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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Programa de Pós-Graduação em Administração
Lidiene Silva Pesker Costa
DE PAI PARA FILHO:
a Natureza do Processo de Sucessão em Pequenas e Médias Empresas Familiares
Belo Horizonte
2013
Lidiene Silva Pesker Costa
DE PAI PARA FILHO:
a Natureza do Processo de Sucessão em Pequenas e Médias Empresas Familiares
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Administração da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre
em Administração.
Orientadora: Profª. Dra. Simone Costa Nunes.
Belo Horizonte
2013
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Costa, Lidiene Silva Pesker
C837p De pai para filho: a natureza do processo de sucessão em pequenas e médias
empresas familiares/ Lidiene Silva Pesker Costa. Belo Horizonte, 2013.
156f.: il.
Orientadora: Simone Costa Nunes
Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Administração.
1. Empresas familiares - Sucessão. 2. Pequenas e médias empresas. I. Nunes,
Simone Costa. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de
Pós-Graduação em Administração. III. Título.
CDU: 658.11
Lidiene Silva Pesker Costa
DE PAI PARA FILHO:
o processo de sucessão em pequenas e médias empresas familiares
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Administração da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre
em Administração.
___________________________________________________________________________
Orientadora Profª. Dra. Simone Costa Nunes (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)
___________________________________________________________________________
Profª. Dra. Liliane de Oliveira Guimarães (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)
___________________________________________________________________________
Profª. Dra. Denize Grzybovski (Pontifícia de Passo Fundo)
Belo Horizonte, 20 de Fevereiro de 2013
Ao meu amado marido, Lucas,
pelo amor, companheirismo, paciência
e apoio incondicionais.
Aos meus pais, Ersueli e Maria Augusta,
e meus irmãos, Eleine e Hérisson,
por serem meu porto seguro
e por acreditarem em meus ideais.
Aos meus sogros, Sérgio e Simone,
pela inspiração, investimento e
incentivo sempre presentes.
AGRADECIMENTOS
Ao longo do caminho para a realização desta dissertação, pude contar com o apoio,
tempo e carinho de várias pessoas e instituições, que tornaram possível a chegada ao final da
caminhada. Assim, deixo aqui registrado meus sinceros agradecimentos:
A Deus, dono da minha vida e Quem me capacita.
À Profa. Dr
a. Simone Nunes, pela dedicação na orientação, pela confiança, pelo
carinho, paciência e presteza com que me atendeu, sempre com observações pertinentes e
enriquecedoras, sendo indispensável sua participação na elaboração deste trabalho.
Às Profas
. Dras
. Denize Grzybovski e Liliane Guimarães, pela prontidão em aceitar o
convite para participarem da banca examinadora e pela disponibilidade de ler e criticar,
enriquecendo esta dissertação.
Aos colegas da turma de mestrado, pela convivência e aprendizado, especialmente a
Tatiana Almeida e Júnia Guerra, pelos ótimos momentos compartilhados, pela amizade,
companheirismo e por dividirem comigo tempos de trabalho árduo. Com vocês ao meu lado
ficou muito mais fácil.
Aos professores do programa, que foram essenciais nesta gratificante experiência que
foi o mestrado, por seus esforços em prol de nos transmitir conhecimento e conteúdos
importantes para o nosso desenvolvimento profissional e intelectual.
Aos funcionários Jaqueline, Cristiano e Paola, por estarem sempre prontos a nos
atender.
Agradeço de forma muito especial às empresas que abriram suas portas, personificadas
pelos fundadores, antecessores e herdeiros, que gentilmente nos concederam a oportunidade
de pesquisá-las e ofereceram parte do seu tempo para contribuir com suas experiências tão
essenciais para a viabilização desta pesquisa. Obrigada por contarem suas histórias, abrirem o
coração e pela confiança dispensada.
Ao Prof. Pedro Augusto Xavier de Assis, por ter sido um intermediador, abrindo
caminho para a realização da pesquisa em uma das empresas estudadas. Além disso, por ter
auxiliado na realização das entrevistas na referida empresa.
Ao bolsista Danilo Calsoni Gomes, pela colaboração na transcrição das entrevistas.
À Mariana Caroline de Almeida Faustino pelo apoio e por ter sido facilitadora no
contato com uma das empresas estudadas.
À Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), pela estrutura
disponibilizada e o ambiente agradável de trabalho e também pelo apoio financeiro concedido
por meio do Fundo de Incentivo à Pesquisa (FIP) ao projeto: “Oportunidades e desafios no
processo de sucessão de pequenas e médias empresas familiares do setor industrial de
Contagem”, do qual esta pesquisa fez parte.
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pelo
apoio financeiro concedido nos dois anos do curso.
“Ora Àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais
do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o Seu
poder que opera em nós, a Ele (Jesus Cristo) seja a
glória”.
Efésios 3:20 (Bíblia Sagrada).
RESUMO
O presente trabalho foi realizado com o objetivo de analisar o processo sucessório no contexto
das pequenas e médias empresas familiares que estão passando ou já passaram por uma
sucessão, enfocando as dificuldades encontradas e as oportunidades geradas. Procurou-se
entender como isso vem acontecendo nas empresas de menor porte, sabendo-se que este é um
ponto crítico para as organizações familiares e que muitas delas acabam morrendo na
transição entre a primeira e a terceira gerações (Allio, 2004; Gersick, Davis, Hampton &
Lansberg, 1997; Bjuggren & Sund, 2005; Pereira & Sousa, 2009). O trabalho originou-se da
curiosidade e da inquietação da pesquisadora com as altas taxas de mortalidade das empresas
familiares e com a necessidade de entender o processo sob as diversas perspectivas: a do
antecessor, do sucessor e da família. O referencial teórico baseou-se na revisão das diversas
definições dos conceitos de empresa familiar e a caracterização das mesmas; a descrição e
análise das pequenas e médias empresas; o processo de sucessão e as dificuldades e
oportunidades que podem emergir do mesmo. Para alcançar os objetivos propostos foi feito
um estudo multicaso de caráter qualitativo, utilizando como instrumento de coleta de dados
entrevistas semiestruturadas. Foram entrevistadas 19 pessoas de cinco empresas diferentes,
que foram escolhidas pela relação familiar com a empresa (fundador, antecessor ou sucessor).
No decorrer do trabalho, foi possível entender melhor a natureza da sucessão em pequenas e
médias empresas familiares, comparando suas experiências com os pressupostos teóricos
estudados. Observou-se que a falta de planejamento formal da sucessão é uma realidade nas
pequenas e médias empresas familiares, sendo este um processo mais intuitivo desencadeado
por acontecimentos naturais da dinâmica da família e do cotidiano da empresa. Mesmo sem
este planejamento formal, sem que os antecessores se preparem para a sua saída e sem outros
requisitos encontrados na literatura como sendo determinantes para o sucesso na passagem de
gerações, as empresas estudadas têm conseguido vencer essa fase e passar pela ação
sucessória sem maiores riscos à sua sobrevivência. Observou-se que algumas dificuldades
poderiam ser evitadas se certas medidas fossem tomadas, mas, de modo geral, concluiu-se que
justamente pelas peculiaridades das pequenas e médias empresas, que não exigem grandes
estruturas ou formalização dos processos, as sucessões aconteceram e ainda trouxeram
oportunidades de crescimento para as organizações.
Palavras-chave: Empresa familiar. Sucessão. Pequenas e médias empresas.
ABSTRACT
The present study purpose was analyze the nature of the succession process in the context of
small and medium-sized family businesses that are going through or have gone through a
succession, focusing on the difficulties and opportunities envolved. We sought to understand
how the process has been going on in smaller companies, knowing that this is a critical issue
for organizations and families that many of them end up dying in the transition between the
first and third generation (Allio, 2004; Gersick, Davis, Hampton & Lansberg, 1997; Bjuggren
& Sund, 2005; Pereira & Sousa, 2009). The work grew out of curiosity and restlessness of the
researcher with the high mortality rates of family businesses that are so important
economically and socially as well as the need to understand the process from different
perspectives, that of the predecessor and the successor of the family. The theoretical
framework was based on the review of the definitions of family business and characterization
it self, the description and analysis of small and medium enterprises, the succession process
and the difficulties and opportunities that may emerge from it. To achieve the proposed
objectives was made a qualitative study with multiple cases, using as an instrument for data
collection semi-structured interviews. We interviewed nineteen people from five different
companies that were chosen by the family relationship with the company (founder,
predecessor or successor). During the work, we could better understand the nature of the
succession process in small and medium-sized family businesses, comparing their experiences
with the theoretical study. It was observed that the lack of formal succession planning is a
reality in small and medium-sized family businesses, which is a more intuitive process
triggered by natural events in the dynamics of family and daily life of the company. Even
without this formal planning without the predecessors to prepare for his departure and no
other requirements found in the literature as being crucial to success in the passage of
generations, the studied companies have achieved through this phase and go through probate
action without major risks to their survival. It was observed that some difficulties could be
avoided if certain measures were taken, but in general, it was concluded that precisely
because of the peculiarities of small and medium enterprises, which do not require large
structures or formalization of processes, succession happened and even brought growth
opportunities for organizations.
Key words: Family business. Succession. Small and medium-sized enterprises.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Genetograma Alimentar .......................................................................................... 57
Figura 2 - Genetograma Educar................................................................................................ 65
Figura 3 - Genetograma Medicar - 1 ........................................................................................ 76
Figura 4 - Genetograma Medicar – 2........................................................................................ 78
Figura 5 - Genetograma Adoçar ............................................................................................... 92
Figura 6 - Genetograma Transportar ........................................................................................ 97
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Enfoques dos estudos sobre sucessão .................................................................... 21
Quadro 2 - Definições de empresa familiar .............................................................................. 27
Quadro 3 - Pontos fortes e pontos fracos das empresas familiares, segundo administradores. 29
Quadro 4 - Pontos fortes e pontos fracos das empresas familiares, segundo administradores
profissionais .............................................................................................................................. 30
Quadro 5 - Definição de pequenas e médias empresas ............................................................ 32
Quadro 6 - Relação dos entrevistados ...................................................................................... 52
Quadro 7 - Categorias de análise .............................................................................................. 55
Quadro 8 - Divisão acionária da Transportar ........................................................................... 99
Quadro 9 - Síntese da categoria: sucessão .............................................................................. 105
Quadro 10 - Síntese da categoria: o antecessor ...................................................................... 109
Quadro 11 - Síntese da categoria: o sucessor ......................................................................... 114
Quadro 12 - Síntese da categoria: a família ............................................................................ 118
Quadro 13 - Síntese da categoria: dificuldades ...................................................................... 129
Quadro 14 - Síntese da categoria: oportunidades ................................................................... 132
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Distribuição anual e por meio de divulgação .......................................................... 19
Tabela 2 - Temas estudados sobre empresas familiares ........................................................... 20
LISTA DE SIGLAS
3Es - Encontro de Estudos em Estratégia
ANPAD - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CEO - Chief Executive Officer
EnADI - Encontro de Administração da Informação
EnANPAD - Encontro da ANPAD
EnEO - Encontro de Estudos Organizacionais
EnEPQ - Encontro de Ensino e Pesquisa em Administração e Contabilidade
EnGPR - Encontro de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho
FAPEMIG - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IRPF - Imposto de Renda de Pessoa Física
PIB - Produto Interno Bruto
PMEs - Pequenas e Médias Empresas
PUC-MINAS - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
PwC - Pricewaterhouse Coopers
RH - Recursos Humanos
ROB - Receita Operacional Bruta
SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SUMÁRIO1
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 15
2 REFERENCIAL TEÓRICO .......................................................................................... 24
2.1 Empresas familiares ...................................................................................................... 24
2.2 As empresas de pequeno e médio porte....................................................................... 30
2.3 O processo de sucessão ................................................................................................. 34
2.4 Dificuldades e/ou oportunidades que podem surgir no processo sucessório ........... 39
2.4.1 O antecessor ................................................................................................................. 39
2.4.2 O sucessor .................................................................................................................... 41
2.4.3 Profissionalização da empresa .................................................................................... 43
2.4.4 Planejamento sucessório ............................................................................................. 45
3 METODOLOGIA DE PESQUISA ................................................................................ 46
3.1 Estratégia e método de pesquisa .................................................................................. 46
3.2 Unidades empíricas de análise ..................................................................................... 49
3.3 Estratégia de coleta de dados ....................................................................................... 51
3.4 Estratégia de análise de dados ..................................................................................... 53
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ........................................................... 56
4.1 Descrição do caso: ALIMENTAR ............................................................................... 56
4.2 Descrição do caso: EDUCAR ....................................................................................... 64
4.3 Descrição do caso: MEDICAR ..................................................................................... 75
4.4 Descrição do caso: ADOÇAR ....................................................................................... 84
4.5 Descrição do caso: TRANSPORTAR .......................................................................... 94
4.6 Análise conjunta dos casos ......................................................................................... 104
4.6.1 Sucessão ..................................................................................................................... 104
4.6.2 O antecessor ............................................................................................................... 105
4.6.3 O sucessor .................................................................................................................. 110
4.6.4 A família ..................................................................................................................... 115
4.6.5 Dificuldades ............................................................................................................... 118
4.6.6 Oportunidades ............................................................................................................ 130
5 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 133
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 138
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA: SUCEDIDO ....................................... 145
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA: HERDEIRO ....................................... 146
APÊNDICE C – ANÁLISE CONJUNTA DOS CASOS – RESUMO COMPARATIVO
ENTRE AS EMPRESAS ..................................................................................................... 147
1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo Ortográfico
assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil
desde 2009. E foi formatado de acordo com o Padrão Puc Minas de Normalização, 2011.
15
1 INTRODUÇÃO
A presente dissertação foi escrita com o intuito de conhecer mais de perto o processo
de sucessão no contexto das organizações familiares de pequeno e médio porte, partindo-se do
pressuposto de que ele é decisivo para a sobrevivência de tais empresas, conforme Morris,
Williams, Allen and Avila (1997); Le Breton-Miller, Miller and Steier (2004) e Wang,
Watkins, Harris and Spicer (2004). Além disso, sabe-se que a mais alta taxa de mortalidade
dos negócios gerenciados por famílias ocorre na transição entre a primeira e a terceira geração
(Allio, 2004; Gersick, Davis, Hampton & Lansberg, 1997; Bjuggren & Sund, 2005; Pereira &
Sousa, 2009). Para tal, realizou-se pesquisa multicaso, analisando cinco empresas familiares
de pequeno e médio porte que estivessem passando pela sucessão ou que já tinham finalizado
com sucesso a transição, uma vez que a propriedade e a gestão ainda estavam sob o comando
da família fundadora.
Entre as razões que motivaram a presente pesquisa, pode-se destacar, em primeiro
lugar, a curiosidade da pesquisadora, aguçada pela convivência com uma família proprietária
de empresa que deseja fazer a sucessão em médio prazo. Casada com um sucessor da segunda
geração e partilhando de diversas conversas com os sócios fundadores sobre o tema, algumas
dúvidas foram levantadas a respeito de como conduzir uma sucessão em uma empresa de
menor porte, de forma a aumentar as chances de sucesso.
Outro aspecto motivador do estudo está relacionado ao valor das empresas familiares
demonstrado não só pelos benefícios que elas trazem à sociedade, mas especialmente pela
expressividade em relação à composição do tecido empresarial e econômico mundial
(Chrisman, Chua & Steier, 2003; Grzybovski, 2007; Lee, 2006). Segundo dados apresentados
no site do Family Firm Institute (2012), em nível global empresas controladas e administradas
por famílias são responsáveis por 70 a 90% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. No
Brasil, a maioria das empresas é de propriedade familiar e o país é o lar de pelo menos 20
organizações de mais de um século de idade que estão sob o comando da quarta ou quinta
geração. No Canadá, cerca de metade da força de trabalho é empregada por empresas
familiares que geram quase 45% do PIB. Nos Estados Unidos essas organizações são
responsáveis pela maior parte da riqueza, constituindo 80 a 90% do total de negócios
existentes no país, contribuindo com 64% do PIB e empregando 62% da mão de obra.
As organizações familiares participam ativamente no crescimento do país, também
pela sua contribuição na criação de novos empregos, incubação de novos negócios, promoção
de atividades empresariais e desenvolvimento econômico de pequenas regiões (Astrachan,
16
Zahra & Sharma, 2003; Grzybovski, 2007; Heck & Stafford, 2001; Teixeira, Toso, &
Grzybovski, 2009). Dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
(SEBRAE) mostram que até 2005 existiam funcionando no Brasil aproximadamente 6 a 8
milhões de empresas e que 90% delas eram familiares. Pode-se observar, ainda, no país,
diversos perfis de empresas – indo das pequenas padarias ou tinturarias às grandes
corporações, como os grupos Votorantin e Pão de Açúcar – juntas essas organizações
somavam mais de 12 milhões de empregos diretos e a participação no PIB chegava a ser de
12% no segmento agrobusiness, 34% na indústria e 54% nos serviços (Serviço Brasileiro de
Apoio às Micro e Pequenas Empresas, 2005).
A partir desses dados pode-se constatar que a empresa familiar, pela natureza do seu
negócio e por sua representatividade econômica, demanda esforços constantes de pesquisa a
fim de se chegar a mais esclarecimentos sobre suas peculiaridades e de contribuir com seu
desenvolvimento. A literatura sobre o assunto concentra altas doses de atenção sobre os
desafios específicos que permeiam essas organizações, tais como os aspectos relacionados à
interação família e empresa, à profissionalização, aos conflitos entre os sócios, à governança,
à cultura; mas, de forma notória, um dos problemas centrais que assolam essas organizações é
a capacidade de manter a liderança da família ao longo das gerações (Le Breton-Miller et al.,
2004).
O terceiro aspecto que motivou a presente pesquisa foi, portanto, a constatação, com
base em leitura de artigos e livros, da importância da sucessão para essas empresas. No Brasil
e no mundo, um dos tópicos mais pesquisados sobre as organizações familiares diz respeito à
sua sobrevivência em longo prazo, tendo as famílias proprietárias a preocupação em assegurar
a continuidade dos seus negócios como forma de garantir o conforto e a prosperidade das
próximas gerações (Le Breton-Miller et al., 2004; Morris et al., 1997; Wang et al., 2004).
Apesar da representatividade, existe um problema relacionado às organizações
familiares que diz respeito ao alto nível de mortalidade observado entre elas. A preocupação é
que, mesmo diante de tantos números positivos, um estudo feito pela Pricewaterhouse
Coopers (PwC) em 2010 com empresas familiares atuando em diversos setores da economia
em 35 países constatou que 36% das empresas sobrevivem à passagem para a segunda
geração; 19%, para a terceira; 7%, para a quarta; e apenas 5%, para a quinta ou mais gerações.
Nos Estados Unidos, estima-se que 30% das empresas familiares sobrevivem à mudança para
a segunda geração, cerca de 12% passam para a terceira e apenas 3% passam para a quarta
geração. No Brasil, os números são semelhantes e apenas 5% das empresas familiares têm
chegado à terceira geração.
17
Os números sugerem que muitas não conseguem resistir a esse processo ou, se
atravessam, é com certa dificuldade. Fazer com que um empreendimento continue próspero,
competitivo e com perspectivas de crescimento após ser transferido para uma nova geração de
comando da família tornou-se um desafio a ser enfrentado, uma vez que é alto o número de
empresas extintas ou vendidas durante esse processo (Gersick et al., 1997).
A sucessão é o momento de transferência do poder da geração atuante para aquela que
assumirá a empresa. Ela pode ocorrer de forma lenta, planejada e em longo prazo, como
também de forma inesperada, por motivos que levam o atual dirigente a sair repentinamente
dos negócios (morte, doença, acidente) (Leone, 2005). Embora a sucessão seja altamente
relevante para a continuidade dos negócios e sobrevivência das empresas familiares, ela pode
vir a ser traumática, caso não seja conduzida de maneira racional e eficaz. É necessário que tal
processo seja cuidadosa e racionalmente planejado, considerando-se a vasta gama de fatores
que o atingem (Estol & Ferreira, 2006).
Até o presente momento, muitas pesquisas da área de administração nas escolas de
negócios vinham ignorando a dimensão familiar das empresas, o que é surpreendente, visto
que a maioria das organizações em todo o mundo é familiar (Heck, Hoy, Poutziouris & Steier,
2008). O interesse dos autores pelas particularidades das organizações denominadas
familiares nos estudos da teoria das organizações vem evoluindo nas últimas três décadas.
Começou devagar e um pouco desconexo, mas tem apresentado acelerado crescimento desde
meados da década de 2000 (Heck et al., 2008). Esse segmento peculiar de empresas está
ganhando espaço nas discussões acadêmicas e no mundo prático dos negócios, no qual se
procura compreender a complexa dinâmica da relação entre família e empresa (Debicki,
Matherne III, Kellermanns & Chrisman, 2009).
Existe no meio internacional uma boa perspectiva de que as organizações familiares se
tornem cada vez mais um campo acadêmico respeitado nas pesquisas em universidades.
Desde a década de 1980 ela vem se destacando como uma área independente nos estudos
organizacionais e vem despertando mais interesse dos pesquisadores (Bird, Welsch,
Astrachan & Pistrui, 2002; Astrachan, 2010). Esse interesse pode ser demonstrado, sobretudo,
quando se observa o crescente volume de produções científicas do campo. Nos Estados
Unidos, por exemplo, pode ser visto expressivo aumento de artigos sendo publicados na
revista Academy of Management, que é uma referência na área (Debicki et al., 2009; Stewart
& Miner, 2011).
No Brasil também existe interesse crescente em se compreender a natureza dessas
organizações. Muitas pesquisas têm sido desenvolvidas buscando a formulação de teorias,
18
geração de conhecimento e proposição de alternativas aos problemas intrínsecos a esse tipo de
negócio. Entretanto, sabe-se que o campo de estudos também é relativamente novo no país e
foi ignorado por muitas décadas, principalmente no meio acadêmico, que mostrou certa
resistência a reconhecer o universo familiar no ambiente organizacional e enfatizar a
importância do estudo de algumas especificidades relacionadas a aspectos menos objetivos
como os valores, a cultura e a influência da família nos negócios (Bird et al., 2002; Borges,
Lescura & Oliveira, 2010).
As pesquisas brasileiras datam do início da década de 1990, sendo João Bosco Lodi e
Renato Bernhoeft dois dos autores pioneiros na área. O campo surgiu a partir de trabalhos
resultantes de consultoria que tinham como foco os problemas vivenciados pelas organizações
ao longo dos processos de sucessão (Grzybovski, 2007). A partir de 1999 ocorreu gradativo
crescimento do volume de trabalhos publicados, tendo mais destaque e espaço em eventos
científicos da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração
(ANPAD) (Borges et al., 2010).
Como foi dito anteriormente, a questão da sucessão, desde os primórdios dos estudos
sobre empresas familiares, vem sendo a principal preocupação de pesquisadores, consultores e
donos de empresa. No entanto, embora intensamente avaliada, a pesquisa ainda permanece
fragmentada em seu foco e resultados (Bird et al., 2002; Chrisman, Chua & Sharma, 2003;
Grzybovski, 2007). Os estudos são direcionados para as diferentes partes de um processo que
é mais amplo, em que cada autor procura focar aquilo que julga ser a parte mais importante,
mas que, na verdade, é relativamente pequena se o problema for olhado como um todo
(Chrisman et al., 2003; Le Breton-Miller et al., 2004).
Le Breton-Miller et al. (2004) realizaram uma pesquisa que exemplifica essa dispersão
dos estudos sobre sucessão no âmbito internacional, examinando mais de 40 artigos e sete
livros que tratavam sobre o assunto. Em um resumo dos achados mais comuns entre as
publicações, um dos temas recorrentes relativos à sucessão diz respeito aos antecessores e
seus atributos, como motivação e vontade de trabalhar, relacionamento com o sucessor,
personalidade e necessidades. Outro tema também recorrente foi o sucessor, enfatizando-se da
mesma forma sua relação com o antecessor, motivação, interesse, compromisso e capacidade
de gestão. Depois aparecem pesquisas sobre a formação do sucessor, desenvolvimento de
carreira fora da empresa familiar, qualidade das relações familiares, colaboração, trabalho em
equipe, relacionamento entre irmãos, planejamento sucessório e conselho de administração.
Todos esses assuntos, segundo os autores, são parte do esforço de se delimitar os aspectos
importantes para uma boa sucessão, que podem facilitar ou dificultar o processo.
19
Assim como no meio internacional, as pesquisas no Brasil estão sendo feitas a partir
de diversas abordagens teórico-conceituais. Tal diversidade mostra vasta gama de campos
temáticos a serem investigados, mas, ao mesmo tempo, pode demonstrar falta de foco nas
investigações e dispersão dos esforços dos pesquisadores, não permitindo que contribuições
teóricas mais robustas e aprofundadas surjam para o avanço da área (Grzybovski, 2007).
Para fins deste estudo, realizou-se pesquisa bibliográfica na qual foi feito um
levantamento dos trabalhos publicados no Brasil sobre empresas familiares em anais de
eventos científicos da ANPAD2 e em diversos periódicos
3 importantes que apresentam
produção relevante no campo, no período compreendido entre 2000 e 2011.
A fim de identificar como foi a evolução das publicações ao longo do período em
relação ao número de artigos e também averiguar em qual meio de divulgação existem mais
trabalhos apresentados sobre o tema, apresenta-se, a seguir, a Tabela 1, que mostra a
distribuição anual e por meio de divulgação dos mesmos.
Tabela 1 - Distribuição anual e por meio de divulgação
Ano Eventos Periódicos
Quantidade % Quantidade %
2000 2 2,4 5 23,8
2001 2 2,4 0 0
2002 2 2,4 3 14,3
2003 3 3,6 1 4,8
2004 6 7,1 0 0
2005 5 6,0 2 9,5
2006 12 14,3 4 19,0
2007 8 9,5 0 0
2008 19 22,6 3 14,3
2009
2010
5
11
6,0
13,1
2
1
9,5
4,8
2011 9 10,7 0 0
TOTAL 84 100 21 100
Fonte: Elaborado pela autora.
2Anais de eventos científicos da ANPAD pesquisados: Encontro da ANPAD (EnANPAD); Encontro de Estudos
Organizacionais (EnEO); Encontro de Estudos em Estratégia (3Es); Encontro de Administração da Informação
(EnADI); Encontro de Ensino e Pesquisa em Administração e Contabilidade (EnEPQ); Encontro de Gestão de
Pessoas e Relações de Trabalho (EnGPR). 3Periódicos pesquisados: Revista de Administração de Empresas (RAE/EAESP-FGV); Revista de Administração
de Empresas Eletrônica (RAE-e/EAESP-FGV); Revista de Administração Contemporânea (RAC/ANPAD);
Revista de Administração (RAUSP/USP); Revista de Administração Mackenzie (RAM/Mackenzie); Revista
Eletrônica de Administração (REAd/UFRGS); Revista Organizações & Sociedade (O&S/UFBA)
20
Ao analisar a tabela, é possível observar que a maior parte dos trabalhos foi publicada
em eventos científicos, nos quais foram encontradas 84 publicações, contra 21 em periódicos.
Em relação à evolução ao longo do período de 11 anos considerado, os dados mostram que as
pesquisas sobre empresas familiares até o ano 2005 ainda eram um pouco tímidas, passando a
ter mais representatividade a partir de 2006, nos eventos científicos, com destaque em 2008,
quando foi encontrado o maior número de artigos publicados. Assim, é possível averiguar que
o interesse pelo tema no Brasil é crescente, mostrando a importância do estudo para a área de
Administração. O incremento do volume de artigos demonstra uma possível consolidação do
campo no cenário brasileiro (Borges et al., 2010).
Uma questão essencial sobre a produção científica do campo de estudos que foi
investigada nesta pesquisa bibliográfica refere-se às abordagens temáticas encontradas nos
diversos trabalhos publicados. A partir da análise dos artigos selecionados foi possível
identificar os temas trabalhados, demonstrando aqueles que aparecem de forma mais
recorrente e aqueles que ainda não são tão explorados (TAB. 2).
Tabela 2 - Temas estudados sobre empresas familiares
(continua)
Temas Quantidade %
Sucessão 40 38,1
Cultura 8 7,6
Governança 8 7,6
Estratégia 6 5,7
Representações Sociais / Familiares 6 5,7
Práticas Gerenciais 5 4,8
Produção Científica sobre Empresas
Familiares 5 4,8
Família 4 3,8
Crescimento e Desenvolvimento 3 2,9
Finanças
Comprometimento Organizacional
3
2
2,9
2,9
Gênero 2 2,9
Gestão do Conhecimento 2 2,9
Ciclo de Vida 2 2,9
Aprendizagem 1 1,0
Teoria da Agência 1 1,0
Empreendedorismo 1 1,0
Mudança Organizacional 1 1,0
21
(conclusão)
Temas Quantidade %
Relações de Poder 1 1,0
Teoria Institucional 1 1,0
Profissionalização 1 1,0
Controle 1 1,0
Teoria da Ação Comunicativa 1 1,0
TOTAL 105 100
Fonte: Elaborado pela autora.
Entre as abordagens temáticas mais estudadas no campo de empresas familiares, pode-
se reafirmar que o tema de mais destaque é a sucessão, tanto em eventos científicos quanto em
periódicos, estando presente em 40 trabalhos, representando 38,1% do total. Diante do
conjunto de dados, mais uma vez se confirma a relevância da questão da sucessão nos estudos
da área. Porém, o que se observou foi que o processo sucessório tem sido estudado sob uma
ótica muito diversificada, contribuindo para a falta de aprofundamento e impossibilidade de
conclusões mais concretas sobre o tema. Nos 40 artigos encontrados que tratam sobre
sucessão, ainda foi feita a investigação das diversas abordagens existentes, identificando-se 26
enfoques diferentes (QUADRO 1).
Quadro 1 - Enfoques dos estudos sobre sucessão
(continua)
No Enfoques Quantidade
1 O processo sucessório 8
2 Relações de poder / dominação existentes em um processo de
sucessão 4
3 Influência dos valores familiares e da cultura organizacional sobre o
processo de sucessão 3
4 Inserção / exclusão da mulher no processo sucessório 2
5 Vínculos estabelecidos entre indivíduo e organização que
caracterizam sua permanência ou expurgo da empresa familiar 2
6 Sucessão e empreendedorismo 1
7 Desafios no processo de sucessão 1
8 Continuação da carreira de líderes dentro do processo de sucessão 1
9 Ciclo de vida da empresa relacionado à sucessão 1
10 Sucessão patrimonial e sucessão gerencial 1
11 Processo sucessório sob uma visão mais subjetiva e menos
funcionalista 1
22
(conclusão)
No Enfoques Quantidade
12 Conflitos entre pais e filhos no processo sucessório 1
13 Preocupação de alunos de um curso de Administração quanto ao
desenvolvimento de um processo sucessório 1
14 Sucessão com foco no papel do herdeiro 1
15 Sucessão e as relações sociais / familiares 1
16 Sucessão em pequenas e médias empresas 1
17 Implicações do processo de sucessão para o alinhamento entre a
gestão estratégica de pessoas e a estratégia organizacional 1
18 Proposição de um instrumento para avaliação do processo sucessório 1
19 Significados presentes nos discursos dos membros da família sobre o
processo de sucessão 1
20 Características presentes no modelo de gestão que possam explicar
sua longevidade sob a perspectiva do processo sucessório 1
21 Dificuldades enfrentadas pelos membros da 3ª geração 1
22 Profissionalização e processo de sucessão 1
23 Repercussões do processo sucessório sobre os resultados econômicos,
tecnológicos e organizacionais 1
24 O que possibilita a sobrevivência das empresas relativo ao processo
de sucessão 1
25 Estratégias desenvolvidas por famílias empresárias para conduzir os
herdeiros à gestão 1
26 Integração de questões relativas ao processo sucessório às relações de
poder, à profissionalização e à sobrevivência da empresa familiar 1
Fonte: Elaborado pela autora.
A diversidade de enfoques para o estudo da sucessão é grande. Pode-se perceber que
quase todos os assuntos foram tratados somente em um único artigo e que cada um discute o
problema sob uma ótica particular (ou do fundador ou do sucessor ou das relações familiares,
das relações de poder, etc.) e não procurando integrar os aspectos relacionados ao problema.
A justificativa para o estudo deste tema advém, portanto, da observação da
fragmentação das investigações e da falta de profundidade dos mesmos. Na medida em que se
reconhece a importância socioeconômica das empresas familiares e que o interesse científico
voltado para a compreensão dessas organizações se torna crescente, surge a necessidade de
mais pesquisas sobre a sucessão que possam contribuir para o aprofundamento da área.
A relevância desta pesquisa está em identificar possíveis obstáculos que, uma vez de
conhecimento dos envolvidos, podem auxiliar no bom encaminhamento dos processos de
sucessão, contribuindo para minimizar os problemas enfrentados. Além disso, tem-se a
oportunidade de agregar conhecimento, de preservar e diminuir as estatísticas negativas e
reverter, dentro do possível, os fracassos dos processos sucessórios em empresas familiares,
23
aumentando, por decorrência, o número daquelas que finalizam de maneira satisfatória sua
sucessão.
A escolha de estudar pequenas e médias empresas familiares se justifica pelo fato de
que elas são de grande relevância na economia de todo o mundo e que grande parte do índice
de mortalidade ocorre enquanto as organizações ainda são pequenas e enfrentam dificuldades
em sua gestão também em virtude do seu tamanho. Portanto, tentar entender melhor como
funciona a sucessão nessas organizações, ressaltando aspectos positivos e negativos que
podem influenciar diretamente o seu sucesso, é algo valioso e importante.
Existe a necessidade de mais pesquisas acadêmicas que tratem do problema da
sucessão (Miller, Steier & Le Breton-Miller, 2003) e o tema escolhido mostra-se, portanto, de
relevância para os estudos organizacionais, esperando-se que, ao final desta pesquisa, possam
ser indicados alguns caminhos rumo à longevidade das empresas familiares.
Assim, o problema que norteia este estudo baseia-se na seguinte questão: como ocorre
o processo de sucessão em pequenas e médias empresas familiares?
Tendo em vista o exposto e com o intuito de responder à pergunta da pesquisa, o
objetivo geral deste trabalho consiste em analisar a ação sucessória em pequenas e médias
empresas familiares que estão passando ou já passaram por uma sucessão, enfocando as
dificuldades encontradas e as oportunidades geradas, em uma análise multicaso.
Para alcançar o objetivo, foram delineados os seguintes objetivos específicos:
a) Analisar os fatores desencadeadores do processo sucessório;
b) analisar como ocorreu ou está ocorrendo a sucessão na empresa;
c) identificar as dificuldades presentes no processo;
d) averiguar as oportunidades que surgiram em decorrência da sucessão.
Esta dissertação foi estruturada em quatro capítulos além desta introdução. No capítulo
2 encontra-se o referencial teórico pesquisado, que embasa a análise sobre as empresas
familiares. Nele encontra-se a revisão sobre as definições dos conceitos de empresa familiar e
a caracterização das mesmas; a descrição e análise das pequenas e médias empresas; o
processo de sucessão e as dificuldades e oportunidades que podem emergir do mesmo. O
capítulo 3 trata dos aspectos metodológicos, explicitando a estratégia e o método de pesquisa
escolhido, a descrição das unidades empíricas de análise, os instrumentos utilizados para a
coleta dos dados e, por último, a estratégia escolhida para a análise dos dados.
No capítulo 4 estão a apresentação dos casos pesquisados e a análise conjunta dos
mesmos. As conclusões e considerações finais deste estudo foram feitas no capítulo 5, onde se
24
apresenta a síntese dos principais resultados e conclusões a que se chegou, além das sugestões
para novos estudos. As referências utilizadas encontram-se listadas em seção pós-textual,
seguidas pelos apêndices.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Empresas familiares
As pesquisas sobre empresas familiares iniciaram-se a partir do ponto de vista de
diversas disciplinas e campos de estudos. Partindo de uma perspectiva advinda das
consultorias realizadas em empresas, escritores e pesquisadores notaram como era grande o
envolvimento de membros das famílias nos negócios, seja como proprietários, gerentes ou
funcionários. Os primeiros estudiosos são provenientes de um grupo eclético de áreas
acadêmicas, entre elas finanças, direito, economia, sociologia, entre outras. Eles trouxeram
para a pesquisa os modelos e métodos de suas respectivas áreas, embora tivessem consciência
de que um negócio familiar era diferente do modelo tradicional de empresa. Assim, o
surgimento das pesquisas sobre empresas familiares pode ser atribuído, em grande parte, à
abordagem proativa de consultores cujos primeiros esforços concentraram-se nas práticas
baseados nos trabalhos e estudos de caso, como, por exemplo, do autor Donnelley (1964), que
é um dos pioneiros na área (Heck et al., 2008).
Até a década de 1950 era notória a presença das empresas familiares em praticamente
todos os setores da economia brasileira, indo das atividades agrícolas até o sistema financeiro,
perpassando pela indústria têxtil, de alimentos, serviços e de meios de comunicação. Com o
início do processo de desenvolvimento e modernização que aconteceu no Brasil a partir dessa
época, essas empresas passaram a compartilhar seus espaços com as grandes multinacionais e
estatais (Gonçalves, 2000).
A partir desse momento também, segundo Gonçalves (2000), a empresa familiar
recebeu um estigma que a marcaria por várias décadas: o da incompetência pressuposta. Isso
porque as teorias organizacionais que se firmavam tinham como princípio uma unidade
industrial enorme, perfeitamente burocratizada, onde os novos líderes exerceriam a liderança
baseada em competência. Esse fato, de acordo com o referido autor, contradizia as
peculiaridades das pequenas e médias empresas familiares identificadas na época como uma
organização informal, confusa e incompleta, que premia a confiança pessoal em detrimento da
25
competência, que pratica o nepotismo e não abre espaço para a profissionalização e que age
de maneira imediatista, impossibilitando um planejamento empresarial.
Embora historicamente exista o questionamento a respeito da eficiência dessas
organizações em função da influência da dimensão familiar como um fator negativo para os
negócios, Pyromalis e Vozikis (2009) afirmam que grande parte dos estudiosos da área
atualmente assegura que, muitas vezes, as empresas familiares podem atingir desempenho
superior ao das empresas não familiares. Isso se dá justamente por manterem certas vantagens
competitivas que dizem respeito às suas peculiaridades, tal como a preservação do
conhecimento idiossincrático, os laços fortes e o forte compromisso dos membros familiares
com a organização.
Ao analisar os aspectos particulares e intrínsecos à natureza das empresas familiares,
estas tomam forma de problema de pesquisa científica. Como objetos de estudo, sua
problematização abrange o conceito, os pontos que a distinguem das organizações não
familiares, suas características peculiares e os aspectos associados à interação entre família e
empresa.
Na definição do que seja uma empresa familiar existe um desafio que consiste na
dificuldade de se chegar a uma noção unificada para caracterizar esse tipo de organização. A
literatura refere autores importantes da área, como Donnelley (1964), Tagiuri & Davis (1996),
Bernhoeft (1989), Gallo e Sveen (1991), Sharma, Chrisman & Chua (1997), Lodi (1998) e
Davel, Silva e Fischer (2000). Estes apresentam definições diversas sobre o tema. Cada um
leva em consideração a definição que acredita ser a melhor com base em diferentes critérios
como propriedade familiar, controle familiar, tradições e valores, influência da família na
direção da empresa, empresa de mais de duas gerações, sucessão (Campos, Bertucci e
Pimentel, 2008). A caracterização das empresas familiares varia segundo um ponto de vista
particular dos mesmos.
Entre as primeiras definições que surgiram, a empresa familiar é conceituada como
aquela que passou por pelo menos um primeiro processo de sucessão, estando no mínimo sob
o comando da segunda geração. Essa empresa é de propriedade e está sendo gerida por
membros de uma ou mais famílias proprietárias e transfere o cargo de gestão para outros
membros com laços consanguíneos. Além disso, os objetivos familiares devem ter estreita
ligação com a política, os interesses e os objetivos da empresa (Donnelley, 1964).
Concordando com este conceito, Lodi (1998) afirma que a sucessão na gestão está muito
ligada ao fator hereditário, de forma a estabelecer uma identidade empresarial (cultura
organizacional) vinculada ao sobrenome da família ou à figura do fundador, e que, na maioria
26
das vezes, não está dissociada da sucessão patrimonial. Talvez, em razão dos primeiros
estudos terem surgido como consequência da necessidade de resolução de problemas ligados
à sucessão, este, no início, era o fator determinante para a definição desse tipo de empresa.
Porém, com o avanço dos estudos, outros conceitos foram surgindo.
Observa-se que a empresa familiar geralmente é definida como aquela que tem sua
origem e sua história vinculadas a uma família; ou, ainda, aquela que mantém membros da
família na administração dos negócios em seguidas gerações. Esses, porém, não são atributos
exclusivos, segundo Bernhoeft (1989). O autor mostra outra visão, pois acredita que a
caracterização dessas empresas vai além do parentesco envolvido. Ele também considera
familiar a organização baseada em relacionamentos que possuem as variáveis dedicação e
tempo de empresa, que mantém relação de confiança com um funcionário velho de casa,
independentemente de vínculos familiares, e em que os laços afetivos são fortes a ponto de
influenciar a cultura da organização, mesmo que não existam laços consanguíneos.
Em outra definição, dada por Tagiuri & Davis (1996), organizações familiares ainda
podem ser aquelas onde dois ou mais membros da família influenciam na direção do negócio
por meio do exercício de laços de parentesco, papéis de gestão ou direitos de propriedade.
Para Gallo e Sveen (1991), uma empresa é familiar se existir apenas uma família detentora da
maior parte do capital, tendo controle total e fazendo parte da administração. Ainda, destaca-
se a definição de Sharma et al. (1997), que consideram familiar o negócio administrado com
perspectivas de se manter ao longo das gerações seguintes e que detém a visão do negócio
dentro de uma mesma família ou de um pequeno grupo de famílias.
Neste trabalho adotou-se como definição a abordagem de Davel et al. (2000), que
abarcam a pluralidade de conceitos partindo dos pontos comuns e divergentes entre eles e
propõem alguns aspectos fundamentais para a conceituação de uma organização: a) a família
deve deter a propriedade da empresa, podendo esta ser total, majoritária ou minoritária; b) a
família precisa ter voz ativa na gestão; c) os valores da família e da empresa se confundem; d)
o processo de sucessão deve ser determinado pela família. Assim, mesmo em meio a tantas
divergências conceituais, pode-se perceber que um ponto comum diz respeito à existência de
uma profunda relação entre família e organização, não somente no tocante à gestão, mas
também à propriedade e ao poder de decisão dos proprietários membros da família.
Os conceitos de empresa familiar, extraídos dos diversos autores, estão sintetizados no
Quadro 2:
27
Quadro 2 - Definições de empresa familiar
Autor Definições
Donnelley (1964)
É aquela que passou por pelo menos um primeiro processo de
sucessão, estando no mínimo sob o comando da segunda geração. É
de propriedade e está sendo gerida por membros de uma ou mais
famílias proprietárias e transfere o cargo de gestão para outros
membros com laços consanguíneos. Os objetivos familiares devem
ter estreita ligação com a política, os interesses e os objetivos da
empresa.
Lodi (1998)
A sucessão na gestão está muito ligada ao fator hereditário, de
forma a estabelecer uma identidade empresarial (cultura
organizacional) vinculada ao sobrenome da família ou à figura do
fundador e, na maioria das vezes, não está dissociada da sucessão
patrimonial.
Bernhoeft (1989)
É familiar a organização baseada em relacionamentos que possuem
as variáveis dedicação e tempo de empresa, que mantém relação de
confiança com um funcionário velho de casa, independentemente
de vínculos familiares, e em que os laços afetivos são fortes a ponto
de influenciar a cultura da organização, mesmo que não existam
laços consanguíneos.
Tagiuri & Davis (1996)
Organizações familiares podem ser aquelas onde dois ou mais
membros da família influenciam na direção do negócio por meio do
exercício de laços de parentesco, papéis de gestão ou direitos de
propriedade.
Gallo e Sveen (1991)
Uma empresa é familiar se existir apenas uma família detentora da
maior parte do capital, tendo controle total e fazendo parte da
administração.
Sharma et al. (1997)
Consideram familiar o negócio administrado com perspectivas de
se manter ao longo das gerações seguintes e que detém a visão do
negócio dentro de uma mesma família ou de um pequeno grupo de
famílias.
Davel et al. (2000)
Aspectos fundamentais para a conceituação de uma organização
familiar: a) a família deve deter a propriedade da empresa, podendo
esta ser total, majoritária ou minoritária; b) a família precisa ter voz
ativa na gestão; c) os valores da família e da empresa se
confundem; d) o processo de sucessão deve ser determinado pela
família.
Fonte: Elaborado pela autora.
É possível destacar características peculiares a essas organizações que lhes concedem
sentido único e as separam dos outros tipos de negócios. Uma característica central que as
diferencia das demais diz respeito à forma como acontece a sucessão da gestão, que se dá
principalmente de maneira hereditária, partindo de uma ou mais famílias. A estrutura
impressa em uma empresa desse tipo implica uma série de interações específicas com a
família que detém sua propriedade, produzindo particularidades na sua forma de atuação
(Oliveira, 1999). O aspecto familiar associado à dinâmica empresarial confere às organizações
familiares caráter especial. Elas possuem, por exemplo, atributos bivalentes que são inerentes
a esses negócios e que podem ser tanto fonte de vantagens como de desvantagens,
dependendo da maneira como ocorre a interação entre as dimensões família e empresa. Tais
28
atributos são fruto da sobreposição de funções de pessoas que ao mesmo tempo são membros
da família, proprietários e gestores (Tagiuri & Davis, 1996).
Nesse sentido, Bernhoeft (1989) enumera alguns fatores que também podem ser vistos
em outras organizações, mas, de forma destacada estão presentes nas do tipo familiar. Ele
ressalta o papel importante da confiança nas relações, independentemente de vínculo familiar;
a força dos laços afetivos influenciando todas as esferas do negócio; a valorização do
histórico que imprime mais tolerância ao erro e vai além da simples busca por resultados; a
exigência de grande dedicação significando não ter horário para sair, trabalhar em casa e nos
finais de semana; a fidelidade; a tendência ao emocional e não tanto ao racional; os jogos de
poder, valendo mais a habilidade política do que a capacidade.
Esse diferencial, segundo Lodi (1998), também está relacionado aos recursos
financeiros disponíveis pela família; ao apoio pessoal e patrimonial dos familiares, que pode
ser muito útil em períodos de turbulência; à reputação e relações construídas pela
confiabilidade no nome da família; à relação mais pessoal e de lealdade com funcionários,
vendo-os como pessoas e não como simples recursos; à união entre os acionistas e os
dirigentes, que vai além das questões profissionais, facilitando a comunicação entre a
Diretoria Executiva, o Conselho de Administração e a Assembleia dos Acionistas, fazendo
com que mesmo nos momentos de perdas os acionistas sustentem a empresa; sistema de
tomada de decisão mais rápido e eficiente; mais sensibilidade para procurar sempre o
interesse social em detrimento do pessoal; à continuidade pelo processo de sucessão,
preferencialmente de forma hereditária.
Ainda, os autores Mussi, Teixeira e Massukado-Nakatani (2008) destacam pontos
fortes das empresas familiares que influenciam diretamente seu sucesso e longevidade. Estes
estão relacionados à cultura familiar e os seus efeitos sobre as organizações pela transferência
de valores, significados, compartilhamento de objetivos e também de importantes
conhecimentos tácitos que são passados de pai para filho; compromisso com a reputação e
com a sobrevivência no longo prazo da empresa; mais flexibilidade facilitando a
implementação de ações; e o rápido acesso a recursos para investimentos.
Como desvantagens associadas a esse tipo de negócio e que aparecem em muitas
organizações, pode-se destacar os efeitos negativos advindos da sobreposição entre família e
empresa, como: dificuldade de separar decisões familiares e profissionais; conflitos de
interesse entre família e empresa; falta de disciplina; grande valorização das relações afetivas;
personalização dos problemas administrativos; emprego e promoção de parentes por
29
favoritismo e não por competência (paternalismo); e os traços autoritários (Gonçalves, 2000;
Lodi, 1998; Macêdo, 2002; Ricca, 2007).
Outros fatores negativos associados à gestão dizem respeito a: ausência, em muitos
casos, de objetivos bem delimitados; centralização do poder; não formalização; pouco
planejamento estratégico; foco nas questões operacionais em detrimento das estratégicas; uso
indevido de recursos da empresa por membros da família; falta de sistema de planejamento e
controle financeiro; e um último e muito importante, problemas na sucessão associados a
diversos fatores, que serão abordados em tópicos posteriores (Gonçalves, 2000; Lodi, 1998;
Macêdo, 2002; Ricca, 2007).
Desta forma, Ricca (2007) faz um apanhado geral dos pontos fortes e fracos das
empresas familiares, que resume todos os outros comentados anteriormente e os expõe de
duas formas diferenciadas, na concepção dos administradores familiares e dos
administradores profissionais, o que pode ser observado nos Quadros 3 e 4, respectivamente:
Quadro 3 - Pontos fortes e pontos fracos das empresas familiares, segundo
administradores
Pontos Fortes Pontos Fracos
Carisma
Dificuldade em transferir esse carisma para as futuras gerações.
Dificuldade em delegar (só o dono sabe fazer).
Medo de correr riscos.
Não inova.
Não vê pontos fortes; normalmente só
vê desvantagens.
Desacordos familiares geralmente só trazem desvantagens quando
se administra um negócio.
Rapidez de decisão. Incompatibilidade de personalidade com o controlador.
Lealdade e obediência dos empregados
à tradição.
Cultura empresarial muito forte.
Fracionamento do poder acionário na sucessão.
Administração voltada para o dia-a-dia, devido à dificuldade de
estabelecer planos em longo prazo, pelo conflito sobre as
perspectivas dos negócios entre os membros da família.
Conservadorismo.
Pouca evolução tecnológica (fazer sempre as coisas de forma
tradicional).
Fonte: Ricca (2007, p. 16).
30
Quadro 4 - Pontos fortes e pontos fracos das empresas familiares, segundo
administradores profissionais
Pontos Fortes Pontos Fracos
Nome do fundador como um símbolo.
Indicação de pessoas para cargos importantes mais por amizade do
que por competência profissional. Insegurança em relação à
continuidade das políticas.
Considerar todas as pessoas de acordo
com o que são.
Dificuldade de priorizar atividades em virtude de visão distorcida
da realidade empresarial, afetada pelo nepotismo. Dificuldade em
estabelecer homogeneidade de conceitos na administração da
empresa.
Se a figura do dono é um bom exemplo, a
empresa como um todo cria valores
consentâneos com os do fundador.
Permite empregar profissionais não competentes.
Agilidade nas decisões. As decisões baseadas em poucas pessoas podem não obedecer a
uma lógica (podem ser muito pessoais).
Propicia mais segurança no emprego, pois
o contato com o dono é direto e torna as
relações mais pessoais.
Geralmente, não há algum suporte econômico voltado para o
crescimento da empresa.
Objetividade (os objetivos da empresa são
claros). Pouca liberdade para “sair fora dos trilhos”.
Quando o patrão é atuante, é fácil corrigir
desvios (desde que ele “compre a ideia”).
A estrutura pode ser contaminada por pessoas que não tenham
capacidade profissional para a função.
Geralmente o antecessor procura
transmitir ensinamentos a seu sucessor,
sobre o negócio em si e produtos, o que
garante a continuidade e qualidade do
produto final da empresa.
Paternalismo. Falta de rumos (as coisas são direcionadas pelo
humor do dono). Formação do sucessor dentro da própria empresa
(“ele adquire todos os vícios”).
Direção firme. Aproximação direta dos
diretores com a estrutura da empresa,
transmitindo segurança e confiança.
Interesses pessoais. Conflito de interesses. Fragilidade diante do
desaparecimento do fundador.
Liderança definitiva. Poder de decisão.
Confiança.
Centralização de poderes.
Envolvimento subjetivo.
Aproximação e compreensão humana.
Poder de sugestão e persuasão.
Não conformidade com novas realidades.
Adaptação e assimilação mais lentas.
Preocupação com a responsabilidade
social, embora protecionista.
Ausência de preparação e desenvolvimento dos níveis de chefia e
gerencial.
Mais humano, considerando o aspecto
social dos empregados.
Receio de inovação (barreiras),
Muita incompetência.
Relações informais entre os diversos
níveis.
Conflitos de poder. Morosidade nas decisões. Excesso de
centralização.
Tradição em tudo o que faz. Muito atrito entre os membros da 2ª e 3ª gerações da família.
Briga pelo poder.
Fonte: Ricca (2007, p. 16–17).
2.2 As empresas de pequeno e médio porte
O esforço de classificar e caracterizar as empresas por porte deriva primordialmente da
necessidade da aplicação de medidas de incentivo que visam ao seu fortalecimento e à sua
expansão (Oliveira, 2006). Na prática, existem variados critérios de classificação que devem
estar em acordo com a finalidade a que se presta e com os objetivos das instituições que
fazem esse enquadramento, como fomento, pesquisa ou outro. Seja baseando-se no valor do
31
faturamento, no número de funcionários ou no patrimônio líquido, cada um dos órgãos
representativos do setor, das instituições financeiras e da legislação adota a forma de
classificação que mais lhe convém.
Para as pequenas empresas, especificamente, a adoção de critérios é um importante
fator de apoio que permite que elas possam usufruir de benefícios e incentivos previstos na
lei, que dispõe sobre tratamento diferenciado ao segmento. Para a academia, essa classificação
é fundamental para a realização de pesquisas e análises comparativas de empresas com
características mais próximas, visando alcançar mais homogeneização do universo estudado
(Oliveira, 2006).
Na legislação brasileira existe lei específica que institui o Estatuto Nacional da
Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. A lei vigente é a Lei Complementar nº 123, de
14 de dezembro de 2006 (Brasil, 2006), que foi alterada por republicação em atendimento ao
disposto no artigo 5º da Lei Complementar nº 139, de 10 de novembro de 2011. A Lei nº 123,
em seu Capítulo II, artigo 3o, considera empresa de pequeno porte a sociedade empresária, a
sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário que
aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 e igual ou inferior a R$
3.600.000,00 (Brasil, 2006). A empresa de médio porte é aquela que aufere anualmente
receita bruta superior a R$ 3.600.000,00.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que é uma
empresa pública federal e um dos principais instrumentos de financiamento de longo prazo,
utiliza para efeito de enquadramento em suas condições de financiamento a classificação de
pequena empresa como sendo aquela com Receita Operacional Bruta (ROB) anual superior a
R$ 2.400.000,00 e inferior ou igual a R$ 16.000.000,00. Até o ano de 2010 esses valores
variavam de R$ 1,2 milhão a R$ 10,5 milhões. A média empresa tem ROB anual entre R$ 16
milhões e R$ 90 milhões (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, 2012).
Já o SEBRAE, além de utilizar a segmentação conforme os critérios da Lei
Complementar nº 123 por faixa de faturamento, também adota o conceito de número de
funcionários nas empresas, principalmente para fins de estudos e levantamentos sobre a
presença dessas empresas na economia brasileira. Para essa classificação a pequena empresa é
aquela que tem entre 20 e 99 funcionários, considerando-se os setores de indústria e
construção, e de 10 a 49 no comércio e serviço. A média tem entre 100 e 499 funcionários
para os setores de indústria e construção e de 50 a 99 no comércio e serviço (Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, 2012).
32
A seguir, o Quadro 5 sintetiza os critérios adotados para enquadramento das pequenas
e médias empresas no Brasil:
Quadro 5 - Definição de pequenas e médias empresas
Critérios para
classificação
Receita Bruta Anual Número de Funcionários
Pequena Empresa Média Empresa
Lei Complementar nº
123 de 14/05/2006
Superior a R$
360.000,00 e igual
ou inferior a R$ 3,6
milhões
Superior a R$ 3,6
milhões - -
SEBRAE - -
I - Na indústria e
construção: de 20 a
99 funcionários.
II - No comércio e
serviços: de 10 a 49
funcionários.
I - Na indústria e
construção: de
100 a 499
funcionários.
II - No comércio
e serviços: de 50
a 99 funcionários.
BNDES
ROB anual superior
a R$ 2,4 milhões e
inferior ou igual a
R$ 16 milhões
Superior a R$ 16
milhões e inferior
ou igual a R$ 90
milhões
- -
Fonte: Elaborado pela autora.
Para fins deste estudo será utilizada a definição de empresa de pequeno porte para
aquela que aufere receita bruta anual entre R$ 360.000,00 e R$ 3,6 milhões, conforme a Lei
Complementar nº 123, de 14/05/2006. Na definição de empresa de médio porte optou-se por
considerar o valor superior a R$3,6 milhões (conforme a Lei Complementar nº 123) e inferior
aR$90 milhões (segundo classificação do BNDES). Neste trabalho justifica-se tal delimitação,
pois a Lei Complementar nº 123 acaba por não estabelecer o limite entre a média e a grande
empresa. Dessa forma, não seriam consideradas nesta pesquisa as empresas que tivessem
receita bruta anual superior a R$90 milhões (grande empresa, de acordo com o BNDES).
As pequenas e médias empresas (PMEs) desempenham papel fundamentalmente
importante na economia. É notória sua contribuição como fonte de emprego ao gerar
oportunidades para grande parcela da força de trabalho e como fonte de renovação da
economia ao estimular o desenvolvimento empresarial (Cintho, Dattein, Mambrini, Medina &
Maccari, 2010; Oliveira, 2006; Reis & Escrivão Filho, 2003). Para Cintho et al. (2010), elas
podem atuar como um amortecedor de choque em momentos de crise econômica, realizando
tarefas que podem ser menos compensadoras, mas que são necessárias para o funcionamento
33
do sistema, além de exercer papel crucial no processo de acumulação, concentração e
dispersão de capital.
As PMEs têm avançado e se desenvolvido de forma surpreendente. Elas atuam como
um elo importante na cadeia de produção, podendo ser tanto compradoras de produtos e
serviços como fornecedoras, principalmente para as grandes empresas. Segundo relatório
publicado pelo SEBRAE (2011a) sobre as pequenas empresas do simples nacional, até o ano
2009 existiam 438.513 empresas de pequeno porte distribuídas em todo o país. Essas
organizações estão concentradas no eixo Sul-Sudeste, que responde por mais de três quartos
do total. O estado de São Paulo é o que mais abriga as pequenas empresas, com cerca de 30%
do total, seguido por Minas Gerais e Rio Grande do Sul. No universo das empresas
brasileiras, as pequenas e médias representam mais de 90% e correspondem a 59% da mão de
obra ocupada (Cintho et al., 2010; Oliveira, 2006).
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as pequenas e
médias empresas desempenham importante papel no crescimento e desenvolvimento do país,
pois servem como uma espécie de “colchão amortecedor do desemprego” (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística, 2003, p. 15). Muitas vezes elas são a alternativa de ocupação para
reduzida parcela da população, que tem como abrir seu próprio negócio, e alternativa de
emprego formal ou informal para outra grande parcela de trabalhadores, em geral com pouca
qualificação e que não encontra espaço em grandes organizações. Dados do SEBRAE (2011b)
indicam que em 2001 somente as micro e pequenas empresas de comércio e serviço
ocupavam cerca de 7,3 milhões de pessoas, representando 60,8% da mão de obra empregada
no segmento empresarial dessas atividades. Segundo Oliveira (2006), entre 1995 e 2000, de
cada 100 novos empregos gerados no Brasil, 96 eram provenientes das PMEs.
A importância desse segmento tem sido foco de preocupação de estudiosos no Brasil e
no mundo, que procuram compreender os problemas enfrentados por elas a fim de oferecer
aos dirigentes os conhecimentos necessários para uma administração mais eficaz e propiciar
sua sobrevivência em um ambiente econômico em constante mudança (Leone, 1999; Reis &
Escrivão Filho, 2003). Apesar de existirem tantos dados que demonstram a importância
econômica e social das PMEs no Brasil, sabe-se que muito ainda precisa ser feito, tanto no
que diz respeito à parte governamental quanto acadêmica, para melhorar as condições de
sobrevivência dessas empresas, sendo essa uma condição indispensável para o
desenvolvimento econômico do país (Oliveira, 2006).
O interessante é que uma característica presente em todas essas organizações é o fato
de terem sua origem em empreendimentos familiares (Gonçalves, 2000; La Rovére, 2001).
34
Embora no Brasil as empresas familiares variem de micro e pequenas, chegando a grandes
corporações, como os grupos Votorantim, Gerdau e Camargo Corrêa, predominam, em sua
maioria, os pequenos e médios empreendimentos. Sabe-se, ainda, que aquelas que mais
empregam no país, as que menos reagem em épocas de crise, as que menos desempregam na
recessão e aquelas que alimentam, vestem e são a fonte de renda de milhares de brasileiros
são as pequenas e médias empresas familiares (Cohn, 1991). É possível observar que, mesmo
nas chamadas economias desenvolvidas, o modelo empresarial começa, em geral, com
pequenas empresas familiares. Só bem mais tarde as organizações evoluem para uma estrutura
societária mais impessoal. Sua coesão decorre de vínculos morais e emocionais como parte da
composição de um grupo com uma origem comum, que é a família e sua história (Bernhoeft
& Gallo, 2003).
De pequeno ou grande porte, novas ou antigas, as empresas familiares têm algumas
vantagens competitivas, como a preservação do conhecimento idiossincrático, os laços fortes
e o forte compromisso dos membros com a organização (Pyromalis & Vozikis, 2009), mas,
em sua grande maioria sofrem atritos em virtude das diferenças entre prioridades do negócio e
preferências da família – ou do fundador. Os dilemas, porém, comuns às empresas familiares
em sua fase inicial, que é onde geralmente se encontra a maioria das micro e pequenas
empresas, estão em aceitar as mudanças ou restringir-se à estratégias originais; empregar ou
não membros da família; planejar a sucessão ou permitir que a geração seguinte naturalmente
se encarregue do negócio; e são também o grande desafio da continuidade.
2.3 O processo de sucessão
A sucessão de pessoas que ocupam o topo do comando é uma fase crítica em qualquer
tipo de organização. Na gestão de empresas familiares, porém, a capacidade de garantir
sucessores competentes entre as gerações para manter o negócio dentro da família pode ser
um processo ainda mais complexo. Os desafios se tornam maiores nessas empresas onde
muitas vezes existem poucos talentos para se trabalhar, fatores emocionais interferindo na
relação entre sucessor e sucedido e, ainda, complexos laços sociais e familiares (Lansberg,
1999; Le Breton-Miller et al., 2004).
A sucessão é uma etapa importante, delicada e inevitável no ciclo de vida das
empresas familiares que envolve o sucedido, o sucessor, a família e a empresa. Mesmo
existindo muitos estudos sobre a sucessão na empresa familiar tanto no Brasil quanto no
exterior, essa prática ainda é uma caixa preta a ser aberta e se constitui em uma das questões
35
mais críticas de investigação enfrentadas pelos pesquisadores da área (Campbell, Heriot &
Welsh, 2007). De modo geral, somente 30% das empresas familiares chegam à segunda
geração, 12% à terceira e 3% à quarta geração. Allio (2004) e Miller et al., (2003), ao
examinarem 16 casos de fracasso no processo sucessório, concluíram que a principal razão
para o insucesso estava na ausência de alinhamento entre o passado e o futuro da empresa.
Estudo feito pelos autores Bjuggren & Sund (2005) no Reino Unido mostrou que
apenas 24% das empresas familiares foram transferidas para a segunda geração e que apenas
14% chegaram à terceira. Afirmam também que quando uma empresa consegue sobreviver
até a segunda geração, a probabilidade de ela sobreviver às outras aumenta substancialmente.
Porém, mais possibilidades de sobrevivência é resultado principalmente de algumas ações que
podem facilitar o processo de sucessão e fazer com que seja mais eficiente, como preparar os
próximos sucessores inserindo-os no contexto da empresa e planejar e realizar a sucessão em
tempo hábil.
Mesmo sendo uma questão inevitável para as empresas, o assunto costuma ser um tabu
nas discussões das famílias proprietárias, que nem sempre o encaram com a real importância
que tem para a sobrevivência da organização, adiando uma discussão sobre o seu
planejamento até que ela fatalmente ocorra (Davis & Harveston, 1998).
Uma empresa familiar é o resultado da confluência de três sistemas independentes
(família, propriedade e gestão) e superpostos, os quais se desenvolvem sob pilares
completamente diferentes (Gersick et al., 1997). A sobrevivência dessas organizações está
ligada à sua capacidade de conciliar esses três eixos (Tagiuri & Davis, 1996). A sucessão
constitui uma mudança organizacional que impacta de forma significativa todo o sistema,
interferindo nas três esferas. No que diz respeito à família, existe um impacto relacionado ao
tempo que o fundador passa na empresa, impactos psicológicos causados pela sua saída, pois
em grande parte dos casos sua história na organização se confunde com a própria história de
vida, além de, em maior ou menor grau, as mudanças também provocarem alterações em sua
renda e rotina.
Além disso, existem conflitos entre familiares que podem emergir nessa situação, tal
como a disputa pelo poder. Olhando para a gestão da empresa, sabe-se que não
necessariamente o sucessor adotará as mesmas práticas e modos de administrar que seu
antecessor, uma vez que as capacidades técnicas e gerenciais, bem como os objetivos e
experiências anteriores, podem diferir significativamente daquelas vistas no sucedido. Para a
empresa, as alterações podem ocorrer antes, durante e especialmente após a sucessão, tanto no
36
tocante aos métodos e relações de trabalho, às práticas, valores e rituais institucionalizados e
legitimados pelos empregados, quanto aos resultados operacionais finais (Mussi et al., 2008).
Considerável número de empresas familiares passa por processos de sucessão e, nesse
período, frequentes conflitos e diferentes tipos de resistências emergem, envolvendo membros
da família e profissionais que atuam na área (Scheffer, 1993).
Para que o negócio tenha continuidade, são necessários planejamento e organização do
desenvolvimento sucessório. Mesmo existindo muitos fatores que interferem diretamente
nesse processo, a falta de planejamento é uma das principais causas para o seu fracasso
(Lambrecht, 2005; Lansberg, 1988; Tillmann e Grzybovski, 2005). É essencial que a geração
que está à frente da empresa abra espaço para preparar a próxima que virá assumir a gestão.
Pelo impacto visível sobre todas as esferas, o estudo da sucessão, assim como sua
implantação, é de fundamental importância para as empresas familiares. O planejamento
possibilita uma transição mais suave, com baixos custos, procurando, assim, garantir a
eficiência e a competitividade no longo prazo. Muitos processos sucessórios acontecem
abruptamente, sem qualquer planejamento, tornando-se desgastante tanto psicológica e
emocionalmente, quanto financeiramente, consumindo recursos essenciais para a operação da
empresa. O planejamento sucessório vai diminuir a possibilidade de conflitos que tanto
prejudicam o crescimento, a prosperidade e a continuidade dos negócios. Fica claro que a
forma como a sucessão ocorre tem grande influência sobre a sobrevivência e expansão dos
negócios. Esse procedimento pode acontecer de forma gradativa e planejada ou a partir
situações inesperadas ou repentinas de mudança de direção, por exemplo, quando acontecem
morte, acidente ou doença afastando o dirigente do cargo (Leone, 2005; Tillmann e
Grzybovski, 2005).
Para Bernhoeft (1989), a ação sucessória na empresa familiar é um assunto relevante e
ao mesmo tempo delicado. Essa é uma questão que não pode ser tratada apenas sob os
aspectos lógicos da administração, uma vez que envolve pontos afetivos e emocionais
relacionados à própria estrutura familiar. Esse autor analisa o tema baseando-se em seis
fatores que considera os mais importantes a serem encarados para que não haja
comprometimento da sobrevivência da empresa: do sucedido, do sucessor, da organização, a
família, do mercado e da comunidade.
Lodi (1987) é bem sucinto ao considerar que a sucessão é uma transferência de poder,
levando um a dois anos de importantes mudanças na gestão da mesma. Segundo ele, uma
primeira crise pode ocorrer no período de transferência de poder entre a geração do fundador
e do sucessor, relação que é fortemente marcada por conflito entre pai e filho, visto que se
37
caracteriza pela tendência à autocracia e à concentração de decisões por parte do primeiro e
por uma luta pela liderança por parte dos sucessores. Assim sendo, ele aconselha iniciar o
quanto antes a sucessão enquanto o fundador ainda estiver presente no negócio.
A jornada da sucessão inicia-se quando a geração que está à frente no controle da
empresa familiar começa a se preocupar com a transferência de controle e o gerenciamento
das responsabilidades e termina quando eles passam totalmente o controle dos negócios para a
próxima geração (Lansberg, 1999). Gersick et al. (1997) definem que a sucessão é o ápice
para essas organizações e que, após a transformação do empreendimento individual em
familiar, a perpetuação torna-se uma preocupação essencial do ciclo de vida dessas empresas.
Eles enfatizam que a sucessão não é um evento único que ocorre quando um líder já está
velho e tem que sair da gestão, mas é longa e, em certos casos, contínua.
Oliveira (1999) concorda com estes autores quando afirma que se trata de um dos
momentos de mais importância para a otimização da continuidade do negócio. E se nesse
processo não forem alcançados os resultados esperados, a efetividade da organização familiar
pode ficar muito comprometida, assim com a família também pode ser afetada, sobretudo
sofrendo conflitos internos que podem levar à sua desagregação (Ricca Neto, 1998). A análise
da sucessão deve ser feita de forma real, pois em muitos casos os executivos cometem um
engano afirmando que seus herdeiros naturais são os melhores sucessores que a empresa
poderá ter em seu quadro de comando. Quando o herdeiro não tem competência, pode ocorrer
grande turbulência na administração da empresa.
Existem vantagens e desvantagens associadas ao processo sucessório. As vantagens
estão relacionadas à possibilidade de continuidade do comando familiar, a um
desenvolvimento decisório ágil, com elevado grau de flexibilidade para implementação de
ações, a otimização dos resultados atuais e futuros da empresa, pelo fato de ter uma pessoa
com interesse societário à frente, além de ter espírito familiar de união e confiança. As
desvantagens seriam a possível disputa de poder entre os membros da família e a existência de
dificuldades em desempenhar diferentes papéis (Oliveira, 1999).
Além da familiar, Oliveira (1999) destaca outro tipo de sucessão nas empresas, a
profissional. O autor pontua que a sucessão familiar é que tem recebido mais ênfase, mas
deve-se considerar a profissional como em significativa evolução. Por sucessão profissional
pode-se entender, por um lado, a gestão que era familiar passando a ser administrada por
profissionais contratados e, por outro, a empresa já profissionalizada que troca um ou mais
executivos. Na sucessão familiar alguns aspectos devem ser analisados. Entre eles estão a
realidade da família (seus valores, crenças, atitudes e comportamentos pessoais), se existe
38
dicotomia entre empresa e família, como é a relação com os membros agregados (genros e
noras, por exemplo), qual a expectativa de vida dos membros mais antigos e influentes e a
atuação do patriarca e da matriarca da família.
Existe uma série de problemas relacionados à sucessão que têm levado muitas
empresas ao fracasso. Esses problemas são distintos e o nível de complexidade pode variar em
função do porte da empresa e das características da estrutura familiar (Le Breton-Miller et al.,
2004). Em se tratando de pequenas empresas, aos problemas tradicionais da empresa familiar
ainda se somam outros, típicos dos pequenos negócios, a exemplo de: falta de capital de giro
próprio, gestão pouco profissional, desvio de foco dos seus objetivos empresariais, etc.,
potencializando o risco de morte prematura do negócio (Yilmazer & Schrank, 2010).
Talvez a primeira tarefa para a longevidade e prosperidade de uma empresa familiar
de pequeno porte seja mudar a maneira de pensar. Muitas parecem estar ainda com
pensamentos e ações muito intuitivos, sem estratégia, sem se preocupar em aprimorar seu
negócio e sua forma de administrar, desenvolvendo e explorando apenas uma pequena parte
do seu potencial. Basta considerar as altas taxas de mortalidade. Em relação à sucessão
familiar e à longevidade de uma empresa de porte pequeno, explorar todas as suas
potencialidades pode garantir mais chances de entregá-la para um herdeiro em melhor saúde
do que quando ela surgiu. E para o fundador essa conquista é algo gratificante (De Geus,
1998).
As pequenas empresas geralmente sofrem os problemas relacionados à sucessão de
forma bem mais acentuada do que as grandes organizações. Elas estão mais expostas às
dificuldades, pois ao mesmo tempo em que ocorre a transferência do poder, também é feita a
transferência do capital. A maioria das empresas de grande porte já tem seu capital negociado
no mercado financeiro e em sua maior parte os executivos profissionais são contratados,
facilitando, assim, o processo sucessório (Leone, 1992; Yilmazer & Schrank, 2010).
É possível perceber que a maioria das empresas de pequeno porte está sob o comando
ainda da primeira geração (fundador) ou, no máximo da segunda. Assim, algumas
peculiaridades que influenciam diretamente a sucessão podem ser destacadas: o fundador vê a
empresa como propriedade privada e a empresa é a fonte de renda da família; o negócio ainda
não está consolidado ou se encontra em fase de consolidação, o que ainda demanda muitos
investimentos; os filhos acabam assumindo a empresa motivados principalmente pelo senso
de dever; a transferência não é planejada; dificuldade para separar família e empresa; o
sucessor nem sempre apresenta talento ou preparação para assumir o negócio. Dessa forma,
pode-se caracterizar a sucessão nessas pequenas empresas como incipientes, em que muitas
39
questões importantes relativas a esse momento ainda estão sendo estruturadas, tais como o
processo de profissionalização, estabelecimento de critérios bem definidos para direcionar a
escolha do sucessor, permanência de membros mais antigos que tendem a não querer sair da
empresa, entre outros (Campos et al., 2008).
Essa questão deve ter posição de destaque nos estudos sobre empresas familiares, visto
que o cuidadoso planejamento dessa etapa pode tornar a transição entre as gerações um
momento potencialmente bom para o crescimento das organizações ou pode, ao contrário,
acontecer de forma não planejada e acarretar sérios riscos à sua sobrevivência.
2.4 Dificuldades e/ou oportunidades que podem surgir no processo sucessório
Como visto anteriormente, a sucessão em empresas familiares é um dos temas mais
estudados e pesquisados por especialistas nesse tipo de negócio. O grande interesse por essa
questão pode ser atribuído a diversos fatores, destacando-se o fato de que seu sucesso ou
fracasso podem viabilizar ou comprometer definitivamente a continuidade de uma
organização. Sendo assim, alguns assuntos principais relacionados ao tema serão examinados:
a questão do antecessor, do sucessor, da profissionalização, do planejamento sucessório e
outros.
2.4.1 O antecessor
O primeiro aspecto ressaltado por Scheffer (1995) que tem grande influência sobre o
processo sucessório diz respeito à figura do antecessor. Estudos têm explorado os atributos
dessa importante figura como sendo preditora de uma sucessão bem-sucedida ou como
variável crítica no assunto (Le Breton-Miller et al., 2004). Ward (1987) chega a afirmar que o
proprietário da empresa é o fator mais importante para o êxito da sucessão.
A relação entre antecessor e sucessor pode ser decisiva nas empresas familiares.
Lansberg (1988) e Ward (1987) encontraram íntima ligação positiva entre a qualidade dessa
relação e o sucesso do processo de sucessão. Quando existe boa relação, geralmente também
existe transferência de conhecimento, que é vital para o processo. Além disso, se um
relacionamento está firmado em bases fortes como respeito mútuo, as pessoas se sentem
apoiadas e reconhecidas, criando um círculo de confiança e feedback e fazendo do
aprendizado uma realização evolutiva que começa em casa (Le Breton-Miller et al., 2004).
Em contrapartida, quando não existe bom relacionamento, tudo o que foi dito fica ao contrário
40
e a empresa fica mais vulnerável aos conflitos pessoais que podem ser determinantes do
fracasso da sucessão.
Nesse sentido, Cadieux (2007) ressalta alguns papéis que podem ser assumidos pelo
antecessor junto ao sucessor, contribuindo para melhor desempenho do mesmo e para o
processo como um todo. Um primeiro papel é o de supervisor. Nele, o antecessor se torna
superior imediato de seu filho, atribuindo-lhe tarefas, dando instruções, supervisionando o
trabalho, corrigindo, sempre que necessário, e ao mesmo tempo preparando-o para assumir a
gestão e apresentando-o à empresa.
Outro papel é o de professor. É preciso ter consciência de que certos conhecimentos
são específicos, únicos e devem ser repassados aos sucessores, tendo, assim, a necessidade de
se gastar tempo com o mesmo para lhe ensinar o que naturalmente ele pode não compreender.
Ainda existe o papel de protetor, em que o antecessor permite que o outro tome certas
decisões assumindo as consequências para que tenha experiência real na gestão da empresa.
Também se destaca o papel de introdutor (atuar como mediador entre o sucessor e os outros
atores no ambiente de trabalho, tanto interno quanto externo, a fim de que o mesmo obtenha
reconhecimento como líder); e o de colaborador (papel decorrente de supervisor, que emerge
ao longo do tempo, depois que o sucessor desenvolve suas habilidades e ganha confiança na
empresa). Por fim, depois de sair efetivamente do comando, o antecessor pode desempenhar
as funções de suporte técnico e consultor, bem como participar do Conselho Administrativo
da organização (Cadieux, 2007).
É importante que o antecessor consiga superar sua ansiedade em relação à sucessão,
não fique imerso em um estágio de negação, mas que esteja disposto a encarar a situação e a
deixar o processo acontecer como algo natural (Handler, 1990; Lansberg, 1988; Ward, 1987).
Existem medos normais que devem ser enfrentados. Realmente, para quem está na posição de
líder, deve ser complicado lidar com a perda do poder, do status na sociedade e até mesmo de
certa parte da sua identidade. É uma ruptura muito expressiva para o fundador de uma
empresa ter que sair e deixar sua posição para outro ocupar. Na maioria dos casos, a vida de
um fundador de uma empresa familiar está totalmente ligada à sua atuação profissional. Sabe-
se que, em média, um Chief Executive Officer (CEO) de uma companhia permanece nesse
cargo por quase sete anos. Um fundador de uma empresa familiar se estabelece como gestor
por aproximadamente 32 anos.
Também existe a parte difícil de ter que escolher um sucessor. Nas empresas
familiares, o assunto se torna complexo, pois uma situação é planejar a sucessão, preparar a
formação dos indicados e avaliar o desempenho quando um dos candidatos a ocupar o cargo
41
do sucedido tem com o mesmo uma relação meramente profissional. Por outro lado, podem
ser muito mais complicados os casos em que os protagonistas estão vinculados por laços
afetivos e em que o antecessor tem que fazer uma escolha entre um filho e um irmão. Mas
muitos donos de empresa chegam a declarar que esse passo os coloca, na verdade, de cara
com a natureza mortal do ser humano, vindo à tona os conflitos da aposentadoria, da velhice e
do fim da vida (Le Breton-Miller et al., 2004).
São poucos os executivos que dedicam certa atenção ao planejamento da sua
aposentadoria e, consequentemente, à sua sucessão, podendo ocasionar diversos problemas na
gestão da empresa que muitas vezes poderiam ser antecipadamente resolvidos. Desta forma, o
processo sucessório pode se tornar uma grande fonte de conflitos (Bernhoeft, 1989; Cohn,
1991; Lodi, 1998). A dificuldade do antecessor em deixar a empresa é o obstáculo mais citado
numa sucessão de sucesso (Sharma, Chrisman, Pablo & Chua, 2001).
O êxito de um programa sucessório também depende da maneira como a liderança do
fundador (que também é o presidente da empresa) preparou a família para o poder e a riqueza
e um requisito fundamental é a atenção para sua possível saída (Lodi, 1998). Nesse sentido,
Lodi (1987) e Tillmann e Grzybovski (2005) destacam quão importante é a sucessão
planejada, tendo em vista que a tendência de muitos que ocupam o poder é não querer sair. E
mesmo que não exista uma idade certa, ele precisa estar preparado, implicando também a
preparação do sucessor, principalmente enquanto ainda está em pleno vigor e controle da
organização. A transição tende a ser menos traumática se ocorrer de forma planejada e não
abrupta, com a devida preparação do sucessor e com os conselhos e o conhecimento tácito do
fundador, que devem ser repassados.
2.4.2 O sucessor
Sem dúvida o sucessor é a outra peça fundamental desse quebra-cabeça. Além da sua
relação com o antecessor, que já foi discutida anteriormente, outros fatores-chave são
importantes.
O primeiro é a motivação do indivíduo. É desejável que ele esteja disposto e
totalmente comprometido com o processo (Sharma et al., 2001). Segundo Handler (1992),
quanto mais o trabalho na empresa da família estiver ligado às necessidades pessoais, de
carreira, de identidade pessoal e à fase de vida do sucessor, mais probabilidade de a sucessão
ser bem-sucedida. É desejável que o líder não force a entrada dos herdeiros no negócio.
Quando o sucessor não está partilhando os mesmos planos do sucedido e não quer seguir sua
42
carreira na empresa, ele pode se sentir frustrado e acabar não fazendo um bom trabalho.
Sucessores satisfeitos tendem a investir mais, são mais entusiasmados e assumem as
responsabilidades, adotando sentido distinto de identidade com a empresa (Handler, 1990; Le
Breton-Miller et al., 2004). Geralmente os estudiosos questionam sobre o quanto um sucessor
realmente está preparado para assumir a empresa. Porém, estar capacitado diz respeito não só
à sua formação profissional, mas também à sua vontade, seus objetivos de vida e sua relação
com o pai e com a família (Scheffer, 1995).
As perspectivas de um eficiente processo sucessório são boas quando o sucessor
demonstra habilidades, desempenho e experiência para liderar a empresa, alcançando
credibilidade e legitimidade para ser o novo chefe (Chrisman, Chua & Sharma, 1998). Isso
exige tempo de preparo e busca constante de desenvolvimento. Ward (1987) afirma que a
preparação do sucessor é um dos principais fatores que possibilitam a sobrevivência da
empresa depois da sucessão. Muitos problemas podem surgir porque o sucessor não se
preparou adequadamente para assumir a gestão. Elevado número de empresas quebra na
segunda geração, pois seus novos gestores não têm a capacidade necessária para administrá-la
e não conseguem manter o negócio lucrativo. A incompetência da nova gestão é um risco para
a longevidade das organizações familiares.
Também é muito positivo quando o sucessor entra precocemente no negócio, podendo
se familiarizar com a empresa, com sua cultura, seus valores e com os funcionários. É
possível também desenvolver aquelas capacidades específicas relacionadas ao ramo do
negócio (Ward, 1987). Tillmann e Grzybovski (2005) ressaltam que a entrada e o processo de
formação dos herdeiros deve começar cedo, pois quanto mais jovem ele se envolver na
empresa da família e se comprometer com ela, mais chances terá de obter sucesso em sua
administração e também de alinhar seus objetivos com os da organização. Segundo os autores
é essencial inserir gradativamente os filhos nos negócios, incentivando-os e os fazendo
“amar” a empresa. Quando isto acontece, tudo fica mais fácil.
O sucessor deve entrar lentamente, começando de baixo, exercendo atividades
operacionais básicas para adquirir conhecimento funcional em todas as áreas, buscando a
construção de uma carreira generalista para posteriormente subir na hierarquia (Lambrecht,
2005). Entrar na empresa cedo ajuda o sucessor a construir relacionamentos e ganhar
credibilidade para chegar ao topo organizacional (Morris et al., 1997). Não que a entrada
tardia do sucessor na empresa seja um entrave ao processo de sucessão, mas aqueles que se
preparam e conhecem substancialmente a organização podem ser mais eficazes do que os
outros.
43
A preparação profissional do sucessor inclui muitas coisas. Deve-se pensar na
formação educacional e na elaboração de um plano de desenvolvimento profissional para os
herdeiros. Segundo Morris et al. (1997), a educação de um sucessor é positivamente
correlacionada com uma transição suave e com o êxito pós-sucessão. Além disso, também é
importante fazer cursos superiores e de especialização, ter experiência de trabalho em outras
empresas que não a da família, além do desenvolvimento interno, dentro da organização
familiar (Lambrecht, 2005).
A experiência externa pode ser a chave da prosperidade de muitos sucessores de
triunfo. Fazendo parte do desenvolvimento, o sucessor pode adquirir bagagem de
conhecimentos diferentes, aprimorar seu senso de identidade, autoconfiança e credibilidade,
tendo somente a ganhar e a enriquecer sua formação para assumir a gestão futuramente
(Ward, 1987).
Existe um problema que fica latente quando nenhum herdeiro quer assumir a empresa,
ficando o antecessor sem opção, tendo que contratar gestores externos ou até mesmo tendo
que vender o negócio. Por isso, a escolha do sucessor deve ser feita com bastante cuidado,
pois existem também as situações em que todos os herdeiros gostariam de assumir a gestão,
mas somente um será escolhido. Neste caso, o gênero e a ordem de nascimento não devem ser
critérios válidos para o processo de escolha, mas sim a meritocracia e a preparação do
sucessor. A briga pelo poder pode ser muito prejudicial (Lambrecht, 2005).
2.4.3 Profissionalização da empresa
Conforme ressaltam Bernhoeft (1989), Le Breton-Miller et al. (2004), Morris et al.
(1997) e Ricca Neto (1998), a questão da profissionalização está diretamente relacionada ao
processo sucessório e também é intimamente ligada à sobrevivência das organizações
familiares, podendo ser um fator que se configura como uma oportunidade ou como uma
dificuldade.
É importante esclarecer que a profissionalização em uma empresa familiar não
significa necessariamente a retirada de todos os membros da família da sua gestão e a
consequente entrada de profissionais externos. Na realidade, existem na literatura duas
vertentes que entendem esse processo de maneiras diferentes. Em uma primeira, defendida
principalmente pelos estudiosos americanos, a profissionalização é entendida sob a
perspectiva da contratação de um executivo que não é membro da família para condução dos
negócios da organização. Nessa linha, pensa-se que quando a gestão é transferida para uma
44
pessoa externa ao núcleo familiar, é possível conduzir a empresa com padrões mais racionais
e objetivos, retirando-se, assim, aspectos subjetivos que podem ser prejudiciais (Burkart,
Panunzi & Shleifer, 2003; Morris et al., 1997; Tsui-Auch, 2004).
Nessa primeira vertente é defendida a ideia de que os problemas no processo de
sucessão podem ser minimizados pela administração mais profissionalizada, que
consequentemente traria mais eficiência com a separação da propriedade e do controle,
conseguida por um executivo externo à família, que tem condições de julgar de forma menos
arbitrária. Desta forma também, a empresa alcançaria maior grau de formalização em suas
etapas, podendo implantar sistemas de controle financeiro e regras burocráticas em sua gestão
(Burkart et al., 2003; Martins, Menezes & Bernhoeft, 1999; Morris et al., 1997).
Como foi dito, a vertente que defende a contratação de profissionais externos é uma
tendência marcante das empresas norte-americanas que buscam a separação da propriedade e
do controle. Isso é explicado pelas diferenças culturais entre os países que influem
diretamente na condução e nas práticas empresariais. Ao contrário do que acontece nos
Estados Unidos, por exemplo, nos mercados emergentes existe mais conservadorismo, que
prima pela manutenção da gestão nas mãos da família proprietária e que é mais resistente à
contratação de profissionais externos (Burkart et al., 2003).
Isso explica o fato de que nos artigos brasileiros encontra-se mais tendência à segunda
vertente, que defende a manutenção dos membros da família no topo da empresa, afirmando,
ainda, que eles podem ser melhores gestores do que os profissionais externos (Gersick et al.,
1997; Lodi, 1989; Scheffer, 1995). A profissionalização, portanto, significa o processo de
assumir práticas administrativas mais racionais, modernas e menos personalizadas, com
adoção de métodos impessoais e racionais que estariam mais adequados ao mercado
competitivo e não ficariam restritos à contratação externa (Lodi, 1998).
A profissionalização não significa que um membro da família não possa assumir a
gestão, sendo contrária à sucessão familiar. Um processo sucessório eficiente pode ser
consolidado com a adoção de práticas profissionalizadas, que serão um meio de diminuir os
aspectos subjetivos e de facilitar e formalizar a escolha do sucessor, que também pode ser um
membro da família (Lodi, 1989). Nesse sentido, é possível afirmar que as empresas familiares
estão em vantagem competitiva em relação a outras, uma vez que se pode alcançar eficiência
profissional com o diferencial de que os executivos eficientes também são os donos,
implicando mais interesse, empenho e agilidade na tomada de decisões. Profissionais externos
podem priorizar a gestão da própria carreira e buscar resultados de curto prazo, enquanto os
45
donos darão uma perspectiva de longo prazo, tendo em vista a manutenção do patrimônio e a
sobrevivência da empresa para as próximas gerações (Carney, 2005).
Na realidade, a decisão pela contratação de profissionais externos ou pela manutenção
dos membros da família na gestão com a formalização dos processos administrativos pode ser
impulsionada pelo tamanho da organização e pelo crescimento da família. Quando a empresa
familiar já está muito grande, pode ser conveniente a contratação de profissionais, pois na
família não existe número suficiente de pessoas capacitadas para assumir todos os cargos. Da
mesma forma, com o crescimento da família a empresa pode não conseguir absorver todos os
membros e isso tende a gerar conflitos que vão influenciar a sucessão, sendo necessária a
contratação de novos profissionais para minimizar tais problemas (Muchon & Campos, 1998).
No caso das pequenas e médias empresas, porém, em virtude do seu tamanho reduzido, do
fato de que, de modo geral, elas ainda estão sob o comando da primeira ou segunda geração e
de que a família ainda é pequena (a sucessão ocorre dos pais para os filhos ou entre irmãos),
fica evidente que a profissionalização aconteceria sob a perspectiva da segunda vertente. Esta
sugere a adoção de processos mais formais e não a contratação de executivos externos, uma
vez que os próprios membros da família podem ser preparados para profissionalizar a
empresa.
2.4.4 Planejamento sucessório
Há evidências na literatura sobre os efeitos positivos que um bom planejamento tem
sobre o processo sucessório (Lansberg, 1988; Morris et al., 1997; Tillmann e Grzybovski,
2005). Autores como Handler (1990), Lansberg (1988), Sharma et al. (2001) e Ward (1987)
concordam que a sucessão deve começar com muita antecedência e gerenciada como uma
ação planejada. Isso significa fazer os preparativos necessários, visando à harmonia da família
e à continuidade da empresa no futuro (Le Breton-Miller et al. 2004).
O planejamento da sucessão ou a falta dele também é um fator quase determinante do
sucesso ou insucesso do processo. É importante que o planejamento da sucessão aconteça o
mais cedo possível e seja incorporado no plano de negócios e na estratégia da empresa, pois
quanto mais tempo a família tem para planejar a sucessão, mais suave pode ser essa transição
(Ward, 1987). Esse planejamento pode evitar muitos conflitos, como aqueles que surgem
entre os filhos no momento da escolha do futuro sucessor. Se a decisão final do sucessor for
precedida de um plano estratégico que prevê os requisitos mais importantes para a nova
liderança, os herdeiros já estarão cientes dos critérios e dos motivos que levaram à escolha de
46
um deles e isso pode evitar a disputa de poder e fazer com que a escolha ocorra de forma mais
meritocrática.
A sucessão precisa ser vista como um processo e não como um fenômeno pontual nas
organizações familiares. Pensando na longevidade da empresa, ela vai ocorrer várias vezes ao
longo das gerações e o seu foco deve ser a continuidade. Sendo assim, a família deve
identificar, compreender e elaborar uma maneira própria para transferência do negócios ao
longo das gerações, o que requer o desenvolvimento de padrões para a realização da sucessão.
O planejamento envolve o estabelecimento de políticas sobre a participação da família, sobre
a entrada de novos membros, elaboração do plano de desenvolvimento das pessoas, os
critérios para escolha do sucessor, os pré-requisitos, as estratégias adotadas, os valores e a
missão familiar, entre outros (Lambrecht, 2005).
O planejamento significa fazer os preparativos necessários para garantir a harmonia da
família e a continuidade da empresa ao longo das gerações seguintes. Essas preparações
devem ser pensadas em termos das necessidades futuras de ambas (Lansberg, 1988).
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
3.1 Estratégia e método de pesquisa
Existem três situações em que indicadores qualitativos são importantes para uma
pesquisa. A primeira ocorre em momentos em que a evidência qualitativa é mais relevante do
que simples informações estatísticas relacionadas a épocas passadas. A segunda situação
acontece quando a metodologia qualitativa é usada para capturar dados psicológicos que são
reprimidos ou não facilmente articulados como atitudes, motivos, pressupostos, quadros de
referência, entre outros. Por último, ela é essencial em situações nas quais observações são
necessárias para a análise do funcionamento de estruturas e organizações complexas que são
difíceis de se submeterem à observação direta (Bonoma, 1985; Godoi & Balsini, 2004).
Os métodos qualitativos são usados quando o entendimento do contexto social e cultural
é um elemento importante para a pesquisa. Para a utilização desses métodos é preciso
aprender a observar, registrar e analisar as interações entre pessoas e entre elas e os
sistemas/ambiente. Essa abordagem possibilita entender um fenômeno por meio do estudo e
análise do campo empírico situado em seu ambiente natural. Os dados são obtidos mediante o
contato (participação) do próprio pesquisador e/ou outras pessoas com o objeto de estudo.
47
Partindo desses dados pessoais, o pesquisador fará sua interpretação de modo a compreender
os fenômenos dessa realidade estudada (Godoy, 1995).
Assim, neste trabalho optou-se pela estratégia qualitativa de pesquisa com o intuito de
apreender a realidade social das organizações familiares, tendo como finalidade explorar um
tema que ainda não apresenta vasto material publicado no Brasil, como é o caso do processo
de sucessão especificamente no contexto das pequenas e médias empresas familiares,
extraindo daí pontos relevantes para a condução do processo com mais possibilidades de
sucesso.
A pesquisa qualitativa é ideal, uma vez que a interpretação é o foco, ou seja, há
interesse em interpretar a situação em estudo sob o olhar dos próprios participantes; a
subjetividade é enfatizada, sendo que o ponto de interesse está sob a perspectiva dos
informantes; há flexibilidade na condução do estudo, não existindo uma definição a priori das
situações; o interesse é no processo e não no resultado; o âmbito sendo intimamente ligado ao
comportamento das pessoas na formação da experiência.
Trabalhos qualitativos vêm ganhando espaço na preferência das pesquisas relacionadas
às organizações desde a década de 1970, e entre as metodologias mais utilizadas, pode-se
destacar a pesquisa documental, etnografia e o estudo de caso. Entre estas, o estudo de caso é
o mais utilizado (Godoy, 1995).
O método do estudo de caso “[...] não é uma técnica especifica. É um meio de
organizar dados sociais preservando o caráter unitário do objeto social estudado” (Goode &
Hatt, 1973, p. 422). Bonoma (1985, p. 203) salienta que o “estudo de caso é uma descrição de
uma situação gerencial”, enquanto Yin (1989, p. 23) afirma que “é uma inquirição empírica
que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de um contexto da vida real, quando a
fronteira entre o fenômeno e o contexto não é claramente evidente e onde múltiplas fontes de
evidência são utilizadas”.
Yin (1989) e Godoy (1995) consideram o estudo de caso importante para a
compreensão de processos ou comportamentos novos ou pouco compreendidos. Ele é
preferido quando o tipo de questão de pesquisa procura responder “como” e “por que”,
proposições explicativas, tratando de relações que ocorrem ao longo do tempo; quando o
controle que o investigador tem sobre os eventos é muito reduzido; ou quando o foco
temporal está em fenômenos contemporâneos no cenário de vida real.
A necessidade de se utilizar essa estratégia de pesquisa nasceu do desejo de entender um
fenômeno social complexo, a sucessão em empresas familiares. Ela é adequada
principalmente porque se quer investigar questões que não podem ser compreendidas em sua
48
completude por meio de outra estratégia. Tal estudo consistiu em uma inquirição detalhada
das organizações ou grupos, objetivando proporcionar uma análise do panorama e dos
processos envolvidos no fenômeno (Yin, 1981). Um ponto importante a ser ressaltado é que a
principal diferença entre o estudo de caso e outros projetos qualitativos, tais como a teoria
fundamentada e a etnografia, é que ele está aberto para utilizar a teoria ou categorias
conceituais de forma a orientar a pesquisa e a análise de dados. Em contraste, as outras
pressupõem que as perspectivas teóricas são baseadas e emergem de dados de primeira mão
(Meyer, 2001).
Em pesquisas que investigam o segmento de empresas familiares e os seus fenômenos –
sucessão, profissionalização, estratégia, governança e cultura –, procura-se explicar ligações
causais em intervenções ou situações da vida real que são complexas demais para tratamento
com base em estratégias experimentais ou de levantamento de dados. Tais pesquisas também
procuram descrever um contexto de vida real no qual uma intervenção ocorreu; avaliam uma
intervenção em curso e exploram aquelas situações nas quais a intervenção não tem clareza no
conjunto de resultados. Yin (2005) ressalta que o uso de estudo de caso é importante
justamente por ser possível compilar informações provenientes do seu ambiente natural, o que
é diferente de confiar em dados advindos de fontes derivadas, como resultados de teses,
estatísticas ou respostas de questionários. Assim não é surpresa constatar que a maioria das
publicações sobre o tema organizações familiares utiliza estudo de caso como estratégia de
pesquisa. E, considerando os fenômenos em análise, pode-se concluir que essa é uma
estratégia adequada ao estudo dessas empresas.
Os métodos de coleta de dados podem incluir tanto dados de observação direta e
entrevistas, como análise de arquivos públicos e privados (Halinen & Törnroos, 2005;
Leonard-Barton, 1990). “Como esforço de pesquisa, o estudo de caso contribui, de forma
inigualável, para a compreensão que temos de fenômenos individuais, organizacionais, sociais
e políticos” (Yin, 2005, p. 21). E, em se tratando de um fenômeno social complexo como a
sucessão em empresas familiares, o estudo de caso possibilita um tipo de investigação em que
é possível manter as características holísticas, ou seja, do todo, levando-se em conta as partes
e suas inter-relações, bem como o que é significativo nos eventos da vida real (Yin, 2005).
Pelas publicações existentes no Brasil sobre o tema a ser pesquisado, é possível
perceber que o trabalho empírico que apoia o desenvolvimento da teoria sobre o processo de
sucessão em pequenas e médias empresas é relativamente escasso. E para atingir os objetivos
propostos, é necessária uma metodologia capaz de capturar os processos dinâmicos,
possibilitar uma descrição dos mesmos em um nível de detalhe que possa fornecer
49
compreensão do comportamento individual, do grupo de trabalho e organizacionais ao longo
do tempo, sendo indicado o uso do estudo de caso (Leonard-Barton, 1990).
3.2 Unidades empíricas de análise
A seleção dos casos é uma parte importante na construção da pesquisa que utiliza
estudo de casos (Eisenhardt, 1989). Pretende-se, neste trabalho, fazer um estudo de casos
múltiplos. O estudo de caso único está sujeito a um limite de generalização e a vários vieses
potenciais, como o risco de ignorar a representatividade de um único evento ou de dar
relevância exagerada a um dado por ele estar imediatamente disponível e ser o único
conhecido. Esses problemas podem ser reduzidos quando os dados são comparados, fazendo-
se um cruzamento entre eles. A abordagem de multicasos é a alternativa adequada, pois pode
aumentar a validade externa e ajudar a proteger contra os preconceitos do observador
(Leonard-Barton, 1990), além de acrescentar mais confiança às descobertas (Meyer, 2001). A
intenção da investigação é poder estudar várias empresas, prevendo-se encontrar resultados
semelhantes entre elas (Yin, 1989).
Para a seleção dos casos pretendeu-se seguir a lógica da amostragem teórica, ou seja,
os casos foram escolhidos por razões teóricas e não estatísticas, optando-se pelas empresas
que pudessem contribuir para os objetivos do trabalho e que atendiam aos critérios
predefinidos. Neste estudo, a seleção aleatória não foi necessária nem preferível, pois os casos
foram escolhidos de forma a estender a teoria emergente sobre a questão da sucessão em
pequenas e médias empresas e para preencher as categorias teóricas elaboradas pela autora
(EISENHARDT, 1989).
Para responder à questão proposta, é preciso adquirir uma visão em profundidade de
um número limitado de casos (Yin, 1981). Em virtude do tempo disponível para a pesquisa e
dos recursos existentes, optou-se por trabalhar com cinco casos. Como observou Pettigrew
(1990), dado o número limitado de casos que poderão ser estudados, fez sentido escolher
aqueles em que o tema de interesse, a sucessão, era transparentemente observável. Além
disso, para a escolha do mesmo, os critérios estabelecidos foram: o primeiro e essencial para
uma empresa ser considerada foi pertencer e ser gerida por uma família; segundo, tinha que
ter sido transferida de uma geração para a seguinte ou estar em fase de transferência da atual
geração gestora para a geração subsequente; terceiro, a empresa deve se enquadrar na
classificação de pequena ou média conforme a seguir: pequeno porte – aquela que aufere
receita bruta anual entre R$ 360.000,00 e R$ 3,6 milhões, seguindo a Lei Complementar nº
50
123, de 14/05/2006; médio porte – empresa que aufere receita bruta anual superior a R$3,6
milhões (Lei Complementar nº 123) e inferior a R$90 milhões (segundo classificação do
BNDES).
Por motivos de logística e facilidade de acesso às empresas, optou-se por organizações
com unidade na região metropolitana de Belo Horizonte, que é também a região onde reside a
pesquisadora, que atendessem aos critérios preestabelecidos e que pudesse contribuir com este
trabalho a partir de suas experiências relativas ao processo de sucessão. A definição dos
objetos de pesquisa se deu, portanto, pela contribuição e utilidade que os mesmos teriam para
responder ao problema de pesquisa proposto (Goode & Hatt, 1973). As empresas foram
contatadas a partir de indicações ou contato pessoal.
A primeira empresa selecionada, aqui denominada Alimentar, atua no setor de
indústria e comércio de alimentos e foi criada na década de 1980. Atualmente, conta com
mais de 200 funcionários, cinco espaços físicos para revenda dos produtos e atendimento
virtual para entrega em toda a região. Sua receita bruta anual está entre R$3,6 milhões e R$16
milhões, o que a enquadra como média empresa. A organização está sob o comando da
primeira geração fundadora e está passando por seu primeiro processo de sucessão, uma vez
que os herdeiros da segunda geração já estão trabalhando no negócio.
A segunda empresa selecionada, Educar, atua no setor de educação e foi fundada na
década de 1990. Tem aproximadamente 120 funcionários e sua receita bruta anual está entre
R$360.000,00 e R$3,6 milhões, sendo uma pequena empresa. Assim como a primeira
escolhida, estão na Educar a primeira geração fundadora e a segunda geração, ocasionando
sua primeira sucessão.
O terceiro caso é uma empresa do ramo farmacêutico cujo nome fictício adotado neste
trabalho é Medicar. É mais antiga, tendo aberto as portas por volta de 1930. Conta com 14
empregados, quatro estagiários e três pessoas da família trabalhando no negócio, sendo um da
segunda geração e dois da terceira. A Medicar passa por seu segundo processo de sucessão,
visto que o seu fundador já faleceu, estando hoje sob o comando da segunda geração. É uma
pequena empresa com receita bruta anual entre R$360.000,00 e R$3,6 milhões.
A Adoçar é a quarta pesquisada, cuja atividade econômica principal é a fabricação e o
comércio varejista de doces, balas, bombons e semelhantes. Também é uma empresa mais
antiga, fundada na década de 1920, com receita brutal anual entre R$360.000,00 e R$3,6
milhões. Quem está no comando da empresa é a terceira geração e está em andamento o
terceiro processo sucessório, ou seja, da terceira para a quarta geração de herdeiros.
51
A quinta e última empresa é a Transportar, fundada na década de 1950 e cuja principal
função é o transporte rodoviário. Seu fundador já é falecido e a sucessão da segunda para a
terceira geração também já ocorreu. Quem está no comando é, portanto a terceira geração.
Nessa empresa já se encontra um membro da quarta geração em atuação no negócio. Ela
possui cerca de 450 a 500 funcionários e é uma média empresa com faturamento bruto anual
entre R$3,6 milhões e R$16 milhões.
3.3 Estratégia de coleta de dados
A principal forma de coleta de dados foi mediante entrevistas semiestruturadas com os
fundadores que ainda se encontram direta ou indiretamente atuando nas empresas e com os
membros da segunda, terceira e quarta geração, dependendo do caso. Para participar das
entrevistas, foram definidos os seguintes critérios:
a) Ser membro da primeira geração (fundadora) e das gerações subsequentes;
b) Estar em atuação direta ou indireta na empresa: entendeu-se que isso tornaria o
herdeiro um candidato mais provável à sucessão.
Para fins deste estudo, acredita-se que as pessoas que atendessem a tais critérios
seriam as que poderiam contribuir, de alguma maneira, com informações relevantes para o
entendimento dos casos.
A entrevista foi considerada o método mais adequado aos objetivos propostos, uma
vez que deu acesso direto às pessoas envolvidas no processo. Para utilizar a entrevista como
principal meio de coletar os dados, foi importante construir uma relação de confiança entre o
pesquisador e os entrevistados (Meyer, 2001). Para tal, foi feito um contato formal com cada
empresa, em que os objetivos da pesquisa foram explicitados, bem como o problema a ser
investigado e a metodologia utilizada.
Como o objeto de pesquisa envolve questões pessoais de vida e de família dos
entrevistados, além dos aspectos empresariais e administrativos, foi acordado com todas as
empresas que os seus nomes, bem como os nomes dos entrevistados, seriam mantidos em
sigilo, não sendo, portanto, aqui identificadas. Assim definido, foi criado um nome fictício
para cada uma e um código para cada entrevistado.
Os códigos dos entrevistados foram formados a partir da combinação a seguir. Em
primeiro lugar, o entrevistado é identificado conforme a sua posição na família (fundador, pai,
mãe, filho, filha, neto). Em segundo lugar, foi acrescentada uma mesma letra do alfabeto para
52
cada entrevistado de uma mesma empresa: letra A para a Alimentar, B para a Educar, C para a
medicar, D para a Adoçar e E para a transportar.
O Quadro 6 apresenta a caracterização dos entrevistados com os códigos
correspondentes a cada um.
Quadro 6 - Relação dos entrevistados
Empresa Código dos
entrevistados Idade Geração Função na empresa Escolaridade
Alimentar
Pai A 52 Primeira Sócio proprietário -
Diretor Geral Segundo grau completo
Mãe A 53 Primeira
Sócia proprietária –
Atualmente não
exerce função
formal.
Graduação em Matemática e
MBA em Gestão Estratégica
Filho 1A 29 Segunda Gerente geral Graduação incompleta em
Administração
Filho 2A 24 Segunda Supervisor de loja Tecnólogo em Gestão
Comercial
Filho 3A 22 Segunda Supervisor de loja Graduação em Marketing
Educar
Mãe B 64 Primeira Sócia proprietária -
Diretora Graduação em Pedagogia
Filha 1B 37 Segunda Vice-diretora
Graduação em
Administração e em
Matemática.
Pós-graduação em Gestão de
Instituições de Ensino
Filho 4B 30 Segunda
Gestor de
Comunicação e
Marketing
Graduação em Relações
Públicas
Filha 5B 27 Segunda Gestora Pedagógica Graduação em Pedagogia
Medicar
Pai C 87 Segunda Sócio proprietário -
Farmacêutico Graduação em Farmácia
Filho 3C 44 Terceira Gerente de loja Graduação em Fisioterapia
Filha 5C 39 Terceira Farmacêutica Graduação em Farmácia
Adoçar
Pai D 86 Segunda Assessoria
Administrativa Técnico em Contabilidade
Filho 1D 58 Terceira Sócio proprietário –
Gerente de produção Segundo grau completo
Filho 2D 54 Terceira Sócio proprietário –
Gerente comercial
Graduação em
Administração
Neto 1D 34 Quarta Dono de loja Graduação em
Administração
Neto 2D 31 Quarta Gerente de produção
e dono de loja
Graduação em
Administração
Transportar
Pai E 74 Segunda Sócio – Consultor Segundo grau completo
Filho 1E 48 Terceira Diretor Geral Segundo grau completo
Fonte: Dados da pesquisa.
53
As entrevistas foram agendadas por telefone ou por contato via correio eletrônico (e-
mail). Em alguns casos, quando solicitado, o roteiro de entrevista foi enviado
antecipadamente, para conhecimento dos respondentes. Foram realizadas 19 entrevistas no
período compreendido entre os meses de março e outubro de 2012.
Todas as entrevistas foram individuais, realizadas nas dependências das empresas
investigadas e tiveram duração em torno de 50 minutos. Posteriormente às entrevistas, a
pesquisadora fez novos contatos com os respondentes, via telefone, a fim de esclarecer
dúvidas e validar algumas informações no momento da análise dos dados.
Conforme exigido pelo protocolo de entrevista semiestruturada, a pesquisadora
utilizou uma lista de perguntas para direcionar os assuntos e garantir que as informações
necessárias fossem obtidas, ao mesmo tempo em que ficou aberta para outras informações que
surgiram no decorrer das entrevistas. Mesmo tendo um roteiro para direcionamento das
perguntas, preferiu-se conduzir as entrevistas como uma conversa na qual os respondentes
ficavam mais à vontade para falar e expor suas ideias e a pesquisadora realizava intervenções
resgatando o roteiro original, quando julgava necessário. Isso foi importante, pois propiciou
uma maior proximidade entre entrevistadora e entrevistado. As informações contidas no
roteiro de entrevistas dizem respeito à empresa, ao processo de sucessão, aos obstáculos
encontrados, à forma como os antecessores trabalhavam com seus sucessores, às dificuldades
enfrentadas, entre outras. Foram elaborados dois roteiros diferentes específicos para cada
entrevistado, um para o antecessor e outro para o sucessor, conforme se pode observar nos
Apêndices A e B do presente trabalho.
Em virtude do tempo e dos recursos disponíveis, optou-se por fazer estudo transversal,
coletando os dados em um único momento no tempo. Esses dados foram obtidos a partir de
uma investigação retrospectiva, buscando-se reconstruir os momentos vividos pela empresa
no processo sucessório por meio da memória das pessoas envolvidas no mesmo (Leonard-
Barton, 1990).
3.4 Estratégia de análise de dados
A análise dos dados teve início no momento da coleta dos mesmos. Eisenhardt (1989)
é uma entre os autores que argumentam a favor da articulação entre coleta, codificação e
análise dos dados, enfatizando que melhores resultados podem ser alcançados com a
sobreposição desses passos. Uma boa maneira de realizar essa sobreposição, segundo essa
54
autora, é por meio de notas de campo, em que o entrevistador faz anotações sobre suas
percepções e observações, bem como suas análises no decorrer da pesquisa para que nenhum
pensamento seja esquecido e se perca quando chegar ao final.
Além de dar ao pesquisador uma vantagem no momento de iniciar a análise,
Eisenhardt (1989) afirma que a sobreposição com a coleta permite que ele se beneficie de uma
coleta de dados mais flexível, tendo liberdade de fazer ajustes durante a atividade, sempre que
julgar necessário. Tais ajustes podem ser a inserção de um novo caso ou de temas relevantes
que surgirem no desenvolvimento ou a adição de perguntas no roteiro de entrevista. Isso vai
permitir que o pesquisador inclua temas importantes que possam emergir ou aproveitar
oportunidades singulares em alguma situação.
Depois de realizar as entrevistas, todas as gravações foram transcritas, procurando-se
manter de forma fiel as falas dos entrevistados. O próximo passo foi a análise das respostas
em cada um dos casos. Essa fase é muito importante, pois o volume de dados pode ser muito
grande e o pesquisador corre o risco de se perder em meio a tanta informação. Pettigrew
(1990, p. 181) salienta que há um perigo sempre presente de “morte por asfixia de dados”.
Por isso, no primeiro momento, cada caso foi analisado separadamente, possibilitando
a compilação do volume de informações e propiciando conhecimento profundo de cada um,
com suas especificidades, e permitindo que os padrões únicos surgissem separadamente antes
de se fazer a análise conjunta dos mesmos. Posteriormente, os casos foram cruzados, a fim de
se obter uma comparação dos registros e avaliar se os mesmos dados foram observados ou
não em diferentes contextos, buscando-se padrões entre os mesmos ou novas informações.
Assim, além de identificar contrastes e/ou semelhanças nos casos, foi possível fazer
comparações entre eles (Eisenhardt, 1989).
Para evitar problemas de falsas conclusões ou de suposições prematuras no
processamento das informações, um quadro referencial prévio de categorias (Quadro 7) foi
criado. Tais categorias foram estabelecidas a partir dos objetivos específicos deste trabalho,
tendo a literatura como norteadora.
55
Quadro 7 - Categorias de análise
Objetivos Específicos Categorias Subcategorias
Analisar os fatores desencadeadores
do processo sucessório Sucessão
Planejamento
Entrada dos filhos para trabalhar na empresa.
Motivos inesperados (morte, doença ou outro)
Analisar como ocorreu ou está
ocorrendo a sucessão na empresa O antecessor
Seu papel no processo
A relação com o sucessor
Previsão de desligamento da empresa
Analisar como ocorreu ou está
ocorrendo a sucessão na empresa
O sucessor
Critérios para escolha do sucessor
Motivação do sucessor para assumir a empresa
Relacionamento com os outros herdeiros
Relacionamento com os funcionários
Formação/ preparação profissional
Habilidades, desempenho e experiência para
liderar a empresa
Entrada no negócio precocemente
Experiência externa
A família
Envolvimento da família nos negócios
Situação dos outros herdeiros que não
assumirão a sucessão
Propriedade da empresa
Identificar as dificuldades presentes no
processo Dificuldades
Falta de planejamento
Dificuldade do antecessor em deixar o negócio
Não preparação do sucessor
Falta de profissionalização
Disputa de poder entre os herdeiros
Conflitos dentro da família
Conflitos com funcionários
Averiguar as oportunidades que
nasceram em decorrência da sucessão Oportunidades
Profissionalização da gestão
Possibilidade de crescimento
Novas formas de conduzir o negócio
Melhorias financeiras
Fonte: Elaborado pela autora.
No próximo capítulo apresentam-se a descrição individual dos casos pesquisados e a
análise feita de forma conjunta com base nas categorias de análise apresentadas.
56
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
4.1 Descrição do caso: ALIMENTAR
A Alimentar é uma empresa relativamente nova, com pouco mais de 20 anos de
existência, fundada por um casal advindo do interior de Minas Gerais na década de 1980 que,
desde cedo, tinham o sonho de sair do interior e abrir um negócio no ramo de alimentação. O
marido (Pai A) ficou responsável pela administração e a esposa (Mãe A) pela cozinha. Em
pouco tempo de existência o negócio se expandiu e tornou-se uma marca conhecida. Hoje eles
contam com cinco lojas para atender à demanda na região metropolitana de Belo Horizonte.
A empresa está passando por seu primeiro processo sucessório, transferindo o negócio
da primeira geração fundadora para a segunda. A família é composta de seis membros: o Pai
A, Mãe A (fundadores) e quatro filhos com as idades de 29 (Filho 1A), 24 (Filho 2A), 22
(Filho 3A) e 17 (Filho 4A) anos, sendo todos homens. Até a ocasião da presente pesquisa o
filho mais novo é o único que não está trabalhando na organização.
O Pai A é um dos sócios e o responsável por toda a parte de gestão. Na empresa ele
exerce a função de Diretor Geral, sendo um dos principais tomadores de decisão em todas as
áreas. A Mãe A, que também é sócia, no momento não está exercendo função formal. Desde a
fundação da empresa ela foi a pessoa responsável pela área de produção a partir do
desenvolvimento de produtos, do controle de qualidade, da busca de inovação, decidindo
sobre os itens a serem fabricados e se responsabilizando pela fábrica e pelo treinamento dos
funcionários dessa área. Hoje, com a organização crescendo e bem mais estruturada, o setor
de produção foi totalmente profissionalizado e conta com equipe de quatro engenheiros de
alimentos e 20 nutricionistas para atender à demanda de serviço. Por isso e por outras
questões particulares, a Mãe A se afastou um pouco das atividades rotineiras da Alimentar,
mas ainda procura dar assistência à fábrica e é uma figura importante para as relações sociais
da empresa com o público.
O filho mais velho (Filho 1A) trabalha diretamente com o pai e é um parceiro, a
pessoa de confiança, alguém que na ausência do pai tem condições de responder por ele. O
Filho 1A está formalmente na empresa há sete anos e atua principalmente nas áreas financeira
e de compras. O Filho 2A é responsável pela supervisão e pelas compras de uma das lojas da
rede que trabalha em um segmento diferenciado das demais e o Filho 3A trabalha como
supervisor de loja, auxiliando também nos setores de recursos humanos e marketing.
57
A Figura 1 mostra um esquema que pretende representar os níveis de gerações e o
papel que cada um exerce na empresa da família:
Figura 1 – Genetograma Alimentar
Legenda:
É sócio e também trabalha na empresa.
Apenas sócio, não trabalha na empresa.
Não sócio, apenas trabalha na empresa.
Não sócio e não trabalha na empresa.
Fonte: Dados da pesquisa.
Entretanto, como é comum acontecer em pequenas e médias empresas familiares,
apesar de cada membro da família ter atividades direcionadas, na prática todos fazem um
pouco de tudo (Drucker, 1981; Leone, 1999; Oliveira, 2006; Reis, Escrivão Filho, 2003),
exercendo um tipo de gerência geral nas lojas, acompanhando o trabalho dos funcionários e
organizando o atendimento, conforme expressa a fala de um dos entrevistados: “Na verdade
cada um olha um pouco, uma parte e todo mundo olha tudo. Então nós estamos sempre nas
lojas acompanhando os funcionários. Isso aí é parte do trabalho de todo mundo” (Filho 3A).
O processo sucessório na Alimentar começou e vem acontecendo de forma natural e
intuitiva, quase inconsciente. Não existiu um planejamento prévio de ações e estratégias para
sua ocorrência. Ele também não começou em virtude da morte de um fundador ou de uma
doença que o afastasse do cargo, exigindo a entrada de um herdeiro para assumir seu lugar.
Conforme os próprios fundadores sinalizaram durante a entrevista, até aquele momento eles
ainda não haviam pensado formalmente a respeito do assunto.
Pai A
(Diretor Geral) Mãe A
Filho 1A (Gerente geral)
Filho 2A (Supervisor de
loja)
Filho 3A (Supervisor de
loja) Filho 4A
58
Mesmo assim, existe um sentimento de continuidade, um desejo de que os filhos
assumam a empresa futuramente e que o negócio tenha vida longa. Segundo o Filho 3A, o pai
e a mãe sempre demonstraram a importância que o empreendimento fundado por eles tem
para a família, que ele faz parte de um sonho e que todo o trabalho para fazer o negócio dar
certo sempre foi realizado pensando nos filhos, no seu futuro, uma vez que um dia tudo
passaria para as suas mãos. Os pais têm consiência de que não ficarão ali para sempre e por
isso procuraram ensinar aos herdeiros o valor da empresa e incitar neles o amor por ela:
Desde quando a gente era criança, nós sempre fomos preparados pra isso. Eles
sempre falaram também que eles fezem tudo pra gente, que eles não iriam ficar o
resto da vida também e [...] então a gente sempre aprendeu a dar valor ao que eles
tem e dar valor ao trabalho também (Filho 3A).
Na época em que os filhos eram menores, os pais não tinham com quem deixá-los nos
finais de semana e por isso eles tinham que ir junto para a loja e acabavam ajudando em
diversas atividades. Segundo a Mãe A, já com cinco anos de idade o filho mais velho
auxiliava no atendimento aos clientes:
Eles tinham cinco anos e se você chegasse aqui o Filho 1A, com cinco anos, no
domingo, de 11 horas da manhã às 13 horas da tarde, ele estava no caixa, com o
dedinho, em cima de um banquinho. Os fregueses parece que vinham aqui só para
vê-lo (Mãe A).
O tempo passou e assim eles foram crescendo dentro do ambiente empresarial,
trabalhando com diversas atividades e se interessando também pelo negócio da família, tudo
de forma muito natural:
Então eles foram entrando na brincadeira, né? E nós precisávamos trazê-los também
porque não tinha com quem deixar em casa no fim de semana. Então eles
começaram trabalhando no fim de semana. E eles foram tomando mais amor e eles
foram entrando, nada pensado, você vai fazer isso, você vai fazer aquilo, sem muito
planejamento né? (Mãe A).
Com certeza eu acho que ao longo dos anos a gente já vem, todo mundo assim em
união fazendo uma preparação. Meu pai e minha mãe sempre foram preocupados
com isso. Não é à toa que nós sempre estivemos aqui dentro da empresa. Eu desde
oito, 10 anos de idade que eu me lembre eu estava presente já, estava nos finais de
semana, eu vinha com eles é [...]. E depois se tornou uma coisa mais séria, né, então,
vem desde pequeno mesmo (Filho 2A).
Depois de adultos, o interesse dos filhos em assumir um cargo dentro da organização
familiar se deu por diversas razões. A entrada efetiva do Filho 1A na empresa, por exemplo,
foi marcada pela abertura de uma nova loja que deveria ser por ele gerenciada. O Pai A
59
argumenta que abriu tal loja com o intuito de envolvê-lo em uma atividade na Alimentar. Na
época em que estava na faculdade, o Filho 1A começou a atuar em outro ramo. Não
concordando com a nova atividade assumida pelo filho, os pais propuseram abrir uma loja em
sociedade com ele e assim conseguiram desviar sua atenção para o negócio familiar. Já os
Filhos 2A e 3A viram na empresa uma oportunidade de colocar em prática os conhecimentos
adquiridos nos cursos de graduação e uma forma de ganhar experiência.
Atualmente os filhos assumiram mais responsabilidades para ajudar os pais e também
adquiriram conhecimento mais profundo da sua organização. Sem ter conscientemente a
intenção de prepará-los para a sucessão, mas talvez pensando em dividir responsabilidades de
algumas tarefas, os pais delegaram atividades e os envolveram na rotina da Alimentar. Tal
fato pode ser percebido nas falas dos herdeiros, em que eles explicam que muitas
responsabilidades já foram confiadas a eles:
Várias coisas da rotina da empresa já estão sendo passadas para nós, né, pros filhos.
Eles deixam várias coisas do dia-a-dia para nós, para evitar atrito também e pra
gente ir aprendendo também a se virar sozinho. É, eles acompanham, mas grande
parte do dia-a-dia já é os filhos que fazem (Filho 3A).
Mesmo estando em fase intermediária do processo e acontecendo informal e
intuitivamente, pode-se considerar, de acordo com a literatura estudada (Grzybovski,
Hoffmann & Muhl, 2008; Rossato Neto & Cavedon, 2004; Tillmann & Grzybovski, 2005),
que a sucessão já está em andamento na empresa Alimentar. Os filhos se envolveram ainda
cedo com a empresa, os pais têm em mente que o futuro do negócio é ser gerido pelos
herdeiros e os estão preparando para assumi-lo futuramente.
Por enquanto, nenhuma disputa de poder é evidente entre os herdeiros. Entre os quatro
filhos, o mais novo (Filho 4A) tem deixado claro seu desinteresse pelo negócio da família. Ele
é o único que não trabalha na empresa e tem como objetivo estudar Direito e seguir a carreira
diplomática. Quando ele vai às lojas é por obrigação, pois, esporadicamente, em determinadas
épocas do ano, como Páscoa e Natal, a sua ajuda é solicitada:
Detesta vir ajudar fim de semana ou alguma coisa que precisa. Vem no Natal; uma
obrigação. Quando ele vem aqui às vezes ele fica só anotando, faz tipo um consultor
[...], fala o que está errado [...], já vem com tudo. É até bom, sabe, que muita coisa é
verdade (Mãe A).
Em relação ao papel do fundador no processo de sucessão, pode-se dizer, com base
nos relatos do Filho 1A, que o pai é um colaborador. Segundo o Filho 1A, o pai já exerceu
60
mais os papéis de professor, de supervisor, de introdutor, em que ele era um superior imediato
que lhe atribuía tarefas, dava instruções, supervisionava o trabalho, ensinava, cobrava e
corrigia. Hoje eles são parceiros, trabalham quase que em um mesmo nível. O pai ouve o
filho, dá autonomia para ele e compartilha praticamente todas as decisões da empresa.
As relações familiares na Alimentar, segundo comentaram os membros da família,
caminham dentro da normalidade, existindo alguns conflitos comuns entre pais e filhos, entre
irmãos, mas que não são levados para o ambiente de trabalho. Da mesma forma, os conflitos
que aparecem na rotina do serviço na empresa também não passam para um nível pessoal a
ponto de atrapalhar o convívio familiar. Apenas se observou que existe divergência de ideias e
de objetivos entre a geração fundadora e a segunda geração, que se se configura como uma
dificuldade latente para a finalização do processo sucessório e para que os pais tenham mais
confiança em transferir a gerência do negócio para os sucessores.
Os fundadores são mais conservadores quanto à gestão do negócio, a investimentos e a
novas ideias. Como foram eles que abriram a empresa e a viram crescer como resultado dos
seus esforços e da sua maneira de conduzir a administração, eles não têm a intenção de
expandir ou de se tornarem uma grande empresa. Querem continuar com um estilo mais
conservador de gestão, ficar a princípio com as cinco lojas atuais, com grande variedade de
produtos e atendendo ao cliente de forma personalizada. Por outro lado, os filhos têm uma
visão mais ambiciosa, veem possibilidade de crescimento, de ganhar mais dinheiro e uma das
formas seria a abertura de franquias.
Em virtude desse conflito de ideias os fundadores se mostraram um pouco hesitantes
em relação à finalização do processo de sucessão, especialmente a Mãe A, que é quem mais
se opõe às novas ideias e às mudanças propostas pelos filhos. Mesmo o Pai A, que afirmou já
ter encontrado seu sucessor, não acha que o herdeiro está totalmente preparado para assumir a
empresa. Ao serem questionados sobre suas expectativas em deixar a administração da
empresa nas mãos dos sucessores em um futuro próximo, de forma incisiva a Mãe A
responde:
Eu não, eu bato muito de frente. Então, como a minha ideia é um pouco contrária,
[...] essa sucessão aí eu estou muito brigando, entendeu? Em uma época eu me
afastei mais, agora que eu estou tentando voltar. Eu fiquei mais angustiada, porque
[...] não aceito algumas coisas. Mas é aonde vem a sucessão e começa alguns atritos
familiares, porque eles pensam de um modo e a gente pensa de outro, né?
A respeito de suas expectativas de desligamento da empresa, os fundadores afirmam
que isso não ocorrerá em curto ou médio prazo. Porém, o Pai A se mostrou um pouco mais
otimista com a ideia e mais disposto a pensar sobre o assunto. Talvez ele pense assim por já
61
estar preparando seu sucessor e por ter menos conflitos de ideias com os filhos. A Mãe A está
mais resistente. Mesmo assim, o Pai A ainda vê a necessidade de estar presente para ensinar e
até mesmo frear algumas atitudes dos filhos com as quais ele não concorda.
Um ponto comum percebido nos antecessores é que mesmo no futuro, quando eles já
tiverem mais confiança em seu sucessor, eles pensam em continuar na empresa como
consultores, pois não vão conseguir sair totalmente, com medo de ficarem sem alguma
atividade e de se sentirem deprimidos. O Pai A acha que em algumas áreas ele ainda seria
indispensável:
Mas nessa parte aí de obra, manutenção, isso aí eles são meio fracos. Eu acho que
isso eu não posso largar. Talvez daqui alguns anos apareça alguém, né? E segurá-los
também pra não ficar montando novos pontos assim só por montar, né? Aí eu vou
mostrando que não é bom negócio. Mas isso aí acho que ajuda a segurar muito. Eu
ajudo.
Da mesma forma, a Mãe A não se vê desligada totalmente do negócio e pretende
continuar na empresa, mesmo que não tenha um ritmo de trabalho tão acelerado e muitas
obrigações, mas nunca se distanciar totalmente: “Eu não me vejo desligada total. Até agora eu
não consegui enxergar isso não. Entendeu? Eu enxergo assim ó, eu vindo aqui, duas, três
vezes por semana, na parte da manhã na fábrica” (Mãe A).
Em relação à formação profissional dos herdeiros, todos aqueles que atuam na
empresa acabaram escolhendo cursos voltados para a área de gestão. O Filho 1A começou a
fazer o curso superior em Administração, mas parou antes de concluir. O Filho 2A formou-se
em Gestão Comercial no ano de 2012 e o Filho 3A, em Marketing. Segundo eles, a decisão
pelos respectivos cursos foi tomada individualmente e por vontade própria de cada filho. Eles
gostam da área e decidiram livremente procurar uma formação gerencial a fim de se capacitar
para gerir um negócio:
Todo mundo pegou o gosto pela coisa e viu que a gente tinha uma oportunidade nas
mãos, então vamos capacitar pra isso, né, vamos [...] a gente vê a faculdade ou o
curso técnico que eles não vão te ensinar a fazer, mas eles vão abrir sua cabeça pra
muita coisa (Filho 3A).
Além do curso de formação superior, os filhos procuram participar de feiras onde
novidades no ramo são apresentadas. O único que fez um curso adicional foi o Filho 3A, que
foi para São Paulo fazer especialização em lojas virtuais para aprender estratégias de venda
pela internet. Ele também é o único que tem alguma pouca experiência fora da empresa
familiar. Trabalhou pelo período de oito meses em uma rede de supermercados com o
objetivo de conhecer outra realidade de trabalho em uma empresa que não fosse a dos pais.
Ele não ficou mais tempo, pois o horário de serviço estava atrapalhando seus estudos.
62
A escolha do potencial sucessor pelo Pai A não se deu em decorrência de critérios
predefinidos de habilidades e formação profissional. Hoje ele é o candidato preferido à
sucessão, devido à sua afinidade com o pai, pela idade, por ser o mais velho e por estar há
mais tempo trabalhando na organização. Conforme o relato de um dos irmãos, ele é o que
demonstra mais vontade e mais dedicação à empresa. Ele disse que o Filho 1A realiza o
trabalho com muita seriedade, tem mais responsabilidades e parece ter mais amor pelo
negócio da família. Sobre o envolvimento do irmão mais velho com a empresa, o Filho 3A
comentou: “A vida dele é grande parte a empresa também, trabalha muito mais que a gente
também”.
Aliado a isso, ele tem perfil mais empreendedor e de liderança, fora sua aptidão
natural com a área de finanças e de compras, o que o fez trabalhar na mesma área que o pai e
ser hoje sua pessoa de confiança na organização. Entre os próprios irmãos existe consenso de
que o Filho 1A seria o possível sucessor à presidência da empresa. Isso pode ser observado na
fala do Filho 3A:
Hoje é o Filho 1A, né [...], porque ele está mexendo mais na área financeira, então
ele está mais por dentro [...]. O Filho 1A está mais por dentro, né, [...] há mais tempo
na empresa também, ele já passou por todos os setores, eu acredito então que ele já
tem uma capacidade maior. Eu e o Filho 2A estamos aí mais ou menos há cinco
anos, só que a gente está se desenvolvendo.
Ainda se percebe que existe uma motivação pessoal em todos os filhos que trabalham
na empresa. Essa motivação é visível principalmente no Filho 1A, que é o principal candidato
à sucessão. Ele não demonstra alguma vontade de trabalhar em outro lugar que não seja o
negócio da família e afirmou que está feliz com a perspectiva de se estabelecer ali como um
futuro gestor para dar continuidade ao negócio, fazendo-o prosperar e crescer pouco a pouco:
“E minha vida está boa demais” (Filho 1A).
O relacionamento dos herdeiros com os funcionários é muito bom, segundo percebem
os três filhos. Para eles, os funcionários já estão acostumados a vê-los desde pequenos nas
lojas, ajudando, e por isso essa boa relação foi sendo construída pouco a pouco. A Alimentar
tem a filosofia de tratar os funcionários não só como simples empregados, mas como
colaboradores, com todo respeito e até certo paternalismo: “[...] meus funcionários eu não
gosto que os tratem mal não. Eu sempre fui muito amiga dos funcionários” (Mãe A).
Seguindo essa filosofia, os pais ensinaram aos filhos que os funcionários são parte
fundamental da organização, visto que o bom funcionamento do negócio também depende
deles e por isso devem ser tratados com respeito e amizade. Os fundadores acreditam que os
gestores devem conhecer as pessoas com quem trabalham, devem perguntar sobre suas
63
famílias, a vida pessoal, ainda mais porque a maioria do quadro é composto de mulheres, que
são mais sensíveis e gostam desse tipo de aproximação.
Nós temos que tratar todo mundo muito bem, saber o nome de todo mundo, dar bom
dia, boa tarde, começar a perguntar da vida do filho, se o filho tá doente [...]. Nós
temos um quadro aí quase 80% de mulher, então muitas mães de família [...]. Nós
procuramos saber da vida deles também e somos bem presentes, bem participativos
(Filho 3A).
Na percepção dos entrevistados, os funcionários veem os chefes quase como colegas
de trabalho, que trocam ideias, que procuram saber das suas necessidades. Segundo a família,
os funcionários têm muita abertura para falarem diretamente com eles. Assim como os pais,
os filhos vêm buscando construir essa relação de amizade e ganhar o respeito das pessoas que
trabalham na empresa. Todos procuram tratar os funcionários da mesma forma.
Em relação às oportunidades e mudanças decorrentes da entrada dos filhos no negócio,
é possível perceber, pela fala deles, que muita coisa tem sido modificada e melhorada,
principalmente as relacionadas ao processo administrativo. Desde que eles assumiram
algumas responsabilidades operacionais, algumas áreas que antes não eram tão valorizadas
pelos pais fundadores, mas que são primordiais na administração de uma empresa,
começaram a se desonvolver. Pode-se citar o controle de estoque, a informatização dos
sistemas, a implantação de algumas políticas de Recursos Humanos (RH), como o
estabelecimento de metas e de premiação de funcionários, coisas que os filhos aprenderam
nos cursos de graduação e que conseguiram implantar com sucesso na empresa Alimentar.
Um dos filhos chegou a falar que tais mudanças ajudaram no crescimento do negócio. A
empresa está mais organizada em virtude da estruturação de alguns processos administrativos
que formalizaram e profissionalizaram mais a gestão.
Outra mudança positiva implantada por um dos filhos, Filho 1A, foi o sistema de
compras por meio de leilão. Antes desse leilão as compras eram feitas separadamente, por
loja, e a demanda de vendedores para serem atendidos todos os dias era grande, o que
ocupava muito tempo do comprador:
Aí eu via que chegava aquele tanto de vendedor pra atender. Eu não tinha tempo pra
ficar comprando, tipo assim, ficar anotando um por um, ver quem tinha preço
melhor. Ficava um comprador em cada loja, demorava a semana inteira pra fazer
(Filho 1A).
Então o filho mais velho teve a ideia de marcar um dia, em um horário específico, em
que todos os interessados em vender seus produtos para a Alimentar se reuniam e davam seus
64
lances. Aqueles com melhor preço e qualidade conseguem a venda. Em duas horas a empresa
conegue fazer toda a compra necessária para a semana e o Filho 1A tem muito tempo livre
para exercer outras atividades.
O primeiro modernizou muito nossas compras. Para você ter ideia, hoje ele faz um
leilão uma vez por semana com uma hora e meio, duas horas, ele compra tudo. O
que eu ficava a semana inteira comprando, ele hoje compra tudo com duas horas. O
povo gosta muito dele, porque [...] no princípio eu achei até que o pessoal não ia vir,
né? Leilão? Será que o cara vai estar disposto a toda segunda-feira duas da tarde? O
leilão dele hoje é disputado. Não tem nem [...] tem lá umas 15 cadeiras, falta até
cadeira para o pessoal sentar (Pai A).
Além da eficiência na compra, eles ganharam vantagem no preço que caiu bastante,
pela concorrência direta e pela compra em volume que é feita. A partir da sua fala percebeu-se
que o Pai A foi um dos que ficaram mais satisfeitos com esse novo sistema de compras
implantado pelo filho.
4.2 Descrição do caso: EDUCAR
A Educar é uma empresa que atua no setor de educação básica e está no mercado há
pouco mais de 15 anos. Sua idealizadora é uma mulher, que dedicou 35 anos da sua vida à
educação, trabalhou como funcionária em rede pública e privada exercendo diversos cargos,
desde professora, coordenadora até chegar a gerente e diretora. Como precisou trabalhar para
ajudar a sustentar os cinco filhos, ela adiou por muito tempo o sonho de ter o próprio negócio.
Por ter sido inserida no mercado de trabalho ainda muito nova, sua aposentadoria por tempo
de serviço se deu antes dos 50 anos de idade e, logo que aposentou, comprou o primeiro
terreno e abriu uma escola, que começou pequena e hoje conta com mais de 1.300 alunos. Na
época, o marido era funcionário de uma empresa multinacional e trabalhava com vendas. Ele
aderiu ao sonho da esposa, pediu demissão do emprego e se juntou a ela na fundação da
Educar.
A família principal é composta de sete membros: o pai, a mãe e cinco filhos, todos
casados. Eles têm cinco netos, mas nenhum com idade para trabalhar ainda. Atualmente estão
na empresa todos os membros da família direta e oito pessoas da indireta (dois genros, duas
noras, uma irmã do Pai B juntamente com o marido e a filha e uma cunhada, que é esposa do
irmão da Mãe B). A sociedade é composta somente pelo Pai B e a Mãe B, sendo os dois os
únicos donos, sem a participação de algum outro filho, genro, nora ou cunhado. Nos cargos
mais altos estão o Pai B (idade não informada) e a Mãe B (64 anos). O Pai B é o diretor
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financeiro que se responsabiliza pela parte administrativa e financeira da empresa e pelo
gerenciamento de obras e serviços de manutenção. A Mãe B é a diretora geral e, portanto, a
principal responsável pela área pedagógica.
Hierarquicamente, nos cargos subordinados aos pais está a Filha 1B, a mais velha,
com 37 anos, que exerce o cargo de vice-diretora e trabalha diretamente com a mãe na direção
pedagógica da organização; e o filho 2B (33 anos), que é o gestor financeiro e atua ao lado do
pai na administração. O Filho 3B (32 anos) é o gestor de tecnologia e trabalha
especificamente na área de Informática; o filho 4B (30 anos) é o gestor de comunicação e
marketing; e a caçula, Filha 5B (27 anos), é gestora pedagógica.
Da família indireta, a irmã do Pai B é assistente financeira, o marido dela é
funcionário no setor de manutenção e a filha é professora. Também há uma cunhada e um
genro que são funcionários terceirizados, donos de duas lanchonetes que funcionam dentro da
escola, uma nora que é professora de Educação Física, outra que é gestora pedagógica e um
genro que é coordenador. Desta maneira a, Figura 2 procura representar o genetograma da
Educar:
Figura 2 - Genetograma Educar
Legenda:
É sócio e também trabalha na empresa.
Não sócio, apenas trabalha na empresa.
Fonte: Dados da pesquisa.
Irmã (Assistente
Financeira)
Marido (Funcionário na
manutenção)
Filha 1B (Vice-diretora)
Filho 2B (Gestor
Financeiro)
Filho 3B (Gestor de
Tecnologia)
Filho 4B Gestor de Com.
e Marketing
Filha 5B (Gestora
Pedagógica)
Filha (Professora)
Pai B (Diretor
Financeiro)
Mãe B (Diretora Geral)
66
A Educar está passando por sua primeira sucessão. Formalmente não existe um
planejamento desse processo, mas a Mãe B e o Pai B demonstram consciência e se preocupam
com essa etapa que vem acontecendo de forma natural com a entrada dos filhos para
trabalharem no negócio da família. Na entrevista a Mãe B deixou claro que mesmo não tendo
algo formalizado ou escrito, em sua cabeça e na prática a sucessão já vem ocorrendo há algum
tempo. Ela sabe que o processo é longo e que muitas de suas ações e de seu marido são feitas
visando ao futuro e à longevidade da empresa: “Está na cabeça e já estou até executando.
Porque o processo é longo, né, gente? É um processo longo. E eu acho que mais é na prática
mesmo também. Então, eu não tenho esse planejamento, assim no papel não” (Mãe B).
Todos os filhos cresceram no ambiente escolar acompanhando a mãe em suas
atividades no ramo da educação. Porém, segundo os depoimentos dos filhos entrevistados, a
escolha do curso superior de cada um se deu independentemente do negócio da família. Em
outras palavras, eles não foram persuadidos pelos pais ou por algum tipo de pressão para
seguirem carreira na empresa. As escolhas ocorreram de acordo com os interesses próprios de
cada um. A Filha 1B formou-se em Administração de Empresas e depois em Matemática. À
época da entrevista para esta pesquisa, ela estava finalizando um curso de pós-graduação em
Gestão de Instituições de Ensino e já vinha se preparando para cursar o mestrado. O Filho 2B
inicialmente ia fazer Medicina, mas optou por Administração e atualmente cursa Direito. O
Filho 3B cursou o ensino superior na área de Informática, o Filho 4B se formou em Relações
Públicas e a Filha 5B em Pedagogia.
A filha mais nova foi a única que relatou ter tido alguma influência da mãe e do
negócio da família sobre a sua decisão. Ela chegou a estudar bastante tempo na escola
fundada pelos pais e, além disso, acompanhou a mãe em suas atividades pedagógicas nas
escolas em que trabalhava. Mesmo assim ela deixa bem claro que nada foi imposto,
espontaneamente o meio acabou influenciando sua decisão, mas ela resolveu seguir a
profissão de pedagoga por desejo e vontade própria:
A minha mãe e meu pai também nunca disseram: “Ah, eles têm que trabalhar lá”.
Tanto que a Filha 1B não começou a trabalhar aqui. Ela veio, depois saiu, foi
trabalhar em outra instituição, depois voltou. E em momento nenhum minha mãe se
posicionou pra ela ficar. Eu depois que formei na escola logo já fiz Pedagogia. Mas
desde criança eu me lembro de ficar brincando de escolinha, não sei se por
influência da minha mãe mesmo, sempre que eu ia pra escola não queria ir embora,
queria ficar brincando com os meninos de escolinha. Eu sempre gostei muito. Eu
não me lembro de pensar em fazer outro curso sem ser Pedagogia não, nunca (Filha
5B).
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Na época em que a Educar foi fundada, a Filha 1B trabalhava em um banco e como
professora em uma escola. Ela e o Filho 2B, sendo os mais velhos, acompanharam e
participaram do momento da abertura da empresa ajudando os pais nas atividades. Porém,
segundo o próprio relato da Filha 1B, ela não quis logo no primeiro momento deixar os
empregos que tinha para se dedicar exclusivamente ao negócio familiar. Durante cerca de
cinco anos ela ficou com receio dos problemas que poderia encontrar na empresa da família e
continuou ajudando sem se envolver totalmente:
No meu caso foi até um pouco diferente porque eu não tive o interesse de início, o
interesse espontâneo. Exatamente uma das coisas que me preocupava era de ser
família. Apesar de que a gente sempre teve um bom relacionamento e tudo,
exatamente por isso que pensei assim, nossa eu já tenho outro trabalho, e eu gostava
bastante de ficar lá, de dar aula, estava tudo bem. E eu vim, mas é [...] com um
pouco de receio (Filha 1B)
Quando recebeu uma proposta da escola onde trabalhava para assumir um cargo mais
alto, a Filha 1B refletiu e viu que estava muito mais engajada e interessada pelo negócio da
família e decidiu sair dos dois outros empregos para se dedicar integralmente à Educar.
Já os outros filhos começaram a trabalhar na empresa ainda jovens, assumindo
atividades mais básicas e operacionais e aos poucos criaram raízes efetivamente. Os mais
novos nem chegaram a trabalhar em outro lugar. Os pais os colocavam em atividades mais
simples como forma deles ajudarem e contribuírem com o negócio que estava no início, o que
colaborou para que eles conhecessem mais profundamente a escola e quisessem trabalhar
nela:
Falei que eles iriam trabalhar aqui para ajudar a pagar a faculdade. Daí eles vieram,
ajudavam na portaria, ajudavam no xerox, ajudavam a olhar aluno, como auxiliar de
sala e começaram a participar do ambiente, mas sem nenhum [...], nenhuma
responsabilidade, vamos dizer, maior que eles têm hoje, né?! E assim as coisas
foram caminhando. Eles foram tomando gosto (Mãe B).
Pode-se observar que os filhos hoje estão na empresa familiar por vontade própria.
Todos os entrevistados responderam que não pensam em trabalhar em outro lugar, que estão
muito felizes e realizados profissionalmente com as atividades que exercem. Como cada filho
se encaixou no negócio dentro da sua área de formação, ficou mais fácil organizar o
relacionamento e o entrosamento dos familiares na empresa, pois cada um cumpre seu papel,
tem sua responsabilidade e não precisa interferir nas atividades do outro. Tudo isso pode ser
visto nas falas dos membros da família entrevistados:
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Hoje eles gostam muito de trabalhar aqui na escola, não querem sair. Às vezes
recebem propostas, né, é [...] de outras empresas. Eles não vão. Eu falo: “se vocês
quiserem ir, podem ir, não tem problema nenhum. Vai fazer falta, mas vocês têm o
direito”. Não querem, gostam muito, muito, muito, sabe? Todos eles. E aí eu
consegui colocar cada um num setor pra facilitar também o entrosamento, o
relacionamento [...], pra não dar problema. Mas assim é mais fácil, né, da gente lidar
com essas questões familiares aqui dentro, e cada um está no seu lugar, no seu papel
(Mãe B).
Não existem critérios predefinidos pelos sucedidos para a escolha do sucessor. Essa
seleção está acontecendo de forma espontânea e natural. Em virtude da idade, da área de
atuação e do tempo de experiência, a tendência é que os dois filhos mais velhos sejam os
futuros gestores: a Filha 1B para assumir a posição da mãe e o Filho 2B para assumir o lugar
do pai.
Mesmo antes de existir a Educar, a Filha 1B já trabalhava no setor de educação. Na
empresa familiar ela começou como professora, atuou muito tempo como coordenadora
pedagógica, passou a ser gestora pedagógica, chegando ao cargo de vice-diretora, que exerce
atualmente. Além da experiência, segundo a própria mãe, a Filha 1B apresenta características
e habilidades como liderança, relacionamento interpessoal, alto nível de interesse,
comprometimento, dedicação, entre outros, que a tornam apta para assumir a direção
pedagógica geral da instituição. Referindo-se à filha como uma possível sucessora, tem-se o
seguinte relato da Mãe B:
Eu já. Eu visualizo a Filha 1B. Ela é a filha mais velha e eu acho que ela tem um
perfil muito grande de liderança. Todos têm, mas eu visualizo a Filha 1B. A Filha
5B que também atua na área pedagógica é a mais nova. São 10 anos de diferença de
idade entre elas. Pode ser que isso aí tenha influenciado um pouco porque a Filha 1B
já adquiriu mais experiência, sabe? E o perfil dela é muito adequado pra isso (Mãe
B).
À afirmação da Mãe B acrescenta-se a percepção do Filho 4B:
Não, o óbvio, né. Porque, por exemplo, se ela é diretora e tem uma vice-diretora,
logo seria que a vice assumisse o lugar da diretora e obviamente outra pessoa, não
necessariamente filho, assumir a vice. Talvez a Filha 1B mesmo, por ela exercer
esse cargo e ela estar com ela como vice, vamos falar assim, então vamos
experimentar, ver como é que funciona (Filho 4B).
Além disso, hoje a Filha 1B se diz totalmente motivada e deseja realmente ficar na
empresa familiar. Como foi dito anteriormente, no início ela teve receio de deixar seu trabalho
em outra empresa para se dedicar exclusivamente à Educar e um dos principais motivos era o
fator família. Hoje, porém, este é justamente o fator que mais a incentiva a ficar na empresa:
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Eu sempre pensava que não ia ficar, mas é como se fosse apaixonar mesmo pela
coisa, inclusive por ser da família. Não só por ser escola, né, que isso a gente já
gostava mesmo, tanto é que trabalhava era em escola também. Isso eu já gostava.
Mas o fato de trabalhar, de ser família e tudo, aí eu fui apaixonando mesmo. E isso
foi rápido, assim, em meses já não tinha dúvida (Filha 1B).
Mas, se todos os filhos estão no negócio, por que os outros quatro não seriam também
potenciais candidatos à sucessão? Entre os cinco filhos do casal fundador, dois atuam em
áreas que não teriam relação direta com a pedagogia, tais como a administração financeira e
informática. Entretanto, os dois filhos mais novos, Filho 4B e a Filha 5B, estão envolvidos
com a parte pedagógica. O Filho 4B, apesar de ser gestor de Comunicação e Marketing, é um
profissional dinâmico que procura se envolver e ficar a par principalmente da área
pedagógica.
Na entrevista, a Filha 1B chegou a comentar sobre sua dúvida se a melhor pessoa para
um dia ocupar o lugar da mãe seria ela mesma ou o referido irmão, visto que ele também é
uma pessoa dinâmica, comunicativa e com perfil de liderança. Porém, atualmente, o Filho 4B
tem outros planos para a sua carreira e está se envolvendo com outras atividades que não se
relacionam com a empresa. Além disso, deve-se levar em consideração o seu pouco tempo de
experiência.
Já a Filha 5B, como ela e a própria mãe relataram, apesar de atuar na mesma área da
irmã mais velha, tem 10 anos a menos de experiência. Por isso, a Filha 1B tem mais chances
de ser a sucessora da Mãe B e, no lugar do Pai B, ficaria o Filho 2B, que tem formação na
área de Administração e que é hoje o braço direito do pai na gestão administrativa e financeira
do negócio:
A Filha 1B, por exemplo, fez Administração, ela fez o curso de Matemática, ela tem
uma visão, assim, muito ampla de todo o trabalho da escola, tem mais tempo na
escola, acompanha mais de perto o trabalho. Não natural assim, porque ela é mais
velha, tem que ser ela não. Acho que a Mãe B não pensa assim não. Acho que se
fosse outra pessoa ela colocaria sim, não por ser mais velha. Acho que pela vivência
dela, pela experiência que ela tem. A direção não é só esse foco pedagógico, né, tem
toda uma outra organização e a Filha 1B tem mais essa visão, por exemplo, do que
eu, muito mais (Filha 5B).
Existe na Educar um meio que a família utiliza para compartilhar as principais
decisões da empresa. Somente os membros da família direta, ou seja, pai, mãe e filhos,
formam o que eles denominam G7. É um conselho deliberativo que se reúne, em média, duas
vezes por semestre para discutir sobre decisões importantes para a escola. Os assuntos
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deliberados no G7 dizem respeito às questões mais estratégicas e de mais impacto e
investimento, como a abertura de novas turmas, construção ou reforma de algum prédio, um
grande evento, entre outras. Com a sucessão, os dois mais velhos ocuparão os cargos mais
altos dentro da empresa e, no dia-a-dia, em termos executivos, serão os principais tomadores
de decisão. Mas, com o G7 todos os herdeiros podem participar da gestão, apesar de que a
palavra final sempre fica com o Pai B e a Mãe B e no futuro ficará com os sucessores. Tal
situação pode ser observada na fala da Filha 1B:
Acho que eles não teriam dificuldade em falar que eu serei a sucessora. Apesar de
que a gente continuaria do mesmo jeito, porque aqui, na verdade, a gente faz muita
coisa juntos. Tem a reunião do G7, né, onde todos ajudam nas decisões principais
(Filha 1B).
O grupo G7, formado pelos pais e os cinco filhos, demonstra também a preocupação
em não deixar que as questões familiares prevaleçam sobre a empresa. Hoje eles acreditam
que cada membro da família direta e também da estendida que exerce algum cargo está ali
como um funcionário necessário, que tem qualificação e que traz resultados para a
organização. Os genros, noras e cunhados, por exemplo, atuam em cargos que estão
diretamente ligados às suas áreas de formação, mas não influenciam na gestão do negócio.
Eles não podem participar do G7, visto que este grupo é restrito aos acionistas e futuros
acionistas, ficando clara a separação entre grupo decisório e funcionário membro da família.
Feito o questionamento à Mãe B, se ela acreditava que a presença de tantos familiares na
empresa poderia impactar o processo de sucessão, a resposta foi a seguinte: “Não, acho que
não. A direção não. Da forma que a gente está fazendo, não. Fica bem claro pra todo mundo
os papéis”.
A relação dentro da família e na empresa parece ser muito boa:
E por ser família é diferente, então apesar de não ser perfeito, que não tem jeito, hoje
em dia o relacionamento, a convivência é muito tranquila e saudável, porque a gente
conseguiu, é [...] conviver bem e estipular alguns critérios e princípios que faz com
que a gente respeite um ao outro sem deixar de ser cada um do jeito que é (Filha
1B).
Como foi dito, existe uma preocupação constante em separar as questões familiares
das profissionais. Na empresa, por exemplo, os filhos não tratam os pais por pai e mãe, mas
sim pelos nomes de cada um. Segundo os relatos dos entrevistados, cada filho é tratado como
um profissional, como qualquer outro funcionário. Recebem o salário de acordo com a função
que exercem e não há uma mistura dos gastos familiares com os da empresa. As mesmas
71
cobranças que são feitas a um funcionário servem também para os herdeiros. Segundo o Filho
4B, às vezes eles são até mais cobrados, justamente por serem da família:
Isso aí a gente sempre vai ser tratado como profissional normal. Mesmas atribuições
que outro teria em meu lugar é as que eu tenho. Lógico que você é filho do dono
sabe de mais coisa. Mas assim, muito pelo contrário, quando ela tem que chamar a
atenção, ela chama do mesmo jeito. Às vezes a família é até pior pra isso, como tem
liberdade fala até mais, não tem aquele negócio de passar a mão na cabeça não.
Nos momentos em que surgem discussões e os laços familiares acabam se tornando
mais aparentes do que os laços profissionais, principalmente em situações nas quais existe
algum desentendimento entre irmãos, os pais procuram fazer o possível para sanar o
problema, agindo como chefes, analisando a situação profissional, e não pessoal do conflito.
Sobre o modo como os pais conduzem a relação família e empresa e lidam com os conflitos
familiares, os entrevistados responderam:
A Mãe B que tinha a experiência com escola, que é o negócio da gente, né, tem a
habilidade muito grande de [...], de fazer com que as pessoas se relacionem bem,
saiba a hora de cobrar ou coisa parecida. Essa questão mesmo de relacionamento, aí
ela [...] e principalmente com família, né, a gente aprendeu acho que bem direitinho
como que faz, o quê que tem que separar, o que não tem jeito, o que tem que saber
lidar, né? (Filha 1B).
Se a gente vê que vai gerar qualquer discussão entre eles a gente interfere pesado pra
não deixar, sabe? O que não pode é o seguinte, ah, meu filhinho, então tá. Isso pode.
Né? Lá em casa é mãe mesmo, aqui é profissional. Aí você pensa, não tem como
você cortar isso de forma, assim, definitiva. Isso não existe. Mas aqui é o professor,
saber que se errou, errou igual um funcionário comum. Se precisar chamar a
atenção, vai chamar a atenção do mesmo jeito (Mãe B).
Percebe-se que os fundadores cumprem vários papéis juntos aos herdeiros. Eles são os
supervisores, ou seja, superiores imediatos de seus filhos ao lhes atribuir tarefas, dar
instruções, supervisionar, corrigir e os preparar para assumir a gestão. Também cumprem os
papéis de professor e protetor, ensinando-lhes, transmitindo conhecimento e experiência, mas,
ao mesmo tempo, permitindo que eles tomem decisões sozinhos, a fim de que tenham
responsabilidade e adquiram experiência na vivência da gestão.
O relacionamento entre herdeiros e funcionários também é bom. Os funcionários os
respeitam não só como donos da empresa onde trabalham, mas porque veem neles a
capacitação necessária para estar naquela posição onde estão hoje. Por isso também foi
importante que os filhos não tivessem entrado na empresa logo em altos cargos. Eles foram
crescendo gradativamente, aprendendo, conhecendo todo o processo de funcionamento e
conquistando a confiança a partir dos resultados de trabalho:
72
Quem passa na sala de aula é diferente, né, especialmente educação básica, que são
crianças e adolescentes. Então, quando tem alguém liderando que já passou pela sala
de aula, tem uma experiência maior e que eles viram, não por ser filha, eu pulei lá do
nada pra ser diretora não. Então mesmo que não tenha vivenciado, sabem da
história. Um comenta com o outro (Filha 1B).
Eu até, particularmente, não gosto que me vejam como filho do dono não. Eu prefiro
que me enxerguem como profissional. E eu luto pra isso. Porque justamente aquele
negócio, “você tá aí porque é filho do dono”. Não, não tô não, eu estudei pra isso, eu
trabalho com isso, eu sou profissional. Se eu não tivesse aqui eu poderia estar em
qualquer outra empresa, outra escola e tudo. Eu trabalho assim. E acredito que isso
aconteça, acho que [...], tanto é que às vezes entra funcionário novato, por exemplo,
esse ano entrou aí uma professora. Depois de quatro meses descobriu, né? É até
engraçado. “Ah, não sabia que era filho dela” (Filho 4B).
Os fundadores da Educar demonstram um perfil de gestor que não terá grandes
dificuldades em finalizar o processo sucessório e deixar o negócio na mão dos seus
sucessores. Talvez, em virtude da idade, eles já se mostram abertos e até mesmo desejosos à
ideia de se aposentarem. Em conversa com a Mãe B ela relata que julga já ter trabalhado
tempo bastante e que está na hora de deixar mais por conta dos filhos para que ela e o marido
possam usufruir o tempo com menos obrigações, podendo fazer viagens e outras coisas que
queiram sem ter compromisso diário com a empresa familiar:
Nós não somos eternos, né? E segundo, que [...] não quer dizer que eu tenha uma má
qualidade de vida, mas acho que eu posso melhorar (Mãe B).
A minha mãe já ta com 60 e [...] 64, né? Acho que é 64 anos. Até brinco com ela
que tá na hora de parar um pouquinho. Mesmo com o pique todo que ela tem ela
(Filha 5B).
A Mãe B acha que não está longe o dia em que ela e o marido deixarão grande parte
do comando diário e operacional da empresa. Segundo ela, em seis anos talvez isso já seja
possível. Apesar de demonstrar grande confiança no potencial dos filhos, e principalmente na
possível sucessora que é a Filha 1B, ela ainda não se sente totalmente segura em deixar tudo
no atual momento:
Eu ainda não posso sair não. Assim, definitivamente não. Pra deixar, pra num [...].
Pra não ser, não acontecer aquele caso assim, ah, porque o fulano saiu da empresa, a
empresa acabou, né?! Então, assim, a gente tem que ir passo a passo e eu acho que
enquanto a gente tem saúde você vai ficando (Mãe B).
A Mãe B tem diminuído um pouco seu ritmo de trabalho nos últimos tempos. Ela já
consegue fazer algumas atividades hoje fora da rotina de trabalho, tais como exercício físico,
73
chegar um pouco mais tarde na empresa, ir ao médico em qualquer horário, que antes era
impossível realizar. Segundo suas próprias palavras, a empresa flui normalmente com suas
breves ausências. Porém, como ela detém toda a experiência e conhecimento do negócio,
muita coisa ainda é centrada em sua figura. O que falta é ela ter um pouco mais de confiança
para colocar em prática o que já vem pensando. Mesmo tendo vontade de deixar a instituição,
a Mãe B ainda não conseguiu se desprender de muitas atividades rotineiras, tendo
preocupação com o bom andamento dos negócios. Isso pode ser observado nas falas dos três
filhos entrevistados, que comentam a provável saída dos pais:
Eles estão com dificuldade. Eles têm. Eu tenho certeza que eles têm dificuldade e
têm que se preparar um pouquinho mais para isso. Apesar dela, às vezes, falar
assim: “Eu estou pronta [...]”, mas só o fato dela falar: “falta isso, falta aquilo” é
porque no fundo não está (Filha 1B).
Ela hoje sabe disso, até porque, vamos supor, tem dias às vezes que ela não vem
aqui e as coisas transcorrem normalmente, antigamente isso não acontecia. Lógico
que hoje eu ainda sinto que ela é uma força muito grande assim, muita coisa ainda
depende. Mas também eu acho que nesse processo, que eu falo que eu acho que isso
é natural, as coisas vão acontecendo, né? Porque mesmo ela não estando, a escola
normalmente funciona (Filho 4B).
A decisão tem, só que agora ela não está conseguindo é desligar. Talvez porque ela
não sentiu ainda é [...], que a gente está preparado, alguma coisa assim. Então, é por
isso que eu acho que está devagar, porque ela tá muito ligada na rotina, né? (Filha
5B).
Tanto os fundadores quanto os filhos percebem que mesmo depois de se completar
oficialmente o processo sucessório, os sucedidos não deveriam se ausentar totalmente das
atividades na Educar. Mesmo que os sucessores já se sintam capazes de tocar a empresa
sozinhos, eles sabem que a experiência e a orientação dos pais também seria fundamental
para a continuidade do negócio. A ideia dos filhos é que os antecessores continuem
trabalhando sem obrigação de horário e sem rotina, mas que sejam um suporte para os
sucessores, exercendo o papel de consultores ou conselheiros:
Com certeza eu vou errar, né. E nunca vou deixar de consultar ela. Eu só conseguiria
de verdade se tivesse ela como uma conselheira. Ela não pode nunca, assim, afastar
100%. Não ia dar certo. Se ela fizer isso, no fundo sabe disso e entre nós irmãos a
gente fala e tem isso muito claro, se os dois afastarem de tudo, 100%, desligar, falar
assim “não quero nem saber”, pode não dar certo” (Filha 1B).
Eu não vejo minha mãe, por exemplo, à toa dentro de casa. Ela nunca fez isso a vida
inteira, tanto ela quanto meu pai. Eu não vejo eles falarem assim “Ah não, então vou
largar com vocês” (Filho 4B).
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Existe, por parte da fundadora, uma preocupação quanto a resguardar a empresa e a
família em caso de sua ausência ou da de seu marido. Já pensando também em deixar a
direção do negócio em alguns anos, ela tem sentido a necessidade de formalizar e registrar
algumas decisões relativas ao papel dos filhos na empresa, a fim de evitar que conflitos
possam surgir. Hoje em dia ela observa que tudo tem se encaminhado muito bem, mas o seu
receio é que a calmaria se deva principalmente à presença dela e do marido na empresa.
Assim sendo, a Mãe B tem pensado em fazer um testamento ou procurar ajuda com um
especialista para que ela obtenha mais informações de como resguardar a família e o
patrimônio da empresa:
Eu pretendo pesquisar mais e ver como eu vou fazer para deixar por escrito, sabe?
Qual o papel de cada um na ausência da gente. Uma coisa documentada, oficial, que
a gente nunca sabe do amanhã, né? Porque eles todos são casados, têm família,
mulher, marido. E aí, depois, né, se pode complicar [...]. Pra eu não prejudicar a
empresa no futuro e nem eles também. Hoje está tudo bem, mas será que é porque
eu e o pai estamos aqui? (Mãe B).
Ficou claro que cada filho trabalha exercendo um cargo específico e que na ausência
da mãe e do pai os dois mais velhos assumirão o comando principal das atividades, pois vão
exercer os cargos mais altos. Mas, pensando nos cinco filhos como herdeiros, existe também a
preocupação dos fundadores em regularizar em vida a questão da propriedade, ou seja, já
fazer uma divisão dos bens a fim de dizimar as possibilidades de conflitos futuros em virtude
da divisão da herança. Segundo a Mãe B, conflitos entre familiares, advindos da divisão dos
bens, podem influenciar significativamente o negócio:
Porque eu vejo muitos problemas quando falece o pai e a mãe. Por exemplo, essa
escola é dos cincos filhos e nós temos outras propriedades também, não é só a
escola, né? Eu tenho casas, lotes, sítio [...]. Então eu penso nisso também, entendeu?
Que aí, depois, quando a gente morrer mesmo já está tudo certo, o seu é isso, seu é
isso, seu é isso, seu é isso. Não precisa brigar por causa de nada. Se não isso pode
dar problema até na empresa, né. A empresa deixa de existir por brigas de família. E
como a família passa a não ser só eles cinco mais, passa a ser os agregados também,
então isso aí pode ser problema sim. Acontece muito isso aí. Eu já vi isso na própria
família, já vi em outras famílias também (Mãe B).
Em relação às dificuldades enfrentadas no processo de sucessão na empresa Educar, a
fundadora considera que não são os fatores internos e familiares os principais entraves ao
processo. Tudo já está bem encaminhado, e apesar de não ter feito ainda, já foi dito que ela
pretende formalizar o mais rápido possível algumas decisões, a fim de resguardar a empresa e
os filhos de possíveis conflitos futuros quanto à herança.
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Um possível ponto de conflito poderia ser o emprego de muitos familiares no negócio.
Mas, como já relatado anteriormente, os proprietários parecem conduzir bem essa questão,
empregando pessoas que realmente são qualificadas, que são tratadas como qualquer outro
funcionário e que não estão vinculadas à gestão. Somado a isso, os membros da família
parecem se dar bem e sentem prazer em dividir o ambiente de trabalho com pessoas próximas,
familiares, com quem se sentem mais à vontade:
O que eu queria deixar é uma mensagem assim, de que muita gente fala que
trabalhar com família é difícil, é complicado. Eu acho o seguinte, é sim, mas
também é difícil e complicado trabalhar com quem não é da família. Às vezes até
mais. E se você souber colocar cada um na sua função, delegar o que é de
responsabilidade deles e dentro da empresa, você ser mais profissional, eu acho que
a coisa funciona (Mãe B).
Com o nível de profissionalização que a empresa alcançou, parece que ficou mais fácil
para os fundadores e sucessores conseguir lidar com as dificuldades de se trabalhar com
família. Na Educar eles demonstram conseguir separar bem as duas esferas e, por enquanto, a
empresa tem espaço para abrigar todos os familiares que estão lá, pois eles são, antes de tudo,
profissionais.
4.3 Descrição do caso: MEDICAR
A história da empresa Medicar começou há muito tempo, em 1890, quando seu
fundador (Fundador C) se formou na Escola de Farmácia de Ouro Preto e abriu um
estabelecimento no ramo em sua cidade natal no interior de Minas Gerais. Após 33 anos, em
1923, ele decidiu se mudar para uma cidade vizinha e fundar ali uma escola. Mesmo sendo
farmacêutico, quis mudar o ramo de atuação com o intuito de contribuir com a região que, na
época, não contava com colégio próprio, tendo a população que se dirigir a cidades maiores
para ter acesso à educação. Pouco tempo depois ele se enveredou na política e chegou a ser
prefeito nessa mesma cidade. Já casado e com 12 filhos para criar, o Fundador C decidiu se
mudar para Belo Horizonte, a fim de que os filhos pudessem ter mais acesso à educação e se
formassem em nível superior. Em 1933 ele foi para a capital, adquiriu uma farmácia e um ano
depois levou a família para junto dele.
Na época os filhos mais velhos já estavam na faculdade, mas os mais novos ajudavam
o pai na farmácia fazendo entregas, limpando as gôndolas, atendendo no balcão ou em
qualquer outra atividade que fosse necessária. Como foi dito, o Fundador C queria que todos
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os filhos estudassem e tivessem diploma de curso superior, mas nunca os influenciou na
escolha das futuras profissões. Cada filho escolheu o curso que desejava e se formou. Direito,
Engenharia, Letras e Normal Superior são algumas das escolhas feitas por eles. Entre os 12
filhos, porém, apenas um decidiu seguir a carreira de farmacêutico. Um dos entrevistados
disse que uma das irmãs chegou a cogitar a hipótese de também fazer Farmácia a fim de
agradar o pai. Porém, vendo ele que a filha tinha muito mais gosto pela área de exatas,
convenceu-a a fazer o que gostava e ela se formou em Engenharia.
Ele nunca forçou nada. Só que tinha a Farmácia e a gente mesmo, os filhos, viam a
necessidade de ajudar e vinham pra cá. Ele nunca forçou nada. Tanto que uma irmã
quis, para agradar ele, queria estudar Farmácia e seguir a profissão. Mas ele via que
ela tinha tendência mais para Física, Matemática. Aí ele falou: “não, você tem
tendência pra Engenharia, vai estudar Engenharia” (Pai C).
Em 1941 o Fundador C morreu. Com 17 anos de idade, na ocasião, um dos filhos, o
Pai C, que tinha acabado de terminar o ginásio, ainda não sabia o que queria fazer. Ficou
algum tempo sem estudar e em 1947 prestou o vestibular para Farmácia. Diante de muitas
dúvidas, ele, que já trabalhava no empreendimento da família há algum tempo, decidiu ser
farmacêutico pensando que assim já teria seu emprego garantido: “Lá em casa nós éramos 12
irmãos e não tinha nenhum farmacêutico. Então eu pensei assim, ah, eu vou fazer Farmácia
porque assim já encontro o lugar certo pra trabalhar” (Pai C).
Sendo um dos filhos mais novos, logo depois da morte do fundador, o Pai C não tinha
condições de assumir a empresa e por isso dois irmãos mais velhos, mesmo sem formação na
área de Farmácia, o fizeram. Nesta referida época, a representação das gerações das famílias e
o papel de cada um na empresa era a espelhada na Figura 3:
Figura 3 - Genetograma Medicar - 1
Pai C (Vice-diretora)
Irmão 1 (Gestor
Financeiro)
Irmão 2 (Gestor de
Tecnologia)
Irmã 1 Gestor de Com.
e Marketing
Irmã 2 (Gestora
Pedagógica)
Outros 7
irmãos
Fundador C
77
Legenda:
Pessoas já falecidas que eram sócias e/ou trabalhavam na empresa.
É sócio e também trabalha na empresa
Apenas sócio, não trabalha na empresa.
Fonte: Dados da pesquisa.
Algum tempo depois de se formar, sendo o único farmacêutico da família, ele assumiu
a direção da Medicar. Após assumir, o Pai C ainda contou com a ajuda do irmão mais velho e
de duas irmãs que trabalharam com ele por muitos anos. As mulheres ficaram até a
aposentadoria. O irmão que tinha ficado na empresa era engenheiro químico, e após um
tempo resolveu voltar a trabalhar em sua área e também deixou o negócio.
A herança nunca foi motivo de conflito entre os irmãos. Como a maioria deles seguiu
sua própria carreira, independentemente da empresa familiar, nenhum deles quis ter
participação na Medicar. Quando o Fundador C faleceu, deixou apenas a farmácia e uma casa
que ainda não estava totalmente quitada como herança. Na casa ficou morando um dos
herdeiros que pagou o restante da dívida, casou-se e hoje, depois de falecido também, sua
esposa ainda reside nela. A farmácia passou para o nome de todos os irmãos, visto que cada
um recebeu sua parte proveniente da herança. Segundo o Pai C, ele até hoje guarda o primeiro
contrato em que consta a assinatura de todos eles.
Pouco tempo depois, os irmãos, que já estavam com a vida estruturada e trabalhavam
em outras atividades, abriram mão e saíram da sociedade, ficando apenas o Pai C e o seu
irmão mais velho. Nessa época eles chegaram a abrir outra unidade da farmácia, que ficou sob
responsabilidade desse irmão. Passados alguns anos ele não quis mais trabalhar na área e
decidiram vender e ficar apenas com uma loja. O irmão acabou por sair da sociedade, que
permaneceu com o Pai C e sua esposa, que são os proprietários até o momento da presente
pesquisa.
A Medicar está passando por seu segundo processo de sucessão. O Pai C tem 87 anos
de idade e vai transferir o negócio para a terceira geração. Ele tem cinco filhos - quatro
homens e uma mulher. Três deles exercem suas profissões independentes da empresa familiar,
dois são engenheiros e um é advogado. Os outros dois, o Filho 3C (44 anos) e a Filha 5C (39
anos) são os que estão hoje trabalhando com o pai na empresa. Ele se formou em Fisioterapia
e ela, em Farmácia. A única mulher entre os filhos foi a que seguiu a profissão do pai e hoje é
a pessoa de sua maior confiança dentro da farmácia Medicar.
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Cada membro da família que trabalha na empresa tem seu cargo e suas funções
primordiais. O Pai C é o sócio proprietário e cuida da parte financeira, fica à frente no
atendimento ao público e como farmacêutico principal da farmácia e é o responsável pelas
compras do departamento de drogaria e perfumaria. A Filha 5C é a outra farmacêutica. Além
do atendimento ao público, ela é a principal responsável pelo gerenciamento do laboratório de
manipulação e cuida também da parte técnica relacionada às regulamentações e às exigências
de infraestruturas ligadas à Vigilância Sanitária e Prefeitura. O Filho 3C atua basicamente na
área administrativa de pessoal e estoque de produtos, além da gerência da loja. “E lá em casa
fui mais eu que segui o caminho mesmo. Meu irmão quis fazer fisioterapia, os outros foram
saindo e tomando, né [...] um engenheiro, o outro advogado, foram rumos diferentes” (Filha
5C).
Depois que todos os irmãos abriram mão da sua parte na sociedade em favor do Pai C
que ficou sendo o único dono da empresa em sociedade com sua esposa, o genetograma da
Medicar ficou representado conforme a Figura 4:
Figura 4 - Genetograma Medicar – 2
Legenda:
É sócio e também trabalha na empresa.
Apenas sócio, não trabalha na empresa.
Pessoas que foram sócios e/ou já trabalharam na empresa, mas saíram.
Irmão 1 (Vice-diretora)
Irmã 1 (Gestor
Financeiro)
Irmã 2 (Gestor de
Tecnologia)
Outros 8
irmãos
Outros 3
filhos
Filho 3C (Administração e
Gerência da Loja)
Filha 5C (Gerente do
Laboratório e
Farmacêutica)
Pai C (Principal gestor e
Farmacêutico)
Esposa
79
Não sócio e não trabalha na empresa.
Não sócio, apenas trabalha na empresa.
Fonte: Dados da pesquisa.
O segundo processo sucessório, da mesma forma como ocorreu no primeiro, vem
acontecendo natural e intuitivamente. O Pai C nada planejou em relação à sucessão ou à
entrada dos filhos na empresa. Assim como seu pai fez, ele quis que todos os filhos tivessem
uma formação, mas não os induziu a seguir sua profissão com o objetivo de ter um herdeiro
para assumir o negócio da família. Quando menores, todos os filhos também ajudaram na
farmácia em diversas atividades, mas cada um seguiu o caminho profissional que escolheu:
No começo os meninos pequenos vinham aqui para encher (risos). Ficavam
correndo aí, brigando [...]. Depois que cresceram um pouco que ajudavam alguma
coisa. Quando tinham uns sete, oito anos, eu [...] aí dei uma função pra eles. A
função deles era varrer a farmácia. Varria a frente da farmácia toda, depois podia ir
embora porque eles estavam no colégio, tinham que fazer dever. Mas faziam tudo,
um dia era um, outro dia era outro e iam revezando (Pai C).
É, sempre nós ficamos na farmácia. Desde quando eu nasci que nós morávamos aqui
em cima mesmo da farmácia e a gente sempre estava aqui, mesmo sem ter horário
nem nada, mas já ficava aqui, ajudava alguma coisa que precisava, limpava, essas
coisas assim (Filho 3C).
A filha mais nova foi a que quis seguir o pai e se formou em Farmácia. Assim como os
seus irmãos, ela começou cedo a ajudar na empresa da família. Ela, porém, tomou gosto pelo
negócio e pela profissão de farmacêutica e decidiu seguir sua vida profissional dentro da
Medicar. Hoje ela seria a principal candidata à sucessão, pois, além de ter a formação
necessária, é quem tem o maior preparo para assumir a direção do negócio. Como começou a
ajudar na empresa ainda muito nova, com 13 anos ela pôde conhecer de perto todas as áreas e
trabalhar um pouco em cada uma delas:
E a Filha 5C conhece bem o funcionamento. Conhece tudo. Ela tá aqui desde criança
também. Se precisar fazer compras, se eu viajar, ficar um tempo fora, ela faz. Ela
está preparada para ficar aqui na gestão (Pai C).
Eu considero que eu entrei com 13 anos porque ele já me colocou com função aqui
dentro, entendeu? Eu ficava duas horas só no caixa. Eu lembro direitinho. De 13 até
os 17 anos, aí depois eu fiquei mais vezes, ficava uma tarde [...], assim com o
horário que eu podia porque eu passei a estudar Farmácia também. Durante a
faculdade eu continuei aqui trabalhando em funções mais secundárias nessa época,
né, que eu estava estudando. Mais é atendimento, caixa, essas funções mais básicas,
né? (Filha 5C).
80
Pode-se perceber, pelo relato da própria Filha 5C, que ela se sente realizada
trabalhando no negócio da família e principalmente como farmacêutica. Ela está na empresa
por vontade própria e por vocação. Em nenhum momento isso foi imposto a ela, aconteceu
naturalmente:
Eu gosto. Eu realmente gosto de Farmácia. Eu, desde o segundo ano que eu estudava
no colégio as disciplinas que eu mais gostava eram Química e Biologia mesmo.
Mais Química, também. Aí eu fui pra Farmácia, exatamente porque eu gostava
mesmo de [...] da área técnica. Eu adoro farmacologia, tem disciplinas da Farmácia
que eu gosto muito mesmo. Eu, eu [...] eu considero que eu tenho vocação sim. Eu
vendo as necessidades da farmácia, né, eu fui incorporando (Filha 5C).
O Filho 3C está na empresa há menos tempo. Quando mais jovem ele trabalhava
diariamente com o pai. Ele chegou a cursar Farmácia em Ouro Preto por cerca de um ano,
mas decidiu retornar a Belo Horizonte para fazer o curso de Fisioterapia. Segundo afirmou o
Filho 3C, ele tentou a carreira como fisioterapeuta, mas recentemente decidiu ficar na
empresa familiar e ali se estabelecer.
Por ter menos experiência e também por não ser formado na área, o Filho 3C não seria
o sucessor principal. Futuramente, na ausência do pai, a irmã deverá ser a principal tomadora
de decisões na gestão da Medicar. Porém, a presença do Filho 3C também é importante para a
empresa, uma vez que, como a irmã está mais focada na área técnica, ele seria um suporte na
área administrativa e financeira.
A Filha 5C já se considera apta a assumir o negócio. Com os 20 anos de experiência
na Medicar ela acredita que, na ausência do pai, ela teria total capacidade de assumir sozinha:
“Então eu acho que tenho capacidade sim. Assumiria com tranquilidade. Igual eu te falei, eu
entrei aqui mesmo em 94, né? Então já vai quase 20 anos. Eu não consigo me ver saindo
daqui não” (Filha 5C)
Uma dificuldade que se apresenta no caso da empresa familiar Medicar é o fato de o
pai não conseguir encerrar o processo de sucessão. Segundo ele mesmo falou e também seus
filhos, ele não se vê parando de trabalhar, mesmo com a idade já avançada. Os filhos e a
esposa acham que ele deveria diminuir bastante o ritmo, porém isso ainda não aconteceu:
Enquanto ele tiver aqui ele vai estar trabalhando também. Eu acho que sim. Acho
realmente difícil ele parar. Minha mãe faz pressão, né, pra ele parar, mas ele não
quer. Eu tô aqui todo dia junto com ele. Toda manhã eu tô aqui. Eu acho que ele
devia diminuir (Filha 5C).
81
Além de não diminuir o ritmo de trabalho, o Pai C ainda centraliza muito as decisões
na empresa. A maioria delas tem que passar por ele. A Filha 5C, que já poderia ter mais
autonomia, deve consultá-lo quando precisa decidir sobre alguma questão da farmácia.
Quando ele não concorda com a decisão, ela não é aceita. A esse respeito, a Filha 5C citou
como exemplo que o pai teve muita resistência na implantação de sistemas informatizados na
empresa. Como não era seu costume utilizar computador e softwares no dia-a-dia, o Pai C não
julgou necessário implantar esses sistemas e queria continuar com seu controle manual. Aos
poucos, porém, a filha conseguiu convencê-lo, mas até hoje alguns processos ainda são feitos
manualmente:
Mas assim, toda decisão que eu tomo eu não passo por cima dele não,
principalmente as mais importantes. Aí eu venho e falo, tava pensando isso, isso
[...]. Quando ele não concorda a gente vai tentando convencer. Porque tem umas
coisas que ele não [...] computador foi uma das coisas que ele resistiu (Filha 5C).
As compras na parte de medicamentos aí eu poderia fazer também. Mas ele não
deixa, ele não larga essa parte. Até tento tirar um pouco pra ele ficar mais livre, mas
ele ainda fica. Se depender dele, fica aqui o dia inteiro e não sai daqui mais (Filho
3C).
Outra mudança que ela conseguiu fazer na Medicar, mas com certa dificuldade, foi a
implantação de um laboratório para manipular e vender medicamentos homeopáticos. O Pai C
era contra a filosofia homeopática e por isso não queria implantar essa terapia alternativa em
sua farmácia. Aos poucos a Filha 5C conversou, mostrou as vantagens e ele acabou cedendo.
Além de se preocupar com a área técnica, a Filha 5C tem procurado fazer alguns
cursos na área administrativa. Porém, em virtude da gestão mais centralizadora, ela não
consegue implantar o que aprende no curso e que vê aplicação em sua empresa, como, por
exemplo, a modernização e o controle eletrônico das compras e do estoque. Seu pai é ainda o
principal responsável pelas compras e ele não quer informatizar esse processo e fazer da
maneira como a filha acha melhor e mais eficiente.
Mesmo convivendo com um estilo mais centralizador de gestão e não tendo tanta
autonomia nos momentos de tomada de decisão, percebe-se que a presença dos filhos na
empresa e o processo de sucessão são fatores importantes para a manutenção e sobrevivência
do negócio familiar. Muitas mudanças vieram pelas mãos dos herdeiros, principalmente da
Filha 5C. Essas mudanças são essenciais para a gestão e para o crescimento da empresa, como
a informatização e o laboratório de manipulação. Além disso, mesmo estando na rotina da
empresa, o Pai C percebe que existem atividades que ele já não daria conta de executar hoje e
82
que a presença dos filhos faz com que ele queria manter a farmácia aberta e em posse da
família, do contrário, ele já teria vendido:
Meu pai mesmo fala, se a gente não tivesse aqui, ele não ia continuar no [...]. Porque
tem muito detalhe, principalmente os órgãos reguladores. Com certeza ele já teria
vendido o negócio. Houve várias reformas físicas aqui da farmácia, pelo menos nos
últimos 20 anos. Tiveram três ou quatro reformas físicas para a adequação dessa
nova legislação. E isso teve uma participação desse outro irmão meu que é
engenheiro, entendeu? (Filha 5C).
Para o Pai C é difícil pensar em se aposentar e afastar totalmente da farmácia. Ele não
consegue diminuir a rotina, pois pensa que certos procedimentos do funcionamento diário
dependem da sua presença. Talvez por isso ele também tenha mais dificuldade em
descentralizar as decisões. É ele quem abre a empresa todos os dias, é sempre o primeiro a
chegar. Há anos ele acreditava que, aos 80 anos, poderia aposentar-se. Hoje, contudo, já em
seus 87 anos, não vislumbra ainda tal possibilidade:
Não, eu falei que quando eu fizer uns 80 anos por aí, eu ia aposentar. Quando eu
aposentar, vou ver se reduzo meu horário um pouco. Mas fica difícil, não consigo.
Sou eu que abro aqui todo dia. Porque a gente sempre tem uma coisinha pra fazer,
mais outra, mais outra [...] (Pai C).
O sucedido (Pai C) percebe que tem importante papel junto à comunidade e a vários
clientes que o conhecem há anos e que são fiéis à empresa pela tradição que tem. Alguns
funcionários e fornecedores se tornaram amigos e sempre que passam pela farmácia param
somente para cumprimentar e conversar com o Pai C. Mas, para ele, a principal dificuldade
em deixar o negócio está no fato de pensar que deverá ficar sem uma atividade. Segundo suas
próprias palavras, ele não conseguiria:
Não, parar mesmo não. Parar eu acho até errado, porque você ficar parado, olhando
pra televisão, olhando para as paredes dentro de casa, você vai começar a tomar os
calmantes da vida. A vida fica muito monótona. E farmácia a gente tem [...] vive
mais, né, porque o contato com o povo, você encontra pessoas agradáveis, outras
desagradáveis, mas tem contato com todo tipo de gente, né? (Pai C).
No atendimento muita gente confia mais nele, né, como farmacêutico mais antigo. A
gente tenta diminuir um pouco esse horário, mesmo porque já passou da hora de ter
aposentado. Mas ele descansa é aqui. Se ele sair daqui já era (Filho 3C).
Ao mesmo tempo, o Pai C pensa sobre como vai ficar a propriedade da empresa no
futuro e na divisão da herança entre os filhos. Segundo ele, os três filhos que não têm vínculo
algum com a Medicar, que trabalham com outras atividades, não deveriam entrar como
83
sócios. A propriedade da empresa seria dividida entre a Filha 5C e o Filho 3C, que são os que
estão efetivamente cuidando do negócio e os sucessores principais. Os outros filhos
receberiam outros bens que o pai possui.
Eu estou querendo passar também pra Filha 5C, depois talvez o outro filho. Os
outros estão fora. Cada um está seguindo sua profissão. Eu queria resolver antes. É,
a gente, na idade que estou pode viver mais 10 anos, 20 anos, mas posso viver mais
um dia (Pai C).
Ele já pensou em colocar a filha na sociedade, mas, acabou não o fazendo por questões
legais de herança, segundo afirmou:
Teve essa situação uns três anos atrás. Eu falei com ele que eu gostaria de ter pelo
menos 10% de participação na farmácia porque na hora de assinar um documento
[...]. Porque às vezes ele viaja e tem decisão importante que eu vou ter que tomar na
ausência dele. Só que aí, ficou pensando, pensando, pensando e pensando e não
resolveu, porque parece que existe uma lei falando que você não pode beneficiar
nenhum filho. Pensei nisso pra facilitar o trabalho mesmo, não na questão de querer
herança e tal (Filha 5C).
O Pai C disse estar estudando um jeito para, em vida, resolver a situação e não deixar
algo pendente para depois de sua morte quanto aos seus bens. Para a Filha 5C, contudo, assim
como ocorreu no passado, a herança não seria motivo de conflito entre os irmãos, pois
acredita que aqueles que estão fora da empresa não têm interesse no empreendimento
familiar.
Eu falo que ninguém é insubstituível. Meu pai vai fazer muita falta aqui, eu também,
eu acredito que eu vou fazer falta. Mas a empresa, a farmácia é muito maior do que a
gente, entendeu? Essa farmácia não acaba não. Eu posso acabar, o pessoal aqui, mas
eu acho que vai passar pra outra pessoa. Se for o caso vai vender para outra empresa
de farmácia. Agora, acabar a estrutura não. Não acredito (Filha 5C).
É interessante perceber que na empresa Medicar os membros da família têm apego
pelo negócio e um desejo muito grande de que ele sobreviva ainda por vários anos,
independentemente da presença deles ali. Eles querem que a empresa se perpetue, mesmo que
por algum motivo não apareçam futuros herdeiros para assumir e ela tenha que ser vendida
para terceiros. O importante é a farmácia continuar ali, servindo à comunidade. Porém,
segundo eles, se prosseguir sob o comando da família, seria ainda melhor.
84
4.4 Descrição do caso: ADOÇAR
A Adoçar é uma empresa familiar quase centenária, que teve o início da sua história
vinculado a um imigrante europeu (Fundador D) que chegou ao Brasil em 1912. Inicialmente,
ele foi para o estado do Rio de Janeiro, onde trabalhou em uma fábrica de doces e aprendeu o
ofício. Conhecendo mais tarde sua esposa, que morava em uma colônia em Minas Gerais, ele
decidiu mudar-se para Belo Horizonte e fundou aqui sua fábrica na década de 1920. O
negócio iniciou-se em sociedade com uma irmã, que pouco tempo depois o deixou como
único dono.
O empreendimento foi se desenvolvendo e, alguns anos depois, foi aberta a primeira
loja da rede. Naquele momento estavam trabalhando na fábrica o Fundador D, sua esposa, um
filho e cerca de 10 funcionários. O dono da Adoçar teve três filhos - um homem e duas
mulheres. O filho (Pai D) começou a ajudar o pai ainda bem novo e se tornou sua pessoa de
confiança na fábrica. Em 1952, o Fundador D faleceu e o Pai D, com 26 anos, assumiu o
comando da empresa junto com a esposa.
Para o Pai D não foi difícil gerir a fábrica sozinho, uma vez que sua experiência já era
grande o bastante para lhe capacitar no ofício de fabricante de doces. Ele se envolveu muito
cedo com as atividades e se viu preparado para assumir o comando da empresa quando o pai
faleceu. Somado a isso, seu interesse era totalmente voltado para o negócio familiar. Segundo
disse na entrevista, ele nem chegou a se dedicar muito aos estudos. Formou-se como técnico
em Contabilidade, mas deixou a carreira de lado e se voltou integralmente para o
empreendimento familiar:
Eu já me via preparado pra assumir a empresa. Sem dificuldade. Foi como passar
daqui pra lá. Tanto é que não segui carreira nenhuma. Assim, não me formei. Formei
em técnico em Contabilidade. Depois do ginásio, naquele tempo era ginásio, só
continuei aqui, não estudei mais. Me dediquei inteiramente à fábrica, à indústria. Era
o que eu queria. E meu pai queria também que eu ficasse (Pai D).
Na divisão da herança ficou acordado inicialmente entre os filhos que ele ficaria com a
empresa e as outras irmãs herdariam os outros bens que o pai deixou, pois, inicialmente, não
manifestaram interesse em assumir uma posição na fábrica. Porém, logo quando começaram a
fazer o inventário, elas resolveram ter também participação na empresa e entraram com um
processo judicial que durou quase 17 anos, até, oficialmente, o Pai D conseguir assumir
sozinho a propriedade da Adoçar.
85
Ele e sua esposa tiveram nove filhos, sendo três homens e seis mulheres. Da mesma
forma como ocorreu com seu pai (Fundador D), o Pai D levou os filhos desde cedo para
ajudar na fábrica. Segundo manifestou um dos entrevistados, parecia haver, desde a Fundação
da empresa, a expectativa de que apenas os filhos homens trabalhassem no negócio familiar.
Acredita-se que o Fundador D não desejava a presença de genros e cunhados trabalhando na
empresa. Assim, dos nove filhos da terceira geração, também só os homens foram trabalhar na
fábrica. Nenhuma mulher assumiu qualquer atividade:
É, mas sabe o que acontece, tenho a impressão que o europeu gosta de pegar o filho
homem para vir para o lado dele. Pra servir com ele, né? Acha, por exemplo, que o
homem é mais fiel, de repente, do que se arrumar uma filha e entrar os maridos,
querer dar palpite demais numa coisa que é dele. Tanto que, hoje, quem olha a
fábrica são os homens (Filho 2D).
Pode-se perceber, pela fala do Filho 2D, que esse traço cultural familiar vem passando
pelas diferentes gerações na empresa. O mais velho entre os homens da terceira geração
(Filho 1D) também começou a ajudar o pai na empresa ainda muito jovem. Sua atuação ficou
focada principalmente na área de produção, aprendendo na prática como fabricar os doces e
adquirindo experiência acompanhando o pai em suas atividades:
Eu nasci aqui dentro. Desde pequeno eu ajudava meu pai aqui. Então eu digo que eu
já nasci trabalhando. Eu comecei ajudando e ele me colocou cedo pra trabalhar
também. Eu ajudava na parte de fabricação de balas, ajudava a tomar conta dos
funcionários, olhava é [...] bombom, bala, chocolate, recheio, tudo. Então eu fui
gostando (Filho 1D).
Porém, sua opção por seguir a vida profissional dentro na empresa familiar não esteve
presente durante toda a sua trajetória. Apesar de ele ter “nascido” dentro da organização,
conforme afirmou, e de ter passado a gostar do que fazia, em dado momento parece ter
surgido alguma dúvida sobre continuar na empresa ou buscar novos caminhos. Assim, houve
uma época em que ele fez um concurso para a aeronáutica e, tendo sido aprovado, foi estudar
em Campinas.
Quando decidiu estudar e trilhar outros caminhos fora da empresa familiar, os pais,
que já contavam com o filho como uma peça fundamental na fábrica, buscaram um meio de
trazê-lo de volta à empresa e fizeram uma oferta para o Filho 1D se tornar sócio na Adoçar.
Ele acabou aceitando, retornando, assim, ao seu trabalho e ajudando na continuidade da
organização familiar:
86
Eu trabalhei aqui dentro, aprendi e gostava. Apesar de que quando foi nos meus 15,
16 anos, eu fiz um concurso para a Aeronáutica e passei. Aí fui pra Campinas fazer
o curso lá, estudar lá. Ia largar tudo aqui. Minha mãe chegou, meu pai, me pediram
pra não sair e eu que era o braço direto e que realmente queria dar continuidade,
acabei que eu não fui, fiquei. Nessa época minha mãe me deu um terreno pra entrar
na sociedade com meu pai na fábrica (Filho 1D).
O segundo filho (Filho 2D) inseriu-se no contexto da empresa familiar um pouco mais
tarde. Ele decidiu que queria se dedicar aos estudos, mas, durante o seu curso de graduação
em Administração, ele passou a interessar-se mais pelo negócio e também foi trabalhar na
Adoçar. Segundo ele, a escolha do curso superior foi influenciada pelo fato de a família já ter
um negócio próprio. Tanto que depois ele pensou em fazer Engenharia Mecânica, mas logo
desistiu para se dedicar totalmente ao empreendimento familiar:
Porque toda a vida nós moramos aqui ao lado. Então vivia aqui na fábrica. Toda
hora que precisava a gente dava uma mão. Aí, querendo ou não você vai gostando.
Eu comecei a estudar. Não queria fazer outra coisa, mas de repente eu fiz
Administração e passei a interessar. Aí eu passei a vir para fábrica também. A gente
quando vai fazer a opção de curso, a gente ainda é muito novo pra escolher, né?
Então eu falei assim: “Ah, vamos tentar ligar”. Tanto que depois eu tentei fazer
Engenharia Mecânica e falei: “Não, vou desistir do curso. Nós temos a indústria,
vou mexer com a indústria” (Filho 2D).
O mais novo entre os homens (Filho 3D) formou-se em Engenharia Civil. A princípio
não se interessou muito pelo trabalho na empresa da família, cuja atividade era bem diferente
da sua área de atuação, e abriu sua própria empresa no ramo de construção. Algum tempo
depois, percebendo a necessidade de ajudar nas funções administrativas da fábrica, ele
também entrou para o negócio da família. Entretanto, o Filho 3D não deixou totalmente a
empresa de construção que havia fundado. Ele ficou trabalhando nos dois empreendimentos e
buscou conciliar todas as atividades.
Os três filhos entraram efetivamente na empresa familiar para auxiliar o pai no
gerenciamento e na fabricação dos produtos e, aos poucos, contribuíram para a empresa se
desenvolver e crescer. O Pai D e o Filho 1D estavam voltados para as atividades relacionadas
à produção, enquanto o Filho 2D e o Filho 3D ficaram com a área comercial e administrativa,
respectivamente. Até o seu falecimento, a Mãe D também auxiliava o marido no trabalho na
fábrica. Mesmo sendo professora, ela ajudou na empresa da família, mas nunca teve
participação na sociedade.
Até a entrada da terceira geração, a fábrica contava somente com uma loja para vender
seus produtos ao público em geral. Para o Pai D seria difícil administrar, sozinho e
simultaneamente, a fábrica e várias lojas. Porém, quando da entrada dos filhos para ajudar, foi
87
possível abrir outros pontos de comercialização dos produtos da empresa. Inicialmente, a
ideia era oferecer uma atividade às irmãs, que não participavam da sociedade, e aos sobrinhos,
que ainda não tinham uma ocupação definida.
Destaca-se nesse caso que as lojas são empresas independentes da fábrica. Apesar de a
Adoçar não possuir um sistema de franquias, é acordado com os proprietários das lojas que
mantenham o mesmo padrão na organização interna, de logomarca e de produtos que são
comprados diretamente da fábrica. Em certa época, algumas pessoas de fora da família
também chegaram a ter lojas. Mas, com o tempo, percebendo que não era viável para a
Adoçar, decidiu-se restringir as lojas somente aos parentes:
Nós abrimos um leque muito grande, aqui era muito fechado. Nós estávamos
chegando à conclusão que a gente tava com uma loja só e o que acontece, nós
estávamos perdendo o foco, por exemplo, dos jovens. Os jovens estavam indo para
os shoppings e nós não tínhamos loja em shopping. A cidade estava crescendo
demais, então nós começamos a tentar expandir a marca. Como tinha muitas irmãs e
sobrinhos, vamos dar uma ocupação a eles. Os que não tinham serviço, não estavam
empregados. Que que era a ideia nossa a princípio? Botar uma loja pra cada
sobrinho, que era um jeito melhor de você administrar a marca porque sabia que ali
estavam pessoas confiáveis, então era muito mais fácil (Filho 2D).
Além da expansão com a abertura de novas lojas, a entrada dos herdeiros da terceira
geração trouxe algumas mudanças significativas para a estrutura da empresa. Houve
inovações nos processos administrativos e operacionais na área financeira, no controle de
estoques e inovações tecnológicas e nos produtos. De acordo com um dos entrevistados, a
nova geração buscou atualizar-se frente às inovações do mercado e do setor. Os filhos fizeram
diversos cursos na área de gastronomia para aprimorar o produto fabricado e acrescentaram
novos itens ao portfólio. Além disso, segundo eles, passou a existir uma atenção especial aos
clientes das lojas. O Filho 1D e o Filho 2D, que além de trabalharem na fábrica também são
donos de lojas, procuram ficar atentos à opinião dos consumidores, observando a demanda, se
existe procura por um produto específico e se algum item não tem muita saída e deve ser
retirado da linha de produção. Desta forma, eles inovaram e desenvolveram muitos produtos
novos para a Adoçar:
Eu também trago muito coisa, porque a gente faz muitos cursos e a gente tem mania
de escutar muito o cliente. O que que hoje está em evidência? Por exemplo, a trufa é
um doce da moda. Como o pessoal queria, nós fizemos. De uns anos pra cá eu tenho
viajado, eu e o Filho 3D viajávamos muito. Nós íamos para a Europa,
procurávamos, íamos naquelas lojas, experimentávamos os produtos. Mas acho
mesmo que a gente tem que aprender a escutar o povo (Filho 2D).
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No processo de sucessão da segunda para a terceira geração houve uma pequena
dificuldade na divisão das funções de cada membro da família e na saída efetiva do sucedido.
Aos poucos, os filhos foram entrando para trabalhar na empresa, mas não foram estipulados
cargos específicos para cada um deles. Cada um fazia o serviço que achasse necessário e,
algumas vezes, tarefas ficavam sob a responsabilidade de mais de uma pessoa. Em outros
momentos, um irmão acabava interferindo no que deveria ser função de outro. Essa falta de
definição de cargos resultava em uma gestão confusa e em alguns conflitos de relacionamento
entre os irmãos.
Por outro lado, o Pai D, que trabalhou sozinho durante muitos anos, estava
acostumado a comandar a empresa à sua maneira. Na sua visão o negócio familiar servia à
família e poderia sustentar todos os seus membros, incluindo aqueles que não trabalhavam na
organização. Na sua maneira de administrar os recursos não havia separação do que era da
empresa, do que era salário e retirada de lucros. Se precisasse ele tirava da empresa para pagar
a faculdade de todos os netos. Porém, ele não atentou para o fato de que a família havia
crescido. Não eram mais 11 pessoas, mas sim 40, visto que cada filho se casou e teve seus
filhos. Logo os herdeiros da terceira geração perceberam que não mais seria viável que todos
vivessem à custa da empresa familiar e tiveram que reorganizar a administração,
principalmente o setor financeiro.
Começar a sustentar todo mundo não tem jeito. Cada um tem que ter a sua retirada
específica de acordo com o cargo. E aqui não tinha cada um a sua retirada. Se um
precisasse, retirava. Aí não tem jeito, acaba quebrando a empresa. E isso deu um
conflito muito grande com meu pai. Aí ele falava: “‘não, criei os meus filhos assim,
vai ser assim desse jeito” (Filho 1D).
Naquela época a Adoçar contou com a ajuda externa de uma empresa de consultoria
que organizou as funções de cada membro da família e os processos da área financeira e da
área administrativa da empresa, além de aconselhar o antecessor a passar para os filhos a
gestão do negócio efetivamente e, inclusive, a propriedade.
A minha parte era toda voltada para produção. Papai não dava mais conta de
acompanhar o financeiro sozinho. Aí nós tivemos um conflito também, porque [...],
já tinha passado pra gente a fábrica e a administração de tudo estava meio confusa. E
aí chamamos um consultor que foi indicado pra gente, precisou de consultoria aí
quase dois anos. O consultor falou pra ele que muitas empresas não vão pra frente
por causa disso. Não eram nove filhos mais. Então tinham nove e passou pra 40.
Imagina se pagasse até hoje faculdade pra um, pra outro, os netos dele lá tal [...].
Isso deu um conflito bem pesado, mas graças a Deus deu certo depois. No fim cada
um ficou responsável por uma área (Filho 1D).
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Acatando a orientação da consultoria, nos anos 1990 o Pai D se retirou da sociedade
com a venda da sua parte nas cotas e a empresa ficou com os três filhos homens. Dois anos
antes da presente pesquisa, o Filho 3D faleceu. Com isso, teve que acontecer uma
reestruturação na empresa, visto que algumas atividades, principalmente da área
administrativa, ficavam sob o seu comando:
O Filho 1D mexia só com fabricação. Eu fiquei na área comercial e o Filho 3D
começou a entrar na parte administrativa. Nesse período nós crescemos muito. Só
que há dois anos atrás meu irmão mais novo, o Filho 3D, faleceu. Então, o que
acontece, ele estava mexendo com um monte de coisa, aí sobrou. Teoricamente nós
tivemos [...], nós começamos novamente a reestruturar tudo, porque ficou um buraco
que tinha que ser ocupado. E ele olhava muita coisa (Filho 2D).
Com o falecimento do irmão mais novo, seus três herdeiros entraram na sociedade da
Adoçar. Porém, nenhum deles quis assumir responsabilidades na empresa e deixaram todas as
decisões e a operacionalização sob responsabilidade dos outros dois sócios. Teve que haver
uma grande reestruturação. O Filho 1D, o Filho 2D e o Neto 2A tiveram que assumir setores
diferentes dos que estavam trabalhando antes e aprender a fazer o que o irmão fazia, pois o
Filho 3D deixou uma lacuna que teve que ser preenchida. Segundo um dos entrevistados, está
sendo complicado para os irmãos assumir responsabilidades que não são da sua competência,
mas eles estão conseguindo se reestruturar e superar as dificuldades:
Hoje a gente entende bem até. E aí fala, poxa, a situação obrigou a gente a se unir,
então, graças a Deus. A minha cunhada, que é esposa do Filho 3D, também apoia a
gente. Não trabalha aqui não, às vezes ajuda. Ela entrou no lugar do marido, mas ela
não se envolveu. A gente conversa com ela muito, ela vem aqui, mas não participa.
Fica meio apertado, mas estamos levando, está até melhorando (Filho 1D).
O Pai D, que está com 86 anos de idade, ainda trabalha na fábrica, auxiliando em tudo
que pode na área administrativa e também na produção, mas atua primordialmente como um
conselheiro:
Hoje a fábrica é minha, dos herdeiros do Filho 3D e do Filho 1D. Meu pai já passou.
Hoje ele é um colaborador. Ele trabalha bem ainda. Agora ele está com 86 anos.
Tem produtos que é ele que faz aí, mas ele não tem mais parte na propriedade. Mas a
gente tá sempre consultando, né? Apesar de que ele dá os palpites dele. A gente,
sempre que tem alguma coisa, conversa com ele, explica pra ele o que vamos fazer e
nunca faz nada também sem falar (Filho 2D).
Os sócios proprietários da terceira geração parecem ser muito conscientes da
importância de não se colocar pessoas na empresa apenas por ser da família. Esse, inclusive,
90
foi um dos motivos que impulsionaram a ideia da abertura das lojas para os familiares. Eles
queriam ajudar, dar uma ocupação, mas viram que na fábrica não seria possível, não teria
espaço para todos. Eles percebem a necessidade de ter alguém para ocupar a vaga no setor
administrativo financeiro, mas também sabem que essa pessoa teria que ser qualificada e
motivada para tal. Isso é visto claramente nas falas dos dois sócios da terceira geração:
Acho que o maior problema em empresas familiares é quando os filhos crescem, vão
criando família e às vezes você não pode sustentar com aquilo ali todo mundo. Eu
tenho uma amiga, por exemplo, que quebrou por causa disso. E quebra mesmo
(Filho 1D).
A ideia de montar as lojas também foi porque aqui não caberia muito mais gente da
família. Então, o que acontece, não adiantava ficar enchendo de gente. Então, acaba,
se você colocar uma pessoa, por exemplo, pra receber e pra não ajudar, não é
interessante. Mas a partir do momento que a gente achar que precisa de alguém, a
primeira pessoa vai ser da família. Se tiver competência pra fazer também, né?
Porque não adianta só botar uma pessoa só por ser da família também, não vai
adiantar (Filho 2D).
Pode-se dizer que a empresa familiar Adoçar está a caminho do seu terceiro processo
de sucessão, visto que a quarta geração já está atuando na organização. Os netos herdeiros do
patrimônio da fábrica são cinco no total. Porém, apenas um deles, filho mais novo do Filho
1D, está trabalhando na empresa (Neto 2D). Seu irmão (Neto 1D) formou-se em
Administração e trabalha com lojas da Adoçar. Os filhos do irmão falecido trabalham na outra
empresa que o pai fundou na área de construção. Eles são engenheiros. O filho do Filho 2D
formou-se em Odontologia e exerce a profissão.
O Neto 2D é graduado em Administração e tem acompanhado o pai nas atividades da
fábrica desde novo. Juntamente com seu irmão mais velho, Neto 1D, ele é dono de duas lojas.
A administração de ambas fica sob a responsabilidade do irmão, enquanto o Neto 2D se
dedica às atividades na Adoçar. Juntos eles abriram recentemente uma fábrica de sorvetes que
é administrada por ambos.
O Neto 2D começou a ajudar o pai na fabricação dos produtos quando tinha 15 anos.
Nunca trabalhou em outro lugar. Sempre teve interesse e vontade de trabalhar na empresa da
família e se dedicou a aprender e adquirir experiência na prática:
Não, nunca pensei em trabalhar fora daqui. Nunca. Sempre estava aqui. Se
perguntar, nunca fiz entrevista de emprego. Porque desde sempre, como eu te falei,
desde novo meu pai colocou isso na cabeça e eu gostava, né, no fundo eu gostava de
vir aqui (Neto 2D).
91
Porque na verdade mesmo, meu irmão é quem está mais lá com meu pai. Eu estou
mais com as lojas. Então na fábrica eu nem palpito não. Então eu praticamente só
mexo com as lojas mesmo, direto ao público (Neto 1D).
O Neto 2D seria, o principal sucessor na fábrica. Ele está sendo preparado já há algum
tempo para assumir o lugar do seu pai na parte de produção. Até a morte do irmão mais novo,
o Filho 1D estava com planos de diminuir sua carga de trabalho e para isso já estava passando
a linha de produção para o comando do seu filho. Na visão deles, o Neto 2D estaria
capacitado para assumir na ausência de seu pai. No entanto, esse afastamento não foi possível,
uma vez que a morte do Filho 3D obrigou os membros da família a assumirem novas
responsabilidades e, por enquanto, o Filho 1D não poderá se afastar como gostaria. Isso
ocorreu também porque na área administrativa ainda não havia algum sucessor sendo
preparado com possibilidades de assumir:
Tem muitos anos que eu venho preparando, desde pequenos, preparando eles pra
isso, pra ficar no meu lugar. Então se eu morrer amanhã, eu morro tranquilo porque
eu sei que eles dão conta do recado. Não vai ser por isso que vai parar a empresa.
Então, já tenho meu sucessor. Da parte dele sou garantido. Melhor que eu até. Eu já
estava até preparando pra sair, pra diminuir minha carga aqui dentro. Mas fiquei
com o financeiro depois do Filho 3D. Eu entrei numa área nova [...] apanhei muito.
Agora que eu estou começando a pegar o jeito (Filho 1D).
Começou a se pensar no Neto 2D talvez pra cuidar da parte de fabricação. Ele está
sendo ensinado, tudo pra continuar a parte operacional de produção. Então, o que
acontece quanto à parte de administração, não pensamos ainda direito, ainda não
(Filho 2D).
O outro neto, que é o mais velho dos dois, chegou a trabalhar um tempo na fábrica
com o pai. Começou até antes mesmo do seu irmão. Na adolescência ele ajudou muito e ficou
na fábrica até iniciar o curso superior. Logo que começou o curso de Administração o Neto
1D conseguiu uma vaga para trabalhar em um banco e decidiu aceitar a fim de ter experiência
fora da empresa da família. Ele ficou quatro anos no banco e quando estava prestes a se
graduar resolveu voltar para a fábrica. Na mesma época, surgiu a ideia de abrir uma nova loja
da Adoçar em um shopping. Ele acabou assumindo a loja e não voltou a trabalhar com pai:
Eu já trabalhei lá muitos anos atrás. Depois fui ficando velho, entrei na faculdade e
tinha um tio meu que trabalhava no Banco Real e me chamou. Aí eu falei com o
meu pai: “Ó pai, eu acho interessante para mim saber o outro lado como é que é, ser
funcionário”. Aí parei de trabalhar com meu pai e fiquei quatro anos no banco.
Quando estava faltando seis meses pra me formar eu cheguei pro meu pai e falei:
“Ó, eu vou voltar, eu vou sair do banco”. Quando fui pegar com o meu pai de novo
na fábrica, surgiu a primeira loja nossa e então nós pegamos lá, eu e meu irmão.
92
Pegamos, eu não voltei pro meu pai e já fui pras lojas. De lá pra cá eu não voltei
mais pra fábrica não (Neto 1D).
Até o momento da presente pesquisa, a representação do genetograma juntamente com
o organograma da empresa, onde se pode observar visualmente as gerações, as pessoas que já
passaram pela organização e quem ainda está atuando é a que se encontra na Figura 5:
Figura 5 - Genetograma Adoçar
Legenda:
Pessoas já falecidas que eram sócias e/ou trabalhavam na empresa.
Não sócio, apenas trabalha na empresa.
Não sócio e não trabalha na empresa.
É sócio e também trabalha na empresa.
Apenas sócio, não trabalha na empresa..
Pessoas que foram sócios e/ou já trabalharam na empresa, mas saíram.
Fonte: Dados da pesquisa.
93
A entrada da quarta geração na empresa familiar também trouxe aspectos positivos
para o desenvolvimento da Adoçar. O Neto 2D é formado em Administração, mas, assim
como seu pai e tios, ele procura fazer vários cursos na área de alimentação e trazer novos
produtos para o portfólio, buscando diversificação frente ao mercado.
Há cerca de dois anos, ele e seu irmão que é sócio nas lojas tiveram a ideia de entrar
no negócio de produção de sorvetes. As lojas já vendiam sorvete, porém, compravam de
fornecedores terceirizados. Eles tiveram a ideia de fabricar o próprio sorvete com a marca
Adoçar e hoje estão investindo nesse novo ramo:
E hoje, de um bom tempo pra cá, a maioria dos produtos novos, lançamentos, foi
tudo o meu filho que desenvolveu. Fez diversos cursos (Filho 1D).
Agora eu e meu irmão estamos entrando na área do sorvete, né. Não tem nada a ver
com a fábrica, com meu pai, com meu tio, avô, não (Neto 1D).
A sucessão da primeira para a segunda geração aconteceu por motivo de falecimento
do fundador. Mesmo assumindo ainda jovem e repentinamente, o Pai D se considerava
preparado e assumiu sem grandes dificuldades, pois já vinha desde cedo ajudando o pai e
aprendendo com ele. Já a terceira geração efetivou o processo sucessório em virtude da idade
e da necessidade de afastamento do antecessor, que já não conseguia cuidar sozinho da
administração e que precisava dar espaço aos filhos que queriam resolver os problemas que
viam na gestão do pai (um deles era a falta de critério para retirar recursos da empresa e a
mistura dos gastos empresariais com os familiares). Os filhos assumiram a empresa e já
tinham experiência e prática suficiente para darem continuidade ao negócio. Da mesma
forma, a quarta geração está naturalmente trilhando esse caminho, começando a trabalhar na
empresa cedo e adquirindo experiência e maturidade com a convivência com a geração
anterior:
É, foi mais natural. Na verdade, meu pai veio passando aos poucos. Não foi da noite
pro dia, tipo agora segura aí que a bomba é sua. Não, foi aos poucos. Meu pai cobra
muito responsabilidade. Eu, por ter feito todo um serviço dentro da produção, de
tudo, de todas as áreas da produção, ter trabalhado em tudo, ele foi vendo, foi
ficando mais velho e foi passando (Neto 2D).
É, ali eles têm pelo menos mais 20 anos de empresa, acredito eu. Meu avô tem 86 e
está lá forte ainda. Então pelo menos até uns 20 anos. Acredito que nós vamos
continuar muito tempo ainda nesse mesmo segmento dos meus pais, meus tios, meu
irmão. Não vejo uma grande mudança de regime ali dentro, nada assim não (Neto
1D).
94
Mesmo que o processo de sucessão já esteja bem encaminhado, não existem
perspectivas concretas quanto à saída da terceira geração da empresa, sendo a idade um dos
motivos para tal. Os atuais gestores ainda estão em pleno vigor no trabalho, estão na faixa dos
50 anos e pretendem ainda trabalhar muito tempo. Quanto ao futuro, a intenção é não sair
totalmente da empresa, mas sim diminuir bastante o ritmo.
4.5 Descrição do caso: TRANSPORTAR
A história da empresa começa com a vontade de um pai de família com oito filhos
(Fundador 1E) de ter um negócio próprio que poderia ser o sustento, a estabilidade e uma
opção de trabalho para seus herdeiros no futuro. Assim, na década de 1950 ele encontrou uma
empresa de transporte que estava à venda e, juntamente com dois amigos (Fundador 2E e
Fundador 3E), comprou os direitos da concessão da Transportar. Seu segundo filho (Pai E) na
época estava com 20 anos de idade, já tinha carteira profissional e, por ser habilitado para
dirigir os veículos, foi trabalhar com o pai na empresa:
Nós éramos oito filhos. Então ele preocupava que, quando fosse adulto, o que ia
fazer? Então ele procurou um negócio onde ele podia colocar os filhos e achou por
bem mexer com transporte coletivo. Nisso eu estava com 20 anos e ele me mandou
pra cá pra tomar conta da empresa. Meu pai falou: “Olha, vai você, que você tem a
carteira profissional e pode dirigir ônibus” (Pai E).
Como é característico de pequenos negócios, os donos faziam um pouco de tudo na
Transportar. Não tinham cargos e departamentos definidos, todos tinham que dar conta de
realizar qualquer tarefa que fosse necessária para o bom andamento do negócio. O Pai E
desempenhou várias atividades, foi motorista, trocador, ajudante de mecânico e conheceu
profundamente o empreendimento da família. Além dele, seu irmão mais velho (Irmão 1E)
também foi trabalhar na empresa. Então, logo no início o Fundador 2E quis deixar a sociedade
e vendeu sua parte para os dois filhos do Fundador 1E que estavam com ele na organização:
“Os outros dois sócios eram amigos do meu pai. Quando daí uns 60, 90 dias, um resolveu
sair. Falou: ‘Não estou gostando disso não’. Aí eu e meu irmão compramos a parte dele” (Pai
E).
Três anos mais tarde o Fundador 3E também decidiu sair e a empresa comprou sua
parte. Na abertura da empresa cada um dos três sócios fundadores tinha 33,33% das cotas.
Com a saída dos dois (Fundador 2E e Fundador 3E) e a entrada dos filhos do Fundador 1E,
95
este ficou sendo o sócio majoritário, com 50% de participação na empresa. O Pai E e o Irmão
1E ficaram, cada um, com 25% do total.
Os anos passaram e em 1969 o Fundador 1E faleceu. Com o seu falecimento todos os
filhos (seis homens e duas mulheres) entraram na sociedade após a divisão da herança. Como
os dois mais velhos já possuíam, juntos, 50% de participação na empresa, com a partilha dos
bens passaram a deter 62,50%, ficando eles como sócios majoritários. Os restantes 37,50%
representam a soma das cotas dos outros seis irmãos.
O negócio estava em pleno processo de crescimento, mas ainda não dava muito lucro,
conforme observou o Pai E, uma vez que todo o capital era reinvestido na própria empresa:
Porque não tinha lucro. O lucro era todo reinvestido, tá entendendo? Ora, você veja,
uma empresa que começou com dois ônibus, pra acompanhar um progresso e ter que
fazer um parque de manutenção, né, igual tem aqui e comprando mais ônibus, que
os ônibus ficavam velhos muito depressa. Não tinha como sobrar muita coisa” (Pai
E).
Dos seis irmãos que passaram a ser donos em virtude do falecimento do pai, três foram
trabalhar na organização familiar e os outros três ficaram apenas como sócios. Como não
recebiam divisão dos lucros e a empresa não tinha dinheiro para comprar a parte dos que
queriam vender suas cotas, dois irmãos dos que eram apenas sócios, mas não trabalhavam na
organização, entraram com processo judicial em 1990 para dissolução da sociedade4. Mais
tarde outros três também manifestaram o desejo de sair da sociedade e pediram que fosse feita
uma cisão5:
Hoje, com a experiência que eu tenho, eu compraria a parte deles e depois atrasava
os pagamentos. Aí já tinha resolvido o meu problema. Mas como eu sempre zelei
pelo pagamento em dia, eu não tive condições. E eu pensava que a empresa ia
crescer mais do que cresceu, pensava que eles tivessem participação com a gente no
4 Em acordo com a seção VI do Novo Código Civil (Lei 10.406 de 2002) nos artigos 1.033 a 1.038, a dissolução
de sociedade é o ato que desencadeia o processo de extinção da personalidade jurídica de uma sociedade ou que
desvincula um sócio do quadro societário. Uma das formas de dissolução pode se dar através de uma ação
judicial por solicitação de algum sócio que solicita a dissolução dos vínculos contratuais que a originaram. A
natureza da ação de dissolução de sociedade se divide em duas fases: na primeira cabe ao julgador examinar o
mérito da causa. Uma vez reconhecida a causa diz-se dissolvida a sociedade. Finalizada a primeira fase da ação
de dissolução, será proferida sentença que decreta a dissolução da sociedade, reconhecendo assim a obrigação de
pagar determinada quantia ao sócio retirante por meio de perito nomeado pelo juízo (liquidação por
arbitramento), que procederá à verificação do valor a ser liquidado (Campinho, 2005). 5 Conforme o artigo 219, II, da lei 6.404/76, a cisão é uma operação em que ocorre a transferência de uma
parcela do patrimônio de uma empresa para uma ou mais sociedades constituídas especialmente para esse fim ou
já existentes (no caso de cisão parcial) ou transferência da totalidade do patrimônio em caso de cisão total.
Quando é parcial, ocorre a versão de uma parte do patrimônio da sociedade cindida, implicando a redução do seu
capital social na proporção do que foi transferido. Se todo o patrimônio for transferido para outra sociedade,
ocorrendo a extinção daquela cindida, configura-se a cisão total (Bertoldi & Ribeiro, 2011).
96
futuro com uma situação melhor. Então, o que acontece, eles entraram com uma
ação de dissolução (Pai E).
Saíram cinco irmãos da sociedade e ficou apenas o Pai E, o Irmão 1E e um terceiro
irmão (Irmão 2E). Mesmo enfrentando dificuldades com os processos judiciais, com o
pagamento obrigatório dos valores estipulados para ressarcir os sócios que saíram (o que
influenciou negativamente o patrimônio da empresa), com vários conflitos de cunho familiar
que surgiram na convivência dentro da organização com tantos familiares e tendo que assumir
uma postura mais enérgica como administrador, conforme o Pai E relata a seguir, ele, com o
apoio do Irmão 1E, continuou trabalhando e fazendo o negócio crescer. Nesses momentos
difíceis o Pai E conseguiu gerir o negócio como muito profissionalismo, sem se deixar abalar
tanto com os problemas pessoais.
Pra você sobreviver você tem que criar uma administração e esquecer que a empresa
é familiar. Você tem que falar não, não pode e eu passei por problemas difíceis. Vou
te citar um deles. Telefone. Eles ganhavam aqui, tinham o seu salário. Quando
chegava o fim do mês, o que eles ganhavam não dava pra pagar telefonema que eles
estavam dando. Quando eu vi que as contas de telefone subiram demais eu falei:
“Agora cada um paga a sua conta”. Aí eu sou ruim, não é? Mas sociedade é assim,
se você fez alguma coisa que deu certo, é nossa, se deu errado, é fulano (Pai E).
Como foi dito, a passagem da primeira para a segunda geração aconteceu
abruptamente, em virtude da morte do fundador. Dois dos filhos já trabalhavam na empresa e
tinham participação acionária. Porém, um deles, o Pai E, acabou se destacando como líder e
assumiu o papel de sucessor, tendo o total apoio do Irmão 1E. Mesmo sem ter feito curso
superior, mas tendo características e habilidades empreendedoras, ele aprendeu muito com a
vivência prática na empresa e se tornou o presidente, além de contribuir para o crescimento do
negócio familiar. Sobre sua experiência em assumir a direção da empresa, ele disse:
Mas então, como é que você procura um sucessor, como você faz um sucessor? Tem
um ditado que fala “onde não houver um sucessor, um líder, se faça de líder”. É o
que aconteceu. Eu tive que me fazer de líder, né? Tive uma vantagem muito grande,
que meu irmão mais velho me dava muito apoio, certo? Ele é quem eu precisava
realmente porque eu e ele fazíamos uma totalidade majoritária (Pai E).
Depois de resolvidos os problemas da sociedade, quando tudo parecia caminhar para
uma gestão mais tranquila, depois de 50 anos de união, o Irmão 1E faleceu e, por causa da sua
herança, entram como sócios da Transportar sua esposa e mais seis filhos, que representam a
terceira geração. O Pai E também teve seis filhos, sendo três mulheres e três homens. Hoje a
família está na quarta geração. Só da parte do Pai E são 11 netos.
97
Falando-se especificamente da linhagem do sucessor (Pai E), inicialmente nenhuma de
suas três filhas teve interesse ou foi incentivada a trabalhar na empresa familiar e atualmente
elas são sócias em um negócio no ramo de construção civil. Junto delas trabalha um neto. Um
dos filhos homens trabalhou um tempo com o pai, mas hoje já está aposentado.
De todos os herdeiros da terceira geração, trabalham na empresa um filho do Irmão 1E
(Sobrinho 1E) e dois filhos do Pai E (Filho 1E e Filho 2E). Da quarta geração há um neto
(Neto 1E), primogênito da filha mais velha do Pai E. O sobrinho é o único representante da
família do irmão falecido na empresa e atua na área de suprimento e manutenção juntamente
com o Filho 2E (46 anos). O Filho 1E (48 anos) é o diretor geral, responsável pela área
administrativa financeira e operacional e conta com o Neto 1E (27 anos) como seu principal
assessor. Este está em todos os setores, auxiliando na administração da empresa e exercendo a
função de gerente geral.
A Figura 6 mostra um esquema que pretende representar os quatro níveis de gerações
e o papel que cada um exerce na empresa da família atualmente:
Figura 6 - Genetograma Transportar
Fundador 1E Fundador 3E Fundador 2E
Pai E (Consultor)
Irmão 2E Irmão 1E Outros
5 irmãos Esposa Esposa
Filha 1 Filho 1E
(Diretor Geral)
Outros
5 Filhos
Sobrinho 1E (Manutenção)
Filho 2E (Manutenção)
Outros 3
filhos
Neto 1E (Gerente Geral)
98
Legenda:
Pessoas que foram sócios e/ou já trabalharam na empresa, mas saíram.
Pessoas já falecidas que eram sócias e/ou trabalhavam na empresa.
É sócio e também trabalha na empresa
Apenas sócio, não trabalha na empresa.
Não sócio, apenas trabalha na empresa.
Não sócio e não trabalha na empresa.
Fonte: Dados da pesquisa.
Para lidar com o expressivo número de herdeiros, sócios e gerações que convivem na
mesma família, o Pai E precisou ter pulso firme na administração e tomar medidas para
estabelecer alguns critérios a fim de nortear a entrada dos familiares na empresa, além de
tentar proteger o patrimônio e oferecer mais possibilidades de longevidade ao seu negócio.
Como disse o Filho 1E, “são muitas pessoas e a empresa não teria capacidade de absorver
todos”. Entre as medidas tomadas, estão: definição da quantidade de membros de cada família
que pode, por vez, trabalhar na empresa; estabelecimento de critérios para a entrada dos
herdeiros no quadro de empregados da empresa; abertura de empresas holdings controladoras
do patrimônio e das ações das empresas da família; e a doação prevista em testamento de uma
porcentagem a mais das ações da empresa para o sucessor.
Sendo assim, estabeleceu-se que cada família só poderia colocar um filho para
trabalhar na empresa. Entre os critérios de acesso à empresa, estão: curso superior concluído
ou em andamento, conhecimentos na área de informática e domínio de uma língua
estrangeira, prioritariamente o inglês. Desta forma, evita-se que a empresa seja um “cabide de
empregos” (Pai E). Preza-se pela meritocracia e evitam-se o paternalismo e o nepotismo. Tais
acordos não foram registrados em documentos que possam comprovar sua validade, mas foi
um combinado verbal.
Primeiro, cada filho só pode colocar um filho aqui. Então, por exemplo, a minha
filha mais velha tem dois filhos, já sabe que só um pode ficar aqui. Isso não está
previsto em contrato, é verbal. Pros meninos que estão, por exemplo, pensando “ah,
não, não precisa estudar não que amanhã vou lá pra empresa”, então não pensam que
vai ser fácil não (Pai E).
Não viriam todos. Um de cada família a princípio. Mas se você for colocar um de
cada família vem seis pra cá. Então tem que no mínimo estar cursando ou ter um
99
curso superior, tem que falar no mínimo um idioma, a informática [...]. Isso não está
registrado, mas é um acordo verbal que a gente tem. Porque tem que fazer outras
coisas também, tem que ver quem tem vocação pra estar aqui (Filho 1E).
Logo, fica evidente que não basta ser da família para conseguir uma vaga para
trabalhar na empresa. Para os atuais gestores, o membro que vier a trabalhar com eles precisa
ser qualificado.
Outra medida adotada pelo Pai E foi a contratação de profissionais externos para
reorganizar o patrimônio da empresa a fim de sanar alguns problemas relativos à herança e à
sociedade. A primeira ação foi a abertura de holdings6 para administrar o investimento dos
acionistas. O Pai E abriu duas holdings das quais somente ele e a esposa são sócios. Uma é a
holding imobiliária, que detém os seus imóveis pessoais, os imóveis que a Transportar utiliza
em suas operações e faz transações de aluguel. A outra holding é dona da construtora e da
Transportar. A sociedade da construtora é formada pelas três filhas do Pai E juntamente com
o Filho 1E. As cotas da Transportar, por sua vez, estão divididas conforme o Quadro 8:
Quadro 8 - Divisão acionária da Transportar
Porcentagem Sócio
55% Holding do Pai E e de sua esposa
30% Filhos herdeiros do Irmão 1E que faleceu
7% Esposa herdeira do Irmão 1E que faleceu
8% Irmão 2E
Total: 100%
Fonte: Dados da pesquisa.
6 Segundo Lodi e Lodi (2004), holding é uma empresa que controla outras, cujos produtos são os investimentos
que podem ser uma fábrica, prestadora de serviços, atividades rurais, grupos empresariais, etc. É uma ferramenta
administrativa que possibilita ao empresário ter mais proteção e solidez do seu patrimônio. O interesse é o
sucesso das suas empresas controladas e não o produto em si que elas oferecem. A propriedade de bens em nome
de uma pessoa física oferece uma série de riscos e custos elevados quando comparados à sua incorporação a uma
pessoa jurídica. Utiliza-se a expressão holding patrimonial para qualificar uma empresa que controla o
patrimônio de uma ou mais pessoas físicas, ou seja, em vez das pessoas físicas possuírem bens em seus próprios
nomes, possuem por meio de uma pessoa jurídica – a controladora patrimonial, que geralmente se constitui na
forma de uma sociedade limitada. Entre as principais vantagens pela realização dessa operação, está a redução da
carga tributária incidente sobre os rendimentos da pessoa física (IRPF), a possibilidade de realização de
planejamento sucessório (herança), a preservação do patrimônio pessoal perante credores de uma pessoa jurídica
(empresa) da qual a pessoa física participe como sócio ou acionista e a facilidade na outorga de garantias (avais,
fiança) e na emissão de títulos de crédito (notas promissórias) por meio da pessoa jurídica em função de sua
grande credibilidade junto ao mercado.
100
Como o Pai E enfrentou dificuldades quando assumiu a empresa no lugar do seu pai
em virtude da divisão da herança, ele está preocupado com as próximas gerações. Assim, vem
estabelecendo medidas com o objetivo de evitar possíveis conflitos futuros entre os herdeiros
da Transportar. Uma vez que o Filho 1E é o seu sucessor, está na empresa há muitos anos e
tem se dedicado muito ao negócio, o pai decidiu que deveria passar para ele uma parte maior
da empresa na divisão da herança, a fim de que ele tenha significativa porcentagem das cotas
para continuar sendo o principal tomador de decisões na Transportar:
Eu procurei fazer alguma coisa para dar maior autoridade a ele (Filho 1E). E não só
pra isso. Ele abraçou a empresa, começou a trabalhar desde cedo lá e trabalha 24
horas por dia. Eu pensei o seguinte, se eu faltar, minha parte vai ser dividida para os
seis. Eu tenho um que já aposentou, não quer fazer nada e vai receber a mesma
parte. Dos seis, o que trabalha mesmo, assim, com garra, é o Filho 1E (Pai E).
O Pai E conversou com sua esposa e depois reuniu todos os filhos. Apresentou a eles
as suas preocupações e argumentou que não seria justo que o Filho 1E recebesse a mesma
parte que os outros na empresa. A maioria concordou e ele fez um testamento doando 10% da
sua parte e da esposa para o seu sucessor, de forma que somente os outros 90% serão
divididos na herança e o filho ficará com a maior porcentagem. Apenas um filho discordou,
pensando que teria prejuízo, conforme a fala do Pai E:
Chamei minha mulher e falei com ela: “Olha, na nossa falta não é justo que o Filho
1E receba o mesmo que os outros. Eu quero dar a ele 10%, sem prejuízo da
herança”. Ela falou: “não, eu acho que é muito justo também, eu quero dar também”.
E não fiz surpresa pros meus filhos não, eu informei pra todos que eu estava fazendo
aquilo porque eu não quero quando eu partir que tenha surpresas não. Alguns
abriram o coração e falaram: “o senhor está certo, ele merece”, outros falaram:
“acho que é pouco, o senhor devia dar mais”. Só um virou e falou assim: “olha, eu
vou ter prejuízo, né”? Então, falei: “então me fala o valor do prejuízo que eu vou te
pagar, estou dando o que é meu”. Fui ao cartório, fiz um testamento, nós assinamos
(Pai E).
Meu pai há uns quatro, cinco anos, me deu um presente. Ele me deu 10% a mais do
patrimônio dele. Ele fez um testamento e comunicou todos os irmãos. Segundo ele
foi um presente por merecimento (Filho 1E).
Percebe-se que várias ações dos gestores da Transportar acontecem rumo à
profissionalização da gestão. Naturalmente eles perceberam essa necessidade ao se depararam
com problemas relacionados à chegada de mais pessoas na família e o consequente aumento
do número de gerações. Segundo o Pai E, a empresa pretende, em um futuro próximo, criar
um Conselho Administrativo para melhor organizar os papéis de cada membro da família e
estruturar ainda mais a gestão do negócio.
101
Em relação à gestão, a Transportar já encerrou seu segundo processo de sucessão,
visto que o comando hoje está sob responsabilidade da terceira geração. O Pai E continua na
empresa e ainda é o proprietário principal, pois detém sozinho a maior porcentagem das cotas.
Com 74 anos de idade ele atua como um consultor na organização, mas, no dia-a-dia, quem
toma todas as decisões é o Filho 1E:
O processo de sucessão já encerrou. Acredito que ficou definido, né, porque a idade
média nossa está em torno de 45, 50 anos. Com certeza já aí há uns 15 anos, 20 anos
eu fui assumindo e tudo. Então isso ficou bem claro. Eu sou administrador, não
sócio. Estou no contrato social como administrador não sócio (Filho 1E).
Há algum tempo o Pai E vem se organizando e, consequentemente, preparando seu
filho para assumir a administração da Transportar. Aos poucos ele deu autonomia, afastou-se
das atividades diárias e hoje vê o quanto o filho está pronto para liderar o negócio. Segundo
ele (Pai E), não foi muito difícil essa passagem. Primeiro, porque ele se percebe como alguém
que tem a visão de que o melhor é delegar e preparar um sucessor, visto que a empresa tem
que continuar e que ninguém é insubstituível. O segundo motivo diz respeito à demonstração
de maturidade do Filho 1E, que procurou aprender o máximo que pôde na convivência com o
pai e que se mostra ao mesmo tempo firme em suas decisões e atento aos conselhos do seu
consultor:
Por exemplo, chega o Filho 1E e fala: “Papai, eu estou querendo fazer essa coisa
assim, assim, assim”. Eu falo: “Olha, eu não faria assim não. Mas pode fazer que eu
dou apoio”. Certo? Porque as vezes eu estou desatualizado. Você vai ficando velho,
vai achando que é bobagem. Então eu dou todo o apoio. Dou autonomia, pode fazer.
Eu não seguro o crescimento da empresa, senão fica aquele velho [...]. Eu conheci
uma pessoa, morreu com 103 anos. E eu comecei a analisar que ele deu muito
prejuízo de ter vivido muito tempo, sabe por quê? Porque ele tinha um negócio aqui,
mas ele não deixava os filhos mandarem, não dava autonomia. Um sujeito bom,
direito, mas que depois que morreu os filhos venderam tudo (Pai E).
O Pai E não pretende se afastar totalmente do negócio. Ele deseja continuar como um
apoio para o filho, mas sem se comprometer com horários e rotinas e sem desautorizar o seu
sucessor nas decisões que ele toma. Para isso, além de dar autonomia na prática, o antecessor
passou procuração para o filho não depender dele nem para assinar papéis. Por outro lado, o
Filho 1E também concorda que o pai não deveria se ausentar por completo, visto que sua
experiência e seus conselhos são de grande valia para ele na administração da empresa. Além
disso, o filho sabe que o pai dedicou muitos anos ao negócio da família e isso é a vida dele e,
portanto, ele não conseguiria se afastar totalmente. Prova disso é que uma nova sede
administrativa da Transportar está sendo construída e o Filho 1E fez questão de fazer uma sala
102
para seu pai onde ele poderá ficar para auxiliar no atendimento ao público e no que mais for
solicitado.
Eu quero não ter a obrigação de [...]. Eu já estou chegando a esse ponto, o meu filho
tem procuração pra assinar pra mim. Se eu não vier, a empresa não para. Enquanto
Deus me der força de eu vir aqui, assinar uns documentos, porque administrar aqui
eu não estou administrando não, hoje eu passei a ser mais um conselheiro. Eles me
pedem opinião e tal, tudo o que vai fazer. Então eu acho o seguinte, não deixa eu
morrer pra eles mandarem não, eles têm que mandar agora. Porque eu estou aqui pra
corrigir os erros, ajudar (Pai E).
Nós não queremos que ele deixe nunca. Sabe por quê? É a vida dele. Papai está com
74 anos, então nós estamos cobrando que ele fique mais. Estamos com um prédio de
administração já fazendo uma sala pra ele. Ele nunca foi centralizador, mas também
não deixamos de fazer nada sem consultar, principalmente em relação a
investimento (Filho 1E).
O sucessor é o quarto filho do Pai E e o primeiro entre os homens. Apesar de ter mais
um irmão trabalhando na Transportar, foi ele quem se destacou para assumir a empresa
familiar: “Nesse processo todo de sucessão, eu tenho seis filhos, o meu irmão também seis,
mas o único que liderou pra assumir a empresa foi o Filho 1A, meu filho. Ele manifestou
interesse, abraçou. Se não fosse ele, não tinha empresa” (Pai E).
Com 15 anos de idade, o Filho 1E começou a trabalhar. Na época, a ideia foi do seu
pai, que desejava iniciá-lo na vida profissional. O primeiro emprego aconteceu fora da
empresa familiar, uma vez que a Transportar estava enfrentando os conflitos em virtude da
dissolução da sociedade e o pai achou por bem não levar o filho para a empresa no primeiro
momento. Pensando em ter uma experiência como funcionário em uma organização externa, o
Filho 1E iniciou a carreira em uma concessionária, que o admitiu a pedido do Pai E. Este
chegou a fazer uma proposta à empresa de que pagaria o salário do filho, porque seu objetivo
era ensinar, fazer com que o filho tivesse responsabilidades com horário, patrão e serviço. O
dono da concessionária não aceitou a ajuda do Pai E, dizendo que ele foi um ótimo
funcionário Depois de três anos o Filho 1E saiu.
Segundo o Filho 1E, essa foi uma boa experiência, em que ele pôde aprender e
também levar novas ideias para a empresa da família. Ao sair da concessionária, ainda jovem,
com 18 anos, ele foi trabalhar com o pai. Pensando em uma forma de fazer o filho conhecer
de perto o negócio, o Pai E fez com que ele passasse por praticamente todos os departamentos
da empresa. Depois de aprender bastante o trabalho de um setor, ele era transferido para
outro. Esse procedimento acabou gerando comentários dos empregados na empresa que, sem
saber que as mudanças de uma área para outra eram feitas intencionalmente, diziam que o
103
filho não tinha capacidade, pois não parava em lugar algum, estava sempre trocando. Porém,
intuitivamente, o Pai E sabia que, permitindo que o filho assim o fizesse, teria conhecimento
profundo e, ao mesmo tempo, generalizado do negócio:
Quando ele voltou pra trabalhar aqui eu falei com ele: “Filho 1E, você vai fazer uma
coisa, quero pisar em ovos sabe? Você vai trabalhar em um departamento, quando
você aprender tudo você fala comigo que eu passo você para outro”. Aí ele foi pra
contabilidade, quando ele teve conhecimento do processo contábil eu passei ele pra
parte de contas a pagar, depois foi pro departamento de pessoal, pra compras, foi pra
manutenção. Então ele foi conhecendo tudo (Pai E).
Com isso ele começou em cargos mais baixos, passou por todas as áreas e foi se
capacitando para crescer na organização. Segundo o próprio Filho 1E, ele ficou tão motivado
a trabalhar na empresa da família, que nunca mais quis sair de lá. Para o Pai E, o sucessor é
um ótimo gestor, respeitado por todos os funcionários e tem feito a empresa crescer:
Trabalhei dos 15 aos 18 anos na outra empresa. Nisso, eu acho que também foi
muito positivo pra mim, né, na área de escritório e tudo. Aí cheguei e tomei gosto,
fui ficando, ficando e fazendo parte de tudo. Como o negócio era do meu pai, acho
que é até mais atrativo, tem uma motivação, né? (Filho 1E).
No presente momento, a Transportar está no princípio do processo de sucessão da
terceira para a quarta geração. O Filho 1E percebe que já é o momento de se pensar na
passagem do bastão. Dos 11 netos do Pai E, o mais velho é quem está na empresa e tem sido
preparado com o objetivo ser o futuro sucessor na direção da empresa:
E ele (Filho 1E) já está preparando um sucessor, que ele pensa que será o Neto 1E.
(Pai E).
Nós já estamos na hora de começar a fazer a próxima sucessão. Meus filhos são
muito novos ainda, não têm uma definição de tudo. Uma está com 17 anos e o outro
com 15. O Neto 1E que já veio, entendeu? Minha irmã mais velha casou primeiro e
a distância entre os netos ficou um pouco longa. Sem sombra de dúvida ele é o
principal candidato a sucessor. Só depende dele (Filho 1E).
O Filho 1E tem dois filhos, mas ambos são muito jovens e ainda não manifestaram
interesse em trabalhar na organização familiar. Mesmo não sendo herdeiro direto do
antecessor que está no comando, o Neto 1E foi bem recebido por ele e tem todo o apoio
necessário. Segundo o Filho 1E, o sobrinho tem qualificação e capacidade para liderar a
empresa futuramente. Além disso, ele já percebe a necessidade de começar a preparar aquele
que poderá substituí-lo na direção da empresa futuramente:
104
Você tem que ser desprendido. Você tem que saber que está aqui, tem uma missão e
um dia você vai. Um dia pode ser amanhã, pode ser daqui a 100 anos, se Deus
quiser, então [...]. Mas você não sabe, olha a fatalidade, se eu não preparo e fico com
ciúme querendo esperar meu filho chegar e não sei nem se ele vai querer. Se você
não passar as coisas, primeiro que você não consegue administrar sozinho, segundo
que você precisa de bons e excepcionais líderes e precisa da família também pra dar
sequência. Então, eu passo tudo para o Neto 1E, como se fosse meu filho, com o
maior prazer (Filho 1E).
Como dito no início, o neto atua com um assessor direto do antecessor na empresa.
Nas próprias palavras do tio, ele é um “faz-tudo”. Dá suporte no setor de Recursos Humanos,
ajuda na administração financeira, operacional, na manutenção, enfim, ajuda em tudo que for
preciso. Além de ter começado a trabalhar na empresa da família bem cedo e de acompanhar
o Filho 1E no dia-a-dia, aprendendo com ele e adquirindo experiência, o Neto 1E é formado
em Direito e procura usar seus conhecimentos na empresa.
5 ANÁLISE CONJUNTA DOS CASOS
Depois de descritos todos os cinco casos estudados, aqui será feita a análise
comparativa entre os mesmos, relacionando as realidades encontradas às categorias
previamente definidas e à literatura estudada sobre cada tópico.
5.1.1 Sucessão
O primeiro objetivo específico proposto para investigação neste trabalho foi analisar
os fatores desencadeadores do processo sucessório. Para isso, a categoria de análise foi a
sucessão, em que se procurou averiguar se nas empresas estudadas o processo aconteceu em
virtude de um planejamento formal feito previamente, se foi natural e intuitivamente marcado
pela entrada dos filhos para trabalhar na empresa ou, ainda, em razão de algum acontecimento
inesperado, como morte ou doença do antecessor que forçou o sucessor a assumir seu lugar.
Em nenhum dos casos pesquisados encontrou-se uma sucessão feita de forma
formalmente planejada. Os processos que estão em andamento no momento desencadearam-
se em virtude dos acontecimentos naturais que envolveram o cotidiano da família e a entrada
dos filhos para trabalhar na organização. Todos estão na organização por vontade própria, por
consequência de uma educação em que os pais intuitivamente os inseriram bem cedo no
cenário da empresa familiar, sendo, assim, influenciados por ela, mas sem terem sido
105
preparados propositadamente para serem futuros sucessores. Com o passar do tempo, eles
estão crescendo em suas funções e assumindo posições de destaque na gestão.
Nos casos em que as empresas já passaram por processos de sucessão anteriores e que,
portanto, estão na terceira ou na quarta geração (Medicar, Adoçar e Transportar), os
sucessores assumiram por consequência da morte de seus antecessores ou em virtude da sua
idade já avançada.
Para melhor entendimento dos resultados da análise da primeira categoria investigada,
“a sucessão”, apresenta-se no Quadro 9 uma síntese:
Quadro 9 - Síntese da categoria: sucessão
Categoria Subcategorias Síntese
Sucessão
Planejamento Não houve planejamento formal do processo sucessório em
nenhuma empresa
Entrada dos filhos para
trabalhar na empresa
Está ocorrendo nos processos de sucessão atuais em todos
os casos
Motivos inesperados
(morte, doença ou outro)
Ocorreu nas empresas Medicar, Adoçar e Transportar na
passagem da prmeira para a segunda geração
Fonte: Elaborado pela autora, com dados da pesquisa.
5.1.2 O antecessor
Depois de saber os fatores que desencadearam o processo sucessório nas empresas
pesquisadas, pretendeu-se analisar como foram as sucessões passadas e como estão
acontecendo os processos no presente momento. O primeiro ponto neste subitem foi
investigar a atitude do antecessor frente ao processo, tendo em vista que a figura desse
personagem pode ter grande influência na sucessão, sendo uma variável crítica que chega a
determinar o sucesso ou insucesso da passagem (Le Breton-Miller et al., 2004; Scheffer,
1995). Segundo afirma Ward (1987), o antecessor é a figura mais importante no caminho para
o êxito da sucessão.
Seguindo tal perspectiva, Cadieux (2007) ressaltou alguns papéis assumidos pelo
antecessor no processo que podem contribuir para o seu bom desempenho e,
consequentemente, propiciar uma sucessão mais tranquila e com mais chances de dar certo.
Identificaram-se seis papéis principais sendo exercidos pelos antecessores nos casos
estudados. Na empresa Alimentar, o Pai A é um colaborador. Cadieux (2007) refere que é um
papel que surge ao longo do tempo depois que o sucessor já alcançou um nível mais elevado
106
de confiança e desenvolveu suas habilidades. O relacionamento na empresa entre pai e filho é
como o de dois sócios. O relato do Filho 1A conta que o pai o ouve, dá autonomia para ele
tomar decisões e compartilha praticamente todas as deliberações da empresa:
Ah, eu enxergo mais é [...] já foi mais de professor. Hoje em dia é como te falei
mesmo, de parceiro mesmo, de sócio, discute as ideias, tem coisa que eu não
concordo e ele concorda e pronto, tem coisa que ele não concorda e eu concordo e
pronto. E [...] é mais por esse lado mesmo (Filho 1A).
Nas empresas Educar e Medicar percebe-se que os antecessores desempenham o papel
de supervisor, em que eles são superiores imediatos que atribuem tarefas aos sucessores, dão
instruções, supervisionam o trabalho, cobram e corrigem quando necessário. Assim, os
sucessores são apresentados à empresa e preparados para assumir a gestão. Na Educar, além
de supervisor, é notável, especialmente na Mãe B, que ela também exerce os papéis de
professora e protetora, pois procura transmitir seus conhecimentos à Filha 1B, gastando tempo
para lhe ensinar, discutir ideias e passar um pouco da sua vasta experiência. Ao mesmo
tempo, ela permite que a filha tome suas próprias decisões, a fim de que aprenda a lidar com
as consequências dos seus atos e sinta como é ter responsabilidade em um cargo de gestão.
Essa realidade é percebida na fala da Filha 1B:
Isso na verdade ela sempre fez, a vida toda, passar o que ela sabe da experiência
dela. Isso aí ela faz até com todo mundo e com a gente que é família mais ainda.
Sempre foi assim, mas aí ela intensificou agora, né, de um tempo pra cá que ela está
com plano na cabeça de começar a sair. Inclusive em menos de dois anos pra cá ela
já acelerou muito mais. Já delega bastante coisa e, inclusive, de falar: “se vira que se
der errado aí depois a gente conversa” (risos) (Filha 1B).
Nos casos das empresas Adoçar e Transportar, como os processos estão em fase mais
avançada e os antecessores já finalizaram a passagem do bastão, hoje eles exercem o papel de
consultores. Isso porque eles ainda estão na empresa, são ouvidos pelos filhos, mas não estão
mais na direção, à frente do comando efetivo do negócio. Nesses casos, a gestão está sob o
domínio dos sucessores, que contam com seus pais como suporte, como conselheiros na
organização, assim como disse o Pai E da Transportar:
Eu acho que já aconteceu. Já passei pro Filho 1E. Eu considero ele hoje um
sucessor. É ele quem decide tudo. Os outros não têm poderes pra mexer. Ele é o
diretor-geral. Ele passa a ter poder até mais do que eu. Ele é um bom filho, ele sabe
me ouvir, então ele tem, como se diz, carta branca.
107
Um segundo aspecto investigado a respeito dos antecessores foi seu relacionamento
com os herdeiros que potencialmente ocuparão seus lugares na gestão. Como foi visto
anteriormente na revisão da literatura, a relação entre essas duas importantes figuras do
processo de sucessão pode ser decisiva em empresas familiares (Ward, 1987). De modo geral,
o relacionamento entre antecessores e herdeiros em todas as empresas estudadas é bom, ou
seja, predispõe transferência de conhecimento, respeito mútuo, apoio, reconhecimento,
confiança, aspectos esses que deixam a empresa menos vulnerável aos conflitos pessoais, que
podem ser prejudiciais ao andamento do negócio (Le Breton-Miller et al., 2004). A qualidade
do relacionamento entre sucessores e antecessores vem a ser decisiva para o sucesso do
processo sucessório, tendo em vista que a boa relação envolve comunicação, ensino e
aprendizagem, fatores essenciais ao crescimento e desenvolvimento dos novos gestores
(Lansberg, 1988).
Porém, cabe aqui ressaltar alguns pontos negativos presentes no relacionamento entre
antecessor e sucessor na empresa Alimentar. Na relação familiar existem desentendimentos
entre pai e filho, entre irmãos, marido e mulher, mas nada que crie um clima ruim entre eles,
principalmente dentro de casa. No ambiente de trabalho, o que se percebe é um conflito de
idéias, que pode estar relacionado às diferentes gerações que estão convivendo na empresa,
conforme se observou principalmente na fala da Mãe A:
Porque na minha imagem, na minha cabeça, eu ficaria só aqui, né, Belo Horizonte.
Esse meu filho mesmo, o terceiro, a ideia dele é montar franquia. Então aquilo ali,
pra ele que não está com a cabeça, né, fica achando que a gente é grande, que é
maravilhoso [...].
Os pais fundadores estão satisfeitos com sua empresa e não pretendem expandir o
negócio, preferindo manter uma gestão mais tradicional e conservando um serviço
personalizado com foco no cliente. Já os filhos têm ampla visão e mais ambição. Eles
percebem que o negócio poderia crescer e entre as mudanças necessárias para que isso ocorra
estão a redução e padronização do mix de produtos, o que possibilitaria, entre outros, a
abertura de franquias e o consequente aumento nos lucros. Mais à frente esse assunto será
abordado novamente, quando serão discutidas de forma mais específica as dificuldades
enfrentadas no processo sucessório.
A terceira subcategoria analisada sobre o antecessor foi a sua previsão de
desligamento da empresa. Lodi (1998) acredita que um requisito fundamental para se obter
êxito no processo sucessório é o antecessor ter atenção quanto ao momento da sua saída. Para
108
isso, é necessário que ele planeje a aposentadoria e seu futuro fora da rotina da gestão do
negócio familiar.
Entre as cinco empresas estudadas, em duas (Transportar e Educar) os antecessores
conseguiram ou estão fazendo a transição espontaneamente. Como visto na descrição do caso,
na Transportar o Pai E se preparou e também preparou seu filho para assumir a gestão. Ao
perceber que o Filho 1E já tinha condições de administrar tudo sozinho, o pai não só deixou
em seu comando as decisões do dia-a-dia, como também deu a ele procuração para assinar
como o responsável pela organização. Isso, porém, não aconteceu de uma hora para outra. O
Pai E se afastou aos poucos, foi dando autonomia e tinha consciência de que precisava
preparar seu sucessor e que em um dado momento ele poderia desacelerar seu ritmo de
trabalho para que o filho assumisse. O Filho 1E é o atual gestor e ainda não tem perspectiva
de quando irá sair da empresa. Ele ainda é jovem e seu sucessor começou a ser preparado há
pouco tempo.
A Educar está passando por seu primeiro processo de sucessão, mas, como os
fundadores têm mais idade e estão no mercado de trabalho há bastante tempo, eles expressam
claramente o desejo de deixar a liderança do negócio em curto ou médio prazo. Não só existe
o desejo de deixar nas mãos dos filhos para que a Mãe B e o marido tenham mais tempo livre
para fazer o que quiserem, mas atitudes já foram tomadas visando este objetivo. Nos últimos
anos a mãe diminuiu um pouco o ritmo de trabalho, delegou certas responsabilidades para a
Filha 1B e percebe que a empresa funciona normalmente nos momentos em que ela se
ausenta. Mesmo não acontecendo hoje, o importante é que os fundadores dessa empresa estão
no caminho de finalizar a transição brevemente.
No caso da Alimentar, o Pai A e especialmente a Mãe A se mostraram hesitantes em
relação à finalização do processo de sucessão. Eles ainda não se sentem totalmente seguros
para deixar a administração do seu negócio. Mesmo o Pai A, que afirmou já ter encontrado
seu sucessor no Filho 1A, não acha que o herdeiro está completamente preparado para
assumir a empresa sozinho. Dois motivos para isso seriam a idade dos antecessores - que
estão na faixa dos 50 anos e, portanto, em plena atividade - como também a questão do
conflito de ideias entre fundadores e herdeiros, que pode deixar os primeiros com receio de
que os filhos façam mudanças no negócio que sejam prejudiciais a longo prazo. Por isso, os
fundadores afirmam que o seu afastamento não ocorrerá em curto ou médio prazo.
Analisando os depoimentos do Pai A na descrição do caso, percebe-se que ele ainda
faz mais planos para a sua aposentadoria e parece se sentir um pouco mais confortável com a
sucessão do que a Mãe A. Segundo ele, no fundo já existe o pensamento de se aposentar e
109
passar o negócio para o nome dos filhos, com exceção dos imóveis onde estão as instalações
da empresa, que seriam sua fonte de renda por meio dos aluguéis, mas isso daqui a no mínimo
10 anos.
O Pai C na empresa Medicar e o Pai D na Adoçar demonstraram grande dificuldade
em planejar sua saída. No primeiro caso isso ainda não aconteceu, o Pai C continua como
principal gestor e tomador de decisões na empresa. No caso da Adoçar, o Pai D só efetivou a
finalização do processo de sucessão quando recebeu instruções de um consultor externo para
fazê-lo - e isso quando já estava em idade avançada. A despeito da quarta geração já estar
inserida na organização e de o Neto 2D estar se capacitando e se preparando para suceder seu
pai na parte de fabricação dos produtos, os Filho 1D e Filho 2D, que são os atuais gestores da
Adoçar, ainda não pensam sobre sua aposentadoria. Na realidade, antes da morte do irmão
mais novo (Filho 3D), o Filho 1D estava planejando diminuir sua carga de trabalho, mas não
efetivar a finalização do processo de sucessão. Segundo relataram os membros da família, os
gestores da terceira geração têm perspectiva de continuar por pelo menos mais 20 anos.
Assim, apresenta-se no Quadro 10 um resumo da análise dos dados relativos à segunda
categoria averiguada, “o antecessor”:
Quadro 10 - Síntese da categoria: o antecessor
Categoria Subcategorias Síntese
O antecessor
Seu papel no processo
Alimentar: colaborador
Educar: supervisor, professor e protetor.
Medicar: supervisor
Adoçar e Transportar: consultor
A relação com o sucessor
Boa relaçãos entre antecessor e sucessor em todas as cinco
empresas, com ressalva para a Alimentar, que vivencia um
conflito de gerações, e para a Medicar e Adoçar, onde os
antecessores são mais centralizadores e não permitem que os
filhos desenvolvam sua autonomia.
Previsão de desligamento
da empresa
Alimentar e Medicar: antecessores não têm perspectiva de
deixar o negócio.
Educar: os fundadores têm o desejo de se aposentar no futuro
próximo.
Adoçar: o Pai D na sucessão anterior teve dificuldades para
planejar sua saída e só o fez depois de receber orientação
externa. Os atuais gestores ainda não têm planos de deixar o
negócio.
Transportar: na sucessão anterior o Pai E planejou sua saída
da gestão e fez a transição espontaneamente. O gestor atual
(Filho 1E) ainda não tem perspectiva de se desligar da
empresa.
Fonte: Elaborado pela autora, com dados da pesquisa.
110
5.1.3 O sucessor
Continuando a investigação sobre como está ocorrendo a sucessão, além do antecessor
procurou-se analisar algumas subcategorias relativas à outra figura essencial no processo: o
sucessor.
Primeiramente buscou-se averiguar se existiam nas empresas critérios definidos para a
escolha do sucessor. É esperado, em um processo de sucessão bem encaminhado e com mais
probabilidades de sucesso, que existam critérios preestabelecidos para a escolha e preparação
de um herdeiro que assumirá a empresa futuramente. Entre os autores que discutem o assunto,
Lodi (1987) é um dos que argumentam sobre três critérios básicos para a entrada de um
sucessor na organização familiar: a) ter se formado em algum curso de formação profissional;
b) ter bom desempenho escolar; c) ter realizado um bom trabalho em outra empresa por no
mínimo dois anos. Além desses requisitos básicos, o autor estabelece como fundamental que
os herdeiros com possibilidades de assumir o lugar do gestor devem começar sua atuação na
empresa da família em atividades operacionais mais básicas e de baixo escalão a fim de
adquirir conhecimento em todas as áreas da organização e ir galgando novos cargos ao longo
do tempo.
Para Tillmann e Grzybovski (2005), além da competência técnica, as habilidades
pessoais dos herdeiros também são fatores importantes para a escolha de um sucessor.
Segundo eles, são necessárias habilidades de liderança, visão empresarial e caráter que
valoriza a tradição familiar, que está diretamente ligada ao sucesso do negócio.
Adicionalmente, para Souza (2001), seria necessário avaliar se o candidato tem perfil
empreendedor. Na prática, porém, em virtude da falta de planejamento formal do
desenvolvimento sucessório, a maioria das empresas pesquisadas não tem estabelecido
formalmente os critérios para a escolha do futuro sucessor. Porém, mesmo que de forma
intuitiva, observou-se que os pais tem se utilizado de alguns critérios para seleção daquele que
o sucederá na gestão como: afinidade existente entre pai e filho, idade, a primogenitura,
tempo de trabalho na organização, ou a formação no ramo foram os pontos considerados
relevantes pelos antecessores no momento de indicar o filho que o sucederia.
Tal fato demonstra uma forte característica das pequenas e médias empresas
familiares. Nas grandes empresas, a sucessão é vista como parte da estratégia organizacional e
da gestão estratégica de pessoas. Como nessas organizações os passos já são estruturados e
formalizados, os programas de sucessão são formatados como políticas de RH integradas a
outras ações, como gestão de carreira, plano de remuneração e gestão por competências, e
111
alinhados ainda à estratégia da organização. Desta forma, fica mais fácil estabelecer critérios e
fazer uma seleção mais apurada nas grandes empresas, que contam, muitas vezes, com
assessoria externa especializada no assunto. Nas pequenas e médias, entretanto, esses
programas e políticas de RH são incipientes ou até mesmo inexistentes. Muitas delas não têm
delimitada nem mesmo sua estratégia organizacional. Sendo assim, a estruturação de um
processo sucessório fica muito mais comprometida nesse tipo negócio, ficando a cargo da
intuição e da casualidade (Coelho, Queiroz & Moreira, 2004; Grzybovski et al., 2008).
Aqui cabe fazer uma ressalva sobre a empresa Transportar. Até o presente momento,
não existiam critérios formalmente estabelecidos para seleção dos sucessores. Vendo que a
família está crescendo, o Pai E, juntamente com seu filho (Filho 1E), estabeleceram regras
para a entrada de parentes na empresa, bem como pré-requisitos de qualificação necessária
para conseguir uma vaga. Esse assunto também será abordado novamente mais adiante
quando será avaliada a questão da profissionalização na empresa.
Procurou-se avaliar neste trabalho quais requisitos previstos na literatura os sucessores
apresentam e que os fizeram ser, entre seus irmãos, eleitos pelos pais. Para isso, analisou-se as
habilidades, o desempenho e a experiência que os sucessores demonstram para liderar a
empresa, sua formação e/ou preparação profissional, se a entrada no negócio se deu
precocemente e a experiência externa.
Os casos da Alimentar e Educar são parecidos neste aspecto. Em ambas aconteceu de
mais de um filho estar trabalhando na organização, com exceção do filho mais novo do Pai A
e da Mãe A, que ainda não manifestou interesse. Nas duas situações também os filhos mais
velhos são os potenciais sucessores à gestão da empresa familiar. No caso da Alimentar, o
Filho 1A não tem formação superior, nunca trabalhou em outro lugar e procura adquirir
conhecimento na prática do trabalho diário, além de participar de feiras do ramo alimentício.
Quanto ao Filho 1A, a formação educacional poderia agregar mais conhecimento, mas
também não o impede de ser um sucessor em potencial, visto que ele pode adquirir
experiência com seu pai e na prática.
Já a Filha 1B, que trabalha em instituição de ensino, julga ser essencial no seu ramo ter
formação na área pedagógica para poder assumir um cargo de direção. De acordo com suas
próprias palavras: “Pra começar, professor, se você não tiver passado na sala de aula, eles têm
tendência a te respeitar menos como chefe” (Filho 1B). Como visto no estudo de caso, ela é
formada em dois cursos superiores (Matemática e Administração de Empresas) e
recentemente finalizou a pós-graduação em Gestão de Instituições de Ensino. Pretende iniciar
o mestrado. Ela trabalhou por alguns anos em outras escolas e em um banco, adquirindo
112
experiência externa à empresa familiar. Assim, quando foi trabalhar na organização, a Filha
1B já tinha conhecimento prévio das funções escolares e também pôde aprimorar suas
competências executando diversas funções na escola, até chegar à vice-diretoria. Além da
experiência, ela demonstra habilidades, conforme percebe a Mãe B, que a qualificam a
assumir o negócio futuramente, como: perfil de liderança, bom relacionamento interpessoal,
compromisso, dedicação e interesse pelo trabalho na Educar, tal como ela mesma relata:
Pelo interesse que eu tenho também pela escola, o comprometimento, a dedicação,
pra minha mãe conta muito mesmo, porque apesar de todos serem a mesma coisa,
terem comprometimento e interesse, o nível varia de alguns pra outros, né? E aí ela
até fala pra ter menos [...], puxa minha orelha, fala: “Você tem dois filhos pequenos.
Seu horário de sair é quatro horas. Vai descansar”. Isso aí é brincando, porque não
tem jeito, né? (Filha 1B).
Nas empresas Medicar e Transportar, dos sucessores escolhidos tanto nos processos de
sucessão anteriores quanto nos que estão ocorrendo no momento, apenas um filho parece se
destacar como principal sucessor. Na Medicar, entre os 12 filhos da segunda geração e entre
os cinco filhos da terceira, um em cada uma delas demonstrou total interesse pelo ramo do
negócio e se formou em Farmácia com o objetivo de assumir um cargo na empresa da família.
O Filho 1E, que assumiu a Transportar, não chegou a fazer curso superior, mas foi um
aprendiz empenhado, assumiu o trabalho na empresa com dedicação, liderança e dominou
rapidamente a gestão, conforme reporta o Pai E. Um ponto forte em sua preparação foi a
estratégia utilizada pelo pai de colocá-lo em vários setores da empresa a fim de que ele
aprendesse bastante sobre cada um para que, quando chegasse na administração geral, ele
tivesse amplo conhecimento do seu negócio.
A Adoçar teve três herdeiros que assumiram a sucessão da empresa, cada um em um
setor diferente. Um deles, o filho mais velho, não tem formação superior, mas também foi
aprendiz que seguiu o pai desde muito jovem e aprendeu com ele o ofício de fabricante de
doces. Seus irmãos mais novos formaram-se em Administração e em Engenharia Civil e
puderam usar seus conhecimentos específicos nos cargos que ocuparam na empresa.
Agregado a isso, todos eles procuram se especializar no ramo de doces, fazendo cursos
diversos que os auxiliam na melhora do produto, diversificação do mesmo e nos quais eles
buscam conhecer novas tecnologias para incrementar a produção.
A sucessão dos gestores de uma organização que pertence a uma família não é
delimitada por um momento específico ou por um fato. É um processo contínuo que começa a
se desenrolar muito antes de sua concretização caracterizada pela transferência efetiva do
113
poder para uma nova geração e a retirada total da geração anterior. Esse processo pode
iniciar-se quando os filhos ainda são pequenos, sendo demonstrado pela forma como os pais
proprietários os educam e de maneira muitas vezes não consciente os preparam para o
exercício profissional (Grzybovski et al. 2008; Lodi, 1987, 1998; Rossato Neto & Cavedon,
2004; Tillmann & Grzybovski, 2005). Em quase todos os casos, com exceção da Educar, que
à época da fundação da escola os sucessores já eram mais velhos, a sucessão realmente
iniciou ainda cedo. Autores como Lodi (1987) e Tillmann e Grzybovski (2005) argumentam
que o planejamento é algo muito importante, especialmente enquanto os herdeiros da primeira
geração ainda são jovens, pois, desta forma, eles podem se envolver e se comprometer ainda
cedo com a empresa e definir melhor seus objetivos e carreiras profissionais, tendo assim
mais chance de adminitrá-la bem. A sucessão pensada e planejada antecipadamente pode
trazer grandes benefícios para o negócio, além de ampliar as chances de sucesso das empresas
familiares.
Assim, percebeu-se em todas as empresas que esse foi um aspecto positivo nos
processos sucessórios. Os futuros herdeiros foram inseridos no contexto da empresa familiar
desde a tenra idade e acabaram sendo preparados para um dia assumirem o lugar dos pais.
Mesmo que isso não tenha acontecido propositadamente, fez parte da educação dada a eles
desde a infância. Eles começaram ajudando os pais em momentos de necessidade, realizando
tarefas compatíveis com a idade e com o nível de capacidade de cada um. Cada filho passou
por vários setores da empresa, iniciando nas atividades mais operacionais. Eles exerceram
diferentes funções, cumprindo desde afazeres simples da rotina da empresa até chegarem hoje
ao nível mais alto na gestão.
Esses ensinamentos também faziam parte de uma vontade natural dos pais de terem
seus herdeiros junto a eles para darem continuidade ao trabalho que começaram, mas não que
isso tenha imprimido caráter mais formal e planejado. A história da empresa e da sucessão
familiar foi sendo delineada a partir da realidade vivenciada e da própria história da família.
Uns queriam ajuda na fabricação dos doces, outros precisavam levar os filhos para o trabalho,
pois não tinham com quem deixá-los, outros ainda somente para dar uma ocupação e ensinar
os filhos a terem responsabilidade. O importante é que a entrada precoce dos herdeiros nas
empresas da família fez com que eles crescessem naquele ambiente, sendo inconscientemente
influenciados por ele até chegarem ao ponto de não mais desejarem sair de lá. Isso ficou
evidente em todos os atuais sucessores e também nos candidatos em potencial a futuros
sucessores das empresas estudadas.
114
Até mesmo na Educar, onde os filhos não eram tão jovens, isso foi observado. O fato
de terem acompanhado todos os passos de fundação e crescimento da escola foi suficiente
para despertar neles o interesse e a paixão pelo negócio familiar.
Em relação ao sucessor, viu-se também que autores como Handler (1992), Scheffer
(1995), Sharma et al. (2001) e Le Breton-Miller et al. (2004) opinam sobre a importância de
os herdeiros estarem comprometidos e totalmente envolvidos com o processo por disposição e
vontade própria. Segundo esses autores, uma sucessão exitosa está também relacionada à
motivação do sucessor para assumir a empresa, tendo seus objetivos pessoais ligados ao
futuro na organização. Em todas as empresas pesquisadas essa motivação é visível,
principalmente nos herdeiros que são os principais candidatos à sucessão. Eles não
demonstram qualquer vontade de trabalhar em outro lugar que não seja a empresa da família e
se dizem felizes nas funções que exercem. Isso pode ser claramente observado na fala de um
herdeiro:
É, igual você perguntou aquela hora: “Você pensou em trabalhar em outro lugar?”.
Nunca! Por que nunca? Porque eu me sinto feliz. Porque, é [...] é o que eu formei, é
o que estudo, o que eu pratico. Apaixonei pela área de educação também, tanto que
minha pós eu fiz em projetos educacionais na área de educação. Nem vejo hoje, né,
não percebo alguém que queira sair. Acho que todo mundo é bem realizado aqui,
não só pelo fato de ser filho não, mas porque cada um está trabalhando em sua área
(Filho 4B).
Em relação ao relacionamento entre os herdeiros e entre estes e os funcionários, não se
observou, nos processos de sucessão atuais, problemas de relacionamento. Os filhos
demonstram se dar bem entre si e os funcionários parecem aceitar bem a presença dos
sucessores nas empresas, de acordo com a percepção de pais e filhos.
O resumo da categoria “o sucessor” é apresentado no Quadro 11:
Quadro 11 - Síntese da categoria: o sucessor
(continua)
Categoria Subcategorias Síntese
O sucessor
Critérios para a escolha do
sucessor
Não foram encontrados critérios predefinidos formalmente
para a escolha dos sucessores nas empresas, porém,
intuitivamente os antecessores se utilizaram sim de critérios
como idade, tempo de casa, afinidade, entre outros.
Formação/ preparação
profissional
Alimentar: sucessor não tem formação superior. Participa de
feiras e se prepara com a vivência prática no negócio.
Educar: sucessores possuem dois cursos superiores e pós-
graduação.
Medicar: formados em Farmácia e buscam cursos na área
administrativa.
115
(conclusão)
Categoria Subcategorias Síntese
O sucessor
Adoçar: um sucessor não é formado e os outros dois fizeram
Administração e Engenharia. Todos participam de cursos
gastronômicos em São Paulo.
Transportar: sucessor não tem formação superior. Prepara-se
com a vivência prática no negócio.
Habilidades, desempenho e
experiência para liderar a
empresa.
Todos demonstram grande interesse pelo negócio familiar,
são dedicados, com perfil de liderança, empreendedorismo,
bom relacionamento interpessoal e competência para
assumir.
Entrada no negócio
precocemente
Em todos os casos os herdeiros começaram ainda jovens a
trabalhar na empresa da família. Na Educar, eles já eram
mais velhos, mas acompanharam o desenvolvimento da
escola desde a sua fundação.
O sucessor
Experiência externa
Alimentar e Medicar: o sucessor não teve alguma expêriencia
externa.
Educar: trabalhou em outras escolas e em um banco antes de
ir para a empresa familiar.
Adoçar: dois sucessores não tiveram alguma experiência
externa e um trabalhou em seu negócio próprio antes de ir
para a empresa da família.
Transportar: trabalhou por três anos em uma concessionária.
Motivação do sucessor
para assumir a empresa
Todos estão na empresa por vontade e decisão própria. Eles
são tão motivados e não pensam em trabalhar em outro
lugar.
Relacionamento com os
outros herdeiros Não observou-se conflitos entre os herdeiros.
Relacionamento com os
funcionários
Bom relacionamento com os funcionários. Eles aceitam bem
a posição de liderança que os sucessores ocupam.
Fonte: Elaborado pela autora, com dados da pesquisa.
5.1.4 A família
O terceiro aspecto avaliado sobre o processo de sucessão nas empresas pesquisadas diz
respeito à família. Diante disso, buscou-se averiguar o envolvimento da família nos negócios,
como ficará a situação dos herdeiros que não vão assumir a gestão e se já existe algum
planejamento a respeito da situação da propriedade da empresa.
Observou-se que em todos os casos parece existir separação da esfera familiar da
esfera empresarial. Os antecessores demonstram a preocupação em definir cargos e salários
correspondentes à função que cada um exerce e não parece haver mistura das despesas dos
membros da família com as despesas operacionais da empresa. Como já relatado
anteriormente, os familiares que trabalham nessas organizações familiares estão lá por mérito
116
e são tratados como profissionais. Porém, alguns aspectos relacionados ao envolvimento da
família podem ser ressaltados nos casos da Educar, da Adoçar e da Transportar.
Uma característica verificada especialmente na empresa Educar e que tem relação
positiva com o bom relacionamento entre os familiares é a preocupação em separar família de
empresa. Na empresa, por exemplo, os filhos não tratam os pais por pai e mãe, mas sim pelos
nomes de cada um. Os membros da família que trabalham na empresa são tratados como
profissionais, como funcionários contratados, e isso é bom para que eles saibam conter os
impulsos dos laços familiares e separar o que é pessoal do profissional.
Na instituição de ensino, além da presença dos cinco filhos, viu-se que também
trabalham na organização mais oito pessoas da família indireta (dois genros, duas noras, uma
irmã do Pai B juntamente com o marido e a filha e uma cunhada, que é esposa do irmão da
Mãe B). O interessante, neste caso, é perceber que, apesar de ter tantas pessoas da família
empregadas na empresa, elas são contratadas pela formação e pela competência que
apresentam para ocuparem um cargo, não simplesmente pelo fato de terem ligação de
parentesco com os donos do negócio. Somado a isso, não há influência direta dos parentes
sobre a gestão da escola. Utilizando a estratégia de montar o grupo G7, os fundadores
deixaram bem-delimitada a fronteira entre donos e membros da família funcionários da
empresa, de forma que as decisões ficam a cargo somente dos atuais sócios (Pai B e Mãe B) e
dos cinco filhos que serão os futuros herdeiros. No final, a ultima palavra é sempre dos pais,
que ainda comandam a organização.
No caso da Adoçar, a transição entre a segunda e a terceira gerações foi marcada pela
tendência do Pai D a querer sustentar toda a família, inclusive os netos que não tinham ligação
direta. Até a interferência de uma consultoria externa, havia divergência de ideias que
prejudicava a administração da empresa, pois o pai queria continuar agindo da mesma forma e
ajudando todos os filhos e netos, utilizando arbitrariamente as finanças da empresa. Os filhos,
por outro lado, percebiam que a família já havia crescido muito e que essa não era a forma
adequada de gerir os recursos financeiros, pois chegaria um momento em que a empresa não
teria condições de sustentar todos, inclusive aqueles que não tinham alguma relação de
trabalho ou compromisso com ela. Esse impasse foi resolvido e o Pai D acabou acatando a
decisão dos filhos e do consultor.
A Transportar é muito antiga e já chegou à quarta geração. Como a família é muito
grande, os gestores tiveram a ideia de definir algumas regras que delimitassem a entrada de
seus membros para trabalharem na empresa, visto que o negócio familiar não teria condições
de absorver todos. Foi acordado que somente um filho de cada família poderia ser contratado,
117
desde que fosse qualificado, com formação superior, conhecimento em informática e em
inglês. O atual gestor, Filho 1E, informou que esse acordo foi feito verbalmente. Porém seria
importante ter um registro deste combinado para as futuras gerações.
Quando se trata do relacionamento entre os herdeiros, não foi possível identificar
ainda conflitos por causa da sucessão. No momento em que se encontram os processos
sucessórios nas empresas investigadas, os filhos ainda estão novos e não existe disputa
acirrada pelo poder. Todos têm clara a ideia de quem vai ser o futuro sucessor em cada uma
delas. Por enquanto, parece que os potenciais sucessores vão assumir naturalmente o lugar dos
pais, enquanto os outros herdeiros que trabalham na empresa vão continuar exercendo seus
cargos. Aqueles que já estão fora da empresa, trabalhando em profissões independentes do
negócio familiar, assim também deverão permanecer, ao que tudo indica.
Porém, a herança em muitas empresas familiares pode se tornar o motivo de queda da
organização ou de briga entre irmãos (Donnelley, 1964). No caso da Alimentar, por exemplo,
os quatro filhos são herdeiros naturais e se os pais não resolverem essa questão em vida, cada
um vai receber a parte que lhe cabe. Mesmo que o Filho 4A não venha a manifestar realmente
interesse pelo negócio futuramente, cabe lembrar que, sendo sócio, ele teria direito à divisão
dos lucros. Ou, não querendo ter seu nome vinculado à empresa, ele pode resolver vender sua
parte para uma terceira pessoa fora da família, trazendo para dentro um sócio estranho.
Quando não se faz o planejamento desses aspectos, a empresa pode incorrer em muitos
riscos (BERNHOEFT; GALLO, 2003). Esses autores sugerem que os antecessores se
antecipem a esses riscos e, mesmo que não façam a distribuição do patrimônio em vida, que
deixem resguardado em testamento ou que deixem escrito um acordo societário definindo
como deve ser a venda, quem tem prioridade de compra, valor estipulado para pagamento, o
que acontece no caso de morte de um sócio e da entrada dos herdeiros na sociedade, entre
outras questões, para que no futuro a empresa não corra o risco de cair em mãos erradas e
indesejadas ou que venha a fechar por falta de entendimento entre os sócios.
Entre os casos estudados, algumas empresas - como a Educar, Medicar e a Transportar
- já estão preocupadas com a divisão da herança, nas mãos de quem ficará a propriedade no
futuro e estão buscando orientação para já deixar essas decisões encaminhadas.
Já as empresas Alimentar e Adoçar não manifestaram preocupação quanto ao futuro
dos filhos e da empresa no tocante à divisão do patrimônio. A Mãe A chegou a falar que: “Só
depois que eu morrer eles vão pensar em herança (risos)” (Mãe A).
Um resumo da categoria “a família” é apresentado no Quadro 12:
118
Quadro 12 - Síntese da categoria: a família
Categoria Subcategorias Síntese
A família
Envolvimento da família nos
negócios
Todas as empresas demonstraram conseguir delimitar a
esfera familiar e a esfera empresarial, não misturando as
duas.
Situação dos outros herdeiros
que não assumirão a sucessão
Aqueles que trabalham nas empresas por enquanto
parecem estar satisfeitos e aceitando bem o sucessor
escolhido. Esses continuarão trabalhando normalmente. Os
que já exercem suas atividades externamente ao negócio
familiar também continuarão da mesma forma.
Propriedade da empresa
Apenas os antecessores das empresas Educar, Medicar e
Transportar buscam orientação para em vida deixar
resolvida a questão da herança.
Fonte: Elaborado pela autora, com dados da pesquisa.
5.1.5 Dificuldades
Depois de analisar o que desencadeou e como está acontecendo o processo de
sucessão nas empresas pesquisadas, no próximo objetivo específico deste trabalho procurou-
se identificar as dificuldades presentes nessa etapa.
Um primeiro aspecto a ser avaliado é a falta de planejamento formal, que pode estar
diretamente relacionada à dificuldade do antecessor em deixar o negócio. A ideia de que um
processo de sucessão precisa ser cuidadosamente planejado e que um bom planejamento tem
efeitos positivos sobre os resultados do mesmo é defendida em diversos trabalhos (Estol &
Ferreira, 2006; Handler, 1990; Lansberg, 1988; Le Breton-Miller et al., 2004; Lodi, 1987;
Morris et al., 1997; Sharma et al., 2001; Tillmann & Grzybovski, 2005; Ward, 1987).
Ainda, autores como Bjuggren & Sund (2005) e Lambrecht (2005) chegam a afirmar
que, mesmo existindo outros fatores que interferem de maneira direta na sucessão, o
planejamento facilita de tal forma a passagem que aumenta as possibilidades de sucesso e de
sobrevivência das empresas familiares no longo prazo. A falta dele pode ser a principal causa
de um fracasso.
Leone (2005) enfatiza que, quando a sucessão ocorre por consequência de um
planejamento, a transição de uma geração para outra acontece de forma mais suave, com
menos custos, podendo propiciar mais eficiência e competitividade para a empresa. Para o
autor, os processos que acontecem abruptamente tornam-se desgastantes para as pessoas, que
são afetadas psíquica e emocionalmente, e também para o negócio, que sofre impactos
financeiros.
119
A falta de uma estratégia de planejamento da transição das gerações acarretou certos
problemas para a empresa Transportar e para os seus sucessores na passagem da primeira para
a segunda geração, que poderiam não existir se eles estivessem mais preparados para assumir.
Conforme ressaltou Leone (2005), como o processo aconteceu abruptamente, em virtude da
morte do fundador, os filhos foram afetados em sua relação familiar, que ficou desgastada por
causa da empresa. Esta, por sua vez, sofreu impactos financeiros, visto que teve que arcar com
os prejuízos da dissolução ajuizada por alguns irmãos e também perder parte do seu
patrimônio em razão da ação que foi promovida a partir da demanda de outros irmãos. Da
mesma forma, no primeiro processo de sucessão da Adoçar, o fundador faleceu e houve uma
ação judicial que demorou 17 anos para ser resolvida.
São raros os casos em que os herdeiros não reivindicam sua parte na sociedade em
casos de morte do pai ou da mãe (Bernhoeft & Gallo, 2003). A Medicar parece ser, portanto,
uma exceção a essa regra. Por isso, um planejamento em relação à propriedade da empresa,
preparação de um sucessor que esteja motivado e o projeto de aposentadoria do antecessor são
essenciais para uma sucessão com mais perspectivas de sucesso. Isso significa fazer os
preparativos necessários, visando à harmonia da família e à continuidade da empresa no
futuro (Le Breton-Miller et al., 2004).
Algo relacionado à falta de planejamento, à dificuldade dos antecessores em deixar o
negócio, também se configura na literatura como um entrave importante ao processo de
sucessão, chegando a ser citado como o maior obstáculo a uma sucessão exitosa (Sharma et
al., 2001). Apurou-se que os antecessores da Alimentar, Adoçar e Medicar não estão
preparados para transferirem efetivamente a gestão do negócio para os filhos nem pretendem
sair da empresa em médio prazo. No entanto, é necessário considerar um dado que justifica o
fato de os fundadores das duas primeiras empresas citadas ainda não quererem deixar o
comando: a idade. Todos estão na faixa dos 50 anos. Eles podem ser considerados ainda
jovens para se aposentar e estão ativamente atuando no negócio. Somado a isso, também é
pertinente considerar a idade dos futuros sucessores que estão em fase de aprendizado, não
tendo atingido, conforme o próprio Pai A argumenta, adequado nível de preparação e
maturidade para assumir o lugar do gestor:
A própria idade da gente impede isso, né? Se a gente parar de trabalhar agora, com
50 anos, 52, eu acho que é sofrimento, né? Isso aí impede. Uma das coisas. E a outra
é que eles ainda estão muito novos, né? Não estão preparados, eu acho. Eles vão dar
conta a partir da hora que amadurecerem. Eu acho que eu amadureci muito na minha
vida com 30 anos de idade. Então eu acho que com eles vai ser [...] de repente vão
copiar o pai (Pai A).
120
Já na Medicar, o antecessor está com a idade mais avançada e não consegue diminuir a
rotina de trabalho. Ele não tem perspectiva de parar ou deixar a gestão sob responsabilidade
da sua sucessora e, portanto, não conseguiu finalizar o processo de sucessão. Em suas falas
ele manifestou medo de se sentir ocioso e de ter que lidar com uma rotina que o obrigue a
ficar parado, o que ele não suportaria. O antecessor é uma figura forte na organização.
Segundo Ward (1987), Lansberg (1988) e Handler (1990), os antecessores precisam ficar
atentos e não devem se deixar imergir em um estágio de negação do processo sucessório. É
fundamental que um gestor que está há muito tempo no comando da sua empresa consiga
encarar a sucessão mais abertamente e esteja disposto a contribuir para que ela aconteça de
forma tranquila e natural. Poucos executivos dão atenção ao planejamento da sua saída,
podendo isso ser fonte de diversos problemas que poderiam ser resolvidos antecipadamente
(Handler, 1990; Lansberg, 1988).
Na sucessão atual da empresa Medicar e na passagem da segunda para a terceira
geração que está no comando na Adoçar, percebe-se que a característica centralizadora dos
antecessores prejudicou, em parte, o desenvolvimento dos sucessores e do processo de
sucessão. Na Adoçar o Pai D estava tão acostumado a ser o único tomador de decisões que só
conseguiu abrir mão da gestão e perceber que os filhos estavam capacitados para assumir
quando ouviu isso de um consultor externo, que o aconselhou. Na Medicar, mesmo com 87
anos de idade, o Pai C ainda é o principal tomador de decisão e a Filha 5C, que é a sucessora,
não tem total autonomia para implantar mudanças que julga necessárias. Handler (1990)
afirma que é importante que o antecessor se afaste um pouco e permita que o sucessor tome
suas próprias decisões e seja responsável por seus acertos e erros, visto que isso é vital para o
desenvolvimento do sucessor como líder. Postura de desconfiança, de controle ou de
agressividade por parte do antecessor pode ser muito prejudicial para o processo.
Uma situação comum a todos os casos é o fato de que os antecessores pretendem
continuar em suas empresas como consultores ou conselheiros, sem terem obrigação com
horário ou rotina de trabalho, sem ter a voz de comando final, mas nunca se ausentar
totalmente do negócio da família.
Tirando os conflitos advindos da divisão do patrimônio da empresa entre os herdeiros
e a dificuldade dos antecessores em deixar o negócio em alguns dos casos, não foram
encontrados outros problemas entre aqueles registrados na literatura relacionados à falta de
planejamento, como: falta de um sucessor que quisesse assumir a empresa ou que tivesse sido
obrigado a fazê-lo contra a sua vontade; sucessor sem experiência e sem preparo para
121
assumir; disputa de poder entre os filhos; problemas com funcionários; ou outro que pudesse
prejudicar o andamento do negócio.
Na literatura pesquisada viu-se que um sucessor exitoso precisa investir tempo para se
preparar e buscar se desenvolver constantemente como profissional (Chrisman et al., 1998;
Lodi, 1987). Sua preparação envolve a formação educacional por meio de cursos superiores,
de especialização e experiência externa de trabalho em outras organizações (Lambrecht, 2005;
Lodi, 1987). Em algumas empresas pesquisadas, como na Alimentar, Adoçar e Transportar,
essa formação educacional não faz parte da realidade de vida de alguns sucessores. Também
nem todos tiveram experiência fora da empresa. Quase todo o conhecimento e preparação
vêm da prática no dia-a-dia do negócio e do convívio com os antecessores que transmitem
seus conhecimentos e seu know-how para os filhos. Sabe-se que a preparação profissional
pode ser um diferencial e um indício de uma transição suave e com boas perspectivas de
sucesso, como afirmam Morris et al. (1997), mas também não é a garantia. Existem casos,
como os das referidas empresas, em que a falta de formação acadêmica parece não ser, ao
menos segundo a percepção dos entrevistados, um empecilho. Eles entendem que somente a
prática já esteja sendo suficiente.
Uma situação identificada no processo sucessório da empresa Alimentar e na Adoçar
que pode vir a ser uma dificuldade no futuro está relacionada à falta de um sucessor que possa
assumir as atividades da Mãe A, na primeira, e da parte administrativa, na segunda. Falando
sobre a preparação de sucessores, o Pai A comentou sobre a Mãe A que: “Ela não achou
sucessora não, eu já achei. Eu acho que eu sou mais de sorte, eu já achei sucessor” (Pai A).
O negócio principal da Alimentar é a produção de alimentos. Todos os filhos estão se
preparando para assumir um posto de gestão, seja na área financeira, de compras, de
marketing, mas nenhuma outra pessoa, como o próprio Pai A afirmou, detém a qualidade e o
know-how da fabricação e da qualidade dos produtos, a não ser a Mãe A. Em sua fala o Filho
1A declarou:
Não, eu tenho menos [...] a gente tem assim, uma experiência mesmo, mas eu não
tenho o paladar dela. Porque se eu preciso, por exemplo, eu falo mãe, vai lá,
experimenta uma coxinha de catupiry nova, ela vem. E aí ela vai provar e isso aí eu
não tenho não. Isso aí nós não temos não. Falar assim, o paladar, o [...] esse know-
how dela a gente não tem não. Ninguém na empresa tem. O fino do paladar, que ela
aprendeu na vida inteira, ninguém tem não. São poucos.
O Filho 2A chegou a fazer um curso de gastronomia no Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial (SENAC), mas, segundo ele, não é seu objetivo trabalhar na
produção. Ele acha importante ter o curso para saber dialogar com os nutricionistas e
122
engenheiros de alimentos que trabalham com ele, mas isso não quer dizer que ele esteja
buscando experiência e know-how para futuramente assumir a posição da mãe.
Mas, e se ela por algum motivo inesperado vier a faltar um dia? O problema é que na
falta da Mãe A não há, até o momento presente, pessoa da família com o preparo e a
capacidade necessária para dar continuidade ao trabalho que ela faz, e isso pode vir a ser um
risco futuro para o bom andamento do negócio:
Não, porque não é querendo encher a bola dela não, mas a qualidade só ela detém.
Ela tem o paladar. Ela tem um bom paladar. Se ela se desligar total a qualidade some
com o tempo (Pai A).
Não, tem dia que eu chego aqui e [...] até deu uma caída, eu achei. Dei uma sumida.
Agora eu quero voltar mesmo entendeu? (Mãe A).
Nessas falas fica evidente que, no contexto atual, se a Mãe A se afasta, os produtos
perdem qualidade. Tal situação demonstra, na atualidade, sinais de problemas que podem
surgir com a ausência da antecessora na direção da fábrica e com a falta de outra pessoa para
substituí-la. A mãe comentou sobre uma funcionária que foi treinada durante um longo tempo
por ela e, quando estava “pronta”, adequada às necessidades da empresa em termos técnicos,
o Pai A e o Filho 1A julgaram necessário demiti-la7. Na época do acontecido a Mãe A estava
ausente da empresa. Segundo ela, tal demissão poderia ter sido evitada caso houvesse uma
gerência atuando diretamente na fábrica em sua ausência. Mesmo sendo necessário do ponto
de vista dos gestores, a Mãe A, que lida diretamente com a parte de produção, sabia da
dificuldade e do tempo gasto com a funcionária em treinamento e, portanto, outras medidas
poderiam ter sido tomadas que não a demissão e a consequente perda de uma boa funcionária,
segundo a sua perspectiva.
Percebe-se que a Mãe A não tem ainda um sucessor que possa assumir tanto a função
técnica quanto a gerencial que ela executa na Alimentar. A falta de um gestor que possa atuar
nesses dois sentidos pode significar a perda de qualidade, de bons funcionários e,
consequentemente, de clientes e mercado. Por isso, é importante ter outra pessoa que possa
acompanhá-la e aprender com ela, para que na sua ausência a Alimentar continue oferecendo
a qualidade até então oferecida e conhecida por seus consumidores.
Esse também é um problema enfrentado na Adoçar. Com a morte do irmão mais novo,
há dois anos, os irmãos estão tendo dificuldade para reestruturar a administração da empresa,
visto que o Filho 3D era responsável por setores específicos da gestão e na organização não
7 Os motivos alegados para a demissão da funcionária foram as faltas recorrentes injustificadas na ausência da
Mãe A.
123
havia outra pessoa preparada para assumir suas atividades. Por isso, o Filho 1D teve que adiar
os planos de reduzir sua rotina de trabalho e tanto ele quanto o Filho 2D tiveram que assumir
e aprender novas atividades para ocupar o lugar do irmão. Nessa empresa também já há um
sucessor da quarta geração sendo preparado para assumir as funções relativas à fabricação dos
produtos, ou seja, sucessor do Filho 1D. Mas nenhum outro está sendo preparado para
assumir a gestão e, conforme as palavras do próprio antecessor, para uma só pessoa cuidar de
todos os setores pode ficar sobrecarregado.
Uma dificuldade também detectada no processo de sucessão da Alimentar é o conflito
de ideias entre os membros da família a respeito da forma de gestão e dos objetivos da
organização. De um lado, estão os pais, fundadores, que já estão satisfeitos com o
desempenho da empresa e com o tamanho que alcançaram. Para eles, o importante é continuar
atendendo às particularidades dos clientes, fabricar produtos customizados, ter mais variedade
para oferecer e poder ser flexível para mudar sempre que um cliente solicitar. Isso fica
bastante evidente na fala da Mãe A:
Eu não quero ter milhões, não era a minha ideia ter milhões de Alimentar para ter
poucas coisas. Não é um Mc Donalds, entendeu? Então eu concordo que tem que ir
na ideia deles também. Mas não é tirar algumas coisas porque, é [...] eu tenho que
vender só para aquele grupo de 500 pessoas no mínimo. Não. Eu tenho meu
grupinho de 20 que gosta, que ama a Alimentar, que gosta de vir aqui e que sabe que
eu vou fazer o produto dele do jeito que ele quer.
Do outro lado estão os filhos, que gostariam de diversificar o negócio, que estão
preocupados com a margem de lucro, mesmo que isso custe o sistema de atendimento mais
personalizado. Por eles a Alimentar deveria fabricar menos produtos e ficar somente com
aqueles que têm mais saída. Isso possibilitaria a abertura de um sistema de franquias que
poderia ampliar muito o negócio. Tal situação é perceptível na fala do Filho 3A:
Não, eles [os pais] estão satisfeitos com o que têm, né? Eu já tenho um sangue
empreendedor, eu gosto de arriscar, eu gosto de empreender, então isso aí tá no meu
sangue, eu acho que eu nasci com isso, num sei, às vezes [...] eu tenho mais
ambição”.
A Mãe A, por sua vez, deixa claro que não concorda com essa visão: “Então é aí que
muda que a cabeça minha é muito antiga, que é daquele tempo antigo, há 22 anos, e a deles já
é moderna, né? Quer franquia, diminuir produto, ter aquele tanto né? Claro, é mais fácil de
padronizar tudo sim” [...].
124
Segundo Tillmann e Grzybovski (2005) na fase da sucessão que envolve o trabalho
conjunto das diferentes gerações, a diversidade de pessoas relacionadas à idade, gênero e
ideais se configura em uma complexidade de relações que devem ser administradas, onde os
interesses muitas vezes entram em colisão. O sucessor geralmente possui formação acadêmica
e profissional diferente do fundador, resultando assim em visões contrárias a respeito da
trajetória da empresa e acentuando conflitos internos, assim como acontece na Alimentar.
Para os fundadores, e principalmente para a Mãe A, este é o ponto mais crítico quando
eles pensam na sucessão da empresa. O conflito de ideias gera insegurança nos pais em
transferir a gestão da empresa para os filhos. O medo é que estes efetuem mudanças drásticas
na administração, alterando todo o sistema que segundo os fundadores funciona muito bem
até hoje. Na visão deles, isso pode não ser bom para o futuro da Alimentar. A Mãe A acredita
que o seu modo de gestão e a forma como ela e o Pai A têm conduzido o negócio até hoje é a
fórmula para o sucesso alcançado: “Mas se eu não tivesse feito isso, a Alimentar não teria
chegado onde está, porque foi com a variedade de produtos que eu trouxe um número de
clientes maiores, né, com vários gostos” (Mãe A).
Donnelley (1964) afirma que os conflitos de interesses podem ser uma fraqueza das
empresas familiares. Muitas organizações acabam ignorando a real necessidade da empresa
para resolver problemas que nascem dentro da família, como no caso do conflito de gerações
na Alimentar. O autor ainda fala sobre o problema dos interesses minoritários dos membros.
Geralmente todos acham que têm o mesmo direito de mandar e de influir nas decisões e
políticas corporativas, porém uma pequena empresa não consegue absorver tantas visões
divergentes. É preciso existir uma unidade de pensamento.
Na empresa Alimentar pode-se ver claramente a presença de questões relatadas por
Donnelley (1964), como objetivos e interesses totalmente diferentes entre os membros. E
nessa situação prevalece a voz dos mais fortes, os pais. Esse é um dos motivos que levam o
Filho 3A a ter dúvidas quanto a realmente continuar ajudando na empresa da família como um
funcionário e subordinando-se às decisões dos seus pais:
Tem alguns objetivos diferentes, né, então como é muita gente tomando decisões
[...] aí a gente não tem como todo mundo ditar seu rumo, né, então a gente tem que
ceder. Eu vejo que eu poderia fazer de uma outra forma, fazer uma coisa diferente e,
talvez eu tenha um pouco mais de ambição também que os outros, isso me incomoda
um pouco.
Como não consegue colocar algumas de suas ideias em prática na Alimentar, o Filho
3A fala muito em sair da empresa. Na entrevista ele foi questionado sobre seu pensamento a
125
respeito de permanecer ou não, se ele gostaria de sair para trabalhar em outro lugar ou até
montar o próprio negócio, um negócio maior. Ele reconhece que existe o desejo de ter algo só
dele, onde seja possível colocar em prática tudo que aprendeu na empresa da família, mas
onde ele tenha mais autonomia para decidir sobre a gestão e a estratégia do negócio. Porém,
ao mesmo tempo, não há a pretensão de deixar totalmente a Alimentar. Caso monte um
negócio próprio, ele gostaria de ficar trabalhando nos dois lugares:
Eu estou me preparando pra isso eu tô [...] a minha vontade na verdade é essa. Estou
aqui aprendendo, pegando know-how, pegando também maturidade, mas uma hora
eu quero seguir meu caminho próprio, eu quero [...] um negócio próprio de
alimentação também, mas diferente um pouco [...]. Não que eu deixasse de trabalhar
aqui também não, poderia trabalhar nos dois, mas eu queria ter algo paralelo aí,
alguma coisa minha. Vou batalhar pra isso né.
No início desta pesquisa ele ainda estava trabalhando na Alimentar, mas sempre
comentava com os pais e com os irmãos que estava planejando vender seu carro para abrir o
próprio negócio. Alguns meses após a entrevista fomos informados de que ele realmente
havia saído. Considerando que o mesmo já saiu anteriormente da empresa e depois retornou,
conforme relataram seus pais, acredita-se que isso seja uma fase e que o Filho 3A, depois de
vivenciar a realidade e as dificuldades do mercado, vai acabar notando que a empresa familiar
é o melhor lugar para ele ficar. Esse filho parece ter espírito empreendedor, sonha em criar
um grande negócio e obter mais lucros, conforme se apreende da fala de um de seus irmãos:
Acho que ele gosta de ler aquelas revistas, daquelas histórias de não sei quem. O
cara do Facebook construiu não sei o quê, o outro Eike Batista fez não sei o quê, o
outro lá do Bretas fez parará. Acho que ele está querendo é isso, fazer algo
revolucionário e ficar rico (Filho 1A).
Uma crise nas organizações familiares também pode estar ligada à sucessão entre a
geração fundadora e a segunda geração. Isso porque a primeira tende à autocracia e à
concentração de decisões, enquanto a outra é marcada por uma crise de liderança entre os
possíveis sucessores (Gersick et al., 1997; Grzybovski et al., 2008; Lodi, 1987). Isso pode ser
constatado na Alimentar. Por isso a empresa não pode deixar que as relações familiares
desenvolvidas entre os membros da família proprietária, assim como sua capacidade em
administrar as relações empresariais, seja o motivo de conflito no momento da sucessão de
gestores (Lodi, 1987).
Percebe-se que algumas empresas estão no caminho de se profissionalizarem e, sendo
assim, já tomaram medidas que demonstram essa atitude, como será visto na análise das
126
categorias subsequentes. Porém, a maioria ainda apresenta um processo mais simples na
administração dos negócios e pouca estruturação organizacional. A própria falta de
planejamento da sucessão, a não preparação dos antecessores quanto à sua saída, o fato de não
existirem critérios para a escolha do sucessor salientam características peculiares das
pequenas e médias empresas que, mesmo não estando totalmente profissionalizadas, ainda
conseguem sobreviver e crescer.
Em grandes empresas com processos mais estruturados, com planejamentos
estratégicos robustos, com a necessidade de uma gestão e uma logística bem mais definidas
para atender à demanda, é imprescindível, por exemplo, que o sucessor tenha qualificação,
que tenha boa formação acadêmica e esteja em condições de competir com os grandes
executivos no mercado (Reis & Escrivão Filho, 2003).
As pequenas e médias empresas, por sua vez, possuem características peculiares no
que se refere à sua forma de gerir, cujo bom funcionamento consiste em executar as
atividades e ações gerenciais básicas relativas às áreas funcionais. Assim, enquanto em
grandes organizações é possível dividir seus setores por função e analisar cada um deles
separadamente, bem como seus processos estruturados, nas pequenas e médias isso é muito
difícil (Reis & Escrivão Filho, 2003).
A maioria das PMEs não conta com estrutura tal que possibilite a implantação de
práticas gerenciais mais eficazes. Geralmente elas são mais centralizadas, com estrutura
organizacional simples em que as atividades são exercidas de forma cumulativa por poucas
pessoas ou por uma única pessoa, o empresário, não necessitando de grande quantidade de
unidades ou funções nem de estrutura administrativa sofisticada (Drucker, 1981; Leone, 1999;
Reis & Escrivão Filho, 2003).
Uma grande estrutura de gestão não é aplicável e muitas vezes nem é desejada em
pequenas e médias empresas por causa da complexidade e do custo da mesma. Por isso sua
administração tende a ser simples, de baixo custo, mais informal, sem normas e processos
estruturados (Reis & Escrivão Filho, 2003). Essa informalidade, porém, tende a diminuir à
medida que a empresa cresce. E isso é necessário, pois o risco de surgirem problemas
administrativos e de baixa eficiência é latente quando a empresa não se desenvolve
gerencialmente (Reis & Escrivão Filho, 2003).
Tratando-se do relacionamento entre os herdeiros, percebeu-se que não existem
conflitos aparentes de disputa de poder ou de não aceitação do sucessor escolhido por parte
dos outros irmãos. Na Alimentar, por exemplo, um dos filhos (Filho 4A) não manifestou
interesse, até então, em atuar na empresa, visto que pretende seguir uma carreira diferente do
127
ramo de atuação da organização familiar. Entre os outros dois filhos que trabalham hoje na
organização, parece existir consenso de que o Filho 1A seria o possível sucessor à presidência
da empresa, o que pode ser constatado na fala do Filho 3A:
Hoje é o Filho 1ª, né... é, porque ele está mexendo mais na área financeira, então ele
está mais por dentro [...]. O Filho 1A está mais por dentro, né, [...] há mais tempo na
empresa também, ele já passou por todos os setores, eu acredito então que ele já tem
uma capacidade maior. Eu e o Filho 2A estamos aí mais ou menos há cinco anos, só
que a gente está se desenvolvendo.
Verifica-se que, no atual momento da sucessão nessa empresa, os filhos ainda estão
novos e não existe uma disputa acirrada pelo poder. Todos declaram aceitar bem a ideia de
que o Filho 1A será o futuro sucessor na gestão da empresa. Porém, no futuro, não se sabe.
Por enquanto, o Filho 4A está apenas com 17 anos e não mostra nenhum interesse pelo
negócio. Em alguns momentos, quando está nas lojas, ele procura contribuir analisando o
serviço prestado e chega a comentar com o pai que ele poderia trabalhar durante um período
do dia na Alimentar e, durante o outro, na profissão que deseja seguir, a Advocacia: “Ao
mesmo tempo ele falou outro dia que vai formar em Direito e vai trabalhar seis horas no poder
público e seis na Alimentar pra ele ganhar dobrado” (Pai A).
Não se sabe ainda se realmente esse desinteresse do Filho 4A pela empresa é
definitivo. No futuro ele também pode ser um potencial sucessor. Se o filho mais novo
realmente não quiser trabalhar na empresa, o problema pode estar na questão da propriedade.
Como não existe planejamento, os fundadores ainda não pensam sobre a propriedade da
empresa, conforme se observa na fala da Mãe A: “Só depois que eu morrer eles vão pensar
em herança” (Mãe A).
Esse é um assunto que não é conversado na família, mas que, como aconteceu com as
empresas Adoçar e Transportar, pode vir a ser um problema no futuro.
Na Educar, todos os herdeiros estão na empresa da família, mas também existe uma
conformidade dos irmãos mais novos sobre os dois mais velhos assumirem a posição do Pai B
e da Mãe B. Justamente pela diferença de idade, é perceptível que a Filha 1B e o Filho 2B têm
mais experiência do que os outros. Na Medicar, dos cinco filhos, apenas dois estão na
empresa hoje, sendo que a Filha 5C, a mais nova, é a única com formação em Farmácia e é
quem acompanha o pai desde muito nova, e por isso deverá ser a sucessora do Pai C. O outro
filho que atua na empresa parece concordar com o fato de a sua irmã vir a suceder o pai na
empresa, não tendo mostrado que isso seja motivo de conflito entre eles:
128
A Filha 5C tem mais é [...], ela tem mais tempo junto com o pessoal aqui também.
Porque, igual eu falei, eu não estou o tempo inteiro na farmácia. Eu estou há menos
tempo. Ela que fica [...], na parte de cima, por exemplo, a manipulação é ela que
olha tudo. Então ela já ta com mais [...] com mais bagagem pra gerência também
(Filho 3C).
No caso da Adoçar, somente os homens assumiram posições na empresa familiar e
houve uma divisão da sucessão. Todos são igualmente donos, cada um atuando em uma área.
Ao que parece, as irmãs nunca manifestaram interesse em trabalhar no negócio. Porém, na
sucessão anterior, da primeira para a segunda geração, o Pai D enfrentou conflito com as
irmãs que, mesmo não trabalhando na empresa, resolveram requerer sua parte na herança e ter
influência na empresa da família.
Da mesma forma, na Transportar o Pai E enfrentou conflitos com seus irmãos em
virtude da herança do pai e da sociedade na empresa. Alguns irmãos reivindicaram a
participação nos lucros. Não sendo possível fazer essa distribuição em virtude da fase de
crescimento pela qual a empresa passava, quando os recursos eram reinvestidos no próprio
negócio, eles entraram na justiça pedindo que a sociedade fosse desfeita. Já o atual sucessor
(Filho 1E) conseguiu assumir sem enfrentar problemas com os outros herdeiros. Eles
reconhecem de tal forma o trabalho e o merecimento do irmão em estar na posição de gestor
principal, conforme afirmou o Pai E que, com exceção de um deles, os demais aceitaram bem
a doação de 10% da empresa que foi feita a ele em testamento.
Em nenhuma das empresas foram identificados conflitos dos sucessores com os
funcionários. Como eles trabalham no negócio desde cedo e foram aos poucos conquistando
novos espaços na organização, os funcionários parecem aceitar bem a posição que os
herdeiros ocupam no momento, segundo a própria percepção de sucessores e sucedidos. Além
disso, em todos os casos foi dito que os filhos são tratados como profissionais, pois os
funcionários podem perceber que eles estão ali por mérito, não por simples paternalismo e
nepotismo. Mas é perceptível que, por serem filhos do dono, eles têm certa vantagem em
relação aos funcionários externos à família para ocuparem cargos mais elevados e para serem
os principais candidatos à gestão da organização. Por outro lado, os filhos que trabalham
demonstram responsabilidade, compromisso e são cobrados como qualquer outro funcionário.
O resumo da categoria “dificuldade” está no Quadro 13.
129
Quadro 13 - Síntese da categoria: dificuldades
Categoria Subcategorias Síntese
Dificuldades
Falta de
planejamento
A falta de um planejamento formal acarretou problemas para as empresas
Adoçar e Transportar, bem como para os seus sucessores no primeiro
processo de sucessão. Como o processo aconteceu abruptamente, em virtude da
morte do fundador, houve problemas em relação à herança, que levaram a
processos judiciais e afetaram o patrimônio da organização. Na Medicar, como
não existe o planejamento, o antecessor não consegue finalizar o processo de
sucessão, mesmo não estando com idade para continuar na direção. Ainda não
apareceram dificuldades nas empresas Alimentar e Educar por causa da falta
de planejamento da sucessão.
Dificuldade do
antecessor em
deixar o negócio
Os antecessores da Alimentar e da Adoçar não têm planos de se aposentar e
passar o negócio para os filhos. Um dos motivos é a idade, visto que eles ainda
são novos; e o outro é a necessidade de os sucessores se prepararem mais. Já na
Medicar o antecessor já poderia ter finalizado o processo, mas não tem
perspectiva de parar ou deixar a gestão com sua sucessora. Na Adoçar o Pai D
estava tão acostumado a ser o único tomador de decisões que só conseguiu
abrir mão da gestão e perceber que os filhos estavam capacitados para assumir
quando foi aconselhado por um consultor. Uma situação comum a todos os
casos é que os antecessores prtendem continuar em suas empresas como
consultores ou conselheiros
Não preparação do
sucessor
Nos casos das empresas Alimentar, Adoçar e Transportar, alguns sucessores
não fizeram curso superior nem tiveram experiência fora da empresa. Quase
todo o conhecimento e preparação vêm da prática no dia-a-dia do negócio e do
convívio com os antecessores, que transmitem seus conhecimentos e seu know-
how para os filhos. Porém, a falta da formação acadêmica não se configura uma
dificuldade em nenhum dos casos. Uma situação identificada no processo
sucessório da empresa Alimentar e na Adoçar que pode vir a ser uma
dificuldade no futuro está relacionada à falta de um sucessor que possa assumir
as atividades da Mãe A, na primeira, e da parte administrativa, na segunda.
Falta de
profissionalização
Mesmo não estando totalmente profissionalizadas, as empresas dos casos
estudados ainda conseguem sobreviver e crescer. Algumas estão no caminho de
se profissionalizar e, sendo assim, já tomaram medidas que demonstram essa
atitude. Uma grande estrutura de gestão não é aplicável e muitas vezes nem é
desejada em pequenas e médias empresas, por causa da complexidade e do
custo da mesma.
Disputa de poder
entre os herdeiros
Tratando-se do relacionamento entre os herdeiros, não se detectaram conflitos
aparentes de disputa de poder ou de não aceitação do sucessor escolhido, por
parte dos outros irmãos. Porém, em casos como o da Alimentar, como não
existe planejamento sobre a divisão dos bens, a herança pode vir a ser um fator
de disputa entre os filhos e ser uma dificuldade, principalmente porque um
deles nem trabalha na empresa. Na sucessão anterior, da primeira para a
segunda geração, os sucessores da Transportar e Adoçar enfrentaram
problemas com os irmãos por causa da herança, inclusive ações judiciais.
Conflitos dentro
da família
Dificuldade também observada no processo de sucessão da empresa Alimentar
é o conflito de ideias entre os membros da família a respeito da forma de gestão
e dos objetivos da organização. Os pais não querem aceitar algumas mudanças
propostas pelos filhos que querem fazer a empresa crescer e gerar mais lucro.
Conflitos com
funcionários Em nenhuma das empresas apurou-se conflito entre sucessores e funcionários
Fonte: Elaborado pela autora, com dados da pesquisa.
130
5.1.6 Oportunidades
Depois de identificadas as dificuldades presentes nos processos de sucessão das
empresas estudadas, procedeu-se à apreciação das oportunidades que surgiram em decorrência
da entrada dos sucessores nas organizações.
Até a chegada dos filhos para trabalhar nas empresas, os antecessores conseguiram
administrar o negócio de forma intuitiva, visualizando oportunidades e fazendo a empresa
crescer. Porém, chega um momento em que é necessário trazer mais eficiência, estruturação e
formalização aos processos e os sucessores foram essenciais neste aspecto. Os pais já não
dariam conta de administrar tudo sozinhos, e ter junto a eles pessoas de total confiança que
também se preocupam com o destino do negócio é essencial para um futuro promissor.
De modo geral, em todos os casos a entrada dos sucessores propiciou melhoria e
reestruturação de algumas atividades das empresas, especialmente as relacionadas aos
processos administrativos. Como a maioria deles tem formação superior, eles puderam trazer
novos conceitos, novas formas de proceder na administração que aprenderam nos cursos. Um
exemplo é o caso Alimentar, cujos fundadores ressaltaram que os filhos passaram a valorizar
e desenvolver setores para os quais antes não tinham tanta atenção, como o RH e o controle
de estoques, informatizaram sistemas, implementaram políticas para motivação e
desenvolvimento dos funcionários e, segundo o Pai A, uma mudança significativa que
agilizou as compras e reduziu o custo dos insumos de produção foi o sistema de compras por
intermédio do leilão implementado pelo Filho 1A.
Na empresa Medicar, a Filha 5C, mesmo encontrando restrições impostas pelo pai,
também trouxe novas oportunidades para o seu negócio. Entre os seus feitos pode-se destacar
a implantação do laboratório de manipulação, que é coordenado por ela, a venda de
medicamentos homeopáticos, também manipulados na farmácia, e a implantação de sistemas
informatizados. Aliado a isso, o próprio Pai C chegou a falar que, se não tivesse os filhos para
ajudá-lo, talvez ele já tivesse vendido a farmácia.
As novas gerações que chegaram para trabalhar na Adoçar também trouxeram
novidades e ideias que impulsionaram o crescimento da empresa. Como visto, até a terceira
geração entrar no negócio, existia apenas uma loja que vendia os produtos da fábrica. Com a
ajuda dos filhos foi possível abrir outros pontos de vendas e fazer a marca se expandir na
região metropolitana de Belo Horizonte. Os herdeiros têm uma filosofia diferente da dos
antecessores quanto à inovação. Eles procuram fazer vários cursos na área para se atualizarem
com o mercado, para desenvolverem novos produtos, além de estarem atentos à opinião dos
131
consumidores, que é o principal meio de avaliar a demanda do que está sendo ofertado no
mercado ou do que precisa ser inovado.
Registrou-se também que a profissionalização já é realidade em muitas empresas. É
importante ressaltar que a profissionalização em organizações familiares não está somente
relacionada à contratação de gestores externos, mas também à adoção de práticas
administrativas mais modernas, estruturadas e menos informais. Assim, nada impede que os
membros da família permaneçam no topo, como acontece com as empresas investigadas no
presente trabalho (Gersick et al., 1997; Lodi, 1989; Scheffer, 1995).
Mesmo que não estejam em uma fase totalmente profissionalizada, como as grandes
empresas, com setores estruturados, processos administrativos robustos, alto controle
financeiro, alta qualificação dos gestores, entre outros, existem claramente traços de uma
empresa mais profissionalizada nos cinco casos. As empresas estão mais organizadas, em
virtude da estruturação dos processos administrativos que formalizaram e profissionalizaram
mais a gestão. Traços de profissionalição podem ser destacados nas empresas Educar e
Adoçar, onde as famílias são maiores e seus atuais gestores se preocupam em impor regras ou
ter atitudes para controlar a entrada de familiares na empresa. Os parentes que desejam
trabalhar na organização têm que ser qualificados. Na Adoçar, a ideia da abertura das lojas foi
justamente uma estratégia para evitar que todos quisessem trabalhar na fábrica e para, de
alguma forma, ajudar aqueles que ainda não tinham ocupação formal no mercado de trabalho.
Da mesma forma, a Transportar precisou passar por uma situação difícil, enfrentando
processos judiciais para aprender a lidar com o elevado número de herdeiros, sócios e
gerações que convivem na mesma família. Hoje, porém, a empresa já se encontra mais
preparada para lidar com o processo de sucessão. Foram definidos critérios para a entrada de
familiares na organização; o Pai E já deixou em testamento uma parcela maior das cotas da
empresa para o Filho 1E, seu sucessor, para que ele não perca o direito de comando na
organização; também foi utilizada como estratégia para proteger o patrimônio da empresa e
dos filhos a abertura de empresas holding.
De acordo com Lodi e Lodi (2004), a holding pode ser a solução para as transferências
necessárias e para a maior longevidade de um grupo societário. Um dos seus objetivos é a
solução de problemas referentes à herança e à sucessão administrativa, uma vez que ela
transcende a figura de uma pessoa física. Uma de suas finalidades é manter ações de outras
empresas, possibilitando, assim, o controle de grupos empresariais e a concentração desse
controle, evitando a pulverização acionária desse grupo.
132
A preocupação com a profissionalização ou com a implantação de normas, políticas e
contratos é importante para a manutenção das empresas familiares ao longo do tempo,
podendo ser um dos meios de contribuir para o sucesso do processo sucessório, tendo em
vista que a racionalização das atividades de uma empresa pode ser sinônimo de melhor
desempenho e de perspectiva de crescimento (Martins et al., 1999).
A síntese da categoria “oportunidades” pode ser vista no Quadro 14:
Quadro 14 - Síntese da categoria: oportunidades
Categoria Subcategorias Síntese
Oportunidades
Possibilidade de crescimento
Em todos os casos observou-se que a entrada das novas
geraçãoes propiciou o crescimento das empresas. Destaca-
se o caso da Adoçar, onde a abertura de novas lojas e a
expansão do negócio só foi possível com a chegada dos
sucessores.
Novas formas de conduzir o
negócio
Os sucessores influenciaram na gestão das empresas e
impantaram novas ferramentas administrativas, estuturando
e formalizando os processos nas organizações.
Melhorias financeiras
A partir dos avanços implantados pelos sucessores foi
possível aperfeiçoar o desempenho financeiro. Destaca-se a
Alimentar, que implantou o sistema de leilão de compras e
procicou ganhos com baixos custos e diminuição do tempo
de compras.
Profissionalização da gestão
A profissionalização é uma realidade nas empresas. Mesmo
que não estejam totalmente estrututradas, elas adotam
posturas que as colocam nesse caminho. Destaca-se a
adoção de critérios para a entrada dos sucessores e a
abertura de empresas holding para proteger o patrimônio da
empresa e da família, no caso, a Transportar, e a abertura de
novas lojas para evitar a entrada desenfreada de parentes na
fábrica da Adoçar.
Fonte: elaborado pela autora, com dados da pesquisa.
133
6 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sendo um segmento com notável representatividade na economia brasileira e mundial,
o interesse pelo estudo das empresas denominadas familiares é, apesar de recente, importante
para o aprimoramento de teorias que contemplem suas particularidades e deem aos donos de
empresas e estudiosos da área meios que propiciem a manutenção dessas organizações e sua
longevidade.
Entre os tópicos estudados com maior destaque sobre as empresas familiares, o
processo sucessório é um dos mais relevantes, uma vez que pode ser a ponte para o sucesso
ou o caminho para o fracasso, dependendo de como é conduzido pela família proprietária. A
alta mortalidade existente entre as organizações gerenciadas por famílias é um dado
preocupante, que tem na sucessão a principal causa para o desaparecimento das mesmas.
Tendo em vista que a taxa de mortalidade se concentra nos primeiros anos de vida ou
na passagem do bastão entre as primeiras gerações, enquanto as organizações ainda estão em
processo de crescimento, procurou-se neste trabalho entender a natureza da sucessão
especificamente no contexto das pequenas e médias empresas familiares. Buscou-se destacar
as dificuldades enfrentadas nesse percurso, bem como as possíveis oportunidades que o
processo pode gerar para o desenvolvimento do negócio.
Para alcançar os objetivos estabelecidos, realizou-se um estudo multicaso de caráter
qualitativo em cinco empresas familiares de pequeno e médio porte, localizadas na região
metropolitana de Belo Horizonte e que já tivessem encerrado ou estivessem passando, no
momento, pelo processo de sucessão. As organizações foram escolhidas atendendo aos
critérios preestabelecidos e descritos na metodologia desta dissertação e também pela
facilidade de acesso da pesquisadora.
Definido o público-alvo de respondentes que atendessem às necessidades de respostas
à presente pesquisa sobre o tema em questão, foram realizadas 19 entrevistas
semiestruturadas, que tiveram dois roteiros orientadores. Além disso, a investigação na
literatura pertinente sobre o tema foi essencial para compor a base de análise sobre a sucessão
nas empresas pesquisadas.
Com o estudo foi possível averiguar que a falta de um planejamento formal da
sucessão é uma realidade em todos os casos estudados. Geralmente, o que desencadeia o
processo sucessório em pequenas e médias empresas são os acontecimentos naturais relativos
ao cotidiano da organização, da gestão, da família e também os aspectos relacionados à
educação dos filhos, que os colocam naturalmente como potenciais sucessores. Além desses
134
fatores ditos intuitivos e não intencionais, existem também os fatos inesperados que podem
ocorrer como a morte dos fundadores, que impelem os herdeiros a assumirem a posição de
sucessores.
Ao contrário do que foi visto na teoria na qual os autores defendem que a falta de
planejamento é o primeiro passo para o fracasso no processo de sucessão e,
consequentemente, um entrave à longevidade da empresa familiar, nos casos estudados a
sucessão ocorreu ou está em andamento sem grandes problemas que coloquem em risco sua
sobrevivência, ao que tudo indica. Apesar de enfrentarem dificuldades que poderiam ter sido
evitadas se houvesse um estratégia de sucessão, como foi o caso da Adoçar e Transportar, em
que os herdeiros chegaram a brigar judicialmente pela posse da empresa, os sucessores
conseguiram assumir e dar continuidade ao negócio da família, ainda o fazendo crescer e
prosperar.
Sobre o antecessor, observou-se que em todas as empresas a relação entre este e os
sucessores é boa, existindo respeito, companheirismo, transferência de conhecimento e
confiança. Os antecessores procuram exercer diversos papéis que, segundo visto na teoria, são
importantes para o desenvolvimento do sucessor e para o êxito da sucessão. Apenas se
registrou um conflito na Alimentar, que não está diretamente relacionado às figuras do
sucessor e sucedido, mas sim à convivência entre gerações distintas, que possuem objetivos
desencontrados. Também se ressaltam as empresas Medicar e Adoçar, onde os antecessores
são mais centralizadores. Nos casos em questão, essa característica de desconfiança e controle
por parte dos pais pode se constituir um entrave para o desenvolvimento da organização e
para o seu crescimento, visto que os filhos perdem a oportunidade de desenvolver sua
autonomia e liderança na organização. Na Medicar, por exemplo, a filha não consegue
implantar melhorias administrativas quando não tem o aval do pai.
Viu-se que, de modo geral, poucos são os executivos que dedicam atenção à sua saída
e à finalização do processo de sucessão. Nos casos pesquisados, essa também é uma realidade.
Dos antecessores entrevistados, apenas os da empresa Educar têm o desejo de se aposentar e
estão se preparando para isso. Os outros responderam veementemente que não têm
perspectiva de deixar a empresa e acham que nunca vão se desligar totalmente. Segundo os
autores pesquisados, esse pode ser um grande obstáculo ao sucesso das empresas familiares.
Nos casos estudados, mesmo continuando nas organizações, a maioria dos antecessores tem a
consciência de que a gestão e as decisões precisam ser delegadas aos sucessores e que eles
deverão continuar nas empresas apenas como suporte, como conselheiros, não intervindo
diretamente no comando e nas atividades do dia-a-dia do funcionamento. Assim, eles
135
conseguem manter um ambiente harmonioso e os sucessores ainda veem com bons olhos a
presença dos pais para lhes aconselhar com sua vasta experiência.
Em se tratando dos sucessores, embora nem todos terem formação acadêmica ou
preparação profissional com experiência externa, aspectos estes que, segundo o arcabouço
teórico pesquisado, são essenciais para se ter mais chances de sucesso, os herdeiros
demonstraram ter habilidades, desempenho e competência para assumirem o lugar dos
antecessores. A experiência prática e o fato de terem sido inseridos bem cedo no contexto das
organizações familiares já têm sido o suficiente para os sucessores conseguirem dar
continuidade ao negócio. Assim, em grandes empresas com processos robustos, setores
estruturados, com alta concorrência entre profissionais qualificados querendo assumir a
gestão, talvez seja realmente imprescindível que os sucessores apresentem todas as
características de formação profissional, experiência, estabelecimento de critérios. Nas
pequenas e médias, por outro lado, um sucessor com poucos atributos, mas com boa
experiência prática parece já ser suficiente para atender à demanda de profissional de que a
organização necessita.
Outro aspecto observado na pesquisa discrepante da literatura consultada está
relacionado à não existência de conflitos no processo de transmissão de poder advindos da
disputa entre os herdeiros, conflitos de interesses e a interferência das relações familiares nos
processos organizacionais. Neste estudo pôde-se perceber uma articulação harmoniosa entre
os interesses familiares e organizacionais nas empresas analisadas, predominando, na maioria
das vezes, os interesses delas. Em todos os casos os gestores têm a preocupação em manter na
organização somente pessoas da família que realmente possam contribuir com seu trabalho
para o desenvolvimento dos negócios. Além disso, as decisões importantes concernentes à
gestão ficam a cargo daquele que ocupa a posição de gestor ou, em algumas situações, como o
da empresa Educar, certas decisões estratégicas são compartilhadas com os futuros herdeiros,
sendo que os outros membros da família direta e estendida não interferem.
Somente em relação à propriedade da empresa percebeu-se que, conforme a teoria
relata, quando não há preparação ou planejamento dos antecessores a esse respeito, a empresa
e os familiares ficam sujeitos aos conflitos que geralmente surgem em virtude da distribuição
da herança. Foi o caso das empresas Adoçar e Transportar, que enfrentaram diversos
problemas com a morte dos fundadores e a entrada dos irmãos na sociedade. Não só as
relações e os laços familiares ficaram abalados, mas as empresas chegaram a sofrer perdas
financeiras em virtude dos conflitos patrimoniais. Por isso, hoje os antecessores já estão
136
tomando medidas a fim de evitar esses problemas para as futuras gerações, que podem ter
proporções bem maiores em se tratando de sociedade entre primos.
Por outro lado, o processo de sucessão pode ser fonte de oportunidades para as
empresas familiares. A entrada dos filhos nas organizações pesquisadas foi sinônimo de
crescimento, desenvolvimento, melhorias financeiras, implantação de novos processos
administrativos, abertura para um novo mercado e até mesmo de profissionalização da gestão.
De modo geral percebeu-se que, justamente pelas peculiaridades das pequenas e
médias empresas, que não exigem grandes estruturas ou formalização dos processos, as
sucessões aconteceram de forma mais intuitiva e isso não acarretou grandes prejuízos às
organizações. Como a estrutura ainda é simples, com menos processos, menos pessoas, os
problemas advindos da falta de planejamento e formalização do processo sucessório foram
contornados e todas continuaram com seu funcionamento normal e ainda com oportunidades
para crescimento. Aliado a isso tem-se o papel primordial dos antecessores, que com seu
empreendedorismo e força de vontade trabalharam e fizeram o possível para dar continuidade
ao negócio, inclusive adotando intuitivamente algumas práticas apontadas pela literaruta
como facilitadoras do processo.
Entre várias lacunas que poderiam ser destacadas na realização deste trabalho, cabe
ressaltar o não cruzamento de diferentes meios de coleta de dados para análise do caso. A
utilização de entrevistas é a principal forma de buscar informações, porém, poderiam ter sido
consultados também os contratos sociais das empresas, que forneceriam informações
adicionais, reafirmando ou até mesmo negando alguns dados informados verbalmente pelos
entrevistados. A pesquisa documental é muito importante para se chegar a uma maior
veracidade nos dados.
Não se pôde, com esta pesquisa, preencher todas as lacunas teóricas, sequer esgotar as
discussões a respeito da sucessão em empresas familiares, mas sim tentar contribuir com
novos exemplos e com discussões anteriormente iniciadas por outros autores. Assim, sugere-
se que os estudos sobre o tema continuem, investigando-se outros casos de pequenas e médias
empresas que possam afirmar ou descartar os achados desta dissertação.
Sugere-se, também, fazer estudos comparativos entre casos de empresas de menor
porte e grandes organizações, averiguando se a natureza do processo realmente se diferencia
em virtude do porte e da estrutura organizacional. Outra sugestão de pesquisa seria a
realização de um estudo profundo sobre os aspectos intrínsecos às pequenas e médias
empresas, indicando-se caminhos para a realização do processo sucessório condizentes com a
137
realidade dessas organizações, tendo em vista que a maioria das pesquisas sobre empresas
familiares requer ações facilitadores mais adequadas às grandes organizações.
138
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145
APÊNDICES
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA: SUCEDIDO
1) Quais membros da família trabalham na empresa e em quais cargos?
2) A sucessão à presidência está em andamento nesta empresa?
3) Quando começou e o que desencadeou o processo?
4) Há algum planejamento?
5) Como a sucessão está sendo feita?
6) Existiu algum critério para a escolha do sucessor? Quais?
7) Como ele está sendo preparado?
8) Qual o seu papel no processo de sucessão?
9) Existe alguma expectativa de o(a) senhor(a) se desligar da empresa?
10) Para o(a) senhor(a), o que caracteriza o seu efetivo desligamento e o consequente fim do
processo sucessório?
11) O que o(a) senhor(a) pretende fazer depois de concluída a sucessão?
12) De que forma a família está envolvida nos negócios?
13) A empresa tem outros herdeiros?
14) Como ficará a situação deles na empresa?
15) Alguma dificuldade surgiu durante o processo de sucessão?
16) Como se pretende superar as dificuldades destacadas?
17) Quais oportunidades para o negócio podem ter surgido em decorrência do processo
sucessório?
18) Como o senhor pretende agir em relação à propriedade da empresa?
19) Quais as principais mudanças que ocorreram na empresa em função da sucessão?
20) Quantos empregados tem a empresa?
21) Receita bruta anual da empresa:
( ) Menos de R$ 360.000,00
( ) Entre R$ 360.000,00 e R$ 2,4 milhões
( ) Entre R$ 2,4 milhões e R$ 3,6 milhões
( ) Entre R$ 3,6 milhões e R$ 16 milhões
( ) Mais de R$ 16 milhões e menos de R$
90 milhões
Dados do entrevistado:
Nome:
Sexo: ( ) M ( ) F
Idade: ____ anos
Função: ________________
Nível de escolaridade:
( ) Primeiro grau
( ) Segundo grau
( ) Graduação
( ) Pós-Graduação
146
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA: HERDEIRO
1) Quais membros da família trabalham na empresa e em quais cargos?
2) A sucessão à presidência está em andamento nesta empresa?
3) Quando começou e o que desencadeou o processo?
4) Há algum planejamento?
5) Como a sucessão está sendo feita?
6) Existe algum critério para a escolha do sucessor? Quais?
7) Como ele está sendo preparado?
8) Por que você decidiu trabalhar nesta empresa e não em outra?
9) Pretende sair um dia?
10) Você acha que seria o mais indicado para assumir a empresa?
11) A empresa tem outros herdeiros?
12) Como ficará a situação deles na empresa?
13) Como será o procedimento em relação à propriedade da empresa?
14) Para você, o que marca efetivamente a finalização do processo sucessório?
15) Como o sucedido tem assessorado o sucessor no aprendizado das funções?
16) Você acha que os funcionários aceitam bem sua presença na empresa?
17) Como é o seu relacionamento com eles?
18) De que forma a família está envolvida nos negócios?
19) Alguma dificuldade surgiu durante o processo de sucessão?
20) Como se pretende superar as dificuldades destacadas?
21) Quais oportunidades para o negócio podem ter surgido em decorrência do processo
sucessório?
Dados do entrevistado:
Nome:__________________
Sexo: ( ) M ( ) F
Idade: ____ anos
Função:__________________
Nível de escolaridade:
( ) Primeiro grau
( ) Segundo grau
( ) Graduação
( ) Pós-Graduação
147
APÊNDICE C – ANÁLISE CONJUNTA DOS CASOS – RESUMO COMPARATIVO ENTRE AS EMPRESAS
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Sucessão
Planejamento Sem planejamento
formal
Sem planejamento
formal
Sem planejamento
formal
Sem planejamento
formal
Sem planejamento
formal
Entrada dos filhos
para trabalhar na
empresa
Foi o fator
desencadeador do
processo de sucessão
Foi o fator
desencadeador do
processo de sucessão
Foi o fator
desencadeador do
processo de sucessão
Foi o fator
desencadeador do
processo de sucessão
Foi o fator
desencadeador do
processo de sucessão
Motivos inesperados
(morte, doença ou
outro)
Não Não
Ocorreu na
passagem da
primeira para a
segunda geração
Ocorreu na
passagem da prmeira
para a segunda
geração
Ocorreu na
passagem da prmeira
para a segunda
geração
O antecessor
Seu papel dentro do
processo Colaborador
Supervisor,
professor e protetor. Supervisor Consultor Consultor
Relação com o
sucessor
Boa relação entre
antecessor e
sucessores, apesar
do conflito de
gerações
Boa relação
Boa relação mesmo
diante do perfil
centralizador do
antecessor que não
permite que os filhos
desenvolvam sua
autonomia
Boa relação mesmo
diante do perfil
centralizador do
antecessor que não
permite que os filhos
desenvolvam sua
autonomia
Boa relação
Previsão de
desligamento da
empresa
Antecessores não
têm perspectiva de
deixar o negócio
Fundadores têm o
desejo de se
aposentar em um
futuro próximo (10
anos)
Antecessores não
têm perspectiva de
deixar o negócio
O Pai D na sucessão
anterior só deixou a
gestão depois de
receber orientação
externa. Os atuais
gestores ainda não
têm planos de deixar
o negócio.
O Pai E planejou sua
saída da gestão e fez
a transição
espontaneamente. O
gestor atual (Filho
1E) ainda não tem
perspectiva de se
desligar da empresa.
148
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
O sucessor
Critérios para a
escolha do sucessor
Não foram
encontrados critérios
predefinidos
formalmente para a
escolha dos
sucessores nas
empresas, porém,
intuitivamente os
antecessores se
utilizaram os
critérios: afinidade,
idade,
primogenitura,
tempo de empresa
Idade, área de
atuação
correspondente ao
negócio e ao cargo,
tempo de
experiência
Formação necessária
em Farmácia e maior
preparo e
experiência para
assumir a empresa
Ser homem e ter
experiência
Interesse, formação
em nível superior,
capacitação.
Formação/ preparação
profissional
Sucessor não tem
formação superior.
Participa de feiras e
se prepara com a
vivência prática no
negócio.
Sucessores possuem
dois diplomas em
cursos superiores e
pós-graduação
Formação em nível
superior em
Farmácia e cursos na
área administrativa
Um sucessor não é
formado e os outros
dois fizeram
Administração e
Engenharia. Todos
participam de cursos
gastronômicos em
São Paulo.
Sucessor não tem
formação superior,
prepara-se com a
vivência prática no
negócio.
Habilidades,
desempenho e
experiência para
liderar a empresa.
Demonstram
interesse, são
dedicados, com
perfil de liderança,
empreendedorismo,
bom relacionamento
interpessoal e
competência para
assumir
Demonstram
interesse, são
dedicados, com
perfil de liderança,
empreendedorismo,
bom relacionamento
interpessoal e
competência para
assumir
Demonstram
interesse, são
dedicados, com
perfil de liderança,
empreendedorismo,
bom relacionamento
interpessoal e
competência para
assumir
Demonstram
interesse, são
dedicados, com
perfil de liderança,
empreendedorismo,
bom relacionamento
interpessoal e
competência para
assumir
Demonstram
interesse, são
dedicados, com
perfil de liderança,
empreendedorismo,
bom relacionamento
interpessoal e
competência para
assumir
149
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
O sucessor
Entrada no negócio
precocemente
Os herdeiros
começaram ainda
jovens a trabalhar na
empresa da família.
Os herdeiros
começaram ainda
jovens a trabalhar na
empresa da família.
Na Educar, eles já
eram mais velhos,
mas acompanharam
o desenvolvimento
da escola desde a sua
fundação.
Os herdeiros
começaram ainda
jovens a trabalhar na
empresa da família.
Os herdeiros
começaram ainda
jovens a trabalhar na
empresa da família.
Os herdeiros
começaram ainda
jovens a trabalhar na
empresa da família.
Experiência externa
O sucessor não teve
alguma expêriencia
externa
O sucessor trabalhou
em outras escolas e
em um banco antes
de ir para a empresa
familiar
O sucessor não teve
alguma expêriencia
externa
Dois sucessores não
tiveram alguma
experiência externa e
um trabalhou em seu
negócio próprio
antes de ir para a
empresa da família
O sucessor trabalhou
por três anos em
uma concessionária
Motivação do sucessor
para assumir a
empresa
Os sucessore estão
na empresa por
vontade e decisão
própria. Eles são tão
motivados e não
pensam em trabalhar
em outro lugar.
Os sucessore estão
na empresa por
vontade e decisão
própria. Eles são tão
motivados e não
pensam em trabalhar
em outro lugar.
Os sucessore estão
na empresa por
vontade e decisão
própria. Eles são tão
motivados e não
pensam em trabalhar
em outro lugar.
Os sucessore estão
na empresa por
vontade e decisão
própria. Eles são tão
motivados e não
pensam em trabalhar
em outro lugar.
Os sucessore estão
na empresa por
vontade e decisão
própria. Eles são tão
motivados e não
pensam em trabalhar
em outro lugar.
Relacionamento com
os outros herdeiros
Não observou-se
conflitos entre os
herdeiros.
Nenhum conflito Nenhum conflito Nenhum conflito Nenhum conflito
Relacionamento com
os funcionários
Os funcionários
aceitam a posição de
liderança que os
sucessores ocupam.
Bom relacionamento Bom relacionamento Bom relacionamento Bom relacionamento
150
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
A família
Envolvimento da
família nos negócios
Demonstraram
conseguir delimitar a
esfera familiar e a
esfera empresarial,
não misturando as
duas
Demonstraram
conseguir delimitar a
esfera familiar e a
esfera empresarial,
não misturando as
duas
Demonstraram
conseguir delimitar a
esfera familiar e a
esfera empresarial,
não misturando as
duas
Demonstraram
conseguir delimitar a
esfera familiar e a
esfera empresarial,
não misturando as
duas
Demonstraram
conseguir delimitar a
esfera familiar e a
esfera empresarial,
não misturando as
duas
Situação dos outros
herdeiros que não
assumirão a sucessão
Aqueles que
trabalham nas
empresas por
enquanto parecem
estar satisfeitos e
aceitando bem o
sucessor escolhido.
Esses continuarão
trabalhando
normalmente. Os
que já exercem suas
atividades
externamente ao
negócio familiar
também continuarão
da mesma forma.
Aqueles que
trabalham nas
empresas por
enquanto parecem
estar satisfeitos e
aceitando bem o
sucessor escolhido.
Esses continuarão
trabalhando
normalmente. Os
que já exercem suas
atividades
externamente ao
negócio familiar
também continuarão
da mesma forma.
Aqueles que
trabalham nas
empresas por
enquanto parecem
estar satisfeitos e
aceitando bem o
sucessor escolhido.
Esses continuarão
trabalhando
normalmente. Os
que já exercem suas
atividades
externamente ao
negócio familiar
também continuarão
da mesma forma.
Aqueles que
trabalham nas
empresas por
enquanto parecem
estar satisfeitos e
aceitando bem o
sucessor escolhido.
Esses continuarão
trabalhando
normalmente. Os
que já exercem suas
atividades
externamente ao
negócio familiar
também continuarão
da mesma forma.
Aqueles que
trabalham nas
empresas por
enquanto parecem
estar satisfeitos e
aceitando bem o
sucessor escolhido.
Esses continuarão
trabalhando
normalmente. Os
que já exercem suas
atividades
externamente ao
negócio familiar
também continuarão
da mesma forma.
Propriedade da
empresa
Não se preocupam
em resolver a
propriedade da
empresa
Buscam orientação
para em vida deixar
resolvida a questão
da herança.
Buscam orientação
para em vida deixar
resolvida a questão
da herança.
Não se preocupam
em resolver a
propriedade da
empresa
Buscam orientação
para em vida deixar
resolvida a questão
da herança
151
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Dificuldades
Falta de planejamento
Ainda não
apareceram
dificuldades em
virtude da falta de
planejamento da
sucessão
Ainda não
apareceram
dificuldades em
virtude da falta de
planejamento da
sucessão
Como não existe o
planejamento, o
antecessor não
consegue finalizar o
processo de
sucessão, mesmo
não estando com
idade para continuar
na direção
A falta de
planejamento formal
acarretou problemas
para a empresa, bem
como para os seus
sucessores no
primeiro processo de
sucessão. Como o
processo aconteceu
abruptamente, em
virtude da morte do
fundador, houve
problemas em
relação à herança,
que levaram a
processos judiciais e
afetaram o
patrimônio da
organização
A falta de
planejamento formal
acarretou problemas
para a empresa, bem
como para os seus
sucessores no
primeiro processo de
sucessão. Como o
processo aconteceu
abruptamente, em
virtude da morte do
fundador, houve
problemas em
relação à herança,
que levaram a
processos judiciais e
afetaram o
patrimônio da
organização
Dificuldade do
antecessor em deixar o
negócio
Os antecessores não
têm planos de se
aposentar e passar o
negócio para os
filhos. Um dos
motivos é a idade,
visto que eles ainda
são novos; e o outro
é a necessidade de os
sucessores se
prepararem mais
Os antecessores
pretendem continuar
em suas empresas
como consultores ou
conselheiros
O antecessor já
poderia ter
finalizado o
processo, mas não
tem perspectiva de
parar ou deixar a
gestão com sua
sucessora.
Os antecessores
pretendem continuar
em suas empresas
Os antecessores não
têm planos de se
aposentar e passar o
negócio para os
filhos. Um dos
motivos é a idade,
visto que eles ainda
são novos; e o outro
é a necessidade de os
sucessores se
prepararem mais.
Os antecessores
pretendem continuar
em suas empresas
como consultores ou
conselheiros
152
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Dificuldades
Os antecessores
pretendem continuar
em suas empresas
como consultores ou
conselheiros
como consultores ou
conselheiros
Nesta empresa o Pai
D estava tão
acostumado a ser o
único tomador de
decisões que só
conseguiu abrir mão
da gestão e perceber
que os filhos
estavam capacitados
para assumir quando
foi aconselhado por
um consultor.
Não preparação do
sucessor
Alguns sucessores
não fizeram curso
superior nem
tiveram experiência
fora da empresa.
Quase todo o
conhecimento e
preparação vêm da
prática no dia-a-dia
do negócio e do
convívio com os
antecessores, que
transmitem seus
conhecimentos e seu
know-how para os
filhos. Porém, a falta
da formação
acadêmica não se
configura uma
Não se aplica Não se aplica
Alguns sucessores
não fizeram curso
superior nem
tiveram experiência
fora da empresa.
Quase todo o
conhecimento e
preparação vêm da
prática no dia-a-dia
do negócio e do
convívio com os
antecessores, que
transmitem seus
conhecimentos e seu
know-how para os
filhos. Porém, a falta
da formação
acadêmica não se
configura uma
Alguns sucessores
não fizeram curso
superior nem
tiveram experiência
fora da empresa.
Quase todo o
conhecimento e
preparação vêm da
prática no dia-a-dia
do negócio e do
convívio com os
antecessores, que
transmitem seus
conhecimentos e seu
know-how para os
filhos. Porém, a falta
da formação
acadêmica não se
configura uma
153
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Dificuldades
dificuldade em
nenhum dos casos.
Uma situação
identificada no
processo sucessório
que pode vir a ser
uma dificuldade no
futuro está
relacionada à falta
de um sucessor que
possa assumir as
atividades da Mãe A
dificuldade em
nenhum dos casos.
Uma situação
identificada no
processo sucessório
que pode vir a ser
uma dificuldade no
futuro está
relacionada à falta
de um sucessor que
possa assumir as
atividades da parte
administrativa
dificuldade em
nenhum dos casos.
Falta de
profissionalização Não se aplica Não se aplica Não se aplica Não se aplica Não se aplica
Disputa de poder entre
os herdeiros
Não se detectaram
conflitos aparentes
de disputa de poder
ou de não aceitação
do sucessor
escolhido, por parte
dos outros irmãos.
Porém, no caso da
Alimentar, como não
existe planejamento
sobre a divisão dos
bens, a herança pode
vir a ser um fator de
disputa entre os
filhos e ser uma
dificuldade,
Não se detectaram
conflitos aparentes
de disputa de poder
ou de não aceitação
do sucessor
escolhido, por parte
dos outros irmãos.
Não se detectaram
conflitos aparentes
de disputa de poder
ou de não aceitação
do sucessor
escolhido, por parte
dos outros irmãos.
Não se detectaram
conflitos aparentes
de disputa de poder
ou de não aceitação
do sucessor
escolhido, por parte
dos outros irmãos.
Na sucessão
anterior, da primeira
para a segunda
geração, os
sucessores
enfrentaram
problemas com os
irmãos por causa da
herança, inclusive
Não se detectaram
conflitos aparentes
de disputa de poder
ou de não aceitação
do sucessor
escolhido, por parte
dos outros irmãos.
Na sucessão
anterior, da primeira
para a segunda
geração, os
sucessores
enfrentaram
problemas com os
irmãos por causa da
herança, inclusive
154
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Dificuldades
principalmente
porque um deles
nem trabalha na
empresa
ações judiciais ações judiciais
Conflitos dentro da
família
Conflito de ideias
entre os membros da
família a respeito da
forma de gestão e
dos objetivos da
organização. Os pais
não querem aceitar
algumas mudanças
propostas pelos
filhos que querem
fazer a empresa
crescer e gerar mais
lucro.
Não se aplica Não se aplica Não se aplica Não se aplica
Conflitos com
funcionários Não se aplica Não se aplica Não se aplica Não se aplica Não se aplica
Oportunidades Possibilidade de
crescimento
A entrada das novas
geraçãoes propiciou
o crescimento das
empresas atraves da
melhoria e
reestruturação dos
processos
administrativos.
A entrada das novas
geraçãoes propiciou
o crescimento das
empresas atraves da
melhoria e
reestruturação dos
processos
administrativos.
Implantação do
laboratório de
manipulação, que é
coordenado por uma
sucessora, abertura
de mercado para
venda de
medicamentos
homeopáticos e
manipulados na
farmácia
Até a terceira
geração entrar no
negócio, existia
apenas uma loja que
vendia os produtos
da fábrica. Aabertura
de novas lojas e a
expansão do negócio
só foi possível com a
chegada dos
sucessores
A entrada das novas
geraçãoes propiciou
o crescimento das
empresas atraves da
melhoria e
reestruturação dos
processos
administrativos
155
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Oportunidades
Novas formas de
conduzir o negócio
Os sucessores
influenciaram na
gestão das empresas
passando a valorizar
e a desenvolver
setores que não
tinham tanta atenção
como o RH, controle
de estoques,
informatização dos
sistemas, políticas de
motivação e
desenvolvimento de
funcionários
Os sucessores
impantaram novas
ferramentas
administrativas,
estuturando e
formalizando os
processos nas
organizações.
Implantação de
sistemas
informatizados de
controle financeiro e
vendas
Os herdeiros
procuram fazer
vários cursos na área
do negócio da
empresa para se
atualizarem com o
mercado, para
desenvolverem
novos produtos,
além de estarem
atentos à opinião dos
consumidores, que é
o principal meio de
avaliar a demanda
do que está sendo
ofertado no mercado
ou do que precisa ser
inovado
Os sucessores
impantaram novas
ferramentas
administrativas,
estuturando e
formalizando os
processos nas
organizações.
Melhorias financeiras
A partir dos avanços
implantados pelos
sucessores foi
possível aperfeiçoar
o desempenho
financeiro. Na
Alimentar,
houveram ganhos
significativos com os
baixos custos e a
diminuição do tempo
de compras depois
da implantação do
sistema de leilão
Não aplica Não aplica Não aplica Não aplica
156
Categoria Subcategorias Síntese
Alimentar Educar Medicar Adoçar Transportar
Oportunidades Profissionalização da
gestão Não aplica
Traços de
profissionalição
podem ser
destacados na
Educar, onde a
família é mais
numerosa e seus
atuais gestores se
preocupam em
impor regras ou ter
atitudes para
controlar a entrada
de familiares na
empresa. Os
parentes que
desejam trabalhar na
organização têm que
ser qualificados.
Não aplica
Traços de
profissionalição
podem ser
destacados na
Adoçar, onde a
família é mais
numerosa e seus
atuais gestores se
preocupam em
impor regras ou ter
atitudes para
controlar a entrada
de familiares na
empresa. Os
parentes que
desejam trabalhar na
organização têm que
ser qualificados. A
abertura de novas
lojas para evitar a
entrada desenfreada
de parentes na
fábrica da Adoçar é
um traço marcante
dessa
profissionalização
Foram definidos
critérios para a
entrada de familiares
na organização; o
Pai E já deixou em
testamento uma
parcela maior das
cotas da empresa
para o Filho 1E, seu
sucessor, para que
ele não perca o
direito de comando
na organização;
também foi utilizada
como estratégia para
proteger o
patrimônio da
empresa e dos filhos
a abertura de
empresas holding.
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