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ECONOMIA BRASILEIRA
CURSO REGULAR
ECONOMIA BRASILEIRA
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SUMÁRIO
1. Economia cafeeira no Império
2. Economia cafeeira no início da República
3. Experiências de padrão-ouro no Brasil
4. Industrialização na República Velha
5. Quadro Sinóptico
6. Questão comentada
7. Indicações de leituras obrigatórias
8. Indicações de leituras complementares
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ECONOMIA BRASILEIRA
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1. Economia cafeeira no Império
1.1 Declínio econômico do Brasil na primeira metade do século XIX
Na primeira metade do século XIX, o Brasil passou por período de estagnação
econômica, em razão sobretudo da crise no setor exportador. Os principais produtos de
exportação – açúcar, algodão, couros, peles – sofreram baixas nos preços, o que provocou
diminuição dos saldos comerciais. O valor das exportações em 1850 era, muito
provavelmente, menor do que no início do século XIX, de acordo com Celso Furtado. O
açúcar brasileiro sofreu com a concorrência antilhana, americana e cubana. A produção em
larga escala de algodão nos Estados Unidos fez cair o preço do algodão e praticamente
inviabilizou a produção brasileira.
Segundo o mesmo autor, “a causa principal do grande atraso relativo da economia
brasileira na primeira metade do século XIX foi o estancamento das exportações”. O autor
argumenta que não era possível fomentar a industrialização sem prévia expansão das
exportações.
Os acordos desvantajosos de 1810 e 1827 com a Inglaterra provavelmente não foram
os principais responsáveis pelo atraso na industrialização no país, já que as desvalorizações na
moeda brasileira causaram efeito “protecionista” que compensou largamente as baixas tarifas
de importação.
“As iniciativas de indústria siderúrgica da época de Dom João VI fracassaram não
exatamente por falta de proteção, mas simplesmente porque nenhuma indústria cria mercado
para si mesma, e o mercado para produtos siderúrgicos era praticamente inexistente.”
A única forma de o Brasil desenvolver-se no século XIX era por meio do comércio
internacional. Não havia mercado interno capaz de dinamizar a economia, em razão da
simplicidade dos mecanismos econômicos e do atraso tecnológico. Os Estados Unidos, no
mesmo período, puderam fomentar o desenvolvimento econômico em razão das exportações
do algodão para a Inglaterra, permitindo incentivos à industrialização.
1.2 Gestação da economia cafeeira
O produto de exportação que surgia como elemento propulsor da economia em
meados do século XIX foi o café. Ele foi introduzido no Brasil em fins do século XVIII e era
amplamente cultivado em várias áreas com fins de consumo local. Sua importância comercial
aparece com a desorganização da produção haitiana. Na década de 1830, o café já passa a
responder por 18% do valor das exportações do Brasil, ficando em terceiro lugar atrás do
açúcar e do algodão. Nos vinte anos seguintes, assume o primeiro lugar com 40% do valor das
exportações.
O desenvolvimento da produção de café como produto comercial ocorreu
primordialmente nas áreas montanhosas próximas ao Rio de Janeiro. As principais razões
para esse fato foram: existência de relativa mão-de-obra abundante, proveniente da economia
mineira decadente; proximidade com o porto, que permitia o escoamento da produção. Assim,
inicialmente a produção de café fez uso de recursos pré-existentes e subutilizados.
Apesar da redução do preço internacional do café entre 1821-30 e 1841-50, a
produção brasileira quintuplicou nesse período. Os produtores brasileiros encontraram no café
forma de utilizar os recursos produtivos do período da mineração. Esse fato é prova de que
não havia no período outra atividade produtiva que pudesse atrair os investidores brasileiros.
Para Furtado, a fase de gestação da economia cafeeira compreende o segundo e o
terceiro quartel do século XIX. Em comparação com a atividade açucareira, a empresa
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cafeeira caracterizava-se por custos monetários menores, pois utilizava mais amplamente o
fator terra. Assim, apesar da diminuição dos preços no período inicial, houve
desenvolvimento intenso da produção cafeeira, já que havia estoque de mão-de-obra escrava
subtulizada da região mineradora e abundância de terras.
Há diferenças relevantes entre as classes dirigentes nas economias açucareira e
cafeeira. Na atividade açucareira, as fases produtiva e comercial estavam completamente
separadas. Considerando que as principais decisões eram tomadas na fase comercial,
dominada por portugueses e, em seguida, por ingleses, não é difícil compreender a alienação
do senhor de engenho no que diz respeito ao conjunto da economia açucareira. Assim, o
senhor de engenho não conseguia enxergar os sinais do mercado e carecia de elementos para
balizar a produção.
Já na economia cafeeira, os homens que dirigiam a produção tinham experiência
comercial. Além disso, os interesses da produção e do comércio estavam interligados. Em
linhas gerais, o processo de gestação da economia cafeeira compreendia: aquisição de terras,
recrutamento de mão-de-obra, organização e direção da produção, transporte interno,
comercialização nos portos. Furtado enfatiza a influencia que os dirigentes da economia
cafeeira tinham sobre o governo, que em alguns momentos tomava medidas que favoreciam o
setor. Nesse sentido, era óbvia a vantagem da proximidade da atividade cafeeira com a capital
do país.
Ao final do terceiro quartel do século XIX, concluía-se a etapa de gestação da
economia cafeeira. Restava, entretanto, solucionar o problema da mão-de-obra.
1.3 O problema da mão-de-obra
A força de trabalho da economia brasileira era constituída, basicamente, pela mão-de-
obra escrava. Por volta de 1850, esse contingente não deveria alcançar 2 milhões de escravos.
No censo de 1872, registraram-se 1,5 milhão de escravos, o que indica que havia
inelasticidade da mão-de-obra escrava. Furtado apresenta dados que comprovariam que a taxa
de natalidade era menor que a de mortalidade, evidenciando, provavelmente as precárias
condições de vida desses indivíduos.
A ideia de recrutar mão-de-obra do setor de subsistência esbarrava no fato de que esta
encontrava-se dispersa, o que demandaria grande mobilização de recursos, inclusive com
apoio dos proprietários de terra.
Utilizar a população urbana na lavoura cafeeira era inviável, pois esta dificilmente se
adaptaria à disciplina do trabalho agrícola e às condições de vida nas grandes fazendas.
A solução apontava para a imigração europeia, que ocorria espontaneamente para
outros lugares, como os Estados Unidos. Nesse país, a imigração era antes um movimento
autônomo do que produto da necessidade de mão-de-obra para a lavoura de algodão nos
EUA. Naturalmente, a chegada de europeus ao país aumentava a demanda por algodão e
expandia as plantações de algodão.
No Brasil, o governo imperial fomentou a criação de colônias em diversas partes do
país como forma de estimular o povoamento e estimular a economia. Entretanto, segundo
Furtado, “a vida econômica das colônias era extremamente precárias, pois, não havendo
mercado para os excedentes de produção, o setor monetário logo se atrofiava, o sistema de
divisão de trabalho involuía e a colônia regredia a um sistema econômico rudimentar de
subsistência”. Formou-se na Europa, consequentemente, opinião contrária à emigração para o
império brasileiro.
A classe dirigente da economia cafeeira percebeu o fracasso da política de colonização
do governo imperial, que dificultava o solucionamento da mão-de-obra e resolveu agir. O
senador Vergueiro, em 1852, decidiu contratar trabalhadores diretamente da Europa. O
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governo financiou o transporte e mais de duas mil famílias vieram para o Brasil até 1857. Em
essência, o trabalhador vendia seu trabalho futuro. Como o risco corria por conta do
trabalhador, que assinava contrato comprometendo-se a não abandonar a fazenda até quitar
sua dívida, o sistema acaba se degenerando para um sistema de servidão temporária.
A solução para o problema da mão-de-obra veio apenas em 1870, quando o governo
do Império passou a cobrir os custos com o transporte dos imigrantes que trabalhariam na
lavoura cafeeira. Os cafeeiros deveriam arcar com os custos do imigrante durante o primeiro
ano de atividade. Um fator externo pode ter contribuído para a vinda de imigrantes europeus
para o Brasil: a crise no sul da Itália no período de unificação política do país acabou
incentivando famílias a imigrarem.
1.4 Fluxo da renda
Para Furtado, o fato de maior relevância ocorrido na economia brasileira nos últimos
anos do século XIX foi o aumento da importância relativa do setor assalariado. O crescimento
econômico antes da abolição da escravidão ocorria por meio da expansão do setor escravista e
do setor de subsistência. Nesse período, o fluxo da renda era mínimo, pois os trabalhadores
não auferiam renda e, portanto, não podiam consumir nada.
Com a abolição da escravidão e o aumento do trabalho assalariado, passa a haver um
fluxo de renda muito mais complexo. De maneira simplificada, esse fluxo de renda tem início
com as exportações. Os trabalhadores transformam sua renda em gastos de consumo –
alimentos, roupas, serviços, etc –, que vem a constituir a renda dos pequenos produtores,
comerciantes, etc. Estes últimos também transformam parte de sua renda em gastos de
consumo. Percebe-se, assim, a propagação do impulso externo sobre a economia. A massa de
salários pagos no setor exportador passa a ser o núcleo de uma economia de mercado interno,
já que incentiva a produção local.
1.5 Tendência ao desequilíbrio externo
Com o aumento relativo do trabalho assalariado, a economia brasileira passou a
enfrentar problemas quanto a capacidade de adaptar-se às regras do padrão-ouro. O problema
residia no fato de que a economia brasileira era especializada na exportação de produtos
primários e com elevado coeficiente de importação, o que a tornava susceptível a oscilações
agudas.
Para entender o problema, precisamos entender o funcionamento do padrão-ouro,
vigente à época. Pelas regras do padrão-ouro, os países deveriam dispor de reserva metálica
para cobrir eventuais déficits no balanço de pagamentos. Se houvesse, por exemplo, déficit
em BP causado por excesso de importações frente às exportações, o país deveria exportar
ouro, reduzindo o meio circulante (moeda). Assim, pela teoria quantitativa da moeda, haveria
redução nos preços, o que estimularia as exportações e diminuiria as importações, levando BP
ao equilíbrio.
Nos países centrais, o padrão-ouro funcionava, pois as importações representavam
pequena parcela do PIB e as oscilações em BP podiam ser estabilizadas com o fluxo de
reserva metálica para o exterior. Porém, no Brasil assalariado do século XIX, o problema
residia no fato de que os desequilíbrios em BP podiam ser muito mais agudos, pois refletiam
quedas nos preços dos produtos primários.
No Brasil escravista, a procura monetária era igual às exportações, assim toda ela
poderia se transformar em importações, não havendo qualquer desequilíbrio externo. Com a
introdução do trabalho assalariado, a renda criada pelas exportações implica crescimento do
total de pagamento dos fatores de produção. Essa renda tende a multiplicar-se na cadeia
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explicada anteriormente. Assim, cresce a demanda por importados. Em épocas de crise nas
economias centrais, tende a cair o preço dos produtos primários, reduzindo a entrada de
divisas nas economias dependentes. Porém, o efeito de propagação das exportações ainda está
ocorrendo, e as importações continuam a crescer. Daí surge o desequilíbrio externo, pois não
há divisas suficientes para atender as importações, já que há a necessidade de mobilizar
grandes reservas metálicas para o exterior para corrigir o desequilíbrio em BP.
1.6 Concentração da renda
Na economia cafeeira brasileira, havia forte tendência de concentração da renda nas
mãos dos fazendeiros. As razões para isso residem no fato que havia reserva de mão-de-obra
proveniente dos setores em decadência que foi complementada, posteriormente, pela
imigração europeia. Além disso, havia abundância de terras, o que retirava qualquer incentivo
à melhorar a produtividade do trabalho nem da terra. Quando a terra ficava esgotada, bastava
mover a produção para outro terreno.
Quando havia elevação dos preços do café, aumentavam os lucros dos cafeicultores,
sem aumentar os salários dos trabalhadores, já que não havia incentivos para melhoria da
produtividade física.
Em períodos de crise nos países centrais, poderia ocorrer queda brusca no preço dos
produtos primários. Porém, como vimos, a busca por importações continuava, motivada pelo
efeito multiplicador dos gastos advindo do impulso externo inicial, o que levava a déficit no
BP. Se a economia brasileira operasse dentro das regras do padrão-ouro, reservas metálicas
sairiam do país, reduzindo os preços dos produtos de exportação sobretudo, reduzindo,
consequentemente, as margens de lucro dos cafeicultores. Como nos gastos de consumo dessa
classe (cafeicultores), os produtos importados participavam com elevada parcela, haveria
tendência de redução das importações, corrigindo-se o desequilíbrio em BP.
Entretanto, a correção do desequilíbrio ocorria por meio de reajustamentos na taxa de
câmbio. Ao ocorrer redução no preço dos produtos exportados, ocorria baixa brusca no poder
aquisitivo da moeda externa nacional. A simples previsão de um desequilíbrio dessa natureza
provocava “corrida” contra o valor externo da moeda, ou seja, comprava-se libra e vendia-se
mil-réis no mercado de câmbio, desvalorizando o mil-réis frente à libra. Assim, o valor de
todos os produtos importados subia, reduzindo-se a procura pelos bens importados. Logo, sem
liquidar divisas, que aliás o Brasil não tinha, a economia lograva corrigir o desequilíbrio pelo
reajustamento do câmbio.
Como desvalorizações da moeda nacional implicavam elevações nos preços dos
importados, e a economia brasileira dependia bastante da importação de enorme variedade de
bens, a sociedade era penalizada e arcava com os custos de crise no setor exportador. Esse
fenômeno foi denominado de “socialização das perdas” por Celso Furtado. Os empresários
exportadores mantinham seus lucros com esse mecanismo em tempos de crise e os
trabalhadores perdiam poder de compra. Isso tendia a concentrar ainda mais a renda.
Para se ter ideia da dependência da economia brasileira de produtos importados, mais
de 50% das importações era de tecidos e alimentos.
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Pauta de Importações - Brasil - 1902/1903
Farinha de Trigo
6%
Máquinas e
Ferramentas
5%
Outros
42%
Carvão de Pedra
6%
Manufaturas de
Ferro e Aço
6%
Bebidas
7%
Manufaturas de
Algodão
12%
Prod. Químicos e
farmaceuticos
3%
Arroz
3%
Charque
5%Trigo em grãos
5%Fonte: Silva (1957)
2. Economia cafeeira no início da República
2.1 Descentralização republicana
O sistema monetário vigente à época do Império era totalmente inelástico, no sentido
de que havia poucos mecanismos de expansão da base monetária. As expansões que ocorriam
serviam para cobrir déficits do governo ou resolver problemas emergenciais. No período
escravista, esse sistema não apresentava maiores problemas, em razão da baixa monetização
da economia. Porém, com o aumento da importância relativa do trabalho assalariado, esses
sistema monetário demonstrava ser totalmente inadequado.
Com a proclamação da República em 1889, passou a haver reivindicação por
autonomia regional, inclusive na área politico-financeira. A reforma monetária de 1888, que
não havia sido executada pelo governo imperial, foi aplicada pelo governo provisório na
gestão do Ministro da Fazenda Rui Barbosa. Essa reforma concedeu o poder de emissão de
papel-moeda a inúmeros bancos regionais, provocando expansão do crédito exacerbada em
todo o país. Esse processo culminou com a “febre” de atividade econômica que ficou
conhecida como Encilhamento.
A expansão da base monetária provocou pressão sobre o balanço de pagamentos, pois
expandir os meios de pagamento implica elevação do nível de preços de acordo com a teoria
quantitativa da moeda, o que prejudica o desempenho das exportações. Assim, os desajustes
em BP provocaram desvalorizações do mil-réis, de acordo com o mecanismo explicado
anteriormente. Para se ter ideia do montante da desvalorização, a taxa de câmbio em 1890 era
de 26 pence/mil-réis, caiu para 14 pence/mil-réis em 1893 e para 8 pence/mil-réis em 1899.
Essas desvalorizações prejudicavam enormemente as classes assalariadas,
especialmente nas zonas urbanas, pois estas dependiam de artigos importados.
Simultaneamente, essas desvalorizações favoreciam o setor cafeeiro, uma vez que
aumentavam os lucros dos cafeicultores em mil-réis, o que provocava expansão das
plantações, fomentada pelo excesso de crédito do período.
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2.2 Reação do governo
As sucessivas desvalorizações do câmbio pioravam as contas do governo, pois a
dívida era em libras. Assim, em 1898, o governo reage e o Ministro Joaquim Murtinho acorda
o I Funding Loan, um empréstimo de consolidação junto a banqueiros ingleses, com o
objetivo de rolar a dívida externa. Pelo acordo, o Brasil teria 13 anos para iniciar o pagamento
da dívida, recebeu 10 milhões de libras esterlinas para pagar juros e sanar as contas. Além
disso, o governo assumiria o compromisso de implementar políticas austeras, retirando
inclusive papel-moeda de circulação (incinerando). A título de garantia foi oferecida aos
bancos credores a receita da alfândega do Rio de Janeiro.
O objetivo de Murtinho era retirar frear a inflação decorrente da expansão do crédito e
diminuir a pressão sobre o BP. Assim, além das medidas mencionadas anteriormente, foram
estimuladas as exportações, que aumentaram de 26 milhões de libras em 1896-99 para 37
milhões de libras em 1900-03 (a causa básica foi a grande expansão das exportações de
borracha).
O resultado dessa política contracionista do governo Campos Sales foi a falência de
empresas (muitas criadas no período do Encilhamento), a recuperação do câmbio e do
Balanço de Pagamentos.
2.3 Crise da economia cafeeira
A década de 1890 foi extremamente favorável ao setor cafeeiro, em razão da expansão
do crédito, das desvalorizações sucessivas do mil-réis, que aumentavam a renda em mil-réis
dos cafeicultores, da queda da oferta não-brasileira. Além disso, o problema da mão-de-obra
resolvera-se com a imigração europeia, que passou à mão dos Estados, que ganharam
autonomia com a virada para a República.
Dessa forma, a produção brasileira de café aumentou consideravelmente, conforme
dados abaixo:
1880: 3,7 milhões de sacas
1890-91: 5,5 milhões de sacas
1901-02: 16,3 milhões de sacas
É interessante observar que a produção crescia não em função do crescimento da
demanda, mas em razão da disponibilidade de mão-de-obra e terras subocupadas, e da
vantagem relativa que apresentava esse artigo de exportação. Não havia outro investimento
atrativo para os empresários brasileiros.
Os produtores brasileiros perceberam que se encontravam em condições privilegiadas,
umas vez que a produção brasileira representava três quartos da oferta mundial de café.
O excesso de produção tendia a fazer baixar o preço do café. Durante a década de
1890, essas baixas nos preços de café eram compensadas pela desvalorização no câmbio, uma
vez que os cafeicultores mantinham seus lucros em mil-réis com as depreciações da moeda
nacional.
Com a política contracionista de Murtinho no governo Campos Sales, o câmbio se
recuperou e o mil-réis se valorizou em relação à libra esterlina (A taxa de câmbio se valorizou
a 12 pence/mil-réis, o que significou valorização de 70% em relação à taxa de 1898). Essa
valorização fez que os cafeicultores não mais pudessem absorver as quedas nos preços do
café. Assim, passou a haver o problema da superprodução.
Para solucionar o problema, foi celebrado o Convênio de Taubaté em 1906, cujas
principais medidas foram:
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- para restabelecer o equilíbrio entre oferta e demanda de café, o governo deveria
intervir no mercado comprando os excedentes de café;
- o financiamento dessas compras ocorreria por meio de empréstimos externos;
- o serviço desses empréstimos seria financiado por imposto em ouro sobre cada saca
de café exportada;
- os Estados produtores se comprometeriam a desencorajar novas plantações de café, a
fim de solucionar o problema no longo prazo.
No início do plano de valorização, o Estado de SP foi quem contraiu os empréstimos e
financiou a compra de estoques, uma vez que o governo federal relutou em aceitar o esquema.
O plano fora bem concebido, porém não resolvia o problema, uma vez que os preços
mantinham-se elevados, assim como os lucros. Dessa forma, os negócios continuavam
atrativos para novos investimentos. A redução artificial da oferta fazia essa mesma oferta ser
ampliada, tornando o problema mais grave no futuro. Além disso, essa política de
valorização, mantendo os preços do produto elevados no mercado internacional, incentivava a
produção não-brasileira de café, agravando ainda mais o problema.
É importante destacar que o café apresenta demanda inelástica em relação ao preço
(curva de demanda tendendo à verticalidade). Em outras palavras, a demanda de café pouco
varia em relação ao preço. Assim, era possível manter preços de café elevados, sem redução
significativa da demanda. O gráfico abaixo representa o que se passava com a política de
valorização de café. Observa-se que a oferta de café se deslocava para a direita com a
manutenção dos preços, aumentando-se cada vez mais os excedentes, que virariam estoques.
Além disso, a demanda de café é inelástica em relação à renda. Logo, um aumento de
renda nos países consumidores não implicava aumentos significativos na demanda.
Por isso diz-se que as políticas de valorização do café “escondiam” os sinais do
mercado. A solução do problema era apenas adiada.
Ocorreram duas outras políticas de valorização:
- em 1917, quando a safra do ano não tinha como ser vendida, pois os navios estavam
impossibilitados de escoarem a produção por motivos da I Guerra Mundial. Assim, a solução
foi nova emissão de notas inconversíveis para financiar a compra da safra.
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- a partir de 1922, passou a haver regulação permanente da oferta de café. Para isso, o
governo de SP criou o Instituto Paulista de Defesa do Café. A armazenagem ocorria em
armazéns “reguladores”, nos entroncamentos ferroviários estratégicos, e era administrada
pelos próprios produtores.
3. Experiências de padrão-ouro no Brasil
No Brasil, houve duas claras experiências de padrão-ouro: a primeira no período de
1906 a 1914, e a segunda no período de 1926 a 1930.
A experiência de padrão-ouro no período 1906-14 foi possível graças à “era do ouro”,
termo que se refere às favoráveis condições da economia brasileira:
- fluxos de capital para o país, sobretudo capitais ingleses;
- lucros no setor cafeeiro, que geravam divisas (moeda estrangeira) para a economia;
- o boom de exportações da borracha produzida no Brasil;
- aumento geral das exportações brasileiras.
Esses fatores permitiram que o Balanço de Pagamentos operasse com superávit. Dessa
forma, era possível operar os mecanismos do padrão-ouro. Para tanto, foi criada em 1906, a
Caixa de Conversão, que emitia notas conversíveis em ouro a uma taxa fixa, evitando a
apreciação do câmbio. Salienta-se que essa era uma demanda do setor cafeeiro para evitar a
apreciação e consequente diminuição dos lucros em mil-réis.
Essa experiência de padrão-ouro teve fim em 1914, com o início da I Guerra Mundial.
Já em 1913, passou a haver déficits em BP, acarretando a perda de reservas metálicas e o
fechamento da Caixa de Conversão em 1914.
A segunda experiência de padrão-ouro ocorreu em 1926-30, no governo de
Washington Luís. Mais uma vez, essa experiência só foi possível graças a resultados positivos
no BP, consequência da entrada de capital no país. Assim, foi criada a Caixa de Estabilização,
com funcionamento análogo à Caixa de Conversão.
Com a crise de 1929, houve fuga de capitais, esgotando-se as reservas metálicas
provocando o fechamento da Caixa de Estabilização. O preço do café caiu bruscamente e
passou a haver altos déficits no BP, inviabilizando o mecanismo de padrão-ouro.
4. Industrialização na República Velha
Há basicamente duas teorias que explicam a origem da industrialização no Brasil:
4.1 A Teoria dos Choques Adversos
A indústria surge como resposta às dificuldades de importar produtos industriais ou
manufaturados em períodos de dificuldade do setor exportador. Crises no setor exportador
(baixas nos preços ou diminuição das vendas) provocam queda da entrada de divisas (e, por
vezes desvalorizações no câmbio, em caso de déficits no BP), dificultando as importações de
bens de consumo, incentivando, por conseguinte, a produção nacional, por meio da ocupação
da capacidade instalada. Citam-se o período da I Guerra Mundial e o período de Depressão
nos anos 1930 para corroborar a teoria, pois nesse período houve aumento da produção da
indústria brasileira.
4.2 A Teoria da Industrialização induzida por exportações
A indústria cresce em momentos de expansão da economia cafeeira, que provoca
expansão da renda e do mercado consumidor. As fases de expansão do setor exportador
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provocam o aumento de divisas (que pode induzir a valorizações no câmbio), permitindo o
investimento industrial por meio da importação de bens de capital (máquinas, por exemplo),
ampliando e diversificando a capacidade instalada.
Abaixo, mostra-se a estrutura da produção industrial em 1919. Observa-se que a
indústria produzia majoritariamente bens de consumo, com destaque para têxteis e alimentos.
Estrutura da produção industrial - Brasil 1919
têxteis
29%
roupas e calçados
9%
produtos alimentícios
21%
bebidas
6%
fumo
5%
madeira e móveis
7%
outros bens de
consumo
7%produtos de metal
4%
mineral não metálico
6%
equipamentos de
transporte
2%
outros - bens de
produção
4%
Bens de Produção
16,6 %
Bens de Consumo
83,4%
Fonte: dados em Baer
(1995)
5. Quadro sinóptico
- A fase de gestação da economia cafeeira compreende o segundo e o terceiro quartel
do século XIX, período em que se formou a classe de cafeeiros nas regiões próximas
ao Rio de Janeiro.
- O café foi o produto que recolocou o Brasil na rota do comércio internacional, a partir
de meados do século XIX, sobretudo a partir do momento em que foi resolvido o
problema da mão-de-obra com as imigrações européias.
- A abolição da escravidão implicou uma das maiores transformações na economia
brasileira: o aumento relativo do trabalho assalariado na economia, implicando maior
monetização da economia.
- Os lucros altos do setor cafeeiro na primeira década republicana provocaram
expansão enorme da produção brasileira de café, que passou a responder por três
quartos da produção mundial.
- A expansão desenfreada de crédito e dos meios de pagamento na década de 1890
provocaram “febre” de negócios, inflação dos preços, pressão sobre o Balanço de
pagamentos e desvalorizações no câmbio.
- O I Funding Loan de 1898 no governo Campos Sales visou a corrigir os déficits no
BP e sanear as contas públicas, com políticas fiscais e monetárias contracionistas.
- Os cafeicultores perceberam que deveriam retirar excedentes de produção do mercado
para manter os preços do café elevados. Daí surgiram as políticas de valorização do
café, a partir do Convênio de Taubaté de 1906. A partir desse momento, houve várias
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políticas de retenção de estoques, com o objetivo de manter os lucros dos
cafeicultores.
- As políticas de valorização do café apenas adiaram o problema da superprodução,
uma vez que as inversões no setor continuavam e não havia alternativas de
investimentos
6. Questão comentada
TPS 2011
Celso Furtado, ao analisar o desenvolvimento brasileiro da primeira metade do século XX,
afirmou que houve um processo de articulação das distintas regiões do país em um sistema
com um mínimo de integração. De acordo com esse autor:
a) o processo de integração, subsequente ao de articulação, deveria ter-se orientado no
sentido de exportar produtos antes absorvidos pelas regiões mais prósperas
ERRADO
Resolução:
O que ocorria é que o setor exportador foi perdendo espaço para a produção voltada ao
mercado interno, em razão do aumento dos lucros deste setor em detrimento do primeiro.
(Mudança do eixo dinâmico da economia).
b) o processo de industrialização teve início em períodos diferentes nas várias regiões
brasileiras, tendo-se dispersado fortemente principalmente no pós-guerra.
ERRADO
Resolução:
“O processo de industrialização começou no Brasil concomitantemente em quase todas as
regiões. (...) Entretanto, superada a primeira etapa de ensaios, o processo de industrialização
tendeu naturalmente a concentrar-se numa região. A etapa decisiva de concentração ocorreu,
aparentemente, durante a Primeira Guerra Mundial, época em que teve lugar a primeira fase
de aceleração do desenvolvimento industrial. (...) Os dados da renda nacional parecem indicar
que esse processo de concentração se intensificou no após-guerra.” (Furtado, Celso. Formação
econômica do Brasil, 24 ed. Rio de Janeiro. P. 238.)
c) o fluxo de mão de obra da região de mais baixa produtividade para outra região de
produtividade mais alta tendeu a pressionar os níveis salariais desta última, que se
mantiveram, então, aquém da elevação da produtividade.
CERTO
Resolução:
“(...) O fluxo de mão-de-obra da região de mais baixa produtividade para a de mais alta,
mesmo que não alcance grandes proporções relativas, tenderá a pressionar sobre o nível de
salários desta última, impedindo que os mesmos acompanhem a elevação da produtividade.
Essa baixa relativa do nível de salários traduz-se em melhora relativa da rentabilidade média
dos capitais invertidos. Em consequência, os próprios capitais que se formam na região mais
pobre, tendem a emigrar para a região mais rica. A concentração das inversões traz economias
externas, as quais, por seu lado, contribuem ainda mais para aumentar a rentabilidade relativa
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dos capitais invertidos na região de mais alta rentabilidade.” (Furtado, Celso. Formação
econômica do Brasil, 24 ed. Rio de Janeiro. P. 239-240.)
d) os preços dos produtos essenciais eram relativamente baixos nas regiões de mais baixa
produtividade, o que resultou em salários monetários relativamente baixos em função
da produtividade.
ERRADO
Resolução:
“Do ponto de vista da região de mais baixa produtividade, o cerne do problema está nos
preços relativamente elevados dos gêneros de primeira necessidade, o que é um reflexo da
pobreza relativa de terras ou da forma inadequada como estas são utilizadas. Sendo
relativamente elevado o custo de subsistência da mão-de-obra, os salários monetários tendem
a ser relativamente altos em função da produtividade, comparativamente à região mais rica
em recursos naturais.” (Furtado, Celso. Formação econômica do Brasil, 24 ed. Rio de Janeiro.
P. 240.)
e) o rápido crescimento da economia cafeeira no período entre 1880 e 1930 reduziu
significativamente as diferenças regionais de renda per capita.
ERRADO
Resolução:
“O rápido crescimento da economia cafeeira – durante o meio século compreendido entre
1880 e 1930 – se por um lado criou fortes discrepâncias regionais de níveis de renda per
capita, por outro dotou o Brasil de um sólido núcleo em torno ao qual as demais regiões
tiveram necessariamente de articular-se.” (Furtado, Celso. Formação econômica do Brasil, 24
ed. Rio de Janeiro. P.
CURSO REGULAR
ECONOMIA BRASILEIRA
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7. Indicações de leituras obrigatórias
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 24 ed. São Paulo: Editora Nacional,
1991. Caps. 18 a 32.
Marcelo de Paiva Abreu (org.). A ordem do progresso. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990. Caps. 1
e 2.
GREMAUD, A. P., Economia brasileira contemporânea, 7 ed., Editora Atlas, 2008, caps. 12 e
13.
8. Indicações de leituras complementares
Versiani Flávio e ilson Suzigan. O Processo Brasileiro de Industrialização: uma Visão
Geral. Universidade de Brasília; Departamento de Economia,
1990. 46p, Série Textos Didáticos. 10. O Processo Brasileiro de Industrialização: uma Visão
Geral
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