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A TEORIA DAS RESTRIÇÕES COMO RECURSO PARA A EXCELÊNCIA DA GESTÃO DA MANUFATURA Paulo Fernando Checoli Angelise Valladares Monteiro Universidade Federal De Santa Catarina E-mail: [email protected], [email protected] ou [email protected] Resumo A utilização ótima dos recursos na indústria tem sido objeto de muitos estudos na Engenharia da Produção. A Teoria das Restrições, como alternativa eficaz para a gestão da produção, é relativamente recente. No Brasil há poucos estudos publicados sobre seu uso e resultados. Este artigo visa descrever e analisar as etapas de implementação da metodologia Tambor-Pulmão-Corda (TPC), desenvolvida no âmbito dessa Teoria, numa linha de produção, de uma empresa multinacional de grande porte, atuante no mercado de auto-peças, unidade instalada em Curitiba-PR.. Com o estudo foi possível constatar a potencialidade inovadora da aplicação desses referenciais para o desenvolvimento de competências industriais. Abstract The great resources use in the industry has been object of many studies in the Production Engineering. The Theory of Constraints, as effective alternative for the production administration, is relatively recent. In Brazil there are few studies published on its use and results. This article seeks to describe and to analyze the implementation stages of the methodology Drum-Puffer-Rope (TPC), developed in the ambit of that Theory, in a production line, of a multinational company of great load that works in the market of solemnity-pieces, unit installed in Curitiba-PR.. With the study it was possible to verify the innovative potentiality of the application of those concepts for industrial competencies development. Palavras-chaves: Gestão da Produção, Gestão Industrial, Teoria das Restrições, Metodologia Tambor-Pulmão-Corda, Mudança Organizacional. Introdução O fenômeno da globalização e as tradicionais limitações de recursos, capital e tempo colocam a indústria em uma posição de desafio crescente. Nesses termos, observa-se o aumento na variedade da oferta de bens e serviços, a redução dramática no ciclo de vida dos produtos, o nível de exigência na qualidade, a demanda cada vez maior por níveis de pontualidade nunca vistos e a redução contínua de estoques na cadeia logística. Competir através de qualidade e produtividade tem sido a tônica da indústria no mundo todo. Na indústria brasileira, o cenário é ainda mais desafiador. Após algumas décadas de proteção, com a quase impossibilidade de importações – que levou muitos à acomodação – , a indústria nacional foi submetida a uma abertura de mercado relativamente rápida. Devido a esses fatores, as empresas estão constantemente obrigadas a atingir um melhor desempenho global, especialmente no que se refere a variáveis como qualidade, custos e flexibilidade. Procurando, dessa forma, obter uma vantagem competitiva e, consequentemente, tornarem-se atraentes aos consumidores. Em busca desta meta, vive-se um processo de valorização da manufatura como meio de obter a vantagem em relação aos concorrentes. Isso tem gerado debates sobre as novas formas para o gerenciamento da produção, assim como sobre o seu potencial em contribuir para o sucesso das

05 - A Teoria Das Restrições Como Recurso Para a Execência Da Gestão Da Manufatura - 1

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Teoria Das Restrições Como Recurso Para a Execência Da Gestão Da Manufatura - 1

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  • A TEORIA DAS RESTRIES COMO RECURSO PARA AEXCELNCIA DA GESTO DA MANUFATURA

    Paulo Fernando ChecoliAngelise Valladares Monteiro

    Universidade Federal De Santa CatarinaE-mail: [email protected], [email protected] ou [email protected]

    ResumoA utilizao tima dos recursos na indstria tem sido objeto de muitos estudos na Engenharia

    da Produo. A Teoria das Restries, como alternativa eficaz para a gesto da produo, relativamente recente. No Brasil h poucos estudos publicados sobre seu uso e resultados. Este artigovisa descrever e analisar as etapas de implementao da metodologia Tambor-Pulmo-Corda (TPC),desenvolvida no mbito dessa Teoria, numa linha de produo, de uma empresa multinacional degrande porte, atuante no mercado de auto-peas, unidade instalada em Curitiba-PR.. Com o estudofoi possvel constatar a potencialidade inovadora da aplicao desses referenciais para odesenvolvimento de competncias industriais.

    AbstractThe great resources use in the industry has been object of many studies in the Production

    Engineering. The Theory of Constraints, as effective alternative for the production administration, isrelatively recent. In Brazil there are few studies published on its use and results. This article seeks todescribe and to analyze the implementation stages of the methodology Drum-Puffer-Rope (TPC),developed in the ambit of that Theory, in a production line, of a multinational company of great loadthat works in the market of solemnity-pieces, unit installed in Curitiba-PR.. With the study it waspossible to verify the innovative potentiality of the application of those concepts for industrialcompetencies development.

    Palavras-chaves: Gesto da Produo, Gesto Industrial, Teoria das Restries, MetodologiaTambor-Pulmo-Corda, Mudana Organizacional.

    IntroduoO fenmeno da globalizao e as tradicionais limitaes de recursos, capital e tempo colocam

    a indstria em uma posio de desafio crescente. Nesses termos, observa-se o aumento na variedadeda oferta de bens e servios, a reduo dramtica no ciclo de vida dos produtos, o nvel de exignciana qualidade, a demanda cada vez maior por nveis de pontualidade nunca vistos e a reduo contnuade estoques na cadeia logstica. Competir atravs de qualidade e produtividade tem sido a tnica daindstria no mundo todo. Na indstria brasileira, o cenrio ainda mais desafiador. Aps algumasdcadas de proteo, com a quase impossibilidade de importaes que levou muitos acomodao , a indstria nacional foi submetida a uma abertura de mercado relativamente rpida.

    Devido a esses fatores, as empresas esto constantemente obrigadas a atingir um melhordesempenho global, especialmente no que se refere a variveis como qualidade, custos e flexibilidade.Procurando, dessa forma, obter uma vantagem competitiva e, consequentemente, tornarem-se atraentesaos consumidores. Em busca desta meta, vive-se um processo de valorizao da manufatura comomeio de obter a vantagem em relao aos concorrentes. Isso tem gerado debates sobre as novas formaspara o gerenciamento da produo, assim como sobre o seu potencial em contribuir para o sucesso das

  • organizaes. Nesse contexto, busca-se encontrar filosofias e sistemas de manufatura flexveis,capazes de atender as presses da atualidade.

    No Brasil, onde um significativo parque industrial est instalado, algumas empresas vmdespendendo esforos para se adequar a essa nova realidade competitiva. O ramo automobilstico estentre os mais fortemente afetados, o que supe que esteja, tambm, na vanguarda pela busca desolues inovadoras. Por conseqncia, o setor de autopeas, at por fora da relao cliente-fornecedor, sofre presses para buscar continuamente novas formas de gesto que permitam asobrevivncia.

    Mais do que simplesmente utilizar corretamente os recursos disponveis o que nem sempre tarefa trivial , necessrio dispor de um processo de melhoria contnua. O caminho trilhado pelooriente vastamente divulgado na literatura especializada. Just-in-time kaizen,, kanban podem serconsiderados exemplos de palavras incorporadas ao vocabulrio da gesto industrial. Recentemente, aproposta da abordagem das restries a Theory of the Constraints , aqui denominada Teoria dasRestries ou TOC, tem surgido como alternativa de processo acelerado de melhoria contnua.Segundo GOLDRATT (1992), trata-se de uma nova filosofia de gerenciamento global.

    Uma maneira de investigar de que forma esses novos sistemas de gerenciamento da produoso aplicados, estud-los atravs das atividades de Planejamento e Controle da Produo (PCP). ATeoria das Restries, de um lado, coloca conceitos inovadores para a tomada de decisesempresarias, e de outro, desafia prticas e fundamentos usualmente aceitos como corretos no mbitoda gesto industrial.

    Este trabalho est inserido na problemtica referente busca da competitividadeindustrial brasileira, onde a abordagem TOC ainda pouco difundida. Nesse sentido,pretende-se aqui verificar os impactos da implementao de uma metodologia da Teoria dasRestries, o Tambor-Pulmo-Corda (TPC), em uma organizao industrial multinacional de grandeporte, atuante no mercado de auto-peas, instalada em Curitiba-PR. O intuito de avaliar se, no casoestudado, a TOC pode ser considerada uma contribuio efetiva para o desenvolvimento decompetncias industriais; que promovam excelncia na gesto da manufatura, propiciando, por suavez, o desenvolvimento de competncias para a produo internacional.

    denominador comum na literatura que empresas industriais podem ser competitivas pormeio de trs caractersticas principais de suas mercadorias: qualidade, preo e disponibilidade. Afuno de produo interfere de forma significativa em cada uma destas caractersticas. A busca porvantagem competitiva tem sido meta estratgica de muitas organizaes e, em alguns casos, questode sobrevivncia nas empresas. A TOC se apresenta como abordagem alternativa recente ao Just-in-Time, ao mesmo tempo que se contrape contabilidade de custos tradicional. Casos de sucesso emimplantaes tm sido relatados na Europa e EUA (NOREEN et al., 1996), e em menor intensidade noBrasil (CSILLAG e CORBETT, 1998).

    Para CERTO e PETER (1993), em um ambiente internacional, onde a tecnologia flui maislivremente, a importncia da qualidade da gesto se acentua. Em uma empresa industrial, a funo deproduo emprega o maior nmero de pessoas e freqentemente responsvel pela maior parte dosativos da empresa. Este trabalho se torna relevante ao relatar o processo de implementao eresultados obtidos numa empresa de grande porte em territrio nacional. Nesse sentido, ressalta-se aimportncia de se estudar novas formas de gesto da produo (como a TOC).

    A relativa carncia de estudos da TOC no Brasil e a ausncia de literatura descrevendo aimplementao do TPC, so argumentos que aliados atualidade do tema, reforam a sua relevncia.Este estudo pode servir como uma introduo aos conceitos da TOC queles que no os conhecem,bem como abrir novas questes para outros acadmicos, profissionais e pesquisadores. Alm disso,pode ser til, como fonte de relato de experincias em gesto de mudanas tecnolgicas, e s empresasque estejam procura de uma ferramenta poderosa para alavancar sua competitividade. Outro fator dedestaque, diz respeito a possibilidade de sugerir novos aspectos para as empresas que estejam emprocesso de implementao da TOC, aumentando suas chances de sucesso.

  • Fundamentos Teoria das RestriesUm dos principais pressupostos por trs da TOC de que todo sistema, como uma empresa

    que visa lucro, tem que ter pelo menos uma restrio. Sendo assim, para melhorar o desempenho dosistema preciso administrar a restrio (CSILLAG e CORBETT, 1998). Realmente no h escolhanesse assunto o indivduo controla as restries ou elas o controlam. Sendo assim, as restries irodeterminar a sada (ganho) do sistema, quer sejam reconhecidas e controladas ou no (NOREEN et al.,1996).

    Em conformidade com esses argumentos, GOLDRATT (1990; 1992; 1995) ressalta o enfoquesistmico como parmetro da teoria. Para otimizao de desempenho dos sistemas com restriofsica, o autor prope quatro etapas: identificar a restrio do sistema, ou seja, identificar ospouqussimos recursos (normalmente um nico) que determinam ou limitam o desempenho global dosistema, isto , as pouqussimas causas que impedem o sistema de caminhar na direo de sua meta. Asegunda etapa decidir como explorar a restrio, procurando como no desperdiar nem um poucodaquilo que se tem pouco; extrair o mximo do recurso que falta. Se as no-restries nooferecerem o que as restries precisam consumir, a deciso anterior ficar apenas no papel: nuncaser executada. Por isso, o prximo passo subordinar todas as outras decises deciso acima.Todos os recursos no-restritivos precisam estar programados para fazer exatamente o que a restrioprecisa. A otimizao local no permitida, pois pode comprometer o desempenho de todo o sistema.

    Cumpridos os passos at aqui, o sistema atingir o desempenho mximo. O prximo passo elevar a restrio do sistema. Elevar significa abrir a restrio, acrescentar recurso que falta. Dessamaneira, estar-se- melhorando o desempenho de modo geral. Contudo, no se pode fazer issoindefinidamente. Pois, em algum momento, a restrio vai passar a ser algum outro recurso. Cabedestacar que, se no passo anterior a restrio for quebrada, deve-se voltar ao primeiro passo.

    Metodologia Tambor-Pulmo-Corda (TPC)O TPC refere-se a uma metodologia proposta desenvolvida no mbito da Teoria das

    Restries, para programao e controle da produo. A programao baseada em passos ou etapasprincipais de trabalho, sempre na busca pela otimizao contnua. O controle do sistema feito atravsdo gerenciamento de pulmes. Outro termo muito utilizado o Recurso com Restrio de Capacidade(RRC). Este diz respeito ao recurso que estabelece o mximo fluxo possvel da malha produtiva.

    Os passos que compem a otimizao contnua da produo, na viso da TOC, apresentamcaractersticas distintas. O primeiro passo visa identificar a restrio, que significa encontrar qual orecurso que determina o mximo fluxo da malha produtiva. Numa situao de demanda maior que acapacidade do RRC, a restrio o RRC. Apresenta-se como recurso que impede a empresa de faturarmais e aumentar seu lucro (a meta da empresa). O segundo passo explorar a restrio. Cada minutode produo do RRC vale dinheiro; no se deve desperdiar nem um minuto deste recurso. Dissosegue que todas as peas produzidas pelo RRC devem ser faturveis. No faria sentido utilizar o RRCpara produzir produtos no vendveis no momento. A fonte de informao que vai servir de base paraa sequncia de produo do RRC o mercado. possvel afinar a seqncia de programao do RRCde forma a minimizar os tempos de preparao de mquina.

    Esse raciocnio se aplica somente ao RRC. Essa seqncia detalhada (qual pea, qual lote,horrio de incio, horrio de final) de produo no RRC chamada de tambor. Numa analogia comuma fila de soldados marchando, o tambor que vai ditar o ritmo de toda malha produtiva (de toda afila de soldados). A continuidade e a sequncia de trabalho no RRC no devem ser afetados porinterrupes/problemas em outras mquinas que executam operaes anteriores ao RRC. Em outraspalavras, o RRC deve estar protegido contra problemas em outros recursos (no restritivos). Docontrrio haveria uma situao sem sentido: a empresa perdendo faturamento por paradas em recursosno restritivos. A proteo a ser instalada de um estoque de peas antes do RRC. Essa proteo doRRC protege o lucro da empresa, e nenhuma outra operao deve ser protegida, pois isto saumentaria o Investimento, sem aumento do ganho. Todo o estoque em processo deve ser idealmenteconcentrado no RRC. Essa proteo deve ser dimensionada para cobrir 99% das ocorrncias deinterrupes (baseada em histrico/experincia) nos recursos anteriores ao RRC. Em outras palavras, oestoque protetivo formado por uma chegada antecipada de peas (pulmo de tempo) em relao necessidade do programa do RRC.

  • O terceiro passo subordinar todas as demais decises deciso do passo anterior. No TPCisto implica que a liberao de material para a primeira operao da malha produtiva deva ser feitaobedecendo a seqncia estabelecida pelo tambor e com antecedncia tal que as operaes ao RRCpossam ser executadas e as peas estarem disponveis para o RRC com antecedncia. Essa liberaoobedecendo essas regras denominada corda. Na analogia com a tropa, como o se o tambor fossedado ao soldado mais lento e este soldado mais lento fosse amarrado ao primeiro da fila para evitardisperso. Para proteger o ritmo total deixa-se uma folga na corda: um espao entre o soldado maislento e o restante da tropa sua frente. (GOLDRATT, 1989).

    A esmagadora maioria das mquinas so no RRC. Como a liberao de materiais guiadapela capacidade de produo do RRC, por definio a menor capacidade da malha produtiva, todos osrecursos no RRC estaro trabalhando abaixo de sua capacidade, ou seja, apresentaro eficinciaabaixo de 100% (SMITH, 1999). Este um dos aspectos mais polmicos e difceis de implementaodo TPC. Essa uma tpica manifestao do mundo do custo, quando se acha que boas eficinciaslocais levam a bom desempenho do sistema como um todo (CSILLAG e CORBETT, 1998). De fato,aumentar a eficincia de utilizao dos recursos no RRC apenas aumenta o estoque em processo, semaumentar o lucro (reduziria portanto o Retorno Operacional sobre Investimento - ROI).

    O quarto passo elevar a restrio. Quando os passos anteriores esto completos a exploraomxima da restrio est garantida, ou seja, a produo est gerenciada de forma tal que o mximoganho est garantido. Se a demanda ainda maior que o desempenho alcanado, o prximo passo conseguir mais daquilo que falta. Os indicadores de desempenho ajudam a tomar deciso. Pode-secomparar o esforo necessrio (investimento, despesa operacional) com o ganho conseqente e avaliarcomo o ROI ser afetado. O nico local onde desejvel ter eficincia 100% no RRC. Antes decomprar mais capacidade existe uma srie de aes que podem melhorar a eficincia do RRC.

    O aumento indefinidamente do desempenho do sistema atravs de aumento de capacidade doRRC, muitas vezes no possvel. Entretanto, faz-se necessrio checar a cada aumento decapacidade deste como est a capacidade ociosa nos outros recursos, a fim de perceber se a restriodo sistema mudou de lugar. Se mudou, volta-se ao incio do processo.

    Todos os recursos no restritivos precisam ter mais capacidade que a restrio para garantirque restrio no pare e tambm para garantir a venda de toda a produo da restrio. A TOCclassifica a capacidade dos recursos em trs tipos. O primeiro a capacidade produtiva, aquela partedo recurso que ser utilizada para processar o material O segundo a capacidade protetiva, aquelaparte da capacidade excedente em relao demanda, que necessria para regenerar os pulmes. Oterceiro a capacidade ociosa, aquela parte que pode ser vendida ou eliminada (CSILLAG eCORBETT, 1998).

    No TPC o controle de produo feito pelo gerenciamento de pulmes. O pulmo protetivo darestrio j foi apresentado. H outros dois tipos de pulmes: o pulmo mercado, que um pulmo deprodutos acabados na expedio, deve ser construdo se a pontualidade na entrega de produtos fatorde vantagem competitiva. Esse pulmo protege as datas de entrega compromissadas com os clientes,compensando interrupes no fluxo produtivo entre o RRC e o cliente. O outro tipo o pulmomontagem. Quando as peas que saem do RRC vo se juntar a outras peas numa montagem, importante a instalao de um pulmo destas outras peas antes da montagem. Este pulmo serve paragarantir que cada pea produzida pelo RRC ser utilizada e vendida.

    Para controlar a produo no TPC basta controlar os pulmes, ou seja, controlar se cada peaest chegando no pulmo no prazo programado. Em outras palavras, basta manter um controle deentrada das peas nos pulmes fsicos. Se houver alguma falha, o pulmo ser menor que o planejadoe aes devem ser tomadas antes que o pulmo v a zero. Gerenciar os pulmes comparar a data deentrada efetiva de cada item com a data programada para ele. Este controle serve para soar um alarmeantes que o problema maior acontea. Se as peas esto chegando no prazo programado, nada h afazer. A tarefa de controlar a produo muito simplificada, bastando controlar os poucos pulmesexistentes na malha produtiva.

    Cada vez que h atraso na entrada de uma pea no pulmo sinal que um problema aconteceu.Acompanhar e relatoriar as causas ajuda a identificar as causas mais freqentes, e aes para eliminarestas causas devem ser implementadas. Fazendo isso sistematicamente a empresa estar reduzindo asflutuaes estatsticas e as interrupes. Se a empresa reduz sistematicamente as interrupes e as

  • flutuaes estatsticas, poder reduzir os pulmes sem que isso coloque em risco o RRC ou o ganho,ou seja, poder melhorar continuamente o ROI, alm de reduzir o lead-time, reduzindo porconseqncia o tempo de resposta aos clientes. Este o processo de melhoria contnua na viso daTOC: identificar oportunidades de eliminao do desperdcio sem colocar o ganho em risco.

    Histrico dos processos de gesto da produoA instituio, objeto do estudo, uma multinacional integrante do grupo Mercosul. Com mais

    de 100 anos de existncia, atua em diversos segmentos, tendo como principal segmento, o de auto-peas. Tem mais de 180.000 funcionrios distribudos em 132 pases, e possui um faturamento anualsuperior 25 bilhes de dlares (1997). O foco o desenvolvimento e fabricao de produtos com altocontedo tecnolgico. A empresa investe anualmente 8% do faturamento em Pesquisa eDesenvolvimento, o que faz com que seu nome esteja associado a quase todas evolues tecnolgicasnos equipamentos automotivos.

    Antes da implementao do TPC, o planejamento da produo era baseado no sistemaPlanejamento das Necessidades de materiais (MRP). Por volta do dia vinte de cada ms, com base nademanda de mercado e estoques existentes, eram geradas as encomendas de produo necessrias parao ms seguinte. Essas encomendas eram entregues num nico pacote para a seo de produo, quetinha liberdade para definir a seqncia de execuo. Os materiais necessrios ficavam liberados nosestoques, e para sua entrega bastava uma solicitao da seo produtiva. As nicas limitaes eram adisponibilidade de material no estoque e o volume de encomendas.

    Como as encomendas para o ms subsequente eram liberadas por volta do dia vinte do mscorrente, nesta poca a seo tinha liberdade para retirar material suficiente para quarenta dias detrabalho (os dez dias do ms em curso mais os 30 dias do ms seguinte). Esse fato, aliado utilizaoda eficincia como indicador de desempenho e s encomendas acima da capacidade de produo dalinha, resultou num nvel de estoque em processo suficiente para dezessete dias teis (cobertura de0,85 ms), e estava espalhado por todas as operaes da linha. O lote de transferncia entre operaesera de quinhentas peas.

    Os produtos mais urgentes eram informados atravs de uma lista crtica uma lista com osprodutos mais urgentes , entregue semanalmente pela rea de materiais para a produo. Cabia aossupervisores dar prioridade para esses produtos na seqncia de produo. O processamento dasoperaes na usinagem mole consumia em mdia quatro dias; o tratamento trmico, executado emoutra seo de produo especialista neste processo, tomava cerca de cinco dias e por fim a usinagemdura e montagem do produto levavam em mdia outros cinco dias, totalizando um lead-time de catorzedias.

    A falta de identificao do RRC aliada demanda acima da capacidade de produo gerou,por vrios meses, sucessivos horas-extras, atingindo o nvel de vinte por cento, o que significa todosos operadores da linha trabalhando todos os sbados. Mesmo assim, a demanda no era atendida, amdia de fornecimento dirio ficava em dez mil peas, com regularidade ruim (alternncia entrefornecimentos altos e baixos). A manuteno era quase exclusivamente corretiva e para o setor demanuteno a informao da linha quando qualquer mquina quebrava era que o atendimento eraurgente. O plano de manuteno preventiva era sempre postergado, uma vez que com este nvel deproduo no d para parar nenhuma mquina. Mais uma conseqncia da no identificao do RRCda linha.

    A eficincia de mo-de-obra era (e ainda ) um importante indicador de desempenho naempresa, sendo medido por unidade, por gerncia, por seo e, at mesmo, por grupo de mquinas.Como conseqncia, cabia a cada supervisor de produo tentar garantir que os operadores estivessemproduzindo o tempo todo. A eficincia na seo em estudo nos trs meses anteriores implementaodo TPC foi de 94%.

    Aplicao da TOC em malha produtivaA TOC foi implementada seguindo algumas etapas lgicas, citadas na pesquisa documental e

    nas entrevistas. A primeira etapa do processo de implementao, foi a realizao de uma palestra detrs horas ao corpo gerencial (diretores, gerentes e chefes) da unidade industrial de Curitiba. Na

  • segunda etapa, foi realizado um Workshop de dois dias (16 horas) com 25 pessoas de diversosdepartamentos, onde foram aprofundados os conceitos da TOC e do TPC.

    A etapa seguinte, que durou cinco dias, objetivou a construo da soluo especfica, ou seja,a determinao de aes necessrias e suficientes para que a implementao do TPC na linha deproduo fosse realizada com sucesso. Subsequente, foi apresentado o plano de introduo (a soluoespecfica desenvolvida) ao corpo gerencial. Isso possibilitou um reforo dos conceitos e sugestes denovos paradigmas, reduzindo a insegurana e a resistncia mudana. A fim de promover acompreenso dos conceitos do TPC aos operadores de produo, efetuou se a divulgao, a todos osnveis hierrquicos afetados pela implementao. Essa divulgao auxiliou o aprendizado sobre a novasistemtica de trabalho e soluo de problemas.

    Os onze integrantes do grupo TOC assumiram a tarefa de implementar o TPC na linhaescolhida. As aes necessrias para a implementao foram distribudas no grupo, que se reuniu nosprimeiros trs meses em uma freqncia de trs vezes por semana. Os resultados intermedirios e osresultados finais foram apresentados ao corpo gerencial, em reunies especificamente convocadas paraesse fim, dentro da seo em todos os nveis e, por um tempo, em cada visita de outros integrantes daDireo da empresa em nveis nacionais e internacionais.

    Impactos no desempenho de fornecimentoMedido com base na mdia diria de fornecimento no ms (volume total fornecido no final da

    linha dividido pelo nmero de dias teis no ms), a produo subiu do limite anterior de 10.000 peas/dia para 12.400 peas/dia, sem investimentos em mquinas. Em uma situao de demanda aquecida,como era o caso, esta melhora de desempenho implicou diretamente em aumento de vendas da mesmaordem de grandeza (acima de 20%). Por se tratar de linha de capital intensivo, esperar-se que oaumento do lucro tenha sido superior aos 20%, considerando o resultado adicional de reduo doscustos unitrios (pela diviso dos custos fixos por um volume maior produo).

    O resultado obtido com a TOC confirma o potencial desta metodologia na direo de melhoriana utilizao de recursos da empresa, sem dvida uma contribuio importante para a prpriacompetitividade da empresa. Torna-se impressionante o fato de existir um potencial desta ordem degrandeza, mesmo numa multinacional de administrao exemplar, o que deixa a questo de qual noser o tamanho do desperdcio na gesto de recursos de empresas menos organizadas.

    Os pulmes protetivos instalados permitiram, segundo os integrantes do grupo TOC econsoante a teoria, uma melhora sensvel na pontualidade e na regularidade do fornecimento. Ou seja,os pulmes cumpriram seu papel de proteo da restrio e do mercado. Essa melhora, apesar deesperada pela teoria, no pode ser mensurada pela ausncia de registros na empresa. Na poca daimplementao os controles de produo enfatizavam o volume de entregas. No havia um indicadorde desempenho de pontualidade de entregas item a item.

    O patamar mais elevado de fornecimento se sustentou por cinco meses, reduzindo-seposteriormente por queda da demanda. Os entrevistados ressaltaram ainda a tranqilidade em que alinha passou a operar aps a implementao da TOC. As entregas quebrando recordes sucessivamenteforam feitas de forma natural, sem atropelos, como esperado.

    Impactos no estoque em processoO estoque em processo foi reduzido em 35% (de 0,85 ms para 0,55 ms), tomando-se por

    base a comparao da mdia de cobertura nos trs meses anteriores implementao com os trsmeses posteriores obtidas em pesquisa documental.

    A reduo do estoque em processo teve desdobramentos relatados: maior organizao daseo (menor volume de recipientes distribudos dentro da linha) e reduo dos custos de defeito(menor nmero de peas afetadas no momento de deteco de um desvio de qualidade). A reduocontnua das causas de inturrupes do fluxo possibilitou, em consonncia com a base terica, reduodos pulmes sem colocar em risco o lucro, possibilitando aumento no ROI.

    Outros impactos da implementao da TOC

  • O alcance dos objetivos de aumento de produo e reduo do estoque em processo foicomplementado por uma reduo simultnea de 80% no nvel de horas-extras (de 20% para 4%). Estefato se explica pela liberao de horas-extras pelo gerente de produo de forma muito mais seletiva:na maioria das vezes as horas-extras se limitavam ao RRC; poucas vezes foi permitida a execuo dehoras-extras em postos no-RRC, a fim de regenerar pulmes.

    A eficincia de mo de obra teve queda de trs pontos percentuais (de 94% para 91%), apesardo aumento expressivo no volume de fornecimento. A justificativa reside no dimensionamento doquadro de pessoal, acima do efetivamente necessrio pelos clculos baseados nos tempos-padro. Estafolga, aceita e liberada pelo gerente de produo, tinha como objetivo impedir que a mo de obra setornasse o RRC, ou seja, para viabilizar a capacidade protetiva que garantiria a regenerabilidade dospulmes aps interrupes.

    A simplificao da gesto do fluxo de materiais na linha liberou tempo do supervisores paraoutras tarefas. Foram citados nas entrevistas: aumento do tempo disponvel dos supervisores paracontato com os operadores, melhorando a comunicao e clima de trabalho; a reduo dos incndios,reduzindo o nvel de stress. A disponibilidade de tempo ocioso dos operadores foi aproveitada paratreinamento em outras operaes, viabilizando a introduo da multifuncionalidade. Tambmencontros de rotina para discusso de possibilidades de melhorias de qualidade (reduo de refugos eretrabalhos) foram introduzidos.

    Os planos de manuteno preventiva passaram a ser facilmente cumpridos. Com aidentificao clara do RRC e a instalao dos pulmes, passou a ser simples planejar uma interruposem afetar o desempenho final da linha. Por outro lado, o nvel de exigncia na velocidade deatendimento da manuteno s mquinas do RRC aumentou para um nvel nunca visto e foi foco detenso no relacionamento entre os supervisores de produo e de manuteno. Problemas crnicos dequalidade e de continuidade na produo ficaram visveis com a gesto dos pulmes, e foramequacionados um a um, a partir do impacto que provocaram nos pulmes. No foi possvel pormmensurar o impacto da TOC nos custos de defeito pela inexistncia poca deste indicador para aseo em questo.

    A reduo dos lotes de transferncia entre operaes (de 500 para 100 peas) teve vriosdesdobramentos: permitiu reduzir o lead-time de produo de 29% (de 14 para 10 dias), com aconsequncia direta de reduo no tempo de resposta ao mercado; contribuiu decisivamente para areduo do estoque em processo; reduziu o peso do recipiente a ser movimentado, um conforto para osoperadores.

    Muitos entrevistados citaram como resultado da TOC um aumento de produtividade da linha.Apesar de muito provvel, a julgar pelos impactos relatados anteriormente, no foi possvel mensurareste fato pela ausncia deste medidor poca da implantao. Os resultados obtidos mais doconfirmaram os resultados esperados com base na teoria. O objetivo muito desafiador firmado pelogrupo TOC, no incio do projeto, de na malha em questo, aumentar a capacidade de produo em20%, sem investimentos de capital, reduzindo o estoque em processo, reduzindo horas-extras,melhorando o nvel de atendimento aos clientes, simplificando a administrao (com reduosignificativa de aes emergenciais) em at 4 meses, foi alcanado.

    Comentrios finaisEste estudo foi iniciado atravs de uma pesquisa documental, cobrindo os trs meses

    anteriores e os trs meses posteriores implementao da TOC. Como fonte primria de dados foramrealizadas entrevistas semi-estruturadas, com os integrantes do grupo que assumiu a tarefa deimplementao. Posteriormente, um questionrio foi aplicado aos integrantes do grupo, a fim deidentificar a pertinncia dos fatores relevantes abordados durante as entrevistas.

    Os principais fatores de intervenincia foram: planejamento de implementao, criao de umgrupo para implementao, motivao e comprometimento dos componentes do grupo, treinamento,construo da soluo especfica de forma participativa e reconhecimento pelo alcance de resultadosintermedirios. Cabe destacar, contudo, a indicao de outros fatores que interferiram negativamenteno processo, como por exemplo, a falta de integrao dos instrumentos de elaborao do tambor e dacorda e a manuteno do grau de eficincia de mo-de-obra como indicador de desempenho.

  • Face s ordens de grandeza dos resultados expressos, pode-se afirmar que a metodologia TPC,fundamentada na abordagem da Teoria das Restries atua como um instrumento poderoso paraalavancar resultados operacionais na gesto da produo e na busca por competitividade. Cabe aindaressaltar que tais resultados expressivos foram obtidos numa empresa multinacional, lder mundial noseu ramo de atuao. Este fato permite inferir que o potencial de resultados deva ser maior emorganizaes com nvel de sofisticao menor de gesto, particularmente para o imenso volume deorganizaes de capital nacional de pequeno e mdio portes. Diante da carncia observada na literaturacorrente sobre o tema, esses resultados contribuem para futuros estudos.

    Como abordado por FLEURY e FLEURY (2000), no sentido de promover a adoo deestratgias empresariais capazes de promover o desenvolvimento de competncias industriais voltadaspara a produo internacional, as empresas precisam desenvolver seus produtos em um mercado comcaractersticas culturais prprias, atendendo s especificidades do consumidor. A produtividade umdos fatores para a obteno da vantagem competitiva, pressuposto bsico para a sobrevivncia nocenrio empresarial atual. Em termos gerais, oportuno observar que os instrumentos de gesto daproduo assumem cada vez mais um papel de destaque no alcance de melhores nveis delucratividade e produtividade.

    Referncias bibliogrficasCERTO, C. S., PETER, J. P. Administrao estratgica. So Paulo: Makron, 1993.CSILLAG, J. M., CORBETT, T. N. Utilizao da teoria das restries no ambiente de manufatura

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