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FACULDADE FORTIUM JOSEFINA MARIA FERREIRA ALBUQUERQUE PROGRESSÃO TEXTUAL ANÁLISE DO DISCURSO DE POSSE DO MINISTRO WASHINGTON BOLÍVAR NO CARGO DE PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA BRASÍLIA 2009

58336080 Progressao Textual Josefina Maria

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  • FACULDADE FORTIUM

    JOSEFINA MARIA FERREIRA ALBUQUERQUE

    PROGRESSO TEXTUAL ANLISE DO DISCURSO DE POSSE DO MINISTRO

    WASHINGTON BOLVAR NO CARGO DE PRESIDENTE DO

    SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA

    BRASLIA

    2009

  • JOSEFINA MARIA FERREIRA ALBUQUERQUE

    PROGRESSO TEXTUAL ANLISE DO DISCURSO DE POSSE DO MINISTRO WASHINGTON BOLVAR NO

    CARGO DE PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA

    Artigo Acadmico apresentado ao

    Ncleo de Ps-Graduao e MBAs da

    Faculdade FORTIUM, como requisito

    para obteno do ttulo de especialista

    em Lngua Portuguesa, Gramtica e

    Reviso de Texto, sob orientao da

    Professora Mestra Kelly Cristina Nunes

    da Silva.

    BRASLIA

    2009

  • Trabalho de autoria de Josefina Maria Ferreira Albuquerque, intitulado Progresso

    Textual Anlise do Discurso de Posse do Ministro Washington Bolvar no cargo

    de Presidente do Superior Tribunal de Justia, requisito para a obteno do

    certificado de Especialista em Lngua Portuguesa, Gramtica e Reviso de Texto,

    aprovado em 14 de dezembro de 2009, pela Professora Mestra Kelly Cristina Nunes

    da Silva.

    _________________________________________

    Professora Mestra Kelly Cristina Nunes da Silva

    Orientadora

  • A produo de linguagem constitui atividade interativa altamente complexa de produo de sentidos, que se realiza, evidentemente, com base nos elementos lingusticos presentes na superfcie textual e na sua forma de organizao, mas que requer no apenas a mobilizao de um vasto conjunto de saberes, mas, sobretudo a sua reconstruo [...] no momento da interao verbal. (KOCH, 2008a, p.19).

  • RESUMO

    Este trabalho que se sustenta na vertente cognitivo/discursiva/interacional da

    Lingustica Textual tem como objetivo a anlise da construo da cadeia

    argumentativa do discurso. A abordagem da progresso do raciocnio se assenta no

    estudo da coeso e da coerncia. A progresso textual examinada sob trs

    aspectos: progresso referencial, temtica e tpica.

    PALAVRAS-CHAVE: Lingustica textual. Coeso e coerncia. Progresso textual.

    Progresso referencial. Progresso temtica. Progresso tpica.

  • ABSTRACT

    This article based on the interational/cognitive/discursive vertente of the

    Textual Linguistic has as objetive the analisis of the construction of the

    argumentative speech. Achieving the progression of arguments is based on the

    study of cohesion and coherency. The textual progression is examined through

    three aspects: referencial, themathic and topic progression.

    KEYWORDS: Textual linguistics. Cohesion and coherency. Textual progression.

    Referencial progression. Thematic progression. Topic progression.

  • SUMRIO

    PARA SITUAR O LEITOR................................................................................. 8

    1 QUAL O OBJETIVO DESTE ARTIGO? ......................................................... 10

    2 COMO SE D A PROGRESSO TEXTUAL? ................................................ 11

    3 PROGRESSO REFERENCIAL....................................................................... 13

    3.1 ANFORA................................................................................................... 13

    3.2 ANFORA INDIRETA.................................................................................. 14

    4 PROGRESSO TEMTICA............................................................................. 19

    4.1 TIPOS DE PROGRESSO TEMTICA...................................................... 19

    4.2 RELAES LGICO/SEMNTICAS E DISCURSIVO/ ARGUMENTATIVAS.. 20

    5 PROGRESSO TPICA.................................................................................. 22

    6 CONCLUINDO............................................................................................... 24

    7 REFERNCIAS............................................................................................... 26

    7.1 BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR............................................................. 27

    8 ANEXOS......................................................................................................... 28

  • 8

    PARA SITUAR O LEITOR...

    1989. Um ano que separa pocas distintas. Tantas e to importantes

    mudanas ocorreram nesse ano que se pode dizer que o Sculo XXI se antecipou,

    dando incio a ps-modernidade.

    Hobsbawm, na obra A Era dos Extremos: o breve Sculo XX (1994, p.

    248), diz que foi o colapso do imprio sovitico em 1989, a desintegrao e

    dissoluo da prpria URSS em 1989-1991 que tornaram impossvel fingir, quanto

    mais acreditar, que nada tinha mudado. Sustenta ser possvel considerar, sob certa

    perspectiva histrica, a curta durao do Sculo XX, que, no seu entender, durou de

    1914, com o incio da Primeira Grande Guerra, at o fim da era sovitica

    (HOBSBAWM, 1999, p. 7).

    Nesse ano, uma srie de revolues derrubou governos comunistas,

    fortalecendo os ideais democrticos. Na Europa, a queda do Muro de Berlim

    reunificou a Alemanha aps 40 anos de separao e marcou o fim da Guerra Fria.

    Na China, a coragem de um manifestante annimo que protestava junto a

    milhares de outros estudantes contra o regime comunista ficou registrada como um

    dos momentos marcantes do Sculo XX e tornou-se smbolo da luta pela paz e

    liberdade.

    Tambm nas cincias houve inovaes. O que foi anunciado como o

    maior feito cientfico do sculo a descoberta da fuso nuclear a frio , se no se

    consolidou como a soluo para os problemas energticos que a humanidade ainda

    enfrenta, pelo menos serviu para desmistificar a cincia como indicativo de certezas

    absolutas.

    A chegada da Voyager 2 a Netuno comprovou a inteligncia e a grandeza

    do Homem, mas, tambm, sua insignificncia perante o Universo. Esperava-se que

    essa viagem interplanetria, que demandou alto investimento e mobilizou diversos

    cientistas da Nasa, trouxesse contribuio mais significativa sobre o conhecimento

    do Cosmos e de suas origens.

    Maior revoluo se deu no campo tecnolgico. O mundo nunca mais foi o

    mesmo depois do surgimento da Web rede aberta, de alcance mundial, que

    interliga computadores para a comunicao instantnea entre usurios em sites de

    notcias, mensageiros eletrnicos, redes sociais, pginas de games on-line, servios

  • 9

    governamentais e infinitas outras possibilidades que justificam a afirmao de que

    vivemos em uma aldeia global.

    Em 1989, vivia-se, no Brasil, poca de contagiante esperana. Depois de

    quase vinte anos de ditadura, haveria, em novembro daquele ano, eleies diretas

    para a escolha do presidente. Com a promulgao, no ano anterior, da Constituio

    cidad assim chamada pela macia participao popular em sua elaborao ,

    tudo apontava, depois de longo perodo de exceo democrtica, para a

    consolidao da democracia nas instituies do Pas.

    Iniciativas dos diversos segmentos da sociedade eram levadas

    Assembleia Constituinte, que as estudava, as debatia, para, ento, inclu-las no texto

    constitucional. Foi assim que nasceu o Superior Tribunal de Justia (STJ). Depois do

    amadurecimento poltico e acadmico das ltimas dcadas, sua implantao foi

    amplamente examinada por uma comisso de magistrados e consolidada na

    Constituio de 1988. Em abril de 1989, o STJ comeou a funcionar.

    No mbito do Judicirio, esta foi uma das grandes novidades trazidas pela

    nova Constituio: a criao de uma corte responsvel por uniformizar a

    interpretao da lei federal no mbito da justia federal e estadual, seguindo os

    princpios constitucionais e a garantia e defesa do Estado de Direito. Como ltima

    instncia da Justia brasileira para as causas infraconstitucionais, rgo de

    convergncia da Justia comum, ao STJ cabe apreciar causas oriundas de todo o

    territrio nacional.

    Esse era o cenrio em que vivia o autor do discurso que aqui se pretende

    analisar. Washington Bolvar, primeiro presidente do STJ, antes de entrar para o

    servio pblico, o que se deu na dcada de 60, quando veio para Braslia e se

    tornou membro do Ministrio Pblico, advogou no interior da Bahia. Sua bagagem

    intelectual, sua experincia como defensor pblico e a busca pela justia e verdade

    foram determinantes para moldar o esprito de um homem comprometido com seu

    tempo e com os anseios da sociedade.

    Em seu discurso de posse, ele reala o alcance nacional das decises

    proferidas pelo recm-criado tribunal, a genialidade com que foi pensada a escolha

    de seus membros e a importncia de se julgar grandes e poderosos sem concesso

    de privilgios. Convicto da necessidade do constante aprimoramento jurdico, prev

    a criao da Escola Nacional da Magistratura, hoje uma realidade. Repisa a

    necessidade de se selecionar servidores por meio de concurso pblico, assentando

  • 10

    seu entendimento na nova Constituio. Seu discurso revela, dessa forma, o que ele

    depreende da realidade poltica e social do momento por que passa e se soma

    viso pessoal do que est por vir.

    1 QUAL O OBJETIVO DESTE ARTIGO?

    Neste artigo, busca-se analisar como o Ministro Washington Bolvar

    construiu a cadeia argumentativa do seu discurso, de que forma os fatos que

    vivenciava se encontram presentes em sua fala e se somam com um claro

    discernimento do universo poltico-social em que estava inserido. Pois seu texto

    nada mais do que a concretizao da linguagem realizada

    por sujeitos histricos e sociais em interao, sujeitos que constroem mundos textuais cujos objetos no espelham fielmente o mundo real, mas so isto sim, interativamente e discursivamente constitudos em meio a prticas sociais (KOCH, MORATO & BENTES, 2005, p. 8).

    O respaldo terico que d apoio a este artigo a Lingustica Textual, mais

    precisamente a vertente cognitivo/discursiva/interacional, que v o texto como a

    unidade bsica de comunicao humana, realando o exame da coerncia

    argumentativa e de como o texto organizado, no s pelo encadeamento dos

    enunciados, mas tambm pelo conhecimento construdo pela vivncia do autor.

    Importa frisar que existem critrios de textualidade presentes no texto

    (coeso e coerncia) e em quem o recebe (informatividade, situacionalidade,

    intertextualidade, intencionalidade e aceitabilidade). Aqui, a abordagem da

    progresso do raciocnio lgico se assenta no estudo da coeso dos elementos

    que amarram as ideias trazidas e do a unicidade textual e da coerncia dos

    argumentos apresentados.

  • 11

    2 COMO SE D A PROGRESSO TEXTUAL?

    A competncia na construo argumentativa se d pelo encadeamento

    lgico das ideias apresentadas. Independentemente do gnero, referentes surgem e

    depois so retomados para, com a presena ou no de conectores, novos

    argumentos serem inseridos. Dessa forma, fica garantida a progresso do raciocnio

    do autor a respeito de determinado assunto, facilitando para o interlocutor a

    compreenso da mensagem. V-se, assim, que bastante apropriada a expresso

    tessitura (ou trama) textual, que remete primeira acepo da palavra tessitura ou

    textura, relacionada composio de um tecido.

    As cadeias argumentativas exigem a retomada dos referentes para sua

    modificao ou expanso para se criar na memria do leitor, no decorrer da leitura,

    representaes cada vez mais complexas, que surgem pela soma dos argumentos

    feitos. Essas retomadas acontecem em nvel microestrutural (dentro de cada

    pargrafo) e em nvel macroestrutural (entre os pargrafos do texto).

    Na sequenciao do texto, dois blocos se sucedem na organizao dos

    enunciados. So eles o tema e o rema. O tema o referente novo, do qual se

    pretende dizer algo; o rema, a predicao, aquilo que se fala sobre o tema. No correr

    do texto, o rema pode ser retomado e se transformar em tema, para o qual novas

    predicaes sero feitas. Dependendo da forma como se d o encadeamento dos

    enunciados, a coeso e a coerncia textual vo exigir a presena de conectores

    para consolidar a relao lgico-semntica entre tema e rema.

    O texto apresenta um assunto central que se divide em conjuntos tpicos

    menores. Um segmento tpico (menor unidade tpica) se mantm em foco por um

    tempo at a introduo de outro segmento. A organizao tpica se d em nvel

    linear (horizontal), em que se pensa na organizao tpica concernente quela

    poro de desenvolvimento textual, e em nvel hierrquico (vertical), em que partes e

    subpartes tpicas se organizam para se integrar, de forma coerente, ao quadro

    tpico hierarquicamente superior.

    Assim, o estudo da progresso textual deve ser feito sob trs aspectos: a

    progresso referencial com foco em como se d a retomada de referentes; a

    progresso temtica com foco na relao estabelecida entre o tema e o rema e

    entre esses dois blocos e o bloco seguinte; e a progresso tpica com o propsito

  • 12

    de mostrar a organizao das ideias nos segmentos tpicos, a forma como se d a

    progresso linear dos fragmentos menores e a constituio da unidade textual.

  • 13

    3 PROGRESSO REFERENCIAL

    A exposio das ideias de forma lgica e coerente deve satisfazer, como

    ensina Charolles (1978, apud COSTA VAL, 2006, p. 21), a quatro metarregras, quais

    sejam, repetio, progresso, no contradio e relao. Neste subcaptulo, o

    interesse maior pela repetio que Costa Val chama de continuidade e pela

    progresso, com o fim de se mostrar como se d a retomada do referente para o

    acrscimo de novas informaes. A no contradio, elemento intrnseco da

    coerncia, percebida no s com o que o texto traz de forma explcita, mas

    tambm com o que dele se pode concluir por pressuposies ou inferncias. A

    relao, que a autora entende como articulao, diz respeito aos recursos utilizados

    para se estabelecer, coerentemente, as relaes entre os argumentos do texto. Ser

    explorada no prximo subcaptulo.

    A progresso e a continuidade (repetio) referencial so percebidas pela

    introduo de referentes novos, pela retomada (repetio do mesmo termo,

    sinnimos, antnimos, hipnimos e hipernimos) e pela inferncia textual ou

    contextual. Como ensina Koch (2008b, p. 127), existem dois processos de

    introduo de referentes textuais: de forma ancorada ou no ancorada. A introduo

    no ancorada quando o referente totalmente novo no texto, aparecendo pela

    primeira vez. E ancorada quando aparece com base em algum tipo de associao

    com elementos presentes no texto ou no contexto, o caso das anforas.

    3.1 ANFORA

    A anfora a remisso a um referente citado anteriormente, com o intuito

    de dar progresso ao texto, com o acrscimo de novas informaes. Ela retoma

    (reativa) referentes previamente introduzidos no texto, estabelecendo uma relao

    de correferncia entre o elemento anafrico e seu antecedente (KOCH & ELIAS,

    2009, p. 136). Ela responsvel pela progresso referencial, uma vez que mantm

    em foco o objeto do discurso, para a construo das cadeias referenciais. Reserva-

    se, tecnicamente, a denominao de anfora para a remisso para trs e de

    catfora para a remisso para frente.

    Marcuschi (2005, p. 54) amplia o significado de anfora. Ele entende que

    anfora designa expresses que, no texto, se reportam a outras expresses,

    enunciados, contedos ou contextos textuais (retomando-os ou no). Esse

  • 14

    entendimento passou a designar as anforas indiretas, que retomam no um

    antecedente explcito, mas um elemento com o qual semanticamente se relaciona,

    denominado ncora.

    Antes de abordar as anforas indiretas, bom lembrar que a retomada de

    referentes pode-se realizar por meio de recursos gramaticais (pronomes, elipses,

    numerais, advrbios locativos) ou por meio de recursos de ordem lexical (repetio,

    sinnimo, antnimo, hipnimo e hipernimo).

    Exemplos retirados do quarto pargrafo do discurso mostram ocorrncias

    de catfora e de anfora.

    Ex.:

    O primeiro acontecimento foi uma lio que veio da China, uma cena fugaz(1), mas inesquecvel, que as televises de todos os continentes mostraram: um homem(2), s e desarmado, postou-se frente de uma coluna de tanques(3) e conseguiu paralis-los(3). Causou-me grande admirao o gesto de quem acreditava tanto na democracia que estava pronto a morrer por ela(2). Para onde o primeiro tanque(4) tentava desviar, movia-se(2) o chins desconhecido(2), brava e solitariamente, at quando os seus(2) amigos foram correndo tir-lo(2) de l, arriscando, por sua vez, as prprias vidas. Igual admirao me causou a conduta dos soldados(5), procurando desviar o carro de combate(4) e no simplesmente esmagar obstculo to irrelevante(2) para quem(5) dispunha de tanto poderio; o que os(5) teria movido o respeito universal bravura ou enorme comiserao pelo gesto tresloucado? Qualquer das hipteses tambm lhes(5) faz honra.

    1 catfora uma cena fugaz refere-se a: um homem, s e desarmado,

    postou-se frente de uma coluna de tanques e conseguiu paralis-los. 2 anforas um homem retomadas: quem; se; o chins desconhecido;

    seus; lo; obstculo to irrelevante. uma coluna de tanques retomada: los. primeiro tanque retomada: o carro de combate. os soldados retomadas: quem, os, lhes.

    3.2 ANFORA INDIRETA

    Quando um objeto de discurso introduzido no texto com base em algum

    tipo de associao com elementos presentes no cotexto ou no contexto

    sociocognitivo dos interlocutores1, produz-se uma introduo ancorada. introduo

    1 O trao definidor da anfora indireta diz respeito possibilidade de o antecedente da expresso anafrica estar implcito, perceptvel pela situao comunicativa ou recupervel por conhecimentos partilhados entre os interlocutores. Essa expresso no est associada apenas a fatores lingusticos, mas tambm a pontos de vista sociocognitivos, discursivos e interacionais.

  • 15

    de referentes de forma ancorada d-se o nome de anfora indireta, pois no existe

    no cotexto um antecedente explcito, como no tpico anterior, mas um elemento de

    relao que se denomina ncora.

    A anfora indireta, ento, ao contrrio da anfora direta, no retoma nem

    reativa um antecedente explcito, introduz um elemento cuja significao pode estar

    associada a elementos do cotexto, ser constituda com base em inferncias

    ancoradas no texto ou, ainda, estar saliente na situao comunicativa e recupervel

    pelos saberes compartilhados (MENESES, 2006, p. 64). Ela pode, portanto, remeter

    a trs diferentes espcies de fontes: 1) a elementos presentes no cotexto; 2) a

    inferncias ativadas por elementos do cotexto num processo mental de

    interpretao; e 3) a informaes previamente compartilhadas pelos interlocutores.

    Por ser facilmente identificvel no texto, a primeira espcie considerada anfora

    indireta associativa, enquanto as duas ltimas so no associativas.

    Anfora indireta associativa: De acordo com Kleiber (2001, apud

    MENESES, 2006, p. 67), as anforas indiretas associativas aquelas que, apesar

    de no terem referente explcito no texto, so associadas a elementos nele explcitos

    podem ser de quatro tipos: meronmicas, locativas, actanciais e funcionais.

    Explicar-se- cada uma delas com exemplos retirados do discurso.

    Anforas associativas meronmicas o elemento anafrico parte de uma entidade maior citada anteriormente.

    Ex.: Trs acontecimentos recentes me impressionaram e todos tm muito a ver com o destino do Homem e, especialmente, com o dos Juzes:

    Anforas associativas locativas o elemento novo mantm associao com um lugar, j citado, ao qual est vinculado.

    Ex.: [...] se casse num continente, abriria uma cratera de cinco quilmetros, no mnimo, e destruiria tudo o que houvesse num raio de milhares de outros; se desabasse no oceano, provocaria maremotos que devastariam imensas regies costeiras.

    Anforas associativas actanciais o vnculo anafrico se estabelece entre um acontecimento e os actantes, ou seja, entre o

    acontecimento e as entidades implicadas no evento.

  • 16

    Ex.: Caso se multipliquem as experincias, que os brasileiros tambm conseguiram reproduzir, j fazem os cientistas projeo para viagens interplanetrias [...]

    Anforas associativas funcionais a relao se estabelece entre um elemento desencadeador (ncora) e o agente que desempenha

    determinada funo, embasada na noo trazida pela ncora.

    Ex.: [...] um homem, s e desarmado, postou-se frente de uma coluna de tanques e conseguiu paralis-los. [...] Igual admirao me causou a conduta dos soldados, procurando desviar o carro de combate [...]

    s anforas associativas apresentadas por Kleiber, Marcuschi (2001,

    apud MENESES, 2006, p. 82) acrescenta mais uma: so as anforas indiretas

    baseadas no papel temtico do verbo.

    Ex.: [...] se [o asteroide] casse num continente, abriria uma cratera de cinco quilmetros, no mnimo, e destruiria tudo o que houvesse num raio de milhares de outros; se desabasse no oceano, provocaria maremotos que devastariam imensas regies costeiras. Enfim, uma viso do Apocalipse.

    Anfora indireta no associativa: Marcuschi introduz, tambm, categorias

    de anforas indiretas em que no existe no texto o suporte de um elemento

    cotextual explcito que se associe com o anafrico. A ativao de referncias novas

    se d com base no conhecimento compartilhado pelos interlocutores ou em

    inferncias ancoradas pelo conjunto textual. Nesse tipo de categorizao encontra-

    se ainda a anfora indireta baseada em pores textuais recuperadas por

    nominalizao, denominada por Conte (1996, apud KOCH, 2008a, p. 120) de

    encapsulamento anafrico, conhecida tambm por rotulao.

    Anforas indiretas baseadas em esquemas cognitivos e modelos mentais Essa modalidade anafrica percebida quando no texto

    existem representaes conceituais ou relaes cognitivas

    indicadas por modelos mentais associados a cenrios, frames ou

    scripts, estabelecidos pela experincia de vida e por

    conhecimentos adquiridos e estereotipados.

  • 17

    Ex.: Se ao menos fosse o asteride B 612, ao invs de motivos para alarme, certamente todos estaramos exultantes, quer por ser pequenino, quer pela principal razo de nele morar o Pequeno Prncipe, de Saint-Exupry, dando-nos a certeza de que sua vinda no traria catstrofe, mas sabedoria.

    Anforas indiretas baseadas em inferncias ancoradas no modelo de mundo textual Inferem-se, pelas pistas deixadas no texto,

    referncias que fazem a conexo entre elementos ou entre uma

    poro textual e o anafrico. Ex.: [...] um homem, s e desarmado(1), postou-se frente de uma coluna de tanques(2) e conseguiu paralis-los. [...] Igual admirao me causou a conduta dos soldados, procurando desviar o carro de combate e no simplesmente esmagar obstculo to irrelevante(1) para quem dispunha de tanto poderio(2) [...]

    Anforas indiretas baseadas em elementos textuais ativados por nominalizaes (rotulaes) So ricos os exemplos no discurso

    analisado. Trata-se de um processo referencial em que pores

    textuais so resgatadas por meio de uma forma pronominal (isso,

    aquilo, tudo, nada, o) ou nominal que recupera toda a informao

    enunciada. Os rtulos podem ser prospectivos ou retrospectivos.

    Exs.: O primeiro acontecimento foi uma lio que veio da China, uma cena fugaz, mas inesquecvel, que as televises de todos os continentes mostraram: um homem, s e desarmado, postou-se frente de uma coluna de tanques e conseguiu paralis-los(1). Causou-me grande admirao o gesto(1) de quem acreditava tanto na democracia que estava pronto a morrer por ela. [...] Igual admirao me causou a conduta dos soldados, procurando desviar o carro de combate [...] o que os teria movido - o respeito universal bravura ou enorme comiserao pelo gesto tresloucado(2)? Qualquer das hipteses(2) tambm lhes faz honra. [...] Se ele [o asteride] tivesse sido capturado pelo campo gravitacional do nosso planeta e colidido(3), o impacto(3) equivaleria a 40 bilhes de toneladas de TNT ou o equivalente exploso de 40 mil bombas de hidrognio [...]

    Com exceo da anfora indireta que se refere a conhecimentos prvios

    partilhados pelos interlocutores, encontram-se tanto na anfora associativa, quanto

    na no associativa elementos-fonte mencionados no cotexto precedente. A diferena

  • 18

    entre elas est na facilidade ou no de se identificar a ncora qual o anafrico se

    associa.

    Na anfora associativa, o elemento de ancoragem pode ser apontado

    com mais facilidade, j na no associativa esse elemento no aparece com tanta

    clareza, havendo casos, como nas ativadas por nominalizaes, em que a anfora

    se refere a grandes pores textuais. O motivo de no ser to facilmente apontada

    no cotexto pode estar no fato de que as conexes ativadas no crebro

    associaes que levam a inferncias necessrias para a interpretao do texto

    fazem parte da gramtica internalizada, so intuitivas do falante, que as emprega

    naturalmente e so capazes de reconhecer falhas em seu uso.

  • 19

    4 PROGRESSO TEMTICA relevante, na anlise de um discurso, pensar na progresso temtica

    no s no tocante s relaes que se estabelecem entre os elementos textuais

    (tema e rema), mas tambm em como se d a organizao e hierarquizao dos

    enunciados. Koch2 diferencia quatro formas de se fazer a progresso temtica.

    4.1 TIPOS DE PROGRESSO TEMTICA Progresso temtica linear o rema de um enunciado passa a ser

    tema do enunciado seguinte, o rema deste passa a ser tema do

    prximo e assim sucessivamente.

    Progresso temtica com tema constante a um mesmo tema so acrescentadas, em cada enunciado, novas informaes.

    Progresso temtica com temas derivados quando de um hipertema se derivam temas parciais e a cada um se acrescentam

    novas informaes (remas).

    Progresso por desenvolvimento de um rema subdividido Um hipertema desenvolvido em partes.

    Cumpre observar, porm, que o mais comum que os tipos se mesclem

    no texto. A ttulo de exemplo, ser analisado um pargrafo do discurso:

    Ex.: Progresso temtica com tema constante Tema: o asteride que quase colidiu com a Terra em 1989 E o terceiro acontecimento, por onde se v que o Homem pode prever catstrofes mas nem sempre capaz de evit-las, ocorreu no dia 23 do mesmo ms de maro, por volta das 11 horas (hora de Braslia). Um asteride de cerca de um mil metros de dimetro, viajando a 288 mil quilmetros por hora, passou a uma distncia insignificante em termos csmicos da Terra, pouco mais do dobro da distncia que nos separa da Lua. Segundo os clculos matemticos, o asteride cruzou a rbita da Terra e somente no colidiu porque ela no estava naquele ponto de interseo. Se ele tivesse sido capturado pelo campo gravitacional do nosso planeta e colidido, o impacto equivaleria a 40 bilhes de toneladas de TNT ou o equivalente exploso de 40 mil bombas de hidrognio, conforme calcularam os computadores operados pelos astrnomos do programa de Explorao do Sistema Solar da Nasa; se [o asteroide] casse num continente, abriria uma cratera de cinco quilmetros, no mnimo, e destruiria tudo o que houvesse num raio de milhares de outros; se [o asteroide] desabasse no oceano,

    2 Op. cit., pp. 161-164.

  • 20

    provocaria maremotos que devastariam imensas regies costeiras. Enfim, uma viso do Apocalipse.

    4.2 RELAES LGICO/SEMNTICAS E DISCURSIVO/ARGUMENTATIVAS Outro aspecto a se abordar na progresso temtica diz respeito a como

    se opera a relao entre os segmentos textuais (tema e rema), entre os enunciados

    de um pargrafo e entre os pargrafos do texto.

    A relao, requisito de coerncia pela lgica estabelecida , mas

    tambm de coeso, a que Costa Val3 denomina, com maior propriedade, de

    articulao, se refere maneira como os argumentos se ligam, se organizam e se

    entrelaam. Responsvel pelo encadeamento argumentativo, pela amarrao das

    ideias, ela que garante a unicidade do texto.

    Entre os segmentos textuais, tomados em nvel micro e macroestruturais,

    as relaes estabelecidas no necessariamente exigem a presena de mecanismos

    de conexo, j que elas podem se dar tambm em segmentos construdos por

    justaposio. Porm a presena de recursos especficos que explicitem as ligaes,

    principalmente as de cunho lgico/semnticas, favorece a legibilidade e a

    compreenso ao assegurar para o leitor a significativa ligao que h entre os

    elementos textuais.

    Os encadeadores do tipo discursivo no se preocupam com a relao de

    contedo entre dois segmentos, eles estabelecem a orientao argumentativa do

    texto. Tambm chamados de operadores argumentativos, marcam as relaes

    pragmticas, discursivas ou argumentativas.

    Vejamos como o Ministro Washington, em seu discurso, faz o

    encadeamento das ideias por justaposio e utiliza os articuladores textuais para

    marcar o interrelacionamento dos enunciados.

    Encadeamento por justaposio Ex.: O gnio inventivo do Povo Brasileiro, ao editar a nova

    Constituio, quis que ele representasse o encontro do saber e da experincia dos militantes da Justia Comum, Federal e Estadual, compondo-o de um tero dentre Juzes dos Tribunais Regionais Federais, um tero dentre Desembargadores dos Tribunais de Justia e um tero, em partes iguais, dentre advogados e membros do Ministrio Pblico Federal, Estadual, do Distrito Federal e dos Territrios.

    3 Op. cit., p. 27

  • 21

    Encadeamento por conexo com indicadores de relaes lgico-semnticas Ex.: Nem aqui celebramos hoje uma posse, mas simples

    provimento de cargos pblicos para o desempenho de pesadas tarefas; at porque, ns, Juzes, nada possumos: todo o poder emana do Povo e por ele e para ele exercido; e toda a glria quando h pertence Ptria.

    Encadeamento por conexo com indicadores de relaes discursivo-argumentativas Ex.: Em verdade, o Judicirio, que compe, com o Legislativo e

    o Executivo, os Poderes da Unio, h de afirmar sua independncia no somente pela autonomia financeira, que a Constituio lhe assegurou, mas, sobretudo, pela sabedoria e firmeza de suas decises. Esses so os articuladores principais de um texto, mas existem outros,

    como os articuladores utilizados para a organizao do texto. Veja o exemplo:

    Encadeamento por conexo com organizadores textuais Trs acontecimentos recentes me impressionaram e todos tm

    muito a ver com o destino do Homem e, especialmente, com o dos Juzes: o primeiro foi testemunhado pelo mundo inteiro; o segundo apenas por alguns; e o terceiro, por sorte da Humanidade, ningum teve a infelicidade de ver.

    O primeiro acontecimento foi uma lio que veio da China, uma cena fugaz, mas inesquecvel, que as televises de todos os continentes mostraram [...]

    O segundo acontecimento foi a notcia divulgada no dia 22 de maro do corrente ano, pelos cientistas Stanley Pons e Martin Fleischmann, da Universidade de Utah [...]

    E o terceiro acontecimento, por onde se v que o Homem pode prever catstrofes, mas nem sempre capaz de evit-las, ocorreu no dia 23 do mesmo ms de maro [...]

  • 22

    5 Progresso Tpica

    Tpico o assunto sobre o qual se fala. Um texto apresenta um tpico

    central, que pode ser constitudo de um ou de vrios quadros tpicos, cada um

    destes quadros se subdivide em subtpicos, que, por sua vez, se compem de

    segmentos tpicos.

    Se retirarmos um quadro tpico do texto, constataremos que ele traz a

    noo completa de um cenrio textual, porm, quando somado significao global

    constitutiva do contexto, tem sua contribuio argumentativa medida pelos vnculos

    que direta ou indiretamente so estabelecidos com os demais quadros tpicos. Um

    quadro tpico pode apenas ilustrar um ponto de vista. Pode, ainda, desencadear

    uma reflexo ou ser ponto de partida para o desenvolvimento do tpico central.

    A progresso tpica realiza-se dentro de um texto pelo encadeamento

    lgico/argumentativo em dois nveis: linear (ou horizontal) e vertical (ou hierrquico).

    Para que a coerncia no seja prejudicada, no se admite rupturas ou interrupes

    longas sem explicitamento, em nenhum dos dois nveis. Para facilitar o

    acompanhamento do raciocnio do autor, quando h quebra da continuidade tpica

    com posterior retomada, so necessrios elementos de coeso que justifiquem as

    digresses, tais como organizadores textuais e marcadores de discurso.

    No discurso em anlise, v-se, claramente, que o autor introduz sua

    argumentao construindo trs cenrios diferentes, que so os trs quadros tpicos

    iniciais, com o objetivo de, a partir deles, traar um paralelo reflexivo entre as lies

    que encerram e a busca pela paz social, necessria para combater a crise na qual

    se encontrava a Ptria, os objetivos da mais nova Corte Superior do Pas, a conduta

    esperada de um magistrado e a difcil misso que ter pela frente, tpicos que

    compem o novo quadro, o qual trata mais especificamente do assunto central: o

    papel que esperado dos magistrados no cenrio de crise por que passa o Pas.

    A seguir, o esquema dos quadros-tpicos, em uma anlise hierrquica:

  • 23

    Discurso de Posse do Ministro Washington Bolvar no cargo de Presidente do

    Superior Tribunal de Justia

    Supertpico

    Democracia, inovao e fragilidade humana

    & STJ e a prtica social da Justia como

    instrumentos para a paz social

    Quadros-tpicos Quadro-tpico

    O STJ e a prtica social da Justia como instrumentos para se alcanar a paz social.

    Veja-se, agora, o esquema de um dos quadros tpicos, dividido em

    subtpicos: Quadro-tpico

    O STJ e a prtica social da Justia como

    instrumentos para se alcanar a paz social

    Subtpico Subtpico

    Um chins se ps frente de uma coluna de tanques e conseguiu paralis-los.

    Cientistas descobrem a fuso nuclear a frio.

    Um asteride quase se chocou com a Terra.

    Criao do STJ, sua composio e finalidade e previses para o futuro.

    Os magistrados e a prtica social da Justia.

  • 24

    6 CONCLUINDO... Sabe-se que o produtor de um texto conta com o conhecimento prvio do

    leitor e com sua capacidade de inferncia para a apreenso dos sentidos de uma

    produo. Como nem todos tm a mesma facilidade em realizar operaes mais

    elaboradas para captar sua total significao, se no for completamente coeso e

    coerente, deve ter pistas que levem a sua compreenso facilmente recuperveis

    pelo contexto.

    O texto, a partir dessa viso, encerra em si muito mais que o resultado

    final de um encadeamento lgico e coerente do raciocnio do escritor, ele o

    produto de interao entre autor e leitor. Pois, para o seu processamento,

    necessrio que autor e interpretador joguem o jogo da linguagem, mobilizem uma

    srie de estratgias de ordem sociocognitiva, interacional e textual com vistas

    produo do sentido (KOCH, 2008a, p. 189). E com base nos elementos

    lingusticos que esto na superfcie textual e tambm na forma de organizao dos

    argumentos que se faz possvel a construo dos sentidos pretendidos pelo

    produtor.

    Os sentidos de um texto vo-se construindo progressivamente, com o

    constante ir e vir entre as ideias enunciadas, que garantem, com o movimento de

    retrao e progresso, a tessitura textual. Para alcanar o entrelaamento

    argumentativo, o autor dispe de vrias estratgias que visam assegurar os trs

    pontos abordados:

    a progresso/continuidade referencial: obtida pela manuteno de um

    referente (objetos de discurso), enquanto sobre ele se fala, com o objetivo de ret-lo

    na memria do leitor.

    a progresso/continuidade temtica: o emprego de termos do mesmo

    campo semntico assegura a construo de um cenrio na mente do leitor. O tipo de

    conexo estabelecida entre os argumentos e a forma com eles so organizados

    permitem ao leitor compreender o contnuo textual dotado de sentido.

    a progresso/continuidade tpica: o texto composto de um tpico

    principal, que construdo a partir de quadros tpicos, subtpicos e segmentos

    tpicos que o sustentam e o diferenciam de outra exposio sobre o mesmo

    assunto.

  • 25

    Conclui-se, assim, que a progresso textual, responsvel pelo

    encadeamento das ideias e pela manuteno do fio discursivo, engloba aspectos de

    coeso e coerncia e resultado de estratgias cognitivo-discursivas,

    sociointeracionais e de formulao textual utilizadas para a construo significativa

    do discurso.

  • 26

    7 REFERNCIAS HOBSBAWM, E. J. A Era dos Extremos: o Breve Sculo XX. Companhia das Letras: So Paulo, 1994. Disponvel em: . Acesso em: 18 out. 2009. ______. O Novo Sculo. Companhia das Letras: So Paulo, 1999. Disponvel em: . Acesso em: 18 out. 2009. KOCH, I. V: As tramas do texto. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008a. KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender os sentidos do texto. So Paulo: Contexto, 2008b. ______. Ler e escrever estratgias de produo textual. So Paulo: Contexto, 2009. ______. Referenciao e discurso. So Paulo: Contexto, 2005. MARCUSCHI, L. A. Anfora Indireta: O barco textual e suas ncoras. In KOCH, I. V.; et al. Referenciao e discurso. So Paulo: Contexto, 2005. MENESES, M. S. Continuidades referenciais sem retomada: um trabalho com anforas indiretas, associativas e esquemticas. 2006. 170 p. Dissertao (apresentada ao final do Mestrado em Lingustica) Universidade Federal do Piau. COSTA VAL, M. G. Redao e textualidade. So Paulo: Martins Fontes, 2006.

  • 27

    7.1 BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR CAVALCANTE, M. M. Teoria e Anlise Linguistica: Anforas indiretas e relaes lexicais. Fortaleza: UFCE, 2006. GALVES, C. et al. O Texto: Leitura e escrita. Campinas: Pontes, 2002. KOCH, I. V. A Coeso Textual. So Paulo: Contexto, 2003. ______. A interao pela linguagem. So Paulo: Contexto, 2007.

  • 28

    8 ANEXOS I Anlise do discurso do Ministro Washington Bolvar

    Progresso referencial: referentes textuais sublinhado

    Progresso temtica: marcas de relaes lgico-semnticas, discursivo-

    argumentativas e de organizao textual em negrito

    Progresso tpica diagrama

    II Discurso do Ministro Washington Bolvar na ntegra, publicado na Revista BDJur,

    do Superior Tribunal de Justia

  • DISCURSO DE POSSE DO MINISTRO WASHINGTON BOLVAR DE BRITO NO CARGO DE PRESIDENTE DO STJ1

    WASHINGTON BOLVAR DE BRITO* Ministro do Superior Tribunal de Justia,

    Presidente do Superior Tribunal de Justia e do Conselho da Justia Federal

    Exmo. Sr. Ministro Jos Nri da Silveira, Presidente do

    Supremo Tribunal Federal; Exmo. Sr. Ministro de Estado da Justia, Dr.

    Oscar Dias Correa, neste ato representando o Excelentssimo Senhor

    Presidente da Repblica; Exmo. Sr. Ministro Francisco Rezek, Presidente

    do Tribunal Superior Eleitoral; Exmos. Srs. Ministros de Estado; Exmos.

    Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal; Exmos. Srs. Senadores e

    Deputados Federais; Exmos. Srs. Ministros Presidentes dos Tribunais

    Superiores, do Tribunal de Contas da Unio e respectivos Ministros;

    Exmos. Srs. Ministros aposentados desta Corte; Exmos Srs. Presidentes

    dos Tribunais de Justia dos Estados e do Distrito Federal, dos Tribunais

    Regionais Federais e respectivos magistrados que os integram; Exmos.

    Srs. Presidentes dos Tribunais de Alada; Exmos. Srs. Juzes Federais e

    Juizes Estaduais de Primeira Instncia; Exmos. Srs. Membros do Ministrio

    Pblico; Exmos. Srs. Embaixadores acreditados junto nossa Nao;

    Exmos. Srs. Representantes dos Governos Estaduais; Exmos. Srs.

    Procuradores da Repblica; Exmos. Srs. Presidentes dos Tribunais de

    Contas dos Estados e respectivos membros; Srs. Advogados; Srs.

    Funcionrios; Senhoras e Senhores:

    Sejam minhas primeiras palavras para agradecer ao eminente

    colega e amigo Ministro Evandro Gueiros Leite.

    Trs acontecimentos recentes me impressionaram e todos tm

    muito a ver com o destino do Homem e, especialmente, com o dos Juzes:

    1 Discurso proferido na solenidade de posse no cargo de Presidente do STJ em 23/06/1989.

    *Aposentado do cargo de Ministro do STJ, a partir de 02/12/1991.

  • Discurso de posse do Ministro Washington Bolvar de Brito no cargo de Presidente do STJ

    o primeiro foi testemunhado pelo mundo inteiro; o segundo apenas por

    alguns; e o terceiro, por sorte da Humanidade, ningum teve a

    infelicidade de ver.

    O primeiro acontecimento foi uma lio que veio da China,

    uma cena fugaz, mas inesquecvel, que as televises de todos os

    continentes mostraram: um homem, s e desarmado, postou-se frente

    de uma coluna de tanques e conseguiu paralis-los. Causou-me grande

    admirao o gesto de quem acreditava tanto na democracia que estava

    pronto a morrer por ela. Para onde o primeiro tanque tentava desviar,

    movia-se o chins desconhecido, brava e solitariamente, at quando os

    seus amigos foram correndo tir-lo de l, arriscando, por sua vez, as

    prprias vidas. Igual admirao me causou a conduta dos soldados,

    procurando desviar o carro de combate e no simplesmente esmagar

    obstculo to irrelevante para quem dispunha de tanto poderio; o que os

    teria movido - o respeito universal bravura ou enorme comiserao pelo

    gesto tresloucado? Qualquer das hipteses tambm lhes faz honra.

    O segundo acontecimento foi a notcia divulgada no dia 22 de

    maro do corrente ano, pelos cientistas Stanley Pons e Martin

    Fleischmann, da Universidade de Utah, Estados Unidos, de que teriam

    conseguido a fuso nuclear a frio, liberando energia do mesmo tipo da

    obtida na exploso de uma bomba H, produto da fisso atmica. O novo

    metdo, resultante da compresso de tomos de deutrio na rede

    cristalina do paldio, convertendo-os em tomos de hlio e nutrons,

    produziria energia sem a violncia, nem a constante ameaa de poluio

    ambiental do antigo. A gua pesada seria obtida de uma fonte inesgotvel

    - o mar que nos rodeia. Caso se multipliquem as experincias, que os

    brasileiros tambm conseguiram reproduzir, j fazem os cientistas

    projeo para viagens interplanetrias, utilizando a gua da cauda dos

    cometas e a Terra seria iluminada por uma energia nuclear limpa e

    infinita.

    2

  • Discurso de posse do Ministro Washington Bolvar de Brito no cargo de Presidente do STJ

    E o terceiro acontecimento, por onde se v que o Homem pode

    prever catstrofes mas nem sempre capaz de evit-las, ocorreu no dia

    23 do mesmo ms de maro, por volta das 11 horas (hora de Braslia).

    Um asteride de cerca de um mil metros de dimetro, viajando a 288 mil

    quilmetros por hora, passou a uma distncia insignificante em termos

    csmicos - da Terra, pouco mais do dobro da distncia que nos separa da

    Lua. Segundo os clculos matemticos, o asteride cruzou a rbita da

    Terra e somente no colidiu porque ela no estava naquele ponto de

    interseo. Se ele tivesse sido capturado pelo campo gravitacional do

    nosso planeta e colidido, o impacto equivaleria a 40 bilhes de toneladas

    de TNT ou o equivalente exploso de 40 mil bombas de hidrognio,

    conforme calcularam os computadores operados pelos astrnomos do

    programa de Explorao do Sistema Solar da Nasa; se casse num

    continente, abriria uma cratera de cinco quilmetros, no mnimo, e

    destruiria tudo o que houvesse num raio de milhares de outros; se

    desabasse no oceano, provocaria maremotos que devastariam imensas

    regies costeiras. Enfim, uma viso do Apocalipse.

    Mas o que teriam a ver tais acontecimentos com o destino do

    Homem e, especialmente, com a formao dos Juzes? Que liame teriam

    entre si e em que aproveitariam a essa festa do Direito e da Justia, num

    Tribunal que nasce?

    O trao comum a universalidade dos trs fatos, que

    interessaram vivamente a todos os povos e pases. Nem menor do que o

    outro a reflexo que inspiram, nem a lio que cada um deles encerra. O

    primeiro, ao relembrar que os ideais de democracia e de liberdade so

    mais fortes do que o instinto de conservao e o apego prpria vida; e

    de que nenhuma ditadura, por mais longa, ou mais poderosa, ou mais

    terrvel, que seja, pode estirp-los do corao de um homem, ou de um

    povo. O segundo, ao demonstrar que h sempre um mtodo novo, para

    substituir o antigo, e que a Cincia no est somente a servio da

    3

  • Discurso de posse do Ministro Washington Bolvar de Brito no cargo de Presidente do STJ

    dominao e da morte, mas tambm da melhoria da vida humana e de

    sua futura projeo para alm das galxias. E finalmente o terceiro, ao

    advertir para a fragilidade do mundo e de tudo quanto h nele, para

    nivelar, na mesma desolao, a grandeza e a misria dos homens, j que

    tudo pode sofrer grandes transformaes ou simplesmente acabar, no

    vrtice de um buraco negro ou numa coliso csmica. Basta lembrar que

    em 1937 o asteride, batizado de Hermes - o mensageiro dos deuses -

    tambm passara bem perto de ns e qualquer outro j pode estar vindo

    dos confins do Universo. quele ltimo visitante se deu a denominao

    alfanumrica de 1989FC. Se ao menos fosse o asteride B 612, ao invs

    de motivos para alarme, certamente todos estaramos exultantes, quer

    por ser pequenino, quer pela principal razo de nele morar o Pequeno

    Prncipe, de Saint-Exupry, dando-nos a certeza de que sua vinda no

    traria catstrofe, mas sabedoria.

    Embora saibamos que vivemos num mundo j de si to frgil,

    que as naes digladiam entre si e os homens se matam no somente

    pelos mais torpes motivos, mas at mesmo pelos mais nobres, quando

    deveriam ajudar-se uns aos outros, aflige-nos ver que a nossa Ptria

    tambm se agita e se debate na maior de todas as suas crises. Nunca

    uma ptria precisou tanto de patriota. E nunca o nosso Pas necessitou

    tanto da compreenso e da harmonia dos brasileiros entre os Poderes da

    Repblica.

    Talvez por isso este Superior Tribunal de Justia, que a

    grande novidade do Poder Judicirio, institudo pelo Povo, reunido em

    Assemblia Nacional Constituinte, sob a proteo de Deus, possa

    representar esse ideal de congraamento, um mtodo novo de operar um

    Tribunal no Brasil, uniformizando a interpretao do direito federal e

    velando pela fiel execuo de suas leis.

    O gnio inventivo do Povo Brasileiro, ao editar a nova

    Constituio, quis que ele representasse o encontro do saber e da

    4

  • Discurso de posse do Ministro Washington Bolvar de Brito no cargo de Presidente do STJ

    experincia dos militantes da Justia Comum, Federal e Estadual,

    compondo-o de um tero dentre Juzes dos Tribunais Regionais Federais,

    um tero dentre Desembargadores dos Tribunais de Justia e um tero,

    em partes iguais, dentre advogados e membros do Ministrio Pblico

    Federal, Estadual, do Distrito Federal e dos Territrios. Em verdade, ele

    o grande Tribunal de convergncia nacional, fim de carreira, pelo mrito,

    de magistrados e juristas.

    Se ele prprio representa a valorizao do mrito, justo que

    se dedique ao mrito dos cidados, ao merecimento de seus pleitos,

    prevalncia do direito federal, julgando-lhes as causas. Necessrio que

    os seus funcionrios tambm sejam escolhidos de conformidade com as

    leis e tenham os seus mritos reconhecidos e proclamados. Que patrocine

    uma Escola de Aperfeioamento dos Servidores da Justia, uma Escola

    Nacional para a Magistratura, uma Fundao, instituda por lei, que

    aproveite o seu excelente parque grfico e divulgue as conferncias, as

    palestras, as aulas ministradas por seus Juzes, muitos dos quais

    professores de escol de nossas Universidades, ou pelos juristas de

    renome, nacionais e estrangeiros, como convidados especiais.

    Os Magistrados brasileiros devem dar o exemplo de

    compreenso e de harmonia, de que a Ptria tanto carece. E devem

    inspirar-se na antiga lio do Eclesistico: "No procures tornar-te juiz se

    no tens fora para extirpar a injustia; do contrrio te intimidars diante

    de um poderoso e manchars tua integridade." (Ecl., 7,6).

    Em verdade, o Judicirio, que compe, com o Legislativo e o

    Executivo, os Poderes da Unio, h de afirmar sua independncia no

    somente pela autonomia financeira, que a Constituio lhe assegurou,

    mas, sobretudo, pela sabedoria e firmeza de suas decises.

    Busquemos todos, legisladores, administradores, magistrados,

    advogados, membros do Ministrio Pblico, servidores, melhorar seu

    5

  • Discurso de posse do Ministro Washington Bolvar de Brito no cargo de Presidente do STJ

    funcionamento, que reconhecemos falho, porquanto sobrecarregado, mas

    suscetvel de grande aperfeioamento. Com o Supremo Tribunal Federal,

    guardio da Constituio, que sempre esteve altura dos graves

    momentos histricos j vividos pela Nao; com a ajuda das Associaes

    de Magistrados e a indispensvel colaborao da Ordem dos Advogados

    do Brasil certamente alcanaremos esse aperfeioamento.

    Mas, para que se firme a confiana do povo no Poder Judicirio

    devemos diligenciar para que tambm os grandes e os poderosos, quando

    delinqentes, como tal sejam tratados, sem quaisquer privilgios, seno

    os porventura outorgados em lei, e velar para que no escapem, se

    culpados, da punio exemplar. Nem podemos tolerar a violncia e a

    desordem, praticadas sob os mais diversos pretextos, pela turba

    ensandecida e inflamada pelos demagogos e aventureiros; nem podemos

    permitir que o povo, ainda que descrente e desiludido dos Poderes

    regulares do Estado, pratique a justia pelas prprias mos, negando os

    direitos do Homem e do Cidado; se culpado, cabe ao Poder Judicirio

    puni-lo; culpado, ou inocente, turba que no cabe justi-lo.

    "Abre tua boca a favor do mudo, pelo direito de todos os que

    se acham em desolao. Abre tua boca; julga retamente, e faze justia

    aos pobres e aos necessitados", eis a lio dos Provrbios (cap. 31, vs. 8

    e 9). Enquanto Juiz, nesses doze anos de judicatura, tenho-me esforado

    para realizar esse programa. Valendo-me da expressiva sntese potica de

    Viriato Gaspar, sei que

    Um fiapo de mim ficou em cada

    pessoa que cruzou a minha vida.

    - que pena eu ter a alma to espalhada

    que j nem possa mais ser dividida.

    6

  • Discurso de posse do Ministro Washington Bolvar de Brito no cargo de Presidente do STJ

    chegada a hora de nos apartamos, cada um para o seu

    trabalho, a servio da Ptria, que est em perigo e precisa de ns.

    Nem aqui celebramos hoje uma posse, mas simples

    provimento de cargos pblicos para o desempenho de pesadas tarefas;

    at porque, ns, Juzes, nada possumos: todo o poder emana do Povo e

    por ele e para ele exercido; e toda a glria - quando h - pertence

    Ptria.

    Antes de declarar encerrada esta Sesso Solene e de renovar

    os agradecimentos s altas autoridades j enumeradas, aos Srs. Oficiais-

    Generais e todos os queridos amigos e convidados que aqui estiveram

    presentes ou representados, ao renovar estes agradecimentos, anuncio

    que os cumprimentos sero dados no salo contguo ao deste Plenrio.

    Solicito ao Cerimonial a gentileza de conduzir as Senhoras dos Srs.

    Ministros Vice-Presidente e Corregedor-Geral e a minha prpria ao salo

    anexo. Apelo, ainda, a todos os eminentes amigos e convidados para que

    tenham a tolerncia de permanecer por um instante ainda em seus

    lugares, at que os integrantes da Mesa e as autoridades que aqui se

    encontram, e que dela fazem parte, os Srs. Ministros de Estado, Ministros

    do Supremo Tribunal Federal, Presidentes dos Tribunais Superiores,

    Tribunais de Justia, Tribunais de Alada e os demais j enunciados, todos

    ns, possamos nos deslocar, juntamente com os Ministros da Corte.

    Que Deus os abenoe e muito obrigado.

    7