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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA
CURSO DE TURISMO
DEPARTAMENTO DE TURISMO
THAÍS SANTOS DA MOTA
POORISM: A POBREZA COMO ATRATIVO TURÍSTICO
NITERÓI
2013
THAÍS SANTOS DA MOTA
POORISM: A POBREZA COMO ATRATIVO TURÍSTICO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Turismo da Universidade Federal
Fluminense como requisito parcial de avaliação
para a obtenção do Título de Bacharel em
Turismo.
Orientador: Profº D. Sc. MARCELLO DE BARROS TOMÉ MACHADO
Niterói
2013
POORISM: A POBREZA COMO ATRATIVO TURÍSTICO
Por
THAÍS SANTOS DA MOTA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Turismo da Universidade Federal
Fluminense como requisito parcial de avaliação
para a obtenção do Título de Bacharel em
Turismo.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________________
Profº. D. Sc. Marcello de Barros Tomé Machado – Orientador - UFF
__________________________________________________________________
Profº. M. Sc. Bernardo Lazary Cheibub – Convidado
___________________________________________________________________
Profª. D. Sc. Helena Catão Henriques Ferreira – Departamento de Turismo
Niterói, 19 de dezembro de 2013
A Deus, o único digno de receber toda honra, toda glória e todo louvor. Porque Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas. Aos meus amados pais, a minha querida avó, aos meus maravilhosos irmãos e aos poucos e bons amigos com os quais a vida me presenteou.
AGRADECIMENTOS
Ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo por serem a fonte real da minha felicidade, força
e razão de viver. Sem Deus, certamente não teria nada nem seria ninguém. Ele tem
me ajudado a manter o equilíbrio e tem sido o grande “orientador” da minha vida.
A minha mãe Sueli que sempre acreditou e investiu em mim, me ensinou o caminho
de Deus e sempre me instruiu a acreditar nos meus sonhos, fazendo o possível e o
impossível para me ver feliz.
Aos meus familiares pelo incentivo, por acreditarem que eu chegaria até aqui e por
todas as palavras de incentivo.
As minhas queridas companheiras de estudo na UFF, com as quais compartilhei
momentos de alegria, conhecimento e aprendizado: Beatriz Dias, Carolina Cabral,
Nathália Gomes, Nikita Chrysan, Sylvia de Frias e Yasmin Chan.
Ao meu orientador Profº Marcello de Barros Tomé Machado por seu auxílio durante
o período de construção deste trabalho.
Muito obrigada a todos que de alguma forma contribuíram para que eu pudesse
concluir mais essa etapa da minha vida.
RESUMO
Nos dias de hoje, estudar turismo é deparar-se com um fenômeno multifacetado e em constante transformação. Nesse contexto, destaca-se a prática do turismo em locais de pobreza conhecida como poorism. Analisar o contexto histórico da pobreza bem como sua relevância social faz-se necessário para compreender como o poorism é capaz de transformá-la em atrativo turístico. O objetivo geral deste estudo é investigar a existência do poorism como uma opção de segmento turístico que vem incorporando-se ao itinerário de muitos turistas no mundo inteiro, especificamente, nas favelas do Rio de Janeiro. Este trabalho tem como objetivos específicos: analisar as referências sobre o tema e contribuir com a construção de novas bases teóricas para o estudo do turismo contemporâneo, da segmentação do turismo e das motivações responsáveis por novas formas de consumo em viagens; pesquisar dados sobre a pobreza a nível mundial e enquanto tendência para o turismo e, explicar o que é poorism e como ele pode ser desenvolvido visando à diminuição dos efeitos da pobreza além de verificar se o interesse pela observação da pobreza alheia influencia a decisão de quem opta por esse tipo de turismo. A metodologia utilizada compreende uma pesquisa descritiva do tipo bibliográfica e de campo. Os resultados revelam que as opiniões dos turistas foram bastante dividas quando se trata de reconhecer a relevância da pobreza alheia para a execução do turismo em favelas, todavia, a maioria não considera que a pobreza tenha sido o fator principal ao influenciar a decisão da compra do tour. Verifica-se que a maioria dos turistas opta por consumir esse tipo de turismo com o objetivo de conhecer melhor a realidade da comunidade local, evidenciando um interesse em vivenciar uma experiência de turismo “real”.
Palavras-chave: Turismo contemporâneo. Segmentação. Motivações. Pobreza. Poorism.
ABSTRACT
Nowadays studying tourism is to come across a multifaceted phenomenon and constantly changing. In this sense, it stands out the practice of tourism in places of poverty known as poorism. Analyze the historical context of poverty as well as its social relevance becomes necessary in order to understand how poorism is able to turn poverty into tourist attraction. The general objective of this study is to investigate the existence of poorism as a tourism segment option which has being incorporating into the itinerary of many tourists around the world. This work has the following specific objectives analyze the references about the subject and contribute to the construction of new theoretical basis for the analysis of contemporary tourism, of segmentation in tourism and of the motivations which can generate new ways of consumption when travelling; to research data about poverty worldwide as well as tendency for tourism and to explain what is poorism and how it can be developed in order to reduce the poverty effects besides assessing if the interest about the observation of others' poverty influences the decision of who opts for this type of tourism. The methodology includes a descriptive research by the type bibliographic and a field research. The results revealed that the tourist’s opinions were sharply divided when it comes to admit the relevance of poverty of others for the execution of tourism in “favelas”, however, most of them do not consider that poverty had been the main factor when influencing their decision about buying the tour. It was established that most tourists choose to consume this type of tourism in order to better understand the reality of the local community, evidencing an interest in experience a "real" tourism experience.
Keywords: Contemporary Tourism. Segmentation. Motivations. Poverty. Poorism.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Variáveis da Segmentação 21
Figura 2 Bases para a segmentação de mercado 23 Figura 3 Tipologia das motivações em turismo 27 Figura 4 A pobreza global 36 Figura 5 Lista das Nações Unidas dos Países Menos Desenvolvidos 37 Figura 6 The United Nations Human Development Index (HDI) rankings for
2012 40
Figura 7 Ranking Índice de Desenvolvimento Humano Global (IDH) 40 Figura 8 Estratégias de turismo favorável a pessoas afetas pela pobreza 59 Figura 9 Gráfico de gênero 64 Figura 10 Gráfico de faixa etária 64 Figura 11 Gráfico de grau de escolaridade 65 Figura 12 Gráfico de país de origem 66 Figura 13 Gráfico de profissão 66 Figura 14 Gráfico de favelas visitadas 67 Figura 15 Gráfico de frequência na participação do tour 69 Figura 16 Gráfico de fonte do conhecimento do tour 70 Figura 17 Gráfico de meio pelo qual o tour foi comprado 70 Figura 18 Gráfico dos sentimentos vivenciados durante o tour 71 Figura 19 Gráfico de nível de satisfação após o tour 72 Figura 20 Gráfico de influência da pobreza como fator determinante para a
compra do tour 73
Figura 21 Gráfico de exploração da pobreza alheia durante o tour 73 Figura 22 Gráfico de porcentagem da contribuição financeira direta do turista à
comunidade 74
Figura 23 Gráfico de tipos de colaboração financeira direta para a comunidade local
74
Figura 24 Gráfico de recomendação do tour para outro turista 75
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
1 TURISMO CONTEMPORÂNEO, SEGMENTAÇÃO DO MERCADO
TURÍSTICO E NOVAS FORMAS DE CONSUMO EM VIAGENS
13
1.1 TURISMO CONTEMPORÂNEO: CENÁRIOS E TENDÊNCIAS 13
1.2 A EXPANSÃO DO MERCADO POR MEIO DA SEGMENTAÇÃO DO
TURISMO
18
1.3 AS MOTIVAÇÕES E A EXPERIÊNCIA DO TURISTA COM NOVAS
FORMAS DE CONSUMO EM VIAGENS
24
2 CONCEPÇÕES ACERCA DA POBREZA 30
2.1 POBREZA: VISÕES OFICIAIS 30
2.2 LOCALIDADES DE CONCENTRAÇÃO DE POBREZA 36
2.3 A POBREZA ENQUANTO TENDÊNCIA NO TURISMO 44
3 POORISM: A POBREZA COMO ATRATIVO TURÍSTICO 46
3.1 A POBREZA QUE SE VENDE 47
3.2 TOURS DE POBREZA: OS CHAMADOS TOURS DA REALIDADE 52
3.3 A GESTÃO DO DESAFIO DA POBREZA: O TURISMO COMO
MINIMIZADOR DA POBREZA LOCAL
54
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS 62
4.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 62
4.2 RESULTADOS DA PESQUISA 63
CONSIDERAÇÕES FINAIS 76
REFERÊNCIAS 79
APÊNDICE 84
10
1 INTRODUÇÃO
O turismo tem a capacidade de moldar-se aos gostos e às necessidades do
turista, tornando “exóticos” lugares e produtos os mais variados. A viagem é antes
de tudo motivada pela busca por uma experiência de descobrimento pessoal e do
mundo. O turista contemporâneo quer se envolver com o destino e com os seus
habitantes, entender seu modo de vida, conhecer seus hábitos, vivenciá-los e
experimentá-los.
Assim, a compreensão da experiência como um diferencial a ser ofertado aos
consumidores foi um avanço importante em termos mercadológicos, sobretudo, no
que diz respeito à utilização da segmentação do turismo, permitindo o conhecimento
das necessidades do mercado e a oferta de produtos adaptados a cada segmento.
É essencial ter a noção de que a sociedade vem se transformando e,
consequentemente, os turistas também estão interessados por novos produtos e
novas alternativas de turismo. Nesse sentido, observa-se o crescente interesse de
turistas – estrangeiros, em sua maioria – por conhecer o “lado feio” das grandes
cidades, especificamente, as áreas mais pobres e miseráveis.
Não é tarefa simples precisar as motivações desses turistas, afinal, muitos
podem entender esse tipo de turismo como uma tentativa egoísta de transformar a
pobreza em espetáculo, porém, geralmente, percebe-se que muitos dos turistas que
procuram esse tipo de turismo estão interessados em comparar algo que é
conhecido, apenas por meio da mídia, com suas próprias experiências vivenciadas
in loco.
Sendo assim, o tema abordado, a saber, o “pobrismo” ou poorism foi
escolhido de forma a estudar o resultado da junção de dois assuntos aparentemente
opostos e controversos: turismo e pobreza. Não é de hoje que o termo poorism já
vem sendo utilizado em artigos e reportagens pelo mundo, principalmente nos
Estados Unidos, fazendo referência ao turismo cujo foco está na visitação de áreas
pobres.
A justificativa deste trabalho se dá pelo interesse de abordar um assunto que
tem chamado a atenção dos estudiosos do turismo e dos turistas em geral, uma vez
que o poorism trata de um segmento turístico inusitado e ao mesmo polêmico.
11
O objetivo geral deste estudo é investigar a existência do poorism como uma
opção de segmento turístico que vem incorporando-se ao itinerário de muitos
turistas no mundo inteiro, especificamente, nas favelas do Rio de Janeiro. Além
disso, o estudo da pobreza e de seus impactos sempre foi um assunto importante
para sociedade devido a sua gravidade, presente nas discussões dos governos do
mundo inteiro. Por isso, tomou-se como exemplo o turista que vem às favelas da
cidade do Rio de Janeiro, visando compreender suas motivações ao incluírem no
roteiro a visita de um local mais pobre da cidade, em vez de simplesmente
conhecerem os lugares considerados tradicionalmente turísticos.
Enquanto os objetivos específicos são: a) analisar as referências sobre o
tema e contribuir com a construção de novas bases teóricas para o estudo do
turismo contemporâneo, da segmentação do turismo e das motivações responsáveis
por novas formas de consumo em viagens b) pesquisar dados sobre a pobreza a
nível mundial e enquanto tendência para o turismo, c) explicar o que é poorism e
como ele pode ser desenvolvido visando à diminuição dos efeitos da pobreza além
de d) verificar se o interesse pela observação da pobreza alheia influencia a decisão
de quem opta por esse tipo de turismo.
Para o desenvolvimento do referencial teórico foi feito uma pesquisa
descritiva do tipo bibliográfica com levantamento de dados que abordam o tema, tais
como livros, trabalhos de conclusão de curso, revistas, artigos científicos juntamente
com uma pesquisa de campo.
O presente trabalho foi estruturado em quatro capítulos que buscam
respostas sobre o problema que norteou a pesquisa: saber se a pobreza encontrada
nas favelas visitadas, efetivamente, foi o principal fator a influenciar a decisão do
turista na escolha do tour.
O primeiro capítulo traz uma breve contextualização do turismo
contemporâneo, da expansão do mercado por meio da segmentação em turismo e
um resumo do estudo das motivações dos turistas em viagens bem como o
desenvolvimento de novas formas de consumo em viagens.
O segundo capítulo faz uma breve apresentação das visões oficiais e dos
conceitos de pobreza, além de mostrar algumas das localidades de concentração da
12
pobreza no mundo bem como introduzir a temática da pobreza enquanto tendência
para o turismo.
O terceiro capítulo aborda especificamente as definições na visão de diversos
estudiosos do tema do que vem a ser poorism, a condição da pobreza enquanto
atrativo turístico, além de demonstrar exemplos de tours de pobreza mundo afora
bem como propor o desenvolvimento do turismo como instrumento de redução da
pobreza local.
O quarto capítulo trata da metodologia do trabalho. Nele é apresentado o
caminho metodológico seguido para o estudo do tema proposto: o método adotado,
o tipo de pesquisa, a técnica de coleta e análise dos dados e os resultados da
pesquisa.
Por fim, serão apresentadas as considerações finais a partir de uma síntese
dos resultados obtidos, as principais contribuições deste trabalho, além de
sugestões para futuras pesquisas visando um aprofundamento maior do estudo
desse tema.
13
1 CONCEITUAÇÃO DE TURISMO CONTEMPORÂNEO, SEGMENTAÇÃO DO
MERCADO TURÍSTICO E NOVAS FORMAS DE CONSUMO EM VIAGENS
Este capítulo tem como objetivo conceituar turismo contemporâneo,
abordando a relação do ser humano com o turismo desde o passado até os dias
atuais, abordando a segmentação do turismo e as motivações dos turistas, atreladas
às tendências e às inovações percebidas nas novas formas de consumo no turismo.
1.1 TURISMO CONTEMPORÂNEO: CENÁRIOS E TENDÊNCIAS
O turismo é um fenômeno relativamente recente, todavia, é sabido que
viagens são realizadas desde a pré-história, pelas mais diversas motivações;
relacionadas à sobrevivência e ao bem-estar, destacando-se entra essas: religiosas,
com fins medicinais e comerciais.
O nomadismo, ou seja, o modo de vida em que não se tem lugar fixo foi
característico no estilo de vida dos primeiros seres humanos e, por consequência,
primeiro motivador de viagens na sociedade. Esse fato antecedeu uma tendência ao
posterior potencial para o desenvolvimento da atividade turística no mundo.
Segundo Meyer (2007, p.16), para tratar de um fenômeno tão complexo como
o turismo, é preciso, primeiramente, conceituá-lo. A autora comenta que: “A
etimologia dessa palavra está relacionada ao termo tornus (torno) e tornare (tornear)
do latim; turn, do inglês; e tour do francês. Em todos os casos, há referência à ideia
de girar, dar a volta, retornar, ao mesmo lugar”.
É importante destacar que o ser humano não é apenas um indivíduo em
busca de realização financeira ou meramente preocupado com a sua sobrevivência,
como foi essencialmente no passado, mas, principalmente, um ser orientado por
experiências por meio das quais busca agregar valor pessoal a sua existência. A
busca dessas experiências é vista como uma forma de alcançar autoconhecimento,
transformação do ser e aprendizado, ainda que o viajante possa se deparar com as
mais variadas dificuldades no decorrer de sua jornada.
Bastos (2006) observa que na visão de muitos autores e estudiosos do
fenômeno, o turismo é também uma atividade funcional, pois esta recompõe o
14
sujeito física e psicologicamente do estresse cotidiano. O homem moderno sai em
busca de um espaço, anteriormente limitado a sua comunidade local com o intuito
de recompor-se interna e externamente do enfrentamento das obrigações diárias.
Em relação ao turismo que caracteriza esse homem moderno, Ito observa
que:
O período compreendido entre os séculos XVI e XVII é considerado como a base da construção do turismo moderno. Desde o século XVI, verifica-se o crescimento do volume das viagens. Como havia dificuldade de circulação de informação, por meio da realização de viagens conhecia-se o mundo, outras culturas, outros povos (2008 p. 126).
O turismo com base nos moldes atuais, cuja trajetória de desenvolvimento
está relacionada às transformações sociais ocorridas no século XIX, era
fundamentado no modo de produção industrial e no desenvolvimento da tecnologia,
como meio determinante para se definir o indivíduo que estaria apto a viajar ou não.
(ITO, 2008).
A autora supracitada acrescenta que o “Turismo contemporâneo” ou o “Último
período de desenvolvimento do turismo” teve início imediato em 1945, no pós-
guerra. Nesse cenário, o fordismo aparece como sistema de produção, havendo a
formação de mercados globais, propiciando o desenvolvimento de diversas
atividades, dentre elas, o turismo; acrescentando que: “No final do século XX e início
do XXI, o turismo mantém-se como prática e fenômeno de massas, com tendência
de crescimento, com a incorporação de tecnologia, construção de hotéis e resorts;
criação de rotas áreas etc”. (2008, p. 131).
Todavia, essa análise não possui unanimidade entre todos os estudiosos do
assunto, visto que numa etapa mais recente, o turismo de experiência, cujo
fundamento não se baseia em características fordistas, é apontado como o grande
precursor do turismo contemporâneo.
Em outra análise, Cardoso (2011) comenta que a modernidade trouxe às
viagens um sentido associado ao prazer e à liberdade, sobretudo, com o avanço do
desenvolvimento dos meios de transporte, com a invenção da máquina a vapor, com
o desenvolvimento da construção civil, do processo de urbanização, além dos
15
avanços sociais, demonstrando que a sociedade moderna é fortemente enraizada
na ideologia capitalista, cujo interesse maior visa ao crescimento econômico.
Ao abordar essa questão, Cardoso pondera que:
O turismo é uma atividade que recebe evidência na modernidade devido às mudanças estruturais da sociedade que o inseriram no capitalismo, o tornando um objeto de desejo a ser adquirido como pré-requisito para se cativar um sonho de felicidade (2011 p. 15).
Há pessoas que se deixam fantasiar com a crença em propagandas de
serviços turísticos que lhes prometem desfrutar dos melhores momentos de suas
vidas, por meio da compra de determinada viagem, o que instiga o consumo e
transforma os sentidos atribuídos à ideia de viajar.
Nesse sentido, a aquisição de bens e sentido pessoal fica atrelada ao
consumismo, como meio de suprir necessidades emocionais, tais como a tão
almejada busca da felicidade. Logo, quando esse sentimento não é alcançado,
geralmente observa-se uma sociedade mergulhada no vazio e na busca constante
por prazeres capazes de preencher suas mais diversas ausências.
Cardoso (2011) afirma que a viagem moderna difere-se das primeiras viagens
da antiguidade ao demonstrar uma tendência humana em buscar meios para fugir
do cotidiano. Consequentemente observa-se a existência de formas de viagens que
propiciam o consumismo, a busca do conforto e das facilidades advindas da
comercialização de viagens. Desse modo, salienta a referida autora, que uma das
características perceptíveis no ser humano moderno é a tentativa da busca de
reinvenção social, na qual se abandona qualquer modelo de passado, visando à
“tradição do novo”. Essa ideia parte do conceito da “destruição criativa”, típico da
modernidade. Percebe-se então uma sociedade significativamente marcada pela
presença do individualismo com forte valorização da experiência pessoal.
Buscando a compreensão da conexão dos acontecimentos sociais e das
transformações que eles causam na sociedade influenciando outras esferas da vida
humana, dentre elas, as atividades relacionadas ao turismo, Cardoso comenta: “As
transformações pelas quais a sociedade passa constantemente tem determinado o
16
ritmo de vida das pessoas. E, consequentemente, as expectativas delas em relação
ao turismo” (2011 p. 9).
De acordo com Cardoso (2011), a contemporaneidade caracteriza uma
sociedade, por vezes intitulada, do ócio ou pós-industrial. Sobretudo, porque há
maior disponibilidade de tempo livre, consequência da redução no tempo de
trabalho, que veio a ser tornar possível após o advento da revolução industrial, cujo
destaque se dá com o advento dos avanços tecnológicos.
Nesse sentido, Cooper et al. (2011) comentam sobre o quanto a internet pode
mobilizar todos os negócios ligados ao turismo contemporâneo, influenciando a
cultura e o comportamento do consumidor, sobretudo, o que ele compra e a forma
com a qual se comunica com o mundo.
Portanto, é possível observar a existência de um ambiente turístico
caracterizado por consumidores exigentes e poderosos, que estão demonstrando
mudanças de geração em geração, em suas necessidades e expectativas.
Logo, os fornecedores de produtos turísticos são vistos no mercado como
profissionais conectados em redes e conduzidos pelo conhecimento, buscando
estratégias empreendedoras a fim de atrair determinados grupos de mercado-alvo,
principalmente, ao explorar uma tendência social em potencial.
Conforme Cardoso (2011) afirma, o turismo, simultaneamente às mudanças
sociais, passou por diversas transformações, inclusive no que diz respeito às
motivações dos turistas e às tendências futuras de turismo.
Sendo assim, é importante entender que principalmente nos dias atuais, o
turismo transpõe a simples ideia de deslocamento, pois sua abrangência vai muito
além de distâncias espaciais percorridas, uma vez que abarca olhares, vivências e
fruições de cada indivíduo.
Atualmente, é possível observar que o comportamento do turista em viagens
tem sido influenciado por motivações incomuns, novidades e tendências das mais
diversas. Para esses turistas mais curiosos, exigentes e conscientes do universo de
possibilidades que possuem, é preciso pensar estrategicamente em como manter a
motivação e continuar movimentando um mercado em constante crescimento.
A respeito do perfil do turista, Ito observa que:
17
A sociedade contemporânea expõe os indivíduos a um ambiente complexo, múltiplo e competitivo onde vivenciam e experimentam muitas oportunidades e necessidades. O turismo cresce diante desta demanda crescente por necessidades hedonistas. O turista compra diferentes destinos/atrativos: montanhas, praias, hotéis, sítios arqueológicos, entre outros, buscando suprir necessidade, sonho, fantasia e auto-realização (2008 p. 138).
Cooper et al. (2011) alertam que para haver uma abordagem contemporânea
do turismo é preciso, primeiro, entendê-lo como uma particularidade do setor de
serviços, cuja inseparabilidade entre experiências de consumo e de produção, faz
com que ele se torne um produto turístico com características específicas.
Assim, ao tratar o turismo em sua abordagem contemporânea, aspectos
referentes à mobilidade temporária voluntária devem ser levados em consideração,
a fim de identificar o potencial de produtos e das experiências existentes no universo
do turismo contemporâneo.
Além disso, Cooper et al. chamam atenção para a importância da abordagem
contemporânea voltada para a segmentação, uma vez que os produtos turísticos e
os mercados estão ligados de maneira intrínseca:
Uma abordagem contemporânea significa reconhecer as experiências com produtos turísticos, relacionando-as ao mercado do “pós-turista” e entregando experiências turísticas envolventes e memoráveis que efetivamente “transformam” o visitante (2011 p. 19).
O mercado do turismo contemporâneo é definido pelo “pós-turista”. Segundo
Molina apud Tomé Machado: “O Pós-Turismo seria um novo caminho, gerado pelas
seguintes forças: o desenvolvimento de conhecimento científico e de novas
tecnologias; amplas mudanças sociais e culturais; novas formas de controle do
espaço e território; crescimento da pobreza e da violência; o terrorismo organizado;
os problemas ambientais e o medo de contrair doenças” (2003, p. 2).
O Pós-Turismo engloba turistas exigentes, poderosos e versados, que
entendem o setor além de estarem conscientes a respeito de como levar vantagens
na escolha de destinos e utilizar a flexibilidade de preço a seu favor.
18
Ademais, o turista contemporâneo caracteriza-se por compor um grupo que
dispõe de pouco tempo e exige entrega imediata (on-line) de produtos e de serviços
turísticos com alto padrão de qualidade, ou seja, são pessoas que fogem dos
moldes tradicionais de comportamento e de segmentação. Para compreender quem
é esse “pós-turista”, é necessário compreender os efeitos da globalização, uma vez
que a sociedade atual faz parte de um “mundo sem fronteiras”.
A globalização é capaz de unificar mercados distintos provocando duas forças
opostas no ambiente do mercado de turismo contemporâneo: a homogeneização
das preferências do cliente com os interesses comunicados pelo marketing de
massas e a fragmentação, à medida que os mercados de massa tendem a se dividir
em segmentos cada vez mais fragmentados.
Por ser um fenômeno social relevante e com muitos fatores positivos Cooper
et al. comentam que:
Turismo é uma atividade de ponta nas sociedades atuais, envolve deleite/encanto e satisfação pessoal. Insere-se nas sociedades democráticas, complexas e pluralistas, demandando ética, desenvolvimento sustentável, respeito à diversidade e aos problemas ambientais e sociais [...]. Turismo articula-se com lazer, entretenimento, gastronomia, eventos, cultura, esportes, hospitalidade e meio ambiente [...] (2011 p. 82).
Desse modo, por caracterizar um mercado formado por turistas ávidos por
roteiros turísticos que melhor se adaptem as suas necessidades, preferências, aos
seus gostos e estilos de vida, é preciso compreender por que se faz necessária a
organização da atividade turística em segmentos como será visto com mais detalhes
a seguir.
1.2 A EXPANSÃO DO MERCADO POR MEIO DA SEGMENTAÇÃO DO TURISMO
A segmentação surge como uma importante ferramenta para conquistar, criar
necessidades e desejos no consumidor do produto turístico. Por meio dela, é
possível estudar e planejar o mercado turístico, visando à formatação de novos
produtos que propiciem a diversificação da oferta turística.
19
De acordo com Panosso Netto e Ansarah: “A ideia de segmentar o mercado
turístico, em qualquer destino, tem o mesmo significado semântico, qual seja:
identificar pessoas com afinidades e desejos semelhantes que estejam dispostas a
consumir um mesmo produto” (2010 p. 2).
O Ministério do Turismo no Brasil, por exemplo, reconhece que a
segmentação do mercado turístico implica no domínio do conhecimento da oferta de
um destino (atrativos, infraestrutura, serviços e produto turísticos), além da
demanda, (as especificidades dos grupos de turistas que já o visitam ou
possivelmente virão a visitá-lo).
Nesse sentido, o Ministério do Turismo entende que a segmentação é uma
forma de organizar o turismo para fins de planejamento, gestão e mercado. Diante
disso, entende-se que segmentos turísticos podem ser estabelecidos a partir dos
elementos de identidade da oferta e também das características variáveis da
demanda (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2010).
Para compreender a segmentação, é fundamental compreender o contexto do
que vem a ser mercado, para isso, geralmente, leva-se em consideração a
improbabilidade de que os consumidores tenham as mesmas preferências ou
busquem sempre o mesmo tipo de experiência turística.
Dessa forma, é preciso apreender a oferta (o tipo de turismo ou experiência a
ser oferecida) e a demanda (perfil dos turistas potenciais que consumirão aquela
experiência), pois, falar de mercado turístico é trazer à tona a noção de
segmentação da oferta ou da demanda, visto que se lida com uma infinidade de
pessoas das mais diversas.
A respeito da segmentação do mercado, Rigatto pondera que:
Ao compreender que o mercado é composto por consumidores, que eles se comportam de diferentes maneiras, com diversas atitudes e desejos diferentes entre si, esses fatores podem influenciar nas variáveis geográficas, demográficas, psicológicas e comportamentais (2007 p. 84).
Para Cooper et al. (2011), a segmentação voltada para o mercado turístico é
baseada em uma estratégia de marketing que visa atrair um público específico para
20
um lugar específico. Portanto, busca-se conhecer o potencial do turista a fim de lhe
oferecer os produtos que mais se adequem aos seus sonhos e as suas expectativas.
Partindo desse princípio, segundo o Ministério do Turismo (2010), segmentar
a demanda é definir e unificar a parcela das pessoas que compartilham as mesmas
características, necessidades e expectativas. É estar preparado para identificar as
necessidades de cada pessoa a fim de ofertá-la o tipo de experiência turística que
melhor se adaptará aos seus desejos e as suas expectativas.
Além disso, analisar e entender o porquê da segmentação não está apenas
relacionado à compreensão da demanda dos turistas atuais, é preciso conhecer e
entender as modificações e tendências que estão influenciando os padrões de
consumo da sociedade.
É necessário ressaltar que os profissionais que atuam nos serviços
relacionados diretamente ao turismo não criam os segmentos, de fato, eles apenas
os identificam e decidem para quais segmentos os esforços de criação e oferta de
produtos serão direcionados, tornando possível a atração e a fidelização dos
turistas.
Diante disso, a segmentação pode ser considerada um elemento estratégico
de ação de marketing de destinos, cujo uso pode ser um critério essencial no
processo de elaboração de meios para desenvolver o turismo, visando à atração de
diferentes perfis de turistas.
Segundo Cooper et al. devido à dificuldade em atender a todos os públicos
em potencial, não existe país no mundo que não queira segmentar seu mercado
turístico. Desse modo, eles argumentam que:
Ao compreender que o mercado é composto por consumidores, que eles se comportam de diferentes maneiras, com diversas atitudes e desejos diferentes entre si, esses fatores podem influenciar nas variáveis geográficas, demográficas, psicológicas e comportamentais. (2007 p. 84).
Ainda buscando a análise de outras bases teóricas, a Organização Mundial
do Turismo afirma:
21
Os fatores que fazem o turista optar por um destino ou outro são variados, e, muitas vezes, subjetivos, impossíveis de serem identificado. Podem ser visitas a amigos e familiares, tratamento de saúde, profissional, estudo, fuga do cotidiano ou do estresse, para conhecer-se melhor ou aventurar-se na natureza selvagem (2011, p. 25).
Panosso Netto e Ansarah (2010) comentam que o tema segmentação em
turismo no Brasil é recente se comparado com o resto do mundo, enquanto no Brasil
apenas na década de 1990 passou a fazer parte dos currículos de turismo com
maior frequência, ele já era abordado pelo mercado turístico mundial desde antes de
1950.
Geralmente, a segmentação do turismo a nível nacional é abordada em
capítulos de livros sobre fundamentos do turismo que aparecem superficialmente em
obras específicas de marketing aplicado ao turismo, no entanto, são poucas as
obras que abordam exclusivamente a segmentação do mercado turístico.
De acordo com Valls (1996) apud Panosso Netto e Ansarah (2010), para
pensar em segmentação turística, é preciso estudar a interligação da mesma às
possíveis variáveis de segmentação, assim, a divisão do produto-mercado em
segmentos pode ser organizada conforme apresentada na figura 1:
• necessidades do comprador, motivações e vantagens buscadas; • características socioeconômicas e demográficas (segmentação descritiva); • características de comportamento de compra (segmentação sociocultural);
• estilos de vida descritos em termos de atividades, interesses e opiniões (segmentação psicográfica).
Figura 1: Variáveis da Segmentação Fonte: Valls (1996, p.171)
No contexto da segmentação turística, Rigatto (2007) explica que por ser
caracterizado como uma das variáveis do “Mix de Marketing”, o produto turístico está
diretamente associado à escolha do segmento alvo e, igualmente, ao grau de
satisfação gerado pelo produto. Além disso, a heterogeneidade das pessoas que
compõem a demanda do universo turístico também aparece com um dos fatores que
movimenta o mercado turístico, tornando favorável a tendência à segmentação.
Essa heterogeneidade implica numa constante atualização da oferta do
mercado, visto que nesse contexto percebe-se a existência uma grande
22
necessidade do ser humano pela busca de novas experiências que possam dar
conta de promover a interação entre os mais diversos perfis humanos.
Segundo Porter (1986, p. 24), ao buscar um melhor entendimento da
complexidade do que é o mercado, as cinco forças de atuação que o influenciam
devem ser consideradas:
• Rivalidade existente no setor: os destinos ou produtos turísticos que concorrem diretamente entre si; • Ameaça de novos concorrentes: a possibilidade, de haver concorrência, de médio ou longo prazo, entre produtos, empresas ou destinos, que anteriormente não eram concorrentes; • Ameaça dos produtos substitutos: produtos que não necessariamente possuem uma relação direta com o produto concorrente (em questão), mas que podem reduzir seu consumo, por competir indiretamente com ele; • Aumento do poder de barganha dos compradores: os compradores podem atuar no mercado, influenciando a lucratividade do turismo em uma localidade; • Aumento do poder de barganha dos fornecedores: os fornecedores são agentes capazes de induzir ou retrair a captação de consumidores para um destino, por exemplo, quando elevam seus preços e não há substitutos para os mesmos no mercado.
De acordo com Rigatto (2007), há ainda outros fatores que também são
capazes de influenciar o produto turístico, dentre eles, as instabilidades financeiras;
ações terroristas; epidemias generalizadas; instabilidade nas relações políticas entre
os países; condições climáticas desfavoráveis; má distribuição dos serviços; má
qualidade dos serviços oferecidos.
Portanto, é essencial observar as características sociais, econômicas e
demográficas de um mercado com potencial de consumo a fim de que o produto ou
o serviço desenvolvido para ele possa ser efetivamente e eficazmente absorvido.
Não se pode falar em segmentação dissociando-a das técnicas desenvolvidas
pelo marketing, visto que é essencial para os produtores turísticos conhece-las e
dominá-las, a fim de aplicá-las às características do mercado do consumidor/turista.
Nos estudos relacionados à segmentação, aspectos importantes como: perfil do
público alvo, características do produto comercializado, comportamento do
consumidor, padrões de consumo, características dos grupos (geográficas,
demográficas e psicográficas), tendências futuras, entre outros.
23
De acordo com Cooper et al. (2011), a compreensão de mercados de produto
é muito útil para a análise da classificação dos diferentes tipos de turismo, dessa
forma, entende-se que turistas podem ser classificados em função de seu
comportamento.
O conceito dos mercados de produto tem utilidade para o turismo à medida
que permite a definição dos mercados no que diz respeito ao produto turístico, com
base em grupos de atributos particulares e na identificação de diferenças,
propiciando a delimitação de fronteiras entre mercados de produto turístico.
(COOPER ET AL, 2011).
Geralmente, baseando-se nesse conceito, os turistas que compartilham dos
mesmos “desejos” tenderão a se agrupar num mesmo grupo de afinidades e
preferências e, como consequência, os profissionais do turismo devem estar
preparados para ofertar o que eles buscam.
É possível observar alguns desses aspectos na figura 2, como apresentados
pelo Programa de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil: Módulo
Operacional 8: Promoção e apoio à comercialização (2007):
Geográficas Demográfica e
Socioeconômica
Psicográficas (de ordem
psicológica)
Padrões de comportamento
Padrões de consumo e
predisposição do consumidor
Fronteiras políticas; Climas;
Fronteiras populacionais
Gênero; Idade;
Estado Civil; Composição;
Familiar; Ciclo de vida;
Ocupação; Educação;
Renda
Estilo de vida; Atividades;
Características de personalidade; Preferências
Momento das compras, impulso ou preferência por
marcas; Número de unidades
compradas; Frequência de
compras; Hábitos em
relação à mídia
Frequência de uso – muito versus
pouco; Ocasião;
Fidelidade à marca; Propriedade de outros produtos;
Conhecimento do produto;
Benefícios buscados
Figura 2: Bases para a segmentação de mercado Fonte: Adaptado de Goeldner, 2002, apud MTur 2007.
Por fim, é possível perceber que os métodos comuns de segmentação de
mercado funcionam bem, eles favorecem o estudo do turismo, visto que a indústria
do turismo requer uma ampla variedade de dados sobre o perfil e o comportamento
24
do turista, para assim conhecer o que, efetivamente, influenciá-lo-á no momento do
consumo.
1.3 AS MOTIVAÇÕES E A EXPERIÊNCIA DO TURISTA COM NOVAS FORMAS DE
CONSUMO EM VIAGENS
Rigatto (2007) aponta que o turismo é caracterizado como um fenômeno de
características particulares, como, por exemplo: intangibilidade, sazonalidade,
elasticidade e aspecto emocional, sendo considerada uma das atividades
econômicas mais afetadas pela instabilidade da oferta e da demanda.
Como lembra Ito (2008), desde os primeiros estudos sobre a psicologia do
turismo ocorridos na década de 1960, a motivação das viagens pouco mudou no
comportamento dos turistas, quando se analisa a predominância de fatores
relacionados, principalmente, à fuga do cotidiano. Não obstante, é importante
salientar que alguns turistas não querem exatamente sair da rotina, mas, apenas
sair do seu entorno habitual, continuando a fazer as mesmas coisas que fariam
normalmente se não estivessem viajando.
Ito observa que há na literatura do turismo o interesse em sistematizar e
classificar os tipos de motivações das viagens:
Entretanto, pode-se agrupá-las em: viajar é fugir, viajar é descansar e refazer-se; viajar é compensar e integrar-se socialmente; viajar é comunicar-se; viajar é alargar o próprio horizonte; viajar é ser livre e independente; viajar é partir para a descoberta de si mesmo; e viajar é ser feliz. Considera-se que para a maioria dos viajantes estas motivações se misturam, confundem-se e se superpõem, não sendo necessário apontar apenas uma (2008, p. 123).
Segundo Cardoso (2011), o elemento mais fascinante da viagem torna-se
evidente no “olhar turístico”, demonstrando o comportamento humano em viagens
que busca desvelar destinos e valoriza o contato com o outro por meio de situações
que serão estimulantes e favoráveis ao encontro, à troca e ao acolhimento.
25
Dessa forma, entende-se que o viajante contemporâneo está em busca de
uma experiência turística muito mais completa, atento ao novo, buscando sentir e
fruir cada momento da viagem, de forma que ela não seja simplesmente um
momento de lazer e entretenimento, mas também uma oportunidade de descobrir e
desenvolver seu autoconhecimento.
Meyer aprofunda essa ideia sobre a busca da experiência como a fuga do
extraordinário, do comum, do usual e da rotina, ao comentar que:
O Turismo como forma de fuga do extraordinário, daquilo que é comum, frequente, permite a busca por vivências distintas das experimentadas na rotina. O extraordinário procurado é o que está ou vai além do costume, é algo que não se faz ou não ocorre habitualmente e, por isso, na maioria dos casos se torna prazeroso, provoca estranhamento e desejo de repetir a experiência (2007, p. 36).
Conforme observa Ito (2008), é possível observar em muitas pesquisas sobre
motivações, ainda que com menor frequência, que “viajar é partir para a descoberta
de si mesmo”. O ato de viajar é também, nesse sentido, um instrumento de
autoconhecimento, de descobertas externas e internas, de independência e ao
mesmo, de compartilhamentos.
Por outro lado, o contato intercultural promovido pela viagem é fundamental
na motivação do turista em viagens. A interação propiciada pela prática do turismo é
um elemento norteador no comportamento do turista.
É por meio dessa interação que o individuo será capaz de estabelecer alguns
dos seus vínculos sociais mais importantes, influenciando sua visão e interpretação
do universo que o cerca como um todo.
O turismo propicia ao ser humano, meios para expandir suas experiências,
seus valores, conferindo significado, sentido e conhecimento à vida, por meio da
complexidade encontrada nas trocas e experiências que a mesma é capaz de
propiciar. Especialmente, ao pensar que viajar implica na quebra ou na confirmação
de estereótipos, pré-conceitos e paradigmas e também, na construção de formas de
pensamentos, gostos e atitudes.
De acordo com Cardoso (2011), nos dias atuais, a viagem também tem o
crédito de ser reconhecida como uma necessidade básica do ser humano. Sem
26
deixar de citar a questão do status social, na qual a prática do turismo confere ao
viajante status, como se obrigatoriamente, as pessoas precisassem viajar para “ser”.
Nesse sentido, Cardoso salienta que:
Percebe-se, então, que a satisfação encontrada na viagem não estava conectada unicamente àquelas condições básicas de sobrevivência, afinal o homem procura mais do que a simples subsistência. Prova disso são todas as invenções e equipamentos criados pelo homem para seu conforto, praticidade, e até mesmo status social (2011, p. 32).
Por outro lado, nota-se que o turista consegue se apropriar dos mais diversos
ambientes disponíveis no mundo, tornando-os únicos por meio de suas experiências
e das descobertas que ele vivenciará na dinâmica da viagem. Logo, as paisagens
serão apenas os cenários onde acontecerá o desenrolo de suas emoções e onde ele
viverá algumas das experiências mais marcantes de sua vida.
Ao tratar sobe como o turismo apropria-se dos mais diversos ambientes do
mundo, Ito observa que:
Atualmente o turismo alcançou praticamente todas as áreas do globo. Todas as regiões do mundo e suas paisagens são transformadas em destinos turísticos: Savanas africanas, florestas tropicais, desertos, praias, glaciais enfim, toda sorte de ecossistemas. Sendo cada vez mais valorizados aqueles que apresentam maiores níveis de preservação ambiental (2008, p. 137).
Portanto, a busca por um destino está vinculada ao desejo de sair ao
encontro de algo que possa ser capaz de deslocar o ser humano para muito além
das barreiras físicas e geográficas. Não se trata simplesmente de viajar apenas por
viajar. A motivação para uma viagem nasce na mente humana, despertada pela
imaginação, curiosidade e, principalmente, pelos sonhos.
A capacidade de sonhar é responsável por motivar o ser humano a lutar pela
materialização de seus desejos pessoais. No caso das viagens, o ser humano, cuja
imaginação é ilimitada, está constantemente buscando novidades que possam fazê-
lo se superar e ainda continuar sonhando com experiências futuras.
27
Para Swarbrooke e Horner (2002), um amplo leque de fatores motiva os
consumidores a comprarem produtos turísticos. Os autores dividem os fatores
motivacionais em turismo em dois grupos: os que motivam uma pessoa a tirar férias
e, os que motivam uma pessoa a tirar determinadas férias em determinada
destinação e determinado período.
Entretanto, sabe-se que o leque de motivações é ilimitado e de difícil
categorização. Não há qualquer meio de categorizar os principais fatores
motivacionais em turismo que seja amplamente conhecido, entretanto, de acordo
com os autores, pode-se esboçá-los em alguns de seus aspectos como na figura 3:
Figura 3: Tipologia das motivações em turismo. Fonte: Swarbrooke e Horner (2002, p. 86).
A respeito das experiências turísticas e das motivações envolvidas, Rigatto
explica que:
O consumidor/turista compra uma experiência integral, e não, um produto definido. Essas experiências têm fases bem determinadas que estejam inseridas em questões como antecipação, atividades antes do início da viagem – motivação, informação detalhada sobre o destino, escolha do destino; fase do consumo durante a viagem e a fase da memória, após a viagem (2007, p. 85).
28
Swarbrooke e Horner (2002) comentam que as motivações de cada turista
individual não só são diferentes, mas também podem variar entre diferentes
segmentos de mercado. Diante disso, mundialmente, várias pesquisas têm sido
feitas a fim de testar os fatores motivacionais em diferentes grupos demográficos,
analisando fatores como: idades, sexos, nível cultural, renda e estado civil.
Segundo os autores, vários aspectos estão por detrás das motivações em
viagens: um aspecto demográfico que a indústria do turismo pode considerar como
determinante é o gênero. Logo, muitos produtos turísticos são resultados de
combinações percebidas nos interesses entre homens e mulheres.
Além disso, ao discorrer sobre motivações a nível nacional e cultural,
Swarbrooke e Horner comentam que:
Algumas motivações são universais, como a nostalgia, o romance e o desejo de ver lugares interessantes, embora o comportamento seja realmente influenciado pela nacionalidade e cultura do turista. Muitas pessoas em todo o mundo buscam alguma forma de realização espiritual [...] (2002, p. 92).
É preciso também observar que essas motivações, geralmente, mudam com
o tempo para cada indivíduo, em resposta às mudanças que podem estar
relacionadas às mais diversas circunstâncias pessoais. Por serem diferentes entre
si, turistas não necessariamente serão motivados pelas mesmas razões.
Segundo Meyer (2007), é preciso entender também a importância das
emoções que envolvem a escolhas dos turistas. A experiência como turista impele o
sujeito a sentir a ansiedade da espera, o interesse em buscar previamente
informações sobre o local a ser visitado, o desejo de conhecer o novo, a curiosidade
a respeito do que será visto e a sensação da expectativa.
Por outro lado, não se pode negar que essas motivações também podem ser
consideradas egocêntricas. Sob essa ótica, cada indivíduo baseará suas escolhas
naquilo que vai de encontro as suas próprias necessidades, sem necessariamente
levar em conta o que pensa ou como vive o seu semelhante.
No caso do turismo, para o turista, as viagens acontecem como resultado de
uma contemplação de seus interesses pessoais, sendo assim, questiona-se muito o
29
impacto das atitudes dos turistas, principalmente, o que eles podem causar na
população local dos destinos visitados.
As motivações também podem variar entre diferentes segmentos do mercado,
o que dificulta decifrar a linha tênue entre os desejos dos consumidores e os fatores
que influenciam seus comportamentos reais. Elas possuem tamanha complexidade,
que Ito (2008) explica que ao mesmo tempo em que o turista é motivado pela busca
da sensação de liberdade e evasão, ele se depara com a satisfação ao retornar ao
seu destino de origem, num processo contraditório de “valorização da liberdade da
opressão do meio social em que vive, e simultaneamente valorizando-o”.
Desse modo, o turismo não é simplesmente o resultado de uma equação
entre hedonismo e busca pela sensação de fuga do cotidiano, pois as motivações
em viagens são múltiplas para cada indivíduo, ou seja, não é uma questão de
apontar apenas uma única motivação. O motivo da viagem, entretanto, é o principal
meio disponível para auxiliar o conhecimento que favorece a segmentação do
mercado.
Ademais, é preciso frisar que o turismo é consumido por seres humanos cuja
natureza envolve características tão complexas, que pensar em motivações envolve
questões como: suprimento de necessidades, concretização de sonhos, realização
de fantasias e essencialmente, a tão almejada auto-realização.
A personalidade de um indivíduo também é decisiva no que diz respeito à
escolha de um destino, inclusive, à forma como ele planeja seu roteiro,
principalmente, por meio da escolha dos tours que ele fará naquele destino. Como
exemplo disso, há o turista que opta por realizar um tour guiado a uma favela, o que
nesse caso, demonstra um interesse peculiar desse indivíduo.
Finalmente, quando se trata de discussões sobre motivações do consumidor
em turismo, não se pode ignorar o fato de que motivação é algo particular, ela varia
de indivíduo para indivíduo uma vez que cada um tem a sua. Por isso, conceituá-la
não é tarefa fácil, todavia, conhecê-la é necessário para o entendimento do
desenvolvimento e surgimento de novas tendências no turismo, como será visto
mais adiante, com o exemplo do poorism.
30
2 CONCEPÇÕES ACERCA DA POBREZA
Este capítulo tem como objetivo contextualizar a temática da pobreza,
destacando as suas mais diversas concepções, bem como apresentar as principais
localidades de concentração de pobreza, evidenciando a percepção de uma
tendência da segmentação da pobreza como produto turístico.
2.1 POBREZA: VISÕES OFICIAIS
A pobreza é um fenômeno social que caracteriza o estado econômico no qual
se encontra a maioria dos povos ou nações do mundo, ela não escolhe raça, sexo,
país ou idade e, por tratar de um processo histórico que sempre existiu em todas as
sociedades, suas causas são geralmente complexas e por isso, de difícil
mensuração, variando de acordo com o conceito utilizado. (CRESPO E GUROVITZ,
2002).
Segundo Mattei (2009), a pobreza representa uma situação de escassez ou
ausência que geralmente caracteriza-se pela privação de recursos, ou seja, de bens
materiais ou imateriais, tais como: dinheiro, relações, influência, poder, qualificação
profissional, estado de saúde, capacidade intelectual ou ainda como uma privação
da condição de liberdade e dignidade.
De acordo com Santos (2007), na perspectiva da subsistência, o pobre é
definido como o indivíduo cuja renda não é suficiente para obter o mínimo de
alimentos necessários as suas necessidades básicas, essencialmente restringidas
às necessidades físicas. Portanto, trata-se do indivíduo que se encontra desprovido
dos direitos essenciais à vida em sua condição humana.
Segundo Barros et al. (2000), duas das possibilidades por meio das quais se
podem decompor o grau de pobreza utilizadas no Brasil são: a renda per capita e o
grau de desigualdade na distribuição de bens, sem deixar de citar a mensuração por
meio do Produto Interno Bruto (PIB) per capita. Por exemplo, a análise anual do
crescimento econômico do país e a distribuição de renda, apresentam-se como vias
importantes na observação dos efeitos da pobreza.
31
Conforme observa Borges (2006), a pobreza é usualmente tratada como um
problema, devido à complexidade de seus efeitos negativos, o que a torna uma
ameaça à estabilidade e à sociedade, um desafio ao Estado, um empecilho para o
crescimento e ao desenvolvimento humano, uma despesa a ser coberta por
programas sociais.
No cenário mundial, a pobreza figura como um dos problemas mais antigos a
acometer a humanidade e também, o mais duro de ser superado ou erradicado,
tendo como característica o fato de uma minoria gozar de uma vida de extrema
riqueza, enquanto que para a maioria das pessoas garantirem a sobrevivência ou
simplesmente viverem com dignidade, torna-se um desafio diário.
A respeito do conceito de pobreza baseado na ausência de meios que
possibilitem a sobrevivência humana, Crespo e Gurovitz observam que:
O enfoque de sobrevivência, o mais restritivo, predominou nos séculos XIX e XX, até a década de 50. Teve origem no trabalho de nutricionistas inglesas apontando que a renda dos mais pobres não era suficiente para a manutenção do rendimento físico do indivíduo. Essa concepção foi adotada na Inglaterra e exerceu grande influência em toda a Europa, sendo usada mais tarde pelo Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD) (2002 p. 4).
Nesse sentido, observa-se que por meio do enfoque da escassez de meios
relacionados à sobrevivência, ocasionado em função da limitação da renda para a
manutenção das necessidades básicas do indivíduo, foi possível delimitar uma
forma de identificar aqueles que pertenceriam às classes pobres.
Para Codes (2008), existem as noções de pobreza absoluta, relativa e
subjetiva. Ele argumenta que na primeira, ser pobre é ter menos do que um padrão
de sobrevivência física; na segunda, é ter menos posses do que os demais
membros da sociedade em que se vive, sendo que tal privação afeta questões de
convívio social e depende do modo de vida da sociedade. Por fim, a terceira diz que
cada indivíduo pode se autodenominar pobre, se sentir que não tem o suficiente
para satisfazer as suas necessidades, nesse caso, funcionaria mais como uma
forma de demonstrar como o indivíduo se enxerga no contexto social no qual está
inserido.
32
De acordo com Santos (2007), a linha tradicional de pobreza está associada
ao conceito de pobreza absoluta, a qual corresponde à ausência de atendimento no
que diz respeito às necessidades mínimas vitais relativas à sobrevivência física do
ser humano.
Acredita-se que a partir do capitalismo, a desigualdade tornou-se mais
evidente na sociedade, o que fortalece a ideia de que a pobreza acentuou-se no
século XVI com a dissolução do mundo feudal e o surgimento da ideologia
capitalista, sendo responsável por fomentar as desigualdades entre as classes e
assim, acentuando as diferenças sociais.
Por outro lado, a pobreza não pode ser vista, apenas, como uma limitação do
indivíduo a seus recursos financeiros, pois, pobre também pode ser aquele
desprovido de liberdade, do direito de decidir, do direito de ir e vir, de se sentir
incluso e opinar nas questões sociais, sobretudo, opinar a respeito de sua própria
vida.
Segundo Santos (2007), evidências empíricas têm demonstrado que nem
sempre o aumento da renda está associado à melhoria do bem estar humano,
demonstrando a subjetividade da pobreza, uma vez que os recursos monetários não
são capazes de comprar tudo aquilo que propiciará felicidade.
Para Codes (2008), atualmente, o fenômeno da pobreza tende a ser
percebido como uma questão multidimensional e complexa, que não somente diz
respeito às situações em que as necessidades humanas não são suficientemente
satisfeitas, mas nas quais também diferentes fatores estão interligados. Ele observa
que o tema emergiu com maior força em outras partes da Europa e nos países em
desenvolvimento no final do século XX, pois naquele período, ficou evidente que
questões relacionadas às desigualdades sociais e à pobreza não estavam sendo
equacionadas como frutos do crescimento econômico, tanto nos países ricos como
nos pobres.
Todavia, com o decorrer do tempo, a preocupação com a pobreza ganhou
centralidade nas pautas de governos nacionais e nos debates acadêmicos e sociais.
Sua gravidade chamou a atenção das lideranças do mundo inteiro, que perceberam
que para alcançar bons níveis de desenvolvimento social, seria preciso amenizar os
efeitos da pobreza.
33
Em 2002, a Organização das Nações Unidas (ONU) em um de seus relatórios
anuais observou a acentuação das disparidades sociais entre ricos e pobres no
mundo. Foi constatado que a pobreza, a falta de saúde e as taxas de fecundidade
são usualmente mais elevadas nos países mais pobres.
Observou-se que em nível mundial, as disparidades de renda e de acesso
aos diversos recursos, haviam se acentuado. No mundo, a diferença entre o
rendimento per capita dos 20% mais ricos e dos 20% mais pobres aumentou de 30
para 1, em 1960, para 78 para 1, em 1994.
De acordo com o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), o
número de mulheres que vivem na pobreza é superior ao de homens, sendo que a
disparidade entre os gêneros teve um aumento na última década. (Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2002).
Consequentemente, essa condição, também as deixa vulneráveis a outras
situações de insegurança, como, por exemplo, aos abusos sexuais. Nesse sentido,
Crespo e Gurovitz explicam que:
A insegurança também está relacionada ao sentimento de vulnerabilidade. Relaciona-se ao mundo externo, ao indivíduo e à família: a exposição a choques, a situações de estresse e a riscos que aumentam a imprevisibilidade e a instabilidade. Ela também é a experiência da preocupação e do medo. Mesmo onde a pobreza diminuiu, a maioria das pessoas pobres diz que a vida tornou-se instável e incerta, particularmente como resultado do crime crescente, da violência e da corrupção. (2002 p. 10).
Além das mulheres, os mais afetados com os efeitos da pobreza e da
segregação social, são as crianças, os incapacitados, os marginalizados e as etnias,
os quais se tornam mais vulneráveis aos efeitos devastadores das múltiplas crises
que impactam o mundo. Geralmente, eles são os mais atingidos por situações
oriundas de guerras, desastres climáticos, crises financeiras, além da volatilidade
nos preços da comida e energia.
De acordo com Borges (2006), as linhas de pobreza são construídas a partir
de juízos de valor, refletindo os métodos adotados para a sua construção. Sendo
assim, para medir a pobreza, geralmente utiliza-se o método das condições de vida,
também chamado de necessidades básicas insatisfeitas.
34
Segundo Mattei (2009), baseando-se nas pesquisas feita pelo Banco Mundial
em 2008, 1.4 bilhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza, dentre essas
pessoas, a maioria vive com menos de US$ 1,25/dia. Essa linha de pobreza deriva
do cálculo do custo de uma determinada cesta de bens e serviços, resultando no
método dos “custos das necessidades básicas”, além de fazer referência ao patamar
estabelecido para verificar se indivíduos estão em situação de pobreza.
Mattei (2009) explica que esse valor foi restabelecido pelo Banco Mundial em
2008, quando o mesmo reconheceu que havia bem mais pobres no mundo,
comparativamente aos números indicados pela linha de pobreza definida de acordo
com os preços de 1993. Por isso, os indicadores da pobreza mundial foram
calculados a partir de uma nova linha com base nos preços de 2005, que considerou
o valor de US$ 1.25/dia.
Todavia, apesar de relevante, a renda, sozinha, não consegue captar as
expressões da pobreza. Embora alguns países experimentem crescimento
econômico nos últimos anos, nem sempre esse desenvolvimento vem acompanhado
de melhorias em múltiplas áreas, como, por exemplo, na saúde pública e na
educação. Além disso, é importante frisar que os próprios pobres descrevem sua
experiência como de privação multidimensional e não apenas como uma ausência
de recursos financeiros.
A Organização das Nações Unidas no Brasil (Programa das Nações Unidas,
2010) chama atenção em suas pesquisas para a existência de outras metodologias
para o estudo da pobreza, como, por exemplo, o Índice de Pobreza Multidimensional
(IPM). Esse índice aborda uma metodologia baseada em múltiplos critérios,
indicadores, pesos e cortes, que permitem apropriações para atender às demandas
de acordo com a realidade do território a ser estudado.
O índice publicado no Relatório de Desenvolvimento Humano (2010) analisa
as dimensões da pobreza para além da questão puramente econômica, levando em
conta as variáveis das privações de direitos sociais. Por meio dele, é possível
identificar privações sociais em educação, saúde e padrão de vida dos domicílios.
Sua concepção é baseada na ideia de que pobreza é uma expressão de várias
privações sociais e não apenas de uma (renda, por exemplo).
35
A metodologia do Índice de Pobreza Multidimensional (IPM) identifica os
domicílios que sofrem várias privações, simultaneamente, e conforme o percentual
de privações enfrentadas, esses domicílios são classificados como pobres. É por
isso que esse índice é chamado de multidimensional, visto que os métodos
tradicionais, em sua maioria, consideram apenas a renda como medida, ou seja, são
metodologias unidimensionais.
Assim, é necessário compreender a relevância da pobreza como uma
questão social, caracterizada como um fenômeno multifacetado. Nesse sentido, é
preciso entender que o parâmetro da renda, por si só, não é capaz de expressá-la
completamente.
Para a Organização das Nações Unidas (ONU, 2013), apenas o crescimento
econômico não necessariamente gera o fim da pobreza, uma vez que as causas da
mesma são muito complexas e vão muito além de fatores meramente econômicos. A
respeito disso, são observados os exemplos dos países da América do Sul que,
mesmo com economias que crescem a ritmo acelerado, ainda não foram capazes de
retirar a maior parte de sua população da extrema pobreza.
A respeito da multidimensionalidade da pobreza, Narayan et al. (2000)
comentam que apesar da falta de acesso à comida ser uma das características
básicas para delimitá-la, a privação de poder, a ausência de voz ativa na sociedade,
a dependência do Estado, a vergonha e a humilhação diária, também caracterizam a
condição de vida do chamado pobre.
Crespo e Gurovitz (2002) salientam que essa privação de poder pode ser
descrita como a incapacidade de autocontrole do indivíduo em relação ao que lhe
acontece, em consequência da pobreza que lhe acomete.
De acordo com Narayan et al. (2000), os pobres raramente são ouvidos ou os
seus interesses chamam a atenção da sociedade. Suas vozes são silenciadas pela
minoria que detém o poder, consequentemente, tornando-os as maiores vítimas da
corrupção. Os programas sociais, por exemplo, contribuem em uma porcentagem
muito pequena, eles não são capazes de fazer com os que os pobres possam
escapar da condição da pobreza.
Todavia, é importante comentar que no Brasil o número de pobres está
diminuindo. Conforme dados divulgados no site do Programa das Nações Unidas
36
para o Desenvolvimento (2013) o Brasil já cumpriu o objetivo de reduzir pela metade
o número de pessoas vivendo em extrema pobreza até 2015: de 25,6% da
população em 1990 para 4,8% em 2008. Todavia, até 2008, 8,9 milhões de
brasileiros ainda tinham renda domiciliar inferior a US$ 1,25 por dia. Isso significa
que em relação ao crescimento populacional do país, em 2008, o número de
pessoas vivendo em extrema pobreza era quase um quinto do observado em 1990 e
pouco mais do que um terço do valor de 1995.
Finalmente, é preciso entender que as definições da pobreza e suas causas
são complexas, variando de acordo com gênero, idade, cultura e outros contextos
sociais e econômicos, não podendo ser definida de forma única e universal.
2.2 LOCALIDADES DE CONCENTRAÇÃO DE POBREZA
De acordo com órgão ligado às Nações Unidas, os 50% mais pobres da
população respondem por apenas 1% da riqueza do planeta. Enquanto isso, o Brasil
possui 1,3% da riqueza e 2,8% da população mundial; quase um terço do patrimônio
dos 10% mais ricos está nos EUA (Palavras ao Tempo, 2012 apud Rothkopf, 2008).
Segundo dados do Banco Mundial, aproximadamente 25% dos latino-
americanos vivem com menos de US$2 ao dia como se observa na figura 4:
Figura 4: A pobreza global Fonte: Correio On Line Democrático/ Dados Banco Mundial (2008).
1
1 Disponível em: http://unctad.org/en/Pages/ALDC/Least%20Developed%20Countries/UN-list-
of-Least-Developed-Countries.aspx. Acesso em: 01 de Agosto de 2013.
37
A região da América Latina e do Caribe apresenta a maior desigualdade a
nível mundial, excetuando-se a África Subsaariana. Na América Latina e no Caribe,
os 10% mais ricos da população detêm 48% da renda total e os 10% mais pobres
recebem apenas 1,6%.
Nos países industrializados, em geral, os 10% mais abastados tem 29,1% da
renda, enquanto os 10% mais pobres recebem 2,5%. Logo, se a América Latina
tivesse o mesmo índice de desigualdade que o mundo desenvolvido, os seus níveis
de pobreza estariam mais próximos a 5% do que à atual taxa de 25%.
Quase 90% da riqueza do mundo estão sob o controle de moradores da
América do Norte, Europa e dos países de renda elevada na região Ásia-Pacífico,
como o Japão e a Austrália.
Um dos relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU) aponta que os
países menos avançados (PMA) são também os mais pobres do mundo. Trata-se de
48 países que foram oficialmente designados pela Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas (ONU), em conformidade com uma série de
critérios. Eles podem ser observados como apresentados na figura 5:
Afeganistão Madagáscar
Angola Malavi
Bangladesh Mali
Benin Mauritânia
Butão Moçambique
Burkina Faso
Mianmar
Burundi Nepal
Camboja Níger
República Centro-Africano
Ruanda
38
Chade Samoa
Comores São Tomé e Príncipe
Congo (República Democrática do)
Senegal
Djibouti Serra Leoa
Guiné Equatorial
Ilhas Salomão
Eritreia Somália
Etiópia Sudão
Gâmbia Timor-Leste
Guiné Togo
Guiné-Bissau
Tuvalu
Haiti Uganda
Kiribati Rep. Unida da Tanzânia
República do Laos
Vanuatu
Lesoto Iémen
Libéria Zâmbia
Figura 5: Lista das Nações Unidas dos Países Menos Desenvolvidos Fonte: United Nations Conference on Trade and Development
2
Ao observar essa lista é possível perceber que o continente Africano tem o
maior número de países em estado de menor desenvolvimento. No entanto, a
2 Disponível em: http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/Ranking-IDH-Global-2012.aspx. Acesso
em: 01 ago. 2013.
39
pobreza não é apenas um problema concernente aos países africanos, ela está
presente na vida das populações do mundo inteiro como Sabença destaca:
A pobreza era vista como uma ausência de riqueza, com as suas privações resolvidas pelo crescimento econômico ou por ações compensatórias de tipo de assistencialista. Julgava-se por isso que os países ricos estavam livres deste flagelo, ou então que tinham amenizado o problema devido ao seu desenvolvimento. A pobreza é então uma marca dos países subdesenvolvidos, atingindo persistentemente níveis de desumanização, de despojamento e de miséria indescritíveis (2010 p. 9).
Embora o abismo entre ricos e pobres tenha diminuído consideravelmente
nos últimos anos, fato que pode ser constatado por meio da análise dos relatórios
anuais da Organização das Nações Unidas (ONU), essa diminuição ainda não foi
significativa o suficiente para mudar a vida da maioria das pessoas.
Um estudo divulgado pelo Banco Mundial (BM), em 2013, mostrou que a Índia
possui um terço da população mundial vivendo em extrema pobreza. Nada mais é
do que 400 milhões de indianos sobrevivendo com menos de US$ 1,25 por dia. No
ranking mundial, A Índia só perde para a África Subsaariana, que sozinha,
contabiliza um total 34% da população vivendo na miséria (Por dentro dos Brics,
2013).
Segundo Santos (2007), nos Estados Unidos, os afro-americanos são
considerados pobres em comparação aos americanos brancos, não obstante, eles
são muitos mais ricos quando comparados aos habitantes de países em
desenvolvimento, principalmente, se comparados aos afrodescendentes.
No entanto, quando comparados com os habitantes de países como China,
Sri Lanka ou até mesmo algumas partes da Índia, os afro-americanos tem uma
expectativa de vida significativamente reduzida.
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), outra medida comparativa de
riqueza, analisa os níveis de alfabetização, educação, esperança de vida,
natalidade, entre outros fatores, para avaliar a qualidade de vida humana. Na figura
6, pode-se observar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) organizado em
muito alto, alto, médio, baixo e sem dados:
40
Muito alto Alto Médio Baixo Sem dados
Figura 6: The United Nations Human Development Index (HDI) rankings for 2012 Fonte: Wikipédia (2013)
Diferentemente da perspectiva do crescimento econômico, o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) é uma medida resumida do progresso baseada em
três dimensões básicas do desenvolvimento humano: renda, educação e saúde.
Na figura 7, é possível observar um ranking a nível global (2012),
demonstrando os 20 primeiros países com melhores Índices de Desenvolvimento
Humano (IDH), enquanto o Brasil, por exemplo, ocupa a 85ª posição da lista:
Ranking IDH
Global País
IDH
(2012)
1 Noruega 0,955
2 Austrália 0,938
3 Estados Unidos 0,937
4 Países Baixos 0,921
5 Alemanha 0,920
6 Nova Zelândia 0,919
7 Irlanda 0,916
8 Suécia 0,916
9 Suíça 0,913
10 Japão 0,912
11 Canadá 0,911
12 República da Coreia 0,909
13 Hong Kong, China 0,906
14 Islândia 0,906
15 Dinamarca 0,901
16 Israel 0,900
41
17 Bélgica 0,897
18 Áustria 0,895
19 Singapura 0,895
20 França 0,893
85 Brasil 0,730
Figura 7: Ranking Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) Global Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2012)
3
É possível observar que o continente Europeu apresenta a maior quantidade
de países com os melhores índices de desenvolvimento a nível mundial, seguido da
Oceania, além da América do Norte e da Ásia, enquanto que o Brasil ocupa a 85ª
posição do ranking, demonstrando que apesar de fazer parte dos BRICS (Brasil,
Rússia, Índia, China e África do Sul), ainda não alcançou níveis tão satisfatórios no
que diz respeito ao desenvolvimento humano, sendo superado por muitos países.
De acordo com Saldanha (2003), desde 1990, o Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento atualiza anualmente um relatório denominado
Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), que classifica 162 países por meio
do ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
O Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) é reconhecido pelas Nações
Unidas como um exercício intelectual independente cuja importância visa aumentar
a conscientização sobre o desenvolvimento humano no mundo inteiro.
De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(2012) o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é uma medida resumida do
progresso, em longo prazo, em três dimensões básicas do desenvolvimento
humano: renda, educação e saúde. O objetivo da criação do IDH foi o de oferecer
um contraponto a outro indicador muito utilizado, o Produto Interno Bruto (PIB) per
capita, uma vez que esse se limitava apenas à dimensão econômica do
desenvolvimento.
Em 1997, um informe do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), que havia divulgado que o número de pobres era de 1,3
3 Disponível em: http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/Ranking-IDH-Global-2012.aspx. Acesso
em: 01 ago. 2013.
42
bilhões, o que representava 22,8% da população mundial. Seu critério para
mensurar a pobreza considera aqueles que vivem com até 370 dólares por ano, ou
seja, o equivalente a 1 dólar por dia.
Atualmente, a questão da pobreza se agravou ainda mais, visto que o
Relatório Econômico Social 2013, elaborado pelo Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social da Organização das Nações Unidas (ONU), aponta que até
2050, o número de pessoas vivendo em situação de pobreza no mundo inteiro deve
triplicar, atingindo a marca de 3 bilhões.
De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) 4 os resultados do Censo Demográfico de 2010 mostraram as disparidades
no rendimento da população do país. Embora a média nacional de rendimento
domiciliar per capita desse ano tenha sido de R$668, aproximadamente 25% da
população recebia até R$188, enquanto que metade dos brasileiros recebia até
R$375, valor muito menor do que o salário mínimo daquele ano (R$510).
O Censo 2010 detectou que a proporção de pessoas que viviam com até R$
70,00 de rendimento domiciliar per capita era, em média, 6,3% no Brasil nos
municípios de médio porte, ou seja, naqueles em que a população varia de 10 a 50
mil habitantes. Nos municípios com até 50 mil habitantes, 75% da população
ganhava até o equivalente a um salário mínimo. Já nos com mais de 500 mil
habitantes, metade da população recebia até R$ 503. Enquanto que o rendimento
médio domiciliar per capita nos municípios mais populosos era de R$ 991.
O mesmo Censo revelou que 36% dos brasileiros possuem privações em
atraso educacional, infraestrutura do domicílio, acesso a serviços básicos ou acesso
à seguridade social, por outro lado, quando não analisado apenas o critério da
renda, constatou-se que a maioria dos brasileiros possui graves carências que
impactam significativamente o seu dia-a-dia. A pesquisa aponta que 58,4% dos
brasileiros possuem pelo menos um tipo de carência social.
4 Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/03122002relatorio_onu.shtm. Acesso em: 4 de
Agosto de 2013.
43
De acordo com o Relatório das Organizações das Nações Unidas (ONU),
citado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2002), verificou-se
que quase um terço da população vive com até meio salário mínimo per capita. Em
termos absolutos são cerca de 49 milhões de pessoas. Quando acrescentada a este
grupo as pessoas sem rendimento, chega-se à estimativa de 54 milhões de pessoas
que podem ser consideradas “pobres”. No país, cujas diferenças são acentuadas no
Nordeste, a proporção de pessoas que vive com até um salário mínimo é de quase
51%, enquanto no Sudeste não chega a 18%.
Além disso, no Brasil outro fator de desigualdade chama muita atenção: o
racial. Analisando os dados da população que vive com até meio salário mínimo de
rendimento familiar per capita, levando-se em consideração a cor, observa-se que
apenas 34,8% são declaradamente brancas, enquanto 77,1% são de cor preta ou
parda.
De acordo com o Relatório Econômico Social 2013, elaborado pelo Conselho
de Desenvolvimento Econômico e Social das Nações Unidas (Programa das Nações
Unidas), há cerca de 1 bilhão de pessoas morando em bairros sem a mínima
infraestrutura: água potável, saneamento, eletricidade, serviços básicos de saúde e
educação.
Na teoria há muitas tentativas, planos e ideias que visam à diminuição da
quantidade de pessoas vivendo em situação de pobreza no mundo e, o
desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária, como, por exemplo, a criação
em 2000, dos oito Objetivos do Milênio da Organização das Nações Unidas (ONU). 5
Todavia, segundo Relatório Econômico Social (2013) apud O Economista,
baseado nas previsões da Organização das Nações Unidas (ONU), caso os
esforços e as medidas necessárias não sejam efetivamente desenvolvidos na
prática, estima-se que a pobreza poderá alcançar 3 bilhões de pessoas no mundo
até 2050. 6
5 Disponível em: http://www.objetivosdomilenio.org.br/objetivos/. Acesso em: 18 de Agosto de
2013. 6 Disponível em: http://www.oeconomista.com.br/onu-pobreza-pode-alcancar-3-bilhoes-de-
pessoas-no-mundo-ate-2050/. Acesso em: 04 de Agosto de 2013.
44
2.3 A POBREZA ENQUANTO TENDÊNCIA NO TURISMO
Contrariamente ao modelo habitual de turismo limitado à pura e simples
busca do lazer e do entretenimento, percebe-se a existência de uma tendência
crescente do turismo emissor para áreas economicamente carentes.
Segundo Fortunato (2011), essa tendência pode ser observada por meio de
designações e variações de voluntário, solidário e comunitário. Além disso, o ser
humano sempre foi estimulado por sua curiosidade e desejo de explorar o universo,
a partir de si mesmo e, principalmente, por meio da observação do outro.
Nesse caso, percebe-se uma tendência do comportamento humano em
observar a vida de pessoas que vivem em áreas menos desenvolvidas. Em suas
discussões, sobre o assunto, Freire-Medeiros observa que:
A possibilidade da revelação de si através do encontro com “a comunidade” onde permanece resguardada “a cultura autêntica”, livre das influências corrosivas do meio externo, é um elemento fundamental na composição do produto turístico dito “alternativo” (2006, p. 3).
Percebe-se uma demanda interessada por um tipo de turismo que propicie
maior contato e entrosamento com a realidade da comunidade visitada, embora
essa interação fuja do modelo “tradicional” de turismo. Nesse caso, a pobreza vem a
ser o elemento norteador que desperta o interesse e a curiosidade.
Nesse sentido, Freire-Medeiros (2006) argumenta que cada vez mais, os
turistas estão buscando experiências inusitadas, interativas, aventureiras e
autênticas. Há uma tendência caracterizada pelo interesse em se comprar o oposto
daquilo que se convencionou como “turístico”.
Como prova disso, observa-se que milhares de pessoas viajam para o
continente Africano, Sul-Americano e Asiático em busca de uma experiência mais
intimista com a população dos destinos que se encontram em situação de pobreza.
Assim, percebe-se uma tendência no mercado, fundamentada no interesse
por um turismo alternativo cuja base vem a ser por meio da comercialização da
pobreza. A respeito disso, Bastos observa que:
45
Além de a reflexão sobre a diferença ser totalmente natural em uma viagem, a reflexão sobre a ética é um tanto propícia nesse mesmo contexto: como lidamos com o outro, como os outros nos tratam e como gostaríamos de ser tratados e respeitados são questões que passam muitas vezes pela cabeça de um turista que, de certa forma, precisa confiar em estranhos a todo o momento (2006, p. 48).
De acordo com Koven (2004) apud Freire-Medeiros (2009), o interesse por
descobrir um pouco mais a respeito da vida dos pobres não é algo recente. A elite
vitoriana cujos cidadãos encabeçavam as agências de assistência social, assim
como a própria Igreja experimentou a busca por uma convivência mais aprofundada
com os pobres da sociedade londrina. À época, esse fato caracterizava o que se
denomina slumming.
Freire-Medeiros (2009, p. 29) explica que “em 1884, o Dicionário Oxford
definiu o termo como a tendência a visitar as áreas mais pobres de diferentes
cidades, seja com o propósito de fazer filantropia seja apenas por curiosidade”.
A referida autora afirma que, nos dias de hoje, do grupo de turistas que
pratica o slumming, 99% é composto de estrangeiros, cujo interesse na pobreza
turística faz com essas pessoas se desloquem a destinos tão diferentes de seus
países de origem.
Nesse sentido, também caracteriza a existência do consumo da própria
diferença socioeconômica por meio da visitação dos símbolos associados à pobreza
enquanto atrativo turístico.
Trata de um novo segmento ainda não oficial, denominado poorism, o que
vem a ser conhecido como “turismo da pobreza”, cujo conceito será melhor
detalhado no capítulo seguinte. Em relação ao desenvolvimento de segmentos no
turismo, Meyer comenta que:
Surgem inúmeros tipos de atividades que podem ser realizadas durante a prática turística, às quais chamamos de diferentes segmentos e nichos de mercado. As próprias cidades se tornaram destinos turísticos privilegiados (2007, p. 23).
46
Esse tipo de turismo vem crescendo rapidamente nos últimos anos,
principalmente na última década. A visitação de áreas carentes tem sido cada vez
mais solicitada no mercado de experiências do turismo.
Ademais, a própria indústria do entretenimento, por meio dos filmes,
consegue atrair a atenção e instigar o interesse de pessoas do mundo inteiro para
essa realidade, despertando a curiosidade e estimulando o imaginário.
Nota-se um crescente número de pessoas, em sua maioria, oriundas de
países desenvolvidos e de situação social totalmente oposta, interessadas em visitar
os moradores de lugares mais miseráveis, como, por exemplo, as comunidades
carentes de Mumbai ou as favelas da cidade do Rio de Janeiro.
Portanto, há uma tendência em escolher algo que não é feito habitualmente e,
por isso, na maioria dos casos, fazer o diferente torna-se objeto de desejo. O
extraordinário passa a ser procurado como alternativa de produto turístico,
expressando uma tendência no mercado em buscar o que vai além daquilo que faz
parte da rotina do comportamento em viagens.
Finalmente, por caracterizar um fenômeno de extrema complexidade, de uma
forma não muito lógica e nem sempre ética, a pobreza é capaz de despertar os mais
diversos sentimentos na sociedade, tais como o interesse, a curiosidade, a
admiração, a compaixão, a indiferença, a repulsa e ainda, de um modo mais
extremo, o encantamento.
3 POORISM: A POBREZA COMO ATRATIVO TURÍSTICO
Este capítulo tem como objetivo abordar a pobreza como elemento de
interesse comercial para o turismo, introduzindo e desenvolvendo o conceito de
poorism, além de tratar o aparecimento de tours desenvolvidos por meio de visitas
guiadas para destinos marcados pela pobreza, além de abordar a importância da
gestão do desafio da pobreza por meio do pro-poor tourism.
47
3.1 A POBREZA QUE SE VENDE
Segundo Selinger (2009), uma nova palavra tem chamado atenção no
turismo: “poorism”. Conforme explicado anteriormente, esse termo faz referência à
existência de tours que levam pessoas, geralmente das classes mais abastadas,
para as áreas habitadas pelas classes mais pobres ou miseráveis. Essa palavra é
resultante de um neologismo criado a partir da junção de duas palavras inglesas:
poor e tourism.
Esse tipo de turismo já vem acontecendo em cidades como: Rio de Janeiro
(Brasil), Soweto (África do Sul), Mumbai (Índia), Rotterdam (Holanda) e Nova York
(Estados Unidos). Para alguns estudiosos do tema, a essência do “poorism” pode
ser entendida como uma forma consciente de consumo da pobreza alheia, cujos
benefícios tangíveis para as comunidades visitadas são pouco significantes.
Por outro lado, Freire-Medeiros (2009), em seu livro “Gringo na laje”,
observou que o turismo dito pro-poor tourism é visto como positivo quando influencia
satisfatoriamente na percepção do turista a respeito da comunidade visitada,
normalmente, estigmatizada e, de maneira geral, ignorada dos pontos de visitação
turística das cidades.
Freire-Medeiros (2009) chama a atenção para o poorism, ao observar que a
pobreza turística vem sendo beneficiada pela elitização da pobreza, seja por meio
da circulação de imagens midiáticas ou por pessoas capazes de transformar a
alteridade, nesse sentido classificada como o exótico, em produto turístico.
Ademais, o processo da transformação de locais associados à pobreza em
atração turística trata da capacidade paradoxal que o turismo possui em diversificar-
se como produto, nesse caso, por meio da busca da alteridade e da autenticidade
como elemento norteador do consumo da pobreza.
Segundo Freire-Medeiros (2009), a compreensão do fato de que alguém se
dispõe a pagar para ver o sofrimento alheio durante o período das férias, cujo
contexto é associado a um momento de convívio humano marcado pelo lazer e pela
alegria, não é tarefa simples para o pensamento humano, sobretudo, ao buscar-se
uma interpretação dentro dos limites da razão.
48
Para ter uma noção do que vem a ser a comercialização da pobreza turística,
primeiramente, é preciso analisar a participação dos atores sociais nela envolvidos,
que de forma resumida, são apresentados como: aquele que cobra, quem paga para
consumir e aqueles que representam a “atração” em si.
Geralmente, o indivíduo que paga para consumir a pobreza é identificado
como alguém que possui uma atitude voyeurista 7diante do que considera como
exótico e curioso. Por isso, o turista do poorism8 ou slumming9 é muitas vezes
percebido como um indivíduo unicamente interessado em transformar a pobreza
alheia em entretenimento em causa própria. Todavia, há exceções no que diz
respeito ao perfil desse turista, portanto, não se deve generalizar o seu
comportamento.
Segundo Selinger (2009), um voyeur pode ser compreendido como alguém
que assiste os outros e geralmente reduz o que vê a sua própria noção da realidade.
Assim, como consequência, observa-se uma dramatização negativa da diferença,
evidenciada pelo olhar carregado de estereótipos e pré-conceitos.
Por isso, muitas pessoas analisam o poorism como um tipo de turismo
voyeurista que favorece o conceito de visita de um “zoológico de pobres”,
alimentado por uma observação e por um olhar, que nada ou pouco pode fazer para
mudar ou amenizar, por exemplo, a situação econômica alheia, consequentemente,
tornando ainda mais evidentes as disparidades entre visitante e visitado.
Posicionar o ser humano e suas condições de vida como produto de
consumação turística envolve uma noção de ética e moralidade altamente complexa.
Por exemplo, o turista voyeur vai ao encontro da pobreza, sem com ela desejar
interagir ou misturar-se. Ele paga para observar de longe, pois jamais seria capaz de
envolver-se no contexto social da comunidade visitada.
7 Pessoa que tem por hábito praticar o voyeurismo, ou seja, excesso de curiosidade pelo que
é particular ou íntimo por meio da observação alheia. 8 Prática que consiste na compra de tours em áreas consideradas miseráveis ou de má
reputação com o objetivo de se ter uma ideia de como é a realidade da população que habita nessas comunidades.
9 Segmento do turismo relacionado às visitas ou aos tours comercializados, permitindo que
turistas possam ter uma experiência nas comunidades mais pobres ou economicamente desfavorecidas.
49
Percebe-se a existência de um contexto sórdido de contemplação da miséria
e da degradação humana, o que também pode caracterizar uma forma comercial de
diversão voltada para satisfazer os mais bizarros caprichos humanos, dentre eles, a
sensação de ser ou estar numa condição superior ao do outro.
Por outro lado, Barretto (2004) apud Freire-Medeiros (2010) explica que na
visão dos habitantes dos lugares turísticos, a presença dos turistas em suas
comunidades, representa, principalmente, uma maneira de se ganhar dinheiro e não,
necessariamente, a possibilidade haver trocas culturais ou a existência de uma
relação de hospitalidade.
Para Freire-Medeiros (2009), a constituição de um mercado consumidor da
pobreza turística trata de experiências bastante heterogêneas, nas quais se
desenvolvem articulações entre elementos usualmente opostos, como dinheiro e
emoções, interesses e sentimentos, lazer e miséria, compaixão e indiferença.
Conforme explica Fortunato (2011), o poorism pode ser abordado por dois
víeis: o que se relaciona à visitação da localidade amparada pela contribuição
financeira do turista e segundo: o que caracteriza apenas o olhar rápido e superficial
do turista, que por fim, pouco contribui para o desenvolvimento da comunidade local.
A comercialização de experiências turísticas que propõe o contato e o
encontro com a pobreza ajuda a reforçar ou a desfragmentar as questões ligadas à
pobreza turística, tais como estereótipos, ícones, imagens e símbolos ligados ao
destino e aos dilemas sociais que o envolvem.
Ademais, observa-se a existência do interesse, sobretudo, do turista que
procura diferenciar-se e viver experiências que estejam além dos roteiros
tradicionais comercializados pelo mercado turístico. Nesse caso, trata-se de um
consumo consciente que visa o entendimento prático de como vivem as pessoas
cujo contexto social é marcado pela pobreza, sujeira, miséria e absoluta depravação.
Em sua análise sobre o assunto, Freire-Medeiros (2009) explica que:
Em tempos de globalização, o certo é que a indústria do turismo possibilita circular em localidades, transformá-las e consumi-las, criando uma cultura material e uma economia de sensações que lhe é específica [...] (2009, p. 48).
50
Selinger (2009) argumenta que apesar de sua tamanha complexidade,
algumas instâncias da execução do poorism são cabíveis dentro dos princípios da
moralidade.
Embora seja entendida como o cúmulo da “espetacularização” do consumo, a
experiência local de estar incorporado ao contexto da pobreza também pode ser
vista como uma forma de desmistificar as representações da pobreza concebidas
pelos meios de comunicação.
Para Freire-Medeiros (2009), o olhar curioso do turista é capaz de perceber
as hierarquias sociais envolvidas na estrutura organizacional das comunidades. A
experiência do turista obtida pela participação prática de um tour é capaz de
influenciar sua forma de pensar e analisar os fatos tais como eles se apresentam e,
a partir de sua experiência, estarem aptos a desenvolverem suas próprias opiniões.
Além disso, os próprios agentes sociais envolvidos na comercialização do
poorism também procuram de certa forma colaborar para a desconstrução de
estigmas, ainda que contribuam muito pouco para que haja a participação da
comunidade local na distribuição dos lucros obtidos.
No entanto, também se faz importante questionar se esse tipo de turismo
enfatiza a liberdade do turista de ir a qualquer lugar, a qualquer hora, não
importando o preço que se tenha que pagar e, se o prestador de serviços turísticos
está à disposição para capitalizar a pobreza à custa dos outros, sem medir os
impactos da atividade na vida da comunidade receptora.
Na visão de Selinger (2009), ao analisar criticamente as complexidades do
poorism, a primeira dificuldade seria em justificar a prática do poorism como um
empreendimento moral, quando em vez de viajar com o intuito de praticá-lo, o turista
poderia simplesmente deixar de gastar com a viagem e, de forma mais ética, doar
esse dinheiro para uma organização voltada para a caridade.
Por não ser possível assessorar o impacto da prática de todos os envolvidos
no poorism, torna-se difícil a sua mensuração. Além disso, apoiar o desenvolvimento
do poorism também contribui para reforçar as estruturas sociais e financeiras
subjacentes que dão origem à pobreza e assim, perpetuá-la.
Uma vez que a atividade não possui um órgão regulador, não se pode ter um
prévio conhecimento sobre seus potenciais turistas nem ter total certeza se o guia
51
de turismo ou a empresa responsável pelo tour estarão repassando os ganhos da
atividade para a comunidade e, não simplesmente, acumulando receita para ganhos
pessoais.
Os turistas também não podem ter certeza se, de fato, as pessoas
observadas consentem em ser observadas. Logo, não é possível ter certeza se o
que acontece nesses tours é uma exposição da realidade ou simplesmente uma
encenação de uma minoria, omitindo os interesses reais de uma maioria.
Portanto, o estudo deste assunto traz à tona alguns questionamentos: os
tours de pobreza deveriam ser totalmente sem fins lucrativos ou seria moralmente
permissível para os operadores turísticos fazerem um negócio dessa prática desde
que houvesse algum repasse para a comunidade local?
Por fim, para Selinger (2009) proibir a prática do poorism não vai resultar em
uma solução suficientemente pragmática para erradicar a pobreza, pois não se pode
ignorar que o fato da pobreza existir no mundo não foi consequência do poorism e
sim o contrário.
52
3.2 TOURS DE POBREZA: OS CHAMADOS TOURS DA REALIDADE
Para Freire-Medeiros (2007), a prática do turismo em localidades fora do
comum caracteriza-se por uma demanda do mercado turístico que vem se
demonstrando cada vez mais interessada em consumir a diferenciação.
Consequentemente, localidades até então inimagináveis, passam a compor
os chamados tours da realidade, sustentados a partir dos pilares da autenticidade e
da auto-realização.
Como explica Freire-Medeiros (2007), esses tours são capazes de mobilizar
intensas emoções, o que permite aos seres humanos a possibilidade de formular
sua própria trajetória e a de sua sociedade.
Na busca de práticas turísticas ditas alternativas e únicas, o indivíduo é
impelido a viajar para destinos idealizados como autênticos. Como exemplo disso,
há os “tours sociais”, também conhecidos como pro-poor tourism ou pitty tourism,
cuja proposta é a de vender participação e autenticidade.
Tendo como destino localidades em desvantagem econômica, os tours que
envolvem a busca do autêntico ultrapassam os moldes do turismo convencional,
envolvem interações face-a-face, o desejo de refúgio em um espaço íntimo e
acolhedor, permitindo ao turista a possibilidade de formular sua própria trajetória,
além de influenciar intensamente suas emoções.
Segundo Freire-Medeiros (2007), a viagem para lugares associados ao
sofrimento nos remete às primeiras peregrinações religiosas cujo elemento
norteador era baseado na experiência religiosa vivida com o encontro com o
autêntico. Esse fato permaneceu inalterado, visto que ainda hoje tais peregrinações
continuam acontecendo, como é o caso das romarias. 10
Nos dias de hoje, percebe-se uma procura crescente por experiências
marcadas pelo exotismo, inusitadas, interativas, aventureiras e autênticas, em
destinos cujo apelo difere daquilo que se convencionou tratar como “turístico”.
10
Peregrinação religiosa feita por um grupo de pessoas a uma igreja ou local considerado santo, seja para pagar promessas, agradecer ou pedir graças, ou simplesmente por devoção, podendo ser feita a pé ou em veículos.
53
Como consequência, observa-se a segmentação e especialização do setor de
serviços, especificamente, do turismo em organizar-se para atender as
necessidades e os diferentes perfis de turistas: desde o turista estereotípico até o
mais radical.
De acordo com Freire-Medeiros (2007), a Global Exchange, foi a primeira
organização não governamental a realizar o primeiro “tour social”. Identificou-se um
potencial no mercado turístico formado por indivíduos interessados em localizar o
seu papel nos problemas sociais. Logo, a intenção das agências promotoras seria
“substituir” sentimentos de apatia por profundo entendimento e um senso de
mobilização diante da realidade social alheia.
Segundo a autora supracitada, os “tours sociais” atraem pessoas que buscam
a consumação de elementos ligados a mortes, desastres e misérias. Ao mesmo
tempo, transformam localidades marginalizadas e ignoradas em atrativo turístico,
permitindo o engajamento altruísta dos turistas e motivando um sentimento de
aventura e de deslumbramento da paisagem física.
Ao reforçar esse ponto de vista, Cardoso comenta que:
A relação de troca cultural possibilitada pela viagem por meio da apreciação de novas paisagens, das características dos lugares, da perspectiva de observação do si mesmo e do outro, da quebra de paradigmas que leva os sujeitos a repensar suas crenças e valores, demonstra o caráter transformador da viagem (2011, p. 51).
Logo, a complexidade desses tours emerge do fato de seu objeto de consumo
não ser algo óbvio e tangível. Atualmente, são cada vez mais frequentes passeios a
localidades trágicas reinventadas na condição de atrações turísticas.
No que diz respeito a esse processo, capaz de fazer o turismo emergir
inesperadamente em localidades que são reinventadas em suas premissas
históricas e estéticas, Freire-Medeiros (2007), apresenta os exemplos das slums de
Calcutá, dos campos de guerra no Camboja e do Ground Zero em Nova York.
À vista disso, conclui-se que dinheiro e emoções se mesclam propiciando o
desenvolvimento de um produto com características específicas, idealizado para
54
uma parcela específica de turistas que buscam experiências turísticas destacadas
por um diferencial um tanto particular.
3.3 A GESTÃO DO DESAFIO DA POBREZA: O TURISMO COMO MINIMIZADOR
DA POBREZA LOCAL
Conforme Freire-Medeiros (2010) explica, na década de 1970, embora as
agências internacionais de desenvolvimento apostassem no turismo como solução
para os problemas econômicos das nações periféricas, os cientistas sociais
examinavam criticamente seu impacto nas comunidades receptoras.
Até então, o turismo era tomado como sinônimo de exploração e aculturação,
como o cúmulo de um exagero devastador da sociedade de consumo e ameaça ao
equilíbrio ambiental das comunidades hospedeiras.
Todavia, de acordo com Borges (2006), por entender a capacidade do turismo
em favorecer a redução da pobreza, a Organização Mundial do Turismo (OMT) vem
desde 1999 estimulando governos de diversos países a aproveitar o potencial do
turismo.
Essa ideia intensifica-se à medida que o turismo possui significativa
participação no Produto Interno Bruto (PIB) de vários países com elevado grau de
pobreza. Entretanto, apesar de ser frequentemente indicado como alternativa capaz
de amenizar a pobreza, ainda há poucos estudos que, efetivamente, quantifiquem as
relações entre turismo e pobreza.
Por outro lado, o turismo é considerado em muitos países como uma
atividade eminentemente econômica, cuja indústria tem tamanha influência que
geralmente é caracterizada como “o passaporte para o desenvolvimento”.
O suporte que é dado ao turismo visa à atração de turistas internacionais
como meio para possibilitar o desenvolvimento da infraestrutura dos destinos bem
como propiciar investimentos financeiros do setor público e privado.
Todavia, o que chama atenção para, especificamente, o caso do poorism, é o
fato de que a maioria desses investimentos não leva em consideração o
desenvolvimento das atividades turísticas ocorridas nas localidades carentes.
55
O desafio atual para os governos e interessados na promoção do turismo é o
de responder às mudanças abarcando as esferas mais amplas do desenvolvimento,
por meio de estratégias capazes de amenizar os impactos do turismo na vida dos
pobres.
De acordo Organização Mundial do Turismo (OMT), apud Sarmento (2011),
em meio aos fluxos de turismo, destaca-se o aumento do número de turistas na
África e no Oriente Médio, regiões que duplicaram a sua quota de mercado desde
1975.
Para Sarmento (2011), o turismo apresenta algumas vantagens comparativas
potenciais: ele é consumido no local de produção, sendo assim, o deslocamento dos
consumidores para os destinos proporcionam a possibilidade de criação de micro
empresas nos centros urbanos e nas áreas rurais o que propicia a venda adicional
de bens e serviços como acontece com o artesanato, os souvenires, entre outros.
O acesso aos mercados internacionais é um problema considerável para
muitos países, especialmente para os setores tradicionais. Todavia, o turismo
confere a esses países a capacidade de exportar seus produtos, reduzindo,
simultaneamente, o problema das distâncias geográficas.
Ademais, o turismo cria importantes oportunidades para a diversificação da
economia local ao oferecer oportunidades para o desenvolvimento da capacidade
empresarial de pequena escala, bem como, ao propiciar o surgimento do
empreendedor de pequeno porte. Além disso, promove a equidade de gênero na
medida em que pode empregar uma elevada proporção de mulheres, podendo
constituir uma das alternativas para a integração mundial de muitos países devido às
vantagens competitivas e singularidades que cada destino é capaz de oferecer.
Por se capaz de influenciar na diversificação da economia local, o produto
turístico pode ser construído com base nos recursos naturais, culturais e nas
singularidades detidas por cada destino. Por exemplo, o turismo também é capaz de
atrair pessoas para as áreas mais remotas da terra, devido as suas “riquezas”, as
quais podem estar intimamente ligadas à herança cultural, à vida selvagem e ao
valor paisagístico de um destino.
56
Logo, o turismo pode ser utilizado como ferramenta de reordenamento do
território e fixação das populações rurais, evitando a indesejável migração rural-
urbana.
Sendo assim, é preciso saber como gerir a atividade, buscando maximizar os
efeitos benéficos do turismo e as suas oportunidades. Uma forma de maximizar os
seus efeitos para a comunidade local é por meio de ações que possibilitem a
redução da pobreza por meio de uma gestão bem planejada da atividade turística
local.
Para Ashley et al. (2000), efetivamente, os mais pobres podem ganhar alguns
benefícios diretos a partir do turismo enquanto suportam a maioria dos custos. Por
isso, é importante encontrar maneiras de reduzir os custos, maximizando os
benefícios diretos para a comunidade envolvida.
Segundo Organização Mundial do Turismo (OMT) apud Sarmento (2011), é
essencial envolver os vários atores participantes do processo turístico durante esse
processo: os governos (que deverão delinear as estratégias visionárias, as leis e a
coordenação global); a iniciativa privada; os pobres enquanto produtores,
trabalhadores e participantes nas tomadas de decisão; a sociedade civil como
garantia da inclusão dos mais necessitados.
Ademais, a aspiração à participação na indústria do turismo é geralmente
elevada no meio dos residentes locais, sendo assim, o turismo deveria facilitar a
inclusão, propiciando a geração de empregos em benefício dos residentes das
comunidades locais.
Conforme destacam Ashley et al. (2000), atingir essas expectativas requer um
equilíbrio entre os tipos de serviços demandados pelo mercado consumidor turístico
e os que a comunidade local está apta a oferecer. O que é importante do ponto de
vista da pobreza não é simplesmente o quanto de dinheiro entra para o país, mas, o
que permanece no destino e é gasto em bens e serviços comercializados
diretamente pelos pobres.
Todavia, é importante levar em consideração que para as oportunidades para
os pobres migrarem para as áreas onde o turismo é desenvolvido, dependerão de
diversos fatores, tais como trâmites burocráticos, infraestrutura, qualidade de
transporte e de uma boa rede de relacionamentos.
57
Ashley et al. (2000) observam que o setor informal é o meio no qual as
oportunidades para empresas de pequena escala são maximizadas pelos pobres.
Como exemplo, ele cita o caso de Bai Chay, Ha Long Bay, no Vietnã, onde quase
uma dúzia das famílias locais gerencia hotéis privados.
Em fins de 2003, o Ministério do Turismo identificou a necessidade de
formular alternativas inovadoras para a gestão do turismo no país, motivado pelos
resultados observados do impacto da atividade turística na qualidade de vida da
população residente nas regiões beneficiadas pelos Programas Regionais de
Desenvolvimento do Turismo (PRDT) (Ministério do Turismo, 2005).
A realização de um estudo para o fortalecimento institucional do setor turismo,
que enfatizasse seu papel de vetor de desenvolvimento social local e agregasse os
novos paradigmas de alívio à pobreza, formulados pela Organização das Nações
Unidas (ONU) e adotados pela Organização Mundial do Turismo (OMT), permitiu a
elaboração do Projeto de Aperfeiçoamento dos Programas Regionais de
Desenvolvimento do Turismo, visando ao Alívio da Pobreza (2005).
Baseado nessa perspectiva, a Organização Mundial do Turismo (OMT)
buscou realizar ações estratégicas visando aumentar as possibilidades de inclusão
social, pela promoção do conceito de turismo sustentável e o alívio da pobreza.
Sabe-se que erradicar a pobreza por meio da redução das desigualdades sociais é
um dos meios pelos quais se pode contar com o Estado, como principal agente de
redistribuição, mediante uma gama mais ampla de políticas compensatórias, no
entanto, não é tarefa simples nem pode ser resolvido apenas por meio do turismo.
Segundo Projeto de Aperfeiçoamento dos Programas Regionais de
Desenvolvimento do Turismo, visando ao Alívio da Pobreza (2005), no Brasil, o
turismo vem se constituindo, desde 1994, importante eixo de atuação
governamental, por meio dos programas regionais de desenvolvimento do turismo
(PRDT), com significativos investimentos do poder público.
O Manual para a Redução da Pobreza por meio do Turismo, divulgado em
2011, pela Organização Internacional do Trabalho (Organização Internacional do
Trabalho, 2011), também destacou a capacidade do turismo em gerar empregos e
reduzir a pobreza nas zonas rurais dos países em desenvolvimento e menos
58
desenvolvidos. Além disso, reconhece o turismo como importante fonte de
crescimento econômico, particularmente, em países que são vítimas da pobreza.
De acordo com o manual, a missão da Organização Internacional do Trabalho
(OIT) é “promover o trabalho decente” visando à redução da pobreza. Nesse
sentido, alguns avanços recentes foram observados no setor do turismo, por
exemplo, em 2010, a economia global do setor foi responsável por mais de 235
milhões de empregos, o equivalente a 8% do número total de empregos (diretos e
indiretos) ou um de cada 12,3 empregos. (Manual para Redução da Pobreza por
meio do Turismo, 2011).
O turismo é apontado como um dos setores econômicos que mais está
crescendo em diversos países do mundo. É um setor intensivo em mão-de-obra e
uma importante fonte de desenvolvimento e empregos, especialmente para grupos
com acesso limitado ao mercado de trabalho, como mulheres, jovens, trabalhadores
migrantes e populações rurais.
De acordo com os dados do Manual para a Redução da Pobreza
(Organização Internacional do Trabalho, 2011), foi constatado que as chegadas de
turistas em países menos desenvolvidos triplicaram entre 1998 e 2008,
apresentando uma taxa média de crescimento anual de 13% e um aumento de
receitas de 1 a 5,3 bilhões de dólares.
O turismo aparece como a atividade responsável pela maior exportação de
serviços nos países menos desenvolvidos, representando 33% das exportações
desses países e 65% das exportações de países menos desenvolvidos insulares.
Por esse motivo, o turismo está se tornando, cada vez mais, um grande,
senão o principal, impulsionador do crescimento e da geração de empregos, renda e
receita para muitos países em desenvolvimento do mundo.
Atualmente, a atividade ocupa a primeira ou segunda posição no ranking das
receitas de exportação de 20 dos 48 países menos desenvolvidos (PMD) e tem
crescido constantemente em pelo menos dez outros.
Ashley et al. (2000) afirmam que o turismo pode gerar quatro diferentes tipos
de renda: salários provenientes de um emprego formal, lucro obtido por meio da
venda de bens ou serviços por meio do trabalho temporário (por exemplo: venda de
alimentos, artesanatos, materiais de construção, serviços de guiamento), dividendos
59
e lucros provenientes das empresas locais e, finalmente, por meio de renda coletiva
gerida por empresários pertencentes as comunidades locais.
Na figura 8, observam-se algumas estratégias para que o turismo propicie a
redução da pobreza:
Promover benefícios
econômicos
Acentuar impactos
não financeiros sobre meios
de vida
Promover a
participação e parcerias
1. Impulsionar
empregos,
salários locais/
rurais
2. Impulsionar
oportunidades
empresariais
locais/rurais
3. Criar fontes
coletivas de
renda – taxas,
cotas de receitas
1. Desenvolver
capacidades
e oferecer
capacitação com
sensibilidade
a questões de
gênero, com
responsabilidade
equilibrada.
2. Mitigar impactos
ambientais
3. Abordar a
questão de usos
confl itantes de
recursos naturais
4. Melhorar
impactos sociais
e culturais
5. Aumentar
o acesso de
populações
locais/rurais a
infraestrutura e
serviços
1. Criar uma estrutura
de políticas/
planeja-mento
mais favorável
2. Aumentar a
participação de
pessoas afetadas
pela pobreza
em processos
decisórios
3. Desenvolver
parcerias favoráveis
a pessoas
afetadas pela
pobreza com o
setor privado
4. Promover fl uxos
mais intensos
de informações,
Figura 8: Estratégias de turismo favorável a pessoas afetadas pela pobreza Fonte: Manual para a Redução da Pobreza apud Propoor Tourism, (2011)
60
Políticas, regulações, marketing de destinos e estratégias claras constituem a
base para o desenvolvimento do turismo sustentável, a redução da pobreza em
larga escala, a proteção dos recursos naturais e modos de vida e a promoção do
desenvolvimento econômico. No processo de se desenvolver, implementar e avaliar
políticas relacionadas ao turismo, é importante levar em consideração o impacto do
setor para mulheres, trabalhadores migrantes e crianças.
A importância do turismo para a redução da pobreza e para facilitar o
desenvolvimento de economias menos desenvolvidas e emergentes foi reconhecida.
Ela está estreitamente vinculada à promoção dos Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio (ODM), estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Esses objetivos foram criados para erradicar a extrema pobreza e a fome;
atingir o ensino básico universal; promover a igualdade entre os sexos e a
autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna;
combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade
ambiental e estabelecer uma parceria global para o desenvolvimento.
Segundo Manual para a Redução da Pobreza por meio do Turismo (2011), a
Organização Mundial do Turismo (OMT, 2001) elaborou um Código Mundial de Ética
no qual estabeleceu uma estrutura voluntária para o desenvolvimento responsável e
sustentável do turismo. Nesse Código são abordados os direitos e responsabilidades
de todos os atores envolvidos no setor do turismo.
O código também inclui artigos que preveem comportamentos a serem
adotados em locais de destino e por governos, operadores turísticos, agentes de
desenvolvimento turístico, agentes de viagens, trabalhadores e viajantes.
Em suma, o código declara que os benefícios econômicos, sociais e culturais
do turismo são de particular interesse para o desenvolvimento sustentável do setor,
desde que as populações e comunidades locais se associem às atividades turísticas
e tenham uma participação equitativa nos benefícios econômicos, sociais e culturais,
especialmente, na criação direta e indireta de empregos.
O Manual para a Redução da Pobreza por meio do Turismo (2011) aponta o
exemplo da África do Sul, onde foi percebida a importância do turismo para a
economia do país.
61
Como consequência, foram adotadas cinco estratégias visando o crescimento
do turismo no país: aumentar o volume do turismo a taxas elevadas e sustentáveis;
aumentar os gastos totais do turismo na África do Sul; aumentar o tempo de estadia
de turistas e maximizar a entrada de divisas na África do Sul; aumentar o volume e a
distribuição de gastos em todo o país e durante o ano todo e, melhorar a atividade e
os padrões dos gastos para promover transformações e o empoderamento
econômico da população negra.
O turismo é um setor sofisticado e dinâmico cujas empresas devem adaptar-
se constantemente para satisfazer necessidades de consumo em constante
mudança. Sendo assim, pessoas em situação de pobreza podem ter uma renda com
o turismo trabalhando diretamente em serviços turísticos, setores relacionados ou
em sua cadeia de abastecimento.
Também é preciso destacar que para haver o envolvimento dessas pessoas
no setor, os governos devem ser capazes de atuar no estabelecimento de
estratégias, programas e políticas de desenvolvimento e de condições legais
relacionadas à segurança, ao saneamento, às condições de trabalho, à
infraestrutura, à educação e à capacitação profissional.
O desenvolvimento de políticas e estratégias deverão priorizar destinos cuja
demanda tem capacidade ou potencial para compensar os investimentos públicos e
assumir o papel dinamizador do desenvolvimento sustentável e de criação de portas
de saída para a pobreza.
Como aponta a Organização Internacional do Trabalho (2011) por meio do
Manual para a Redução da Pobreza, a maioria dos novos empregos em países em
desenvolvimento está sendo criada no setor do turismo. Portanto, o turismo constitui
a principal exportação de serviços para muitos países em desenvolvimento,
possuindo potencial significativo na garantia de vantagens competitivas para os
países mais pobres e menos desenvolvidos.
Apesar da capacidade inegável do turismo em atuar como minimizador da
pobreza recomenda-se que outros setores sejam considerados no interesse de um
desenvolvimento econômico mais equilibrado, sustentável e de baixo risco, para que
seja possível a implementação bem sucedida de uma estratégia de redução da
pobreza.
62
Por fim, não se pode ignorar o entendimento de que as relações entre o
turismo e a pobreza são múltiplas e dinâmicas. Nesse contexto, o vínculo entre o
setor de turismo e setores afins é determinante para a redução da pobreza. Logo, é
essencial que a renda gerada pelo turismo seja distribuída de forma a contemplar os
interesses da comunidade receptora, de maneira que ela venha a ser beneficiada
direta ou indiretamente com a prática da atividade turística.
No capítulo seguinte, serão apresentados os resultados da pesquisa
norteadora deste trabalho. Buscou-se conhecer com mais detalhes o perfil e a
motivação do turista que visita as áreas pobres, especificamente, das favelas da
cidade do Rio de Janeiro, visando à busca do preenchimento de lacunas que a
bibliografia não foi capaz de elucidar.
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Neste capítulo será apresentada a metodologia utilizada para elaboração da
pesquisa a fim de buscar respostas para o problema deste trabalho. Será mostrado
o método, o tipo de pesquisa, a técnica de coleta dos dados e a análise dos
resultados.
4.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa é designada como uma pesquisa semi-estruturada de natureza
descritiva que passa pelo processo qualitativo e quantitativo.
A pesquisa qualitativa é, na definição de Richardson (2012, p.79-80), “a busca
por uma compreensão detalhada dos significados e características situacionais dos
fenômenos”. Esse tipo de pesquisa caracteriza-se por ter um caráter eminentemente
exploratório, procurando os aspectos subjetivos dos fenômenos e as motivações não
explícitas dos comportamentos.
Enquanto que a pesquisa quantitativa tem como foco a dimensão mensurável
dos fenômenos, buscando traduzir as opiniões e informações por meio de números.
É utilizada quando se sabe precisamente o que deve ser perguntado para atingir os
objetivos da pesquisa. Esse tipo de pesquisa caracteriza-se “pelo emprego da
63
quantificação, tanto nas modalidades de coleta de informações, quanto no
tratamento delas por meio de técnicas estatísticas” (RICHARDSON, 2012, p. 70).
Quanto aos seus objetivos, optou-se por um tipo de pesquisa de caráter
descritivo. A pesquisa descritiva descreve as características de determinado
fenômeno ou problema. (GIL, 2010, p. 27-28)
Quanto aos procedimentos técnicos adotados (técnicas de coleta de dados),
utilizou-se a aplicação de questionários com perguntas abertas e fechadas,
aplicados em contato direto com turistas que fizeram tours nas favelas da cidade do
Rio de Janeiro.
Esse questionário abordou aspectos tais como perfil pessoal do turista,
interesse e motivação do turista, sentimentos e percepção do turista durante o tour,
influência exercida pela pobreza para a decisão de compra do tour, visando à
compreensão de como esse tipo de turismo está sendo comercializado, explorado e
entendido.
4.2 RESULTADOS DA PESQUISA
Buscou-se conhecer com mais detalhes as características do poorism
realizado nas favelas cariocas, o que se tornou viável por meio dos questionários
entregues diretamente aos turistas que fizeram tours nas favelas da Rocinha, Santa
Marta e Vidigal durante os fins de semana (sábados e domingos) compreendidos
entre os meses de Setembro e Outubro.
Cada questionário semi-estruturado continha 16 questões, dividas em 4
questões abertas, 5 questões fechadas sendo que uma delas está subdivida em 1
questão de múltipla escolha e por fim, 7 questões de múltiplas escolhas, totalizando
8 questões de múltiplas escolhas.
No total, foram aplicados 11 questionários para turistas internacionais e
nacionais. Na figura 9 é possível identificar o gênero dominante dos turistas que
responderam os questionários:
64
Figura 9: Gráfico de gênero Fonte: Elaboração própria
De um total de 11 pessoas, 64% pertenciam ao sexo feminino enquanto 36%
pertenciam ao sexo masculino. Na figura 10, foi possível identificar que a maior parte
dos entrevistados (73%) possuía idade a partir de 31 anos ou mais, demonstrando a
existência de um mercado formado por pessoas mais maduras.
:
Figura 10: Gráfico de faixa etária Fonte: Elaboração própria
65
Na figura 11, verifica-se que das 11 pessoas entrevistadas, quase metade (5)
possuem Ensino Superior completo, seguido das pessoas com Mestrado completo,
evidenciando por meio dessa amostra que, geralmente, a maioria dos turistas
interessados nesse tipo de tour possui um alto grau de escolaridade.
Figura 11: Gráfico de grau de escolaridade Fonte: Elaboração própria
Na figura 12, é possível identificar que a maior parte dos questionados (37%)
eram provenientes da Noruega formando um grupo de 4 pessoas. É importante
destacar que segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(2012), a Noruega é o país que ocupa o primeiro lugar no Ranking do Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) Global. Logo, estima-se que as pessoas
provenientes desse país, ao viajarem para um país com características tão
contrastantes como o Brasil e ao participarem desse tipo de tour, passam a observar
a cidade como um todo de forma mais clara, sendo capazes de perceber as
diferenças que distinguem socialmente, por exemplo, os habitantes do Leblon e os
da favela Santa Marta, embora ambos locais estejam geograficamente localizados
na Zona Sul (zona próspera) da cidade.
Em segundo lugar aparece o Brasil com 2 pessoas (18%) seguido da
Espanha (18%). Por fim, com 1 pessoa cada, aparecem França (9%), Estados
Unidos (9%) e Portugal (9%). É importante salientar que esse resultado não significa
que esses sejam os principais grupos de estrangeiros que visitam as favelas
66
cariocas, pois, baseia numa amostragem de turistas reduzida e não compreende o
objetivo desta pesquisa detalhar esse quesito:
Figura 12: Gráfico de país de origem Fonte: Elaboração própria
Na figura 13, é possível observar as diversas profissões dos turistas que
responderam os questionários:
Figura 13: Gráfico de profissões Fonte: Elaboração própria
67
Dentre as diversas ocupações do grupo chama atenção a existência de uma
antropóloga e de um diplomata, ambos, interessados em desenvolver suas
percepções acerca das diferenças presentes no modo de vida da comunidade local.
Por serem provenientes de um grupo de formação diferenciada, observa-se que
cada uma dessas pessoas tende a ter experiências e expectativas diferentes. Por
exemplo, durante o tour, um engenheiro ao observar as construções irregulares
encontradas na favela pode pensar em como aquelas casas conseguem manter-se
sustentadas, a professora de dança pode ficar encantada pela musicalidade
existente no local e usá-la como ideia para desenvolver seus dons artísticos, a
enfermeira pode impressionar-se com as condições precárias de saneamento
básico, temendo pela saúde da população local; o vendedor pode tomar como
exemplo para a sua atividade a capacidade da própria comunidade em criar e
vender seus produtos, o professor pode refletir sobre as condições de educação das
crianças do local, comparando-a com a de seu próprio país.
Em seguida, procurou-se saber qual favela havia sido visitada, como pode ser
observado na figura 14, demonstrando que a maior parte dos turistas haviam feito o
tour na favela Santa Marta (73%), em segundo lugar, Rocinha (18%) e em último
instância, Vidigal (9% ). Esse resultado também é uma expressão do fato da maior
parte desta pesquisa ter sido aplicada na favela Santa Marta e não significa que
essa favela seja a de maior visitação em meio as cidades do Rio de Janeiro.
Figura 14: Gráfico de favelas visitadas Fonte: Elaboração própria
68
Ao serem questionados a respeito de como surgiu o interesse em fazer um
tour numa favela, foi percebido que a maioria respondia por um viés semelhante que
se caracterizava pelo interesse ou pela curiosidade de se ter uma melhor noção e
conhecer de perto a vida da comunidade local.
Algumas dessas pessoas possuem amigos na cidade e por isso, desejaram
conhecer de forma mais íntima uma realidade tão diferente em vários aspectos da
sua própria realidade. Por exemplo, o grupo oriundo da Noruega, que como foi
possível observar no capítulo 2, é o país com melhor Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH). Um deles, por exemplo, declarou estar interessado em conhecer o
Rio “de verdade”, com seu lado encantador, mas também com as suas mazelas e,
não apenas “o estilo de vida carioca encontrado nas praias”.
Além disso, para a maioria dessas pessoas, presenciar as condições de vida
e trabalho, a partir da observação de suas tarefas rotineiras bem como do entorno,
apareceu como um ponto importante no que diz respeito à desmistificação das
ideias preconcebidas ou midiáticas que a maioria das pessoas tem das favelas.
Para alguns dos turistas que responderam o questionário, a realização do tour
torna-se relevante até mesmo para verificar até onde vai a veracidade da autoridade
e do controle exercido em consequência da instalação da Unidade de Polícia
Pacificadora (UPP) nesses locais.
Por outro lado, algumas pessoas também fizeram esse tipo de tour em função
do trabalho que exercem. Por exemplo, havia profissionais do turismo com o objetivo
de conhecerem melhor a respeito de um segmento turístico com o qual começaram
ou começaram a trabalhar, dado a existência de uma demanda crescente de turistas
interessados em realizar o slumming.
Na figura 15, é possível perceber que a maioria dos turistas entrevistados
(55%) não estava fazendo esse tipo de tour pela primeira vez, o que pode indicar
que grande parte dos turistas acaba voltando às favelas para terem ao menos uma
segunda experiência no local:
69
Figura 15: Gráfico de frequência de participação no tour Fonte: Elaboração própria
Na figura 16 é possível notar que a maioria das pessoas tomou conhecimento
do tour, respectivamente, por meio de amigos (46%), sites de turismo (18%),
parentes (9%), outros: trabalho (9%), outros: professor de português (9%), não
especificado (9%), sendo que as demais categorias: blogs de viagens, no local de
hospedagem, revistas de viagens ou jornais e televisão (0%), não apresentaram
quantidade relevante para a apuração dos dados desta pesquisa.
70
Figura 16: Gráfico de fonte de conhecimento do tour Fonte: Elaboração própria
Quando questionados a respeito de onde haviam comprado o tour, os dados
foram surpreendentes: a maior parte dos turistas da amostra (42%) havia sido
levada gratuitamente por amigos moradores da comunidade local e apenas 25% dos
turistas havia compram em agências de viagem, enquanto a terceira maior parte
(17%) havia comprado diretamente com um guia de turismo, conforme a figura 17:
Figura 17: Gráfico de meio pelo qual o tour foi comprado Fonte: Elaboração própria
71
De acordo com os questionários aplicados, como pode ser evidenciado por
meio da figura 18, quando perguntados sobre os sentimentos vivenciados durante o
tour, verifica-se que surpresa e curiosidade foram os sentimentos vivenciados por
aproximadamente 21% dos turistas, sendo identificados como os sentimentos de
maior expressão em meio aos turistas.
Por outro lado, a compaixão (18%) aparece em seguida com a maior
representatividade nos questionários, sem deixar de citar a alegria, que também teve
destaque em meio aos 12 sentimentos elencados. Todavia, é importante destacar
que apenas 1 pessoa (4%) do total, respondeu que teve vontade de ajudar a
comunidade local durante o tour. Não se deve ignorar o fato de que esse turismo
impacta profundamente o emocional do turista de diversas formas, influenciando sua
percepção do outro, de si mesmo e da experiência da viagem como um todo.
Figura 18: Gráfico dos sentimentos vivenciados durante o tour Fonte: Elaboração própria
Quando questionados sobre o nível de satisfação obtido após o tour, de
acordo com a figura 19, verifica-se que a maior parte dos turistas fica muito satisfeita
(55%) ou satisfeita (27%) após o tour. Entretanto, vale destacar que houve 1 pessoa
(9%) que se demonstrou muito insatisfeita e outra indiferente (9%) após o tour: Essa
72
pessoa que se demonstrou muito insatisfeita, foi uma das pessoas que estava
fazendo o tour pela primeira vez e, aparentemente, demonstrou-se muito insatisfeita
com a forma com que o tour foi conduzida pela guia, alegando sentiu falta de uma
interação mais autêntica com a comunidade local.
Figura 19: Gráfico de nível de satisfação após o tour Fonte: Elaboração própria
Ao serem questionados se a pobreza encontrada nas favelas foi o fator
principal motivador da decisão de compra desse tipo de tour, percebeu-se por meio
das respostas encontradas na amostra que há certa resistência ou dificuldade em
assumir até que ponto a pobreza, efetivamente, influencia a existência desse tipo de
turismo.
De uma amostra de 11 pessoas, percebeu-se que a maioria sentiu-se um
pouco incomodada ao responder, especificamente, essa questão. Um dos
participantes chegou até mesmo a questionar a necessidade dessa questão estar
presente na pesquisa, por não acreditar que haja relação entre o tour e o interesse
pela pobreza. Portanto, as respostas obtidas indicaram que a maior parte discorda
totalmente (37%) dessa afirmação, por outro lado, vale destacar que 2 pessoas
(18%) concordaram, enquanto que apenas 1 pessoa (9%) concordou totalmente,
como pode ser verificado por meio da figura 20:
73
Figura 20: Gráfico da influência da pobreza como fator determinante para a compra do tour
Fonte: Elaboração própria
A pesquisa ainda revelou ainda que não existe um consenso definido no que
diz respeito à exploração da pobreza alheia feita por meio desse tour, logo, é
possível verificar que as opiniões foram bem dividas, como apresentadas na figura
21:
Figura 21: Gráfico de percepção da exploração da pobreza alheia durante o tour Fonte: Elaboração própria
74
Além disso, verificou-se que durante o tour, a maior parte dos turistas (64%)
contribuiu financeiramente diretamente para a comunidade local, fortalecendo a ideia
de que o pro-poor tourism também tem a capacidade de gerar benefícios para os
países pobres ou desenvolvimento, como no caso do Brasil, uma vez que os turistas
possam, efetivamente, consumir in loco, como se pode notar na figura 22:
Figura 22: Gráfico de porcentagem da contribuição financeira direta do turista à comunidade Fonte: Elaboração própria
Dentre os que contribuíram, é possível destacar que grande maioria (72%)
contribuiu por meio da compra de artesanatos locais, como demonstrado por meio
da figura 23:
Figura 23: Gráfico de tipos de colaboração financeira direta para a comunidade local Fonte: Elaboração própria
75
Por fim, ao serem questionados se recomendaria esse tipo de tour para
outros turistas, 8 (73%) pessoas responderam que sim, enquanto 3 (27%)
responderam que não, como pode ser observado na figura 24:
Figura 24: Gráfico de recomendação do tour para outro turista Fonte: Elaboração própria
Logo, esse resultado também pode ser uma expressão do resultado positivo
encontrado no nível de satisfação, que como visto anteriormente, foi
majoritariamente muito satisfatório, reforçando a prospecção de que esse tipo de
turismo tende a continuar atraindo novos adeptos.
Percebe-se então com os resultados obtidos por meio da aplicação dos
questionários que cada vez mais turistas estrangeiros com nível de escolaridade
avançado e, em sua maioria, provenientes de países desenvolvidos têm procurado
experiências de turismo em favelas. Essas pessoas são motivadas pela curiosidade
e pelo exotismo, que podem ser consequência do que observam, inicialmente, por
meio das imagens vinculadas pela mídia e, especialmente, fomentado pelo boca-a-
boca.
Constatou-se também que a maior parte desses turistas não tem a mínima
noção de que esse tipo de turismo baseia-se no conceito do poorism, pois, na visão
da maioria deles fazer turismo na favela não expressa um desejo de se consumir ou
explorar a pobreza alheia, mas, simplesmente o interesse por conhecer com maior
propriedade a realidade de vida da comunidade local. Logo, fica claro que a maioria
não enxerga ou é capaz de admitir a situação tal como ela é: pessoas ricas
“assistindo” a vida de pessoas pobres.
76
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo teve como objetivo estudar o poorism, fenômeno em atual
expansão, proveniente do turismo contemporâneo bem como as dimensões da
pobreza a fim de entender sua capacidade em converter-se em atrativo turístico. Por
se tratar de um segmento exótico de relevância para uma compreensão holística do
turismo, considerou-se pertinente estudá-lo.
Para alcançar o objetivo foi necessário: a) analisar as referências sobre o
tema e contribuir com a construção de novas bases teóricas para o estudo do
turismo contemporâneo, da segmentação do turismo e das motivações responsáveis
por novas formas de consumo em viagens; b) pesquisar dados sobre a pobreza a
nível mundial e enquanto tendência para o turismo, c) explicar o que é poorism e
como ele pode ser desenvolvido visando à diminuição dos efeitos da pobreza além
de c) verificar se o interesse pela observação da pobreza alheia influencia a decisão
de quem opta por esse tipo de turismo.
Para concretizar esses objetivos, foi realizada uma pesquisa descritiva do tipo
bibliográfica para a elaboração do referencial teórico abordando conteúdos
referentes ao turismo contemporâneo, segmentação de mercado, motivações,
relevância histórica e social da pobreza, poorism e tours de realidade além de
reflexões a respeito da capacidade do turismo em atuar como agente na gestão do
desafio da redução da pobreza.
Além disso, foi feita uma pesquisa de campo com a utilização de
questionários com questões abertas e fechadas, aplicados a 21 turistas que
realizaram pelo menos um tour em favela. Assim, procurou-se descrever as
características de uma pequena amostra de turistas praticantes do turismo em
favelas. Buscou-se conhecer as características desse grupo, por meio de elementos
tais como: sua distribuição por idade, gênero, procedência, nível de escolaridade e
ocupação, além de levantar informações a respeito de suas opiniões e atitudes.
É importante frisar que a maioria dos turistas desta pesquisa demonstrava
interesse e curiosidade por ver com seus próprios olhos como vivem os moradores
das favelas cariocas. Nota-se que esse turista deseja ser capaz de formar a sua
77
própria opinião sobre a comunidade e não apenas continuar reproduzindo uma
opinião da mesma baseada no que a mídia e os filmes vinculam mundialmente.
Verificou-se também que a divulgação desse tipo de turismo por meio dos
amigos (46%) foi a maior ponte de conexão do turista às comunidades, seguida de
sites de turismo (18%) Além disso, vale destacar que a maioria (42%) foi levada
gratuitamente para conhecer as favelas por meio de amigos.
Quando questionados a respeito do ou dos sentimentos que tiveram maior
influência em suas reações durante o tour: surpresa e curiosidade aparecem em
primeiro lugar (21%), seguidos pela compaixão (18%). Essa constatação permitiu à
pesquisadora base para confirmar que a maioria das pessoas que fazem o slumming
ou o poorism é motivada, principalmente, pela curiosidade e, também são
constantemente surpreendidas com o que os seus olhares são capazes de capturar.
Após o tour, constatou-se que maior parte dos turistas (55%) encontrava-se
muito satisfeita com a experiência. Além disso, ao conversar superficialmente com
eles, nota-se inclusive um desejo de estar voltando à comunidade futuramente.
No que diz respeito à questão norteadora deste trabalho, ou seja, a questão
que pretendia descobrir se a pobreza havia influenciado a decisão do turista ao
escolher fazer um tour em uma favela, verificou-se que 37% discordaram totalmente
dessa afirmação, contrariando a ideia inicial de que a pobreza era o elemento de
maior peso na decisão do turista. No entanto, é importante comentar que nota-se
que a maioria das pessoas demonstra certo receio em assumir de forma direta que o
interesse pela pobreza alheia também está ligado à escolha do tour, talvez, por
considerar que admitir o interesse soe como antiético ou até mesmo imoral.
Uma parcela de 45% dos turistas acredita que esse tipo de tour explora a
pobreza alheia enquanto 55% não concordaram com esse fato. Portanto, verifica-se
que as opiniões estão bem dividas e não há um consenso estabelecido. Isso indica
que a abordagem do tour demonstrou-se de alguma forma conectada à pobreza de
acordo com as percepções do turista, portanto, pode-se conjecturar que essa
abordagem pode ter sido expressa por elementos da fala do guia ou ainda, pelo que
é mostrado em si ao turista durante o tour.
Vale ressaltar que a maioria dos turistas (64%) contribuiu financeiramente
para a comunidade durante o tour. Sendo assim, é possível observar o lado positivo
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desse tipo de turismo, principalmente, quando realizado por pessoas
conscientizadas da situação do outro e dispostas a fazerem algo para contribuir.
Como discutido no decorrer do capítulo 3, o turismo pode ser um instrumento na luta
contra a pobreza, sobretudo, quando realizado da maneira correta.
Durante a elaboração da pesquisa surgiram poucas limitações: o fato da
amostra ter sido de apenas 21 pessoas e da mesma ter sido limitada apenas à
turistas que visitaram as favelas do Rio de Janeiro. Todavia, como o interesse era de
se realizar uma pesquisa prioritariamente qualitativa a amostra permitiu que fosse
possível ter um breve conhecimento do perfil desse tipo de turista bem como da
influência da pobreza na sua decisão.
Por fim, de acordo com os resultados desta pesquisa, pode-se concluir que a
pobreza não foi o fator principal na motivação do turista ao visitar uma favela e que,
na maioria dos casos, o interesse é despertado pela curiosidade de saber como é a
vida da comunidade local, por meio da observação do modo de vida da comunidade
e dos aspectos culturais (elementos materiais e imateriais que compõem a imagem
do local).
Todavia, é sugerido que se faça outras pesquisas a respeito do tema, com
uma amostra maior de pessoas que tenham feito esse tipo de tour, não apenas nas
favelas, mas em outros locais marcados pela pobreza e de interesse turístico,
viabilizando a abordagem desse assunto a fim de ser possível avaliar se o interesse
pela pobreza é de fato o elemento de maior motivação na execução do turismo em
locais acometidos pela pobreza.
Ademais, não se pode negar que a favela seja um claro exemplo da
materialização da pobreza, não sendo possível dissociá-la da mesma, por mais que
hoje em dia nem todos os seus habitantes vivam em condições precárias.
Entretanto, não se pode negar que todos eles foram privados do direito a uma
moradia em condições igualitárias quando comparados aos demais membros da
sociedade. Portanto, embora o turista não assuma diretamente a influência da
pobreza ao optar por visitar uma favela, ele não pode ignorar a significativa presença
da mesma nesse local.
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APÊNDICE
Este questionário destina-se a coletar informações de turistas que tenham
feito algum tipo de tour nas favelas, visando subsidiar o Trabalho de Conclusão de
Curso, sob o tema “Poorism, a pobreza como atrativo turístico”, a ser apresentado
ao Curso de Turismo da Universidade Federal Fluminense pela aluna Thaís Mota.
Agradeço-lhe a gentileza da participação.
1. Sexo:
( )Feminino ( )Masculino
2. Faixa etária:
( )Menor de 18 anos ( )19 a 21 anos ( )22 a 24 anos ( )25 a 27 anos ( )28 a 30 anos ( )Acima de 31 anos
3. Grau de escolaridade:
( )Ensino Fundamental completo ( )Ensino Médio completo ( )Ensino Superior completo
4. País de origem:
__________________________
5. Profissão:
__________________________
6. Qual foi a favela que você visitou?
__________________________
7. Como surgiu o interesse em fazer um tour em favela?
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
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Foi a primeira vez que você fez esse tipo de tour?
( ) Sim ( )Não
8. Como você teve conhecimento do tour em favela?
( )Amigos ( )Sites de turismo ( )Revistas de viagens ( )Parentes ( )Blogs de viagens ( )Televisão ( ) No local de hospedagem ( )Outros________________
9. Onde você adquiriu o tour?
( )Agência de turismo ( )Hotel ( )Hostel ( ) Guia de turismo ( )Outros
10. Quais sentimentos o tour despertou em você?
( ) Compaixão ( )Tristeza ( )Vontade de ajudar ( )Medo ( )Pena ( )Repulsa ( ) Alegria ( )Ansiedade ( )Revolta ( )Surpresa ( )Curiosidade ( )Outros____________ 11. Nível de satisfação após o tour:
( ) Muito insatisfeito ( )Insatisfeito ( )Indiferente ( )Satisfeito ( )Muito satisfeito
12. Você acredita que a pobreza encontrada nas favelas foi o fator
principal na sua decisão de comprar esse tipo de tour?
( )Concorda totalmente ( )Concorda ( )Nem concorda nem discorda ( )Desconcorda ( )Desconcorda totalmente ( )Não sabe opinar
13. Acredita que esse tipo de tour tende a explorar a pobreza alheia?
( ) Sim ( )Não
14. Durante o tour, você colaborou financeiramente de forma direta
para a comunidade local?
( ) Sim ( )Não
Se sim, de que forma colaborou?
( )Compra de artesanatos locais ( )Outros_____________ ( )Doação (dinheiro, roupas, alimentos, projetos sociais)
15. Você recomendaria o tour para outro turista?
( ) Sim ( )Não
Recommended