23
Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976 5. A INDÚSTRIA DE DEFESA: A IMPORTÂNCIA DESEMPENHADA PELA INDÚSTRIA MILITAR NA DETERMINAÇÃO DE PODER DE UMA NAÇÃO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E A SUA INFLUÊNCIA POTENCIAL NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E INDUSTRIAL BRASILEIRO. Autor: Beni Iachan Orientador: Prof. José Maldonado. JUNHO, 2015

5. A INDÚSTRIA DE DEFESA: A IMPORTÂNCIA … · muito para a evolução da ciência e tecnologia no mercado civil. Para que se realizasse o trabalho, foram estudados alguns teóricos

Embed Size (px)

Citation preview

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

5. A INDÚSTRIA DE DEFESA: A IMPORTÂNCIA DESEMPENHADAPELA INDÚSTRIA MILITAR NA DETERMINAÇÃO DE PODER DE UMANAÇÃONOCENÁRIOINTERNACIONALEASUAINFLUÊNCIAPOTENCIALNODESENVOLVIMENTOECONÔMICOEINDUSTRIALBRASILEIRO.

Autor:BeniIachan

Orientador:Prof.JoséMaldonado.

JUNHO,2015

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

125

I. RESUMO

IACHAN,Beni.AIndústriadeDefesa:aimportânciadesempenhadapelaindústria militar na determinação de poder de uma nação no cenáriointernacional e a sua influência potencial no desenvolvimento econômico eindustrial brasileiro. Rio de Janeiro, 2014. Monografia (MBE em ComércioExterior)–InstitutodeEconomia,UniversidadeFederaldoRiodeJaneiro,RiodeJaneiro,2014.

A indústria de defesa compreende indústrias governamentais eprivadasque trabalhamnodesenvolvimento, pesquisa, produção e serviçosnaáreamilitar.Otrabalhoapresentadofocalizaaindústriadedefesaecomoela pode influenciar o poder de uma nação no âmbito econômico.Tradicionalmente, é dada muita importância para a indústria de defesa,principalmente pela abordagem da proteção à soberania nacional. Com adiminuição dos conflitos internacionais (entre nações), em detrimento dosconflitos intranacionais (dentrodeumanação), esteobjetivo, emboraaindaseja o prioritário, vem sendo dividido com o foco na inovação edesenvolvimentoqueestaindústriaproporciona.Éumaindústriaqueinvestepesado em produtos de alto valor agregado e que, por vezes, contribuemmuitoparaaevoluçãodaciênciae tecnologianomercadocivil.Paraqueserealizasseotrabalho,foramestudadosalgunsteóricosdorealismo-correnteque dá muita importância ao que chama-se de “Hard Power” para adeterminação de poder de uma nação, assim como correntes de autoresclássicosqueencorajamoinvestimentonaindústriadedefesacomofontedeincentivoaocrescimentoeconômico,inovaçãoedesenvolvimento.Emsuma,estetrabalhovisaestudaraindústriamilitarcomoumaimportantearmadeafirmaçãodepodernãosópelaforça,maspelasvantagenscomparativasnoâmbito tecnológico, com inovações particulares que se expandem ao setorcivil, focandoemcomoummaior investimentona indústriadedefesapodetrazer para o Brasil benefícios sociais, econômicos e nas suas relaçõesinternacionais.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

126

SÍMBOLOS,ABREVIATURAS,SIGLASECONVENÇÕES

ABNT AssociaçãoBrasileiradeNormasTécnicasIE InstitutodeEconomiaUFRJ UniversidadeFederaldoRiodeJaneiroPND PolíticaNacionaldeDefesaEND EstratégiaNacionaldeDefesaABIMDE AssociaçãoBrasileiradasIndústriasdeMateriaisdeDefesaSIPRI StockholmInternationalPeaceResearchInstitute

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

127

SUMÁRIO1.INTRODUÇÃO.............................................................................................................................128

2.CONCEITOSBÁSICOSEREFERENCIALTEÓRICO..............................................................1302.1.AIndústriadeDefesa........................................................................................................1302.2.AimportânciadaDefesanasRelaçõesInternacionais..........................................1312.3.AimportânciaeconômicadaIndústriadedefesa...................................................1332.3.1.OKeynesianismoMilitar...........................................................................................1332.3.2.Schumpeter,aInovaçãoeaIndústriadeDefesa..............................................137

3.OBRASILEAINDÚSTRIADEDEFESA..................................................................................1384.CONCLUSÃO..................................................................................................................................143

REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS................................................................................................146

ÍndicedeTabelas

1:contraposiçãodeprodutosdealtovaloragregadoecommodities.________1412:Faturamentoeorigemdasmaioresdomundonosetor.____________________1433:GastosmilitaresnoMundo,1998-2013. _____________________________________145

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

128

1.INTRODUÇÃO

DuranteoSéculoXXaimportânciadasrelaçõesinternacionaiscresceuem proporção geométrica, principalmente por conta do advento e daevolução das telecomunicações, que ajudaram a “encolher” o mundo eaproximar as nações. Por conta disso, o papel e a importância do comérciointernacional também aumentaram, permitindo que os países expandissemseusmercadosezonasdeinfluência.Aomesmotempo,diferençasculturaiseembatesdepoderforamevidenciadosdemaneiramaisrápidaeabrangente,fazendo com que as tensões e conflitos ganhassem escala global. Comoconsequência, o destaquedado aopodermilitar (e ao alcancedeste) nuncadeixou de ser uma prioridade dentro dos Estados protagonistas no cenáriointernacional.

Para pensadores e teóricos das relações internacionais, comoMearshimer (2001), o papel jogado pelo poder exercido pelas capacidadesmilitaresdeumanação(HardPower,segundoJosephNyeeRobertKeohane,1977),éprovavelmenteomaisimportantenachamadabalançadepoderque,porsuavez,jogaumpapelfundamentalnasnegociaçõesentrepaíses.

Além disso, para que um país esteja preparado para se defender nãobastamapenasarmaseumgrandecontingentedehomens.Éprecisotambémque domine a alta tecnologia e que se conte com homens devidamentecapacitadosepreparadosparaoperarnovos sistemasqueestas tecnologiasgeram. Assim, a estratégia de defesa deve focar também na pesquisa einovação, algo que vai na mesma direção dos interesses nacionais no quetange o desenvolvimento econômico, uma vez que, muitas vezes ascontribuições geradas transbordam a esfera militar. Segundo Schumpeter(1912), uma das ferramentas mais importantes para o crescimento de umpaíséo investimentoeminovaçãoe tecnologia.Epoucas indústriassão tãointensivasnestamatériaquantoaindústriadeDefesa.Comoexemplosclarosdeinovaçõesusadasnocotidianoquesurgiramnaindústriamilitar,podemoscitarosmicrocomputadores,aInternet,ofornodemicroondaseatémesmooschocolatesaçucaradosM&Ms.

É importante ainda destacar o que Keynes (1936) afirma sobre aimportância do investimento estatal para a recuperação e desenvolvimentoeconômicoe,nestesentido,semdúvidagastosmilitarespodemcumprirumpapeldedestaque.

Portodososmotivoscitadosacima,otrabalhorealizadovisaentendera relação entre a relevância dada à indústria de defesa dentro do fluxomundialdepodereemcomoinvestirnestaindústriapodeserbenéficoparao

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

129

país. Para isso, além do trabalho de pesquisa a teóricos das relaçõesinternacionais e de economia internacional, se buscou entender a relaçãoexposta através de exemplos práticos e de como o Brasil pode crescerinvestindonestemercado.

A hipótese da pesquisa concentra-se no fato de que, o investimentoestatal na indústria militar pode proporcionar a uma nação um papel deprotagonismo, não apenas pela afirmação através do poder bruto, mastambém pelas consequências econômicas e de desenvolvimento que elarepresenta(evoluçãotecnológica,altodesempenhoindustrial,exportações...).

Emresumo,oquesepretendeexplicaréporqueoinvestimentonaáreadedefesapodeinduziraoprotagonismodeumpaísnocenáriointernacional,não apenas por conta do citadoHard Power,mas tambémpelo Soft Powerqueacabaporproporcionando,sobretudoatravésdosbenefícioseconômicose no campo da inovação, gerando muitas vezes produtos de vanguarda enovidadestecnológicas.

Paraarealizaçãodestetrabalho,foramestudadasbrevementealgumascorrentes teóricas das Relações Internacionais, que buscam explicar asrelaçõesdepodermilitarcomoprotagonismonocenáriointernacional,assimcomo a importância econômica que a indústria militar pode desempenhardentrodestemesmoprotagonismo.

Apesquisabuscaresponderàpergunta:comoaindústriamilitarpodeser importante para a dominância e desenvolvimento econômico de umanação, considerando o soft power e, mais especificamente, as transaçõesinternacionaiseainovação,comoferramentadepoder?

OObjetivoGeral do trabalho é explicar a importância que a indústriamilitar tem para o desenvolvimento econômico de um país e o seu rol depoder dentro do cenário internacional, através da análise de correntesteóricasealgunsexemplospráticos.

Alémdisso,osobjetivosespecíficossão:

• Analisar a importância da indústria militar para odesenvolvimentodeumanação.

• A partir das teorias estudadas, verificar a relação entre aindústriadedefesaeodesenvolvimentoeconômico.

• Verificar como o Brasil vem incentivando o crescimento daindústriadedefesa.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

130

Do ponto de vista prático, é muito importante estudar este tema,principalmente pelas baixas taxas recentes de crescimento econômicobrasileiro,alémdoque,historicamente,noBrasiloinvestimentoempesquisa,desenvolvimentoe inovaçãoéhistoricamentebaixo.Ea importânciadadaaestaindústriavemsendocrescentenoBrasil.AEstratégiaNacionaldeDefesa,de2007,eaLeideFomentoàBaseIndustrialdeDefesa,de2013,mostramaimportânciadadaaoassunto.

Com a importância que o Brasil vem ganhando no cenáriointernacional, incluindoaânsiaporumassentopermanentenoConselhodeSegurança da ONU, estudar a defesa também possui relevância estratégica.Estudá-la é importante pelo papel fundamental que ela joga nas relaçõesinternacionais. E esta matéria vem sendo defendida, desde os autores davanguardadasrelaçõesinternacionais,comoMorgenthau(oobjetivodetodoEstadoéasobrevivênciaeopoder),Herz(odilemadesegurança),passandopor Mearshimer e autores das correntes mais liberais das RelaçõesInternacionais,comoRobertKeohaneeJosephNye,criadordostermosHardPowereSoftPower.

Comosepercebeduranteotrabalho,outrosautores,dentroeforadasRelações Internacionais tambémdão relevância à IndústriadeDefesa comofontededesenvolvimentoeconômico.Schumpeter,como termo“destruiçãocriativa” e Keynes, incentivador dos gastos de governo para recuperaçãoeconômica, se encaixam neste quadro.Do ponto de vista do ComércioExterior, o estudo do desenvolvimento da indústria de defesa podeproporcionarmais clareza nos benefícios que ela pode trazer ao campo dainovação, permitindo que o Brasil eventualmente torne-se referência nestesetor,exportandoestetipodematerial,dealtovaloragregado.

2.CONCEITOSBÁSICOSEREFERENCIALTEÓRICO

2.1.AIndústriadeDefesa

Parao entendimentoda temática aqui focalizada, é necessáriodefiniralguns conceitos fundamentais. O primeiro deles é o que exatamente é aindústriadedefesa.

SegundoaPND(PolícitaNacionaldeDefesa), “Segurançaéacondiçãoque permite ao País preservar sua soberania e integridade territorial,promover seus interessesnacionais, livredepressõeseameaças, e garantiraoscidadãosoexercíciodeseusdireitosedeveresconstitucionais”.Pode-seafirmar, portanto, que a Indústria de Defesa é o conjunto das empresasestatais e privadas e de organizações (civis emilitares), que participam de

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

131

umaoumaisdasetapasdepesquisa,desenvolvimento,produção,distribuiçãoemanutençãodeprodutosqueajudemagarantiadasegurançadasfronteirasetambémdaleiedaordemnacional. O Governo Brasileiro, defineProdutosdeDefesa(PRODE),como“todobem,serviço,obraou informação,inclusive armamentos, munições, meios de transporte e de comunicações,fardamentosemateriaisdeusoindividualecoletivoutilizadosnasatividadesfinalísticasdedefesa,comexceçãodaquelesdeusoadministrativo.”1

2.2.AimportânciadaDefesanasRelaçõesInternacionais

A importânciaque aDefesa joganasRelações Internacionais variadeacordocomascorrentesteóricas.Noentanto,éinegávelqueestádiretamenteligada aos conceitos de poder e influência, elementos chave no estudo dasrelações internacionais.Dentrodocampodasrelações internacionaisháumdebate intenso sobre a importância sistêmica da Indústria Militar para ospaíses, enquanto os principais jogadores do cenário internacional - osEstados,aindacontamcomopoderbélicoparaexercerasuainfluênciasobreosoutros.Alémdisso,outrotemaimportante–asoberania,tambémdependepara muitos, do poder que uma nação possui. E a partir deste ponto,chegamos aos conceitos de “Hard Power” e “Soft Power”, amplamentedifundidos nas discussões das relações internacionais e que definiremos aseguir.

Comoafirmadoacima,adisputapor“poder”tempapelprotagôniconorelacionamento entre as nações. E o estudodahabilidadede influenciar oucontrolaro comportamentodeoutrasnaçõeséumdos focosprincipaisdasRelaçõesInternacionais,desdeosmaisantigosestudos.Dentrodestaótica,épossíveldividirainfluência(oucontrole)depoderemduasesferas:

“HardPower”(ou“PoderDuro”):modelodeinfluênciamaisimportantesegundo os pensadores da corrente realista das relações internacionais, oconceito só ganhou a denominação acima no final dos anos 1980, cunhadoporJosephNye(Nye,1990),quejustamenteprecisavaumacontraposiçãoaotermo “Soft”, também criado por ele. No entanto, a noção já existiamesmoantesdaformaçãodosestadosmodernos.

Maquiávelemseumaisconhecidolivro,“OPríncipe”,nosdáumanoçãobásicadoconceito:“(...)digojulgarcomopodendomanter-seporsimesmosaquelesquepodem,porabundânciadehomensededinheiro,organizarum

1 LEI Nº 12.598, DE 21 DE MARÇO DE 2012. - Estabelece normas para compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa; altera a Lei no 12.249, de 11 de junho de 2010; e dá outras providências. (http ://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/Lei/L12598.htm)

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

132

exércitoàalturadoperigoaenfrentarefazerfaceaumabatalhacontraquemvenhaassaltá-lo(...)”(Maquiavel,1469-1527,P.46)

Apartirdaanálisedestepequenoextratopode-senotaraimportânciaquesemprefoidadaàcapacidademilitardeumEstado.

Seguindoemordemcronológica,Hobbes(1651),emseutambémmuitoconhecidolivro“OLeviatã”,incluiunaesferadepodereinfluêncianãoapenasa habilidade de controlar as forças armadas, mas também as forçaseconômicasefinanceiras.

Outrospensadoresmaisrecentes,comoMorgenthau,comoargumentodo uso coercitivo da força como formamais importante de impor o poderpolíticodeumanação,contribuíramparaaconsolidaçãodestepensamento.

Esta forma de “poder” identificada pelos pensadores acima é oHardPower. Em poucas palavras, os autores Kurt Campbell e Michael O’Hanlon,definemotermocomo“Aaplicaçãodopodermilitarparaatenderosfinsdeumanação,ouseja,autilizaçãodetropas,bensnavaisemuniçõesdeprecisãoparaatingirumobjetivonacionalvital”(CampbelleO’Hanlon,2006P.7).

Alémdopodermilitar,podemosconsideraraindapressõeseconômicaseembargos,porexemplo,comoformasdeaplicaçãodoHardPower.

“SoftPower”(ou“PoderBrando”)foicunhadoporJosephNyeapenasnofinaldoséculopassado(Nye,1990).Basicamente,éumtermoparadescrevera habilidade de determinar uma agenda e influenciar o comportamento deoutrasnaçõesatravésdemeiosculturaiseideológicos.

Paraexplicarasrelaçõesdeinfluênciaentreasnações, JosephNyefazuma definição simbólica que resume bem como as nações exercem o seupoder:“Poweristheabilitytoinfluenceotherstogetthemtodowhatyouwant.Therearethreemajorwaystodothat:oneistothreatenthemwithsticks;thesecondistopaythemwithcarrots;thethirdistoattractthemorco-optthem,sothattheywantwhatyouwant”.(Nye,1990,P.153)

As trêsvertentes somadasebemaplicadas sãooqueNye chamoude“SmartPower”(Nye,2005,p.75-77).Dentrodestadefinição,parececlaroqueasduasprimeirasmaneiras(pauecenouras)sãoumamaneiradeinfluênciatípica do poder duro, com a coerção militar e econômica. Já a terceira(atração), jogaopapeldepoderbrando.Dito isso e comoveremosadiante,parececlaroqueaindústriamilitarproporcionagrandesvantagensnosdoisprimeiros aspectos, mas também no terceiro: as vantagens competitivas e

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

133

inovaçõesqueestaindústriaproporcionageramegeraramgrandeinfluência,transmitem valores e transformam algumas nações em modelos a seremseguidos.

Com a transição de um sistema bipolar da Guerra Fria, que dividia omundoentreaquelespaísesqueviviamsobainfluênciadocapitalismonorte-americano e aqueles que eram influenciados pela União Soviética – a ummultipolar, vivemos hoje uma fase de incertezas, principalmente pelasconstantesmudançasdeordemglobal.Mudançasprofundaseexponenciais,acentuadas pela grande e acelerada transformação científica e tecnológica.Novosatoresinternacionaisvêmaparecendonocenárioeconômico,científicoe tecnológico e, manter a posição estratégica internacional parece exigircapacidades tecnológicas e industriais que proporcionem vantagenscompetitivas no comércio exterior, assim como também da capacidademilitar. Em outras palavras, ambas as capacidades (fontes dedesenvolvimento tecnológico e inovação), podem (e devem) ser integradasparaqueumanaçãoestabeleçaumposicionamentoestratégicodeinfluêncianomundo.

Dispor de poder econômico e militar parece ser fundamental para ofuturodeumpaísenãohámuitoscaminhosalternativos:ambosdevemserconsequênciadodesempenhocientífico,tecnológicoedoespíritoinovadordeuma nação. O posicionamento estratégico de uma nação depende econtinuarádependendodacombinaçãodesuainfluênciaeconômicaemilitar.

2.3.AimportânciaeconômicadaIndústriadedefesa

Como já mencionado, equipamentos da indústria de defesacostumam possuir alto conteúdo tecnológico e valor agregado. Apenas issogera, por si, grandes oportunidades de inovação tecnológica e crescimentoeconômico. Além disso, tecnologias desenvolvidas para a Defesa quasesempre têm utilidades também para o mercado civil, provocando otransbordamentotecnológicoparaoutrossetores.

Sendoumaárea tão importanteparagerarestabilidadeecrescimentoeconômicos,foifeitoaseguirumbreverecorridosobreopapeldaindústriadedefesaaplicadoàsteoriasdeKeyneseSchumpeter.

2.3.1.OKeynesianismoMilitar

No começo do século XX, as novas tecnologias (influenciadas peladifusão do petróleo como fonte de energia, da oferta de aço barato e dequalidade e do advento da eletricidade), a velocidade do comércio e oaumentodoconsumoedaproduçãopermitiamcrescimentoexponencialdos

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

134

principais mercados e, como consequência, o aumento do poder dasprincipaispotênciasmundiais.Alémdisso,aunificaçãodaAlemanhaeItálianofinaldoséculoanteriorcriava,novosmercados,novaspotênciasegrandes“players”internacionais.

Com o advento e o fim da Primeira Guerra Mundial, no entanto, ospaíses europeus mergulharam em uma grave crise econômica, e foramobrigados a recorrer ao apoio dos Estados Unidos. Após as negociações doTratado de Versalhes, o país norte-americano era o principal credor dasdívidasdos aliados e, entre os principais países beligerantes, o único a saireconomicamentebemposicionadodaGuerra.Assim,enquantoqueem1913aeconomiadosEstadosUnidoseramenordoqueasomadaseconomiasdeAlemanha, França e Grã Bretanha, em 1920 o país já os havia superado e,sozinho, era responsável por mais da metade da produção industrial domundo.Duranteaguerra,apolíticadecomércioexteriordospaíseseuropeuspriorizava as importações (para fins bélicos), o que gerou grande déficitcomercialeperdadasreservasemouro.Noentanto,a“solidão”econômicadopaísnorte-americanoeafaltadefôlegodosconsumidoresmundiais,acaboupor gerar um excesso de produção. E a década de 20 marcou o ápice e adecadênciadoLaissez-faire2.

A inicial bonança nos Estados Unidos, tinha como característica aabundânciadeempregos,ofertadeprodutosepreçosbaixos,motivadapelasexportações e apoio à Europa no pós-guerra. No entanto, à medida que aprodução europeia voltava a crescer, os níveis de demanda interna nosEstadosUnidosnãocresciamnamesmaproporção,gerandoumexcedentedeproduçãoeimpulsionandoospreçosdeprodutosindustrializadosparabaixo;como consequência, as indústrias foram obrigadas a reduzir seus níveis deprodução, o que gerou desemprego e a retração nos lucros e,concomitantemente, adeflagraçãodoque se chamade “GrandeDepressão”,em1929.

Apesar de algumas medidas tomadas no governo Hoover, a recessãocontinuavaemaltaquandodaeleiçãodeFranklinRoosevelt.EfoiRooseveltoresponsávelpela instauraçãodochamado“NewDeal”, fortemente inspiradonasideiasdeJohnMaynardKeynes,queajudouaestancaragrandecrise.

O plano do “New Deal” aparecia como alternativa ao liberalismoclássico, tendo comoprincipaldiferença, aparticipaçãodiretadoEstadonaeconomia, o que representou uma profunda transformação na política 2 Política que determina a mínima interferência governamental na economia, promovida e defendida por Adam Smith e John Stuart Mill. De acordo com o Laissez-faire, a função do estado era apenas manter a ordem e evitar a interferência na iniciativa privada. http://www.merriam-webster.com/dictionary/laissez-faire

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

135

econômicaesocialdosEstadosUnidos,caracterizadoatéentãopelaescassaintervenção do Estado na economia. O New Deal estabelecia o controle doEstado sobre a emissão de valores monetários e, principalmente, buscavareerguer as indústrias básicas, criando empregos e tomando medidas quegarantiama segurança social.Estava,portanto, sendo implementadaa ideiade Keynes do “Pleno Emprego”, que buscava recuperar a demanda dostrabalhadores,estimulandoaeconomiaaindaemrecessão.

Para Keynes, a garantia do emprego e do consumo elevado, além daparticipaçãodoEstadoemsetoresdaeconomiaquenãointeressamosentesprivados, ajudam na manutenção econômica de um sistema. E a indústriamilitar,claro,épeçaimportantenaparticipaçãodoEstadonaeconomia.

E daí, a importância da indústria de defesa para Keynes. O“Keynesianismomilitar”, como é chamado, é a posição que o governo tomaparaaumentarosgastosmilitaresvisandoocrescimentoeconômico.

A segunda guerra mundial, a partir da entrada dos EUA no conflito,permitiu a este país que afastasse os fantasmas econômicos da GrandeDepressão.Ademandamilitar efetiva fez comqueoproduto real crescesseaproximadamente65%entre1940e1945,sendoqueaproduçãoindustrialdisparou90%(DUBOFF,1989,p.91).

Com o fim da guerra, o medo do retorno à crise do pré-guerra pelademandainternainsuficientealiadaaocrescimentodoexcedenteeconômicogerado pela indústria durante a guerra, fez com que algumas medidasdevessemsertomadasparaamanutençãodaestabilidadeeconômicanorte-americana. E entre estas medidas estava o esforço do consumo militar-industrialpelopaís.PrincipalexemplodissofoiapublicaçãopeloentãochefedoEstadoMaior doExército norte-americano,DwightEisenhower emabrilde1947,deumMemorandoparaosenvolvidosnosdepartamentosdedefesadosEUA,comoassunto:“Osrecursoscientíficose tecnológicoscomoativosmilitares”3.Oaspectocrucialdesteplanoeraacapacidadequeoestadoteriapara absorver boa parte da capacidade industrial e tecnológica da nação eque,portanto,opapeldogastomilitarseriaodecriaçãodedemandaefetiva.Ogastomilitarincrementavaademanda,ajudavaasustentarumaltoníveldeemprego, acelerava o processo tecnológico e contribuía para a elevação doníveldevidadeumpaís.

3 General Dwight D. Eisenhower, “Memorandum for Directors and Chiefs of War Department General and Special Staff Divisions and Bureaus and the Commanding Generals of the Major Commands; Subject: Scientific and Technological Resources as Military Assets,” Abril 1946.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

136

Exemploreconhecidoepioneirodeteóricoecientistanoâmbitomilitarfoi Vannevar Bush. Bush começou seus estudos durante a primeira GuerraMundial, desenvolvendoumdispositivoqueusava camposmagnéticosparadetectarsubmarinos.Apesardebemsucedidoemtestes,oequipamentoforanegligenciadopelaMarinhaAmericana.Depois,usandoasrecentesinvençõeseinovaçõesnocampodafotografia,BushdesenvolveuumequipamentoparaoFBI,capazdeleratémilimpressõesdigitaisporminuto,tambémrecusadopelaentidade.Bush,noentanto,nãodesitiu;tornou-sepresidentedoInstitutoCarnegie, que gastava USD 1,5 milhão por ano em pesquisa edesenvolvimento, ganhando prestígio. Em 1940, Bush notava que os gastoscom pesquisa militar nos Estados Unidos concentravam-se nas mãos demilitares, de maneira desordenada e ineficiente. Então, com o apoio dopresidente Roosevelt, fundou o Comitê Nacional de Pesquisa em Defesa(NationalDefenseResearchCommittee–NDRC),queiriaaproximargoverno,militares, empresas e líderes científicos para coordenar a pesquisa militar.Depois, em 1941, com o mesmo intuito e maior orçamento, o comitê foisubstituídopeloEscritóriodePesquisaeDesenvolvimentoCientífico (Officeof Scientific Research and Development - OSRD), da qual Bush tambémtornou-se diretor. Esta organização ajudou a coordenar as atividades dediversoscientistasnaaplicaçãodaciênciaàguerra,duranteasegundaguerraedepois,duranteaGuerraFria.

Originalmente desenhadas para apoiar as pesquisas das ForçasArmadas dos Estados Unidos, a OSRD tornou-se uma organização líder dodesenvolvimentoepesquisaem tecnologiasmilitares.Graçasaela,diversastecnologiasaplicadasnaGuerraenoserviçosecretodopaísforamcriadasouincrementadas. Bush e a organização também estiveram envolvidos noProjeto Manhattan, responsável pelo desenvolvimento da Bomba Atômica.Bushtornou-seumapessoareconhecidanomeio,sendoinclusivecitadopelarevistaamericanaColliers,comoohomem“quepoderiaganharouperderaguerra”(Ratcliff,1942).

Em um famoso artigo, “AsWe May Think”, de 1945 Bush pensou asatividadesdoscientistasnopós-guerra.

Emseuartigode1ºdeJulhode1945,Bushcomeçapreocupadocomasatividadesdoscientistasnofuturo,sobretudoosfísicos.Noentanto,aolongodeseuartigopassaadestacarosgrandesavançosgeradosnosanosdeguerrae como estes seriamúteis tambémpara os anos de paz. Bush continua seuartigoe,comele,vaiprevendoumasériede inovações,comoosavançosdafotografiaeainternet(oqueelechamade“memex”).

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

137

OtrabalhodeVannevarBush foidesuma importânciaparaosucessodos EUA na Segunda Guerra mundial, mas não apenas isso. Bush foi oresponsável pela mudança na maneira de se encarar a Pesquisa e oDesenvolvimentocientíficosnopaís,ajudandoaprovaropapelfundamentalque a tecnologia desempenhava na guerra. Além disso, ajudou ainstitucionalizarorelacionamentoentreacomunidadecientífica,governoeomundo corporativo, criandomeios para que todos pudessemganhar comoconstanteavançodomundocientífico.

Graças às mudanças institucionais realizadas após a Segunda GuerraMundial, os Estados Unidos são hoje uma demonstração da força que aPesquisa e o Desenvolvimento na área de defesa necessita e o que podemrepresentarparaoutrossetores.Desdeoperíododopós-guerra,grandepartedosinvestimentosdeP&Dévoltadoparaadefesa-em2009,aáreadedefesarepresentava55%dosinvestimentostotaisemP&Dnopaís(NationalScienceBoard,2012)4.

E,atravésdealgunsexemplosbastanteconhecidos,ficaclaraarelaçãoentre a pesquisa e o desenvolvimento militar e, como as tecnologias quesurgiramentãoforamdepoisimplementadasemmassapelasociedadecivil:oforno deMicroondas, desenvolvido pela empresa Raytheon, o Computador,desenvolvidoparaajudaremcálculosdeartilharia,aInternet,idealizadaporBush e inventada durante a Guerra-fria por cientistas americanos quebuscavamumacomunicaçãodescentralizada,eatémesmoguloseimaseitensdeculinária,comooleitecondensadoeoschocolatesM&M.5Aáreadesaúdeeoutrosimportantessetoresvêmsendobeneficiadosaolongodosanoscomapesquisaedesenvolvimentodaindústriamilitar.

2.3.2.Schumpeter,aInovaçãoeaIndústriadeDefesa

Nascido em1883, Joseph Schumpeter foi um contemporâneo de JohnKeynesechegouaserministrodasfinançasdoImpérioAustro-Húngaroem1919, mas sua posição de destaque foi como acadêmico e professor. Suasideias ganharam amplo destaque neste meio, principalmente através deteoriascomoadoscicloseconômicos,adestruiçãocriativaesuaideiasobreainovaçãoedesenvolvimentoeconômico.

ParaSchumpeter,ascrisesconjunturaisnãosurgiamapenasporcontade fatores externos, como guerras ou períodos de más colheitas. As crisestambémestavamligadasàatividadeempresarial.Segundoele,ainovação,ou 4 National Science Board. Science and Engineering Indicators 2012. Arlington VA: National Science Foundation, 2012. 5 http://www.tecmundo.com.br/tecnologia-militar/34671-8-tecnologias-inventadas-para-a-guerra-que-fazem-parte-do-nosso-cotidiano.htm e http://guerraetecnologia.blogspot.com.br/ - acessados em 05/09/2014

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

138

a exploração bem sucedida de novas ideias, era vista como o motor daeconomia.Eapartirdaí, formuloua teoriadoDesenvolvimentoEconômico.Esta teoria consistia na observação de que as longas ondas dos ciclos dedesenvolvimento resultavam na combinação de inovações queimpulsionavamocrescimentorápidodaeconomia.Novosbensdeconsumo,novosmétodos de produção, transporte e logística são o que impulsiona omovimentodamáquinacapitalista.Atravésdainovaçãotecnológica,oslucrose o crescimento eram maximizados e o desenvolvimento como processointencionaldemudança,eraalcançado.

E o produtor, segundo Schumpeter, era quem deveria iniciar esteprocesso.Eleéquemdevetransformaruma“invenção”,definidapelopróprioautor como “ideia, esboçooumodeloparaumnovooumelhorado artefato,produto, processo ou sistema” (Schumpeter, 1982) em uma “inovação”, nosentidoeconômico-“somentecompletaquantoháumatransaçãocomercialenvolvendo uma invenção, e assim, gerando riqueza” (Schumpeter, 1982).Graças a estas ideias, Schumpeter conclui que as grandes empresas econglomeradosseriamospilarescentraisdodesenvolvimentoeconômico.Ainovação tecnológica destas empresas criaria uma ruptura no sistemaeconômico, alterando os padrões de produção e criando diferenciação paraestasempresas,tendoassim,roldegranderesponsáveldodesenvolvimentoeconômicodeumpaís.

Poucas indústrias são tão sinérgicas com as teorias de inovação deSchumpeter quanto a Indústria de Defesa. A dinâmica de pesquisa edesenvolvimentodestesegmentoé,maisdoqueemqualqueroutro,umtemadeimportânciafundamental.Estarumpassoàfrentedoconcorrenteéoquepodedefinirosucessodeumaoperação.Aomesmotempo,ecomojácitado,astecnologiasdesenvolvidasparaoâmbitomilitarpodemtambémserúteisparaaplicaçãonomercadocivil.

3.OBRASILEAINDÚSTRIADEDEFESA

A partir de uma análise de dados indireta, sobre a performance doBrasil eo interessenospróximosanosdentrodo segmentodedefesaeumparalelotraçadocomasteoriasacimadescritas,veremoscomooBrasilvematuando para alinhar o desenvolvimento do país com o crescimento daindústriadedefesa.

mmAinda que tardiamente, o Brasil vem notando a necessidade doinvestimentointernonaindústriadedefesa.Apesardeaindaaquémepoucoefetivo,em2008foipublicadaaEstratégiaNacionaldeDefesa.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

139

AEstratégiaNacionaldeDefesa(END),publicadaem18deDezembro2008 através do Decreto nº 6.703 e discutida por mais de um ano peloMinistério da Defesa, as Forças Armadas e a Secretaria de AssuntosEstratégicosdoGoverno,buscareafirmaranecessidadedamodernizaçãodasForçasArmadasedefineaEstratégiaNacionaldeDefesacomo:

“(...) inseparável de estratégia nacional de desenvolvimento. Esta motiva aquela. Aquela fornece escudo para esta. Cada uma reforça as razões da outra. Em ambas, se desperta para a nacionalidade e constrói-se a Nação. Defendido, o Brasil terá como dizer não, quando tiver que dizer não. Terá capacidade para construir seu próprio modelo de desenvolvimento” (END, P. 8).6

DentreasprincipaispautasdaEND,estáaReestruturaçãodaIndústriaBrasileira de Material de Defesa e a estratégia dá também ao Estado aatribuição de ajudar na priorização dodesenvolvimento de capacitaçõestecnológicasindependentes;apoiaraconquistadeclientelaestrangeiraetambém de buscar parcerias com outros países com o objetivo dedesenvolveracapacitaçãotecnológicanacional.Percebe-se,portanto,quea inserção no mercado internacional, exportações e atração de empresasestrangeirasparaoBrasil,estánapautadeprioridadesdaEND.

Uma das entidades que auxiliam as indústrias de defesa no Brasilchama-se ABIMDE (Associação Brasileira das Indústrias de Materiais deDefesaeSegurança).Criadaem1985,aABIMDE,umaentidadecivil,semfinslucrativos, congregava 150 empresas associadas em 2009, que geravam 25milempregosdiretos,maisde100milindiretosemovimentava,maisdeUS$2,7bilhõesemvendas,sendoUS$1bilhãoemexportações.Em2013,datadaúltimaaferição,quase200empresas,quegeravam30milempregosdiretose120milindiretoserammembros.Nesteperíodo,ovalordasvendaschegavaaUS$4bilhõeseodasexportaçõespraticamentedobrou,alcançandoUS$2bilhões(fonte:ABIMDE).

AatuaçãodaABIMDEtemsidoimportante,poiselatemcomofunçõesprincipais a interlocução das empresas junto às esferas governamentais,nacionais e internacionais, dando apoio às empresas no desenho deestratégias que cumpram com as necessidades da END. Os produtos dedefesa, como citado nos capítulos acima, são produtos indutores dedesenvolvimento, cuja intensidade em tecnologia permitiriam avanço eautonomiadopaís.Alémdisso,acapacitaçãogeradaeatecnologiaagregadatambémpossibilitariamoaumentodasexportaçõesnosetor.

6 Estratégia Nacional de Defesa, divulgado em 18 de Dezembro de 2008 e disponível em http://www.defesa.gov.br/projetosweb/estrategia/arquivos/estrategia_defesa_nacional_portugues.pdf

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

140

Também como já citado, o desenvolvimento e produção de novastecnologias nacionais para a área de defesa, permitem também a aplicaçãodual, para uso civil. Exemplo disso é o avião cargueiro KC-3907, recémdesenvolvido pela empresa Embraer em parceria com a Força AéreaBrasileira(exemplotambémdeinvestimentoestatal).Oprojetodaaeronaveenvolveu em seu desenvolvimento mais de mil engenheiros, custaráaproximadamente US$ 50 milhões e já possui 28 unidades encomendadaspelaForçaAéreaBrasileira.Alémdisso,eadicionalmenteao fatodeoaviãoapresentarenormepotencialparaexportação(aapresentaçãodaaeronoavecontoucomapresençaderepresentantesde32paíseseintençãodecompramanifestadapor6países8),oequipamentotambémjádespertaointeressedeorganizaçõescivis,petrolíferas,demineração,couriers,poisterágrandevaliaparaotransportedecarga,veículos,combateaincêndios,entreoutras.

Noquetangeaosbenefíciossocioeconômicosgerados,eaindasegundoa ABIMDE, nos últimos anos, cada Real investido em desenvolvimento desistemas de Defesa gerou cerca de 10 vezesmais este valor em divisas deExportação.9Além disso, estima-se que até 2030 o número de empregosespecializadosgeradosnosetordobre(P.18),asubstituiçãodeimportações,quejáalcançavaloresdecercadeUS$2bilhões,porano,devechegaraUS$3,5em2020eUS$4,4em2030,enquantoqueasexportaçõespodematingirmaisdeUS$7bilhõesem2030(P.17).

No que tange à industrialização, modernização e valor agregado, éindiscutívelopotencialdasindústriasdedefesa.Atabela1,retiradadaOCDEOrganização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE),mostra a diferença entre o valor agregado dos produtosmanufaturados nosetordedefesaeoqueatualmenteonossopaísexporta:

7 http://www.defesanet.com.br/kc390/noticia/17177/Embraer-apresenta-o-aviao-de-transporte-militar-KC-390/ , de 21 de outubro de 2014. 8 http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/embraer-aposta-em-vendas-fortes-do-kc-390 , de 21 de Outubro de 2014. 9 http://www.defesa.gov.br/projetosweb/cedn/arquivos/palestras-junho-2013/a-industria-nacional-de-defesa-abimde.pdf , P. 17.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

141

TABELA1:CONTRAPOSIÇÃODEPRODUTOSDEALTOVALORAGREGADOECOMMODITIES.

Fonte:OCDE10

Aoanalisarosdadosapresentadosnatabela,verifica-sequeprodutoseequipamentosprovenientesda indústriadedefesapossuemvalor agregadosubstancialmente superior a commodities e outros equipamentosmanufaturados de presença importante na indústria brasileira. Nota-se,portanto, o potencial que a indústria de defesa (cujos principaisconsumidores são os Estados nacionais) apresenta para o crescimento e odesenvolvimento.

OBrasilvemsetornandoummercadodegrandeatrativonosúltimosanos. A descoberta do pré-sal, a grande costa territorial, o territórioamazônico,ariquezaemterrasférteiseaposiçãogeopolíticaestratégicanaAméricadoSuldãoaopaísgrandevisibilidade.Noentanto,obaixoníveldecompetitividadevemprejudicandoas indústriasnacionais.Aaltíssimacargatributária, as altas taxas de juros, os enormes gargalos em infraestrutura, aburocracia ineficiente,entreoutrosfatores,sãoproblemasqueprecisamsersolucionadosparaocrescimento,nãoapenasdasindústriasdedefesa,comotambémdetodasosoutrossetores.

Através das leituras acima e da observação realizada, fica claro,portanto que o desenvolvimento do país e da indústria de defesa estãoconectados.AEstratégiaNacionaldeDefesaofereceproteçãoeimpulsionaocrescimento e a Estratégia Nacional de Desenvolvimento. Ambas devemtrabalhar em conjunto, mirando o desenvolvimento e a consequenteautonomia do país. Investimentos públicos nas indústrias e no que elasprecisam para o crescimento e desenvolvimento permitem uma política de 10 http://stats.oecd.org/Index.aspx?DataSetCode=TIVA_OECD_WTO em 21 de outubro de 2014.

Segmento US$/kg

Mineração (ferro) 0,02Agrícola 0,3

Aço, celulose 0,3 - 0,8 Automotivo 10

Eletrônico (áudio e vídeo) 100Defesa (foguetes) 200

Aeronáutico (aviões comerciais) 1.000Defesa (mísseis) / Tel. Celulares 2.000

Aeronáutica (aviões militares) 2.000 - 8.000Espaço (satélites) 50.000

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

142

inovação fundamental para o incremento da soberania do Brasil e para oaproveitamentodoenormepotencialqueonossopaístemdetornar-secadavez mais um protagonista no cenário mundial. Através das indústrias dedefesaoBrasil verá, comoéóbvio supor, o crescimentode sua soberania epoder através da garantia do PoderDuro,mas tambémpoderá termuito acrescer no Poder Brando: em conhecimento, tecnologia e fatores queextrapolam o poder simplesmente militar. A capacidade de exercer a suainfluênciatambémseráamplamentedesenvolvidaatravésdoquechamamosacimadeSmartPower.

Ao traçar um paralelo com as teorias de Keynes e Schumpeter épossívelnotarainfluênciaqueoEstadoeseusgastospodemexercersobreodesenvolvimentodeumpaís, principalmentequando analisamoso setordedefesa: ao mesmo tempo em que ajuda a garantir a sua autonomia esoberania, um Estado que investe em defesa fomenta as suas indústriaslocais,multiplicandoassuasreceitasegerandomuitosempregos,atravésdeuma indústria que investe constantemente em pesquisa e inovação e éaltamente intensiva em ciência e tecnologia. E uma indústria de base forte,permite ainda diversas possibilidades de expansão demercado através dasexportações. A recente crise econômica que o Brasil vem enfrentando e adependência brasileira nas exportações de commodities pode ter comosoluçãooinvestimentoestatalnodesenvolvimentodasindústriasdedefesa.AEstratégiaNacionaldeDefesajádeterminaaimportânciadoinvestimentoeno reaparelhamento das forças armadas e a retomada do crescimento daindústria, de um modo geral, no Brasil, são forças motrizes e argumentossuficientesparaavalorizaçãodestesegmento.

Poroutrolado,tambémpodemosverqueoaltovaloreestimaquesãodados às inovações deste mercado permitem que o desenvolvimento,segundoentendidoporSchumpeter,sejaacelerado.

OlhandoasideiasdeSchumpeter,podemosconcluiraimportânciaqueas Indústrias de Defesa podem jogar no desenvolvimento de um país. Sãoindústrias que concentram grandes conglomerados, com alto grau deinvestimento em Pesquisa e Desenvolvimento, altamente tecnológicas,intensivasemcapital,flexíveis,multidisciplinaresecomumasedegrandeporinovação.Nestemeio,estarumpassoàfrente,nestemercado,podesignificaradiferençaentreavidaeamorte.

Na prática, esta conclusão se confirma: ao olharmos as grandesempresasdeDefesanomundoem2013,vemosqueas10maioresdomundoencontram-seempaísesaltamentedesenvolvidos,sendo7delasnosEstadosUnidos (Tabela 2). Dentre as maiores companhias, não podemos citar

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

143

empresas chinesas, pois não há aferição acurada sobre elas. No entanto,estimativasmostramqueagiganteNorincoteveumfaturamentopróximodeUS$ 62 bilhões no ano passado, o que a colocaria em primeiro lugar norankingabaixoindicado11.

TABELA2:FATURAMENTOEORIGEMDASMAIORESDOMUNDONOSETOR.

Fonte:DefenseNewsTop100-2013

As empresas supracitadas têm sede em países conhecidos pelo altograudedesenvolvimentoindustrialetecnológicoeissonãoéporacaso.Sãoempresasqueestãorodeadasdeoutrasempresasdebase,deinfraestrutura,por centros de pesquisa e desenvolvimento de capacidade reconhecida egrandes universidades e institutos de ensino. Todos estes fatores ajudam acriarambientes favoráveisaocrescimentodeumpaísedesua indústriadedefesa.

4.CONCLUSÃO

Apósestudarosdadosereferênciasdoscapítulosanteriores,podemosperceber como a indústria de defesa pode ser determinante para odesenvolvimentoeafirmaçãoepoderdeumpaís.Alémdacondiçãosinequanon que fica clarapeladefiniçãodePoderDuro,um investimento sólidonaindústria de defesa potencializa a criação de uma influência econômica eindustrial, não só para o próprio setor de defesa,mas tambémpara outrossetores intensivos em tecnologia. A diminuição da dependência de um paísemrelaçãoaosoutrostambéméfator importanteasenotarquandosetemuma base industrial de defesa sólida, permitindo a um país a tomada dedecisõesestratégicasemnomedoprópriointeresse. 11 http://www.businessweek.com/articles/2014-09-25/chinas-norinco-is-defense-giant-on-global-growth-path , acessado em Outubro de 2014.

Ranking Empresa País Faturamento em Defesa (US$)

1 Lockheed Martin Corporation EUA 44.883.000.0002 Boeing EUA 31.378.000.0003 BAE REINO UNIDO 26.813.124.0004 Raytheon Company EUA 22.705.020.0005 General Dynamics EUA 21.023.000.0006 Northrop Grumman Corporation EUA 20.600.000.0007 EADS N.V. HOLANDA 14.912.960.0008 Finmeccanica ITÁLIA 12.528.670.8139 United Technologies EUA 12.117.000.00010 L-3 Communications EUA 10.839.000.000

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

144

Além disso, investir neste setor traria benefícios socioeconômicosimediatos, como a criação de empregos e o incentivo à formação deprofissionais altamente qualificados. O alto valor agregado e o grandediferencial técnicodosprodutosda indústriadedefesapermitemtambémoaumentodasexportaçõesdeumanação.

Épossívelconcluirtambémqueodesenvolvimentodosetordedefesadepende diretamente dos investimentos realizados pelo Estado, o principalcliente empotencial. Este investimento, se bem realizado, certamente traráretorno estratégico, político e econômico para o país e as empresasenvolvidas.

NocasodoBrasil,anecessidadedeinvestimentodoEstadovemsendopercebida,motivadapelaEstratégiaNacional deDefesa. Leis de incentivo àindústrianacional tambémpossibilitarãoo crescimentoda indústria local efortaleceráopapeldoBrasilcomopotênciaregionalefuturamentemundial.A implementação dessas políticas possibilitam um fluxo de crescimento efortalecimento das empresas que atuam no segmento. Além disso, omaiorinvestimento em pesquisa em desenvolvimento cria a possibilidade dedisseminação de tecnologias para os outros setores. Os recentesdesenvolvimentos do KC-390, através da Embraer, a aquisição dos caçassuecos Grippen pela Força Aérea Brasileira, com possibilidade detransferênciadetecnologia,alémdeprojetosdelongoprazocomooSISGAAZ,SISFRON entre outros em andamento, mostram o crescimento doinvestimento.Noentanto,oBrasilaindacontacomapenasumaentreascemmaiores empresas de defesa do mundo, exportações concentradasprincipalmente em produtos de baixa emédia tecnologia e importações deprodutosdemaiorvaloragregado.Some-seaissoofatodequeaindaexisteumagrandedemandapeloReaparelhamentodasForçasArmadas,chega-seàconclusãodequeopotencialdecrescimentodasindústriasdosetordedefesaéumatendênciaparaospróximosanos.

Por último, podemos notar que, mesmo diante domomento atual decrise econômica e de uma leve tendência mundial à desindustrialização, éimportanteperceberqueaindústriadedefesavemsobrevivendoecrescendoataxasrazoáveisnosúltimosanos(tabela3).Independentedainstabilidadeeconômica, os gastos em defesa continuam sendo uma necessidade dosEstadosepodemtambémservirdeapoioparaosdiasdedificuldade.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

145

TABELA3:GASTOSMILITARESNOMUNDO,1998-2013.

Fonte:SIPRI

Comomostra a tabela, após uma breve redução nos gastos militaresentre 1988 e meados dos anos 1990 (talvez pelo Fim da Guerra Fria e asensação momentânea de estabilidade e paz – o “Fim da História”, deFukuyama), os gastos a partir da segunda metade dos anos 1990 e 2000mantiveram um ritmo de crescimento razoável e estável, mesmo durantemomentosdecriseeconômica,como2008e2009.

Para concluir, podemos perceber que, ao manter uma forte baseindustrialnosetordedefesa,umpaíspassaapossuir, alémde importantesferramentas para determinação de poder, independência e soberania, umagrande possibilidade de desenvolvimento de forma constante,economicamente,tecnologicamenteeatémesmosocialmente.

Para que no futuro seja realizado um estudo mais profundo econclusões mais assertivas sobre o Brasil, durante projetos e pesquisasvindouros será fundamental analisar o atual papel da indústria de defesanacional, observando de perto as Empresas Estratégicas de Defesa e overdadeiropapeldelasparaodesenvolvimentodopaísaolongodasúltimasdécadas, comparando a performance e contribuição destas Empresas aodesenvolvimentonacional, comaperformancede empresasde reconhecidacapacidadeemoutrossegmentos.

Pós-graduação em Comércio Exterior – Monografias selecionadas 2014/2015 ISSN 1413-7976

146

REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS BARTOLOMÉ, Mariano. La Seguridad Internacional post 11-S: situación, debates y

tendencias,BuenosAires:InstitutodePublicacionesNavales,2006BUSH, V. As We May Think. Atlantic Monthly, 1945. Disponível em:

http://www.theatlantic.com/unbound/flashbks/computer/bushf.htm AcessadoemJaneirode2015

CAMPBELL, K.M.&O’Hanlon,M. E. Hard Power: TheNewPolitics ofNational Security.NewYork:BasicBooks,2006.

DUBOFF,RichardB.,AccumulationandPower(Armonk,NY:M.E.Sharpe,1989).GADELHA,C.A.G.Políticaindustrial:Umavisãoneo-schumpeterianasistêmicaeestrutural.

Revista de Economia Política O mercado internacional de equipamentosmilitares:negóciosepolítica externa.Brasília: IPEA,mar2011.Disponível em:http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/100709_boletim_internacional03.pdf

KEOHANE,Robert&JosephNye,PowerandInterdependence.WorldPoliticsinTransition,Little,BrownandCo.,Boston,1977.

LESKE,Ariela.InovaçãoePolíticasnaIndústriadeDefesaBrasileira,RiodeJaneiro(2013).http://www.wto.org/english/res_e/statis_e/statis_e.htm, acessado em18/06/14

MEARSHEIMER,John,TheTragedyofGreatPowerPolitics,W.W.Norton&Co.,NovaYork,2001.

RATCLIFF,J.D."Brains,"Colliers,Jan.17,1942.SCHUMPETER, J. A Teoria do Desenvolvimento Econômico (1912). São Paulo, Ed. Abril,

1982.SCHUMPETER,J.A.BusinessCycles.NewYork:McGraw-Hill,vol.1,1939.Stockholm International Peace Research Institute, http://www.sipri.org/databases,

acessadoem18/06/2014.STOESSINGER,John,WhyNationsGotoWar,St.MartinPress,NovaYork,1982.MACHIAVELLI, Nicollò, 1469-1527. O Príncipe/Nicolau Maquiavel – São Paulo: Legatus

Editora,2010.MORGENTHAU,Hans J. PoliticsAmongNations:The Struggle forPower andPeace.New

York:AlfredA.Knopf:1950.NYE,J(1990)SoftPower,ForeignPolicy,vol.80,pp153-171.NYE, J.,2005. ‘OntheRiseandFallofAmericanSoftPower’,NewPerspectivesQuarterly,

22(3),p.75-77.