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Selecionar pela inteligência

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Page 1: Selecionar pela inteligência

LEITURA SOBRE O CAPÍTULO 1 DO

HANDBOOK OF PRINCIPLES OF ORGANIZATIONAL BEHAVIOR

EDITADO POR EDWIN A. LOCKE – EDITORA BLACKWELL PUBLISHING

SELECT ON INTELLIGENCE DE FRANK L. SCHMIDT E JOHN E. HUNTER

Ricardo Yogui

1. Introdução

Acreditava-se que cada organização, parâmetros de trabalho e emprego eram únicos e

que não era possível saber qual método de seleção poderia funcionar de forma abrangente

para qualquer processo seletivo sem conduzir um estudo específico sobre uma determinada

posição dentro das organizações. Esta era a Teoria da Especificidade Situacional.

Apoiando-se na Meta-Análise, foi possível realizar processos de seleção de forma

mais abrangente. A Meta-Análise é um recurso estatístico formulada inicialmente por Karl

Pearson em 1904, que combina o resultado de vários estudos que focam em um conjunto de

hipóteses de pesquisa relacionadas, buscando identificar medidas comuns do tamanho do

efeito, o qual é modelado usando uma forma de meta-regressão. A Meta-Análise é também

conhecida como Método da Generalização Validada (VG). Inicialmente amplamente utilizada

em epidemiologia e medicina, ganhou aplicações na área da Pesquisa Educacional nos anos

70, principalmente através dos trabalhos de Gene V. Glass, Frank L. Schmidt e John E.

Hunter, sendo estes dois últimos reconhecidos pela SIOP (Society for Industrial and

Organizational Psychology). Tomando como base a Meta-Análise e que a dimensão

Inteligência é o maior determinante para o desempenho no trabalho, Frank L. Schmidt

(Professor da Universidade de Iowa) e John E. Hunter (Professor da Universidade de

Michigan) escreveram o capítulo 1, Select on Intelligence, do Handbook of Principles of

Organizational Behavior, editado por Edwin A. Locke. Neste texto, destacam a importância

da Habilidade Mental Geral (GMA – General Mental Ability) não somente no processo de

seleção bem como em outras áreas, como por exemplo para calibrar a relação entre satisfação

no trabalho e desempenho profissional.

2. O que é Inteligência?

Segundo Schmidt e Hunter, não se pode defini-la como a habilidade de se adaptar ao

ambiente, uma vez que seres desprovidos de inteligência podem realizar tal feito. Inteligência

é a habilidade de compreender e raciocinar corretamente com abstrações (conceitos) e

resolver problemas. Entretanto, a mais usada definição é que a Inteligência é a habilidade de

apreender. Inteligência é também frequentemente mencionada como a habilidade mental

geral (GMA) ou habilidade cognitiva geral, sendo a mais ampla de todas as habilidades

mentais do ser humano. Quando o desempenho é medido objetivamente usando

cuidadosamente testes construídos de exemplos de trabalho, a correlação (validade) com as

medidas de Inteligência é ao nível de 0.70 (setenta por cento) sendo que o valor 1 representa

predizer perfeitamente. Outra medida importante de desempenho é o nível de aprendizagem

nos programas de treinamento no trabalho, que como mencionamos é usado para definir a

Inteligência também.

A principal razão pela qual a GMA prediz o desempenho no trabalho é o fato da

pessoa que é mais inteligente ter a capacidade de aprender mais sobre o trabalho em si e de

modo muito mais rápido, destacando que o desempenho está ligado primeiramente ao

conhecimento do trabalho e não diretamente à GMA. Porém a GMA contribui para que um

funcionário tenha um desempenho superior se comparado a um outro na mesma atividade,

pois no surgimento de problemas não previstos no desempenho da atividade, o GMA é usada

diretamente para solucionar estes problemas. Também tem sido evidenciado que os

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profissionais gradualmente vão se posicionando suas carreiras de forma consistente com o

nível de GMA.

3. Cidadania Comportamental / Citizenship Behavior

A Cidadania Comportamental é a presença ou falta de ações que contribuem para

ajudar a treinar novos contratados, trabalhar até mais tarde em uma emergência ou em

feriados e finais de semana. A Cidadania Comportamental (boa ou ruim) é diferente do

desempenho no trabalho mas é frequentemente confundida com ela.

Muitos céticos acham difícil de acreditar que a GMA é a dimensão determinante

dominante no desempenho profissional, destacando que algumas pessoas inteligentes

apresentam baixa Cidadania Comportamental (absenteísmo, descuido no trabalho, hostilidade

com a chefia, não disposição para atividades extras para atender prazos). É importante

destacar que a baixa habilidade direciona para uma inabilidade para o bom desempenho; uma

baixa Cidadania Comportamental não direciona primariamente para um baixo desempenho

mas sim para uma perturbação no Comportamento Organizacional. Pode-se ter uma pessoa

com baixa habilidade profissional e com uma alta Cidadania Comportamental e vice-versa

mas fundamentalmente não se pode colocar a Cidadania Comportamental como sendo

parâmetro de desempenho profissional. Além disto, o efeito da Cidadania Comportamental

pode ser limitado quando o trabalho é corretamente estruturado de modo a atenuar as

características pessoais para sua execução.

4. O que é requerido para este Princípio GMA funcionar?

São três as condições requeridas para fazê-lo funcionar:

Ser seletivo nos processos de contratação – isto significa que a Empresa deve ter mais candidatos por vaga para um processo que prioriza a GMA, para tal

ser atrativa aos potenciais colaboradores e além disto ser capaz de reter os

profissionais com melhor desempenho que ela contrata

Ter métricas claras para mensurar a GMA – adoção de melhores e usuais

procedimentos para esta avaliação como o Wonderlic Personnel Test –

desenvolvido pelo psicólogo industrial Eldon F. Wonderlic. A nota deste teste

é calculada baseada em um teste de 20 minutos e 50 questões que mensuram a

aptidão para aprendizado e solução de problemas. Uma relação aproximada

com o Coeficiente de Inteligência (IQ), pode ser feita usando a seguinte

fórmula: IQ = (2WPT + 60). Na impossibilidade do uso de teste deste tipo,

existem outras formas de mensuração, não tão efetivas, como GPA (grade

point average) e histórico escolar mas que mensuram de forma parcial da

Inteligência.

A variabilidade no desempenho do trabalho deve ser maior que zero – se todos os profissionais contratados tiverem o mesmo nível de desempenho então

não se pode afirmar que foi contratado “o melhor”. Importante destacar a

comprovação para funções onde as habilidades profissionais são fundamentais:

os “top workers” produziram 15 vezes mais que os “bottom workers”. Em

funções gerenciais, a diferença é ainda maior, o que justifica o investimento

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para a contratação dos melhores profissionais. Outra vantagem é o quadro de

talentos disponíveis para futuras promoções que aumenta consideravelmente,

isto afeta positivamente como um todo, toda a Organização.

5. Existem exceções para este Princípio?

Algumas pessoas consideram que a experiência no trabalho suplanta a habilidade

mental como preditor de desempenho. As pesquisas mostram que para atividades de zero a

cinco anos de “prática” a experiência é um bom preditor porém quando se estende para uma

faixa maior de experiência, digamos de 5 a 30 anos, a experiência não desempenha bem como

preditor de desempenho. Isto pode ser ocasionado pelo processo contínuo de aprendizado,

onde novos conceitos são aprendidos e velhos são esquecidos em cinco anos. Mas a GMA

continua a ser um bom preditor desempenho no trabalho mesmo para profissionais que estão

12 ou mais anos de vida profissional. Entretanto, isto não é uma escolha de Sofia, ou seja,

combinar os dois conceitos – experiência e GMA – é desejável, pois o melhor é ter um

processo de múltiplos métodos.

6. Aspectos de implementação em um Sistema de Contratação baseado em Habilidades

Inteligência muito superior para a Posição – Muitos acreditam que um profissional

com uma Inteligência muito superior para uma posição é um problema pois ele terá um

desempenho superior até certo ponto e posteriormente seu desempenho cairia por considerar

sua atividade muita tediosa. Centenas de estudos provam que isto não é verdadeiro, pois o

nível de Inteligência direciona o desempenho profissional ao nível compatível de sua

Inteligência. Assim, isto não deve ser um impeditivo na contratação de profissionais.

Múltiplos Preditores além da Inteligência – Embora a Inteligência seja o melhor

preditor para o desempenho no trabalho, outros preditores em conjunto com a Inteligência

podem ser usados de forma a produzir um resultado mais efetivo que a adoção exclusiva e

única da Inteligência. Estes preditores adicionais poderiam ser testes de Integridade e

Entrevistas Estruturadas.

Risco de questões legais – membros de grupos de minorias étnicas apresentam

menores médias nos testes de GMA, e consequentemente menor taxa de admissão. Algumas

organizações governamentais consideram isto um “impacto adverso”. O termo impacto

adverso é inadequado, pois ao contrário do que se sugere, a GMA não cria diferenças mas sim

evidencia a predisposição para desempenho profissional com base na Inteligência através de

um processo igualitário, preciso e claro para todos os grupos. Mesmo havendo o risco da

questão legal, desde meados dos anos 80 os Empregadores tem esclarecido esta questão e

diminuindo consideravelmente esta polêmica com relação ao “impacto adverso”.

Rejeição dos candidatos a testes de habilidade mental – Algumas pessoas

comentam que os candidatos não gostam de realizar este tipo de teste, porém em pesquisas os

mesmos consideram que habilidade mental é relevante para o desempenho profissional.

Valor econômico: A questão é se o ganho trazido pelo alto desempenho não provoca

um aumento significativo nos encargos salariais da Empresa, anulando o efeito positivo da contratação via GMA. Inicialmente não se registra este efeito e pelo uso da GMA também por

empresas concorrentes. Além disto, o processo sempre permite a geração de novos candidatos

prontos a assumir novas funções. Eventualmente, em um caso específico faz-se necessário um

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plano de retenção especifico. O contra-ponto é o nivelamento por baixo, e a contratação de

profissionais medíocres que não gera impacto positivo na organização.

7. Exemplos Reais

Planta US Steel e o Sindicato – No processo de contratação de aprendizes baseado

em GMA, especificamente na unidade da Filadélfia, o Sindicato interveio para que não fosse

usado este critério. Resultado: Ao serem treinados, os aprendizes admitidos mostraram

desempenho inferior aos históricos de desempenho que a US Steel tinha desde a adoção da

GMA no processo seletivo.

Força Policial de Washington – Até meados nos anos 80, era uma das melhores na

seleção de candidatos – através de teste de inteligência geral e a análise da vida pregressa do

candidato- para a Academia de Polícia. Por intervenção do prefeito, o teste e a análise foram

substituídas por critérios obscuros. Resultados: 80% dos aprovados eram incapazes de

completar o treinamento requerido. Houve então a flexibilização no conteúdo do treinamento

e os oficiais formados não eram competentes, resultando numa queda considerável da

qualidade do serviço prestado à população além de crimes cometidos por policiais. Duas

coisas aconteceram neste caso: pessoas com menor Inteligência foram admitidas bem como

criminosos.

Contratação no Governo Americano – Foi realizado um estudo com 3 tipos de

profissionais (Auditor IRS, Analista de Requerimentos da Previdência Social e Inspetor da

Fazenda) separados em 2 grupos: os que foram recentemente admitidos através de teste GMA

e os que foram admitidos sem o teste GMA. Resultado: os profissionais selecionados através

do teste GMA tiveram um desempenho de 70% enquanto que o outro grupo ficou com um

desempenho de 50%. Se for extrapolado para outras funções, esta diferença representa um

grande valor em bilhões de dólares aos cofres públicos.

Planta da Philip Morris em Cabarrus – O departamento de recursos humanos

conduziu um estudo para comparar o desempenho dos trabalhadores admitidos através do

GATB(General Aptitude Test Battery)/GMA e os admitidos sem este critério.Resultado: os

que se aplicaram aos testes eram superior em várias dimensões de desempenho – aprendiam

8% mais habilidades durante os treinamentos, tinham 25% menos falhas operacionais e 58%

menos questões disciplinares. Além disto, incidentes devido a o comportamento não seguro

na planta era 35% menor.

8. Conclusões

Uma maior Inteligência conduz para um melhor desempenho no trabalho e a contratação

usando GMA traz um maior valor à Organização. Lembrando que a base é a empresa ser

atrativa para potencializar o resultado do processo com um número maior de potenciais

candidatos. Além disto não basta captar os mais Inteligentes mas sim ter condições de

mantê-los baseado no desempenho profissional.