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Liceus escoLas Técnicas e secundárias 1 229.98 mm 2 Liceus escoLas Técnicas e secundárias 3 4 LICEU DE MARIA AMÁLIA VAZ DE CARVALHO, LISBOA ARGUMEnTUM Edições, Estudos e Realizações Arquivo da Parque Escolar iSBn 978-989-96106-4-4 Cristina Menezes dEPóSiTo LEGAL 320191/10 Teresa Heitor FoToGRAFiA ConTEMPoRânEA Luís Calixto diAGRAMAS FoToGRAFiA AnTiGA CooRdEnAção CooRdEnAção EdiToRiAL TiRAGEM AUToRiA TExTo PRodUção EdiToRiAL iMPRESSão dESiGn GRÁFiCo E PRé-iMPRESSão FixAção E REViSão do TExTo Edição
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1LiceusescoLas Tcnicase secundrias
2
joaomartinsDistance Measurement229.98 mm
3LiceusescoLas Tcnicase secundrias
4LICEU DE MARIA AMLIA VAZ DE CARVALHO, LISBOA
5Edio PARQUE ESCoLAR, EPEAv. infante Santo, n.2, 7 piso, 1350-178 Lisboa, Portugal
CooRdEnAo
Teresa Heitor
AUToRiA
PARQUE ESCoLAR, EPEdiRECo GERAL dE PRoJECTo REA dE EdiFiCAES
CooRdEnAo EdiToRiAL
ARGUMEnTUM Filipe Jorge
TExTo
Alexandra Alegre,Colaborao: Teresa Heitor, Helder Cotrim, diana Vaz, Joo Carneiro da Silva, Jos Freire da Silva
diAGRAMAS
Lus Calixto
FoToGRAFiA AnTiGA
Arquivo Fotogrfico da Secretaria-Geral do Ministrio de EducaoArquivo do Ministrio das obras PblicasArquivo Histrico da Cmara Municipal de Lisboa
FoToGRAFiA ConTEMPoRnEA
Arquivo da Parque Escolar
FixAo E REViSo do TExTo
Cristina Menezes
dESiGn GRFiCo E PR-iMPRESSo
ARGUMEnTUM Joo Martins
PRodUo EdiToRiAL
ARGUMEnTUM Edies, Estudos e Realizaes
iMPRESSo
noRPRinT
TiRAGEM
1000 exemplares
dEPSiTo LEGAL 320191/10
iSBn 978-989-96106-4-4
1. Ediodezembro de 2010
6 PREFCio - (RE)ConHCER o PATRiMnio ESCoLAR
inTRodUo - oBRAS PBLiCAS E EdUCAo. noTA SoBRE AS PoLTiCAS
EdUCACionAiS do ESTAdo no SCULo xx
1. EdiFCioS PARA o EnSino LiCEAL
1.1. os primeiros edifcios liceu: final da Monarquia e i Repblica
1.2. Anos 30: os liceus modernos
1.3. Plano de 38
1.4. Plano de 58
1.5. Estudos normalizados de 1968
1.6. Transio do Ensino Liceal para o Ensino Unificado
2. EdiFCioS PARA o EnSino TCniCo E PRoFiSSionAL
3. PRoJECToS-TiPo PARA o EnSino SECUndRio
4. EdiFCioS SELECCionAdoS
1. Liceu de Passos Manuel, Lisboa
2. Liceu de Cames, Lisboa
3. Liceu de Pedro nunes, Lisboa
4. Liceu de Alexandre Herculano, Porto
5. Liceu de Rodrigues de Freitas, Porto
6. Liceu de d. Filipa de Lencastre, Lisboa
7. Liceu de diogo de Gouveia, Beja
8. Liceu de d. Joo iii, Coimbra
9. Liceu de Latino Coelho, Lamego
10. Liceu de S da Bandeira, Santarm
11. Liceu de nuno lvares, Castelo Branco
12. Liceu de Alves Martins, Viseu
13. Liceu de Gonalo Velho, Viana do Castelo
14. Liceu de infanta d. Maria, Coimbra
8
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236
15. Liceu de Gil Vicente, Lisboa
16. Liceu de d. Joo de Castro, Lisboa
17. Liceu de Carolina Michaelis, Porto
18. Liceu de Jos Estvo, Aveiro
19. Liceu de Sebastio e Silva, oeiras
20. Liceu de Rainha d. Leonor, Lisboa
21. Liceu de Padre Antnio Vieira, Lisboa
22. Liceu de Afonso de Albuquerque, Guarda
23. Liceu nacional de Cascais, Cascais
24. Liceu de d. Pedro V, Lisboa
25. Escola Preparatria do Ensino Secundrio
26. Projecto normalizado para o Liceu-tipo
27. Escola Secundria de Benfica, Lisboa
28. Escola Secundria Professor Herculano de Carvalho, Lisboa
29. Escola Secundria de Vila nova de Santo Andr, Santiago do Cacm
30. Escola de desenho industrial Marques de Pombal, Lisboa
31. Escola industrial de Machado de Castro, Lisboa
32. Escola Tcnica Elementar de Josefa de bidos, Lisboa
33. Escola Comercial de Filipa de Vilhena, Porto
34. Primeiro Projecto normalizado 1960 (Projecto Mercrio)
35. Escola industrial e Comercial de Gabriel Pereira, vora
36. Escola Agro-industrial de Grndola
37. Escola de Regentes Agrcolas de vora
38. Escola Secundria Professor Reynaldos dos Santos, Vila Franca de xira
39. Escola Secundria de Virgilio Ferreira, Lisboa
40. Escola Secundria de d. Martinho Vaz de Castelo Branco,
Pvoa de Santa iria
ndiCE dE iMAGEnS
BiBLioGRAFiA
8 (re)conHecer o PaTriMnioescoLar
9Parque Escolar EPE, responsvel pelo Programa de Modernizao das Escolas com Ensino Secundrio,procura com esta publicao LiCEUS, ESCoLAS TCniCAS E SECUndRiAS proporcionar a divulgao
dos edifcios escolares da rede pblica, e para a fixao da sua memria, garantindo deste modo a
continuidade de um percurso iniciado no final do sculo xix.
no sendo uma compilao exaustiva trata-se, sobretudo, de subsidiar o estudo da arquitectura
escolar em Portugal, mobilizando referncias histricas e procedendo anlise de estudos de caso. Com
base nesta informao pretende-se convocar o debate sobre essa histria recente e ainda insuficien -
temente estudada, e a reflexo sobre os seus modos de produo, ocupao e transformao.
A sistematizao desta informao significa tambm a vontade de contribuir para uma maior sensibilizao do valor
e significado do edifcio escolar enquanto artefacto construdo portador de uma identidade arquitectnica prpria que o
diferencia dos demais edifcios pblicos. o edifcio escolar que, pela sua condio instrumental de lugar destinado
educao e formao, estabelece os limites e as condies em que esse servio prestado, que o identifica e lhe d
significado, operando como um discurso que instituiu um sistema de valores e prticas de utilizao, reflexo das formas de
conceber a educao e as suas relaes com a sociedade (Markus, 1993).
neste sentido, esta publicao vai tambm concorrer para a consciencializao das mudanas ocorridas nos modos
de ensino e de aprendizagem e nas formas de apropriao quotidiana do espao escolar ou seja na cultura escolar,
entendida esta como o conjunto dos aspectos institucionalizados que caracterizam a escola como organizao (Viao,
1994), na medida em que as solues projectuais reproduzem os modelos organizativos das escolas e os mtodos
pedaggicos perfilhados.
no capitulo introdutrio obras Pblicas e Educao: notas sobre as politicas educativas do Estado no sculo xx
proposta uma leitura cronolgica dos modos de produo dos edifcios escolares presentes no universo estudado
edifcios destinados ao ensino publico liceal, tcnico-profissional e secundrio tendo como base referencial o sistema
educativo portugus e as reformas mais significativas realizadas ao longo dos ltimos 125 anos e que suportaram as
evolues formais e organizacionais protagonizadas numa produo diversificada, com perodos de maior ou menor
intensidade.
nos quatro captulos seguintes agruparam-se os edifcios escolares de acordo com o programa escolar a que se
destinavam ensino liceal, tcnico-profissional, unificado e secundrio relacionando o processo de produo que os
assistiu e os modelos pedaggicos que reproduzem com as estratgias arquitectnicas adoptadas. Utilizando como suporte
a lgica social do momento, procurou-se identificar os factores que influram na sua concepo e geriram a sua construo
e ocupao. o esforo analtico foi ento conduzido para a compreenso da expresso arquitectnica e da correspondente
gramtica espacial, formal e construtiva.
o perodo compreendido entre o final do sculo xix e a dcada de 1930 sobretudo marcado pela produo dos
edifcios escolares destinados ao ensino liceal. Embora diminuta, esta produo surge vinculada a modelos importados,
inicialmente a partir de Frana e posteriormente alargados Alemanha. Respondendo a situaes especficas, os programas
adoptados conciliam preocupaes de natureza pedaggica e funcional, admitindo um regime de semi-internato hoje
designado por turno nico.
Visando a melhoria das condies de habitabilidade dos espaos de aprendizagem, abandonado o modelo de
edifcio conventual e so experimentadas novas configuraes em extenso. Com isto o edifcio deixa de ser um volume
compacto, para se estruturar em funo de eixos ortogonais com funo distribuidora. Mas, as inovaes programticas
no se resumem questo higinica. no programa de espaos evidencia-se o investimento no ensino experimental e na
prtica do exerccio fsico. os laboratrios organizam-se em ncleos autonomizados relativamente s salas de aula aos
a
10 quais se associam espaos de anfiteatro permitindo a aula magistral. Ao ginsio, nalguns casos complementado por umapiscina, conferido um papel central na organizao global da escola e uma valorizao da sua espacialidade. Ainda
associado s preocupaes com a sade e higiene escolar so introduzidas novas funcionalidades como o caso do
gabinete mdico, do balnerio e do recreio coberto. Exibindo um sentido de monumentalidade, reflectido na imagem e
na projeco exterior dos lugares onde se implantam, transitam de uma expresso eclctica dominada pelas Beaux-Arts,
embora com forte sobriedade decorativa, passando pela influncia do gosto geometrizado do art dco at afirmao da
linguagem modernista.
Embora com pouco significado em termos de dimenso, esto aqui representados um conjunto de edifcios com
reconhecida qualidade arquitectnica, configurando no seu conjunto uma condio de excepcionalidade no patrimnio
escolar portugus. A escala e as caractersticas formais e construtivas destes edifcios, o desfasamento que exibem face s
actuais exigncias pedaggicas e ambientais e a necessidade de se proceder sua readaptao funcional e estrutural
coloca-os numa posio delicada quanto ao impacto da interveno de requalificao.
A partir do final da dcada de 1930, e ao longo das trs dcadas seguintes, sob a responsabilidade do Ministrio
das obras Pblicas, observa-se uma viragem nas estratgias adoptadas na produo dos edifcios destinados ao ensino
liceal e tcnico, visando uma maior eficcia e controlo das fases de concepo e de construo.
A par da criao de um corpo tcnico prprio constitudo por arquitectos, engenheiros e tcnicos de apoio sediado
na Junta das Construes para o Ensino Tcnico e Secundrio (JCETS) e do consequente abandono da encomenda exterior,
so introduzidos instrumentos de normalizao e recomendao tcnica que enquadram as linhas gerais de concepo,
de acordo com um programa-tipo no caso dos liceus, e de ante-projectos no caso das escolas tcnicas. A disciplina
construtiva e a sobriedade formal a que os edifcios foram submetidos so reflexo das estratgias adoptadas.
A persistncia de um modelo educativo de matriz expositiva, vinculado a princpios de ordem e disciplina, traduziu-se
em modelos espaciais de grande rigidez funcional, em que a sala de aula, surge como o elemento base dessa mesma
organizao e os espaos complementares so reduzidos ao elementar ou conjugados noutros espaos, como o caso do
ginsio que tambm pode funcionar como salo de festas ou a biblioteca como sala de actos. nesta abordagem est
tambm patente uma forte resistncia face ao debate internacional ento em curso na rea da educao, cujas repercusses
na arquitectura escolar contribuam para a sua afirmao, como o caso das escolas projectadas por Richard neutra, Franz
Schuster, Hans Scharoun, Alison e Peter Smithson, Arne Jacobsen ou Herman Hetzberger, amplamente divulgadas pela
literatura especializada da poca.
no inicio da dcada de 1960 surgem os primeiros sinais de mudana. Em causa estava a discusso iniciada no final
da dcada anterior sobre a rede escolar pblica, manifestamente insuficiente em dimenso e desajustada face s
orientaes pedaggicas emergentes. ento que os modelos experimentados noutros pases, apoiados em sistemas pr-
-fabricados, apontando um modo de construir mais clere e econmico, se tornam referncias que se procuram adaptar
realidade nacional.
de forma gradual, e j sob a responsabilidade partilhada do Ministrio da Educao altera-se o programa de espaos.
Recorre-se tipologia pavilhonar e coordenao modular e pr-fabricao cuja aplicao se torna recorrente a partir da
dcada de 1970.
o programa de espaos, ao tornar-se mais exigente justificou a incorporao de novas valncias e relaes de
funcionalidade facilitadas pela adopo da tipologia pavilhonar. A par da especializao de espaos lectivos em pavilhes
prprios, so incrementadas as reas de apoio actividade lectiva, como o caso dos sectores administrativo e de direco
e dos ncleos de apoio scio-educativo. As zonas de convivialidade estendem-se ao interior do edifcio escolar e adquirem
lugar prprio. A biblioteca, adquire maior centralidade e assume-se como um espao de trabalho lectivo. o crescente
11protagonismo e especializao dos espaos destinados educao fsica transforma o ginsio em pavilho gimnodesportivo.A sala de aula, apesar de se manter como o elemento base da organizao do espao escolar, abandona a estrutura rgida
anteriormente adoptada, experimenta a forma quadrada e aumenta a rea, permitindo maior flexibilidade no uso.
inicialmente desenvolvem-se e testam-se solues piloto que posteriormente so corrigidas e fixadas em projecto-tipo.
os Liceus de Cascais, d. Pedro V e de Sintra e da Escola industrial e Comercial de vora, so disso exemplo. Algumas das
solues propostas so entretanto adaptadas aos modelos j existentes, como no caso do Liceu da Guarda onde criado
um sector social e introduzido um espao de convvio encerrado, permitindo conciliar actividades musicais, teatrais,
desportivas ou assembleias.
na dcada de 80, face ao aumento da escolaridade obrigatria e da populao escolar, so desenvolvidos novos
projectos-tipo de estrutura pavilhonar visando solues mais eficazes e cleres com custos de construo reduzidos,
evitando situaes de ruptura. o investimento dos projectistas ento dirigido para os procedimentos de coordenao
modular e de racionalizao da construo. A complexidade programtica presente nos projectos anteriores abreviada,
assistindo-se de novo a uma reduo dos espaos especializados. A clula base da organizao espacial destes novos
pavilhes a sala de aula de configurao quadrada que, apoiada na modulao estrutural, permite ser ampliada ou
reduzida e deste modo acolher diferentes funes e actividades.
A par de todo este processo destacam-se alguns projectos desenvolvidos por via de encomendas especiais. neste
grupo que se integra o Liceu Padre Antnio Vieira em Lisboa projectado por Ruy Athougia no final da dcada de 1950, a
Escola Agro-industrial de Grndola, a Escola de Regentes Agrcolas de vora e a Escola Secundria dos olivais Velho, actual
Herculano de Carvalho projectadas por Manuel Tanha, a Escola Secundria Jos Gomes Ferreira, projectada por Ral
Hestnes Ferreira. So projectos que ensaiam diferentes estratgias de concepo que se evidenciam da restante produo
arquitectnica.
no captulo final apresentado, sob a forma de fichas, um repertrio de edifcios escolares, considerados
significativos de entre o universo estudado. na concepo das fichas privilegiou-se a informao grfica, embora nem
sempre uniforme, devido em parte a dificuldades de compatibilizao dos registos existentes ou sua indisponibilidade.
os elementos descritivos seleccionados, foram complementados por esquemas interpretativos da organizao funcional e
tipolgica, permitindo identificar permanncias e rupturas e deste modo apoiar uma anlise comparativa.
o material agora publicado tambm ilustrativo do trabalho que a Parque Escolar EPE tem procurado fazer no
reconhecimento do patrimnio escolar portugus do ponto de vista da interpretao das condies espaciais e da sua
praticabilidade, de modo a conciliar os seus atributos e potencialidades com os objectivos do Programa de Modernizao
e consequentemente com as novas exigncias de uso que lhe so colocadas, obrigando a repensar o edifcio escolar na
sua globalidade.
Em colaborao com a Secretaria-Geral do Ministrio da Educao a Parque Escolar EPE encontra-se a desenvolver
o projecto Arquivo digital Arquitectura Escolar Passado e Presente, organizando e divulgando um acervo digital de
preservao da memria colectiva. Este arquivo ainda pouco conhecido e divulgado, tem sido essencial para a elaborao
dos projectos de modernizao das escolas secundrias, permitindo um conhecimento mais claro de solues estruturais
e construtivas em complemento da observao directa do estado actual dos edifcios sujeitos a interveno.
este conhecimento que tem permitido operacionalizar o programa e a sua forma de concretizao bem como
definir os instrumentos para a sua gesto.
Teresa V. Heitor,
Vogal do Conselho de Administrao da Parque Escolar EPE
introduo
oBras PBLicas e educao. noTa soBre as PoLTicaseducacionais do esTado no scuLo XX
OBRAS PBLICAS E EDUCAO. NOTA SOBRE AS POLTICASEDUCACIONAIS DO ESTADO NO SCULO XX
decreto da reforma da instruo Secundria, de 17 de novembro
de 1836, da autoria de Passos Manuel, aprova o Plano dos Liceus
Nacionais que ir substituir as aulas dispersas pelo Pas, criadas por
reforma pombalina em 1759. o Plano dos Liceus Nacionais procura,
por um lado, o desenvolvimento de uma sociedade industrial,
assente na instruo tcnica, cientfica e artstica de grandes
massas de Cidados, que no aspiram aos estudos superiores e, por outro,
responde necessidade de um ensino laico, exigido pela extino das ordens
religiosas em 1834, que tinham dominado o ensino em Portugal. A planificao
curricular da reforma de Passos Manuel integra disciplinas das reas humansticas
e novos programas nas reas cientficas, procurando atribuir um sentido prtico e
moderno ao ensino e preconizando um mtodo de aprendizagem indutivo e
experimental. Esta reforma assenta num regime de ensino por disciplinas mas sem
um plano que as articule, no define a sua distribuio em cada ano, a sua carga
horria e o nmero de anos de frequncia do curso liceal.1
Para alm das questes pedaggicas e de organizao deste ciclo de ensino,
tambm as instalaes liceais esto na origem da dificuldade de implementao
do Plano; o Estado no possua meios financeiros para a construo de novos
edifcios para acolher a populao liceal e as condies arquitectnicas e
pedaggicas das instalaes existentes no cumpriam as exigncias da reforma de
1836.
As reformas de Jaime Moniz, em 1894-95, e de Eduardo Coelho, em 1905,
conferem um impulso de modernizao ao ensino liceal, assente na adopo do
regime de ensino por classes.2 So estabelecidas as bases para a construo dos
edifcios liceais introduzindo um conjunto de novos espaos no seu programa.
da Reforma de Jaime Moniz destaca-se a adopo do regime de classes,
afirmando a sala de aula como o espao por excelncia da actividade instrutiva e,
consequentemente, como o espao de modelao e organizao de todo o
edifcio. Refere-se, tambm, o estabelecimento do regime de semi-internato nos
liceus que, ao impulsionar o alargamento do tempo escolar na vida do aluno
associado a princpios de auto-governo, promove a introduo de novos espaos
programticos, como as salas de estudo, salas de leitura e espaos de refeio.
Assiste-se tambm a uma valorizao das zonas no edificadas do edifcio liceu,
incorporando elementos como jardins e hortos, zonas de recreio mais vastas e
15
o
1 Valente, Vasco Pulido; O Estado Liberale o ensino. Os Liceus portugueses (1834--1930). Lisboa, Gabinete de investigaesSociais, 1973.
2 Barroso, Joo; Os Liceus. Organizaopedaggica e administrativa (1836-1960),volume i. Coleco Textos Universitriosde Cincias Sociais e Humanas, FundaoCalouste Gulbenkian e Junta nacional deinvestigao Cientfica e Tecnolgica,Lisboa, novembro 1995.
espaos para a prtica de Educao Fsica e jogos. Todo o conjunto necessita agora
de ser protegido por grades ou muros, assegurando a permanncia e proteco
dos alunos no interior dos recintos liceais3.
Esta reforma divide os liceus em centrais, onde era ministrado o curso geral
(cinco anos) e o curso complementar (6 e 7 ano) localizados em Lisboa, Porto e
Coimbra; e nacionais, onde era ministrado unicamente o curso geral e localizados
em cada capital de distrito. Esta hierarquizao diferencia a oferta de estudos dos
diferentes tipos de liceus: os primeiros destinavam-se ao ingresso no ensino
superior; os segundos, ao ensino adaptado a um exerccio profissional.
da reforma do ensino liceal de 29 de Agosto 1905, da autoria de Eduardo
Coelho, salientam-se duas orientaes que se revelaram fundamentais na evoluo
dos edifcios liceu: as questes higienistas e de sade escolar, responsveis pela
promoo de novas prticas higinicas por parte do aluno e pela obrigatoriedade
da prtica de exerccio fsico; e a importncia atribuda s disciplinas cientficas e
ao ensino activo e experimental.
Reclamado internacionalmente, o interesse observado pelas questes higienistas
no mbito escolar surge em Portugal associado criao da inspeco Sanitria Escolar
da direco Tcnica das Construes Escolares em 1901 e implementao de um
plano de higiene escolar sob a responsabilidade de mdicos escolares. A crescente
importncia dada a este tema reflecte-se na presena permanente de inspectores
16
3 Silva, Carlos Miguel Jesus Manique da;Escolas Belas ou Espaos Sos? Umaanlise histrica sobre a arquitecturaescolar portuguesa (1860-1920). disserta-o de Mestrado em Cincias da Educao(Histria da Educao), Univer-sidade deLisboa/Faculdade de Psicologia e deCincias da Educao, Lisboa, 2002.
Ginsio do Liceu de Pedro nunes, Lisboa
sanitrios nas comisses de avaliao de projectos, no sentido de os conformar com as
premissas relativas sade e higiene escolar. A obrigatoriedade da prtica de Ginstica
e de exerccio fsico exige a existncia de amplos locais que permitissem a sua prtica,
que deveriam obedecer a importantes requisitos de higiene. destaca-se o ginsio no
conjunto dos espaos do edifcio liceal, conferindo-lhe um lugar central nas reas
programticas e no tratamento espacial do seu interior.
A reforma de 1905, de influncia positivista, ir consagrar os princpios da
educao moderna, reunindo os currculos de carcter humanista e cientfico, tal
como se ir manter durante o sculo xx. Mantendo o regime de classes, revoga o
sistema de curso complementar nico e estabelece em sua substituio dois cursos:
um de Letras ou Humanidades e outro de Cincias, de dois anos cada, privilegiando
as matrias modernas em detrimento das clssicas, conforme os ideais do
liberalismo. Esta nova organizao liceal reflecte-se no edifcio, que v assim
ampliada a sua complexidade programtica e funcional com a introduo de novos
espaos e com a incluso de material didctico e de equipamentos necessrios
para o ensino dos diferentes saberes, em particular a Fsica, a Qumica, a Geografia
e o desenho. Ao conjunto dos espaos liceais adicionado o laboratrio,
permitindo o desenvolvimento de prticas de ensino experimental que, em
simultneo, promove a aquisio de material pedaggico com carcter
museolgico, utilizado e exposto nas salas de aula especiais, laboratrios e museus.
17
Laboratrio do Liceu de Maria Amlia Vaz de Carvalho, Lisboa
A reforma de 1905 determinante para a concepo dos novos edifcios liceais
programados para a cidade de Lisboa e Porto. o aumento da populao escolar
associado expanso urbana das cidades de Lisboa e Porto obriga diviso das
cidades em zonas escolares. o decreto de 20 de Janeiro de 1906 contempla a
construo de um edifcio liceu por zona escolar, localizado num terreno central. num
primeiro momento, refere-se, em Lisboa, o projecto e a construo do Liceu Cames
(1907-09), da 1 zona escolar, e Liceu Pedro nunes (1908-11), da 3 zona escolar, da
autoria do arquitecto Miguel Ventura Terra; e posteriormente, destacam-se, no Porto,
o Liceu Alexandre Herculano (1914-31), na zona oriental, e o Liceu Rodrigues de Freitas
(1918-31), na zona ocidental, da autoria do arquitecto Jos Marques da Silva. Para alm
dos novos edifcios, esta reforma vai tambm determinar a soluo final do projecto
do Liceu Passos Manuel, da 2 zona escolar de Lisboa, iniciado em 1882 com projecto
do arquitecto Jos Lus Monteiro e concludo em 1911 por Rosendo Carvalheira.
Este perodo de definio da instituio liceal, que cobre o perodo entre
1836 e o final do sculo, coincide tambm com a promulgao das primeiras
reformas destinadas a incentivar a instruo profissional exigida pelo Pas no campo
das actividades industriais, aps a criao das primeiras aulas pela administrao
pombalina. Procurando captar as atenes e o interesse de um pblico mais vasto
de modo a dotar o Pas com tcnicos qualificados, Passos Manuel institui os
Conservatrios de Artes e ofcios de Lisboa (18 de novembro 1836) e do Porto
(5 de Janeiro 1837). Em 1852, o ensino tcnico-profissional alvo de um forte
impulso, por via da aco de Fontes Pereira de Melo que ir promulgar a legislao
que permitir instituir o ensino tcnico industrial nas cidades de Lisboa e Porto,
dividindo-o em trs graus: elementar, secundrio e complementar. neste mbito
so criados o instituto industrial de Lisboa (com Museu da indstria e biblioteca
especializada) e o instituto industrial do Porto contemplando oficinas para as
diferentes reas de especializao.4
no mesmo ano, o plano de modernizao do Pas cria tambm escolas
tcnicas orientadas para o ensino agrcola, com trs graus distintos de ensino e
destinadas a alunos com mais de dezasseis anos. o primeiro grau, de ensino
elementar, seria essencialmente prtico; o segundo grau, terico-prtico,
ministrado em Lisboa, Viseu e vora; e o terceiro grau, de ensino superior,
funcionaria em Lisboa, no instituto Agrcola. Tambm o ensino comercial alvo de
ateno na mesma poca, ao se anexar ao Liceu de Lisboa uma Seco Comercial,
dando continuidade antiga Aula do Comrcio instituda pelo Marqus de Pombal,
em 1755. Mais tarde, em 1869, o ensino comercial integrado no instituto industrial,
que passa a denominar-se instituto industrial e Comercial de Lisboa.
18
4 Carvalho, Rmulo de; Histria do Ensinoem Portugal. Fundao Calouste Gulbenkian,Lisboa, 1986.
na dcada de 80, Antnio Augusto de Aguiar prope uma reestruturao
do ensino profissional face aos deficientes resultados alcanados pelas reformas
anteriores, particularmente evidentes no atraso industrial do Pas, na falta de
qualificao dos trabalhadores do sector e no deficiente ensino terico e prtico
das suas matrias. Procede-se regionalizao do ensino tcnico, at ento
limitado a Lisboa e ao Porto, assistindo-se ento criao, um pouco por todo o
Pas, de escolas profissionais. Em 1884, so criadas as Escolas industriais e de
desenho industrial, e as Escolas Prticas (agricultura, vinicultura e lacticnios); em
1886 reformulado o ensino agrcola e veterinrio; e em 1884 publica-se o Plano
de Organizao do Curso Comercial no instituto industrial e Comercial de Lisboa.
Todas as Escolas Tcnicas Profissionais pertencem ao Ministrio das obras Pblicas,
Comrcio e indstria.
Em 1888, inaugurado em Lisboa, o primeiro edifcio construdo de raiz para
escola profissional a Escola de desenho industrial Marqus de Pombal, com
projecto do arquitecto Pedro de vila.
Com a proclamao da Repblica em outubro de 1910, o sector da
educao e da instruo assume particular relevncia no iderio republicano
enquanto importante via para a reforma do pensamento portugus. As reformas
republicanas incidem em particular no ensino primrio e no ensino superior, e em
menor grau no ensino secundrio.
19
Escola de desenho industrial de Marqus de Pombal, Lisboa
Aps algumas tentativas falhadas, em 1913 finalmente criado o Ministrio
da instruo Pblica do qual ficariam dependentes as direces-Gerais de instruo
Primria e Secundria, Superior e Especial, bem como todas as escolas
dependentes da direco-Geral do Comrcio e indstria.
destaca-se deste perodo a segunda escola profissional do Pas, a Escola
industrial Machado de Castro, em Lisboa, projectada em 1915 pelo arquitecto Vtor
Bastos e concluda no final da dcada de 20.
Em 1918, j sob a presidncia de Sidnio Pais, nomeada uma comisso
incumbida de rever o ensino secundrio, que procurou conciliar o ensino
humanstico com o ensino cientfico, prtico e utilitrio, contemplando tambm
a educao artstica. A nvel programtico, o edifcio destinado ao ensino
secundrio, contempla uma biblioteca para professores e alunos; a adaptao de
uma das salas a salo cinematogrfico; e, quando possvel, a existncia de um
ginsio, balnerios e piscina. Estas alteraes reflectem-se na concepo dos
edifcios liceu dos anos 30, no mbito dos concursos ento promovidos para a
sua construo.
Relativamente s escolas tcnico-profissionais, o Governo de Sidnio Pais
coloca-as na dependncia do Ministrio do Comrcio e Comunicaes e do
Ministrio da Agricultura. Esta situao alterada em 1929, data a partir da qual
todas estas escolas so transferidas para o Ministrio da instruo Pblica.
20
Liceu de Pedro nunes, Lisboa
o perodo que decorre entre 28 de Maio de 1926, que instaura a ditadura
Militar, e o final da dcada de 50 particularmente relevante no sector da educao,
encarada pelo governo como o principal veculo na difuso dos valores
nacionalistas.
A poltica de rejeio da coeducao, iniciada em 1926, exigindo a separao
de sexos nos estabelecimentos de ensino, determina, no caso do ensino
secundrio, a construo de escolas tcnicas e liceais especficas para a populao
feminina. Como exemplo, refere-se o primeiro liceu feminino, o Liceu Maria Pia,
futuro Maria Amlia Vaz de Carvalho, em Lisboa, e os liceus criados a partir de
seces deste primeiro liceu: o Liceu d. Filipa de Lencastre e o Liceu Rainha
d. Leonor; e ainda o Liceu infanta d. Maria em Coimbra e o Liceu Carolina Michaelis
no Porto.
As instalaes liceais so objecto de reforma em 1928, quando, por iniciativa
de duarte Pacheco, Ministro da instruo entre Abril e novembro de 1928, criada
a Junta Administrativa do Emprstimo para o Ensino Secundrio (JAEES; 1928-34),
dependente do Ministrio da instruo Pblica, responsvel pela administrao de
um emprstimo de 40 000 000$00 (por isso tambm conhecida como Junta dos
Quarenta Mil) contrado pelo Governo, destinado ao relanamento das obras de
construo do Liceu Maria Amlia Vaz de Carvalho, em Lisboa, e do Liceu Alexandre
Herculano, no Porto, iniciadas durante o regime republicano e entretanto
interrompidas; organizao dos concursos para a construo dos liceus de Beja,
de Coimbra e de Lamego, entre 1929 e 1931; aprovao do Liceu d. Filipa de
Lencastre em Lisboa, da autoria do arquitecto Carlos Ramos, e do Liceu Feminino
de Coimbra da autoria do arquitecto Cristino da Silva, respectivamente adiada e
abandonada; ao fornecimento de material didctico, mobilirio e postos
meteorolgicos para os liceus; realizao de obras de conservao nos liceus de
Aveiro, Vila Real, vora, Bragana, Guarda e Braga, edifcios no construdos de raiz.
A criao da JAEES permite centralizar num organismo administrativo todas
as obras referentes a edifcios liceu, promovendo a melhoria das suas condies
materiais. A administrao do emprstimo garantida por uma equipa que integrava,
entre outros, um arquitecto e um mdico, o que demonstra a importncia atribuda
ao planeamento e fiscalizao das obras pblicas e garantia do cumprimento das
exigncias relativas higiene e sade pblica nas novas construes.
Em 1933, a JAEES passa para a tutela do Ministrio das obras Pblicas e
Comunicaes (MoPC) e, em Agosto de 1934 (decreto-Lei n 24 337), substituda
pela Junta das Construes para o Ensino Tcnico e Secundrio (JCETS), integrada
no MoPC at 1969, altura em que foi extinta passando os seus recursos a integrar
21
a direco-Geral das Construes Escolares (dGCE)5. A nvel de competncias,
atribuda a esta nova entidade a responsabilidade do estudo e construo dos
novos edifcios destinados ao ensino liceal e tcnico.
Ainda relativamente ao ensino tcnico, em 1930-31 a reforma das Escolas
industriais e Comerciais de ensino elementar procura uniformizar os diversos tipos
de escola existentes, procedendo extino de parte delas e criando outras, entre
as quais a Escola de Artes decorativas Antnio Arroio, projectada em 1928 pelo
arquitecto norte Jnior, em Lisboa. Tambm no ensino mdio se procedem a
alteraes no sentido de desdobrar os institutos industriais e Comerciais de Lisboa
e Porto em institutos industriais e institutos Comerciais; e no ensino agrcola so
criadas as Escolas de Regentes Agrcolas.
Em 1936, o ministro Carneiro Pacheco procede a uma reforma no sector da
educao, com a inteno de se reforarem os objectivos ideolgicos e
pedaggicos do Estado novo. Salienta-se desta reforma a substituio do
Ministrio da instruo Pblica pelo Ministrio da Educao nacional (MEn); a
criao da Mocidade Portuguesa; a reforma dos currculos e programas escolares;
e a adopo do livro nico no ensino primrio6.
no mesmo ano, tambm o ensino liceal alvo de uma reforma que introduz
importantes alteraes no sistema vigente, e que vigorar, no essencial, at
dcada de 70. Em 14 de outubro de 1936 (decreto-Lei n 27 084), atribuda ao
ensino liceal a finalidade especfica de dotar os Portugueses de uma cultura
geral til para a vida. Esta clarificao do objectivo do ensino liceal veio simplificar
a organizao do currculo escolar, abandonando a distino entre Curso Geral e
Curso Complementar e a bifurcao do ensino em Letras e Cincias7. Em sua
substituio criado um curso liceal constitudo por sete agrupamentos anuais de
disciplinas, distribudo por trs ciclos: 1 ciclo, prtico e descritivo com a durao
de trs anos; 2 ciclo, terico e experimental com a durao de trs anos; e 3 ciclo,
destinado sistematizao de todos os conhecimentos adquiridos, com a durao
de um ano. os liceus onde so ministrados o curso completo passam a designar-
-se Nacional e os que ministram os dois primeiros ciclos, Provinciais. Este decreto
aprova, ainda, a cooperao da Mocidade Portuguesa com todos os liceus.
Em Abril de 1938 (decreto-Lei n 28 604) aprovado um importante plano de
construo, ampliao e melhoramentos dos edifcios liceu, englobando um
programa de trabalhos e respectivos encargos, cuja execuo foi da responsabilidade
da JCETS. Com o objectivo de retomar e ampliar a iniciativa de 1928, cujas verbas se
tinham esgotado em 1937, o programa de trabalhos, designado Plano de 38, incluiu
uma lista pormenorizada dos dez novos edifcios liceu a construir e dos liceus objecto
22
5 A dGCE foi criada por decreto-Lei n 49 169, de 24 de Julho de 1969, noMinistrio das obras Pblicas, cons-tituindo o organismo de fuso de vriasentidades responsveis pela construoescolar nos diversos ramos de ensino.
6 Gaspar, Jorge; Simes, Jos Manuel;Marin, Ana; As redes de equipamentoscolectivos in Medeiros, Carlos A. (dir.),Geografia de Portugal, volume 4 Planeamento e Ordenamento do Territ-rio. Lisboa, Crculo dos Leitores, 2006, p.107-165.
7 Em Setembro de 1941, Mrio Figueiredovai repor a distino entre Curso Geral eCurso Complementar e restituir ao 7 anodo curso liceal o carcter preparatriopara o ensino universitrio.
de ampliaes e melhoramentos. Este nmero revela-se, no entanto, insuficiente face
procura escolar que durante os anos 40 triplicou. A vitria dos pases aliados e a
reconstruo da Europa exigiram um nvel de competitividade e de padres
educativos mais elevados que est na origem do aumento da procura escolar que se
verifica aps a ii Guerra Mundial, tambm em Portugal.
A partir da dcada de 50, assiste-se a uma alterao das polticas
educacionais no sentido de combater o elevado ndice de analfabetismo, de
absentismo e de abandono escolar verificado nas escolas. As novas orientaes
polticas vo no sentido de fomentar a formao de recursos humanos qualificados,
dando um novo impulso a uma formao de base tcnica (1947); e de promover a
universalizao do ensino primrio e o cumprimento da escolaridade obrigatria,
atravs do Plano de Educao Popular (1952-55), e o seu realargamento para quatro
anos (1956). A educao encarada como condio determinante de
desenvolvimento econmico, seguindo as orientaes da teoria do capital
humano.8
A abertura de Portugal ao exterior, atravs da participao na Conferncia
Econmica para a organizao e Gesto do Plano Marshall, em Paris (1947-48),
revela-se fundamental na evoluo das orientaes que marcaram a educao a
partir dos anos 50, terminando com o isolamento que caracterizou o sistema
educativo dos anos 30 e 40. Permitiu o acesso, debate e intercmbio de informao
23
8 A teoria do capital humano tem origemnos estudos de Theodore W. Schultz(1902-1998) e difundida por Gary Beckerno final da dcada de 50. Atribu ao ensinouma nova finalidade, assumindo que ocrescimento econmico depende do nvelde qualificao da mo-de-obra.
Liceu de oeiras (actual Escola Secundria de Sebastio e Silva)
e de perspectivas que se revelaram essenciais concepo de polticas para a
qualificao de mo-de-obra nacional e consequente expanso da oferta escolar.
neste quadro de referncia que em 1947 dado um novo impulso ao
ensino secundrio. Com a publicao dos Estatutos do Ensino Liceal e Tcnico
(decreto-Lei n 37 029 e Lei n 2 025 de 19 de Junho), o ensino secundrio passa a
integrar duas vias distintas: o ensino liceal e o ensino tcnico. o ensino liceal,
orientado para o prosseguimento de estudos superiores, com uma durao de sete
anos, divididos em trs nveis, 1 ciclo (dois anos), 2 ciclo (trs anos) e curso
complementar (dois anos). o ensino tcnico, adaptado s exigncias de uma mo-
-de-obra qualificada, com um 1 grau constitudo por um Ciclo Preparatrio do
Ensino Tcnico Elementar e de Pr-aprendizagem Geral, de dois anos, ramo
paralelo ao 1 ciclo do ensino liceal, evitando a transio imediata da instruo
primria para os cursos profissionais; e um 2 grau, de Cursos de Aprendizagem,
Formao e Aperfeioamento Profissionais, com a durao mxima de quatro anos,
permitindo o acesso aos institutos Comerciais e industriais nas reas de servios,
formao feminina, indstria e Artes.
Estas reformas vieram acentuar a separao entre liceus e escolas tcnicas:
os primeiros funcionando como via de acesso privilegiada ao ensino universitrio e
as segundas visando a formao de mo-de-obra especializada e o acesso ao
ensino mdio.
o investimento atribudo ao ensino tcnico-profissional aps 1947, levou
construo de novos edifcios, em detrimento dos edifcios liceu. Logo em 1948,
com o decreto-Lei n 37 028, publicado um programa de construo de novos
edifcios bem como de remodelao e ampliao de edifcios existentes. A JCETS,
entidade responsvel pela sua concretizao, em colaborao com a direco-
Geral do Ensino Tcnico Profissional, define o programa de espaos a estabelecer
em cada escola, bem como as caractersticas especficas de cada. durante a dcada
de 50, assiste-se por todo o Pas a um incremento na construo de estabeleci-
mentos pblicos destinados ao ensino tcnico, para os graus elementar, mdio e
secundrio e para os ramos agrcola, industrial e comercial. So criadas escolas
tcnicas elementares, industriais, comerciais, industriais e comerciais, prticas de
agricultura, agro-industriais, de artes decorativas, e ainda as escolas de regentes
agrcolas, os institutos industriais e comerciais.
Em face do elevado nmero de edifcios a construir com caractersticas
semelhantes, e para acelerar o desenvolvimento da rede de escolas tcnicas a partir
do final da dcada de 40, a JCETS desenvolve um conjunto de estudos com vista
sistematizao de solues arquitectnicas que servissem de base aos projectos
24
das diferentes escolas tcnicas, facilitando, simultaneamente, a sua execuo
construtiva e o controlo administrativo do seu processo de concepo e
construo9.
data de 1947 o primeiro anteprojecto tipo da Escola Tcnica Elementar,
destinada ao Ciclo Preparatrio do Ensino Tcnico Elementar, cuja elaborao visou
o desenvolvimento de uma soluo construtiva economicamente favorvel e
adaptvel a terrenos com diferentes caractersticas topogrficas e de orientao.
A Escola Tcnica Elementar do Bairro de Alvalade, em Lisboa, foi a primeira destas
escolas a ser construda. Em 1950, o projecto-tipo elaborado para as escolas
tcnicas elementares foi alargado s escolas profissionais.
As premissas que orientam a concepo destes projectos iro estar na base
de concepo das escolas destinadas ao ensino tcnico profissional durante toda
a dcada de 50. o aumento do nmero de edifcios a construir, em especial o que
tem lugar com o plano de construo datado de 1960, exige uma nova resposta
por parte da JCETS, no sentido de dar cumprimento aos prazos de execuo.
Surge, assim, o primeiro Projecto Normalizado, em 1960, destinado concepo e
construo de escolas industriais e comerciais. A sua designao afirma a sua
aplicabilidade a todos os edifcios de igual programa e, simultaneamente,
referencia o princpio de modulao da estrutura construtiva e de elementos da
construo na sua concepo.
Este estudo de normalizao o primeiro de um conjunto de estudos que a
JCETS ir elaborar durante a dcada de 60, propondo e testando novos princpios
de concepo alternadamente em edifcios destinados a escolas tcnicas
profissionais e a edifcios liceu.
Quando o volume de trabalho assim o obrigava, os ateliers eram convidados
pelo MoP a desenvolver projectos de arquitectura escolar, como aconteceu, no
incio dos anos 60, com as Escolas Agro-industrial de Grndola e de Regentes
Agrcolas de vora, da autoria do arquitecto Manuel Tainha.
na dcada de 60, a sociedade portuguesa marcada por importantes
transformaes econmicas, sociais e culturais que, no seu conjunto, promovem a
formao individual como um factor de mobilidade social e de melhoria das
condies de vida. na origem desta transformao encontra-se a crescente
urbanizao do territrio e uma progressiva abertura ao mundo exterior; o aumento
de nvel de vida associado terciarizao do emprego; a valorizao dos diplomas
escolares, com reflexos ao nvel do escalonamento de salrio e factor de mobilidade
social; e o alargamento do mercado de profisses liberais originando a
desvalorizao relativa do capital patrimonial em favor do capital cultural/escolar.
25
9 Silva, Jos Costa; As construesescolares do ensino tcnico profissionalin Escolas Tcnicas, Boletim de Pedagogiae Didctica, n. 43, Lisboa, Ministrio daEducao nacional/direco-Geral doEnsino Tcnico Profissional, 1971, p. 291--301.
Assiste-se a um perodo de expanso da frequncia escolar, exigindo do sector
educativo novas orientaes polticas que dessem resposta ao crescente aumento
da populao escolar10.
Em 1959, o governo portugus assina com a organizao para a Cooperao
e desenvolvimento Econmico (oCdE) um contrato para um estudo no campo da
Educao. deste apoio internacional resulta o trabalho de investigao Projecto
Regional do Mediterrneo (PRM)11, centrado no estabelecimento do planeamento
de objectivos educacionais para um perodo de quinze anos, com o propsito de
repensar o sistema educativo de forma a melhorar a sua eficcia face s
necessidades de mo-de-obra qualificada impostas pelo modelo de
desenvolvimento econmico almejado.
A concretizao das propostas enunciadas no PRM implica um esforo
adicional no sector da construo escolar e no equipamento de novas instalaes
escolares, sobretudo ao nvel do ensino ps-primrio. Com efeito, parte do
investimento na Educao que o Governo se mostrava empenhado em executar
destinado concepo, construo e manuteno de instalaes escolares. nesta
estratgia adquirem particular importncia os estudos de investigao orientados
para a procura de solues que implicavam a utilizao mais eficaz dos meios
financeiros disponveis, atravs da pesquisa de novos modos de projectar e
construir.
26
10 Grcio, Rui; A expanso do sistema deensino e a movimentao estudantil inReis, Antnio (dir.), Portugal Contemporneo(1958-1974), volume 3 Declnio e quedado Estado Novo. Inovaes e contra-dies na estrutura econmica e social.Tempos de mudana na vida cultural.Valores e mentalidades em confronto.Lisboa, Edies Alfa, 1990, p. 221-258.
11 Este programa, da iniciativa do ministroLeite Pinto, para o perodo de 1960 a 1975,envolvia a ajuda tcnica e financeira daoCdE e foi estendido a outros pasesmediterrneos: Espanha, Grcia, itlia,Turquia e Jugoslvia.
Liceu de Rainha d. Leonor, Lisboa
Em dezembro de 1963, o MoP e o Ministrio da Educao nacional (MEn)
assinaram com a oCdE um contrato de investigao no campo da construo
escolar, por um perodo de dois anos. Para o efeito, forma-se o Grupo de Trabalho
Sobre Construes Escolares (GTSCE), integrado na JCETS. o objectivo principal
do GTSCE consiste no estabelecimento de normas para cada um dos tipos de
edifcios escolares, que simultaneamente se ajustassem s exigncias pedaggicas
ento em voga, e que fossem compatveis com os investimentos reservados
construo escolar, permitindo a obteno do maior rendimento possvel12.
As concluses deste grupo de trabalho revelam-se fundamentais para a
evoluo da arquitectura escolar em Portugal, em particular no que se refere ao
processo de produo (planeamento, programao, concepo e construo),
designadamente na adopo de novos conceitos, metodologias de trabalho,
regulamentao e tipologia arquitectnica.
A metodologia desenvolvida pelo GTSCE, para o estudo e construo de
projectos-piloto para edifcios escolares, evidencia dois aspectos fundamentais: por
um lado, permite testar as solues desenvolvidas, exigindo um aperfeioamento
de tcnicas construtivas e de organizao funcional; por outro, permite a ligao
do estudo dos projectos-piloto com o estabelecimento das normas gerais,
aplicveis a todos os edifcios escolares de cada tipo e grau de ensino, e a
determinao do limite de custo para os edifcios escolares. de facto, a
27
12 Grupo de Trabalho Sobre ConstruesEscolares (GTSCE); Organizao para aCooperao e o Desenvolvimento Econ-micos; Relatrio do 1 Contrato (31 deDezembro 1963 a 31 de Dezembro 1965),I Texto. Lisboa, Ministrio das obrasPblicas e Ministrio da Educaonacional, Junho 1966.
Liceu de Padre Antnio Vieira, Lisboa
concretizao destas normas em projectos-piloto ir permitir determinar, de modo
realista, os encargos econmicos dos mesmos; e, simultaneamente, possibilitar a
avaliao da aplicao das normas e sua correco.
os projectos-piloto ento desenvolvidos, a construir no concelho de Sintra,
integram trs situaes distintas: 1) Projecto-piloto para uma escola de Ensino
Primrio Elementar em Mem Martins para 160 alunos, sob coordenao da
arquitecta Maria do Carmo Matos; 2) Projecto-piloto do mobilirio escolar para o
edifcio de Mem Martins (como complemento do projecto anterior); e 3) Projecto-
-piloto da Escola do Ciclo Preparatrio do Ensino Secundrio em Mafra, para 704
alunos, sob coordenao do arquitecto Augusto Brando. Este ltimo no
construdo por apresentar uma soluo em que os espaos comuns eram
partilhados por ambos os sexos, prtica no autorizada na poca.
Entretanto, em 1958 (decreto-Lei n 41 572), lanado um plano de
construo de dezasseis novos edifcios liceu Plano de 58, a ser executado num
prazo de oito anos, pretendendo o governo resolver o problema da carncia de
edifcios liceu. os edifcios projectados no mbito deste Plano beneficiaram dos
conhecimentos e prticas experimentadas pelo GTSCE. A concretizao deste
plano reafirma o impulso e a prioridade atribuda ao ensino liceal, preterido na
dcada de 50 a favor do ensino tcnico-profissional.
A construo destes edifcios decorre durante toda a dcada de 60 e incio de
70 e caracteriza-se pela heterogeneidade das solues arquitectnicas. Verifica-se nos
28
Liceu nacional de Cascais (actual Escola secundria de S. Joo do Estoril)
projectos do Liceu Rainha d. Leonor, em Lisboa, concludo em 1961; do Liceu Padre
Antnio Vieira, concludo em 1965; do Liceu da Guarda, concludo em 1969; do Liceu
nacional de Cascais, concludo em 1968 e do Liceu d. Pedro V, concludo em 1970.
Em 1964, no cumprimento das recomendaes do PRM, o governo aumenta
o nmero de anos da escolaridade obrigatria de quatro para seis anos, para
ambos os sexos, passando o ensino primrio a compreender dois ciclos: elementar
(quatro classes) e complementar (duas classes). Manteve-se, no entanto, o 1 ciclo
do ensino secundrio (1 Ciclo do Ensino Liceal ou Ciclo Preparatrio do Ensino
Tcnico) para quem pretendia seguir o estudo liceal ou tcnico.
no mesmo ano, o ministro Galvo Teles cria o Centro de Estudos de
Pedagogia e Audiovisual. A importncia deste organismo no estudo, promoo e
realizao de cursos nas escolas com recurso a processos audiovisuais,
designadamente o cinema, a projeco fixa, o rdio, a gravao sonora e a
televiso, foi decisiva na alterao dos processos tradicionais de ensino-apren-
dizagem centrados no professor e num modelo expositivo.
tambm na dcada de 60 que se inicia a introduo de polticas e aces de
planeamento no sistema escolar portugus, como consequncia das recomendaes
do PRM e da criao do Gabinete de Estudos e Planeamento da Aco Educativa
(GEPAE), em 1965. A integrao de um captulo dedicado ao ensino e investigao no
Plano Intercalar de Fomento (1965-67), que se manteve no III Plano (1968-73) e no IV
Plano (1974-79), expressa esta preocupao com o planeamento no sector educativo.
29
Liceu de Afonso de Albuquerque, Guarda
Em 1967, assiste-se a uma nova alterao na poltica educacional. Em Janeiro
de 1967 (decreto-Lei n 47 480) criado o Ciclo Preparatrio do Ensino Secundrio
(CPES) que, fundindo o 1 Ciclo do Ensino Liceal e o Ciclo Preparatrio do Ensino
Tcnico, pretende completar e ampliar a formao de base obtida no ciclo
elementar do ensino primrio, em ordem a fornecer uma preparao geral
adequada ao prosseguimento dos estudos em qualquer ramo do ensino
secundrio; orientar os alunos na escola dos estudos subsequentes a partir da
observao de suas tendncias e aptides.
Conseguia-se, assim, adiar por dois anos a escolha entre curso liceal e curso
tcnico, quando os alunos com 12 ou 13 anos de idade estivessem mais seguros
das suas vocaes, e, em simultneo, preparar o prolongamento da escolaridade
obrigatria para seis anos. Este ciclo era ministrado em edifcios prprios, com
separao de sexos, tornando necessria a construo de edifcios escolares, um
por concelho.
A construo das Escolas Preparatrias do Ensino Secundrio (EPES)
envolveu a criao de uma equipa coordenada pelo arquitecto Augusto Brando,
integrada na JCETS, em colaborao com a direco de Servios do Ciclo
Preparatrio e com o apoio tcnico da empresa Profabril. Em 1968, esta equipa
desenvolve um projecto-tipo a ser implantado em diversas localidades do Pas.
Simultaneamente, Maria do Carmo Matos desenvolve o denominado Projecto
30
Escola Preparatria do Ensino Secundrio
Normalizado para Liceu-tipo, para a construo de edifcios liceu em diferentes
zonas do pais, listados no III Plano de Fomento. Estas escolas respondem
definio de diferentes tipologias de edifcios, criadas pelos novos princpios e
objectivos educacionais, originando grandes transformaes na sua concepo e
execuo apoiadas em novos sistema construtivos e materiais utilizados que
reflectiram uma reduo no seu custo.
Em 1970, Marcelo Caetano nomeou ministro da Educao Veiga Simo que
introduz no discurso poltico o conceito de democratizao do ensino13. no incio
de 1971 apresenta para discusso pblica dois projectos de reforma do sistema de
ensino Projecto de Sistema Escolar e Linhas Gerais da Reforma do Ensino Superior
que fundamentam as bases da sua reforma, assente no fomento da educao
pr-escolar, no prolongamento da escolaridade obrigatria, na reconverso do
ensino secundrio e na expanso e diversificao do ensino superior.
A reforma da educao de Veiga Simo inscreve-se num quadro poltico e
educativo instvel, associado a um perodo de transio e de profunda crise
acadmica e poltica, marcado pelo Maio de 1968 e as crises acadmicas que a
partir de 1969 se registam em Portugal. insere-se no movimento geral de reforma
dos sistemas educativos ento em curso na Europa, e beneficiou dos estudos
realizados, com o apoio da oCdE, sobre o sistema educativo portugus. Esta
reforma reflecte uma ideia de modernizao do sistema educativo ao promover a
democratizao do acesso ao ensino e a diversidade de oportunidades de
qualificao escolar.
Em Julho de 1973 aprovada a nova Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei
n 5/73) a que deveria obedecer a reforma do sistema educativo, destacando-se: a
institucionalizao da educao pr-escolar; a extenso da escolaridade obrigatria
de seis para oito anos; a polivalncia do ensino secundrio e acrscimo da sua
durao at ao 12 ano; a unificao do 1 ciclo deste nvel de ensino secundrio;
a estruturao da educao permanente e a consagrao do princpio da
democratizao do ensino. Relativamente ao sistema de ensino, este passaria a
abranger: o ensino bsico, obrigatrio, constitudo pelo ensino primrio (quatro
anos) e ensino preparatrio (quatro anos), e o ensino secundrio com dois ciclos
de dois anos cada. Com o 25 de Abril de 1974 esta reforma educativa no chegou
a ser executada.
os acontecimentos do 25 de Abril de 1974 e as consequentes
transformaes polticas, sociais e econmicas, repercutiram-se de modo
determinante no sistema de ensino nacional. A Constituio de 1976 consagra os
princpios de direito de igualdade de oportunidades de acesso e xito escolar,
31
13 Ambrsio, Teresa; o sistemaeducativo: ruptura, desestabilizao edesafios europeus in Reis, Antnio (dir.),Portugal Contemporneo (1974-1992),volume 4 A implantao do regime de-mocrtico e a descolonizao. A mo-dernizao da economia e da sociedade.A cultura em liberdade. Lisboa, EdiesAlfa, 1990, p. 281-290.
responsabilizando o Estado na criao de uma rede de estabelecimentos pblicos
que cubra as necessidades de toda a populao garantindo o ensino bsico,
universal, obrigatrio e gratuito.
Aps o perodo de instabilidade poltica sentida entre Abril de 1974 e Julho
de 1976, quando entra em funes o i Governo Constitucional, verificam-se duas
importantes alteraes na estrutura do ensino secundrio: a unificao do curso
geral, iniciada no ano lectivo de 1975-7614 , e a implantao de cursos
complementares de via nica para os dois ramos de ensino, em 1978.
A unificao do curso geral, com o objectivo social de igualizao de
oportunidades, visa igualmente a actualizao de processos e mtodos
pedaggicos, baseada na experincia dos 3 e 4 anos ps-ciclo preparatrio, e o
reforo da funo social da escola atravs da sua abertura comunidade. Em
outubro de 1978 procede-se reestruturao dos cursos complementares15
procurando-se, como se fizera no unificado, eliminar as duas vias existentes, com o
duplo objectivo de facultar o acesso ao ensino superior e de facilitar a insero dos
jovens na vida activa. Com a consolidao do ensino secundrio unificado a partir
de 1976 e aps a extino do ensino tcnico em 1975 assiste-se extino gradual
das instituies liceais.
Em Abril de 1978, a designao liceu abandonada definitivamente com o
decreto-Lei n 80/78, que estipula que todos os estabelecimentos do ensino
secundrio passam a ter a designao genrica de escolas secundrias. neste
contexto que se desenvolve o projecto do Liceu de Benfica (posteriormente Escola
Secundria Jos Gomes Ferreira) entre 1974 e 1978, da autoria do arquitecto
Hestnes Ferreira. ainda neste perodo que o arquitecto Manuel Tainha
desenvolve um dos primeiros projectos escolares destinados ao acolhimento do
ensino unificado a Escola Secundria Professor Herculano de Carvalho, em
Lisboa. o processo de concepo desta escola foi marcado pela pesquisa de
solues espaciais e funcionais que traduzissem as novas premissas curriculares e
educativas que caracterizaram a fase de transio do ensino liceal para o ensino
unificado.
o esforo colocado na expanso do equipamento escolar destinado ao
ensino secundrio, iniciado no final da dcada de 60, com o Estudo
Normalizado para o Liceu-tipo, retomado no final da dcada de 70 de modo
a dar resposta s necessidades efectivas do Pas. Uma equipa coordenada pela
arquitecta Maria do Carmo Matos e o engenheiro Victor Quadros Martins
desenvolve, na direco-Geral de Equipamentos Escolares (dGEE), tutelada
pelo Ministrio da Educao (ME), o Estudo Base para a Elaborao dos
32
14 Em 1976 entra em funcionamento o 7ano unificado; no ano seguinte, o 8 ano,e em 1978-79 o 9 ano unificado.
15 A estrutura dos cursos complementaresorganiza-se segundo cinco reas deestudo: cientfico-naturais, cientfico-tec-nolgicos, econmico-sociais, humansticose de artes visuais.
Projectos de Execuo de Instalaes para Escolas Preparatrias e Secundrias
(EPI-2) (1976-77). o estudo incluiu a definio de modelos de programao de
espaos e uma tipologia de escolas por nvel de ensino e por nmero de alunos,
visando sobretudo o recurso construo industrializada com a qual se
acreditava ser possvel baixar custos e tempos de execuo dos novos
estabelecimentos exigidos pelo alongamento do ensino obrigatrio e pela
necessidade de oferta em todo o territrio nacional.
Em 1978, a Direco-Geral das Construes Escolares (dGCE), sob tutela do
MoP, desenvolveu o conceito de Famlias de Solues, destinado concepo de
escolas preparatrias e secundrias.
no incio da dcada de 80 que, a par dos Planos Especiais de Construo
Escolar que recorrem a sistemas de construo industrializada, se desenvolve o
projecto-tipo, designado por 3x3, compacto ou monobloco, incorporando
elementos prefabricados, ligeiros e pesados.
A partir de 1986, na sequncia da publicao da Lei de Bases do Sistema
Educativo (Lei n 46/86, de 14 de outubro), o Ministrio da Educao assume em
exclusivo a responsabilidade pela construo escolar, passando as competncias
executivas para as direces regionais de Educao. o conhecimento acumulado
relativo aos projectos tipificados resultantes dos programas anteriores transferido
para as direces regionais que os continuam a aplicar para resolver situaes de
escolas novas.
33
Escola Secundria de Benfica, Lisboa (actual Escola Secundria de Jos Gomes Ferreira)
1.
edifciosPara o ensinoLiceaL
1.1.
os primeirosedifcios liceu:final da Monarquia e i repblica
1.1. Os primeiros edifcios liceu: final da Monarquia e I Repblica
no contexto das reformas de Jaime Moniz (1894-95) e de Eduardo
Coelho (1905) que so construdos os edifcios liceais das primeiras
dcada s do sculo xx. A sua concepo denota uma clara
influncia dos modelos franceses dos lyces construdos a partir
da segunda metade do sculo xix. Estes modelos so
reinterpretados pelos arquitectos portugueses1 nos edifcios liceais
que projectam, que se assumem como elementos estruturantes das novas reas
de expanso das cidades de Lisboa e Porto. Salientam-se, em Lisboa, o Liceu
Passos Manuel (1882-1911), do arquitecto Rosendo Carvalheira (projecto inicial de
Jos Lus Monteiro), e os liceus da autoria do arquitecto Miguel Ventura Terra, o
Liceu Cames (1907-09) e o Liceu Pedro nunes (1909-11), seguindo-se a construo
do Liceu Maria Amlia Vaz de Carvalho (1915-34); no Porto, da autoria do
arquitecto Jos Marques da Silva, o Liceu Alexandre Herculano (1914-31) e o Liceu
Rodrigues de Freitas (1918-33).
Estes projectos reflectem a importncia atribuda s questes pedaggicas
e higienistas emergentes no final do sculo xix. A nvel pedaggico so
consagrados o regime de classes, o semi-internato e o ensino activo e experimental;
as medidas higienistas traduzem-se na melhoria das condies de habitabilidade
do edifcio ao nvel da iluminao, do arejamento e da ventilao dos espaos
interiores, e na contemplao de espaos destinados prtica da Educao Fsica
no recinto do edifcio liceu.
semelhana do Lyce Lakanal (1882-85), de A. Baudot, e do Lyce Buffon
(1885-88), de . Vaudremer, a concepo destes liceus orientada pela concretizao
dos princpios que melhor servem a finalidade social deste equipamento pblico,
assentes na procura de uma economia da soluo e qualidade tcnica do edifcio,
na melhoria das condies de conforto e higienizao dos espaos, e na correcta
resoluo programtica do edifcio, que garantam as novas prticas pedaggicas
assentes no contacto com o espao exterior envolvente.
Paralelamente influncia parisiense, o processo de concepo dos edifcios
liceu acompanhou a poca de transio que caracterizou o incio do sculo em
Portugal, em que os valores tradicionais da arquitectura so confrontados com os
novos desafios na rea da construo e da aplicao de novos materiais. Em termos
urbanos, os edifcios liceu vo adaptar-se aos novos planos de urbanizao e de
melhoria da cidade ento projectados, contextualizando-os na sua envolvente
urbana e atribuindo-lhes, por vezes, um papel de elemento estruturador.
39
1 influncia adquirida por Jos Lus Mon-teiro, Miguel Ventura Terra e Jos Marquesda Silva aqu ando da sua estadia e forma-o em Paris, no final do sculo xix.
Liceu de Passos Manuel (1882-1911), Lisboa. Arquitectos Jos Lus Monteiro e
Rosendo Carvalheira
o perodo decorrente entre o incio da concepo do Liceu de Passos Manuel,
em 1882, com projecto de Jos Lus Monteiro, e a sua inaugurao, em 1911, com
projecto de Rosendo Carvalheira, foi marcado por sucessivas redefinies do
programa a implementar. Estas indefinies revelam um constante ajustar do
edifcio liceu a uma instituio que, tambm ela, se encontra em fase de definio,
quer na organizao escolar, quer dos seus objectivos e orientaes pedaggicas.
As respostas s exigncias pedaggicas, higinicas e econmicas evidenciam um
esforo colocado na qualificao funcional dos espaos, na simplificao do
desenho dos seus elementos, na introduo de novos processos construtivos e
materiais, mais econmicos e de execuo mais rpida.
Em Julho de 1881, nomeada uma comisso, presidida por Antnio
Augusto de Aguiar, que integra o arquitecto Jos Lus Monteiro, com a tarefa de
escolher o local, organizar o projecto e estudar o oramento para a construo
do edifcio destinado ao Liceu Central de Lisboa, futuro Liceu de Passos Manuel.
Perante a dificuldade de encontrar, na malha urbana de Lisboa, um terreno com
as condies ideais e disponvel para a construo de um liceu, e a urgncia em
se construir um equipamento desta natureza, foi aceite a sua implantao na
freguesia das Mercs, num lote que ocupa parte de um quarteiro de forma
40
Liceu de Passos Manuel, Lisboa
irregular, limitado a norte pela Rua da Academia das Cincias, a nascente pela
Rua do Sculo, a Sul pela Rua dos Poiais de So Bento e a Poente pela Travessa
do Convento de Jesus e Largo de Jesus, a partir do qual se acede ao lote onde
est o edifcio liceu.
o primeiro projecto desenvolvido pelo arquitecto Jos Lus Monteiro, em
1882, com uma planta de forma trapezoidal, reflectia a rea restrita e irregular do
lote. o edifcio organizava os diferentes espaos funcionais em torno de quatro
ptios interiores, o que garantia, simultaneamente, a existncia de espaos de
recreio e a iluminao e ventilao de todos os espaos do programa.
Em termos urbanos, a concepo do Liceu de Passos Manuel integrou o
projecto da abertura de novos arruamentos, contemplados nos planos urbansticos
para aquela zona da cidade, que permitiam a comunicao de importantes artrias
da cidade e facilitavam o acesso da populao ao futuro edifcio. Exceptuando a
rua a norte do edifcio liceu, nenhuma destas ligaes foi, no entanto, concretizada,
registando-se ainda hoje a difcil acessibilidade a esta escola.
Em dezembro de 1887, iniciam-se os trabalhos de construo, suspensos em
1888 pela direco das obras Pblicas. nesta data, a expropriao de dois prdios
adjacentes ao local permitiu a ampliao do terreno disponvel e a rectificao da planta
trapezoidal para rectangular, simplificando a construo e a correco da geometria dos
espaos interiores. Esta alterao, que implicou a inutilizao dos trabalhos de abertura
dos caboucos realizados, foi realizada por Raphael da Silva e Castro, arquitecto do
Ministrio das obras Pblicas (MoP) e responsvel pela construo da obra.
Com a morte deste arquitecto, a direco da obra entregue a Rosendo de
Carvalheira, tambm arquitecto do MoP, que ir apresentar um novo projecto para
o edifcio liceu em 1896, mantendo no essencial a estrutura espacial do projecto
primitivo referenciado tipologia colegial.
o projecto de 1896 apresenta uma planta simtrica que organiza
sequencialmente, no seu eixo central, a entrada principal, a escadaria de acesso
ao piso 1 com um zimbrio, o anfiteatro, o laboratrio qumico, e o volume do
ginsio destacado do edifcio principal. o anfiteatro tem acesso ao nvel do piso
de entrada e dos ptios, e o p-direito ocupa a altura total do edifcio; ao nvel do
piso 1, acede-se a uma galeria que contorna toda a sala. os quatro ptios (com
131m2) so divididos, no sentido norte/Sul, por este conjunto de espaos, e no,
sentido nascente/Poente, por recreios cobertos que incluem os sanitrios e galerias
de circulao e de ligao dos espaos centrais aos restantes espaos lectivos. As
salas de aula ocupam as alas nascente, Sul e Poente, constituindo a base de
programao referenciada a uma organizao pedaggica assente na classe.
41
Liceu de Passos Manuel, Lisboa
o sistema natural de ventilao dos diversos espaos do edifcio
conseguido atravs da distribuio de tubagens provenientes da caixa de ar
existente no piso inferior. A entrada de ar nas salas de aula garantida atravs de
amplas janelas existentes nos alados e de aberturas existentes junto aos
pavimentos, com dispositivos de regulao da entrada de ar; a renovao do ar
conseguida, em conjunto com o p-direito alto, atravs da existncia de bocas de
sada de ar para as galerias, localizadas junto ao tecto, e destas para os ptios ou
para o zimbrio, localizado no cruzamento das diversas galerias de comunicao.
na relao do edifcio liceu com a envolvente exterior, Rosendo Carvalheira
prope um muro de suporte a Poente, definindo simultaneamente o embasamento
do edifcio e o plano marginal da Travessa do Convento de Jesus. Para Sul,
regulariza a plataforma do ginsio, cota do piso inferior. Para nascente e Poente
prope rampas de ligao entre a plataforma do ginsio e a cota de entrada do
edifcio, a norte. proposta ainda uma escada que liga directamente a plataforma
do ginsio, a Sul, com a Travessa do Convento de Jesus. A rea conquistada com
as expropriaes ocupada com campos de jogos e com a casa do reitor.
Segundo o Parecer elaborado pelo Conselho Superior de obras Pblicas e
Minas, em novembro de 1896, este projecto encontrava-se em condies de ser
aprovado, com a introduo de pequenas alteraes que incluam a supresso do
zimbrio e sua substituio por um lanternim.
Em 1902, a direco Tcnica das Construes Escolares assume esta obra,
sendo responsvel pela organizao do projecto definitivo e do oramento para a
sua concluso. no mesmo ano nomeada uma comisso2 para rever o projecto de
1896, que, em Parecer de novembro de 1902, recomenda: a adaptao do edifcio
s necessidades do semi-internato e prope o dimensionamento das salas de aula
para turmas de um mximo de 40 alunos; a existncia de um grande ptio coberto
destinado permanncia dos alunos em dias chuvosos ou a refeitrio (no espao
do piso trreo destinado ao anfiteatro); a localizao do anfiteatro no primeiro piso,
sobre o espao destinado ao ptio coberto; a transformao dos quatro ptios em
apenas dois, pela sua juno dois a dois, no sentido norte/Sul; a substituio dos
vos existentes ao longo dos ptios por arcadas formando galerias exteriores; a
existncia de residncia no edifcio para empregados (porteiro, guardas e
contnuos); a construo de um gradeamento em redor do edifcio; e a separao
da habitao do reitor do edifcio principal. So ainda propostas algumas solues
construtivas no sentido de diminuir o custo total da construo, nomeadamente a
diminuio de cantarias, substituindo-as por tijolo vista, e redesenho dos vos
das janelas das fachadas.
42
2 Entre outras personalidades, estacomisso era composta pelo dr. RicardoJorge, inspector-geral de Sade Pblica,pelos dr. Antnio de Almeida dias e dr. S.Costa Sacadura, inspectores SanitriosEscolares, e pelos arquitectos RosendoCarvalheira, das obras Pblicas, e AdesBermudes, director das ConstruesEscolares.
Liceu de Passos Manuel, Lisboa
Em 1907, mais uma vez se interrompem os trabalhos de construo e, em
outubro do mesmo ano, Rosendo Carvalheira apresenta um novo projecto, no
sentido de tornar a construo menos onerosa, menos imponente e mais adaptada
s novas exigncias higinico-pedaggicas e de organizao dos liceus, expressa
na reforma de 1905.
o projecto final reflecte uma nova concepo espacial orientada para o
aumento dos espaos abertos de recreio dos alunos, acentuando a importncia do
desenvolvimento fsico em paralelo com o desenvolvimento intelectual dos jovens.
os dois ptios rectangulares aumentam o espao destinado ao recreio e formatura
dos alunos e na sua zona de ligao foi criado um recreio coberto com um
refeitrio para os lanches dos alunos.
A distribuio dos diferentes espaos do programa pelos diferentes pisos
do edifcio liceu, estabeleceu, no piso trreo, o aproveitamento de toda a ala Sul,
com 4m de p-direito, para a localizao de dois museus nos ngulos Sudeste e
Sudoeste do edifcio (mais tarde ocupados por balnerios e um ginsio) e a ligao
destes espaos aos pisos superiores atravs de um corredor de ligao a duas
caixas de escadas localizadas na fachada Sul. Ainda neste piso, para alm da grande
caixa de ar, localizaram-se as dependncias destinadas a residncia de empregados
do liceu, arrecadaes, postos do chefe de pessoal e outras dependncias menores.
nas fundaes j existentes, e afastado do edifcio principal, contemplou-se a
43
Liceu de Passos Manuel, Lisboa
instalao de um ginsio, cota do piso inferior do edifcio, e o prolongamento
vertical das suas paredes permitiu a instalao de um laboratrio de Qumica,
garantindo assim o isolamento necessrio do edifcio principal, mas estabelecendo
com ele acesso directo atravs do prolongamento do pavimento do recreio
coberto, no piso intermdio.
no piso intermdio, piso de entrada na fachada norte, localizam-se o
vestbulo, a partir do qual se acede ao interior do edifcio, a sala de espera, a casa
do porteiro, dependncias destinadas aos professores e funcionrios, gabinetes da
inspeco sanitria e assistncia mdica, salas de aula e a sala de desenho.
no corpo central encontra-se a escadaria para o piso superior e o recreio coberto,
os sanitrios, e permite o acesso ao laboratrio de Qumica. A importncia dada
ao ensino cientfico e experimental, consagrada na reforma de 1905, expressa na
atribuio de praticamente toda a ala nascente deste piso a espaos destinados
ao ensino da Fsica e da Electricidade.
no piso superior, localiza-se a sala de festas e reunies, ladeada pela sala de
professores e pelo gabinete do reitor; os restantes compartimentos destinam-se a
salas de desenho, salas de aula, sala de estudo, gabinetes e biblioteca e, sobre o
recreio coberto, o anfiteatro.
A nvel construtivo foram cumpridas todas as recomendaes propostas pelo
parecer de 1902: introduo de processos construtivos mais rpidos e econmicos,
como os pavimentos em cimento armado, que apresentam vantagens no
assentamento de diferentes revestimentos como o mosaico nas galerias e o soalho
de madeira nas salas de aula; estrutura de ferro para a cobertura; e reduo do
emprego de cantarias, limitadas ao corpo central e s guarnies dos vos,
substituindo-as por tijolo vista.
Liceu de Cames (1907-09), Lisboa. Arquitecto Miguel Ventura Terra
Em Julho de 1907, Joo Franco assina o decreto que autoriza o governo a
contrair junto da Caixa Geral de depsitos um emprstimo destinado aquisio
de terreno e construo do Liceu Central da 1 zona escolar, designado por Liceu
de Cames. o arquitecto Miguel Ventura Terra elabora o anteprojecto do edifcio,
cuja construo decorre entre Janeiro de 1908 e outubro de 1909. A concepo e
construo do Liceu de Cames destaca-se como modelo programtico e tipolgico
da arquitectura escolar em Portugal e constitui uma referncia relativamente aos
prazos (21 meses) e custos da sua execuo.
Localizado no primeiro troo das Avenidas novas, na zona de expanso de
Lisboa proposta no plano urbanstico de Ressano Garcia, o Liceu de Cames ocupa
44
Liceu de Passos Manuel, Lisboa
um lote com cerca de 15 000m2, limitado a Poente pela Praa Jos Fontana, a norte
pela Av. do Almirante Barroso, a nascente por propriedades particulares que o
separam da Rua de d. Estefnia, e a Sul pela Rua da Escola de Medicina Veterinria.
A sua localizao reflecte a tendncia para o afastamento dos edifcios liceu dos
centros urbanos que se verificou no incio do sculo xx, respondendo aos requisitos
de ordem higienista, que deveriam garantir reas abertas e salubres e permitir
futuras ampliaes.
Apesar das crticas sua localizao, o Liceu de Cames vai constituir-se como
elemento estruturador e motor de desenvolvimento urbano, ao consolidar o espao
pblico envolvente e estabelecer a continuidade do conjunto edificado, atravs
das fachadas principal e laterais. Esta ideia manifesta-se no desenvolvimento do
futuro Bairro de Cames, na relao que estabelece com o edifcio do Matadouro
Municipal e a Escola de Veterinria, e com o novo espao exterior pblico a actual
Praa Jos Fontana.
A opo conceptual de Ventura Terra, por dois ptios exteriores abertos,
ladeados por galerias exteriores de circulao de acesso aos diferentes espaos, e
a utilizao de novos materiais e acabamentos, como ferro, tijolo de vidro,
marmorite e mosaico, traduz as exigncias higienistas em voga.
A soluo do Liceu de Cames concretizou o programa de espaos (biblioteca,
museu, gabinete de Fsica e laboratrio de Qumica) e as indicaes propostas na
45
Liceu de Cames, Lisboa
Reforma de instruo Secundria de 1905, evidenciando-se a concepo de um
ambiente educativo capaz de promover a permanncia dos alunos dentro do
espao da escola.
o projecto do Liceu de Cames reinterpreta os modelos franceses dos lyces,
baseados numa racionalidade da organizao do programa de espaos que
expressa uma forte hierarquia programtica associada a uma funcionalidade de
cada uma das suas partes constituintes. Para o efeito, adoptado um sistema de
construo mais simples e flexvel, que recorre aos novos materiais, salientando-se
a sustentao da cobertura do ginsio atravs de delicadas asnas metlicas de
grande dimenso e a galeria metlica que envolve este espao.
Com o projecto para o Liceu de Cames, Miguel Ventura Terra ir propor um
edifcio-modelo que se caracterizar pela racionalidade e eficcia na soluo que
apresenta para a resoluo dos problemas da higiene, vigilncia, economia e conforto.
A tipologia em pente assume os ptios, agora abertos, como elementos
estruturantes na organizao dos espaos lectivos, e com funes de ventilao,
iluminao e comunicao. A planta organizada atravs de trs corpos
perpendiculares ao corpo principal, que compe a fachada principal do edifcio, e
definem, entre eles, dois ptios. no corpo central, para alm das reas
administrativas e o refeitrio, localiza-se o novo espao dos edifcios liceais o
ginsio , a eixo da entrada e de simetria de toda a composio, atribuindo-lhe
hierarquicamente uma posio de destaque. As duas alas laterais so ocupadas
com salas de aula normais, que constituem a unidade de modulao da
composio de todo o conjunto.
na fachada principal, de dois pisos, salienta-se o corpo central com mais um
piso destinado habitao do reitor, e os corpos mais altos que resolvem os
ngulos do edifcio. Existem nesta fachada trs acessos ao edifcio: a entrada
principal no corpo central, e duas entradas de acesso directo a cada um dos ptios,
localizadas entre o corpo central e os corpos que resolvem os ngulos do edifcio,
garantindo a distribuio separada dos diferentes ciclos no edifcio (classes 1, 2 e
3 na ala norte e classes 4, 5, 6 e 7 na ala Sul). Em termos funcionais, a introduo
destes acessos garante a autonomia dos dois ncleos destinados aos diferentes
ciclos liceais. Esta disposio espacial assegura assim uma funcionalidade de cada
parte constituinte, reforando a racionalidade e hierarquia presentes na organizao
do programa de espaos. no corpo central existe ainda uma porta de acesso
independente habitao do reitor.
A soluo abre os ptios exteriores a nascente, permitindo a iluminao e
ventilao das galerias exteriores cobertas localizadas no seu permetro e que
46
Liceu de Cames, Lisboa
permitem o acesso s diferentes salas de aula. As salas de aula orientam-se, assim,
para as fachadas Sul e norte, e os restantes espaos lectivos para Poente, em
contacto directo com a envolvente urbana: a norte, as instalaes de Fsica e
Qumica, para as classes mais avanadas, no corpo central o museu, a Sul, para
alm dos gabinetes de professores, a sala de conselho e a biblioteca.
da entrada principal do edifcio acede-se a um guarda-vento e ao trio do
edifcio liceu. a partir deste espao, de forma octogonal, que se comunica com
os servios administrativos, os dois ptios de recreio, o ginsio, e com dois ncleos
de escadas, simtricos, de acesso ao piso 1. o ginsio separa os dois ptios e
ladeado por uma galeria interior altura do piso 1. Subindo o ncleo de escadas
encontra-se um trio de acesso biblioteca (anteriormente museu), que desenha
o piso 1 do corpo central da fachada principal, e, para cada um dos lados
estendem-se as galerias que levam s salas de aula. o acesso s salas de aula do
piso 2 resolve-se tambm por escadas, acessveis a partir dos ptios, que se
localizam nos vrtices dos ngulos do edifcio.
na relao que estabelece com a cidade, Ventura Terra prope um edifcio
de volumetria compacta, recuado em relao ao limite exterior do lote, e que se
abre para o interior do quarteiro atravs dos ptios. Em 1927, a eixo destes ptios,
so construdos dois pavilhes destinados ao gabinete de Fsica, a Sul, e de
Qumica, a norte.
na dcada de 30 levado a cabo um conjunto de obras com vista melhoria
das condies das instalaes para acolher o regime de semi-internato e as
actividades circum e ps-escolares. Em 1931 inaugurada a cantina escolar; em
1933, atravs da construo de um muro de conteno e da sua terraplanagem,
ergueram-se dois campos de tnis, jardins, arruamentos alcatroados e um pomar e
regularizou-se a faixa de terreno a Sul, com cerca de 400m2, para a construo de
um campo de patinagem. Em 1935 o edifcio foi alvo de obras de renovao que
contemplaram a substituio de grande parte dos madeiramentos, estuques e
instalao elctrica e pintura interior e exterior.
Liceu de Pedro Nunes (1909-11), Lisboa. Arquitecto Miguel Ventura Terra
o processo de construo do Liceu de Pedro nunes surge associado criao
de uma zona escolar naquela zona da cidade e, em paralelo, a uma operao
urbana que permitiu a abertura da nova Avenida lvares Cabral. Em dezembro
de 1907, o Governo publica um decreto que prev a compra do terreno de
36 000m2 para instalao da 3 zona escolar (futuro Liceu de Pedro nunes), de uma
escola primria para os dois sexos, e de uma escola normal primria mista;
47
Liceu de Cames, Lisboa
considerava-se ainda a hiptese de se construir tambm uma escola industrial.
Para o edifcio liceu e seus anexos foram reservados 20 000m2 de um terreno
limitado a norte pela Rua Saraiva de Carvalho; a Sul, pelo Jardim da Estrela; a
nordeste, pelas traseiras de vrios prdios da Rua de Santa isabel; a Sudeste,
pela Avenida lvares Cabral; e a Poente, pelo Cemitrio dos inglesinhos.
As escolas primrias no foram construdas, e o liceu iria ceder parte dos seus
terrenos construo da Escola de Joo de deus e Escola industrial de Machado
de Castro, e Cmara Municipal de Lisboa, para abertura da Avenida lvares
Cabral.
o Liceu de Pedro nunes diferencia-se no panorama dos edifcios liceu
portugueses construdos no incio do sculo xx por apresentar um projecto
educativo cujos objectivos iniciais se orientavam para o ensino e a educao dos
alunos3, e que em 1930 viu as suas funes alargadas formao de professores.
Esta condio est na base da inteno, por parte dos professores, estagirios e
alunos, de fazer deste liceu um lugar de inovao e experimentao, tornando-o
um lugar de referncia no panorama educativo nacional. o projecto educativo
apoia-se nos princpios do auto-governo baseados nos princpios de autonomia e
responsabilidade associados educao, expressos na mensagem continua-
mente repetida pelo reitor S oliveira: Ns nos educaremos4. do conjunto
de experincias pedaggicas decorridas no Liceu Pedro nunes, salientam-se,
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3 Gomes, Fernanda Maria Veiga; LiceuPedro nunes, Lisboa in nvoa, Antnioe Santa-Clara, Ana Teresa (coord.), Liceusde Portugal, Histrias, Arquivos,Memrias. Porto, Edies ASA, outubro2003, p. 536.
4 Manifesta-se neste princpio a influnciado iderio do self-government, em vogadesde o incio do sculo xx, e divulgadoem Portugal pelos defensores daEducao Nova. A presena de AdolfoLima, defensor deste movimento, nocorpo docente deste liceu, veiocertamente contribuir para a valorizaoda autonomia no projecto educativodesenvolvido para o Liceu Pedro nunes.
Liceu de Pedro nunes, Lisboa
entre outras, o regime de semi-internato no perodo entre 1931-32 e 1942-43,
as sesses de cinema pedaggico introduzidas em 1936; o posto emissor de
rdio, que transmitia duas vezes por semana; e as conferncias pedaggicas
realizadas.
Ventura Terra substitui a tipologia adoptada no Liceu de Cames por um sistema
mais aberto para o exterior, que se aproxima da tipologia pavilhonar, dispondo trs
corpos autnomos linearmente no terreno de implantao, junto nova Avenida
lvares Cabral. os princpios associados tipologia em ptio, da centralidade e da
vigilncia, no encontram sentido num projecto educativo que apela responsabilidade
e autonomia na participao de um projecto comum. os distintos corpos permitem
a racional distribuio do programa de espaos, em que o edifcio principal acolhe
todas as funes de representao e administrao do liceu, bem como os espaos
dedicados prtica de Educao Fsica, e os corpos laterais acolhem os espaos
lectivos. Simultaneamente, os pavilhes autnomos permitem o cumprimento de todos
os requisitos higienistas ento reclamados. A nvel urbano, os pavilhes permitiam uma
melhor adaptao ao terreno, de acentuado declive para a avenida, em que o pavilho
central, implantado cota da avenida, desenha o seu limite.
a partir deste corpo central que se acede entrada principal do edifcio
liceu. neste corpo localizam-se, os servios administrativos, a biblioteca e a sala
dos professores, gabinetes de fsica e qumica, o grande ginsio/salo de festas,
49
Liceu de Pedro nunes, Lisboa
e, dois ginsios com os respectivos vestirios. A proposta assume a importncia
atribuda Educao Fsica pela colocao de trs ginsios no corpo nobre do
edifcio liceu o corpo central em contacto com a avenida. Esta ideia tambm
expressa na concepo da fachada principal, da qual se salientam os vos do
ginsio, cujo p-direito duplo permite o desenho de vos de grandes
dimenses, que ocupam os dois ltimos pisos do corpo central.
os corpos laterais, recuados e elevados em relao avenida, implantam-se
cota do piso 1 do corpo central, acedendo-se a eles atravs dos recreios em
contacto com as fachadas posteriores. Estes corpos, com trs pisos, surgem
recuados em relao ao corpo central, desenhando um jardim no terreno em
declive para a avenida. As diferentes salas de aula esto situadas nos dois primeiros
pavimentos de cada um dos corpos laterais, ao longo de amplos corredores de
circulao orientados para as fachadas posteriores. o terceiro piso do corpo a
Poente ocupado pelas instalaes de Cincias naturais, e o do corpo a nascente
pelas instalaes de Fsica. Todas as salas, excepto as que foram construdas para
sala de desenho e que se localizam nos topos dos pavilhes, tm janelas para o
exterior e para o corredor, permitindo a iluminao bilateral e a ventilao
transversal do seu espao interior.
os trs corpos, que no comunicam directamente entre si, so articulados
volumetricamente por dois corpos mais baixos de piso nico, onde se localizam, a
nascente, o anfiteatro de Fsica e, a poente, o anfiteatro de Qumica. Uma galeria
trrea com uma estrutura em ferro coberta de telha, circula ao longo das fachadas
posteriores, estabelecendo tambm a ligao ao corredor de acesso ao pavilho
do refeitrio e anexos, entretanto demolidos, situado no centro do ptio que
separava em dois o recreio.
os ptios do Liceu de Cames so aqui substitudos por espaos exteriores
abertos, dispostos ao longo
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