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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
THAMY YASMIM DOS SANTOS VIEIRA
O TRATAMENTO PENITENCIÁRIO RESSOCIALIZANTE
CURITIBA
2012
THAMY YASMIM DOS SANTOS VIEIRA
O TRATAMENTO PENITENCIÁRIO RESSOCIALIZANTE
Monografia apresentada como requisito parcial para conclusão do curso de graduação em Direito e obtenção do grau de Bacharel em Direito na Universidade Tuiuti do Paraná, tendo como orientador de conteúdo Professor Dálio Zippin
CURITIBA
2012
TERMO DE APROVAÇÃO
THAMY YASMIM DOS SANTOS VIEIRA
O TRATAMENTO PENITENCIÁRIO RESSOCIALIZANTE
Esta Monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito, na Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba,___ de____________ de 2012
_____________________________________________________ Professor Doutor Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de Monografia Universidade Tuiuti do Paraná
Orientador: ___________________________________________________ Professor Doutor Dálio Zippin Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Membros da Banca Examinadora:
__________________________________________________ Professor:
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
______________________________________________________ Professor:
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
DEDICATÓRIA
“Dedico o presente trabalho à Deus que me inspirou neste estudo”
AGRADECIMENTOS
“Agradeço ao Dr. Dálio Zippin por ter me orientado neste estudo, à minha
famíliae principalmente ao meu filho Matheu Eduardo dos Santos Vieira”
RESUMO
A presente monografia descreve e analisa o tratamento penitenciário
ressocializante. O objetivo do estudo é mostrar a importância de um tratamento dentro
dos estabelecimentos penais que busque a reintegração do detento. Pretende-se
através do mesmo, estudar a forma que se dá a ressocialização dentro dos
estabelecimentos penais, e se de fato essa perspectiva é alcançada atualmente.
Através de consulta a doutrinas jurídicas, foi feita pesquisa sobre o tema, apontando as
falhas do atual sistema penitenciário, e o que se busca efetivar através da Lei. A
análise das doutrinas demonstra que efetivamente o tratamento penitenciário
ressocializante não ocorre nos estabelecimento penais, por pura desídia do Estado, o
estudo aponta também que se as assistências as quais o detento tem direito, fossem
realmente oportunizadas a eles, a ressocialização ocorreria em praticamente 95% dos
casos, fato esse comprovado pelos estabelecimentos penais administrados pela APAC,
onde ocorre realmente o trabalho de ressocialização do detento.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..................................................................................................07
1 HISTÓRICO......................................................................................................08
1.1 SISTEMA PENSILVÂNICO...............................................................................09
1.2 SISTEMA AUBURNIANO.................................................................................10
1.3 SISTEMA PROGRESSIVO...............................................................................10
2 SISTEMA PRISIONAL......................................................................................12
2.1 ESTABELECIMENTOS PENAIS.......................................................................13
2.1.1 Penitenciária......................................................................................................14
2.1.2 Colônia Agrícula, Industrial ou Similar...............................................................16
2.1.3 Casa do Albergado............................................................................................17
2.1.4 Centro de Observação.......................................................................................18
2.1.5 Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico................................................18
2.1.6 Cadeia Pública...................................................................................................19
3 A RESSOCIALIZAÇÃO COMO FINALIDADE DA PENA.................................21
4 O TRATAMENTO PENAL RESSOCIALIZANTE..............................................23
4.1 DA ASSISTÊNCIA.............................................................................................25
4.1.1 Assistência Material...........................................................................................26
4.1.1.1 Alimentação.......................................................................................................26
4.1.1.2 Vestuário............................................................................................................27
4.1.1.3 Instalações Higiênicas.......................................................................................27
4.1.2 Assistência à Saúde...........................................................................................28
4.1.3 Assistência Jurídica............................................................................................30
4.1.4 Assistência Educacional.....................................................................................31
4.1.5 Assistência Social...............................................................................................33
4.1.6 Assistência Religiosa..........................................................................................34
4.1.7 Assistência ao Egresso.......................................................................................35
4.2 TRABALHO DO CONDENADO..........................................................................36
5 SISTEMA APAC.................................................................................................39
6 CONCLUSÃO.............................................................................................................44
BIBLIOGRAFIA.............................................................................................................45
7
INTRODUÇÃO
Ao abordar o tema do tratamento penitenciário ressocializante nos deparamos com
um campo em construção. Atualmente uma das questões que mais afligem a
sociedade é a violência, e o que se deve fazer com aquele sujeito que de uma forma ou
de outra transgrediu alguma norma penal. No entanto, entendemos de que a punição
dada ao infrator deve ser justa e eficaz, tratando este individuo como um sujeito de
direito que cometeu um erro ao transgredir tais normas, mas, ao ser punido deve ter
um trabalho que o ressocialize, para que possa retornar de forma digna ao convívio
social. Contudo, a realidade que encontramos atualmente é de penitenciarias que não
cumprem seu papel ressocializante, e se tornam verdadeiras “escolas do crime”,
realidade esta que se comprova através do grande número de fugas e rebeliões, bem
como, pela alta taxa de reincidência que chega a ser de 85%. Através destes dados
estatísticos de reincidência, como já dito, a ressocialização no atual sistema
penitenciário brasileiro é utopia, uma vez que as cadeias e presídios contam com
superlotação e presos em condições desumanas, situação esta que afeta não apenas a
pessoa do preso, como também toda nossa sociedade.
8
1 HISTÓRICO
A partir do momento em que o homem passou a viver em sociedade viu-se a
necessidade de adotar-se regras, e por sua vez, a necessidade da aplicação de penas
para todas as vezes que estas regras fossem violadas. Desta forma ao longo dos anos
foram surgindo varias legislações, que tinham por finalidade esclarecer cada infração e
as penalidades a elas aplicadas, exemplos clássicos destas legislações são os Códigos
de Hamurábi e de Manu.
Hoje percebe-se que existe uma preocupação em encontrar limites ao direito de
punir do estado, uma vez que este deve preservar os direitos dos condenados. Porém
nem sempre foi assim, o sistema punitivo já foi extremamente cruel e desumano, e a
população em geral se deleitava ao assistir as execuções em praça pública, como se
fosse um verdadeiro espetáculo. A história das penas é mais horrenda e cruel do que a
historia dos delitos, pois a violência das penas eram mais cruéis e até mais numerosas
do que a própria violência dos delitos.
Foucault em seu livro Vigiar e Punir narra uma execução ocorrida em Paris, no
ano de 1757:
[Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757], a pedir perdão
publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris [aonde devia ser] levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; [em seguida], na dita carroça, na praça de Greve, e sobre um patíbulo que aí será erguido, atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, sua mão direito segurando a faca com que cometeu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre, e às partes em que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas lançadas ao vento. Finalmente foi esquartejado [relata Gazette d’amsterdam]. Essa ultima operação foi muito longa, porque os cavalos utilizados não estavam afeitos a tração; de modo que, em vez de quatro, foi preciso colocar seis; e como se isso não bastasse, foi necessário, para desmembrar as coxas do infeliz, corta-lhe os nervos e retalhar-lhe as juntas. Afirma-se que, embora ele sempre tivesse sido um grande praguejador, nenhuma blasfêmia lhe escapou dos lábios; apenas as dores excessivas faziam-no dar gritos horríveis, e muitas vezes repetia: ‘Meus Deus, tende piedade de mim; Jesus, socorrei-me’. Os espectadores ficaram todos edificados com a solicitude do cura de Saint-Paul que, a despeito de sua idade avançada, não perdia nenhum momento para consolar o pacinte. (Idem, 1983, p. 11)
9
Verifica-se que na antiguidade, até o Século XVIII, as penas tinham uma
característica extremamente aflitiva, ou seja, o corpo do agente é que pagava pelo mal
praticado. A mudança desta mentalidade de aplicação das penas começou a ocorrer no
período iluminista, onde através das idéias de Beccaria, em sua obra Dos Delitos e Das
Penas, começou a se propagar a indignação de como os seres humanos estavam
sendo tratados pelos seus semelhantes, sob uma falsa premissa de legalidade.
Atualmente pode-se analisar que há uma grande preocupação com a vida e com
a integridade física e mental do condenado, vários pactos internacionais visam efetivar
a preservação da dignidade humana do condenado, e cada vez mais abolir dos
ordenamentos jurídicos os tratamentos degradantes e cruéis.
A pena de prisão é um grande avanço na história das penas, pois o corpo do
condenado não mais pagava pelo mal cometido, e sim com a privação de sua
liberdade. Na Idade Media, dentro dos mosteiros existia uma “punição imposta aos
monges ou clérigos faltosos, fazendo com que se recolhessem às suas celas para se
dedicarem, em silêncio, à meditação e se arrependerem da falta cometida,
reconciliando-se assim com Deus”, sendo esta a origem da pena privativa de liberdade,
segundo Pimentel (1983, p. 132).
Por sua vez os sistemas penitenciários tiveram origem no Século XVIII, dentre
eles os que mais se destacaram foram: o Pensilvânico, o Auburiano e o Progressivo.
1.1 SISTEMA PENSILVÂNCO
O Sistema Penitenciário Pensilvânico, também chamado de Sistema de Filadélfia
ou Celular, teve seu início no ano de 1790, na Walnut Street Jail, uma velha prisão
localizada na rua Walnut, nesta prisão existia uma enorme aglomeração de criminosos,
mais tarde esse regime penitenciário passou para a Eastern Penitenciary, e significou
um grande progresso, não só pela sua arquitetura, mas também pela maneira como era
executado o regime penitenciário em seu interior.
Neste sistema o preso era isolado dos demais e recolhido em sua cela, ele não
podia trabalhar, nem receber visitas, e era estimulado ao arrependimento por leitura da
Bíblia. Este sistema teve muitas críticas, pois era extremamente severo e
10
impossibilitava a readaptação social do condenado, já que este ficava em completo
isolamento. As críticas a este sistema fez com que surgisse outro sistema penienciário,
que ficou conhecido como Sistema Auburniano.
1.2 SISTEMA AUBURNIANO
O Sistema Auburniano foi criado no ano de 1818, na cidade de Auburn, no
Estado de Nova York. Este sistema era menos rigoroso que o anterior, e permitia o
trabalho dos presos, inicialmente dentro de suas celas, e posteriormente em grupos, o
isolamento noturno foi mantido neste sistema, como também a proibição das visitas, até
mesmo dos familiares. Uma grande característica deste sistema era a imposição de
silêncio absoluto entre os detentos, por esta razão esse sistema também ficou
conhecido como silent system.
O ponto vulnerável deste sistema era a regra desumana do silêncio.
Teria origem nesta regra o costume dos presos se comunicarem com as mão, formando uma espécie de alfabeto, prática que até hoje se observa nas prisões de segurança máxima, onde a disciplina é mais rígida. Usavam, como até hoje usam, o processo de fazer sinais com batidas nas paredes ou nos canos d´água ou, ainda, modernamente, esvaziando a bacia dos sanitários e falando no que chamam de boca do boi. (PIMENTEL, 1983, p. 138)
1.3 SISTEMA PROGRESSIVO
Este sistema surgiu na Inglaterra, no início do Século XIX, sendo adotado
posteriormente pela Irlanda. O surgimento deste sistema inglês se deu pelo diretor de
um presídio no condado de Narwich, na ilha de Norfolk, na Austrália, Alexander
Maconochie diretor do presídio e capitão da Marinha Real, impressionado com o
tratamento desumano dado aos presos deportados para a Austrália, resolveu modificar
o sistema penal. Criou então um sistema progressivo de cumprimento das penas, que
deve ser realizado em três estágios. No primeiro estágio, conhecido como período de
prova, o detento era mantido completamente isolado, como no sistema pensilvânico;
como progressão ele passa para o segundo estágio, onde era permitido o trabalho
comum, mas com imposição do silêncio absoluto e isolamento noturno, como ocorria no
11
Sistema Auburniano, “passando depois de algum tempo para as chamadas public work-
houses, com vantagens maiores” (PIMENTEL, 1983, p. 140); progredindo então para o
terceiro estágio qual permitia o livramento condicional.
O Sistema Progressivo Irlandês acrescentou mais uma fase as três já existentes
no Sistema Progressivo Inglês. O primeiro e o segundo estágio permanecem como no
sistema inglês, já a terceiro estágio é o de prisão intermediária (prisão industrial ou
agrícola), sendo que tanto de dia quanto de noite, o preso segue em vida comum para
demonstrar os resultados dos estágios anteriores, ou seja, para verificar se houve a tão
esperada regeneração e aptidão para a liberdade; e então sim, no quarto estágio se
chega ao livramento condicional.
O Sistema Progressivo é o sistema penitenciário adotado no Brasil, onde o
condenado progride de seu regime de pena a ser cumprido inicialmente (fechado, semi-
aberto e aberto) até chegar, em fim, à liberdade total.
12
2 SISTEMA PRISIONAL.
Como vimos o sistema prisional adotado no Brasil é o Progressivo, ou seja,
aquele em que o condenado vai progredindo em seu regime de cumprimento de pena,
até chegar à liberdade. Atualmente as infrações penais são classificadas de forma
hierárquica, assim sendo as penas e regimes de cumprimento de sentença também
devem obedecer esta ordem, portanto pode-se dizer que, de certa forma, que o sistema
prisional brasileiro encontra-se hierarquizado. As infrações penais são classificadas da
seguinte forma: infrações de bagatela ou insignificantes, infrações de menor potencial
ofensivo, infrações de médio potencial ofensivo, infrações graves e infrações
hediondas. Sobre as infrações de bagatela não há efetivamente execução, pois não
caracteriza ilícito penal, já as demais infrações seguem disposições próprias que
regulam de que forma se dará a execução.
Segundo o Art. 1˚ da Lei de Execução Penal (LEP), o objetivo da execução é de
se fazer cumprir o disposto em sentença criminal, ou seja, só há de se falar em
execução penal se existir uma sentença criminal condenatória ou absolutória imprópria,
a qual tenha sido aplicada uma pena, seja ela privativa de liberdade, restritiva de
direitos, multa ou medida de segurança.
Aos condenados que tenha sido aplicada a pena privativa de liberdade, restritiva
de direitos ou medida de segurança, são os estabelecimentos penais que darão o
efetivo cumprimento a pena recebida, respeitando o regime imposto na sentença,
sempre lembrando que o réu não pode ficar em situação mais grave do que a
delimitada no título executório.
Em que pese todo o idealismo da LEP, atualmente o que encontramos é um
caos no sistema prisional brasileiro, um dos maiores problemas deste sistema é a falta
de estrutura adequada dos estabelecimentos penais, como podemos observar com os
presídios e cadeias públicas que sofrem com a superlotação, falta de condições básicas
para atender aos detentos, a falta de estabelecimentos penais para atender o regime
aberto e semi-aberto, entre outros problemas. Mesmo que a Lei se esforce para criar
um sistema prisional que harmonize o cumprimento da execução penal, o que
13
encontramos atualmente é um sistema carcerário que anda na contramão da finalidade
que fundamenta sua razão de ser.
Junqueira (2005,p.72) faz em seu livro referência à degradante situação do
sistema prisional brasileiro:
Constitui a prisão dos lugares mais horrendos. Concede-se ao ser
humano tratamento indigno ao mais perverso e selvagem dos animais. As celas mais parecem jaulas. E estas, por sua vez, projetadas para o acolhimento de seis ou oito pessoas, acabam por abrigar em situações várias, vinte ou trinta, talvez quarenta. Com toda certeza e convicção, não imaginavam seus idealizadores que, apesar do crescente progresso científico e tecnológico ao passar das décadas, houvesse situação tão desumana e cruel ao nascer do século XXI. Ressurge a Lei de Talião, de Dungi da Suméria, e nesta fórmula do “olho por olho, dente por dente, braço por braço”, dá-se ao dito criminoso penas das mais impróprias à condição de Homem. Diz-se da superação da fase retributiva da pena, quando da consideração do castigo, tão somente, como elemento teológico da sanção a ser imposta ao delinqüente, fazendo-se então, “justiça” pelo emprego do mal contra o mal. Porém, mutatis mutandis, continua sendo o sistema carcerário o local da angústia e do sofrimento, invejando os presos, as coudelarias e os canis, nas palavras de Roberto Lyra. Se não mais é privada a vingança, decorre agora do Estado, apresentando-se institucionalizada, o que se mostra mais gravoso. (Idem)
2.1 ESTABELECIMENTOS PENAIS
Apesar da atual realidade do sistema prisional brasileiro dificultar o trabalho a ser
desenvolvido com os detentos, deve-se, de qualquer forma, buscar a individualização
da sanção penal aplicada, de forma que o cumprimento da sentença aplicada seja
ajustado ao executado, para que assim se obtenha uma execução que atinja seu fim.
Todos os estabelecimentos penais devem cumprir com o que dispõe a
legislação vigente, no que concerne à adequação do estabelecimento e da necessidade a que a pena é aplicada. Para que se tenha a garantia que as sanções penais sejam efetivamente aplicadas àqueles que respondem a processos junto ao juízo penal (custódia provisória), executadas por aqueles que sofrem uma sanção penal (cumprimento de pena ou medida de segurança), bem como àquele egresso do sistema e que está reinserido contexto social, deve o Estado propiciar uma estrutura adequada. Assim, “os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso” (art. 82, caput, da LEP). (PRADO, 2011, p. 111)
Os estabelecimentos penais que compõem o sistema prisional são: a Penitenciária;
a Colônia agrícola, industrial ou similar; a Casa do Albergado; o Centro de Observação;
o Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico; e a Cadeia Pública. Esta separação
14
dos reclusos é feita com base na espécie de regime de cumprimento de pena aplicado
na sentença, trabalho desenvolvido pelo detento, tratamento que será dado ao
condenado, nível de periculosidade, etc, porém, apesar da peculiaridade de cada
estabelecimento acima citado, “o mesmo conjunto arquitetônico poderá abrigar
estabelecimentos de destinação diversa desde que devidamente isolados” (art. 82, §2˚,
da LEP).
2.1.1 A Penitenciária
A penitenciária é o estabelecimento penal destinado ao condenado à pena de
reclusão, a ser cumprida em Regime Fechado, conforme Art. 87 da Lei de Execução
Penal.
Decorre do Art. 87 da Lei de Execução Penal ser manifestamente ilegal
o cumprimento de pena de detenção ou prisão simples em regime fechado, contrariando, inclusive o disposto no Art. 33 do Código Penal. Por conseguinte, também é incorreto o cumprimento de pena fixada no regime semi aberto ou aberto em cela de penitenciária, em ambiente fechado. (MARCÃO, 2012, p. 135)
O Art. 88 da referida Lei rege que o condenado a pena privativa de liberdade
cumprirá sua pena em cela individual, a qual deve conter dormitório, aparelho sanitário
e lavatório, regula ainda que, cada unidade celular deve observar a “salubridade do
ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, isolação e condicionamento
térmico adequado à existência humana;” além de “área mínima de 6m² (seis metros
quadrados)”. Porém o sistema prisional brasileiro ainda não se adaptou ao idealismo
programático da Lei de Execução Penal.
Atualmente um dos males que aflige a atual situação prisional é a superlotação e
a falta de condições mínimas dos presídios, motivo pelo qual os reclusos sempre
reclamam de mal-estar nas acomodações, constrangimento ilegal e impossibilidade de
readaptação social. Desta forma celas individuais ainda esta longe de ser uma
realidade para os encarcerados, por este motivo o CNPCP (Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária), em junho de 2005, propôs uma alteração no texto do
Art. 88 da LEP, onde se permite que os detentos sejam alojados em celas coletivas,
15
com o máximo de 6 (seis) pessoas, situação já conformada nas Diretrizes para
Construção de Estabelecimentos Penais.
Vale ressaltar que “não só as questões vinculadas à estrutura disponibilizada aos
presos, mas também questões como alimentação, vestuário, comunicação com o meio
exterior, passam longe do mínimo que deveria ser oportunizada” (PRADO, 2011, p.
116). Além das condições mínimas que devem ser respeitadas e oportunizadas para
todos os detentos, existem algumas condições especiais que também devem ser
respeitadas, como por exemplo construção de lugar específico para gestante e
parturiente.
Visando a ressocialização e o alcance de uma execução justa da pena imposta, e com olhos voltados ao principio da personalidade ou intranscendência , segundo o qual o processo e a pena não podem ir além da pessoa do autor da infração (art. 5˚, XLV, da CF), a Lei de Execução Penal estabelece que a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa. (MARCÃO, 2012, p. 136)
Além do disposto acima, a LEP também regula, em seu art. 83 § 2˚, que “os
estabelecimentos penais destinados à mulheres serão dotados de berçário, onde as
condenada poderão cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo até 6
(seis) meses de idade”. Em relação ao módulo de saúde feminino a realidade é
lamentável, um retrato atual do Brasil mostra que poucos são os Estados que cumprem
o dispositivo legal e possuem creches e berçários para os filhos das condenadas.
Quanto a Penitenciária masculina, a peculiaridade na Lei é que a mesma seja
construída em local afastado do centro urbano porém em distancia que não prejudique
a visitação. Dispositivo de suma importância, pois devido às expansões das cidades,
vemos atualmente Penitenciárias localizadas em lugares comprometedores com a
segurança da sociedade, uma vez que podem ocorrer fugas, motins, rebeliões, e até
mesmo planos arquitetados de fora da unidade penal com intuito de resgatar detentos,
por este motivo as Penitenciarias devem ser localizadas em lugares afastados, porém
sempre observando a facilidade de acesso, a fim de não prejudicar a visitação e desta
forma se mantenha o respeito aos familiares do detento, para que uma simples visita
não se torne um problema ainda maior a ser suportado pela família do detento.
16
2.1.2 Da Colônia Agrícola, Industrial ou Similar.
Estabelecimento penal destinado ao condenados à pena privativa de liberdade, a
ser cumprida em Regime Semi-Aberto, como também aos condenados ao Regime
Fechado que por progressão passaram ao Regime Semi-Aberto, e para os condenados
ao Regime Aberto que por regressão passaram para o Semi-Aberto.
Os Presos que usufruem da semiliberdade deverão desenvolver atividades
laborativas e educacionais, durante o dia e a noite deverão se recolher no
estabelecimento penal. O que se busca com este regime é que o preso aos poucos
possa se reintegrar a sociedade, principalmente para àqueles detentos que cumpriram
longo tempo em regime fechado, pois este não tem aptidão para passar desde logo
para o regime aberto, é preciso um regime de transição, para que ele se adapte.
Os condenados a este regime podem ser alojados em compartimento coletivo,
observados as condições mínimas estabelecidas na alínea “a” do parágrafo único do
art. 88 da LEP.
O Regime Semi-Aberto no Brasil é outro quadro lastimável, uma vez que não
existe estabelecimentos suficientes para atender a demanda de condenados a este
regime, desta forma os condenados ao Regime Semi-Aberto acabam tendo que
aguardar vaga em penitenciaria ou cadeia pública, tendo seus direitos violados, uma
vez que estando o preso em regime fechado perde, por desleixo do estado, o beneficio
da Saída Temporária, com o equivocado argumento de que estando o preso, de fato,
em Regime Fechado não faz jus ao benefício. O mesmo acontece com o condenado
que inicia o cumprimento de sua pena em Regime Fechado e, por progressão, passa
para o Regime Semi-Aberto, mas acaba permanecendo, de fato, no Regime Fechado
esperando vaga para sua transferência.
Além da violação dos direitos do condenado ao Regime Semi-Aberto, outro
problema do detento que deveria estar cumprindo pena no Regime Semi-Aberto, mas
acaba sendo incluso ou permanecendo no Regime Fechado aguardando vaga, é a
superlotação dos estabelecimentos penais destinados ao sistema fechado, que já é
carente no atendimento aos condenados no respectivo regime, ainda tem que atender,
por desídia do estado, os condenado do Regime Semi-Aberto.
17
2.1.3 Da Casa do Albergado
Estabelecimento Penal destinado ao condenado a pena privativa de liberdade a
ser cumprida em Regime Aberto, e ao condenado a Pena Restritiva de Direitos
consistente em limitação de fim de semana.
Este estabelecimento se caracteriza pela ausência de obstáculos contra a fuga,
pode-se afirmar que “a segurança, em tal estabelecimento, resume-se no senso de
responsabilidade do condenado” (MIRABETE, 2004, p. 276). Os detentos que cumprem
pena em Regime Aberto devem durante o dia trabalhar, estudar, fazer suas atividades
normais, e durante a noite e dias de folga se recolher no estabelecimento penal. Aos
que cumprem pena restritiva de direitos com limitação de fim de semana, deverão
permanecer aos sábados e domingos, durante 5 horas na Casa do Albergado, neste
período podem ser ministradas palestras ou atividades educativas.
Porém é quase inexistente estabelecimentos penais do gênero, o que
impossibilita o cumprimento de tal pena, e estas acabam sendo cumpridas em regime
domiciliar. Porém deve se considerar que
A pena em regime aberto, ou a de limitação de fim de semana, podem
ser cumpridas em ala distinta de prédio destinado ao cumprimento de pena em regime fechado ou semiaberto, desde que não seja possível e/ou permitido o contato entre os presos deste regime e aqueles submetidos à modalidade aberta ou limitação de fim de semana. (MARCÃO, 2012, p.141)
Portanto o estabelecimento penal Casa do Albergado não precisa ser um edifício
especifico em si, pode ser uma ala apartada de uma Penitenciária, desde que
respeitada as condições impostas pela Lei para o Regime Aberto, neste sentido o
julgado do STJ:
O sistema penitenciário não traduz, em parte, as exigências normativas.
A legislação precisa ser interpretada finalisticamente. Casa do albergado imprime idéia de local sem as características de cárcere, próprio para o cumprimento de penas em regime fechado ou semiaberto. Não se confunde com o edifício, construção física. Fundamental é o ambiente a que fica submetido o condenado. Satisfeita a exigência da lei, se o local, embora contíguo ao presídio, do interior deste, é separado, sem o rigor penitenciário, baseado na autodisciplina e senso de responsabilidade. (MARCÃO, 2012, p. 145 apud DJU, 1992, p.11335 )
18
2.1.4 Centro de Observação
A execução penal deve ser realizada de maneira individual, ou seja, a pena à ser
cumprida pelo detento deve ser ajustada as condições que o cercam, desta forma
preceitua o art. 96 da LEP “No Centro de Observações realizar-se-ão os exames gerais
e o criminológico, cujos resultados serão encaminhados à Comissão Técnica de
Classificação.”, ou seja, é no Centro de Observação que serão feitos os exames
criminológicos, e através destes exames deve-se formular um programa individual e
acompanhamento da execução da pena. Segundo o doutrinador Mirabete (2004, p.
281) “Sua tarefa mais importante é, pois, a classificação dos condenados para uma
distribuição por grupos análogos nos estabelecimentos penais, com a destinação
àquele mais adaptado para a respectiva execução da pena privativa de liberdade.”
Pelo dispositivo legal constante na Lei de Execução Penal, é no centro
de observação onde pode ser encontrada a estrutura necessária para a realização desses exames, ou seja, este estabelecimento penal cumpre função primordial quando da execução da pena. No entanto, o que se constata é a falta desse estabelecimento desfalcando assim, o que deveria ser a adequada execução da pena. (PRADO, 2011,p. 119)
Como vimos os Exames Criminológicos realizados no Centro de Observação são
de suma importância para execução penal, porém a falta deste estabelecimento acaba
por não propiciar para o detento uma execução adequada a sua condição. Dada a falta
de estabelecimento adequado para realização de tais exames, o art. 97 da LEP permite
que estes sejam realizados pela Comissão Técnica de Avaliação.
2.1.5 Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico.
O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico é o estabelecimento penal
destinado àqueles que cumprem Medida de Segurança, ou seja, é destinado a abrigar
os agentes considerados inimputáveis ou semi-inimputáveis. Os agentes assim
considerados, necessitam de tratamento especial, desta forma, é neste
estabelecimento penal que tais condenados cumprem as Medidas de Segurança a eles
aplicadas, é um hospital-presídio, pois embora se destine ao tratamento do agente, não
19
se pode descartar a restrição da liberdade de locomoção do internado, uma vez que
este foi presumido perigoso em decorrência da lei.
Porém o que ocorre, mais uma vez, é a omissão do Estado, pois não existe
estabelecimentos suficientes para cumprir todas as Medidas de Segurança, por esta
razão condenados que foram considerados inimputáveis ou semi-inimputáveis acabam
cumprindo pena em Cadeia Pública e Penitenciarias aguardando vaga para um Hospital
de Custódia, desta forma, desvirtuando totalmente a finalidade da Medida de
Segurança. E “mesmo nos casos em que se consegue vaga para a internação, a
finalidade da medida também não é alcançada, já que reconhecidamente tais hospitais
não passam de depósito de vidas humanas banidas de sanidade e esperança.”
(MARCÃO, 2012, p. 143)
Segundo dispõe o artigo 100 da Lei de Execução Penal, “o exame psiquiátrico e os demais exames necessários ao tratamento são obrigatórios para todos os internados”. Ocorre que a própria realidade acaba por descaracterizar a função dos hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico, previstos pela legislação, uma vez que, atualmente, a grande maioria figura como puro e simples cárcere, sem a estrutura peculiar ao desenvolvimento do tratamento adequado à periculosidade do agente. (PRADO, 2011, p.120)
2.1.6 Cadeia Pública
Este estabelecimento Penal destina-se ao Preso Provisório que aguardam
julgamento, são eles: os Presos em Flagrante; Prisão Temporária e Prisão Preventiva.
Deve existir em cada Comarca ao menos uma Cadeia Pública para garantir o interesse
da Administração Criminal enquanto tramita o processo criminal, e devem ser instaladas
próximas aos centros urbanos, para que o preso permaneça junto ao seu meio social e
familiar onde vive, como fator de ressocialização e assistência.
A separação dos Presos Provisórios é necessária, pois a Prisão Provisória tem a
finalidade apenas de custódia daquele que sofre investigação penal ou processo
criminal, para que este fique a disposição da Justiça. Porém a realidade atual deste
estabelecimento penal é que nele estão recolhidos, presos provisórios e condenados;
homens e mulheres; adultos e adolescentes; imputáveis, semi-inimputáveis e
inimputáveis, todos reclusos de maneira conjunta dentro da Cadeia Pública.
20
Não pode deixar de ser aventado, quando o tema tratado versa sobre
estabelecimentos penais, que as cadeias públicas nos dias de hoje, em sua maioria esmagadora, representam de maneira gritante o descaso das autoridades para com o encarcerado. São nas cadeias públicas onde podem ser encontradas as piores situações quanto à limpeza, salubridade, alimentação, condições dignas, etc. Essas unidades lembram os antigos porões onde os presos que aguardavam julgamento eram atirados, ficando na maioria das vezes ao alvedrio da própria sorte. (PRADO, 2011, p. 120)
Como se pode ver neste estabelecimento penal também está clara a completa
omissão do Estado, presos que deveriam apenas ficar sob custódia, à disposição da
justiça, pois ainda não foram condenados pela prática de crime, sofrem com a
superlotação, dividindo celas com condenados definitivos, gerando grave situação de
risco.
21
3 A RESSOCIALIZAÇÃO COMO FINALIDADE DA PENA
Para as Teorias Absolutas a finalidade da pena é apenas o castigo, o pagamento
do mal praticado. O castigo compensa o mal causado e dá a reparação moral. Para a
Escola Clássica que considerava o crime um ente jurídico, a pena era visivelmente
retributiva, não existindo preocupação alguma com a pessoa do condenado, já que a
pena se destinava apenas e tão somente a restabelecer a ordem pública alterada pela
pratica do crime.
Já para as Teorias Relativas a pena tem uma função exclusivamente prática, em
especial uma finalidade de prevenção, uma prevenção em relação a todos, e em
relação ao condenado. Na Escola Positiva, quando o homem passa a ser o centro do
Direito Penal, a pena não é mais vista como castigo, mas como uma oportunidade de
ressocializar o criminoso.
Adotamos atualmente no Brasil a Teoria Mista ou Eclética, de acordo com esta
teoria a pena tem natureza retributiva, ou seja, tem o aspecto moral de reparação do
mal causado, mas também tem a finalidade de integração social do condenado. Desta
forma a pena não busca só prevenção, mas também educação e humanização, é um
misto de punir e humanizar, de corrigir e educar.
Esta Teoria Mista aparece em nosso ordenamento jurídico no final do caput do
artigo 59 do Código Penal, onde diz que o juiz “estabelecerá , conforme seja necessário
e suficiente para reprovação e prevenção do crime”, unificando assim a Teoria Absoluta
e a Teoria Relativa, que são baseadas, respectivamente, pelos critérios de reprovação
(o castigo) e de prevenção.
Superada esta fase histórica em que a pena era tida apenas como
retribuição ou prevenção criminal, passou-se a entender que sua finalidade precípua, na fase executória, era a de reeducar o criminoso, que dera mostras de sua inadaptabilidade social com a prática da infração penal. Surgiram assim os sistemas penitenciários fundados na idéia de que a execução penal deve promover a transformação do criminoso em não criminoso, possibilitando-se métodos coativos para operar-se a mudança de suas atitudes e de seu comportamento social. ( MIRABETE, 2004, p. 62)
No artigo 1˚ da Lei de Execução Penal está claramente disposto a finalidade da
execução penal onde diz “ A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de
sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração
22
social do condenado e do internado.”, desta forma vimos que a execução penal não se
limita ao puro e simples cumprimento da pena recebida pelo condenado, mas também
deve propiciar condições para seu retorno a sociedade. Observa-se então que a
reinserção do condenado é um dos objetivos fundamentais da execução da pena, e o
Estado deve proporcionar todos os mecanismos para o efetivo cumprimento deste
objetivo.
“A execução penal humanizada é crucial para o resgate da pessoa humana, que
se encontra oculta na pessoa do condenado” (PRADO, 2011, p. 35). Devemos entender
que a ressocialização do condenado além de ser um direito dele é de suma importância
para a sociedade em geral, pois se não houver um trabalho de ressocialização do
condenado, dentro do estabelecimento penal à que este foi destinado, quando o
mesmo voltar a sociedade, na maioria das vezes, voltará a cometer infrações penais.
Desta forma vemos que a ressocialização é um problema político-social do Estado, pois
enquanto não houver efetiva atuação do Estado, o problema da ressocialização será
insolúvel. Neste sentido:
De que adianta, por exemplo, fazer com que o detento aprenda uma
profissão ou um ofício dentro da penitenciária se, ao sair, ao tentar se reintegrar na sociedade, não conseguirá trabalhar? E se tiver de voltar ao mesmo ambiente promíscuo do qual fora retirado para fazer com que cumprisse sua pena? Enfim, são problemas sociais que devem ser enfrentados paralelamente, ou mesmo antecipadamente, à preocupação ressocializante do preso. (GRECO, 2004, p. 542)
Desta forma podemos aduzir que a sociedade também tem papel de
colaboradora na ressocialização do detento, não é por outro motivo que a LEP em seu
artigo 4˚ estabelece que “ O Estado deve recorrer à cooperação da comunidade nas
atividades de execução da pena e da medida de segurança.”, vale ressaltar que o
Estado não se exime da responsabilidade de ressocialização do detento, apenas afirma
que cabe a sociedade uma parcela desta responsabilidade na reintegração daquele que
delinqüiu. Essa co-responsabilidade da sociedade é fundamental para se atingir a
finalidade da execução penal, pois a maneira da sociedade se defender da reincidência
dos criminosos é acolhendo-os, não como autores de um delito, mas como pessoas
humanas.
23
4 O TRATAMENTO PENITENCIÁRIO RESSOCIALIZANTE
Por tratamento penitenciário podemos entender o conjunto das funções
recuperativas da pena, praticadas por diferentes áreas, é um trabalho conjunto com
uma orientação em comum, buscando proporcionar ao detento possibilidades de
retornar a sociedade.
Dada a finalidade reeducadora da pena, seu caráter individualizado e pela
adoção de técnicas das ciências naturais, o Sistema Penitenciário converteu-se em
tratamento penitenciário, por sua analogia à tratamentos médicos, psicológicos,
pedagógicos, etc. (MIRABETE, 2004, p. 62). O Tratamento Penitenciário consiste em
um conjunto de atividades que buscam a reeducação e reinserção social do detento, o
tratamento não pretende impor uma modificação da personalidade, mas colocar à
disposição da mesma elementos essenciais para o retorno à liberdade.
O objetivo do Tratamento Penitenciário ressocializante é fazer do detento uma
pessoa com a intenção e capacidade de viver respeitando a lei penal, procurando
desenvolver no reeducando uma atitude de apreço por si mesmo, de responsabilidade
individual e social. Desta forma o Estado não só busca prevenir que o condenado
cometa novos delitos, como também fazer com que este retorne a sociedade em
melhores condições do que àquela que o levou a delinqüir.
O “tratamento” aparece, pois, como um dos objetivos do sistema. Trata-
se, porém, de solene mistificação. É perfeitamente óbvio que o sistema de encarceramento é incompatível com qualquer espécie de “tratamento”, seja qual for o sentido a que ele se atribua. O simples fato de forçar uma pessoa a viver em isolamento, numa situação em que todas as decisões são tomadas para ela, não pode ser forma de treinamento para viver numa sociedade livre. (FRAGOSO, 1980, p. 13)
Deve-se lembrar que a responsabilidade sob a questão penitenciária não deve
ficar apenas para o Estado, e sim deve ser divida com toda sociedade, sob pena de os
problemas da não ressocialização se prolongarem, como vêm se prolongando
indefinidamente. Portanto toda sociedade deve buscar auxiliar o Estado, na obtenção
do seu fim, não só por um dever social, mas também porque é a própria sociedade que
sofre com os malefícios do atual sistema penitenciário brasileiro.
24
Porém mesmo que se consiga a colaboração da sociedade, ainda é muito difícil
se alcançar o objetivo de ressocialização, pois como conseguir reintegrar um detento a
partir das condições de cumprimento de pena dentro dos estabelecimentos penais, e
mais, como conseguir reeducar para liberdade em condições de não liberdade, uma vez
que como vimos, por falta de vagas nos estabelecimentos penais o sistema progressivo
não funciona, desta forma o condenado ao invés de progredir gradualmente de regime
até alcançar a liberdade, passa de uma situação de não liberdade total para o meio
social.
A superlotação, a falta de classificação e de tratamento contribuem,
assim, para um processo de progressiva desumanização do preso e a confirmação de noções preconceituosas a respeito da delinqüência. Como no dizer de Alípio Silveira, “a pena, em vez de afastar do delito o delinqüente primário, cria o reincidente”. (PALMA,1997, p. 35)
A Lei de Execução Penal traz a assistência ao condenado e ao egresso como
forma de auxílio na ressocialização do detento, como podemos ver na própria
Exposição de Motivos extrai-se do nº 38 “a assistência aos condenados e aos
internados é exigência básica para se conceber a pena e a medida de segurança como
processo se diálogo entre seus destinatários e a comunidade”. Apesar da LEP elencar
as espécies de assistência à que o detento tem direito, na prática elas não são
realizadas. E a medida em se tem superlotação carcerária, ociosidade, abusos sexuais,
falta de acompanhamento clínico, psiquiátrico e psicológico, cada vez mais fica difícil
obter a ressocialização do condenado. Nesse sentido:
Dadas às políticas estatais de tratamento ao recluso, desprezam-se
documento e tratados internacionais, quando não a própria Constituição pátria, em conseguinte detrimento de um dos fins primordiais da sanctio júris, como aliás dispõe o caput do artigo 10, da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, na medida em que “a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade”. (JUNQUEIRA, 2005, p. 69)
O objetivo da assistência, como está expresso no artigo 10 da LEP, é prevenir o
crime e orientar o retorno do condenado à sociedade, a assistência é uma exigência
básica para se dar à pena e à medida de segurança um processo de diálogo entre os
destinatários das mesmas e a sociedade.
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Além das assistências que devem ser prestadas aos sentenciados, outro fator
que é essencial para a ressocializaçao do condenado é o trabalho do preso. Pois
através do trabalho o detento tem a possibilidade de aprender um oficio, para que
quando saia do estabelecimento penal em que se encontra, este possa sustentar a si
próprio e a sua família, não precisando desta forma voltar ao mundo do crime.
4.1 DA ASSISTÊNCIA
A assistência ao sentenciado é dividida em duas classes: conservadoras e
reeducadoras. Os meios conservadores de assistência servem para conservar a vida e
a saúde do detento durante a execução da pena, são elas: assistência médica e
assistência material. Já a assistência reeducadora é aquela que recai sobre a
personalidade e comportamento do recluso, são elas: assistência educacional,
assistência psiquiátrica, assistência social e assistência religiosa.
Se a reabilitação social constitui a finalidade precípua do sistema de
execução penal, é evidente que os presos devem ter direito aos serviços que a possibilitem, serviços de assistência que, para isso, devem ser-lhes obrigatoriamente oferecidos, como dever do Estado. É manifesta a importância de se promover e facilitar a reinserção social do condenado, respeitadas suas particularidades de personalidade, não só com a remoção dos obstáculos criados pela privação da liberdade, como também com a utilização, tanto quanto seja possível, de todos os meios que possam auxiliar nessa tarefa. Junto a laborterapia, o programa de reeducação na fase executória da pena privativa de liberdade é uma das bases fundamentais desse processo, e em todo programa destinado a reinserção social não deve faltar a assistência material, moral e intelectual, pois a reeducação e readaptação social implica necessariamente desenvolver intensa ação educativa. Nesse sentido, pode-se falar em “tratamento” penitenciário sem o perigo de transformá-lo em um sistema opressor de transformação do homem condenado ou internado. (MIRABETE, 2005,p. 63)
A assistência também é devida ao egresso, pois da mesma forma que se deve
preparar o preso ou o internado para o convívio social, se deve preparar a própria
sociedade para receber estes sujeitos de forma harmônica. Desta forma não se pode
tirar a assistência daquele que já alcançou a liberdade, sob pena de se tornar inútil todo
trabalho de assistência desenvolvido dentro dos estabelecimentos penais.
De acordo com o item 41 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal, é
necessário esclarecer em que consiste cada uma das espécies de assistências,
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obedecendo assim os princípios e regras internacionais sobre os direitos da pessoa
presa. As assistências a serem prestadas estão elencadas no artigo 11 da Lei de
Execução Penal, e são elas: Assistência Material; Assistência à Saúde; Assistência
Jurídica; Assistência Educacional; Assistência Social; e Assistência Religiosa.
4.1.1 Assistência Material
Conforme o artigo 12 da LEP, “a assistência material consiste no fornecimento
de alimentação, vestuário e instalações higiênicas ao preso ou internado”, além disso o
artigo 13 da referida lei dispõe que “o estabelecimento disporá de instalações e serviços
que atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais destinados à
venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela administração”. Estas
disposições visam que não sejam atingidos direitos do condenado que não lhe foram
retirados pela sentença, vale ressaltar que a alimentação, o vestuário e as instalações
higiênicas devem ser de acordo com o mínimo que se espera de um tratamento digno
ao ser humano.
Como é cediço, nesse tema o Estado só cumpre o que não pode evitar.
Proporciona a alimentação ao preso e ao internado, nem sempre adequada. Os demais direitos assegurados e que envolvem a assistência material, como regra, não são respeitados. (MARCÃO, 2012, p. 52)
A assistência material também é devida ao egresso na forma do artigo 25 da
LEP, sendo necessário a concessão de alojamento e alimentação, em estabelecimento
adequado, pelo prazo de dois meses, prazo esse que poderá ser prorrogado uma única
vez se comprovado, por declaração do assistente social, o emprenho na obtenção do
emprego, pois enquanto o egresso estiver procurando emprego a assistência social
deve dar total apoio para que se concretize seu objetivo.
4.1.1.1 Alimentação
Segundo as Regras Mínimas da ONU para o Tratamento do Preso “todo preso
deverá receber da Administração, nas horas usuais, uma alimentação de boa
qualidade, bem preparada e servida, cujo valor seja suficiente para a manutenção de
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sua saúde e de suas forças (n˚ 20.1)”. O tema de alimentação nas prisões e de suma
importância, não só porque o detento tem direito a uma alimentação de qualidade e
suficiente a sua subsistência, mas também porque é um fator que pode incidir positiva
ou negativamente sobre a pessoa presa.
A alimentação deve ser distribuída normalmente, em três etapas: o desjejum, o almoço e o jantar, tendo um conteúdo variado, suficiente e equilibrado para não prejudicar a saúde de seus consumidores. Deve-se ter em conta ainda que, além da alimentação comum, haverá necessidade de refeições especiais para os doentes, conforme prescrição médica, e para os idosos e mulheres que estão amamentando, circunstâncias que exigem cuidados especiais. Prevê, ainda, nas Regras Mínimas, que todo preso deverá ter a possibilidade de prover-se de água potável sempre que o necessitar (n˚ 20.2). (MIRABETE, 2005, p. 67)
4.1.1.2 Vestuário
No que diz respeito ao vestuário pode-se também citar algumas das Regras
Mínimas da ONU. “Todo preso que não tenha permissão para usar suas roupas
pessoais deve receber um conjunto delas, apropriado ao clima e suficiente para mantê-
lo em boa saúde (n˚ 17.1)”. “Todas as roupas devem ser mantidas limpas e em bom
estado e as internas devem ser mudadas e lavadas tão freqüentemente quanto possível
para manter a higiene (n˚ 17.2)”. “Em circunstâncias excepcionais, quando o preso sai
do estabelecimento para fins autorizados, deve permitir-se que use roupas pessoais ou
trajes que não chamem a atenção (n˚ 17.3)”.
Os estabelecimentos penais devem fornecer uniformes para os detentos, estes devem
ser apropriados ao clima para não prejudicar a saúde do condenado, e nem podem
ofender sua dignidade e respeito próprio, além disso os estabelecimentos penais
devem contar com uma lavanderia para cuidar da higiene das roupas dos presos.
4.1.1.3 Instalações Higiênicas
A higiene pessoas e a limpeza da cela ou alojamento, bem como, a conservação
de objetos de uso pessoal é um dever do preso, porém o Estado deve dar condições
para que os presos ou internados cumpram com essa obrigação, tendo a sua
disposição elementos de uso indispensável para higiene e limpeza das celas. A respeito
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disso pode-se citar 2 das Regras Mínimas, (n˚ 16): “devem-se possibilitar os meios para
que possam apresentar-se convenientemente e conservar o respeito próprio, como
cuidados do cabelo e da barba, que devem ser cortados regularmente”; e (n˚ 15):
“colocando-se à disposição dos presos e internados os artigos de asseio e higiene
indispensáveis para a saúde e limpeza”.
4.1.2 Assistência à Saúde
Regulada no artigo 14 da LEP, a Assistência à Saúde deve ser oportunizada ao
preso e ao internado, esta assistência tem caráter preventivo e curativo, e compreende
o desenvolvimento nos setores médicos, farmacêuticos e odontológicos. Essa
assistência, quando não houver estrutura dentro do estabelecimento penal, pode ser
prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento. “Não
poderia ser diferente a previsão do artigo 14, parágrafo 2˚ da Lei de Execução Penal,
uma vez que a essencialidade do serviço (assistência) a ser prestado não pode ser
obstada pelas inércias do Poder Público.” (PRADO, 2011, p. 51).
Vale dizer que a disposição destes serviços públicos já são precários para toda
sociedade, e dentro do sistema prisional não é diferente, e com um agravante, dada a
dificuldade de contato com parentes e amigos, quando o condenado precisa de
tratamento médico, farmacêutico e odontológico vindo de fora dos estabelecimentos
penais, esse tratamento chega tardiamente.
No que diz respeito a assistência à saúde existe uma peculiaridade em relação
ao acompanhamento médico à mulher, o §3˚ da Lei n˚ 11.942/2009 determina que
“Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no
pós-parto, extensivo ao recém-nascido”, diante desta Lei podemos ver que o direito da
mulher encarcerada foi revigorado, uma vez que é de suma importância cuidados
médicos especiais para todas a mulheres gestantes, quem dirá para as mulheres nesta
situação e que se encontram encarceradas.
Medida extremamente importante, contudo, de exeqüibilidade quase impossível, nas condições atuais, uma vez que as unidades da federação não estão providas quer de profissionais (ginecologistas/ obstetras/ pediatras) quer de estabelecimentos adequados. Urge, assim, para viabilizar o atendimento, imediatas providências no sentido de firmar parcerias com a rede pública de
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saúde (as Secretarias de Saúde deverão ser acionadas) para o atendimento respectivo ou a realização imediata de concurso para admissão do pessoal especializado. (KUEHNE, 2012, p. 14)
Além do tratamento de enfermidades uma das funções do médico é de
inspecionar o estabelecimento penal para informar o Diretor a respeito da quantidade,
qualidade, preparação e distribuição dos alimentos; higiene dos estabelecimentos;
qualidade e higiene das roupas de cama e de uso pessoal dos detentos, salubridade,
iluminação e arejamento do ambiente. O médico também deverá informar ao diretor do
estabelecimento penal se a saúde física ou mental do preso foi ou poderá ser afetada
pelas condições do regime prisional.
Além disso de acordo com as Regras Mínimas de Tratamento do Preso no Brasil,
o médico deverá obrigatoriamente examinar cada preso quando este ingressar no
estabelecimento penal, afim de determinar se existem enfermidades físicas e mentais, e
as medidas necessárias a serem tomadas em caso positivo; assegurar o isolamento do
detento que suspeito de doença infecto-contagiosa; determinar a capacidade física e
mental do preso ao trabalho; além de apontar as deficiências físicas e mentais que
possam ser um obstáculo para sua reinserção social.
Os detentos e os internados também têm direito ao atendimento farmacêutico,
atendimento este intimamente ligado ao tratamento médico e indispensável para o
mesmo, uma vez que não adianta o condenado ser atendido por um medico se depois
não terá remédios para seu tratamento. As Regras Mínimas para Tratamento do Preso
aconselha em seu n˚ 22.2 que os estabelecimentos penais devem ter em sua
organização serviço de material, aparelhagem e de produtos farmacêuticos, de modo
que possam ser prestados os convenientes cuidados aos presos doentes. As Regras
Mínimas também recomenda em seu n˚ 22.3 indispensável “uma qualificada assistência
odontológica acessível a qualquer preso ou internado, devendo poder valer-se ele dos
cuidados de um dentista devidamente habilitado”.
Segundo as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil, para se
garantir a assistência à saúde do preso, os estabelecimentos penais devem ser dotados
de enfermaria com cama, material clínico, instrumental adequado a produtos
farmacêuticos indispensáveis para internação médica ou odontológica de urgência,
além de dependência para observação psiquiátrica e cuidados toxicômanos. Deve
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também existir uma unidade de isolamento para doenças infecto-contagiosas, e caso o
estabelecimento penal não esteja adequado para atender o preso, se houver
necessidade de atendimento, o detento deverá ser transferido para uma unidade
hospitalar adequada.
Porém o que mostra a realidade é que os estabelecimentos penais não dispõem
nem de equipamentos, nem de pessoal apropriados para os atendimentos médico,
farmacêutico e odontológico. Fato é que o Estado não conseguiu efetivar esses direitos,
e não os assegura até hoje.
4.1.3 Assistência Jurídica
Conforme preconiza o artigo 15 da LEP, a Assistência Jurídica é destinada aos
presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogado, ou seja,
que não tenha condições de contratar um advogado sem prejuízo próprio ou do
sustento da família. E ainda, de acordo com o artigo 16 da LEP, “as unidades da
federação deverão ter serviços de assistência jurídica, integral e gratuita, pela
Defensoria Pública”.
O processo de execução tem caráter jurisdicional, portanto devem ser
observados alguns princípios para seu desenvolvimento. Desta forma deve ser
disponibilizado ao sentenciado um serviço técnico especializado no andamento de seu
processo de execução, ou seja, é necessária a presença de um advogado para que não
haja violação dos Princípios do Contraditório, Ampla Defesa e Devido Processo Legal.
Ao que temos conhecimento, todos os estabelecimentos penitenciários
dispõem, em sua estrutura, de serviço jurídico adequado a atender aos reclamos dos condenados. Não há negar eventuais deficiências, mesmo porque os Estados não estão providos com o número adequado de profissionais da área para prestar o atendimento devido. Infelizmente ainda nos dias de hoje (2010) há unidades da federação cujas defensorias públicas não se encontram regularmente constituídas, além daquelas com número insuficiente de defensores ao desempenho de sua nobilitante função. (KUEHNE, 2012, p. 44)
A problemática que atinge atualmente o sistema penitenciário brasileiro, no que
tange a Assistência Jurídica, é a demora na constituição de um advogado, seja
particular ou por parte do Estado, o que acarreta, muitas vezes, a demora para
concessão de benefícios à que o preso tem direito ao longo da execução de sua pena.
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4.1.4 Assistência Educacional
A atividade intelectual dentro dos estabelecimentos penais busca o
desenvolvimento educacional e o aprimoramento e formação profissional do
condenado. A Assistência Educacional é um dos principais pilares da função
ressocializadora da pena, pois o estudo acarreta sensíveis efeitos no presente e no
futuro do condenado, tanto durante o cumprimento da pena, quanto no momento de sua
reinserção social.
A Constituição Federal em seu artigo 205 dispõe que a educação é “direito de
todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração
da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” Sendo assim a Assistência
Educacional é a prestação básica mais importante, tanto para o homem livre, quanto
para o que está preso, constituindo um elemento importantíssimo do tratamento
penitenciário ressocializante, sendo dever do Estado prover a educação do preso ou
internado se este não tiver feito no lar e na escola.
A Assistência Educacional tem o objetivo de proporcionar ao condenado
melhores condições de readaptação social, preparando-o para o retorna à vida em
liberdade, além do que, não há de se negar que a dedicação do preso ao
aprimoramento de sua cultura, por meio do estudo, contribui decisivamente para o
destino da execução da pena, pois é através do estudo que o detento conhece ou
aprimora valores de interesse comum, além do que a influência da educação mantém a
disciplina do estabelecimento penal.
Dispõe o artigo 18 da LEP que “o ensino de primeiro grau será obrigatório,
integrando-se no sistema escolar da unidade federativa”. Desta forma os condenados
sem instrução de primeiro grau têm o direito, como qualquer cidadão, de recebê-la do
Estado, este deve ser ministrado por pessoas que possuam capacidade técnica exigida
para isso, de acordo com as normas jurídicas correspondentes ao ensino prestado na
rede escolar publica ou particular. Deste modo o ensino dado dentro dos
estabelecimentos penais tem o mesmo valor dos ministrados nos estabelecimentos de
ensino credenciados.
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Conforme dispõe o artigo 19 da Lei de Execução Penal, o ensino
profissionalizante será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento. Neste
ponto se busca uma readaptação nos setores produtivos da sociedade, já que essa
formação ou aperfeiçoamento técnico poderá servir de norte quando o condenado
voltar ao convívio social.
Devem ser tomadas medidas no sentido de melhorar a educação de
todos os reclusos que daí tirem proveito, incluindo instrução religiosa nos países em que tal for possível. A educação de analfabetos e jovens reclusos será obrigatória, prestando-lhe a administração especial atenção. Tanto quanto for possível, a educação dos reclusos deve estar integrada no sistema educacional do país, para que depois da sua libertação possam continuar, sem dificuldades, a sua educação. (MARCÃO, 2012, p. 55, apud, REGRAS MÏNIMAS DA ONU PARA TRATAMENTO DO PRESO, item 77)
Cada estabelecimento penal, de acordo com suas possibilidades, deve dispor de
uma biblioteca com livros recreativos, instrutivos e didáticos, o que visa proporcionar o
contato do detento com diversos tipos de literatura, o que é de suma importância para
sua instrução.
O estudo não era expressamente reconhecido na LEP como causa de remição
da pena, porém foram desenvolvidas diversas teses doutrinárias e jurisprudências no
sentido de estender o benefício da remição aos condenados matriculados em curso de
instrução (ensino fundamental, médio, e superior), fato que levou o STJ a se posicionar
a respeito do assunto através da súmula 341, a qual diz: “a freqüência a curso de
ensino formal é causa de remição e parte do tempo da execução de pena sob regime
fechado ou semi-aberto”.
Atualmente, a partir do advento da Lei 12.433/2011, não há mais o que se
discutir a respeito, a referida Lei veio para consolidar estes posicionamentos e trouxe
uma nova redação ao artigo 126 da LEP, incluindo o estudo como uma das formas do
preso poder se beneficiar com o instituto da remição.
Artigo 126: O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou
semi-aberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. (Artigo com redação dada pela Lei 12.433, de 29.06.2011)
§1˚ A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de: I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de freqüência escolar –
atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
II – 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.
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§ 2˚ As atividades de estudo a que se refere o § 1˚ deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos freqüentados.
§ 3˚ Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.
§ 4˚ O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.
§ 5˚ O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
§ 6˚ O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semi-aberto e o que usufrui de liberdade condicional poderão remir, pela freqüência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observando o disposto no inc. I do § 1˚ deste artigo.
§ 7˚ O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.
Como visto no artigo 126, § 1˚, inc. I da LEP, o estudo poderá ter carga horária
diária desigual, mas para que o detento tenha direito ao benefício da remição, as 12
(doze) horas de estudo devem ser, obrigatoriamente, dividida em 3 (três) dias, para que
assim se obtenha o direito de remir 1 (um) dia de sua pena.
Outra inovação importante trazida pela Lei 12.433/2011 é a possibilidade dos
condenados que cumprem pena em regime aberto, ou que estejam sob livramento
condicional, se beneficiarem com o instituto da remição através do estudo, situação
contemplada no § 6˚ do artigo 126 da LEP. Vale ressaltar que antes da promulgação da
referida Lei, os sentenciados sob o regime aberto, ou que se encontravam em
livramento condicional, não tinham direito de usufruir da remição.
4.1.5 Assistência Social
A Assistência Social tem por objetivo amparar o preso ou o internado, e prepará-
los para a vida em liberdade. Visa proteger e orientar o preso ou internado, ajustando
estes no convívio dentro do estabelecimento penal, e preparando-os para retornar ao
convívio social, através de orientações e contato com vários setores da atividade
humana.
Este é um dos poucos campos de assistência em que o Estado não é totalmente
omisso, é significativo o número de profissionais do setor que atendem os
estabelecimentos penais, mesmo que, ainda muito longe das reais necessidades.
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Surge a conscientização de que os assistentes sociais são personagens
importantíssimos na reinserção social do condenado, são uma verdadeira ponte entre o
sentenciado, a família e a sociedade.
Esse desiderato é sustentado por uma série de medidas que vão desde o tratamento dado ao preso ou internado, até o amparo de sua família. Assim, devem-se estruturar as unidades penais de maneira que possam corresponder aos anseios ressocializadores da sanção penal. A assistência social representa um elo entre o interior dos estabelecimentos penais e a sociedade, que é o destino final do preso ou internado. (PRADO, 2011, p. 56)
A Assistência Social visa promover ao condenado uma lenta aproximação com a
vida em liberdade, pois dentro dos estabelecimentos penais os sentenciados passam
por longo período de afastamento, e se acostumam com uma vida sem
responsabilidade própria, o que traz para estes indivíduos dificuldades psicológicas e
materiais que impedem sua rápida inserção no meio social. E para retornarem a este
convívio precisam de uma assistência que objetive suprir as dificuldades trazidas pela
vida em não liberdade.
4.1.6 Assistência Religiosa
Regulada no artigo 24 da LEP, a Assistência Religiosa traz a possibilidade da
pratica de atividades religiosas pelos presos ou internados dentro do estabelecimento
penal. A assistência religiosa também encontra regulamentação na Constituição da
República Federativa do Brasil, onde diz, em seu artigo 5˚, inc. VII, “é assegurada, nos
termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de
internação coletiva”.
Segundo as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil, os
estabelecimentos penais devem facilitar a presença de representante religioso, com
autorização para fazer serviços litúrgicos e fazer visita pastoral a adeptos de sua
religião. A oportunidade e a liberdade de culto são de suma importância no
cumprimento da execução penal, e na ressocialização do condenado, a própria idéia de
crença dispensa a compreensão de sua importância.
Atualmente a Assistência Religiosa no sistema prisional não ocupa prioridade,
nem é o ponto central dos sistemas penitenciários. Não se pode negar, entretanto, a
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importância da religião como um dos fatores de ressocialização do preso ou internado.
Através de pesquisas feitas em vários estabelecimentos penais de São Paulo, concluiu-
se que a religião tem grande influencia no comportamento do encarcerado, e é a única
variável que contem em si mesma a possibilidade de transformar o homem encarcerado
ou livre.
Atualmente, em um aspecto mais prático, a assistência religiosa faz
com que novos valores sejam inseridos na vida do preso e do internado. Esses novos valores dizem respeito à vida presente e às perspectivas que se deve ter para o futuro, minimizando, em suas mentes, os efeitos das mazelas do cárcere e do cumprimento de sua reprimenda, bem como incutindo esperança na vida fora dos estabelecimento penais. (PRADO, 2011, p. 58)
Para que a assistência religiosa atenda sua finalidade na execução penal, é
necessário que esteja integrada na organização do próprio estabelecimento penal,
impedindo assim que atrapalhe o trabalho penitenciário. Para a celebração de missas,
realização de cultos e outras atividades religiosas, é indispensável que o
estabelecimento penal possua local adequado para tanto, como determina o artigo 24 §
1˚ da LEP.
4.1.7 Assistência ao Egresso
É considerado Egresso o condenado que já alcançou a liberdade definitiva, até
um ano de sua saída efetiva do estabelecimento penal, e o que goza de Liberdade
Condicional durante o período de prova.
Segundo o artigo 25 da LEP a Assistência ao Egresso consiste na orientação e
apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade, e na concessão, se necessário, de
alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de dois meses.
O que ocorre quando o individuo obtém sua liberdade é uma evolução
desproporcional entre o individuo e a sociedade, o que acarreta um desajustamento
social do ex-condenado, o que tradicionalmente tem levado a reincidência. Muitas
vezes o egresso tem condições de voltar ao convívio social do qual foi afastado, porem
este encontra resistência da sociedade, o que dificulta ou impede sua reinserção na
mesma.
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São conhecidas as dificuldades que encontram os estigmatizados com a tatuagem indelével impressa pela sentença penal, no inicio ou mesmo na retomada de uma vida socialmente adequada e produtiva. A parcela ordeira da população, podendo escolher, no mais das vezes não faz a opção de contratar ou amparar um ex-condenado, seja qual for o delito cometido, até porque reconhece a falência do sistema carcerário na esperada recuperação, mas desconhece ou não assume sua parcela de responsabilidade na contribuição para a reincidência. (MARCÃO, 2012, p. 58)
O que se deve ter em mente é que, se de um lado a ressocialização do
condenado depende dele mesmo, sua reinserção na sociedade depende, e muito, do
meio a que ele retorna. É inevitável que o egresso ao retornar ao convívio social
encontre uma sociedade fechada, o que acaba acarretando a perda de todo o trabalho
penitenciário que objetiva a ressocialização do condenado. Para evitar que isso
aconteça é indispensável que, ao alcançar a liberdade, o egresso seja eficientemente
assistido pelo Estado.
Cabe ao serviço de assistência colaborar com a obtenção de trabalho pelo
egresso, buscando assim possibilitar que este possa arcar com os custos de sua
existência e de seus dependentes. A inserção no trabalho não contribui apenas para
seu avanço social, mas também evita o ócio, companheiro inseparável das idéias e
comportamentos marginais.
4.2 TRABALHO DO CONDENADO
De acordo com o disposto no artigo 28 da LEP “o trabalho do condenado, como
dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva”.
Ou seja, o trabalho figura tanto como dever, quanto como um direito do preso, e é um
dos grandes pilares que sustenta a finalidade ressocializadora do sanção penal. O
trabalho desenvolvido pelo preso cumpre uma função social tanto sob o aspecto do
cumprimento de sua sanção, quanto para sua preparação ao retorno no convívio social.
Atualmente, pela função ressocializante da pena, o trabalho penitenciário tem
uma função pedagógica. Entende-se hoje por trabalho penitenciário as atividades
exercidas pelos presos e internados, dentro dos estabelecimentos penais ou fora deles,
com remuneração equiparada a de pessoas livres. De acordo com o artigo 29 da LEP a
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remuneração pelo trabalho do preso não pode ser inferior a três quartos do salário
mínimo.
Graças ao advento da Lei n˚ 6.416/77 deu-se a obrigatoriedade da remuneração
ao trabalho realizado pelo detento. A remuneração do condenado deve ser usada para
indenização dos danos causados pelo crime, na assistência à família, em pequenas
despesas pessoais, na formação da caderneta de poupança que lhe será entregue
quando sair do estabelecimento penal, bem como para o ressarcimento ao Estado das
despesas de sua manutenção.
De há muito é conhecido o brocardo popular de que a mente vazia é oficina do diabo. Assim, a LEP dá o devido destaque à questão laborativa, infelizmente, não compreendido tal aspecto, haja vista a visível deficiência de oportunidades para os privados de liberdade. Estimados, nos dias de hoje – out/10 – em mais de 490.000 privados de liberdade, o percentual daqueles que labutam mal atinge 20%. Quadro deveras lamentável. (KUEHNE, 2012, p. 51)
O trabalho do preso é visto como condição da dignidade humana, se o
condenado já trabalhava antes de ser recolhido em estabelecimento penal, o labor irá
manter aquele hábito, impedindo que ele se degenere, se o mesmo não trabalhava, o
trabalho irá gradativamente disciplinando sua conduta, instalando em sua
personalidade a disciplina e o trabalho. Para alcançar o objetivo educador do trabalho,
este deve ser organizado de forma aproximada ao trabalho em sociedade.
O trabalho representa um instrumento de suma importância para o objetivo
principal da execução penal, o de reintegrar o condenado à sociedade, mas
infelizmente é um campo apenas programático, tendo em vista que os
estabelecimentos penais não aproveitam a mão de obra que os cárceres disponibilizam.
Com o percentual de detentos que trabalham, se está longe de alcança uma execução
penal efetivamente digna.
É preparando o individuo pela profissionalização (mão-de-obra
qualificada), pela segurança econômica que vai adquirindo, pela ocupação integral de seu tempo em coisa útil e produtiva e, conseqüentemente, pelo nascer da razão de viver, pelo reconhecimento dos direitos e deveres, das responsabilidades e da dignidade humana que se obterá o ajustamento ou reajustamento desejado. (MIRABETE, 2004, p. 91)
O trabalho prisional também tem um objetivo profissionalizante, embora seja
limitadas as oportunidades de trabalho penitenciário, o propósito de profissionalização
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deve ser acentuado quando o detento não tem capacitação profissional, pois a
aquisição de um oficio ou profissão é fator decisivo para a reintegração social do
condenado.
Não obstante, em relação a diretiva implementada pelo texto legal, bem
como ao que substancialmente representa o trabalho do preso, constata-se que grande parte das pessoas encarceradas não tem condições de exercer esse direito, uma vez que, como por todos é sabido, não existem vagas suficientes em canteiros de trabalho. Por outro lado, com raras exceções, aqueles que ainda conseguem trabalhar ao longo do cumprimento de sua pena, laboram em atividades que não representam uma possibilidade de garantir o próprio sustento quando em liberdade. (PRADO, 2011, p 63)
Segundo dados da DEPEN/Pr, existe hoje no Paraná 466 canteiros de trabalho,
sendo eles 359 canteiros próprios, e 107 canteiros conveniados com empresas, o
percentual de presos que trabalham atualmente é de 20,92%, ou seja, 2.987 presos,
sendo 1597 em canteiros próprios e 1.390 em canteiros conveniados. (DEPEN/PR,
2012)
Nos canteiros próprios existe a fábrica de produtos químicos (xampu, detergente,
água sanitária, sabão para roupa), a fabrica de vassouras e rodos, sapataria, barbearia
e lavanderia. Nos canteiros de empresas conveniadas existe por exemplo o convênio
com o Departamento de Estradas e Rodagem do Estado do Paraná, onde os detentos
trabalham na fabricação de placas e serviços gerais, na Colônia Penal Agrícola; o
convênio com a empresa Allpha Indústria e Comércio de Bolas Ltda, onde os detentos
fazem colagem de gomos e acabamento de bolas, na Penitenciária Estadual de
Cascavel. (Idem)
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5 SISTEMA APAC
Como vimos, no Brasil a questão da educação e reintegração social dos
condenados é pouco trabalhada, e não há investimentos suficientes para a efetiva
reintegração. O que se constata é que o índice de reincidência daqueles que já
cumpriram sua pena é muito elevado variando de 70% a 85%, sendo mais alto quanto
maior tenha sido o tempo de encarceramento.
Porém existe uma experiência de trabalho ressocializante que reduz o nível de
reincidência a praticamente zero. Trata-se da APAC – Associação de Proteção e
Assistência ao Condenado. A APAC foi fundada em São José dos Campos, em 1972,
esta associação propõe a religião como elemento fundamental para o trabalho de
reeducação e reintegração social do condenado, mas não é apenas isso, é toda uma
proposta alternativa ao atual sistema prisional, denominada assim pelos seus
fundadores de “Sistema APAC”.
A APAC surgiu quando seu fundador Mario Ottoboni, no início do ano de 1972,
passou por uma experiência de um Cursilho de Cristandade, quando lhe ocorreu a idéia
de exercer um apostolado junto aos presidiários. Após a obtenção de permissão da
autoridade policial, passou a visitar regularmente durante alguns meses a Cadeia
Pública de São José dos Campos, reunindo ao mesmo tempo outros cursilhistas para
começarem um movimento de evangelização. A primeira atividade foi a celebração de
missas no interior do presídio, sendo convencionado que as missas se repetiriam
mensalmente, seguida da distribuição de comida, roupas, objetos de limpeza e material
para trabalhos manuais.
Este movimento manteve-se por um ano e meio até ser institucionalizado. Em 15
de julho de 1974 foram aprovados os estatutos sociais da APAC, e em 30 de setembro
de 1975 a associação foi oficializada através do Provimento 02/85 da Corregedoria dos
Presídios de São José dos Campos.
A grande inovação desse sistema é facultar aos condenados outros regimes de
cumprimento de pena além do regime fechado, contando para tanto com a colaboração
da comunidade, cidadãos reunidos e organizados em associações com a função de
auxiliar a Justiça no processo de reinserção do condenado. Ou seja, neste sistema
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podemos ver como é de suma importância a colaboração da sociedade para a efetiva
reintegração social do sentenciado.
A APAC prepara o condenado para adaptar-se o mais adequadamente
possível à sociedade, submetendo-o a um aprendizado social e profissional eficiente, colocando-o no mercado de trabalho e acompanhando-o nos primeiros tempos de reintegração social. Procura reformulá-lo interiormente, mediante um sistema de prêmios e castigos que atinge o comportamento do condenado nos mínimos pormenores de sua vida diária. Aos que aderem à sua proposta, a APAC possibilita algo praticamente inacessível à maioria dos presidiários brasileiros: reabre – ou mesmo abre- a porta de um outro mundo, do nosso mundo da ordem social, dando-lhes a oportunidade de deixar o “mundo do crime”, o mundo da “ordem pelo avesso”, como bem constatou José Ricardo Ramalho na pesquisa efetuada na Casa de Detenção de São Paulo, divulgada em 1979. (CAMARGO, 1984, p. 16)
Este sistema é constituído por uma escala de estágios sucessivos, até chegar a
cumprir sua pena, mesmo que elevada, em Regime Aberto. A progressão para os
próximos estágios depende do desempenho do condenado nas atividades dadas em
cada estágio, lembrando que a proposta da APAC é religiosa, ou seja, dá-se especial
atenção às práticas religiosas e ao relacionamento do preso com seus companheiros,
com os membros da APAC, bem como, com as autoridades. Em 1978 houve uma
mudança neste sentido, a Lei n˚ 1819/78 traz a exigência de que o condenado cumpra
pelo menos um sexto de sua pena no regime inicial, para então passar para o primeiro
estágio do sistema APAC.
Durante os primeiros anos de funcionamento da APAC em São José dos
Campos o êxito foi tão grande que despertou o interesse do Ministério da Justiça, e em
1978 existia APAC’s organizadas em mais ou menos 30 Comarcas. O critério usado
para avaliar este êxito do sistema é a taxa de reincidência que em 1983 era de 5%,
numero muito abaixo do sistema penitenciário comum que gira em torno de 75%.
A proposta terapêutica da APAC aplica-se gradativamente, sendo quatro etapas
sucessivas as quais são subdivididas em vários graus. Essa escala de progressão
atinge o preso desde seu primeiro dia de cumprimento de pena, até seis meses após o
cumprimento integral de sua sentença condenatória. Para a APAC os reeducandos só
serão considerados recuperados após seis meses de efetivo gozo da liberdade
definitiva.
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Ao dar entrada num estabelecimento penal administrado pela APAC o
condenado já está enquadrado do sistema de progressão. O novo detento ocupa cela
separada dos que já iniciaram a progressão, e devem cumprir todas as obrigações e
proibições validas para todos os encarcerados daquele estabelecimento penal. O
regulamento das cadeias sob o sistema APAC com base em obrigações morais, sendo
incentivado o sentimento de fraternidade, obediência e cortesia com as autoridades, é
proibido dentro do sistema APAC o emprego de palavras de baixo calão, jogos e
brincadeiras de mau gosto.
Ao chegar ao presídio a APAC abre uma pasta prontuário para o novo detento,
com sua fotografia e questionário preenchido pelo próprio reeducando, neste momento
lhe é designado um padrinho, que também deve preencher um formulário com
informações que conseguiu obter e seu parecer inicial.
O encontro do detento que acabou de chegar com os outros presos e com os
membros da APAC se dá durante a missa semanal, celebrada no pátio interno da
cadeia. Ao termino da missa padrinhos e madrinhas servem refrescos, bolo e salgados
aos detentos, comemorando os aniversariantes do mês. Durante a missa todos os
padrinhos são obrigados a participar do ritual de eucaristia, o que inclui a comunhão, já
os reeducandos, após algumas missas na cadeia, um membro da APAC lhe pergunta
se deseja se confessar para poder comungar. Os reeducandos não são obrigados a
comungar, mas seu comportamento é sempre observado pelos padrinhos ao longo das
missas.
Durante a missa mensal também é feita a entrega do premio ao autor da melhor
composição sobre o tema proposto aquele mês, como por exemplo dia das Mães ou
Natal. Nesta ocasião podem ser propostos outros concursos como limpeza da cela,
decoração de Natal, etc. Além de semanalmente ser feita à reza do terço dos afilhados
com seus padrinhos, e a reza do terço diária somente entre os reeducandos. Para uma
pessoa que acaba de ser preso o volume de atividades desenvolvidos na APAC
realmente surpreende.
A filosofia apaquena entende que a família é o principal ponto de formação dos
criminosos, com base em vários estudos perceberam que a grande maioria dos
detentos vem de famílias desestruturadas, onde foram abandonados pelos pais, os
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cônjuges se separaram, ou casos de alcoolismo na família, ou ainda, em outros casos,
os detentos eram oriundo de famílias bem estruturadas, porem que não existia boa
relação entre pais e filhos. Desta forma foi comprovado que a família é a causa
geradora da criminalidade em 98% dos casos. Por este motivo a família tem grande
valor na proposta terapêutica apaqueana, e por isso os padrinhos dos reeducandos são
sempre casais, os quais desenvolvem o papel de substituir os pais dos reeducandos,
mostrando para eles o valor da família, encorajando-os e devolvendo para estes a auto-
estima, para que assim possam se recuperar.
A proposta apaqueana de substituir os pais pelos padrinhos implica em
apresentar ao reeducando, na prática, a conduta moral do padrinho e, em conseqüência, os costumes sociais de pequena burguesia como modelo ideal. Não se levam em conta as diferenças sócio-econômicas e culturais. Dos reeducandos é exigida uma mudança de hábitos que para muitos padrinhos nem chega a parecer como tentação: exprimir-se em palavras de baixo-calão, usar tóxicos, freqüentar casas de jogo e prostituição, etc. Há uma série de penalidades previstas para cada delito, culminando com a regressão aos estágios anteriores da escala de recuperação e com a perda do casal de padrinhos. (CAMARGO,1984, p. 49)
A avaliação dos reeducandos deve ser feita pelos padrinhos por escrito de
sessenta em sessenta dias, com o preenchimento de um relatório informativo, bem
como, mensalmente devem se reunir com os membros da Diretoria Executiva, para
proceder à avaliação do processo de aproveitamento de cada reeducando.
Os presos neste estagio inicial são incentivados a usar a biblioteca e a trocar
correspondência com seus padrinhos, todas estas cartas são arquivadas na sua pasta-
prontuário, além das correspondências os reeducandos mantém contato pessoal com
seus padrinhos, que pode ser de uma a quatro vezes por semana.
A responsabilidade do pai de família é exaltada, a APAC incentiva os
reeducandos a elaborarem trabalhos manuais, dando-lhes o material necessário para
fabricação e se encarregando da comercialização, desta forma dá aos detentos
condições de ajudar suas famílias. E para garantir este objetivo a APAC controla a
venda e pagamento do trabalho feito pelos reeducandos. Além do que, ao final do
primeiro estágio os padrinhos podem retirar os afilhados do presídio uma vez por mês,
para passarem um domingo em família, auxiliando desta forma a reintegração do
detento na família e na sociedade.
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Outro valor moral que deve ser mostrado aos reeducandos é o trabalho, a APAC
condena a ociosidade das cadeias, e desde o final do primeiro estagio de recuperação
o reeducando tem a oportunidade de trabalhar. Já no segundo estagio oportuniza-se ao
reeducando a profissionalização e sua colocação no mercado de trabalho, sendo
função dos padrinhos acompanhar os primeiros passos dos afilhados na reinserção
profissional.
O padrinho continua a ser o modelo de como uma vida de trabalho
honesto frutifica em bons resultados econômicos. Não se consideram as diferentes condições e remuneração do trabalho: o pressuposto é que o trabalhador vence na vida e que a pobreza é fruto da incapacidade ou da malandragem. (CAMARGO, 1984, p. 49)
Neste segundo estagio de recuperação a APAC coloca os reeducando em
firmas, nos mais diferentes tipos de ocupação, onde eles são registrados e
remunerados como os demais trabalhadores da empresa. A APAC continua ainda
procedendo o controle da vida financeira do reeducando, forçando-o a fazer uma
poupança mensal e a ajudar a família.
Ao final do dia de trabalho o reeducando deve voltar ao centro de reintegração
social para passar a noite, suas entradas e saídas são rigorosamente controladas pela
APAC. O trabalho fora do centro de reintegração social é o ultimo estagio na escala de
recuperação, equivale à prisão albergue do sistema penitenciário oficial.
Desta forma a APAC traz uma proposta nova, inédita dentre todas as reformas já
feitas em toda historia da pena de prisão. Com um sistema de prêmios e castigos
encoraja os detentos a serem o melhor que podem ser, e através da religião, da noção
de família e do trabalho, traz ao reeducando um ambiente totalmente diferente do
encontrado no sistema prisional oficial.
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6. CONCLUSÃO
Através do presente estudo vimos que o sistema prisional encontra-se debilitado,
o Estado não fornece estruturas suficientes para atender a demanda de presos, desta
forma os estabelecimentos penais não conseguem atingir seu objetivo de reintegrar o
detento. Além da superlotação e a falta de estabelecimentos adequados, as
assistências à que o preso tem direito, como forma de ressocialização, também não são
devidamente fornecidas pelo Estado, fatos estes que levam aos altos índices de
reincidência, mostrando que a ressocialização não esta sendo atingida.
Por outro lado analisamos o sistema prisional denominado como “sistema
APAC”, onde os estabelecimentos penais administrados pela APAC, com o apoio da
sociedade, fornecem todas as assistências à que o detento tem direito, tratando o preso
de forma digna, mostrando ao mesmo que ele pode, e consegue voltar ao seio da
sociedade como um sujeito cumpridor das normas e das leis do sistema jurídico
brasileiro. A filosofia apaqueana mostra na prática como as assistências, o trabalho, a
família e a sociedade cumprem papel importante para a ressocialização do detento, fato
que se prova pelo índice de reincidência dos egressos deste sistema que é de apenas
5% (cinco por cento).
Desta forma podemos comprovar que de fato é possível ressocializar o detento,
que o ser humano que cometeu um crime pode voltar à sociedade e não mais cometê-
lo. Porém para que este fim seja obtido a Sociedade e o Estado devem cumprir seu
papel dentro da ressocialização, sob pena dos efeitos da não ressocialização se
prolongarem no tempo, como atualmente vem acontecendo.
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BIBLIOGRAFIA
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