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Anais do II Simpósio Gênero e Políticas Públicas, ISSN 2177-8248 Universidade Estadual de Londrina , 18 e 19 de agosto de 2011.
GT5 – Gênero e Violência – Coordenadora Valéria Cristina Siqueira Ferreira
Lei Maria da Penha:
Avanços e Desafios no Município de Belém – PA1.
Lana Claudia Macedo da Silva2
Simone Nonato Miranda3
Suzana Cristina Rodrigues Trindade4
RESUMO
O presente trabalho constitui um sub-projeto no âmbito do Projeto de Pesquisa:
“Mulheres da Barca: Análise das Políticas Públicas direcionadas as Famílias Chefiadas
por Mulheres da Vila da Barca – Belém – PA”, fomentado pelo CNPq. Consiste na
discussão da Lei Maria da Penha, seus avanços e desafios na região metropolitana de
Belém (PA), a partir do levantamento de dados quantitativos realizado na Divisão
Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM). Objetiva analisar os impactos
preliminares da Lei Maria da Penha na prevenção e combate à Violência contra a
Mulher no município de Belém, nos cinco anos posteriores à criação da LMP. Em
análise aos dados da DEAM referente aos anos de 2006 a 2010, verificamos elevado
acréscimo de denúncias, mormente, a partir do ano de 2006, isto é, após a criação da
LMP, revelando os primeiros resultados positivos da Lei ao fornecer visibilidade a este
fenômeno silenciado e tolerado historicamente pelas ideologias do patriarcado. Em
2007 há a duplicação de atendimentos chegando a 10.544, destes 33% dizem respeito
aos casos em que se fez o registro do Boletim de Ocorrência Policial (BOP’s). No ano
seguinte, os BOP’s apresentam ligeira elevação de 38% dos 10.549 casos denunciados.
Em 2009 os números de Boletim de Ocorrência continuam evoluindo e alcançam 41%
do total de 11.027 atendimentos. E, finalmente em 2010, os registros de BOP’s
apresentam breve regressão somando 38% dos 11.195 tipos de denúncias efetuadas.
Contudo, verificamos que dos casos denunciados pelas mulheres pouco mais de um
terço são registrados. E, destes não se sabe quantos terminam suspensos e quantos são
concluídos. A parca estrutura física é outro aspecto revelador da ausência de políticas
públicas para combater esse fenômeno, dos 143 municípios do Estado somente 10
contam com Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, 2 possuem casa-
1 Trabalho apresentado ao II Simpósio Gênero e Políticas Públicas na Universidade Estadual de Londrina,
ocorrido entre os dias 18 e 19 de agosto de 2011. GT 5: Gênero e Violência. 2 Orientadora e Professora da Universidade do Estado do Pará. Mestre em Sociologia. Doutoranda em Sociologia pelo PPGCS/UFPA. Coordenadora do grupo de pesquisa: “Mulheres da Barca: Análise das
Políticas Públicas direcionadas as Famílias Chefiadas por Mulheres da Vila da Barca – Belém – PA”.
Contato: lanacmacedo@ig.com.br 3 Graduanda do 6º semestre do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade do Estado do
Pará. Bolsista do projeto de pesquisa: “Mulheres da Barca: Análise das Políticas Públicas direcionadas as
Famílias Chefiadas por Mulheres da Vila da Barca – Belém – PA”. Contato: otanon_23@gmail.com 4 Graduanda do 6º semestre do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade do Estado do
Pará. Bolsista do projeto de pesquisa: “Mulheres da Barca: Análise das Políticas Públicas direcionadas as
Famílias Chefiadas por Mulheres da Vila da Barca – Belém – PA”. Contato: suzanacrt@gmail.com
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abrigo, a saber: Belém e Marabá e 2 Unidades de Acolhimento Temporário em Belém e
Santarém e seus respectivos dependentes menores em situação de risco de vida
conforme prevê a LMP. A Lei Maria da Penha rompe com o “silêncio” da Violência
Doméstica, consolidando-a como problema social e de gênero, fornecendo visibilidade a
um crime considerado até então próprio à esfera privada. Contudo, romper com o ciclo
de violência implica em um processo de conscientização, prevenção e combate a
violência.
Palavras – Chave: Violência Doméstica; Lei Maria da Penha; Gênero.
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Para início de conversa...
Este estudo5 lança luz sobre uma das expressões da violência de
gênero, a praticada pelo homem contra a mulher. Inicialmente, a pesquisa tencionava
analisar os dados da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher no município de
Belém6 referente aos cinco anos que antecedem e os cinco posteriores à criação da Lei
Maria da Penha. Contudo, no que tange aos anos anteriores à Lei, a equipe só teve
acesso aos dados referente aos oito meses, do ano de 2006, anteriores à Lei, isto é, os
meses de janeiro a agosto do referido ano. Quanto aos dados posteriores à Lei quase
todas as informações foram apresentadas, com exceção dos dados referentes ao
encaminhamento dado ás mulheres que recorreram à DEAM durante o período de
setembro de 2006 a abril de 2011.
Apreciação dos dados
O dado inicial que chama a atenção diz respeito ao número total de
atendimentos pela DEAM. De janeiro a agosto de 2006 o órgão apresentou 5664 tipos
de denúncia. Nos anos de 2007 a 2010 esses números apresentam considerável
acréscimo. Em 2007 há a duplicação de atendimentos chegando a 10.544, destes 33%
dizem respeito aos casos em que se fez Boletim de Ocorrência Policial. No ano
seguinte, os BOP’s apresentam ligeira elevação de 38% dos 10.549 casos denunciados.
No ano seguinte, os números de Boletim de Ocorrência continuam evoluindo e chegam
a 41% do total de 11.027 atendimentos. E, finalmente em 2010, os números de mulheres
que prestam BOP’s apresentam breve regressão somando 38% dos 11.195 tipos de
denúncias efetuadas. Representada em gráficos:
5 O trabalho constitui um sub-projeto no âmbito do Projeto de Pesquisa: “Mulheres da Barca: Análise das
Políticas Públicas direcionadas as Famílias Chefiadas por Mulheres da Vila da Barca – Belém – PA”,
fomentado pelo CNPq. 6 Agradecemos a equipe da DEAM/Belém, em especial a Delegada Dra. Alessandra do Socorro da Silva
Jorge, por fornecer material que pudesse colaborar para a realização da pesquisa.
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Total de BOP’s e de atendimentos na DEAM/Belém, 2007 a 2010.
FONTE: DEAM, 2011.
O gráfico acima revela significativa ascensão no número de casos
denunciados a Delegacia após a criação da Lei Maria da Penha. A representação indica
os efeitos primeiros de uma política pública de direitos humanos dirigida à equidade de
gênero. Contudo, seria ingênuo pensar em uma elevação dos casos de violência
cometidos contra a mulher. Em nosso ver, é mais prudente concordar com a tese de que
a criação da Lei Maria da Penha forneceu visibilidade à cultura de violência cometida
contra a mulher.
Contudo, verificamos que dos casos denunciadas pelas mulheres
pouco mais de um terço são registrados. E, destes não se sabe quantos terminam
suspensos e quantos são concluídos. Estudo etnográfico realizado na DEAM do Rio de
Janeiro verificou que no ano de 2006 mais de 70% dos registros de ocorrência
efetivados nas delegacias terminavam suspensos devido a: “preocupação com os filhos,
à reinterpretação do conflito ocorrido e finalmente à necessidade de preservação da
moradia da família, dada a importância material e simbólica que a casa adquire no
contexto analisado”. (BRANDÃO, 2006, p. 220).
Historicamente, a Violência Doméstica foi mascarada e justificada
pela idéia de que “em briga de marido e mulher, não se mete a colher”, ”ou será minha
ou não será de ninguém” (TELES & MELO, 2003). Essas posições alimentam a
Violência doméstica, pois a naturalizam, tornando-a uma prática “comum”, o homem
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agredir a mulher, seja sua namorada, companheira, esposa. Pensar a Violência
Doméstica como problema privado, que não necessita de intervenção é mais evidente,
pois “a mulher gosta de apanhar”, “tem que levar umas porradas para aprender”. Tais
ideologias paralisam e estigmatizam a mulher, silenciam os atos de violência cometidos
pelo homem, além de contribuir para a omissão dos direitos da mulher, enquanto
cidadã, ser de direitos.
Tais posições são “toleradas” pela cultura patriarcal e machista que
defende a submissão do sexo feminino perante o masculino. O homem é o “macho”, e
detentor do pátrio poder. Pelas distinções e atribuições entre os sexos, que segundo
Motta-Maués (1993) estão decalcadas nas idéias ou concepções acerca das definições
sociais dos mesmos, que são informados pelas regras culturais em conjunto com as
relações sociais existentes, isto é a atuação da mulher limita-se à esfera interna, ao
âmbito doméstico e o homem atua no espaço público, exercendo as funções mais
importantes.
A cultura do patriarcado reafirma a superioridade do homem em
detrimento da sujeição da mulher. Nesse contexto a violência doméstica se materializa
se justifica e torna-se uma “prática” rotineira vivenciada por inúmeras mulheres
brasileiras. A violência doméstica está enraizada em nossa sociedade, por isso o
enfrentamento é necessário, viver sem violência é direito de todas as mulheres.
O debate a cerca da violência doméstica é um campo abrangente, e
não pode ser isolado, tão pouco banalizado pelas “premissas” do senso comum.
Compreender a violência doméstica como uma questão de Gênero, amplia as
possibilidades de intervenção, conscientização, prevenção e combate contra essa
desigualdade de Gênero, que inferioriza a mulher e fere o seu direito a dignidade.
Compreender “gênero” como uma categoria útil de análise é
importante para compreender as relações sociais entre os sexos, de modo a trazer à baila
a reflexão acerca da idéia dos papéis sociais imutáveis, coadunando com a mentalidade
cartesiana que fragmenta corpo e alma, razão e sensibilidade, homem e mulher.
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Para Scott (1978) a categoria Gênero rompe com o determinismo
biológico implícito no uso de terminologias como “sexo” ou “diferença sexual”. Logo,
as diferenças sociais entre homens e mulheres estão imersas na construção histórica e
cultural, independente do caráter biológico, mas de identidades atribuídas culturalmente
na sociedade, os papéis sociais. Para a autora, a maneira como as sociedades
representam o gênero utilizam-no para articular regras de relações sociais ou para
construir o sentido da experiência. Pois, sem o sentido não há experiência, sem o
processo de significação não há sentido.
Louro (2000) enfatiza que as identidades de gênero e sexuais são,
portanto compostas e definidas por relações sociais, elas são moldadas pelas redes de
poder de uma sociedade. A sociedade e seu poder simbólico influenciam, direta ou
indiretamente, na construção dos papéis sociais, em outras palavras, no “tornar-se
homem” ou “tornar-se mulher”. Tais influências não consideram que, as mulheres não
nascem mulheres, se tornam mulheres, às características associadas tradicionalmente à
condição feminina derivam menos de imposições da natureza e mais de mitos
disseminados pela cultura (BEAUVOIR, 1985).
Nesse sentido Beauvoir (1985) em “O Segundo sexo”, desconstrói a
ideologia da condição feminina como “segundo sexo”, limitada aos determinantes
biológicos e a supremacia do homem. A sociedade difunde a idéia da submissão da
mulher, da diferença de papéis sociais distinguidos pelo sexo, “o homem vive/existe
sem a mulher, mas a mulher sem o homem não”, a sujeição feminina foi “enraizada”
culturalmente, a violência doméstica faz parte desse universo de “invisibilidades”,
“tolerâncias”, pois o “homem é o dono da mulher”, “ela é minha mulher, eu que mando
nela”.
No Brasil as estatísticas apontam que a cada 15 segundos uma mulher
é agredida (CARTILHA DIREITOS DA MULHER, 2011), diante desse dado
significativo, não podemos “fechar os olhos”, consentir que a violência doméstica se
“naturalize” na vida da mulher. A LMP fortalece o enfrentamento à violência
doméstica, a denúncia consiste num passo importante, para o combate e prevenção.
Contudo, não representa o fim do ciclo de violência, pois o decurso da denúncia até o
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possível julgamento envolve questões singulares, já que os atores estão ligados a
relações sociais conflituosas, afetivas, familiares e de dependência. Segundo Araújo,
Martins e Santos (2004, p. 31) a questão de gênero atravessa os diferentes motivos que
levam as mulheres a permanecerem numa relação abusiva:
Os motivos mais freqüentes são a dependência emocional e econômica, a
valorização da família, a idealização do amor e do casamento, a preocupação
com is filhos, o medo da perda e do desamparo diante da necessidade de
enfrentar a vida sozinha, a ausência de apoio social e familiar.
Entre os casos denunciados a DEAM/Belém nos anos de 2006 a 2010,
a lesão corporal segundo a LMP aparece em primeiro lugar com 28% de denúncias,
seguida pela Ameaça segundo a LMP com 27%, em terceiro está as “vias de fato”
representando 20% e em quarto a perturbação a tranqüilidade com 15% do total. A
categoria “outros” apresenta dados expressivos atendendo a 4% dos casos, o que nos faz
interrogar se as 35 categorias de denúncias apresentadas pela DEAM seriam
insuficientes para caracterizar todos os tipos de delitos, crimes e lesões cometidos
contra a mulher.
Os crimes concernentes a violência sexual são classificados em
diferentes categorias, a saber: estupro, atentado violento ao pudor, imp. ofensa ao
Pudor, atos obscenos, assédio sexual e tentativa de estupro somam 27 casos em 2007,
alcançando menos de um por cento, subindo para 37 em 2008, depois 39 casos no ano
de 2009 e alcançando 48 no ano de 2010, representando, um acréscimo em torno de
80% dos casos nos últimos quatro anos analisados.
Outro dado revelador diz respeito ao percentual de mulheres
albergadas no ano de 2007, foram em número de 07% (sete) de mulheres do total de
10.544 denúncias, sendo 17% (dezessete) sofreram ameaças, 16% (dezesseis)
correspondentes a perturbação a tranqüilidade, 26% (vinte e seis) sofreram lesão LPM, a
denúncia caracterizada como “vias de fato” corresponde ao maior percentual atingindo
28% (vinte e oito), a injúria corresponde a 02% (dois) e ainda há os elementos “outros”
que corresponde a 6%, (seis), porém, não explicita seu significado e outros tipos de
denúncias que não alcançam nem um por cento no quadro de tipologias apresentadas
pelo DEAM. Contudo, dentre esse número que parece insignificante encontramos os
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crimes vinculados a esfera da sexualidade referidos acima, tentativa de homicídio,
difamação, danos, maus tratos,
Salientamos o número elevado de mulheres que não aceitaram
acolhimento nesse ano perfaz 93% (noventa e três). Nos demais anos não foram
repassados esses dados que são reveladores de que a denúncia não constitui a
consumação dos fatos, quer seja porque essas mulheres não cogitam a possibilidade de
sair de sua casa e separar-se do companheiro, pois elas tendem a acreditar na
possibilidade de mudança comportamental desses homens, ou porque ainda são frágeis
os mecanismos de proteção às mulheres em comparação os quantitativos de mulheres
que deles necessitam, seja numericamente ou em estar estruturais
No ano de 2008, a DEAM realizou 10.549 atendimentos a lesão
corporal segundo a lei Maria da Penha representando 28% (vinte e oito) dos casos de
denúncias, a ameaça (LMP) e a “vias de fato” tiveram ambas um percentual de 24%
(vinte e quatro) das acusações.
No ano de 2009 a DEAM registrou 11027 atendimentos, destes 27%
(vinte e sete) representam lesão corporal segundo a LMP, seguida de ameaça na LMP
com 28% (vinte e oito) dos casos. Às vias de fato atendem a 20% (vinte) dos casos
seguida pela perturbação da tranqüilidade com 17% (dezessete) das denúncias daquele
ano.
No ano de 2010, verificamos que a DEAM registrou 11.195
atendimentos. Destes, a ameaça (LMP) teve um acréscimo de 5% em relação ao ano
anterior, respondendo por 33% (trinta e três) das denúncias, seguida pela Lesão
Corporal (LMP) com 29% (vinte e nove) dos casos. As Vias de fato aparecem com 15%
(quinze) dos casos, ficando acima das denúncias de Perturbação da tranqüilidade com
13% (treze) e a categoria “Outros” com 4% (quatro) dos atendimentos.
Quanto ao número de mulheres albergadas em 2008 os índices
registram 64 (sessenta e quatro). No ano seguinte sobe para 75 (setenta e cinco)
mulheres. E, em 2010 o número retrocede para 54 (cinqüenta e quatro) abrigadas.
Ressaltamos que a LMP garante à mulher em situação de violência doméstica e seus
respectivos dependentes menores a proteção em casas-abrigos pelo tempo máximo de
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seis meses. Contudo, o Estado do Pará conta com 2 casa-abrigo (a primeira Casa-abrigo
Albergue Emanuele Rendeiro Diniz, localizada em Belém e a segunda casa-abrigo em
Marabá) e mais 2 Unidades de Acolhimento Temporário em Belém e Santarém. A
Secretaria de Estado da Mulher e da Diversidade Humana está com processo seletivo
aberto para a coordenação da primeira casa-abrigo do Estado, com previsão de
funcionamento para este ano (2011) e uma equipe multidisciplinar composta por
profissionais das áreas psicossocial, jurídica e saúde para atender a 20 mulheres que se
encontram em situação de risco de morte, conforme estabelece a LMP de 2006.
Não é novidade dizer que o Estado do Pará possui dimensões
geográficas bastante generosas. Entretanto, dos 143 municípios do Estado somente 10
contam com Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, são eles: Belém,
Altamira, Castanhal, Breves, Redenção, Marabá, Santarém, Itaituba, Tucuruí e
Paragominas. Esse quadro sintetiza a precariedade e escassez de estrutura para combater
um fenômeno enraizado no seio da sociedade.
De tantos números apontados pelo levantamento, não tivemos acesso
aos que indicam o prosseguimento dado aos casos denunciados. Contudo, estudo
realizado sobre a violência doméstica na capital paraense revela que no ano de 2006, o
Juizado Especial Criminal de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher,
encaminhou 981 (novecentos e oitenta e um) Termos Circunstanciados de Ocorrência
(TCO) a Delegacia de Crimes contra a Integridade da Mulher (DCCIM). No entanto,
nas palavras da autora:
Apesar do Juizado não ter esses dados sistematizados, os funcionários do
juizado afirmam que boa parte das audiências não ocorre ou quando ocorrem
“não dão em nada” porque as mulheres desistem de dar prosseguimento ao
caso, em geral pedindo para apenas para que o companheiro assine um termo
de “bom viver”, aguardando o término do prazo decadencial, para “pensar”
(SOUZA, 2006, p. 04).
O senso comum tende a perceber a mulher como a pessoa responsável
por atenuar a situação de conflito doméstico, reforçando o estigma de pacificadora e
condescendente. A mulher representa a “edificadora do seu lar”, discurso presente na
Igreja Católica ao reafirmar a divisão social dos papéis de gênero.
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Importante salientar que a DEAM conta com uma equipe de
profissionais especializados para atuar com a temática: advogada, socióloga, assistentes
social, psicóloga e técnicos. Nesse sentido, a DEAM também promove palestras sobre a
LPM direcionadas à sociedade mais ampla e, especificamente aqueles que procuram o
órgão para realizar denúncias. Em 2007 foram 95 palestras, no ano seguinte tivemos 93,
em 2009 realizaram 70 palestras e no ano de 2010 alcançaram 122 palestras.
Se fossemos concluir...
A Violência Doméstica apresenta-se como um grave problema social.
A Lei Maria da Penha garante a visibilidade para este fenômeno silenciado e tolerado
historicamente pelas ideologias do patriarcado. Contudo, existem diversas “Marias” no
município de Belém e no Estado, que a LMP não integrou, por isso a necessidade da
conscientização, prevenção, combate e enfrentamento à Violência Doméstica contra a
Mulher.
As “verdades” patriarcalistas e machistas reforçam a violência
doméstica, a posição de “superioridade” do homem em relação à mulher, não a
consideram como humana, livre, autônoma, ela é “propriedade” do homem e não um ser
de direitos. A violência doméstica vai além de uma “briguinha de casal entre quatro
paredes”, é uma questão social, pública e principalmente de gênero, pois as relações
sociais entre homens e mulheres estão imersas por estigmas históricos que mascaram
essa desigualdade de gênero e a “naturalizam”.
É necessária a percepção desse fenômeno como um problema de
gênero, por isso a violência doméstica enquanto questão de gênero deve ser enfrentada,
a intervenção da sociedade e, principalmente do Estado é fundamental. A violência
doméstica deixa de ser um problema “privado”, a LMP consolida-o como público, essa
questão é tão complexa que vai além das percepções do senso comum.
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A Lei Maria da Penha torna evidente a necessidade de proteger os
direitos da mulher, garantindo a visibilidade a essa desigualdade de gênero, a violência
doméstica não surge sem o processo de significação. Culturalmente ela foi
“naturalizada”, contudo não podemos aceitar que continue sendo “invisível”, por isso a
LMP reforça o processo de enfrentamento à Violência Doméstica.
A lei pela lei não garante o rompimento com o ciclo de violência, mas
a apropriação, a conscientização, prevenção e combate alicerçam o enfrentamento.
Campanhas são realizadas nesse sentido como: “Quem ama, não mata”, “Sem as
mulheres, os direitos não são humanos”.
Nosso município de Belém, a LMP tem uma longa caminhada na
superação dessa desigualdade de Gênero presente no cotidiano de inúmeras mulheres, a
conscientização é a melhor representação contra a violência doméstica, pois ”A sua vida
recomeça quando a violência termina”. A Educação tem um papel fundamental no
processo de construção da igualdade de Gênero, que envolve mudanças culturais na
compreensão deste fenômeno, amparado na hierarquia dos papéis sociais e de gênero.
Nesse sentido, a conscientização contribui para a construção de novas vidas, sem
violência, com autonomia, liberdade, assim “Toda mulher tem direito a uma vida livre
de violência”.
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Referências
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SOUZA, Luanna Tomaz de. CONRADO, Mônica Prates. Vergonha ou intimidação?
Um retrato da violência cometida contra a mulher em Belém do Pará. Trabalho
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Internacional Fazendo Gênero 7: Gênero e Preconceitos, realizado em 2006 na
Universidade Federal de Santa Catarina.
TELES, Maria Amélia de Almeida. MELO, Mônica de. O que é violência contra a
mulher. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 2003.
Documentos
Divisão Especializada de Atendimento à Mulher. Vítimas que decidiram por
encaminhamento, ano 2007.
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