View
214
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
XI Salão de
Iniciação Científica PUCRS
Responsabilidade Civil Ambiental: uma análise crítica sobre o
nexo de causalidade e seus limites em casos de pluralidade de
agentes poluidores
Natália Mallmann1, Orci Paulino Bretanha Teixeira2 (orientador)
1Estudante, Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, PUCRS,
2Professor orientador, Faculdade de
Ciências Jurídicas e Sociais, PUCRS
Resumo
Em vista da problemática existente em relação ao meio ambiente, resultante dos riscos
assumidos pelo progresso industrial e a visão utilitarista da sociedade quanto ao seu uso,
cumulado com dificuldade da definição dos responsáveis pelos danos ao meio ambiente por
meio das teorias da causalidade tradicionais, demonstra-se necessidade de um estudo mais
aprofundado da responsabilidade civil, o qual além da sua função reparadora também passou
a ter a função precaucionista, ultrapassando a concepção tradicional. Nessa nova
configuração, com o intuito de garantir a proteção ao meio ambiente, sabendo-se que os danos
causados por múltiplos poluidores nem sempre são identificados a tempo ou se o são, em
virtude das ações que decorrem de mais de uma fonte, tornam o estabelecimento do nexo
causal entre o fato e o dano muito difícil. Acerca disso, o presente trabalho pretende contribuir
para o estudo do nexo de causalidade, como pressuposto da responsabilidade civil, no âmbito
ambiental, com o objetivo de analisar, dentre as teorias da responsabilidade civil ambiental, a
que melhor explica o nexo causal em relação à pluralidade de agentes responsáveis pela
fomentação de um mesmo dano, assim como os limites da solidariedade que se impõem em
relação aos que causaram esse dano. Para tanto, foi realizado um cotejo crítico em relação às
teorias casuísticas e a sua aplicação em hipóteses de pluralidade de agentes poluidores e, dada
a complexidade do estabelecimento do liame causal, os possíveis mecanismos capazes de
solucionar essas questões, dos quais podemos destacar a presunção de nexo causal, a inversão
do ônus da prova, ou ainda o desenvolvimento (e aplicação) de outros sistemas inéditos
quanto ao elemento causal, como a teoria alternativa ou a teoria das probabilidades.
Paralelamente, foi realizada uma análise crítica de decisões proferidas em diferentes tribunais
do território nacional, para determinar como o ordenamento jurídico brasileiro se posiciona
2346
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
frente aos casos em que se configuram diversas fontes emissoras na produção de um dano ao
meio ambiente e o como o liame causal é estabelecido. Da análise dos casos concretos,
podemos concluir que o nexo causal, paulatinamente, está sendo atenuado, para cumprir seu
papel dentro da responsabilidade civil e proporcionar a reparação, suprimindo as necessidades
que a sociedade está inserida e que as teorias clássicas já não mais solucionam, protegendo
efetivamente o meio ambiente.
Introdução
A humanidade percorre um caminho incessante pela busca das causas dos
acontecimentos, sendo esta uma dúvida que paira em diferentes ciências. Exemplo disso é a
atração do físico Isaac Newton em descobrir a causa dos objetos lançados ao ar retornarem ao
solo, chegando ao que hoje se denomina de força da gravidade, ou ainda, antes de Newton, o
matemático e astrônomo Galileu Galilei, que observando a trajetória dos objetos quando
jogados para cima, afirmou que a Terra girava em torno do Sol. Esta busca pela explicação
das causas também se reflete no campo da ciência jurídica, onde a causalidade, frente as suas
implicações, merece especial atenção.
Os danos representam os resultados das condutas de pessoas físicas ou jurídicas em
desacordo com os preceitos consagrados no ordenamento jurídico. No entanto, o instituto da
responsabilidade civil clássico prevê que o dever de indenizar nascerá tão somente pelo
estabelecimento do nexo de causalidade entre a conduta do agente e o resultado danoso.
Portanto, para que haja a obrigação de indenizar, não basta que o agente tenha ferido o
Direito, tampouco que algo ou alguém tenha sofrido um dano, pois é preciso que se verifique
a relação de causalidade que ata a conduta do agente ou sua atividade ao dano.
É justamente o liame de causalidade, existente entre a conduta ou atividade e o dano,
que determinará a obrigação de indenizar, sendo este o mais delicado elemento da
responsabilidade civil e, por muitas vezes, o mais difícil de ser determinado. O desafio em
determinar o liame causal se torna ainda mais complicado quando relacionado aos danos
ambientais, onde essa determinação se mostra mais custosa às partes envolvidas,
principalmente quando relacionada aos casos onde há inúmeros agentes poluidores em
potencial.
2347
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
Este também é o posicionamento de Paulo Affonso Leme Machado (São Paulo,
2009) ao afirmar que “[...] quando é somente em um foco emissor não existe nenhuma
dificuldade jurídica. Quando houver pluralidade de autores do dano ecológico, estabelecer-se
o liame causal pode resultar mais difícil, mas não é tarefa impossível”.
O ordenamento jurídico brasileiro estabeleceu, relativamente à matéria ambiental,
que a responsabilidade civil pelo dano é objetiva, nos termos do artigo 14, § 1º, da Lei nº
6.938/81 e recepcionada pelo artigo 225, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal, no entanto os
pressupostos da responsabilidade civil clássica permanecem inalterados: dano, conduta e nexo
de causalidade.
São duas as principais teorias que tem provocado debates fervorosos na doutrina
brasileira, sendo de um lado a teoria do risco integral, em que todo e qualquer risco deverá ser
incorporado do processo produtivo do empreendedor, e do outro, a teoria do risco criado,
segundo a qual há a definição tão-somente do que poderá ser periculoso e efetivamente gerar
situações lesivas com o intuito de responsabilização (STEIGLEDER, Porto Alegre, 2004).
Isso ocorre porque a aceitação de uma ou de outra teoria, entre as inúmeras existentes, será
refletida de forma direta na determinação do nexo de causalidade e, consequentemente, em
casos de pluralidade de agentes poluidores e de sua extensão solidária.
Annelise Monteiro Steigleder (Porto Alegre, 2004) entende que a admissão da teoria
do risco integral no Direito Brasileiro
[...] é justificada pelo âmbito de proteção outorgado pelo art. 225, caput, da
Constituição Federal de 1988, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
podendo-se vislumbrar a instituição de uma verdadeira obrigação de incolumidade
sobre os bens ambientais. Ademais, o §1º do art. 14 da Lei nº 6.938/81 faz incidir o
regime de responsabilização a qualquer atividade que gere dano ambiental, e não
somente às perigosas, como ocorre no art. 927, parágrafo único, do Código Civil.
A adoção da teoria do risco integral, no entanto, é conflituosa, uma vez que não são
admitidas excludentes de responsabilidade civil, o que por outro lado é possível na teoria do
risco criado, pelo qual a culpa exclusiva da vítima, fato de terceiros e força maior são
consideradas excludentes de causalidade, conduzindo ao rompimento do liame causal,
2348
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
resultando na constituição por si só as causas adequadas ao ato danoso (STEIGLEDER, Porto
Alegre, 2004).
Dessa forma, quando abordamos questões de excludentes de responsabilidade civil
em caráter ambiental estamos nos referindo a responsabilidade civil extracontratual em regra,
ou seja, daquela fundada em ato ilícito, isto é, contrário a legislação brasileira vigente, o que,
porém, não exclui casos de responsabilização civil contratual.
Na relação de causalidade haverá, assim, sempre a existência de um prejuízo para
fins de ligação entre a ocorrência do dano e a fonte poluidora (STEIGLEDER, Porto Alegre,
2004), tornando ainda mais difícil a responsabilização em casos de pluralidade de agentes
poluidores. A par disso, como afirma José de Aguiar Dias (Rio de Janeiro, 1997)
[...] a indivisibilidade do dano, portanto, pode aparecer como consequência da
dificuldade de fixar o montante do prejuízo atribuível a cada um, operando a fusão
dos dois danos num só e único prejuízo. Seria, na verdade, injurídico beneficiar os
autores do ato ilícito com a incerteza que só eles estão em condições de desfazer e
uma vez que não haja outra solução capaz de atender ao imperativo da reparação ao
lesado.
O nexo de causalidade suscita ainda outras controvérsias que estão longe de serem
pacificadas. Como por exemplo, como estabelecer o nexo de causalidade entre empresas
localizadas em um mesmo pólo industrial, que, em razão das atividades que desenvolvem,
poluíram o transcurso do rio que faz fronteira com as suas instalações? E, nesse sentido, quais
os limites para responsabilização solidária dessas empresas?
Com intuito de solucionar os percalços inerentes ao nexo de causalidade que
constitui pressuposto para responsabilização civil ambiental, a teoria do risco integral “supõe
que a mera existência do risco gerado pela atividade, intrínseco ou não a ela, deverá conduzir
à responsabilização” (STEIGLEDER, Porto Alegre, 2004), o que leva à teoria da conditio sine
qua non, a qual tem por objetivo atenuar o rigorismo do nexo causal, de modo que o liame
entre os riscos inerentes a determinada atividade e o dano seja baseado em juízos de
probabilidade (STEIGLEDER, Porto Alegre, 2004), o que poderá implicar em “mera conexão
entre atividade e dano [...] não se exigirá um nexo de causalidade adequada entre atividade e
dano” (STEIGLEDER, Porto Alegre, 2004).
2349
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
Branca Martins da Cruz (São Paulo, 1997) destaca, contudo, que
Desta (r)evolução nas teorias da causalidade, procurando adaptá-las às
necessidades probatórias desta nova realidade para o Direito que é o dano ambiental,
uma idéia, constantemente presente, afigura-se no dever ser posto em destaque: à
verdade substitui-se a verossimilhança; a certeza dá lugar à probabilidade. Não
abdicando embora da existência de um nexo causal entre a acção e o dano, o Direito
do Ambiente (leia-se a responsabilidade civil por danos ambientais) vem fundar este
elo em juízos de probabilidade séria, consubstaciados na experiência social
(normalidade e adequação) e apoiados no conhecimento científico, abandonando a
procura de uma causalidade certa e absoluta a que lhe e negado o acesso.
Mais uma vez, porém, salienta-se que em hipóteses de pluralidade de agentes
poluidores a determinação tão-somente da causa não se faz suficiente para responsabilização
civil ambiental, de modo que a própria identificação e a responsabilização solidária desses
agentes, sempre que demonstrado a contribuição concorrente entre os mesmos, é
imprescindível e prioritária.
Sabe-se, por fim, que o instituto da responsabilidade civil, infelizmente, ainda carece
de desenvolvimento pleno dentro de cada teoria da causalidade e, principalmente, no
concernente às hipóteses de pluralidade de agentes poluidores e a sua extensão, tendo por
objetivo este trabalho refletir de forma crítica sobre essas teorias casuísticas para o fim de
contribuir satisfatoriamente para a construção do Direito Ambiental no Brasil.
Metodologia
O método de abordagem teórica da pesquisa é dialético, sendo realizado um cotejo
crítico em relação às teorias casuísticas e a sua aplicação em hipóteses de pluralidade de
agentes poluidores. A par disso, foram verificaremos eventuais contradições existentes entre
as diferentes correntes doutrinárias sobre o nexo causal, as quais foram contrabalanceadas
para que fosse viável encontrar uma solução concreta dos parâmetros básicos necessários
construção efetiva do Direito Ambiental e da tutela ao meio ambiente.
Ademais, ainda foi utilizado o método dedutivo, partindo da premissa geral para a
aplicação das diferentes teorias e princípios aos casos concretos, analisando-se de que forma o
Direito estará proporcionando a melhor tutela do meio ambiente.
2350
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
Resultados
Um dos principais objetivos deste trabalho consiste em desvendar a teoria da
causalidade ou mecanismos jurídicos que melhor se adequam aos casos de pluralidade de
agentes poluidores, superando os limites apresentados em relação à problemática do nexo
causal. São inúmeras as soluções apresentadas por diferentes autores para esse fim, porém
aqui restringir-se-á aos entendimentos que melhor explicam essa relação entre nexo de
causalidade e pluralidade de agentes poluidores.
Nessa perspectiva, o nexo de causalidade, sendo pressuposto da responsabilidade
civil, está inserido em um complexo plano. Lucia Gomis Catalá (PAMPLONA, 1998) afirma
que em razão da complexidade em que os danos estão imersos a prova do estabelecimento do
nexo causal se torna difícil, o que por vezes conduz a ausência de reparação pela distância
(separação espacial existente entre a fonte e o dano ambiental ocasionado pela primeira), pela
multiplicidade de fontes (resultado de diferentes focos de emissão), pelo tempo (o fato do
dano não ser perceptível por um determinado período de tempo) e pela dúvida científica (os
conhecimentos científicos em matéria ambientais são incompletos, imprecisos e
contraditórios).
Todos os fatores suscitados pela autoria do dano tornam o nexo de causalidade
complexo, de modo que as teorias do risco integral e do risco criado, que se valem das teorias
clássicas da responsabilidade civil da equivalência de condições e da causalidade adequada, se
mostram ineficientes para solucionar a problemática ambiental, pois as mesmas se baseiam
em avaliação eminentimente fática, o que prejudica a prova do nexo causal (CARVALHO,
Rio de Janeiro, 2008).
Em virtude da complexidade que envolve a prova do nexo de causalidade, Antonio
Herman Benjamin (São Paulo, 1998) aponta algumas soluções, sendo a primeira declinada às
presunções de causalidade, segundo a qual, em regra, estamos em frente de uma atividade
perigosa e daí se presume, iuris tantum, o nexo. Esta é uma questão bem abordada pela autora
Lucia Gomis Catalá (Pamplona, 1998), classificando as presunções em refutables e
2351
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
irrefutables, sendo que a primeira está prevista no sistema jurídico alemão, em que a lei
estabelece a presunção iuris tantum que poderá ser excepcionada em determinados casos.
A Alemanha, em lei de 10 de dezembro de 1990, estabeleceu-se normas sobre
responsabilidade civil concernentes às atividades perigosas para o meio ambiente. Em seu
artigo 6o
e parágrafos presumem as hipóteses de nexo de causalidade e no artigo 7o
se
estabeleceu as hipóteses de exoneração da presunção (MACHADO, São Paulo, 2009). De
acordo com o entendimento de Paulo Affonso Leme Machado (São Paulo, 2009) o que
importa é perceber que a legislação alemã “dispensou, para a presunção de autoria ou
presunção de responsabilidade, que fosse estabelecido o liame de causalidade entre os atos
praticados pela instalação e o dano”.
Relativamente às presunções irrefutables, Lucia Gomis Catalá (Pamplona, 1998)
aponta um sistema que considera bem mais rígido, onde se torna quase impossível
descaracterizar a presunção de causalidade, referindo-se à Lei Francesa no
68-943/68, relativa
a responsabilidade civil no âmbito da energia nuclear, a qual estabeleceu que quando
determinadas circunstâncias causam danos à saúde dos cidadãos, em razão de acidente
nuclear, há a presunção de causalidade, a menos que se prove o contrário. Esta foi também a
solução, segundo a autora, encontrada pela legislação japonesa, que prevê que aquelas pessoas
que residam em determinado local e sofram de doenças resultantes da contaminação
atmosférica, estas têm o direito de pleitear o ressarcimento pelos danos sofridos, sem a
necessidade de prova do nexo causal, sendo a mesma presumida.
Outro exemplo que pode ser utilizado como paradigma são as presunções inseridas
no modelo americano, pelo qual há um alcance a todos aqueles considerados potencialmente
responsáveis pelo dano, mesmo que estranhos a este, gerando uma situação concreta de
rompimento com o nexo de causalidade, que implicará na presunção de causalidade
(CATALÁ, Pamplona, 1998).
Antonio Herman Benjamin (São Paulo, 1998), apresentando soluções para superar os
problemas relacionados ao nexo de causalidade, aponta a inversão do ônus da prova como
caminho em casos de multiplicidade de potenciais fontes de degradação. A inversão do ônus
da prova, semelhante ao que ocorre nas relações de consumo, sem dúvida também se torna
2352
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
uma opção viável, ainda mais se verificada a multiplicidade de potenciais fontes e a
hiposuficiência das vítimas (MILARÉ, São Paulo, 2005), o que não raro se verifica em casos
de danos ambientais, dada a difícil caracterização do fato gerador do dano ou mesmo a
pluralidade de agentes poluidores.
No que se refere ao nexo de causalidade e a inversão do ônus probatório, parte dos
doutrinadores portugueses da corrente do Professor Antunes Varela tem adotado a
denominada teoria das normas, segundo a qual a determinação do ônus da prova se dará de
acordo com a estrutura técnico-científica das normas aplicáveis e ao seu escalonamento
sistemático no caso concreto. Por essa teoria as presunções legais provocarão a inversão do
ônus da prova tão somente na esfera empírica da apreciação e valoração da prova (GOMES,
São Paulo, 1996).
A outra parte dos doutrinadores portugueses baseia-se na tese de normalidade/
anormalidade do fato concreto, onde há uma maior preocupação com o critério casuístico.
Essa teoria concebe uma flexibilização das regras de repartição do ônus da prova, de modo
que as presunções judiciais poderão levar à inversão casuística do próprio ônus da prova
(GOMES, São Paulo, 1996).
Com o mesmo escopo Édis Milaré (São Paulo, 2005) entende ser a inversão do ônus
da prova a melhor opção para resolução do problema em definir o nexo causal nos casos
concretos. Segundo o autor a inversão do ônus da prova transfere ao demandado “[...] a
necessidade de provar que este não tem nenhuma ligação com o dano, favorecendo, em última
análise, toda a coletividade, considerando que o bem ambiental pertence a todos”.
Outra opção para solucionar a problemática do nexo de causalidade seria o
desenvolvimento de outros sistemas inéditos em relação à causalidade, como a
responsabilidade civil alternativa (teoria da causalidade alternativa), pela qual é imputada a
responsabilidade pelo dano a todos, pelo fato de não se lograr determinar qual deles,
individualmente, produziu o dano, e a teoria da “parcela de mercado” (market share liability)
(BENJAMIN, São Paulo, 1998). Por meio de qualquer dessas teorias seria possível adotar
uma linha mais ampliada do nexo de causalidade e a sua aplicação no Direito brasileiro.
2353
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
Ou ainda, a teoria das probabilidades, desenvolvida na doutrina espanhola e para
quem as incertezas científicas não devem conduzir à incerteza jurídica. Esta teoria, em face da
tensionada dualidade entre os enfoques científico e jurídico, determina que a causalidade
deverá estar representada levando-se em conta un grado suficiente de probabilidad, expressa
em ocasiões de uma probabilidad próxima a la certeza, bastando estar caracterizada a alta
probabilidad (CATALÁ, Pamplona, 1998).
Essa teoria estabelece que o legitimado não estará obrigado a provar a relação de
causalidade e a exatidão científica, demonstrando a sensibilidade à que se expõe em relação à
complexidade e às incertezas. Bastará que o juiz esteja convicto da existência da
probabilidade determinante ou considerável para que o nexo de causalidade esteja
configurado (CATALÁ, Pamplona, 1998).
A partir dessa concepção estaria se substituindo a certeza pela probabilidade para
fins de atenuar o nexo de causalidade, já que as teorias clássicas não suprem as novas
necessidades da responsabilidade civil ambiental. José Rubens de Morato Leite e Délton
Winter de Carvalho (São Paulo, 2007) entendem que havendo a transferência da prova do
nexo causal ao degradador e a isso juntando um sistema de causalidade onde prevalece o
requisito de probabilidade, substituindo-se a certeza, tal como a teoria da causalidade
alternativa e outras, estaria-se renovando as normas tradicionais, visando à imputação do dano
ao meio ambiente.
Nem sempre é fácil determinar o nexo causal para identificar o responsável pela
causa do dano, não obstante havendo apenas um foco emissor tal tarefa se torna mais fácil. O
fato é que, como já afirmado, quando evidenciada a multiplicidade de fontes poluidoras, tal
tarefa torna-se quase impossível, o que justifica uma atenuação do relevo do nexo causal
(BENJAMIN, São Paulo, 1998) e justifica a substituição da certeza pela probabilidade.
A solidariedade dos agentes poluidores na responsabilidade civil
2354
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
O artigo 30, inciso IV, da Lei n
0 6.938/81, considera poluidor: “a pessoa física ou
jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente, por atividade
causadora de degradação ambiental”. Em outras palavras, o texto legal é claro ao
responsabilizar todos aqueles que contribuíram de qualquer forma para ocorrência do dano
ambiental.
Antonio Herman V. Benjamin (São Paulo, 1998) esclarece que o vocábulo poluidor
deve ser interpretado de forma ampla, devendo-se incluir aqueles que diretamente
contribuíram para o dano ambiental, citando como exemplo o fazendeiro, o industrial, o
madeireiro, o minerador, o especulador, bem como aqueles que concorrem de maneira
indireta, facilitando ou viabilizando a ocorrência do dano, neste caso estão incluídos os
bancos, o órgão público, o arquiteto, o incorporador, o corretor, o transportador, dentre outros.
Para explicar a responsabilidade indireta, por exemplo, das instituições financeiras,
Paulo Affonso Leme Machado (São Paulo, 2009) faz analogia a Lei no
8.974/95, que trata do
uso de técnicas de engenharia genética e da liberação, no meio ambiente, de organismos
geneticamente modificados, cujo texto legal prevê, expressamente, a co-responsabilidade dos
bancos em casos de financiamento dos projetos de biotecnologia. Naquela norma quem
financia tem a obrigação de analisar se o financiado está cumprindo com a legislação
ambiental, no momento do financiamento. O ilustre autor entende, por fim, que “o artigo 12,
da Lei no 6.938/81 estabelece a mesma obrigação de exigir-se a apresentação da licença”, de
modo que os órgãos financiadores se tornam co-responsáveis pelos eventuais danos
decorrentes da atividade produtiva.
De acordo com os ensinamentos de Lucia Gomis Catalá (Pamplona, 1998), tratando-
se de responsabilidade múltipla frente a um mesmo resultado lesivo, entende-se pela aplicação
do princípio da responsabilidad mancomunada, pelo qual o responsável somente será
responsabilizado pela parte do dano que pode lhe ser imputado de maneira concreta, ou pelo
princípio da responsabilidad solidária, cuja responsabilização atingirá qualquer dos co-
responsáveis de forma integral, isto é, responderá pela integralidade da reparação, não se
prejudicando qualquer direito de regresso em relação ao percentual de participação de cada
um dos responsáveis identificados.
2355
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
No Brasil, a jurisprudência tem se consolidado no sentido de que a responsabilidade
recaia solidariamente a qualquer daqueles que tenham de alguma forma contribuído para o
dano ambiental. Esse é o entendimento que se absorve do recente julgamento do REsp
1056540/GO, do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir que a solidariedade, no caso
concreto, decorre da dicção dos artigos. 3º, incisos IV, e 14, § 1º, da Lei 6.398/1981, sendo
que “se é possível identificar o real causador do desastre ambiental, a ele cabe a
responsabilidade de reparar o dano, ainda que solidariamente com o atual proprietário do
imóvel danificado”.
Antonio Herman V. Benjamin (São Paulo, 1998) defende a aplicação subsidiária do
artigo 1518 [atual artigo 942], caput, do Código Civil, cujo teor é no sentido de configurar a
responsabilidade solidária pela reparação a todos que deram causa ao dano, isso porque
considera o fato danoso único e indivisível “consequência da impossibilidade de
fragmentação do dano”. A respeito do tema, Jorge Alex Nunes Athias (São Paulo, 1993)
afirma ser
[...] uma das maiores dificuldades que se pode ter em ações relativas ao meio
ambiente é exatamente determinar de quem partiu efetivamente a emissão que
provocou o dano ambiental, máxime quando isso ocorre em grandes complexos
industriais onde o número de empresas em atividade é elevado. Não seria razoável
que, por não se poder estabelecer com precisão a qual deles cabe a responsabilização
isolada, se permitisse que o meio ambiente restasse indene.
Outra solução encontrada para os casos de danos ocasionados por mais de uma
empresa no mesmo local é aquela adotada pelos Estados Unidos, pela qual se admite a
responsabilização de acordo com a parcela de mercado de cada empresa em relação à
potencialidade em produzir o dano, denominada market share liability (STEIGLEDER, Porto
Alegre, 2004). Esta teoria, essencialmente, como já exposto, flexibiliza o nexo de causalidade
a padrões extremados, pois não sendo possível identificar o responsável pelo evento danoso,
todas as empresas daquele seguimento são responsabilizadas. Admite-se também a
responsabilização, no âmbito das áreas contaminadas, pelo custo total de limpeza de forma
coletiva ou individual (STEIGLEDER, Porto Alegre, 2004).
No Brasil, porém, não há previsão legal para aplicação da teoria do market share
liability (STEIGLEDER, Porto Alegre, 2004), o que de certa maneira limita os aplicadores do
direito à teoria do risco integral, acolhida pelo nosso ordenamento jurídico e segundo a qual a
2356
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
mera existência da atividade potencialmente perigosa enseja na presunção de causalidade,
para fins de inverter-se o ônus da prova.
Com intuito de sanar os problemas relacionados com a relação de causalidade no
sistema jurídico brasileiro, quando depara-se com situações de dano em um determinado
distrito industrial, onde todas as empresas ali localizadas poderiam concorrer para o dano
ambiental, por serem fontes geradoras de riscos, há a possibilidade de conjugar as teorias do
risco integral com a causalidade alternativa, para fins de responsabilizar os causadores do
dano tão somente pela prova da existência do dano e dos fatores de risco (STEIGLEDER,
Porto Alegre, 2004).
Não obstante esta seja uma solução razoável, a jurisprudência brasileira não vem se
inclinando para essa seara. O Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao julgar
ação civil pública no
596046029 (1998), em que se pretendia a condenação dos curtumes a
reposição da situação pretérita à instalação dos equipamentos anti-poluição, face a poluição
secular do curso d’água do Arroio Pampa, no município de Novo Hamburgo, entendeu ser
impossível atribuir a responsabilidade pela poluição exclusivamente às rés. Concluíram os
julgadores da época que seria impossível isolar o quadro de poluição generalizada e
responsabilizar todas as empresas da região pela poluição de curso d’água, decorrente de
resíduos industriais e domésticos, os quais por muito tempo já preponderavam na região, sob
o argumento de que se assim o fizesse também teria que se condenar todos os outros
habitantes do município que contribuíram para deterioração das condições naturais, pela
justificativa de responsabilidade civil objetiva.
Os limites da aplicação da solidariedade entre os agentes poluidores
Sabe-se que a solidariedade é o caminho que deve ser seguido para viabilizar a
responsabilização em casos de pluralidade de agentes poluidores. Cabe, porém, indagar qual é
o limite para responsabilização objetiva dos agentes poluidores, levando em consideração as
dificuldades relativas ao estabelecimento do nexo de causalidade já abordadas deste trabalho,
que ora se relembra: indeterminação da fonte poluidora, substâncias imperceptíveis que levam
2357
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
um período de tempo para serem relacionadas ao dano, fazendo com que haja uma emersão na
incerteza sobre onde e como a eventual exposição se deu, ou ainda pela identificação do
modus operandi da causa do dano pela conduta do agente.
Considera-se que quanto aos limites para aplicação, a solidariedade entre os agentes
poluidores pode ser subdivida em duas, sendo a primeira linear entre aqueles agentes que
estão de alguma forma vinculados as atividades produtivas direita e indireta, como previsto no
artigo 3o, inciso IV, da Lei n
o 6.938/81, e a segunda sobre aqueles que de forma escalonada se
vinculam aos danos ambientais. Questiona-se: além do alargamento da responsabilidade
solidária, incluindo no rol de poluidores os agentes indiretos pelos danos (instituições
financeiras, órgãos públicos, incorporadores, etc.), seria ainda possível incluir os fornecedores
de materiais para que se chegasse a um produto final comercializável, o que pode ser o
resultado de um processo industrial de alto risco?
Sabe-se que, no que se refere à solidariedade linear, isto é, aquela estabelecida por
meio da ação ou omissão do agente direto/indireto para a ocorrência do dano, esta é possível e
já faz parte da prática jurídica, tanto em relação aos órgãos públicos, observadas as suas
peculiaridades, quanto em relação aos demais exemplos já citados para o evento danoso.
Justificando esta afirmação, pode-se observar que o próprio entendimento do
Superior Tribunal de Justiça em relação à solidariedade de agentes poluidores diretos e
indiretos, é de que tanto poluidores direitos como indiretos são responsáveis pelos eventuais
danos ambientais advindos do seu processo produtivo. Assim veja-se a seguinte ementa:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE.
LEGITIMIDADE PASSIVA DO ENTE ESTATAL. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA. RESPONSÁVEL DIRETO E INDIRETO. SOLIDARIEDADE.
LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. ART. 267, IV DO CPC.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356 DO STF.
1. Ao compulsar os autos verifica-se que o Tribunal a quo não emitiu
juízo de valor à luz do art. 267 IV do Código de Ritos, e o recorrente sequer aviou
embargos de declaração com o fim de prequestioná-lo. Tal circunstância atrai a
aplicação das Súmulas nº 282 e 356 do STF.
2. O art. 23, inc. VI da Constituição da República fixa a competência
comum para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à
proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas. No
mesmo texto, o art. 225, caput, prevê o direito de todos a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
2358
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
3. O Estado recorrente tem o dever de preservar e fiscalizar a preservação
do meio ambiente. Na hipótese, o Estado, no seu dever de fiscalização, deveria ter
requerido o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo relatório, bem como a
realização de audiências públicas acerca do tema, ou até mesmo a paralisação da
obra que causou o dano ambiental.
4. O repasse das verbas pelo Estado do Paraná ao Município de Foz de
Iguaçu (ação), a ausência das cautelas fiscalizatórias no que se refere às licenças
concedidas e as que deveriam ter sido confeccionadas pelo ente estatal (omissão),
concorreram para a produção do dano ambiental. Tais circunstâncias, pois, são aptas
a caracterizar o nexo de causalidade do evento, e assim, legitimar a
responsabilização objetiva do recorrente.
5. Assim, independentemente da existência de culpa, o poluidor, ainda
que indireto (Estado-recorrente) (art. 3º da Lei nº 6.938/81), é obrigado a indenizar e
reparar o dano causado ao meio ambiente (responsabilidade objetiva).
6. Fixada a legitimidade passiva do ente recorrente, eis que
preenchidos os requisitos para a configuração da responsabilidade civil (ação
ou omissão, nexo de causalidade e dano), ressalta-se, também, que tal
responsabilidade (objetiva) é solidária, o que legitima a inclusão das três esferas
de poder no pólo passivo na demanda, conforme realizado pelo Ministério
Público (litisconsórcio facultativo).
7. Recurso especial conhecido em parte e improvido.
(STJ, REsp 604725 / PR, Relator Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/06/2005, DJe 22/08/2005, p. 202)
Relativamente àqueles que de forma escalonada se vinculam à ocorrência do dano,
ou seja, daqueles que fornecedores do processo produtivo de determinado produto, não se
encontra na doutrina brasileira um estudo sobre o referido aspecto em relação ao dano
ambiental. Sabe-se, no entanto, que houve uma ampliação às hipóteses de responsabilidade
solidária (SCHREIBER, São Paulo, 2009). A responsabilidade civil do modelo individualista
previa que a reparação do dano era o resultado da relação estabelecida pela vítima e o ofensor,
sendo que a solidariedade passiva com caráter indenizatório se limitava aos casos de
cumplicidade para na produção do dano ou por responsabilidade por fato alheio, não se
podendo dar interpretação extensiva a essas hipóteses, em razão do axioma de que a
solidariedade não se presume (SCHREIBER, São Paulo, 2009).
Aos poucos, porém, esta restrição foi se rompendo, como por exemplo, com a
construção da teoria da causalidade alternativa, em que potenciais causadores do dano, na
impossibilidade de identificação do causador específico do dano, podem ser responsabilizados
solidariamente perante os danos ao meio ambiente (SCHREIBER, São Paulo, 2009). Embora
esta renovação das hipóteses de solidariedade tenha ajudado a solucionar alguns casos
considerados insolucionáveis, Anderson Schreiber (São Paulo, 2009) alerta que a
responsabilidade solidária passou a ter uma abrangência verdadeiramente assustadora aos
olhos da doutrina que se vinculam aos paradigmas individualistas.
2359
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
Tal circunstância advém da responsabilidade solidária instituída pelo Código de
Defesa do Consumidor, no artigo 3o, que define o fornecedor de produtos e serviços para, em
seguida, determinar, no artigo 12, a responsabilidade solidária entre uma variedade de
fornecedores. De acordo com os ensinamentos de Anderson Schreiber (São Paulo, 2009),
ainda que o código consumerista tenha previsão para possibilidade de ações de regresso
contra os demais responsáveis, em virtude da “dificuldade de determinação do percentual de
participação causal de cada um dos fornecedores excluem, na prática, a reunificação do custo
da reparação sobre um único responsável”.
Ou seja, a reparação toma nova forma, transferindo a responsabilidade individual
para a responsabilidade coletiva, resultando conforme afirma Anderson Schreiber (São Paulo,
2009) “[...] na maior parte dos casos, por todo o grupo de agentes potencialmente lesivos”.
Em matéria ambiental, assim, não se pode excluir totalmente a possibilidade de
responsabilidade solidária escalonada entre aqueles que forneceram materiais para fabricação
e aqueles que fabricam o produto.
O autor Anderson Schreiber (São Paulo, 2009), por fim, sabiamente afirma que
[...] parece bastante evidente que, ao difundir o ônus da reparação – e, em última
análise, do próprio dano – sobre mais de uma pessoa, a responsabilidade solidária
transcende as amarras individualistas da dogmática tradicional da responsabilidade
civil e se soma a outros instrumentos mais recentes que, em paralelo às técnicas de
responsabilização, vão ganhando espaço, na cultura jurídica contemporânea, como
forma de administração dos danos injustos. Nesse sentido, merecem particular
atenção as técnicas de prevenção e precaução dos danos.
Nessa perspectiva, em matéria ambiental, a solidariedade insere a responsabilidade
civil uma refuncionalização, conferindo-a uma função preventiva. Délton Winter de Carvalho
(Rio de Janeiro, 2008) afirma que tal alteração se concretiza com a objetivação da
responsabilidade civil, prevista no artigo 14, da Lei no
6.938/81, bem como ao
reconhecimento constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito
fundamental “com ênfase preservacionista que tem função preventiva da responsabilidade
civil [...]”.
2360
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
Annelise Monteiro Steigleder (Porto Alegre, 2004), a respeito da matéria, afirma que
também é por meio dos princípios da precaução e da prevenção que a responsabilidade civil
se refuncionaliza a) ampliando o conceito de dano, incluindo danos futuros e prováveis,
acabando com a ideia de danos certos e atuais; e b) alterando o modus operandi que
ocasionou a ocorrência do dano, o que resulta de uma avaliação sobre a sustentabilidade da
atividade poluidora.
Concluindo, a solidariedade proporciona um viés importante para atenuação do
relevo do nexo causal, pois basta que a atividade do agente poluidor seja potencialmente
degradante para que sua aplicação seja consolidada, se tornando possível a responsabilização
daqueles agentes poluidores que concorreram para que o dano se realizasse (BENJAMIN, São
Paulo, 1998).
Conclusão
O nexo de causalidade é um tema que nos trás mais dúvidas que incertezas, o que
concomitantemente nos motiva a estudar esse elemento que é essencial à responsabilidade
civil e que deverá conviver com as questões relativas ao meio ambiente de forma a garantir
efetivamente a sua principal função: a de reparação.
O nexo de causalidade é elemento indispensável, fazendo parte junto com o dano e
das atividades de risco dos pressupostos da responsabilidade civil. No entanto, levando-se em
consideração de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é protegido pelo
Constituição Federal, e que muitas vezes, em razão da dificuldade em determinar o
responsável pelo dano ao meio ambiente, o nexo de causalidade foi atenuado, com vistas a
garantir a funcionabilidade da responsabilidade civil, por meio reparação. Logo, em algumas
situações não é mais necessária a prova cabal absoluta da relação de causalidade.
No Brasil, das teorias da causalidade examinadas, tendo em vista que o dano ao meio
ambiente é de responsabilidade objetiva, nos termos do art. 14, § 1º, da Lei de Política do
Meio Ambiente e recepcionada pelo art. 225, §§ 2º e 3º, da Constituiçao Federal, a teoria do
2361
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
risco integral, fundada na teoria de equivalência de condições, é a mais adotada pela doutrina
e jurisprudência.
Não obstante ao direcionamento dado pela doutrina e pela jurisprudência,
considerando que as teorias clássicas não mais suprimem as necessidades impostas pela
sociedade, a fim de superar os obstáculos postos em relação ao nexo de causalidade é que
entendemos ser o desenvolvimento de outras teorias mais adequadas para efetivação do dever
de reparação.
Nessa perspectiva, a teoria da causalidade alternativa seria uma das opções
escolhidas para melhor solucionar as questões que envolvem um grupo na geração de um
dano e o estabelecimento do nexo de causalidade, em face da indeterminação daquele que de
fato produziu o dano ao meio ambiente, provendo a responsabilização solidária e evitando-se
com isso a irresponsabilidade.
Concomitantemente à teoria da causalidade alternativa, a teoria da probabilidade
também seria capaz de sanar as questões relativas ao liame causal, proporcionando a sua
atenuação. Por meio dessa teoria abandonamos a certezas e buscamos no juízo de
probabilidade a resposta para configurar o nexo causal, que nascerá da atenuação concebida
pelos aplicadores do Direito.
Outro aspecto apresentado foi a inversão do ônus da prova como maneira de atenuar
a relação de causalidade e permitir a responsabilização daqueles que produziram o dano ao
meio ambiente. Esta é uma solução, ainda que tímida, que está à disposição, bastando a
coerência para sua aplicação. Este é também o atual posicionamento do Superior Tribunal de
Justiça para o julgamento de ações ambientais. Quanto ao estabelecimento de presunções, se
algum dia se fizer presente no ordenamento jurídico brasileiro, será uma porta de saída para a
atenuação e configuração do nexo causal, embora provavelmente não traga grandes avançados
quando relacionado à pluralidade de agentes poluidores.
Qualquer dos caminhos expostos, seja pela atenuação do nexo causal pela teoria da
causalidade alternativa ou da probabilidade, seja pelo estabelecimento de presunções da
relação de causalidade ou pela inversão do ônus da prova, o que se busca incessantemente é o
2362
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
aperfeiçoamento do instituto da responsabilidade civil frente aos novos desafios em que a
sociedade está inserida, já que as teorias clássicas não mais suprimem as suas necessidades.
No Brasil, estabelecido o liame causal entre aqueles que produziram o dano ao meio
ambiente, a responsabilidade será solidária, consoante o artigo 942, do Código Civil,
considerando a indivisibilidade do dano. No entanto, há que se salientar a dupla dimensão da
solidariedade, que poderá ser estabelecida linearmente, entre aqueles que produziram o dano,
ou de forma escalonada, ou seja, até que etapa no processo de produção aquele que colaborou
para o produto final deverá ser envolvido.
Não há respostas concretas para esse questionamento, porém temos como exemplo o
Código de Defesa do Consumidor que ampliou a solidariedade, determinando a
responsabilidade solidária dos fornecedores. Logo, se configura uma transferência do
responsável individual para o coletivo, em virtude do seu potencial lesivo, no âmbito
consumerista. Embora inexistente na esfera ambiental, esta é uma alternativa que não poderá
ser esquecida, eis que não raro os danos ao meio ambiente se apresentam por meio de uma
gama de agentes poluidores.
Referências
ATHIAS, Jorge Alex. Responsabilidade civil e o meio ambiente – breve panorama do direito
brasileiro. In: BENJAMIN, Antônio Herman (Coord). Dano ambiental: prevenção,
reparação e repressão. São Paulo: RT, p. 237-249, 1993.
AZEVEDO, Vicente de Paulo Vicente. Crime-dano-reparação. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1934.
BENJAMIN, Antonio Herman V. Responsabilidade civil pelo dano ambiental. Revista de
Direito Ambiental, n. 9, São Paulo, RT, p. 5-52, 1998.
2363
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
__________. O princípio do poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental In:
__________. (Coord). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: RT, p.
226-236, 1993.
CARVALHO, Délton Winter de. Dano Ambiental Futuro: a responsabilização civil pelo
risco ambiental. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
CATALÁ, Lucia Gomis. Responsabilidad por daños al medio ambiente. Pamplona:
Aranzadi, 1998.
CRUZ, Branca Martins da. Responsabilidade civil pelo dano ecológico: alguns problemas.
Revista de Direito Ambiental, n. 5, São Paulo, RT, p. 5-41, 1997.
CRUZ, Gisela Sampaio da. O problema do nexo causal na responsabilidade civil. Rio de
Janeiro: Renovar, 2005.
CUSTÓDIO, Helita Barreira. Responsabilidade civil por danos ao meio ambiente.
Campinas, São Paulo: Millennium, 2006.
DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997.
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, vol.
1.
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, 2
vol.
FARIAS, Paulo José Leite. Competência federativa e proteção ambiental. Porto Alegre:
Sergio Antônio Fabris, 1999.
FREESTONE, David; HEY, Ellen. The precautionary principle and international law.
Netherlands: Kluwer Law International, 1996.
2364
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
GHERSI, Carlos Alberto; LOVECE, Graciela; WEINGARTEN, Celia. Daños al ecosistema
y al medio ambiente. Buenos Aires: Astrea, 2004.
GOMES, Manuel Tomé Soares. A responsabilidade civil na tutela do ambiente. Revista de
Direito Ambiental, n. 4, São Paulo, RT, p. 5-16, 1996.
LANFREDI, Geraldo Ferreira. A objetivação da teoria da responsabilidade civil e seus
reflexos nos danos ambientais ou no uso anti-social da propriedade. Revista de Direito
Ambiental, n. 6, São Paulo, RT, p. 87-107, 1997.
LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Direito ambiental na sociedade
de risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.
___________; CARVALHO, Délton Winter de. O nexo de causalidade na responsabilidade
civil por danos ambientais. Revista de Direito Ambiental, n. 47, São Paulo, RT, p. 77-95,
2007.
LEMOS, Patrícia Faga Iglesias. Meio ambiente e responsabilidade civil do proprietário:
análise do nexo causal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 17. ed. São Paulo:
Malheiros, 2009.
MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura. Meio Ambiente: direito e dever fundamental.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4. Ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005.
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Responsabilidade civil pelo dano ambiental e o princípio da
reparação integral do dano. Revista de Direito Ambiental, n. 32, São Paulo, RT, p. 68-82,
2003.
2365
XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Barreto B. Responsabilidade civil, meio
ambiente e ação coletiva ambiental. In: BENJAMIN, Antonio Herman V.. Responsabilidade
civil pelo dano ambiental. Revista de Direito Ambiental, n. 9, São Paulo, RT, p. 278-207,
1993.
NORONHA, Fernando. Desenvolvimento contemporâneo da responsabilidade civil. Revista
dos Tribunais, São Paulo, v. 761, p. 31-44, 1999.
SALOMON, Fernando Baum. Nexo de causalidade no direito privado e ambiental.
Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2009.
SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil. São Paulo: Atlas,
2009.
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros,
2004.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32 ed. São Paulo:
Malheiros, 2008.
Site: http://www.planalto.gov.br
Site: http://www.stj.jus.br
STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do
dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
__________. Considerações sobre o nexo de causalidade na responsabilidade civil por dano
ao meio ambiente. Revista de Direito Ambiental, n. 32, São Paulo, RT, p. 83-103, 2003.
TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado como um direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
2366
Recommended