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Crônicas e escritos de Gideon Marinho Gonçalves
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Contato:
Gideon Marinho Gonçalves gideonmarinho@gmail.com
* * *
20 de Julho de 2008 Versão 1.0
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AOS MEUS FILHOS Glauber e Jean,
razão do meu viver.
AOS MEUS PAIS Felisberto e Denir,
minha inspiração para a vida.
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Conteúdo
Aos meus filhos 3
Aos meus pais 3
Introdução 5
Música contemporânea, impulsos do inconsciente 6
Verdade e Mentiras - Quarteto em Cy 8
As artimanhas de Scapino - Molière me faz rir 9
Uma noite de erudição 11
Perfume de harmonia 13
Vivendo com arte 15
A Arte da prostituição de Gabriela 17
Com anjos no frio - Lembranças de Joinville 21
Focus e Quidam. Emoção ao máximo! 23
Descobrindo o samba 25
A donzela no Arco dos Teles 26
Nascedouro de pedras 28
O Theatro da minha vida 30
Chico Buarque e o "sempre" 33
A Solidão e o celular 35
Mulher do Metrô 39
Indo à praia 41
Arte, a lanterna da alma 46
Av. Rio Branco, meu Rio de Janeiro 48
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INTRODUÇÃO
A intensidade do dia-a-dia procuro não deixar fugir de meu olhar. Registro as minhas
impressões sobre a vida como que compungido por um compromisso urgente comigo
mesmo. A vida no subúrbio e na cidade passa ligeira. Observo o seu rastro buscando
situações que seriam efêmeras sob outro aspecto, mas que me servem como matéria prima
para as minhas reflexões.
Não me preocupo demasiadamente com os estilos literários. Em parte porque não sou
especializado em Literatura, e mais, não consigo adestrar o ritmo e a métrica da minha
narrativa aos diversos estilos existentes. A vida é ligeira e às vezes a rima que
complementa um fato sensível dá-se na imaginação de cada um. Não é preciso registrá-la,
necessariamente.
Os fenômenos de minha imaginação e sentimento, mesmo que às vezes intensos e
desconcertantes, são narrados em forma de prosa poética, poemas, poesias ou ensaios.
Não se choquem, e perdoem-me a impetuosidade, às vezes.
Agradeço os comentários à obra!
O Autor
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MÚSICA CONTEMPORÂNEA, IMPULSOS DO INCONSCIENTE
Macaé, Janeiro de 2002 i
ábado. Acordei me sentido só. Tomei
um banho e liguei a TV enquanto preparava um
café. Assisti ao Artur da Távola no programa da
TV Senado chamado “Quem tem medo da
Música Clássica?” Hoje o tema era a linda e
surpreendente A Sagração da Primavera de
Stravinski. Uma frase dita pelo Stravinski, para
justificar a sua música, e repetida pelo Artur da
Távola, fixou na minha mente, algo como:
- A música tem de ser libertada, não precisa ser
bela! Pensei muito sobre isso.
Ouço Debussy, Images pour Orchestre, Orquestra Sinfônica de Boston dirigida por
Michael Tilson Thomas. Linda execução. Ultimamente meu gosto tem recaído sobre a
música contemporânea. Gosto de Stravinski, Debussy, Schomberg etc. Parece que a
música de hoje é impositiva, como se fosse um organismo vivo que precisa alimentar-se
das agonias do homem, e para isso vai à busca do seu alimento em nosso subconsciente.
Isso às vezes choca, contudo agrada-me, excita-me, parece sacudir meus neurônios. Às
vezes penso que ela, a música, se preocupa em quebrar, impiedosamente, os preconceitos
estéticos do homem para firmar-se como um organismo vivo em sua luta pela
perpetuação da espécie. De fato, concluo que a música é um ser vivo que sobrevive e
apresenta-se como tal no consciente e subconsciente do homem.
A música contemporânea descomprometeu-se com as regras impostas pelo consciente
histórico e apresenta-se hoje se utilizando dos impulsos do inconsciente. Por isso às
vezes choca. Acordes e combinações de sons e ritmos que se insurgem do nosso mais
profundo inconsciente e têm de passar pelo crivo do consciente. Choca, mas é bom,
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parece empurrar destroçar alguns neurônios fazendo-os reorganizarem-se, encontrarem e
aceitarem novas combinações estéticas.
É uma renovação da Arte e, conseqüentemente, uma parcela, mesmo que miúda, da
evolução biológica.
FIGURA: FREE VIOLIN IMAGES + PICTURES - HTTP://WWW.8NOTES.COM/PICTURES/VIOLIN/TN_VIOLIN5_JPG.JPG
.
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VERDADE E MENTIRAS - QUARTETO EM CY
Macaé/RJ - Quarta-feira, 11 de junho de 2003
oje fui ao Teatro Municipal de Macaé
ver o Quarteto em Cy. Não iria, foi um dia
difícil. Dia em que saberíamos qual empresa
ganharia o contrato de serviço, ou seja, qual
seria a minha nova empregadora. Trabalhei
direto sem almoço até às 14 horas e depois fui embora. Não quis ficar para saber o
resultado da licitação. À noite lembrei que teria um show no Teatro Municipal. Liguei
para lá e consegui um desconto de 10 reais. Arrumei-me e fui correndo. Cheguei antes do
show começar que, aliás, atrasou meia-hora.
Valeu à pena. São quatro mulheres lindas, todas irmãs e com o nome começando com Cy.
O Quarteto em Cy foi formado em Salvador pelas irmãs Cyva, Cybele, Cynara e Cylene,
estreando na TV Itapoã, em Salvador. Em 1959, Cyva foi para o Rio de Janeiro RJ tentar
a carreira artística e depois as outras a seguiram. Conheceram, então, Vinícius de Moraes,
que sugeriu o nome para o quarteto. Cantaram pérolas da bossa-nova. Aliás, o tema do
espetáculo era algo como “Verdades e Mentiras”.
Abriram o espetáculo com uma música sobre o tema. Depois vieram Samba do Avião e
Samba de uma Nota Só, de Tom Jobim; João e Maria de Chico Buarque. O grupo era
acompanhado por um baixo e um teclado o qual incluía a percussão, e o que, no meu
entendimento, foi um tremendo erro. A formação pedia um percussionista principalmente
com pandeiro, na maioria das músicas. Tirando essa falha da formação do grupo e alguns
desafinos por conta da idade das cantoras, todo o demais foi ótimo. Cantei e voltei feliz.
Voltei correndo para ver a final de Flamengo e Cruzeiro.
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AS ARTIMANHAS DE SCAPINO - MOLIÈRE ME FAZ RIR
Macaé/RJ - Domingo, 18 de maio de 2003
oje fui ao teatro. Pela manhã, quando passava
em frente ao teatro vi que iria acontecer uma peça à
noite: “As artimanhas de Scapino”, uma comédia de
Molière. Comprei o ingresso.
Já era 08h45min da noite e eu ainda estava jogado no
sofá assistindo ao Jornal Nacional. Corri para escolher uma roupa bonita, afinal de contas
eu queria ir bem vestido para o teatro. Escolhi uma camisa amarela de linho e uma calça
também de linho. Passei a camisa e, para variar, desisti dela. Peguei a camisa verde.
Vesti-me, perfumei-me, passei gel na barba e nos cabelos que ainda me restam. Lá fui eu
correndo. Faltavam somente cinco minutos. O saguão do teatro estava vazio o que
indicava que todos já haviam entrado. Dei boa-noite ao recepcionista e procurei o meu
assento, G-1, bem na linha do eixo central do palco. Eu estava meio triste, desanimado,
mas quando vi a companhia já no palco, toda maquiada, com figurino e gestos próprios
do século XVI me animei. De fato, linda companhia, chama-se “Companhia de Teatro
Atores de Laura” foi formada em 1992 na Casa de Cultura Laura Alvim, daí [acho] o seu
nome. A direção é de Daniel Herz e Susanna Kruger que aliás também atuou na peça
como a Zerbineta, muito linda. Já que falei do diretor apresento então resto do elenco:
Anderson Mello atuou como Argante; o pai durão de uma menina que iria se casar sem o
seu conhecimento com Otávio que, aliás, era representado por João Marcelo Pallottino.
Scapino foi representado por Charles Fricks. Marcio Fonseca representou Silvestre, o
criado de Otávio. Leandro Castilho representou Leandro, filho de Gerônimo este
representado por Paulo Hamilton, um turco pão-duro que não desconfiava das tendências
homossexuais de Leandro, seu filho. Vanessa Dantas representou Jacinta, a primeira
esposa de Otávio que rivalivava com Zerbineta, representada por Susanna Kruger.
Raphaela Cotrim atuou como Merina, empregada de (acho) Argante e Val Elias atuou
como Carlos, o mensageiro. Estava aquele clima, teatro cheio, coreografia linda,
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iluminação perfeita. A cortina aberta e os atores todos no palco esperando o início da
peça. Eu observava cada um deles. Estavam vestido à caráter, um lindíssimo figurino e
maquiagem perfeita.
A comédia se passa na Itália do século XVI, uma sociedade estruturada em classes sociais
bem distintas. Scapino, um criado esperto, ardiloso e cheio de manhas. Todos o procuram
quando estão em situação difícil para ajudá-los a sair destas situações. Scapino, sempre
esperto, pensa em tirar proveito de tudo, por aí vai... A peça é toda calcada em fortes
gesticulações caricaturísticas dos personagens, tudo muito lindo. Eu confesso que esqueci
a tristeza e me diverti bastante.
Acabou a peça, apressei-me para sair. Cumprimentei um e outro e voltei rápido para casa.
Joguei-me na cama e dormi.
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UMA NOITE DE ERUDIÇÃO
Macaé/RJ – Abril de 2003
Dia atípico, tenso, feliz, triste e corrido. Acordei com o Sol forçando
meus olhos. Vontade de levantar, mas preguiça não deixando. Dias
daqueles. Ontem, enfim, fechei um contrato importante, como
consultor de informática. Passaria o dia apreensivo por conta disto.
Tinha também o prazo do meu projeto se findando.
Hoje é dia de aula de violino. Saí às 17 em ponto, enfiei a bermuda
marrom e a camisa amarela. Amontoei estojo do violino e partituras em
cima de mim e fui correndo para a aula. Reclamei o que pude com o professor Jackson,
gente da maior qualidade, mas, coitado, tendo de me aturar. Eita lição difícil que não me
deixa ir adiante!...
Cheguei em cima da hora. Tomei banho rápido e fui para o teatro municipal de Macaé
meio sem vontade. Cheguei atrasado. Um trio de cordas com piano. Grupo chamado de
Solistas Itinerante, Música de Câmara Brasil. Um violino tocado por Pablo de Leon, viola
tocada por Horácio Schaefer, cello tocado por Roberto Ring e o piano por Sonia Rubnsky.
Não preciso nem dizer... Adorei.
O repertório da melhor qualidade. O grupo abriu o espetáculo com J. S. Bach: Variações
Goldberg BWW 988. Seguiu com J. Brahms: Quarteto para cordas e piano no. 1 em sol
menor op. 25. Linda peça. Os músicos de primeira qualidade.
Confesso que bocejei umas duas vezes, mas segurei as pontas. Depois teve um intervalo
de 15 minutos anunciado pela Claudete, colega do Coral Petrobrás da Bacia de Campos
que, diga-se de passagem, eu também faço parte no naipe dos baixos.
Depois do intervalo a pianista Sonia Rubnsky deu lugar ao maravilhoso Nelson Ayres. O
repertório mudou para música brasileira. O Roberto Ring, violoncelista, fez um breve
discurso sobre a tenuidade entre música popular e erudita que, na opinião dele, e na
minha também, não há diferenças. Pois bem, seguiu-se H. Villa Lobos com Ária da
Bachiana Brasileira no. 4, maravilhosamente executada pelo grupo, com o violino e viola
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agora em pé. Seguiu-se Tom Jobim com Saudades do Brasil. Aqui vale mencionar o
belíssimo arranjo do Nelson Ayres. Veio depois um deslumbrante Ernesto Nazareth com
o Odeon que simplesmente não tenho palavras para descrever a beleza dos arranjos e da
execução. Depois seguiram as composições do Nelson Ayres: Mantiqueira, Veranico de
Maior, Perto do Coração e Fogo no Baile. Realmente maravilhosas, surpreendi-me com a
erudição dos arranjos e execução. No final Nelson convidou ainda a Sonia Rubinsky e
tocaram à quatro mãos um Frevo que não lembro o nome, maravilhoso, acompanhado
pelas cordas...
Enfim, não tive como não comprar o CD na saída, que ouço agora enquanto escrevo isto...
Vim para casa. No caminho comprei pão e bolo, como sempre...
Que bom que o dia terminou assim... com música e muita paz no coração...
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PERFUME DE HARMONIA
Rio de Janeiro/RJ - Dezembro 2005
os últimos finais de semana, mais
precisamente aos domingos, tenho
experimentado um novo aroma, é o perfume de
simpatia. Sorte minha, na igreja sento-me ao
lado de uma pessoa, não uma pessoa qualquer,
mas uma mulher especial. Os seus dedos,
ligeiros, quando se juntam em formação para deslizarem pelo teclado, guiados pelo olhar
atento, e uma ligeira expressão nos lábios, que se retesam como querendo experimentar o
paladar do acorde que virá, exalam, tudo junto, um perfume de simpatia.
Talvez ela não perceba, mas me delicio com cada acorde, cada fuga do "centro tonal".
Cada síncope para enfatizar um jato de acordes, que para a minha alma transforma-se em
jatos de perfume de harmonia. Sei lá, mas dá vontade cheirar os acordes vindos do meu
lado. É coisa de músico inquieto com o trivial, que quer sentir cada sabor e provar cada
aroma do som.
Esta mulher, H., é simples, mas charmosa. Tenho certeza que quando se ajeita para sair de
casa..., Aliás, no domingo em que regeu a cantata de Natal estava com terninho charmoso
e bem talhado. Gostei, tudo a ver com o momento. Mas também já a vi de calça jeans e
blusa, isto foi em um ensaio de quinta-feira. Também tinha tudo a ver com o momento.
Bem, voltando ao seu arrumar, tenho certeza que se olha de todos os ângulos em frente ao
espelho e experimenta todos os olhares possíveis.
Sorte minha, vem, senta-se ao teclado com aquele jeito simples mas impetuoso. As
músicas e os hinos tocados no culto parecem satisfazerem-se completamente com os
arpejos, síncopes e acordes que ela os presenteia. Eu ao lado, apresso-me em sustentar a
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melodia, pelo menos a melodia, com o meu saxofone soprano, e assim completar o
conjunto de sons que todos, na platéia, esperam ouvir.
Dá vontade virar de lado para vê-la tocar. Sempre põe o hinário no colo, não na estante.
Parece que é para, em segredo, combinar com as músicas como irá atendê-las em seus
pedidos de harmonia, e assim, produz um som maravilhoso.
Como dizia, dá mesmo vontade virar de lado para vê-la tocar, mas tenho de ficar
concetrado na partitura. Meus ouvidos, então, encarregam-se de capturar cada detalhe e
armazená-los em minha mente para deliciar-me semana inteira.
Nos improvisos de solos não planejados, combinamos muito bem, parece-me, e o som soa
como uma dupla bem ensaiada. Insisto com ela para reunirmo-nos e estendermos nosso
repertório. Ela, meio ressabiada, como é, diz: claro vamos ensaiar, mas, pé atrás, fica
esperando eu tudo fazer. Entendo, é o cuidado necessário quando se tem um novo amigo.
Aliás, amizade, como quero ter a sua! Imagino que faríamos um boa dupla para tocarmos
por aí.
Espero que a sua paciência amortize as minhas chatices. blá blá blá...
Gosto dela e vou insistir um pouquinho mais para conseguir a sua confiança, e tentar tê-la
como amiga. Quem sabe, formaremos uma boa dupla musical?
Agora, bem, todos já sabem, nossos corações apressaram-se e atiraram-se vorazmente um
ao outro...
Bem, o nosso amor foi eterno enquanto durou, e este é um "Amor prá ser lembrado", que
virou um belíssimo poema publicado em outro livro meu.
Figura obtida em: http://docesbalancos.blogs.sapo.pt/arquivo/RoseOnPiano_Misted~AFR.jpg
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VIVENDO COM ARTE Rio de Janeiro/RJ – 22 de março de 2008
vida é arte, e é mesmo, queiramos ou não. O
grande lance é perceber isso. A arte é uma forma de
manifestarmos o nosso afeto mediante ela. Os pintores
utilizam a tinta, os cantores a voz etc.… mas, todos nós,
quando nos alfabetizamos temos um instrumento fenomenal, a escrita! Quando
percebemos que podemos manifestar os nossos afetos (a arte) por meio da escrita
começamos a desvendar a vida, ou seja, a arte maior, e ela, a vida, está aí como que
implorando que a desvendemos. Que a utilizemos como tela de uma grande pintura.
Platéia de uma grande composição, que seja...
O problema é que nós somos inundados diariamente de "palavras" mais "palavras" por
meio de tudo, ou seja, do rádio, da TV, do meio entorno de nós, e então a nossa mente
artística fica encoberta e aprisionada em baixo dessa montanha de palavras que não são
nossas. Dos compromissos que originalmente não deveríamos ter, enfim.
O segredo é arrumar meios de nos esquivarmos dessas torrentes diárias
de palavras, que não são nossas, nem são para nós, dos compromissos efêmeros
e libertar a nossa arte por meio das nossas próprias palavras...
Por detrás de um semblante sério pode existir uma "alma caliente", ou por
detrás de um olhar pesado pode existir um ser simples, ingênuo que ainda se
surpreende diariamente com a nossa escrita, a nossa arte...
Leia Sartre, o existencialista e veja a vida por meio da existência, simplesmente, mas não
seja triste como Sartre foi... Seja feliz como é uma criança e madura como a senioridade
de Sartre sugere...
Mas sempre com arte, em tudo...
Figura retirada de: img354.imageshack.us/img354/9939/sartre0zu.jpg
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A ARTE DA PROSTITUIÇÃO DE GABRIELA
Rio de Janeiro/RJ - domingo, 1 de julho de 2007
Estou envolto em um mundo de pensamentos.
Aqueles que nos assaltam parecendo ninjas
insurgentes da escuridão. Livros, um após o outro,
um junto ao outro, um por cima do outro. Estava
lendo Exegese Bíblica, um livro maravilhoso e
profundo sobre interpretação bíblica, mais ainda,
sobre a interpretação do Cristianismo. De repente
após o almoço, caminhando incertamente pelo Centro do meu maravilhoso Rio de Janeiro
com a intenção de fazer a digestão do almoço, encaminhei-me para a charmosa Livraria
Imperial, no Paço Imperial. Entrei e vaguei de um lado para o outro observando os livros
sem pretensão e disposição financeira de comprar qualquer um deles, os quais eu olhava
displicentemente. Como sempre faço, caminhei para a estante de Artes para ver alguma
coisa sobre música e pintura. Deparei-me, então, com dois imensos, pesados e
envelhecidos volumes de Arte em perfeito estado de conservação. Dois "tomos" com
pinturas famosas desde a Renascença até a publicação dos livros, que se deu em 1932. O
texto, com aquele português antigo e regra de acentuação diferentes da atual, me cativou
profundamente. As pinturas são coladas nas páginas conforme aqueles álbuns de
fotografias da época de nossos avós. Meus olhos brilharam. Me apressei e comprei os
dois volumes. No caminho para o caixa, casualmente olhei para o lado e vi um outro
livro: "Eu, mulher da vida" de Gabriela Silva leite. Alcancei-o instintivamente e folheei-o
rapidamente. Resolvi também comprá-lo. Cheguei ao caixa, paguei-os e os enfiei em duas
sacolas grandes. Saí e apressei os passos de volta para o trabalho.
Imediatamente quando cheguei em casa, comecei a ler os livros. Ora, eu iniciei este
escrito falando dos diferentes livros lidos ao mesmo tempo, lembram-se! Pois é, assuntos
contradizentes, conflitantes, etc. Mas não é assim a nossa imaginação, o nosso
pensamento? Náo é tudo misturado mesmo? Nossos pensamentos parecem preemptivos e
compartilhados. Folheei com atenção e curiosidade os livros de Arte. Realmente muito
bonitos. As obras são fotografias autênticas, ou seja algumas tiradas pelo autor e outras
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reunidas e organizadas por ele diretamente de onde estavam expostas. O livro inicia com
obras do século XIII. Para cada pintura o autor descreve as situações que as envolvem etc.
Vou usá-los para decorar a minha sala e o meu quarto no futuro. Ficarão expostos, abertos
ao acaso... Bem, mas o que me impressionou muitíssimo mesmo foi a Gabriela. Isso
mesmo. O tal livro que veio como de brinde junto aos de Arte. Trata-se de uma prostituta
que se tornou líder de todas as outras prostituas. Ela hoje deve ter uns 54 anos, mas na
época em que escreveu o livro tinha 40. O livro foi editado em 1992. Devorei-o em 3
dias, dando descanso para o de Exegese.
Vejam que trecho maravilhoso deste delicioso livro:
(...) O Lula estava no palanque com o Gabeira, que fez questão que eu
falasse...
Não tive dúvida quando me deram a palavra. Contei a história,
dizendo mais ou menos assim: "Ao conhecer pessoalmente o cara que eu via de
longe falando em São Bernardo do Campo, como sindicalista, a sensação que
eu tive foi uma baita raiva porque ele me molhou de suor quando me abraçou. É
que isso me fazia lembrar dos homens na zona, no verão, e uma coisa que eu
detestava era quando eles iam transar com o corpo suado e ficavam pingando o
suor em cima de mim.
Senti que o povo se assustou um pouco, os políticos mais ainda (a não ser o
Gabeira, que dava um sorrisinho cúmplice), aí acrescentei: "Depois que a raiva
passou, eu fiquei pensando. Então, ele é um homem igual aos outros, porque ele
também sua. É igual aos homens que iam na zona e transavam comigo nas tardes
de verão.
Continua ela:
Quando desci do palanque, tinha um monte de gente chorando, querendo me
abraçar. Era gente comum, que eu nunca havia visto na vida. Mas vieram também
meus companheiros católicos do PT, (...), esbravejando comigo, que aquilo não
era discurso para se fazer em comício. (...)
Quando foi à noite, estava ainda bastante confusa, achando que no fundo tinha
feito mesmo algo errado. Envergonhada do meu discurso, fui à Churrascaria
Majórica, no centro de Friburgo. Ainda na porta, o Lula me chamou meio de lado,
e me disse com aquele vozeirão rouco:
Gabriela, eu queria fazer uma perguntinha a você.
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Minha mulher sempre me disse para eu usar desodorante, mas eu não gosto. Ela
diz que eu transpiro demais e que meu suor fede. E hoje você falou disso no seu
discurso. Me fala com sinceridade, não precisa mentir: eu estava fedendo muito
naquele dia? Foi por isso que você ficou com raiva?
Imaginem que este livro foi escrito muito antes do Lula ganhar as eleições presidenciais.
O mais interessante do livro é uma coisa que ficou clara para mim. A Gabriela era
prostituta e não queria deixar de sê-la. As pessoas e instituições que tentaram ajudá-la o
faziam com a intenção de que ela deixasse a sua vida indigna. Ela sempre afirmou que
gostava de ser prostituta e mesmo assim ser útil para a sociedade e para as outras pessoas
que precisassem dela. Por aí vai o livro.
É uma visão realmente chocante. Confesso que me chocou também. São os nossos
preconceitos que são revolucionados com situações que ela conta no livro. Achei bom ler
este livro. De fato fez-me ver um pouco o outro lado da moeda, apesar de achar que
existem formas de vida muito mais saudáveis e que nos fazem infinitamente mais felizes
que a que ela optou, ou seja, a prostituição. A felicidade da família é algo inigualável.
Impossível não associar o estilo de vida de Gabriela com uma obra de Arte. Seria a Arte
da Vida? Os lugares que ela freqüentou, as pessoas que ela conheceu em situações e
momentos singulares parecem todos tons das tintas de uma palheta de aquarela. Eu aqui,
lendo o seu livro e paralelamente pintando na imaginação um quadro!
No início achei Gabriela meio grosseira, mas a medida em que fui passando as páginas fui
descobrindo uma erudição espontânea e, talvez, inconsciente. A erudição de Gabriela é
especial por não permitir que a sua narrativa tome forma clássica e torne-se comum. Ela
pincela, vez outra, doses de “grosseria” na linguagem coloquial que nos faz lembrar a sua
origem e forma de vida. Isso é deliberado e me fascinou na leitura, pela sutileza e
inteligência que ela demonstrou.
A Arte, pelo menos no meu ponto de vista, não tem de ser necessariamente materializada.
Tem de ser sentida. Que seja por uma só pessoa, e isto, de alguma forma é uma
característica da Arte, de nos dar a liberdade de subjetivamente vivê-la, experimentá-la. O
livro de Gabriela fechado, é como uma partitura na estante. Lido, torna-se uma música
executada, com todas as suas componentes, melodia, harmonia e ritmo. Ou seja, a sua
Arte somente é sentida quando entramos em seu mundo, quando a ouvimos, quando nos
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chocamos com a sua firmeza em ser chamada de prostituta. Talvez pelo seu deboche da
sociedade careta e hipócrita, como ela repetidamente declara.. Desesperadamente procuro
referências nas formas de Arte existentes, como a música, a pintura, para decifrar
Gabriela. Mas deveria? Ou seria a prostituição a própria Arte de Gabriela? Gabriela não é
prostituta. Gabriela é artista! Não, com certeza, ela gritaria ao ler essa abominação à sua
maneira de viver:
- Mais um idiota tentando me redimir para o seu mundo!
E assim segue Gabriela, pintando na vida a arte da prostituição, e com isto me chocando e
fazendo-me mais sensível à Arte, a mãe de todas as Artes. A vida!
Enfim, vou voltar para o meu livro de Exegese que por sua vez está também mexendo
profundamente com a minha maneira de encarar o Cristianismo.
É a leitura, os livros, transformando-nos.
Viva aos livros! Viva às pessoas!
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COM ANJOS NO FRIO - LEMBRANÇAS DE JOINVILLE
ntem foi um dia frio. Estive durante o dia
todo envolvido com o meu projeto do DRH e às 18
horas tinha marcado com um amigo para tocarmos
blues. Deu 18h10min saí correndo para casa. Ao pôr
os pés lá fora parece que me desliguei completamente
do trabalho. Senti aquele frio nas orelhas, nos cotovelos... Veio-me assim, meio de
sobressalto, as lembranças de quando eu morava em Joinville. Lá fazia muito frio, mas
era um frio gostoso de sentir... Eu adorava me agasalhar bem e sair pela cidade, bela
cidade, sentindo o vento nas minhas bochechas. Onde eu morava, um bairro chamado
Atiradores, o mais arborizado da cidade, era ótimo caminhar pelas ruas floridas e com o
vento frio batendo nas orelhas...
Cheguei em casa correndo. Muito frio. Tirei a roupa do trabalho. Tomei um banho quente
e agasalhei-me bem com meias grossas e casaco pesado. Joguei-me no sofá, liguei a TV e
fiquei assistindo o A&E Mundo, um canal a cabo... Mas a minha mente insistia em
remeter-me à Joinville. Meio que magicamente comecei a sentir o perfume das flores do
local. A mente trouxe-me lembranças que achei já estarem sepultadas. As ruas sem saída
sempre floridas, os bairros de alemães com aquelas crianças de cabecinhas aloiradas, as
meninas lindas com os vestidos compridos, super compridos...
De repente, percebi que evocara, um dia antes, os anjos para povoarem o meu
apartamento e agora eu os via na minha cozinha. Levantei e fui até ao quarto e fiquei
olhando para a cabeceira da cama observando um anjo pousado lá. Vim caminhado
devagarzinho até a cozinha. Recostei-me no marco da porta, e com as mãos no bolso,
corpo jogado de lado, fiquei observando a pia, a geladeira e verificando se lá também não
existiriam anjos...
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Despertei do sonho com aumento repentino do volume da TV por entrar um comercial.
Revolvi meu corpo meio com preguiça e afundei novamente no sofá. Olhei agora
desperto, para cada canto de meu apartamento e fiquei imaginando se ainda me lembraria
daquele lugar quando cinco anos se passassem... Imaginei também um anjo ali, não um
mais cinco, talvez seis, encarregados de me protegerem... Lembrei que essa coisa de anjos
começara quando recebi um e-mail simples, mas definitivamente profundo de uma linda
colega de trabalho desejando-me, do nada, um bom dia com um anjo ao meu lado.
O frio aumentou mais ainda. A preguiça levou-me novamente para o sofá. Não dei bolas
para o blues que iria tocar. Estiquei o braço e consegui alcançar uma revista na mesa de
centro... Folheei-a, mas não li nada… A joguei de volta na mesinha de centro e adormeci
no frio...
Acho que o anjo percebeu que agora poderia descansar e sentou-se me observando
adormecer...
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FOCUS E QUIDAM. EMOÇÃO AO MÁXIMO!
Macaé/RJ - Quinta-feira, 7 de novembro de 2002
nesquecível. Ofereceram-me para comprar o
ingresso do Focus, isso mesmo, o mais famoso grupo de Rock Progressivo viria a Macaé.
Dei o dinheiro e comprei o ingresso. A apresentação estava super badalada em Macaé.
Parecia que todos iriam. Cheguei em casa bem animado. Vesti uma roupa leve e fui para
o Teatro Municipal. A fila estava atravessando a rua. Muita gente. Trânsito parado e
controlado pela Guarda Municipal em frente ao Teatro. Evento grandioso. O saguão do
Teatro estava lotado. Entrei. Muita gente. Vi todos os colegas do trabalho que disseram ir.
Não tinha mais lugar. Existiam pessoas penduradas em todos os cantos. Sentados na
passagem, escada etc. Resolvi dar uma volta pela frente da platéia e por sorte achei uma
cadeira na segunda fileira que era reservada para as autoridades e a imprensa. Tinham
umas coisas em cima da cadeira. Retirei e as coloquei na cadeira ao lado. Sentei-me ali
esperando que a qualquer momento alguém chegasse pedindo o seu lugar de volta. Não
veio ninguém reclamar o lugar. Ótimo, fiquei feliz ali. Bem próximo do palco.
Dei uma espiada em redor. Identifiquei rostos
conhecidos da cidade e do trabalho, autoridades e
pessoas comuns. Estava aquele clima de festa e
expectativa. Deu a hora de iniciar e abertura foi feita
por um grupo chamado Quidam. Grupo polenês.
Surpreendi-me com a qualidade da música que eles
apresentaram. Tinha uma cantora maravilhosa chamada Emila Derlowska. Muito linda e
elegante. Cantou com uma voz dece e firme. Tinha um quê de NewWave. O flautista,
uma rapaz de bermudas destoando dos demais, literalmente arrebentou na flauta
transversa. Enfim, grupo excelente. Emocionei-me.
Depois de cantarem e tocarem muito, enfim, entrou o Focus. Grandioso. Realmente faz
bater mais forte o coração. O lendário flautista e organista Thijs van Leer com o seu
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inseparável chapéu. O teatro delirou com os primeiros acordes. Eu me encolhia na
poltrona sentindo-me um nada diante de tanta beleza e emoção. A impressão que eu tinha
era de que o Teatro tornara-se algo vivo e que o seu coração pulsava forte, expressão da
emoção que pairava no ambiente. E para variar, eu estava ali, bem na frente. O guitarrista
estava a menos de 5 metros à minha frente.
O show acabou quase meia-noite. Sai feliz e voltei apressado para casa. Nas semanas
seguintes consegui o CD do show e alguns CDs do Quidam.
Lembranças e emoções eternas, estas.
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DESCOBRINDO O SAMBA Macaé/RJ – Maio de 2002
escobri o samba, sem querer e sem planejar... Tudo começou
de repente... Veio o festival. Apareceu um CD. Encantei-me com o
"O Feitiço da Vila" de Noel Rosa e Vadico. Montei um grupo com
formação de choro, mas para tocar samba.
Tocamos com traje caracterizado. Achei que ficaria melhor com um casal dançando
samba. Ficou ótimo. Dormi aquela noite sentindo-me realizado em mais um sonho.
Depois disso desandei a ouvir o samba. Apareceu o Fundo de Quintal. Baixei MP3 sem
pretensões e sei lá o porquê. Baixei outro MP3 e outro e outro. Apoderei-me do
cavaquinho. Toquei, toquei e toquei. Depois tive de entregá-lo ao Glauber, meu
primogênito. Comprei outro.
Sei lá, mas passei a amar o samba. Imaginando os primeiros sambistas do morro. Sem
cultura e pretensões. Simplesmente cantando e dançando os pagodes e partidos altos. O
samba falando do cotidiano deles. O ritmo expressando a alegria, enfim, o samba.
Pesquisei vorazmente pela web tudo sobre o samba. Hoje o samba faz parte da minha
vida. Tive de quebrar barreiras culturais em minha formação musical.
Uma coisa ainda não consegui vencer, é o ritmo difícil acelerado tocado no cavaquinho...
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A DONZELA NO ARCO DOS TELES
Rio de Janeiro/RJ - Quarta-feira, Abril 19,
2006
O Arco dos Teles é mágico. Um corredor
de ruas estreitas ladeadas por casas de
danças, bares e restaurantes, quase tudo
preservado ainda no estilo do tempo do
império. Foi ali, que no início do século
passado, houve a Revolta da Vacina. Dizem também que Carmem Miranda morou em um
destes sobrados. O charme é sentar-se em mesas postas no meio da rua. As pessoas, neste
ambiente, despojam-se de seus afazeres do trabalho, e entregam-se ao relax sugerido por
este ambiente.
Isaque, grande amigo, irmãozão. A saudade sempre aperta o peito quando lembro dele. O
conheci em Macaé/RJ. Moisés me apresentou-o. Casou-se com Marina. Linda e delicada
menina. Convidaram-me para tocar em seu casamento. Fomos para Belo Horizonte e
toquei em um belo sábado pela manhã. Lindo casamento.
Pois bem, Moisés me ligou dizendo que o Isaque estaria hoje aqui no Rio. Saí às 18:45 e
corri para encontrá-los no Arco dos Teles, como combinado.
Lugar sedutor. Muita gente e mulheres bonitas. Parece que tem um cheiro carioca no ar.
Dá aquela sensação de alegria por estar participando, pisando, andando em lugar carioca
tão instigante. Quando cheguei, eles já estavam lá há mais de quarenta minutos.
Sentei-me e logo percebi a dupla ao lado. Uma donzela aparentando uns dezenove anos
de idade. Usava uma saia rebaixada, com a barriga à mostra, aliás como é o costume hoje
em dia na cidade. Cabelos soltos, rosto lindo e delicado. Segurava um cigarro nos dedos
da mão direita. Sentava displicentemente com os pés apoiados nos reforços da cadeira. A
saia estava jogada sobre as coxas grossas, que balançava continuamente. Os joelhos
abrindo e fechando fazia com que a saia fugisse insistentemente para cima deixando à
mostra um par de coxas morenas claras, lisas e torneadas. O corpo estava meio jogado
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para a frente sobre o copo de cerveja, que estava pela metade. Tragava o cigarro e
expulsava a fumaça para o lado com uma ligeira virada de rosto, sem contudo, perder de
vista a sua amiga sentada a sua frente. Os jatos de fumaça eram embranquecidos e
iluminados pela lâmpada de um poste preservado à séculos.
Eu e os amigos, contagiados com essa sedução displicente, estávamos quase em êxtase.
Eu, Mosa e Isaque estávamos assim, relaxados e felizes. Falávamos gesticulando, rindo
muito. Para sermos ouvidos um pelo outro fazíamos isto quase aos berros. A donzela
continuava ali na mesa ao lado esbanjando sedução e beleza e nos ignorando
solenemente. Em dado momento ela levantou-se e, juntamente com a amiga, e foi para
dentro de um bar jogar sinuca. Este bar, com as portas em arco, ficava bem á nossa frente.
Ficamos, os três, observando-as no desempenho do jogo. Um de nós, logo incentivado
pelos demais, resolveu enviar flores para elas. Tivemos este ímpeto ao avistarmos um
vendedor de flores, um jovem negro, alto, aparentando ter vinte e cinco anos de idade.
Provavelmente um morador das favelas dos morros adjacentes. Um descendente de
escravo. Compramos as rosas por três reais e pedimos para o simpático vendedor as
entregarem. Ficamos aguardando e observando atentos a reação das donzelas. Nada
aconteceu. Elas nem esboçaram um sorriso, pequeno que fosse. Quase ao mesmo tempo
avistamos uma menininha também vendendo flores. Compramos outro ramo de flores e a
enviamos com um cartão. Nada, elas não deram a mínima. Depois de muito conversarmos
e rirmos, fomos embora. Já era nove e meia da noite. Ainda conversamos um pouco mais
antes de nos separarmos próximo ao ponto das barcas, na Praça XV. Voltei feliz, mas
com saudade de meus amigos. Isaque fora para a casa de Moisés, em Niterói. Saudades,
muitas saudades. Momentos mágicos, estes.
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NASCEDOURO DE PEDRAS
Bicuda Pequena - Macaé/RJ
Macaé/RJ - Dezembro de 2004
Bicuda Pequena. Lugar mágico nas montanhas da minha vida...
Escalo-a sem planejar. A minha vida me surpreende. Mas tem também a Bicuda Grande.
Dizem ser irmã mais imponente que a Pequena... Não importa, o que vale é que estou
feliz... Sorrindo das pedrinhas bicudas ao pé da montanha imponente...
Mete medo olhar o cume, parece que vai despencar, mas claro que não vai, é só
impressão.
É que somos pequenos mesmo, percebo isto olhando admirado a enorme pedra.
Surpreendo-me com a música tocada pelo vento nos foles do vale... Ninguém parece
ouvi-la, mas ela está lá nos meus ouvidos. Não sei o modo tonal, se maior ou menor,
talvez nenhuma nem outro outro... Mas ainda sorrio, encantado com este milagre...
Ofegante quero parar de subir, mas não posso. A montanha não deixa. Parece que a
gravidade lá funciona ao contrário... Tenho de chegar ao redil, na laje. Ovelha guiada pelo
pastor...
O Nascedouro
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De repente um sobressalto! Um nascedouro de pedras... Surpreendo-me e quase me
precipito sobre ele. Equilibro-me no vento e me delicio com a visão. Centenas de pedras
pontudas, lá em baixo, no vale. Combinam comigo, e com a música que ouço no vale...
Agora, queria ter uma montanha à minha destra, penso, para me proteger da vida... mas
elas estão lá, esperando milênios para crescerem... Sinto-me um pássaro pousado na
colina a olhar o vale... Que vontade voar, pular, quem sabe me tornar uma pedra, também
do nascedouro...
As pessoas da montanha
Volto-me e vejo o redil... Ovelhas simples, rodeando seu pastor... Vou tocar hoje, uma
música qualquer, que gosto muito... para as pedras do nascedouro ouvirem...
Toco na sua direção. As ovelhas ouvem-na primeiro, Mas a música é para as pedras do
nascedouro, juro, e que se movem, suavemente, de um lado para o outro no ritmo e
direção do som...
Olhos vivos, vestidos de chitas, corações despojados... Vida, muita vida ali, à beira do
nascedouro. As ovelhas cantam, mostram-se com o seu belo que é belo. Gosto. Extasio-
me, me delicio com a vida à beira do nascedouro.
O Som no Nascedouro
Meu som ecoa deslizando montanha a dentro, vertendo os vales, fincando-se nas grutas.
Visitando as rochas, rios, cachoeiras... Mistura-se com a vida da montanha... As pedras do
nascedouro dançam ao novo som... Divertem-se ao pé de sua imponente mãe...
Deixo o som lá. Ele se perde fugindo montanha a dentro como um cão fugidio, feliz...
Importa não. O que vale mesmo é que vi o vale, o vale da minha vida, e percebi que
sempre ao lado de um vale existe uma montanha imponente...
Mas na Bicuda, tem mais...
Tem também um nascedouro de pedras, que esmaga o meu coração, de pedra...
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O THEATRO DA MINHA VIDA
Rio de Janeiro/RJ - Domingo, 2 de outubro de 2005
a sexta-feira passei em frente ao
Theatro Municipal do Rio de Janeiro, na
Cinelândia. Estava iluminado. Era noite.
Tinha um enorme cartaz, que já estava lá há
tempo anunciando espetáculos a preço
popular.
Meu coração pulava pela ânsia da arte. Tenho fome de arte, todo o tipo dela. A cada dia
reconheço que deveria ter estudado Arte, não Economia e Informática. Às vezes penso
que ainda há tempo para estudá-la. Tavez entrar em uma faculdade de Artes, enfim. Aliás,
estou amadurecendo a idéia de fazer faculdade de Violino. Tenho estudado arduamente,
diariamente. O cartaz do Theatro Municipal estava chamativo. Pensei rápido: Meus
filhos, vou trazê-los aqui!
Cheguei em casa e liguei para a Idailza avisando-a de que no Domingo eu levaria o Jean
ao Theatro Municipal. Ela passou o telefone para ele e então ouvi um “Oba!” feliz.
Liguei para a Irani, irmã de Idailza e que é mãe da Priscila e de duas gêmeas de 8 anos,
lindas: Paloma e Paola.
No domingo levantei-me às 06h30min. Ageitei-me e camihei para apanhar o Jean,
Paloma e Paola. A Paola é apaixonada por Violino. Diz ela que quer aprender este
instrumento ainda na infância. Elas duas já estavam agitadas quando eu
e o Jean chegamos lá. Enfiei todo mundo no Pálio, passamos na Nete, outra irmã de
Idailza, para convidar a Dayane, sua filhinha, mas ela não pode ir.
O Theatro Municipal do Rio de Janeiro é lindo por fora e por dentro. Deslubrante mesmo.
As crianças quase ficaram com o pescoço duro de tanto olharem para o alto. A Paola
disse:
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- Tio, aqui está cheio de mulheres peladas.
Todos rimos. Ela se referia aos afrescos e vitrais com os painéis do Theatro. Chegamos
cedo e compramos quatro ingressos na galeria nobre. Entramos na nave do Theatro, nos
sentamos e ficamos observando os músicos afinarem os seus instrumentos. O Theatro
estava lotado. As crianças não paravam de olhar os vitrais e as obras de arte.
Onze horas em ponto a orquestra estava a postos e entrou o maestro. Para a minha
surpresa agradável era o grande e conhecidíssimo Isaac Karabtchevsky. Meu coração
disparou a mil por hora. Confesso uma coisa aqui. Também foi a primeira vez em que
entrei no Theatro Municipal. Desde garoto sonhava ir lá. Sempre ouvia meus colegas na
banda de música falarem sobre o Municipal. Quando cresci e passava em frente a este
monumento, sempre via a classe rica descendo de seus carros com seus choféis e então
concluía que aquilo não seria para mim.
Ainda menino quando eu solava o Prelúdio La Traviata de Verdi no clarinete junto com a
orquestra me imaginava em uma grande orquestra no Teatro Municipal com o corpo de
balé se movimentando ao som da música que eu tocava. Bem, isto ficou somente na
imaginação mesmo, pois jamais toquei no Municipal.
Enfim, voltando ao espetáculo. O maestro, após a verificação da afinação feita pelo spala,
dirigiu-se ao público de forma muito simpática e passou a explicar situações de ensaios
etc. Pois é, o espetáculo seria iniciado, como foi, com o Hino Nacional. Isaac
Karabtchevsky fez uma brincadeira com o público lançando um desafio para ver quem
conseguiria cantar o Hino Nacional inteiro sem errar. Deu chance para três pessoas mas
ninguém conseguiu. Todos rimos muito e finalmente, ao seu comando nos levantamos
para cantarmosm o nosso lindo Hino Nacional. Foi um momento de muita emoção.
A orquestra iniciou a apresentação e pude sentir aquele espírito da arte passeando pelas
galerias do Theatro. Todos em silencio com a atenção direcionada para o palco. A Paola
fez carinha de choro de emoção e todos rimos um pouco dela. Ainda bem que não
notaram a minha cara de choro também, pois não resisto a concertos sem chorar. Claro
que disfarço o quanto posso, mas nem sempre consigo. Enfim, o espetáculo acabou e
voltamos todos felizes para a casa. Antes tive de passar no Mc Donald com as crianças.
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Enfim, visitei o Theatro Municipal do Rio de Janeiro que tanto visitou as minhas ânsias
musicais desde a minha infância.
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CHICO BUARQUE E O "SEMPRE"
empre! – Às vezes esta palavra soa irônica. Eu a uso
sempre (viu só?), e muitas vezes, sempre (de novo)! Certa vez
achei que estava sendo pouco criativo quando terminava um verso com o "sempre".
Sábado, cinco da tarde, entre um afazer e outro puxei o "Segundo Caderno" do jornal "O
Globo" de 19 de março de 2006, que guardara para ler no futuro. Observando a matéria
sobre o lançamento do filme de Cacá Dieguez “O maior amor do mundo”, chamou-me a
atenção a letra da trilha sonora escrita por Chico Buarque para esse filme. Letra inédita
que passo a transcrever aqui:
Sempre
Eu te contemplava sempre.
Te mirei de mil mirantes,
Mesmo em sonho estive atento
Pra poder lembrar-te sempre,
Como olhando o firmamento
Vejo estrelas cintilantes
Que se forma para sempre.
O teu corpo em movimento,
Os teus lábios em flagrante,
O teu riso, teu silêncio,
Serão meus, ainda e sempre.
Dura a vida alguns instantes,
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Porém mais do que o bastante
Quando cada instante
É sempre.
Letra inédita de Chico Buarque para a canção-tema de “O maior amor do mundo” – Jornal O Globo – Segundo Caderno
de 19/03/2006
Pois é, cá está o grande Chico se safando no apelo do "sempre". Engraçado, já há algum
tempo percebi que quando estamos em estado do que chamo "transe poética", a
eternidade parece lançar-se à nossa mente como uma realidade preponderante e que
norteia toda a nossa poesia. Isso parece acontecer, mais ainda, quando o sentimento em
questão é o amor. Nesse caso a eternidade parece construir em nossa mente uma estrada
para o amor caminhar (que poético, não acham?).
O destino dessa estrada seria o "sempre". Talvez isto seja um desejo subconsciente para
que aquilo que é tão bom e tão almejado, como é o amor, nunca acabe. O "sempre" surge,
então, como aquela palavra que representa muito bem e completamente a idéia deste
estado de transe poético que me referi anteriormente.
Bem, depois de ler esta poesia, do Chico Buarque, senti-me mais aliviado, e já não vou
mais rejeitar de pronto o "sempre", que, aliás, fica tão bem quando acompanhado com
umas reticências em forma de pontinhos: "sempre..."
Claro que não ouso me comparar ao Chico, mas confesso que senti-me meio vingado com
o meu lado chato e questionador, daquela personalidade, dentre tantas outras que os
psicólogos dizem termos, que vez outra me aborda acusando-me de ousado, metido e sem
senso do ridículo, quando escrevo as minhas poesias, ensaios, etc...
Imagino o que passava na cabeça do Chico Buarque, que de tão treinado em poetizar,
deve, ao conversar, espontaneamente falar todas as palavras em metáforas. Agora, no
entanto, quando escreveu esta poesia, parece tão simples e ingênuo ao ponto de
aparentemente não ter se incomodado em recorrer aos antigos clichês poéticos, contudo
válidos ainda, que a natureza nos empresta: “sonho”, “firmamento”, “estrelas cintilantes”,
“corpo”, “lábios”, “riso”, “silêncio”, “instantes”, e o, claro, “sempre”, que, aliás, termina
a sua poesia como que caminhando pela tal estrada que me referi poeticamente.
Só faltaram as reticências...
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As poesias do Chico, claro, são para sempre.
A SOLIDÃO E O CELULAR
Macaé/RJ – janeiro de 2002
Bip do celular. A Solidão tomou um
susto.
- Afinal, quem ousa invadir a minha
guarda. Pensou ela, rapidamente
Outro bip no celular. Ele, o celular, está
lá, sempre bem perto de mim. Não sei pra quê. Não toca nunca. Vazio, feio, sem graça e
sem capa. Bateria já meio fraca, mas está lá. Ganhei de presente de amigo que queria me
achar. Reclamava que nunca me encontrava. A bem da verdade, ele já estava na estrada
de ida, mas era amigo de coração.. Cruzou por mim e se tornou amigo, mas o seu destino
era lá pro outro lado… bom amigo.
Bip novamente. Outro susto na Solidão. Ameaço atender o celular. Ela fica ali, olhando e
tentando ouvir. Má educada. Que coisa!. Apanho o celular. Ela se apressa em chamar sua
irmã, a Decepção. Esta, cheia de liberdade, arranca-o de minha mão.
Ah sim, deixa-me contar. A Decepção é irmã mais velha da Solidão. No início eu a
estranhava. Tinha cara feia e jeito de debochada. Não ia muito com a sua cara. Mas,
enfim, a Solidão, minha velha e boa companheira de longos anos, queria, que queria me
apresentá-la. Enfim, um dia cheguei cansado e desesperado. Lá estavam elas. A Solidão
ao lado da Decepção me esperando para dar-lhes um pouquinho de atenção. Disse-me ela,
mais tarde, que desde cedo estava ansiosa para a minha chegada. Já vinha insistindo com
a sua irmã, há tempo para vir morar conosco.
Neste dia, lembro bem, eu estava me despedindo de coisas que tanto acreditava. Que
tanto me fizeram feliz. E que, agora, ruíam, acabavam e transformariam profundamente a
minha rotina. Meu coração estava ferido. Não tanto como hoje, mas era o início de uma
ferida profunda...
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Bem, mas como eu ia dizendo, sentei-me no sofá, como sempre fazia quando chegava em
casa pra acolher a Solidão. Levantei os olhos, assim meio sem vontade de cumprimentá-
las. Não queria mesmo me tornar íntimo da Decepção. A Solidão me bastava e já fora
difícil aceitá-la na minha vida. Já havíamos conversado longamente sobre este assunto.
Estava vivendo um momento que parecia feliz, e na minha vida não teria espaço para
mais ninguém. A Solidão, sim, esta eu já me convencera que jamais me deixaria apesar de
várias tentativas frustradas no passado. Ela é muito insistente, e parece um carrapato.
Quando gruda não quer sair nunca mais, mas pra dizer a verdade, uma grande
companheira.
Eu estava muito pra baixo naquele dia, somente queria o aconchego da Solidão. Queria
estender-me no sofá, com a roupa do trabalho mesmo. Pegar uma coberta bem pesada,
ligar a TV, abraçar-me com a minha Solidão e ficar ali, esquentando da tarde fria, quieto,
durante horas e horas, até dá fome e ter que levantar pra comer alguma coisa…
Mas lá estavam as duas. Não tive escolha, estendi a mão direita, torcendo para que o peso
do meu antebraço logo fizesse a minha mão escorregar do cumprimento indesejado, mas a
danada da Solidão, deu pulinhos de alegria e também agarrou a minha mão. Agora as
duas sacudiam o meu braço como adolescentes brincalhonas.
Enfim, a Decepção estava devidamente apresentada a mim. Besteira minha, essa
indisposição de fazer novos amigos. A Decepção se mostraria, mais tarde, uma grande
amiga e companheira. Ciumenta que só ela, mas enfim, amigona do peito. Agora eu teria
de acomodar as duas. Imaginem, duas criaturas na minha vida. Bem, mas dizem que pra
tudo na vida tem um jeito. E tem mesmo. Hoje já não a estranho mais. Até me acostumei
com elas. E quando elas não estão por perto sinto muita falta.
Bem, mas voltando para a história do celular, que eu já ia esquecendo, ameacei resgatá-lo
das mãos da Decepção. Mas aí desisti e pedi, com um gesto no rosto, para ela me ajudar.
Ela, feliz e com cara de vencedora e debochada, que insiste em fazer nessas situações,
agora já super íntima, claro, riu no canto da boca.
Sabe aquela cara que dá ódio quando alguém a faz para a gente? Pois é, ela é especialista
nisto. Estendeu o celular para eu ver. Olhei. Não consegui distinguir bem quem era.Ela,
com aquela postura desengonçada de debochada. Pezinho esquerdo batendo no chão.
Braço esticado na minha direção, e com o celular em riste. A outra mão na altura da
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cintura, ria, mas não muito, ria com aquela carinha de debochada mesmo, como eu disse.
Ela já tinha olhado, meio de soslaio, para ver quem era, ciumenta do jeito que sempre foi..
Como eu disse, não consegui enxergar bem, mas fingi que não me importava em saber
quem era, e continuei fazendo a minha partitura no Encore. Ela, chata e insistente do jeito
que sempre foi e sempre será, levantou mais ainda o celular para eu ver, virando o rosto
ligeiramente para o lado...
A Solidão se intrometeu, esticou o rosto e apressou-se em me dizer com a voz pausada e
de deboche.
- É a Te-le-mar… Men-sa-gem da Te-le-mar…
Era mesmo a Telemar. Sabe aquelas mensagens chatas que ela insiste em nos enviar,
como se tivéssemos tempo e dinheiro para ficar entrando em seus joguinhos idiotas, feitos
por programadores idiotas, e concebidos por analistas mal pagos da Telemar… idiotas
também!!?.
Calma, calma, calma e calma… É isso, ufa! Sempre que a Telemar subestima a minha
inteligência e importância eu fico assim. Irritado.
Espera aí! Eu disse Inteligência? Importância? Não, não disse, ainda bem, só pensei.
Senão as duas, iriam me chavecar a tarde inteira. Bem, mas enfim, era a Telemar! Fingi
que não via a Solidão ali, parada, pertinho de mim e esperando alguma reação.. Mas a
danada, sei lá como, conseguiu perceber a minha cara irritada, e fez questão de dizer em
voz alta para eu ouvir…
- Você não tem amigos, seu bobo… quem poderia ser?
Ameacei, com raiva, sem olhá-la, dar-lhe um peteleco.! Ela deu dois pulinhos para trás, se
juntou à Decepção, que já tinha se afastado para recolocar o celular no lugar, e ficaram
repetindo…
- Você não tem amigos, seu bobo..
- Você não tem amigos, seu bobo..
Fiquei em silêncio, fingindo não ligar. Com um sorriso sem graça, e sem graxa, no canto
da boca. Teclava o “j” repetidamente na partitura do Encore, meio esperando elas se irem
para continuar o meu trabalho.
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Veio-me a lembrança um quase amigo que fizera, dias desses. Deu vontade contar para
elas, só para matá-las de raiva.…
Até conversei uns minutos com ele, lembrei. E, p-e-l-o c-e-l-u-l-a-r… Deu vontade falar
assim, soletrando mesmo. Para deixá-las morrendo de raiva…
Acho que elas perceberam que eu não estava bem, e então a Solidão se aproximou
devagarinho, com medo de outro peteleco, e.chegou bem pertinho. A Decepção também
veio, me olhando pelos ombros da Solidão. É sempre assim, quando uma se aproxima, a
outra acha que tem o direito de participar, e para piorar tudo, sempre combinam as coisas
contra mim. Ufa, que raiva que tenho delas, nunca se desentendem por nada. Enfim, a
Solidão me perguntou..
- O que foi Gimago, você quer dizer alguma coisa e não está conseguindo?
Então eu disse. Tomei coragem e contei..
- Vocês são umas idiotas mesmo. Dia desses quase fiz um amigo, suas bobas...
Elas recuaram olhando uma para a outra sem acreditarem. A Decepção ainda com aquela
cara de deboche, e a Solidão com a cara de espanto exagerada que sempre faz..
Perguntaram-me, quase em coro…
- Quando foi isso. Qual o nome dele?
Eu, relutei, gaguejei, mas tinha de dizer, senão iria passar por mentiroso. Disse meio que
enrolando as palavras, para elas não entenderem…
- Foi um tal de E-n-g-a-n-o…
Elas ficaram sem ação e em silêncio. A Solidão quebrou o gelo, olhou para os lados, e
disse para a Decepção..
- Acho bom a gente deixar ele um pouco só…
E se foram, não para muito longe, pois sabem que eu preciso delas em todos os
momentos.
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MULHER DO METRÔ
Rio de Janeiro/RJ - Quarta-
feira, Abril 19, 2006
Dias desses consegui viajar
sentado no trem do Metrô no
trajeto de Pavuna para Centro
do Rio de Janeiro. Abri o livro
do Wittgeinstein e comecei a ler.
Em alguma estação à frente entrou uma mulher pobre, morena, cabelos molhados
provavelmente do banho da manhã, meio ondulados e soltos. Parte caindo pela frente dos
ombros, parte caindo por trás. Braços musculosos e veias das mãos bem salientes
sugerindo trabalho árduo. O semblante era rígido. Não percebi qualquer vestígio de
maquiagem. Os lábios soltos e freqüentemente mordidos pelos dentes inferiores. O
vestido era simples com flores estampadas de baixa qualidade. Tinha o formato dos seios
sugerido pela falta de sutiã, contudo nada indecente. A barriga um pouco maior que o
normal para uma pessoa magra. Diria que era meio barrigudinha, mesmo assim
ligeiramente sexy.
O vestido descia até próximo dos joelhos. Não tinha qualquer enfeite. Os pés rugosos com
as veias também à mostra. Os dedos enfileirados, Os quatro menores indecentemente
separados do maior pela tira da sandália rosa. Unhas dos pés pintadas de gelo, única
vaidade que notei. Uma bolsa de plástico aparentando couro falso estava pendurada pela
alça, bem acomodada em seu ombro esquerdo, que, por sua vez, estava à mostra.
Parei de ler Wittgeinstein para observá-la atentamente. Ela estava recostada entre o final
do banco à minha frente, do outro lado do vagão, e a beira da porta. O ombro cuidava em
manter o resto do corpo um pouco distanciado da parede do trem. Devia ter não mais que
vinte e sete anos. Bonita mulher, rosto bem desenhado, contudo sem brilho e expressão.
Fiquei tentando adivinhar a sua profissão. Julguei que fosse uma empregada doméstica,
mas pela hora, quase nove da manhã, ou estava atrasada ou tinha outra profissão.
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Enfim, fiquei imaginando aquele corpo por baixo da roupa. A sua barriguinha
protuberante formando um colo acolhedor. Como disse, os seios bem formados e
provavelmente um umbigo discreto. Vez outra, pelo balançar do trem, ela mudava a
posição dos pés chamando-me a atenção os seus dedos enfileirados sobre a sandália. O
trem estava cheio e tive dificuldade em continuar reparando-a. Talvez isto tenha-me feito
forçar o olhar, e ela percebeu-me. Olhou-me naturalmente. Apertou mais uma vez os
lábios e desviou logo o olhar. Outra vez trocou a posição do pé de apoio e passou a mão
direita sobre o cabelo. Aproveitou, ainda, para arrumar a alça da bolsa, que teimava em
escorregar de seu ombro esquerdo.
Voltei para a leitura de meu livro. Quando tornei olhá-la, não mais a encontrei. Descera
em alguma estação. Fiquei meio frustrado. Ajeitei-me no banco, curvei um pouco mais a
cabeça e voltei à minha leitura.
Bem, não a perdi, claro. A descrevi aqui.
A lembrança da mulher do metrô, vez outra volta à minha mente. A beleza pode ter uma
representação muito particular, concluo.
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INDO À PRAIA
Macaé/RJ - Domingo, 25 de novembro de 2001
Levantei animado, como faço todos os finais de
semanas. O Sol batia forte no meu quarto com
persianas novas, aliás, achei desnecessário
encomendar os caixonetes das persianas, apesar
de já tê-los pago.
Na segunda-feira vou lá na casa Chama tentar trocá-los por tapetes.
7:30 levantei-me. Fui, ainda sonolento, para a cozinha fazer café. Enquanto o café
pingava lavei as louças do dia anterior. Resolvi que iria à praia. Fiz barba correndo, passei
uma camiseta e somente às 9 horas consegui sair, ufa...
Solidão é a minha amiga mais próxima. À noite é terrível ter de abandonar mais um dia e
cair na cama. Tenho medo de que a solidão aumente ainda mais.
Aproveitei essa solidão e no sábado, ontem, dei uma adiantada substancial no meu
Narrador. Consegui, enfim, carregar todos sons waves das sílabas na memória, ou seja,
usei os arquivos de Recurso do windows que o bcc++ usa muito bem... Ih, confudi os
leitores com nomenclaturas de programação de computador.
Tou saindo... beijos! A saída é sempre meio complicada, como disse antes, decidi ir à
praia às 7 horas da manhã. Às 9 eu ainda estava a procura de uma sacola qualquer para
enfiar bronzeador, carteira, dinheiro, toalha etc... Não encontrei sacola, achei uma
embalagem compridona de uma estante de partituras jogada no quarto de empregada que,
aliás, uso para depósito de bugigangas.
Levo ou não a cadeira de praia, matutava eu indeciso, como sempre...
Sempre nessas situações de dúvidas experimento a indecisão fazendo e desfazendo o que
quero decidir. Assim sendo peguei a cadeira, que fica na varanda, dobrei-a e caminhei.
Achei-me estranho. Fui até ao espelho. Olhei-me, virei, dei voltinha, isso com a cadeira
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na mão. Esbocei um sorriso de galã e, então, decidi que não iria levar a tal cadeira.
Pensei: Com cadeira fica difícil trocar de lugar na praia, e o caminho até lá também é
meio longo. Fico meio brega com cadeira na mão. Decidi deixá-la na varanda, de onde
não deveria ter saído, aliás.
No caminho da praia
Eu tinha jurado que não ligaria. Afinal de contas só eu ligo, a procuro e, além do mais, eu
estava com aquela dor de cotovelo. Sei lá porquê, mas jurava que ela tinha arrumado um
namorado. Claro que sim, ela sempre fora muito dissimulada. Era capaz de me olhar nos
olhos prá mentir com segurança, aliás, ela somente olhava profundamente nos meus olhos
nesses momentos de mentiras deslavadas. Faz parte da personalidade dela esse atributo, o
de mentir com a segurança como estivesse falando a maior verdade do mundo. Pois é,
como eu dizia, eu jurava que ela estava namorando e se deliciando com as carícias dadas
e recebidas enquanto eu aqui, trabalhando que nem um burro e sozinho, sem ninguém. Eu
estava assim, deprê pra valer. Jurava que não iria telefoná-la. No caminho da praia não
resisti a fraqueza e ataquei um telefone público com força e disquei a cobrar, como
sempre. Ela atendeu e ainda ralhou comigo:
- Poxa heim, achei que nunca mais fosse ligar.
Eu, com cara de tacho e o coração amolecido pela saudade, falei como um cordeirinho:
- Tudo bem? Está feliz? E as crianças como vão?
Enfim, quebrei a minha jura de durão, como sempre, compatível com o meu modo
molenga de ser.
Na praia
Olhei bem, com a cabeça cheia de más intenções, procurando um lugar para fazer pouso
estratégico, aliás, para um quase quarentão abandonado como eu, não basta ir à praia, tem
é que arrumar uma boa companhia. Olhei, olhei e nada, quando via uma mulher bonita
que parecia estar só não tinha coragem de pousar ali, do ladinho, com cara de distraído.
Enfim, encontrei uma clareira ao lado de uma morena, que, digamos, não era lá essas
coisas, mas tinha umas pernas lindas e um corpo esbelto. Desdobrei a toalha vermelha,
depositei o meu saco improvisado em cima e desandei a cavar, com o pé, um travesseiro
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de areia para substituir a cadeira que não tivera coragem de trazer. Como sempre nessas
horas, a gente vê, quer olhar, mas finge nada ver e nem se importar com o alvo do desejo
ao lado. Mantive a minha cara de distraído e os pés, como se fossem uma pá, juntando
areia para o tal travesseiro. Arrumei a toalha em cima, aproveitei para ficar de cócoras e
desfraldar as minhas lindas coxas grossas, morenas e cabeludas. Claro que ela olhou, mas,
como eu, fingiu nada ver e também armou aquela cara de distraída, como a minha. Puxei
o bronzeador vagabundo e danei a me bronzear. Sei lá, eu nunca aprendo coisas que são
básicas para as mulheres. Eu não consigo distinguir bronzeador de protetor solar. Espalho
o bronzeador como se aquilo fosse me proteger do famigerado câncer de pele, quando, na
verdade, aquilo ajuda é o cruel solzinho a nos torrar.
No dia anterior, ou seja, ontem, sábado, ela havia ido à um show de um desses sertanejos
aí, lá na Barra, no Rio de Janeiro. Eu ligara e o meu filho mais velho, atendeu. Quando
percebeu que era eu ficou meio sem graça, tadinho, temeroso em dizer que a mãe havia
ida à uma festa. Eu juro que fiquei com aquela dorzinha de cotovelos, mas, fazer o quê?
Afinal nós estamos separados...
Voltando à história da praia ao lado da morena, pois é, fiquei por ali, puxei a revista Veja
e comecei uma leitura desmotivada. Sabe quando estamos, assim, fingindo ler uma coisa,
mas com a atenção e o rabo de olho voltado para alguém? Pois é, assim estava eu. Depois
de alguns momentos levantei-me e com aquele jeito carioca de ficar na praia, mesmo não
sendo mais um garotão, fiz pose de galã e passei a olhar tudo em volta. Claro que estava é
me exibindo para a tal morena. Ela, por sua vez, já percebera e estava realmente
começando a dar mole. Olhava diretamente para mim, fazia pose de gostosona, ficava de
bruços para exibir a bunda. Que bela bunda! Pensei cá com os botões da minha camiseta,
que não tem botão e nem estava no meu tronco:
- Está no papo, enfim acho que consegui uma companhia.
Esbocei um sorriso maroto. Ela respirou fundo, mas não correspondeu, contudo,
continuou com aquele jogo de sedução. Sentei-me novamente na areia e aí resolvi:
- Tenho de me aproximar dela. Eu é que tenho de tomar a iniciativa.
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Estava tudo certinho, ou seja, ela estava só, deduzi eu, pois estava sentada sobre uma
toalha única, não havia par de chinelos, latinhas de cerveja ou qualquer outra coisa que
denunciasse a presença de um homem por perto. Saquei duas balinhas de café de dentro
do meu saco comprido de estante e me postei entre a minha toalha e a dela. Tomei
coragem e perguntei com um sorriso, que suponho demonstrava ser do homem mais lindo
e comiserado do mundo:
- Aceitas uma balinha de café?
- NÃO! Respondeu ela.
Tomei um susto. Meu Deus! Pensei, ela parecia estar dando mole e implorando para eu
tomar a iniciativa! Fiquei desapontado. Recuei meio desnorteado e joguei-me sentado de
volta na toalha fingindo não ter ficado abalado. Para piorar, ela levantou-se e saiu. Voltou
acompanhada de um cara barrigudo e horroroso que se sentou ao seu lado. Era o seu
namorado, acho eu.
Desnorteado na praia
Eu caminhava meio sem rumo na direção oposta da que chegara. Óculos escuros nas
parabólicas. Andar meio gingado. Tralhas enroladas na toalha vermelha e o tal saco de
estante meio que despencando das minhas mãos.
- Quantas gatas, meu Deus!
Mas cadê a coragem de sentar pertinho? Caminhei, assim, meio que querendo parar, mas
sem coragem. Deixei a multidão para trás e já estava na praia dos surfistas. Não tivera
coragem de sentar-me ao lado de nenhuma outra mulher bonita, depois do fóra
inesperado. Caminhei até à Praia do Pecado. Para justificar meu desapontamento e
covardia de reerguer a moral, justifiquei a caminhada com a necessidade de perder umas
barriguinhas. Sabia, sou assim, aliás, acho que a maioria das pessoas é como eu. Sempre
que perco uma batalha procuro logo uma desculpa que justifique as minhas ações e
atitudes pós e reflexivas. Cansei. Fiz meia-volta e caminhei de volta olhando o mar. Não
tinha nada na areia para ver. Aqui estou eu, veja você, numa praia lotada de belas
mulheres seminuas e eu olhando para o mar em um pedaço de areia vazia, por medo de
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um fóra. Nessas horas sinto-me um adolescente rejeitado. Parece que a solidão, de truta
com a memória, diverte-se trazendo-me à tona frustrações passadas, longínquas e
recentes. Pois é, assim estava eu. Caminhando em uma paisagem linda, mas feio por
dentro.
Resolvi sentar-me ali, no lugar ermo mais ou menos longe das outras pessoas. À esquerda
podia vislumbrar uma mulher que eu não havia percebido na chegada. Sentei-me como da
primeira vez. Fiz o tal travesseiro de areia e pus-me a ler a revista Veja. Agora era uma
leitura de verdade, afinal, não dá mesmo pra ficar fazendo dueto com a solidão quando
estamos à beira de um mar tão lindo. De repente a minha atenção é desviada para a tal
mulher da silhueta. Ela estava levantando-se rapidamente e indo embora. Ufa, mais uma
vez bastou eu estar à vista de uma mulher para ela me rejeitar, matutei.
Batendo em retirada
Entrei um pouco na água, bronzeei-me e voltei para o meu ninho na areia. Depois de
algum tempo, levantei-me e fui embora. Vi-me imerso novamente no meio da multidão
banhista, mas eu estava resolvido a ir embora. Caminhei meio que desanimado em
direção à volta. Cada mulher! Passei pelo point das adolescentes onde o Glauber e a Iza
gostam de ficar quando estão comigo. Resolvi pousar por ali um pouco. Dessa vez tomei
coragem logo de início, mas sem antes dar umas duas rodeadas em torno do local
escolhido, sem coragem de sentar-me. Três mulheres a beira dos 30 faziam uma pequena
algazarra sobre a correção de umas provas de um tal concurso sei lá pra onde. Sentei-me e
logo fui chamado por uma voz masculina, era o meu corretor que lá estava com a sua
mulher e mais uma penca de gente. Cumprimentei-o e fiquei por ali. Saquei os
fragmentos úmidos que restaram da revista Veja novamente e passei a ler com desalento.
Vez outra a minha atenção era desviada para a algazarra das mulheres que citei.
Fiquei por ali até enjoar. Levantei-me e fui embora.
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ARTE, A LANTERNA DA ALMA
Macaé/RJ - Quarta-feira, Abril 19, 2006
Momentos antes da apresentação no palco.
Diálogo com Carlinha.
Carlinha me cumprimenta respondendo às
minhas perguntas:
- Bom dia Menino... Quantas perguntas!!!
Deixa-me respirar fundo pra responder a
todas...
- Você está feliz?
- Mais ou menos... estou preocupada,
ansiosa, nervosa...
- Muito frio à noite?
- Bem... eu sou meio suspeita pra responder a essa pergunta pois até no verão eu durmo
de cobertor... frio é uma sensação que me acompanha sempre!!! rs.
- Cantarolou muito à noite?
- Tentei cantar no banheiro mas não consegui... a única música que soou bem aos meus
ouvidos foi uma música gospel que eu gosto muito!!!
- Animada?
- Sinceramente? Ontem à noite pensei em desistir... ficar só na platéia... Pode parecer
frescura ou "ataque de estrelismo" como muitos dizem, mas não é... eu fico muito nervosa
e isso chega a me prejudicar às vezes! Problemas que já haviam estagnado em mim, como
o meu problema cardíaco, nessas horas fazem questão de estar presentes... e isso me
assusta! E o engraçado é que quando fico nervosa costumo ser mais extrovertida que o
normal.. coisa de doida, né?
- Com coragem para encarar a galera?
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- Coragem? Tá aí uma palavra que eu adoraria que fizesse parte do meu vocabulário...
Estou prá lá de insegura!!!
- Vc é única... e todos queremos conhecer essa singularidade no dia do evento...
- Obrigada pelo elogio... mas não acho que estou com essa bola toda...
- Bjs
- Bjs
- Encare isso como se fosse um game... Todos somos inseguros. Acredite, eu sou também
e muito. O meu envolvimento nisso se dá por uma questão subjetiva, ou seja, gosto do
"outro" e me empolgo quando vejo no rosto dos "outros" uma animação misturada com
desafio que pode ter um significado eterno para a vida destes "outros".
Ontem toquei com um amigo. Ele foi lá em casa e ensaiamos com cavaquinho e violão.
Ele ficou super feliz mas também inseguro... Depois que se foi, sentei na varanda e fiquei
pensando longamente sobre os "momentos" nas nossas vidas... Se pudéssemos registrar
cada "momento" em que estamos em contato com as outras pessoas...
Esse evento tem um mérito gratificante que é podermos "vislumbrar" um pouco do "id"
das outras pessoas sob a luz da arte. Você sabia que a arte é como uma lanterna da alma?
Pois é, quando a pessoa está em contato com ela o seu interior se ilumina e as pessoas
sensíveis que estão em volta se beneficiam em poder apreciar um “quadro” que somente
se expõe nestes momentos... Cada pessoa, sob o efeito da arte, é como uma "obra"
ambulante se expondo, prontas para serem observadas por outras pessoas "sensíveis"...
Na verdade nós humanos somos, de fato, uma grande obra de arte...
Você está com os CDs que te pedi ontem?
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AV. RIO BRANCO, MEU RIO DE JANEIRO Macaé/RJ - 2002
Vou ao Rio! Na Próxima semana estarei lá. Quinta-
feira tem reunião com a equipe do Sinergia, projeto
SAP que está sendo implantado em toda a Petrobrás.
O pessoal estará no bairro do Maracanã, Rio. Uhh,
que felicidade. Tenho saudades da Av. Rio Branco,
do Centro do Rio. Meu Rio de Janeiro. Como tenho saudade das avenidas entulhadas de
gente apressada. Av. Rio Branco. Quando trabalhava lá, adorava caminhar por ela, no
horário do almoço, e observar o semblante das pessoas, não só o semblante mas a postura,
as roupas, enfim, as pessoas. Sempre na última semana do ano dá nostalgia, mas é bonito.
As pessoas jogam os papéis acumulados durante o ano pela janela, tudo picadinho. As
lembranças me fazem sofrer. Mas, como um presente de Natal, estarei lá, na Av. Rio
Branco, no último dia útil do Ano. Vou à Livraria Saraiva. Meu Deus, que felicidade
poder novamente andar entre as prateleiras entulhadas de livros! Adoro livros.
Quando ainda trabalhava no Centro do Rio de Janeiro, comprava sempre. No horário do
almoço corria para os sebos da praça Tiradentes e rua da Carioca. Todo mês gastava uma
grana preta com livros. Amo os livros. Vou lá, correndo, na Saraiva Mega Store. Vou
também no meu jornaleiro, gente boa, na Rua São José, que guarda os volumes da minha
coleção de Música Erudita. Talvez pegarei os últimos volumes, a coleção irá se
completar. Estou ansioso por tudo isso. E tem também a lotada, rs, vontade de fazer sinal
para o táxi de farol aceso e me sentar ao lado de uma mulher bonita. Ir de Bangu até o
Centro, pela Av. Brasil. Estou nostálgico hoje, tenho saudades, saudades, muitas
saudades!
Meu coração bate forte quando ando pela Av. Rio Branco. Minhas lembranças ficam à
espreita na janela do pensamento, como que esperando ver pessoas do passado, amigos,
colegas ou simplesmente seres que eu avistava no passado. Meu coração bate forte
sempre. Atravesso a rua para não passar em frente do prédio 25, Edifício Avenida 25.
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Não que não quisesse ver as pessoas, mas é que dói, sei lá o porquê. Parece que há um
choque do passado com o presente. Parece que o passado vem como uma enorme onda de
um mar bravo e quer encobrir, passar por cima, afogar o presente. Dá agonia de afogado.
Os prédios parecem ondas por cima de mim. Sinto-me como um ser insignificante
perdido em mil lembranças. Os carros parecem tubarões que passam por mim a mil.
Ninguém me conhece, ninguém me vê. É assim a cidade grande. Amo or Rio de Janeiro.
Amo a Av. Rio Branco.
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Aprovada em 19 de fevereiro de 1998.
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