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Nuvem Negra
Primeira Edição: Abril de 2012/RJ Edição de texto e Diagramação: Shirlei Di Tonini
Arte da Capa: Stéfanie Tonini
Agradecimentos:
Primeiramente agradeço a Deus pela divina inspiração. Somente
Ele e mais ninguém é totalmente responsável por essa obra.
Agradeço a toda minha família, pelo amor incondicional.
Principalmente ao meu amado esposo Ivan de Moura e aos meus
amores de filhos, Miguel e Stéfanie. Não me esquecendo, de
claro, todos os meus amigos queridos, que sempre me apoiaram
e nunca me deixaram desistir dos meus sonhos. Todos vocês são
perfeitos pra mim.
Em memória de Flávia Alves dos Santos,
Um dia vamos nos encontrar... Amiga
Shirlei DiTonini
Sumário
Pensamento ........................................................................4
Prólogo................................................................................5
1-Perfeição .........................................................................7
2-Os Vitrais........................................................................17
3-Ondas Negras..................................................................24
4-O reflexo lunar................................................................31
5-O clarão...........................................................................49
6-O castelo Devour............................................................62
7-O esconderijo..................................................................80
8-Calor e Frio.....................................................................88
9-Demônios e Anjos..........................................................100
10-Os corações..................................................................109
11-Secreto..........................................................................116
12-A revelação...................................................................124
13-O convite dos Marfans..................................................137
14-Retiro Espiritual............................................................149
15-Inverno..........................................................................172
16-A morte.........................................................................190
17-Ritual da Meia-Noite....................................................198
18-Desaparecidos...............................................................218
19-Novo Esconderijo.........................................................236
20-Espíritos........................................................................248
21-Tulipas Congeladas.......................................................252
22-Livres............................................................................265
23-Inferno...........................................................................271
24-Céu................................................................................278
25-O Nuvem Negra: O Diário de Megan Augustin............283
Pensamento:
Uma palavra se me disse em segredo e os meus ouvidos
perceberam um sussurro dela.
Entre pensamentos de visões da noite, quando cai sobre os
homens, o sono profundo, sobreveio-me o espanto e o tremor e
todos os meus ossos estremeceram. Então um espírito passou
por diante de mim; fez- me arrepiar os cabelos da minha carne.
Parou ele, mas não conheci sua feição; um vulto estava
diante de meus olhos: E calando-me, ouvi uma voz que me
dizia: Seria porventura o homem mais justo do que Deus? Seria
porventura o varão mais puro do que o seu Criador?
Livro de Jó Cap.4 verso: 12-17
Prólogo
ϯ Décimo Sexto Aniversário
Tomada por uma profunda depressão, sentia como se uma
densa nuvem pairasse sobre minha cabeça. Sob meus pés não
existia chão. Não conseguia achar razão, nem sentido para vida.
Meu único desejo era encontrar-me com a morte. Porém nem ao
menos cogitava a forma com que isso aconteceria. Chorava até
pressentir que meu tórax explodiria. As lágrimas vertidas seriam
de um alguém amargurado e angustiadíssimo. Em meio a estes
sentimentos aterradores, deitada de costas na cama, observava
os pingos de chuva, que escorriam pelo vidro da janela...
Os relâmpagos que anunciavam a tempestade iluminavam
meu quarto e assemelhavam-se a flashes de uma câmera
fotográfica antiga. Fotos seriam reveladas de um ser
desesperado e confuso. Escorregando pelo vidro, do lado de fora
da janela, açoitada pela chuva contemplei a palma de uma mão.
Grande, bem maior que a minha e que possuía ossos finos e
pontiagudos no lugar das unhas. Esta espalmou me convidando
a fazer o mesmo. Estranhamente, não tive medo. Apenas a
observava por alguns segundos, meditando que talvez meu
desejo mórbido tivesse sido atendido.
Seria a morte? Questionei-me. Mesmo sem obter a resposta
decidida elevava a mão esquerda em direção ao suposto fim.
Antes, porém, observando que ainda em meu dedo anelar
pousava o anel que meu pai me presenteara no meu décimo
sexto aniversário, diante de todos os amigos da cidade, na festa
mais sem graça de todos os tempos. O observei por alguns
segundos. Ele fez minha mente vagar em surrealidades incríveis.
Ao alcançar finalmente a misteriosa mão, despenquei num
pesadelo gelado e úmido, cheio de sentimentos confusos, do
qual somente despertaria três dias depois...
Anne Clair Gardner
ϯ
01
Perfeição
... Sua perfeição beirava o irreal, era demasiada para o meu lento coração...
Debaixo de uma nuvem de desespero. Dentro de um poço
fundo. Onde tudo era sujo e imundo me encontrava. As roupas
úmidas e manchadas de terra apegavam-se irritantemente ao
meu corpo. Chorava irradiando uma compulsão muito dolorosa.
Por vezes tentava sair daquele lugar. Porém não havia escadas,
nenhum apoio para que me ajudasse a escapar. Agachei-me,
enfiei minha cabeça entre os joelhos e me abracei forte. Sentia
muito frio e uma solidão nauseante. Por vezes levantava um
pouco a cabeça, tentando me acalmar. Procurando uma posição
para respirar melhor. Sorvia o cheiro da terra molhada pelo
sereno da noite passada. Acolhedor. Lembrei-me da minha
família. Teria que ser forte por eles. Saudades... De um tempo...
Saudades... De momentos. Mirei o céu, observava a lua, um
breve luar se afiguraria na chegada daquela noite. Porém sua
beleza foi ofuscada de uma só vez, por sua sinistra parceira, uma
sombra estranha e obscura. O dia se tornou noite. A pequenina
luz tornou-se densas trevas. Uma massa negra, espessa e
sombria tomou toda a extensão do firmamento. Observava
terríveis pingos de chuva, arderem no meu rosto, anunciando
uma tempestade de proporções gigantescas. Desesperei-me. E a
água da torrente, se misturou às minhas lágrimas na primeira
tentativa em despertar...
Não era do meu feitio, mas naquela manhã acordei cedo, por
volta das sete horas. O despertador me ajudou na dura tarefa,
pois mais uma vez não tinha dormido bem. Mas era raro mesmo
ter uma boa noite de sono. Os pesadelos sempre me
perseguiram. Desde a minha infância. Mas agora se tornavam
cada vez mais constantes e intensos. Forçava-me a não pensar
neles. Naquele dia acordara esperançosa e com desejo de
encontrar razão para minha vida. Os questionamentos
filosóficos, porém atormentavam-me: De onde viemos? Quem
nós somos? Pra onde vamos? Não possuía as respostas. Mas
obstinada como eu era, as buscaria com certeza. Necessitava
fervorosamente ter objetivos, alvos e metas a serem cumpridas.
Algo que me fizesse prosseguir, ir adiante, buscar e quem sabe
conquistar. É eu sabia. Pensar assim aos dezesseis anos seria
muito precoce. Mas “precoce” deveria ser o meu nome do meio.
O lugar onde vivia desde criança ficava no hemisfério norte,
numa pequena cidade chamada Vila de Blackville, localizada no
centro da Província de New Brunswick, Canadá. Lugar muito
aconchegante com apenas 931 habitantes. A cidade considera a
capital da pesca do salmão no Miramichi. O clima apesar de
quase sempre muito frio, não ofuscava a beleza do local, nem
mesmo o jeito hospitaleiro dos habitantes. Pelo contrário, o
tornava mais atrativo e charmoso. Sempre amei o Rio
Miramichi. Repleto de peixes e de calmaria sossegadora. Apesar
da água extremamente congelada, ele sempre foi meu refúgio
preferido. Gostava de passear a beira do rio, solitária,
absorvendo o vento frio rasgando na minha pele.
Morava com meus pais, numa casa espaçosa e muito
confortável nos arredores da cidade, há uns cinco minutos,
viajando de carro. Anne Clair Gardner, este era meu nome. A
filha única de um casal de missionários canadenses da Igreja
Unida de Blackville. Pastor Abel Gardner, meu pai, era um
homem rígido com suas regras e muito sisudo. Sarah Gardner,
minha mãe, era uma mulher belíssima, doce e gentil.
Personalidades distintas, que aparentavam se amarem de
verdade e até se completarem. Arriscaria afirmar. Achava
naquela época, que o único problema na vida deles era a filha:
Complicada, geniosa, briguenta, com pouquíssimos amigos e
atormentada por pesadelos. Que entrava e saia de hospitais por
conta de dores no coração sem diagnóstico preciso e que já
havia consultado todos os psicólogos da região. Não era mesmo
exemplo de perfeição.
Meus pais me contaram quando completei dez anos, que
durante uma missão no Brasil, no interior do Mato Grosso, na
cidade de Bonito, minha mãe estava grávida de mim, e
aconteceram algumas complicações. E acabei nascendo antes do
tempo certo, com sete meses. E em consequência disso, muito
doente. Meus pais então tiveram que voltar para o Canadá, às
pressas, para que me tratassem num hospital de confiança no
nosso país. Eles me contaram que foi um tempo difícil e que
escapei da morte por muita sorte. Diziam-me que era mimada e
inconsequente, em decorrência desses fatos. Não concordava
que fosse mimada, apenas opiniosa. Entretanto sempre achei que
havia algo a mais. Algo escondido. Um segredo por trás da
minha vida. Algo que me incomodava no fundo da alma. Uma
coisa era verdade, tinha muito problemas na escola: Detenção,
castigo, suspensões e algumas faltas. Confesso que minha fama
não era das melhores. Porém minhas notas eram excelentes e
isso devia compensar um pouco meu comportamento ruim.
Apesar dos meus professores não entenderem como conseguia
me sair bem em todas as atividades escolares. Mas era algo
natural pra mim... Aprender.
Quem cruzasse comigo pelos corredores da escola, não se
intimidaria. Não como uma adolescente esguia, de cabelos
longos e lisos, castanhos claros, belos por eles mesmos, pois
vaidade não era uma de minhas virtudes ou defeito. Sei lá.
Possuía a pele alva e os olhar endurecido cor de castanho-mel.
Vestia-me de jeans, camiseta e grossos casacos de inverno. Com
tênis surrados ou grosseiras botas cobrindo os pés. Não era de
assustar ninguém. Mas naquela época, não possuía consciência
de que poderia existir um monstro dentro de mim, pronto pra ser
despertado e doido pra sair. Apesar de muitas vezes
experimentar sentimentos terríveis e pensamentos malignos, que
me faziam ficarem a ponto de em algumas ocasiões... Perder a
noção dos meus limites.
(...) O coração doía de tensão e ansiedade. O caminhar lento,
era pra tentar disfarçar os desejos mórbidos que se apoderavam
do espírito dela. No corredor a meia luz, cruzara com um
menino, um NERD, que usava óculos grandes e andava de um
jeito engraçado, enquanto lia um livro. Vinha em sua direção de
cabeça baixa e em meio a distração com a leitura, esbarrara no
ombro dela, sem querer, com força. Fora o suficiente para
desencadear um misto de sentimentos ruins, que resultaram em
muitas pancadas e em mais uma suspensão (...).
Apesar de ter a cabeça repleta de orações e versículos da
bíblia desde criança, ir a congregação, nunca foi algo que me
desse realmente prazer. Porém se existia uma regra inquebrável
na minha casa, era essa. “Domingo é dia do Senhor, dia de
participar das reuniões da igreja”. Essa era a frase pronta
predileta do Pr. Gardner. Então sempre comparecia, mesmo
contra minha vontade. Ia apenas para agradar meus pais. Acho
que não conseguirei explicar melhor, mas uma das razões, era
porque sempre tive muito amor por eles e fazê-los sofrer,
também me causaria sofrimento. Na verdade, não conseguia
encontrar nas reuniões dominicais, as respostas que procurava.
Tentava entender Deus, mas Ele era subjetivo demais pra mim.
Uma incógnita. Alguém inalcançável. De quem sempre ouvia
falar, mas que não havia conhecido pessoalmente ainda.
Discursavam sobre sua perfeição. Excelso amor. Proteção... Mas
se Ele era isso tudo mesmo, porque o mundo que Ele mesmo
criou, a humanidade, que Ele formou com suas mãos, se tornou
tão imperfeita e cruel? Ele não deveria fazer alguma coisa pra
concertar e tornar tudo novamente... Perfeito?
Perfeição... Perfeito... Sempre foi Franco Marfan. Não posso
falar de perfeição, sem me lembrar dele. Como se algum dia da
minha vida, conseguisse passar, sem que eu me lembrasse dele.
Nós nos conhecíamos desde a infância. Ele era um rapaz lindo e
o mais encantador de Blackville. Sua pele morena refletia
hipnoticamente nos raros dias de sol. Os seus olhos verdes
brilhantes pareciam duas piscinas de perdição e encanto. Os
cabelos negros cerrados na cabeça lhe proporcionavam um
aspecto másculo que seu corpo rígido e alto, de um metro e
oitenta e cinco apenas confirmavam. As expressões grosseiras
de seu rosto contrastavam com a suavidade do seu jeito sedutor
de falar. Um perfeito Adônis, tão perfeito quanto poderia ser
irreal. Estudava numa cidade distante de Blackville, em
Freddericton, na universidade de New Brunswick. Tinha a idade
de dezoito anos. Cursava faculdade de Direito. Era um aluno
adiantado e inteligentíssimo. Nunca se interessaria por uma
garota sem graça do colegial... Ahr!... Porém sempre nutria uma
paixonite por Franco. Um amor platônico, impossível. Tinha a
absoluta certeza de que ele jamais me notaria.
Sua família morava nos arredores da cidade, Os Marfans.
Muito conhecidos por sua gentileza e solidariedade. Sempre
engajados em projetos sociais, colaborando diretamente com a
Congregação religiosa local, as escolas e as instituições
filantrópicas. Com certeza, era a família mais rica da cidade. E
não faziam economia quando se dispunham em conceder auxílio
a alguém. Proprietários de uma grande empresa de advocacia
prestavam vários serviços para as cidades vizinhas.
Empregavam a quase todos os jovens aspirantes a advogados da
região. Todos os anos se reuniam num grande congresso, em um
clube privadíssimo e secreto, localizado dentro da floresta da
colina. Sempre foram populares e queridos por todos, porém
possuíam um ar de soberba, que procuravam disfarçar muito
bem. Poucos observadores e desatentos fãs, não conseguiriam
perceber. Percepção que eu possuía como por dom ou maldição,
não sabia ao certo ainda. Suas áureas sombrias, sentidas no ar,
os perseguiam enquanto passeavam com seus carros luxuosos
pelo centro da cidade. Gente mórbida fazendo esforço pra
aparentar angelical. Por uma ou duas vezes comentei com meus
pais sobre eles, mas os Marfans pareciam assunto proibido na
nossa casa. Mais uma das regras do meu pai.
A obscuridade pairava sobre a casa deles. Uma bela mansão
situada quase no topo da floresta da colina, cercada de altas
árvores, de onde podia se observar todo o vale com um belo lago
azul e o Rio Miramichi com suas lindas águas cristalinas e
repletas de salmões. Pela manhã, bem cedo a neblina descia e
cobria parcialmente as três janelas grandes de madeira da casa,
laqueadas de branco neve, que ficavam no segundo andar. À
noite havia pontos de luz, que podiam ser vistos da praça da
cidade, que de longe aparentavam mais serem estrelas caídas no
jardim dos Marfans. Construção imponente, convidativa e até
atraente. A casa se comportava como se instasse as pessoas
hipnoticamente a entrarem por suas portas.
Os Marfans organizavam grandiosas recepções.
Comparecemos a uma delas, eu e meus pais. As pessoas
retornavam de lá, descrevendo a beleza da mansão, a excelência
do Buffet e do serviço e como os anfitriões eram
impressionantemente elegantes e admiráveis. Sim, eles eram
isso tudo mesmo. Não posso negar: O Sr. Ivan Marfan, de pele
alva e límpida, com seus fios grisalhos caindo pelo pescoço e
com suas duas janelas azuis irresistíveis, dificilmente passaria
despercebido. Homem garboso, que ostentava ser uma estátua
rara e intocável, de um porte encantador, tanto quando movia
seus lábios finos e avermelhados, quanto quando caminhava
firme e elegante nas ruas de Blackville com seus ternos bem
cortados. O chefe da família era um senhor jovem, de palavras
sólidas, porém gentis. Sempre sorridente, porém um sorriso
contido, controlado e bem direcionado a determinadas pessoas e
na medida apropriada. Sua estonteante esposa, a jovial Sra.
Havana Marfan, era o tipo de mulher de corpo escultural e
sorriso fresco. Com o olhar marcante de seus belos olhos verdes-
água, fulminava seus inimigos e enchia de desejo os mais aflitos
homens no recinto onde se encontrava. Sua outra arma de
sedução eram os belos cabelos negros encaracolados, que
pousavam em seus ombros, ela os manipulava de maneira que
exalavam o perfume doce de Amêndoa do seu xampu. Os
vestidos elegantes e caros cobriam o seu sinuoso corpo de dama,
revelando partes de sua pele de cor morena jambo, e
combinavam perfeitamente com seus sapatos valiosíssimos.
Evelyn Marfan, irmã de Franco, não fugia a regra de perfeição.
Moça de traços delicados, a primeira vista, aparentava muita
ingenuidade e doçura, porém detrás de seus lindos olhos azuis,
os mesmos do pai, refletia uma malignidade terrível. Debruçada
no corrimão da escada, a primeira vez que a vi, ela estava
observando os convidados, sem transparecer nenhum tipo de
reação. Os cabelos curtos e tingidos de vermelho escorriam por
sua cabeça, numa ponta desregular que ultrapassava o queixo,
cobrindo-lhe parcialmente os olhos e as orelhas deixando apenas
o pescoço desnudo. Contrastando sombriamente com a pele
muito clara. Quando caminhava, assemelhava-se a um gato
passeando por sobre um muro, com uma graça e uma elegância
invejável. A família Marfan possuía a aparência de prole
perfeita. Da primeira vez que fui à casa dos Marfans, na ocasião
em que me deparei com Evelyn, logo que cheguei me admirei-
me com os dragões: Na entrada, encontravam-se dois, um de
frente pro outro. Esculpidos na pedra, aparentavam guardar o
imenso portão de ferro. Sobre grandes pedestais, as criaturas
encontravam-se sentadas, com as patas dianteiras fincadas na
frente e as traseiras agachadas, como que se de surpresa fossem
saltar das colunas. A calda enrolava-se no suporte igual a uma
serpente e na ponta dela se desenhava uma seta apontando pra
baixo. Nas testas, sombriamente tatuado, observava-se uma
insígnia em forma de um olho meio tribal, que no momento que
vi achei difícil de definir. O sol quando tocava os olhos das
esculturas, dava-lhes um tom avermelhado, com nuances
alaranjado, que parecia conceder-lhes vida e movimentos para
observar tudo e principalmente todos à sua volta. Atravessando
o portão, logo se via um vasto jardim de grama verdíssima. De
imensa beleza, com um caminho de luminárias e flores vistosas
vermelhas, rosas. Flores elegantes amarelas, tulipas. E fartas
flores rosadas, rosas colombianas. Que nos conduzia até a
entrada principal da mansão. No alto ao longe podia se ver o
brasão da família Marfan. Algo parecido com os dragões do
portão, entre espadas e arcos, com um fundo de tapete fino,
parecendo persa, de cor amarela, bordado por inúmeros
triângulos, das cores vermelho, azul e branco. De frente a porta,
esta de madeira de pinho, da cor branca, da qual podia ainda se
sentir o seu aroma, mesmo debaixo do laqueado da pintura, ao
alcance dos olhos, se encontrava uma campainha manual. Mais
decorativa do que usual, em forma de uma coruja, talhada na
madeira. Os olhos do animal me causavam arrepios, pareciam
espionar qualquer um que chegasse perto da entrada. Nas suas
patas havia um manete, para fazer soar a campainha.
Adentrando a mansão, no espaçoso hall, logo a frente era
possível avistar a escadaria dupla que conduzia até a parte
superior da casa, onde localizavam-se as espaçosas cinco suítes
belamente decoradas. Uma vasta sacada unia todos os ambientes
e proporcionava aos moradores uma vista privilegiada de toda a
cidade e da floresta da colina. O piso de toda mansão era
composto de lâminas laqueadas de madeira de lei amarronzada.
Possuía um aspecto de espelho, que refletia toda mobília antiga
e bem conservada. Um lar aconchegante e perfeito, que exalava
um aroma de lavanda suave, inebriante que proporcionava boas
sensações. As paredes pontuadas de quadros extensos, assinados
por artistas de renome, acrescentavam um charme e elegância
dignos do lugar. Julguei também que a mobília era de altíssimo
bom gosto, o piso-espelho, a madeira utilizada na construção do
imóvel, eram todos da mais superior qualidade... Perfeitos. Na
parte inferior, logo a esquerda se podia observar o vasto
escritório do Sr. Marfan. Com uma biblioteca portando uma
parede repleta de livros, apoiados nas retas prateleiras de
madeira maciça escurecida. No piso, um macio carpete cinza,
conjugava-se sutilmente com todo ambiente sóbrio. Observei
alguns troféus destacados numa mesa de pés vitorianos e
algumas esculturas situadas nos cantos do local. À direita, a
grande sala de estar, espaçosa e elegante convidava ao descanso
e ao relaxamento em seus macios sofás verde-oliva. Bem
iluminada com uma ampla janela e cortinas off White que
deixavam a luz penetrar e tornavam a sala indiscutivelmente
agradável. Passando por debaixo das escadas, chegava-se até a
cozinha da casa. Igualmente aos outros cômodos era muito
ampla e arejada, com móveis claros e brilhantes.
Ultrapassando uma mesa central que portava uma cesta
gigante de frutas verdes, chegava-se até a área externa. Onde a
seguir se descobria uma grandiosa piscina, em formato de feijão,
de água azul cristalina. O fundo do ambiente ao ar livre mais
parecia uma pintura: Com as extensas nuvens brancas no céu e
as altas e vastas árvores verdes a baixo que se encontrava com a
floresta da colina. Passeando pela mansão dos Marfans, notei
algumas portas trancadas em que somente alguns empregados
podiam entrar. Deviam ser adegas ou dispensas, mas uma voz
dentro de mim alertava-me e fazia-me questionar. Existia algo
oculto e de certa forma de ordem ruim, naquele lugar, podia
sentir. Ninguém era tão excelente... Entretanto meu único alento
era Franco. Apesar de pertencer àquela família, achava-o
diferente e realmente especial. Ele pertencia à ordem do bem.
No meu íntimo pressentia isso e aguardava desesperadamente
que meu coração não me traísse...
Mas algo oculto em breve se revelaria a mim, de uma forma
trágica, dolorosa e extremamente inusitada.
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