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© 2017 by INTELECTO EDITORA
Produção editorial: Demes Brito
Diretor editorial: Demes Brito
Diagramação e revisão: Formato Serviços
Capa: Intelecto Soluções Inteligentes
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Coletânea de temas tributários grupo de pesquisas do
direito Mackenzie / líder Eduardo Marcial Ferreira Jardim;
coordenadora Letícia Menegassi Borges. – 1. ed. –
São Paulo: Editora Intelecto, 2017.
Vários autores.
ISBN 978-85-5827-017-5
1. Direito – Coletâneas 2. Direito tributário – Artigos 3.
Universidade Presbiteriana Mackenzie I. Jardim, Eduardo Marcial
Ferreira. II. Borges, Letícia Menegassi.
17-03196
CDU-34:336.2
Índices para catálogo sistemático:
1. Direito tributário : Coletânea de artigos 34:336.2
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É proibida a reprodução total
ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos
direitos de autor (Lei no 9.610/98) é crime estabelecido pelo
artigo 184 do Código Penal.
Impresso no Brasil/Printed in Brazil
Nota: O Acordo Ortográfico foi aplicado integralmente nesta obra.
INTELECTO EDITORA
Rua Turiaçu, 390, 5o andar
Perdizes
05005 000 São Paulo SP
011 2592 8003
intelectosolucoes.com.br
SUMÁRIO
Prefácio ................................................................................................. vii
INCONSTITUCIONALIDADES TRIBUTÁRIAS PONTUAIS ......................... 1
Eduardo Marcial Ferreira Jardim
SEGURANÇA JURÍDICA E A GUERRA FISCAL ........................................ 19
Juliana Nogueira Ortigosa
CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRAVA DE 30% NA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS NA EXTINÇÃO DA PESSOA JURÍDICA .................... 55
Alexandre Evaristo Pinto; Letícia Menegassi Borges
CONSTRUÇÃO E RECONSTRUÇÃO DO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO: DA TIRANIA DO TEXTO À TIRANIA DO ESPÍRITO ....................................... 93
Leonardo Ogassawara de Araújo Branco
EXTRAFISCALIDADE E OS TRIBUTOS AMBIENTAIS: O DIREITO TRIBUTÁRIO COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE .......................................................................................... 119
Leonardo Rodrigues de Godoy
A “(IN)JUSTIÇA” FISCAL À LUZ DO PACTO FEDERATIVO ...................... 157
Luciano de Almeida Pereira
vi JARDIM / BORGES
A NÃO INCIDÊNCIA DO ISS NA EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS E A INDEFINIÇÃO DO CONCEITO DE RESULTADO DO SERVIÇO .................. 171
Marcela Fernandes Muniz de Melo
FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE) PARA O EQUILÍBRIO SOCIAL E ECONÔMICO DO FEDERALISMO 209
Maykel Ponçoni
NOTA FISCAL PAULISTA ...................................................................... 227
Paulo Sérgio Nogueira Salles
SINDICALIZAÇÃO CONSUMERISTA E A CONTRIBUIÇÃO SOCIAL DE PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR (CPCON) .............................................. 263
Rafael Albertoni Faganello
A (IN)VALIDADE DA MODULAÇÃO TEMPORAL DOS EFEITOS DA DECISÃO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA .................................................... 291
Thaís Fernandes Pereira
A Tributação em nosso país estampa uma contradictio in terminis,
pois, de um lado, hospeda o mais bem elaborado sistema constitucional
tributário em comparação com o direito estrangeiro, enquanto, de outra
parte, abriga uma legislação em flagrante descompasso com o figurino
constitucional.
Deveras, no plano excelso as virtudes despontam à saciedade, na
dimensão em que a Constituição Federal versou a matéria tributária de
forma exaustiva como nenhum outro Texto no cenário comparado. No
palco internacional, aliás, ao dispor sobre tributação, a Constituição
dos Estados Unidos da América do Norte, por exemplo, por meio da
Seção VIII, dedica um único artigo ao tema, ao investir o Congresso de
poderes para legislar sobre o assunto.
que as leis de finanças devem determinar as receitas e as despesas do
Estado de acordo com a lei orgânica, conforme o disposto no art. 34
do referido Texto. Na mesma trilha dispõe a Constituição da Itália que
consagra o postulado da legalidade como regra para a instituição de
prestação pessoa ou patrimonial. Enfim, esse é o modelo adotado por
todos os países no tocante à tributação no patamar constitucional, na
dimensão em que a matéria é pouco ou minimamente positivada em
suas Constituições.
Entre nós, dá-se exatamente o contrário, pois, desde a Emenda nº
18/65, editada sob a égide da Carta de 1946, o Brasil foi aquinhoado com
um sistema tributário constitucionalizado que homenageou a tributação
PREFÁCIO
viii JARDIM / BORGES
com um Capítulo específico, no qual emergem dezenas e dezenas de
normas versando o assunto.
O sistema tributário instalado em 1965 foi mantido nas Cartas de
1967, bem como em 1969, tendo sido ampliado na Constituição de
1988, convindo obtemperar que a estrutura original foi preservada, a
qual consiste numa partilha rígida de competências distribuídas entre
a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, tudo conjugado com
sobrenumeráveis comandos que esmiúçam todos os meandros da tribu-
tação, a exemplo de mencionar as espécies tributárias em seu substra-
to, bem como determinando que o IPI e o ICMS serão seletivos e não
cumulativos, dentre incontáveis outras regras que norteiam a tributação.
Com efeito, as virtudes de nosso sistema constitucional tributário
afiguram-se evidentes, na dimensão em que instrumentam as pessoas
jurídicas de direito público interno a obterem as receitas necessárias
por meio da tributação e ao mesmo tempo limitam o poder tributário
do Estado, protegendo, assim, o cidadão e o contribuinte.
Ademais, a apontada exaustividade impregna o sistema de clareza
solar, otimizando, destarte, as condições para a produção legislativa de
excelente qualidade, o mesmo ocorrendo em relação à edição de norma
concreta e individual objetivada a resolver conflitos entre a Fazenda
Púbica e o contribuinte.
Entretanto, o que se verifica é exatamente o contrário, porquanto,
não raro, a legislação tributária é confusa e, sobretudo, inconstitucio-
nal, fato veementizado, aliás, no primeiro estudo desta Coletânea com
a denominação de “Inconstitucionalidades Tributárias Pontuais”. Para
agravar o problema, a legislação processual e a burocracia, ao revés de
resolverem demandas, fazem o contrário, pois eternizam as controvér-
sias judicializadas.
Os Estudos contidos neste livro representam o resultado de debates,
seminários e exposições que ocorreram no decorrer do ano-calendário
de 2016, os quais problematizam tópicos controversos na seara da tri-
butação. A visão dos trabalhos é pautada pela óptica crítica dos temas
abordados, tudo dentro de uma concepção constitucional.
Afora o trabalho de Marcela Fernandes Muniz de Melo, autora con-
vidada, os demais autores integram o Grupo de Pesquisa que presido,
convindo observar o caráter heterogêneo de seus integrantes, pois há
ix
tanto bacharel formado há pouco tempo, como há mestrandos, mestres,
doutor, professores de direito, advogados e juízes do Conselho Admi-
nistrativo de Recurso Fiscais do Ministério da Fazenda e do Conselho
Tributário Municipal.
nos trabalhos do Grupo de Pesquisas durante o ano, culminando com
a elaboração dos estudos objeto desta obra, acalentando que tenhamos
sucesso em nossa permanente empreitada. Por derradeiro, expresso
os meus cumprimentos e o preito de minha gratidão e admiração aos
estimados colegas e amigos que participaram desta obra.
Eduardo Marcial Ferreira Jardim
Eduardo Marcial Ferreira Jardim1
Sumário: Introdução. 1. Breves reflexões sobre hermenêutica. 2.
Cobrança ânua dos impostos sobre a propriedade. 3. Tributos cumu-
lativos. 4. ICMS sobre bens. 5. Desvinculação de Receitas da União/
DRU. 6. Ação Declaratória de Constitucionalidade/ADC. 7. Negação
de prestação jurisdicional em face da eternização do processo judicial.
8. Inconstitucionalidade do § 9º do art. 195 da Constituição Federal
e a CSLL de bancos e instituições financeiras. Conclusões.
INTRODUÇÃO
Consoante estampado pelo próprio sumário, a proposta tematizada
compreende imensurável abrangência e incursiona numa seara plena
de controvérsias que, a rigor, cada tópico renderia ensanchas para uma
monografia.
Entrementes, a proposta deste estudo não cogita incursionar nos
meandros dos múltiplos itens a serem desenvolvidos, mas cogita, sim,
remeditar sobre todos os referidos pontos temáticos e refletir critica-
mente sobre a quintessência dos aludidos títulos, mostrando de forma
compendiada e incisiva as vicissitudes que permeiam os mencionados
campos da tributação, todos, no ver do autor, maculados de inegável
coima de inconstitucionalidade.
1 Mestre e Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pro-
fessor Titular de Direito Tributário na Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie.
INCONSTITUCIONALIDADES TRIBUTÁRIAS PONTUAIS
2 JARDIM / BORGES
Destarte, é com esse animus que autor reafirmará a sua postura
pioneira no sentido de insurgir-se contra a cobrança anual de tributos
sobre a propriedade, bem como questionará sobre a absurda cobrança de
tributos cumulativos, embora na contramão do figurino constitucional.
Nessa vereda, não se forra de visão crítica deste estudo a cobrança
de imposto mercantil sobre bens, senão também o estelionato fiscal
representado pela DRU ou mesmo a afronta à direito e garantia sim-
bolizada pela ADC, além de analisar a inconcebível eternização do
processo judicial e o desrespeito ao postulado da igualdade em relação
à legislação da CSLL.
Por fim, dada a magnitude do Congresso Nacional IBET, o autor
entendeu por oportuno versar temas dessa dimensão e expor ao crivo
competente dos congressistas, acalentando que tenha alguma repercus-
são na busca pelo respeito ao cidadão e ao Texto Excelso.
Parafraseando RUY: “Com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora
da lei não há solução” (Discursos parlamentares. Rio de Janeiro: Ministério
da Educação e Saúde, 1892, 19 v., t. I, Capítulo XII, p. 285-289, Obras
Completas).
1 BREVES REFLEXÕES SOBRE HERMENÊUTICA
O Direito Positivo brasileiro proclama a literalidade como sua pre-
missa maior, pelo que, em regra, a letra rasa e pedestre da lei traduz o
a edição da norma concreta e individual. Essa noção, aliás, encontra-se
positivada no art. 4º da Lei de Interpretação do Direito Brasileiro, o
mesmo ocorrendo nos arts. 126 e 495, V, do Código de Processo Civil,
sem contar os arts. 108 e 111 do Código Tributário Nacional, dentre
outros diplomas normativos. A bem ver, esses comandos estabelecem
como regra a aplicação da letra da lei e somente na ausência de dispo-
sição expressa é que o intérprete ou aplicador, enfim, empregariam a
Por incredível que pareça, esse anacronismo se reporta aos albores
do primeiro direito nacional, no caso o Código Civil Francês de 1805.
Naquela época, a literalidade se justificava enquanto representava uma
fronteira intransponível ao absolutismo monárquico e, por essa forma,
haveria de proteger os direitos básicos do cidadão. Ademais, como
3
admitia Demolombe, a codificação teria o condão de prever todos os
acontecimentos possíveis no mundo fenomênico, explicando, assim, a
concepção estritamente literal do direito.
Todavia, a literalidade teve vida fugaz, pois não tardou um impor-
tante avanço no plano interpretativo, uma vez que a Escola de então,
a Exegese, aprimorou a busca da compreensão do direito por meio da
conjugação da literalidade com a lógica no plano normativo.
Se a letra isolada valesse, o turista não teria direito à vida e nenhuma
outra garantia enumerada no art. 5º da Carta da República, porquanto
a literalidade contempla tão somente os brasileiros e os estrangeiros
residentes. Como se vê, a literalidade conduz a absurdos dessa natureza.
Da mesma forma, à luz da letra do art. 156, X, do Código Tributário
tributária. Cumpre ponderar, por óbvio, que a extinção somente ocorre
se favorável ao contribuinte, em despeito do disposto na letra, o que
revela, mais uma vez, a impropriedade da literalidade que é simples
leitura do texto normativo e não interpretação.
Por oportuno, merece ser lembrada a sutil e cáustica lição de Gustav
Radbruch, citado por Recaséns Sichez, na qual diz ele que uma nor-
ma estampada numa Estação Ferroviária que proíba levar cães naquele
local, poderia ensejar o repúdio do literalista que, a seu turno, diria
que a proibição diz respeito apenas a cães, logo, não se aplica a ursos,
hipopótamos, leões, tigres etc.! É a visão literal.
O que se propõe, consiste na combinação de todos os meios interpre-
tativos em qualquer labor exegético, no caso a linguagem, não fora de
contexto, mas com a dimensão do significado das palavras, combinada
com os métodos lógico, analógico, teleológico, histórico-evolutivo e
sistemático. Todos devem ser compulsados sempre, embora, vez por
outra, um deles haverá de prevalecer no alentado caminho de desven-
damento do direito.
Em estreita síntese, pode-se dizer que a linguagem reveste a maior
importância, a exemplo de memorável lição do Ministro Luiz Gallotti,
proferida no RE nº 71.758/GB, a saber:
Como sustentei muitas vezes, ainda no Rio, se a lei pudesse chamar de
compra o que não é compra, de importação o que não é importação,
4 JARDIM / BORGES
de exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda,
ruiria todo o sistema tributário inscrito na constituição.
Ainda há poucos dias, numa carta ao eminente Ministro Prado Kelly
a propósito de um discurso seu sobre Milton Campos, eu lembrava a
frase de Napoleão: “Tenho um amo implacável, que é a natureza das
coisas” (RTJ 66/165 – O grifo é nosso).
Na mesma vereda, cabe lembrar o bloqueio de ativos estabelecido
por meio de Medida Provisória do Presidente Collor, em que o Governo
perdeu todas as demandas pela simples razão de que aquela providência
afrontava o direito de propriedade, cuja estrutura semântica significa o
direito de usar, gozar e dispor.
O analógico, como sabido, consiste basicamente na aplicação da
norma a um caso semelhante, meio interpretativo já desenvolvido pela
Escola da Exegese. No Tributário, por exemplo, em que pese ao pre-
conceito acerca de sua suposta inaplicabilidade, a analogia é empregada
até pelos seus contestadores, como a cobrança de ISS sobre serviços de
saúde, assistência médica e congêneres, estes claramente inferidos por
meio de processo analógico.
O lógico, por sua vez, tem por supedâneo o raciocínio fulcrado na
conjugação da premissa maior, premissa menor e conclusão, método,
nidade de livros e jornais que se preordena a otimizar a democratização
da liberdade de manifestação e a viabilizar o acesso ao conhecimento e
à cultura, tudo pela intributabilidade constitucionalizada das mercado-
rias livros e jornais. Cabe recordar a imagem da estação ferroviária do
exemplo de Radbruck, em que o teleológico revela que a proibição de
levar cães aquele local tem por finalidade oferecer conforto, segurança
aos usuários, além de assegurar acentuado grau de higidez.
visão progressiva da lei, como queriam os pandectistas alemães, dentre
eles Windscheid, na segunda metade do século XIX. Pressupõe, assim,
a aplicação da lei à época em que se situa o intérprete e não ao tempo da
sua criação. É o caso, por exemplo, da criminalização do adultério que,
mesmo antes de sua revogação, perdera eficácia porquanto nas últimas
5
décadas não teria sentido uma conduta dessa feição ensejar repercus-
são de natureza penal, mas tão somente civil. Igual sorte, ocorre com
a imunidade no tangente ao livro eletrônico, o qual, ainda não havia
ao tempo da Carta de 1988, razão por que a visão histórico-evolutiva,
assim como a teleológica, autorizam dessumir o reconhecimento dessa
imunidade por esse prisma interpretativo.
Finalmente, o método sistemático repousa na concepção contextual
do Direito, na medida em que ao aplicar um artigo de um diploma nor-
mativo, deve o intérprete aplicar todo o Direito. Essa noção contextual
reconhece o Direito como um sistema no qual as normas se interligam
direta ou indiretamente, em relações de horizontalidade e verticalida-
de, em que as regras mais importantes e sobranceiras, os chamados
princípios, hospedam um valor superlativo que se espraia em todos os
quadrantes do Direito, ad exemplum dos direitos e garantias, forma de
Estado e forma de governo. Por conseguinte, esse método requer que a
norma sob exame seja contrasteada com os princípios constitucionais
gerais e aqueles específicos da área pesquisada, como meio de aquilatar
o seu traço de validade ou invalidade e a sua exata dimensão no cenário
jurídico.
2 COBRANÇA ÂNUA DOS IMPOSTOS SOBRE A
PROPRIEDADE
Conforme noção cediça, tanto entre nós, como no direito compa-
rado, os impostos sobre a propriedade tendem a ser cobrados todos os
anos. É o caso do IPVA, bem como do IPTU, senão também do IPTR.
Vejamos, pois, começando pelo Imposto sobre a Propriedade de Veículo
Automotor, segundo a legislação paulista, apenas à guisa de exemplo,
porquanto a exigibilidade anual se dá em todos os Estados da Federa-
ção. Assim, a legislação do Estado de São Paulo dispõe que o referido
imposto é devido anualmente e tem como fato gerador a propriedade
de veículo automotor.
Igual sorte informa a legislação do IPTU paulistano e dos demais
municípios do país ao atremar que o fato gerador ocorre todo dia 1º de
janeiro de cada ano. Idêntica disposição predisse a legislação do IPTR
federal, porquanto a legislação estipula que o fato gerador se verifica
todo dia 1º de janeiro de cada ano.
6 JARDIM / BORGES
Deveras, o modus faciendi pelo qual os impostos sobre a propriedade
são cobrados todos os anos é uma tradição incorreta que não resiste
a uma avaliação lógica. Ora, a referida exigibilidade ânua contraria a
lógica dos planos do nascimento e extinção do liame obrigacional, seja
no direito público, seja no direito privado, seja entre nós, seja alhures.
Destarte, como sabido e ressabido qualquer obrigação somente se
um fato qualquer qualificado pelo direito, portanto um fato juridicizado.
Assim, ocorrido o referido fato, exsurge uma obrigação que investe um
dado sujeito do direito subjetivo de exigir de outrem o cumprimento de
uma prestação. Por conseguinte, o pagamento regular, no valor correto
e temporaneamente, põe fim ao vínculo obrigacional. A afirmação resta
estreme de dúvidas, e tal raciocínio é dotado de inegável universalidade
e, por isso mesmo, é aplicável em qualquer campo normativo.
Torna-se de mister, pois, reconhecer que o legislador não dispõe de
um cheque em branco e fazer o que bem entender, máxime porque não
pode ele ir além de determinados balizamentos da lógica da teoria geral do
direito. É-lhe vedado criar teratologias desse jaez, ou seja, dizer que uma
obrigação extinta renasce todos os anos! Oh my God!, diriam os ingleses.
Posto isso, força é repensar a legislação dos impostos sobre a pro-
priedade e pugnar por reformular a legislação por um mínio de respeito
aos postulados da Teoria Geral do Direito e ao contribuinte que paga
a conta do Estado.
3 TRIBUTOS CUMULATIVOS
se tornaram comuns no direito positivo brasileiro, a exemplo das contri-
buições PIS e Cofins, sem contar o extinto Imposto sobre Movimentações
Financeiras/IPMF e também a extinta Contribuição sobre Movimentação
Financeira/CPMF, objeto de frequentes projetos de ressuscitação.
Mais uma vez, merece afasta a visão literalista que tende a admitir o
que está escrito, merecendo repúdio, também, a noção segundo a qual
sempre foi assim e ninguém falou nada. Essas cogitações são falaciosas,
na dimensão em que, quando muito, podem ser dotadas de persuasão
psicológica, mas falecem de um mínimo de densidade lógica, tudo na es-
7
Façamos uma reavaliação contextual, lógica e ontológica da vedação
à cobrança de tributos cumulativos de forma explícita e, ao depois, de
maneira implícita. As primeiras, sobejamente conhecida dos cultores
da tributação, são aquelas que alcançam o Imposto sobre Produtos
Industrializados/IPI, o Imposto sobre Operações relativas à Circulação
de Mercadorias/ICMS, bem como os impostos e as contribuições de
seguridade social de natureza residual.
Com efeito, o Texto Excelso contemplou a não cumulatividade com
as cores de princípio constitucional tributário e fê-lo no tocante aos
impostos sabidamente incidentes sobre a produção e a circulação – IPI
e ICMS – bem como retrilhou a vedação ao versar sobre impostos re-
siduais e contribuições de seguridade também residuais, caso tenham
natureza cumulativa.
Evidentemente, o Sistema Constitucional Tributário limitou-se a
proibir a tributação cumulativa tão somente com relação a tributos de
natureza cumulativa ou potencialmente cumulativa. A contrario sensu,
seria despropositado qualificar com a cláusula da não cumulatividade o
imposto sobre a renda ou o IPVA ou o IPTU ou qualquer outro gravame
de natureza economicamente monofásica.
Ante a esses comentos, força é depreender que o capítulo dedicado a
Tributação e Orçamento na Carta da República proíbe por todas as luzes
a tributação cumulativa, restando, assim, manifestamente inconstitu-
cionais todos os tributos cumulativos, o que encampa o PIS e a Cofins
cumulativa, tanto a de outrora, como aquela ainda cumulativa, além
do extinto IPMF e a extinta CPMF ou tributo com semelhante perfil.
Nem se diga que uma emenda poderia excepcionar um dado tributo
da não cumulatividade, até porque o sistema tributário é dotado de
petreidade decorrente do art. 154, I, que, ao permitir apenas a insti-
tuição de impostos e contribuições residuais, fechou as portas para
qualquer nova tributação ou modificação no plano do poder consti-
tuinte derivado.
4 ICMS SOBRE BENS
A contar da promulgação da Constituição de 1988 até o mês de
dezembro de 2001, o Texto Supremo qualificava como tributável pelo
ICMS a entrada de mercadoria importada, mesmo que fosse para uso
8 JARDIM / BORGES
próprio, consoante o disposto na redação original do art. 155, § 2º, IX,
a, do Texto Supremo, assim averbado: “incidirá também sobre a entrada
de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado
a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, assim como sobre serviço prestado
no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento
destinatário da mercadoria ou serviço”.
Em primeiro lugar, merece reproches a contradição redacional que
deforma o conceito de mercadoria, pois a coisa destinada a uso próprio
não é mercadoria, fato, diga-se a vol d’oiseau, indiscutível, o que mostra
mais uma vez a péssima qualidade da produção da norma jurídica no
direito pátrio.
Por óbvio, o referido equívoco lógico e terminológico deu margem a
incertezas e, sobretudo, a testilhas, o que abriu espaço para a aprecia-
ção do assunto no Congresso Nacional. Todavia, ao revés de corrigir as
cincas, o parlamento cristalizou o erro, reincidindo no erro de legislar
na contramão do figurino constitucional, como sói acontecer.
Tanto assim é, que, em dezembro de 2001, o poder constituinte
derivado editou a Emenda nº 33, a qual estabeleceu a importação de
bens como susceptível de tributação pelo ICMS, conforme estampa o
mandamento inserto no art. 155, § 2º, IX, a, da Constituição Federal,
assim grafado:
IX – incidirá também:
a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por
pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do
o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem
ou serviço. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
Realmente, trata-se de mais uma dentre as incontáveis teratologias
produzidas pelo legislador, máxime porque não se pode conciliar o
inconciliável, equipole dizer, não se pode tributar bem como se fosse
mercadoria. Merece relembrada a lição inesquecível de Luis Gallotti,
de acordo com a qual o legislador não pode designar uma coisa por ou-
tra, a exemplo de considerar bem como o mesmo que mercadoria, ou
chamar de renda o que não é renda, ou dizer que não é propriedade o
9
que é propriedade, sob pena de comprometer a lógica e a razão de ser
do direito e a segurança jurídica.
Em suma, ao revés de afugentar uma dúvida que não poderia existir,
o Poder Público culminou por produzir uma figura bizarra que causa
estupefação aos estudiosos da Ciência do Direito.
O absurdo não escapou da arguta crítica do festejado professor Ro-
que Carrazza que, ao questionar a disposição da Emenda nº 33, assim
atremou: “A prevalecer esta nova redação, terá agora que pagar o ICMS a
pessoa física que vier a importar bens para uso próprio, ainda que sem caráter de
habitualidade e sem exercer o comércio. Com esta marota alteração, abateu-se,
em pleno voo, jurisprudência que começava a seguir na traça da melhor doutrina.
É a velha política do atual Governo, que sempre que perde uma questão, máxime
na Suprema Corte, modifica a Constituição” (ICMS, Malheiros, p. 70, 2005).
5 DESVINCULAÇÃO DE RECEITAS DA UNIÃO/DRU
O art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias versou
o assunto, o qual aquinhoou o Poder Executivo com o percentual de
20% da arrecadação dos tributos federais, compreendendo, assim, os
interventivas econômicas.
Esse censurável privilégio em prol do Executivo foi instituído no
ano-calendário de 1994, com o nome de Fundo Social de Emergência,
modificado para Fundo de Estabilidade Fiscal e ganhou a denominação
atual desde 21 de março de 2000, por meio da Emenda nº 27. Desde sua
concepção gozou de vigência temporária, mas sempre foi prorrogado e,
conforme a história do país, a tendência é no sentido de perpetuar-se,
como aconteceu com a CPMF que, embora extinta, teima em voltar, ou
a Zona Franca de Manaus que, após sucessivas renovações, foi prorro-
gada até 2073!
A aludidas DRU afigura-se uma indecência sob múltiplos prismas,
pois, afora o percentual destinado à educação e aos repasses dos Fundos
de Participação, a receita dos impostos não pode ser afetada, consoante
dispõe o art. 1.657, IV, que assim averbou:
Melhor sorte não cabe ao produto da arrecadação das contribuições
sociais e das contribuições interventivas/CIDE, uma vez que o título
10 JARDIM / BORGES
na geração de recursos financeiros objetivados a financiar a ordem
social ou a reembolsar a União pela atuação interventiva. Logo, atri-
buir destinação diversa significa, no mínimo, o cometimento de uma
burla que o Magistrado Federal Andrei Pitten Velloso define como
estelionato fiscal, com quem o autor deste Estudo faz coro com todas
as letras (Jornal Carta Forense, de 3/10/2011).
o Pretório Excelso, passaram ao largo das observações ora enunciadas e,
culminou por legitimar o desvio de destinação que, não demasia iterar,
representa um acinte ao contribuinte e ao Estado de Direito.
6 AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE/ADC
Instituída por meio da Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março
de 1993, e interserta nos arts. 102, I, a, e 103, § 4º, da Constituição
Federal, representa meio que instrumentaliza o Presidente da Repú-
blica, ou a Mesa do Senado ou a Mesa da Câmara dos Deputados ou o
Procurador-Geral da República a postular uma prestação jurisdicional
no Pretório Excelso no sentido de declarar a conformidade de uma dada
lei ou ato normativo federal com a Lex Legum.
Sobremais, a decisão proferida pela Suprema Corte produz eficácia
contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judi-
ciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual, distrital federal e municipal, consoante o disposto art. 102,
§ 2º, do Diploma Magno. Logo, o tema objeto do decisum jamais poderá
ser demandado em qualquer juízo, instância ou tribunal.
no Judiciário e também em tribunais administrativos.
Vejamos, por exemplo, um breve relato do primeiro pleito desse jaez,
o qual versou sobre o contraste de constitucionalidade da contribuição
de seguridade social Cofins, à época, discutida com frequente sucesso
por contribuintes que se insurgiam contra a sua exigibilidade na Justiça
Federal de primeira instância e nos Tribunais Regionais Federais.
11
O Governo Federal de então, preocupado com o aludido insucesso, conforme prefalado criou a denominada ação declaratória de constitucio-nalidade por meio da Emenda nº 3/93. A propósito, a primeira demanda dessa natureza foi a ADC nº 01/DF e teve por mérito a pretensão de legitimar a Cofins e reverter as derrotas da União no judiciário federal. Com efeito, logrou êxito no seu intento e o STF proclamou a constitu-cionalidade da referida contribuição de seguridade social, cujos efeitos foram devastadores para os contribuintes que demandavam, pois os seus
indevida, até porque o revés se dera em face do tsunami representado pela ADC e não pela gestão da Procuradoria da Fazenda Nacional.
é a afronta irreparável a direito garantia fundamental do contribuinte que se vê obstado de bater às portas do judiciário e discutir o assunto, ainda que por outra óptica. Em suma, a ADC concebida pela Emenda nº 3/93, suprimiu da Carta da República um valor dotado de petreidade que é o direito sacramental de recorrer ao judiciário. É realmente tão espantoso, quanto inaceitável e revoltante.
em conta que o destinatário da decisão contida em ADC não participa do pleito e deve curvar-se à decisão, não podendo, jamais, opor-se àquilo que foi decidido!
Para rematar, o dislate merece um comento adicional, porquanto, ao contrário do nomen juris, a ADC não é ação, máxime porque a palavra ação pressupõe a existência do actum trium personarum, vale dizer, autor, juiz e réu. Logo, não configura ação o questionado pedido binomial entre autor e tribunal, conforme se verifica na ADC.
afigura-se vitando e de luminosidade solar, tanto que a sua censurável mácula e clara invalidade pode ser revelada em poucas palavras e sem torneios de linguagem, conforme as reflexões ora expostas de maneira concisa e objetiva.
7 NEGAÇÃO DE EFETIVA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL EM
FACE DA ETERNIZAÇÃO DO PROCESSO JUDICIAL
sentido de atividade do Estado consubstanciada na edição de norma
concreta e individual que ponha fim a um conflito de interesse. Assim,
12 JARDIM / BORGES
uma sentença da lavra de um magistrado de primeiro grau não deixa
de exprimir a concreção de atividade jurisdicional, embora, no mais
das vezes a solução do problema possa levar anos e anos ou décadas e
décadas, dependendo de particularidades do feito e das possibilidades
de recursos que poderiam possibilitar a definitividade e o advento da
coisa julgada num dado Tribunal. Se a matéria for de natureza tribu-
tária, a lide somente terminará no Superior Tribunal de Justiça ou no
Supremo Tribunal Federal, com preponderância desta Corte, em virtude
da exaustiva constitucionalização do direito tributário.
Neste item do presente Estudo, a expressão efetiva prestação jurisdi-
cional é concebida como aquela que põe fim ao processo, daí a acepção
de efetiva e não a singela locução em sua geralidade ampla. Enfim, o
que se quer é demonstrar que o contribuinte de tributos se ressente de
uma atividade do Estado que resolva efetivamente questões tributárias,
considerada como tal a decisão que faça coisa julgada.
Deveras, é de comum sabença que os feitos de índole tributária
cumprem um alentado percurso entre a protocolização da exordial até o
advento de decisão definitiva. Se utilizarmos uma metáfora, poder-se-ia
dizer que não é uma maratona, o que já seria muito, mas uma ultra-
maratona, a exemplo daquelas provas de 80 ou até 100 quilômetros.
De par com incontáveis exemplos de retardo na prestação jurisdicio-
nal, um caso recente merece ser citado, qual seja, aquele em que uma
advogada grávida deu entrada a um Recurso Extraordinário no Supremo
Tribunal Federal, fato ocorrido por volta do ano 2000. A essência do
pleito se limitava a definir se o ICMS representa faturamento das em-
presas ou não. Simplesmente isso. Após muito tempo, a advogada pediu
pauta do processo e colocou nas redes sociais a sua inconformidade
com a longa demora, mencionando, inclusive, que, grávida à época do
ajuizamento do RE, sua filha já contava com quinze anos de idade e a
decisão não foi prolatada!
Seria despiciendo trazer à colação um rol de exemplos de demora na
decisão judicial definitiva, pois é um infortúnio ao qual os operadores
do Direito conhecem de cátedra. Destarte, a vicissitude enfrentada na
busca do dar a cada um o que é seu, exprime um desafio de sobremão e, o
a segurança jurídica e o direito inalienável do demandante.
13
Ex-positis, a proposta pugnada neste estudo em relação ao presente
tópico consistiria em tornar coisa julgada a decisão dos Tribunais de
Justiça e dos Tribunais Regionais Federais, remanescendo para o Su-
perior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal apenas causas
absolutamente excepcionais, seja por abrigar um valor astronômico,
como algo acima de 100 milhões de reais.
Ao lado dessa sugestão no sentido de dar definitividade às decisões
dos Tribunais, propõe-se, também, a implantação de juizados especiais
com poder de julgar pleitos de pequeno valor.
O que não se pode tolerar de modo indiferente é o atual status quo
em que os processos se eternizam contra o contribuinte, fato agravado
pelos privilégios da Fazenda Pública quanto à exigência de certidões
e regularidade como requisito para exercer uma série de atos da vida
civil, ou seja, uma fórmula de chantagem oficial inexistente no mundo
civilizado, afora o arrolamento de bens na contramão do direito de pro-
priedade, ou o protesto de CDA, e ainda a inscrição no Cadin e outras
aberrações verificadas num binômio autoritário e arbitrário entre o
fisco e o contribuinte.
8 INCONSTITUCIONALIDADE DO § 9º DO ART. 195 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A CSLL DOS BANCOS E
INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS
A Emenda nº 20, de 15 de dezembro de 1998, instituiu uma dis-
criminação no tocante à quantificação das contribuições de seguridade
social, na medida em que instrumentou o legislador com poderes de
estipular alíquotas e bases de cálculo diferenciadas em virtude da ati-
vidade econômica ou da utilização intensiva de mão de obra.
Outrossim, a matéria foi novamente modificada por meio da Emenda
nº 47, de 5 de julho de 2005, a qual, por seu turno, ampliou o patamar
de discriminação, incluindo o epíteto relativo ao porte da empresa ou
da condição estrutural do mercado de trabalho, na exata conformidade
com o texto encartado no § 9º do art. 195, a saber:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de
forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos prove-
nientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e
14 JARDIM / BORGES
dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (Vide Emenda
Constitucional nº 20, de 1998)
I – dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o fatura-
mento e o lucro;
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na
forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitu-
cional nº 20, de 1998)
9º As contribuições sociais previstas no inciso I do caput deste
artigo poderão ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas,
em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão
de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mer-
cado de trabalho. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
47, de 2005)
De conseguinte, com fulcro na letra do aludido comando a legislação
já houvera majorado a alíquota de instituições financeiras, fazendo-o
de 9% para 15%. Não satisfeito com a dimensão do gravame, o Poder
Executivo Federal editou a Medida Provisória nº 675/2015, elevando
de 15% para 20% a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Lí-
quido (CSLL) de instituições financeiras, bem como majorou de 15%
para 17% a alíquota das cooperativas de crédito. Segundo o texto, a
cobrança dos novos percentuais terá vigência até 31 de dezembro de
2018, retornando, depois, ao nível anterior. A matéria, a bem ver, foi
convertida em Lei pelo Plenário do Congresso Nacional na sessão do
dia 15 de outubro deste ano-calendário.
Independentemente da percentagem atual ou da anterior, o tema foi
submetido ao crivo do Judiciário, inclusive o Supremo Tribunal Federal
e, esta Corte decidira por legitimar a cobrança majorada de instituições
financeiras, com supedâneo em sua capacidade contributiva.
conforme manifestação impressa no Recurso Extraordinário nº 528.160/
SP, julgado em 21/5/2013 e colhido no site do Supremo Tribunal Federal,
cujo teor lastreia a decisão que proclamou a constitucionalidade das
alíquotas discriminadas em função da atividade.
Nessa trilha, vejamos um excerto do voto da relatora, Ministra Cár-
men Lúcia, que assim averbou:
15
O Tribunal de origem assentou: “Tendo em vista que a CSSL é
uma contribuição social que se configura como imposto, deve
ser observado o princípio da capacidade contributiva, salientan-
do que este princípio abrange todo o sistema tributário, não se
restringindo aos impostos. Dessa forma, a diferença na alíquota
questionada no presente mandamus não constitui violação ao
princípio da isonomia, vez que a distinção se estabelece em fun-
ção da natureza de sua atividade e da capacidade econômica, o
que justifica a discriminação imposta. Saliente-se que a própria
Constituição, no art. 195, § 9º, prevê a possibilidade de alíquotas
diferenciadas em razão da atividade econômica (…)” (fl. 175). 4.
Este Supremo Tribunal decidiu que a instituição de alíquotas di-
ferenciadas da Contribuição sobre o Lucro Líquido não contraria
o princípio constitucional da isonomia, desde que se observem os
princípios da razoabilidade e da capacidade contributiva.
Como se vê, a posição pretoriana não se escoima de uma impreci-
são preliminar, enquanto afirma que a contribuição de seguridade teria
natureza de imposto, fato decididamente inconcebível, máxime porque
imposto e contribuição social são espécies tributárias inconfundíveis,
na medida em que o imposto gera receitas destinadas a prover gene-
ricamente orçamento público, enquanto a contribuição social produz
prevista na Constituição.
Melhor sorte não cabe ao mérito do decisum, porquanto a letra da
emenda que autoriza o tratamento diferençado acutila o primado da
igualdade em sua acepção genérica prevista no caput do art. 5º da Cons-
tituição Federal, sobre afrontar a igualdade tributária explicitada no
art. 150, II, do Diploma Excelso, que proíbe expressamente tratamento
tributário desigual em função da ocupação dos contribuintes.
Em veras, discriminar a tributação em face da atividade econômica
seria o mesmo que cobrar mais imposto de médico do que de advogado,
cumprindo o vetor da capacidade contributiva. Ora, escalonar a tribu-
tação em virtude da profissão ou atividade ou qualquer outro critério
que não seja a dimensão da renda ou do patrimônio, significa passar ao
largo do postulado da igualdade e também da capacidade contributiva.
16 JARDIM / BORGES
Portanto, o mandamento previsto nas Emendas vertentes, ao con-
trário de otimizar a igualdade e a capacidade contributiva, culminam
por afrontar os referidos princípios constitucionais.
Por sem dúvida, essa craveira de aferição da igualdade contradiz
o substrato da igualdade consubstanciado na adoção de um discrimen
compatível com uma dada finalidade, consoante prelecionado com pena
de ouro por Celso Antônio Bandeira de Mello. Assim, seria correto,
por exemplo, tributar com alíquotas mais elevadas a dimensão da renda
ou do lucro ou da propriedade ou do patrimônio, jamais em virtude da
profissão ou atividade ou qualquer outro aspecto exógeno àquelas gran-
dezas reveladoras de conteúdo econômico e de capacidade contributiva.
Destarte, não demasia retrilhar e dizer que, verativamente, a litera-
lidade do discrimen, quer pela Emenda nº 20/98, quer pela Emenda nº
47/2005, esta inserta no § 9º do art. 195 da Constituição, não tem o
condão mágico de qualificar como não discriminação, aquilo que é uma
discriminação que ofende a quintessência do postulado da igualdade.
À derradeira, a aludida emenda e toda legislação concernente ao
econômica ou quaisquer fatos estranhos à renda, ou ao lucro, ou à
propriedade ou ao patrimônio não se escoima de reprovável ultraje ao
primado da igualdade.
CONCLUSÕES
A positivação da literalidade como regra matriz de interpretação tra-
duz um anacronismo reprochável que desserve ao Direito e à Sociedade.
A cobrança anual de imposto sobre a propriedade significa cobrar
tributo sobre obrigação extinta.
A tributação cumulativa, a qualquer título, é vedada pelo sistema
constitucional tributário.
Imposto mercantil somente pode incidir sobre mercadorias, jamais
sobre bens.
A DRU desnatura o regime jurídico tipificador dos impostos e das
contribuições sociais e CIDE.
17
A ação declaratória de constitucionalidade não reveste o aspecto
conceptual de ação e, além disso, revoga o irrevogável, no caso o pos-
tulado da universalidade da jurisdição.
O plexo infinito de recursos ao STJ e ao STF eterniza o processo
judicial tributário e, ao contrário de assegurar direitos e garantias, cul-
mina por negar a prestação jurisdicional.
A discriminação tributária em virtude da atividade do contribuinte
acutila o primado da igualdade na seara tributária.
Juliana Nogueira Ortigosa1
Princípios pertinentes. 1.3 Instabilidade jurídica no Brasil. 2. Guerra
fiscal. 2.1 Denominação. 2.2 Histórico. 2.3 Conceito. 2.4 Guerra fiscal
estadual e municipal. 2.4.1 Âmbito municipal. 2.4.2 Âmbito estadual.
2.4.2.1 Convênios Confaz. 3. Efeitos da guerra fiscal. 4. Segurança
jurídica na guerra fiscal. 4.1 Constituição Federal em fronte à guerra
Convênios do Confaz e a segurança jurídica. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O Princípio da Segurança Jurídica engloba a estabilidade e a previ-
sibilidade do Direito, se mostrando como suporte aos contribuintes e
aos Órgãos Federativos, para que esses possam prever as consequências
das normas jurídicas, conforme aludido pelo professor Eduardo Jardim
no seu artigo sobre Segurança Jurídica no Direito Tributário,
1 Mestranda em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mac-
kenzie (2016). Advogada com Graduação em Direito pela Universidade Presbiteriana
Mackenzie (2015). Membro do Grupo de Pesquisa “Pacto Federativo Brasileiro e as
Implicações Tributárias e Orçamentárias ao lume da Cidadania” (vinculado ao Progra-
ma de Pós-graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana
Mackenzie). Endereço eletrônico: [email protected]
SEGURANÇA JURÍDICA E A GUERRA FISCAL
20 JARDIM / BORGES
a ideia de segurança jurídica traduz o meio pelo qual as relações
sociais rendem margem ao desencadeamento de efeitos previsíveis,
consagradores de prerrogativas individuais ou coletivas, insertas em
comandos antecipadamente juridicizados.2
Mesmo que não expresso na Constituição Federal, tal princípio já
foi recepcionado pelo Supremo Tribunal Federal como princípio consti-
tucional, devendo ser tratado como guia e limitador das ações inseridas
no nosso ordenamento jurídico.
Todavia, nem sempre as unidades federativas agem de maneira a
respeitar o Princípio da Segurança Jurídica.
No presente artigo, temos o intuito de analisar esse princípio em
fronte do fenômeno conhecido como Guerra Fiscal.
A Guerra Fiscal trata da concessão de benefícios fiscais pelos entes
da federação, individualmente, com o intuito de atrair maiores investi-
mentos para as suas regiões, buscando o desenvolvimento econômico
e social do território.
Inseridos nesse fenômeno, há conflitos que geram insegurança para
as relações jurídicas, como a concessão de benefícios fiscais unilaterais,
acarretando concorrência desleal e a imprevisibilidade do próprio in-
centivo, gerando insegurança nas relações.
Abordaremos a natureza e os reflexos da intersecção do Princípio
da Segurança Jurídica e da Guerra Fiscal.
Para tanto, primeiramente, apresentaremos o conceito de Segurança
Jurídica, seus princípios pertinentes e seu contraposto, a instabilidade
jurídica no Brasil, com o intuito de construir uma base para o trabalho.
Com este mesmo pensamento, será exposto o tema Guerra Fiscal
de modo genérico, abrangendo sua denominação, história e conceito.
Ainda, de modo geral, iremos apresentar, também, a Guerra Fiscal
nos âmbitos municipais e estaduais e, especificamente, trataremos dos
convênios do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de
2 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Reflexões sobre a Segurança Jurídica na Ambi-
tude do Direito Tributário Brasileiro. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo:
Oliveira Rocha, p. 21, mar. 1994.