainda não se chegou a conclusões quanto ao potencial de retorno económico
desse método de cultivo, sendo necessários mais dados e mais experiência.
Quanto à seleção do combustível a ser produzido a partir das macroalgas e o processo
apropriado para tal, são estes largamente determinados pela composição química daquelas.
Porém, tal composição química varia conforme a espécie de alga, a localização da cultura,
a salinidade da água e a estação do ano. Em geral, as macroalgas possuem baixo teor de
lípidos, pelo que a produção de biodiesel com base nelas não é apropriada. Por outro lado,
a quantidade de matéria orgânica total, açúcares e água é elevada, o que faz com que os
principais processos considerados para o aproveitamento de macroalgas sejam a digestão
anaeróbica, para produção de biogás, ou a fermentação alcoólica, para produção de etanol.
Outro tipo de algas com grande potencial energético é o das microalgas, organismos
unicelulares fotossintéticos com crescimento mais acelerado que as macroalgas. A
produção em larga escala de biomassa microalgal geralmente segue um método de
produção em sistema fechado, nomeadamente em fotobiorreatores, nos quais o meio de
cultivo é constantemente enriquecido com nutrientes, a um ritmo constante, enquanto a
mesma quantidade de algas é continuamente retirada do sistema. O enriquecimento do
meio de cultivo cessa durante a noite, continuando porém a circulação de água, de modo a
evitar o assentar da biomassa.
Os principais biocombustíveis considerados para produção a partir de microalgas são o
biodiesel, o etanol, o biogás e o hidrogénio, sendo que os processos utilizados e, por
conseguinte, os produtos obtidos, dependem da biologia e da composição das espécies de
microalgas. Como sumariamente se referiu supra, os óleos encontrados nas microalgas
possuem características físico-químicas similares às de outros óleos vegetais, o que faz
com que elas possam ser consideradas como potencial matéria-prima para a produção de
biodiesel. Ora, muitas espécies de microalgas são ricas em triglicerídeos, que consistem
basicamente no óleo utilizado para o fabrico de biodiesel. No que toca à produtividade das
microalgas, temos que a produção de óleo depende das concentrações de lípidos na
biomassa e da taxa de crescimento destas algas, sendo que é possível estimular a
concentração daqueles lípidos nas microalgas por meio de determinadas técnicas de
cultivo.
Biomassa Algal versus Biomassa Terrestre – As Vantagens e as Desvantagens da
Utilização de Algas para a Produção de Biocombustíveis
Segundo vários estudos realizados sobre a matéria, as características geralmente
desejadas para a produção de biomassa terrestre com fins energéticos são,
nomeadamente, a alta produtividade (alta produção de matéria seca por hectare), o baixo
consumo energético, o baixo custo, a sua composição com o mínimo de contaminantes, a
reduzida necessidade de nutrientes e o mínimo de área cultivável ocupada. No entanto,
22
afigura-se difícil, senão impossível, reunir todas estas características, sendo que a produção
destas matérias-primas está ainda dependente do clima local, das condições da terra, dos
recursos hídricos existentes (uma vez que estas culturas implicam um grande consumo de
água), da resistência a pragas e da necessidade de fertilizantes. Concomitantemente,
cumpre relembrar os já referidos impactos ambientais inerentes a estes projectos de
produção de energia em larga escala, a par de impactos económicos e sociais, sendo de
destacar o aumento dos géneros alimentícios.
Ora, considerando os factores acabados de mencionar, a utilização de algas para a
produção de biocombustíveis apresenta muitos requisitos desejados. É verdade que uma
exceção passa pelos custos de produção, que em geral estão ainda acima do desejado, o
que se deve essencialmente ao estágio inicial da pesquisa e desenvolvimento para a
produção comercial de larga escala. Não obstante, é de crer que o desenvolvimento de
novas tecnologias e o avanço dos métodos de produção possivelmente levarão à redução
dos custos dos produtos finais. Além do mais, os preços-alvo levam também em
consideração o preço do petróleo, o que significa que o aumento do preço deste
combustível fóssil, nos próximos anos e décadas, fará com que os biocombustíveis ganhem
competitividade nos mercados.
Os atributos positivos da utilização de algas como matéria-prima para a produção de
biocombustíveis incluem a sua baixa necessidade de espaço, a possibilidade do seu cultivo
em água salgada ou doce (portanto, em condições normalmente adversas para plantas
terrestres), a possibilidade de utilização de águas residuais para o seu cultivo (uma vez que
se tratam de águas ricas em nutrientes), as suas elevadas taxas de reprodução e
crescimento, a ausência de competição face aos recursos alimentares e, por fim, a
possibilidade do seu cultivo associado a outros co-produtos. Ora, como organismos
aquáticos, as algas não necessitam de terras aráveis para cultivo, não competindo com
outros produtos agrícolas (nomeadamente alimentícios) por espaço. Na verdade, as
instalações para cultivo de algas podem ser construídas em áreas marginais, de baixo valor,
ou no próprio ambiente marinho, no caso das macroalgas. Acresce que várias espécies
algais podem ser cultivadas em água salgada, portanto sem a necessidade de utilização e
competição por água doce, cada vez mais escassa. Tal permite, também, a associação do
seu cultivo à criação de peixes, moluscos e camarão, facto que possibilita a filtragem de
grande quantidade de nutrientes normalmente libertados por estas aquaculturas. Esta
combinação proporciona vantagens, não só para o crescimento das algas (que beneficiam
dos nutrientes), como para o ecossistema em causa (tendo em conta os impactos negativos
que o excesso daqueles nutrientes causa). Por fim, é de salientar as vantagens inerentes à
possibilidade de utilização de águas residuais no cultivo de algas, o que acopla a
necessidade algal por nutrientes com o tratamento terciário desses resíduos. Através da
remoção de nutrientes, como o nitrogénio e o fósforo, da água pelas algas, é mitigado o
potencial de eutrofização (fenómeno marcado por uma acumulação excessiva de nutrientes
num dado ecossistema, que leva a um crescimento massivo de organismos, os quais,
aquando a sua morte e decomposição, provocam um grande consumo de oxigénio e, por
conseguinte, a morte da fauna e a deterioração da qualidade da massa de água) dos
ecossistemas recetores. Tudo isto a par da grande vantagem apontada, a que já aludimos
supra, da eficiência energética destas matérias-primas.
23
A Questão da Viabilidade Económica
Muita controvérsia existe quanto aos custos de produção de biomassa algal, sendo este o
principal fator apontado como desvantagem do recurso a esta fonte de energia. Contudo,
tem-se assumido, em geral, que os custos de produção devem diminuir, de forma a tornar a
utilização de biomassa algal para a produção de biocombustíveis economicamente
competitiva. Na verdade, factores como o custo da mão-de-obra (altamente especializada),
as barreiras normativas, as técnicas avançadas de cultivo e a melhoria da produtividade são
frequentemente apontados como determinantes do custo de produção de algas, sendo que
estes factores ocasionam grandes diferenças nos custos de produção entre países
europeus e asiáticos. Por exemplo, o preço estimado da biomassa seca produzida no
continente asiático é de 233 dólares por tonelada, enquanto o da mesma quantidade de
biomassa obtida por exploração dos recursos naturais da Irlanda é de 471 dólares. No
entanto, há que ter em conta que estes valores são baseados no atual contexto de
produção de algas nestes países, sendo que no continente europeu a produção ainda é em
escala moderada. Posto isto, alguns estudos na matéria têm apontado, como solução para
a redução dos custos, não só a passagem para uma produção em massa destas matérias-
primas, como a utilização e comercialização de subprodutos deste processo. Ora, se a
biomassa utilizada para a produção de biocombustíveis for um co-produto de tratamento de
efluentes ou da extração de produtos de alto valor, como o betacaroteno e a astaxantina,
estes processos podem tornar-se comercialmente viáveis. Concomitantemente, tem sido
chamada a atenção para a necessidade de incremento de estímulos a estas culturas por
parte dos Estados, uma vez que o investimento necessário para a instalação de
fotobiorreatores é muito mais elevado que o necessário para o início de novas áreas de
cultivo para a produção de biomassa terrestre.
No entanto, julga-se que o que irá determinar o grande êxito dos biocombustíveis
produzidos a partir de algas será a superação dos atuais obstáculos tecnológicos e
comerciais, sendo que os altos preços do petróleo atualmente, acompanhados das
projeções de preços futuros, juntamente com os avanços na área da bioquímica e da
tecnologia, têm estimulado novas pesquisas e investimentos nesta matéria.
Porque é que Portugal Deveria Investir na Produção de Biocombustíveis a partir das
Algas?
Face ao exposto até agora, considero que o investimento na produção de biocombustíveis a
partir das algas poderia trazer grandes vantagens para Portugal.
À parte das vantagens, já arroladas supra, inerentes à utilização de energias renováveis e,
em especial, à utilização dos biocombustíveis como substitutos dos combustíveis fósseis,
nomeadamente no que respeita à redução das emissões de gases com efeito de estufa, à
redução da dependência energética e ao cumprimento dos compromissos internacionais
assumidos pelo nosso país em matéria ambiental, é possível apontar vantagens adicionais,
relacionadas com a utilização desta fonte de energia em concreto. Como foi dito, a
utilização de algas para a produção de biocombustíveis apresenta muitas virtualidades.
Destacam-se a reduzida necessidade de espaço para o cultivo das matérias-primas (algas),
a possibilidade do seu cultivo em água salgada ou doce (portanto, em condições
24
normalmente adversas para plantas terrestres), a possibilidade de utilização de águas
residuais para o seu cultivo (uma vez que se tratam de águas ricas em nutrientes), as suas
elevadas taxas de reprodução e crescimento, a ausência de competição face aos recursos
alimentares, a possibilidade do seu cultivo associado a outros co-produtos e, acima de tudo,
a sua grande eficiência energética.
Na verdade, quando ponderamos o investimento na produção de biocombustíveis a partir
das algas por um país como Portugal, há que ter em conta um fator determinante, o fator
geográfico. Portugal dispõe de uma enorme faixa costeira, quer a oeste, quer a sul
(extensão aproximada de 1853 quilómetros). Acresce que o nosso país dispõe da maior
Zona Económica Exclusiva da União Europeia. Esta inclui também a área circundante das
regiões autónomas dos Açores e da Madeira, totalizando uma superfície que ronda os
1700000 quilómetros quadrados, uma área que equivale a dezoito vezes a área total do
país. Nos termos da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar de 10 de
Dezembro de 1982 (Convenção de Montego Bay), ratificada por Portugal em 1997, a zona
económica exclusiva é uma zona situada além do mar territorial e a este adjacente, sujeita
ao regime jurídico específico (…) (artigo 55º). Posto isto, e segundo o artigo 56º nº1 a), na
ZEE, o Estado costeiro tem direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento,
conservação e gestão dos recursos naturais, vivos e não vivos, das águas sobrejacentes ao
leito do mar, do leito do mar e seu subsolo e no que se refere a outras atividades com vista
à exploração e aproveitamento da zona para fins económicos, como produção de energia a
partir da água, das correntes e dos ventos. Ora, a vastidão do oceano apresenta-se como
uma verdadeira opção para solucionar problemas relacionados com a falta de áreas
terrestres apropriadas para a produção de energia renovável. Isto a par da abundância de
recursos naturais disponíveis naquelas zonas. Portugal, enquanto Estado costeiro, tem
todas as condições geográficas, naturais, climáticas e mesmo jurídicas para a produção em
massa de algas. Trata-se mesmo de uma vantagem competitiva face a outros Estados,
nomeadamente Estados continentais, os quais se encontram igualmente numa situação de
dependência energética mas não dispõem dos mesmos recursos que o nosso país e, como
tal, veem as suas possibilidades de produção de biocombustíveis limitadas. Limitam-se as
opções à produção de biocombustíveis com base em matérias-primas agrícolas,
suscitando-se os problemas já expostos, de falta de espaço para o cultivo (em países de
alta densidade demográfica) e de concorrência com produtos alimentares.
Posto isto, considero que o investimento na produção de biocombustíveis a partir destas
matérias-primas é uma grande oportunidade para Portugal, não só a nível ambiental, como
a nível económico. E também a nível social, se se pensar na criação de emprego inerente à
exploração desta fonte de energia renovável.
Obviamente que admito os custos, ainda elevados, subjacentes a este investimento. No
entanto, são custos cuja redução se prevê a médio e longo prazo, nomeadamente através
da produção em massa destas matérias-primas, da comercialização de subprodutos
resultantes do processo de produção destes biocombustíveis (como o betacaroteno e a
astaxantina) e dos avanços na área da bioquímica e da tecnologia, áreas determinantes
nesta matéria. A propósito deste último fator, é de salientar o trabalho desenvolvido pelas
universidades portuguesas, em especial pela Faculdade de Ciências da Universidade de
Coimbra, que, quanto a esta matéria, se tem destacado. Tirando partido da sua algoteca
(que constitui a maior coleção de algas do mundo, com 4000 estirpes de algas de água
25
doce, mais de 300 géneros e 1000 espécies isoladas de uma vasta gama de habitats), esta
faculdade entrou em 2009 na corrida global para a descoberta da estirpe com maior
capacidade para a produção de biodiesel. Assim, e em suma, considero que não devem os
custos iniciais de produção de biocombustíveis a partir das algas dissuadir Portugal. Isto a
par da expectativa de aumento dos preços do petróleo e seus derivados, que contribui para
um aumento da competitividade destes biocombustíveis.
Por fim, trata-se esta de uma boa alternativa para Portugal mesmo do ponto de vista dos
seus compromissos internacionais, na medida em que a alta eficiência energética das
algas, a par do carácter limpo desta fonte de energia, contribuem para o cumprimento dos
compromissos assumidos pelo Estado português, quer a nível europeu, quer a nível
mundial, de redução das emissões de gases com efeito de estufa e de incremento das
energias renováveis.
Concluindo, considero que a produção de energia a partir das algas, especialmente o
biodiesel, constitui uma grande oportunidade para Portugal, sendo de aplaudir as iniciativas
nos nossos investigadores, que procuram mais e cada vez melhores soluções nesta
matéria. O nosso país tem as condições naturais, geográficas, científicas e legais para
avançar, pelo que há que incentivar o investimento naquela que pode ser uma solução, ou
pelo menos uma alternativa mais viável, para Portugal.
26
Conclusão
As crescentes preocupações sobre a diminuição da disponibilidade dos combustíveis
fósseis, juntamente com os problemas ambientais resultantes da sua exploração, produção
e utilização, têm estimulado a investigação científica de forma a desenvolver e melhorar os
biocombustíveis produzidos a partir de recursos renováveis.
Como foi dito, a substituição dos combustíveis tradicionais por biocombustíveis acarreta não
só vantagens ambientais, mas também políticas, económicas e sociais. Contudo, a
utilização desta fonte de energia não é isenta de problemas e, nesta medida, a utilização de
algas como matéria-prima para a produção de biocombustíveis tem demonstrando um
grande potencial. Isto uma vez que a sua utilização permite contornar muitas das
desvantagens inerentes à produção de biocombustíveis de primeira geração.
As algas, em especial as microalgas, apresentam grande potencial para a produção
simultânea de biodiesel, bioetanol, hidrogénio e metano, assim como de produtos químicos
de elevado valor. Como foi dito, a utilização de algas para a produção de biocombustíveis
apresenta muitas virtualidades, destacando-se a reduzida necessidade de espaço para o
seu cultivo, a possibilidade do seu cultivo em água salgada ou doce (portanto, em
condições normalmente adversas para plantas terrestres), a possibilidade de utilização de
águas residuais para o seu cultivo (uma vez que se tratam de águas ricas em nutrientes), as
suas elevadas taxas de reprodução e crescimento, a ausência de competição face aos
recursos alimentares, a possibilidade do seu cultivo associado a outros co-produtos e,
acima de tudo, a sua grande eficiência energética.
Em suma, pode afirmar-se que os combustíveis obtidos a partir de algas representam
claramente uma alternativa promissora para o futuro. E uma excelente alternativa para
Portugal.
Eu considero que a produção de energia a partir das algas, especialmente o biodiesel,
constitui uma grande oportunidade para Portugal, sendo de aplaudir as iniciativas nos
nossos investigadores, que procuram mais e cada vez melhores soluções nesta matéria. O
nosso país tem as condições naturais, geográficas, científicas e legais para avançar, pelo
que há que incentivar o investimento naquela que pode ser uma solução, ou pelo menos
uma alternativa mais viável, para Portugal.
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