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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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Práticas de Telejornalismo Online: Casos da Folha de São Paulo, do G1 e do UOL1
Thiago FRISON2
Oswaldo da Silva RIBEIRO3
Universidade Católica Dom Bosco, Campo Grande, MS
Resumo
Na conturbada era da convergência de formatos para a internet, procurou-se compreender
de que maneira o telejornalismo e suas referências são trabalhadas atualmente no meio
online e se ele possui relações com a prática tradicional voltada para a televisão. Partindo
da análise de conteúdo, comparou-se a produção em vídeo de Folha de São Paulo, G1 e
UOL com de dois telejornais: Jornal Nacional e Jornal da Record. O material dos sites tinha
peculiaridades que os diferenciavam de material telejornalístico. Ficou evidenciado o uso
do vídeo na internet como apoio ao texto, infográfico, documental e sobre bastidores, além
do tratamento diferente à mesma notícia se comparado com a televisão e liberdade quanto
ao tempo. Apesar de ter algumas características semelhantes ao telejornalismo, o que se
produz na internet é uma desconstrução do formato, que difere do telejornalismo.
Palavras-chave: Telejornalismo; Convergência; Internet; Análise de Conteúdo
Um formato em construção num momento conturbado
É de se observar que o desenvolvimento de novos meios de comunicação tem aproximações
com seus antecessores. Assim foi o rádio, que partiu do texto do jornalismo impresso para a
criação de uma identidade, bem como foi com a TV, que tinha no texto radiofônico o ponto
de partida para os primeiros telejornais veiculados. Ninguém é substituído, mas todos se
adaptam aos momentos. A possibilidade multimídia que a internet ofereceu fez com que
ela, no princípio, abraçasse mais de um antecessor e, de forma a desbravar as
possibilidades, trabalha de tudo um pouco.
Esse meio oferece potencialidades para praticar o jornalismo, que nem sempre são
utilizadas integralmente. É possível apontar como potencialidades do jornalismo na
internet: 1-Multimidialidade/Convergência (Com a digitalização da informação, a
multimidialidade no jornalismo online se refere ao uso das mídias tradicionais como formas
1 Trabalho apresentado na Divisão Temática Jornalismo, da Intercom Júnior – XII Jornada de Iniciação Científica em
Comunicação, evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação
2 Graduado em Jornalismo (2015B) pelo Curso de Jornalismo da UCDB, email: thiagofrison@outlook.com
3 Orientador do trabalho. Professor do Curso de Jornalismo da UCDB, email: oswaldoribeiro@ucdb.br
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de linguagem às informações a serem transmitidas); 2-Interatividade (é a interação que o
usuário tem com a notícia, seja com quem a escreveu, seja com quem também a lê ou
mesmo com a hipertextualidade da mesma); 3-Hipertextualidade (É a possibilidade de ligar
textos a outros textos a partir dos links); 4-Costumização do Conteúdo/Personalização
(Possibilidade dada ao usuário de pré-selecionar o que é de seu interesse, além de poder
escolher também a programação visual que preferir); 5-Memória (É o arquivamento [fácil e
barato] do que é produzido na internet dentro dela mesma. O conteúdo pode ser recuperado
a partir da hipertextualidade e de buscadores); 6-Instantaneidade/Atualização contínua (É a
facilidade no acesso às informações na internet aliada à constante atualização dos registros
proporcionada pelas facilidades que as novas tecnologias oferecem). (PALACIOS, 2003).
Vivemos em uma eterna convergência. Produtos convergem em outros e linguagens
noutras. Jenkins (2011) lembra que o momento da convergência é sempre muito
conturbado. Formatos estão construindo-se e, em especial, neste momento em que a web se
fortalece cada vez mais, espaço que o receptor também é emissor, o fluxo de conteúdos
transita nas diversas plataformas, dando espaço para que uma linguagem se solidifique.
E é neste espaço que uma das mais completas maneiras de se contar uma história, como
defendem Machado (2001), Paternostro (1999) e Maciel (1995), também segue
convergindo para um outro formato. O telejornalismo criou linguagens e narrativas quase
absolutas e que oferecem ao telespectador a possibilidade do som acompanhar a imagem. O
repórter em frente à câmera – que entra após os âncoras, diante do teleprompter,
convocarem a sua participação - fala diante dos acontecimentos, elementos gráficos e textos
que entram na tela para complementar a informação – um modelo clássico.
“Telejornalismo online”?
Brasil (2002) defende que segue a construção do telejornalismo online – que, afirma o
próprio autor, utiliza o termo na ausência de outro mais específico. O autor é um dos
pioneiros na utilização da internet para experimentar o telejornalismo. Programas
experimentais foram veiculados na então recente TV UERJ, em 2002, que observou a
potencialidade de explorar uma linguagem monopolizada (a do telejornalismo), em um
meio acessível (a internet). A ausência de um termo específico se reflete na bibliografia,
que utiliza mais de um termo para se referir à mesma construção de um formato de
telejornalismo na internet.
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[...] pode-se definir o “telejornalismo na web” como uma linguagem que
está em construção, junto às falhas e acertos, com a tendência de
aprimorar a informação, de modo que atenda a demanda de uma notícia
esmiuçada, mais satisfatória e, ao mesmo tempo imediata. Interativo e
hipertextual, o “telejornalismo na web” possibilita ao internauta uma visão
da realidade bem mais completa e complexa. (SILVA; RODRIGUES,
2005, p. 74).
As potencialidades do jornalismo na web apontadas por Palacios, naturalmente, podem ser
utilizadas na construção de um telejornalismo online, bem como Brasil fez. Não há ainda,
porém, modelos a serem seguidos. Brasil (2002) faz uma analogia interessante para o caso:
As práticas do telejornalismo online se caracterizam hoje, segundo Brasil (2002), em
cumprir algumas funções experimentais:
Transmissões ao vivo via Internet (livewebcasting) para treinamento
de estudantes e jornalistas. Entrevistas e “entradas” ao vivo em telejornais.
Desenvolvimento de linguagens experimentais para o jornalismo de
TV.
Aplicação de princípios de “realidade virtual” e jogos de simulação
para jornalismo.
Videojornalismo. Produção de matérias jornalísticas em regime de
multitarefas.
Implantação de bases de dados digitais com arquivos de imagens
em movimento e acesso pela Internet.
Desenvolvimento de novas formas de jornalismo participativo e
interativo. ICQ (Instant Communication Query), Chats (forums), Blogs,
Videoblogs.
Produção de matérias para TV que incluam “storyboards”
(transcrições textuais das matérias para televisão referenciadas por
imagens estáticas na forma de videoframes ou quadros de vídeo.
Jornalismo internacional – treinamento específico para formação de
correspondentes estrangeiros com a utilização dos recursos de pesquisa da
rede.
Pesquisas de público em tempo real, “ao vivo” sobre temas
apresentados nos telejornais na Internet.
Experimentação e desenvolvimento de novas formas de
documentários específicos para o jornalismo de TV na Internet (IPTV).
(BRASIL, 2002, p. 7-8).
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A tendência da convergência desse formato, afirma-se com base em Jenkins (2011), é que a
internet pode ser a ferramenta de distribuição de todos os conteúdos, que está cada vez mais
procurando e sendo procurada por públicos específicos. (JENKINS, 2011).
Propostas brasileiras de um formato
Bibliografia escassa e dificuldades de pesquisa. Algo está submergindo, e o que se pretende
é compreender o que o mercado jornalístico do país desenvolve. Foram catalogados 346
vídeos nos websites dos jornalísticos TV Folha (da Folha de São Paulo, TV UOL (editoria
de notícias), G1, Jornal Nacional e Jornal da Record, de maneira que se pudesse
compreender de que maneira uma nova linguagem estaria sendo construída, e as
similaridades e distanciamentos entre os formatos online e “tradicional”. Eles foram
veiculados entre 17 e 21 de agosto de 2015. A ideia é a de que a prática desses sites pudesse
refletir o todo do mercado, bem como Santos (1988) defende em sua tese sobre o glocal,
associando esse princípio com um olhar qualitativo, que permite maior sensibilidade com o
que foi analisado. O método de análise de conteúdo de Bardin (2011) colaborou com o
andamento das análises, permitindo associar a bibliografia estudada com as características
que o material apresenta.
Dos quase 350 materiais coletados, 144 foram selecionados. A proposta era selecionar para
análise apenas cinco por dia de cada veículo, porém, a extrema semelhança entre conteúdos
de um mesmo veículo, como se representassem uma divisão de um mesmo assunto,
motivaram uma coleta superior a proposta – uma liberdade que a pesquisa qualitativa
oferece. Por mais que uma seleção existira, a análise de conteúdo de Bardin (2011) oferece
uma ferramenta que foi imprescindível para os resultados: na seleção, todos os 346 vídeos
coletados foram pré-analisados, e as impressões que os não-selecionados apresentaram
também colaboraram com as análises e os resultados, indicando e fortalecendo as
percepções sobre a linguagem em construção de um telejornalismo na internet.
Era esperado encontrar durante as análises uma reprodução dos modelos tradicionais, bem
como experiências anteriores no Brasil o fizeram. O portal Terra e o UOL, com seus
respectivos Jornal da Lilian e UOL News foram os pioneiros em um telejornalismo online.
Ambos eram produzidos de forma bem simples e seguindo o que se fazia em TV. Eles eram
uma CiberTV, que são como canais de TV que existem somente na internet. (AMARAL,
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2007). Porém, a ferramenta multimídia no espaço web vem possibilitando outras utilizações
para o vídeo, com narrativa diversa do telejornalismo “convencional”.
“Convencional” X Online: abordagens diferentes
Tornou-se evidente diferença de narrativa entre a televisão e a internet mesmo quando
tratam dos mesmos assuntos. Várias ocorrências na semana de análise indicam as
divergências entre os dois suportes.
Quando o grande fato do dia entre os veículos analisados era a votação da desoneração da
folha de pagamento (dia 18), o Jornal da Record produziu reportagem, com as
características apontadas de telejornalismo apontadas por Maciel¹, enquanto o G1 optou
pelos trechos de discursos de políticos com apoio textual.
Com os protestos, algo semelhante ocorreu (17). Enquanto nos dois telejornais a narrativa
reportagem deu voz aos personagens e contexto pontual ao evento (o que ocorreu de forma
bastante semelhante no Jornal da Record e Jornal Nacional), na internet foi possível
explorar nichos (como Folha e UOL fizeram quando se dispuseram a compreender quem é
que estava ali protestando através de vídeos com linguagem possivelmente documental)
sem se preocupar com o tempo. Este “fenômeno” ocorreu em dois protestos que ocorreram
na semana.
A diferença entre abordagens pode depender até mesmo pela velocidade do meio internet,
contra a instantaneidade de Paternostro (1999) – que defende que os fatos são veiculados
tão logo aconteçam, ou ao vivo – e o desfecho tardio de notícias. Num mesmo dia, o Jornal
Nacional nem tratou da discussão sobre a legalização da maconha para uso pessoal
(enquanto G1 e UOL publicaram trechos dos votos, cuja sessão se estendeu pela noite
daquele dia), e noticiou a votação da maioridade penal que, no momento da transmissão,
ainda não tinha acabado, com a participação de um repórter ao vivo. Como o Jornal da
Record é veiculado mais tarde, acabou por noticiar em nota (breve texto informativo), sem
imagens, pelos apresentadores o desfecho da votação. Nota-se grande diferença e uma
necessidade do fato completo para veiculação pelo “convencional”, até porque, juntos, G1 e
UOL publicaram onze minutos da discussão dos ministros do Supremo Tribunal Federal, e
os jornal de televisão pareceram não fazer questão da veiculação no mesmo dia.
Outro evento (dia 20) reforça que televisão e internet dão abordagem bem diferente sobre
um mesmo assunto no vídeo: enquanto o G1 deu espaço inclusive para os ritos cerimoniais
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¹ É o texto gravado pelo repórter sobre as imagens capturadas que serão usadas na reportagem. Serve de
suporte às imagens e deve estar em harmonia com esta (MACIEL, 1995).
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da visita de uma chefe de estado, o Jornal Nacional optou por uma nota de vinte segundos
para noticiar a visita, que e nem comentou sobre os acordos anunciados por Dilma Rousseff
nos vídeos que o G1 publicou.
Também neste dia, UOL e Record deram dois formatos a uma notícia. O IBGE divulgou as
taxas de desemprego referentes ao mês de julho. No Jornal da Record, narrativa de
reportagem tradicional do telejornalismo foi utilizada, enquanto o UOL preferiu divulgar a
entrevista com a pesquisadora do instituto (informações adicionais estavam no texto).
Numa outra ocorrência, no Jornal da Record o discurso da presidente durante o lançamento
de obras do Rio São Francisco deu origem a uma reportagem, enquanto o G1 disponibilizou
mais de sete minutos do discurso da chefe de estado mais a notícia em texto.
Essas diferenças notadas e na análise apontam possivelmente para uma exploração maior
dos temas, sem se preocupar com o tempo. Pode indicar também que a internet estaria
criando o seu próprio método de “contar história”, que unificasse as informações textuais
com as publicadas em vídeo.
Pluralidade de fontes de imagens e tempo maior
É interessante notar em todos os casos um tempo dedicado superior ao do telejornalismo. A
abordagem no vídeo também é diferenciada, e os jornalistas parecem não descartar algum
imagem por mais que ela seja tremida ou amadora, mas sempre aproveitadas na íntegra com
apoio textual.
Quanto ao tempo, fica a impressão de aproveitar que a transmissão não é pela televisão,
onde tempo é dinheiro, e oferecer aos usuários conteúdos mais longos. No período
analisado, G1 e UOL divulgaram muitas entrevistas coletivas na íntegra ou divididas em
vários vídeos, um tempo que seria impossível de ser dedicado na televisão quando se
recordam as características de superficialidade e envolvimento da narrativa com o que o
telespectador está habituado defendidas por Paternostro (1999). Esse conteúdo é
disponibilizado a quem, provavelmente, tem mais interesse no assunto e quer saber além do
que normalmente seria veiculado pela televisão. É evidente o uso pelo G1 e UOL de
imagens oriundas de agências de notícias, como a Reuters e a AFP. As imagens (geralmente
curtas) levam a marca dos sites brasileiros e recebem elementos textuais (que são inseridos
pelos jornalistas), todos sem o off¹. O G1 utiliza em larga escala essa possibilidade, com
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mais da metade desses conteúdos se considerado o total coletado. A TV Folha chegou a
postar uma reportagem na íntegra produzida pela agência internacional Association Press.
Outra possível tendência do vídeo nos portais de jornalismo na internet é evidenciada em
duas ocorrências. Algumas publicações tentam transmitir a sensação de transmissão em
fluxo para os usuários das páginas. Em uma sequência de mais de dez minutos da visita da
líder da Alemanha ao Brasil, coletada em 20/08, o rito de receber líderes de estado foi
postado pelo G1 na íntegra e é um exemplo desse possível fenômeno. G1 e UOL também se
preocupam, principalmente quando envolvem agentes políticos, publicar vídeos com
entrevistas ou declarações quase que imediatamente após a sua concretização na realidade.
Uso como bastidor
Boa parte das notícias publicadas são de temas relacionados à política. Naturalmente, o
senso comum nos lembra de que o ambiente político é de negociação nos bastidores. Essa
questão do bastidor também pode ser uma característica do uso da ferramenta multimídia
vídeo pelos portais jornalísticos da internet.
Em dia de importantes votações no Congresso Nacional, por exemplo, o G1 opta sempre
em publicar junto aos seus textos trechos com duração considerável de discurso da
presidente da República comentando as mudanças defendidas, e do presidente do Senado,
mais preso aos ritos processuais. Essas imagens são disponibilizadas aos usuários com uma
velocidade interessante se considerado o momento em que o fato ocorreu.
Outro tipo de imagem que pareceu descartada pelos telejornais e que transmite a ideia de
bastidor são as discussões de deputados durante as sessões. UOL e G1 publicaram naquela
semana, por exemplo, materiais em vídeo sobre a discussão da maioridade penal e sobre a
legalização do uso pessoal de maconha, enquanto no telejornalismo convencional o assunto
foi abordado maneira bem mais breve. Ocorreu, inclusive, de o UOL publicar (também
vinculado a um texto) a questão de ordem (que originou uma discussão, também divulgada)
de uma deputada contra o trâmite adotado por Eduardo Cunha.
Essa ideia de uso bastidor se evidencia também no G1. As imagens da chanceler alemã
Angela Merkel se aproximando do Palácio do Planalto se encaixam nesta possível
característica do uso do vídeo na internet. Nas imagens, a líder de Estado foi recebida pelos
cavaleiros e cumprimentou a presidente, e em seguida entoaram o hino nacional dos dois
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países. Um rito cerimonial que não foi transmitido em nenhum outro lugar (a não ser pela
TV oficial NBR, de onde o G1 capturou as imagens).
A foto em movimento: uso como apoio ao texto
Mais uma possível utilização do vídeo na internet. Alguns recortes desses materiais
audiovisuais não possuem qualquer estrutura telejornalística de reportagem, mas seus
conteúdos têm relação com o texto da página. Com a possibilidade de utilizar vídeos
amadores sem editá-los, o elemento vídeo parecia dar credibilidade às informações textuais.
Entrevistas e discursos são subdivididos em vídeos e publicados como apoio ao texto
“principal”, sendo cada um desses trechos publicados em diferentes notícias, que por sua
vez, tratavam de ganchos diferentes sobre o mesmo fato. Os discursos também davam a
sensação de complementar as informações da notícia. Mais uma vez, relembra-se da visita
da chanceler alemã, em que os vídeos da visita inseridos junto aos textos pareciam ter
função de complementar, até porque o simples rito cerimonial nada diz sobre o que
realmente ficou acordado entre os dois países.
Nesse sentido de complementar a notícia em texto, as agências de notícias têm grande
importância ao G1 e UOL, que são os que mais utilizaram essas imagens. São vídeos
curtos, alguns com até 30 segundos, e que podem não oferecer entendimento se assistidos
sem ler a matéria.
Tem-se a impressão de que o uso da ferramenta vídeo tem função semelhante ao da foto no
jornal impresso. Nos jornais, o leitor observa a fotografia até antes de ler o texto, para que
tenha certeza do acontecimento, dando ainda mais crédito ao fato. Não são fotos comuns
(bem como os vídeos), mas com as chamadas “partículas informativas”, fazendo da imagem
mais que uma ilustração, mas que também informa (BAURET, 2000).
Tal função como ferramenta é tão forte que o UOL, além de publicar vídeos com
repercussões do meio político, produziu até mesmo um vídeo que analisa as expressões
corporais de Cunha, Collor, Temer e Calheiros no chamado “jogo da política”.
O infográfico, apesar de não figurar na semana analisada nos telejornais Jornal Nacional e
Jornal da Record, já foi utilizado no passado pelos “convencionais”. A ferramenta
multimídia vídeo ganhou também esse uso, reforçando uma sensação de que o conteúdo
multimídia não é telejornalismo. Para complementar outro texto, um vídeo foi utilizado pela
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Folha de São Paulo como infográfico sobre o mapa da cidade de Rio de Janeiro em 1500 e
em 2015, quando tratava do avanço da urbanização sobre o mar.
Destaca-se aqui também outra finalidade do vídeo que foi e é utilizada (relembra o senso
comum) pelo Jornal Nacional: a charge. A TV Folha publicou duas charges durante a
semana, lembrando mais uma vez, todas vinculadas a algum texto. Ao mesmo tempo em
que essa possível característica se revela na internet, deve-se lembrar que já foi utilizada na
televisão, mas não deve por isso deixar de ser apontada.
Uso documental
Uma surpresa se levarmos em conta que, apesar das indicações do senso comum, esse uso
não deu nenhum indício de existência durante as leituras da bibliografia. Foi necessário
recorrer a Nichols (2005) para compreender a narrativa do vídeo-documentário e
estabelecer semelhanças com os conteúdos coletados e que pareciam ter essa estrutura.
Afirma o autor que vídeo-documentário é conhecido como um gênero cinematográfico
voltado para a representação do real, com o objetivo de transmitir a realidade aos seus
telespectadores através de imagens fiéis e testemunhais.
Os documentários de representação social são o que normalmente
chamamos de não-ficção. Esses filmes representam de forma tangível
aspectos de um mundo que já ocupamos e compartilhamos. Tornam
visível e audível de maneira distinta a matéria de que é feita a realidade
social, de acordo com a seleção e a organização realizadas pelo cineasta.
Expressam nossa compreensão sobre o que a realidade foi, é e o que
poderá vir a ser. (NICHOLS, 2005, p.26).
Folha e UOL, talvez até por funcionarem dentro do mesmo grupo, dão a mesma construção
nos materiais que suscitaram dúvida quanto ao uso documental do vídeo nos sites
jornalísticos. Os conteúdos, de forma geral, não possuem texto em off (narração), são
criativos na imagem, não se apegando às práticas comuns do telejornalismo, recorrem a
detalhes que precisam da experiência subjetiva do usuário (com seus depoimentos
construindo toda a história), não tem preocupação linear mas não deixam de perder seu
objetivo e se baseiam em grande parte nas experiências dos entrevistados. Dessa forma,
com base em Nichols (2005), observa-se que a produção destes dois veículos tem essência
documental e transitam entre dois modelos: o performático e o poético.
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No performático, afirma Nichols (2005), o documentário estimula a sensibilidade,
utilizando uma linguagem afetiva; "Bota o dedo na ferida" ao tratar de assuntos polêmicos;
promove uma afinidade subjetiva entre o público; utiliza combinações livres do real e
imaginário; usa técnicas expressivas (números musicais); utiliza técnicas de oratória para
tratar de questões sociais; não usam a "voz de Deus"; técnicas cinematográficas livres; deve
ser subjetivo; e é concreto e material, baseado nas especificidades da experiência pessoal,
na tradição da poesia, da literatura e da retórica. Há tentativa de demonstrar como o
conhecimento material propicia uma compreensão dos processos gerais na sociedade.
O poético tem uma despreocupação com a linearidade e com a localização de espaço e
tempo, valorização do ânimo do narrador, a influência desse sobre os argumentos que criam
a narrativa. Tomadas históricas, fotogramas congelados, câmera lenta, legendas ocasionais
para identificar tempo e lugar, vozes que recitam passagens de diários e a música
obsedante, constroem o tom e o estado de espírito desses materiais. (NICHOLS, 2005).
Com linguagem diferenciada, próximo dessas duas categorias de Nichols, Folha e UOL
produziram, por exemplo, material que tentou compreender quem eram os cidadãos que
participavam do protesto de agosto de 2015, o que os levou a estarem ali e suas opiniões
diante da condução do governo federal. Um conteúdo bem trabalhado e que chama a
atenção pelas suas imagens, edição e narrativas próprias que não se preocupavam com o
tempo.
Procurando “botar o dedo na ferida”, como diria Nichols (2005), a Folha apresentou outro
produto bem elaborado, que é o caso de um documento sobre os moradores da vila Soma,
em Sumaré/SP. A impressão que fica é que a Folha (que não publica muitos materiais em
vídeo) tem preferência pelo documental, não utilizando a o vídeo meramente como foto de
jornal (possível tendência identificada na análise anterior).
O destaque da semana analisada e que reforça a tese de uso documental da ferramenta vídeo
nos sites jornalísticos da internet, e que afasta ainda mais a possibilidade de semelhança
com gêneros do telejornalismo, foram os cinquenta minutos distribuídos em onze vídeos
sobre a organização da cidade do Rio de Janeiro para as olimpíadas. Se reunidos, eles
trariam em um único vídeo diversos ganchos sobre o assunto, com linguagem de
documentário. Em dois desses materiais publicados, observa-se novamente o uso da
ferramenta multimídia vídeo como infográfico, dando apoio aos outros vídeos publicados.
O último evento em que tal tendência foi notada ocorreu no último dia, quando UOL e
Folha de SP produziram pequenos vídeos com linguagem documental sobre a participação
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¹ É o modelo proposto pelo autor: Cabeça (apresentação da notícia), off, boletim (aparição do repórter para
complementar uma informação que pode não ter imagem), sonora (entrevistas) e pé (texto curto narrado pelo
apresentador para complementar ou adicionar uma informação), que é opcional.
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de camadas da sociedade nos protestos pró-governo Dilma, que ocorreram durante aquela
semana. Esses documentários (apesar de alguns também terem vínculo com notícias em
texto publicadas) podem “existir sozinhos” na rede sem perder o sentido. A impressão que
fica é que essa tendência vai aumentar e será predominante na rede nos próximos anos.
Considerações de um novo modelo
Não concluir, mas considerar, buscando evitar a sensação de verdade inquestionável –
inimiga de qualquer pesquisa. Uma delas é a característica do telejornalismo defendida na
fundamentação teórica por Paternostro (1999), que fala sobre o tempo. A tendência no
“convencional” é ser breve no texto, com a superficialidade quebrada com o uso da
imagem. Ao menos naquilo que foi analisado, o material não é breve, como defende a
autora, mas depende na maioria das vezes de um texto para ter sentido.
Essa ausência de sentido pode ser associada à quebra do modelo estrutural de reportagens
de Maciel¹ (1995). Existe a possibilidade da audiência de conteúdo telejornalístico estar
habituada à forma de se contar uma história, que são as características discutidas pelo autor.
Nesse sentido, existe uma desconstrução do modelo, partindo para algo indefinido.
Acredita-se numa desconstrução, pois a prática do recurso vídeo é por essência do
telejornalismo e, apesar de não ser idênticas, algumas características dos materiais da
internet ainda são semelhantes às do telejornalismo, oferecendo essa sensação de
desconstrução e transição para outro formato
Interessante notar que o mesmo UOL que há alguns anos produzia o seu UOL News, numa
época em que Brasil (2002) afirma ser uma mera reprodução daquilo que se praticava no
telejornalismo convencional, “abandonou o barco” e optou por conteúdos menos
elaborados, se assim podemos chamar, com função figurativa do conteúdo texto, que parece
ser o de prioridade para o portal. A exceção fica para os conteúdos com aparência
documental (ou seja, restou evidenciada a desconstrução do telejornalismo para outros
caminhos).
Quando Machado (2001) defendia a reportagem como a forma mais completa de se contar
uma notícia, certamente ele fazia uma observação à época. Existem algumas características
do telejornalismo convencional nos materiais audiovisuais da internet sim, porém, mais
parece ser um conjunto de características subaproveitadas que estão longe da ideia de
narrativa e linguagem telejornalística apontada nos autores presentes na fundamentação
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deste trabalho. O que ainda parece estar ocorrendo é um processo de convergência no
jornalismo produzido para a internet.
Para Jenkins (2009), a convergência é contínua e ocorre em todas as áreas. Por ser uma
época conturbada, o fenômeno ocorre igualmente na prática audiovisual do jornalismo na
rede. Constata-se com base no autor o comportamento migratório dos usuários com base no
grande número de materiais publicados pelos portais se comparado aos telejornais. Esse
público recebe hoje um conteúdo diferenciado da televisão. Se o jornal convergiu ao rádio,
que por sua vez convergiu para a televisão, este último transita para a internet, sendo
possivelmente acompanhado pelo público.
Nesse momento, Jenkins (2009) trata também da cooperação entre múltiplos mercados.
Essa ideia do autor restou evidente do G1, que utiliza imagens da Globo nos textos, mas
transmite pela emissora o breve noticiário G1 em 1 minuto – ou seja, interação entre dois
suportes. Passa por óbvia também esta cooperação na Folha de SP, que é um jornal
impresso por essência, mas que mantém conteúdos em outros mercados-suportes.
Ainda dentro desse fenômeno, observou-se outra tendência apontada por Jenkins (2011), de
que vídeos capturados das mãos de amadores, mesmo sem qualidade técnica, bastariam
para a exposição de fatos íntimos ou que não teriam a presença da imprensa. Foi a partir das
análises que se encontrou a utilização desses vídeos amadores em Folha, G1 e UOL. O
instantâneo nas mãos da população está se integrando à instantaneidade da rede. Talvez seja
esta mais uma profecia de Jenkins que está se cumprindo.
As características de Palacios são parcialmente utilizadas quando analisados apenas os
materiais audiovisuais, o que revela que o meio web não está sendo totalmente explorado
por este nicho do jornalismo. Interessante notar que os telejornais de televisão, que tem por
essência sua transmissão em fluxo, conseguem também utilizar as potencialidades da rede
(principalmente a característica memória).
A hipótese de que existiria uma repetição do modelo convencional foi quebrada. Ainda na
fase exploratória proposta pela análise de conteúdo, a sensação era de que o que os portais
publicavam não era telejornalismo e que a pesquisa tinha perdido o seu objeto. Na
realidade, prosseguir com o estudo foi fundamental para identificar a já apontada
desconstrução do modelo. Semelhanças, sim... diferenças, também. Mas a essência do
telejornalismo defendida pelos autores em bibliografia não parecia estar presente quando os
materiais eram assistidos. E dessa forma é que se chegou ao momento de tentar
compreender como a ferramenta vídeo, alma do telejornalismo, partiu para a internet. O que
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ocorre, na realidade, é a tendência documental e de bastidor. Ousa-se considerar um uso
figurativo do vídeo pelos portais.
Quando Brasil (2002) disse que o modelo estava sendo construído, parece que a obra foi
abandonada e outras utilizações para o vídeo estão sendo feitas. É dessa forma que se
considera neste espaço, por fim, que não existe nos espaços pesquisados um telejornalismo
para o online. Pode ser que no futuro tenha outro nome, mas chamar de telejornalismo
implicaria em ousadia excessiva do pesquisador.
Porque este caminho foi escolhido pelo mercado? Porque abandonar o telejornalismo? Este
que parece surgir é um modelo turbulento e de adaptação como a convergência que ainda
vivemos? Estas são perguntas que futuros estudos podem responder.
Referências
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