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A ADMINISTRAÇÃO DE CARREIRAS E SEUS
IMPACTOS NA GESTÃO DO CONHECIMENTO: UM ESTUDO DE CASO DO INCAPER
NEY NAKAZATO MIYAHIRA CARINA LABBATE MAUGÉ SIMÕES
DANIEL CAMPOS NETO
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Painel 12/035 Instrumentos de gestão de carreiras e critérios para a nomeação de dirigentes públicos
A ADMINISTRAÇÃO DE CARREIRAS E SEUS IMPACTOS NA GESTÃO
DO CONHECIMENTO: UM ESTUDO DE CASO DO INCAPER
Ney Nakazato Miyahira
Carina Labbate Maugé Simões
Daniel Campos Neto
RESUMO
A gestão do conhecimento tem sido amplamente discutida, contudo em poucas ocasiões o tema é abordado juntamente com administração de carreira. Este artigo
pretende estudar essa relação em uma organização pública. Foi realizado um estudo de caso no Incaper – Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e
Extensão Rural – que passou por uma reformulação no seu modelo de administração de carreira, visando reforçar o fluxo de gestão de conhecimento, tão necessário ao Instituto. Os principais resultados encontrados foram que a
configuração de carreira adotada anteriormente privilegiava apenas um grupo de profissionais a gerar conhecimento (devido ao critério de promoção por titulação),
causando sentimento de desconforto por parte dos demais profissionais. Na nova configuração, distintos critérios foram estabelecidos considerando os diferentes perfis profissionais, dando maior ênfase na transmissão do conhecimento. Este
trabalho oferece uma alternativa promissora para motivar organizações do setor público a aprimorarem seus sistemas de carreira e fortalecerem, ao mesmo tempo, a
gestão do conhecimento.
3
1 INTRODUÇÃO
O conhecimento é objeto de estudo de longa data. No período clássico, o
conceito de conhecimento foi inicialmente introduzido por Platão como “crença
verdadeira justificada” (NONAKA e TACKEUCHI, 1995). Esta definição não é
considerada perfeita, induzindo acadêmicos e práticos a buscarem métodos para
melhor estabelecer este conceito tão presente na vida das pessoas e ao mesmo
tempo tão abstrato.
Na administração, o tema “conhecimento” tem ganhado cada vez mais
importância. Lastres et al. (2002) destaca que vivemos na “era do conhecimento”, na
qual o conhecimento é apontado como fator de vantagem competitiva para as
empresas. Cassiolato e Lastres (2005) falam em “economia do conhecimento”
ressaltando que após a virada do milênio o conhecimento se tornou ativo
indispensável para as empresas. Saber fazer a gestão deste ativo na organização se
tornou um dos desafios da atualidade.
Em virtude da grande amplitude de assuntos abarcados na temática de
gestão do conhecimento, procurou-se nesta pesquisa focar na interface entre gestão
do conhecimento e os processos de gestão de pessoas, em especial, os
relacionados à administração de carreira. O interesse pelo recorte em Administração
de Carreira se deve pela capacidade de, por um lado, estimular e instrumentalizar as
pessoas para pensar suas carreiras e seu desenvolvimento profissional e pessoal;
de outro, oferecer à empresa os conceitos e ferramental necessários para se pensar
a gestão de Recursos Humanos (RH) de forma estratégica e para integrar o conjunto
das políticas e práticas de administração de pessoas (DUTRA, 1996).
Não foram identificados estudos que abordassem de forma direta a
relação entre gestão do conhecimento e administração de carreira. Em linhas gerais,
foram encontrados estudos que exploravam o papel do RH em contextos em que a
gestão do conhecimento é relevante, destacando, em alguns casos, as contribuições
específicas dos processos de RH, tais como avaliação, treinamento, remuneração,
seleção e retenção (LENGNICK-HALL e LENGNICK-HALL, 2012; McIVER et al.,
2012; OLTRA, 2005; YAHYA e GOH, 2002; BOXALL e HAESLI, 2005). Como os
estudos de carreira possuem grande interface com outros processos de RH, foi
possível extrair contribuições dos estudos identificados para a atual pesquisa.
4
Tendo em vista esta carência de estudos sobre a relação da carreira e a
gestão do conhecimento, este artigo busca responder a seguinte pergunta de
pesquisa: como a administração de carreiras contribui para o processo de criação do
conhecimento organizacional?
Para responder o problema de pesquisa, adotou-se como estratégia de
pesquisa o estudo de caso. O objeto de estudo foi o Instituto Capixaba de Pesquisa,
Assistência Técnica e Extensão Rural – INCAPER.
2 OBJETIVOS DO ESTUDO
Com este estudo, pretendemos contribuir, para academia, com o
entendimento da relação entre gestão do conhecimento e administração de carreira,
esperando também despertar o interesse para futuras pesquisas. Para os práticos,
pretendemos contribuir, oferecendo às organizações os resultados obtidos com este
trabalho, para que possam enxergar oportunidades de melhorias nas suas práticas
de gestão de pessoas, em especial, aquelas relacionadas à administração de
carreira. O quadro 1 apresenta os objetivos do estudo, relacionados às variáveis e
análise de dados propostas.
PERGUNTA PESQUISA
OBJETIVOS DO ESTUDO DE CASO
VARIÁVEIS COLETA DADOS
ANÁLISE DADOS
Como os
critérios de movimenta-ção na
carreira contribuem para o processo de criação do
conhecimento organizacio-nal?
Compreender o papel da gestão do conhecimento na Instituição.
Analisar se a gestão do conhecimento é ressaltada nas ações de natureza estratégia da organização. Verificar como ocorre o fluxo de criação do conhecimento organizacional
Análise documental Entrevista com gestor chave e consultor
Análise da gestão do conhecimento no INCAPER
Compreender o que motivou a configuração dos critérios de movimentação na carreira.
Analisar o sistema de administração de carreira, considerando seus dois componentes: estrutura de carreira e instrumentos de gestão.
Análise dos critérios de carreira e sua contribuição para o processo de criação do conhecimento em duas fases: antes e depois da reestrutu-ração da carreira
Verificar quais destes critérios estão relacionados com a criação do conhecimento.
Analisar se, por meio destes critérios de carreira, há incentivos para a criação de conhecimento em cada etapa deste fluxo.
Avaliar a percepção dos profissionais sobre os critérios de movimentação na carreira e seus impactos na criação do conhecimento.
Identificar se a configuração dos critérios de carreira propiciou um contexto de reciprocidade e troca de conhecimento
Quadro 1: relação pergunta problema, os objetivos e o referencial conceitual
Fonte: Elaborado pelos autores.
5
3 RESGATE CONCEITUAL E MODELO CONCEITUAL ADOTADO
3.1 Gestão do Conhecimento
O referencial teórico utilizado sobre gestão do conhecimento envolverá
três autores conceituados nesta temática: (1) Nonaka e Tackeuchi (1995); (2)
Davenport e Prusak (1998); (3) Von Krogh, Ichijo e Nonaka (2001).
Antes de abordarmos o referencial teórico sobre gestão do conhecimento
é importante mencionar a definição de conhecimento como “crença verdadeira
justificada”, conceito inicialmente introduzido por Platão (NONAKA e TACKEUCHI,
1995). Krogh, Ichijo e Nonaka (2001) se apropriam deste conceito, destacando que
as pessoas justificam a veracidade de suas crenças com base na sua observação
do mundo, portanto estas observações dependem de percepção e experiências
individuais. Conhecimento, assim, é uma construção de realidade e não algo
verdadeiro e universal, não é uma simples compilação de fatos, mas um processo
humano singular e irredutível, que não se reproduz com facilidade. Na mesma linha,
na qual reforça a vivência e experiência do indivíduo para criação do conhecimento,
Davenport e Prusak (1998) definem conhecimento como uma mistura fluida de
experiência condensada, valores, informação contextual e insight experimentado.
Para Nonaka e Tackeuchi (1995) conhecimento é criado por um fluxo de
informações ancorado nas crenças e compromissos de seus detentores.
Nonaka e Takeuchi (1995) não utilizam o termo “gestão do
conhecimento”. Os autores se apropriam do conceito de “criação de conhec imento
organizacional”, que significa a “capacidade de uma empresa criar novo
conhecimento, difundi-lo na organização como um todo e incorporá-lo a produtos,
serviços e sistemas”. Nota-se, portanto, que os autores se utilizaram de um conceito
amplo, que não só consideraram a geração e disseminação do conhecimento entre
pessoas, mas também sua incorporação na organização. Já Von Krogh, Ichijo e
Nonaka (2001) criticam o termo “gestão do conhecimento”, pois consideram o termo
em si limitado. Os autores argumentam que o termo “gestão” remete a controle,
no entanto quando se trata de criação de conhecimento, estamos nos referindo
a “processos que talvez sejam intrinsecamente incontroláveis ou, ao menos,
6
que talvez sejam sufocados por um gerenciamento mais intenso” (VON KROGH,
ICHIJO E NONAKA, 2001, p. 6). Os autores reforçam que as empresas devem, ao
invés de controlar o conhecimento, promover um ambiente favorável para criação do
conhecimento organizacional.
Nonaka e Tackeuchi (1995) afirmam que a criação do conhecimento
organizacional ocorre na conversão do conhecimento entre tácito e explicito e
novamente tácito. Seus estudos sobre os ciclos de conversão de conhecimento os
autores trabalham tanto a dimensão epistemológica (conhecimento tácito e
explícito), como a dimensão ontológica (passagem do conhecimento do indivíduo ao
grupo e do grupo à organização e vice-versa), estabelendo quatro estágios:
socialização; externalização; combinação; internalização, conforme Figura 1 (a
seguir).
Figura1: Ciclos de conversão do conhecimento
Fonte: Nonaka Tacheuchi, 1995.
Nonaka e Tackeuchi (2002) elencaram as condições capacitadoras para a
gestão do conhecimento, são elas: a) intenção (deve estar na estratégia do
negócio); b) autonomia (automotivação individual, estrutura facilitadora e sistema de
gestão que possibilite tal autonomia); c) flutuação (deve-se permitir a crítica, o
aprendizado com a crise, o pensamento e o caos criativo); d) redundância; e e)
variedade de requisitos. O primeiro item já se encontra na estratégia do Instituto.
Discute-se aqui o segundo item, a automotivação individual e o quanto o sistema de
gestão pode facilitar a autonomia.
7
Enquanto Nonaka e Tackeuchi (1995) dão luz ao processo de criação do
conhecimento, Von Krogh, Ichijo e Nonaka (2001), diferentemente, oferecem
destaque às condições do contexto para a criação do conhecimento. Os autores
defendem que o conhecimento é relacional e específico ao contexto , que sua
criação é dinâmica por meio de interações sociais, e sua natureza é subjetiva,
profundamente arraigada em sistemas de valores individuais. A forma como as
pessoas interagem - compartilhamento cooperativo (contexto capacitante) versus
acumulação competitiva (contexto hipercompetitivo) - afeta o compartilhamento de
conhecimento tácito nas organizações. Em linhas gerais, o contexto capacitante
pode ser definido como um lugar onde se compartilha, se cria e se utiliza o
conhecimento. Trata-se de uma rede de interações, determinada pela solicitude e
pela confiança dos participantes.
Davenport e Prusak (1998) também reforçam a importância do contexto e
das interações no compartilhamento de conhecimento, todavia dão luz ao que
denominam mercado do conhecimento. Reconhecer que estes mercados existem é
importante para a gestão do conhecimento nas organizações, para que
compreendam como eles funcionam e torná-los eficientes. No mercado do
conhecimento existem compradores, vendedores, inclusive corretores. Estes atores
avaliam o saldo na relação ‘comercial’ em busca de satisfação de interesses, ou
seja, trocam conhecimento, porque acreditam que ganham com esta transação. Os
autores listam três fatores operando como “recompensa” no mercado do
conhecimento: reciprocidade (o ganho recíproco ao compartilhar o conhecimento);
reputação (reconhecimento perante os outros de ser um bom fornecedor de
conhecimento); e, por último, o altruísmo (prazer em ajudar). Portanto, nota-se que
os autores defendem que o compartilhamento deve ser atrativo, recompensador
para as pessoas. Os autores defendem que para estabelecer uma cultura
consistente de compartilhamento do conhecimento, é necessário usar moedas
valiosas, como gratificações monetárias, aumentos salariais, promoções,
mecanismos para aferir a gestão do conhecimento na avaliação de desempenho dos
profissionais, bem como colocar pessoas respeitadas em funções facilitadoras.
8
Assim como Von Grogh, Davenport e Prusak (1998) também exploram o
fator confiança na troca de conhecimento, caso não haja confiança, qualquer projeto
de gestão do conhecimento ou envolvendo conhecimento poderá ser um fracasso.
3.2 Modelo estratégico de gestão de pessoas
Apesar de Nonaka e Takeuchi (1995) se dirigirem ao conceito de criação
do conhecimento organizacional, eles entendem que uma organização não pode
criar conhecimento por si mesma, sem a iniciativa do indivíduo, sem a interação que
ocorre entre o grupo. Nesse sentido, Von Krogh defende que o ato de conhecer é
um processo humano singular e irredutível, logo o conhecimento não se reproduz
com tanta facilidade. Portanto, quando falamos de criação de conhecimento
organizacional, estamos nos referindo a pessoas (indivíduos) e à interação destas
com o grupo. O modelo que a Organização adota para fazer a gestão das pessoas
não pode ser, portanto negligenciado num contexto em que a organização que visa
a criação de conhecimento organizacional. Dessa forma, as práticas de gestão de
pessoas passam a ter um papel de crescente destaque nos estudos sobre gestão do
conhecimento.
Um modelo de gestão de pessoas, segundo Fischer (2002, pág. 12),
consiste na “maneira pela qual uma empresa se organiza para gerenciar e orientar o
comportamento humano no trabalho.” Na visão de Dutra (2009), modelo de gestão
de pessoas pode ser comparado com uma lente que auxilia a enxergar a realidade e
a compreender as pessoas.
Moreira (2010) ressalta que o debate acadêmico sobre gestão de
pessoas, estratégia e desempenho organizacional tem se concentrado em dois
modelos normativos de integração: o modelo universalista defendido pela Escola
das “Melhores Práticas”- Best Practices - e o modelo configuracional e contingencial
da Escola do Alinhamento - Best Fit .
Como demonstrado em Moreira (2010), a Escola de Melhores Práticas
(Best Practices) apresenta uma abordagem universalista, ou seja, proposições que
assumem como premissa a existência de um conjunto de melhores práticas de
gestão de pessoas, cuja adoção está diretamente relacionada a níveis superiores de
9
desempenho organizacional. A Escola do Alinhamento (Best Fit) considera duas
formas de ajuste: a) Alinhamento Configuracional ou Interno (Internal Fit) também
denominada Horizontal Fit, que requer políticas e práticas de gestão de pessoas
consistentes em toda empresa de tal forma que as pessoas trabalhem de forma
alinhadas; b) Alinhamento Contingencial ou Externo (External Fit), também
denominado Vertical Fit ou Strategic Fit, que se refere à necessidade de integração
das políticas e práticas de gestão de pessoas com a estratégia da organização.
Considerando as duas escolas mencionadas, neste estudo de caso,
nossa abordagem está mais aderente à Escola do Alinhamento (Best Fit), tanto
horizontal como vertical. Vertical, uma vez que a pesquisa está centrada em analisar
os critérios de administração da carreira do INCAPER e sua aderência com a
estratégia do Instituto que é gerar e transmitir conhecimento para o ruralista (Fit
External/ Alinhamento Vertical). Horizontal, por observar a integração (Fit Internal)
dos critérios de administração na carreira com outras práticas de gestão de pessoas.
3.3 Administração de carreira
A definição operacional de carreira utilizada nesta pesquisa se refere à
perspectiva da organização, que engloba políticas, procedimentos e decisões
ligadas a espaços ocupacionais, níveis organizacionais, compensação e
movimentação de pessoas (LONDON e STUMPH, 1982). Dutra (1996) estabelece
que um sistema de administração de carreira possui dois componentes principais:
estrutura de carreira e os instrumentos de gestão.
Por estrutura de carreira temos como definição: uma “sucessão de
posições, a valorização e os requisitos de acesso às mesmas”. Em se tratando do
conceito de instrumentos de gestão constituem mecanismos que oferecem suporte
para que a pessoa planeje a carreira e a organização balize expectativas. Há uma
íntima relação dos instrumentos de gestão com os demais instrumentos de gestão
de pessoas, como por exemplo, o processo de avaliação e desempenho.
10
3.4 Relação entre gestão de pessoas e gestão do conhecimento
Lengnick-Hall e Lengnick-Hall (2012) postulam que na economia do
conhecimento, a gestão de pessoas passa a ser responsável pelo gerenciamento
das capacidades que as pessoas criam e pelos relacionamentos que devem
desenvolver. Levando em consideração as reflexões de Ulrich (1999), os autores
destacam que o RH não pode se confinar aos seus processos convencionais. Nessa
era, inclui-se o trabalho com a funções tradicionais (seleção, treinamento e
desenvolvimento, gestão da performance), mas, também, com funções não
tradicionais, como a gestão do conhecimento.
Boxall e Haesli (2005) exploram as relações entre as estratégias de
Recursos Humanos e as medidas de Gestão do Conhecimento. Em particular, o foco
principal da análise é sobre como essas relações afetam as etapas de recrutamento
e retenção de talentos. O autor faz um cruzamento entre a necessidade de
personalização ou codificação do conhecimento e a necessidade de reter ou recrutar
pessoas neste contexto.
Os estudos que mais se aproximaram do tema de pesquisa foi de Oltra
(2005) e Yahya e Goh (2002).
Oltra (2005) defende a relação entre práticas de RH e a eficácia da
gestão do conhecimento (GC). Dentre elas, destacamos aquelas mais relacionadas
ao nosso objeto de estudo: inclusão formal das atividades de GC na descrição dos
cargos; produtividade do compartilhamento de conhecimento medido na avaliação
de desempenho; produtividade do compartilhamento do conhecimento considerado
nas revisões de salário; ações de treinamento centradas em CG inseridas no
planejamento geral de treinamentos.
Yahya e Goh (2002) trazem para a discussão a questão da política de
remuneração e recompensas que incentive a gestão do conhecimento. Os autores
observaram que as práticas de remuneração devem: a) recompensar atitudes que
promovam criatividade na resolução dos problemas diários; e b) os pagamentos
devem ser baseados em grupos e recompensas que estimulem a troca de
conhecimento e o compartilhamento entre os membros do grupo.
11
Fazendo um paralelo com Davenport e Prusak (1998), nota-se que as
práticas de RH devem reconhecer a importância da gestão do conhecimento, tornar
o objeto atrativo, passar mensagens para as organizações e orientar o
comportamento dos profissionais.
Para concluir este capítulo de referencial teórico, relacionados os
principais autores abordados com as variáveis que se pretende observar no estudo
de caso. Ver Quadro 2.
CONCEITOS ATRELADOS VARIÁVEIS DE OBSERVAÇÃO
Ciclo de conversão do conhecimento tácito e explícito (Nonaka e Tackeuchi, 1995)
Best fit vertical e horizontal (Moreira, 2010) Relação entre GC e Gestão de Pessoas
Analisar se a gestão do conhecimento é ressaltada nas ações de natureza estratégia da organização. Verificar como ocorre o fluxo de criação do conhecimento organizacional
Sistema de Administração de carreira Dutra (1996)
Analisar o sistema de administração de carreira, considerando seus dois componentes: estrutura de carreira e instrumentos de gestão.
Mercado do conhecimento Davenport e Prusak (1998)
Analisar se, por meio destes critérios de carreira, há incentivos para a criação de conhecimento em cada etapa deste fluxo.
Contexto capacitante (Von Krogh, Ichijo e Nonaka, 2001) Condições capacitadoras para a gestão do conhecimento (Nonaka e Tackeuchi, 1995)
Identificar se a configuração dos critérios de carreira favoreceu para um contexto de reciprocidade e troca de conhecimento
Quadro 2: Conceitos versus variáveis observadas no estudo de caso
Fonte: Elaborado pelos autores.
4 METODOLOGIA
A pesquisa efetuada constitui em um estudo de caso. Segundo Martins
(2008), o estudo de caso é adequado quando se deseja entender a fundo o contexto
de uma organização e também quando se deseja construir uma teoria. “O estudo de
caso possibilita a penetração em uma realidade social, não conseguida plenamente
por um levantamento amostral e avaliação exclusivamente quantitativa” (MARTINS,
2008, p.9).
As técnicas de coleta de dados uti lizadas no estudo de caso foram:
análise documental e entrevistas semiestruturadas.
12
Por ser uma autarquia, o INCAPER tem seu funcionamento todo
normatizado por regras e decretos governamentais. Este fato tornou a análise
documental muito rica. O estudo de caso iniciou-se com uma detalhada leitura de
todas as normas, estatutos, decretos que se relacionavam com critérios de carreira
do INCAPER.
Com relação à entrevista, houve uma restrição, por parte da organização,
de envolver os profissionais do Instituto, uma vez que no período de realização da
pesquisa, os novos critérios de carreira estavam sob negociação sindical. Foi
possível realizar uma entrevista com um gestor sênior do INCAPER que possui uma
visão ampla e estratégica do Instituto e uma percepção sobre os principais aspectos
positivos e a desenvolver dos critérios de carreira e sua interface com a gestão do
conhecimento. Além deste gestor sênior, um dos consultores especializados, que
apoiaram os trabalhos de remodelagem dos critérios de carreira do INCAPER,
participou da pesquisa. Tal consultor participou de diversas entrevistas com gestores
chave da organização, visitou os principais processos do Instituto, bem como foi
envolvido em discussões de validação com a Alta Administração e instâncias de
validação do novo desenho de cargos e carreira. O fato do consultor não ser
servidor do INCAPER possibilitou um olhar mais isento sobre o contexto, fato
relevante, principalmente quando se trata de estudos sobre carreira e remuneração.
Por outro lado, número restrito de participantes, pode ser considerado uma limitação
da pesquisa.
5 BREVE DESCRIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO ESTUDADA
O Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural
– INCAPER teve origem a partir da junção dos seguintes Insti tutos: Empresa
Capixaba de Pesquisa Agropecuária - Emcapa; Empresa de Assistência Técnica e
Extensão Rural do Espírito Santo - Emater-ES e Empresa Espírito-Santense de
Pecuária – Emespe.
13
A missão do INCAPER é a promoção de soluções tecnológicas e sociais
por meio de ações integradas de pesquisa, assistência técnica e extensão rural,
visando ao desenvolvimento do Espírito Santo. Tem como visão, posicionar o
Espírito Santo como referência em soluções integradas de pesquisa, assistência
técnica e extensão rural, tendo como objetivos estratégicos: a garantia de geração
de renda, a inclusão social e a transferência de informações, conhecimentos e
tecnologias para melhorar a qualidade de vida da população que vive no campo;
pautando-se por valores como ética, transparência, confiabilidade, respeito,
probidade, utilidade, comprometimento, trabalho em equipe, pa rticipação, gestão
democrática e valorização do conhecimento.
O papel de destaque da gestão do conhecimento na estratégia do
INCAPER reforçou e ratificou a escolha desta Instituição como estudo de caso para
os propósitos do artigo.
O Instituto passou, no ano de 2012 e início de 2013, por uma
reformulação no seu modelo de estrutura de cargos e carreiras e modelos
promocionais, adotando instrumentos de gestão de pessoas condizentes com as
mensagens e práticas que se almejavam incentivar no ambiente organizacional.
Este recente processo de mudança possibilitou, neste estudo de caso,
confrontarmos a estrutura de carreira antes e depois desta reformulação.
Sobre a carreira no INCAPER, os cargos efetivos são divididos em dois
grupos ocupacionais: o Grupo de Suporte em Desenvolvimento Rural, que
compreende as atividades meio que permitem o funcionamento do INCAPER nas
áreas de administração e apoio técnico, e o Grupo de Desenvolvimento Rural,
compreendendo as atividades finalísticas nas áreas de Pesquisa Agropecuária,
Assistência Técnica e Extensão Rural. Apenas este último Grupo foi objeto de
análise.
O estudo em questão foca-se nas funções de pesquisador e de
extensionista, que anteriormente pertenciam ao um cargo amplo único, o de Agente
de Desenvolvimento Rural. Após a reformulação de carreira, o Instituto optou por
separar as funções em cargos distintos.
14
6 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Debruçando-se sobre o material coletado, faz-se agora a análise dos
dados, utilizando-se como estrutura de organização os objetivos do estudo de caso,
contemplados no quadro 3.
6.1 Análise da gestão do conhecimento
Por meio da análise documental da missão, visão e valores, pudemos
observar que a criação do conhecimento faz parte da razão de ser do INCAPER, por
possui um papel importante para gerar, adaptar, divulgar e aplicar novos
conhecimentos, considerando suas áreas de atuação e o público alvo, como os
produtores rurais e a agroindústria artesanal. Destacamos no quadro a seguir os
aspectos que podem ser associados à criação de conhecimento organizacional.
Missão “Promover soluções tecnológicas e sociais por meio de ações
integradas de pesquisa, assistência técnica e extensão rural ...”
Visão “... referência em soluções integradas de pesquisa, assistência técnica e extensão rural”
Valores Valorização do conhecimento.
Objetivo
estratégico
...Garantia de (...) a transferência de informações, conhecimentos e
tecnologias para melhorar a qualidade de vida da população que vive no campo.”
Quadro 3: Missão, visão, valores e objetivo estratégico do INCAPER
Fonte: Elaborado pelos autores.
O fluxo da transferência do conhecimento pretendido pelo INCAPER
(Figura 2) envolvem as figuras do pesquisador, do extensionista e do ruralista
(apenas o pesquisador e o extensionaista são servidores do INCAPER). O primeiro
seria o responsável por gerar o conhecimento, por meio de suas atividades
acadêmicas; faz-se então a transmissão desse conhecimento aos extensionistas
que devem repassá-los, de forma palatável, aos ruralistas. Estes, por sua vez,
retroalimentam o ciclo, comparti lhando necessidades da rotina rural, o que
demandam novas vertentes de pesquisas, que devem chegar aos pesquisadores por
meio dos extensionistas. E assim, fecha-se o ciclo.
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Figura 2: Fluxo da disseminação do conhecimento do INCAPER para o ruralista
Fonte: Elaborado pelos autores.
Trazendo o referencial do ciclo de conversão do conhecimento do Nonaka
e Tackeuchi (1995), pudemos identificar os momentos em que ocorrem a conversão
de conhecimentos no INCAPER.
Ocorre a socialização (conversão do conhecimento tácito a tácito) no
momento em que o pesquisador encontra-se em suas atividades acadêmicas. Uma
vez concluída a pesquisa, ocorre a externalização do conhecimento consolidado
como conceitual, isto é, dissemina-se o conhecimento entre distintos pesquisadores
(passagem do conhecimento tácito a explícito). Em um terceiro passo, o grupo de
pesquisadores repassa o conhecimento aos extensionistas, por meio da etapa
conhecida como combinação, que é a inter-relação entre conhecimentos sistêmicos
dos grupos (passagem do conhecimento explícito a explícito). Na sequência, os
extensionistas devem repassar o conhecimento ao ruralista, que vai aplicar de fato o
conhecimento; ocorre então a internalização, fase conhecida como o “aprender
fazendo” (passagem do conhecimento explícito a tácito). Uma vez internalizado, o
conhecimento passou da organização (INCAPER) ao grupo (extensionista) e depois
ao indivíduo (ruralista). O ruralista, em sua prática rural diária pode acumular novos
conhecimentos tácitos e praticar a socialização com o extensionista. Reinicia-se,
então, o ciclo do NONAKA e observa-se o retorno do fluxo de conhecimento
idealizado pelo INCAPER).
16
6.2 Análise do sistema de administração de carreira
Neste item pretende-se fazer uma reflexão dos instrumentos de gestão e
da disposição da estrutura de carreira dos pesquisadores e extensionistas e o
quanto estes dois tópicos encontram-se condizentes com os preceitos do INCAPER:
a criação e disseminação de conhecimento agropecuário. Encontram-se em
discussão a descrição do cargo, os critérios de movimentação, as avaliações de
desempenho e seu uso na evolução da carreira e os reflexos da sinergia desse
conjunto de ferramentas na criação do conhecimento, tanto na situação anterior à
reestruturação de carreira, quanto na posterior.
6.2.1 Antigo modelo de estrutura de carreira
Estrutura de carreira e instrumentos de gestão relacionados
Conforme citado, as atribuições de pesquisa e extensão encontravam-se
dispostos em um mesmo cargo “Agente de Desenvolvimento Rural” cujo requisito de
acesso era curso de graduação de nível superior completo, bacharelado, em área
relacionada com a atividade a ser desempenhada e registro em órgão de classe
respectiva, quando houver.
A descrição deste cargo era a seguinte:
Pesquisador e extensionista para elaborar, coordenar, supervisionar, avaliar e executar programas, projetos, subprojetos e ações de estudos e de
pesquisa agropecuária e de assistência técnica e extensão rural relacionados com a atividade fim do Instituto, com geração de tecnologias, inovação e desenvolvimento, publicação de trabalhos técnico-
científicos, abrangendo diversas especialidades de interesse da Instituição. Atuar junto aos produtores rurais, pescadores e suas famílias em atividades educativas, transferências de tecnologias, de profissionalização,
organização, agroturismo, agroindústria, indústria artesanal, empreendedorismo e parcerias junto a segmentos da sociedade rural e outras atividades correlatas ligadas ao meio rural.
O requisito de acesso bem como a descrição do cargo estavam
propositadamente genéricos e abrangentes, visando maior maleabilidade de
recrutamento, almejando polivalência na execução das tarefas e maior integração e
sinergia nas atividades de pesquisa e extensão.
17
Em relação à sua estrutura de carreira (Figura 3), o cargo de Agente de
Desenvolvimento Rural encontrava-se com um horizonte vertical de 4 classes e
horizontal de 17 referências, tendo uma variação interclasses de 10% e
interreferências de 3%.
Figura 3: estrutura de carreira do antigo cargo de Agente de Desenvolvimento Rural
Fonte: Legislação do INCAPER
Quanto às regras de promoção, ou seja, mudança de classe, deste cargo
seguia o modelo de promoção por titulação automático, isto é, era promovido todo
servidor que alcançasse uma titulação maior que a atual. Dessa forma, o servidor
ingressava com o título de graduação e, após o estágio probatório era promovido à
classe II caso apresentasse o título de especialização lato sensu, à classe III caso
apresentasse o diploma de mestrado e à classe IV na apresentação do título de
doutorado.
Como este estímulo era único aos dois tipos de profissionais existentes
no cargo (pesquisador e extensionista), havia o incentivo único e exclusivo à
obtenção de títulos, que condizia com a realidade do pesquisador, mais voltado às
atividades acadêmicas, porém, destoava da prática diária do extensionista, que se
encontrava frequentemente em visitas técnicas, em fazendas e regiões interioranas,
sem acesso a ofertas de cursos acadêmicos. Estes viam baixa condição de
evolução na carreira por conta da obrigatoriedade de titulação como critério para
ascensão. Isso porque a obtenção de títulos, para grande parte dos profissionais
que reside no interior, é muito difícil de conciliar com a atuação profissional. Além
disso, a titulação não se configurava como elemento determinante para a atuação
em extensão; suas atribuições requeriam muito mais uma vivência prática, uma
habilidade relacional com o ruralista do que diplomas e certificados escolares.
18
Em relação à movimentação entre referências, era aplicada uma
progressão por desempenho, com um ciclo bianual, que se baseava na média de
das avaliações anuais aplicadas a esse público. As progressões eram automáticas,
caso o profissional recebesse nota acima de 70%.
Tal avaliação estava alicerçada em 142 critérios que, embora tivessem
como preceitos o louvável intento meritocrático e traduziam, em diversos
indicadores, a tentativa de estímulo não só à geração do conhecimento
(publicações), como também sua transmissão (atividades de extensão, como visitas
técnicas, capacitações no campo, etc), encontravam-se excessivos, mal utilizados,
sub ou super utilizados, isto é, sem um dimensionamento adequado. Além disso,
estavam misturados entre critérios de exposição de publicações, extensão e
técnicas administrativas, sendo que apenas alguns critérios faziam sentido aos dois
públicos. A maior parte dos critérios tinha maior significado e relevância ora para os
pesquisadores, ora para os extensionistas. Junte-se a isso o fato destes
profissionais encontrarem-se na mesma carreira, o que dificultava a
comparabilidade. Por fim, vale ressaltar que o valor de incremento na progressão de
3% era irrisório, refletindo-se em pouco efeito prático remuneratório, o que se
traduzia em um grande esforço para levantamento e avaliação dos 142 critérios,
sem que houvesse um impacto relevante na carreira. Segundo relatos coletados nas
entrevistas, a avaliação acabava se deslegitimando, seja pela sua complexidade,
seja pela sua baixa relevância, fazendo com que os gestores atribuíssem nota
máxima a seus avaliados, o que gerava progressões automáticas a todos.
Impactos na disseminação do conhecimento
Pelo disposto do antigo modelo, pode-se apreender que o fluxo de
conhecimento desejável ao INCAPER não estava devidamente
estimulado/amparado pelas ferramentas de gestão disponíveis. A promoção por
titulação conseguia estimular o início do ciclo, isto é, motivava o pesquisador a
buscar constantemente a geração do conhecimento, por seus estudos e realizações
de dissertações e teses, mas não focava o extensionista no seu objetivo principal de
bem recepcionar o conhecimento gerado pelos pesquisadores e transmiti -los de
maneira palatável aos ruralistas. Ao invés disso, os extensionistas passavam a
19
também buscar capacitações acadêmicas, muitas vezes frustrando-se por obter
pouca oferta em seu ambiente de trabalho, por não vislumbrar uma aplicabilidade
imediata no seu dia-a-dia ou simplesmente por não ter o perfil acadêmico, como o
pesquisador.
Analisando-se o fluxo de conhecimento ideal ao INCAPER (Figura 4),
verifica-se que não há o devido estímulo na passagem do conhecimento entre
pesquisador para o extensionista, seja pelos motivos acima descritos, seja também
pela falta de motivação aos pesquisadores em repassar tal conhecimento.
Regatando-se os conhecimentos disseminados por Davenport, não houve uma
moeda de troca atrativa para que o pesquisador “venda” (repasse) conhecimento ao
extensionista, nem uma moeda de troca atrativa para que o extensionista se
demonstre pró ativo na busca (“compra”) do conhecimento gerado pelo pesquisador.
Na inexistência dessas moedas de troca, o ambiente gerado é de baixa solicitude
para a troca de conhecimento. Isto se reflete também na passagem do extensionista
para o ruralista e no retorno do conhecimento prático e vivencial do ruralista para o
extensionista e deste para o pesquisador.
Figura 4: Impactos na disseminação do conhecimento do INCAPER no antigo modelo .
Fonte: Elaborado pelos autores.
6.2.2 Novo modelo de estrutura de carreira
De acordo com os propósitos do INCAPER, o cargo amplo de agente de
desenvolvimento rural pretendia abarcar tanto o trabalho de pesquisa quanto o de
extensão; entretanto, análises e estudos detalhados no momento de reestruturação
de carreira comprovaram se tratar de dois grupos de profissionais com perfis e
20
atuações bastante distintas. Ambos possuem atuação próxima às demandas que o
Instituto recebe do Ministério de Desenvolvimento Agrário, mas os servidores da
extensão rural se relacionam também com as demandas do Ministério do
Desenvolvimento Social, enquanto os servidores da pesquisa se envolvem com as
demandas do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Os servidores da área de extensão têm como foco o atendimento às
comunidades e aos pequenos produtores rurais transferindo a tecnologia produtiva,
além de participar de campanhas de inclusão social, exigindo maior abrangência de
atuação, não apenas na assistência técnica. Além disso, esses servidores estão
espalhados pelo Estado, longe de centros urbanos, o que dificulta a obtenção de
títulos acadêmicos, sendo que esses não são imprescindíveis ao bom desempenho
das suas atividades. Há ainda um contexto de vulnerabilidade do servidor diante de
pressões do ambiente em que atua, por vezes tendo que lidar com assentamentos e
estando com frequência exposto a riscos.
Já os servidores que atuam como pesquisadores necessitam estar em
contínua atualização e produção acadêmica, inclusive para que o Instituto consiga
competir por financiamentos para suas pesquisas. Segundo relatos, estes servidores
são atraídos pela função a ser desempenhada e pelo reconhecimento que a
Instituição possui no mercado quanto à qualidade de suas pesquisas. Nesse sentido,
para o grupo de pesquisadores, o incentivo à titulação e à produção acadêmica é
muito relevante. Porém, para os extensionistas, tal estímulo não só destoa das suas
atribuições, como gera frustração na dificuldade de obtenção de títulos. Essas
peculiaridades nas naturezas tão distintas das atividades implicam em necessidades
e expectativas de carreiras distintas, necessitando estímulos de movimentação
(progressões e promoções) apropriados a cada grupo, para que possam fazer
corretamente o seu papel (pesquisa ou extensão) e garantir a correta e essencial
gestão do conhecimento, tão importante para o Instituto. Fez-se então, a divisão do
cargo amplo em dois cargos, um para os pesquisadores e outro para os
extensionistas, Agente de Extensão em Desenvolvimento Rural e Agente de
Pesquisa e Inovação em Desenvolvimento Rural, respectivamente
21
A separação em dois cargos específicos permitiu o tratamento dos
componentes das carreiras (tanto de pesquisa quanto de extensão/assistência
técnica) de forma mais alinhada às necessidades específicas e às características
demandadas dos profissionais. Vale destacar que tal divisão em nada prejudica a
interação entre os profissionais e a integração das atividades de pesquisa e
extensão. Tal integração ocorre, e deve continuar ocorrendo, pela realização de
ações conjuntas, que envolvam profissionais dos diversos cargos.
A estrutura de carreira de ambos os cargos guardou grande semelhança
para que não haja um sentimento de injustiças ou favorecimentos discricionários.
Dessa forma, adotou-se para ambos os mesmos horizontes, os mesmos
incrementos de progressão e promoção e as mesmas regras de progressão, tendo
apenas distinção nas regras de promoção na carreira, o que conferirá estímulos
distintos, alinhados com o que se espera de cada grupo de profissionais.
Os horizontes de carreira continuaram em 4 classes, na vertical; e adotou-
se 15 referências na horizontal. Os incrementos na progressão foram reduzidos de
3% para 1,5% e a regra adotada foi a da antiguidade, fator historicamente valorizado
no serviço público. Entretanto, para que não se perca a valorização da meritocracia,
adotou-se a possibilidade de aceleração na progressão, através da avaliação de
desempenho satisfatória (nota acima de 70%), que faz com que se caminhe até
duas referências, garantindo-se a possibilidade de ganho na progressão de até 3%
para os profissionais que de fato bem desempenharem suas funções no período
contemplado.
A avaliação de desempenho passa a ser pautado em uma avaliação por
competências, em que se enfocam oito critérios pontuados como essenciais a todos
os servidores públicos. São eles: postura profissional (peso10); trabalho em equipe
(peso: 15); aplicação de normas e procedimentos (Peso: 10); iniciativa e capacidade
de lidar com situações novas e inusitadas (Peso: 12); conhecimentos técnicos
(Peso: 9); qualidade do trabalho (Peso: 16); produtividade no trabalho (Peso: 20); e,
aproveitamento em programas de capacitação (Peso: 8)
A uti lização desta avaliação, conforme citado, implicará na aceleração da
progressão a pesquisadores e extensionistas e na promoção do extensionista,
conforme descrição a seguir. Vale ressaltar que a avaliação de desempenho
compõe um instrumento de gestão e deve estar alinhado com os preceitos
22
Institucionais, além de integrado harmonicamente com as demais práticas de gestão
de pessoas. Nesse sentido, ele serve não só como insumo para a evolução da
carreira, mas para o desenvolvimento profissional de cada servidor, apontando
oportunidades de treinamento, capacitações e atuações complementares no
trabalho. Observa-se, portanto, o esforço do INCAPER em propiciar o alinhamento
horizontal (internal fit) das práticas de gestão de pessoas.
O incremento na promoção passa a ser de 15% da classe I para a II, de
10% da classe II para a III e de 5% da classe III para a IV, com a intenção de se
valorizar e reter o profissional no início da carreira. Embora o incremento na
promoção seja o mesmo para os pesquisadores e extensionistas, as regras para a
promoção passam a ser distintas para os dois casos.
Figura 5: Nova estrutura de carreira
Fonte: Elaborado pelos autores.
Para os extensionistas, adotou-se a promoção por seleção. Como critério
de elegibilidade à promoção tem-se a necessidade de permanência mínima de 5
anos na classe atual, valorizando-se a experiência e a vivência na atividade, a
coleção de cinco avaliações periódicas de desempenho individual e a disponibilidade
de recursos financeiros. Tal necessidade, inexistente no modelo anterior, dá
sustentabilidade ao modelo, colocando-o em consonância com o momento
financeiro vivenciado em cada ciclo promocional, pelo INCAPER. Traz também, a
mensagem implícita de que, uma vez que o recurso para a promoção seja limitado,
haverá a competição entre os servidores, sendo promovidos apenas os que fizerem
jus ao mérito. O critério de seleção, ou seja, a priorização e escolha é justamente o
momento de se classificar os servidores aptos em uma ordem decrescente e
contemplar os que mais merecerem a promoção. Tal classificação obedecerá à
seguinte composição (Figura 6).
23
Figura 6: Critérios de Classificação da promoção por seleção
Fonte: Legislação do INCAPER
A avaliação individual refere-se à avaliação de desempenho pautado por
competências, já descrita anteriormente; é o que possui o maior peso, pois é neste
critério que se consegue valorizar a vivência prática, a boa atuação do extensionista,
reforçando e estimulando a transferência do conhecimento rural.
Há um critério de capacitação e qualificação, com peso de 34%,
denotando a importância também do extensionista se qualificar, com a diferença de
que no novo modelo há a possibilidade de se pontuar capacitações técnicas e de
curta duração, mais condizentes com a rotina do extensionista; antes, cobrava-se
apenas a titulação acadêmica de longo prazo: especializações lato e sctricto sensu.
Por fim, os critérios de participação em comissões e gestão e fiscalização
de contratos, ambos valendo 8%, são critérios universais a todos os servidores do
Estado do Espírito Santo, e visa o estímulo à execução de tais atividades,
necessárias e essenciais à Gestão Pública, mas que não possuem uma
contraprestação pecuniária direta, isto é, não há pagamento extra para o servidor
que acumula tais atribuições.
Já a promoção adotada aos pesquisadores é a promoção por titulação,
que, embora tenha um estímulo parecido com a antiga promoção vivenciada pelo
cargo agente de desenvolvimento rural, há também diferenças, que vem contribuir
para o alinhamento vertical e horizontal do instrumento com a estratégia do
INCAPER e demais sub sistemas de recursos humanos. Tais mudanças acabam
também por estimular não só a geração do conhecimento, mas a transmissão dele
pelo pesquisador, ao extensionista. O critério de elegibilidade, como o nome diz, é a
obtenção do título acadêmico, mantendo-se a promoção para a classe II ao se
atingir a especialização lato sensu, a promoção para a classe III ao se obter o
mestrado e a promoção para a classe IV na obtenção do título de doutor.
24
Há, contudo, uma diferença com a antiga promoção por titularidade, pois
nesta nova, se insere também como filtro de elegibilidade a observância na
disponibilidade de recursos financeiros. Ao se introduzir este fator, não só se alinha
com a gestão orçamentária do instituto, mas também se introduz a noção de
meritocracia e comparação entre semelhantes, para se escolher os que
apresentaram melhor desempenho para a promoção; mesma linha de raciocínio
aplicado aos extensionistas. A limitação orçamentária traz um segundo passo à
promoção por titulação, que é o critério de priorização; se para o extensionista, os
critérios estavam fortemente baseados na avaliação por competências, para o
pesquisador, selecionou-se critérios condizentes com sua atuação específica e
peculiar, a ênfase na geração do conhecimento, sem se esquecer da importância de
repasse desse conhecimento à área de extensão: (Figura 7).
Figura 7: Critérios de classificação dos pesquisadores
Fonte: Legislação do INCAPER
Nota-se a ênfase na geração do conhecimento, que corresponde a 34%
da nota, mas há também uma preocupação na transmissão dessa tecnologia (25%),
além da qualidade da Universidade em que se busca o título, refletida pela nota
CAPES (16%), bem como alguns critérios comportamentais que mensurarão a boa
relação com a extensão (17%). Por fim, estimulou-se também a captação financeira
para as pesquisas realizadas (8%).
O quadro 4 apresenta um quadro-resumo dos instrumentos de gestão e
estrutura de carreira no antigo e no novo modelo do INCAPER.
25
Instrumentos de Gestão
e Estrutura de Carreira Antigo Modelo Novo Modelo
Cargo Agente de
Desenvolvimento Rural
Agente de Pesquisa e Desenvolvimento Rural
Agente de Extensão e Desenvolvimento Rural
Horizonte - Referências 17 15
Horizonte - Classes 4 4
Incremento na
Progressão 3% 1,50%
Incremento na Promoção 10% - 10% - 10% 15% - 10% - 5%
Regra da Progressão por desempenho por tempo, com acelerador por desempenho
Regra da Promoção Promoção por Titularidade
Promoção por titulação ao pesquisador
Promoção por seleção ao extensionista
Avaliação Avaliação com 142
critérios Avaliação por Competência
Quadro 4: Comparativo entre s instrumentos de gestão e estrutura de carreira no antigo e no novo modelo .
Fonte: Elaborado pelos autores.
Verificam-se pelas descrições das duas ferramentas de gestão de carreira
que as mensagens e estímulos repassados aos dois públicos são agora distintos e,
ao que parece, condizentes com o fluxo do conhecimento almejado pelo Instituto. É
o que se analisa a seguir.
Impactos na disseminação do conhecimento
Tendo como referência, as condições capacitadoras da gestão do
conhecimento (interação, autonomia, flutuação, redundância e variedade de
requisitos), podemos inferir que o primeiro item já se encontra na estratégia do
Instituto. Discute-se aqui, com os critérios de carreira, o segundo item, a
automotivação individual e o quanto o sistema de gestão pode facilitar a autonomia.
Os demais itens: flutuação, redundância e variedade de requisitos são impactados
pelo ambiente de negócio, pelo modelo de gestão e pelo perfil dos gestores e
servidores.
26
Neste sentido, o novo modelo promove maiores condições capacitadoras
para que haja a transmissão do conhecimento. Os pesquisadores, ao serem
estimulados não só na obtenção do título (importante para a geração do
conhecimento), mas também na transmissão e na boa relação com a área de
extensão, passam a ser motivados a uma postura proativa e solícita na relação com
o extensionista. Estes, por sua vez, ao serem estimulados a perseguirem a boa
execução de suas atribuições, e não mais em uma corrida desfocada por títulos,
passam a se desenvolver mais rapidamente e eficientemente em sua área,
adotando-se também uma postura solícita na recepção do conhecimento passado
pelo pesquisador e no repasse ao ruralista. Esta solicitude (Von Krogh, Ichijo e
Nonaka, 2001) é ainda reforçada pelo fato de que no novo modelo, por serem dois
cargos distintos, os pesquisadores e os extensionistas não concorrerão entre si, por
recursos orçamentários destinados à promoção. Nem haverá a análise comparativa
de carreiras entre eles, tornando-se evidente que são carreiras distintas e
igualmente necessárias e importantes ao INCAPER, motivo pelo qual as duas
carreiras, embora de cargos distintos, mantenham a mesma tabela remuneratória.
No fluxo do conhecimento do INCAPER, passa a haver estímulos não só
na geração da pesquisa, mas também na transmissão do conhecimento até os
ruralistas. (Figura 8). Restam dúvidas quanto ao retorno do fluxo, isto é, o quanto os
instrumentos de gestão estão possibilitando e motivando o feedback técnico dos
ruralistas aos extensionistas e estes alimentando novas pesquisas dos
pesquisadores. Pelo escopo do artigo, não foi possível evidenciar e analisar tal
retorno, ficando como proposta de pesquisa futura.
Figura 8: Impactos na disseminação do conhecimento do INCAPER no antigo modelo
Fonte: Elaborado pelos autores.
27
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta pesquisa, pretendeu-se de forma geral compreender como a
administração de carreiras contribui para o processo de criação do conhecimento
organizacional.
Por meio da pesquisa, percebeu-se que os critérios antigos de carreira do
INCAPER estimulavam demasiadamente a titulação, ou seja, a geração de
conhecimento, ao passo que critérios para transmissão do conhecimento eram
pouco explorados. Com a reformulação dos critérios de carreira, notou-se que
estímulos para a transmissão foram fortemente introduzidos e a titulação foi
enfatizada apenas para o público que de fato se apropria deste conteúdo no dia-a-
dia do trabalho.
Os antigos critérios de carreira também não reconheciam as diferenças
de natureza de trabalho do pesquisador e extensionista, tratando-os de forma
semelhante. Este fato gerou descontentamento, uma vez que a probabilidade de um
grupo alcançar os critérios de promoção era maior para um deles. Este
descontentamento constituía entraves para a criação e transferência de
conhecimento. Tais aspectos foram considerados e modificados na reformulação
dos critérios de carreira.
Nota-se, portanto, que este trabalho ofereceu uma alternativa promissora,
dentro de suas limitações, para compreender como a administração de carreiras
contribui para o processo de criação do conhecimento organizacional.
Como limitação deste trabalho pode-se mencionar que o estudo se
restringiu a uma única organização, assim os objetivos foram atingidos no contexto
do caso estudado.
Pensando em estudo futuros, uma possibilidade a considerar é utilizar a
metodologia aplicada neste trabalho em outras organizações, permitindo assim uma
comparação entre organizações. Outra possibilidade de pesquisas futuras seria
fazer um estudo entre organizações que têm a gestão do conhecimento como parte
de seu intento estratégico versus aquelas que não têm, com o intuito comparar a
configuração das carreiras. Por fim, espera-se que o presente trabalho tenha
cooperado para que a organização estudada - o INCAPER – compreenda como a
administração de carreiras contribui para o processo de criação do conhecimento
organizacional.
28
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30
___________________________________________________________________
AUTORIA
Ney Nakazato Miyahira – Universidade de São Paulo.
Endereço eletrônico: neymiyahira@usp.br
Carina Labbate Maugé Simões – Universidade de São Paulo.
Endereço eletrônico: calabbate@gmail.com
Daniel Campos Neto – Universidade de São Paulo.
Endereço eletrônico: danielcamposneto@gmail.com
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