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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
João Ricardo Nickenig Vissoci
A influência do contexto bioecológico no processo de formação da identidade no esporte: possibilidades de colonização ou emancipação para atletas de
futsal
DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
SÃO PAULO
2015
i
João Ricardo Nickenig Vissoci
A influência do contexto bioecológico no processo de formação da identidade
no esporte: possibilidades de colonização ou emancipação para atletas de futsal
DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Psicologia Social, sob a orientação do Prof. Dr. Antônio da Costa Ciampa.
SÃO PAULO
2015
Banca Examinadora
________________________________
________________________________
________________________________
________________________________
________________________________
iii
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a toda a minha família, que sempre apoiou e incentivou meus sonhos e andanças. À Bruna, que foi meu suporte durante todo o caminho e aos amigos Leonardo, José Roberto e Lenamar, que me ajudaram a iniciar, não desistir e chegar até aqui.
iv
AGRADECIMENTOS
Ao finalizar esta Tese, quero agradecer a todos que contribuíram para meu
desenvolvimento acadêmico e profissional durante toda a minha trajetória, na pós-
graduação:
À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, especificamente ao
Programa de Estudos Posgraduados em Psicologia Social, pela estrutura,
funcionários, materiais e contribuições no decorrer dos anos.
Aos docentes do Programa de Estudos Posgraduados em Psicologia Social,
por compartilharem o seu conhecimento e pela disponibilidade em ministrar
disciplinas.
Ao meu orientador Professor Doutor Antonio da Costa Ciampa,
principalmente por ter dado possibilidades emancipatórias a um desconhecido e
posteriormente pelas conversas, orientações, ensinamentos, paciência, amizade,
conselhos e oportunidades ao longo destes anos de convivência.
À minha co-orientadora e amiga Professora Doutora Lenamar Fiorese Vieira,
do Programa de Pós-Graduação em Educação Física associado UEL/UEM, por
todos os anos de convivência e amizade, e por ter aberto todas as portas que
contribuíram com minha trajetória acadêmica.
Ao meu orientador no Doutorado sanduíche na Duke University, Professor
PhD Ricardo Pietrobon, por abrir um mundo de novas possibilidades à minha
carreira e pela amizade conquistada.
Aos professores da banca examinadora, Profa. Dra. Maria do Carmo Guedes,
Prof. Dr. Salvador Antonio Meireles Sandoval, Prof. Dr. José Luiz Lopes Vieira,
pelas correções e sugestões no projeto e no trabalho final.
Às equipes de futsal da Liga Nacional 2013 por aceitarem fazer parte do
estudo.
Aos integrantes do Grupo de Pesquisa Pró-Esporte, coordenadores,
doutorandos, mestrandos, graduados e acadêmicos, pelo auxílio neste trabalho,
pela convivência compartilhada, troca de experiências, momentos de descontração,
companhia no laboratório, almoços e confraternizações.
Aos colegas da Faculdade Ingá, diretores, professores, funcionários e alunos,
pelo companheirismo e apoio nas reposições de aula, licenças e cafés.
v
Aos amigos José Luiz Lopes Vieira, Nelly Moraes Gil e Aline Chotte pela
amizade ao longo do processo, em especial aos companheiros de jornada Leonardo
Pestillo de Oliveira, José Roberto do Nascimento Junior, por todo o apoio, amizade,
viagens e parceria já de longa data.
À Capes e ao CNPQ pelo apoio ao desenvolvimento científico deste estudo e
pelo auxílio financeiro recebido.
Em especial ao meu pai Luiz Carlos, minha mãe Arlene, meus irmãos João
Augusto e Bianca e à minha companheira Bruna, pelo carinho, incentivo, suporte e
paciência em todos os momentos da minha vida.
E a Deus pelas bênçãos e a oportunidade desta conquista.
vi
VISSOCI, João Ricardo Nickenig. A influência do contexto bioecológico no processo de formação da identidade do atleta: Possibilidades de colonização ou emancipação para atletas de futsal. 2015. 190f. Tese (Doutorado em Psicologia Social) – Programa de Estudos Posgraduados em Psicologia Social. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2015.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo defender a tese de que o contexto bioecológico
esportivo do futsal apresenta características que podem potencializar a busca por
emancipação e ao mesmo tempo atributos que favorecem a colonização da ordem
sistêmica sobre as metamorfoses no processo de formação identitária. Para tanto,
conduzimos três estudos buscando: (1) revisar de forma sistemática a literatura para
verificar direção e magnitude da associação de correlatos a identidade; (2)
caracterizar os parâmetros do contexto bioecológico dos atletas de futsal de alto
rendimento; e (3) analisar a influência do contexto sobre a formação da identidade
por meio do padrão semântico associado à narrativa sobre a carreira atlética e
estudos de caso sobre a história de vida. No primeiro estudo, revisamos 121 artigos
de forma sistemática categorizando as associações de variáveis com identidade em
questões demográficas, suporte psicossocial, problemas de saúde/lesões, controle
da vida, status educacional, auto-percepção, motivação, desenvolvimento
pessoal/carreira, compromisso com o esporte, atitudes alimentares, estratégias de
enfrentamento, aposentadoria e burnout. Associações positivas e negativas foram
identificadas com variáveis específicas e não-específicas do esporte. No segundo e
terceiro estudos, entrevistamos atletas de futsal e técnicos. Identificou-se no
segundo estudo, ao caracterizar os sistemas ecológicos dos atletas, que o contexto
do futsal apresenta elementos que podem instigar a busca de autonomia em
expressões identitárias, mas também possibilita a heteronomia. O terceiro estudo
identificou grupos de atletas utilizando o método da história de vida e análise em
rede, com discursos direcionados à heteronomia com projetos de vida na lógica do
agir instrumental, e outros dois grupos com discursos direcionados à autonomia de
sua expressão identitária, com distinção em projetos de vida baseados em políticas
de identidade ou identidades políticas. Conclui-se que a identidade pode ser
instigada a uma direção emancipatória, dado características do contexto que
possibilitem essa direção. Contudo, a forma como a modalidade do futsal se
estrutura percebe-se maiores possibilidades de agir instrumental frente ao sucesso
no esporte. Características externas ao esporte como estudo ou influencia familiar
podem proporcionar maior multiplicidade de papéis que resultam em riqueza de
sentidos ao discursar sobre carreira e identidade, favorecendo manifestações
autonômicas na busca de um bom viver.
Palavras-Chave: Identidade; Esporte; Atletas, Contexto. VISSOCI, João Ricardo Nickenig. Influence of the bioecological context in identity formation process in sports: Colonization or emancipation possibilities to futsal players. 2014. 190f. Thesis (PhD in Social Psychology) –
vii
Program of Graduate Studies in Social Psychology. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2014.
ABSTRACT This thesis aims to argument the rationale that sports bioecological context of futsal
has characteristics that can enhance the search for emancipation while also may
contribute favoring the colonization by systemic order on the metamorphoses in
identity formation process. Therefore, we conducted three studies seeking: (1) to
systematically review the literature to verify direction and magnitude of variables
related to identity; (2) characterize bioecological context parameters of high
performance futsal players; and (3) analyze contextual influences on identity
formation through semantic pattern associated with athletic career narrative and life
story case studies. In the first study, we systematically reviewed 121 articles
categorizing variables associations with identity in demographics, psychosocial
support, health problems / injuries, control of life, educational status, self-perception,
motivation, personal / career development, commitment sports, eating attitudes,
coping strategies, retirement and burnout. Positive and negative associations were
identified with specific and non-specific sport variables. In the second and third
studies, we interviewed futsal athletes and coaches. In the second study we
identified by characterizing athletes’ ecological systems, that futsal context presents
elements that can instigate autonomy seeking behavior within identity expressions,
but also enables the heteronomy. In third study we verified through the method of life
history and network analysis, a group of athletes with narratives directed to
heteronomy with life projects in the logic of instrumental action, and two other groups
with narratives directed towards autonomy of their identity expression, with
distinction in life projects based on identity politics or political identities. In
conclusion, identity can be instigated in an emancipatory direction given context
features. However, the way the futsal sport is structured greater possibilities of
instrumental action are perceived in relation to success in the sport. Exterior features
to the sport such as education or family influences may provide greater multiplicity of
roles that result in wealth of meaning when narrating about career and identity,
promoting autonomic manifestations in search of a good living.
Keywords: Identity; Sport; Athletes, Context.
viii
LISTA DE FIGURAS Capítulo 2
Figura 1 -
Diagrama do modelo teórico do Sintagma Identidade –
Metamorfose – Emancipação...........................................................
26
Figura 2 -
O modelo desenvolvimental de participação
esportiva………………………………………………………................
33
Figura 3-
Elementos da teoria bioecológica do desenvolvimento do talento
esportivo...........................................................................................
38
Capítulo 3
Figura 1. Diagrama do fluxo do estudo…………………………........................ 54
Capítulo 4
Figura 1 -
Mapa do contexto Bioecológico dos atletas de futsal de elite
brasileiros..........................................................................................
87
Figura 2 -
Temas emergentes e categorias de primeira e segunda ordem
para caracterização do contexto
bioecológico.……………………………………………………………
89
Figura 3a -
(a) Rede de associações (proximidade e intensidade da cor das hastes) entre as características do contexto bioecológico e orientação dos atletas (nodos – círculos)……………………................................................................
103
Figura 3b -
(b) valor médio da do tamanho da distância (hastes) entre as
variáveis do ambiente e as orientações dos atletas (autonomia e
heteronomia).………………………………….....................................
104
Capítulo 5
Figura 1 -
Rede de conexões semânticas dos discursos sobre história de
vida em atletas de futsal brasileiros do grupo direcionado para
heteronomia e sem projeto de vida, nos períodos vitais da carreira
atlética de (a) experimentação, (b) especialização e (c)
investimento.....................................................................................
122
Figura 2 -
Rede de conexões semânticas dos discursos sobre história de
vida em atletas de futsal brasileiros do grupo direcionado para
autonomia e sem projeto de vida, nos períodos vitais da carreira
atlética de (a) experimentação, (b) especialização e (c)
investimento.………….......................................................................
129
Figura 3 -
Rede de conexões semânticas dos discursos sobre história de
vida em atletas de futsal brasileiros do grupo direcionado para
autonomia e com projeto de vida fundamentado na identidade
política, nos períodos vitais da carreira atlética de (a)
experimentação, (b) especialização e (c)
investimento.…………………………………………...........................
139
ix
LISTA DE TABELAS E QUADROS Capítulo 1
Quadro 1 - Estrutura da tese organizada por capítulos e seus principais
objetivos……………………………………………………………...
11
Capítulo 2
Quadro 1 -
Comparação entre as fases de desenvolvimento atlético de
Bloom (1985) e Cotè (1999).......................................................
36
Capítulo 3
Tabela 1 - Delineamentos de pesquisa e características das
amostras.....................................................................................
55
Tabela 2 - Variáveis associadas à identidade em atletas nos
diversos estudos incluidos.................................................
60
x
LISTA DE APÊNDICES
Apêndice A - Estratégia de busca na base de dados
Pubmed………………………………………………………………
158
Apêndice B - Parecer do Comitê de Ética em
Pesquia..............................................................................................
159
Apêndice C - Termo de consentimento livre e esclarecido………............................. 163
Apêndice D - Roteiro de entrevista semi-estruturado sobre carreira
esportiva...............................................................................................
165
Apêndice E - Autorização para realização da pesquisa com atletas e treinadores
de futsal brasileiros………………………………………………..............
167
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA.................................................................................................. iii
AGRADECIMENTOS........................................................................................ iv
RESUMO........................................................................................................... vi
ABSTRACT....................................................................................................... vii
LISTA DE FIGURAS......................................................................................... viii
LISTA DE TABELAS E QUADROS................................................................. ix
LISTA DE APÊNDICES.................................................................................... x
CAPÍTULO 1 01
INTRODUÇÃO.................................................................................................. 02
1.1 Caracterização do Tema........................................................................ 02
1.2 Justificativa............................................................................................ 07
1.3 Delimitação da Pesquisa....................................................................... 10
1.4 Limitações da Pesquisa........................................................................ 10
1.5 Objetivos................................................................................................. 10
1.5.1 Objetivo Geral....................................................................................... 10
1.5.2 Objetivos Específicos............................................................................ 10
1.6 Estrutura da Tese................................................................................... 11
Referências…………………………………………………………………………. 13
CAPÍTULO 2 15
REVISÃO DE LITERATURA: ............................................................................ 16
2.1 Identidade e Esporte…………………………………………………………. 16
2.1.1 Sociedade, socialização e individuação…………………………………… 17
2.1.2 Política de identidade e identidade política……………………………….. 21
2.1.3 Sintagma Identidade-Metamorfose-Emancipação……………………….. 23
2.1.4 Emancipação, autonomia e riqueza de papéis........................................ 29
2.2 Modelos de desenvolvimento de talentos esportivos e carreira atlética………………………………………………………………………………….
31
2.3 Parâmetros do contexto na perspectiva da teoria bioecológica ……. 36
Referências…………………………………………………………………………. 44
CAPÍTULO 3 47
ARTIGO ORIGINAL: Formação da identidade no esporte: Uma revisão
sistemática……………………………………………………………………………..
48
Referências…………………………………………………………………………. 70
CAPÍTULO 4 79
ARTIGO ORIGINAL: Contexto esportivo de alto rendimento: Um ambiente
ecológico possibilitador de metamorfoses orientadas para autonomia ou
heteronomia?......................................................................................................
78
Referências…………………………………………………………………………. 110
CAPÍTULO 5 112
ARTIGO ORIGINAL: O esporte é um contexto de emancipação ou
colonização?...................................................................................................... 113
Referências…………………………………………………………………………. 153
CONSIDERAÇÕES FINAIS………………………………………………………….. 155
APÊNDICES E ANEXOS…………………………………………………………….. 158
1
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO GERAL E ESTRUTURA DA TESE
Caracterização do tema
Problema
Justificativa social e científica
Delimitação do estudo
Limitações do estudo
Definição de termos
Objetivos
Estrutura da Tese
2
Capítulo 1.
1.1 Caracterização do Tema
O contexto esportivo tem sido amplamente estudado em seu papel no
desenvolvimento humano (MELO, 2010; ROCHA et al., 2011), com evidências
indicando as potencialidades desse contexto para o desenvolvimento de habilidades
positivas (SINCLAIR & ORLICK, 1993) e sua influência em prejuízos neste processo
(BRANDÃO et al., 2013). Interesse especial tem sido atribuído ao processo de
desenvolvimento da carreira atlética e do ser humano envolvido com o esporte, a
iniciação precoce e suas consequências para as transições de carreira posteriores
ou para o contraste com o desenvolvimento humano no esporte (STAMBULOVA,
FRANCK & WEIBULL, 2012; VISSOCI, 2009; WYLLEMAN & LAVALLEE, 2003).
A maior parte da literatura na área tem direcionado o foco para estudos sobre
aposentadoria do esporte e o abandono da prática como uma consequência de
problemas na formação da carreira (STAMBULOVA, FRANJ & WEIBULL, 2012).
No entanto, apesar dessa área de estudo ser crescente, os fatores associados à
qualidade do desenvolvimento humano no esporte ainda são inconsistentes,
especialmente em momentos de transição dentro da carreira.
Nesse sentido, um processo que vem assumindo importância como elemento
mediador da formação positiva no esporte é a identidade e, em especial, o conceito
de identidade atlética (BREWER et al., 1999). Diversos estudos trazem a identidade
como um elemento interveniente para o bem-estar, estratégias de enfrentamento,
saúde, satisfação com a vida entre outros (DANIELS, SINCHAROEN & LEAPER,
2005; GROVE, FISH & EKLUND, 2004; HOULE, BREWER & KLUCK, 2010; . Boa
parte dessas pesquisas tem utilizado o conceito de identidade atlética como
referência para seus estudos (BREWER & CORNELIUS, 2010; BREWER, VAN
RAALTE & LINDER, 1993; HOULE, BREWER & KLUCK, 2010), que por definição
se refere ao grau de identificação do indivíduo com o papel de atleta.
Não obstante, apesar das importantes contribuições da literatura para a
compreensão da formação da identidade no esporte e suas consequências
comportamentais, afetivas e cognitivas, algumas limitações podem ser encontradas
na perspectiva da identidade atlética, em especial a inconsistência sobre a sua
associação com indicadores positivos ou negativos no esporte (BREWER et al.,
3
1993b; SINCLAIR & ORLICK, 1993). Contrastando com o exposto sobre o papel
positivo da identidade atlética no esporte, estudos relataram encontrar evidências de
que maiores níveis de identidade atlética também estão associados a desfechos
como susceptibilidade a distúrbios emocionais e psicológicos com o término da
carreira (BREWER et al., 1993; SINCLAIR & ORLICK, 1993).
Uma possível explicação para esses resultados está na ideia de que
identidade não seria um processo estático e transversal no desenvolvimento
humano, sugerindo que modificações na constituição identitária seriam necessárias
para a continuidade da busca do indivíduo por autonomia e não pela manutenção
de papéis ao longo da evolução da carreira. Dessa forma, uma forte identidade
altética pode ser positiva em um dado momento da carreira (iniciação, por exemplo)
e negativa em outro (como na aposentadoria), dadas as características históricas da
vida do indivíduo, podendo agir (identidade atlética) como um elemento de
alienação em determinados momentos.
Essa noção está em concordância com a perspectiva de constituição da
identidade proposta pelo Sintagma Identidade-Metamorfose-Emancipação
(CIAMPA, 2009), que será o referencial teórico desta tese. Essa concepção será
mais bem abordada durante o decorrer deste estudo, mas para estabelecer um
posicionamento, acreditamos que a formação da identidade é um processo contínuo
relacionado ao movimento do ser humano de vir-a-ser, à sua atividade e, portanto,
vinculado à humanização e socialização e ao acesso à linguagem.
Por se tratar de um processo contínuo, entende-se que o ser humano passa
por transformações constantes (metamorfoses) com as modificações do indivíduo
e/ou do ambiente, direcionando-se como um movimento político de busca de
autonomia, integrando aspectos da cultura na sua expressão individual identitária
(fundamentada em identidades políticas) e emancipação da dominação ideológica
ou da manutenção da heteronomia (enquadramento nas regulações dos papéis -
Política de Identidade) com base nas nossas experiências históricas e no projeto de
vida (CIAMPA, 1987, 2009).
Assim, nossa hipótese é de que o estudo da identidade precisa ser
compreendido numa perspectiva histórica ao longo do desenvolvimento do
indivíduo, com ênfase especial para os sentidos atribuídos às vivências e a forma
como esses sentidos são integrados com a perspectiva de si, gerando novas
metamorfoses. Para esse processo ser compreendido, contudo, faz-se necessário
4
uma compreensão do contexto no qual o indivíduo está inserido, como forma de
auxiliar na compreensão de suas metamorfoses.
Apesar do processo de construção identitária ser um processo subjetivo, as
estimulações ambientais são determinantes para uma facilitação do processo na
busca por emancipação ou na alienação num processo regulatório da autonomia.
Olhando o esporte, podemos perceber que dependendo da forma como este é
vivenciado, o processo e busca por autonomia pode ser potencializado ou
restringido. Elementos como falta de estrutura para a prática, alta monetarização do
espetáculo, pressão por resultados e uso de substâncias são aspectos que
dificultam a busca por autonomia do indivíduo. Por outro lado, as experiências que o
esporte proporciona como viagens, contatos com diferentes pessoas e ascensão
social podem indicar uma potencialização da busca por autonomia e emancipação.
Dessa forma, para compreender o contexto no qual os atletas de futsal
estiveram inseridos ao longo do seu processo de desenvolvimento, utilizamos o
referencial teórico bioecológico de Bronfenbrenner (1996). Essa perspectiva teórica
proporciona um modelo para análise das características do contexto através da
divisão do ambiente em camadas (sistemas) que variam da mais próxima ao
indivíduo (microssistema), como os relacionamentos, atividades e papéis que adota,
até a mais distante (macrossistema), envolvendo características da cultura, leis e
aspectos burocráticos, com estruturas intermediárias (meso e exossistema), numa
perspectiva histórica temporal e vital (cronossistema).
Nosso campo de estudo será o futsal, que é atualmente a modalidade com
mais praticantes no país (QUEIROGA et al., 2005), por diferentes motivos, mas
entre eles pela proximidade com o futebol de campo, a facilidade da prática e a
simplicidade das regras. Apesar de serem esportes semelhantes e regidos pela
mesma entidade internacional (FIFA), o futsal vem tentando encontrar maior espaço
no cenário midiático nacional. Ainda, enquanto alguma atenção tem sido dada a
estudos com o futebol de campo, por ser a modalidade mais praticada ao redor do
mundo e por lidar com grande quantidade de investimentos (FULLER, JUNGE &
DVORAK, 2012), poucas evidências têm sido investigadas no futsal, que tem ampla
representatividade no Brasil como atração a jovens atletas, constituindo um
importante espaço de construção de metamorfoses.
O interesse no futsal se justifica com dados recentes da FIFA (2014) que
sugerem que o Brasil é o maior exportador de jogadores de futebol de campo e
5
futsal, com uma frequência de transferências de aproximadamente 1500 atletas
para clubes internacionais somente no ano de 2013, e em sua maioria com idades
variando de 17 a 22 anos de idade. Contudo, estudos recentes têm enfatizado que
menos de 1% dos jogadores que aspiram chegar a um nível profissional são
avaliados em teste de qualificação para seleção de jogadores em clubes brasileiros
profissionais de futebol de campo (DAMO, 2007; MELO, 2010).
Esses atletas acabam por sofrer as consequências dessa busca por
profissionalização a ponto de prejudicar sua formação em áreas alternativas
(WYLLEMAN & LAVALLEE, 2003; VISSOCI, 2009). Ainda, enquanto milhares de
talentos esportivos são transferidos para o exterior, dados da Confederação
Brasileira de Futebol mostram que a cada ano, aproximadamente 50% destes
retornam ao Brasil por uma diversidade de fatores como: problemas de adaptação,
clima, linguagem, cultura, problemas com outros jogadores, com comissão técnica,
entre outros (BRANDÃO, MAGNANI, MEDINA & TEGA, 2013; JACOBS & DUARTE,
2006), indicando que parecem existir problemas ou deficiências na formação desses
talentos esportivos (SOARES et al., 2011).
Assim, o processo de desenvolvimento atlético acaba sendo semelhante para
atletas de futebol de campo e futsal, chegando inclusive a se cruzar, conforme
relatos de ex-jogadores na mídia. Muitos começam a prática no futsal pela sua
maior difusão nos municípios do interior do Brasil, enquanto outros acabam por
voltar o olhar para o futsal após desistirem da carreira do futebol de campo, seja no
início da carreira ou mesmo no final, como é o caso do jogador Daniel Carvalho, que
desistiu do futebol profissional para retomar a carreira no futsal
(GLOBOESPORTE.COM, 2013). De fato, a carreira no futsal é amplamente
diferente da carreira no futebol de campo, tanto em características de estrutura da
modalidade como progressão financeira.
Portanto, partindo das concepções do Sintagma-Identidade-Metamorfose-
Emancipação e da concepção do contexto bioecológico, essa tese partiu da
seguinte questão geradora: Qual o papel do contexto bioecológico do futsal na
formação identitária em atletas de rendimento? A tese a ser defendida neste texto é
de que o contexto bioecológico esportivo apresenta características que podem
potencializar a busca por emancipação da identidade ao mesmo tempo em que
apresenta atributos que incentivam a regulação das metamorfoses, direcionando
para a heteronomia, e que essas características do contexto podem possibilitar a
6
formação de identidades políticas associadas à adesão a projetos de vida voltados à
emancipação, determinantes para que o indivíduo exerça a prática esportiva de
forma autonômica, conquistando fragmentos emancipatórios frente à opressão
sistêmica.
Para tanto, conduzimos três estudos que serão apresentados
sequencialmente nesta tese para alcançar a resposta da questão geradora. O
primeiro estudo trata-se de uma revisão sistemática sobre Identidade em atletas de
rendimento. Acreditamos que com esse estudo será possível evidenciar como o
conceito de identidade vem sendo estudado no contexto esportivo, com quais
variáveis está associado e como isso impacta na formação do atleta. Com este
estudo, poderemos identificar as lacunas da literatura, especificando as limitações e
futuras direções para a área e enfatizar a necessidade da tese defendida.
O segundo estudo apresenta uma análise de conteúdo fundamentada na
teoria bioecológica de Bronfenbrenner (1995) para evidenciar as características do
contexto bioecológico do futsal, relacionando com as possibilidades de
emancipação ou colonização do mundo da vida presentes no contexto esportivo.
Com isso, levantamos a hipótese de que existem elementos no contexto que
favorecem à colonização do atleta pela ordem sistêmica como o status, poder
financeiro ou a burocracia envolvida com a carreira esportiva. Contudo, acreditamos
também que o esporte de rendimento tem um potencial de possibilitar fragmentos
emancipatórios que favorecem as metamorfoses autonômicas para a identidade.
Por fim, apresentaremos um estudo no qual foi analisada a formação
identitária de atletas, numa perspectiva multi-metodológica, com narrativas de
história de vida, análise de redes semânticas e análise de conteúdo. Nesse estudo
pretendemos demonstrar a partir de casos emblemáticos, como atletas percebem o
contexto esportivo e manifestam suas metamorfoses identitárias em diferentes
momentos da carreira. Assim, acreditamos que este estudo ilustrará o conteúdo final
da tese defendida sobre a influência do contexto, através da diversidade de
atuações ambientais (papel, para BRONFENBRENER, 1995), proporcionando maior
(ou menor) riqueza de papéis (CIAMPA, 2009) que favorecem fragmentos
emancipatórios em metamorfoses identitárias.
7
1.2 Justificativa
Como o estudo trata da constituição da identidade em atletas de futsal, em
especial com um olhar sobre o papel possibilitador de emancipação ou regulação
por parte do contexto, vou comentar aqui brevemente como esse trabalho se
encaixa na minha história de vida, e como o meu contexto foi um potencializador
para fragmentos (hoje) emancipatórios em minha identidade.
Quando comecei a estudar Psicologia, foi por uma estimulação contextual
(amigos, no caso) que acabei conhecendo a Psicologia do Esporte. Confesso que,
quando comecei a estudar Psicologia, não tinha o curso como uma parte importante
para a concretização de um projeto de vida. Acabei por buscar a Psicologia mais por
uma influência de Política de Identidade (no caso, fazer um curso superior e ser
diferente do meu irmão), e ao procurar a Psicologia do Esporte encontrei algo que
aliava meu interesse por esportes e o curso que começava a fazer e me interessar.
Entretanto, mais que a área, consegui encontrar no Grupo Pró-Esporte e muito
especialmente, na Professora Lenamar Fiorese Vieira, uma área que logo me atraiu
muito, que é a pesquisa ou a ciência.
Desde o início, dediquei-me mais às iniciações científicas do que
propriamente à faculdade, e com o passar do tempo fui percebendo que havia uma
competência relacionada à prática da pesquisa. Ainda nesse contexto, desde o
princípio os temas de pesquisa que mais me interessavam eram aqueles pouco
abordados ou com certa dificuldade de encontrar material teórico, principalmente
envolvendo o desenvolvimento humano através do esporte. Antes de entrar no
Mestrado, trabalhei com agressividade e desenvolvimento moral (na época,
entrando em contato por telefone com a autora da área, nos EUA, porque tínhamos
dificuldade em achar conteúdo teórico e empírico no esporte aqui no Brasil), depois
trabalhando com agressividade e estresse com viés da fisiologia. Mas o Mestrado
mesmo é que deu a direção do meu interesse no campo da pesquisa. Aqui quero
fazer um pequeno recorte para minha história familiar.
Eu sou o segundo filho, do meio, e desde cedo cresci em um ambiente no
qual fui altamente estimulado a desenvolver habilidades como matemática, inglês,
esportes, música, entre outros. Acima de tudo, fui criado em um ambiente que me
estimulava a encontrar minhas próprias soluções. Meus pais trabalhavam e cresci
muito próximo de meu irmão e irmã, e éramos incentivados por estes a resolver
8
nossos problemas sozinhos, até por uma necessidade deles de tempo para o
trabalho.
Assim, desde cedo, eu costumava mexer muito nas coisas, buscando
investigar e entender como elas funcionavam. E foi fazendo pesquisa que consegui
encontrar uma forma de aplicar isso de um jeito que fosse reconhecido
externamente como produtivo. Voltando ao Mestrado, entrei no Programa de Pós-
Graduação em Educação Física UEL/UEM, no qual fui logo querer montar um
projeto que envolvia uma metodologia mista (quanti-quali), e o tema que mais me
interessava ainda era o desenvolvimento humano. Ficava fascinado com a ideia de
estudar e assim entender como o esporte poderia auxiliar (ou atrapalhar, mas não
aceitava isso muito na época) na formação do indivíduo.
Durante o programa, lendo alguns artigos sobre desenvolvimento de talentos
esportivos e procurando algum referencial teórico, entrei em contato com estudos
que sugeriam a identidade como um elemento importante para a formação do atleta,
mas ainda pouco estudado. Procurando então alguma forma de estudar identidade,
passei pela concepção teórica do Sintagma, porém, como na época (e hoje
também, por que não?) ainda não tinha maturidade acadêmica suficiente para
entender a teoria e o que era aquela história da tal da Severina, fui para um modelo
teórico mais estruturado (positivista também) do Status de Identidade. E assim,
puxando também o referencial teórico que minha orientadora se identificava
(Bronfenbrenner), fiz lá minha primeira incursão no estudo da identidade.
Lembro-me como a banca, composta por um Professor de Psicologia Social,
me perguntou por que não havia seguido o modelo do Sintagma, e minha resposta
foi a mesma (não entendia!), mas aquilo ficou marcado em minha memória. Alguns
anos e muitas aulas na graduação ministradas depois, junto com meu amigo
sempre parceiro, procurando por um programa de Doutorado que fosse próximo de
Maringá, em Psicologia, e com boa conceituação, é que acabamos por encontrar o
Professor Ciampa, na PUC-SP.
Foi aí que resolvi estudar essa tal de identidade, por esse tal de Sintagma,
como queria ter feito antes, mas agora com mais maturidade acadêmica. Algumas
questões ainda me inquietavam, principalmente porque no Mestrado eu havia
concluído que o modelo de formação atlética empregado no futebol de campo não
era favorável para uma identidade madura (de acordo com a concepção teórica da
9
época, hoje já não penso mais assim). E, principalmente, que alguns atletas
conseguiam seguir caminhos diferentes, mesmo estando no mesmo contexto.
Assim, voltei meu olhar para esse campo de investigação. No entanto, para
não finalizar a história com um final feliz, somente estudar identidade não me
emancipava: de fato, eu não estava me sentindo realizado com o doutorado apenas,
na perspectiva de retomar a vida de escravidão acadêmica que levava até então
(aproximadamente 40 horas de aula semanais em sala!). O Doutorado era um
caminho, mas ainda assim não conseguia encaixar esse mesmo caminho na minha
formulação de projeto de vida, de finalizar o doutorado e seguir com uma carreira
acadêmica, concursado e etc. (como se espera pela Política de Identidade).
Foi aí que, novamente por uma indicação da amiga e orientadora Prof.
Lenamar Fiorese Vieira, comecei a trabalhar em um projeto junto à Duke Univeristy,
sobre metodologia de pesquisa. Encurtando a história, esse projeto permitiu que eu
fizesse um estágio doutoral sanduíche nesta Universidade, onde passei um ano me
dedicando ao estudo de metodologia de pesquisa, assunto para o qual pretendo me
aprofundar cada vez mais. Contudo, mais que um conhecimento, esse estágio me
permitiu duas realizações que até então não havia tomado consciência. A primeira é
a de que existe uma possibilidade de carreira que aqui chamarei de "metodologista",
alguém que trabalha com foco em desenvolvimento de metodologias e formas de
investigação. A segunda é o fato de que eu adoro viajar e conhecer coisas novas.
Com isso, acredito que esse Doutorado me permitiu vislumbrar um fragmento
emancipatório para o meu personagem de docente/pesquisador, agora mais um
"investigador" acadêmico e com potencial para trabalhar em parceria com diferentes
isntituições ao mesmo tempo, investigando variados assuntos, viajando para tal, o
que tem sido uma realização pessoal e profissional. O mesmo tentei aplicar à
redação dessa Tese, continuando com um interesse pessoal de investigação no
esporte, porém mais que isso, aplicando inovações metodológicas ao projeto e
tentando proporcionar uma forma diferente de investigar identidade, potencialmente
contribuindo para o NEPIM (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-
Metamorfose – PUC-SP) e quem sabe com a área da Psicologia Social como um
todo.
10
1.3 Delimitação da Pesquisa
O Estudo 1 esteve delimitado a artigos publicados com populações de atletas
que utilizassem um referencial teórico para a compreensão da identidade. Os
estudos 2 e 3 delimitaram-se aos atletas adultos das equipes de futsal participantes
da principal competição brasileira da modalidade, a Liga Nacional de Futsal 2013, e
seus respectivos técnicos.
1.4 Limitações da Pesquisa
A pesquisa limita-se por fazer cortes transversais, com o objetivo de avaliar
de forma retrospectiva a memória dos atletas sobre seus processos de narrativa de
histórias de vida sobre sua carreira atlética. Outra limitação se refere à generalidade
da amostra utilizada, que representa os atletas de alto rendimento de futsal, mas
restringe as interpretações à modalidade do futsal e esse nível de competição.
Outras abstrações são teóricas dada a similaridade cultural do esporte. Já as
limitações específicas ao método de análise dos dados serão discutidas no corpo do
texto, em cada artigo que compõe a tese.
1.5 Objetivos
1.5.1. Objetivo Geral
Investigar a influência do contexto bioecológico do futsal para a
formação da identidade em atletas de futsal de alto rendimento.
1.5.2 Objetivos Específicos
Revisar de forma sistemática a literatura para verificar o estado dos
estudos sobre identidade, suas metodologias empregadas,
variáveis associadas e referenciais teóricos utilizados;
Caracterizar os parâmetros do contexto bioecológico dos atletas de
futsal de alto rendimento, visando identificar elementos que
possibilitem movimentos heteronômicos ou autonômicos em
metamorfoses identitárias;
Identificar a influência do contexto bioecológico sobre a formação
da identidade por meio do padrão semântico associado à narrativa
11
sobre a carreira atlética e estudos de caso sobre a história de vida
de atletas de futsal de rendimento.
1.6 Estrutura da Tese
Essa tese está estruturada no “Modelo Escandinavo”, que é um formato de
apresentação no qual os resultados das pesquisas que compõem o documento são
descritos em formatos de artigos independentes. Na proposta desta tese, a estrutura
é formada por seis capítulos (Quadro 1).
Capítulo 1 Introdução geral e estrutura da Tese
Apresentação da introdução, problemática da pesquisa, justificativa,
delimitações e limitações do estudo e objetivos.
Capítulo 2 Revisão de Literatura
Apresentação dos marcos teóricos: Sintagma Identidade – Metamorfose
– Emancipação, Modelos de desenvolvimento de talentos esportivos,
Teoria Bioecológica do desenvolvimento humano.
Capítulo 3 Artigo Original 1
Formação da identidade no esporte: Uma revisão sistemática.
Capítulo 4 Artigo Original 2
Contexto esportivo de alto rendimento é um ambiente de formação
identitária orientada para autonomia ou heteronomia?
Capítulo 5 Artigo Original 2
Esporte: um contexto de emancipação ou colonização?
Capítulo 6 Discussões Gerais e Conclusões
Apresentação das conclusões gerais da tese
Quadro 1. Estrutura da tese organizada por capítulos e seus principais objetivos.
No primeiro capítulo são apresentadas a introdução, problemática da
pesquisa, justificativa, delimitações e limitações do estudo e os objetivos. O capítulo
dois é composto pela revisão de literatura e nos capítulos três, quatro e cinco
encontram-se os artigos originais redigidos segundo as orientações e normas da
ABNT, que já foram submetidos a periódicos. Por fim, no capítulo seis são
apresentadas as conclusões gerais da tese. Os capítulos com artigos foram
estruturados para apresentar ao leitor a sequência de estudos realizados para se
chegar ao fechamento da pergunta proposta nesta tese.
12
O primeiro estudo (capítulo 3) apresenta uma revisão sistemática sobre
identidade e o contexto esportivo, amplamente conduzida para sumarizar o corpo de
evidências do assunto. Esse capítulo foi determinante para a definição da
originalidade da pergunta de pesquisa desta tese e contribui para a sua totalidade
como ponto de partida e fonte de informação utilizada nos capítulos subsequentes.
Ainda, este capítulo foi concebido como forma de identificar os conceitos associados
ao estudo da identidade na literatura da Psicologia do Esporte, principalmente para
identificar a direção das associações reportadas, como forma de gerar evidências
para uma crítica à falta de referencias que interpretem as influências do contexto.
No segundo estudo (capítulo 4) é feita uma caracterização do contexto
bioecológico que envolve os atletas de futsal. Este capítulo funciona como um
elemento intermediário ao agrupamento de evidências para a resposta da questão
geradora desta tese. Neste capítulo é possível evidenciar a diversidade de
elementos contextuais envolvidos no processo de formação identitária e atletas,
especificamente identificando papéis ambíguos do mesmo ambiente para atletas
diferentes.
O terceiro estudo (capítulo 5) foi estruturado para condensar as informações
obtidas nos estudos 1 e 2, avançando sobre o conteúdo e apresentando o processo
de formação identitária na perspectiva do atleta, destacando as influências
ambientais. Este estudo finaliza esta tese discutindo diretamente a questão
geradora e apresentando evidências da importância de contextos diversificados e
plurais que permitam o alcance de maior riqueza de papéis, favorecendo a
movimentos autonômicos na formação identitária.
13
Referências
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14
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15
CAPÍTULO 2
SINTAGMA IDENTIDADE – METAMORFOSE – EMANCIPAÇÃO E PERSPECTIVA BIOECOLÓGICA DO CONTEXTO.
Identidade e Esporte
Modelos de desenvolvimento de talentos Perspectiva bioecológica
16
Capítulo 2.
2.1 Identidade e Esporte: A perspectiva do Sintagma Identidade-Metamorfose-
Emancipação
No Brasil, o estudo da identidade pode ser representado pelos trabalhos de
Ciampa (1987), dentro da Psicologia Social, que apresenta a identidade em seus
escritos como uma questão de metamorfose, uma transformação permanente. Para
o autor, a identidade é uma unidade entre a atividade, a consciência e a identidade,
assim, para a identidade ser metamorfose deve-se levar em consideração a
atividade do indivíduo, como um ser que faz, e não uma atribuição estática,
definindo o indivíduo a partir daquilo que fez; o movimento do indivíduo (sua
atividade) define um objetivo, uma finalidade na relação com o contexto social.
Nesta perspectiva, a identidade também é algo que diferencia e ao mesmo
tempo define o indivíduo, sendo o reconhecimento de que o indivíduo é o próprio de
quem se trata, de quem se fala e não de outra pessoa. Contudo, também unifica, a
identidade situa o sujeito dentro de um contexto de um grupo social (CIAMPA,
1987).
Essa contextualização levanta alguns pontos fundamentais para se
compreender o processo de formação de identidade, de acordo com as proposições
de Ciampa (2005). A citar: (a) que identidade é um processo atrelado ao movimento
do ser humano de vir-a-ser, relacionado à sua atividade e, portanto, vinculado à
humanização e socialização e ao acesso à linguagem; (b) passamos por
transformações constantes (metamorfose) no nossa formação identitária, indo ao
encontro ou de encontro à ideologia; (c) esse movimento de metamorfose se
direciona como um movimento político na busca pela autonomia e emancipação da
dominação ideológica, ou da manutenção da heteronomia, com base nas nossas
experiências de vida e no projeto para o futuro.
Essas três constatações direcionam a estrutura desta apresentação da
construção teórica (por que não teoria?) fundamentada no sintagma identidade-
metamorfose-emancipação, abordando a noção de sociedade e o processo de
socialização; o sintagma propriamente dito e a dicotomia poítica de identidade e
identidades politicas, numa perspectiva de projetos de vida e busca pelo
reconhecimento.
17
2.1.1 Sociedade, socialização e individuação
Para iniciar a compreensão da teoria de identidade do sintagma identidade -
metamorfose - emancipação é necessário discorrer sobre a noção de sociedade que
fundamenta tais pressupostos teóricos. Essa seção trata da perspectiva de
sociedade e apresenta os fundamentos do qual emergiram a perspectiva proposta
por Ciampa (1987). Essa apresentação é importante para situar em que posição se
coloca a proposta teórica do Sintagma, importante para a compreensão de uma
teoria que aborda os estudos sociais.
Partindo da concepção de sociedade apresentada por Berger e Luckman
(2008), entendemos que a realidade é uma relação dialética entre a subjetividade e
objetividade. Dessa forma, a tudo aquilo que corresponde à experiência subjetiva, o
que se deseja ou nos motiva, precisa passar pelas condições objetivas, da
realidade, para a sua concretização. Portanto, qualquer acepção que visa
compreender a sociedade precisa, necessariamente, passar por ambas as
dimensões objetiva e subjetiva da sociedade.
Como concebemos, a partir das proposições de Mead (1993), que o ser
humano está em constante construção, continuamente se desenvolvendo, o que
nos torna definitivamente humanos é a interlocução com o social, a socialização. A
perspectiva é de que não nascemos humanos, necessariamente, mas sim
humanizáveis através do processo da linguagem. É através da linguagem que
estabelecemos relações com outros seres humanos e com o ambiente, conseguindo
atribuir um sentido subjetivo para as experiências objetivas.
Por sentido entende-se uma forma complexa de consciência, na qual se
percebe uma relação entre as experiências do mundo objetivo. "A experiência atual
em um dado momento pode ser relacionada com uma experiência já acontecida há
pouco ou num passado remoto. Geralmente a experiência atual não é relacionada
com uma única outra experiência, mas com um tipo de experiência, um esquema de
experiência, uma máxima comportamental, uma legitimação moral, etc., derivados
de muitas experiências e armazenados no conhecimento subjetivo ou tomados do
acervo social do conhecimento" (BERGER & LUCKMANN, 2004, p. 15-6).
Esse processo de socialização se inicia com a interiorização, apreensão ou
interpretação imediata de um acontecimento externo, objetivo, mas subjetivo, de
outra pessoa, e assim contraindo um sentido para o meu mundo interno. O
18
indivíduo, ao ser colocado nos primeiros contatos com a estrutura social objetiva,
encontra-se frente a um ambiente composto por outros pares significativos com
realidades objetivas que conduzem a sua socialização, processo este chamado de
socialização primária (BERGER & LUCKMAN, 2008). Esses elementos significativos
seriam pares relacionados ao indivíduo como membros familiares ou outros pares
sociais que tenham representação para a criança, como professores de educação
física ou treinadores, no caso do esporte.
Para exemplificar, essa definição apresenta um ponto bastante preocupante
sobre a inserção de criancás no esporte, no que se refere ao processo de
socialização que ocorre nesse ambiente. Casos como o do Neymar ilustram essa
preocupação. No contato da criança com o contexto esportivo, conceitos como
competitividade, vitória acima da prática entre outros elementos podem configurar a
forma como o ambiente esportivo integra o processo de socialização, possivelmente
influenciando no processo de formaçao identitária.
A realidade objetiva, composta por significados oriundos dos sentidos
subjetivos dos pares significativos, impõe ao indivíduo um universo simbólico
(BERGER & LUCKMAN, 2008). É nesse universo simbólico, formado por diferentes
áreas de significação, que ocorre a legitimação da identidade através dos processos
de comunicação e linguagem. Exemplificando, determinados comportamentos no
contexto esportivo, como o uso de substâncias visando uma melhora no
desempenho (doping), podem ser uma forma de operacionalização da busca por um
sentido (legitimização de sua identidade) através do reconhecimento de seu status
ou de participação no grupo de 'vencedores', obtendo reforço de pares como o
técnico, torcedores, família. Portanto, a forma como esse universo simbólico se
constitui, influenciado pelos significados presentes naquela determinada localização
(ou grupo social), poderá orientar a socialização do indivíduo e os sentidos
construídos.
Contudo, a socialização não ocorre apenas na forma primária. Nesse modelo
atual de sociedade, sociedades contemporâneas ou modernas, somos requisitados
a adotar diferentes papéis, assumindo diferentes posições e adentrando novos
campos de significações. Essa multiplicidade de papéis acaba por direcionar a
outros formatos de socialização: a socialização secundária que visa complementar a
primária sem modificar sua essência ou a relação com o seu passado, ou a
ressocialização, quando há uma mudança na significação do seu passado,
19
reinterpretando as experiências para se harmonizar com a realidade objetiva
(BERGER & LUCKMAN, 2008), conceitos estes importantes para, posteriormente,
compreendermos a idéia de metamorfose do sintagma.
Todo esse processo se decorre num contexto de sociedade que, como
aponta a literatura (HABERMAS, 1990, BERGER & LUCKMAN, 2004;
SIEBENEICHELER, 2003), vive um perído de pós-modernidade. Essas sociedades
pós-modernas se configuram por um desencanto com as concepções religiosas e
aumento da cultura dita "profana", estruturada socialmente em torno do mecanismo
capitalista e do aparelho burocrático do Estado, dissolvendo-se as formas de vidas
tradicionais e fomentando a formação de Identidades mais abstratas que
potencializam a individualização em contraste com a socialização (HABERMAS,
1990). Frente a essas concepções, essa sociedade estaria lidando com um
momento de crise dos sentidos, no qual o ser humano individualizado tem maior
distanciamento de socializações secundárias que, com a falta de estruturas sociais,
normas e moral bem definida, gera uma dificuldade em se definir o que seria o
"viver bem" que buscamos (SIEBENEICHLER, 2003BERGER & LUCKMANN,
2004).
Mundo da vida X Ordem Sistêmica
Para compreender as forças que direcionam a estrutura social, Habermas
(2012) sugere que a sociedade é constituída por duas estruturas conceituais
antagonístas que abrangem a complexidade do fenômeno social, o mundo da vida e
a ordem sistêmica. A análise do indivíduo e seu processo de socialização e
individuação ocorreriam nesse contexto de mundo da vida e ordem sistêmica, e na
interrelação dinâmica entre as duas esferas (PINZANI, 2009).
O mundo da vida é a estrutura que, através da linguagem, permite o encontro
entre o falante e o ouvinte, formando os processos de entendimento entre os
agentes. Caracteriza-se por representar espaços públicos (institucionais) e privados
dominados pela família e pelas relações sociais, estruturado através de tradições
culturais e de processos socializadores. Constitui um arcabouço compartilhado
composto pelo saber cultural, pelas estruturas de universos simbólicos e os
componentes que servem à produção de identidades pessoais (HABERMAS, 2002).
É o espaço que serve de local para a prática comunicativa, servindo para a
20
renovação do saber cultural, integração social, criação da solidariedade e formação
de identidades (SIEBENEICHLER, 2003).
A estrutura que antagoniza o mundo da vida, na concepção de Habermas
(2002), é o sistema ou a ordem sistêmica. Essa estrutura se organiza em função da
burocratização e a racionalização da vida que neutralizam o mundo da vida com
ações instrumentais que restringem a autonomia do indivíduo. O sistema se
reproduz através dos processos econômicos (sistema dinheiro/capital) e
burocráticos (sistema poder), invadindo outros âmbitos da sociedade e
contaminando formas autônomas de vida. Assim, as lógicas de funcionamento
econômico e burocrático invadem e reproduzem-se no interior das relações sociais,
usurpando as formas autênticas de linguagem e transformando o universo de
códigos emancipatórios de conduta em uma forma empobrecida e padronizada de
relações que valorizam a monetarização e burocratização, invadindo, portanto, o
mundo da vida.
Nessa perspectiva, a teoria do Agir Comuncativo (HABERMAS, 2012)
entraria como uma explicação da atuação do indivíduo na luta entre a busca pela
manutenção do mundo da vida frente à força da ordem sistêmica. A ideia é de que a
linguagem seria o elemento mediador das interações no mundo da vida (agir
comunicativo), estruturada a partir da moralização dos motivos da ação e
estabelecimento de relações com o mundo e outros indivíduos através de normas
intersubjetivas e não impostas, movimentado pelo recurso da solidariedade. Por
outro lado, na ordem sistêmica, a ação que predomina é a técnica, mediada pelo
trabalho, movimentada pelo dinheiro ou poder burocrático (agir instrumental ou
estratégico). Quando percebemos a substituição da força da solidariedade pelo
poder monetário ou da burocratização, evidenciamos um processo de colonização
do mundo da vida pela ordem sistêmica. Essa colonização tem como consequência
processos patológicos e alienação (ALMEIDA, 2005; LIMA, 2010, HABERMAS,
2012).
2.1.2 Política de Identidade e Identidade Política
Na perspectiva do Sintagma, entendemos identidade como um rompimento
da dicotomia existente entre identidade pessoal e identidade social, pois
consideramos que toda identidade é social. Entretanto, mantém-se a concepção de
uma identidade coletiva a qual sugere que o processo de constituição da identidade
21
é influenciado pelas relações sociais do indivíduo. Ciampa (2005) aponta para essa
necessidade do reconhecimento do outro, com base nas proposições de Mead
(2005), e do senso de comunidade para a formação da identidade.
Especificamente, Ciampa (1987) sugere que o reconhecimento social
possibilita a identidade como uma forma de se perceber como ser humano, através
de identidades pressupostas pelo discurso social ou pela cultura (LIMA, 2010).
Nesse campo do reconhecimento do que é chamado por Habermas (2012) de
identidade de "papéis", a análise da constituição da identidade passa pela
percepção individual de identificação com o grupo ou papel significado através da
atividade, a prática.
Nesse sentido, Ciampa (2007) propõe o conceito de políticas de identidade
com base na utilização do termo por Goffman (1988), através do estudo do sujeito
estigmatizado. A idéia é de que a pessoa que possuiria algum estigma acaba
adotando também um conjunto de comportamentos e formas de expressão já
esperados pela cultura ou pela política que envolve tal papel. Como uma forma de
elucidação, imaginemos um atleta que desde cedo se dedica ao esporte: é
esperado deste que saiba desempenhar seu papel no campo ou na quadra, mas
não se espera que o seu aproveitamento escolar seja adequado, daí tiramos frases
como "atletas treinam o corpo e não a mente", ou como nos Estados Unidos que
existe até uma alcunha para esses jovens atletas, chamados de jocks. Diversos
estudos inclusive discutem o efeito do jock em contrapartida do estudante, que
seriam a mesma pessoa com identidades diferentes (MILLER & KATHLEEN, 2009).
Dessa forma, entende-se que as políticas de identidade configurariam uma
forma de agir comum a qualquer sujeito que pertencer a determinado grupo ou
adote um papel específico. Essa concepção define critérios, orientações às quais os
indivíduos devem adotar para serem reconhecidos, estabelecendo pontos de
identidades pressupostas e podendo ser idealizadas ou até feitichizadas, que não
favoreceriam a emancipação e a autonomia. Contudo, as políticas de identidade
também funcionam como um agente que catalisa as demandas individuais a partir
de uma identificação com as reinvindicações de um coletivo. Nessas situações,
estamos falando de um conceito que será melhor abordado na seção seguinte, mas
que se refere à noção de personagem, que representa o indivíduo em atividade, em
movimento, em seu processo de metamorfose buscando então aderir proposições
de uma identidade coletiva (política de identidade) como forma de obter
22
reconhecimento e proporcionar alterações na forma como se vê e percebe o mundo,
metamorfoseando o seu posicionamento e busca por emancipação (ALMEIDA,
2005).
Fica assim exposta uma dupla direção que pode ser atribuída à relação do
indivíduo com as identidades coletivas, um caminho no qual este se submete à
política de identidade proposta (sentido regulatório) e outro que resiste à esse
enquadramento e busca integrar suas noções identitárias a partir do que pressupõe
a cultura do grupo, assumindo então uma identidade política (sentido emancipatório)
(CIAMPA, 1987; ALMEIDA, 2005). O primeiro sentido, regulatório, ocorreria quando
as pressuposições de determinado grupo social geram regras normativas que
prejudicam a autonomia do indivíduo, restringindo as representações de sua
identidade e direcionando para a heteronomia do sujeito. Quando trabalhamos as
políticas de identidade como instrumento de regulação, estamos nos referindo às
situações em que essas políticas são utilizadas de forma ideológica para a
manutenção de uma determinada realidade instituída, não possibilitando a
expressão da subjetividade individual (GUARESCHI, 2000).
Já o segundo sentido ocorre quando a adoção da política de identidade
favorece o enfrentamento da opressão da ordem sistêmica, direcionando o indivíduo
para a mudança ou transformações em si e no seu contexto a partir do equilíbrio
das desigualdades e das demandas grupais frente ao poder burocrático e/ou
monetário, direcionando para maior autonomia e movimentos emancipatórios
(CIAMPA, 2002). Diferente do conceito de política de identidade, a identidade
política permite verificar as metamorfoses do indivíduo como metamorfoses também
do grupo gerando novos espaços de expressão da identidade e dos interesses
pessoais, mobilizando os mais amplos do grupo (LIMA, 2010).
Nesse sentido, identidade política aparece como o conceito que antagoniza a
dominância das políticas de identidade no entremeio do processo de construção da
identidade. Identidade política é definida como aquela que envolve elementos que
proporcionam: (a) igualdade como a associação a motivações, ideias e grupos que
favoreçam ao reconhecimento e apoio no seu processo de metamorfose e
enfrentamento à opressão, mas sem restringir sua expressão à politicas de
identidade impositivas, e (b) diferença pela identificação a uma identidade coletiva
em oposição a outras possibilidades (CIAMPA, 2002). Como um atleta que, ao se
identificar como atleta de futsal, se nega como atleta de futebol de campo ou de
23
voleibol, adquirindo assim elementos da política de identidade do contexto do futsal,
podendo integrá-las em sua própria noção identitária num sentido regulatório ou
emancipatório. Contudo, identificar-se como atleta não exclui outros aspectos de
sua identidade como filho ou pai de família, participante da comunidade, estudante,
entre outros. Assim, uma identidade política configura a integração de uma nocão
de identidade coletiva sem que isso direcione para uma incorporação dessa
identidade coletiva, negando outros componentes, alienando-se no processo de
metamorfose e fechando-se à solidariedade universal (LIMA, 2010).
Para avançar na concepção de política de identidade e identidade política,
Lima (p.194) aponta que:
[...] Quando o indivíduo se submete à política de identidade proposta, diz-se
que se ajustou ao instituído, tornou-se alienado. Além disso, existem
indivíduos que resistem ao enquadramento e buscam ser conhecidos a partir
da coordenada onde estão localizados, neste caso, colocando-se como
pontos fixos, os quais a política de identidade deve tensionar para
reconhecer o que está sendo representado [...]
Esse fragmento aponta para a idéia de que indivíduos que resistem à
opressão das políticas de identidade modificam o grupo no qual estão inseridos,
gerando movimentações nas concepções de socialização que obrigam a política de
identidade a se "tensionar" para reconhecer o que está sendo representado pelo
indivíduo. No esporte, podemos elencar alguns exemplos de como esse processo
veio modificando a concepção de ser atleta de futsal ou futebol de campo, por
exemplo:
2.1.3 Sintagma Identidade-Metamorfose-Emancipação
Os elementos centrais da concepção de construção de identidade de Ciampa
e estudados pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfose
(NEPIM-PUC-SP) são contemplados pelo Sintagma Identidade-Metamorfose-
Emancipação. A ideia de sintagma envolve três elementos centrais, que são a
Identidade, o processo de metamorfose e a busca por emancipação. Esta seção
apresentará os conceitos relacionados à noção do Sintagma e Metamorfose,
enquanto a ideia de Emacipação será melhor abordada na seção seguinte.
A construção da identidade se dá a partir da perspectiva de que o indivíduo é
ao mesmo tempo composto por singularidade e individualidade, de forma que se
24
identifica com as concepções culturais e também se diferencia pela conjunção de
singularidades, formando uma indvidualidade. Como posiciona Ciampa (1987): "o
indivíduo é a indiferença de todas as determinidades, de modo que se exibe
enquanto totalidade, ao passo que do ponto de vista ontogenético, enquanto
individualidade, o EU é a diferença de todas as determinidades, é uma vivente
forma e se reconhece como tal" (p. 142).
É na singularidade que o indivíduo se diferencia dos demais por se identificar
com papéis ou grupos, mas, ao mesmo tempo, se iguala às motivações ou causas
coletivas frente à sociedade. Eu me diferencio dos demais porque sou um jogador
de futsal, não sendo um professor ou empresário, mas ao mesmo tempo me
equalizo com os outros jogadores de futsal, perante a sociedade, pela presença no
mesmo contexto, com objetivos semelhantes e demandas parecidas. Por outro lado,
na individualidade eu nego essas determinações impostas e me reconstruo a partir
da minha subjetividade, que congregra as diferentes singularidades e atividades que
escolho exercer. Mesmo sendo um jogador de futsal, eu sou um goleiro, de um time
qualquer, que resido na região sul do Brasil, com descendência negra, com dois
filhos, que gosta de jogar vídeo games e pratica o Budismo como religião. Essa
concepção é determinante para a perspectiva do Sintagama porque define que
identidade é um processo psíquico influenciado pelo social, mas a identidade se
constrói socialmente e está intrinsecamente relacionada às alterações do social,
alinhada com a perspectiva de que e identidade é, ao mesmo tempo, política.
Da mesma forma, como o ser humano só se torna humano a partir da
ascensão da linguagem (HABERMAS, 2012), a identidade, de forma semelhante, é
determinada pelo discurso social que envolve determinadas noções de
singularidades. Assim, compreender a narrativa e as conexões linguísticas sobre a
história de vida do indivíduo são importantes para caracterizar o processo de
construção da identidade (LIMA, 2010). De forma semelhante, a análise deste
discurso permite evidenciar de que forma a identidade se modifica, ou entra em
metamorfose regulada pela opressão sistêmica ou direcionada para a emancipação.
Essas significações verificadas no discurso sobre identidades apresentarão de que
forma a subjetividade do indivíduo articula-se na busca por reconhecimento social,
com a identidade representando a luta política de conjunção entre a objetividade da
natureza, a normatividade da sociedade e a intersubjetividade da linguagem
(HABERMAS, 1983).
25
Como foi exposto, acreditamos que a identidade entre em metamorfose ao
longo do percurso histórico do indivíduo, conforme este desempenha suas
atividades. Identidade é metamorfose, é a capacidade do indivíduo em construir
novas identidades, frente a situações conflitivas, harmonizando com as identidades
anteriores, agora superadas (CIAMPA, 2009). Esse caráter de metamorfose
também diz respeito à identidade enquanto função política, como uma manifestação
frente às estratégias de dominação. Esse sujeito em construção não existe como
algo imutável, com predicações estabelecidas, mas é uma concepção de ser como
devir, compreendida por meio das mudanças estabelecidas através dos sentidos
dados ao si e ao seu projeto de vida (CIAMPA, 1987).
Nessa concepção, metamorfose não é algo atribuído ao indivíduo, passivo no
seu processo de desenvolvimento. A pessoa é, ao mesmo tempo, produto e
produtor, autor e personagem, que se constitui a partir da sua atividade,
contextualizada num ambiente e num percurso histórico. Essas transformações são
originadas pelo próprio sujeito, "ele é o que faz" (CIAMPA, 1987, p. 135). Essas
metamorfoses identitárias constituem-se como uma ação política voltada para uma
tentativa de escapar do processo de colonização da ordem sistêmica, completando
o sintagma que sugere identidade enquanto metamorfose e emancipação, que pode
vir a surgir como fragmento para algum aspecto da identidade do indivíduo, ou
apenas como utopia emancipatória, funcionando como meta visada ou como
sensação de falta (CIAMPA, 1997).
Para que a emancipação exista, seja como fragmento ou mesmo como
utopia, o agir comunicativo, através da linguagem, precisa alcançar uma unidade
entre a subjetividade e a objetividade, "sem essa unidade, a subjetividade é desejo
que não se concretiza, e a objetividade é finalidade sem realização" (CIAMPA,
2009, p. 151). Essa unidade pode ser percebida pela congruência da atividade com
o compromisso pessoal com o projeto de vida, que pode acontecer via
metamorfoses. A expressão de si como outro de si, que não apenas é o que se
espera ser, caracteriza a metamorfose da identidade, que supera a identidade
pressuposta (CIAMPA, 1987).
Para ilustrar, se projetarmos um atleta que consegue unidade entre o atleta
(pai) que gostaria de dar mais atenção para a família e filhos (projeto de ser pai),
dificilmente conseguirá uma unidade com sua atividade presente enquanto precisa
se distanciar para jogar pelo clube que paga o melhor salário ou permite maior
26
desempenho (atleta/desempenho). Dessa forma, Ciampa (2009) sugere que ao
passar a se representar (1o sentido - como representante de si) acaba se tornando
um ser diferente de si por representar um outro dele mesmo (2o sentido -
desempenhando um papel - o atleta que se espera que ele seja, que o determina
enquanto atividade, e assim o limita). Ao se representar (o papel) o invidíduo acaba
por repor a si no seu presente – 3o sentido: re(a)presentar – sem conseguir
expressar o outro que também é ele (atleta pai, que é mesmo sem estar sendo).
Quando o sujeito deixa de se representar (no 3o sentido), conseguiria expressar um
outro de si que também faz parte dele (atleta pai), negando a sua própria negação
em ser algo que é mas não se projeta (representar no 2o sentido).
Em sequência, apresentaremos alguns conceitos que facilitarão a
compreensão da concepção teórica do sintagma (Figura 1).
Figura 1. Diagrama do modelo teórico do Sintagma Identidade –
Metamorfose – Emancipação.
27
Personagem
Como já foi mencionado, identidade se caracteriza pelo indivíduo em
atividade, que se movimenta e se modifica dado um conjunto de sentidos atribuídos
em determinado período histórico. Dessa forma, ao exprimir o sujeito em ação, este
coisifica sua atividade sendo entendido como um Personagem, alguém que é autor
e ator de sua própria história (CIAMPA, 1987). Personagem é o nome ou a
interiorização (sentido) que o indivíduo atribui às predicações (identidades
pressupostas) dadas pelo outro, gerando reconhecimento social (Figura 1).
Exemplificando, ser atleta é adotar o Personagem de atleta, no contexto
esportivo. A identidade, por sua vez, se constitui a partir da articulação de diferentes
personagens que encenamos conjuntamente (ALMEIDA, 2005) – adicionamos aqui
essa articulação que se dá numa perspectiva horizontal (diferentes personagens
constituindo uma mesma identidade) e vertical (personagens sendo substituídos por
novos personagens) e, que se sucedem num processo de metamorfose, numa
direção de progressão (para emancipação) ou regressão (para a reposição ou
repetição de personagens).
Essa concepção da identidade como expressão de personagens caracteriza
que a manifestação do indivíduo só ocorre a partir de personagens, de forma que
não existe vida sem uma representação de personagem. Ainda, a identidade é
constituida de diversas personalidades simultaneamente, portanto, é impossível
expressar a totalidade do indivíduo, sendo sempre um representante de si mesmo
(CIAMPA, 1987). Contudo, essa expressão da identidade em personagem não pode
se limitar ao substantivo, ou ao papel, desconsiderando a atividade do indivíduo
sobre seu personagem. O não agir, não vir-a-ser do indivíduo pode levar a confusão
do personagem com o papel, que caracterizaria uma atividade previamente
padronizada como tentativa de controle-regulação da autonomia, podendo
possibilitar a colonização da ordem sistêmica sobre o agir e resultando em
metamorfoses que não progridem para a emanipação. Não obstante, vale ressaltar
que nem toda metamorfose sugere uma progressão na luta contra a opressão e em
busca da emancipação, às vezes uma metamorfose pode ocorrer, como já dito,
alterando um personagem, que não gera emancipação, mas proporciona um
movimento, uma ação mesmo que na direção da sensação de falta de
emancipação.
28
Nesse sentido, quando o processo de metamorfose não resulta em uma
alternação do personagem, tornando-se uma reposição do personagem (e
manutenção do papel ou da política de identidade), pode acontecer o que foi
chamado de feitichismo do personagem (LIMA, 2010). Um personagem feitichizado
é aquele que se parece com uma metamorfose, mas é uma repetição do mesmo
papel. Proporciona ao indivíduo uma impossibilidade em atingir a concretização de
um projeto de vida, que dá uma impressão de não-metamorfose e impede o
indivíduo de se autodeterminar. Esse feitichismo do personagem é associado à um
processo de produção da identidade, como um reforçamento desse produto
(personagem feitichizado) a partir do seu valor de mercado (social ou monetário -
como um atleta e o uso de sua imagem comercial), de forma que se busca a
preservação do status, por um interesse sistêmico e não humano.
Tal fenômeno é melhor compreendido com a explicação do processo de
mesmice x mesmidade, descrito a seguir.
Mesmice X Mesmidade
A dualidade entre a perspectiva de metamorfose e aparência de não-
metamorfose descrita anteriormente é fruto da necessidade dos seres humanos em
obter reconhecimento. A busca por reconhecimento pressupõe uma identidade
através da política de identidade, por meio do reconhecimento de papéis. Esse
movimento por reconhecimento explicita um jogo de alternância de personagens,
que pode ser positivo ou negativo na perspectiva da luta por emancipação
(CIAMPA, 1987). Essa articulação é resultado da dicotomia entre o que o individuo
tem como atividade e o que é pressuposto a ele pelas políticas de identidade.
Como dito antes, a aparência de não-metamorfose representa um momento
onde a articulação de personagens não parece demonstrar grandes mudanças para
a identidade, dando uma falsa impressão de não-movimento, ou de cristalização da
identidade. Entretanto, o processo que está acontecendo, longe de uma estabilidade
da identidade, é uma sequência de metamorfoses que funcionam como reposição
dos personagens, pela manutenção do status (CIAMPA, 2005). A essa situação de
reposição de identidade, também chamado de alteridade, deu-se o nome de
mesmice, um processo que por vezes pode ser mais desgastante para o indivíduo
que a própria metamorfose em busca da emancipação.
29
Pensando num atleta em transição para o fim da carreira, que é uma
mudança significativa no contexto que inflinge uma necessidade de mudança
também no processo identitário, o fluxo natural da construção identitária desse
alteta seria adotar um personagem de ex-atleta, podendo procurar outras formas de
carreira no esporte mesmo (treinador, por exemplo) ou fora dele, de acordo com o
seu projeto de vida. Mas, caso esse mesmo atleta opte por entrar num processo de
mesmice identitária, fazendo uma reposição de sua personagem de atleta, pode
acabar tendo maior desgaste para se manter no contexto esportivo, muitas vezes
aceitando situações mais precárias, uso de substâncias ilegais ou até mesmo
desenvolvimento de patologias. Esse processo de mesmice pode ser desencadeado
tanto por características do atleta (como um feitichismo do personagem - não querer
abandonar a fama, o status, o rendimento financeiro), como por condições externas
(ambientais - como a falta de preparação para a transição com uma formação
vocacional).
O contraponto da mesmice é o fenômeno da mesmidade, que se refere à
superação do personagem reposto, do feitiche, pelo indivíduo. Esse processo é
representado pela expressão da metamorfose, do outro que também sou eu, um
novo personagem que vem complementar a identidade com conteúdos não
autoritariamente predefinidos, direcionando o indivíduo para maior autonomia frente
à opressão da ordem sistêmica (LIMA, 2010, p. 164-165). Enquanto a mesmice é
marcada por mudanças quantitativas na identidade, a mesmidade representaria um
conjunto de mudanças qualitativas, que envolveriam a aprendizagem de novos
conhecimentos, normas, habilidades, e que são propotas pelo próprio indivíduo
autodeterminado (ALMEIDA, 2005).
2.1.4 Emancipação, autonomia e riqueza de papéis
Habermas (2012) discute a existência de duas estruturas antagônicas no interior da
sociedade, o sistema e o mundo da vida. O sistema se reproduz por meio dos chamados
processos econômicos (dinheiro) e burocráticos (poder), que invadem outros âmbitos da
sociedade e acabam por contaminar formas autônomas de vida. Contaminação no sentido
de reproduzir no interior das relações sociais, usurpando as formas autênticas de
linguagem, transformando o universo de códigos emancipatórios de conduta, que acabam
por valorizar a monetarização e burocratização, invadindo, desta forma, o mundo da vida. O
chamado mundo da vida, por sua vez, representa os espaços públicos (institucionais) e
30
privados (família, relações sociais). Constitui-se assim, um arcabouço compartilhado,
composto pelo saber cultural, pelas estruturas de socialização e os componentes que
servem à produção de identidades pessoais.
Seguindo a ideia de socialização, Habermas (2012) apresenta o conceito de razão
comunicativa, que orientada ao entendimento, aponta para a questão da emancipação,
defendendo a conjectura de que um potencial emancipatório existe em qualquer
proferimento, na intenção de compreender os sentidos das produções simbólicas
democráticas e autônomas. Mas é complexa a tarefa de se pensar em homens
emancipados, em pleno exercício da razão, capazes de se entender como outros na esfera
pública democrática (HABERMAS, 2003; FENERICH, 2013), o ideal seria considerar que “a
emancipação resulta da conquista de uma razão autônoma em relação ao sentido”
(FENERICH, 2013, p. 652). A realização de projetos emancipatórios, é dificultada por uma
interiorização a-crítica de normas (heteronomia), pois neste caso o sujeito só se reconhece
através de um projeto que seja baseado em relações de dominação (CIAMPA, 2002).
Autonomia pode ser pensada como o resultado de um processo de maturação e
descentração do eu e do grupo, neste sentido a descentração é considerada uma evolução
do sujeito da heteronomia para a autonomia, realizando o processo de emancipação da
autoridade da regra e da coerção do grupo e formando autônomamente seus padrões de
julgamento, bem como suas concepções de regras, sem a interferência de terceiros (LA
TAILLE, 2006; FREITAG, 1989). Ocorre então uma alteração no modo como o sujeito se vê
a si mesmo e se percebe no mundo, além do modo como se posiciona frente a este mundo,
reivindicando assim autonomia e reconhecimento (CIAMPA, 2002; ALMEIDA, 2005).
Em suas discussões sobre moral, Habermas (1990) postula o processo de busca do
sujeito a uma liberdade moral e política, que teria a universalização de uma máxima de
ação estabelecida como norma, conduzida pela experiência mental do sujeito, e pelas
condições de autonomia de consciência. Ponto que Kant considera como autonomia da
vontade, entendida, por assim dizer, como internalização refletida da competência
comunicativa no sentido de sua estrutura ideal contrafaticamente antecipada (APEL, 1994).
A autonomia, no entanto, não é um conceito distributivo e não pode ser alcançada
individualmente. Assim, um sujeito só pode ser livre se todos os outros também forem,
Habermas (2013) sublinha então, que a noção de autonomia já discutida por Kant, introduz
um conceito que só pode ser explicitado plenamente dentro de uma estrutura
intersubjetivista.
Autônomo é o sujeito que goza de liberdade, com ações não decorrentes de uma
forma de poder exterior, e não irremediavelmente determinado por forças internas sobre as
quais a vontade não exerce influência alguma. Além disso, é também autônomo quem
31
legitima regras, princípios e valores morais sem referência a uma fonte que o transcende,
sem referência, portanto a figuras de autoridade como Deus (LA TAILLE, 2006).
2.2 Modelos de desenvolvimento de talentos esportivos e carreira atlética
Miller e Kerr (2002) colocam que a busca pela excelência no esporte pode
prejudicar as chances do indivíduo para conquistar a excelência pessoal. Frente a
isto, Vieira (1999) aponta que o desenvolvimento da carreira atlética deve estar
relacionado ao processo de crescimento e desenvolvimento individual, devendo a
iniciação ser planejada levando em consideração as fases de desenvolvimento da
criança. Nesse sentido, diversos estudos propuseram modelos para o
desenvolvimento atlético, caracterizando as etapas evolutivas. Esses modelos são
importantes para os profissionais do esporte porque relatam características e
valores específicos para o processo de desenvolvimento em cada momento da
evolução do atleta (BARREIROS, 2005).
Bloom (1985) estudou talentos em diferentes áreas do conhecimento e
delimitou estágios comuns de desenvolvimento, apesar das diferenças entre as
fases. O autor analisou o desenvolvimento de talentos em três áreas: atlética ou
motora; musical ou artística; intelectual e cognitiva.
Os estágios propostos por Bloom (1985) foram: anos iniciais, anos
intermediários e anos finais, delimitando em cada fase as características próprias
em relação ao envolvimento do atleta, professores e pais. Nos anos iniciais as
crianças estão começando a se envolver com o esporte e o objetivo mais importante
é o divertimento. Quando as crianças começam a competir, os pais são os principais
incentivadores e compartilham o prazer e aproveitamento dos filhos (WUERTH,
2004). Nessa fase os jovens evoluem de um contato inicial com o esporte a um nível
de especialização em um papel ou modalidade. Aqui as crianças enfrentarão um
esporte organizado em sessões de treinamento, competições aos finais de semana
e em feriados, maior carga física de treinamento e demanda psicológica
(STAMBULOVA, 2008). É aconselhado, nesta fase, que a criança experimente
diferentes modalidades esportivas com o foco do divertimento e ludicidade
(WYLLEMAN, 2007).
Nos anos intermediários, aumenta-se o comprometimento com o esporte e a
criança muda o foco da prática para o aprimoramento das habilidades e técnicas
com competições de maior nível. Nessa fase, que se inicia entre os doze/treze anos
32
de idade e vai até os dezoito anos, os jovens atletas se comprometem intensamente
com o esporte e se percebem como sendo talentosos ou promissores, com
capacidade de alcançar o alto nível de rendimento (WYLLEMAN, 2000). Além disso,
os jovens talentos precisam agora lidar com novas cargas de prática, maior
freqüência e especialidade de treinamentos, necessidade de maior preparo físico e
psicológico para as competições e maior expectativa dos pares sociais pelo
desempenho atlético.
Nos anos finais, os atletas são considerados obcecados com o esporte, e a
responsabilidade e independência são características desta fase. O nível das
competições alcançou o alto rendimento, assim como a pressão pelo desempenho e
as demandas em treinamentos (SALMELA et al, 2007). Essa fase requer do atleta o
desempenho em seu nível mais elevado, de forma consistente e com a maior
constância possível. A busca pela profissionalização faz com que o foco dos
objetivos pessoais dos atletas esteja voltado exclusivamente para o esporte,
envolvendo alta intensidade e freqüência de treinamento e maior número de
competições (BLOOM, 1985).
Por outro lado, com ênfase na influência do contexto social no
desenvolvimento de talentos esportivos, sabe-se que as crianças necessitam do
suporte de um grande número de indivíduos para desenvolver seu talento, assim,
pais, técnicos, mentores, amigos e instituições (colégios, clubes, escolas esportivas)
devem auxiliar no desenvolvimento do talento. Ambientes familiares integrativos,
que oferecem condições estáveis entre os membros da família, com clima de
suporte e que favorecem a individuação e autonomia foram ressaltados como o
ambiente que propicia melhor estímulo para o desenvolvimento do talento
(CSIKSZENTMIHALYI et al, 1997). Nesta perspectiva, o talento não pode existir
sem o suporte social, reconhecimento e envolvimento de pares sociais (pais,
técnicos, professores, familiares, entre outros) (BARREIROS, 2005).
Outra perspectiva para o suporte teórico do desenvolvimento de talentos
esportivos que será utilizada neste estudo foi proposta por Cotè (1999), que
construiu um modelo constituído de etapas de participação esportiva (Figura 2). Tal
modelo é composto por três períodos: o primeiro vai desde a infância (anos de
experiência), passando por uma etapa intermediária (anos de especialização) para
terminar no final da adolescência (anos de investimento).
33
Figura 2. O modelo desenvolvimental de participação esportiva (Fonte adaptada: CÔTÈ;
BAKER; ABERNETHY, 2007, p. 197).
Os anos de experiência referem-se à faixa de seis a doze anos e têm os pais
como principais influências para a entrada e desenvolvimento do interesse do filho
pelo contexto esportivo. A experiência diversificada entre as modalidades esportivas
é importante neste estágio para o desenvolvimento de capacidades motoras
básicas. O foco das atividades está no prazer e divertimento que os atletas sentem
ao praticar o esporte (COTÈ, 1999).
Estas atividades são caracterizadas por serem jogos que não envolvem a
presença de adultos, podendo ser realizados em diversos lugares (sendo adaptados
para cada modalidade). As regras são feitas pelas pessoas que participam,
ocasionando prazer, motivação, flexibilidade e qualidade de vida. Em contrapartida,
as práticas deliberadas são realizadas sempre com um propósito – seja para
melhorar as habilidades motoras ou psicológicas – com envolvimento de adultos na
maior parte do tempo e trabalhada por regras e específicos ambientes, sendo estes
34
exercícios muitas vezes desagradáveis e rígidos (CÔTÈ; BAKER; ABERNETHY,
2007).
Por volta dos treze anos inicia-se o estágio da especialização, no qual o
atleta sofre maior influência de professores e colegas definindo seu interesse para
um ou dois esportes. O interesse por atividades alheias à prática do esporte diminui,
mas o divertimento e a brincadeira ainda se sustentam como elementos centrais da
vivência esportiva. Inicia-se o treinamento específico, num aumento do volume de
prática com o objetivo de desenvolver habilidades esportivas específicas (COTÈ,
1999). A presença dos pais é caracterizada pela ênfase no desempenho do atleta
tanto no esporte como na escola, compromisso financeiro e de tempo com o atleta,
e aumento no interesse pelo esporte do filho (SALMELA et al., 2007). Desta forma,
existe um aumento de horas de treinamento e maior quantidade de campeonatos a
ser disputada, necessitando de maior dedicação para o esporte (CÔTÈ; HAY, 2002).
A presença do treinador e dos professores é maior nesta fase, os quais apresentam
maior interesse pessoal, esperando grandes resultados pela disciplina e trabalhos
mais fortes (WOLFENDEN; HOLT, 2005).
No estágio do investimento, o forte compromisso do atleta para alcançar o
alto nível e o desempenho em um esporte específico é evidenciado: a carga de
treinamento aumenta, assim como a dedicação à carreira atlética. O interesse dos
pais no esporte também aumenta e o suporte parental fica evidente como essencial
para que o atleta enfrente as demandas dos treinamentos e da competição (COTÈ,
1999; VIANNA JUNIOR, 2002).
Cotè (1999) aponta ainda para uma quarta fase, chamada de recreacional,
que pode ser alcançada através de qualquer fase anterior e é caracterizada pela
integração das atividades prazerosas e que busquem a saúde. O atleta que vai para
a fase recreacional pode regressar ou ingressar pela primeira vez na etapa de
investimento. Um último aspecto abordado pelo modelo é que um indivíduo que
inicia uma prática esportiva pode abandoná-la a qualquer momento, principalmente
se o divertimento e o aperfeiçoamento de habilidades não forem presentes (Figura
2).
A passagem dos atletas para os anos de especialização antes do tempo
pode acarretar em diversos fatores influenciadores na desistência do esporte.
Estudos realizados por Wolfenden e Holt (2005) observaram que atletas que
decidiram focar em um esporte específico com idade inferior (abaixo dos 10 anos)
35
tiveram um pico de performance antecipado e sem oportunidade de praticar outras
atividades, tendo dificuldades de adaptação na transição de fases por serem mais
novos que os demais competidores/companheiros. Além disso, os treinamentos
esportivos muitas vezes não são agradáveis e divertidos, havendo diminuição da
motivação intrínseca e posteriormente a desistência do atleta da modalidade
(WALL; CÔTÈ, 2007) (Figura 2).
Os atletas progridem em suas carreiras quando conseguem lidar com as
tarefas e demandas de cada estágio das mesmas. A superação destes estágios e a
mudança de uma fase para outra é considerada uma transição, que é definida por
Scholssberg (1981, apud ERPIC, 2004) como um evento que resulta em mudanças
na crença sobre si mesmo e sobre o mundo, a qual requer uma modificação
correspondente no comportamento e relacionamento do indivíduo (WYLLEMAN &
LAVALLEE, 2003) (Figura 2).
A estruturação de um programa esportivo tem sido importante para que
atletas consigam chegar neste pico de performance, devendo incentivar a
comunicação dos atletas com outros agentes sociais (família, técnico e
professores), podendo ajudar em problemas (estresse, desmotivação, fadiga) que
os indivíduos passam ao longo da carreira (FRASER-THOMAS; CÔTÈ; DEAKIN,
2008). Assim, como na fase de experimentação, o atleta tem a opção de abandonar
a modalidade que pratica e mover-se para o esporte recreativo daquela modalidade
ou tentar avançar a maiores níveis de desempenho (BAILEY et al., 2010). Apesar
dos estudos classificarem as fases e transições do desenvolvimento da carreira
esportiva, deve-se entender que estas trajetórias variam de acordo com o esporte
praticado pelo atleta (como no caso da ginástica), sistemas esportivos, normas
sociais e a cultura de cada região (CÔTÈ; BAKER; ABERNETHY, 2007;
STAMBULOVA et al., 2009).
Para este estudo com os atletas de futsal, optamos pelo modelo de
desenvolvimento atlético de Cotè (1999), sobre o de Bloom (1985), por acreditarmos
se aproximar mais da realidade da modalidade no Brasil. A principal diferença entre
os modelos teóricos é o período de abrangência de cada estágio: para Bloom (1985)
os anos intermediários (desenvolvimento) ocorrem dos catorze aos dezoito anos,
enquanto para Cotè (1999), na segunda fase de especialização, a abrangência vai
dos treze aos quinze anos, como evidencia o Quadro 2.
36
Quadro 1. Comparação entre as fases de desenvolvimento atlético de Bloom (1985) e Cotè
(1999)
BLOOM (1985) Idade COTÈ (1999) Idade
Anos Iniciais 6 – 13 anos Experimentação 6 – 12/13 anos
Anos Intermediários 14 – 18 anos Especialização 13 – 15 anos
Anos Finais 19 anos ou mais Investimento 15 anos ou mais
Essa escolha pelo modelo de Cotè (1999) ocorreu por se entender que este
modelo se adapta melhor à realidade das transições atléticas na atualidade, as
quais acontecem mais cedo e com maior comprometimento, além de diversos
estudos atuais optarem pelo modelo de Cotè (1999) como suporte teórico para as
transições atléticas em diferentes contextos esportivos (MORAES et al., 2004;
BARREIROS, 2005; SALMELA et al., 2000; VISSOCI, 2009).
2.3 Parâmetros do contexto na perspectiva da Teoria Bioecológica
O desenvolvimento humano é considerado um conjunto de processos nos
quais as propriedades da pessoa e os parâmetros do ambiente produzem mudança
nas características do indivíduo durante o seu crescimento, a partir de sua interação
(BRONFENBRENNER, 1995). Dessa forma, o desenvolvimento é caracterizado
como um processo ativo do ser humano em interação com o seu ambiente e nas
relações interpessoais que estabelece com todos que participam direta ou
indiretamente do mesmo contexto.
Entretanto, não é o ambiente real em si que influencia o comportamento de
desenvolvimento de uma criança, mas sim a percepção ou interpretação deste
contexto feito pelo indivíduo em desenvolvimento (BRONFENBRENNER, 1993).
Assim, para o estudo da influência do contexto no desenvolvimento humano é
necessário investigar a percepção desta influência na perspectiva do indivíduo além
dos parâmetros reais do contexto. Portanto, somente analisar as qualidades
objetivas de um ambiente sem levar em consideração o sentido dessas qualidades
para o indivíduo não representa uma análise da ecologia do desenvolvimento
humano (KREBS, 1997).
Para a execução da tarefa de análise das alterações no comportamento ao
longo do ciclo de vida do indivíduo, Bronfenbrenner (1996) propõe a investigação de
ocasiões selecionadas visando verificar o que o autor chamou de “transições
ecológicas”. As transições devem ser escolhidas pelo efeito significante nas
37
capacidades ao longo do desenvolvimento da criança (VIEIRA, 1999). Uma
transição ecológica é definida por Bronfenbrenner (1987) como:
Uma conseqüência e um processo instigador do desenvolvimento. Assim, do
ponto de vista de pesquisa, compõe toda transição ecológica uma experiência de
natureza constituída de um design ‘antes-depois’, no qual cada sujeito pode atuar
como controle dele próprio. Em resumo, uma transição ecológica fixa o estágio de
ambos (antes-depois) para a ocorrência e o estudo sistemático do fenômeno
desenvolvente (p. 17).
O objetivo do estudo das transições ecológicas está na busca pela
caracterização do ponto de transição a partir dos fatores que precipitaram a
transição e os efeitos que esta situação produziu no indivíduo em desenvolvimento.
Os efeitos das transições refletem a relação entre o potencial dos atributos pessoais
do sujeito e a influência dos parâmetros do contexto (BRONFENBRENNER, 1995).
A relação entre os atributos da pessoa e do contexto foi definida por
Bronfenbrenner (1995) como um paradigma bioecológico, o que corresponde ao
estudo da relação entre os traços pessoais e a interação entre as experiências
ambientais determinando o resultado do desenvolvimento. A perspectiva é de que
os processos psicológicos como cognição, motivação, emoção, entre outros,
possuem um conteúdo externo, baseados nos elementos do contexto
(BRONFENBRENNER & CECI 1994).
O modelo bioecológico (Figura 3) sustenta-se então a partir de quatro
domínios: a) as características pessoais do sujeito presente nesse contexto; b) o
processo através do qual o desenvolvimento emerge; c) o contexto no qual o
desenvolvimento ocorre; e d) a dimensão temporal ao longo da qual o
desenvolvimento acontece (Figura 2).
Os dois elementos centrais do paradigma são os atributos pessoais e os
parâmetros do contexto. O contexto, conforme proposto por Bronfenbrenner (1993),
é um conjunto de estruturas que se inter-relacionam e se completam, cada qual
envolvendo a estrutura anterior. Para Bronfenbrenner (1992), o processo de
desenvolvimento humano não pode ser definido sem levar em consideração a
variável tempo, partindo da premissa da ocorrência do desenvolvimento ao longo do
ciclo de vida, como um processo contínuo que ocorre dentro de um período
cronológico. Assim, o autor propõe a existência do cronossistema, o qual
compreende o período histórico-social no qual ocorre o ciclo de vida, que serve
38
como pano de fundo para os eventos ambientais e as transições. Explico que o
nosso interesse principal aqui é proporcionar informações suficientes sobre o
contexto relacionado ao fustal para compreender então a relação entre o contexto e
a formação da identidade do alteta (Figura 3).
Figura 3. Elementos da teoria bioecológica do desenvolvimento do talento esportivo
(KREBS et al., 2011).
Parâmetros do Contexto
Bronfenbrenner (1999) dá grande ênfase à influência do contexto ecológico
para o processo de desenvolvimento humano. Sua perspectiva sistêmica do
contexto pode proporcionar uma visão didática e explicativa da influência do
contexto no desenvolvimento, de forma interligada ao indivíduo. Apesar de partirem
de pressupostos epistemológicos levemente diferentes, verificamos uma
convergência com a proposição de Ciampa (1987) no que concerne à definição de
39
identidade como elemento social, indissociável do processo de socialização
humana. Ainda, na avaliação da constituição identitária, Ciampa (2005) também
sugere a investigação do processo numa perspectiva temporal-histórica (através do
método de história de vida), verificando as características políticas e contextuais e
sua influência no processo de individuação.
Dessa forma, a percepção sistemática de contextos proposta por
Bronfenbrenner (2005) permite analisar o ambiente em camadas, desde a mais
próxima ao indivíduo até a mais distante e generalista, envolvida por uma noção de
evolução temporal cronológica e subjetiva do indivíduo.
Grande ênfase é dada para a importância do sentido atribuído pelo indivíduo
à sua experiência com o contexto e suas interrelações. Em um nível mais próximo
da pessoa estão os ambientes nos quais ela participa ativamente como o time de
futsal no qual joga, sua família, escola, entre outros. A segunda esfera envolve a
estrutura de inter-ligações entre os ambientes do indivíduo, como escola-time de
futsal, definido através da maneira como o sujeito vivencia sua participação nos dois
ambientes e como estes se interferem. A terceira camada insere contextos que
influenciam o processo de desenvolvimento de forma indireta, nos quais o indivíduo
não participa ativamente, como a família do treinador ou direção do clube que o
deseja contratar. Envolvendo esse sistema ecológico aparece a camada final que
envolve a cultura, política, legislação que envolvem os outros ambientes no qual a
pessoa está inserida. Finalmente, esses ambientes ecológicos se situam em uma
perspectiva temporal-histórica cronológica ou percebida como evolução pelo sujeito
(Figura 3).
Microssistema-mesossistema-exossistema-macrossistema
O microssistema é a estrutura básica de análise do modelo proposto por
Bronfenbrenner (2005). É a partir dessa definição que se estrutura a interpretação
das outras camadas dos parâmetros do contexto do modelo bioecológico. O
microssistema é caracterizado a partir da análise dos padrões de atividades,
relacionamentos interpessoais e papéis experimentados pelos atletas em
desenvolvimento ao longo da carreira esportiva que facilitaram ou inibiram o
engajamento em atividades mais complexas. As atividades são consideradas como
o principal vínculo para a influência direta do ambiente sobre a pessoa em
desenvolvimento.
40
Bronfenbrenner (1995) definiu dois tipos de atividades, as moleculares e as
molares. As atividades moleculares são aquelas executadas pelo sujeito, mas que
têm pouca importância ou significado. Já as molares, por sua vez, são aquelas que
apresentam significado para o sujeito e para outras pessoas do ambiente,
demonstrando persistência ao longo do tempo. Por exemplo, jogar basquete na
escola pode caracterizar uma atividade molecular, com pouca significância, mas
jogar futsal na escolinha já proporciona relevância para a carreira do atleta.
A caracterização de uma atividade molar é feita a partir de algumas
propriedades básicas. A atividade é marcada por ser um processo contínuo, que
transmite a permanência extrapolando a definição de começo e fim. Tal atividade
apresenta um momento próprio que define o grau do impulso para a realização da
mesma, possibilitando a sensação de persistência e resistência à interrupção até a
atividade estar completada (BRONFENBRENNER, 1993). O momento da atividade
é definido pela existência de uma intenção, o desejo de realizar a atividade pelo
prazer da atividade ou como um meio para alcançar um objetivo maior.
Outra característica das atividades molares é o grau de complexidade dos
objetivos ou intenções que as motivam. A complexidade pode ser baseada na
estrutura da atividade, manifesta no número de atividades molares executadas
simultaneamente, na permanência e expectativa de continuidade temporal ampliada
e na presença de objetivos oriundos da intenção principal. Ou ainda, a
complexidade no campo ecológico, refletido na participação do indivíduo em
sistemas interpessoais, eventos ou situações que contemplem outros ambientes
(microssistemas), formando relações de mesossistemas ou exossistemas e a
expansão ou modificação do ambiente através da reorganização do microssistema
imediato (BRONFENBRENNER, 1996).
Os relacionamentos interpessoais são caracterizados sempre que uma
pessoa presta atenção às atividades de outra, ou participa ativamente de alguma
delas. Quando a relação ocorre em ambas às direções é estabelecida uma díade,
elementos determinantes para a formação de estruturas interpessoais mais amplas
e para o desenvolvimento humano (KREBS et al., 2011).
Bronfenbrenner (1993) apresentou três tipos de díades: o primeiro tipo refere-
se à díade observacional, a qual ocorre quando uma pessoa presta atenção na
atividade do outro e é reconhecida por tal feito. O segundo tipo é a díade de
atividade conjunta, que se estabelece quando, além da observação, a pessoa
41
participa da atividade da outra, seja de forma compartilhada ou complementar. O
terceiro tipo é a díade primária, considerada o vínculo interpessoal mais importante
para o desenvolvimento. Na díade primária o vínculo existe mesmo quando as
pessoas não compartilham o mesmo ambiente, aparecendo no pensamento de cada
um, estabelecendo fortes sentimentos emocionais e influenciando o comportamento
um do outro mesmo quando separados.
As díades apresentam três características básicas: a reciprocidade, o
equilíbrio de poder e a relação afetiva. A reciprocidade refere-se à coordenação das
atividades entre as pessoas, gera feedback mútuo, motivação para perseverança e
interdependência. O equilíbrio de poder remete à influência de cada participante na
atividade, e sempre um lado da díade tem mais domínio sobre o outro. Essa
característica é importante para a aprendizagem no sentido de que o equilíbrio do
poder se altera em favor da pessoa em desenvolvimento (BRONFENBRENNER,
1992). Por exemplo, quando um atleta consegue exercer maior importância na
relação com o treinador dando dicas táticas. A relação afetiva ressalta o
estabelecimento de sentimentos mais pronunciados entre os membros da díade,
podendo este sentimento ser positivo, negativo, ambivalente ou assimétrico, quando
um participante gosta do outro, mas o inverso não ocorre (BRONFENBRENNER,
1995).
Outro elemento característico do microssistema são os papéis. O papel é
entendido como um conjunto de atividades pertinentes a cada posição, que refletem
as expectativas da sociedade em relação ao ocupante e as expectativas que o
ocupante da posição tem em relação aos demais membros do contexto (KREBS,
1995). Para Bronfenbrenner (1995), um papel é uma série de atividades e relações
esperadas de uma pessoa que ocupa uma determinada posição em um ambiente, e
de expectativas de outros pares sociais em relação àquela pessoa.
A expectativa do papel refere-se ao padrão de atividades executadas e
também às relações diádicas estabelecidas entre as partes do ambiente, levando
em consideração a reciprocidade, o equilíbrio do poder e a relação afetiva. Tais
expectativas são enraizadas na cultura da sociedade, que ditam as formas de agir e
de se relacionar no ambiente. Vieira (1999) aponta que o desenvolvimento humano
é facilitado pela interação com pessoas que ocupam uma variedade de papéis,
como também pela participação num repertório cada vez mais amplo de atividades
e relacionamentos. Dessa forma, a variabilidade de experiências de papéis
42
representa uma forma de facilitar o desenvolvimento humano, na perspectiva
ecológica. A teoria dos sistemas ecológicos tem sido utilizada como base para
estudos na área do contexto esportivo que buscaram investigar o desenvolvimento
de talentos (VIEIRA, 1999a; VIEIRA, 1999b).
O microssistema usualmente é representado pelas estruturas dentro do
círculo interno, envolvendo os ambientes mais próximos do indivíduo, no caso a
comunidade, igreja, escola e família. Em um estudo prévio, Vissoci (2009)
identificou como contextos do microssitema do futebol de campo em atletas
brasileiros o clube em si, a escola e a família, ressaltando a necessidade de uma
maior amplitude de inserções em ambientes para favorecer o desenvolvimento da
carreira atlética de forma holística.
As relações estabelecidas entre os contextos do microssistema caracterizam
a estrutura do mesossistema – é a estrutura do contexto bioecológico que inclui as
interligações e potenciais processos acontecendo em dois ou mais ambientes dos
quais o indivíduo faz parte ativamente. Essa estrutura direciona a atenção para os
efeitos da participação multi ambiental do ser humano em desenvolvimento. Assim,
considera-se a relação entre os laços estabelecidos na família e na escola de futsal,
por exemplo, verificando o impacto da pressão dos pais por desempenho em
relação à política de formação atlética da escola. Por outro lado, contextos nos
quais o sujeito não está diretamente atuante também podem ser decisivos para a
compreensão do processo de desenvolvimento. Façamos a suposição de que, na
mesma situação, a empresa que financia a escola de formação atlética passa por
uma crise economica e precisa parar de financiar o clube. Esse acontecimento, que
não afeta diretamente o atleta porque ele não está envolvido com a empresa que
financia o clube, é um fator determinante para a continuidade do mesmo no esporte
e um agente influente na sua metamorfose identitária.
Assim, essa camada que envolve as relações entre contextos do
mesossistema com outros contextos distantes do sujeito é chamado de
exossistema. Em ambas as esferas, procura-se verificar a participação
multiambiental do sujeito, laços indiretos estabelecidos entre os agentes de cada
contexto, conhecimento entre os ambientes e os padrões de comunicação
intrambiental. O macrossistema aparece como instância mais distante do indivíduo
em desenvolvimento e contempla todos os sistemas anteriores, assinalando uma
43
cultura ou subcultura que referencia as características dos exossistemas,
mesossistemas e microssistemas, sua definição é:
O macrossistema consiste de todo um padrão de micro, meso e exossistemas característicos de uma determinada cultura ou outro contexto social maior, com um particular referencial desenvolvimentista-instigativo para o sistema de crenças, recursos, riscos, estilos de vida, estruturas, oportunidades, opções de vida e padrões de intercâmbio social que estão incluídos em cada um desses sistemas. O macrossistema pode ser visto como a arquitetura societal de uma cultura particular, subcultura ou outro contexto social maior (BRONFENBRENNNER, 1992, p. 228).
O macrossistema compreende todos os padrões sociais de cada um dos
sistemas: seus sistemas de crenças, valores, riscos, recursos, estilos de vida,
estruturas, oportunidades e padrão de relacionamentos interpessoais
(BRONFENBRENNER, 1993).
44
Referenciais
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47
CAPÍTULO 3
Identidade em atletas de rendimento: Uma revisão sistemática Athlete’s identity: A systematic review
48
Capítulo 3.
IDENTIDADE EM ATLETAS DE RENDIMENTO: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA.
Athletes’ Identity: A Systematic Review
Resumo
O objetivo deste estudo foi conduzir uma revisão sistemática da literatura sobre a identidade
em atletas de rendimento, incluindo estudos de 1978 a 2014. Um total de 121 estudos
foram avaliados e reportados em três seções: características metodológicas, variáveis
associadas a identidade e principais suportes teóricos. As amostras dos estudos variaram
de 1 a 2000 participantes. Os estudos compreenderam uma amplitude de níveis
competitivos e modalidades, em gêneros diferentes e variados métodos de pesquisa.
Variáveis associadas à identidade foram categorizadas: questões demográficas, atmosfera
moral, suporte psicossocial, problemas de saúde/lesões, controle da vida, status
educacional, auto-percepção, motivação, desenvolvimento pessoal/carreira, compromisso
com o esporte, atitudes alimentares, estratégias de enfrentamento, aposentadoria e
burnout. O estado atual da área de estudo, limitações e sugestões para prática e futuras
pesquisas são discutidas.
Palavras-chave: Identidade; Esporte; Atletas; Revisão.
Abstract
This study aimed to conduct a systematic review of the literature on athletes’ identity
formation, including researches from 1978 to 2014. A total of 121 studies were evaluated
and reported in three sections: the methodological characteristics of the studies, variables
associated with identity and main theoretical supports. Study samples ranged from 1 to
2.000 participants. These studies comprised a range of several competitive levels and
modalities, in different genders and research methods. Variables associated with identity
were categorized as follows: demographic questions, moral atmosphere, psychosocial
support, health/injury problems, life control, educational status, self-perception, motivation,
personal/career development, sport commitment, eating attitudes, coping, retirement and
burnout. The current status of this area, limitations, suggestions for practice and future
research are discussed.
Keywords: Identity; Sport; Athletes; Review.
Introdução
Com o crescimento do interesse em estudos sobre o processo de
desenvolvimento de atletas, diversos temas têm surgido como importantes para
uma boa formação atlética (por exemplo, carreira atlética, aposentadoria, influência
de pais e pares sociais entre outros). Em especial, a identidade tem sido
49
considerada um elemento significativo para diferentes aspectos do desenvolvimento
do atleta, como a qualidade de vida (ZABRISKIE, LUNDBERG & GROFF, 2005), os
sintomas emocionais (KILLEYA-JONES, 2005; BROWN & POTRAC, 2009), a
satisfação com a vida (MASTEN, TUŠAK & FAGANEL, 2006) e o planejamento de
carreira (ver PARK, LAVALLEE & TOD, 2014). Apesar do corpo de estudos ter
crescido significativamente na última décadas sobre o papel da identidade no
processo de desenvolvimento humano envolvidos ao esporte ainda é inconsistente.
Pesquisas recentes têm procurado analisar a influência da identidade em
aspectos do desenvolvimento esportivo como a carreira atlética (DONNELLY &
YOUNG, 1988; LALLY & KERR, 2005; CIAMPA, LEME & SOUZA, 2010; HOULE,
BREWER & KLUCK, 2010) e a aposentadoria do esporte (WEBB et al., 1998;
LALLY, 2007; STIER, 2007; CARLESS & DOUGLAS, 2009). Evidências sugerem
que a identidade pode favorecer aspectos como participação esportiva
(ANDERSON, 2009) ou recuperação de lesões (TASIEMSKI, WILSKI & MEDAK,
2012) mas desfavorecer outros como controle emocional (BREWER et al., 2007).
Ainda, apesar da existência de diversos modelos teóricos sobre identidade (e.g
identidade atlética, identidade social, identidade de trabalho) maior ênfase têm sido
dada ao conceito de identidade atlética (BREWER, VAN RAALTE & LINDER, 1993;
BREWER & CORNELIUS, 2001), que seria específico a experiência esportiva. Tais
investigações apontam efeitos positivos e negativos da identidade atlética com
diferentes consequências, ou ainda sugerem que a identidade precisaria ser mais
abordada a partir de uma perspectiva subjetiva e integrada à história do indivíduo.
Apesar da vasta literatura sobre o tema, até onde conseguimos encontrar
nenhum estudo ainda se propôs a sintetizar as informações buscando descrever o
conteúdo e direção das características associadas à identidade atlética e auxiliar em
futuras direções, especificamente aplicando uma metodologia de revisão
sistemática. Os benefícios em se conduzir uma revisão sistemática para o
desenvolvimento de intervenções ou designar pesquisas futuras têm sido enfatizada
na literatura internacional (CRAIG et al., 2008; PARK, LAVALLEE & TOD, 2014).
Estudos com esse tipo de abordagem metodológica conseguem sintetizar as
melhores evidências disponíveis na literatura e teorias utilizadas para delinear
direcionamentos de pesquisa ou estratégias de intervenção, assim como
proporciona maiores conhecimentos sobre os variados métodos de pesquisa
aplicados para estudo do tema.
50
Face ao exposto, o objetivo deste estudo foi revisar, de forma sistemática, as
pesquisas sobre identidade no contexto esportivo, com foco nas características das
amostras, delineamentos de pesquisa utilizados e variáveis associadas aos
constructos de identidade aplicados ao esporte. Foram incluidos artigos publicados
até 2014, com a exclusão de publicações que não abordassem algum modelo
teórico sobre identidade e/ou que não fossem com atletas. Dessa forma,
procuramos caracterizar os aspectos metodológicos e teóricos utilizados nas
diversas investigações e analisar as principais variáveis ou conceitos associados
com identidade em atletas de rendimento.
Metodologia
Protocolo e Regitro
Essa revisão sistemática está descrita seguindo as diretrizes PRISMA (Preferred
Reporting Items for Systematic Review and Meta-Analyses, MOHER, et al., 2009)
(PRISMA) e está registrado na base Prospero (International Prospective Register of
Systematic Reviews) (PROSPERO – N. CRD42015015980).
Critério de Eligibilidade
Os critérios de inclusão de estudos na revisão sistemática foram: a) estudos
com amostras de atletas; b) Estudos sobre identidade ou com um modelo teórico
sobre identidade. Como critérios de exclusão definimos: a) artigos publicados em
línguas que não inglês, português ou espanhol. Artigos em línguas que não as
listadas foram traduzidos por um especialista, e em casos da ausência deste, foram
excluídos; b) Revisões da literatura, artigos de opinião ou cartas de editores; c)
Pesquisas não publicadas em períodicos com revisão por pares.
Bases de Informação
Nossa busca foi conduzida nas seguintes bases eletrônicas, cobrindo desde
o início da base até Maio 2014: Medline, Embase, Web of Science, Physical
Education Index, PsychiatryOnline, PsycINFO, ScienceDirect, SportDiscus, Lilacs e
Scielo. Nós não utilizamos limite de data ou de linguagem quando realizamos a
busca. Ainda, conduzimos, manualmente, análises de referências e citação nos
artigos que foram incluídos na pesquisa inicial, utilizando o Google Acadêmico.
Buscamos, também, a sugestão de experts na área sobre fontes de informação
51
através de comunicações por email.
Buscas
A busca inicial foi composta pelos descritores Identity Crisis, Social
Identification, Identificarion (Psychology), Human Development, Identity, Social
identity, Psychosocial Development, Social Status, Social Function, Sports, Sports
Medicine, Athletic Performance, Exercise e sinônimos associados. A busca
completa utilizada na base Pubmed está anexada no Apêndice 1. Não utilizamos
filtros para linguagem e tempo. Os operadores booleanos AND, OR e NOT foram
empregados para a constituição das estratégias de busca nas diferentes bases de
dados.
Seleção dos estudos
Títulos e resumos dos artigos obtidos na busca foram avaliados
independentemente por 2 revisores (JRNV, LPO). Os resumos que não
apresentaram informações suficientes para definir sua eligibilidade foram mantidos
para análise do texto completo. Os revisores, independentemente, avaliaram os
textos completos e determinaram a elegibilidade de cada estudo. Discordâncias
foram resolvidas por consenso ou, caso a discordância persistisse, pela opinião de
um terceiro revisor (LFV). Um quadro com as características de todos o estudos
incluídos está anexada no Apêncide 2.
Qualidade dos Estudos
A avaliação da qualidade dos estudos foi realizada classificando-se cada
estudo de acordo com itens adaptados de Bennett et al, (2010) para pesquisa
quantitativas, e Joanna Briggs Institute - Qualitative Assessment tool and Review for
qualitative studies (The Joanna Brings Institute, 2013), para os estudos qualitativos.
Os itens avaliados nos estudos quantitativos foram os seguintes: justificação da
questão de pesquisa, explícita questão de pesquisa, clareza nos objetivos do
estudo, descrição dos métodos utilizados para análise dos dados, método de
administração do questionário, localização e data, métodos suficientemente
descritos para a replicação, evidência de confiabilidade, evidência de validade,
método de verificação de entrada dos dados, uso de codificação, cálculo do
tamanho da amostra, método de seleção da amostra, descrição da população da
52
amostra, descrição do questionário, descrição do desenvolvimento do questionário,
pré-teste do instrumento, instrumento de confiabilidade e validade, método de
pontuação, consentimento, aprovação ética da pesquisa e evidência de tratamento
ético dos participantes da pesquisa.
Para os estudos qualitativos, os aspectos analisados: congruência entre a
perspectiva filosófica indicada e a metodologia, congruência entre a metodologia da
pesquisa e da questão de pesquisa ou objetivos, congruência entre a metodologia
de pesquisa e os métodos utilizados para a coleta de dados, congruência entre a
metodologia da pesquisa e da representação e análise dos dados, congruência
entre a metodologia e a interpretação dos resultados, declaração que localize o
pesquisador cultural ou teoricamente, influência do pesquisador na pesquisa, e vice-
versa, representação dos participantes, e de suas vozes, investigação ética de
acordo com os critérios atuais, ou, para estudos recentes, se havia evidências de
aprovação ética por um órgão adequado, as conclusões foram tiradas dos relatórios
de pesquisa a partir da análise, ou interpretação dos dados (SHEA et al., 2009).
Nenhum estudo foi excluído por razões de qualidade, já que estudos prévios
direcionam a não exclusão a priori de estudos por razões de qualidade. No
Supplementary Guidance for Inclusion of Qualitative Research in Cochrane
Systematic Reviews of Interventions é apontada como uma das possibilidades, a de
não exclusão, permitindo que temas potencialmente valiosos continuem incluídos,
desde que seja explicitado o potencial risco de viés (SANDELOWSKI et al., 2007).
Extração dos dados
Quatro revisores (JRNV, LPO, JRNJ, CRM), em duplas, extrairam as
informações dos artigos de forma independente e discordâncias foram resolvidas
por um quinto revisor (LFV). Características gerais dos estudos foram coletadas
como: Local de realização do estudo, população alvo, metodologia empregada,
instrumentos de coleta, referencial teórico para identidade, métodos de análise de
dados. Além disso, procuramos identificar como defecho primário: as variáveis
associadas à identidade e a direção dessa associação.
Análise dos dados
Para a análise dos dados foi realizada metassumarização, a qual é uma
abordagem orientada para agregação quantitativa da síntese tanto de pesquisas
53
qualitativas, como de pesquisa quantitativas. A metodologia envolve extração,
agrupamento e formatação dos resultados, e o cálculo da frequência e intensidade
do tamanho do efeito (SANDELWOSKI et al., 2007).
Após a extração dos resultados dos estudos incluídos e agrupamento dos
achados relevantes, foram criados temas - representações concisas, mas
abrangentes, através de análise de conteúdo dos principais resultados. Para avaliar
a magnitude dos resultados extraídos, foi calculada a frequência do tamanho do
efeito. Para tanto, o número de estudos que apresentavam determinado tema
(menos os resultados derivados de um estudo de base comum e que
representassem uma duplicação da mesma conclusão) foram divididos pelo número
total de estudos incluídos e apresentados em forma de porcentagem.
Para verificar quais pesquisas contribuíram para o conjunto final de
conclusões abstraídas, foi calculada a intensidade do tamanho do efeito de cada
estudo: 1) dividindo-se o número de temas contidos no estudo pelo número total de
temas em todos os artigos; e 2) dividindo-se o número de temas com tamanhos de
efeito >25 contidos nesse estudo pelo número de temas com tamanho de efeito >25
em todos os estudos (SANDELWOSKI et al., 2007).
Associação entre temas relacionados à identidade e seus respectivos
tamanhos de efeito foram analisados e representados graficamente através de
análises em rede (CONSTANTINI, et al. 2014; BORSBOOM et al., 2011). Esse
método permite identificar associações a partir de uma matriz de vizinhança,
calculada a partir do grau de co-ocorrência dos temas num mesmo artigo. Assim, na
representação gráfica, cada nodo circulare é uma representação dos temas
associadas a identidade e nodos quadriculares são os artigos incluídos no estudo.
As conexões entre os nodos (hastes) são os graus de associação entre os temas. O
tamanho dos nodos circulares representa o tamanho do efeito de cada tema para os
estudos entre identidade e esporte. As análises foram executadas através do
programa Linguagem R (R-Project), através do pacote qgraph (EPSKAMP, 2014).
Resultados
Com base nas etratégias de busca, um total de 7854 citações foram
identificadas. Como demonstrado na Figura 1, após a revisão dessas referências
com os critérios de elegibilidade pré-definidos, um total de 121 artigos foram
incluídos para análise completa e extração dos dados.
54
Seleção dos Estudos
Figura 1. Diagrama do fluxo do estudo.
Características dos Estudos
Métodos de pesquisa
A Tabela 1 apresenta as características de métodos e amostra das
pesquisas. Pesquisadores utilizaram métodos qualitativos (43%), quantitativos
(54%) ou uma combinação dos dois (0,8%) para examinar a identidade atlética.
Apenas uma (0,8%) pesquisa foi realizada por meio do método longitudinal. Em
relação à coleta dos dados, foram utilizados instrumentos, tais como entrevistas
(38%) e questionários (62%), principalmente aqueles validados e estandardizados.
Os questionários mais utilizados foram a Athletic Identity Measurement Scale
(AIMS; BREWER, VAN RAALTE & LINDER, 1993) em sua versão original e também
na sua versão mais recente, desenvolvida por Brewer e Cornelius (2001), as duas
versões da AIMS foram utilizadas em sua totalidade ou apenas alguns itens,
dependendo dos objetivos do estudo. Além da AIMS, outros dois questionários se
destacaram, Sports Identities Index (SII; CURRY & WEANER, 1987) e a Exercise
Identity Scale (EIS; ANDERSON E CYCHOSZ, 1994).
55
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17,
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27,
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2013);
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2009);
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2001);
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2000);
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2005);
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2002);
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1993);
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2007);
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58
Características da amostra
O número total de participantes foi de 18875 e o número de sujeitos das
amostras variou de 1 à 2421 (Tabela 1). Sobre as amostras, as pesquisas
escolheram sujeitos que se enquadravam em diversas categorias, tais como: atletas
profissionais, atletas amadores, estudantes que disputavam competições esportivas
colegiais e universitárias, atletas que já se aposentaram e atletas lesionados; estes
sujeitos eram de ambos os sexos. O número de estudos com menos de 50 sujeitos
foi 45, e 39 estudos foram conduzidos com amostras entre 51 e 200. Quatorze
estudos tiveram amostra entre 201 e 500, e onze estudos examinaram mais de 500
sujeitos. Em relação ao gênero, os estudos apresentaram as seguintes
características, 60 estudos continham sujeitos de ambos os gêneros, 18 estudos
com sujeitos apenas no gênero feminino, e 23 estudos com sujeitos apenas do
gênero masculino (Tabela 1).
Os estudos apresentaram variedade quanto ao nível competitivo das
amostras, 46 estudos avaliaram atletas universitários e colegiais, 16 estudos foram
conduzidos com atletas amadores, 17 estudos com atletas de elite, que participaram
de competições nacionais, internacionais ou olímpicas, 13 estudos com atletas
profissionais, 9 estudos com atletas com características mistas, e 12 estudos
realizados com atletas deficientes.
Os pesquisadores investigaram esportes coletivos (27%), esportes individuais
(23%) ou realizaram pesquisa com ambos os tipos de esportes (29%). Em 7 estudos
os sujeitos tinham idade abaixo de 16 anos, em 55 estudos a idade variou entre 16
e 26 anos, em 5 estudos a idade variou de 27 a 40 anos, 1 estudo foi realizado com
sujeitos acima de 40 anos, e 39 estudos tiveram uma variação de idade entre 15 e
85 anos. A maioria dos estudos foi conduzida na América do Norte (67), além de
estudos realizados na Europa (37), na Austrália (7), e outros países, tais como o
Brasil (3), China (2) e Coréia do Sul (1) (Tabela 1).
Suportes teóricos
Nos estudos quantitativos, o modelo teórico que teve maior utilização (21) foi
o da Identidade Atlética (Athletic Identity) que refere-se ao quanto o atleta se
identifica ou se percebe no papel de um atleta (BREWER, RAALTE, & LINDER
1993).
Nos estudos qualitativos, diversos suportes teóricos foram aplicados, no
entanto, assim como nas pesquisas quantitativas, o modelo teórico de Identidade
59
Atlética (Athletic Identity) foi o que mais apareceu (52) como referencial teórico
utilizado pelos autores. Outro referencial bastante utilizado nos estudos foi a teoria
identidade social (SIT, TAJFEL & TURNER, 1979), utilizada em 11 estudos.
Variáveis Associadas à Identidade no Esporte
A Tabela 2 apresenta as variáveis e associadas com a identidade em atletas
e a direção da correlação (+ ou -). Foram identificadas 14 variáveis associadas à
identidade atlética, incluindo questões demográficas, atmosfera moral, suporte
psicossocial, lesões/problemas de saúde, controle da vida, nível educacional,
autopercepção, motivação, carreira/desenvolvimento pessoal, participação da
carreira esportiva/comprometimento, atitudes alimentares, estratégias de coping,
pré-aposentadoria/planejamento de carreira-aposentadoria, burnout (Tabela 2).
Questões demográficas. Dos 16 estudos que examinaram as questões
demográficas dos atletas, em relação à identidade atlética, tais como raça, nível
competitivo, cultura, idade e gênero, quatro estudos analisaram a diferença da
identidade atlética entre as raças. Apenas 1 estudo (CUNNINGHAM, CHOI &
SAGAS, 2008) apresentou forte identidade pessoal de raça com identidade atlética
positiva. Dos cinco estudos que investigaram associação com o nível competitivo, 1
(MILLER, 2009) descreveu que os jocks apresentaram menos identidade atlética
quando comparado a outros grupos de atletas, e apenas 1 (LAMONT-MILLS &
CHRISTENSEN, 2006) apresenta nos resultados que os atletas de elite são os que
demonstram maior identidade atlética. Cultura foi um tema pouco recorrente e no
único estudo que citou esta dimensão, a forma da relação não ficou clara em sua
direção em intensidade. Quatro estudos verificaram as diferenças entre a identidade
atlética e a idade dos sujeitos, sendo que dois destes estudos (CHEN, SNYDER &
MAGNER, 2010) apresentaram relação positiva para os sujeitos mais velhos. Dois
estudos analisaram as diferenças da identidade atlética com relação ao gênero, os
resultados apresentados foram contraditórios, com um indicando maior identidade
atlética em mulheres e outro em homens (Tabela 2).
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Suporte Psicossocial. Oito estudos realizaram análise da relação entre o
suporte psicossocial e a identidade atlética. Dentre os suportes psicossociais
analisados, encontram-se o suporte social, a resistência mental, o estresse positivo,
a emoção e autoestima e o suporte técnico. A maioria dos estudos (87,5%)
apresentou relação positiva entre o suporte psicossocial e a identidade atlética,
sendo que apenas um estudo (BREWER, et al., 2007) apresentou relação negativa
entre a emoção e autoestima com a identidade atlética. Atmosfera moral pode ser
definida como a percepção do sujeito sobre o ambiente em que está inserido com
relação ao comportamento dos companheiros de equipe e treinadores, se estes se
comportam de maneira moral ou não. Dos artigos analisados, apenas 1
(STEINFELDT et al., 2011) fez menção à relação da atmosfera moral com a
identidade atlética, sendo esta relação considerada positiva para este estudo.
Lesões/Problemas De Saúde. Sete de 17 estudos encontraram relação
positiva entre lesões/problemas de saúde e a identidade atlética. No entando, 6
estudos encontraram relação negativa entre as lesões/problemas de saúde e a
identidade atlética, sendo que as lesões/problemas de saúde, como o câncer por
exemplo, podem ser considerados fatores que levam os atletas a não se
identificarem mais como atletas, devido a possibilidade de a lesão ou o problema de
saúde serem os responsáveis pelo fim da carreira de atleta (ADAMSEN et al., 2009;
DOUGLAS & CARLESS, 2009;). Dois estudos investigaram a relação entre as
atitudes alimentares e a identidade atlética. Ambos (LANTZ, RHEA & MESNIER,
2004; LAMONT-MILLS & CHRISTENSEN, 2006) reportaram uma relação negativa
entre as variáveis, ou seja, a presença de distúrbios alimentares ou a dificuldade de
controle da alimentação pode levar os sujeitos a perderem a identidade atlética.
Apenas um estudo apresentou esta variável como possível de se relacionar com a
identidade atlética. Black e Smith (2007) encontraram resultados que demonstram
que quanto mais o sujeito estabelece capacidade de evitar o burnout, ou cria
estratégias para evitar o burnout, maior sua identidade atlética, evitando assim o
desgaste mental com relação à prática esportiva.
Habilidades para Vida. Controle da vida se refere a percepção de autonomia
por parte dos atletas e o poder de tomada de decisão enquanto estão competindo e
durante sua carreira. Sete estudos demonstraram que os sujeitos que apresentavam
maior controle de sua vida, apresentaram também uma maior identidade atlética,
com destaque para a qualidade de vida (ZABRISKIE, LUNDBERG & GROFF, 2005),
63
projetos de vida (YOUNG & BURSIK, 2000), satisfação com a vida (BURNS et al.,
2012), controle da ansiedade e de distúrbios emocionais (MASTEN, TUSAK &
FAGANEL, 2006; BROWN & POTRAC, 2009), e controle do álcool (GROSSBARD,
2009). No entanto, alguns estudos encontraram uma relação negativa entre o
controle da vida e a identidade atlética, mais especificamente, quanto maior a falta
do controle da vida, menor a identidade atlética, ou seja, quanto maior a depressão
(KILLEYA-JONES, 2005), a insatisfação (BREWER et al., 1999) e a agressividade
(VISEK et al., 2010) menos os sujeitos apresentaram identidade atlética. O único
estudo que relacionou as estratégias de coping e a identidade atlética encontrou
relação positiva entre as variáveis, tendo como destaque o fato de que os sujeitos
que conseguiam gerenciar melhor o tempo mais ficava em evidência a sua
identidade atlética (PALMER & LEBERMAN, 2009).
Nível Educacional. Os dois estudos que analisaram o nível educacional
(STEINFELDT, REED & STEINFELDT, 2010; MCGILLIVRAY & MCINTOSH, 2006)
reportaram relação indefinida com a identidade atlética.
Autopercepção. Autopercepção corresponde à percepção do sujeito sobre
sua autoeficácia, esteriótipo, identidade masculina, identidade feminina,
comportamento supersticioso, atividade expressas pessoalmente, paixão,
desvalorização esportiva, identidade em moratória, identidade social, ajustamento
social e autoproteção. Três estudos investigaram a relação entre a autoeficácia e a
identidade atlética, no entanto 1 estudo (STRACHAN et al., 2012) reportou relação
negativa quando a variável estudada foi a identidade de grupo. Três estudos
concluiram que a autopercepção de esteriótipo se relacionava negativamente com a
identidade atlética (YOPYK & PRENTICE, 2005; EZZELL, 2009; RIBEIRO &
DIMEO, 2009). Já quando se investigou a identidade masculina ou a identidade
feminina, a relação com a identidade atlética foi indefinida (MEÂN & KASSING,
2008; STEINFELDT, 2009; CHIMOT & LOUVEAU, 2010; STEINFELDT &
STENFELDT, 2010; STEINFELDT & STEINFELDT, 2012). Relações positivas com
a identidade atlética também foram encontradas quando as variáveis estudadas
foram o comportamento supersticioso (TODD & BROWN, 2003), atividade
expressas pessoalmente (PACKARD, 2010; RYSKA, 2002), paixão pela atividade
(CAUDROIT et al., 2010), identidade social (ZUCCHERMAGLIO, 2005),
ajustamento social (GROVE, LAVALLEE & GORDON, 1997) e autoproteção
(GROVE, FISH & EKLUND, 2004). Mais relações negativas foram reportadas pelos
64
estudos que investigaram as variáveis desvalorização esportiva (CAUDROIT et al.,
2010) e a identidade em moratória (MURPHY, PETITPAS & BREWER, 1996;
MILLER & KERR, 2003; PUMMELL, HARWOOD & LAVALLEE, 2008).
Motivação. Apenas dois estudos investigaram as relações entre a motivação
e a identidade atlética, sendo que esta relação apresenta particularidades em cada
um dos estudos. O estudo de Curry e Weiss (1989) identificou uma relação positiva
entre a motivação social e gênero com a identidade atlética. Já o estudo de Curry
(1993) não apresentou relação significativa com a identidade atlética, quando a
população estudada era de homens.
Carreira Esportiva/Desenvolvimento Pessoal/Aposentadoria. Dos 5 estudos
que reportaram a relação entre a carreira/desenvolvimento pessoal, 4 apresentaram
uma relação positiva com a identidade atlética, ou seja, quanto mais os sujeitos se
preocupam com a carreira e o seu desenvolvimento pessoal, mais caracteristica é a
presença da identidade atlética (DONNELLY & YOUNG, 1988; LALLY & KERR,
2005; HOULE, BREWER & KLUCK, 2010; PARK, LAVALLEE & TOD, 2013). Já o
estudo de Ciampa, Leme e Souza (2010) apresentou relação indefinida entre
carreira/desenvolvimento pessoal e a identidade atlética, analisando o processo ao
longo da vida do indivíduo, e que como tal, apresenta diferentes influências sobre o
processo de desenvolvimento.
Sete estudos investigaram a relação entre a participação da carreira
esportiva/comprometimento e a identidade atlética. Todos apresentaram como
resultados a relação positiva entre estas variáveis, ou seja, os atletas que se
comprometiam mais com sua carreira esportiva, se preocupando com a transição de
sua carreira, apresentavam também maior identidade atlética. (STEVENSON, 1990;
MAGUIRE, 1994; MARTIN, MUSHETT & SMITH, 1995; WHEATON, 2000; PELAK,
2002; DANIELS, SINCHAROEN & LEAPER, 2005; CHEN, SNYDER & MAGNER,
2010).
Com relação ao planejamento da aposentadoria por parte dos sujeitos, 6
estudos encontraram relações positivas entre o planejamento de carreira com
pensamento na aposentadoria e a identidade atlética, ou seja, o engajamento na
carreira esportiva faz com que os atletas pensem mais em como organizar sua vida
de atleta pensando no futuro, o que lhes garante maior identificação com o contexto
esportivo. Já estudos como os de Erpic, Wylleman e Zupancic (2004), Warriner e
Lavallee (2008) e Carless e Douglas (2009) reportaram que o término da carreira se
65
relacionou negativamente com a identidade atlética, fator que pode ser explicado
pelo fato de o sujeito não se organizar, ou preparar para o fim da carreira esportiva,
o que o leva a uma diminuição da identidade atlética.
Discussões
Até onde conseguimos encontrar, esse é o primeiro estudo que procurou
investigar de forma sistemática a literatura sobre identidade em atletas de
rendimento e identificar quais os tipos de variáveis associadas à identidade,
sumarizando as evidências proporcionando sugestões para futuros estudos. Um
total de 121 artigos alcançaram os critério de inclusão e exclusão, abrangendo
diferentes tipos de metodologia e populações. O nível de competição dos atletas foi
variado, abrangendo diferentes níveis de formação atlética, em diferentes
modalidades esportivas individuais e coletivas.
De forma geral, a identidade parece estar associada com consequências
positivas aos atletas, corroborando a perspectiva de que a exposição ao contexto
esportivo parecer ser favorável para o desenvolvimento humano. Resultados
recentes têm comprovado esse achado considerando o esporte um ambiente que
impulsiona o desenvolvimento positivo do atleta (FRASER-THOMAS, CÔTÈ &
DEAKIN, 2005). Potencialmente facilitando o desenvolvimento de habilidades para a
vida, transferidas diretamente do esporte (GOULD & CARSON, 2008).
Nessa perspectiva, boa parte dos estudos apresentaram evidências que
quanto maior a identidade atlética, maiores os benefícios da prolongada prática
esportiva de rendimento (HORTON & MACK, 2000). Nossos resultados indicam que
partindo da definição de identidade como o papel de atleta (Identidade atlética), as
evidências sugerem uma associação positiva com diferentes características
esportivas (Tabela 2). Um dos motivos desses resultados é a grande difusão do
modelo da identidade atlética, a partir da facilidade em avaliar o construto, através
do Questionário de Identidade Atlética (ver BREWER, VAN RAALTE, & LINDER,
1993). De fato, parece-nos coerente que quanto maior a identificação do indivíduo
maiores sejam seus atributos pessoais no esporte como percepção de competência,
comprometimento, dedicação entre outros (Tabela 2).
Vale ressaltar que o modelo teórico da Identidade Atlética (ver BREWER,
VAN RAALTE, & LINDER, 1993) foi o mais utilizado em estudos quantitativos.
Novamente uma explicação para esse predomínio é a existência de instrumentos de
66
coleta de dados, amplamente divulgados e aplicados para estudo do fenômeno da
identidade no contexto esportivo. Assim, percebe-se também que nos estudos de
design quantitativo as variáveis associadas foram, em sua maioria, aquelas que
também contêm modelos teóricos traduzidos em instrumentos psicométricos de
coletas de dados como Qualidade de Vida, Habilidades Psicológicas e Auto-
Percepção entre outros.
Diferente de estudos qualitativos que tem maior predominância de
associações entre identidade e correlatos como carreia atlética (ex. LALLY, 2008),
que envolve um processo de desenvolvimento e não é reconhecido com um
instrumento psicométrico para sua avaliação, gerando discussões alternativas sobre
o papel da identidade na experiência atlética. Nesses estudos, por exemplo, foi
possível identificar que a perspectiva de identidade altética também apresentou
evidências de associações negativas com variáveis não específicas do esporte
como esteriótipos em momentos de aposentadoria do esporte ou para jovens em
período colegial (EZZELL, 2009).
Analisando os resumos (Tabela 2) das direção das associações entre os
temas, sugere-se que a alta identificação com o papel do atleta parece favorecer a
experiência e sucesso esportivo, mas pode ser um elemento prejudicial para a vida
do atleta fora do contexto de rendimento. Uma possível explicação está na falta de
experimentação dos atletas de outros aspectos do desenvolvimento de sua carreira
(WYLLEMAN & LAVALLEE, 2003) que podem prejudicar seu envolvimento com
atividades, relacionamentos e papéis diversificados, restringindo seu
desenvolvimento (BRONFENBRENNER, 1995).
De forma geral observa-se uma escassez de estudos que investiguem as
influências contextuais sobre a formação identitária dos altetas de rendimento.
Poucos também foram os estudos que verificassem a formação da identidade como
processo que decorre ao longo da carreira atlética. Diferente do conceito de
identidade atlética, que corresponde ao papel de atleta, a formação da identidade
também é considerada como um processo contínuo e sofre influências ao longo do
desenvolvimento humano (LEMES; CIAMPA, 2003). Essa é uma possível
explicação para a ambiguidade das associações entre identidade e seus correlatos
(Tabela 2), entendendo identidade como uma metamorfose contínua na qual os
personagens que o indivíduo assume (ex. atleta) vão assumindo características de
autonomia ou heteronomia em função do momento histório e dos sentidos atribuídos
67
na experiência (CIAMPA, 2009). Dessa forma, enquanto a identidade atlética pode
ser um agente motivador no início da carreira ao final, para se aposentar, parece
funcionar como um elemento causador de sofrimento.
Os resultados dos diferentes estudos precisam ser tomados com cautela,
visto que diferentes aportes metodológicos foram desenvolvidos para compreensão
da identidade no esporte, e dentro de cada perspectiva o conceito da identidade
aparece com características diferenciadas. As diversas abordagens metodológicas
implicam em diferentes resultados, com inferências mais amplas em estudos
quantitativos e variedade maior de elementos em estudos qualitativos. O método
empregado, da metassumarização, permitiu associar essas metodologias e
sumarizar os achados mesmo em perspectivas metodológicas diferentes (Tabela 2)
(SANDELWOSKI et al., 2007).
Este estudo apresenta algumas limitações importantes que precisam ser
consideradas. A nossa revisão se propõs a abranger apenas os estudos que
envolvessem atletas. Dessa forma, uma vasta literatura em praticantes de exercicios
físicos ou esporte por lazer não entraram na revisão. Outra limitação foi a restrição
da linguagem de publicação dos estudos, 4 estudos em alemão, 5 em coreano, e 3
em francês foram exlcuidos da análise pela dificuldade em conseguir uma tradução
que permitiesse a extração dos dados de forma coerente. A terceira limitação foi
que a revisão não apresentou todas as associações encontradas pelo espaço
limitado para representação dos resultados. Para tanto, seguindo diretrizes já
aceitas na literatura (GOODGER et al., 2007; SALLIS, et al 2000) associações com
menos de três sujeitos foram agrupadas com outras variáveis semelhantes ou não
foram reportadas, podendo gerar alguma inconsistência na sugestão de futuros
direcionamentos. Por fim, nós optamos por incluir estudos com metodologias
qualitativas e quantitativas, apesar da importante diferença epistemológica das
abordagens. Essa opção foi para tentar abordar o maior número de estudos sobre o
assunto possível e também para levantar a discussão acerca das opções
metodológicas utilizadas em estudos sobre identidade. Acreditamos que a opção de
reportar as associações como uma medida categorizada pode diminuir o impacto
dos estudos qualitativos, que tem, por definição, maior profundidade no processo
avaliado. Próximos estudos poderiam aprofundar nessa questão com uma
abordagem metanalítica ou de metassumarização.
68
Com base nos resultados desse estudo, diversas direções futuras de
pesquisa podem ser identificadas. Percebe-se que a maioria dos estudos utiliza a
ideia de identidade atlética como suporte teórico para os estudos quantitativos.
Evidencia-se aqui uma importante lacuna de um modelo de identidade no esporte
que seja mais compreensivo, levando em considerações aspectos contextuais e
históricos do atleta. Outros referenciais utilizados ainda precisam de um corpo maior
de evidências empíricas de seu entendimento. Ainda, testar esses modelos
aplicados em estudos quantitativos e qualitativos e desenvolver um modelo que seja
específico ao esporte pode auxiliar em responder maiores questionamentos na área.
Sobre os métodos de pesquisa, a maioria dos estudos emprega um método
de coleta de dados retrospectivo, e muitos sugerem o viés relacionado à memória e
ao resgate das experiências como limitações. O emprego de metodologias
prospectivas, com designs longitudinais pode facilitar a compreensão do processo
dinâmico que é a constituição da identidade. Ainda, os dados, em geral, foram
coletados com entrevistas ou questionários padronizados ou não (como a
questionário de BREWER, VAN RAALTE & LINDEN, 1993) e, apesar destes
métodos serem amplamente aceitos, diferentes metodologias de coleta como
pesquisa ação, participante, grupos focais ou etnográficos poderiam proporcionar
indicadores inovadores aos estudos da área.
Quanto aos métodos de análise, tanto os estudos quantitativos quanto os
qualitativos seguem procedimentos semelhantes aos mais utilizados na literatura
como comparações de grupos, correlação, modelos de regressão, análise de
conteúdo e temática. Métodos inovadores como modelagem de equações
estruturais, sistemas dinâmicos, análises em rede ou mesmo idiográfica e histórias
de vida (estudos de caso único) podem levar a diferentes insights. Ainda, poucos
estudos levaram em consideração suportes teóricos como o bioecológico de
Bronfenbrenner (2005) ou a perspectiva holística do desenvolvimento da carreia de
Wyllemann e Lavalle (2003), podem proporcionar modelos que adicionem relevância
à compreensão do fenômeno.
Sobre as características das populações estudadas, poucos estudos
investigaram a identidade em atletas ainda jovens (<16 anos). Dado a relevância do
conceito para essa faixa etária e o estágio do seu desenvolvimento, mais estudos
com adolescentes são necessários para verificar como a identidade é influenciada
pelas altas demandas competitivas e de comprometimento nesse período. Outra
69
limitação encontrada no corpo de literatura está na distribuição geográfica dos
estudos, que se restringem à América do Norte, Europa e Austrália. Esses países
também tem recebido destaque nos estudos sobre desenvolvimento de talentos
esportivos e carreira atlética (ver PARK, LAVALLEE & TOD, 2014), assuntos
evidenciados como correlatos à identidade. Assim, mais estudos são necessários
em países latinos ou de culturas orientais que permitam gerar discussões
transculturais e avaliar os efeitos ambientais com mais qualidade.
Por último, nenhum estudo verificou o efeito de intervenções sobre o
processo de formação identitária como forma de prevenir efeitos como problemas
de transição de carreira, sintomas emocionais ou outras patologias ou alienações.
Os resultados sumarizados nessa revisão sugerem que a identidade é um elemento
determinante para consequências comportamentais, afetivas e cognitivas nos
atletas, específicas do esporte ou não, portanto, é um elemento a ser considerado
em intervenções. Outras implicações práticas envolvem a tomada de consciência
sobre os efeitos positivos e negativos da exposição ao esporte sobre a formação da
identidade. Especificamente contribuindo com indicadores para a constituição de
programas de iniciação esportiva, treinamento esportivo ou de aconselhamento de
carreira e aposentadoria. Fomentando assim, a autonomia para que se maximize os
efeitos positivos da identidade sobre os resultados como saúde e bem-estar no
esporte e transferência de habilidades para a vida fora do contexto esportivo.
70
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CAPÍTULO 4
ARTIGO ORIGINAL
Contexto esportivo de alto rendimento: Um ambiente ecológico
possibilitador de metamorfose orientadas para autonomia ou heteronomia? Elite sports context: An exological environment fostering metamorphosis
autonomy or heteronomy oriented?
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Capítulo 4
CONTEXTO ESPORTIVO DE ALTO RENDIMENTO: UM AMBIENTE
ECOLÓGICO POSSIBILITADOR DE METAMORFOSES
ORIENTADAS PARA AUTONOMIA OU HETERONOMIA?
Elite sports context: An ecological environment fostering
autonomous or heteronomous oriented metamorphosis
Resumo
O objetivo deste estudo foi analisar os parâmetros do contexto bioecológico do futsal em
atletas brasileiros de alto nível, visando evidenciar elementos significativos do contexto que
possibilitem a formação identitária com orientação para autonomia ou heteronomia.
Entrevistamos no estudo 25 atletas adultos de clubes que disputam a Liga Nacional de
futsal, com um roteiro semi-estruturado sobre o desenvolvimento da carreira esportiva. Três
grupos de características do contexto foram evidenciadas, o primeiro que seriam
caracterísitcas ambivalentes, que funcionariam como possibilidades emancipatórias ou de
colonização de acordo com o sentido atribuído pelo atleta, a segunda são características
que favorecem metamorfoses direcionadas à autonomia e a terceira são características que
possibilitam metamorfoses de reposição identitária favorecendo a mesmice ou a
feitichização da personagem atleta de Futsal. Conclui-se que o contexto esportivo do Futsal
apresenta características que instigam o processo para construção da autonomia ou inibem
a expressão identitária autonômica, requerendo cuidado e atenção dos profissionais da
área esportiva sobre como a estrutura de seus clubes pode influenciar a expressão e
formação identitária.
Palavras-chave: Identidade; Esporte; Atletas, Contexto.
Abstract
This study aimed at analyzing the bioecological parameters of the context of Futsal in
Brazillian elite players, seeking to provide evidence about contextual significant elements
fostering or twharting an autonomous identity formation and expression. We interviewed 25
adult athletes from different team playing the National League of Futsal, with a semi-
structured script about career development. Results showed three groups of contextual
characteristics, regarding ambivalent characteristics (1) working wither to possibilitate
emancipation or colonization according to the meaning attributed by the athletes;
characteristics that foster metamorphosis directed to autonomy (2); and characteristics
thwarting an autonomous expression of identity facilitating metamorphosis of identity
reposition and, consequently, idealization of the athlete role. So it is concluded that Futsal's
sport context have characteristics that either facilitate or thwarts autonomous identity
expression and formation, requiring care and attention by sports practitioners in relation to
how athletes experience this environment in terms of identity formation.
Keywords: Identity; Sport; Athletes, Context.
81
Introdução
Evidências apontam o esporte como um ambiente com possibilidades de
intervir de maneira positiva no desenvolvimento humano e esportivo, e a identidade
atlética pode potencializar a aquisição de habilidades que auxiliem o ser humano no
seu do dia a dia (FRASER-THOMAS, CÔTÈ & DEAKIN, 2005; GOULD & CARSON,
2008). Embora existam evidências, não há consenso de que o contexto esportivo
favorece ou não o desenvolvimento humano. Evidências também sugerem a relação
negativa entre identidade atlética e aspectos negativos ligados ao esporte como
situações de transição de carreira/aposentadoria ou lesões (ver PARK, LAVALLEE
& TODD, 2013) e também com a formação educacional/vocacional e psicossocial
com o comprometimento precoce com o esporte (VISSOCI, 2009). Essas restrições
podem ser relevantes para um processo de formação de identidade que facilite ou
atrapalhe a busca por autonomia.
De fato, compreender como o contexto esportivo apresenta elementos que
possibilitam ou dificultam a formação de identidade parece determinante para
entender o desenvolvimento humano daqueles ligados com o esporte,
principalmente durante as transições da carreira atlética. Contudo até onde
pudemos encontrar nenhum estudo analisou ambiente esportivo e suas
características bioecológicas oportunizando possibilidades de busca por autonomia
ou de manutenção da heteronomia no processo de formação identitária durante a
carreira atlética.
Para entender identidade partimos da concepção de identidade do Sintagma
Identidade – Metamorfose – Emancipação (CIAMPA, 1987, 2009), a qual trata de
um processo relacionado ao movimento do ser humano de vir-a-ser, relacionado à
sua atividade. Portanto, este processo está vinculado á humanização e socialização
e ao acesso à linguagem; passando por transformações constantes (metamorfoses)
com as modificações do indivíduo e/ou do ambiente, direcionando-se como um
movimento político de busca da autonomia frente a opressão sistêmica. Ainda,
integra aspectos da cultura na sua expressão individual identitária (fundamentada
em identidades políticas) e emancipação da dominação ideológica (ou colonização
pela ordem sistêmica), ou da manutenção da heteronomia (enquadramento nas
82
regulações dos papéis - Política de Identidade) com base nas nossas experiências
históricas e no projeto de vida (CIAMPA, 1987, 2009).
Dentro da perspectiva supracitada, a formação identitária sofre influência do
sentido atribuído pelo sujeito às características do contexto em que está incluído,
em especial às características culturais e pressupostas (Políticas de Identidade,
CIAMPA, 2002), as quais estão ligadas a essa troca do sujeito com o ambiente. Por
isto, compreender como o contexto se estrutura e é entendido pelo indivíduo é
determinante para entender seu papel na metamorfose identitária e,
consequentemente, o impacto do contexto no desenvolvimento humano do indivíduo
em busca da emancipação da expressão da sua autonomia. Nesta perspectiva, o
estudo avança em caracterizar o contexto de atletas de Futsal para compreender
como o ambiente esportivo pode favorecer movimentos autonômicos ou
heteronômicos e em qual grau fornecem possibilidades emancipatórias ou
reguladoras para os seres humanos que exercem, também, o papel de atleta.
Para caracterizar os parâmetros do contexto, buscamos suporte na teoria
bioecológica de Bronfenbrenner (2005), a qual proporciona um modelo para estudo
de processos de desenvolvimento em contexto. Essa perspectiva teórica tem sido
aplicada em diferentes estudos na área do esporte (VIEIRA, 1999a; VIEIRA, 1999b;
KREBS et al, 2011) e da Psicologia Social (JORDAHAL; LOHMAN, 2009; FLEARY
et al., 2010), mas ainda nenhum estudo utilizou esta perspectiva como forma de
compreensão da identidade em atletas. A teoria bioecológica propõe estudar o
desenvolvimento humano (BRONFENBRENNER, 1995) em quatro níveis de
contexto (micro-, meso-, exo- e macrossistema).
Os quatro níveis de contexto são diferenciados entre si de acordo com a
interação direta que o indivíduo tem em cada nível (BRONFENBRENNER, 1992). O
microssistema é o ambiente imediato (ex.: casa, escola, clube, etc.), no qual o
indivíduo atua diretamente, estabelece relações interpessoais (ex.: relação pai e
filho), executa atividades (ex.: cotidianas ou esportivas) e exerce um determinado
papel (ex.: papel de atleta, filho, etc.). O mesossistema é caracterizado por elos
entre dois ou mais microssistemas (ex.: casa-escola) que o indivíduo faz parte
diretamente configurando participações multi-ambientais, maior conhecimento e
comunicação entre os ambientes diferentes. Em terceiro nível, o exossistema
caracteriza-se por ligações entre dois ou mais ambientes, sendo que no mínimo em
um destes ambientes o indivíduo não atue diretamente. Contudo, ocorrem eventos
83
neste nível ambiental que podem influenciar o comportamento dentro do ambiente
imediato que contém a pessoa em desenvolvimento; por exemplo, a rescisão de
patrocínio pode influenciar o desenvolvimento do indivíduo no microssistema
“clube”, em que o atleta participa ativamente.
O macrossistema consiste em um padrão externo de micro-, meso- e
exossistemas característicos de uma determinada cultura ou um contexto social
maior, contendo normas, sistema de crenças, recursos, riscos, oportunidades,
estilos de vida, estruturas e padrões de intercâmbio social. O cronossistema se
refere à noção temporal, cronológica dos eventos (transições de carreira) e vital
(própria do indivíduo), em que ocorre o desenvolvimento (BRONFENBRENNER,
2005; KREBS et al., 2011).
Face ao exposto, o objetivo deste estudo foi caracterizar o contexto
bioecológico de jogadores de futsal brasileiros, visando analisar os elementos
significativos para o desenvolvimento dos atletas. Especificamente buscamos, com
base na teoria bioecológica do desenvolvimento humano de Bronfenbrenner (2005)
e na concepção do sintagma identidade - metamorfose - emancipação de Ciampa
(2009), evidenciar elementos do contexto que favorecessem a busca por
emancipação ou autonomia ao indivíduo ou que funcionasse como barreiras,
direcionando para a heteronomia e mesmice do processo de metamorfose
identitária.
Métodos
Estudo transversal de caráter qualitativo exploratório, com o objetivo de
analisar as características do contexto bioecológico experienciado por atletas de
Futsal. Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos da Universidade Estadual de Maringá (Parecer no 248363/2013).
Consentimento livre e esclarecido foi assinado por todos os participantes do estudo.
Seleção dos Participantes
A população do estudo foi composta por jogadores brasileiros de Futsal. Para
cobrir uma variedade de experiências esportivas, nós selecionamos uma amostra de
jogadores por conveniência em cada um dos times disponíveis. Foram selecionados
dois atletas de cada time para as entrevistas. Contudo, quatro equipes não
liberaram seus atletas para participar das entrevistas, e uma equipe liberou apenas
84
um atleta. A amostra final foi composta por 25 atletas. A segunda amostra foi
composta por sete treinadores, representantes de cada uma das equipes dos atletas
entrevistados. O critério para seleção dos participantes foi o nível de desempenho
das equipes (participação na Liga Nacional de Futsal 2013, que é uma das
competições mais relevantes do mundo, na modalidade). Nós solicitamos aos
treinadores que sugerissem atletas tidos como referência dentro da equipe, em
termos de desempenho técnico ou experiência. Nossa hipótese é de que esse atleta
representaria a cultura de equipe por ser o centro das relações estabelecidas na
mesma.
Instrumentos e Procedimentos
Entrevistas
As entrevistas seguiram um roteiro semiestruturado, com objetivo de
direcionar o discurso sem orientar a resposta de perguntas específicas. Os assuntos
abordados nas entrevistas seguiram os elementos dos parâmetros do contexto,
oriundos da teoria bioecológica, e a trajetória de carreira experimentada pelos
atletas. No início de cada entrevista, os atletas eram orientados sobre a
confidencialidade das informações, da utilização de aparelhos para gravação dos
depoimentos e da garantia de abandonar o estudo a qualquer momento. As
entrevistas foram conduzidas em uma sala privada, no local de treinamento ou no
hotel em que os atletas estavam hospedados, com duração de 20 a 40 minutos.
Transcrições foram feitas logo após cada entrevista e, caso mais informações
fossem necessárias, uma nova entrevista era agendada.
Análise Documental
Após cada entrevista com os atletas e treinadores, nós indagávamos os
participantes sobre documentos ou fontes de informações relevantes para a
compreensão da estrutura, funcionamento e organização da modalidade do Futsal.
A partir das entrevistas e uma análise prévia sobre as indicações, quatro
documentos (FIFA, 2014, CBFS, 2013, 2014a, 2014b) entraram para análise para
identificar elementos referentes ao macrossistema do Futsal.
Análise dos dados
Categorias do sistemas ecológicos. O método de análise dos dados aplicado
para caracterização dos sistemas ecológicos (micro, meso, exo e macrossistemas)
85
dos atletas foi o perfil idiográfico, caracterizado pelas etapas de análise indutiva e
dedutiva. Na etapa indutiva, as gravações foram transcritas gerando
aproximadamente 98 páginas digitadas em espaço simples. Independentemente,
dois pesquisadores identificaram os temas brutos (citações ou parafrases que
capturavam as ideias gerais dos depoimentos) caracterizando as respostas dos
atletas à luz dos conceitos utilizados como base para a entrevista. Essa análise
inicial gerou um perfil idiográfico de cada atleta (GRATTON & JONES, 2010). Na
sequência, através de extensas discussões, o consenso foi obtido sobre um perfil
conjunto de temas para cada atleta e respostas para cada atleta, assim como uma
lista de subtemas caracterizando cada indivíduo.
Os investigadores discutiram os perfis idiográficos dos atletas e todos os
temas subjacentes. Os temas emergentes foram agrupados sobre domínios em
comum, gerando uma lista de temas englobando todos os sujeitos da pesquisa. A
partir destes temas, uma análise indutiva com base no referencial teórico
determinou temas de maior generalização em relação aos temas evidenciados.
Cada seção geral (domínio) foi formada por um tema emergente de primeira ou
segunda ordem.
Para verificação suplementar da análise indutiva, os temas de primeira e
segunda ordem foram verificados através de uma análise dedutiva. Nesta etapa,
nós retomamos as transcrições das entrevistas e verificamos se todos os temas
emergentes e dimensões estavam representados nos relatos. Para fins de sigilo e
identificação dos depoimentos, atletas e treinadores foram codificados de acordo
com a nomenclatura A (A1, A2, A3...) para os atletas e T (T1, T2, T3…) para os
treinadores.
Associação com o contexto Bioecológico. Para a análise da associação entre
os paramêtros do contexto e a classificação dos atletas de acordo com o movimento
de expressão identitária (autonomia ou heteronomia), utilizamos o método de
análise de redes (BORSBOOM et al., 2011). Cada atleta foi categorizado de forma
dicotômica em (1) orientado para autonomia ou (2) orientado para heteronomia, a
partir do conteúdo das entrevistas.
A rede foi construída utilizando cada categoria do contexto identificada pela
análise idiográfica e classificação em direção para heteronomia ou autonomia. Para
tanto organizamos um banco de dados no qual foram categorizadas (de forma
dicotômica, com 0 = não e 1 = sim) as características do contexto expressas por
86
cada atleta em seu discurso sobre sua carreria esportiva. Assim, chegamos a um
banco de dados com 61 temas emergentes que caracterizaram as categorias do
ambiente bioecológico dos atletas e 2 representando autonomia e heteronomia,
totalizando 63 nodos (representações circulares na Figura 2). As hastes (conexões
entre os nodos) foram desenhadas para cada variável que apareciam
simultaneamente no discurso do mesmo sujeito, gerando assim uma matriz de
vizinhança com a frequência de co-ocorrências.
Nós aplicamos uma rede não-direcional, com algorítimo de posicionamento
que permite aproximar nodos com associações mais altas. Dessa forma, quanto
mais próximos os nodos maior é associação entre as variáveis. As hastes tiveram
uma disposição ponderada indicando que a espessura (intensidade da cor) exprime
a força da haste, que é o grau de conexão entre dois itens.
Utlizamos o descritivo APL (Tamanho médio de trajetória - Avarage Path
Lenght), que é uma medida que indica o grau de associação a partir do tamanho
médio de distância entre dois nodos na rede. Calcula-se a média de trajetórias
(hastes) que são percorridas para alcançar o nodo alvo. Quando menor essa média,
mais próximos os nodos são e maior é associação, como tem sido reportado em
outros estudos (Borsboom et al., 2011). Essa análise permitiu identificar ao grau de
associação entre as categorias do contexto e a orientação da expressão de
autonomia dos atletas (autonomia e heteronomia), evidenciando quais elementos do
contexto funcionam como possibilidades emancipatórias ou de colonização da
formação identitária. Todas as análises foram conduzidas com o programa
Linguagem R (R-PROJECT, 2015).
Resultados
Mapa bioecológico dos atletas de futsal
As ideias coletadas foram sintetizadas e organizadas em uma representação
esquemática da configuração do contexto bioecológico dos atletas de Futsal, em
relação ao desenvolvimento de suas carreiras atléticas (Figura 1). Os elementos
(círculos) conectados com o círculo central (atleta) representam os microssitemas, e
as conexões em vermelho representam o mesossitema. O exossistema está
representado por elementos que não se conectam diretamente ao atleta, mas se
relacionam indiretamente e se interconectam (linhas verdes) no macrossistema, que
87
compreende o ambiente cultural, político, econômico e valorização da modalidade
pela sociedade.
Figura 1. Mapa do contexto Bioecológico dos atletas de Futsal de elite brasileiros.
Organizamos a descrição do microssistemas em 4 ambientes que integram a
dinâmica dos conceitos de atividades, relacionamentos interpessoais e papéis
(Figura 1). O primeiro se refere aos sistemas diretamente relacionados à prática
esportiva, seja em uma escolinha de futsal ou futebol de campo ou a própria equipe
esportiva. A segunda dimensão do microssistema integra contextos relacionados à
formação acadêmica/profissional como escola (que não esportiva) e/ou ensino
superior (faculdade), e ambiente de trabalho que não o esporte. A terceira dimensão
aborda temas relacionados à família, tanto família na fase infantil como atualmente
na fase adulta, como esposa ou filhos. O último contexto evidenciado reúne
características da comunidade ou cidade na qual o atleta reside, também incluindo
elementos dos torcedores. A relação entre esses elementos de microssitema
determinam o mesossitema dos atletas de futsal.
88
Numa terceira estrutura, conseguimos identificar quatro domínios
significantes para caracterizar o exossistema, (1) a Diretoria da equipe aqui
representando os agentes que fomentam e organizam a modalidade no nível da
equipe e no nível das Federações, (2) Mídia, representando os agentes ligados à
publicidade e a propagação da modalidade no cenário regional, nacional e
internacional, (3) Setor Público/Privado, relacionado aos ambientes profissionais
que empregam as famílias dos altetas, financiam as equipes e representam os
interesses do capital relacionados ao esporte, e (4) Administração Pública, referindo
aos incentivos municipais e o respaldo de governabilidade que influenciam a
modalidade e a vida do atleta (Figura 1).
Os conteúdos das entrevistas com os atletas foram aglutinados em temas
emergentes que caracterizaram cada um dos elementos (categorias de primeira
ordem) dos sistemas ecológicos (categorias de segunda ordem) que configuram o
contexto esportivo do futsal (Figura 2). Para facilitar a descrição, organizamos os
resultados a partir do sistemas ecológicos com exemplos de trechos de discurso dos
atletas.
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90
Macrossistema
Sobre a primeira dimensão do macrossistema (Crenças, Figura 2), emergiu a
categoria de preocupação com o prazer evocado pela prática do futsal que
representa o fator intrínseco associado à carreira esportiva, conforme relato do
atleta A15:
Eu amo o que eu faço. Período de férias é legal na primeira semana e segunda semana, depois eu já
começo a ficar amargurado, porque você quer voltar a treinar, você quer voltar a jogar. Isso acaba
sendo muito intrínseco [...] a vontade de jogar que está no sangue (A15).
Percebemos uma presença forte da percepção pela valorização da
modalidade pela comunidade (torcedores ou moradores da cidade do clube), na
dimensão de Valores (Figura 2). Essa valorização se reflete na presença dos
torcedores nos ginásios, pelo contato com os atletas no dia-dia e pela participação
midiática nos clubes. Como retrata o depoimento:
Faz 6 anos que to em [nome da cidade]. Cria raiz, amigos. Pra ter uma ideia tem uma senhora de 86
anos que em todo jogo desde a série prata ela vai de cadeira de rodas com o vozinho, ela sempre ta
lá. Tu chega no ginásio e conhece todo mundo. Todo jogo, na maioria dos jogos tem 3.500 pessoas,
4.000 pessoas acompanham o futsal. Lá o pessoal vive o futsal (A2).
Apesar dessa valorização, fica claro também nos discursos que a modalidade
não alcança o cenário nacional, principalmente quando comparada ao futebol de
campo. Os relatos sugerem pouco investimento, situações precárias de contratos de
trabalho, pouco impacto midiático e desvalorização em relação a outras
modalidades que são olímpicas como o voleibol e futebol de campo (Figura 2).
Neste contexto, o reconhecimento do atleta de futsal também emergiu como
um elemento negativo. Temas como sentirem-se cobrados ou percebidos pela
comunidade como famosos, ou como tendo bons ganhos financeiros por aparecer
na televisão, serem tratados como atletas de futebol de campo apesar de não
receber o mesmo investimento ou ter a mesma estrutura de organização; e, por fim,
serem reconhecidos profissionalmente apenas quando estão vencendo jogos
(Figura 2). Alguns relatos ilustram bem a percepção distorcida de reconhecimento
pelo papel de atleta:
Ah eu quero ganhar titulo [...], toda competição que eu to que quero ganhar, não quero saber de ah
eu já ganhei isso, ganhei aquilo ta bom, não, as portas só se abrem aos vencedores. Isso eu tenho
plena consciência, e tem que ta ganhando, não adianta jogar 2,3 jogo bem e não ser campeão, tem
gente que se contenta em ganhar jogo, eu quero ganhar titulo, os cara fala quem foi campeão lá, o
sucesso da equipe é o sucesso individual de cada um (A8).
91
Ah quando ganha sempre ta tudo bem [...], e quando perde a gente sempre fica um de cara feia pro
outro, assim, sempre tem uma influência quando perde, mas no geral é tranquilo [...], um ajuda o
outro, procura ajudar quem ta mal, pra no próximo jogo ir bem (A11).
Sobre a categoria da Estrutura, relatos evidenciaram a falta de organização e
precariedade da modalidade (Figura 2) e a incerteza quanto à situação profissional.
Atrelado aos temas relacionados a pouca estrutura, também aparece a precarização
dos contratos de trabalho e da situação empregatícia do atleta. Alguns atletas
sequer reconhecem a prática como profissionalizada. As próprias equipes tem
pouca estrutura financeira, o que não garante a continuidade do time ano após ano,
como relata o atleta A7:
o esporte está valorizado no Brasil. só que eu acho que às vezes, o time tem 5 mil pra te dar, tem
alguns que falam não e falam mal, só que tem 3 jogadores que aceitam mil e quinhentos. A eu jogo
por 3 mil, o cara não vai pagar 3 mil, eu posso pagar 2. Porque eu vou contratar um por 3 mil se eu
posso pagar 2? Normal [...], tem muita gente que não quer parar de jogar, tem qualidade mas está
acertando só por causa disso, a, pra mim mil e quinhentos está bom. Acho que patrocínio também
tem muito, é só a pessoa querer fazer um pouquinho de esforço que a pessoa consegue o dinheiro
[...] (A7).
Poucas equipes conseguem ter continuidade e oferecer planejamento de
carreira ao atleta, sem discutir a formação de talentos ou pessoal através do esporte
(Figura 2). Estas características serão revisitadas nos discursos referentes à outras
estruturas do contexto bioecológico.
Microssistema
Como principais características do microssistema, destacamos o ambiente
diretamente relacionados à prática esportiva, seja em uma escolinha de futsal ou
futebol de campo, ou a própria equipe esportiva. O segundo ambiente relatado
integra contextos relacionados à formação acadêmica/profissional como escola (que
não esportiva) e/ou ensino superior (faculdade), e ambiente de trabalho que não o
esporte. Temas relacionados à família, tanto na fase infantil como na fase adulta
também estiveram presentes e o ambiente que reúne características da comunidade
ou cidade na qual o atleta reside, incluindo elementos dos torcedores.
Configurando as Atividades, é possível perceber que a entrada no futsal
usualmente ocorria por diversão, praticado no contra turno da escola (Figura 2).
Estes discursos indicam o comprometimento prematuro com a prática, o que parece
ser influenciado pelo objetivo de ser um atleta de futebol desde a infância. Contudo,
92
com a evolução da prática, o comprometimento do atleta aumentava, junto com a
percepção de possibilidades de emprego por meio do futsal/futebol de campo,
conforme depoimento a seguir:
[…] comecei com 5 anos a tomar gosto pela competição eu comecei a treinar muito novo, então eu
falei eu vou levando e vamos ver ate onde vai dar, e a única coisa que eu quero é seguir estudando
então vou tentar levar pros jogos e fui levando e quando eu vi que eu estava em um time de ponta no
caso o [nome do time] com 18 anos eu realmente falei já to aqui demorei pra caramba pra chegar
agora eu vou seguir em frente (A14).
Outra categoria foi o impacto das políticas de identidade do papel atleta sobre
a vivência e desenvolvimento do adolescente envolvido com o esporte.
Especificamente com relação à educação, transformando outras atividades molares
em moleculares que acabam perdendo força e entrando em descontinuidade. Cabe
ressaltar, que esse comprometimento ou vislumbre de uma profissionalização com a
prática esportiva, ocorreu para estes jogadores por volta dos 13 a 15 anos, diferente
de carreiras vocacionais que usualmente iniciam-se após o ensino médio (por volta
dos 17 a 19 anos). Os relatos dos atletas A10 e A11 ilustram essa ação das
Políticas de Identidade:
Olha no [nome do time] esportes, sob o olhar dos meus pais eu sempre deixava meio a desejar [...],
eu sempre queria deixar de lado os estudos e sempre fui apaixonado pelo que faço até hoje, sempre
fui apaixonado pelo futsal entendeu, então eu matava aula mesmo pra brincar com a rapaziada, e
acabava enganando meus pais [...], [...] aonde é que eu acabei deixando pra trás, que quando eu fui
ver que aula não era pra mim, não tinha cabeça mais para estudar porque eu tava muito atrás dos
outros alunos (A10).
Ah quando eu decidi mesmo que eu, na verdade desde pequeno era o sonho de ser jogador sempre
[...] foi a partir dos 18 anos que começou a ficar mais sério o negócio, eu comecei a ganhar os
primeiros salários tal (A11).
Ao tratar das Atividades, os atletas expressaram temas referentes à
experiência com a prática do futsal (Figura 2). Um dos domínios identificados foi o
de dificuldades instrumentais com a carreira, pouco investimento e auxilio financeiro
aos atletas, alguns relataram ter dificuldades para se estabelecer e se alimentar:
Eu com 14 anos com essa trajetória toda, eu já fui pra vários times de campo. O [nome do time], que
eu estava no [nome do time], o meu pai deixou eu ir, eu cheguei lá e não tinha o que comer. O
quartel ficava a 4 km de onde a gente treinava. O treino acabava as 11:30 por aí, e no quartel servia
comida até 12:00. Se tu não chegar lá. Então nós não tínhamos tempo pra chegar lá. Tinha 3 km pra
caminhar, não conseguia (A2).
93
Todos os relatos apontaram que as primeiras experiências com o esporte
foram na escola, com a prática de diversas modalidades (Figura 2). De maneira
semelhante, os relatos sugeriam maior identificação com a prática de exercícios
físicos nas aulas de educação física e com o professor da disciplina, evidenciado no
relato do atleta A2:
Com 5 pra 6 anos eu comecei a frequentar o colégio, aí eu comecei a frequentar esportes. Comecei
no futsal até os 12 anos se não me engano. Depois junto com o campo. Mas ali também tinha como
tem hoje, basquete, handebol, o geral. Eu sempre participei em tudo. Na seleção do colégio desde o
atletismo até, mesmo sendo baixinho, no basquete, vôlei. Disputei estaduais com 15 e 16 anos no
basquete, vôlei, handebol (A2).
Por fim, sobre as Atividades do microssistema, em uma etapa mais avançada
da trajetória esportiva dos atletas, a vivência acadêmica/vocacional retorna como
uma alternativa à carreira esportiva. Relatos demonstram a busca de alguns atletas
por formação educacional, até mesmo a nível superior, como plano secundário de
futura atuação profissional. Outros apontam o retorno à formação educacional após
alcançar uma consolidação da carreira atlética, como relata o atleta (A4):
a carreira é curta então o cara tem que saber fazer as escolhas certas, foi por isso que eu decidi
procurar a vida acadêmica, para dar uma base, porque se o esporte não desse certo, eu tinha uma
coisa na minha vida então (A4).
Sobre a dimensão de Relacionamentos Interpessoais, emergiram temas
associados à forte vinculação entre os atletas, caracterizando padrões de
relacionamento interpessoal. Os relatos evidenciam que no início da carreira
esportiva muitos atletas mudam de cidade para jogar, vivendo em casas juntos com
outros atletas. No relato do atleta A1, esse relacionamento com outros atletas
configura uma "família”, como exemplificado no trecho:
quando eu fui jogar fora, a gente criou um vínculo de amizade que é totalmente diferente. Porque
hoje em dia a maioria dos jogadores são casados, de outros estados, acaba que tu tem, é claro, a
gente passa muito tempo junto, mais que com a família, seria uma família mas naquela época tu
treinar com outro atleta e chegar em casa vai estar o atleta, aí tu acordar vai estar o atleta, sabe é
bem diferente, muda muito do que hoje. Tu vai lá, trabalha com o cara, tu vai pra sua casa e o cara
também foi pra casa, pra ver a esposa, você pra ver tua esposa (A1).
Em paralelo, além dos atletas, os treinadores acabam se tornando influências
significativas para os atletas, na maneira como estes se relacionam com o contexto
esportivo. Contudo, essa influência nem sempre é positiva, principalmente com
94
treinadores que cobram exageradamente por resultados. Os depoimentos ilustram
essa ambivalência da relação com o treinador:
foi o treinador que me cobrava muito me exigia muito, eu não sei se ele marcou positivamente ou
negativamente, quem sabe ele cobrava tanto por ver em mim um grande potencial, com o passar do
tempo eu comecei a olhar por esse lado, na época eu não gostava muito, só que hoje, depois de 4, 5
anos que eu sai de la, eu vejo que ele me via com outros olhos, via esse potencial, só que tem que
trabalhar, então quem sabe foi o cara que marcou, eu não sei até hoje se foi positivo ou negativo,
mas eu acho que foi um cara que marcou sempre aquela cobrança. (...) É que era uma cobrança
diferente [...], a fama dele não era muito boa, de ser um treinador muito exigente, por mais que
fizesse, se dedicasse 100%, [...] as vezes até cobrava na frente dos colegas, que deixava a gente
meio mal assim na frente dos colegas, mas eu tinha ja meus 22, 23 anos já era um pouquinho mais
maduro, quem sabe fosse um moleque eu tinha chutado o balde, só que como eu via naquilo ali
também meu futuro (A8).
Por volta de 9 anos eu comecei na própria escola, tinham os meus professores que também eram
treinadores de clubes e foi na hora que já começou aquela separação (vem cá você vai treinar
comigo), aí foram dando o direcionamento que acabou indo pro futsal e acabei me adequando e tô
até hoje. (...) Eram pessoas assim muito legais, muito boas, tive sorte de pegar treinadores que não
tinham tanto enfoque assim ou só o enfoque da questão da vitória, mas de uma formação
educacional dentro do esporte, que pra mim foi fantástico (A15).
Os atletas relataram boas relações com a família, em especial no que se
refere ao suporte para a prática esportiva. Em alguns relatos a prática esportiva era
influenciada diretamente por um membro da família que também era atleta ou que
foi atleta em algum momento da vida. Essas relações são ilustradas nos recortes de
entrevista a seguir:
[...] não no meu caso não porque minha esposa é muito parceira não me cobra questão de presença
porque ela entende, ela já ta comigo há 4 anos, [...] a gente consegue conciliar o máximo que pode,
toda folga que eu to eu procuro ta junto deles, participar a maior parte do tempo do crescimento da
minha filha que eu acho que isso é importante (A5).
[...] a eles faziam tudo pra me ajudar [...]. O meu pai já jogou já. E minha mãe também gosta, sempre
ia nos jogos, não faltava em nenhum jogo, e se tivesse que trabalhar ela faltava no trabalho pra ir.
Ela fazia de tudo pra gente ir jogando, fazia lanche (A7).
No que se refere ao Papel (Figura 2), os atletas relatam promessa de
ascensão social e estabilidade pelo esporte. Relatos mostravam que o Futsal
proporcionava bons salários, possibilidades de mudanças comportamentais como
evitar drogas, tendo ainda impacto no desenvolvimento pessoal por se distanciar da
família e precisar "se virar" sozinhos, como relata o atleta:
Se não fosse futsal de me dar oportunidade acho que eu não teria me dado bem, todos meus amigos
da infância ou morreram ou foram preso, se meteram com coisa errada então o lado positivo é esse
95
do esporte então eu só tenho que agradecer [...] o esporte só traz coisa boa, é saúde, é paz, é
tranquilidade, te faz te da uma paz de espírito muito grande (A4).
Foi possível verificar que os atletas se identificavam com a personagem de
pai ou marido (Figura 2). É interessante notar uma característica repetidamente
relatada ao descrever suas relações com as famílias, demonstrando uma
ambivalência em relação à distância da família, que o esporte acaba promovendo
pela sua característica de viagens e competição. Para alguns, os discursos giraram
em torno de manifestações de saudade, enquanto para outros atletas a distância da
família auxiliou no amadurecimento pessoal, conforme relatos:
geralmente a gente fica longe, e eu vejo muitas vezes as pessoas que estão perto da família e que
poderiam ser mais carinhosas, porque não é fácil ficar longe da família, das pessoas que tu gosta e
lá no final sabe que se Deus quiser as coisas vão melhorar e poder dar o que tu deseja para as
pessoas que tu ama (A3).
o negativo é que tem muitas viagens tem muitos treinos que são necessários então a gente fica
longe da família não tem a oportunidade de ver os filhos crescer visitar os pais ainda mais os meus
que estão longe (A5).
Um domínio que emergiu quanto aos Papéis do microssistema (Figura 2) foi
uma relevância da comunidade para a sua definição identitária. Os atletas relataram
o acolhimento que recebiam das cidades pelas quais iam jogar, principalmente com
o tom de reconhecimento do seu papel enquanto atleta, como demonstram as falas:
Foi onde tudo começou, onde a torcida abraçou o time, que lotou a primeira vez o ginásio. Você
olhava na cidade, era todo mundo de amarelo, era prédios com, sabe. Faziam camisetas de 50 60
metros que desciam os prédios. Foi uma loucura, foi um absurdo. Então foi ali que começou (A2).
[...] ainda mais que a [nome do time[ em [nome da cidade] é uma cidade que é muito hospitaleira,
acolhe muito legal todo mundo em São Paulo em um ano eu não conheci meus vizinhos, e lá em
uma semana meu vizinho, desce aí e vamos tomar uma cervejinha e tal, e isso é muito diferente no
lugar aonde tu vai, porque as vezes o atleta pode estar feliz, mas aí tu mora em um lugar ruim, sabe,
tu acaba já não rendendo o que poderia render sabe (A15).
O Futsal tem uma presença forte em cidades mais interioranas, fora de
grandes centros que são tomados por equipes de futebol de campo ou voleibol, por
exemplo. Dessa forma, os atletas são conhecidos por toda a cidade, e reconhecidos
como atletas mesmo em outros contextos. Este reconhecimento parece dar
importância ao atleta, proporcionando destaque e acolhimento por parte da
comunidade e torcedores.
96
Mesossistema e Exossitema
Na análise do mesossistema, encontramos uma forte característica de
participação multiambiental entre o ambiente familiar dos atletas e a sua equipe
esportiva. Também, de comunicação interambiental da prática esportiva sobre a
vida acadêmica/vocacional. Menos presente, evidenciamos elementos de
conhecimento interambiental da comunidade e do reconhecimento dos atletas em
suas participações esportiva (Figura 2).
A participação multiambiental da família exerce uma influência importante
para que os atletas não percam de vista a relevância da continuidade dos estudos
durante a experimentação e especialização esportiva, caracterizando a
comunicação interambiental como elemento que potencializa a experiência e
diversidade de atividades molares. Os atletas relataram perceber cobrança dos pais
para que continuassem os estudos apesar de perseguirem, simultaneamente, a
carreira atlética. Contudo, notamos também que essa cobrança se estende até,
aproximadamente, o ensino fundamental ou médio, conforme relato:
Meus pais sempre foram muito tranquilos e sempre falaram ó quer jogar? tem que estudar, minha
única cobrança era estudar ter notas boas no colégio pra fazer o que queria e de treinador também
(e você sempre levou o estudo junto?) sempre até hoje eu faço administração [...] to no sexto período
dois períodos de me formar e pra mim isso vai ser uma felicidade incrível poder dar isso pros meus
pais sempre falaram que tem que estudar e seguir jogando e hoje estou conseguindo me formar sem
gastar um real tendo bolsa do clube então pra mim ta sendo maravilhoso (A14).
A participação multiambiental no esporte sobre o contexto educacional, por
sua vez, tem efeito inverso no período de investimento da carreira esportiva (Figura
2). Os atletas por volta dos 17 anos relataram abandonar os estudos, ou ter muita
dificuldade em acompanhar uma carreira educacional para se especializar na
prática esportiva. No entanto, alguns atletas reportaram o interesse em retomar as
atividades acadêmicas/vocacionais quando conseguiram alcançar uma estabilização
da carreira esportiva, visando a vida pós aposentadoria do esporte, o que
caracteriza uma comunicação interambiental importante para o desenvolvimento do
atleta, como exemplificado na fala dos atletas:
com 13 anos quando eu sai da escola e fui para um clube federado que foi o atlético (...), de positivo
foi que eu aprendi uma série de coisas como atleta a se portar como atleta questão de horários dos
treinamentos se dedicar mais de investir mesmo nesta parte e o ponto positivo é que um período
assim eu larguei os estudos isso foi ruim (A5).
97
É uma idade que decidi até muita coisa, ou você vai jogar mesmo ou vai estudar. E eu até na época
tava meio desiludido com o futebol. E como eu sempre joguei futsal eu falei a vou jogar futsal e
estudar [...]. Seria alguma coisa normal. E acabou dando certo. Hoje em dia eu só jogo futsal (...)
Quando eu entrei, passei na faculdade cheguei a fazer um ano e depois eu fui jogar no Minas e
parei. Voltei pra São Paulo e voltei a fazer faculdade, eu tentava conciliar. (A20).
Ao longo da trajetória, os pais perdem parte da importância, dando lugar às
próprias famílias que os atletas constituem (Figura 2). Esta família influencia os
atletas pela distância que acabam tendo devido às viagens e demandas do esporte.
Mas, também caracterizam uma força de comunicação interambiental entre o atleta
e as famílias dos colegas de equipe, favorecendo o comprometimento do atleta e
sua integração com o grupo. Quando um atleta chega no clube no qual as famílias
não interagem entre si, o relato aponta que a integração entre os atletas e própria
adequação ao clube sofrem influências:
Como tu viu ali, todo mundo combinando pra ir num parque pra jogar um pôquer. Então acho que até
o [nome de um colega de equipe] comentou, a esposa dele chegou e comentou com a minha esposa
que é difícil encontrar isso no meio do futebol, que ela ta se sentindo bem. (...) e que aqui ela se
sentiu, se estranhou quando ela chegou, porque no primeiro dia as gurias levaram, que nem agora,
estamos aqui, hoje, as gurias fazem uma janta la em casa outro dia na outra, tudo junto entendeu?
(...) Então isso, acho que tu vê sua família se sentindo bem, o atleta se sentindo bem, tu começa a
criar um vinculo com o clube (A2).
Uma situação recorrente nos relatos foi de que a participação multiambiental
com a família também era um fator determinante para lidar com a falta de estrutura
no início da carreira esportiva. A maior parte dos clubes não apresenta recursos
financeiros e estrutura para investir em jogadores de base, as famílias precisam
prestar o suporte financeiro e instrumental necessário para a prática (Figura 2).
Evidenciamos também o relato de atleta sobre a objeção dos pais com a
profissionalização esportiva, por potencialmente afetar o desenvolvimento
vocacional do atleta, como sugere o relato:
Meus pais até apoiavam assim de certa maneira [...], no meu caso praticamente, já tava trabalhando
[...], e jogava, ai eles tiveram receio assim [...] quando falei que ia para de trabalha pra joga, mais
agora eles estão ai [...] apoiando [...]. Rapais eu trabalhava mais pra isso [...] porque eu não tinha um
suporte financeiro da família e da equipe [...], eu precisava de dinheiro pra mim me mante (A3).
Para alguns atletas, apesar das dificuldades, a escolha pela carreira no
Futsal foi feita de forma autônoma, a partir do desejo de ser atleta (Figura 2).
Diferente de ser apenas uma expressão de políticas de identidade, essa escolha
parece sugerir uma direção de formação de uma identidade política de atleta, a
98
partir de um conhecimento interambiental de experiências fora do contexto do
esporte e do próprio esporte, com estabelecimento de um projeto de vida associado
de utilizar o esporte para se desenvolver pessoalmente, como sugere a entrevista
do atleta A4.
Quando eu me formei que eu consegui já um status profissional que eu tinha uma profissão que eu
decidi atuar no futsal, tive que abdicar de algumas coisas para me dedicar ao futsal, [...] foi quando
surgiu a oportunidade lá em [nome da cidade] de jogar a liga nacional com 18 19 anos eu jogava no
nacional e em 1999 quando o [time do atleta] tava a primeira equipe na liga, era meu primeiro ano no
juvenil. Joguei a primeira liga, e continuei jogando lá em [nome da cidade] e em outras equipes, tive
muitas propostas para sair de [nome da cidade], ir para o sul, mas sempre procurei me dedicar a
profissão que eu tava tentando, só que tava estudando, [...] quando eu me formei, eu decidi jogar
futsal profissionalmente (A4).
Não é surpresa que essa fala está associada a um atleta que tem diferentes
participações multiambientais ao longo de sua carreira, favorecendo a exploração
de outros personagens ao vivenciar o ensino superior e também uma profissão fora
do esporte para conseguir o sustento (Figura 2). Dessa forma, a escolha pela
carreira de atleta se da num momento em que a decisão pode ser mais autônoma.
Relatos semelhantes sugerem que o ingresso no esporte permitiu a fuga de
situações de risco sociais, como relata o atleta (A7):
[...] droga, onde eu morava tinha muita coisa disso. Meu pai se separou da minha mãe quando eu
tinha 13 anos, então eu era um pouco revoltado, eu era muito briguento. No esporte eu esqueci um
pouco disso, [...] mas se não fosse o esporte eu podia até estar fazendo alguma coisa aí de errado,
de repente (A7).
Caracterizando a Comunicação Interambiental (Figura 2), identificamos que a
forma como as equipes e a modalidade se estruturam desfavorecem o
desenvolvimento pessoal e atlético. Relatos apontam o estado precário das relações
de trabalho estabelecidas entre o atleta e as equipes, em especial pelas políticas de
contratação definidas pela diretoria das equipes. Poucas equipes, conforme relatos
dos treinadores, tem contratos que duram 12 meses, e, um número menor ainda,
paga direito trabalhista como 13o salário ou férias aos atletas. Em geral, esses
benefícios são alocados para atletas que tem maior destaque de desempenho e são
analisados caso a caso pelas diretorias das equipes. Ainda, os contratos costumam
iniciar e terminar no mesmo ciclo que a temporada, portanto, no casos das equipes
com menor destaque, podendo durar apenas 9 meses. Os relatos indicam que
esses contratos podem ser terminados a qualquer momento sem nenhum tipo de
99
proteção para o atleta, podendo, por vezes, nem existir um contrato no papel e
assinado pelas partes. Essa situação foi relatada por diversos atletas, conforme
destacado na entrevista com o atleta A1:
porque mesmo o cara que tem moral, o atleta mais experiente, se ele não demonstrar em um ano, o
contrato do outro ano não vai ser o mesmo, então isso é, a gente sabe que se a gente fizer um bom
ano, tu vai ser reconhecido lá no final (A1).
A falta de estrutura burocrática e até trabalhista para o atleta gera incerteza
quanto ao ambiente de trabalho. Dificulta o planejamento de vida em longo prazo, e
influencia diretamente na carreira do atleta e indiretamente na formação de sua
família, que acabam precisando se mudar de cidade para acompanhar a
instabilidade da vida atlética (Figura 2). No caso do atleta A2, configurando um tema
de Ligação Indireta entre ambientes, sua carreira poderia ter sido terminada
precocemente por influência do interesse principalmente no aspecto financeiro da
diretoria da equipe, na qual iniciou sua carreira. Por duas vezes o atleta conseguiu
atrair o interesse de equipes maiores do futebol de campo, mas não foi liberado
para assinar contrato com a outra equipe porque sua diretoria exigiu um valor alto
pelo seu "passe", como fica evidenciado no depoimento abaixo:
Por ter diretores que pensam mais no financeiro do que no próprio atleta, o clube queria 40 mil por
mim. Então ele pediu 40 mil pro clube pra me liberar. Porque não tinha aquela lei Pelé. Então eu teria
que ficar vinculado com o clube até os 18 anos ou ter parado de jogar. Aí meio que eu me
decepcionei com o campo [...]. Os caras falaram, 40 mil eu posso trazer um jogador profissional pro
meu time e tu tem 14 anos e quando chegar nos 18 de repente não vai jogar o que tu joga. É uma
incerteza [...]. Então ele não quis investir. (...) Ele era amigo do presidente e conversou e tal, e o cara
me liberou pra eu ir. Aí fui no [nome do campeonato] novamente e tiramos o [nome do time] fora, o
[nome do time], e pegamos o [nome do time] na semifinal. Perdemos mas acabei fazendo 2 gols
também. Aí o mesmo cara que queria me levar veio de novo. Daí era pra eu seguir no campo. Aí
chamou o meu pai e todo mundo e tal. Eu achava que eu já era do [nome do time] no meu contrato,
mas não. Eu pertencia ainda pro outro cara. Então aconteceu praticamente a mesma coisa. Então ali
foi uma decepção geral. Falei pro meu pai que não quero mais saber (A2).
Por outro lado, equipes com maior estrutura de formação atlética, com
contratos bem estipulados e direitos concedidos aos atletas, criam ambientes mais
favoráveis de rendimento esportivo, de manutenção da carreira e planejamento de
vida, conseguindo manter atletas por mais tempo, como retrata o atleta (A19).
Contudo, essa não é a realidade da modalidade no Brasil.
pro clube, uma criança, um menino que vem, que o clube cria até o juvenil, depois o cara vai arranca
ele por questão de mil reais, então, ao mesmo tempo que a gente briga por nós, o clube tem que
brigar por eles, então tem que ver até que ponto que vale, o clube investir numa criança até o final e
100
não comprar ela pronta, tudo vai disso daí, mas eu acho que partindo disso, de associações [...] é
deixar mais a voz do atleta nas opiniões de grupo (A19).
Sobre o Conhecimento Interambiental (Figura 2), percebemos a importância
dada pela forma como a modalidade e seu desempenho é veiculado na mídia, seja
no sentido positivo ou negativo. Principalmente, porque a forma como o futsal é
apresentado nos espaços midiáticos não representa a situação real da modalidade.
Fica claro na fala dos atletas que a mídia cria uma expectativa e distorce a
realidade, de forma que os atletas são encarados como jogadores de grande
rendimento, como são os de futebol de campo. Isso demonstra como a Política de
Identidade adotada fica incongruente com a personagem, e em outra análise, gera a
falta de unidade entre a personagem vivida (no campo objetivo) com o projeto de
vida (subjetivo) de ser um atleta altamente reconhecido. Contudo, a realidade é
diferente, e a magnitude do reconhecimento e rendimento financeiro de atletas de
elite de futebol de campo e de vôlei é superior aos de atletas de futsal, conforme
relatos (A6) e (A23):
acho que a maioria das pessoas que veem a gente na tv acha que a gente ganha milhões, mas não
é. Olha é bem pouco esses atletas que ganham muito bem (A23).
Uma parte da imprensa assim, acho que é aquele negócio do senso do como eu sou de [nome da
cidade], Ah... o menino de [nome da cidade] nunca vai pra frente, nunca vai sair daqui, não adianta,
pessoal de casa não serve, tem que tá vindo de fora. Isso que é o negativo memo (A6).
Essa distorção afeta a percepção cultural do atleta de futsal frente a sua
comunidade e torcedores. Em contraponto, a modalidade não recebe o mesmo
destaque de outros esportes na grande mídia (Figura 2). Apenas alguns canais
pagos transmitem os jogos de futsal, fenômeno que ainda é recente e que tem
ajudado no desenvolvimento da modalidade. Esse é um elemento relevante para a
evolução da modalidade como um todo, nessa lógica de que maior destaque
midiático atrai maiores financiamentos privados e a atenção dos órgãos de
governança pública. Esse fato geraria mudanças nas outras camadas do contexto
bioecológico dos atletas, favorecendo o seu desenvolvimento. Entretanto, essa
relação não é linear, o maior conhecimento interambiental midiático também
favorece processos como reconhecimento perverso, mesmice, ou mesmo
exemplificando a colonização do mundo da vida do esporte, pela ordem sistêmica
gerando ainda mais a cultura do culto ao vencedor, ao sucesso em detrimento aos
valores esportivos. Estes fatos estão evidenciados no depoimento do atleta A10,
101
que teve sua especialização no esporte desde os 5 anos de idade e recebendo
reconhecimento para tal:
não tenho condições financeiras [...], minha família não tinha condições, quem me bancava mesmo é
os pais dos atletas que conviviam comigo [...] que faziam uma vaquinha [...] na época, pra pagar
todas as minhas despesas, mensalidade, e até mesmo cada gol que eu fazia por partida como
incentivo (A10).
Neste contexto, a situação econômica e de trabalho da família do atleta,
quando na iniciação, aparece como um elemento importante para o engajamento ou
continuidade na prática (Figura 2). É interessante como o sentido atribuído pelo
atleta a esta característica modifica-se nas diferentes narrativas. O atleta A13, por
exemplo, sugere em seu relato que a situação financeira ruim de sua família foi um
dos fatores motivadores para a profissionalização no esporte:
Principal motivo era de querer ajudar a minha família, tirar a minha família da carência, e sempre
sonhei ser um jogador não famoso, mas sempre ta conhecido e ajudar minha família, comprar uma
casa pros meus pais, ter a minha casa (A13).
Essa história se repete em diversos discursos, inclusive recortes midiáticos
sobre a história de diferentes talentos esportivos de diferentes modalidades (Figura
2). Por outro lado, outros atletas relatam as dificuldades enfrentadas na carreira pela
falta de estrutura familiar, como suporte instrumental à prática, podendo em
momentos apresentar dificuldade para satisfazer necessidades básicas como
alimentação e moradia.
De forma semelhante, sabe-se que muito do financiamento para essas
equipes esportivas vem de instituições privadas. O sucesso da modalidade na
cidade do interior do estado atrai a atenção de indústrias que apoiam fortemente a
equipe. Contudo, essa realidade não é tão comum, como sugeriram as falas dos
treinadores. T7 relatou que seu time de uma cidade do interior tem muita dificuldade
em conseguir investimento e patrocínio, de forma que seu time não consegue
manter uma continuidade ou estabelecer um planejamento de longo prazo. Ainda,
outro aspecto bastante comum é a instituição de ensino superior patrocinar equipes
em suas cidades, oferecendo bolsas de estudos para os atletas em troca do
marketing com a equipe. Esta ação auxilia as equipes a tentarem uma oferta mais
atraente aos atletas, mesmo sem se relacionar diretamente a valor monetário. Como
ressalta o atleta A20, essa situação favorece, por vezes, a abertura de
possibilidades de vida até então não vislumbradas pelos jogadores:
102
[nome da cidade] é uma cidade que a comunidade tem sua parcela, tem uma grande empresa.
Porque você vai a grandes centros é muito difícil ter um time de futsal forte, porque o foco é outro, é
no futebol. Então eu acredito que tem que ser mais ou menos isso. Ajuda da comunidade, das
empresas, porque aí sim você consegue exercer a profissão que já que a concorrência com o futebol
é muito grande e o espaço é pouco infelizmente. (A20).
Referindo às legislações e o respaldo de governabilidade regional e nacional
que influenciam a modalidade e o desenvolvimento do atleta (Figura 2). O auxílio
público para o Futsal parece ser fundamental, como sugeriram os treinadores. No
entanto, mais importante que os auxílios financeiros são as políticas de incentivo ao
esporte que favorecem a criação de equipes esportivas.
Associação entre o contexto bioecológico e as direções do movimento
identitário no discurso dos atletas
A Figura 3a mostra a associação em rede entre as características do contexto
que foram mais presentes no discurso dos atletas. Essas características indiacam o
grau de associação com a classificação dos indivíduos (autonomia e heteronomia).
Valores mais baixos (na Figura 3b) indicam maior associação. Dessa forma, as
características do ambiente (descritas anteriormente) mais associadas à autonomia
(possibilidade emancipatória) foram “diferença de maturidade” (ao profissionalizar-se),
“esporte vs. drogas/criminalidade”, “percepção de futuro”, "início com futsal e futebol" e
"influência familiar para continuar nos estudos". Para a heteronomia (possibilidade
colonizadora) as maiores associações foram com as característica do ambiente de
"abandono da escola para jogar", "diferenças entre futsal e futebol", "cobrança por
estudos", "modelos para políticas de identidade" e "pouco reconhecimento" (Figura 3b).
103
Figura 3a. (a) Rede de associações (proximidade e intensidade da cor das hastes) entre as características do contexto bioecológico e orientação dos atletas (nodos – círculos) e (b) valor médio da do tamanho da distância (hastes) entre as variáveis do ambiente e as orientações dos atletas (autonomia e heteronomia).
104
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105
Discussões
Este estudo buscou investigar o contexto, na perspectiva bioecológica,
associado ao desenvolvimento da carreira atlética em atletas de Futsal. A análise foi
delineada de forma a identificar elementos do contexto que potencializassem
possibilidades emancipatórias ou de colonização para a formação identitária dos
atletas. Esta abordagem é inovadora, visto que nenhum artigo foi identificado, até o
momento, que investigasse o contexto bioecológico em atletas de Futsal, com
especial atenção para a formação da identidade na perspectiva do Sintagma
Identidade - Metamorfose - Emancipação.
Os resultados evidenciaram que o contexto esportivo do Futsal apresenta
características que instigam ou inibem a expressão identitária autonômica. Três
grupos de características do contexto foram evidenciados. O primeiro que seriam
características ambivalentes, que funcionariam como possibilidades emancipatórias
ou de colonização de acordo com o sentido atribuído pelo atleta, a segunda são
características que favorecem metamorfoses direcionadas à autonomia, e, a terceira
são características que possibilitam metamorfoses de reposição identitária
(CIAMPA, 1987), favorecendo a mesmice ou a feitichização do personagem (LIMA,
2010) atleta de Futsal.
Esses resultados suportam nossa hipótese inicial de que o esporte não
proporciona, essencialmente, características instigativas de desenvolvimento,
apesar da ampla literatura sugerir o contrário. Diversos estudos sugerem a
influência do esporte no desenvolvimento de habilidades positivas (FRASER-
THOMAS, CÔTÈ & DEAKIN, 2005) e, apesar de concordarmos com essa
perspectiva, desfechos negativos também estão associados a exposição ao
contexto esportivo.
Como os resultados ainda são inconsistentes, nossa hipótese foi delineada
na perspectiva de que existem variáveis ainda não estudadas satisfatoriamente. No
nosso caso, a identidade, que poderia mediar essa relação entre a carreira atlética e
um desenvolvimento autonômico, na direção do que é considerado um "viver bem"
(HABERMAS, 1990). Um resultado que merece destaque é a possibilidade que o
esporte proporciona de profissionalização e carreira para muitos jovens que vm de
famílias de pouca condição socioeconômica e financeira, configurando um elemento
potencialmente favorável. Este resultado foi semelhante aos encontrados em
diferentes modalidades esportivas como futebol de campo (HECIMOVICH, 2004;
106
MORAES et al, 2004). Entretanto, essa característica precisa ser analisada com
cautela, porque essa profissionalização pode estar associada à outras
características não favoráveis, como o abandono da formação escolar, muito
comum nos relatos dos atletas deste estudo e também evidenciada na literatura
(VISSOCI, 2009), e distanciamento familiar.
Esse resultado atrai preocupação porque, ao falarmos do Futsal, estamos
lidando com uma modalidade que é similar à modalidade mais bem aceita no
contexto brasileiro e mundial, que é o Futebol de Campo. Diversos relatos
apontaram para a relevância da modalidade como um agente proporcionador de
reconhecimento aos atletas, também como um desejo de todo jovem, com relatos
de intenso amor pela prática. Aqui cabe uma reflexão sobre o efeito de Políticas de
Identidade associadas ao papel do atleta no cenário brasileiro. Estudos sugerem
que a idealização do jogador de futebol trás problemas para a formação identitária
em jovens talentos, que muitas vezes estabelecem projetos de vida inconsistentes
com a sua realidade de realização, sonhando com carreiras internacionais e de
sucesso quando a realidade aponta que apenas 1% acaba se mantendo na prática
profissional de elite (DAMO, 2005).
Essa representação do papel de atleta, como determinado pela Política de
Identidade associada, faz com que atletas se sujeitem a situações precárias de
treinamento e formação, muitas vezes com dificuldades para arrumar alimentos ou
suportando cobranças exaustivas por parte de treinadores, como apontaram os
resultados desse estudo. Ainda, análises documentais e entrevistas com treinadores
indicaram para a construção de um valor de mercado grande em jovens talentos.
Mesmo de se tornarem jogadores de elite, alguns atletas tem seus "passes"
negociados com clubes internacionais, ou acabam sofrendo com colonização da
ordem sistêmica, com a burocracia e negociações que impedem a carreira de
evoluir, como foi o caso de um dos atletas entrevistados. Estudos semelhantes
evidenciaram que ex-atletas de Futebol de Campo tem muitas dificuldades em
superar essa personagem feitichizada, muitas vezes recorrendo à substâncias
químicas e com consequências comportamentais comprometedoras para sua
formação (LEME, 2011).
Ainda assim, percebemos que o esporte configura uma atividade molar para
o individuo, com sua continuidade por longos períodos de tempo, mesmo contando
com dificuldades. Essa característica do microssistema sugere a influência do
107
contexto para a manutenção de metamorfoses com aparência de não-metamorfose.
Em relatos encontrados neste estudo, foi através de modificações ambientais
(transições ecológicas) que pareceram incentivar metamorfoses que
proporcionassem a alteração da personagem. Atletas que se casam e constituem
família, começam a incorporar diferentes personagens advindos de contextos
paralelos ao esportivo, fazendo com que novas socializações remetam a novas
metamorfoses, aceitando a estabilidade em um clube de menor expressão para
conseguir proporcionar mais tranquilidade à família.
De acordo com os resultados relacionados ao exossistema, percebe-se que
há uma cultura que reconhece o atleta pela comunidade e seus pares, cultura esta
(Política de Identidade) que é internalizada como amor pela modalidade, que ajuda
a superar obstáculos, mas favorece a alienação. Esse reconhecimento não é
reforçado pelas estruturas políticas e burocráticas da modalidade, que é pouco
desenvolvida, com contratos precários para os atletas e instabilidade de carreira, em
especial pelo pouco reconhecimento que a modalidade recebe de investidores e da
mídia.
A falta de reconhecimento da própria estrutura da modalidade parece
influenciar os atletas que apesar de gostar de jogar, e por gostar, adotam a ideia de
que fazem um sonho ser realizado. Mas isso em um contexto pouco estruturado e
instável. Dessa forma, cria-se um ciclo que favorece a reposição identitária, através
de um mecanismo de reconhecimento perverso. O atleta precisa se expor a essas
condições não instigantes do desenvolvimento de prática porque começaram cedo,
deixaram a família e outras possibilidades de formação pessoal, assumiram o papel
do atleta reconhecido pela comunidade, perseguindo uma carreira que é sonho de
todos, mas que na verdade não tem uma boa estrutura, e é idealizada.
O contexto bioecológico do Futsal não proporciona apenas possibilidades de
colonização, que direcionam o indivíduo para a heteronomia. Algumas
características foram discutidas, inclusive com a perspectiva de ambivalência, mas
outras são notoriamente possibilidades emancipatórias que favorecem o
desenvolvimento do ser humano que está sendo atleta. A primeira referência está
na presença de relacionamentos interpessoais significativos (no âmbito do
microssistema), ou díades primárias que favoreçam o desenvolvimento do sujeito.
Diversos estudos apontam para a importância dos pares sociais, pais, e da
qualidade da relação atleta-treinador para proporcionar satisfação e
108
desenvolvimento positivo com esporte (LORIMER & JOWETT, 2009). Isto corrobora
com os achados desse estudo que relataram treinadores que além de ensinar
elementos da técnica e tática esportiva, também auxiliaram no desenvolvimento do
indivíduo, como um agente de socialização secundária que favoreciam o agir
comunicativo em detrimento do agir instrumental focado na vitória e resultados. O
mesmo com grupos familiares que proporcionavam os elementos mínimos
instrumentais para que o atleta pudesse procurar se desenvolver através do
esporte.
Outro ponto bastante interessante foi o relato de que a prática esportiva foi
uma alternativa que ajudou a estruturar projetos de vida que emancipassem o
indivíduo de Políticas Identitárias como violência, abuso de drogas e outras. De fato,
a literatura aponta que o uso de substâncias e outros comportamentos desajustados
moralmente são menos frequentes em populações envolvidas com esportes
(MILLER, 2009; MILLER; KERR, 2009). Além disso, a necessidade de uma
estrutura física e emocional equilibrada para alcançar o desempenho também
favorece a aprendizagem de habilidades para a vida que auxiliam no dia-dia.
A pesquisa limita-se por fazer cortes transversais, com o objetivo de avaliar
de forma retrospectiva a memória dos atletas sobre seus processos de narrativa de
histórias de vida sobre sua carreira atlética. Outra limitação se refere à generalidade
da amostra utilizada, que representa os atletas de alto rendimento de futsal, mas
restringe as interpretações à modalidade do futsal, e esse nível de competição.
Outras limitações específicas concernem ao método de análise dos dados,
exclusivamente análise de conteúdo, seguindo o modelo idiográfico. Outros
formatos como análises semânticas ou história de vida poderiam proporcionar
diferentes compreensões.
Os resultados do estudo apontam para a importância da análise do contexto
como indicador de estimulações para o desenvolvimento, no caso a formação da
identidade. Os malefícios da especialização precoce e profissionalização tem sido
amplamente estudados, e os nossos resultados apontam para os elementos
contextuais que favorecem esses processos. Da mesma forma, características
como suporte parental, manutenção da vida escolar e prática de outras atividades
além do esporte parecem auxiliar na expressão autônoma de identidade. Sugere-se
que programas de treinamento levem em consideração a inserção de elementos
que possibilitem a emancipação dos atletas que participam desses contextos, assim
109
como clubes devem se preocupar com características que auxiliam no
enfrentamento de transições ecológicas, favorecendo metamorfoses identitárias
autonômicas. Novas pesquisas precisam ser realizadas para aprofundar o
entendimento sobre os contextos com maior especificidade, como as características
das atividades molares do microssistema, influências das forças do mesossistema e
exossistema, com base em uma politica de esportes do macrossistema que
permitam abordagens de análises do cronossistema com perspectivas longitudinais.
110
Referências
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112
CAPÍTULO 5
ARTIGO ORIGINAL
O esporte é um contexto de emancipação ou colonização?
Is sport a context for emancipation or colonization?
113
Capítulo 5.
ESPORTE É UM CONTEXTO DE EMANCIPAÇÃO OU
COLONIZAÇÃO?
Is sport a context for emancipation or colonization?
Resumo
O objetivo deste estudo foi analisar a influência do contexto em proporcionar possibilidades
emancipatórias ou regulatórias no processo de construção da identidade em atletas de
futsal através do padrão semântico de fala e da caracterização do contexto bioecológico,
exemplificados com narrativas da história de vida de sujeitos considerados emblemáticos.
Entrevistamos no estudo 25 atletas adultos de clubes que disputam a Liga Nacional de
futsal, com um roteiro semi-estruturado sobre o desenvolvimento da carreira esportiva. Os
resultados identificaram 3 grupos caracterizados pela forma como expressavam suas
metamorfoses identitárias. Um grupo era marcado por um discurso direcionado à
heteronomia com projetos de vida inexistentes ou enquadrados na lógica do agir
instrumental, os outros dois grupos eram direcionados à autonomia de sua expressão
identitária, com distinção em projetos de vida baseados em Políticas de Identidade ou
identidades políticas. Conclui-se que as caracterísitcas do contexto foram marcantes para
proporcionar experiências que instigaram metamorfoses identitárias resultando em
fragmentos emancipatórios ou reposições de mesmice identitária, resultando em atletas
com padrões de narrativa diversificados em busca de uma boa vida.
Palavras-chave: Identidade; Esporte; Atletas, Contexto.
Abstract
The aim of this study was to analyze the influence of the context to allow emancipatory or
regulatory possibilities to the process of identity formation through a narrative semantic
pattern and bioecological context characterization, exemplified through life story technique
applied to emblematic subjects. We interviewd 25 adult athletes from futsal teams playgin at
the National League of Futsal, with a semi-structured script about sports career
development. Results identified 2 groups characterized by their expression of identity
metamorphosis. One group was marked by a nerrative directed to heteronomy with
unixistintg life project or cornered by the logic of instrumental act; the other two groups were
directed to autonomic identity expression, differentiated by the existence of a life project
based on identity policies or political identity. So it is concluded that contextual
characteristics were determinant to estimulate experiences instigating identity
metamorphosis resulting in emancipatory fragments or repositional mesmices, referred in
athletes with diverse narrative patterns in the search of a good life.
Keywords: Identity; Sport; Athletes, Context.
114
Introdução
Estudos recentes apontam que para obter sucesso no esporte é necessário
que os atletas sejam altamente focados e imersos em suas carreiras atléticas
(LAVALLEE, ROBINSON, 2007; PARK, LAVALLEE, TOD, 2013). Essa intensa
identificação têm se mostrado positivamente associada com melhora no
desempenho e na capacidade de enfrentamento das pressões dos treinamentos
(BREWER, RAALTE, & LINDER 1993). Contudo, resultados recentes têm
demonstrado que identidade atlética também está diretamente associada com
desfechos negativos no esporte, inclusive relacionando altos níveis de identidade
atlética como problemas para enfrentar transições de carreira (CARLESS &
DOUGLAS, 2009; STIER, 2007; LALLY, 2007) e lidar com defechos emocionais
(BROWN & POTRAC, 2009).
Essas inconsistências evidenciadas na literatura sugerem que os estudos
sobre identidade humana a compreendam enquanto processo contínuo, analisando
além do momento atual, o percurso histórico pessoal e o ambiente no qual o sujeito
está inserido (CIAMPA, 2002). Até onde pesquisamos, não foram encontrados
estudos que analisassem a influência do contexto ecológico do Futsal sobre a
percepção do atleta da sua formação identitária em sua narrativa de história de vida
e da carreira esportiva.
Especificamente em relação ao Futsal, nenhum estudo foi encontrado na
literatura que investigasse o processo de formação da identidade dos atletas,
especialmente em uma perspectiva epistemológica que compreenda a dimensão
subjetiva, suas experiências, narrativas e sentidos atribuídos à dialética com o
ambiente (CIAMPA, 1987). Para tanto, nossa proposta é concebermos a formação
da identidade como um processo atrelado à socialização (HABERMAS, 1990) do
indivíduo, marcada pelo acesso do ser humano à linguagem e consequentemente
ao sentido atribuído às experiências, tratando-se então de uma questão social
(CIAMPA, 1987).
Nesse sentido, a concepção do Sintagma Identidade - Metamorfose -
Emancipação foi adotada como suporte teórico para análise do processo de
construção da identidade em atletas de Futsal. Essa concepção trata identidade
como um processo relacionado ao movimento do ser humano de vir-a-ser,
115
relacionado à sua atividade no qual adota personagens; passando por
transformações constantes (metamorfoses) com as modificações do invidvíduo e/ou
do ambiente, direcionando-se como um movimento político de busca de autonomia
e emancipação. Nessas metamorfoses o indivíduo articula personagens de acordo
com a sua troca com o ambiente, integrando aspectos da cultura na sua expressão
individual identitária (fundamentada em identidades políticas) e emancipação da
dominação ideológica, ou da manutenção da heteronomia (enquadramento nas
regulações dos papéis - Política de Identidade) e reposição de personagens
favorecendo a opressão da ordem do capital e da burocracia (CIAMPA, 1987).
Nesta perspectiva, compreender identidade envolve entender que todo
indivíduo está num processo de busca por autonomia. A autonomia em si pode ser
considerada como o resultado de um processo de maturação e descentração do eu
e do grupo, sendo esta descentração uma evolução do sujeito da heteronomia para
a autonomia, realizando o processo de emancipação da autoridade da regra e da
coerção do grupo, formando autonomamente seus padrões de julgamento e suas
concepções das regras, sem que terceiros interfiram neste processo (FREITAG,
2002).
Assim, investigar identidade envolve um processo que é ao mesmo tempo
regressivo (verificando a história do indivíduo e seus significados) e progressivo
(identificando os projetos de vida estabelecidos), com base em Políticas de
Identidade ou Identidades políticas (CIAMPA, 2002). Diferente do que tem sido
verificado em sua maioria na literatura, com investigações sobre identidade atlética
como um construto momentâneo, mais parecido com o conceito de papel
(HABERMAS, 1990) do que de identidade em si. Nesse sentido, este artigo avança
na literatura ao incluir também uma análise dos parâmetros do contexto,
investigando o quanto o ambiente apresenta ao sujeito possibilidades que
favoreçam a emancipação ou a opressão (colonização) da ordem sistêmica
(HABERMAS, 1990).
Estudos com abordagens semelhantes investigaram a identidade de atletas
nessa perspectiva e verificaram a influência de alta identificação com a personagem
do atleta como um elemento que dificultou a vida pós-carreira (LEME, 2011) ou a
relevância do esporte para emancipação em deficientes físicos (PRESOTO, 2005).
Contudo, esses estudos não levaram em consideração a investigação do contexto
como potencializador de possibilidades emancipatórias ou regulatórias para o
116
processo do indivíduo. Ainda, verificando o papel da linguagem no processo de
constituição da identidade, outra perspectiva de avanço nos achados do estudo
pode estar na análise semântica das narrativas de história de vida.
Na perspectiva da história de vida do atleta, concebemos o desenvolvimento
atlético em três etapas divididas pela participação social e comprometimento com a
prática (CÔTÈ, 2004). A carreira atlética é dividida em (a) experimentação (pouco
comprometimento, participação parental e variedade de prática), (b) especialização
(foco em uma modalidade e menor participação parental) e (c) investimento
(profissionalização na modalidade e maior participação da comissão técnica e pares
sociais).
Face ao exposto, o objetivo deste estudo foi analisar a influência do contexto
esportivo em proporcionar possibilidades emancipatórias ou regulatórias no
processo de construção da identidade de atletas de futsal através do padrão
semântico de fala e da caracterização do contexto bioecológico, embasados em
com narrativas da história de vida de sujeitos considerados emblemáticos.
Métodos
Para fins de coleta de dados o projeto inicialmente passou pelo comitê de
ética da Universidade Estadual de Maringá, sendo aprovado com o parecer n°
248.363/2013 (APÊNDICE 3).
Design no Estudo
O estudo foi delineado como transversal do tipo qualitativo com base na
teoria do Sintagma Identidade - Metamorfose - Emancipação de Ciampa (1987). As
entrevistas foram analisadas para identificar os padrões semânticos de discurso,
características significativas da história de vida, projetos de vida e relação com o
contexto. A sequência metodológica deste estudo seguiu duas abordagens que se
integram: a) entrevistas com o método de história de vida frente à carreira dos
atletas, para as quais foram selecionados alguns casos considerados emblemáticos
(sujeitos que representam com seu percurso histórico de vida o movimento de
metamorfoses identitárias a ser analisado) para condução de estudo de caso; b)
mineração de texto (FEINRER, 2014; WEISS et al., 2005) (tradução livre de Test
mining), que é um método amplamente utilizado na área de mineração de dados
(tradução libre de Data mining – WITTEN & FRANK, 1999) para extrair informação
117
em documentos pouco ou semi-estruturados (como transcrições de entrevistas),
associado com análise em redes para verificar os padrões de conexão semântica
dos discursos dos atletas.
Seleção dos Participantes
A população deste estudo foi composta por jogadores brasileiros de Futsal.
Para cobrir uma variedade de experiências esportivas, nós selecionamos uma
amostra por conveniência de jogadores em cada um de seus times. A seleção para
as entrevistas foi não-probabilística, consistindo em dois atletas de cada time.
Contudo, quatro equipes não liberaram seus atletas para participar das entrevistas e
uma equipe liberou apenas um de seus atletas. Assim, nossa amostra final foi
composta por 25 atletas adultos com idade média de 25.49 ± 4.91 anos e média de
idade no início da prática do futsal de 9.12 ± 3.59 anos.
Os critérios para seleção dos participantes foi o nível de desempenho das
equipes (participação da Liga Nacional de Futsal 2013, que é uma das competições
mais relevantes do mundo, na modalidade). Nós solicitamos aos treinadores que
sugerissem atletas que fossem alguma referência dentro da equipe, pelo
desempenho técnico ou por experiência esportiva na modalidade. Nossa hipótese é
que esses atletas representariam a cultura de equipe e o centro das relações
estabelecidas na mesma. Esses atletas inicialmente participaram de uma entrevista
semi-estruturada sobre o desenvolvimento de suas carreiras (WYLLEMAN &
LAVALLEE, 2003).
Os atletas foram categorizados inicialmente em dois grupos, de acordo com o
conteúdo relacionado à expressão de suas metamorfoses presentes em seus
relatos de histórias de vida, àqueles direcionados para autonomia e os voltados para
a heteronomia. Contudo, percebemos que o grupo de atletas com expressão
autonômica também poderiam ser separados de acordo com os projetos de vida
estabelecidos, fundamentados em Políticas de Identidade ou em Identidades
Políticas (previamente conduzido por DANTAS, 2013). Para cada grupo, elencamos
um atleta como sujeito emblemático (ATKINSON, 1998), com os quais conduzimos
novas entrevistas para aprofundar o discurso em uma narrativa de história de vida.
Foram analisados os momentos da história de vida e dos discursos de acordo com
as fases de desenvolvimento da carreira atlética proposta por Côtè (1999) de
118
experimentação (menos de 13 anos), especialização (14 a 16 anos) e investimento
(mais de 17 anos).
Instrumentos
Entrevistas. As entrevistas seguiram um roteiro semi-estruturado abordando
os elementos do contexto bioecológico e a trajetória de carreira experimentada
pelos atletas. No início de cada entrevista os participantes eram orientados sobre a
confidencialidade das informações, da utilização de aparelhos para gravação dos
depoimentos e da garantia de abandonar o estudo a qualquer momento do seu
andamento. Todas as entrevistas foram conduzidas em uma sala privativa, no local
de treinamento dos atletas ou no hotel em que estavam hospedados para as
partidas.
A condução das entrevistas foi realizada com perguntas abertas, de forma a
organizar um quadro que representasse os acontecimentos relatados pelo atleta
sobre o seu desenvolvimento atlético e de vida. A organização dos relatos se deu de
forma cronológica, associada à interpretações dos relatos de acordo com o
referencial teórico. Para garantir a coerência com o resto da argumentação do
artigo, sequenciamos descrição dos relatos de história de vida em 3 momentos que
respeitavam tanto o tempo cronológico, de acordo com as fases do desenvolvimento
da carreira atlética (CÔTÈ, 2004), como o tempo vital que compreendia momentos
de transição ecológica (BRONFENBRENER, 1995) e metamorfoses (CIAMPA,
2009). Caso a história necessitasse de mais separações, para facilitar a
compreensão do processo de formaçao identitária, novos momentos seriam
inseridos.
A duração média das entrevistas foi 40 minutos, com recordação consentida
do áudio. Transcrições foram feitas logo após cada entrevista, caso mais
informações fossem necessárias, uma nova entrevista era agendada.
Análise dos dados
Rede de conexões semânticas. Técnicas de mineração de texto (FEINRER,
2014; WEISS et al., 2005) foram aplicadas para análise dos padrões semânticos
dos discursos dos atletas. Os textos foram divididos de acordo com a classificação
temporal dos discursos, a partir das etapas de desenvolvimento da carreira em (a)
experimentação, (b) especialização e (c) investimento (CÔTÈ, 1999).
119
A mineração de texto pode ser conduzida de diferentes formas, a partir de um
processo de 3 etapas: coleta de dados, pré-processamento do texto e aplicação de
algoritmo de análise (WEISS et al., 2005). A coleta de dados foi feita por entrevista e
transcrição, conforme descrito anteriormente. As transcrições coletadas foram
transformadas em um banco de dados separando cada parágrafo do texto em uma
linha do banco criando-se um corpus com base nas entrevistas. O pré-
processamento do texto seguiu sequência: a) inicialmente removendo contectores
entre as palavras (artigos, advérbios, interjeições entre outros); b) redução de
verbos para radicais semânticos das palavras (processo conhecido como
stemização); c) remoção de pontuações; d) revisão manual do corpus para limpeza;
e) diminuição do percentual de termos esparsos (aceitação de 70%, FEINRER,
2014). A revisão manual foi necessária porque os algorítimos para mineração de
texto são mais ajustados para a língua inglesa, não apresentando a mesma
performance para a língua portuguesa.
Após a técnica de mineração de texto, uma matriz com a co-ocorrência
(frequência nos mesmos parágrafos) de cada palavra foi gerada que posteriormente
foi utilizada para geração de uma matriz de associação através de uma correlação
policlórica. Finalmente, a matriz de correlação policlórica foi analisada por um
método de análise de rede (BORSBOM et al., 2011; EPSKAMP et al., 2014).
A rede foi construída (1) tomando cada palavra da matriz de correlação como
um nodo (representação circular, nas figuras). Esses nodos foram conectados pelas
hastes (2) representando a intensidade da sua correlação na matriz pliclórica. Essa
associação varia de 0 a 1, com valores mais próximos de 1 como mais altos. Esses
passos representam uma configuração de rede bipartite, na qual as palavras que
fossem expressas nos mesmos parágrafos teriam uma relação maior (direta), com
relações indiretas estabelecidas pela presença de palavras em comum. Por
exemplo, ao dizer "Eu gosto de futsal", os termos "gosto" e "futsal" teriam uma
associação alta e direta. Contudo, se em outro parágrafo eu disser "Eu gosto de
vencer", "futsal" e "vencer" teriam uma associação indireta pelo compartilhamento
da sentença com a palavra comum "gosto". Duas palavras que não compartilharam
outros termos foram consideradas pouco (não) associadas.
Nós aplicamos uma rede não-direcional, com algorítimo de posicionamento
que permite aproximar nodos com associações mais altas (BORSBOM et al., 2011).
De forma que quanto mais próximos os nodos (palavras), maior é associação entre
120
os termos. As hastes tiveram uma disposição ponderada, de forma que a espessura
(intensidade da cor) exprime a força da haste, que é a conexão entre dois itens.
Como indicadores descritivos da rede, utilizamos o conceito de betweness
(EPSKAMP et al., 2014) (aqui traduzido como conectores) para identificar os termos
que eram mais importantes para fazer as conexões entre os clusters da rede de
conexões semânticas. Todas as análises foram conduzidas com o programa
Linguagem R (R-Project, 2014), através dos pacotes tm (FEINERER, 2014) e
qgraph (EPSKAMP et al., 2014).
Compreensão do movimento regressivo e progressivo da formação identitária
(Histórias de Vida). O método de história de vida (ATKINSON, 1998) foi aplicado
para análise do movimento progressivo (projetos de vida) e regressivo (história de
vida) como forma de compreensão da formação identitária dos atletas de futsal.
Para cada estrato de atletas foi selecionado um relato que representasse um sujeito
emblemático do processo a ser analisado, configurando estudos de caso. A análise
procurou evidenciar momentos determinantes para a formação identitária dos
atletas, em especial evidenciando possiblidades emancipatórias ou regulatórias
oferecidas pelo contexto (BRONFENBRENNER, 1995), sentido atribuídos pelos
atletas e movimentos de metamorfose identitária (CIAMPA, 1987). Para análise e
descrição das histórias de vida, nomes fictícios foram atribuídos aos atletas que
configuraram os sujeitos emblemáticos.
Resultados
Ao analisar as entrevistas conseguimos identificar três grupos de expressões
identitárias, resguardando suas idiossincrasias e sentidos atribuídos às
experiências. As categorizações foram: a) indivíduos com discurso voltado para
heteronomia e que não evidenciaram um projeto de vida; b) indivíduos com discurso
voltado para autonomia mas com um projeto de vida fundamentado em políticas de
identidade; c) indivíduos com discurso voltado para autonomia e com um projeto de
vida estabelecido com base em identidades políticas. Para cada grupo
apresentaremos as redes de conexões semânticas dos discursos e um estudo de
caso.
121
Grupo direcionado para heteronomia e sem projeto de vida
A análise semântica das palavras utilizadas nos discursos sobre a história de
vida dos atletas indica como principais conectores, para o período da
experimentação, as palavras "comecei", "futsal", "vizinho", "indicação" e "rua",
servindo então de conexão entre as ideias dos discursos (Figura 1a). Essas
palavras representam características lúdicas da fase de experimentação na
modalidade, que começa como uma brincadeira infantil e por alguma circunstância
(indicação de vizinhos ou professores) acaba se tornando uma atividade de
importância. Contudo, vale destacar que para esse grupo de atletas, o início da
carreira já é marcado por aspectos que remetem ao esporte espetáculo e
colonizado pela importância financeira (palavras como: pagar, mensalidade,
incentivo, condição financeira; associadas ao conector "comecei") ou pela
burocratização da prática, já inserido como um atleta profissionalizado (palavras
como: federado, profissional, mamadeira e fraldinha, avaliado e dispustas;
associadas aos conectores "futsal" e "indicação") (Figura 1a).
Já a rede da fase de especialização mostra o foco do discurso dos atletas em
conceitos manifestos pelas Políticas de Identidade associadas ao esporte,
representada nos conectores valorizado, trabalho, cobrado, recompensa e
profissional (Figura 1b). O único cluster de palavras que foge ao relacionado ao
esporte diretamente é aquele que se conecta à rede pela palavra "pai". Contudo,
ainda assim, as palavras associadas se referem à aspectos do apoio instrumental à
prática esportiva. Vale destacar que o conector "cabeça" (como controle emocional)
aparece associado a palavras referentes à pressão da prática esportiva em um
cluster (também relacionado à "trabalho", "valorizado" e "cobrado") e por outro lado
com características relacionadas à estratégias de enfrentamento ao contexto
(palavras como "ganhava", "visitar", "família") (Figura 1b).
A rede da fase de investimento é semelhante, trazendo significados das falas
dos atletas com uma orientação altamente heteronômica, associando conceitos
pressupostos à ideia de "time", "trabalho", "vencer". Todos esses conectores se
relacionam com outras palavras de cunho instrumental (Figura 1c). Mesmo quando
são conectores que fogem ao pré-estabelecido para o papel de atleta, temos
associações com aspectos de rendimento, como no caso de "deus" e "família".
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Primeiro Caso: Luta pelo sucesso, o atleta perfeito
Este primeiro caso trata-se da história de José Roberto, um atleta promissor
que desde muito cedo em sua carreira atlética já era tratado como talento esportivo.
Pela sua narrativa, podemos perceber que essa alcunha o persegue até os
momentos atuais, caracterizando um momento de fe tichização da personagem
atleta, representado pela falta de autonomia presente em seu relato.
Momento 1 - Descoberta (A promessa)
O relato de José Roberto inicia com a descrição da sua entrada no contexto
do Futsal. Sua descrição é de que sempre gostou de jogar "bola", mesmo com os
pés descalços, na rua, como forma de brincadeira. Logo de início, um aspecto da
fala de José Roberto que chama atenção é representativo da influência da Política
de Identidade sobre sua identidade, o sujeito utiliza da comparação com o "resto
das pessoas" para fortalecer sua convicção, como uma busca de um senso coletivo
de autodefinição, expressado no trecho a seguir:
"jogar com os pés descalços, jogar descalço na rua [...], sempre com os pés no chão [...], com trave de chinelo, e lajota [...], que roubava do vizinho [...], acho que começou ai, quem não começou ai, acho que a maioria começou ai."
Com 5 anos de idade, José Roberto relata ter sido "achado" por um vizinho,
que o indicou para uma escola de Futsal. Logo nessa primeira seleção, foi aceito
para disputar o campeonato estadual fraldinha (a 5 anos de idade), tornando-se um
atleta federado. Iniciando sua carreira vencendo e ganhando medalhas: "Primeira
medalha, foi com 5, 6 anos de idade mesmo, eu já comecei já, sendo um vencedor."
Diferente do relato de outros atletas, José Roberto nunca praticou outras
modalidades e estampa isso com orgulho de sempre ter se dedicado apenas ao
Futsal. Durante sua narrativa, fica evidente que José Roberto se sente orgulhoso de
seu desenvolvimento como atleta, como se carregasse uma responsabilidade
grande nisso. Vindo de uma família com pouca condição financeira, ainda com 5 a 7
anos, José Roberto era patrocinado pelos pais dos atletas que jogavam na mesma
equipe, pagando, inclusive, um incentivo para cada gol que fazia. É importante
destacar como o contexto de José Roberto já apresentava evidências de
possibilidades colonizadoras ao invés do potencial emancipatório que seu talento
para o esporte poderia ter proporcionado, favorecendo essa idealização da
personagem atleta, inclusive sobrepondo outros personagens esperados como de
filho, ou estudante, que não aparecem no relato.
126
Momento 2 - Profissionalização (ou encarceramento).
Não é surpresa que no seu período de profissionalização, com 16 anos, José
Roberto relate perceber que decepcionava seus pais, porque não se dedicava aos
estudos como fazia ao Futsal. Mas, para o atleta, essa falta de exploração em
outras atividades se explicava pelo amor que sentia pelo Futsal até perceber que
não conseguiria acompanhar os estudos: "[...] é que eu acabei deixando pra trás,
que quando eu fui ver que aula não era pra mim, não tinha cabeça mais para
estudar porque eu tava muito atrás dos outros alunos."
Nesse período, José Roberto relata ter começado a receber uma
remuneração, apesar de pequena, se profissionalizando como atleta. Apesar dessa
remuneração ser pequena, permitia que voltasse para casa visitar sua família com
mais frequência, pois já morava longe há anos e também permitia comprar algumas
coisas que gostasse. Nesse momento do relato, a forma como José Roberto
expressa sua relação com o Futsal faz refletir o quanto se sentia preso à esse
personagem. Mesmo sem perceber, José Roberto se coloca como coadjuvante do
que acontece em sua vida. Sua escolhas são feitas por outras pessoas, ou por
aspectos que não consegue controlar (amor pelo esporte impossibilita estudar, ou a
necessidade de ser um jogador de sucesso o faz ficar longe da familia). O mais
marcante é a forma como expressa a conquista de remuneração, permitindo que
tivesse seus próprios desejos satisfeitos. Nesse momento, José Roberto narra:
"Minha primeira recompensa foi com 16 anos de idade, em [nome da cidade] no [nome do clube]. Primeira foi uma ajuda de custo [...], onde eu recebia passagem de volta pra eu visitar minha família, pra que eu tivesse cabeça boa, como eu sai muito novo [...] das atenções dos meus pais, eu ganhava uma passagem ida e volta e pra me manter ali [...], comprando umas coisinhas que eu gostava de comer tal e umas coisas extras."
Momento 3 - Ápice (mas nada de novo).
Uma mudança que foi marcante na carreira de José Roberto foi sua
transferência para um clube de mais expressão, permitindo que disputasse o melhor
torneio estadual de atletas profissionais. Aqui, para José Roberto, é quando sua
carreira realmente desenrola tornando-se, em suas palavras, um "grande"
profissional: "aonde eu deixei de ser um amador pra ser um grande profissional
mesmo [...]."
Essa profissionalização veio como uma surpresa para José Roberto, que
acreditava que ainda não estava na hora. Relata que conseguiu transformar isso em
um ponto positivo para sua carreira. Nesse momento, percebia muita cobrança,
127
especialmente porque seu potencial era grande e precisava dessa cobrança para
continuar evoluindo. Mesmo nesse ambiente, José Roberto relata não perceber
pontos negativos com as suas escolhas e com o ambiente profissional que vive. É
um momento de muita felicidade por que conquistou seu objetivo que era jogar em
uma equipe de alto nível, no melhor campeonato. Percebe-se que o discurso de
José Roberto têm uma direção de heteronomia, com o sucesso sendo representado
pela adequação de sua identidade ao que é esperado de um atleta (Política de
Identidade). Em poucos momentos de fala José Roberto não-atleta aparece no
discurso, assim como pouco fala de amizades, relacionamentos e família. Em
sequência, José Roberto é transferido para outro clube, agora para disputar o
melhor campeonato do país, alcançando um de seus objetivos de vida:
"Olha graças a Deus [...], minha meta era jogar num time de liga nacional, e graças a Deus eu to conseguindo, é... e meu próximo passo agora se Deus quiser como eu já peguei a seleção estadual, se Deus quiser é vestir a camisa da seleção brasileira [...], e isso ai não foge nenhum momento da minha cabeça e eu tenho certeza que eu vou conseguir isso [...], com o trabalho do dia-a-dia que eu venho desenvolvendo."
Nessa etapa da carreira, José Roberto deixa claro seu projeto de vida (atleta
de alto rendimento), que novamente envolve apenas o sucesso, enquanto atleta.
Parece que José Roberto se apresenta como alguém que está lutando, se
superando, vencendo. Sua justificativa para esse enfrentamento é sempre a paixão
pelo esporte, que justifica todos os sacrifícios que fez para alcançar o sucesso que
percebe atualmente. Em um dos poucos momentos que José Roberto não foi
apenas a representação do atleta perfeito (no sentido de um outro dele que o nega),
relatou a frustração por não ter acompanhado o crescimento de seus irmãos, de
ficar mais perto de sua família. Mas logo retoma a fachada de atleta que sofre mas
consegue, que é vencedor, e que sua batalha é para continuar vencendo, tudo pela
paixão que sente pelo Futsal.
Grupo de indivíduos com discurso voltado para autonomia mas com um
projeto de vida fundamentado em políticas de identidade
As redes com as conexões evidenciam para a fase de experimentação como
principais conectores as palavras "profissional", "atleta", "jogar" (ou "jogava") e
"comecei" (Figura 2a). O discurso para esse período da carreira atlética é
semelhante ao do grupo anterior (Figura 1a), tratando de práticas diversas antes da
profissionalização mas o que diferencia aqui é a maior variabilidade de conceitos
128
relacionados ao "jogar" o esporte. Esse conceito tem uma faceta mais
multidimensional, sugerindo uma experiência identitária mais ampla e menos
pressuposta. Esse conceito de jogar é o que foi identificado, pela análise de rede,
como o tema central do discurso dos atletas (Figura 2a).
Na fase de especialização, percebemos um maior distanciamento do padrão
narrativo dos atleta do grupo anterior. Aqui, a ocorrência de conectores é menor,
mas recebendo maior amplitude de definições, como é o caso das palavras
"obrigação", "atleta" e "seriedade" (expresso com o radical semântico "seri") (Figura
2b). No caso de "atleta", identificamos dois clusters associados que remetem ao
atleta jogador, que percebe cobrança e precisa alcançar seus objetivos e outra
estrutura relacionada ao atleta social, e a suas vinculações afetivas. O mesmo
acontece com "obrigação", que divide o cluster das relações sociais com o termo
"atleta", mas também se conecta com características mais instrumentais e de
reconhecimento do esporte (Figura 2b).
Na fase de investimento, esse grupo de atletas marca sua classificação como
direcionados para autonomia (Figura 2c). O discurso não é carregado de palavras
comuns à Política de Identidade associada à carreira esportiva. Os conectores são
palavras associadas à vida e dia-dia do ser humano envolvido com o esporte como
"futsal", "lesão", "pre-temporada", "jogar", "equipe" e "esposa" (Figura 2c). Destaca-
se que não são marcantes44 falas relacionadas à vitória, cobrança, rendimento.
Contudo, as falas não evidenciam perspectivas de projeto de vida, algo que não
seja ligado à "seleção". Os conceitos ligados aos conectores sugerem o
reconhecimento pela prática, sucesso, práticas familiares e sociais, preparação
entre outros.
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Segundo Caso: Heroificação do esporte
Este caso trata da história de vida de um atleta que chamaremos aqui de
Leonardo. Leonardo atualmente é um atleta de futsal que disputa a Liga Nacional de
Futsal, e tem participações em torneios internacionais, como jogador da Seleção
Brasileira de Futsal. Essa narrativa será dividida em 3 momentos, que caracterizam
suas metamorfoses identitárias e exemplificam a busca por emancipação através da
prática do Futsal.
Momento 1 - Descoberta (Idealização do ser atleta)
Leonardo relata que começou a praticar o Futsal por volta dos 12 anos de
idade, ao frequentar escolas de treinamento esportivo na escola. Na época,
percebia que a prática esportiva ocorria como uma forma de brincadeira, praticando
diferentes modalidades, como relata Leonardo:
"eu sempre participei em tudo. Na seleção do colégio desde o atletismo até, mesmo sendo baixinho,
no basquete, vôlei. Disputei estaduais com 15 e 16 anos no basquete, vôlei, handebol."
Contudo, o interesse pelo Futebol começou cedo ao acompanhar o irmão que
treinava em uma escola para profissionais. Esse caso é interessante porque é
representativo da amostra entrevistada, no que se refere à iniciação esportiva. Em
geral, percebeu-se que os atletas iniciavam com uma variabilidade de modalidades
e se interessavam ao Futebol de Campo, por ter maior dedicação. No caso de
Leonardo, sua entrada no esporte foi um acaso. Em um torneio, ao acompanhar seu
irmão, acabou entrando para jogar porque um dos atletas faltou. Nesse jogo
mostrou um potencial grande para a prática esportiva e acabou ingressando na
equipe, aos 14 anos.
Nesse momento, Leonardo inscreve-se na equipe profissional da cidade,
mesmo com uma idade jovem, e começam a receber um salário para jogar. Ainda
assim, apesar da maior seriedade, a prática ainda era levada como uma brincadeira,
da mesma forma como é percebida com outras modalidades. Inclusive, como já
relatado, Leonardo não deixa de participar em outras atividades esportivas,
disputando torneios estaduais com a escola no vôlei e no basquete. Este dado é
bastante relevante porque demonstra uma característica peculiar da história de
Leonardo em relação à outros jovens que ingressam na prática do Futebol de
Campo.
133
Nessa fase, vale destacar que o esporte ainda não desempenha um papel
dominante para o processo de socialização de Leonardo, neste momento da sua
narrativa ainda percebe-se incursão da ordem sistêmica sobre a prática do esporte
(Futebol de Campo, no caso). Sua identidade de atleta está associada à uma
brincadeira, uma atividade prazerosa na qual ainda está se descobrindo
interessado. Sua escolha em adentrar o contexto, ser um jogador, ainda é marcada
por um movimento autonômico, potencialmente influenciado pela cultura brasileira
de "amor ao Futebol" e pelo irmão que já praticava. Entretanto, é comum crianças
brasileiras passarem por escolas de Futebol de Campo quando jovens, mas boa
parte abandona com a ascenção de interesses acadêmicos e sociais na
adolescência. Esse interesse de Leonardo em acompanhar o irmão nos treinos de
Futebol de Campo representam a aproximação da Política de Identidade da
modalidade, que atrai o interesse de jovens para a prática, muitas vezes em
atividades de "identificação" com referências do contexto, com verbalizações como:
"Eu vou ser o Ronaldinho Gaúcho".
Contudo, essa primeira participação de Leonardo com o Futebol aparece
como uma possibilidade emancipatória para sua formação identitária. Caracteriza
um momento em uma nova oportunidade de experiências que podem se integrar a
sua socialização. Com o decorrer de seu ingresso na carreira atlética, disputando
campeonatos estaduais e conseguindo adquirir destaque em seu rendimento,
começa a entrar num segundo momento de seu desenvolvimento esportivo e, por
conseguinte, em sua identidade. Leonardo passa a obter maior reconhecimento por
sua atividade no contexto do Futebol de Campo, fortalecendo sua identificação com
a personagem do atleta, agora um atleta profissionalizado e com talento.
Podemos dizer que até esse momento o contexto esportivo vinha
funcionando como um elemento potencializador de emancipação para Leonardo.
Até então o personagem de atleta parecia uma alternativa, que abria toda uma nova
cadeia de possibilidades e desejos que potencializam modificações/criações de
objetivos pessoais, talvez um rascunho de projeto de vida atrelado à carreira
atlética. Essa identificação com o papel de atleta se fortalece quando um clube
grande de Futebol de Campo do estado de Leonardo o procura com uma proposta
de contrato (aos 15 a 16 anos). Neste momento, percebemos como a influência de
elementos da ordem burocrática ou do capital, muito comuns neste contexto do
134
Futebol de Campo, agem para restringir o processo emancipatório das
metamorfoses identitárias.
"Então ali deu uma repercussão enorme no estado. naquela época veio o [nome do clube], que a
[nome do patrocinador] tinha investido no [nome do clube], e eles vieram atrás de mim. Por ter
diretores que pensam mais no financeiro do que no próprio atleta, o clube queria 40 mil por mim.
Então ele pediu 40 mil pro clube pra me liberar. Porque não tinha aquela lei Pelé. Então eu teria que
ficar vinculado com o clube até os 18 anos ou ter parado de jogar. Aí meio que eu me decepcionei
com o campo [...]. Os caras falarem 40 mil eu posso trazer um jogador profissional pro meu time e tu
tem 14 anos e quando chegar nos 18 de repente não jogar o que tu joga. É uma incerteza [...]. Então
ele não quis investir."
Aqui percebe-se que o valor monetário associado à uma possível ascenção na
carreira de atleta de Futebol de Campo causa mudanças na perspectiva de Leonardo frente
a si a e seu projeto de vida. Até esse momento não havia uma presença forte no discurso
em relação à carreira no Futebol de Campo, contudo, frente à "frustração" de não ter o
contrato liberado impõe uma barreira à uma carreira ainda inexistente. Leonardo refere que
após esse acontecimento, ficou aproximadamente um ano sem jogar Futebol de Campo,
como um reflexo dessa quebra na personagem de atleta que se construia.
Dedicando-se à escola e outras atividades que não o Futebol de Campo em
si, surge uma nova oportunidade para ingressar na carreira do Futebol de Campo,
com o mesmo técnico com quem havia jogado anteriormente. Nessa oportunidade,
Leonardo disputou o maior campeonato de Futebol de Campo do estado, com
momentos muito marcantes como ganhar de um dos maiores times da modalidade
e, novamente, com um bom destaque. Contudo, para conseguir chegar nesse local
em sua carreira, Leonardo refere ter tido diversos problemas:
"Exemplo eu, eu com 14 anos com essa trajetória toda, eu já fui pra vários times de campo [...], eu
resumi alí a história. O [nome da equipe], que eu estava no [nome da equipe], o meu pai deixou eu ir,
eu cheguei lá e não tinha o que comer. O quartel ficava a 4 km de onde a gente treinava. O treino
acabava as 11:30 por aí, e no quartel servia comida até 12:00. Se tu não chegar lá. Então nós não
tínhamos tempo pra chegar lá. Tinha 3 km pra caminhar, não conseguia. Então minha família, meu
pai ligava pra mim e eu falava que não pai, eu to comendo em restaurante, sabe. Porque eu queria
aquilo pra mim entendeu."
Era, segundo Leonardo, a oportunidade que teve para seguir na carreira e
conforme o investimento pessoal era feito novamente na vida esportiva, Leonardo
esbarra novamente na burocracia e discussões financeiras com o seu contrato.
"Aí fui no [nome do campeonato] novamente e tiramos o [nome da equipe] fora, o [nome da equipe],
e pegamos o [nome de outra equipe] na semifinal. Perdemos mas acabei fazendo 2 gols também. Aí
o mesmo cara que queria me levar veio de novo. Daí era pra eu seguir no campo. Aí chamou o meu
135
pai e todo mundo e tal. Eu achava que eu já era do [nome da equipe] no meu contrato, mas não. Eu
pertencia ainda pro outro cara. Então aconteceu praticamente a mesma coisa. Então ali foi uma
decepção geral. Falei pro meu pai que não quero mais saber, vou estudar, não quero mais saber do
futebol, eu vou arrumar um emprego. E meu pai, assim minha família bem humilde, meu pai pedreiro,
minha mãe dona de casa. Então eu disse que não quero mais saber, vamos lagar e parar por aí."
Novamente, Leonardo vê seu projeto de vida de "jogador de futebol" ser
impossibilitado por uma demanda externa e cessa sua atividade. Essa situação com
a diretoria do clube não foi, necessariamente, uma caracterísitca negativa para
Leonardo. Esse acontecimento poderia ter sido interpretado como uma possibilidade
de mudança de direção em sua vida, se conseguisse estabelecer um novo projeto
de vida, entretanto parece que Leonardo não havia superado efetivamente sua
personagem atleta e concretizado uma metamorfose, como veremos no decorrer da
descrição.
Momento 2 - Profissionalização (Retorno, ascenção e estagnação)
Após passar um tempo sem se dedicar à carreira esportiva, voltando a
formação acadêmica e trabalhando para ajudar os pais em casa, Leonardo se ve
frente a uma nova oportunidade para adotar o personagem atleta. Um chamado,
agora para jogar Futsal pela sua cidade natal, chega a Leonardo através de uma
notícia na televisão. Os dirigentes da equipe de Futsal dessa cidade anunciam o
interesse pela contratação de Leonardo com a justificativa de que era uma "semente
da terra":
"Estava eu almoçando e assistindo tv, aí fizeram uma matéria da região que a [nome da equipe]
estava contratando o ala esquerda [nome do atleta aqui chamado de Leonardo] que era a semente
da nossa terra, cria dalí. E eu fiquei olhando, mas não pode ser porque ninguém me ligou, não falou
nada, não to sabendo. E foi uma informação que vazou antes do tempo pra imprensa. Aí eu acabei
de almoçar e quando eu acabei toca o telefone de casa e era o dirigente lá me ligando. Agora vazou
eu tenho que te trazer de qualquer jeito. Naquele mesmo tempo eu pensei, poxa se já vazou na
imprensa vai ter obrigação de me levar agora [...]. aí o cara disse que nós aqui vamos te dar meio
salário mínimo. E eu, não, não, eu quero dois salários mínimos pra mim ir, se não, não vou. Porque
já tinha saído. Eu ter convivido muito novo no meio dos caras eu já tinha a malandragem pra isso.
Daí eu pedi. Eles fizeram uma reunião e me deram a resposta à tarde. E tudo começou aí."
Foi nesse momento que a carreira de Leonardo inicia-se no Futsal,
disputando seu primeiro campeonato como o jogador que mais fez gol na
temporada. Percebe-se, pelo relato, que sua entrada no Futsal foi uma virada
importante em sua vida, já está na mesma equipe há seis anos e conseguiu ver seu
time sair de fase bronze (que seria análogo à terceira divisão) para disputar a Liga
Nacional. Passou, nesse tempo, pela profissionalização da equipe, com aumento
136
nos investimentos. É, para Leonardo, um ambiente muito mais amigável que o
Futebol de Campo, quando relata:
"Futsal hoje em dia é todo mundo fala bem, se comunica bem, ninguém quer passar a perna em
ninguém, ninguém quer ser mais que ninguém, já o campo não. O campo é eu vou te machucar
porque eu quero jogar amanha entendeu, não pensa na equipe."
Nesse período, percebeu-se um discurso com bastante ênfase no
reconhecimento obtido com a prática. Seu relato indica a importância da sua equipe
para a comunidade/cidade, que a adesão da torcida é grande, funcionando como
um agente importante de motivação. Leonardo casou-se e teve um filho e já começa
a vivenciar problemas com a carreira. Mas constitui-se uma fase na qual Leonardo
consegue unificar sua personagem objetiva (ser atleta) com um projeto de vida (ser
atleta) reconhecido por tal e proporcionando um viver bem. Entretanto, com o
decorrer do tempo e a exposição na carreira, transições normativas (idade) como
não-normativas (lesões ou mudanças na família) fazem com que novos ajustes
identitários sejam necessários.
Momento 3 - Ápice (Atleta ou pai, reposição da personagem).
Na continuidade de seu relato, Leonardo está entrando em um momento de
crise, com mudanças ambientais. Fica evidente naquele momento, com 34 anos,
que seu esforço para a manutenção do desempenho era grande. Ao mesmo tempo,
lesões vinham acontecendo, o que o deixaram fora de boa parte em temporadas
passadas. Essas condições têm feito Leonardo questionar sua permanência no
futsal, potencialmente preparando uma aposentadoria.
Como percebido ao longo de sua carreira, situações de transição não são
caracterísitcas de problemas para a formação identitária do indivíduo, na verdade
constituem oportunidade para novos movimentos de metamorfose. Entretanto,
também podem ser momento de manutenção da identidade, facilitando a
colonização da ordem sistêmica e reposição de papéis. No caso de Leonardo,
percebe-se que há uma dúvida, que o leva a refletir e buscar mais informações
sobre a continuidade da sua prática e, consequentemente, de sua identidade:
"Aí eu conversando com a minha esposa, eu com 34 anos, falei, e até o treinador agora da seleção é
o [nome do treinador] [...], que nós fomos campeão [...] lá em [nome do estado] em 2002 ou 2003.
Minha esposa falou pra mim, você ta pensando mais um ou dois anos? E eu, a amor acho que vou
me dedicar e esforçar esse ano e vou buscar uma convocação na seleção. E ela me olhou assim,
137
você ta brincando [...]? E eu, ué por quê? Você acha que eu não tenho condições? E ela, não amor
eu não to falando disso. E eu, claro amor, eu to bem eu vou brigar por isso, tenho objetivos."
A fala explicita o momento que Leonardo está enfrentando, buscando
opiniões ou talvez reforçamentos para a manutenção de sua personagem de atleta
com pessoas significantes do contexto. Aqui percebemos que apesar das escolhas
inicialmente autônomas pelo personagem de "atleta" no futsal, Leonardo passa a
representar esse papel, frente à dificuldade em transitar para fora do contexto
esportivo. Há um certo feitichismo em idealizar o abandono da modalidade após
uma nova convocação para a seleção brasileira, reforçando as metas pessoais e o
projeto de vida, agora não tão coerente com uma identidade política através do
esporte.
Essas caracterizações ficam evidentes quando Leonardo relata que, na fase
que está, precisa dar "algo mais" quando "estiver cansado ou tiver uma dorzinha
ali", tudo explicado como uma necessidade para alcançar um objetivo maior, que no
caso seria a seleção. Esse movimento reforça a busca de reconhecimentos que
fortalece a posição, mas que acaba por ser um reflexo da adesão à políticas de
identidade, quando Leonardo relata que está fazendo isso para dar exemplo ao
filho. Essa dificuldade é compreensível porque foi neste ambiente atual, com esse
personagem, que Leonardo conseguiu encontrar um ambiente favorável para seu
desenvolvimento e para sua família, integrado com as famílias dos seus colegas de
equipe e com a comunidade.
É nessa relação com o filho que, no entanto, começamos a vislumbrar um
potencial emancipatório para Leonardo. Em diferentes momentos de sua narrativa
começa a se perceber um personagem "pai" aparecendo como projeto de vida,
simultâneo ao de "atleta". No entanto, da forma como se estabelece o ambiente de
Leonardo, esse projeto depende de um bom desempenho no esporte, o que parece
ser um significado regulatório. Numa tentativa de integrar os papéis, Leonardo se
coloca na perspectiva de atleta-pai com os próprios colegas de equipe, relatando:
"Eu tenho que sempre dar algo a mais. Mesmo que eu não chegue na seleção, mas eu vou fazer
uma baita temporada. Eu to fazendo, sabe, eu to buscando um nível maior. Se eu não almejar nada,
eu me acomodo. Por mais que tenha 6 anos de clube, eu não posso me acomodar. Eu tenho que
ser exemplo pros que estão chegando [...]. Chegam aqui e, olha o cara tá acomodado, não pera aí, o
cara tá há 6 anos aqui e o cara tá correndo o que ta correndo, fazendo o que ta fazendo. Chamar os
caras junto. Então eu acho que o meu pensamento é esse, que esse ano o time ta unido."
138
Assim, no momento atual, apesar de indicar movimentos autônomos, sua
identidade parece indicar uma metamorfose no sentido da mesmice (reposição da
identidade e facilitador da colonização do mundo da vida), repondo a personagem
de atleta, com vislumbres de colonização da ordem sistêmica se tornando presentes
em seu discurso, evidenciando um direcionamento heterônomico se tornando
manifesto:
"Tu tem que saber que em primeiro lugar vem o emblema da sua equipe, por isso vem no teu peito, e
seu nome atrás, tu tem que colocar isso na cabeça, primeiro o clube e depois o seu nome. Quando
você souber que o clube vem em primeiro lugar e você em segundo plano, acho que tem tudo pra
dar certo."
Grupo atletas com discurso voltado para autonomia e com um projeto de vida
estabelecido com base em identidades políticas.
As conexões da rede semântica dos atletas que configuram o grupo com
discurso voltado para autonomia e com projeto de vida com base em identidades
políticas apresentou configuração diferente daquela dos grupos anteriores, com um
foco em conectores e significados diversos àqueles ligados a Políticas de Identidade
relacionadas ao esporte (Figura 3).
Na fase de experimentação, os discursos relatam aspectos esportivos como
os conectores "futsal", "categoria", "mirim" e "juvenil", aqui associados a
características da formação atlética (Figura 3a). Entretanto, vale destacar que não
aparecem conectores relacionados à desempenho, sucesso, vitória, como visto nos
discursos dos outros grupos. Aparece, contudo, termos de outras esferas da
vivência humana, como os conectores "vida" e "trabalho", associados,
simultaneamente, à aspectos da formação humana e o contraste com o esporte
como estudar, treinar e manejo do tempo (Figura 3a).
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142
A complexidade das conexões fica mais interessante nas fases de
especialização (Figura 3b) e investimento (Figura 3c) que mantém conectores
semelhantes como "futsal", "vida" e "esporte" mas com sentidos mais amplos e
diversificados. Na especialização, o discurso volta para aspectos da dificuldade com
a prática ligados à "futsal", "futebol" e "vida" mas também aos benefícios alcançados
com o esporte (Figura 3b). Palavras que destacam o reconhecimento obtido com a
prática aparecem relacionados ao contector "equipe" e "profissão", mas ao conector
"esporte" em si, aparecem palavras que representam sua presença num contexto
mais amplo de benefícios, associado à formação acadêmica. Parece indicar que a
pecepção do contexto esportivo vai na direção de estabelecimento de projeto de
vida, assumindo as característias do papel de atleta como aspectos de identidade
política.
Esse mesmo padrão continua na representação das conexões das narrativas
referentes à fase de investimento (Figura 3c). Destacam-se os conectores "futsal",
"base", "trabalho" e "importante", todos associados à palavras que mostram uma
perspectiva ampla da prática esportiva como elementos familiares, carreira
esportiva, ganhos financeiros, sensações positivas e a palavra "escolha". Ainda,
aspectos que são notoriamente atrelados à direções regulatórias como "alto" e
"nível" se associaram a palavras como "humano", "cidadão" e "profissão", sugerindo
conceitos diferentes dos instrumentais ou convencionais vistos em outros grupos.
Terceiro Caso: Salvação e vida pelo esporte
Aqui apresentaremos o caso de Ricardo, atleta de 30 anos, nascido no
Nordeste, mas cresceu em uma cidade do Centro-Oeste. Atualmente, é um atleta de
uma grande equipe de Futsal do país, com uma carreira bem estabelecida. Contudo
sua história têm peculiaridades que indicam a importância das experiências e do
contexto para a forma como a socialização ocorre facilitando ou não a autonomia do
indivíduo.
Momento 1 - Descoberta (Esporte e novas perspectivas)
Ricardo começa seu relato dizendo que cresceu em uma cidade grande, mas
que teve uma infância humilde, que sua família tinha poucas condições financeiras e
viviam em um bairro pouco estruturado. Nesse contexto que Ricardo introduz sua
inserção no Futsal, como um ambiente que permitiu se emancipar dessa situação,
realizando-se pessoalmente e profissionalmente:
143
"graças ao futsal eu consegui me realizar não só pessoalmente, profissionalmente e pessoalmente,
tudo ligado ao esporte"
Seu início no futsal foi ainda na infância, por volta dos dez anos, seguindo o
que constumeiramente acontece na iniciação esportiva. Como logo de início se
destacou na prática, logo estava disputando todas as categorias de esporte infanto-
juvenil. Sempre na região da sua cidade natal. Sua "descoberta" para o futsal,
novamente, da forma mais comum, jogando futebol na rua e um vizinho o indicou
para uma escolinha por perceber que tinha talento. Nessa primeira equipe
estruturada de futsal foi que Ricardo teve toda a sua base de formação técnica no
esporte, com seus professores da época.
Aliado a um ambiente que proporcionava experiências estimulantes e
reconhecimento pela relevância da prática para o Brasil, Ricardo também relata que
sua família foi muito importante apoiando sua carreira. O relato indica que seus pais
acharam no esporte uma boa situação para Ricardo se desenvolver e conseguir
uma condição de vida melhor. Entretanto, a infância/adolescência de Ricardo foi
marcada por momentos de dificuldade e ambientes pouco estimulantes, fora a
prática do futsal. Seus pais se separaram quando Ricardo tinha 15 anos, o que foi
relatado como um momento muito difícil. Ainda assim, mesmo separados, Ricardo
relata que continuaram apoiando sua prática do esporte, e que o esporte ajudou a
superar a dificuldade da sua situação família.
Além da situação dificil afetiva e financeira de sua família, Ricardo também
precisava lidar, na adolescência com o ambiente em que vivia, que era perigoso,
com alta criminalidade:
"eu vim morava num lugar totalmente de alta periculosidade então [...] tenho certeza que se não
fosse o esporte eu não teria me dado muito bem, se não fosse futsal de me dar oportunidade acho
que eu não teria me dado bem, todos meus amigos da infância ou morreram ou foram preso, se
meteram com coisa errada [...]"
Ricardo conseguiu manter-se no esporte, apesar dos acontecimentos de sua
trajetória de vida, contando com muito apoio familiar. Vale destacar que mesmo se
destacando como um atleta de potencial, continuou estudando, diferente das outras
trajetórias de atletas (caso 1 e caso 2), nunca saindo do entorno de sua cidade. Foi
apenas após o término dos estudos no ensino médio que Ricardo resolveu dedicar
mais tempo ao futsal (fase de investimento), mesmo assim procurou um emprego
144
para conseguir se sustentar e treinava nos períodos alternativos. E por volta dos
dezoito ou dezenove anos, surgiu a oportunidade de jogar a liga nacional (maior
competição da modalidade). Foi nesse período que Ricardo optou por se dedicar ao
futsal, abdicando de seu emprego. É uma escolha interessante porque a entrada no
contexto não foi uma continuidade de escolhas infantis, mas sim uma decisão frente
à uma oportunidade (transição ecológica) que gerou um movimento adaptativo em
Ricardo, que se assemelha a uma expressão autonômica aderindo a sua
metamorfose uma personagem de atleta com base em identidade política.
É uma consolidação dessa metamorfose que já vinha dando sinais desde sua
iniciação esportiva, e que pela forma como foi descrita aparenta ter potencializado
um fragmento emancipatório para Ricardo.
Momento 2 - Profissionalização (Não-acomodação e continuidade da direção
emancipatória)
Pelo transcorrer da história de Ricardo, esperava-se agora iniciar um relato
de como Ricardo se dedicou à carreira atlética, entrando cada vez mais nas
Políticas de Identidade do esporte, movido pelo status, reconhecimento perverso do
papel do atleta e pela cultura do futebol presente no Brasil. Contudo, o que
encontramos é um caminhar para uma direção oposta, aqui interpretado como uma
continuidade da autonomia na sua expressão identitária, evitando o enquadramento
da colonização da ordem sistêmica.
Ricardo relata que após essa primeira participação na liga nacional, ainda na
sua fase de atleta juvenil, recebeu diversas propostas de contrato para jogar em
outras equipes espalhadas pelo Brasil. Entretanto, Ricardo preferiu ficar em sua
equipe, na cidade em que cresceu, para continuar sua formação acadêmica e
adquirir uma "base" para depois "tentar o futsal como esporte e alto rendimento".
Aqui o relato nos surpreendeu, porque até o que se sabe, praticar o esporte é algo
tido como sonho para muitos jovens, ainda mais jovens que vem de famílias de
pouca condição financeira, como uma promessa de ascenção social.
Quando retomamos o contato com Ricardo para explorar melhor essa sua
escolha, a explicação foi que apesar de gostar do futsal, e de ter se dedicado à
modalidade desde os seus 10 anos, disse que sempre foi uma orientação de seus
pais que ele terminasse os estudos e que tivesse uma estrutura caso a vida no
esporte não desse certo. Ricardo relata que sua relação com o esporte era muito
positiva, mas que queria dar uma chance para a carreira profissional que vinha
145
tentando em paralelo. Tanto que sua opção por equipes para jogar, ainda que na
sua cidade, era sempre em equipes que davam bolsas de estudos para os altetas
em faculdades:
"sempre me dediquei o futsal, desde os dez anos, mesmo na minha vida acadêmica, eu trabalhava
um período treinava o outro estudava outro a noite, então minha vida era bastante complexa, meu
tempo era praticamente todo preenchido, eu trabalhava num horário, ia treinar, do treino ia estudar,
depois ia para casa, sempre ativa, sempre tive treinando, jogando"
Percebe-se que mesmo com a vida atlética se desenvolvendo e evoluindo, o
esporte fazia parte de seu projeto de vida, mas era um mecanismo a alcançar, num
projeto maior de alcançar o viver bem, com satisfação e saúde, alcançando uma
situação financeira satisfatória. Dessa forma, percebemos que não é o papel de
atleta (Política de Idenitdade) que domina sua expressão identitária, mas a
identidade política de atleta que se apropria das características do contexto
esportivo para se definir nesse processo de metamorfose direcionado para
fragmentos emancipatórios.
Momento 3 - Ápice (Dedicação exclusiva ao futsal, mas com a cabeça no
projeto de vida).
A partir de 2010, já com 27 anos, Ricardo recebe uma proposta de um
grande clube do país, talvez um dos maiores e decide então se dedicar
exclusivamente ao futsal. Desliga-se de seu emprego e muda-se de sua cidade. Foi
ai que sua vida tomou um rumo totalmente diferente, como relatou Ricardo.
"tanto que surgiu outra equipe em 2011 equipe do [apelido do time], que ai a gente pode ter um
trabalho, de um nível mais elevado tanto taticamente fisicamente tecnicamente a gente se dedicou
ao futsal tive que abrir mão do meu emprego para viver do futsal, foi ai que decidi jogar futsal
profissionalmente, fiz uma boa temporada. [...] desde então tive uma vida totalmente diferente."
Atualmente, Ricardo é casado e tem dois filhos. Recentemente, com uma
mudança grande de cidade para entrar em uma equipe grande, conforme explica
Ricardo "talvez a maior do país, que todo atleta sonha em jogar", Ricardo deixou
sua família na cidade que morava anteriormente e foi se dedicar à prática esportiva.
O que parece ser um indício de adesão heteronômica em suas metamorfoses,
parece não funcionar assim. Ricardo relata que sua família deu todo o apoio que
precisava, e que até hoje funcionam como base para que consiga enfrentar as
dificuldades. A cobrança que percebe nessa equipe é muito grande, muito maior
146
que em outros times menores em que jogou. Mas essa pressão se dissolve com um
ambiente de grupo muito interativo e acolhedor que recebeu.
É interessante que, ao relatar sobre a mudança de cidade, Ricardo sugere
que foram bem acolhidos até porque alguns foram para lá (cidade da equipe) para
se estabilizar e não apenas para jogar. Perguntamos se essa não era a perspectiva
de Ricardo e a resposta foi de que não, que sua casa era com a sua família e que
logo planejava retornar, porque já estava planejando o término de sua carreira.
Fica evidente que o esporte, ou a representação do papel "ser atleta" não
domina a sua expressão identitária, fortalecendo cada vez mais a ideia de que seu
projeto de vida vai além do sucesso no esporte, definido a paritr de uma identidade
política e pós-convencional. Em momento nenhum do seu discurso ouvimos falas
que indicasem um senso coletivo de sua atividade, do seu vir a ser, ou uma escolha
determinada por características instrumentais, como parece ficar claro na sua fala:
"sempre a gente tem que procurar buscar novos desafios, e acho que esse foi um grande destino na
minha vida".
Essa tomada de consciência de Ricardo sobre a alienação que leva a um agir
instrumental e estratégico do esporte, fica evidente quando perguntamos sobre a
sua perspectiva em relação ao esporte. Ricardo parece muito esclarecido das forças
opressoras que existem no esporte e utiliza disso para conseguir seus objetivos
pessoais, sem ceder a essa pressão, como explica:
"apesar que a carreira é curta então o cara tem que saber fazer as escolhas certas, foi por isso que
eu decidi procurar a vida acadêmica, para dar uma base, porque se o esporte não desse certo, eu
tinha uma coisa na minha vida então, não me arrependo do que fiz, hoje consegui ta em uma equipe
de alto nível de alto rendimento. [...] espero em um alto nível uns 35 anos e depois me dedicar ao
futsal como tenho outra profissão, mas mesmo assim nunca vou deixar o futsal de lado, que me faz
ser homem, ser humano, um cidadão do bem, estão eu espero um dia dar sequencia fora de quadra
[...] fazendo alguma coisa para tá contribuindo para o futsal essa vai ser daqui um tempo meu
pensamento."
Discussões
O objetivo deste estudo foi analisar a influência do contexto esportivo em
proporcionar possibilidades emancipatórias ou colonizadoras no processo de
construção da identidade em atletas de futsal através do padrão semântico de fala e
da caracterização do contexto bioecológico, exemplificando com narrativas da
história de vida de sujeitos considerados emblemáticos. Analisando as narrativas de
147
25 atletas de futsal de alto rendimento, identificamos 3 grupos caracterizados pela
forma como expressavam suas metamorfoses identitárias num sentido de
direcionamento do discurso da história de vida (movimento regressivo) e dos
projetos de vida (movimento progressivo). Um grupo era marcado por um discurso
direcionado à heteronomia com projetos de vida inexistentes ou enquadrados na
lógica do agir instrumental, os outros dois grupos eram direcionados à autonomia de
sua expressão identitária, com distinção em projetos de vida baseados em Políticas
de Identidade ou identidades políticas. Uma organização semelhante dos dados em
estudos de identidade com base no Sintagma Identidade - Metamorfose -
Emancipação já foi previamente desenhada com uma população geral (DANTAS,
2013).
Os resultados encontrados nesse estudo permitiram identificar que o padrão
semântico do discurso dos atletas seguem estruturas diferentes de acordo com a
sua classificação, facilitando a identificação de conceitos enquadrados pelas
Políticas de Identidade nos discursos dos atletas, e, após analisar os estudos de
caso com os discursos sobre histórias de vida fica evidente que a percepção do
contexto esportivo como agente estimulador de possibilidades emancipatórias e
colonizadores está associado a história de vida do atleta e suas experiências.
Percebe-se que atletas que apresentaram maior multiplicidade de papéis, com
maior participação multiambiental e intercâmbio entre relações de diferentes
contextos também apresentaram um processo de metamorfose com maiores vias de
emancipação do domínio idoeológico da ordem sistêmica atrelada ao esporte.
Como sugere a teoria bioecológica (BRONFENBRENNER, 2005), a
participação do indivíduo em diferentes ambientes, com multiplicidade de papéis
favorece o processo de desenvolvimento, no caso a Identidade-Metamorfose-
Emancipação. Nossos resultados corroboram essa perspectiva e também apontam
que essa riqueza de papéis (como proposto por CIAMPA, 1987) auxiliam o indivíduo
na auto-exploração, proporcionando maior autonomia e conquista de fragmentos
emancipatórios em seu processo de formação identitária.
Entendemos que o processo de formação identitária é algo subjetivo,
dependente das experiências do indivíduo e da relação que este estabelece com o
ambiente (HABERMAS, 1990). Contudo, faz parte dessa análise o impacto que o
contexto tem nesse processo, proporcionando elementos para a atribuição de
sentido pelo indivíduo. Contextos altamente controladores que regulam a
148
experiência do indivíduo não abrem espaço para a manifestação da autonomia do
sujeito, facilitando sua adequação às regreas impostas pelas Políticas de
Identidade, representando uma incursão da ordem sistêmica sobre o mundo da vida
do sujeito (HABERMAS, 2012). Nossos resultados deixam esse processo evidente
na comparação progressiva entre os três casos expostos, tanto na análise das
palavras que utilizam para descrever suas carreiras como na sequência de
acontecimentos em suas histórias de vida.
Em especial, os atletas do primeiro grupo utilizavam com muita frequência
palavras que representam uma forma de racionalidade instrumental, ligados à
vitória, sucesso e outras características do esporte espetáculo. Enquanto os grupos
mais autonômicos apresentavam conexões semânticas mais diversas, unindo
experiências esportivas e não esportivas, potencialmente alcançando mais
racionalidade comunicativa entre suas manifestações de personagens e seus
contextos.
Não obstante, são esses atletas (mais autonômicos) que apresentam
metamorfoses identiárias mais direcionadas para fragmentos emancipatórios.
Contudo, essa metamorfose pode também assumir papel de não-metamorfose, fato
mais evidente nos atletas do grupo 1, mas também presente nos atletas do grupo 2.
Uma característica que pareceu ser comum aos grupos 1 e 2 de atletas foi que, no
início da prática esportiva, esta parece mais lúdica (Descoberta), menos regulatória.
Mas conforme a dedicação ao futsal vai se intensificando, com a progressão da
carreira (Profissionalização), fica mais claro o processo de mesmice (Ápice) em que
se encontram, regulados pelas Políticas de Identidade, principalmente vinculado ao
lado financeiro e ao grande reconhecimento que o esporte parece proporcionar
(CIAMPA, 2002; HABERMAS, 1983; 1989).
Diversos momentos das entrevistas, falas referentes à importância da
modalidade para a comunidade e para suas famílias pareciam dar mais força à suas
identidades, podendo ser entendidas como personagens feitichizadas. Muito
diferente do grupo 3, que já tem um discurso que não se regula pela necessidade de
realização no esporte, nem pelo reconhecimento de seu papel de atleta, mas sim
pelo reconhecimento de suas conquistas e da relevância do esporte como elemento
para concretização de projetos de vida mais amplos, envolvendo a família, planos
de futuro e a busca pelo viver bem, evidenciando um processo de metamorfose com
fragmentos emancipatórios (HABERMAS, 1990).
149
Estudos com populações de atletas também têm encontrado resultados
semelhantes, sobre o efeito da modalidade como elemento regulatório da formação
da identidade em atleta de futebol de campo, com dificuldades para se ajustar na
vida após aposentadoria (WEBB et al., 1998; LALLY, 2007), ou emancipatórios para
atletas deficientes (PRESOTO, 2005; Le CLAIR, 2011). A literatura especializada
também tem apontado para essa direção, utilzando referenciais teóricos
epistemologicamente diferentes, como a identidade atlética que é o grau de
identificação com o papel de atleta (PARK, LAVALLEE, TOD, 2013).
No entanto, nenhum estudo ainda havia investigado o esporte como
elemento possibilitador de processos de fragmentos emancipatórios ou de
colonização para atletas de rendimento. Ao contrário, há uma extensa literatura
apontando para os malefícios dessa prática de rendimento. Contudo, corroborando
achados recentes, o esporte de rendimento tem potencial para possibilitar
regulações (racionalidade instrumental e regulações da origem sistêmica) mas
também pode possibilitar fragmentos emancipatórios, como representados pelos
atletas do grupo 3 aqui analisados. Ainda, nenhum estudo foi encontrado
investigando esse processo em atletas de futsal, que é uma das modalidades mais
praticadas no Brasil e no mundo (DAMO, 2005).
Aprofundando, especificamente a análise do contexto no discurso dos atletas,
percebemos que o esporte pode possibilitar fragmentos emancipatórios ou
incursões da colonização da ordem sistêmica dependendo das outras
características de vivência do atleta e de algumas situações especificas. Ficou
definido que a iniciação e profissionalização precoce, com um foco específico em
rendimento parecem favorecer movimentos heteronômicos e manutenção da
mesmice identitária, além de prejudicar o estabelecimento de projetos de vida que
não sejam baseados em um agir instrumental. Reforçando a importância de escolas
de formação com uma perspectiva holística de desenvolvimento de talentos, que já
tem sido apresentado na literatura como mais eficazes para o bom desenvolvimento
do atleta e transferência de habilidade para a vida (GOULD & CARSON, 2008),
também exemplificado pelo terceiro estudo de caso de Ricardo.
Outra característica marcante foi a presença da escola/faculdade, diversos
estudos têm apontado para o problema da carreira dupla que atletas precisam levar,
com a vida escolar (STEINDFELDT, STEINDFELDT, 2010). Esses resultados
corroboram os nossos achados, agora numa perspectiva de formação identitária.
150
Contudo, como entendemos que o processo de metamorfose é constante e
individual, não podemos decretar que o abandono da escola é essencialmente um
fator regulatório da expressão da identidade, mas pelos resultados que
encontramos, esse abandono foi um elemento importante que facilitou maior
imersão na carreira atlética e consequentemente, maior adequação ao agir
instrumental e a Políticas Identitárias. Em contrapartida, o caso 3 apresentou o
oposto, que a continuidade nos estudos favoreceu a exploração pessoal e a
formação de identidades políticas com a prática esportiva (estar atleta ao mesmo
tempo que estou aluno, impossibilitando projetos de vida de conseguir o sucesso no
esporte qualquer custo).
De forma semelhante, a presença da família têm sido continuamente
reportada como um elemento importante para formação de talentos esportivos, em
especial para proporcionar o apoio afetivo e instrumental para a prática. Nossos
achados vão ao encontro da literatura (WYLLEMAN & LAVALLEE, 2003), mas
expandem apresentando a relevância da família estabelecida pelo atleta (esposa e
filhos) como elementos significativos que geram crises e consequentes
metamorfoses. Foi o que apareceu em algumas das redes semânticas, dando
significado à palavras como vida ou obrigação com o esporte. Nas histórias de vida,
o grupo 2 relatou a família como um elemento que o questionava, potencialmente
fazendo-o refletir sobre sua mesmice identitária e estimulando uma metamorfose, da
mesma forma que a família também foi usada por Leonardo para a manutenção de
sua Política de Identidade (mostrar ao filho que não desiste, que precisa se
esforçar). Já no caso do grupo 3, a família é notadamente um elemento de apoio à
manutenção da emancipação de Ricardo.
Uma última caracterísitca que precisa ser analisada é a presença do esporte
como alternativa a ambientes de violência e criminalidade. Diversos relatos de
estudos mostram que o esporte é utilizado como forma de ascenção e mobilidade
social para pessoas de baixa condições financeiras (DAMO, 2005, VISSOCI, 2009),
como é o relato do atleta do grupo 3, mas além disso, proporciona oportunidades de
vida em ambientes com fortes presenças de alienação. Avançando na literatura
evidenciando o uso de esportes como estratégia de tomada de consciência e
desenvolvimento.
Este estudo apresenta limitações que precisam ser discutidas. A primeira
reflete na abrangência da amostra. Apesar de tentarmos entrevistar a maioria dos
151
atletas que representassem a popoulação de jogadores de futsal de rendimento, o
método empregado presa por maior profundidade de análise e não amplitude e
generalização. Assim, os resultados se restringem as experiências aqui
apresentadas, mas podem ser compreendidos numa perspectiva cultural da
modalidade. Ainda, optamos por utilizar apenas 3 casos de sujeitos emblemáticos,
seguindo as sugestões da literatura, que possibilitam o uso de casos que retratam
claramente o processo teórico estudado. Uma segunda limitação está na análise
semântica, que aplicada à lingua portuguesa sofre algumas alterações pela falta de
dicionários mais adequados para o procedimento, entretanto sugere-se a aplicação
de novos estados para confirmar os achados. Contudo, os resultados são
corroborados pelos estudos de caso, de forma que sustentam sua argumentação.
Por fim, tratamos exclusivamente da modalidade do futsal e suas características,
assim novos estudos são necessários para verificar essa manifestação em outras
modalidades ou em outros níveis de desempenho esportivo.
Como implicações para a prática, fica evidente a importância de elementos
como o conceito de transição ecológica (BRONFENBRENNER, 1995), muitas vezes
oriundas de mudanças geográficas, que indicam caracteristicas ambientais que
estimulam modificações no processo de desenvolvimento do indivíduo, provocando
crises e necessidades de movimentos, hora heteronômicos e de manutenção da
colonização do mundo da vida e mesmice identitária, outros em metamorfoses que
favorecem a autonomia e a emancipação. Dessa forma, esse estudo avança ao
indicar a importância de um cuidado com os programas de desenvolvimento de
talentos esportivos, especialmente aqueles que não modalidades altamente
estruturadas mas que atraem grande parcela de praticantes, como é o futsal.
Relação com treinadores, climas motivacionais de treinamento, suporte familiar,
formação holística são conceitos que precisam ser melhor analisados numa
perspectiva de formação identitária no esporte e suas consequências no
comportamento humano.
A análise semântica empregada associada à análise em redes permitiu
evidenciar padrões de discurso que podem ser utilizados para identificação de
características de expressão identitária, podendo facilitar o entendimento do
fenômeno nos estudos em Psicologia Social. Contudo, é uma aplicação inicial do
método e precisa de maiores análises de sua usabilidade em outros estudos, sem
152
ferir a premissa a hermenêutica que tange os estudos com o fundamento do
Sintagma Identidade - Metamorfose - Emancipação.
O estudo mostra, ainda, que quando se atinge uma identidade política, pós-
convencional (como no caso de Ricardo), o indivíduo se sente mais seguro para
promover mudanças em seu contexto, e adotar comportamentos emancipatórios
que enfrentam a opressão provida pelas Políticas de Identidade. O caso de José
Roberto, refletido no padrão semântico da fala dos altetas do grupo que
representava, evidencia a necessidade de maior clareza de consciência frente a
reposição de personagens feitichizadas (processo de mesmice representando
colonização da ordem sistêmica) e as consequências disso para a formação
humana. Leonardo exemplifica um atleta que está em processo de tomada de
consciência que, como em seu caso, pode precisar de uma lesão ou de uma
pressão familiar para conseguir assumir a necessiade da luta pela emancipação e
estabelecimento de projetos de vida com base no agir reflexivo e comunicativo,
identidades políticas e autonomia.
153
Referências
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154
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155
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese defendida neste texto foi de que o contexto bioecológico esportivo do
Futsal apresenta características que podem potencializar a busca por emancipação
da identidade ao mesmo tempo que apresenta características que favorecem a
colonização da ordem sistêmica sobre as metamorfoses, direcionando para a
heteronomia. Entendemos que essas características do contexto podem possibilitar
formação de identidades políticas associadas à adesão a projetos de vida voltados
emancipação, determinantes para que o indivíduo exerça a prática esportiva de
forma autônomica, conquistando fragmentos emancipatórios frente à opressão
sistêmica.
Para alcançar evidências que suportassem a tese defendida, e após uma
profunda revisão da literatura, conduzimos três estudos que procuraram identificar o
estado da área dos estudos em identidade no esporte, verificar as características do
contexto bioecológico dos futsal e analisar associação com a formação da
identidade desses atletas.
O primeiro estudo procurou investigar de forma sistemática a literatura
nacional e internacional para levantar os estudos sobre identidade no esporte e
identificar quais os tipos de variáveis associadas à identidade e que suportes
teóricos têm sido utilizados. O segundo estudo buscou investigar o contexto, na
perspectiva bioecológica, associado ao desenvolvimento da carreira atlética em
atletas de Futsal, delineado de forma a identificar elementos do contexto que
potencializassem possibilidades emancipatórias ou de colonização para a formação
identitária dos atletas. O último estudo analisou a influência do contexto esportivo
em proporcionar possibilidades emancipatórias ou colonizadoras no processo de
construção da identidade em atletas de futsal através do padrão semântico de fala e
da caracterização do contexto bioecológico, exemplificando com narrativas da
história de vida de sujeitos considerados emblemáticos.
Os resultados encontrados nesse estudo permitiram identificar que o padrão
semântico do discurso dos atletas seguem estruturas diferentes de acordo com a
sua classificação em termos de expressão identitária e comprometimento com um
projeto de vida, facilitando a identificação de conceitos enquadrados pelas Políticas
de Identidade nos discursos dos atletas, e, após analisar os estudos de caso com os
156
discursos sobre histórias de vida fica evidente a influência do contexto esportivo
como agente estimulador de possibilidades emancipatórias e colonizadoras.
Quando pensamos em projetos de vida e identidade política, precisamos pensar em
algo direcionado para a ação comunicativa (reflexiva, crítica, autonomia) e não
instrumental (alienada, funcional) com vias de uma identidade Pós convencional.
Assim, o desenvolvimento esportivo parece ter um viés muito mais Instrumental do
que comunicativo, olhando para o desenvolvimento atlético com foco em habilidades
atléticas ou habilidades para a vida boa.
Percebemos que o contexto esportivo do Futsal apresenta características que
instigam ou inibem a expressão identitária autonômica. O esporte torna-se
rapidamenta uma atividade molar na vivência desses atletas e fortalece-se ao longo
da carreira, ocupando espaço de outras atividades como a educação e presença
familiar, que se tornam moleculares. Contudo, esse fenômeno é altamente
influenciado pelas forçar do meso e exossistemas, norteadas pela estrutura, valores
e crenças do macrossistema. Os resultados evidenciaram que a força da
comunicação interambiental ou da participação multiambienta podem favorecer
experiências que suplantem os agir instrumental referenciado pela reposição e
feitichização do personagem "atleta".
Ainda, o corpo de literatura sobre identidade e esporte ainda precisa avançar
quanto à presença de estudos sobre a influência do contexto nesse processo,
partindo para abordagens menos subjetivistas, analisando características pessoas e
não a identidade como um processo. O contexto pode ser um agente
relevante, quando você se depara com treinadores que o auxiliam, escolas com
focos diferente de rendimento e formação atlética, família que da suporte com foco
em autonomia de decisão e não uma tomada de decisão forçada por políticas de
identidade colonizando o que os pais imaginam de boa vida.
Assim, conclui-se que o contexto esportivo tem potencial para ser um
elemento que possibilite a busca por reconhecimento e fragmentos emancipatórios
na expressão identitária dos atletas, mas este processo é mediado pelo
comprometimento individual com um projeto de vida. Atletas sem projetos de vida
seria aqueles que não conseguem vislumbrar nem metas a serem alcançados.
Focam no momento, em tocar o dia dia e, consequentemente têm pior sequencia
de discurso. Percebemos, também, que em momentos e crise a cultura
157
(macrossistema) favorece o agir instrumental, munido os atletas de falas prontas e
enquadradas em Políticas identitárias marcadas por discursos repetitivos e simples.
Essas metamorfoses identitárias precisam ser analisadas em contexto,
facilitando a compreensão do impacto do ambiente no processo individual de
formação identitária e proporcionando elementos para a estruturação de ambientes
de experimentação esportiva mais favoráveis à emancipação que à colonizção da
identidade pela ordem sistêmica.
158
APÊNDICES E ANEXOS
APÊNDICE A
Estratégia de busca na base de dados Pubmed
Search Query Items found
#4 Search (#3 NOT animals) 2807
#3 Search (#1 AND #2) 3089
#2 Search ("Sports"[Mesh] OR "Sport"[All Fields] OR "Athletics"[All Fields] OR "Athletic"[All Fields] OR "Sports Medicine"[Mesh] OR "Sport Medicine"[All
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"Exercises, Aerobic"[All Fields] OR "Aerobic Exercise"[All Fields])
215602
#1 Search ("Identity Crisis"[Mesh] OR "Crises, Identity"[All Fields] OR "Crisis, Identity"[All Fields] OR "Identity Crises"[All Fields] OR "Social
Identification"[Mesh] OR "Social Identity"[All Fields] OR "Identities, Social"[All Fields] OR "Identity, Social"[All Fields] OR "Social Identities"[All Fields] OR "Identification, Social"[All Fields] OR "Identifications, Social"[All Fields] OR "Social Identifications"[All Fields] OR "Group Identification"[All Fields] OR "Group Identifications"[All Fields] OR "Identification, Group"[All Fields] OR
"Identifications, Group"[All Fields] OR "Identification (Psychology)"[Mesh] OR "Identifications (Psychology)"[All Fields] OR "Identification"[All Fields] OR
"Human Development"[Mesh] OR "Development, Human"[All Fields])
467669
159
APÊNDICE B
Parecer do comitê de ética
160
161
162
163
APÊNDICE C
Termo de consentimento livre e esclarecido
Gostaríamos de convidá-lo a participar da pesquisa intitulada “A influência do
context bioecológico no processo de formação da identidade do atleta: Possibilidades de
colonização ou emancipação para atletas de futsal.”, que faz parte do curso de Doutorado
do Programa de Estudos posgraduados em Psicologia Social da PUCSP e é co-orientado
pela Prof. Dra. Lenamar Fiorese Vieira, da Universidade Estadual de Maringá.
O objetivo da pesquisa é analisar o efeito das características perfeccionistas na
coesão de grupo de equipes de futsal de alto rendimento por meio de um modelo de
equação estrutural mediado pelas necessidades psicológicas básicas dos atletas. Para isto
a sua participação é muito importante, e ela se daria da seguinte forma: respondendo a
três questionários com questões referentes às características de perfeccionismo, às
necessidades psicológicas básicas e à coesão de grupo, além de uma entrevista
semiestruturada.
Gostaríamos de esclarecer que sua participação é totalmente voluntária, podendo
você: recusar-se a participar, ou mesmo desistir a qualquer momento sem que isto
acarrete qualquer ônus ou prejuízo à sua pessoa. É garantido o sigilo e confidencialidade
aos sujeitos da pesquisa, bem como não são previstos riscos ou desconfortos inaceitáveis
na participação no estudo. O benefício esperado é a disponibilização para profissionais
que trabalham com o futsal a relação entre os atributos psicológicos (perfeccionismo,
motivação e coesão de grupo) de atletas de futsal de alto rendimento e a influência da
trajetória esportiva nesta relação.
Caso você tenha mais dúvidas ou necessite maiores esclarecimentos, pode nos
contatar nos endereços abaixo ou procurar o Comitê de Ética em Pesquisa da UEM, cujo
endereço consta deste documento. Este termo deverá ser preenchido em duas vias de
igual teor, sendo uma delas, devidamente preenchida e assinada entregue a você.
Além da assinatura nos campos específicos pelo pesquisador e por você,
solicitamos que sejam rubricadas todas as folhas deste documento. Isto deve ser feito por
ambos (pelo pesquisador e por você, como sujeito de pesquisa) de tal forma a garantir o
acesso ao documento completo.
Caso V. Sra. concorde com a participação no estudo, solicitamos seu
consentimento preenchendo as informações abaixo:
Eu, _______________________________________, declaro que fui devidamente
esclarecido e concordo em participar VOLUNTARIAMENTE da pesquisa coordenada pela
Profª Dra. Lenamar Fiorese Vieira.
__________________________________________ Data: _____/_____/_____
Assinatura (do Pesquisado)
Eu, José Roberto Andrade do Nascimento Junior, declaro que forneci todas as
informações referentes ao projeto de pesquisa supra-nominado.
164
__________________________________________ Data: _____/_____/_____
Assinatura (do Pesquisado)
Qualquer dúvida com relação à pesquisa poderá ser esclarecida com o pesquisador, conforme o
endereço abaixo:
Lenamar Fiorese Vieira Rua Neo Alves Martins, 1886 Apto 151 Telefone: 32232145/99451923
Qualquer dúvida com relação aos aspectos éticos da pesquisa poderá ser esclarecida com o
Comitê Permanente de Ética em Pesquisa (COPEP) envolvendo Seres Humanos da UEM, no
endereço abaixo:
COPEP/UEM
Universidade Estadual de Maringá.
Av. Colombo, 5790. Campus Sede da UEM.
Bloco da Biblioteca Central (BCE) da UEM.
CEP 87020-900. Maringá-Pr. Tel: (44) 3261-4444
E-mail: copep@uem.br
165
APÊNDICE D
Roteiro de entrevista semi-estruturado sobre carreira esportiva
Experimentação (Experiências iniciais com a atividade motora – 6 a 12 anos)
Gostaria que você comentasse sobre suas atividades motoras na infância
Quais atividades e /ou brincadeiras costumava fazer?
Onde morava?
Com quem costumava brincar?
Que idade tinha?
Especialização (da aprendizagem à automatização – 12/13 a 15 anos)
Dentre os esportes que aprendeu, qual praticou mais?
Roteiro – Quais?
Idade?
Por quê?
Alguma característica pessoal tua foi importante para praticar o futsal?
Quanto tempo por semana, horas por dia se dedicava aos treinamentos?
Fale sobre os teus professores/ técnico
Que outra atividade tinha além de treinar futsal? Estudava?
Como tua família participava do teu envolvimento com o futsal?
Quando começou a competir em nível de federação?
O que recorda de positivo ou negativo desta época?
Teve algum tipo de suporte financeiro... da família..... de patrocinadores... da equipe.... do
governo municipal... estadual ... ?
- Ganhou medalhas nesse período?
-Quais os motivos que o levaram a praticar o futsal?
-Qual o seu nível de cobrança em relação ao seu desempenho e suas metas?
-Como era a relações de grupo na categoria juvenil/adulto? (Faziam confraternizações? Saiam
em grupo? Como eram as relações do grupo nos treinamentos e competições?).
Investimento (Dedicação exclusiva ao esporte escolhido – Acima de 15 anos)
O esporte escolhido.
- Qual o momento de sua carreira esportiva que escolheu dedicar-se exclusivamente ao futsal?
Em que ano ou época isso aconteceu?
Quantos anos tinha naquela época?
Quais foram os fatores que te levaram a optar por essa modalidade?
166
Quantos horas e dias de treinos por semana?
Como era o teu relacionamento com o teu técnico?
Que outras atividades tinha que fazer além de se dedicar aos treinamentos? Estudam?
Como era o teu relacionamento com tua família?
Considera que por ter sido atleta foi valorizado dentro da comunidade que vivia?
Como você elaborava seus planos para o futuro?
- Qual o impacto que o esporte teve na sua vida?
- Aponte os fatores positivos e negativos de ser um jogador de futsal.
- Quais os motivos que o mantém praticando o futsal?
- Qual o seu nível de cobrança em relação ao seu desempenho e suas metas atuais?
- Como são as relações de grupo na equipe atual? (Fazem confraternizações? Saem em
grupo? Como são as relações do grupo nos treinamentos e competições?)
167
APÊNDICE E
Autorização para realização da pesquia com atletas e treinadores de futsal
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