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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN Campus Avançado Profª Maria Elisa de Albuquerque Maia – CAMEAM
Departamento de Letras – DL Programa de Pós-Graduação em Letras – PPGL
Curso de Mestrado Acadêmico em Letras – Estudos do Texto e do Discurso
LUZINETE CESÁRIO DE ARAÚJO FREITAS
PELOS FIOS DO DISCURSO PEDAGÓGICO: O PROCESSO DE ENSINO DA
ESCRITA NOS CURSOS DE LETRASUERN.
PAU DOS FERROS – RN 2012
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
LUZINETE CESÁRIO DE ARAÚJO FREITAS
PELOS FIOS DO DISCURSO PEDAGÓGICO: O PROCESSO DE ENSINO DA
ESCRITA NOS CURSOS DE LETRASUERN
Dissertação apresentada ao Departamento de Letras, da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Letras, na área de concentração Estudos do Discurso e do Texto, Linha de pesquisa: Texto, ensino e construção de sentidos. Orientadora: Prof.ª Dra. Maria Lúcia Pessoa Sampaio.
Pau dos Ferros, RN 2012
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
LUZINETE CESÁRIO DE ARAÚJO FREITAS
PELOS FIOS DO DISCURSO PEDAGÓGICO: O PROCESSO DE ENSINO DA
ESCRITA NOS CURSOS DE LETRASUERN
Dissertação apresentada ao Departamento de Letras, da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Letras, na área de concentração Estudos do Discurso e do Texto, Linha de pesquisa: Texto, ensino e construção de sentidos. Orientadora: Prof.ª Dra. Maria Lúcia Pessoa Sampaio.
Aprovada em Pau dos Ferros/ RN, em 25 de maio de 2012.
BANCA EXAMINADORA:
_________________________________________________________________ Profª. Drª. Maria Lúcia Pessoa Sampaio
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte Presidente da Banca
_________________________________________________________________ Profa Dra Maria da Conceição C. de Medeiros G. M. Flores
Universidade Potiguar Examinadora Externa
__________________________________________________________________
Profa. Drª. Rosângela Maria Bessa Vidal
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte Examinadora Interna
_________________________________________________________________
Profa. Drª. Maria do Socorro Maia Fernandes Barbosa Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Examinadora Suplente
Pau dos Ferros, RN 2012
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Aos filhos:
Larissa Raynne e Emanuel Rawã.
Ao esposo: Rainor Gurgel;
luzes na escuridão; palavras exatas nas horas inexatas;
sustentáculos nas minhas decisões... razões do meu persistir.
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais;
Aos meus filhos e esposo;
Aos meus colegas e amigos;
À minha orientadora, por acreditarem em mim, muito mais do que eu mesmo
acredito,
Muito obrigada.
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
O Discurso não reflete uma situação, ele é uma situação. Ele é uma enunciação que torna possível considerar a performance da voz que o anuncia e o contexto social em que é anunciado.
Bakhtin
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
RESUMO
O estudo parte da pergunta: o discurso pedagógico do professor de Didática da Língua Portuguesa possibilita o desenvolvimento de um processo de ensino de escrita, pautado na tríade: interação, construção de sentidos e produção de
conhecimentos A pesquisa foi realizada em cursos de Letras da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte e os dados analisados são do Bando de Dados do Programa de Cooperação Acadêmica entre a Universidade Federal do Maranhão (IES Proponente), a Universidade de São Paulo (IES Associada I) e a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (IES Associada II). É considerada documental, visto que os dados já estavam coletados, embora ainda, parte deles se encontrasse em fase de organização. Para maior sustentabilidade das análises buscou-se respaldo nos aportes teóricos de Bakhtin (1992, 2002), Riolfi (2008) Perelman e Tyteca (1999) Marcuschi (2008), Rastier (2000), Souza (2008), Freitas (2008), Gregolim (2003), Antunes (2003), Geraldi (1995) e Pécora (1999), dentre outros. Com o objetivo de investigar o processo de ensino da escrita nas aulas de
MetodologiaDidática da Língua Portuguesa, a pesquisa toma por base o discurso de uma professora e as estratégias por ela utilizadas na sala de aula. Os resultados apontam as vozes que permeiam o discurso no contexto da sala de aula, as concepções de escrita da professora – sujeito da pesquisa -, bem como as estratégias de ensino voltadas à escrita.
Palavras-chave: Discurso. Ensino. Escrita
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
ABSTRACT
The study begins with the question: The teacher's pedagogical discourse of the Portuguese Didactic enables the development of a process of teaching writing, based on drug interaction, meaning construction and production of knowledge? The research was conducted in courses of letters, the university of Rio Grande do Norte and the data analyzed are from the Database Program Academic Cooperation between the Federal University of Maranhão (IES Proponent), the University of São Paulo (IES Associate I) and the University of Rio Grande do Norte (IES Associate II). Documentary is considered, since the data were already collected, although, part of it is found in the phase of organization. For more sustainability analysis sought to support the theoretical contributions of Bakhtin (1992, 2002), Riolfi (2008) Perelman e Tyteca (1999) Marcuschi (2008), Rastier (2000), Souza (2008), Freitas (2008), Gregolim (2003), Antunes (2003), Geraldi (1995) e Pécora (1999), among other. With
the objective to investigate the process of teaching writing classes Methodology/Didactic Portuguese Language, the research builds on the discourse of a teacher and the strategies it uses in the classroom. The results point to the voices that permeate the discourse in the context of the classroom, conceptions of the teacher's written - research subject - , and teaching strategies geared to writing.
Keywords: Discourse. Education. Writing.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Situação resumitiva dos conceitos de discursos abordados no estudo .... 29
Figura 2 - Especificação de alguns tipos de discursos .......................................................31
Figura 3 - Andaimagem para a aprendizagem da escrita ..................................................37
Figura 4 - A formação do escritor ............................................................................................38
Figura 5 - Percurso dos elementos constitutivos do ensino produtivo............................43
Figura 6 – Elementos constitutivos do ensino da escrita ..........................................49
Figura 7 - Relações de continuidade fala/escrita em relação a gêneros textuais ........53
Figura 8 - Gêneros e relação de continuun ...........................................................................63
Figura 9 - Do discurso à escrita ...............................................................................................81
Figura 10 - Concepções de construção do saber ..............................................................101
Figura11 – Momento burocrático vivenciado ......................................................................108
Figura 12 – Momento democrático planejado e executado.............................................108
SUMÁRIO
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
INTRODUÇÃO .............................................................................................................................10
1 TRAÇANDO O PERFIL METODOLÓGICO .....................................................................20
1.1 A PESQUISA ...................................................................................................... 20
1.1.1 Um passeio pelas classificações...................................................................20
1.1.2 Nas malhas do conhecimento a escolha do método...................................22
1.1.3 Reduzindo o necessário por necessidade................................................... 23
1.1.3.1 A palavra como isca.......................................................................................23
1.1.3.2 Os fatos no prisma do ver, ouvir e examinar..................................................24
1.1.4 A espera do pesquisador............................................................................... 26
2 DISCURSO E ESCRITA: UM NOVO FAZER PEDAGÓGICO .....................................28
2.1 DISCURSO: VOZ QUE PRODUZ VOZES ......................................................... 28
2.1.1 Discurso pedagógico: dialogismo e construção de sentidos ...................30
2.1.2 Escrita: processo e ato criador......................................................................36
2.2 DISCURSO, ESCRITA E ENSINO NO CONTEXTO DA SALA DE AULA .......... 39
3 PELOS FIOS DO DISCURSO PEDAGÓGICO: O PROCESSO DE ENSINO DA
ESCRITA NOS CURSOS DE LETRASUERN ....................................................................47
3.1 ENSINAR A ESCREVER: UM DESAFIO QUE PERPASSA A FORMAÇÃO
ACADÊMICA ............................................................................................................. 48
3.2 DISCURSO PEDAGÓGICO E ESCRITA: UMA REDE DE RELAÇÕES ................56
3.2.1 A interação no contexto de sala de aula: processo de construção de
conhecimento...........................................................................................................59
3.2.2 Discurso pedagógico e escrita: vertentes da construção do
conhecimento...........................................................................................................65
3.3 FORMAÇÃO PROFISSIONAL, DISCURSO E ESCRITA: A FUSÃO DE TRÊS
GRANDES PILARES DO ENSINO ........................................................................... 87
3.4 DISCURSO SOBRE O PLANEJAMENTO NA UNIVERSIDADE: UM ATO
SOLITÁRIO................................................................................................................92
CONCLUSÃO................................................................................................................... 112
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 120
APÊNDICE...............................................................................................................127
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
INTRODUÇÃO
Todo início de conversa inquieta, mas geralmente
parte do necessário silêncio
para tomar fôlego e ordenar a realidade em volta,
quebrando o ritmo das diástoles e sístoles, do
côncavo e do convexo, em rumo do incógnito ...
(Freitas)1
O processo de ensino torna-se possível quando um sujeito passa a interagir
com outros sujeitos, criando novos espaços de significações, de relações dialógicas
e de configurações discursivas, no mesmo contexto ou em diversos e diferentes
contextos. Essa mediação, pautada na interação, serve de suporte para que o
homem possa se autoconstruir e projetar cada vez mais, rápidas operações de
riscos e desafios, capazes de promover o seu desenvolvimento intelectual, cultural e
de aprendizado sempre num processo de interação com o outro.
Acredita-se, portanto, ser o discurso pedagógico uma porta de entrada para a
constituição de um processo interativo inteligível, capaz de dar conta das estratégias
discursivas considerando o caráter dialético, ideológico e dialógico da linguagem,
apontando para a construção de possíveis e múltiplas aprendizagens.
Assim toma-se como base a Teoria da Argumentação no Discurso (TAD), a
Teoria Dialógica do Discurso (TDD) e o Sociointeracionismo. A Teoria da
Argumentação do Discurso porque através dos seus pressupostos pode-se discutir
os papeis de atuação dos atores (alunos e professor) considerados em um ambiente
real (sala de aula) em uma interação concreta de comunicação, na qual se
manifestam discursos de situação, de oposição e de provocação, que definem os
papeis de atuação do proponente e do opositor e, às vezes, do questionador (aquele
que levanta dúvidas sobre a discussão) diante das questões problematizadas, o que
1 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, epígrafe escrito para este trabalho, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
possibilita aos atores pensarem, discutirem e repensarem suas intervenções, ora de
forma disciplinada ora de forma compartilhada.
Neste sentido, a Teoria da Argumentação do Discurso, além de dar
sustentabilidade ao Discurso Pedagógico do professor, possibilita ao aluno
(proponente, opositor e questionador) construir a competência de produzir discursos
dentro dos níveis local e global de coesão, coerência e argumentatividade, A escrita
resultante desses discursos tende a ser crítica, significativa e singular.
A Teoria Dialógica do Discurso (TDD), por pautar-se na interação verbal de
caráter dialógico, em que há um processo de comunicação ininterrupto construído
por pessoas que estabelecem relações sociais, interagem por meio de uma
linguagem pluridimensional e complexa, compreendendo ativa e diretamente o
mundo verbal e não-verbal, onde os enunciados dos interlocutores são
acontecimentos que se definem, especificamente, por suas condições contextuais
tanto de produção quando de recepção. Por assim ser, a Teoria Dialógica do
Discurso encontra-se com a escrita no momento em que se passa a dominar o
gênero e suas regras, ponto de articulação entre forma e conteúdo, pois a escrita é
um trabalho longo e audacioso que, inicialmente, sugere transgressão;
posteriormente formação.
Por conseguinte, o Sociointeracismo também concebe a aprendizagem como
um fenômeno pautado na interação com outro. Além disso, a aprendizagem, como a
escrita, deflagra vários processos inter e intrapessoal, modificados através do
discurso do outro (professoraluno). Assim, na abordagem sociointeracionista a
escrita passa a ser produção de elaboração, de reflexão e de construção.
Optou-se pela temática: “Pelos fios do discurso pedagógico o processo de
ensino da escrita em cursos de LetrasUERN”, por perceber que as palavras
produzem diferentes significados de acordo com o lugar do qual o sujeito fala
(ORLANDI, 1999), porque há uma íntima relação entre “o contexto em que se realiza
a comunicação, os significados que comunicamos e as formas pelas quais são
expressos” (AZEREDO, 2006, p. 17) e ainda, por considerar que o educador, no
contexto da sala de aula, deve articular o ensino, a construção de sentidos, o
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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processo interacional, as práticas discursivas, possibilitando assim o surgimento de
novos discursos e de uma escrita significativa.
Assim, a motivação para este trabalho surgiu da percepção de que, no interior
dos estudos sobre linguagem e educação, não é dada ênfase necessária ao
discurso pedagógico do educador, enquanto mecanismo capaz de construir
conhecimentos, sentidos e aprendizagens dana escrita.
Um segundo fator que fez com que se pensasse nessa temática é a
mecanização com que se trabalha a metodologiadidática da língua portuguesa no
ensino superior, muitas das vezes, embasada apenas no domínio técnico do código,
numa morosidade complexa que coloca a escrita como instrumento reprodutor de
conhecimentos, desconsiderando a compreensão dos mecanismos e recursos da
estrutura textual em cada situação discursiva e também os contextos interno e
externo da escrita.
Uma terceira causa é porque parece haver um distanciamento muito grande
entre as teorias estudadas quando da formação acadêmica e as suas aplicabilidades
quando o universitário passa a atuar, profissionalmente, em sala de aula.
Desse modo, se a aprendizagem transcorre através do processo de interação,
que por sua vez ocorre numa relação locutor x palavra x interlocutor, algo de muito
estranho permeia o discurso pedagógico do educador, uma vez que, em muitos
casos, parece se perder nesta inter-relação social de comunicação e aprendizagens
múltiplas.
Ao colocar o discurso pedagógico como objeto da investigação, não se tem a
intenção de omitir falhas e ou fraquezas pedagógico-metodológicas dos professores,
sequer beneficiá-los com os resultados dos dados ou colocá-los uns em posição
superior a outros. Entretanto, crê-se que o professor seja um dos tantos profissionais
capacitados a lidar com pessoas de diferentes níveis, inclusive, intelectual e social e
que, talvez, por primazia do ofício tenha que agir como conselheiro, psicólogo,
filósofo e até réu, por isso a competência para usar a língua, as palavras e o
discurso como arma de grande potência à transformação e à formação do indivíduo
parece ser uma das habilidades que lhe é inerente por natureza.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Enfim, é essa miscelânea de características provocantes e afins que,
aguçadas, abre veredas pelos caminhos incógnitos do discurso pedagógico e
impulsiona não à busca de respostas às inquietações, mas ao questionamento das
trilhas obscuras que medeia as relações: discurso pedagógico do professor, escrita
do aluno, dialogicidade e interação entre os sujeitos construtores de conhecimentos
e saberes, buscando através dessas relações, entender o processo de construção
da escrita na universidade, bem como, os princípios da formação profissional e a
sua extensão social, intelectual e cultural inserto em outros níveis de ensino.
Em face do caráter da aquisição do saber, missão das universidades,
acredita-se que as parcerias fortalecem e ampliam o espaço da universalização do
conhecimento, além de mobilizar estudantes e intensificar, por parte dos professores
e gestores, as conexões de redes que fazem aproximar diferentes comunidades
científicas. Reforçando essa premissa e acreditando que esta pesquisa apresenta
interesses que estão em consonância com os objetivos específicos do PROCAD
(Programa Nacional de Cooperação Acadêmica)2, dentre eles os de “formalizar o
estado da arte no qual se encontra o conhecimento efetivamente mobilizado na
MELP (Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa) sobre a formação de
professores de Língua Portuguesa”, “compreender algumas das representações
sobre o que seja a formação do professor de Língua Portuguesa e seu ensino-
aprendizagem hoje” e “analisar as conseqüências para o ensino e para a pesquisa a
respeito do ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa oriundas dos diferentes
encaminhamentos dados na disciplina”.
Em consonância com os questionamentos até então expostos, circunscreve-
se a seguinte questão: o discurso pedagógico da professora de Didática da Língua
Portuguesa possibilita o desenvolvimento de um processo de ensino de escrita,
pautado na tríade: interação, construção de sentidos e produção de conhecimentos
2 O PROCAD é um Projeto de Cooperação Acadêmica, que toma como objeto de investigação a
disciplina de MetodologiaDidática do Ensino de Língua Portuguesa para analisar dois contextos de grande relevância para a educação brasileira: o ensino de língua portuguesa e a formação de professores. O PROCAD constitui um contexto de cooperação entre a Universidade de São Paulo (USP), junto à Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Por conseguinte, o estudo, no geral, objetiva investigar o processo de ensino
da escrita nas aulas de Didática da Língua Portuguesa através do discurso da
professora e das estratégias, por ela, utilizadas em sala de aula. Considerando a
abrangência da temática, o estudo propõe ainda identificar as diferentes vozes no
discurso pedagógico que permeiam a interação professor-aluno, evidenciar as
estratégias usadas pela professora para compreender o processo de ensino da
escrita e analisar a concepção de ensino da escrita através do discurso da
professora de Didática da Língua Portuguesa do curso de LetrasUERN
Para trabalhar a temática sustentada pelas categorias teóricas, empíricas e
de unidades de análise, toma-se como aporte os estudos de Bakhtin (1992; 2002),
Riolfi (2008) para quem o “discurso é quem sustenta a prática”, Perelman e Tyteca
(1999) que fortalecem as discussões acerca da argumentatividade, elemento
indispensável e intrínseco ao discurso. Já Marcuschi (2008), Rastier (2000), Souza
(2008), Freitas (2008), Gregolim (2003), Antunes (2003), Geraldi (1995) e Pécora
(1999), dentre outros, interagem com os demais para questionar o processo de
ensino da escrita. Firma-se, então, a intenção em estabelecer entre tais aportes e o
discurso pedagógico uma relação intrínseca com o intuito de sustentar a concepção
de que o discurso é um forte aliado na construção de conhecimento de ensino,
justamente por manifestar-se na realidade singular de interação-enunciação.
A pesquisa desenvolveu-se na disciplina de MetodologiaDidática da Língua
Portuguesa, em turmas do Curso de Letras, da Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte, Estado do Rio Grande do Norte, e contribui para os estudos da
argumentatividade na linguagem humana e das práticas de ensino da escrita, pois
se entende ser nas interações discursivas que emergem a construção de sentidos, o
diálogo entre interlocutores, a veracidade ou plausibilidade dos argumentos do
orador, as marcas de outros discursos e, possivelmente, a produção de novos
conhecimentos, o que significa dizer que o êxito da prática discursiva submete-se a
uma relação entre aquele que fala e o que escuta e poderá intervir no processo de
re(produção) da escrita.
Para melhor compreensão das discussões propostas estruturou-se esse
trabalho atendendo aos seguintes princípios: introdução, espaço que possibilita
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
explicitar o objeto de estudo, os procedimentos metodológicos e a pergunta inicial e
fundadora desta pesquisa, além de expor os objetivos propostos à investigação.
Coloca-se ainda a relevância da pesquisa para o âmbito da universidade e do
ensino, justificando a necessidade de se fazer um passeio investigativo nas
tessituras do discurso pedagógico do professor de Didática da Língua Portuguesa,
para nele e através dele encontrar elementos influenciáveis nos processos de ensino
e aprendizagem, tanto do aluno quando do professor, e mais, o papel da
universidade enquanto formadora de profissionais que, certamente, serão
multiplicadores de aprendizagens e formações.
Aqui também se traça, em linhas gerais, o percurso investigativo percorrido,
ao estabelecer interação e diálogo com autores que versam acerca do tema, ora em
consonância ora em discordância com os pensamentos do pesquisador. E buscando
alargar a construção investigativa em torno do tema, adentra-se num espaço mais
amplo ao veicular a pesquisa ao PROCAD – Programa de Cooperação Acadêmica
entre a Universidade Federal do Maranhão (IES Proponente), a Universidade de São
Paulo (IES Associada I) e a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (IES
Associada II).
Em seguida, trabalha-se o Capítulo metodológico, em que se traçam todos
os caminhos da pesquisa desde a definição da temática, os tipos de pesquisa
viáveis à investigação do objeto de estudo, as técnicas e instrumentos utilizados, o
plano de coleta e a natureza da análise dos dados.
Na continuidade dos estudos traz-se Capítulo teórico, onde se apresentam
diversos conceitos para o termo “discurso”, com o propósito de entendê-lo e
encontrar resíduos para a formação de um conceito próprio. Aqui se classifica ainda
o discurso com a intenção de se chegar, enfim, ao discurso pedagógico, reflete-se
sobre as proposições que o denominam de “autoritário” e “dialógico”, procurando
entender os nós que sustentam a construção de sentidos no processo de interação
entre os sujeitos mediante a criação e a produção de conhecimentos.
Ainda aqui, apresenta-se a visão de que o discurso docente favorece as
discussões em torno da temática em foco e descreve-se o papel da universidade
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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frente à ressignificação do discurso pedagógico, enquanto instituição formadora de
profissionais.
Sequenciando a trajetória da pesquisa chega-se ao Capítulo de análise,
onde ao tomar como orientação os estudos realizados, a análise de entrevistas e os
relatos das observações dispostas no Banco de dados do PROCAD, na UERN,
traça-se o perfil do trabalho do professor de Didática da Língua Portuguesa, bem
como a sua responsabilidade diante da árdua e difícil tarefa de apreensão e
construção de conhecimento da escrita.
Nesse contexto, explicita-se ainda a escrita como um trabalho de análise,
construção e reconstrução que exige tanto do aluno quanto do professor
disponibilidade de tempo e conhecimentos científicos, filosóficos, históricos, sociais
e culturais, imersos em uma rede de relações que se entrecruzam para comunicar e
deixar-se comunicar entre si, tecendo os fios de vários discursos que, após a sua
materialidade, resultam em escrita não reprodutiva, que imprime a subjetividade do
sujeito-autor, possibilitando ao mesmo tempo se construir, reconstruir-se por meio
dos seus pensamentos associados aos de outrem e possibilitando a outrem
traçarem, no perfil da incompletude do ensinar e aprender a sua subjetividade.
Ainda neste capítulo, aborda-se a importância da interação entre alunos e
profissionais, bem como entre profissionais e profissionais a fim de garantir o
sucesso da prática pedagógica do ensinar, do aprender, partindo dos princípios da
instituição e da concepção dos sujeitos nela envolvidos.
Enfim, apresenta-se a conclusão, momento em que se colocam todas as
pressuposições encontradas ao longo de todo o percurso da investigação, por isso,
registra-se nesse espaço os extratos implícitos nas entrevistas e observações,
mesclando-os a conhecimentos de formação e experienciais da pesquisadora, com
o intuito de cumprir com os objetivos propostos, bem como de encontrar na escrita a
singularidade, sem perder de vista os conceitos já construídos, mas sempre
primando pela inferência, como uma possibilidade presente na prática e no discurso
pedagógico, ferramentas que, dependendo da eficácia do seu uso, podem mudar as
dimensões do ensino e da aprendizagem da escrita, mudando, inclusive, as práticas
de formação de profissionais, no âmbito das universidades.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Mediante o exposto, acredita-se que esse estudo seja relevante tanto sob a
ótica acadêmica quanto profissional, haja vista focalizar o “discurso pedagógico do
professor” como uma ferramenta inerente e indissociável do “processo de ensino da
escrita”, instigando os professores a refletir mais profundamente acerca da sua
atuação, enquanto mediador da ação pedagógica e formador de profissionais,
atuante na sociedade, e ainda convidando leitores, estudantes e pesquisadores a
direcionar um olhar mais atento aos estudos da argumentação, da linguagem e dos
processos interativos enquanto forma de construção de conhecimentos, sentidos e
aprendizagens múltiplas.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Não tente cortar da palmeira a talha se nela
existir o favo da jati. Procure ser mais rápido
que a ema selvagem e pinte um arco-íris que
não seja cor-de-rosa; imagine o mundo ao seu
redor, mas procure a essência da existência no
ego do teu sensível ser. Se não puderes ser
diamante pela cor que ofuscas, seja outra pedra
de igual valor. Descubra o ponto culminante
dos teus desejos mais ardentes, porém, nas
curvas desta estrada, siga sempre a razão e na
neblina fria da noite, deixes o limpador de tua
consciência percorrer pelas cortinas de vidro que
te separa da ímpia realidade. Todavia, não te
esqueças de estar em paz consigo mesmo.
Procure entender o óbvio e compreenderás na
ociosidade dos fatos a linguagem falada do
amor. (Freitas.)3
3 3 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas. Palavra, poesias e sentimentos.
CAPÍTULO 1 – TRAÇANDO O PERFIL
METODOLÓGICO
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1 TRAÇANDO O PERFIL METODOLÓGICO
1.1 A PESQUISA
1.1.1 Um passeio pelas classificações
Se continuarmos ancorados em nós mesmos com
medo de atravessar o vazio, perdemos o encontro e
com ele a possibilidade de entender que o sentido
não nos pertence, mas somente nós podemos
produzí-lo. (Freitas)4
Trabalhar pesquisa na universidade, principalmente, quando articulada ao
ensino, requer que se tenha um conceito bem definido de sujeito como elo entre
pesquisa e ensino, pois a universidade enquanto espaço independente insere os
estudantes em dimensões diversas, estabelecendo entre essas e o saber técnico
uma relação dialética, sem contudo constituir uma concepção reducionista e
simplificadora do fazer científico.
A pesquisa ora apresentada classifica-se sob a ótica de diversos critérios,
pois traz em si um objetivo, logo se afirma ser exploratória e descritiva. Exploratória,
porque ao se pensar no objeto de estudo “discurso pedagógico”, buscou-se
informações acerca do assunto, delimitou-se um tema, “pelos fios do discurso
pedagógico: o processo de ensino da escrita em curso de Letras/UERN”. A partir do
tema elaboraram-se objetivos e se pensou na questão de pesquisa que norteia o
estudo. Descritiva, por ser desenvolvida na área das Ciências Humanas, e também
porque “o discurso pedagógico” passa a ser observado e interpretado pelo
pesquisador; e mais há premissa de que, através da observação e interpretação dos
fenômenos presentes no objeto de estudo, o processo de ensino da escrita possa
melhorar.
4 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, epígrafe escrito para este trabalho, maio/2012.
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A pesquisa é bibliográfica pelo fato de colocar o pesquisador em contato com
o que já se produziu e se registrou acerca do tema pesquisado, permitindo-lhe maior
cobertura dos fenômenos, rejeitando informações que são puramente inadequadas,
evitando redundância e filtrando o campo de busca.
Documental porque as fontes de informação, ou seja, os dados (documentos)
já se encontravam arquivados no Banco de Dados do PROCAD, existente na
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. Evidencia-se que, no
início da pesquisa, o mesmo estava em fase de organização, mas agora já começa
a receber tratamento analítico e de publicação, uma vez que já se encontra
organizado e disponível para acesso e pesquisa.
Enfim, com um caráter multisignificativo no campo das pesquisas sociais, esta
pesquisa tem abordagem qualitativa possibilitando ao pesquisador lidar com
diferentes técnicas interpretativas, reduzindo assim a distância entre teoria e dado,
contexto e ação. Assim,
[...] um campo que era anteriormente dominado pelas questões da mensuração, definições operacionais, variáveis, testes de hipóteses e estatística alargou-se para contemplar uma metodologia de investigação que enfatiza a descrição, a indução, a teoria fundamentada e o estudo das percepções pessoais. Designamos esta abordagem por Investigação Qualitativa. (BOGDAN e BIKLEN 1994, p.11)
Por esta e outras causas, diz-se que a abordagem desta pesquisa é de
caráter qualitativo, visto que supõe, também um corte temporal-espacial do discurso
pedagógico, objeto de estudo, interpreta um fenômeno do dia-a-dia e revela apenas
parte do problema, podendo conduzir a vínculos mais visíveis de causa e efeitos.
A escolha dessa abordagem reflete o ponto de equilíbrio entre o
conhecimento linguístico e o conhecimento de mundo, considerando que é da fusão
dessas duas facetas que se pode retratar as situações comunicativas presentes na
mente do emissor para um suposto receptor, pois em cada sociedade,
“a produção de discurso é imediatamente controlada, selecionada, organizada e redistribuída por um número de procedimentos, cujo papel é tutelar seus poderes e perigos, domesticar suas casualidades, escapar da sua ponderável, formidável materialidade” (FOUCAULT, 1984, p.109).
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Por conseguinte, gerar conhecimento a partir de uma investigação planejada
e desenvolvida, capaz de fazer com que se compreenda a realidade ou se possa
sobre ela intervir, e mais abordar temas e fatos de ordem pública, nos quais se
fazem presentes os conceitos e técnicas consagrados da Ciência é exigência de
toda pesquisa científica.
1.1.2 Nas malhas do conhecimento a escolha do método
Para Golbenberg (1997) o método é uma observação sistemática dos
fenômenos da realidade condicionada a sucessão de muitos e diferentes passos,
orientados por conhecimentos teóricos, que visa sobretudo explicar as causas
desses fenômenos, suas correlações e aspectos ainda não-revelados. Assim pode-
se afirmar que o método científico atende a um conjunto de regras básicas que
levam à produção do conhecimento científico, sendo responsável pela eficácia da
investigação.
Os métodos científicos são impessoais e objetivos, pois o pesquisador a
priori desconhece a verdade acerca do fato ou fenômeno que tenta explicar. Nesse
sentido, o método parte da observação sistemática e controlada que inicia o
percurso investigativo.
Assim, o método abordado por essa pesquisa é o indutivo, visto que se fez a
análise do discurso pedagógico inserto nas entrevistas (documento do Banco de
Dados); estabeleceu-se uma relação entre esse discurso e o fazer pedagógico da
professora no que concerne ao processo de ensino da escrita e em seguida,
analisou-se a relação encontrada.
A escolha do método justifica-se porque
O conhecimento é fundamentado na experiência, não levando em conta princípios preestabelecidos. No raciocínio indutivo a generalização deriva de observações de casos da realidade concreta. As constatações particulares levam à elaboração de generalizações (GIL, 1999; LAKATOS; MARCONI, 1993, p.37)
Nessa perspectiva, esboça-se o método que sustenta essa pesquisa da
seguinte forma: primeiro toma-se o objeto de pesquisa e indaga-se: o discurso
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
pedagógico da professora de Didática da Língua Portuguesa possibilita o
desenvolvimento de um processo de ensino de escrita, pautado na tríade: interação,
construção de sentidos e produção de conhecimentos A partir de então, o
pesquisador passou, de forma imparcial e neutra, a utilizar os documentos do Banco
de Dados do PROCAD (entrevista e transcrição das observações feitas em sala de
aula) para dar maior sustentabilidade aos sentidos advindos das induções. Na
sequência, buscou-se responder à questão de partida, através da interpretação das
induções realizadas, com o intuito de chegar a uma generalização, validada via os
resultados extraídos dos dados investigados.
1.1.3 Reduzindo o necessário por necessidade
1.1.3.1 A palavra como isca
Para Severino (2007, p. 124), a entrevista é uma técnica que tem por objetivo
coletar informações, por meio de sujeitos entrevistados, sobre um determinado
assunto, havendo, portanto, a interação entre pesquisador e entrevistado. Nesse
sentido, “o pesquisador visa apreender o que os sujeitos pensam, sabem,
representam, fazem, argumentam” (SEVERINO, 2007, p. 124).
Já Haguette (1997, p. 86) define a entrevista como um “processo de interação
social entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a
obtenção de informações por parte do outro, o entrevistado”.
No que concerne a essa pesquisa a entrevista tornou-se imprescindível, pois
o objeto de estudo, exigia do pesquisador dados subjetivos, isto é, aqueles que
estão relacionados com os valores, às atitudes e à opinião do sujeito entrevistado,
embora a pesquisadora deste trabalho não tenha feito a coleta dos dados.
Pela leitura realizada, percebe-se que a técnica de entrevista utilizada foi a
aberta, visto que o entrevistador, mestranda do PPGL (Programa de Pós-Graduação
em Letras) objetivava levantar dados, para através destes encontrar mais
argumentos definidores da disciplina de MELP (Metodologia do Ensino de Língua
Portuguesa, pois sempre introduzia o tema e o entrevistado tinha a liberdade de
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
discorrer sobre ele, podendo explorá-lo com maior profundidade. Entretanto, não
com muita frequência, o entrevistador interferia na discussão para retomar temas já
questionados ou para elucidar questões ainda obscuras, ou ainda para recompor o
contexto da entrevista. Percebe-se ainda que ocorreu uma interação sólida entre
entrevistado e entrevistador, tanto é que a entrevista associa-se a uma conversa
informal, visto que:
A palavra é o modo mais puro e sensível de relação social. [...] Existe uma parte muito importante da comunicação ideológica que não pode ser vinculada a uma esfera ideológica particular: trata-se da comunicação da vida cotidiana. O material privilegiado de comunicação na vida cotidiana é a palavra” (MINAYO, 2004, p. 109)
Assim sendo, entende-se que a entrevista facilita a compreensão do ponto de
vista do sujeito sobre a temática em discussão. Esse fato evidencia que a entrevista
pode fornecer dados importantes acerca do objeto de estudo e ainda conjugada a
outras técnicas pode obter dados mais confiáveis, portanto, mais científicos.
1.1.3.2 Os fatos no prisma do ver, ouvir e examinar
A observação, como muitos imaginam, não consiste apenas em ver ou ouvir,
mas em examinar os fatos ou as ferramentas que o pesquisador pretende estudar,
auxiliando-o na identificação e obtenção de fragmentos que até então passam
alheios aos olhos e à consciência dos indivíduos, mas que são essenciais para a
redefinição de conceitos e ou até determinantes na orientação do comportamento
desses indivíduos. Assim a observação pode ser considerada uma modalidade de
verificação através da qual se estuda atos de aferição que apontam para veracidade
ou falsidade das pressuposições.
Convém situar as observações no cerne das interrogações para de forma
sistemática constituir as dimensões fundamentais do processo investigativo.
Registra-se que as observações em análise foram realizadas em aulas de Didática
da Língua Portuguesa, no período de fevereiro a março de 2010, apresentam caráter
descritivo e reflexivo, pois, respectivamente, fazem uma descrição dos eventos
especiais e das atividades realizadas no contexto da sala de aula, bem como
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
apresentam reflexões analíticas e esclarecimentos necessários aos assuntos postos
em discussões. Assim,
A observação constitui elemento fundamental para a pesquisa, principalmente com enfoque qualitativo, porque está presente desde a formulação do problema, passando pela construção de hipóteses, coleta, análise e interpretação dos dados, ou seja, ela desempenha papel imprescindível no processo de pesquisa.( RICHARDSON, 1999, p.37)
Por ser sistemática e o pesquisador já saber previamente o que vai observar
enquadra-se na observação estruturada e também naturalista uma vez que ocorre
em contexto natural e os fatos são observados na mesma proporção em que
ocorrem, o pesquisador utiliza dados objetivos passíveis de réplica e os fenômenos
observados são mais descritos que os processos subjacentes.
Por conseguinte é caracterizada como observação participante porque o
pesquisador, assumindo o papel de ator social passou a ter acesso às perspectivas
de outros seres.
Uma das vantagens da utilização dessa técnica é a possibilidade de um contato pessoal do pesquisador com o objeto de investigação, permitindo-lhe acompanhar as experiências diárias do sujeito e aprender o significado que atribuem à realidade e às suas ações (LUDKE e ANDRÉ, 1986, p. 38)
Em conformidade com o exposto, a observação exige uma prévia do
observador, visto que esse lidará com sujeitos no desenvolver de suas ações, para
os quais ele deverá atribuir significados.
No caso dessa pesquisa, o objetivo do investigador, autor deste trabalho, foi o
de analisar os dados, considerando o discurso implícito e explícito em documentos,
referentes à observação de 10 aulas de Didática da Língua Portuguesa,
pertencentes ao Banco de Dados do PROCAD. Assim o observador não interagiu
com o objeto de estudo no momento da observação, mas para ter maior afinidade
com a temática em estudo, de posse dos registros das observações passou a
examiná-los. Embora, a observação tenha sido feita por outros informantes, além
dos resultados, a reação de seus autores. A observação participante aqui realizada
denomina-se de nível menor, visto que o observador assiste à situação.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
1.1.4 A espera do pesquisador
Os dados foram analisados a partir do Banco de Dados do PROCAD
existente na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte e são classificados
como primários e secundários, porque já foram utilizados em outros estudos e
pesquisas e também porque se encontram a disposição do pesquisador no banco de
dados supracitado.
A análise dos dados coletados pautados na entrevista e na observação
participante caracteriza-se predominantemente descritiva. Buscou-se realizar uma
análise de conteúdo pautada nos resultados alcançados no estudo (obtidos através
das respostas da entrevista e análise das observações; na fundamentação teórica,
bem como na experiência pessoal da pesquisadora, a fim de que os resultados
pudessem ter validade científica atendendo assim às seguintes condições:
coerência, consistência, originalidade e objetivação.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
O maior desafio do
educador é conhecer o seu
próprio deserto dentro do
deserto da sua profissão,
depois engatinhar pelas
veredas do produzir
conhecimento.
(Freitas)5
5 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012.
CAPÍTULO 2 – DISCURSO E ESCRITA: UM
NOVO FAZER PEDAGÓGICO
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Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
2 DISCURSO E ESCRITA: UM NOVO FAZER PEDAGÓGICO
2.1 DISCURSO: VOZ QUE PRODUZ VOZES
A escrita invade minh’alma, fortalece meus
conhecimentos e propaga o meu discurso. Suas
raízes, as minhas inovações; suas inovações; meus
maiores desafios... Nela me encontro para me
perder outras vezes... (Freitas)6
O termo “discurso” traz em si uma força muito expressiva que o torna plural,
assegurando-lhe lugar(es) tanto nos estudos lingüísticos quanto nos estudos
literários. Produzido ou recontextualizado pelo enunciador provoca efeito de sentido
e vai construindo, pelas veias das interpretações e da linguagem, as suas verdades.
É através dele que se expandem as aprendizagens, os valores sociais e culturais, as
ideologias de grupo e as crenças, no trajeto da demonstração, da argumentação ou
da persuasão.
Com tamanha abrangência o termo discurso passa pelo crivo de muitas
definições. Segundo o Aurélio (2011) discurso é uma peça oratória proferida em
público; uma exposição metódica sobre certo assunto, arrazoado.
Para Mouillaud (1997) discurso é uma exposição metódica fluente oriunda das
operações mentais efetuáveis a partir de operações intermediárias e parciais. Sob a
ótica de Van Dijk (1999), discurso pode ser definido como uma prática social
complexa, na qual estão envolvidos muitos atores sociais, que intervêm no ato
comunicativo quer oral quer escrito, em situações específicas provocadas pelo e no
contexto.
Outro autor que também compactua com a ideia de que o discurso é uma
prática social é Pinto (1988), para quem a linguagem verbal e outras semióticas
constituintes dos textos integram o contexto sócio-histórico e são decisivas na
6 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, epígrafe escrito para este trabalho, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
reprodução, manutenção ou transformação das pessoas, bem como das relações e
construções das identidades em sociedade.
Já para Foucault (1987), o termo discurso alude ao conjunto de regras e
práticas que apresenta uma verdade acerca da produção de manifestações de
certos objetos e conceitos, e ainda define o que se pode dizer sobre aqueles objetos
e conceitos, num dado momento. Nessa acepção, os discursos são controlados por
procedimentos externos e internos.
Bakhtin (2003) postula ser o discurso um fato concreto, muito complexo e
multifacético, viabilizado pela interação entre eu e o outro, por meio de enunciados
que refletem conteúdo, estilo e construção composicional, visto que linguagem e
sujeito, em um processo de análise, são inseparáveis.
Para Revuz (1990) discurso é um conjunto de enunciados de caráter
polifônico efetivados em dois planos distintos: o da heterogeneidade mostrada e o
da heterogeneidade constitutiva.
Figura 1- Situação resumitiva dos conceitos de discursos abordados no estudo
Fonte: FREITAS, 20127.
7 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Refletindo-se acerca de todos os conceitos expostos, define-se discurso como
A expressão do pensamento humano trabalhado linguístico, cultural, social e ideologicamente, processado em uma relação de interação, ora em consonância ora em discordância, mas que constrói aprendizagens múltiplas pelas muitas e diferenças vozes presentes, pelo processo de incompletude, pelas vias da interpretabilidade e pelos critérios de inferências que permitem estabelecer entre discurso, linguagem e sujeito uma cumplicidade que vai além das palavras, das frases e dos textos, quebrando assim o paradigma de pureza e neutralidade dos enunciados. (FREITAS, 2012)
8
Dentre os conceitos postulados pelos autores, destaca-se aquele que tem
maior pertinência à discussão: o de Bakthin. Para melhor se chegar ao alvo faz-se,
em seguida, um breve comentário acerca da classificação do discurso.
2.1.1 Discurso pedagógico: dialogismo e construção de sentidos
Ao priorizar o grau de rigor que o método produz, Aristóteles (1998, p. 47)
tipifica quatro espécies de discursos: o lógico, o dialético, o retórico e o poético,
respectivamente, focados na certeza, na certeza absoluta, na busca da verdade e na
busca de influir na emoção.
Considerando o discurso como seu objeto de estudo, a Análise do Discurso
evidencia que as dificuldades de contextualização dos discursos se dão
basicamente pela relação de continência contraditória entre texto e sociedade, pelos
determinantes econômicos, sociais, culturais e pela lentidão com a qual se dá a
passagem da análise semiológica para a interpretação da semântica, pois aqui
também deve levar-se em conta as variáveis do contexto. Daí, apoiada na tese de
que as imagens trazem em si e consigo valores éticos, morais, culturais e
ideológicos e ainda concepções de interpretação, compreensão, significação e
ressignificação, aponta-se para o discurso da estética, imbricados nas mais variadas
tipicações dadas ao discurso, como se pode ver abaixo na figura 2
8 Conceito retextualizado, pela autora do trabalho, com base nas definições de discurso anteriormente
postuladas.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Figura 2 – Especificação de alguns tipos de discursos
Fonte: Freitas, 20129
Sem pretensão de deter na diversidade de discursos existentes socialmente:
político, científico, publicitário, religioso, filosófico, etc., foca-se, a partir de agora, no
objeto desta discussão: o discurso pedagógico, aquele que se usa para provocar os
processos de ensino e aprendizagem.
Nesse tipo de discurso, a linguagem adquire uma importância fundamental,
pois permite, tanto ao aluno quanto ao professor, serem sujeitos historicamente
construídos, com competências e habilidades para atribuir significados às formações
e práticas discursivas num ambiente de interação. Dessa forma, compreende-se ser
a aprendizagem a internalização de processos compartilhados no plano social.
Inserida nesse panorama, a argumentação passa a ser compreendida como um
discurso que envolve peculiaridades contraditórias, assumindo, provavelmente, uma
posição privilegiada nos processos de ensino e aprendizagem, principalmente, ao se
considerar “o discurso como a realidade singular de interação-enunciação”
(MARCUSCHI, 2008, p. 83).
Tudo isso aponta para uma relação dialógica fundamentada num processo
contínuo de produção de sentido, que implica na compreensão do próprio
enunciado, enquanto fios ideológicos, sociais e históricos, na cadeia da
9 FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
comunicação discursiva, formada pelo já-dito e o ainda não-dito na atmosfera da
língua, onde estão presentes interlocutores ativos, construindo sentidos, porque
A palavra (e em geral, o signo) é interindividual. Tudo o que é dito, expresso, situa-se fora da “alma”, fora do locutor, não lhe pertence com exclusividade. Não se pode deixar a palavra para o locutor apenas. O autor (o locutor) tem seus direitos imprescritíveis sobre a palavra, mas também o ouvinte tem seus direitos, e todos aqueles cujas vozes soam na palavra têm seus direitos (não existe palavra que não seja de alguém). A palavra é um drama com três personagens (não é um dueto, mas um trio) (BAKHTIN, 1988 p. 350)
Percebe-se pelo exposto que a palavra não tem um dono específico, porque
vem de todos, passa por todos e é de propriedade de todos. Nesse sentido, suas
significações vão se construindo e se reconstruindo em muitos mundos para atender
às necessidades específicas e se expande rumo às novas construções, não sendo,
portanto, dita da mesma forma sequer com o mesmo sentido, culminando assim com
a famosa frase: “o homem não se banha duas vezes no mesmo rio, porque nem o
homem nem o rio serão os mesmos”.
Parafraseando Heráclito, autor da frase, supõe-se que o discurso pedagógico
do professor não será reproduzido pelo aluno, porque os discursos e os autores não
são os mesmos, porque as palavras ganham sentidos e são ressignificadas sempre
que mudam de posição e se inserem em outros contextos e porque as condições de
produção atendem a peculiaridades advindas das relações de interação das práticas
cotidianas vividas pelos sujeitos da interlocução.
Tomando por base o dialogismo bakhthiano que aponta para o “caráter
polifônico dessa relação exibida pela linguagem” (BRAIT, 1997, p. 56), acredita-se
que não se pode mais pensar em discurso pedagógico como um duelo de forças,
onde o professor faz uso da palavra autoritária para “transmitir conhecimentos”,
perpetuar-se como “dono da verdade” ou como meio de assegurar a reprodução
social-cultural, uma vez que,
Os sujeitos são posicionados ideologicamente, mas são também capazes de agir criativamente no sentido de realizar suas próprias conexões entre práticas e ideologias a que estão sendo expostos e de reestruturar as práticas e as estruturas posicionadoras. [...] As práticas discursivas são investidas ideologicamente à medida que incorporam significações que
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
contribuem para manter ou reestruturar as relações de poder. Em princípio, as relações de poder podem ser afetadas pelas práticas discursivas de qualquer tipo. (FAIRCLOUGH, 2008, p.87)
Considerando o fato de que os sujeitos são capazes de agir quando expostos
a situações que deles exigem posicionamento, coloca-se o discurso pedagógico do
professor como um instrumento que aguça os interlocutores a produzir sentidos
quando chamados a estabelecer conexões entre práticas e ideologias. Essa ação
faz com que os interlocutores mesclem conhecimentos já existentes com
conhecimentos novos produzidos no acaloramento das discussões; neste encontro
de acontecimento surge, provavelmente, uma nova estrutura de pensamentos,
valores, ideias que alteram a ordem das práticas discursivas até então vigentes,
obviamente, alterando também as relações de poder ou até provocando uma
espécie de desnivelamento entre os sujeitos interlocutores, causado não somente
pelo discurso, mas pela eficácia da argumentatividade presente no discurso.
Postulando tal pensamento, reforça-se a ideia de que, desde os primórdios
dos tempos o relacionamento entre os seres humanos, em qualquer das suas
dimensões quer históricas, quer sociais ou culturais dá-se, basicamente, por meio de
símbolos. Nesse sentido, considerando a interação social, e observando o
comportamento linguístico dos seres humanos, verifica-se, segundo Koch (2000, p.
12), que “a interação social por intermédio da língua caracteriza-se,
fundamentalmente, pela argumentatividade”.
Para Isócrates, citado por (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 1999, p.
50), “o objetivo de toda argumentação provoca ou aumenta adesão dos espíritos às
teses que se apresentam a seu assentimento”. Para tal, o argumentador deve
despertar no outro a ação pretendida (positiva ou negativa), bem como instigar a
criação em seu interlocutor, a disposição para atar os elos coesivos deixados no
texto durante a captura da coerência.
Assim sendo, o ato de argumentar requer estratégias discursivas capazes de
permitir ao orador a obtenção do chamado acordo com o auditório universal, ou seja,
saber alternar, no texto, lugares-comuns e lugares-específicos, razão pela qual se
afirma que a combinação e a seleção de alguns elementos em detrimento de outros
é diretamente proporcional à sua indispensabilidade na argumentação, pois
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
[...] a argumentação visa a provocar ou incrementar a “adesão dos espíritos” às teses apresentadas ao seu assentimento, caracterizando-se, portanto, como um ato de persuasão. Enquanto o ato de convencer se dirige unicamente à razão, através de um raciocínio estritamente lógico e por meio de provas objetivas, sendo, assim, capaz de atingir um “auditório universal”, possuindo caráter puramente demonstrativo e atemporal (as conclusões decorrem naturalmente das premissas, como ocorre no raciocínio matemático), o ato de persuadir, por sua vez, procura atingir a vontade e o sentimento do(s) interlocutor(es), por meio de argumentos plausíveis ou verossímeis e tem caráter ideológico, subjetivo, temporal, dirigindo-se, pois, a um “auditório particular”: o primeiro conduz a certezas, ao passo que o segundo leva a inferências que podem levar esse auditório – ou parte dele – à adesão dos argumentos apresentados. (PERELMAN, 2005, p. 18)
Mediante o exposto, considera-se que o prisma da argumentação se expressa
pelo ato de expor de um ponto de vista, defendido pelo sujeito argumentador como
sendo o ideal para seu discurso, sempre acompanhado de uma razão persuasiva.
Assim sendo, o produtor do discurso, além de ter leituras e vasta experiência de
vida, deve saber utilizar os elementos linguísticos com o intuito de expressar seus
pensamentos e levar o outro a crer no seu ponto de vista, na sua tese.
Em se tratando do discurso pedagógico do professor, o foco principal aponta
para uma argumentação mais aberta, em que a ordem possibilita aos participantes
do discurso buscar caminhos úteis que servem de ponto de partida à reflexão,
sustentáculo de um ensino produtivo e de uma aprendizagem de qualidade. Para
isso, o professor se faz consciente de que os argumentos são mutáveis e de acordo
com a sua classificação (argumentos quase lógicos, argumentos baseados na
estrutura real e argumentos que fundam a estrutura do real) e ordem tendem a
modificar o significado dos enunciados, entretanto, os argumentos embora distintos,
são plausíveis de interação.
Dessa forma, para se elaborar um discurso, satisfatoriamente, harmonizam-se
estruturas próprias da língua com elementos extralingüísticos, movimentos de
retroação e avanço, para que o leitor não se perca, ao fazer os movimentos
cognitivo-discursivos necessários à construção dos efeitos de sentido engendrados
na tessitura textual e, se usam as técnicas da argumentação, coerentemente, para
direcionar o discurso para um auditório particular, a fim de transmitir a mensagem
desejada para um público específico. É
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Pensando no uso efetivo do discurso em situações reais de interação social, que jamais podemos ver a linguagem verbal como linear, unívoca, totalmente racional; ao contrário, temos de vê-la como um meio de interação, como algo que emerge de sujeitos históricos e culturalmente situados e se dirige a outros sujeitos em situações semelhantes, refletindo, nessa interação, as ambigüidades, as controvérsias; enfim, as relações dialéticas e dialógicas que permeiam as relações humanas. (SOUZA, 2008, p. 61)
Nesse sentido, afirma-se que a língua enquanto sistema de práticas
sociointerativas de base cognitiva e histórica tem seus usos apropriados a diversas
situações e práticas sociais nas quais participam diferentes tipos de discursos, e
gêneros diversos nos quais se faz presente um vocabulário de formas semânticas já
inventariadas e outras, ainda, em vias de lexicalização.
Assim a pluralidade dos discursos em trânsito, no espaço social, reflete a
também pluralidade das práticas sociais, de tal modo que “os textos são
configurados pelas situações concretas de que participam, e, além disso, pela
mediação de gêneros e discursos, eles se articulam às práticas sociais, cujas
situações de enunciação e de interpretações são ocorrenciais”. (RASTIER, 2000, p.
445)
Essa asserção clarifica o pensamento de que é pela interação que se dá a
produção de conhecimentos, uma vez que nesse processo, além do locutor, se
fazem presentes o interlocutor, a palavra e novas significações advindas dos usos
da linguagem em situações diversas de práticas sociais de produção. Isso nos leva a
crer nas possibilidades de que numa atividade colaborativa em que se dá a
interação entre autor-texto-leitor e ou falante-texto-ouvinte, embora havendo
desencontros, extraem-se informações objetivas que implicam em construção de
sentidos, com base em atividades inferenciais; ação que provoca múltiplas
aprendizagens.
Assim sendo, o discurso, a argumentação e a interação devem ser
considerados princípios integrantes no desempenho da função comunicativa, sendo
interligados entre si e complementares do ponto de vista do objeto do dizer, em que
estão presentes aspectos pragmáticos, tipológicos, processos de esquematização,
plano de codificação-decodificação e uma série de conseqüências formais e não-
formais.
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Por esse viés, o discurso pedagógico do professor, para atender às
demandas atuais da construção de conhecimento, aos saberes necessários à
formação pessoal e profissional, às essências das múltiplas aprendizagens e ao
extenso e complexo labirinto das culturas presentes na sociedade tende a ser
multifacético, estende-se à emancipação e transformação da realidade, promovendo
a construção de uma educação e de uma pedagogia que prime pela diversidade
humana, respeite as diferenças e a alteridade, reflita sobre formação, informação,
cultura, diálogo, ensino e aprendizagem. Somente assim dar-se-á a politização do
professor, que, consequentemente, reverberará no aluno e ambos passam a ser
agentes históricos e críticos dana sociedade.
2.1.2 Escrita: processo e ato criador
O processo de apropriação do conhecimento passa por várias e diferentes
propriedades, dentre elas, a da escrita, preferencialmente, com interface múltipla
que ative os saberes: filosófico, linguístico e discursivo, pois a escrita implica
singularidade, haja vista direcionar-se para o novo e para a produção do
conhecimento, o que, certamente, construirá juízo de valor, pois “a manifestação da
singularidade demanda que aquele que escreve possa agenciar de tal modo sua
divisão subjetiva que chegue a administrar as diversas vozes presentes em seu texto
de maneira harmoniosa” (RIOLFI & MAGALHÃES 2008, p, 100).
Assim sendo, o trabalho de escrita distingue-se das demais operações
proporcionadas pela linguagem, uma vez que é tido como peculiar, pelo fato de que
o escritor ao apresentar ao leitor o produto final, resultado do percurso de seus
pensamentos como fio condutor de reconstituição e retomada do processo de
enunciação, oculta a malha traçada por fios ideológicos, epistemológicos, filosóficos,
sociais e culturais, usados, por ele, para escrever.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Figura 3 - Andaimagem para a aprendizagem da escrita
Fonte: FREITAS, 201210
Nessa perspectiva, escrever requer habilidades e ousadia por parte de quem
escreve, no sentido de romper com a tradicional forma de escrita, cuja linhagem é
apenas a repetição incessante da voz do outro, sem considerar os fragmentos
deixados ao longo dos enunciados elaborados. A escrita tradicional afasta-se da
singularidade11 porque agrega em seus liames uma posição enunciativa linear que já
circula em dada cultura, possivelmente, no contexto cultural no qual o autor está
inserido. Por este viés
Ninguém pode ocupar uma posição neutra sobre „mim‟ e ao „outro‟ [...], a diretriz axiológica necessita de que ocupemos uma posição singular no acontecimento único da existência, porque todo juízo de valor é sempre uma tomada de posição individual na existência (BAKTHIN, 2003, p.117)
Além da concepção de escrita acima mencionado, há outro muito comum no
meio escolar, ou seja, aquele em que o escritor escreve para atender às solicitações
10
FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012. 11
Entende-se singularidade como produto do ato reflexivo de interpretabilidade do dito ou do lido, submetido a um macroprocesso social e individual indivisível que, através de uma relação contínua entre o interno e o externo, possibilita o indivíduo tornar-se autor da sua escrita.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
feitas por outros (professor, exigências dos vestibulares, livro didático...), sem ter a
preocupação de acrescentar algo novo ao tema proposto.
Figura 4 - A formação do escritor
Fonte: FREITAS, 201212
Ao executar tal ação, o escritor (aluno), geralmente, alia-se aos pensamentos
e propósitos do propulsor da solicitação (professor) que, na maioria das vezes, ainda
comete o equívoco de imaginar que “ensinando análise sintática, ensinando
nomenclatura gramatical, consegue tornar os alunos suficientemente competentes
para ler e escrever textos, conforme as diversificadas situações sociais” (ANTUNES,
2003, p 46).
Esse tipo de escrita precisa ser superado para que os autores possam na
construção dos seus textos fazer interagir a cultura escolar e seus próprios desejos,
passando assim de um escritor constituinte para um escritor constituído com
capacidade para enxergar a demanda social de maneira singular, na qual a
12
FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
linguagem torna-se testemunha dos atos e fatos escritos e possibilita a tessitura de
uma escrita criativa, em que as manobras linguístico-discursivas presentes no texto
servem como âncora para prender a atenção do leitor e convidá-lo a ser coparticípe
daquele ato de escrita, pois
A civilização, necessariamente universal, conflita com os mecanismos de representação dos desejos individuais. Nessa diferença entre a civilização e o homem é necessário não o homem da certeza, como na harmonia forçada, mas o homem da aposta. Estar em conflito com a natureza não é necessariamente ruim. Alguns só podem suportar isso por meio de uma doença que possa fazer uma falsa ponte entre o si mesmo e o mundo. Trata-se da adequação à expectativa do outro. Há também aqueles que, suportando este conflito, pagam o preço da autorização de algo novo. São os criadores, a quem devemos tanto: poetas, escritores, cineastas e cientistas (RIOLFI, 2008, p.116)
No entanto, a passagem do estado de comodidade para o de responsabilidade
exige características preliminares, principalmente no ensino, dentre elas: o desejo do
próprio aluno de se tornar sujeito criador, a concepção de ensino constituída na
interação do professor e do estudante e ainda a influência que o profissional,
principalmente, professor de Língua Portuguesa recebe na sua formação, com vista
a um ensino interativo, centrado no aluno, mas que atenda à verdadeira
competência pedagógica que parte do reconhecimento dos conteúdos a serem
ensinados e envereda pelo mosaico das metodologias para relacionar os conteúdos
aos objetivos e às situações de aprendizagens.
2.2 DISCURSO, ESCRITA E ENSINO NO CONTEXTO DA SALA DE AULA
É bem verdade que, no contexto da sala de aula, as concepções de ensino
são heterogêneas, mas não se pode preservar, a qualquer custo, apenas a
permanência da tendência tradicional, uma vez que a evolução humana, histórica e
social prima também pelo avanço no pensamento ideológico, tanto do aluno quanto
do professor. Essa relação intrínseca de trocas e ajustes existentes entre a corrente
tradicional e a moderna é o que garante a circularidade da pluralidade de ideias e,
certamente, a construção de sujeitos mais abertos aos questionamentos, às
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
40
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
mudanças e às novas tendências do fazer pedagógico, o que aponta para uma
pedagogia dialógica. E mais
[...] a relação de conhecimento não termina no objeto, ou seja, a relação não é a do sujeito cognoscente (ou a do sujeito que conhece) com o objeto cognoscível (ou com o objeto que pode ser conhecido). Essa relação se prolonga a outro sujeito, sendo, no fundo, uma relação sujeito-objeto-sujeito, e não sujeito-objeto. (FREIRE, 1982, p.114)
Ao se situar o professor como um dos sujeitos reais do fazer pedagógico,
obviamente, dá-se a ele a voz que precisa ter quando da produção do conhecimento
sobre sua prática. Isso lhe permite a possibilidade de rupturas do tradicional
paradigma dos cursos de formação de professores rumo à inserção de proposta de
reflexão crítica sobre a prática, tendo como triangulação central, intrínseca e
indissociável o ensino, a pesquisa e a extensão focados na prática docente e
diretamente ligados ao desenvolvimento da pessoa e da sociedade, uma vez que
[...] a prática educativo-libertadora se obriga a propor aos homens uma espécie de „arqueologia‟ da consciência, através de cujo esforço eles podem, em certo sentido, refazer o caminho natural pelo qual a consciência emerge capaz de perceber-se a si mesma. No processo de „hominização‟ em que a reflexão se instaura, se verifica o „salto individual, instantâneo, do instinto ao pensamento‟. Desde aquele remotíssimo momento, porém, a consciência reflexiva caracterizou o homem como um animal não apenas capaz de conhecer, mas também capaz de saber-se conhecendo... A percepção crítica deste fato, de um lado, desfaz o dualismo simplista que estabelece uma inexistente dicotomia entre a consciência e o mundo; de outro, retifica o equívoco em que se encontra a consciência ingênua, ideologizada nas estruturas da dominação, tal o de considerar-se como aquele recipiente vazio a ser enchido de conteúdos. (FREIRE, 1996, p.100)
A capacidade de transcender as leis do pensamento e da lógica faz do ser
humano um eterno aprendiz. Nessa ótica, o ser humano tem autonomia para refletir,
mudar, escolher, intervir no mundo, negar a possibilidade de ser reduzido à
subjetividade, vislumbrar melhor os valores, transformar a si mesmo e através do
seu discurso e da escrita transformar o pensamento do outro. Por isso,
Aprender e ensinar fazem parte da existência humana, histórica e social, como dela fazem parte a criação, a invenção, a linguagem, o amor, o ódio, o espanto, o medo, o desejo, a atração pelo risco, a fé, a dúvida, a curiosidade, a arte, a magia, a ciência, a tecnologia. E ensinar e aprender
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
cortando todas estas atividades humanas. Foi exatamente porque nos tornamos capazes de dizer o mundo, na medida em que o transformávamos, em que o reiventávamos, que terminamos por nos tornar ensinantes e aprendizes. Sujeitos de uma prática que se veio tornando política, gnosiológica, estética e ética. Seria realmente impensável que um ser assim, “programado para aprender”, inacabado, mas consciente de seu inacabamento, por isso mesmo em permanente busca, indagador, curioso em torno de si e de si no e com o mundo e com os outros. (FREIRE, 2001, p 19)
Mediante o exposto, entende-se que a universidade enquanto instituição
responsável em parte, pela formação inicial de professores, deve romper com o
paradigma da transmissão de informações, ensinando aos futuros professores como
usar a informação, selecioná-la, trabalhá-la e transformá-la em conhecimento,
criando com isso novos ambientes de aprendizagem, pois como afirma Demo (1997,
p. 128) “quem pesquisa tem o que ensinar, porque ensina a produzir, não a copiar”.
Ao trazer os comentários expostos para uma clivagem entre formação de
professores e a posição do professor de Língua Portuguesa diante da escrita criativa
parece haver em ambos um ponto comum: o medo de passar de uma a outra
instância e se perder nas perspectivas do ensinar e aprender.
Entretanto,
Não posso ser professor se não percebo cada vez melhor que, por não ser neutra, minha prática exige de mim uma definição. Uma tomada de posição. Decisão. Ruptura. Exige de mim que escolha entre isto e aquilo. Não posso ser professor a favor de quem quer que seja e favor de não importa o quê. Não posso ser professor a favor simplesmente do Homem ou da Humanidade, frase de uma vaguidade demasiado contrastante com a concretude da prática educativa. Sou professor a favor da decência contra o despudor, a favor da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da democracia contra a ditadura de direita ou de esquerda. Sou professor a favor da luta constante contra qualquer forma de discriminação, contra a dominação econômica dos indivíduos ou das classes sociais. Sou professor contra a ordem capitalista vigente que inventou esta aberração: a miséria na fartura... (FREIRE, 1996, p. 115)
Como bem coloca o autor a prática pedagógica do educador lhe é inerente
por definir sua concepção de ensino e aprendizagem. Através dela, define-se
postura e caminho e traçam-se ações educacionais. Nesse sentido, a prática
pedagógica define a visão político-social do profissional em educação e coloca em
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
posição de escolhas; daí se dizer que o professor influencia na construção da
identidade do aluno para a transformação de sua realidade e modo de pensar.
Para que um professor desempenhe com maestria a aula na matéria de sua
especialidade, ele precisa conhecer as demais matérias, os temas transversais que
devem perpassar todas elas e, acima de tudo, conhecer o aluno. Tudo o que diz
respeito ao aluno deve ser de interesse do professor. Ninguém ama o que não
conhece, e o aluno precisa ser amado! E o professor é capaz de fazer isso. Para
quem teve uma formação rígida, é difícil expressar os sentimentos; há pessoas que
não conseguem elogiar, que não conseguem abraçar, que não conseguem sorrir. O
professor tem de quebrar essas barreiras e trabalhar suas limitações e as dos
alunos.
Não há como separar o ser humano profissional do ser humano pessoal.
Certamente o professor, como qualquer pessoa, terá seus problemas pessoais,
chegará à escola mais sisudo que o habitual e terá mais dificuldade em
desempenhar seu trabalho em sala de aula. Os alunos notarão a diferença e a
eventual impaciência do professor nesse dia, mas eles não sabem os motivos da
sisudez do mestre e podem interpretar erroneamente
Assim sendo, as concepções de ensino e a formação do professor tornam-se
imprescindíveis na desconstrução, reconstrução e construção da realidade, dos
modos de pensar e agir, bem como das escolhas e formações dos enunciados
imersos no cerne do discurso pedagógico dialógico, pois o sujeito está,
permanentemente, em processo de constituição e desenvolvimento, pressuposto
indispensável ao processo de formação continuada, quando se crê que
A educação significa um movimento de transformação interna daquele que passa de um suposto saber (ou da ignorância) ao saber propriamente dito (ou à compreensão de si, dos outros, da realidade, da cultura acumulada e da cultura no seu presente ou se fazendo). A educação é inseparável da formação e é por isso que ela só pode ser permanente (CHAUÍ, 2003, p.11)
Percebe-se pela exposição da autora que a sociedade atual não mais prima
por uma formação dogmática, ao contrário, está sendo forçada a ceder lugar para
uma formação científica, voltada para a análise e criticidade, elementos capazes de
viabilizarem a qualidade do ensino e, consequentemente, da aprendizagem e da
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
educação. Entretanto, como bem alerta Perrenoud (2000), é impossível formar
professores quando se fecham os olhos à necessidade de fazer escolhas
ideológicas; as diferenças existem para serem consideradas e o modelo de
sociedade e de ser humano nela inserto não permite que se defina de maneira única
o papel dos professores nem as finalidades da escola.
Figura 5 - Percurso dos elementos constitutivos do ensino produtivo
.
Fonte: FREITAS, 201213
Mediante o exposto, o educador, que precisa aprender a exercer o papel de
orientador, de facilitador, para ajudar o aluno a buscar, compreender, assimilar a
informação e transformá-la em conhecimento. o professor precisa dar o seu recado
de forma criativa e apostando nas relações interpessoais.
Assim fazer da escola e do ato de educar espaços e momentos prazerosos,
alegres e felizes para professores e alunos demanda muita criatividade, motivação e
gosto pelo desafio. Mas é possível fazer do ambiente escolar um exercício de
qualidade de vida, realização pessoal e profissional, basta estarmos abertos a idéias
e propostas inovadoras. O prazer pelo aprender não é uma atividade que nasce
13
FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
espontaneamente nos alunos, pois, muitas vezes, não é uma tarefa que cumprem
com prazer. Para que este hábito possa ser melhor cultivado, é necessário que o
professor consiga despertar a curiosidade dos alunos e acompanhar suas ações na
solução das tarefas que ele propuser.
Não obstante, cada profissional deve ter claramente definido o seu papel
nesse contexto social, onde esta relação aqui considerada passa a ser alvo de
pesquisas, na busca do diálogo, do livre debate de idéias, da interação social e da
diminuição da importância do trabalho individualizado.
Nessa perspectiva, a interação professor/aluno ultrapassa os limites
profissionais, escolares, do ano letivo e de semestres. É, na verdade, uma relação
que deixa marcas, e que deve sempre buscar a afetividade e o diálogo como forma
de construção do espaço escolar.
É preciso acentuar que o educador não precisa ser aquele mentor
(direcionador) do conhecimento, em que os saberes ficam centrados somente em
sua imagem, com isso bloqueando, deturpando e dificultando o desenvolvimento do
intelecto (cognitivo) do aluno. E sim, o bom educador deve possibilitar e gozar
oportunidades ao seu aluno, dando condições a esse educando de desenvolver as
suas habilidades, potencialidades e, acima de tudo as suas aptidões.
Desse modo, o professor precisa conhecer, entender, perceber os vários
métodos de ensino aprendizagem, se esforçando de ir ao encontro dos alunos e
tentando compreender o seu processo de conhecimento, na ajuda da articulação de
sua experiência na ação, respeitando e valorizando o grau de individualidade dos
alunos e as dificuldades apresentadas por cada um.
Diante de tantos conflitos na busca por um ensino de qualidade, parece ser
de suma importância voltar o olhar às finalidades do sistema de ensino e às suas
competências, na tentativa de encontrar a distância entre estas duas âncoras e
aproximá-las o mais possível, para não se cair no “conto do vigário” e acreditar que
não se tem um ensino produtivo porque os recursos econômicos disponíveis não
são suficientes para tal. Convém lembrar que a prática reflete uma questão política e
mesmo vivenciado a escassez dos recursos econômicos nada impede que se reflita
sobre onde se quer chegar, como chegar, por que chegar, razão pela qual
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
O problema está em como chegar ao conjunto de alunos com que
trabalhamos, já que as lições e explicações tradicionais não servem. Por
isso, é evidente a necessidade de reforçar a dimensão pedagógica de
nossa docência para adaptá-la às condições variáveis de nossos
estudantes. Impõe-se a nós a necessidade de repensar as metodologias de
ensino que propomos a nossos estudantes (considerando a condição de
que estamos trabalhando para um processo de formação contínua...); a
necessidade de revisar os materiais e recursos didáticos...; a necessidade
de incorporar experiências e modalidades diversas de trabalho.... Este não
é, naturalmente, um trabalho fácil; ao contrário disso, exige uma
reconstrução do perfil habitual dos professores universitários. (ZABALA,
2004, p. 31)
O professor dessa nova era deve saber não para ensinar, mas para fazer
aprender, para construir competência e identidade, para mediar relações entre o
mundo e o saber. Essas mudanças afetam, em princípio, a rotina dos professores e
trazem-lhes uma crise de identidade que para Nóvoa (1992, p.14) encaixa-se em
três fases: “a procura intrínseca pelas características intrínsecas ao bom professor; a
tentativa de encontrar o melhor método de ensino e a importância concedida à
analise do ensino no contexto da sala de aula, com base no chamado paradigma
processo-produtivo.”
Tardif (2002, p. 36) vai mais além e afirma ser o “saber docente, um saber
plural formado pela combinação mais ou menos coerente de saberes advindos da
formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares, e experienciais”.
As discussões até então propostas pressupõem que a formação do professor
é um dos eixos que define a concepção de ensino vigente. E mais, que é preciso
refletir com mais ênfase sobre a qualidade dos cursos formadores de profissionais, a
fim de que se tenha êxito no saber, na aprendizagem, nas atuações em sociedade e
na construção de competências formadoras de agente transformador e
transformado.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Não tenho medo de escrever, reescrever. Não tenho medo de errar, refletir, refazer
e aprender. Sou mulher, brasileira, nordestina, professora... Aspiro, quem sabe, a ser
pesquisadora. Abraço a escrita e nela me encontro para abraçar, possivelmente, muitos
desencontros... (Freitas)14 14
FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, maio/2012.
CAPÍTULO 3 – PELOS FIOS DO
DISCURSO PEDAGÓGICO: O
PROCESSO DE ENSINO DA
ESCRITA NOS CURSOS DE
LETRASUERN
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Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
3 PELOS FIOS DO DISCURSO PEDAGÓGICO: O PROCESSO DE ENSINO DA
ESCRITA NOS CURSOS DE LETRASUERN
O labirinto da escrita não é obra de um único
arquiteto, de um só tecelão, porque os fios urdidos
do discurso que sustentam o seu alicerce,
principalmente aqueles do discurso pedagógico,
foram fortificados por muitas vozes e diferentes
sujeitos em diferentes lugares. (Freitas)15
Para responder a questão que suscita essa pesquisa os dados foram
analisados à luz dos teóricos: Bakhtin (1992, 2002), Riolfi (2008) Perelman e Tyteca
(1999) Marcuschi (2008), Rastier (2000), Souza (2008), Freitas (2008), Gregolim
(2003), Antunes (2003), Geraldi (1995) e Pécora (1999), dentre outros que dão
sustentabilidade a esse trabalho.
Para tanto, estabeleceu-se como foco de análise o discurso pedagógico
circundante no contexto da sala de aula, marcado nas transcrições das aulas
observadas, bem como o discurso da professora, presente na entrevista
(documentos existentes no Banco de Dados do PROCAD/UERN). Ambos
apresentam como atores do processo ensino da escrita, alunos e professora.
Assim pode-se afirmar que a análise do conjunto das respostas é aqui
representada por três categorias insertas nos dados, são elas:
1. Discurso.
2. Ensino.
3. Escrita.
Nessas categorias teóricas estão implícitas as categorias empíricas advindas
da pesquisa documental, especificamente das questões e itens presentes no roteiro
da entrevista e as unidades de análises, obtidas das respostas da entrevista e
contextualização interpretativa das transcrições das aulas observadas.
14
FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, epígrafe escrito para este trabalho, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Através dessas análises têm-se clara a compreensão do processo de ensino
de escrita através do discurso pedagógico do professor para a construção ou
re(construção) de valores, conhecimentos e saberes.
Convém esclarecer que, no caso da UERN, Didática da Língua Portuguesa é
uma das disciplinas de MELPs, objeto de estudo ainda em construção conceitual.
3.1 ENSINAR A ESCREVER: UM DESAFIO QUE PERPASSA A FORMAÇÃO
ACADÊMICA
A escrita é, indiscutivelmente, uma modalidade específica da língua, na qual
se fazem presentes o contexto, a intenção do escritor e o tópico sobre o qual se
escreve e ainda um interlocutor invisível aos nossos olhos que faz, a todo o
momento, o seu julgamento: ora entende, ora condena, mas que, na verdade,
complementa o trabalho de sujeito-autor.
Nessa perspectiva, lapidar a escrita exige esforço, disponiblidade,
conhecimento e muito trabalho, pois ao aceitar tamanho desafio precisa-se ter a
consciência de que a escrita está imersa num emaranhado de contextos que precisa
ser percorrido e explorado a fim de que se possa entender a eficácia de cada fio
construtor dos nós que a tecem.
Assim, antes de se pensar em escrita pensa-se em linguagem como
habilidade interativa, uma necessidade do homem que o leva a ativar complexas
potencialidades intelectuais interrelacionadas, com a intenção de desenvolver-se
intelectual, social e pessoalmente, prática que faz evoluir a escrita dentro dos
processos de reprodução, produção e criação, edificados através de registros e dos
papeis de locutores e interlocutores que se complementam nessa construção de
memórias e identidades pela reflexibilidade, pela intervenção pedagógica, pela
articulação de conhecimentos, pela qualidade da seleção das atividades e
conteúdos e, ainda, pela formação daquele que medeia esse processo complexo, e
interativo que se vê.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Figura 6 - Elementos constitutivos do ensino da escrita
Fonte: FREITAS, 201216
A figura 6 aponta para os caminhos que o professor precisa percorrer para
trabalhar “o processo do ensino da escrita” no contexto da sala de aula. Extraída dos
constructos implícitos nos estudos de Gregolim (2003), Antunes (2003), Geraldi
16
FREITAS, Luzinete Cesário de Araújo. Maio/2012
ESCRITA
Vocabulário Construção
Objetividade Clareza Concisão Produção de sentido
Cautela Editabilidade
Audiência
Envolvimento
Ausente Desconhecida
ESCRITA ESCRITA
Consigo Com a realidade
Ausência de artifícios paralinguísticos
Distanciamento
Planejada e coordenada
Singularidade
Variedade Nível Frase Oração
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
50
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
(1995) e Pécora (1999), parte-se do pressuposto de que a escrita se estrutura a
partir de dois pilares, quais sejam “vocabulário” e “construção”.
O primeiro se processa através de variedade disponível na língua e está
classificado em níveis que atendem as variáveis socioculturais do autor. O segundo
perpassa o nível da palavra, chegando à frase e à oração, devendo, por isso, ter um
grau maior de complexidade, ser bem mais elaborada e interconectar-se entre si e
com o primeiro para construir o limiar do ato de escrever, em um movimento que
começa a se edificar no decurso de um “processo criador” (BAKHTIN, 2002, p.348-
349) que exige do autor “cautela” - quando da escolha do vocabulário para uso na
língua porque as palavras, embora materializadas, não são mortas, movimentam-se,
criam sentidos, vivem e produzem vida – e “editabilidade” como registro do discurso
produzido pela reflexibilidade que promove a própria formação do sujeito, através do
seu diálogo interno.
Percebe-se que os elementos supracitados fundem-se para projetar o
“envolvimento” do autor com o seu público via “audiência”. Nesse momento, o autor
se desprende de sua escrita, pois dela já não tem mais o controle, uma vez que ela
está disponível ao julgamento da audiência que o faz sob critérios próprios, sem a
interferência do autor que, embora imprima sua voz no texto, permanece ausente e
desconhecido no cenário da construção de sentidos do outro (falante ou leitor) pela
interpretabilidade da audiência.
Aqui o autor não dispõe de artifícios paralinguísticos, por isso, talvez recorre a
outros tipos de conhecimentos, tais como: lingüísticos, filosóficos, culturais, sociais e
pragmáticos, sem perder de vista as dimensões constitutivas do enunciado, para
conectar-se ao mundo do leitor e com ele instaurar a interlocução, uma ação que
foca a contiguidade e aponta para o desacomodar de posições cristalizadas, onde
eclode então o “saber construído por meio da palavra” (BAKTHIN, 2002, p. 37), que
se processa através da relaçãointenção do sujeito com o meio e a conseqüente
internalizaçãoapropriação da cultura (VYGOTSKY, 2000, p.48).
Ainda percorrendo as trilhas do processo de construção da escrita, o autor
distancia-se de si mesmo e da realidade para planejar e coordenar o ato de escrever
sob a égide da objetividade, clareza, concisão, produção de sentidos e
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
51
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
singularidade, porque assim ele dá forma ao objeto estético da escrita, possibilitando
o princípio da relação criadora do autor, podendo ser sinalados pela escrita não
como um indivíduo singular, mas como um indivíduo plural de eus.
Todos os procedimentos mencionados e presentes no exercício do escrever
escoam para um contexto mais amplo: o do apreender a aprender a escrever
enquanto participante “do objeto da aprendizagem e agente do seu próprio saber”
(DEMO, 1997, p. 45) na constituição do sujeito como ser social.
Trabalhar com a escrita exige dos professores disponibilidade para refletir
acerca de todos os elementos supracitados, pois teoria e prática devem andar
juntas, uma vez que são elas essenciais à relação ensino-aprendizagem. Assim a
escrita, para dar conta do caráter dialógico imerso em si, necessariamente,
possibilita o diálogo entre interlocutores, assim como o diálogo entre discursos, pois
dessa forma, atende aos princípios da dialogicidade.
Sob essa ótica o professor, principalmente o de nível de superior, professor-
formador, supõe-se que tenha a audácia de pensar a escrita em uma perspectiva de
“trabalho” e não mais de “apenas cumprimento de tarefas propostas”.
Talvez em virtude dessa exigência, provocada pelas mudanças histórico-
sociais é que o ensino de língua e os cursos de formação exigem, cada vez mais,
um professor dinâmico, reflexivo e flexível, responsável, capaz de desenvolver
competências e habilidades, repensar conceitos e não ter medo de transpor a
barreira do incógnito. Um professor que busque no conhecido, o desconhecido e
junto com o aluno investigue-o, explore-o, vire-o pelo avesso e não aponte
respostas, construa indagações e pressuposições ao longo da trajetória de pesquisa
para que as pistas de reflexibilidade se multipliquem, alargando as possibilidades de
construção de conhecimento.
Para se avançar nas análises voltadas ao processo de ensino da escrita,
versa-se sobre a questão da reescrita, procurando entender como as discussões
acerca do subtema em foco acontecem em sala de aula.
Eles dizem que eu sou chata nessa questão da escrita, porque eu escrevo muito nas
provas deles, porque eu risco muito nas provas, porque é horrível você fazer um
trabalho, e depois você devolver todo riscado, porque nossos planos nós já
apresentamos e achamos que está bom, já leva pra casa todas as observações que a
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
gente tem que refazer e trazer na outra, isso aconteceu hoje a medida que eles iam
apresentando eu já ia logo riscando como eles dizem, e eles já iam levando pra fazer
esse processo de reescrever (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
A escrita conforme se observa na fala da professora é um trabalho complexo,
que, realmente, dá trabalho, não somente a quem escreve, mas também aquele que
se dispõe a intermediar ensino, escrita e aprendizagem. Daí a grande necessidade
de o professor entender que o seu papel na história do ensino da escrita é o de fazer
com que o aluno entenda que esse processo percorre um caminho de idas e vindas,
ou seja, escrever exige, indiscutivelmente, que se volte vez por outra ao texto para
encaixar nas falhas, pensamentos recontextualizados e abrir mais falhas,
oportunidades geradoras de alteridade, de construção de novos conhecimentos,
visto que “falando, ouvindo, lendo, escrevendo é que vamos incorporando e
sedimentando os padrões da língua” (ANTUNES, 2009, p.174).
Lapidar a escrita não é colocá-la apenas dentro dos conhecimentos
epilinguísticos e ou das normas exigidas pela língua, certamente, é criar
possibilidades de encontro, de desencontros e de retorno a novos encontros entre
sujeito-autor, sujeito-leitor-mediador, conhecimentos comuns e incomuns e práticas
de vivências culturais, sociais, históricas e ideológicas.
Em conformidade com o discurso da professora, a escrita não é trabalhada de
forma pronta, acabada e mais, ela passeia por várias áreas e dialoga com vários
autores, tais como: Marcuschi, Basti, para mesclar teorias e pensamentos e
fundamentar o seu trabalho, o que lhe permite construir conhecimentos para si e
auxiliar na construção de conhecimento e de escrita de seus alunos, principalmente,
quando ela corrige a primeira versão do trabalho prático e a devolve ao aluno,
sugerindo-lhe a reescrita.
Para Marcuschi (2001a, 2001b) as relações de continuidade, fundam-se nos
gêneros textuais: “as diferenças entre fala e escrita se dão dentro do continuum
tipológico das práticas sociais de produção textual e não na relação dicotômica de
dois pólos opostos. Em conseqüência, temos a ver com correlações em vários
planos, surgindo daí um conjunto de variações e não uma simples variação linear”
(MARCUSCHI, 2001a, p. 37, destaque do autor)
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Figura 7 – Relações de continuidade fala/escrita em relação a gêneros textuais
Fonte: (MARCUSCHI, 2001a, p. 38).
Como fica subtendido, através da figura 7, no cerne dessa ação, de caráter
didático-pedagógica é cabível ao professor examinar, cautelosamente, os textos dos
alunos, observando as devidas e necessárias estruturas que os compõem (sintática,
semântica, morfológicas e até estilística e linguística), pois ao voltar ao texto o aluno
o reproduz, dá-lhe uma nova redação.
Esse acontecimento novo de dimensão significativa faz com que o aluno
perceba que escrever é trabalho, é construção de conhecimento, logo ele, enquanto
sujeito do ato de escrever, internaliza regras de composição de gêneros textuais e
avança nas condições de domínio da modalidade escrita.
A saber, a reescrita é uma intervenção de caráter interativo e dialógico, é
também um instrumento poderoso de interação entre professor e aluno, mas as
reclamações deste parecem ter uma fundamentação lógica se vistas pelo viés dos
erros superficiais como os de correção de ortografia e substituição de algumas
palavras por outras.
Outro motivo que pode leva o aluno a reclamar da reescrita é o fato de que,
nas instituições de ensino, ainda é muito comum o aluno escrever apenas para
atender a uma solicitação do professor, nesse caso a reescrita é ineficaz e cega
porque o aluno não foi convidado a repensar a escrita inicial mediante um propósito.
Sem dúvida, pela via de reescrita o aluno (autor) repensa os dados ou ideias
expostas, indagando a si próprio sobre a funcionalidade da sua escrita, via
argumentações, exposições e leituras de outras realidades, refacção que faz parte
do processo de reescrita e é ferramenta básica que não se pode inibi-las. Ao
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contrário, elas devem ser ensinadas, uma vez que tanto o aluno quanto o professor
são chamados a escrever sem preconceito, sem constrangimento, mas com
cuidado, conteúdo significativo e responsabilidade, por isso
Num processo de evolução da prática educativa, a unidade teoria-prática tem-se constituído uma preocupação fundamental das ciências pedagógicas como tentativa de interligação e superação da aparente dicotomia presente na intervenção pedagógica. Embora seja consenso entre os estudiosos que inexiste essa dicotomização, sabemos, porém, que para se fazer valer esse pressuposto é necessário que, como mediadores desse processo, estabeleçamos um confronto permanente entre os conhecimentos teóricos assumidos que justificam a nossa prática pedagógica. (SAMPAIO, 2002, p. 56)
Nessa perspectiva, cabe ao professor deixar bem claro para o aluno que a
análise daquilo que foi escrito considera se os objetivos foram alcançados, se há
coesão, clareza, coerência e concisão no desenvolvimento das ideias, sequenciação
entre os vários segmentos do texto e se não houve desvio da temática em pauta.
Tudo isso faz menção à reescrita e requer do professor uma mudança de
postura pedagógico-avaliativa, visto que no plano de seu campo profissional ele
mudará de nível, ou seja, liberta-se do olhar preconceituoso, tradicional com o qual
avalia um texto e passa a ter um olhar voltado à pluridimensão do ensino e da
aprendizagem, oferecendo ao aluno o poder da palavra, da criticidade, da
argumentação, da boa, gostosa, autônoma e singular escrita.
Eventualmente se essa escrita parte da observação dos fatos e das
discussões desses fatos, obviamente, dependendo da capacidade argumentativa, do
conhecimento prévio de quem escreve, transpõe os “restos metonímicos do discurso
do outro” (RIOLFI, 2007, p.32), adentrando no campo da escrita vista como um
trabalho, pois revela um Eu inconsciente que pode ter sido acordado pela voz do
outro (professor) para expressar pensamento em conformidade com o acervo
cultural e a ideologia político-social que postula.
Assim começa a gestação da escrita criativa, “aquela que perpassa o campo
da subjetividade do escrevente e se desfaz de algumas máscaras sociais” (RIOLFI,
2008) e não a reprodução do pensamento do outro, mas isto só acontece na escola
(universidade) quando há entre os sujeitos (alunos e professor) interação, confiança
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
e vontade de fazer a diferença e transformar as forças internas e externas com as
quais se convive. Nesta nova empreitada, todos os sujeitos estão dispostos e
expostos às críticas. É preciso ter coragem.
Associando o dito com o graficamente representado, encontra-se ainda na
fala da professora resquícios de uma escrita planejada e coordenada, que desde o
seu princípio apresenta uma rede de significação que vai além de “apenas uma
versão”, tendo em vista que todo sujeito-autor é possuidor de uma “audiência”
ausente e desconhecida, que o faz se distanciar, no processo da escrita, na maioria
das vezes, da realidade e de si mesmo.
Esse distanciamento favorece tanto o sujeito-autor quanto o sujeito-mediador-
leitor, pois a interação entre ambos se estabelece com maior afinco nesse vazio e
daí tanto um quanto o outro começa a trabalhar a escrita criativa, pois
[..] vai começar o (inaudível) quer dizer ele vai selecionar seu objeto de pesquisa, e ele vai ler textos, ele vai ler alguma coisa pra fundamentar aquilo que ele quer trabalhar, e no final nem ele vai escrever nem ele vai passar por esse processo transcrito como eles dizem, que é reescrever depois do olhar critico do professor, né? E aí esses trabalhos, eles ficam muito felizes quando eu chego e digo: gente! Vocês vão fazer em dupla. Aí eles dizem oba! Ou dependendo do tamanho da turma às vezes eu até imprimo/ aí eu digo, mas não se animen muito não, porque vocês não sabem por que eu estou pedindo pra vocês fazerem assim: aí eles dizem por quê? Pra que é que eu quero esse artigo. É por isso que eu quero em dupla ou em trio, porque eu vou ter condições de ler todos bem lidos, e apontar melhorias em cada um desses trabalhos (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
A preocupação da professora em fazer com que o aluno possa, realmente, ter
uma formação bem alicerçada pode ser percebida ao longo de toda a entrevista. É
perceptível, ainda, que ela prima pelo diálogo, pela interação, pela intervenção.
Exige do aluno que ele seja capaz de fazer com autonomia o seu trabalho, mas lhe
fornece condições para tal e chama sempre a atenção do aluno para que ele tenha
consciência de que a aprendizagem da e para a vida está além da universidade, por
isso ele precisa estar bem preparado para enfrentá-la.
Entretanto, a professora é feliz ao usar a expressão “reescrever depois do
olhar crítico do professor”, uma vez que cabe ao professor, mediante a concepção
de reescrita, fazer com o aluno reflita acerca da sua escrita, principalmente, de como
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melhorá-la, auxiliando-o a tornar-se sujeito-autor-constituído, expressando assim
singularidade.
Por este viés a reescrita passa a ser um ato positivo que altera o nível de
aprendizagem do aluno, visto que propicia ao aluno autonomia e autoridade
tornando-o, inclusive, capaz de alterar os prováveis sentidos contidos no texto,
reafirmando-os, refutando-os ou reconstruindo-os.
É importante saber que o fato de o professor lê o texto do aluno e “apontar
melhorias”, não dá conta da tessitura que há por trás do processo de reescrita.
Nesse caso, o professor tende mais para o processo de correção do que para o
processo de reescrita, visto que essa requer acompanhamento de cada versão
escrita.
3.2 DISCURSO PEDAGÓGICO E ESCRITA: UMA REDE DE RELAÇÕES
Vive-se numa sociedade que define a escrita como condição essencial e
indispensável à inserção social do sujeito, mas que nega ao sujeito-autor, condições
suficientes para que o seu dizer faça história. Entretanto se a escrita funciona como
ponto de “articulação entre língua e história, discurso e sujeito” (AGUSTINI &
GRIGOLETTO, 2008, p.12), tendo como equilíbrio a singularidade e a alteridade,
quais razões nos levam a falarmos de escrita e oralidade de forma distinta, como se
o sujeito da escrita fosse um e o da oralidade fosse outro Ao separarmos, sem
escrúpulo algum, tais modalidades da língua, que sujeito apagamos, que sujeito
priorizamos Na esfera do ensino, por que diferenciar escrita e oralidade,
trabalhando-as soltas, descontextualizadas, sem estabelecer relações entre as duas
modalidades
Acredita-se que o discurso da escrita vai além da materialização do texto, pois
nele está contido, dentre muitos aparatos o enquadramento de sentido e a posição
de quem o produz. Assim sendo, escrever é mais do que transpor para o papel
argumentos, teses, pensamentos, dentre outras substantivações que se possam
atribuir ao termo, pois temos liberdade para usar a língua de maneira relativa, e
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também limitada, considerando as injunções implícitas na socialização para a qual a
língua está à disposição e a quem serve.
À margem dessa concepção, muitos são os professores, principalmente de
língua materna que, nesse jogo de empurra-empurra, fazem com que os gêneros em
circulação percam a sua especificidade, bitolando-os e os levando para o aluno
como modelos iniciados, prontos e acabados. É nas sombras destas atitudes que se
esconde o profissional e se faz com que o aluno deixe sua identidade pessoal e
assuma outra que não lhe é própria, “de um grupo amorfo”. (ANTUNES, 2009, p.
103)
É partindo desse princípio que se anula um sujeito, negando-lhe o direito de
planejar, produzir e até criar seus discursos, seja ele da escrita ou da oralidade e
depois ainda o condenamos, quando para justificar as mazelas metodológicas,
teoriza-se que o aluno afeiçoa-se mais à oralidade porque é uma instância da língua
com a qual ele tem mais proximidade. Percebe-se que ao agir assim, atribui-se ao
aluno todo o fracasso da aprendizagem e se sai pela tangente, deixando de assumir
muitas das responsabilidades cabíveis aos profissionais.
O professor-formador de cidadão é um profissional qualificado, versátil, não-
prepotente, visto que no discurso da oralidade ou da escrita, é preciso que se pense
na função social da linguagem, voltada à produção e à socialização do
conhecimento, uma vez que “falando, ouvindo, lendo, escrevendo é que vamos
incorporando e sedimentado os padrões da língua” (ANTUNES, 2009, p. 174).
Entretanto, tanto o discurso da escrita quanto o da oralidade, no contexto da
sala de aula, apresenta-se parcial e preconceituosamente, pois a maioria dos
profissionais ao trabalhar tais modalidades utiliza-se do próprio discurso para falsear
as ações do fazer pedagógico com as duas modalidades de discursos citadas e
rotularem o aluno de incompetente e incapaz.
Faz-se isso com tanta naturalidade que se oculta um detalhe que, apesar de
pequeno, faz toda a diferença: diz-se que assim ensina; tem-se método
contemporâneo que atende às exigências da atual sociedade, fundamenta-se em
teorias também modernas, leem-se os melhores autores no assunto; estabelece-se
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um diálogo interativo com o aluno em sala de aula acerca do assunto abordando
questões relevantes, exercita-se dado conteúdo, mas por que o aluno não aprende
Alinhando essa discussão às categorias de interação e construção de
conhecimento, traz-se a oralidade para essa rede de relações na tentativa de
entender o trabalho da professora de Didática com a língua, descrito no próximo
fragmento:
Na sala de aula é assim/ o que é trabalhar a oralidade lá no semestre? Lá é assim levar música hoje, né? vou levar (inaudível) aí leva cidadãos (professora sorrindo) leva Asa Branca né? é impressionante e depois é pedir a opinião dos alunos, se restringe basicamente a isso. [...] Marcuschi é a maior autoridade mesmo para discutir essa questão da oralidade. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
As asserções colocadas pela professora trazem à tona manifestações que
revelam incoerência no modo de ensinar, pois desviam o aluno da construção do
saber, restringindo-se aos simplismos do exercício da atividade oral, impedindo-o de
construir formas de expressão que possam servir-lhe em situação de comunicação
específica, onde seja considerada, inclusive, a adequação da resposta verbal.
Não se queria investigar como se processava a oralidade, vertente do
discurso pedagógico em outra sala senão a sua, mas percebe-se que a professora
deslocou-se da posição de professora informante, convocada a conceituar a
oralidade, para mostrar uma metodologia de ensino que quase anula o trabalho com
a oralidade no contexto da sala de aula.
Talvez esse discurso advém também da sua experiência no ensino
fundamental. Fato é que ela fugiu à questão, deixando obscuro o conceito de
oralidade embora aponte Marcuschi como autoridade no assunto. Marcuschi é um
teórico ausente no contexto da sala de aula investigada, no sentido de detectar as
dificuldades de escrita e elaborar estratégias para superá-las; logo, o teórico
presente é o professor diante de um auditório presente, capaz de interagir e
enriquecer a rede de conceitos e significações posta em pauta.
Se deixado à margem, o discurso da oralidade tende a enfraquecer e se
distancia de um processo de aprendizagem mais sólido, contextualizado, interativo,
uma vez que se infunda em falares que se perdem na vaguidão da sala de aula e
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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apresenta um nível de informatividade mínimo à ampliação da prática discursiva, da
percepção dos fenômenos lingüísticos, filosóficos, dialógicos, enfim, da atividade
interativa enquanto âncora do ensino de língua materna.
Mas essa neutralização do discurso pedagógico enquanto rede de relações
não se limita apenas aos ensinos fundamental e médio, ela chega à universidade,
pois, embora tida como uma instituição propícia à criação e à inovação de saberes,
os universitários sempre são orientados a falar em nome de alguém, ou seja,
priorizando apenas a alteridade em detrimento da singularidade. Essa é também
uma das muitas e disfarçadas maneiras de dizer: “você não tem competência
linguística e pragmática para expor e argumentar acerca de determinados assuntos”
ou ainda “tem uma autoridade que já fala sobre isto”.
Essa pode ser até uma ação corriqueira, mas inóspita como formadora de
identidades, pois, nessa situação, apenas se faz reproduzir pensamento de autores
considerados renomados no cânone acadêmico, quando muitas das vezes quem
reproduz essas vozes, sequer com elas, concorda. Tal comentário não aponta
adversidade à alteridade, até porque “o sujeito é também alteridade, carrega em si o
outro, o estranho, que o transforma e é transformado por ele” (CORACINI, 2007, p.
17), o que não parece soar bem, é que no decorrer da vida acadêmica se fique o
tempo todo e todo o tempo escrevendo e ou falando o “que outros dizem ou
disseram” sobre determinada temática, porque se pode pensar e se tem capacidade
de expor pensamentos. A universidade deve formar pessoas que pensam para agir
e não que reproduzem pensamentos e agem em nome deles.
3.2.1 A interação no contexto da sala de aula: processo de construção de
conhecimento
O discurso pedagógico do professor se constitui a partir da interação que se
estabelece entre o cruzamento de diversas e diferentes vozes, nas quais se fazem
presentes conceitos e visões de mundo dos interlocutores, imersos numa cadeia de
significação, por isso, acredita-se que o texto enquanto lugar onde repousa a
materialização do discurso seja, também, desse uma extensão, mas uma extensão
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reconstruída e ressignificada pelo desenvolvimento da competência discursiva e
linguística.
Assim toda aprendizagem está impregnada de interação e, provavelmente, de
afetividade. Ao pensar especificamente na aprendizagem escolar, diz-se que a trama
tecida entre alunos, professores, conteúdo escolar, livros, escrita, etc, não acontece
puramente no campo cognitivo, mas permeia relações diversas.
O trecho abaixo reproduz parte da aula da professora informante. Nele,
professora e aluna refletem acerca de alguns elementos presentes num planejamento
de ensino
Porque de certa forma no planejamento, vocês dão essa resposta. E quando vocês colocaram, eu já mim preocupei, de onde eles retiraram esse gênero textual aqui, certo? `[...] mas uma entrevista, uma reportagem, pode ser um texto informativo né? Mas aí no plano de vocês vem dizendo em algum momento, cadê? (PROFESSORA) Está lá em baixo, notícia em casa. Certo? (ALUNA 1) [...] Vocês já teriam que rever esse segundo objetivo, né? Que é conhecerem o gênero textualmente informativo né? Eu acho que de certa forma vocês estão confusos até quanto a esse... (inaudível) textuais, né? Esse grau de informatividade, grau de informatividade todo texto tem né? (PROFESSORA) Com certeza. (ALUNA 1) Pronto, e às vezes, nós pecamos no texto, ou por não colocarmos o número de informações suficientes, ou por colocarmos informações demais. Então a informatividade todo texto tem. Então, o ideal aí, é que vocês privilegiassem, por exemplo, a reportagem, né? Ou gênero notícia. Vocês estão lembrados na aula passada, aquele planejamento sobre propaganda que eu trouxe; que eu disse que comecei a trabalhar com dois gêneros, depois eu vi que não era ideal, né? Porque trabalhar um gênero, é trabalhar as condições de produção e funcionalidade desse gênero, né? Qual é o propósito comunicativo? Eu acho que aí onde vocês estão confundindo, né? O propósito comunicativo desse texto aí, que a gente não conhece, talvez seja informar. (inaudível)... aí é o propósito comunicativo do texto. (PROFESSORA) : É ele traz... É assim: ele traz tabelas, traz curiosidades, traz imagens; traz é imagens dos animais, por curiosidade, e traz muitas informações, ele é bastante rico em informações. E no caso, pra caracterizar o gênero, ele... (ALUNA 1)
Fonte: Transcrição da observação
É perceptível no trecho ora apresentado que a sala de aula é um cenário no
qual o discurso se manifesta em situações reais de interação social, caracterizado
por uma linguagem não-linear, múltipla, pautada nas relações dialética, dialógicas e
humanas, onde se inscreve a heterogeneidade, a polissemia e a argumentação, pois
aluna e professora compartilham conhecimentos, mutuamente. Ao passo que a
professora aguça a memória mnemônica da aluna, ela começa a fazer inferências
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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rumo ao conceito de gênero textual, informatividade, propósito comunicativo. As
orientações propostas pela professora para a reescrita do objetivo também se dá de
forma sutil, e faz com que a aluna entenda que através do processo de reescrita ela
irá melhorar aquela escrita e fazer se entender por ela. É um aprendizado interativo,
dialógico, onde a simetria se manifesta em um grau instável de poder.
Nesse sentido, afirma-se que o discurso pedagógico enquanto meio que
proporciona reciprocidade entre os locutores assume uma nova postura, não mais
podendo ser considerado como autoritário uma vez que faz gerir entre o
autorfalante, o leitorouvinte e o tema do discurso novas possibilidades de
aprendizagens, de ressignificação da temática exposta.
Essa nova configuração do discurso pedagógico rompe com o tradicionalismo
pedagógico e faz ascender o desejo de se ter um ensino mais sólido, mais dinâmico,
mais atraente, pois professor e aluno, com direito a vez e voz, certamente, sentir-se-
ão mais valorizados, abertos ao diálogo, pois como bem define Bakhtin (2002, p.38),
“o ser humano é dialógico por natureza, a linguagem só se constitui através da
relação eu-tu, não existe comunicação fora da perspectiva dialógica”.
Por esse viés, acredita-se que a universidade enquanto instituição voltada ao
ensino, pesquisa e extensão torna-se o espaço ideal para que se contemplem as
discussões acerca de uma escrita interativa, tecidas por fios de muitos outros
saberes e discursos, pois formar professor – papel da universidade – requer leitura e
escrita na academia, uma prática que exige, por parte dos professores formadores,
uma conduta ativo-transformadora e interacional no processo pedagógico.
É preciso se permitir desatar os nós da escrita, depois trançar e traçar
estratégias voltadas à qualidade da formação de professores, dado que o trabalho
com a escrita requer compromisso. É um desafio não apenas para o aluno, talvez
seja um desafio maior para o professor, pois como mediador entre ensino-
aprendizagem, ele provoca o aprofundamento da teoria, situando a escrita como
atividade constitutiva de sujeitos e identidades.
Estabelecendo um elo entre as palavras do autor e o que aconteceu no
contexto da sala de aula, quando das observações gravadas, lugar de onde se
extrem os trechos abaixo, pode-se perceber que a professora, nas suas aulas, abre
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espaço para que os alunos questionem, exponham as suas opiniões acerca de
assuntos variados. Ela não conduz a aula sozinha, ela interage no contexto da sala
de aula, isto torna a relação professor-aluno menos assimétrica. Isso se evidencia
nos trechos abaixo, pois as alunas se colocam de forma livre, não havendo a
interferência da professora:
No caso desses recursos característicos que a gente, nesse sentido pelo menos o que a gente quis colocar, na poesia vem focar, tanto esse lados estruturais, né? Esse lado mais; o que é um poema? O que é que... digamos assim, diferencia um poema de uma poesia? Aquele sentimentalismo, aquela expressão toda que tem a pessoa que escreve
o poema Então foi mais ou menos isso que a gente quis, não ficando, é claro que o contexto, essas características estruturais de fora, mas o mais importante é vocês sabem o que se chama cordel, né? Aqueles livrinhos pintados na corda que levaria os alunos a olhar o que eles mais se agradassem. A partir dali eles iam ler aquele cordel, digamos assim, e tentar fazer outro de acordo com sua vivência, né? Às vezes, as literaturas de cordel são difíceis, não é? (ALUNA 1) Eu acrescentaria assim: acho que ficaria divertido pra eles também tentar trazer, Domingos Sávio, um desses cordelistas, porque ele começou a fazer cordel com quatorze anos de idade, já tem livros e eu acho assim uma atividade super interessante. Quem sabe, é tanto que ele já concorreu várias vezes e ganhou em primeiro lugar. E numa dessas vezes que ele foi, o pessoal se admirou bastante a questão da idade, porque ele começou com dezessete anos de idade e já escreve tão bem cordel, porque é coisa de gente mais idosa, né? Gente mais madura. Eu acho que uma pessoa mais jovem escrevendo cordel, trazer pra uma sala de aula pra expor, ficaria legal, ajudaria melhor os alunos a querer trabalhar isso. (ALUNA 2)
Fonte: Transcrição da observação
Os discursos supracitados expressam voz e pensamento de alunos no ato da
interação. Eles trazem à tona também elementos externos ao contexto da sala de
aula em que estão inseridos, mas estabelecem uma conexão entre o ensino em
níveis de ensino diferentes. Ambas primam pela valorização do outro e da escrita do
outro, tomando-a como ponto de partida para conceituar e diferenciar poesia de
poema, bem como para instigar em outros alunos a construção da escrita singular.
Nesse caso, percebe-se que a interação desloca-se, ou seja, não se estabelece
apenas entre professor e aluno, mas também entre alunosalunos e perpassa os
muros da universidade, chegando a outras instâncias, mas mantendo um caráter
singular: o de construir através do diálogo e do respeito aprendizagens sólidas,
porém, plausíveis de transformações sempre.
De acordo com Bazarim (2009) a interação entre professor e aluno tem
impacto no letramento dos estudantes. Como o processo de letramento não se dá
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apenas no ensino fundamental e médio, mas é um processo que decorre de toda a
vida, é coerente afirmar que a interação, no contexto de sala, inclusive na
universidade, prevê aprendizagem, e obviamente, como se utiliza da língua em
processo de simultaneidade, passa a ser “meioinstrumento de trabalho e o objeto
de ensino” (op. cit., p. 46).
Ainda conforme a autora, o processo de interação se dá atendendo às
perspectivas de maior ou menor grau de simetria, como se pode ver no gráfico
abaixo:
Figura 8 – gêneros e relação de continuum
Fonte: Bazarim. Interação, gêneros e letramento: a reescrita em foco. 2009.
Voltando para o contexto de produção da análise (sala de aula da UERN) o
processo de interação, no decorrer da aula observada atende ao critério “professor-
aluno” apontando para menos instrução e mais simetria, onde o interlocutor
(estudante) mostra-se interessado, desempenhando um novo papel interacional nas
discussões e, automaticamente, nas construções de saberes, assim a interação é
vista como um continuum e, é claro, que esse demonstra confiança mútua entre
professor e aluno. Esse fato aponta que sendo a aula um evento comunicativo
compreende “não somente o discurso e seus participantes, mas também o papel
desse discurso e o ambiente de sua produção e recepção, incluindo suas
associações históricas e culturais” (SWALES, 1990, p. 46 citado por SILVA, 2005).
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Os trechos das alunas aqui expostos são apenas amostras dos fatos que
ocorrem no contexto de produção daquela aula e que ultrapassam os limites do
continuum descrito por Bazarim, pois parece haver uma interação bem mais
acentuada entre os estudantes, isso não é uma negação da interação entre
professor e aluno, mas uma ressalva que clarifica a ideia de que a professora tem
uma concepção de interação pautada na interlocução e trabalha o contexto não
como pano de fundo da sua aula, mas como espaço de construção e troca de
saberes, o que se distancia das práticas escolares tradicionais, apontando também
para uma mudança de caráter interacional, que sinaliza a disposição da professora
em inovar. Mesmo assim, nesse novo padrão interacional é “possível identificar
momentos de conflito, perturbações, mas também de grande participação dos
alunos, o que evidencia a complexidade da interação em contexto de ensino-
aprendizagem. (BAZARIM, 2009, p. 52).
Repensar a escrita na universidade é fator determinante para os cursos de
formação docente, uma vez que o autor deve ater-se pelas prerrogativas “o que
dizer”, “para quem dizer” e “como dizê-lo” (GERALDI, 1995). Se assim pensada, na
universidade, a escrita apresenta traços de autoria, institui valor interacional, pois se
a linguagem é tecida no movimento das relações histórico-sociais, é complexa e
incompleta, conduz-nos à realidade óbvia de que “o incompleto na linguagem é o
lugar do possível, é condição do movimento dos sentidos e dos sujeitos” (ORLANDI,
2004, p. 71).
É exatamente neste espaço de movimento, neste lugar de possibilidades que
se enxerga a harmonia entre o discurso pedagógico do professor e a escrita do
aluno como momento de criação, de desassujeitamento, de interação menos
assimétrica, onde o aluno é seduzido a escrever e o discurso instrucional
proporciona a aproximação entre os interlocutores, ações capazes de revelar as
habilidades de escrita dos alunos apontando para o processo de andaimagem
mediado pela língua.
Isso faz com que se vivencie a escrita como prática social situada e
significativa, bem como oferece aos alunos os recursos lingüístico-discursivos a
serem utilizados em seus textos o que gera, em alguns casos, “uma relação de
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especularização entre a escrita da professora e do aluno” e, em outros, “estratégias
de retextualização” uma escrita como “atividade criativa e interativa”, fruto da
confiabilidade gerada entre professora e aluno, e provavelmente, da “relação que o
professor tem com a escrita de diversos gêneros” (BAZARIM, 2009, p. 239-249).
Entretanto, “para ampliar os mundos de letramento(s) dos alunos através da escola,
antes de tudo é preciso criar condições para a ampliação do mundo de letramento
do próprio professor” (BAZARIM, 2009, p. 249), realidade que, camuflada ou
desapercebida, permeia o contexto do ensino.
Nessa perspectiva, entende-se que discurso pedagógico e escrita são
modalidades de interação da linguagem que se completam, se interrelacionam e
passam a construir novos sentidos dentro de uma cadeia significativa que parte da
argumentação para sustentar aquilo que o autorleitor e ou ouvintefalante defende
de acordo com o seu posicionamento histórico-social e cultural. Isto torna possível “o
conhecer o outro”, adentra “no mundo do outro”, amplia os horizontes da existência
e estabelece vínculos e diálogos, pois tanto discurso como escrita variam de acordo
com os sujeitos, as situações e os contextos. Assim sendo, na universidade ou nas
escolas, o texto ultrapassa os fins avaliativos, visto que escrever supõe produção de
sentidos que advém da interlocução entre sujeitos. Só “então escrever é o modo de
quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando
essa não-palavra – e entrelinha – morde a isca, alguma coisa se escreveu”
(LISPECTOR, 1998, p. 20).
Então, acredita-se que o processo de interação no contexto da sala de aula
propõe maior interatividade entre aluno e professor, aluno e aluno e ainda entre
aluno e conteúdo, o que possibilita o amadurecimento do aluno nas diversas
possibilidades de construção do conhecimento.
3.2.2 Discurso pedagógico e escrita: vertentes da construção do conhecimento
Marco divisório entre a Pré-história e a História, a escrita surgiu em espaços e
tempos diferentes, mas já traz em sua essência a necessidade de interação entre os
homens.
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Cuneiforme, hieroglífica, ideográfica... processual, a escrita é um aprendizado
necessário, complexo e fundamental no processo de desenvolvimento, evolução e
qualidade da e na construção de conhecimentos, pois aprender a escrever, observar
e analisar a escrita do outro, bem como a sua é construir(se) (em)uma nova
inserção cultural que movimenta os processos de desenvolvimento social e
interacional do sujeito.
Entretanto, para se chegar a esse nível, é importante que já se tenha, bem
clara, uma noção de texto.
[...] minha ideia de escrita vem da noção de texto [...] Dessa concepção de texto que eu
tenho, o texto como unidade de sentido, o texto baseado nessa concepção de língua
como interação social, e tem que ter um interlocutor, tem que ter um processo, tem que
ter um propósito comunicativo bem definido, que tem que ter um nível de linguagem
bem adequado a esse interlocutor, né? que ele precisa se dar conta, que ele precisa ter
esse critério da informatividade desse texto, nem pecar por excesso e nem por e nem
por restrição, e assim, você vai recuperando. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
A fala da professora, ideologicamente, estilhaça a ideia de unilateralidade da
escrita, colocando-se em deslocamento e não resistência às práticas pedagógicas
inovadoras, dimensional e pautada na constituição de estratégias capazes de
conduzir professora e aluno a confrontarem saberes, repensarem e
reterritorializarem conceitos, tendo em vista o não assujeitamento, mas as reflexões,
ponto de partida que possibilitam ao aluno e professor trabalharem e se deixarem
trabalhar pela materialidade da escrita.
Assim, entender que a escrita, necessariamente, deve ocupar lugar
privilegiado na formação e na vida do professor - não com ares de superioridade em
relação a outras etapas também importantes, mas como um instrumento harmônico
e criativo na (re)construção do conhecimento - é uma das compreensões que
aponta para o fato de que o professor, se adepto de uma concepção
sociointeracionista da linguagem, entenderá que os signos internalizados, as
palavras e contrapalavras se articulam entre si, formando um elo ininterrupto, no
qual os meus pensamentos associados ao pensamento de outrem transformam-se
em discursos, que, após serem lapidados e expostos a atividades epilinguísticas e a
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materialização em texto, revelam a ação da linguagem pela e na escrita, pois “a
compreensão da linguagem escrita é efetuada, primeiro através da linguagem
falada” (VYGOTSKY, 1998, p.154).
Outrossim, compreende-se que a escrita desde os primórdios dos tempos
vem descortinando horizontes reveladores de evolução nos processos de ensino e
aprendizagem, bem como no processo de produção de conhecimentos, pois o
homem evolui à medida que se socializa, que interage com o outro, e com ele. Daí,
a linguagem toma novas dimensões, ocupa novos espaços e até variados e exóticos
suportes, se considerarmos que “escrever é, portanto, se mostrar, se expor, fazer
aparecer seu próprio rosto pelo outro” (MARIANI, 2006, p. 68).
Ao abraçar a escrita como uma prática social e cultural inegável à formação
do ser humano, principalmente, do professor, pois a escrita constitui identidade e
aponta a subjetividade, sendo, inclusive, instrumento essencial, tanto para o ofício
de pesquisador quanto para o avanço da produção de conhecimento, entende-se
que "formação é introduzir alguém ao passado de sua cultura; é despertar alguém
para as questões que esse passado engendra para o presente, e é estimular a
passagem do instituído ao instituinte”. (CHAUÍ, 2003, p. 12). Isto posto, a escrita, na
formação de professores, atende a perspectiva da teoria social crítica, ou seja,
formação como prática não mecânica, impessoal, a-histórica e linear. Assim,
... às vezes é muito difícil ser Professor do ensino, né? É muito difícil pela clientela né?
a clientela atenta demais! (todos sorriem) e exige também do professor uma boa
formação. Ele precisa ter segurança, ele precisa entender de literatura, precisa
entender de gramática/ ele precisa ser um Professor bem informado. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Realmente, “ser um professor bem informado” adentra no potencial formativo
da escrita e envereda nas interações mediadas pela escrita discursiva, o que requer
das licenciaturas, mais, especificamente, dos cursos de Pedagogia e Letras, um
olhar mais atento e audacioso voltado às práticas das escritas técnica, formal,
reflexiva, discursiva e narrativa, tendo como foco principal de discussão e tomada de
decisões aquilo que se aprende e se ensina, bem como a relação existente entre a
escrita e o professor, pois em muitos casos, o professor não escreve, mas exige que
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o seu aluno escreva, isto foge aos princípios da coerência ético-profissional e aponta
para o perfil de um professor, que no decorrer de sua formação acumulou
insuficiência de aprendizagem, deixando de apreender o objeto da escrita enquanto
constituinte de significados, propulsor de exercício contínuo. Isto posto, o professor
precisa estar bem informado, seguro, atento às mudanças e ter uma boa formação.
Por conseguinte, convidam-se todos educadores e educandos a refletir
acerca da escrita e produção de texto não como mesmice, mas como uma prática
social em que possam estar presentes quatro elementos básicos à transformação da
realidade social, no campo do ensino-aprendizagem: a valorização da diversidade, a
pesquisa, a inserção do sujeito na diversidade cultural e a construção da identidade
de sujeitos propositivos.
Nesse sentido e considerando as multiplicidades de saberes, valores,
culturas, escritas, leituras, pensamentos vivos em constante proliferação na
sociedade atual, é inconcebível acreditar que o término de um curso (graduação,
especialização, pós-graduação) é o passaporte para que se ensine, proveitosa e
produtivamente, a língua materna ou disciplinas relacionadas a qualquer área de
ensino. Esses cursos alicerçam as construções científicas, metodologias, teóricas e,
possivelmente, práticas, por isso não se concebe, nos dias de hoje, um professor
que não lê, que não escreve, que não pesquisa, mas que atua para formar cidadãos.
A prática do professor influencia a aprendizagem do aluno e as situações, que
ocorrem no contexto de sala de aula, impensadas quando da elaboração dos
currículos e ementas, delineiam o perfil do trabalho do professor, pois “o dia-a-dia da
sala de aula é quem vai ditando as normas” (PROFESSORA). Entende-se que o
“ditando normas” utilizado pela professora não tem um sentido pejorativo, ela ao
utilizar o termo clarifica e enfatiza que o professor atento às situações deem sala de
aula, dependendo do nível de seu conhecimento é capaz de construir um currículo
vivo, de convidar a si mesmo e ao aluno, a tornarem-se sujeitos construtores de
saberes e conhecimentos interligados em uma cadeia toda significativa, exponencial,
investigativa e, que, na incompletude do conhecimento, concebem o nascituro de
novos conhecimentos ou reformulam os já existentes, dando-lhes não apenas uma
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nova roupagem, mas cercando-o de novos sentidos geradores de mais novos
sentidos.
Cabe então aos professores sair do embelezamento apenas teórico ou
apenas prático e utilizando-se dos dois, no mesmo patamar de igualdade valorativa,
despir-se do medo de escrever (produzir, criar), e ser um produtor efetivo de textos
atento à relação entre conteúdo e forma e se perguntando sempre: que voz se
ocupa enquanto sujeitos do fazer pedagógico
Esse alerta é cabível também ao professor do ensino superior, obviamente
com algumas exceções, pois se no âmbito da universidade não se tem uma
preocupação com a pedagogia da escrita, é pouco provável que o futuro professor
que de lá sai com formação, não seja um reprodutor de teorias, inapto, por assim
dizer, ao ensino da escrita. Isto, geralmente ocorre, porque há um mascaramento
das informações dispostas no texto, em outras palavras, o texto é produzido para um
professor (na escola ou na universidade) que atribuirá uma nota para aquilo que o
aluno aprendeu (ou pensa que aprendeu). Esse por sua vez, mascara, na maioria
das vezes, as suas argumentações, para falar em nome da ideologia do professor,
exaltando-a. Quando não, o aluno recebe do professor um texto de apoio para poder
escrever o seu.
Há nesse tipo de produção, certamente, um apagamento parcial do
pensamento do aluno, uma grande desvalorização da sua capacidade de aprender,
raciocinar, argumentar, agir e brincar (com seriedade) com as palavras. Talvez seria
mais rico o professor dizer para o aluno que o texto é de “apoio”, e que o novo,
possivelmente virá através da interpretação, fruto das leituras, ou ainda, das
experiências do cotidiano do leitor inseridos naquele contexto
[...] infelizmente esses alunos, na maioria, eles ainda chegam na Universidade, com um nível de conhecimento e aprendizagem muito baixo, sabe? Não falo só de conhecimento lingüístico de mundo não/mas de conhecimento lingüístico, né? Dificuldade escrita, tem dificuldade de construir sentidos, [...] (PROFESSORA) [...] eles passaram/ ficaram o ensino médio todinho e o ensino fundamental estudando sujeito, predicado, advérbio, né? mas não perguntem muito não, porque eles não sabem o que é isso não, viu? (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
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Esses alunos serão, provavelmente, professores e, podem, posteriormente,
ensinar a seus futuros alunos também a apagar o novo, visível (invisível) nas
informações dos textos de apoio, afinal, a sua formação mostrou-lhes que é perigoso
enveredar por caminhos incógnitos, pois, ao ousar por eles seguir, corre-se o risco
de ser incoerente, de se deparar com o novo e não saber o que fazer diante da
descoberta, além do mais quase nenhum professor, nenhum aluno avalia suas
próprias falhas para nelas encontrar o palpável, o questionador; parece que teme
reformulá-las, porém, convém lembrar que o “erro, o incoerente, a falha” é um
espaço propício à reflexão, à (re)construção de conceitos e valores e também um
espaço de aprendizagens múltiplas.
É verídico e preocupante que muitos alunos cheguem à universidade com as
mais variadas limitações “de leitura, de escrita e conhecimento linguístico-textual”
como afirma a professora informante, entretanto essas dificuldades são extensivas
e, às vezes, arrastam-se desde as séries iniciais, no entanto acredita-se que a
Universidade precisa fazer com que esses alunos superem tais dificuldades e
passem a ver o texto como um construto que envolve língua como estrutura
acrescida de acontecimento discursivo, que apresenta configurações em contextos
específicos. Com isso, compreende-se que essas dificuldades são partes de um
processo de aprendizagem, podendo não ser sequer considerados como falhas,
mas como “espaço ainda não preenchido” na tentativa de se desenvolver uma tarefa
difícil, pois escrever não é fácil, como imaginam e afirmam muitos estudiosos e
pesquisadores.
Por outro lado, a asserção da professora, inocente ou não, acende uma
fagulha na qualidade do processo seletivo, executado pela própria universidade. Isso
posto, não se está duvindando da competência da universidade, mas querendo
entender a relação entre processo seletivo, ensino e conhecimento. Também não se
propõe que a universidade seja um ambiente de exclusão, mas a sociedade é um
tipo de tribunal que faz julgamentos sociais e ao ingressar na faculdade, a sociedade
espera que o indivíduo tenha domínio de algumas competências, a saber: leitura e
escrita. Se o egresso não as tem, terá muitas dificuldades para lidar com as
situações de aprendizagem na universidade, entretanto ele sai de lá “formado”, a
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universidade empenhou o seu nome nesse processo de formação e deu-lhe o aval
para atuar, profissionalmente, na sociedade. Entende-se assim, que ele (o formado)
está apto para tal.
A professora acrescenta ainda “que eles (os alunos) passaram o ensino
fundamental e médio estudando sujeito, predicado, advérbio, né? mas não
perguntem muito não, porque eles não sabem o que é isso não, viu?”, é uma crítica
que pode ser dividida, porque se o aluno não aprende, ele sozinho não é
responsável pelo seu mau desempenho, e nos níveis de ensino citados, os
professores que atuam são aqueles que passaram por uma formação, muitos na
mesma instituição de ensino superior que hoje detecta tal realidade. Com isso não
se está atribuindo culpa à universidade, aos professores ou alunos com
especificidades, mas mostrando que por esse fracasso na aprendizagem todos
parecem ser responsáveis.
Conforme o exposto, sente-se que a escrita deve deixar o patamar de
instrumento avaliador e assumir a grandiosa e complexa tarefa do aprendizado, que
surge do exame, da organização, da análise e da síntese de ideias feitas pelos
alunos e também pelo professor, pois nem sempre esse se posta como produtor.
Para isto, não deve a escrita ser ensinada de forma pronta, acabada, estática. Uma
receita, onde os ingredientes são postos um após outro, atendendo a medidas pré-
estabelecidas. Por isso as aulas de Didática da Língua Portuguesa, aparentemente,
possibilitam ao aluno repensar a sua escrita, haja vista que a ele apresenta-se um
repertório de estratégias, no qual se fazem presentes a reflexão pessoal, a auto-
organização e a interação intelectual entre sujeitos, não sendo enfadonha nem
insípida, uma vez que
[...] no geral as aulas acontecem, sabe que eu gosto de uma discussão sabe que eu gosto dessa disciplina, das oficinas que eu trabalhei até hoje, essa é a que eu falo menos. E aconteceram quatro aulas e em nenhum momento a gente ouviu um silêncio, porque os alunos conduziram a aula do começo até o final. Um grupo apresentava e os outros, não sei o que aconteceu com eles, parece que ele incorporou o professor, foi assim uma situação de chegar a deixar a gente lá no canto da parede, né?
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Então é uma aula que no geral acontece muito assim/ e eu gosto dessa parte, porque ela tem um caráter muito prático essa minha disciplina. Eu consegui da um caráter, mas no próximo semestre eu já consiga, eu já pensar em algumas modificações, porque não dá para ficar parado. Tem sempre que se modificar, não da para ficar acomodado. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
No calor dos questionamentos levantados em torno da escrita e a sua relação
com a professora informante, percebe-se que a construção de conhecimentos,
enquanto prática associada às diferentes linguagens e gêneros discursivos ainda é
muito opaco, no universo acadêmico. Entretanto acredita-se ser o professor
universitário, também, um agente de construção, visto que ele (o professor),
enquanto sujeito, tem o crucial papel de inserir a si e a outrem nas práticas sociais,
requerentes das habilidades de escrita, pois como bem coloca Heath (1982, p. 93) o
evento da construção de conhecimento evidencia qualquer “situação em que um
portador qualquer de escrita é parte integrante da natureza das interações entre os
participantes e seus processos de interpretação”, fato que deve ocorrer,
frequentemente, na Universidade, especificamente com maior ênfase na sala de
aula, espaço discursivo e polifônico.
As palavras da professora, no geral, apontam para um salto produtivo no
ensino aprendizagem, pois tanto ela quanto os seus alunos falam de posições
diferentes e alternadas através do diálogo estabelecido entre si, quando do decorrer
da análise do conteúdo proposto à discussão. Tanto aluno quanto professor vivem
uma dualidade situacional em que ambos medeiam a interação e provocam reflexão
acerca de juízos de valor ali presentes.
Esse fato impulsiona um salto na consciência e nas habilidades cognitivas, o
que permite a construção e a compreensão de raciocínios muito mais abrangentes e
complexos, o que provavelmente no campo da escrita transforma, profundamente, o
processo educativo. Por assim ser, “ensinar” a escrita exige esforço, muito trabalho,
paciência e, por que não dizer perseverança. Precisa-se ter em mente que a escrita
também está, intimamente, interligada ao tempo e ao espaço, pois os textos escritos
são registros conservados num determinado tipo de suporte, capazes de alcançar
distâncias ilimitadas, isto dá à escrita um caráter diferenciado que envolve
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significação, reflexão, diálogo, intertextualidade, criação e transformação da
realidade circundante.
Outro fator que influencia uma escrita autônoma, criativa parece ser a leitura,
visto que através dela se pode compreender com mais clareza os mundos existentes
e também interpretá-los, porém o ato de ler, no contexto acadêmico, ainda se
apresenta como um conjunto de práticas voltadas ao desenvolvimento da
potencialidade do sujeito. Não se nega, com essa afirmação que os universitários ou
professores universitários não leem, até porque uma afirmação desse tipo
caracteriza calúnia, mas vê-se que cada um preserva as leituras que as suas áreas
de ensino focam, ou seja, há uma preocupação ora em ler o autor que as referências
e ou professor indicam; ora a leitura limita-se, de forma superficial, para o
cumprimento de tarefas e ainda serve de apoio para a produção de algum trabalho.
A leitura vai além dessas situações e não deve ser descriminada da escrita, pois
ambas se complementam num todo harmônico, sendo indissociáveis, portanto, para
a produção de conhecimento.
Aluno e professor precisam ler mais, escrever mais, não apenas para cumprir
as exigências formais dos programas de disciplinas, mas para viver em sociedade,
além dos muros escolares, visto que é necessário e urgente “despertar nossos
professores e alunos para a formação lingüística de sujeitos epistêmicos, pois só
assim as dificuldades atuais diminuirão” (SILVEIRA, 1997, p.160).
Porém, é preciso lembrar ainda que um ensino, nesse patamar, exige “tempo
e provocação adequadas” (MACHADO, 2002, p. 55), voltados para a inserção do
trabalho com a leitura e a escrita de diversos gêneros textuais e condições reais de
produção, onde os agentes do processo educativo possam orientar e serem orientados
à produção de novos conhecimentos, uma vez que “orientar significa qualificar para
a autoria” (MACHADO, 2006, p.20).
Assim sendo, acredita-se que a escrita é bastante significativa no processo de
formação do professor, pois a esse profissional, nessa sociedade da informação,
cabe dominar os conhecimentos, escrever e produzir com eficácia, pensando o seu
trabalho como docente, discutindo e construindo sua ação pedagogia, além de
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tornar-se mediador entre essa sociedade da informação e seus alunos, fazendo-os
refletir sobre as informações e transformá-las em conhecimentos.
Por conseguinte, parece que se colocam nas mãos do professor todos os
sucessos e insucessos dos processos de ensino e aprendizagem, mas essa
premissa não é verídica, apenas entende-se que o professor tem uma missão muito
importante na sociedade; senão é ele o eixo sustentador de todos os grandes
edifícios sociais, é o alicerce sobre o qual os construíram.
Destarte, ao se pensar as práticas contemporâneas de sala de aula é preciso
ter um olhar atento, centrado na historicidade dos processos de práticas discursivas
enquanto constituinte de poder e mudanças sociais.
Assim, na interrelação do discurso pedagógico, tanto o aluno quanto o
professor medeiam cadeias de diálogo inerentes a micro e macroestruturas que
sustentam a tríade: ideologia, construção de sentido e interpretabilidade, frutos de
um conhecimento que se molda na tridimensionalidade da palavra quer oral quer
escrita, possibilitando a configuração de novos enunciados linguísticos que marcam
a posição do sujeito autorfalante, leitorouvinte através de marcadores
metadiscursivos textual e interpessoal, responsáveis pela tessitura das redes de
construção de sentidos atribuídas ao texto.
O recorte que ora se faz delineia, parcial e naturalmente, a concepção de
prática de ensino da língua materna internalizada pela professora e parece dar conta
da construção de conhecimento.
[...] E aí uma outra coisa me chamou a atenção nesse texto de vocês, eu vou ler o objetivo, pra que vocês entendam o que eu estou querendo dizer, né? Vocês colocam como objetivo: “despertar o aluno para o sentido do texto com o qual me contemple a nossa realidade, incentivá-los a expor suas próprias opiniões através da escrita”, né? É por isso que eu perguntava: lá no texto não me parece claro se oral, ou se é escrito, né? Porque o objetivo contempla apenas a escrita, não é? E quando vocês dizem: “despertar o aluno para o sentido do texto, (inaudível) ... contemple a nossa realidade. É onde eu falava. É a parte onde vocês se limitam a fazer perguntas que não está direcionada, com a nossa realidade, né? Mas está perguntando unicamente do texto, né? O texto em si, quando diz assim será que os animais sozinhos dariam conta de resolver esse problema, né? E depois, vocês propõem uma análise da estrutura e elementos do texto, e vocês colocam: “como está organizado o texto”? (PROFESSORA) [...] E aí depois vocês perguntam: “há traços da fala dos personagens”? Abrindo parênteses diz assim: “isso vai ajudar a ver que tipo de discurso predomina na narrativa”; eu não entendi! Eu não sei qual seria esse discurso que vocês estão falando,
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Fonte: Transcrição da observação
Pelo diálogo estabelecido, percebe-se que o trabalho da professora mescla
discurso, aprendizagem, escrita, reelaboração de conceitos e técnicas e envereda
pelo caminho do não-pronto. Ela segue fazendo questionamentos, indagando o
aluno, colocando-o na posição de interlocutor ativo, que opina, que reflete, que
orienta e é orientado. Essas ações são um convite a ambos (aluno e professor) para
aprender, reaprender e apreender elementos constitutivos e essenciais à escrita e à
formação de novas aprendizagens. Assim, aluno e professor, sujeitos na construção
do conhecimento, percorrem as trilhas do dado e do novo recorrendo a memórias
que os inserem no universo do outro.
Ademais “a nossa memória textual atua no tecido de nossos discursos,
ligando os contextos históricos e impregnando de sentido os textos que produzimos.”
(AZEREDO, 2007, p. 133). Assim sendo, é notório no discurso pedagógico a
presença da heterogeneidade mostrada, através de marcas explicitas no próprio
texto e ainda o jogo de referência que estabelece uma ponte entre o texto e o
mundo, entre um e outro sujeito discursivo, ação que postula a tese de que o
empréstimo traz em seu cerne o já-dito acrescido de um ainda não-dito, sendo que
nos entremeios deste já-dito e do não-dito, constroem-se novos enunciados, ou seja,
as singularidades, entretanto “é preciso evitar fazer da intertextualidade um desafio à
singularidade do texto, mas ao contrário colocá-la a favor dessa singularidade,
observando o modo como as vozes se fazem ouvir diferentemente, segundo seu
lugar nos textos” (SAMOYAULT, 2008, p. 133).
O diálogo acima representa uma orquestra de vozes que se faz perceber
através da cumplicidade, da redefinição de conceitos básicos, como os de objetivos
e ainda pela elaboração e escolha de “objetivos” inerentes à tarefa proposta.
Tal atitude enriquece a leitura, compreensão e produção textual, e mostra de
forma clara e concisa a construção de sentido no decurso das retomadas das falas
né? Quando vocês dizem há traços das falas dos personagens: seria aquela questão de discurso direto, discurso indireto, seria isso? (PROFESSORA) É a questão do discurso direto ou indireto (ALUNA 1) [...] É aí onde entra aquele papel das tipologias. Um texto de caráter informativo, provavelmente, ele vai puxar mais pra uma tipologia narrativa de caráter, ou aquela expositiva que Marcuschi fala; né? (PROFESSORA)
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tanto da professora quanto da aluna, da interatividade, e da intertextualidade que se
nota, embora de forma vaga e tímida garantindo o entrelaçamento de alusões a
inúmeras considerações armazenadas em nossas mentes, aproximando-se, ou
talvez, integrando-se a heterogeneidade constituída, que mostra como “se constitui,
em profundidade, em espessura e em tempo, um estilo ou uma linguagem”
(SAMOYAULT, 2008, p. 139). Isso fica claro nos fragmentos seguintes:
[...] porque a partir do ponto que ela pede isso aí, que ela especifica... (inaudível) ela não está conseguindo trabalhar, e sem trabalhar esse gênero, sei lá, as características da narrativa em si, mas a linguagem em si, como é que essa linguagem fica mais poética? Se eu digo: Uma mulher linda! Ou uma linda mulher! Quem é mais poético? Uma mulher linda, ou uma linda mulher? Não é? (PROFESSORA) Criativo assim, porque tem a questão das gravuras, era difícil para eles, porque eles tinham que associar a linguagem a questão das gravuras. Eles tinham que juntar várias gravuras e montar uma imagem, é tanto que ela distribuiu várias revistas, eles iriam colocar várias gravuras e montar uma imagem. A partir daquela imagem, eles tinham que relacionar as imagens, criar esse conto em prosa poética... (inaudível) relacionar essa linguagem com o tipo de gravura que eles tinham lá. (inaudível) ...até por que foi uma tecla que ela bateu muito na sala, porque foi difícil pra eles associarem essa linguagem... (inaudível) (ALUNA 1)
Fonte: Transcrição da observação
Pode-se perceber através do diálogo entre os interlocutores que há uma ação
compartilhada socialmente, em tempo e lugar específicos, ou seja, no contexto da
sala de aula interna e externa à universidade, o que exige um esforço dos
interlocutores em focar a linguagem como elemento indissociável do eixo dos
enunciados, pois a recepçãocompreensão destes enunciados coloca-nos em estado
de concordância ou discordância mediante dizeres nossos e dos outrem.
Como se pode observar, professora e aluna constroem juntas na
universidade, parte do conhecimento que será recontextualizado e novamente
construído, fora da universidade, e o mais incrível é que esta façanha acontece por
intermédio da escrita. Em outras palavras, o discurso pedagógico, nesse momento,
no contexto daquela sala provoca a escrita e abre fendas para a construção de
novos discursos pedagógicos e possibilidades de escrita em outras realidades.
Fiorin e Savioli (1996, p.38) já afirmavam que “todo texto é produto de criação
coletiva: a voz do seu produtor se manifesta ao lado de um coro de outras vozes que
já trataram do mesmo tema e com as quais se põe em acordo ou desacordo." Em
consonância com a realidade que os dados nos apresentam, deixa-se de considerar
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como absurda a ideia de que o discurso influencia o texto e vice-versa. Mais ainda,
passa-se a compreender que os processos de ensino e aprendizagem são
indissociáveis, e tanto aluno quanto professor, no contexto de sala de aula, são
produtores e analistas dessas duas modalidades de saber. Diz-se com isto que um
ensino de qualidade prima pela dualidade entre ações que se complementam,
fundem-se e produzem aprendizagens múltiplas.
É verdade que a burocracia institucional atrapalha o desenvolvimento de
muitas aprendizagens, mas o professor, paralelamente, ao discurso e à
materialização desse discurso institucional, cria ramificações em nome do discurso
supracitado como meio de não se esconder enquanto cidadão que pensa, age,
influencia e pode ser influenciado, pois, inserto na pluralidade de vozes, o discurso
pedagógico torna-se não-linear, heterogêneo, polifônico, construído em co-autoria.
O discurso pedagógico, apesar de ser institucional, vem rompendo com os
paradigmas tradicionais e clássicos, construindo-se a partir da multiplicidade de
vozes, da co-autoria entre os sujeitos da interação, através de uma relação
dialógica, dialética, o que é favorável à construção do saber. Entretanto, o professor
é consciente de que o seu discurso só tem consistência se interagir com o discurso
do outro, quer em estado de consonância, quer em estado de discordância, pois se
assim não for, é possível que o professor não seja mediador da aprendizagem, mas
dificultador da mesma, pois a evolução histórico-social-cultural já não admite que a
sala de aula, principalmente, na universidade, não seja um lugar de escuta, de
reflexão, de interpretação e produção de conhecimentos.
Vale salientar que o espaço da interlocução, ou seja, a sala de aula, é
propício à intertextualidade, à interdiscursividade, ao dialogismo e à construção de
sentidos. Isto extrapola os liames da metalinguagem e instiga o fazer singular. Essa
singularidade provoca inquietações e direciona professor e aluno para uma reflexão
acerca dos conceitos de formação pedagógica dos professores, prática pedagógica
e relevância do ensino e aprendizagem, temáticas, que neste contexto, não exige
maior aprofundamento.
Pensar discurso pedagógico e associá-lo à escrita parece um absurdo num
primeiro plano, entretanto, ao direcionar o olhar para a alteridade reconhece-se que
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o discurso pedagógico não deve ser dissociado da escrita, uma vez que o texto é a
materialidade do discurso, por sinal interpretado e construído novamente para
atender a uma linhagem ideologia-político-social de um novo autor.
Considerando que discurso e escrita tecem entre si fios intrinsecamente
relacionáveis, que estão constantemente se renovando através da interação que os
interlocutores mantêm entre si, acredita-se que o discurso pedagógico, no contexto
de sala de aula poderá instigar a escrita criativa.
No entanto, uma atitude desse porte não parte de educadores que trazem em
sua história profissional uma concepção de ensino transmissivo, pois a escrita não
deve ser vista como um processo enfadonho, pronto, acabado. Ela deve ser vista
dentro de um contexto, onde os sujeitos sejam considerados sujeitos do discurso e
da escrita, capazes de imprimirem no que escrevem as marcas de singularidade, e
mostrar que a escrita é, verdadeiramente, um trabalho que exige competência,
desejo e uma vontade insopitável de escrever.
Isto se faz presente no trecho abaixo:
Lá na frente a gente poderia apresentar também, uma aula teórica né? Já que são textos informativos, pra a gente mostrar pros alunos, por exemplo, a notícia, se ela traz uma característica diferente, nela mesma, de outros tipos de textos, né? Então, eu acho que a gente deveria ver essa parte teórica também. Tentar passar pro aluno, qual a característica de um e a característica de outro pra que assim ele não possa se confundir na produção de seu texto. (ALUNA 1). E o que você entende por essa parte teórica, no contexto da sala de aula, do ensino fundamental? Qual o seu papel? (PROFESSORA) Acho que é mais jogar as características do gênero, né? Da notícia, por exemplo, vai diferenciar da propaganda, por exemplo. Porque ela vai ensinar um objetivo, porque além da informação, ela traz um recado, uma coisa assim. Já a propaganda não, tem o intuito de persuadir a pessoa em si. Até mesmo pra se comprar um produto né?, uma vez que, tem que conquistar na lábia né?, ou na imagem. (ALUNA 1) E vocês como é que se posicionam em relação ao que ela disse? (PROFESSORA)
Fonte: Transcrição da observação
Os comentários postos pela aluna clarificam a ideia de que se tem, no
contexto daquele ambiente de aprendizagem, a constituição de um diálogo,
provavelmente dialógico, visto que as interrogativas aparecem na fala como forma
de provocações, de reflexões e as asserções feitas também apontam para um
caminho investigativo. Por outro lado, os verbos usados sugerem a aplicabilidade da
atividade, não a impondo, mas complementando, acredita-se, outra atividade feita
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anteriormente. Apresentam ainda a preocupação em mostrar características de
gêneros textuais diferentes com o intuito de orientar o aluno a produzi-los com bases
em suas características específicas.
Por outro lado, a professora apóia-se na “tecnologia da interação humana,
colocando em evidência, ao mesmo tempo, a questão das dimensões
epistemológicas e éticas”, (TARDIF, 2002, p. 128) para instigar não apenas na
aluna, mas em toda a turma, o exercício do pensamento reflexivo, possibilitando
assim uma visão mais aberta dos saberes e recuperando a autonomia dos sujeitos,
auxiliando-os a tomarem consciência das necessidades socialmente existentes na
sua formação.
Tal atitude aponta para um ensino não puramente transmissivo, unitário. Por
esse viés o ensino deixa de ser técnico, fragmentado, uníssono, caracterizando-se
pela e na singularidade, no respeito mútuo e valores como a ética, a solidariedade, a
sensibilidade, provocando o ensino, o conhecimento e a aprendizagem a “fazer-se e
refazer na e pela pesquisa” (DEMO, 1998, p. 5).
Assim, pensa-se no diálogo como forma de interação, na qual os sujeitos
produzem e trocam conhecimentos como meio de ascender histórica e socialmente,
expressando um pensar verdadeiro, voltado à criticidade. Retornando para o
contexto da universidade, pode-se dizer que é através deste processo interativo de
troca, de busca, de construção de saberes diversos, de humanização que se dá o
aprendizado da escrita.
Nesse sentido, cabe à universidade reconstruir o saber e a formação do
educador promovendo a superação de paradigmas conservadores e tomando frente
nesse processo de produção da escrita, pois na universidade o aluno já não deve
mais apenas reproduzir conhecimentos sequer tomar a escrita como um fim em si
mesma, com o intuito de apenas cumprir as exigências desse ou daquele
componente curricular.
Entende-se que o educando da universidade é consciente de que escrever é
uma necessidade inerente ao ser humano, por isso ele, certamente, sente o desejo
de desenvolver tal atividade sem ter que estar bitolado a uma determinação
metodológica. Pela sua maturidade psicológica, ele entende que a escrita é um
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trabalho de lapidação, que exige paciência, (re)leitura do que já está escrito e
humildade para refazer seus pensamentos, transformando-os significativamente.
Contemplar o objeto à distância, enamorando-o apaixonadamente, é descobrir a
essência do existir. Assim acontece com a escrita, com as palavras e com os
discursos. São as veredas que se percorre até chegar a eles de maneira peculiar
que fazem a diferença e trazem a reflexão, como representa os trechos a seguir.
Sei, nesse texto, né? Nós colocamos isso aí, porque no caso, na continuação da unidade, foca bastante a parte de verbos. Nos exercícios, seguintes da unidade, é... foca bastante assim a ideia, mas, é no caso retirar do texto, no caso seria esse texto, retirar do texto os verbos. Depois é, tipo uma tabela: retirar do texto, depois colocar no infinitivo, colocar qual é conjugação; na unidade do texto do livro estava assim. Mas, no caso, nós colocamos aí, a funcionalidade do gênero, seria no caso, não esse aí, a intenção nossa seria do gênero notícia. (ALUNA 1) Mas também poderia ser na propaganda, porque a propaganda utiliza muito os verbos no imperativo e chama muito a atenção, também poderia ser usado... (ALUNO 3) No caso, a utilização dos verbos seria essa: como os verbos funcionam, em textos, notícias, propagandas como.... (não entendi o nome do aluno) falou a funcionalidade seria essa. Não em si, aquela coisa é... (inaudível), mas no caso a funcionalidade deles, como eles são empregados nesse gênero. (ALUNA 2) E ela me disse: eu já tinha percebido isso, só que você não lembrou, porque da forma como está aí parece ser uma coisa totalmente dissociável, né? (ALUNA 4) Separada do restante do planejamento, né? (PROFESSORA) Essa parte aí entraria lá naquela, no caso da outra pontuação e grafia? Ou ele teria que ser colocado de outra maneira? Seria colocado é, juntamente, com aquela proporcionando o conhecimento, a importância da utilização dos aspectos constituintes, no caso da pontuação e da grafia? Ou seria ele separadamente? Mas de outra maneira? (ALUNA 1) Bom, você vai trabalhar a norma escrita. Vocês não iriam trabalhar a norma escrita textual? Não é? Vocês não vêm desde a noção de gênero, não é? Porque eu não sei que gênero poderia ser: se seria uma notícia, uma propaganda, desde que tivesse esse critério mais informativo que o que vocês estão vendo né? Estão priorizando, então, será que faria sentido, depois que trabalhar a escrita vir com esse mesmo texto e puxar esses verbos nesse texto? Essa é a minha pergunta. (PROFESSORA) Não. (ALUNA 2) Não? E como seria? Onde é que vocês iriam ver esse papel da funcionalidade dos verbos? (PROFESSORA)
Fonte: Transcrição da observação
As apresentações expostas pelas alunas versavam sobre “a elaboração de
um plano de aula”, orientado pelo professor e realizado pelos alunos em
consonância com o plano do professor regente de classe. Com isso, mostra-se que
escrita e discurso estão associados um ao outro formando um todo organizado em
que as ações sustentam as aprendizagens, ou seja, no caso da elaboração do
plano, em uma análise ainda bem peculiar pode-se apresentar as tessituras entre os
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elementos presentes no discurso e que possibilitam a passagem da “escrita normal”
para a “escrita laborativa” (ALMEIDA, 2009).
Assim sendo, em um primeiro momento, pode-se representá-la, graficamente:
Figura 9 – Do discurso à escrita
Fonte: FREITAS, 201217
A metáfora do funil é um convite à reflexão. Neste prisma vê-se que o
discurso pedagógico 1, referente ao discurso do professor encontra-se no topo do
funil, não para determinar autonomia, poder, mas para indicar que ali começa um
processo de linguagem, que passa por uma interpretação onde são inseridas as
marcas de subjetividade de um outro sujeito que também tem ideologia e história e
que se mistura à ideologia e história do outro do discurso para se transformar em
escrita normal, quando o texto, enquanto materialidade do discurso, reproduz o
pensamento do autor do discurso pedagógico 1 e ou apenas o recontextualiza,
sendo que o interpretador fica sempre à sombra de um autor.
17 FREITAS, Luzinete Cesário de Araújo. Maio/2012.
escrita normal discurso pedagógico 2 escrita criativa
Ideologia
Interpretação
Discurso Pedagógico 1
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A escrita normal, por seu turno, tem circularidade e passa a imprimir o
discurso pedagógico 2 (o discurso do estudante), que pode passar da escrita normal
para a escrita criativa, quando professor e aluno aprenderem que é possível através
“do olhar filosófico construir uma lógica para relacionar o linguístico com o discursivo
e encontrar aí a ideologia e o inconsciente, tudo relacionado à atitude laborativa do
pesquisador” (ALMEIDA, 2009, p.162)
Sob esse viés, o sujeito é visto como ser sócio-histórico que se constrói nas
práticas sociais, podendo escrever a partir de um discurso reportado. Não significa
dizer que a escrita seja uma reprodução desse discurso, ele é apelidado de
reportado porque na percepção de Bakthin pode focar, por exemplo, o mesmo tema.
Isso não impede que o sujeito torne-se autor do seu texto, pois não lhe tira a
liberdade de pensar, de expor o seu ponto de vista e argumentá-lo com eficácia,
sequer de apresentar as marcas de singularidades, através da escrita, pois o
homem, enquanto artesão de suas palavras, tece-as em fios urdidos, que
entrelaçados se formam e se transformam na organização de um todo organizado,
em constante movimento rotativo, recebendo e distribuindo novas informações que
vão se fundindo e se aquecendo resultando em novos saberes. Para isto é preciso
que se tenha uma “ideia não da Língua Portuguesa em si, mas de linguagem, a ideia
do novo da interação social, até a gente chegar na Língua Portuguesa fisicamente”.
(PROFESSORA)
Mediante o exposto, acredita-se haver possibilidades de se estabelecer uma
ponte entre o discurso pedagógico e a escrita de modo que um seja parte do outro,
mas que um não seja reproduzido a partir do outro. Porém, deve-se entender que a
escrita como trabalho, exige de educandos e educadores a aceitabilidade de que as
certezas são formas de negar os questionamentos e as buscas, por isso desconfiar
dessas certezas é natural aos nossos olhos, elas constituem o mascaramento do
real, do reflexo e demonstram medo: medo de perguntar, medo de questionar e ser
questionado, medo de se expor, medo de si mesmo, medo de interagir.
Nessa avalanche de medos e certezas, deixa-se de construir o novo e segue-
se às sombras dos autores citados, das certezas conceituais e cognitivas que foram
construídas ao longo do processo de estudo; perpetua-se a cristalização de um
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ensino transmissivo e automático, deixa-se de aprender a escrita, reforça-se o
processo assimétrico da interação entre os sujeitos e desvaloriza-se o discurso
pedagógico, colocando-lhe na categoria de autoritário.
Como se pode observar educador e educando buscam resposta para
questões ainda obscuras. Através do diálogo, expresso pelo discurso por sinal
pedagógico, ambos preconizam pressupostos e cada um, da posição que ocupa
enquanto interlocutor, argumenta a favor de saberes ora semelhantes ora
divergentes, mesmo assim pensam juntos a prática e a teoria na complexa tarefa de
aprender para vida. Pois, “se responsabilizar pela própria prática implica em poder
se autorizar a julgar a qualidade de seu fazer pelos resultados que obtém de seus
alunos e não pela sua semelhança com o ideal ao qual se identificou docente
(RIOLFI & ALAMINOS, 2007, p. 13).
Estabelecer uma relação de cumplicidade entre discurso pedagógico e a
escrita pode ser uma ousadia, mas é ao mesmo tempo uma tentativa de enveredar
pelos caminhos da construção do conhecimento, de eliminar a neutralidade e de
encontrar a heterogeneidade discursiva, a polifonia, o novo.
Assim estranho seria não labutar a ideia de que discurso e escrita são
binômios indissociáveis, que se dão numa cadeia dialógica, na qual se faz presente
a alteridade, a autoria, o sujeito enquanto ser histórico e social e mais alguns
elementos de extrema valia, dentre eles conhecimentos filosóficos, culturais e
científicos. Assim sendo, “deve existir uma influência contínua do trabalho sobre a
linguagem e o pensamento conceitual, e vice-versa” (LUCÁKS, 1981, p.50 citado
ALMEIDA, 2009, p. 80)
Nesse sentido, entender a complexa rede de interações sociais e lingüísticas
que formam o arcabouço da competência pragmática é acreditar que o uso da
escrita agrega-se à manifestação de identidade, uma vez que, ao assumir a palavra,
o sujeito se reconhece – a si mesmo – e na interlocução com o outro com quem
dialoga. Essa realidade está imersa na visão bakhtiniana de enunciação como
“produto da interação social, quer se trate de um ato de fala determinado pela
situação imediata ou pelo contexto mais amplo (e) que constitui o conjunto das
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condições de vida de uma determinada comunidade lingüística” (BAKHTIN, 1988, p.
112-20).
Sob esta ótica, o discurso pedagógico do professor influencia diretamente na
escrita do aluno, podendo ocorrer também o inverso. E mais, essa escrita que tem
por base o discurso pedagógico não é uma reprodução, visto ser fruto da
competência interpretativa do ouvinteleitor, momento em que se aflora a autoria e,
possivelmente, uma escrita criativa, gerada a partir de um discurso
recontextualizado, daí porque no momento em que se escreve, o sujeito-autor sente-
se livre para brincar com as palavras, sem, portanto, elas colidirem, mas utilizando-
as com os seus sentidos próprios e figurados e colocando-as à disposição de um
mundo vasto, pois quando elas soam (no ar) ou se fazem soar (no papel) tomam
formas e estruturas diversificadas e se espalham aquém dos olhos e do domínio, daí
deixam a “individualidade”, passam a “coletividade” e provocam muitas leituras. Esse
ato estabelece entre os sujeitos uma “interlocução de muitas vozes que agitam,
conduzem, animam, perturbam” (MARQUES, 2001, p. 25-31).
Em outras palavras, a professora informante clarifica essas ideias quando
explica:
[...] eu vou fazer uma leitura dos textos, depois vou fazer uma segunda leitura, claro que vocês sempre vão ter/ se não ficar bom, sempre tem essa questão que vocês precisam preparar a disciplina/ mas eu estou visando também a publicação desses trabalhos, né? então é contribuir pra pesquisa nesse sentido. É uma pesquisa, um artigo, até porque eles estão no quarto período e ainda não são exímios produtores de textos. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Como se pode observar a professora convida o seu aluno a escrever não
apenas para duas realidades (a do aluno e a dela), mas para diversas realidades,
pois a partir do momento em que a escrita vai para a publicação ganha dimensões
variadas em mundos divergentes. Isso estimula o aluno a produzir e ter cuidados
sintáticos, semânticos, estilísticos, lingüísticos e pragmáticos com o que escreve,
além de compreender que a escrita tem uma funcionalidade e não pode ser objeto
apenas de avaliação no contexto acadêmico.
A atitude da professora de ler várias vezes os textos produzidos e orientar os
alunos a melhorá-los não mostra, aparentemente, que ela esteja utilizando-se do
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discurso autoritário para impor seu poder de sujeito detentor de um saber, ao
contrário, indica as habilidades e competências profissionais por ela utilizadas para
inserir os alunos em um processo de reescrita que tem como ponto de partida, a
análise, o questionamento e o diálogo, elementos essenciais numa relação dialógica
que exige confiança e cumplicidade.
Tal atitude aponta, ainda, para o nível de cultura e formação da professora
que acredita ser a pesquisa de grande relevância para se formar exímios produtores
de textos, talvez porque à proporção que se escreve, se lê, se refazem os
pensamentos e se tem novas leituras e escritas. Neste sentido, pode-se dizer que a
escrita, resultado de pesquisas, necessariamente tem um nível de elaboração mais
dinâmico, coeso e plural.
Ressalta-se, porém, que a prática de correção eficaz parece centrar-se no
“encontro entre sujeitos em processos lingüísticos que se prestam para produzir
significação entre episódios de interação pessoal e dialógica” (RUIZ, 2001). Essa
prática aponta para uma postura específica voltada à dimensão textual e à
discursiva e prioriza a negociação de sentidos antes de aferir o domínio das regras.
Entretanto no discurso da professora não há evidência de elementos que
comprovem o tipo de correção aqui descrito
Por ser processual, a escrita sofre influências de outras instâncias de
conhecimento, inclusive do discurso pedagógico, que atendendo ao viés da
dialogicidade utiliza-se da linguagem para ganhar vida, memória, sentido e
estabelecer a interação entre os interlocutores, razão pela qual os alunos da
universidade, diante da escrita, devem se colocar como sujeito daquilo que dizem,
uma vez que a escrita é um ato social que se faz na e pela história, pelos fios
urdidos do discurso que se profere, visto que “a fala mostra, de forma transversa,
uma relação a si no ato de escrever” (SOUZA, 2006, p.76)
A escrita, assim como o discurso, deve ser um diálogo vivo, onde os
interlocutores se encontram, discutem seus pontos de vistas quer congruentes quer
divergentes, cada um utilizando argumentos eficazes, claros e coesos que garantam
a sustentabilidade de suas teses e, evidentemente, delas a produção, ou melhor, a
criação de novos conhecimentos, haja vista “este texto, colocado no papel e lido por
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outra pessoa, inclusive por mim mesma, em outro momento, ser uma nova escritura”
(ARROYO, 2003, p. 32).
Para refletir um pouco mais acerca do intercruzamento dos fios constituintes
da intrínseca relação entre discurso e escrita, acredita-se que o professor,
consciente da sua função, não apenas social, mas formadora, sofre com os
empecilhos postos pelos sistemas tradicionais e burocráticos de ensino, mas os
novos paradigmas de linguagem, de discurso e de propostas de ensino perfuram o
bloqueio e fazem fluir métodos e metodologias capazes de fazer a diferença. Assim
sendo, a dimensão da escrita vai além de seu caráter instrumental e o professor, por
sua vez, não é mero transmissor de informações e conteúdos escolares. O professor
é, sim, coadjuvante dessenesse processo de construção, daí porque
Eu sempre costumo dizer pra eles, eu sempre oriento bem direitinho. olhem! Vocês vão receber um referencial teórico/ mas não é só pra enfeitar o trabalho de vocês não. Isso aqui que você está dizendo ali, é pra nortear quando chegar lá na análise vocês não vão poder fugir disso aqui não. Lembre- se o que foi que você disse lá atrás certo?, ou vice versa. E se tudo já começou por aqui, pelo amor de Deus não vão escrever o referencial teórico ou a dedução. Você observa, agora escrever sua teoria lá, agora observando o que você disse aqui. Então é a construção de um pesquisador tímida! Uma construção Tímida, mas é. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Ao tomar como parâmetro a fala da professora, acima mencionada, entende-
se que na universidade, os graduandos devem aprender a catar para somar,
ressignificar, pois ao tomarem-se como parâmetro as ideias de autores e
professores estabelecem pontes entre o que eles dizem e o que se pode dizer; é
exatamente neste espaço vazio entre o já-dito e dizível que se imprimem dizeres
acerca do mundo em que se vive e que são permeados de leituras e escritas
diversas. Faz-se necessário compreender “no âmbito da universidade, e fora dela,
que o aluno precisa assumir a condição de ser leitor/sujeito-autor, isto é, tornar-se
responsável pelo que diz; construir lugares de significância, interpretáveis, e
historicizar seu dizer (ORLANDI, 2004, p.38).
Mediante o exposto, acredita-se que a linguagem, enquanto instrumento
mediador que aproxima sujeito e história perpassa o texto, buscando sentidos em
pré-constructos, nos quais os sentidos são diversos e divergentes, metafóricos e
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polissêmicos, o que possibilita uma escrita mais autêntica, que pode representar
diferentes épocas e visões de mundo.
Assim o discurso, “é sempre pronunciado a partir de condições de produção
dadas” (PÊCHEUX, 1997, p. 77); é prática política, lugar de debate, conflito e
confronto de sentido; é materialidade específica da ideologia e tem a língua como
sua materialidade específica (ORLANDI, 2005a). Surge de outros discursos, ao
mesmo tempo em que aponta para outros. Assim, a materialidade linguística de um
discurso remete a outras memórias discursivas; não provém de uma fonte única: “[...]
nasce de um trabalho sobre outros discursos que ele repete, ou modifica”
(MITTMANN, 1999, p. 272). Considerando o aqui já-dito, aposta-se na ideia de que
os fios da história entrelaçados ao fios da linguagem tecem os fios de novos
discursos, inclusive pedagógicos, que por sua vez tecem os fios da escrita.
3.3 FORMAÇÃO PROFISSIONAL, DISCURSO E ESCRITA: A FUSÃO DE TRÊS
GRANDES PILARES DO ENSINO
O discurso pedagógico do professor, para ser epitetado de autoritário ou
dialógico, passa pelo crivo da formação do educador e pelos seus pensamentos
ideológicos e culturais anexados à sua postura pedagógica, sua metodologia e,
principalmente, pelos seus conhecimentos, pois como sustenta Bakthin (1992, p. 32)
“o centro da relação é o espaço discursivo que fica entre dois sujeitos em estado de
interação” e é, justamente, neste espaço que os sujeitos se constroem e constroem
conhecimentos utilizando-se da linguagem para expô-los.
É preciso maturidade, não só acadêmica, mas pessoal e profissional para que
se viva e se atue na e em sociedade, por isso, o conhecimento e a fundamentação
teórica são importantes para que se discutam certos assuntos e se tenha
capacidade para propor a discussão de tantos outros, por isso, “o olhar crítico do
professor”, mediante a avaliação de uma produção textual, independente do gênero
ao qual este pertence, é uma ferramenta que imprime a abertura para novas
reflexões e pode ser a chave para novas pesquisas, novos aprendizados e conceitos
e até para a quebra de paradigmas que emperram a ascensão de muitos indivíduos
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e departamentos em instituições de ensino, quer de nível fundamental, médio e ou
superior.
Mediante o exposto, a professora informante considera
O Professor tem a atenção que está formando esse aluno pra ministrar. Pra ministrar aulas lá fora, né? Mas como não tem, então me parece que a Didática da Língua Portuguesa aqui na UERN, me parece essencial, indispensável, né? e aí volto a dizer, essencial, e ideal que seja um professor de letras formado na área de letras daqui, pra ministrar, pra que ele possa fazer essa transposição de conhecimentos lingüísticos essa
a formação que ele tem com relação a essa disciplina. (PROFESSORA) Fonte: Entrevista da professora
Vê-se nas colocações da professora uma série de indagações que são
pertinentes, não somente a professores, mas extensiva a toda sociedade, pois as
teias de relações sociais que cercam a humanidade se multiplicam velozmente e daí
entende-se que a universidade, enquanto instituição formadora de profissionais que
vão, provavelmente, atuar em sala de aula, deve estar constantemente repensando
o seu currículo, os seus propósitos e criando oportunidades para que o seu trabalho
seja realmente dialógico, interativo e seja, na sociedade, não reproduzido, mas
refletido e recontextualizado.
Entretanto falar de “transposição de conhecimentos lingüísticos” é repensar a
prática de forma reflexiva, mas não distante da teoria, capacidade que todo
profissional, quer de Letras ou não, desenvolve quando não se antecipa em
posicionamentos precipitados, tais como, subestimar a capacidade do discente
diante do objeto a ser aprendido. Além disso, na transposição, os saberes eruditos e
científicos são apenas alguns dos que precisam ser mobilizados para garantir que o
professor possa junto com os alunos desenvolver as competências necessárias à
aprendizagem, visto que se não se levar em consideração objeto de ensino e não
acreditar na relação teoria-prática reflexiva, corre-se o risco de usar, no contexto da
sala de aula a transposição imatura. É inerente, considerar:
A formação, inicial e contínua, embora não seja o único vetor de uma profissionalização progressiva do ofício de professor, continua sendo um dos propulsores que permitem elevar o nível de competência dos profissionais. Além de aumentar seus saberes e seu savoir-faire, ela também pode transformar sua identidade, sua relação com o saber, com a aprendizagem, com os programas; sua visão da cooperação e da autoridade, seu senso ético; em suma, pode fazer emergir esse novo oficio
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pelo qual lutou [...] A autonomia e a responsabilidade de um profissional dependem de uma grande capacidade de refletir em e sobre sua ação. Essa capacidade está no âmago do desenvolvimento permanente, em função da experiência de competências e dos saberes profissionais. Por isso, a figura do profissional reflexivo está no cerne de uma profissão, pelo menos quando a consideramos sob o ângulo da especialização e da inteligência no trabalho. (PERRENOUD, 2002, pp.12-13)
Porquanto, discorda-se, em parte da professora quando ela aponta “que ideal
e essencial para ministrar a disciplina de Didática da Língua Materna é um professor
formado na área de Letras” e se utiliza da “transposição dos conhecimentos
lingüísticos” para justificar suas colocações.
Respeita-se a posição da professora, mas encontra-se na sua fala resquícios
de preconceito profissional, pois os estudos existem para respaldar aqueles que não
se sentem seguros em determinadas dimensões e, para tornar cada vez melhor,
aqueles que já são “bons” – situação que pode ser vivenciada por qualquer
profissional - e o fato de o professor ser da área de Letras não garante que a
disciplina seja ministrada com sucesso.
O que garante a aprendizagem do aluno e está intimamente relacionado ao
sucesso da disciplina parecem ser as habilidades desenvolvidas pelo professor, a
inserção de mais disciplinas de caráter didático-pedagógico nos cursos de formação,
a construção de conhecimento plural na capacitação pedagógica, a criação de
ambiente agradável em sala de aula e a qualidade da interação entre alunos e
professor.
Na realidade, as escolas de nível fundamental e médio guardam e até certo
ponto enaltecem uma cultura de que o fato de o professor ter uma formação faz de
si um profissional competente, comprometido com a aprendizagem do aluno e capaz
de ser, estar e atuar com eficácia no contexto de sala de aula. Entretanto, essa não
é uma premissa de todo verdadeira, pois temos diferentes níveis de profissionais.
O problema maior é que as transformações sociais exigem,
permanentemente, a reelaboração da formação e da prática docente e, muitos
professores não têm convicção de que esta renovação implica em novos saberes, o
que, possivelmente, faz soerguer novas práticas e, consequentemente, mudanças
metodológicas no contexto de sala de aula, bem como alterações, ora positivas ora
negativas, na qualidade do ensino e da aprendizagem.
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Com efeito, entende-se que a formação inicial é apenas a ponta do iceberg,
para o avanço dos processos de ensino e aprendizagem e que a universidade é
responsável até certo ponto por essa formação.
Enquanto estiver no crivo de suas responsabilidades, a universidade deve
desdobrar-se para dar conta de formar um profissional com capacidade para agir em
situações diversas, por isso, além da disciplina de Didática da Língua Materna, deve
inserir outras que se voltem mais especificamente para o ensino. Tal atitude pode
ser eficaz no processo de formação.
O aluno, quando sai da universidade e adentra na realidade profissional,
precisa de outras e múltiplas didáticas, uma vez que, por exigência dos entraves
sociais e culturais, será quase que obrigado a abraçar outras tarefas e quando,
realmente, vai atuar, em sala de aula, torna-se multiprofissional, multidisciplinar.
Assim, para sujeitos multi se esperam formações múltiplas dentro de um só
currículo.
Mediante o exposto, acredita-se que seja obrigação do professor,
principalmente do professor universitário “cuidar da sua formação” (Informação
verbal)18. Implica dizer que o professor não se restringe apenas à sua área, para
nela crescer. A ele, cabe inserir-se, mas com a responsabilidade de aprender, em
outras áreas para que estabeleça, inicialmente, consigo um intercâmbio entre
formações, para, num segundo momento, fomentar no aluno esta ideia,
considerando que tal atitude, além de ser uma forma de crescimento individual e
intelectual, possibilita ao ser humano (quer professor quer aluno) conhecer outras
realidades e lhe dá maior credibilidade para interagir, argumentar, propor e discutir
assuntos que não sejam apenas do contexto de sua formação.
Ainda na fala da professora informante aparece uma fenda que aponta para
um processo denunciatório. Inicialmente, o emprego do “tem” parece dizer que o
professor não se preocupa em preparar o aluno para ser um profissional, ou seja,
não existe uma prática de socialização que prepare o aluno para o exercício do
ensinar.
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SOUZA, Gilton Sampaio de. Nota de reunião com os mestrandos. PPGL, UERNCAMEAM, em 20 de setembro de 2011
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Se assim o for, a conexão entre contexto formativo, perspectivas individuais e
contexto de atuação se perde ao longo do caminho elastecendo o campo da
aprendizagem apenas pela observação, aprendizagem essa que se porta na prática
como lugar de aprendizagens profissionais.
Essa é uma realidade ainda muito presente na concepção dos professores e
das instituições de ensino. A prática, na verdade, vista com outro olhar e tomada
como objeto de investigação, de onde se extraem saberes que podem ser discutidos
e ampliados nos cursos de formação de professores, aponta para a construção de
conhecimentos plurais advindos de uma prática plural.
A sociedade e o mundo exigem profissionais qualificados, capacitados; e ser
capacitado e qualificado quer dizer, na maioria das vezes, não apenas repetir o que
se ouviu ou se lê na sua área de formação, mas ter condições e conhecimentos de
adentrar em assuntos de diversos e diferentes patamares.
Sente-se firmeza e segurança, ainda, quando a professora diz: “vão
pesquisar, vão observar aulas, depois a gente realiza um trabalho em cima dessas
observações com planejamento/ é planejamento de aulas de Língua Portuguesa a
partir do que eles viram lá na escola/ e ainda um artigo sobre isso”.
(PROFESSORA), pois se vê que os encaminhamentos propostos conduzem o aluno
a refletir acerca da formação de professor de língua materna, além de propiciar a ele
o contato direto com a investigação, ação que o leva a criar argumentos e defendê-
lo.
Isto exige um discurso autônomo, condizente com a ideologia, o que
provavelmente, alarga as possibilidades do aluno refletir acerca dos fatos que ao
serem expostos e discutidos, coletivamente em sala de aula (discurso -
interdiscursos), serão tratados de forma específica, quando da elaboração do artigo,
o que leva o aluno ao encontro com a escrita, assim orientada
Você pega as noções da linguística textual que vai trabalhar com os conceitos de coesão e coerência, né? aí você vai buscar as ideias de (inaudível não entendi o nome do autor) aí você pega uma concepção de língua e vai aplicar esse texto, né? aí você recorre a Basti, aí você quer voltar isso mais pra o ensino, né? pra organizar a linguística textual lhe ajuda muito nesse sentido, né? Marcuschi, etc. e vamos por aí (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
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Adentrando-se na fala da professora percebe-se que, no contexto da sala de
aula, é provocada situação de estudo, leitura, escrita, discussão e reflexão que
favorece o avanço da prática pedagógica do professor, visto que existe uma parte
dos resultados advindos deste trabalho, que é dependente do processo de
construçãoreconstrução do conhecimento individual do professor e outra parte de
construçãoreconstrução coletiva, em que os conhecimentos do professor mesclam-
se aos conhecimentos dos alunos para ora recuperar as competências básicas de
leitura, escrita, planejamento de ideias ora para construí-las a partir das discussões
traçadas naquele ambiente.
Decerto formar professores de língua materna não é fácil, ao professor é
entregue uma missão político-social de grande valia. Como um dos mais importantes
agentes do processo educacional, o professor tem em suas mãos a
responsabilidade de construir uma educação cidadã, um ensino constituinte de
sentido e formar cidadãos participativos, atuantes e investigadores.
3.4 DISCURSO SOBRE O PLANEJAMENTO NA UNIVERSIDADE: UM ATO
SOLITÁRIO
Considera-se que o objeto da educação é o conhecimento. E é partindo dessa
premissa que se entende o planejamento como um ato de reverberar práticas
pedagógicas, associando-as aos processos de ensino e aprendizagem de modo que
atenda a superação das dificuldades do aluno e avance num processo interativo e
multidisciplinar, capaz de possibilitar ao corpo docente pensar, junto, estratégias e
ações propícias não somente aos objetivos de uma única disciplina, mas das
disciplinas afins, considerando, impreterivelmente, a realidade, para nela intervir.
Nesta perspectiva, prima-se pelo “planejamento participativo” (GANDIN,2008),
por entender que é de fundamental importância no ensino superior, uma vez que
será o norte do professor e a qualidade da disciplina ministrada depende tanto do
conhecimento do professor quanto de um bom planejamento de forma que o tempo
seja adequado ao aprendizado e às atividades do aluno.
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Entende-se ainda que, para planejar, o professor estabelece uma rede de
relações educativas tecidas pelos fios dos processos pedagógicos, em consonância,
de certa forma, com os princípios do planejamento estrutural, entretanto, enquanto
mediador de aprendizagem, o professor tem a certeza de onde quer chegar junto
com os seus alunos; reconhece, principalmente, as limitações e possibilidades de si
e de seus alunos e sabe que toda intervenção é, indiscutivelmente, técnica, social,
científica e política.
O planejamento participativo respalda a possibilidade de manter uma atitude prático-reflexiva permanente, como forma de fazer do espaço escolar um lugar privilegiado de aprendizagem, de construção do conhecimento. Dessa forma, não pode ser visto isolado do contexto social da instituição escolar, dissociado do Projeto Político-Pedagógico da Escola, mas, sobretudo, como um meio que possa instrumentalizar os sujeitos da educação na vivência prática de elaboração, execução e avaliação. (SAMPAIO, 2002, p. 67)
Por assim ser, o planejamento requer atuação concreta, com vistas às ações
e às situações, em tempo integral e com ênfase na interação entre
educadoreducador e educadoreducando, está, diretamente, no contexto da sala de
aula; aquela, especificamente, no ambiente escolar.
Nesse sentido, o que tem maior valia no “processo dinâmico da realidade é a
crítica e o conhecimento crítico” (FRIGOTTO, 1987, p. 81), pois podemos repensar
nossa prática de modo que esta altere e transforme a realidade vivida, fazendo fluir
mais e novos conhecimentos com ênfase no histórico, social, ideológico e filosófico.
Mediante o exposto, clarifica-se a concepção de planejamento e acrescenta-
se: o planejamento é de caráter coletivo, pois a responsabilidade em formar bons
profissionais não é de um ou de outro profissional, ela é de responsabilidade de
todos os profissionais da instituição formadora, logo, o planejamento não deve ser
um ato individual e visa à socialização do conhecimento.
Assim sendo tem-se a concepção de que diante de uma tomada de decisão
desse porte, os professores, necessariamente, levam o aluno a ler criticamente a
realidade que o cerca. Além do mais, o planejamento para ser considerado
participativo e coletivo exige que se tenham princípios e objetivos comuns. Se assim
não se processar o ato de planejar torna-se
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Um processo solitário. [...] vou te explicar por que: acontece um clima mesmo, o nosso Departamento ele perdeu costumes/ quando eu entrei na UERN, o nosso Departamento viveu um desses momentos em que todo mundo preparava sua Disciplina e durante a semana pedagógica era a apresentação e todo mundo interferia, mas aí o que aconteceu, né? acabava de certa forma sendo um momento constrangedor. Né?/ Muita gente queria, outros ficavam por aí/ e chegou a uma certa altura a causar algumas discussões muito calorosas, que não parecia ninguém comentou nada, mas de repente desapareceu essa prática e de certa forma todo ficou calado; então de certa forma todo mundo sentiu-se beneficiado com o fim dessa prática né? (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Ao refletir acerca das palavras da professora, imagina-se o vazio existente na
ação de um processo solitário. Vê-se o vazio tomando conta dos espaços que
poderiam ser preenchidos pelas discussões, pelo traçar de estratégias que visam à
melhoria da qualidade do processo de ensino e aprendizagem, mais
especificamente, da escrita na universidade. O vazio, embora propulsor de sentidos,
provoca incômodo porque a permanência dele no âmbito do planejamento isenta a
interação entre os sujeitos, e é essa interação que os faz crescer e leva-os a
transformarem realidades presentes e ou anteriores, principalmente, quando se está
a trabalhar com a formação de profissionais.
A fala da professora reporta a outra memória quando revela “Muita gente
queria, outros ficavam por aí”, pois existem contextos em que boa parte dos
profissionais não se sentem à vontade para expor suas propostas e planos de
trabalho. Alguns, porque deixam que o constrangimento os domine, outros porque
talvez não acreditem no seu potencial enquanto formadores de educadores ou
desacreditem nas propostas e discussões realizadas em nível da instituição e outros
porque, infelizmente, focam apenas na sua disciplina não compartilhando de
proposta tida como inovadoras, sequer se importando com o que os outros
profissionais estão propondo aos alunos como conteúdo de ensino e aprendizagem.
Ainda nesse patamar de conflitos individuais há aqueles que primam pelo
novo, que veem na integração dos profissionais as devidas possibilidades de
alterarem o contexto atual. Na instituição pesquisada, com base nos dados não se
diz que vivem situação igual à exposta, mas a priori, semelhante.
Todo este labirinto, interno nas instituições, afeta externamente os alunos e a
sociedade, por isso deve-se pensar “o planejamento como uma ferramenta para dar
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eficiência à ação humana” (GANDIN, 2008, p. 1), à busca da autonomia, à tomada
de decisões, à resolução de problemas e também à formação do cidadão, portanto,
deixar perecer valores que norteiam boas ações pode ser um meio de alienar o
homem enquanto sujeito, principalmente, quando se pretende garantir a eficiência
destas ações quer no nível micro quer no nível macro.
As situações cômodas, geralmente, omitem aspectos importantíssimos e o
ensino superior tem características próprias, visto que lida com sujeitos em processo
de formação profissional, por isso, pensa-se em condições objetivas e subjetivas nas
quais estão pautadas a concepção de ensino, aprendizagem e escrita.
Assim, entende-se que somente por meio da reflexão, da sistematização do
conhecimento é que o professor internaliza a ideia de que no contexto da sala de
aula, quando se pensa em aprendizagem, não se pode exacerbar um método em
detrimento de outro, pois ali há singularidades a serem exploradas com o intuito de
provocar várias formas de apreender o saber e a heterogeneidade que aponta para
criativas trajetórias.
E mais, é dessa mistura que surgem os novos caminhos pedagógicos, as
novas formas de saber-fazer em sala de aula, pois desse aprimoramento na prática
pedagógica é que se pode levar o aluno a uma postura autônoma, criativa, propícia
à construção de conhecimento, endossada pelos patamares do “aprender a
aprender”, “saber pensar”, “saber tomar decisões”. (GRÉGIO, 2003, p.53).
É muito comum se ouvir no âmbito da universidade, por parte dos
professores, críticas acirradas à Ementa por ser um documento de caráter
institucional, entretanto através dela o professor tem autonomia para traçar sua
proposta de trabalho, seus planos, pensar que conteúdos se adéquam melhor à
realidade das turmas; elaborar seus objetivos tendo em vista aonde quer chegar
com a turma, enfim, ela apenas é um resumo descritivo que indica como os
conteúdos serão ministrados.
Isso não prima pela falta de interação entre os professores sequer impede
que os professores-formadores levem os futuros professores a questionarem e
indagarem conhecimentos que vão além da grade curricular.
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Nesse sentido, a interação é fundamental e com ela a investigação voltada
de fato, a questões relevantes tais “como, por quê, para quê” o aluno precisa realizar
determinada tarefa solicitada, considerando ainda que relevância tem esta tarefa
para a vida. Isso não é um trabalho simples e não se faz isoladamente. Os trechos a
seguir são um convite para que se possa agir, no ensino, centrada no fator
aprendizagem:
[...] eu até comentava outro dia, que assim não que voltasse (inaudível) hoje está todo mundo com seus planos de aula, mas que talvez por área, pegasse os Professores que trabalham com ensino médio, que trabalham com Didática, os Professores de estágio, talvez fosse bom haver essa interação entre eles em algum momento pra discutir realmente, pra ver o que é/ por que ele está estagiando, né? em plena disciplina, pra ver o que é que precisa ser melhorado, né? Muitas angústias né? Ele tem que dar de conta do problema da formação do alunos, né? e ainda resolver o problema da prática desses alunos lá fora, né? do professor colaborador, né? que geralmente tem algumas críticas a fazer [...] então seria necessária realmente essa interação. E assim o nosso Departamento [...] porque essa área tem causado praticamente descobertas. (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Já é de praxe falar de interação no meio educacional. A relação ternária
professor-aluno-saber aparece via conjunto de regras onde cada membro tem a
preocupação de saber o que o outro espera de si, assim como a sua função no meio
social no qual está inserido, entretanto, não é comum se falar em interação entre os
profissionais, embora se saiba que a qualidade dessa interação influencia na
potencialização dos resultados esperados pela instituição de ensino e altera o
desenvolvimento dos trabalhos tanto individuais quanto coletivos.
Nas asserções feitas pela professora informante enxerga-se a ausência de
interação, no Departamento de Letras da UERNCAMEAM, especificamente, entre
os professores de Didática e Estágio, nas disciplinas consideradas eixos
norteadores no processo de formação.
Já que estas disciplinas objetivam orientar os futuros profissionais acerca de
procedimentos teóricos, metodológicos e pedagógicos do ensino e da
aprendizagem, apoiando-se uma na outra, talvez fosse viável, os professores das
disciplinas mencionadas, com o apoio da UERN, juntarem-se aos professores que
irão receber os estagiários, estudarem as propostas referentes às disciplinas e
também aos conteúdos propostos pela escola campo de estágio, intencionando,
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com isto, a melhoria e a qualidade da formação, através de ações pensadas em
conjunto.
Categoricamente, a professora informante afirma não haver discussões em
torno dessas temáticas, o que é espantoso, pois a distância entre universidade e
escola campo de estágio é perceptível em nível social e escolar, mas esse
“afastamento didático-pedagógico” interno na UERN, instituição formadora de
professores, parece revelar uma rachadura nos princípios de “ensino de caráter
humanístico e profissional”19, pensado pela própria universidade, arranhando
também, o art 9, do cap. III, da organização curricular do regulamento dos cursos de
formação da IES em questão, que declara ser a organização curricular referenciada
com base nos “princípios formativos: da interdisciplinaridade, da articulação teoria e
prática, da flexibilização, da contextualização, da democratização, da
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, bem como outras formas de
organização do conhecimento”20.
A fala da professora revela ainda que a interação entre os professores das
disciplinas de Didática e Estágio seria um dos instrumentos que os levaria a refletir
sobre o quê, porquê e para quê o aluno está estagiando, questões que servem de
base para a reformulação e ou criação de novas propostas de ensino, talvez mais
produtivas, interativas, dialógicas voltadas às descobertas advindas de estudos
sistemáticos, científicos e contextualizados.
Nessa situação, o ensino e a aprendizagem se apresentariam em nível mais
real tanto para a academia, especialmente para o Departamento de Letras, que
parece já ter avançado neste aspecto, tanto que ela chega a dizer que “descobertas”
já foram detectadas através das observações executadas e atividades
desenvolvidas no decorrer do estágio, momento em que o universitário vive o papel
do professor e convive com a realidade de sala de aula, ou seja, momento crucial
em que teoria e prática se encontram ou se confrontam, ou para confirmar a
19
Extraído do título VI – Da atuação universitária, art. 32, § 2, do Estatuto da UERN, disponível em http://www.uern.br/pdf/Documentos/regulamentodecursosdegraduação-uern-original-consepe.pdf, acessado em 26 de agosto de 2011. 20
Extraído do Regulamento dos Cursos de Formação da UERN, disponível em http://www.uern.br/pdf/Documentos/regulamentodecursosdegraduação-uern-original-consepe.pdf, acessado em 26 de agosto de 2011.
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pressuposição de que ambas caminham juntas ou para refutá-las, ou ainda para
causar angústia e conflito entre professor regente de sala, professor-estagiário e
professor de estágio.
Infelizmente, na maioria, das vezes, o resultado desses choques é negativo e
os conflitos, provocadores de estudos e descobertas, passam a ser agressivos,
desrespeitosos e improdutivos, pois, exatamente, pela ausência da interação, do
diálogo e da humildade há uma sobreposição de saberes, isto é, um vai apontando o
outro como culpado pelo fracasso das atividades no contexto de sala de aula e as
acusações viram a bola da vez que passa de mão em mão, mas que ninguém a
sustenta para investigar.
Faça-se, neste ínterim, jus ao pensamento de Nóvoa (2001, p. 32), para quem
“mais importante do que formar é formar-se, pois, todo conhecimento é
autoconhecimento e toda formação é autoformação”. Sábios vocábulos esses! Resta
se ter coragem, para admitir que no vazio de nossas inserções, quer individuais quer
coletivas, alargamos o mundo da escrita, da cultura letrada, do saber e do ensino e
nele também se provoca o nosso desenvolvimento, o de outras pessoas e de o
grupos sociais diversos.
[...] seria bom que os alunos começassem a saber o que seria um Professor em clima de estágio, né? Então de certa forma essa interação está como se não tivesse dando pra acontecer, por causa dessa movimentação, [...] é o momento de se pensar nisso, nesse grupo, que é um grupo pequeno, né? Em se reunir, em tirar algum momento do tempo que se tem pra se planejar, e começar a fazer esse intercâmbio de formações, ai, né? (inaudível) (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Por acreditar nesse pensamento, e ver no professor, não um salvador da
humanidade, mas um profissional capaz de, através do seu discurso, abrir um leque
de reflexão acerca de dado assunto, cavando um cenário de desconfiança, conflito e
dúvidas, onde habita o caráter investigativo e não reprodutivo, faz-se jus às palavras
do Ministro Haddad (2008), ecoadas na 72ª Reunião Ordinária do Conselho Pleno
da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições de Ensino Superior
(ANDIFES), quando na ocasião enalteceu o pensamento de Demo (2002, p.72) ao
argumentar que “a qualidade da educação depende, em primeiro lugar da qualidade
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do professor”. Acrescenta-se ainda a seguinte premissa: a qualidade do professor
depende, em primeira instância, da qualidade da instituição que o formou.
O discurso da professora informante mostra com clareza a grande
necessidade de se estabelecer uma relação de “grupo” mais forte, capaz de
“planejar” com o intuito de “fazer intercâmbio de formações”. Com essa asserção, ela
parece propor aos colegas professores lidar com habilidades complementares, ter
compromisso com o desempenho dos alunos e responsabilidade mútua e traçar
metas claras que visem melhores resultados e eficácia no aprendizado.
A professora diz que a interação entre os professores não acontece devido a
“essa movimentação”, entretanto pelo teor do seu discurso não se sabe a que
movimentação ela se refere. Esse é um ponto obscuro da sua fala.
Embora, o termo “trabalho coletivo” esteja em voga nas instituições, percebe-
se que ele não flui, positivamente, entre os profissionais, talvez porque trabalhar em
equipe não é uma tarefa fácil, pois foge aos padrões das “situações cotidianas e
familiares nas IES, por ser portadora de um aprendizado construído e constituído
sob pilares desafiadores que convidam a olhar para fora de si, no intuito de
encontrar as ideais de outrem, pô-las no círculo das discussões, juntamente com as
suas, e daí extrair conhecimentos até então não elaborados.
Tudo isto é muito desafiador e não se está acostumado com situações de
desafio, traz mais comodidade se viver em situações de sucessos, entretanto,
Gramigma (1994), já nos alertava para o fato de que o evento da aprendizagem
passa pelo crivo do “aprender fazendo”, e considerava esta estratégia eficaz e “mais
efetiva no ensino”, porque, quando se pauta no aprendizado do fazer, têm-se
maiores probabilidades de internalizá-lo melhor, com mais clareza, mais intensidade,
o que, provavelmente, torna-se mais duradouro.
O trabalho em equipe, apesar de ser complexo pressupõe que toda
aprendizagem é autoaprendizagem, nesta perspectiva, entende-se que ele pode ser
considerado também como uma autorealização humana, e tem possibilidades de
criar ambientes de aprendizagens, complexas, porém, significativas, pautadas na
investigação, na escrita e na argumentação de teses que influenciam na eficácia do
processo educacional.
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A professora, através da sua fala, faz um apelo aos demais profissionais a
juntos alçarem vôo em forma de “V como os gansos”, para que à medida que cada
um implemente ações que venham a melhorar o ensino e aprendizagem e
consequentemente, fortalecer o processo de formação na UERN, possam olhar na
mesma direção, compartilhando os mesmos objetivos, sempre em sintonia tanto na
resolução dos problemas quanto no fracasso ou sucessos das atividades propostas,
pois onde há união, onde a interação é preservada, o progresso é maior, mais
fraterno e, possivelmente, mais humanitário, assim sendo “a gente precisa desse
diálogo” (PROFESSORA).
Acredita-se ainda que a preocupação da professora é coerente, porque desde
o princípio desta análise ela vem dando pistas de que “ensinar e aprender” são
ações humanas distintas, mas que se arquitetam via relações complexas que tem
como suporte a vivência. Entretanto, a sua fala não explicita, claramente, a sua
concepção de ensino e planejamento, apenas revela uma necessidade de maior
“interação” no decorrer do ato de planejar com o intuito de “intercambiar formações”,
por isso diz-se que os termos “interação” e “intercâmbio de formações” nesse
contexto, apresentam-se, de certa forma, distantes da qualidade cognitiva das
aprendizagens, que se associa à aprendizagem do pensar.
Em conformidade com os conhecimentos experienciais e adquiridos, quando
se pensa em conhecimento humano imerge-se em diferentes referenciais, que
fazem com que se pense em diversos conceitos, a saber: conceito de homem, de
mundo, de cultura, de valores, de sociedade, de educação, de tecnologia, de
vivência, enfim, esses referenciais apontam para diversas abordagens, tendências e
linhas pedagógicas do ensino que fornecem diretrizes à ação docente que, embora
individual e intransferível, pauta-se em uma concepção de ensino sustentada nos
princípios teóricos, práticos, reflexivos e produtivos, assim representados:
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Figura 10 - Concepções de construção do saber
Fonte: FREITAS, 2012.
21
Essa concepção de ensino e aprendizagem alinha-se à concepção de
planejamento participativo – ferramenta para intervir na realidade – com vistas nos
contextos: interno (no estudo em questão – a universidade e o leque de saberes que
nela circundam; intermediário – rede de ações que medeiam as relações intrínsecas
imersas no contexto interno, e externo – estratégias que servem de ponte entre os
contextos interno e intermediário quando da construção de saberes inserto no
externo.
A realidade social e a formação do profissional têm início no primeiro dos
contextos e se estendem pelos demais. O que os diferencia um do outro é o nível
em que se dá o planejamento, a execução das ações e a qualidade destas que
ascende de um para outro contexto, visando à construção da sociedade e os valores
que a ela serão atribuídos.
Por assim ser é que, não apenas os professores e ou grupo de professores,
mas a universidade define, com cautela, a que resultados se deseja chegar, tanto
21 FREITAS, Luzinete Cesário de Araújo. Maio/2012.
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em relação à formação dos alunos quanto à dos seus professores, partindo de uma
situação de análise que enxergue uma sociedade organizada e participativa.
Isto requer uma quebra de padrões dentro da própria IES, visto que para um
planejamento nesse nível, com essa qualidade tão democrática, aparentemente, na
vanguarda deste nosso tempo, inclui distribuição de poder, possibilidades de
decisão na construção também “do que” e “para que” fazer, além de técnicas e
instrumentos viáveis à execução do mesmo.
Assim, tem-se bem claro os níveis de participação: “colaboração, nível de
decisão e construção em conjunto” (GANDIM, 2001, p.89). Neste sentido, o
planejamento participativo não prima apenas pelo trabalho em equipe, ele exige
também trabalho individual e de plenárias para que as estratégias e propostas sejam
discutidas e, se necessário, reestruturadas, a fim de que se alcance o pensamento
coletivo e as discussões polarizadas e a formação de grupo que apenas polemizem
questões sem argumentações viáveis ao progresso sejam evitadas.
Para adentrar melhor nas discussões acerca de planejamento, recorre-se à
ementa da disciplina Didática da Língua Portuguesa, que assim se apresenta:
Reflexões sobre ensino: leitura, escrita e gramática. Vivência de atividades docentes em escolas públicas dos níveis fundamental e médio, observando o desenvolvimento do processo ensino
aprendizagem de língua materna. (UERN, 2011)22
Sendo uma descrição discursiva sucinta, na qual se apresenta conteúdo
conceitual e ou procedimental de uma disciplina, a ementa é pensada por um grupo
de profissionais (professores) da universidade, para ser desenvolvida pelo professor
da disciplina, que não pode alterá-la.
Observa-se no contexto da ementa que há por parte da universidade uma
preocupação em colocar o aluno (universitário) em “vivência com atividades
docentes em escolas públicas dos níveis fundamental e médio”, porém, essas
vivências se apenas “observadas” de quase nada adianta no processo de formação
de professores de língua materna. Percebe-se ainda que a ementa contempla
22
http://www.uern.br/acessado em 26 de janeiro de 2012.
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leitura, escrita e gramática, saberes essenciais e indispensáveis ao usuário da
língua, mais especificamente, estudantes e futuros professores.
Entretanto, acredita-se que se os fatos observados, no decorrer destas
vivências de atividades docentes fossem postos em fórum de discussões, teriam um
maior enriquecimento da disciplina e da aprendizagem. Por outro lado, entende-se
que é muita ação para ser desenvolvida, com eficácia em apenas 120 horas
(divididas em créditos teóricos e práticos). Essa é uma das angústias vivida pela
professora de Didática da Língua Portuguesa, pois o trabalho de análise das
observações realizadas pelos alunos é complexo e demanda tempo, se bem
articulado, obviamente. Isto é claro nos trechos a seguir:
Então como Professora eu gostaria que essa ficasse pelo menos dois semestres com a mesma disciplina, não? Porque assim, você viu que não dá certo, né? Então, você leva essa ideia pra o semestre que vem / você vê que alguns textos não tinham o que deveria, o que você esperava ver, você viu também que algumas atividades não renderam, outras que você não esperava render tanto, rendem. Então assim são várias modificações que você faz, né? E então assim ela é tão visível essa mudança, visível na prática quando eu digo, do que no PCC, certo? Porque praticamente não muda de hábito, porque foi ideia geral, mas na prática tá entendo? Mas na prática, quando você vai fazendo a leitura dos textos já vai tocando né?, já vai trazendo outras discussões, pra mim é essa disciplina que está mesmo no PCC porque você já passou o perfil. Eu, por exemplo, quando recebi essa disciplina, eu não tinha, na minha atividade de classe, ela não contemplava o planejamento. Contemplava fazer um relatório, depois eu vi que esse relatório, esse menino ia ficar escrevendo o que ele via lá, né? tentava interpretar algumas teorias, né? mas não fazia muito sentido, não, eu me pergunto o que é que eu estou contribuindo pra prática mesmo, né? (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Nos constructos da fala da professora fica clara a ideia de que os conteúdos
planejados para o semestre são atropelados, e muitas vezes, transpostos para o
semestre seguinte. Essa parece não ser uma atitude louvável, pois pode influenciar
e alterar o desenvolvimento do aluno. No mais, há uma tensão, uma inquietude
muita acentuada nas entrelinhas do discurso da professora informante.
Pela fala dela entende-se que há um atropelamento de atividades no contexto
da sala de aula, o que faz com que se indague se há, na universidade, a
preocupação de se elaborar um plano de ensino que contemple o tempo do aluno na
universidade, na disciplina e, dentro deste contexto, a construção de saberes viáveis
à sua formação e alinhado com a proposta da ementa.
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Através do tenso discurso exposto, a professora, disfarçadamente, tenta
expor a sua concepção de ensino, deixando transparecer que prima por construção
de conhecimento, pautada nas discussões da teoria e da prática, mas deixa claro
também que na incompletude – nesse contexto de incompletude refere-se às
lacunas de construção de conhecimento que precisam ser repensadas,
reestruturadas e melhor aprimoradas - do seu trabalho busca meios para melhorar e
crescer a cada dia, porque acredita ter consciência de que as suas ações no
contexto da sala de aula têm o poder de modificar o ensino e elevar a qualidade da
aprendizagem, por isso sempre faz uma autoanálise dos seus projetos de ensino, do
seu planejamento, da execução das atividades propostas no contexto da sala de
aula, mas "defrontar-se com questões, de ordem burocrática e gerencial, que
acabam interferindo nas acadêmicas e pedagógicas" (MACHADO, 2006, p. 34) é
conflituoso visto que estas estão fora do nosso alcance enquanto profissionais, mas
é graças a estes conflitos que podemos expressar nosso descontentamento frente a
alguns fatos, refletir sobre eles e propor solução para melhorá-los, pois
Cada Professor busca essa abertura e diz sempre que cada um espera alguma coisa do outro, né? (inaudível) da Disciplina você vai dizer se deu certo, se deu errado, e você vai fazer suas “alterações” e esse programa uma coisa que eu sou muito sincera comigo, certo? é que geralmente nós fazemos um programa, muito pra dar conta, pra prestar contas, ele é muito mais burocrático, como todo documento é certo? E nós procuramos sintetizar o máximo possível (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
Embora a ementa seja de ordem burocrática, nela encontra-se flexibilidade,
pois ao professor cabe selecionar textos para a disciplina, priorizar alguns aspectos
que considere relevante para o crescimento do aluno e propor atividades que se
alinhem aos seus objetivos de ensino, elementos de grande relevância no ato de
planejar e que é da responsabilidade do professor da disciplina, não do grupo de
elaboração da ementa.
Nessa perspectiva, o programa de ensino contempla a ementa, mas não faz
dela uma bíblia a ser seguida ao “pé da letra”, assim do burocrático soergue-se o
democrático, razão pela qual ao pensar o programa considera-se o todo e não
apenas uma parte, o que não fica claro nas palavras da professora que o encara
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
105
Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
como “um documento direcionado à prestação de contas” razão pela qual ela
justifica a ação dos professores em “sintetizá-lo”.
Para melhor compreender o que vem sendo discutido adentra-se nas palavras
da professora informante e entende-se, que mesmo atendendo às exigências
burocráticas impostas pela instituição, a professora encontra espaços para imprimir
as marcas de suas ações no contexto da sala de aula, no ensino e aprendizagem do
aluno e coloca os alunos em campo para pesquisar, não apenas para cumprir uma
meta determinada, mas para colocá-los em contato com o mundo do ensino, da
pesquisa e da extensão.
Aqui, mais uma vez, implicitamente a professora volta a questionar a
necessidade do processo interativo entre os professores ao dizer que “um sempre
espera alguma coisa do outro” e ainda acopla ao processo de interação, o momento
de avaliação entre os professores, só que esse momento é parte de uma política
interna da universidade ou quem sabe dos próprios departamentos. Pensa-se,
inclusive, que se o professor sente essa necessidade, ele mesmo tem autonomia
para propor aos seus colegas a discussão necessária.
A LDB (Lei de Diretrizes e Bases, 1996, p.6) já estabelece que:
Artigo 13 - Os docentes incumbir-se-ão de: I. participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
II. elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
III. zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV. estabelecer estratégias de recuperação dos alunos de menor rendimento;
V. ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;
VI. colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.
Como se pode observar ao professor são dadas muitas atribuições porque a
ele cabe a difícil missão de elaborar situações de aprendizagens que permitam ao
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
aluno reelaborar seus conhecimentos a partir do que foi estudado, fato que implica
na pressuposição de que o professor, didaticamente, trabalha em sala de aula
visando ao desempenho do aluno, ou seja, preocupa-se com a formação integral do
sujeito que quer formar para a vida.
Em conformidade com as discussões até então apresentadas, pensa-se o
ensino como um ato de organizar, articular e apresentar o conteúdo de forma
dinâmica, interpretativa e reconstitutiva, pois o grande desafio do professor,
inclusive, daquele de ensino superior é cumprir o seu papel que parece ser o de
“cuidar para que os alunos pesquisem e elaborem, para, com isso, dar conta dos
conteúdos e principalmente saber refazer os conteúdos" (DEMO, 1998). Sob essa
ótica, vê-se o papel do professor como uma conquista social, compartilhada, pois
implica em trocas e representações.
Por conseguinte, o professor não pode ser visto como mero transmissor de
informações, pois até aquele que se omite de aprender para melhorar suas ações
(isto não é uma apologia ao comodismo) ainda devem ter méritos porque a
informação, por ele utilizada, nos interstícios do discurso ou da escrita, é
recontextualizada, polida e dita a um outro sujeito para ser repensada e, assim,
seguir no grande ciclo da palavra.
Mediante o exposto, acredita-se que o trabalho do professor é imprescindível
e começa com um primeiro e grande passo: o de planejar as suas ações como
docente. O trabalho do professor não é inspirador, mas investigativo, e muitas das
vezes, audacioso, uma vez que o professor para alcançar o nível de criticidade
favorável ao bom desempenho da profissão, inicialmente, “rasga” alguns valores
internos a si e à sociedade. Depois desta atitude, ele os (re)constrói na tentativa de
(re)pensar, inclusive alguns pressupostos teóricos e pedagógicos com os quais
vinha convivendo, refletindo ainda, acerca daqueles com os quais ele deve conviver.
Assim, será convidado a repensar a educação, a sociedade, os seus atos
enquanto profissional. Haverá momentos de opinar por estas ou aquelas teorias e
pedagogias. São momentos de dúvidas, estudos (não se concebe na sociedade
atual um professor que não estude), momentos gritantes de desapego...
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Parafraseando Gadotti (1998) é um “desrespeito a si mesmo” para um renascer
ideológico, político, social e filosófico.
A história da sociedade atual, apesar de apresentar muitas fendas negras,
cria muitas e ricas possibilidades para que professores, alunos e pesquisadores se
posicionem diante das velhas, enganosas e seguras práticas e se tenha a coragem
para dizer sim às mudanças, às transformações e às inovações viáveis à
transposição teórico-prática, assim, estamos repensando a nossa prática e como
bem coloca Gadotti (1998, p.71) “repensando também a sociedade”, papel, inclusive,
de todo o professor comprometido com a formação do educador e com um
planejamento de qualidade.
Ressalta-se que ensino e planejamento são coisas sérias, mas nem todos
professores veem por esta ótica, talvez por isso
O programa da Disciplina precisava obrigatoriamente está em uma página, certo? E parece que criou se mesmo essa ideia de que (inaudível) pode começar a escrever sobre o programa ele tem muito apoio, ele tem mais do que a gente precisava, mas a ideia foi boa como diz a história, e aí acaba fazendo o programa muito objetivo né? E por que eu digo que ele é objetivo? Porque ele é voltado pra lado de prestar contas, e aí eu vou ter que prestar contas do meu plano de trabalho individual, e do programa, então eu vou copiar, mas aí vem conversa comigo, com outro professor, que tem esse cronograma, né? ele é muito mais detalhado do que meu programa da Disciplina porque inclusive ele vem com a data (PROFESSORA)
Fonte: Entrevista da professora
O que se vê por traz das palavras da professora Qual o seu trabalho? Como
percebe o trabalho do outro professor (observado) e o do aluno (observador)? O que
fazer diante da insuficiência do tempo cronológico, que passa apressadamente?
Como ela reage diante de uma carga horária tão pequena para tanto ensino-
aprendizagem
Percebe-se que a concepção de ensino da professora aponta para uma
prática pedagógica interativa, que visa a uma formação de qualidade, refletida
dentro e fora da universidade, entretanto, penso que a professora de Didática da
Língua Portuguesa, na UERN, ao planejar vive dois momentos, inicialmente,
distintos, que posteriormente, juntam-se como resultado de um todo organizado,
especialmente, pelo nível de formação ideológica e profissional definido, adicionado
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
de sua prática pedagógica. Esses momentos podem ser representados
esquematicamente assim:
Figura11 – Momento burocrático vivenciado
Fonte: Entrevista da professora
Figura 12 – Momento democrático planejado e executado
Fonte: Entrevista da professora
A figura 11 parece expressar a divisão social do trabalho, onde repousam as
relações de poder. Vê-se que por trás de todo esse campo burocrático, próprio do
discurso pedagógico oficial, há princípios hierárquicos que apontam, que regulam a
BUROCRÁTICO
Ementa ProgramaPlano de trabalho
individualcronograma
DEMOCRÁTICO
Trabalho com outros
textos
Trabalho com às
atividades
Discussões em torno
das práticas de leitura
das práticas de escrita planejamento plano de aula
Análise de aulas
observadas
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
interação pedagógica. Essas vozes dizem ao professor o pensável para o contexto
de sala de aula e para a formação do futuro professor, e aqui sim o discurso
pedagógico apresenta-se como “instrumento dominador e regulador da reprodução
cultural” (BERNSTEIN,1986, p. 7), legitimando o nível elevado de abstração, muitas
vezes invisível aos olhos daqueles que conhecem apenas, parcialmente, a situação
para a qual traçam estratégias.
Entretanto, esse fazer burocrático gera entre os segmentos institucionais
conflitos, inquietações, desejo de inovar. E daí, surge a figura 12: o democrático,
onde o professor, por uma série de razões que lhe acompanham ao longo da sua
formação humana, torna-se capaz de enxergar o impensável, instigá-lo junto com os
seus alunos e torná-lo pensável.
Não se diz com isto que o professor é salvador da humanidade, o mágico
solucionador de problemas, sequer que seja ele responsável pelas mazelas da
educação, do ensino e da aprendizagem. Mas reafirma-se ser ele um dos principais
pilares através do qual as mudanças e melhorias virão, por isso, os professores,
especialmente, os formadores, devem estar bem preparados e cientes das suas
responsabilidades. Ele precisa superar os impasses, mas sozinho a luta torna-se
incansável, por isso é preciso que as Faculdades repensem seus programas e suas
práticas em torno do ensino, da aprendizagem e da essência do “formar
profissionais”.
Embora o sujeito galgue pelas veredas do desejo de ensinar língua materna
numa perspectiva inovadora, a burocracia impregnada no ambiente escolar
(universitário) parece impermeável e, de certa forma, interfere na ação do professor,
principalmente, quando se tem a consciência de que “geralmente nós fazemos um
programa, muito pra dar conta, pra prestar contas, ele é muito mais burocrático,
como todo documento é certo? E nós procuramos sintetizar o máximo possível”
(PROFESSORA).
Mas essa inquietude imersa na fala da professora aponta para o fato que de
que, dentro de si as vozes se alteram e trazem reflexos de que o diálogo que advém
destes questionamentos torna-se fundamental para se (re)pensar a formação, pois
aponta para o despertar de que “a consciência só se torna consciência quando se
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
impregna de conteúdo ideológico (semiótico) e, conseqüentemente, somente no
processo de interação social” (BAKHTIN, 2002, p. 34).
Convém lembrar que nos contextos internos e externos de sala de aula, o que
há por trás de cada palavra fascina e faz emergir do imaginário, verdades que o eu
do locutor desconhece e é pelas veredas do incógnito que se encontra uma das
grandes preocupações (senão uma das centrais) da professora: a de dar ares de
singularidade à escrita e incluir a si própria e seus alunos na despolitização de
conceitos vigentes. Acredita-se que a formação política é essencial às demais
formações humanas, sem, contudo usá-la em detrimento da formação pedagógica.
Entretanto, a fala da professora entra em choque com os propósitos por ela
expostos durante toda a entrevista, quando ela diz: “o programa muito objetivo [...]
voltado pra lado de prestar contas, e aí eu vou ter que prestar contas do meu plano
de trabalho individual, e do programa, então eu vou „copiar’, mas aí vem conversa
comigo, com outro professor, que tem esse cronograma [...]”.
Percebe-se então que o programa traz em si alguma essência voltada para o
ensino, a pesquisa e a extensão, afinal ele não é elaborado do nada, certamente,
em si estão insertos conhecimentos científicos, filosóficos, culturais, sociais dentre
outros de igual valor. Então, o termo “copiar” parece muito vago de significado para
alguém que se diz primar por interação, construção de conhecimentos, aulas
dinâmicas, pesquisa, escrita criativa, processual e elaborada.
O educador da nova era, além de pesquisador, estudante, de ter noções de
psicologia, sociologia, filosofia dentre outros pressupostos, é um inventor, um
criador, porque a ele cabe a árdua missão de reinventar a educação, criando
condições necessárias e democráticas para que se possam traçar estratégias
pedagógicas que amenizem o “individualismo criado pela exploração do trabalho”
(GADOTTI, 1998, p.90).
Sob esta ótica, compartilha-se do pensamento de Gadotti (1998) de que essa
nova empreitada, esse novo desafio não terá sucesso se for pensado, refletido,
elaborado e planejado pelos educadores, pois para que eles passem a desenvolver
essa ação, precisam se reeducar juntos, ato que inclusive, já teve o seu limiar.
Assim sendo, essa nova empreitada, esse novo desafio, certamente, perpassa os
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
pensamentos dos tecnocratas, no (des)conforto dos seus gabinetes, pois nenhuma
reforma é tão grande, nem uma lei é tão completa, infalível que a contemple com
veemência.
Nesse momento pensa-se em Gadotti, em Freire, em Chauí, pensa-se em
Sampaio, pensa-se na professora (sujeito - agente e centro destas discussões).
Passeia-se pelo Eu inconsciente de Lacan, e em seguida afirma-se: o trabalho do
professor, principalmente, o do ensino superior, especificamente o de Didática da
Língua Portuguesa, tende a ultrapassar as propostas colocadas pela ementa,
extravasar as peculiaridades do contexto acadêmico, pois não se caracteriza nas
bancadas burocráticas, infiltra-se na sociedade.
Visitar, observar e modificar pensamento em outros níveis de ensino
(despindo-se para ser transformado a partir de fatos e experiências vivenciadas),
fazer evoluir a profissão docente e discente; criar condições inovadoras à leitura,
escrita, interpretação e tudo isso jamais será descrito sob a forma de plano e
projetos.
Logo, o trabalho do professor de Didática da Língua Portuguesa deve,
necessariamente, ser interativo, dialógico, visto que requer competência e
habilidades múltiplas e despolarização do trabalho improdutivo envolvendo
dimensões que a própria universidade, a própria sociedade e muitos dos seus
professores desconhecem, o que não se aplica aos professores da UERN.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
CONCLUSÃO
Assim como as perguntas movem o mundo, as
inquietações nos impulsionam a caminhar sempre
em busca de respostas geradoras de outras
perguntas-chave. Elas movem o nosso espírito e
fazem ascender múltiplos conhecimentos.
(Freitas)23
Até aqui se fez um percurso pelos fios do discurso pedagógico para
compreender o processo de ensino da escrita em curso de LetrasUERN. Uma
investigação que exige continuidade, preferencialmente, de forma bem mais
aprofundada visto ser a escrita uma prática social pautada nas dimensões de leitura,
produção e análise linguística, fruto de discurso exteriorizado que organiza a
atividade mental do indivíduo. Esse ao internalizar o discurso do outro tem o seu tom
expressivo assimilado, reelaborado e reacentuado.
Mediante ao exposto, volta-se à pergunta inicial: o discurso pedagógico da
professora de Didática da Língua Portuguesa possibilita o desenvolvimento de um
processo de ensino de escrita, pautado na tríade: interação, construção de sentidos
e produção de conhecimentos
Diante dos dados contemplados, pode-se afirmar que, no contexto da sala de
aula, dá-se a mediação e que o professor se coloca como um dos interlocutores do
discurso possibilitando a presença de outra vozes no contexto de ensino, pois a
escrita é um confronto entre as várias vozes que a constituem e o texto, um
processo que, a partir de intervenções (dos enunciadores, do autor, dos
interlocutores), pode ser reescrito.
Entretanto, diante da nova realidade histórico-social, acredita-se que o
discurso pedagógico deve ser repensado e reconstituído, uma vez que o professor
deve constituir um lugar de escuta (interpretação) e reconstituir sua voz a partir
23
FREITAS, Luzinete Cesário Freitas, epígrafe escrito para este trabalho, maio/2012.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
também desse lugar, a partir do que foi dito, podendo esse lugar ser constituído de
diversos modos, o que constituirá uma organização do trabalho pedagógico e uma
delimitação de sentidos.
Nesta perspectiva, ao aprender o que dizer, se aprende como dizer, o que se
espera que seja dito, ou seja, criam-se expectativas de desempenho de papéis, de
habilidades e conhecimentos que determinam o que cada um faz e diz no espaço
escolar ou em relação a ele.
O discurso utilizado pelo professor assim como as estratégias propostas para
o ensino de escrita, no curso de Letras, apesar de já ter tido um avanço significativo
ainda não atende, na íntegra as exigências de um ensino produtivo de escrita, pois
os universitários, na sua grande maioria, escrevem para atender a uma solicitação
do professor, acabam por escrever pensando apenas em um interlocutor real,
ignorando assim o interlocutor virtual.
Além do mais, ao aluno universitário não é concedida a autoridade para
argumentar acerca de determinadas temáticas; a ele apenas a autoria da escrita em
nível muito superficial, pois para usar a voz, no contexto da escrita,
necessariamente, tem sempre que recorrer e priorizar outras vozes; falta-lhe o
impulso da criação da escrita, embora a concepção de ensino da escrita do
professor possa ser considerada como processual.
Diante do exposto, vê-se a necessidade de dar um novo rumo ao discurso
pedagógico, pois o mesmo caracteriza-se como propulsor de múltiplas
aprendizagens, dominando valores, criando confiança e aceitabilidade, como pode-
se ver na análise dos dados que constituem o capítulo anterior.
Assim, entende-se que as formas discursivas são uma extensão da palavra
provida de significação, extraordinariamente rica e importante nas instâncias da
comunicação e criação ideológica, nascituro da compreensão, processo discursivo
regido pela competência da renovação que inova a síntese dialética entre a vida
interior e a vida exterior, através da pluralidade de linguagens, reforçando, desta
forma, a complexidade da língua, no campo de ação dos seus infinitos enunciados,
das suas inúmeras possibilidades expressivas, da sua flexibilidade e de suas
características estilísticas e da sua variabilidade social e histórica.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Convém lembrar que a linguagem é essencial para a constituição da
sociedade, dos sujeitos e da história e refrata sentidos ideológicos produzidos no
discurso exterior e interior, de maneira interativa, dialogizada que ao permitir a
compreensão dos espaços sociais, tende a criar hierarquias, dominações,
discriminação, consensos e dissensos entre homens e conhecimentos, uma vez que
os signos refletem a realidade.
Entende-se, portanto, que o caráter dialógico, argumentativo e interacional no
discurso pedagógico é um passo decisivo para a construção do processo de ensino-
aprendizagem, uma vez que deve valorizar-se no contexto da sala de aula a
interação social.
Além do mais é preciso considerar que a argumentação é parte do processo
de mediação pedagógica, que deve, através da intervenção do professor enquanto
mediador e argumentador, desencadear mudanças nos modos de pensar e agir dos
alunos, intensificando, assim, a estruturação da dinâmica argumentativa e as
estratégias de argumentação, a produção de novos discursos e a ampliação do
processo de aprendizagem compartilhada.
Em vista dos argumentos apresentados, a universidade, assim como a escola
de nível fundamental e médio, é um espaço propício à transformação, à libertação;
um espaço para a construção e criação de conhecimentos e os educandos que dela
são membros integrantes trazem consigo dispositivos culturais, sociais, históricos e
ideológicos acumulados no decurso de suas vivências e aprendizagens, razão pela
qual, principalmente, nos cursos que formam profissionais para atuarem na
educação, deve-se ter o cuidado de trabalhar com afinco “as regras de base e de
desempenho, atualmente, conhecidas como regras de reconhecimento e regras de
realização” (BERNSTEIN, op.cit, 259).
Desta forma a universidade possibilita ao universitário distinguir e reconhecer
as peculiaridades dos contextos e regular a criação e produção de relações internas
a eles, respectivamente, como ponto de partida para que a prática pedagógica do
professor seja articulada ao seu discurso pedagógico, revelando assim de forma
mais eficaz e coerente à construção uma saber, uma vez que não se pode refletir
sobre a prática pedagógica, desconsiderando o discurso pedagógico do professor.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
Por conseguinte, a universidade precisa (re)estabelecer com as escolas uma
maior aproximação a fim de conhecer o seu currículo, pois esse seria um primeiro
passo para que se redimensionasse a prática pedagógica, numa perspectiva
inovadora de bases conceituais sobre o aprender e ensinar.
Entretanto, essa é uma tarefa complexa, pois requer mudanças nas políticas
de currículo e também uma investigação mais detalhada nas políticas educacionais,
pois esse novo olhar voltado à pratica educativa e ao ensino-aprendizagem deve
expressar uma perspectiva epistemológica pluralista, produtiva para o entendimento
do mundo globalizado que, por sua vez, aponta para a superação e o entendimento
dos pares binários: macro-micro, global-local, totalidade-singularidade, estrutura-
ação, identidade-diferença através do seu enunciado.
O discurso aqui colocado entrelaça-se com o de Bakthin (1992) para quem a
nossa consciência é “heteroglóssica (plurivocálica)”. Assim sendo, acredita-se que
os discursos, inclusive, o pedagógico, trazem em si a contribuição do outro, o que
vai delineando o nosso posicionamento ideológico frente ao mundo e alterando as
relações dialógicas construtoras das mais diversas formações discursivas.
Ao considerar que tanto os sistemas ideológicos quanto a ideologia do
cotidiano têm caráter eminentemente dialógico, ou seja, ambos influenciam as ações
dos sujeitos e são ao mesmo tempo influenciados entre si, entende-se que o
professor tome por base a ideologia do cotidiano, advinda das crenças por ele
construídas ao longo de sua formação para traçar suas estratégias de ações para o
ensino em sala de aula.
Se no período de sua formação, por algum motivo, ele foi impossibilitado de
refletir as ações docentes à luz do discurso científico, poderá ele, diante de uma
situação inesperada, não desenvolver uma crescente consciência de si e do próprio
mundo, apagando, inclusive a ressignificação do discurso pedagógico.
Por outro lado, se o professor for capaz de desenvolver uma reflexão,
associando-a à noção de autoconsciência, poderá ressignificar seu discurso
pedagógico, suas ações e ainda influenciar na ressignificação da consciência de
outrem. Nesse sentido, as ações são questionadas, compreendidas e repensadas, o
que resulta novas aprendizagens, por isso o trabalho do professor deve manter
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
caráter multidimensional e polissêmico e estar sempre em (re)construção.
Tomando a universidade como locutor e os educandos (futuros profissionais)
como destinatário, numa perspectiva bakthiniana, de interação, de tomada de
consciência, em processo de coautoria, de colaboração e negociação acredita-se
que a Universidade deve planejar estratégias que ressignifique, de forma mais firme,
o sistema ideológico, ainda cristalizado, em alguns educandos (e também
educadores) quebrando o mito de que o professor é detentor do saber e, deve suprir
as falhas do processo educativo, por elas se responsabilizando, dentre outros mitos
conservadores, ainda presentes, nas escolas e, evidentemente, em algumas
universidades.
Nesse sentido, cabe à universidade ressignificar também o seu discurso
pedagógico, associá-lo às suas ações e situar a escrita e a formação docente de
forma mais reflexiva e crítica, articulando os conhecimentos teórico, científico e de
saberes dana prática aos aspectos sócio-histórico-culturais que fazem parte
integrante do processo pedagógico.
O saber, atualmente, não está mais na universidade como ainda pensam
muitas pessoas, está apenas em parte da universidade, dada a sua
heterogeneidade e abundância, advindas, principalmente, dos meios de
comunicação interativa. Mediante o entrecruzamento deste saberes, cabe a
universidade assumir a função de (re)construtora crítica dana criação e produção de
conhecimento novo, com uma série de atividades pedagógicas e científicas e não
apenas com “as aulas” propriamente ditas.
Deduz-se, assim, que a universidade enquanto formadora de profissionais
tem um papel bastante relevante na formação humana e na transformação da
sociedade, o que a coloca numa posição peculiar no cerne da ação pedagógica. Daí,
percebe-se que a tarefa na universidade, também é bastante complexa, pois para
chegar a esse patamar terá, obrigatoriamente, que quebrar tabus e muralhas
construídos há séculos, assim não será de um dia para o outro que as mudanças
tomarão formas e refletirão na sociedade.
Mas estas dificuldades não podem ser vistas como empecilhos
intransponíveis. A universidade, ao ceder às exigências do novo equilíbrio entre
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Luzinete Cesário de Araújo Freitas – Dissertação de Mestrado 2012, UERN - PPGL
ensino e investigação, eixos que devem estabelecer relação intrínseca com as
questões metodológicas e pedagógicas, terá como foco principal a reflexão, o
(re)planejar de suas ações e ao professor cabe refletir acerca dos “saberes que
ensina” para as pessoas a quem esses “saberes vão ser ensinados”. Tudo pensado
numa dimensão individual (autoreflexão) e uma dimensão coletiva (reflexão
partilhada) (NÓVOA, op. cit).
Nessa lógica, a universidade não só tem como papel formar pessoas, mas
também produzir cultura e ciência, para tal deve repensar todo o seu projeto
institucional, formular proposta de formação de professores voltadas aos níveis
básicos de ensino; articular práticas, disciplinas e projetos de intervenção visando às
relações entre ensino, pesquisa e extensão; (re)pensar a estrutura curricular dos
cursos de Licenciatura e as propostas de estágio e ter uma proposta pedagógica,
(re)definindo, como já foi anteriormente mencionado o seu discurso pedagógico, pois
a partir dessa ressiginificação acredita-se que toda a memória pedagógica é afetada
por novas e variantes informações, fato que possibilita ao sujeito deslocar-se de
posição, construindo assim memória sob a ótica de outras formações discursivas,
passando deste ponto em diante a utilizar-se de outra pedagogia, desmanchando ou
reforçando sua concepção de ensino, aprendizagem e formação docente.
Acreditar que a escrita pode ser possibilitada pela dinâmica discursiva do
professor no contexto da sala de aula é apostar na prerrogativa de que nenhum
discurso é reproduzido, todos são ressiginificados na medida em que o locutor o
aprecia, o constrói, o compreende e o interpreta, visto que nesse intervalo de
organização inter e intramental o sujeito tece uma rede de significados que parte do
já-dito para o dizível, onde se fazem presentes várias vozes ecoando conceitos e
visões de mundos diversos.
A escrita, nesse contexto, não se volta para a produção textual, na qual os
alunos têm seus olhares atentos para as questões de caráter linguístico-gramatical.
Escrita, aqui, aponta para a produçãocriação de conhecimento, algo não instável,
inerente as capacidades do ser humano e que não pode ser ensinada quer na
escola quer universidade, porque é fruto de um desejo, uma vontade incontrolável
de aprender, de querer fazer e saber como fazer.
Pelos fios do discurso pedagógico: o processo de ensino da escrita nos cursos de Letras/UERN
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Entretanto, a escrita, nesta perspectiva, deve, urgentemente, ser instigada
pelos professores, principalmente de língua portuguesa das universidades, lugar
onde a produçãocriação do conhecimento se dá, impreterivelmente, pela pesquisa e
extensão. Isto posto um dos instrumentos viáveis à provocação é o discurso
pedagógico do professor, que possibilita ao educando a oportunidade de ter voz,
incorporá-la a outra vozes, não sendo assim apagado pelos autores que se tornam,
na maioria das vezes, centrais frente aos escritos realizados.
No entanto, focar a escrita nesse paradigma requer mudanças na concepção
de alguns professores universitários, pois exige que se lha enxergue não como um
produto, mas como constante aprendizagem que emerge da inquietação, do querer,
do contexto, pois “todas as práticas pedagógicas que envolvem a questão da
linguagem colocam em relação três elementos: interlocutor, enunciação e mundo”
(CARDOSO,1999, p. 35), que se interrelacionam num processo de interlocução,
regido pela compreensão, interpretação e produção de sentido.
Sob a ótica desse pensamento, afirma-se que a escrita é um trabalho que
produz trabalho, por isso precisa ser planejada, criativa e inovada através da
linguagem, numa complexa atividade interativa, na qual a abordagem discursiva
possibilita ao educando uma reflexão mais responsável voltada ao conjunto de
saberes e a sua ressignificação no interior do evento comunicativo.
Quebrar a linearidade da sequência programática da escrita é olhar com
permanente desconfiança para o conhecimento, procurando sempre redefini-lo
enquanto objeto de investigação e de aprendizagens de códigos ainda
desconhecidos; sem exagero, é claro, mas potencializando competências e
habilidades inerentes ao ser humano, através da sedução de novos olhares, que
muitas vezes, se escondem à margem do discurso pedagógico e acabam sendo
sonegados pela sociedade, deteriorando assim o sistema de ensino e fugindo da
redignificação do trabalho educacional.
Ao possibilitar que o educando questione, participe, seja sujeito ativo na
(re)construção do conhecimento une-se “historicidade que não está no produto, mas
no processo à materialidade lingüística”, isto é, o “discurso” e o “texto em si”
(ALMEIDA, 2009, p.65). Nessa perspectiva, dar-se-á ao educando condições de
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produzir-se enquanto ser social, capaz de apresentar, através da heterogeneidade,
singularidade na sua escrita e na sua voz, como forma de produzir conhecimentos e
também de questionar e se posicionar diante de situações comunicativas
divergentes.
Enfim, é necessário investigar com mais ênfase se o discurso do professor do
ensino superior se faz presente no discurso dos professores de outros níveis de
ensino e influenciam, realmente, na sua prática pedagógica de escrita, sugestão
possível para um novo estudo.
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INTRODUÇÃO
Discussão acerca de:
Interação entre sujeitos
Discurso Pedagógico
Objetivos
Geral
Específicos
Metodologia
Trabalhos na
área
Relevância
acadêmica
Estrutura da
Dissertação
O diálogo com o PROCAD
Processo de ensino da escrita
Entrevistas Observação
ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS
A pesquisa
Caracterização
Técnicas de coleta de dados
Método
D I S S E R T A Ç Ã O
ELEMENTOS TEÓRICOS
Discurso: voz que produz
vozes
Discurso, escrita e ensino no contexto da sala de
aula
Discurso pedagógico: dialogismo e construção
de sentidos
Escrita: em busca de sujeitos mais
autênticos
PROCEDIMENTOS E ANÁLISES
DOS DADOS
Ensinar a escrever: um desafio que perpassa a formação acadêmica
Discurso pedagógico e escrita: uma rede de relações
Formação profissional, discurso e escrita: a fusão de três grandes pilares
do ensino
A interação no contexto da sala de aula: processo de construção de sentidos
Planejamento na Universidade
Discurso pedagógico e escrita: vertentes da construção de conhecimentos
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
APÊNDICE A - MAPA
CONCEITUAL DA
DISSERTAÇÃO
APÊNDICE
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