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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM METODOLOGIAS PARA O ENSINO DE LINGUAGENS E AS SUAS
TECNOLOGIAS
Londrina 2016
LOURIDES APARECIDA FRANCISCONI
ENSINO DA ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA PERSPECTIVA DA MATRIZ HISTORICO-CULTURAL:
Os interstícios do ser e vir-a-ser professora da arte
LOURIDES APARECIDA FRANCISCONI
ENSINO DA ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA PERSPECTIVA DA MATRIZ HISTÓRICO-CULTURAL:
Os interstícios do ser e vir-a-ser professora da arte
Dissertação apresentada à UNOPAR, como requisito final para obtenção do título de Mestre Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias, Área e concentração em Formação de Professores e Ação Docente em situações de Ensino. Orientador: Profa. Dra. Samira Fayez Kfouri da Silva
Londrina 2016
LOURIDES APARECIDA FRANCISCONI
ENSINO DA ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA PERSPECTIVA DA MATRIZ HISTÓRICO-CULTURAL:
Os interstícios do ser e vir-a-ser professora da arte
Dissertação apresentada à UNOPAR, como requisito final para a obtenção do titulo
de Mestre no Mestrado em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas
Tecnologias, Área e concentração em Formação de Professores e Ação Docente em
situações de Ensino, conferida pela Banca Examinadora formada pelos professores:
_________________________________________ Profa. Dra. Samira Fayez Kfouri da Silva
(orientador) UNOPAR
_________________________________________ Profa. Dra. Rosemari Bendlin Calzavara
UNOPAR
_________________________________________ Prof. Dr. Ronaldo Alexandre de Oliveira
UEL
Londrina, 31de março de 2016.
“Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo,cada um pode começar agora e fazer um novo fim”. Francisco Candido Da Silva Xavier
AGRADECIMENTOS
À Deus, porque mesmo eu sendo pequena, me permite sonhar e
vislumbrar possibilidades de ser mais, superando minhas próprias limitações.
Aos meus avós, Maria Bellan Conz (in memorian), Roggero Conz (in
memorian) por tudo que com eles aprendi na arte de narrar a vida, narrando a
realidade.
Ao meus pais, Clarice Ferrari Conz e Moacir Conz (in memorian) por
terem me ensinado os valores para a vida em sociedade.
À minha família, por colaborar em cada momento desse processo,
dentro de suas possibilidades.
À Roselania Francisconi Borges, por mediar nas horas mais difíceis
do meu processo, com incentivos, não permitindo que eu desistisse desde a
graduação;
Aos amigos...
Injusto seria agradecer poucos, ou, alguns.
Muitos colaboraram para que eu pudesse trilhar os percursos
percorridos até aqui. Talvez alguns mais, outros menos. Mas todas as pessoas, que
fizeram ou estão fazendo parte da minha pequena história, meu carinho, respeito e
gratidão.
Mas, em especial, à Gleisse C.M Serra por toda cooperação nesses
longos anos de amizade e parceria; trocas filosóficas, sonhos e utopias.
Aos Professores e colegas do Programa Mestrado;
Aos professores Sonia Maria Mendes e Flavio Bento, que
acompanharam parte deste percurso, enquanto membros do Programa;
Aos professores constituintes da Banca, Rosemari Bendlim
Calzavara e Ronaldo Alexandre Oliveira, que tanto estão cooperando para o meu
crescimento;
À professora Samira Fayez Kfouri da Silva, minha orientadora, por
ter aceito, fazer parte dessa historia;
Às inteligências universais que me intuem, amparam, inspiram e
instigam minha curiosidade, em busca das possibilidades do que pode a Arte
Às minhas Estrelas Crianças, representadas por Kauan, Maria, Luiza
e Arthur, motivo maior para que eu nunca desista!
Ensino da Arte Na Educação Infantil na Perspectiva da Matriz Histórico-Cultural: Os Interstícios do Ser e vir-a-ser Professora da arte. 2016. 172 f. Dissertação (mestrado em metodologias para o ensino de linguagens e suas tecnologias) - universidade norte do Paraná, Londrina, 2016.
RESUMO
O presente estudo objetivou apresentar um relato de experiência sobre práticas docentes em artes visuais na Educação Infantil Pública Municipal de Londrina, Estado do Paraná. Tomou como mote de investigação o memorial descritivo, tanto do acervo da pesquisadora, como fornecido pelo recorte do campo investigado, tais como: imagens, projetos de trabalho, planos de aula, recursos, Projetos Políticos Pedagógicos e Planos de Formação Continuada em Arte. Privilegiou um recorte que abrangeu três centros municipais de Educação Infantil, por serem locus da ação pedagógica da pesquisadora, enquanto professora de Educação Infantil. A abordagem ensino da arte na Educação Infantil solicitou o estabelecimento de interfaces entre áreas distintas, tais como, Psicologia, Filosofia e Arte, visando compreender o movimento entre os processos de desenvolvimento e aprendizagem e a produção de semioses da criança por meio de experiências estésicos e estéticas. Buscou-se na legislação educacional brasileira vigente os recursos preconizadores que amparam os campos de experiência e a inserção da epistemologia da Arte no currículo infantil. A metodologia da pesquisa se amparou na abordagem qualitativa, no caráter exploratório, devido à proposição de investigar em seus desdobramentos a formação e a ação docente em Arte, e esta como campo de continuidade. Inseriu-se também no campo da abordagem dialética, devido à possibilidade de considerar a complexidade das relações causais entre os objetos de estudo, em seus próprios contextos e, ao mesmo tempo, visualizar a historicidade da produção dos fenômenos sociais, que não são neutros e nem simples ações pacificas, mas conflituosos e contraditórios. O arcabouço teórico da Matriz Histórico-Cultural em Lev Vygotsky (1998, 2001, 2003, 2009) e Reuven Feuerstein (apud GOMES, 2002; MEYER e GARCIA, 2007), entrelaçado à Teoria da Relação Dialógica de Paulo Freire, mostrou-se oportuno para entender as especificidades das interações sociais e as consequências para a aprendizagem. O corpus teórico-metodológico amparou-se também na abordagem etnográfica, devido a constituição de três unidades categoriais para subisidiar as análises: o escopo do professor mediador; ambientação; experiências estésicos e estéticas. Tais categorias conferem ao estudo, também, um caráter de pesquisa-formação devido ao fato de que em Josso (2004) encontrou-se os subsídios para a narrativa autobiográfica. O que permitiu à pesquisadora, o movimento entre os interstícios da gama processual de experiências advindas de diferentes percursos e momentos. Nas análises e confronto de dados, buscou-se identificar como as categorias estão presentes no espaço educativo da infância, visando situar não somente a práxis nesses espaços, mas o processo de formação da pesquisadora, que é, ao mesmo tempo, objeto de análise e coletora de dados. Nos dados coletados, em tempos e momentos diversos, nas memórias retomadas nos intercâmbios com as análises dos mesmos, descortinou-se as possibilidades do pensar e fazer Arte na Educação Infantil, considerando a realidade dos que ensinam e dos que aprendem. Ou seja, das interações que podem mediar ou não, os saberes, dizeres e fazeres dos professores da infância.
Palavras-chave: Ensino da arte. Mediação. Narrativa Autobiográfica. Educação Infantil.
Art Education in Early Childhood Education from the Perspective of Historical-Cultural Matrix: The interstices of Being and come-to-be art teacher. 2016.172 f. dissertation (master in methodologies for the teaching of languages and their technologies) - North University of Paraná, Londrina, 2016.
ABSTRACT
The present study aimed to present an account of experience on teaching practices in Visual Arts in early childhood education Municipal Public of Londrina, Paraná State. Took as motto of the descriptive research, both from the researcher, as supplied by clipping the field investigated, such as: images, work projects, lesson plans, resources, Teaching political projects and plans for continuing education in art. Favored a cut covering three city centers of Early Childhood Education, because they are the locus of pedagogical action researcher, while Professor of early childhood education. The teaching approach of art in early childhood education has requested the establishment of interfaces between different areas, such as psychology, philosophy and art, aiming to understand the movement between the processes of learning and development and the production of child semioses through estésicos and aesthetic experiences. Sought brazilian educational legislation in force preconizadores resources that support the fields of experience and the insertion of the epistemology of art in children's curriculum. The methodology of research on qualitative approach, broke in the exploratory character, due to the proposition to investigate in his unfolding training and teaching in action art, and this field of continuity. Entered in the field of dialectical approach, due to the possibility of considering the complexity of causal relationships between the objects of study in their own contexts and at the same time, show the historicity of social phenomena, which are not neutral and not simple peaceful actions, but conflicting and contradictory. The theoretical framework of historical-Cultural Matrix in Lev Vygotsky (1998, 2001, 2003, 2009) and Reuven Feuerstein (apud GOMES, 2002; MEYER and GARCIA, 2007), interlaced to the theory of Dialogic Relationship of Paulo Freire, was to understand the specifics of social interactions and consequences for learning. The theoretical-methodological corpus also broke in the ethnographic approach, due to the formation of three categories to subsidize the analysis: the scope of professor mediator; ambiance; estésicos and aesthetic experiences. Such categories, give the study, too, a research-training character due to the fact that in Josso (2004) found the subsidies for the autobiographical narrative. What enabled the researcher, the movement between the interstices of procedure range of experiences coming from different distances and times. The analysis and data confrontation, sought to identify how the categories are present in the educational space of childhood, in order to be not only the praxis in these spaces, but the process of formation of the researcher, that is, at the same time, object of analysis and data collection. In the data collected, and several moments, the memories taken up in the exchanges with the analyses thereof, unveils the possibilities of thinking and making art in early childhood education, considering the reality of teaching and learning. That is, the interactions that can mediate or not, you know, say and do from teachers of the children‟s education. Keywords: Teaching art. Mediation. Autobiographical Narrative. Early Childhood Education.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BNCC Base Nacional Curricular Comum
CMEI Centro Municipal de Educação Infantil
CND Curso Normal à Distância
DCNEB Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica
DCNEI Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
FPE Funções Psicológicas Elementares
FPS Funções Psicológicas Superiores
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
NDR Nível de Desenvolvimento Real
NEE Necessidades Educacionais Especiais
PARFOR Programa de Aperfeiçoamento de Formação Docente
PEI Programa de Enriquecimento Instrumental
PME Plano Municipal de Educação
PPP Projeto Político Pedagógico
RCNEI Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
SME Secretaria Municipal de Educação
TIC Tecnologias da Informação e da Comunicação
UEL Universidade Estadual de Londrina
UNOPAR Universidade Norte do Paraná
ZDP Zona de Desenvolvimento Proximal
ZDR Zona de Desenvolvimento Real
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Exploração sensível do espaço. 2008, 2009 ....................................... 113
Figura 2 - Exploração sensível/coleta material. Oficina Expressão
Bidimensional. 2010 ........................................................................... 113
Figura 3 - Expressão Bidimensional: relação figura e fundo. 2010 ..................... 113
Figura 4 - Experiências cromáticas. Oficina de Gravura; Ateliê de Gravura,
UEL, 2013 .......................................................................................... 113
Figura 5 - Oficina de Expressão Bi e Tridimensional. 2013 ............................... 114
Figura 6 - Experimentações Pictográficas. 2015. ................................................ 115
Figura 7 - Experiência cromática. O corpo como meio e suporte. 2009. ............. 119
Figura 8 - Oficina de gravura, 2012. ................................................................... 121
Figura 9 - Oficina de gravura, 2012. A matriz da gravura .................................... 121
Figura 10 - Oficina de gravura, 2012. O preparo ................................................. 121
Figura 11 - A impressão. 2012 ............................................................................ 121
Figura 12 - O Produto. 2012 ................................................................................ 121
Figura 13 - O processo. Relação Figura e Fundo. 2013. ................................... 124
Figura 14 - Autorretrato. 2013. ........................................................................... 124
Figura 15 - Releitura imagem especular. 2013. ................................................... 124
Figura 16 - Ambientação do espaço. Experiência Cromática. 2008. .................. 128
Figura 17 - Ambientação do espaço. Experiência Cromática. 2008. ................... 128
Figura 18 - Movimento, cores e formas. 2010. ................................................... 129
Figura 19 - Ambientações para experiências diversas. 2008, 2009, 2010,
2012. ................................................................................................. 129
Figura 20 - Ambientações para experiências diversas. 2008, 2009, 2010,
2012. ................................................................................................. 130
Figura 21- Explorando o espaço ateliê. UEL, 2012. ............................................ 130
Figura 22 - Ambientando ateliê na sala de aula. 2010. ....................................... 130
Figura 23 - Ambientando ateliê na sala de aula. 2010. ....................................... 131
Figura 24 - Ambientações diversas: refeitório e pátio externo. 2013, 2015. ....... 131
Figura 25 - Desenho com água. Experiência estesico e estética. 2010. ............ 132
Figura 26 - vivência estética. 2010. .................................................................... 132
Figura 27- Vivência estetica por agregação e regras. 2010. .............................. 133
Figura 28 - Experimentos cromáticos. 2013. ...................................................... 143
Figura 29 - Experimentos cromáticos. 2013. Oficina de expressão
Bidimensional ..................................................................................... 143
Figura 30 - Experimentos cromáticos. 2013. Oficina de expressão
Bidimensional ..................................................................................... 143
Figura 31 - Experimentos com a não cor e leitura de imagens (reprodução da
obra). 2013. ....................................................................................... 145
Figura 32 - Experimentos com a não cor e leitura de imagens (reprodução da
obra). 2013. ....................................................................................... 146
Figura 33 - composição coletiva. Bumba meu boi. 2012. .................................... 146
Figura 34- Releitura do Bumba meu boi e festa junina. 2012. ........................... 147
Figura 35- Nova releitura da produção Bumba meu boi e festa junina. 2012. .... 147
Figura 36 - O Bumba meu boi. 2012. .................................................................. 147
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 13
1 A ARTE DO VIR-A-SER PROFESSORA DO ENSINO DAS *ARTES* NA
EDUCAÇÃO INFANTIL ................................................................................................ 16
2 INFÂNCIA, ARTE E ENSINO NO CONTEXTO EDUCACIONAL BRASILEIRO ....... 29
2.1 ARTE E INFÂNCIA: UM UNIVERSO DE POSSIBILIDADES .................................. 29
2.2 O ENSINO DA ARTE E A EDUCAÇÃO INFANTIL NA LEI 9394/96 ....................... 33
2.3 OS PRINCÍPIOS ÉTICOS, ESTÉTICOS E POLÍTICOS: O ESCOPO DO
PROFESSOR MEDIADOR ............................................................................................ 40
2.4 O ENSINO DA PERSPECTIVA DA MATRIZ HISTÓRICO-CULTURAL .................. 46
2.5 DESENVOLVIMENTO DA AUTONOMIA EM PAULO FREIRE: A ESTÉTICA E A
ÉTICA COMO MARCA HUMANA ................................................................................. 55
3 FAZER E PENSAR A ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL ......................................... 62
3.1 O CÉREBRO, A CONSTITUIÇÃO OBJETIVA E SUBJETIVA E AS SEMIOSES
DA INFÂNCIA ................................................................................................................ 63
3.2 INTERAÇÃO, DIÁLOGO E INSERÇÃO CULTURAL COMO EXPERIÊNCIAS DE
APRENDIZAGEM MEDIADA ........................................................................................ 68
3.3 A APROPRIAÇÃO SIMBÓLICA E A CONSTITUIÇÃO DAS SEMIOSES PELA
CRIANÇA ...................................................................................................................... 72
3.4 ENTRE O JOGO SIMBÓLICO E AS IMAGENS MENTAIS: A FORMAÇÃO DE
CONCEITOS E A SIGNIFICAÇÃO DO MUNDO EM ARTE .......................................... 80
4 METODOLOGIA ........................................................................................................ 88
4.1 PRESSUPOSTOS EPISTEMOLÓGICOS DA PESQUISA QUALITATIVA.............. 88
4.2 RECURSOS METODOLÓGICOS ........................................................................... 90
4.3 SITUANDO O CAMPO E DELIMITANDO A EXPERIÊNCIA ................................... 94
5 LIMITES E POSSIBILIDADES: A IDIOSSINCRASIA DA EXPERIÊNCIA COM O
ENSINO DA ARTENA EDUCAÇÃO INFANTIL ............................................................ 99
5.1 OS MEANDROS DO SER E FAZER-SE PROFESSORA DA INFÂNCIA E DA
ARTE ............................................................................................................................. 101
5.2 TECENDO AS TRAMAS DO OLHAR NA URDIDURA DA PERCEPÇÃO SOBRE
O ESPAÇO LUGAR DA AÇÃOPEDAGOGICA ............................................................. 108
5.3 ANDRILHANDO NAS LINGUAGENS DA ARTE: UM UNIVERSO POTENCIAL
DE VIVÊNCIAS ............................................................................................................. 111
5.4 O ATELIÊ: A AMBIENTAÇÃO COMO PARTE DO PROCESSO E NÃO COMO
MERO ESPAÇO CIRCUNSCRITO ............................................................................... 125
5.5 O MOVIMENTO DE SENTIR-VER-PENSAR-AGIR E TRANSFORMAR O
MUNDO ......................................................................................................................... 134
6 O QUE PODE A ARTE .............................................................................................. 149
6.1 PARA NADA CONCLUIR ........................................................................................ 169
7 CONSIDERAÇÕES .................................................................................................... 171
REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 180
ANEXOS ............... ............................................................................................... 188
13
INTRODUÇÃO
No percurso específico de um estudo em processo, visto que aqui
não se encerra, os dados e as análises que aqui apresento, vinculam-se a um
movimento de investigação muito particular. Apresento um recorte que priorizou a
necessidade da busca e amparou-se nas formas de formação contínua e qualitativa.
Ao mesmo tempo, visou coletar, refletir, analisar e otimizar informações que possam
colaborar para elucidar as questões postas sobre o processo formativo humano e
suas correlações e, em especial, sobre o processo de mediação em ensino da arte
na Educação Infantil.
Tomei como ponto de partida o pressuposto que a finalidade maior
da educação é humanizar. E que a humanização ocorre por processo contínuo e
interacional. Parti da premissa de que a Arte é mediadora por excelência na
constituição de saberes e agires no mundo. Sinalizei a necessidade de um visualizar
além do que está determinantemente posto no cenário educativo atual, no âmbito da
educação básica. Mais especificamente, no que concerne ao ensino da arte1 em sua
primeira etapa e subsequentes. Assim como, de sua estruturação e planificação em
torno dos estudos para a compreensão da cultura visual ou, das diversidades de
saberes que constituem a simbólica do cotidiano cultural da sociedade atual.
Desse modo, ao dimensionar o contexto sócio-educativo circunscrito
a um momento histórico, cuja realidade enfoca a complexidade das relações
humanas em um universo tecno-globalizado, virtual, dinâmico, efêmero e
multicultural, evidenciei a premente necessidade de um repensar de paradigmas em
educação e em ensino. Sobretudo, àqueles pertencentes ao aparato da práxis em
arte e sua aplicabilidade e, ainda, aqueles que concebem o conhecimento como
sendo produzido apenas dentro do âmbito das academias e como posse de uns
poucos privilegiados.
Descortinei no âmbito teórico, legal e prático, que a escola
contemporânea em todas as suas modalidades e instâncias, requisita emergência
de olhares, análises, reflexões, pensamentos. Exige ainda que estes suscitem
possibilidades de ações de transposições didáticas compatíveis aos contextos dos
1 - Arte: conhecimento e produção artístico-estética; arte: conteúdos.
14
sujeitos e das especificidades da relação ensino e aprendizagem. Pressupõe,
portanto, posturas diferenciadas no que se refere à qualidade das relações que
abarcam o cotidiano das interações sócio-afetivas na dimensão das atividades
pedagógicas e suas implicações.
Especificamente os que envolvem as questões curriculares em
vigências com as reais necessidades de seus destinatários, os docentes e os
discentes. A saber: a qualificação profissional constante e significativa, envolvendo a
formação permanente e continuada em todos os seus aspectos e âmbitos
disciplinares, inclusive as experiências adquiridas em serviço; a adequação e a
postura profissional frente às diversidades sócio-classistas e culturais; o uso de
instrumentos e ferramentas tecnológicas como mecanismos e meios disseminadores
de informação e cultura, sendo úteis na elaboração e execução da pratica diária; a
busca constante sobre as ideias de cunho filosófico e psicológico que alimentam e
sustentam as informações de bases objetivas e subjetivas sobre a constituição
humana em todos os seus aspectos e fatores, incidências e consequências futuras.
Diante do exposto, ficou evidenciado que a instituição escolar do
século XXI, em todas as suas modalidades, requer um profissional apto a atender a
sua demanda e a interferir na atual estrutura com possibilidades de transformação
da realidade instaurada, permitindo sua própria mudança. Para tanto, faz-se
necessário que os docentes em geral, saibam perceber, identificar e acolher as
necessidades emergentes dos sujeitos da aprendizagem, começando por suas
próprias questões sobre as temáticas convergentes. Estas necessidades envolvem
o repensar e o replanejar da escola em qualquer instância ou modalidade; servindo
a mesma máxima ao planejamento das áreas curriculares, dos saberes disciplinares
e constituídos na práxis. Assim como, das concepções teórico-metodológicas que
organizam o trabalho educativo. A flexibilidade cognitiva e a abertura ao novo, ao
diferente, ao estranhamento, necessitam entrar na agenda da educação e do ensino.
Somente na conferência da condição epistêmica aos atores do cenário educativo e à
escola como o espaço aberto para discutir as questões curriculares, será efetivado a
sua função maior; a de mediar o acesso ao conhecimento entre os saberes
instituídos historicamente e internalizados culturalmente, e, aqueles provenientes
das experiências subjetivas e criativas do cotidiano.
Esta postura demarca a relevância de pedagogias que abarquem em
seu cerne as dimensões sociais e afetivas, estéticas e sensíveis como mediadoras
15
naturais do desenvolvimento da autonomia no processo de constituição de saberes
para a humanização, visando à equidade. Nesta perspectiva, o abandono de velhos
paradigmas e posturas unilaterais em detrimento das relações mediadas, torna-se
imprescindível em uma ação educativa que, respeitando as individualidades e o
diverso, possibilitam a inserção e a reapropriação, a recriação, a reelaboração e a
produção das culturas específicas. Bem como, da internalização de uma contra-
consciência ás formas de internalizações aculturadas; atendendo equitativamente a
todas as classes socioeconômicas e aos sujeitos em suas particularidades
especiais, sem preconceitos às formas de pertencer étnica e culturalmente.
Nesse sentido, apresento e defendo como prerrogativa [ à luz de
autores consagrados, aqui de um referencial muito especifico] para o ensino da arte
na educação infantil, a ênfase das interações sociais como dimensões relevantes da
constituição das identidades. Enfatizo o caráter e a função social da Arte como
mediadora no processo de desenvolvimento cognitivo, social, afetivo e cultural e,
sobretudo da empatia e da sensibilidade. Formas muito especificas da inteligência
que conjuntamente á razão e á função emotiva, otimizam o agir e o ser do potencial
humano a nível criador e pensante, no sentido da criticidade e da autonomia para as
ações reflexionadas. Ações a serem comportamentalizadas na vida social, em cada
um dos seus núcleos, família, comunidade externa, acadêmica, politico ideológica,
filosófica e religiosa, global cibernética e cultural histórica.
16
1 A ARTE DO VIR-A-SER PROFESSORA DO ENSINO DAS *ARTES* NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Apresentar imagens requer técnica e poética, condições tão importantes na formação de um professor quanto saber aspectos teóricos da historia da arte, fundamentos da linguagem e procedimentos que envolvem a criação artística. Tem que querer compartilhar emoções e saberes (MARTINS, 2012, p.64).
A Arte, por sua presença no mundo, marca a trajetória cultural da
humanidade. Sendo assim, não deve ser habitada somente por quem se dedica ao
seu ensino ou por quem a produz. A presença permeável da Arte no mundo permite
que a habitemos e que ela nos habite, nos toque, nos provoque e nos influencie.Esta
experiência mediada nos torna muito mais que consumidores e produtores; habilita-
nos a sermos intérpretes dos cenários sociais e das formas de manifestações
diversas das culturas atuais e históricas, de sua propagação e manutenção.
Ao ensino da arte2 cabe o compromisso de promover o
desvelamento dos conteúdos específicos e dos conceitos geratrizes que possam
agregar ao corpo sensitivo e pensante a gama potencial em formas de descobrir
apropriar-se do mundo estesicamente. Bem como, as provocações estéticas
necessárias para o movimento específico na constituição produtiva de percepções
que movam à invenções criativas, do eu, do outro, do nós, do mundo e de sua
objetualidade3. De modo que ocorra em um processo de construção, desconstrução
e reconstrução imanente.
A mais importante legislação vigente da educação brasileira,
denominada Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9394/96
(BRASIL, 1996), explicita que a Arte é área de conhecimento e currículo em toda a
Educação Básica. De acordo a alteração ocorrida na LDB em 2010, consta em seu
parágrafo 2º que “o ensino da arte”, especialmente em suas expressões regionais,
2 Neste trabalho, visando diferenciar a epistemologia e o ensino, Arte (com grafia maiúscula), será utilizada para indicar o campo do conhecimento, enquanto Área e um saber específico, as organizações e o produto artístico dos Cânones.O termo arte (com grafia minúscula) refere-se ao ensino da arte e as produções dele advindas.
3 O termo objetualidade, no contexto exposto, e em consonância ao aporte teórico será tomado para referir-se à todos os recursos pedagógicos utilizadospara as experiências de aprendizagem em artenaeducação Infantil, tais como: livros, narrativas diversas, imagens, audiovisuais, brinquedos, brincadeiras, materiais artísticos convencionais e alternativos; produções culturais diversas e recursos da natureza.
17
constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da educação
básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos (BRASIL,
2010b).
Enquanto primeiro nível de ensino, a Educação Infantil se configura
como cenário latente da gama cognoscente e sensível. Do potencial expressivo, da
imaginação e da criatividade das crianças. Caracterizando-se como espaço em que
a invenção necessita que a imaginação alce vôos tangíveis e sem limites, para que o
potencial criativo possa aflorar nas interfaces com a capacidade argumentativa.
Nesse sentido, o que promove o desenvolvimento potencial das
formas da inteligência é a experiência (VYGOTSKY, 2003). O ensino da arte na
educação infantil favorece o cultivo da vitalidade natural e imanente dos pequenos
descobridores do mundo. A caracterização das formas reativas aos estímulos
presentes na objetualidade dos diversos estímulos ofertados e do entorno, ou ainda,
nas informações diversas que emanam das interações, suscitam formas
mediacionais equivalentes à capacidade perceptiva e ao contexto de inserção das
crianças.
Tais apontamentos iniciais configuram-se em relevantes enunciados
para localizar a questão da temática, ou da problematização aqui exposta; o porque
da abordagem sobre o ensino das artes na educação infantil e o pensar-se como
parte do processo de formação, pela perspectiva relacional instituída no confronto
arte, ensino, profissão e vida. E ainda suscitar o fomento sobre as questões de
campo disciplinar, quer seja na formação docente, ou do conhecimento sobre e das
crianças em processo de aprendizagem.
No decurso de meu processo de formação acadêmica básica,
poucas lembranças estão armazenadas em minha memória, sobre o ensino da arte.
No entanto, a memória é excelente no que concerne às narrativas orais e visuais, às
leituras diversas e à escrita de versos: meus avós paternos eram contadores de
histórias; misturavam mitos, contos, fábulas e a realidade. Minha avó, era
analfabeta, não sabia ler ou escrever. Mas, narrava historias orais, que ouvira de
seus pais e aquilo causa em mim, um fascínio, pois, os bisavós maternos, vieram da
Itália ainda mocinhos e eu não os conheci nem por fotografias. Mas, os conhecia
pelas historias que a minha avó contava, do motivo da vinda, da vida ao Brasil, da
dureza da vida rural e do sonho de construir uma nova realidade.
18
Meu avô paterno nunca falava sobre sua família. Mas, esses
familiares, eu conheci alguns, por histórias, narradas pela minha avó e
pessoalmente. O biso paterno, veio da Áustria e a bisa da Espanha, e aqui se
casaram. Tiveram 7 filhos, conheci todos os tios e tias, pessoalmente e a bisa, por
fotografia. Meu avô contava outros tipos de histórias, envolvia política, filosofia e
religião; também escrevia textos imensos que ele denominava de poemas.
Desenhava muito, inclusive na areia. Era bonito observar sua ação de escrever ou
ler e transcrever seus próprios textos de um caderno a outro, como se quisesse
multiplicá-los, para perpetuar sua memória no tempo. Assim como, à roda de
brinquedos cantados e dos desenhos de passarinhos e coqueirinhos. Desenhos, que
mesmo sendo estereotipados [ hoje eu assim os identifico á luz de teorias
específicas sobre desenvolvimento gráfico e expressivo ] quando na época da
infância, pareciam pequenos milagres saídos de gravetos, canivetes, canetas e
pedaços de carvão que, ele, meu avô paterno, utilizava para desenhar, na areia, em
pequenos pedaços de madeira, paredes e em locais que pudesse deixar uma
marca. Fascinava-me vê-lo mover-se no processo, tanto de produzir, quanto de
narrar histórias, orais, escritas e visuais.
Trago estas memórias, pois elas traduzem, me constituem e
eternizam um tempo/espaço/ambiente que representa parte do que hoje sou, como
pessoa, como profissional. Martins (1998) explica que esses momentos de contato
com a natureza ou a essência da narrativa, são quase mágicos para uma criança em
processo de desenvolvimento e aprendizagem, visto que "[...] nem mesmo sabendo
por que, ficamos envolvidos num jogo. Num jogo de ensinar e aprender" (p.127).
Muito por certo, esses momentos mágicos da minha infância, irromperam minha
paixão pelas narrativas das infâncias, com as quais tenho atuado desde 1994, como
professora. Fascina-me suas semioses4 como campo de possibilidades, tanto de
aprendizagem, quanto de ensino, de busca, de estudo e pesquisa.
Esse argumento por si, creio eu, garante a abrangência cientifica
desse estudo. Não o bastasse, atento-me ao fato de que, meu verdadeiro encontro
4 O termo Semioses será utilizado para referir-se às formas comunicacionais que a criança utiliza. Embora nos
remeta diretamente à Semiologia, abordada pelos estudos de "Semiótica e Filosofia" de Charles Sanders Peirce (1977) indicando a construção do processo de significação e produção de significado, neste estudo não será abordado a questão Semiótica na perspectiva pierciana do termo. Mas sim, com base nos estudos da Matriz Histórico-Cultural de internalização e apropriação simbólica mediada pelos sistemas de signos (VYGOTSKY, 1998, 2003) e nas pesquisas de Francisco Duarte Junior (2002), sobre a constituição do saber pelo processo de asthesia e da estética.
19
com a arte, ocorreu no universo educativo da infância. Desde meu ingresso em
1994, muitas foram as dificuldades, as angustias e os questionamentos, dadas as
especificidades da ação docente no universo da infância. E em proporção de maior
abrangência, as alegrias dos encontros estéticos, das vivências tornadas
experiências nas formas interacionais de mediação com os pares e com as crianças,
sempre fruto da curiosidade investigativa, do estudo, da busca, da pesquisa. Dessa
forma em 2005, encontro-me com o ensino da arte na formação docente para as
Artes Visuais e traço meu percurso de formação, tendo como meta, pensar e agir
para que o ensino das artes na Educação Infantil, ocorra, ocupando o lugar de
Epistemologia que lhe cabe.
Assim como em um mapa, sinalizo meu trajeto, nesse estudo, à luz
de muitas inteligências que me amparam, instigam, provocam, subsidiam, socorrem,
mediam e aqui, por ora, denomino de Matriz Histórico-Cultural, de Lev Seminovith
Vygotsky. Desse modo, sinalizo um recorte especifico para pensar a interação social
como base da mediação da aprendizagem.
Destarte, busco amparo nos pressupostos de Goodson (2007),
onde, ainda na graduação, encontrei a fundamentação necessária para traçar o
itinerário sobre a relevância da mediação e da mediação em ensino da arte na
infância, na perspectiva curricular, considerando minha própria história e formação
profissional. Segundo este autor,
A história de vida de um professor é parte crucial da compreensão da prática escolar. Para compreender algo tão profundamente pessoal quanto ensinar, precisamos compreender quem é o professor, sua personalidade, porque o modo de ensinar, as práticas de ensino e as pedagogias estão intimamente ligadas à sua história. (GOODSON, 2007, p.21)
Tomo a afirmativa do autor para o entendimento da constituição
histórica do humano e seu movimento, caracterizado na interação. Cada um de nós
é uma biografia, uma história construída e constituída por relações familiares,
sociais, afetivas e também por crenças, valores e necessidades mediadas por estas
interações, que marcam, afetam, instigam e movem a fazer escolhas nos mais
diferentes e diversos aspectos da vida, inclusive nas questões de ordem profissional.
Dessa forma, comecei minha prática docente. Em julho de 1994
ingressei no serviço Publico Municipal de Londrina, Estado do Paraná e em maio de
1995, eu quis sair, devido as angustias que me assolavam e ao assédio moral
20
sofrido em decorrência do meu cargo (auxiliar de creche) e da função exercida
(Monitora de creche). Era hábito nas reuniões de professores, o monitor, cargo de
maior destaque na instituição, culpabilizar os ocupantes do cargo de auxiliares, pelo
comportamento inadequado das crianças. Falavam como se eu não estivesse
presente e ainda diziam que se as 'colegas viessem a tomar conhecimento do teor
das conversas', teria sido por mim.
Desde os tempos idos até o presente, não mudou muito. Em vários
momentos da minha história fui assediada moralmente. Ora por não ter formação,
ora por tê-la. Em virtude de ter feito um concurso com Edital aberto pela Secretaria
de Assistência Social, em 1995, e, mesmo com a transposição para a Secretaria
Municipal de educação em 1998 e, a mudança de nomenclatura do cargo para
Professor, mais de uma vez ouvi de colegas, chefias e coordenadores que não sou
professora. Tanto que para setor Gerencial da SME, eu, não posso planejar, mas
posso executar. O mais interessante é que em vários momentos, e por critério
estipulados pelo próprio setor gerencial, assumi como auxiliar de supervisão (2012).
Em 2014, assumi como regente de oficina de artes, devido a minha formação e
cooperei com redações de Projetos Políticos Pedagógicos em dois CMEI, em 2011,
2012 e 2015, retrospectivamente. Entre os anos de 2007 a 2015, elaborei, orientei e
cooperei com Projetos de Trabalho em Artes, ora com suportes teóricos
metodológicos, ora de forma prática e em sala de aula. Outro aspecto importante
que considero foi a Supervisão de Estágio Curricular, na parceria UEL/SME/CMEI e,
2015, acompanhando 3 acadêmicas em Artes Visuais (Vide anexo 1), de julho a
novembro e, além de atuar como professora por anos seguidos, antes do acidente
de Trabalho em 19995, que me afastou em 2002 de sala de aula, devido as
especificidades laborativas corporais das atividades6, mas não da função
pedagógica.
5 - Em virtude de uma queda durante a atividade laboral, em decorrência de o piso estar
escorregadio, cai sentada e devido ao impacto, lesionou as articulações sacroilíacas, que suportam o peso do tronco e estão, portanto sujeitas ao desenvolvimento da dor por entorse e artrite. Localizada na bacia, provoca dores lombares e dificulta o movimento. Motivo pelo qual, além de ser afastada, até hoje prossigo com o tratamento, arcando com todos os custos, pois, na época não foi feito o procedimento do CAT- certificado de acidente de trabalho. 6 Ao professor de Educação Infantil, compete algumas especificidades no duo cuidar e educar, que no passado
foram muito confundidas com assistencialismo e devido a fatores de ingerências, ficava a cargo do professor, a limpeza de mesas e colchonetes, banheiros e outras demandas de higiene do local a de instrumentos a serem utilizados durante a rotina. O que requer esforço físico e movimentos bruscos repentinos. O acidente de
21
Assim fui me fazendo professora e, desse modo no encontro com
Josso (2004) em "experiência de vida e formação", descubro as possibilidades para
o pensar sobre o movimento das histórias de vida como mecanismos de formação
contínua e das narrativas autobiográficas como elos de produção de saberes. Ao
prefaciar o livro supracitado, Nóvoa (2001 in JOSSO, 2004) explicita a história do
movimento de uma vida em formação, tendo como premissa que "todo
conhecimento é auto-conhecimento, toda formação é auto-formação" (p.14). O autor
enfatiza a citação e situa a historiografia das autobiografias como processo histórico
da historia do trabalho cientifico na perspectiva apresentada por Josso (2004). Ou
seja, historias escritas a partir da vivência tornada a própria experiência percebida,
sentida, vivida e que,
[...] nos introduz num universo de ideias sem o qual nada compreenderemos sobre os dilemas educativos e, em particular, sobre os dilemas de formação de adultos [...] passa pela definição das historias de vida como metodologia de pesquisa-formação, isto é, como metodologia, onde a pessoa é, simultaneamente, objecto e sujeito da formação (NÓVOA, 2004, p. 15).
Sobre o fazer pela experiência adquirida, Larrosa (2002) esclarece
que é um processo muito além de informações, tornando-se um fator cada vez mais
raro na vida cotidiana, devido ao excesso de informação. Para este autor “dir-se-ia
que tudo o que se passa está organizado para que nada nos aconteça [...]. Nunca se
passaram tantas coisas, mas, a experiência é cada vez mais rara” (LARROSA, 2002,
p.21). A ênfase do autor sobre o saber adquirido pela experiência, recai, no fato de
que para ele, a contemporaneidade, apregoa à informação um caráter não real de
experiência, pois, “a informação não é experiência. [...] não deixa lugar para a
experiência [...] ela é quase uma antiexperiência” (LARROSA, 2002, p.21).
Logo, na perspectiva posta, pressuponho que, o que se vivencia é
um discurso retórico do estar informado e ser sujeito que informa, sem estar de fato,
tendo uma vivência tornada em uma experiência. Isto é, a ação simbólica tangível,
estésica e estética, como possibilidade de apreciar e comunicar o mundo, ao ler e
interpretar suas coisas, seus objetos, compreendendo a aplicabilidade do que se
aprende.
Tendo como mote, as possíveis relações mediadas pelas narrativas
dos autores supracitados e, entrelaçando-as, tanto aos postulados da matriz
trabalho, não me permite mais alguns movimentos físicos, por isso o afastamento da função em sala de aula, por um período de 6 horas diárias.
22
histórico-cultural, quanto às pedagogias dialógicas freirianas aos pensamentos
pertinentes, considero que a medida, o lugar, o locus possível das e para as
aprendizagens mediadas pela arte, é o corpo sensitivo e pensante em constante
movimento. E este, o corpo, enquanto campo, meio e mecanismo da experiência,
possibilita retomar as minhas vivências da infância e, quer seja, em meu próprio
processo, quer seja como professora mediadora entre a criança e as questões
artísticas, ou os pares e o processo formativo, em aspecto geral e em ensino da
arte. E desse modo, me é permitido compreender o lugar que ela, a experiência,
ocupa em meu processo e qual o papel que o outro social, representa, enquanto
mediador desse processo de construção do saber mediado pela arte e seu ensino.
Cada ser humano é um universo de potencial a ser explorado, desenvolvido,
otimizado. Mas, só é potencialmente capaz, desde que seja instigado, motivado,
mediado e sinta necessidades de.
Tal percepção e compreensão é crucial para que eu possa mover-
me na senda acadêmica e profissional. E assim, tomar de empréstimo meu próprio
corpo como objeto de estudo em intercâmbio contínuo, tanto com as filosofias
diversas que sustentam as teorias psicológicas do discurso pedagógico, seus
conceitos, paradigmas e leis. Quanto com os corpos sensitivos e pensantes dos
pequenos descobridores do mundo, as crianças com as quais interajo e com o meu
próprio corpo. E ademais, com outros corpos sensoriais e inteligíveis do e no
universo da andragogia, que, embora mais resistentes, não menos sensíveis em
potencial para o aprender fazendo, sob mediação, a pensar a transposição didática
em arte visual para a infância.
Isto p
osto, busco em Varela (2003) a base para pensar a junção pesquisa-
formação-pesquisador no âmbito expresso da experiência e não como simples
expectador. Visto que o processo de conhecer, explicitado por esse autor, consiste
em agir, criar e fazer. Prática que só é possível por vias de uma pedagogia
cartográfica, um método de junção de coisas, com quesito multirreferencial. O que
me direciona à Lévi-Strauss (1970) e ao bricoleur, visto que, na perspectiva desse
autor, a ciência hodierna não é absoluta e o conhecimento histórico, acumulado
secularmente pelos humanos, não inclui apenas os processos científicos pós criação
da ciência moderna. E para efeito, a mesma age, como se todo o conhecimento
surgido a posterior, fosse originário do acaso ou fruto de mero acidente.
23
Ao pensar o ensino da arte na educação infantil sob esta perspectiva
interdisciplinar, Barbieri (2012, p. 18), despontou como a possibilidade de pensar
pedagogias em arte que instigasse à “[...] cada criança a descobrir como é o seu
mundo de invenções, abrir a porta para novos conhecimentos, e assim aprender a
imaginar e fazer”. E ao professor, enquanto pesquisador, do objeto de estudo e de si
mesmo, a perceber as sutilezas da práxis enquanto correlação teoria e pratica em
ação cooperada e processual. O que implica o aprender a fazer pela experiência,
considerando nesse aspecto, o que a autora destaca, como a dialeticidade do ato de
ensinar e aprender, caracterizado nas vivências cotidianas. Ou seja, “todos nós
temos experiências estéticas desde que nascemos, porque elas se relacionam com
a estrutura que vai se criando, tanto em nosso pensamento, quanto em nossa
percepção” (BARBIERI, 2012, p. 37). Isto posto, infiro que o nascimento humano,
abarca duas dimensões, uma biológica e uma cultural.
Fato que constato em Paulo Freire (1996) quando este autor alude à
constituição do conhecimento, destacando o respeito para o “saber da experiência
feito” (FREIRE, 1996, p.29). Para ele no ato da “leitura do mundo” precede a “leitura
da palavra” (FREIRE, 1996, p. 81). Logo, o saber não é um dado apenas do
arcabouço do conhecimento armazenado historicamente e arquivados em
instrumentos tecnológicos e em narrativas diversas, como a própria oralidade, os
livros, as bases de dados das TIC e afins. Ou, como explicita Larrosa (2002) da
informação recebida. Mas, antes passa pelas possibilidades de um “saber ingênuo”
(FREIRE, 1996, p.39) que emana da objetualidade do mundo nas diversas
vivências, ou experiências, tornadas em um saber específico.
Meus avós não possuíam títulos acadêmicos. Diria eu que, hoje,
seriam considerados iletrados. Mas, a priori, minha paixão por aprender, surgiu das
minhas vivências primárias, amplamente sentidas pelo corpo e memorizada pela
experiência da ação - estesicamente vivenciada e esteticamente percebida.
Experiências que, sendo mediadas pelo gesto, a troca, a expressão, a fala, a
simbologia, a interação com o outro - meus avós - que sabiam um pouco mais que
eu, criança curiosa, instigaram-me à busca, à construção da autonomia pelo
processo da ação e do ato de aprender, e a paixão por ensinar. Hoje, eu o sei.
Assim sendo, penso eu, que se claro fosse à compreensão sobre o
ato fundante (FREIRE, 1996) do aprender e, de imediato, a humanidade percebesse
e compreendesse as possibilidades do ato de ensinar, não haveria a necessidade de
24
trilhar caminhos limitados. Pelo contrário, muito certamente, uma vez que houvera
compreendido a relevância das experiências informais, enquanto campos de
possibilidades, bem como a sua repercussão nas semioses infantis, o ensino da arte
trilharia caminhos possíveis, correlacionando arte e vida.
Sob este prisma, entendo e concordo com Freire (1996), quando o
mesmo alude a politicidade do ato educacional, e de como o mesmo pode ser um
universo de vivências e experiências, em sentido de via mão dupla. E me questiono
qual está sendo, de fato, a base para se estabelecer uma intimidade entre vivência e
memória, experiência e historia, interação e ação, mediação e transcendência?
Afinal, para que serve o ensino da arte na educação infantil? Quais relações são
contextualizadas entre os elementos da experiência social da criança e os diversos
elementos curriculares propostos e denominados, hoje, de campos de experiências?
Tomo esta prerrogativa como mote ao meu processo, da formação
do professor da infância e às especificidades do ensino da arte nessa modalidade
educativa. Esta formação pode ser considerada um divisor de águas no que tange
ao espaço que o ensino da arte aufere, ou deixa de conquistar, nesse início do
período de escolarização. Nesse caso, apresento aqui, uma análise de minha
autobiografia, ou, das vivências tornadas experiência como professora no sistema
público municipal de Londrina, Estado do Paraná, bem como a minha formação
acadêmica em Artes Visuais. Dessa forma no transito entre instâncias e
modalidades educacionais, elucidar à luz da matriz Histórico-Cultural e do referencial
coadjuvante aqui exposto as possibilidades do pensar e fazer arte na Educação
Infantil.
Alguns outros questionamentos povoam minha mente e me instigam
às ações laborais em ensino da arte na educação infantil, quando possível7. Ei-los:
como a Epistemologia da Arte configura os temas relevantes do cenário
contemporâneo na e da formação docente para a infância? Qual é, de fato, o
entendimento dado a Arte, enquanto campo conceitual, na formação do professor
que atua na Educação Infantil? A organização do currículo Arte e a transposição
7 Professora Sistema Publico Municipal com laudo de readequação funcional, devido a um acidente de trabalho
1998, que provocou uma lesão na articulação da bacia (sacrum-ilite). Desde então, há oscilações em minha ação laboral. Ora estou no administrativo, ora no pedagógico e ate na SME (2014) Setor Apoio Psicopedagógico. Outro fator, é a variabilidade em termos legal, relacionada ao meu cargo função, ora sou professora,ora não sou. Ora ministro oficinas e formação docente, ora não posso planejar e apenas executar sob orientação.
25
didática estão alcançando suas preconizações? Em quais parâmetros, de fato, o
professor da educação infantil ampara o seu fazer pedagógico com os conteúdos
específicos da Epistemologia da Arte?
Visando responder a estas e a outras questões, o objetivo deste
estudo é desvelar as possibilidades do ensino da arte na Educação Infantil a luz da
matriz Histórico-Cultural e se possível, ampliá-las. Para as análises serão
considerados como parâmetros, alguns percursos de minha experiência docente,
enquanto profissional de Educação Infantil e professora colaboradora do curso de
Artes Visuais da Universidade Estadual de Londrina. A Cidade de Londrina,
Localiza-se na região norte do Paraná. Buscando alcançar tal objetivo, propus,
apresentar e analisar minha experiência com oficinas pedagógicas promovidas a
partir de Projetos de Trabalho8 elaborados entre os anos de 2007 a 2015, em três
Centros de Educação Infantil (CMEIs) do referido município.
Motivo pelo qual, em termos metodológicos, optei pela pesquisa
qualitativa de cunho etnográfico e autobiográfico. Assim fui/estive a/no campo com o
intuito de ser parte/cooperar/observar/refletir/descrever/analisar as práticas do
ensino das artes em âmbitos específicos de instituições de Educação Infantil do
município em tela, no que concerne ao recorte exposto. O campo, nesse caso,
envolveu minhas memórias históricas e registros narrativos diversos, tais como,
recursos escritos, fílmicos e imagéticos.
Amparei-me metodologicamente na afirmação de Sampieri, Collado
e Lucio (2013, p. 506), segundo os quais,a pesquisa etnográfica pretende “descrever
e analisar ideias, [...] hábitos, conhecimentos e práticas de grupos, culturas e
comunidades”. No caso desta pesquisa, a descrição e análise tiveram como recurso
metodológico uma amostra da coletânea de meus registros, enquanto diário de
campo ou acervo pessoal, resultado de minha atuação pedagógica como professora
do sistema educacional infantil de Londrina de 2007 a 2015 em três instituições de
educação infantil. O que confere à amostra, dados advindos do processo formativo e
profissional, configurando-a também como pesquisa-formação e caráter
autobiográfico (JOSSO, 1999, 2004).
8A perspectiva dos Projetos de Trabalho possibilita organizar o currículo de forma a promover ações
significativas, tanto do âmbito do ensino, quanto da aprendizagem. Os projetos abrem possibilidades de pesquisas sobre os diversos âmbitos do conhecimento de modo relacional e não linear, contextualizando do micro para o macro. No caso do ensino de arte, ganha relevância pela possibilidade de aproximação entre os campos conceituais e a realidade cotidiana dos envolvidos (HERNANDEZ; VENTURA, 1998).
26
Segundo Minayo (2012, p. 14) a metodologia confere ao processo
de pesquisa “o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da
realidade”. Por se tratar também de um estudo bibliográfico a premissa básica é que
este processo de pesquisa “embora seja uma prática teórica” pode vincular
“pensamento e ação”. Nesse caso, ele pode se constituir como uma atividade
científica fundamental já que pela investigação e (re) construção da realidade, é
capaz de produzir conhecimento. Pois, “nada pode ser intelectualmente um
problema se não tiver sido, em primeiro lugar, um problema na vida prática”
(MINAYO, 2012, p. 16).
De acordo a essa premissa, como forma de subsidiar as análises
extraídas das experiências em questão, realizei uma pesquisa bibliográfica para a
qual tomei como referência autores da Matriz Histórico-Cultural. Dialoguei mui
diretamente com Lev Seminovitch Vygotsky (1896-1934) e Reuven Feuerstein
(1921-1914), devido ao fato de suas teorias respaldarem as minhas analises, por
preconizarem a mediação como essencialidade da construção humana. Ambos os
autores, autores, enfatizam a cultura e a afetividade como marcas da estruturação e
modificabilidade da capacidade de ensinar e aprender e me oferecem os subsídios
para pensar a transposição didática, considerando a construção da autonomia pelo
ensino da arte.
Ademais, busquei em Paulo Freire (1921-1997) o pensamento
dialógico como baliza para os preconizadores de uma prática que possa contribuir
com a formação e com a construção de consciências autônomas e politizadas,
éticas e estéticas, considerando a práxis como via de mão dupla. Nesse sentido, a
experiência prática dos professores, ou seja, a minha práxis, é a peça fundamental
nesse processo.E nesse aspecto insiro-me como parte essencial em um processo
mutual na relação ensino e aprendizagem em arte.
Com o intuito de refletir sobre estas e outras questões que, por
ventura, surgissem durante o exercício de pensar, organizei esta reflexão em seis
capítulos, excetuando-se as considerações finais.
No capítulo intitulado Infância, arte e ensino no contexto educacional
brasileiro, abordo o lugar que a Arte ocupa na formação humana. Para tanto, reuni
os pressupostos básicos ligados ao referencial teórico que embasa este estudo, bem
como as legislações pertinentes ao contexto educacional brasileiro, principalmente,
aquelas voltadas a Educação Infantil e ao ensino da arte.
27
No capítulo seguinte, denominado Fazer e pensar a arte na
Educação Infantil destaco os principais conceitos da Matriz Histórico-Cultural em
correlação a alguns aportes teóricos que indicam a relevância da produção
semiótica na infância. Apresento Peirce, por sua definição de signo de uma coisa
que representa outra à alguém que a Interpreta e, cito Marx, por sua relevância para
o entendimento do conceito de atividade. Sinalizo as incursões de Duarte Júnior
sobre os campos dos saberes estésicos e estéticos e busco na aproximação às
pedagogias de Paulo Freire, as balizas, sobre os possíveis caminhos para pensar
ações voltadas ao ensino e a aprendizagem de arte na escola infantil. Recorro a
Josso como mediadora da narrativa do vir-a-ser professora da arte e da infância.
No capítulo destinado à Metodologia apresento a perspectiva
epistemológica e o percurso metodológico que norteia este estudo, definindo o
campo e período de pesquisa, bem como os critérios para análise de dados.
No último capítulo destinado às análises, intitulado A idiossincrasia
da experiência com o ensino da arte na educação infantil: Aprendizagem mediada e
autonomia na perspectiva da interação, apresento um panorama, considerando
aspectos relevantes do meu percurso de experiência, das minhas vivências pessoal
e acadêmico profissional, arguidas sob os questionamentos que inquietam minha
mente e impulsiona a minha ação, enquanto práxis, da pedagogia à andragogia.
Na sequência, no capítulo o que pode o ensino da arte?, apresento
uma narrativa intercalando parte do meu processo profissional e parte do meu
processo acadêmico, como resgate de percursos específicos entre o formar-se e o
Vir-a-Ser professora e Professora da Arte.
Enquanto considerações finais teço alguns argumentos em
associação a muitos questionamentos que, em paralelo ou dicotomicamente,
assolam a realidade, quer seja, da arte, campo de ensino, ou campo de formação
para a práxis. Creio que um bom professor não é somente teórico ou pratico, mas,
ambos e, saber mediar, despertar o prazer para o querer, à reciprocidade ao contato
com o conteúdo do objeto a ser aprendido, seja racional, sensível ou a junção de
ambos é uma arte a ser aprendida em cooperação.
28
Dentre as mais sofisticadas tecnologias, a ferramenta mais básica e mais eficaz do
professor, é o ato de ler a realidade cotidiana, observando as nuances estéticas que
a estesia contempla e desencadeia e, permitindo à si mesmo, o encontro com as
possíveis experiências.
(Lourides Francisconi, 2015 - da série, pensamentos engarrafados )
29
2 INFÂNCIA, ARTE E ENSINO NO CONTEXTO EDUCACIONAL BRASILEIRO
Neste capítulo abordo o lugar que a Arte ocupa na formação
humana. A partir da legislação que regimenta a educação brasileira e, à luz do
referencial teórico da Matriz Histórico-Cultural, dos postulados dialógicos de Paulo
Freire e autores específicos da Área da Arte, sinalizo um panorama sobre o fazer e o
pensar arte na Educação Infantil. Destaco a atual legislação brasileira que organiza
a educação básica e que preconiza em suas diretrizes que o ensino da arte é
Currículo desde a Educação Infantil. Aponto as teorias que postulam a importância
da interação social como fator premente da constituição humana no
desenvolvimento infantil e indicam a arte como mediadora do potencial inteligível e
sensível.
2.1 ARTE E INFÂNCIA: UM UNIVERSO DE POSSIBILIDADES
Este estudo visa a compreensão da função da arte na constituição
da autonomia da criança de 4 meses a 6 anos, destacando aspectos entre limites e
possibilidades para a Educação Infantil. Busco por meio do escopo de referenciais
teóricos e legais, subsídios para o entendimento de que as proposições curriculares
em arte no contexto escolar vigente da Educação Infantil abrangem muito mais do
que a simples enumeração de objetivos a serem cumpridos e conteúdos a serem
ensinados.Destaco que a atitude de um professor pesquisador é essencial como
parte exponencial do processo de formação, seja sua ou de outrem. Acrescento que
as políticas publicas atuais, padecem de carências especificas no que tange ao
ensino da arte na infância.
Destarte, considerando que a Lei 9394/96, em sua versão atual, ao
abordar a educação da infância, esclarece em seu Art. 29 que:
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL, 2015, p. 22).
Considerando que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI), fixadas pela Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009
(BRASIL, 2010a), articulam-se às Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação
30
Básica (DCNEB) e estabelecem os fundamentos e os procedimentos que as
propostas pedagógicas da educação infantil devem respeitar, tendo em vista os
seguintes princípios:
Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades. Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática. Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais (BRASIL, 2013b, p. 16).
Considerando o que explicita a referida Diretriz Curricular, entre
outros, que as práticas pedagógicas possam ser mediadoras das experiências que:
Promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movimentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança; Favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical; Promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança,teatro, poesia e literatura; Possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores, máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos (BRASIL, 2010a, p. 25).
E ainda, considerando as atuais discussões alçadas pela Base
Curricular Nacional Comum (BNCC), que postulam a integração dos campos de
experiências como requisitos essenciais para a aprendizagem da infância, não
descontextualizados de suas práticas culturais, caracterizando o campo Linguagens
em a linguagem verbal, a corporal, a musical, a visual, sendo estas compreendidas
como mecanismos complexos de constituição de subjetividade humana. E que
ainda, segundo a BNCC as "Linguagens são instrumentos de expressão, de
representação, de interação, de comunicação, de pensamento, de apreciação
estética, de construção de conhecimentos, além de se configurarem também como
um campo de conhecimentos" (BRASIL, 2015b, p. 21).
Arrazorei que, no âmbito da educação Infantil, conforme já
preconizado por meio das DCNEI (Parecer CNE/CEB nº20/09) e citado a posterior
no contexto do tem em foco, a necessidade é de agenciar experiências concretas de
aprendizagem que promovam a inserção da criança em sua cultura de base, assim
como ao acesso às culturas distintas da história humana. O modo de se fazer isso,
seria pelo convívio em espaços coletivos, à produção de narrativas, na utilização de
31
possibilidades de uso das diferentes formas da linguagem da cultura adulta e nas
expressões peculiares de semioses do universo infantil.
Estas são possibilidades que não ocorrem isoladas ou
fragmentadas, mas sim, interdisciplinarmente, promovendo um conjunto de ações
que conjuguem práticas na articulação de distintos saberes, oriundos de campos
científicos, míticos, ou do senso comum, aos fazeres infantis. Orientando novos
arranjos como pontos de convergência entre os elementos da cultura cientifica,
lúdica, artística, mítica, mágica, enfim, da vida.
Vale ressaltar que a BNCC fica em aberto para discussão até a data
de 15/03/2016 em plataforma do MEC, sendo muito simples o cadastro do usuário, o
acesso e a contribuição ao texto preliminar, amplamente estudado e debatido pela
sociedade acadêmica e civil, desde o ano de 2015. A BNCC alia-se, dessa forma ao
PNE (Lei 13.005/14) e as demais preconizações legais, em busca de uma solidez
equânime na qualidade em educação no País, desde a Educação Infantil, vinculada
à contextualização de saberes primários, de cultura de base, aos históricos culturais,
acumulados pela humanidade. Dentre os vários objetivos, sintetizo o aspecto
essencial da BNCC, de traçar um panorama cartográfico ao processo de aquisição
do saber que funcione como uma bússola, tanto aos que ensinam, como aos que
aprendem.
Em função de tais deliberações, entendo, ser necessário que a
destinação das proposições curriculares da epistemologia em arte, a sua utilidade e
abrangência, seja amplamente discutida nos espaços educativos da primeira
infância, com vistas ao fomento do Currículo como processo em detrimento ao
produto in locus. Por produto, entendo e discuto aqui, o que é dado e está pronto e,
portanto, não requer nenhum tipo de intervenção. E por processo, entendo a
experiência da criança, a sua participação efetiva na ação com o objeto do
conhecimento, o seu fazer artístico, as suas produções de semioses de forma
contextualizada, ou seja, a sua vivência com o objeto a ser conhecido.
Com relação a BNCC, no mês de novembro do ano de 2015,
elenquei as prerrogativas essenciais, em conjunto com alguns pares, ao campo
Linguagens, e aos conteúdos relacionados ao ensino da Arte e seus campos
conceituais. Priorizei, de forma cooperada, as experiências estésicas e estéticas,
que não constavam no documento preliminar. Fazendo o mesmo no documento
aberto no site do MEC. Entendo que estas aberturas para sugestões são relevantes,
32
dada a proporção do País, visto que, cada região possa pensar sua realidade e
compor suas bases curriculares, ofertando à criança experiências para compor o seu
percurso de criação sob a orientação cooperada do outro social e dos possíveis
objetos que possam nutrir seu referencial estético. Logo, a interação dialogada,deixa
de ser discurso e passa a ocorrer, inclusive no que tange aos documentos
preconizadores. No entanto, até onde tenho informação, somente eu, de um grupo
de 33 membros, efetivei o cadastro e fiz sugestões à BNCC.
A partir de reflexões sobre o exercício de minha prática pedagógica
e sobre meu processo de formação, me inquieto e, trago como inferências à
problematização desse estudo, que a formação em Pedagogia não dá conta de
ensinar Arte na Educação Infantil e a formação de professores em Arte é escassa
para suprir a demanda atual. Entendo ainda, que a contemporaneidade requer um
novo perfil de professor, um profissional com flexibilidade e autonomia criativa, que
saiba perceber as especificidades, não somente da sua área da atuação, mas,
também as suas próprias especificidades de saberes e de seu contexto para nele
intervir e se mover.
Nesse sentido, me parece provável que o processo educacional em
arte, na educação infantil, sob os auspícios da lei, encontra-se em uma fase de
latência, sendo muito incipiente o ensino dos conteúdos da área, embora de caráter
interdisciplinar no currículo da infância. Um fator relevante refere-se ao fato de que
no contexto posto, ou em minha realidade de atuação profissional, não existe o
cargo e a função correspondente ao professor das Artes.
Dessa forma, em acordo ao que a legislação atual preconiza e a
demanda indica, a necessidade de ações conjugadas no duo educar e cuidar, os
espaços das instituições educacionais da infância, caracterizam-se em locus
privilegiado e potencial das experiências diversas que contribuirão para a formação
integral da criança (BRASIL, 2010a). Destarte, descarta de sobreaviso, os meandros
de práticas conteudistas e vazias de significados nos espaços destinados a
educação das crianças, denominados de CMEI - Centro Municipal de educação
Infantil, quando do âmbito público municipal; CEI - Centro de Educação Infantil,
quando do âmbito privado e ou mantido em parte por entidades filantropas e parte
pelo ente público municipal.Ou Centro Estadual de Educação Infantil (CEEI), quando
da esfera pública estadual.
Esse novo olhar sobre a práxis na escola infantil permeia meu
33
estudo sobre o entendimento das intenções e significados implícitos e explícitos nas
proposições curriculares para a Educação Infantil e, mais especificamente, aquelas
que tangem ao ensino da arte. As relações de poder e de espaço, envolvem
questões relevantes e pertinentes sobre aquilo que é o „ser humano‟ e o „tornar-se
humano‟ na cultura e sociedade contemporânea de forma abrangente. E isto posto,
trago à baila, o que me move nesta pesquisa, o 'ser, estar e tornar-se' professor,
seja qual for a área de formação. E muito mais, quando remete à educação da
infância. Logo, compreender o alcance de alguns limites, considerando o âmbito
tangível das possibilidades na construção do conhecimento mediado pela arte,
configura-se em um sinuoso, porém, promissor caminho, para o pensar sobre os
níveis de constituição da autonomia cognitiva e sensível que esta matéria
potencializa, inclusive para a constituição de uma práxis politizada.
Para Dewey (2010, p. 110) o ter “uma experiência” implica em
vivenciar aquela “experiência singular”. Tal aspecto da experiência implica em
vivências significativas, capazes de modificar a realidade, mudar comportamentos
por meio da significação que irrompe no ato prático e transcende o aqui e agora das
relações cotidianas.
Na esteira reflexiva destes pensamentos, destaco o que se prioriza
para o ensino da arte, ou seja, a atual legislação brasileira para a educação infantil.
2.2 O ENSINO DA ARTE E A EDUCAÇÃO INFANTIL NA LEI 9394/96
Em acordo a Lei nº 9394/1996 (BRASIL, 1996) quando a mesma
versa sobre os currículos para a Educação Básica, e devido à redação dada pela Lei
nº 12.796, em seu Art. 26, esclarece que:
Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos (BRASIL, 2015, p. 18).
Com relação ao ensino da arte, a mesma lei o traz como
componente curricular obrigatório, explicitando a seguinte redação, dada pela Lei nº.
12.287, de 2010,em seu“§ 2o O ensino da arte, especialmente em suas expressões
34
regionais, constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos”
(BRASIL, 2015, p. 18).
Explicita a referida Lei que “Os currículos a que se refere o caput
devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática,
o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil” (BRASIL, 2015, p. 18).
As Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil, fixadas pela
Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009, articulam-se às Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Básica (BRASIL, 2013b) e estabelecem os fundamentos e
os procedimentos que as propostas pedagógicas da Educação Infantil devem
respeitar, tendo em vista os seguintes princípios:Éticos, Estéticos e Políticos.
Para os princípios Éticos, preconiza a Lei, a “valorização da
autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao
meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades” (BRASIL,
2010a, p. 16).
Nesse sentido, os princípios Éticos dizem respeito às formas
comportamentais da vida em sociedade e à operacionalização de práticas
educativas. Estas, em contrapartida, conexas com a realidade sociocultural das
crianças. Os comportamentos sóciomorais caracterizam-se em apreensões culturais
primárias. Visto que a Ética, enquanto comportamentos, permeia as relações
humanas no cotidiano das ações e em contextos diversos.
Logo, o grande foco das práticas e comportamentos Éticos da
sociedade, pauta-se pelas questões inspiradas por valores como Igualdade e
Equidade, considerando a Justiça como a centralidade dos Direitos adquiridos no
processo histórico da Humanidade.
Sendo assim, compete a Educação Infantil a função de promover
experiências por meio das quais as crianças sejam inseridas nas relações éticas e
morais, considerando as especificidades de seus contextos de origem, corroborando
ou complementando, as ações primárias das famílias. É notório que para se
desenvolver e aprender conceitos Éticos, as crianças precisam aprender com os
outros, quer sejam adultos ou iguais, nas práticas sociais diversas, por meio das
interações e dos vínculos que possa estabelecer.
Para os princípios Políticos “dos direitos de cidadania, do exercício
35
da criticidade e do respeito à ordem democrática” (BRASIL, 2010a, p. 16) entendo
que envolve o educar para a autonomia no exercício critico de práticas politizadas.
Dessa forma, a ação pedagógica, de modo interdisciplinar, necessita
oportunizar atividades diversas, experiências de cunho politizado, por meio das
quais as crianças possam participar ativa e criticamente de situações, com vistas a
promover experiências aproximadas à vida, expressando sentimentos, opinando,
questionando, refletindo, analisando, avaliando e concensuando em busca do bem
estar próprio, do outro e comum.
Nessa perspectiva, saliento que a arte possui uma função
politizadora. As diversas experiências promovidas por meio das atividades do âmbito
lúdico artística, permite a representação, tanto matérica, quanto abstrata, no uso de
diferentes semioses e possibilita um intercâmbio entre a criança, os objetos, o seu
corpo sensitivo e pensante e os pares. Como bem o disse Fernando Pessoa (1942)
o que sente, pensa ao sentir e ao manipular os objetos e verificar sua
transformação, a criança levanta suas próprias questões, imagina, inventa e
estabelece relações sob uma lógica argumentativa própria. O que ocorre fora, ocorre
dentro, no âmbito da cognição, como bem o assinala Vygotsky (1998) ao descrever
a zona de desenvolvimento real (ZDR), caracterizada pelo o que a criança já sabe
fazer sem ajuda. E a zona de desenvolvimento potencial (ZDP), constituída por
aquilo que ela poderá fazer sob mediação.
Nesse elo de interconexão, as semioses infantis são produtos
essenciais para futuros posicionamentos e movimentos do ser, estar e também do
ter e do pertencer. Apreender a utilizar argumentos coerentes é exercício prático na
aprendizagem de posturas políticas. O ser ético, estético e político em Freire (1996)
caracterizam-se como comportamentos. Logo, configuram-se em aprendizagens a
serem constituídas nas interações sociais estabelecidas nos diversos contextos das
práticas culturais humanas.
Portanto, a instituição de Educação infantil tem o dever de promover
e assegurar que as crianças possam participar de práticas diversas, tendo como
principio a garantia de serem atendidos seus direitos básicos, tais como:
alimentação, sono, higiene e autocuidados, saúde, proteção, interação social e
afetiva com colegas, outras crianças da instituição e adultos; de brincar, conhecer e
zelar pelos bens naturais e culturais. Sendo participante de diversas atividades por
meio das quais possa exercer a expressividade de suas diferentes linguagens, que
36
são canais de comunicação, tais como: falar, escutar, desenhar, pintar, dançar,
representar, simbolizar, dramatizar, práticas de leituras e escrita diversas do mundo.
Para os princípios Estéticos “da sensibilidade, da criatividade, da
ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e
culturais” (BRASIL, 2010b, p.16), ressaltamos,de acordo com Duarte Junior (2003),
que a inteligência sensível é uma das formas de comunicação do humano. Segundo
ele, a estética, como princípio de um saber - asthesis, asthesia - vincula-se a
capacidade de perceber, apreender pelos sentidos e caracteriza seu grau máximo
nas formas comunicativas dos processos expressivos e criativos do potencial
inteligível e emocional, que os humanos utilizam para informar, comunicar e
exteriorizar sensações, sentimentos e pensamentos. Este autor diferencia o
conhecimento inteligível e saber sensível.
Ainda de acordo com Duarte Junior (2012), as questões teóricas
sobre como adquirimos conhecimento sempre permearam a vida humana, ou seja:
O pensar como conhecemos e ajudamos a construir a realidade na qual nos movemos e o que diz respeito basicamente ao sentido que damos à vida.Nesse embate entre o ser humano e as coisas ao derredor, as quais são percebidas com as especializações e limitações de nossos órgãos dos sentidos, é que elaboramos um guia, um sentido, um mapa do mundo e da existência.E isto é justamente o conhecimento que temos e que viemos acumulando e transmitindo desde as nossas origens enquanto espécie (DUARTE JUNIOR, 2012, p. 362).
A forma como o humano organiza a realidade é o que o diferencia
das demais espécies. Segundo Duarte Junior (2012, p. 326) todos os demais
animais “têm um conhecimento de seu meio ambiente, que lhes possibilita a
sobrevivência”, no entanto, apenas o humano é capaz de construir um conhecimento
radicalmente distinto, “abstraído e armazenado por meio dos signos”. Assim, “o
mundo é significado, quer dizer, transformado em signos, pelos quais então
conhecemos tudo e a nós mesmos num trabalho reflexivo” (DUARTE JUNIOR, 2012,
p.362).
Nesse processo tipicamente humano, de significar o ambiente e a si
mesmo, o corpo também é tornado signo. Ele é ao mesmo tempo, suporte e meio
das experiências e das significações.Sendo esse um processo que ocorre em via de
mão dupla. O ato de significar as significações propicia o entendimento e a
37
elaboração das questões que perpassam o desenvolvimento da sensibilidade
corporal – cinestesia - e da percepção sensorial. Logo, de vários aspectos da
inteligência. Enquanto orientador, o campo cinestésico [ a criança tem necessidade
de movimentos sícronos [dança, canta e desenha ao mesmo tempo; narra sobre o
processo, interage e troca informações] permite a otimização dos campos sensoriais
e perceptivos, assim como a coordenação motora de equilíbrio e a sociabilidade.
Logo, o autor explicita duas instâncias por meio das quais “nos
movemos na construção do sentido da vida, do conhecimento do mundo, a sensível
dada pelo corpo; e a inteligível, representada pelos signos em nossa mente”
(DUARTE JUNIOR, 2012, p.362).
Ambas são interconectas e necessitam serem educadas.Para
exemplificar o autor toma como exemplo, a complexidade requerida pela mecânica
quântica em seus cálculos matemáticos e a sensibilidade desenvolvida pelo
provador de cafés e pelo Sommellier. Ao produto da inteligência simbólica, ele
denomina de conhecimento inteligível e à capacidade de mover-se em sentido físico,
sentir, perceber a objetualidade do mundo, de saber sensível.
Também em Dewey (2010) o encontro entre o sensível e o inteligível
ocorre, quando o autor defende o caráter estético inerente pela experiência. Seja a
experiência do âmbito artístico ou não. Para o autor “[...] nenhuma atividade
intelectual é um evento integral, uma experiência, a menos que seja complementado
por essa qualidade estética" (DEWEY, 2010, p.114). O que implica em que relação
entre a criança e o objeto do conhecimento, não se reduz apenas a objetividade do
mesmo. Se assim o for, não haverá encontro. Não haverá experiência. É o encontro
que torna a experiência a vivência do ato. Por isso, as ações artísticas, são
importantes como processo à criança e, não tanto enquanto resultado/produto.
Em uma linha de raciocínio muito próxima, encontrei consonância
nos pressupostos de Parsons (1992) quanto aos seus estudos sobre o
desenvolvimento estético para a compreensão da Arte.
De acordo com este autor, a valoração e o gosto estético, vinculam-
se as vivências culturais e as experiências singulares. Para este autor, as noções de
belo e bom são interconexas às informações que as pessoas possuem sobre o que
conhecem, sabem, produzem e apreciam. Ou seja, comportamentos estéticos frente
à determinados estímulos provenientes de objetos, situações, fatos. Quer estes
saberes, sejam obtidos, por vias dos objetos do mundo ou obras da Arte e/ou temas
38
da natureza.
Parsons (1992) confere a aprendizagem estética papel de central
relevância no tocante ao desenvolvimento cognitivo. Segundo ele, visamos na arte
conceitos gerais superiores á expressividade, pois, a obra, o artefato, o objeto
artístico, “não se limita a ser um conjunto de objetos bonitos, constituindo antes uma
das formas de que dispomos para articular a nossa vida interior”. (PARSONS, 1992,
p.29).
Ao conferir relevância ao conhecimento estético, Parsons (1992)
destaca as atribuições da filosofia e da psicologia sobre a natureza da Arte em geral.
Dessa forma,
[...] alargar a abordagem na perspectiva do desenvolvimento cognitivo ao domínio da experiência estética implica necessariamente em levar a serio as idéias acerca da arte [...] para entender as diferentes variedades de experiências estéticas através das teorias do desenvolvimento(PARSONS, 1992, p. 29).
Esta afirmativa corresponde aos enunciados básicos sobre as
concepções filosóficas de Parsons (1992) a cerca do conhecimento estético. Ele
destaca como fundamental a questão de que: a) a arte não se restringe a produção
do belo, visto os produtos expressivos serem respostas do universo interior humano
ao exterior. A arte é o meio para fazer isto; b) a arte exprime muito além do que o
artista tentou comunicar de modo consciente. O sentido da arte pertence ao domínio
público e, embora a sua compreensão seja uma construção social e histórica, visto
ser complexa, a aprendizagem é do âmbito individual; c) as interpretações, as
valorações aferidas à obra podem ser objetivas, pois, coincidentes as experiências
no intercâmbio razão e emoção. Não há de serem consideradas certas o erradas.
Mas sim, mais ou menos racionais e mais ou menos defensáveis, visto
corresponderem aos estágios do desenvolvimento estético.
O desenvolvimento estético de acordo com Parsons (1992) ocorre
em estágios evolutivos não lineares, porém gradativos, que representam o conjunto
de idéias que as pessoas utilizam para compreender a Arte em suas especificidades
estéticas. Estas idéias são: 1º Estágio: Preferência; 2º Estágio: Tema; 3º Estágio:
Expressividade; 4º Estágio: Forma e Estilo; 5º Estágio: Juízo.
Assim, de acordo com as suas experiências, a partir de um
determinado conhecimento que impulsione o desenvolvimento estético, pode-se ter
uma criança de 5 anos no estágio 3º ou da Expressividade e um adulto no estagio 1º
39
ou da Preferência.
A estesia, enquanto ação corresponde à aprendizagem pelo fazer, e
a estética, enquanto apreciação, gosto, preferência, corresponde ao prazer
percebido e sentido, diante de algum objeto de desejo ou de vislumbre. Enquanto
campo de aprendizagem, a estética confere comportamento e ocorre em contextos
micros e contextuais (DUARTE JUNIOR, 2003).
Logo, ambas as experiências, quer sejam do campo da estesia ou
da estética, vinculam-se as práticas organizacionais e as formas de interação
estabelecidas entre os grupos culturais. As experiências estésico/estéticas, ocorrem,
mormente, articuladas para os adultos. No entanto, para a Educação Infantil
requerem ações ativas, efetivas, em que o conhecer, o fazer e o apreciar, sejam
mediados por práticas de integração e cooperação, entre a instituição educativa e as
famílias. É no fazer e na interação que a vivencia ocorre e a experiência se
concretiza sob a tutela da mediação.
Estas práticas culturais que envolvem o micro e o macro das
relações são fundamentais, para assegurar que os princípios Estéticos, Políticos e
Éticos se articulem, visando uma educação que de fato, permita o acesso aos
direitos institucionalizados.
Os princípios estéticos vinculam-se as possibilidade de produção
artística e apreciação desta produção oriunda de diferentes culturas, bem como nas
diversas formas de expressão dos jogos simbólicos, presentes nas atividades
lúdicas, nas práticas distintas do brincar e nas diferentes brincadeiras existentes.
Nesse sentido, a dimensão estética pauta-se na função poética e na dimensão ética.
Tomo como fundamental, para as produções de semioses infantis, as possibilidades
dos processos criativos, quer sejam por vivências concretas, sensoriais ou na
ativação da memória de longo prazo – experiências já consolidadas, internalizadas -
como mecanismos de interação e integração, de pertencimento ao grupo de origem.
Em todas estas situações lúdicas e simbólicas, a função imaginária e o pensamento
trabalham de forma integrada.
Ritcher (2005) sinaliza que o primordial, para além de métodos e
metodologias, é o processo poético. Ou seja, a construção de um repertório sensível
e inteligível que resultará do encontro intencional entre mediador e mediado,
exigindo a reinvenção constante do “eu”. A capacidade de reinventar-se passa pela
experiência de imaginar-se e pela empatia consagrada no ato de sentir-se
40
pertencente.
Ainda segundo a autora supracitada, o princípio estético não se
vincula ao belo estereotipado. Mas, sim ao processo de percepção do princípio da
organização das formas, tanto, do eu e dos objetos no mundo natural e cultural,
quanto, as utilizadas pela criança em suas composições, organizações cromáticas e
espaciais, aspectos visuais, auditivos, palativos e sensoriais.
2.3 OS PRINCÍPIOS ÉTICOS, ESTÉTICOS E POLÍTICOS: O ESCOPO DO
PROFESSOR MEDIADOR
A Educação Infantil encontra-se em um momento exponencial de
sua historicidade enquanto campo de formação acadêmica. De um longo processo
histórico em que a criança não fora considerada em seus direitos de criança, e a
infância não reconhecida, enquanto condição afetiva, chegamos ao sujeito dos
direitos educacionais instituídos e legalizados no século XX. O sujeito
cognocescente, constituído de fato e em direitos. A criança cidadã, tão conclamado
pelas pesquisas dos campos das ciências psicológicas e assegurado pela
legislação. Muito se tem discutido sobre o fato de que a infância é uma construção
histórica e social (ARIÈS, 1978; VYGOTSKY, 1998; LEONTIEV, 1998).
Nessa altura das reflexões, faz-se necessário vislumbrar nos aportes
filosóficos de Karl Marx (1818-1883) as forma das relações sociais, as organizações
humanas e suas subsistências, ou seja, como historicamente, homens e mulheres
sobrevivem, se organizam socialmente, educam e produzem modos de
sobrevivência. Para Marx (1984) a tipologia educativa de uma época caracterizadas
nas especificidades das relações de trabalho expressa o nível de desenvolvimento,
em sentido amplo, alcançado pela sociedade na qual se inserem. Embora este
teórico não seja o aporte principal deste estudo, Karl Marx contempla o acervo
filosófico base dos estudos de Lev Vygotsky e colaboradores, portanto da Matriz
Histórico-Cultural, assim como de aspectos relevantes dos estudos de Paulo Freire
em suas pedagogias.
Isto posto, farei uma breve incursão em alguns pontos dos
pensamento marxiano visando entrelaçar a perspectiva história de vida, formação,
profissão e ensino da arte na Educação Infantil.
Em A Ideologia Alemã ( 2007) ) este autor categoricamente afirma
41
que a existência humana, isto é, a produção matérica da vida e a organização social
do homem, não ocorre de modo natural ou imediato entre homem e natureza. Mas,
intermediado pela própria natureza e seus recursos, que são transformados pela
ação do homem. Isto é, “o modo pelo qual os homens produzem seus meios de vida
depende, antes de tudo, da própria constituição dos meios de vida já encontrados e
que eles têm de reproduzir.” (MARX, 2007, p. 87).
A essa produção reproduzida, Marx (2007) denomina de atividade
prática ou trabalho. Contudo, a produção da vida humana via trabalho, não é
entendida por Marx como uma mera reprodução de subsistência enquanto recurso
das condições física da humanidade. Mas sim, um modo determinado por meio do
qual, os indivíduos humanos, exteriorizam historicamente, sua vida em correlação
aos seus modos de produção. Em outras palavras, cada homem é aquilo que faz de
si mesmo pela sua atividade laboral. Nesse aspecto, Marx é enfático ao afirmar que
“tal como os indivíduos exteriorizam sua vida, assim são eles” (MARX, 2007, p. 87).
Logo, não há divisão entre homem e labor no pensamento de Marx,
pois, “quando se fala do trabalho, está-se tratando, imediatamente, do próprio
homem.” (MARX, 2004, p. 89). E segundo esta prerrogativa, não há determinismo na
existência humana, dada a priori pelas condições materiais. Para produzir, o homem
reproduz à partir do já está posto, ou seja da realidade objetiva, existente exterior a
si.
Nesse sentido a objetividade produz a subjetividade. O que torna o
homem, produto do próprio homem e fruto de sua história. O trabalho é ação
fundante da sociabilidade humana, o elo de primazia entre o homem e suas
necessidades, o mundo natural, a realidade e o mundo da cultura [ a arte está na
base cultural, enquanto linguagem, recurso tecnológico relevante de impressão,
expressão, informação, comunicação] : o homem, muito especificamente, age sobre
a natureza por necessidades básicas, interfere nela e a modifica, se transforma e,
produz cultura - interage e age socialmente - e se produz enquanto homem
humanizado.
Á luz das elucidações de Marx elaborei algumas reflexões sobre as
condições atuais da mulher na sociedade e os modos organizacionais de
atendimento à infância, considerando a inserção da jornada dupla de trabalho da
mulher na sociedade atual. Se no passado histórico, a incumbência educativa, a
priori, ficava a cargo da mãe ou da família até por volta dos sete anos de idade, hoje,
42
as crianças começam a frequentar o CMEI aos 4 meses e a matricula se torna
obrigatória aos 4 anos de idade.
Nesse ponto, creio que o pensamento de Karl Marx sobre os
processos de constituição humana, intermedia esse meu olhar, contextualizando as
relações que envolvem as práticas educacionais na infância. Caso, o professor não
esteja atento às especificidades de seu tempo e época, ou se quer se compreenda
em processo de aprendizagem, não haverá prerrogativa para atender a demanda de
seu contexto. Isto é, a ação laboral com a infância, envolve muito mais do que a
demanda da atividade trabalhista, enquanto troca de capital, exige e permite. Requer
trocas simbólicas e afetivas [ no sentido da afetação pelo objeto do conhecimento]
necessita de interação, de cooperação, na consideração de que o produto da
atividade docente é a aprendizagem da criança.
Tendo em mente, este aspecto da atividade docente, faço uma
inferência, aludindo aos avanços dos campos tecnológicos atuais. Os mesmos
permitem que as ciências específicas denominadas de neurociências, estudem as
condições favoráveis, assim como as variáveis e as intercorrências, ao
desenvolvimento e a aprendizagem da criança do século XXI. E ainda, considerando
o aparato cerebral e sua fisiologia funcional, constroem dados que muito contribui ao
professor da infância, à compreensão sobre todo o organismo corporal e sua
funcionalidade, demonstrando a integralidade humana. O mesmo arsenal que
permite os estudos das ciências possibilita a informação aos professores. Para
tanto, faz-se necessário uma alfabetização tecnológica. No capítulo posterior irei
abordar sobre a temática do uso das tecnologias da informação e da comunicação
na Educação Infantil.
Ao partir desse raciocínio, entendo que nos pensamentos freirianos,
encontrei o amalgama Arte, vida e trabalho, no sentido de atividade docente, pois
em Pedagogia da Autonomia: Os saberes Necessários à Prática Pedagógica, Freire
(1996), afirma que há uma ligação profunda entre o processo educativo e os demais
processos essenciais à vida de uma sociedade. Dando ênfase a dimensão cultural
da sociedade, ele elege as vinculações entre ética,estética e política, como
comportamentos efetivos de ação pedagógica na constituição da autonomia e da
das práticas cidadãs.
Quando o mediador trabalha com a elaboração de valores e códigos
culturais, ou seja, pela linguagem, ele oportuniza o diálogo e permite o uso
43
apropriado das palavras e a significação de símbolos e representações. É o
momento da problematização, definição de termos, conceitos e significados, para
que a criança compreenda a realidade dada a partir de sua prévia leitura de mundo,
a qual é significada em sua realidade objetiva. Portanto, transcende o espaço das
relações sociais do micro e ganha a dimensão macro das interações.
Por isso a educação Infantil é campo de possibilidades para
promoção de experiências cinestésicas: estésicas e estéticas, políticas e éticas.
Visto que, uma concepção estética exigida pela prática de ensinar-aprender, deve
ser efetivada por uma “experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica,
pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com
a decência e com a serenidade.” (FREIRE, 1996, p. 13).
Destaco que, de acordo com este autor, há um ciclo gnosiológico9
em que o ato de ensinar e aprender são interconexos, visto que sempre há algo
conhecido e algo a ser descoberto, tanto pela criança quanto pelo professor. Nesse
aspecto, as experiências perceptivas e sensoriais na Educação Infantil são
fundamentais, pois a ação prática do saber é que permite o transformar algo já
existente em outra coisa, ou dar vida a algo que não existia objetivamente.
Assim, as ações efetivas, os fazeres experienciais, são
fundamentais no momento desse ciclo. Ou seja, transformar algo já conhecido em
um novo produto, por meio da vivência de um processo complexo. Posso dizer que é
uma forma de oportunizar o conhecimento dos pequenos, já que na realidade da
Educação Infantil, a todo o momento há a transformação, principalmente, quando o
campo da imaginação e da ludicidade é explorado.
O que nos retorna a Karl Marx (1984) e suas elucubrações sobre as
relações Arte e Trabalho, enquanto produção de sentido e ato tipicamente humano.
Para ele, o que distingue a ação laboral do humano das demais espécies é a
distinção característica atribuída ao ato em si, pela atribuição de sentido, contida na
ação de prospecção e a planificação. Explica-nos ele que " o animal é
imediatamente um com a sua atividade vital. Não se distingue dela. O homem faz da
sua atividade vital mesma um objeto do seu querer e de sua consciência" (MARX,
1984, p.156). Logo, o homem não é fruto do determinismo, mas é construção
9 Gnosiologia/Gnoseologia: s.f. Teoria do conhecimento humano; teoria que se volta para uma análise reflexiva acerca da origem, natureza e essência da ação cognitiva, do ato de conhecer, do conhecimento humano. (Etm. gnosio + logia). (GNOSIOLOGIA, 2015).
44
histórica e um ser genérico, pois " a sua própria vida lhe é objeto [...] Só por isto a
sua atividade é atividade livre [...] (p.156). Se assim não o for, caso o homem faça
de sua ação laboral, apenas um mecanismo de relação existencial, entramos no que
Marx (2007, p.156) denomina de alienação, sendo "[...] apenas um meio para a
existência".
Nesse aspecto retomo o fazer pela Arte, e busco em Marx (2007) os
elementos de coesão para o prenúncio do ato de criar. Nesse item ou na questão
denominada pelo autor como o "engendrar prático de um mundo objetivo, no
trabalhar a natureza inorgânica o homem se prova como um ser genérico consciente
[...]" p.156) reside os aspectos relacionais da subjetividade que consiste em a
capacidade humana de estabelecer relações entre objetos, ou, um ser que "se
relaciona com o gênero como a sua essência própria ou // se relaciona // consigo
como ser genérico" (MARX, 2007, p.156).
Parafraseando Marx, entrelaço arte e filosofia, em suas explicações
na associação atividade e criação, o sentido da estética para o homem. Os animais
também constroem seus objetos, tais como as suas moradias, coletam seus
alimentam, brincam e se organizam em sociedade. No entanto, sua produção é
unilateral, envolve "apenas o de que necessita imediatamente para si e para ou seu
filhote" (MARX, 2007, p.157) ao contrário da atividade consciente do homem, que
possui característica universal, pois, produz para satisfazer além de suas
necessidades fisiológicas e
[...] produz formas [...] sabe aplicar a medida inerente ao objeto; por isso o homem também forma segundo as leis de beleza [...] O objeto de seu trabalho é portanto, a objetivação da vida genérica do homem [...] por ela a natureza aparece como a sua obra e sua realidade efetiva (MARX, 2007, p.157).
A vida tornada objeto estético do ato de criação, ou não, segundo
Marx. Este excerto de Marx me conduz às narrativas autobiográficas de Josso
(2004). Esta autora enfatiza as experiências historiográficas como percurso
autoformativo, de um "caminhar para si" (p.16). O caminho proposto por Josso é a
de narrativa da singularidade, da explicitação dos fatos que envolvem os percursos,
as vivências que podem ou não, transformarem-se em experiências automotivando o
sujeito aos atos e atitudes de percepção do próprio processo de formação. Josso
(2004) discute o tema das histórias de vida a serviço da formação e da auto-
formação, onde incide as metodologias autobiográficas e que pode ser definida
45
como:
a referência das tomadas de posições dos processos-projetos de formação do nosso estar-no-mundo singular/plural por meio da exploração pluridisciplinar, ou para alguns transdisciplinar, e da sua
complexidade biográfica (JOSSO, 2004, p.29).
Dito de outra forma, o vir-a-ser pessoa/professor, se faz nas
interrelações em espaços específicos e contextuais. Nesse aspecto Josso (2004,
p.37) discute "as experiências ao longo das quais se formam e se transformam
identidades e subjetividades" na fase adulta e o lugar, além da função, que a
formação, atividade/práxis, enquanto ação de humanizar, ocupa no processo. Visto
esse processo, ser consequência de vivencias advindas de experiencias do censo
comum e do mundo das teorias.
O enunciado de Josso, me faz reflexionar sobre as recomendações
das Diretrizes Curriculares de que, para o atendimento e a demanda da relação
ensino e aprendizagem da infância nas especificidades propostas, que explicitam
que para “além das exigências dessas diretrizes, devem também ser observadas a
legislação estadual e municipal atinentes ao assunto, bem como as normas do
respectivo sistema” (BRASIL, 2010a, p. 11).
Explicita a Diretriz Curricular, entre outros que “as práticas
pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter
como eixos norteadores as interações e a brincadeiras” (BRASIL, 2010a, p. 25).
Mas, e sobre o ensino das artes? O que diz as Diretrizes
Curriculares para a Educação Infantil?
De modo interpretativo, elenco os principais fatores que a Diretriz
sinaliza, como subsídios para o fomento das ações pedagógicas em arte com a
infância. De acordo com o exposto, posso inferir que as práticas necessitam primar
por oportunizar experiências com o objeto de conhecimento em arte que:
Promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movimentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança;Favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical;Promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança,teatro, poesia e literatura;Possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais,
46
que alarguem seus padrões de referência e de identidades no diálogo e conhecimento da diversidade;Incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza;Propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifestações e tradições culturais brasileiras;Possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores, máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos. (BRASIL, 2010a, p 26-27).
Pelo exposto nas DCEI, a arte configura-se em mediadora por
excelência. No entanto, a qualidade social da Educação Infantil, e, mais
especificamente do ensino da arte, é conquista a ser construída coletivamente.
Envolve as relações cooperadas e significa compreender que a educação ocorre por
processo e este envolve produção de cultura. Sabemos que é na cultura que se
constrói, se mantém e se transformam os saberes.
Portanto, produzir e socializar os saberes culturais específicos da
infância em consonância aos saberes do mundo cultural histórico é tarefa a ser
realizada por todos os segmentos sociais, incluindo as políticas públicas de base, a
integração escola e família.
2.4 O ENSINO DA ARTE NA PERSPECTIVA DA MATRIZ HISTÓRICO-CULTURAL
Devido ao simples fato de que toda nova geração encontra as forças de produção já obtidas pela geração anterior e que lhe servem de matéria-prima para uma nova produção surge um encadeamento na historia dos homens, surge a historia da humanidade, que é tanto mais historia da humanidade quanto mais crescem as forças produtivas dos homens e, por conseguinte, as sua relações sociais. A consequência necessária: a história social dos homens nada mais é que a historia do seu desenvolvimento individual, tenham ou não, consciência disso. Suas relações materiais são a base de todas as suas relações [...] as formas necessárias em que se realiza a sua atividade material e individual (MARX & ENGELS, 1984, p.432-433).
O principio básico da Matriz Histórico-Cultural centra-se na defesa
da ação prática, da atividade material humana. A mesma necessita ocorrer em um
ambiente apropriado, como mecanismo de desenvolvimento dos processos mentais,
da funcionalidade da cognição, de modo a modificar o ambiente e renovar
continuamente o hall das atividades cerebrais do humano, manifestando-se em
novas práticas comportamentais. Os estudos e pesquisas de Lev. S. Vygotsky
47
(1896-1934) e seu grupo sustentam que "a cultura torna-se parte da natureza
humana num processo histórico que, ao longo do desenvolvimento da espécie e do
indivíduo, molda o funcionamento psicológico do homem" (OLIVEIRA, 1992, p. 24).
De acordo com Luria (2010, p. 23), as relações dos processos
mentais e a realidade, ou seja, a capacidade funcional do cérebro, enquanto órgão
responsável pela gama de ações inteligíveis e emocionais e os comportamentos
humanos, ocorrem em dependência “das práticas sociais complexas". Assim, as
ações educativas e formativas do presente, se pautam por modos de agir no e do
passado, pois, utilizam-se de instrumentos culturais que auxiliam tanto na
manipulação do ambiente, quanto a formar a organização mental das futuras
gerações, suscitando novas formas de agir.
Nesse sentido, o ser humano possui duas dimensões, uma biológica
ou natural e uma cultural, que possibilitam sua ação no mundo. Da dimensão
biológica herda-se a constituição genética, os sistemas que agem na funcionalidade
do corpo e o cérebro que o comanda com todas as suas características
neurofisiológicas e psicológicas. Da dimensão cultural, todas as formas de
organização e ação no mundo, a nível físico externo e interno, denotando a
objetividade e a subjetividade humana (LURIA, 2010).
Para Vygotsky (1989 apud OLIVEIRA, 1992) a explicação básica da
constituição dos processos psicológicos superiores congregam quatro linhas: a
filogênese- origem e desenvolvimento da espécie, limites e possibilidade, evolução,
interação e plasticidade cerebral; a ontogênese - origem e desenvolvimento do
indivíduo, ligado a filogênese, fases comuns; a sociogênese - a história cultural:
filogenia, cultura e história se entrelaçam, definindo o funcionamento psicológico.
Nenhum ser humano existe fora do contexto histórico. O ser humano já nasce
interpretado; microgênese – a especificidade do desenvolvimento, a história dos
fenômenos psicológicos e a construção da singularidade.
Segundo Oliveira (1992), para Vygotsky e seu grupo de pesquisa,
duas linhas de desenvolvimento são consideradas para o entendimento da
constituição psíquica pertencentes à ontogênese: a natural e a cultural. A cultural
ganha primazia sobre a natural, pois se reporta de forma específica ao
desenvolvimento humano, embora, ambas são consideradas complementares e em
relativa primazia. Fato que Vygotsky e seu grupo constataram por meio de seus
estudos no domínio ontogenético sobre os instrumentos mediadores, tanto em nível
48
sociocultural, quanto nos processos interpsicológicos.
A linha cultural ganha destaque também na perspectiva da Teoria da
Mediação de Reuven Feuerstein (1921-2014). Este autor considera que a relação
com o ambiente, denominada por ele de transmissão cultural, está associada com a
relação com o outro ser humano, uma interação que é marcada pela presença
intencional do outro, por uma experiência de aprendizagem mediada, que busca
inserir esse primeiro no ambiente cultural. Para Feuerstein, a falta deste 'nascimento
cultural', provoca a síndrome da privação cultural e prejuízos sérios para a
aprendizagem.Ele também preconiza a capacidade humana de aprender sempre e
sob diversas condições,pois, o sistema cerebral e suas funções são dotados da
capacidade de modificabilidade Tais conceitos constituem a Teoria da
Modificabilidade Cognitiva Estrutural.
Feuerstein (1998 apud GOMES, 2002) sinaliza que a interação, a
transmissão cultural e o papel do mediador são imprescindíveis para o processo
mediacional. Ao mesmo tempo ele esclarece que nem toda interação ou transmissão
cultural é considerada uma mediação, uma vez que,
[...] a área de interesse da EAM é a interação entre o ser humano e seu ambiente sociocultural, a tendência para considerar qualquer interação ambiente-criança, como sustentando as características da EAM é grande (FEUERSTEIN; FEUERSTEIN, 1994 apud GOMES, 2002, p. 87).
Feuerstein (1998 apud GOMES, 2002), define doze critérios
mediadores. Dentre eles, enfatiza três que se consolidam enquanto função
estruturante e determinante na eficácia de uma ação mediada. O primeiro critério
abarca duas características ou atributos,a Mediação de intencionalidade e
reciprocidade.Refere-se à formação de vínculos entre os indivíduos de forma que o
mediador demonstra certa intenção com relação ao mediado e o mediado, em
contrapartida, denota receptividade e auto-motivação para aprender. Em outras
palavras: é preciso querer ensinar (professor) algo a alguém (aluno) para que o
mesmo possa querer aprender.
Em relação ao segundo critério, a Mediação de Significado,
Feuerstein (1998 apud GOMES, 2002) destaca sua aplicabilidade qualitativa pela
posição do mediador em transmitir seus sentidos de mundo ao mediado,
possibilitando a esse elaborar novos sentidos e possibilidades.
49
O terceiro critério, a Mediação de transcendência, inscrito também
enquanto função estruturante se revela na ação de ultrapassar as barreiras do
conteúdo concreto, como alerta Gomes (2002) quando afirma que “o conceito de
transcendência não é sinônimo de transferência” (grifo do autor, p. 92).
Os outros nove critérios estabelecidos por Feuerstein (1998 apud
GOMES, 2002) são de grande importância para a mediação da aprendizagem.
Entretanto, esses não se inscrevem como critérios estruturantes e determinantes.
Ou seja, não são obrigatórios ao processo, embora possuam sua relevância. As
eficácias na internalização de tais competências dependem da apreensão dos três
primeiros critérios.
Nesse contexto, estão presentes os critérios de Mediação do
sentimento de competência em que o papel do mediador configura-se em preparar o
mediado para que seus sentimentos internalizados de competência surjam. Este se
relaciona ao processo de conscientização dos processos ou ferramentas internas do
indivíduo, permitindo a esse uma visão holística do seu ser e, consequentemente,
uma abertura para o aprender.
Outro critério é a Mediação da regulação e controle do
comportamento através do planejamento, relacionado à ação cognitiva do sujeito em
refletir sobre sua ação, como também, ao controle de seus processos de
funcionamento. Conforme Gomes (2002, p. 97) “a mediação de regulação de
controle e comportamento [...] busca uma abstração reflexora e uma tomada de
consciência das próprias ações”. A Mediação do comportamento de compartilhar,
visa novas relações que conduzam a novas aprendizagens e identidades; relaciona-
se ao sentido de alteridade e de empatia, ou seja, o colocar-se no lugar do outro, ter
a compreensão e o respeito pelo que se passa com esse outro.
O critério da Mediação da individualização psicológica do sujeito
com relação ao outro, se estrutura quando o intuito do mediador consolida-se em
singularizar o indivíduo diante da sociedade e promover nesse a busca de um
caminho próprio. Pois, diante de um mundo globalizado e de diversas possibilidades,
é necessário que o indivíduo estabeleça uma busca verdadeira de seu eu, isto é,
sua autenticidade.
O critério da Mediação da busca de objetivo e metas, corresponde
ao planejamento do indivíduo frente a suas escolhas, como modo ativo de
investimento do ser no mundo. O nono critério se inscreve no âmbito da curiosidade
50
e do desafio: a Mediação do desafio: a busca da novidade e da complexidade.
Nele,o papel do mediador está em promover desafios e apresentar situações-
problemas que promovam no mediado o desejo de buscar o novo, a mudança, a (re)
construção e a transformação. Esse critério se mostra importante frente à sociedade
de massa, pois se torna quase uma constante a repetição dos erros ou da mesmice
do que a transformação, a mudança reflexiva e crítica de todo o processo
(FEUERSTEIN, 1998 apud GOMES, 2002).
A Mediação da conscientização do ser humano como modificável
relaciona-se na imprevisibilidade e superação das expectativas, ou seja, na visão de
indivíduo não determinada, ao mesmo tempo em que explica a constituição do
sistema cerebral como flexível e do cérebro como um órgão dinâmico dotado de
grande plasticidade. Nesse caso,
Na ausência da crença na modificabilidade, ou na relutância para se engajar na sua aplicação, o sistema educacional torna-se anêmico, manifestando, na melhor das hipóteses, uma proposta de aceitação passiva, que é a aceitação do indivíduo como ele é, na pior a escola rejeita-o de modo espartano, quando sua condição não preenche as expectativas da sociedade. (FEUERSTEIN, 1994apud GOMES, 2002, p.102).
O critério da Mediação de modificabilidade, em concomitância aos
de pertencimento e de conscientização relaciona o mediado a sua história, tornando-
o, desse modo, agente de seu passado, presente e futuro.
O último critério, mas, o não menos importante, é a Mediação de
busca por alternativas otimistas. Este se constitui na exploração de meios e
possibilidades que promovam o indivíduo e o meio ao seu redor, o qual implica na
elaboração de um sistema de crenças pela busca de um ideal (FEUERSTEIN, 1998
apud GOMES, 2002).
Na esteira do pensamento de Vygotsky e Feuerstein, tendo o ensino
da arte como mediador de possibilidade para o desenvolvimento da autonomia,
busco em Paulo Freire (1921-1997), os pressupostos que sustentam tal concepção.
Em sua Teoria da Relação Dialógica, encontrei os meios e as formas dos homens
modificarem a si mesmos, modificando o mundo. O mundo é o mediador por
excelência para o processo de construção da autonomia, da ética, da estética e da
politização que demarca a atuação consciente do sujeito em sua sociedade. A
51
cultura, tendo o diálogo como mecanismo de educação recíproca, de experiência
cooperativa em busca da emancipação dos estigmas da não competência e do
gerenciamento da própria história, apresenta-se como a mediadora, sendo o
requisito essencial no pronunciamento do mundo.
Para Freire (1967) a educação é um instrumento de transformação
em sentido holístico, do homem e da sociedade, tendo como essência mediadora o
diálogo. A intencionalidade de Freire com tal proposição consiste em proporcionar a
homens e mulheres, tenham a idade que tiverem,o acesso e as condições do
aprender o ato de ler a palavra lendo o mundo.
Para Freire, a leitura de mundo precede a leitura da palavra. Este
movimento do mundo ao verbo, e deste aos códigos linguísticos, ocorre mediado
pela decodificação dos códigos estéticos do entorno. Visto que “apreendendo as
relações dos objetos, e a razão de ser dos mesmos, o sujeito cognoscente produz a
inteligência dos objetos, dos fatos e do mundo” (FREIRE, 1989, p. 225), produzindo
sua autonomia que é assim construída na diversidade. Nos objetos do mundo,
reside a arte e seu arsenal epistêmico.
A proposição freireana para a construção da autonomia “funda-se na
ética, no respeito à dignidade e a própria autonomia dos sujeitos de aprendizagem”
(FREIRE, 1996, p. 11). Nesta perspectiva reside sua dimensão construtiva. A
capacidade autônoma é desenvolvida e conquistada a partir das experiências entre
os sujeitos da relação ensino e aprendizagem por meio de ações que envolvem
vivências dialógicas. Ou seja, em um contexto onde são possibilitadas tomadas de
decisões com liberdade de opção opinativa, de escolha da execução e
materialização do pensamento e até das emoções, em atitudes e formas concretas.
Uma vez que o desenvolvimento da autonomia, que é um atributo
essencialmente humano, vincula-se à ideia de dignidade, não há espontaneidade
em seu desenvolvimento/construção. Motivo da sua inserção na dimensão sócio-
político-pedagógica por ser condição social e histórica, fundamentada na cultura de
sujeitos humanos que, por meio das ações educativas e em contextos formativos
adequados se libertam e se emancipam do sistema opressor e da condição de
oprimido. Condição esta que inviabiliza, impossibilita, restringe e anula a liberdade
de ser-fazer-pertencer (FREIRE, 1996). Logo, do Vir-a-Ser.
A ideia central aqui exposta remonta a de flexibilidade e
modificabilidade para aprender e agir em um meio e contexto específicos. Vincula-
52
se, portanto, a outra ideia, a de interação e cooperação entre sujeitos sociais e
históricos em sua dialeticidade, que ao se confrontarem, se reorganizam e
organizam a vida.
Assim a capacidade de articular pensamentos e a fala, emerge como
condição premente para a construção de uma autonomia a ser constituída em um
ambiente, onde, as práticas dialógicas conduzem o processo de aprender para o
pensar sobre as próprias necessidade ao intervir, visando o bem próprio e por
extensão, o de outrem.
Aloca-se nessa perspectiva a necessidade da busca, de novos
modos de gerir as próprias necessidades. No que se refere ao ensino da arte na
educação infantil, incide em denotar uma atenção especial ao próprio processo em
sentido retrospectivo e prospectivo. Em resumidas palavras, faz-se urgente
interpretar o que informam as leis, em aspectos morais e filosóficos e as principais
teorias que as amparam, considerando que,
Tendo a reflexão como uma prática social, com apoio e estímulos mútuos, permitindo trocas entre saberes e fazeres, os profissionais formadores e os que estão sendo formados assumem papel protagonista para a melhoria da qualidade da educação [...] (GOMES; REIS, 2015, p. 81).
Nessa perspectiva, é imprescindível o entendimento de mediador e
articulador da própria continuidade de formação, pois o professor em formação e o
que está na continuidade da emergência do processo precisa ter clareza quanto a
complementaridade do mesmo.
A relação ensino e aprendizagem na Educação Infantil configuram-
se na emergência de um campo multifacetado do conhecimento e da pesquisa.
Nesse aspecto, a profissão professor e, mais especificamente, a pedagogia em arte,
não podem ser analisadas sob uma ótica exclusiva do campo das necessidades da
ação docente. Visto que, por ser dinâmica, de acordo com Nóvoa (1992) a práxis,
em qualquer instância se apoia “na tríade profissão, sua história e sua constituição;
o sujeito profissional e a instituição em que ocorre efetivamente a sua ação”
(GOMES; REIS, 2015,p. 82). Nesse sentido, é fundamental considerar todas as
variáveis do contexto, inclusive as especificidades das crianças e seus critérios de
comunicação com o mundo.
O pensamento freireano tem a educação enquanto processo de
53
formação humana. Processo este que ocorre em um contexto existencial e que,
vinculado dentro de um espaço/tempo histórico é ao mesmo tempo, social e
individual, ao qual acrescento, o natural e o cósmico, síntese perfeita para uma
alfabetização integral. Nessa perspectiva, alfabetizar-se significa aprender a
codificar, decodificar e interpretar – não só os signos linguísticos - mas o mundo,
com seus objetos, sua materialidade e espiritualidade, sua realidade cósmica e o
homem, enquanto sujeito de inter-relações inserido em determinada cultura.
É assim que a Arte, enquanto meio educativo/produtivo, de inter-
relação, desponta sob o olhar de Paulo Freire como a possibilidade de aprender a
olhar além, compreendendo os múltiplos contextos relacionais que abarcam e
dimensionam a vida em todas as formas e manifestações, não apenas a humana.
Isto significa, portanto, o alargamento visionário das fronteiras sócio-naturais que em
uma relação dinâmica, vincula a linguagem e todas as formas comunicativas
humanas à realidade imediata e seus contextos específicos. Incluindo-se aqui a
primordial capacidade expressiva humana que se consolida nas manifestações de
seu potencial imaginativo, pensante e criativo.
Este potencial é corporificado nas produções artísticas ou produtos
de sua dimensão estética e sensível. Está presente ainda nos objetos e artefatos
originários das culturas diversas, no arcabouço tecnológico e no instrumental
simbólico. Se a objetualidade do universo visual, por um lado, indica a capacidade
humana, de relação autônoma com o mundo. Por outro, quando em associação aos
objetivos das classes dominantes, impõem socialmente, um consumo passivo e
acrítico e uma condição de analfabetos visuodigitais. Demarcando, grosso modo, a
posição de meros receptores de informações e não de decodificadores que
interpretam o mundo.
É neste sentido que se estabelece em Paulo Freire(1998) a ênfase
na intencionalidade de uma prática que, abarcando em seu cerne a visão para além
do instituído, não é neutra. Esta não neutralidade da práxis supera posturas
ingênuas ou astutas do ato educacional e da própria educação. Desse modo, a
educação enquanto processo deve ser “vivenciada como prática concreta de
libertação e de construção de história” (SEVERINO, 1982 apud FREIRE 1988, p. 7),
configurando-se como uma prática direcionada a equidade e a diversidade cultural
dos sujeitos da relação ensino e aprendizagem.
A igualdade significa em Freire (1988) o acesso e a permanência de
54
todos à educação, independentemente da posição socioeconômica ou da cultura de
base. Tal igualdade de acesso envolve a apropriação de um conjunto de
conhecimentos proveniente dos saberes e dos bens culturais. Estes por sua vez,
propiciarão o desenvolvimento de habilidades básicas dos sujeitos da
aprendizagem, potencializando-as e permitindo a sua construção plena. Para Freire,
a plenitude da formação humana envolve considerar o que “é próprio do seu
universo cultural em inter-relação com os bens históricos das multiculturas que
compõem o universo educativo na abrangência macro das relações sociais”
(GADOTTI, 1992, p. 24).
Portanto, em quaisquer circunstâncias, cabe ao docente a criação de
condições para que a aprendizagem ocorra. O professor é o agente que irá
oportunizar momentos educativos e ações pedagógicas em que o sujeito da
aprendizagem se confronte com o objeto da mesma e a mediação aconteça.
Freire (1996, p. 30) discorre sobre a afetividade e afirma que a
conduta/postura do educador e o papel da afetividade no processo educacional,
alude a uma prática na mutualidade. Ou seja, na parceria afetiva/efetiva entre
professores/educadores e os crianças/estudantes.
A afetividade, como explicita a psicologia feursteniana (FEURSTEIN
apud GOMES, 2002) é marca humana, visto ser o elemento de afetação, que nas
interações, medeia, a motivação. Partindo deste principio, creio ser a pulsão vital, a
mola propulsora que desencadeia a automotivação que sustenta a busca e requer o
querer aprender, pois, a vontade de aprender, por sua vez, instiga a curiosidade,
impulsiona a formulação de perguntas e exige respostas. Respostas necessitam de
pesquisa, diálogo, reflexão, confronto, portanto, resolução de problemas. Logo,
leitura, interpretação, compreensão e reelaboração que gera ressignificação e
consequentemente, a apreensão e o conhecimento que se inicia por meio das
leituras de mundo.
A aquisição da língua materna, com a devida interpretação de seus
códigos e símbolos, permite aos indivíduos aprendentes, a aquisição da capacidade
do pensar bem. Pensar bem, sob esta ótica, depende do ler e interpretar bem. Além
da sintaxe perfeita, da coerência e desencadeamento das ideias e das normativas
gramaticais que envolvem a redação textual, é necessário saber ler para além do
que é visível e aparente, interpretando todos os contextos textuais, quer sejam
escritos ou imagéticos. E não apenas no aspecto subjetivo, mas objetivamente,
55
fazendo as inter-relações necessárias com outros aspectos da realidade imediata e
de outras realidades espaço/temporal (FREIRE, 1996).
Tal fato é constatado em Pedagogia do oprimido. Nesta obra, Freire
(1987) aborda como moldamos e construímos nossa consciência político-social,
advertindo que não podemos exigir ou impô-la ao outro como meio de modificação
de sua realidade. Discursando sobre sua construção/constituição pessoal e
profissional, ele nos desvela e revela as bases de fundamentação da mesma no
parentesco entre as vivências da infância e a realidade de sua atuação docente e do
contexto Sócio-Histórico e político do Brasil, da segunda metade do Século XX.
Em seus diálogos com diversos autores, entre eles, Jean Paul Sartre
(1905-1980) e Karl Heinrich Marx (1818-1883), Freire descobriu ser uma das
expressões da conivência dos oprimidos com os opressores a fragilidade e como
esta pode tornar-se a força dos oprimidos. Ele enfatiza que é a partir das leituras
críticas da própria realidade e do entendimento de responsabilidade social no
espaço/tempo do aqui e agora, que o sonho esperançoso emerge como
ancoradouro de possibilidades e de perspectivas, de concepções e mudanças “para
tornar-se concretude histórica” (FREIRE, 1992, p. 5).
Ainda para Freire (1996) é preciso respeitar o saber da experiência
feito, entendendo a realidade do outro, para que haja o desvelamento da razão de
ser e agir de cada sujeito envolvido no processo de construção do saber e do
desenvolvimento crítico, autônomo, cidadão. Só assim haverá a compreensão dos
modos de como nos experimentamos em cada momento do percurso de nossa
humanização. E de quais seriam os objetos estimulantes, mediadores entre o eu e a
realidade a ser desvelada, compreendida, apreendida e ressignificada.
A partir desta leitura elucidativa e do entendimento da minha
inconcretude e responsabilidade interativa, creio ser possível, vislumbrar novos
horizontes para a formação humana no quesito ensino da arte, que possibilite
descortinar novas percepções e interações sobre os contextos e as parcerias, desde
que ocorram em cooperação intencional e recíproca. O saber advindo da
experiência, seja por interação com o objeto a ser mediado e ou com o mediador,
eclode em possibilidade de vivências a serem transformadas.
2.5 DESENVOLVIMENTO DA AUTONOMIA EM PAULO FREIRE: A ESTÉTICA E A
ÉTICA COMO MARCA HUMANA
56
As ciências da educação sinalizavam há muito, a ampliação e a
diversificação das fontes legítimas dos saberes pedagógicos e, a necessária
coerência entre “o saber-fazer e o saber-ser-pedagógicos” (FREIRE, 1992, p.
12).Em um momento histórico em que a sociedade do século XX era assolada pelos
apelos excessivos ao individualismo e à competitividade como marca de autonomia,
Freire anunciava possibilidades educativas apontando para a dimensão ética,
estética e política da ação pedagógica.
A ética, nesta perspectiva, é inseparável da prática formativa e,
sobretudo das ações humanas. Segundo Freire (1996) a melhor forma de
„ensinarmos‟ sobre condutas éticas, é vivenciá-las em nossa realidade cotidiana. O
que envolve, para nós, enquanto professores, desde o modo como lidamos conosco
mesmos, aos tratamentos que damos as especificidades da prática docente, e que
implicam em relação entre pares, discentes, outros colaboradores, famílias e autores
cujas ideias conceptivas divergem das nossas.
A imparcialidade conceptivo-ideológica deve ser assinalada com
base no diálogo saudável, em contrapontos divergentes e não em refutação sem
nexo, sem coerência. O estudante, a criança, precisa ser informado sobre todas as
possibilidades, ideias, concepções e visões de mundo para que, a partir de seus
próprios pontos de vista, possa reelaborar criticamente seu pensamento,
desenvolvendo sua autonomia para um pensar e agir bem.Porém, com respeito e
tolerância ao diverso, ao inusitado, ao que nos causa estranhamento. Só assim
poderemos falar de comportamentos éticos e estéticos politizados.
Nesse sentido, a estética é abordada enquanto capacidade
subjetivo/perceptiva e sensível, da condição de humanizadores e humanizados que
adquirimos no processo do tornar a ser presença.Ou seja, a nossa capacidade de
nos educarmos uns aos outros em reciprocidade e parceria colaborativa, visando à
beleza, enquanto postura ética nesta relação. Tal perspectiva sinaliza a necessidade
da não naturalização da realidade social e histórica na qual estamos imersos. É um
convite para a reflexão sobre as posturas/condutas ideológicas, totalistas e
acomodadas. É o vislumbrar do possível no intercâmbio com os limites, lançando
novos olhares às possibilidades, sobre e no processo formativo humano
sedimentado na inconcretude (FREIRE, 1996).
Neste pressuposto descortina-se o sentido da ação de ensinar
enquanto mediação. Mediação a ocorrer entre o objeto do conhecimento a ser
57
experienciado e o sujeito da aprendizagem. Nesta visão, discentes e docentes,
crianças e adultos, ambos são criadores de situações, em que, no confronto com o
objeto de conhecimento, o mediador, interagem reciprocamente na interpretação dos
estímulos.A vivência da aprendizagem, ou seja, a do desvelamento, da descoberta,
da apreensão e ressignificação, ocorrem, embora em âmbitos diferentes, em uma
relação cooperativa, mutual, onde “quem ensina aprende ao ensinar e, quem
aprende ensina ao aprender [...]” (FREIRE, 1996, p. 25).
Portanto, parafraseando Freire (1996), o ensinar inexiste sem
aprender ou, o aprender precede o ensinar. Ninguém pode falar ou fazer, ensinar e
criar condições de, sobre o que não sabe, não conhece ou não vivenciou. A prática
do aprender-ensinar e ensinar-aprender necessita de ser autenticamente vivenciada
em sua totalidade e realidade de processo relacional. É assim que ensinar se
transforma no aprender-ensinar e aprender contínuos.
Esta tríade caracteriza a especificidade humana do ato de ensinar
designado por Freire (1996) como “competência profissional e generosidade
pessoal” (p.105). Estes são condicionantes propícios em uma relação ensino-
aprendizagem para se gestar, nascer e nutrir/desenvolver um clima de respeito
mútuo e disciplina saudável entre “[...] a autoridade do docente e a liberdade do
aluno/criança [...]”(FREIRE, 1996, p.107).
As premissas freireana estabelecem as proposições para um
processo educacional que priorize a humanização do humano em um contexto
relacional vinculado a uma existência que extrapola o espaço convencional das
relações imediatas. A base deste desenvolvimento e aprendizagem qualitativos
consolida-se no diálogo. A cada um dos sujeitos da relação ensino-aprendizagem é
assegurado o direito de ter voz e vez, em um processo que permita e priorize o
saber ouvir e falar. A capacidade retórica argumentativa seria o meio estratégico
para o pensar e expressar bem e para o efetivo exercício da cidadania e,
consequentemente, da autonomia responsável.
A cultura é valorizada como mediadora na construção de uma
identidade cultural do sujeito aprendente que, ao mesmo tempo em que a ela se
reporta, em busca de subsídios, pois, produto de seu grupo social, a transforma e se
transforma,produzindo novos modos relacionais e produtores de uma cultura que
enfatiza e permite este movimento. Movimento este que, por ser dialógico e
dialético, possibilita a construção de sua identidade cultural, que é ao mesmo tempo
58
pessoal e coletiva. O dialogo como campo de experiências da dialogia, emerge
então por vivencias. Pois,“[...]o diálogo é o encontro amoroso dos homens que,
mediatizados pelo mundo, o pronunciam, isto é, o transformam e, transformando-o,
o humanizam”(FREIRE, 1976, p. 43). Este, portanto, é o grande ato criativo/criador
exercido pelo homem.
Esta afirmativa sinaliza o fato de criarmos nossa própria existência,
recriando a nós mesmos. Sendo que esta recriação ocorre por meio de ações
demarcadas por nosso processo educativo, que é construtivo e continuo e que se
insere na dimensão relacional do eu/outro e do eu/mundo. Daí o fato de Freire ser
enfático ao afirmar que, por meio de nossos processos criativos, incluindo todas as
formas manifestas da Arte, e estas como linguagem estética, enfeamos ou
embelezamos o mundo. Portanto, não é possível nos “eximir da ética e da estética,
pois fazemos o mundo a partir de nossa autonomia” (FREIRE, 1996, p.57).
Ao demonstrar esta unicidade entre ética e estética – enfear ou
embelezar o mundo – Freire nos convoca à responsabilidade quanto às nossas
ações produtivo-criativas. Entendendo a criatividade como capacidade humana e
potencial a ser desenvolvido e construído, visando uma atuação consciente,
autônoma e responsável, frente à relação complexa que envolve o humano,em seus
contextos de inserção.
As ações estéticas não podem desvincular-se da postura ética.
Assim, o processo artístico em Freire é pensando a partir da totalidade humana.
Sendo por meio dele que ocorre a humanização do humano e a ressignificação
humanizada do mundo.
Pensar a totalidade humana, nesta premissa, requer vislumbrar o
desenvolvimento percepto/sensível conjuntamente com os valores culturais a serem
apropriados e re-criados pelos sujeitos da aprendizagem. Só nesta dimensão
ocorrerá a construção de caminhos conciliadores para uma existência na
mutualidade. Quer seja, na ambiência da práxis educativa, ou na relação com o
mundo e seus objetos. Estes, enquanto espaços cartográficos, microcosmos
geográficos, onde a felicidade e a responsabilidade caminhem juntas, criando e re-
criando o mundo via um processo amoroso.
59
É assim que no discurso e prática de suas várias pedagogias10,
Freire (1985, 1987, 1996, 2000) enfatiza os desafios e as possibilidades de uma
ação educativa que se paute por uma relação de amorosidade entre docência e
discência; entre saberes informais e formais; entre a sociedade, a cultura e a
realidade imediata de meninos e meninas, de crianças e adultos envolvidos neste
processo. Tais saberes, ele os denomina de saberes necessário a prática
pedagógica. Estes saberes envolvem o saber-fazer das ações simples às mais
complexas, abrangendo manipulação, conceituação e estabelecimento de inter-
relações.
Tais conhecimentos, estes modos de saber fazer, envolvem desde o
manipular e preparar uma mistura cromática á utilizá-la para expressar-se. Sendo
muito natural para a criança, pois, de início ela apreende a cor por sua capacidade
expressiva e não por conceitos. Ou, preparar um alimento adequadamente, à defesa
de uma tese sobre determinado assunto ou temática, envolve a necessidade de
saberes fundantes e o domínio do uso de instrumentos e recursos a serem utilizados
no desenvolver da ação. Necessita e requer pesquisa, experiência, elaboração de
hipóteses, levantamento de dados, análise, confronto de dados, elaboração de
argumentos.
Nesta premissa ensinar em qualquer área ou modalidade educativa
é criar possibilidades para a produção/construção constante do eu e do outro. Ou
seja, é a aceitação compreensiva da natureza da ação pedagógica como processo
interativo-formativo que ocorre por meio da busca constante e da pesquisa, que
também faz parte da natureza da ação docente e do ser professor. É dimensionar a
capacidade humana de humanização entre sujeitos, que embora diferentes entre si
e em seus saberes primeiros, ao interagirem e agirem,atuam intencional e
reciprocamente uns sobre os outros, pois, “[...] quem forma se forma e reforma e,
quem é formado, forma-se e forma ao ser formado” (FREIRE, 1996, p. 25).
Nesse aspecto incide a categoria mediacional. Sendo assim, educar,
enquanto ação humana de ensinar e aprender, se caracteriza na carga intencional
direcionada aos modos como viver e agir e ensinar o como agir e viver ao outro.
Possibilita o acesso à experiência, à analise, à reflexão e ao entendimento sobre os
10
As pedagogias freireanas estão reunidas em várias obras de Paulo Freire, entre elas: Pedagogia da autonomia (1996); Por uma pedagogia da pergunta (1985); Pedagogia do oprimido (1987) e Pedagogia da indignação (2000).
60
modos de ser e agir em cada cultura, a partir de parâmetros que oportunizam o
movimento autônomo responsável de novas ações.
Exigindo, portanto, a consciência da incompletude, por que somos
agentes históricos e construtores em um tempo/espaço de possibilidades
condicionadas por fatores como a herança genética e sócio-cultural. Tais fatores
denotam responsabilidade frente aos abusos que negam a decência e ofendem a
liberdade do direito a vida em sua plenitude e essência: direitos de imaginar, sonhar,
pensar, criar e materializar. Portanto, o direito as aprendizagens lúdicas mediadas
pela arte.
61
Penso que a educação infantil é o locus por excelência para permitirmos diversas
experiências, utilizando materiais que ampliem o repertorio estésico e estético, descobrindo
materiais e estratégias na resolução de problemas e, sobretudo valorizar a produção da
criança.
(Lourides Francisconi, 2015).
62
3 FAZER E PENSAR A ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: MEDIAÇÃO
A grama desenha o verde A árvore desenha o céu
O vento desenha a nuvem A nuvem desenha o azul
A água desenha o rio E o homem desenha o tempo na exatidão do sonho.
Amilcar de Castro (1999)
Neste capitulo a prática de sustentação do discurso segue as
seguintes indagações: o que é a Arte? Para que serve? O que é o desenho? Como
uma criança aprende a desenhar? Quais fatores influenciam o desenvolvimento
gráfico e estético? O que caracteriza a ação gráfico-plástica? O que é uma pintura?
A criança produz pinturas? Qual a relevância da função semiótica na cognição?
Como o cérebro aprende? Qual a relação da ambientação com a aprendizagem? Na
busca por tais respostas, entendemos que os postulados de (VYGOTSKY, 1988,
1998, 2001, 2003, 2009) e de Reuven Feuerstein (1998 apud GOMES, 2002), assim
como as elucidações de Meier e Garcia (2007), bem como as elucidações
apresentadas por Santaella (2007) com base nos estudos de Semiótica e Filosofia
de Peirce (1977) sobre processos de significação e produção de significados; de
Barbosa (2010, 2014) sobre as prerrogativas históricas e conceituais do ensino da
arte atual; e de Barbieri (2012) sobre as possibilidades de experimentos artísticos
com a infância; e em Martins (1998, 2012, 2014) sobre os possíveis caminhos de
aproximar arte, vida, pesquisa e profissão e em aproximação às pedagogias de
Paulo Freire (1967, 1987, 1996) que explicitam as praticas do ser e tornar-se
professor (a) sob os auspícios de dimensões politizadas, serão meu norte, sobre os
possíveis caminhos para o pensamento e a promoção de ações tendo como mote o
ensino e a aprendizagem de arte na Educação Infantil. E ademais, em Karl Marx
(1984, 1977) sintetizo alguns aspectos sobre arte, estética e trabalho.
Dessa forma, neste capitulo , desenho uma síntese dos principais
conceitos da Matriz Histórico-Cultural em correlação aos aportes teóricos
supracitados, por serem eles que subsidiam o meu pensar para estabelecer as
relações possíveis entre o pensamento dos autores e os meus questionamentos.
Dessa forma, busco entender a relevância da produção semiótica na infância, entre
63
os questionamentos em tela e outros que possivelmente, irão surgir no decurso.
3.1 O CÉREBRO, A CONSTITUIÇÃO OBJETIVA E SUBJETIVA HUMANA E AS
SEMIOSESDA INFÂNCIA
Começo este capítulo definindo o que é o cérebro na perspectiva da
Matriz Histórico-Cultural. Para Vygotsky (1998, 2003) e colaboradores. Ou seja, o
cérebro é o substrato material da atividade psíquica e configura-se em um sistema
aberto de grande plasticidade. Suas estruturas e funções são modeladas no
decorrer evolutivo da espécie, nos campos da filogenia e da ontogenia, sendo que, a
mente humana constitui-se socialmente e o humano nasce com as funções
elementares básicas, tais como a atenção, percepção, memória; funções também
presentes em outras espécies. Porém, no caso humano, a interação sociocultural
possibilita a constituição das Funções Psicológicas Superiores (FPS), tais como a
atenção seletiva, memória lógica e a aquisição e desenvolvimento da linguagem. As
FPS são características tipicamente humanas, construções provenientes do
desenvolvimento social ao longo da história evolutiva do homem.
Sendo assim, a consciência é construída na interação com os
instrumentos tecnológicos e as criações culturais. O princípio básico é o da
interação, ou das atividades compartilhadas entre pessoas, e, o principal paradigma
preconizado é o da mediação, pois, a relação do homem com o mundo não é direta.
Ocorre por intermédio de conexões ou uso de instrumentos de validade sígnicas e
simbólicas.São mediadores por excelência, a cultura, o outro social, os instrumentos
e os signos (GOMES, 2002; OLIVEIRA, 1992).
De acordo com Vygotsky (2003) existem duas categorias de
instrumentos: os técnicos, onde se inserem as ferramentas de ação no mundo físico;
e os signos, que são as ferramentas de ação no mundo psicológico, ou, os
instrumentos de caráter simbólico e reguladores do psiquismo. A linguagem
configura-se em um sistema articulado de signos que representam os aspectos da
realidade, intrinsecamente ligados à cultura.
Sendo a linguagem o instrumento de conexão e de ação cultural
entre as pessoas, Vygotsky (2001), esclarece que o pensamento e a linguagem
estão diretamente relacionados. Tais capacidades funcionais da inteligência humana
64
ocorrem em processo condicionado, pois a linguagem, enquanto fala articulada
necessita do pensamento para ser efetuada.
Além das condições orgânicas especificas, tais como percepção
auditiva funcional e o aparato fonoarticulatório, ou seja, a capacidade funcional de
falar, faz-se necessário as trocas simbólicas que ocorrem por meio das relações
interpessoais e conotam significado às palavras. Para que uma criança aprenda a
articular vocábulos fonéticos, ela necessita de um ambiente social propício. Isto é,
devidamente ambientado, com sujeitos falantes e dialógicos, com instrumentos
diversos que mediatizem as conexões necessárias com os signos padrão da língua
a ser apreendida.
Em Vygotsky (2001) a linguagem é um processo individual e um
processo social, simultaneamente. Nesse aspecto, a fala, enquanto processo
fonoarticulatório especificamente humano,dimensiona o comportamento gerado na
interação social, devido e na eminência do uso de signos de grande relevância, os
signos linguísticos. Estes são utilizados para formar o léxico e organizar a
comunicação,em sua gama de narrativas, formais ou não formais, sonoras, gráficas,
visuais.
Neste ponto, é necessário uma interlocução com Charles Sanders
Peirce (1839-1914) e seus estudos sobre Semiótica e Filosofia (1977),
especificamente os capítulos que abordam a classificação dos signos e o ícone, o
indicador e os símbolos (p. 93-134).
Este recorte é fundamental para o entendimento sobre o termo
Semiótica11, vinculando-o as semioses infantis, visto que Peirce (1977, p.94), define
signo como um objeto de representação, apropriação e atribuição de sentido na
construção de significados, ou seja, o" [...] representam em é algo que, sob certo
aspecto ou de algum modo, representa alguma coisa para alguém". Segundo este
autor, a função do signo é a de dirigir-se ao interlocutor, criando na mente dele um
"signo equivalente, ou talvez melhor desenvolvido. Ao signo assim criado, denomino
11
Neste estudo a semiótica não é o cerne central. Porem, a interlocução com os estudos peirceano é importante para a compreensão da aplicabilidade dos conceitos da matriz histórico-cultural. Para efeito de estudo recorro a Santaella (2007) e, muito embora Vygotsky (1889-1934) tenha mantido interlocução com as fontes soviéticas da filologia, matriz da semiótica soviética, (p.16), a autora não faça nenhuma menção do contato do mesmo com a obra de Peirce que assim como John Dewey (1859-1952) é pragmático. Contudo, pode-se pressupor que Peirce, sendo o precursor das pesquisas sobre o campo da semiótica, possa ter sido estudado pelo circulo de estudos soviéticos. De origem grega a palavra semiótica ou semeion, quer dizer signos e caracteriza-se na ciência geral dos signos. Maiores detalhes, ver Santaella (2007, p.1). O que é Semiótica.
65
interpretante do primeiro signo" (PEIRCE, 1977, p.94, grifos do autor).
Nessa perspectiva, signo é todo objeto que representa algo externo
a ele, criando dessa forma uma idéia do objeto ou o seu sentido de existência
funcional, que pode ser, social (uma cadeira serve para sentar-se e descansar);
emocional (produzir marcas ou apreciar uma paisagem cultural ou natural, encantar
os olhos e acalmar a alma); instrumental (um talher é fundamental às refeições);
simbólica (transformar uma tampa de panela em um volante de carro e viajar pelo
mundo da imaginação). Este autor diferencia signo e objeto, estabelecendo os
conceitos de apropriação de sentido e construção de significado, ou seja, "para que
algo seja um signo deve 'representar' algo diverso, que é chamado, como dissemos,
seu objeto [...]" (PEIRCE, 1977, p. 95, destaque do autor).
Nesse sentido, tomando como base os estudos de Santaella (2007)
sobre a definição de semiótica na perspectiva abordada por Peirce, é possível dizer
que as narrativas infantis, verbais e não verbais, são campos de possibilidades de a
criança conhecer, perceber, ler, aprender, apresentar e representar o mundo,
mediada por sua cultura.
Com relação aos canais de comunicação da infância, ou as
manifestações de suas semioses, recorro aos estudos de Santaella (2007) no que
se refere as denominações de linguagens verbais e não verbais e que nesse estudo
eu caracterizo de semioses, abarcando o hall das atividades expressivas e gráficas
da criança. As narrativas semióticas, ou semioses infantis, veiculam formas de
manifestações de sentido e de sociabilidade, cindindo o campo de apropriação
simbólica, ou a internalização de Vygotsky (1998).
Definindo os termos, a autora alerta para uma distinção necessária
entre a língua materna (signos lingüísticos, de herança cultural) e a linguagem,
ações que fazemos na utilização dos signos lingüísticos para falar e escrever,
desenhar (linguagem verbal) e expressar, exprimir percepções, sensações, desejos,
emoções, pensamentos, sentimentos (linguagem não verbal) . A autora enfatiza a
pluralidade de linguagens existentes, de âmbito verbal e não-verbal, as quais
medeiam nosso ser e agir no mundo, tais como
a leitura, a produção de formas, volumes, massas, interações de forças, movimentos; que somos também leitores e produtores de dimensões e direções de linhas, traços, cores [...] nos orientamos e nos comunicamos por imagens, gráficos, sinais, setas, sons musicais, gestos, de expressões, cheiro, tato, olhar, sentir, apalpar [...] (SANTAELLA, 2007, p.2).
66
Por meio da aquisição da linguagem, a criança supera as limitações
de seu meio social, controlando seu próprio comportamento. A linguagem demarca
as formas de expressão no uso da razão e emoção, na exposição de pensamentos e
sentimentos. Esta capacidade ou função é o que diferencia o humano dos demais
seres.
A aprendizagem nessa perspectiva é um processo de
interdependência. Envolve a aquisição de informações, o desenvolvimento de
habilidades, de atitudes e valores em contato com o meio físico e social,favorecendo
a transição das Funções Psicológicas Elementares (FPE) tais como: reações
automáticas, ações reflexas e associações simples, de origem biológica, para a
construção das FPS que envolvem o uso de funções sofisticadas. Estas funções
sofisticadas incide em:o controle consciente do comportamento, a atenção e a
memória voluntária, a memorização ativa, o pensamento abstrato, o raciocínio
dedutivo, a capacidade de planejamento. As funções psicológicas superiores são de
origem sociocultural; o desenvolvimento natural transforma-se em social e o
comportamento humano é determinado histórica e culturalmente.
No início do século XX Vygotsky e seu grupo de pesquisadores
soviéticos denominados de Troika, usaram o conceito de consciência sob o
entendimento “consciência existente - das bewusste Sein” (LURIA, 2010, p. 23),
sustentando a ideia da construção histórica da mesma em alinhamento com o
pensamento filosófico marxista.
Segundo os postulados marxistas, a ação humana transforma o
ambiente e modifica o homem, rejeitando a ideia corrente da consciência como
"propriedade intrínseca da vida mental" (LURIA, 2010, p. 23).
Para Marx (1984) o homem é um ser natural e o trabalho é a
essência humana. Logo, se o homem é produto de si mesmo, portanto, é produto do
trabalho. Ou seja,
O trabalho não produz só mercadorias; produz a si mesmo e ao trabalhador [...] esse fato nada mais expressa senão: o objeto que o trabalho produz, o seu produto, se lhe defronta como um alheio, como um poder independente do produtor. O produto do trabalho que se fixou num objeto, se fez coisa, é a objetivação do trabalho [...] (MARX, 1984, p.143).
Ao tomar consciência da natureza como meio de produção e
67
produto, o homem descobre, por assim dizer, sua própria natureza criadora na
apropriação objetiva da realidade que se transforma e o modifica, tornando-se ação,
de fato subjetiva, [consciência constituída da própria constituição] pela vivência do
ato experienciado.
Para Vygotsky e colaboradores a explicação para a base biológica
do desenvolvimento psicológico, requisita o entendimento de que a consciência é a
forma mais elevada de reflexo da realidade. Ela não é um dado à priori, nem é
imutável e passiva, mas sim formada pela atividade e usada pelos homens para
orientá-los no ambiente, não apenas adaptando-se a certas condições, mas também
se reestruturando (LURIA, 2010, p. 23).
O principio básico da Matriz Histórico-Cultural centra-se na defesa
da ação prática, da atividade material humana [ trabalho, seja de que natureza for, a
essência é a atividade pelo ato] em um ambiente apropriado. Tem como mecanismo
de desenvolvimento os processos mentais, a funcionalidade da cognição, de modo a
modificar o ambiente e renovar continuamente o hall das atividades cerebrais do
humano,por meio das atividades práticas, manifestando-se em novos
comportamentos. Os estudos e pesquisas de Vygotsky e seu grupo, sustentam que
"a cultura torna-se parte da natureza humana num processo histórico que, ao longo
do desenvolvimento da espécie e do indivíduo, molda o funcionamento psicológico
do homem" (OLIVEIRA, 1992, p. 24).
Para Luria (2010, p. 23) as relações entre os processos mentais e a
realidade, a capacidade funcional do cérebro no quesito gama de ações inteligíveis e
emocionais e os comportamentos humanos, ocorre em dependência “das práticas
sociais complexas".
Assim, as ações educativas e formativas do presente, se pautam por
modos de agir no e do passado. Utilizam-se de instrumentos culturais que auxiliam
tanto na manipulação do ambiente quanto a formar a organização mental das futuras
gerações, suscitando novas formas de agir. È nesse sentido que apreender implica
em mudanças de comportamentos.
Ainda de acordo com a Matriz Histórico-Cultural, o ser humano
possui duas dimensões, uma biológica ou natural e uma cultural. Ambas,
possibilitam sua ação no mundo. Da dimensão biológica herda-se a constituição
genética, os sistemas funcionais do corpo e o cérebro que o comanda com todas as
suas características neurofisiológicas e psicológicas. Da dimensão cultural, todas as
68
formas de organização e ação no mundo, em nível físico externo e interno,
denotando a objetividade e a subjetividade humana.
Para Vygotsky (1989 apud OLIVEIRA, 1992) a explicação básica da
constituição dos processos psicológicos superiores congregam quatro linhas: a
filogênese,a origem e desenvolvimento da espécie, limites e possibilidade, evolução,
interação e plasticidade cerebral;a ontogênese,a origem e desenvolvimento do
indivíduo, ligado à filogênese, fases comuns; a sociogênese, a história cultural, onde
a filogenia, a cultura e a história se entrelaçam, definindo o funcionamento
psicológico. Nenhum ser humano existe fora do contexto histórico. O ser humano já
nasce interpretado; a microgênese, onde reside a especificidade do
desenvolvimento, a história dos fenômenos psicológicos e a construção da
singularidade.
Vygotsky (1989 apud OLIVEIRA, 1992) informa a necessidade de
considerarmos as duas linhas de desenvolvimento para o entendimento da
constituição psíquica e pertencentes a ontogênese. A linha cultural ganha primazia
sobre a natural, pois se reporta de forma específica ao desenvolvimento humano.
Fato que, Vygotsky e seu grupo,constataram por meio de seus estudos no domínio
ontogenético ou a formação do ser, sobre os instrumentos mediadores, tanto em
nível sociocultural, quanto nos processos interpsicológicos.
3.2 INTERAÇÕES, DIÁLOGO E INSERÇÃO CULTURAL COMO EXPERIÊNCIAS
DE APRENDIZAGEM MEDIADA
A linha cultural ganha destaque também na perspectiva da Teoria da
Mediação e da Modificabilidade Cognitiva Estrutural de Reuven Feuerstein (1921-
2014). Feuerstein considera que a relação com o ambiente, denominada por ele, de
transmissão cultural, está associada com a relação dos humanos entre si em
ambientes e contextos muito específicos. Ou seja, uma interação que é marcada
pela presença intencional do outro, por uma experiência de aprendizagem mediada,
que busca inserir esse primeiro no ambiente cultural.
A falta deste nascimento cultural provoca a síndrome da privação
cultural e, como consequência, prejuízos sérios para a aprendizagem. Feuerstein
também preconiza a capacidade humana de aprender sempre e sob diversas
condições. Visto que,o sistema cerebral e suas funções são dotados da capacidade
69
de modificabilidade. Esta capacidade implica no estabelecimento de novas
organizações, tanto em nível da cognição, quanto dos neurônios e suas funções.
Os pressupostos feuerstenianos assentam suas bases na tríade
religião, filosofia e ciência. Consta entre seu referencial teórico conceitos
epistemológicos referentes ao interacionismo e ao estruturalismo, à fenomenologia,
e ao evolucionismo, do materialismo histórico e dialético e dos cinco pontos
principais dos “princípios do pensamento judaico” (MEIER; GARCIA, 2007, p. 92).
Seus estudos abrangeram desde crianças e adolescentes vítimas do
holocausto, e órfãs, provenientes de culturas distintas e de diversos países europeus
e africanos, com sérios prejuízos cognitivos e afetivos, às crianças com Síndrome de
Down. As pesquisas de Feuerstein possibilitaram a formulação de um método de
instrumentalização cognitiva que opera via dois mecanismos: um sistema de
avaliação do potencial de aprendizagem e um Programa de Enriquecimento
Instrumental (PEI). O sistema de avaliação do potencial de aprendizagem é uma
metodologia avaliativa que estuda as razões da baixa funcionalidade cognitiva ao
mesmo tempo em que provê orientações para potencializá-las.
Esse tipo de avaliação considera a capacidade intelectiva como
dinâmica e modificável. Explica-se a partir do conceito teórico de Desenvolvimento
Proximal de matriz vygotskyniana e da Modificabilidade Cognitiva Estrutural a qual
resulta da associação entre os conceitos de esquemas piagetianos e de
organicidade plástica do substrato cerebral, do campo neurocientifíco. O PEI, sendo
multidimensional, estrutura-se focado nos três componentes da interação: o sujeito
em processo de aprendizagem, o estímulo e o mediado. O objetivo do programa é a
modificação das estruturas cognitivas e a expansão do potencial de aprendizagem,
aumentando a eficiência mental e melhorando o desempenho da capacidade
intelectiva.
Feuerstein defende que tanto o “desenvolvimento cognitivo e a
manifestação da aprendizagem são efeitos de um tipo muito específico de interação
humana por excelência” (GOMES, 2002, p. 73), denominadas de experiências de
aprendizagens mediadas.
Para Feuerstein, todos nós somos mediadores em potencial, pais,
professores, irmãos mais experientes, outras crianças e linguagem é o principal
instrumento por meio do qual ocorre o processo de mediação. A mesma configura-
se como um meio propício de desenvolver/construir o pensamento complexo e o
70
metacognitivo, a capacidade de estabelecer relações, fazer associações e de
reverter o processo do pensar. É por meio da dialogicidade intencional entre o
emissor e o receptor da mensagem, que se concretiza a verdadeira experiência de
aprendizagem mediada.
Assim, na ação do aprender a ouvir e a falar, a criança e ou o
estudante/mediado, desenvolve sua própria capacidade de aprender a pensar e a
aprender a aprender para o pensar critico. Tal capacidade envolve aspectos
relativos ao perceber, observar, estar atento aos detalhes, analisar e construir
significados. No estabelecimento conectivo no campo das inter-relações há a
construção da consciência cônscia frente ao mundo e aos objetos, diferenciando o
eu e o outro e conferindo-lhes autonomia (GOMES, 2002).
Em Feuerstein o enfoque na cognição justifica-se por sua
permissividade flexível-plástica e adaptativa, envolvendo os processos de recepção
da informação pelo indivíduo, o input, a sua elaboração e comunicação, o output, em
acordo as informações, como meio adaptativo. Esse processo envolve as funções
do uso de processamento de informações, como a interiorização, a representação e
a operação; do uso de experiências anteriores em novas e situações complexas de
adaptação, onde “a autorregulação transforma-se no pilar básico da adaptabilidade
e da aprendizagem, e, portanto, da inteligência” (MEIER; GARCIA, 2007, p.113).
Nesta perspectiva, a cognição é concebida por Feuerstein como um
conjunto de um número finito de funções cognitivas básicas [...] componentes que
emergem de atividades inatas da criança, de sua história de aprendizagem, das
suas atitudes perante a aprendizagem e das suas motivações e estratégias (MEIER;
GARCIA, 2007, p. 115-116).
Dessa forma, ao entender a cognição enquanto produto histórico,
Feuerstein afirma que a sua compreensão só será possível nos contextos
relacionais onde é produzida e do qual ela se expressa, visto que tais contextos
exigirem interações/mediações específicas, com variações de formas e conteúdos.
Assim, as impossibilidades intelectuais de um dado momento, e para uma dada
pessoa, podem caracterizar-se como potencialidades, se o contexto de interações
mediarem e instrumentalizarem afetiva e cognitivamente o sujeito para uma nova
direção em seu desenvolvimento (DA ROSS, 1999 apud MEIER; GARCIA, 2007,
p.116).
Nesse caso, tanto para Vygotsky quanto para Feuerstein, o bom
71
mediador é aquele que se antecipa ao desenvolvimento e o bom ensino é aquele
direcionado as funções psicológicas superiores em construção e a sua atuação
prioritária é sempre na zona de desenvolvimento proximal. A ação mediada deve
estabelecer-se referendada na heterogeneidade dos sujeitos da relação ensino e
aprendizagem.
Para Gomes (2002) o que difere e formaliza um mediador é a sua
capacidade de criar situações de aprendizagem permeada por uma relação
dialógica,impulsionando os conflitos cognitivos e ocasionando a mobilização das
funções cognitivas, viabilizando a intervenção transformadora que garantirá o nível
de mudanças mentais, propícias ao aprender a pensar. Ou seja, a boa capacidade
argumentativa e de formular perguntas do mediador colabora para a uma boa
qualidade no desenvolvimento das funções cognitivas essenciais.
Paulo Freire (1967,1996) informa que sem diálogo não há formação
humana. Para ele o diálogo é o encontro dos homens mediado pelo mundo, que,
nesse encontro triádico, pronunciam o mundo, consubstanciando-o. Logo, o diálogo
é uma exigência existencial. Ele somente ocorre por intermédio de um signo
relevante: a linguagem.
Em acordo a Freire e em conformidade aos enunciados epistêmicos
de Vygotsky e Feuerstein é no uso de narrativas, quer sejam verbais ou não verbais,
que os humanos trocam informações e se comunicam. Porém, somente haverá
práticas dialógicas se ocorre no encontro em que se solidarizam o refletir e o agir
dos sujeitos da dialogia, que, endereçando sua dialogicidade ao mundo a ser
transformado e humanizado, não podem reduzir suas práticas dialógicas em atos de
depositar ideias particulares como universais. Ou, tampouco torná-las simples troca
de ideias a serem consumidas pelos permutantes. A verdadeira autonomia
pensante e argumentativa se constrói em práticas cooperadas, onde se apreende a
falar e a ouvir com vistas a um pensar ordenado.O que indica que a pratica dialógica
não se esgota nas interações sociais, pois, os homens se constroem historicamente
em contextos culturais diversos.
Em tal situação ocorrem as trocas entre o patrimônio material e
simbólico – valores, conhecimentos, sistemas representativos, técnicas, construtos
materiais e tecnológicos instrumentais – e, o sujeito da aprendizagem em suas
formas de pensar e agir. São estas “trocas de repertórios, de visão de mundo, de
ajuda mutua que ampliam as capacidades individuais" (REGO, 1995 apud MEIER;
72
GARCIA, 2007, p. 123).
Como podemos perceber, a atitude ativa é uma condição premente
da relação de aprendizagem mediada. Tal condição, além de conotar a este tipo de
interação um status especial,a caracteriza como interposição intencional e planejada
do mediador, que age entre as fontes externas dos estímulos e o aprendiz,
selecionando, dando forma, focalizando, intensificando os estímulos e
retroalimentando o mesmo em sua relação ás experiências. São estas experiências,
devidamente significadas e ou transformadas, que irão a produzir a aprendizagem
apropriadamente, intensificando as mudanças no sujeito.
3.3 A APROPRIAÇÃO SIMBÓLICA E A CONSTITUIÇÃO DAS SEMIOSES PELA CRIANÇA
As pedagogias da infância sinalizam há muito a necessidade da
criança ocupar seu lugar de sujeito em sua história. As aprendizagens infantis
seguem padrões particulares e não podem ser rotuladas em universais. Elas
dependem dos estímulos e das condições e fatores mediacionais. Cada criança tem
ritmo próprio. Aprende de modo especifico, não seguindo um padrão. O que se tem,
de fato, são aproximações etárias, porém, não universais. Ou seja, espera-se que
em situações, condições ditas normais, a criança de determinada idade seja capaz
de realizar algo. Ou seja, apresentar movimentos de rolar, por volta de 3 a 4 meses;
verbalizar onomatopeias, dá, má, bá, por volta dos 5 a 6 meses de idade e assim por
diante;ficar na posição ereta por volta dos 12 meses; fazer rabiscos e deixar marcas,
assim que consiga segurar o instrumento, desenhar rabiscos, linhas e formas,
sucessivamente, até ler conforme as convenções sociais exigem aos seis, sete
anos, pois, as leiras de mundo, fazem desde o nascimento.
De acordo com Vygotsky (1998) as funções psíquicas humanas são
originárias das relações sociais e se tornam relações interiorizadas. A tese central
desta ideia reside no fato de que os conhecimentos a serem adquiridos são externos
aos sujeitos da aprendizagem e encontram-se materializados nos produtos da
capacidade expressiva e criativa humana. São as manifestações artísticas e as
criações diversas, as obras plástico-visuais e literárias, a linguagem e o arcabouço
técnico instrumental e tecnológico que constituem a realidade cotidiana da vida
contemporânea.
73
O trabalho, ou seja, a atividade prática é o desencadeador desse
processo.A construção das FPS, tais como a memória, a linguagem e a consciência,
acontece simultaneamente à apropriação do saber e do fazer da sociedade. O
desenvolvimento humano, tanto orgânico como intelectual, é o resultado da relação
homem-trabalho-natureza. Nesta relação, o homem, por sua ação e interação
produz instrumentos e signos, ou seja, ferramentas e símbolos, produzindo a cultura,
a qual, por sua vez produz o homem humano ou o homem humanizado
(VYGOTSKY, 1998).
Uma ideia básica para Vygotsky é a relação entre o instrumento e o
signo, segundo a qual não há um sistema de atividade predeterminado na criança. A
respeito dessa questão, Braga (2010, p. 25) aponta que, além dos signos e
instrumentos,
[...] o caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social (VYGOTSKI 1988 apud BRAGA, 2010, p. 25).
Neste sentido, para Vygotsky (1989 apud BRAGA, 2010, p. 27),
todas as funções superiores originam-se em processos de relações reais entre
pessoas (sociais e culturais) e aparecem no desenvolvimento da criança duas
vezes: primeiro no nível social e depois no nível individual.
Vale ressaltar a importância da linguagem, enquanto um sistema
semiótico de primeira ordem e da fala, enquanto um mecanismo de produções de
semioses diversas no processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança. E,
bem como dos meandros da expressão gráfico/plástica como mecanismos de
semioses nas ações de ler, interpretar e ressignificar o mundo e os objetos
imanentes.
O desenho, entre os jogos de faz-de-conta e a imagem mental,
subordina-se às leis da conceituação e da percepção da objetualidade. A percepção
do objeto corresponde à atribuição de sentido dada pela criança, constituindo-se
realidade conceituada, e não material (VYGOTSKY, 1998).
Conforme já assinalei em Francisconi (2012) nesse ponto, creio ser
primordial nova incursão pelo universo peirceano via estudos de Santaella & Noth
(2008) e Joly (1996), devido ao fato de que a circunscrição e a definição do objeto
artístico vinculado à imagética do arsenal cultural e natural, no que tange a uma
74
alfabetização multissensorial, à professores e crianças, não é simples. Ao contrario,
é tarefa complexa, devido à diversidade da gama de informação e a rapidez da
veiculação, fins e objetivos dos veiculadores.
Ambos os autores supracitados, oferecem indicativos em seus
estudos sobre as variantes e as significações que o emprego do termo imagem
carrega e comporta, assim como as bases epistemológicas que o fundamenta. Para
os autores supracitados a empregabilidade multidimensional do termo nos insere em
um campo de questionamentos também complexos. Seus significados são
diversificados e a sua utilização, que envolve aspectos representativos e
comunicativos, data dos primórdios evolutivos da espécie humana. As Imagens,
enquanto objetos de apropriação, representação e apresentação de sentido, são
utilizadas como meio expressivo e comunicativo de cultura, muito antes do registro
do surgimento da palavra pela representação gráfica lingüística.
O que as caracteriza como constructos socioculturais e destaca sua
dimensão mediadora no processo de constituição psíquica dos homens
humanizados. Encontradas em formas de desenho ou pinturas e feitas com produtos
naturais na fase inicial da historia humana e, posteriormente a partir de produtos
convencionais, sintéticos e instrumentos tecnológicos, em suportes como as paredes
rochosas de cavernas, em pedaços de madeiras ou tecidos e ou em espaços
comuns de convívio sócio-político e ou religioso, polidas ou entalhadas em pedras
ou em mármore; fundidas em bronze em ouro ou outro metal, envoltas em molduras
suntuosas ou em relevo em objetos decorativos e de adorno pessoal. Mentais,
virtualizadas, estáticas ou móveis, com conotação sexual, filosófica, política ou
religiosa e científica, de modo geral, imagens, ou as narrativas visuais ou a
linguagem não verbal, têm sido construídas como representação do objeto real e do
objeto ideal, sinaliza Joly (1996)
Destarte, fixas ou em movimento, originam-se da capacidade
percepto global humana, como meio de exteriorização de sensações e sentimentos,
no percurso intercambiante entre a razão e a sensibilidade a caminho do
conhecimento. Atuam como elos conectivos entre os signos (imagens mentais
materializadas, quando instrumentos culturais) e os signos naturais (imagens dos
objetos do mundo). Assim como da capacidade de produção tecnológica dos atuais
instrumentos coletores de precisão, dispositivos de captura, produção, manipulação
e veiculação de imagens, utilizadas pela indústria tecno-digital e midiática em
75
distintas áreas da atuação humana.
Desse modo, Segundo Santaella & Noth (2008) e Joly (1996) falar
de uma história da historia das imagens, como aspecto primordial da historiografia
humana, possibilita delinear um sintético panorama antropológico de sua gênese.
Este diálogo possibilita visualizar e compreender a dialética da imagem e o
movimento constitutivo/construtivo do homem/imagem e do eu, como mecanismo,
meio e objeto de apropriação do universo expressivo e criativo, onde insere a Arte e
suas dimensões.
Sob este prisma, a verificação extrapola o âmbito factual e emerge
nas relações postas do movimento conexo das interações objeto/signo (interpretam-
em). Assim o produto/imagem (interpretante) e o produtor (homem contextualizado),
em uma relação causal, conotam às semioses (seja produzidas na idade e por quem
for) o caráter ambíguo historiográfico das Imagens (histórico e epistêmico) que estão
na base da problemática ocidental constitutiva da fundamentação das ações
criativas ou ato poético. Assim como da evolução do próprio homem (homem que
nada mais é de que uma imagem) quer seja em aspectos físicos ou psicológicos.
Destarte, não é por mero acaso que a metáfora é bíblica: “[...] E Deus criou o
homem à sua imagem; à imagem de Deus ele o criou [...]” (GENÊSIS, 1, 27). Pode
se inferir que tal afirmativa conotou ao homem/imagem atributos divinos em caráter
material e espiritual e ao mesmo tempo lhe afere um poder criador.
Politicamente falando, a afirmativa da semelhança física entre Deus
e o homem foi o argumento defensor de produção icônica em face da proibição
judaica de produção e consumo de imagens, explicito no 2º mandamento da lei
mosaica: “[...] Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti imagem
esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem em baixo na terra,
nem nas águas debaixo da terra" (ÊXODO, 20, 3-4).
No entanto, semioticamente falando, a imagem saiu vitoriosa de tal
embate e populacionou o mundo da cultura interferindo a nível político e psicológico
na organização social (SANTAELLA, 2007). Tornou-se objeto de consumo, pois,
enquanto linguagem é um mecanismo e meio de impressão, expressão e
comunicação: percepções, sentimentos e interpretações do homem sobre si e o seu
contexto são explicitadas, ganham forma e materialidade objetual via conteúdos
imagéticos. É assim que a linguagem visual e plástica, personificada via
objeto/imagem, assume sua função pedagógica no imbricamento entre a imagem, a
76
palavra falada e a palavra escrita, visando uma equivalência textual entre ambos os
signos.
E uma vez que a linguagem constitui o principal mediador da
aprendizagem e do desenvolvimento, exercendo “[...] um papel essencial na
organização das funções psicológica superiores” (VYGOTSKY, 1998, p. 30), é por
intermédio dela que o ser humano se constrói, enquanto ser sócio-histórico,
modificando os seus processos psíquicos. Assim, a linguagem permite a evocação
de objetos ausentes, a análise, a abstração e a generalização de características de
objetos, dos eventos e situações, assim como a produção de semioses.
Logo, possibilita o intercâmbio social entre os seres humanos em
diferentes contextos culturais e, nas interfaces do tempo e espaço da historicidade
humana. Assim como a possibilidade de leituras e interpretação semiótica desta
realidade, registrando as percepções, sensações, impressões, sentimentos e
pensamentos para a posteridade. Ou, no caso da criança, simplesmente, agindo
pelo prazer do gesto e da ação de construir e deixar marcas.
Ao pensar a infância e o seu desenvolvimento, pelo viés do ensino
da arte e, visto a Arte ser uma linguagem com um sistema de signos muito
específicos, enfatizo a mediação simbólica e o uso de instrumentos e símbolos na
infância. A mediação é a essencialidade na constituição e produção de um repertório
específico de semioses, em tempos de fluidez nas informações e comunicações, nos
diferentes espaços e contextos da criança, para que a mesma possa, conhecer, agir
e re-agir aos possíveis objetos, os signos que emanam da simbólica do cotidiano.
Em Gardner (1999, p. 83) constato serem os anos iniciais na escola
infantil o locus da “idade de ouro da imaginação e da criatividade, um momento em
que toda criança brilha como artista”. Nesse caso, os espaços de educação da
infância, a própria ambientação originada na ação cotidiana dos pequenos, conduz a
um universo encantante de cores, formas e sons, imagens, gestos, ritmos, gostos,
preferências estéticas e expressões que envolvem o misterioso processo da
criatividade. Na tentativa de entendê-lo, a escola e o ensino, a posteriores, perdem a
chance de promoverem ações que destaquem a originalidade dos processos
estéticos dos jovens criadores e possibilitem o acesso aos níveis refinados das
possibilidades latentes da catarse poética. A Educação Infantil, portanto, requer uma
atenção especial aos padrões globais do desenvolvimento infantil, tomando como
referência o particular da produção dos bens simbólicos que possam nutrir o capital
77
imaterial da infância.
Em última instância, a função do ensino da arte não é formar
artistas, mas, mediar os recursos latentes potencias humanos, fundamentais para a
organização da vida, ética, estética e politicamente, falando, especificamente no
atual cenário contemporâneo, fluido, líquido e instável da informação, comunicação
e relações.
De acordo Santaella (2007 apud ROJO, 2013, p. 139) a
comunicação volátil dos dias atuais, caracteriza-se como um hibridismo em
ambientes virtuais. Isto é, dados e informações armazenados sem lugares fixos,
“acentua uma cultura da mobilidade, fazendo circular inúmeros bens simbólicos".
Santaella (2008 apud ROJO, 2013) discorrendo sobre os designers digitais e o
universo hipermídia, argumenta que estas novas modalidades de linguagens, muito
em breve, hão de tornar-se uma segunda língua materna, pois as mesmas suscitam
novos modos de formular e gerir modalidades de pensamentos heterogêneos, não
lineares, mas convergentes.
Considerando as singularidades infantis em processo de
aprendizagem, em questões tais como, diversidade, alteridade e diferença, cabe às
instituições educacionais pensarem currículos que norteiem propostas pedagógicas
desafiadoras e instigantes, articuladoras e conectas aos modos de ser, viver e
aprender em aproximação à realidade contextuais das crianças e,sobretudo, dos
profissionais que nela atuam.
Para Rinaldi (1999) conceituar o espaço da escola infantil como
“escola da educação” é assegurar a sua característica de um locus de experiências
convergentes para a formação de valores tendo o diálogo como mediador. Para a
autora, educação e valor, são termos relacionáveis e transversais, pois, “educar é
também, acima de tudo, educar os valores intrínsecos em cada indivíduo, em cada
cultura, para torná-los extrínsecos, visíveis, conscientes e compartilháveis”
(RINALDI, 1999, p.42). Isto implica em considerar ambos os sujeitos da mediação,
professor e a criança, ou, os diversos atores da relação ensino e aprendizagem.
Considerando a relevância das semioses infantis, Rego (1995)
apresenta subsídios para esclarecer a importância da mediação para o
desenvolvimento e constituição das mesmas. A autora informa que é no intercâmbio,
nas práticas sociais mediadas, que a apropriação simbólica ocorre e as funções
psicológicas superiores se desenvolvem. Por consistirem em instrumentos de
78
construção psicológica, o uso dos sistemas simbólicos é análogo ao uso dos
instrumentos técnicos utilizados para a manipulação do espaço físico.
Dessa forma, alude-se também ao uso dos aparatos das novas
Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC). O fato é que a criança da
emergência do século XXI já nasce conectada a uma gama sem precedentes de
instrumentais tecnológicos. Expostos a um mundo com extremo apelo visual,
disponibilizados pelos meios midiáticos de comunicação e de entretenimento, os
imaginários infantis são construídos com base nestes referenciais. Sem a devida
mediação, a criança contemporânea, fica refém de uma gama infinda de estímulos
que, tanto podem potencializar seu desenvolvimento positivamente, quanto
negativamente, para os processos de percepção global, da leitura e interpretação de
mundo, de desenvolvimento estésico, estético e criativo, de censo crítico, ético e
político.
Fantin e Rivoltella (2012) ao abordar a inserção das tecnologias no
âmbito escolar, explana que os instrumentos por si só nada colaboram para a
aprendizagem. Alerta a autora que a apropriação simbólica e a interação cultural são
fundamentais para o processo de aprender e agir no mundo tecnológico. Adverte
ainda que a escola e o ensino precisam considerar, para além da informação usual e
das imagens, outras formas de inteligibilidade do mundo, apresentadas pelas TIC
em contraponto ao universo micro dos estudantes. Na perspectiva da autora, mediar
processos de aprendizagem e pensar ações educativas como experiências
significativas de aprendizagem implica em compreender todas as formas de
conexões e as possibilidades, bem como a relação entre sujeito e cultura no sentido
de ampliar o conhecimento de si, do outro e do mundo "[...] como interações e
experiências que os sujeitos constroem, participando dos sistemas simbólicos da
cultura” (FANTIN; RIVOLTELLA, 2012, p. 60).
Demarca-se na fala da autora, sobre as questões expostas acima,
que a mediação eficaz na Educação Infantil irá depender de toda a gama de
experiências estésicas [asthesia] e estéticas possíveis acerca da exploração da
potência da arte pelas crianças e seus professores.
Para Martins (2012) isto implica em situações pedagógicas em que a
curadoria educativa, isto é, a seleção de um repertório de imagens e artefatos,seja
efetivada, considerando a “ativação cultural de obras e artistas submersas nos livros,
nos museus, nos sites, nas reproduções esquecidas, para além daqueles habituais
79
[...]” ( MARTINS, 2012, p.114).
O fato torna-se crucialmente preocupante ao tomarmos como
referência a atualidade emergente do contexto e do momento histórico atuais, em
contraponto, as práticas sociais e educativas, de crianças e professores em voga.
Os usuários do universo http://www.com, são crianças e jovens que
naturalmente utilizam as novas modalidades de ferramentas como recursos
extensores do corpo com naturalidade e conexas em uma sociedade que se move
no intercâmbio da informação, comunicação, modificação e modificabilidade. Estes
sujeitos, as crianças, estando imersos no mundo virtual, encontram-se também
suscetíveis à rapidez da evolução tecnológica. A inserção das TIC ultrapassa os
aspectos usuais da vida cotidiana manifestando-se em distintos campos
epistemológicos e, as artes, assim como o seu ensino, não fogem a esta regra.
Em contrapartida, muitos adultos e os professores têm dificuldade
para utilizar os aparatos instrumentais atuais, inclusive como ferramentas
pedagógicas coadjuvantes. Ao pensarmos a Arte enquanto produto/produção da
capacidade expressivo, imaginativa, sensível e pensante humana, presente nas
imagens e nos objetos que emanam a simbólica do cotidiano, aludimos ao conceito
de Multiletramentos de Rojo (2013). Ou, a sensibilização pedagógica, a
alfabetização visual para o mundo global, digital e plural. Enquanto linguagem, a
Arte, congrega em si o potencial técnico e tecnológico mais sofisticado e latente,
concebido pela mente humana desde as eras remotas.
O uso das tecnologias na Arte remonta aos primórdios e acompanha
a evolução humana. Em tais épocas ancestrais, utilizando-se de instrumentos
externos, tais como, galhos, gravetos e afins como extensão do seu corpo e de
suportes e materiais, como rochas, pedras, elementos diversos da natureza, sangue
de animais e humano, o homem já traçava sua representação de mundo. Este era
um exercício constante de domínio das emoções sobre o que não podia ainda ser
compreendido e explicado pela lógica ou por outras formas de narrativas, em
tentativas continuas de apropriar-se, mágica e simbolicamente, do entorno.
Nesse sentido, a teoria de Vygotsky refere-se à constituição social
do homem, tendo a cultura como parte de sua natureza humana, como simbiose que
ocorre no processo filo e ontogenético, moldando o funcionamento psicológico de
cada membro da espécie. A cultura é um mediador importante e caracteriza-se em
evidências e indicativos da capacidade de remodelagem contínua do cérebro em
80
função das experiências do sujeito; necessidades e fatores incidentes, tanto
externos quanto internos, que possibilitam experiências mediadas por instrumentos
e símbolos culturais.
Assim, o quesito a apropriação simbólica, pensado face aos campos
conceituais do ensino da arte, a vida e as tecnologias no século XXI, emerge como
campo de possibilidades de questionar as sinuosidades do desenvolvimento gráfico,
expressivo e estético na educação infantil. E, se o mesmo segue uma linha de
evolução intrínseca ao desenvolvimento motor e psíquico da criança. Nesse caso,
seria o desenvolvimento estético uma constituição social, ou, fruto de atividade
espontânea? Sendo constituído socialmente, qual o papel do outro na construção
dos sistemas de representação da criança? E ainda, que relações existem entre
desenvolvimento semiótico e o cognitivo? Nesse contexto, o que a atividade gráfico-
plástica representa para a criança e quais as relações entre a língua, a fala e o
desenho? No intuito de um fomento sobre tais questões abordarei sobre a formação
simbólica e a significação do mundo pela Arte neste capitulo.
3.4 ENTRE O JOGO SIMBÓLICO E AS IMAGENS MENTAIS: A FORMAÇÃO DE
CONCEITOS E A SIGNIFICAÇÃO DO MUNDO MEDIADO PELA ARTE
A criança olha, cheira, toca, ouve, se move, experimenta, sente, pensa [...] Desenha com o corpo, cata com o corpo, sorri com todo o corpo. Chora com todo o corpo. O corpo é ação/pensamento [...] se dá na sensação, na percepção, sempre regado pelo sentimento [...] é tocada pelas cores, pelas texturas e formas. Reage esteticamente a isso produzindo garatujas (MARTINS, 1998, p. 96-97).
Embora Lev S. Vygotsky não tenha investigado de modo sistemático
o processo de apropriação do desenho como processo semiótico, seus postulados
auxiliam a identificar a matriz conceitual que deve ser utilizada nas reflexões e
elaboração de conhecimentos a respeito do grafismo infantil numa perspectiva
histórico-cultural.Seus estudos preconizam uma interação contínua entre a base
biológica humana e a vida social em constante mudança.
O acesso dos homens ao mundo é mediado pelas ferramentas, os
instrumentos tecnológicos e pelos sistemas simbólicos disponíveis em seus
contextos. Os sistemas simbólicos mediam as relações interpsíquicas e ao serem
internalizados, se tornam mediadores intrapsíquicos, possibilitando o
81
comportamento simbólico. Assim, operar simbolicamente significa agir mesmo em
ausência do objeto concreto.
Em Vygotsky (2009) os sistemas de signos são formas de
representação que incluem a linguagem e o desenho como sistemas convergentes,
enquanto mediadores da construção das funções psicológicas superiores. Os signos
mediam o funcionamento psicológico da criança, alterando as estruturas das
funções mentais. É no intercambio sócio afetivo que as operações com estes
instrumentos ganham relevância no desenvolvimento do potencial funcional da
cognição humana.
No processo de formação de conceitos, o sistema de signos, a
saber, a língua e o desenho, são primordiais para o desenvolvimento de duas
funções básicas que permite a comunicação infantil: o pensamento generalizante e a
criação de categoriais conceituais. É o momento em que a língua e o pensamento se
inter-relacionam e se tornam linguagem, no sentido de a fala articulada. As 'palavras'
como signos na relação do homem com o mundo são generalizações, visto que
cada palavra refere-se a uma classe do objeto, constituído num signo em forma de
representação dessa categoria de objetos, desse conceito (VYGOTSKY, 2001).
Em determinado momento a inteligência, que era da ordem da
capacidade instrumental prática, se une à simbólica articulando a fala e o
pensamento, possibilitando a ação regida pelas mediações simbólicas. A criança
passa a resolver seus problemas a partir de possibilidades de resoluções
percebidas, imaginadas, pensadas e, de forma articulada, as comunica,
expressando-se corporalmente ou utilizando sua capacidade de abstração. Essa
aprendizagem demarca a saída da inteligência prática para a abstrata.
No universo das relações simbólicas, as interações entre
pensamento e palavra, demarcam a dialeticidade da constituição humana. Tal
pensamento encontra ressonância também em Freire (1996) na ênfase que este
autor postula sobre a mediação enquanto prática de pronunciamento
consubstanciado de mundo, ou de humanização coletiva via interações sócio-
afetivas para a autonomia politizada.
Para Vygotsky (1988), em um contínuo movimento, fala e
pensamento se articulam e se complementam,tornando-se simbólicos. Da fala
social, evolui-se para a fala interiorizada, egocêntrica (por volta dos 36 meses de
idade), indicando que os mecanismos de comunicação exterior estão sendo
82
internalizados, tornando-se o discurso interior.
No processo da construção do desenho, o comportamento gráfico
passa a ser mediado pela fala. Caracteriza-se em uma ação anunciada, elaborada
no pensamento, antecipada pela linguagem oral e materializada pela mão, sendo
comunicados graficamente em simbiose com os olhos e demais campos perceptivos
por meio das formas semióticas de expressão. É a aprendizagem ocorrendo
mediada pela Aisthesis.
O desenho implica em uma representação do percebido, da
experiência vivida (aquilo que a criança sabe do objeto de início) mediada, tanto pelo
sistema simbólico, quanto pela língua e expresso pela linguagem em sua função
semiótica essencial.Ou seja, a fala articulada e a materialização objetiva em forma
plástica, das imagens do universo mental.As representações gráficas são
abstrações generalizantes do objeto da experiência na ação sobre o mundo e da
ação perceptiva da atividade intrapsíquica. Este é um momento de relevante
atividade, onde, a imaginação e a realidade convergem em formas gráficas como
pronunciamento do mundo percebido, sentido (OLIVEIRA, 1992; SILVA, 2002).
De acordo com Martins (1998, p. 97) é o momento em que a criança,
assim como o artista, persegue uma “idéia plástica e nela trabalha muito [...] com
gana e prazer [...] sua pesquisa é exercitada através do exercício gestual que se
manifesta em garatujas”.
As primeiras formas expressivas de ação do pensamento são
apenas descargas motoras, sem conotação simbólica. De inicio o corpo é “ação e
pensamento” (MARTINS, 1998, p.96) e a criança produz garatujas sonoras, gráficas,
corporais devido ao prazer estético da ação, uma característica da poesia na
ludicidade. Mormente, a maioria dos adultos não percebe a relevância das ações
semióticas do âmbito gráfico/plástico para os pequenos e o como os pequenos
produtores de marcas, estão disponíveis as experiências. Estas experiências são
fundamentais para o entendimento, tanto da funcionalidade dos objetos, quanto da
percepção do potencial corpóreo e da subsequente compreensão de mundo
(MARTINS, 1998, p. 96).
Para Vygotsky (1988) a linguagem e o desenho possuem a mesma
conotação enquanto mecanismos semióticos e de representação sígnica. Sendo
que, a gênese do sistema simbólico remonta ao brincar, ao gesto e ao exercício
gráfico e pictórico, ou mecanismo de produzir marcas. A atividade lúdica, o brincar e
83
o expressar-se graficamente e com cores são, por excelência, precursores da
aquisição da linguagem escrita, relevante sistema de signo humano, com matizes
peculiares.
No entanto, o ato motor da produção de marcas, ocorre em
concomitância ao ato fisiológico da fala articulada enquanto a criança rabisca,
desenha, colore, a criança, fala, gesticula, dança, canta, balbucia, chora, sorri,
sente, pensa, elabora, cria, constrói. O desenvolvimento gráfico, expressivo e
estético, segue uma linha de evolução intrínseca ao desenvolvimento motor e
psíquico da criança.
Nesse sentido, é transposto pela criança para o suporte, o meio de
sua expressão, aspectos perceptivos e conceituais do possível objeto de
aprendizagem, sob uma lógica própria de representação, pois,
[...] as crianças não desenham o que vêem, mas sim o que conhecem. [...] o desenho é uma linguagem gráfica que surge tendo por base a linguagem verbal. [...] esses fatos nos fornecem elementos para passarmos a interpretar o desenho das crianças como um estágio preliminar no desenvolvimento (VYGOTSKY, 1988, p. 127).
As ações gráficas, os rabiscos desordenados, as
garatujas,demarcam a ação da criança em seu território social. De início surgem
pelo simples prazer do ato, do gesto sobre o objeto que deixa marcas impressas. É
a ação pelo prazer do fazer, exercício de simples descarga motora, onde o objeto
que produz marcas se torna a extensão por excelência do corpo em movimento
integral. Corresponde a fase pré-linguistica de desenvolvimento na aquisição da
língua e ao uso da inteligência prática, da ação concreta sem mediação simbólica.
Na sequência e em consonância ao processo de desenvolvimento e da
aprendizagem, o traço ganha a conotação de apresentação do objeto, demarcando
o inicio da ação intencional (LURIA, 2010).
O desenho como objeto de representação, surge com o
desenvolvimento da linguagem oral, do uso e apropriação da língua,
aproximadamente, entre os 2 a 4 anos de idade. É o momento onde, embora ainda
de forma incipiente, a criança começa a nomear suas construções gráficas e,
quando questionada sobre isso, muda suas respostas repentinamente, quer seja por
necessidade própria ou na resolução de problemas, tais como: que cor usar, por
84
onde começar o desenho, desenhar um gato sem cauda e com duas cabeças; o
cachorro é desse jeito ou do outro; quer colorir de azul; tem que pintar tudo? Pode
pintar de preto? Quer cor de pele; rosa é de menina; não sei fazer a cor roxa.
No processo de desenvolvimento cognitivo, de acordo com Vygotsky
(2003), esse momento corresponde à fase de passagem da fala social para o
diálogo interno. Ela demarca o desenvolvimento da atuação simbólica no mundo e
do pensamento generalizante. É a saída do particular ou micro para o universal ou
macro das relações:do pensamento egocêntrico à empatia. Implica em estabelecer
relações e reverter o pensamento, ao início da questão (metacognição ou a
reversibilidade). No quesito interações, marca o início do desenvolvimento de
constituição da alteridade e da capacidade empática, do reconhecimento do
pertencer, ser e estar, de localizar-se no espaço sociorrelacional e identificar o outro
social.
Na perspectiva histórico-cultural, o conceito de Outro Social possui
relevância específica no processo de desenvolvimento e aprendizagem. Vale
ressaltar que para Vygotsky (2003), existem mediadores por excelência,
caracterizados na interação com a cultura de origem, entre pessoas, e com os
instrumentos e signos. Para ele, é por meio das interações sociais e/ou sócio
afetivas e das inter-relações que as FPS se desenvolvem, pois demandam
experiências reais entre indivíduos humanos e destes com os produtos culturais,
tanto os materiais quanto os imateriais/intelectuais.
O mediador humano ganha destaque em situações em que a
aprendizagem envolve a apropriação de bens culturais, simbólicos, materiais e não
materiais. O papel do Outro na constituição psíquica do Eu configura-se nas ações
partilhadas que repercutem nos modos específicos de participação dos sujeitos em
sua vida.
Tais experiências são vetores de desenvolvimento e aprendizagem e
para Vygotsky (2003) são processos distintos, mas interdependentes e não são
coincidentes. O processo de desenvolvimento segue o da aprendizagem, criando a
ZDP ou, o potencial em latência. Por sua vez a aprendizagem pode ser
consequência do Nível de Desenvolvimento Real (NDR) o potencial em ação. Em
outras palavras, a constituição do Eu, enquanto sujeito humano sensitivo, pensante
e ativo, demanda da mediação do Outro, em intercâmbio contínuo.
Assim, ao abordar os temas relacionados ao desenho como sistema
85
de representação, há necessidade de se considerar, as infâncias e suas expressões
gráficas, em contextos distintos, e os modos e meios pelos quais são promovidas as
experiências semióticas e estéticas.
A necessidade é que ocorram em ambientes reais, devidamente
mediadas e ambientes ambientados, para que as crianças possam apropriar-se das
formas culturais de ação. Ou seja, na compreensão de que os signos
configuracionais são aprendidos na observação do que está posto e instituído
culturalmente, na vivência entre pares desenhando e na ação própria do ato;
experiências vividas nas trocas simbólicas dos bens, tanto materiais, quanto
imateriais diversos, são relevantes na constituição de um repertorio poético. É a
transformação do espaço em lugar, da reinvenção do contexto posto e da
possibilidade de interações diversas e exploração transformadora do ambiente por
meio do movimento e da vivencia direta sobre e com o objeto da aprendizagem.
Portanto, promover escolhas à criança é interferir em sua aprendizagem social,
afetiva e cognitiva.
No quesito ambientes ambientados, posso citar as possibilidades
dos ateliês, como espaço-lugar de produção de sentido. Segundo Schwall (2012, p.
35), o ateliê configura-se em “um local multissensorial que convide a interações,
envolvendo a mente, as mãos, a imaginação e os sentidos”. Ou seja, um ambiente
que disponibilize, ofereça condições para a ação e a transformação, tanto dos
materiais, quanto do próprio espaço em lugar, visto ser um local por excelência de
experiências dos processos expressivos criativos e caracterizar-se em “inventário
mutável de materiais e linguagens” (SCHWALL, 2012, p.35).
Segundo esta prerrogativa, além da ação da criança, a ação do
mediador é imprescindível na ambientação do espaço. A atualização dos materiais,
dos instrumentos e da organização “com base no desejo e na necessidade de cada
classe [...] fazer listas regularmente do que foi usado no passado e dos materiais a
serem experimentados” (SCHWALL, 2012, p.37). Esta atitude pedagógica garante a
que avaliação contemple sua fase processual considerando as faces e os diferentes
papeis que os materiais, o ambiente e a ambientação desempenham na
aprendizagem da criança.
De acordo com Vygotsky (1988) a dinâmica do movimento entre a
observação e a ação demanda uma reação implícita no gesto da ação. A ação
gráfica, por sua vez,denota uma intenção de que, ao ser interpretada pelo outro
86
social, ou nominada pelo autor, transforma uma coisa em outra, ocorrendo ao
mesmo tempo, a internalização de conceitos e a simbolização do mundo.
A seguir apresentaremos o percurso metodológico elaborado para
empreender esta pesquisa visando dela retirar alguns apontamentos que, quiçá,
possam oferecer contribuições ao debate sobre o ensino da arte na Educação
Infantil.
87
[..
[...] o pesquisador deve exercer o papel subjetivo de participante e o papel objetivo de
examinador, vinculando para a assimilação da realidade em estudo, a percepção imediata e
espontânea própria da vida cotidiana e a percepção objetiva própria da investigação
reflexiva (Tuleski; Chaves; Leite, 2015, p. 32).
88
4 METODOLOGIA
4.1 PRESSUPOSTOS EPISTEMOLÓGICOS DA PESQUISA QUALITATIVA E DA
PESQUISA FORMAÇÃO
Visando alcançar o objetivo proposto para este estudo, em seus
respectivos desdobramentos, desenvolvi um estudo exploratório caracterizado como
pesquisa de abordagem qualitativa. Tal abordagem é definida como aquela
[...] que se aplica ao estudo da história, das relações, das representações, das crenças, das percepções e das opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a respeito de como vivem, constroem seus artefatos e a si mesmos, sentem e pensam (MINAYO, 2008, p. 57).
Também Martins (2012) destaca que os estudos de base natural,
pela natureza interacional pesquisador e campo de estudo implica em que o
Ambiente natural como base dos dados investigados [...] resulta grande valor conferido ao contato direto e preferencialmente prolongado do pesquisador com o campo de estudo [...] por conta dessa tarefa, poderá utilizar recursos como filmagens, fotografias, documentos históricos, gravações,registros escritos, etc.; com o objetivo de ampliar a confiabilidade de suas percepções (MARTINS, 2012, p. 32).
Amparada, ainda, por uma abordagem dialética, esta pesquisa tem
como foco, o fomento e o entendimento deste processo como coletivo e
emancipador para todos os sujeitos da relação ensino e aprendizagem. Sujeitos
estes que estão, todos, em constante aprendizado e que são parte ativa e integrante
do mesmo. Portanto, agem e reagem mediante os limites e as possibilidades dos
contextos de inserção.
A abordagem dialética demonstra possibilidades de considerar a
“complexidade, a especificidade e as diferenciações internas dos objetos de
pesquisa que precisam ser, ao mesmo tempo, contextualizados e tratados em sua
singularidade”. Considera ainda “a historicidade dos processos sociais e dos
conceitos, as condições socioeconômicas de produção dos fenômenos e as suas
contradições sociais” (MINAYO, 2012, p. 25).
De acordo com Guerra (2014, p. 10), a pesquisa qualitativa abarca
89
uma variedade de paradigmas de referência os quais podem ter vantagens de várias
ordens, como:
[...] de ordem epistemológica, na medida em que os actores são considerados indispensáveis para entender os comportamentos sociais; de ordem ética e política, pois permitem aprofundar as contradições e os dilemas que atravessam a sociedade concreta; e de ordem metodológica, como instrumento privilegiado de análise das experiências e do sentido da acção (GUERRA, 2014, p. 10).
Nesse sentido, a pesquisa de abordagem qualitativa não utiliza
práticas convencionais, tais como a construção de inquéritos ou questionários. Visto
que busca analisar processos que se constroem na “complexidade das dinâmicas
sociais” e, principalmente, “dos processos de mudança”, em função de que é por
meio de tais processos é que se instituem “assimetrias e interagem inúmeras
racionalidades”, pois, aqueles que estão nele envolvidos “agem de forma
diferenciada, têm acessos diferenciados aos recursos, possuem diferentes
competências para interpretar e intervir no contexto em que se inserem” (GUERRA,
2014, p. 10).
O que conotou a esta pesquisa seu caráter autobiográfico pois, lido
com as minhas vivências, as experiências que constituem o meu ser enquanto
pessoa, professora e pesquisadora. Josso (2004) diferencia os conceitos e define as
vivências, como as experiências que envolvem as ações cotidianas e que podem
resultar em memórias ou não. É relativo, pois, a memória a ser construída, irá
depender do grau de significado a vivência. E nesse caso, há consolidação de
memória e obvio, uma experiência de aprendizagem. Esta aprendizagem servirá de
base nas novas vivências, na forma de idéias, comportamentos, saber fazer algo,
sendo portanto, base para as futuras aprendizagens. Para esta autora as pesquisas
com trabalhos autobiográficos educam as formas de percepção sobre os processos
do adulto que apreende por de meio da "mediação do trabalho autobiográfico que
leva á narrativa de formação dita “biografia educativa [...]" (JOSSO, 2004, p.47).
Estas formas de narrativas permitem:
[...] trabalhar com um material constituído por recordações consideradas pelos narradores como "experiências" significativas das suas aprendizagens, da sua evolução nos itinerários socioculturais e das representações que construíram de si mesmos e do seu ambiente humano e natural (JOSSO, 2004, p.47).
Ainda em Josso (1999), os processos de pesquisas atuais, abarcam
90
duas vertentes importantes em aspectos teóricos e metodológicos e que incidem em
aprendizagens importantes. A autora destaca dois aspectos relevantes que
caracterizam as pesquisas, ou "dois objetivos teóricos. De uma parte, um projeto de
deslocamento do posicionamento do pesquisador [...] e um refinamento de
metodologias de pesquisas-formação articuladas a uma construção de histórias de
vida" (JOSSO, 1999, p.14).
As bases fundamentais para este procedimento me são fornecidas
por Josso (1999, 2004). A autora, que na complementaridade de interfaces distintas,
porém entrelaçadas, da formação humana, configura-se um processo de pesquisa
que não desvincula aspectos teóricos e científicos das demais experiências de vida
do pesquisador. Pois, segundo Josso
[...] a construção de narrativa exige atividade psicossomática em dois níveis, pressupõe a narração sobre si mesmo, sob o angulo da sua formação, por meio do recurso a recordação-referência, que balizam a duração de uma vida. No plano da interioridade, implica em deixar-se levar pelas associações livres para evocar referencias as suas recordações-referências e organizá-las numa coerência narrativa, em torno do tema de formação (JOSSO, 2004, p.39).
Assim, essa pesquisa priorizou um recorte historiográfico dos fatos
experiências da minha formação pessoal, acadêmica e profissional e orientou a
construção da narrativa de todo o processo, da escolha de cada elemento e da
forma de organização que o constitui.
4.2 RECURSOS METODOLÓGICOS
O REVERSO DO AVESSO: Começar pelo começo, ou, construir relações na
tessitura dos interstícios da vida?
De acordo como referencial metodológico escolhido, busquei
desenvolver uma análise que privilegiou o caráter histórico dos fatos. Sendo assim,
orientei-me pela perspectiva de que o pensamento é determinado pela realidade, ou
seja, o ponto de vista de que a partir de suas práticas os homens [ eu, pessoa,
profissional] vão produzindo suas idéias e a partir delas vão formulando suas
concepções.
Nesta perspectiva, não é possível deixar de fora desta análise o fato
de que, em uma sociedade cuja produção é coletiva e a apropriação é individual, as
91
contradições sociais estão presentes nas relações entre os homens. Tanto, no modo
como produzem e distribuem a riqueza gerada, com colaboração de todos os outros
homens, como na forma como constroem e distribuem os bens relacionados a vários
aspectos da produção da vida. Como é o caso das práticas educativas, por exemplo.
Tendo em mente tal premissa, considerei importante recuperar o que
ensinou o educador Paulo Freire sobre o prisma de uma proposta dialógica em
educação, ao afirmar que “os homens se educam conjuntamente enquanto se
relacionam para produzir suas vidas” (FREIRE, 1996, p. 91). Sendo assim os
elementos constitutivos, que permeiam o ato de dialogar, são ação e reflexão, pois,
segundo Freire "não há palavra verdadeira que não seja práxis" (p.91).
Destarte, o ato de dialogar requer uma ação correlata, implicando na
transformação, no pronunciamento do mundo. Isto, para Freire, “é um ato de criação
e recriação, é um ato de amor” (FREIRE, 1987, p. 94). Portanto, o diálogo configura-
se na ação amorosa, no “encontro entre os homens para o ser mais do humano,
construindo sua autonomia”, visto que nas relações de dominação, ambos, diálogo e
amor, enquanto o sentimento de empatia, estão ausentes.
No bojo dessa questão, tem-se que as relações sociais vão
produzindo as necessidades dos homens em um determinado tempo histórico e
configurando suas idéias e suas concepções. As quais podem ser propagadas por
meio da arte, do pensamento, da ciência e de outras formas de manifestação
humana, ou seja, estas são materializadas no cotidiano das relações sociais.
Desse modo, as práticas educacionais produzidas por mim e pelos
participantes deste estudo não podem ser estudadas apartadas da realidade
concreta ou das condições das especificidades das minhas condições de vida e das
demais pessoas; seja os adultos, ou as crianças, e do contexto da sociedade da
qual fazem parte. Em função dessa compreensão empreendi uma reflexão sobre a
experiência pedagógica construída no município de Londrina/PR a partir de Projetos
de Trabalho planejados para promover a realização de oficinas pedagógicas em
ensino de arte voltada a Educação Infantil.
Nesse aspecto, tomei como pressuposto que, ao circunscrever a
experiência cultivada em algumas unidades de ensino deste município, e em
particular - a partir da forma como o ensino da arte é pensado e vivenciado - posso
estar alcançando o todo. Ou seja, abrangendo o universo educacional do nível de
ensino da Educação Infantil do referido município e estudando em profundidade tais
92
“fragmentos”, ao realizar a “[...] aproximação entre a abstração dos resultados da
pesquisa e a concretude da prática social.” (GIL, 2009, p. 15).
Para tanto, tomei como recursos para a coleta de dados a pesquisa
documental e observações descritivas (diários de campo), material constituído no
decurso do meu processo de produção acadêmica e de labor em diversos formatos
(planos de aula, projetos de trabalho, Produções acadêmico-científico, imagens,
audiovisuais, autores estudados, arquivos da memória). A pesquisa documental foi
composta por documentos (projetos políticos pedagógicos, calendários escolares,
cronogramas de práticas pedagógicas, etc.) das três instituições de ensino nas quais
atuei como professora, além de outros dados documentais do município de Londrina
(dados censitários, Plano Municipal de Educação, etc.). Tais documentos foram
fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação do município após solicitação de
autorização formal para coleta e uso de arquivos e documentos. (Vide anexo I).
Para subsidiar as análises foram reunidos ainda, documentos legais
e pareceres, conforme legislação nacional, estadual ou municipal e também
documentos de meu acervo pessoal, tais como: planos de aula, imagens, relatos de
experiência, produções acadêmicas resultantes de estudo realizados no curso de
graduação em Artes Visuais e pós-graduações a nível lato sensu, entre outros. (Vide
anexo III).
De acordo com Sá-Silva, Almeida e Guindani (2009, p. 2) a pesquisa
documental deve ser valorizada na investigação científica, pois dela se pode retirar
e/ou resgatar uma “riqueza de informações” adequadas a “[...] ampliar o
entendimento de objetos cuja compreensão necessita de contextualização histórica
e sociocultural”.
Nesse sentido, diante da necessidade de reconstrução de aspectos
voltados a uma experiência sobre a qual se busca refletir:
[...] o documento escrito constitui uma fonte extremamente preciosa para todo pesquisador nas ciências sociais. Ele é, evidentemente, insubstituível em qualquer reconstituição referente a um passado relativamente distante, pois não é raro que ele represente a quase totalidade dos vestígios da atividade humana em determinadas épocas. Além disso, muito frequentemente, ele permanece como o único testemunho de atividades particulares ocorridas num passado recente (CELLARD, 2008, p. 295 apud SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009, p. 2).
93
Outro instrumento utilizado para coleta de dados foram as
observações descritivas ou diários de campo. Estes “diários” foram constituídos por
planos de aula elaborados para a realização das oficinas de ensino da arte (em
parcerias cooperadas); relatórios de impressões ou avaliações realizadas ao longo
do processo de construção e execução das oficinas, registro de imagens a partir de
produções dos participantes das oficinas durante o processo em curso ou enquanto
resultados do mesmo.
De acordo com Loureau (2004, p. 273) a criação do diário de campo
é atribuída ao antropólogo polonês Bronislaw Malinowski (1884-1942) autor da obra
Diário de etnógrafo, escrito entre 1914 e 1918. Este antropólogo, inspirado na
etnografia, concebia suas observações e registros sobre o campo como um relato
etnográfico por meio do qual o observador “comparece em carne e osso” na situação
investigada, implicando-se no campo e instituindo a ideia de que “não existe um
dentro e um fora da ciência” (LOUREAU, 2004, p. 273)
Ao relatar situações ocorridas sobre uma experiência o pesquisador
vai registrando ao longo do processo de pesquisa impressões, fatos, situações que
não foram historiadas em documentos formais, mas, que surgem em momentos
informais revelando modos de vida e concepções. Ou seja, contradições e conflitos
presentes nas relações sociais capazes de oferecer dados preciosos à análise das
mesmas. Tais registros auxiliam na elaboração dos dados e podem ser compostos
de fatores, tais como: regras implícitas nas atividades de um grupo social, tradições,
costumes e formas de colocar frente a situações sociais diversas, sentimentos e
ações verbalizadas ou evidenciadas em gestos e atitudes, entre outras (MINAYO,
2008).
Se tais fatores forem levados em conta pelo pesquisador, este não
terá dificuldades em “colocar-se do ponto de vista do grupo pesquisado, com
respeito, empatia e inserção, o mais íntima e intensamente possível” (MYNAIO,
2008, p.277). E assim criar condições a “ter abertura para o grupo, sensibilidade
para sua lógica e para sua cultura, lembrando-se de que a interação social faz parte
da condição e da situação de pesquisa.” (MINAYO, 2008, p. 277) e tanto o
pesquisador como os seus interlocutores e observados “interferem dinamicamente
no conhecimento da realidade.” (MINAYO, 2008, p. 203).
Esta pesquisa caracteriza-se também como bibliográfica, pelo aporte
teórico constituído por fontes teóricas da área da Educação, da filosofia, da
94
Psicologia e da Arte, a partir de autores que me forneceram subsídios para desvelar
as possibilidades para pensar o campo de experiências ao ensino da arte na
Educação Infantil. Dessa forma, recuperei produções teóricas que envolvem temas
como: a legislação a respeito do ensino da Arte, o ensino da arte na educação
infantil, formação de professores, historiografia e formação, as bases psicológicas da
aprendizagem na perspectiva Histórico-Cultural, bem como alguns dos pressupostos
epistemológicos que embasam as questões curriculares da área.
Tais pressupostos conferem à ação do professor o suporte
necessário ao seu fazer pedagógico em arte, visto que podem “possibilitar vivências
éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais, que alarguem seus
padrões de referência e de identidades no diálogo e conhecimento da diversidade”
(BRASIL, 2010a, p. 26). O agir por estas vias já configura a politicidade da ação
pedagógica, pois, como assinala Paulo Freire (1996), não existe neutralidade na
práxis.
Para tanto, adotei como ponto de partida os pressupostos da teoria
de Lev S. Vygotsky (1896-1934) de que o ser humano é uma construção social e
carrega as marcas das experiências primárias em alinhamento aos dados das
experienciais constituídas nas várias vivências de minhas práticas do âmbito
histórico-cultural. Dessa forma, descortina-se o universo da minha práxis, cuja opção
pela pesquisa da temática em tela, surge da necessidade de aquisição de
conhecimentos e a reflexão sobre os mesmos, visando suprir as especificidades da
transposição didática com o ensino da arte na Educação Infantil.
Em função de tais delineamentos é que esta metodologia foi
pensada, considerando o âmbito de minha experiência como estudante, como
professora da Educação Infantil, como docente na formação em Artes Visuais e
enquanto pesquisadora em ensino da Epistemologia em Arte na Educação da
Infância.
4.3 SITUANDO O CAMPO E DELIMITANDO A EXPERIÊNCIA
O município de Londrina recebeu este nome em homenagem à
cidade de Londres, com significado de “pequena Londres”. Sua criação ocorreu em
03 de dezembro de 1934 e sua instalação foi em 10 de dezembro do mesmo ano. O
processo de colonização foi feito por imigrantes de diversas nacionalidades e
95
cidadãos vindos e diversas regiões do país. Atualmente, ocupa 1.653,3 Km², e sua
densidade demográfica é de 306,49 hab./km². Situa-se a 380 km de Curitiba, capital
do estado (LONDRINA, 2015).
Sua população estimada é de 506.701 habitantes, sendo
considerada uma das cidades pólo do Paraná em função de sua vocação para
diversas áreas do desenvolvimento, visto que sua economia é baseada na
agricultura e pecuária, além de atividades industriais, comércio e serviços
(IPARDES, 2016).
Na área educacional, a rede municipal de ensino conta com 85
escolas municipais e 28 Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs). Conta
ainda com 140 escolas particulares de Educação Infantil, 55 Centros de Educação
Infantil, Filantrópicos conveniados, além de 07 escolas especiais conveniadas com a
Prefeitura (LONDRINA, 2015).
Em termos censitários, com base no Censo Escolar 2014 -
INEP/MEC, o número de matrículas na Educação Infantil pública municipal perfaz
um total de 5.931, sendo 1.028 na modalidade creche e 4.903 na pré-escola. No
Ensino Fundamental Municipal foram contabilizadas 27.444 matrículas (IPARDES,
2016).
De acordo com dados do Plano Municipal de Educação (PME), a
Secretaria Municipal de Educação (SME), tem por prerrogativa incentivar e apoiar
diversas pratica de formação docente. Entre elas, destacam-se algumas tais como,
“projetos de pesquisa, projetos de extensão acadêmicos e de estágios curriculares
de curso de formação docente e de cursos superiores,que possam contribuir com a
melhoria da qualidade da educação infantil” (LONDRINA, 2015, p.25).
Segundo informações da SME:
[...] em 2014 foram autorizados 531 estágios, além da liberação de 15 de projetos de pesquisa. Em parceria com a Universidade Estadual de Londrina (UEL) , é feita a divulgação de abertura de cursos de graduação ofertados pela plataforma Paulo Freire – Parfor, além de cursos de pós-graduação ofertados pela própria universidade e outras instituições. Atualmente100% dos professores da Educação Infantil possuem formação em nível PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO LONDRINA - PARANÁ 26 superior e 78% possuem ao menos uma pós-graduação, revelando alta qualidade no atendimento prestado (LONDRINA, 2015, p. 25-26).
96
Outro aspecto importante é quanto à formação continuada de
professores. Para esta são previstas no calendário escolar datas específicas para
atividades de “prática pedagógica para a formação do professor”, sendo esta
formação também voltada à equipe pedagógica de cada unidade educacional
(LONDRINA, 2015, p. 26).
Dentre os 28 CMEIs que constituem o sistema educacional infantil
de Londrina, elegi três deles para comporem a amostra deste estudo. Esta escolha
foi feita em função de que estas unidades educacionais são os locais onde foram
desenvolvidas as oficinas que caracterizam o objeto de estudo. Nestes três CMEIs
houve, em períodos distintos, participei efetivamente, enquanto docente, da
elaboração de projetos de trabalho e desenvolvimento de oficinas em arte voltadas
aos alunos e/ou professores.
De modo geral, os demais CMEIs, seguem a mesma organização
que apresento, a seguir, para compor sua constituição. Em relação à organização
das turmas, estas eram até 2015 denominadas de Infantil 1 (EI 1); Infantil 2 (EI-2);
Infantil 3 (EI 3); Infantil 4(EI 4); Infantil 5 (EI 5) e Infantil 6 (EI 6).
No entanto devido as mudanças ocorridas para atender a demanda,
a partir de novembro de 2016, as turmas são organizadas segundo as seguintes
nomenclaturas: CB - creche bebe (crianças nascidas a partir de 01/04/2015 e no ano
de 2016); C1 - creche 1 (criança nascidas a partir de 01/04/2014 até 31/03/2015); C2
- creche 2 (criança nascidas a partir de 01/04/2013 até 31/03/2014); C3 - creche 3
(criança nascidas a partir de 01/04/2012 até 31/02/2013); P4 - Pré escola 4 (criança
nascidas a partir de 01/04/2011 até 31/03/201 ); P5 - Pré escola 5 (criança nascidas
a partir de 01/04/2010 até 31/03/2011.
Para fins de identificação e caracterização do campo de estudo e, ao
mesmo tempo para preservar as identidades dos CMEIs , adotei nomes fictícios, de
acordo com o seguinte quadro.
Quadro 1 - Caracterização dos Locus da pesquisa
CMEI LOCALIZAÇÃO N. DE ALUNOS NOME FANTASIA
01 Zona oeste 124 Vincent Van Gogh
02 Zona sul 165 Kazimir Malevich
03 Zona oeste 120 Joan Miró
Fonte: Da autora.
97
Embora a minha atuação como professora no município de Londrina
tenha se dado desde o ano 1994 e ainda permaneça em curso, para este estudo
priorizo um recorte especifico, que compreende o período entre fevereiro de 2007
(por abarcar a época de início das oficinas) a novembro de 2015 (época do
encerramento da última oficina). Este recorte coincide com meu processo de
formação acadêmica e algumas opções de formação continuada, devido a demanda
da pesquisa.
Nesse sentido, busquei delimitar o período citado, como forma de
estabelecer um parâmetro necessário às possíveis considerações a este estudo.
Visto que as oficinas de ensino da arte, tanto no quesito formação continuada,
quanto parceria cooperada12, ainda poderão vir a acontecer em anos posteriores.
A seguir, no capítulo destinado às análises, demonstro como
aconteceram as oficinas, os projetos em ensino das artes e entrelaço, saberes
experienciais, tanto das vivencias sociais, quanto das acadêmicas. Nessa
configuração, busquei relacionar os pressupostos teóricos à prática. E, desse modo,
extraio, tanto dos documentos, quanto da memória, as possibilidades de construir
uma cartografia de algumas etapas do percurso do ser e tornar-se professora. Teço
minhas inferências, nas demandas de um processo profissional e autobiográfico
que descortinam, em meu entendimento, os limites e as possibilidades do ensino da
arte para a Educação infantil, considerando o recorte em destaque.
12
Ação pedagógica conjunta entre o professor com formação específica em Arte e o professor de Educação Infantil com formação em Pedagogia ou outra área da Educação (FRANCISCONI; LIMA, 2015).
98
O desenho, a pintura, a colagem, a modelagem, a gravura, a impressão, para a criança é um
modo de pesquisar o mundo, investigando uma idéia.
E pouco importa se é pelo prazer do gesto ou pela ação combinatória do corpo
sensitivo e pensante.
O que importa é que por meio dele e nele, registra suas marcas.
(Lourides Francisconi, 2015)
99
5 A IDIOSSINCRASIA DA EXPERIÊNCIA COM O ENSINO DA ARTE NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Aprendizagem Mediada E Autonomia Na Perspectiva Da Interação
O meu olhar é nítido como um girassol. Tenho o costume de andar pelas estradas Olhando para a direita e para a esquerda, E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento, É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem... Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer, Reparasse que nascera deveras... Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo... Fernando Pessoa (1946, p. 2)
O excerto acima, foi escolhido como base para algumas reflexões
que conjuntamente à analises que trarei a seguir e, na perspectiva do referencial
teórico desse estudo, me orienta como docente, como estudante e pesquisadora. O
que quero dizer é que, ao utilizar a metáfora do girassol, faço alusão ao
heliotropismo13. E assim, coloco-me na condição de aprendiz em movimento, que,
tal como o girassol, em seu ritmo contínuo, capta a essência daquilo que lhe é
necessário [ a energia da luz solar em seu processo de fotossíntese ]. E desse
modo, move-se entre contrários, em busca do necessário á manutenção do existir e
da existência. Da mesma forma, eu, em meu processo de formação, de aprender, de
reaprender, de conhecer, reconhecer e de laborar, capto, aproveito, interajo e ajo,
sob o mesmo principio. Movendo em tentativas do Vir-a-Ser que me torna o que
Sou. Ao menos, por ora.
Assim, convicta de que não nasci pronta, estou me fazendo nas
diversas vivências das quais tomo e sou parte. Muitas vivências tornam-se
Experiências, pois, estas que são vivenciadas em contextos distintos, tanto em nível
do âmbito pessoal e social, quanto acadêmico e profissional e incidem no que sou,
como se fossem retalhos tecidos do eu em mim na confluência do todo.
13
O heliotropismo é o movimento que as flores do girassol realizam [ uma reação biológica de algumas espécies de plantas] em oposição à luz solar para produzir fotossíntese. Fonte: www.priberam.pt. 14/03/2016.
100
Segundo Paulo Freire (1967, 1996, 1998) o ato do conhecer funda-
se na cultura do sujeito em processo. O ponto de partida, na perspectiva posta, é a
descoberta da possibilidade de ler e o mundo, interpretar a realidade e
consubstanciá-la, pronunciando o mundo e sua objetualidade em um movimento
contínuo, tendo como grande mote a dialogia. O que me oportuniza, confrontos,
conflitos, limites e possibilidades na construção de argumentos, trocas,
comportamentos, interações e ações, na construção de sentido com as nuances do
ser, estar sendo e tornar-me professora da arte e da infância.
E é assim que eu percebo e concebo o conceito de práxis. Uma
relação entre distintos, diferentes, contrários, divergentes, mas, convergentes para o
campo que Vygotsky, Feuerstein e Freire, denominam de Mediação. Nesse sentido,
uma prática educativa mediada pelo diálogo é o mecanismo para a libertação
consciente, tanto da Assumpção do mediado, quanto do mediador. Pois é elo de
conexão, cooperação para a percepção e o entendimento da responsabilidade e
gestão da autonomia em busca do aprender, tanto à nível pessoal, quanto
profissional.
Para Freire, os formadores/formandos, são concebidos como
sujeitos do processo de construção do conhecimento, e o mundo e a cultura, como
mediadores. Nesse sentido, as atitudes e ações conscientes implicam em que
“ultrapassemos a esfera espontânea de apreensão da realidade, para chegarmos a
uma esfera crítica [que] não pode existir fora da „práxis‟ [...] Por isso mesmo, a
conscientização é um compromisso histórico” (FREIRE, 1979, p. 15, grifo do autor).
Logo, é compromisso político, visto não existir neutralidade na prática educativa.
Com esta orientação apresento este relato de experiência em
formato de narrativa descritiva e narrativa imagética, contextualizada, sobre o lugar
do ensino das Artes na Educação Infantil, à luz da Matriz Histórico-Cultural e dos
demais referentes que comigo dialogaram ao longo deste percurso e também da
minha autobiografia. Esse movimento me permitiu caracterizar um recorte do meu
processo de formação e prática docente no universo da Educação Infantil na cidade
de Londrina, Estado do Paraná. E assim integrar, conforme esclarece Josso (2004)
nesse percurso, fragmentos, e registros plurais do meu percurso em busca do
conhecimento em arte visual que amparasse o meu saber-fazer pedagógico. Visto
que nessa perspectiva "aprender designa, então, mais especificamente, o próprio
processo de integração [...] aprender pela experiência[...] é a capacidade de resolver
101
problemas, [...] acompanhada de uma formulação teórica e/ou de uma simbolização"
(JOSSO, 2004, p.39).
Como citei anteriormente, o desenvolvimento deste estudo envolveu
diversas fontes para a coleta de dados que apresento em formato de análise. .As
análises foram realizadas sob a tutela prismática, entre os aspectos intercambiantes
da práxis e a formação da pesquisadora, ora, como sujeito do processo, ora como
investigadora.
Apresento a narrativa em dois movimentos. Um momento, do/em
tempo de descrição da práxis em campo e, por meio dela, discorro sobre alguns
limites e s possibilidades para o ensino da arte na Educação Infantil, considerando
as características asseguradas pelas categorias construídas segundo os
pressupostos que norteiam este estudo e as minhas intervenções no universo citado
em tela. O outro momento construído no tempo cartográfico das narrativas visuais,
que delinearam o conhecer, apreciar e produzir em Arte de muitos pequenos e
grandes artistas em interfaces com alguns aspectos de minhas inquietudes poéticas.
5.1 OS MEANDROS DO VIR-A-SER PROFESSORA DA INFÂNCIA E DA ARTE...
As oficinas pedagógicas em ensino da arte tiveram vários formatos e
foram ministradas em vários espaços e em vários períodos. A primeira, surgiu de
uma idéia de intervenção em campo, durante o período de minha formação
acadêmica em Artes Visuais, na realização do estágio curricular obrigatório, no 3º
ano do curso de graduação.
A parceria entre a Universidade Estadual de Londrina/UEL e a SME,
possibilitou a formulação de um curso em formato de oficina para os professores do
Sistema Público de Ensino do Município de Londrina. Este curso foi vinculado ao
Pólo Rede Arte na Escola14, no ano 2007. O curso ocorreu no Museu de Arte de
Londrina e no Ateliê de Gravura da UEL.
A linguagem da Gravura, foi escolhida por dois motivos: a) além de
ser uma linguagem dificilmente utilizada devido à técnica, conceitos e procedimentos
específicos envolvidos, b) é comumente confundida com ilustração no sentido
14
O Pólo Rede Arte na Escola UEL, implantado em 2004, fruto de convênio entre a Universidade Estadual de Londrina e o Instituto Arte na Escola, tem o objetivo implantar, de promover e disseminar ações que contribuam para o âmbito pedagógico do ensino das artes na região sul. (ARTE NA ESCOLA, 2015a, 2015b).
102
etimológico e artístico no universo da Educação Básica inicial. O curso constou de
uma carga horária de 32 horas, com encontros 8 encontros presenciais de 4 horas, 1
vez por semana. A metodologia que utilizei foi de cunho teórico-prático. Amparada
na Abordagem Triangular de Ana Mae Barbosa e no método de leitura de imagem
de Robert Willian Ott15, ambas, prevê alguns momentos para que a contextualização
entre o conhecer, apreciar e produzir arte ocorra, na perspectiva da leitura de
imagens, são eles: aquecer e sensibilizar, descrever, analisar, interpretar,
fundamentar e revelar.
Ainda em 2007, elaborei, desenvolvi e orientei em parceria
cooperada, no CMEI Vicent Van Gogh, um projeto de trabalho intitulado Pequenos
Grandes Artistas: cores, sons e formas. O projeto foi realizado de julho a dezembro
de 2007. Dele participaram duas professoras regentes de Educação Infantil, turmas
de EI 5 e 20 alunos de cada turma, totalizando 40 crianças.
Entre os anos de 2008 a 2012, participei, como colaboradora,
regente e mentora da realização de diversos Projetos de Trabalho em parceria
cooperada. Os mesmos envolveram diversos temas, entre eles: Conhecendo
Londrina através da arte e As linguagens da arte na formação da criança,
Diversidade e Arte: da Pré-história à Londrina, [oficina com a linguagem da gravura
e pictórica]. Tais oficinas envolveram um total de 08 profissionais com formações
distintas e aproximadamente 100 crianças, das turmas de Educação Infantil EI 2; EI
3; EI4 e EI 5.
No ano 2013, em função de minha transferência para o CMEI
Kazimir Malevich, elaborei e desenvolvi oficinas para 80 crianças de 4 a 5 anos das
turmas de Educação Infantil EI 4 e EI 5, no período de agosto a novembro de 2013.
Nesta experiência, trabalhei os conceitos centrais preconizados para o ensino da
arte, tais como, conhecer, ler e produzir imagens, articulados aos espaços de
convívio das crianças.
No CMEI Joan Miró, no ano de 2015, foram feitas parcerias
cooperadas envolvendo subsídios teóricos e práticos sobre o ensino da arte. Bem
como ação pedagógica cooperada visando trabalhar técnicas específicas de arte
relacionadas à expressão bidimensional com turmas de Educação Infantil EI 4, EI 5
e EI 6, perfazendo um total de 104 crianças. Nesse CMEI, de agosto a novembro do
15
Informações precisas em :OTT, R. W. Aprendendo a olhar: a educação orientada pelo objeto em museus e escolas. São Paulo: MAC, 1989.
103
mesmo ano, foram realizadas supervisões e orientações para acadêmicas em Artes
Visuais do 3º ano graduação da Universidade Estadual de Londrina que
desenvolveram atividades em ensino da arte com 104 crianças.
Ainda no ano supracitado, entre os meses de setembro e novembro,
ministrei 12 horas de formação continuada, em formato de oficina, aos professores
de Educação Infantil do sistema público municipal com o tema: Experimentações
Pictográficas Interação e Experiência na Ação Lúdica no Programa Calendário de
Formação Continuada do ano letivo de 2015. Ao todo, participaram da oficina
aproximadamente 34 profissionais de áreas distintas.
Assim, os dados que agora apresento em forma de narrativa
experiencial, abarcam uma parte do meu processo de formação e de docência,
tanto, como professora de Educação Infantil, quanto como professora de Artes
Visuais e Docente no Ensino Superior.
Como forma de enriquecer e ilustrar a apresentação destes e ainda
facilitar a compreensão das questões destacadas adicionarei às análises, narrativas
imagéticas, capturadas16 por mim, ou por algum cooperador, durante a realização
das oficinas. Tais imagens fazem parte de meu acervo pessoal e serão analisadas à
luz do referencial teórico proposto nos primeiros capítulos deste estudo. Também
farão parte da análise informações contidas nos documentos disponibilizados pelos
CMEIs participantes deste estudo a partir da autorização da SME, tais como
disponibilizados pelos mesmos e constantes nos anexos (TLC, Vide anexo II).
Entendo que esta é uma tarefa complexa, visto que os dados
coletados podem suscitar diferentes significados. Utilizei como recurso didático um
minucioso trabalho de leitura e análise das imagens, memórias escritas, visuais,
audiovisuais; os mesmos critérios adotei, para os dados documentais,
estabelecendo a correlação com o referencial teórico que fundamenta este estudo.
Isto feito segue-se à narrativa do processo. Segundo Faraco e
Moura (1983) "para que haja uma narrativa é necessário, uma estória e um contador
de estória" (p.115). Logo, a narrativa é o relato de um fato ou episódio, ou seja, a
narração de uma história que envolve um cenário onde ocorrem ação e movimento,
a partir de um enredo composto por personagens que se relacionam em torno de um
16
Todas as imagens utilizadas são do acervo pessoal da Pesquisadora e constam de Termo de Autorização. Conforme modelo em anexo. Todos os termos ficam arquivados nas CMEI nas fichas de matriculas, devidamente assinados pelos responsáveis. A SME de Londrina, disponibiliza um modelo unificado.
104
fato específico ou de diversos fatos. Esta narrativa em tela será em primeira pessoa
do singular, pois, enquanto um dos personagens de tal narrativa, estive e estarei
integrando os fazeres das oficinas, ora como personagem central, ora como
coadjuvante dos processos de ação e criação.
Com esse propósito estabeleci temas ou categorias, bem como
atributos a eles relacionados, para apresentar os resultados. São elas:
Quadro 2 - Delimitação das categorias e atributos a serem observados
Categoria Atributos
1. Escopo do Professor-Mediador
a) intencionalidade b) reciprocidade
2. Ambientação dos Espaços
a) organização e materialidade b) exploração e reorganização
3. Experiências Estésico-Estéticas
a) vivências cooperadas b) vivências lúdico-poéticas
Fonte: Da autora.
Os critérios acima elencados são prerrogativas, considerando todas
as perspectivas sinalizadas na fundamentação teórica no que concerne aos fazeres
pedagógicos em arte na Educação Infantil e ainda, considerando que a prática do
professor é pautada também por documentos. O que me outorga, enquanto
pesquisadora e objeto de pesquisa, visto eu estar no campo e ser campo, a analise
de aspectos documentais, do âmbito pedagógico dos três CMEIs, campo da minha
ação docente. Até pelo motivo de que, em dois deles, participei efetivamente da
elaboração, implantação e reorganização. Todo o material necessário, teve acesso
por vias legais, conforme autorização em anexo (Anexo I e II).
Os documentos disponibilizados pelos CMEIs para esta pesquisa
foram: Projeto Político Pedagógico (PPP) e Projeto de Formação Continuada,
calendários e cronogramas correlatos. Apenas uma, das três unidades selecionadas,
disponibilizou toda a documentação requisitada. Uma delas não disponibilizou
nenhuma informação. Todos os documentos foram disponibilizados por e-mail. O
Projeto Político Pedagógico disponibilizado por duas Instituições, prevê ações
articuladas de formação continuada às praticas pedagógicas em acordo ao
calendário escolar, organizado pela SME, a cada inicio de ano letivo em
consonância ao Projeto Práticas contínuas do saber fazer.
Sobre a organização referente ao ano de 2015, dois, dos três
105
CMEIs, informaram que os e-mails foram deletados e a de 2016 ainda não foi
disponibilizada com o calendário anual. Apenas um deles forneceu a organização do
mês de janeiro de 2016, bem como o calendário escolar de 2015 com as datas da
formação continuada.
Em relação aos documentos de meu acervo pessoal analisei
Projetos de Trabalho e planos de aula, imagens resultantes das ações
desenvolvidas, relatos de experiência, Trabalho de Conclusão de Curso em Artes
Visuais (BRASIL, 2007), assim como monografias elaboradas como critério para
conclusão de três pós-graduações Lato Sensu, vídeos, rascunhos, anotações.
Portfólios da Graduação (trabalhos de fotografia e desenhos realizados no CMEI).
Também analisei documentos legais e pareceres que versam sobre as
especificidades da modalidade Educação Infantil e, discorrem sobre as bases do
ensino da arte.
A pesquisa caracterizou-se também como bibliográfica, pelas
inúmeras fontes da Psicologia, da Arte, de autores da Filosofia, da Pedagogia que
comigo dialogaram. Esse diálogo foi extremante necessário visando elucidar os
parâmetros, limites, possibilidades para os desafios da transposição didática com a
pedagogia em arte na Educação Infantil nos interstícios da práxis.
Por conseguinte, recuperei produções teóricas que envolveu temas
como: a legislação a respeito do ensino da Arte, o ensino da arte na educação
infantil, a formação de professores, bem como alguns dos pressupostos
epistemológicos que embasam tal ensino. Tais pressupostos conferem à ação do
professor o suporte necessário ao seu fazer pedagógico em arte, visto que podem
“possibilitar vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais, que
alarguem seus padrões de referência e de identidades no diálogo e conhecimento
da diversidade” (BRASIL, 2010a, p. 26).
Adotei como mote os pressupostos da Matriz Histórico-Cultural de
que o homem é uma construção histórica, fruto da interação social, impregnadas por
experiências primárias. Busco assim, aproximar formação, profissão e pessoalidade,
no sentido de existência. Onde o ser pessoa e o tornar-se profissional, são
processos interconexos fruto das diversas experiências culturais as quais tive
acesso. Dessa forma, configuro o universo da minha práxis, cuja opção pela
pesquisa da temática em tela, surge da necessidade de conhecimento para suprir as
especificidades da transposição didática. Para tal, optei pela modalidade das
106
oficinas vinculadas às proposições dos Projetos de Trabalho.
Os saberes relacionados ao campo da práxis, desde meu ingresso
na ação docente, em 1994, em uma creche municipal de Londrina, estão sendo e
foram articulados em busca do entendimento da continuidade. Quando do meu
ingresso, o edital do concurso prescrevia que a função seria a de auxiliar de creche.
Ou seja, meu trabalho seria em cooperação a uma outra função e cargo,
denominado de monitor, para o qual a exigência era o magistério. Para o meu cargo
a exigência era apenas ser alfabetizado e ter afinidade com crianças. Nesta época
minha formação escolar resumia-se a ter concluído o Ensino Fundamental.
No entanto, a demanda era relevante, faltava servidor para as
devidas funções e eu fui designada a assumir uma turma de Maternal 5, constituída
por crianças com idade entre 4 e 5 anos e consideradas “problemas” aos olhos
daquela unidade educativa e de seu corpo de funcionários. Em 1994, as instituições
de educação infantil, eram denominadas creche e eram vinculadas à Secretaria de
Assistência Social. Somente apos a promulgação da Lei 9394/1996, mais
especificamente no ano de 1998, que a SME de Londrina, assumiu as 11 unidades
de creches que mantinha e as regulamentou com as devidas denominações,
tornando-as CMEI para atender as prerrogativas da Lei.
A falta de habilitação específica e de formação adequada para a
função colocou-me em uma situação extremamente desconfortável e de grandes
conflitos. A solução foi o movimento na senda em busca do saber pelo viés da
formação, desde o ensino profissionalizante, o magistério de nível médio (2001-
2002) realizado pela modalidade EAD, colégio Oblatas de São José de Curitiba,
Estado do Paraná. Uma experiência traumática. Para atender a prerrogativa da LDB,
que instituía a década da educação, a SME de Londrina, resolveu promover
formação para os profissionais dos CMEIs, que por ventura não a tivesse.
Nesse contexto, fui notificada a fazer o normal nível médio
denominada de CND (curso normal a distancia). O curso CND possuía uma grade
curricular blocada em módulos por semestre, duração de 4 semestres, perfazendo
um total de 6 módulos a serem cursados em dois anos. Todo o curso foi pago com
recurso próprio em valor total de R$ 3.500,00, divido em 24 parcelas de
R$145,80,00 e consistia na seguinte metodologia: um espaço, que ora era em uma
escola da rede ou em uma igreja ou outro local qualquer, um aparelho de TV 14p, 1
aparelho de VHS e fitas K7 com vídeo aula e 1 tutor, para ligar a TV, conectar o
107
aparelho de VHS e manipular as fitas, 1 kit com 3 livros por modulo. Nenhuma
interação. Nenhuma dúvida sanada. Mediação? Nenhuma Conferência. Além das
aulas, tive o material impresso sobre os conteúdos básicos curriculares e teorias de
aprendizagem.
Esse alias, até bom. Guardo alguns exemplares de lembrança.
Relacionado à arte, nada especifico, apenas informações do âmbito da historia geral
e da literatura. O mais interessante, foi a aprendizagem que resultou desse
percurso. Nele teve início minha paixão pela pesquisa. Como a solidão foi marcante
nesse período, busquei interação com os teóricos, principalmente Paulo Freire e
Vygotsky. Outra questão importante nesta experiência foi o desenvolvimento da
autonomia e da criticidade, além de uma dose de exigência que tenho comigo,
quando o assunto é aprender. Como tive de escrever 4 monografias (assim a grade
curricular denominava o trabalho semestral relativo ao bloco de disciplinas),
aprimorei o gosto, também pela escrita. Rememorando, nessa época, devido à uma
das monografias, li o manifesto comunista de Karl Marx (versão de bolso) meu
primeiro contato com o materialismo dialético histórico. O objetivo da leitura, a
época, entender a formação social da mente de Lev Vygotsky.
Na seqüência veio a Licenciatura em Artes Visuais (UEL, 2005 -
2008) além de algumas pós-graduações Lato Sensu, tais como em Ensino da Arte
Contemporâneo (UEL, 2009 - 2010); Gestão Escolar (UNOPAR, 2010 - 2011);
Metodologia do Ensino Superior (UNOPAR, 2011-2012) e Neuropsicopedagogia
(UNOPAR, 2012 - 2013). Esta última inconclusa, devido a graves problemas de
saúde. Em 2013, ainda em fase convalescente, participei do concurso seletivo deste
mestrado, ingressando em 2014. Ainda no ano de 2012, ingressei como professora
colaboradora no Curso de Artes Visuais da UEL (2012-2014) na primeira licenciatura
do curso e no Programa de Aperfeiçoamento de Formação Docente (PARFOR,
2013-2016). Nos mesmos tenho ministrado as disciplinas de Estágio I e II,
Fundamentos do Ensino e Fundamentos da Pesquisa em Arte e em Educação e
Metodologia do Ensino, além de orientações de Projetos de Pesquisa e TCC.
Durante este processo de formação surgem inúmeros desafios e
muitos questionamentos. Ao quesito desafio, eu vinculo os modos de produção de
sentido nos contextos da práxis. Ao quesito questionamentos, eu atribuo as buscas
sobre informações como campo possível do respeito as especificidades históricas e
as distinções de classe, em contraponto com uma realidade extremamente
108
paradoxal para atender as demandas do ensino da arte na realidade da qual sou
parte. Os dois quesitos, transformam-se em requisitos nas tramas dos limites e das
possibilidades nos caminhos do ser e estar sendo professora da arte.
5.2 TECENDO AS TRAMAS DO OLHAR NA URDIDURA DA PERCEPÇÃO SOBRE
O ESPAÇO LUGAR DA AÇÃO PEDAGÓGICA
Minha primeira experiência ocorreu durante o Estágio Curricular Não
Formal no ano de 2007, como ministrante de Oficinas em Arte, em Formação
Continuada aos professores do Sistema Público Municipal de Londrina. Tal
experiência foi decorrente por eu ser membro participante do Pólo Rede Arte na
Escola (2007) e dos Grupos de Pesquisa: Formação Inicial e Continuada de
Educadores em Arte: Marcas e Perspectivas dos Saberes e Fazeres Docentes - Arte
Visual (UEL, 2008) e Produzir Arte - Produzir Educação Na Perspectiva Da Estética
Conectiva E Da Arte Relacional (UEL, 2009-2015).
Nesse sentido, continuei a pensar e organizar temáticas vinculadas
às especificidades do ensino da arte, tanto para quem ensina, quanto para quem
aprende, desde a data em tela até o presente momento.
Relacionado às atividades de pesquisa sobre a formação inicial e
continuada e, devido ao fato da minha atuação como professora no CMEI Vicent
Van Gogh, solicitado pela equipe gestora do referido CMEI, um Projeto de Trabalho
que atendesse a demanda, tanto dos professores, quanto das crianças relacionadas
ao eixo Arte: Cor, Desenho e Estética. Desse modo, elaborei duas propostas de
projetos: Pequenos grandes artistas: cores, tons e formas e Conhecendo Londrina
por meio da arte, respectivamente nos anos de 2007 a 2008. Estes dois temas
surgiram das dificuldades das professoras em fazerem a transposição didática com
tais conteúdos. Apresentei a proposta às professoras que aderiram, pois, a mesma
ia ao encontro, tanto de suas necessidades para a transposição didática, quanto ao
atendimento das necessidades das crianças. Dessa forma, Paralelamente, as aulas
da oficina com as crianças, estudávamos os temas relacionados aos campos
conceituais, estética e grafismo, além de aspectos da teoria das cores de autores
específicos da Arte e conteúdos do RCNEI (BRASIL, 1998).
O Projeto Pequeno Grande Artista, foi elaborado em concomitância
ao estudo de campo do meu Trabalho de Conclusão de Curso e inscrito em um
109
concurso da Rede Arte na Escola, chegou a final do mesmo, recebendo um
certificado na categoria Educação Infantil.
Dessa forma, entre os anos de 2007 a 2013, relacionado ao tema de
minha pesquisa de Trabalho de Conclusão de Curso em Artes Visuais, denominado
O ensino da Arte na Educação Infantil: Subsídios Teóricos E Praticas Investigativas
Na Formação Inicial E Continuada De Educadores, bem como ao trabalho de pós-
graduação Lato Sensu, Currículo Integrado: Ações Contemporâneas para o Ensino
da Arte na Primeira Infância, desenvolvi uma pesquisa-ação no referido CMEI,
oportunizando, tanto cursos de formação continuada em Arte17, aos professores que
optaram em participar do projeto e, quanto ações pedagógicas cooperadas com os
mesmos. Nesse percurso participaram 80 crianças de Educação Infantil de faixas
etárias distintas e 8 professores com formação distinta, tais como, em Pedagogia,
Letras e Magistério nível médio.
Ainda no ano de 2009, elaborei em parceria com a equipe gestora, o
projeto anual do CMEI Vicent Van Gogh denominado A Arte e suas Linguagens:
Novos Olhares para o Mundo e Assessorei com aporte teórico, metodológico e
prático o referido projeto voltado a 20 crianças de Educação Infantil 3, com o
subtema Eu, a Fantasia e a Arte.
Em 2013, elaborei e desenvolvi em parceria cooperada, entre os
meses de março a novembro,o Projeto Gravura: da Pré-história à Londrina, com
uma turma de Educação Infantil 5.
Em junho de 2013, devido ao processo de municipalização das
instituições filantrópicas de Educação Infantil, fui transferida por processo de
remoção para o CMEI Kazimir Malevich. Nesta instituição, elaborei e desenvolvi o
Projeto Oficina de Expressão Bi e Tridimensional: A Arte que Vemos e Fazemos,
com 4 turmas de Educação Infantil, entre 4 e 5 anos, perfazendo um total de 80
crianças. A oficina foi ofertada por aproximadamente quatro meses, entre os meses
de agosto a novembro de 2013. No ano de 2014 não desenvolvi nenhuma oficina,
pois fui alocada somente em trabalho administrativo na SME.
Ainda em 2013, ao ingressar como docente colaboradora na
Universidade Estadual de Londrina, ministrando a Disciplina de Estágio Curricular
17
Os cursos foram ministrados em formato de oficina de cunho teórico-prático e inseriram-se na modalidade capacitação em serviço preconizado pela Lei 9394/1996, em seu artigo 61, parágrafo I – “a associação entre teoria e práticas, inclusive, mediante a capacitação em serviço”, com certificados emitidos pela Universidade Estadual de Londrina.
110
Obrigatório, uma de minhas prerrogativas foi otimizar o acesso dos acadêmicos aos
anos iniciais da educação básica, inclusive à Educação Infantil Publica Municipal.
Mesmo que a grade curricular não contemple estas modalidades de educação na
formação do futuro professor de Artes Visuais, é relevante que o futuro professor
conheça a realidade das modalidades educacionais de sua época. De Inicio a ação
causou constrangimento a alguns colegas professores, por se tratar de um tema
distante do habitual da organização curricular. No entanto, não somente obtive o
apoio da maioria como orientadores de campo do estágio, assim como a
Universidade Estadual de Londrina e a Coordenação do Estágio, mantém a
organização até o momento presente. Como consequência das praticas do estágio,
foi implantado em 2015 o PIBID, em um dos CMEIs que recebeu um grupo de
Estagiários; aspecto relevante de formação por troca de experiências para
acadêmicos em processo de formação e professores da base, sem a formação
específica em Arte Visual.
Ainda no ano de 2014, alguns Trabalhos de Conclusão de Curso,
foram direcionados a essa demanda, sendo dois orientados por mim e também fui
convidada a ser membro de banca em outros dois trabalhos.E na modalidade Parfor,
os temas relacionados ao Ensino da Arte na Educação Infantil, ganham destaque.
Embora a especificidade da grade curricular seja a mesma prevista para a primeira
licenciatura em Artes Visuais. No entanto, por se tratar de uma segunda licenciatura
e pelo fato de os docentes já atuarem, inclusive na Educação Infantil, tenho mais
possibilidades de trabalhar ações nas disciplinas ministradas observando os
aspectos da transposição didática e projetos de pesquisa específicos à esta
modalidade.
Em 2015, também devido ao processo de municipalização, passei a
compor a equipe administrativa e pedagógica do CMEI Joan Miró, a partir de janeiro.
Neste, além das atividades cooperadas e ambientação do espaço do ateliê, suporte
teórico e metodológico na elaboração do Projeto Político Pedagógico, desenvolvi
orientação de campo de três estagiárias do Curso Artes Visuais da UEL, entre os
meses de agosto a novembro. Também elaborei e ministrei duas oficinas sobre
expressão bidimensional e pintura, aos professores de Educação Infantil do sistema
público municipal, nos meses de setembro e novembro do supracitado ano.
Todas essas intervenções e ações ocorreram, primeiramente, devido
às minhas inquietações relacionadas às concepções vigentes e as demandas do
111
ensino da arte para a aprendizagem da criança. E concomitante, devido a
solicitações de pares em consonância às percepções sobre as especificidades da
ação pedagógica especializada por eixos de experiências e áreas do conhecimento
e ainda à convite dos organizadores das práticas pedagógicas da SME.
A seguir, apresento as análises destas experiências com as oficinas
em arte visual. Destaco as especificidades destas vivências no universo da
Educação Infantil, bem como estabeleço pontos e contrapontos entre as categorias
e os referidos atributos elencados conforme a fundamentação teórica.
5.3 ANDRILHANDO NAS LINGUAGENS DA ARTE: UM UNIVERSO POTENCIAL
DE VIVÊNCIAS
O falar sobre a Arte diferencia a espécie humana dos demais
animais. O fazer Arte afere singularidade ao ser humano. O apreciar, o ler a Arte me
sensibiliza à necessidade de entendimento, não somente sobre o universo do ensino
da arte e os objetos do mundo, mas, sobretudo, sobre o eu e o nós, enquanto
sociedade. Esta condição me possibilita ita tecer alguns questionamentos sobre os
campos conceituais, da Arte, produção e ensino, com crianças da Educação Infantil.
Dessa forma, o fazer arte na Educação Infantil, envolve a
sensibilidade do professor em perceber as especificidades e as necessidades de
aprendizagem da criança e, nesse caso específico, vincula-se a curiosidade sobre o
mundo e seus objetos, a exploração das formas da materialidade e o potencial da
mesma. Ou seja, é preciso querer ensinar para que a mediação ocorra e a criança
tenha a reciprocidade, o desejo, a vontade de aprender; de conhecer e dar-se a
conhecer aos possíveis objetos do saber.
A finalidade do ensino da arte na Educação Infantil não está no
produto como resultado, mas, antes no processo como produto possível da
experiência de saberes estéticos provenientes da estesia. Saberes provenientes da
cultura primária.
Saberes originados na interação com o professor. Saberes a serem
constituídos nas trocas simbólicas com os bens imateriais diversos das culturas
humanas e saberes construídos na troca com os pares no contexto da rotina.
Durante os períodos de minha inserção nos contextos diversos de
campo deste estudo, por inúmeras, tive vivências inusitadas, instigadoras,
112
problematizadoras, sensacionais, com as questões do ensino da arte. A percepção e
a constatação dos fenômenos categoriais e dos atributos, existentes ou ausentes,
referendados à luz dos conceitos centrais preconizados pela Matriz Histórico-
Cultural e pelas pedagogias de Paulo Freire, foi o cerne dos subsídios para tecer as
minhas reflexões e com isso as análises.
Com algum discernimento e com a mente inquieta, instigada por
muitos questionamentos que, ora se harmonizam e ora se contradizem, próprio do
movimento da dialeticidade, teço algumas reflexões circunscritas aos espaços do
estudo, resgato algumas inquietações, tais como: o ensino da arte ocorre de forma
incipiente devido a ausência do professor com formação específica em Arte e pelo
fato do professor de Educação Infantil não ter formação para mediar a transposição
didática com a epistemologia em Arte.
Na esteira dessa análise, tomo como base meu próprio processo
para arguir sobre as prerrogativas do ensino da arte na Educação Infantil. Como
professora de Educação Infantil, minha formação inicial sequer dava conta do
mínimo necessário aos eixos de conhecimento preconizados no Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI - BRASIL, 1998). Quiçá, daria
para fazer a transposição didática com os campos dos conteúdos específicos da
área de arte. Eu jamais ouvira o termo "Asthesia" e nem imaginava sua definição.
Sobre Estética, eu sabia o que sabe no censo comum, ou pensava saber.
A realidade profissional instigou meu movimento em busca de
saberes que pudessem corroborar para outras formas de pensar pedagogicamente,
o ensino da arte com a Educação Infantil. Sob esta senda, pude constatar o
surgimento desta necessidade, também, em muitos pares. Especificamente, aqueles
com quem cooperávamos. O que implica que é necessário uma abertura para a
própria necessidade e para acolher a necessidade do outro. Descobri, hoje, que isso
é denominado de o "aprender a dar sentido" (JOSSO, 2004, p.129). Isto implica em
um debruçar-se sobre si mesmo, a reflexão de cada dia após a ação efetivada. É a
Assumpção da própria subjetividade pela objetividade; peço licença para
parafrasear, entrelaçando Freire, Vygotsky e Josso.
Isto posto, irei agora discorrer sobre o processo, tecendo as tramas
113
em associação às narrativas imagéticas18.
As mesmas nos contam uma historia. O como é possível, ou não, o
aprender a conhecer em arte, explorando o entorno e nas trocas diversas (figuras1 a
6). Será que a Estesia foi contemplada? E a apreciação Estética? E a Ambientação?
As vivências demonstradas, configuram experiências? E a mediação?
Figura 1- Exploração sensível do espaço. 2008, 2009
Fonte: Da autora.
Figura 2- Exploração sensível/coleta material. Oficina Expressão Bidimensional. 2010
Fonte: Da autora.
18
Durante as análises, o termo figuras será substituído por narrativas imagéticas, dada a relevância
discursiva da imagem como texto visual, bem como pela importância como fonte documental que as imagens dimensionam neste estudo.
114
Figura 3- Expressão Bidimensional: relação figura e fundo. 2010
Fonte: Da autora.
Figura 4 - Experiências cromáticas. Oficina de Gravura; Ateliê de Gravura, UEL, 2013
Fonte: Da autora.
Figura 5- Oficina de Expressão Bi e Tridimensional. 2013
Fonte: Da autora.
115
Figura 6- Experimentações Pictográficas. 2015 Fonte: Da autora.
Nas experiências demonstradas nas narrativas imagéticas (figuras 1
a 6) priorizei ações por meio das quais, as crianças e os professores, pudessem
conhecer alguns aspectos dos conceitos centrais dos saberes em arte, tais como:
história da Arte, leitura de imagens e produção artística. Estas experiências
consideraram as necessidades postas e as relacionadas ao saber sensível, tanto
das crianças, quanto dos professores participantes das oficinas de forma
contextualizada e interdisciplinar, priorizando as experiências por estesia.
Dessa forma, nas narrativas (1, ano 2010) e (2, ano de 2007), a
ambientação foi à campo; o objetivo era coletar material [ elementos que a natureza
não necessitasse mais] para a experiência de pintura e, observação das cores,
formas, padrões orgânicos, cheiros, sons. Como as narrativas demonstram, a
estesia e a estética podem ocorrer concomitantes. As crianças e a professora, assim
como eu, exploramos e tivemos contato com um pequeno mundo potencial, vivo,
dinâmico, habitado, no mundo do CMEI. As crianças perceberam as formigas, em
seu trabalho de carregar as folhas para o formigueiro; as sementes, tanto no solo,
caídas sob a ação do tempo, quanto nas árvores, as joaninhas, os besouros, as
borboletas; coletaram, folhas secas e flores caídas, terra vermelha para fazer tinta.
Sensações ao tocar os troncos, vislumbre ao observar as variedades de cores que
continham as folhas, os troncos, na grama. A Estesia ocorreu e a
contemplação/Estética também. Os diálogos indicaram o progresso: de que cor é a
116
casa da formiga? É igual cada de gente? Se chover enche molha a casa da formiga?
E a joaninha voa? Como as árvores comem? Que dá água e comida à pra elas?
Elas precisam dormir? A cor daquela flor é igual minha blusa (criança referindo-se
ao tom vermelho de sua roupa). Quem descascou essa árvore?
A última pergunta foi referente a um tronco de eucalipto que havia
perdido a proteção da casca. As crianças focaram eufóricas com o tom
cinza/prateado, e discutiam, pois, não identificavam a tonalidade. Ao final,
concordaram que era quase branco, meio branco, mas um pouco quase azul. Ao
retornar à sala, fizeram tentativas para descobrir a cor do tronco da arvore do
eucalipto. Nesse contexto, eu ainda não conhecia a definição do termo Asthesia.
Informo que, as narrativas imagéticas (figuras 1 a 4) constam de
minhas experiências de aprendizagem no CMEI Vicent Van Gogh. As primeiras
experiências, ainda incipientes com os critérios mediacionais em ensino da arte,
foram essenciais para a continuidade em busca dos saberes relativos aos atributos
categoriais aqui expostos.
Retornando as narrativas imagéticas supracitadas, a transposição
didática considerou o locus das crianças participantes dos Projetos de Trabalho,
Pequeno Grande Artista e Conhecendo Londrina por meio da arte. A
contextualização histórica ocorreu do micro para o macro das relações e produções
artísticas; conheceram e estiveram em ateliês de artistas locais e passearam por
períodos históricos da arte moderna. Elza Heffer (Londrina) Claudio Garcia
(Londrina) Paulo Mentem (1927- 2011) Alfredo Volpi (1896-1988), Joan Miro (1893-
1983) e Van Gogh (1853-1890) foram alguns artistas que conosco dialogaram, quer
seja, na interação, ou por reproduções imagéticas de suas obras.
O desenvolvimento dos Projetos de Trabalho, no quesito
necessidades dos participantes, quer sejam, as especificidades das crianças e ou as
das professoras, possibilitou a percepção das nuances da mediação; trabalhei com
as prerrogativas contemporâneas para o ensino da arte com o intuito de promover a
mediação.
No início, as dúvidas continham um núcleo comum e um específico
devido à organização curricular dos cursos de formação dos participantes da oficina,
que eram em Artes Visuais, Letras, Pedagogia e Magistério. As dúvidas do núcleo
comum incidiam no próprio campo das categorias mediacionais. Como por
exemplo,fazer a transposição didática do ícone Monalisa com as crianças, às
117
crianças e aos professores? As dúvidas do núcleo específico sobrevinham aos
campos epistemológicos da Arte, tais como: o que é o ensino da arte e qual a sua
função? O que é cor primária? Como a criança aprende a cor? Criança produz
pintura?Como trabalhar a história da arte com as crianças de Educação
Infantil?Processo? Produto? Obra prima? Obra de arte?Desenvolvimento gráfico e
estético? Ensinar, aprender arte de que forma? O que é releitura? Com ler uma
imagem? Como trabalhar a historia da arte? Estas, entre outras tantas, são questões
que, direcionam e tem norteado, as minhas reflexões sobre o tema infância, arte,
ensino e mediação.
Para tanto, a interlocução com Martins (1998) foi essencial para o
entendimento sobre o processo de desenvolvimento expressivo e as aprendizagens
subsequentes às experiências de exploração pictográficas, no âmbito cognitivo,
afetivo e social. Nas atividades de produção artística, a criança assume seu papel de
exploradora, de pesquisadora, inventora de possibilidades, recriando a realidade ao
apropriar da materialidade à sua disposição. O ato de recriar a partir da
objetualidade mundana, isto é, do objeto da aprendizagem, denota o movimento da
ciranda metamórfica do processo expressivo. Embora não sendo estáticos, os
movimentos são maleáveis e “mantêm sua essência enquanto potencialidades
gerais [...] receptivos às intervenções externas mediadas” (MARTINS, 1998, p. 94-
95).Os movimentos metamórficos da expressividade infantil são categorizados em
“ação, pesquisa, exercício, intenção, símbolo, organização, regra, poética pessoal”
(MARTINS, 1998, p. 115).
Desse modo, é possível afirmar, com base em Feuerstein (apud
GOMES, 2002) que, para ocorrer a reciprocidade com o objeto da aprendizagem em
Arte é fundamental determinado grau de conivência entre a professora e o objeto
dado a conhecer-se e as crianças, contextualizando as interconexões entre o lúdico,
o afetivo, o intelecto e as emoções, a imaginação, a realidade, os signos e a
simbolização, tanto do mediador quanto do mediado.
Caso o (a) professor (a) não saiba desenhar, entender os elementos
configuracionais do desenho e interpretar as especificidades da gênese do processo
expressivo do âmbito gráfico e plástico, como poderá mediar as experiências
estésico e estéticas com a Educação Infantil?
Essa experiência concreta, que se efetiva na ação entre o objeto de
conhecimento da Arte e os vários sujeitos da aprendizagem, configura-se em
118
relevante para a percepção do pensar sobre os detalhes das especificidades do
processo de aprendizagem ao considerar as singularidades e as especificidades na
constituição dos saberes. Logo, um pensar sobre a práxis no intercâmbio de
saberes, que não são neutros, mas, extremamente políticos no processo
educacional e sua avaliação, tal como nos legou Paulo Freire (1996).
Por esse prisma, posso dizer que a mediação, enquanto conceito no
quesito ensino da arte na Educação Infantil está permeado por conflitos teóricos,
confusões discursivas e práticas mescladas. O amálgama triádico, incorre em
práticas pedagógicas gestadas sob rótulos distintos no âmbito do recurso discursivo
e muito incipientes no âmbito da prática. Quero dizer com essa assertiva que, não
basta saber desenhar. É preciso gostar de desenhar e colorir o desenho. Brinco com
as palavras para expressar a seriedade da questão. Arte e ensino na Infância são
coisas muito sérias. O objetivo aqui não é culpabilizar aquele ou aquela, isto ou
aquilo, mas, falar de pessoas em processo e percursos como campo de
possibilidades. Não há necessidade de que eu desenhe como Rafael, mas há, muita
relevância que eu entenda que para a criança, o desenhar é um ato de significação
do mundo. E se eu ainda não compreendi o que isto significa, então, é hora do
movimento em busca de informações sobre.
No caso exposto, ou mais especificamente, em se tratando do
município de Londrina, este, segue as orientações expostas nas DCNEI 2009 e a Lei
9394/1996 para o ensino da infância. Em termos legais, encontra-se em
alinhamento, a princípio, aos preconizadores do Ministério da Educação e demais
políticas educacionais do estado do Paraná. Como parâmetro de ação didático-
pedagógica, utiliza-se o RCNEI e afins. No entanto, não há registro oficial de uma
Diretriz Curricular em Arte para a Educação Básica Municipal e, tão pouco existe o
cargo de professor de Arte.Ademais, a função correlata, fica a incumbência do
professor que atua na infância, tenha a formação que tiver.
Os PPPs dos CMEIs seguem orientações e normativas da SME, em
sua elaboração, implantação e implementação e, ainda no que se refere à
constituição de sua linha filosófica. Desse modo, há CMEIs que intitulam-se
Sociointeracionista, há os que se pretendem Socioconstrutivista. E há aqueles se
denominam de Histórico-Cultural.
Em relação aos três CMEIs, campo da minha experiência, no CMEI
Vicent Van Gogh, até o ano de 2013, a orientação filosófica pautava-se na
119
perspectiva Sociointeracionista, sob a orientação teórica de Jean Piaget, Lev
Vygotsky e Henry Wallon. Recebi a informação da continuidade desta linha filosófica
de orientação para o trabalho pedagógico em 2016, porém, não tive acesso ao
Projeto Político Pedagógico ou sobre o projeto de formação continuada da instituição
para o corpo docente.
No CMEI Kazimir Malevich, a orientação também é
sociointeracionista, conforme consta na linha filosófica daquela instituição,
disponibilizada de acordo a orientação da SME.
No CMEI Joan Miró, o trabalho pedagógico orienta-se pela
concepção Histórico-Cultural de Vygotsky e colaboradores.
Em relação as minhas experiências no CMEI Vicent Van Gogh, entre
os anos de 2009 a 2012 (figura 7) pude perceber a característica inicial mediacional
do sentido atribuído ao ato pedagógico. As ações cooperadas ocorreram durante
todo o ano letivo dos respectivos anos.
Figura 7. Diversos. autora.
120
Mesmo sem a formação especifica as professoras das duas turmas,
se envolveram com as especificidades conceituais do ensino da arte, colocando-se
na condição de aprendizes e buscando informações que subsidiassem formas
específicas de saberes pedagógicos sobre o conhecimento constituído pela
epistemologia da área. Os desafios apresentados consistiam em trabalhar as cores
e as experiências de estesias em associação a apropriação simbólica: tarefa árdua,
complexa e gratificante, envolvendo pesquisa e cooperação entre nós e os
professores das oficinas.
Esta é a mobilidade do professor como ser de relações que, entre o
cuidar e o educar, essencialidades da Educação Infantil, assume sua condição de
inacabado, segundo os pressupostos de Freire (1967,1988, 1996).
Desse modo, parafraseando João Guimarães Rosa, em Grande
Sertão Veredas, sobre a continuidade da formação humana ou aspectos da não
terminalidade da pessoa, podemos considerar que o “[...] mais importante e bonito
do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram
terminadas – mas, que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam” (ROSA,
1976, p.20).
Seguindo a mesma linha de raciocínio e, em simbiose aos aportes
teóricos filosóficos e psicológicos de sustentação deste estudo, o enunciado no
gesto nas narrativas imagéticas, sinaliza o vivenciado nas experiências, pois, é na
relação que o ser humano se constrói. Ademais, os ensinamentos de Paulo Freire, o
seu relevante legado sobre as práticas estritamente humanas, das ações do ensinar
e do aprender, incidem sobremaneira na questão da categoria mediacional. Afirma
ele que
Jamais pude entender a educação como experiência fria, sem alma, em que os sentimentos e as emoções, os desejos e os sonhos devessem ser reprimidos em uma espécie de ditadura racionalista. Nem tão pouco jamais compreendi a pratica educativa como uma experiência a que faltasse o rigor em que se gera a necessária disciplina intelectual (FREIRE, 1996, p. 145-146).
Logo, sendo o espaço da Educação Infantil, constituído de relações
educativas, tomo de empréstimo o pensamento de Paulo Freire para interpor as
narrativas imagéticas seguintes (figuras 8, 9, 10, 11, 12) sobre a categoria mediação
e seus atributos essenciais. Sem apologias aos limites, pois a incipiência
pedagógica em arte existe, devido as características da formação dos docentes,
121
inclusive a minha, mas, com foco nos resultados, visto a dinâmica das relações e às
especificidades das práticas gestadas por cooperação pedagógica vislumbrarem o
não limite, das possibilidades.
Figuras: 8, 9,10,11, 12 -- Oficina de gravura, 2012. Fonte: Da Autora.
.
122
As narrativas imagéticas expostas na sequência (figuras 8 a 12)
evidenciam parte do processo criativo de uma criança na linguagem da gravura.
Sendo que, para produzir por esta técnica, além de saber grafar/desenhar, isto,
representar marcas graficamente contextuais e em acordo às suas possibilidades, é
necessário a internalização de dois conceitos básicos: gravar e imprimir. Todas as
etapas foram exploradas de modo contextualizado com a cultural local e a produção
artística histórica de forma que, as crianças pudessem vivenciar fases do processo
de gravar e imprimir utilizando diferentes meios e ferramentas tecnológicas;
conhecer a historia da gravura; aspectos da arte rupestre e aspectos da xilogravura
brasileira com ênfase para a Literatura de Cordel. Em um processo artesanal, a nível
estésico, o grupo explorou a impressão das mãos e com as mãos; produziram por
frotagge; desenharam em pedras, muros e areia; e conheceram um ateliê de gravura
e um artista gravador.
Com isto, respondo o meu questionamento, preciso saber desenhar
para mediar o ensino da arte na infância? Minha consideração é que, não
necessariamente eu/professor, tenho de saber desenhar tecnicamente. Mas,
considerar a minha própria expressão, respeitando tanto, as minhas necessidades,
quanto as de outrem, no caso, as crianças e os pares. O que não me resguarda da
busca. Ao contrário, pois a necessidade é a força que me move. Nesse aspecto a
importância do meu fomento sobre o ensino da arte na Educação Infantil. Por
deveras Freire (1996, p.12) nos ensina que “não há docência sem discência” e
somente “a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação
Teoria/Prática, sem a qual a teoria pode ir virando blablablá e a prática, ativismo”.
Desse modo, minha narrativa sobre o ensino da arte para a
Educação Infantil, considerando as especificidades da formação docente, que são
diversas, permite uma reflexão sobre os fazeres pedagógicos envolvendo o tema, e
uma incursão por meu processo e, compreendo que esse é um movimento de suma
importância. Visto que “embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma
ao for-mar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado e ensinar não é
transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua
construção” (FREIRE, 1996, p.12).
A afirmativa de Paulo Freire, me faz retornar a algumas das
questões norteadoras de meu processo de pesquisa. Sem pretensa arrogância e
123
redundância, mas, por necessidade caracteristica de minhas análises, as retomo,
como geratrizes para indicar possibilidades: a) A epistemologiada Arte tem
assegurado sua inserção noscurrículos dos cursos de licenciatura como prerrogativa
para a formação humana no sentido dialético e dialógico? b) Sendo a Arte eixo
estruturante dos saberes das crianças, será que, a sua organização no currículo e
na transposição didática, está cumprindo sua função sociopolítica e pedagógica?
O movimento entre estes questionamentos norteadoras e as
categorias são relevantes, pois, de acordo com Feuerstein (apud GOMES, 2002)
não há mediaçao fora da interação sistematizada. Ou seja, todo processo mediado,
ocorre por interação, mas, nem toda interação implica em ações intencionais. E
somente a intencionalidade conduz à reciprocidade, dois criterios centrais da
mediação para o autor.
Para tanto e, muito embora consciente de que falta muito para que
eu, professora, em processo de Vir-a-Ser, possa estar apta a realizar os aspectos
relevantes da pratica mediacional preconizada na matriz historico cultural, apresento
a seguir, na sequência da narrativa imagética (figuras 13, 14 e 15) aspectos
importantes relacionados ao desenvolvimento gráfico e cromático. Tais produções
são resultados da experiencia no CMEI Kazemir Malevitch, no ano de 2013 com a
Oficina de Expressão Bi Tridimensional: A Arte que Vemos e Fazemos.
Neste CMEI, minhas vivências e das crianças, na oficina, constaram
das relações cromáticas, figura e desenho, luz e sombra, cor e não cor, ponto, linha,
movimento do traço, diferenciação entre desenho e pintura, considerando as
prerrogativas preconizadas aos campos conceituais do ensino da arte: conhecer,
apreciar esteticamente e fazer. Sobre as vivências com as nuances cromáticas, e as
experiências pictográficas.
Ritcher (2008, p.15) ao discorrer sobre o trabalho com a cor, ou seja,
a pintura, alerta sobre a sua quase ausência no âmbito da Educação Infantil. Fato
constatado por nós em todo esse processo de estudo e pesquisa. O que
percebemos é a resistência ao uso da cor (enquanto produto tinta) devido à
especificidade do material: tinta é sinônimo de sujeira, de desordem e bagunça. De
acordo com a autora, não é por acaso e a pintura não acontece na escola. “A
indiferença é um produto histórico de hierarquizações culturais e contradições
teóricas que afetam diretamente a mediação pedagógica em artes” (RITCHER, 2005
p. 15).
124
Figura 13- O processo. Relação Figura e Fundo. 2013. Fonte: Da autora.
Figura 15 - Releitura imagem especular. 2013. Fonte: Da Autora.
Figura 14 - Autorretrato. 2013. Fonte: Da Autora.
125
5.4 O ATELIÊ: A AMBIENTAÇÃO COMO PARTE DO PROCESSO E NÃO COMO
MERO ESPAÇO CIRCUNSCRITO
O meio circundante é fator preponderante na organização da
construção do conhecimento, devido não somente ao fator interacional, mas,
sobretudo, às inter-relações, assinala Vygotsky (1998; 2003). Nesse sentido,
Feuerstein (apud GOMES, 2002) enfatiza que a transcendência é critério
mediacional relevante, pois a criança somente atribuirá sentido ao objeto da
aprendizagem se compreender sua usualidade, quer seja objetiva ou simbólica.
Paulo Freire (1996) delega que a autonomia crítica, a capacidade argumentativa,
enquanto funções necessárias às futuras ações na vida sociopolítica, não se
consolida fora da condição de diálogo.
Nesse ponto da análise, retorno à Vygotsky que define o brinquedo,
enquanto ação do brincar, não apenas como “uma atividade que dá prazer à
criança” (VYGOTSKY, 1998, p. 121), mas, que trabalha com todas as necessidades
humana, nessa fase de desenvolvimento, envolvendo aspectos objetivos e
subjetivos. Nas diversas fases do desenvolvimento infantil, é comum o surgimento
de tendências e desejos que não são possíveis de serem realizados. É justamente
aí que, segundo Vygotsky, insere-se a invenção do brinquedo como um organizador
na resolução do conflito. Segundo ele, é por meio da capacidade de fantasiar, de
simular e fazer de conta que a criança “[...] envolve-se num mundo ilusório e
imaginário onde os desejos não realizáveis podem ser realizáveis, e esse mundo é o
que chamamos de brinquedo” (VYGOTSKY, 1998, p. 122-123).
Nesse quesito, reside a função lúdico-poética da Arte. Enquanto
linguagem articuladora das semioses infantis, o ensino da arte, promove o
desenvolvimento sensível e inteligível, de forma integrada. Isso posto, aludimos ao
fato de que sendo a arte
[...] por si mesma, a experiência sensível em que o nosso corpo perceptivo reflete, propor situações de aprendizagem em arte implica vibrar nesse corpo o assombro pelo mundo e o estranhamento diante daquilo que, amortecidos, com os nossos sentidos embotoados, já não vemos mais (MARTINS, 1998, p.118).
Na perspectiva posta, a pedagogia do ensino da arte para a criança
implica em ambientes organizados de modo a oferecer-lhe acesso a diversidade de
126
estímulos, de contato possível ao objeto do conhecimento que se pretende
promover. Ponto fundamental, segundo os aportes teóricos aqui apresentados, é a
participação, a escuta e o acolhimento, considerando, as especificidades e as
necessidades da demanda, ou seja, a turma, a idade, o contexto. Oferecer um
ambiente devidamente estruturado em termos de ambientação ou, adequado ao
tema de estudo, é prerrogativa essencial para que a mediação, intencional e
recíproca, ocorra.
Ao fazer referências ao ambiente adequado, tenho em mente um
“espaço povoado de objetos com os quais a criança possa criar, imaginar, construir
e, em especial, um espaço para brincar [...]" (HORN, 2004, p.19). E desse modo,
apropriar-se simbolicamente da realidade objetiva, em um contexto e situação
transitória,com a vivência entre objetos concretos e ausentes. Como por exemplo,
transformar um cabo de vassoura em um cavalinho, colabora para que a criança
construa seus significados sobre os conceitos e, consequentemente, para a
constituição da função do pensamento desvinculado das situações concretas, ou no
desenvolvimento da capacidade de abstração.
As questões que envolvem o processo de expressão e criação
necessitam da função imaginante. Imaginar é peculiar na criança, assim como a
capacidade de criar é peculiar ao humano. De acordo com Vygotsky (1998) a
espécie humana caracteriza-se por comportamento tipicamente proativo, mas,
também reativo. Age e reage, antecipa situações e resolução de problemas, planeja,
projeta, constrói e reconstrói o mundo e si mesmo, em relação dialética. O que
conota ao humano, e especificamente, à criança em desenvolvimento, a
necessidade de interagir e agir por cooperação, recebendo informações e
produzindo conhecimento, retroalimentando o contexto, alimentando-se
interpsiquicamente.
Portanto, posso inferir que, toda aprendizagem implica em mudança
de comportamento. A mudança comportamental ocorre por oposição de contrários.
Ao brincar de faz-de-conta, o âmbito da imaginação é acionado. As situações
favoráveis aos processos criativos são exploradas devido aos fatores intencionais
voluntários e, consequentemente, a formação da planificação da realidade, assim
como a motivação da vontade, as quais, são expostas nas semioses diversas com
as quais a criança se comunica.
As experiências do brincar possibilita à criança assumir papéis
127
sociais, internalizar normas de comportamentos e regras, desenvolver formas de
apropriação e motivação tipicamente humanas. Permite liberar desejos, adquirir o
domínio de alguns impulsos imediatos, como quando em decorrência do bom
desempenho da brincadeira, ou não e, na ação de produção de semioses
registradas nas expressões pictográficas, apreende a controlar suas reações
emotivas. Em tais situações, a criança consegue e consente, organizar-se com e/ou
sobre, por meio do espaço; com os objetos e a materialidade tangível e não tangível.
As vivências do âmbito da ludicidade e da estesia são coadjuvantes na organização
e controle dos impulsos e na criação de desejos secundários, ou seja, “um afeto que
incorpora outro afeto. Assim as crianças criam necessidades e desejos
relacionando-os a um eu fictício” (OLIVEIRA, 2010, p. 44).
Compreendo na explicação dos autores que o ambiente, enquanto
espaço de ação lúdico-poética, assim como, enquanto mediador de experiências de
mundo, configura-se para a criança em aquilo que ela vê, sente, percebe e o que faz
nele. Logo ele é geográfico, topológico, geométrico, artístico, cultural, social, afetivo,
micro e macro.
Nessa gama de intercâmbios, as ações promovidas necessitam
estar pautadas em princípios que regimentam a aprendizagem para a alfabetização
integral, observando os conceitos do plano cartográfico em relações espaciais
básicas, tais como: dentro, fora, ao lado, na frente, perto, longe. Relações que
envolvem o campo visual/imagético a incidir na gestalt dos objetos, na composição e
distribuição dos elementos no espaço, na organização espacial das formas, na
distribuição das linhas e nas nuances, odores e sons e da ordem do letramento
alfabético. Em situações e ações, que requerem que o cognitivo e afetivo sejam
então concebidos como uma unidade indissociável e em conexão dialética. Não
fragmentando, cartesianamente falando, o corpo e a mente, o intelecto e o afeto, a
emoção e a razão.
É nesse ponto que a ação intencional colabora, alcançando a ZPD,
entre o que a criança já sabe sobre algo determinado, e instigá-la a tal ponto que,
consiga transpor o contexto e, estabelecer relações, entre, o que está á sua
disposição, ao alcance dos olhos e das mãos e o que está no mundo; e aquilo que
poderia estar sendo, possível de tomar forma, e, ser sentido, tocado, visto no
espaço, no ambiente em que se encontra ou fora dele.
Segundo Gandini (2006) o ambiente também educa. O espaço por si
128
já é educador. A ambientação, ou seja, a organização adequada impregnada de
uma intencionalidade povoa a reciprocidade dos pequenos curiosos pelas
descobertas de mundo. Cada espaço no ambiente necessita ser organizado de
modo a recepcionar, convidar, acolher a criança à ação, pesquisa, descoberta,
transformação e a reorganização do mesmo.
As aulas de arte não necessitam do espaço circunscrito do ateliê
para ocorrer. O ateliê seria o espaço ideal, por sua característica de confronto com a
realidade eminente do universo artístico e criador. No entanto, é possível adequar,
ambientando espaços. Nesse caso, o ateliê é o lugar onde o processo ocorre. Tanto
em nível interno das salas de aula, quanto em nível externo dos espaços físicos e
naturais do CMEIs. Nas narrativas a seguir (figuras 16 a 27) demonstro alguns
exemplos de ambientação do espaço, realizado tanto por mim, como em cooperação
com as crianças e alguns pares.
Figura 16 - Ambientação do espaço. Experiência Cromática. 2008
Fonte: Da autora.
Figura 17- Ambientação do espaço. Experiência Cromática. 2008. Fonte: Da Autora.
:
129
Figura 18, 19- Movimento, cores e formas. Vivências diversas. 2007, 2008,2009, 2010, 2012.
Fonte: Da autora.
130
Figura 20 - Ambientações para experiências diversas. 2008, 2009, 2010, 2012
Fonte: Da autora.
Figura 21- Explorando o espaço ateliê. UEL, 2012
Fonte: Da autora.
Figura 22 - Ambientando ateliê na sala de aula. 2010. Fonte: Da Autora.
131
Figura 23 - Ambientando ateliê na sala de aula. 2010
Fonte: Da autora.
Figura 24 - Ambientações diversas: refeitório e pátio externo. 2013, 2015
Fonte: Da autora.
132
Figura 25 - Desenho com água. Experiência estésica e estética. 2010. Fonte: Da Autora.
Figura 26 - Experiências cromáticas: água, beterraba, café, cenoura, cola, terra. 2015. Fonte: Da autora
133
Figura 27- Vivência estetica por agregação e regras. 2010. Fonte: A Autora.
As experiências de ambientes ambientados são relevantes para o
ensino da arte devido à liberdade conferida à promoção da autonomia criativa às
crianças. Também confere à Área, o lugar que necessita ocupar enquanto
epistemologia, campo de saberes específicos com organização de conteúdos
próprios. Visto, os CMEIs, além da problemática da ausência do professor especifico
não dispor de espaços específicos e ou recursos de materiais artísticos disponíveis.
Nas atividades demonstradas conforme as narrativas imagéticas enunciadas (figuras
16 a 24), a ambientação ocorreu conforme a proposta e em acordo ao material
recursivo disponível, sendo utilizado desde elementos da natureza à produtos
industrializados.
Outrossim, destaco que, em situações de ambientação do espaço,
quer seja pelo professor ou, como resultado das vivências – as marcas da ação
impregnam o ambiente e o transformam - a criança se reconhece no mesmo,
identificando-se como autor, sendo este um fator fundamental na organização e
constituição psíquica. Ou seja, em atividades de cunho lúdico-poética, a mediação
com a ZPD (VYGOTSKY, 1998), ocorre naturalmente, devido as situações diversas
de cooperação entre o professor e a criança e desta com os seus pares (figuras 25,
26, 27).
Mesmo quando as vivências ocorrem em espaços convencionais,
como nas salas de aula (figuras 21 e 22) a ambientação é fator determinante para
que o objeto a ser apresentado e pesquisado, favoreça a mobilidade da criança. E,
nessa ótica, o plano de aula, considera a criança em relação aos objetos, ao espaço,
134
ao ambiente e a ambiência. Ou seja, em relação à organização da materialidade
disponível no espaço e passível de ser modificada ou realocada.
Sendo assim, em espaços alternativos ou convencionais, quais
sejam, o pátio, a sala de aula, o refeitório, o solarium, o parque infantil, a pracinha ou
ambientes artísticos específicos (figuras16 a 27), a materialidade, o espaço e a
ambientação são fatores fundamentais para descentrar a criança da figurado
adulto,e não do mediador. Isto vai garantir a possibilidade de aquisição da
autonomia cognitiva, sensível e criativa às crianças, ampliando o potencial
perceptivo, a função estésica e a dimensão estética na construção do conhecimento.
5.5 O MOVIMENTO DE SENTIR-VER-PENSAR-AGIR E TRANSFORMAR O MUNDO
L’esserecreativo è un individuo equilibrato, il contrario di um individuo agressivo e di um individuo disperato.
Arno Stern (2000)
Criar é inerente ao humano. No entanto, para que esta função tão
essencial possa ganhar forma, faz-se necessário que a vida seja organizada de
modo a ofertar condições aos pequenos criadores potenciais. Ou seja, promover às
crianças, a gama de estímulos necessários em experiências percepto globais para
que internalizem as especificidades referentes à dimensão do criar, mediante o
sentir, ver e perceber. No caso, as questões relacionadas à ordem estética dos
objetos e que, consequentemente, passa pelo plano da condição estésica, de um
apreender pelos sentidos percepto globais.
Duarte Junior (2003, 2012) é enfático ao sinalizar uma formação que
promova a educação dos sentidos, tanto no aspecto das vivências sensoriais,
quanto estéticas e éticas. Ao sinalizar tal possibilidade o autor outorga, tanto à Arte
e, mais especificamente ao seu ensino, a função de mediadores por excelência no
processo de aquisição e construção dos saberes sensíveis em imbricamento aos
saberes inteligíveis. Para Duarte Junior (2003):
Se à arte cabe o papel de instrumento para a educação da sensibilidade e para a descoberta de uma outra forma de significação que não a conceitual, parece necessário que sua inserção em processos educacionais se faça em estreita comunhão com o desenvolvimento de valores éticos e de um raciocínio lógico (DUARTE JÚNIOR, 2003, p. 213).
135
Logo, um processo de ensino que não contemple em suas
modalidades e níveis uma formação estética, foge aos princípios básicos
fundamentais para as diversas instâncias e formas de organização da vida em
sociedade e no cotidiano. Ressalto que e as DCNEI (BRASIL, 2009), preconizam os
princípios éticos, estéticos e políticos na organização dos currículos para a infância,
como conceitos fundantes da consciência humana e da organização social. Nesse
caso entendo, que um ensino que priorize uma educação estética e sensibilizada,
caracteriza-se como o ponto central para a redução da racionalidade massificante,
alienante, impingida pelo progresso regimentado pelo capital que estimula ao
consumo passivo.
Na esteira desse raciocínio, faço alusão que a educação em todas
as modalidades e níveis, e muito mais especificamente, no nível infantil e na
formação docente, necessita preocupar-se com a educação estética. Nesse caso,
um processo que prioriza a correlação teoria e prática não pode adimplir-se das
dimensões humanas e tão pouco deixar de reconhecer e dedicar a devida atenção
“ao fundamento sensível de nossa existência [...] propiciando o seu desenvolvimento
[...] tornando mais abrangente e sutil a atuação dos mecanismos lógicos e racionais
de operação da consciência humana" (DUARTE JUNIOR, 2003, p. 171).
Também Saviani (1992) ao discorrer sobre a produção do
conhecimento, afirma a característica imaterial do mesmo, visto haver diferentes
tipos de conhecimentos e saberes necessários à formação humana,
[...] tais como: conhecimento sensível, intuitivo, afetivo, conhecimento intelectivo, lógico, racional, conhecimento estético, conhecimento artístico, conhecimento axiológico, conhecimento religioso, conhecimento pratico e conhecimento teórico (SAVIANI, 1992, p.15).
Sob este argumento, os espaços destinados à Educação Infantil, os
CMEIs, são o locus privilegiado da aquisição de saberes; o local onde as crianças
podem e tem o direito ao contato com a diversidade das culturas históricas da
humanidade. Neles, por primazia, cada criança tem o direito às possibilidades de
adquirir um repertório próprio subjacente à:
[...] actividade criadora [...] responsável pela criação de qualquer coisa de novo, que corresponda aos reflexos deste ou daquele
136
objecto do mundo exterior [...] quer a determinadas construções do cérebro ou do sentimento que vivem e se manifestam somente no próprio ser humano (VYGOTSKY,2009, p. 9).
Diante da assertiva do autor sobre a importância dos atos criativo,e,
considerando que o maior peso cultural compete à expressão gráfica e plástica e,
ainda que o foco deste estudo não é sobre o desenvolvimento do grafismo infantil,
mas antes, ao ensino da arte na Educação Infantil como mediador do
desenvolvimento das semioses infantis, sinteticamente, trago à baila, alguns
aspectos do desenvolvimento gráfico na infância.
Segundo Vygotsky (2009) há quatro (4) momentos ou etapas na
trajetória da evolução do desenho infantil. Estes momentos abarcam o período das
garatujas e da expressão amorfa dos elementos isolados; o da representação de
formas esquemáticas de objetos distantes; do desenho de memória pelo qual
representam o que já sabem sobre as coisas e, o período dos desenhos
radiografados ou narrativas gráficas sobre o objeto que desejam representar.
Obviamente que, para promover ações que incidam na dimensão
estética, há necessidades de profissionais que compreendam as sinuosidades dos
percursos elementares do processo de desenvolvimento relacionáveis a estesia e ao
ato criador. Ademais, conforme orienta Parsons (1992), o desenvolvimento estético
perpassa o ato da leitura e interpretação das imagens e ou objetos. O que
corresponde às vivências culturais do leitor. Logo, também perpassa, pelo âmbito da
imaginação e não logra o ato de pensar e agir. Posto que, para ler e interpretar
esteticamente, segundo Parsons (1992) o leitor necessita ter alguma familiaridade
com o objeto estético. Tal enunciado é também articulado por Vygotsky (2009, p.
119) como sendo o “principio educativo da do trabalho pedagógico” e que, segundo
ele, consiste em “realçar a especial importância de promover a criação artística na
idade escolar”.
Nesse aspecto, a grande tarefa do ensino infantil no CMEI é
preparar a criança para as futuras aprendizagens, de dar formas a comportamentos
auto gerenciados e, sobretudo, ao ato criador; possibilitar o desenvolvimento e ativar
os exercícios da imaginação que é uma das principais forças no processo de
aprendizagem. De modo que “a formação de uma personalidade criadora projectada
no amanhã, prepara-se através da imaginação criadora encarnada no presente”
(VYGOTSKY, 2009, p.110).
137
Todavia, por ser processo, além de dinâmico, é contraditório.
Envolve interações e inter-relações que se interpõe e se amalgamam. No
intercâmbio sinuoso das contradições de cada percurso, a educação necessita
considerar a ambivalência das etapas do processo, caso pretenda, de fato,
promover de modo eficaz, a tão discursada humanização. Sobre isso, mui
sabiamente, Paulo Freire nos delega que “como professor devo saber, que, sem a
curiosidade que me move; que me inquieta e que me insere na busca, não aprendo
nem ensino” (FREIRE, 1996, p.85).
Para as pedagogias voltadas à Educação Infantil, esta prerrogativa
torna-se fundamental. Por se tratar de um momento da vida em que, todos os
campos perceptivos e as funções cognitivas, estão latentes e prontas a receberem a
dose necessária de estímulos necessários às vivencias lúdicas e todos os encantos
das poéticas do fazer artístico.
Logo, o processo educacional que entendemos à luz do referencial
aqui exposto, configura-se na relação ensino/aprendizagem e no universo das
experiências diversas, quer sejam artísticas,com os possíveis objetos artísticos do
conhecimento, ou da ordem do cotidiano para de fato, tornar-se mediado.Visto
que,que em essência, requer ações do âmbito estésico e estético e demanda a
participação cooperada e ativa das pessoas a qual se destina, a saber: gestores,
professores, as crianças e as suas famílias.
As experiências de cunho estésico e estético vinculadas à ética,
para se consolidarem, necessitam tornar-se vivências cooperadas intercambiadas às
vivências lúdico-poéticas. Dito de outra forma, sem a intencionalidade à promoção
de ambientes ambientados, às necessidades e especificidades da criança, e dos
movimentos na senda de descoberta de mundo e constituição de saberes, que a
insira na vida em sociedade, de forma politizada, não podemos falar em mediação
na Educação Infantil, relacionada à área dos bens imateriais e tão pouco do ensino
da arte.
Por isso, na prática escolar infantil, o currículo, aqui entendido como
o PPP, não pode se limitar ao papel de guia curricular sem considerar o contexto de
onde emana a demanda sígnica e simbólica da experiência e ao processo de
produção sociocultural de toda a comunidade escolar ao qual se destina.
O primordial, ao se pensar a formação humana, por práticas
cooperadas, é a garantia à promoção de experiências, por vivências éticas, estéticas
138
e políticas aos pequenos descobridores de mundo, que tanto deixam suas marcas,
são afetados pelo outro, como afetam e constroem formas que aperfeiçoam a
inserção proativa e reativa do eu na cultura. Para efeito de materialização, o corpo
sensitivo e pensante entra em ação em um embate direto com o mundo, a fim de
manipular a realidade, segundo necessidades muito especificas e pautadas em
regras próprias. Características da autonomia criativa e do direito de autoria.
Portanto, criar, não é atributo artístico, mas capacidade humana a
ser desenvolvida e aprimorada pelas possibilidades ofertadas e devidamente
mediadas pelo campo epistêmico da Arte enquanto sistema simbólico da
humanidade. E é responsabilidade da educação, promover o desenvolvimento do
potencial artístico estético dos membros da sociedade à qual se vincula.
Sendo a educação um processo que tem início antes do nascimento
e ocorre em diferentes espaços e tempos: em casa, na rua, na igreja, na escola, ou
seja, nos diversos âmbitos sociais em que o sujeito está inserido, por meio das
relações estabelecidas com as outras pessoas de seu grupo social, urge otimizá-la
em busca da excelência tão sonhada. Por meio da educação, o sujeito apropria-se
da cultura, preparando-se para agir sobre o mundo físico e social. Esse processo
ocorre na vida cotidiana e assume características específicas no contexto escolar.
Sobre a ação educativa escolar, Saviani (1992, p. 21) destaca que
“[...] o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada
indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo
conjunto dos homens”. Segundo o autor, o objeto da educação é identificar os
elementos culturais que o indivíduo precisa assimilar para se tornar humano e
descobrir a maneira mais adequada de atingir esse objetivo.
Muito antes de chegar a escola, a criança já tem contato com as
formas gráficas, visuais, sonoras, via campos tecnológicos distintos. Imagens
diversas, ambíguas ou definidas coabitam o universo visual e impregnam a mente
imaginativa dos observadores infantis, ávidos por explorar o mundo e descobrir o
potencial simbólico de cada signo. Sem a devida mediação, a criança é refém do
universo icônico, midiático e consumista.
O processo educativo, ao priorizar as experiências de aprendizagem
em vivências cooperadas, implicará em ações integradas entre o CMEI e a família,
com vistas a educar para a autonomia, para a criticidade, a politicidade e o bom
senso. Pois, diante das facilidades tecnológicas do mundo, das relações diversas
139
que a vida em sociedade oferece e requer, é imprescindível a integração entre as
instituições, CMEI e família, para promover a educação dos pequenos. O fato é que
a conexão entre a educação de modo geral, o ensino de arte, os sistemas
simbólicos da cultura, as tecnologias, as aprendizagens significativas e a vida social,
nem sempre trilham os mesmos caminhos.
Diante desta premissa, reside ímpar, a característica lúdica e a
poeticidade do aprender sob a mediação das experiências envolvendo os campos
do fazer e apreciar, conhecendo contextualizadamente, o objeto de aprendizagem
mediado pela Arte. Dai decorre a necessidade de olhares atentos para o lugar que a
arte esta ocupando, enquanto mecanismo de desenvolvimento do potencial global
das semioses infantis.
De acordo com Barbosa (2007) nós, professores, não estamos
acostumados a ver; a olhar as imagens, a fazer leituras e interpretações; dialogar
com as mesmas e compreender o contexto de inserção, produção e consumo da
imagética e dos artefatos diversos da Arte. A educação não prioriza a valorização do
ver e a construção do olhar. O ensino à apreciação não é ação contínua na
realidade escolar, de modo geral. As prerrogativas da Lei 9.394/96, preconizando
conteúdos locais no currículo, exige contextualização social daquilo que é ensinado.
Nesse sentido, há potencialização das abordagens geratrizes para o ensino da arte,
com a valorização do elemento contextualização. O que não significa que de fato, a
mediação esteja ocorrendo. E, na realidade da Educação Infantil, Pública e
Municipal, da cidade de Londrina, a dicotomia legalidade e prática tornam-se
significativa, pela falta do cargo de professor da Arte Visual e função
correspondente.
De acordo com Fantim e Rivoltella (2012) para mediar processos de
ensino e aprendizagem, implica em perceber que, o mundo, no contexto atual, muito
para além da informação e da imagem, operacionaliza com muitas outras formas de
comunicação. E a criança nasce inserida nessa realidade e sabe manipular
instrumentos e ferramentas diversas, desde muito pequena. O CMEI como o “lugar
onde as crianças podem e devem ter contato com outras referencias culturais,
diferentes daquelas trazidas pela televisão e pela internet” (BARBIERI, 2012, p. 28)
necessita primar por experiências que enriqueça o capital cultural de cada criança.
As novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC) são
instrumentos importantes e necessários no cotidiano. E como tal, o CMEI, posto, ser
140
uma instituição educativa, não pode eximir-se da existência e funcionalidade e
avanços das TIC. No entanto, na esteira do objeto de estudo que me moveu,
considerarei dois fatores importantes: a necessidade de as crianças conhecerem e
aprenderem a utilizar os instrumentos e as ferramentas tecnológicas atuais e
históricas (pinceis, lápis, giz, tinta, livros diversos, além daqueles que podem
construir com materiais alternativos), e a falta do recurso instrumental tecnológico e
técnico nos CMEIs, vinculados as TIC.
Muitos professores tem dificuldade em utilizar um computador.
Quiçá, capturar e tratar imagens, utilizar a internet e a rede social como ferramenta
pedagógica. Nos CMEIs, ainda não há recursos tecnológicos disponíveis. A rede
internet existe, mas é bloqueada para os instrumentos tecnológicos pessoais dos
professores. O que inviabiliza muito o trabalho pedagógico e o acesso às
informações imagéticas, audiovisuais e afins. E aqui deparo-me com um limite
importante. O recurso audiovisual, assim como as imagens e os hipertextos, são
fontes importantes de pesquisa, estudo; acesso a informações, gerenciamento de
dados da ação, captura e manipulação de ações a serem transformadas em novas
formas.
Todavia, o exponencial das limitações relacionadas ao ensino da
arte na Educação Infantil caracteriza-se na formação e na vontade. Nas interfaces
dos limites e das possibilidades, nas narrativas imagéticas a seguir (figuras 31 a 34),
destaco alguns aspectos das experiências estésico e estética com crianças de
Educação Infantil (EI 3 , EI 4, EI 5) nos CMEI Vicent Van Gogh, Kazemir Malevich
Joan Miró. Visei considerar o modo sensível e inteligível de a criança cirandar nas
imagens e produzir semioses peculiares amparada por um repertório muito
específico impregnado das suas leituras de mundo.
Nas narrativas imagéticas (figura 25) demonstro a descoberta de
possibilidades gráficas nos experimento estésicos e estéticos e na agregação de
elementos às vivencias lúdico-poéticas como caminho possível de descobertas.
As experiências pictográficas, seja, com a cor e a ausência dela,
com materiais convencionais e alternativos, garante a exploração, a investigação, a
constatação e a refutação dos resultados e a compreensão elementar do processo
de criação e do ato criador.
Sendo esse movimento o princípio fundamental ao desenvolvimento
característico de pesquisa. Na experiência exposta (figura 25) o resultado, isso é, a
141
obra, o desenho, fica visível somente alguns segundos. Aspecto importante à
constatação da alguns conceitos cotidianos, como agregação, solubilidade,
permeabilidade, evaporação e apropriação por agregação. Para a leitura imagética
posterior, ou a vivencia estética, necessita ser realizado o registro fotográfico.
A ação de produzir marcas por meio de materiais alternativos
envolvia explorar o entorno do parque infantil, coletar os materiais alternativos e
agregá-los aos materiais convencionais. O objetivo consistia em experimentar
possibilidades de expressão gráfica com água, terra, folhas, sementes e cola, tinta
guache e alguns papéis. Desenhar com a água é como desenhar com a tinta? Com
o giz, lápis, carvão? O que aconteceu com o desenho feito com água? Alguns dos
questionamentos que foram feitos às crianças para proceder a leitura das imagens
construídas com a água.
Na narrativa imagética da (figura 26), a ação com a cor dos
elementos alternativos, como a propriedade de agregação, incide na vivência da
estesia para a apreciação estética.
Após a apreciação estética do resultado/produto da experiência com
a água, a proposta consistiu em preparar tintas a partir do material coletado e alguns
industrializados, tais como, cola e pigmento líquido. Como complicador havia uma
regra: a ambientação foi realizada no parque, entre os balanços, e a regra envolvia
utilizar todo o entorno, mas, não interferir nos balanços. Como demonstramos na
narrativa imagética (figura 27), a ação envolvia o processo da atenção percepcional.
A atividade consistia em explorar as cores primarias tendo como
tema a diversidade da sala de aula em interpolação ao brinquedo balanço.
A tarefa difícil, pois, brincar emana ao ato brinquedo enquanto ação
do ser brincante; o brincar é por excelência a atividade principal da criança. E o
brincar com regras, no caso, brincar entre determinados objetos do
brincar/brinquedos, sem poder utilizá-los, é bastante contraditório e complexo.
A proposta envolvia a observação da internalização (plano
intrapsíquico) das regras exteriores (plano interpsíquico) o como se daria a
aceitação mediante determinadas trocas, ou, a negociação. Quais caminhos seriam
constituídos pelo modo da argumentação, a fim de refutar a observação posta à
ação, caso a mesma impingisse algum desconforto, constrangimento ou
cerceamento de direitos (na perspectiva da criança).
No caso em questão, às crianças na faixa etária de 5 anos. Em
142
pleno processo de simbolização. O envolvimento com a atividade proposta tornou-se
tão significativo, que nenhum dos participantes burlou a regra. O grupo dessa
amostra consistia em torno de 8 crianças de 5 anos. A constatação desse fato nos
remete as considerações de Vygotsky (2009) sobre o processo de desenvolvimento
e estético e a apropriação simbólica infantil. Ele explica que as experimentações
pelo fazer são fundamentais devido ao caráter científico e técnico, presente também
nas produções artísticas e ou lúdico-poéticas, pois,
[...] todas as formas de atividade técnica infantil assumem grande importância uma vez que orientam o interesse e a atenção das crianças e dos jovens para uma nova esfera em que se manifesta a imaginação criadora[...] tanto a ciência quanto a arte permite o uso da imaginação criadora, sendo um dos seus frutos, a técnica [...]as crianças quando tentam assimilar os processos de criação cientifica e técnica, apoiam-se também, na imaginação criadora e na criação artística (VYGOSKY, 2009, p. 109).
Neste ponto da analise, é necessário abrir um parêntese para
ressaltar a importância das atividades lúdico - poética às crianças com síndromes ou
deficiências - NEE19. Na narrativa imagética (figura 28), demonstro a atividade de
uma criança com idade aproximada de 5 anos e que apresentava um quadro de
dificuldade no foco de atenção e concentração (espectro autista + TDAH).
Demonstrava também dificuldades na comunicação e na sociabilidade com ritmo
imaturo da fala, restrita compreensão de ideias e uso de palavras sem associação
ao significado; movimentos desordenados nas atividades; reações anormais às
sensações e aos sentimentos [dificuldade de controle esfincteriano, choro
compulsivo e insegurança] agredindo aos colegas por requerer atenção e,
interferindo nas ações dos mesmos durante as demais atividades.
Ao realizar atividades expressivas e vivências diversas com cor e
materiais diferentes, assim como as atividades com música, seu foco de atenção e
de concentração melhorava em torno de 80%, chegando a ficar envolvido na
atividade cerca de 30 minutos. Seu humor, ou seja, a qualidade de sua energia
emotiva melhorava significativamente. A energia emotiva é fundamental para o
processo de desenvolvimento e aprendizagem.
19
Embora não seja o foco deste estudo, a breve inserção da criança com necessidades educacionais especiais – NEE- será inferida em decorrência do teor da análise e da importância dos dados obtidos ao desenvolvimento do tema da mesma. A criança, após o relatório elaborado pela professora em 2013, foi avaliada, diagnosticada e, no momento deste estudo, é acompanhada pelo Apoio Pedagógico Especializado da SME.
143
Figura 28- Experimentos cromáticos. 2013
Fonte: Da autora.
De acordo com a literatura corrente (ROTTA; OHLWEILER;RIESGO,
2006, p. 355) “ o transtorno do déficit de atenção/hiperatividade [TDAH] é um dos
transtornos psiquiátricos mais comuns da infância e da adolescência [...] situam a
prevalência de 3 e 6% dos casos em idade escolar”. Logo, as dificuldades de
aprendizagem são temas atuais de estudo e pesquisa, também,no domínio da
neuropediatria, por constituírem pauta relevante de uma concepção humanística de
formação.
A fim de estabelecer alguns contrapontos, demonstro nas narrativas
imagéticas (figuras 29, 30) a produção de algumas crianças na faixa etária de 5 e 4
anos em atividade correspondente à mesma proposta. O intuito não é comparativo,
mas de parâmetros para a análise tanto, desse estudo, quanto para o sentido da
mediação em situações similares.
Figuras 29, 30 - Experimentos cromáticos. 2013. Oficina de expressão Bidimensional
144
A proposta consistia em experimentar as cores primárias (vermelho,
azul e amarelo) e produzir uma composição. Esta atividade fez parte de um estudo
em uma sequência sobre experimentos cromáticos e para isso foi considerado as
experiências estésicos e leitura de imagens, das 80 crianças que participavam da
oficina no CMEI Kazimir Malevitch, no ano de 2013.
A ideia corrente é de que as crianças entre 3 a 6 anos não produzam
cromáticos, pinturas, no sentido técnico do termo. Até porque, o uso de cor,
enquanto objeto tinta no âmbito da Educação Infantil é um complicador para muitos
professores, por vários fatores, tais como: tempo, rotina, organização e
ambientação, materialidade, informações técnicas especificas. No entanto, em
atividades mediadas e em vivencias cooperadas, crianças de 4 anos produziram
expressões pictóricas, a partir de a imagem especular, como as que já
demonstramos e expomos na sequência das narrativas imagéticas (figuras 28, 29,
30) possibilitando à todas, modos de vivencias estéticas pelo conhecer, fazer e ler,
não somente os materiais, as imagens da arte ou do entorno, mas, as próprias
produções. Inclusive a criança com NEE, mesmo com toda a dificuldade
fonoarticulatória, conseguia verbalizar seu contentamento com a experiência e se
encantar com a nuance azul e brincar com o a tinta e o papel, até o limite possível
do experimento, o momento em que, tinta, papel, mesa, mão, tornam-se unos. O
papel rasga e temos o descarte e o desprezo pelo produto; a criança simplesmente
o ignora. Prova notória de que o processo é a experiência estética.
Nesse ponto, creio, ser possível arguir sobre um aspecto importante
da formação docente e que é um dos centros nervosos dessa pesquisa, a
consciência da continuidade ou do inacabamento, conforme orienta Freire (1996).
Estas podem ser evidências da defesa das questões postas de que
em um ambiente com ações pedagógicas específicas e, com a devida transposição
didática, os resultados para a aprendizagem da infância, otimizam as possibilidades
da epistemologia em Arte.
Ou seja, não basta disponibilizar à criança objetos diversos para livre
exploração. É imperioso mediar o processo de apropriação, informando os modos
sociais de ação com os instrumentos culturais, sejam quais forem. Esta tarefa cabe
ao par mais desenvolvido da relação humana e, no caso do ensino das artes, ao
professor.
Outro aspecto importante, no quesito, que requer, a cooperação de
145
ambos, mediador mediado, são os trabalhos em grupo ou coletivos. No caso da
narrativa imagética (figura 31) a proposta consistiu, além de experimentos diversos
com a cor, trabalhar coletivamente em uma composição, uma releitura, tendo como
referencia temas da cultura popular brasileira que estávamos estudando. Trabalho
árduo e prazeroso. O trabalho grupal, cria conflitos, mas repercute em muito mais
resolução de problemas. As crianças trocam, interagem, brincam e até brigam, mas
se resolvem. As vezes com mediação do professor e outras, sendo mediadores uns
dos outros. Nesse aspecto, a ambientação é cooperada, tanto cabe ao professor,
quanto as formas de organização que as crianças vão sugerindo, por meio da
própria ação, configurando o espaço.
Figura 31- Composição coletiva. Bumba meu boi. 2012
Fonte: Da autora.
No que se refere a narrativa acima, o tema sobre as manifestações
folclóricas juninas e o Bumba meu boi, foi escolhido pela turma para compor a obra
que foi minuciosamente planejada, como em um processo poético: pensar, decidir e
pesquisar possibilidades de materiais, técnicas e suportes, elaborar o esboço,
preparar a base. A linguagem escolhida foi a pintura, porque desenho e gravura, ja
tinham feito. As crianças queriam fazer uma tela, mas, que fosse bem grande. Como
não havia material artístico disponível, a solução foi encontrar na sala de aula, e
pelas crianças em comum acordo, algo parecido com uma tela? A porta do armário
que a turma não usava mais.
Preparei a base com as crianças que fizeram todo o processo de
146
preparo da tinta e entitamento; procedi a feitura dos desenhos e à ação da pintura,
em duplas, ou até quartetos, dada a dimensão da estrutura do suporte (em torno de
1m x70 cm altura). O trabalho de feitura teve duração de 8 semanas, visto que eu
tinha aula duas vezes por semana no sistema de oficina e o grupo era constituído
por 20 crianças. Cada aula durava em torno de 1 hora ou, de acordo com o interesse
do grupo.
O resultado, apresento nas narrativas imagéticas a seguir (figuras 32
e 33). Não satisfeitos com o resultado, dado o envolvimento, a turma optou por
proceder a uma releitura da própria obra e, ainda transformamos algumas das
personagens em tridimensionais, conforme expostos nas narrativas em sequência
(Figuras 34, 35).
Figura 32- Releitura do Bumba meu boi e festa junina. 2012
Fonte: Da autora.
Figura 33- Nova releitura da produção Bumba meu boi e festa junina. 2012
147
Fonte: Da autora.
Figura 34- O Bumba meu boi. 2012
Fonte: Borges (1936).
Figura 35- As releituras do Bumba-Meu-Boi. 2012.
Fonte: Da Autora.
As releituras foram baseadas no estudo da obra Bumba Meu Boi
(figura 34) de Severino Borges (1919-1991) poeta e, gravador e cordelista
nordestino. Além da reprodução imagética, as crianças e as professoras,
conheceram a obra real do autor, que na semana nordestina de 2012, esteve em
exposição no Museu de Arte de Londrina. E muitos outros artefatos referentes às
148
tradições folclóricas da cultura popular brasileira, de modo geral.
As questões expostas demonstram as possibilidades de
proporcionar as crianças vivencias lúdicas, poéticas, sensíveis e inteligíveis com as
quais, além da interação do espaço da sala de aula, haja a transcendência para o
macro das relações. As manifestações comemorativas, de modo geral, tendem a ser
sufoco às crianças, como imposição de adestrá-las para que façam expressões
artísticas bonitinhas. Sendo que esse, não é o objetivo, e tão pouco a função
epistêmica do ensino da arte ou da sua presença na Educação Infantil. Nesse
sentido, há de pensar e promover pratica de inserção das crianças em sua cultura e
na cultura histórica. E não basta apensas discorrer sobre a diversidade cultural de
modo conceitual, pois,
Apesar de certas ocasiões comemorativas propiciarem aberturas para propostas criativas de trabalho, muitas vezes os temas não ganham profundidade e nem o cuidado necessário, acabando por difundir estereótipos culturais e favorecendo pouco a construção de conhecimentos sobre a diversidade de realidades sociais e culturais (BRASIL, 1998, p.165).
Sendo assim, a arte que a criança pensa e faz, necessita de
mediadores que promovam experiências adequadas às suas especificidades e
necessidades de descobridores potenciais de mundo. Vygotsky (apud GOMES,
2002, p. 53) deixa muito claro que “se as ferramentas culturais modificam os objetos
do mundo, os instrumentos psicológicos modificam o sujeito em sua relação com o
meio”. Sendo as ferramentas culturais mecanismos de atuação sobre o mundo, as
mesmas possibilitam a modificação, tanto do mundo quanto do homem, e diferencia
a espécie humana das demais, incluindo-se ai a capacidade simbólica, criativa
criadora. Se as crianças não agirem sobre e com os instrumentos da simbólica e da
tecnologia, dos artefatos, da imagética e sistemas de signos, como irão modificar-se
e transformar o mundo?
Sob este prisma, somente serei/seremos mediadores quando
me/nos compreender/ermos como aprendizes eternos. Para tanto a mobilidade em
busca de saberes e modos gestacionais da prática docente são requisitos mínimos
para se pensar a qualidade da relação ensino e aprendizagem. Dito por outra
perspectiva, sem a devida vivência com o objeto do conhecimento em arte, não
149
poderemos promover as possibilidades e estaremos sempre lidando nos liames dos
limites.
Sob esta prerrogativa, concordo com Larrosa (2002, p. 21), quando
a firma que “a experiência é o nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o
que se passa, não o que acontece, ou o que toca [...]” Mediar é mais que
simplesmente ensinar!
EQUANDOMETIRARAMOCHÃODESCOBRIQUETINHASASAS!
150
6 - O QUE PODE A ARTE? O QUE PODE O ENSINO DA ARTE?
151
ASTHESIACINESIAÊXTASE
152
SOMENTEAQUILOQUEVEMOSÉ
TUDOAQUILOQUEVEMOS?20
IMAGEMVISÃOAÇÃOGEÔMETRARTESÃO 21
20
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 16
153
ENXERGARÉOMESMOQUEVER?
21
VINCENT VAN GOGH. Noite Estrelada. 1889. Fragmento da Obra. Localização: Museu de Arte Moderna, Nova Iorque. Disponível em: <http://pt.m.wikipedia.org>
154
155
SENTIRSENTIDOSENTINDO
LEREPALAVREAR
156
COMPLEXIFICAR
157
MATERIALIDADE
VISIBILIDADE
158
PROVOCAÇÕES
TRANSGRESSÕES
TACTILIDADE
POSSIBILIDADES
159
FAZERSAIRAFORMADOAMORFO
160
PÁTIOINFÂNCIAPONTOMUTAÇÃOTRANSGRESSÃO
161
CRISTAIZAÇÕESRUPTURASLÚDICAS
FORMASQUEINFORMAMSEMINFORMAR
162
ORGÂNICOSPONTOSLINHASFRAGMENTOSDEMIM
163
164
165
DESVELARAMPLIARPEDAÇOSPERDIDOSDEMIM
166
167
VIBRARCORPOMOVERMENTE
168
TRANSFORMAREAPRESENTAR
169
6.1 PARA NADA CONCLUIR, JAMAIS22 ...
Resgatar pedaços de mim !
Consertar o possível do avesso.
Construir-me um pouco por vez
desfazer-me diante do começo...
Começo?
Existe um começo? Ou, talvez, é recomeço?
Por certo não sei e nem saberia explicar.
Pois, se deveras, como dizem, o começo é a infância, porque a
vontade de querer para sempre brincar?
Brincar de história; ouvir e contar, recontar...
Comer pipoca, pular corda, comer fruta madura colhida "no pé" e
tomar banho de rio; pescar com peneira, escorregar na grama, tomar banho de
chuva, rodopiar até ficar tonta...
Sabor de Infância!
Brincar de casinha, de pique-esconde, e "Seu Conde" mandou
(nunca soube quem era o danando do conde mandão!).
Jogo de Bétis, bola na lata, bola queimada e lenço atrás. Jogar
forca, jogar burquita, peteca, passar anel e soltar pipa e até fazer estilingue (com a
desculpa que era para o irmão menor que não podia usar o canivete para cortar a
forquilha do galho).
Ah! Se a mãe soubesse que era pra atirar pedras nos aviões... Que
nunca passavam no céu a voar e, quando vinham, logo eu pensava "é a polícia, a tal
da ditadura", que tanto ouvia o pai e o vô contar, e ficava à espreita, da tal fumaça
vermelha que o danado ia soltar, escondidinha, eu e o irmão, atrás do bambuzal.
Bonecas? Claro que eu tinha e Muitas! Inclusive de espigas de milho
(essas eu produzia) e de pano, cheinha de serragem que a mãe costurava o
corpinho de saco de açúcar (açúcar vinha em saco de pano) e bordava os olhos e a
boca em ponto cruz. Olhinhos azuis, sobrancelhas pretas e boca vermelha.
22
A seqüência de imagens apresentadas no capitulo acima, não sequem uma hierarquia objetiva, por isso não apresentam-se em tabelas, gráficos ou quadros e nem incluem seqüência numérica. O objetivo é narrar um historia, um pedaço da biografia da pesquisadora. O texto poesia é parte da narrativa e não as considerações deste estudo como um todo.
170
Livros? Nunca tive nenhum. Mas li muitos. Surrupiava da biblioteca
do vô e do pai quando os dois iam à cidade. Cidade longe, demoravam o dia todo
entre o ir e voltar, na carrocinha puxado pela Estrela, a égua que servia como "burro
de carga", para tudo no sítio.
Se eu assistia TV? Ia ao cinema? Não! Não tinha luz elétrica. A luz
era do sol, da lua, das velas e das lamparinas de querosene. Mas eu ouvia rádio.
Músicas. "Tonico e Tinoco, Zilo e Zalo, Cascatinha e Inhana, Teixeirinha", esse, o
pai ouvia todos os dias, no mesmo horário, na rádio farroupilha de Porto Alegre, AM,
às 3 horas da manhã. Acho que era devido á frequência ser melhor, ou então, ele
sofria de insônia. Ou, amava muito música dos pampas. Nunca saberei, com
certeza. Ah! E quando ele deixava, a mãe ligava o rádio para ouvir as rádio-novela,
tinha uma que eu lembro bem o titulo: "O homem sem passado". O pobre homem,
chamado Alex, levara uma paulada na cabeça e perdera a memória. Coisa triste não
ter história para contar, não?
Se eu desenhava? E Pintava? Mas é claro! Tinha uns "cotocos" de
lápis de cor ganhos da tia que vinha de São Paulo e trazia o que os primos não
queriam mais. Tinta guache? Nunca ouvi falar, até meus filhos irem à escola. Usava
era anilina mesmo, e pó xadrez, que a mãe misturava na água pra colorir o chão de
madeira e na Cal pra pintar as paredes da casa. E tinha de todas as cores! E como
eu gostava de ver aquelas misturas, apesar do cheiro, não era nada bom e o pó
ainda adentrava pelo nariz e irritava a garganta. Eu vivia tomando injeção por
infecção de garganta. Mas, não deixava de ajudar a fazer a tinta e pintar as paredes
e o chão. Era diversão garantida.
E claro, carvão, não faltava na roça. Mas ai de mim, se ousasse
desenhar nas paredes de madeira. Mesmo que fosse da tulha onde se armazenava
o milho e o café. Era castigo, na certa. Por isso eu desenhava na terra e nos troncos
das arvores caídas.
Como? Se eu sabia desenhar?
Bem ...essa já é outra história...
Lourides APARECIDA Francisconi
Londrina, 21 de Março de 2016
171
7 CONSIDERAÇÕES
PARA NADA CONSIDERAR, MAS, MESMO ASSIM CONSIDERANDO...
A humanidade acumulou na arte uma experiência tão grandiosa e excepcional que qualquer experiência de criação doméstica e de conquistas pessoais parece ínfima e mísera em comparação com ela. Por isso quando se fala em educação estética no sistema de educação geral, deve-se sempre ter em vista essa incorporação da criança à experiência estética da sociedade humana: incorporá-la inteiramente a arte monumental e através dela incluir o psiquismo da criança naquele trabalho geral e universal que a sociedade humana desenvolveu ao longo dos milênios sublimando na arte o seu psiquismo (VYGOTSKY, 2001, p. 351-352).
Neste estudo, a pesquisa científica recebeu uma conotação
diferenciada de parte dos percursos processuais que já fora por mim vivenciados.
Muitos caminhos foram percorridos para chegar a esse momento de apresentar,
reapresentando, o que representa a Arte e seu ensino na minha formação e, por
conseguinte, qual o retorno, eu, professora, estou dando na distribuição da atividade
social do grande projeto de humanização em um processo denominado Educação e
Ensino. E, mais especificamente, a educação dos sentidos, tendo como prerrogativa,
a razão e a emoção.
Nada fácil a tarefa, porém a mais graciosa e divertidamente
inteligível. Ás particularidades da minha história no decurso desse processo de
estudo, incidiram, muitas vezes, em linhas sinuosas e cores matizadas de tons nada
agradáveis. Fato instaurado devido à diversidade das relações e determinados
percursos em que, o movimento, descortinou as possibilidades nos limites
existentes, entre a realidade para o ensino da arte no universo educativo infantil. E
destarte, mediante o recorte e a análises dos dados, ora apresentados e as
narrativas filosóficas do discurso teórico e legal institucionalizado, apresentei em
forma de relato autobiográfico, aspectos da minha trajetória pessoal, formativa e
profissional no universo da temática em tela, dialogando com referenciais, teóricos,
legais, práxicos.
No entanto, face as especificidades da demanda, dizendo de outra
forma, por inúmeras vezes, faltou-me ânimo para o enfrentamento da realidade
diante do quadro de constelações e das constatações de discursos retóricos que
172
constituem a demanda laboral cotidiana. O desalento foi tanto que o corpo sofreu as
consequências da emoção sentida. Em muitas delas, pensei em desistir!
Nesse sentido, as narrativas ora apresentadas, pautadas no diálogo
estabelecido à luz de referencial teórico da Matriz Histórico-Cultural, confere a
pesquisa, o status de locus privilegiado para o entendimento das relações postas e
suas consequências, mediante os questionamentos que foram e motivaram o norte
da pesquisa e mediam o fomento desse estudo.
Tais requisitos e proposições problematizadoras, envolveram
aspectos da formação docente, relacionados aos aportes teóricos, metodológicos e
práticos dos saberes em Arte. Tais como a conceitualidade epistemológica
preconizada ao ensino da arte contemporâneo e sua incidência nos currículos de
formação docente, visando à transposição didática ao universo infantil; os
parâmetros, a inserção e as práxis em arte no universo posto e a historiografia como
indicio da autoformação do professor e sua repercussão na práxis.
E desse modo, do desejo suscitado pela necessidade de
entendimento sobre a trajetória na aquisição do conhecimento, tanto minha quanto
sobre o processo das crianças e, daquelas formas e modos comportamentais que
distingue o humano das demais espécies e denota sua singularidade, dei início a
esta experiência de aprendizagem, formatada em relato historiográfico, síntese de
percursos da minha formação. Josso (2004) me forneceu as bases para pensar o
quanto a professora que hoje sou, herdou da criança que já fui características e
comportamentos adquiridos no processo de formação em trâmite.
E assim, recorri ao campo de coleta, tanto do meu acervo material e
da memória, quanto do universo contextual da vivencias, os modos e formas, de
descortinar estas premissas como sendo possível de observação, constatação,
refutação e ou mensuração.
Diante das evidências, busquei na junção da Arte e da Psicologia e
no entrelaçamento de suas bases filosóficas, metodológicas e históricas o
entendimento dos fundamentos para compreender a minha constituição psíquica e
assim entender os modos relacionais e as bases fundamentes das formas de
aquisição de saberes. Priorizei as informações advindas da matriz Histórico-Cultural
pelo fato de Vygotsky (1998, 2003) e Feuerstein (apud GOMES, 2002) esclarecerem
os pontos básicos dos conceitos fundamentais da construção do saber construído
por mediação, marca eminentemente humana.
173
Nesta busca descobri as chaves, assim como os segredos que
abrem as portas do universo psíquico. Quando estas portas são devidamente
abertas, tornam-se receptoras dos estímulos provenientes dos diversos sistemas
simbólicos que constituem a objetividade material do mundo. A realidade objetiva
natural é um dado a priori que o homem não cria, mas, recria, por sua ação e se
transforma na realidade objetiva social. E esta se configura um dado histórico.
Portanto, ao recriar a realidade objetivamente, não só a mesma é alterada, como a
realidade interna, psíquica do homem, também é transformada, constituindo a sua
subjetividade, ou a realidade interior de cada ser humano.
Assim, em Marx (1984, 2007) encontrei as respostas para a
importância do Trabalho, enquanto atividade humana direcionada a uma finalidade,
que não é somente material. Mas que possui conotação de caráter imaterial de
significação. Ou seja, o homem produz conhecimento. Logo, produz Arte.
Nesse processo de ação laboral, de fazer, de atos intencionais ou
não intencionais e transformadores, os mediadores são relevantes. E Vygotsky
destaca os signos e os símbolos como mediadores da constituição das funções
psíquicas humanas. Dentre as quais destaco as funções cognitivas base, como a
capacidade de perceber, pensar e sentir. Logo, um signo como a linguagem é um
mediador de primeira grandeza. Descobri que a Arte é uma linguagem que possui
códigos próprios e constatei em Paulo Freire (1998) que o primeiro encontro
dialógico da criança, ocorre por meio das leituras imagéticas do mundo.
Dessa forma, a criança é inserida na cultura, tanto natural, quanto a
construída pela ação humana. No processo de ler o mundo, tem inicio a
internalização dos elementos simbólicos. Este fenômeno é decorrente de outro
processo essencial, para que de fato o humano consiga conviver socialmente, a
interação. Vygotsky (2003) denomina a esse fenômeno de apropriação objetiva por
mediação e Feuerstein (apud GOMES, 2002) de Intencionalidade, reciprocidade e
transcendência. A isso Paulo Freire (1996) denomina de aprender-ensinar-aprender.
Assim, os símbolos são internalizados, por representarem
elementos do arsenal semiótico da cultura. Os signos surgem ao humano, tanto
como extensores do corpo para auxiliar nas tarefas mais complexas, tanto como
mediadores, interceptando os estímulos do objeto do saber, auxiliando na leitura e
interpretação dos dados advindos do mesmo e, com isso, ganhando um significado.
Para Peirce (1977) o signo caracteriza a representação valorativa de
174
um objeto sentido e significado. Isto é, para que haja aprendizagem, é necessário a
compreensão da informação recebida, quer seja dialógica ou visualmente; ou ainda,
a informação captada por cada canal sensorial de recepção e interpretada pela
percepção. Esta relação ocorre entre o eu, o outro social e o objeto do saber. Para
haver um signo é necessário ocorrer a atribuição de sentido. Motivo pelo qual, na
semiótica peirceana, o signo abarca duas dimensões, a do significante, que passa
pelo campo da sensorialidade ou estésico (perceptivo) e a significação, que abarca a
compreensão. Da harmonia entre os campos da percepção e do entendimento, ou
seja, significante e significado, resulta a significação.
É dessa forma que a criança aprende que se chorar, terá atenção e
suas necessidades, desejos, serão satisfeitos. Ou ainda, aprende que pode deixar
suas marcas no mundo, utilizando seu próprio corpo ou valendo-se dos objetos
tecnológicos, como lápis, canetas, objetos afins. Visto que os mesmos são
subjetivados por mediação e no uso de recursos do campo da percepção global.
Para agir no mundo de modo proativo, a criança precisa, para ver, perceber, pensar,
sentir, fazer , ser parte ativa dessa significação.
Logo os instrumentos e ou os recursos tecnológicos construídos
como fruto da ação laboral humana, quer seja, no embate com as vicissitudes do
mundo material e sensível, em busca da superação das limitações, ou por motivos
estéticos, são originados na utilização, desenvolvimento e constituição de seu
potencial. Sendo que este abarca duas dimensões: a razão e a emoção. Ambas,
sendo requisitadas em busca de modos, meios e fins que possam de inicio, apenas
satisfazer as necessidades elementares. Mas que, a partir da experiência adquirida
na convivência com a repetição da ação, quer seja no plano individual ou vendo o
outro a executando, demarca o inicio da compreensão humana sobre que,
determinadas ações determinam certos tipos de reações. Este entendimento
deflagra o inicio de uma consciência política e do estabelecimento das inter-
relações.
Assim, superando as necessidades de ordem práticas, a criança
humana, internaliza tais ações e aprende via interação a planejar com maestria
criativa, novas possibilidades de intervir em espaços físicos e simbólicos do mundo
exterior e interior. Esse embate relacional, tanto Vygotsky (1998, 2003) quanto
Duarte Junior (2003), enfatizam que ocorre por estesia (fazer) e reação estética
(apreciar).
175
Todavia, o processo de reconstrução, aqui apresentado, também é
contínuo e é Histórico-Cultural. Isto é, envolveu interações do eu, do outro, do
coletivo e com o entorno micro e o macro das relações. Se o movimento humano na
historia demarca a singularidade, as vivências de cada percurso aqui apresentado,
denota o movimento que empreendi e o como mediei as possibilidades de constituir
um saber em arte. Tanto a mim, quanto aos pares e a possível transposição às
crianças. Certamente, a professora de 2007 não é a mesma de 2016. Assim como, a
mulher de hoje, embora guarde os resquícios da menina de outrora, não é a menina,
mas a mantém na essência. A vida é surpreendente. E para suprerender mais, tenho
a Arte e seu potencial criador, estético e político.
Assim os autores que subsidiam as análises aqui apresentadas,
permitiu-me um movimento sinuoso e convergente pelo cenário educativo, do
passado a atualidade. Com isso entendo que, no cenário contemporâneo, em suas
diversas interações, a criança ávida por descobrir o mundo circula por múltiplos
espaços culturais interagindo, observando e absorvendo; contribuindo com a
produção de uma cultura própria e inerente as suas percepções e capacidades
simbólicas, expressivas e cognitivas. O mesmo ocorrendo com o professor, visto a
formação ser processo.
Outrossim é que, na atualidade, a presença e atuação da criança no
mundo, embora de maneira diferenciada, se faz com a mesma intensidade que a
dos adultos. Muito embora, nem sempre os adultos, reflitam como se deve sobre o
que a criança diz e faz ao utilizar-se de suas semioses como canal expressivo,
impressivo e meio comunicacional.
É por intermédio da pluralidade de linguagens que a criança interage
com o mundo e com os objetos que estão no mundo. Assim como com as pessoas,
os objetos, a cultura, as outras crianças; escreve sua biografia através de todas as
formas manifestas de sua multiplicidade de linguagens. Apresenta sua visão de
mundo e o torna presente, produzindo cultura, levantando e constatando suas
hipóteses/problemas e atribuindo significados sob uma lógica que escapa a
percepção da maioria dos adultos.
É fato que a criança fala com todo o corpo, porque sente com todo o
corpo. Assim ao falar desenha, dramatiza, gesticula, dança, gargalha, sente,
percebe, saltita, vibra, transforma uma coisa em outra, dando-lhe uma materialidade,
atribuindo significados diversos, vivendo uma experiência de âmbito subjetivo e
176
racional, de ordem estética e cinestésica.
Sob tais prerrogativas, vivenciar uma experiência estética para a
criança significa abrir as janelas de recepção para um mundo de descobertas, pronto
a ser explorado de maneira inteligível e sensível; o que implica na estesia. Pensar
em uma educação sensível é considerar que as potencialidades de docentes e
discentes possam se transformar em sensibilidades. Logo, as possibilidades
necessitam ultrapassar os liames dos limites disponibilizados pelo e no cotidiano ao
ensino da arte na educação infantil e viabilizar a concretude de ações geratrizes de
aprendizagens cooperadas.
Tomei como possibilidade que a sensibilidade para a criança é a
chave que abre as portas do mundo a ser contemplado, questionado, descoberto,
vivenciado através da experiência do ler e interagir com o mundo e o que é e está no
mundo. Com o que é real o que pode ser transformado em realidade pela atuação
da capacidade imaginativa e pensante.
E para o docente da primeira infância, significa a percepção de todo
o movimento que envolve sua práxis numa relação dialógica que possibilite a ação
eficaz apoiada em conhecimentos que não sejam limitadores. Mas sim construtores
de sua identidade, que é pedagógica, mas que também é pessoal e se faz na
ambiência das interações com os pares e com os sujeitos de aprendizagem.
Sendo a linguagem um dos signos relevantes na mediação do
mundo e a Arte, além de ser uma linguagem, possui seu arsenal de signos
específicos, a mesma conota experiências com características muito especificas e
requer praticas especificas, com conhecimentos específicos.
O humano age por necessidade e por satisfação. Foram às
necessidades, percebidas nos liames dos limites e possibilidades incitaram meu
movimento até o momento. Hoje, as traduzo, como as bases programáticas de um
processo educacional que, demarcou e possibilitou, o inicio da minha compressão
sobre a constituição estético-sensível. Mas, não somente a minha, pois, no processo
de retroagir, tanto eu, quanto os pares, e ou meninos e meninas, homens e
mulheres, tornam-se conscientes de seu ser e estar no mundo. E é assim que,
humanizando-se politizada e criticamente, podem mover-se em busca do Vir-a-Ser
concretude, conforme Freire (1996) assinala.
As bases programáticas curriculares e as ações pedagógicas em
arte, que aqui analisei, implicam em ações simples, porém, complexas; ações do
177
âmbito da estesia e da estética, que promovam sentido ao conhecer, apreciar e
produzir arte, imbuída da essência do lúdico, da ação pelo gesto, do gosto pela ação
da descoberta, instigando a curiosidade epistêmica em busca da experiência do ser,
vir-a-ser e do ser-mais.
Logo, o ensino da arte na Educação Infantil, considerando as
possibilidades, pelo viés da mediação, pode atender a emergência do tempo e
espaço do ensino atual e promover ações que atenda as especificidades da criança.
O necessário implica em que as proposições curriculares atenda as
necessidades de conhecimento dos pequenos descobridores de mundo, em suas
dimensões científicas, artísticas e filosóficas e em correlação com as experiências
de ordem pratica das vivencias cotidianas e na ambiência das multiculturas e os
artefatos simbólicos, dos instrumentos tecnológicos que as constituem. Para tanto,
pensar a formação especifica do professor como, pelo viés da continuidade é uma
prerrogativa que creio necessária.
Freire, Vygotsky e Feuerstein, correlatamente aos demais autores
que nos amparam este estudo, em seus pensamentos e teorias demarcam a
emergência do estado da ação educativa e das relações humanas focalizadas entre
os iguais e, com as demais formas de vida que habitam o planeta Terra. O
humano,ou seja, nós, quer seja, política, ética, ou esteticamente, transitamos por
limites e possibilidades na rotina exorbitante que aliena, massifica e entorpece os
sentidos
Aos sinalizar nesse estudo algumas das possibilidades educativas
em arte que – pois, creio que muitas outras possibilidades ainda estão por se
apresentar - quando devidamente mediadas, oferecem o suporte necessário para o
embate da criança consigo mesma, com suas forças produtivas (sensações,
necessidades, desejos, imaginação, sentimentos, pensamentos e criatividade) e
com tudo que é e está no mundo, vislumbro um ensino que possa satisfazer as
necessidades mais básica da criança, ser feliz, ser criança. É na Educação Infantil,
que se amplia o processo de politização e de constituição dos valores. Não se
poderá falar de educação de excelência, trabalhando sempre com e por limites.
Ademais, entendo que nas possíveis aproximações entre a
perspectiva teórica de Paulo Freire, Lev Seminovitch Vygotsky e Reueven
Feuerstein e os dados advindos da minha ação de observação, reflexão e
intervenção no contexto assinalado, me foram relevantes para fornecer as bases e
178
os subsídios para o pensar, planejar, fazer e consolidar a práxis educativa no século
XXI com o ensino de Arte na escola infantil, otimizando as condições para o
potencial semiótico das crianças. E o mais importante, tendo como base a dialogia
na constituição da autonomia criativa, na observação de padrões éticos e estéticos
politizados, sem estereótipos e ou preconceitualizações.
Pois deveras, compete ao ensino promover vivências diversas e
otimizà-las, para tornarem-se experiências. Á Escola, CMEI, compete, como
instituição social legitima, promover ações para o desenvolvimento social e cultural ,
humanizando para dignidade, para o respeito ao diverso, para as praticas
autônomas e politizadas.
Enfim, ensinar e aprender em arte visual envolve interrogações
como a quem se destina? Como se faz o movimento em busca de intervir, inferir,
sem melindrar? Por que é tão complicado e relegado a um plano secundário se é um
saber tal como outro que demarca a historia humana? E sob quais bases e valores
são elaborados Currículos? E a dicotomia Lei e Transposição Didática, como
resolvê-la, na própria formação do professor?
Destarte, este estudo, enquanto parte de um processo de pesquisa
que não se esgota com a finalização de um programa de mestrado, teve como
agenda, traçar o panorama de um processo histórico de formação. Um
entrecruzamento de profissão e vida, que vislumbrou falar de um tempo de ser
criança e fazer coisas de criança, tendo como meta priorizar uma Área especifica
dos saber humano, quer seja, a Arte, a criança e as suas especificidades de
enfrentamento do mundo. Investiguei as possibilidades de fazer coisas de criança
mediada pela Arte. Prossegui e o movimento me revelou que a ação de ensinar e
aprender são constituídos de historicidades. Logo, envolve mais de um. Destarte, os
sentidos de minhas ações, sonhos e objetivos, ou seja, meus comportamentos
efetivos configuraram-se em relações contextuais de minha existência em gestação
e gestão constante. Daí a importância do pensar para intervir e agir flexibilizando.
Pois, no ato de informar/conhecer, a percepção clara e interpretativa e a apreensão
do real e da realidade é e foi, fundante para a escolha de caminhos e métodos; de
pedagogias que pudessem e possam, dar conta de atender as necessidades e as
especificidades dos sujeitos humanos em processo relacional; de formação e
construção contínua. No caso, Eu, meus pares, as crianças e os acadêmicos em
arte visual que estão sob minha mediação e que ainda possam vir a estar.
179
A atualização constante do saber/fazer e ser docente pode,
resumidamente, ser descrita como relações em que ensinar e aprender se
configuram como processos imbricados. Envolve a intenção e a reciprocidade, a
participação efetiva de pares, de atores sociais distintos e diversos. Pressupõe o
desafio do desconhecido, do diferente, do inusitado, do estranhamento, da novidade,
da curiosidade, da imaginação, daquilo que instiga, angustia e permite a indagação.
Assim como do que já é conhecido de forma ingênua, da experiência do senso
comum ou do âmbito da formalidade.
Ao ensino de Arte ou a Arte-Educação compete à mediação de
significados e de transcendência da e na compreensão dialética do ser presença no
mundo na ambiência do tempo e espaço do qual as linguagens artísticas e suas
formas de materialização (pictóricas, pictográficas, sinestésicas e sonoras)
emergem. Sendo, portanto, portadoras de informações históricas sobre as relações
sócio-afetivas e político-ideológicas de seu tempo.
Ou seja, á mim professora, compete o movimento da busca.
Necessito ser construtora, intérprete autônoma e politizada. Preciso abrir-me as
vivências para que me permita afetar pelas leituras primeiras, aquelas originadas
das relações vivenciais com o mundo, que, quando, devidamente sentidas e
significadas, e ou comprovadas à luz da consolidação de dados, tornem-se em
experiências. E mesmo quando refutadas, sirvam como subsidio de descarte para a
anão ação.
Ao considerar o percurso traçado à luz do referencial que me
norteou, das vivências com os pares, com as crianças, como os adultos e com as
comunidades escolares externas e internas do percurso transcorrido e resultante
nesta pesquisa, aprendi que: as possibilidades existem, apesar dos desafios e de
toda a ordem de dificuldade. E que a humildade é a chave mestra para a
cooperação no intercambio em qualquer processo, seja de pesquisa cientifica, seja
relacional afetivo, seja da vida.
180
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ANEXOS
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