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Lágrimas pela Fé
Antônio Augusto Fonseca Júnior
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A Trilogia das Lanças de Christos:
Entre Anjos e Demônios
Assassino de Almas
Príncipe da Destruição
Busca por Sangue
A Marcha dos Dez Mil: Sangue e Glória
O Mal e a Noite: contos de fadas e monstros para adultos
Profecias da Noite:
Benção do Inimigo
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Sumário
Personagens ......................................................................... 5
Prelúdio ............................................................................... 7
Capítulo Um .......................................................................... 14
Capítulo Dois ........................................................................ 54
Capítulo Três ......................................................................... 92
Capítulo Quatro ................................................................... 129
Capítulo Cinco .................................................................... 162
Capítulo Seis ....................................................................... 196
Capítulo Sete ....................................................................... 224
Capítulo Oito ....................................................................... 262
Capítulo Nove ..................................................................... 286
Capítulo Dez ....................................................................... 327
Capítulo Onze ..................................................................... 353
Capítulo Doze ..................................................................... 376
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Personagens
Belfael
anjo da guarda
Calpian
poderoso anjo Dominação
Deloru
demônio guerreiro, um dos Senhores Negros
Drahel
antigo Principado de Itaúna
Eailah
anjo Potência
Elkalas
anjo da morte
Francis
voltou a andar devido a um milagre
Frederico
padre investigador de milagres
Khalyhel
poderoso Arcanjo da falange de Uriel
Korphet
demônio da morte
Liliel
anjo caída do suicídio, uma dos Imoladores
Lucas
padre investigador de milagres
Mikaela
anjo Dominação da falange de Uriel
Nefadriel
Arcanjo do Fogo, um anjo caído e líder dos Imoladores
Olavo
padre investigador de milagres
Osmar
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primeiro padre a investigar os milagres
Osório
um padre de Itaúna
Paliel
um Arcanjo responsável por Itaúna
Payg
anjo Principado de Itaúna
Quelius
anjo guerreiro e anjo da guarda
Raquel
esposa de Francis
Roberto
recebeu um dos milagres de Teodoro
Teodoro
padre falecido a quem se responsabilizam os milagres
Urfel
demônio conspirador, um dos Senhores Negros
Vanessa
garota que recebeu um dos milagres de Teodoro
Zael
anjo Tronos caído, um dos Imoladores
Zalas
anjo da morte responsável por Itaúna
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Prelúdio
Nove horas da noite. Já era tarde para uma cidade
pacata como Itaúna, onde os dias de semana se
encerravam cedo e as poucas agitações eram reservadas
para os sábados e domingos. Ele verificou o relógio mais
uma vez para conferir e em seguida desviou os olhos para
o céu nublado. Um pingo d´água caiu direto em seu rosto,
escorrendo pela bochecha. Enxugou a face com a mesma
mão do relógio. Respirou profundamente, cansado do dia
que parecia esquecido pelos anjos.
- Agora só falta começar a chover – reclamou.
Três passos depois, a chuva caiu punitiva sobre
seus ombros cansados. No princípio, era apenas uma tênue
garoa que foi aumentando à medida que o homem se
apressava. O clima parecia brincar com ele. Bastava
começar uma corrida para que pingos d´água mais grossos
começassem a cair. O guarda-chuva pareceu um peso
desnecessário naquele dia que começou tão radiante e
promissor antes que colocasse os pés para fora do quarto.
Agora, como se não bastasse aquele trabalho estafante,
precisava suportar a chuva.
Decidiu parar de correr. Não tinha mais ânimo. Já
que estava próximo do hotel, resolveu andar devagar, sem
se importar com a roupa encharcada. Os cabelos já
estavam grudados na cabeça e a água não parava de
escorrer pelos olhos, incomodando sua visão.
Começou a pensar nos fatos da última semana.
Estava curioso quanto ao ocorrido, mas tinha suas
dúvidas. Aquela estátua, aquela gruta. Tudo o deixava
cada vez mais intrigado. Havia algo a mais ali, ele tinha
certeza, mas não podia provar. E como ele queria provar.
Precisava disso para fortalecer sua fé. Estava farto de
apenas questionar. A vida se tornara uma procissão de
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investigações para destruir esperanças de povos sofridos.
Mas o coração dizia que havia algo naquela estátua. Havia
algo naquela imagem de Nossa Senhora. Não era o caso de
ele mesmo desejar isso. Algo dentro dele avisava.
Crer em milagres não era uma coisa fácil para
aquele padre. Nunca fora. Ele mesmo não sabia o motivo
de ter se tornado um homem de Deus. Por que será?
Sempre fora cético quanto a qualquer história anormal.
Acreditava piamente em Deus no início, mas não nos
milagres que as pessoas tanto gostavam de relatar. Em sua
cabeça, imaginava que o Senhor não perderia tempo
fazendo estátuas chorarem sangue ou vibrarem ou dando
shows nos macabros palcos de algumas igrejas
protestantes. Em sua concepção divina, o Senhor
simplesmente acompanharia a vida das pessoas com
milagres mais simples, que apenas aqueles de muita fé
perceberiam.
Talvez sua fé houvesse se diluído juntamente com
sua inocência. O passar dos anos costuma fazer isso com
as pessoas, pensou, enquanto tentava voltar seus
pensamentos para o trabalho. Fora naquela cidade a
mando da Igreja para decifrar aqueles sinais, não para
fazer perguntas sobre sua própria fé. Tentou concentrar-se
nos acontecimentos do dia. Havia anotado tudo em sua
agenda, mas repassava mentalmente os fatos. A agenda!
Droga, agora já deveria estar toda molhada.
- Maldição – xingou alto. Parou de andar um pouco
para olhar para os lados, para ver se não havia mais
alguém ali. Um fiel não poderia ouvir um padre
praguejando assim.
Retirou o cabelo molhado na testa e olhou para
todos os lados da rua. Nada. Nada além da chuva caindo.
A não ser... forçou os olhos. Pareceu ter visto algo de
relance quando olhou para frente de novo. Colocou a mão
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em forma de cunha na testa e tentou enxergar melhor, mas
a chuva dificultava a visão. Suspirou profundamente e
continuou andando. A imagem de Nossa Senhora
chorando não saía de sua mente. O que fazer? Já deveria
requisitar a análise do líquido? Sim ou não? A dúvida
vinha de seu próprio coração, porque ele queria acreditar.
Pensou em caminhar para igreja ao invés de ir para
o hotel. Precisava orar, precisava pensar. Só que não
poderia entrar lá todo molhado. Seria melhor voltar para
seu quarto apertado e tomar um bom banho quente. É,
talvez fosse. Aproveitaria para tentar secar a agenda ou
passar suas anotações para outro lugar. Passar todos
aqueles registros sobre milagres para páginas mais dignas.
Dignas? Mas seriam aqueles registros dignos daquelas
páginas?
Mais um vulto. Dessa vez ele parou para ver o que
era. Forçou a visão e viu alguém caminhando em sua
direção. Era uma figura pálida que andava sem se
incomodar com a chuva, quase como ele fazia. Não pôde
notar a expressão de seu rosto. Apenas via suas roupas
surradas e rasgadas, como as de um mendigo. O padre
perguntou-se se não havia perigo. Mesmo em uma cidade
do interior podem ocorrer assaltos e assassinatos.
Seus olhos se fixaram na figura e suas pernas
continuaram se movendo, ainda que com certa hesitação.
A chuva continuava dificultando a visão. A água escorria
pela testa, pelas sobrancelhas e chegava aos olhos. Ergueu
a mão para limpá-los. A visão clara revelou que o dia
estava para terminar não sob a benção divina, mas com o
terror da escuridão. O que estava à sua frente não era um
homem.
Ele parou. Para dizer a verdade, ele não parou. Não
pôde, não conseguia. Quem parou foi seu corpo. Sua
mente paralisou todos os músculos. Não conseguia se
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movimentar. O seu cérebro parecia centrado em apenas
um único esforço, entender como a chuva passava através
daquela criatura esfarrapada. Os grossos pingos d´água
passavam através daquela forma esquálida, por mais que
ela parecesse sólida. Era possível vê-los atravessando as
roupas, transpondo o rosto.
Ah, o rosto! Por Deus! Aquele rosto estava morto.
Parecia vivo, mas era claro para quem olhasse. A razão
poderia dá-lo como vivo, mas o coração o denunciava. O
padre sentiu sua alma gritar “Cuidado!”. E aqueles olhos
acinzentados não paravam de fitá-lo. Era um olhar de pura
acusação. Não como um pai repreende um filho, não como
uma professora xinga um aluno. Não, nada disso. Aquilo
era como um juiz julgando um réu que considerava
culpado desde antes do julgamento.
- Padre Osmar... – disse, mas o padre poderia jurar
que não vira sua boca se abrir. – Padre Osmar, você não
deve continuar. Não pode tornar Teodoro um santo. Não
vai. Não pode.
Talvez aquelas palavras fossem feitas para
intimidar. Talvez fossem uma ameaça. Mas não surtiram
esse efeito. Ocorreu o contrário. Aquilo deixou Osmar
aturdido. Enquanto olhava para a figura fantasmagórica,
seu coração se enchia de fé. Sentia o vazio das dúvidas ser
preenchido quase que instantaneamente. Sua missão
pareceu-lhe clara. Tudo estava respondido.
- Demônio – gritou Osmar. Quem falou não foi seu
cérbero. Esse ainda paralisava seu corpo, tentando
entender a aberração à sua frente. Quem disse isso foi sua
alma, seu coração, sua fé.
Houve uma ligeira mudança na expressão da
estranha figura. Parecia um leve traço de surpresa. Só que
foi tão fugaz que não era possível ter certeza.
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- Estou avisando. Vai parar ou não? – falou o
estranho. Coincidência ou não, no mesmo instante em que
ele avançou um passo ameaçador, ouviu-se o ribombar de
um trovão.
Osmar recuou alguns passos. Talvez seu cérebro
tenha despertado com o estrondo ou simplesmente parou
de tentar entender a figura sobrenatural que avançava cada
vez mais.
- Filho do Diabo, não se aproxime! Não vai
impedir que mais uma alma pura seja canonizada! Deus
não vai permitir! – vociferou Osmar, procurando por seu
terço e se xingando por ter deixado a Bíblia em casa.
A fé do padre aumentava tanto que ele já não
pensava mais em recuar. Seus pés prenderam-se firmes ao
asfalto. O rosto decidido desafiava o fantasma, pouco se
importando com a chuva que batia violentamente contra a
pele.
O estranho não se intimidou com a fé. Muito pelo
contrário. Pareceu ainda mais irritado, decepcionado.
Continuou avançando com ares de violência. Seu cabelo
molhado, mesmo sem ser tocado pela chuva, movia-se
como que atiçado por uma ventania sobrenatural. Osmar
começou a sentir esse vento quando a figura estava a
poucos passos. A temperatura esfriou ainda mais. O corpo
gelou e ele sentiu-se no meio da mais terrível das
tempestades.
- Afaste-se, demônio! Se havia alguma dúvida em
mim, agora ela se foi! Sua aparição não me convencerá.
Pelo contrário, apenas me traz mais fé para que eu possa
concluir minha missão.
Cada palavra sucessiva do padre aumentava a ira
do estranho. Só que toda a fúria não aparecia em seu rosto.
Era manifestada por um frio sobrenatural, pelo estrondo
dos trovões. Tudo isso aumentava aos ouvidos de Osmar à
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medida que ele via o estranho avançando. Houve um
momento em que se perguntou se estava tremendo por
medo ou pelo frio. Não houve tempo para resposta. Tudo
o que soube era que ouvia aqueles trovões com seu
coração e sentia aquele frio em sua alma.
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Capítulo Um
Pequena Conceição de Minas. Nome grande para
uma cidade tão pequena. Ao menos já descrevia o que as
pessoas iriam encontrar. Mesmo assim, podia-se dizer que
o nome ainda era prepotente. O lugar era minúsculo, não
era pequeno. De certo modo, o nome Conceição dava uma
ideia de religiosidade. De fato, isso se podia encontrar ali.
Como em toda minúscula cidade do interior, a fé era
explícita no rosto das pessoas, diferente do ateísmo ou da
fé cínica tão comum na cidade grande. Não se
encontravam católicos não-praticantes. Esse era um termo
até desconhecido pelos pacatos e fiéis cidadãos.
Para completar o nome, a cidade ou vilarejo ou
comunidade encontrava-se em Minas Gerais. Bem no
interior, para se dizer a verdade. Para se chegar lá,
primeiro era preciso pegar um ônibus em Belo Horizonte.
Então o viajante precisava ter paciência para enfrentar as
estradas nada boas enquanto o veículo balançava pelo
caminho.
Qualquer um precisava torcer para ter um bom parceiro
de viagem. Passar tanto tempo na estrada ao lado de um
estranho nem sempre era saudável. Quem sabe quando não
vai se encontrar alguém que gosta de falar demais quando
se quer dormir e descansar ou daquelas pessoas espaçosas
que abrem as pernas a ponto de ocupar dois bancos? Para
piorar, poderia haver ao lado um daqueles que sempre
enjoam nas viagens e nunca se lembram de tomar um bom
remédio para tratar do problema.
Caso o viajante sobrevivesse, perceberia o calor
aumentado à medida que se afastava de Belo Horizonte.
Então chegaria a Teófilo Otoni, dali tentaria alcançar
Pequena Conceição de Minas. Como? Poderia usar o
ônibus que partia uma vez por dia da cidade para o
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vilarejo. E ele que não se arriscasse a perdê-lo ou
precisaria passar o dia todo procurando por um louco
disposto a passar pela terrível estrada e a dar-lhe carona.
Se pegasse o ônibus, o viajante, peregrino seria um
termo melhor, sofreria durante uma hora e meia na mais
terrível das estradas, passando por mata-burros, porteiras e
muita poeira. Ao menor sinal de chuva, seria bom
acrescentar no mínimo mais uma hora de viagem. Os
bancos duros e os buracos da estrada dilatariam esse
tempo. Quando chegasse, o peregrino poderia ser
considerado um mártir com apenas um resquício de coluna
e estaria ávido por uma boa cama e descanso. A não ser
que possuísse parentes em Pequena Conceição de Minas, o
indivíduo estaria fadado a péssimas horas de sono e a
procurar por um lugar para dormir. O único refúgio seria a
igreja, que o padre às vezes liberava caridosamente. Por
sinal, justamente por isso o lugar estava tão movimentado.
Naquele dia ensolarado do início de dezembro, o
ônibus para Pequena Conceição de Minas estava cheio.
Havia quase trinta pessoas nele, isso sem contar as seis
galinhas, o cachorro e o cabrito. A viagem foi mais
incômoda que o normal, já que crianças chorando e
vomitando nunca ajudam a aliviar o desconforto dos
bancos e da estrada esburacada. Pior ainda ouvir uma
ladainha sem fim de pessoas que não paravam de rezar.
Volta e meia ouvia-se um “Aleluia!” que era
acompanhado por todos no ônibus. Todos, exceto três
figuras bem vestidas que estavam sentadas no banco de
trás.
Essas pessoas levavam pequenas malas pretas.
Pareciam até médicos, já que estavam vestidos de branco.
Só um deles não trajava calça e camisa social brancas, mas
tinha o mesmo olhar sério dos outros dois. Este, um
homem negro e franzino, usando óculos, fora mais
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