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A presente obra abordará brevemente sobre o Juizado Especial Criminal, mas precisamente ao instituto despenalizador da Transação Penal e seus aspectos relevantes. Constando ainda, as diferença deste nobre instituto com o instituto da suspensão condicional do processo.
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KELEE CRISTINA PINESSO
JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL: TRANSAÇÃO PENAL – ASPECTOS RELEVANTES
1° edição
CAMPO GRANDE-MS2013
Dedico esta minha conquista, aos meus pais:A quem devo a vida e minha formação moral. Meu reconhecimento e gratidão pela paciência, compreensão e apoio constante nesta jornada da vida. A vocês que souberam me acolher quando a tarefa se mostrou árdua, impulsionando-me a superar obstáculos, comemorando com o mesmo entusiasmo cada uma de minhas tentativas e a cada conquista. Sem esse apoio seria muito difícil realizar tão árdua tarefa. Ofereço a vocês a minha vitória.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por ter me dado saúde e força para
proporcionar-me a conclusão de mais uma etapa da vida que se consuma neste
trabalho.
Aos meus pais que com muito carinho e apoio, não mediram esforços
para que eu chegasse até esta etapa de minha vida. A vocês, exemplo de vida e
força, agradeço a possibilidade de realização de um grande sonho.
O Direito não é pura teoria, mas uma forma de vida. Por isso a justiça sustenta numa das mãos a balança em que pesa o Direito e na outra a espada de que se serve para defendê-lo. A espada sem a balança é a força bruta; a balança sem a espada é a impotência do Direito. Uma não pode avançar sobre a outra, nem haverá ordem jurídica perfeita sem que a energia com que a Justiça aplica à espada seja igual à habilidade com que maneja a balança. O Direito é um trabalho incessante, não somente dos poderes públicos, mas, ainda, de uma nação inteira. (Rudolf Von Ihering)
RESUMO
A presente obra consiste na explanação da Lei n.º 9099, de 26 de setembro de 1995 - Juizado Especial Criminal, mais especificamente sobre a transação penal e seus aspectos relevantes. O que gerou interesse pelo assunto foi o fato de a transação penal ser um dos temas mais relevantes da atualidade, já que visa descongestionar a máquina do judiciário, buscando a economia processual e redução do tempo entre a prática da infração penal e a decisão judicial, de modo a dar uma resposta mais rápida à sociedade, pois é célere e informal. Desse modo, pode-se dizer que se trata de uma solução consensual, a fim de que não haja prosseguimento do processo criminal em relação a crimes de menor potencial ofensivo. A lei em questão consegue resolver muitas lides como simplicidade, informalidade e celeridade, sendo que ainda possibilita que a Justiça resolva um problema antigo, qual seja, o acúmulo de processos nos cartórios.Essa monografia foi e continuará sendo de grande valia para minha vida profissional.
Palavras-Chave: Juizado Criminal. Transação. Celeridade. Direito Penal
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................13
2. HISTÓRICO DA LEI Nº 9.099/95 .....................................15
3. INFRAÇÕES PENAIS DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO ...........................................................................183.1 CONEXÃO OU CONTINÊNCIA DA INFLAÇÃO DE MENOR
POTENCIAL OFENSIVO COM CRIME DE COMPETÊNCIA DO
JUÍZO COMUM ..................................................................................20
3.2 CONCURSO MATERIAL, FORMAL OU CONTINUADO .............21
3.3 DESCLASSIFICAÇÃO DE CRIME DA COMPETÊNCIA DO
TRIBUNAL DO JÚRI PARA CRIME DE MENOR POTENCIAL
OFENSIVO .........................................................................................23
3.4 CRIMES PRATICADOS CONTRA IDOSOS ................................23
3.5 CRIMES ELEITORAIS .................................................................24
3.6 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ...........................................................25
4. PRINCÍPIOS INFORMATIVOS ........................................27
5. DA FASE PRELIMINAR ..................................................35
5.1 DESNECESSIDADE DE INQUÉRITO POLICIAL.........................35
5.2 PRISÃO EM FLAGRANTE............................................................36
5.3 DESIGNAÇÃO DA AUDIÊNCIA PRELIMINAR ............................37
5.4 AUDIÊNCIA PRELIMINAR............................................................37
5.5 FASES DA AUDIÊNCIA PRELIMINAR.........................................38
6. COMPOSIÇÃO DE DANOS CIVIS ..................................40
6.1 FUNÇÃO DO CONCILIADOR ......................................................40
6.2 REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO ..........................................41
6.3 INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ..............................41
6.4 EXTENSÃO DA REPARAÇÃO DOS DANOS...............................41
6.5 CARACTERÍSTICAS DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DA
COMPOSIÇÃO CIVIL.........................................................................42
6.6 EFEITOS NA ÁREA PENAL DA COMPOSIÇÃO CIVIL
HOMOLOGADA POR SENTENÇA ....................................................42
6.7 REPRESENTAÇÃO VERBAL......................................................43
6.7.1 Momento para seu oferecimento................................................43
6.7.1.1 Ofendido menor......................................................................44
7. TRANSAÇÃO PENAL......................................................457.1 HISTÓRIA DA TRANSAÇÃO PENAL...........................................46
7.1.1 Direito Comparado.....................................................................46
7.1.2 A transação penal no Sistema Penal Italiano.............................46
7.1.3 A transação penal no Sistema Penal Português .......................48
7.1.4 A transação penal no Sistema Penal Norte-americano.............49
7.1.5 A transação penal no Sistema Penal Alemão............................50
7.2 NATUREZA JURÍDICA DA TRANSAÇÃO PENAL.......................51
7.3 PRESSUPOSTOS DA TRANSAÇÃO PENAL .............................53
7.4 IMPEDIMENTO DA TRANSAÇÃO PENAL..................................55
7.5 REINCIDÊNCIA E A TRANSAÇÃO PENAL .................................56
7.6 PROCEDIMENTO DA TRANSAÇÃO PENAL ..............................56
7.6.1 Da Proposta Inicial ....................................................................57
7.6.2 Da aceitação .............................................................................58
7.6.3 Da Homologação ......................................................................60
7.7 DA INEXISTÊNCIA DA TRANSAÇÃO PENAL ............................63
7.8 IMPOSSIBILIDADE DA TRANSAÇÃO PENAL EX OFFICIO ......63
7.9 NATUREZA JURÍDICA DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DA
TRANSAÇÃO PENAL........................................................................65
7.9.1 Requisitos da sentença homologatória .....................................66
7.9.2 Efeitos da sentença homologatória...........................................67
7.10 A TRANSAÇÃO PENAL E A AÇÃO PENAL DE INICIATIVA
PRIVADA ...........................................................................................67
7.11 ATUAÇÃO DOS CONCILIADORES E DOS JUÍZES LEIGOS . .68
7.12 A TRANSAÇÃO PENAL E O PERDÃO JUDICIAL ....................68
7.13 PRESSUPOSTOS DA TRANSAÇÃO PENAL E A COISA
JULGADA...........................................................................................69
7.14 TRANSAÇÃO PENAL E ASSISTENTE DA ACUSAÇÃO...........69
7.15 TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO .......................................................................................70
7.16 TRANSAÇÃO PENAL E RETROATIVIDADE.............................71
7.17 CONSEQUÊNCIA AO DESCUMPRIMENTO DA TRANSAÇÃO
PENAL PELO AUTOR DO FATO......................................................72
8. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO .................................748.1 OFERECIMENTO DA DENÚNCIA ...............................................74
8.2 ARQUIVAMENTO DO TERMO CIRCUSTANCIADO DE
OCORRÊNCIA ...................................................................................75
8.3 TRANSAÇÃO PENAL...................................................................76
8.4 DILIGÊNCIAS IMPRESCINDÍVEIS .............................................76
8.5 COMPLEXIDADE DOS FATOS...................................................77
8.6 REJEIÇÃO DA REMESSA DO TCO AO JUÍZO COMUM ...........78
8.7 CARACTERÍSTICA DA DENÚNCIA ORAL .................................79
8.8 REQUISITOS DA DENÚNCIA ORAL ...........................................79
8.8.1 Exposição do fato criminoso com suas circunstâncias .............80
8.8.2 Qualificação do autor do fato....................................................80
8.8.3 Classificação do crime ..............................................................81
8.8.4 Testemunha: rol e números máximos ......................................82
8.8.5 Materialidade da infração penal................................................82
8.9 CITAÇÃO DO ACUSADO ............................................................84
8.10 TESTEMUNHAS .......................................................................84
8.10.1 Condução coercitiva.................................................................85
8.11 CONCILIAÇÃO CIVIL E TRANSAÇÃO PENAL .........................85
8.11.1 Audiência ................................................................................85
8.11.1.1 Concentração da prova em audiência única e o princípio
constitucional da ampla defesa ..........................................................86
8.11.1.2 Redesignação de audiência .................................................87
8.12 EXCLUSÃO DAS PROVAS .......................................................87
8.13 RECEBIMENTO DA DENÚNCIA OU QUEIXA...........................88
8.14 INTERROGATÓRIO DO RÉU ....................................................89
8.15 DEBATES ORAIS ......................................................................89
8.16 RESUMOS DOS FATOS RELEVANTES ...................................89
8.17 A SENTENÇA ............................................................................90
9. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO .............91
9.1 NATUREZA JURÍDICA ................................................................91
9.2 PROPOSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ................................92
9.3 CABIMENTO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO........................................................................................92
9.4 ACEITAÇÃO DA PROPOSTA ......................................................97
9.5 DIFERENÇA ENTRE A TRANSAÇÃO PENAL E A SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO.......................................................97
9.6 DIFERENÇA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
COM O SURSIS..................................................................................97
9.7 EXTENÇÃO E APLICAÇÃO .........................................................98
9.8 COMPETÊNCIA.........................................................................998
9.9 CONCURSO DE CRIMES ...........................................................99
9.10 CÁLCULO DA PENA MÍNIMA ..................................................100
9.11 BENEFÍCIOS DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO .....................................................................................101
9.12 REQUISITOS DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO .....................................................................................102
9.13 REVEL .....................................................................................105
9.14 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA SUSPENSÃO EX
OFFICIO PELO PODER JUDICIÁRIO, SEM ACEITAÇÃO DO
ACUSADO .......................................................................................105
9.15 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA SUSPENSÃO EX
OFFICIO PELO PODER JUDICIÁRIO, SEM OFERECIMENTO DO
MINISTÉRIO PÚBLICO ...................................................................106
9.16 SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
SIMULTÂNEO ..................................................................................107
9.17 NÃO CABIMENTO DE HABEAS CORPUS PERANTE A
RECUSA FUNDAMENTADA DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM
OFERECER SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO ........107
9.18 CONCURSO DE AGENTES ....................................................108
9.19 MOMENTO DA PROPOSTA DE SUSPENSÃO CONDICIONAL
DO PROCESSO ..............................................................................108
9.20 HOMOLOGAÇÃO ....................................................................109
9.20.1 Pressupostos para homologação da suspensão ..................109
9.21 PERÍODO DA PROVA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO .....................................................................................110
9.22 CONDIÇÕES OBRIGATÓRIAS E FACULTATIVAS ................111
9.23 RÉU QUE NÃO CONCORDA COM AS CONDIÇÕES
OBRIGATÓRIAS E/OU FACULTATIVAS IMPOSTAS NA
SUSPENSÃO ...................................................................................111
9.24 PRESCRIÇÃO .........................................................................112
9.25 CAUSAS DE REVOGAÇÃO OBRIGATÓRIA DA SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO .....................................................112
9.26 INQUÉRITO POLICIAL ............................................................113
9.27 TRANSAÇÃO PENAL E REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO .....113
9.28 CAUSAS DE REVOGAÇÃO FACULTATIVA DA SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO......................................................113
9.29 CAUSA DE DESCONSIDERAÇÃO DA SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO .....................................................114
9.30 APLICABILIDADE DA REGRA DA SUSPENSÃO –
RETROATIVIDADE/IRRETROATIVIDADE .....................................114
9.31 IMPOSSIBILIDADE DA CONCESSÃO DE SURSIS AO
SENTENCIADO CUJA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO HAJA SIDO REVOGADA ............................................114
9.32 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO REGIME SEMI-
ABERTO AO SENTENCIADO CUJA SUSPENSÃO CONDICIONAL
DO PROCESSO HAJA SIDO REVOGADA .....................................115
9.33 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE ...............................................115
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................119
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................119
ANEXOS ............................................................................121
13
13
1. INTRODUÇÃO
A presente obra abordará brevemente sobre o Juizado Especial
Criminal, mas precisamente ao instituto despenalizador da Transação Penal e
seus aspectos relevantes. Constando ainda, as diferença deste nobre instituto
com o instituto da suspensão condicional do processo.
A Transação Penal, além de ser um instituto criado recentemente, não
possui antecedente algum no Direito Processual Penal Brasileiro.
A Carta Magna de 1988 determinou ao legislador a classificação das
infrações penais em pequeno, médio e grande potencial ofensivo,
necessariamente recomendando resposta proporcional à gravidade dos delitos.
Para dar cumprimento à referida norma Constitucional, antes de qualquer coisa,
era necessária a promulgação de uma lei federal.
Após a edição da lei federal, competiria aos Estados, no uso de sua
competência constitucional, não apenas criar os juizados especiais, mediante
regra de organização judiciária, como ainda suplementar a legislação federal por
intermédio de normas específicas de procedimento, que atendesse as suas
peculiaridades, e até mesmo de processo, se entendesse que a regra do art. 98, I,
haveria de ser conjugada com a do art. 24, X, da Carta Magna.
Com o advento da lei nº 9.099/95, que tinha como finalidade a
transformação da justiça criminal, até então regulamentada por regras
ultrapassadas, permitiu-se uma aplicação imediata da pena não-privativa de
liberdade ou de multa, já no início da ação penal e antes do oferecimento da
14
denúncia. Deste modo, pode-se dizer que, trata-se de uma solução consensual, a
fim de que não haja prosseguimento do processo criminal em relação a crimes de
menor potencial ofensivo.
No Brasil, tem-se também, outros modelos de justiça consensual, como
por exemplo, a justiça do trabalho, que veio a integrar a Carta Magna de 1946,
sempre com o objetivo de solucionar o conflito através da conciliação entre as
partes.
Outro importante regramento que trouxe a mediação e a solução das
demandas através da via de conciliação foi a lei nº 8.078/90.
José Frederico Marques apresentou um anteprojeto de Código de
Processo Penal, que veio a introduzir um acordo entre as partes para solucionar
os conflitos. Este acordo seria uma espécie de transação penal, realizada pelo
membro do Ministério Público, se a pena prevista para o crime cometido fosse de
multa, prisão simples ou detenção.
A Transação Penal é um dos temas mais relevantes da atualidade, já
que visa descongestionar a máquina do judiciário buscando a economia
processual e reduzir o tempo entre a prática da infração penal e a decisão judicial,
de modo a dar uma resposta mais rápida à sociedade, pois é célere e informal.
Tal instituto admite a proposta de aplicação imediata de pena não-privativa de
liberdade ou multa aos réus primários que tenham cometidos infrações de menor
gravidade, com condenação que não ultrapasse mais de dois anos.
Um dos pontos positivos da referida lei é que consegue resolver muitas
lides com simplicidade, informalidade e celeridade. O que anteriormente não era
possível.
15
2. HISTÓRICO DA LEI Nº 9.099/95
Antes mesmo da criação da própria Lei Federal, já eram aplicadas, na
prática, as regras referente ao Juizado Especial Criminal e alguns de seus
institutos. Pode-se citar, o SIMPÓSIO sobre os “Juizados Especiais de Pequenas
Causas Cíveis e Criminais”, realizado no ano de 1992 em Curitiba-PR, onde fora
aprovada a proposta de que até que se criassem os Juizados Especiais Criminais,
os juízes de direito realizariam a transação penal, conforme prevê o art.98, I, da
Carta Magna, na hipótese do réu admitir a culpa e de modo que haja a
concordância entre as partes na aplicação imediata de uma pena restritiva de
direito.
Segundo Nereu José Giacomolli:
No estado do Rio Grande do Sul, antes mesmo da criação da Lei dos Juizados Especiais Criminais, alguns magistrados gaúchos já aplicavam a transação penal, embora outro tenha sido o entendimento da Corte Superior. 1
Os Estados pioneiros na criação dos Juizados Especiais Criminais,
através de leis estaduais, foram Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Paraíba.
Posteriormente, foi decretada a inconstitucionalidade dessas leis estaduais pelo
Supremo Tribunal Federal.
Damásio E. de Jesus explica que:
Foram apresentados 06 (seis) projetos de Lei para a criação dos Juizados Especiais Criminais: o projeto de Lei nº. 1.480-A, pelo
1 GIACOMOLLI, Nereu José. Juizado Especial Criminal. Lei 9.099/95. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p.26.
16
Deputado Federal Michel Temer; o projeto de lei nº. 3.698/89, pelo Deputado Dederal Nelson Jobim, além dos projetos de lei nº.1.129/88, pelo Deputado Federal Jorge Arbage; o de nº. 1.708/89, pelo Deputado Federal Manoel Moreira; o de nº. 2.959/89, pelo Deputado Federal Daso Coimbra; e o de nº. 3.883/89, pelo Deputado Federal Gonzaga Patriota. Por fim, foram englobados os projetos de leis de autoria dos Deputados Federais Michel Temer e Nelson Jobim, que se transformaram no substitutivo que foi encaminhado para discussão e votação no Congresso Nacional, que resultou na lei nº. 9.099/952.
José Frederico Marques apresentou um anteprojeto de Código de
Processo Penal, que introduziu um acordo entre as partes, para solucionar os
conflitos. Este acordo seria uma espécie de transação penal, realizada pelo
membro do Ministério Público, se a pena prevista para o crime cometido fosse de
multa, prisão simples ou detenção.
O autor Antônio Roberto Sylla diz que:
O seu artigo 84 previa uma espécie de transação penal se o crime fosse apenado com multa, prisão simples ou detenção, sendo que nesses casos, o Ministério Público poderia propor ao acusado o pagamento de uma multa apenas, e as conseqüências penais seriam a extinção da punibilidade pela perempção, com a aceitação da pena de multa em substituição à pena de prisão simples ou detenção. 3
O segundo projeto a ser proposto foi o de nº 1.655/1, de 1983, que
previa a extinção do feito sem o julgamento do mérito, em caso de aceitação por
parte do acusado, em resposta formalizada, do pagamento da pena de multa, que
seria fixada pelo juiz.
A Carta Magna de 1988 trouxe em seu texto constitucional o Instituto da
Conciliação no Juízo Criminal, mas precisamente em seu artigo 98, inciso I.
Com o advento da Lei Federal nº 9.099/95, deu-se início a uma forte
tendência mundial no que se referia ao tratamento dos crimes de menor potencial
ofensivo, vindo a ser utilizada a chamada Justiça Penal Consensual para
resolução desses pequenos conflitos de ordem criminal, criando mais um sistema
próprio despenalizador chamado de transação penal.
Logo após a criação dessa Lei Federal, passou-se aos Estados a
competência, não apenas para a criação dos Juizados Especiais Criminais,
2 JESUS, Damásio E. de. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. São Paulo: Saraiva, 1996, p25.3 SYLLA, Roberto Antônio. Transação Penal Natureza Jurídica e Pressupostos. São Paulo: Método, 2003, p.55.
17
mediante regras de organização judiciária, mas também suplementar, a legislação
federal por intermédio de normas específicas de procedimento que atendessem
as suas peculiaridades.
A lei em tela foi criada com o objetivo de desafogar os cartórios,
diminuindo o acúmulo de processos. Tendo em vista sua finalidade, em virtude
dos princípios que regem a Lei do Juizado Especial Criminal, tais como, oralidade,
informalidade, economia processual e celeridade.
18
3. INFRAÇÕES PENAIS DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO
Com a entrada em vigor da lei nº 10.259/2001, que instituiu a figura dos
juizados especiais federais, deu-se nova aplicação ao art. 61 da lei nº 9.099/954.
Por esta razão, estão submetidos ao procedimento dos Juizados Especiais
Criminais, tanto da Justiça Comum Estadual quanto da Justiça Federal:
a. Todas as contravenções penais, qualquer que seja o procedimento
previsto;
b. Os crimes que a lei comine pena máxima abstrata igual ou inferior a
dois anos de reclusão ou detenção, qualquer que seja o procedimento previsto e
c. Os crimes a que a lei comine exclusivamente pena de multa,
qualquer que seja o procedimento previsto;
Anteriormente, eram consideradas infrações de menor potencial
ofensivos de acordo com o art. 61 da Lei nº 9099/95:
a.Todas as contravenções penais e
b.Os crimes que a lei cominasse pena máxima de um ano, desde que
não estivesse previsto nenhum procedimento especial.
Deste modo, com a entrada em vigor da lei nº 10.259/2001, surgiu as
seguintes alterações:
4 Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta lei, as contravenções penais e os crimes que a lei comine pena máxima não superior a 1 (um) ano, excetuados os casos em que a Lei preveja procedimento especial.
19
1º. Aumentou-se o máximo cominado da pena privativa de liberdade de
um ano para dois anos e
2º. A circunstância especial impeditiva do procedimento especial, não
existe mais, sendo estabelecida a todos os crimes (com pena máxima de dois
anos), não importando o procedimento previsto.
Embora a Lei nº 10.259/2001 se refira somente à Justiça Federal,
[...] na verdade acabou fixando uma nova definição, que alcança não apenas as infrações de competência dos Juizados Federal, mas também os Estaduais, provocando, por conseguinte, a derrogação do art.61 da Lei nº. 9.099/95. Com efeito, não é possível manter dois conceitos diversos dessa expressão, um para Justiça Estadual e outro para Justiça Federal. A uma, porque a legislação inferior não pode dar duas definições diferentes para o mesmo conceito previsto no art.98, I, d, do texto constitucional; a duas, porque o tratamento diferenciado importaria em ofensa ao princípio da proporcionalidade. “Ora, restringir a aplicação do novo artigo às infrações penais de competência da Justiça Federal Comum é inconcebível. Admitir tal situação levaria a absurdos jurídicos como, por exemplo, aplicar os benefícios da Lei nº. 9.099/95 a indivíduo que desacatasse policial federal, e veda-los quando o desacato fosse cometido contra policial militar. Isso porque, no primeiro caso, a competência para julgamento de eventual ação penal seria da Justiça Federal, por força do art.109, IV, da Constituição Federal, e no segundo, da Justiça Estadual.Como a infração prevista no art. 331 do Código Penal tem como pena máxima cominada a de dois anos de detenção, somente seria a infração considerada de menor potencial ofensivo perante o juízo federal, o que é, obviamente, um contra-senso permitir que o autor de um delito de competência da Justiça Federal tenha tratamento privilegiado pelo juízo. Dessa maneira, em qualquer Juizado Especial Criminal, seja no âmbito comum, seja no âmbito federal, os chamados crimes de menor potencial ofensivo passam a seguir a definição do art. 2º, parágrafo único, da nova lei.5
Pode-se perceber que, por força do art.2º, parágrafo único, da Lei nº
10.259/2001, que revogou o art. 61 da Lei nº 9.099/95, apenas ampliou a
competência do Juizado Especial Criminal em relação aos crimes de menor
potencial ofensivo (todos os crimes a que a lei comine pena privativa de liberdade
igual ou inferior a dois anos), não alterando, assim, o instituto da suspensão do
processo, mencionado no art.89 da mesma lei, haja vista que tal dispositivo
somente é aplicável aos crimes que a pena mínima cominada, seja igual ou
inferior a um ano.
O legislador através da Lei nº 11.313, de 28.06.2006, deu uma nova
5 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Volume 4: Legislação Penal Especial. São Paulo: Saraiva, 2006, p.542-543.
20
redação ao art.61 da Lei nº 9.099/95, considerando crimes de menor potencial
ofensivo “as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima
não superior a dois anos, cumulada ou não com multa”.6
3.1 CONEXÃO OU CONTINÊNCIA DA INFLAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO COM CRIME DE COMPETÊNCIA DO JUÍZO COMUM
Grande parte dos doutrinadores entende que, deve ocorrer a separação
dos processos, uma vez que a regra da continência e da conexão é de ordem
legal. Já a subordinação da infração de menor potencial ofensivo ao procedimento
sumaríssimo dos Juizados Especiais Criminais é norma de disposição
constitucional conforme menciona o art.98, I, da Carta Magna. 7 Assim, cada
infração deve seguir um curso diferente, operando-se a cisão entre os processos.8
Em sentido contrário, Damásio E. de Jesus:
Se o sujeito comete dois delitos, um da competência do Juizado Especial Criminal e outro da competência do juízo comum, este atrai o crime daquele. De modo que as duas infrações são processadas e
6 BRASIL. Lei nº 9099/1995. PLANALTO. Portal on line. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11313.htm . Acesso em: 28 de maio de 2007.7 Art.98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:I - Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para conciliação, o julgamento e execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos orais e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;[...]8 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: Em se tratando de pluralidade de crimes, cometidos na previsão do art. 70 do Código de Processo Penal, havendo, pois, pluralidade de ações, reunidas em instituto próprio para, literalmente, não ser confundido com o concurso formal e o crime continuado, o Código de Processo Penal, ao tratar das espécies de competência, realça quando ocorrer por ‘conexão’, em cujo âmbito se coloca a espécie ‘quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influi na prova de outra infração’. Se uma das infrações chama o Código de Processo Penal, cumpre distinguir. Princípios constitucionais não podem ser relegados em homenagem à lei ordinária. Se uma das infrações chama o Código de Processo Penal, seguir-se-á o respectivo procedimento. A outra será apreciada conforme lei especial; uma das finalidades é evitar a instrução, aproximando-se as partes. Encerrado na fase preliminar, resta prejudicado o procedimento sumaríssimo (Supremo Tribunal de Justiça. Súmula 6ªT.,REsp 110.655/SP, Rel. Min.Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 1º-7-1998, DJU,28-9-1998,p.121).
21
julgadas no Juízo Comum. Sem prejuízo da aplicação da suspensão condicional do processo, desde que presente suas condições (art.89 desta lei), e da eventual exigência de representação nos delitos de lesão corporal dolosa leve e lesão corporal culposa (art.88 e 91). Sem prejuízo, também, da separação do processo por conveniência da instrução criminal (art. 80 do CPP). [...] Contra, no sentido da separação dos delitos, um sendo julgado pela justiça comum e outro considerado em face da Lei n. 9.099/95 (posição majoritária na doutrina): Sidney Bloy DalabridaRevista, Conexão e continência na Lei n. 9.099/95, Revista Brasileira de ciência criminais, São Paulo, Revista dos Tribunais, abr./jun. 1998, 22:1049.
Assim, no concurso de crimes, sendo um de competência do JECRIM e
outro de competência da justiça comum, somam-se as penas máximas da pena
privativa de liberdade. Caso ultrapasse o lapso de dois anos, deverá ser
encaminhada a justiça comum.
3.2 CONCURSO MATERIAL, FORMAL OU CONTINUADO
A pluralidade de delitos pode resultar da prática de uma ou mais
condutas do agente, configurando o concurso formal e material. Quando o infrator
comete dois ou mais delitos da mesma espécie, mediante uma ou mais condutas,
estando os delitos unidos pela semelhança de determinadas circunstâncias de
tempo, lugar e maneira de execução, caracteriza-se o crime continuado.
Segundo Ada Grinover:
“No concurso material, previsto no artigo 69 do código penal, se a soma
das penas máximas de cada crime exceder a dois anos, não há espaço para o
juizado, segundo a jurisprudência dominante”. 10
Em relação a suspensão condicional do processo, o Supremo Tribunal
Federal e o Supremo Tribunal de Justiça têm decidido a respeito da utilização do
9 JESUS, Damásio E.de. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. 10 ed.rev.e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 61.10 GRINOVER, Ada Pellegrine, Juizado Especial Criminal. São Paulo: RT, 1997, p.380.
22
somatório mínimo do acréscimo da exasperação da majorante do concurso de
crimes à pena mínima do fato para verificação do cabimento do benefício.11
Dessa forma, é possível concluir que:
[...] para a transação penal o raciocínio jurídico seja semelhantes, mas no sentido de aplicar-se à pena máxima12 prevista em abstrato ao fato o acréscimo máximo das majorantes do concurso formal e do crime continuado para verificar se desse cálculo resulta pena inferior ou superior a dois anos. Sendo menor que dois anos, permanece a competência do Juizado Especial Criminal. Ao contrário, sendo o resultado da equação pena superior a dois anos, fica afastada a competência do Juizado, devendo o processo tramitar em Vara Criminal da Justiça Comum.
Quanto ao concurso material, do mesmo modo, deve-se fazer a soma das penas máximas cominadas em abstrato aos crimes em concurso e verificar se dessa equação o resultado é superior ou inferior a dois anos. A solução que apontamos é a mesma antes referida, ou seja, sendo inferior, fixa a competência do Juizado Especial Criminal e, sendo superior a dois anos, essa competência deve ser afastada. 13
Segundo Fernando Capez:
Considera-se isoladamente cada infração, remetendo-se as demais para o Juízo Comum, com cisão do processo, pois a competência dos Juizados Especiais é determinada pela Constituição Federal. Não é, contudo, a posição que prevalece na jurisprudência.14
Desse modo, deve ocorrer a separação dos processos. Assim, o crime
de menor potencial ofensivo será apreciado pelo JECRIM, enquanto o outro
encaminhado à justiça comum.
11 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 723: Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de 1/6 for superior a um ano.SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 243: O benefício da suspensão condicional do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de 01 ano.12 A incidência do acréscimo mínimo da majorante à pena mínima do crime para os casos de suspensão condicional do processo se deve ao fato de ela ser prevista para ser aplicada aos crimes de médio potencial ofensivo em que o benefício se dá pela análise da pena mínima prevista em abstrato ao crime. Quando à transação penal, ao contrário, a fixação da competência se dá pela pena máxima prevista em abstrato para o crime, para ver se há a adaptação ao conceito de crime de menor potencial ofensivo. Por esta razão, os acréscimos do concurso de crimes, nesse caso, incidem sob o cálculo da pena máxima prevista em abstrato para o crime.13 GLEBER, Daniel. Juizado Especial Criminal: Lei 9.099/95: Comentários e Críticas ao modelo consensual penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2006, p 127.14 CAPEZ, 2006, p.545-546
23
3.3 DESCLASSIFICAÇÃO DE CRIME DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI PARA CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO
Para Fernando Capez, “incidem os institutos despenalizadores (sursis
processual e transação penal), desde que preenchidos os requisitos legais.”15
Por exemplo, a desclassificação de um crime denunciado como
tentativa de homicídio (competência do tribunal de júri), o qual é desclassificado
para lesões corporais leves. Transitada em julgado, a decisão para o Ministério
Público, já que pode haver recurso por parte do parquet, devem os autos serem
remetidos ao Juizado Especial Criminal, devendo a vítima ser intimada para que
manifeste interesse pela representação, conciliação cível entre outros,
prosseguindo o fato com essa nova definição jurídica.
Não há razão ou necessidade de um processo por crime de menor
potencial ofensivo, mesmo que, por desclassificação, tramite fora do Juizado
Especial Criminal, que é o juiz natural para esses casos.
Pode acontecer que os juízes togados e leigos que atuam no Juizado
Especial Criminal, não concordem com a decisão de desclassificação e quando
receberem os autos do processo suscitem conflito negativo de competência.
Nesse caso, os autos do processo serão remetidos ao Tribunal de Justiça, que
decidirá sobre a competência para o processo e julgamento do processo.
3.4 CRIMES PRATICADOS CONTRA IDOSOS
O art. 94 da Lei nº 10.741/200316 (Estatuto do Idoso) determinou a
15 CAPEZ, 2006, p.547.16 Art.94. Aos crimes previstos nesta lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se o procedimento previsto na Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, e, subsidiariamente , no que couber, as disposições do código penal e do código de processo penal.
24
aplicação do procedimento da lei nº 9.099/95 em relação aos crimes previstos
neste mesmo artigo, cuja pena máxima não ultrapasse quatro anos.
Esse dispositivo apenas permite a aplicação do rito sumaríssimo, após
o recebimento da denúncia. Nos crimes referentes aos idosos, não ocorre a
aplicação da transação penal, já que tal texto não trouxe nova definição de
infração de menor potencial ofensivo. A intenção do mencionado artigo era
simplesmente conceder maior celeridade ao procedimento judicial, em fase da
peculiaridade da vítima idosa, e não de tornar menos gravoso tais delitos.
Entendimento contrário levaria a conclusão de que uma lei que surgiu
para ampliar a proteção ao idoso estaria abrandando, neste aspecto, a situação
dos agressores.
O posicionamento do nobre doutrinador Damásio E. de Jesus:
O art.61 da Lei. n. 9.099/95 disciplina a conceituação de crimes de menor potencial ofensivo para efeito da competência do Juizados Especiais Criminais. O art.94 do Estatuto do Idoso disciplina a espécie de procedimento aplicável ao processo e não as infrações de menor potencial ofensivo. Temos, pois, disposições sobre temas diversos, cada uma impondo regras sobre institutos diferentes, sendo incabível a invocação do princípio da proporcionalidade. 17
Dessa forma, tem-se como inconstitucional o artigo 94, da Lei nº
10.741/2003 (Estatuto do Idoso), porquanto destoa da intenção do legislador
constitucional ao estabelecer regras sobre o Juizado Especial Criminal, que são
perfeitamente delineadas pela Lei nº 9.099/95 e Lei nº 10.259/01.
3.5 CRIMES ELEITORAIS
O Tribunal Superior Eleitoral já decidiu no sentido de que as:
[...] infrações penais definidas no Código Eleitoral obedecem ao disposto nos art. 355 e seguintes, e o seu processo é especial, não
17 JESUS, 2007, p.14.
25
podendo, via de consequência, ser da competência dos Juizados Especiais a sua apuração e julgamento [...] 18
Entretanto, o mesmo Tribunal admite incidência dos institutos da
Transação Penal e do Sursis processual,
[...] salvo para os crimes que contam com um sistema punitivo especial, entre aqueles a cuja pena privativa de liberdade se acumula a cassação do regime se o responsável for candidato, a exemplo tipificado no art.334 do Código Eleitoral.19
Em relação aos crimes eleitorais de menor potencial ofensivo existe,
ainda, grande divergência mesmo no âmbito da própria Justiça Eleitoral. A
despeito disso, importante consignar que, na prática, é aplicada a Lei dos
Juizados Especiais Criminais, vez que atende, perfeitamente, a intenção do
legislador.
3.6 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Antes da criação da Lei nº 11.340/06, os casos de violência doméstica
eram os principais vetores do Juizado Especial Criminal, os crimes de maus-
tratos, ameaças e de lesão corporal leve, os quais são considerados crimes de
menor potencial ofensivo, são os de maior incidência nos lares brasileiros e, por
consequência, eram os de mais elevada reiteração no dia-a-dia dos Juizados
Especiais Criminais. Para Damásio:
A lei n. 11.340, de 7-8-2006, criou mecanismos para combater a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do art. 226, §8º, da CF. Seu art.41 dispõe que: “Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n.9.099, de 26 de setembro de 1995”. Por violência doméstica e familiar contra a mulher entende-se: “...qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agredidas; II – no âmbito da família, compreendida
18 CAPEZ, 2006, p.547.19 Ibdem, p.547.
26
como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual” (art.5º da Lei n. 11.340/2006).20
É certo que a questão é, atualmente, objeto de sérias discussões,
mormente quanto à aplicação ou não dos institutos despenalizadores previstos no
artigo 41, da novel legislação, cuja redação é, por alguns, dita como
inconstitucional.
4. PRINCÍPIOS INFORMATIVOS
20 JESUS, 2007, p.15.
27
O legislador rompeu moderadamente os velhos sistemas processuais
em busca da conciliação ou da transação penal, tendo em vista a natureza da
infração penal, de modo que não haveria necessidade da aplicação dos
procedimentos morosos com seus extensos arcos processuais em infrações
penais de menor potencial ofensivo.
Assim, o legislador atenuou aos princípios da legalidade e da
indisponibilidade da ação penal pública, autorizando o titular da ação penal, o
Ministério Público, a transacionar com o autor do fato sobre a aplicação da pena
e, simultaneamente, a solucionar o problema da indenização do dano ex delicto,
resolvendo a um só tempo e longe da morosidade penal e da ação civil, a
satisfação das pretensões punitivas e de ressarcimento.
Dessa forma, de acordo com o art. 62 da lei nº 9.099/9521, os princípios
que norteiam o Juizado Especial Criminal são a oralidade, informalidade, economia
processual e celeridade, além dos princípios gerais da ação penal, que serão
abordados adiante.
Ainda, têm-se como seus principais objetivos a reparação dos danos
sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade.
Relativamente aos princípios informativos, no âmbito do juizado especial
criminal, pode-se citar:
a. Princípio da oralidade: a forma escrita que predomina nos
procedimentos criminais cedeu lugar à oralidade, ou seja, os atos realizados no
juizado, preferencialmente, serão na forma oral. Reduzem-se, a termo, apenas os
atos considerados essenciais, a teor do §3º do art. 65. Assim, há um predomínio da
forma falada sobre a escrita, sem que esta, entretanto, fique excluída. É o que
ocorre, por exemplo, na elaboração dos termos circunstanciados, nas tentativas de
conciliação e transação, depoimentos, entre outros.
b. Princípio da informalidade: o processo no Juizado Especial Criminal
deve ser despido de formalidades, isto significa dizer que, fica afastada a rigidez
21 Art.62 - O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena privativa de liberdade.
28
formal dos atos praticados perante o juizado. Assim, muitos atos devem ser
praticados com simplicidade e com intenção de conseguir os resultados desejados. É
o que ocorre, por exemplo, quando a lei estabelece que os atos não serão
considerados nulos se atingirem as finalidades para os quais foram realizados, como
prevê o art.65. Se, porventura, houver prisão em flagrante, não se formará o auto de
prisão em flagrante. De outra banda, é dispensado o relatório de sentença (art.81,
§3º) e que, se a sentença for confirmada pelos seus próprios fundamentos, a súmula
da julgamento servirá de acordão. (art. 81, §5)
c. Princípio da economia processual: visa dar fim à lide de forma
econômica, ou seja, a aplicação deste principio convém obter o máximo de resultado
na atuação a lei com o mínimo emprego possível de atividade jurisdicional.
d. Princípio da celeridade: que “busca reduzir o tempo entre a prática da
infração penal e a decisão judicial, para dar uma resposta mais rápida a
sociedade.”22
Encontram-se também presentes, no Juizado Especial, outros princípios
que tradicionalmente regulam o Direito Penal e Processo Penal, tais como: o
contraditório e ampla defesa, estado de inocência, devido processo legal, imediata
aplicação da nova lei processual, vedação das provas ilícitas, entre outros.
Dentre os princípios gerais, que também devem ser observados, ao lado
dos princípios específicos dos Juizados Especiais, pode-se citar:
a. Princípio da Verdade Real: O processo Penal busca descobrir
efetivamente como ocorreram os fatos, de modo que, não se admite ficção e
presunções processuais. Ainda que o réu seja revel, será necessário que a acusação
faça prova cabal do fato imputado para que haja a mencionada condenação.
Por esse princípio, pode o juiz determinar de ofício a produção de provas,
que entenda necessária para esclarecer as dúvidas sobre determinado ponto. Sobre
isso, Gonçalves esclarece:
O princípio da verdade real, que constitui regra nas ações penais em geral, é mitigado nos juizados pela possibilidade de transação nas infrações de
22 GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Juizado Especial Criminal – doutrina e jurisprudência atualizadas. 3 ed. rev.e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p.6.
29
menor potencial ofensivo de ação pública. Isso porque a transação obsta o início da ação penal, de forma que a responsabilidade pelo delito não chega a ser apurada. 23
b. Princípio do Contraditório: Estabelecido no art. 5º da Carta Magna24,
assegurando às partes o direito de serem ouvidas e a oportunidade de se
manifestarem em igualdade de condições, tendo ciência bilateral dos atos
processuais, bem como a oportunidade para produzir provas em sentido contrário.
A Constituição Federal ainda acentuou em seu art. 5º, LIV - “Ninguém será
privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Sobre tal
princípio, Tourinho Filho diz:
Tal princípio consubstancia-se na velha parêmia audiatur et altera pars – a parte contrária deve ser ouvida. Assim, a defesa não pode sofrer restrições, mesmo porque o princípio supõe completa igualdade entre acusação e defesa. Ambas estão situadas no mesmo plano, em igualdade de condições, e, acima delas, o órgão jurisdicional, como órgão ‘superpartes’, para, depois de ouvir as alegações das partes e de apreciar as provas, ‘dar a cada um o que é seu’. 25
Aliás, em todo processo de tipo acusatório, vigora esse princípio, onde o
acusado, isto é, a pessoa em relação a quem se propõem a ação penal, goza do
direito primário e absoluto da defesa. O réu deve conhecer a acusação que se lhe
imputa para poder contrariá-la, evitando-se assim ser condenado sem ser ouvido.
Tourinho Filho esclarece:
Já em se tratando de inquérito policial, não nos parece que a constituição
se tenha referido a ele, mesmo porque, de acordo com o nosso ordenamento, nenhuma pena pode ser imposta ao indiciado. Ademais o texto da Lei Maior fala em litigantes, e na fase da investigação preparatória não há litigantes[...] É verdade que o indiciado pode ser privado da sua liberdade nos casos de flagrantes, prisão temporária ou preventiva. Mas para esses casos sempre se admitiu o emprego do remédio heróico habeas corpus. Nesse sentido, e apenas nesse sentido, é que se pode dizer que a ampla defesa abrange o indiciado. O que não se concebe é a permissão do contraditório naquela fase informativa que antecede à instauração do processo criminal, pois não há ali nenhuma acusação. Não havendo, não se pode invocar o princípio do par conditio – igualdade de armas. Todos sabemos que não se admite decreto condenatório respaldado, exclusivamente, nas provas apuradas nas etapas pré-processual. A autoridade policial não acusa; investiga. E investigação condenatória é não-senso. Se assim é, parece-nos não ter sentido estender o instituto do contraditório ao inquérito, em que não há acusação. Quanto a ampla
23 GONÇALVES, 2007, p.8.24 Art. 5º [...] LV - Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;25 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Volume I. 27 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p.46 – 47.
30
defesa, tem o indiciado direito ao habeas corpus sempre que sofrer ou achar ameaçado de sofrer violência ou coação na sua liberdade de locomoção.26
Em razão deste princípio, não é permitido a condenação do réu
exclusivamente com base nas provas produzidas durante o inquérito, sendo que
nesta fase não vigora o mencionado princípio.
c. Princípio da Ampla Defesa: Previsto no art. 5º, LV, da Lei Maior, que
estabelece que sejam assegurados todos os meios lícitos de defesa aos acusados
em processo penal.
Está incluído no princípio da Ampla Defesa, o direito a mais completa
defesa, podendo ser tanto processual (autodefesa) como técnica (efetuada por
defensor). O mencionado princípio também decorre da obrigatoriedade de se
observar à ordem natural do processo, de modo que a defesa se manifeste sempre
por último.
Assim, o Ministério Público sempre se manifestará depois da defesa, e
obriga, sempre que, seja aberta vista dos autos à defensoria do acusado, para que
possa exercer seu direito de defesa na amplitude que a lei consagra.
d. Princípio do Devido Processo Legal: Estando mencionado no art. 5º,
LIV27, que afirma que ninguém será privado de sua liberdade sem o devido processo
legal. Assim no instante em que o ilícito penal é cometido, já deve haver uma lei que
regulamente o procedimento para a sua devida apuração. Além disso, por se tratar
de matéria de ordem pública, não podem as partes optarem por procedimentos
diversos daqueles estabelecidos em lei. No âmbito processual, Capez afirma que:
[...] garante-se ao acusado a plenitude de defesa, compreendendo o direito de ser ouvido, ser informado pessoalmente de todos os atos processuais, ter acesso a defesa técnica, ter a oportunidade de se manifestar sempre depois da acusação e em todas as oportunidades, à publicação e movimentação das decisões, ressalvadas as decisões legais, de ser julgado perante o juízo competente, ao duplo grau de jurisdição, à revisão criminal e à imutabilidade das decisões favoráveis transitadas em julgado. Deve ser obedecido não apenas em processos judiciais, civis e criminais, mas também em procedimentos administrativos, inclusive militares, e até nos procedimentos administrativos do estatuto da criança e do adolescente. 28
26 TOURINHO FILHO, 2005, p.49 – 50.27 Art.5º [...] - LIV- Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.28 CAPEZ, 2006, p. 32 - 33.
31
Assim de acordo com o principio constitucional do devido processo legal, o
acusado tem a plenitude do direito à defesa, devendo ser ouvido e ter ciência de
todos os atos processuais realizados.
e. Princípio da presunção da Inocência: Nos termos do art. 5º, LVII, da
mencionada Carta Magna 29, este princípio se desdobra em 3 aspectos:
a) da instrução processual, como presunção legal relativa de não-culpabilidade, invertendo-se o ônus da prova;
b) da avaliação da prova, valorizando-a em favor do acusado quando houver dúvida;
c) no curso do processo penal, como paradigma do tratamento do imputado, especialmente no que concerne à análise da necessidade da prisão. 30
Desta forma, tem-se que ninguém poderá ser considerado culpado até o
transito em julgado da sentença penal condenatória. Trata-se de um dos mais
comezinhos princípios do processo penal.
f. Inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos: Fica estabelecido
no art. 5º, LVI, da Constituição Federal que: “são inadmissíveis, no processo, as
provas obtidas por meios ilícitos”.
A vedação das provas ilícitas atua no controle da regularidade da atividade
estatal persecutória, inibindo e desestimulando a adoção de práticas probatórias
por parte de quem é o responsável pela sua produção.
A norma assecuratória da inadmissibilidade das provas obtidas com
violação de direito, com efeito, presta-se a um só tempo, a tutelar direitos e garantias
individuais, bem como a própria qualidade do material probatório a ser introduzido e
valorado no processo.
Em relação aos direitos individuais, a vedação das provas ilícitas tem por
destinatário imediato a proteção dos direitos à intimidade, à privacidade, à imagem
(art. 5º, X), à inviolabilidade do domicílio (art.5º, XI), ou seja, normalmente os que
são mais atingidos durante as diligências investigatórias.
29 Art.5º [...] LVII - Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;30 CAPEZ, 2006, p.44.
32
No que se refere à qualidade da prova, o reconhecimento da ilicitude do
meio de sua obtenção já impede o aproveitamento de métodos cuja idoneidade
probatória seja previamente questionada, como ocorre, por exemplo, na confissão
obtida mediante tortura, ou por hipnose, ou ainda, pela ministração de substâncias
químicas, como o soro da verdade, entre outras.
Na realidade, a vedação da prova não ocorre unicamente em relação ao meio escolhido, mas também em relação aos resultados que podem ser obtidos com utilização de determinados meio de prova. Uma interceptação telefônica, enquanto meio de prova, poderá ser lícita se autorizada judicialmente, mas ilícita quando não autorizada. No primeiro caso, a afetação (o resultado) do direito à privacidade e/ ou intimidade é permitida, enquanto, no segundo, não, disso resultando uma violação indevida daqueles valores. 31
Por outro lado, a vedação das provas obtidas ilicitamente também oferece
a repercussão no âmbito da igualdade processual, no ponto que, ao impedir a
produção probatória irregular pelos agentes do estado – normalmente os
responsáveis pela prova - equilibra a relação de forças relativamente à atividade
instrutória desenvolvida pela defesa. Sobre isso, Oliveira explica:
g. Princípio da oportunidade ou conveniência: O ofendido ou seu
representante legal pode optar em propor ou não à ação penal.
h. Princípio da Disponibilidade da Ação: O querelante poderá abrir mão do
prosseguimento da ação e até mesmo a desistência do recurso já interposto, através
do perdão e perempção (art.60, do Código de Processo Penal), mesmo quando já
tenha sido oferecida e recebida a queixa crime.
i. Princípio da Indivisibilidade da ação: A queixa realizada contra qualquer
um dos autores do crime obrigatoriamente se estenderá a todos – previsto no art.48,
do CPP (Código de Processo Penal).
j. Princípio da oficialidade: Apenas o Ministério Público será o titular da
ação penal pública.
l. Princípio da Obrigatoriedade: O Ministério Público é obrigado a oferecer
a denúncia, quando houver indícios de autoria e materialidade.
31 OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 6 ed. rev. e atual. ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p.297 e 298.
33
m. Princípio da Indisponibilidade da Ação: O Ministério Público não pode
desistir da ação pública já proposta e do prosseguimento do recurso já interposto,
previsto no art.42 e 576, do CPP.
Com a entrada em vigor da lei nº 9.099/95, foram alterados os princípios
da ação penal pública, dentre eles, o Princípio da Obrigatoriedade e o da
Indisponibilidade da Ação.
A primeira alteração foi quanto :
A possibilidade de transação entre o Ministério Publico e o autor da infração penal, visando a aplicação imediata de pena de multa ou restritiva de direito, afastou o principio da obrigatoriedade da ação publica, substituído agora pelo principio da discricionalidade regrada.
É que a existência da transação e de sua homologação pelo juiz faz com que a ação penal não tenha inicio, ficando afastada a obrigatoriedade antes existente.32
O Ministério Público somente poderá propor a transação penal se
estiverem presentes todos os requisitos exigidos pelo art. 76, §2º da Lei nº
9.099/95.33
Se faltar qualquer um dos requisitos estipulados pelo art.76, §2º, que serão
estudados adiante, não será possível a realização da transação, de modo que o
Ministério Público deverá oferecer a denúncia.
32 GONÇALVES, 2007, p.933Art. 76 - Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direito ou multas, a ser especificada na proposta.§ 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o juiz poderá reduzi-la a metade.§ 2º Não se admitira a proposta se ficar comprovado:I- ter sido o autor da infração condenado, pela pratica de crime, à pena privada de liberdade, por sentença definitiva;II- ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de 5 (cinco) anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa nos termos deste artigo;III- não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.§ 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz.§ 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos.§ 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei.§ 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.
34
Se este fizer a proposta de transação e o autor da infração não concordar
deverá continuar o procedimento com o oferecimento da denúncia.
Assim, pode-se afirmar que o Ministério Público não tem total
independência para propor ou não a transação, devendo respeitar o que a lei
estabelece. Neste caso, a discricionariedade é regrada.
A necessidade da existência dos referidos requisitos diferenciam o
principio da discricionariedade regrada do princípio da discricionariedade plena,
existente nas infrações de ação privada, em que o ofendido pode simplesmente
optar por não ingressar com a ação, sem que tenha de obedecer a qualquer
exigência legal.
A segunda alteração foi com relação:
[...] à criação do instituto da suspensão condicional do processo, que pode gerar a extinção da punibilidade do agente sem julgamento do mérito da ação penal, caso a suspensão não seja revogada no período de prova, verificando-se que o princípio da indisponibilidade da ação pública foi mitigado pelo novo instituto em relação às infrações que o admitem. É que, aceita a proposta, a ação será suspensa, não mais havendo a indisponibilidade antes existente. 34
E como última alteração:
O princípio da oficialidade continua existindo nas infrações de ação pública abrangida pela lei n.9.099/95, já que, como não poderia deixar de ser, o titular da ação continua sendo o Ministério Público, nos termos do art.129, I da Constituição Federal. 35
Estas foram as principais alterações mencionadas pelo nobre doutrinador
Gonçalves em relação ao principio da indisponibilidade da ação penal.
34 GONÇALVES, 2007, p.11.35GONÇALVES, 2007, p.11.
35
5. DA FASE PRELIMINAR
5.1 DESNECESSIDADE DE INQUÉRITO POLICIAL
Visando a maior celeridade ao procedimento investigatório, a Lei nº
9.099/95, em seu art. 69, dispensou a instauração de inquérito policial para a
apuração das infrações de menor potencial ofensivo, sendo que no lugar do
Inquérito Policial foi instituído o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), o
qual a autoridade policial deverá lavrar assim que tomar conhecimento da
ocorrência.
A finalidade do TCO é a mesma do Inquérito Policial, de modo que,
aquele é realizado de maneira menos formal e sem a necessidade de colheita
minuciosa de provas, enquanto este deve obedecer a todos os requisitos do
procedimento estipulado em Lei. Segundo Fernando Capez:
No lugar do Inquérito, elabora-se um relatório sumário, contendo a identificação das partes envolvidas, a menção à infração praticada, bem como todos os dados básicos e fundamentais que possibilitem a perfeita identificação dos fatos, tais como a indicação das provas, o rol de testemunha, quando houver, e, se possível, um croqui, na hipótese de acidente de trânsito. Tal documento é denominado “termo circunstanciado”, uma espécie de boletim ou talão de ocorrência. O termo circunstanciado é tão informal que pode ser lavrado até mesmo pelo policial militar que atendeu a ocorrência, dispensando o deslocamento do mesmo até a delegacia. 36
Todos os órgãos encarregados constitucionalmente da segurança
pública, conforme art. 144, da Lei Maior, que venham a tomar conhecimento de
uma ocorrência deverão lavrar o termo circunstanciado e que remetam os
envolvidos a secretaria do juizado especial ao exercício do “ATO DE POLÍCIA”.
36 CAPEZ, 2006, p.551.
36
5.2 PRISÃO EM FLAGRANTE
Em relação aos crimes de menor potencial ofensivo não será mais
formalizada a prisão em flagrante delito e nem será imposta fiança, desde que o
autor do fato seja encaminhado ao Juizado Especial Criminal imediatamente após
a lavratura do TCO ou assuma o compromisso de ali comparecer no dia e hora
designados.
No entanto, deverá ser autuado o infrator penal em prisão em flagrante
delito quando for impossível a condução imediata do mesmo ao Juizado Especial
Criminal (JEAC) ou quando se negar a comparecer posteriormente ao JEAC, na
forma do artigo 69, da Lei nº 9.099/95.
Assim, se o autor do fato for conduzido imediatamente ao Juizado
Especial Criminal, juntamente com o termo circunstanciado e o Promotor de
Justiça verificar que este não caracteriza infração de menor potencial ofensivo,
ele deverá ser conduzido à Delegacia de Polícia para lavratura do Flagrante
Delito.
Por fim, quando o autor do fato quebrar o compromisso de comparecer
no dia e hora marcados no JEAC, descabe providência desse teor, devendo o
magistrado remeter as peças existentes ao Juizado Comum, onde serão dadas
vistas ao representante do Ministério Público para a adoção das medidas
cabíveis, ou seja, arquivamento, instauração de inquérito policial ou a realização
da denúncia.
5.3 DESIGNAÇÃO DA AUDIÊNCIA PRELIMINAR
37
Logo após a lavratura do termo circunstanciado, a vítima e o autor do
fato são informados da data e o horário que deverão comparecer à sede do
Juizado Especial Criminal.
Com o procedimento Sumaríssimo, o senso de responsabilidade e a
confiança no comparecimento das partes, presume-se que ambas são igualmente
interessadas na busca do consenso.
Estando presente na secretaria do Juizado Especial Criminal, a vítima e
o autor, sendo possível a realização da audiência preliminar, esta será realizada
de acordo com o art. 68, da mesma lei 37, com a presença do advogado no ato. O
não comparecimento no momento da entrega do termo resultará na intimação do
autor do fato e, se for o caso, do responsável civil.
5.4 AUDIÊNCIA PRELIMINAR
A audiência preliminar começa a ser tratada no art.72, da referida Lei 38.
Ela precede ao procedimento sumaríssimo, cuja instauração depende
do que nela for decidido.
5.5 FASES DA AUDIÊNCIA PRELIMINAR
37 Art.68 - Do ato de intimação do autor do fato e do mandado de citação do acusado, constará à necessidade de seu comparecimento acompanhado de advogado, com a advertência de que, na sua falta, ser-lhe-á designado defensor público.38 Art.72 - Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, responsável civil, acompanhados por seu advogado, o juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata da pena não privativa de liberdade.
38
A audiência preliminar, destinada a uma tentativa de conciliação cível
(gênero) ou penal (espécies), compõe-se de três fases:
1. Composição de Danos Cíveis
2. Transação Penal
3. Denúncia
A composição civil estabelece que no preâmbulo da audiência, estando
presente o representante do Ministério Público, o autor do fato com seu
advogado, a vítima, e, se for o caso e possível, o responsável civil, que poderão
também comparecer com seus advogados, o juiz esclarecerá aos presentes, a
respeito da composição dos danos civis e da transação penal.
A composição civil refere-se aos danos de natureza civil. A transação
penal é um acordo entre o representante do Ministério Público e o autor do fato,
onde é proposta a este uma pena não privativa de liberdade, assim ficando
dispensado dos riscos de uma pena de reclusão ou detenção, que poderia ser
imposta em futura sentença, e, o mais importante, de não ter que se submeter a
um processo criminal.
Haverá o oferecimento da denúncia pelo representante do Ministério
Público se: a – a requerimento do Promotor de Justiça, o TCO não for arquivado
pelo juiz; b – não ocorrer a transação penal (art.76); c – o esclarecimento do fato
noticiado no termo no TCO, não exigir diligências imprescindíveis; d – a
complexidade dos fatos não determina a remessa das peças ao juízo comum e –
não configurando uma das hipóteses previstas no art. 43, do Código Penal;
40
6.1 FUNÇÃO DO CONCILIADOR
A composição de danos civis trata da primeira fase da audiência
preliminar estabelecida nos artigos 73 e 74, da Lei nº 9.099/9539, que será
realizada entre o autor do fato e a vítima, conduzida pelo juiz ou pelo conciliador
sobre a orientação do magistrado.
A atuação do juiz resumir-se-á em orientar a conciliação civil, pois a
homologação do eventual acordo civil celebrado pelos interessados só poderá ser
feita pelo magistrado, de modo que, obtida a conciliação, será homologada por
um juiz togado, em sentença, irrecorrível, e terá eficácia de título executivo a ser
cumprido no juízo cível competente.
Se o valor estipulado pelo juiz for de até 40 salários mínimos, a
conciliação poderá ser executada no próprio juizado.
6.2 REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO
Quando se tratar de delito cuja ação penal é pública condicionada à
representação, não se pode olvidar que esta é condição objetiva de
procedibilidade da ação.
Se o ofendido for incapaz, será representado ou assistido por seu
representante legal (pai, tutor ou curador), ou nos casos de ausência do mesmo
39 Art. 73 - A conciliação será conduzida pelo juiz ou por conciliador sob sua orientação.Parágrafo único - Os conciliadores são auxiliares da justiça, recrutados na forma da lei local, preferentemente entre bacharéis de direito, excluídos os que exerçam funções na administração da justiça criminal.Art. 74 - A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente. Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.
41
ou de conflito de interesses deste com aquele, por curador especial nomeado pelo
juiz.
6.3 INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
O membro do Ministério Público atuará nessa fase somente se o
ofendido for incapaz, ou seja, tem por objetivo zelar para que não sejam
prejudicados os interesses deste, na composição dos danos civis.
6.4 EXTENSÃO DA REPARAÇÃO DOS DANOS
Fica a critério das partes a extensão da reparação dos danos. Não há
limite de proposição. De modo que, pode pleitear a reparação de danos da
mesma forma que seria feito em ação civil de ressarcimento por dano.
Assim, o acordo civil pode compreender tanto os danos materiais
quanto os danos morais. Por fim, pode-se tratar de matéria de qualquer natureza
ou valor.
6.5 CARACTERÍSTICAS DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DA COMPOSIÇÃO CIVIL
42
Realizada a composição civil, será reduzida a termo e homologada pelo
juiz togado. Esta sentença homologatória possui efeitos irrecorríveis, embora não
esteja imune de questionamento judicial via mandado de segurança. Ainda, terá
eficácia de título executivo, que, caso seja descumprido, poderá ser executado no
juízo cível competente e se seu valor não exceder a 40 salários mínimos, esta
poderá ser executada no próprio juizado. 40
6.6 EFEITOS NA ÁREA PENAL DA COMPOSIÇÃO CIVIL HOMOLOGADA POR SENTENÇA
Nas Infrações Penais de Menor Potencial Ofensivo, de ação penal
privada e pública condicionada, a composição civil homologada por sentença
acarreta a renúncia do direito de queixa ou de representação e, de conseqüência,
a extinção da punibilidade.
Se o acordo civil foi realizado durante a audiência de instrução e
julgamento, ocorrerá a desistência da queixa ou da representação e a extinção
da punibilidade.
Os crimes de lesão corporal culposo e lesão corporal leve estão
condicionados à representação do ofendido por disposição expressa da lei nº
9.099/95.
As infrações penais de menor potencial ofensivo, de ação penal pública
incondicionada, a composição dos danos podem ser levadas em consideração
pelo promotor de justiça, como um dos critérios, tanto no exame de conveniência
a ser oferecida a transação penal, quanto na escolha da pena a ser proposta.
40 Art. 3º - O juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas:I - as causas cujo valor não exceda a 40 (quarenta) vezes o salário mínimo.[...]Art.53 - A execução de títulos executivos extrajudicial, no valor de até 40 (quarenta) salários mínimos, obedecerá, ao disposto no código de processo civil, com as modificações introduzidas nesta lei.
43
6.7 REPRESENTAÇÃO VERBAL
6.7.1 Momento para seu oferecimento
Na audiência preliminar, após ser constatado que não foi possível a
realização da composição de danos civis, o Juiz dará ao ofendido a oportunidade
de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo.
Se não oferecida a representação, não há que se falar em
decadência, devendo-se aguardar ao decurso do prazo decadencial, que é
tratado no art. 38 do Código de Processo Penal41, de modo que o direito de
representação não se esgote na audiência.
6.7.1.1 Ofendido menor
Se tratando de ofendido menor de 18 anos, o titular do direito de
representação será o responsável legal do ofendido (pai, mãe, tutor ou curador).
Caso este, não exerça a sua representação no prazo de seis meses, contados do
dia em que teve conhecimento do autor do crime, poderá, ainda, o ofendido vir a
exercê-lo quando completar 18 anos, dentro do mesmo prazo, calculado no
momento em que adquiriu capacidade processual.
41 Art. 38 - Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.
44
Assim, depois que o ofendido atingiu 18 anos, o direito de
representação poderá ser exercido, independentemente, por ele e por seu
representante legal, o que significa que o prazo decadencial é computado
separadamente para um e para outro de conformidade com a data em que cada
um deles teve ciência da autoria de delito.
Por último, determina-se que a mera entrega da representação no
protocolo da Secretaria do JEAC interrompe o prazo da decadência.
7. TRANSAÇÃO PENAL
A transação penal é um instituto novo no Brasil, por força do art.98,
inciso I, inserido na Carta Magna, e vem sendo considerada uma das formas
45
despenalizadoras mais importantes da atualidade, sem discriminalizar, aduzindo-
se, entre outras razões, a de reparar os danos e os prejuízos a que a vítima
sofrer. Segundo Fernando Capez:
A busca da reparação do dano cível é atingida pelo art.74, parágrafo único, da lei, quando, quebrando a regra geral do CP (art.104, parágrafo único, parte final), admite que o recebimento da indenização acarreta a renúncia ao direito de queixa ou de representação em determinados crimes. A transação penal, matéria restrita ao campo da legislação federal, é bem tratada no art.76, onde se admite a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, que aceita, permite a submissão da matéria ao juiz, para homologação. Não existe qualquer prejuízo para a sociedade, pois, conforme já salientado, nas infrações de menor potencial ofensivo a possibilidade de imposição de pena privativa de liberdade é pequena. Importante foi ter a lei acolhida à necessidade de homologação judicial do acordo penal (art.76, §3º). A CF, ao consagrar o princípio da separação dos poderes, conferindo ao Poder Judiciário precipuamente a função de prestar jurisdição. As exceções a este princípio, por comportarem restrições ao principio constitucional da separação dos poderes, só podem estar previstas na própria lei maior. Além disso, a regra mantém com o poder jurisdicional a fiscalização do direito de defesa e o exame da conveniência do acordo para a sociedade, eliminando-se a possibilidade de conluio entre acusação e defesa. 42
Já Nereu Giacomilli43 se refere ao instituto da transação penal como
“juizado da vítima” por ser mais econômica e possuir vários benefícios.
7.1 HISTÓRIA DA TRANSAÇÃO PENAL
7.1.1 Direito Comparado
O Brasil seguiu uma tendência internacional, com a criação da Lei nº
9.099/95, na adequação do tratamento referente aos crimes de menor potencial
42 JESUS, 2007, p.4-543 GIACOMOLLI, 2002, p.51.
46
ofensivo. Assim, a justiça penal consensual ficou encarregada de tentar resolver
estes pequenos casos e de aplicar este novo instituto despenalizador.
Em países com o sistema da Common Law, da tradição do direito anglo-saxônico, vigora o princípio da discricionariedade pura, entretanto nestas localidades aplica-se a plea bargaining ou plea negotiatio, que não podem se confundir com transação penal, pois apresentam suas próprias características [...].
Prosperou o entendimento de que a transação penal é um instituto novo em nosso sistema jurídico e que difere de outros previstos em ordenamentos alienígenas, apesar de ter semelhanças com o instituto americano plea bargaining.44
Analisando os países centrais, que adotam modelo semelhante ao
brasileiro em matéria de direito penal consensual, pode-se concluir que, no Brasil
demorou a chegar este instituto despenalizador. De fato, somente com o advento
da Constituição Federal de 1998, que se criou o julgamento diferenciado dos
crimes de menor potencial ofensivo.
7.1.2 A transação penal no Sistema Penal Italiano
No direito penal italiano, permite-se a realização de um acordo entre os
órgãos acusatórios e defesa. Logo após, o recebimento da denúncia, será
discutido a cerca de uma pena pecuniária diminuída até um terço. Não altera a
causa de pedir do crime, ou seja, o crime continua sendo o mesmo.
A lei italiana nº 689, de 24 de novembro de 1981, mais precisamente em seu artigo 77, prevê os casos de pena alternativa, onde o juiz poderá aplicar uma sanção, a pedido do acusado, podendo até, em determinados casos, extinguir a infração penal. Em 1988, o Código de Processo Penal italiano, através da leitura do artigo 444, passou a permitir a aplicação de uma pena alternativa ou pecuniária, acordando o acusado e o Ministério Público, desde que a pena diminuída até um terço não ultrapasse a dois anos.45
Havendo consenso entre as partes,
44 GLEBER, 2006, p.44.45 SYLLA, Roberto Antônio. Transação Penal Natureza Jurídica e Pressupostos. São Paulo: Método, 2003, p.63.
47
[...] a sentença não comporta recurso de apelação. Existe um controle judicial sobre o consenso e sobre o pedido de aplicação de pena alternativa. O juiz julga procedente o pedido sempre que houver congruência entre os fatos e a pena e estiverem presentes os requisitos legais, devendo esta decisão ser motivada. 46
A transação Penal no sistema italiano é conhecida como
patteggiamento. Segundo o autor Nereu Giacomolli:
[...] Observa-se no sistema italiano, uma mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, enunciado no art.112 da Constituição Federal,[...].” Ainda o mesmo autor refere que, no ordenamento jurídico italiano, há também uma espécie de transação que tem características idênticas à plea bargaining. A diferença entre a nossa transação penal e do instituto italiano é evidente no que diz respeito aos limites do acordo, como a função dos operadores jurídicos e das consequências oriundas das negociações.
As diferenças mais importantes entre a transação penal brasileira e o instituto da patteggiamento, na Itália, estão no fato de que a transação penal é proposta pelo Ministério Público, órgão responsável pela acusação, antes do oferecimento e do recebimento da denúncia. Já o sistema italiano, também é iniciado pelo Ministério Público, mas pode ser realizado depois do recebimento da denúncia, já na fase processual, porém antes dos debates da causa.
A mais marcante diferença entre estes dois institutos está nos seus objetivos. Enquanto no sistema italiano a transação penal é um prêmio, um incentivo ao autor do fato delituoso, beneficiando-o com aplicação de uma pena mais branda e dispensando a fase dos debates do processo fazendo com que se utilize do princípio da economia processual, no sistema brasileiro, a transação também vem beneficiar o autor do fato, porém o que se avalia é a vida pregressa, como ele se comportou antes da prática da infração penal, da vida irreparável antes do fato criminoso, além das demais condições que estão previstas no art.59 do Código Penal Brasileiro. 47
Estas são as diferenças mais marcantes do instituto da transação penal
no sistema italiano e do brasileiro.
7.1.3 A transação penal no Sistema Penal Português
O Ministério Público, no sistema penal português, é quem preside o
inquérito policial, podendo promover o seu arquivamento, quando não tiver provas 46 GLEBER, 2006, p.45.47 GLEBER, 2006, p.45 - 46.
48
suficientes da existência do fato ou quando não obtiver indícios necessários para
se provar a autoria do fato delituoso. O processo também poderá ser arquivado
pelo membro do Ministério Público e pelo Juiz do caso, sendo que também se faz
presente a concordância do argüido, de acordo com o artigo 280 do Código de
Processo Penal.
Assim, os crimes com punição de prisão não superior a seis meses ou
multa, que não tenha sido acusado por particular, o membro do Ministério Público,
se entender ser aplicável somente à pena de multa ou mesmo medida de
segurança, requer a descrição do fato e principalmente da menção dos artigos
violados, de modo que sua aplicação recaia no rito sumaríssimo.
O tribunal tem dois caminhos: rejeitar o requerimento e enviar o processo para outro rito, ou designar audiência. Nesta o arguido não pode aceitar, ocasião em que o processo é encaminhado para outro rito. Aceitando a sanção proposta, mais as custas, imposto de justiça e a indenização civil, a declaração, com o despacho oral, são reduzidos a termos. Este vale como sentença condenatória e transitado em julgado imediatamente (art. 395 do CPP). A este rito também se aplica o arquivamento e a suspensão do processo (art.395 CPP).48
Após a homologação da transação penal portuguesa, a mesma se torna
equivalente a uma sentença condenatória irrecorrível sujeita a todos os efeitos daí
recorrentes.
A principal diferença entre o instituto da transação penal portuguesa e o
instituto da transação penal brasileira é que para ocorrer a transação penal, no
sistema português, é necessário que o processo já tenha se iniciado com a
denúncia oferecida, já no sistema brasileiro, ela ocorrerá numa fase anterior ao do
oferecimento da denúncia.
7.1.4 A transação penal no Sistema Penal Norte-americano
48 GIACOMOLLI, 2002, p.92.
49
A transação penal no sistema norte-americano é conhecida como plea
bargaining ou negotiation e não pode ser confundido com a transação penal do
sistema brasileiro. De modo que o sistema norte-americano é bem mais amplo
que o brasileiro, onde vigora o princípio da oportunidade da ação penal, o
membro do Ministério Público tem poder discricionário bem maior que o brasileiro.
Assim, no sistema norte americano, o Ministério Público poderá exigir
penas menores e mais brandas, ou ainda negociar o local de cumprimento da
sanção. Sendo que, a plea bargaining é aplicada na maioria dos crimes,
totalizando cerca de 85% deles resolvidos através de negociação.
O mais conhecido modelo de plea bargaining é o que consiste no seguinte: uma vez que se dá conhecimento da acusação – qualquer que seja o crime – para o imputado, pede-se a pleading, isto é, para se pronunciar sobre a culpabilidade; se se declara culpado (pleads guilty) - se confessa – opera-se o plea, é dizer, a resposta da defesa e então pode o juiz, uma vez comprovada a voluntariedade da declaração, fixar data da sentença (sentencing), ocasião em que se aplicará a pena (geralmente ‘reduzida’ – ou porque menos grave ou porque abrangerá menos crimes -, em razão do acordo entre as partes), sem necessidade de processo ou veredito (trial ou veredict); em caso contrário, abre-se ou continua o processo e entra em ação o jurado.49
O nobre doutrinador Damásio de Jesus estabelece as principais
diferenças entre estes dois institutos, o plea bargaining e a transação penal
brasileira. Naquele, vigora inteiramente o princípio da oportunidade da ação penal
pública, enquanto neste o representante do Ministério Publico não pode exercê-lo
integralmente; naquele, o Ministério Público e a defesa podem transacionar
amplamente sobre conduta, fatos, adequação típica e pena (acordo penal amplo),
como, por exemplo, concordar sobre o tipo penal, se simples ou qualificado, o que
não é permitido na proposta de aplicação de pena mais leve e o acordo pode ser
feito fora da audiência, enquanto na transação somente ocorre em audiência
(artigo 72); havendo concursos de crimes, no plea bargaining, o representante do
parquet pode excluir da acusação algum ou alguns delitos, o que não ocorre na
transação penal; e por último, o plea bargaining é aplicável a qualquer delito, ao
contrário do que ocorre com a transação brasileira, que tem incidência restrita.
49 GOMES, Luiz Flavio. Suspensão Condicional do Processo Penal. São Paulo: RT, 1995, p.36-37.
50
7.1.5 A transação penal no Sistema Penal Alemão
O membro do Ministério Público, no sistema alemão, pode requerer a
punição do infrator, desde que se trate de crime de menor potencial ofensivo e
ainda, que o autor do fato concorde com a pena imposta.
Sendo proposta a pena, esta é tida como uma maneira especial de
oferecimento da denúncia, sendo apresentada logo ao final da investigação
criminal.
O réu somente poderá aceitar ou rejeitar a ordem penal aplicada. A
vantagem do instituto penal alemão, para a acusação, é evitar o julgamento, onde
sempre haveria possibilidade de absolvição. A vantagem, para o agente infrator,
seria evitar o constrangimento do processo penal. Este processo somente é
aplicado aos delitos de menor gravidade.
A transação, no sistema penal alemão, é considerada uma forma
especial de denúncia, ainda que ocorra dentro da ação penal.
Daniel Gerber entende que ocorre o mesmo com a transação penal
brasileira, sendo que ele sustenta que a mesma seria uma nova modalidade de
exercício da ação penal.
[...] a proposta de transação, que é modalidade de ação penal, somente pode ser feita nos casos em que o agente ministerial tiver feito análise semelhante àquela que faz para o oferecimento da denúncia e tiver vislumbrado elementos suficientes para o desencadeamento de ação penal contra o autor do fato. (grifo nosso)50.
De acordo com o posicionamento dominante, a transação penal não
é uma espécie de ação penal, pois, ação penal requer devido processo legal. Por
fim, conclui-se com Airton Zanatta que:
[...] diante de todos os sistemas estrangeiros analisados, há uma valorização da atividade ministerial, na medida em que, todos os sistemas, a presença do Ministério Público é fundamental no
50 GERBER, 2006, p.155.
51
encaminhamento das propostas de solução penal. Com isso, verifica-se uma forte tendência à atenuação do princípio da obrigatoriedade, especialmente no que se refere aos crimes de menor gravidade. Consta-se que se oportuniza a discricionariedade controlada ao Ministério Público em sistemas penais de tradição legalista. 51
Assim, os ensinamentos acima são de suma importânica para que se
possa entender, na seqüência, o instituto mais abordado no presente trabalho.
7.2 NATUREZA JURÍDICA DA TRANSAÇÃO PENAL
Após a fase da composição civil do dano, segue-se a da transação penal.
Ela consiste em:
[...] um acordo celebrado entre o representante do Ministério Público e o autor do fato, pelo qual o primeiro propõe ao segundo uma pena alternativa (não privativa de liberdade), dispensando-se a instauração do processo. Amparada pelo princípio da oportunidade ou discricionariedade, consiste na faculdade de o órgão acusatório dispor da ação penal, isto é, de não promovê-la sob certas condições, atenuando o princípio da obrigatoriedade, que assim, deixa de ter valor absoluto. 52
Daniel Gerber defende a tese de que a transação penal é um negócio
jurídico, porque:
O conceito de Transação Penal vem do latim transactio, no sentido de exprimir uma espécie de negociação, em sentido gramatical, um sentido de pacto no qual as pessoas realizam um contrato, ou negociam, a fim de prevenir um litígio, ou mesmo colocar fim a um determinado litígio que se tenha iniciado. Cumpre a transação penal a tarefa de evitar a contestação. Assim, esta terá sempre um caráter consensual; por esta razão, este acordo é também denominado de composição amigável.
No direito civil, a transação consiste num “negócio jurídico bilateral, através da qual às partes interessadas fazendo concessões mútuas, previnem ou extinguem obrigações litigiosas ou duvidosas”. Trata-se de uma solução contratual da lide.
A transação penal tem a mesma função do direito civil, qual seja, a de extinguir ou prevenir o litígio. Deste modo, no âmbito penal, o Ministério Público e o autor do fato deverão, quando em audiência preliminar, estabelecer um determinado acordo sobre uma proposta de aplicação
51 Ibidem, p.49.52 CAPEZ, 2006, p.553.
52
de pena, onde cada parte deverá abrir mão de parte dos seus direitos, sempre com o objetivo de extinguir o litígio. 53
Já para o nobre doutrinador Roberto Sylla, a transação penal pode ser
conceituada de uma maneira geral, como sendo:
[...] um instituto jurídico onde, estando presentes os requisitos legais, o Ministério Público dispõe da ação penal, propondo ao autor de uma infração de menor potencial ofensivo a aplicação da pena não privativa de liberdade, que, abrindo mão do direito de ampla defesa, aceita esta proposta.54
Nos termos do art.76 da Lei n. 9.099/95 foi adotado o princípio da
discricionariedade regrada. Assim, o representante do Ministério Público somente
poderá dispor da ação penal nas hipóteses previstas legalmente, desde que
exista a concordância do autor da infração de menor potencial ofensivo e a
homologação judicial. Isto é,
[...] no lugar do tradicional e inflexível princípio da legalidade, segundo o qual o representante do Ministério Público tem o dever de propor a ação penal pública, só podendo deixar de faze-lo quando não verificada a hipótese de atuação, caso em que promoverá o arquivamento de modo fundamentado (CPP, art.28), o procedimento sumaríssimo dos Juizados Especiais é informado pela discricionariedade acusatória do órgão ministerial. Com efeito, preenchidos os pressupostos legais, o representante do Ministério Público pode, movidos por critérios de conveniência e oportunidade, deixar de oferecer a denúncia e propor um acordo penal com o autor do fato, ainda não acusado. Tal discricionariedade, contudo, não é plena, ilimitada, absoluta, pois dependem de estarem preenchidos os requisitos legais, daí ser chamado pela doutrina “discricionariedade regrada”.55
A transação penal é o novo instrumento de política criminal de que
dispõe o representante do Ministério Público para propor ao autor da infração de
menor potencial ofensivo a aplicação sem denúncia e instauração do processo,
de pena não privativa de liberdade, desde que, entendido por este conveniente ou
oportuna a resolução rápida do litígio penal.
7.3 PRESSUPOSTOS DA TRANSAÇÃO PENAL
53 GERBER, 2006, p.148.54 SYLLA, 2003, p.6355 CAPEZ, 2006, p.554.
53
O Ministério Público não tem discricionariedade absoluta, mas limitada, uma vez que a proposta de pena alternativa somente poderá ser formulada se satisfeitas as exigências legais. Por essa razão, tal faculdade do órgão ministerial é denominada “discricionariedade regrada ou limitada”. 56
Os pressupostos para a realização da transação penal, são os
seguintes:
1. Formulação da proposta por parte do representante do Ministério
Público e aceitação por parte do autor da infração penal de menor potencial
ofensivo e de seu defensor;
2. Crime cuja pena máxima cominada não seja superior a dois anos ou
que se trate de contravenção penal;
3. Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada, ou a ser
efetuada a representação, nos casos referentes à ação penal pública
condicionada a representação;
Assim, defendido por Fernando Capez e Damásio E. de Jesus que não
cabe a aplicação do benefício da transação penal em crime de ação penal de
iniciativa privada.
Em sentido contrário a eles, sustentando ser cabível a transação penal
em ação penal de iniciativa privada, há o posicionamento de Ada Pellegrini
Grinover, bem como diversos julgados do Supremo Tribunal de Justiça. 57
Ao se admitir a proposta de transação penal nos crimes de ação penal privada, segundo posicionamento do STJ, indaga-se a quem caberia a sua formulação: ao querelante ou ao Ministério Público? Segundo André Estefam, baseando-se em julgado do Superior Tribunal de Justiça (RHC 8.123/ AP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 16-4-1999, DJ, 21-6- 1999, p.202),admite-se a proposta de transação penal por parte do MP em não havendo formal oposição do querelante, “donde conclui que este tem a primazia na decisão pela proposta ou não. E o mesmo raciocínio pode-se aplicar à suspensão do processo, a qual poderá ser formulada pelo parquet, nos crimes de ação penal privada, desde que não se oponha o querelante. Enfim, a conclusão, as afirmações de ação penal privada admitem os institutos da transação penal e da suspensão
56 CAPEZ, 2006, p.554.57 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. “A Terceira Secção desta Egrégia Corte firmou o entendimento no sentido de que, preenchidos os requisitos autorizadores, a Lei dos Juizados Especiais Criminais aplica-se aos crimes sujeitos a ritos especiais, inclusive aqueles apurados mediante ação penal exclusivamente privada. Ressalte-se que tal aplicação se estende, até mesmo, aos institutos da transação penal e da suspensão do processo” (STJ, 5ª Turma, HC 34.085/SP, Rel.Min.LauritaVaz, j. 8-6-2004, DJ, 2-8-2004, p.457).
54
condicional do processo, os quais podem ser propostos pelo MP, desde que não haja discordância da vítima ou seu representante legal, o que impõe considerar que o ofendido é quem detém discricionariedade para a propositura. 58
4. Em ambas as hipóteses, não ser caso de arquivamento do termo
circunstanciado;
Na realidade, deve-se considerar que a simplificação do procedimento não afastou a necessidade dos requisitos exigidos pelo art .41, ainda que informalmente, e, principalmente, a analise do que preceitua o art. 43, ambos do CPP. Â evidencia, antes de ‘propor a transação penal’ – que já faz parte da ação penal – é indispensável o exame da presença dos requisitos do art. 43 supra referido. A ausência de qualquer dos requisitos enunciados neste dispositivo, caracteriza falta de justa causa que impede não só o oferecimento da denuncia, mas também a transação penal. Nessa hipótese, deve o Ministério Publico pedir o arquivamento do ‘Termo Circunstanciado’, como deixa implícito o art. 76, caput, da Lei nº. 9.099/95. Não concordando o juiz, com o pedido de arquivamento, deve-se proceder nos termos do art. 28 do código de processo penal, com encaminhamento dos autos ao Procurador-Geral de Justiça. Evidentemente que a analise de existência de justa causa passa pelo exame do Termo Circunstanciado, cujo o conteúdo necessário examinaremos em outro tópico”59
5. Não ter sido o agente beneficiado anteriormente, pela transação, no
prazo de cinco anos;
6. Não ter sido o autor da infração condenado por sentença definitiva
(com trânsito em julgado), pela prática de crime, à pena privativa de liberdade
(reclusão, detenção e prisão simples);
7. Os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, bem
como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem a adoção da medida.
7.4 IMPEDIMENTO DA TRANSAÇÃO PENAL
Encontra-se estabelecido no art. 76, § 2º da Lei 9.099/95, os
impedimentos para a proposta de transação penal por parte do Ministério Público. 58 CAPEZ, 2006, p.554-555.59 BITENCOURT, Cezar Roberto, Juizado Especial Criminal e Alternativas à pena de prisão, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 1997, p.155.
55
Esses impedimentos podem ser classificados em objetivos e subjetivos. Os
primeiros são decorrentes de fatos externos ao agente e os segundos da situação
pessoal do autor da infração de menor potencial ofensivo.
Os impedimentos objetivos são:
a. Ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva (Inc. I): a lei exige a condenação anterior por crime praticado, excetuando a contravenção penal, bem como a aplicação de pena privativa de liberdade, excluídas as demais sanções penais, por sentença com trânsito em julgado;
b. Ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos do art.76: a lei impede a concessão de novo benefício da transação penal durante o prazo de cinco anos (Inc.II);
c.Circunstâncias da infração praticada (Inc. III): Circunstâncias são elementos acidentais da infração penal, que não integram a estrutura do tipo, mas influem na variação do fato praticado, por exemplo, a forma como foi praticada a infração de menor potencial ofensivo poderá indicar não ser suficiente e necessária a transação penal.60
Já os impedimentos subjetivos são:
a. Antecedentes (Inc. III). Constituem o comportamento anterior do autor
do fato, seus precedentes judiciais, por exemplo, os processos anteriores, os processos em andamento etc.
b. Conduta Social ( Inc. III). Este é o comportamento social do agente, sua inclinação ao trabalho, relacionamento familiar etc.
c. Personalidade (Inc. III). De acordo com o nobre doutrinador Aníbal Bruno, “é todo complexo, porção herdada e porção adquirida, com o jogo de todas as forças que determinam ou influenciam o comportamento humano” (Direito Penal, Rio de Janeiro, Forense, v.1, p.154)
d. Motivos (Inc. III). Constituem o caráter psicológico da ação, o móvel que impulsiona o autor da conduta, a razão do fato praticado. 61
Assim, estes são os impedimentos para a concessão do beneficio do
instituto da transação penal, conforme previsto no art. 76, §2º da mencionada lei.
60 MORAIS, Alexandre & SMANIO, Gianpaolo Poggio. Legislação Penal Especial – Série Fundamentos Jurídicos – 9. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p.283 61 MORAIS,2006, p.283-284.
56
7.5 REINCIDÊNCIA E A TRANSAÇÃO PENAL
O reincidente não terá direito ao beneficio do instituto despenalizador
da transação penal. De modo que a lei não exige a reincidência, bastando apenas
à condenação anterior, com sentença definitiva, não importando o lapso temporal,
para impedimento da proposta de aplicação de pena por parte promotor de
justiça. nos termos do art. 63 e 64 do Código Penal.
7.6 PROCEDIMENTO DA TRANSAÇÃO PENAL
Na ação penal pública condicionada à representação do ofendido, a
existência da composição cível do dano, na fase anterior da audiência preliminar,
impede a transação penal, visto que haverá extinção da punibilidade, ou seja,
somente haverá possibilidade da transação penal, se inexistir acordo entre a
vítima e o autor do fato ou a vítima e seu representante legal não oferecerem a
representação.
Em relação à ação penal pública incondicionada, a transação
independe da conciliação civil, ou seja, pouco importa tenha ou não ocorrido o
acordo civil, pois este não será considerado causa extintiva, podendo ser
efetuada mesmo que não tenha ocorrido acordo civil entre o autor do fato e a
vítima.
Se a ação penal for privada, entende-se que não cabe a transação,
pois, de acordo com o princípio da disponibilidade, a qualquer tempo o ofendido
poderá por outros meios, como exemplo a perempção e o perdão, desistir do
processo, ou seja, não tem autoridade para oferecer nenhuma pena, limitando-se
a legitimidade que recebeu do estado à mera propositura da ação.
57
7.6.1 Da Proposta Inicial
O ofendido não participa da proposta de transação penal, pois a
ação penal é pública, não existindo também assistente do Ministério Público, pois
ainda não há ação instaurada. Segundo Morais:
O titular da ação penal avaliará as circunstâncias previstas no art.59 do Código de Penal, para a efetuação da proposta, cujos limites estarão fixados pelos parâmetros legais da norma secundária, ou seja, entre o máximo e o mínimo previsto para a sanção penal.
O promotor de justiça na escolha da sanção penal a ser transacionada, tal qual o juiz na aplicação da pena na sentença condenatória, tem discricionariedade ampla para fixá-la. No entanto, a fixação não pode ser aleatória e certos parâmetros devem ser observados.
Senão vejamos:
A opção entre a pena restritiva de direitos e multa deve atender as finalidades sociais da pena, aos fatores referentes à infração praticada (tais como: motivo, circunstância e consequências) e a seu autor (antecedentes, conduta social, personalidade, reparação de dano a vítima).
Com respeito à pena restritiva de direito, a escolha está limitada àquelas elencadas no art. 43 do Código Penal, ou seja, prestação de serviço à comunidade, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana, observadas as normas definidoras destas (art.46-48 do CP[...].
A pena restritiva de direitos, no sistema do código penal, é sempre fixada em substituição à pena privativa de liberdade, isto é, primeiro o juiz fixa a pena privativa de liberdade e depois substitui pela pena restritiva de direitos. Sua duração, inclusive, é a mesma da pena privativa de liberdade a ser substituída (art.55 do CP).
Para a elaboração da proposta, o promotor de justiça deverá realizar a mesma operação mental, tendo em vista a pena privativa de liberdade prevista para a infração penal, se for o caso.
Na fixação da pena pecuniária, por sua vez, quanto ao número de dias- multa procede-se da mesma forma da eleição da pena restritiva de direitos; no tocante à determinação do valor de cada dia-multa, deve ser este ajustado em função da situação econômica do autor da infração. 62
O Ministério Público efetua oralmente ou por escrito a proposta de
transação penal, se entende-la cabível, consistente na aplicação imediata de
pena restritiva de direito ou multa, devendo especifica-la, inclusive quanto as
62 MORAIS, 2006, p.284 - 285.
58
condições ou o valor, conforme o caso. Não será admitida proposta genérica ou
imprecisa.
7.6.2 Da aceitação
Após ser feita a proposta da transação penal, pelo membro do
Ministério Público, o defensor e o autor da infração poderão aceitá-la ou não.
Embora a lei não faça menção expressa, o autor da infração juntamente com seu
defensor poderão efetuar uma contraproposta.
Há necessidade da aceitação da proposta de transação pelo autor do
fato e por seu defensor (§ 3º, art.76), uma vez que a transação é consensual e
bilateral e ainda para garantia do princípio da ampla defesa.
A aceitação da proposta da transação penal não implica o
reconhecimento da culpabilidade.
Assim, caso exista impugnação de qualquer dos dois (autor do fato ou
seu defensor) à proposta do membro do Ministério Público, esta não poderá ser
submetida à apresentação do juiz, o que vale dizer que este não poderá
homologar a transação penal sem o consenso das partes.
No caso de discordância, por não estar de acordo com os termos da
proposta ou por pretender decisão judicial de sua inocência, as partes passarão à
fase seguinte, qual seja, a audiência preliminar, com o oferecimento da denúncia
oral pelo membro do Ministério Público e o prosseguimento do feito. No mesmo
sentido, Luiz Flavio Gomes:
Havendo discordância, deverá prevalecer a vontade do autor, pois, se ele pode o mais, que é desconstituir seu defensor, pode o mesmo, que é discordar de sua posição.
No mesmo sentido, Edílson Mougenot Bonfim, para quem prevalecerá o desejo do autor da infração, pois cabe a ele dispor livremente de seus direitos, e Cezar Roberto Bitencourt, o qual argumenta que, por
59
analogia, deve-se aplicar a previsão a respeito da suspensão condicional do processo: prevalece a vontade do acusado (art.89,§7º). Há, contudo, posicionamento no sentido de que se deve aqui aplicar a mesma orientação que a jurisprudência predominante firmou na hipótese de oferecimento do recurso de apelação pelo advogado quando o réu manifesta o desejo de não recorrer. No caso tem-se entendido que prevalece a vontade do defensor, uma vez que o réu, sendo leigo, não tem condição de avaliar a necessidade do apelo, devendo sempre prevalecer a vontade do profissional habilitado. 63
A necessidade da aceitação da proposta da transação penal pelo autor
do fato e seu defensor, ampara-se no princípio da ampla defesa, sendo aqui
incluída a defesa técnica, não parecendo ser possível a aceitação de qualquer
dos dois prevalecer sobre a negativa do outro. Mesmo que o autor do fato tenha
aceitado a proposta da transação, pois este não possui noção das consequências
jurídicas de seu ato, será necessária a orientação de seu defensor.
Em relação ao recurso de apelação interposto pelo defensor, quando o
réu manifesta o desejo de não recorrer, o Supremo Tribunal Federal vem
decidindo:
Habeas Corpus. Apelação interposta por defensor, que não foi conhecida, por falta de legitimidade para o recurso, tendo em conta que o réu, ao tomar ciência da sentença, sem assistência do defensor, afirmou que não recorreria[...] A declaração do réu, feita sem a assistência do defensor, no sentido de que não deseja recorrer da sentença condenatória, não deve por si só, produzir efeitos definitivos[...] Sem a assistência do defensor, nem sempre o réu está plenamente capacitado a avaliar as possibilidades de sua defesa[...] Habeas Corpus deferido para que, afasta a preliminar de ilegitimidade, julgue o tribunal indigitado coator a apelação do réu como entender de direito. (DJU, 17-6-94, p.15.708)
Prevalência do recurso do advogado sobre renúncia do réu:
Ordem concedida de ofício para o fim de assegurar o processamento e julgamento do recurso interposto, em atenção ao magistério do STF no sentido de que cabe ao defensor, dativo ou constituído, decidir sobre a conveniência ou não do exercício da faculdade de apelar. 64
O Superior Tribunal de Justiça vem decidindo no mesmo sentido:
O réu, normalmente, não tem conhecimento técnico. Não sabe o que será melhor para ele. Cabe ao advogado decidir. Ademais, no caso concreto, o próprio renunciante firmou documento demonstrando que quer recorrer (STJ, RSTJ 42/89)
Ressalta-se, porém, que já houve entendimento jurisprudencial em contrário, em relação a suspensão condicional do processo,
63 CAPEZ, 2006, p.556-557.64 MORAIS, 2006, p.286.
60
privilegiando-se a opinião do acusado, em detrimento de sua defesa técnica (TJ/SP, Ap. Crim. Nº240.3503, Lorena, 1º CCrim., Rel. Dês. Fortes Barbosa, j. 15-12-97, v.u). 65
Assim, o Supremo Tribunal entende que deve prevalecer a vontade do
profissional habilitado, pelo fato de possuir melhores condições de avaliar a
situação do réu.
7.6.3 Da Homologação
Aceita a proposta ou a contraproposta será homologada por sentença
pelo juiz. Caso acolha a proposta aceita, o juiz aplicará a pena decorrente do
acordo estipulado, o qual não importará em reincidência, não constando na
certidão de antecedentes criminais do autor do fato e não terá efeitos civis.
Podendo ser concedido novamente este benefício somente após o prazo de cinco
anos.
Caso seja rejeitada a proposta, o representante do Ministério Público
oferecerá a denúncia oralmente, prosseguindo o feito, ou poderá requerer o
arquivamento.
O juiz não é obrigado a homologar o acordo penal, devendo analisar
preliminarmente a legalidade da proposta efetuada pelo Ministério Público, bem
como a aceitação por parte do autor ou seu defensor.
Ainda assim, o juiz analisará se estão presentes os requisitos legais, os
pressupostos para a efetuação da proposta e para a realização da transação.
Estando os mesmos presentes, será homologada a sentença. Caso contrário, o
juiz não acolherá a proposta do promotor de justiça e consequentemente não
homologará a transação penal.
65 MORAIS, 2006, p.286.
61
Nas hipóteses em que a pena de multa é a única aplicável, o juiz pode
reduzi-la até a metade e não há condenação em custas.
Da decisão proferida pelo magistrado caberá o recurso de apelação, ou
seja:
Quanto ao exame do mérito da elaboração da proposta, este encontra-se dentro da discricionariedade facultada pela lei ao Ministério Público. Assim, cabe ao promotor de justiça verificar a oportunidade da proposta da transação.
Entretanto, como a lei adota o princípio da oportunidade regrada, poderá o juiz, caso não aceite os termos em que foi elaborada a proposta e a aceitação formulada, em relação a seu mérito, utilizar, subsidiariamente, ou por analogia, o art.28 do Código de Processo Penal, remetendo as peças ao Procurador Geral de Justiça, para que este modifique a proposta apresentada pelo Ministério Público, designando outro Promotor de Justiça para realiza-la. No entanto, se o Procurador Geral de Justiça insistir na proposta efetuada, deverá o juiz homologar o acordo efetuado.
Desta forma, se o Juiz não acolher a proposta do Ministério Público, duas serão as possibilidades: a primeira, em caso de a proposta estar em desacordo com a lei, não homologará a transação, cabendo desta decisão apelação das partes; a segunda, em caso de desacordo quanto ao mérito da proposta, deverá o juiz aplicar, como antecedente exposto, o art. 28 do Código de Processo Penal. Assim há de proceder, porque a imputação inicial ao autor do fato, qualquer que seja sua forma, é vedada ao julgador, sob pena de ofensa ao devido processo legal, bem como por ferir o princípio da imparcialidade do Juiz e o sistema acusatório, onde há nítida separação entre as funções do Ministério Público, de imputação do fato a pedido da pena a ser aplicada, como órgão encarregado da acusação, e as do poder judiciário, de aplicação do direito ao fato concreto, de julgar definitivamente a lide. É função privativa do Ministério Público a propositura da ação penal e consequentemente da pena a ser aplicada ao autor do fato, nos termos da constituição federal (art.129, inciso I).
[...]
Caso o Juiz não homologue a transação realizada, por análise de sua oportunidade, adentrando na esfera de discricionariedade das partes, caberá, ainda, mandado de segurança por parte do Ministério Público, por ferir direito líquido e certo, bem como habeas corpus por parte do autor do fato, em proteção do seu direito de ir e vir.
Os mesmos remédios constitucionais poderão ser utilizados pelas partes, caso o Juiz na sentença homologatória, modifique o teor da transação penal, invadindo a área que a lei reservou para discricionariedade das partes.
Se a pena de multa for a única a ser aplicada, o Juiz poderá reduzi-la até a metade na sentença homologatória, evidentemente tendo em vista as condições pessoais do autor do fato e a circunstância da infração
62
aplicada. Desta sentença homologatória, com redução da pena proposta, caberá apelação. 66
Assim, se o Ministério Público não oferecer a proposta de transação
penal ou se o juiz discordar de seu conteúdo, deverá, por analogia ao art. 28 do
Código de Processo Penal, remeter os autos ao Procurador-Geral de Justiça, o
qual terá como opção designar outro promotor para formular a referida proposta,
alterar o conteúdo daquela que fora formulada, ou ratificar a proposta realizada
pelo Ministério Público de primeiro grau. Nesse caso a autoridade judicial estará
obrigada a homologar a transação penal.
Ainda, em sentido contrário, tem-se o nobre doutrinador Cezar Roberto
Bitencourt67, que afirma caber a aplicação do art. 28 do Código de Processo
Penal, sendo cabível unicamente o habeas corpus.
Por fim, o Juiz somente pode deixar de homologar o acordo que
contrariar as exigências legais, se discordar do conteúdo ou ainda da falta de
proposta, devendo aplicar o art. 28 do Código de Processo Penal68.
7.7 DA INEXISTÊNCIA DA TRANSAÇÃO PENAL
Não havendo transação penal, se não houver necessidade de diligência
imprescindível e se não for caso de arquivamento, o Ministério Público oferecerá
denúncia oral, de imediato, ao Juiz.
7.8 IMPOSSIBILIDADE DA TRANSAÇÃO PENAL EX OFFICIO
66 MORAIS, 2006, p.287 e 288.67 BITENCOURT, 1997, p. 72.68 Art. 28 - Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.
63
A transação penal consiste na discricionariedade do Ministério Público
de transacionar a pena a ser aplicada ao autor do fato.
A Carta Magna estabelece como direitos do estado o ius puniendi e o
ius punitionis, ao determinar a aplicação da pena pelo órgão competente do Poder
Judiciário, por infração penal prevista em lei, através do devido processo legal,
que será iniciado pelo representante do Ministério Público, conforme estabelece o
art. 5º, incisos XXXIX, LIII, LVII e art. 129º, inciso I.
O Ministério Público exerce parcela da soberania do Estado ao realizar a persecução criminal, ao verificar as condições necessárias para o início do devido processo legal, função que exerce privativamente, no caso da ação penal pública.
O constituinte consagrou o sistema acusatório, como a separação orgânica e funcional entre o responsável pela acusação (Ministério Público) e o responsável pelo julgamento (Poder Judiciário).
A interpretação das normas constitucionais deve ser sistemática, buscando harmonizar seus diversos dispositivos, posto que a constituição é sintetizada por canotilho como o “estatuto Jurídico do fenômeno político.”
Assim, Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins demonstram: “o que cumpre notar e a noção de auto-referência constitucional, o que se entende significar não poder a constituição valer-se de parâmetros, critérios e princípios que não os nela mesmos substanciados” (comentários a Constituição do Brasil, Saraiva, v.1, p.353).
Portanto, a interpretação que deve ser feita do art.98, I, da Constituição Federal deve ser harmônica com o princípio instituído em seu art. 129, I e seu art. 5º, XXXIX, LIII e LVII, ou seja, se existe o devido processo legal, com a adoção do sistema acusatório e o princípio da imparcialidade do Juiz, se a transação é admitida nas infrações de menor potencial ofensivo e se o início da persecução penal na ação penal pública cabe exclusivamente ao Ministério Público, é este órgão do estado que tem a faculdade de dispor da ação penal nas infrações penais de menor potencial ofensivo, assim definidas na Lei nº 9.099/95.69
Assim, a transação penal pressupõe um consenso entre as partes, ou
seja, entre o membro do Ministério Público e o autor do fato ou seu defensor, não
podendo de forma alguma ser imposta a transação penal a qualquer delas pelo
órgão julgador.
69 MORAIS, 2006, p.288 e 289.
64
Sendo assim, é inadmissível a realização da transação penal ex officio,
posto que a transação decorre da vontade das partes, obedecendo os requisitos
legais necessários e não de uma obrigação legal a ser imposta às partes pelo
Juiz.
Igualmente inadmissível o entendimento de que a transação consubstanciaria direito subjetivo do autor do fato, desde que presentes os requisitos legais. Se sequer o órgão julgador pode impor as partes a transação, uma das partes jamais poderia impor a outra qualquer espécie de acordo, caso contrário deixaria imediatamente de ser considerada uma transação. Seria Verdadeira “contradição nos próprios termos”.
No sentido do texto, o Egrégio Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, por votação unânime de sua 12º Câmara, na Correição parcial nº1.012.835/9, da comarca de Indiatuba, relatado pelo Juiz Walter Guilherme, com a participação dos juízes Junqueira Sangurardi e Ary Casagrande, emitiu o seguinte pronunciamento:
“Exsurge, no entanto, uma questão irredutível: se o promotor não propõe a aplicação imediata da pena ou a suspensão precisamente, por que entende que os requisitos legais não estão atendidos, ou ainda, na primeira hipótese, o faz em desacordo com o desejo do acusado, como no caso dos autos?
A tentação é grande, e eminentes Juízes e prestigiados autores assim propugnam de transferir o encargo ao julgado.
Data vênia, não vejo como permitir ao juiz que decida ex officio. O espírito da Lei nº. 9.099/95, no caso é o da transação. Acordo entre acusador (que faz a proposta) e o acusado (que aceita).”
Idêntico é o entendimento do Ministério Público do Estado de São Paulo, consubstanciado na súmula 01/96 da 2ª Procuradoria de Justiça:
“As propostas de aplicação de pena restritiva de direitos ou de multa (art.76 da Lei. nº.9.099/95), bem como de suspensão condicional do processo, são de iniciativa exclusiva do Ministério Público, em face de sua condição de titular do ius puniendi, não podendo o juiz agir ex officio.” 70
Caso o Juiz venha a formular proposta de transação penal ex officio, e
ainda, aceita pelo autor do fato e homologada, esta sentença homologatória
deverá ser considerada como inexistente, não podendo produzir qualquer efeito,
uma vez que a transação foi realizada sem a concordância de uma das partes, ou
seja, sem a concordância do Ministério Público.
Poderá, então, ser atacada por via de mandado de
segurança, remédio constitucional adequado para reparação do direito líquido e
certo da acusação.
70 MORAIS, 2006, p.289 e 290.
65
7.9 NATUREZA JURÍDICA DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DA TRANSAÇÃO PENAL
Primeiro passo é analisar se a sentença homologatória da transação
penal é declaratória, constitutiva ou condenatória.
A sentença declaratória limita-se a declarar o que já existe, tornando
seguro o que era até então inseguro, através de coisa julgada sobre o fato
existente, tornando-a solução judicial obrigatória entre as partes. Produz efeitos
ex tunc, ou seja, retroage para alcançar a data do fato declarado.
Por sua vez, a sentença constitutiva além de declarar certo o que já
existia, cria uma situação jurídica que até então inexistia. Esta gera efeitos ex tunc
e ex nunc, isto é, retroage para a data do fato e tem efeito futuros.
Por fim, a sentença condenatória também é considerada declaratória
por afirmar a situação existente, além de ser constitutiva, criando para o
sentenciado uma situação nova, até então inexistente, e impondo-lhe uma sanção
penal, que será posteriormente executada. A execução é a efetivação da
sentença condenatória.
Deste modo, a natureza jurídica da sentença homologatória da
transação penal é condenatória, pois, primeiramente é declarada a situação do
autor do fato, ou seja, torna certo o que antes era incerto. Ainda, cria uma
situação nova para as partes envolvidas, isto é, cria uma situação jurídica que até
então não existia. Por fim, estabelece uma sanção penal ao autor do fato, a qual
deve ser executada.
Conclui-se que a sentença homologatória da transação penal possui
efeitos dentro e fora do procedimento, isto é, tem efeitos processuais e materiais,
produzindo ainda efeitos ex nunc, para o futuro. Encerra o procedimento e faz
coisa julgada formal e material, impedindo novo questionamento sobre os fatos.
66
7.9.1 Requisitos da sentença homologatória
Tendo em vista os princípios do Juizado Especial Criminal (princípio
da informalidade e princípio da simplicidade) e se tratando de sentença
condenatória, a mesma deverá conter os seguintes requisitos:
1- descrição dos fatos tratados;
2- a identificação das partes envolvidas;
3- disposição sobre a pena a ser aplicada ao autor do fato e
4- a data e a assinatura do Juiz;
7.9.2 Efeitos da sentença homologatória
Os efeitos da sentença homologatória são:
a – Não gera reincidência;
b – não gera efeitos civis, não podendo, portanto servir de
título executivo no juízo cível;
c – não gera maus antecedentes, nem constará da certidão
criminal;
d – os efeitos retroagem a data dos fatos;
67
e – na hipótese de concurso de agentes, a transação
efetuada com um dos co-autores ou partícipes, não se estende nem se comunica
aos demais;
f – esgota o poder jurisdicional do juiz, não podendo mais
este decidir sobre o mérito, a não ser em embargos declaratórios, oponível em
cinco dias, ressalvada a hipótese de descumprimento posterior da prestação
pactuada, quando será instaurado o processo, devolvendo ao Juiz o poder
jurisdicional sobre aquele fato, ou seja, a justiça consensual cede lugar a justiça
conflituosa.
7.10 A TRANSAÇÃO PENAL E A AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA
Não cabe a aplicação do beneficio da transação penal nos crimes de
ação penal de iniciativa privada, uma vez que somente pode ser elaborada a
proposta de transação penal por parte do representante do Ministério Público.
Além do mais, vigora o princípio da disponibilidade, podendo ocorrer a
qualquer tempo o perdão do ofendido, a desistência da ação, o abandono,
tornando perempta a ação e, portanto, incompatível com o presente instituto.
Ainda o ofendido não tem autonomia para oferecer nenhuma pena, limitando-se a
legitimidade que recebeu do estado à mera propositura da ação.
7.11 ATUAÇÃO DOS CONCILIADORES E DOS JUÍZES LEIGOS
68
Os conciliadores e os Juízes Leigos não poderão praticar atos
instrutórios e decisórios, sob pena de infringir o princípio da jurisdição penal e o
devido processo legal.
7.12 A TRANSAÇÃO PENAL E O PERDÃO JUDICIAL
A qualquer momento poderá ser declarada a extinção da punibilidade,
desde que estejam presentes as hipóteses legais, não sendo necessário o
processo para a prolação da sentença concessiva do perdão judicial.
Conforme estabelece a Súmula 18 do STJ:
“A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da
punibilidade, não substituindo qualquer efeito condenatório.”
Por fim, se a hipótese for de perdão judicial, a transação penal ficará
prejudicada.
7.13 PRESSUPOSTOS DA TRANSAÇÃO PENAL E A COISA JULGADA
As hipóteses de impedimento da transação penal estão estabelecidas
no art.76, § 2º, da Lei nº 9.099/95.
Se for formulada a proposta de transação penal, pelo representante do
Ministério Público, aceita (pelo autor do fato ou seu defensor) e homologada pelo
magistrado, com trânsito em julgado, sendo posteriormente percebida a causa
69
impeditiva, não se admitindo a revogação ou a revisão da sentença
homologatória.
Por fim, ainda, durante o prazo recursal, não havendo trânsito em
julgado da sentença homologatória, constatada nulidade insanável (por exemplo,
a ilegitimidade da parte, incompetência material, vício de consentimento, ou fato
de conhecimento posterior impeditivo da transação penal – art.76, §2º, da
mencionada Lei), assim, poderá a parte legítima interpor apelação visando
revogar a transação.
7.14 TRANSAÇÃO PENAL E ASSISTENTE DA ACUSAÇÃO
A transação penal não acarreta efeitos civis, cabendo aos interessados
propor ação no juízo cível, conforme estabelece o art.76, §6º.
Após a realização da composição cível dos danos, na primeira fase da
audiência preliminar, a vítima não terá interesse na transação penal. O mesmo
acontece se não houver acordo para devida reparação dos danos a vítima, pois a
imposição da sanção penal decorrente da transação não produz efeitos civis.
Por conseqüência, não há que se falar em assistente da acusação, até
porque não há acusação formalizada, o qual se trata da fase anterior à
instauração da ação penal.
O art. 28 do Código Processo Penal autoriza a vítima ou seu
representante legal a habilitar-se para a assistência processual somente após o
início da ação penal, que se dará com o recebimento da denúncia. Portanto, antes
de iniciada a ação penal não é admitida assistente de acusação.
Eventual apelação da sentença homologatória da transação penal não
poderá ser interposta pela vítima da infração de menor potencial ofensivo, por
falta de legitimidade processual.
70
7.15 TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
A suspensão condicional do processo e a transação penal são
consideradas institutos independentes, com pressupostos e regras próprias.
A transação penal é aplicada em crimes de menor potencial ofensivo,
sendo que a mesma não poderá ser realizada se o autor do fato já tiver sido
beneficiado com a proposta de transação penal anterior ao prazo de cinco anos,
bem como se já tiver sido condenado anteriormente por sentença definitiva, pela
prática de crime, à pena privativa de liberdade, que são impedimentos objetivos
da transação penal.
Já a suspensão condicional do processo, destina-se a crimes com pena
mínima igual ou inferior a um ano, a mesma não implica em condenação, não se
constituindo em impedimento objetivo para que o autor do crime de menor
potencial ofensivo obtenha a transação penal.
Entretanto, a suspensão condicional de processo anterior, poderá influir
na análise dos antecedentes do autor do fato e desta forma configurar a hipótese
prevista no inciso III, do art.76, que consubstancia impedimento subjetivo à
obtenção da transação penal pela presente lei, sendo então inadmitida a proposta
de transação por parte do Ministério Público.
7.16 TRANSAÇÃO PENAL E RETROATIVIDADE
A transação penal é considerada uma norma mista, considerando
disposições penais e processuais. Entretanto, por ocasionar a aplicação de uma
sanção penal ao autor do crime, deve ser interpretada como de caráter
predominante penal. De modo que seus dispositivos devem obedecer ao princípio
71
constitucional estabelecido no art.5º, XL, a qual determina a retroatividade da lei
penal mais benéfica ao réu.
Por ser uma norma que beneficia ao réu, além de ter aplicação
imediata, deve ter aplicação retroativa para alcançar os fatos praticados
anteriormente a sua vigência.
Sendo que, a mencionada norma somente deve retroagir para os fatos
com o devido processo penal ainda não transitado em julgado, não podendo
atingir àqueles definitivamente julgados, tendo em vista sua natureza normativa
mista.
Por fim, a transação deve ser aplicada aos processos que ainda não
transitaram em julgado, mesmo que o fato tenha ocorrido anteriormente à
vigência da referida lei, mas não poderá passar por cima da coisa julgada, que
funcionará como limitação à aplicação da lei.
7.17 CONSEQUÊNCIA AO DESCUMPRIMENTO DA TRANSAÇÃO PENAL PELO AUTOR DO FATO
Após o oferecimento da transação penal pelo membro do Ministério
Público e a aceitação por parte do autor da infração penal e seu defensor, o Juiz,
acolhendo a proposta, poderá impor qualquer das penas restritivas de direito
prevista pela lei nº 9.714/98 ou pena de multa, que se não cumpridas, tornariam a
Lei nº 9.099/95 inútil.
Com o objetivo de evitar a total ineficácia dos juizados especiais
criminais, deverá o membro do Ministério Público definir como um dos requisitos
da proposta de transação penal seu efetivo cumprimento, e, consequentemente,
deverá o magistrado condicionar a homologação da transação, uma vez aceita
72
pelo autor da infração e seu defensor, ao prévio cumprimento da transação
imposta.
Assim, se o autor do ato infracional cumprir integralmente a sanção
imposta, o Juiz imediatamente homologará a transação, encerrando o processo,
ou seja, extinguindo a punibilidade do autor do fato. Porém, se o autor do fato não
cumprir a transação estipulada, deste modo, descumprindo o acordo realizado
com o representante do Ministério Público, este poderá prosseguir na persecução
penal, oferecendo a denúncia.
TRANSAÇÃO – JUIZADOS ESPECIAIS - PENA RESTRITIVA DE DIREITOS- CONVERSÃO – PENA PRIVATIVA DO EXERCÍCIO DA LIBERDADE – DESCABIMENTO. A transformação automática da pena restritiva de direitos, decorrente da transação, em privativa do exercício da liberdade discrepa da garantia constitucional do devido processo legal. Impõe-se, uma vez descumprido o termo de transação, a declaração insubsistência deste último, retornando-se ao estado anterior dando-se oportunidade ao Ministério Público de vir a requerer a instauração de inquérito ou propor a ação penal, oferecendo denúncia. 71
Nesse caso de descumprimento da pena restritiva de direito, imposta
pelo acordo da transação penal, acordado entre o representante do Ministério
Público e o autor do fato e seu defensor, não cabe falar em conversão em pena
privativa de liberdade, já que, se assim ocorresse , haveria ofensa ao princípio de
que ninguém será privado de sua liberdade sem o devido processo legal
estabelecido na Carta Magna art. 5º, LIV. No lugar da realização da conversão,
deve o Juiz determinar a abertura de vistas ao representante do Ministério Público
para o oferecimento da denúncia e instauração do processo crime.
.
71 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC nº79.572-GO, Rel.. Min. Marco Aurelio, Boletim Informativo do STF nº180.
73
8. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO
Não sendo caso de arquivamento do termo circunstanciado, nem tendo
ocorrido à composição dos danos civis ou a transação penal, passa-se na mesma
audiência, se possível, à fase de oferecimento da denúncia oral pelo
representante do Ministério Público ou queixa oral pelo ofendido, que serão
74
reduzidas a termo. Sendo que uma cópia fica com o acusado. O juiz marcará a
data da audiência de instrução e julgamento, saindo cientes as partes .
8.1 OFERECIMENTO DA DENÚNCIA
Haverá o oferecimento da denúncia pelo representante do
Ministério Público se:
a – a requerimento do Promotor de Justiça, o TCO (termo
circunstanciado de ocorrência) não for arquivado pelo juiz; nesse caso, será
aplicado o artigo 28, do CPP e se a Procuradoria-Geral de Justiça não concordar
com o arquivamento será designado outro membro do MPE para oferecimento da
denúncia; estando correto o arquivamento, os autos serão arquivados, nada
podendo fazer o Juiz;
b – não ocorrer a transação penal (art.76), ou seja, não
aceita pela parte ou por ser incabível no caso;
c – o esclarecimento do fato noticiado no termo do TCO não
exigir diligências imprescindível;
d – a complexidade dos fatos não determinar a remessa das
peças ao juízo comum ou
e – não configurando uma das hipóteses previstas no art. 43
do código penal72:
72 Art. 43. As penas restritivas de direitos são: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998) I – prestação pecuniária; II – perda de bens e valores;III – (revogado) IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;V – interdição temporária de direitos;VI – limitação de fim de semana.
75
8.2 ARQUIVAMENTO DO TERMO CIRCUSTANCIADO DE OCORRÊNCIA
O arquivamento do TCO (termo circunstanciado de ocorrência)
ocorrerá do mesmo modo que no Inquérito Policial.
Se o promotor de justiça entender que a autuação sumária e os documentos e laudos periciais que a acompanham não forem elementos no sentido da existência da infração penal, deve requerer o seu arquivamento (art.76, caput). Discordando do Ministério Público, o juiz remete o feito ao Procurador-Geral de Justiça (art.28 do CPP). Tratando-se de crime de ação penal privada, o feito permanece no juizado aguardando a iniciativa do ofendido (CPP, art.19). 73
Assim, ao ser examinado o fato descrito no TCO, pelo promotor de
justiça e sendo detectado a atipicidade penal da conduta imputada ao autor do
fato ou a ocorrência induvidosa de uma das excludentes da ação, o representante
do MP (Ministério Público) requererá ao juiz o arquivamento do mesmo.
Se o juiz não concordar com as justificativas apresentadas pelo MP,
para o arquivamento do TCO, deverá remeter o mesmo ao Procurador Geral de
Justiça, aplicando o art. 28, do CPP74, nos termos em que dispõem o art. 92 da Lei
nº 9.099/9575.
8.3 TRANSAÇÃO PENAL
73 JESUS, 2007, p.8074 Art. 28 - Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.75 Art. 92. Aplicam-se subsidiariamente as disposições dos Códigos Penal e de Processo Penal, no que não forem incompatíveis com esta Lei.
76
A transação penal consiste na aplicação, mediante consenso entre o
representante do Ministério Público e o autor do fato e seu defensor, de pena
restritiva de direitos ou multa, especificada na proposta realizada pelo MP e
posteriormente homologada pelo juiz.
8.4 DILIGÊNCIAS IMPRESCINDÍVEIS
Será oferecida a denúncia oral se não houver a necessidade da
realização de diligências. Por exemplo, o caráter imprescindível das referidas
diligências está ligado:
a - a ausência de elementos que individualizam o autor da
infração penal;
b - à falta do Boletim Médico ou outra prova da materialidade
do delito;
c - à identificação da vítima;
d - à inexistência de testemunhas indicadas no TCO e
e - desde que seja necessário a produção de provas
testemunhal para o esclarecimento do referido fato delituoso;
A realização de diligências não mandará, necessariamente, a remessa
do TCO ao Juízo Comum nos moldes do art. 66 da Lei76.
O representante do Ministério Público poderá requerer ao Juiz o
sobrestamento do procedimento ou a redesignação da audiência para realização
das devidas diligências, as quais são imprescindíveis ao oferecimento da
76 Art. 66. A citação será pessoal e far-se-á no próprio Juizado, sempre que possível, ou por mandado.Parágrafo único. Não encontrado o acusado para ser citado, o Juiz encaminhará as peças existentes ao Juízo comum para adoção do procedimento previsto em lei.
77
denúncia, devendo ser realizadas rapidamente (com amparo no Princípio da
Informalidade), mediante requisição do Juiz ou do Promotor de Justiça.
“Nesse caso, o representante do Ministério Público não oferece a
denúncia, requerendo ou aguardando a sua realização (art.77, caput).” 77
8.5 COMPLEXIDADE DOS FATOS
Alguns casos poderão possuir fatos complexos, de modo que seu
esclarecimento poderá exigir investigações ou providência de maior porte, que
impeçam ao promotor de justiça de formar seu convencimento e assim oferecer a
denúncia. Por exemplo, nas lesões corporais decorrentes de erros médicos,
demandando diligências para o exame de sua configuração e do nexo de
causalidade; nos acidentes de trânsitos envolvendo vários veículos e vítimas,
dificultando a compreensão de sua dinâmica e dos responsáveis por sua
ocorrência; nas infrações penais de menor potencial ofensivo em que não for
identificada a autoria e nos casos complexos de concurso de crimes.
Embora vigore o princípio da celeridade nesse procedimento, não pode
ele implicar na apresentação de uma acusação infundada ou erronia, se para uma
boa apreciação do fato o Ministério Público necessitar da realização de
diligências.
Nesse caso, o membro do parquet se encarregará de formular o
requerimento ao juiz para a remessa do TCO, com as respectivas peças que os
instruam para o Juízo Comum competente (art.77, §2º, c.c art. 66, parágrafo
único)78.77 JESUS, 2007, p.82.78 Art. 77. Na ação penal de iniciativa pública, quando não houver aplicação de pena, pela ausência do autor do fato, ou pela não ocorrência da hipótese prevista no art. 76 desta Lei, o Ministério Público oferecerá ao Juiz, de imediato, denúncia oral, se não houver necessidade de diligências imprescindíveis.§ 1º Para o oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência referido no art. 69 desta Lei, com dispensa do inquérito policial, prescindir-se-á do exame do corpo
78
8.6 REJEIÇÃO DA REMESSA DO TCO AO JUÍZO COMUM
Caso o Juiz entenda que seja possível a realização imediata da
denúncia, poderá indeferir o requerimento de remessa do TCO ao Juízo comum
feito pelo membro do parquet.
De modo que poderão ser adotadas duas soluções:
1º - o Ministério Público interpor correição parcial ou quando
cabível, dependendo do Estado da Federação sendo que inexiste tal medida no
Estado de Mato Grosso do Sul, sendo cabível o mandado de segurança ou,
2º - caso o Ministério Público não interponha a correição
parcial, poderá o juiz, aplicando analogicamente o art. 28, do CPP, remeter o TCO
e os documentos que o acompanham ao Procurador-Geral de Justiça.
8.7 CARACTERÍSTICA DA DENÚNCIA ORAL
Tendo em vista que o processo perante o JEAC orientar-se-á pelos
critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, conforme
de delito quando a materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova equivalente.§ 2º Se a complexidade ou circunstâncias do caso não permitirem a formulação da denúncia, o Ministério Público poderá requerer ao Juiz o encaminhamento das peças existentes, na forma do parágrafo único do art. 66 desta Lei. § 3º Na ação penal de iniciativa do ofendido poderá ser oferecida queixa oral, cabendo ao Juiz verificar se a complexidade e as circunstâncias do caso determinam a adoção das providências previstas no parágrafo único do art. 66 desta Lei.
79
estabelece art.62, da referida Lei, assim, pode-se afirmar que a renúncia deverá
revestir-se de clareza e concisão.
A clareza e a concisão não implicam na desconsideração das diretrizes
ou requisitos da denúncia ou queixa crime, estabelecidos no art.4179, do Código
de Processo Penal, o que resultaria em grave e evidente prejuízo ao princípio do
contraditório e ao exercício da ampla defesa.
8.8 REQUISITOS DA DENÚNCIA ORAL
Devem ser observados dos requisitos elencados no art. 41, do CPP.
8.8.1 Exposição do fato criminoso com suas circunstâncias
Bastará apenas a descrição sucinta do fato típico penal, com a
indicação das circunstâncias, sendo necessária a subsunção à norma
incriminadora, sendo certo que a atipicidade leva a rejeição da peça acusatória
(denúncia ou queixa), nos termos do art.43, I, do CPP80, como também a presença
de uma das causas excludentes de antijuridicidade redunda na licitude do
comportamento do agente.
79 Art. 41 - A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas80 Art. 43 - A denúncia ou queixa será rejeitada quando:I - o fato narrado evidentemente não constituir crime;II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.Parágrafo único - Nos casos do nº III, a rejeição da denúncia ou queixa não obstará ao exercício da ação penal, desde que promovida por parte legítima ou satisfeita a condição. (grifo nosso).
80
Assim, as circunstâncias que devem constar na denúncia oral são: as
referentes ao tempo do delito (importante para a contagem da prescrição, da
pretensão punitiva e para o devido exercício da ampla defesa); o local dos fatos
(para fixação da competência) e o perfeito enquadramento típico, tais como as
condições de meio e modo de execução, qualificadoras, atenuantes, agravantes,
causas de aumento e diminuição da pena e resultados oriundos do delito.
8.8.2 Qualificação do autor do fato
Na qualificação do agente da infração penal consta o nome deste,
assim como todos os dados que permitam sua identificação, como, por exemplo,
o cognome, apelido, pseudônimo, cidadania, filiação, sexo, idade, estado físico,
dentre outros.
8.8.3 Classificação do crime
O representante do parquet ou a vítima na ação penal privada deverá
indicar em qual ou quais dispositivos penais se baseia a acusação, ou seja, em
qual tipo penal amolda os fatos narrados no TCO.
Ainda, o enquadramento jurídico-penal, com a definição de uma ou
mais figuras típicas, as respectivas qualificadoras, as causas de aumentos, os
agravantes, as normas referentes ao concurso de pessoas e ao concurso de
infrações, propiciará o conhecimento dos limites da demanda ao imputado e seu
defensor, possibilitando-lhes o exercício pleno do direito de defesa.
81
A perfeita classificação ensejará o conhecimento preciso acerca do
enquadramento técnico-jurídico da acusação, bem como a análise da fixação da
competência do juizado especial criminal.
8.8.4 Testemunha: rol e números máximos
O rol de testemunha é dispensável quando desnecessário a oitiva da
mesma para provar os fatos, estipulado no art.41 do CPP.
Sendo necessário a produção de prova oral, deverá o titular da ação
penal, o representante do Ministério Público ou a vítima, indicar as testemunhas
que deseja que sejam ouvidas em audiência de instrução e julgamento, sob pena
de preclusão.
O juiz poderá entender pertinente a oitiva de testemunhas arroladas a
destempo, que serão ouvidas como testemunha do Juízo.
Tendo em vista a omissão da Lei em relação ao número máximo de
testemunhas, aplica-se o disposto no art. 539, do CPP, ou seja, o número máximo
de testemunha a ser arrolado é cinco, tanto pela acusação quanto pela defesa.
A restrição de testemunhas é para as partes e não para o juiz (art.209,
CPP).
8.8.5 Materialidade da infração penal
82
O TCO será fundamental para o oferecimento da denúncia,
dispensando-se o laudo de corpo de delito, podendo ser feita a substituição pelo
boletim médico ou prova equivalente.
Assim, no caso de lesões corporais, bastará o boletim médico ou prova
equivalente, tal como o atestado médico ou cópia reprográfica do portuário clínico.
Ainda, no crime de dano, a fotografia trazida pelo próprio ofendido.
“O boletim médico ou prova equivalente supre ausência do exame de
corpo de delito (art.77, §1º). Nesse sentido: TACrim SP, ACrim 1.080.305, 13ª
Câm., rel. Juiz Rui Stoco, j. 27-1-1998, RT, 751:628.” 81
8.9 CITAÇÃO DO ACUSADO
Sendo oferecida a denúncia oral, a mesma será reduzida a termo e
entregue ao acusado, se presente, ficando para os efeitos legais, citado e
cientificado do dia e hora da realização da audiência de instrução e julgamento.
Sair-se-ão cientificados, também, o representante do parquet, o
ofendido, o responsável civil, quando for o caso, e seus advogados.
Se o denunciado não estiver presente, sua citação será sempre
pessoal, por mandado, na hipótese de se encontrar no território jurisdicional do
juizado especial criminal ou por precatória, se encontrar-se fora deste. Assim, no
Juizado Especial Criminal não há citação por edital.
Precatória para audiência de testemunha
Excepcionalmente, é admissível a sua expedição, competindo ao juiz, diante do caso concreto, verificar a sua conveniência, pertinência e se não é medida protelatória, considerando a necessidade da prova e os princípios da celeridade e informalidade do processo. Tanto é que o art. 81 desta Lei permite ao juiz indeferir a prova excessiva, impertinente ou
81 JESUS, 2007, p.82.
83
protelatória. Admitindo carta precatória em procedimento da Lei n. 9. 099/95: STG, CC 18619, 3ª Seção, DJU, 4 ago. 1997, p. 34653 e Jurisprudência Criminal do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, Alfredo de Oliveira Garcindo Filho, Curitiba, edição do autor, 1998, p.392; STJ, RHC 9.740, 5ª T. rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, RT, 789:555.82
Rogatória
Segundo STJ, não é recomendável, diante do princípio da celeridade que ordena o sistema do juizado (RHC 10.476, rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU, 5 mar. 2001, p. 239).83
Por fim, o comparecimento espontâneo na Secretaria do Juizado
Especial Criminal também atende às finalidades do ato de citação sendo,
portanto, perfeitamente admissível e de acordo com os princípios que norteiam a
interpretação da presente Lei, tais como a celeridade, a economia processual e a
informalidade.
8.10 TESTEMUNHAS
Está claramente estabelecido no art. 78, §1º84, que, uma vez citado,
será o réu cientificado da data da audiência de instrução e julgamento, abrindo-se
82 JESUS, 2007, p.84.83 Ibidem, p.84.84 Art. 78. Oferecida a denúncia ou queixa, será reduzida a termo, entregando-se cópia ao acusado, que com ela ficará citado e imediatamente cientificado da designação de dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, da qual também tomarão ciência o Ministério Público, o ofendido, o responsável civil e seus advogados.§ 1º Se o acusado não estiver presente, será citado na forma dos arts. 66 e 68 desta Lei e cientificado da data da audiência de instrução e julgamento, devendo a ela trazer suas testemunhas ou apresentar requerimento para intimação, no mínimo cinco dias antes de sua realização.§ 2º Não estando presentes o ofendido e o responsável civil, serão intimados nos termos do art. 67 desta Lei para comparecerem à audiência de instrução e julgamento.§ 3º As testemunhas arroladas serão intimadas na forma prevista no art. 67 desta Lei. (grifo nosso)
84
a possibilidade de trazer suas testemunhas ou de apresentar requerimento para a
intimação das mesmas, desde que o faça até cinco dias antes da audiência.
O decurso do tempo existente entre a citação e a audiência de
instrução e julgamento atenderá aos interesses do acusado, o qual contará com o
tempo suficiente para localizar e indicar suas testemunhas e estabelecer, em
conjunto e sob a orientação do seu defensor, a estratégia defensiva.
Se a defesa não apresentar o rol na secretaria no prazo previsto, ou
seja, cinco dias antes da realização da audiência de instrução e julgamento,
restará precluso o direito de fazê-lo posteriormente. O representante do Ministério
Público e a vítima também sofrerão as mesmas conseqüências, se na denúncia
ou na queixa crime, não indicarem as testemunhas que desejam ouvir na
audiência de instrução e julgamento.
Por fim, mesmo que às partes estejam precluso o direito de arrolar e
ouvir testemunhas, tem a possibilidade de elas serem inquiridas como
testemunha do juízo, caso o juiz ache necessidade. E como já fora dito, a
restrição de testemunhas é para as partes e não para o juiz (art.209, CPP).
8.10.1 Condução coercitiva
No Juizado Especial Criminal nenhum ato determinado pelo juiz será
adiado, quando imprescindível, a condução coercitiva de quem leva a
comparecer. A condução coercitiva somente é cabível na audiência de instrução
e julgamento, pois a ausência do autor, vítima ou responsável civil na audiência
preliminar implica apenas na inviabilidade de realizar a conciliação. Se tratando
de crime de ação penal privada, o não comparecimento do querelante à audiência
de instrução e julgamento é causa de perempção.
85
8.11 CONCILIAÇÃO CIVIL E TRANSAÇÃO PENAL
É permitida a tentativa de acordo civil e de transação penal, na abertura
da audiência de instrução e julgamento. Somente na hipótese de não ter havido a
possibilidade de sua realização na fase preliminar por ausência do autor do fato.
8.11.1 Audiência
“Será sempre rápida e direta (princípio da oralidade, atrelado ao da
concentração).” 85
Na audiência de instrução e julgamento, o juiz, inicialmente, insiste na
conciliação, a qual, não ocorreu na fase preliminar. Aplicar-se-á o art. 7286,
disposto em Lei e esclarecerá as partes sobre a possibilidade de acordo pela
reparação do dano ou aceitação pelo autuado de pena mais leve (proposta do
MP). Devem ser aplicados os artigos 72, 73, 74 e 76 da mencionada Lei87.
85 CAPEZ, 2007, p.563.86 Art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.87 Art. 73. A conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob sua orientação.Parágrafo único. Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados, na forma da lei local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os que exerçam funções na administração da Justiça Criminal.Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.Art. 75. Não obtida a composição dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo.Parágrafo único. O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica decadência do direito, que poderá ser exercido no prazo previsto em lei.
86
Não havendo conciliação, será recebida a denúncia ou a queixa crime e
serão ouvidas a vítima e as testemunhas de acusação, conforme menciona o
art.81, caput88.
8.11.1.1 Concentração da prova em audiência única e o princípio constitucional da ampla defesa
Com o princípio da amplitude da defesa o acusado pode usar de todos
os meios que lhe são dispostos em leis. A concentração da prova em audiência
única não constitui regra absoluta, cumprindo ao juiz, para não prejudicar o réu,
deferir os pedidos de realização de provas necessárias e pertinentes, designando
se preciso nova audiência.
8.11.1.2 Redesignação de audiência
Poderá a audiência de instrução desdobrar-se em quantas forem
necessárias para o devido esclarecimento dos fatos e à busca da verdade,
conforme diz respeito ao direito das partes em produzir suas provas, de acordo
com o princípio do devido processo legal.
88 Art. 81. Aberta a audiência, será dada a palavra ao defensor para responder à acusação, após o que o Juiz receberá, ou não, a denúncia ou queixa; havendo recebimento, serão ouvidas a vítima e as testemunhas de acusação e defesa, interrogando-se a seguir o acusado, se presente, passando-se imediatamente aos debates orais e à prolação da sentença.§ 1º Todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, podendo o Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias.§ 2º De todo o ocorrido na audiência será lavrado termo, assinado pelo Juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência e a sentença.§ 3º A sentença, dispensado o relatório, mencionará os elementos de convicção do Juiz.
87
8.12 EXCLUSÃO DAS PROVAS
A Lei confere ao Juiz amplitude sobre admissão das provas em
audiência, uma vez que possibilita a exclusão, mediante decisão fundamentada,
daquelas que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias.
Apesar de o Juiz já ter formado seu convencimento, em que pese a
existência de outras testemunhas devidamente arroladas, não poderá negar às
partes o direito de ver inquirida suas testemunhas, já que tais depoimentos
poderão embasar eventuais recursos impostos contra a sentença. Podendo
ocorrer, inclusive, a hipótese de revisão criminal do julgado proferido.
Assim, quanto ao excesso da prova, a norma tem cunho
exclusivamente pragmático, necessitando que as partes colaborem com a
celeridade do procedimento, evitando desperdício de tempo quanto ao quadro
probatório.
A prova impertinente é aquela que não guarda qualquer relação com o
fato descrito na denúncia ou aquela desnecessária à comprovação das teses da
defesa.
A prova protelatória tem o objetivo de prolongar ou de procrastinar o
andamento do processo.
8.13 RECEBIMENTO DA DENÚNCIA OU QUEIXA
“Não havendo reconciliação, após a resposta da defesa, o juiz recebe,
ou não, a denúncia ou queixa (art.81, caput).” 89
89 JESUS, 2007, p.86.
88
Somente após a sustentação oral é que o juiz recebera ou rejeitará a
denúncia.
Recebida a denúncia ou queixa, ouvirá inicialmente a vítima. Na
sequência, ouvirá as testemunhas de acusação e depois as de defesa (que o réu
deverá trazer à audiência ou das quais deverá apresentar rol em cartório pelo
menos cinco dias antes de sua realização) e, finalmente o réu/querelado será
interrogado.
Havendo recebimento ou não da denúncia ou queixa, “Da rejeição
caberá recurso de apelação no prazo de 10 dias, mas o recebimento não caberá
recurso algum, prosseguindo-se o processo. Recebida a denuncia ou queixa,
passa-se, de imediato, ao inicio da instrução” 90
8.14 INTERROGATÓRIO DO RÉU
O imputado será ouvido após a oitiva das testemunhas, ressaltando,
assim, o interrogatório como peça de defesa, já que estará o quadro probatório
praticamente delineado.
8.15 DEBATES ORAIS
90 CAPEZ, 2006, p.563-564.
89
Quantos aos debates orais, o Juiz, após as exposições do Ministério
Público e da defesa, fará o destaque e o registro dos principais pontos, ou seja,
será reduzida a termo.
O tempo para exposição das razões tanto da acusação quanto da
defesa será de 20 minutos. A lei foi omissa nesta questão, assim, aplica-se o
disposto no art. 538, § 2, do Código de Processo Penal.
8.16 RESUMOS DOS FATOS RELEVANTES
O Juiz procurará ser, no registro do testemunho, o mais fiel possível ao
conteúdo e as expressões utilizadas pelo depoente. Da mesma forma, deverá o
Juiz registrar as respostas às indagações formuladas pelo representante do
parquet e pela defesa, como também às eventuais perguntas indeferidas, com a
respectiva fundamentação da decisão.
8.17 A SENTENÇA
Na sentença deverão conter o nome das partes ou a indicação de
dados suficientes para identificá-las, a exposição sucinta da acusação e da
defesa, as razões de convencimento em que se fundar a decisão, a indicação dos
artigos aplicados, o dispositivo legal, e a assinatura do Juiz, de acordo com o art.
381, do CPP91.
91 Art. 381 - A sentença conterá:I - os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para identificá-las;II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;IV - a indicação dos artigos de lei aplicados;V - o dispositivo;VI - a data e a assinatura do juiz.
90
Mesmo sendo dispensável o relatório, o juiz deverá abordar as teses de
acusação e defesa e, após a análise do conjunto probatório, indicar as razões que
embasaram seu convencimento.
9. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
9.1 NATUREZA JURÍDICA
91
Trata-se da espécie de transação processual em que o titular da ação,
o Ministério Público, abre mão de seu prosseguimento e da busca de uma
condenação, enquanto o acusado, sem discutir sua responsabilidade pelo delito,
submete-se ao cumprimento de determinadas condições por um tempo
determinado.
Assim, com o término do prazo, sem que tenha havido revogação, será
decretada extinção da punibilidade.
Trata-se de uma alternativa à jurisdição penal, um instituto de despenalização: Sem que haja exclusão do caráter ilícito do fato, o legislador procura evitar a aplicação da pena. Nesse sentido: STF, HC 74.017, 1ªT., rel. Min. Octavio Gallotti, DJU, 27 set. 1996, p.36153. Cuida-se, além disso, de instituto de natureza penal material. Nesse sentido Ada Pellegrine Grinover, Direito intertemporal e âmbito de incidência da Lei dos Juizados Especial Criminal, Boletim do IBCCrim, São Paulo, 35:4, nov. 1995; TJSP, ACrim 206.049, 5º câm. Crim., j.29-8-1996, rel.Des Dante Busana. Não é um novo procedimento. Trata-se de novo sistema criminal. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 1.057.683, 2ª Câm., h. 5-6-1997, RT, 745:599 e 600; TACRimSP, ACrim 1.075.105, 11ª Câm., RT, 749:695.92
Por fim, sobre a criação deste instituto despenalizador, atenua o
princípio da indisponibilidade da ação pública, pois permite que o representante
do Ministério Público, que é o titular da ação, proponha a suspensão condicional
do processo, ou seja,
9.2 PROPOSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
O promotor de justiça pode propor, diante do caso concreto a transação
penal ou a suspensão condicional do processo, se não for hipótese de
arquivamento do TCO e de conciliação civil extintiva da punibilidade.
92 JESUS, 2007, p.105.
92
9.3 CABIMENTO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
Este instituto despenalizador, criado pela Lei nº 9.099/95, aplica-se a
todas as infrações penais e contravenções que possuam pena mínima, em
abstrato, não superior a um ano. Por exemplo, aplica-se a suspensão condicional
do processo ao crime de furto simples, que possui a pena mínima de um ano. Já
em relação ao crime de furto qualificado não se aplica a suspensão condicional do
processo, pois a pena mínima do mesmo é de dois anos.
É irrelevante saber a espécie de pena privativa de liberdade (reclusão,
detenção ou prisão simples) prevista para infração penal.
A suspensão condicional do processo se aplica aos crimes de menor
potencial ofensivo previstos no código penal e na legislação especial, pouco
importando a existência de rito especial.
Além disso, apesar de orientação diversa, não há como excluir o
cabimento da suspensão condicional nos crimes de competência da Justiça
93
Federal ou Eleitoral, uma vez que o art. 89, da referida Lei93, não faz qualquer
restrição. Sobre o instituto disciplinado no art. 89:
[...] é aplicável dentro e fora dos Juizados Especiais Criminais. A conclusão nº 2 da comissão nacional de Interpretação da Lei nº 9. 099/95, de 26 de setembro de 1995 (Escola Nacional da Magistratura, Brasília, outubro de 1995), diz o seguinte: “São aplicáveis pelos juízes comuns (estaduais e federais), militar e eleitoral, imediata e retroativamente, respeitada a coisa julgada, os institutos penais da Lei nº. 9. 099/95, como a composição cível extintiva da punibilidade (art.74, parágrafo único), transação (arts.72 e 76), representação (art.88) e suspensão condicional do processo (art. 89). 94
Por outro lado, o art. 90-A, acrescentado a ela a Lei nº 9.839/99, veda a
aplicação do benefício na esfera da justiça militar.
Assim, não há nada que impeça também a aplicação desse sursis
processual aos crimes de competência originária dos tribunais.
Existe uma grande discussão em torno de ser possível ou não a
aplicação do instituto da suspensão condicional do processo nos crimes de ação
penal privada.
Para muitos, ela é vedada porque a lei só fez menção à proposta por
parte do Ministério Público e, porque, nesse tipo de ação, vigora o princípio da
oportunidade, de modo que qualquer acordo implicaria em perdão ou perempção.93 Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições:I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;II - proibição de freqüentar determinados lugares;III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz;IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.§ 2º O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano.§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta.§ 5º Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade.§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.§ 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo prosseguirá em seus ulteriores termos.94 JESUS,2007, p.106.
94
Já outros, entendem que a omissão legal deve ser suprida por analogia
in bonam partem, pois não faria sentido deixar de ser cabível o benefício em
crimes de igual gravidade, apenas porque um é de ação privada e o outro de ação
pública. Para este, trata-se de direito subjetivo do querelado, e
Nela não há suspensão condicional do processo, uma vez que já prevê meios de encerramento da persecução, perdão, retratação etc. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 1.102.383, 15 ª Câm., RT, 765:614. No sentido de que, não sendo o Ministério Público dominus litis na ação penal privada, não é cabível a medida: TJMG, ACrim 134.541, 2ª Câm., rel. Dês Alves de Andrade, j.4-3-1999, RT, 771:665. Há orientação em termos de ser admissível o sursis processual, uma vez que se trata de direito pelo público subjetivo de liberdade. Nesse sentido: STF, HC 81.720, 1ªT., rel. Min. Sepúlvera Pertence, j.26-2-2002, DJU, 9abr. 2002, Informativo STF, n.262; TARS, 2ª Câm., ACrim 297.025.876, RT, 747:763; TACrimSP, RJTACrimSP, 33:161 e 34:257; STJ, HC 13.337, 5ª T., rel Min. Flex Fishcher, DJU, 13 ago. 2001, p.181; Ada Pellegrini Grinover et al., Juizados especiais criminais, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p.246; Louri Germano Barbiero. Na ação penal privada cabe a suspensão condicional do processo?, RT, 751:508; Conclusão n.II-26 do V Encontro Nacional do Coordenadores de Juizados Especiais, Salvador (BA), 18-21 de maio de 1999, DOE (SP), Poder Judiciário, Cad. 1 parte 1, 24-8-1999, p.195
Ainda é aceito a aplicação do instituto condicional do processo de
competência do tribunal de júri (arts. 124 e 126, ambos do CP), uma vez que não
há nessa hipótese, violação ao dispositivo constitucional que atribui ao júri
competência para julgar os crimes dolosos contra a vida (art.5º XXXVIII, d, da
Carta Magna), pois na suspensão condicional do processo não existe análise de
mérito da acusação. Assim, se houver revogação do benefício, o andamento da
ação será retomado e o julgamento será feito pelo tribunal de júri.
Sobre a suspensão condicional do processo, Jesus cita alguns
exemplos, como:
O auto aborto e o aborto provocado com o consentimento da gestante (CP. art.124) admitem a suspensão condicional do processo. Nesse sentido : TJSP, HC 280.904, 4ª Câm. Crim., j. 27-4-1999, RT, 768:580. Não há lesão ao princípio constitucional da competência do júri para julgamento dos crimes dolosos contra a vida (CF, art 5º, XXXVIII, d), uma vez que a medida se insere no rito processual próprio (arts. 394 e s. e 406 do CPP). Tanto é que, revogada a suspensão, o processo tem o seu curso normal, podendo o acusado vir a ser julgado pelos jurados. E se, terminado o período de provas sem revogação, o juiz declara extinta a punibilidade? Não estaríamos subtraindo ao júri o julgamento do auto-aborto? Não, tendo em vista que a lei nova criou mais uma causa extintiva da punibilidade, incidente sobre a pretensão punitiva.
95 JESUS, 2007, p.112.
95
Nesse caso, tal como ocorre com a absolvição sumaria e a impronuncia, não há lesão ao princípio constitucional da competência do júri. 96
A existência de causas obrigatórias de aumento ou de diminuição da
pena, que poderá alterar o limite mínimo da pena em abstrato deve ser levada em
conta a fim de possibilitar ou impossibilitar a aplicação do dispositivo. Assim,
como exemplo, o reconhecimento do furto noturno, mencionado no art. 155, §1º,
do Código de Processo Penal, torna inaplicável o instituto da suspensão
condicional do processo ao delito mencionado, por implicar um aumento de um
terço de pena, que, desse modo, passa a ser de no mínimo um ano e quatro
meses.
Por outro lado, considerando, de forma exemplificativa, que a pena
mínima prevista para o furto qualificado é de dois anos e que a redução máxima
referente ao reconhecimento da tentativa é de dois terços, conclui-se ser possível
a aplicação do instituto despenalizador da suspensão condicional do processo na
tentativa de furto qualificado e de outros crimes que tenham pena mínima no
mesmo patamar, já que, nesse caso, a pena mínima é de oito meses.
Ainda, tem-se a possibilidade do reconhecimento da agravante
genérica, que por sua vez não obsta o benefício. Jesus argumenta sobre as
causas de aumento de pena, que:
Devem ser consideradas na compreensão da “pena mínima cominada”, desprezando-se, entretanto, o aumento decorrente do concurso formal e do crime continuado. Nesse sentido : Enunciado n. 11 do VII Encontro Nacional de Coordenadores de Juizados Especiais Criminais, Vila Velha (ES), 27 de maio de 2000. No sentido da consideração das causas de aumento de pena: STJ, RHC 7.056, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, DJU, 16 de fev. 1998, p. 132. No sentido de que, no crime continuado, deve ser considerado o acréscimo da pena: STJ, REsp 125.715, 5º T., DJU, 28 set. 1998, p.89.
Causas de diminuição de pena
Devem ser levadas em conta. Nesse sentido, considerando a redução máxima: TACrimSP, A Crim. 1.019.113, 6º Câm., 19-6-1996, rel. Juiz Mathias Coltro, SEDDG, rolo-flash 1.043/30097
A nova lei nº 11.340/2006, a Lei Maria da Penha, trata das questões
referentes à violência doméstica ou familiar contra a mulher e estabelece em seu
96 JESUS, 2007, p.127.97 JESUS, 2007, p.127.
96
art. 41, que independentemente da pena, não se aplica a Lei nº 9.099/95, dos
Juizados Especiais Criminais, às infrações penais desta natureza.
De acordo com tal dispositivo, e considerando o amplo conceito de
violência doméstica estabelecida pela Lei nº 11.340/06, conclui-se que não é
cabível a aplicação do instituto da Suspensão Condicional do Processo em crimes
como lesão corporal leve, ameaça ou constrangimento ilegal praticado contra
mulher com violência doméstica ou familiar, apesar desses delitos mencionados
terem a pena inferior a um ano.
A previsão legal de multa cumulativa com a pena privativa de liberdade
não impede a concessão do benefício. Assim, o crime de estelionato, por
exemplo, admite o beneficio, uma vez que apenado com reclusão de um a cinco
anos e multa.
Por outro lado, a previsão legal de multa alternativa com a pena
privativa de liberdade pode ter influência no cabimento da suspensão. É o caso,
por exemplo, dos crimes contra a relação de consumo, previsto no art. 7º, da Lei
nº 8.137/90, para os quais a pena é de reclusão de dois a cinco anos ou multa.
Nesse caso, a pena mínima é a de multa, e, portanto, cabível ao instituto
despenalizador da suspensão condicional do processo.
Por fim, há de se ressaltar que o instituto da Suspensão Condicional do
Processo é aplicável também às contravenções penais, já que a menção única à
palavra crime, expressa no art.89, da mencionada Lei, não teve a finalidade de
excluir o benefício em relação às contravenções, que afinal, constituem infração
de menor gravidade. Por isso, é possível que o autor da infração de menor
potencial ofensivo recuse a proposta da transação penal para aplicação imediata
da pena de multa ou restritiva de direitos e, na seqüência, aceite a proposta de
Suspensão Condicional do Processo.
9.4 ACEITAÇÃO DA PROPOSTA
97
Se o autor da infração aceitar a proposta de suspensão condicional do
processo formulada pelo MP, esta se tornará irretratável, salvo em caso de
comprovado vício de consentimento, tais como erro e coação. Se o autor não
aceitar a proposta, o processo prosseguirá.
9.5 DIFERENÇA ENTRE A TRANSAÇÃO PENAL E A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
A transação penal é aplicada quando a pena máxima abstrata
cominada ao delito não for superior a dois anos (art.61) e se encerra com a
aplicação da pena (art.76, §4º).
Já a suspensão condicional do processo, no sursis processual, a pena
mínima não é superior a um ano (art.89) e não havendo revogação da medida,
culmina com a extinção da punibilidade, não havendo imposição da pena (art.89,
§6º).
9.6 DIFERENÇA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO COM O SURSIS
A diferença da suspensão condicional do processo em relação ao sursis
é que aquele não exige sentença condenatória, procurando evita-la pelo
sobrestamento da ação penal; é uma forma de despenalização e caso a
suspensão seja revogada, o processo segue seu curso regular, enquanto este
está subordinado à existência de sentença condenatória, tem natureza retributiva
98
e sancionaria e caso revogado, o condenado cumpre a pena que se encontrava
suspensa.
9.7 EXTENÇÃO E APLICAÇÃO
A suspensão provisória do processo pode ser aplicado:
a - a todos os delitos e contravenções referidos no art. 89 da
lei nº 9.099/95, que estejam descritos no CP ou em legislação especial e
b - por todos os juízes e não somente pelo Juizado Especial
Criminal. Incide, pois, presentes os seus requisitos, sobre todos os delitos da
competência do juízo comum e do Juizado Especial Criminal, obedecida à regra
de classificação do art. 89, caput, da mencionada lei.
9.8 COMPETÊNCIA
O Juizado Especial Criminal só poderá aplicar a suspensão condicional
do processo nas ações penais por infrações de sua competência e nas
contravenções e nos delitos a que a norma incriminadora comine pena mínima
igual ou inferior a um ano. As outras infrações são de competência da justiça
comum.
9.9 CONCURSO DE CRIMES
99
Nos casos de concurso material, somente será possível aplicar o
instituto da suspensão condicional do processo se a soma das penas mínimas
não ultrapassarem um ano. Diante disso, Jesus assume duas posições:
1ª) As penas mínimas abstratas não podem ser somadas para fim de impedimento da medida. As infrações penais devem ser consideradas isoladamente. Nesse sentido: TACrimmSP, ACrim 1.007.849, 8ª Câm., rel. Juiz S.Garcia, SEDDG, rolo-flash 1.049/187; TACrimSP, HC 292.000, 11ªCâm., 2-7-1996, rel. Juiz Xavier de Aquino, SEDDEG, rolo-flash 1.048/159; TACrimSP, ACrim 963.943, 12ª Turma, 3-6-1996, rel. Juiz Walter Guilherme. Nesse sentido, na doutrina: Ada Pellegrine Grinover et. Al., Juizado Especiais Criminais, 3 ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p.254, n4.5.; STJ, RHC 7.583, 5ªT., rel. Min. Edson Vidigal, j. 23-6-1998, DUJ, 31 ago. 1998, p. 110; STJ, RHC 7.809, 6ª T., rel. Min. Vicente Cernicchiaro, DJU, 9 nov. 1998, p. 172-3. 2ª) É inadmissível a medida se a soma das partes mínimas ultrapassa o limite legal. Nesse sentido : STJ, HC, 7.560, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, DJU, 12 abr. 1999, p. 196; STJ, RHC 8.093, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, DJU, 17 maio, 1999, p. 220; TACrimSP, ACrim 1.142.949, 1ª Câm., j. 15-7-1999, RT, 771:610. Na doutrina no Segundo sentido: René Ariel Dotti, Conceitos e distorções da Lei nº.9.099/95- Temas de direito e processo penal, Juizado Especiais Criminais, org. Antonio Sergio A. de Moraes Pitombo, São Paulo, Malheiros Ed., 1997, p.45 e s. Nossa posição: a primeira. De observar-se que o art. 89, caput, da lei nº 9.099/95 impõe como condição do sursis comum (CP, art.77) dentre os quais se encontram as “circunstâncias” da prática do crime, subjetivas e objetivas, inserindo-se nesta a gravidade objetiva do fato, que poderia pelo número de infrações em concurso material, desautorizar a concessão. Nesse sentido: Ada Pellegrine Grinover et al., Juizados Especiais Criminais, 3 ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p.255. 98
No caso do concurso formal e de crimes continuados, somente será
cabível a aplicação do instituto despenalizador da Suspensão Condicional do
Processo, se o aumento mínimo, que é de um sexto, conforme menciona os arts.
70 e 71, do Código Penal, aplicado sobre a pena mínima do crime mais grave,
não suplantar o limite de um ano.
No caso de concurso formal entre homicídio e lesão culposa, por
exemplo, dever-se-á levar em conta a pena mínima do homicídio culposo. Como a
pena mínima desse crime é de um ano, havendo a incidência do aumento de um
sexto referente ao concurso formal, estará afastada a possibilidade da aplicação
da suspensão condicional do processo, uma vez que a pena mínima passará a
98 JESUS, 2007, p.88-89.
100
ser de um ano e dois meses. Este posicionamento foi consagrado pelas súmulas
243 do STJ e 723 STF:
Há três orientações: 1ª) As infrações devem ser consideradas isoladamente. Nesse sentido Ada Pellegrine Grinover et. al.., Juizados Especiais Criminais , 3 ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p.254; STF, HC 760:533; STJ, RHC 7.809, 6ª T., rel. Min. Vicente Cernicchiaro, DJU, 9 nov. 1998, p. 172-3. Para esta posição as penas mínimas abstratas não podem ser somadas (STF, HC, 76.717, 2ª T. rel., Min Mauricio Correa, RT, 760:533). 2ª) Se, com a causa de aumento (CP, art.70, caput), a pena mínima ultrapassa o limite legal, é inadmissível a medida. Nesse sentido: STF, HC 78.876, 2ª T., rel.Min Mauricio Correa , DJU, 28 MAIO 1999, P.6-7; STJ; RHC 8.093, 5ªT., rel.Min Gilson Dipp, 17 maio 1999, p.219; STJ, RHC 8.331, 5ªT.,rel. Min Gilson Dipp, 17 maio 1999, p.220. 3ª) Não se admite a medida se a soma das penas mínimas abstratas ultrapassa o limite legal ( sumula 243 do STJ) TAMG, ACrim 1.142.949, 1ª Câm., rel. Juiz Audebert Delage, RT, 756:662; TACrimSP, ACrim 1.142.949, 1ª Câm., j. 15-7-1999, RT, 771:610). Na doutrina, no terceiro sentido: René Ariel Dotti, Conceitos e distorções da Leo. N. 9.099/95 – Temas de Direito e Processo Penal, Juizados Especiais Criminais, org. Antonio Sergio A. de Morais Pitombo, São Paulo, Malheiros Ed., 1997, p.46. Nossa Posição: a primeira. De observar-se que o art. 89, caput, da Lei nº. 9.099/95 impõe como condições dos sursis processual a presença dos requisitos de permissibilidade do sursis comum (CP, art. 77), dentre os quais se encontram as “circunstâncias” da prática do crime, subjetivas e objetivas, inserindo-se nestas a gravidade objetiva do fato, que poderia pelo número de infrações em concurso formal, desautorizar a concessão. Nesse sentido, com posição original: Ada Pellegrine Grinover et. al., Juizados Especiais Criminais, 3 ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p.255. 99
Entretanto, há posicionamentos em sentido contrário, que estão
fundados em aplicações analógicas do art. 119, do CP, que determina a análise
autônoma de cada delito para fim de reconhecimento de causas extintivas da
punibilidade.
9.10 CÁLCULO DA PENA MÍNIMA
Nos casos de suspensão do processo (art. 89, da Lei nº 9. 099/95),
para o cálculo da pena mínima:
99 JESUS, 2007, p.129.
101
(a) [...] leva-se em conta a causa de aumento decorrente do concurso formal ou do crime continuado, ou, no caso de material, a soma de todas as penas mínimas abstratas, não havendo que calcular benefício sobre a pena de cada crime isoladamente, como se não houvesse concurso. Esse entendimento, inclusive, encontra-se na Súmula 243 do STJ. Referido tribunal vem também entendendo essa interpretação ao instituto da transação penal: “Segundo precedentes, ‘a transação penal não tem aplicação em relação aos crimes cometidos em concurso formal ou material e os chamados crimes continuados, se a soma das penas mínima cominada a cada crime, computando o aumento respectivo, ultrapassar o limite de um ano’. Agravo desprovido.” O limite da pena, na realidade, não pode ultrapassar 2 anos, em face do advento da Lei. 10.259/2001.
(b) Do mesmo modo se procede com qualquer causa especial de aumento de pena. Se, com o aumento, a pena mínima ultrapassar o limite legal, torna-se inadmissível a medida.
(c) Na compreensão da pena mínima não superior a um ano, para efeitos de admissibilidade da suspensão do processo, devem ser consideradas as causas especiais de diminuição de pena em seu percentual maior, desde que já reconhecidas na peça de acusação.100
Tal é o entendimento do nobre doutrinador Fernando Capez. No
entanto, vale ressaltar que, no caso, não é o posicionamento dominante.
9.11 BENEFÍCIOS DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
Os benefícios na suspensão condicional do processo são:
a- O acusado deve evitar a prisão;
b- Não o obriga ao constrangimento de comparecer várias
vezes como réu perante a justiça criminal;
c- Reduz o custo do delito e
d- Diminui o volume do serviço judiciário, permitindo que a
justiça cuide com maior zelo da criminalidade violenta;
100 CAPEZ, 2006, p.574-575.
102
9.12 REQUISITOS DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
Os requisitos da suspensão condicional do processo são:
a - a denúncia seja recebida, pois, se o fato narrado não
constituir crime, se já tiver extinta a punibilidade pela prescrição ou outra causa,
se houver a ilegitimidade da parte ou se faltar alguma condição da ação, a
denúncia deve ser rejeitada, conforme art. 43, do Código de Processo Penal,
assim ficando vedada a suspensão condicional do processo;
b - o acusado não esteja sendo processado;
Em relação a este requisito, têm-se dois posicionamentos, os quais
acarretam grande divergência. Para Luiz Flavio Gomes, em sua obra Suspensão
Condicional do Processo (São Paulo, Revista dos Tribunais), há a
inconstitucionalidade do dispositivo, que não se sustentaria diante do princípio do
estado de inocência. A lei, nesse contexto, estaria negando um benefício ao
acusado, sem que este tivesse sido condenado pelo delito anterior. Essa é a
orientação dominante na jurisprudência. Já Júlio F. Mirabete argumenta que,
[...] ao contrário do que se tem por vezes afirmado, a existência desse requisito não viola o princípio da presunção de inocência, ou de não culpabilidade, ao impedir a suspensão pela simples exigência de um outro processo contra o acusado. A lei pode exigir requisitos vários para a concessão ou mantença de direitos ou benefícios. Assim, nunca se argüiu a inconstitucionalidade, nem poderia faze-lo, do disposto nos arts. 81,§3º e 89 do Código Penal , pelos quais se prorroga o prazo do sursis e do livramento condicional pela existência de outro processo durante a vigência desses benefícios. Aliás, a suspensão do processo é uma exceção à regra de que o autor do crime deve ser processado e, tratando-se de um benefício , é natural que a lei estabeleça exigências para sua concessão, impedindo que se desenvolva a ação penal. 101
A lei, ao vedar o benefício, fez menção apenas àquele que está sendo
processado por outro crime (doloso, culposo, apenado com reclusão ou detenção,
de ação pública e privada) não impedindo, portanto, sua concessão a quem está
sendo processado por contravenção penal.
101 MIRABETE, Júlio F. Juizados Especiais Criminais. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 150.
103
c- o réu não tenha sido condenado anteriormente por outro
crime;
Este requisito também possui divergência quanto à doutrina e a
jurisprudência, uma vez que para alguns o decurso do prazo de reincidência de
cinco anos referidos no art.64, I, CP, faz com que seja possível o benefício,
enquanto para outros o silêncio da lei indica estar vedada a concessão da
suspensão, qualquer que tenha sido o período decorrido após a condenação. A
mesma divergência existe acerca da vedação em fase da condenação anterior à
multa.
Sendo que nas duas situações, os partidários do cabimento do
benefício sustentam a aplicação subsidiária do código penal (art.64, I e 77, §1º),
enquanto os demais entendem incabível essa aplicação subsidiária ou a utilização
da analogia, por entenderem que o legislador quis efetivamente afastar o
benefício nas duas hipóteses; caso contrário, teria expressamente permitido sua
aplicação.
Uma outra questão que pode gerar certa dúvida é a do cabimento da
suspensão condicional do processo quando, em processo anterior, foi o réu
beneficiado pelo perdão judicial. Havia grande divergência doutrinária e
jurisprudencial em torno da natureza jurídica da sentença concessiva do perdão
judicial. Seria ela condenatória ou declaratória da extinção da punibilidade? Se a
natureza for condenatória, estará vedada a suspensão do processo, mas, se for
declaratória, não. A divergência, entretanto, está superada pela edição da Súmula
18 do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece ser a sentença concessiva do
perdão judicial declaratória da extinção da punibilidade. Assim sendo, não impede
a suspensão condicional do processo em crime posterior.
E por último, que:
d - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e
personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a
concessão do benefício.
104
Esses são considerados os requisitos subjetivos da suspensão
condicional do processo, enquanto os mencionados anteriormente, são
classificados como requisitos objetivos.
Fernando Capez entende que:
Admite-se a possibilidade de o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, propor a suspensão condicional do processo, pelo prazo de 2 a 4 anos: em crime cuja pena mínima cominada seja igual ou inferior a um ano, abrangido ou não por esta Lei, desde que o acusado preencha as seguintes exigências legais:
- não estar sendo processado ou não ter sido condenado por outro crime: A Lei fala em crime, de forma que não abrange o processo ou a condenação por contravenção penal. Convém notar que, para Cezar Roberto Bitencourt, “não será justo impedir ad, eterno esse novo beneficio por que, por exemplo, num passado distante, o acusado já foi condenado por um crime. [...]Assim, pode se invocar a previsão do art. 64, I, do Código Penal, segundo o qual as condenações com mais de 5 anos não prevalecem para efeitos de reincidência. Parece-nos que a semelhança de propósito autoriza a interpretação, para desconsiderar como fator impeditivo da suspensão do processo (como também da transação penal) condenações cumpridas ou extintas, há mais de 5 anos.
-estarem presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (CP, art.77). Convém notar que, de acordo com o disposto no art. 77,§1º, do CP, a condenação anterior a pena de multa não impede a concessão da suspensão condicional da pena. Indaga-se: tal condenação também não impediria a concessão do sursis processual? Para Luiz Flavio Gomes, a pena de multa anterior não impede nem o sursis clássico, nem a suspensão condicional do processo: “De se observar que o art.89 não pode ser interpretado isoladamente. Por força do art. 92 da Lei 9.099/95, aplicam-se subsidiariamente o código penal e o código de processo penal, no que não forem incompatíveis com a citada lei. Em se tratando de condenação anterior a multa, é evidente que não houve nenhum fato grave. A concessão da suspensão, assim, nada perde em termos de prevenção geral. Se presente todos os demais requisitos, será possível a suspensão”. Em sentido contrário: Cezar Roberto Bitencourt, para quem “a lei não se preocupa com a natureza da pena cominada ou aplicada ao débito anterior, interessando-se somente pela existência ou não de outro processo ou outra condição, por outro crime. 102
Deve haver bastante prudência por parte do Ministério Público e dos
Juízes em relação a estes requisitos, pois que, por se tratar de medida
despenalizadora, há de dar especial atenção a eles, para evitar que a sociedade
fique desamparada ante a concessão do benefício a todo e qualquer delinqüente.
Assim, não deve ser concedida a suspensão condicional do processo
quando houver alguma suspeita de que o acusado voltará a delinqüir ou quando o
102 CAPEZ, 2006, p. 569-570.
105
delito se reveste de especial gravidade, já que não se pode colocar em uma
mesma situação daquele que pratica a receptação de uma bicicleta usada e
aquele que pratica a receptação de toda uma carga de um caminhão roubado.
9.13 REVEL
Se o autor da infração de menor potencial ofensivo for revel não poderá
obter o beneficio do instituto da suspensão condicional do processo, instituto que
se fundamenta na ordem e qualidades do acusado no sentido de demonstrar
condições de cumprir deveres.
9.14 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA SUSPENSÃO EX OFFICIO PELO PODER JUDICIÁRIO, SEM ACEITAÇÃO DO ACUSADO
A inexistência de consenso entre a acusação e a defesa não tem a
faculdade de afastar o princípio da obrigatoriedade da ação penal. Na Lei nº
9.099/05, está prevista a suspensão consensual do processo. O Poder Judiciário
somente pode verificar a legalidade da proposta, sob pena de ferir os princípios
constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
O STF entende em relação ao caráter personalíssimo da suspensão
condicional do processo que:
Tendo sido afastada a Suspensão Condicional do Processo (Lei. nº 9.099/95, art.89) com relação a um dos réus pelo Tribunal de Justiça Estadual, não poderia a referida decisão atingir os demais co-réus que aceitaram as condições estabelecidas na Suspensão, tendo em vista o caráter personalíssimo desta aceitação. Com base nesse entendimento
106
a turma deferiu habeas corpus para restabelecer a Suspensão Condicional do Processo relativamente aos pacientes. 103
9.15 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA SUSPENSÃO EX OFFICIO PELO PODER JUDICIÁRIO, SEM OFERECIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A possibilidade da aplicação do instituto da suspensão condicional do
processo exige o consenso entre a acusação e a defesa. O Poder Judiciário
somente pode verificar a legalidade da proposta, sob pena de ferir os Princípios
Constitucionais do Contraditório e da exclusividade da Ação Penal Pública e
afastar o ius puniendi e o ius punitionis do Estado.
Os Juizados Especiais Criminais, em harmonia com a Carta Magna,
consagram o sistema acusatório, onde existe separação orgânica entre o órgão
acusatório e o órgão julgador.
A simples possibilidade de o Poder Judiciário, sem a devida proposta
do membro do Ministério Público, oferecer a suspensão condicional do processo,
estaria dando-lhe o controle sobre a ação penal pública, o qual o dono da mesma
é o Ministério Público, em clara incompatibilidade com o art. 129, I, da
Constituição Federal.
O Supremo Tribunal de Justiça decidiu “no sentido da exclusividade da
realização da proposta por parte do Ministério Público, para a concessão da
Suspensão Condicional do Processo.” 104
No mesmo sentido, a Súmula 696 do STF:
Estando presente os pressupostos legais permissivos da suspensão
condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça e propô-la, o
103 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 2ªT. – HC nº 75.924/MG – Rel. Min. Marco Aurelio, decisão: 30-3-98 – informativo STF, nº 105.104 RHC nº. 5.664/SP., rel. Min. José Arnaldo, DJ 28-11-96.
107
Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por
analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.
9.16 SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO SIMULTÂNEO
Não é permitido que o denunciado receba o beneficio de sursis
processuais em dois ou mais processos contemporâneo. A existência de um
processo exclui a medida quanto ao outro.
9.17 NÃO CABIMENTO DE HABEAS CORPUS PERANTE A RECUSA FUNDAMENTADA DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM OFERECER SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
Trata-se de faculdade exclusiva do Ministério Público o oferecimento da
Suspensão Condicional do Processo, estando presente os requisitos legais, para
fins de política criminal. É absolutamente incabível o ajuizamento de habeas
corpus contra negativa de oferecimento de proposta de suspensão condicional do
processo por parte do representante do Ministério Público. A suspensão
condicional do processo previsto na Lei nº 9.099/95, circunscreve-se:
[...] no princípio da disponibilidade regulada, da vontade consciente do acusado e seu defensor, das desnecessidades da aplicação da pena privativa de liberdade de curta duração, tendo em vista o menor potencial ofensivo da infração. A admissibilidade da suspensão do feito que deverá ser proposta ou não, fundamentalmente, pelo Ministério Público, nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, depende do preenchimento dos requisitos estabelecidos no art. 89 da Lei nº 9.099/94. A gravidade do delito integra o núcleo do crime, como elemento objetivo, constituindo-se no próprio mérito, que deverá ser analisado durante a instrução criminal, não se cogitando, portanto, de aspecto subjetivo, nos termos como estabelece a disposição legal em exame ao determinar a aplicação do art. 77, CP. O restrito campo “writ”, não se presta para exame de
108
elementos subjetivos que, em suma, importaria em reapreciação do aspecto de justiça ou injustiça na negativa da preposição ou denegação de pedido de suspensão do processo. 105
O posicionamento explicitado acima é o entendimento predominante no
Superior Tribunal de Justiça.
9.18 CONCURSO DE AGENTES
Quando duas ou mais pessoas são acusadas da prática de um mesmo
crime, é possível que apenas uma delas tenha direito ao benefício. Por exemplo,
é o que acontece, quando um dos autores do crime, possua maus antecedentes
ou é reincidente.
Assim, fica claro que somente caberá o benefício àquele que não
possuir maus antecedentes e que não seja reincidente. Caso este aceite o
benefício da suspensão condicional do processo, haverá o desmembramento do
feito, para que a instrução possa prosseguir em relação ao outro. Sobre o
concurso de pessoas do CP, art. 29: “A medida pode ser aplicada a umas e
negadas a outras.”106
9.19 MOMENTO DA PROPOSTA DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
O representante do Ministério Público deverá oferecer a proposta da
suspensão simultaneamente ao oferecimento da denúncia.
105 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 5º T. HC nº 5.027-0/RJ – Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini – Ementário STJ, 18/ 462.106 JESUS, 2007, p.134.
109
A referida proposta deve ser fundamentada e deve conter as condições
obrigatórias e, eventualmente, a sugestão de condições facultativas e deverá ser
analisada pelo acusado, logo após a realização da mesma (art.89, §7º).
9.20 HOMOLOGAÇÃO
Se o acusado e seu defensor aceitarem a proposta da suspensão, o
Juiz suspenderá a ação penal por período de dois a quatro anos, mediante o
cumprimento das condições estipuladas.
Na fixação do prazo da suspensão condicional do processo, o juiz
deverá levar em conta a gravidade do delito praticado pelo autor do fato, suas
circunstâncias e conseqüências, a personalidade do agente, entre outras.
Se, por outro lado, o juiz entender que não estão presentes os
requisitos legais, deixará de homologar o acordo, ou seja, a ação penal deverá
prosseguir. Nesse caso, o autor deverá impetrar habeas corpus e o Ministério
Público ingressar com mandado de segurança na defesa de direitos líquido e
certo do acusado.
9.20.1 Pressupostos para homologação da suspensão
São quatro os pressupostos para a homologação da suspensão
condicional do processo, dentre eles:
110
a- Proposta do Ministério Público;
b- Legalidade da proposta;
c- Aceitação do acusado e
d- Recebimento da denúncia.
9.23 PERÍODO DA PROVA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
O prazo do período da prova será de dois a quatro anos, mediante o
devido cumprimento das condições impostas pelo Juiz, por parte do acusado.
O período de dois a quatro anos é fixado pelo juiz tendo em vista: a) a natureza do crime e personalidade do denunciado (RT, 481:410); b) a cominação abstrata da pena (BMJTACrimSP, 18:10). 107
Se o paciente estabelece um acordo com a acusação, o que proporcionou a suspensão condicional do processo, na forma do art. 89, da Lei nº 9.099/95, está implícito que reconheceu a suas responsabilidade pelo ato delituoso, não podendo, posteriormente, e sem demonstrar o vício na manifestação de sua vontade, que o mesmo seja atípico, em franca contradição com aquilo que ficou estipulado no juízo monocrático. 108
Já sobre o período de provas nas contravenções,
“A Lei é omissa, uma vez que se refere a crime (caput do art.89).
Deve, todavia, ser aplicado o art.11 da LCP por analogia: o período de prova é de
um a três anos.” 109
107 JESUS, 2007, p.131.108 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 6º T. RHC mº. 6.493/RJ – Rel. Min. Anselmo Santiago, decisão: 6 de outubro de 1997.109 JESUS, 2007, p.116.
111
9.22 CONDIÇÕES OBRIGATÓRIAS E FACULTATIVAS
O Juiz, após o acusado aceitar a proposta feita pelo representante do
Ministério Público, receberá a denúncia, suspenderá o processo, fixando as
seguintes obrigações:
a - Reparação do dano, salvo impossibilidade de faze-lo;
b - Proibição de frequentar determinados lugares;
c - Proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem
autorização do Juiz e
d - Comparecimento pessoal e obrigatório a Juízo,
mensalmente, para informar e justificar suas atividades.
Compete ao Juiz deprecante,
“[...] ao enviar carta precatória para os efeitos do art.89, da Lei nº
9.099/95, fixar as condições pessoais a serem propostas ao acusado, antes, é
evidente, sob formulação do Ministério Público”. 110
Já em condições facultativas, o Juiz poderá estipular outras condições
adequadas ao fato e a situação do acusado.
9.23 RÉU QUE NÃO CONCORDA COM AS CONDIÇÕES OBRIGATÓRIAS E/OU FACULTATIVAS IMPOSTAS NA SUSPENSÃO
Se não houver o consenso do acusado, não haverá a suspensão
110SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 3ª Seção. Conflito de Competência nº 18.619/SP – Rel. Min. José Arnaldo, Diário da Justiça, Seção I, 4 de agosto de 1997, p.34.653.
112
condicional do processo, conforme art. 89, §7º.
Desta forma, o processo deverá prosseguir em face do Princípio do
Devido Processo Legal.
9.24 PRESCRIÇÃO
A partir da concessão da suspensão condicional do processo, a
prescrição será suspensa (art. 89, §6º), até o término do período de prova e
consequente extinção da punibilidade, ou até eventual revogação da mesma
(art.89, § 3º e 4º ). Dessa forma, a prescrição da pretensão punitiva:
“[...] não ocorre durante o sursis processual (§6º). O legislador criou
uma nova causa suspensiva da prescrição.” 111
9.25 CAUSAS DE REVOGAÇÃO OBRIGATÓRIA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
Será revogada a suspensão condicional do processo se durante o
prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem
motivo justificado, a reparação do dano.
O simples fato do cometimento de novo crime não acarreta a revogação
da suspensão condicional do processo, uma vez que a lei fala em “ser
processado”, sendo assim necessário o recebimento da denúncia ou queixa
crime.
111 JESUS, 2007, p.135.
113
9.26 INQUÉRITO POLICIAL
Não acarretará a revogação do benefício da suspensão condicional do
processo, uma vez que o beneficiário ainda não foi processado.
9.27 TRANSAÇÃO PENAL E REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO
O beneficiário que cometer uma infração de menor potencial ofensivo e
na fase pré-processual aceitar a proposta de transação penal oferecida pelo
representante do Ministério Público e consequentemente a aplicação da pena
restritiva de direito ou multa, sendo homologada pelo Juiz, não será revogada o
benefício da suspensão condicional do processo, uma vez que não haverá
processo.
9.28 CAUSAS DE REVOGAÇÃO FACULTATIVA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
Conforme estabelece o art. 89, §4º da referida lei, a suspensão
condicional do processo poderá ser revogada se o autor da infração vier a ser
processado, no curso do prazo, por contravenção penal ou descumprir qualquer
outra condição imposta.
114
9.29 CAUSA DE DESCONSIDERAÇÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO
O representante do Ministério Público ao juntar a denúncia, durante o
curso do prazo, para crime que não se enquadre nos requisitos legais, previsto
pelo art. 89, da lei nº 9.099/95, deverá requerer a desconsideração da suspensão
condicional do processo, por não se tratar de causa obrigatória ou facultativa da
revogação.
O Juiz, após receber a denúncia, deverá desconsiderar a suspensão
condicional do processo, prosseguindo-se nos termos posteriores do processo e
cessando a suspensão da prescrição.
9.30 APLICABILIDADE DA REGRA DA SUSPENSÃO – RETROATIVIDADE/IRRETROATIVIDADE
A suspensão condicional do processo, tem retroatividade benéfica,
apesar de ser norma predominantemente processual, por ter conteúdo e reflexos
penais.
9.31 IMPOSSIBILIDADE DA CONCESSÃO DE SURSIS AO SENTENCIADO CUJA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO HAJA SIDO REVOGADA
Se o beneficiário der causa a revogação do benefício da suspensão
condicional do processo, sendo posteriormente condenado à pena privativa de
115
liberdade, não se aplicará o sursis, uma vez que a conduta do beneficiário
demonstrou-se incompatível com o novo benefício.
9.32 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO REGIME SEMI-ABERTO AO SENTENCIADO CUJA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO HAJA SIDO REVOGADA
O Juiz poderá estabelecer qualquer um dos regimes iniciais da pena
(art.33, §3º CP), devendo levar em consideração os critérios estabelecidos no art.
59, do Código Penal. É evidente que:
[...] o Juiz, ao estabelecer na sentença, que o condenado poderá iniciar o desconto da pena, este ou naquele regime, o faz a partir de dados existentes nos autos, estabelecendo-a abstratamente, provisoriamente e somente será concretizada no juízo das execuções, visto que poderá ocorrer progressão ou regressão durante o procedimento executório, nos termos dos art. 112 e 118 da nova lei de execução penal. 112
Assim, o Juiz, atendendo, dentre outras circunstâncias, à culpabilidade,
aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, fixará o regime
inicial de cumprimento da pena.
Ainda, o descumprimento das condições impostas pelo benefício da
suspensão condicional do processo, demonstra o não merecimento ao regime
inicial aberto.
9.33 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
O Juiz deverá decretar a extinção da punibilidade, conforme previsto no
112 TACRIM – SP – HC 14.948/1, Rel. Brenno Marcondes.
116
art. 89, §5º, da lei 9.099/95, se o acusado não tiver dado causa a revogação do
benefício durante o período de prova. A extinção da punibilidade impede que seja
negado qualquer benefício futuro ao réu pela prática de outra infração penal, ou
seja, não será considerado reincidente ou portador de antecedentes criminais.
Decorrido o período de prova sem que o réu tenha dado causa a revogação do benefício, o juiz declarará extinta a punibilidade do agente. Assim, “o término do período de prova sem revogação do sursis processual não induz, necessariamente, à decretação da extinção da punibilidade delitiva, que somente tem lugar após certificado que o acusado não veio a ser processado por outro crime no curso do prazo ou não efetuou, sem motivo justificado, a reparação do dano.” 113
Deste modo, extinta a punibilidade pelo cumprimento das condições, se
o acusado vier a cometer novo delito, poderá novamente ser beneficiado com a
suspensão do processo, desde que presente os requisitos legais do art. 89, da
mencionada Lei. Ao contrário do benefício da Transação Penal (art. 76, §2º, II), ou
seja, não existe previsão legal que impeça nova suspensão condicional do
processo pelo prazo de cinco anos.
113 CAPEZ, 2006, p.573.
117
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após o estudo do tema objeto do presente trabalho, tem-se que o art.
98, inciso I, da Carta Magna de 1988, trouxe uma grande inovação para nosso
ordenamento jurídico brasileiro, qual seja, a criação dos Juizados Especiais
Criminais para o julgamento de infrações penais de menor potencial ofensivo,
através dos procedimentos oral e sumaríssimo, permitindo a aplicação do instituto
da transação penal entre as partes.
De outra banda, permite, também, a aplicação do instituto
despenalizador da suspensão condicional do processo e, por fim, o julgamento de
recursos por turmas de juízes de primeiro grau, tendo assim como objetivo
descongestionar a máquina do judiciário, buscando a economia processual e a
redução do tempo entre a prática da infração penal e a decisão judicial, de modo
a dar uma resposta mais rápida à sociedade, pois é célere e informal.
Assim, a Lei em tela trouxe grandes inovações para o nosso
ordenamento jurídico brasileiro tais como a composição do dano civil, a transação
penal, a representação e a suspensão condicional do processo.
Destarte, pode-se concluir que a finalidade primordial da lei, ou seja, o
desafogamento dos processos existentes no Juízo Comum, infelizmente não foi
completamente atingida, porquanto, consoante se vê diariamente, os cartórios
continuam com milhares de processos, seja na Justiça Comum ou mesmo no
âmbito do JECRIM.
118
O que se deve buscar, definitivamente, é a real efetivação da lei que
dispõe sobre os Juizados Especiais Criminais, mediante investimento, do Poder
Público, desde a informatização até a contratação de pessoal, que deve,
constantemente, receber capacitação para melhor atender aos jurisdicionados.
Apenas assim, será atingida a verdadeira intenção do legislador: desafogar a
máquina judiciária.
119
REFERÊNCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Juizado Especial Criminal e Alternativas à pena de prisão. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p.155.
BRASIL. Constituição Federal do Brasil, 2007, Saraiva. 2007.
BRASIL. Lei nº 9099/1995. PLANALTO. Portal on line. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9099.htm. Acesso em: 21 mai 2007.
BRASIL. Lei nº 11.313/2006. PLANALTO. Portal on line. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11313.htm . Acesso em: 28 mai 2007.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. – 2º T. – Rextr. nº 175.161 – 4/SP – Rel. Min. Marco Aurélio, Diário de Justiça, Seção I, 14 de maio de 1999.
______. Suspensão do Processo: Caráter Personalíssimo. 2º T, HC nº 75.924/MG, Rel.min. Marco Aurélio, 30 de março de 1998, Informativo STF, nº 105.
______. Causa de aumento de pena do Artigo 18, III da Lei 6.368/76. 1º T, HC nº 75.393/ SP, Rel.min. Sepúlveda Pertence, DJU, 19 de dezembro de 1997, pág. 42.
______.Transação penal: sujeito ativo, procedimento, sentença, implicações legais e constitucionais. HC nº 79.572-GO, Rel. Min. Marco Aurélio, Boletim Informativo do STF nº180, julho de 2000.
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. – 5º T. – HC nº 5.027-0/RJ – Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini – Ementário STJ, 18/ 462.
______. 6º T. RHC mº. 6.493/RJ – Rel. Min. Anselmo Santiago, decisão: 6 out. 1997.
______. 3ª Seção – Conflito de Competência nº 18.619/SP – Rel. Min. José Arnaldo, Diário da Justiça, Seção I, 4 de agosto de 1997, p.34 - 653.
Brasil. Tribunal de Alçada Criminal. – SP – HC 14.948/1, Rel. Brenno Marcondes.
120
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.
______. Curso de Direito Penal. Volume 4: Legislação Penal Especial. São Paulo: Saraiva, 2006.
GIACOMOLLI, Nereu José. Juizado Especial Criminal – Lei 9.099/95. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
GRINOVER, Ada Pellegrine. Juizado Especial Criminal. São Paulo: RT, 1997.
GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Juizados Especiais Criminais: Doutrina e Jurisprudência atualizadas. 3 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.
GOMES, Luiz Flavio. Suspensão Condicional do Processo Penal. São Paulo: RT, 1995.
GLEBER, Daniel. Juizado Especial Criminal: Lei n° 9.099/95: Comentários e Críticas ao modelo consensual penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2006.
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MORAIS, Alexandre & SMANIO, Gianpaolo Poggio. Legislação Penal Especial – Série Fundamentos Jurídicos – 9. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
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______. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Criminais. 4 ed. rev. e atual . São Paulo: Saraiva, 2007.
121
ANEXO I
Fonte: MORAES, Alexandre de & SMANIO, Gianpaolo Poggio. Legislação penal especial. – 9 ed. – São Paulo: Atlas, 2006, p. 281. (Série fundamentos jurídicos)
122
ANEXO II
Fonte: MORAES, Alexandre de & SMANIO, Gianpaolo Poggio. Legislação penal especial. – 9 ed. – São Paulo: Atlas, 2006, p. 297. (Série fundamentos jurídicos)
123
ANEXO III
Fonte: MORAES, Alexandre de & SMANIO, Gianpaolo Poggio. Legislação penal especial. – 9 ed. – São Paulo: Atlas, 2006, p. 336. (Série fundamentos jurídicos).
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