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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E BIOLÓGICAS
PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICA DE MATERIAIS – FIMAT
Renato Harley dos Santos
PROPRIEDADES ESTRUTURAIS E ELETRÔNICAS DE
INTERFACES DE NITRETO DE BORO CÚBICO E HEXAGONAL
Ouro Preto – MG
2014
Renato Harley dos Santos
PROPRIEDADES ESTRUTURAIS E ELETRÔNICAS DE
INTERFACES DE NITRETO DE BORO CÚBICO E HEXAGONAL
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Ciências – Física de Materiais como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências. Orientador: Prof. Dr. Ronaldo Junio Campos Batista
Ouro Preto – MG
2014
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todos os que, direta ou indiretamente, colaboraram comigo
no desenvolvimento desta pesquisa.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por iluminar, guiar e proteger meu caminho.
À minha esposa, Ana Paula, pelo apoio, por todo incentivo, por toda a ajuda, pela
fé depositada em mim e por todo o amor.
À minha família, uma peça fundamental na minha vida, na qual tive incentivo,
apoio e exemplo de vida.
Ao professor e orientador Ronaldo, pela orientação, incentivo, disponibilidade e
paciência e por ter confiado a mim este trabalho, assim como também ao
professor Allan, de quem fui co-orientado.
A todos os professores que, de alguma forma, contribuíram para a minha
formação.
Aos amigos do laboratório, que sempre estavam prontos para me ajudar,
principalmente na solução de problemas computacionais.
Aos colegas do mestrado – todos individualmente têm sua parcela de contribuição
neste trabalho, afinal não fazemos uma pesquisa como esta sozinhos.
Finalmente, agradeço ao CNPq, à FAPEMIG, à Capes e à UFOP pelo apoio
financeiro recebido que possibilitou a concretização deste trabalho.
RESUMO
Nesta tese, utilizando métodos baseados na teoria funcional da densidade,
investigamos as propriedades estruturais e eletrônicas do nitreto de boro
hexagonal depositado sobre nitreto de boro cúbico hidrogenado. Além disso,
aplicamos pressão uniaxial sobre estes materiais e verificamos como propriedades
estruturais e eletrônicas seriam afetadas.
Vimos que a simples deposição não afeta sua estrutura eletrônica e, assim, o
nitreto de boro hexagonal pode até servir como uma camada protetora em
situações em que a interação com espécies químicas do ambiente possa afetar as
propriedades de transporte das superfícies. Mas, com a aplicação de uma pressão
uniaxial na interface de nitreto de boro cúbico com o nitreto de boro hexagonal,
sua estrutura eletrônica pode ser afetada, alterando suas propriedades de
transporte, podendo, inclusive, tornar a interface semicondutora.
Vimos, também, que a morfologia da superfície de nitreto boro cúbico hidrogenada
(que pode ser terminada em B-H ou N-H) tem um forte efeito de propriedades
eletrônicas da superfície de nitreto de boro cúbico, o que, por sua vez, afeta as
propriedades eletrônicas e estruturais da interface nitreto de boro cúbico/nitreto de
boro hexagonal.
Palavras-chave: nitreto de boro hexagonal e nitreto de boro cúbico.
SUMMARY
In this thesis, using methods based on density functional theory, we investigate the
structural and electronic properties of hexagonal boron nitride deposited on
hydrogenated cubic boron nitride. In addition, uniaxial pressure applied on these
materials and we note how structural and electronic properties would be affected.
We have seen that the simple deposition does not affect its electronic structure and
thus the hexagonal boron nitride can even serve as a protective layer in situations
where interaction with chemical species of the environment may affect the
transport properties of surfaces. But, by applying a uniaxial pressure in cubic boron
nitride interface with the hexagonal boron nitride, their electronic structure can be
affected by changing its transport properties and can even make semiconductor
interface.
We have seen, too, that the surface morphology of cubic boron nitride
hydrogenated (which can be completed in B-H or N-H) has a strong effect of
surface electronic properties of cubic Boron Nitride, which in turn affects the
electronic and structural properties of Boron Nitride interface of hexagonal boron
cubic-nitride.
Key words : hexagonal boron nitride and cubic boron nitride.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – ESTRUTURA DE BANDAS DO NITRETO DE BORO
CÚBICO ................................................................................................................ 14
FIGURA 2 - ESTRUTURA CRISTALINA DO GRAFENO COM ÁTOMOS DE
CARBONO ........................................................................................................... 16
FIGURA 3 – MÉTODO UTILIZADO PARA OBTER CAMADAS FINA S DE
GRAFITE .............................................................................................................. 17
FIGURA 4 – REPRESENTAÇÃO DE REDE CRISTALINA
HEXAGONAL ......................................... .............................................................. 18
FIGURA 5 – ESTRUTURA CRISTALINA DO NITRETO DE BORO
CÚBICO .............................................................................................................. 21
FIGURA 6 – VISTA LATERAL DO FILME DE NITRETO DE BOR O
CÚBICO .............................................................................................................. 41
FIGURA 7 – ESTRUTURA DE BANDAS PARA VETORES DE ONDA S
PARALELOS ......................................... .............................................................. 43
FIGURA 8 – DEPOSIÇÃO DO FILME DE h-BN SOBRE c-BN OR IENTADO NA
DIREÇÃO (111) .................................................................................................... 46
FIGURA 9 – DEMONSTRAÇÃO DAS POSSÍVEIS DEPOSIÇÕES DE h-BN
SOBRE c-BN ........................................ ................................................................ 46
FIGURA 10 - ENERGIA EM FUNÇÃO DA DIMENSÃO DA CÉLULA
PERPENDICULAR ÀS SUPERFÍCIES ...................... .......................................... 48
FIGURA 11 - ESTRUTURA DE BANDAS (PRESSÃO 1) ...... ............................ 51
FIGURA 12 - ESTRUTURA DE BANDAS (PRESSÃO 2) ...... ............................ 52
FIGURA 13 - ESTRUTURA DE BANDAS (PRESSÃO 3) ....... ............................ 53
FIGURA 14 - ESTRUTURA DE BANDAS (PRESSÃO 4) ...... ............................ 54
FIGURA 15 – VARIAÇÃO DA CARGA COM A DIMINUIÇÃO DA
DISTÂNCIA ........................................ ................................................................. 55
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................... 11
Nitreto de Boro ................................... .....................................................
Nitreto de boro hexagonal – Grafeno ............... ......................................
Nitreto de boro cúbico – Diamante ................ ........................................
1 METODOLOGIA .................................... ................................................
1.1 Método......................................... .........................................................
11
15
20
23
23
1.2 A Aproximação de Born – Oppenheimer ........... .............................
1.3 A Aproximação de Partícula Independente........ ..............................
1.4 Aproximação de Hartree e Hartree – Fock........ ................................
1.5 A Teoria do Funcional da Densidade............. ...................................
1.5.1 O Teorema de Hohenberg – Kohn................ ..................................
1.5.2 O formalismo de Kohn – Sham.................. .....................................
1.5.3 O Funcional de Troca – Correlação ........... ...................................
1.6 Teoria de Pseudo – Potencial .................. ..........................................
1.7 Método LCAO ................................... ...................................................
1.8 Implementação SIESTA .......................... ............................................
2 RESULTADOS PRELIMINARES ......................... ..................................
25
26
29
30
31
32
34
35
36
37
41
2.1 Um isolante no volume com superfície condutora .........................
2.2 Estabilidade do estado metálico das superfícies ...........................
2.3 Geometria de contato entre nitreto de boro cúbi co e hexagonal ..
2.4 Efeito da pressão uniaxial nos estados de super fície ....................
CONCLUSÃO ......................................... ...................................................
REFERÊNCIAS ..........................................................................................
41
44
45
50
57
58
INTRODUÇÃO
Atualmente, o interesse em materiais compostos por boro (B), carbono (C) e
nitrogênio (N) tem aumentado devido ao grande potencial de aplicabilidade destes
e também por serem candidatos promissores para o desenvolvimento de novos
dispositivos eletrônicos em nanoescala.
A nanociência e a nanotecnologia têm atraído uma enorme atenção nos últimos
anos, em grande parte devido aos enormes avanços experimentais do ponto de
vista de instrumentação, manipulação e síntese, dentre outros. Dada a escala dos
sistemas, efeitos quânticos passam a ser predominantes, e surge a necessidade
de se compreender os processos em nível atômico. Simulações computacionais
que permitem uma resolução precisa das equações da mecânica quântica têm um
papel fundamental no estudo de nanoestruturas. Através destas simulações, é
possível, hoje, realizar o estudo de situações realistas, de nanosistemas que
envolvem de centenas a milhares de átomos, com uma descrição bastante realista
das propriedades desses sistemas.
Este novo ramo de produção (nanotecnologia) pode ser entendido como a
capacidade potencial de criar objetos úteis a partir de átomos ou moléculas,
usando técnicas e ferramentas específicas. Os principais avanços desta nova área
começaram a surgir na década de 1980, quando instrumentos que permitem a
manipulação em nível nanométrico foram criados. Entre esses instrumentos, os
mais importantes são os microscópios: de varredura por sonda (SPM), de
tunelamento com varredura (STM) e de força atômica (AFM).
Nitreto de Boro
O nitreto de boro (BN) está entre os materiais mais duros, entre aqueles que mais
se aproximam da natureza do diamante.
Trata-se de um composto em que o boro e o nitrogênio se unem somente através
de ligações covalentes, que podem ocorrer entre dois átomos de elementos
diferentes.
Decorrentes do nitreto de boro, têm-se o nitreto de boro cúbico (c-BN) e o nitreto
de boro hexagonal (h-BN), materiais artificiais extremamente duros.
Ao observarmos a tabela periódica, podemos verificar que o boro (B) e o
nitrogênio (N) são os vizinhos à esquerda e à direita do carbono (C),
respectivamente; juntos formam um composto binário: o nitreto de boro (BN) que é
um isoeletrônico com compostos de carbono e apresenta ligações química similar
[23]. Algumas propriedades importantes de BN são a sua baixa densidade, alta
condutividade térmica, inércia química muito elevada, elevada resistividade e
dureza [2]. E mais: o nitreto de boro é um material polimorfo, sendo as fases
hexagonal (h-BN) e cúbica (c-BN) as predominantes
Nitreto de boro é um composto químico com fórmula BN, no qual o número de
átomos de boro e nitrogênio são iguais, apresentando propriedade isoeletrônica
semelhante à estrutura de carbono, tendo, assim, variadas formas cristalinas [36].
Este composto é produzido sinteticamente a partir de ácido bórico ou de trióxido
de boro e, portanto, não encontrado na natureza.
Este composto sintético com extraordinária propriedade mecânica, térmica,
elétrica, óptica e química é amplamente aplicado para fins tecnológicos. Por ser
branco, apresenta alta refletividade no espectro da luz visível. Suas propriedades
com relação aos raios ultravioletas são insignificantes, sendo que o mesmo é, de
algum modo, transparente aos referidos raios. O nitreto de boro possui por
característica a propriedade de não conduzir bem a eletricidade; contudo, conduz
calor tão bem quanto os metais. É um pouco menos duro que o diamante, mas
mais estável, e mantém uma dureza até 200 ºC, enquanto o diamante desfaz-se
em grafite a cerca de 900 ºC.
Ao ser sintetizado, o nitreto de boro tem a forma de um pó branco, que pode ser
utilizado na fabricação de cerâmicas duras com diversas aplicações industriais. É
importante na fabricação e no revestimento de ferramentas, como, por exemplo,
proteção em escudos e roupas à prova de balas; revestimento de peças industriais
sujeitas à forte abrasão; protetor contra radiação e contra o choque de
micrometeoritos, entre outras. Com as mesmas propriedades, pode ser disposto
em forma de fios, que podem ser tecidos nos mais diversos formatos e com total
flexibilidade. Assim, eles podem ser incorporados em resinas para formar peças
complexas. São incontáveis as aplicações industriais do nitreto de boro [1, 12, 38
e 39].
Em um trabalho recentemente publicado, aplicando um formalismo do funcional da
densidade, no qual foram investigadas interfaces originadas pela interação entre
superfícies de nitreto de boro passivadas com hidrogênio, descobriu-se que essas
interfaces apresentavam lacunas de bandas que poderiam ser controladas de
forma contínua, aplicando uma pressão uniaxial, que foi explicada em termos da
interação entre os estados de superfície com terminações B-H e N-H. Esse
sistema apresentou um gap que poderia ser modificado de zero até cerca de 4,4
eV, e a interface apresentou um comportamento metálico com elétrons na
superfície N-H e buracos na superfície B-H, dependendo da superfície de
separação.
Então, investigando algumas camadas de filmes de BN hidrogenado, observaram-
se, na figura abaixo (figura 1) , as geometrias dos filmes para algumas camadas,
variando de um a cinco camadas, como também sua respectiva estrutura
eletrônica na parte inferior.
Figura 1: Estrutura de bandas de nanofilmes de nitreto de boro cúbico passivados com hidrogênio (referência 2).
Como podemos observar da esquerda para a direita, as camadas aumentam de
um até cinco, e, assim, à medida que esse número de camadas aumenta, a
sobreposição entre os orbitais dos átomos em cada superfície diminui. Essa
dependência do gap sobre o número de camadas é explicado em termos de
diferença entre os grupos B-H e N-H [23].
Os átomos de hidrogênio (H) não compensam o excesso ou a falta de elétrons nos
orbitais N e B em superfícies de c-BN em ligações N-H e B-H, resultando em
estados de superfícies dentro do gap de c-BN. No caso de filmes com quatro
camadas ou mais, não há sobreposição entre os orbitais de N-H e B-H, e logo a
interação entre as referidas superfícies é desconsiderada. Ressaltando que a
distância entre os átomos N e B em ambos os lados do filme de quatro camadas é
de 7,12Å, que é o dobro que o raio do ponto de corte do orbital de N e B, que é
2,5Å.
Outro caso semelhante [3], é a interação entre os nanotubos semicondutores de
carbono (SCNTs) e superfícies de diamante, que possuía um grande gap isolante,
permitindo um comportamento metálico. No entanto, neste caso, a parte superior
da banda de valência da superfície do diamante estava acima do limite inferior da
banda de condução de SCNTs.
Diante disso, entendemos que a interação entre superfície terminada em N-H e B-
H ocorre com filmes com menos de três camadas, ou seja, existe uma
sobreposição entre os orbitais de átomos de B e N em diferentes superfícies. E,
num filme de uma única camada, a sobreposição entre os orbitais é máxima, e o
excesso ou a falta de elétrons nas superfícies N-H e B-H é cancelado. Logo, essa
única camada de filme de c-BN apresenta uma lacuna de banda muito semelhante
ao do bulk de c-BN.
Após as análises desses resultados, espera-se que a sobreposição entre os
orbitais dos átomos de B-H e N-H de superfícies c-BN indicam o gap, uma vez que
afeta a distribuição de carga que dá origem aos estados de superfície.
Portanto, com as propriedades dessas interfaces, ou seja, comportamento
semicondutor, metálico e isolante, é possível e viável sua utilização em eletrônica,
como dispositivos altamente estáveis, assim como o acoplamento entre a pressão
aplicada e a lacuna da banda podem ser utilizados em dispositivos
eletromecânicos.
Nitreto de boro hexagonal – Grafeno
O nitreto de boro (BN) hexagonal apresenta as mesmas geometria e propriedades
mecânicas do grafeno. Como podemos observar pela figura 2 , o grafeno é um
cristal atômico bidimensional formado por átomos de carbono localizados nos
vértices de uma rede hexagonal.
Figura 2: Estrutura cristalina do grafeno: átomos de carbono localizados numa rede em formato de favos de mel [26].
Há poucos anos, o grafeno começou a ser investigado cientificamente, depois de
várias tentativas, nas quais Novoselev e Geim conseguiram isolar folhas de
grafeno individuais [25, 26 e 24], utilizando um método simples para extrair da
estrutura do grafite folhas de grafeno. Para isso, utilizaram fitas adesivas para
remover algumas camadas de grafite e, logo em seguida, usaram um substrato
para reduzir ainda mais o número de camadas de grafite, obtendo-se, assim, o
grafeno. Na figura 3 , podemos ver, de forma ilustrativa, esse processo.
Figura 3: Método realizado para obter camadas finas de grafite utilizando uma fita adesiva. Na linha superior, a fita adesiva é usada para remover algumas camadas de grafite do material macroscópico. Na linha inferior e à esquerda, a fita com as camadas de grafite é pressionada sobre um substrato de um material perviamente escolhido e, à direita, algumas camadas de grafite permanecem aderidas ao substrato, após retirada da fita de sobre o mesmo [26].
Diante das previsões teóricas, em que o mesmo afirmava que era impossível a
existência de bidimensionais grandes a temperaturas finitas, percebe-se que essa
teoria não levou em conta a possibilidade de a rede cristalina vibrar e se deformar
na direção perpendicular ao plano do cristal, pelo fato da existência do grafeno [11
e 13].
Como podemos observar na figura 4 , a estrutura hexagonal pode ser construída
de uma rede triangular e uma célula unitária composta por dois átomos A e B
representados em cores azul e amarela.
Figura 4: Representação de uma rede cristalina hexagonal a partir de duas redes triangulares: uma a partir do átomo A (azul) e outra a partir do átomo B (amarelo). a1e a2
são os vetores da rede triangular e , 1,2,3,i iδ =
são os vetores que apontam para os átomos que são os primeiros vizinhos de um átomo da rede [9].
A posição de todos os átomos de cor amarela pode ser obtida a partir da posição
de um dos átomos de uma célula unitária somados a vetores múltiplos dos vetores
1a→
e 2a→
enquanto o mesmo se pode obter para os átomos de cor azul. Os vetores
1a→
e 2a→
são dados por:
1 (3, 3)2CCd
a→
=
e
2 (3, 3)2CCd
a→
= −,
sendo que CCd0
1.42A� e é a distância entre os átomos de carbono no grafeno.
Entende-se que a estrutura hexagonal formada pelos átomos de carbono implica
que a ligação química entre eles é aquela formada pela hibridização sp2 dos
orbitais s e p. E que os três elétrons de valência do átomo de carbono fazem parte
das três ligações do tipo sp2, e o elétron restante, que ocupa o orbital pz, por
exemplo, forma ligações chamadas de π π− , que são mais fracas do que as
outras. Portanto, este elétron do orbital p que se localiza em orbital perpendicular
ao plano do grafeno é o responsável pela maior parte das propriedades
eletrônicas do mesmo. E, em função de a célula unitária do grafeno possuir dois
átomos, a estrutura eletrônica forma duas sub-bandas, uma π e uma *π , que
constituem as bandas de valência e condução do grafeno, respectivamente.
Materiais como grafenos (ou nitreto de boro hexagonal), conhecidos tanto na
natureza quanto os artificiais, estão entre os mais fortes, resistentes e flexíveis.
Através de simulações atomísticas utilizando o módulo de Young, conhecido como
módulo de elasticidade, em que o mesmo é um parâmetro relacionado à rigidez
mecânica do material e no qual é definido como a razão entre a tensão /F Aσ = e
a deformação relativa 0/L Lε = ∆ , logo,
0
0
/
/
FLF AE
L L A L
σε
= = =∆ ∆
, onde
0L é o comprimento inicial do material,
F é a força aplicada ao material perpendicularmente a uma seção
transversal de área A,
0L L L∆ = − é a variação do comprimento do material em função da aplicação
da força. Podemos notar que as unidades de σ e do Módulo de Young são as
mesmas de pressão: 2/N m Pa= .
Diante desse módulo, observa-se que o nitreto de boro hexagonal é da ordem de
1 TPa (1 TPa= 1012Pa). Em caso de comparação, o módulo de Young do aço é
210 GPa (1GPa= 109Pa) e do Kevlar (fibra sintética da DuPont usada em coletes à
prova de balas) é da ordem de 112 GPa [22].
Outra importante informação é a chamada tensão de resistência máxima, que é o
valor máximo de tensão que o material suporta antes de se deformar ou romper.
Enquanto o aço e o Kevlar possuem valores da ordem de 400 MPa e 3000 MPa,
respectivamente, (1 MPA= 103 PA) a tensão de resistência máxima de grafenos é
da ordem de 130000 MPA.
Devido a fatores como baixa densidade, tamanho pequeno, razão de aspecto
elevada, ou seja, a razão comprimento pelo diâmetro e propriedades mecânicas
superiores, os nanotubos de carbono são considerados os candidatos ideais para
reforçar materiais compósitos [5, 30 e 33]. Lembrando que compósito é um
material formado pela mistura de dois ou mais materiais diferentes.
Nitreto de boro cúbico – Diamante
O nitreto de boro cúbico é uma forma alotrópica sintética do BN, obtida sob
condições de altas temperaturas e altas pressões, a partir do nitreto de boro
hexagonal (h-BN), composto obtido também de forma artificial.
Em termos de dureza, apenas o diamante o supera como material comercialmente
aplicado na indústria. A vantagem marcante do nitreto de boro cúbico em relação
ao diamante é sua resistência elevada à temperatura. Enquanto no diamante a
grafitização inicia-se a 900 °C, o nitreto de boro cúbico, apresenta uma
estabilidade até 2000 °C. Somente a partir dessa temperatura é que o nitreto de
boro cúbico (c-BN) regride, voltando à sua forma original hexagonal.
Conhecido por borazon, o nitreto de boro cúbico foi desenvolvido no intuito de se
alcançar e até mesmo superar as propriedades do diamante. Todavia, ele não
conseguiu atingir tal dureza, mas conseguiu outras propriedades, tais como a
condução térmica. Assim, o nitreto de boro cúbico é usado para torneamento de
acabamento em aços endurecidos, mediante uma dureza de 45 HRc. Acima de 55
HRc, ele é tido como única ferramenta de corte capaz de substituir os métodos de
retificação tradicionalmente usados. É importante frisar que aços abaixo de 45 HRc
contêm uma quantidade maior de ferrita, que tem, por consequência, um efeito
negativo na resistência ao desgaste do c-BN. Contudo, seu principal uso
relaciona-se à usinagem sob altas velocidades de materiais ferrosos, de difícil
usinabilidade tais como aços de elevada dureza e ferros fundidos não maleáveis,
atuando em um corpo em que as ferramentas, promovendo uma alta qualidade
superficial, podem eliminar operações de retífica [1, 12, 38 e 21]. Idem anterior.
Atualmente, em ciência de materiais, um de seus objetivos principais é obter
materiais com propriedades elétricas, térmicas e mecânicas para aplicações
tecnológicas. Assim, o nitreto de boro (BN) – bem como também o diamante –,
devido às suas propriedades físicas e químicas, é um destes materiais.
O nitreto de boro cúbico (c-BN) apresenta a mesma geometria e propriedades
mecânicas ao diamante, além de apresentar parâmetros de rede e propriedades
físicas: dureza, condutividade térmica e gap de energia muito próxima às do
diamante [14].
Podemos observar, pela figura 5, que o nitreto de boro cúbico possui uma
estrutura cristalina, tendo duas redes cristalinas cúbicas de face centrada, sendo
que uma é composta de átomos de boro e a outra de átomos de nitrogênio,
semelhante à do diamante. Nessa estrutura, os átomos são ligados a quatro
vizinhos próximos de espécies alternadas através de ligações tetraédricas
σ ligando orbitais hibridizados 3sp
[16].
Figura 5: Estrutura cristalina do nitreto de boro cúbico, sendo que (• ) são os átomos de boro e (o) são os átomos de hidrogênio.
A dureza do nitreto de boro cúbico é uma propriedade marcante, podendo ser
medida mesmo em cristais pequenos. Ele é estável a temperaturas de 1600 K [19
e 8]. É um material atrativo como ferramenta de corte por não reagir com materiais
ferrosos, além de apresentar gap de energia superior ao do diamante.
Comparando o nitreto de boro cúbico ao diamante, o nitreto de boro cúbico
apresenta uma resistência muito elevada à temperatura. Além disso, a queda da
dureza do diamante com a temperatura é tão brusca a partir de 500 °C que, em
800 °C, ela é inferior à do c-BN à mesma temperatura.
Do exposto, é possível entender que o nitreto de boro é um composto dos mais
interessantes do ponto de vista prático e científico. Ele se cristaliza em duas
formas aqui expostas: cúbica e hexagonal. O nitreto de boro cúbico vem sendo
bastante utilizado devido ao seu baixo custo em relação ao diamante e à sua
maior eficiência; assim como também o nitreto de boro hexagonal que, quer na
sua forma pura ou como um composto, é um material imensamente adequado
para aplicações especiais a temperaturas elevadas. É extremamente empregado
em selos de gás para sensores de oxigênio, peças para fornos de alta temperatura,
cadinhos para fundição, óculos, barragens laterais para fundição fina e barcos de
evaporação para alumínio.
1 METODOLOGIA
Sabe-se que, para se obter uma informação sobre um sistema quântico, é
suficiente a resolução da Equação de Schrödinger para encontrar as autofunções
e os autovalores. Uma vez que não existe uma resposta analítica para resolver os
problemas de muitos corpos, o cálculo da referida equação torna-se bastante
complexo. Também constitui-se em problema nessa resolução o fato de que tal
equação não pode ser empregada para resolver em casos de muitas partículas,
uma vez que o custo computacional aumenta com N 3, sendo N o número de
partículas. Assim, deve-se utilizar outros métodos aproximativos de baixo custo
computacional e que fornecem o resultado mais fidedigno possível. Um dos
métodos que vêm sendo implementados é o programa SIESTA.
Este capítulo refere-se às bases teóricas de muitos métodos utilizados na
resolução do problema. São eles: Aproximação de Born – Oppenheimer, a
Aproximação de Hartree e Hartree-Fock, a Teoria do Funcional da Densidade, a
Teoria de Pseudo – Potencial e p Método LCAO. Dá-se ênfase à implementação
do SIESTA (Spanish Initiative for Electronic Simulations with Thousandis of Atmos).
1.1 Método
Por se tratar de um método caro computacionalmente e com o objetivo de obter as
propriedades quânticas do sistema, resolvemos a equação de Schrödinger usando
a fórmula:
HΨ = EΨ
Sendo o o Hamiltoniano, a energia referente a esse operador e o estado
quântico.
Ψ=Ψ( 1, 2 ..., N, 1, 2... MΞ , )
onde
Enquanto está relacionada às coordenadas dos N elétrons, está relacionado
às coordenadas dos M núcleos.
Considerando o hamiltoniano não-relativístico que descreve um sistema de N
elétrons interagentes num sólido de M núcleos dado a seguir
^ ^ ^ ^ ^ ^
e n ee en nnH T T V V V= + + + +
onde cada termo desse hamiltoniano representa uma expressão das interações no
sistema. Segue, abaixo, o significado de cada termo da expressão anterior.
Operador energia cinética eletrônica
2^
1 2
N
ei
iT
=
∇= −∑
Operador energia cinética nuclear
^2
1
1
2
m
N ji
Tmj=
= − − ∇∑
Operador da energia potencial repulsiva elétron – elétron
^
1
1m n
eei j i
i j
V
r r→ →
= >=
−∑∑
Operador referente à atração núcleo-elétron
^
1 1
.n m
eni j
j i
ZiV
R r→ →
= >= −
−∑∑
Operador da energia potencial repulsiva núcleo – núcleo
^
1
n m
nni j i
i j
ZiZjV
R R→ →
= >=
−∑∑
Como resolver a equação de Schrödinger em um sistema de muitos corpos tem
um custo computacional muito grande, são apresentadas, a seguir, aproximações
com o objetivo de melhorar a performance destes cálculos.
1.2 A Aproximação de Born – Oppenheimer
Este tipo de aproximação torna possível separar o movimento dos elétrons do
movimento dos núcleos. Na sua essência, a aproximação de Born – Oppenheimer
se baseia na ideia de que a massa do elétron é muito menor do que a massa do
núcleo, de forma que mudanças significativas nos estados dos elétrons ocorrem
quando os núcleos podem ser considerados estáticos [17]. A maior parte dos
estudos utiliza a aproximação de Born – Oppenheimer. Contudo, existem estudos
considerando alguns contextos em que se pode avançar na aproximação.
Para resolver um problema pela referida aproximação, o primeiro passo é subtrair
a energia cinética do núcleo do hamiltoniano molecular. Os elétrons se movem em
um potencial de núcleos fixos.
Usa-se, para resolver tal problema, a equação
^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^
e ee en nn n e nH T V V V T H T = + + + + ≡ +
Sendo que ^
eH é o hamiltoniano eletrônico que depende das coordenadas dos
elétrons r→
e parametricamente da coordenada dos núcleos R→
,
^ ^
,e eH H r R→ → =
Logo
( , ) ( ) ( , )e eH r R E R r Rλ λ→ → → → →
= =
Onde ( , )r Rλ→ →
é a função de onda eletrônica, e ( )eE R→
a energia eletrônica
dependente de R→
.
Ressalta-seque a energia eletrônica eE R→
depende de R→
. Variando as
posições nucleares em pequenos passos e, em cada passo resolvendo a equação
anterior, obtém-se eE . eE é uma superfície de potencial para o movimento dos
núcleos ( superfície adiabática).
O próximo passo seria resolver a equação de Schrödinger para o movimento dos
núcleos.
^
n eT E R R E R→ → → + Φ = Φ
eE R→
é a superfície de potencial e R→
agora é uma variável.
Nesta tese, vamos tratar o movimento dos núcleos classicamente, onde a
força que atua nos núcleos é obtida através da expressão:
R R eF E R→ → → = −∇
Uma vez realizada a aproximação de Born – Oppenheimer, o passo a seguir é
resolver a equação de Schr dinger para ^
eH .
1.3 A Aproximação de Partícula Independente
Após realizar a aproximação de Born – Oppenheimer, o problema consiste em
encontrar uma solução 21 3, , ... nr r r rψ
→ → → →
para uma equação de Schr dinger de N
elétrons caracterizada pelo hamiltoniano:
2
1 1 1 1 1
1 1
2
N N M N Ma
ele ii i A i j
i A i j
ZH
r r r r
→
→ → → →− − = = >
= − ∇ − +− −
∑ ∑∑ ∑∑
Na equação acima, a interação repulsiva sentida pelo i-ésimo elétron depende da
coordenada de todos os demais elétrons do sistema. É importante salientar que,
em um sistema de muitos corpos, o tratamento das interações elétron-elétron é
uma tarefa bastante complexa. Este problema é simplificado através da
aproximação de partícula independente, na qual cada elétron move-se
independentemente sob a ação de um potencial efetivo devido aos demais
elétrons [3]. Essa aproximação permite a resolução de N equações de um elétron.
A função da onda, aí, pode ser descrita como o produto de funções de um elétron,
o que se conhece por produto de Hartree:
21 3 1 1 2 2 3 3, , ... . . ,...n nr r r r r r r rψ→ → → → → → → → = Φ Φ Φ Φ
sendo que i ir→ Φ
é a solução da
equação :
( ) .i i i i ii
h i r rε→ → Φ = Φ
Onde
2
'
2' 1
1 '
1
2
jMA
iiA j i
i A i
rZ
h r dr
r r r r
→
→ →−
→ → →→= ≠
Φ = − ∇ + +
− −∑ ∑∫
O hamiltoniano efetivo do i-ésimo elétron opera somente nas coordenadas deste
elétron. Já o hamiltoniano de campo médio pode ser entendido como:
1
( )N
mi
H H h i=
= =∑
O produto de Hartree é totalmente descorrelacionado, além de não obedecer ao
princípio de exclusão de Pauli, isto porque não é antissimétrico por troca de
índices nas partículas. Diante disso, não se constitui uma boa representação para
a função de onda eletrônica. Tal anti-simetrização conduz ao determinante de
Slater, de acordo com Hartree (1947) [15]:
1 1 1 2 1
2 1 2 2 2
0
2 1 2 2 2
1
!
n
n
n
x x x
x x x
n
x x x
ϕ ϕ ϕ
ϕ ϕ ϕψ
ϕ ϕ ϕ
→ → →
→ → →
→ → →
=
M M M
Em que n nxϕ→
são spin-orbitais.
Em seguida à resolução do determinante, introduz os multiplicadores de
Lagrangeikε , levando em consideração a condição de normalização, 1i iφ φ = .
Diante disso, tem-se a condição de extremo variacional:
0 01
0i
N
k i ii
Hδ ε=
Ψ Ψ − Φ Φ =
∑
As equações de Hartree-Fock para orbitais de um elétron, resultadas da relação
acima, podem ser descrita como
2' ' '
*
' '2
' '1
1( ).
2
j j iMA
i i i i iA j jiA
x x xZ
d x x x d x xr r r r r
ϕ ϕ ϕϕ ϕ ε ϕ
→
→ → →
→ → → → →
→ → → →=
− ∇ + + − = − −
∑ ∑ ∑∫ ∫
O termo
' '*
'
'
j i
ij
x xx d x
r r
ϕ ϕϕ
→ →
→ →
→ →
−∑ ∫ surge da assimetria da função de onda 0Ψ e é
conhecido como potencial de troca. Em virtude da interação de troca, o movimento
de elétrons de mesmo spin não é independente. Apesar de introduzir correlação
entre elétrons de mesmo spin, a aproximação de Hartree-Fock é definida como
não correlacionada. Um determinante único de Slater não é capaz de expandir a
função de onda multieletrônica.
Para a expansão da função de onda exata, forma-se um conjunto de
determinantes em que é obtida quando se levam em consideração estados
excitados, a equação
0 0, ,
...,r s rs rs rst rsti a a ab ab abc abc
ra a b r s a b c r s t
C C C C< < < < < <
Ψ = Ψ + Ψ + Ψ + Ψ +∑ ∑ ∑em que
raΨ
é o
determinante no qual o orbital aΨ foi substituído pelo orbital rΨ . Ressalta-se
que a função de onda acima descrita trata-se de uma série infinita.
1.4 Aproximação de Hartree e Hartree – Fock
Após obter-se o hamiltoniano, é preciso encontrar a função de onda, que
representa o sistema. Para tanto, utiliza-se a teoria do orbital molecular.
Na descrição de qualquer sistema, a função de onda ideal necessitaria de ser
expressa como uma combinação linear de funções que formam a base no espaço
de Hilbert. Contudo, mediante as dificuldades de se computar analítica ou
computacionalmente, fazem-se, apenas, aproximações.
O método de Hartree sugere que a função de onda total seja o produto de todas
as funções de ondas individuais dos elétrons [34].
1 2 1. ... n nψ ψ ψ ψ−Ψ =
Partindo dessa equação, é possível estabelecer um princípio dito variacional, na
qual a energia total precisa ser minimizada com o vínculo de ortogonalidade entre
diversos 1ψ . O resultado de tal equação é uma equação do tipo Schrödinger para
cada orbital, na qual o potencial é dado pela interação entre núcleos e elétrons e a
repulsão entre elétrons. O resultado dessa função da onda total é bem simples e,
por isso, um elétron só percebe um campo médio mediante outros elétrons
circundando-o.
No método Hartree – Fock, por sua vez, utiliza-se o determinante de Slater, já
visto anteriormente.
Outra vez, aplica-se o princípio variacional sob os mesmos requisitos, cujo
resultado é a equação de Fock, dada por
A A A Af ψ ε ψ=
O operador de Fock é tido como um hamiltoniano efetivo para um elétron e
pode ser verificado na soma de um hamiltoniano aH e o potencial de troca atrocaV :
A A Atrocaf H V= +
O termo potencial de troca aparece ao se exigir que a função de onda seja
antissimétrica através do determinante de Slater. Esse termo é tratado pelo
método Hartree – Fock, enquanto o restante da interação entre elétrons continua
com o termo de interação média, desprezando-se os efeitos de correlação.
1.5 A Teoria do Funcional da Densidade
Um objeto físico, a densidade eletrônica, poderia ser usado como variável básica
ao invés da função de onda [17]. Tal formalismo é conhecido como Teoria do
Funcional da Densidade, que tem como vantagem maior a redução do número de
variáveis: de 3N da função de onda para 3 da densidade (exceto spin), sendo N o
número de partículas.
Esta teoria tem por base os teoremas de Hohenberg – Kohn:
• O primeiro afirma que a densidade eletrônica pode ser a nova variável e
que o potencial externo é determinado tão somente pela densidade
eletrônica;
• O segundo estabelece que a energia pode ser escrita como uma funcional
universal e a energia do estado fundamental é obtida minimizando-se esse
funcional.
É importante destacar que esta teoria constitui-se, atualmente, um dos métodos
mais populares, talvez pelo fato de prever resultados bem satisfatórios a um baixo
custo computacional, uma vez que seu objeto é a densidade eletrônica e não a
função de onda do sistema.
A função de onda é encontrada ao se resolver a equação de Schr dinger
para certo potencial ( )rν . Pode-se dizer, portanto, que o estado quântico [ ]vΨ é
um funcional de ( )rν .Então, se existe ( )rν ,calcula-se [ ]vΨ .Uma vez que Ψ é um
funcional de ( ), ( )r n rν também o será. O valor esperado de qualquer observável é
dado por:
0 0 0( ) ( )r n r dr= Ψ Ψ = ∫
1.5.1 O Teorema de Hohenberg – Kohn
A teoria do funcional da densidade se baseia num teorema que permite formular o
problema de muitos corpos em termos de densidade eletrônica como variável
básica. Este teorema estabelece que a energia do estado fundamental é um
funcional único da densidade eletrônica [17].
Para mostrar que dois potenciaisexternos extV . e 'estV ., diferentes a menos de uma
constante, conduzem necessariamente a diferentes estados fundamentais 0Ψ e
0'Ψ faz-se:
extH T V V= + +
Em que T é o operador energia cinética, extV é um potencial externo e V interação
elétron – elétron.
Deste modo, pode-se escrever
( ) 0 0 0extT V V ε+ + Ψ = Ψ
( ) 0 0 0' ' ' 'extT V V ε+ + Ψ = Ψ
É possível provar a primeira parte do teorema por absurdo. Supõe que 0Ψ seja
igual a 0'Ψ e, fazendo:
( ) ( )0 0 0 0' 'ext extV V ε ε− Ψ = − Ψ
Em que 0ε e 0'ε são números naturais. Isto quer dizer que extV e 'extV são diferentes
por uma constante, caso contrário 0 0'Ψ ≠ Ψ .Outra vez, por absurdo, mostra-se
que diferentes potenciais externos conduzem a diferentes densidades eletrônicas
do estado fundamental. Conforme o princípio variacional:
[ ]'0 0 0 0 0 0 0 0 0' ' ' ' ' ' ' 'ext ext ext extH H H V V n V V d rε ε
→= Ψ Ψ < Ψ Ψ = Ψ + − Ψ = + −∫
[ ]0 0 0 0 0 0 0 0 0' ' ' ' ' ' 'ext ext ext extH H H V V n V V d rε ε→
= Ψ Ψ < Ψ Ψ = Ψ + − Ψ = + −∫
Supondo que 0 0'n r n r→ → =
e, somando-se as equações anteriores, tem-se:
0 0 0 0' 'ε ε ε ε+ < + , o que não é correto.
Conclui-se, assim que 0 0'n r n r→ → ≠
para 'ext estV V≠ e que, portanto 0ε é o
funcional único da densidade eletrônica do estado fundamental.
O teorema de Hohenberg – Kohn pode ser generalizado para incluir estados
degenerados; também para cálculos práticos, como, por exemplo, para sistemas
polarizados e sistemas com temperatura finita.
1.5.2 O formalismo de Kohn – Sham
Segundo o teorema de Hohenberg – Kohn, é possível utilizar a densidade
eletrônica como variável para encontrar a energia do estado fundamental de um
sistema de n elétrons interagentes. Todavia, não é capaz de fornecer um esquema
computacional eficaz. Caso seja utilizado um sistema de referência não-
interagente e o potencial externo, tal que este sistema possua a mesma densidade
eletrônica no estado fundamental que o sistema real [20 e 31].
O funcional da energia pode ser escrito para o sistema real como
estn r T n r V n r V n r→ → → → Ε = + + .
Pegamos a expressão anterior e, somando e subtraindo o funcional da energia
cinética do sistema não-interagente e o termo direto, ou de Hartree, temos
2 2' '' '
2 2' 's ext
n r n r n r n re e
n r T n r T n r V n r d r d r d r d r n r V r d rr r r r
→ → → →
→ → → → → → → → → → →
→ → → →
Ε = + + − + + − −
∫ ∫ ∫ ∫ ∫
2 ''
2 's ext xc
n r n re
T n r d r d r n r V r d r E n rr r
→ →
→ → → → → → →
→ →
≡ + + + −
∫ ∫ ∫
No qual o funcional da energia de troca-correlação são os termos entre
chaves. A densidade que minimiza o funcional [ ]E n é a densidade do estado
fundamental. Logo obtemos a energia do estado fundamental variando a equação
anterior em relação a densidade eletrônica fixando o número de partículas.
Minimizando o funcional [ ]L n pelo método dos multiplicadores indeterminados de
Lagrange, temos:
[ ] [ ]2
iri
L n E n d r Nε →
→ = − Φ −
∑ ∫
E fazendo [ ]
0L n
n
δδ
= temos:
2 22
'
2 'ext xc i i i
n r d re V V r r
m r rε
→ →
→ →
→ →
∇ − + + + Φ = Φ
−
∫h
Onde xcxc
EV
n
δδ
=
1.5.3 O Funcional de Troca – Correlação
É preciso utilizar uma aproximação para o potencial de troca – correlação,
quando se pretende implementar o formalismo de Kohn – Sham[8]. Esta primeira
aproximação foi sugestão de LDA (Local DensityApproximation ); ela ignora os
aspectos não locais de xcV e assume que xcΕ pode ser escrita assim:
xc xcn r d rε→ → Ε = ∫
Dependendo apenas da densidade local e considerando o termo
xcE n r→
a energia de troca-correlação. Nessa primeira aproximação assumimos
que a densidade varia lentamente de forma que a densidade do sistema não-
homogêneo seja igual a do sistema homogêneo. Em cálculos incluindo spin, a
energia de Exchange-correlação é frequentemente separada em um termo de
troca e outro de correlação. Esse termo de troca é obtido na aproximação de
Hartree-Fock para um gás homogêneo, e uma aproximação bastante usada para a
energia de correlação é baseada em cálculos de Monte Carlo [10].
A fim de melhorar a aproximação para o funcional [ ]xcE n incluímos informações
sobre a taxa de variação de n r→
em relação a .r→
A aproximação GGA
(generalized gradiente approximation) [16] se dá onde a energia de troca e
correlação pode ser escrita da seguinte forma:
3; ; .GGAxcE n n d r f n n
→ → → ∇ = ∇ ∫
A escolha de ;f n n→ ∇
depende do comportamento de xcE n r
→
em situações
particulares.
1.6 Teoria de Pseudo – Potencial
A teoria de pseudo – potenciais refere-se a potenciais falsos e foram, de início,
introduzidos para simplificar os cálculos de estrutura eletrônica, eliminando a
necessidade de incluir os elétrons do caroço e o forte potencial que os ligam [28 e
18].
É uma aproximação muito útil, quando se trata de elementos químicos com muitos
elétrons ou quando se tem um amplo sistema. Esta aproximação revela que os
elétrons de caroço não são relevantes na descrição de ligações químicas, uma
vez que apenas os elétrons de valência são responsáveis por esses efeitos.
Neste processo, a forma real da função de onda dentro da região do caroço dá
lugar a uma função analítica, qual seja:
1( ) ( )lrF rR r r f r+= =
Em que ( )R r é a pseudo – função de onda radial e l é o número quântico de
momento angular. A função f(r) é escolhida de forma a não gerar um potencial
singular. Esta pode se constituir em um polinômio:
4 3 2( )f r r r rα β γ δ= + + +
ou uma exponencial:
4 3 2( ) exp .f r r r rα β γ = + +
Para que se possa determinar os coeficientes em f(r), aplicam-se as seguintes
condições:
• Os auto-valores de valência da pseudo – função de onda devem ser iguais
aos da função real;
• A pseudo – função de onda não deve ter nós, para não haver singularidade
no potencial, e deve ser igual à função de onda real fora do caroço;
• A pseudo – carga contida em uma esfera com raio cr deve ser igual à carga
real na mesma esfera:
2 22 2
0 0( ) ( )
c cr rPsl lR r r dr R r r dr=∫ ∫
• As derivadas primeira e segunda da função F(r) devem ser iguais às
derivadas primeira e segunda da função de onda real, no ponto cr r= .
Obtém-se o pseudo – potencial, invertendo-se a equação radial de Kohn – Sham:
2
2 2
( 1) 1( ) ( )
2 ( )Ps
l
l l dV r F r
r F r drε += − −
Para que se possa utilizar o pseudo – potencial em diferentes ambientes químicos,
deve-se remover a blindagem dos elétrons de valência.
1.7 Método LCAO
No cálculo da densidade eletrônica do estado fundamental, é preciso escolher
entre funções matemáticas aquelas que representam bem as auto – funções de
um elétron. Todavia, em se tratando de moléculas, encontrar uma função
matemática que represente bem um orbital molecular pode se constituir em uma
barreira intransponível. Na resolução deste problema, J. J. Roothaan propôs um
método conhecido como combinação linear de orbitais atômicos (LCAO – Linear
CombinationofAtomicOrbitals), no qual orbitais atômicos e moleculares são
expandidos em uma combinação linear de funções de base previamente
escolhidos.
Nesse contexto, pode-se escrever:
n
i iC µ µµ
Ψ = Φ∑
em que iC µ representa os coeficientes de combinação linear que irão representar
os orbitais iΨ , como misturas de µ funções de base µΨ . Os orbitais iΨ
satisfazem i i iH εΨ = Ψ ; considerando-se a equação anterior, pode-se escrever:
n n
i i iH C Cµ µ µ µµ µ
εΦ = Φ∑ ∑
Multiplicando-se por cada uma das funções 'µΦ da base tem-se:
' '
n n
i i iH C S Cµ µ µ µ µ µµ µ
ε=∑ ∑
em que, ' 'H Hµ µ µ µ= Φ Φ e ' 'Sµ µ µ µ= Φ Φ
é a integral de recobrimento e corresponde a uma medida da superposição das
funções 'µΦ e µΦ . Em forma de matriz, tem-se:
[ ] 0i iH S Cε− = e,
O problema possui solução quando,
[ ]det 0H Sε− =
A equação acima fornece os autovalores iε , e com esses autovalores é possível
encontrar os coeficientes iC através da equação:
[ ] 0i iH S Cε− =
1.8 Implementação SIESTA
Ao descrever sobre o tema “Metodologia”, é necessário fazer uma alusão ao
programa SIESTA (Spanish Initiative for Electronic Simulations with Tousands of
Atoms) [27 e 32], que se trata de uma implementação de cálculos de estrutura
eletrônica de primeiros princípios e é otimizada para que se possam ser realizados
cálculos com tempo computacional em escala mais eficiente que N3, e também o
TRANSIESTA, que é uma extensão do programa SIESTA, no qual o mesmo faz
cálculos de transporte em situações de não equilíbrio [7]. Pode-se dizer que o
SIESTA realiza cálculos auto-consistentes de DFT/Pseudo – Potencial e possui
bases formadas por combinações lineares de orbitais atômicos (LCAO) de alcance
finito.
A implementação SIESTA utiliza o formalismo DFT proposto por Kohn e Sham, e
os elétrons do caroço podem ser trocados por Pseudo – Potenciais de norma
conservada propostos por Troulier-Martins [37]. As bases implementadas são
obtidas resolvendo-se o problema do átomo isolado para elétrons de valência com
os mesmos pseudo – potenciais e aproximações DFT. Raios de corte são
impostos a essas funções de base, o que gera matrizes esparsas cujos elementos
podem ser determinados em operações que escalam linearmente com o tamanho
do sistema.
Para tornar mais fácil a implantação do hamiltoniano, basta usar diversas técnicas
de maneira conveniente para cada termo. Define-se, de início, a densidade de
carga do átomo neutro:
0( ) ( )NAi i
i
n r n r R≡ −∑
Sendo NAin a densidade de carga esférica atômica do átomo i em seu estado
neutro e isolado. É preciso esse passo no processo, no sentido de se evitar o
longo alcance dos pseudo-potenciais . Para isso, o potencial de Hartree gerado
por 0( )n r é somado e subtraído no hamiltoniano de Kohn – Sham. Define-se, em
seguida, ( )n rδ :
0( ) ( ) ( )n r n r n rδ = −
Em que ( )n r é a densidade de carga atual. Pode-se reescrever o potencial de
Hartree com as contribuições de ( )n rδ e 0( )n r que geram HV δ e 0HV respectivamente.
Para se definir o potencial de átomo neutro, escreve-se, antes, o pseudo-potencial
com uma parte não local de curto alcance VNL, e uma parte de longo alcance VL.
Deste modo, o potencial de átomo neutro pode ser escrito:
'2
'
( )( ) ( )
NAi i
NA i L i
n r R drV r R V r R e
r r
−− = − +−∫
O hamiltoniano de Kohn – Sham avaliado pelo SIESTA é obtido por
[ ]( ) ( ) ( ) ( )KSNL NA H xc
i
H T V r R V r R V r V rδ= + − + − + +∑
É necessário lembrar que T é a energia cinética do sistema não-interagente.
No SIESTA, a força em um átomo i é dado por:
00
0 02 2ii eei xc
i i i i i
H S UF E V V V
R R R R Rµν µν µ µδ δ
µν µν µ µ µν νµν µν µ µν
φ φρ ρ φ ρ φ−∂ ∂ ∂ ∂∂= + − + − +
∂ ∂ ∂ ∂ ∂∑ ∑ ∑ ∑
Define-se o termo ii eeU − como sendo:
2 20'
0' '
( ) ( )2 2
l lii ee H
ll l l
Z Ze eU V r n r
R R− = −−∑ ∫
O primeiro termo é tido como a interação entre núcleos com cargas 'l lZ Z , e
o segundo termo é a energia eletrostática da carga do átomo neutro 0( )n r .As
funções de base são representadas por φ e S é a matriz de sobreposição
( )Sµν µ νφ φ= .
Algumas características, de maneira resumida, mais importantes do SIESTA são:
� Nele, usa-se o método de Kohn-Sham no formalismo da Teoria do
Funcional da Densidade com as aproximações de densidade local (LDA) e
de gradientes generalizados (GGA), permitindo cálculos com ou sem
polarização de spin;
� Como também os pseudo-potenciais de norma conservada em formulação
não-local;
� Ele pode ser escrito em Fortran 90 e sua memória é alocada
dinamicamente, podendo ser compilado para execução em modo serial ou
paralelo (MPI);
� Nele, são projetadas as funções de onda e a densidade no espaço real para
calcular os potenciais de Hartree e de correlação e troca e seus elementos
de matriz;
� Conjuntamente com o método padrão de Rayleigh-Ritz, ele usa
combinações lineares de orbitais pseudo-atômicos, fazendo com que as
simulações com algumas centenas de átomos sejam possíveis com
máquinas (computadores) relativamente modestos.
� Com o SIESTA, é possível realizar cálculos ab initio de estrutura eletrônica
em átomos, moléculas, sólidos e clusters, dentro do formalismo de
supercélulas, fazendo o cálculo de:
� Energia total ou parcial;
� Forças atômicas;
� Tensor de stress;
� Momento de dipolo elétrico;
� Populações atômicas de Mulliken;
� Densidade eletrônica;
� Como também relaxação da geometria, com superfícies fixa ou variável;
� Amostragem de pontos k na zona de Brillouin;
� Densidade local de estados e projetada sobre orbitais;
� Estruturas de bandas;
� Dinâmica molecular na aproximação de Born – Oppenheimer.
2 RESULTADOS
2.1 Um isolante no volume com superfície condutora
Figura 6: Vista lateral de um filme de nitreto de boro cúbico orientado na direção (111) passivado com hidrogênio nas superfícies. É possível ver que, ao contrário de um filme de diamante, o nitreto de boro cúbico apresenta duas superfícies distintas: uma terminada com ligações N-H e outra com ligações B-H.
A figura 6 mostra a geometria da célula unitária usada para simular as superfícies
(111) de BN cúbico e a figura 7 , a respectiva estrutura de bandas para vetores de
onda paralelos à superfície e à densidade de estados eletrônicos projetada na
superfície terminada em B-H e N-H. A linha tracejada vermelha indica o nível de
Fermi e é possível ver, na estrutura de bandas, que as superfícies de BN cúbico
são metálicas. Este comportamento é completamente diferente do observado para
seu análogo de carbono, o diamante. É possível ver nos quadros que mostram as
densidades de estados que a maioria das bandas ocupadas próximas ao nível de
Fermi estão localizadas na superfície terminada em B-H e que a maioria das
bandas vazias próximas ao nível de Fermi estão na superfície terminada em N-H.
Para explicar esta estrutura eletrônica, vamos considerar a ocupação dos orbitais
hibridizados sp3 dos átomos de N e B que ligam ao H.
Longe das superfícies, cada átomo de B se liga a outros 4 átomos de N e vice-
versa – ver figura 6 . Cada ligação destas tem um par de elétrons no qual os
orbitais hibridizados sp3 dos átomos de B e N dividem 8 elétrons (sendo 3 do B e 5
do N). Assim, a camada 2 destes átomos fica totalmente preenchida (satisfazendo
a regra do octeto), e os próximos orbitais atômicos vazios são da camada 3, que
tem energia muito mais alta. Isto faz com que exista um grande intervalo de
energia, gap, entre as bandas ocupadas (valência) e vazias (condução) na
estrutura de bandas do nitreto de boro cúbico soído, bulk.
Nas superfícies, entretanto, ocorre algo diferente. O átomo de boro da superfície
B-H faz 4 ligações sp3, sendo 3 com nitrogênios do interior do sólido e 1 ligação
com o hidrogênio da superfície – ver figura 6. O boro tem 3 elétrons na sua
valência e o hidrogênio tem 1, assim os 3 átomos de N do interior teriam de
contribuir 4 elétrons para preencher completamente a camada 2 do B da
superfície. Com os orbitais completamente preenchidos, existiria um enorme gap
entre estados ocupados e vazios e a superfície terminada em B-H seria isolante.
No entanto, os 3N do interior do sólido fornecem um pouco menos que 4 elétrons
(3.75 na média pois cada N oferece 0.25 elétrons para cada um dos seus quatro
boros vizinhos) e, assim, os orbitais não ficam completamente preenchidos. Por
isso, não existe gap entre estados ocupados e vazios e o sistema fica metálico.
Como os orbitais estão quase totalmente preenchidos existem poucos estados
vazios, como pode ser visto na densidade projetada (painel do centro da figura 7 ,
onde são vistos poucos estados acima do nível de Fermi). Assim, podemos
concluir que as bandas de curvatura negativa mostradas na figura estão
localizadas na superfície B-H e, como veremos no próximo parágrafo, bandas com
curvatura positiva estão localizadas na superfície N-H.
Para o caso da superfície terminada em N-H, temos uma situação diferente. O N
tem 5 elétrons na sua valência e com 1 do H resta espaço apenas para mais 2
elétrons vindos dos 3 átomos de B do interior. Entretanto, os 3 átomos de boro
fornecem um pouco mais que 2 elétrons (2.25 na média pois cada B aceita 0.25
elétrons dos nitrogênios vizinhos) e, com isso, uma pequena fração dos elétrons
tem que ocupar estados de mais alta energia. Essa fração não é suficiente para
preencher todos os estados de alta energia e, por isso, não existe gap, como pode
ser visto no painel da direita da figura 7 . Isto explica também o por que da alta
densidade de estados desocupados.
Figura 7: Painel da esquerda: estrutura de bandas para vetores de onda paralelos à superfície do filme mostrado na figura 6. Painel do centro: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de B e H da superfície terminada em B-H. Painel da direita: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de N e H da superfície terminada em N-H.
2.2 Estabilidade do estado metálico das superfícies
A partir da discussão anterior, uma pergunta natural que surge é se o estado
metálico da superfície pode ser afetado pelo contato com outras superfícies ou
espécies químicas. Tal pergunta é interessante do ponto de vista tecnológico, pois
a resposta poderia tornar viável o uso do nitreto de boro cúbico como sensores
químicos ou dizer se as superfícies continuam metálicas em condições ambientes.
De fato, foi mostrado recentemente que a superfície terminada em B-H cede
elétrons para a superfície terminada em N-H se o houver contato físico entre estas
superfícies[?]. Como resultado, ambas as superfícies ficam isolantes. Assim, é de
se esperar que o contato com outras superfícies, líquidos ou gases possa
modificar o comportamento elétrico dessas superfícies. Nesta tese, investigamos o
contato das superfícies hidrogenadas do nitreto de boro cúbico com nitreto de boro
hexagonal. A escolha desse material é baseada no fato de que: (i) o nitreto de
boro hexagonal, assim como grafeno, pode ser produzido em poucas camadas (ou
até uma) que possibilitariam o revestimento da superfícies com filmes de
espessura controlada chegando até uma monocamada; (ii) a distância entre o
nitreto de boro hexagonal e as superfícies pode ser variada aplicando pequenos
valores de pressão uniaxial (estas interagem via forças de Van der Waals), o que
permite afetar os estados de superfície de maneira ajustável. Além disso, nitreto
de boro hexagonal é quase-comensurável com a superfície (111) do nitreto de
boro cúbico (podendo, inclusive, ficar comensurável sob pequenos valores de
pressão uniaxial) o ,que é muito interessante do ponto de vista computacional, já
que permite descrever a interface com poucos átomos por célula unitária.
Como veremos a seguir, a simples deposição do nitreto de boro hexagonal sobre
as superfícies hidrogenadas do nitreto de boro cúbico praticamente não afeta a
sua estrutura eletrônica. Assim, o nitreto de boro hexagonal pode servir como uma
camada protetora em situações em que a interação com espécies químicas do
ambiente possa afetar as propriedades de transporte das superfícies. Por outro
lado, veremos, também, que a aplicação de pressão uniaxial na interface nitreto
de boro cúbico/nitreto de boro hexagonal pode mudar a estrutura eletrônica da
interface, alterando as suas propriedades de transporte e podendo, inclusive, se
tornar a interface semicondutora.
2.3 Geometria de contato entre nitreto de boro cúbi co e hexagonal
O nitreto de boro hexagonal (h-BN) não é perfeitamente comensurável com a
superfície de nitreto de boro cúbico (c-BN) orientado na direção 111. No entanto, a
interação entre este dois materiais poderia fazer com que o h-BN se expanda e se
adapte ao substrato de c-BN, como ocorre na deposição do grafeno sobre cobre,
por exemplo. Além disso, como veremos a seguir, a pressão tem um grande efeito
geométrico de contato, fazendo com que a diferença de energia entre mínimos de
potencial seja muito maior que a energia necessária para expandir o h-BN e fazê-
lo comensurável com o substrato. Para investigar a geometria de contato,
consideramos 4 configurações possíveis para cada superfície que levam em conta
simetria das redes e que são descritas a seguir.
A figura 8 mostra a célula unitária utilizada para investigar a estabilidade
energética da deposição do h-BN sobre o c-BN. Os átomos que estão
representados pelas cores azul (correspondente ao elemento nitrogênio), verde
(correspondente ao elemento boro) e branca (átomo de hidrogênio) fazem parte
do nitreto de boro cúbico (c-BN). Já as cores vermelha e cinza correspondem ao
boro e nitrogênio respectivamente, representando a estrutura de nitreto de boro
hexagonal (h-BN). Esta célula é menor que a usada para investigar as
propriedades eletrônicas, já que percebemos que estas necessitam de um número
maior de planos atômicos para descrever tanto o c-BN quando o h-BN.
Figura 8: Deposição de um filme de h-BN sobre c-BN orientado na direção (111). Neste caso, o h-BN interage com a superfície terminada em N-H. Chamamos esta configuração de NH; ela corresponde ao esquema representado no painel central esquerdo da figura 9 .
Figura 9: Possíveis deposições do h-BN sobre o c-BN. Painel superior esquerdo: Bcentro. Painel superior direito: Ncentro. Painel central esquerdo: NH. Painel central direito: BH.
Painéis inferiores mostram duas geometrias possíveis que não foram investigadas neste trabalho.
A figura 9 mostra, esquematicamente, as possíveis deposições nas quais o h-BN
fica comensurável com o c-BN. Neste diagrama, o hexágono verde maior
representa a superfície de c-BN, na qual o vértice de cada triângulo equilátero
representa a posição de um átomo de hidrogênio. Triângulos preenchidos/vazios
representam a presença/ausência de um átomo no primeiro plano atômico do c-
BN. O hexágono menor representa o h-BN, onde círculos azuis representam os
átomos de nitrogênio e verdes os de boro.
Figura 10: Energia em função da dimensão da célula perpendicular às superfícies para 4 configurações mostradas na figura 8. Painel superior: superfície terminada em N-H. Painel inferior: superfície terminada em B-H.
A figura 10 mostra a energia livre de Helmholtz (nesse caso é a energia interna
pois T=0) para as 4 configurações mostradas na figura 8 para a célula comprimida
(entre 12 e 13 Å) e livre (entre 15 e 16 Å). Ambos os painéis mostram que a
compressão faz com que a diferença de energia entre configurações de equilíbrio
aumente. Assim, assumindo que o acréscimo de 1% no parâmetro de rede do h-
BN tenha um efeito desprezível na superfície de potencial da interação entre h-BN
e c=BN, podemos dizer que, com a compressão, o custo para manter o h-BN não-
comensurável (onde não é possível colocar todos as células da rede no mínimo
global) fica muito maior que o custo para aumentar o seu parâmetro de rede para
fazê-lo ficar comensurável com o c-BN, que é da ordem de 28 meV.
No caso da superfície terminada em N-H, painel superior da figura 10 , é possível
ver que, mesmo sem compressão, a diferença de energia entre configurações de
equilíbrio é consideravelmente maior que o custo para expandir o h-BN em 1% (28
meV). Assim, a simples deposição do h-BN sobre a superfície terminada em N-H
do c-BN faz com que o primeiro fique comensurável com o segundo. O mesmo
não pode ser afirmado sobre a superfície terminada em B-N, pois as diferenças de
energia são da ordem do custo de se expandir o h-BN.
Essa diferença de comportamento entre as superfícies pode ser compreendida
levando em conta que os estados de superfície do c-BN hidrogenado (figura 7 ) da
superfície terminada em B-H estão localizados nos átomos de B e H, enquanto os
estados da superfície N-H são mais delocalizados. Isto pode ser visto na
densidade de estados projetada – é possível ver na figura 7 um enorme pico na
densidade de estados da superfície terminada em B-H, o que não ocorre na
densidade de estados da superfície terminada em N-H. Assim, a interação entre a
superfície terminada em B-H e o h-BN tem um alcance menor que a interação
entre superfície N-H e o h-BN, o que justifica as diferenças no comportamento da
energia observado na figura 10 .
Como veremos a seguir, a localização dos estados nas superfícies hidrogenadas
de c-BN é relevante também na estrutura eletrônica das interfaces c-BN/h-BN.
2.4 Efeito da pressão uniaxial nos estados de super fície
Nesta secção, mostraremos as diferenças na estrutura eletrônica do material
quando não há uma pressão aplicada e quando existe uma pressão uniaxial. Os
painéis das figuras 11 a 14 mostram a estrutura de bandas para vetores de onda
paralelos a superfície e a densidade de estados eletrônicos projetada na superfície
terminada em B-H e N-H, quando estas interagem com h-BN. Podemos perceber
na figura 11 que, embora uma variação na densidade de estados em comparação
com a figura 7 , o material apresenta comportamento metálico, e que o mesmo
material vai diferenciando seu comportamento à medida em que se aplica uma
pressão, como vemos nos painéis das figuras 12, 13 e 14 .
Figura 11: Painel da esquerda: estrutura de bandas para vetores de onda paralelos a superfície do filme mostrado na figura (Pressão 1) 1. Painel do centro: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de B e H da superfície terminada em B-H. Painel da direita: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de N e H da superfície terminada em N-H.
Figura 12: Painel da esquerda: estrutura de bandas para vetores de onda paralelos a superfície do filme mostrado na figura (Pressão 2) 1. Painel do centro: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de B e H da superfície terminada em B-H. Painel da direita: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de N e H da superfície terminada em N-H.
Figura 13: Painel da esquerda: estrutura de bandas para vetores de onda paralelos a superfície do filme mostrado na figura (Pressão 3) 1. Painel do centro: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de B e H da superfície terminada em B-H. Painel da direita: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de N e H da superfície terminada em N-H.
Figura 14: Painel da esquerda: estrutura de bandas para vetores de onda paralelos a superfície do filme mostrado na figura (Pressão 4) 1. Painel do centro: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de B e H da superfície terminada em B-H. Painel da direita: densidade de estados eletrônicos projetada nos átomos de N e H da superfície terminada em N-H.
Lembrando que as bandas de curvatura negativa se devem a estados localizados
na superfície B-H e bandas com curvatura positiva a estados na superfície N-H.
Podemos ver que um pequeno valor de pressão (segundo painel) já é capaz de
tornar a superfície N-H isolante. Por outro lado, a superfície terminada em B-H
continua metálica até valores de pressão bem maiores.
Como discutido na seção 2.1, a falta ou o excesso de carga nas superfícies é que
dá origem ao comportamento metálico observado. E as superfícies se tornam
semicondutoras à medida em que as cargas são trocadas entre superfícies BH e
NH [23]. Naquele caso, a distância entre superfícies era o fator determinante para
o tamanho do gap. Então, é natural pensar que, com a pressão (que faz com que
a distância entre nitreto de boro hexagonal e as superfícies hidrogenadas
diminua), a superposição entre orbitais aumente favorecendo a transferência de
carga. Embora razoável, tal explicação não condiz com o resultado numérico.
Como é possível ver na figura abaixo (15) , praticamente não há variação da
carga com a diminuição da distância entre nitreto de boro hexagonal e cúbico
(observe que a escala do gráfico varia entre 7.9 e 8.1).
Figura 15: Variação da carga com a diminuição da distância (Å) entre nitreto de boro hexagonal e cúbico. Além da transição metal/semicondutor, é preciso explicar as diferenças de
comportamento observadas para as superfícies B-H e N-H (lembramos que a
superfície N-H é muito mais sensível à pressão que a B-H). É possível entender o
comportamento mostrado nos gráficos das estruturas de bandas analisando a
densidade de estados eletrônicos projetada nas terminações B-H e N-H das
superfícies – figuras 11 até 14 . É possível ver um grande pico na densidade de
estados projetadas na superfície B-H, o qual está associado a uma banda de
pouca dispersão que pode ser vista no painel da esquerda da figura 11 . O pico e
a pouca dispersão desta banda mostra que na superfície B-H os estados
eletrônicos estão localizados, o que não ocorre na superfície N-H. Como os
estados da superfície N-H são mais delocalizados, eles sentem a presença do
nitreto de boro hexagonal antes dos estados da superfície B-H, o que pode ser
visto comparado os painéis centrais e da direita das figuras 11, 12, 13 e 14 . Note
que, no caso da superfície B-H, mesmo com a compressão máxima, o pico ainda
existe, evidenciando a localização deste estados.
CONCLUSÃO
Neste trabalho, investigamos o contato das superfícies hidrogenadas do nitreto de
boro cúbico com nitreto de boro hexagonal. Na superfície de nitreto de boro cúbico
terminada em B-H, os estados de superfície são localizados nos átomos de B e H,
enquanto na superfície terminada em N-H os estados são delocalizados. Esta
diferença deve ter um grande impacto nas propriedades de condução eletrônica
das superfícies já que são os estados de superfícies que dão origem ao caráter
metálico das superfícies de nitreto de boro cúbico hidrogenado. Além disso, são
responsáveis por diferenças observadas tanto na estrutura eletrônica quanto nas
propriedades estruturais das interfaces nitreto de boro hexagonal/nitreto de boro
cúbico hidrogenado.
Com relação às propriedades eletrônicas, vimos que, com a deposição do nitreto
de boro hexagonal sobre a superfície do nitreto de boro cúbico hidrogenado,
praticamente sua estrutura eletrônica não é afetada, sendo que, assim, o nitreto
de boro hexagonal pode servir como uma camada protetora em situações em que
a interação com espécies químicas do ambiente poderia afetar as propriedades de
transporte das superfícies. Mas, por outro lado, vimos que a pressão tem um
grande efeito, afetando sua estrutura eletrônica e alterando suas propriedades de
transporte, podendo tornar a interface semicondutora. Vimos, também, que, devido
à localização dos estados de superfície do nitreto de boro cúbico terminado em B-
H, a superfície terminada em N-H é muito mais sensível à pressão do que a
superfície terminada em B-H.
Com relação às propriedades estruturais, vimos que, para o caso da deposição na
superfície terminada em N-H, é energeticamente favorável que o nitreto de boro
hexagonal fique comensurável com a superfície de nitreto de boro cúbico. Para o
caso da superfície terminada em B-H, não é possível afirmar que a
comensurabilidade ocorra. Mais uma vez a origem desta diferença está na
localização dos estados de superfície da superfície terminada em B-H, que torna
os estados de superfícies praticamente insensíveis à presença do nitreto de boro
hexagonal.
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