16
CURRENT ISSUES Janeiro 2015 volume 15 número 1 Perspectivas Econômicas para 2015 Luiz Nelson Porto Araujo O cenário macroeconômico neste ano será fortemente impactado pela redução do preço do barril de petróleo. Com o custo energético mais baixo o crescimento global deve ser maior, sem pres- sões inflacionárias que justifiquem uma política monetária mais restritiva. No Brasil, após o fra- casso da "Nova Matriz Econômica", adotada entre 2011-2014, os ajustes insinuados pela nova equipe econômica nas áreas fiscal, monetária, cambial e institucional devem trazer desafios adi- cionais e, quando operacionalizados, permitirão ao país retomar uma trajetória consistente de desenvolvimento econômico. Introdução Em termos globais persistem as preocupa- ções com o fraco crescimento do produto e o aumento dos riscos geopolíticos. Essas preocupações podem afetar as perspectivas para a estabilidade financeira global caso as perspectivas para um baixo crescimento de longo prazo impliquem em reavaliações re- pentinas das vulnerabilidades nas economias mais endividadas, ou se alterações no ape- tite por risco disparem fortes ajustes nos mercados financeiros e subvertam o nível de confidência dos consumidores e das indús- trias. O cenário macroeconômico em 2015 será fortemente impactado pela redução do preço do barril de petróleo; pela manutenção do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) nos Estados Unidos; pelo risco de deflação na Zona do Euro e pela adoção de uma even- tual política monetária de compra de ativos; pelo risco de deflação e pela elevada razão entre a dívida pública e o PIB no Japão; pelo ajuste macroeconômico na Rússia, em fun- ção das sanções do Ocidente e da queda do preço do petróleo; pela redução do ritmo de crescimento da economia chinesa em pata- mar inferior ao histórico; pelos desafios da infraestrutura na Índia; pelas disparidades regionais, baixa produtividade da mão-de- obra, elevada volatilidade e por políticas eco- nômicas populistas, voluntaristas e inconsis- tentes na América Latina, inclusive Brasil. Em julho de 2014 o barril de petróleo Brent era comercializado a US$ 115. Ao final de

2015 delta perspectivas econômicas para 2015

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Perspectivas econômicas para 2015

Citation preview

Page 1: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

CURRENT ISSUES

Janeiro 2015 volume 15 número 1

Perspectivas Econômicas para 2015 Luiz Nelson Porto Araujo

O cenário macroeconômico neste ano será fortemente impactado pela redução do preço do barril

de petróleo. Com o custo energético mais baixo o crescimento global deve ser maior, sem pres-

sões inflacionárias que justifiquem uma política monetária mais restritiva. No Brasil, após o fra-

casso da "Nova Matriz Econômica", adotada entre 2011-2014, os ajustes insinuados pela nova

equipe econômica nas áreas fiscal, monetária, cambial e institucional devem trazer desafios adi-

cionais e, quando operacionalizados, permitirão ao país retomar uma trajetória consistente de

desenvolvimento econômico.

Introdução

Em termos globais persistem as preocupa-

ções com o fraco crescimento do produto e

o aumento dos riscos geopolíticos. Essas

preocupações podem afetar as perspectivas

para a estabilidade financeira global caso as

perspectivas para um baixo crescimento de

longo prazo impliquem em reavaliações re-

pentinas das vulnerabilidades nas economias

mais endividadas, ou se alterações no ape-

tite por risco disparem fortes ajustes nos

mercados financeiros e subvertam o nível de

confidência dos consumidores e das indús-

trias.

O cenário macroeconômico em 2015 será

fortemente impactado pela redução do preço

do barril de petróleo; pela manutenção do

crescimento do Produto Interno Bruto (PIB)

nos Estados Unidos; pelo risco de deflação

na Zona do Euro e pela adoção de uma even-

tual política monetária de compra de ativos;

pelo risco de deflação e pela elevada razão

entre a dívida pública e o PIB no Japão; pelo

ajuste macroeconômico na Rússia, em fun-

ção das sanções do Ocidente e da queda do

preço do petróleo; pela redução do ritmo de

crescimento da economia chinesa em pata-

mar inferior ao histórico; pelos desafios da

infraestrutura na Índia; pelas disparidades

regionais, baixa produtividade da mão-de-

obra, elevada volatilidade e por políticas eco-

nômicas populistas, voluntaristas e inconsis-

tentes na América Latina, inclusive Brasil.

Em julho de 2014 o barril de petróleo Brent

era comercializado a US$ 115. Ao final de

Page 2: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 2

dezembro foi cotado a US$ 57. Na primeira

semana deste ano a cotação atingiu US$ 50.

Em termos gerais, a queda do preço do barril

é positiva para o crescimento econômico na

medida em que aumenta o poder de compra

dos consumidores e diminui os custos de

produção (em particular, nos setores intensi-

vos em energia, como a petroquímica). Essa

relação entre o preço do petróleo e o desem-

penho econômico é bem definida: o ciclo en-

tre 1948 e 1973 (ano do primeiro choque do

petróleo), e aquele entre 1993 e 2008 (pri-

meiro ano da recente recessão) estão asso-

ciados a baixo custo do petróleo. As quatro

recessões do período do pós-guerra (1974-

75, 1981-82, 1990-91 e 2008-09) estão

associadas com custo crescente do petróleo.

Com o custo energético mais baixo em 2015

o crescimento global deve ser maior, sem

pressões inflacionárias que justifiquem uma

política monetária mais restritiva. Por outro

lado, o baixo preço do petróleo deve implicar

em deterioração das condições de crédito de

economias como a Rússia, a Venezuela e o

Irã, que conseguem equilibrar suas contas

com uma cotação do barril igual ou superior

à US$ 100. Mais ainda, pode afetar o setor

de gás de xisto nos Estados Unidos, que foi

financiado com títulos de elevado risco e re-

torno (high yield junk bonds). Assim, a forte

queda recente do preço do petróleo, ao

mesmo tempo em que deve suportar o cres-

cimento global pode trazer riscos para a es-

tabilidade financeira. Os ajustes serão mais

significativos caso a precificação do risco de

liquidez pelos investidores não reflita as mu-

danças estruturais na liquidez de mercado.

Isto poderia implicar em pressões sobre os

mercados de financiamentos para bancos e

empresas.

A expectativa é que em 2015 o crescimento

médio global seja de 3,5%, liderado pelas

economias mais desenvolvidas, mas grande

disparidade nas taxas de crescimento entre

os países. Esta expectativa está sujeita a di-

versos riscos que podem impactar negativa-

mente os resultados. Em particular, as eco-

nomias fortemente alavancadas da Zona do

Euro colocam dúvidas sobre a capacidade da

região em crescer de maneira sustentada.

Mais ainda, a recuperação da Zona do Euro

será desigual, sendo que as economias pres-

sionadas por dívida pública elevada provavel-

mente terão apenas uma modesta recupera-

ção. Além disso, as taxas de inflação indicam

um risco razoável de deflação e baixo cresci-

mento. A situação do Japão, por sua vez,

pode prejudicar as exportações, especial-

mente chinesas, com impactos negativos so-

bre o crescimento em 2015. A China en-

frenta desafios estruturais relevantes, asso-

ciados à redução da sua taxa de crescimento

e ao combate à corrupção endêmica, sendo

que as suas perspectivas são particular-

mente relevantes para os exportadores de

commodities da América Latina, da África e

do Oriente Médio. Diversos fatores geopolíti-

cos – conflitos armados na Ucrânia e no Ori-

ente Médio – podem adicionar novos fatores

negativos ao crescimento potencial. Por fim,

as condições nos mercados financeiros glo-

bais vão ficar mais apertadas do que eram

antes do FED anunciar o "taper talk" no pri-

meiro semestre de 2013, traduzindo-se em

maiores custos de empréstimos internacio-

nais, particularmente com a recente volatili-

dade nos mercados emergentes.

No Brasil, após o fracasso da "Nova Matriz

Econômica", adotada entre 2011-2014, os

ajustes insinuados pela nova equipe econô-

mica nas áreas fiscal, monetária, cambial e

institucional devem trazer desafios adicionais

e, quando operacionalizados, permitirão ao

país retomar uma trajetória consistente de

desenvolvimento econômico. Especifica-

mente, esses ajustes passam pela recons-

Page 3: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 3

trução do tripé macroeconômico – responsa-

bilidade fiscal (sem a agora famosa "contabi-

lidade criativa"), meta de inflação (sem bus-

car o seu teto mas, sim, o seu centro) e câm-

bio flutuante (salvo intervenções pontuais

decorrentes de choques externos adversos)

–, pelo realinhamento de preços relativos,

pelo abandono de subsídios cruzados para

diversos setores – em parte através da polí-

tica de concessão de empréstimos do

BNDES aos "campeões nacionais" –, pela re-

organização da estrutura produtiva e pela for-

mulação e oferta de novos projetos de par-

cerias público-privadas (que permitiram o au-

mento do investimento).

Estados Unidos – Retomada do

Crescimento e Transformação

Estrutural

Em 2014, os Estados Unidos continuaram –

com sucesso – a política de acomodação

monetária com retomada da produção e do

emprego. O ano de 2014 deve apresentar

um crescimento do PIB de 2,2%, a inflação

ao consumidor deve ser de 2,0% (exata-

mente a meta implícita na política monetária

do Federal Reserve Bank - FED), a taxa de

desemprego deve alcançar 6,3% e o déficit

em transações correntes -2,5% do PIB.

O ano encerrado foi marcado por transições

importantes no FED. Primeiro, Bem Ber-

nanke deixou a presidência quando o seu

mandato expirou ao final de janeiro e foi su-

cedido por Janet Yellen, até então, vice-pre-

sidente. Segundo, o Federal Open Market

Committee (FOMC) – responsável pelas ope-

rações de mercado aberto – concluiu com

sucesso o seu programa de compra de ativos

(Quantitative Easing - QE), completando o ta-

pering off do início do ano e estabelecendo

um limite de US$ 4,2 trilhões para a sua car-

teira (apenas US$ 480 bilhões sete anos an-

tes). Além disso, com a economia gradual-

mente convergindo à interpretação do FED

do seu duplo mandato de máximo emprego

e preços estáveis, ele ajustou as suas inten-

ções com relação à sua política de taxa de

juros próxima de zero.

As projeções para 2015 são de crescimento

do PIB de 3,2%, manutenção da taxa de in-

flação ao consumidor (2,0%), redução da

taxa de desemprego para 6,0% e manuten-

ção do déficit em transações correntes (-

2,5% do PIB). Neste cenário, o maior desafio

para a política monetária neste ano pode es-

tar associado ao início do aumento das taxas

de juros, que são mantidas próximas de zero

desde o outono de 2008, após o pânico do

mercado que se seguiu à quebra da Lehman

Brothers. O FOMC manteve, nas reuniões de

setembro e outubro, a meta para a taxa dos

Fed funds entre 0% e 0,25% a.a, sugerindo

que não deve ser desprezada a possibilidade

de manutenção das taxas em vigor, principal-

mente se – apesar do comportamento do PIB

e de desemprego – a taxa de inflação man-

ter-se ao redor da meta de longo prazo de

2,0%.

A principal transformação estrutural nos Es-

tados Unidos, desde o início do segundo se-

mestre de 2007, é o rápido crescimento na

produção doméstica de combustíveis "não

convencionais", impulsionado sobretudo pela

exploração das significantes, mas anterior-

mente inacessíveis, reservas de gás de natu-

ral (principalmente, xisto). Este crescimento

é o produto de avanços na tecnologia de pro-

dução, em particular, uma nova combinação

de perfuração horizontal e fraturamento hi-

dráulico. Com o aumento da produção do-

méstica reduziu-se a dependência de energia

importante, diversificou-se a economia e, em

termos globais, contribuiu de maneira signi-

ficativa para a queda do preço do barril de

Page 4: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 4

petróleo, com deslocamento importante dos

fluxos de exportação e importação.

O maior desafio do presidente Obama na

condução da economia dos Estados Unidos,

dois anos antes da conclusão do seu se-

gundo mandato, agora é enfrentar a ferrenha

oposição republicana – agora majoritária –

na Câmara dos Deputados e do Senado que

tomou posse nesta semana. São previstos

embates em relação à política de saúde

aprovada pelo presidente em março de 2010

(o Patient Protection and Affordable Care Act,

conhecido como Obamacare), ao anúncio

em dezembro do ano passado do restabele-

cimento de relações diplomáticas com Cuba,

à política de imigração e, ainda, a aprovação

do oleoduto Keystone XL, da TransCanada,

que está há anos sob avaliação da adminis-

tração democrata. Como no passado recente

é muito provável que os conflitos esperados

no Congresso impactem o desempenho eco-

nômico da economia norte-americana.

Zona do Euro e Japão – O Perigo

da Deflação e a Necessidade de

Crescimento

Zona do Euro

A Zona do Euro deve encerrar o ano de 2014

com um crescimento do PIB de 0,7%, uma

inflação ao consumidor de 0,5% (muito

abaixo da meta implícita), uma taxa de de-

semprego de 11,5% e um déficit em transa-

ções correntes de -2,0% do PIB. As dispari-

dades destes indicadores entre os 28 Esta-

dos-Membros da União Europeia (o Euro en-

trou em circulação na Lituânia em

01/01/2015, elevando o número de Esta-

dos-Membros que utilizam a moeda única

para 19) é imensa e continuará no horizonte

próximo.

Em termos gerais, a crise econômica na

Zona do Euro não terá alterações significati-

vas em 2015, apesar de um pouco suavi-

zada. Em 26/07/2012, Mario Draghi, o pre-

sidente do Banco Central Europeu, afirmou

em uma conferência em Londres que faria "o

que fosse necessário" para preservar o Euro.

Esta posição, simples e direta, permitiu a es-

tabilidade monetária e política da região em

um momento de grande pressão. Mas, em

2015 o desafio continua a ser a retomada

do crescimento e o risco de deflação, na me-

dida em que nenhum destes dois problemas

foi subjugado no ano encerrado.

O receio, como observado durante a Grande

Depressão da década de 1930, é que a

queda continuada dos preços induza os con-

sumidores e empresários a postergarem os

seus dispêndios, na medida em que a expec-

tativa é que os preços continuem a cair. Em

um cenário de baixo crescimento, preço do

petróleo em queda e sem outras pressões in-

flacionárias o mais importante desafio do

Banco Central Europeu em 2015 será, sem

dúvida, a possibilidade de deflação.

As medidas anunciadas em 2014, incluindo

taxas sobre os recursos dos bancos deposi-

tados junto ao Banco Central, de modo a in-

duzir o aumento dos empréstimos, não tive-

ram os resultados esperados. A expectativa

é que apenas uma política monetária com

um quantitative easing – semelhante ao ado-

tado nos Estados Unidos nos últimos anos –

seja capaz de produzir os resultados espera-

dos. Até este momento a Alemanha é a res-

ponsável pela mais forte oposição à esta po-

lítica mas, em 2015, pode abandonar esta

posição com a divulgação de novas informa-

ções sobre a fragilidade econômica da re-

gião. Existe, ainda, a expectativa de que a

indecisão com relação à adoção desta polí-

tica pode gerar pânico entre os investidores.

O próprio Bank of England já manifestou em

Page 5: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 5

diversas oportunidades que a fragilidade da

Zona do Euro é uma das maiores ameaças à

recuperação econômica do Reino Unido.

As projeções para 2015 são sugerem um ce-

nário macroeconômico melhor em relação

ao período recente, com um crescimento do

PIB de 1,2%, inflação de 1,0% (ainda sob

risco de deflação), desemprego de 11,0% e

déficit em transações correntes de -2,0% do

PIB (igual ao ano anterior). Mais uma vez, as

disparidades econômicas acentuadas entre

os países não deve implicar em um cenário

de estabilidade, inclusive política e social.

Em termos individuais, a Espanha e a Grécia

já estão em uma trajetória deflacionária mas

ainda permanece o risco de contágio no res-

tante da região. Mais ainda, as eleições

anunciadas para o início deste ano na Gré-

cia, com possibilidade de vitória da esquerda

– que possui posição radicalmente contrária

ao ajuste econômico dos últimos anos – deve

não apenas trazer mais turbulência a um ce-

nário já bastante complicado mas, principal-

mente, implicar até mesmo na saída do país

da Zona do Euro.

Em termos estruturais, a Zona do Euro en-

frenta três grandes desafios: primeiro, custos

crescentes de energia – que deve ser suavi-

zado com a queda do preço do barril de pe-

tróleo; segundo, baixa velocidade de recupe-

ração da atividade econômica e, terceiro,

queda da produtividade do trabalho (decor-

rente de um mercado de trabalho engessado

por legislação trabalhista e queda do nível de

inovação, principalmente no setor industrial).

Em particular, por exemplo, os custos de-

crescentes da energia na Europa, especial-

mente na Alemanha, estão induzindo um

processo progressivo de transferência para

outras regiões das indústrias intensivas em

energia e, consequentemente, à perda do

primeiro elo da cadeia de valor do setor in-

dustrial. Este é um dos riscos mais importan-

tes ao crescimento e aumento da produtivi-

dade nos países daquela região.

Um termômetro da atual dinâmica econô-

mica da Zona do Euro e dos ajustes que de-

vem ser operacionalizados é a cotação do

euro, que no início deste ano caiu para o seu

menor valor dos últimos nove anos em rela-

ção ao dólar. Sem dúvida nenhuma esta co-

tação reflete, neste momento, as expectati-

vas do mercado com relação à situação po-

lítica da Grécia, que terá impactos sobre a

sua própria sustentabilidade macroeconô-

mica no curto prazo.

Japão

Em 2014, o Japão, a segunda maior econo-

mia da Ásia, deve ter um crescimento do PIB

de 0,8%, uma inflação ao consumidor de

2,5%, uma taxa de desemprego de 3,7% e

um superávit em transações correntes 1,0%

do PIB. O problema estrutural do país (prati-

camente ao longo das últimas duas décadas)

continua sendo o baixo crescimento e o risco

de deflação, apesar das inúmeras tentativas

de redesenho da política macroeconômica

em sucessivos governos.

A política econômica adotada pelo primeiro

ministro Shinzo Abe, eleito em dezembro de

2012 e reeleito em dezembro de 2014 – de-

nominada de Abenomics – tem tido sucesso

em resolver alguns dos principais problemas

da economia japonesa. Esta política está

fundamentada em três elementos, usual-

mente referidos como "as três flechas": polí-

tica monetária agressiva, política fiscal flexí-

vel e uma política estrutural focada no cres-

cimento.

Apesar das iniciativas adotadas o governo ja-

ponês ainda deve buscar outras medidas

Page 6: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 6

para assegurar o crescimento sustentado, ti-

rar o país de um ciclo deflacionário de mais

de duas décadas e estabilizar as finanças pú-

blicas. Vale observar que, apesar da nova po-

lítica econômica, o Japão teve uma queda da

produção no segundo semestre de 2014,

derivado do impacto do aumento do imposto

sobre vendas em abril e que resultou em

uma queda acentuada no consumo das fa-

mílias.

A meta é uma inflação de 2,0% em 2015

fundamentada em uma política monetária

definida pela expansão da base monetária e

posse de títulos públicos. O Banco Central do

Japão denominou esta política de Quantita-

tive and Qualitative Monetary Easing (QQE).

Os resultados até este momento sugerem

que os mercados financeiros podem ter dei-

xado um equilíbrio deflacionário: os preços

das ações aumentaram, a taxa de câmbio

desvalorizou-se e as taxas de juros de longo

prazo mantiveram-se baixas. Além disso, a

economia apresenta crescimento mais forte

induzido pela demanda doméstica, conju-

gada com queda no desemprego e melhoria

no mercado de trabalho.

A flexibilização quantitativa (quantitative eas-

ing) resultou em significativa depreciação do

iene durante 2013-14, ajudando a aumentar

a competitividade da exportação japonesa e

os lucros das empresas. No entanto, o foco

principal durante o seu próximo mandato

será a implementação convincente de refor-

mas estruturais, uma vez que elas são es-

senciais para aumentar a taxa de cresci-

mento do PIB a médio e a longo prazos.

A menos que o primeiro ministro Abe possa

entregar reformas significativas em breve, as

projeções para 2015 indicam um cenário

macroeconômico relativamente estável em

relação ao ano anterior, com o mesmo cres-

cimento do PIB (0,8%), devido ao efeito ne-

gativo de população em declínio ao longo das

últimas décadas e a necessidade de estabi-

lizar a elevada dívida pública em relação ao

PIB (de 227,0%). A inflação ao consumidor

deve cair para 2,2% (abaixo da desejada), a

taxa de desemprego deve permanecer está-

vel (3,7%), assim como o superávit em tran-

sações correntes (1,0% do PIB).

Brics – Nada em Comum, Além

das Disparidades Econômicas e

Políticas

Rússia

As relações entre a Rússia e Ocidente pas-

sam pelo pior momento da sua história

desde o fim da Guerra Fria e a queda do

Muro de Berlin devido à crise da Ucrânia.

Muitos países ocidentais acusam Moscou de

apoiar com armas e tropas os separatistas

que tomaram o controle de territórios no

leste do país (anexando a Crimeia) e, como

punição, tanto os Estados Unidos como a

União Europeia adotaram sanções econômi-

cas, e pessoais, contra a Rússia.

Desde meados de junho do ano passado, o

preço do barril de petróleo caiu 45% e o ru-

bro desvalorizou-se 39% em relação ao dólar

norte americano. O rubro continuou a cair

apesar do aumento da taxa de juros pelo

Banco Central da Rússia, sendo que os mer-

cados financeiros globais consideram que

não existe compensação para o congela-

mento da liquidez russa: a única saída rea-

lista para o derretimento financeiro da Rússia

é que as sanções impostas pelo Ocidente se-

jam removidas e, para que isso aconteça, ela

deve evacuar a Ucrânia.

Page 7: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 7

Em 2014, a Rússia deve apresentar um cres-

cimento do PIB de 0,2% (muito próximo da-

quele do Brasil), uma taxa de inflação ao

consumidor de 7,5%, uma taxa de desem-

prego de 6,0% e um superávit em transações

correntes -2,5% do PIB. De fato, a economia

russa está perto de estagnação, com uma

demanda doméstica fraca, sendo que o nível

de confiança dos consumidores e das em-

presas já eram fracos em 2013, devido à

persistência de problemas estruturais.

O aumento dos riscos geopolíticos e o novo

ambiente de incerteza política e sanções ti-

veram um impacto adicional negativo sobre

a atividade econômica através de três ca-

nais: primeiro, a maior volatilidade no mer-

cado de taxa de câmbio e uma significativa

desvalorização da moeda nacional; segundo,

o limitado acesso aos mercados financeiros

internacionais, para os bancos e sociedades

não financeiras e, terceiro, a manutenção da

baixa confiança dos consumidores e das em-

presas sobre as perspectivas de crescimento

futuro.

Existem riscos substanciais para as perspec-

tivas de crescimento da Rússia em 2015-

2016, na medida em que o país precisa de

adequar às sanções internacionais e estabi-

lizar a economia. As projeções para 2015

são de crescimento do PIB de 0,5%, manu-

tenção da taxa de inflação ao consumidor

(7,5%), aumento da taxa de desemprego

para 7,0% e queda do superávit em transa-

ções correntes para 2,9% do PIB. Um cres-

cimento maior dependerá de um aumento

relevante do investimento privado e do nível

de confiança dos agentes econômicos, o que

exigirá a criação de um ambiente de política

previsível e uma agenda de reformas estru-

turais que ataque as restrições internas e ex-

ternas ainda não equacionadas. Em resumo,

estas reformas precisam se concentrar em

melhorar: primeiro, as instituições econômi-

cas para assegurar a estabilidade das finan-

ças públicas; segundo, o nível educacional e

a infraestrutura para tornar os trabalhadores

mais produtivos; e, por fim, o regime de con-

corrência para incentivar o empreendedo-

rismo e as empresas privadas.

Índia

Com uma população de 1,2 bilhões de habi-

tantes e a 10º maior economia do mundo, a

Índia apresenta desde a sua independência,

em 1947, uma das maiores taxas de desen-

volvimento econômico historicamente obser-

vadas. Em 2013, o país estava em crise e,

agora, deve apresentar um dos melhores re-

sultados dentre as economias emergentes,

sendo que esta recuperação é fomentada

pela queda do preço do barril de petróleo – o

país é um grande importador de óleo e gás.

O ano de 2014 deve apresentar um cresci-

mento do PIB de 5,5% (inferior à média his-

tórica dos últimos anos), uma taxa de infla-

ção ao consumidor de 7,9%, uma taxa de

desemprego de 4,0% e um déficit em tran-

sações correntes de -2,2% do PIB.

A eleição em maio de 2014 do primeiro mi-

nistro Narendra Modi – eleito pelo Partido do

Povo Indiano (Bharatiya Janata Party), de di-

reita, com vínculos com a organização naci-

onalista hindu Rashtriya Swayamsevak

Sangh –, foi um evento significativo na Índia.

Ele derrotou o Partido do Congresso, que go-

vernou a Índia por 54 de seus 67 anos de

independência. Ao conquistar a maioria ab-

soluta no parlamento pela primeira vez desde

1984, Modi não precisará fazer alianças para

realizar as mudanças econômicas defendi-

das pelo seu partido.

Em apenas seis meses o novo primeiro mi-

nistro promoveu uma revisão dramática da

Page 8: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 8

política externa da Índia e do seu perfil glo-

bal. Seu mantra de política externa é triplo:

consolidação geoestratégica no sul da Ásia,

atração de investimento direto estrangeiro e

aspiração a tornar-se uma potência mundial.

Em consonância com esta revisão Japão,

China, Rússia e Austrália estão se tornando

mais importantes para a Índia, enquanto que

os EUA e a Europa estão perdendo terreno.

As pressões inflacionárias caíram fortemente

nos últimos meses e o Banco Central Indiano

já sinalizou um afrouxamento da política mo-

netária no início de 2015. A combinação de

um estímulo monetário com as reformas

econômicas podem implicar no fortaleci-

mento da recuperação da economia indiana

no médio prazo. O governo do primeiro mi-

nistro Modi também ressaltou os investimen-

tos em infraestrutura como uma prioridade

na agenda de reformas econômicas, especi-

almente em energia e transporte.

A combinação das reformas econômicas e

uma política monetária acomodativa do

Banco Central Indiano em 2015 podem via-

bilizar a retomada do crescimento econô-

mico a taxas acima de 7,0% ao ano a partir

de 2017. As projeções para 2015 são de

crescimento do PIB de 6,5%, queda da taxa

de inflação ao consumidor para 7,5% e da

taxa de desemprego para 3,8% e manuten-

ção do déficit em correntes em -2,2% do

PIB.

China

Com uma população de 1,3 bilhões de habi-

tantes a China tornou-se, recentemente, a

segunda maior potência econômica mundial,

atrás apenas dos Estados Unidos. Desde a

introdução das reformas econômicas em

1978, a China transitou de uma economia

centralmente planificada para uma baseada

no mercado, com rápido crescimento econô-

mico e desenvolvimento social. Com o PIB

crescendo à uma taxa média anual de 10,0%

ao longo das últimas décadas, mais de 500

milhões de chineses deixaram a pobreza.

Neste período ela tornou-se a maior exporta-

dora (US$ 2,2 trilhões em 2013, seguida pe-

los Estados Unidos com US$ 1,6 trilhões),

maior detentora de reservas internacionais

(US$ 3,8 trilhões em 2013, seguida pelo Ja-

pão com US$ 1,3 trilhões). Em poucos anos

deve tornar-se, também, um dos maiores ex-

portadores de investimento direto estran-

geiro e um dos poucos países com uma mo-

eda de reserva internacional.

Como qualquer outro país em desenvolvi-

mento, a China enfrenta diversos desafios,

dentre eles: extensa pobreza (segunda maior

população de pobres, apenas atrás da Índia),

elevada desigualdade da renda, rápida urba-

nização, envelhecimento da população, mi-

gração interna da mão-de-obra (para as ci-

dades), sustentabilidade ambiental, conflitos

geopolíticos na região Ásia-Pacífico e corrup-

ção. O objetivo do 12º Plano Quinquenal

(2011-2015) busca solucionar estes desa-

fios, com foco na qualidade de vida da popu-

lação.

A China deve apresentar em 2014 um cres-

cimento do PIB de 7,4% (muito inferior à mé-

dia histórica dos últimos anos mas consis-

tente com a trajetória de queda observada

no último triênio), uma inflação ao consumi-

dor de 2,4%, uma taxa de desemprego de

4,0% e um superávit em transações corren-

tes de 1,8% do PIB. O ano passado foi parti-

cularmente difícil para a economia chinesa,

que buscou adequar o excesso de crédito cri-

ado após a estratégia de "crescimento-a-

todo-custo" adotada após a crise de 2008.

Em termos estruturais a China está, de fato,

moderando o seu ritmo de crescimento em

função de diversos fatores, de ordem interna

Page 9: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 9

e externa. Primeiro, a recessão, iniciada em

2007 no mercado subprime hipotecário dos

Estados Unidos, expandindo-se para uma

crise de dívida soberana na Zona do Euro e

terminando em uma crise econômico-finan-

ceira global. Segundo, os desequilíbrios

econômicos no mercado imobiliário residen-

cial local, com uma imensa oferta sem de-

manda. Terceiro, as consequências da rá-

pida expansão de crédito no sistema finan-

ceiro a partir de 2009, com o surgimento de

empréstimos problemáticos (ainda não total-

mente identificados).

As projeções para 2015 são de crescimento

do PIB de 7,0% (continuando a trajetória de

queda), manutenção taxa de inflação ao

consumidor (2,4%) e da taxa de desemprego

(4,0%) e aumento do superávit em transa-

ções correntes para 2,0% do PIB. O cresci-

mento mais lento da economia chinesa

neste ano estará, ainda, associado a um

preço mais baixo do barril de petróleo. Assim,

a China irá "exportar deflação" para o resto

do mundo: os preços das mercadorias que

saem da China já estão caindo e esta ten-

dência deve continuar. Os Estados Unidos, a

Europa e a América Latina serão pressiona-

dos por produtos chineses baratos, redu-

zindo a inflação e, na Zona Euro, com possi-

bilidade até mesmo de deflação. Como re-

sultado, os bancos centrais, confrontados

com uma taxa de inflação inferior à meta,

podem ser mais cautelosos sobre o aumento

das taxas de juros, mesmo se suas respecti-

vas economias estiverem crescendo a um

ritmo saudável, arriscando a recriação das

condições que levaram ao surgimento das

bolhas de ativos pré-2007.

Um risco relevante para a economia mundial

é uma desaceleração chinesa mais acentu-

ada do que o esperado, com um cenário de

"pouso forçado" (crescimento do PIB redu-

zido para apenas 5,0% e permanecendo

baixo por um período prolongado). Uma de-

saceleração mais intensa da China reduziria

as exportações de países como a Alemanha,

que vendem máquinas e equipamentos, e

aqueles como o Brasil, que fornecem maté-

rias-primas (em particular, produtos minerais

e agropecuários). Além disso, os preços das

commodities sofreriam declínios ainda mais

significativos, que prejudicariam os países

exportadores de recursos naturais em todo o

mundo (este ano, o Brasil sofreu os efeitos

negativos da queda da cotação do minério de

ferro decorrente, em grande parte, da redu-

ção do crescimento chinês). Em termos ge-

rais, esta desaceleração implicaria em ondas

de choque negativas para o resto do mundo

prejudicando o crescimento, o emprego e as

exportações.

América do Sul – Os Desafios do

Populismo, da Desigualdade e do

Preço do Petróleo

O desenvolvimento da América do Sul (e

mesmo da América Latina) ao longo dos últi-

mos 50 anos é um dos mais curiosos episó-

dios na histórica econômica moderna. Em

1960, o PIB dessa região equivalia a 30%

daquele dos Estados Unidos; em 2010, esta

participação era pouco superior à 20%. As-

sim, não apenas o nível de renda é baixo

mas, ainda, ela ficou relativamente menor.

Este resultado contrasta fortemente com

aquele observado em diversos países da re-

gião da Ásia-Pacífico (em particular, China,

Japão, Índia e Coréia do Sul), que se encon-

travam em estágio de desenvolvimento infe-

rior ou similar. Atualmente, o principal pro-

blema da região é a queda absoluta e relativa

da renda – particularmente, em países como

Argentina, Bolívia, Peru e Venezuela. Além

disso, a economia brasileira, a maior da re-

gião (em termos de PIB e população), estag-

nou nos últimos quatro anos, em função de

Page 10: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 10

uma política macroeconômica populista, vo-

luntarista e inconsistente.

Desde o pós-guerra o desempenho econô-

mico da América Latina está associado a ten-

tativas de ajuste – como no caso do Brasil

recente, populistas, voluntaristas e inconsis-

tentes – aos desequilíbrios estruturais e a cri-

ses sucessivas, econômicas e políticas. A

elevada volatilidade da atividade econômica

é um fato nestes países e, de fato, uma das

razões do seu baixo desempenho. Um outro

problema, certamente associado ao anterior,

é a baixa produtividade do trabalho (PIB por

trabalhador) e total dos fatores. Apesar de

todas as tentativas, e dos avanços conquis-

tados, os problemas ainda permanecem e,

consequentemente, a qualidade de vida da

população local é muito inferior àquela que

poderia ser atingida.

A América do Sul deve apresentar em 2014

um crescimento do PIB de apenas 0,9% (in-

ferior à média histórica dos últimos anos),

uma inflação ao consumidor de 9,5%, uma

taxa de desemprego de 6,0% e um déficit em

transações correntes de -2,5% do PIB. As

disparidades entre os países da região são

imensas. A taxa média de crescimento regi-

onal foi determinada, principalmente, pelo

fraco – ou negativo – crescimento de algu-

mas das maiores economias: Argentina (-

0.2%), Brasil (0,2%) e Venezuela (-3.0%).

Comparativamente, o crescimento da Bolívia

foi de 5,2%, da Colômbia, de 4,8%, e do Pa-

raguai e Equador, 4,0%.

As projeções para 2015 são de crescimento

do PIB de 1,5%, taxa de inflação ao consu-

midor de 9,0%, manutenção da taxa de de-

semprego (6,0%) e aumento do déficit em

transações correntes para -2,8% do PIB.

Dois dos principais riscos para a região neste

ano são a deflação na Zona do Euro e a vo-

latilidade em outras economias emergentes

– em particular, na China.

Este crescimento também deve ser bastante

desigual. Para as maiores economias (Brasil,

Chile, Colômbia, Peru e Uruguai), financeira-

mente abertos e exportadores de commodi-

ties, o crescimento médio, deve ficar abaixo

de 4,0%, sendo a menor taxa de cresci-

mento do PIB esperada para o Brasil. Entre

esses países, as condições internas serão

fundamentais para a manutenção da estabi-

lidade neste ano. Por exemplo, o Brasil está

buscando superar os gargalos de oferta que

limitam a expansão da produção e aumen-

tam a taxa de inflação. Para outros exporta-

dores de commodities da região o quadro é

ainda menos favorável. Na Argentina e Vene-

zuela, as pressões sobre a inflação, o sando

em transações correntes e a taxa de câmbio

mercados remontam a 2013 e devem conti-

nuar neste ano.

Além disso, uma taxa de inflação mais baixa

nas economias mais desenvolvidas pode re-

duzir ainda mais as expectativas futuras de

inflação, implicando em um aumento das ta-

xas de juros reais (com taxas de curto prazo

perto de zero). Ainda, o crescimento mais

fraco de outras economias emergentes deve

impactar negativamente os mercados de

commodities, sendo que o esperado au-

mento da demanda global deve ser contra-

balançado por preços de commodities mais

baixos. Por fim, temos os efeitos do término

dos estímulos monetários nos Estados Uni-

dos e o reequilíbrio na China. Cada uma des-

tas variáveis contribui para o aumento da vo-

latilidade macroeconômica global e regional.

Assim, os formuladores de políticas precisa-

rão de arcabouços ágeis, flexíveis e resilien-

tes de modo a mitigar os choques esperados.

Neste cenário, a formulação de políticas ma-

Page 11: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 11

croeconômicas consistentes, capazes de ab-

sorver choques, permanece na ordem do dia.

E finalmente, precisam ser adotadas refor-

mas estruturais para educação, infraestru-

tura, e os mercados de produto e de traba-

lho, de modo a permitir o crescimento a um

ritmo mais elevado e mais sustentável ao

longo do tempo.

Um tema pontual ao final do ano passado foi

o reatamento de relações diplomáticas entre

Cuba o os Estados Unidos (que removeu um

obstáculo importante no seu relacionamento

com a América Latina), abrindo espaço para

áreas de colaboração mais produtivas. Esta

mudança de política permite o engajamento

dos Estados Unidos em uma agenda muito

mais ampla, incluindo temas como democra-

cia e direitos humanos, inclusão social, com-

petitividade, energia e meio-ambiente. Em

resumo, os Estados Unidos devem fortalecer

o seu soft power na região.

Apesar disto, é possível que alguns países da

região, particularmente a Venezuela, tenham

fortes preocupações com a normalização das

relações diplomáticas entre estes dois paí-

ses. Historicamente, a Venezuela é um im-

portante fornecedor de petróleo para os Es-

tados Unidos apesar da sua participação da

pauta de importações ter declinado nos últi-

mos anos. Além disso, as relações entre eles

têm deteriorado ao longo da última década

e, ainda, a Venezuela lidera um grupo de oito

países (Venezuela, Cuba, Bolívia, Nicarágua,

Dominica, Equador, Antígua e Barbuda e São

Vicente e Granadinas) membros da Aliança

Bolivariana para os Povos da Nossa América

- Tratado de Comércio dos Povos (antiga Al-

ternativa Bolivariana para as Américas -

ALBA) que, em geral, adota posições de po-

lítica externa contrárias aos Estados Unidos.

Desde 2000 a Venezuela fornece petróleo a

Cuba sob condições comerciais bastante

vantajosas, em retorno pelo apoio técnico,

médico e político de Cuba.

A economia venezuelana está em franca de-

terioração e a nova política entre os Estados

Unidos e Cuba pode levar ao seu isolamento

crescente na região. A Venezuela depende

do petróleo para 95,0% das suas reservas

cambiais, importando mais de 70% dos bens

de consumo básico. A queda do preço do

barril de petróleo representa uma restrição

significativa na capacidade do governo em

atender ao consumo básico local e financiar

a sua política diplomática baseada no petró-

leo. Mais ainda, a deterioração desta econo-

mia deve impactar negativamente o soft po-

wer do regime bolivariano na região. Não foi

outro o pedido de "socorro" ao Brasil feito

pelo presidente da Venezuela, Nicolás Ma-

dura, ainda na posse da presidente Dilma.

Brasil – Os Desafios do Ajuste

após o Fracasso da "Nova Matriz

Econômica"

O Brasil é a maior economia da América do

Sul, considerando o tamanho do seu PIB, a

sua área geográfica e a sua população. Mais

ainda, é dotado de extensas reservas de re-

cursos naturais – petróleo, minerais e flores-

tas – e persiste na construção de um sistema

político democrático desde 1985. Em termos

globais é a sétima maior economia, atrás dos

Estados Unidos, China, Japão, Alemanha,

França e Reino Unido, tendo deixado de

avançar posições nos últimos quatro anos.

Apesar de todo o seu potencial, o Brasil

ainda apresenta disparidades regionais signi-

ficativas, especialmente em indicadores so-

ciais como saúde, mortalidade infantil, nutri-

ção, educação, mobilidade e acesso a tec-

nologias de comunicação. Em termos gerais,

Page 12: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 12

as regiões Sul e Sudeste possuem indicado-

res econômicos e sociais muito superiores

aquelas do Norte e Nordeste. Mais ainda,

apesar da queda consistente da pobreza nos

últimos 20 anos, ela ainda assola uma par-

cela importante da nossa população, pri-

vando o acesso à educação primária, saúde

básica e nutrição de milhões de brasileiros.

O Brasil, como outras economias emergen-

tes no mesmo estágio de desenvolvimento,

depara-se com uma série de desafios econô-

micos, políticos e sociais de natureza estru-

tural. Estes desafios estão diretamente rela-

cionados à evolução histórica do país, à sua

inserção no sistema mundial de governança

e aos gargalos e disparidades econômicas e

sociais que há séculos definem a sua estru-

tura sociedade. A identificação destes desa-

fios é tarefa muito mais simples do que a de-

cisão política e a alocação de recursos, físi-

cos e financeiros, para a sua superação.

Cabe ao governo – em suas diversas instân-

cias decisórias – hierarquizar as demandas

da sociedade e formular e implantar as es-

tratégias e ações necessárias para superá-

los.

Mais ainda, estes desafios estruturais que

solapam há décadas o nosso desenvolvi-

mento foi potencializado por uma política

econômica nos últimos quatro anos que

comprometeu sobremaneira a capacidade

do país em superá-los. Esta política, materi-

alizada na chamada "Nova Matriz Econômica"

foi elaborada a partir de uma visão ideológica

de afronta à organização dos mercados, à

proteção dos direitos de propriedade e de re-

púdio à convivência harmoniosa com o setor

privado na construção de mecanismos que

permitissem ao país ao menos a manuten-

ção da sua participação relativa no sistema

econômico mundial. Do ponto de vista insti-

tucional a política econômica entre 2011-

2014 pode ser resumida como populista, vo-

luntarista e inconsistente. O seu abandono,

anunciado veladamente durante a campa-

nha eleitoral do ano passado, é prova cabal

da sua insustentabilidade e da necessidade

de se readequar as políticas públicas com o

objetivo de viabilizar o crescimento domés-

tico.

Por fim, cabe observar ainda que, além da

questão estrutural, o Brasil teve eleições ge-

rais no ano passado que, juntamente com a

Copa do Mundo de futebol, acabaram por

prejudicar o seu desempenho econômico. A

teoria econômica estuda, há décadas, os

chamados ciclos político-econômicos, sendo

uma proposição fundamental desta teoria

que os políticos, conhecedores dos efeitos

do momento econômico sobre os votos dos

eleitores, manipulam as variáveis macroeco-

nômicas, com objetivo de serem eleitos (ou

reeleitos). Assim, com a proximidade das

eleições, os principais instrumentos de polí-

tica econômica são direcionados à expansão

da economia. Depois do período eleitoral,

são adotadas medidas contracionistas, a fim

de reverter os efeitos adversos da política ex-

pansionista adotada anteriormente. Este ci-

clo, quando conjugado com os problemas

estruturais, deve demandar medidas ainda

mais fortes.

A expectativa dos mercados – e da popula-

ção em geral – é o reconhecimento pelo exe-

cutivo federal de que a estabilidade macroe-

conômica é condição fundamental para o de-

senvolvimento e a inserção social de milhões

de brasileiros. Essa estabilidade se resume

ao controle da inflação nos níveis observados

nas economias mais desenvolvidas (de 2,0 a

3,0% ao ano), a disciplina fiscal e monetária,

a gestão pública eficiente e a programas so-

ciais focalizados na população mais carente.

É óbvio que intervenções pontuais em deter-

Page 13: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 13

minados setores de atividade e o uso de po-

líticas anticíclicas inteligentes devem ser de-

fendidas. No entanto, isto não deveria impli-

car na adoção generalizada de medidas de

ajustes descontínuas, populistas e de baixa

eficiência e eficácia – apesar de todas as

pressões políticas em sentido contrário. Nas

palavras da presidente da República em sua

diplomação e do ministro da Fazenda em sua

posse, é preciso dar cabo do "sistema patri-

monialista" que assola o país desde o seu

descobrimento.

O cenário atual brasileiro é um dos mais fa-

voráveis do mundo, em praticamente todos

os setores de atividade econômica. É claro

que a crise financeira mundial deve continuar

limitando a produção e o emprego local. No

entanto, a formulação e implantação de po-

líticas públicas inteligentes e a demanda do-

méstica devem mais do que compensar os

seus efeitos negativos e assegurar um cres-

cimento sustentável a taxas mais elevadas.

É preciso, apenas, o abandono de dogmas e

de políticas econômicas ultrapassadas, po-

pulistas e inconsistentes.

Após os ajustes necessários, principalmente

ao longo deste ano, a economia brasileira

deve se recuperar gradualmente após um

longo período de desaceleração, motivada

principalmente por fatores internos, quando

o crescimento do PIB caiu de 7,5%, em

2010, para apenas 0,2% em 2014. Neste

período, a produção industrial e a demanda

por investimentos foram afetadas despropor-

cionalmente. Por outro lado, a demanda ex-

terna se deteriorou num cenário de prolon-

gado enfraquecimento e incerteza nas eco-

nomias desenvolvidas, além da desacelera-

ção das principais economias emergentes,

como a China.

A vulnerabilidade do país ao cenário externo

deve continuar moderada devido às reservas

internacionais que permanecem em patama-

res elevados, à favorável composição da dí-

vida externa, ao montante do investimento

estrangeiro direto que segue financiando

grande parte do déficit nas transações cor-

rentes (apesar deste situar-se ao redor de

3,0% do PIB), ao relativamente baixo nível de

abertura ao comércio internacional quando

comparado a outros emergentes, a pequena

parcela da dívida pública nas mãos de não

residentes, e ao regime de câmbio flutuante.

Mais ainda, o compromisso da nova equipe

econômica com o controle da inflação e a

prudência fiscal – sem "contabilidade cria-

tiva" – devem reduzir a vulnerabilidade da

economia a choques externos e potencializar

o crescimento doméstico. Nas palavras no

novo ministro da Fazenda em seu discurso

de posse, "assim, restam poucas dúvidas de

que, mais uma vez, a democracia brasileira

dá prova de sua excelência, ao reafirmar o

consenso do imperativo da disciplina fiscal

para o crescimento econômico e social e

para o desenvolvimento sustentável." Este

consenso começa a materializar-se com uma

meta de superávit primário de 1,2% do PIB

neste ano e de 2,0% em 2016, obtido com

aumento das receitas, controle das despesas

e melhor gestão da res pública. Em conse-

quência, a dívida bruta do setor público – o

novo indicador de referência, ao invés da dí-

vida líquida – deverá cair no futuro, apesar

dos desafios de preservação do equilíbrio fis-

cal frente à demanda por investimentos e a

pressão popular por mais e melhores servi-

ços.

Neste cenário, e com os anúncios e as ex-

pectativas já formadas, este ano deve mar-

car o início da reconstrução dos fundamen-

tos macroeconômicos da economia brasi-

leiro – formulados originalmente em 1995,

com o Plano Real – preservando-se o pro-

cesso de incluso social da população mais

Page 14: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 14

carente e implantando, de fato, o combate

ao malfeito.

Page 15: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 15

Projeções econômicas para 2015

Crescimento do

PIB (%)

Inflação ao consu-

midor (%)

Desemprego

(%)

Déficit em transações

correntes (% do PIB)

Estados Unidos 3,2 2,0 6,0 -2,5

Zona do Euro 1,2 1,0 11,0 -2,0

Japão 0,8 2,2 3,7 1,0

Rússia 0,5 7,5 7,0 2,9

Índia 6,5 7,5 3,8 -2,2

China 7,0 2,4 4,0 2,0

América Latina 1,5 9,0 6,0 -2,8

Brasil 0,8 6,5 7,3 -3,3

Zona do Euro: Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia,

Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos e Portugal.

América Latina: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela.

A projeção da taxa de desemprego para o Brasil é feita com base nos resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de

Domicílios Contínua - PNADC, elaborada pelo IBGE.

Fonte: BCE, Banco Mundial, BIS, BIS, Cepal e FMI; análise Delta Economics & Finance.

Avaliação das economias da América do Sul

Política Economia Social Competitividade Doing business

Argentina muito ruim muito ruim ruim muito ruim muito ruim

Bolívia neutro neutro ruim muito ruim muito ruim

Brasil bom ruim ruim ruim ruim

Chile muito bom bom bom bom muito bom

Colômbia neutro neutro muito ruim ruim muito bom

Equador neutro neutro muito ruim ruim ruim

Paraguai neutro neutro neutro muito ruim ruim

Peru bom neutro muito ruim ruim muito bom

Uruguai neutro neutro ruim muito ruim ruim

Venezuela muito ruim muito ruim muito ruim muito ruim muito ruim

Fonte: com base em informações compiladas pelas Nações Unidas, Cepal e FMI; análise Delta Economics & Finance.

Page 16: 2015 delta perspectivas econômicas para 2015

C U R R E N T I S S U E S

__________________________________________________________________________________

DELTA ECONOMICS & FINANCE 16

Luiz Nelson Porto Araujo, economista, é sócio-diretor da Delta Economics & Finance. Foi Professor do De-

partamento de Planejamento e Análise Econômica da EAESP-FGV e da FCECA da Universidade Macken-

zie.

As opiniões expressas nesse estudo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es) e não expressam,

necessariamente, a visão da Delta Economics & Finance.

Sobre a Delta

Fundada em 2000, a Delta é uma empresa brasileira de consultoria econômica e financeira. Nossa mis-

são é oferecer soluções de qualidade aos nossos clientes mediante um compromisso com ética, inova-

ção, trabalho em equipe, alianças estratégicas e capacidade analítica.

Disponibilizamos sofisticadas soluções em corporate finance, economic regulation, local development &

logistics e strategy & operations. O diferencial destas soluções está na utilização de modernos métodos

analíticos.

Nossos profissionais possuem extensa experiência em vários setores de atividade econômica, dentre eles,

automotivo, bancário, óleo e gás, petroquímico, construção, imobiliário, energético, transportes e saúde.

Para maiores informações, visite nosso site:

www.deltaef.com

Disclaimer

This research is based on information obtained from, or are based upon public information sources that are considered to be

reliable, but Delta does not make any representation with respect to its completeness or accuracy and, therefore, of which we

assume no liability. All opinions expressed herein reflect the author’s judgment at the original time of publication, without regard to

the date on which the User may receive such information, and are subject to change without notice. Delta reserves the right to

modify the views expressed herein at any time without notice. Moreover, Delta reserves the right not to update this information or to

discontinue it altogether without notice.

Delta may have issued other research that are inconsistent with, and reach different conclusions from, the information presented in

a particular research. These publications reflect the different assumptions, views and analytical methods of the analysts who

prepared them. Past conclusions should not be taken as an indication or guarantee of future conclusions, and no representation or

warranty, express or implied, is provided in relation to future conclusions.

The material in each of these publication is copyrighted. Copying and/or transmitting portions or all of a particular research without

permission may be a violation of applicable law. Delta encourages dissemination of its work and will normally grant permission to

reproduce portions of the work promptly.

© 2015 – all rights reserved

Delta Economics & Finance