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Fotos: © Instituto Tecnológico da Vale/Pesquisa UrbisAmazônia
Publicado pela Fundação Vale.
© Fundação Vale 2013
Coordenação editorial: Setor de Ciências Humanas e Sociais da Representação da UNESCO no Brasil
Redação e supervisão técnica: Berenice de Souza Cordeiro
Revisão técnica: Fundação Vale, Ministério das Cidades, Setores de Ciências Naturais e Ciências Humanas e Sociais da Representação da
UNESCO no Brasil
Revisão gramatical e editorial: Unidade de Comunicação, Informação Pública e Publicações da Representação da UNESCO no Brasil
Projeto gráfico: Fundação Vale (Crama Design Estratégico)
Diagramação: Unidade de Comunicação, Informação Pública e Publicações da Representação da UNESCO no Brasil
Ilustrações: Fundação Vale e Ministério das Cidades
Esta publicação tem a cooperação da UNESCO no âmbito do projeto 570BRZ3002, Formando Capacidades e Promovendo o Desenvolvimento
Territorial Integrado, o qual tem o objetivo de contribuir para a melhoria da qualidade de vida de jovens e comunidades.
Os autores são responsáveis pela escolha e apresentação dos fatos contidos neste livro, bem como pelas opiniões nele expressas, que não são
necessariamente as da UNESCO, do Ministério das Cidades (Brasil) e da Fundação Vale, nem comprometem as Organizações. As indicações
de nomes e a apresentação do material ao longo desta publicação não implicam a manifestação de qualquer opinião por parte da UNESCO,
do Ministério das Cidades (Brasil) e da Fundação Vale a respeito da condição jurídica de qualquer país, território, cidade, região ou de suas
autoridades, tampouco da delimitação de suas fronteiras ou limites.
Esclarecimento: a UNESCO mantém, no cerne de suas prioridades, a promoção da igualdade de gênero, em todas suas atividades e
ações. Devido à especificidade da língua portuguesa, adotam-se, nesta publicação, os termos no gênero masculino, para facilitar a leitura,
considerando as inúmeras menções ao longo do texto. Assim, embora alguns termos sejam grafados no masculino, eles referem-se
igualmente ao gênero feminino.
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Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços 1
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
João Batista Peixoto1
1. Política pública de saneamento básico
Os serviços de saneamento básico são reconhecidos, em praticamente todos os países, como atividades essenciais de relevante
interesse público e cujo provimento deve ser de responsabilidade direta ou indireta do poder público. Também são reconhecidos,
mesmo nos Estados unitários, como atividades de caráter local intrinsecamente vinculadas ao planejamento, à organização e à
gestão das cidades, particularmente nas áreas urbanas, inclusive vilas e povoados rurais.
No Brasil, a regulação normativa, a organização e a gestão dos serviços públicos de saneamento sofreram as influências
centralizadoras típicas do Estado unitário em boa parte do período colonial e no período imperial, e convivem
com modelos híbridos de gestão desde a instauração da república federativa (1889) e a promulgação da primeira
Constituição Republicana (1891) até os dias atuais, em que a União, os estados e os municípios interagem cooperativa ou
concorrentemente de diversas formas.
A União marcou forte presença na gestão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário até o início da
década de 1990, por meio da extinta Fundação Serviço Especial de Saúde Pública (FSESP)2, que atuou na implantação e na
administração desses serviços em cooperação com centenas de municípios em praticamente todos os estados brasileiros,
sendo que o governo federal se mantém, até hoje, como o principal responsável pelo financiamento do setor.
Com forte presença no Nordeste e participação menos ostensiva nas demais regiões até a década de 1960, os estados se
tornaram, na década de 1970, por meio de suas empresas de saneamento, os maiores agentes na prestação dos serviços de
abastecimento de água e, em menor grau, de esgotamento sanitário, em consequência do modelo adotado com o Plano
Nacional de Saneamento (Planasa)3.
O caráter centralizador da gestão de parte dos serviços (água e esgotos), induzido pelo Planasa, fez com que parte das políticas
locais de saneamento básico passasse a ser gerenciada por instituições federais (Ministério do Interior e Banco Nacional da
Habitação – BNH) e dos estados (companhias estaduais), sem se levar em consideração a realidade local ou a necessidade de
contribuir para o desenvolvimento socioeconômico e com a gestão administrativa local.
Embora reconhecida a autonomia municipal para a gestão dos serviços de interesse local em todas as Constituições republicanas
e reconhecidos os municípios como entes federados na Constituição de 1988, o efetivo poder de gestão destes sobre os serviços
públicos de saneamento básico continua limitado até os dias atuais, seja em razão de heranças autocráticas históricas do Planasa
– que ainda mantêm municípios e estados em irracionais conflitos de interesses e de competências sobre a titularidade desses
serviços –, ou, principalmente, da ausência de políticas públicas institucionalizadas e regulamentadas e da falta de capacitação
técnica dos gestores públicos, particularmente os municipais.
Em consequência desses fatos, verifica-se que o cenário atual ainda reflete um panorama confuso da gestão dos serviços de
saneamento básico, em que convivem: a) situações onde não há uma política municipal formalmente instituída ou quaisquer
instrumentos normativos ou regulatórios; b) legislação e regulação municipais insuficientes ou inadequadas para a gestão
dos serviços; c) atos normativos estaduais constitucionalmente questionáveis em face da titularidade municipal dos serviços;
d) delegações municipais baseadas em instrumentos jurídicos insuficientes, inadequados ou sem o devido suporte legal;
e) delegações municipais irregulares, vencidas ou sem qualquer instrumento jurídico que as validem; e f ) convênios de
cooperação e contratos de programas celebrados entre municípios e estados e as respectivas empresas de saneamento para
1 Consultor independente em gestão de serviços de saneamento básico.2 O Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), criado em 1942, foi transformado em fundação pela Lei nº 3.750/1960 e substituído, em 1991,
pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), vinculada ao Ministério da Saúde.3 O Planasa foi instituído em 1969, conforme a Lei nº 5.318/1967.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços2
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
a prestação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, sem observar, em essência, os artigos 30, 175 e
241, da Constituição Federal de 1988, e as Leis no 11.107/2005 e no 11.445/2007.
Cumprindo dispositivo constitucional4 e visando a corrigir essa situação, a Lei nº 11.445/2007 instituiu as diretrizes nacionais para
o saneamento básico, que deverão ser observadas pelos entes federativos na instituição de suas políticas públicas para o setor,
incluída a organização e a gestão desses serviços; entende-se a gestão como as funções de planejamento, regulação, fiscalização
e prestação e, interagindo com todas elas, o controle social.
A instituição formal de determinada política pública visa a estabelecer as diretrizes, os objetivos e as regras da atuação do
poder público na sua implementação e gestão. No que se refere ao saneamento básico, todos os entes federados (União,
estados, Distrito Federal e municípios) podem instituir as respectivas políticas para o setor, visando a cumprir as competências
constitucionais comuns5, respeitadas as competências constitucionais atribuídas ao ente titular desses serviços. A Política
Federal de Saneamento Básico foi instituída no Capítulo IX da Lei nº 11.445/2007 (arts. 48 a 53).
Conforme a referida lei, cabe ao titular dos serviços formular a respectiva política pública de saneamento básico, o que inclui,
entre outras medidas: a) elaborar os planos de saneamento básico; b) organizar e prestar diretamente ou autorizar a delegação
dos serviços; c) definir o ente responsável pela sua regulação e fiscalização, e os procedimentos de sua atuação; d) fixar os
direitos e os deveres dos usuários; e e) estabelecer mecanismos de controle social, além de cumprir as disposições do artigo 175
da Constituição Federal6.
A instituição formal da Política Municipal de Saneamento Básico ocorre com a edição da lei e do respectivo regulamento pelo
ente titular, ou mediante a revisão, complementação e consolidação da legislação existente, que trate de todos os aspectos
disciplinados pela Lei nº 11.445/2007.
2. Marco legal
O lento avanço na execução de políticas públicas de saneamento básico no passado recente, incluído o baixo atendimento,
a gestão ineficiente e a insustentabilidade técnica e econômica da maioria dos serviços, pode ser creditado, em grande parte,
à falta de diretrizes normativas legais de âmbito nacional, que orientassem os entes federativos quanto à concepção jurídico-
institucional e à organização e execução administrativa de suas políticas para esse setor essencial e de grande importância
socioeconômica.
2.1. Lei nº 11.445/2007 (Lei do Saneamento Básico)
Essa lacuna do ordenamento legal aplicável ao saneamento básico foi suprida de forma quase completa com a edição da Lei
nº 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais e trata de todos os seus aspectos relevantes, a começar pela definição
ampla e descritiva dos princípios fundamentais a que se subordinam e pela caracterização abrangente dos quatro serviços de
saneamento básico (Capítulo I).
Nessa lei, também são estabelecidas as diretrizes para:
4 Artigo 21, inciso XX, da CF/1988.5 Artigo 23, inciso IX, da CF/1988.6 CF, art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação,
a prestação de serviços públicos.
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação,
bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;
II – os direitos dos usuários;
III – política tarifária;
IV – a obrigação de manter serviço adequado.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços 3
a) o exercício da titularidade que deve ser seguida pelos entes federados detentores dessa condição, em relação aos serviços
públicos de saneamento básico (Capítulo II) – nesse capítulo são definidos, de forma objetiva e suficiente, a obrigação e os
requisitos para a formulação da política pública pelos entes titulares (municípios), tratando especialmente dos aspectos
relativos à prestação direta dos serviços e, no caso de prestação delegada, das condições para a celebração e a validade
dos respectivos contratos;
b) a prestação regionalizada dos serviços (Capítulo III) – diferentemente dos demais, os dispositivos desse capítulo não
primaram pela objetividade e pela clareza dos seus propósitos, mas inovaram na concepção jurídica da forma de prestação
regionalizada, atendendo a interesses estaduais, em contraposição à prestação mediante gestão associada, disciplinada pela
Lei nº 11.107/2005 (Lei dos Consórcios Públicos);
c) o planejamento (Capítulo IV) – trata da obrigatoriedade e dos requisitos para a elaboração do plano de saneamento básico
pelo titular;
d) a regulação e a fiscalização dos serviços (Capítulo V) – trata dos princípios e objetivos da regulação, e das competências
normativas da entidade reguladora, que se aplicam principalmente aos serviços delegados, bem como dos direitos dos
usuários à informação;
e) os aspectos econômicos e sociais dos serviços (Capítulo VI) – disciplina as questões essenciais relativas à política de cobrança
pela prestação e disposição dos serviços, inclusive reajustes e revisões de tarifas;
f ) determinados aspectos técnicos da prestação dos serviços (Capítulo VII) – particularmente os relativos à sua qualidade.
Essa lei é regulamentada pelo Decreto nº 7.217/2010, cujas disposições, no entanto, considerando a limitada competência da
União sobre a matéria, restringem-se a detalhar e a promover melhor entendimento das diretrizes da referida lei, para efeito de
sua execução.
2.2. Lei nº 11.107/2005 (Lei dos Consórcios Públicos)
A nova redação do artigo 241 da Constituição Federal de 1988, a partir da Emenda Constitucional nº 19, aprovada em 4 de junho
de 1998, disciplinou o regime jurídico dos consórcios públicos, reconhecendo-os como pessoas jurídicas de direito público, bem
como introduziu o novo conceito de gestão associada de serviços públicos, por meio da qual um ente da Federação pode cooperar
com outros entes para a execução do planejamento, da regulação, da fiscalização e da prestação de serviços públicos.
A Lei nº 11.107, de 2005, veio disciplinar a mudança produzida na Constituição Federal pela referida emenda, que fixou normas
gerais para três novos tipos de contratos administrativos entre entes federativos: o contrato de constituição de consórcio
público, o contrato de rateio das despesas de consórcio público e o contrato de programa para a prestação de serviços públicos
por meio de gestão associada. Essa lei foi regulamentada pelo Decreto nº 6.017/2007.
A gestão associada pode ser eficiente e eficaz para a execução das políticas públicas de saneamento básico, tanto para
as funções de planejamento e de regulação, como para a prestação integral ou parcial dos serviços, uma vez que permite
organizar e estruturar os serviços com escopo e escala mais adequados para a sua viabilidade técnica e econômica, e para a sua
sustentabilidade permanente.
2.3. Lei nº 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos)
Sem prejuízo das diretrizes da Lei nº 11.445/2007, que trata de aspectos dos serviços públicos de limpeza urbana e manejo de
resíduos sólidos, a Lei nº 12.305/2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), disciplinando os aspectos que se
aplicam a todos os entes da Federação e às pessoas físicas e jurídicas responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de
resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços4
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
Além da extensa e abrangente definição dos termos e conceitos adotados, entre eles a caracterização completa dos tipos de
resíduos, são relevantes, nessa lei, as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos – incluídos os
perigosos –, às responsabilidades de seus geradores e do poder público, e aos instrumentos econômicos aplicáveis.
Dessas diretrizes, destacam-se também as que visam, incisivamente, a induzir e incentivar a adoção dos instrumentos de gestão
associada e as medidas e ações que promovam a inclusão dos catadores de materiais recicláveis nos arranjos institucionais e
administrativos para a gestão integrada, bem como ao gerenciamento de resíduos sólidos.
Assim como a Lei do Saneamento Básico, essa lei elege o planejamento como instrumento determinante e vinculante dos
processos e ações da Política de Resíduos Sólidos, definindo com destaque as atribuições dos entes federados relativas a essa
função, e os requisitos e conteúdos mínimos para os planos nacional e estaduais, para os planos municipais de gestão integrada
e para os planos de gerenciamento de resíduos sólidos, de responsabilidade de seus geradores.
O Decreto nº 7.404/2010 regulamenta e detalha as normas de execução da PNRS, particularmente as atribuições que competem
à União e ao governo federal; também tem destaque o Título III, que trata das responsabilidades dos geradores de resíduos
sólidos e do poder público, e disciplina, entre outros, os aspectos e procedimentos relativos à coleta seletiva, à logística reversa
e à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.
2.4. Lei nº 9.433/1997 (Política Nacional de Recursos Hídricos)
Essa lei institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(Singreh), reforçando os fundamentos que consideram a água como bem de domínio público, recurso natural limitado e dotado
de valor econômico, e o uso prioritário dos recursos hídricos para o consumo humano e a dessedentação de animais, em
situações de escassez, bem como o objetivo de assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água,
com padrões de qualidade adequados aos respectivos usos.
Também são relevantes as diretrizes dessa lei que tratam da outorga dos direitos de uso de recursos hídricos e da cobrança pelo
uso desses recursos, tanto para a captação de água para abastecimento público, como para o lançamento, no meio ambiente
(em corpos d’água como rios e mares, ou no solo), de efluentes dos sistemas de tratamento de esgotos sanitários e de resíduos
sólidos. Do mesmo modo, afetam a política de saneamento básico e as legislações estaduais que instituem as respectivas
políticas e sistemas de gerenciamento dos recursos hídricos de seus domínios.
2.5. Outras normas aplicáveis
São relevantes e afetam a política de saneamento básico as seguintes normas:
a) Lei nº 10.257/2001 (Estatuto das Cidades), que disciplina os artigos 182 e 183 da Constituição Federal e estabelece as diretrizes
da política urbana, com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade
urbana.
b) Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), que estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de
ordem pública e interesse social, que se aplicam de forma precedente e complementar aos direitos e obrigações dos
usuários de serviços públicos de saneamento básico, definidos nas respectivas políticas municipais.
c) Decreto nº 5.440/2005, que estabelece definições e procedimentos sobre o controle de qualidade da água de sistemas de
abastecimento e institui mecanismos e instrumentos para divulgação de informações ao consumidor sobre a qualidade da
água para consumo humano.
d) Portaria nº 2.914/2011, do Ministério da Saúde, que dispõe sobre procedimentos de controle e vigilância da qualidade da
água para consumo humano e seu padrão de potabilidade.
e) Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama):
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços 5
�� Resoluções no 357/2005 e no 397/2008, que dispõem sobre a classificação dos corpos de água e estabelecem diretrizes ambientais
para o seu enquadramento, bem como as condições e os padrões de lançamento de efluentes no meio ambiente.
�� Resolução nº 377/2006, que dispõe sobre o licenciamento ambiental simplificado de sistemas de esgotamento sanitário.
�� Resolução nº 396/2008, que dispõe sobre a classificação e as diretrizes ambientais para o enquadramento das águas
subterrâneas.
f ) Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações Públicas).
g) Leis no 8.987/1995 (Lei de Concessões e Permissões de Serviços Públicos) e no 11.079/2004 (Lei de Concessões Especiais em
Regime de Parceria Público-privada).
Completa esse ordenamento a legislação do titular que institui a Política Municipal de Saneamento Básico e disciplina a
organização e as funções de gestão dos serviços.
Apesar do grande avanço institucional conferido pelo atual ordenamento legal, a implementação das políticas de saneamento
básico, na prática, ainda apresenta baixa efetividade e pouca eficácia.
3. Instrumentos de gestão dos serviços públicos de saneamento básico
As funções de gestão dos serviços de saneamento básico foram definidas na Lei nº 11.445/2007, e abrangem o planejamento,
a regulação, a fiscalização e a prestação, considerando em todas elas a adoção de instrumentos e mecanismos de participação
e controle social.
3.1. Planejamento7
A Lei nº 11.445/2007 define o planejamento como um elemento determinante para a gestão dos serviços públicos de
saneamento básico, sendo entendido como o conjunto de atividades referentes à identificação, à qualificação, à quantificação, à
organização e à orientação de todas as ações, públicas e privadas, por meio das quais um serviço público deve ser prestado ou
colocado à disposição de forma adequada. Nesse contexto, o planejamento é um instrumento essencial para, entre outras ações:
a) diagnosticar e avaliar a situação em que se encontram os serviços, e definir as ações necessárias para torná-los adequados
para a população; b) estabelecer os objetivos e as metas que se pretende alcançar, e definir programas e projetos, bem como
prioridades das ações para a gestão dos serviços; c) definir e avaliar as fontes de financiamento dos serviços; e d) estabelecer
mecanismos de controle, monitoramento e avaliação.
Os objetivos e as metas são determinantes para a definição do plano de investimentos requeridos. A escala e o nível de integração
entre diferentes serviços são essenciais para se determinar o arranjo mais racional para a sua organização e prestação, visando a
proporcionar maior qualidade e menor custo para os usuários e uma política de subsídios mais justa.
O processo de planejamento dos serviços públicos de saneamento básico ocorre em dois níveis. No primeiro nível está o plano
de saneamento básico, instrumento essencial da política pública, de natureza abrangente e de caráter prospectivo e analítico da
situação existente (diagnóstico), e propositivo dos objetivos e metas, bem como dos programas, projetos e ações necessárias
para alcançá-los, constituindo-se ainda em um instrumento vinculante para o poder público titular, nos aspectos relativos à
organização e à prestação dos serviços.
Em segundo nível está o planejamento da gestão dos serviços, de caráter executivo e estratégico das ações administrativas e
técnicas, orientadas tanto para a prestação como para a regulação, a avaliação e a fiscalização.
7 PEIXOTO, João Batista. Gestão econômico-financeira no setor de saneamento. Brasília: Convênio Funasa/Assemae, 2012.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços6
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
3.2. Regulação e fiscalização8
No sentido estrito, a regulação de atividades ou serviços públicos de competência estatal, inclusive a organização e o
funcionamento de suas instituições, decorre da obrigação-dever constitucional, sob pena de responsabilização dos governantes,
e objetiva, entre outras funções, proteger o Estado e a sociedade; garantir direitos sociais relativos às atividades e aos serviços
públicos essenciais; e, por fim, garantir o acesso/universalização e proteger o usuário/consumidor em relação aos serviços de
interesse ou de utilidade pública.
O exercício da função de regulação ocorre em dois níveis. O primeiro abrange o exercício da titularidade do serviço,
cabendo ao poder público competente editar e fazer cumprir as leis (Poder Legislativo), e os regulamentos e atos jurídico-
-administrativos (Poder Executivo), que constituem a política pública correspondente e que organizam, regulamentam e
implementam o sistema de gestão (Capítulo II, arts. 8º a 13, da Lei nº 11.445/2007). O segundo nível da regulação pode
ser atribuído pelo titular, por meio dos instrumentos mencionados anteriormente, a organismos ou agentes públicos, de
natureza e competências jurídicas próprias para essa função, aos quais se podem delegar competências regulatórias de
caráter técnico-executivo, de fiscalização e de função arbitral, definidas conforme a organização jurídico-administrativa dos
serviços a que se aplica (Capítulo V da Lei nº 11.445/2007).
No que diz respeito à fiscalização, sem prejuízo da atuação dos agentes institucionais responsáveis pela fiscalização da gestão
pública (Poder Legislativo, Tribunais de Contas, órgãos de controladoria e ouvidoria etc.), o titular deve instituir/definir o
organismo e designar os agentes responsáveis pelas funções de regulação e fiscalização dos serviços públicos de saneamento
básico, particularmente em relação à sua prestação. Por definição e coerência jurídico-administrativa, cabe a esse organismo
fiscalizar, por meio de monitoramento e avaliação sistemática, os aspectos essenciais da gestão dos serviços.
Ainda que se constitua como organismo de caráter técnico-executivo, é importante que ele atue sob alguma forma de controle
social, seja mediante a representação direta em sua instância diretiva ou deliberativa, ou mediante a submissão de seus atos a
consultas e audiências públicas.
3.3. Prestação dos serviços9
A Constituição Federal de 1988 definiu diversas formas de prestação dos serviços públicos. Além da prestação direta – realizada
pela administração centralizada ou descentralizada do titular – e da prestação indireta – delegada por meio de concessão ou
permissão, que inclui as chamadas parcerias público-privadas (PPPs) regulamentadas pela Lei nº 11.079/2004 –, passou a existir
também a gestão associada, no âmbito da cooperação interfederativa10, por meio de consórcios públicos ou convênios de
cooperação, regulamentada pela Lei nº 11.107/2005.
O Quadro 1, a seguir, mostra os possíveis arranjos organizacionais da gestão de serviços públicos existentes atualmente no Brasil.
8 Idem.9 Ibidem.10 Este termo é usualmente adotado pelos juristas para caracterizar o objeto geral da gestão associada no âmbito dos consórcios públicos e
dos convênios de cooperação, e tem o sentido de cooperação entre entes da federação, nos planos horizontal (município com município) ou
vertical (município com estado e/ou com a União).
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços 7
Quadro 1. Matriz de arranjos organizacionais da gestão e da prestação de serviços públicos
Tipo de gestão
Gestor ReguladorForma de prestação
Instrumento de outorga
Prestador
Dire
ta (e
xclu
siva
)
Titu
lar
Órgão ou entidade
do titularDireta Lei
Órgão ou entidades do titular��Órgão da administração direta
��Autarquia
��Empresa pública
��Empresa de economia mista
��Fundação
Entidade do titular
ou entidade
conveniada de
outro ente federado
do mesmo estado
Indireta
Contrato de
Concessão ou de
Permissão
Terceiros��Autarquia
��Empresa pública
��Empresa de economia mista
��Empresa privada
��Consórcio de empresas
��Sociedade de propósito específico
AutorizaçãoCooperativa de usuáriosAssociação de usuários
Ass
ocia
da
Cons
órci
o pú
blic
o (e
ntes
con
sorc
iado
s)
Entidade de cada
titular ou consórcio
público ou entidade
conveniada
de outro ente
consorciado
Associada
direta
Contratos de
consórcio e de
programa
Consórcio público
Associada
indireta
Contratos de
consórcio e de
programa
Órgão ou entidade de ente consorciado��Órgão da administração direta
��Autarquia
��Empresa pública
��Empresa de economia mista
��Fundação
Contratos de
consórcio e de
concessão ou
permissão
Terceiros��Autarquia
��Empresa pública
��Empresa de economia mista
��Empresa privada
��Consórcio de empresas
��Sociedade de propósito específico
Contrato de
consórcio e
autorização
Cooperativa de usuáriosAssociação de usuários
Ente
s co
nven
iado
s
Entidade do titular
ou entidade do ente
conveniado
Associada
indireta
Convênio de
cooperação
e contrato de
programa
Órgão ou entidade de ente conveniado��Órgão da administração direta
��Autarquia
��Empresa pública
��Empresa de economia mista
��Fundação
Fonte: Quadro elaborado pelo autor.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços8
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
Conforme se verifica, são numerosos os possíveis arranjos institucionais da organização e da gestão dos serviços públicos.
Contudo, na prática, essa flexibilidade de opções parece mais confundir do que ajudar os municípios a encontrar a solução mais
adequada para a organização e a gestão dos seus serviços públicos.
As formas de prestação direta e indireta são as tradicionalmente conhecidas e amplamente praticadas no setor de saneamento
básico até os dias atuais, com algumas experiências de gestão por meio de consórcios públicos constituídos nos moldes da Lei
nº 11.107/2005.
Sujeita ao mesmo ambiente de regulação das demais formas, a gestão associada veio constituir uma alternativa muito
importante para a gestão dos serviços de saneamento básico pelos municípios, uma vez que a associação destes em âmbito
territorial mais amplo permite obter escalas administrativas e operacionais mais viáveis e sustentáveis. Além disso, a gestão
associada proporciona aos municípios melhores condições para cumprir as diretrizes normativas da Lei nº 11.445/2007, visto
que admite a atuação conjunta desses entes para o exercício pleno das funções de planejamento, regulação, fiscalização e
prestação dos serviços.
O Quadro 2, a seguir, mostra os consórcios existentes na área de saneamento básico em 2011 no Brasil.
Quadro 2. Consórcios existentes na área de saneamento básico em 2011
EstadoNº de
consórciosÁreas de atuação dos consórcios
Nº de municípios
CE 13 Tratamento de resíduos (12); abastecimento de água e esgotamento sanitário (1) 106
MG 02 Tratamento de resíduos (1); abastecimento de água e esgotamento sanitário (1) 26
PI 01 Abastecimento de água e esgotamento sanitário 30
RN 01 Abastecimento de água 07
RS 03 Tratamento de resíduos (2); serviços de saneamento básico (1) 52
SC 03 Regulação (1) e prestação dos serviços de saneamento básico (2) 146
SP 01 Regulação 27
PR 02 Abastecimento de água e esgotamento sanitário 38
RO 01 Abastecimento de água e esgotamento sanitário 14
Fonte: Pesquisa do autor na internet.
3.4. Política de cobrança11
A política de cobrança pela disposição e/ou prestação dos serviços abrange os seguintes aspectos: regulação econômica,
regime de cobrança e custos, formas e fontes de financiamento.
A regulação econômica dos serviços públicos, em especial aqueles em que seja aplicada qualquer forma de cobrança direta dos
usuários ou de contraprestação definida, tem como objetivo principal fazer com que o prestador atue sempre com a máxima
eficiência e obtenha justa remuneração, e que o usuário receba ou tenha à sua disposição serviços de qualidade, pelo menor
custo possível.
11 Ibidem.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços 9
Esse objetivo será alcançado com a adoção da modalidade de regulação dos aspectos econômicos do serviço que melhor se
coaduna com o modelo de gestão institucional e organizacional instituído pelo titular. No campo teórico, várias modalidades
de regulação econômica de serviços ou de utilidades públicas vêm sendo desenvolvidas e experimentadas, algumas com mais
vigor, nas últimas três décadas.
De algum modo, com as devidas adequações às particularidades de cada situação, algumas dessas modalidades são
tecnicamente aplicáveis e podem produzir efeitos satisfatórios na gestão dos serviços de saneamento básico; sabiamente, tais
modalidades não foram qualificadas nem limitadas pela Lei nº 11.445/2007.
Em tese, essas modalidades se aplicam, conceitualmente, tanto ao regime de cobrança de preços públicos (tarifas) como ao
regime tributário de taxa, tendo como premissa que, em ambos os regimes, o valor da contraprestação paga pelo usuário
sempre deve estar associado ao efetivo custo econômico do serviço, explicitando-se, quando for o caso, eventual subsídio
vinculado. As modalidades mais conhecidas são:
a) regulação pelo custo econômico do serviço;
b) regulação por incentivos;
c) regulação por preço-teto (price cap);
d) regulação de referência (benchmark ou yardstick competition).
A aplicação eficiente de qualquer dessas modalidades requer do regulador/fiscalizador elevado nível de conhecimento dos
aspectos técnicos e econômicos da prestação dos serviços.
A cobrança direta dos usuários deve ser a principal fonte de financiamento dos serviços, conforme estabelece o artigo 29 da
Lei nº 11.445/2007, o qual determina que “os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-
financeira assegurada, sempre que possível, mediante remuneração pela cobrança dos serviços” (grifo nosso).
No entanto, outras fontes devem ser consideradas para a viabilidade e a sustentabilidade dos serviços, entre elas: subvenções
ou subsídios públicos e privados; inversões diretas de capitais públicos (de autarquias e empresas); empréstimos de fundos
e bancos públicos e privados; investimentos de capitais próprios de delegatários dos serviços; fundos de recursos hídricos e
compensações ambientais; e fundos especiais de universalização dos serviços, definidos no artigo 13 da Lei nº 11.445/2007.
São elementos essenciais da política de cobrança pela prestação ou disposição dos serviços:
a) o regime e a forma de cobrança – taxa ou preço público (tarifa);
b) a forma de prestação dos serviços;
c) a modalidade de regulação econômica e a metodologia de sua aplicação;
d) a estrutura de cobrança (estrutura tarifária); e
e) a política de subsídios.
A estrutura de cobrança (estrutura tarifária), letra d acima, deve considerar, entre outros, os seguintes elementos:
(i) categorias de usuários;
(ii) faixas ou quantidades crescentes de utilização ou de consumo;
(iii) quantidade mínima de consumo ou de utilização do serviço;
(iv) custo mínimo necessário para disponibilização do serviço em quantidade e qualidade adequadas; e
(v) capacidade de pagamento dos consumidores.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços10
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
3.5. Política de subsídios12
O acesso aos serviços públicos de saneamento básico, como componente indispensável do sistema de saúde pública, é direito
social estabelecido pela Constituição Federal. Portanto, a disposição e o uso desses serviços devem ser promovidos e garantidos
independentemente do nível de renda das famílias.
Para os serviços que dependem de conexão física, como o abastecimento de água e o esgotamento sanitário, que em geral
são contratuais e adotam o regime tarifário, a adesão dos cidadãos é voluntária e depende de sua iniciativa. Nesse caso, a
universalização e a garantia de acesso aos serviços para aqueles que não tenham capacidade de pagar, total ou parcialmente,
somente será alcançada se a disposição desses serviços for gratuita, ou se o poder público estabelecer uma política de subsídio
adequada, mediante a instituição de preços (tarifas ou taxas) de caráter social (subsídio tarifário), ou por meio de créditos diretos
em espécie aos beneficiários (subsídio fiscal).
Na situação em que o custo da prestação do serviço, em condições de máxima eficiência e padrão adequado de qualidade, seja
elevado em relação à renda da coletividade, inviabilizando sua recuperação integral mediante a cobrança direta dos usuários,
o sistema de subsídio deve ser indireto (subvenção pública) e beneficiar indistintamente toda a coletividade, podendo ser
proporcional às condições de renda dos grupos de usuários.
No caso de prestação regionalizada, seja diretamente por consórcio púbico ou por um único prestador delegado, sob um contrato
único, para um conjunto de municípios, também pode ser adotado o subsídio tarifário entre localidades (subsídio cruzado), em
que aquelas com maior capacidade e viabilidade econômica subsidiam as com renda média mais baixa, desde que seja garantido
tratamento tarifário isonômico aos usuários de qualquer dessas localidades que apresentem iguais condições econômicas.
3.6. Instrumentos de delegação da prestação dos serviços
O artigo 10 da Lei nº 11.445/2007 estabelece:
Art. 10. A prestação de serviços públicos de saneamento básico por entidade que não integre a administração
do titular depende da celebração de contrato, sendo vedada a sua disciplina mediante convênios, termos de
parceria ou outros instrumentos de natureza precária.
No regime de gestão associada, seja a autorizada por consórcio público ou por convênio de cooperação, a contratação da
prestação dos serviços por órgão ou entidade vinculada ao ente consorciado ou conveniado é realizada por meio de contrato
de programa, o qual deve observar os requisitos do artigo 13 da Lei nº 11.107/2005, e do artigo 23 da Lei nº 8.987/1995 (Lei de
Concessões).
No regime de concessão ou permissão, a contratação da prestação dos serviços sempre deve ser realizada mediante licitação
e observará as regras contratuais estabelecidas pela Lei nº 8.987/1995, quando se tratar de concessão comum (em que o
concessionário é remunerado integralmente pela cobrança de tarifa), ou, complementarmente, pela Lei nº 11.079/2004, quando
se tratar de concessão administrativa (em que o concedente é usuário único do serviço) ou de concessão patrocinada (em que
o concessionário é remunerado parcialmente pela cobrança de tarifa dos usuários finais e mediante pagamento complementar
pelo concedente).
A concessão ou permissão também pode ser outorgada por consórcio público, se autorizada no contrato de consórcio. Portanto,
no caso de gestão associada, com prestação regionalizada de serviços, tanto o contrato de programa como o contrato de
concessão ou permissão podem ser celebrados coletivamente pelo consórcio com um único prestador.
12 Ibidem.
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços 11
Assim, diferentemente do que ocorria antes da edição das Leis no 11.107/2005 e no 11.445/2007, não se admite mais que a
delegação da prestação dos serviços para órgão ou entidade pertencente a outro ente federado seja outorgada por instrumento
de convênio administrativo, ou somente pelo próprio convênio de cooperação previsto na primeira dessas leis. Logo, é preciso
haver contrato de programa.
3.7. Instâncias e mecanismos de participação e de controle social
A Lei nº 11.445/2007 define o controle social como:
Art. 3º. [...]
IV – controle social: conjunto de mecanismos e procedimentos que garantem à sociedade informações,
representações técnicas e participações nos processos de formulação de políticas, de planejamento e de
avaliação relacionados aos serviços públicos de saneamento básico.
Essa definição se repete na Lei nº 12.305/2010 (PNRS) e nos respectivos decretos de regulamentação.
Ainda que com baixa efetividade, atualmente é bastante disseminada, nas diferentes instâncias federativas, a instituição de
organismos e mecanismos de participação e controle social na gestão pública, como atestam os Conselhos de saúde, de
educação, de meio ambiente e de políticas urbanas.
Isso ocorre também em relação ao saneamento básico. Muitos municípios já instituíram Conselhos Deliberativos, com
participação paritária ou dominante da sociedade civil, como instâncias de controle e decisão de atos administrativos, inclusive
de política tarifária, de autarquias constituídas para a prestação desses serviços.
Não é mera coincidência constatar que, nos municípios onde existiam instâncias com essas características e poder decisório, os
serviços de saneamento básico geralmente têm maior cobertura – em alguns casos são universalizados – e são de melhor qualidade.
Não é por outra razão que a Lei nº 11.445/2007 prevê e destaca incisivamente as diretrizes relativas a essa questão. Seu artigo 9º,
inciso V, determina como elemento essencial da política de saneamento o estabelecimento de mecanismos de controle social.
Seu artigo 11, inciso IV, determina como condição de validade dos contratos que tenham como objeto a prestação de serviços
públicos de saneamento, a obrigatoriedade de realização prévia de audiência e consulta públicas sobre o edital de licitação, no
caso de concessão, e sobre a minuta do contrato, neste e no caso de gestão associada. O parágrafo 2º do inciso V do mesmo
artigo determina que as normas de regulação devem prever os mecanismos de controle social nas atividades de planejamento,
regulação e fiscalização dos serviços.
De modo mais direto, o artigo 47 da mesma lei define a participação em órgãos colegiados, como os Conselhos, como forma de
exercício do controle social. Essa tem se mostrado, de fato, a forma mais direta e eficaz de controle social e pode – e deve – ser
estendida também aos organismos reguladores dos serviços.
4. Programas federais e o saneamento básico
O governo federal tem desempenhado um papel importante na instituição do marco legal e na implementação de ações de
saneamento básico por diversas de suas instituições: Ministério das Cidades (MCidades); Ministério da Saúde (MS) e Fundação
Nacional de Saúde (Funasa); Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Agência Nacional de Águas (ANA); Ministério da Integração
Nacional (MI), Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) e Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São
Francisco e do Parnaíba (Codevasf ).
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços12
Saneamento básico: política, marco legal e instrumentos de gestão dos serviços
Algumas dessas instituições têm se esforçado na realização de ações que visam à implementação e ao desenvolvimento das
políticas públicas de saneamento básico, em conformidade com o atual ordenamento legal. No entanto, alguns programas
federais, em que pese sua importância social e econômica, não têm primado pela observância de certas diretrizes, ao adotarem
medidas que se contrapõem ou dificultam a sua realização.
Um desses programas é o Minha Casa Minha Vida (MCMV), cujos projetos de financiamento não contemplam componentes
de infraestrutura ou soluções individuais adequadas de saneamento básico nas áreas em que são implementados; por outro
lado, a ausência ou dificuldade de implementação pelo poder público local algumas vezes impede ou atrasa a execução desses
projetos, quando não são executados à revelia dessa situação.
Outro é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), cujas ações na área de saneamento básico têm privilegiado os
investimentos em infraestrutura, mas deixam em segundo plano ou são excessivamente flexíveis ou condescendentes com as
ações estruturantes relacionadas à melhoria ou à reestruturação da gestão dos serviços, rendendo-se a interesses corporativos
existentes dentro e fora do setor público e, em muitos casos, perpetuando as condições de insustentabilidade dos investimentos
em médio e longo prazos, o que compromete a qualidade desses gastos públicos.
A proposta do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), em fase final de aprovação pela Presidência da República, dedica
grande importância às ações estruturantes, indicando o seu predomínio no médio prazo, quando tiverem sido alcançados
índices razoáveis em direção à universalização dos serviços, com o objetivo de melhorar a gestão e fornecer condições de
sustentabilidade dos serviços em caráter evolutivo e permanente.
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