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2. Fundamentos da medição por coordenadas
A base para a medição por coordenadas é o sistema cartesiano, utilizando a
representação de cada ponto num sistema ortogonal de coordenadas (x, y, z). A
partir desta informação de posição, registrada diretamente do componente, é
possível avaliar as características dimensionais do projeto.
Na primeira máquina MMC —desenvolvida no final da década de 50 pela
empresa FERRANTI Ltd. para atender demandas da indústria— os movimentos
da máquina eram definidos por operações essencialmente manuais enquanto as
coordenadas cartesianas dos pontos tocados somente eram registradas no
―display‖ da máquina. Os eixos de medição x e y apresentavam curso de 610 mm
e 381 mm, respectivamente, e o eixo z um curso de 254 mm sem registro de
medida. A resolução apresentada era de 0,012mm com uma incerteza declarada do
equipamento de 0,025mm (ORREGO, et al., 2000). De forma crescente, a
utilização da MMC conquistou espaço no universo da manufatura sendo
introduzida em todo o ciclo produtivo: participa do desenvolvimento do processo
de fabricação, do controle de processos e encontra grande aplicação no controle
dimensional da qualidade do produto acabado.
A evolução das MMC, que se modernizaram ao incorporar controladores
CNC, possibilitou uma maior velocidade de medição e redução significativa dos
erros atribuíveis às operações então presentes nas MMC manuais. Por sua vez, os
sistemas de aquisição com múltiplos apalpadores ou indexáveis trouxeram grande
versatilidade e flexibilidade para as medições. O controle de especificações de
produto, utilizando MMC, tornou possível a avaliação de distintas características
dimensionais em um mesmo equipamento. Cada novo modelo de máquina passou
a apresentar uma maior velocidade de movimentação e expressivas reduções dos
erros máximos informados pelo fabricante do equipamento. Resultado de
investimentos sucessivos no aprimoramento desses equipamentos, pela introdução
de tecnologias inovadoras, permitiu sem dúvida a redução das incertezas
associadas às medições, o que tem permitido de forma crescente, a conseqüente
Fundamentos da medição por coordenadas 28
melhoria da qualidade dos produtos produzidos ou controlados por essas
máquinas.
Resultante desses aprimoramentos —que permitiram sofisticações e a
modernização das atuais MMC, melhorando os aspectos construtivos do controle
dimensional e da fabricação, a operação e o processamento de dados— a nova
versão do equipamento passou a ter grande influência sobre o resultado da
medição. Devido à vasta gama de fatores de influência e à forte interação que
existe entre os diversos fatores que afetam a qualidade da medição, a avaliação da
confiabilidade metrológica resultante dos processos de medição passou a impor
novos desafios. Avaliar processos de medição com o uso de MMC é uma tarefa
que demanda conhecimento técnico e habilidade do avaliador sobre a tecnologia
de medição por coordenadas, sobre os métodos de avaliação dos processos de
medição, sobre o impacto que a falta de confiabilidade terá sobre o processo de
medição. Este conhecimento especializado tornou-se indispensável para que se
possa reconhecer as causas especiais e realizar as intervenções necessárias para
implementar as correções cabíveis. A falta desse conhecimento específico pode
ser indutora de equívocos e operação indevida, impondo ameaças no dia-a-dia da
prática de controle dimensional.
2.1. Fontes de erros em medição por coordenadas
Os fatores que atuam sobre os processos de medição por coordenadas são
normalmente divididos em cinco grandes grupos: máquina, ambiente, peça,
estratégia de medição e operador. Não obstante a literatura especializada
comumente classificar esses fatores de forma distinta, raramente eles atuam de
maneira independente sobre os resultados da medição, fato que torna impraticável
uma avaliação isolada das fontes associadas de erro. Apresentam-se, a seguir, os
principais fatores de influência sobre os resultados de medições por coordenadas e
suas inter-relações.
Fundamentos da medição por coordenadas 29
2.1.1. A máquina de medir por coordenadas
As MMC existentes possuem distintas arquiteturas e configurações, de
acordo com a aplicação para a qual são desenvolvidas. Dentre os subsistemas que
integram a maioria das MMC destacam a estrutura (guias e mancais), escalas,
sistema de apalpação, controlador e software de medição (comando numérico e
processamento de dados). No que concerne as prováveis fontes de erro do sistema,
estas originam-se, notadamente da estrutura e do sistema de apalpação
2.1.1.1. A estrutura
As fontes de erro provenientes da estrutura podem ser de origem estática
(desvios geométricos e de montagem) ou de origem dinâmica. O modelo de guia
rígida (VDI/VDE 2617-3, 1989) é o mais amplamente utilizado para descrever os
erros de origem geométrica das MMC. Esse modelo descreve seis possíveis erros
para cada guia (três de rotação e três de translação).
Erros de translação — ocorrem na direção transversal ao movimento (erros de
retitude das guias) e na direção paralela ao movimento (erros de escala). Os erros de
rotação, também provocados pelos erros de retitude das guias, são erros de primeira
ordem, e terão tanto mais influência quanto mais afastada a característica sendo
avaliada estiver das escalas.
Erros de escala ou posição e dois de retilineidade - representam a translação, os
de rotação ou angulares são chamados roll, pitch, yaw (figura 4).
Erros de ortogonalidade — Além dos 18 erros de corpo rígido para as três guias,
os erros de ortogonalidade entre as guias (nos planos XY, YZ e ZX) (figura 4)
caracterizam as diferentes (vinte e um) componentes de erros paramétricos
encontrados na maioria das MMC tridimensionais; i.e. tipo portal móvel (ISO
10360-1, 2000). A influência do erro é proporcional ao tamanho e distância entre as
características medidas
Fundamentos da medição por coordenadas 30
Figura 4. Erros geométricos associados à operação de uma máquina de medir por coordenadas: (a)
seis possíveis naturezas de erros geométricos do carro com movimento de translação pura na
direção Y; (b) três possíveis erros angulares - a k o – devido à falta de ortogonalidade entre os
eixos perpendiculares a direção k. (ORREGO, et al., 2000)
Desvios de retitude das guias — são geralmente derivados do processo de
fabricação, mas podem também ser modificados pelo carregamento sobre as
mesmas e pelos gradientes térmicos do ambiente. Os erros de ortogonalidade são
mecanicamente ajustados (não de maneira muito fina, porém) durante a montagem.
Desvios residuais de fabricação e de montagem — para promover a compensação
dos erros residuais de fabricação e de montagem é utilizando um ajuste via software
conhecido como CAA (computer-aided accuracy). Esse método se baseia no
mapeamento dos erros residuais através de ensaios com artefatos calibrados, e na
sua posterior compensação via software. Algumas máquinas possuem correção para
os 21 erros paramétricos, mas a maioria possui apenas para os erros de escala e de
ortogonalidade.
Desvios de origem dinâmica — são devidos às acelerações às quais a estrutura é
submetida. Ocorrem durante a desaceleração da MMC para entrar em velocidade de
apalpação (no modo de aquisição ponto a ponto) ou durante as aquisições por
scanning (modo de aquisição contínuo).
2.1.1.2. O sistema de apalpação
O sistema de aquisição por contato (sistema de apalpação) é subdivido em
duas categorias principais: os comutadores (ou touch-triggers) e os analógicos (ou
medidores). O primeiro tipo adquire os pontos de forma individual, perdendo
contato com a superfície adquirida após a aquisição de cada ponto. O segundo
adquire os pontos sem perder contato com a superfície (modo scanning),
geralmente podendo também adquirir pontos de forma individual. Cada tipo
possui suas próprias peculiaridades com relação aos erros de medição.
a) b)
Fundamentos da medição por coordenadas 31
Construtivamente, o apalpador comutador é mais simples que o analógico.
O princípio de funcionamento consiste em uma chave comutadora (ou cristal
piezelétrico nos sistemas mais modernos), segurada em sua posição por uma mola,
que altera seu estado de tensão elétrica quando submetida a um deslocamento. No
momento que a alteração da tensão é detectada, são adquiridas simultaneamente
as coordenadas das três escalas, representando a posição do centro da esfera do
apalpador. Geralmente são acoplados a um cabeçote indexador, que confere
grande versatilidade com respeito à orientação dos apalpadores.
Os principais erros associados aos apalpadores comutadores são o pré-travel
(erro devido à flexão da haste do apalpador antes que a força para comutação seja
atingida) e o erro de devido à anisotropia na força necessária para comutação de
acordo com a direção de apalpação. A exatidão dos modernos sistemas
comutadores é relativamente alta em detrimento do tempo de aquisição de pontos
individuais, que é extremamente lento quando comparado aos sistemas de
aquisição por scanning. Ainda, o cabeçote indexável ao qual o apalpador
comutador é geralmente acoplado constitui uma fonte adicional de erro. A
repetitividade de posicionamento angular influencia os resultados de medição, e
pode introduzir erros sistemáticos significativos quando o processo de
qualificação dos apalpadores é realizado a partir de um único ciclo (prática
comum em medições industriais).
Os sistemas analógicos são mais sofisticados, compostos por um conjunto
de sensores (indutivos ou ópticos) responsáveis pela efetiva medição da superfície
com referência a um caminho pre-estabelecido pelo usuário. A aquisição do perfil
é feita de maneira conjunta pelo sistema de apalpação e pelas escalas. São
subdivididos em sistemas ativos (que efetuam o controle da força de medição de
forma dinâmica) e passivos (sem controle da força de medição por parte do
cabeçote medidor). A aquisição de pontos individuais ocorre quando um
deslocamento pre-determinado (que corresponde a uma força de contato imposta
pelas molas) é atingido, o que confere a esses sistemas altíssima exatidão, mas os
torna mais lentos que os sistemas comutadores. Os principais erros associados ao
modo scanning são: a resposta dinâmica do sistema (velocidade de medição
versus massa, rigidez e amortecimento do sistema de apalpação, limitando a faixa
de freqüências em que o sistema é capaz de adquirir sem atenuação); a flexão
(média e variante) dos apalpadores devido à dificuldade do controle da força de
Fundamentos da medição por coordenadas 32
contato em tempo real para aquisições em alta velocidade; e a geração de calor no
interior do cabeçote.
2.1.2. Ambiente de medição
O ambiente de medição pode afetar o processo de medição de distintas
maneiras. As fontes de erro mais influentes relacionadas ao ambiente são a
temperatura, as vibrações e as partículas em suspensão.
A temperatura do ambiente pode apresentar uma tendência média em
relação à temperatura de referência, flutuações dessa tendência média ao longo do
tempo e variações em torno dessa tendência dentro do volume da sala de medição.
A temperatura de referência definida para controle dimensional é de 20°C (ISO 1,
2002). Algumas MMC possuem sistemas para medição de temperatura nas escalas
e nas peças, de forma a minimizar o efeito das tendências médias e flutuações da
temperatura ao longo do tempo. Os gradientes volumétricos da temperatura
ambiente provocam distorções não lineares na estrutura. Se esses gradientes forem
muito pronunciados, erros de rotação e translação irão surgir decorrentes desse
fator. Se houver uma variação significativa desses gradientes ao longo do tempo, a
matriz de erros utilizada pelo CAA perderá a validade. O material da estrutura
deve apresentar baixos coeficientes de expansão térmica (para minimizar
distorções) e alta condutividade térmica (para auxiliar na rápida equalização da
temperatura no caso de flutuações térmicas no ambiente).
Em máquinas próximas do ambiente de produção, o nível de vibrações pode
ser extremamente elevado. Vibrações podem representar um problema ainda mais
crítico no caso de equipamentos operando com apalpadores analógicos no modo
scanning. A influência das vibrações provenientes do ambiente de medição pode
ser minimizada pelo uso adequado de bases inerciais e amortecedores sob as
MMC.
2.1.3. A peça objeto da medição
A peça a ser medida não representa fonte de erro por si própria. Entretanto,
as interações de suas características físicas e mecânicas (e suas variações) com a
Fundamentos da medição por coordenadas 33
estratégia de medição, com o ambiente e com a própria MMC provocam uma das
mais significativas fontes de erro em medição por coordenadas (ARENHART, et
al., 2008).
Se o ambiente de medição apresentar tendência de aumento ou redução na
temperatura média, as medições de características de tamanho (diâmetros,
posições) serão tão mais afetadas quanto maior o coeficiente de expansão térmica
médio da peça (e também a dimensão da característica). Se houver uma variação
do coeficiente de expansão térmica do material utilizado, entre lotes do processo
de produção, haverá uma variação do erro de medição entre os distintos lotes.
A massa da peça pode também distorcer a estrutura e alterar a condição do
ajuste via CAA. Quanto maior for a dimensão da característica, maior será o os
erro de medição resultante dos desvios geométricos da estrutura. As variações dos
desvios de forma característicos do processo de fabricação também podem
interagir com erros geométricos e dinâmicos da máquina, provocando uma
variação do erro de medição entre peças, devido ao processo de fabricação. A
interação entre peça e estratégia de medição será discutida na próxima seção.
2.1.4. Estratégia de medição
A definição da estratégia de medição se dá em três etapas:
Preparação da medição (tempo de estabilização térmica das peças,
periodicidade e método de qualificação dos apalpadores, fixação das peças,
análise do desenho de projeto da peça a ser medida);
Aquisição dos dados (parâmetros da MMC, configuração de apalpadores,
número de pontos definições de scanner);
Avaliação dos parâmetros geométricos (parâmetros de filtragem, tipos de
ajustes matemáticos, relação entre os elementos geométricos).
Com relação à primeira etapa, o tempo de estabilização das peças requer
atenção especial. Os equipamentos mais modernos, estão dotados de termômetros
que permitem medir temperatura da peça, da estrutura e do meio ambiente. Isto
possibilita a compensação do resultado, utilizando o coeficiente de dilatação
térmica do respectivo material, para a dimensão em relação à temperatura de
referência. Porém como a medição de temperatura é feita na superfície da peça, no
caso da peça não estar estabilizada termicamente, a compensação poderá
apresentar um erro residual elevado.
Fundamentos da medição por coordenadas 34
A periodicidade da qualificação dos apalpadores também é um fator
importante, devendo ser mais frequente no uso de múltiplos apalpadores (ou
múltiplas orientações com cabeçotes indexáveis) e em ambientes onde há a
variação significativa da temperatura do ambiente. Quando ocorre a mudança de
temperatura a distância entre os apalpadores é alterada, devendo ser verificada a
necessidade de uma requalificação dos mesmos. Alterações significativas, tanto na
temperatura do meio ambiente ou observada nos resultados de medição de um
padrão de acompanhamento, definem a necessidade de uma requalificação dos
apalpadores.
Durante à aquisição dos dados, os parâmetros ajustáveis da MMC, a
velocidade de movimentação e a distância de aproximação (que definem o tempo
de estabilização dinâmica da estrutura para medições ponto a ponto) ou a
velocidade de medição e a força de medição (para medições por contato contínuo)
são os principais parâmetros. Quanto maior a velocidade de movimentação da
estrutura e menor a distância de aproximação existe a redução da qualidade dos
pontos adquiridos, ou seja, é maior o erro de medição. Em medições por scanning,
a força de contato e a velocidade de movimentação são os parâmetros críticos. A
interação entre os desvios de forma (e as variações dos mesmos) e o número e a
distribuição dos pontos utilizados na medição dos elementos é um fator
preponderante sobre a qualidade dos resultados de medição (WECKENMANN, et
al., 1998).
A configuração dos apalpadores é geralmente um fator de maior importância
nas medições que envolvem definição de uma ou mais referências a serem
medidas com distintos apalpadores, como comumente ocorre em especificações
de posição e orientação. Quanto maior o comprimento dos apalpadores, mais eles
estarão sujeitos a erros geométricos e a variação do gradiente de temperatura no
volume em torno da MMC tem influência sobre a estrutura. Isso é ainda mais
crítico com o uso de cabeçotes indexáveis, pois os erros residuais da calibração
podem ser elevados, dependendo do método utilizado na qualificação dos
mesmos.
A representação de um elemento geométrico será tão mais fiel quanto maior
for a amostragem utilizada para sua descrição. No contexto industrial, contudo, os
curtos tempos de medição requeridos não permitem altas densidades de
amostragem. Quando o processo de produção apresentar variabilidade nos desvios
Fundamentos da medição por coordenadas 35
de forma entre peças superior à repetitividade do processo de medição, as
estratégias de medição com baixa densidade de amostragem apresentam distintos
resultados dos valores de erro de medição entre peças. Essa fonte de variabilidade
é resultado da interação entre a estratégia de amostragem utilizada e os erros de
forma típicos gerados pelo processo de fabricação, sendo independente do
equipamento utilizado.
Estudos recentes revelaram que os métodos de avaliação dos parâmetros
geométricos utilizados nas medições industriais podem diferir significativamente
daqueles requeridos para uma correta avaliação da especificação segundo as
normas (ARENHART, et al., 2008). Na avaliação dos parâmetros os erros são
causados pela escolha incorreta dos algoritmos de ajuste que representem a função
da característica avaliada, passando por limitações do software de medição (p.ex.
a ausência de ajustes tipo best-fit para especificações onde nem todos os graus de
liberdade estão restritos, ou a desconsideração dos erros de forma dos elementos
ajustados nas avaliações), até erros grosseiros gerados por interpretações
equivocadas das especificações geométricas (p.ex. uso de referências não
especificadas). Os resultados mostraram que avaliações inconsistentes dos
parâmetros geométricos, tais como definidos pelas especificações geométricas de
produto, podem gerar erros superiores aos que são causados pelo conjunto
MMC/ambiente.
2.1.5. O operador
O operador, enquanto executor das tarefas de medição, terá pouca ou
nenhuma influência sobre os resultados de medição. Quando o ―operador‖ é
mencionado como fator de influência sobre os resultados de medição, geralmente
se está referindo ao recurso humano responsável pela definição das estratégias de
medição e avaliação do desempenho metrológico do processo de medição.
O conhecimento técnico especializado requerido do operador de medição
por coordenadas, responsável por planejar a medição (elaborar estratégia) e
avaliar o processo e seus resultados, vai muito além da proficiência em operar o
equipamento. Para alcançar o rendimento máximo do equipamento, sem superar
os critérios de aceitação do processo de medição para cada tarefa específica de
Fundamentos da medição por coordenadas 36
medição, são necessários conhecimentos técnicos em distintas áreas. Estes
conhecimentos, envolvendo a medição por coordenadas, incluem interpretação
das especificações de produto (ISO 1101, 2004; ASME Y14.5M, 1994),
conhecimento da tecnologia de medição por coordenadas, conhecimento da peça a
ser avaliada e seu processo de fabricação, conhecimento de metrologia e
estatística (para avaliação do processo de medição), etc.
O desconhecimento das especificações do produto fatalmente irá incorrer
em erros grosseiros como os citados na seção anterior. O uso indiscriminado de
velocidades de medição elevadas e/ou densidades de amostragem reduzidas, assim
como a redução da distância de aproximação para redução dos tempos de
medição, sem uma posterior validação do processo de medição, poderão levar os
resultados de medição a apresentarem erros completamente incompatíveis com
aqueles exigidos pelas tarefas de medição (OLIVEIRA, et al., 2003). Desta forma,
pode-se concluir: (i) que o operador (enquanto planejador e avaliador dos
processos de medição por coordenadas) é uma peça-chave para assegurar o uso
eficaz dos equipamentos de medição e (ii) que os investimentos feitos de forma
isolada em equipamento e ambiente podem não trazer o retorno esperado em
termos de desempenho metrológico dos processos de medição por coordenadas.
2.2. Avaliação da confiabilidade metrológica de processos por MMC
A realização de medições é tarefa essencial para assegurar a qualidade de
um produto durante todo o seu ciclo de vida. As medições realizadas no contexto
do desenvolvimento e validação do processo de produção de um produto
geralmente requerem o mais alto desempenho metrológico possível. Isto se dá
pelo fato do custo por falhas ocorridas nas etapas iniciais da vida de um produto
(não detectadas e não corrigidas antes de seu lançamento) ser, via de regra,
elevado. Portanto, nessa etapa os sistemas de medição devem apresentar alta
exatidão enquanto os procedimentos de medição tendem a ser mais elaborados e
mais robustos.
Após o lançamento da linha de produção, as medições passam a ser
realizadas para o controle e avaliação da produção, situação em que, de forma
geral, são empregados sistemas de medição e procedimentos adequados à
Fundamentos da medição por coordenadas 37
realidade da mesma. Neste contexto, os procedimentos de medição geralmente são
definidos de modo a se obter o menor tempo de medição possível, em detrimento
da confiabilidade das medições. O desconhecimento do desempenho metrológico
dos processos de medição por coordenadas pode levar, entretanto, a altos custos
por falhas internas e externas. Portanto, faz-se necessário uma validação do
processo de medição, de modo a se obter o status de confirmação metrológica do
processo de medição (ISO 10012, 2003).
A confirmação metrológica depende do critério de aceitação adotado para o
processo de medição, que por sua vez depende da aplicação a que se destinam as
medições. As principais atividades da garantia da qualidade relacionadas ao
controle dimensional de peças de linha de produção são a avaliação da
conformidade do produto, o controle estatístico e a avaliação da capacidade dos
processos de produção.
2.2.1. Metrologia para garantia da qualidade
A metrologia requerida para se assegurar a garantia da qualidade será
discutida segundo três vertentes distintas, a saber:
Controle estatístico do processo — O controle estatístico dos processos de
produção (CEP) tem como objetivo manter os processos em estado de
controle e previsibilidade, eliminando causas especiais de variação. Evita-se,
assim, a sua deterioração natural e reduz-se continuamente a variabilidade
por causas comuns e estruturais. O controle é feito a partir de uso de cartas de
controle, permitindo, assim detectar e corrigir causas especiais no início da
implantação do processo. Durante a fase da produção é aplicado para avaliar
a estabilidade do processo de produção ao longo do tempo. Na avaliação do
controle estatístico do processo de produção, a tendência apresentada pelos
processos de medição não influencia os limites de controle, mas sim a
posição do processo. Para esta aplicação, o critério de aceitação para o
processo de medição deve dizer respeito a sua variabilidade frente à
variabilidade do processo de produção. Se o processo de medição apresentar
variabilidade relativamente elevada, os limites de controle ficarão relaxados,
e a carta perderá a capacidade de detectar variabilidade por causas especiais e
alterações na média do processo de produção.
Capacidade do processo de produção — A capacidade de um processo de
produção procura avaliar o mesmo frente às especificações do produto. A
partir da avaliação de capacidade, pode-se estimar qual a fração não-
conforme a ser gerada pelo processo de produção. Entretanto, a avaliação
dessa capacidade somente tem valor preditivo se o processo estiver sob
controle estatístico. Os índices de capacidade de processo de produção mais
usuais são o Cp (que avalia a dispersão do processo frente à amplitude do
intervalo de tolerância) e o Cpk (que avalia, além da dispersão, a posição do
processo com relação à média do intervalo de tolerância). Para realizar a
Fundamentos da medição por coordenadas 38
avaliação da capacidade, é importante que o sistema de medição apresente
baixa variabilidade (para o caso do índice Cp) e também tendência não-
significativa (para o caso do índice Cpk). A capacidade Cp observada a partir
das medições denota uma composição da variabilidade apresentada pelo
processo de produção e da variabilidade inerente ao processo de medição,
fazendo com que o processo de produção pareça menos capaz do que ele é
efetivamente. O mesmo é válido para o índice Cpk, com a diferença que,
dependendo do sinal da tendência apresentada pelo processo de medição, o
processo de produção pode aparentar ser mais ou menos capaz do que ele é
na realidade.
Inspeção 100% — A avaliação da conformidade de 100% do produto
produzido é utilizada para processos com índice da capacidade inerentemente
baixos, que geram uma fração não-conforme elevada; para liberação ou
aceitação de lotes; ou para avaliação de características críticas. Na avaliação
da conformidade, os valores obtidos pelo sistema de medição são
confrontados às especificações do produto. Nesse processo de avaliação, a
incerteza de medição deve ser levada em consideração. A Norma ISO 14253-
1 (ISO 14253-1, 1998) apresenta um conjunto de regras que pode ser
utilizado para classificação de produtos. O fornecedor deve reduzir a
amplitude do intervalo de tolerância em função da incerteza de medição, para
que seja evitado que peças com possibilidade de apresentarem defeitos (na
região de dúvida definida pelo intervalo de incerteza em torno da tolerância)
cheguem até o cliente. Um controle dimensional tem por função segregar
corretamente os componentes conformes dos não conformes, porém o não
uso das regras pode levar a erros de classificação de produtos, figura 5, e
consequentemente a elevados custos por falha externa e interna.
Produção de componentes
Processo de inspeção
inadequado
Reprovação Indevida
Aumento de sucata
Ação indevida CEP
Falhas :de componentesde montagem
Conseqüências
conforme
conforme
conforme
conformeconforme
conforme
conforme
conforme
conforme
conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
Figura 5. O processo de medição e suas consequências, adaptado de (OLIVEIRA, et al., 2003)
Produção de componentes
Controle dimensional
Satisfação dos clientes devido
a qualidade do produto
Redução amostragem
processo estavel
Facilidadede montagem
Conseqüências
conforme
conforme conforme
conforme
conforme conforme
conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
conforme
conforme
conforme
NÃO conforme
NÃO conforme
Fundamentos da medição por coordenadas 39
Um estudo recente (ARENHART, et al., 2009) mostrou que os custos
associados à qualidade para inspeção realizada sem o uso das regras definidas pela
ISO 14253-1 são iguais ou maiores do que aqueles que fazem uso da inspeção
realizada com a redução do intervalo de incerteza. Este fato fica ainda mais
marcante quando os processos de produção refletem baixa capacidade e/ou
características críticas (custo por falha externa muito superior ao custo por falha
interna).
2.2.2. O manual de análise dos sistemas de medição
O Manual de Análise de Sistemas de Medição (MSA) (CHRYSLER;
FORD; GENERAL MOTORS, 2003) apresenta um conjunto de testes estatísticos
que permitem avaliar a confiabilidade metrológica dos processos de medição
frente aos processos de produção e às especificações de produto. Estes testes
estatísticos têm critérios de aceitação bem definidos e permitem avaliar a
capacidade dos sistemas de medição para a realização das tarefas de CEP, de
avaliação da capacidade do processo de produção e de avaliação da conformidade
de produtos.
O conjunto de testes avalia o desempenho metrológico do processo de
medição a partir de suas características metrológicas, separadamente. O processo
de medição terá atingido o status de confirmação metrológica segundo o MSA se
for aprovado em todos os testes. Entretanto, como os valores de referência
utilizados para estes testes não requerem que uma estimativa incerteza de medição
seja declarada, não fornecerão rastreabilidade ao processo de medição.
A seguir será conduzida uma breve revisão das características
metrológicas e respectivos testes estatísticos utilizados para acessá-las, quando o
foco recai nos processos de medição por coordenadas. São elas:
Repetitividade — A repetitividade (INMETRO VIM, 2008; INMETRO
VIM, 2008)é definida no MSA como a variação nos valores de medição
obtidos por um instrumento, quando utilizado por um mesmo operador,
medindo características idênticas na mesma peça. Em última análise, é a
menor variabilidade possível de ser obtida por um determinado sistema de
medição. No Apêndice D, o manual apresenta um teste estatístico para
avaliação da repetitividade, utilizando uma única peça medida 10 ou mais
Fundamentos da medição por coordenadas 40
vezes por um único operador. Entretanto, o MSA menciona que esse teste
não serve para o propósito de validação do processo de medição.
Tendência — A tendência (INMETRO VIM, 2008) é definida no MSA
como uma estimativa do erro sistemático do processo de medição. O teste
estatístico utilizado visa a avaliar se a tendência é ou não significativa frente
às variações por causa comum do processo de medição. O teste consiste em
se obter uma peça da linha de produção, determinar seu valor de referência,
escolher apenas um operador que irá realizar 10 ou mais medições na peça.
Caso a tendência resulte significativa, o manual recomenda que ela seja
corrigida antes da aprovação e liberação do sistema de medição para o uso.
Na avaliação de especificações de produto em máquinas de medir por
coordenadas, a tendência nem sempre é passível de correção, pois os erros
encontrados são resultado de um complexo sistema de causas. Por exemplo,
na avaliação do erro de posição de um furo em relação a duas referências
nominalmente ortogonais, não é mais possível saber a magnitude nem o
sentido da contribuição de cada escala para o erro observado, podendo tornar
inconsistente uma correção aplicada diretamente ao valor do erro de posição.
Linearidade — A linearidade é definida no MSA como a variação da
tendência ao longo da faixa de operação do instrumento. O teste estatístico de
linearidade é similar ao realizado para verificação da tendência, porém sendo
utilizadas cinco ou mais peças com seus valores de referência determinados,
escolhidas de maneira a cobrir toda a faixa de operação do instrumento. Esse
teste avalia tanto a tendência (offset) do sistema de medição quanto o erro de
ganho do sistema de medição. Caso o erro de linearidade resulte significativo,
o manual recomenda que seja corrigida antes da aprovação e liberação do
sistema de medição para o uso. Em máquinas de medir por coordenadas, um
teste semelhante é o ensaio de avaliação do máximo erro permissível para
medição e comprimentos (MPEE), conforme definido pela ISO 10360-2 (ISO
10360-2, 2001). Embora esse teste não avalie a linearidade frente à
repetitividade do equipamento, ele a avalia contra critérios de aceitação
estabelecidos pelo fabricante (especificações do fabricante). Os critérios de
aceitação para esse teste também podem ser definidos internamente ou no
contrato entre fornecedor e cliente.
Estabilidade — A estabilidade (INMETRO VIM, 2008) é definida no MSA
como a variação da tendência ao longo do tempo. O teste estatístico consiste
em selecionar uma peça que será medida por um único operador ao longo de
um período de tempo. A avaliação não difere de um estudo de CEP, podendo
ser realizado em fase 1 e 2, embora o manual não mencione o procedimento.
Em máquinas de medição por coordenadas, estudos similares são os interim
checks (ou ensaios de verificação rápida) (ISO 10360-2, 2001) (NADERLLI,
et al., 2006).
Reprodutibilidade — A reprodutibilidade é definida pelo MSA como a
variação da média das medições realizadas por diferentes operadores,
utilizando o mesmo sistema de medição e medindo características idênticas
na mesma peça. O termo reprodutibilidade não apenas se refere à diferença
entre operadores, a qualquer diferença que possa existir entre conjuntos de
subgrupos (e.g.:. um mesmo operador utilizando dois sistemas de medições
diferentes, ou utilizando dois procedimentos diferentes). Em medição por
coordenadas uma situação típica é a medição de um mesmo tipo de peça em
distintos locais dentro do volume de medição da MMC. Estudos realizados
por (ARENHART, et al., 2008) revelaram que diferenças significativas são
Fundamentos da medição por coordenadas 41
obtidas ao se medir uma mesma peça em distintas posições/orientações no
mesmo equipamento, principalmente na avaliação de especificações que
possuem referências físicas e requerem o uso de múltiplos apalpadores (p.ex.
especificações de posição e orientação). Não existe no MSA um teste
estatístico para avaliar especificamente a significância da reprodutibilidade
frente à repetitividade. Entretanto, o guia Evaluating the Measurement
Process (EMP) (WHEELER, et al., 1989) utiliza testes de hipótese baseados
em cartas de controle com limites de três sigmas para comparar tendência e
inconsistência (variação da dispersão) entre conjuntos de subgrupos com
relação à repetitividade do processo de medição, ao estilo dos demais estudos
apresentados pelo MSA.
Repetitividade & Reprodutibilidade — A ―repetitividade e
reprodutibilidade‖ (R&R) é definida no MSA como a estimativa da variação
combinada da repetitividade e reprodutibilidade. O teste estatístico consiste
na medição de cinco (5) ou mais peças representativas da variação esperada
do processo de produção, com dois ou três ciclos de medição realizados em
condições de repetitividade, para todos os subgrupos entre os quais pode
haver reprodutibilidade significativa. As estimativas de R&R são comparadas
à variação total do processo de produção (TV - total variation) encontrada no
estudo (%R&R/TV); e ao intervalo de tolerância (%R&R/Tol). O parâmetro
%R&R/TV posiciona o processo de medição frente à variabilidade do
processo de produção, sendo indicado quando as medições são utilizadas para
controle estatístico e avaliação da capacidade do processo de produção. O
parâmetro %R&R/Tol relaciona o processo de medição com o intervalo de
tolerância, sendo utilizado quando as medições são utilizadas para avaliação
da conformidade. O processo de medição é considerado capaz (com relação à
variabilidade) para desempenhar a tarefa para o qual é utilizado se os
parâmetros resultarem inferiores a 10% e marginalmente capaz quando entre
10% e 30%. O parâmetro R&R não pode ser considerado como estimador da
variabilidade total do processo de medição, uma vez que desconsidera a
variabilidade que pode ser provocada pela interação entre os erros de forma
inerentes das características (e suas variações ao longo do processo de
produção) e o procedimento adotado (no MSA, essa fonte de variabilidade é
referida como within part variation). No caso de processos de medição por
coordenadas, essa fonte de variabilidade, como anteriormente citado, não
pode ser negligenciada, sendo necessário um método para incluí-la na
avaliação da análise da variabilidade do processo de medição.
2.2.3. A incerteza de medição
A incerteza de medição é um dos mais poderosos estimadores da
confiabilidade metrológica de um processo de medição, uma vez que se propõe a
levar em consideração em um único parâmetro todas as possíveis fontes de erros
atuantes. Se suficientemente bem estimada, permite obter a rastreabilidade
(INMETRO VIM, 2008) da medição. A principal referência para avaliação da
incerteza de medição é o Guia para Expressão da Incerteza de Medição - ISO
GUM (BIPM, IEC, IFCC, ISO, IUPAC, IUPAP, OIM, 1995).
Fundamentos da medição por coordenadas 42
A incerteza máxima permissível pode ser um critério adotado para a
obtenção do status de confirmação metrológica do processo de medição. Esse
valor é geralmente definido como uma parcela do intervalo de tolerância do
produto (p.ex. 10% do intervalo de tolerância). Entretanto, a incerteza máxima
permissível deve ser definida não somente com base na tolerância do produto, mas
também nos índices de capacidade do processo de produção, ou seja, nos custos
por falhas internas e externas que podem decorrer da avaliação da conformidade, e
nos custos de operação e manutenção do sistema de medição.
Por exemplo, se a incerteza de medição for muito alta, uma quantidade
muito grande de peças possivelmente boas poderá estar sendo rejeitada,
implicando em altos custos por falha interna. Por outro lado, para se obter
incertezas baixas, investimentos devem ser feitos no sistema de medição como um
todo, o que inclui não só equipamento, mas ambiente e principalmente
capacitação de recursos humanos.
2.2.4. Incerteza em medição por coordenadas
Atualmente, uma das temáticas mais abordadas em relação à medição por
coordenadas é a transferência de rastreabilidade para as medições realizadas em
peças de produção. Rastreabilidade (INMETRO VIM, 2008), por sua vez, só é
possível de ser obtida quando resultados de medição são informados de forma
completa, ou seja, com seus valores de incertezas de medição, tendo agregado o
uso de uma referência a um padrão rastreável ao SI.
Os principais métodos propostos para avaliação da incerteza em medição
por coordenadas podem ser divididos em (WILHELM, et al., 2001):
análise da sensibilidade;
parecer de um especialista emitido por profissional capacitado;
método numérico utilizando simulações computacionais;
método experimental utilizando artefatos calibrados.
Cada método apresenta suas peculiaridades com relação à complexidade e
custos em termos de implementação e operação e com relação à confiabilidade
obtida. O método de avaliação da incerteza deve, portanto, ser definido de acordo
com a finalidade da avaliação de incertezas, com o objetivo da medição, e com a
Fundamentos da medição por coordenadas 43
criticidade da tarefa, não sendo possível apontar um método definitivo que atenda
igualmente a esses requisitos (BALDO, 2009). A seguir será feita uma breve
análise com respeito a cada um dos métodos.
Análise de sensibilidade — Pode ser utilizada em casos nos quais um
modelo matemático do processo de medição pode definido. Para definição do
modelo, cada fonte de incerteza deve ter sua quantificação, ter seu coeficiente de
sensibilidade derivado a partir do modelo matemático, e ter sua correlação com as
demais fontes de incerteza estimada. Para processos de medição por coordenadas,
nem a definição do modelo matemático nem a estimativa das correlações são
tarefas simples de serem realizadas, podendo em alguns casos ser impossível.
Recentemente alguns modelos matemáticos para avaliação de especificações de
produto foram propostos (BALDO, 2009).
Parecer de um especialista — Essa técnica tem sido utilizada por
metrologistas especialistas por décadas, quando outras técnicas mais recentemente
estudadas não estavam disponíveis. As fontes de incerteza do tipo B conforme
definidas pelo ISO GUM são geralmente estimadas com base em um julgamento
de um especialista, em conhecimentos obtidos a priori (p.ex. especificações de
fabricantes), com experimentos isolados para estimação de algumas fontes, ou a
partir do histórico de medições realizadas. Essas informações, se adequadamente
estimadas e combinadas em um balanço de incertezas tipo aditivo, podem
fornecer uma estimativa razoavelmente confiável da incerteza de medição.
Simulações computacionais — O método computacional tem encontrado
espaço entre os métodos de avaliação de incerteza em MMC nos últimos anos.
Permitem uma propagação das fontes de incerteza de maneira mais consistente
que os métodos analíticos, fornecendo como saída uma estimativa mais realista da
distribuição. A estimativa de incerteza será tão completa quanto for o modelo. O
método apresenta duas principais dificuldades: uma delas é a implementação, pois
exige a criação de um modelo matemático do sistema de medição e de todas as
outras fontes de incerteza associadas; e a estimativa dos valores dos parâmetros do
modelo. Com a disponibilidade de softwares comerciais como o Virtual
Coordinate Measuring Machine (VCMM) (TRAPET, et al., 1999)
(SUMMERHAYS, et al., 2005), o primeiro problema passa a ser o custo de
aquisição do sistema. Entretanto, as estimativas dos parâmetros de entrada
continuam a ser um desafio: exigem ensaios demorados, utilizando artefatos de
referência, estimativas de algumas fontes; ou, quando possível podem-se utilizar
informações mais básicas, como ensaios de aceitação (p.ex. MPEE definido pela
ISO 10360-2) que não apresentam uma estimativa de incerteza tão robusta. A
especificação técnica ISO 15530-4 (ISO/TS 15530-4, 2008) fornece orientação
para implementação e validação de softwares de avaliação da incerteza para
processos de medição por coordenadas utilizando simulação computacional.
Experimental utilizando artefatos calibrados — A estimativa da
incerteza de medição pelo método da substituição, utilizando artefatos padrão
calibrados, é descrito pela especificação técnica ISO 15530-3 (ISO/TS 15530-3,
2004). O procedimento é de caráter fundamentalmente experimental, e fornece
estimativas robustas da incerteza de medição. Apresenta uma abordagem simples
Fundamentos da medição por coordenadas 44
do ponto de vista do usuário, que considera basicamente quatro componentes de
incerteza, combinadas conforme a equação a seguir:
O componente ucal é relativa ao procedimento de calibração das peças padrão,
sendo obtida do certificado de calibração. O componente up é relativa ao erro de
repetitividade da tarefa específica de medição, estimado pelo desvio-padrão das
medições repetidas. O componente uw representa a interação entre o processo de
medição e as variações provenientes do processo de fabricação. Finalmente, b é a
tendência média estimada, a ser adicionada ao balanço de incerteza caso não seja
passível de correção. Apesar de a especificação citar a componente uw, não
apresenta uma proposta concreta para identificar a origem de tais contribuições à
incerteza (apenas faz referência à variação do coeficiente de expansão térmica de
diferentes lotes de material). Menciona, contudo, que tal fonte é parcialmente
considerada pela tendência observada na avaliação da incerteza realizada
utilizando uma única peça calibrada. Ainda, prevê o uso de mais de uma peça
calibrada, mas não fornece um método estatístico consistente para o tratamento
dos dados. Na literatura encontram-se algumas outras abordagens numéricas para
auxiliar na minimização da influência dessa componente pela definição de
estratégias de medição robustas, e/ou para contemplá-la na incerteza de medição
(WECKENMANN, et al., 1995) (SUMMERHAYS, et al., 2005) (MAY, et al.,
2007). Esses métodos se utilizam ou de modelos analíticos de perfis, ou perfis
obtidos de medições reais em peças de produção para emular, via simulação de
Monte Carlo, a interação entre peça e estratégia de medição (a ser) utilizada. Uma
abordagem recente (ARENHART, 2009) busca avaliar esse componente,
utilizando múltiplas peças padrão calibrada, situação em que a variação da
tendência entre peças permite acessar a componente uw. Conforme apontado pelos
mesmos, essa componente também pode ser utilizada para acessar a variabilidade
total do sistema de medição em um estudo de R&R.