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DIFERENÇAS ENTRE OS SETORES PÚBLICO E PRIVADO DA SAÚDE NA
MACRORREGIÃO OESTE DO PARANÁ
Nathalia Vasconcelos Fracasso1
Neide Tiemi Murofuse2
Manoela de Carvalho3
RESUMO: Estudo descritivo de abordagem quantitativa que apresenta as diferenças entre o setor
privado e o setor público da saúde na Macrorregião Oeste do Paraná quanto à composição da força de
trabalho e tipos de vínculos de trabalho, o tipo de atividade desenvolvida pelos setores, e o porte
populacional dos municípios onde predominam os serviços públicos e privados. Foram utilizados os
dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) coletados em março de 2014. Dos
28.329 vínculos de trabalho identificados, 51,96% estão inseridos no setor público e 48,03% no setor
privado. Nos resultados, destaca-se que enquanto no setor público tem predominado os vínculos de
trabalho com estabelecimentos de saúde de atenção básica (43,61%), o setor privado tem a maioria dos
trabalhadores vinculados aos hospitais e serviços especializados e de apoio ao diagnóstico e à terapia
(97,67%). Também foi identificado o predomínio de profissionais de saúde com formação de nível
superior no setor privado, especialmente nos serviços hospitalares e especializados (67,13%),
enquanto no setor público foi mais frequente o cadastro de profissionais e trabalhadores sem formação
universitária (47,87%). Quanto aos vínculos, 60,41% dos trabalhadores vinculados ao setor público
são estatutários e, no setor privado, 38,04% vinculados como autônomos.
PALAVRAS-CHAVE: Sistemas de saúde; setor privado; setor público; vínculos empregatícios; força
de trabalho em saúde.
INTRODUÇÃO
A relação entre os serviços públicos e privados foi regulamentada pela Constituição de
1988 em seu art. 199, que prevê que a assistência à saúde deveria ser livre à iniciativa privada
e que as instituições privadas poderiam participar de forma complementar ao Sistema Único
de Saúde (SUS). Além disso, ressalta que a preferência seria das instituições filantrópicas e
sem fins lucrativos e que é proibida a destinação de recursos públicos para auxílios ou
subvenções às instituições privadas com fins lucrativos (BRASIL, 1988).
No entanto, o que se tem observado no Brasil, é que há um crescimento significativo
do setor privado nas últimas décadas, comparando-se ao setor público, o que vai contra os
princípios de que os serviços privados seriam um complemento ao SUS. Há uma tendência à
1 Discente do curso de enfermagem da UNIOESTE, e-mail: vasconcelosnathalia@hotmail.com
2 Doutora em enfermagem fundamental e docente aposentada da UNIOESTE.
3 Doutora em Saúde Coletiva e docente adjunta do curso de enfermagem da UNIOESTE.
2
privatização do sistema de saúde brasileiro, com baixo financiamento público destinado à
saúde, o que dificulta a universalização do acesso ao serviço de saúde (OCKÉ-REIS, 2012).
Segundo Santos (2012), o SUS, após sua formalização foi se constituindo em um
sistema “pobre para os pobres” e complementar para os clientes de planos e seguros privados.
Para superar esta tendência à privatização, Ocké-Reis (2012) propõe que o sistema brasileiro
de saúde deveria valorizar o profissional de saúde, regulamentando a formação de
especialistas e seu regime de trabalho no sistema público e privado. Ademais, ressalta a
importância de se potencializar os mecanismos de ressarcimento do SUS pelos serviços
prestados aos usuários de planos privados de saúde e de acompanhar a contabilidade e a
qualidade da cobertura da previdência social, do auxílio doença, do seguro de acidente de
trabalho (SAT) e dos institutos de seguridade estadual e municipal.
Enfim, o sistema privado só será verdadeiramente complementar, quando o Sistema
Único de Saúde tiver financiamento suficiente para tornar-se único e universal (OCKÉ-REIS,
2012).
OBJETIVOS
Identificar as diferenças entre os setores público e privado de saúde na Macrorregião
Oeste do Paraná em relação aos municípios onde estão localizados os estabelecimentos, o tipo
de atividade que desenvolvem e, a composição da força de trabalho quanto à formação
profissional e tipos de vínculos de trabalho.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa tem abordagem do tipo quantitativa e apresenta parte dos resultados da
pesquisa intitulada “Força de trabalho em saúde: estrutura, dinâmica e tendência na
Macrorregião Oeste do Paraná”, realizada pelo Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais
(GPPS) da Unioeste. A Macrorregião Oeste do Paraná é composta pela 8ª Regional de
Francisco Beltrão, 9ª Regional de Foz do Iguaçu, 10ª Regional de Cascavel e 20ª Regional de
Toledo. No momento de elaboração deste projeto de pesquisa a 7ª Regional de saúde de Pato
Branco ainda não se constituía parte integrante da Macrorregião Oeste e por este motivo não
constam os dados referentes a essa região.
3
As informações foram coletadas no banco do Cadastro Nacional de Estabelecimentos
de Saúde (CNES) em março de 2014 e, totalizaram 28.329 vínculos de trabalho no setor saúde
na região estudada. O CNES disponibiliza informações atuais sobre a infraestrutura de
funcionamento de estabelecimentos de saúde em todas as esferas administrativas do país
(DATASUS, 2014). A organização e tabulação dos dados coletados foram realizadas no
programa Microsoft Excel, a partir de descrição estatística simples. Os 28.329 registros
obtidos no CNES referem-se ao quantitativo total de vínculos empregatícios existentes em
todo o setor saúde desta Macrorregião. Foram identificadas as diferenças entre o setor público
e o setor privado a partir dos tipos de estabelecimentos de saúde cadastrados segundo o tipo
de serviço que ofertam e o nível de atenção (ambulatorial e hospitalar), o número de
habitantes dos municípios onde estão localizados e, a diferença na composição da força de
trabalho nos setores público e privado em relação à formação e o vínculo dos profissionais.
Em relação à formação, os profissionais foram classificados em: A - Profissionais de
saúde com formação de nível superior (terapeuta ocupacional; psicólogo; nutricionista;
médico; sanitarista; médico veterinário; fonoaudiólogo; fisioterapeuta; farmacêutico;
enfermeiro; dentista; biólogo; biomédico; assistente social; educador físico); B – Profissionais
e trabalhadores de saúde sem formação de nível superior (agente comunitário da saúde; agente
de saúde pública; atendente de enfermagem; atendente de farmácia; auxiliar de banco de
sangue; auxiliar de radiologia; auxiliar de saúde bucal; auxiliar de farmácia; auxiliar de
laboratório; auxiliar em patologia clínica; cuidador; instrumentador cirúrgico; perfusionista;
protético dentário; socorrista; técnico de enfermagem; técnico de laboratório; técnico de
ortopedia; técnico em biotecnologia; técnico em farmácia; técnico em patologia; técnico em
segurança do trabalho; técnico em radiologia; técnico em saúde bucal; visitador sanitário); C –
Outros trabalhadores de nível superior sem formação na área de saúde (administrador;
advogado; arquiteto; contador; engenheiro; físico; orientador educacional; pedagogo;
professor. Secretário executivo; tecnólogo em construção civil; analista de informática); e D –
Outros trabalhadores sem identificação do nível de formação (agente de segurança;
almoxarife; analista de RH; arquivista; assistente administrativo; auxiliar de contabilidade;
auxiliar de escritório; auxiliar de faturamento; auxiliar de lavanderia; auxiliar de manutenção;
auxiliar de pessoal; auxiliar de serviços; comprador; contínuo; copeiro; costureira; cozinheiro;
4
digitador; diretor; dirigente; empregado doméstico; encarregado de manutenção; faxineiro;
gerente; instrutor de cursos; lavadeiro; motorista; operador de marketing; piloto; porteiro;
profissional de nível médio; recepcionista; relações públicas; repositor de mercadorias;
supervisor).
Em relação ao tipo de serviço que é ofertado pelos estabelecimentos de saúde foi
elaborada uma classificação para facilitar o entendimento: a) Serviço hospitalar (SH): hospital
geral, hospital de especializações, centro de atenção hemoterapia/hematologia; b) Serviço de
atenção básica (SAB): centro de saúde/unidade básica, posto de saúde e farmácia; c) Serviço
intermediário (SI): centro de atenção psicossocial, clínica/centro de especialidades,
consultório isolado, pronto atendimento, unidade de apoio diagnose e terapia (SADT isolado),
laboratório central de saúde pública (LACEN), policlínica, unidade móvel de nível pré-
hospitalar na área de urgência, unidade móvel terrestre, hospital-dia; d) Serviço administrativo
(SADM): central de regulação dos serviços de saúde, central de regulação médica das
urgências, unidade de vigilância de saúde e secretarias de saúde.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa com seres humanos da
Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Cascavel com o parecer nº 535.238 no
ano de 2014.
RESULTADOS
O estado do Paraná, localizado na região Sul do país, é constituído atualmente por 399
municípios e população total de 10.577.755 habitantes (DATASUS, 2012). O processo de
regionalização dos serviços de saúde no Estado, no momento de elaboração do projeto desta
pesquisa, propôs a definição de 5 macrorregiões, das quais, a Macrorregião Oeste, constituída
por 79 municípios, totaliza 1.647.657 habitantes (PARANÁ, 2009).
Nesta região, do total de 28.329 vínculos de trabalho no setor saúde, 14.722 estão
adscritos no setor público (51,96%) e 13.607 estão vinculados ao setor privado (48,03%). Não
foi possível identificar neste trabalho o número de vínculos concomitantes existentes no setor
público e no privado. No entanto, o setor público se constitui como o maior empregador na
saúde nesta região.
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Tabela 1 – Distribuição dos vínculos dos setores público e privado nos municípios da
Macrorregião Oeste do Paraná segundo o porte populacional, 2014
Porte Populacional Público Privado Total
N % N % N %
Menos de 5.000 896 3,16 151 0,53 1047 3,70
5.000 até menos de 20.000 3880 13,70 1962 6,93 5842 20,62
20.000 até menos de 50.000 1987 7,01 2134 7,53 4121 14,55
50.000 até menos de 100.000 1416 5,00 1100 3,88 2516 8,88
Acima de 100.000 6543 23,10 8260 29,16 14803 52,25
Total 14722 51,97 13607 48,03 28329 100,00
Fonte: CNES (2014).
Na tabela 1, observa-se a predominância do setor privado nos municípios com porte
populacional acima de 100.000 habitantes, isso se justifica pelo fato de que o setor privado se
instala onde há maior desenvolvimento industrial, econômico e populacional e, portanto,
maior potencial de mercado consumidor dos serviços prestados. Ao contrário, no processo de
implementação do SUS, o setor público tem se instalado, geralmente, onde o setor privado
não tem interesse. É importante destacar que nos municípios com porte populacional de
menos de 5.000 habitantes, o setor público predomina sobre o setor privado com 896 vínculos
(3,16%). Já nos municípios com população acima de 100.000 habitantes o setor privado
predomina com 8.260 vínculos (29,16%).
De acordo com Piola et al. (2009), apesar de todos os avanços obtidos com a
implantação do SUS, este ainda enfrenta dificuldades para garantir a integralidade do
atendimento e o acesso oportuno da população a determinados tipos de atendimentos,
particularmente a consultas especializadas e exames. Em parte, estas dificuldades se devem ao
complexo processo de regionalização de redes de atenção divididas entre serviços prestados
por instituições de natureza administrativa e interesses diversos. Neste mix público e privado,
ao encontrar dificuldades de acesso aos serviços de média complexidade e aos SADT, o poder
judicial tem sido acionado por usuários para garantir os direitos sociais estabelecidos e obrigar
o Estado a financiar serviços privados de toda a ordem, com todos os problemas decorrentes
desta prática, incluindo a inversão da lógica solidária, originalmente planejada para a
construção do SUS, pela lógica da utilização individual e privada dos recursos públicos.
6
Na tabela 2, podemos observar que em relação aos estabelecimentos públicos de
saúde, o que prevalece são os vínculos com os centros de saúde/unidade básica e os postos de
saúde que estão classificados como serviços de atenção básica (AB), compreendendo 6.420
(43,61%) do total de vínculos empregatícios no setor público. Comparando com o setor
privado observou-se que predominam os vínculos com os serviços hospitalares, dentre os
quais os vínculos com os hospitais gerais perfazem 5.928 (43,57%) e os hospitais
especializados, 1.358 vínculos (9,98%) do total de vínculos no setor privado. Os vínculos nos
serviços intermediários, compostos por clínica/centro de especialidade, consultório isolado e
unidade de apoio e diagnose, correspondem a 44,12%, que somados aos serviços hospitalares
caracterizam a oferta do setor privado.
Essa dependência da rede privada é um fator que compromete
significativamente a possibilidade de constituição de redes resolutivas, uma
vez que os serviços privados tendem a se localizar nas áreas urbanas de
maior porte, onde a concentração demográfica e os níveis de renda são mais
elevados, permitindo maiores possibilidades de maximização de lucros à
iniciativa privada. Por essa razão, a desigualdade na possibilidade de acesso,
no interior do SUS, só poderá ser superada com fortes investimentos
públicos, que permitam disponibilizar os serviços necessários nas regiões
atualmente desprovidas de serviços suficientes para o atendimento às
necessidades da população (PIOLA et al., 2009, p. 146).
Foram identificados 34 registros classificados como serviço de atenção básica no setor
privado, dos quais 29 deles são farmácias e os outros 5 (centro de saúde/unidade de saúde,
posto de saúde) podem indicar um problema com o cadastramento no CNES.
Tabela 2 – Estabelecimentos de saúde públicos e privados distribuídos quanto ao tipo de
serviço prestado na Macrorregião Oeste do Paraná, 2014
Tipo de serviço
Estabelecimentos de saúde AB SADM SH SI Total
Públ. Priv. Públ. Priv. Públ. Priv. Públ. Priv. N %
Centro de apoio a saúde da família 15 - - - - - - - 15 0,05
Centro de atenção hemoterapia e ou hematologia - - - - 147 - - - 147 0,52
Centro de atenção psicossocial - - - - - - 237 - 237 0,84
Centro de regulação de serviço de saúde - - 22 - - - - - 22 0,08
Centro de regulação médica das urgências - - 43 - - - - - 43 0,15
7
Centro de saúde/Unidade básica 6420 1 - - - - - - 6421 22,67
Clínica/Centro de especialidade - - - - - - 681 2054 2735 9,65
Consultório isolado - - - - - - 81 2609 2690 9,50
Farmácia 17 29 - - - - - - 46 0,16
Hospital/dia-isolado - - - - - - 26 30 56 0,20
Hospital especializado - - - - - 1358 - - 1358 4,79
Hospital Geral - - - - 2952 5928 - - 8880 31,35
Laboratório central de saúde pública (LACEN) - - - - -
- 7 - 7 0,02
Oficina ortopédica - - - - - - - 2 2 0,01
Policlínica - - - - - - - 244 244 0,86
Polo Academia da Saúde 16 - - - - - - - 16 0,06
Posto de saúde 1307 4 - - - - - - 1311 4,63
Pronto atendimento - - - - - - 695 - 695 2,45
Pronto socorro geral - - - - 162 - - - 162 0,57
Secretaria de saúde - - 1242 - - - - - 1242 4,38
Serviço de atenção domiciliar -isolado (home care) - - - - - -
1
1 0,00
Unidade de apoio diagnose e terapia - - - - - - 95
1340
1435 5,07
Unidade de vigilância em saúde - - 133 - - - -
-
133 0,47
Unidade móvel pré-hospitalar na área de urgência
- - - - - - 349
-
349 1,23
Unidade móvel terrestre - - - - - - 75 7 82 0,29
Total 7775 34 1440 0 3261 7286 2246 6287 28329 100,00
Fonte: CNES (2014).
Nota: AB – Serviço de atenção básica; SADM – Serviço administrativo; SH – Serviço hospitalar; SI – Serviço
intermediário; PÚBL. – Estabelecimento público; PRIV. – Estabelecimento privado.
Na tabela 3, que apresenta o tipo de atividade (ambulatorial, ambulatorial + hospitalar
e hospitalar) em relação aos serviços prestados, identificou-se que são desenvolvidas
atividades ambulatoriais em 63, 47% dos serviços de saúde, especialmente nos serviços
públicos de atenção básica (52,81%) e serviços intermediários (45,96%). As atividades
8
ambulatoriais + hospitalares são desenvolvidas em 35, 86% dos serviços, especialmente nos
serviços privados hospitalares (52,13%).
Tabela 3 – Tipo de atividade prestada nos setores públicos e privados segundo o tipo de
serviço de saúde na Macrorregião Oeste do Paraná, 2014
Tipo de atividade AB SADM SH SI Total
Públ. Priv. Públ. Priv. Públ. Priv. Públ. Priv. N %
Ambulatorial 7775 34 309 2 1440 - 2165 6254 17979 63,47
Ambulatorial + Hospitalar - - 2952 7094 - - 81 33 10160 35,86
Hospitalar - -
190 - - - - 190 0,67
Total 7775 34 3261 7286 1440 0 2246 6287 28329 100,00
Fonte: CNES (2014).
Estes dados apontam para um processo recentemente denominado de
“ambulatorização” dos serviços de saúde, observado a partir da implantação do SUS, com
diversas repercussões para o modelo assistencial e para as práticas nos serviços de saúde. O
processo de desospitalização da assistência implicou na diminuição do número de leitos
hospitalares, especialmente da rede psiquiátrica, por meio de diversas alterações na estrutura e
nos processos de trabalho das equipes de saúde e, paralelamente, houve um crescimento de
serviços ambulatoriais, não só públicos na rede básica, mas também, de serviços
especializados e de exames laboratoriais e tratamentos que não exigem internamento
hospitalar, no setor privado. Outros estudos podem ser realizados para melhor compreensão
deste fenômeno.
Foram analisadas, também, diferenças nas características relacionadas à força de
trabalho dos setores público e privado na Macrorregião Oeste do Paraná. No setor privado,
prevaleceram os vínculos de médicos, com 5.468 cadastros (40,19%), técnicos de
enfermagem com 1.173 (8,62%), auxiliares de enfermagem com 1.059 (7,78%), dentistas com
1.071 (7,87%) e enfermeiros, com 481 cadastros (3,53%). Em comparação, o setor público
têm os médicos com 2.723 (18,50%) vínculos, agentes comunitários de saúde com 2.356
(16%) vínculos, técnicos de enfermagem com 1.403 (9,53%) e auxiliares de enfermagem com
1.395 (9,48%), enfermeiros com 1.121 (7,61%) e dentistas com 698 (4,74%).
9
Este cenário tem apontado para a permanência de um problema identificado nos anos
de 1980, quando da realização da 1ª Conferência nacional de recursos humanos da saúde, na
qual a polarização das equipes de saúde entre profissionais médicos e profissionais auxiliares
(técnicos, auxiliares e agentes de saúde) era entendida como um obstáculo à organização de
um modelo assistencial voltado às necessidades de saúde da população, com ênfase em ações
multiprofissionais para a atenção integral dos usuários. Passados 25 anos de implantação do
SUS, este ainda é um problema para a gestão do trabalho e a regulação e planejamento da
força de trabalho no SUS (CARVALHO, 2012).
Tabela 4 – Distribuição da força de trabalho segundo a formação profissional de acordo com
o tipo de serviço prestado nos setores público e privado de saúde na Macrorregião Oeste do
Paraná, 2014
Classificação por serviço A B C D Total
Públ. Priv. Públ. Priv. Públ. Priv. Públ. Priv. N %
AB 2675 14 4345 15 78 5 630 - 7809 27,57
SADM 348 - 707 - 51 - 334 - 1440 5,08
SH 1748 4315 1029 2208 7 32 524 732 10547 37,23
SI 994 4806 967 738 35 183 250 559 8533 30,12
Total 5765 9135 7048 2961 171 220 1738 1291 28329 100,00
Fonte: CNES (2014).
A tabela 4 apresenta as diferenças entre a formação profissional dos trabalhadores
vinculados ao setor público e ao setor privado. Enquanto nos serviços públicos predominam
os profissionais e trabalhadores de saúde sem formação de nível superior (47,87%), no setor
privado é mais frequente os vínculos de profissionais de saúde com formação de nível
superior (67,13%).
Este resultado apoia a hipótese de que o mercado de trabalho no setor privado,
caraterizado pelos serviços hospitalares e de média complexidade e SADT, tem sido o maior
empregador de profissionais de saúde de nível superior, especialmente do profissional
médico. Por outro lado, o desprestígio do setor público, caracterizado especialmente pelos
serviços de atenção básica, e a política de desresponsabilização do Estado frente aos serviços
públicos de saúde, tem retirado deste setor os profissionais qualificados para a assistência à
10
saúde, o planejamento e avaliação de programas, dificultando a organização de um sistema de
saúde que tenha, na Atenção Básica, o nível ordenador dos demais tipos de serviços.
Tabela 5 – Tipo de vínculo segundo a classificação por serviço público e privado na
Macrorregião Oeste do Paraná, 2014
Vínculos
AB SADM SH SI Total
Públ Priv Públ Priv Públ Priv Públ Priv N %
Bolsa 37 - - - - 1 - 2 40 0,1
Cargo comissionado 154 - 84 - 12 - 17 - 267 0,9
Celetista - 17 - - - 3047 1 1692 4757 16,8
Consultoria 2 - 1 - 1 1 - 8 13 0,05
Contrato por prazo determinado 666 6 77 - 306 227 206 457 1945 6,9
Contrato verbal/informal 22 - 3 - 3 16 4 43 91 0,3
Emprego público 1836 - 113 - 90 - 125 3 2167 7,7
Estatutário 4553 - 1130 - 1539 - 1672 - 8894 31,4
Intermediado org da sociedade
civil de interesse publ(oscip) 1 - - - 444 3 31 5 484 1,7
Intermediado p/ entidade
filantrópica e/ou sem fins
lucrativo 3 - - - 14 271 - 33 321 1,1
Intermediado por cooperativa - - - -
2 1 3 6 0,0
Intermediado por empresa privada 173 2 7 - 111 1588 106 1228 3215 11,4
Intermediado por organização não-
governamental(ONG) - - - - 1 1 - 1 3 0,0
Intermediado por organização
social(OS) 3 - - - 6 1 - 4 14 0,0
Proprietário - 1 - -
18 - 1180 1199 4,2
Sem intermediação 32 8 2 - 666 1470 23 880 3081 10,9
Sem tipo 293 - 23 - 68 640 60 738 1822 6,4
SI - - - - - - - 10 10 0,0
Total 7775 34 1440 0 3261 7286 2246 6287 28329 100
Fonte: CNES (2014).
Na tabela 5, comparamos o tipo de vínculo empregatício segundo a classificação por
serviço público e privado e pudemos observar que, no setor público, 60,41%dos vínculos
(8.894) são estatutários, enquanto no setor privado há uma variação maior nos tipos de
vínculos, sendo o contrato celetista (34,95%) menos frequente que os vínculos como
11
autônomos (20,71% dos vínculos intermediados por empresas privadas e 17,33% sem
intermediação), totalizando 38,04%, portanto, sem proteção social trabalhista.
Chama a atenção, ainda, que dos 1.945 vínculos contratados por prazo determinado,
64,52% estavam inseridos no setor público. Estas novas modalidades de vinculação do
trabalhador ao serviço público tem sido objeto de estudo e de políticas de gestão do trabalho,
cujo objetivo tem sido a desprecarização dos vínculos de trabalho no setor saúde, tendo em
vista a defesa de condições de trabalho adequadas às necessidades do SUS de estabelecimento
de vínculo e co-responsabilização entre profissionais e usuários deste sistema, assim como,
pela valorização do trabalhador da saúde enquanto sujeito protagonista na consolidação do
sistema de saúde e seus preceitos constitucionais.
Outros estudos poderão aprofundar as análises em relação aos vínculos de trabalho nos
setores público e privado, destacando a importância crescente de vínculos que não garantem
os direitos sociais e trabalhistas conquistados historicamente pela classe trabalhadora, tais
como os vínculos intermediados por ONGs, cooperativas, OSs e OSCIPs, e entidades
privadas, filantrópicas que constam como vínculos autônomos no CNES, tanto no setor
público como no privado. Estudos que contribuam para a compreensão das consequências
destes tipos de vínculos, tanto para a organização do SUS como para a saúde dos
trabalhadores da saúde, serão importantes para a luta por um sistema de saúde conforme
inscrito na Constituição Federal de 1988.
CONCLUSÕES
Os dados apresentados indicam diferenças importantes entre a estrutura do setor
público e do setor privado na saúde, na região analisada. Dos 28.329 vínculos de trabalho
identificados, 51,96% estão inseridos no setor público e 48,03% no setor privado. Nos
resultados, destaca-se que enquanto no setor público tem predominado os vínculos de trabalho
com estabelecimentos de saúde de atenção básica (43,61%), o setor privado tem a maioria dos
trabalhadores vinculados aos hospitais e serviços especializados e de apoio ao diagnóstico e à
terapia (97,67%). Também identificou-se o predomínio de profissionais de saúde com
formação de nível superior no setor privado, especialmente nos serviços hospitalares e
especializados (67,13%), enquanto no setor público foi mais frequente o cadastro de
12
profissionais e trabalhadores sem formação universitária (47,87%). Quanto aos vínculos,
60,41% dos trabalhadores vinculados ao setor público são estatutários e, no setor privado,
38,04% vinculados como autônomos.
Apesar do texto constitucional que afirma que as instituições privadas poderiam
participar de forma complementar ao SUS, tem se observado uma composição mista entre os
setores, na qual o setor público tem se limitado a 'complementar' as ações e serviços faltantes
ou rejeitados pelo setor privado. Apesar do número majoritário de trabalhadores vinculados ao
setor público, observa-se que apenas a diferença quantitativa não será capaz de ampliar o
papel deste setor na ordenação do sistema de saúde.
Carvalho, Santos e Campos (2012) indicaram que a complementaridade do público em
relação ao privado tem se concretizado principalmente pelo modelo de atenção adotado que
privilegia a assistência individual-curativa, induz ao consumo de procedimentos para
diagnóstico, exames clínico-laboratoriais, favorecendo o fluxo de usuários do setor público,
que iniciam o atendimento nas unidades básicas ambulatoriais, porta de entrada preferencial
do sistema de saúde, para completar o atendimento no setor privado que detém a maior parte
dos recursos especializados e equipamentos de diagnóstico e terapia, além dos leitos
hospitalares. Além disso, outros autores (OCKÉ-REIS, ANDREAZZI, SILVEIRA, 2005) já
denunciaram que ações governamentais acabam patrocinando o setor privado, via mercado de
planos e seguros de saúde, por meio de contratação coletiva para funcionários públicos,
concessão de subsídios, isenções e renúncia de arrecadações fiscais e outros incentivos.
Sugere-se outros estudos para aprofundar as análises dos dados apontados, tendo em
vista a necessidade de questionar sobre a plausibilidade deste mix público-privado para a
concretização dos princípios da universalidade, igualdade e integralidade da atenção à saúde a
todos(as) os(as) brasileiros(as).
REFERÊNCIAS
BRASIL. Art. 199 da Constituição Federal de 1988: Trata da assistência à saúde ser livre
à iniciativa privada. Acesso em 15 de junho de 2014.
CARVALHO, M. Contribuições ao planejamento da força de trabalho em saúde para a
atenção básica. Tese de Doutorado - Faculdade de Ciências Médicas da Universidade
Estadual de Campinas – UNICAMP, São Paulo, 2012.
13
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