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Mônica Maria Tassigny, UNIFOR
EDITORIAL
O tempo passa... escoa em nossas mãos. E novamente chegou o Natal! Chegamos à última edição da ANIMA de 2014 com saudades do ano velho e com muitas esperanças para o ano que vem.
Com grande satisfação a ANIMA traz em sua 28ª. edição os melhores trabalhados apresentados ao VI Seminário de Pesquisa da Estácio e II Jornada de Iniciação Científica da Universidade Estácio de SÁ, evento que tem como objetivo promover a visibilidade e a interdisciplinaridade do conhecimento científico.
Foram selecionados os melhores resumos para publicação em formato - Artigo Completo. A escolha dos trabalhos se deu mediante processo avaliativo apoiado por docentes das diversas áreas de conhecimento na Estácio.
Nesta edição publicamos 15 (quinze) estudos desenvolvidos na área ambiental, gestão, jurídica, saúde e tecnologia.
Assim, na área ambiental são apresentados três estudos, quais sejam: Acúmulo de resíduos sólidos nas margens do Rio Cotia (SP), Descarte adequado de medicamentos: alternativa possível e aplicação de informações, Sensoriamento remoto aplicado na conservação do solo.
Na área Jurídica são apresentados os estudos: Aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão preventiva nos crimes de tráfico de drogas, A constituição do campo assistencial no Brasil, Direito fundamental à saúde x direito econômico das empresas de saúde suplementar, Legitimidade e parâmetros para efetivação de políticas afirmativas de promoção da igualdade étnico-racial no Brasil, O poder moderador e sua repercussão sobre o poder executivo, O processo administrativo disciplinar nas entidades paraestatais, Representações sobre formação de mediadores judiciais em Niterói.
Da área da Saúde são três estudos: Avaliação do índice de
resto-ingesta em uma unidade de alimentação e nutrição (UAN) localizada na cidade de Antônio Carlos/SC, Células tronco e terapias regenerativas e, por último, o artigo Enfermagem na ATI UNESA Petrópolis).
As áreas de Tecnologia e Gestão contribuem com o conhecimento apresentado nos estudos: Caracterização mecânica de blocos cerâmicos utilizados em alvenaria na região norte do estado do Rio de Janeiro e A influência do “esquematismo” da indústria cultural na internet.
Desejamos a todos boas festas e uma leitura
muito proveitosa.
11 ACÚMULO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NAS MARGENS DO RIO COTIA (SP) - SILVA, Geni Ferreira; TIZZATTO, Elisangela G.; FERREIRA, Marcos Roberto; SANTOS, Michael Jackson Alves; MAJER, Alessandra Pereira.
17 DESCARTE ADEQUADO DE MEDICAMENTOS: ALTERNATIVA POSSÍVEL E APLICAÇÃO DE INFORMAÇÕES – SANTOS, Amanda Pereira; SOUZA, Dorenilde Santos; SOUZA, Eliene Rodrigues; BROUWER, Mônica da Silva Fernandes; MAJER Alessandra Pereira.
23 SENSORIAMENTO REMOTO APLICADO NA CONSERVAÇÃO DO SOLO – MIRANDA, Ciomara de Sousa; NADAI, Karla Bethânia L.; PARANHOS FILHO, Antônio Conceição.
29 CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA DE BLOCOS CERÂMICOS UTILIZADOS EM ALVENARIA NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - ALMEIDA, B. G. B; AZEVEDO, T. M; SÁ, T. V; SANTOS, A. L. H. A;
ALMEIDA, L.L.P.
35 A APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO PREVENTIVA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS – VARGAS, Róbson.
43 A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO ASSISTENCIAL NO BRASIL – BRAGA, Virna Ligia Fernandes.
49 DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE X DIREITO ECONÔMICA DAS EMPRESAS DE SAÚDE SUPLEMENTAR – ALVES, Osair; MARTINS, Marianne Rios de Souza.
55 LEGITIMIDADE E PARÂMETROS PARA A EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS AFIRMATIVAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL NO BRASIL: AS CONTRIBUIÇÕES DO DIÁLOGO ENTRE CONSTITUIÇÃO E DIREITO INTERNACIONAL – CAMPINHO, Bernardo Brasil.
63 O PODER MODERADOR E SUA REPERCUSSÃO SOBRE O PODER EXECUTIVO – OLIMPIO, Telmo; MARQUES, Allan; BOLONHA, Carlos.
69 O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NAS ENTIDADES PARAESTATAIS – OLIVEIRA, Jahson Costa; MARTINS, Marianne Rios.
75 REPRESENTAÇÕES SOBRE FORMAÇÃO DE MEDIADORES JUDICIAIS EM NITERÓI – ALMEIDA, G. G. S. L. de.
81 RESTO-INGESTA EM UMA UNIDADE DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO (UAN) LOCALIZADA NA CIDADE DE ANTÔNIO CARLOS/SC – AQUINO, Gabriela Rodrigues Varela; ZIMMERMANN, R. S.; CLEMENTE, Isaura Hammerschmitt; ACIOLY, P. L.
87 CÉLULAS TRONCO E TERAPIAS REGENERATIVAS – CARVALHO, Husten da Silva; SOUZA, Luciana Borges Oliveira; LUZ, Flávia Cristina Oliveira; XAVIER, Eveliney Vicente de Alencar; SANTOS, João Paulo Bello; MAXIMIANO, Elizabeth; MATTOS, Adriana.
99 ENFERMAGEM NA UTI UNESA PETRÓPOLIS – MOTA, Gisele Luzia M. G.; DÁVILA, Érica V. W.; LARA, Christianne Reis de Souza; MONTEIRO, Ana Cláudia M.
105 A INFLUÊNCIA DO ESQUEMATISMO DA INDÚSTRIA CULTURAL NA INTERNET – FLORES, Bárbara de Almeida; TÁVORA, Getúlio.
Sumário
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 11
ACÚMULO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NAS MARGENS DO RIO COTIA (SP)
ACCUMULATION OF SOLID WASTE IN THE BANKS OF COTIA RIVER
Geni Ferreira da Silva, Elisangela G. Tizzatto, Marcos Roberto Ferreira, Michael Jackson Alves dos Santos, Alessandra, P. Majer
RESUMO As matas ciliares são ambientes de grande importância ecológica, contribuindo com a manutenção da qualidade da água e dificultando o despejo de lixo em seu curso. Por este motivo é observado um acúmulo de resíduos nestas áreas, problema que vem se agravando na extensão do Rio Cotia. Neste contexto, este estudo visou avaliar, qualificar e quantificar os resíduos observados às margens do rio Cotia, identificando sua provável fonte de origem e testando o efeito das características da comunidade vizinha neste acúmulo. Para tanto, três áreas da margem com diferentes perfis de ocupação (próximo à área de conservação X área doméstica X área doméstica/industrial) foram avaliadas. Foram encontrados 1.562 itens, com massa de 246,801 kg, destes, a maior parte dos resíduos (64,14%) correspondeu a itens associados à construção civil, sendo seguida por plástico (29,38%) e papel (3,32%). Na comparação entre os pontos somente foi observada uma distinção na abundância, com a área residencial apresentando um maior número total de resíduos (p=0,012). A avaliação da fonte mais provável destes resíduos indica tanto um efeito associado aos moradores locais como o descarte ilegal por parte de caçambeiros associados à construção civil em áreas mais nobres.
ABSTRACT Riparian forests are ecologically important environments, contributing to the maintenance of water quality and hampering the garbage dump in their course. For this reason it is observed an accumulation of waste in these areas, a serious problem in Rio Cotia. This study aimed to evaluate, qualify and quantify residues observed on the banks of river Cotia, identifying its probable source of origin and testing the effect of the surrounding community. To this end, three areas with different margin occupation profiles were evaluated. 1,562 items were found, with 246,801 kg of mass, of whom the majority of the residues (64.14%) corresponded to items associated with construction, followed by plastics (29.38%) and paper (3.32%). Comparing the points, only a distinction in abundance was observed, with the residential area presenting a greater total number of residues. The assessment of the most likely source of these residues indicates both an effect associated with local residents as the illegal disposal associated with construction in richer areas.
Palavras-Chave: Resíduos Sólidos, Degradação ambiental, impacto ambiental, prevenção e controle, sensibilização pública. Keywords: Solid Waste, Environmental degradation, environmental impact, prevention and control, public awareness.
___________________________________________________________________________________1. Faculdade Estácio Europanamericana de Humanidades e Tecnologias, 2. Faculdade Estácio Cotia, 3. Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo - Autor para correspondência – lhemajer@gmail.com
A mata existente à beira dos cursos fluviais e das
nascentes de água é denominada mata ciliar e,
corresponde a um ambiente de grande importância
como habitat e fonte de alimentos para a fauna
aquática e terrestre, sendo fundamental para a
conservação da biodiversidade (LEITE &
PEREIRA, 1996). Sua preservação é também de
suma importância por proporcionar a diminuição
dos processos de erosão e assoreamento no leito e
margem dos rios, o aumento da infiltração das
águas provenientes das chuvas para o
abastecimento dos lençóis freáticos e a
regularização da vazão das águas superficiais pela
redução da sua velocidade de escoamento. Além
disso, a presença dos componentes deste tipo de
Geni Silva, Elisangela Tizzatto, Marcos Ferreira, Michael Santos, Alessandra Majer
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 12
formação resulta num efeito filtro, inclusive no que
diz respeito ao acúmulo de resíduos sólidos,
dificultando o despejo de lixo e esgoto nos cursos
de água e também retendo e removendo parte dos
resíduos carregados por estes (KOBIYAMA et al.,
1998).
O acúmulo de resíduos sólidos representa um
problema sério em ambientes aquáticos, o que
inclui suas margens, já que podem resultar em
alterações físicas do ambiente, efeitos diretos e
indiretos sobre a fauna e flora, além de impactos
estéticos acentuados (e.g. MASCARENHAS et al.,
2004; MANZANO, 2009; COLABUONO et al.,
2010). Este tipo de lixo é definido como qualquer
resíduo nesta categoria (e.g. plástico, vidro,
borracha, metal, tecido, isopor, matéria orgânica e
madeira antropogênica) descartado, depositado ou
abandonado nos ambientes aquáticos, por qualquer
fonte (COE & ROGERS, 2000). Dentre esta
variedade de matérias-primas, os itens de plástico,
isopor e nylon geralmente constituem a maior
fração destes resíduos (ARAÚJO & COSTA,
2006), o que em muito se deve às suas
características intrínsecas, como baixa densidade
(que facilita sua flutuação, e consequente
dispersão), acumulação lenta, persistência, aporte
crescente com o tempo, e ampla disseminação do
uso (GREGORY, 1999).
Em ambientes naturais distintos, assim como as
margens de rios, dados relacionados ao grau de
divergência entre o estado atual do ambiente e o
seu ideal, são capazes de expressar sua saúde
ecossistêmica (ARAÚJO & COSTA, 2008) sendo
aplicáveis como importantes ferramentas de
gerenciamento, inclusive em situações de
disposição inadequada de resíduos sólidos. Neste
contexto o presente trabalho visou: (1) avaliar os
resíduos sólidos encontrados nas margens do rio
Cotia no que diz respeito à matéria-prima principal
e a provável fonte de origem; (2) quantificar, de
acordo com a matéria-prima principal a abundância
e massa destes resíduos; e (3) testar se as
características da comunidade vizinha influenciam
no tipo e quantidade de resíduo acumulado.
Três áreas da margem do Rio Cotia (SP) foram
consideradas como pontos de amostragem. A
primeira logo abaixo da represa do Morro Grande
(área com menor impacto), a segunda no bairro
Jardim Sandra (ocupação residencial), e a terceira
próxima ao km 27 da Rodovia Raposo Tavares
(marginada por casas e empresas). Em cada uma
destas, em uma área relativamente homogênea de
24 metros, foram dispostos 12 transectos
perpendiculares à linha d’água com largura de 2
metros e extensão de 5 metros. Cinco destes
transectos foram aleatoriamente selecionados para
a amostragem, nos quais todos os itens maiores
que 2,5 cm foram catalogados e pesados. Somente
no terceiro ponto foram amostrados somente
quatro transectos, em função da menor área
disponível.
Para fins de catalogação, os itens amostrados
foram divididos em nove tipos de resíduos sólidos
(plástico, tecido, vidro & cerâmica, metal, papel &
papelão, borracha, madeira, outros e resíduos de
composição mista) e também classificados quando
Geni Silva, Elisangela Tizzatto, Marcos Ferreira, Michael Santos, Alessandra Majer
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ao seu uso. A comparação relativa à quantidade de
resíduo acumulado foi realizada por meio de uma
ANOVA multifatorial, seguida por um teste a
posteriori HSD de Tukey.
Considerando o estado inicial da área de estudo,
foram encontrados 1.562 itens, com massa de
246,8 kg. Destes, a maior parte dos resíduos, 64%,
correspondeu a itens associados à construção civil
(n = 1.002, 229 kg). A segunda categoria mais
abundante foi o plástico (29%, n = 459, 9.761 kg),
com a terceira e quarta destas categorias sendo
papel (3%, n = 52, 2,6210kg) e metal (1%, n =18,
0,934 kg), respectivamente.
Considerando a comparação entre os pontos de
amostragem, foi observado que a menor
quantidade de resíduos se deu no primeiro ponto,
próximo à reserva do Morro Grande. Neste ponto o
resíduo mais observado foi o plástico, com itens
como garrafas do tipo pet, saco de lixo, sacolas de
supermercado e fragmentos plásticos diversos.
Neste caso, a fonte principal de resíduos parece
associada às oferendas religiosas disposta nas
margens desse ponto. Já a maior quantidade de
resíduos foi encontrada no Jardim Sandra, onde os
itens mais frequentes no primeiro ponto também
foram comumente identificados, porém também
sendo observados sacos de areia e pedra, além de
outros itens associados à construção civil. Neste
caso, a primeira parte dos resíduos pode ser
parcialmente associada à ocupação doméstica do
entorno, com observações de queima de objetos
como moveis velhos e lixo em geral. Porém, outra
fonte de contribuição importante foi a utilização da
área para o descarte ilegal de entulho por parte dos
caçambeiros. Já no ponto próximo a Raposo
Tavares o resíduo mais observado foi o plástico,
com itens como garrafa pet, saco de lixo e
fragmento plástico também sendo os mais
frequentes. Resíduos associados à construção civil
também foram observados, porém, neste caso, a
fonte destes parece associada a obras realizada na
ponte que sustenta a rodovia e que se localiza na
lateral da área de amostragem.
Em termos de massa total, não foi observada uma
diferença no acúmulo observado entre os três
pontos de amostragem (GL = 2, F = 1,41 e p =
0,29; Fig. 1A). Porém, considerando a abundância
de resíduos esta diferença foi evidenciada com
maior número de itens no Jardim Sandra, bairro de
ocupação principalmente residencial (GL = 2, F =
6,4 e p = 0,012; Fig. 1B). Os demais pontos não
diferiram quanto à abundância.
Os resultados apresentados neste trabalho
correspondem a um diagnóstico inicial a respeito
dos resíduos acumulados às margens do Rio Cotia,
visando um futuro monitoramento e contínua
avaliação. Entretanto, apesar de iniciais, os dados
coletados até o momento permitem identificar dois
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principais tipos de resíduos sólidos como mais
relevantes, que por sua vez identificam diferentes
fontes. No caso dos resíduos associados à
construção civil suas características indicam uma
fonte externa ao ponto de amostragem, que
aparentemente recebe os itens gerados em bairros
mais nobres da região. Desta maneira, os impactos
associados a este descarte, são sentidos pela
população local do Jardim Sandra, cuja paisagem,
o tráfego de pedestres/veículos e drenagem urbana
são comprometidas, além de ocorrer a atração de
resíduos não inertes e vetores de doenças
(MORAIS, 2006).
Figura 1 – Comparação entre valores médios de (A) massa total de resíduos e (B) número total de resíduos entre os
pontos de amostragem. Ponto 1 - próximo à reserva do Morro Grande, Ponto 2 – Jardim Sandra, Ponto 3 - próximo à
rodovia Raposo Tavares.
Ao mesmo tempo, a perda da qualidade ambiental
destas áreas, resulta gradualmente em seu
abandono por parte da maioria dos moradores, uma
relação de aversão frente ao recurso natural
vizinho. Esta por sua vez, tem uma consequência
clara que é a acentuação da degradação ambiental,
já que a própria população acaba contribuindo com
o descarte inadequado naqueles pontos que ela já
considerada como perdidos. Este cenário não é raro
atualmente e os resultados mostram que já está
ocorrendo no Rio Cotia.
Para a recuperação da qualidade do rio e de suas
margens é essencial o restabelecimento do elo
afetivo entre este e a população local, visando que
estes indivíduos contribuam não só para a melhoria
das condições na área, mas também para sua
manutenção. Uma das ferramentas utilizadas para
alterar este panorama é a comunicação ambiental,
onde a partir do mapeamento das fontes e
influências associadas a um problema ambiental
específico, as informações sobre aquele assunto
conscientizam este publico e assim, contribuem
com a formação de cidadãos ambientalmente
educados (JOHN, 2000). Nessa perspectiva pode-
se dizer que o domínio da informação está
diretamente ligado ao poder de interferir e
reorientar as relações humanas e da sociedade com
a natureza (RAMOS, 1995).
O presente projeto visa justamente isso. O
diagnóstico aqui apresentado é somente a primeira
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etapa deste trabalho, que já inclui o monitoramento
sazonal do acúmulo de resíduos, e será expandido
para avaliar também a qualidade da água e
biodiversidade, visando gerar informações que
possam alimentar uma campanha de comunicação
ambiental específica para o rio Cotia e recuperar a
relação afetiva entre este e a população local.
ARAÚJO, M. C. B., COSTA, M., The significance
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beach. Pan American Journal of Aquatic
Sciences, 1, 28–34. 2006.
ARAÚJO, M. C. B.; COSTA, M. Environmental
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COE, J.M.; ROGERS, D.B. Marine Debris:
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LEITE, H. G. & PEREIRA, R. Considerações
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MANZANO, A. B. Distribuição, taxa de
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MASCARENHAS, R., SANTOS, R.; ZEPPELINI,
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MORAIS, G. M. D. Diagnóstico da Deposição
Clandestina de Resíduos de Construção e
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(Mestrado em Engenharia Civil) – Escola de
Engenharia, Universidade Federal de Uberlândia,
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RAMOS, L. F. A. Meio Ambiente e Meios de
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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 16
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 17
DESCARTE ADEQUADO DE MEDICAMENTOS: ALTERNATIVA POSSÍVEL E APLICAÇÃO DE INFORMAÇÕES
PROPER DISPOSAL OF DRUG RESIDUES
Amanda Pereira Santos1, Dorenilde Santos de Souza1, Eliene Rodrigues de Souza1, Mônica da Silva Fernandes Brouwer1, Alessandra Pereira Majer1, 2, 3*
RESUMO Grande parte da população brasileira possui medicamentos em sua residência, porém estes não são geralmente descartados adequadamente nos casos de sobra ou vencimento, resultando em impactos ambientais negativos. Visando minimizar esta questão, este trabalho visou revitalizar o Ecoponto da Faculdade Estácio Cotia, realizando também uma avaliação quali-quantitativa destes resíduos. Desta maneira, a estrutura recebeu uma nova pintura, capa para as lixeiras e sinalização, incluindo além da coleta de comprimidos, líquidos e medicamentos pastosos/pó, também caixa para perfuro-cortantes. Quanto a avaliação dos itens descartados, foram descartados mais de 769 resíduos, sendo mais frequentes os comprimidos. A maior parte destes resíduos foi descartada de forma avulsa, sem rótulo ou com o rótulo danificado, porém nos demais foi possível determinar que 100% e 74% dos comprimidos e líquidos, respectivamente, se encontravam vencidos. Já considerando a classe terapêutica principal, foram observados tipos diversificados, sendo mais frequentes anti-hipertensivos, anticoncepcionais, anti-inflamatórios e antibióticos. Apesar da inexistência de informações sobre os possíveis impactos negativos associados a algumas destas substâncias, de modo geral são associados ao descarte inadequado de anticoncepcionais disfunções endócrinas em animais aquáticos e seres humanos, enquanto que para antibióticos a resistência microbiana é fato registrado, o que demonstra a importância deste tipo de iniciativa.
ABSTRACT Most people have drugs at their homes, but do not properly discard them in the case of leftovers or expiration date overdue. In order to minimize this problem, this study aimed to revitalize the residue disposal point at Faculdade Estácio Cotia also conducting a qualitative/quantitative assessment of these wastes. Thus, the structure received a new paint, cover for bins and signage. More than 769 residues were discarded so far, mainly pills. Most of this waste was disposed unlabeled, for the rest were determined that 100% and 74% of the tablets and liquid, respectively, were expired. When considering the main therapeutic class the more frequent were anti-hypertensives, contraceptives, anti-inflammatories and antibiotics. Despite the lack of information about the possible negative impacts of these substances, the improper disposal of contraceptives is associated to endocrine dysfunctions in humans and aquatic animals, whereas microbial resistance to antibiotics is registered, which demonstrates the importance of this type of initiative.
Palavras-Chave: Contaminação ambiental: prevenção e controle, sensibilização pública e educação ambiental. Keywords: Environmental contamination: prevention and control, public awareness and environmental education.
_______________________________________________________________ 1. Faculdade Estácio Cotia 2. Faculdade Estácio Europanamericana de Humanidades e Tecnologias 3. Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo –Autor para correspondência –
lhemajer@gmail.com
Amanda Santos, Dorenilde Souza, Eliene Souza, Mônica Brouwer, Alessandra Majer
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 18
A organização mundial da saúde (OMS) define
medicamento como “qualquer substância química
num produto farmacêutico usada para modificar ou
explorar sistemas fisiológicos ou estados
patológicos em benefício do recebedor”.
Entretanto, no mundo todo se tem identificado a
presença de fármacos, tanto nas aguas como no
solo. Essa contaminação ambiental resulta do
descarte indevido e da excreção de metabólitos,
que por sua vez não são eliminados no processo de
tratamento de esgotos (BARCELOS et al., 2011).
Estes, porém, apresentam efeitos negativos claros
em diversas espécies. Os estrógenos sintéticos, por
exemplo, se constituem classe de fármacos
intensamente discutida considerando os possíveis
efeitos adversos, por interferirem no
desenvolvimento e reprodução de organismos
aquáticos, além de estarem relacionados ao
desenvolvimento de vários tipos de cânceres em
humanos. Estudo envolvendo peixes jovens da
espécie Rutilus rutilus, que foram expostos a
estrogênios sintéticos além de outros perturbadores
endócrinos, evidenciou uma feminização dos
peixes machos (ALVARENGA & NICOLETTI
2010). Também, bactérias presentes em ambientes
contaminados por antibióticos podem adquirir
resistência a essas substancias, visto que tais
organismos têm material genético com alta
capacidade de mutação. Ainda a contaminação dos
animais e do homem, pelos resíduos, acontece por
via oral, respiratória e cutânea, lembrando também
que diversas das espécies afetadas são, por sua vez,
fonte de alimento (UEDA, 2009).
No Brasil, analises em amostras de efluentes de
rios do estado do Rio de Janeiro, detectaram 9 de
13 compostos farmacêuticos investigados, dentre
eles reguladores de peso, anti–inflamatórios,
analgésicos e outras drogas de uso humano e
veterinário. O monitoramento de fármacos
residuais no meio ambiente vem despertando
grande interesse no desenvolvimento de método de
remoção adequados, devido ao fato de muitas
dessas substâncias serem frequentemente
encontradas em águas naturais e interferirem
significativamente na fisiologia, no metabolismo e
no comportamento das espécies (BELISÁRIO et
al., 2009).
Um ponto importante de entrada destas substâncias
no ambiente são as sobras, que por sua vez
apresentam várias causas. Dentre elas estão a
dispensação de medicamento em quantidade além
da necessária para o tratamento, as amostras-grátis
distribuídas pelos laboratórios farmacêuticos como
forma de propaganda, compra desnecessária de
medicamentos pela população e o gerenciamento
inadequado de medicamentos por parte de
farmácias e demais estabelecimentos de saúde
(EICKHOFF et al., 2009). Mas a destinação final
dos resíduos de origem farmacêutica pelo
consumidor final é a que apresenta maior lacuna na
legislação. Desta forma é um tema relevante para a
saúde pública, em virtude das diferentes
propriedades farmacológicas dos medicamentos
que, inevitavelmente, se tornarão resíduos
(BARCELOS et al., 2011). Considerando este
cenário, o presente trabalho teve como objetivos:
(1) a revitalização do ecoponto previamente
implantado na Faculdade Estácio Cotia, adequando
Amanda Santos, Dorenilde Souza, Eliene Souza, Mônica Brouwer, Alessandra Majer
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 19
a estrutura para o descarte de medicamentos na
instituição e permitindo assim a destinação final
correta destes resíduos por alunos e funcionários e
(2) a quantificação dos medicamentos descartados
e identificação de suas substâncias com ação
biológica.
A revitalização da área correspondente ao
ecoponto existente na instituição consistiu na
avaliação da estrutura para disposição de resíduos,
idealizando um melhor cumprimento de sua função
frente aos itens a serem coletados. O mesmo se deu
considerando sua localização dentro da instituição,
visando uma maior visibilidade e facilidade de
acesso.
Os resíduos descartados foram quantificados e
classificados quanto à validade e ação
biológica/terapêutica, sendo estas relacionadas
com os impactos ambientais descritos na literatura.
A revitalização do Ecoponto incluiu a reforma da
estrutura metálica que suporta as lixeiras
destinadas ao recebimento dos resíduos,
envolvendo esta a pintura e adição de porção
específica para disposição de caixa de papelão
voltada ao descarte de perfuro cortantes, que no
primeiro ano do Ecoponto foram descartados em
conjunto com diferentes medicamentos. A
estrutura agora conta com uma metragem de
92,3cm de altura, 1,55m de comprimento e 38,7cm
de profundidade, e se divide em lixeiras destinadas
ao recolhimento específico de: medicamentos
líquidos, sólidos, pomadas e a caixa para perfuro
cortantes.
A localização do Ecoponto também foi
considerada, sendo, entretanto, determinada que a
posição original era a mais adequada. Esta se
localiza em frente à entrada principal do prédio,
apresentando, portanto, excelente acesso e
visibilidade ao público da instituição. Para a
adequada identificação da estrutura foi adicionado
um cartaz informativo.
Dos medicamentos recebidos pelo Ecoponto a
maior parte correspondeu a itens de administração
oral (comprimidos ou líquidos), o que concorda
com a observação relatada por uma Instituição de
ensino com programa semelhante. Este programa
desenvolvido pela Faculdade de Farmácia da
UFRGS realiza campanha de descarte de
medicamentos vencidos (ROCHA et al., 2009) e
neste caso mais de 70% dos resíduos entram nesta
categoria. Este fato é atribuído a facilidade de
acesso e praticidade em termos de consumo
associada a este tipo de medicamento.
Considerando os comprimidos, que foram os
resíduos mais frequentes, até o momento foram
contabilizados 723 comprimidos, sendo 547 destes
descartados de modo avulso (fora da embalagem e
da cartela) o que impossibilitou sua identificação
Amanda Santos, Dorenilde Souza, Eliene Souza, Mônica Brouwer, Alessandra Majer
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 20
quanto aos demais parâmetros avaliados. Do total
que pode ser contabilizado, 100% dos
comprimidos se apresentaram fora do período de
validade. Já para líquidos, foram descartadas 39
itens, com 74,4% estando vencidas e 7,7% destas
sem rótulo ou com rótulo ilegível, o que
impossibilitou a determinação deste parâmetro.
Já considerando a classe terapêutica principal, para
comprimidos foram observadas substâncias com
dez tipos de ações distintos, sendo mais frequentes
anti-hipertensivos (28,9%), anticoncepcionais
(11,9%), anti-inflamatórios (11,3%) e antibióticos
(10,7%). Para os medicamentos líquidos, a
quantificação do volume foi dificultada em função
das diferenças em termos de tamanho e formato de
embalagens, porém foram mais frequentes
compostos antialérgicos, analgésicos,
antiasmáticos, antitussígenos e descongestionantes
nasais.
Apesar da inexistência de informações sobre os
possíveis impactos negativos associados a algumas
destas substâncias, de modo geral são associados
ao descarte inadequado de anticoncepcionais
disfunções endócrinas em animais aquáticos e
seres humanos (BELISÁRIO, 2009), enquanto que
para anti-inflamatórios e antibióticos a resistência
microbiana é fato registrado (BILA & DEZOTTI,
2003).
A simples instalação e revitalização do ecoponto
na instituição já permitiu observar a adesão de
vários alunos e funcionários da faculdade quanto á
destinação adequada de seus medicamentos em
desuso, demonstrando a importância da
disponibilização de uma estrutura para descarte
como o ecoponto. Apesar disso, são ainda raros
projetos similares, especialmente aqueles
desenvolvidos dentro de instituições de ensino
superior. Porém, projetos com objetivos similares
são desenvolvidos por algumas prefeituras
brasileiras ou mesmo outros países. Em Curitiba,
por exemplo, postos de recolhimento de
medicamentos estão presentes em pontos de
ônibus. Já em Portugal, assim como em outros
países desenvolvidos, existe um sistema integrado
de gestão de resíduos de embalagem e de
medicamentos instalados em drogarias e pontos de
fácil acesso para os consumidores (ALVARENGA
& NICOLETTI, 2010).
A importância deste tipo de iniciativa fica clara
quando se analisa os compostos presentes nestes
itens, assim como seus impactos conhecidos. Por
outro lado, a falta de informação sobre os possíveis
efeitos de inúmeras substâncias, tanto sobre a
espécie humana como sobre outras existentes no
ambiente, mostra o quão pouco se sabe sobre o
assunto atualmente, e quão importante é a
destinação correta destes resíduos. Por outro lado,
a falta de campanhas que visem a educação da
população em relação a este tema resulta na
continuidade do descarte inadequado, fato cujos
impactos negativos somente se acentuarão com o
crescimento populacional humano.
Considerando este fato, a próxima etapa do
presente projeto incluirá a elaboração e aplicação
da campanha de comunicação ambiental, por meio
da qual serão disponibilizados exemplos destes
fatos para a população da instituição. Com isso, se
espera uma potencialização do descarte observado
Amanda Santos, Dorenilde Souza, Eliene Souza, Mônica Brouwer, Alessandra Majer
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 21
até o momento no Ecoponto, estimulando também
um maior cuidado com as farmácias caseiras por
parte dos alunos e funcionários. Fazendo isso, a
instituição de ensino está cumprindo seu papel
estipulado nas políticas públicas e contribuindo
com a conscientização não só do seu público
interno, mas também com a disseminação deste
conhecimento a partir destes indivíduos.
ALVARENGA, L. S. V.; NICOLETTI, A. M.
Descarte doméstico de medicamentos e algumas
considerações sobre o impacto ambiental
decorrente. Guarulhos, Revista Saúde, 4 (3):34-
39. 2010.
BARCELOS, M. N.; PERES, A. P.; PEREIRA, I.
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Aplicação do método FMEA na identificação de
impactos ambientais causados pelo descarte
doméstico de medicamentos. Revista Engenharia
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2011.
BELISÁRIO, M.; BORGES, S. P.; GALAZZI, M.
R.; PIERO, D. B. P.; ZORZAL, B. P.; RIBEIRO,
N. J. O emprego de resíduos naturais no tratamento
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poluentes. Revista Cientifica Internacional, Ano
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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 22
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 23
SENSORIAMENTO REMOTO APLICADO NA CONSERVAÇÃO DO SOLO
REMOTE SENSING IN APPLIED SOIL CONSERVATION
Ciomara de Sousa Miranda, Karla Bethânia Ledesma de Nadai, Antonio Conceição Paranhos Filho
RESUMO A erosão é um processo pelo qual há remoção de uma massa de solo de um local e sua deposição em outros locais, como resultado da ação de forças exógenas. Objetivou-se neste estudo mapear as erosões, utilizando-se de geotecnologias, e trazer propostas de medidas de controle da degradação do solo e da água. Utilizando-se de imagens de satélite georreferenciadas, com operações de fusão, buffering e trabalhos de campo foi possível determinar, através da fotointerpretação, as áreas erodidas e também as áreas de APP. Gerou-se também, através de um modelo de elevação, o mapa de declividade do local. Através dos resultados das imagens, com a localização das erosões, propôs-se o método de estruturas construídas de paliçadas de bambu, essencial para o sucesso no controle da voçoroca. Com o uso das geotecnologias foi possível localizar e avaliar a situação da degradação do solo, podendo-se visualizar as áreas de erosão e em seguida propor uma medida intervenção eficaz e de baixo custo para o controle dos processos erosivos encontrados na propriedade rural.
ABSTRACT Erosion is a process whereby there is a mass removal of soil from a site and its deposition elsewhere, as a result of the action of exogenous forces. The objective of this study to map the erosion, using the geo, and bring proposals for measures to control soil degradation and water. Using satellite images georeferenced with a merger, buffering and fieldwork was determined by remote sensing, the eroded areas and also areas of APP. It also generated through an elevation model, the slope of the site map. Through the results of the images, with the location of erosions, it was proposed the method of structures built of bamboo fences, which is essential for success in controlling gully. With the use of geo-technology were able to locate and assess the situation of soil degradation, and we could visualize the areas of erosion and then propose an effective intervention measures and cost-effective for the control of erosion found on the farm.
Palavras-chave Erosão, proposta de intervenção, geoprocessamento, conservação solo, Sensoriamento Remoto. Key-words Erosion proposed intervention, geoprocessing, soil conservation, Remote Sensing
___________________________________________________________________________________________1. FESCG – Mato Grosso do Sul – ciomara.miranda@gmail.com
É imprescindível que nos ambientes rurais sejam
adotadas ações prioritárias em relação às
atividades de conservação de solo e de água, pois
são estes os principais recursos naturais que
mantém a atividade agropecuária. Diante da
realidade da gestão agropecuária, o produtor
necessita de ações estratégicas para desenvolver o
manejo sustentável dos recursos naturais.
Tal manejo passa pelo planejamento de uso dos
mesmos, com aplicação de conceitos introduzidos
para a abordagem da complexidade ambiental e
com avaliação dos problemas levando em conta
seus vários aspectos interdependentes: geologia,
solos, vegetação, clima, uso atual, hidrologia e
aspectos antrópicos (SANTOS 1996).
As propriedades rurais são constituídas pelas áreas
de vegetações nativas, reservas legais e áreas de
proteção permanente, incluindo nascentes, lagoas
Ciomara Miranda, Karla Nadai, Antonio Filho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 24
e cursos de água. A presença dessas estruturas
naturais realiza importantes serviços ambientais
em benefício dos produtores rurais por serem
responsáveis pela manutenção da qualidade da
água e da conservação do solo, sendo assim
essenciais para o sucesso socioeconômico das
propriedades rurais, estando, também, prevista na
legislação.
Aliada à queda da produtividade vegetal nas áreas
de drenagem, a erosão hídrica provoca efeitos
negativos nos recursos hídricos adjacentes devido
ao aumento da produção de sedimentos e,
consequentemente, dos riscos de assoreamento e
de alteração da qualidade da água, tornando-a
imprópria para a dessedentação animal. O
escoamento superficial propicia o carreamento de
sedimentos aderidos à matéria orgânica, nutrientes
e agroquímicos, capazes de causar contaminação e
redução da disponibilidade hídrica.
A degradação da pastagem é um grave problema
no ciclo produtivo na pecuária e, de acordo com
Macedo (1993), é um processo evolutivo de perda
de vigor e produtividade de forrageiras sem a
possibilidade de recuperação, fato que afeta a
produção e o desempenho animal, culminando na
degradação do solo e dos recursos naturais.
O uso das geotecnologias permite avaliar os
recursos e visualizar a situação da área de estudo,
além de anexá-los a bancos de dados
georreferenciados, obtendo-se assim uma
ferramenta para tomadas de decisões. As
vantagens do uso de imagens de satélite são
inúmeras, como a relação custo-benefício,
disponibilidade e aplicabilidade (PARANHOS
FILHO et al., 2008).
O planejamento ambiental visa adotar práticas que
buscam a sustentabilidade da atividade
agropecuária, visando à manutenção do
ecossistema, da produtividade vegetal e animal,
maximizar a rentabilidade e gerar um benefício da
ordem estratégica para a empresa rural.
O presente trabalho visa apontar diretrizes para o
planejamento ambiental da propriedade rural da
Fazenda Rio Grande, utilizando-se para isso as
geotecnologias. Através do levantamento do
estado ambiental é proposta ações de preservação,
recuperação, prevenção de danos ambientais e
otimização do uso dos recursos naturais.
A área de estudo é a propriedade rural Fazenda
Rio Grande, a qual está inserida na Bacia
Hidrográfica do Rio Paraná e na Sub-Bacia
Hidrográfica do Rio Pardo, no Município de
Jaraguari – MS, distante cerca de 40 km de
Campo Grande – MS.
Todo o processamento e extração de informações
das imagens foram realizados no software
Geomática Focus (PCI, 2009). O primeiro
procedimento a ser realizado foi a correção
geométrica da carta topográfica Jaraguari, e da
imagem do satélite LANDSAT 5, sensor TM,
datada de 08/08/2009 (INPE, 2009). Para tanto,
foram utilizados pontos de controles do terreno
(GCP) com coordenadas reais conhecidas obtidos
a partir da imagem ortorretificada do projeto
GLCF (Global Land Cover Facility).
Ciomara Miranda, Karla Nadai, Antonio Filho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 25
Em seguida realizou-se a classificação automática
supervisionada da cena LANDSAT 5/TM, sendo
as áreas de treinamento foram obtidas por meio de
visitas in locu observando a cobertura vegetal e
baseando-se nas classes propostas por Paranhos
Filho (2000).
Para se obter uma melhor resolução espacial da
imagem multiespectral utilizada, realizou-se a
fusão da banda pancromática do satélite CBERS-
2B, sensor HRC (INPE, 2009) com a imagem
multiespectral LANDSAT 5/TM (INPE, 2009)
utilizando-se o algoritmo Pansharp. Tal algoritmo
se baseia em preservar as características
espectrais, obtendo-se dessa maneira uma imagem
colorida, com melhor resolução espacial (no caso,
2,5m). Os arquivos de saída são interpolados
utilizando o método de convolução cúbica.
A partir das informações vetoriais dos cursos
d’água, retiradas pela fotointerpretação da
imagem fusionada, foram gerados mapas de
distância para a delimitação das Áreas de
Preservação Permanente (APP) em consonância
com o exigido pela Lei Federal 4771/1965
(BRASIL, 1965) e pela Resolução do Conselho
Nacional do Meio Ambiente, CONAMA, n.º
302/2002 (CONAMA, 20002). Para isso utilizou-
se a ferramenta Buffer. No caso da Fazenda Rio
Grande, os buffers gerados foram de 30 e 50
metros para respectivas larguras dos cursos
d’água, áreas úmidas e nascentes.
Para o reconhecimento do terreno utilizou-se o
Modelo Digital de Elevação (MDE) da Shuttle
Radar Topographic Mission (SRTM),
reamostrado pelo Projeto TOPODATA
(VALERIANO, 2008). Sendo assim, pode-se
obter os valores de declividade aplicando o
algoritmo SLP – Slope of Elevation.
Com os dados de campo e o do GPS (Sistema de
Posicionamento Global), foi possível fazer o
levantamento das erosões presentes na
propriedade. Estas verificações são
imprescindíveis para escolha do melhor método
de recuperação da área.
A Figura 1 mostra o mapeamento das áreas de
erosão e as Áreas de Preservação Permanente
(APP), é importante considerar que os processos
erosivos encontrados em áreas próximas às APP’s
causam problemas de assoreamento dos cursos
d’água.
A localização espacial destas feições erosivas é de
grande importância na determinação de sua
extensão e abrangência, como por exemplo, qual
corpo d’água será afetado pelo material carreado.
Facilita também no seu monitoramento,
determinação de medidas mitigadoras,
acompanhamento de recuperação de áreas,
análises temporais e geração de mapas
secundários, como o de vulnerabilidade
ambiental.
O permanente monitoramento das estruturas
construídas (paliçadas, terraços, cordões
vegetados) é essencial para o sucesso no controle
da voçoroca, fazendo a manutenção sempre que
necessário. Após chuvas fortes, deve-se fazer a
inspeção para verificar possíveis danos e adotar
medidas de reparos para conservá-las. Essa prática
Ciomara Miranda, Karla Nadai, Antonio Filho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 26
é de especial importância na fase inicial dos
trabalhos de implantação dos suportes de
proteção, quando os materiais ainda não estão
completamente consolidados.
Figura 1: Mapeamento das erosões e da APP.
As erosões identificadas na Figura 1 podem ser
visualizadas a seguir nos registros fotográficos
feitos em campo, mostrados na Figura 2.
A proposta de intervenção baseia-se na aplicação
de estruturas construídas de paliçadas de bambu, é
essencial para o sucesso no controle da voçoroca,
fazendo a manutenção sempre que necessário.
Após chuvas fortes, deve-se fazer a inspeção para
verificar possíveis danos e adotar medidas de
reparos para conservá-las. Essa prática é de
especial importância na fase inicial dos trabalhos
de implantação dos suportes de proteção, quando
os materiais ainda não estão completamente
consolidados.
a) Ponto 1:
erosão próxima a
APP
b) Ponto 2: erosão
em forma de ravina c) Ponto 3:
erosão em forma
laminar
Figura 2: Erosões localizadas na área de estudo.
Esta estrutura pode ser usada tanto para a
contenção das paredes verticais da voçoroca como
para a redução da velocidade de escoamento
superficial da enxurrada, contribuindo para a
retenção dos sedimentos transportados (Figura 3).
Com o tempo, o acúmulo de sedimentos na base
frontal da paliçada possibilita o surgimento de
vegetação ou, então, o bambu poderá brotar,
funcionando como uma barreira natural.
Recomenda-se reforçar a segurança das paliçadas
com amarras de arames de aço, principalmente
quando exercem a função de proteger as paredes
verticais, sendo que uma das extremidades da
amarra é fixada na ponta da tora de eucalipto e a
outra, na ponta de uma estaca de eucalipto
enterrada acima da parede da voçoroca, em terra
Ciomara Miranda, Karla Nadai, Antonio Filho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 27
firme e a amarra de aço deverá ficar esticada
(BALIEIRO & TAVARES, 2008).
a. Paliçada de Bambu
b. Água retida na paliçada
Figura 3: Exemplo de uso da paliçada (BALIEIRO &
TAVARES, 2008).
O desenvolvimento sustentável é um desafio na
empresa rural. Assim, o presente trabalho
demonstrou o quanto é necessário a realização do
planejamento no uso dos recursos naturais que são
tão requisitados no processo produtivo da
atividade agropecuária, sendo que o uso das
geotecnologias como ferramenta auxiliar na
gestão ambiental tornou possível a identificação
dos problemas e a caracterização da área
pesquisada, possibilitando a formulação de
práticas que buscam a sustentabilidade. A
pesquisa atingiu as expectativas, pois foi possível
avançar no estudo ambiental que promove a
integridade ecológica, acarretando na proteção,
recuperação e prevenção dos danos ambientais das
empresas rurais, sendo também um aliado no
alcance da responsabilidade social por promover
condições de uma vida sustentável para os
trabalhadores rurais.
BALIEIRO, F. C.; TAVARES, S. R. L.
Recuperação de Áreas Degradadas: A visão da
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Ciomara Miranda, Karla Nadai, Antonio Filho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 28
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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 29
CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA DE BLOCOS CERÂMICOS UTILIZADOS EM ALVENARIA NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
MECHANICAL CHARACTERIZATION OF BLOCK CERAMIC USED IN MASONRY IN
THE NORTH REGION OF RIO DE JANEIRO STATE
1Almeida, B. G. B; 1Azevedo, T.M; 1SÁ, T. V; 1SANTOS, A. L. H. A; 1Almeida, L.L.P
RESUMO A Região Norte Fluminense situada no estado do Rio de Janeiro apresenta características que o coloca entre os maiores produtores de blocos cerâmicos para o mercado interno. Na construção civil para fabricação de estruturas em alvenaria podem ser utilizados blocos cerâmicos que devem seguir determinadas características e propriedades, mediante normas que venham garantir o seu desempenho. Para que isso seja garantido, é necessário que sejam feitos estudos mais detalhados e análises das propriedades desejadas. Este artigo faz um estudo entre vários fabricantes de blocos de alvenaria da Região Norte Fluminense para analisar comparativamente seus resultados. Foram escolhidas dez indústrias cerâmicas para um estudo da qualificação dos blocos segundo norma NBR 15270. Os blocos de vedação foram submetidos a ensaios de: análise dimensional (formas e dimensões), desvio das faces e em relação ao esquadro, absorção de água e resistência à compressão. De acordo com os resultados obtidos neste trabalho, podemos observar que as Indústrias Cerâmicas precisam padronizar o sistema de produção, para que nos produtos sejam qualificados em relação à NBR 15270.
ABSTRACT The northern region of Rio de Janeiro presents characteristics that place it among the greatest producers of ceramic blocks to attend the inner market. In the construction field it is possible to use ceramic blocks to produce masonry structures and they have to follow certain characteristics and properties according to rules which ensure their performance. In order to ensure the expected result, it is necessary to do deeper studies and analysis of the desired properties. This article presents a study about several producers of masonry blocks of the Northern region in order to compare and analyze the results. Ten ceramic industries were chosen for a study of the blocks qualification according to the rule NBR 15270. The sealing blocks were subject to experiments of dimensional analysis (forms and dimensions), deviations of faces and in relation to aligned pieces, water absorption and resistance to compression. According to the results obtained in this work, it is possible to realize that the ceramic industries need to standardize the production system for the purpose of qualifying the products in accordance with NBR 15270.
Palavras-chave: Blocos Cerâmicos, NBR 15270, Cerâmica Vermelha, Caracterização Mecânica. Keywords: Rule 15270, sealing blocks, red ceramic, mechanical characterization
_________________________________________________________________________________________ - Universidade Estácio de Sá (UNESA) – Campus Campos dos Goytacazes Avenida 28 de março, 423, Parque Santo Amaro, Campos dos Goytacazes – RJ, CEP 28020-740. E-mails: brunogabry_@hotmail.com, thaysmanhaes12@gmail.com, thainar_sa@hotmail.com, amaanda_lima@hotmail.com, luciana.lezira@estacio.br
Durante toda a evolução do mundo a cerâmica
sempre esteve presente. Sua fabricação data desde
a antiguidade. Em todas as regiões e culturas ela
sempre esteve presente. A cerâmica tem destaque
artesanal e industrial. A farta disposição da matéria
prima faz com que esta se popularize cada vez
mais, havendo uma diversificação e
direcionamento na sua industrialização (Santos,
1989 e Vieira, 2000).
A indústria da cerâmica vermelha no Brasil é uma
das mais importantes. Atualmente a participação
Almeida, Azevedo, Sá, Santos, Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 30
deste setor industrial chega a 1% do PIB (Produto
Interno Bruto). A concentração demográfica
brasileira está nas regiões Sul e Sudeste. Este fato
faz com que a indústria da cerâmica vermelha seja
concentrada nestas regiões, havendo uma
distribuição em todo o Brasil, concentrando o valor
de produção anual em US$2.500.00/ano (Johnston,
2009). Este segmento é especializado na produção
de tijolos furados e maciços, lajes, blocos de
vedação estruturais, telhas, manilhas entre outros
produtos ligados ao setor. Calcula-se que este setor
no Brasil movimenta somente em matéria prima
em torno de 60.000.000 toneladas de matérias
primas ao ano (Rizzatti et al, 2011)
Na região de Campos dos Goytacazes-RJ está
instalado um Polo Cerâmico composto por mais de
cem cerâmicas de pequeno e médio porte. Este
Polo é responsável por cerca de 35 % de toda a
produção de cerâmica vermelha do Estado do Rio
de Janeiro. Entretanto, as empresas locais
apresentam típicos problemas do segmento de
cerâmica vermelha no país como tecnologia
defasada, falta de apoio tecnológico, carência de
mão de obra qualificada, ausência de controle de
qualidade predominando produtos fora das
especificações técnicas devido a não exigência por
parte dos órgãos de fiscalização e consumidores,
etc. (Stevenson, 2001). É prática comum na região
as indústrias cerâmicas prepararem empiricamente
suas massas a partir de duas ou mais argilas em
proporções pré-determinadas. De modo geral as
massas preparadas são constituídas de uma argila
gorda (mais plástica) e de uma argila magra
(menos plástica), com consistência adequada para
conformação por extrusão (Vieira, 2004).
As amostras utilizadas neste trabalho são blocos de
vedação com dimensão 9x19x19, que foram
recolhidas de várias indústrias cerâmicas para uma
análise quantitativa e qualitativa do resultado final
do processo de fabricação, diante a NBR 1520.
Os ensaios foram realizados nos laboratórios da
Universidade Estácio de Sá - Campus Campos dos
Goytacazes, que conta com a aparelhagem básica
para a realização dos referidos ensaios como
prensa universal para a realização do ensaio
mecânico (Ensaio de Compressão), paquímetro
analógico (Análise dimensional), esquadro
metálico (Planeza das Faces e Desvio em relação
ao esquadro), balança digital de no máximo 5 kg
com duas casas decimais e caixa d’ água
(Absorção de Água).
Os blocos cerâmicos tiveram a conformidade
metrológica avaliada através das prescrições da
NBR 15.270-1. A determinação da massa seca e o
índice de absorção de água foram verificados e
calculados de acordo com a NBR 15.270-2. E os
métodos para a execução dos ensaios mecânicos
nos blocos cerâmicos de vedação, com objetivo de
medir a resistência máxima do bloco cerâmico a
compressão foram executados conforme NBR
15.270-3.
A pesquisa atingiu a região do Norte Fluminense
do estado do Rio de Janeiro. Foram realizadas a 10
empreendimentos do setor de blocos cerâmicos
Vermelhos e foram coletadas amostras de blocos
de vedação com dimensão 9x19x19. A figura 1
Almeida, Azevedo, Sá, Santos, Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 31
apresenta as dimensões nominais de fabricação das
indústrias selecionadas para o desenvolvimento do
trabalho.
Quanto às tolerâncias dimensionais, todas as
indústrias cerâmicas apresentaram resultados
diferentes das nominais, de forma que esta
alteração ultrapasse os valores aceitos pela Norma,
que corresponde a uma variação de ± 3 mm de
tolerância dimensional relacionada à média das
dimensões efetivas (NBR 15270-1 e Santos et al,
2012).
(a)
(b)
(c)
Figura 1 – Resultados dos Desvios das dimensões dos tijolos em relação às dimensões nominais de fabricação (em
centímetros), (a) Comprimento, (b) Altura e (c) Largura.
Na figura 2 os valores dos septos dos blocos
cerâmicos das indústrias B, C, D e I ficaram fora
do estipulado pela NBR 15270 para todas as
amostras coletadas. Já as indústrias A, E, F, G, H e
J alcançaram os valores satisfatórios em
comparação a média de 6 mm de septo conforme
as especificação da norma. É importante observar
que houve uma grande variação das medições em
Almeida, Azevedo, Sá, Santos, Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 32
uma mesma empresa, sendo que o menor valor de
espessura do septo observado foi de 2,1 mm e o
maior foi de 10,82 mm.
Figura 2 – Resultado das dimensões dos septos em
relação para cada indústria Cerâmica
Nos blocos cerâmicos também foram aferidos os
desvios de esquadro e faces. O desvio de esquadro
apresentou variação de 0,32 a 2,34 mm e o desvio
de flecha apresentou valores de 0,5 a 1,92 mm,
podemos observar que todas as amostras obtiveram
resultados dentro dos padrões da NBR 15270,
conforme figura 3.
Como pode observar, todos as indústrias cerâmicas
apresentaram resultados como desvio de flecha
e/ou esquadro inferiores ao máximo de 3 mm
admitido pela NBR 15270, embora em algumas
amostras estes valores tenham sido observado que
o desvio padrão ultrapassa o máximo estabelecido
pela norma.
(a) (b)
Figura 3 – Resultados da medicação do desvio, (a) Em relação ao Esquadro e (b) Planeza das Faces ou Flecha.
Quanto à absorção de água, quatro
empreendimentos participantes da pesquisa
apresentaram valores fora dos limites de 8 e 22%
estipulados pela NBR 15270. Os resultados da
absorção são apresentados na figura 4. É
importante ressaltar que os resultados ficaram na
faixa de 18,91 a 25,07%, valores próximos ao
limite.
Almeida, Azevedo, Sá, Santos, Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 33
Figura 4 – Resultados do ensaio de Absorção de Água
dos Blocos cerâmicos, conforme NBR 15270
Os blocos também foram avaliados quanto à
resistência à compressão. Para a maioria das
amostras, os valores médios de resistência à
compressão ficaram abaixo de 1,5 MPa, que é o
mínimo recomendado pela NBR 15270 para bloco
cerâmico comum com dimensão de 9X19X19. A
figura 5 apresenta os resultados dos testes de
resistência à compressão dos blocos cerâmicos,
observa-se que as amostras apresentaram
resistência inferior ao mínimo exigido. Esta
variação também foi observada por Santos ET AL,
2012, que atribuíram o fenômeno à falta de
controle no processo de fabricação, uso matéria
prima não uniforme ou falta de controle na
secagem e queima dos produtos.
Figura 5 – Resultado do ensaio de Resistência Mecânica
dos blocos cerâmicos, conforme NBR 15270
A avaliação dos blocos Cerâmicos da Região Norte
Fluminense/RJ coletados em dez empresas do setor
selecionadas para a pesquisa, apresentaram muita
variação dos resultados comparados com a NBR
15270. As dimensões e os septos possuem uma
grande escala de desvio padrão, já que os
resultados de resistência mecânica não foram
satisfatórios quando confrontado com a Norma.
É importante ressaltar que muitas Indústrias
Cerâmicas da região Norte Fluminense/RJ
possuem processos tradicionais e sem controle de
alguns parâmetros como mistura e temperatura de
queima que influenciam diretamente nos resultados
negativos de algumas das características
analisadas, como por exemplo, a resistência
mecânica do Bloco cerâmico, onde não foi
alcançado o valor indicado pela NBR 15270, que é
de 1,5 MPa.
Almeida, Azevedo, Sá, Santos, Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 34
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A APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO PREVENTIVA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS
APPLICATION OF PRECAUTIONARY MEASURES ALTERNATIVES TO PROBATION IN DRUG TRAFFICKING CRIMES
Róbson de Vargas
RESUMO Tomando como base uma sistematização da prisão cautelar e a existência de diferentes espécies de medidas cautelares alternativas, buscou-se analisar neste trabalho a aplicação das medidas cautelares alternativas nos crimes de tráfico de drogas, de maneira a se identificar, quais são os critérios eleitos pelos tribunais para a sua escolha e adequação (finalidade instrumental das medidas) e quais espécies de medidas efetivamente vem sendo aplicadas na prática. Procurou-se apresentar uma delimitação do entendimento do STF e do STJ sobre a matéria e, por conseguinte, a partir de uma análise quantitativa de acórdãos de Habeas Corpus, decorrentes da decretação da prisão preventiva ao paciente preso em flagrante por tráfico de drogas, apresentar o entendimento dos Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), Santa Catarina (TJSC) e Paraná (TJPR), possibilitando, com essa amostragem, compreender a realidade prática desse sistema.
ABSTRACT Based on a systematization of the precautionary arrest and the existence of different kinds of alternative protective measures, we sought to analyze in this paper the application of alternative precautionary measures in drug trafficking crimes, in order to identify what are the criteria chosen by courts for their choice and suitability (instrumental purpose of the measures) and what kinds of measures are being effectively applied in practice. Sought to present a definition of understanding the STF and STJ on the matter and therefore, from a quantitative analysis of judgments Habeas Corpus, arising from the adjudication of probation patient arrested at the scene for drug trafficking, present understanding of the Courts of Justice of Rio Grande do Sul (Id), Santa Catarina (TJSC) and Paraná (TJPR), allowing, with this sample, understand the practical reality of this system.
Palavras-chave: Processo penal. Prisão cautelar. Instrumentalidade. Função. Tráfico de drogas. Keywords: Criminal Procedure. Precautionary prison. Instrumentality. Function. Drug trafficking.
___________________________________________________________________________ Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS. Professor de Direito Público no Centro Universitário Estácio de Sá-SC. Advogado.
Um dos tormentos do processo penal brasileiro é
sem dúvida a prisão cautelar. Mergulhada em um
cenário de muitos dramas, parece não reagir frente
aos problemas impostos pelo seu próprio
desenvolvimento. Assim, permanece ávida em
torno de justificativas que possibilitem demonstrar
sua necessidade de manutenção, mesmo que isso
represente se aproximar de um modelo jurídico
autoritário em detrimento de um mais humano e
democrático.
A idealizada instrumentalidade divide espaço com
altos índices de encarceramento preventivo,
evidenciado que a sua utilização pelo Estado a
torna um poderoso instrumento intimitadório e
repressivo, sem esquecer-se do efeito sedante que o
Róbson de Vargas
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 36
seu simbologismo opera na opinião pública que
reclama por uma justiça cada vez mais instantânea.
No âmbito do tráfico de drogas, a estratégia
unicamente repressiva tende a trazer mais fracassos
do que avanços, já que a simples promulgação de
uma lei, por mais dura que seja, acaba não surtindo
os efeitos esperados, até porque, o direito penal
exclusivamente, não desempenha nenhuma função
motivadora de respeito à norma.
Diante disso, é altamente questionável assentar
uma política criminal sob as bases do incremento
de penas e sob a restrição ou supressão de
garantias do acusado. De forma ilustrativa, leis
como a dos crimes hediondos (Lei n.º 8.072/1990)
ou a de “combate” ao crime organizado (Lei n.º
9.034/1995), dentre outras, são expressões desse
modelo exclusivamente dissuasório que confia na
força ameaçadora da lei.
Essa preocupação, se trazida para o processo penal,
especialmente para o campo da prisão cautelar,
tende a reforçar o sentido de que esta prisão,
embora decorrente da prática de crimes
genericamente graves e de maior impacto na
opinião pública, como é o caso do tráfico de
drogas, não pode ser revestida de natureza
repressiva ou punitiva, já que a sua função no
processo penal não é servir como punição
antecipada, mas proteger o normal
desenvolvimento do processo dos perigos
decorrente do estado de liberdade do agente
imputado.
Quando a prisão cautelar deixa de ter a finalidade
de instrumentalidade e o seu uso passa a ser
implementado e largamente ampliado, percebe-se o
seu grave desvirtuamento de função, a ponto se
tornar uma espécie de mecanismo publicitário do
sistema de justiça penal, fazendo acreditar na
fantasia de uma falsa solução, não só em relação ao
grave problema do tráfico de drogas, mas de
maneira geral, para toda forma de criminalidade.
A prisão cautelar está (ao menos formalmente)
inserida em um processo penal constitucional que
respeita as garantias fundamentais e, que por sua
vez, não se confunde com impunidade. Ademais, o
processo penal não pode ser visto como um
simples instrumento a serviço do poder punitivo.
Pelo contrário, deve desempenhar um papel de
limitador do poder e garantidor do indivíduo a ele
submetido (LOPES JR., 2009).
Esse processo penal de matiz constitucional
instrumentaliza o direito penal, visando conceder-
lhe efetividade dentro das pautas éticas priorizadas
pelos direitos fundamentais. Assim, pode-se
assinalar que cabe à Constituição a tutela do
processo, assegurando-se, a um só tempo, a
garantia constitucional do processo e o processo
como garantia constitucional dos direitos
(PRADO, 2006). E neste contexto, para que o
processo penal possa marcadamente ser um
instrumento de proteção dos direitos e garantias
individuais, deve assegurar ao acusado a
preservação, e manutenção do seu estado de
inocência, estabelecendo limitações ao uso da
prisão cautelar. Esses limites ao uso da prisão
cautelar, quando observados, realçam a presunção
de inocência.
Róbson de Vargas
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 37
Portanto, o que deve ficar claro é que a prisão
cautelar muito mais que uma prisão sem
condenação, representa uma medida cautelar de
natureza processual penal que busca garantir o
normal desenvolvimento do processo e, por
consequência, a eficaz aplicação do poder de punir
(LOPES JR., 2009). Dito de outro modo, a prisão
cautelar possui um caráter instrumental, servindo
como uma garantia eficaz para que o processo
alcance o seu final (WEDY, 2006).
Por conseguinte, fugindo a uma finalidade e
tendência punitiva, a prisão cautelar deve se
constituir num mecanismo processual que visa
assegurar os meios e garantir o resultado do
processo (KARAM, 1993). Deste modo, em torno
desta concepção de prisão cautelar podemos
identificar que o seu objeto é garantir o normal
desenvolvimento do processo penal, sendo que o
seu papel será importante no sentido de assegurar
os instrumentos adequados e a própria utilidade do
seu resultado, considerando uma eventual demora
na prestação jurisdicional.
Em se tratando de tráfico de drogas, durante muito
tempo a jurisprudência do STF não afastou a
proibição da liberdade provisória, prevista
inicialmente na Lei n.º 8.072/1990, e reforçada
pela Lei 11.343/2006. De maneira geral, o
entendimento era de que a proibição de liberdade
provisória, nos casos de crimes hediondos e
equiparados, decorria da própria inafiançabilidade
imposta pela Constituição à legislação ordinária
(art. 5.º, XLIII, da CF).
Isso porque, o art. 2.º, II, da Lei n.º 8.072/1990
atendia ao comando constitucional, quando
considerava inafiançáveis os crimes de tortura,
tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o
terrorismo e os definidos como crimes hediondos.
Daí, que inconstitucional seria a legislação
ordinária que dispusesse diversamente, tendo como
afiançáveis delitos que a Constituição determina
serem inafiançáveis.1
Após muitas decisões e reflexões, em maio de
2012, por ocasião do julgamento do Habeas
Corpus n.º 104.339/SP, o STF em sessão plenária,
decidiu por maioria de votos, em declarar a
inconstitucionalidade da expressão “e liberdade
provisória” constante do caput do art. 44 da Lei n.º
11.343/2006. Percebe-se, portanto, que a partir
desse julgamento, a concessão de liberdade
provisória para o tráfico de drogas passou a ser
uma alternativa perfeitamente possível, desde que,
ausente qualquer perigo para o processo em razão
da liberdade do acusado.
A jurisprudência que se construiu no STJ em
torno da liberdade provisória para o tráfico de
drogas acompanhou de perto a orientação
emanada do STF, o que, em sede de liberdade
individual, não poderia ser diferente. Com a
declaração incidental de inconstitucionalidade
1 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 1.ª Turma.
Habeas Corpus 103715. Rel. Min. Cármem Lúcia –
j. 23.03.2011 – public. 24.03.2011. Disponível em:
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Classe=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgament
o=M>. Acesso em: 05 jan., 2013.
Róbson de Vargas
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 38
pelo Plenário do STF na parte que proibia a
concessão de liberdade provisória aos
acusados de tráfico de drogas, o STJ também
passou a admitir o benefício, desde que não
houvesse necessidade de garantir o
acautelamento do processo. No que tange a
aplicação de medidas cautelares alternativas, é
possível identificar que o STJ, quando
evidencia a necessidade de acautelamento do
processo e conclui que realmente essa
alteração mostra-se necessária e adequada às
circunstâncias em que o delito foi praticado e
às condições pessoais do acusado, vem
aplicando, de maneira conjunta, as medidas
previstas nos incisos I, IV e V do art. 319 do
CPP (comparecimento periódico em juízo,
proibição de ausentar-se da Comarca e o
recolhimento domiciliar no período noturno e
nos dias de folga quando o investigado ou
acusado tenha residência e trabalho fixos),2
isso quando não deixa essa escolha a critério
do magistrado processante.3
2 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 5.ª Turma.
Habeas Corpus 269174. Rel. Min. Jorge Mussi – j.
15.08.2013 – public. 27.08.2013. Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/justica/detalh
e.asp?numreg=201301195785>. Acesso em: 07 set.,
2013.
3 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 5.ª Turma.
Habeas Corpus 135422. Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior – j. 27.09.2011 – public. 24.10.2011.
Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/justica/detalh
e.asp?numreg=200900845170>. Acesso em: 09 jan.,
2013.
A coleta de dados para análise da presente
pesquisa deu-se através de arquivos
disponibilizados pelo endereço eletrônico de
cada um dos Tribunais de Justiça estaduais,
através do link destinado a pesquisa de
jurisprudências no período de julgamento
compreendido entre 01/01/2012 e 01/01/2013,
lembrando que o início da vigência da Lei
12.403/2011 se deu em 04/07/2011. As
palavras-chave utilizadas na pesquisa foram
tráfico de drogas, medidas cautelares e ordem
concedida. Todavia, os acórdãos
demonstravam, algumas vezes, a presença de
concurso de crimes, situação em que o
paciente havia sido preso pelo tráfico de
drogas e mais outro delito, como por exemplo,
porte de arma, roubo ou associação para o
tráfico de drogas. Sendo assim, optou-se por se
analisar apenas as decisões que trataram
exclusivamente de pacientes presos em
flagrante por tráfico de drogas (art. 33 da Lei
n.º 11.343/2006) e que foram contemplados
com medidas cautelares alternativas.
Foi possível encontrar 42 (quarenta e dois)
acórdãos no TJRS, 21 (vinte e um) acórdãos
no TJSC e 32 (trinta e dois) acórdãos no TJPR.
De um modo geral, pode-se dizer que há nas
decisões substituindo a prisão preventiva por
medidas cautelares alternativas, manifestações
considerando a primariedade e os bons
antecedentes do paciente, a residência e o
trabalho fixo, bem como a pequena quantidade
Róbson de Vargas
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 39
de droga apreendida, tudo respaldado pela
falta de fundamentação idônea da decisão de
1.º Grau, que, por se utilizar de premissas
genéricas, como a da gravidade abstrata do
crime de tráfico de drogas, deixava de
especificar os elementos concretos do fato a
justificar a prisão.
Sendo assim, considerando as decisões
analisadas, sejam elas emanadas do TJRS, do
TJSC ou do TJPR, é possível afirmar que em
relação ao fumus comissi delicti, todos os
acórdãos indicaram claramente a sua presença,
especialmente por se tratar de prisão em
flagrante, cujas circunstâncias estavam a
demonstrar, sem muitas dificuldades, a
materialidade (especialmente através da
quantidade de droga apreendida), e a autoria
do crime.
Já quanto à presença do periculum libertatis,
consubstanciado na demonstração da
finalidade para qual a medida alternativa está
sendo decretada, observamos que a sua
delimitação, na maioria das decisões, não
restou muito clara. Isso porque, ao passo que
as medidas foram sendo aplicadas, não se
identificou se era para atender a necessidade
da aplicação da lei penal, para a investigação
ou a instrução criminal ou, ainda, para evitar a
prática de infrações penais.
Em linhas gerais, quando constatado a
primariedade, os bons antecedentes, a
residência fixa, o trabalho lícito e a pequena
quantidade de droga apreendida, os Tribunais
afastaram o periculum libertatis que poderia
ensejar a decretação ou manutenção da prisão
preventiva. Por outro lado, ao aplicar nestes
casos, as medidas cautelares alternativas, a
finalidade por essa decretação não se mostrou
evidente. Sem essa demonstração, prevalece
inegavelmente uma desvirtuação dos
princípios constitucionais penais que não
materializam de forma mais precisa a própria
noção de devido processo legal.
Acerca desta questão, cumpre anotar que no
julgamento pelo TJRS do Habeas Corpus n.º
70051018695, restou consignado que a
necessidade de cautelaridade, após constatada
a presença do fumus commissi delicti e do
periculum libertatis, poderia se satisfazer com
o comparecimento pessoal do sujeito em juízo,
devendo o magistrado fixar o prazo e as
condições deste comparecimento, com o
objetivo de verificar as atividades
desenvolvidas pelo agente. Essa obrigação
periódica, em determinadas situações, poderá
atender às exigências da cautelaridade no caso
concreto.
Quanto à adequação das medidas, que permite
analisar quais espécies poderiam ser aplicadas
ao caso concreto como forma de alcançar os
fins pretendidos, nossa compreensão é de que
a variação de possibilidades encontradas (ora
se aplicando apenas uma, ora se aplicando
Róbson de Vargas
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 40
duas ou mais), indica primeiro, a existência de
uma margem de discricionariedade do
julgador, que, considerando a gravidade do
crime, suas circunstâncias, bem como as
condições pessoais do indiciado ou acusado,
pode optar por uma ou mais medidas
alternativas como forma de atender o critério
da necessidade.
Já num segundo momento, indica que algumas
medidas encontram maior adesão do que
outras, sendo que algumas não foram aplicadas
em momento algum. Por certo, existem
questões, especialmente relacionadas à
fiscalização da medida, que precisam ser
consideradas no momento da sua decretação
para que exista o mínimo de efetividade.
Todavia, o mais relevante a nosso ver é que as
mesmas não sirvam de subterfúgio para a
antecipação de pena e como mecanismo de
prevenção geral ou especial.
Dentre as decisões avaliadas, pode-se afirmar
que a cumulação de medidas cautelares é a
regra, muito embora nos pareça, que o § 1.º, do
art. 282 do CPP, onde se lê: “as medidas
cautelares poderão ser aplicadas isolada ou
cumulativamente”, priorize o contrário. Sendo
assim, a primeira conjugação mais lembrada
pelos Tribunais estaduais (posição que
encontra receptividade nas decisões emanadas
do STJ), se dá pela substituição da prisão
preventiva pela aplicação de 3 (três) medidas
cautelares alternativas do art. 319 do CPP: I
(comparecimento periódico em juízo, no prazo
e nas condições fixadas pelo juiz, para
informar e justificar atividades); IV (proibição
de ausentar-se da Comarca quando a
permanência seja conveniente ou necessária
para a investigação ou instrução); e V
(recolhimento domiciliar no período noturno e
nos dias de folga quando o investigado ou
acusado tenha residência e trabalho fixos).
A primeira medida como salientado
anteriormente, é tida como a que garante um
controle mais efetivo pela jurisdição. Já a
proibição de ausentar-se da Comarca, se
reveste de uma cautelaridade evidente,
podendo servir para a proteção da prova ou
para a eficácia da lei penal quando presente o
risco de fuga do acusado. Por fim, a medida de
recolhimento domiciliar no período noturno e
nos dias de folga, embora se questione acerca
de sua finalidade cautelar, pode contribuir para
diminuir o risco de fuga ou a tutela da prova.
Num segundo momento, também foi possível
encontrar referência à aplicação conjunta das
medidas dos incisos I e IV (comparecimento
periódico em juízo e proibição de ausentar-se
da Comarca); dos incisos I, II e V
(comparecimento periódico em juízo,
proibição de acesso ou frequência a
determinados lugares e recolhimento
domiciliar durante o repouso noturno e nos
dias de folga); dos incisos I, IV e VIII
(comparecimento periódico em juízo,
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proibição de ausentar-se da Comarca e fiança);
e, ainda, dos incisos IV e V (proibição de
ausentar-se da Comarca e recolhimento
domiciliar durante o repouso noturno e nos
dias de folga). Apenas no julgamento do
Habeas Corpus n.º 70048725071, oriundo do
TJRS, foi possível encontrar a aplicação de
apenas uma cautelar alternativa, a do inciso I
(comparecimento periódico em juízo), todos
do art. 319 do CPP.
Por último, merece ser destacado que,
especialmente o TJSC em seus julgamentos,
vem se abstendo de analisar a necessidade e
adequação das medidas cautelares, deixando
essa tarefa a cargo do Juízo processante.
Assim, o Tribunal catarinense determina a
expedição de alvará de soltura em favor do
paciente, facultando ao Juízo a quo a aplicação
de uma ou mais medidas cautelares previstas
nos incisos do artigo 319 do CPP que entender
pertinentes ao caso concreto. A nosso juízo,
quando o Magistrado de 1.º Grau não
demonstrar fundamentadamente a necessidade
e adequação das medidas, o acusado poderá
impetrar novo Habeas Corpus para que o
Tribunal decida sobre essa imposição.
Na avaliação acerca da aplicação das medidas
cautelares alternativas, feita a partir do crime
de tráfico de drogas, o que se pode constatar é
que o cenário de crise em que se encontra
mergulhada a prisão preventiva permanece
quase que inalterado, especialmente porque o
campo de incidência das novas medidas
apresenta-se muito restrito, existindo certa
dificuldade de se apontar a finalidade
instrumental que dá legitimidade a sua escolha
e adequação.
Contudo, na perspectiva reforçada pelo STF
com a possibilidade de liberdade provisória
agora também para o tráfico de drogas, se
consolida a presunção de inocência no sistema
cautelar. O entendimento do STJ, com
decisões garantindo a aplicação de medidas
cautelares alternativas, realça a
excepcionalidade da prisão preventiva e o
inafastável dever que tem o Juiz de Direito de
bem fundamentar suas decisões judiciais.
Pode-se perceber que em alguns casos, foi
aplicada apenas a medida de comparecimento
periódico em juízo. Já em outros, além dessa
medida, somou-se a proibição de ausentar-se
da Comarca e o recolhimento domiciliar no
período noturno e nos dias de folga. O certo é
que a cumulatividade de medidas se
apresentou como a regra, muito embora, os
fatos guardassem circunstâncias sempre muito
parecidas (agente primário e sem antecedentes,
com residência fixa e trabalho lícito, e autuado
com pequena quantidade de droga).
Por fim, pensamos que as medidas dos arts.
319 e 320 do CPP precisam estar alinhadas a
Róbson de Vargas
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 42
uma exigência cautelar que, por certo, não é a
mesma da prisão preventiva, mas existe e
precisa ser lembrada. Embora as novas
medidas não sujeitem o acusado aos mesmos
efeitos decorrentes do recolhimento ao cárcere,
elas limitam certos direitos e impõem certas
restrições.
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Virna Braga
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 43
A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO ASSISTENCIAL NO BRASIL
THE CONSTITUTION OF ASSISTANCE FIELD IN BRAZIL
Virna Ligia Fernandes Braga
RESUMO O presente artigo resulta do projeto de doutoramento e busca analisar o processo de transição entre um Estado ausente e outro que, gradativamente, foi assumindo a responsabilidade sobre a assistência social como um todo. Metodologicamente, a abordagem parte do conceito de reciprocidade, no qual as doações traziam status a quem doava e estabeleciam, também, uma hierarquia entre doador e receptor.
ABSTRACT This article is the result of the doctoral project and seeks to analyze the process of transition from one state away and another that gradually was taking responsibility for social assistance as a whole. Methodologically, the approach is based on the concept of reciprocity, in which the donations brought status to those who donated and also established a hierarchy between donor and recipient.
Palavras-chave Assistência, Filantropia, Estado, Minas Gerais. Keywords Assistance, Philanthropy, State, Minas Gerais.
_____________________________________________________________________________________ - Mestra em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF, linha de pesquisa “Poder, Mercado
eTrabalho”. Dissertação defendida em dezembro de 2006: Entre a Honra e o Mercado: análise do processo de formação do movimento docente em Juiz de Fora (1934-1964). Doutoranda em História pela mesma universidade.
Como um problema social sem precedentes, a
pobreza tem suscitado debates variados bem como
a busca por estratégias capazes de minimizar seus
efeitos devastadores. A assistência adquiriu,
portanto, um caráter imprescindível no
enfrentamento da chamada “questão social”,
através de iniciativas da própria sociedade civil e
também do poder público. Deste modo, as
tentativas de solucionar tal questão remontam às
primeiras leis inglesas, voltadas para os pobres em
meados do século XVI4 e chegam, atualmente, aos
modelos de previdência social que conhecemos.
4 Os historiadores dataram o século XVI como marco
divisório entre uma assistência mais e menos racional, a
partir da criação da Lei dos Pobres na Inglaterra, em
1531. A lei cobrava uma taxa da população para que a
ajuda aos pobres fosse feita. Muito embora a gestão
desses recursos fosse descentralizada, era o Estado
quem administrava os fundos captados e, também,
“complementava com seus próprios recursos um dos
A análise a ser realizada sobre a pobreza se pauta
na perspectiva da história social e, portanto,
trabalharemos com abordagens advindas da
história e da sociologia a fim de alcançar uma
compreensão ampliada do conceito de pobreza e da
própria caracterização do pobre. A pobreza será
analisada a partir do contexto histórico que a
formata e define e que, também, gera uma noção
específica acerca do pobre e da própria assistência.
A proposta é buscar as origens da pobreza e sua
transformação em uma “questão social” que exigiu
a atenção de sociedades e governos.
Foi no contexto de transição do feudalismo para o
sistema capitalista que a sociedade medieval
passou por mudanças radicais em suas formas de
sociabilidade; redes de solidariedade construídas
durante séculos se dissolveram diante do crescente
mais amplos sistemas de assistência à pobreza existente
no mundo”. [4]
Virna Braga
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 44
desenvolvimento das relações capitalistas de
produção. Apesar da pobreza e dos pobres sempre
estarem presentes na história da humanidade, em
determinado momento na Idade Média os
desvalidos e miseráveis tiveram sua condição e
percepção pela sociedade transformadas.
No Brasil, o aumento de pobres e desvalidos
começa a incomodar já nos anos finais do período
imperial, quando as práticas assistenciais existentes
até então se tornaram insuficientes para socorrer o
crescente número de indivíduos necessitados de
algum tipo de auxílio alheio. A abolição da
escravidão agravou tal situação, trazendo à tona
uma sociedade em transformação: brancos, não
brancos e imigrantes, lutavam para sobreviver nos
centros urbanos, boa parte em situação de risco
social. Não havia política pública para inserção do
negro recém liberto na sociedade republicana,
tampouco para os pobres de modo geral. A miséria
não era só uma ameaça, mas uma realidade
premente para aqueles que não conseguiam um
emprego capaz de lhes garantir a sobrevivência.
Nesse contexto, sociedade e Estado desenvolvem
uma série de iniciativas para tentar dirimir ou
controlar a pobreza, ampliando o escopo
assistencial gradativamente.
As práticas assistenciais estiveram presentes em
Minas Gerais desde muito cedo e, no decorrer do
período imperial, já existia uma rede assistencial
que se ramificava pelo território mineiro e que
contava com subsídio do estado. Entretanto, este
quadro sofreu alterações diante das mudanças
ocorridas no país a partir da abolição e da inserção
do trabalho assalariado. Através da pesquisa de
doutoramento, temos obsevado que tanto a
sociedade quanto o estado de Minas Gerais
reconfiguraram suas formas de atuação quanto ao
auxílio aos desvalidos diante destas mudanças, o
que levou à progressiva institucionalização da
assistência.
No caso de Minas Gerais, como em grande parte
dos estados brasileiros, os socorros iniciais à
pobreza se originaram das inúmeras Santas Casas
de Misericórdia existentes. Essas instituições de
caridade se responsabilizaram pelo auxílio aos
pobres, aos indigentes em geral, aos órfãos, aos
mendigos, às viúvas, inválidos e doentes de todo
tipo. No decorrer da pesquisa foram identificadas
inúmeras casas de caridade, como eram chamadas
as Santas Casas, espalhadas pelas cidades mineiras.
Estas desempenharam um importante papel na
distribuição da assistência de forma geral; como
também no processo de institucionalização dos
socorros.
É a partir deste momento que tem início a pesquisa
aqui desenvolvida, exatamente no processo de
especialização e institucionalização da assistência,
logo após a proclamação da República no Brasil.
Nosso objetivo primordial é traçar um panorama
da constituição do campo assistencial no estado de
Minas Gerais, atentando para a atuação da
sociedade civil e do executivo: quais as
instituições, de que forma atuavam, como
conseguiam se manter, como se organizavam. Qual
o papel do governo, as políticas sociais, suas
iniciativas para lidar com a questão social.
A documentação produzida pelas casas de caridade
(Santas Casas de Misericórdia) do estado de Minas
Gerais permite compreender a organização e
Virna Braga
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 45
distribuição da assistência em seu âmbito privado,
resultante das iniciativas caritativas e filantrópicas
oriundas da própria sociedade diante da
pauperização. Já os documentos oficiais,
produzidos pelo governo mineiro, via Secretaria do
Interior, através do setor de Saúde e Assistência
Pública, fornecem elementos para a análise das
propostas e iniciativas do estado de Minas quando
confrontado com a amplitude de sua questão
social.
Durante a elaboração da qualificação e no decorrer
da pesquisa de doutoramento, houve a percepção
de que as Misericórdias ocupam um lugar
fundamental na história da assistência em Minas
Gerais.5 Elas serão analisadas, contudo, como parte
do aparelho assistencial mineiro e não como objeto
central deste estudo. Importante destacar que os
quadros de enfermos destas casas de caridade são
instrumentos de análise indispensáveis para a
percepção de “quem eram os pobres”, os
“desvalidos” que necessitavam da caridade alheia.
Um grande número de asilos e orfanatos, com
inúmeros relatórios de funcionamento, balanços
financeiros, quadros de internos e de asilados,
muitos deles com detalhes sobre cor, profissão e
idade, compõem a documentação sobre a
assistência pública e privada em Minas Gerais. O
socorro aos pobres alienados não foi abordado por
se tratar de um tema amplo e que, pela quantidade
de fontes disponíveis, implicaria na elaboração de
5 A importância das Santas Casas de Misericórdia na
distribuição da assistência pode ser percebida em várias
regiões do Brasil e existem diversos trabalhos que
constituem a historiografia sobre o tema.
outra pesquisa, com objetivos diversos dos que se
encontram em desenvolvimento.
A tese abarca um recorte temporal que vai de 1888
a 1923 e tem como marco inicial a abolição da
escravidão no Brasil, devido às transformações
sociais profundas que o fim da escravidão impôs
ao país. O marco final, o ano de 1923, foi
escolhido porque, de certo modo, a criação do
CNT – Conselho Nacional do Trabalho e da Lei
Elói Chaves representa uma iniciativa pioneira por
parte do Estado para o longo processo de
universalização da assistência ao trabalhador no
Brasil, ainda em curso. A lei garantia
aposentadoria por tempo de serviço ou invalidez,
pensão para herdeiros no caso de falecimento do
trabalhador, socorros médicos e medicamentos por
preços especiais. No entanto, era limitada a
algumas categorias específicas de trabalhadores. Já
o Conselho Nacional do Trabalho (CNT), criado
para substituir o Departamento Nacional do
Trabalho, foi concebido para atuar como um órgão
consultivo do governo em assuntos relacionados ao
trabalho e à previdência social. Deste modo
representava uma forma de regulamentação do
setor na década de 1920.6
Com o aumento da pobreza, sociedade e Estado se
viram obrigados a reestruturar as práticas
assistenciais vigentes, pois estas já não conseguiam
abarcar o número cada vez maior de desvalidos
que necessitavam de auxilio. Desta forma, houve
uma ampliação do campo da assistência de um
modo geral, bem como sua progressiva
institucionalização a partir de uma parceria entre as
Virna Braga
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 46
iniciativas vindas da sociedade (via instituições de
auxilio, caridade e filantropia) e do Estado (com o
predomínio da prática da concessão de
subvenções).
A redefinição do público-alvo das práticas
assistenciais esteve diretamente ligada às
mudanças sociais, econômicas e políticas, que
interferiram no perfil populacional. Foi a partir dos
anos iniciais da República que uma série de leis e
decretos relacionados à assistência de modo geral
foram criados, estes estabeleciam os parâmetros de
funcionamento de várias instituições de socorro e
tratavam da distribuição de recursos do governo
federal para o socorro público nos estados. As
políticas de proteção social também se voltavam
para a construção de casas para os trabalhadores,
conforme o quadro (Quadro 01):
Sobre os marcos regulatórios da assistência social
no Brasil, Cláudia Maria Ribeiro Viscardi analisa
as leis e decretos aprovados e colocados em vigor
entre 1889 e 1930, muito embora sua abordagem
se volte para os inseridos no mercado de trabalho.
Em 1890, houve a criação de um Banco dos
Operários para a construção de moradias populares
para os trabalhadores da cidade do Rio de Janeiro,
por meio do Decreto n° 843 de 11 de outubro. Tal
iniciativa, para Viscardi, demonstrava a atenção
dos gestores para com as mazelas decorrentes do
pós-abolição nos centros urbanos. Muitas famílias
viviam em péssimas condições nas cidades, que
recebiam um crescente número de imigrantes e
ainda eram o destino de boa parte da população do
campo. Era preciso “estabelecer algum tipo de
política pública de caráter protecionista” para que
os desvalidos não ameaçassem a República recém-
instaurada.7
Com relação à assistência aos pobres fora do
mercado de trabalho, após 1889, houve um
aumento considerável e que afetou diretamente as
finanças das casas de caridade, o numero de
doações passou a ser insuficiente para uma
demanda em crescimento. Esta situação levou a
uma racionalização das práticas assistenciais e da
própria atuação das Santas Casas, seguida de uma
ampliação da atuação do Estado no socorro à
pobreza. Houve uma separação dos espaços de
assistência, ao fim do século XIX, o que levou a
algumas alterações na estrutura dos hospitais: a
caridade foi progressivamente cedendo espaço para
a medicalização e os espaços de cura foram se
especializando.
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Quadro 01 - Legislação social no Brasil na Primeira República 8
8 O quadro não apresenta toda a legislação social do período, pois enfatiza leis e decretos voltados ao campo da
assistência aos pobres. Existem trabalhos que apresentam uma sistematização da legislação assistencial no Brasil, como
os de LOUZADA, VISCARDI, DELGADO, VISCARDI. Contudo, os mesmos são voltados para a assistência aos
trabalhadores, diferente da legislação assistencial para os pobres fora do mercado de trabalho. Deste modo, no ‘Portal
legislação’ do site do Senado Federal foi possível acessar as leis e decretos ligados ao tema “Socorro Público”
http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=102137&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB
Decreto 439 31 de maio de 1890
Estabelece as bases da organização da assistência à infância
desvalida na capital federal; mandava recolher à Casa de São
José e ao Asilo de Meninos Desvalidos, para manter e educar,
menores do sexo masculino, de seis aos 21 anos.
Decreto 843 11 de outubro de 1890 Concede favores ao Banco dos Operários para auxiliar a
construção de casas para os operários e classes pobres.
Decreto 896 29 de junho de 1892 A Assistência Médico-Legal de Alienados, constituída com o
Hospício Nacional, as colonial S. Bento e Conde de Mesquita,
na ilha do Governador, e os asilos da mesma natureza que
forem criados na Capital Federal, tem por fim socorrer,
gratuitamente ou mediante retribuição, os indivíduos de
ambos os sexos, sem distinção de nacionalidade, e que,
enfermos de alienação mental, carecerem de tratamento.
Decreto 1559 7 de outubro de 1893 Reorganiza o serviço da Assistência Médico-legal de
Alienados e os asilos da mesma natureza que forem criados na
Capital Federal.
Decreto 1154 7 de janeiro de 1904 Autoriza o Governo a ceder ao Instituto de Proteção e
Assistência à Infância do Rio de Janeiro um dos edifícios
nacionais existentes na Capital Federal, ou a dar ao mesmo
Instituto, mensalmente aluguel de casa.
Decreto 5125 1 de fevereiro de 1904 Organiza os fins dos estabelecimentos de assistência a
alienados, sua constituição, seu pessoal, nomeação,
substituição, vencimentos, vantagens e penas disciplinares.
Decreto 5964 16 de abril de 1906 Abre ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores o crédito
de $10.000 para representação do Brasil no Quarto Congresso
Internacional de Assistência Pública e Privada em Milão.
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DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE X DIREITO ECONÔMICO DAS EMPRESAS DE SAÚDE SUPLEMENTAR
FUNDAMENTAL RIGHT TO HEALTH X ECONOMIC RIGHTS OF SUPPLEMENTAL HEALTH
ENTERPRISES
Osair Alves, Marianne Rios de Souza Martins
RESUMO Este artigo visa realizar uma análise sobre a eficácia ou não dos direitos prestacionais, tratando de forma mais ampla o direito fundamental à saúde frente ao direito econômico das empresas de saúde suplementar, para entender melhor os direitos sociais prestacionais e sua eficácia. Buscou-se responder: Diante do conflito existente entre o direito fundamental à saúde do contratante de planos de saúde e o direito econômico das operadoras de saúde suplementar, qual tem prevalecido nas decisões proferidas pelos magistrados do Estado do Espírito Santo? Optou-se por uma pesquisa exploratória com coleta de dados junto à jurisprudência firmada no Tribunal de Justiça do Espírito Santo no ano de 2012, concluindo que dessas decisões 90% foram favoráveis aos consumidores.
ABSTRACT This article aims to analyze the effectiveness or ineffectiveness of provisional rights, addressing more broadly the fundamental right to health in front of the economic rights of health supplement enterprises, to understand better the provisional social rights and their effectiveness. It was sought to answer: Given the conflict between the fundamental right to health of the health plan’s hirer and the economic right of the supplementary health operators, which one has prevailed in the decisions handed down by the magistrates of the Espírito Santo State? An exploratory research was chosen, made with data collection on the jurisprudence firmed by the Espírito Santo Court in 2012, concluding that 90% of these decisions were favorable to consumers.
Palavras chave: Direito à Saúde. Direitos Sociais. Direitos prestacionais. Keywords: Right to Health. Social Rights. Provisional Rights.
_______________________________________________________________________ Bacharel em Direito formado pela Faculdade Estácio de Vila Velha. Professora Universitária, advogada, Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais Constitucionais pela Faculdade de Direito de Vitória-ES (FDV), Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso Estácio de Vila Velha.
O presente artigo irá analisar o conflito existente
entre o direito fundamental à saúde do contratante
de planos de saúde e o direito econômico das
operadoras de saúde suplementar, verificando o
que tem prevalecido nas decisões proferidas pelos
magistrados do Estado do Espírito Santo,
verificado se caráter prestacional de determinados
direitos sociais são obstáculos para sua efetivação.
O artigo buscará responder a seguinte indagação:
Diante do conflito existente entre o direito
fundamental à saúde do contratante de planos de
saúde e o direito econômico das operadoras de
saúde suplementar, qual tem prevalecido nas
decisões proferidas pelos magistrados do Estado do
Espírito Santo?
O tipo de pesquisa será a exploratória, com
utilização do procedimento técnico, bibliográfico e
coleta de dados jurisprudenciais junto ao portal do
TJ-ES para verificar os processos judiciais que
tratam do tema, no ano de 2012 averiguando o
percentual de decisões em favor dos consumidores.
O direito fundamental à saúde é uma garantia
constitucional onde em seu art. 196 a Constituição
Osair Alves, Marianne Martins
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 50
define que a saúde é direito de todos e dever do
Estado.
É de fácil constatação que a vida do ser humano é
algo imensurável, pois entre todos os seres vivos, o
homem necessita de muito mais que apenas direito
à vida biológica para realizar-se plenamente e
desfrutar de todos os direitos a ele assegurados
constitucionalmente, ressaltando-se ainda que nem
o próprio indivíduo possa aceitar condição que
menospreze seu valor.
O Estado deve zelar pelo resguardo dos direitos
sociais dos indivíduos, dentre eles a saúde, ainda
que em caráter preventivo, cabe então, ao Poder
Público o dever da proteção, que se dará, por meio
da aprovação pelo Parlamento de normas penais
incriminadoras, pela atuação da polícia ostensiva
para coibir crimes, pelo exercício do poder de
polícia estatal com o fim de impedir obras
irregulares que possam prejudicar os demais
cidadãos, além de várias outras medidas protetivas
(SOUSA JUNIOR, 2006).
O principio da proibição do retrocesso social,
assim este principio não tem aceitação universal,
“[...] desta forma acentue-se que mesmo os que
acolhem a tese de proibição do retrocesso
entendem que o princípio da proporcionalidade
pode inspirar uma nova regulação dos direitos
fundamentais [...]” (CANOTILHO, 2003, p.131).
Percebe-se que a eficácia ou não dos direitos como
a saúde é o de que o Estado não possui ou não quer
possuir auxílios bastantes para prestar atenção a
toda causa social, discutindo e se debatendo as
questões do que seria possível e razoável a ser
exigir do Poder Público.
Amaral (2004, p. 116) entende que:
Deslocar a decisão para o Judiciário em
hipóteses que envolvam “escolhas
dramáticas” é querer alargar para aquele
Poder competências que não são suas. O
Judiciário não está legitimado pelo voto para
tomar tais opções. Muito pelo contrário, é a
própria Constituição que cerca a magistratura
com garantias próprias, para que possa ela
desempenhar seu ofício alheia a pressões de
momento. O Judiciário não pode atuar sob a
influência da opinião pública.
Desta forma, constata-se que o Judiciário vem cada
vez mais ocupando um lugar de destaque na
efetivação do direito fundamental como garantia
constitucional.
Destaca-se então a supremacia da efetivação dos
direitos fundamentais sobre a autonomia privada,
dando ênfase à essencialidade do direito envolvido
prevalecer sobre o interesse privado.
No Brasil existe uma lei específica que trata da
saúde suplementar, é a lei 9.656 de 1998, esta
dispõe sobre os planos e seguros privados de
assistência à saúde, embora o direito à saúde seja
uma garantia constitucional a própria Carta Magna
em seu art. 199 permite a participação de empresas
privadas na prestação de serviços à saúde.
No Brasil existem várias legislações que tratam o
tema da saúde, na Lei 8.080/90 no artigo 3º pode
se destacar que a saúde também se relaciona com a
educação, a moradia, o trabalho, o saneamento
básico, a renda, o meio ambiente, o transporte, o
lazer e o acesso a serviços essenciais, portanto esse
direito é bem mais abrangente, pois uma série de
Osair Alves, Marianne Martins
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 51
fatores contribui para que o cidadão tenha o aceso
à saúde realmente respeitado.
Calcula-se que 25,7% das mulheres e 23,0% dos
homens brasileiros estejam cobertos por um plano
de saúde. O percentual da população brasileira que
possui um plano de saúde varia de um mínimo de
20,7% entre pessoas de até 18 anos, a um máximo
de 29,5% entre pessoas de 40 a 64 anos de idade.
Entre pessoas com mais de 65 anos a cobertura
atinge 26,1% para os homens e 28,2% para as
mulheres. (IBGE, 2008).
No que tange o conflito existente entre o direito
econômico das empresas de saúde suplementar
frente ao direito fundamental à saúde do cidadão
que lhe é garantido pela Constituição Federal, vê
se que inúmeras vezes esse conflito só consegue
ser solucionado com a interferência do Poder
Judiciário.
No ano de 2012 tiveram 243 decisões sobre o tema
no Tribunal de Justiça do Espírito Santo, porém a
presente pesquisa foi delimitada quanto à análise
das decisões em sede de apelação.
Em sede de acórdão de apelação em 2012, foram
encontradas 90 decisões, sendo que desse total
90% foram favoráveis aos consumidores (Figura
01).
Figura 01 – Decisões do Tribunal de Justiça do Espírito
Santo em 2012
Na pesquisa (Figura 02) foi constatada decisões de
erro médico, no qual o consumidor entrou com
uma ação devido a um erro cometido pelo médico
durante o procedimento, negativa de atendimento
quando o consumidor chega ao hospital com uma
emergência e o plano de saúde lhe nega tal
demanda, negativa de cobertura que é aquela em
que o plano de saúde alega que tal procedimento
não é coberto pelo plano, prazo de carência que é
quando o plano alega que o tempo de adesão ao
plano ainda não permite tal atendimento, reajuste
de faixa etária quando o plano quer fazer um
reajuste maior devido a idade do contratante e
reembolso de despesas de quando devido a
situação o consumidor paga as despesas de seu
próprio bolso e depois solicita o reembolso ao
plano de saúde.
90%
10%
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Decisões favoráveis aos consumidores
Decisões desfavoráveis aos consumidores
Osair Alves, Marianne Martins
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 52
Figura 02 - Decisões do Tribunal de Justiça do Espírito
Santo em 2012 – Distribuição.
Foi constatado através dos objetos de pesquisa que
a maioria são relativas negativa de cobertura,
seguido pela negativa de atendimento, depois vem
o prazo de carência, o reajuste por faixa etária e o
reembolso de despesas.
A negativa de atendimento é aquela na qual o
consumidor chega ao hospital com uma
emergência e lhe é negado o atendimento,
diferenciando-se da negativa de cobertura pelo fato
de que nesta é negado o atendimento sobre a
alegação de que tal procedimento não é coberto
pelo plano de saúde do solicitante.
O direito fundamental à saúde é uma garantia
constitucional e é reconhecido no âmbito
internacional em documentos como a Declaração
Universal dos Direitos do Homem, de 1948 e o
Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e, Culturais de 1966, bem como pela
Constituição da República de 1988, como todo
direito prestacional a saúde depende da
concretização daquele que legisla
constitucionalmente, para que se possa adquirir
eficiência na sua prestação através de leis e
políticas sociais que garantam sua efetividade.
Nota-se que tal efetividade ou não de direitos como
a saúde e o de que o Estado não possui ou não quer
possuir auxílios suficientes para prestar este
serviço com a qualidade que a população precisa,
neste sentido o Estado tem o dever de prevenir,
fiscalizar e reprimir violações aos direitos
fundamentais como a saúde, devendo punir tais
infratores, tal prevenção deve acontecer através de
medidas de caráter jurídico e administrativo.
O direito fundamental á saúde é uma garantia
constitucional, mas devido a ineficácia do Poder
Público em fazer valer esse direito, a própria
Constituição outorgou ao setor privado a
possibilidade de explorar esse serviço através de
uma contraprestação pecuniária por parte do
consumidor, o que fez proliferar no Brasil os
Planos de Saúde, muitos sem a menor condição de
estarem em funcionamento, com isso naturalmente
começaram a aparecer os conflitos que em via de
regra só são solucionados via Poder Judiciário.
Conclui-se que diante do conflito existente entre o
direito fundamental à saúde do contratante de
planos de saúde e o direito econômico das
operadoras de saúde suplementar tem prevalecido
nas decisões proferidas pelos magistrados do
Estado do Espírito Santo o entendimento de que na
grande maioria das vezes o Poder Judiciário tem
decidido favoravelmente ao consumidor, tendo em
vista que ao longo do ano de 2012, 90% das ações
julgadas em sede de apelação foram pelo
procedimento do pedido em favor do consumidor.
Osair Alves, Marianne Martins
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 53
Foi possível verificar através do levantamento de
dados jurisprudencial que os motivos que tem
ensejado as lides entre os consumidores e as
operadoras de saúde suplementar foram os
seguintes: 56,62% referente a negativa de
cobertura, 24,72% a negativa de atendimento,
6,7% a prazo de carência, 1,1% a reajuste por faixa
etária e 1,1% a reembolso de despesas.
AMARAL Gustavo org. p/ TORRES, Ricardo
Lobo – Teoria dos Direitos Fundamentais,
Renovar, Rio de Janeiro, 2001
BRASIL. Constituição Federal de 1988.
Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituica
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2013.
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito
Constitucional e Teoria da Constituição. 5. ed.
Coimbra: Almedina, 2003.
SOUSA JUNIOR, José Geraldo de (org). 2006.
Sociedade democrática, direito público e
controle externo. Disponível em:
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESPÍRITO
SANTO. Jurisprudências. Disponível em :
http://aplicativos.tjes.jus.br/sistemaspublicos/consu
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Acesso em: 02 mai. 2013.
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 54
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 55
LEGITIMIDADE E PARÂMETROS PARA A EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS AFIRMATIVAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL NO BRASIL: AS CONTRIBUIÇÕES DO DIÁLOGO ENTRE CONSTITUIÇÃO E DIREITO INTERNACIONAL
LEGITIMACY AND PARAMETERS TO THE IMPLEMENTATION OF AFFIRMATIVE ACTION
TO PROMOTE ETHNIC AND RATIAL EQUALITY: CONTRIBUTIONS FORM THE DIALOGUE BETWEEN CONSTITUTION AND INTERNATIONAL LAW
Bernardo Brasil Campinho
RESUMO A partir de padrões de incorporação de tratados internacionais de direitos humanos e sua eficácia na consolidação de políticas afirmativas no Brasil, este trabalho analisa as interlocuções entre a Convenção Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Constituição brasileira e a legislação federal sobre políticas afirmativas de igualdade étnico-racial, particularmente no campo da educação superior e na contratação para o serviço público, com o intuito de verificar a sua legitimidade, tendo por base a análise de argumentos de reparação, justiça distributiva e diversidade, bem como trazer alguns parâmetros para aplicação destas políticas, a partir da análise conjunto das normas citadas e da interpretação das mesmas os pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e pelo Comitê da ONU para Eliminação da Discriminação Racial. Os resultados encontrados permitiram concluir que o dialogo normativo entre Convenção da ONU para Eliminação da Discriminação Racial e a Constituição tem produzido as condições de legitimação e implantação de políticas afirmativas de igualdade étnico-racial no Brasil, com alto grau de aderência e fidelidade aos parâmetros interpretativos postos pelo Comitê de Eliminação da Discriminação Racial e pelo Supremo Tribunal Federal, realizando tanto justiça distributiva como justiça como reconhecimento.
ABSTRACT From patterns of incorporation of international human rights treaties and their effectiveness in the consolidation of affirmative action policies in Brazil, this paper analyzes the dialogues between the International Convention on the Elimination of All Forms of Racial Discrimination, the Brazilian Constitution and federal law about affirmative action policies of ethnic-racial equality, particularly in the field of higher education, and contracting for public service, in order to verify its legitimacy, based on the analysis of arguments repair, distributive justice and diversity, as well as bring some parameters for implementing these policies, from the set of analysis mentioned standards and interpretations by the jurisprudence of the Supreme Court and by the UN Committee on Elimination of Racial Discrimination. The results showed that the normative dialogue between the UN Convention for the Elimination of Racial Discrimination and the Constitution has produced the conditions of legitimacy and implementation of affirmative action policies of ethnic-racial equality in Brazil, with a high degree of fidelity and adherence to the interpretative parameters posed by the Committee on the Elimination Racial Discrimination and by the Supreme Court, performing both distributive justice and justice as recognition.
PALAVRAS-CHAVE Legitimidade; Parâmetros; Políticas Afirmativas; Igualdade Étnico-Racial; Brasil. KEYWORDS Legitimacy; Parameters; Affirmative Actions; Ethnic and Ratial Equality; Brazil.
____________________________________________________________________________ 1 – UNESA – Rio de Janeiro - bbcampinho@yahoo.com.br
Este trabalho é um resultado parcial de pesquisa
conduzida no âmbito do Edital Pesquisa
Produtividade 2014-2015 da Universidade Estácio
de Sá sobre padrões de incorporação de tratados
internacionais de direitos humanos e sua eficácia
na consolidação de políticas afirmativas no Brasil,
Bernardo Campinho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 56
buscando analisar, neste ponto, o modelo (de ações
afirmativas) mais adotado no Brasil: as cotas
étnico-raciais.
Segundo Joaquim Barbosa Gomes (2001, p. 39),
“as ações afirmativas podem ser definidas como
um conjunto de políticas públicas e privadas de
caráter compulsório, facultativo ou voluntário,
concebidas com vistas ao combate à discriminação
racial, de gênero, de origem nacional, bem como
para corrigir os efeitos presentes da discriminação
praticada no passado, tendo por objetivo a
concretização do ideal de igualdade de acesso a
bens fundamentais como educação e emprego”.
O tema das ações afirmativas na questão da
igualdade étnico-racial passou a ter profunda
relevância no Brasil com a experiência iniciada no
início do século XXI de criação de mecanismos de
cotas para índios e afrodescendentes no acesso à
educação superior, com a reserva de vagas em
universidades públicas.
A legitimidade destes mecanismos foi (e ainda tem
sido) questionada com base na ideia de igualdade
formal perante a lei presente na Constituição da
República (art. 5º, caput e inciso I), razão pela qual
surge a necessidade de aferir se as políticas
afirmativas de cotas étnico-raciais para acesso à
educação superior e a recente legislação federal
sobre cotas da mesma natureza na realização
podem ser consideradas como discriminações
positivas razoáveis à luz da Constituição, de forma
a atender o conteúdo do princípio da igualdade, e
de forma a criar parâmetros para sua efetivação.
Neste ponto, o método de análise escolhido foi o
de privilegiar o diálogo entre o Direito
Internacional dos Direitos Humanos e o sistema
constitucional brasileiro, procurando estabelecer
simetrias e referências que possam criar discursos
de justificação e orientações para operacionalizar o
princípio da igualdade, buscando identificar
elementos que permitam compreender se as
políticas afirmativas na seara das relações étnico-
raciais são compatíveis ou não com este princípio e
como aplica-las corretamente de acordo com
padrões de direitos humanos.
No âmbito do Direito Internacional, verificou-se
que Convenção Internacional de Todas as Formas
de Discriminação Racial (1966), tratado
internacional que, no seu art. 1º, inciso IV,
estabelece que “não serão consideradas
discriminações racial as medidas especiais tomadas
como o único objetivo de assegurar progresso
adequado de certos grupos raciais ou étnicos”,
”contanto que, tais medidas não conduzam à
manutenção de direitos separados para diferentes
grupos raciais e não prossigam após terem sidos
alcançados os seus objetivos”.
Por sua vez, norma internacional destinada a
promover a igualdade étnico-racial dialoga
perfeitamente com os princípios fundamentais
constitucionais adotados pelo Brasil no art. 3º: a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária
(inciso I), a redução das desigualdades sociais
(inciso III) e a vedação a qualquer forma de
discriminação, inclusive aquela de caráter relativo
a raça ou cor (inciso IV).
Bernardo Campinho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 57
Todos estes dispositivos, interpretados em
conjunto e tendo a definição de medidas
temporárias, prevista no art. 1º, IV, da Convenção
da ONU para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial, fundamentam a criação de
mecanismos de caráter inclusivo, no sentido de
combater desigualdades étnico-raciais social e
historicamente construídas, para realizar a plena
igualdade e a justiça social, como requer a
Constituição de 1988.
Neste sentido, esta interpretação é convergente
com o documento final da III Conferência Mundial
de Combate ao Racismo, Discriminação Racial,
Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância
Correlata, realizada em Durban, na África do Sul,
em 2001, no qual os Estados ali presentes, ao tratar
das medidas de prevenção e combate ao racismo e
à discriminação racial, xenofobia e intolerância
correlata, se pronunciaram nos seguintes termos:
Reconhecemos que a desigualdade de
condições políticas, econômicas, culturais e
sociais podem reproduzir e promover o
racismo, discriminação racial, xenofobia e
intolerância correlata, e têm como resultado a
exacerbação da desigualdade. Acreditamos
que a igualdade de oportunidades real para
todos, em todas as esferas, incluindo a do
desenvolvimento, é fundamental para a
erradicação do racismo, discriminação racial,
xenofobia e intolerância correlata (...)
Acreditamos firmemente que a educação, o
desenvolvimento e a implementação fiel das
nossas normas e obrigações dos direitos
humanos internacionais, inclusive a
promulgação de leis e estratégias políticas
econômicas e sociais, são cruciais no combate
ao racismo, à discriminação racial, à
xenofobia e à intolerância correlata (...)
Destacamos a necessidade de se desenhar,
promover e implementar em níveis nacional,
regional e internacional, estratégias,
programas, políticas e legislação adequados,
os quais possam incluir medidas positivas e
especiais para um maior desenvolvimento
social igualitário e para a realização de
direitos civis, políticos, econômicos, sociais e
culturais de todas as vítimas de racismo,
discriminação racial, xenofobia e intolerância
correlata, inclusive através do acesso mais
efetivo às instituições políticas, jurídicas e
administrativas, bem como a necessidade de se
promover o acesso efetivo à justiça para
garantir que os benefícios do desenvolvimento,
da ciência e da tecnologia contribuam
efetivamente para a melhoria da qualidade de
vida para todos, sem discriminação.
A ideia de que as ações afirmativas para a
igualdade étnico-racial são compatíveis com
ambos os padrões da igualdade (formal e material)
encontra também fundamento na Recomendação
(ou Comentário Geral) número 32 do Comitê das
Nações Unidas para a Eliminação da
Discriminação Racial (item 6 da Recomendação),
que expressamente entende que “o conceito de
medidas especiais se baseia no princípio de que as
leis, políticas e práticas adotadas devem
complementar-se, quando as circunstâncias o
aconselhem, com a adoção de medidas especiais
temporárias destinadas a garantir o pleno exercício
dos direitos humanos e das liberdades
fundamentais por grupos desfavorecidos”.
Como explica Flávia Piovesan, ao comentar a
Convenção Internacional para a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial, “faz-
necessário combinar a proibição da discriminação
com políticas compensatórias que acelerem a
igualdade enquanto processo”, na medida em que
“não basta apenas proibir a discriminação,
mediante legislação repressiva”, pois “são
essenciais estratégias promocionais capazes de
estimular a inserção e a inclusão de grupos
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socialmente vulneráveis nos espaços sociais”
(Piovesan, 2006, p. 183).
O debate constitucional reflete profundamente as
concepções trazidas na Convenção Internacional
para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial, ainda que não de forma
expressa. A evidência disto se encontra no
julgamento da Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental n. 186 no Supremo Tribunal
Federal brasileiro, ocasião em que se avaliou a
constitucionalidade ou não de políticas de ações
afirmativas conduzidas por decisões
administrativas de universidades públicas federais
(o caso dizia respeito à Universidade de Brasília).
Foi realizada a análise dos votos proferidos pelos
Ministros na Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental número 186 e foi possível
perceber que a normativa internacional encontra-se
implícita nos votos citados, seja para perceber as
políticas afirmativas de acesso à universidade com
realização da igualdade e não como privilégio, seja
para realçar o caráter provisório destas políticas.
A decisão do Supremo Tribunal Federal neste caso
também consagrou a ideia de igualdade como
respeito às diferenças e seu significado em
sociedades pluralistas, como pode se perceber no
trecho a seguir destacado:
Pensar a igualdade segundo o valor da
fraternidade significa ter em mente as
diferenças e as particularidades humanas
em todos os seus aspectos. A tolerância em
tema de igualdade, nesse sentido, impõe a
igual consideração do outro em suas
peculiaridades e idiossincrasias. Numa
sociedade. marcada pelo pluralismo, a
igualdade só pode ser igualdade com igual
respeito às diferenças. Enfim, no Estado
democrático, a conjugação dos valores da
igualdade e da fraternidade expressa uma
normatividade constitucional no sentido de
reconhecimento e proteção das minorias.
As políticas afirmativas de igualdade étnico-racial
forma positivadas no plano federal com a Lei
12711/2012, que instituiu o modelo das cotas no
acesso à universidade obrigatório nas
universidades federais e regulamentou a matéria
com base no que o STF decidiu na ADPF 186.
Analisando a Lei Federal 12711/2012, há uma
profunda aderência aos conceitos trazidos da
Convenção Internacional para Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial:
igualdade substantiva por meio de medidas
afirmativas, caráter provisório destas medidas e
necessidade de acompanhamento e avaliação dos
resultados das mesmas (arts. 3º, 6º e 7º).
Outra medida do Estado brasileiro, a Lei Federal
12990/2014, amplia o alcance das políticas
afirmativas de igualdade étnico-racial para o
campo da seleção de quadros da Administração
Pública federal reserva de 20% (vinte por cento)
das vagas oferecidas nos concursos públicos para
provimento de cargos efetivos e empregos públicos
no âmbito da administração pública federal, das
autarquias, das fundações públicas, das empresas
públicas e das sociedades de economia mista
controladas pela União (art. 1º), desde que o
número de vagas oferecidas no edital do concurso
seja igual o superior a três (art. 1º, parágrafo 1º).
Igualmente há previsão de avaliação da política
(art. 5º da Lei 12990/2014) e a previsão de seu
caráter temporário (10 anos, conforme estabelece o
art. 6º da Lei 12990/2014). Diferente da Lei
Bernardo Campinho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 59
12711/2012 (ações afirmativas no acesso à
educação superior), no entanto, a Lei 12990 (ações
afirmativas nos concursos públicos federais) não
estabelece um ótimo de representação de grupos
étnico-raciais a partir da sua presença no contexto
social e cultural de cada localidade (“proporção no
mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na
população da unidade da Federação onde está
instalada a instituição”), mas sim um piso uniforme
nacional (20% (vinte por cento) das vagas
oferecidas nos concursos públicos para provimento
de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito
da administração pública federal, das autarquias,
das fundações públicas, das empresas públicas e
das sociedades de economia mista controladas pela
União). Ademais, a Lei 12990/2014 se refere
apenas aos negros, não tratando de políticas
afirmativas para concursos públicos no que se
refere aos grupos indígenas brasileiros.
Cabe ainda assinalar que há três discursos de
justificação das políticas afirmativas de igualdade
étnico-racial: reparação, justiça distributiva e
diversidade.
A argumentação com base em reparação/justiça
compensatória, pela qual as ações afirmativas se
justificam em sociedades que por longo tempo
adotaram políticas de subjugação de um ou várias
categorias de pessoas por outras, de corrigir os
efeitos perversos da discriminação passada
(Gomes, 2001, p. 62), o que no caso brasileiro se
refere aos descendentes de africanos, os quais
foram trazidos à força para o país e escravizados, e
aos indígenas e seus descendentes, que foram em
grande parte dizimados ou escravizados (Souza
Neto e Feres Júnior, 2008, p. 367).
O argumento relacionado à justiça distributiva
repousa no pressuposto de que um indivíduo ou
grupo social tem direito de reivindicar certas
vantagens, benefícios ou mesmo o acesso a
determinadas posições, às quais teria naturalmente
acesso caso as condições sociais sob as quais
vivem fossem de efetiva justiça (Gomes, 2001, p.
66).
Finalmente, o argumento da diversidade surge na
jurisprudência da Suprema Corte dos Estados
Unidos e se relaciona com o pluralismo, com a
construção de uma sociedade “amiga da
diferença”, no sentido de estimular um maior
entendimento inter-racial e a demolição de
estereótipos (Souza Neto e Feres Júnior, 2008, p.
352).
Todos os três argumentos estão presentes no
preâmbulo da Convenção Internacional para a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Racial, quando ocorre o repúdio ao colonialismo e
a todas as práticas de segregação e discriminação a
ele associadas, bem como aos prejuízos que a
discriminação racial causa às sociedades humanas
(“a discriminação entre os homens por motivos de
raça, cor ou origem étnica é um obstáculo a
ralações amistosas e pacíficas entre as nações e é
capaz de disturbar a paz e a segurança entre povos
e a harmonia de pessoas vivendo lado a lado até
dentro de um mesmo Estado”), trazendo como
objetivo “promover o entendimento entre raças e
construir uma comunidade internacional livre de
todas as formas de segregação racial e
Bernardo Campinho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 60
discriminação racial”. Os já mencionados arts. 1,
IV, e 2, II, da Convenção destacam em maior grau
a questão da justiça distributiva, como também o
faz a Recomendação Geral n. 32 do Comitê de
Eliminação da Discriminação Racial, embora
residualmente existam referências à questão da
diversidade.
No plano do sistema constitucional brasileiro, há
um equilíbrio, a partir dos princípios fundamentais
do art. 3º, entre argumentos de justiça distributiva e
argumentos de diversidade/reconhecimento, como
o julgamento da ADPF 186 no Supremo Tribunal
Federal tornou evidente. A justificas dos projetos
de lei que originaram as Leis 12711 e 12990
caminham igualmente no sentido de dar maior
peso aos argumentos relacionados à redistribuição
e à diversidade.
A conclusão do trabalho é de que o dialogo
normativo entre Convenção da ONU para
Eliminação da Discriminação Racial e a
Constituição tem produzido as condições de
legitimação e implantação de políticas afirmativas
de igualdade étnico-racial no Brasil, com alto grau
de aderência e fidelidade aos parâmetros
interpretativos postos pelo Comitê de Eliminação
da Discriminação Racial e pelo Supremo Tribunal
Federal, realizando tanto justiça distributiva como
justiça como reconhecimento.
FERES JÚNIOR, João; DAFLON, Verônica;
BARBARELA, Eduardo; RAMOS, Pedro. Feres
Júnior, João; Daflon, Verônica; Barbarela,
Eduardo; Ramos, Pedro. Levantamento das
políticas de ação afirmativa nas universidades
estaduais (2013). Levantamento das políticas de
ação afirmativa (GEMAA), IESP-UERJ, 2013.
Disponível em:
http://gemaa.iesp.uerj.br/files/Levantamento_3(1).
pdf. Acesso em 13 de setembro de 2014.
GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa e
princípio constitucional da igualdade: o Direito
como instrumento de transformação social. A
experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar,
2001.
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Direito
Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva,
2006.
SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; FERES
JÚNIOR, João. Ação Afirmativa: normatividade e
constitucionalidade. In: Igualdade, Diferença e
Direitos Humanos. Organizadores: Daniel
Sarmento, Daniela Ikawa e Flávia Piovesan. Rio de
Janeiro: Lumen.
1 Com relação às primeiras experiências de políticas
afirmativas nas universidades públicas, segundo estudo
do Grupo de Estudos Multidisciplinar das Ações
Afirmativas do Instituto de Estudos Sociais e Políticos
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, trabalho
conduzido por João Feres Júnior, Verônica Toste
Daflon, Eduardo Barbabela e Pedro Ramos, “Em 2003,
entrou em vigor a Lei Estadual nº. 4.151, que instituiu
reserva de vagas para o ingresso de alunos pretos e
pardos nas universidades estaduais do Rio de Janeiro,
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e
Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF).
Na Universidade do Estado da Bahia (UNEB) a política
foi criada por meio da deliberação número 196/2002 do
Conselho Universitário (...) (Feres Júnior, João; Daflon,
Verônica; Barbarela, Eduardo; Ramos, Pedro, 2013, p.
6).
2 Documento final da III Conferência das Nações
Unidas de Combate ao Racismo, Discriminação Racial,
Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância
Correlata. Disponível em:
http://www.oas.org/dil/port/2001%20Declara%C3%A7
%C3%A3o%20e%20Programa%20de%20A%C3%A7
%C3%A3o%20adotado%20pela%20Terceira%20Confe
r%C3%AAncia%20Mundial%20contra%20o%20Racis
mo,%20Discrimina%C3%A7%C3%A3o%20Racial,%2
0Xenofobia%20e%20Formas%20Conexas%20de%20In
Bernardo Campinho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 61
toler%C3%A2ncia.pdf. Acesso em 13 de setembro de
2014.
3 O Comitê das Nações Unidas para a Eliminação da
Discriminação Racial é um órgão da ONU formado por
especialistas independentes que monitora a aplicação da
Convenção da ONU para a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação Racial, com base em previsão
do art. 8º da Convenção. Informações no site do Comitê:
http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CERD/Pages/CER
DIndex.aspx. Acesso em 13 de setembro de 2014.
Segundo Flávia Piovesan, cabe ao Comitê examinar as
petições individuais, os relatórios encaminhados pelos
Estados-partes e as comunicações interestatais,
ressaltando a autora que o sistema de petições
individuais só se aplica aos Estados que fizeram ou
fizerem uma declaração habilitando o Comitê a recebe-
las e a examiná-las, pois o direito de petição é previsto
sob a fórmula de cláusula facultativa; finalmente,
Piovesan esclarece que a decisão do Comitê é destituída
de força obrigatória ou vinculante, mas é publicada no
relatório anual elaborado pelo Comitê, e este é
encaminhado à Assembleia Geral da ONU (Piovesan,
2006, p. 185-186).
4 Segundo a Convenção da ONU para a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial, “o termo
medidas especiais compreende medidas que em alguns
países podem se denominar ‘ações afirmativas’,
‘medidas afirmativas’ ou ‘ações positivas’, quando
correspondam ao disposto no parágrafo 4º do art. 1º ou
no parágrafo 2º do art. 2º da Convenção...” (item 12 da
Recomendação Geral n. 32 do Comitê da ONU para
Eliminação da Discriminação Racial).
5 Segundo relato da agência de notícias do STF, os
Ministros citados se manifestaram nos seguintes termos:
Ministro Ricardo Lewandowski: “o ministro
Lewandowski afirmou que as políticas de ação
afirmativa adotadas pela UnB estabelecem um ambiente
acadêmico plural e diversificado e têm o objetivo de
superar distorções sociais historicamente consolidadas.
Além disso, segundo o relator, os meios empregados e
os fins perseguidos pela UnB são marcados pela
proporcionalidade e razoabilidade e as políticas são
transitórias e preveem a revisão periódica de seus
resultados. Quanto aos métodos de seleção, o relator os
considerou “eficazes e compatíveis” com o princípio da
dignidade humana...”; o Ministro Celso de Mello
sustentou que “o sistema adotado pela UnB obedece a
Constituição Federal e os tratados internacionais que
tratam da defesa dos direitos humanos”; o ministro
Marco Aurélio disse que “as ações afirmativas devem
ser utilizadas na correção de desigualdades, com a
ressalva de que o sistema de cotas deve ser extinto tão
logo essas diferenças sejam eliminadas”; Ministro
Joaquim Barbosa lembrou que “as ações afirmativas não
são ações típicas de governos, podendo ser adotadas
pela iniciativa privada e até pelo Poder Judiciário, em
casos extremos” e defendeu que, com as ações
afirmativas, ““A igualdade deixa de ser simplesmente
um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e passa
a ser um objetivo constitucional a ser alcançado pelo
Estado e pela sociedade”; finalmente, o Ministro Gilmar
Mendes reconhece “as ações afirmativas como forma de
aplicação do princípio da igualdade, que, em muitos
casos, exige uma ação do Poder Público no sentido de
realizar a equiparação a partir da constatação de que
determinado grupo se encontra em situação vulnerável”.
Os trechos dos votos e manifestações dos Ministros que
foram citados podem ser conferidos no site da Agência
de Notícias STF:
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?
idConteudo=206042&caixaBusca=N. Acesso em 13 de
setembro de 2014. Na reportagem, há link para votos e
outras matérias sobre o julgamento da ADPF 186.
6
Decisão do Supremo Tribunal Federal na Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental disponível
em:
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStfArq
uivo/anexo/ADPF186.pdf. Acesso em 13 de setembro
de 2014.
7 Art. 3º da Lei 12711/2012: “em cada instituição
federal de ensino superior, as vagas de que trata o art.
1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por
autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção
no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na
população da unidade da Federação onde está instalada
a instituição, segundo o último censo do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)”.
Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/lei/l12711.htm. Acesso em 13 de setembro
de 2014.
8 Além do já citado art. 3º (nota anterior), o art. 6º diz
que Art. 6o O Ministério da Educação e a Secretaria
Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial,
da Presidência da República, serão responsáveis pelo
acompanhamento e avaliação do programa de que trata
esta Lei, ouvida a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Por sua vez, o Art. 7o O Poder Executivo promoverá,
no prazo de 10 (dez) anos, a contar da publicação desta
Lei, a revisão do programa especial para o acesso de
estudantes pretos, pardos e indígenas, bem como
daqueles que tenham cursado integralmente o ensino
médio em escolas públicas, às instituições de educação
superior. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/lei/l12711.htm. Acesso em 13 de setembro
de 2014.
9 Neste sentido, confira-se a justificativa do PL
6378/2013, que deu origem à Lei 12990/2014:
Bernardo Campinho
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 62
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostr
arintegra;jsessionid=8CD9489DA65A72CF1DFB25BC
7ABB9932.proposicoesWeb1?codteor=1177136&filena
me=PL+6738/2013. Acesso em 13 de setembro de
2014.
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 63
O PODER MODERADOR E SUA REPERCUSSÃO SOBRE O PODER EXECUTIVO
THE MODERATING POWER AND ITS REPERCUSSION ON THE EXECUTIVE POWER
Telmo Olímpio, Allan Marques, Carlos Bolonha
RESUMO O presente artigo produz uma perspectiva para que se possam ser compreendidas as relações do Poder Moderador no Brasil-Império com a Supremacia Executiva desenvolvida ao longo tempo, objetivando suas implicações sobre a Constituição de 1988. Busca-se, desse modo, alcançar de que maneira a hodierna configuração do Poder Executivo, após a Constituição Cidadã, manteve a trajetória institucional brasileira de uma preponderância do Poder Executivo sobre os demais poderes da República. Conveniência política momentânea ou acomodação estrutural do poderio alargado durante o século XX pelo Executivo? Pretende-se responder esta pergunta como modo de contribuir com o estudo sobre as instituições brasileiras e seu comportamento na contemporaneidade, procurando soluções para as crises que exigem, cada vez mais, um aprimoramento destas mesmas instituições com a finalidade de dar-lhes agilidade na tomada de decisão. É imperioso, portanto, um estudo profundo das raízes de nosso Poder Executivo dentro da estrutura estatal para conceber conceitos que ajudem a compreendê-lo e garanta sua funcionalidade.
ABSTRACT This paper produces an overview that can be understood as the relations of Moderating Power in Brazil-empire with Executive Supremacy developed over time aiming its implications on the 1988 Constitution. The aim of this paper is thus to achieve that way today's configuration of the Executive after the Citizen Constitution has kept the Brazilian institutional trajectory with a preponderance of the Executive Branch over the other Branches of government. Momentary political convenience or structural accommodation of extended might by the Executive in the twentieth century? The paper pursues a way of contributing to the study of Brazilian institutions and their behavior in contemporary times looking for solutions to crises that require increasingly an improvement these institutions in order to give them flexibility in decision making. It is imperative therefore a thorough study of the roots of our Executive Branch within the state structure as a way to conceive concepts that help to understand it and ensure its functionality.
Palavras-chave Constituição Cidadã; Poder Moderador; Separação de Poderes; Supremacia Executiva; Teoria Institucional. Keywords Brazilian Constitution; Executive Supremacy; Institutional Theory; Moderating Power; Separation of Powers.
______________________________________________________________________ 1- Graduando da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Monitor de Teoria do Estado.
E-mail: telmo.olimpio@gmail.com. 2- Graduando da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail:
allancsmarques@gmail.com. 3- Professor Adjunto da Faculdade Nacional de Direito e do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. E-mail: bolonhacarlos@gmail.com.
Perpassando pelos 190 anos em que o Estado
Brasileiro tem no topo de seu ordenamento jurídico
uma Constituição Codificada, pode-se perceber a
evolução da estrutura estatal. Notadamente o Poder
Executivo revela-se proeminente em qualquer
análise histórica constitucional que se possa fazer
do Brasil. A primeira Constituição, com maior
tempo de vida, a de 1824, possui uma diferença
notável em comparação às Constituições que a
sucedem: o Poder Moderador. Embora se viva
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atualmente os 25 anos da Constituição Cidadã,
ainda não se consegue delimitar adequadamente a
atuação do Poder Executivo e o seu diálogo com o
Legislativo e o Judiciário.
Neste contexto de solidificação de uma nova
Constituição, enfrenta-se ainda questões pouco
discutidas como a capacidade legiferante do Poder
Executivo ou, ainda, a demasiada influência que o
Poder Executivo exerce sobre o Supremo Tribunal
Federal. Os presentes questionamentos interferem
diretamente na configuração da Separação de
Poderes e, por conseguinte, na cristalização da
tenra democracia brasileira. Em vista de analisar
estas questões, toma-se como hipótese que se pode
ainda vislumbrar desdobramentos deste 4º Poder
Imperial na formação, na importância e nas
atribuições do Poder Executivo brasileiro.
Precisamente sobre a ideia de uma vida
constitucional para além do texto, pode-se
conceber que a influência do Poder Moderador ao
longo do tempo não depende de sua prescrição no
diploma legal. Sob este broquel, entende-se como
o desacoplamento estrutural do Poder Executivo se
desenvolveu, causando sua sobrepujança sobre os
demais poderes da República. (VERMEULE et
POSNER, 2010.)
Com o método hipotético-dedutivo adotado, visa-
se a revisão bibliográfica histórica e política que
possam embasar densamente a discussão que
envolve a estrutura do Poder Executivo e como
esta foi se delineando ao passar dos anos,
entretanto, busca-se primordialmente perceber
estes aspectos na Constituição de 1988, que tornou
o Brasil um Estado Democrático de Direito.
Nesta expedição, tem-se como marco teórico a
teoria institucional norte-americana, trazendo
como expoente de estudo sobre o Poder Executivo
a obra Executive Unbound de Posner e Vermeule.
No cenário nacional, toma-se como determinante a
obra Sua Majestade o Presidente do Brasil de
Ernest Hambloch.
Neste painel, aspira-se demonstrar que existe uma
tendência na organização institucional brasileira
que leva a uma preponderância do Poder
Executivo, tendo em vista a quantidade e a pujança
de suas competências constitucionais. Avaliando,
assim, o Poder Moderador como ditame propulsor
deste modelo de arranjo institucional no Brasil.
O Poder Moderador presente na Constituição de
1824 é um ponto de partida que abre possibilidade
de analisar a formação do Poder Executivo no
Brasil para além dos aspectos estritamente
jurídicos, aliando, assim, as perspectivas histórica
e política. Somente deste modo, pode-se chegar a
um desenho fiel da realidade em que se possa
compreender o atual exercício do Poder Executivo
após a Constituição Cidadã de 1988.
Deste modo, o Poder Moderador, apesar de ter sido
idealizado pelo pensador francês Benjamin
Constant6, só teve vida útil no Brasil e em
Portugal. Fazendo, portanto, deste instituto jurídico
algo genuinamente atrelado às raízes brasileiras.
Desse modo, busca-se na história nacional a
concepção das instituições políticas e jurídicas de
modo a contribuir com uma Teoria Institucional
do Brasil. Ajudando, pois, a compreender os
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fenômenos e crises contemporâneas a fim de
superar dificuldades com a agilidade que os dias
hodiernos exigem.
De olhos fitos sobre o Poder Moderador, é
elementar a análise de que a Constituição de 1824
o delineou em seu texto como primordial para o
exercício do poder político, mas também firmou a
figura do Imperador como uma união hipostática
dos papéis do Executivo e do Moderador. Em
síntese, no primeiro passo vislumbra-se o marco da
Carta Constitucional de 1924.
O extenso período de duração da Constituição de
1824, em um total de 65 anos que jamais foi
alcançado por nenhuma outra Constituição que a
seguiu, nos faria acreditar na fonte de estabilidade
política provinda de suas notáveis diferenças para
com as demais: a Monarquia, enquanto forma de
governo; e o Poder Moderador, como um sistema
de garantir plenos poderes ao Imperador. Neste
sentido, é que o texto constitucional de 1824 define
o Poder Moderador como “a chave de toda a
organização Politica.”
Antes do golpe republicano de 1889, o Brasil
constituiu aos poucos sua própria forma de arranjo
político, e mantinha o Imperador como figura
central deste modelo. Neste sentido é que
encontramos também, no epicentro, o Poder
Executivo que controla o judiciário pela nomeação
de Magistrados, a Igreja pela nomeação de Bispos
e as Forças Armadas. Assim, pode-se conceber que
desde a primeira formação da conjuntura jurídica e
política do Brasil houve privilégio ao Poder
Executivo para mitigação de crises e conflitos e
como mantenedor da estabilidade nacional.
No Brasil, o Imperador teve importância primaz
para o desenho do Poder Moderador idealizado por
Benjamin Constant. Esta união hipostática que
vivemos entre os poderes Executivo e Moderador
no período imperial revela-se como uma inovação
institucional das relações de poder.
Apesar de os republicanos vislumbrarem no
modelo presidencialista norte-americano um novo
horizonte para o Brasil, não se pode deixar de lado
que, de modo pujante, a figura do Imperador
representou grande influência diante dos primeiros
anos da República, nos governos dos Marechais
Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Pode-se
talvez atribuir a esta não-radicalidade de mudanças
na estrutura do poder governamental que impediu
revoltas e crises nesta ruptura.
A importância do Imperador se desvela como
fundamental para compreendermos o desenvolver
da história política do Brasil. Sem dúvida, pela
união de poderes em uma única pessoa, encontra-
se o mais alto grau de centralidade política que se
viveu até hoje.
Não há a ingenuidade de se pensar que o Poder
Moderador se perpetuou na vida constitucional
brasileira tal qual ele foi arquitetado. Isso seria,
antes de tudo, um completo absurdo. Não obstante,
o Poder Moderador, como instituto notável no
ordenamento jurídico brasileiro, tanto pelo vigor
quanto pela quase exclusividade com a qual foi
aplicado ao Brasil, pode ser considerado o
precursor de uma gravidade latente conferida ao
Poder Executivo e, por sua vez, à pessoa do
Presidente da República.
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Após o advento da República em 1889 e logo após
a promulgação da Constituição de 1891, o Brasil
viveu períodos de autoritarismo que, se no início,
visavam a não-fragmentação do território
brasileiro, mais tarde deu sinais de que era, de
certo modo, algo próprio da vida constitucional
brasileira. Por isso tivemos idas e vindas, até nos
firmamos como uma democracia a partir de 1988,
situação que tem perdurado por 25 anos.
(HAMBLOCH, 1981, p. 57.)
Neste cenário, consegue-se ver de que forma a vida
constitucional funciona com maleabilidade, não
aderindo rigidamente à Constituição escrita. Por
esta fresta gerada pela disparidade do que se vive e
daquilo que se consagra na Carta Constitucional,
vê-se perpassar a influência que o Poder
Moderador exerceu e exerce sobre a hegemonia
executiva. A este comportamento da vida
constitucional podemos chamar de Constituição
Invisível em consonância com Laurence Tribe.
(TRIBE, 2010.)
A Separação de Poderes, que a Constituição de
1988 trata em seu artigo 3º, tem sofrido de forma
bastante brusca as rápidas mudanças que o mundo
tem vivido. Neste quadro, a necessidade de
tomadas ágeis de decisão tem conferido ao Poder
Executivo uma importância primaz para o
funcionamento do país. Este fato fica evidente na
quantidade de atribuições, no quadro de
funcionários e na centralidade de poder que
qualificam o Executivo. (CANOTILHO et al,
2013, p. 1183.)
Conforme divulgado pelo IPEA em 2009, o Poder
Executivo concentrava 79% dos empregos
públicos, frente a apenas 21% dos demais Poderes
da República. Este dado revela a influência não só
econômica mas também de atividades
desenvolvidas dentro do Executivo. Além disso, o
Poder Executivo detém funções essenciais para
vida pública como o funcionamento de bancos e
universidades, de segurança pública e previdência
social, de relações internacionais e diplomacia,
entre outros. Isto evidentemente é um elemento do
próprio presidencialismo que une as figuras do
Chefe de Governo e do Chefe de Estado no
Presidente da República.
É no Presidente da República que encontramos
uma diferença crucial para as cúpulas dos demais
Poderes. O Poder Judiciário, conta com 11
ministros no Supremo Tribunal Federal e o
Legislativo com 513 Deputados Federais na
Câmara de Deputados e 81 Senadores no Senado
Federal; totalizando 594 em todo Congresso
Nacional. Neste quadro, vislumbramos que esta
centralidade no Poder Executivo o torna o poder
mais ágil e competente para agir em crises que
necessitem de acelerada superação. (SCHIMITT,
2006.)
Nos diálogos institucionais entres os Poderes
Executivo e Legislativo, o que tem tomado grande
espaço no debate público são as Medidas
Provisórias. Ao tentar se debruçar sobre esta
questão, são levantadas com frequência apenas
duas hipóteses para o uso quantitativo de Medidas
Provisórias: o abuso por parte do Executivo; ou a
deliberada complacência dentro do Poder
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Legislativo. No entanto, parece antes de tudo que
se trata de uma acomodação da própria vida
constitucional visando ao equilíbrio histórico
brasileiro baseado no Poder Executivo.
(VERMEULE, 2011.)
Enquanto o diálogo travado com o Judiciário,
devemos analisar que o Presidente da República é
o responsável por indicar Ministros à Suprema
Corte e, neste sentido, já exerce influência sobre a
formação do mais poderoso órgão judiciário do
país. Entretanto pode-se perceber em casos
emblemáticos a influência Executiva no órgão
jurisdicional, como no caso do Instituto Chico
Mendes10
cujos autos marcam definitivamente este
ponto essencial de estabilidade que o Executivo
tem representado no arranjo institucional
brasileiro.
O Poder Executivo, tal como se configurou depois
da Constituição de 1988, apresenta uma
proeminência notável quando o confrontamos com
o Legislativo e o Executivo. Entretanto, temos que
considerar a marca do Poder Moderador, como raiz
história desta Supremacia Executiva.
Pode-se, portanto, perceber que o Poder
Moderador, como instituto e valor constitucional
reverberante, do Brasil Império marcou de maneira
influente nossa história institucional. Permitindo
não só uma Supremacia Executiva como uma
atuação atinada quando cotejada com os outros
poderes. Vê-se na Constituição Cidadã que há certa
acomodação estrutural do poderio alargado durante
o século XX pelo Executivo, como reflexo do
Poder Moderador.
1 Este artigo foi elaborado no âmbito do Laboratório de
Estudos Teóricos e Analíticos sobre o Comportamento
das Instituições (LETACI) vinculado à Faculdade
Nacional de Direito (FND) e ao Programa de Pós-
Graduação em Direito (PPGD) da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), com financiamento do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) pela concorrência do Edital
Universal de 14/2013 (Processo 483289/2013-2); da
Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa
do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) pela
concorrência do Edital APQ1 - Auxílio à Pesquisa
Básica 2013/1 (Processo E-26/111.351/2013) e do
Edital 41 de 2013 - Apoio a Grupos Emergentes de
Pesquisa no Estado do Rio de Janeiro (Processo E-
26/110.095/2014),. Página oficial do LETACI:
http://letaci.com/site
5 O Poder Moderador que se analisa está delimitado no
exposto pela Constituição do Brasil de 1824, sendo o
quarto poder detentor da força coativa frente aos demais
poderes. BRASIL. Constituição (1824). Constituição
Política do Império do Brazil.
6 O idealizador do conceito de Poder Moderador foi o
pensador francês de origem suíça Henri-Benjamin
Constant de Rebeque (1767–1830). Conforme a sua
concepção, o poder real em uma Monarquia
Constitucionalista desempenha uma função natural, que
seria a de um mediador neutro, sendo capaz de resolver
conflitos entre os três poderes instituídos e também
entre as facções políticas. Os únicos países a aplicarem
a teoria de Benjamin Constant foram o Brasil, entre
1824 e 1889, e Portugal, entre 1826 e 1910.
7 Isto pode ser confrontado na Constituição Política do
Império do Brasil de 1824, artigo 98, ipsis litteris: “o
Poder Moderador é a chave de toda a organização
Politica, e é delegado privativamente ao Imperador,
como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro
Representante, para que incessantemente vele sobre a
manutenção da Independência, equilíbrio, e harmonia
dos mais Poderes Políticos.”
8 O conceito formulado por Laurence Tribe ajuda a
compreender como a vivência dos valores
constitucionais contribui para o entendimento e até
interpretação do texto constitucional. Aplicando ao que
se estuda neste artigo, pode-se contemplar que a forte
vivência do Poder Moderador nos legou um valor, uma
confiança exacerbada do Poder Executivo que permitiu
por parte de uma dominação. Apesar de não mais
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presente no texto este valor de “Moderação Executiva”
molda e constrói aplicação que se dar a Constituição de
1988. Cf. TRIBE, Laurence H. The Invisible
Constitution. New York: Oxford University, 2010.
9 Podemos aqui ter como uma referência Carl Schmitt,
uma vez que ele foi um dos autores mais contundentes
ao tratar do Poder do Soberano. Isto fica muito bem
exposto na frase pela qual principia uma de suas mais
importantes obras Teologia Política: “Soberano é o que
decide sobre a exceção.” Atualmente, vive-se um série
de dificuldades nas quais podemos enxergar pequenos
estados de exceção. Esta ideia de Carl Schmitt contribui
substancialmente para entendermos o Poder Executivo
hoje e suas atribuições. Cf. SCHMITT, Carl. Teologia
Política. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2006.
10 O caso do Instituto Chico Mendes é emblemático
para o direito constitucional brasileiro porque se trata de
uma revisão na decisão do Supremo Tribunal Federal
em menos de 24 horas. A Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI 4029) foi proposta pela
Associação de servidores do IBAMA alegando vícios
formais e materiais na feitura da lei 11.516/07 que criara
o Instituto Chico Mendes, a partir da Medida Provisória
nº 366/07. Apesar de serem descartados os vícios
materiais, o erro formal levou ao STF julgar como
inconstitucional a lei em 7 de março de 2012 com
efeitos ex tunc.
BOBIO, Noberto. Liberalismo e Democracia. São
Paulo: Brasiliense, 2000.
CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.;
SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L. (Coords.)
Comentários à Constituição do Brasil. São
Paulo: Saraiva/Almedina, 2013.
HAMBLOCH, Ernest. Sua Majestade o
Presidente do Brasil: Um estudo do Brasil
Constitucional (1889-1934). Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1981.
LAZARI, Igor; BOLONHA, Carlos. A
Conveniente Supremacia do Poder Executivo
vis-à-vis a Coordenação Constitucional de
Poderes. Livros do XXII Anais do Congresso
Nacional do CONPEDI/UNINOVE. 1ed.
Florianópolis: FUNJAB, 2013, v. 1, p. 220-237.
POSNER, Eric A.; VERMEULE, Adrian. The
Executive Unbound: After The Madisonian
Republic. New York: Oxford University Press,
2010.
SCHMITT, Carl. Teologia Política. Belo
Horizonte: Ed. Del Rey, 2006.
VERMEULE, Adrian. The Atrophy of
Constitutional Powers (January 6, 2011). Harvard
Public Law Working Paper No. 11-07.
TRIBE, Laurence H. The Invisible
Constitution. New York: Oxford University,
2010.
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O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NAS ENTIDADES PARAESTATAIS
ADMINISTRATIVE DISCIPLINARY PROCESS IN PARASTATALS
Jahson Costa de Oliveira, Marianne Rios de Souza Martins
RESUMO As entidades paraestatais contribuem para o desenvolvimento, dada sua participação na formação de pessoas para a indústria, comércio e serviços. Sendo assim questiona-se: Quais aspectos devem ser observados pelo SEBRAE ao adotar um procedimento específico desvinculado das Leis 8.429/92 e 8.112/90 para processo administrativo disciplinar? O trabalho se baseia em pesquisa exploratória em busca da resposta. Analisar-se-á o conceito, natureza jurídica e princípios e a possibilidade jurídica de um procedimento próprio para o processo administrativo disciplinar. É também baseado na aplicação de questionário nas entidades do Sistema SEBRAE, com o intuito de verificar como se dá o procedimento.
ABSTRACT The parastatals contribute to the progress, given their participation in training people for industry, commerce and services. Thus, the question is: Which aspects should be observed by SEBRAE when adopting a specific procedure unlinked of Laws 8429/92 and 8112/90 for administrative disciplinary process? The paper is based on exploratory research in order to find the answer. It examines the concept, legal nature and principles and the juridical chance of a proper procedure for the administrative disciplinary process. It is also based on a questionnaire in SEBRAE System entities, in order to verify how the procedure takes place.
Palavras-chave Processo Administrativo. Entidade Paraestatal. Procedimento específico. Keywords: Administrative Process. Paraestatal. Specific Procedure.
____________________________________________________________________________________ Advogado formado pelo Curso de Direito da Faculdade Estácio de Vila Velha. Empregado do SEBRAE/ES no cargo de Assistente e nomeado para a função de Pregoeiro na Comissão Permanente de Licitação desde abril de 2007. Professora Universitária, advogada, Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais Constitucionais pela Faculdade de Direito de Vitória-ES (FDV). Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso da Faculdade Estácio de Vila Velha.
O tema da presente pesquisa é o processo
administrativo disciplinar nas entidades
paraestatais. Tal instrumento utilizado pela
Administração Pública com vistas à investigação
de desvios de conduta praticados por seus
servidores, positivado no ordenamento jurídico
pela Lei 8.112/90, que dispõe sobre o regime
jurídico dos servidores públicos civis da União, das
autarquias e das fundações públicas federais.
A pesquisa buscará responder a seguinte
problemática: Quais aspectos devem ser
observados pelo SEBRAE ao adotar um
procedimento específico desvinculado das Leis
8.429/92 e 8.112/90 para processo administrativo
disciplinar?
Para o desenvolvimento deste trabalho, utilizar-se-
á da pesquisa exploratória, na busca dos
fundamentos para embasá-lo. Com vistas ao
embasamento do tema proposto, foi realizada
pesquisa bibliográfica e documental, de cunho
exploratório, além da aplicação de questionário nas
entidades do SEBRAE, com o objetivo de obter
dos empregados responsáveis pelas Assessorias
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Jurídicas e Auditorias Internas a opinião a respeito
do estudo.
Quanto à natureza jurídica destes entes, veja-se o
dizer doutrinário a respeito. Tratar-se-á sempre no
âmbito das entidades paraestatais, pois a doutrina
não especifica o SEBRAE singularmente,
abarcando-o no gênero paraestatal, da qual
podemos dizer o SEBRAE é espécie.
Marçal Justen Filho conceitua essas entidades
como pessoa jurídica de direito privado criada por
lei para, atuando sem submissão à Administração
Pública, promover o atendimento de necessidades
assistenciais e educacionais de certas atividades ou
categorias profissionais, que arcam com sua
manutenção mediante contribuições compulsórias.
(2011, p. 291)
Com relação aos princípios que norteiam as
atividades das paraestatais, dentre elas o SEBRAE,
recorre-se mais uma vez aos escritos doutrinários
visando elucidar o tema.
Por serem pessoas jurídicas de direito
privado, as pessoas de cooperação
governamental sujeitam-se basicamente às
regras de direito privado. Todavia, o elo de
vinculação que as deixa atreladas ao Poder
Público resulta na emanação de normas de
direito público, sobretudo no que toca à
utilização dos recursos, à prestação de contas
e aos fins institucionais.
Praticam atos de direito privado, mas se
algum ato for produzido em decorrência do
exercício de função delegada estará ele
equiparado aos atos administrativos e, por
conseguinte, sujeito a controle pelas vias
especiais, como a do mandado de segurança.
(CARVALHO FILHO, 2012, p. 531)
Ficam obrigadas a atender aos mesmos princípios
que regem a administração, conforme destacado na
Carta Constitucional, em seu art. 37 (legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência)
Não podem, portanto, afastar-se de tais princípios
constitucionais em suas atividades, sob o risco de
incorrerem em ato contrário a um dos postulados, o
que pode ensejar penalidade face algum prejuízo
que possa vir a ser causado à Administração.
Relativo aos agentes sujeitos à observância do
Processo Administrativo Disciplinar, a lei que o
regulamenta é a 8.429/92. Por este diploma
incluem-se na esfera de alcance do processo todos
os servidores públicos, vinculados ou não à
administração.
Resta claro que os empregados das entidades
integrantes das paraestatais, inclusive o SEBRAE,
que é o objeto do estudo em questão, encontram-se
abarcados pela disciplina do diploma que regula os
atos de improbidade administrativa afeitos aos
servidores públicos, equiparados que são a estes
nos casos de desvios de conduta.
Também o Código Penal trata do funcionário
público para efeitos de aplicação de pena por crime
contra a administração pública, em seu art. 327.
Assim, tem-se a imputação de pena e
aplicabilidade aos empregados das entidades
paraestatais na mesma medida dos servidores
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públicos, uma vez que constam previstos no
ordenamento ora apresentado.
Ingressam, então, estes agentes na regra da Lei
8.429/1992, sendo também destinatários do
Processo Administrativo Disciplinar.
Existe diferença marcante nos Estatutos dos
empregados das pessoas jurídicas privadas e dos
entes públicos, materializadas na legislação
correlata, a saber, Consolidação das Leis do
Trabalho e Lei 8.112/1990.
Em leitura ampla, crê-se estarem inseridos na
regulamentação da CLT, por abarcados no
conceito de empregado, os servidores da
Administração Pública. No entanto, a norma
especial não nos deixa tomar tal interpretação.
A Lei 8.112/1990 normatiza a matéria relativa às
relações entre os servidores e a Administração,
desde o provimento, passando pelas promoções e
regime disciplinar, até a aposentadoria. Os
destinatários desta norma constam bem
referenciados, conforme segue:
Art. 1º. Esta lei institui o regime jurídico dos
servidores públicos civis da União, das
autarquias, inclusive as em regime especial, e
das fundações públicas federais.(BRASIL,
1990)
Portanto, excluem-se do raio de ação da CLT os
servidores públicos da União, e também os
servidores dos estados e municípios, pela aplicação
de suas legislações próprias face o princípio da
simetria.
O ápice da questão, depois de explanadas as
normas, é o regimento no qual se enquadram os
empregados das entidades paraestatais.
Marçal Justen Filho (2011, p. 291) apresenta as
seguintes características: - São pessoas jurídicas
de direito privado; - Não estão submissas à
Administração Pública (ou seja, são autônomas); -
Recursos oriundos de contribuições compulsórias.
Não se visualiza nenhuma referência ao regime dos
empregados. Mas não há necessidade. É bem claro
que são pessoas jurídicas de direito privado, e
como já se discorreu a respeito da Lei 8.112/1990 e
a quem ela se destina, por óbvio é que os demais
estão sujeitos à Consolidação das Leis
Trabalhistas, aí abarcados os empregados das
entidades paraestatais.
Com o intuito de entregar melhor base ao estudo,
foi aplicado questionário entre as Unidades
Jurídicas e de Auditoria dos SEBRAE’s nos
Estados da federação. O objetivo era a verificação
quanto à existência de procedimento específico
naquela unidade ou, caso negativo, como se
procede quando da necessidade de verificação de
falta cometida por empregado.
De início, questionou-se quanto à existência de
algum normativo a respeito do Processo
Administrativo Disciplinar na entidade. Das
respostas recebidas, percebe-se unanimidade
quanto à inexistência de procedimento específico.
No entanto, chama a atenção a resposta do Estado
do Rio Grande do Norte transcrita na sequência:
Não possuímos um procedimento
administrativo disciplinar por entendermos
que isso não se aplica ao Sistema “S”. Quanto
à sindicância, por sua vez, entendemos ser
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aplicável, mas não possuímos normativo.
(LIMA, 2013)
A colaboradora apresenta discordância quanto à
pertinência do tema ao SEBRAE, o que se pode
verificar pensamento distinto logo a seguir, quando
a pergunta trata da opinião a respeito de um
procedimento específico para o SEBRAE.
Argumentos interessantes vieram dos Estados do
Ceará e Rio Grande do Norte:
O lado positivo seria padronizar os processos.
O lado negativo é o de se igualar cada vez
mais ao serviço público, comprometendo a
eficiência organizacional com processos
burocráticos. (LEONARDO, 2013).
Acredito que isso fortalece o sistema.
(CORREIA, 2013).
Quando se pergunta a respeito de qual
procedimento é seguido, veja-se a resposta do
SEBRAE Amazonas:
Baseado unicamente no princípio do
contraditório e ampla defesa. Na prática o rito
é basicamente o mesmo da administração
pública: constitui comissão de sindicância;
solicita esclarecimentos; contata testemunhas;
faz acareação, se necessário; e encerra com
relatório contendo a opinião da Comissão
para o Superintendente validar ou não.
(LEONARDO, 2013).
A existência de um procedimento específico,
conforme já discorrido na presente pesquisa, sem
dúvida trará significativo ganho para as entidades,
uma vez que as comissões formadas terão
normativo que irá direcionar os trabalhos, evitando
fragilidades que comprometam as instituições,
principalmente no que diz respeito a passivos
trabalhistas por irregularidades nas relações destas
com seus empregados.
Concluiu-se pela possibilidade relativa de
procedimento desvinculado. Isto porque não há
inconstitucionalidade nas leis mencionadas, e o
fato de serem as entidades paraestatais instituídas
por lei e subvencionadas pela União por meio de
contribuições parafiscais, não há como dela
desgarrarem-se seus empregados. Diz-se
possibilidade relativa por não existir vício
constitucional em se estabelecer procedimento
próprio para tais entes, como já existe com os
Regulamentos de Licitações e Contratos, desde que
estes, ao simplificar, não inovem a ponto de
anularem a norma própria, com ritos que
extrapolem os limites de sua competência, que são
bem descritos por seus Estatutos e Regimentos
Internos.
Pode ser concluído que os aspectos a serem
observados pelo SEBRAE ao adotar um
procedimento específico desvinculado das Leis
8.429/92 e 8.112/90 para processo administrativo
disciplinar, são os a seguir elencados:
a) Formação das comissões por 03 (três)
empregados estáveis, não indicados;
b) Não obrigatoriedade de publicação da
composição das comissões;
c) Não obrigatoriedade da Sindicância, podendo
partir diretamente para o PADI;
d) Os prazos podem ser flexibilizados, com vistas
a tornar mais célere o procedimento, previstas
as prorrogações desde que razoáveis;
e) As penalizações podem, também, ser
flexibilizadas, face a natureza jurídica celetista
dos empregados.
Jahson Costa de Oliveira, Marianne Rios de Souza Martins
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 73
Esta proposta de norma própria decorre da
pesquisa, apontando como diploma subsidiário a
Lei 8.112/90, que tem capítulo destinado ao
Processo Administrativo Disciplinar. A proposta
traz os pontos principais a serem observados
quando da formação do Regulamento, com vistas a
diferenciar-se de maneira a não torná-lo sem efeito.
Portanto, depois de analisadas as possibilidades,
buscado na doutrina e na legislação pátria, têm-se
que o procedimento específico para as entidades
paraestatais no que diz respeito ao Processo
Administrativo Disciplinar é possível, e o dizemos
ser de maneira relativa em função das possíveis
lacunas, que demandarão a subsidiariedade às leis
especiais.
Perfeitamente é, pelo exposto, cabível a elaboração
de manual de processo administrativo disciplinar
para o SEBRAE, da mesma maneira que se dá com
o Regulamento de Licitações e Contratos,
tornando-o adequado à realidade dos empregados a
ele vinculado.
BRASIL. Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores
públicos civis da União, das autarquias e das
fundações públicas federais. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8112c
ons.htm. Acesso em: 10 mai. 2013.
BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
Código Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L
10406.htm>. Acesso em 17 mar. 2013.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de
Direito Administrativo. 12 ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito
Administrativo. 7 ed. Belo Horizonte: Fórum,
2011.
LEONARDO, Elizandra Litaiff. Gerente da
Assessoria Jurídica do SEBRAE - AM. Entrevista
concedida a Jahson Costa de Oliveira em 09 abr.
2013. Manaus, 2013.
LIMA, Ana Regina Feijão. Gerente Unidade
Auditoria Interna do SEBRAE - RN. Entrevista
concedida à Jahson Costa de Oliveira em 05 abr.
2013. Natal, 2013.
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 74
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 75
REPRESENTAÇÕES SOBRE FORMAÇÃO DE MEDIADORES JUDICIAIS EM NITERÓI
REPRESENTATIONS ON JUDICIAL MEDIATORS TRAINING IN NITERÓI
Gabriel Guarino SantaAnna Lima de Almeida
RESUMO Este artigo tem por objeto de reflexão a mediação judicial, sob um olhar específico do Direito, impactado pela Antropologia. Temos como objetivo analisar a formação de mediadores judiciais na Comarca de Niterói, especificamente quanto às representações que os mediadores possuem de sua própria formação e treinamento. Quanto ao método, nos apropriamos de ferramentas metodológicas da antropologia interpretativa para analisarmos as experiências de formação de mediadores, buscando elucidar quais suas representações, como agentes diretos na prática de mediação, acerca do próprio processo de formação. Como resultados e conclusões preliminares, tratando-se de uma pesquisa em andamento, temos que as representações trazidas pelos agentes do campo não se restringem à abordagem institucional do Judiciário, ligados à eficiência e celeridade, mas agregam outras concepções de mediação não restritas àquelas trabalhadas nos processos de formação. Contraditoriamente, ainda, as iniciativas de formação se centram num modelo ligado a formação jurídica e ao Poder Judiciário.
ABSTRACT This article aims at judicial mediation, by considering Law through an anthropological approach. Our objective is to analyze the training process of judicial mediators in the Court of Niteroi, specifically regarding the representations that the mediators themselves have about their training. In what concerns the research methods, we use methodological tools of the interpretative anthropology in order to understand how they see their own training process. As results and preliminary conclusions, since this is an ongoing research, we see that the representations that are brought up by the agents are not restricted to those of institutional speech from the Judiciary Branch, but they are related to others conceptions of mediation not restricted to those worked on its training process. Yet, the mediator’s training process is still related to judiciary culture and its practices.
Palavras-chave: mediação, mediação judicial, formação de mediadores, cultura judiciária, Poder Judiciário. Keywords:
mediation, judicial
mediation, mediator’s
training, judicial
culture, Judicial
Branch.
________________________________________________________________________ 1 - UFF – Rio de Janeiro – fduarte@jfrj.jus.br
Este artigo tem por objeto de reflexão a formação
do mediador judicial, sob um olhar específico do
Direito, impactado pela Antropologia.
A mediação de conflitos, considerada inicialmente
como “meio alternativo de resolução de conflitos”,
é definida como um método de auto composição
indireta, ou assistida, onde há um terceiro
imparcial intervindo no conflito (AZEVEDO,
2013). Trata-se de uma prática ainda recente dentro
do cenário de administração de conflitos no Brasil.
Como já explicado em outra ocasião (DUARTE;
ALMEIDA, 2014), tal política foi inaugurada com
a Resolução n. 125 de 29 de novembro de 2010 do
Conselho Nacional de Justiça. No campo jurídico,
seja por meio de livros de doutrina, seja por meio
de Projetos de Lei referentes à regulamentação da
mediação a mediação tem sido tratada como
“objeto de estudo” do Direito.
Gabriel Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 76
Entretanto, pouco há sobre as práticas de
mediação, isto é, sobre os aspectos procedimentais
de como se realiza uma sessão de mediação, que
consistem nas técnicas de negociação que
permitem tal “tratamento adequado de conflitos”.
A mais expressiva fonte disponibilizada no campo
é o “Manual de Mediação Judicial” (AZEVEDO,
2013) cujo enfoque, porém, é de manual: seu
intuito é prescrever o conjunto de técnicas a serem
utilizados, não sendo, por óbvio, uma descrição do
que se faz, mas um manual sobre o que se
deve(ria) fazer. Menos assim se tem disponível
sobre o modo de transmissão de tais técnicas, ou
seja, pouco sabe como se forma efetivamente um
mediador.
Ante o cenário exposto acima, esta pesquisai tem
como objetivo estudar como os mediadores
entendem e compreendem o seu próprio processo
de formação. Nesta perspectiva, o esforço se dirige
não só a entender como eles enxergam a
implantação desta política de mediação no Rio de
Janeiro (e em Niterói especificamente) e os erros e
acertos dos processos de capacitação e formação
vivenciados, mas especialmente busca
compreender quais as representações que eles
possuem sobre e que significados atribuem ao que
seja a formação do mediador de conflitos e
também a mediação de conflitos em si.
No que se refere à metodologia e à forma de
análise dos resultados, partimos de um olhar
inspirado na Antropologia comparativa,
pressupondo que as práticas, os discursos e
representações do mundo do direito mantêm uma
relação recíproca de influência com a sociedade
brasileira (GEERTZ, 1973; 1997).
As experiências que descrevemos resultam: a) de
pesquisa na modalidade observação participante
que incluiu a frequência de um dos pesquisadores
em Curso de Formação de Mediadores do TJRJ,
realizado em julho de 2012 na Comarca de Niterói,
e no primeiro Curso Básico de Mediação da Escola
Nacional de Mediação e Conciliação, realizado de
Agosto a Dezembro de 2013, por meio da
plataforma de Educação à Distância (CEAD) da
Universidade de Brasília; b) por meio de
entrevistas com os mediadores, com o objetivo de
ouvi-los diretamente acerca do próprio processo de
formação.
Quanto às representações e percepções dos
mediadores acerca de sua própria formação, o
interesse específico se dirige aos mediadores
atuantes na Comarca de Niterói. Os mediadores
entrevistados totalizam 14 mediadores, dentre os
que atuaram no período de 2012 até o presente
momento. Importante frisar que, estando a
pesquisa ainda em andamento, até a presente data,
foi entrevistada parte deste grupo. Todas as
pessoas ouvidas realizaram sua formação básica
em cursos do TJRJ, e alguns realizaram
posteriormente o curso da ENAM. Destacamos a
propósito que não temos o objetivo de formar uma
mostra quantitativamente relevante, mas sim que a
análise qualitativa, devidamente contextualizada,
que possa contribuir e fomentar reflexões críticas
ao campo da mediação de conflitos.
Gabriel Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 77
A implantação da mediação no Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro se inicia em 2009,
quando foram realizados os primeiros cursos de
formação de mediadores. Para tanto, foram
firmadas parcerias com o Conselho Nacional de
Justiça e a Secretaria de Reforma do Judiciário.
Destas parcerias foram realizados os primeiros
cursos de formação de mediadores junto aos
Tribunais de Justiça Estaduais (BUZZI, 2011, p.
53), incluindo-se aí o Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro.
Este primeiro momento de formação, onde foram
formados os mediadores hoje mais experientes
atuando no Tribunal, ocorreu num contexto muito
incipiente da implantação da política de mediação:
não havia ainda sido instalados os Centros de
Mediação nas Comarcas do Estado. Estes
primeiros cursos foram oferecidos para
magistrados, servidores e eventuais acadêmicos e
advogados. O modelo foi o mesmo que seria
reproduzido posteriormente pelos cursos do
próprio Tribunal de Justiça do Rio, como o
descrito em outra ocasião (ALMEIDA, 2012) e
incluía um Curso de 40h/a, eminentemente teórico,
onde eram apresentados os pressupostos, a teoria
da mediação, e algumas práticas simuladas. Estas
horas teóricas, no modelo adotado pelo TJRJ, eram
oferecidos em modulo intensivo, em geral em dez
aulas, cada uma com quatro horas de duração, ao
longo de uma ou duas semanas.
Em 2013, com o primeiro curso de formação de
mediadores da ENAM, órgão do Ministério da
Justiça, houve, em tese, um rompimento com o
antigo modelo do curso de formação de
mediadores, predominantemente teórico, para um
modelo de formação baseado em prática. Ter-se-ia,
assim, um “modelo baseado em competências”
(AZEVEDO, 2012). O curso da ENAM foi
realizado na modalidade de ensino a distância e no
período de quatro meses (Agosto a Dezembro de
2013, no caso observado). Consistia em leituras
semanais, vinculadas a um fórum de discussão on-
line, atividades de questionário, e prática simulada.
O curso, em termos de carga horária, somava 100
h/a.
Marcar esses dos dois momentos de formação é
relevante porque serão referenciados pelos
mediadores em suas falas, especialmente, por se
tratarem de cursos oferecidos de maneira distinta.
Um presencial, de 40h, em dias consecutivos num
intervalo de duas semanas; outro a distância, de
100h, em quatro meses. Os dois, no entanto, com a
mesma premissa: ser um curso de formação de
mediadores judiciais. A percepção daqueles que
realizaram os dois momentos é que a vinculação
estrita ao manual, vivenciada no Curso da ENAM,
permitiu um consolidar teórico das técnicas e uma
segurança em aplicá-las que aquele primeiro
momento, no TJRJ, não permitiu.
Para que o procedimento seja satisfatório, pensam
os entrevistados, o mediador deve ser capaz de
executar algumas técnicas e possuir algumas
habilidades que, em tese, deveriam ser adquiridas
em sua formação, sob o risco de ineficiência do
procedimento – quando não violação ética dos
deveres de imparcialidade, neutralidades e outros
aplicáveis.
Gabriel Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 78
É recorrente na fala deste grupo o “encantamento”
pela mediação: sendo esta compreendida não como
um mero procedimento, mas aberta a outra lógica
de abordagem de conflitos e, também, de postura
frente à vida, à sociedade e às relações humanas.
Noções, pois, que são expressas na recorrente
expressão de que “quando conheci a mediação,
fiquei encantada”. Esse encantamento também se
percebe na busca de outras fontes de leitura que
apresentam diversas abordagens de mediação. Do
público ouvido, nenhum dos entrevistados se ateve
somente às bibliografias indicados pelo Tribunal.
Houve o contato com elementos teóricos de outras
obras sobre o assunto tais como o livro “A
Comunicação Não Violenta” (ROSEMBERG,
2006), por exemplo.
Ocorre que, da maneira que os mediadores
referenciam seus momentos de formação, torna-se
claro que o momento de formação inicial, pelo
TJRJ (que em tese os capacitaria) não foi
satisfatório pois não possibilitou um aprendizado
efetivo de técnicas, funcionando como uma
apresentação inicial, intensiva, porém ainda assim
“fascinante”. Deste modo, o que ocorreu é que o
aprendizado teórico e a atuação prática se deram de
forma desarticulada ainda que concomitantemente,
pois “se aprendeu fazendo”. Os motivos para tal
demandam maior investigação, mas pode-se
afirmar que a ausência de mediadores mais
experientes no Tribunal (afinal, eram as primeiras
turmas) impactou nessa formação, reforçando a
lógica de se passar do teórico direto para a prática
real. Este cenário/abordagem, ainda hoje, persiste:
o numero baixo de mediadores faz com que aquela
ideia de estágio supervisionado ainda hoje não
tenha sido implantada. Os mediadores que
capacitaram em 2012 foram “direto a mesa”
mediar, sem que houvesse um período de
observação e supervisão anterior.
Os entrevistados veem, também, a mediação como
uma oportunidade de tratar as pessoas que chegam
ao Judiciário de maneira mais humana. Pois, para
eles, na prática, não é o advogado o protagonista,
mas os próprios sujeitos em conflito. Isto contrasta
com a expectativa institucional de gestão do
Tribunal que associa os meios alternativos com
eficiência, celeridade e diminuição do número de
processos.
Assim, os entrevistados entendem o processo de
formação de medidores insuficiente, se focado
apenas nas iniciativas institucionais do Tribunal, já
que a mediação na prática é muito mais complexa.
Tem que a mediação possui abordagens diversas e
amplas, por outras matrizes teóricas, que podem se
somar àquela praticada no Judiciário. Entendem
que a formação do mediador deve ser continuada,
sem ponto necessariamente final e que a atividade
de supervisão, orientada e constante, é hoje a
principal deficiência do modelo. Reconhecem que
o Curso da ENAM permitiu uma vinculação sólida
às técnicas do Tribunal, o que no primeiro
momento de formação não havia sido possível.
Admitem ainda que a lacuna entre a consolidação
teórica e a prática prévia pode levar à reprodução
dos papeis consolidados de suas outras carreiras
prévias (como advogados, assistentes sociais,
psicólogos, por exemplo) na prática de mediação, e
não de mediadores propriamente ditos.
Gabriel Almeida
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 79
Como resultados e conclusões preliminares, temos
que as representações trazidas pelos agentes do
campo não se restringem à abordagem institucional
dada pelo Judiciário ao tema, ligada à eficiência e
celeridade, mas agregam outras concepções de
mediação não restritas àquelas trabalhadas nos
processos de formação. Contraditoriamente, ainda,
as iniciativas de formação se centram num modelo
ligado a formação jurídica e ao Poder Judiciário.
Tal contradição sugere a ausência de consenso
sobre o que fazem os mediadores e o que o
Tribunal deles espera.
AZEVEDO, André Goma. Políticas públicas para
formação de mediadores judiciais: uma análise do
modelo baseado em competências. In: Meritum,
v. 7, n. 2 Belo Horizonte, jul./dez. 2012. pp. 104-
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2013
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GEERTZ, Clifford. The Interpretation of
Cultures. London: Hutchinson&Co. 1973.
_______________. O Saber Local: novos ensaios
em antropologia interpretativa - Petrópolis:
Editora Vozes. 1997
ROSEMBERG, M. B., Comunicação Não -
Violenta - Técnicas para Aprimorar
Relacionamentos Pessoais e Profissionais. São
Paulo: Agora, 2006.
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-122, out./ dez. 2014 - 80
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 81
RESTO-INGESTA EM UMA UNIDADE DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO (UAN) LOCALIZADA NA CIDADE DE ANTÔNIO CARLOS/SC
Gabriela Rodrigues Varela de Aquino, Renata Zimmermann, Isaura Hammerschmitt Clemente, Patrícia Acioly
RESUMO As Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) são locais que devem oferecer refeições nutricionalmente saudáveis aos seus comensais. Nestes locais é necessário um maior controle sobre desperdício a fim de reduzir o percentual de resto-ingesta e até mesmo custos, o que gera em beneficio mútuo tanto para a unidade quanto para o comensal que pode usufruir de uma alimentação com maior qualidade. O objetivo deste estudo foi avaliar o índice de resto-ingesta em uma UAN localizada no município de Antônio Carlos/SC. Este estudo foi realizado durante seis dias, onde foram pesadas todas as preparações prontas do almoço antes de serem servidas e as que ficaram no buffet e pastrought foram pesadas após a finalização do almoço, bem como a pesagem do que ficou nos pratos e bandejas dos comensais. Os resultados depois de tabulados foram aplicados em fórmulas especificas onde chegou-se em resultados como o índice de resto-ingesta, quantidade consumida, consumo per capta e número de pessoas que poderiam ser alimentadas com os restos. Sabendo que o Brasil é um dos países que mais desperdiça alimentos no mundo, se faz necessário um maior controle do índice de resto-ingesta nas UAN’s a fim de beneficiar a unidade e os comensais.
ABSTRACT Units of Food and Nutrition (HFS) are places that should offer nutritionally healthy meals to its diners. In these places you need greater control over waste in order to reduce the percentage of intake and rest-even costs, which generates mutual benefit for both the unit and for dinner they can enjoy a higher quality food. The aim of this study was to evaluate the rate of rest-intake in a UAN in the municipality of Antônio Carlos / SC. This study was conducted over six days, which were heavy already prepared lunch before being served and those that were the buffet and pastrought were weighed after completion of lunch, and the weighing of what was in the dishes and trays of diners . The results were then tabulated applied in specific formulas which arrived on the results as the ratio of rest-intake, amount consumed, consumption per capita and the number of people who could be fed with the remains. Knowing that Brazil is a country that wastes more food in the world, it is necessary to better control the rate of rest-UAN's intake in order to benefit the unit and diners.
Palavras-chave: Unidade de Alimentação e Nutrição. Resto-ingesta. Consumo. Desperdício. Sobras. Keywords: Food and Nutrition Unit. Resto-intake. Consumption. Waste. Leftovers
____________________________________________________________________________
Os estabelecimentos responsáveis pela produção e
distribuição de alimentação coletiva são
denominados Unidades de Alimentação e Nutrição
(UAN’s) (GOMES; JORGE, 2012), onde as
refeições devem ser equilibradas nutricionalmente,
devendo atender o perfil dos comensais, acatando
as práticas higiênico-sanitárias vigentes a
legislação (SILVA; SILVA PIOLI; PESSINA,
2010).
De acordo com a lei n. 12.305/2010 que estabelece
a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o gerador
responsável por resíduos deve tomar medidas
corretas para o gerenciamento e descarte do
mesmo, onde o controle do desperdício é o maior
desafio da administração, gerando impacto técnico,
financeiro e ambiental. (CHAMBERLEM;
KINASZ; CAMPOS, 2012).
Gabriela Aquino, Renata Zimmermann, Isaura Clemente, Patrícia Acioly
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 82
O Brasil é o país que mais desperdiça
mundialmente. Segundo dados da Organização
das Nações Unidas, de toda produção do nosso
país 30% é destinado para o lixo (SANTOS et al.,
2007). Tendo em vista que o decreto lei n. 2.848,
de 1940, impede que restaurantes deem as sobras
de comida para quem precisa, responsabilizando os
estabelecimentos no caso de uma pessoa passar
mal com o alimento doado, ou seja, toda
alimentação desperdiçada obrigatoriamente precisa
ser descartada (AUGUSTINI et al., 2008).
Desperdício são todas as sobras alimentares, tanto
as quantidades produzidas e não distribuídas
(sobras), como aquelas servidas e não ingeridas
(restos) (CASTRO et al., 2003; GOMES; JORGE,
2012). O aumento no índice de restos alimentares
está correlacionado diretamente com o
planejamento errôneo do número de refeições
produzidas, falta de dados sobre a frequência dos
comensais no estabelecimento, deficiência no
treinamento dos manipuladores quanto à produção
e ao porcionamento, falta de conhecimento dos
hábitos alimentares dos comensais e deficiência na
habilidade dos manipuladores na preparação dos
pratos (AMORIM, 2010; RICARTE et al., 2008).
O controle de resto-ingesta pode ser feito pelos
índices de conversão, pelo uso das receitas
padronizadas, com fatores de correção e sempre
tendo o número de refeições que serão servidas
(AUGUSTINI et al., 2008), ou seja, adequado em
quantidades, necessidades, porcionamento e
aceitabilidade do cardápio. (BRADACZ, 2003).
Para Veloso, Santana e Oliveira (2007) um recurso
para a satisfação do comensal e diminuição das
sobras e restos é a aplicação de um questionário de
satisfação para analisar os serviços oferecidos.
Sabe-se que um percentual de resto-ingestão
superior a 10% para a população sadia, indica que
os cardápios estão mal elaborados/ planejados e
executados (MATTIELO, 2008). Para Vaz (2006),
a porcentagem das sobras numa UAN deve ser de
3%, sendo considerando como aceitável o valor
entre 7 e 25 gramas de resto por pessoa.
Diante do exposto, e somando o fato de que o
Brasil é o país que mais desperdiça alimentos
mundialmente, o objetivo deste estudo foi avaliar o
índice de resto-ingesta em uma UAN localizada no
município de Antônio Carlos/SC, visando
identificar os fatores que interferem no desperdício
bem como o controle dos mesmos para que haja a
redução do desperdício.
Esta pesquisa trata-se de um estudo de caso,
realizada em uma UAN localizada no município de
Antônio Carlos/SC. A pesquisa ocorreu durante
seis dias nos meses de abril e maio. As aferições
das pesagens foram realizadas no período
matutino, somente no almoço, totalizando nos seis
dias 1123 comensais.
Foi realizada a pesagem de todas as preparações
prontas, das sobras de todo alimento presente nas
panelas, cubas e do passthrou (sobras limpas) e
dos restos que é caracterizado por todo alimento
que o comensal deixou no prato e bandeja (sobras
sujas). Para a realização da coleta de dados foram
utilizadas duas balanças da seguinte maneira: para
as preparações prontas e as sobras suja e limpa foi
Gabriela Aquino, Renata Zimmermann, Isaura Clemente, Patrícia Acioly
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116, out./ dez. 2014 - 83
utilizada uma balança digital da marca
Micheletti®, com precisão mínima de 100g e
capacidade máxima de 15kg com margem de erro
de 5g, calibrada em julho/2012, já para os restos a
balança utilizada é de carrinho da marca
Caudura®, modelo 03, nº 51264, ano 1993, com
capacidade máxima de 300kg calibrada em
março/2013. Os colaboradores foram orientados
quanto ao uso de uma lixeira própria para o
descarte do resto, onde somente iria ser usado para
o trabalho nos dias em questão e no horário de
almoço, não foi permitido o descarte de mais nada
que não fosse às sobras das bandejas e pratos dos
comensais e por fim a alimentação do buffet que
foi utilizada.
Segundo Mattielo (2008), as fórmulas utilizadas
para quantificar resto-ingestão são as seguintes:
Para obtenção do peso da refeição distribuída foi
feito a pesagem da(s) cuba(s) de cada preparação,
depois de pronta(s), sendo descontado o valor dos
respectivos recipientes. Já para a pesagem das
sobras e dos restos, foram colocados em sacos
plásticos de lixo, sendo que o peso do mesmo foi
descontado. Os valores obtidos foram somados
resultando no total de alimentos distribuídos.
Desse total ocorreu a subtração do peso das sobras
e dos restos encontradas após a distribuição das
refeições.
Quantidade consumida = total produzido –
(sobra + resto)
Para determinar o percentual de resto-ingesta foi
pego o peso total do resto, dividido pela
quantidade consumida e multiplicado por 100.
Índice de resto-ingestão em (%) = (Peso do resto
/ quantidade consumida) x 100
O consumo per capta foi determinado pela
quantidade consumida dividida pelo número de
refeição.
Consumo per capta = quantidade consumida/
número de refeições
E para sabermos quantas pessoas poderiam ser
alimentadas com a quantidade de comida que foi
jogada fora, utilizou-se o peso do resto dividido
pelo consumo per capta.
Pessoas alimentadas = Peso do Resto / per capta
Após o cálculo das variáveis acima citadas, pôde-
se fazer uma avaliação do desperdício na Unidade
de Alimentação e Nutrição estudada.
Para melhor compreensão, os resultados foram
apresentados em tabela e gráficos
O período de coleta na Unidade de Alimentação e
Nutrição ocorreu nos dias 15, 19 e 22 de abril e 3,
6 e 13 de maio, no horário do almoço, período em
que foram oferecidas 1123 refeições. O cardápio
era composto por basicamente arroz, feijão, sopa e
ovo frito, dois tipos de carne, um acompanhamento
quente e quatro tipos de saladas.
Na tabela 1, estão apresentados os valores de
sobras ou restos de alimentos. Nota-se que os
restos 25,97%, totalizaram 30,98kg que divididos
pela média per capta poderiam alimentar
aproximadamente 52 pessoas nestes seis dias de
almoço pesquisados. Colaborando com esse dado
Akatu (2004) nos enfatiza que o Brasil é um dos
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campeões mundiais de desperdício, e que
aproximadamente uma família desperdiça por ano
1 bilhão de dólares, o equivalente para alimentar
500 mil famílias. Colaborando ainda com esses
dados Velloso (2002) relata que o desperdício de
alimentos é de 39 mil toneladas/dia, quantidade
esta suficiente para alimentar 19 milhões de
brasileiros com três refeições ao dia.
Com base nestes dados, estima-se que em um ano
o desperdício de alimentos equivaleria a mais de 1
tonelada de lixo, especificamente 1884,61 Kg,
quantidade de alimento suficiente para alimentar o
equivalente a 2991 pessoas neste período.
Tabela 1: Valores de sobras/restos acompanhados
DATA QUANTIDADE
CONSUMIDA
ÍNDICE DE
RESTO-
INGESTA (%)
CONSUMO
PER CAPTA
N° PESSOAS
ALIMENTADAS
COM AS SOBRAS
15/04 119,997 kg 3,17% 621,74g 6,12 pessoas
19/04 126,195 kg 3,16% 685,84g 5,83 pessoas
22/04 119,922 kg 2,86% 627,86g 5,47 pessoas
03/05 131,286 kg 4,1% 694,63g 7,75 pessoas
06/05 127,757 kg 4,71% 658,54g 9,15 pessoas
13/05 104,360 kg 7,97% 492,26g 16,9 pessoas
TOTAL PESQUISA 729,517 kg 25,97% 51,22 pessoas
MÉDIA 121,58 Kg 4,32% 630g 8,5 pessoas
Fonte: Dados primários
De acordo com Amorim (2010), os valores
aceitáveis de sobras são de até 3% (7 a 25g por
pessoa), com intervalos de classificação: ótimo (0 a
3%); bom (3,1 a 7,5%) e inaceitável (acima de
10%). Assim, a UAN estudada se classificaria no
índice resto-ingesta como bom (média de 4,32%).
Apenas em um dia obteve-se o máximo
rendimento com índice resto-ingesta ótimo
(2,86%). Tais dados podem nos remeter as
informações de que as mesmas refeições possam
estar sendo preparadas com muita frequência, a
apresentação e aparência dos alimentos não estão
de acordo com os hábitos dos comensais, a
utilização de utensílios inadequados para servir
como o uso de escumadeiras no lugar de uma
colher, a concha grande ao invés de uma média ou
pequena, o fato de o comensal não precisar pagar a
comida pelo peso do prato, a falta da
conscientização dos mesmos sendo apropriado o
uso de campanhas que facilitem o entendimento da
clientela quanto à importância do não desperdício,
ou até mesmo pode estar ocorrendo uma falha no
planejamento quanto ao número de refeições e
falta de ficha técnica.
O total de resto diário onde a média foi de 5,163
Kg, sendo o menor desperdício encontrado no dia
22/04 com 3,438 Kg e o maior desperdício em
13/05 com 8,320 Kg. Pode ser visualizado os
dados percentuais na Tabela 1.
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De todas as preparações realizadas nos seis dias de
coleta. Pode-se observar que a cenoura não é uma
preparação muito bem aceita, pois sua média do
per capita foi de 21 gramas, assim sendo Nunes
(2008) nos traz como 50g per capita da cenoura,
sua sobra no buffet foi de 4,8 Kg, aparecendo no
cardápio três dos seis dias contabilizados.
O peixe frito e o purê de abóbora aparecem no
cardápio apenas uma vez durante o período
estudado, e mesmo assim as sobras contabilizam
1,320Kg e 3,870Kg respectivamente, levando em
consideração que o consumo per capita do peixe
foi de 26 gramas, e o do purê de abóbora 78
gramas. Sendo que o consumo per capita do peixe
é de 70g, conforme afirma Nunes (2008), pode-se
deduzir que a preferência foi pela carne ensopada
ou ovo servido no mesmo dia.
As preparações quentes que não apresentaram
nenhuma sobra foram o arroz integral, o frango ao
molho e a couve refogada. Já se referindo das
saladas, as que não contabilizaram sobras sujas
foram a acelga e a rúcula com tomate. Todas essas
preparações foram realizadas apenas um dia dos
seis estudados.
Percebe-se a importância do monitoramento do
índice de resto-ingesta nas UANs para que o
nutricionista responsável dimensione/acompanhe o
desperdício, refletindo em uma melhora na
qualidade da alimentação, bem como uma redução
dos custos. O uso da ficha técnica se torna uma
verdadeira aliada no combate ao desperdício, uma
vez que padroniza todas as preparações,
enfatizando também a importância da realização de
treinamento com os funcionários, implementação
de medidas educacionais referentes ao consumo
consciente com os comensais e conhecimento
referente aos hábitos alimentares dos mesmos.
Diante do exposto e somando o fato de que o
Brasil é um dos países que mais desperdiça comida
mundialmente, é de extrema importância que haja
um melhor planejamento em Unidades de
Alimentação e Nutrição, a fim de reduzir o
desperdício.
Notou-se que na UAN estudada o índice de resto-
ingesta teve muita variação. Os registros presentes
neste trabalho podem servir como subsídio para a
implantação de medidas corretivas a fim de reduzir
o desperdício como, a revisão do cardápio para
verificar se está de acordo com as preferências dos
comensais, orientação aos funcionários e
implementação de informações sobre o consumo
alimentar consciente para que haja uma diminuição
na taxa de resto-ingesta.
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CÉLULAS TRONCO E TERAPIAS REGENERATIVAS
STEM CELLS AND THERAPY REGENERATIVE
Husten da Silva Carvalho, Luciana Borges Oliveira de Souza,
Flávia Cristina Oliveira da Luz, Eveliney Vicente de Alencar Xavier, João Paulo Bello dos Santos, Elisabeth Maximiano, Adriana Mattos
RESUMO Há mais de uma década inúmeros grupos de pesquisa têm se dedicado ao estudo das células tronco e de seus potenciais usos no estabelecimento de terapias celulares. Apesar das controvérsias éticas, os riscos de formação de tumores e de rejeição imunológica, os meios de comunicação tendem a exacerbar a expectativa de eficácia terapêutica em pacientes cujas terapias convencionais não funcionam. Isto somado à existência de regras flexíveis para o uso de células tronco em países como a China, Índia e Alemanha, tem provocado a proliferação de instituições que oferecem terapias celulares, mesmo que não tenham sido testadas suficientemente quanto a seus riscos e eficácia. Com base nos últimos avanços científicos sobre a biologia das células tronco, propomos uma revisão que introduza esse assunto através de uma discussão sobre sua definição, origem e classificação, bem como suas aplicações atuais na medicina regenerativa.
ABSTRACT For over a decade several research groups have been dedicated to the study of stem cells biology and the establishment of possible novel therapeutic uses for these cells. Besides ethical issues, risk of tumor development and immunologic rejections, media have the tendency to exaggerate therapeutic efficacy in patients which conventional treatments have failed. In addition to that, flexible regulations about stem cells uses in several countries, such as Chine, India and Germany, could be blamed for the growth of institutions offering cellular therapies even though these strategies have not yet been tested for safety and efficacy of the methods. Based on the last advances about stem cells biology, we propose a review to discuss definitions, origin and classification as well as current applications of these cells in regenerative medicine.
Palavras-Chaves: Células tronco; Terapia regenerativa; Ensaios clínicos; Ética; Medicina regenerativa.
Keywords: Stem cell; Regenerative Therapies; Clinical trials; Ethics; Regenerative medicine.
_____________________________________________________________ 1- Primeiro Autor - Professor adjunto-UNESA 2- Aluna de Iniciação Científica UNESA 3- Aluna de Iniciação Científica UNESA 4- Aluna de Iniciação Científica UNESA 5- Aluno de Iniciação Científica UNESA 6- Professora Colaboradora UNESA 7- Professora Colaboradora UFRJ
A terapia celular é um conjunto de alternativas
terapêuticas que visa a utilização de células
indiferenciadas, com capacidade de auto
renovação, na recuperação de tecidos com danos
(Daley, 2010). Há mais de uma década vários
grupos de pesquisa vêm se dedicando à descoberta
do potencial de células tronco e ao estabelecimento
de terapias celulares. No entanto, os diversos
meios de comunicação têm atribuído poderes
terapêuticos exagerados às células tronco que,
associados à regras flexíveis para o uso de tais
células em alguns países, como a China, a Índia e a
Alemanha, além da falta de esperança por parte de
pacientes, tem estimulado a proliferação de
instituições que oferecem terapias celulares à
pacientes, mesmo que não tenham sido testadas
suficientemente quanto a seus riscos e eficácia
Husten Carvalho, Luciana Souza, Flávia Luz, Eveliney Xavier, João Santos, Elisabeth Maximiano, Adriana Mattos
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 88
(DALEY, 2012). Por outro lado, quando
devidamente utilizadas, suas contribuições na
medicina moderna tem sido de grande importância,
tanto por sua ampla utilização na pesquisa básica,
quanto pelo desenvolvimento de novas opções
terapêuticas na prática clínica (DALEY, 2010).
Suas características as tornam capazes de ser
empregadas em vários campos dentro das ciências
biológicas e médicas (CHIEN, 2008). Tendo como
base os últimos avanços sobre a biologia das
células tronco, propomos uma revisão que
introduza esse assunto através de uma discussão
sobre a aplicação mais atual dos diferentes tipos de
células-tronco na medicina regenerativa.
Procuraremos estabelecer um quadro sobre as
diferentes terapias sendo aplicadas em modelos
experimentais e ensaios clínicos para as doenças
consideradas de alta prevalência e/ou com
limitadas alternativas de tratamento. Para tanto
utilizamos a base de dados da área de saúde para
obtenção de artigos, tais como: MEDLINE,
LILACS e Scielo, DeCS (Descritores em Ciências
da Saúde), Portal CAPES e Portal de Revistas
Científicas da BVS.
Células tronco embrionárias
Há muitos relatos sobre o potencial de
diferenciação das células tronco embrionárias
humanas (CTEH), mas apesar de muito progresso e
conhecimento acumulados, seu uso clínico ainda
está em estágio inicial (LI et al., 2010). Este atraso
aconteceu em grande parte por preocupações
éticas, religiosas ou jurídicas, e também pela
publicação de estudos que associaram seu uso ao
aparecimento de teratomas (MORENO, 2010).
Diferenciação de progenitores neurais da linhagem
ectodérmica a partir de CTEH foi relatada em
estudo que mostrou eficácia na reparação tecidual
em casos de acidente vascular cerebral (DAADI et
al., 2008) e de lesão da medula espinal (SHARP et
al., 2010). Estudo com modelos de lesão da medula
espinhal in vivo mostrou que CTEH diferenciam-se
em oligodendrócitos, causando reconstrução das
bainhas de mielina (HU et al., 2009). Neurônios
dopaminérgicos foram gerados a partir do
tratamento com CTEH, em modelo animal
(FRILING et al., 2009) e em modelo ex vivo
(BISSONNETTE et al., 2011), mostrando forte
potencial terapêutico. A terapia com CTEH, em
modelo animal também tem sido bem sucedida na
geração de novos neurônios motores da medula
espinal, cujo funcionamento precário causa a
esclerose lateral amiotrófica (LI et al., 2007). O
primeiro ensaio clínico usando CTEH aprovado
pela Food and Drug Administration (FDA), nos
EUA, foi para o tratamento de pacientes com lesão
medular. Neste estudo, células progenitoras de
oligodendrócitos geradas a partir de CTEH e
diferenciadas estão sendo usadas para promover o
crescimento de nervos e reparar as bainhas de
mielina (STRAUSS, 2010). Outra aplicação de
CTEH sobre o sistema nervoso é o tratamento de
distrofia macular de Stargardt. Idelson e
colaboradores, em 2010, demonstraram que CTEH
diferenciam-se em células do epitélio pigmentado
da retina e podem substituir células danificadas no
paciente, recuperando a visão (IDELSON et al.,
2009). Ensaios clínicos para doenças cardíacas
envolvendo uso de CTEH, ainda não foram
iniciados, no entanto, cardiomiócitos derivados de
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CTEH podem ser utilizados em modelos in vitro
para testes de drogas ou na indústria farmacêutica
(DICK et al., 2010). Para diabetes tipos I e II, a
substituição de células β seria a melhor solução, no
entanto a escassez de dadores é muito grande.
Infelizmente, semelhante ao que acontece com
hepatócitos, a diferenciação de células-β a partir de
CTEH é difícil e ineficiente (NOGUCHI et al.,
2010). CTEH podem diferenciar-se em
progenitores com marcadores de células tronco
mesenquimais (CTM) que, por sua vez, são
capazes de diferenciar para osteogênese,
adipogênese e condrogênese (OLIVIER et al.,
2006). Condrócitos foram gerados de CTEH,
podendo ser utilizados na reparação de lesão da
cartilagem, assim como adipócitos, para ser
empregados em investigações sobre o metabolismo
lipídico e obesidade (HANNAN &
WOLVETANG, 2009). Além disto, verificou-se
que CTM derivadas de CTEH tem fortes efeitos
imunomoduladores (YEN et al., 2009).
Células tronco embrionárias induzidas
As CTEI são consideradas ferramentas úteis para o
desenvolvimento de drogas e modelos de doenças,
no entanto, vetores retrovirais usados para
introduzir elementos de reprogramação gênica,
como o oncogene c-Myc, limita o uso em estudo
clínico, uma vez que podem induzir ao câncer
(EBBEN et al., 2011).
Células tronco adultas
Células tronco adultas são facilmente obtidas e
permite o transplante autólogo, evitando
complicações relacionadas à rejeição imunológica.
Outra vantagem é a redução dos riscos de
formação neoplásica. Embora tenham potencial de
diferenciação mais limitado, um estudo in vitro
demonstrou que são capazes de se diferenciar em
tipos celulares independentes de sua origem
germinativa (MOODLEY et al., 2010). Vários
estudos relataram que o transplante de células
tronco adultas causa reparação de órgãos
danificados in vivo, como a reparação do tecido
ósseo e revascularização do tecido isquêmico
cardíaco (MENASCHE et al., 2008;
CHIMUTENGWENDE-GORDON & KHAN,
2012). Sabe-se que a capacidade de renovação e
reparação em tecidos ou órgãos é extremamente
dependente de células tronco residentes que geram
células específicas (PASSIER & MUMMERY,
2003). O estado de repouso ou senescência não é
bem compreendido, mas é fundamental para
manter uma população de células que não exerçam
qualquer outra função, senão a de gerar tecidos
específicos durante regeneração (SNIPPERT &
CLEVERS, 2011).
Células tronco hematopoiéticas
Transplantes de células tronco hematopoiéticas
(CTHs) são indicados em doenças hematológicas
malignas e não malignas. A maioria dos
transplantes realizados é autólogo, em diferentes
tipos de câncer, sendo o mieloma múltiplo a
indicação mais comum. No entanto, o
desenvolvimento de procedimentos igualmente
eficientes e menos tóxicos, estão diminuindo a
utilização deste tipo de transplante. Ultimamente
as CTHs vêm sendo utilizadas no tratamento de
tumores, quando induzidas a diferenciar em células
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natural killer (NK) e em células dendríticas que
atacam células tumorais (LJUNGMAN et al.,
2009). No entanto, como a geração destas células
exige manipulação genética, seu uso terapêutico
continua a ser investigado. Resultados promissores
de ensaios pré-clínicos já foram descritos para
várias doenças, tais como diabetes mellitus
(TRIVEDI et al., 2008), cirrose (PAI et al., 2008),
doença de Crohn (CASSINOTTI et al., 2008)[61]
e distúrbios do sistema nervoso (BURT et al.,
2009).
Células tronco mesenquimal
Devine e colaboradores, em 2003, sugeriram que
CTM de primatas podem ser direcionadas para
vários órgãos não-hematopoiéticos e proliferar no
interior de tecidos (DEVINE et al., 2003). Com
este trabalho, tornou-se possível considerar que
uma distribuição sistêmica de CTM seria uma
interessante estratégia para tratamentos. Após
divulgação de numerosos relatórios que mostraram
efeitos benéficos de terapias com uso de CTM, em
modelos experimentais de autoimunidade e lesão
aguda (VAN et al., 2008; MORIGE et al., 2010;
JUREWICZ et al., 2010), ensaios clínicos com
base nessas mesmas células foram iniciados. Um
estudo clínico envolvendo 15 pacientes afetados
por esclerose múltipla e 19 pacientes com
esclerose amiotrófica lateral, tratados com infusão
de CTM, demonstrou aumento na proporção de
células T regulatórias CD4+ CD25+ em sangue
periférico (KARUSSIS et al., 2010) e o
procedimento mostrou-se seguro. Pacientes com 10
dias após o infarto agudo do miocárdio receberam
CTM por infusão intravenosa e experimentaram
melhora (HARE et al., 2009). No entanto,
pacientes tratados com estas mesmas células por
via intracoronária, após infarto agudo do
miocárdio, não apresentaram melhora (MEYER et
al., 2006). Kharaziha e colaboradores, em 2009,
divulgaram dados obtidos de ensaios clínicos em
fase I-II, onde oito pacientes em estágio final de
cirrose no fígado após tratamento com injeção de
CTM, demonstraram melhora nas condições
clínicas (KHARAZIHA et al., 2009). Em 2007,
Mohamadnejad e colaboradores obtiveram
resultados semelhantes e ainda demonstraram que
as CTM são melhores que CTH no tratamento de
cirrose hepática (MOHAMADNEJAD et al.,
2007). Ensaios clínicos também demonstraram que
CTM autólogas, derivadas de tecido adiposo,
foram capazes de tratar fístula perianal de origem
criptoglandular ou associada a doença de Crohn
(GARCÍA-OLMO et al., 2005). Ensaio clínico
com uso combinado de CTE e CTM também
promoveu produção de insulina (TRIVEDI et al.,
2008). Recentemente, pacientes afetados por lúpus
eritematoso sistêmico refratário, tratados com
CTM, demonstraram melhora (BERNARDO &
FIBBE, 2012).
Células progenitoras endoteliais
Células progenitoras endoteliais (CPE) derivadas
de humanos têm sido isoladas de populações
CD34+/lin- ou CD34 +/VEGFR2+ e, ao serem
administradas em camundongos, diferenciam-se
em células endoteliais que expressam o marcador
endotelial PCAM (Platelet endothelial cell
adhesion molecule) ou o fator de Von Willebrand
(RAFII & LYDEN, 2003). A habilidade das CPE
Husten Carvalho, Luciana Souza, Flávia Luz, Eveliney Xavier, João Santos, Elisabeth Maximiano, Adriana Mattos
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em promover revascularização de tecidos lesados
ou isquêmicos tem sido adotada em ensaios com
humanos para tratamento da isquemia (SEEGER et
al., 2005).
A fração de células mononucleares de medula
óssea
Ainda não está claro qual a fração celular, CTH ou
CTM, que apresenta maior plasticidade (HOWS,
2005). Por esta razão, autores propuseram que a
utilização de um conjunto de células que possam
dar suporte à proliferação e à manutenção das
células tronco, como a fração de células
mononucleares (FCM) da medula óssea, é melhor
do que o uso de um único tipo celular (VILAS-
BOAS et al., 2004). Estudos em seres humanos
indicaram a possibilidade de regeneração de
cardiomiócitos (ASSMUS et al, 2010;
MIETTINEN et al., 2010). Estudo envolvendo
meta análises, em pacientes com doença
coronariana que receberam injeção
intracoronariana de FCM, também apresentaram
melhora (HENNING, 2012). Em um estudo
semelhante, com administração de FCM por via
intracoronária, não se observou grande benefício
(TRAVERSE et al., 2011). Em 2012, uma revisão
com incorporação de mais 20 estudos clínicos,
sugeriu que a terapia com FCM, pode melhorar
moderadamente a função do coração a longo prazo,
no entanto, os dados ainda eram insuficientes para
chegar a conclusões mais seguras (CLIFFORD et
al., 2011). Atualmente, a European Society of
Cardiology for Stem Cells and Cardiac Repair,
recebeu financiamento do European Union
Seventh Framework Programme for Research and
Innovation (EU FP7-BAMI) para realização de um
estudo em larga escala que, utilizando os
procedimentos de tratamento padronizados, tentará
determinar se a terapia com FCM é realmente
eficaz no tratamento de enfarte do miocárdio
(CLIFFORD et al., 2011). Quanto à doença arterial
periférica, um estudo de revisão, no qual apenas 2
dos 37 artigos publicados preencheram os critérios
de inclusão, concluiu que os efeitos de injeções
intramusculares de FCM em pacientes com
isquemia de membros inferiores, é capaz de
favorecer o Índice Tornozelo-Braquial e diminuir o
número de amputações (MOAZZAMI et al., 2011).
Subsequentemente, um estudo que associa a
aplicação de injeções subcutâneas do fator
estimulador de colónias de granulócitos (G-CSF),
antes da injeção com FCM intramuscular,
conseguiu resultados com melhora e menor
proporção de amputações (RANDALL, 2012).
Cobellis e colaboradores, em 2008, demonstraram
melhora do fluxo sanguíneo e aumento da
densidade de capilares à longo prazo (12 meses)
após duas infusões de células autólogas da medula
óssea em artéria femural de pacientes com doença
arterial periférica grave (PAD) e isquemia de
membros (COBELLIS et al., 2008). Apesar dos
avanços, estratégias terapêuticas atuais para doença
arterial periférica, permanecem muito limitadas.
Um estudo com 118 pacientes portadores de
diabetes tipo II, submetidos à implantação autóloga
da FCM, no próprio pâncreas, através de um
cateter, demonstrou segurança e eficácia (HU et
al., 2012). Pesquisas em modelo animal relataram
que a infusão de FCM, no fígado, amenizou a
fibrose através da expressão da metaloproteinase-9
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Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 92
(MMP-9), melhorando as funções do fígado e
aumentando a taxa de sobrevivência de pacientes
com doença hepática (TAKAMI et al., 2012).
Com base nestes resultados, foi iniciado um ensaio
clínico com infusão de células autólogas de medula
óssea em pacientes cirróticos e que demonstrou
segurança do procedimento e eficácia (TERAI et
al., 2006). Por outro lado, o transplante autólogo da
FCM na artéria hepática de 58 pacientes com
doença hepática alcoólica, todos com cirrose, não
resultou em melhoria da função hepática (SPAHR
et al., 2013). Estudos clínicos emergentes
relacionados ao tratamento de lesão no cérebro e
na medula espinal têm estimulado inúmeros grupos
de pesquisa. Um estudo clínico incluindo 60
pacientes com hemorragia intracerebral
demonstrou que o implante autólogo da FCM
reduz o comprometimento neurológico e melhora a
atividade neurológica da vida diária dos pacientes
(RAHEJA et al., 2012). Um estudo clínico de
comparação entre as formas de administração da
FCM intra-arterial ou intravenosa, em pacientes
com lesão na medula espinhal na fase subaguda e
na fase crônica, demonstrou que todos os pacientes
na fase subaguda, tratados por via intra-arterial,
apresentaram melhora parcial, e um em cada
quatro pacientes subagudos, tiveram melhora após
administração via intravenosa. Melhora também
foi encontrada em um paciente crônico que
recebeu células por via intra-arterial (SYKOVÁ et
al., 2006). Outro estudo, em modelo animal,
demonstrou que tratamento com FCM é capaz de
favorecer a regeneração nervosa periférica,
dependendo da quantidade de células
administradas (RAHEJA et al., 2012). Quanto à
neuropatia diabética, estudo recente demonstrou
que FCM exerce efeitos terapêuticos, favorecendo
neovascularização e neuroproteção (Kim et al.,
2012). Foi demonstrado, em modelo animal, que
tratamento com FCM promoveu a regeneração
óssea e neovascularização em coelhos (ZHANG et
al., 2009) [96]. Li e colaboradores, em 2012,
demonstraram que pacientes portadores de
osteoporose idiopática, após tratamento com FCM
passaram a apresentar aumento significativo nos
níveis do fator IGF-1, o que favoreceu ganho de
densidade mineral óssea (Li et al., 2012)[97].
Estudos envolvendo a aplicação de células-tronco
em modelos biológicos têm sido capazes de
elucidar os efeitos de agentes farmacológicos;
contribuído para o esclarecerecimento de
mecanismos patofisiológicos específicos e
permitido melhor compreensão sobre os processos
envolvidos na formação e plasticidade de órgãos.
No entanto, o potencial mais importante destas
células é o de ser capaz de substituir tecidos com
lesão. Nos últimos anos, um grande número de
resultados tem sido publicado a partir de
protocolos de pesquisa, estudos pré-clinicos e
seleção clínica, no entanto, as terapias ainda
apresentam riscos e obstáculos a serem vencidos.
Novos estudos com variáveis controladas e
padronizadas são necessários para que a eficiência
e a capacidade de regeneração de tecidos sejam
constatadas. Estudos têm demonstrado que o
tratamento com células-tronco adultas,
principalmente aquelas da FCM da medula óssea,
Husten Carvalho, Luciana Souza, Flávia Luz, Eveliney Xavier, João Santos, Elisabeth Maximiano, Adriana Mattos
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 93
apresenta grande vantagem e um modo geral, seja
pela obtenção mais fácil de células, seja pelos
resultados na regeneração de tecidos em diferentes
órgãos. Embora falhas em estudos clínicos e em
práticas terapêuticas tenham sido identificadas,
pesquisas com a FCM continuam em andamento e
os resultados sobre os efeitos de novas terapias
com FCM têm nos dado grande otimismo quanto à
segurança e eficácia.
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n. 2, p. 451–456, fev. 2009.
ZHANG, G.; SHENG, H.; HE, Y. X.; XIE, X. H.;
WANG, Y. X.; LEE, K. M.; YEUNG, K. W.; LI,
Z. R.; HE, W.; GRIFFITH, J. F.; LEUNG, K. S.;
QIN, L. Continuous occurrence of both insufficient
neovascularization and elevated vascular
permeability in rabbit proximal femur during
inadequate repair of steroid-associated
osteonecrotic lesions. Arthritis Rheum. v. 60, n.
10, p. 2966-2977, out. 2009.
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-122, out./ dez. 2014 - 98
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ENFERMAGEM NA ATI UNESA PETRÓPOLIS
NURSING IN ATI UNESA PETRÓPOLIS
Gisele Luzia Marques Correa Mota, Érica Vinhaes Weber Dávila,
Christianne Reis de Souza Lara, Ana Claudia Moreira Monteiro
RESUMO A Universidade Estácio de Sá - campus Petrópolis desenvolveu um projeto multidisciplinar: Academia da Terceira Idade com intuito de desenvolver ações de pesquisa, ensino e extensão voltados para o atendimento das necessidades da população idosa. A pesquisa surgiu para atender as demandas de cuidados de enfermagem através de atividades educativas desenvolvidas pelos acadêmicos do curso de Graduação em Enfermagem. O objetivo foi traçar o perfil dos idosos atendidos no projeto para que possa ser oferecida uma assistência de enfermagem de qualidade baseada nas necessidades dos integrantes do grupo. Método: Pesquisa de campo com, entrevistas individuais semi estruturadas com perguntas abertas e fechadas, para avaliar aspectos importantes na vida do idoso. Resultados: foi estudada uma população e 15 idosos, e avaliado diversos itens que estão descritos na pesquisa. Conclusão: A educação em saúde para os idosos proporciona alternativas que atendem suas condições biopsicossociais, promovendo a saúde e prevenindo doenças e incapacidades que acometem a terceira idade.
ABSTRACT The Estácio de Sá University - campus Petrópolis developed a multidisciplinary project: senior Academy in order to develop actions of research, teaching and extension geared to meet the needs of the elderly population. The research appeared to meet the demands of nursing care through educational activities developed by scholars of the undergraduate program in nursing. Goals: profile of the elderly in the project so that we can offer a quality nursing care based on the needs of the members of the group. Method: field research with individual semi structured interviews with open and closed questions, to evaluate important aspects in the life of the elderly. Results: we studied a population 15 and older, and evaluate various items that are described in the research. Conclusion: health education for the elderly, provides alternatives that meet your biopsicosociais conditions, promoting health and preventing diseases and disabilities that affect seniors.
Palavras-Chave: idoso, enfermagem, educação em saúde, enfermagem geriátrica, Politica de saúde. Keywords: elderly, nursing, health education, geriatric nursing, health policy.
_____________________________________________________________________________________ 1- Acadêmica de Enfermagem do 4º período - graduação em Enfermagem da Universidade Estácio de Sá - Campus
Petrópolis - RJ
2- Acadêmica de Enfermagem do 5º período - graduação em Enfermagem da Universidade Estácio de Sá campus
Petrópolis - RJ
3 - Enfermeira Mestre em Educação pela Universidade Católica de Petrópolis (UCP), Docente da Universidade Estácio
de Sá campus Petrópolis e Coordenadora do curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Estácio de Sá -
Campus Petrópolis – RJ. E-mail: christiannelara@bol.com.br
4- Enfermeira Mestre em Enfermagem pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Docente da
Universidade Estácio de Sá campus Petrópolis e Coordenadora de Estágio do curso de Graduação em Enfermagem do
campus Petrópolis – RJ. E-mail: ana-burguesa@hotmail.com
INTRODUÇÃO
O momento demográfico por que passa a
população brasileira se caracteriza por baixas
taxas de fecundidade, aumento da
Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 100
longevidade e urbanização acelerada. A
interação dessas transformações tem levado
a um crescimento significativo da população
idosa com relação aos demais grupos etários.
Segundo as projeções estatísticas da
Organização Mundial da Saúde (OMS), o
período de 1975 a 2025 será a era do
envelhecimento. A população de idosos no
país crescerá 16 vezes – colocando o Brasil
como a sexta população de idosos, ou seja,
mais de 32 milhões de pessoas com 60 anos
ou mais. Paralela a essa transição
demográfica ocorreu uma importante
transformação do perfil das doenças na
população, no qual as patologias do
envelhecimento, que costumam ser crônicas
e múltiplas, ganharam maior expressão no
conjunto das sociedades.
O Brasil envelhece de forma rápida e
intensa. No Censo de 2000, contava com
mais de 14,5 milhões de idosos (IBGE,
2002), em sua maioria com baixo nível
socioeconômico e educacional e com uma
alta prevalência de doenças crônicas e
causadoras de limitações funcionais e de
incapacidades.¹. No Rio de Janeiro, a
população maior de 60 anos corresponde a
12,27% do total. Em Petrópolis, a proporção
de idosos é de 13,44% da população geral,
sendo a expectativa de vida no município de
70.06 anos (IBGE, 2000).
A sociedade brasileira – diante da
constatação nos dados estatísticos e
observação da presença cada vez mais
constante dos idosos na comunidade –
começa a exigir o posicionamento dos
governantes por meio de leis que amparem
esta etapa do ciclo evolutivo, que é a velhice.
Discute-se o envelhecimento digno, fala-se
em inclusão social, exige-se o preparo de
profissionais das áreas do conhecimento
(saúde, educação, assistência social, etc.)
para atender as necessidades dessa nova
clientela. No que se refere ao trabalho de
suas habilidades, há a exigência de uma
equipe multiprofissional e interdisciplinar
para atender de forma integral ao idoso.
Diante desta perspectiva a Universidade
Estácio de Sá campus Petrópolis desenvolveu
um projeto multidisciplinar: a Academia da
Terceira Idade com intuito de desenvolver
ações de pesquisa, ensino e extensão voltados
para o atendimento das necessidades da
população idosa do município de Petrópolis.
Com o envelhecimento, podem surgir
inúmeras causas de fragilidade ou risco para os
indivíduos, das quais se destacam a presença
de múltiplas patologias, algumas vezes
situação econômica precária, ingestão de
muitos medicamentos, perdas de autonomia e
independência e dificuldade de adaptação do
idoso às exigências do mundo moderno que
em conjunto levam o idoso ao isolamento
Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 101
social. Assim, podemos dizer que existem
perfis diferenciados de envelhecimento: a)
processo de perdas e abandonos do físico ao
intelectual; b) processo de libertação da
responsabilidade com filhos e emprego – este
marcado pela aposentadoria.
A ideia de realizar a pesquisa surgiu a partir
da constatação de verificar a saúde dos idosos
que participam do projeto Academia da
Terceira Idade, com intuito de atender as
necessidades de cuidados de enfermagem já
diagnosticado através de trabalhos
desenvolvidos pelos graduandos do curso de
Graduação Enfermagem da Universidade
Estácio de Sá - campus Petrópolis. O corpo
docente e discente resolveu traçar um perfil
dos idosos para que posteriormente possam
desenvolver intervenções de enfermagem
através da consulta de enfermagem e educação
em saúde tendo como meta a promoção da
saúde e melhoria da qualidade de vida.
A meta do enfermeiro educador é,
obviamente, promover a saúde. A educação e
a promoção da saúde fazem parte dessa
iniciativa. Ao mesmo tempo, o enfermeiro
como educador é um importante facilitador
de mudanças. O aprendizado como
intervenção deve ser considerado no
contexto de outras intervenções de
enfermagem que efetuarão mudanças. A
enfermeira educadora Susan Bastable ainda
ressalta que “no contexto do cuidado em
saúde, o aumento de enfermeiros que
ensinem e ajudem os outros a aprender é
contínuo”. Certamente, devido às mudanças
que ocorrem rapidamente no sistema de
saúde, influenciando as responsabilidades de
sua prática.
Definimos como Objetivos: Traçar o perfil
dos idosos atendidos no projeto Academia da
Terceira Idade UNESA – campus Petrópolis
para que posteriormente possamos oferecer
assistência de enfermagem de acordo com as
necessidades dos integrantes do grupo.
Descrição metodológica: Este estudo foi
realizado através de uma pesquisa de campo
com, a realização de entrevistas individuais
semiestruturadas com perguntas abertas e
fechadas aos idosos, para avaliar os aspectos:
autoestima, autonomia, hábitos saudáveis,
patologias crônicas e sequelas, vacinação do
idoso, sociabilidade, adesão a terapia
medicamentosa e acompanhamento médico.
Este projeto iniciou-se em 15 de Julho de
2012, através do corpo docente e discente do
curso de graduação em Educação Física A
população atendida no projeto são idosos do
município de Petrópolis a partir de 55 anos de
idade. A ideia de realizar a pesquisa surgiu
com a necessidade de verificar a saúde dos
idosos que participam do projeto Academia da
Terceira Idade, com intuito de atender as
Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 102
demandas de cuidados de enfermagem já
diagnosticados através de atividades
educativas desenvolvidas pelos acadêmicos do
curso de Graduação Enfermagem da
Universidade Estácio de Sá - campus
Petrópolis. Resolvemos traçar um perfil dos
idosos para que posteriormente possamos
desenvolver intervenções de enfermagem
através da consulta de enfermagem e educação
em saúde tendo como meta a promoção da
saúde e melhoria da qualidade de vida da
população assistida. A meta do enfermeiro
educador é promover a saúde. Ao mesmo
tempo, o enfermeiro como educador é um
importante facilitador de mudanças. O
aprendizado como intervenção deve ser
considerado no contexto de outras
intervenções de enfermagem que efetuarão
mudanças.
Foi realizado estudo descritivo, com
abordagem qualitativa. Para Marcus e Liehr
(2001, p. 123), “(...) a pesquisa qualitativa
combina as naturezas científica e artística da
enfermagem para aumentar a compreensão da
experiência de saúde humana. É um termo
genérico que abrange uma multiplicidade de
suportes filosóficos e métodos de pesquisa”.
Segundo Minayo (2004) a pesquisa qualitativa
se aplica aos estudos da história, das
representações, das relações, das crenças, das
opiniões, que os humanos fazem a respeito de
como vivem, constroem seus artefatos e a si
mesmos, sentem e pensam. Esse tipo de
metodologia permite desvelar processos
sociais ainda pouco conhecidos referentes a
grupos particulares, propicia a construção de
novas abordagens, revisão e criação de novos
conceitos durante a investigação. Caracteriza-
se também pela empiria e pela sistematização
progressiva de conhecimento até a
compreensão lógica interna do grupo ou do
processo em estudo. Pode ser utilizada para a
elaboração de novas hipóteses, construção de
indicadores qualitativos, variáveis e tipologias.
A pesquisa descritiva é caracterizada pela
necessidade de se explorar uma situação não
conhecida, da qual se tem necessidade de
maiores informações. Explorar uma realidade
significa identificar suas características, sua
mudança ou sua regularidade (LEOPARDI,
2001). Para Gil (2007), esse tipo de pesquisa
tem como objetivo principal a descrição das
características de determinada população ou
fenômeno. Vários estudos podem ser assim
classificados, e uma de suas características
mais relevantes é a utilização de técnicas
padronizadas de coleta de dados, tais como o
questionário e a observação sistemática.
Local do Estudo: Este estudo foi realizado no
campus da UNESA em Petrópolis, no
consultório de enfermagem durante a consulta
foi utilizado um instrumento de coleta de
dados durante a entrevista com os idosos,
participaram do estudo 15 idosos que faziam
Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 103
parte do projeto academia da terceira idade
(ATI)
A população atendida no projeto são Idosos do
município de Petrópolis, são idosos de ambos
os sexos a partir de 55 anos de idade. Em
levantamento inicial foram obtidas 300
inscrições em 07 dias de oferecimento de
projeto; Sendo 90% do gênero feminino, 10%
de gênero masculino. Inicialmente obtivemos a
constatação de elevado índice de hipertensos e
cardiopatas, (70%), de co-morbidades, (60%),
sedentarismo, (80%).
Em abril 2013 estudamos uma população de
15 idosos, sendo 87% do sexo feminino e
13% do sexo masculino. Dentre a faixa etária
de 55 à 60 temos 13% , de 60 à 65 anos temos
20% , 65 à 74 anos temos 33% e de 70 à 84
anos são 33% . Destes 80% são aposentados,
5% pensionistas e 15% não possuem
aposentadoria Em relação aos hábitos de vida:
93% não fumam, 7% fumam atualmente e
13% pararam de fumar há 5 anos. Fazem uso
de bebidas alcoólica 47%, destes 40%
frequentemente e 7% raramente. Em relação
atividade física 20% não praticam, pois são
iniciantes no grupo, 80% realizam atividade
física orientada duas vezes por semana. Todos
relataram boa convivência em família e 93%
com boa convivência social. Em relação a
saúde 73% são hipertensos, 20% diabéticos e
5% com doença neoplásica, 26% já
apresentam sequelas, destas 13% com AVC e
13% com problemas vasculares. Todos fazem
acompanhamento médico, 70% realizaram
consultas recentes, 5% há um ano, 20% há
mais de 1 ano e 5% há mais de 3 anos. Destes
80% aderem a terapia medicamentosa, 13%
não faz uso e 7% não precisa utilizar a
medicação diária. Quanto a habilitação para o
auto-cuidado: 93% conseguem realizar
hábitos de higiene sem auxílio, 87% realizam
atividades cotidianas do lar, 26% possuem
habilidades tecnológicas, 46% utilizam celular
e telefone , 93% usam transporte coletivo sem
precisar de ajuda, e somente 73% manuseiam a
própria renda. Em relação a necessidade de
sono e repouso 80% dormem em torno de 6 à 8
horas por dia e 20% possuem insônia, fazendo
uso de medicação. Quanto a imunização 93%
estão em dia com a vacina influenza e 47%
com esquema de vacina dupla adulto-DT
completo.
O idoso hierarquiza seus valores de forma que
atenda às suas necessidades, proporcionando a
ele o equilíbrio para viver com
responsabilidade e autonomia. A tarefa do
enfermeiro - educador é levar o idoso à
reflexão, à autoconsciência que possibilitam a
avaliação das próprias potencialidades e, pela
Gisele Mota, Érica Dávila, Christianne Lara, Ana Monteiro
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 104
ação da vontade, a instauração de novos
valores em si e no mundo. Percebe-se que a
educação do idosoo correu, aconteceu que o
mesmo foi educado, quando nele se caracteriza
a autonomia, como superação da dependência.
A enfermagem atua em educação e saúde para
os idosos, como uma meta para melhora da
qualidade de vida, observando sua capacidade
funcional e sua independência física e mental,
tanto na convivência familiar quanto
comunitária, proporcionando alternativas que
atendam suas condições biopsicossociais,
valorizando a promoção da saúde e a
prevenção de doenças e de incapacidades que
acometem a terceira idade. Contribuições /
implicações para a Enfermagem:
Evidenciou-se a necessidade da implantação
da consulta de enfermagem aos idosos que
fazem parte deste projeto, visando a promoção
da saúde e melhoria da qualidade de vida.
BASTABLE, S. B. O enfermeiro como
Educador: princípios de ensino-aprendizagem
para a prática de Enfermagem. Porto Alegre:
Artmed, 2010.
BRASIL. Ministério da Saúde, 2006. Política
Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, Portaria
nº 2.528 de 19/10/06. . Brasília, DF.
GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa.
4 ed. 10 reimpressão. São Paulo. Atlas, 2007.
IBGE. Censo Demográfico 2000 -
Resultados do universo. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br. Acesso em: 20
out. 2013.
LEOPARDI, M. T. et al. Metodologia da
Pesquisa na Saúde. Santa Maria: Palite, 2001.
MINAYO, M. C. de S. O desafio do
conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde.
8.ed. São Paulo: Hucitec, 2004.
MARCUS, M.; LIEHR, P.R. Abordagens de
Pesquisa Qualitativa. In: LOBIONDO -
WOOD, G.; HABER, J. Pesquisa em
Enfermagem. Métodos, Avaliação Crítica e
Utilização. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2001.
_____. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO /
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO.
PARECER Nº 11/2000 (que aprova as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação de Jovens e Adultos) aprovado em
10/05/2000.
UNATI – UNIVERSIDADE ABERTA DA
TERCEIRA IDADE. Cursos para terceira
idade. Disponível em: http://www.unati.uerj.br
Acesso em: 05/10/2013
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-122, out./ dez. 2014 - 105
A INFLUÊNCIA DO “ESQUEMATISMO” DA INDÚSTRIA CULTURAL NA INTERNET
Bárbara de Almeida Flores Getúlio Távora
RESUMO O objetivo deste artigo é investigar a influencia da Indústria Cultural na Internet. Partindo da hipótese de que a Internet é uma mídia que permite uma superação da Indústria Cultural por sua capacidade tecnológica de difusão, desenvolvimento e criação de produtos culturais e conhecimentos sem os estereótipos da cultura de massa. Contudo, a influência da Indústria Cultural se expressa na forma alienada com a qual seus usuários a utilizam. Para provar esta hipótese, utilizaremos o arcabouço teórico da teoria da Escola de Frankfurt e os estudos recentes sobre a consolidação e desenvolvimento da Internet, como os de Pierry Lévy e André Lemos, e realizamos uma pesquisa no site Socialbakers (http://www.socialbakers.com/
Facebook-statistics) como forma de comprovar a influencia da Indústria Cultural na forma com a qual os usuários utilizam a Internet.
ABSTRACT The aim of this paper is to investigate the influence of the culture industry on the Internet. Assuming that the Internet is a medium that allows overcoming the cultural industry for technology diffusion, development and creation of cultural products and knowledge without the mass culture stereotypes. However, the influence of the culture industry is expressed in the alienated form with which your users to use. To test this hypothesis, we will use the theoretical framework of the theory of the Frankfurt School and the recent studies on the consolidation and development of the Internet, such as Pierry Lévy and André Lemos, and conducted a survey in Socialbakers site (http: // www.
socialbakers.com/Facebook-statistics) as a way to prove the influence of the Cultural Industry in the way in which users use the Internet.
Palavras-chave: esquematismo; Indústria Cultural; redes sociais; Internet; Facebook; Twitter; Youtube. Keywords: esquematismo; Indústria Cultural; redes sociais; Internet; Facebook; Twitter; Youtube.
___________________________________________________________________________ 1. Formanda de graduação do Curso de Comunicação Social da Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte,
email:barbaraflores2007@gmail.com 2. Mestre e orientador do trabalho, professor do curso de Comunicação Social da Faculdade Estácio de Sá de
Belo Horizonte, email: getulio@live.estacio.br
A generalização da Internet se concretizou a partir
de meados dos anos de 1990, de forma que
podemos considerá-la um fenômeno recente na
história da comunicação social. Destarte, a Internet
passou a ser nos últimos 20 anos uma das
principais ferramentas de difusão de informação,
utilizada mundialmente por todos os setores de
nossa sociedade - políticos, econômicos e
culturais.
O desenvolvimento tecnológico das últimas
décadas possibilitou a evolução e a consolidação
da Internet como uma importante mídia, isto é,
uma ferramenta ou ainda um meio intermediário de
difusão, transmissão e comunicação de dados,
informações e mensagens, de forma global. A
potencialidade da Internet permite, por um lado, a
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 106
difusão livre de dados e informações, contudo, por
outro lado, e cada vez mais, crescem as formas de
controle e acompanhamento de sua utilização, por
meio de mecanismos políticos e jurídicos, que são
utilizados para limitar e controlar sua utilização,
como ficou expresso nos casos do Site Wikileaks e
a retirada do Site Megaupload da Web9.
Esclarecer os mecanismos que fazem com que os
usuários utilizem a Internet de forma banal e
aproveitando tão pouco seus potenciais técnicos é
um caminho para superar esses limites e
possibilitar aos usuários uma utilização melhor
desta mídia. Identificamos na maneira limitada de
utilização da Internet elementos similares aos
presentes na relação dos usuários com as demais
mídias de massa que são parte e produto da
Indústria Cultural. O que nos levou a questionar:
por que, diante de uma mídia com tantas
potencialidades, grande parte dos internautas
permanece seguindo a mesma forma com a qual se
relacionam com as demais mídias?
É fato que a Internet possibilita aos usuários uma
relação diferente da forma com a qual eles
consomem os produtos da Indústria Cultural, i.e,
não sendo somente receptores passivos de
informações e produções, mas tendo a
possibilidade de serem produtores ativos e
transmissores autônomos e autênticos de
informações e conhecimentos. Tentaremos mostrar
neste artigo que a utilização dos usuários da
Internet reproduz o esquematismo criado neles pela
9 Em janeiro 2012, o site Megaupload foi fechado pelo
governo Norte americano por terem considerado que o
mesmo violava os direitos autorais em suas
publicações.
Indústria Cultural, o que não permite que rompam
a alienação e desenvolvam uma utilização livre e
autônoma.
Para comprovar a hipótese apresentada,
buscaremos fundamentar de forma sucinta o
conceito adorniano de Indústria Cultural, de
cultura de massa e principalmente de
esquematismo apresentado no livro Dialético do
Esclarecimento (1985), como forma de esclarecer
a forma esquemática com a qual consumimos as
mercadorias da Indústria Cultural. Em seguida,
observaremos por meio da análise da utilização do
site Youtube e das redes sociais Facebook e
Twitter, a expressão da influência da Indústria
Cultural na utilização da Internet.
Com a larga utilização da Internet nos últimos 20
anos como uma ferramenta de comunicação,
difusão de informação, conhecimento, integração e
interação de indivíduos por todo o globo, e a
possibilidade da criação de um mundo paralelo,
com produções autônomas e a capacidade
interativa, em que o usuário elabora, teoricamente,
o conteúdo de sua navegação (LÉVY, 2003), a
Internet apresenta-se como uma ferramenta de
possibilidades técnicas ilimitadas, o que a tornou
um dos meios mais utilizados atualmente.
Lévy, possuidor de uma leitura otimista da
utilização das potencialidades da Internet, diz: “O
uso socialmente mais rico da informática
comunicacional consiste, sem dúvida, em fornecer
aos grupos humanos os meios de reunir suas forças
mentais para constituir coletivos inteligentes e dar
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 107
vida a uma democracia em tempo real” (LÉVY,
2003, p. 62).
Relacionado a esta potencialidade da Internet, de
construir uma nova sociedade, colocada por Lévy,
é o usuário que pode, em sua navegação, elaborar
seus caminhos de forma que não siga interesses
externos, distanciando-se dos conteúdos dos
monopólios. Também, pode o usuário criar novos
conteúdos e disponibilizá-los livremente para
outros, construindo uma rede interativa fora da
lógica mercadológica, de forma horizontal,
rizomática e não centralizada.
Todavia, o que se percebe empiricamente é que a
utilização pelos usuários dessa poderosa
ferramenta é muito aquém das possibilidades
ofertadas por ela. Boa parte dos usuários segue
uma conduta alienada, dirigida pelos temas da
televisão, ou mesmo pelas ferramentas mais
superficiais da Internet. Assim é a utilização de
portais de notícias dos monopólios de impressa
(G1 e R7) e a utilização das comunidades virtuais
como o Orkut e o Facebook, em que há a
subutilização de uma ferramenta de comunicação e
interação, tornando-a uma ferramenta egocêntrica
de exposição pessoal.
No livro a Dialética do Esclarecimento, a
alienação das massas é entendida como uma
imposição da Indústria Cultural, imposição esta
que é ao mesmo tempo finalidade e condição
necessária à perpetuação do poder dessa mesma
indústria e do poder das outras esferas dominantes
da sociedade de consumo (ADORNO;
HORKHEIMER, 1985). Deve-se entender por
alienação a atrofia da autonomia do pensamento
crítico das massas, portanto a destituição das
massas de sua capacidade de pensar por si só, o
que cria condições para a aceitação sem resistência
dos desígnios de interesse das classes dominantes.
Partindo desse pressuposto, Adorno e Horkheimer
indicam a criação, pela Indústria Cultural, de um
padrão de desejos predeterminados e tomados
como autênticos pela massa, constituindo um
mecanismo complexo, o qual chamam de
usurpação do esquematismo.
A Teoria Crítica10
demonstra o quanto os aspectos
alienantes presentes na Indústria Cultural, desde
sua criação aos dias atuais, alcançaram um elevado
patamar de alienação das massas, expresso no alto
grau de consumo de seus produtos de forma
acrítica, devido, entre outros fatores, ao
refinamento da sutileza de sua dominação
ideológica e o dilatado tempo de propagação
sistemática de seus artigos na sociedade, somados
a vertiginosos avanços das tecnologias da
comunicação, sem oposição esclarecida.
A consolidação da Indústria Cultural como um
aparato primordialmente relacionado à economia,
tem por função, além da lucratividade, a difusão da
ideologia da classe dominante, função esta que se
presta à manutenção pacífica das relações da
estrutura sócio-econômica. O que é realizado por
meio de seus produtos, ao que os filósofos
frankfurtianos chamam de cultura de massas. Estes
produtos possuem uma esquematização do
pensamento dos consumidores, que criam a
10
A teoria de Adorno e Horkheimer também é referida
por teoria crítica por alguns autores na literatura.
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 108
necessidade de seu próprio consumo, “a
esquematização do procedimento aparece nos
produtos mecanicamente diferenciados revelarem-
se, afinal de contas, como sempre iguais”
(ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 102).
O processo de criação e imposição de desejos às
massas é feito para que aparente ser o oposto do
que na verdade é: a Indústria Cultural dissimula a
satisfação da escolha popular, propagando a
imagem de que sua produção é guiada pelo desejo
das massas. A Indústria Cultural produz
“indivíduos psiquicamente debilitados”,
necessários à continuidade da estabilidade social e
econômica vigente, sempre ávidos pelo consumo
dos produtos que contribuem para sua própria
alienação.
Os indivíduos psiquicamente debilitados, segundo
Adorno e Horkheimer, são aqueles a que lhes falta
esclarecimento. Segundo Kant, em seu texto:
“resposta à pergunta: que é esclarecimento?”:
O esclarecimento é a saída do homem de sua
menoridade, da qual ele mesmo é culpado. A
maioridade é a capacidade de se fazer ele
mesmo o uso de seu entendimento sem
direção de outro individuo. O homem é o
próprio culpado de sua menoridade se a causa
dele não se encontra na falta de
entendimento, mas na falta de decisão e
coragem de servir-se de si mesmo sem a falta
de outrem. (KANT, 2005, p.63).
A falta do esclarecimento e a condição de pensar
por si mesmo faz com que alguns homens passem
a pensar de forma esquematizada pela Indústria
Cultural, que usa o “esclarecimento” como
mistificação das massas. O esquematismo presente
na Indústria Cultural é um termo cunhado por Kant
“para designar o procedimento mental pelo qual
referimos nossas percepções sensíveis a conceitos
fundamentais, que ele chama de categorias”
(DUARTE, 2002, p.39). Adorno e Horkheimer
vão apropriar-se desse termo, não no mesmo
sentido de Kant, para definir a forma pelo qual a
Indústria Cultural reorganiza no pensamento das
massas a sua forma de conceituar e percepção as
coisas sensíveis, ou seja, as coisas e os fenômenos
do mundo, para utilizá-los em seus interesses.
Uma das maiores expressões do esquematismo nas
massas, criado pela Indústria Cultural, é a sensação
de autonomia sobre seu pensamento, da condição
que o indivíduo tem sobre seus gostos e as
necessidades que possa vir a ter. Na verdade, esta
sensação de poder de escolha e de vontades sobre
suas necessidades nada mais é do que a usurpação
do esquematismo da forma de pensar dos
indivíduos feita pela Indústria Cultural, de forma
que esses indivíduos sempre achem necessário o
consumo de algum produto para suprir esses
desejos. A Indústria Cultural cria nos indivíduos
uma necessidade permanente de consumir seus
produtos, que é a essência da cultura de massas.
Esta é a primeira e principal forma da manifestação
do esquematismo do pensamento das massas.
O capitalismo monopolista11
, sendo um sistema de
exploração que pretende perpetuar sua condição de
manter uma classe no poder, classe que representa
uma parte muito pequena da população mundial,
cria um mundo de ilusões para esconder seus
objetivos de exploração e seus interesses
mercadológicos, que não são os de um “bem-estar”
11
Capitalismo monopolista é o capitalismo resultante da
fusão do capital bancário com o capital industrial
gerando, portanto, os monopólios. (LENIN, V. I ;1979)
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 109
para a população e, sim, o privilégio de uma
pequena parte do globo, a classe dominante. Para
garantir o controle ideológico da população, cria
vários mecanismos de sua dominação em que parte
importante desses é garantida através da Indústria
Cultural. Ela, como todo o seu sistema, cria um
mundo de ilusões cheio de valores burgueses que
tornam a relação principal entre os homens um tipo
de relação mercadológica baseada em interesses de
bens.
Habermas tem a mesma posição de Adorno e
Horkheimer ao considerar que a Indústria Cultural
dissemina produtos para o consumo das massas,
tornando-as um instrumento de "redução das
capacidades de fazer um uso crítico da razão"
(LIPOVETSKY, 1989, p.15). O sociólogo Manuel
Castells (1999, p.360) vai levantar sua crítica sobre
essa concepção adotada pelos frankfurtinianos. O
autor observa de forma crítica a visão das “pessoas
como receptáculos passivos de manipulação
ideológica […]”, e para contrapor esta visão de
que as massas são alienadas afirma que “os
indivíduos possuem um nível de autonomia para
organizar e decidir seu comportamento”.
A Alienação do espectador em favor do
objeto contemplado (o que resulta de sua
própria atividade inconsciente) se expressa
assim: quanto mais ele contempla, menos
vive, quanto mais ele aceita reconhece-se nas
imagens dominantes da necessidade, menos
compreende sua própria existência e seu
próprio desejo. Em relação ao homem que
age, a exterioridade do espetáculo aparece no
fato de seus próprios gestos já não serem
seus, mas de um outro que os representa por
ele. É por isto que o espectador não se sente
em casa lugar algum, pois o espetáculo esta
em toda a parte. (DEBORD, 1997, p.24).
A Teoria Crítica de Adorno e Horkheimer terá
grande consonância com a teoria de Debord sobre
a sociedade do espetáculo. Como Debord (1997,
p.14) afirma, o espetáculo é um instrumento do
sistema capitalista de unificação dos gostos, uma
forma de relação social entre pessoas, mediada por
imagens, resultante do modo de produção
capitalista. “Informação, propaganda, publicidade,
consumo e divertimento constituem mecanismos
particulares do espetáculo”. Para ele, a essência
desse espetáculo é a aparência projetada para cada
indivíduo. É a imagem que o indivíduo passa sobre
si para o resto da sociedade, como um produto do
sistema. Ele passa também a ser considerado como
uma mercadoria a partir da definição enquanto um
ser que tem algo a oferecer e não mais o que ele
realmente é, enquanto ser. Observando assim que
nessa sociedade há um processo de alienação do
espectador, onde a mercadoria passa a ocupar
todos os espaços da vida social através do
espetáculo lançado nas mercadorias para o lazer e
o consumo dos indivíduos.
Entre os teóricos existem várias contradições sobre
os reais efeitos que a Indústria Cultural pode trazer
nos sentimentos dos indivíduos, principalmente no
que diz respeito a sua alienação e interferência em
sua capacidade de pensar. A alienação das massas
ao receberem os produtos da Indústria Cultural
veiculados pelas mídias afirmada na Teoria Critica
é questionada por Lipovetsky:
o consumo midiático não é o coveiro da
razão, o espetacular não abole a formação da
opinião crítica, o show da informação
prossegue a trajetória das Luzes. A mídia
substituiu a Igreja, a escola, a família, e
outras instituições, como forma de
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 110
socialização e meio de transmissão do saber.
(LIPOVETSKY, 1989, p.225).
Com a pós-modernidade, várias concepções em
relação a Midia Mass e sua relação com os
usuários vão surgir a partir da premissa de que elas
rompem as barreiras mercadológicas e dos
monopólios, e consequentemente com o controle
dos capitalistas, no comportamento e na cultura das
massas, apesar de alguns autores afirmarem que ela
nada mais é do que a expressão de maneira nova
das mesmas relações mercadológicas.
A pós-modernidade para Daniel Bell
corresponde exatamente à fase pós-industrial
da sociedade de consumo, onde a produção
de bens e serviços (ligados ao grande
consumo de energia) é modificada de acordo
com as novas tecnologias (digitais) da
informação". "A fase pós-moderna da
sociedade não é uma ruptura com a dinâmica
monopolista de capitalismo, mas uma
radicalização do desenvolvimento de sua
própria lógica. Embora esta não seja uma
ruptura com a sociedade capitalista".
(LEMOS, 2004, p.63)
A partir da criação da Internet, surge a noção de
ciberespaço. Lévy (1999, p.17) entende “o
ciberespaço como um sistema de comunicação
formado a partir da interligação dos computadores
em rede”. Afirma que o ciberespaço é um meio
virtual onde ocorrem as interações entre os
usuários, que recebem uma infinidade de
informações. O ciberespaço amplia suas fronteiras
à medida que este espaço é preenchido pelos
próprios, usuários que escolhem de forma livre os
caminhos que seguirão neste ambiente.
Certamente a Internet é uma mídia de grande
potencial técnico que pode trazer para os usuários
as possibilidades de interações livres no caminho
de buscar novas informações e interações com
outros usuários. Ela cria mecanismos onde eles
passam não só de meros receptores, mas também
criadores de textos, vídeos, e informações,
tornando-os autores e criadores de novos
conhecimentos e novas relações interpessoais.
Porém, o que observamos é que estes usuários
podem não estar usufruindo todo seu potencial
desta ferramenta, levando para ela muitas vezes
comportamentos influenciados pela Indústria
Cultural e pelos monopólios, colocando em
questão se realmente sua ação nesta mídia tem sido
de forma livre e autônoma.
Lévy vai observar ainda que este novo meio de
comunicação vai desenvolver um novo tipo de
cultura de massas, a “Cibercultura”. Para Lévy
(1999, p.17), a cibercultura é a unidade de um
conjunto de técnicas, de práticas, de atitudes, de
modos de pensamento e de valores que se
desenvolvem juntamente com o crescimento do
ciberespaço.
Castells (1999) define esta cultura que passa a
existir com a formação da sociedade em rede como
a “cultura da virtualidade real”. Para ele, o
universo digital é mais um ambiente de símbolos
que conduz os usuários não a uma nova realidade
virtual, mas a um experimento humano assimilado
de uma maneira mais abrangente e de maior
diversidade. Para Castells (2003, p.167), “é uma
cultura real" tendo em vista que ela trata de uma
base objetiva e material da experiência e própria
existência humana. O que difere é a forma como
Bárbara Flores, Getúlio Távora
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elas representam a realidade e a constroem em suas
representações e seus significados.
Segundo Bittencourt (2012, p.20), a partir do
momento em que ocorre a expansão da Internet, e a
possibilidade de existir um maior
compartilhamento de conhecimentos criados por
estes mesmos usuários, atingiu-se um nível jamais
imaginado até então nas estruturas epistemológicas
das eras precedentes. Ele acredita que existe uma
“curiosa tendência de se dizer que a Internet
consumou o esvaziamento das relações pessoais”.
Lévy vai chamar de “inteligência coletiva” a
experiência dos usuários conectados às redes
eletrônicas, que difundem novos saberes, conceitos
e informações.
O problema da inteligência coletiva é
descobrir ou inventar um além da escrita, um
além da linguagem tal que o tratamento da
informação seja distribuído e coordenado por
toda a parte, que não seja mais apanágio de
órgãos sociais separados, mas se integre
naturalmente, pelo contrário, a todas as
atividades humanas, volte às mãos de cada
um (LÉVY, 2003, p. 17 ).
Baudrillard acredita que esta nova relação entre os
usuários não os coloca como uma retribalização,
mas de uma mera circulação de informações. Ele
faz uma crítica às relações entre os usuários das
redes que fazem uma "simulação de interação e
não verdadeiras interações" que, segundo o autor,
aumentam a vertente destruidora da comunicação.
Segundo André Lemos, o pensamento de
Baudrillard é aquele do excesso: “quanto mais
informações trocamos, menos estamos em
comunicação. Trocamos o real pelo hiper-real, a
verdadeira comunicação pela sua simulação.
Estaríamos diante de uma encefalação eletrônica,
onde o real desaparece com a instituição do seu
simulacro”. (LEMOS, 2004, p.72).
É verdade que com a Internet surge uma interação
em tempo real criando nos usuários a necessidade
de obter respostas rápidas e imediatas de vários
conteúdos. Certamente esta é uma característica da
modernidade que se reflete em vários aspectos
sociais e das relações entre as pessoas. A Internet
vai ser mais um exemplo da expressão da forma
rápida de agir desta sociedade. Mas autores como
Virilio vão criticar essas informações que circulam
e cobram respostas tão rápidas de seus usuários
que, segundo o autor, estabelecem "uma
institucionalização do esquecimento". Para Virilio,
quanto mais este “saber” cresce, mais o
desconhecido aumenta ou, melhor dizendo, quanto
mais se antecipa a informação número, mais os
usuários passam a ter consciência de essência
incompleta e fragmentar. Para ele “O pensamento
coletivo imposto pelos diversos media visava
aniquilar a originalidade das sensações (...) um
estoque de informações destinado a programar sua
memória” (LEMOS, 2004, p.73). Esta percepção
de Virilio é mais uma expressão da maneira como
o esquematismo atua no pensamento das massas.
Para o sociólogo, o usuário contemporâneo das
tecnologias passou a ser um receptor passivo, a
partir do momento em que ele se coloca no papel
de responder a estímulos imediatos. Ele acredita
que esta maneira dos usuários se comunicarem não
os deixa terem uma compreensão completa dos
fatos e das informações que recebem, por estar no
meio virtual de forma "ingênua e desprovida", de
maneira que suas atitudes autônomas estejam
reduzidas, comprometendo a sua condição de ter
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seus próprios pensamentos e conclusões sobre as
informações que lhes são oferecidas.
A influência do esquematismo da Indústria
Cultural na Internet talvez possa ser demonstrada a
partir da analise da utilização comum dos recursos
mais populares da rede. Assim, para observar este
fenômeno, vamos levantar alguns dados das
principais redes sociais utilizadas na Internet, que
são hoje: o Facebook; o Twitter e o Youtube.
Levantamos os dados estatísticos no site
Socialbakers12
, um site tcheco que produz
estatísticas sobre redes sociais com objetivos de
medir, comparar e constatar o sucesso de várias
empresas na Internet. A Socialbakers vende seus
serviços para essas empresas para que elas possam
avaliar suas atuações nas principais redes sociais
da Internet e disponibiliza gratuitamente na
Internet os dados mais gerais.
Nossa pesquisa foi realizada no dia 26 de
novembro de 2013 e nos forneceu um ranking com
as dez páginas do Facebook com maior número de
“fãs” em todos os países ligados à rede mundial de
computadores. O que observamos pelos dados
registrados na tabela 1, que as cinco páginas mais
acessadas e ‘curtidas’ do Facebook são: Rihana,
Eminem, Shakira, The Simpsons e Harry Potter,
que são produtos da Indústria Cultural. As duas
primeiras são páginas do próprio Facebook, o que
pode ser desconsiderado por apresentarem, não
uma busca dos usuários dessa rede social, mas a
própria utilização desta, no geral. Da terceira à
12
http://www.socialbakers.com/Facebook-statistics
oitava, para ficarmos com as cinco páginas que
realmente expressam a utilização dos internautas
no Facebook, e a primeira é da artista Rihana,
cantora produzida pela Indústria Cultural, em sua
página estão cadastradas 80.498.338 “fãs”. Por
esses dados podemos ver que três das cinco
páginas que estão presentes no ranking são de
produtos da Indústria Cultural e as outras duas,
produtos diretamente relacionados a ela.
Como estamos analisando a presença da Indústria
Cultural, que tem seu principal foco no
entretenimento, é interessante apresentar os dados
deste segmento na rede social. Na tabela 1.2
podemos analisar dados das dez páginas do
Facebook de entretenimento com maior número de
“fãs”. Destes dez sites, nove são de produtos da
Indústria Cultural. Em primeiro lugar, com
69.703.259 fãs, está a página TexasHoldemPoker,
onde usuários jogam um tipo de poker que é
jogado por celebridades em um programa de
televisão nos Estados Unidos e outros países. E em
segundo lugar, temos o The Simpsons, com
68.625.620 “fãs”, um seriado juvenil produzido
pela FOX.
Na tabela 2 podemos verificar os dados levantados
para os dez perfis com maior número de seguidores
na rede social Twitter. Dos dez perfis levantados
na pesquisa, os sete mais seguidos são
KatyPerry (@katyperry), Justin Bieber
(@justinbieber), LadyGaga (@ladygaga) , Barack
Obama (@BarackObama), Britney
Spears (@britneyspears) e Justin Timberlake
(@jtimberlake). Todos, indiscutivelmente,
produtos da Indústria Cultural.
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Tabela 1: Páginas do Facebook
Posição Página Fãns
1 Facebook for Every Phone 341.743.162
2 Facebook for Every Phone 341.743.162
3 Rihanna 80.498.338
4 Eminem 78.103.039
5 Youtube 76.929.399
6 Coca-Cola 76.347.075
7 Shakira 74.509.537
8 Texas HoldEm Poker 69.703.259
9 The Simpsons 68.625.620
10 Harry Potter 66.628.694
Na tabela 2.2 foram levantados dados sobre os dez
twitts ligados ao segmento de entretenimento com
maior número de seguidores no mundo. Na tabela
podemos verificar que dos dez primeiros colocados
neste ranking, quatro são: Legendários
(@Legendarios) com 5.323.539 seguidores,
programa Pânico (@programapanico) com
8.010.147, e mais dois programas de televisão
estrangeiros, todos os produtos da Indústria
Cultural. Os outros são relacionados a aplicativos
para o uso do Twitter e outros dois que não
conseguimos identificar.
Na tabela 3 levantamos os dados dos canais do
Youtube cujos vídeos obtiveram um conjunto
maior número de visualizações. Dentre os dez
primeiros, nove são relacionados a produtos da
Indústria Cultural e um não conseguimos
identificar.
Na tabela 3.1 foram apresentados os dados dos
canais do Youtube na categoria de entretenimento.
Novamente, dos dez canais de entretenimento com
mais visualizações, nove são relacionados
diretamente à Indústria Cultural e um não
conseguimos identificar.
É interessante ainda ressaltar a coincidência dos
mesmos perfis aparecerem nas 3 principais redes
sociais do mundo, que são o Facebook, o Twitter e
o Youtube. Isso é um elemento no qual podemos
nos basear para observar que na Internet, que tem
um grande potencial técnico, em que os usuários
poderiam traçar de forma livre os caminhos de
busca de informações, conhecimentos novas
formas de relação, diferentes das outras mídias
tradicionais, como TV e rádio, em que a relação
entre as mídias e os usuários é de produtor para
receptor passivo, contudo vemos que sua utilização
é em grande parte restrita.
Pela pesquisa realizada no site socialbakers,
podemos observar a influência que a Indústria
Cultural tem na Internet. Contudo, também deixa
transparecer que essa influência se dá
principalmente pela ação dos internautas que
seguem consumindo as mercadorias culturais
mesmo diante de uma possibilidade de superação
dessas relações alienadas, ditadas pela Indústria
Cultural. Isso talvez possa ser explicado, como
apresentamos, pelas teorias de Adorno e
Horkheimer (1985), ao definir a atitude dos
usuários como predeterminadas por um
esquematismo criado e internalizado pelos
produtos da cultura de massas.
Apresentação das Tabelas com o resultado da
pesquisa
Fonte de todas as tabelas: Socialbakers-
http://www.socialbakers.com/Facebook-statistics
dia acessado no dia 27 de Nov. de 2013 entre 7 e
12 horas.
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 114
Tabela 1.2 - Páginas do Facebook de Entretenimento
Posição Página Fãs
1 Texas HoldEm Poker 69.703.259
2 The Simpsons 68.625.620
3 Harry Potter 66.628.694
4 Family Guy 54.438.630
5 Candy Crush Saga 54.192.753
6 Mr. Bean 49.322.969
7 Avatar 48.615.261
8 South Park 48.139.046
9 Titanic 45.819.196
10 SpongeBob SquarePants 45.336.280
Tabela 2- Perfis do Twitter
Posição Perfil Seguidores
1 Katy Perry (@katyperry) 47.903.055
2 Justin Bieber (@justinbieber) 47.346.407 3 Lady Gaga (@ladygaga) 40.717.046
4 Barack Obama (@BarackObama) 40.220.635
5 Taylor Swift (@taylorswift13) 37.149.553 6 Youtube (@Youtube) 36.768.387
7 Britney Spears (@britneyspears) 34.407.083
8 Rihanna (@rihanna) 32.925.905 9 Instagram (@instagram) 29.378.287
10 Justin Timberlake (@jtimberlake) 28.776.233
A Internet possui potencialmente uma capacidade
de desenvolver não apenas uma utilização livre e
autônoma, como nos indica Lévy, como pode
também ser utilizada pela Indústria Cultural para a
propaganda e disseminação de suas mercadorias
culturais. O último aspecto, i.e., a utilização da
Internet em função da Indústria Cultural, parece ser
a forma de maior utilização da Internet, em
detrimento da utilização de toda a capacidade da
rede em romper a lógica de meros receptores de
informações e consumidores passivos de produtos
predeterminados. Este aspecto fica comprovado
pelos resultados da pesquisa apresentados no
tópico “Breve exposição analítica da utilização
Tabela 2.1 - Perfis do Twitter de Entretenimento
Posição Perfil Seguidores
1 UberSocial (@UberSoc) 11.158.274 2 TwitPic (@TwitPic) 90.51.511
3 Programapanico (@programapanico) 8.010.147
4 Funny Or Die (@funnyordie) 7.682.372 5 SportsCenter (@SportsCenter) 6.244.045
6 OMG Facts (@OMGFacts) 5.898.937
7 OneLouderpps (@OneLouderApps) 5.550.625 8 BET's106& Park (@106andpark) 5.447.689
9 Twitcam (@twitcam) 5.422.706
10 Legendários (@Legendarios) 5.323.539
Tabela 3 - Canais do Youtube
Pos Canal Assinantes Visualizações
1 Machinima 10.136.328 4.644.337.595
2 Rihanna VEVO 11.201.410 4.393.542.710 3 JustinBieber VEVO 6.932.778 4.193.366.837
4 TurkishMusic-Türkçe Müzik 2.209.315 4.123.688.752
5 Officialpsy 6.650.872 3.328.384.652 6 PewDiePie 16.667.951 2.917.175.749
7 Eminem VEVO 8.115.446 2.887.180.215
8 Expertvillage 2.232.985 2.875.093.873 9 IGN 3.875.454 2.836.204.340
10 Smosh 13.877.714 2.786.309.195
Tabela 3.1- Canais do Youtube de Entretenimento
Pos Canal Assinante Visualizações
1 PewDiePie 16.667.951 2.917.175.749
2 Expertvillage 2.234.941 2.875.093.873
3 Smosh 13.877.714 2.786.309.195 4 Atlantic Records 1.581.131 2.702.263.363
5 Rooster Teeth 6.691.177 2.562.175.164
6 TheEllenShow 7.407.155 2.278.776.399 7 YOGSCAST Lewis & Simon 6.282.579 2.273.997.527
8 Ultra Music 1.873.137 2.253.439.613
9 CollegeHumor 5.450.596 2.140.158.207 10 Fueled By Ramen 1.888.046 2.131.426.241
Bárbara Flores, Getúlio Távora
Anima, Fortaleza, ano 14, no. 28, p.11-116 out./ dez. 2014 - 115
geral da Internet”. As estatísticas exibidas mostram
que os principais perfis, canais e páginas de
algumas das principais redes sociais da Internet são
sistematicamente de músicos, artistas, produtos da
indústria do entretenimento etc., enfim, de
produtos da Indústria Cultural.
Ainda que pareça que essa utilização se deva pela
inserção da Indústria Cultural na Internet, esse não
é o aspecto principal, pois, cultura de massas, a
principal forma de sua mercadoria, não está, ainda,
sendo produzida em escala industrial na Internet,
tal como tem sido desenvolvida nos demais meios
de comunicação. As causas dessa não inserção
podem ser muitas, contudo, não poderemos tratar
dessa questão nesse artigo, pois foge do escopo de
nossas investigações, mas parece ser uma posição
plausível. O aspecto principal da Internet ser
utilizada de maneira restrita deve ser encontrado na
postura do usuário, que segue a mesma lógica com
a qual consome os demais produtos culturais e se
relaciona com as demais mídias tradicionais,
quando está diante de uma ferramenta tão
poderosa.
Essa postura é determinada, como apresentamos
anteriormente, pelo esquematismo da Indústria
Cultural, que em seu processo de produção cria
uma relação com seus consumidores que os aliena
para o consumo de seus produtos, por meio de seus
próprios produtos. A alienação é feita por meio da
usurpação da forma autônoma de pensamento das
massas, criando uma forma esquemática
predeterminada, em que no indivíduo se expressa
como uma semiformação, i.e., o individuo não é
mais capaz de pensar por si mesmo e por isso entra
num ciclo vicioso, no qual o fato de consumir um
determinado produto reforça a necessidade do
mesmo produto e de novos produtos desse
segmento cultural do capitalismo.
A semiformação criada nos indivíduos pelos
produtos culturais é expressa em outros domínios
da vida, determinando os comportamentos e as
relações em todas as esferas da sociedade.
Destarte, desde a forma das relações mais íntimas
às mais públicas, as pessoas, de maneira geral,
reproduzem os valores, os clichês, os estilos, os
jargões determinados e propagandeados nos
produtos culturais da cultura de massas.
Possivelmente, é essa postura determinada pela
semiformação, que leva os usuários da Internet a
terem uma utilização tão amesquinhada das
potencialidades presentes na rede. Talvez a análise
da utilização geral da Internet, por meio dos sites,
redes sociais e perfis mais procurados e acessados
possam demonstrar ainda mais o quanto a Indústria
Cultural influencia na atitude dos internautas.
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