2010 - ENGELMANN, Erico

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ERICO ENGELMANN

A MOTIVAO DE ALUNOS DOS CURSOS DE ARTES DE UMA UNIVERSIDADE PBLICA DO NORTE DO PARAN

ORIENTADORA: Profa. Dra. SUELI DI RUFINI

2010

2010

ERICO ENGELMANN

A MOTIVAO DE ALUNOS DOS CURSOS DE ARTES DE UMA UNIVERSIDADE PBLICA DO NORTE DO PARAN

Dissertao apresentada ao Programa de Mestrado em Educao, da Universidade Estadual de Londrina, como requisito para a obteno do ttulo de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Sueli di Rufini

Londrina Paran 2010

Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP) E57a Engelmann, Erico A motivao de alunos dos cursos de Artes de uma universidade pblica do norte do Paran / Erico Engelmann Londrina, 2010. 124 f. : il. Orientadora: Sueli di Rufini. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade Estadual de Londrina, Centro de Educao Comunicao e Artes, Programa de Ps-Graduao em Educao, 2010. Inclui bibliografia. 1. Motivao na educao Teses. 2. Motivao no Ensino superior Teses. I. Rufini, Sueli di. II. Universidade Estadual de Londrina. III. Ttulo. CDU 37.015.3 CDU 37.015.3

CDU 37.015.3

A MOTIVAO DE ALUNOS DOS CURSOS DE ARTES DE UMA UNIVERSIDADE PBLICA DO NORTE DO PARAN

Dissertao apresentada ao Programa de Mestrado em Educao, da Universidade Estadual de Londrina, como requisito para a obteno do ttulo de Mestre.

Comisso Examinadora:

________________________________ Profa. Dra. Sueli di Rufini Universidade Estadual de Londrina

________________________________ Profa. Dra. Ktya Luciane de Oliveira Universidade Estadual de Londrina

________________________________ Profa. Dra. Rosane Cardoso de Arajo Universidade Federal do Paran

Londrina, 06 de julho de 2010

AGRADECIMENTOS

Profa. Dra. Sueli di Rufini Pela orientao cuidadosa, disponibilidade, conhecimento, confiana e compromisso profissional no desenvolvimento desta pesquisa. Profa. Dra. Rosane Cardoso de Arajo e a Profa. Dra. Katya Luciane de Oliveira Pelas contribuies valiosas e pela disponibilidade em fazer parte desta banca. Aos professores do Mestrado Em especial Profa. Dra. Neusi Berbel pelos exemplos de ensinamento e competncia. amiga e professora Zita Kiel Baggio Pelo carinho, apoio e incentivo. A minha esposa Pelo amor, pacincia, incentivo e opinio segura durante o curso de mestrado.

A minha filha Pela alegria e curiosidade

RESUMO No contexto educacional, a motivao um dos maiores desafios a ser estudado, pois tem implicaes diretas na qualidade do envolvimento do aluno com o processo de ensino e aprendizagem. Assim, nesta pesquisa, analisamos as orientaes motivacionais de alunos dos Cursos de Artes de uma universidade pblica do Norte do Paran, a partir da identificao do tipo de motivao, da percepo das necessidades bsicas, das estratgias de aprendizagem utilizadas, da percepo de desempenho acadmico e da Inteno de permanecer no curso at a sua conclusao e da relao entre essas diferentes variveis. Participaram do estudo 192 alunos das quatro sries dos cursos de Artes. Os dados da pesquisa foram coletados por meio de um questionrio de auto-relato, contendo 88 questes do tipo escala Likert e foram analisados de acordo com a Teoria da Autodeterminao. Entre os principais resultados da pesquisa podemos destacar que os alunos obtiveram maiores mdias nos tipos mais autnomos de motivao e utilizam positivamente as estratgias de aprendizagem adaptadoras (de gerenciamento de recursos e de profundidade). Alm disso, a satisfao das trs necessidades fundamental para o desenvolvimento de orientaes motivacionais autodeterminadas e esto diretamente relacionadas com a motivao intrnseca. A maioria dos alunos pretende permanecer no curso at a sua concluso e quanto a percepo de desempenho confirma expectativa pessoal de sucesso e segurana quanto ao alcance dos objetivos estabelecidos. No que se refere s relaes entre as variveis, vale destacar que, as estratgias adaptadoras de gerenciamento de recurso e de profundidade esto relacionadas com a motivao intrnseca e as de superfcie com os tipos de motivao menos autnoma; h correlao baixa e negativa entre desmotivao e autonomia; correlao baixa e positiva entre motivao e uso de estratgias mais adaptadoras (profundidade e gerenciamento de recursos); correlao negativa e fraca entre desmotivao e inteno de permanncia no curso at sua concluso; correlao positiva e baixa entre motivao intrnseca e inteno de permanncia no curso at a concluso; correlao positiva e baixa entre motivao intrnseca e percepo de desempenho; a percepo dos estudantes acerca da satisfao das necessidades bsicas, pelo contexto social do curso, foram preditoras da motivao intrnseca; quanto varivel desmotivao, a percepo de satisfao das necessidades teve efeito preditivo negativo, em nvel moderado; a variao do uso de estratgias de profundidade pde ser previsto pelas variveis: motivao extrnseca por regulao introjetada e motivao intrnseca. Dessa forma, acreditamos que esta pesquisa trouxe importantes contribuies, uma vez que, os resultados anteriormente apontados demonstram vrios aspectos que podem estar envolvidos na motivao acadmica, ampliando a compreenso das orientaes motivacionais de alunos de cursos superiores.

Palavras-Chave: Educao. Motivao Escolar. Motivao de Alunos Universitrios Teoria da Autodeterminao.

ABSTRACT In the educational context, motivation is one of the biggest challenges to be studied because it has direct implications on the quality of student engagement with the process of teaching and learning. Thus, in this study, we analyzed the motivational orientations of students in Arts courses at a public university in northern Paran, by identifying the type of motivation, perception of basic needs, the learning strategies used, the perception of academic performance and Intention to stay the course until its conclusion and the relationship between these variables. Study participants were 192 students from four series of courses in Arts. The survey data were collected through a self-report questionnaire containing 88 Likert-type questions and were analyzed according to the Theory of Self-Determination. Among the key findings of the research can highlight that the students had the highest average in more autonomous types of motivation and use learning strategies positively adapters (management of resources and depth). Furthermore, the satisfaction of three requirements is fundamental to the development of motivational orientations and selfdetermined are directly related to intrinsic motivation. The majority of students want to stay the course until its completion and how perceptions of performance confirms the expectation of personal success and security on the common goals established. With regard to relations between the variables, it is noteworthy that the adaptive strategies of resource management and depth are related to intrinsic motivation and the surface with the types of motivation less autonomous, there is a correlation between low and negative motivation and autonomy, and low positive correlation between motivation and use of strategies more adapters (depth and resource management), and weak negative correlation between motivation and intention to stay the course until its completion; and low positive correlation between intrinsic motivation and intention to stay in progress to completion, and low positive correlation between intrinsic motivation and perceived performance; students' perceptions about the satisfaction of basic needs, the social context of the course were predictors of intrinsic motivation; and variable motivation, the perception of the requirements had a negative predictive effect on moderate level, the variation in the use of strategies in depth could be predicted by variables extrinsic motivation by introjected regulation and intrinsic motivation. Thus, we believe that this research made important contributions, since the results shown previously pointed out several aspects that may be involved in academic motivation, broadened the understanding of the motivational orientations of students in higher education.

Keywords: Education. Motivation School. Motivation of University Students. Determination Theory.

LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Continuum de autodeterminao, tipos de motivao com os 55 seus locus de causalidade e processos correspondentes........ Figura 2 - Mapa de Autovalores ................................................................ 72 Figura 3 - Mapa de Valores Prprios ....................................................... 75 Figura 4 - Mapa de Valores Prprios ........................................................ Figura 5 - Resultados da avaliao dos tipos de motivao dos 192 participantes.............................................................................. Figura 6 - Distribuio dos desempenhos dos participantes utilizando-se os escores brutos ...................................................................... Figura 7 - Resultados da avaliao das necessidades bsicas dos 192 participantes ............................................................................. Figura 8 - Distribuio dos desempenhos dos participantes utilizando-se os escores brutos ..................................................................... Figura 9 - Resultados da avaliao das estratgias de aprendizagem............... Figura 10 Distribuio dos desempenhos dos participantes utilizando-se os escores brutos ..................................................................... Figura 11 Pontuao na avaliao das estratgias de aprendizagem ..... Figura 12 Resultados da avaliao da inteno de permanncia no curso e percepo de desempenho.......................................... 77 81 81 83 83 85 85 86 87

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Construtos e amostras de itens utilizados no instrumento......... Quadro 2 - Construtos e amostras de itens utilizados no instrumento.........

70 74

LISTA DE TABELAS Tabela 1 Tabela 2 Extrao de componentes principais, com valor prprio maior que 1,00 .................................................................................... Locao dos itens com saturao >0,30 em cada um dos seis fatores e os ndices de consistncia interna (alfa de Cronbach).................................................................................. Extrao de componentes principais, com valor prprio maior que 2.......................................................................................... Locao dos itens com saturao >0,30 em cada um dos quatro fatores e os ndices de consistncia interna (alfa de Cronbach).................................................................................. Extrao de componentes principais, com valor prprio maior que 1,00..................................................................................... Locao dos itens com saturao >0,30 em cada um dos trs fatores e os ndices de consistncia interna (alfa de Cronbach).... Estatstica descritiva dos resultados da avaliao dos tipos de motivao dos 192 participantes .............................................. Estatstica descritiva dos resultados da avaliao das necessidades bsicas .............................................................. Estatstica descritiva dos resultados da avaliao das estratgias de aprendizagem utilizadas pelos 192 participantes .............................................................................. Estatstica descritiva dos resultados da avaliao da inteno de permanncia no curso e percepo de desempenho pelos 192 participantes ....................................................................... Coeficientes de correlao entre as variveis do estudo ......... Coeficientes de correlao entre as variveis do estudo ......... 71 72

Tabela 3 Tabela 4 -

74 75

Tabela 5 Tabela 6 -

76 77

Tabela 7 Tabela 8 Tabela 9 -

80 83 84

Tabela 10 -

87

Tabela 11 Tabela 12 -

88 88

SUMRIO

1 1.1 2 2.1 2.2 3 3.1 3.2 3.3 3.4 3.4.1 3.4.2

INTRODUO.......................................................................................... 11 Contextualizao da Pesquisa.................................................................. 11 MOTIVAO E APRENDIZAGEM........................................................... 18 A importncia do Contexto de Sala de Aula para a Motivao 21 Escolar..................................................................................... Motivao no Ensino Superior.................................................................. 29 TEORIA DA AUTODETERMINAO....................................................... Teoria das Necessidades Bsicas............................................................ Teoria da Avaliao Cognitiva.................................................................. Teoria da Orientao de Causalidade...................................................... Teoria da Integrao Organsmica........................................................... Motivao Intrnseca e Extrnseca............................................................ Continuum de Autodeterminao............................................................. 32 33 37 41 43 45 54

4 5 5.1 5.2 6 6.1 6.2 6.2.1 6.2.2 6.2.3 6.2.4 6.2.5 6.3 7 7.1 7.2 7.3 7.4 7.5 7.6 8 8.1 8.2

ESTRATGIAS DE APRENDIZAGEM...................................................

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OBJETIVOS ............................................................................................. 66 Objetivo Geral........................................................................................... 66 Objetivos Especficos ............................................................................... 66 METODOLOGIA....................................................................................... Descrio da Amostra............................................................................... Instrumento para Coleta de Dados........................................................... E.M.A.- Escala Motivacional Acadmica.................................................. Escala de avaliao da percepo dos alunos acerca da satisfao das necessidades bsicas (SNB).................................................................... Estratgias de aprendizagem .................................................................. Inteno de permanecer no curso............................................................ Percepo de Desempenho..................................................................... Procedimentos.......................................................................................... RESULTADOS.......................................................................................... Tipos de Motivao................................................................................... Necessidades Bsicas ............................................................................ Uso de estratgias de Aprendizagem....................................................... Percepo de Desempenho e Inteno de Permanncia no Curso......... Correlaes entre as variveis................................................................. Valor Preditivo das Necessidades Bsicas.............................................. 67 67 67 68 72 76 78 78 78 80 80 83 84 86 87 89

DISCUSSO DOS RESULTADOS........................................................... 92 Anlise do Desempenho dos Participantes nas Escalas de Avaliao.... 92 Relaes da Motivao com as Demais Variveis do Estudo.................. 98

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CONSIDERAES FINAIS......................................................................

101 103 115 116 120 121

REFERNCIAS.................................................................................................... APNDICES......................................................................................................... APNDICE A - Instrumento de Coleta de Dados................................................. APNDICE B - Formulrio para Possveis Dvidas - Questionrio do Pr-Teste..................................................................................... APNDICE C - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................

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1 INTRODUO

1.1 Contextualizao da Pesquisa

A educao uma prtica social que contribui efetivamente para a construo e desenvolvimento da cidadania. Essa prtica social um processo que envolve diversos fatores constituintes do ensino e da aprendizagem e que devem estar em consonncia com as reais necessidades dos alunos. Para Freire (2000), implica em aceitar o desafio constante do novo, do inquietante, que possibilita uma socializao mais efetiva e uma consequente construo coletiva do saber, contribuindo para o envolvimento do aluno e facilitando a compreenso da necessidade de uma viso mais abrangente sobre o mundo. O professor e o aluno so os protagonistas dessa escola que precisa confrontar diversos pontos de vista, proporcionando a organizao e o

aprofundamento de idias, revelando sentimentos, enfim, promovendo um espao para a expresso da diversidade. Dessa forma, pode se tornar um local adequado para a construo da cidadania. Historicamente, entretanto, a ao do professor em sala de aula tem se norteado por uma pedagogia tradicional, que prioriza uma conduta de manuteno, de repetio e de memorizao, com a crena generalizada de que o acmulo de informaes propicia elaborao estruturada e organizada de conhecimento. Nesse sentido, Freire (1977, p.56) descrevendo a concepo bancria da educao, afirma que a educao se torna um ato de depositar, em que os educandos so os depositrios e o educador o depositante. O professor um mero transmissor de informaes que tem a pretenso de que o aluno receba, guarde e arquive estas informaes. Salvo algumas excees e experincias, que tm buscado fugir dos aspectos condicionantes dessa tradio escolar, praticamente todas estas caractersticas acima relatadas podem ser constatadas nos diversos nveis de escolaridade e tambm no ensino superior. Numa anlise de contedos de provas utilizadas nesses nveis de ensino ou de livros didticos adotados nas escolas do pas podemos reconhecer que o ato de aprender est diretamente associado memorizao e a repetio de conceitos e idias (BELTRN NEZ et al., 2003; FRACALANZA, 1993; MARCHEZAN, 2005; PIMENTEL,1998). Outros aspectos

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como a obrigatoriedade da frequncia escola, bem como o tipo de currculo adotado, que determinado pelas crenas de uma sociedade em detrimento aos anseios dos seus estudantes, faz com que estes trabalhem utilizando um esforo no espontneo na realizao das atividades propostas (BROPHY, 1999). Covington (2004), refletindo sobre a ao dos alunos no contexto universitrio, mostra que muitos professores pensam que ensinar uma via de mo nica e que o processo de ensino ocorre por meio da transmisso da informao sistematizada e aspiram que o aluno a assimile de forma inalterada. J os alunos, em sua maioria, compreendem que o seu papel de aprendiz se restringe a passividade, desobrigando-se, assim, de um papel mais ativo no processo de aprendizagem. Acreditam, portanto, que assistir s aulas, fazer as leituras e seguir as orientaes do professor so as nicas atividades de sua responsabilidade. Ainda de acordo com Covington (2004), estas aes, que envolvem o ato de aprender, so incumbncias do aluno, que, no entanto, em diversas situaes, so traduzidas em estratgias de memorizao sem qualquer tipo de compreenso, causando enorme prejuzo ao esprito crtico e reflexivo do aluno. A universidade, por conseguinte, refora ainda mais esse clima de passividade, pois tem uma expectativa de que os alunos ingressem nos cursos superiores com esprito investigativo, atitudes ativas e auto-suficientes, no oferecendo a eles, em contrapartida, o preparo necessrio para o desenvolvimento dessas qualidades. Outro aspecto a ser destacado que, em muitas instituies, a aprendizagem dos alunos avaliada de forma mecnica, no estimulando a construo do conhecimento. Este ambiente escolar, no promove a motivao para a aprendizagem, pois no estimula no aluno a curiosidade, o desafio e a valorizao dos estudos. Segundo Durham (2009), a escola pblica, maior formadora de estudantes, no consegue realizar a tarefa de formar adequadamente,

encaminhando-os ao ensino superior sem a bagagem adequada. Jovens estudantes das diversas reas da arte seja a msica, o teatro ou artes plsticas, ingressam em um curso superior de uma universidade trazendo consigo um conjunto de elementos formativos, fundamentados neste modelo escolar. Por vezes, na sua formao, realizada prioritariamente em conservatrios musicais, atelis e escolas de teatro, esse sistema de ensino estruturado com base na repetio e memorizao

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igualmente enfatizado, restringindo significativamente as possibilidades expressivas e criativas. Gainza (1988), tratando da educao musical, sustenta que na educao tradicional, os seres humanos so compreendidos como mquinas decodificadoras de uma linguagem escrita, que dedicam uma grande quantidade de energia com o nico propsito de decifrar notas, de forma a transport-las a um instrumento. As caractersticas deste modelo educacional tradicional, manifestadas continuamente, produziram nos ambientes escolares diversas concepes

equivocadas a respeito do verdadeiro papel do artista. Muitas vezes o relacionam somente com a performance e o virtuosismo e restringem o fazer artstico operacionalizao de notas e dedilhados, s tcnicas e procedimentos prticos, retirando, assim, um aspecto fundamental, que reside na criao de gestos artsticos expressivos. O estudante chega universidade para cursar um dos diversos cursos de graduao em Artes, predominantemente a licenciatura, tendo esse modelo formativo baseado no virtuosismo artstico fortemente incorporado. De um modo geral, neste aluno, esto acentuadas estas caractersticas da performance, voltadas quase que exclusivamente para o domnio de um instrumento especfico, que possibilitar a sua realizao como artista. Glaser e Fonterrada (2007) afirmam, referindo-se formao do msico, que ela est geralmente baseada num modelo tradicional de ensino do instrumento que focaliza o domnio de habilidades e tcnicas e que podem dificultar uma compreenso mais abrangente do objeto de estudo e da funo dessa em relao sociedade em que vive. Em suma, a

preocupao do estudante dessa rea do conhecimento pode estar focalizada no produto final, na performance. Nessa perspectiva, Brophy (1999) faz uma distino entre a motivao para aprender e motivao para o desempenho (performance). Ele assegura que aprender envolve o processamento da informao e o avano na compreenso ou domnio de algo, eventos que ocorrem durante a aquisio de conhecimentos e habilidades. A performance tem relao com a demonstrao de conhecimento ou habilidade, anteriormente adquiridos. Portanto, as aes

direcionadas promoo da motivao devem acontecer sobre o uso de estratgias de aprendizagem dos alunos, de modo a focalizar e contribuir para o processamento

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da informao durante o processo de aprendizagem, o que se diferencia dos incentivos pela boa performance ou pelo resultado final do processo. A questo da motivao tem um carter especial, pois ela demonstra o estado de envolvimento do aluno com determinada atividade, e fundamental no processo de ensino e aprendizagem. Segundo Bzuneck (2004b), a motivao entendida como um conjunto de fatores ou como um processo que leva, instiga ou provoca uma escolha, iniciando um comportamento que est direcionado a um objeto. Ela possibilita um repertrio variado de opes ao aluno, dotando-o de recursos ideais, que tornaro possveis escolhas autnticas e promovero resultados altamente satisfatrios, pois potencializa o nvel de interesse e de compreenso, que so os fatores geradores de uma aprendizagem plena. Nesse sentido, os alunos curiosos e excitados adquirem os recursos necessrios para direcionar aes no sentido de superar os desafios apresentados. Esta superao, por sua vez, depende de um conjunto de fatores, mas, no campo motivacional, implicar em compreender a variabilidade do nvel e da qualidade da motivao aplicada a determinada situao de ensino. O objetivo do ensino, seguindo o pensamento de Brophy (1999), dever estar centrado na obteno de um nvel mdio e constante de motivao, com uma boa qualidade, que propicie ao aluno avanar diante dos desafios. Isto quer dizer que a intensidade do envolvimento do aluno no deve ser em nvel muito baixo e nem muito alto, mas equilibrada e contnua, uma vez que os extremos podem prejudicar a motivao. Este autor afirma, portanto, que o estado de alerta, de concentrao na atividade e de envolvimento mental sustentado, ser mais produtivo quando o aluno enfrentar tarefas com maiores nveis de complexidade. No contexto educacional, o interesse motivacional do aluno deve orientar-se no sentido de possibilitar resultados positivos, impulsionando-o numa direo permanente, em que o foco principal seja o aprender. A motivao representa um grande desafio e se reflete diretamente na eficcia do processo de ensino e aprendizagem. So os comportamentos motivados, que impulsionam os alunos a se envolverem com as atividades acadmicas, proporcionando a busca e a aquisio de novos conhecimentos. O estudo da motivao no contexto escolar , portanto, relevante, tendo em vista o conhecimento por parte da escola como um todo, e, mais especificamente dos professores, de que a desmotivao dos alunos um fato presente e inegvel. Isto , o ambiente escolar, muitas vezes, no evidencia

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necessidades, no produz motivao e no estimula o aprendizado (GUIMARES, 2004a). sabido que no muito comum encontrar em sala de aula alunos motivados intrinsecamente, visto que o contexto escolar, na maioria das vezes, no promove o envolvimento nas atividades acadmicas pelo simples prazer em realizlas. Alm disso, Ryan e Deci (2000a) afirmam que a motivao intrnseca parece diminuir conforme os alunos avanam nas sries. Porm, tendo em vista estudos conduzidos por Csikszentmihalyi (1992), prefigurou-se uma concepo de que os alunos das artes em geral podem apresentar uma tendncia maior a comportamentos intrinsecamente motivados, j que as atividades desenvolvidas estimulam o prazer esttico, a sensibilidade, a emoo, o entusiasmo e a criatividade, proporcionando um envolvimento e uma concentrao natural. Csikszentmihalyi (1992) observa que os artistas e atletas so, particularmente, propensos a experimentar o fluxo1, que o estado no qual a pessoa est to mergulhada na atividade que nada mais parece ter importncia. Nessas experincias, o aluno sente-se entusiasmado com a atividade em si, no se preocupando com o que ela lhe dar em troca. Dessa forma, o estado de fluxo est relacionado diretamente com a motivao intrnseca. Por outro lado, se os alunos das artes sentem satisfao e prazer quando se trata do fazer artstico, envolvendo-se de modo profundo nesta atividade, cabe questionar o padro de envolvimento deste aluno no cotidiano de um curso de graduao em artes, caracterizado por um universo amplo de disciplinas, que vo desde as mais especficas, voltadas para o domnio de habilidades e instrumentos prprios da rea de Artes, at as disciplinas com foco pedaggico, incluindo

estgios, atividades supervisionadas, desenvolvimento de projetos entre outros? No que tange motivao intrnseca, existem outros determinantes que podem contribuir para a promoo desse tipo de envolvimento, como por exemplo, a satisfao das trs necessidades psicolgicas bsicas que so a competncia, a autonomia e o pertencimento, integrantes da Teoria da

Autodeterminao, elaborada por Deci e Ryan (2000a). Resumidamente, a necessidade de autonomia refere-se uma percepo de que a origem do comportamento interna, ou seja, existe a necessidade pessoal de perceber que a

1

A teoria do Fluxo ser detalhada no item 3.4.1

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ao ocorre por vontade prpria e no por presses externas; a necessidade de competncia diz respeito capacidade da pessoa interagir satisfatoriamente com o seu meio e a necessidade de pertencimento ou de estabelecer vnculos a percepo de que existem vnculos interpessoais estveis e duradouros. De acordo com a Teoria da Autodeterminao, a satisfao dessas trs necessidades fundamental para o desenvolvimento de orientaes motivacionais autodeterminadas, que esto diretamente relacionadas com a motivao intrnseca. Nesta perspectiva, as pessoas tm uma propenso natural para a realizao de atividades, que desafiem as habilidades j existentes ou que representem alternativas de exerccios dessas mesmas habilidades. Desse modo, as pessoas agiriam de forma espontnea, por vontade prpria e no a partir de presses externas (REEVE; DECI; RYAN, 2004). Diante disso, levanta-se outra questo: ser que a identificao com as atividades artsticas, a aplicao de esforos para a sua execuo possibilita o uso de estratgias adequadas de aprendizagem, expande/evidencia/ressalta a percepo de desempenho e, por conseguinte, relaciona-se com comportamentos motivados intrinsecamente? Assim, so estes questionamentos que impulsionam esta pesquisa. Posto isso, procurar-se- aprofundar a compreenso em torno das formas autnomas de motivao e como estas podem ser fomentadas no ambiente acadmico, visando compreender a motivao no ambiente especfico das artes. Tendo em vista que a motivao interna influenciada pelas percepes do aluno acerca do ambiente educacional em que est inserido, investigar de que modo o aluno percebe este ambiente pode auxiliar na compreenso e promoo de elementos, possibilitando a organizao deste. Alm disso, podemos contextualizar e aprimorar os pressupostos tericos, visando incentivar novas aes para a motivao e aprendizagem nos cursos de Artes de uma instituio de ensino superior do norte do Paran. Segundo Boruchovitch (2008), diversos estudos, tanto nacionais quanto internacionais tm comprovado que o aluno com motivao mais autnoma se envolve de modo mais produtivo nas atividades escolares. Num estudo realizado por esta autora envolvendo 225 alunos de um curso de formao para professores e que objetivava compreender o tipo de motivao para aprender, constatou-se a

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predominncia da motivao intrnseca, que tem como caractersticas: alto nvel de interesse, autoconfiana e persistncia diante das tarefas acadmicas. Outros trabalhos como o de Accorsi (2005) e Machado (2005) identificaram e avaliaram o uso de estratgias de aprendizagem e sua relao com os aspectos motivacionais, apresentando correlaes positivas entre a meta aprender e o uso de estratgias de aprendizagem. A meta aprender, segundo Boruchovitch (2008), se aproxima bastante das caractersticas presentes na motivao intrnseca. Verificar, ento, de que modo o uso de estratgias para a aprendizagem est relacionado com o desempenho acadmico, especificamente na rea de Artes, pode confirmar estudos j desenvolvidos em outras reas do conhecimento, colaborando assim para a composio e a estruturao do conjunto de conhecimentos relacionados motivao no contexto escolar. Ainda, possibilitar analisar possveis distines no tipo de motivao dos alunos das diversas reas da Arte, seja a msica, o teatro ou Educao Artstica, evidenciando eventuais diferenas nas estratgias para a aprendizagem utilizadas por estes alunos. Tendo em vista os questionamentos apresentados, neste estudo buscar-se- identificar como a satisfao das necessidades bsicas (competncia, autonomia e pertencimento) se relaciona com os tipos autnomos de motivao destes estudantes. Tambm ser investigada a relao entre os tipos de motivao e o uso de estratgias de aprendizagem. Assim, inicialmente sero discutidos alguns aspectos relacionados motivao e aprendizagem e na sequncia, da motivao dos alunos no ensino superior. Nos captulos seguintes, as teorias que sustentaro esta pesquisa sero abordadas, quais sejam, Teoria da Autodeterminao, com seus construtos motivao intrnseca e extrnseca; Teoria do Fluxo e alguns aspectos referentes ao uso de estratgias de aprendizagem. Por fim, sero apresentados os resultados e a discusso dos dados obtidos com a pesquisa.

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2 MOTIVAO E APRENDIZAGEM

Etimologicamente, segundo Bzuneck (2004b, p.9), a palavra motivao de tem sua origem no verbo latino movere, cujo tempo supino motum e o substantivo motivum, determinam semanticamente a palavra motivo. Portanto, a motivao pode ser definida como [...] aquilo que move uma pessoa ou que a pe em ao ou a faz mudar o curso. Nessa direo, o Dicionrio Houaiss da Lngua Portuguesa define a motivao como um conjunto de processos que do ao comportamento uma intensidade, uma direo determinada e uma forma de desenvolvimento prprias da atividade individual (HOUAISS; VILLAR; FRANCO, 2004, p.1968). Face s duas consideraes, pode-se compreender a motivao, de um modo geral, como aquilo que impele uma pessoa a ter determinado comportamento ou atitude e, no mesmo sentido, empreender uma ao diante de determinada situao ou circunstncia. No contexto escolar, as concepes de Brophy (1999) sobre motivao, trouxeram importantes contribuies para o estabelecimento das diferenas existentes entre motivao direcionada ao aprendizado e motivao para o desempenho ou performance. Uma importante contribuio deste autor reside no esclarecimento sobre a distino entre a motivao no contexto de sala de aula e a motivao em outros ambientes. Aprender diz respeito ao processamento da informao, buscar sentido e avanar na compreenso ou assimilao, que acontece quando algum est adquirindo conhecimento ou habilidade, enquanto que performance diz respeito demonstrao de conhecimentos ou habilidades anteriormente adquiridos. A motivao para aprender, segundo Brophy (1999 p.2) [...] pode ser considerada ou como uma disposio geral ou como um estado especfico de uma situao. Isso significa dizer que os alunos que esto orientados para aprender, norteiam-se para a conquista de conhecimentos, ou seja, almejam habilidades ou o aperfeioamento dessas habilidades. Eles no se negam a enfrentar os desafios, esforam-se de modo persistente, procurando deter o controle sobre a tarefa e envolvem-se mais profundamente na busca de solues criativas para as inquietaes decorrentes das dificuldades que surgem (BROPHY,1999).

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Evidentemente, estes alunos no se interessam por todas as atividades indiscriminadamente, mantendo suas preferncias provenientes de sua histria pessoal, profissional, entre outros. Entretanto, conseguem separar estes elementos de cunho pessoal, tirando proveito da atividade, percebendo esta de modo significativo e importante para si, e por vezes, ampliam o seu leque de preferncias, acomodando atividades outrora desinteressantes (BROPHY,1999). De outro lado, para alunos focados excessivamente na performance ou no virtuosismo, segundo Bzuneck (1999), os resultados so associados ao nvel de capacidade (p.56). Este mesmo autor afirma que o ambiente de sala de aula tem particularidades que, no tocante a motivao, difere substancialmente de outros ambientes, seja do trabalho, lazer, entre outros. Estas diferenas se do pela prpria obrigatoriedade da presena do aluno dentro da sala de aula, contedos curriculares e atividades previamente definidas, nmero elevado de alunos nas classes que inviabilizam um atendimento mais individualizado, a atribuio de notas pelo desempenho em trabalhos e provas etc. Estas caractersticas, inerentes ao ambiente escolar, nos levam a crer que uma atuao mais apropriada, preparada e adequada do professor se faz necessria. Percebe-se, que os professores enfrentam dificuldades para motivar seus alunos, especialmente pelos motivos elencados acima. Os contedos obrigatrios a cumprir em tempo pr-determinado, alm do escasso tempo de atendimento mais individualizado do aluno, so os aspectos mais relevantes dessa situao escolar que privilegia o fracasso. De acordo com Tollefson (2000), o fracasso dos alunos pode provocar conflitos entre professores e alunos e tem consequncia tambm na motivao destes ltimos. So diversos os aspectos condicionantes deste fracasso e, de modo geral, as causas atribudas pelos alunos vo desde a alegao de que o contedo chato, difcil, as recompensas dadas pela realizao da tarefa so insignificantes ou mesmo a fatores incontrolveis e externos como, por exemplo, no conseguir enviar o arquivo por e-mail ou dizer que o livro da biblioteca j estava emprestado. Por parte do professor, h resistncia em aceitar a crtica de que sua matria desinteressante ou de que eles no a estariam tornando interessante, culpando assim o prprio aluno pelo desinteresse. Os professores no aceitam as justificativas dos alunos fundamentadas em fatores externos ao ambiente escolar, abstendo-se, desse modo de assumirem as responsabilidades pelas suas omisses.

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Ainda de acordo com Tollefson (2000), os professores podem ter uma crena de auto-eficcia pessoal muito baixa, isto , a autopercepo negativa em relao a sua capacidade de ensinar. Nesses casos, atribuir o fracasso dos alunos a fatores externos e fora do seu controle pessoal, tais como a baixa capacidade dos seus alunos, s falhas no sistema educacional, falta de apoio familiar, entre outros, pode ser um meio para proteger seu senso de auto-eficcia. Um crculo vicioso se forma para justificar ambos os comportamentos. O aluno, com baixo desempenho escolar, culpa o professor pelo fracasso da sua aprendizagem e o professor, acreditando que o aluno o nico responsvel pelo seu fracasso, no se empenha em motiv-lo para a aprendizagem. Um estudo de grande amplitude conduzido pela Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO) no Brasil no ano de 2004, envolvendo cerca de 5.000 docentes de todas as unidades da federao e que visava traar o perfil dos professores brasileiros, mostrou que, dentre uma listagem de fatores possveis, a relao professor/aluno recebeu 53,9% das indicaes sendo, para os docentes, o segundo fator de maior importncia no processo de aprendizagem. Em primeiro lugar, o fator acompanhamento da famlia foi apontado pelos professores como o aspecto que mais influencia a aprendizagem, com 78,3% de indicaes (UNESCO, 2004). Confirmam-se, com estes dados, que os professores atribuem a fatores externos escola a maior responsabilidade pelo fracasso do aluno, mantendo a instituio e o corpo docente numa posio intocvel. Relativo ao aspecto do fracasso do aluno, Casassus (2002) observou que professores mais reflexivos e autnomos em sua prtica tm alunos com melhores desempenhos acadmicos. Ele afirma que, em relao s atribuies causais, aqueles professores que atribuem a causa do sucesso ou do fracasso dos seus alunos a fatores externos, geralmente familiares, apresentam estudantes com menores desempenhos. Alunos que obtm melhores rendimentos tm professores que trazem para si a responsabilidade do sucesso ou do fracasso escolar, isto , professores que centram as atenes nas prprias habilidades e nas dos estudantes bem como nas estratgias de ensino. Segundo Bzuneck (2004c), a motivao como objeto de

socializao, no pode ser ensinada e nem treinada, mas cabe ao professor o papel de motivar os seus alunos, sendo, portanto, indispensvel que se leve em conta, antes da ao pedaggica, rever certas atitudes negativas e crenas errneas que

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os professores podem ter e que poderiam colocar em perigo o seu trabalho de socializao para uma motivao positiva. Pode-se perceber, portanto, que analisar a motivao no contexto escolar implica em abordar um processo que envolve diversos fatores e que recai diretamente no comportamento do aluno. Nesse sentido, Tapia (2004) afirma que a motivao est relacionada interao dinmica entre as caractersticas pessoais do aluno e o contexto em que as atividades escolares acontecem.

2.1 A Importncia do Contexto de Sala de Aula para a Motivao Escolar

A necessidade de viver em coletividade prpria do ser humano e necessria, inclusive, para sua prpria sobrevivncia, tornando-o dependente das relaes sociais. Significa dizer que inerente ao ser humano buscar e assimilar os valores ambientais e as prticas culturais prescritos socialmente. So estas relaes sociais que possibilitam a insero das pessoas na sociedade e acontecem principalmente na famlia, no trabalho e na escola. A escola entendida como espao de explorao e realizao de prticas sociais que fortaleam a construo de uma identidade pessoal e social, caractersticas que a tornam um espao de pesquisa sobre a motivao do aluno extremamente importante. Quando analisamos os focos das pesquisas sobre a motivao, percebe-se que a partir das dcadas de 60 e 70 surge um novo olhar para os estudos da motivao a cognio, que se conserva at os dias atuais. Esta nova abordagem, chamada de cognitivista, trouxe novas perspectivas tericas e empricas para a motivao. O centro principal das pesquisas no campo motivacional est nos aspectos cognitivos do comportamento humano, prevalecendo, nas pesquisam que utilizam esta abordagem terica, as situaes naturais de desempenho,

contrariamente abordagem comportamental, que focaliza o aspecto funcional dos estmulos ambientais para apresentao e manuteno do comportamento. Bzuneck (2004b, p.23), assegura que as melhores contribuies das pesquisas atuais originam-se de estudos que enfocam o contexto de sala de aula, priorizando a abordagem cognitivista ou sociocognitivista. Alm disso, o autor ressalta que as abordagens motivacionais tm enfatizado os [...] componentes cognitivos ou pensamentos, como metas, crenas, atribuies, percepes, ressaltando-se entre

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elas as percepes de competncia e as crenas de auto-eficcia, portanto, variveis ligadas ao self. Brophy (1999) tambm concorda com a importncia de introduzir o contexto especfico da sala de aula nas pesquisas sobre a motivao escolar e assinala as diferenas existentes entre o contexto laboratorial ou experimental e o contexto de sala de aula. Neste ambiente, existem diversos fatores que influenciam a motivao dos alunos, tais como, obrigatoriedade de frequncia na escola, contedos curriculares e atividades de aprendizagem previamente definidas, nmero elevado de alunos nas classes, inviabilizando o atendimento individualizado, atribuio de notas pelo desempenho em trabalhos e provas, entre outros, aspectos que, em pesquisas de laboratrio no podiam ser considerados. Todos estes aspectos, relacionados com a motivao dos alunos, evidencia a importncia da relao professor e aluno. Esta relao, primordial no processo de aprendizagem, tem se modificado enormemente ao longo das ltimas dcadas, passando de aceitao, reverncia e considerao por parte do aluno desobedincia, indisciplina e, inclusive, violncia, tornando o ambiente de sala de aula bastante conturbado. Confirmando esta percepo, destaca-se uma pesquisa recente realizada entre 2007 e 2008 pela Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico (OCDE), chamada "Pesquisa Internacional de Ensino e Aprendizagem", que visava levantar dados sobre o funcionamento das escolas de 23 pases. Nesta pesquisa, confirmou-se que o professor brasileiro dedica uma quantidade significativa de tempo (cerca de 18%) tentando manter a disciplina em sala de aula (OCDE, 2009). Guimares (2004b) destaca que vrias pesquisas cientficas relacionadas interao entre professor e aluno evidenciaram a importncia de se promover, na sala de aula, um ambiente que favorea o estabelecimento de vnculos seguros. A autora afirma ainda, que o fortalecimento dos recursos internos dos alunos, proveniente da satisfao da necessidade de pertencimento, pode representar um maior envolvimento destes com as atividades de aprendizagem e, consequentemente, um melhor desempenho acadmico. importante salientar que a percepo de aceitao torna o aluno mais motivado e mais comprometido com a prpria educao e, consequentemente, pode-se esperar um melhor aproveitamento e melhores resultados de aprendizagem (GUIMARES, 2004b, p.196).

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So as relaes sociais que inserem as pessoas na sociedade e essas relaes acontecem na famlia, no trabalho e na escola. Na literatura cientfica, evidenciam-se cada vez mais os estudos e as pesquisas voltadas para as relaes entre as pessoas. Estas relaes sociais diversas estabelecidas pelos alunos sejam com os pais, com o contexto especfico de sala de aula, com o professor, bem como as variveis pessoais e contextuais dos estudantes tm influncia direta sobre a sua motivao. Neste aspecto, Eccles e Midgley (1989), enfocando o adolescente, argumentam que ajustar as necessidades de desenvolvimento deste com o ambiente educativo fundamental para otimizar os benefcios motivacionais. Uma pesquisa de carter misto (estudo de caso e conjunto de dados quantitativos) realizada por Mansfield (2001) investigou as percepes do contexto de estudantes do primeiro ano do ensino mdio, objetivando compreender como aquele ambiente influenciou as percepes pessoais de natureza acadmica e as metas motivacionais sociais buscadas pelos estudantes. Os resultados revelaram que os estudantes perseguiam uma gama de objetivos sociais e acadmicos ao longo do ano e que esses objetivos foram significativamente influenciados pelas suas percepes do contexto escolar e pelo ambiente concreto de sala de aula. Certas variveis contextuais avaliadas nesse estudo como, por exemplo, a relao professor/aluno, utilizao de incentivos extrnsecos e a ateno cuidadosa, influenciaram os sentimentos sobre a escola de forma positiva e negativa. Os resultados permitiram concluir que a relao com a escola pode estar relacionada com os objetivos pessoais dos estudantes. A importncia do apoio oferecido pelos professores e a influncia que este apoio exerce no envolvimento dos alunos com as atividades escolares e com contexto foram levantadas num estudo realizado por Osterman (2000). A influncia do apoio dado pelo professor ao aluno foi, segundo os dados dessa pesquisa, superior ao apoio familiar e dos colegas, possibilitando uma compreenso mais precisa dos motivos atribudos falta de motivao dos alunos. Os problemas motivacionais so falsamente relacionados com causas internas do aluno, seu ambiente familiar ou relaes com os seus colegas, desconsiderando-se as interaes com o professor como importante fator motivacional. Alguns estudos, Ryan e Grolnick (1986), Ryan e La Guardia (2000) e Reeve (2002, 2006),

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entretanto, fortalecem a idia de que as aes do professor devem estar voltadas para a satisfao da necessidade de pertencimento dos alunos. Silva (2004), numa pesquisa sobre motivao desenvolvida com alunos e professores de Fsica do Ensino Mdio de escolas pblicas do estado de So Paulo, demonstrou a importncia das interaes entre professor e aluno. O autor estabeleceu algumas dimenses para analisar os dados coletados e uma delas se referia interao entre professor e aluno e sua relao com a motivao. Nesse sentido, os resultados da pesquisa possibilitaram a constatao de que os alunos consideram o professor como um elemento importante para a sua motivao. O discurso dos alunos ainda permitiu inferir que uma grande parte da motivao do aluno decorrente do sentimento de bem estar na sala de aula, ser respeitado e includo, alm de fazer parte dos dilogos, ser ouvido e poder se expressar. Reeve, Deci e Ryan (2004) afirmam que o ambiente de sala de aula tem a fora de fomentar ou de impedir a natureza ativa dos alunos e seus esforos para a autodeterminao. Estas influncias podem ser objetivas ou circunstanciais, como por exemplo, atividades interessantes ou recompensas. As outras influncias so as relaes interpessoais, que incluem as relaes com outras pessoas como pais, professores e colegas ou ainda grupos, comunidades ou organizaes. Estas ltimas so focalizadas pela Teoria da Autodeterminao, pois refletem relaes desiguais, nas quais pessoas de maior posio ou experincia, como a condio dos professores, tentam motivar os alunos. Esta relao de carter desproporcional indica que de responsabilidade do professor influenciar a motivao do seu aluno e no a forma inversa, embora no se desconsidere a ao comportamental do aluno sobre a motivao do professor. Ento, se a qualidade da motivao e do envolvimento do aluno est diretamente associada natureza das interaes entre professores e alunos, fomentar um contexto adequado aprendizagem se coloca como um caminho a exercitar. Ames (1984) identifica trs tipos de estruturas que podem ser fomentadas nos ambientes de sala de aula: a individualista, a cooperativa e a competitiva. A autora enfatiza que cada uma delas tem repercusses para a motivao e o rendimento acadmico dos aprendizes. As formas de interao que predominam no ambiente de sala de aula so a individualista e a competitiva, permanecendo a aprendizagem cooperativa margem desse processo (BERRY, 2003). Para Hall (2004), a aprendizagem

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cooperativa uma forma de ensino em que estudantes trabalham juntos, em pequenos grupos, em busca de objetivos comuns. Para este autor, so diversas as caractersticas positivas dessa estrutura de sala de aula como, por exemplo: a interao do grupo que possibilita maior aproximao, a interdependncia positiva, em que os alunos ajudam-se mutuamente, desenvolvimento de habilidades de cooperao (saber ouvir e respeitar os colegas, consenso sobre determinado aspecto, feedback adequado), monitoramento, responsabilidade, etc. Outros benefcios relacionados a esta prtica esto o aspecto da complementaridade do trabalho do professor e o estimulo discusso, o debate e o ensino entre os estudantes. Com a intensificao das pesquisas sobre essa modalidade, especialmente a partir de meados da dcada de 70 at os dias de hoje, resultados significativos para educao se tornaram possveis. Segundo Johnson e Johnson (2009), os estudos que focalizam a aprendizagem cooperativa, especialmente por meio da Teoria da interdependncia social, superam o nmero de 1200 nas ltimas dcadas, propiciando descobertas que validaram, modificaram, ampliaram e melhoraram as teorias utilizadas, interferindo nos procedimentos referentes ao papel do professor, especialmente quanto ao emprego formal ou informal da

aprendizagem cooperativa. Outra estrutura relevante a se considerar no ambiente escolar a competitiva. Segundo Bzuneck e Guimares (2004), ela no est restrita sala de aula, mas tornou-se caracterstica de uma instituio escolar como um todo. Ela ganha relevo desmedido, tanto pela escola enquanto estrutura organizadora do ensino, quanto pelos professores nas suas aes educativas em sala de aula. As instituies escolares e os professores acreditam que a estratgia de competio entre alunos uma maneira adequada de ensino, que estimular o aprendizado por meio de desafios competitivos e que despertar o interesse em estudar. Para Brotto (1999), a competio um processo de interao social que acontece geralmente por meio de aes isoladas, em que os objetivos so mutuamente exclusivos e os benefcios ficam limitados apenas para alguns. O compromisso exterior aos objetivos e funo da escola, atendendo somente aos anseios de um sistema institucionalizado impregnado de graves violaes normativas e que desvia de si a responsabilidade pedaggica, estando aprisionada aos resultados.

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Para Bzuneck e Guimares (2004), o clima competitivo em sala de aula incentiva uma busca veemente no intuito de conquistar o primeiro lugar, estar em evidncia, ser o melhor, mostrar-se superior em relao aos demais, sobretudo, no ambiente escolar em termos de notas. E esses objetivos so referendados pelo professor, pois ele acredita firmemente nas vantagens motivacionais de um contexto com a predominncia de um clima competitivo entre os alunos, cristalizando a idia de que alguns so mais capazes do que outros. No entanto, como consequncias da implementao de situaes competitivas na escola podem ser elencadas a falta de motivao posterior e o baixo rendimento dos alunos que no so os vencedores, ou seja, a maioria. H ainda outro aspecto alertado por Dubet (2003), chamado de questionamento silencioso. Reside numa situao em que os alunos malsucedidos descobrem pouco a pouco que seu trabalho no se paga, que eles no conseguem obter resultados honrosos apesar de seus esforos (p. 41). O retraimento seria ento uma sada honrosa, pois participar de uma competio na qual no h chance de vitria significa aceitar um jogo que provoca a autodiminuio. Desenvolve-se ento um crculo vicioso em que o professor entende que o recolhimento manifestado pelo aluno mera falta de motivao, uma forma de livrar-se das crticas. Da parte do aluno evidencia-se a aceitao plena de uma longa histria de fracassos, realimentada historicamente pela crena na competio como maneira positiva de provocar desafios com vistas ao aprendizado (DUBET, 2003). O agravamento da situao escolar em que a competio tem papel preponderante se d, em boa parte, pela crena dos professores acerca do valor deste tipo de estratgia de ensino. O professor acredita que esta postura facilitadora da disputa entre os alunos propiciar a motivao necessria para um aprendizado ou para a realizao de uma determinada tarefa. Esta crena arraigada dos professores em relao aos benefcios competio como prtica pedaggica, segundo Bzuneck e Guimares (2004), est vinculada ao mundo dos esportes em geral e principalmente nos sistemas de produo e de trabalho. Dubet (2003) sustenta que os defensores desse modelo educacional crem na mobilizao da escola a servio do desenvolvimento econmico. Para estes o investimento escolar considerado um investimento produtivo, a prazo [sic] a formao uma fora produtiva (p.34). Este foco no resultado caracterstica

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predominante na ao pedaggica da escola do sistema capitalista que admite vencedores e perdedores, julgando esse processo como natural e legtimo. Kamii (1991 apud MESQUITA, 1999) sustenta que a competio num sistema scio-econmico difere da competio no ambiente escolar, pois o objetivo principal em um sistema scio-econmico o ganho material. Outros fatores como a no concordncia com regras antes de entrar na competio e a tentativa permanente de eliminar concorrentes so caractersticas desse ambiente, diferindo substancialmente daquelas que compem o ambiente escolar. H ainda outro aspecto que se refere ao apoio dado por governos, seja na instncia federal estadual ou municipal, a iniciativas relacionadas competio escolar, por meio das olimpadas de Matemtica, Portugus e de outras disciplinas, que almejam criar um referencial dentro de sala de aula, ou seja, um aluno destaque, na crena de que ele possa ser seguido pelos demais e respeitado por estes. Este processo, na prtica, representa um modelo de seleo que caminha no sentido inverso do objetivo educacional de qualquer instituio escolar, qual seja o de valorizar todos os alunos da escola, respeitando e considerando as diferenas, proporcionando um processo de escolaridade que privilegie conhecimentos, habilidades e competncias para uma ao crtica na sociedade. Bzuneck e Guimares (2004) enfatizam resultados de pesquisas que assinalam uma desqualificao do esforo pelos alunos quando em ambiente competitivo. Os resultados indicam que, tanto para o sucesso quanto para o fracasso, predomina o fator sorte em detrimento do emprego de maior ou menor esforo. Outro aspecto importante a ser ressaltado refere-se aos sentimentos decorrentes do sucesso no estarem associados a uma melhor aprendizagem, mas sim ao triunfo sobre os demais. Com base em Bzuneck e Guimares (2004), podem-se elencar diversos aspectos negativos decorrentes do emprego da competio em sala de aula: o destaque para as diferenas individuais; a induo dos alunos comparao social; a busca pelo sucesso e rendimento sempre em relao aos seus pares em vez de focalizar a prpria aprendizagem; a promoo de relacionamentos de oposio; o fracasso em contextos competitivos prejudicial para a auto-estima; a insatisfao em relao ao fracasso acentuada em climas competitivos; os alunos em competio desqualificam o papel do esforo como

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aprendizagem prejudicada em situaes de competio; os alunos no consideram seus desempenhos anteriores, pelo contrrio, fixam-se nas pistas fornecidas pela prpria situao competitiva; a competio contribui para a reduo da motivao intrnseca e promove a motivao extrnseca (alunos so movidos pelo objetivo de vencer); os contextos competitivos chamam a ateno para a capacidade individual; a competio tende a fortalecer as crenas sobre o aspecto inato e fixo da inteligncia, pois destaca apenas o resultado final de vencer ou fracassar. Assim, percebe-se constantemente que o momento histrico atual fortemente marcado pelo provisrio, momentneo e passageiro, fatores que contribuem consideravelmente para o enfraquecimento de uma imagem social de escola, especialmente quando admitimos esta escola apenas como simples produto da sociedade e para a sociedade. Com a valorizao do ambiente competitivo na escola, incorre-se no possvel aprofundamento das diferenas, uma nfase da falta de oportunidades e na produo de um enorme nmero de derrotados ante um reduzido nmero de vencedores. Nesta sesso abordou-se um conjunto de aspectos relacionados ao contexto de sala de aula. Pode-se concluir, quanto s aes do professor, que estas s estaro voltadas para a satisfao das necessidades de autonomia, competncia e pertencimento dos alunos caso o professor esteja disposto para a mudana e tenha inteno e interesse em atender s expectativas dos alunos. Para isso, o conhecimento das diversas abordagens tericas sobre a motivao e a insero destas na ao prtica, possibilitar a compreenso e interpretao das diferentes situaes do contexto escolar e do aluno nele inserido. Essa ao reflexiva contribuir de forma efetiva para a motivao e conseqente aprendizagem dos alunos. Percebe-se, portanto, que a anlise da motivao no contexto escolar implica na abordagem de um processo que envolve um conjunto de fatores, que interagem de modo dinmico, seja pelas caractersticas individuais dos alunos ou pelo contexto em que as atividades acontecem, incidindo, de qualquer modo, no comportamento do aluno.

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2.2 Motivao no Ensino Superior

Ao contrrio do que muitas pessoas podem pensar em relao a motivao de alunos, ela diminui medida que as sries avanam (Stipek (1998). Assim, poder-se-ia erroneamente crer que, os estudantes, na medida em que crescem e evoluem como um todo, seja biologicamente ou intelectualmente, apresentariam melhores condies de compreender carncias essenciais para seu desenvolvimento e de serem protagonistas no ambiente de aprendizagem que a escola, com o intuito de mover-se em direo aquisio constante de saberes e competncias, sustentadoras de um individuo autnomo e auto-regulado. No entanto, no esta a realidade educacional do contexto universitrio. Quando se entra em salas de aula de educao infantil, por exemplo, percebe-se, de forma bastante evidente, o ambiente de curiosidade, interesse e ateno manifestado por alunos dessa faixa etria em relao as atividades propostas e conduzidas pelo professor. Entretanto, quando se adentra em salas de aula das sries subsequentes educao infantil, at o ensino universitrio, observam-se de um modo geral, comportamentos que revelam sentimentos de desinteresse, descontentamento e desmotivao. Diversos estudos comprovam esta afirmao como, por exemplo, Jacobs e Newstead (2000), Ruiz (2005) e Stipek (1998). Alm destes, outros estudos conduzidos em Portugal por Cunha (2002), Rosrio et al. (2004) e Silva et al. (2004) estabeleceram uma relao negativa entre o avano dos alunos nas sries e a presena comportamentos autoregulados. Mesmo estudos realizados com outro enfoque terico que no o utilizado neste trabalho reforam esta premissa. Por exemplo, Caldas e Hubner (2001), numa pesquisa comparativa entre alunos de 1 8 sries, afirmaram que os alunos se desinteressam das atividades propostas, sentem-se inseguros e descontentes com a escola e nutrem sentimentos de resistncia e objeo escola da qual fazem parte na medida em que o processo serial de ensino avana. Pintrich (1994), focando especificamente os alunos de ensino superior, concebeu um modelo bastante abrangente e elucidativo para explicar a motivao do aluno. Este modelo engloba quatro componentes principais que so o contexto sociocultural, os fatores relacionados ao ambiente em sala de aula, os fatores internos ao aluno e o comportamento motivado em si.

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O componente sociocultural relacionado por Pintrich (1994) diz respeito s atitudes, crenas e comportamentos que os estudantes apresentam quando chegam universidade, e que esto amparados nas suas experincias anteriores, como por exemplo, origem tnica, classe social, entre outros. Outro aspecto relacionado ao ambiente de sala de aula se refere ao comportamento do professor (linguagem controladora ou no controladora), ao mtodo utilizado centrado na figura do professor ou o tipo de tarefa dada. Os fatores internos ao aluno, segundo este autor, esto relacionados com os sentimentos, percepes, necessidades e metas, e por ltimo, o item comportamento motivado em si, caracteriza-se pelos comportamentos reais e observveis (por exemplo, fazer as atividades de forma apenas parcial, sair constantemente de sala de aula, conversar com colegas durante exposio do professor). Especificamente, em uma sntese da literatura a respeito do assunto motivao no ensino superior, Boruchovitch (2008), afirma que diversos estudos sobre a motivao para aprender vm sendo conduzidos ao longo dos ltimos anos no Brasil, visando compreender melhor essa faixa de ensino, como por exemplo, (ALCAR, 2007; CARDOSO, 2002; GOMBI, 1999; GUIMARES, 1996;

GUIMARES; BZUNECK; SANCHES, 2002; MACHADO, 2005; SOBRAL, 2003; ZANATO, 2007; ZENORINE; SANTOS, 2004). Ainda segundo esta autora, os estudos nacionais e internacionais evidenciam que a motivao intrnseca est alinhada a melhores resultados de aprendizagem e ao uso de estratgias de aprendizagem de processamento profundo da informao, quando comparada motivao extrnseca. Boruchovitch (2008), ao analisar o conjunto de estudos realizados desde 1996 at 2007, assegura que eles apresentaram resultados que possibilitam inferir por um certo predomnio da motivao intrnseca, destacadamente nos alunos de sexo feminino, gnero que apresentou taxas mais altas deste padro motivacional. Bzuneck (2005), com o objetivo de avaliar os resultados das pesquisas nacionais sobre a motivao dos alunos no contexto universitrio, conduzidas at 2005, j afirmava que, independentemente do nmero pequeno de estudos realizados, as informaes obtidas revelam alguns indcios que podem colaborar para a atuao dos professores em sala de aula, pois apontam em que grau os alunos se caracterizam como orientados intrnseca ou extrinsecamente.

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Mesmo com algumas constataes recorrentes numa anlise dos aspectos da motivao de alunos de cursos superiores, manifestadas nos estudos realizados no exterior e no Brasil, relatados anteriormente, reconhece-se a multiplicidade dos fatores que afetam a motivao de estudantes universitrios e que foram evidenciados pelo modelo apresentado por Pintrich (1994). Diante da relevncia do construto motivao para aprender, da escassez de estudos sobre esse tema nos cursos superiores em geral, e tambm nos cursos de Artes, a presente pesquisa pretende buscar um aprofundamento na compreenso das orientaes motivacionais dos alunos e contribuies tericas e prticas para a motivao no contexto escolar. Fica evidente, a partir do exposto, que os resultados dos estudos sobre a motivao dos alunos no ensino superior tm muito a contribuir para o contexto educacional, j que possibilitam uma melhor compreenso das atitudes e dos comportamentos motivacionais dos alunos frente ao processo de aprendizagem, podendo, assim, indicar novas direes para as aes dos professores. No prximo captulo ser apresentada a Teoria da Autodeterminao, as sub-teorias que a integram e a motivao intrnseca e extrnseca, as quais nortearo teoricamente a presente pesquisa.

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3 TEORIA DA AUTODETERMINAO

A Teoria da Autodeterminao (TAD) foi elaborada pelos americanos Edward Deci e Richard Ryan na dcada de 1970 com a finalidade de compreender os elementos componentes da motivao intrnseca e extrnseca, bem como dos fatores relacionados com a sua promoo. Esta teoria pressupe que todos os indivduos so, por natureza, ativos e auto motivados, curiosos, interessados, ansiosos pelo xito. Entretanto, a teoria reconhece que as pessoas podem agir de forma passiva ou hostil ou ainda serem alienadas, mas tais aes resultam da interao entre as pessoas, da natureza individual, das atividades especficas e dos ambientes sociais, que podem apoiar ou contrariar essa natureza. Seu propsito primordial est concentrado no alcance de uma explicao de como as tendncias naturais para o crescimento e as necessidades psicolgicas interagem com as condies socioculturais (DECI; RYAN, 2000; REEVE; DECI; RYAN, 2004). A TAD uma abordagem psicolgica que se ops frontalmente a uma das principais correntes tericas da psicologia, o Behaviorismo, influenciada pelo trabalho do psiclogo americano Burrhus Frederic Skinner (1904-1990), de grande predominncia na dcada de 1960 e que, essencialmente, acreditava na relao funcional entre condies de estmulos e o comportamento. Para Guimares e Boruchovitch (2004), a contraposio de Edward Deci teoria behaviorista estava baseada no argumento de que pessoas motivadas intrinsecamente, inevitavelmente precisariam se sentir competentes e autodeterminadas e que os comportamentos intrinsecamente motivados seriam independentes de consequncias

operacionalmente separadas. Ainda segundo Guimares e Boruchovitch (2004, p.144) a base inicial para a Teoria da Autodeterminao a concepo do ser humano como organismo ativo, dirigido para o crescimento, desenvolvimento integrado do sentido do self e para integrao com as estruturas sociais. Reeve, Deci e Ryan (2004) evidenciaram que a autodeterminao uma tendncia humana inata e est relacionada motivao intrnseca. Nessa perspectiva, as pessoas tm uma propenso natural para a realizao de suas atividades que desafia as habilidades j existentes. Desse modo, as pessoas agiriam de forma espontnea, por vontade prpria e no a partir de presses externas. No entanto, os contextos de convivncia social podem tanto fortalecer quanto prejudicar o desenvolvimento de tal potencialidade.

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Na perspectiva dessa viso terica, todo ser humano internamente constitudo por algumas necessidades psicolgicas bsicas, consideradas como sustentadoras de uma relao efetiva e saudvel deste com o seu ambiente. Estas necessidades psicolgicas bsicas, segundo a Teoria da Autodeterminao so: a necessidade de autonomia, a necessidade de competncia e a necessidade de pertencimento. Segundo Ryan e Deci (2000b), a satisfao dessas necessidades parece ser indispensvel para desenvolver a sensao de bem-estar e de apoio para a concretizao das tendncias naturais para o crescimento e integrao do organismo com seu ambiente. A Teoria da Autodeterminao apresentada como uma macroteoria da motivao e que possibilita conhecer melhor a motivao das pessoas. No contexto educacional, ela se volta promoo do interesse dos estudantes pela aprendizagem, considerando, de modo irrestrito, o valor da educao e salienta a necessidade de confiana dos alunos nas prprias capacidades e atributos (GUIMARAES, 2003). Quatro subteorias foram elaboradas nesta perspectiva terica: Teoria das Necessidades Bsicas, Teoria da Avaliao Cognitiva, Teoria da Orientao de Causalidade e Teoria da Integrao Organsmica. Seus proponentes, Ryan e Deci (2002) destacam que cada uma delas tem um foco especfico, permitindo, quando examinadas de modo coordenado, a compreenso do amplo conjunto que constitui a motivao humana.

3.1 Teoria das Necessidades Bsicas

So trs as necessidades bsicas que propiciam motivao intrnseca e formas mais auto reguladas de motivao extrnseca: a necessidade de autonomia, de competncia e de pertencimento (RYAN; DECI, 2002). Estas trs necessidades psicolgicas bsicas podem ser assim entendidas: a necessidade de autonomia compreende os esforos do indivduo para ser a causa, perceber-se na origem de suas aes com o intuito de determinar o prprio comportamento. As pessoas autnomas acreditam naturalmente que so capazes de realizar uma atividade por vontade prpria e no por presses externas. Este sentimento de liberdade possibilita a satisfao dos seus prprios interesses e

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a livre considerao da relevncia ou importncia, para si mesmas, dos valores sociais, morais ou de costumes. Um aspecto primordial referente necessidade de autonomia diz respeito ao lcus, que se refere ao local de origem da ao, interno ou externo. Representa, em outras palavras, o grau em que um indivduo acredita que sua vida se encontra sob seu prprio controle ou sob o controle dos outros. Segundo Reeve, Deci e Ryan (2004), os alunos so considerados autnomos quando percebem um locus de causalidade interno (origem interna da ao), sentem um alto nvel de liberdade e baixa presso e visualizam a possibilidade de escolha no decorrer de suas atividades. Elas tambm estabelecem suas prprias metas, projetando as aes que sero necessrias para a consecuo deste propsito, avaliam constantemente estas aes, verificando os acertos e erros resultantes do processo. Por outro lado, Guimares (2004a), em relao ao locus de causalidade externo, assegura que a pessoa com este tipo de percepo cr que o bom ou o ruim que lhe acontece est determinado pelo acaso, pela sorte ou pelo poder de presso dos demais. Segundo a autora, a pessoa se percebe como uma marionete, cultivando sentimentos de fraqueza, ineficcia ou obrigao perante as diversas situaes que lhe so apresentadas, causando desvios de ateno e consequente prejuzo da motivao intrnseca. imperativo, entretanto, em relao ao locus de causalidade, ressaltar seu carter varivel. Ele no se posiciona de modo uniforme, perene ou contnuo ou, ainda, fixado em um extremo interno ou externo, de modo inaltervel. De acordo com Guimares (2004a, p.41) [...] o locus de causalidade no uma caracterstica fixa na vida do indivduo. Isto quer dizer que em determinadas situaes a pessoa pode perceber-se em um nvel intermedirio entre o locus de causalidade interno e externo. A necessidade de autonomia enfatizada pelos autores da Teoria da Autodeterminao foi questionada, contestada e, por vezes confundida com independncia, liberdade ou ampla permissibilidade, ou mesmo laissez faire, afirmando que, esta necessidade, evidenciada pelos proponentes da Teoria da Autodeterminao, era apenas um ideal cultural ocidental, e no uma necessidade universal. Para Deci e Ryan (2000), entretanto, ela envolve um sentimento de vontade, de iniciativa, de sentir-se causa da ao, no excluindo, assim, o sentimento de ligao e conexo com outras pessoas. O oposto de autonomia no

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dependncia, mas sim, heteronomia. Nesta perspectiva terica, o ambiente social precisar fornecer os nutrientes adequados para um funcionamento psicolgico humano em nvel mais perfeito. A necessidade de competncia est relacionada tendncia da pessoa para se sentir capaz de interagir satisfatoriamente com o seu meio, obtendo uma sensao de segurana, confiana e eficincia no desenvolvimento das aes. Ela reflete a necessidade de sentir-se eficaz, auto-confiante no seu esforo e na sua capacidade de alcanar os resultados pretendidos. Segundo Guimares (2004a), trata-se de um comportamento intrnseco, pois favorece uma reciprocidade em relao ao exercida. Com este entendimento, o sentimento de contentamento em prevalecer sobre determinado desafio e o consequente crescimento da competncia, resultante deste domnio, possibilitariam emoes positivas, e, portanto, benfico psicologicamente. Guimares (2003) afirma que o sentimento de competncia, por si s, incapaz de promover a motivao intrnseca. Para esta autora, a presena da percepo de autonomia indispensvel, pois esta necessidade traz consigo a valorizao da sensao de liberdade pessoal e o sentimento de responsabilidade pelo desempenho competente. Reeve, Deci e Ryan (2004), ponderando sobre o contexto de sala de aula, destacam que quando os alunos buscam e persistem em desafios adequados ao seu nvel de desenvolvimento, mostram interesse por atividades que possibilitam crescimento e enriquecem as suas capacidades e habilidades. Assim, possvel considerar a necessidade de competncia satisfeita. Por ltimo, a necessidade de pertencimento, tambm entendida pela expresso vnculo, diz respeito ao esforo para estabelecer relaes interpessoais seguras e duradouras, a preocupao com o outro e, de modo concomitante, ao sentimento de que o outro tambm demonstra confiana, respeito mtuo, ligao verdadeira enfim. , portanto, uma necessidade de estar em comunho segura em relao aos integrantes do seu meio (RYAN; DECI, 2002), de se socializar. Esta necessidade especfica apia-se em duas dimenses, quais sejam, sentir-se aceito e ficar mais prximo do outro (RYAN; STILLER, 1991). Alguns estudos (CLEMENT; DORNYEI; NOELS, 1994; MANSFIELD, 2001;) tm assinalado nveis mais altos de confiana e de emoes positivas em alunos que apresentam vnculos positivos com a escola. Estes alunos no s

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aparentam enfrentar os conflitos de modo mais harmonizado como trabalham com mais persistncia, obtendo sucesso na aprendizagem. Sentir-se parte de um contexto, pertencer a este ambiente, pode ser considerado como pano de fundo para a satisfao das outras necessidades (competncia e autonomia). O pertencimento uma necessidade psicolgica humana e demanda o estabelecimento de vnculos ntimos, estreitos e seguros com os outros, visando o envolvimento emocional e interpessoal. Quando ela satisfeita no ambiente escolar, os alunos sentem-se motivados para o relacionamento autntico com as outras pessoas, aproximando-se daquelas que demonstram ateno e respeito em relao a eles (REEVE; DECI; RYAN, 2004). De acordo com Deci e Ryan (1996), quando o ambiente escolar possibilita suporte s necessidades j mencionadas, autonomia, competncia e vnculo/pertencimento, os alunos sentem-se satisfeitos e envolvem-se ativamente nas tarefas, possibilitando assim a manuteno ou o aumento da motivao intrnseca. Ainda segundo estes autores, o apoio do contexto facilita a interiorizao e integrao da motivao extrnseca, porque tende mais a satisfazer do que a frustrar as necessidades psicolgicas bsicas. Entretanto, se o ambiente de sala de aula falho, bloqueador ou essencialmente dissonante em relao a essas necessidades, possivelmente provoca consequncias psicolgicas prejudiciais aos estudantes. Segundo Guimares e Boruchovitch (2004, p.147), [...] a qualidade do relacionamento entre professores e alunos, dentro da escola, influenciada em grande medida pelo estilo motivacional dos primeiros, revela-se a fonte principal de satisfao ou frustrao das necessidades psicolgicas dos estudantes. Estas necessidades essenciais ao indivduo, so propostas como sendo caractersticas universais, presentes em todas as culturas indistintamente, no sendo, consequentemente, privilgio de um ou outro grupo social. Ryan e Deci (2002) admitem, contudo, que aspectos como gnero, idade e cultura, e especialmente o ambiente de interaes, podem tornar as necessidades variveis, uma vez que valores e prticas variam culturalmente. Segundo Deci e Ryan (2002), as necessidades bsicas tm trs funes importantes: a primeira diz respeito prpria alimentao e realimentao de uma base terica que possibilita a identificao de quais so os fatores facilitadores ou atenuadores dos processos naturais, tanto a motivao intrnseca quanto a internalizao de valores do ambiente social; a segunda permite identificar

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os nutrientes necessrios para a motivao e comportamento, no apenas para o desempenho, mas tambm para o desenvolvimento psicolgico saudvel; e a terceira fornece uma base para o planejamento de sistemas sociais, tais como escolas, clnicas e ambiente de trabalho. fundamental, portanto, o entendimento integral das necessidades psicolgicas bsicas das pessoas, pois pode impulsionar o progresso das atividades, ser causa de interao e de desenvolvimento que propiciam maior vitalidade e satisfao. Para Reeve, Deci e Ryan (2004) os resultados de pesquisas (OSTERMAN, 2000; SILVA, 2004), amparadas na teoria das necessidades bsicas, asseguram que, satisfazer as trs necessidades, autonomia, competncia e vnculo, promove o bem estar e permite aes favorveis por parte do aluno, enquanto que a frustrao dessas necessidades provoca mal estar e funcionamento precrio do organismo. importante salientar a correlao e integrao das trs necessidades psicolgicas bsicas, cientes de que o fortalecimento de cada uma se d a partir da satisfao das restantes (DECI; RYAN, 2000).

3.2 Teoria da Avaliao Cognitiva

A segunda subteoria que integra a atual proposio da Teoria da Autodeterminao a Teoria da Avaliao Cognitiva. Elaborada no incio dos anos 80, tem como foco principal entender como os eventos externos (recompensas, elogios, feedback e outros) afetam a motivao intrnseca em sala de aula. Desde o incio dos anos 80, quando da sua elaborao por Ryan e Deci, esta subteoria prope que sejam levados em considerao o contexto interpessoal e intrapessoal na promoo da autodeterminao e da competncia. Segundo Boruchovitch (2008), o contexto interpessoal est relacionado ao de trs eventos, sendo o primeiro informativo, fornecedor de feedback importante, em ocasies em que h a possibilidade de escolha. O segundo refere-se aos eventos controladores que refletem presses relativas s expectativas de desempenho e o terceiro so os eventos amotivadores, que no proporcionam nenhum tipo de informao adequada acerca da competncia ou do lcus causalidade. Os intrapessoais, de outro modo, esto caracterizados pelo interesse e a aprendizagem espontnea.

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A Teoria da Avaliao Cognitiva tm como funo primordial estudar como as condies scio-culturais tendem a aumentar ou diminuir a motivao intrnseca dos alunos, ocupando assim, um papel complementar Teoria das Necessidades Bsicas, que se incumbe de explicar a origem natural do envolvimento em uma atividade (REEVE; DECI; RYAN, 2004). Ainda segundo os mesmos autores, as condies de sala de aula, quando so contrrias percepo de autonomia ou de competncia, podem prejudicar a motivao intrnseca e impedir o crescimento psicolgico do aluno. Especialmente at a dcada de 70, os estudos eram conduzidos sob a perspectiva behaviorista, que enfatizava o uso de recompensas como meio de controle do comportamento. Alguns estudos, entretanto, realizados em laboratrio, permitiram descobrir que a motivao das pessoas por uma determinada atividade diminua aps a oferta de recompensas pela realizao dessa atividade (LEPPER; HEDERLONG; GRINCAS, 1999; LEPPER; HEDERLONG, 2000). As descobertas iniciais foram muito controversas quando do seu aparecimento e, desde ento, centenas de estudos tm fornecido um apoio adicional para constataes tangveis de que as recompensas extrnsecas minam a motivao intrnseca. O uso frequente de recompensas no contexto escolar, com o intuito de atingir objetivos, especialmente aqueles relacionados ao envolvimento dos estudantes em tarefas de aprendizagem, seja por meio de prmios, notas, pontos adicionais ou mesmo de cunho verbal ou social, como elogios ou uma maior ateno por parte do professor, tm sido alvo constante de estudo por parte de pesquisadores recentes. Estes afirmam que as recompensas, sejam elas de quais tipos forem, enfraquecem ou simplesmente destroem o interesse intrnseco do aluno pela aprendizagem ou por aquele contedo, tornando o processo uma mera negociao, em que o professor precisa estar constantemente provido de recursos de gratificao, com o propsito de atender s necessidades do aluno. Stipek (1998) argumentou, com base em resultados de pesquisas, que este tipo constante de relacionamento mercadolgico entre professor-aluno, acaba por frustrar o interesse e o envolvimento do aluno em uma atividade, diferentemente de quando no h o uso de recompensas. Portanto, se o interesse e o envolvimento do aluno com as tarefas (incluindo seu esforo e dedicao) estariam sendo controlados por um reforador externo (os prmios, as notas ou os elogios, entre outros), na ausncia deste haveria grande possibilidade de extino

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daqueles comportamentos. Mais ainda, o aluno se tornaria pouco autnomo ou autodeterminado, sendo incapaz de sustentar sua motivao para aprender baseado no prazer ou nos sentimentos positivos que poderiam resultar do aprendizado em si, ou seja, da motivao intrnseca (GUIMARES, 2004a). As recompensas, nesse sentido, teriam um papel aniquilador da motivao intrnseca, da criatividade e da flexibilidade cognitiva, pois, oferecida indiscriminadamente, mesmo sob situaes em que o aluno estava motivado a realizar determinada tarefa, o induziria a entend-la de modo instrumental, isto , se fao tal atividade recebo tal retribuio. Essa educao, fundamentada na barganha e na presso justifica-se, em parte, pela crena de muitos professores na fora dessa estratgia como nica forma de motivao, alm do fato de que sua implementao pode ocorrer de um modo simples, prtico e facilmente reconhecida, at por crianas em fase inicial de escolarizao (NEWBY, 1991; SALISBURYGLENNON; STEVENS, 1999). O professor, fornecedor da recompensa objetiva, consciente ou inconscientemente, controlaria o comportamento do outro, fazendo-o agir de uma maneira especfica. Os resultados de uma meta-anlise realizada por Deci, Koestner e Ryan (1999) avaliando 128 estudos realizados a respeito da influncia das recompensas externas em atividades inicialmente interessantes, destacaram os efeitos prejudiciais de aspectos ambientais sobre a motivao intrnseca, revelando que a recompensa oferecida pelo desempenho em uma atividade de fato prejudica a motivao intrnseca. Alm disso, os autores salientaram que no apenas as recompensas materiais, mas tambm as ameaas, os prazos finais para entregas de trabalhos, as avaliaes realizadas com presso e as metas impostas, diminuem a motivao intrnseca, porque todas elas conduzem percepo de um locus de causalidade externo, ou seja, os alunos internalizam essas recompensas como controladores para o seu comportamento. Em contrapartida, eles descobriram que as recompensas verbais ou elogios tm um efeito mais promotor do que prejudicial motivao intrnseca. Pesquisas (BROPHY, 1998; PINTRICH, SCHUNK, 2002;) tambm demonstraram que as recompensas externas so potentes motivadores, no to contraproducentes, desde que usadas em certas circunstncias e de um modo mais conveniente. Segundo Pintrich e Schunk (1996), h aspectos positivos na atribuio de recompensas quando estas sinalizam os progressos efetivos em uma atividade

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de aprendizagem. Um exemplo concreto deste modelo de recompensa consiste no elogio, quando inesperado e decorrente da aquisio pelo aluno de uma nova habilidade ou conhecimento. Esta atitude do professor para com o aluno propiciaria a consolidao de um sentimento de eficcia e ainda promoveria a

autodeterminao que, juntos, sustentariam o interesse e inibiriam a necessidade de recompensas. A ressalva para este tipo de recompensa, segundo Guimares (2004a), est na forma de apresentao, que deve ocorrer de um modo simples, moderado, criativo e adequado ao desempenho, utilizando basicamente uma linguagem no-controladora e individualmente, pois interessa unicamente ao merecedor da mesma. Este elogio, respeitadas estas premissas, tornar-se-, ento, uma importante informao da qual dispe o aluno sobre sua competncia e sua evoluo em determinado aprendizado ou na utilizao de certa habilidade. Estudos (FISHER, 1978; RYAN, 1982) asseguram que o feedback positivo fornecido pelo professor, acompanhado por um apoio autonomia do aluno, sugere uma melhora da percepo de competncia por parte do mesmo. Vallerand e Reid (1984) encontraram nveis mais elevados de motivao intrnseca aps feedback positivo do que aps feedback negativo, e as anlises apontaram uma mediao entre a competncia percebida e as alteraes na motivao intrnseca. Com o objetivo de aprofundar a compreenso dos efeitos das recompensas externas, Reeve, Deci e Ryan (2004) propem que os eventos externos tm dois aspectos funcionais: controlador e informacional. No aspecto controlador os eventos externos exercem uma forte presso sobre os alunos, exigindo certo desempenho ou comportamento. Esses eventos externos promovem um locus de causalidade externo, influenciando negativamente a percepo de autonomia dos alunos. J os aspectos informacionais referem-se ao feedback sobre o desempenho do aluno de uma forma no controladora. Existem dois tipos de feedback: o positivo e o negativo. O feedback positivo refere-se informao afirmativa sobre a competncia, aumentando assim, a percepo de competncia dos alunos. E um feedback negativo na forma de comunicao de incompetncia, diminui a percepo de competncia do aluno e, consequentemente, prejudica a motivao intrnseca. A Teoria da Avaliao Cognitiva tem sido muito utilizada para interpretar os efeitos motivacionais de diversos eventos que ocorrem em sala de

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aula, especialmente acerca do uso de recompensas extrnsecas. Ento, ela procura explicar como esta recompensa afeta a motivao intrnseca dos alunos, como por exemplo, numa situao de sala de aula, quando os alunos se envolvem em uma atividade interessante e o professor oferece uma recompensa aps a realizao dessa atividade. Caso a recompensa oferecida tenha o objetivo de pressionar o aluno a se comportar de uma determinada maneira, visando atender a uma imposio do professor e, se assim for percebida pelo aluno, ela ter um efeito controlador e prejudicar a motivao intrnseca. Entretanto, caso essa mesma recompensa for percebida pelo aluno de maneira no controladora, ele no se sentir pressionado e a sua motivao intrnseca no ser prejudicada. Exemplos desse tipo de recompensa so as recompensas externas no contingentes ao envolvimento, concluso ou desempenho na atividade; recompensas externas inesperadas e recompensas que fortalecem a percepo de competncia (LEPPER; HENDERLONG, 2000). Potencializar, portanto, o aspecto informacional das recompensas significa ressaltar quando elas refletem o xito no desenvolvimento de uma atividade, possibilitando ao aluno a percepo destes subsdios como um feedback positivo que contribuir para o aumento da motivao intrnseca. Outro aspecto importante, resultante do contexto recompensador presente em diversas salas de aula, a competio entre os alunos. Ela induzida especialmente pelo professor e pelas outras instncias educativas da escola e ser abordada no prximo tpico.

3.3 Teoria da Orientao de Causalidade

A Teoria da Orientao de Causalidade, terceira subteoria componente da Teoria da Autodeterminao, destina-se a explicar as diferenas individuais nas orientaes pessoais para um comportamento autodeterminado ou controlado, acrescentando a dimenso da personalidade macroteoria. Reeve, Deci e Ryan (2004) e Ryan e Deci (2002) sugerem que ao regularem a si prprios, de acordo com as suas necessidades, interesses e valores, os alunos apresentam uma orientao de causalidade autnoma. Isso significa dizer que estes alunos demonstram iniciativa, buscam atividades que lhes so interessantes e desafiadoras e assumem maior responsabilidade em relao ao seu comportamento.

Diferentemente, os alunos que mostram comportamentos iniciados e mantidos por

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incentivos ambientais, orientao social e controles internos (exemplo: auto-estima contingente), utilizando-os como fontes controladoras para direcionar seus comportamentos, apresentam uma orientao de causalidade externamente controlada, estando mais propensos a uma dependncia de recompensas ou controles externos, tendendo a se conformar com os fatores e eventos, sejam eles ameaas ou prazos, interiorizando assim as expectativas de como deveriam agir. Um outro aspecto importante, relacionado orientao de causalidade, reside no fato de que existem casos em que ela impessoal estando, assim, diretamente relacionada com a desmotivao e falta de ao intencional. Nesse tipo de orientao, o indivduo tende a acreditar que lhe falta capacidade ou recurso para regular pessoalmente as suas aes de uma forma que permita obter o resultado almejado. Estes mesmos autores asseguram que as orientaes de

causalidade refletem a dimenso da autodeterminao da personalidade, isto , o aluno com uma histria pessoal baseada na satisfao das necessidades psicolgicas (autonomia, competncia e vnculo) tende a ter uma orientao de causalidade para autonomia. Entretanto, os alunos motivados por regulao externa (recompensas e presses externas) apresentam uma orientao de causalidade externamente controlada. Um estudo recente realizado por Weinstein e Hodgins (2009) objetivava testar a hiptese de que uma motivao autnoma e a auto-regulao possibilitaria uma escrita expressiva e conduziria a estados emocionais, fsicos e cognitivos positivos. Este estudo, que utilizou a Escala Geral para Orientao de Causalidade (GCOS)2, criada por Deci e Ryan (1985), mostrou que os participantes com maior autonomia para a realizao da atividade alcanaram um bom nvel de satisfao, persistncia, energia e bem-estar, sustentando a hiptese de que a autonomia facilita uma regulao eficaz e possibilita o alcance de resultados positivos. Foi possvel observar nas duas sub-teorias Teoria das Necessidades Bsicas e Teoria da Avaliao Cognitiva que a satisfao das necessidades psicolgicas bsicas promove o envolvimento natural nas atividades e que os fatores ambientais podem interferir no aumento ou na diminuio da2

Segundo La Guardia e Patrick (2008) esta escala utilizada para medir tendncias gerais da populao a uma meta mais autnoma, controlada e de regulao impessoal do comportamento.

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motivao intrnseca. No caso da Teoria da Orientao de Causalidade, constata-se o acrscimo de um novo elemento de anlise, que tem a ver com a personalidade da pessoa, ampliando, ainda mais,