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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC - SP
Luciano Brito Caribé
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS
E DIRIGENTES DE PESSOAS JURÍDICAS
MESTRADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO
SÃO PAULO
2009
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC - SP
Luciano Brito Caribé
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS
E DIRIGENTES DE PESSOAS JURÍDICAS
MESTRADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito Tributário, sob a orientação da Prof.(a) Doutor(a) Elizabeth Nazar Carrazza.
SÃO PAULO
2009
Banca Examinadora
____________________________________
____________________________________
____________________________________
DEDICATÓRIA
A João Pedro, filho amado, cuja
compreensão permitiu-me as horas de
ausência.
A Talita, minha esposa, por sua companhia
em todos os momentos.
A minha mãe Iranice e irmãos Paulo, Leo e
Cris, aos quais incluo Heleno Tôrres, por
sempre acreditarem em mim.
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos Professores Heleno Taveira Tôrres e Paulo
de Barros Carvalho pelos incentivos na busca do
conhecimento.
Agradeço à Professora Elizabeth Nazar Carrazza, pela
acolhedora orientação.
Agradeço aos amigos Luiz de Sá Monteiro, Melissa, Erick
Macedo, Napoleão Casado e Samuel Gaudêncio, cujo
incentivo foi fundamental na conclusão do presente
trabalho.
RESUMO
O presente trabalho visa a uma abordagem científica do enquadre e do
alcance da prescrição normativa dos arts. 134 e 135 do Código Tributário
Nacional, dispositivos estes correlatos aos limites para a atribuição de
responsabilidade tributária aos sócios e aos dirigentes de pessoas
jurídicas, assunto muito relevante nas relações entre o Fisco e os
contribuintes.
O tema tem grande importância, na medida em que percebemos
empresários mal intencionados usarem a separação patrimonial da
personalidade jurídica como uma forma de evadirem-se de pagar tributos.
Por outro lado, evidenciam-se os abusos cometidos pelo Fisco que se tem
insurgido diretamente em face dos sócios e dirigentes das empresas, por
intermédio das ações de execução fiscal, sem ao menos obedecer aos
princípios e às prescrições impostas pelo nosso sistema tributário
nacional.
Nossas conclusões apontam para a necessidade de um maior rigor por
parte do Fisco na atribuição de responsabilidade tributária aos sócios e
aos dirigentes de pessoas jurídicas. E que essa atribuição se dê no curso
dos processos administrativos de constituição dos tributos.
PALAVRAS-CHAVE: responsabilidade, tributária, sócio, administradores.
ABSTRACT
This work aims at a scientific approach towards the scope and framing of
sections 134 and 135 of the Brazilian Tax Code, as well as the other rules
related to the limits of fiscal responsibility to partners and executive
officers of legal entities, a very relevant subject in the relations between
the tax authority and taxpayers.
This topic is very important, as we can observe the usage of the
patrimonial separation of the legal entity by malicious entrepreneurs as a
way to flee from tax payments.
On the other hand, the abuses committed by the tax authority are clearly
shown, as it has been directly suing partners and executive officers
without any regard to the principles and prescriptions of our National Tax
System.
Our conclusions point towards the need of a stronger rigorousness by the
tax authority in attributing tax responsibility to partners and executive
officers of corporations. And this attribution must be done in administrative
proceedings, where the imposition is formed.
KEY-WORDS: responsibility, tax, partner, executive officers.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 1
1. SISTEMA JURÍDICO ................................................................................. 5
1.1. A linguagem aplicável ao mundo das normas: a forma
de manifestação do direito ................................................................ 5
1.2. Texto e norma ................................................................................... 9
1.3. Sobre o objeto do estudo do direito ................................................ 11
1.4. Sistemas jurídicos - sistema do direito posto e sistema
da ciência do direito ........................................................................ 16
1.5. O conjunto das normas válidas como objeto da
ciência do direito ............................................................................. 19
1.6. Sistema constitucional brasileiro ..................................................... 20
1.7. Os princípios constitucionais brasileiros ......................................... 23
2. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA ..................................................... 30
2.1. Fundamentos preliminares ............................................................. 30
2.2. Sujeição passiva ............................................................................. 37
2.3. A sujeição passiva tributária e o princípio constitucional
da capacidade contributiva ............................................................. 42
2.4. Classificação dos contribuintes e responsáveis ............................. 46
2.5. Solidariedade .................................................................................. 54
3. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS E
DIRIGENTES DE PESSOAS JURÍDICAS ............................................... 61
3.1. A responsabilidade dos sócios no caso de liquidação
de sociedade de pessoas ............................................................... 61
3.2. A responsabilidade dos sócios e dirigentes de pessoas jurídicas
pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes
de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatutos ............................................................ 68
3.3. A execução fiscal e os instrumentos de defesa dos sócios
e administradores ........................................................................... 76
4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA .................... 89
4.1. O conceito de pessoa e personalidade jurídica .............................. 89
4.2. A teoria geral da desconsideração da personalidade jurídica ........ 94
4.3. A desconsideração da personalidade jurídica no direito brasileiro 100
4.4. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica
no direito tributário ........................................................................ 105
CONCLUSÕES ............................................................................................ 112
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................... 118
– 1 –
INTRODUÇÃO
A Responsabilidade Tributária dos sócios e dos dirigentes de
pessoas jurídicas é tema de importância sempre ascendente no estudo do
Direito.
Dentre as preocupações que nos ocupam nesta pesquisa, estão o
enquadre e o alcance da prescrição normativa dos arts. 134 e 135 do Código
Tributário Nacional (CTN), ou seja, dos dispositivos legais que tratam da
responsabilidade tributária de terceiros.
Na prática jurídica brasileira, percebemos empresários mal
itencionados usarema separação patrimonial da pessoa jurídica como uma
forma de se evadir do pagamento de tributos.
Por outro lado, têm sido frequentes os abusos cometidos pela
Fazenda Pública que se tem insurgido diretamente em face dos sócios e
dirigentes das empresas, por intermédio das ações de execução fiscal, sem ao
menos obedecer aos princípios e às prescrições impostas pelo Sistema
Tributário Constitucional brasileiro.
Nesse contexto, afigura-se importante que os agentes públicos
disponham, não só de conceitos mais precisos, como também de
delineamentos marcados pelo rigor científico que permitam alcançar o instituto
da responsabilidade tributária no campo em que agora estamos inseridos.
– 2 –
Para contextualizarmos o leitor no tema da responsabilidade dos
sócios e dirigentes da pessoa jurídica relacionada ao agente, faz-se mister
apresentarmos, no capítulo 1, o sistema constitucional brasileiro, discorrendo
acerca dos princípios orientadores de todo o ordenamento jurídico-tributário,
inserido no modelo filosófico que escolhemos para estimular a nossa
investigação, qual seja: o direito como sistema de linguagem.
No capítulo 2, abordamos o fenômeno da responsabilidade tributária
dos sócios e dirigentes das pessoas jurídicas, momento em que detivemos
rigoroso esforço no sentido de analisar os aspectos gerais da obrigação
tributária, definindo a relação jurídica, a sujeição passiva e a responsabilidade
tributária, bem como o processo de positivação do direito com a fenomenologia
da incidência tributária.
No capítulo seguinte, adentramos no estudo propriamente dito da
Responsabilidade Tributária de terceiros, mediante a apreciação das
disposições dos arts. 134 e 135 do CTN, quando buscamos construir a correta
significação da norma que atribui responsabilidade aos sócios de sociedades
de pessoas em caso de liquidação da empresa e aos sócios e administradores
de pessoas jurídicas pelas obrigações tributárias resultantes da prática de
infração à lei, contrato social e estatuto.
Outro aspecto a ser explanado no presente trabalho, ainda no
capítulo 3, guarda pertinência com o entendimento manifestado recentemente
pela Primeira Seção do STJ, que resolveu dificultar em definitivo o exercício do
direito de defesa dos responsáveis tributários ilegítimos, ao considerar ser
– 3 –
incabível a exceção de pré-executividade para arguir a ilegitimidade passiva
em sede de execução fiscal, promovida contra sócio que figura como
responsável na Certidão de Dívida Ativa – CDA, devido à presunção de
legitimidade assegurada à CDA.
Entretanto, conforme defendido no presente estudo, não
vislumbramos legitimidade alguma de CDA que retrate ato administrativo de
inscrição em dívida ativa de crédito inexistente, em face de não terem sido os
sócios, diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito
privado, no curso do processo de positivação do direito, notificados do
lançamento tributário com atribuição motivada de responsabilidade tributária,
não lhes sendo, portanto, conferido, o direito de defesa.
O Ato administrativo de inscrição em dívida ativa, da forma como
vem sendo realizado, infringe diretamente os princípios constitucionais da
ampla defesa, do contraditório e da motivação dos atos administrativos.
Desta feita, entendemos não ser pertinente a generalização imposta
pelo STJ no sentido de mitigar o direito de defesa dos ilegítimos responsáveis
tributários, conferindo-lhes, tão-somente, o manejo dos Embargos à Execução
ou a Ação Anulatória para se discutir a questão da legitimidade passiva.
Existente a possibilidade de se demonstrar de plano, prescindindo
da realização de dilação probatória, a ilegitimidade do sujeito passivo eleito
pelo fisco, não se pode impor limites e restrições de natureza processual
quanto à discussão desta condição da ação, cuja matéria, ressalte-se, é de
ordem pública.
– 4 –
No intuito de robustecer os argumentos expendidos no capítulo 3,
ressaltamos o posicionamento recente firmado pelo Superior Tribunal de
Justiça (STJ) no sentido de que o não pagamento do tributo devido, por si só,
não configura, nem em tese, a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista
no art. 135 do CTN. Para tanto, seria indispensável que os diretores, gerentes
ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado tenham agido com
excesso de poderes ou infração à lei societária, ao contrato social ou ao
estatuto da empresa.
Para melhor compreensão da teoria da desconsideração da
personalidade jurídica e suas relações com o direito tributário, defendemos, no
capítulo 4, nossa posição quanto à inaplicabilidade deste instituto nas lides
tributárias quando houver norma de responsabilidade específica para o caso
concreto.
Com um olhar lançado ao futuro, nossas conclusões apontam para a
necessidade de um maior rigor por parte do Fisco na atribuição de
responsabilidade tributária aos sócios e aos dirigentes de pessoas jurídicas, e
que essa atribuição se dê nos processos administrativos de constituição dos
tributos, garantindo-lhes o direito de se defenderem contra a atribuição de tal
responsabilidade. Dessa forma, ter-se-ão expedidas certidões de dívida ativa
que realmente gozam de presunção, certeza e liquidez, com a indicação dos
prováveis responsáveis tributários.
– 5 –
1. O SISTEMA JURÍDICO
1.1. A linguagem aplicável ao mundo das normas: a forma de
manifestação do direito
Com o objetivo de analisarmos o tema proposto pelo presente
trabalho, a responsabilidade tributária dos sócios e dirigentes de pessoas
jurídicas, precisamos inseri-lo na noção de sistema jurídico, para o fim de
apreciá-lo como um plexo de normas jurídicas, construídas a partir do texto da
lei e através das relações de coordenação e subordinação com as demais
normas do Sistema Constitucional Brasileiro.
O Direito se apresenta em linguagem e dela é dependente; por essa
razão, inúmeras são as relações existentes entre o Direito e a linguagem.
Assim, a linguagem que fala sobre o direito ou por intermédio da qual ele se
expressa pode ser denominada linguagem jurídica1.
Linguagem jurídica é expressão ambígua que pode significar tanto a
linguagem prescritiva do direito positivo, quanto a linguagem descritiva da
Ciência do Direito. Contudo, elas devem ser tomadas como duas realidades
heterogêneas, pois se tratam de fenômenos de linguagem que possuem
organização lógica e função semântica e pragmática diversas. Nesse sentido:
_________________ 1 MORESO, José Juan. Lenguaje Jurídico. In: Valdés, Ernesto Garzón; Francisco J. Laporta. El derecho y la justicia. 2. ed. Madrid: Editora Trotta, 2000, p. 105.
– 6 –
La expresión << lenguaje jurídico >> es ambigua. Podemos
distinguir, al menos, dos sentidos de ella: a) puede referirse al
lenguaje en el que se expresan las normas, al lenguaje del
Derecho (al lenguaje legal, principalmente); b) también se
refiere al lenguaje en el que se expresan los juristas, al
lenguaje de los juristas acerca del Derecho (al lenguaje de la
ciencia jurídica, principalmente).2
A linguagem jurídica prescritiva verte-se em normas, o que significa
dizer que o Direito positivo pode ser estudado como um fenômeno de
linguagem prescritiva de condutas intersubjetivas, o qual se apresenta segundo
os valores previamente estabelecidos pela sociedade em que se insere.
A linguagem da Dogmática jurídica ou Ciência do Direito se
materializa em uma linguagem que toma por foco a própria linguagem
prescritiva. Paulo de Barros Carvalho preceitua que:
"Tomada com relação ao direito positivo, a Ciência do Direito é
uma sobrelinguagem ou linguagem de sobrenível. Está acima
da linguagem do direito positivo, pois discorre sobre ela,
transmitindo notícias de sua compostura como sistema
empírico”3.
A linguagem do Direito positivo é, por correlação, havida como
linguagem-objeto, de cunho prescritivo de condutas intersubjetivas. Prescrever
condutas intersubjetivas, nada mais é do que regular condutas entre pessoas.
Por outro lado, a linguagem da Dogmática Jurídica, nos dizeres de Lorival
Vilanova:
_________________ 2 MORESO, José Juan. Lenguaje Jurídico. In: Valdés, Ernesto Garzón; Francisco J. Laporta. El derecho y la justicia. 2. ed. Madrid: Editora Trotta, 2000, p. 105. 3 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 3.
– 7 –
não se encontra dentro do sistema, não pertence à linguagem
em que se expressam as regras de direito positivo.
Relativamente a essa linguagem, pertence à meta-linguagem
que é a da Ciência-do-Direito: à linguagem que fala sobre a
linguagem das normas.4
Em face da distinção entre os níveis de linguagem, há a
necessidade de grande rigor e precisão na transmissão das mensagens
descritas cientificamente, para que se tenha melhor compreensão do objeto de
estudo. No caso do Direito positivo, que foi tomado como objeto de estudo da
Ciência do Direito, para uma melhor visualização e compreensão de sua
estrutura, é imprescindível que lancemos mão tanto da abstração lógica, ou
formalização, como da generalização.
Explicitando, o que há é o seguinte: o Direito positivo forma um
plano de linguagem de índole prescritiva, ao tempo em que a Ciência do direito,
que o relata, compõe-se de uma camada de linguagem fundamentalmente
descritiva.
Estabelecidos estes níveis de linguagem, relacionados por uma
função metalinguística, cumpre ainda ao intérprete que tomar a linguagem de
sobrenível como estudo, segundo uma concepção empirista contemporânea,
distingui-la através da construção de um outro nível de linguagem, a partir do
qual se possa fazer uma investigação problematizadora dos componentes e
estruturas da linguagem que se está analisando.
Para se chegar a esta "metalinguagem", é preciso a utilização dos
expedientes da generalização e da formalização, adquirindo-se o necessário
_________________ 4 VILANOVA, Lourival. Escritos jurídicos e filosóficos. Brasília: Axis Mvndi Ibet, 2003, p. 329.
– 8 –
rigor e precisão, eliminando as ambiguidades da linguagem cotidiana, expondo
o seu significado, pelo primeiro, e as suas relações sintáticas, pelo segundo.
A linguagem, então, adquire extrema importância, revelando-se a
Teoria Geral dos Signos (Semiótica) como instrumento à disposição do
estudioso do Direito, ampliando em muito sua cognicividade, por tornar seu
discurso capaz de descrever com maior riqueza e precisão o fenômeno
linguístico do seu objeto (Direito Positivo).
É também com as categorias semióticas que se pode captar,
metodologicamente, o ato de compreensão do destinatário do comando
normativo, ato o qual norteará a sua conduta. Pratica-se, pois, consciente ou
inconscientemente, duas operações lógicas. A primeira, denominada de
inclusão de classes, corresponde à percepção de que determinado fato do
mundo social se subsume à classe dos fatos previstos na hipótese normativa.
A segunda, chamada de implicação, corresponde à verificação da relação
jurídica prevista no consequente, deonticamente modalizada.
De fato, em um ato de cognição, é possível se depreender que a
linguagem prescritiva legislada é redutível a regras jurídicas, caracterizadas
pela uniformidade sintática e a heterogeneidade semântica. Partindo do
conceito de norma jurídica como a unidade mínima de significação deôntica,
tem-se sua compostura estrutural, sendo uma proposição hipotética-
condicional (se ocorrer o fato "x", então deve ser a prestação "y") formada por
várias noções, as quais podem estar esparsas por mais de um veículo
normativo (lei ordinária, lei complementar, etc.).
– 9 –
Os chamados enunciados prescritivos recebem um tratamento
formal ao serem acolhidos em nossa mente, que os agrupa e dispõe na
conformidade lógica da implicação, que é a forma dos enunciados normativos,
após a leitura dos enunciados prescritivos. Tais enunciados ingressam na
estrutura sintática das normas na condição de proposição-hipótese ou de
proposição-consequente. E tudo isso porque a norma jurídica deve ser acolhida
como a unidade mínima e irredutível de significação do deôntico5. Assim, se
reconhece força prescritiva às frases isoladas dos textos positivados. Nada
obstante, esse teor prescritivo está na dependência de integrações em
unidades normativas, como mínimos deônticos completos.
1.2. Texto e norma
A linguagem comporta uma estrutura triádica: o (i) suporte físico se
refere a algum objeto do mundo (ii) significado, do qual extraímos um conceito
ou juízo (ii) significação.
O suporte físico refere-se a algo, que é o seu significado, que insere
em nossa mente uma noção, uma ideia ou conceito, a significação.
O suporte físico da linguagem prescritiva do Direito Positivo é o
repertório de enunciados dotados de significados, do qual o sujeito
cognoscente extrai os juízos nele estabelecidos (significação), isto é, a palavra
falada ou escrita, de natureza física ou material. São, portanto, os símbolos
linguísticos marcados no papel ou a mensagem sonora que é dirigida pelo
_________________ 5 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 113.
– 10 –
emissor da ordem, utilizados para comunicarem as prescrições sistemicamente
estabelecidas.
O significado, que está contido no suporte físico supra descrito, se
reporta ao comportamento humano no quadro de suas relações intersubjetivas.
É a representação do comportamento regulado.
A significação é algo que se reproduz em nossas mentes como
resultado de percepção do mundo exterior, captado pelos sentidos. In casu, é a
norma jurídica, na forma como recebemos das leituras dos textos de Direito
Positivo.
No plano da significação têm-se as proposições, que são dotadas do
conteúdo significativo que o enunciado exprime. É para estas que se volta o
interesse da lógica, porque os seus elementos e formas não são palavras nem
expressões linguísticas, mas aquilo que significam.
Como visto, o Direito Positivo é o suporte físico, o repertório de
significados de onde o sujeito cognoscente extrai os juízos nele estabelecidos
(significação).
A norma jurídica é a significação percebida nos textos de Direito
Positivo (grupo de vocábulos) face à respectiva realidade empírica, aparecendo
como uma proposição que representa um enunciado de juízos.
A correta significação dos juízos advirá, contudo, através do exame
dos princípios que emergem da totalidade do sistema, para uma adequada
formulação interpretativa por parte do utente, porque são os princípios gerais
que dão a base de sustentação axiológica ao sistema de normas.
– 11 –
1.3. Sobre o objeto do estudo do direito
O problema fundamental de toda ciência é a demarcação do seu
objeto-formal. E a cada ciência corresponde um e somente um objeto-formal,
para efeito de constituição de um sistema de proposições descritivas, com fim
cognoscitivo sobre ele.
Objeto-formal é o produto de um corte abstrato sobre o objeto-
material, cuja constituição é complexa. Objeto-material, matéria reconstituída
gnosiologicamente sobre a qual se opera essa demarcação, que, por isso
mesmo, dá margem à constituição de “n” objetos e respectivos feixes
homogêneos de proposições: teorias.
A ciência do direito é uma das ciências sobre a realidade chamada
“direito”, cujo objeto não é dado, mas construído mediante critérios seletivos -
redutores de complexidade.
O direito é instrumento, uma técnica social específica baseada na
experiência humana para fins de regular as condutas intersubjetivas no tempo
histórico e no espaço social. É por meio do direito que o Estado age para
manter e realizar o bem comum e os valores da comunidade.
O objeto-formal da ciência do direito é o direito positivo, que
apresenta uma multiplicidade quantitativamente indeterminada e
qualitativamente heterogênea de regras. Assim, o conhecimento científico visa
pôr ordem na multiplicidade heterogênea do objeto-material, delineando
conceitos e isolando as propriedades das normas jurídicas, seletivamente.
– 12 –
O conhecimento gnosiológico busca reconstituir o dado-material e
constituir o objeto-material, na medida em que busca não reconstituir aquele,
mas apenas a experiência (acesso ao objeto) do ser cognoscente, para
possibilitar, num segundo momento, que o conhecimento científico, pelo corte
epistemológico sobre o objeto-material, possa constituir o objeto-formal.
Assim, a ciência não faz o direito, fala sobre ele, separando
conceitualmente as normas para, na linguagem descritiva, emitir enunciados
sobre ele. Então, temos que o objeto-formal da ciência do direito é o direito
positivo (conjunto de normas jurídicas válidas).
Segundo Eurico Diniz de Santi6, o direito é realidade (fato) e
idealidade (norma) – o que se denomina de bidimensionalidade. Como
idealidade, toma dois níveis: a norma e o valor, tornando-se tridimensional por
essa divisão. Entretando, somente as normas, unidades básicas que
conformam o direito positivo, interessam à investigação da ciência formal.
Direito positivo e ciência do direito são fixados, ambos, em sistemas
linguísticos, dado que a semiótica ou teoria dos signos potencializa o discurso
do cientista dogmático, ampliando a capacidade do discurso científico, que
implica, portanto, o estudo do plano sintático, semântico ou pragmático da
linguagem prescritiva do direito posto. Consoante assevera Tércio Sampaio
Ferraz Júnior:7
_________________ 6 SANTI, Eurico Marcos Diniz de. “Introdução: norma, evento, fato, relação jurídica, fontes e validade no direito”. In: Eurico Marcos Diniz de Santi. (Org.). Curso de Especialização em Direito Tributário – Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v. 1, pp. 6-15. 7 FERRAZ JUNIOR, T.S. Introdução ao estudo de direito: técnica, decisão, dominação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 124.
– 13 –
Apenas com objetivos didáticos, oferecemos um critério que
pode, se não sistematizar todos, pelo menos fornecer uma
visão abrangente e compreensiva dos diferentes critérios
tópicos. Servimo-nos, pois, de um ponto de vista semiótico, das
noções de relação sintática, semântica e pragmática. A
semiótica é a teoria dos signos (por exemplo dos signos
lingüísticos, das palavras), em sua tríplice relação: signos entre
si (sintaxe), em relação ao objeto (semântica) e aos seus
usuários (pragmática). Isto só nos basta para dizer que as
normas se classificam conforme critérios sintáticos, semânticos
e pragmáticos, ou seja, normas em relação a normas, normas
em relação ao objeto normado e normas em relação à sua
função.
O gênero norma, do qual “normas jurídicas” são espécie, apresenta-
se necessariamente em linguagem, sem a qual inexiste proposição de dever-
ser. A norma jurídica corresponde à significação que se colhe da leitura dos
textos do direito positivo. Os textos legais (suportes físicos - os enunciados)
são os veículos normativos que se constituem de enunciados prescritivos, aos
quais correspondem proposições (significações).
No presente segmento, interessa o enfoque da estrutura lógica da
norma jurídica, tomando como base a semiótica - estudo dos signos - nos seus
planos: sintático (relação dos signos entre si), semântico (signos com o que
designam) e pragmático (relações do signo com os utentes da linguagem).
Todas as normas apresentam a mesma estrutura sintática. Daí
dizer-se que o direito é um sistema que apresenta em suas unidades - as
normas jurídicas válidas - homogeneidade sintática (mesma estrutura lógica) e
heterogeneidade semântica (diversidade de conteúdos dirigidos à região
material). Destaca-se no interior da norma uma hipótese, descritor de possível
– 14 –
situação fática, e uma tese, prescritor da relação em que um sujeito fica em
face de um outro.
A norma jurídica prescreve condutas intersubjetivas e juridiciza
situações, é proposição jurídica que advém de um enunciado prescritivo. A
homogeneidade sintática dos elementos assim se põe: associa, num nexo de
causalidade jurídica (imputação), a descrição de um fato de possível ocorrência
no mundo objetivo (hipótese) a uma relação deôntica (consequência).
Os limites para a criação de normas jurídicas: um sintático (cinge-se
à estrutura lógica); outro semântico (material), que se cinge aos conteúdos
normativos do “factualmente possível” e do “não-necessário”.
O “ser” norma jurídica pressupõe bimembridade constitutiva: norma
primária e norma secundária, ambas com mesma estrutura sintática, mas com
composição semântica distinta. A primária vincula deonticamente a ocorrência
de dado fato a uma prescrição (relação jurídica); a secundária conecta-se
sintaticamente à primária, prescrevendo: caso não se cumpra o prescrito na
primária, então deve haver uma relação jurídica que assegure o cumprimento
daquela primeira (sanção). E a norma é jurídica, justo porque se sujeita à
sanção, que confere juridicidade à norma primária.
O que caracteriza a norma secundária é a figuração no prescritor da
sanção da possibilidade do uso da coação organizada, mediante órgão
jurisdicional, para fazer valer a efetivação do dever constituído pela eficácia
jurídica de outras normas. É norma de direito adjetivo.
– 15 –
Não é outra a constatação que colhemos do texto de Lourival
Vilanova8:
Se urna norma foi posta, para ser norma jurídica, constituir-se-á
de duas proposições: a primeira fixa as relações jurídicas ou
situações jurídicas decorrentes da verificação ou não-verificação
(fato não-ocorrente, omissivo) de fatos que são fatos jurídicos
justamente porque provocam tais “efeitos jurídicos”; a segunda,
fixa as conseqüências para os sujeitos no caso de não seguirem o
que está preceituado na norma antecedente. A conduta dos
sujeitos se alojará numa ou noutra norma, não em ambas.
Mesclar-se-iam o lícito e o ilícito, o devido e o não-devido se a
conduta se inserisse simultanearnente na primeira e na segunda
norma-parte da norma total. Se se descumpre a norma primária,
ingressa-se na órbita de incidência da norma secundária
sancionadora. Se há observância da norma primária, carece de
sentido prescritivo subsurnir a conduta na norma secundária. Do
âmbito de possibilidades de conduta para os sujeitos, são
selecionadas duas, colocadas em sucessividade temporal.
Cumprir/descumprir, ou observar/inobservar, ou
adimplir/inadimplir, é a dualidade que o ordenarnento jurídico
deixa aos sujeitos ante as normas positivas. São possibilidades
mutuamente excludentes, contraditórias ou contrárias, conforme
logicamente sejam ou não exaustivas (ontologicamente, as
possibilidades de fazer ou não-fazer são inesgotáveis).
Delimitada a nossa posição quanto à forma como se apresentam as
normas jurídicas, como produto construído pela análise sintática, semântica e
pragmática da linguagem legislada e sendo ela a única que importa para a
Ciência do Direito, e visualizando que tanto o direito positivo quanto a Ciência
do Direito podem ser sistematizados, passaremos a tratar no tópico seguinte
das diferenças substanciais entre o sistema do direito positivo e o sistema da
ciência do direito.
_________________ 8 VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Editora Max Limonad, 1997, pp. 132-133.
– 16 –
1.4. Sistemas jurídicos - sistema do direito posto e sistema da
ciência do direito
As normas jurídicas são unidades que, inter-relacionadas mediante
vínculos horizontais (relações de coordenação) e verticais (relações de
subordinação-hierarquia), compõem um sistema, o qual tem como suporte
físico os textos de Direito Positivo e encontra-se vertido numa linguagem de
natureza prescritiva.
Em face desse sistema prescritivo, o cientista do direito desenvolve
intenso trabalho de sua descrição. É o sistema da Ciência do Direito, de
enunciados apofânticos que dizem respeito às normas e princípios que
compõem o sistema prescritivo (deôntico).
A distinção entre ambos os sistemas está na impossibilidade de
pertinência de contradições no interior do sistema da Ciência do Direito, o que
não acontece com o sistema de direito posto, que pode conviver com
contradições intrassistêmicas - antinomias -, as quais apenas deixarão de
existir com a escolha de aplicação da norma legítima e adequada para reger
um dado caso concreto (por hierarquia formal, temporal etc)9.
No Direito Positivo, segundo Lourival Vilanova10, é possível haver
contradições entre as proposições normativas: entre normas de um mesmo
nível hierárquico, ou não, somente elimináveis pelos princípios extralógicos:
Agora, o que a experiência manifesta é a existência de
contradições entre as proposições normativas. Contradições
entre normas de um mesmo nível, entre leis constitucionais,
_________________ 9 Ibidem, pp. 191-195. 10 Ibidem, p. 194.
– 17 –
entre leis ordinárias, entre regulamentos e entre outros atos
normativos. Contradições só elimináveis pelo principio
extralógico da norma de nível mais elevado sobre a norma de
nível inferior, ou pelo critério, também extralógico, da sucessão
temporal (norma de mesmo nível revoga norma anteriormente
ditada); da norma geral que admite a contraposição
contraditória de uma norma especial, estatuindo para todos os
casos compreendidos num conjunto, menos para alguns que
se excetuam, mas que pertencem ao conjunto.
Dessa forma, a inexistência de contradições intra-sistêmicas não é
condição sine qua non para a estrutura sistêmica do jurídico.
Quando a uma dada norma N corresponde uma outra contraditória,
não-N, sendo ambas válidas, uma, ao menos, pertence ao sistema, porque é
também pertinente ao sistema um mecanismo decisional que possibilita a
aplicação de uma ou outra norma a um dado caso concreto (mas nunca
ambas), sem alterar em nada a validade da proposição normativa contraditória
que não for aplicada.
Assim, o Sistema de Direito Positivo pode conter proposições
normativas contraditórias, simultaneamente válidas, ainda que não
simultaneamente aplicáveis e, por isso, o órgão aplicador que deixou de aplicar
não-N, por contradizer N, incidível no caso subjudice, posteriormente pode
aplicar não-N, que continuou como norma válida em relação de
pertinencialidade com o sistema.
Uma norma é válida ou não-válida, de acordo com os critérios de
validade que o sistema jurídico estabelece (lei lógica). O ser-válido e o não-ser-
válido são propriedades análogas ao ser-verdadeiro e ao ser-falso das
– 18 –
proposições descritivas. O comportamento sintático de ambas as formas
valorativas é análogo, na medida em que a diferença que se põe entre os
mesmos reside no lado semântico: é o modo de referência ao objeto que difere.
Uma vez que o Sistema de Direito Positivo não é um sistema
científico, não lhe é peculiar seguir a lei lógica da não-contradição. Na Ciência
do Direito, contudo, a consistência formal é de suma importância para alcançar
(1) o objeto do conhecimento e (2) sua adequação (verdade material ou
gnosiológica) à experiência em que se dá o Sistema de Direito Positivo,
devendo ser, portanto, um todo isento de contradições. E isso porque o sistema
de Ciência do Direito exprime-se em linguagem apofântica, que é
necessariamente susceptível do valor verdade, positivo ou negativo, consoante
a confirmação ou falseabilidade pelo objeto da experiência11.
Pela diferenciação de valores acima descrita, a possibilidade de
convivência de proposições contraditórias no interior do sistema de Direito
Positivo não transita para a linguagem da Ciência do Direito, comprometendo
os valores apofânticos próprios desta linguagem.
Cumpre observar, todavia, que, mesmo assim, ao jurista
apresentam-se dificuldades técnicas, como as ambiguidades, a vagueza e
multissignificações, que são de difícil resolução semântica. E, para esses
casos, que persistirem, ainda no plano da teoria geral do direito, somente as
generalizações lógicas são capazes de ofertar um esquema seguro para captar
o arcabouço da mensagem normativa; isso porque os termos lógicos têm
somente uma significação.
_________________ 11 Cf. VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Editora Max Limonad, 1997, p. 192.
– 19 –
1.5. O conjunto das normas válidas como objeto da ciência do direito
O conhecimento jurídico pressupõe como imperativo epistemológico
que se estabeleça um corte metodológico, para que se torne possível um
trabalho coerente e rigoroso.
Por ser o sistema jurídico dotado de um natural empirismo, pode ser
estudado e apreendido cognoscitivamente segundo vários prismas: dogmática
jurídica, sociologia jurídica, ética, política, história do direito etc, de acordo com
o método que corresponda a cada um deles. Por esse motivo, não há que se
falar em privilégios de um em detrimento dos demais, sendo todos eles dotados
de dignidade científica similar.
Em termos de ciência que fala do Direito Positivo, a dogmática
jurídica, por preocupar-se com o caráter ontológico do jurídico, firma-se como a
parte do conhecimento jurídico que trata do direito posto e se preocupa em
“conhecer de que maneira se articulam e de que modo funcionam as
prescrições normativas”.12 É a dogmática jurídica o que se poderia chamar de
Ciência do Direito stricto sensu, porque se ocupa em descrever o Direito
Positivo posto, tal como ele se apresenta, considerado hic et nunc,. Por esse
motivo, para a dogmática, no dizer de Paulo de Barros13:
(...) é necessário observá-lo (o Direito Positivo) na sua feição
estática e no seu aspecto dinâmico, que se perfaz no seu
processo de positivação, em que a norma editada hoje será o
fundamento de validade de outras regras, até o ponto terminal
da cadeia de elaboração, que se consubstancia no último ato
de aplicação, norma individual de máxima concretude.
_________________ 12 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 12. 13 Ibidem, p. 13.
– 20 –
Foi a partir dessa visão do direito posivito como um sistema de
normas jurídicas válidas, e que possui na norma fundamental o seu ápice, que
desenvolvemos o presente trabalho no intuito de identificarmos quais as
normas que mantêm relação com as normas que dispõem sobre a
responsabilidade dos sócios e dirigentes de pessoas jurídicas de direito
privado.
Trataremos no tópico seguinte do Sistema Constitucional Brasileiro,
o qual contém princípios norteadores de todas as normas que lhe são
subordinadas, e dentre estas as que disciplinam a responsabilidade dos sócios
e dirigentes de pessoas jurídicas de direito privado.
1.6. Sistema constitucional brasileiro
Sistema jurídico, nos ensinamentos do professor Paulo de Barros
Carvalho, é uma expressão ambígua que tanto pode designar o sistema da
Ciência do Direito, quanto o direito positivo, o que acaba instaurando certa
instabilidade semântica. Todavia, os enunciados prescritivos que projetam
sobre a região material das condutas interpessoais acabam tendo um mínimo
de racionalidade, o que lhes garante a condição de sistema.
Há que se notar que, onde houver um conjunto de elementos
relacionados entre si, em face de uma determinada referência, pode-se
encontrar a noção de sistema, lembrando que o uso reiterado da comunidade
dos que lidam interativamente com o nosso idioma favorece outras preposições
que não podem ser desconsideradas. Assim, há que se atentar a tal fato para
– 21 –
procurar no sistema as possibilidades de uso de idioma que nos ofereça a
possibilidade de conjugar tais elementos centrados por uma ideia comum.
O sistema de direito está estruturado de maneira hierarquizada,
convergindo sempre para a norma fundamental e é regido pela fundamentação
ou derivação operacionalizada, tanto sobre o aspecto material quanto sobre o
formal ou processual, o que possibilita sua dinâmica, regulando sua própria
criação e transformação.
Tanto a Ciência do Direito (fenômeno linguístico) quanto o direito
positivo (plexo de enunciados prescritivos) apresenta-se como sistema; o
primeiro mostra-se num sistema nomoempírico descritivo, teorético ou
declarativo, vertido numa linguagem que se propõe ser científica; já o segundo,
nomoempírico prescritivo, apresentando a racionalidade do homem que é
utilizada como objetivo diretivo e vazado em linguagem técnica.
A partir da norma fundamental, cuja função é legitimar a Lei
Constitucional, as demais normas do sistema distribuem-se em várias escalas
hierárquicas, restando, à base da pirâmide, as regras individuais máximas de
concretude, onde uma concepção dessa ordem propicia a análise estática do
ordenamento (nomoestática), ou seja, as unidades normativas são
surpreendidas num instante, e uma análise dinâmica do funcionamento do
sistema positivo (nomodinâmica), onde se indagam as possíveis mutações,
tanto de ordem à criação de novas regras, como às transformações internas
que o complexo de normas tem idoneidade para produzir.
Temos, então, no complexo de normas acima referido, as regras de
comportamento, aquelas diretamente voltadas para a conduta das pessoas em
– 22 –
suas relações intersubjetivas, e as regras de estrutura ou de organização,
destinadas igualmente às condutas interpessoais, tendo por objeto os
comportamentos relacionados à produção de novas unidades deônticas,
dispondo sobre órgãos, procedimentos e forma de criação das regras
transformadas ou expulsas do sistema.
As normas em geral e as proposições expressam-se pelo conectivo
dever-ser (deôntico do sistema do direito positivo) modalizado em permitido
(P), obrigatório (O) e proibido (V). Assim, as regulações de condutas dependem
de edição de outra norma, e são determinadas por órgãos do sistema em que
irão editar normas jurídicas válidas e o modo como serão alteradas ou
desconstituídas. Seu conteúdo é disciplinar as competências, fazendo surgir a
norma de conduta derivada da regra de estrutura, para reger diretamente os
comportamentos interpessoais.
Temos de considerar o texto constitucional como lugar que trata
das linhas gerais que informam a organização do Estado, traçando as
características das instituições que a legislação comum desenvolve,
conferindo-lhes compostura final.
Ressalte-se que nossa Carta Maior é rígida, de modo a permitir
somente a sua alteração através de um procedimento muito mais solene e
rígido do que aquele exigido ora com as leis ordinárias, nada obstante os
valores jurídico-politicos intangíveis consagrados no artigo 60, § 4º, I a IV.
Esse subsistema – legitimado pela norma fundamental e
consubstanciado pelo ponto de confluência do direito positivo à matéria que lhe
– 23 –
dá conteúdo – é constituído por um quadro orgânico das normas atinentes à
matéria tributária em nível constitucional, cujaa homogeneidade das regras é
determinada pela natureza lógica das entidades normativas horizontalmente
coordenadas.
Ainda que as regras de estrutura sejam as de maior aparência,
existem aquelas que se dirigem à disciplina das condutas.
O subsistema constitucional tributário realiza várias funções; enuncia
normas que são verdadeiros princípios, os quais irão influenciar várias outras
normas que lhes são subordinadas. Note-se que, diferentemente de outros
países, no Brasil, por exemplo, foram dispensados fartos preceitos em matéria
tributária, mobilizando, de certa forma, o legislador ordinário, fazendo-se
entender que nossas imposições tributárias encontram-se sob os cuidados de
muitos princípios constitucionais que se irradiam por toda a ordem jurídica.
As normas tratadas no presente trabalho regulam a responsabilidade
dos sócios e administradores das pessoas jurídicas de direito privado, em
relação aos tributos cobrados destas. São, portanto, subordinados à hierarquia
dos princípios constitucionais.
1.7. Os princípios constitucionais brasileiros
Deparamos-nos agora com uma questão de vital importância no ato
de apreensão da correta significação que se deve dar às normas jurídicas,
levando-se em consideração que elas mantém entre si relações de
– 24 –
subordinação e coordenação, todas confluindo para a norma fundamental da
qual a Constituição obtém o seu fundamento de validade. É justamente na
Constituição Federal, norma de hierarquia superior e orientadora de todas as
demais normas do sistema que lhe são inferiores, que vamos encontrar os
princípios jurídicos.
Discorrendo acerca dos princípios jurídicos, Roque Carrazza assim
define:
princípio jurídico é um enunciado lógico, implícito ou explícito,
que, por sua grande generalidade, ocupa posição de
preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso
mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a
aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam.14
Com efeito, os princípios são encontráveis em todos os escalões da
“pirâmide jurídica”. Assim, podemos identificar princípios constitucionais, legais
e até mesmo infralegais; contudo, os constitucionais, sem dúvida alguma, são
os de maior relevância, na medida em que sobrepairam aos outros princípios e
regras, inclusive às contidas na Constituição Federal.15
O princípio dentro de nosso ordenamento possui uma função
especificadora para a exegese e perfeita aplicação dos atos normativos.
Também não passa de ser uma norma jurídica qualificadora, posto que possui
um âmbito de validade maior e orienta a atuação de outras normas, ainda que
sejam de níveis constitucionais.16
_________________ 14 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 19. ed. Rev. amp. e atual, 2a. tiragem. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 33. 15 Ibidem, p. 34. 16 Ibidem, p. 41.
– 25 –
Leciona Paulo de Barros Carvalho17 que os princípios são linhas
diretivas que auxiliam na compreensão dos setores normativos, imprimindo
caráter de unidade relativa que serve de fator de agregação num dado feixe de
normas, e podem ser encontrados de maneira expressa ou implícita sem
considerar algum tipo de supremacia entre eles. Para o objeto do nosso
trabalho, cabe-nos analisar o princípio da igualdade e da capacidade
contributiva, no intuito de avaliarmos se as normas atributivas de
responsabilidade tributária dos sócios e dirigentes de pessoas jurídicas estão
em consonância cosigo mesmos.
É essencial para o desenvolvimento do presente trabalho, definirmos
alguns princípios constitucionais e outros direcionados à orientação das
normas tributárias e, especificamente, das normas relativas à sujeição passiva
tributária. São eles:
Princípio da justiça: É tido como uma diretriz suprema, utilizado para
implementar outros princípios, motivo pelo qual é considerado como
sobreprincípio na medida em que as unidades normativas o proclamam.
Princípio da certeza do direito: Também considerado como
sobreprincípio, é algo que está na própria raiz do dever-ser, sendo incompatível
imaginá-lo sem determinação específica. Elege a certeza como postulado
indispensável para uma harmoniosa convivência social.
Princípio da segurança jurídica: Coordena o fluxo das interações
inter-humanas visando a propagar, no seio da comunidade social, a
previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da regulação da conduta humana.
_________________ 17 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 147.
– 26 –
Princípio da irretroatividade das leis: Princípio que garante a certeza
do direito, alcançando o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada, sendo, portanto, considerado como norma superior que estabelece
limites, objetivos – artigo 5º, XXXVI da CF/88.
Princípio da universalização da jurisdição: Estampado no artigo 5º,
XXXV, tal princípio garante a todos, a tutela jurisdicional do Estado com o
propósito de assegurar a aptidão da coisa julgada.
Princípio que consagra o direito de ampla defesa e o devido
processo legal: Instrumento básico para garantir a preservação dos direitos e
garantias; esse princípio está previsto no artigo 5º, LV, onde aos litigantes, em
geral, está garantido o devido processo legal.
Princípio que afirma o direito de propriedade: Insculpido no artigo 5º,
XXII e XXIV da CF/88, o princípio da propriedade aloja situações materiais que
sofrem impacto tributário, motivo pelo qual deve ser guarnecido de proteção
constitucional.
Já considerando os princípios constitucionais tributários, temos:
Princípio da estrita legalidade: Trata-se de princípio que determina a
introdução de regras tributárias sempre por meio de lei no seu sentido lato. No
que concerne ao princípio da estrita legalidade, sua abrangência acaba sendo
maior, na medida em que estabelece a necessidade de que a lei traga no seu
bojo elementos descritores do fato jurídico e os dados prescritivos da relação
obrigacional.
– 27 –
Princípio da anterioridade: Tal princípio determina que a lei que instituir
ou majorar um tributo só poderá ser aplicada no ano seguinte, para tanto, o
respectivo diploma legislativo deve ser publicado no período que antecede o início
do exercício financeiro em que se pretenda efetuar a cobrança.
Princípio da irretroatividade da lei tributária: Esse princípio existe
para proteger situações já ocorridas e, visando a, de toda sorte, proteger o
direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Assim, seu
reconhecimento impede que o ente tributante venha tomar iniciativas tributárias
no sentido de atingir fatos passados.
Princípio da tipologia tributária: Através desse princípio, será
possível verificar a definição do tipo tributário pela sua integração lógico-
semântica, por meio de dois fatores: hipótese de incidência e base de cálculo.
Diante desses fatores, na medida em que foram adequadamente isolados, será
possível credenciar determinado tributo em imposto, taxa ou contribuição de
melhoria, bem como anunciar seu tipo tributário.
Princípio da proibição de tributo com efeito de confisco: Nada
obstante tratar-se de um princípio que carece de linhas demarcatórias no que
concerne ao conceito do limite o qual incide o inciso IV, do artigo 150 da CF/88,
a nota principal repousa no sentido de que a carga tributária tem limite.
Princípio da vinculabilidade da tributação: Ainda que exista uma
série de atos discricionários da atividade administrativa, a relevância desse
princípio se dá àqueles acontecimentos de maior importância, ou seja, os que
dizem respeito aos fins últimos da pretensão tributária, sendo pautados por
uma estrita vinculabilidade.
– 28 –
Princípio da uniformidade geográfica: Aqui se trata de um princípio
cuja tradução é o sentido de determinar que os tributos instituídos pela União
sejam uniformes em todo o território nacional, de modo que tal postulado deve
ser aplicado aos demais entes para que não haja prejuízo entre eles.
Princípio da não-discriminação tributária, em razão da procedência
ou do destino dos bens: Tal princípio determina que as pessoas tributantes
estão impedidas de graduar seus tributos, levando-se em conta a região de
origem dos bens ou do local para onde se destinem.
Princípio da territorialidade da tributação: A observância desse
princípio é condição determinante para o bom funcionamento do Estado de
direito, na medida em que o poder vinculante de uma lei ensejará que seus
efeitos jurídicos deverão respeitar os limites geográficos da pessoa política que
a editou.
Princípio da indelegabilidade da competência tributária: Lembrando
sempre que transferir capacidade ativa não é transferir competência tributária,
o legislador, ao definir a incidência do imposto, já terá esgotado sua
competência, pelo que somente poderá passar adiante a sua capacidade para
ser sujeito ativo. Assim, a transferência de competência para instituir
determinado tributo é vedada.
Princípio da igualdade: Contido no artigo 5º, caput, da Constituição
Federal, tem como destinatários os órgãos da atividade legislativa, não sendo
de fácil determinação, nada obstante sua grande importância.
– 29 –
Princípio da capacidade contributiva: Fonte principal de critérios
discriminatórios, conforme o qual os impostos serão graduados e
personalizados segundo as possibilidades econômicas do contribuinte.
Passaremos à analise da responsabilidade tributária no âmbito da
teoria geral do direito tributário, momento em que retornaremos à análise do
princípio da capacidade contributiva e de sua relação com a responsabilidade
tributária dos sócios e dirigentes de pessoas jurídicas de direito privado.
– 30 –
2. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
2.1. Fundamentos preliminares
O objeto de nossa investigação é a responsabilidade tributária dos
sócios e dirigentes das pessoas jurídicas. Entretanto, para adentrarmos ao
tema proposto, faz-se necessário, inicialmente, abordarmos alguns conceitos
relacionados ao fenômeno da incidência da norma tributária.
O responsável tributário, assim como o contribuinte, é pessoa física
ou jurídica que ocupa na relação jurídico-tributária o lugar de sujeito passivo. A
sujeição passiva - tema da mais alta relevância para o presente estudo - será
detidamente analisada mais adiante. Por ora, ocupar-nos-emos da relação
jurídico-tributária formal.
Tratamos no capítulo anterior da forma como se apresenta o sistema
do direito positivo. Verificamos que o direito se apresenta em uma linguagem
de índole prescritiva contida de forma esparsa nos diversos veículos
normativos (textos de lei) e que essa linguagem permite a construção pelo
intérprete de normas jurídicas.
Partindo do conceito de norma jurídica como a unidade mínima de
significação deôntica, tem-se sua compostura estrutural como sendo uma
proposição hipotético-condicional (se ocorrer o fato "x", então deve ser a
– 31 –
prestação "y"). Ou seja, se ocorrer o fato “x”, deverá haver uma relação jurídica
entre sujeitos de direito. Assim como nos diz Lourival Vilanova18: “Ao jurista
nenhuma idéia é mais familiar: a norma ao incidir num fato (no fato jurídico)
vincula a esse fato um relacionamento entre sujeitos-de-direito”.
Essa é a norma geral e abstrata, considerada como a norma que
disciplina condutas. No campo em que se insere o nosso objeto de estudo, qual
seja, no direito tributário, temos que a norma geral e abstrata disciplinadora de
condutas se apresentará na forma lógica da regra matriz de incidência
tributária, conforme critérios que identificamos nesse fenômeno.
A regra-matriz de incidência tributária apresenta-se com a mesma
estrutura lógica de qualquer norma jurídica, vista como unidade mínima de
significação deôntica, isto é, hipótese que implica uma consequência. Difere
das demais normas apenas em face do seu conteúdo, pois descreve um fato
tributário e prescreve a relação jurídica obrigacional a ser estabelecida entre
sujeito ativo e passivo, tendo como objeto a prestação pecuniária, em moeda
ou em cujo valor nela se possa exprimir, não decorrente de ato ilícito.
A hipótese da regra-matriz de incidência tributária pode ser definida
como: “descrição normativa de um evento, que concretizado no nível das
realidades materiais e relatado no antecedente de norma individual e concreta,
fará irromper o vínculo abstrato que o legislador estipulou na conseqüência.”19
Como explica Paulo de Barros Carvalho evento jurídico tributário é o
acontecimento real e fato jurídico tributário é o “relato lingüístico desse _________________ 18 VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Editora Max Limonad, 1997, p. 75. 19 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 244.
– 32 –
acontecimento. Fato jurídico, porque tem o condão de irradiar efeitos de direito;
tributário, pela simples razão de sua eficácia estar diretamente ligada à
instituição do tributo.”20
Ainda conforme o autor21, a subsunção não se verifica simplesmente
entre iguais, mas entre linguagens de níveis diferentes. Toda vez que ocorre a
subsunção do fato à norma, com a consequente efusão de efeitos jurídicos
típicos, estar-se-á diante da própria essência da fenomenologia do direito.
No tocante à fenomenologia da incidência da norma tributária ou
regra-matriz de incidência tributária, diremos que houve a subsunção quando o
fato (fato jurídico tributário) guardar identidade com o desenho normativo da
hipótese (hipótese tributária). Quando o fato ganha concretude , instala-se,
automática e infalivelmente, o laço abstrato pelo qual o sujeito ativo torna-se
titular do direito subjetivo público de exigir a prestação, ao passo que o sujeito
passivo ficará na contingência de cumpri-la.22
Convém ressaltar que, para que ocorra a subsunção, o
enquadramento do fato à hipótese normativa tem de ser completo. É preciso
que sejam satisfeitos todos os critérios identificadores tipificados na hipótese
da norma geral e abstrata.
Inexiste cronologia entre a verificação empírica do fato e o
surgimento da relação jurídica. Instaura-se o vínculo abstrato, que une as
pessoas, exatamente no instante em que aparece a linguagem competente que
_________________ 20 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 244. 21 Ibidem, p. 245. 22 Ibidem, p. 246.
– 33 –
relata o evento descrito pelo legislador. São entidades simultâneas,
concomitantes.23
A norma em sentido estrito é a que vai definir a incidência fiscal.
Para obter a regra-matriz, faz-se necessário isolar as proposições em si, como
formas de estrutura sintática, e suspender o vetor semântico da norma para as
situações objetivas, ao mesmo tempo em que se desconsideram os atos
psicológicos de querer e de pensar a norma.
Assim, a hipótese trará a previsão de um fato (antecedente
normativo), enquanto o consequente prescreverá a relação jurídica – obrigação
tributária (consequente). Na hipótese, encontraremos um critério material
condicionado no tempo e no espaço. Já na consequência, nos depararemos
com o critério pessoal e quantitativo.
Lourival Vilanova já dizia que “O dado social juridiciza-se, inserindo-
se em hipótese ou provocando (mediante o legislador, em sentido abrangente)
novas hipóteses e novas conseqüências.”24
Por sua vez, Paulo de Barros Carvalho, no mesmo sentido de
Lourival Vilanova, concluiu que:
A hipótese (...) é construída pela vontade do legislador, que
recolhe os dados de fato da realidade que deseja disciplinar
(realidade social), qualificando-os, normativamente, como fatos
jurídicos.
(...)
_________________ 23 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 247. 24 VILANOVA, Lourival. Causalidade e relação no direito. 4. ed. Rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 86.
– 34 –
Ao escolher os fatos que lhe interessam como pretexto para
desencadear efeitos jurídicos, o legislador expede conceitos
que selecionam propriedades do evento.
(...)
Ao conceituar o fato que dará ensejo ao nascimento da relação
jurídica do tributo, o legislador também seleciona as
propriedades que julgou importantes para caracterizá-lo. E,
desse conceito, podemos extrair critérios de identificação que
nos permitam reconhecê-lo toda vez que, efetivamente,
aconteça.25
Logo, afigurar-se-ia impossível cogitar uma descrição que pudesse
captar o evento na infinita riqueza de seus predicados. “No enunciado
hipotético, vamos encontrar três critérios identificadores do fato: a) critério
material; b) critério espacial e c) critério temporal.”26
O critério material é um dos componentes da hipótese normativa,
nada obstante, muitos confundi-lo, tratando-o como a própria hipótese.
Conceitua-se, erroneamente, o critério material como “descrição objetiva do
fato”, olvidando-se que a descrição objetiva do fato é a própria hipótese e não
seu critério material.
Com efeito, será critério material a identificação de um
comportamento, seja ele um estado, isto é, “ser proprietário”, ou uma ação, isto
é, “vender mercadorias”. O critério material será formado por um verbo
acompanhado de seu complemento.
Por sua vez, o critério espacial é componente da hipótese normativa.
No que se refere a tal critério, sua relevância é marcada pela estreita ligação
_________________ 25 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004 pp. 252-253. 26 Ibidem, p. 253.
– 35 –
com o campo impositivo do ente político instituidor da exação, pela conduta
hipotética a ser realizada fora do território impositivo do ente político instituidor
da exação, que só será constitucional se lhe for reconhecida a
extraterritorialidade.
Tais coordenadas de espaço podem ser determinadas, específicas e
genéricas. Podem se tratar de hipóteses cujo critério espacial faz menção a
determinado local para a ocorrência do fato típico; podem fazer alusão a áreas
específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas
estiver geograficamente contido; bem como podem ser genéricas, de forma
que todo e qualquer fato que suceda sob o manto da vigência territorial da lei
instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos peculiares.
Por fim, o critério temporal é componente da hipótese normativa, sua
relevância é marcada pelo tempo em que se reportam os efeitos da relação
jurídica instaurada em decorrência do fato jurídico. É pelo tempo no fato27 que
se poderá prever a oneração da propriedade do sujeito passivo e o direito à
receita por parte do sujeito ativo.
O consequente da norma é a parte “que estipula a regulação da
conduta, prescrevendo direitos e obrigações para as pessoas físicas ou
jurídicas envolvidas, de alguma forma, no acontecimento do fato jurídico
tributário”.28
_________________ 27 O termo “tempo no fato” foi utilizado pela primeira vez por Paulo de Barros Carvalho para denominar o tempo da ocorrência do evento tributário. Por outro lado, o termo “tempo do fato” denomina o tempo em que o fato jurídico é constituído. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidência. São Paulo: Saraiva 1999, p. 123. 28 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 281.
– 36 –
Destarte, o consequente da norma jurídica, exercendo papel de
prescritor, é instituto hábil a fornecer os critérios de identificação do vínculo
jurídico que nasce.
Preceituando uma conduta, o consequente normativo faz irromper
direitos subjetivos e deveres jurídicos – desenha a previsão de uma relação
jurídica que se instala, automática e infalivelmente, assim que se concretize
o fato.29
Nesse diapasão, são dois os critérios utilizados para identificarmos o
aparecimento de uma relação jurídica tributária: a) quantitativo e b) pessoal.
O critério quantitativo trata do objeto da prestação; no caso da regra-
matriz de incidência tributária consubstancia-se na base de cálculo e na
alíquota. É nesse critério que encontramos referências às grandezas, mediante
as quais o legislador pretendeu dimensionar o fato jurídico tributário, para efeito
de definir a quantia a ser paga pelo sujeito passivo, a título de tributo.
Por sua vez, o critério pessoal é o conjunto de elementos, colhido
como prescritor da norma, que nos indica quem são os sujeitos da relação
jurídica.
É justamente esse critério contido no consequente da regra-matriz
de incidência tributária que nos interessa no presente estudo. Assim, passamos
a tratar da sujeição passiva tributária.
_________________ 29 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 281.
– 37 –
2.2. Sujeição passiva
Delimitados os contornos da relação jurídico-tributária, passamos a
tratar, no presente tópico, do sujeito passivo.
O art. 121 do CTN define o sujeito passivo da obrigação tributária
principal como sendo “a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou
penalidade pecuniária” e o art. 122 do mesmo diploma legal define o sujeito
passivo da obrigação acessória como sendo “a pessoa obrigada às prestações
que constituam o seu objeto”.
Renato Lopes Becho traz a seguinte definição para o sujeito passivo
tributário:
“Extraímos do critério pessoal os sujeitos passivos da
obrigação tributária que, nos tributos discriminados na
Constituição, serão necessariamente aquelas pessoas que
realizarem, inquestionavelmente, a materialidade prevista na
norma constitucional tributária. Nos tributos não discriminados,
serão aquelas pessoas que realizarem as condutas descritas
em dita materialidade. Os sujeitos passivos tributários estão,
portanto, umbilicalmente relacionados com a materialidade
descrita na norma.”30
Ainda, conforme preceitua o art. 121 do CTN, precisamente nos
incisos I e II do seu parágrafo único, há a divisão do sujeito passivo da
obrigação tributária em duas espécies, quais sejam: “I – contribuinte, quando
tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato
gerador;” e “II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte,
sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.”
_________________ 30 BECHO, Renato Lopes. Sujeição passiva e responsabilidade tributária. São Paulo: Dialética, 2000, p. 190.
– 38 –
Com base nesses dispositivos, grande parte da doutrina nacional31,
acompanhando o magistério de Rubens Gomes de Sousa, classificou aquelas
duas espécies em sujeito passivo direto e em sujeito passivo indireto.
O autor acima referido lecionava que o direito tributário pertencia à
categoria dos direitos obrigacionais, definindo a obrigação tributária como “o
poder jurídico por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir de um
particular (sujeito passivo) uma prestação positiva ou negativa (objeto da
obrigação) nas condições definidas pela lei tributária (causa da obrigação).”32
Na doutrina internacional, encontramos definições para a obrigação
tributária, as quais ressaltam a existência dos mesmos elementos identificados
por Rubens Gomes de Sousa. Assim, obrigação tributária é definida na
doutrina alienígena como:
[...] uma relação jurídica ex lege, em virtude da qual uma
pessoa (sujeito passivo principal, contribuinte ou responsável),
está obrigada perante o Estado ou outra entidade pública, ao
pagamento de uma soma de dinheiro, desde que se verifique o
fato gerador determinado pela lei.33
[...] o vínculo jurídico em virtude do qual um sujeito (devedor),
deve dar a outro sujeito, que exercita o poder fiscal (credor),
somas do dinheiro ou quantidades de coisas determinadas
por lei.34
_________________ 31 MACHADO, Hugo de Brito. “Responsabilidade tributária”. In: Responsabilidade tributária. Caderno de Pesquisas Tributárias n. 5. São Paulo: Resenha Tributária, 1980, pp. 43-73; CAMPOS, Dejalma de. “A responsabilidade no direito tributário brasileiro”. In: Responsabilidade tributária. Caderno de Pesquisas Tributárias n. 5. São Paulo: Resenha Tributária, 1980, pp. 93-114; FALCÃO, Amilcar de Araújo, 1928-1967. Fato gerador da obrigação tributária / Amilcar de Araújo Falcão. 6. ed. Revista e atualizada pelo Prof. Flávio Bauer Noveili; anteriores anotações de atualização, pelo Prof. Geraldo Ataliba; prefácio de Aliomar Baleeiro; apresentação de Rubens Gomes de Sousa. Rio de Janeiro: Forense, 1997. 32 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Financeiras, 1954, pp. 83-84. 33 Dino JARACH. El Hecho Imponible. 2. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1971, p. 73. 34 Carlos M. Giuliani FONROUGE. Derecho Financiero. 3 ed. Buenos Aires: Depalma, vol. 1, 1975, p. 352.
– 39 –
[...] o vínculo jurídico ex lege, em virtude do qual uma pessoa
está obrigada perante o Estado, ou outra entidade pública, ao
pagamento de uma soma de dinheiro, quando se verifique o
pressuposto de fato previsto na lei.35
o vínculo jurídico que a lei cria entre o fisco (sujeito ativo) e o
contribuinte (sujeito passivo), em razão do qual este deve
entregar àquele uma soma de dinheiro.36
o direito do Estado de pretender de uma pessoa prestação
denominada imposto.37
Ao constatar a existência dos quatro elementos da obrigação
tributária, Rubens Gomes de Sousa definiu cada um deles e, para o sujeito
passivo, o qual nos interessa no presente trabalho, deu a seguinte definição: “é
o sujeito passivo ou devedor, isto é, a pessoa obrigada a cumprir a prestação
que constitui o objeto da obrigação que o sujeito ativo tem o direito de exigir.”38
Dessa forma, ao discorrer sobre o sujeito passivo da obrigação
principal, esse autor lançou a distinção entre a sujeição passiva direta e a
indireta. Assim concluiu:
(...) o tributo deve ser cobrado da pessoa que esteja em
relação econômica com o ato, fato ou negócio que dá origem à
tributação; por outras palavras, o tributo deve ser cobrado da
pessoa que tira uma vantagem econômica do ato, fato ou
negócio tributado. Quando o tributo seja cobrado nessas
condições, dá-se a sujeição passiva direta, que é a hipótese
mais comum na prática.
_________________ 35 Hector B. VILLEGAS. Curso de finanzas, derecho financiero g tributario. 1. ed. Buenos Aires: Ediciones Depalma, 1972, p. 148. 36 Rafael BIELSA. Estudios de derecho publico. 1. ed. Buenos Aires: Editorial Depalma, vol. II, “Derecho Fiscal”, 1951, p. 127. 37 Albert HENSEL. Diritto Tributario. 1 ed. Milano: Giuffrè, 1956, p. 73. 38 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Financeiras, 1954, p. 91.
– 40 –
Entretanto pode acontecer que em certos casos o Estado tenha
interesse ou necessidade de cobrar o tributo de pessoa
diferente: dá-se então a sujeição passiva indireta.39
Como se pode perceber, para Rubens Gomes de Sousa, a diferença
entre contribuinte e responsável cingi-se ao fato de que o primeiro paga por
dívida própria, enquanto o segundo paga por dívida de outrem.
Por sua vez, Amilcar de Araújo Falcão, ao distinguir o sujeito passivo
principal ou direto, do sujeito passivo indireto, faz alusão à idêntica separação:
Assim é que a definição do sujeito passivo principal da
obrigação tributária, que deve resultar de lei, nela pode estar
implícita sob a simples menção do fato gerador e, pois,
somente através deste ser identificável.
Em tal hipótese, a sujeição passiva direta ou principal se
determinará pela natural e necessária atribuição do fato
gerador, ou da relação econômica subjacente nele, a certo
sujeito ou a certos sujeitos.
Enquanto os sujeitos passivos indiretos quer por transferência
(sucessor e responsável tributário), ou por substituição
(substituto legal tributário) só podem resultar de disposição
legal expressa, a configuração do sujeito passivo principal ou
direto (contribuinte), como dito, pode encontrar-se implícita na
lei: o exame do fato gerador será decisivo para sua concreta
definição.40
Alfredo Augusto Becker41, em contraposição à divisão do sujeito
passivo em direto e indireto, ou seja, de que o primeiro paga por dívida própria
_________________ 39 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Financeiras, 1954, p. 92. 40 FALCÃO, Amilcar de Araújo, 1928-1967. Fato gerador da obrigação tributária / Amilcar de Araújo Falcão. 6. ed. Revista e atualizada pelo Prof. Flávio Bauer Noveili; anteriores anotações de atualização, pelo Prof. Geraldo Ataliba; prefácio de Aliomar Baleeiro; apresentação de Rubens Gomes de Sousa. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 76. 41 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 558.
– 41 –
enquanto o segundo paga por dívida de outrem, insurgiu-se, criticando-a da
seguinte forma:
Desde logo, cumpre fixar este ponto: não é juridicamente
possível distinguir entre débito e responsabilidade, isto é,
considerar que o responsável estaria obrigado a satisfazer
débito de outro. O responsável sempre é devedor de débito
próprio. O dever que figura como conteúdo da relação jurídica
que vincula o Estado (sujeito ativo) ao responsável legal
tributário (sujeito passivo) é dever jurídico do próprio
responsável legal tributário e não de outra pessoa.
Paulo de Barros Carvalho42 também se insurgiu contra essa divisão,
esclarecendo o seu posicionamento fundamentado no seguinte:
a) não haveria, em termos propriamente jurídicos, a divisão dos
sujeitos em diretos e indiretos, posto que repousa em
consideração de ordem econômica. Interessa, do ponto de
vista jurídico-tributário, apenas quem integra o liame
obrigacional. O grau de relacionamento econômico da pessoa
escolhida na endonorma com o evento que fará nascer o
vínculo fiscal é algo que se afasta da cogitação do Direito e
pertenceria mais ao campo de indagação da Economia ou da
Ciência das Finanças.
Para nós, a identificação da natureza da sujeição passiva e suas
consequências se dará pela vinculação do sujeito passivo com o fato jurídico
tributário. Assim, faz-se necessário retomar o estudo do princípio constitucional
da capacidade contributiva, conforme será mais bem explanado no próximo
subcapítulo.
_________________ 42 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da norma tributária. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 167.
– 42 –
2.3. A sujeição passiva tributária e o princípio constitucional da
capacidade contributiva
Expusemos acima as relações de subordinação e coordenação
existentes entre as normas jurídicas, todas confluindo para a norma
fundamental, da qual a Constituição obtém o seu fundamento de validade.
Também apresentamos a conceituação de alguns princípios constitucionais
pertinentes ao objeto do presente trabalho, e discorremos acerca da
importância destes no ato de apreensão da significação que se deve dar às
normas jurídicas.
Entretanto, em virtude da importância que o princípio da capacidade
contributiva representa para a compreensão do objeto do nosso estudo,
entendemos pertinente abordá-lo com maior profundidade.
Na Constituição Federal, enquanto norma de hierarquia superior e
orientadora de todas as demais normas do sistema, encontramos os princípios
jurídicos. Dentre os quais, o princípio da capacidade contributiva exerce
influência sobre as normas definidoras da sujeição passiva tributária.
A necessidade do estudo do princípio da capacidade contributiva
reside no argumento de grande parte da doutrina de que somente o
contribuinte pode ocupar o polo negativo das relações jurídicas tributárias,
possuindo a relação do responsável da natureza jurídica diversa da tributária.
Esse princípio encontra-se previsto no parágrafo 1º do art. 145 da
Constituição Federal, armado nos seguintes termos:
– 43 –
Art. 145. [...]
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal
e serão graduados segundo a capacidade econômica do
contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente
para conferir efetividade a esses objetivos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do
contribuinte.
Deflui-se que o princípio da capacidade contributiva é a fonte
principal de critérios discriminatórios, segundo o qual os impostos serão
graduados e personalizados conforme as possibilidades econômicas do
contribuinte. No entanto, refere-se aos fatos presuntivos de riqueza, na
terminologia de Alfredo Augusto Becker43, e não às condições reais de cada
contribuinte considerados per si. Nesse sentido, ensina-nos Roque Carrazza44:
A capacidade contributiva à qual alude a Constituição e que a
pessoa política é obrigada a levar em conta ao criar,
legislativamente, os impostos de sua competência é objetiva, e
não subjetiva. É objetiva porque se refere não às condições
econômicas reais de cada contribuinte, individualmente
considerado, mas às suas manifestações objetivas de riqueza
(ter um imóvel, possuir um automóvel, ser proprietário de jóias
ou obras de arte, operar em Bolsa, praticar operações
mercantis etc.).
Pelo exposto acima, infere-se que o princípio da capacidade
contributiva guarda pertinência com as manifestações econômicas do fato
gerador relacionado ao contribuinte, o qual possui, com esse fato, relação
pessoal e direta.
_________________ 43 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 497. 44 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 19. ed., Rev. amp. e atual, 2a. tiragem. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 80.
– 44 –
Como compatibilizar, então, o princípio da capacidade contributiva
com a figura do responsável tributário, sujeito passivo indireto na terminologia
da doutrina tradicional, e que não está diretamente relacionado com o fato
signo presuntivo de riqueza?
Para tanto, valemo-nos das lições de Alfredo Augusto Becker45 que,
ao estudar esse princípio, manifestou as constrições ao conceito do princípio
da capacidade contributiva, aduzindo que:
No plano jurídico, a relação entre a carga tributária e o
montante da riqueza do contribuinte é feita sempre e
exclusivamente em relação a cada tributo tomado isoladamente
dos demais.
[...]
A riqueza do contribuinte (que está sendo relacionada com o
tributo singular) não é a totalidade da riqueza do contribuinte,
mas unicamente um fato-signo presuntivo de sua renda ou de
capital.
[...]
A renda ou capital presumido deve ser renda ou capital acima
do mínimo indispensável.
Podemos inferir das constrições acima apresentadas que o autor
restringe o princípio da capacidade contributiva, ordenando que o legislador
tome em consideração o relacionamento entre a carga tributária e o fato-signo
presuntivo de riqueza para cada tributo, isoladamente considerado. A segunda
constrição foi no sentido de que o fato-signo presuntivo de riqueza não é a
totalidade da renda ou capital do contribuinte, mas a riqueza manifestada no
fato. A terceira e última constrição veda a tributação sobre o mínimo
indispensável ao contribuinte.
_________________ 45 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 497.
– 45 –
Delimitadas as constrições ao princípio, Alfredo Augusto Becker
apresentou, em quatro conclusões, o alcance de sua eficácia jurídica. A
primeira conclusão a que chegou foi a de que o princípio tem aplicação
somente perante o legislador ordinário, o qual deve “escolher para a
composição da hipótese de incidência da regra jurídica criadora do tributo,
exclusivamente, fatos que sejam signos presuntivos de renda ou de capital”46.
A segunda conclusão, quanto ao alcance da eficácia jurídica do
princípio da capacidade contributiva a que chegou Alfredo Becker, foi a de que
“o legislador ordinário está juridicamente obrigado a escolher fatos que sejam
presuntivos de uma espécie de renda ou de capital acima do mínimo
indispensável”47. Esclareceu o autor que o legislador tem “o dever de criar
isenções tributárias que resguardem a imunidade tributária do mínimo
indispensável de capital e de renda.”48
O terceiro alcance da eficácia jurídica proposto pelo autor 49 foi de
que “o legislador ordinário está juridicamente proibido de graduar a alíquota ou
ritmar a sua progressividade no sentido inverso da grandeza presumível da
renda ou capital do respectivo contribuinte”.
O quarto, e último alcance da eficácia jurídica, na constatação de
Becker50, sendo o fundamento que nos interessa para responder a indagação
acima efetuada quanto à compatibilização do princípio da capacidade
contributiva com a responsabilidade tributária, foi a de que:
_________________ 46 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 498. 47 Ibidem, p. 499. 48 Ibidem, p. 499. 49 Ibidem, p. 500. 50 Ibidem, p. 500.
– 46 –
Sempre que utilizar o substituto legal tributário, o legislador
ordinário está juridicamente obrigado a, simultaneamente, criar a
repercussão jurídica do tributo sobre o substituído (aquela pessoa
de cuja renda ou capital a hipótese de incidência é fato signo
presuntivo), outorgando ao substituto o direito de reembolso ou
retenção do valor do tributo perante o substituído.
Assim, tributos instituídos em desatenção ao princípio da capacidade
contributiva nos contornos apresentados acima estará eivado de
inconstitucionalidade. Quanto à sujeição passiva indireta, temos que caberá ao
legislador criar mecanismos de repercussão jurídica, outorgando ao substituto
o direito de reembolso ou retenção do valor do tributo perante o substituído.
Em relação à responsabilidade tributária dos sócios-gerentes ou
administradores de pessoas jurídica, nos termos propostos pelo art. 135 do
CTN, temos que por se tratar de uma responsabilidade pessoal atribuída como
sanção decorrente de ato ilícito, como veremos no capítulo seguinte, a ela não
se aplica o princípio da capacidade contributiva.
2.4. Classificação dos contribuintes e responsáveis
Conforme explicitado anteriormente, entendemos que a identificação
da natureza da sujeição passiva e suas consequências se dará pela vinculação
do sujeito passivo com o fato jurídico tributário.
Assim, contribuinte será sempre aquele que realiza o fato jurídico
tributário, previamente definido na Constituição, nos termos do art. 121, I, do
CTN, o qual pode ser individual ou solidário (art. 124, I, do CTN).
– 47 –
Podemos construir a partir das disposições da Constituição Federal
e do Código Tributário Nacional uma classificação para os responsáveis
tributários.
Pelo estatuído no art. 121, parágrafo único, II e no art. 128, ambos
do CTN, encontramos a figura do responsável tributário como sendo aquele
que não tenha realizado o fato jurídico tributário. Dito de outra forma, será o
responsável tributário aquele que não for o contribuinte, mas que possua
relação com a situação jurídica descrita no fato jurídico tributário, nos termos
da legislação das pessoas tributantes.
Em função do disposto nesses artigos, poderemos destacar as notas
que caracterizam o responsável tributário:
1. O responsável tem de ser fixado por lei;
2. O responsável tem de ser vinculado ao fato gerador da
obrigação;
3. O responsável exclui a responsabilidade do contribuinte, ou
responde supletivamente.
Como vimos no capítulo anterior, nem sempre o contribuinte é o
responsável pela dívida tributária. A lei pode estabelecer que terceira pessoa,
que não realizou o fato jurídico tributário, fique compelida a realizar a
prestação, ora com a exclusão da responsabilidade do contribuinte, ora apenas
supletivamente. Trata-se da sujeição passiva indireta, conforme destacado por
Geraldo Ataliba:
– 48 –
Por razões metajurídicas — que não importa aqui recordar
precisamente porque juridicamente irrelevante — o legislador
muitas vezes dispõe que seja sujeito passivo pessoa que não
corresponde rigorosamente à configuração supradescrita, ou
ainda desloca a qualidade de sujeito passivo de uma pessoa
para outra, que fica na posição jurídica daquela.
Assim, ou a obrigação já nasce tendo como sujeito passivo
alguém que não corresponde à configuração indicada pela
Constituição — quando prevê o destinatário tributário — ou a
sujeição passiva desloca-se, por força de lei, para outra
pessoa. Isto só é possível quando o desígnio constitucional não
seja desacatado.51
Quando o legislador estabelece no art. 128 do CTN que a lei poderá
“atribuir de modo expresso a responsabilidade”, quer dizer que a obrigação do
responsável surge como consequência da realização do fato descrito na lei.
Se pusermos em conexão o preceito contido no art. 128 do CTN
com outros artigos da legislação tributária, verificaremos que o mecanismo
utilizado pelo legislador para estabelecer a figura jurídica do responsável
tributário é o igual ao de todas as obrigações ex lege, ou seja, é a lei que deve
determinar os fatos cuja realização implica o nascimento da obrigação do
responsável.
A reserva formal da lei estabelecida pelo dispositivo legal acima
referido implica que somente a lei pode determinar os fatos que façam surgir a
obrigação a cargo de terceiras pessoas de responder pela dívida tributária.
Assim, quando o fato previsto na norma se realiza, nasce a obrigação do
responsável.
_________________ 51 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2003, p. 89.
– 49 –
Deve-se ressaltar, entretanto, que não é qualquer terceiro que pode
ser eleito pela lei como responsável tributário, há de ser um terceiro que
possua alguma relação com o fato gerador. Contudo, não é qualquer vínculo
com o fato gerador que provoca a responsabilidade de terceiro, mas somente
aquele que permita fazer com que o tributo a recolher não onere o responsável.
Nessa forma de atribuição de responsabilidade tributária,
encontramos a figura da responsabilidade por substituição, que se subdivide
em: para trás e para frente. Essa substituição existe para facilitar a
arrecadação do tributo pelo Fisco.
Rubens Gomes de Sousa52, ao lecionar sobre a subsitituição
tributária, esclareceu que:
Ocorre quando, em virtude de uma disposição expressa de lei,
a obrigação tributária surge desde logo contra uma pessoa
diferente daquela que esteja em relação econômica com o ato,
fato ou negócio tributado: nesse caso, é a própria lei que
substitui o sujeito passivo direto por outro indireto.
De modo análogo e com palavras distintas, discorria Alfredo Augusto
Becker53 que:
A fenomenologia do substituto legal tributário consiste, em
síntese, no seguinte: Existe substituto legal tributário, toda a
vez em que o legislador escolher para sujeito passivo da
relação jurídica tributária um outro qualquer indivíduo, em
substituição daquele determinado indivíduo de cuja renda ou
capital á hipótese de incidência é fato-signo presuntivo.
_________________ 52 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Financeiras, 1954, p. 93. 53 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 529.
– 50 –
A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a
condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato
gerador deva ocorrer posteriormente (fato gerador futuro), assegurada a
imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato
gerador presumido. Esse é o caso da denominada substituição tributária para
frente.
Temos ainda os casos de responsabilidade tributária, explicitamente
definidos no Código Tributário Nacional.
Nos artigos 129 a 133, encontraremos a responsabilidade dos
sucessores, também denominada pela doutrina de responsabilidade de
transferência por sucessão, seja por sucessão imobiliária (art. 130), sucessão
por aquisição ou remissão de bens (art. 131, I), sucessão causa mortis (art. 131, II e
III), sucessão empresarial por reorganização (transformação, fusão ou
incorporação) ou extinção (art. 132) e sucessão empresarial por aquisição (art. 133).
No que se refere à responsabilidade tributária por sucessão
imobiliária (art. 130 do CTN), tem-se que os créditos tributários relativos a
impostos, cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de
bens imóveis, e os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais
bens, ou a contribuições de melhoria, sub-rogam-se na pessoa dos respectivos
adquirentes.
Na sucessão por aquisição ou remissão de bens (art. 131, I, do
CTN), são pessoalmente responsáveis o adquirente ou remitente, pelos tributos
relativos aos bens adquiridos ou remidos.
– 51 –
Na sucessão causa mortis, são pessoalmente responsáveis: a) o
sucessor a qualquer título e o cônjuge meeiro, pelos tributos devidos pelo de
cujus até a data da partilha ou adjudicação, limitada essa responsabilidade ao
montante do quinhão do legado ou da meação (art. 131, II, do CTN); e b) o
espólio, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da
sucessão (art. 131, III, do CTN).
A sub-rogação também se aplica à pessoa jurídica de direito privado
que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra,
sendo ela responsável pelos tributos devidos até a data daquele ato; e nos
casos de extinção de pessoas jurídicas de direito privado, quando a exploração
da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio remanescente, ou
seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual (art.
132, do CTN).
Na sucessão empresarial por aquisição (art. 133, do CTN), responde
a pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por
qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou
profissional. Ela responde: (i) integralmente, se o alienante cessar a exploração
do comércio, indústria ou atividade; (ii) subsidiariamente com o alienante, se
este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses, a contar da data
da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio,
indústria ou profissão.
Responde também pelos tributos, quando o adquirente: (i) for sócio
da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo
devedor falido ou em recuperação judicial; (ii) for identificado como agente do
– 52 –
falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a
sucessão tributária; (iii) for parente, em linha reta ou colateral até o 4º (quarto)
grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou
de qualquer de seus sócios.
Os créditos não se sub-rogam (i) quando conste do título a prova de
sua quitação; (ii) na hipótese de alienação judicial em processo de falência; (iii)
na hipótese de alienação judicial de filial ou unidade produtiva isolada, em
processo de recuperação judicial.
Nos artigos 134 e 135 do CTN, encontraremos a figura da
responsabilidade de terceiros ou por imputação legal, a qual pode ser
subsidiária (art. 134) ou pessoal (art. 135).
Pelo art. 134, respondem de forma subsidiária, nos atos em que
intervierem, ou pelas omissões de que forem responsáveis: (i) os pais, pelos
tributos devidos por seus filhos menores; (ii) os tutores e curadores, pelos
tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; (iii) os administradores de
bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes; (iv) o inventariante, pelos
tributos devidos pelo espólio; (v) O síndico e o comissário, pelos tributos
devidos pela massa falida ou pelo concordatário; (vi) os tabeliães, escrivães e
demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados
por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício; (vii) os sócios, no caso de
liquidação de sociedade de pessoas.
Se a responsabilidade for relativa a penalidades, somente haverá
responsabilidade quanto às de caráter moratório.
– 53 –
Já pelo art. 135, estatui o CTN que, quanto aos atos praticados com
excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, serão
pessoalmente responsáveis: (i) os pais, os tutores e os curadores, os
administradores de bens, o inventariante, o síndico e o “comissário”, os
tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, e os sócios; (ii) os
mandatários, prepostos e empregados; (iii) os diretores, gerentes ou
representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Nessa última forma de atribuição de responsabilidade, a conclusão a
que chegamos é que se trata de uma responsabilidade pessoal e não solidária
ou subsidiária.
Como vimos acima, a responsabilidade tributária possui duas
espécies, pode ser por substituição ou por transferência. Na espécie por
substituição, a lei exige que o substituto ocupe o lugar do contribuinte desde o
nascimento da obrigação tributária. Por outro lado, na responsabilidade por
transferência, ocorre no mundo factual o fato jurídico que enseja o surgimento
da obrigação tributária para o contribuinte, e, posteriormente, em função de
algumas circunstâncias, a lei determina que a responsabilidade seja transferida
para um terceiro.
Feitas as considerações acima sobre a teoria geral da sujeição
passiva e a classificação dos responsáveis tributários, guiando-nos pela
sequência dos artigos da forma como apresentados no CTN, concernentes à
sujeição passiva, passaremos a tratar no item seguinte da solidariedade
tributária. Sua análise é imprescindível para chegarmos a algumas de nossas
– 54 –
conclusões quando tratarmos da responsabilidade tributária dos sócios e
dirigentes das pessoas jurídicas de direito privado e da aplicação da teoria da
desconsideração da pessoa jurídica nas lides tributárias.
2.5. Solidariedade
No direito brasileiro, a solidariedade encontra a sua origem no art.
896 do Código Civil de 1916, revogado pelo art. 264 do Código Civil de 2002, in
verbis:
Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação
concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um
com direito, ou obrigado, à dívida toda.
O que nos interessa no presente trabalho é a solidariedade passiva,
ou seja, quando em uma mesma relação jurídica obrigacional integram mais de
um devedor sendo cada um deles obrigado à prestação total.
A finalidade da norma que atribui a dois ou mais sujeitos de direito
ocupantes do polo negativo da mesma relação jurídica obrigacional é garantir
ao credor uma facilidade na cobrança do seu crédito.
Com idêntica finalidade, o art. 124 do CTN disciplina o instituto da
solidariedade passiva na seara do Direito Tributário, estabelecendo que,
quando houver mais de um sujeito na posição de devedor da mesma relação
jurídica tributária, todos serão obrigados pelo valor total do débito tributário.
– 55 –
Assim dispõe o artigo em questão:
Art. 124. São solidariamente obrigadas:
I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que
constitua o fato gerador da obrigação principal;
II – as pessoas expressamente designadas por lei.
Percebe-se na leitura do dispositivo acima transcrito, que o Código
Tributário Nacional admite duas modalidades de solidariedade passiva, as
quais foram bem delineadas por Bernardo Ribeiro de Moraes54:
a) solidariedade de fato (CTN, art. 124, inciso I), quando há
uma pluralidade de pessoas com “interesse comum na situação
que constitua o fato gerador da obrigação principal”. [...] A
solidariedade nasce em razão da própria natureza do fato
gerador da respectiva obrigação, pela própria natureza do
imposto em causa. Se várias pessoas participam de fato de
determinada obrigação tributária, os efeitos jurídicos
abrangerão todas elas, que passam a ser solidárias diante do
cumprimento da prestação tributária.
[...]
b) solidariedade de direito (CTN, art. 124, inciso II), quando
resulta de determinação expressa de lei. A solidariedade
passiva tributária resulta da expressão disposição da lei, seja
com caráter de sanção ou para facilitar a cobrança da
prestação tributária. [...] Diante do caráter necessariamente
oneroso que se reveste para o sujeito passivo, a solidariedade
de direito se dá apenas para os casos expressos, em que a lei
relaciona os responsáveis solidários.
Hugo de Brito Machado esclarece que há solidariedade de fato
“independente de previsão legal”.55
_________________ 54 MORAES, Bernardo Ribeiro de, 1924-. Compêndio de direito tributário / Bernardo Ribeiro de Moraes. 2. ed. Rev., aumentada e atualizada. Rio de Janeiro: Forense, 1994, v. 2, pp. 304-305. 55 Hugo de Brito MACHADO. Curso de direito tributário. 13. ed. Ver. atual e ampliada. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1998, p. 102.
– 56 –
Diferentemente do disposto no art. 1.491 do Código Civil de 1916 e
atualmente disposto no art. 827 do Código Civil de 2002, o parágrafo único do
art. 124 do CTN determina que a solidariedade referida não comporta benefício
de ordem. Isso implica dizer que não poderá qualquer devedor solidário exigir
que o sujeito ativo cobre antes deste ou daquele devedor, observando certa
ordem de preferência, em razão de estar mais diretamente relacionado com a
situação geradora do tributo.
Em seguida, no art. 125 do CTN, o legislador estabeleceu os efeitos
gerais da solidariedade, excetuando as disposições de lei em contrário,
determinando que:
I – o pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos
demais;
II – a isenção ou remissão de crédito exonera todos os
obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles,
subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais
pelo saldo;
III – a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos
obrigados, favorece ou prejudica aos demais.
Percebemos da leitura do inciso I do art. 125 do CTN que em face
de a solidariedade passiva tributária existir entre dois ou mais sujeitos de direito
integrantes da mesma relação jurídica obrigacional, por ser um único vínculo
que liga mais de um sujeito de direito ocupante do polo passivo, o pagamento
efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais. Isto quer dizer que, se
um dos coobrigados liquidar a dívida integralmente, a obrigação tributária será
extinta, liberando os demais de seu pagamento.
– 57 –
Não podemos deixar de assentar que o codevedor que liquidar a
dívida terá o direito de haver dos demais a respectiva cota-parte.
Pelo disposto no inciso II, temos que a isenção ou remissão do
crédito exonera todos os obrigados, pois, sendo um único vínculo, tal isenção
ou remissão aproveita aos demais. No entanto, se a isenção ou a remissão for
outorgada pessoalmente a um deles, somente este será liberado da dívida,
cabendo ao sujeito ativo abater essa parte da dívida e cobrar o restante dos
demais.
O último inciso estabelece que a interrupção da prescrição, em favor
ou contra um dos obrigados, favorece aos demais, dada a sua própria
natureza.
Como demonstrado acima, a análise do instituto da solidariedade
não comporta grandes digressões, com exceção da definição do que venha a
ser “interesse comum” e de sua relação com o art. 128 do CTN.
Alguns autores, sob o pretexto de tentarem atribuir responsabilidade
solidária pelo pagamento do tributo entre o contribuinte pessoa jurídica e os
seus sócios, alegam que o “interesse comum” refere-se ao interesse na
ocorrência dos “fatos econômicos”, o que seria suficiente para a atribuição da
solidariedade. Assim defende Gilberto Etchaluz Villela56:
especialmente nos casos de tributações por sobre empresas e
seus sócios — quando da ocorrência de fatos econômicos de
“interesse comum”, tornados por lei em geradores da exação
— uma interpretação da lucratividade buscada pelos
_________________ 56 Gilberto Etchaluz VILLELA. “A solidariedade tributária – Reflexões sobre a exegese do art. 124 do CTN”. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 42. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, jan-fev de 2002, p. 77.
– 58 –
interessados é justamente o elo de comunhão legal que
estabelece a possibilidade de cobrança tributária in solido. Em
tais circunstâncias teríamos a hipótese de uma imediata
possibilidade de execução fiscal por sobre ambos os
contribuintes — empresa e sócios — sem ocasião para que se
instalasse aquela subsidiariedade até aqui aceita, em situações
especiais, para os referidos sócios.
Parece-nos que o autor está equivocado, pois a sua interpretação foi
literal, como se o direito positivo não se apresentasse como sistema, contendo
normas jurídicas inter-relacionadas mediante vínculos horizontais (relações de
coordenação) e verticais (relações de subordinação-hierarquia).
A construção apresentada pelo autor contraria, pois, o princípio da
separação patrimonial das pessoas jurídicas e consubstancia-se na
desconsideração da personalidade jurídica em matéria tributária, instituto esse
que nos parece não estar de acordo com a finalidade da norma do art. 124, I,
do CTN. Dessa forma, concordamos com a posição defendida por Heleno
Taveira Tôrres, para quem:
Quanto aos demais dispositivos do Código Tributário Nacional,
queremos evidenciar que os art. 124 e 135, em nenhuma
circunstância, têm o condão de permitir formas de
desconsideração da personalidade jurídica, como pensam
alguns. O art. 124, I, do CTN, segundo o qual “são
solidariamente obrigadas: I — as pessoas que tenham
interesse comum na situação que constitua o fato gerador da
obrigação principal”, versa sobre os efeitos da solidariedade,
quando mais de um contribuinte concorre na realização de um
mesmo fato jurídico tributário, i.e., pessoa física com pessoa
física, pessoa física com pessoa jurídica, pessoa jurídica com
pessoa jurídica. Desse modo, a sociedade, quando se
apresenta como sujeito passivo de obrigação tributária, é una;
e só internamente a essa sociedade será possível vislumbrar
alguma espécie de relação solidária que dentre os sócios
– 59 –
possa existir, a depender do tipo societário adotado, mas
nunca em superação da personalidade jurídica que a qualifique
como tal.57
Sobre esse assunto, convém transcrever o entendimento de Paulo
de Barros Carvalho para uma correta interpretação da matéria, objeto do
presente trabalho:
O território de eleição do sujeito passivo das obrigações
tributárias e, bem assim, das pessoas que devam responder
solidariamente pela dívida, está circunscrito ao âmbito da
situação factual contida na outorga de competência impositiva,
cravada no texto da Constituição.
A lembrança desse obstáculo sobranceiro impede que o
legislador ordinário, ao expedir a regra matriz de incidência do
tributo que cria, traga para o tópico de devedor, ainda que
solidário, alguém que não tenha participado da ocorrência do
fato típico. Falta a ele, legislador, competência constitucional
para fazer recair a carga jurídica do tributo sobre pessoa alheia
ao acontecimento gravado pela incidência. Diante de óbice de
tal porte, incontornável sob qualquer pretexto, devemos
entender que os devedores solidários, instituídos pela lei, e
estranhos ao evento jurídico-tributário, não são, na verdade,
componentes daquele liame obrigacional, mas de outro, de
cunho sancionatório, que irrompe à luz pelo descumprimento
de algum dever...
(...) solidariedade, mesmo, haverá tão-somente na
circunstancia de existir uma relação jurídica obrigacional, em
que dois ou mais sujeitos de direito se encontram compelidos a
satisfazer a integridade da prestação. Ali, onde encontrarmos
duas relações, entretecidas por preceitos de lei, para a
segurança do adimplemento prestacional de uma delas, não
teremos, a bem do rigor jurídico, o laço de solidariedade que
prende os sujeitos passivos.58
_________________ 57 TORRES, Heleno Taveira. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 471. 58 CARVALHO, 2004, pp. 315-317.
– 60 –
Misabel Abreu de Machado Derzi, ao atualizar a obra Direito
Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro, complementa que:
4. A solidariedade não é forma de eleição de responsável
tributário.
A solidariedade não é espécie de sujeição passiva por
responsabilidade indireta, como querem alguns. O Código
Tributário Nacional, corretamente, disciplina a matéria em
seção própria, estranha ao Capítulo V, referente à
responsabilidade. É que a solidariedade é simples forma de
garantia, a mais ampla das fidejussórias.
Quando houver mais de um obrigado no pólo passivo da
obrigação tributária (mais de um contribuinte, ou contribuinte e
responsável, ou apenas uma pluralidade de responsáveis), o
legislador terá de definir as relações entre os coobrigados. Se
são eles solidariamente obrigados, ou subsidiariamente, com
benefício de ordem ou não, etc. A solidariedade não é, assim,
forma de inclusão de um terceiro no pólo passivo da obrigação
tributária, apenas forma de graduar a responsabilidade
daqueles sujeitos que já compõem o pólo passivo.59
Pelos esclarecimentos apontados acima, percebemos que a
solidariedade constitui-se em uma forma de relacionamento entre sujeitos
passivos que já integram a relação jurídica e não é, portanto, modo de inclusão
de terceiros na qualidade de sujeito passivo. Tal inclusão é regulada em
capítulo próprio, sobre a responsabilidade tributária, tema que iremos estudar
mais detidamente no próximo Capítulo e no Capítulo 4 que versa sobre a
Desconsideração da Personalidade Jurídica em matéria tributária.
_________________ 59 BALEEIRO, 2003, p. 729.
– 61 –
3. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS E
DIRIGENTES DE PESSOAS JURÍDICAS
3.1. A responsabilidade dos sócios no caso de liquidação de
sociedade de pessoas
Traçados os contornos gerais sobre a sujeição passiva tributária,
passaremos a tratar, no presente tópico, da responsabilidade tributária dos
sócios e dirigentes das pessoas jurídicas.
Dispõe o art. 134 do CTN que:
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do
cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte,
respondem solidariamente com este nos atos em que
intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:
(...)
VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de
pessoas.
Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em
matéria de penalidades, às de caráter moratório.
Pelo estatuído no caput desse dispositivo legal, na tentativa de
construir o seu exato sentido e alcance, percebemos, desde logo que, não
obstante a letra da lei consignar o termo “solidariedade”, a relação do
responsável e do contribuinte é de subsidiariedade. Isso porque a norma
determina que se deve cobrar em primeiro lugar do contribuinte e, somente
– 62 –
diante da impossibilidade de se exigir o efetivo cumprimento da obrigação por
este, é que poderá ser atribuída ao sócio a responsabilidade tributária.
Tal constatação já foi verificada por diversos autores60, dentre eles,
Antonio Carlos Murta61, o qual complementa que não há a exclusão do
contribuinte, permanecendo este no polo negativo da relação jurídica:
A responsabilidade tributária, in casu, é subisidiária à do
contribuinte: porém, quando existente, não o libera, ou o exime:
o contribuinte continua respondendo em conjunto com o
responsável, de forma solidária. Qualquer um deles poderá, ao
alvedrio da Fazenda Pública, ser demandado ou cobrado. A
responsabilidade de um não exclui a do outro; é exemplo claro
de solidariedade passiva. Não podemos, no entanto, olvidar
que a responsabilidade tributária dos chamados terceiros virá
de forma secundária sem exclusão da permanência da
responsabilidade do contribuinte.
Dito de outra forma, a cobrança do crédito tributário deve ser
direcionada em desfavor do contribuinte, pessoa jurídica, e, somente após a
liquidação da sociedade, inexistindo patrimônio suficiente para arcar com as
obrigações tributárias, é que surgirá para os sócios a responsabilidade pelo seu
cumprimento.
A análise da letra da lei suscita algumas indagações concernentes
aos tipos societários que podem ensejar a atribuição de responsabilidade
tributária aos sócios nos casos de liquidação. Assim, há que se perquirir qual o
_________________ 60 VILLELA, Gilberto Etchaluz. A responsabilidade tributária. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 108 e AZEVEDO, Leila Katiane de Araújo. Responsabilidade dos administradores de empresas em matéria tributária. CONGRESSO BRASILEIRO DIREITO TRIBUTARIO promovido pelo IDEPE e presidido por José Eduardo Soares de Melo, de 25 a 27 de outubro de 2000. São Paulo: IDEPE, 2000. 61 MURTA, Antônio Carlos Diniz. Responsabilidade tributária dos sócios. Sociedades por quotas de responsabilidade limitada. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 106.
– 63 –
sentido que o legislador quis atribuir ao termo “sociedade de pessoas”, uma
vez que inexiste no sistema jurídico uma definição normativa para este termo.
Aliomar Baleeiro já definia sociedade de pessoas para fins do art.
134 do CTN, como: “as em nome coletivo e outras, que não se enquadram nas
categorias de sociedades anônimas ou por quotas de responsabilidade
limitada”62.
No mesmo sentido proposto pelo autor acima referido, firmou-se
jurisprudência dos tribunais pátrios:
“Sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Execução
fiscal. Figuras do devedor e do responsável tributário. (...) Não
se aplica à sociedade por quotas de responsabilidade limitada
o artigo 134 do Código Tributário Nacional; incide sobre elas o
artigo 135, itens I e III, do mencionado diploma legal, se o
crédito tributário resulta de ato emanado de diretor, ou gerente
ou outro sócio, praticado com excesso de poder ou infração da
lei, do contrato social ou do estatuto.” (RE 96.607-RJ, 1ª
Turma, Rel. Min. Soares Munhoz, in RTJ 103/1.274).
“(...) Tranquila se tornou a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal no sentido de que, não sendo as sociedades por
quotas sociedades simplesmente de pessoas, porém
sociedades mistas, de pessoas e capitais, os bens particulares
dos sócios, uma vez integralizado o capital, não podem ser
penhorados em razão de dívida fiscal da sociedade, salvo na
hipótese de ter praticado o sócio ato com excesso de poderes
ou em infração à lei, contrato social ou estatutos. Não se tendo
configurado, segundo se colhe do acórdão recorrido, nenhuma
dessas ressalvas, não se substancia, na espécie,
contrariedade aos arts. 134 e 135 do Código Tributário
Nacional.” (RTJ 85:947-8)
_________________ 62 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro (Anotado por Misabel de Abreu Machado Derzi). 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 753.
– 64 –
Verificamos a partir da leitura do inciso VII do art. 134, que o CTN
adotou a classificação das sociedades em: de pessoas, de capital e mistas.
Fábio Ulhoa Coelho apresenta a sua definição de sociedade de
pessoas como sendo: “(...) aquelas em que a realização do objeto social
depende mais dos atributos individuais dos sócios que da contribuição material
que eles dão.” Em contraposição, define às de capital como: “(...) as
sociedades em que essa contribuição material é mais importante que as
características subjetivas dos sócios.”63
A nossa legislação, em especial o Código Civil de 2002, prevê os
seguintes tipos societários: a) sociedade não personificada (art. 986 a 996), a
qual se subdivide em sociedade em comum (art. 986 a 990) e sociedade em
conta de participação (art. 991 a 996) e b) sociedade personificada (art. 997
a 1.141), a qual se subdivide em sociedade simples (art. 966, parágrafo único e
art. 997 a 1038) e sociedade empresarial, esta subdividida em sociedade
limitada (art. 1.052 a 1.087), sociedade anônima (art. 1.088 e Lei 6.404/1976),
sociedade em nome coletivo (art. 1.039 a 1.044), sociedade em comandita
simples (art. 1.045 a 1.051), sociedade em comandita por ações (art. 1.090 a
1.092).
Na presente análise, interessa-nos as sociedades empresariais, pois
somente estas podem ser classificadas como de pessoas, de capital ou mistas.
Com base nesse critério, tem-se: a) Sociedade de pessoas: em comandita
simples; em nome coletivo e em conta de participação; b) Sociedade de
_________________ 63 COELHO, Fábio Ulhoa, 1959-. Curso de direito comercial, vol. 2 / Fábio Ulhoa Coelho. 5. ed. Rev. e atual. De acordo com o novo Código Civil e alterações da LSA. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 24.
– 65 –
capital: em comandita por ações e sociedade anônima; c) Sociedade mista:
sociedade limitada.
Conforme constatação de Fábio Ulhoa Coelho:
(...) embora sejam cinco os tipos disponíveis, somente as
limitadas e as anônimas possuem importância econômica. (...)
No ano de 2000, por exemplo, as Juntas Comerciais
registraram 231.758 sociedades limitadas, 1.466 anônimas e
369 sociedades de outros tipos.”64
Retornando para o disposto na jurisprudência pátria sobre a
interpretação do inciso VII do art. 134 do CTN, tem-se que esse tipo de
responsabilidade somente pode ser atribuída ao sócio de sociedade de
pessoas, quais sejam: em comandita simples; em nome coletivo e em conta de
participação.
Um assunto que gera dissenso na doutrina e na jurisprudência,
merecendo uma análise mais detida é sobre a classificação da sociedade
limitada e de sua relação com o supracitado inciso VII do art. 134 do CTN.
Esse dispositivo legal atribui a responsabilidade aos sócios de “sociedade de
pessoas”. No entanto, como demonstraremos a seguir, a doutrina classifica a
sociedade limitada como sociedade do tipo “mista”.
Aduzimos em linhas acima que as sociedades de pessoas são
aquelas em que a realização do objeto social depende mais das qualidades
pessoais dos sócios do que da contribuição material dada pelos mesmos.
_________________ 64 COELHO, Fábio Ulhoa, 1959-. Curso de direito comercial, vol. 2 / Fábio Ulhoa Coelho. 5. ed. Rev. e atual. De acordo com o novo Código Civil e alterações da LSA. São Paulo: Saraiva, 2002, pp. 22-23.
– 66 –
Nesse sentido, assevera Ricardo Negrão:
Obviamente, em ambos os grupos há necessidade, em sua
formação, de elementos pessoais e de capital; sem eles
inexistiria contrato de sociedade. Entretanto, se há
predominância em sua formação de qualidades pessoais, de
sorte que a mera substituição de um sócio pode acarretar sua
dissolução ou a impossibilidade de sua continuação, então se
diz que a sociedade é pessoal. Se o caráter pessoal é
secundário, e a substituição de sócio se faz livremente, sem
necessidade de prévia consulta ou até mesmo conhecimento
dos demais sócios, então, à evidência, trata-se de sociedade
de capitais.65
Já as sociedades limitadas receberam tratamento especial, tendo
em vista que, pelo disposto no art. 1.053 do Código Civil de 2002, foi-lhe
facultada a regência pelas normas das sociedades simples. Por sua vez, o art.
1.057 dispõe que os seus sócios poderão ou não dispor livremente de suas
cotas e, por fim, estatui o art. 1.061 que o contrato pode permitir que a
administração se faça por sócios ou por não-sócios.
Dessa forma, dependendo da estrutura escolhida em sua
constituição, a sociedade limitada será uma sociedade de pessoa ou de capital.
Em face dessa peculiaridade, a sociedade limitada foi classificada pela doutrina
como do tipo “mista”.
Como o direito positivo brasileiro não define o que vem a ser
sociedade de pessoas e por se tratar de uma construção doutrinária, a
jurisprudência pátria firmou entendimento no sentido de que somente as
sociedades em comandita simples, em nome coletivo e em conta de
_________________ 65 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa, vol. 1 / Ricardo Negrão. 4. ed. Rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 242.
– 67 –
participação, podem ser consideradas sociedades de pessoas para fins de
interpretação do inciso VII do art. 134 do Código Tributário Nacional.
Perfilhamos, pois, desse entendimento.
Superado o dissenso no que concerne à conceituação de sociedade
mista, convém complementarmos o sentido da norma atributiva de
responsabilidade tributária aos sócios de sociedades de pessoas quando na
ocorrência da liquidação da sociedade.
Ocorrendo uma das hipóteses de dissolução societária, os sócios
das sociedades de pessoas, os quais, em virtude dessa classificação também
serão administradores, devem eleger o liquidante para liquidação da
sociedade, nos termos do que estabelece o contrato social.
Segundo Washington dos Santos, liquidação é o:
Ato ou efeito de liquidar; meio pelo qual a sociedade mercantil
dissolvida, sob a mesma firma, com a cláusula “em liquidação”,
dispõe de seu patrimônio, fazendo o ajuste final de contas,
terminando as operações encetadas, cobrando créditos,
pagando suas dívidas, vendendo os remanescentes do seu
fundo e distribuindo, por fim, entre os sócios, o ativo líquido ou
os prejuízos verificados, segundo o que estabelecer a lei ou o
contrato social.66
Uma vez realizada a liquidação da sociedade, se não sobrar
patrimônio para arcar com as obrigações tributárias, caberá a análise da
responsabilidade dos sócios pelos atos ou omissões que resultarem na falta de
pagamento da obrigação principal. Vale lembrar que essa responsabilidade não
_________________ 66 SANTOS, Washington dos. Dicionário jurídico brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 152.
– 68 –
se aplica ao administrador não-sócio, em face da tipicidade apresentada no
dispositivo, fazendo alusão explicita aos sócios.
3.2. A responsabilidade dos sócios e dirigentes de pessoas
jurídicas pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatutos
O art. 135 do CTN amplia a responsabilidade subsidiária dos sócios
de sociedade de pessoas, assunto abordado no item anterior, e das demais
pessoas citadas nos incisos do art. 134, para atribuir-lhes responsabilidade de
forma pessoal (inciso I). Atribui-se responsabilidade, também, a dois outros
grupos de pessoas físicas, elencados nos incisos II e III, quais sejam: os
mandatários, os prepostos, os empregados, os diretores, os gerentes ou
representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Dispõe o art. 135 do CTN que, in verbis:
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos
correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos
praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato
social ou estatutos:
I - as pessoas referidas no artigo anterior;
II - os mandatários, prepostos e empregados;
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas
jurídicas de direito privado.
– 69 –
Quando tratamos da classificação da responsabilidade tributária,
verificamos que ela pode ser por substituição ou por transferência. Na espécie
por substituição, a lei exige que o substituto ocupe o lugar do contribuinte
desde o nascimento da obrigação tributária. Por outro lado, na
responsabilidade por transferência, ocorre no mundo factual o fato jurídico que
enseja o surgimento da obrigação tributária para o contribuinte, e,
posteriormente, em função de algumas circunstâncias, a lei determina que a
responsabilidade seja transferida para um terceiro.
No artigo 135, encontramos a figura da responsabilidade de terceiros
por imputação legal, na modalidade de responsabilidade pessoal atribuída
unicamente às pessoas elencadas nos incisos desse artigo e não de uma
responsabilidade solidária ou subsidiária.
Isso é o que dispõe o caput do art. 135: “São pessoalmente
responsáveis (...)”. Nesse sentido:
Em suma, o art. 135 retira a “solidariedade” e a
“subsidiariedade” do art. 134. Aqui a responsabilidade se
transfere inteiramente para os terceiros, liberando os seus
dependentes e representados.67
Devemos verificar, em relação à responsabilidade prevista no
artigo 135 do Código Tributário Nacional, o seguinte;
1) essa responsabilidade do terceiro é de caráter pessoal, “são
pessoalmente responsáveis”, dispõe o Código. O terceiro, que
representa o sujeito passivo originário ou lhe serve de
instrumento jurídico, responde pela dívida tributária, inexistindo,
portanto, a solidariedade prevista no artigo 134 do Código
Tributário Nacional. Conforme ensina Ives Gandra da Silva
Martins, havendo apenas responsabilidade pessoal e
inexistindo a solidariedade, a responsabilidade das pessoas
_________________ 67 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Manual de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 403.
– 70 –
mencionadas, qando agindo em nome de pessoas jurídicas,
exclui a responsabilidade destas. Assim, passa a responder
pelo crédito tributário a pessoa que agiu com excesso de
poderes ou com infração legal, contratual ou etatutária,
excluindo da consequência desses atos o sujeito passivo
originário (em nome do qual se praticou os respectivos atos).
Em estudos específicos sobre a responsabilidade dos sócios e
de dirigentes de empresas, Leon Frejda Szklarowsky salienta,
corretamente, haver a responsabilidade “qualquer que seja o
tipo de sociedade”, abrangendo tanto a sociedade por cotas
limitada como a sociedade anônima. Segundo o autor citado, a
sociedade “distingue-se dos membros que a compõem;
contudo, segundo a melhor doutrina e a jurisprudência, não se
pode deixar de levar em consideração que aquela não deve
transformar-se em veículo de lesão ao patrimônio alheio,
mormente ao Fisco”. O terceiro, no caso, responde pelo crédito
tributário;68
Como dissemos acima, o Código Tributário Nacional disciplina, no
art. 124, o instituto da solidariedade passiva, estabelecendo que, quando
houver mais de um sujeito ocupando o lugar de devedor na mesma relação
jurídica tributária, todos serão obrigados pelo valor total do débito tributário.
No caso da responsabilidade subsidiária, em primeiro lugar, deve-se
cobrar o crédito tributário de um sujeito e na impossibilidade de se efetivar tal
cobrança, deve-se dirigir a cobrança para outro sujeito com a finalidade de
alcançar a satisfação do crédito.
Na responsabilidade normatizada no caput do art. 135, vemos que
não se trata nem de responsabilidade solidária nem de subsidiária, mas da
responsabilidade pessoal do agente que der origem ao nascimento de
obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes
_________________ 68 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de direito tributário. 2. ed. Rev., aument. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1994, 2. vol, p. 522.
– 71 –
ou infração de lei, contrato social ou estatutos e que delas resultem o crédito
tributário.
Precisamos definir o sentido do caput do art. 135 para o fim de
delimitar o seu alcance, ou seja, demonstrar quem pode ser responsável
pessoal e por quais condutas.
Nos termos do art. 135, somente podem ser responsáveis pelos
créditos tributários os sujeitos elencados nos incisos I a III quando praticarem
atos ilícitos e que desses atos resulte o nascimento da obrigação tributária.
Os atos ilícitos previstos no caput do art. 135 consistem nos atos
praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos.
Muito bem salientada por Sacha Calmon Navarra Coêlho a
observação de que tais condutas somente responsabilizam os terceiros, se
estes a praticarem de forma dolosa, pois em caso de se admitir a conduta
culposa, abrir-se-ia a possibilidade para planejamentos tributários fraudulentos:
O que não se pode admitir é que grandes empresas, até
mesmo multinacionais, por pura matroca obriguem seus
diretores contratados, com poucos bens ou sem eles, a ficar
responsáveis por atos deliberadarnente praticados em proveito
da empresa, com excesso de poder ou infração de lei ou
contrato. A exclusão das empresas daria lugar a enormes
injustiças e à indução de “planejamentos tributários” marotos.
Além disso tornaria as funções gerenciais um tipo de atividade
de alto risco.
Em razão do que foi exposto retro, verifica-se que os
pressupostos para a responsabilização de sócios-gerentes,
diretores e administradores das pessoas jurídicas de Direito
Privado residem no dolo. A dissolução ou o desfazimento de
– 72 –
fato da sociedade, v.g., é infração dolosa. Aproposita a
responsabilidade dos sócios. Fraude, conluio, sonegação para
elidir o cumprimento de obrigação tributária igualmente
aproposita a responsabilidade prevista no art. 135, mas
somente na hipótese de a pessoa jurídica provar a sua
inocência.69
Ademais, temos que os terceiros elencados nos incisos do art. 135,
respondem pessoalmente, pelo tributo, penalidades pecuniárias e obrigações
acessórias. Nesse sentido:
2) a responsabilidade é relativa aos créditos tributários
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou
infração da lei, do contrato social ou dos estatutos. Não
fazendo, o artigo, ressalva alguma, a sua eficácia não se limita
apenas ao valor do crédito tributário. Contrario sensu,
esclarece Aliomar Baleeiro, a responsabilidade abrange
“quaisquer penalidades e obrigações acessórias”. A
responsabilidade pessoal será pelo crédito tributário resultante
dos respectivos atos, abrangendo não apenas a dívida
decorrente de tributo, com os acréscimos decorrentes do
tempo, e mais os acréscimos punitivos.70
Além do que, essa responsabilidade só poderá ser atribuída ao sócio
ou administrador quando constatada a prática de infração à lei, ao contrato
social ou ao estatuto.
Daí dessume-se que a prática de ato ilícito pela pessoa jurídica, em
seu próprio benefício, não pode acarretar a responsabilidade tributária tratada
no art. 135 do CTN a seus sócios e administradores. Vale ressaltar que a
_________________ 69 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Manual de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 405. 70 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de direito tributário. 2. ed. Rev., aument. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1994, 2. vol, pp. 522-523.
– 73 –
pessoa jurídica tem existência distinta da dos seus sócios e administradores,
conforme será mais detalhadamente explanado no próximo capítulo.
Por outro lado, se as pessoas físicas atuam fora dos limites de sua
competência enquanto órgão da pessoa jurídica restará patente que tais atos
serão praticados de forma pessoal pelos sócios ou administradores e não pela
pessoa jurídica. Sua competência está disciplinada na lei societária e no
disposto no contrato social ou estatuto.
Percebemos, então, que a “infração à lei”, prescrita no caput do art.
135, significa infração à lei societária disciplinadora da competência dos
administradores da pessoa jurídica. Se o administrador pautar-se sempre por
critérios de prudência e moderação, deixando clara sua condição de bom
administrador, não poderá ser responsabilizado por dívida fiscal a que não deu
causa.
Para fins de atribuição de responsabilidade pessoal do administrador
da pessoa jurídica, cabe ao Fisco provar que ele causou prejuízo ao praticar
algum ato gerencial fora de sua competência de administrador, ou seja, que o
mesmo não agiu com prudência na administração da empresa e que esse ato
foi causa do inadimplemento. Nesse sentido, pertinente é a observação de
Carlos Lete Achirica, quando afirma que “Se excluye, por tanto, la imposición
de sanciones a los administradores de las sociedades mercantiles por el mero
resultado de su actividad y sin atender a la conducta diligente que hayan
manifestado”71.
_________________ 71 ACHIRICA, Carlos Lete. La responsabilidad tributaria de los administradores de las sociedades mercantiles. Madrid: Civitas, 2000, pp. 65-66.
– 74 –
Já dissemos que a competência do administrador está disciplinada
na lei societária e no disposto no contrato social ou estatuto, e que são as
infrações a essas normas que lhe podem ocasionar a atribuição de
responsabilidade tributária . Carlos Lete Achirica, discorrendo sobre a
impossibilidade de contradição entre as normas societárias e as normas
tributárias, firma posição no sentido de que:
Cualquiera que sea la autonomía que se quiera atribuir a las
normas tributarias parece un completo contrasentido defender
una posición como la apuntada, dado que, seguiendo Ia
argumentación criticada, los administradores tendrían que ser
diligentes en su actuación como gestores para evitar la
responsabilidad frente a la propia sociedad, frente a los socios
o frente a los acreedores sociales. Y, sin embargo, esa
diligencia puesta en el desempeño de su cargo no les
exoneraría de responsabilidad en el caso del artículo 40.1 de la
LGT [prescreve sobre a responsabilidade tributária dos
administradores no Direito Espanhol], cuando lo cierto es que
precisamente para incentivar la diligencia de ciertos sujetos,
para prever actitudes escasamente diligentes, es por lo que la
Ley configura ciertos presupuestos de hechos de los que surge
la obligación a cargo de los responsables tributarios, los
administradores de ias sociedades mercantiles en el caso que
nos ocupa.72
Ou seja, se o administrador tiver atuado dentro das competências
que lhe foram atribuídas pela lei societária, contrato social ou estatuto, agindo
de forma diligente na gerência da empresa, não se lhe pode imputar
responsabilidade tributária.
_________________ 72 ACHIRICA, Carlos Lete. La responsabilidad tributaria de los administradores de las sociedades mercantiles. Madrid: Civitas, 2000, p. 53.
– 75 –
Frise-se, mais uma vez, a necessidade de prova por parte do Fisco
da existência de dolo do administrador na prática do ato. Nesse sentido,
leciona Isabel Sánchez Ayuso73 que:
La imposibilidad de ingreso de una deuda tributaria, dentro del
plazo reglamentariamente señalado, por falta de tesorería,
deberá ser probado por quien la alegue. Sin embargo,
entendemos que, por aplicación del principio de presunción de
inocencia, vigente en Derecho penal, incumbe al acusador la
prueba de que esa situación que implica la imposibilidad de
cumpliminiento de la obligación tributaria se ha producido
mediante la concurrencia de dolo o culpa del sujeto, bien de
propósito, bien sometiendo su patrimonio a riesgos
injustificados y omitiendo con ello la debida diligencia. Obtener
tal prueba está perfectamente al alcance de los medios de
investigación y comprobación de la Administración tributaria.
Feitas as considerações acima, chegamos à conclusão de que a
falta de pagamento de tributo, por si só, não pode ser considerada infração de
lei para fins de atribuição de responsabilidade tributária aos sócios e dirigentes
da pessoa jurídica.
Sobre essa antiga controvérsia, a Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça se posionou, firmando a sua orientação jurisprudencial no
sentido de que o não pagamento do tributo devido, por si só, não configura,
nem em tese, a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do
CTN. Para tanto, seria indispensável que os diretores, gerentes ou
representantes de pessoas jurídicas de direito privado tenham agido com
_________________ 73 AYUSO, Isabel Sánchez. Circunstancias eximentes y modificativas de responsabilidad por infracciones tributarias. Madrid: Marcial Pons, 1996, p. 235.
– 76 –
excesso de poderes ou infração à lei societária, ao contrato social ou ao
estatuto da empresa74.
3.3. A execução fiscal e os instrumentos de defesa dos sócios e
administradores
Vimos no tópico anterior que a responsabilidade tributária
disciplinada no art. 135 do CTN não pode ser atribuída a terceiros, tão-
somente, pela falta de pagamento do tributo, por se configurar em infração
praticada pela pessoa jurídica. Para que tal responsabilização fosse atribuída a
terceiros, seria imprescindível a prática de infração à lei societária, ao contrato
social ou ao estatuto. Vimos também, que esse entendimento foi consagrado
na jurisprudência do STJ, em face do julgamento do Recurso Especial nº
1101728/SP, em sede de recurso repetitivo.
Não obstante o posicionamento acima delineado, o STJ, também em
sede de Recurso Especial75 submetido à sistemática prevista no art. 543-C do
_________________ 74 TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. TRIBUTO DECLARADO PELO CONTRIBUINTE. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. DISPENSA. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO. TRIBUTO NÃO PAGO PELA SOCIEDADE. 1. A jurisprudência desta Corte, reafirmada pela Seção inclusive em julgamento pelo regime do art. 543-C do CPC, é no sentido de que "a apresentação de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF, de Guia de Informação e Apuração do ICMS – GIA, ou de outra declaração dessa natureza, prevista em lei, é modo de constituição do crédito tributário, dispensando, para isso, qualquer outra providência por parte do Fisco" (REsp 962.379, 1ª Seção, DJ de 28.10.08). 2. É igualmente pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do CTN. É indispensável, para tanto, que tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa (EREsp 374.139/RS, 1ª Seção, DJ de 28.02.2005). 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08. (REsp 1101728/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/03/2009, DJe 23/03/2009) 75 PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO À SISTEMÁTICA PREVISTA NO ART. 543-C DO CPC. EXECUÇÃO FISCAL. INCLUSÃO DOS REPRESENTANTES DA PESSOA
– 77 –
Código de Processo Civil, firmou orientação jurisprudencial no sentido de que,
se a execução for ajuizada apenas contra a pessoa jurídica, mas se o nome do
sócio constar da CDA, a ele incumbe o ônus da prova de que não ficou
caracterizada nenhuma das circunstâncias previstas no art. 135 do CTN.
Restou consignado, também, que tal prova deverá ser realizada mediante a
propositura de embargos à execução, sendo inviável a exceção de pré-
executividade para se arguir a ilegitimidade passiva, por se fazer necessária a
dilação probatória.76
O julgamento dos recursos repetitivos acima foi realizado na
sistemática introduzida pela Lei nº 11.672, de 8 de maio de 2008, a qual
JURÍDICA, CUJOS NOMES CONSTAM DA CDA, NO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE. MATÉRIA DE DEFESA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INVIABILIDADE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. A orientação da Primeira Seção desta Corte firmou-se no sentido de que, se a execução foi ajuizada apenas contra a pessoa jurídica, mas o nome do sócio consta da CDA, a ele incumbe o ônus da prova de que não ficou caracterizada nenhuma das circunstâncias previstas no art. 135 do CTN, ou seja, não houve a prática de atos "com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos". 2. Por outro lado, é certo que, malgrado serem os embargos à execução o meio de defesa próprio da execução fiscal, a orientação desta Corte firmou-se no sentido de admitir a exceção de pré-executividade nas situações em que não se faz necessária dilação probatória ou em que as questões possam ser conhecidas de ofício pelo magistrado, como as condições da ação, os pressupostos processuais, a decadência, a prescrição, entre outras. 3. Contudo, no caso concreto, como bem observado pelas instâncias ordinárias, o exame da responsabilidade dos representantes da empresa executada requer dilação probatória, razão pela qual a matéria de defesa deve ser aduzida na via própria (embargos à execução), e não por meio do incidente em comento. 4. Recurso especial desprovido. Acórdão sujeito à sistemática prevista no art. 543-C do CPC, c/c a Resolução 8/2008 - Presidência/STJ. (REsp 1104900/ES, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/03/2009, DJe 01/04/2009) 76 TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL SÓCIO-GERENTE CUJO NOME CONSTA DA CDA. PRESUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA ARGUIDA EM EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. 1. A exceção de pré-executividade é cabível quando atendidos simultaneamente dois requisitos, um de ordem material e outro de ordem formal, ou seja: (a) é indispensável que a matéria invocada seja suscetível de conhecimento de ofício pelo juiz; e (b) é indispensável que a decisão possa ser tomada sem necessidade de dilação probatória. 2. Conforme assentado em precedentes da Seção, inclusive sob o regime do art. 543-C do CPC (REsp 1104900, Min. Denise Arruda, sessão de 25.03.09), não cabe exceção de pré-executividade em execução fiscal promovida contra sócio que figura como responsável na Certidão de Dívida Ativa - CDA. É que a presunção de legitimidade assegurada à CDA impõe ao executado que figura no título executivo o ônus de demonstrar a inexistência de sua responsabilidade tributária, demonstração essa que, por demandar prova, deve ser promovida no âmbito dos embargos à execução. 3. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC. (REsp 1110925/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/04/2009, DJe 04/05/2009)
– 78 –
introduziu alterações no Código de Processo Civil (CPC), acrescendo ao CPC
o art. 543-C, que estabelece o procedimento para o julgamento em massa de
recursos, tornando mais efetiva a prestação jurisdicional. A norma dispõe que,
quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica
questão de direito, cabe ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais
recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao STJ. Os demais
ficarão suspensos até o pronunciamento definitivo do Tribunal.
O posicionamento adotado pelo STJ nos preocupa por entendermos
não ser a interpretação mais adequada, à qual, inclusive, poderá acarretar o
cometimento de inúmeras injustiças, uma vez que se propõe a inviabilizar a
defesa via exceção de pré-executividade dos supostos cor-responsáveis, os
quais podem estar indevidamente indicados na CDA.
A primeira referência ao instituto da exceção de pré-executividade,
ainda que não se haja utilizado dessa denominação, reporta-se a 1890, quando
da instituição da Justiça Federal neste país. Com efeito, o Dec. 848, de 11 de
outubro de 1890, facultava a defesa do devedor antes de realizada a penhora e
desde que assegurado o Juízo. A segurança do Juízo, vale frisar, se tornava
desnecessária caso fosse exibido documento comprovando ou o pagamento ou
a anulação da dívida.
Posteriormente, o Dec. n°5.225, de 31 de dezembro de 1932, do
Estado do Rio Grande do Sul, disciplinou a exceção de impropriedade do meio
executivo. Por este instituto o devedor poderia, antes da uilização de qualquer
outro procedimento executório, contestar o título executivo alegando sua
impropriedade.
– 79 –
Foi, todavia, com um emblemático parecer de Pontes de Miranda
que este instituto ganhou contornos mais semelhantes aos de hoje. Contratado
por uma companhia siderúrgica de renome, a qual se encontrava em grave
situação ante o vultoso número de execuções a que era submetida, aquele
professor emitiu parecer defendendo a possibilidade de o executado se
manifestar dentro do próprio processo de execução por outro meio distinto dos
embargos. Afirmava ser a cognição necessária à execução, sendo de interesse
do Juízo o esclarecimento de todos os âmbitos da contenda, para melhor
decidir, e não tão somente prestar a tutela a que foi instado.
Outros autores atuais77 também criticam a necessidade de penhora
antes da discussão acerca da legitimidade do título, especialmente nos casos
dessa imposição ser injusta ao executado. Entende-se, também, que deve ser
concedida ao executado a possibilidade liminar à execução de pronunciar-se
sobre matérias a respeito das quais o juiz deveria ter tratado, mas não o fez.
Alguns juristas, no entanto, hesitam em propalar as virtudes da
adoção de tal recurso processual por receio de manobras escusas por parte do
devedor, com fim apenas de protelar o adimplemento da respectiva obrigação.
Lembre-se, porém, que esse tipo de atitude está presente em qualquer
processo judicial, desde sempre, sem, contudo, tornar inadequados outros
recursos do devedor, por vezes até mais custosos ao credor.
Não se deve, por isso, cercear os meios legítimos de defesa do
devedor em função de atitudes errôneas por parte de algumas minorias.
_________________ 77 WAMBIER, Teresa Amida Alvim; WAMBIER, Luiz Rodrigues. Processo de execução e assuntos afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 410 e ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, vol. I. Porto Alegre: Letras Jurídicas, 1987, p. 344.
– 80 –
Ademais, convém rememorar que a terminação “pré-executividade”
não designa uma relação jurídica prévia ao processo de execução, mas uma
prévia à efetivação da penhora, ou, mais amplamente, dos atos próprios da
execução. A defesa, como fica evidente, é realizada dentro do processo.
Sobre o cabimento da Exceção de Pré-executividade, deve-se
esclarecer que essa medida é espécie excepcional de defesa no processo de
execução, quando não demande dilação probatória, para discutir pressupostos
processuais e condições da ação.
Não obstante o débito inscrito em dívida ativa possuir presunção de
liquidez, certeza e exigibilidade, uma vez verificada a existência de causas
capazes de afastar quaisquer desses requisitos necessários à validade e à
execução do crédito, inadmissível é que o Executado seja compelido a garantir
o juízo para posteriormente, por meio de Embargos à Execução, demonstrar a
ausência de conteúdo do título exequendo.
Corroborando esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça
vinha admitindo o cabimento da exceção de pré-executividade para discutir, na
ação executiva, a ilegitimidade passiva, bem como outras matérias de ordem
pública, tais como condições da ação e pressupostos processuais, desde que
não fosse necessário, para tal mister, realizar dilação probatória.78
_________________ 78 PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE EM EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE. ARTIGO 135, III, DO CTN. PRECEDENTES. 1. A apreciação da questão federal impugnada pela via especial depende do seu efetivo exame e julgamento pelo Tribunal a quo. 2. Entendimento desta Corte de que não é absoluta a proibição da exceção de pré-executividade em execução fiscal, especialmente nos casos em que se discutiu pressupostos processuais e condições da ação. 3. A imputação da responsabilidade prevista no art. 135, III, do CTN não está vinculada apenas ao inadimplemento da obrigação tributária, mas à comprovação das demais condutas nele descritas: prática de atos com excesso de
– 81 –
No entanto, a recente alteração na orientação jurisprudencial do
STJ, firmada mediante as decisões nos REsp 1104900/ES e REsp
1110925/SP, pela inadmissão da exceção, implica em violação aos preceitos
constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV da Constituição
Federal de 1988), posto que, possuindo condições de comprovar de maneira
clara e precisa os vícios do título executivo, há de se admitir a defesa pelo
Excipiente, independentemente da garantia do juízo. A posição do STJ,
portanto, parece-nos equivocada.
A Certidão de Dívida Ativa para gozar da presunção de certeza e
liquidez, nos termos do art. 204 do CTN79 e inviabilizar a propositura da
poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. 4. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no REsp 471107/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/02/2004, DJ 15/03/2004 p. 234) PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. SÓCIO-GERENTE. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. ARGUIÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. MATÉRIA COGNOSCÍVEL DE OFÍCIO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL CONFIGURADA. 1. O redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente da empresa somente é cabível quando comprovado que ele agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa. O simples inadimplemento de obrigações tributárias não caracteriza infração legal. 2. Este Tribunal firmou o entendimento de que podem ser utilizadas a exceção de pré-executividade ou a mera petição, em situações especiais e quando não demande dilação probatória. 3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 533895/RS, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/03/2006, DJ 25/05/2006 p. 208) PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Recurso Especial interposto contra v. Acórdão que manteve decisão singular nos autos de execução fiscal que acolheu exceção de pré-executividade, excluindo do pólo passivo o recorrido, ao argumento de que o inventariante somente é responsável pelos tributos devidos pelo espólio, e não quanto aos devidos pelo de cujos. 2. A doutrina e a jurisprudência, como todos conhecem, aceitam que "os embargos de devedor pressupõem penhora regular, que só se dispensa em sede de exceção de pré-executividade, limitada à questões relativas aos pressupostos processuais e às condições da ação", incluindo-se a alegação de que a dívida foi paga (REsp nº 325893/SP). 3. A jurisprudência do STJ tem acatado a exceção de pré-executividade, impondo, contudo, alguns limites. Coerência da corrente que defende não ser absoluta a proibição da exceção de pré-executividade no âmbito da execução fiscal. 4. No caso em exame, o acórdão bem aceitou a exceção de pré-executividade, haja vista ter ficado demonstrado ser o executado parte ilegítima na relação jurídica buscada pelo INSS. 5. Recurso não provido. (REsp 371460/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/02/2002, DJ 18/03/2002 p. 188) 79 Art. 204. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída.
– 82 –
exceção de pré-executividade para a alegação de ilegitimidade passiva, precisa
retratar de forma fiel, nos termos do art. 201 do CTN80, o resultado do
lançamento tributário, após esgotados os recursos a ele inerentes, indicando,
conforme o inciso I do art. 202 do CTN81, o nome dos corresponsáveis.
A Certidão de Dívida Ativa, na qual conste o erro quanto à indicação
dos corresponsáveis, apurados em processo regular de lançamento tributário,
ensejará, segundo o art. 203 do CTN82, causa de nulidade da inscrição e do
processo de cobrança dela decorrente.
Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior afirma que:
“Enfim, é o procedimento administrativo que precede à
inscrição que enseja a oportunidade para definir quem vem a
ser o devedor principal, subsidiário ou co-responsável. (...)
Sendo a execução fiscal regulada pela Lei 6.830 puro
procedimento executivo, continua a meu ver, inadmissível, em
feito da espécie, pretender a Fazenda o acertamento da
responsabilidade de terceiros ou coobrigados que não
figuraram no processo administrativo e contra quem não se
formou o título executivo, que é a Certidão de Dívida Ativa.”83
Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que aproveite. 80 Art. 201. Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular. Parágrafo único (...) omissis 81 Art. 202. O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente: I - o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros; (...) omissis 82 Art. 203. A omissão de quaisquer dos requisitos previstos no artigo anterior, ou o erro a eles relativo, são causas de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente, mas a nulidade poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula, devolvido ao sujeito passivo, acusado ou interessado o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada. 83 Humberto Theodoro Júnior, Lei de Execução Fiscal, 4 ed., São Paulo, Saraiva, 1995, pp. 22 e 24.
– 83 –
Isso implica dizer que, para que haja a indicação dos
corresponsáveis na CDA, a eles deve ter sido oportunizado o direito de ampla
defesa quanto à atribuição de sua sujeição passiva, o que deve ocorer no
momento do lançamento tributário.
O lançamento tributário tem sua matriz legal, delimitadora das
atividades dos entes tributantes, no art. 142 do CTN 84. Tem ele o objetivo de
determinar o fato imponível realizado pelo sujeito passivo e apurar o valor do
tributo devido, segundo Vittorio Cassone.85
Lançamento tributário constitui o ato tributário formal descritor do
fato gerador de um tributo, com todos seus aspectos e elementos
integrativos.86 Observadas essas condições, tem ele a finalidade de constituir o
crédito tributário do sujeito ativo da obrigação tributária, no caso, o Estado.
Vale dizer que a descrição do fato só se constitui lançamento tributário, quando
o fato imponível e o seu relato mantiverem simetria com a respectiva hipótese
de incidência. Fora disso, não se tem lançamento tributário. E se o for, será
viciado, não se prestando para constituir o crédito tributário que pretende. O
crédito tributário respectivo será inexigível, por inexistência.
_________________ 84 Código Tributário Nacional – CTN, Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional. 85 O lançamento é o ato privativo da Administração Pública que verifica a registra a ocorrência do fato gerador, a fim de apurar a quantia devida pelo sujeito passivo da obrigação tributária. (CASSONE, Vittorio. Direito tributário. São Paulo: Atlas, 1997, p. 124).
– 84 –
A jurista Mary Elbe, reportando-se a Juan P. Cajarville Peluffo,87 diz,
com precisão, que “os atos administrativos devem fundar-se em motivos reais e
verdadeiros.” É o rigorismo que o lançamento deve manter com a verdade
material.
Sem esse rigorismo, há vício. E o que pretende ser lançamento
tributário verdadeiramente não o é, não se prestando a constituir o crédito
tributário respectivo.
O art. 146, inciso III, alínea “b”,88 da Constituição Federal, diz que
lançamento é matéria de lei complementar. Só após essa prescrição normativa
intermediária, é que a lei ordinária pode dispor sobre lançamento tributário.
Nessa hipótese, a lei ordinária não recebe competência direta da Constituição
Federal, mas da lei complementar.
Geraldo Ataliba89, posicionando-se pela hierarquia da lei
complementar frente à lei ordinária, discorreu da seguinte forma:
É próprio da técnica de elaboração legislativa inserir os
mandamentos hierarquizados em ordem tal que os superiores
precedem os inferiores e vice-versa. Assim, as enumerações
em regra começam pelo mais relevante ou importante, em
ordem decrescente.
_________________ 87 No dizer de Juan P. Cajarville Peluffo, os atos administrativos devem fundar-se em motivos reais e verdadeiros, pois, do contrário, serão atos ilegítimos, uma vez que ‘ por esta regra substancial, a Administração está obrigada a ajustar-se à verdade material dos fatos, sem que a obriguem os acordos dos interessados acerca de tais fatos nem a eximam de investigá-los, conhecê-los e ajustar-se a eles, a circunstância de não haverem sido alegados ou provados pelas partes. (MAIA, Mary Elbe Gomes Queiroz. Do lançamento tributário – Execução e controle. São Paulo: Dialética, 1999, p.107). 88 Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) b) obrigação, LANÇAMENTO, crédito, prescrição e decadência tributários; (grifos nossos). 89 ATALIBA, Geraldo. Lei complementar na Constituição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1971, p. 29.
– 85 –
Abaixo das leis constitucionais, localizou as complementares,
seguidas imediatamente das ordinárias. A hierarquia ideal
corresponde a essa gradação.
A principal conseqüência jurídica dessa circunstância reside na
superioridade da lei complementar sobre a ordinária. E esta
gradação tem, em muitos casos, conseqüências também de
caráter formal, como se verá.
Consiste a superioridade formal da lei complementar - como
em geral das normas jurídicas eminentes, em relação às que
lhe são inferiores - na impossibilidade jurídica de a lei ordinária
alterá-la ou revogá-la. Nula é, pois, a parte desta que
contravenha disposição daquela.
A lei ordinária que dispõe sobre lançamento além das fronteiras
tracejadas por lei complementar é inconstitucional, não tem competência, não
tem eficácia.
A validade do lançamento tributário depende da contemporaneidade
de vários fatores:
a) previsão constitucional;
b) previsão em lei complementar;
c) previsão em lei ordinária;
d) o fato imponível ser concreto, podendo ser presumido ou
arbitrado nos limites admitidos pelo sistema jurídico;
e) a hipótese de incidência descritora, com fidelidade, dos
elementos fáticos selecionados no fato imponível.
– 86 –
O fato imponível objeto do lançamento, em geral, deve ser real,
concreto, para que, à vista do princípio da tipicidade, haja subsunção à
respectiva hipótese de incidência. Esse é também o entendimento de Paulo de
Barros Carvalho90.
A desconsideração da realidade fática do fato gerador gera
insegurança, invalidando a tributação respectiva.
O lançamento, via de regra, deve ter fato imponível, fato real,
concreto. A admissibilidade de lançamento fora desse esquema – arbitramento
e presunção – constitui exceção, somente admissível nos estreitos limites da
legislação pertinente. O que não se encaixar nas exceções, encontra-se sob a
égide da regra geral do lançamento: fato real.
A validade do lançamento tributário depende, pois, de sua
adequação ao sistema jurídico tributário, notadamente de sua vinculação à
lei91. Não depende, portanto, apenas de ser o descritor de um fato, mas que
esse relato mantenha paridade com os aspectos e elementos contidos na
_________________ 90 A devida compreensão da fenomenologia da incidência tributária tem o caráter de ato fundamental para o conhecimento jurídico, posto que assim atuam todas as regras do direito, em qualquer de seus subdomínios, ao serem aplicados no contexto da comunidade social. Seja qual for a natureza do preceito jurídico, a sua atuação dinâmica é a mesma: opera-se a concreção do fato previsto na hipótese, propalando-se os efeitos jurídicos prescritos na consequência. Mas esse enquadramento do conceito do fato ao conceito da hipótese normativa tem de ser completo, para que se dê, verdadeiramente, a subsunção. É aquilo que se tem por tipicidade, que no Direito Tributário, assim como no Direito Penal, adquire transcendental importância. Para que se configure o fato jurídico tributário, a ocorrência da vida real tem de satisfazer a todos os critérios identificadores tipificados na hipótese. Que apenas um não se verifique, e a dinâmica que descrevemos ficará inteiramente comprometida. É precisamente nesse núcleo fundamental que não pode operar a presunção, quando pensamos na existência concreta de uma figura tributária, tornando-se desnecessário aduzir que assim é porque a atividade impositiva do estado mexe com dois valores essenciais à vida em sociedade, quais sejam o direito de propriedade e o direito de liberdade. (“A prova no Procedimento Administrativo Tributário”. Revista Dialética de Direito Tributário – RDDT nº 34, p. 104 e seguintes). 91 Código Tributário Nacional – CTN, Art. 142. (...) Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
– 87 –
hipótese de incidência. Com esse perfil, vê-se que o lançamento não é ato
discricionário do Poder Tributante. Corroboram com essa limitação os juristas
Luciano Amaro,92 Hugo de Brito Machado,93 Maria Rita Ferragut94 e Aliomar
Baleeiro, com atualização de Mizabel Derzi.95
Ausente qualquer um desses fatores ou indicados de forma
incorreta, não há lançamento legítimo, estando viciado de ilegalidade ou de
inconstitucionalidade.
O mesmo se diga em relação à indicação da sujeição passiva dos
responsáveis tributários, uma vez que se trata de elemento integrante da
relação jurídica tributária, consubstanciada no lançamento tributário.
A responsabilidade dos administradores de pessoas jurídicas de
direito privado, nos termos do art. 135, III, do CTN, somente pode ser a eles
atribuída no caso de prática de infração à legislação societária, ao contrato
social ou estatudo. E essa infração deve ser devidamente apurada e
comprovada pelo lançamento tributário, sendo àqueles ofertado o direito de se
defenderem dessa acusação.
_________________ 92 O lançamento deve ser efetuado pelo sujeito ativo nos termos da lei, vale dizer, tem de ser feito sempre que a lei o determine, e sua consecução deve respeitar os critérios da lei, sem margem de discrição dentro da qual o sujeito ativo pudesse, por razões de conveniência ou oportunidade, decidir entre lançar ou não, ou lançar valor maior ou menor, segundo sua avaliação discricionária. (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 335). 93 Quando alguém age em nome do Estado não tem, nem poderia ter, a mesma liberdade de que desfruta ao agir em seu próprio nome. Quem age em seu próprio nome tem ampla liberdade. Pode fazer tudo o que a lei não proíbe. Já os que atuam em nome do Estado só podem fazer aquilo que se compreende nas respectivas competências. (MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional, vol III. São Paulo: Atlas, 2005, p. 54). 94 O lançamento é procedimento administrativo vinculado. O agente, ao exercê-lo, não interfere com apreciação subjetiva alguma, pois existe prévia e objetiva tipificação legal do único comportamento possível da Administração em face de situação igualmente prevista. (FERRAGUT, Maria Rita. Presunções no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2001, p. 139). 95 Na doutrina, o lançamento tem sido definido como o ato, ou a série de atos, de competência vinculada, praticado por agente do Fisco, para verificar a realização do fato gerador da matéria tributária. (BALEEIRO, Aliomar; DERZI, Misabel Abreu Machado (atualizadora). Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 782).
– 88 –
A Certidão de Dívida Ativa que indicar responsável tributário que não
tenha o seu nome incluído no lançamento tributário, ou que a ele não haja sido
ofertado o direito de defesa, é nula de pleno direito, nos termos do art. 203 do
CTN.
Logo, para que se pudesse sanar de imediato a nulidade acima
apontada, mister seria a interposição de exceção de pré-executividade para
questionar a ilegitimidade passiva tributária.
No que tange à inadmissibilidade de utilização desse meio de
impugnação, tendo em vista a vedação de dilação probatória, entendemos que
a juntada da cópia integral do processo administrativo do lançamento tributário
que demonstre a ausência de indicação do responsável tributário ou ausência
de oportunização de direito de defesa, é prova suficiente e irrefutável para a
configuração da ilegitimidade passiva dos responsáveis, ilegitimamente
indicados na Certidão de Dívida Ativa. Estaria dispensada, portanto, a dilação
probatória, com a ouvida da Fazenda Pública, a oitiva de testemunhas, bem
como a realização de prova pericial.
Nesses casos, entendemos que a exceção de pré-executividade é
meio legítimo para a defesa dos supostos responsáveis tributários, não lhes
sendo obrigatório o manuseio, tão-somente, de embargos de devedor ou ação
anulatória.
– 89 –
4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
4.1. O conceito de pessoa e personalidade jurídica
O instituto da desconsideração da personalidade jurídica e a sua
relação com o direito tributário tem sido um tema gerador de muitas
controvérsias tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátria, principalmente
após o advento da Lei Complementar nº 104/2001 e do Código Civil de 2002
(Lei n° 10.406/2002).
A Lei Complementar n° 104/2001 introduziu um parágrafo único ao
art. 116 do CTN e trouxe a possibilidade de:
A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou
negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a
ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos
elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os
procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.
O Código Civil de 2002, por intermédio do seu art. 5096, introduziu no
sistema jurídico uma norma que possibilita ao Juiz, quando verificado o “abuso
da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela
confusão patrimonial” e, “a requerimento da parte, ou do Ministério Público
_________________ 96 Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
– 90 –
quando lhe couber intervir no processo”, determinar “que os efeitos de certas e
determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares
dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.
Temos ainda o art. 135 do CTN, por intermédio do qual, são
pessoalmente responsáveis pelos tributos, resultantes de atos praticados com
excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatuto: I - as
pessoas referidas no art. 134 do Código Tributário Nacional; II - os
mandatários, prepostos e empregados; e III - os diretores, gerentes ou
representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Apresentados os dispositivos normativos do CTN e do Código Civil,
acima transcritos, temos que não encontra mais espaço na doutrina o
pensamento de que o direito tributário se trata de um ramo autônomo do direito
positivo, pois este é uma unidade que não pode ser decomposta, somente
podendo ser dividido em ramos, para atender a uma questão didática.
Valemos-nos da observação de Paulo de Barros Carvalho97, para quem:
a ordenação jurídica é una e indecomponível. Seus elementos
— as unidades normativas — se acham irremediavelmente
entrelaçados pelos vínculos de hierarquia e pelas relações de
coordenação, de tal modo que tentar conhecer regras jurídicas
isoladas, como se prescindissem da totalidade do conjunto,
seria ignorá-lo, enquanto sistema de proposições prescritivas.
Uma coisa é certa: qualquer definição que se pretenda há de
respeitar o princípio da unidade sistemática e, sobretudo, partir
dele, isto é, dar como pressuposto que um número imenso de
preceitos jurídicos, dos mais variados níveis e dos múltiplos
setores, se aglutinam para formar essa mancha normativa cuja
demarcação rigorosa e definitiva é algo impossível.
_________________ 97 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 14.
– 91 –
Isso não quer dizer que os institutos de direito privado serão sempre
aplicados às lides tributárias, justamente em face do observado por Paulo de
Barros Carvalho, no sentido de se encontrarem as normas jurídicas
entrelaçadas pelos vínculos de hierarquia e pelas relações de coordenação,
sendo tais vínculos os limites que devem ser observados. No mesmo sentido,
ensina Heleno Taveira Tôrres98:
As normas jurídicas não existem isoladamente, antes,
apresentam-se estritamente relacionadas, por coordenação e
subordinação, enquanto elementos que são de um sistema.
Por este motivo não seria possível a tentativa de isolamento de
regras jurídicas em confins arbitrariamente demarcados, na
medida em que verteria a ideia de sistema jurídico.
Pretendemos construir a correta significação das normas jurídicas
para verificarmos se o art. 50 do Código Civil de 2002 pode ser fundamento de
validade para a responsabilização dos sócios ou administradores por débitos
fiscais da sociedade à qual pertençam; e se a teoria geral da desconsideração
da personalidade jurídica pode ser aplicada ao direito tributário.
Abordaremos ainda nesse capítulo se as normas insculpidas no
parágrafo único do art. 116 e no art. 135, ambos do CTN, podem ser
consideradas como normas afetas à desconsideração da personalidade
jurídica.
A personalidade das pessoas jurídicas é instituto de máxima
relevância, haja vista constituir-se em uma segurança aos sócios e acionistas
_________________ 98 TORRES, Heleno Taveira. Direito Tributário e Direito Privado. São Paulo: RT, 2003, p. 52.
– 92 –
que se agrupam para a consecução de determinados fins, que não seriam
alcançados, caso não houvesse essa associação.
Para melhor compreensão do tema, convém estabelecermos os
conceitos de pessoa e personalidade jurídicas. Vejamos, primeiramente, o
conceito de pessoa jurídica fornecido por De Plácido e Silva99:
Em oposição à pessoa natural, expressão adotada para
indicação da individualidade jurídica constituída pelo homem, é
empregada para designar as instituições, corporações,
associações e sociedades, que, por força ou determinação da
lei, se personalizam, tomam individualidade própria, para
constituir uma entidade jurídica, distinta das pessoas que a
formam ou que a compõe. Diz-se jurídica porque se mostra
uma encarnação da lei. E, quando não seja inteiramente criada
por ela, adquire vida ou existência legal somente quando
cumpre as determinações fixadas por lei. ... a pessoa jurídica
somente tem existência quando o Direito lhe imprime o sopro
vital. Criando-se ou as confirmando, é, pois, o Direito que
determina ou dá vida a estas entidades, formadas pela
agremiação de homens, pela patrimonização de bens, ou para
cumprir, segundo as circunstâncias, a realização do próprio
Estado.
No que diz respeito à natureza jurídica da pessoa jurídica, formou-
se, ao longo do tempo, teorias baseadas em três sistemas, sendo eles: a) da
ficção; b) da negação da personalidade; c) da realidade100.
_________________ 99 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999, p. 606. 100 Pessoa jurídica – Pelo sistema da ficção, as pessoas jurídicas “são aquelas, que não nascendo da natureza, como a pessoa natural, resulta, de uma ficção jurídica, uma criação imaginária da lei, do direito”: primeira teoria (representação): “É atribuída à pessoa jurídica, não a personalidade verdadeira, mas uma representação da personalidade consubstanciada no órgão representativo dessa pessoa fictícia”; segunda teoria (personificação): “A atribuição é dada a personalidade ao próprio ente fictício, criação deliberativa do legislador, conforme podemos ver o que diz Savigny: ‘Pessoa jurídica é um sujeito de direito de bens criado artificialmente’.” Pelo sistema da negação da personalidade: “Neste sistema temos três teorias, todas elas concluindo pela inexistência das pessoas, quer por julgarem unicamente se as pessoas naturais são capazes de ser sujeito dos direitos e de admitir o caso dos direitos sem sujeito”; teoria individualista, Bolze e Ihering: “Por esta
– 93 –
Quanto ao conceito de personalidade jurídica, o mesmo autor acima
referendado, De Plácido e Silva, assim se posicionou101:
Denominação propriamente dada à personalidade que se
atribui ou se assegura às pessoas jurídicas, em virtude do que
se investem de uma qualidade de pessoa, que as tornam
suscetíveis de direitos e obrigações e com direito a uma
existência própria, protegida pela lei. É, assim, uma
especialização terminológica da personalidade civil para
designar as pessoas constituídas por força da lei, em distinção
à personalidade física, próprias às pessoas naturais.
Teoria, os sujeitos dos direitos são os próprios indivíduos considerados em conjunto. Ela vai de encontro com a um fenômeno jurídico, a pessoa jurídica é distinta da dos indivíduos que a compõem – universitas distat a singulis”; teoria, também individualista, de Ihering: “A pessoa jurídica não é o verdadeiro destinatário dos direitos; quem deles se utiliza são as pessoas naturais que se acham, por assim dizer, atrás daquelas pessoas jurídicas. Pouco importa que se trate de um círculo determinado de indivíduos (universitas personarum) ou de um número indeterminado (universitas bonorum), por exemplo os enfermos de um hospital”; dessa suposição, ele tira a conclusão de que as pessoas naturais são as únicas destinatárias dos direitos; segundo Giorgi, citado por Gudesteu Pires, há nessa teoria confusão do gozo e vantagens materiais que formam o objeto do direito – quaestio facti – com a existência do sujeito do direito – quaestio juris; teoria dos direitos sem sujeito, de Brinz, Beker, Windscheid, igualmente individualista: “Segundo esta Teoria, nas corporações e nas fundações existe apenas um patrimônio destinado a um certo fim. Nestes casos os direitos não têm sujeito. São os direitos sem sujeito”; “teoria da propriedade coletiva, de Planiol e Barthelemy: para Planiol, a personalidade jurídica não é a soma à classe das pessoas: é um modo de possuir os bens em comum, é uma forma de propriedade, que são duas maneiras de possuir os bens: individualmente ou coletivamente. Portanto, o que chamamos de pessoa jurídica, Planiol chama de propriedade coletiva”. Pelo sistema da realidade (são as teorias que consideram a pessoa jurídica ente de existência real e verdadeira): teoria da vontade, de Zitellman e Meurer: “Esta teoria preconiza que o verdadeiro sujeito dos direitos deve ser atribuído tanto às pessoas naturais como às jurídicas. Em toda relação de direito, dizem os seus preconizadores, há uma vontade em exercício e daí concluírem que essa vontade é o sujeito do direito que difere da vontade particular. Para tanto, recorrem a forma matemática para explicar, dizem, 7 + 5 = 12, e explicam sendo o 12 sintético, se bem igual ao 7 + 5 analítico, constitui por outra forma uma quantidade inteiramente nova. É assim, dizem eles, nas corporações, nas sociedades, etc. Nestas, o sujeito dos direitos é uma parcela da vontade do fundador”; (teoria da realidade objetiva, doutrina de Gierke e Endermann, preconizadores da doutrina, aceita por Fadda, Bensa e Giorgi, na Itália, Fouillé e René Worms com algumas variantes na França, Clóvis Beviláqua e Lacerda de Almeida no Brasil): “Partindo da afirmação de que a sociedade é um verdadeiro organismo em que se encontram vida e vontade próprias, os partidários desta teoria concluíram que as pessoas jurídicas são também organismos tão completos como as pessoas naturais. Nas pessoas jurídicas não poderemos ver uma ficção, elas não são entidades abstratas criadas pela lei: são realidades vivas que a lei apenas constata, definindo os direitos que decorrem do fenômeno natural de sua personalidade”; teoria da realidade técnica ou realidade jurídica: “Nesta teoria, os pessoas jurídicas são uma realidade, constatando essa realidade no mundo jurídico e não na vida sensível. As pessoas jurídicas são entidades reais, como o contrato ou o testamento” (LIMA, João Franzen de. Curso de direito civil brasileiro. 7. ed. 1a tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1984, v. 1, pp. 168-174, § 1.o). Nota: A pessoa jurídica por excelência é o Estado. Clóvis Beviláqua diz: “Não podemos admitir o Estado como simples ficção. Se o Estado fosse ficção, sendo a lei a expressão da soberania do Estado, seguir-se-ia que a lei seria emanação, a consequência de uma ficção.” In: SANTOS, Washington dos. Dicionário jurídico brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, pp. 187-188. 101 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999, p. 609.
– 94 –
A personificação da pessoa jurídica tem como consequência
imediata, independentemente do tipo societário escolhido, a separação do
patrimônio da sociedade do patrimônio dos seus sócios. Sem a proteção dada
pela separação patrimonial, os sócios ou acionistas poderiam se desencorajar
de constituí-las, enfraquecendo a economia.
No entanto, a separação patrimonial não é absoluta, pois admite
exceções como demonstramos a seguir, mediante o estudo da teoria da
desconsideração da personalidade jurídica, sua aplicação no direito brasileiro e
sobre a possibilidade de sua aplicação nas lides tributárias.
4.2. A teoria geral da desconsideração da personalidade jurídica
No intuito de afastar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica
quando devidamente verificada a fraude ou abuso de direito praticados pelos
sócios ou administradores, é que foi desenvolvida a teoria geral da
personalidade jurídica, para o fim de imputar o ato ilícito diretamente à pessoa
física responsável pelo ato.
Essa teoria, conhecida na doutrina como Disregard of Legal Entity,
encontra a sua origem na jurisprudência inglesa, no caso Solomon vs. Salomon
& Co. Ltd., de 1897 e na jurisprudência norte-americana, no caso Bank of
United States vs. Deveaux, de 1809.
O primeiro estudo denso sobre a Disregard of Legal Entity que se
tem conhecimento é de autoria do alemão Rolf Serick102, a quem coube a sua
_________________ 102 Forma e Realità della Persana Giuridica. Milão: Giuffré, 1966.
– 95 –
sistematização. No Brasil, a sua primeira aparição deve-se a um estudo de
Rubens Requião, o qual defendia a aplicação da teoria originária do direito
anglo-saxão às particularidades do direito brasileiro:
Como ponto de partida para conceituar a doutrina do disregard
ou da penetração, é necessário convir que as pessoas
jurídicas, sobretudo no que concerne ao direito brasileiro,
constituem uma criação da lei.
(...)
(...) Se a personalidade jurídica constitui uma criação da lei,
como concessão do Estado objetivando, como diz Cunha
Gonçalves, 'a realização de um fim' nada mais procedente do
que se reconhecer ao Estado, através de sua justiça, a
faculdade de verificar se o direito está sendo adequadamente
usado. (...).103
Sobre esse assunto, Fábio Ulhoa Coelho esclarece que há duas
formulações para a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, e são
elas: “a maior, na qual o juiz é autorizado a ignorar a autonomia patrimonial das
pessoas jurídicas, como forma de coibir fraudes e abusos praticados através
dela e a menor, em que o simples prejuízo do credor já possibilita afastar a
autonomia patrimonial"104.
Pelo esclarecimento acima, percebemos que a teoria maior é bem
mais elaborada do que a teoria menor, ao exigir a caracterização da fraude ou
do abuso do direito. Mencionada teoria, ressalte-se, não é contra o princípio da
autonomia patrimonial, ao revés, visa à proteção desse instituto. Nesse sentido,
continua Fábio Ulhoa Coelho105 a aduzir que:
_________________ 103 REQUIÃO, Rubens. “Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica”. Revista dos Tribunais 803/751-764, ano 91. São Paulo, set. 2002, p. 754. 104 COELHO, Fábio Ulhoa, 1959-. Curso de direito comercial, vol. 2 / Fábio Ulhoa Coelho. 5. ed. Rev. e atual. De acordo com o novo Código Civil e alterações da LSA. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 35. 105 Ibidem, p. 37.
– 96 –
A teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica
não é uma teoria contrária à personalização das sociedades
empresárias e à sua autonomia em relação aos sócios. Ao
contrário, seu objetivo é preservar o instituto, coibindo práticas
fraudulentas e abusivas que dele se utilizam.
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica deve ser
aplicada como exceção às regras da separação patrimonial da pessoa jurídica
para coibir a fraude viabilizada pela manipulação de tais regras. Ao ser
aplicada a teoria, deverão ser preservados os atos constitutivos da pessoa
jurídica, ocorrendo tão somente a sua ineficácia episódica para serem
alcançados, num caso específico, os sócios ou administradores.
Ademais, a pessoa jurídica deve ser desconsiderada apenas se o
manto da personalidade servir para a manipulação fraudulenta ou abusiva do
princípio da autonomia patrimonial, perpetrada pelos sócios ou administradores
e não por atos da própria pessoa jurídica. Nesse sentido106:
"enquanto o ato é imputável à sociedade, ele é lícito. Toma-se
ilícito apenas quando se imputa ao sócio, ou administrador. A
desconsideração da personalidade jurídica é a operação prévia
a essa mudança de imputação. A sociedade empresária deve
ser desconsiderada exatamente se for obstáculo à imputação
do ato a outra pessoa. Assim, se o ilícito, desde logo pode ser
identificado como ato de sócio ou administrador, não é caso de
desconsideração."
A aplicação da teoria maior da desconsideração encontra sérios
problemas no campo das provas, porque se desenvolveu como formulação
subjetiva ao prestigiar o afastamento da autonomia patrimonial da pessoa
_________________ 106 COELHO, Fábio Ulhoa, 1959-. Curso de direito comercial, vol. 2 / Fábio Ulhoa Coelho. 5. ed. Rev. e atual. De acordo com o novo Código Civil e alterações da LSA. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 42.
– 97 –
jurídica somente quando da prática, pelos seus sócios ou administradores, de
atos fraudulentos ou abusivos no intuito de perseguir a frustração dos
interesses dos credores.
Para o fim de facilitar a produção de provas na aplicação da teoria,
foi desenvolvida uma formulação objetiva.
Para a teoria objetiva, o pressuposto da desconsideração está na
confusão patrimonial. Assim, percebe-se que a aplicação da teoria resta
facilitada no campo das provas. Se mediante uma análise da contabilidade da
empresa, de suas contas bancárias, verificar-se que o patrimônio da empresa e
dos seus sócios estão interligados, uns pagando as contas dos outros, resta
provada a confusão patrimonial.
Coube a Fábio Konder Comparado a revisão final do art. 50 do Novo
Código Civil, quando o mesmo prestigiou na redação da norma a formulação
objetiva.
A outra teoria da desconsideração sobre a qual falamos é a teoria
menor. Essa teoria tem como pressuposto a inadimplência perpetrada pela
pessoa jurídica. Por essa teoria, o inadimplemento das obrigações da pessoa
jurídica e a solvência dos seus sócios são fatos suficientes para que se levante
o véu da personalidade jurídica.
Essa teoria vai de encontro ao princípio da separação patrimonial,
sendo o seu uso fundamento para a desconsideração de um retrocesso
jurídico.
– 98 –
Na doutrina brasileira, com base na literatura que tivemos acesso,
consideramos os textos de Heleno Taveira Tôrres107 a melhor posição sobre a
teoria da desconsideração da personalidade jurídica.
Segundo esse autor, a teoria da desconsideração da
personalidade jurídica possui duas funções, quais sejam: uma
função substantiva e uma função instrumental.
“uma função substantiva, quando ela é utilizada diretamente
como meio sancionatório”108
“uma função instrumental da desconsideração de atos e
negócios, quando serve de meio para alcançar diretamente aos
sócios, visando a aplicar-lhes sanções de ordem administrativa
ou penal, ou mesmo atribuir-lhes o cumprimento de ordem
judicial, com responsabilidade patrimonial e pessoal em todos
os casos”109.
Para Heleno Taveira Tôrres:
“em termos substantivos, a desconsideração de ato, negócio
ou personalidade jurídica é espécie de sanção que consiste em
negar ou afastar o reconhecimento dos efeitos que suas
qualificações jurídicas operam no ordenamento, em vista de
determinados pressupostos e em face de uma dada situação
específica”110
(...)
“Na sua função instrumental, presta-se apenas para imputar
aos sócios efeitos jurídicos os quais, não fosse a superação, ao
serem imputados diretamente à sociedade, perderiam sua
efetividade ou prejudicariam os demais sócios ou terceiros que
_________________ 107 Heleno TÔRRES. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária / Heleno Tôrres. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. Heleno Taveira Tôrres. Regime Tributário da Interposição de Pessoas e da Desconsideração da Personalidade Jurídica: os Limites do art. 135, II e III, do CTN, p. 21 a 68. Tôrres, Heleno Taveira; Queiroz, Mary Elbe (coordenação) – Desconsideração da Personalidade Jurídica em Matéria Tributária. São Paulo: Quartier Latin, 2005. 108 Heleno Taveira TÔRRES. Regime Tributário da Interposição de Pessoas e da Desconsideração da Personalidade Jurídica: os Limites do art. 135, II e III, do CTN, p. 21 a 68. Tôrres, Heleno Taveira; Queiroz, Mary Elbe (coordenação) – Desconsideração da Personalidade Jurídica em Matéria Tributária. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 45. 109 Ibidem, pp. 45-46. 110 Ibidem, p. 46.
– 99 –
não estivessem envolvidos diretamente com o caso que serve
de motivo para a desconsideração.”111
As duas funções estão muito bem descritas no texto que segue:
Mas como já se disse, por ser evidente, que a pessoa jurídica,
válida na sua constituição, poderá cometer, ao longo de sua
existência, distintas modalidades de atos ilícitos, é possível que
para o efetivo conhecimento probatório de tais atitudes seja
necessária a desconsideração de sua forma jurídica, para
identificar sua real constituição patrimonial e as efetivas
relações entre os sócios e as atividades desenvolvidas pela
sociedade. E assim, uma vez qualificado o ilícito, com o
descortinamento do véu, poderá a autoridade, administrativa ou
judicial, tanto aplicar o regime jurídico que fora afastado por tal
manobra, quando a desconsideração, por si só, já se converte
como modalidade de sanção (função substantiva), como muita
vez se verifica em matéria tributária; como poderá sancioná-lo
mediante punições administrativas ou penais, a depender da
tipológica: como espécie de ilícitos típicos, nas hipóteses de
descumprimento de normas imperativas que obrigam ou
proíbam certas condutas; ou com natureza de ilícitos atípicos,
por excessos do direito de gestão, fraude à lei, abuso de direito
ou confusão patrimonial.112
..., a superação da instrumental separação de patrimônios que
o direito privado preestabelece entre a personalidade jurídica
da sociedade e seus sócios, não deve afetar o princípio de
conservação do contrato societário, porquanto seja mecanismo
que se usa exatamente para os casos em que não se possa
desconstituir a sociedade e que o ilícito não possa ser
conhecido sem o recurso a tal método. E sua aplicação poderá
tanto consistir em modalidade sancionatória per si, como
poderá servir apenas de meio, de instrumento, para que se
possa provar o cometimento de eventuais ilícitos e aplicar-lhe
as sanções previstas, por que encobertos pelo manto da forma
_________________ 111 Heleno Taveira TÔRRES. Regime Tributário da Interposição de Pessoas e da Desconsideração da Personalidade Jurídica: os Limites do art. 135, II e III, do CTN, p. 21 a 68. Tôrres, Heleno Taveira; Queiroz, Mary Elbe (coordenação) – Desconsideração da Personalidade Jurídica em Matéria Tributária. São Paulo: Quartier Latin, 2005, pp. 48-49. 112 Ibidem, p. 46.
– 100 –
societária atribuída no exercício de autonomia privada pelos
respectivos sócios.113
Esse autor, fazendo referência aos critérios adotados para justificar
a medida extrema da desconsideração da personalidade jurídica em outros
ordenamentos jurídicos, quais sejam: “fraude à lei” ou “abuso de direito”,
“simulação”, “aparência” ou “interposição de pessoas”, ou uma conjugação
entre esses critérios, demonstra que somente uma análise criteriosa de cada
ordenamento possa dar a efetiva dimensão do seu padrão de controle e
aplicação da desconsideração da personalidade jurídica de sociedades. Por
esse motivo, não admitimos que essas experiências sejam aplicadas como
uma fórmula universal.
4.3. A desconsideração da personalidade jurídica no direito
brasileiro
Na aplicação da desconsideração da personalidade jurídica no
direito brasileiro contamos com três possibilidades: 1) “leis especiais, dotadas
de hipóteses típicas de desconsideração da personalidade jurídica das
sociedades”; 2) uma regra geral de autorização, consubstanciada no art. 50 do
Código Civil de 2002; e 3) a aplicação da teoria geral da desconsideração da
personalidade jurídica, por integração jurisprudencial, sem qualquer norma
específica que a discipline.
_________________ 113 Ibidem, p. 49.
– 101 –
Segundo Heleno Taveira Tôrres114:
No primeiro grupo estão as leis especiais de disregard the veil,
sob a forma de normas preventivas para casos específicos.
Nestes, o procedimento de desconsideração da personalidade
jurídica de sociedades tem finalidade sancionatória, como
modo de aplicar o regime jurídico superado, por presunção
legal, relativa ou absoluta, sem ficar a depender de um juízo
discricionário do Juiz, como meio de chegar ao ilícito cometido.
No Brasil, há uma extensa produção de leis especiais disciplinadoras
da desconsideração da personalidade jurídica. No entanto, foge ao objeto do
presente trabalho fazer a análise dessas normas. Para tanto, apresentamos tão
somente como exemplificação, a relação das normas especiais115.
_________________ 114 Heleno Taveira TÔRRES. Regime Tributário da Interposição de Pessoas e da Desconsideração da Personalidade Jurídica: os Limites do art. 135, II e III, do CTN, p. 21 a 68. Tôrres, Heleno Taveira; Queiroz, Mary Elbe (coordenação) – Desconsideração da Personalidade Jurídica em Matéria Tributária. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 52. 115 “O instituto da desconsideração da personalidade jurídica, mediante autorização legislativa, não é novo no direito brasileiro, a saber: i) na Consolidação das Leis do Trabalho CLT (Dec.-lei 5.452/43), foi inserida a responsabilidade solidária das sociedades integrantes de um conglomerado econômico (art. 2.°, § 2°); ii) a Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76), para evitar prejuízos aos sócios minoritários, ao mercado imobiliário etc., contemplou situações de responsabilidade pessoal, solidária ou subsidiária de terceiros. (arts. 115 a 117, 233, 242); iii) a Lei do Sistema Financeiro (Lei 4.595/64, art. 34), prescreve limitações a determinadas operações com seus administradores e pessoas jurídicas de cujo capital estes participem; a Lei 7.492/86, no seu art. 17, segue similar conduta; iv) a Lei de Repressão ao Abuso cio Poder Econômico (Lei 4.137/62), em seu art. 6°, prevê responsabilidade civil e criminal para diretores e gerentes de pessoas jurídicas pelos abusos que estes possam efetuar; v) o art. 6.° da Lei da Sonegação Fiscal (Lei 4.729/65) estipula a responsabilização penal de “todos os que, direta ou indiretamente ligados à mesma, de modo permanente ou eventual, tenham praticado ou concorrido para a prática da sonegação fiscal”; vi) a Lei de usura, Dec. 22.626/33, no seu art. 13, parágrafo único, cuida de idêntica responsabilidade penal: “Serão responsáveis como co-autores (....) em se tratando de pessoa jurídica, os que tiverem qualidade para representá-la”. Com o Código de Defesa cio Consumidor (Lei 8.078/90), o instituto ganha popularidade, por força do art. 28, ao dispor sobre as condições para que a desconsideração da personalidade jurídica pudesse prosperar, no âmbito das relações de consumo: ‘‘o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. (....) § 5.° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade foi, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores” (grifos nossos). Em seguida, vieram ainda: i) O art. 18 da Lei 8.884/94 (Lei Antitruste), determinando que ‘‘a personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando
– 102 –
No direito positivo brasileiro, até a entrada em vigor do Código Civil
de 2002, mais precisamente em janeiro de 2003, não existia uma regra geral
de autorização que disciplinasse as hipóteses em que a referida
personalidade jurídica pudesse ser desfeita. Por essa razão, doutrina e
jurisprudência vinham aplicando, em alguns casos específicos, a teoria da
desconsideração, sem haver, todavia, qualquer norma geral de autorização que
disciplinasse tal procedimento.
A referida disciplina só veio a lume, com o Código Civil de 2002,
que, no art. 50, prescreve que:
Art. 50 – Em caso de abuso da personalidade jurídica,
caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão
patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do
Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que
os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações
sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou
sócios da pessoa jurídica.
Pelo disposto no art. 50, percebemos que tal regra contempla tanto a
teoria subjetivista quanto a teoria objetivista. A primeira baseada no abuso de
direito e a segunda na exigência de demonstração da confusão patrimonial.
Por esse dispositivo legal, percebemos que a norma destina-se a
responsabilizar os sócios ou administradores por determinados atos praticados
com abuso da personalidade jurídica, evidenciados pelo desvio de finalidade ou
houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração”; ii) o art. 4.° da Lei 9.605/98, que dispõe sobre a responsabilidade por lesões ao meio ambiente, quando determina que: “poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente”. In: Heleno Tôrres. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária / Heleno Tôrres. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. Heleno Taveira Tôrres. Regime Tributário da Interposição de Pessoas e da Desconsideração da Personalidade Jurídica: os Limites do art. 135, II e III, do CTN, p. 466.
– 103 –
pela confusão patrimonial. Só cabendo ao juiz, no exercício de sua equidade,
decidir pela desconsideração.
Como a norma é específica para determinados atos e podendo
somente ser aplicada no caso concreto, a requerimento da parte ou do
Ministério Público, a decisão do juiz cria norma individual para o caso concreto,
não vale para terceiros que não a tenham requerido.
Faz-se necessário distinguirmos o abuso de direito, disciplinado pelo
art. 187116 do Código Civil de 2002, do abuso de personalidade jurídica. O
primeiro se consubstancia quando um titular de um direito extrapola os limites
impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes, ensejando o seu ato em uma ilicitude. O segundo nem sempre é ato
ilícito, pois a dívida pode ser adimplida, ou pode não haver reclamação por
parte do credor.
O ato somente pode ser considerado como abuso de personalidade
jurídica, quando estiver caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela
confusão patrimonial.
O desvio de finalidade deve ser considerado como o uso indevido da
pessoa jurídica de forma contrária aos seus fins sociais, estabelecidos no
contrato social ou estatuto. Dito de outra forma,seria utilizar a pessoa jurídica
em desconformidade com os interesses dela própria e no interesse pessoal dos
sócios ou administradores ou qualquer outro beneficiário.
_________________ 116 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
– 104 –
Já a confusão patrimonial se mostra mais facilmente, pois ela existe
quando se confundem o patrimônio do sócio e da sociedade, ou seja, quando
os recursos financeiros e interesses da pessoa física se misturam com os da
sociedade.
No que toca à aplicação da teoria geral da desconsideração da
personalidade jurídica, por integração jurisprudencial, sem qualquer norma
específica que a discipline, alegando analogia iuris ou presunção hominis,
entendemos que, a partir da entrada em vigor do art. 50 do Código Civil de
2002, ela já não é mais possível no nosso direito brasileiro, em face da
existência de norma geral autorizadora no nosso sistema jurídico.
Quanto à vigência da regra acima, por se tratar de norma de direito
material, há de ser observada a regra do art. 6º, da Lei de Introdução ao
Código Civil (LICC) que prescreve que a lei em vigor terá efeito imediato e
geral, respeitados o ato jurídico perfeito, direito adquirido e a coisa julgada. No
parágrafo primeiro do art. 6º, está dito que se reputa ato jurídico perfeito o já
consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.
Esse entendimento é compartilhado por Heleno Taveira Tôrres117,
quando leciona:
Numa infeliz importação que se deve a Rubens Requião para
imitar a disregard of legal entity americana, no Brasil, juízes de
civil Law passaram a agir como juízes de common Law, para
os fins de desconsideração de personalidade jurídica de
sociedades, deformando-a em sua construção original e agindo
contra todos os princípios que guiam nosso ordenamento,
_________________ 117 Heleno Tôrres. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária / Heleno Tôrres. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. Heleno Taveira Tôrres. Regime Tributário da Interposição de Pessoas e da Desconsideração da Personalidade Jurídica: os Limites do art. 135, II e III, do CTN, p. 469.
– 105 –
desde a legalidade até os mais elementares princípios da teoria
do processo, como ausência de procedimento e provas. Sobre
a justificativa de fazer justiça no caso concreto, cumpriam-se
desmandos intoleráveis, afirmando a velha teoria da substância
sobre a forma, ao aplicarem a teoria da desconsideração como
sansão e como meio para atribuir aos sócios toda a
responsabilidade pelo destino da sociedade que formavam.
Sem qualquer distinção dos bandos de salteadores, do que
falava Kelsen, diversas pessoas propunham ações com esse
objeto e com especial satisfação viam as suas pretensões
acatadas a futuro por juízes “realistas”, algozes da realidade.
Por isso, foram antijurídicas, até a entrada em vigor do Código
Civil vigente, todas as decisões da desconsideração da
personalidade jurídica tomadas por tais juízes vingativos em
qualquer instância, nos quatro quantos desse país, quando
desprovidas de fundamentação em lei específica, porquanto
até o início de 2003 não dispunha de uma regra geral
predisposta para esse mesmo fim.
Uma vez delineados os contornos gerais sobre a teoria da
desconsideração da personalidade jurídica e das normas específicas que
tratam da matéria na órbita do direito positivo brasileiro, passaremos a
considerar a aplicação desse instituto nas lides tributárias e, em especial, a
possibilidade de se fazer o seu uso como forma a justificar o atingimento de
bens dos sócios e administradores de pessoas jurídicas de direito privado.
4.4. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica no
direito tributário
Tratar da possibilidade da desconsideração da personalidade
jurídica no direito tributário nos leva inevitavelmente para o campo de
– 106 –
irradiação normativa sobre obrigação tributária, mais precisamente, na órbita
da sujeição passiva, pois o objetivo da desconsideração da personalidade
jurídica, quando na tentativa de ser aplicada nas lides tributárias, é justamente
alcançar o patrimônio dos sócios e administradores para garantir as dívidas
fiscais.
Como dissemos acima, pretendemos verificar se o art. 50 do Código
Civil de 2002 pode ser fundamento de validade para a responsabilização dos
sócios ou administradores por débitos fiscais da sociedade da qual pertençam
e se a teoria geral da desconsideração da personalidade jurídica pode ser
aplicada ao direito tributário.
No direito tributário pátrio, encontramos uma trava normativa que
impossibilita a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade
jurídica nessa seara, em face da exigência constitucional de que lei
complementar defina normas gerais de direito tributário sobre obrigação
tributária.
De acordo com o princípio da recepção (art. 34, ADCT), o Código
Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66) foi recepcionado pela Constituição de
1988, em tudo aquilo que não fosse com ela incompatível, em atendimento ao
primado da economia legislativa.
O art. 146 da Constituição Federal de 1988, dispondo sobre normas
gerais de direito tributário, estatuiu que a Lei Complementar possui três
funções, a saber:
– 107 –
I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária,
entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação
tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em
relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos
respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência
tributários;
c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado
pelas sociedades cooperativas.
d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as
microempresas e para as empresas de pequeno porte,
inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do
imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no
art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art.
239. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de
19.12.2003)
Em uma hermenêutica precisa sobre o mandamento contido no art.
146 da CF, descreveu Paulo de Barros Carvalho a norma lá insculpida:
O primeiro passo é saber que são as tão faladas normas gerais
de direito tributário. E a resposta vem depressa: são aquelas
que dispõem sobre conflitos de competência entre as entidades
tributantes e também as que regulam as limitações
constitucionais ao poder de tributar. Pronto: o conteúdo está
firmado. Quanto mais não seja, indica, denotativamente, o
campo material, fixando-lhe limites. E como fica a dicção
constitucional, que despendeu tanto verbo para dizer algo bem
mais amplo? Perde-se no âmago de rotunda formulação
pleonástica, que nada acrescenta. Vejamos. Pode o legislador
complementar, invocando a disposição do art. 146, III, a, definir
um tributo e suas espécies? Sim, desde que seja para dispor
– 108 –
sobre conflitos de competência. Ser-lhe-á possível mexer no
fato gerador, na base de cálculo e nos contribuintes de
determinado imposto? Novamente sim, no pressuposto de que
o faça para dispor sobre conflitos. E quanto à obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários? Igualmente, na condição de satisfazer àquela finalidade primordial. (grifos nossos)118
Assim, são as normas gerais em matéria tributária àquelas que
dispõem sobre conflitos de competência entre as entidades tributantes e
também as que regulam as limitações constitucionais ao poder de tributar.
Essa é a indicação denotativa do seu conteúdo, o campo material e seus
limites.
Com tal sentido, dá-se prestígio à noção de federação, à autonomia
dos municípios e ao princípio da isonomia das pessoas políticas de direito
constitucional interno.
Valendo-nos dos ensinamentos de Paulo de Barros Carvalho, no
sentido de que cabe às normas gerais de direito tributário dispor sobre
obrigação tributária quando for para dispor sobre conflitos de competência
entre as entidades tributantes, verificamos a impossibilidade de aplicação do
art. 50 do Código Civil de 2002 nas lides tributárias, uma vez que trata do polo
passivo de obrigação tributária, sendo exigido pela Constituição Federal que
sua disciplina seja veiculada exclusivamente por Lei Complementar Nacional.
E a esse respeito tratou o Código Tributário Nacional sobre sujeito
passivo, responsabilidade tributária e obrigação tributária.
_________________ 118 Paulo de Barros CARVALHO. Curso de direito tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, pp. 210-211.
– 109 –
Esse entendimento é perfilhado por José Eduardo Soares de Melo119
ao defender que “a desconsideração da pessoa jurídica não poderia ser
aplicada nas lides tributárias, em razão de não provir de lei complementar”.
É preciso esclarecer, por oportuno, que a referida regra foi instituída
por uma Lei Ordinária e, por isso, inaplicável às lides tributárias que, em
conformidade com o que dispõe o art. 146, III, b, da Constituição Federal, a
obrigação tributária é matéria exclusiva de ser tratada por Lei Complementar.
Ora, a sujeição passiva é matéria relativa à obrigação, sendo certo
que, por isso, as regras que dela tratam devam estar inseridas em Lei
Complementar, tal como determinado pela Constituição Federal.
É entendimento de alguns doutrinadores que a Lei Complementar
nº. 104/01 ao inserir um parágrafo único ao art. 116 do CTN, para ali constar
que “a autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios
jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador
do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária,
observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”, estaria
fundamentando a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade
jurídica no direito tributário.
Não é esse o nosso entendimento, por idênticos fundamentos,
verificamos que o parágrafo único do art. 116 do Código Tributário Nacional
não poderia ter delegado à lei ordinária a regulamentação da matéria.
_________________ 119 Melo, José Eduardo Soares. In: GRUPENMACHER, Betina Treier (coord.). Direito Tributário e o novo Código Civil. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 166.
– 110 –
Ademais, a Lei Complementar 104/01 veio desprovida de elementos
suficientes a possibilitar a sua aplicação.
O Supremo Tribunal Federal já se posicionou quanto à
obrigatoriedade de a lei complementar disciplinar de forma clara e efetiva os
temas afetos ao seu âmbito de atuação, sob pena de inconstitucionalidade,
inviabilizando o exercício da competência plena pelos entes federativos,
quando se trate de questão suscetível de causar conflitos.120
Por outro lado, o direito tributário já prevê regras de responsabilização,
o que impossibilita a aplicação da teoria da desconsideração, já que essa se trata
de exceção. Nesse sentido é o entendimento de alguns autores, como o de
Luciano Amaro, que ora reproduzimos:
[...] quando a lei cuida de responsabilidade solidária, ou
subsidiária, ou pessoal dos sócios, por obrigação da pessoa
jurídica, ou quando ele proíbe que certas operações, vedadas
aos sócios, sejam praticadas pela pessoa jurídica, não é
preciso desconsiderar a empresa, para imputar as obrigações
dos sócios, pois, mesmo considerada a pessoa jurídica, a
implicação ou responsabilidade do sócio já decorre do preceito
legal.121
[...] quando o direito atribui responsabilidade a determinada
pessoa (p. ex., o controlador, o administrador) por certos atos
ilícitos por ela praticados, com abuso de sua condição ou
cargo. Também não há aí caso de desconsideração. Em suma,
quando o direito já fornece o remédio legal, não é preciso
‘superar’ ou ‘penetrar’ nenhuma forma jurídica. Basta aplicar a
solução legal, que já se apresenta axiologicamente correta.122 _________________ 120 ADI 1600, Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES, Relator(a) p/ Acórdão: Min. NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, julgado em 26/11/2001, DJ 20-06-2003 PP-00056 EMENT VOL-02115-09 PP-01751 121 Amaro, Luciano. Desconsideração da Pessoa Jurídica no Código de Defesa do Consumidor. Ajuris, v. 20, n. 58, p. 69-84, julho, 1993. - Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nº 88, p.73. 122 Amaro, Luciano. Desconsideração da Pessoa Jurídica no Código de Defesa do Consumidor. Ajuris, v. 20, n. 58, p. 69-84, julho, 1993. - Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nº 88, p. 75.
– 111 –
Assim, chegamos à conclusão de que a desconsideração da
personalidade jurídica não pode ser invocada nas lides tributárias, em face de o
nosso sistema de direito positivo já prever regras específicas para se alcançar
o patrimônio pessoal dos sócios e administradores de pessoas jurídicas de
direito privado.
– 112 –
CONCLUSÕES
No intuito de contextualizarmos o leitor no tema da responsabilidade
dos sócios e dirigentes da pessoa jurídica, discorremos sobre o sistema jurídico
e a forma como ele se apresenta, como feixe de linguagem prescritiva de
condutas intersubjetivas. Verificamos que cabe ao cientista do direito descrever
esse sistema, em uma função metalinguística, construindo a correta
significação das normas jurídicas.
Esse estudo foi de extrema relevância para identificarmos que o
direito pode ser sistematizado em normas que possuem relações de
coordenação e subordinação entre si e que a norma fundamental dá validade à
Constituição Federal. É na Constituição Federal, que encontramos os princípios
constitucionais orientadores de todo o ordenamento jurídico, dentre eles o
princípio da capacidade contributiva, norteador da sujeição passiva tributária.
Verificamos, ainda, que o princípio da capacidade contributiva impõe
ao legislador a criação de mecanismos de repercussão jurídica, outorgando ao
substituto o direito de reembolso ou retenção do valor do tributo perante o
substituído. Constatamos, também,que, em relação à responsabilidade
tributária dos sócios-gerentes ou administradores de pessoas jurídica, nos
– 113 –
termos propostos pelo art. 135 do CTN, por se tratar de uma responsabilidade
pessoal atribuída como sanção decorrente de ato ilícito, a ela não se aplica o
princípio da capacidade contributiva.
Ao abordarmos a fenomenologia da incidência tributária,
apresentando a forma lógica da regra-matriz de incidência, nos termos
propostos por Paulo de Barros Carvalho, identificamos que, no consequente
dessa norma, encontramos o comando norteador da configuração do sujeito
passivo da relação jurídica tributária.
Construindo a correta significação da norma do art. 134 do CTN,
concluímos que, não obstante a letra da lei consigne o termo “solidariedade”, a
relação do responsável e do contribuinte é de subsidiariedade. Isso porque a
norma determina que se deve cobrar em primeiro lugar do contribuinte e,
somente diante da impossibilidade de se exigir o efetivo cumprimento da
obrigação por este, é que poderá ser atribuída ao sócio a responsabilidade
tributária.
Dito de outra forma, a cobrança do crédito tributário deve ser
direcionada em desfavor do contribuinte, pessoa jurídica, e, somente após a
liquidação da sociedade, inexistindo patrimônio suficiente para arcar com as
obrigações tributárias, é que surgirá para os sócios a responsabilidade pelo seu
cumprimento.
Conforme se observou no desenvolvimento do trabalho, no que se
refere à interpretação do inciso VII do art. 134 do CTN, concluímos que esse
tipo de responsabilidade somente pode ser atribuída ao sócio de sociedade de
– 114 –
pessoas, quais sejam: em comandita simples; em nome coletivo e em conta de
participação e que não abarca o tipo societário da sociedade limitada,
porquanto se trate de sociedade do tipo “mista”.
Ressaltamos que a responsabilidade acima tratada não se aplica ao
administrador não-sócio, em face da tipicidade apresentada no dispositivo,
fazendo alusão explicita aos sócios.
Verificamos, ademais, que, na responsabilidade normatizada no
caput do art. 135, não se trata nem de responsabilidade solidária nem de
subsidiária, mas da responsabilidade pessoal do agente que der origem ao
nascimento de obrigações tributárias resultantes de atos praticados com
excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos e que delas
resultem o crédito tributário.
Assim, a prática de ato ilícito pela pessoa jurídica, em seu próprio
benefício, não pode acarretar a responsabilidade tributária - tratada no art. 135
do CTN - aos seus sócios e administradores, isso porque a pessoa jurídica tem
existência distinta da pessoa física.
Por outro lado, caso os sócios e administradores atuem fora dos
limites de sua competência, enquanto órgão da pessoa jurídica, restará patente
que tais atos foram praticados de forma pessoal por eles, enquanto pessoa
física.
No presente estudo, também verificamos que a “infração à lei”
prescrita no caput do art. 135 significa infração à lei societária disciplinadora da
– 115 –
competência dos administradores da pessoa jurídica. Se o administrador
pautar-se sempre por critérios de prudência e moderação, deixando clara sua
condição de bom administrador, não poderá ser responsabilizado por dívida
fiscal a que não deu causa.
Nesse desiderato, conforme observamos, para fins de atribuição de
responsabilidade pessoal do administrador da pessoa jurídica, cabe ao Fisco
provar que ele causou prejuízo ao praticar algum ato gerencial fora de sua
competência de administrador, ou seja, que não agiu com prudência na
administração da empresa e que esse ato foi causa do inadimplemento, tendo
em vista que esse fator, por si só não pode ser considerado infração de lei para
fins de atribuição de responsabilidade tributária aos sócios e dirigentes da
pessoa jurídica.
Outra questão abordada como um dos principais pontos desse
trabalho foi a crítica formulada ao posicionamento do STJ, uma vez que esse
Tribunal proferiu entendimento no sentido de que, se a execução for ajuizada
apenas contra a pessoa jurídica, mas se o nome do sócio constar da CDA, a
ele incumbe o ônus da prova de que não ficou caracterizada nenhuma das
circunstâncias previstas no art. 135 do CTN. Restou consignado, também, por
aquele Colegiado, que tal prova deverá ser realizada mediante a propositura de
embargos à execução, sendo inviável a exceção de pré-executividade para se
arguir a ilegitimidade passiva, por se fazer necessária a dilação probatória.
Entretanto, discordamos do posicionamento firmado pelo STJ,
concluindo que, não obstante o débito inscrito em dívida ativa possuir
– 116 –
presunção de liquidez, certeza e exigibilidade, tal presunção é relativa, pois,
verificada a existência de causas capazes de afastar quaisquer desses
requisitos necessários à validade e à execução do crédito, inadmissível seria
que o Executado fosse compelido a garantir o juízo para, posteriormente, por
meio de Embargos à Execução, demonstrar a ausência de conteúdo do título
exequendo.
Nossa discordância situa-se na possibilidade de os sócios e
administradores fazerem o uso da exceção de pré-executividade para
questionar a ilegitimidade passiva, quando for possível demonstrá-la de plano,
mediante a prova clara e precisa dos vícios do título executivo, sem a
necessidade da dilação probatória.
Deduzimos, então, que a inadmissão da exceção nos termos
propostos pelo STJ, implica violação dos preceitos constitucionais do
contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV da Constituição Federal de 1988).
Pelos dispositivos normativos do CTN que tratam da Certidão de
Dívida Ativa, inferimos que para ela gozar da presunção de certeza e liquidez e
inviabilizar a propositura da exceção de pré-executividade para a alegação de
ilegitimidade passiva, precisa retratar de forma fiel o resultado do lançamento
tributário.
Fazendo-se, então, a juntada de cópia integral do processo
administrativo tributário, no qual conste não ter sido oportunizado o direito de
ampla defesa aos sócios e dirigentes de pessoas jurídicas indicados na CDA
como corresponsáveis, restará provada a causa de nulidade da inscrição e do
– 117 –
processo de cobrança dela decorrente, sendo, portanto, cabível a propositura
da exceção de pré-executividade.
Outra constatação que pudemos extrair do presente estudo é a de
que a Fazenda Pública faz o uso da desconsideração da personalidade
jurídica, sob o fundamento da conjugação dos art. 50 do Código Civil e 135 do
CTN, no intuito de atingir, por intermédio das execuções fiscais, os bens dos
sócios e administradores das pessoas jurídicas.
Feitas tais observações, vimos que a desconsideração da
personalidade jurídica no direito tributário nos leva inevitavelmente para o
campo de irradiação normativa sobre obrigação tributária, mais precisamente,
na órbita da sujeição passiva.
Assim, verificamos que no direito tributário pátrio há uma trava
normativa – disposta no art. 146, III, b, da Constituição Federal – que
impossibilita a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica nessa
seara, em face da exigência constitucional de que lei complementar define
normas gerais de direito tributário sobre obrigação tributária.
Por fim, chegamos à conclusão de que a desconsideração da
personalidade jurídica não pode ser invocada nas lides tributárias, em face de o
nosso sistema de direito positivo já prever regras específicas para se alcançar
o patrimônio pessoal dos sócios e administradores de pessoas jurídicas de
direito privado e em face da inaplicação do art. 50 do Código Civil, enquanto
introduzido por lei ordinária, por ser a matéria, relativa à obrigação tributária,
objeto de lei complementar.
– 118 –
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