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8/6/2019 7033270 a Formacao Do Aluno Leitor
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A formao do aluno leitor
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA DE PRODUO
A FORMAO DO ALUNO LEITOR
TERTULIANA CORRA MACHADO
Dissertao submetida Universidade Federal de Santa Catarinapara a obteno do ttulo de Mestre em Engenharia de Produo
Orientador:Prof. Francisco Antonio Pereira Fialho, Dr.
Florianpolis, 2001
A FORMAO DO ALUNO LEITOR
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Nome:Tertuliana Corra Machado
rea de Concentrao:
A leitura
Orientador:
Prof. Francisco Antonio Pereira Fialho, Dr.
Florianpolis, 2001
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DEDICATRIA
Aos meus alunos e ex-alunos.
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AGRADECIMENTOS
Sem o apoio, o estmulo e a colaborao recebida de diversas pessoas, este
trabalho dificilmente teria sido realizado.
Por isso, agradeo a todos aqueles que, de alguma forma me apoiaram,
torceram por mim e viabilizaram a concretizao deste sonho.
Agradeo, sobretudo a Deus, pela minha famlia, por todas as pessoas
amigas, pelo meu trabalho, pela vida enfim!...
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SUMRIO
Dedicatria................................................................................................................. IV
Agradecimento........................................................................................................... VResumo....................................................................................................................... IXAbstract...................................................................................................................... X
1- Introduo................................................................................................................... 011.1 Justificativa........................................................................................................ 011.2 Estabelecimento do problema........................................................................... 041.3 Objetivos........................................................................................................... 051.4 Metodologia...................................................................................................... 061.5 Estrutura dos captulos....................................................................................... 07
2- Histrico da Leitura no Mundo Ocidental.................................................................. 09
2.1 A diversidade das prticas de leitura no mundo grego e helenstico................ 102.1.1 Novos textos e novos livros: a leitura em Roma................................... 142.1.2 As modalidades de leitura..................................................................... 152.1.3 Os novos leitores................................................................................... 17
2.2 Prticas monsticas na Alta Idade Mdia: Ler, escrever, interpretar o texto.... 182.3 O modelo escolstico da leitura........................................................................ 20
2.3.1 O desaparecimento do modelo escolstico............................................ 222.4 A leitura nos finais da Idade Mdia.................................................................. 242.5 A leitura nas comunidades judaicas da Europa Ocidental na Idade Mdia...... 252.6 O leitor humanista............................................................................................. 27
2.6.1 O texto e sua moldura............................................................................ 292.6.2 O professor e o leitor............................................................................. 312.6.3 O fim de uma tradio...................................................................... ..... 33
2.7 Reforma protestante e leitura............................................................. 332.8 Leituras e Contra-Reforma................................................................................ 36
2.8.1 As leituras dos iletrados........................................................................ 372.9 Uma revoluo da leitura no final do sculo XVIII.......................................... 38
2.9.1 Ler sem comprar.................................................................................... 412.10 Os novos leitores do sculo XIX: mulheres, crianas e operrios.................. 422.11 Um futuro para a leitura.................................................................................. 46
2.11.1 A leitura no mundo.............................................................................. 462.11.2 Crise da leitura. Crise da produo..................................................... 482.11.3 O cnone contestado............................................................................ 502.11.4 Ler de outra maneira........................................................................... 512.11.5 A desordem na leitura......................................................................... 512.11.6 Os modos de leitura............................................................................. 532.11.7 A ausncia de cnones e de novos cnones......................................... 54
3- A importante conquista do jovem leitor.................................................................. 553.1 A leitura: Caminho que leva cidadania.......................................................... 64
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4- Os Parmetros Curriculares Nacionais e a leitura.....................................................4.1 O texto como unidade e a diversidade de gneros............................................ 774.2 A seleo de textos............................................................................................ 78
4.2.1 Textos orais........................................................................................... 78
4.2.2 Textos escritos....................................................................................... 784.2.2.1 Sobre a leitura de textos escritos........................................................ 824.3 Relato de uma experincia................................................................................ 87
5- Resultado da pesquisa e interpretao dos grficos................................................... 95
6- As novas mdias e seu impacto no ato de ler.......................................................... 1266.1 Uma pausa para reflexo................................................................................... 1276.2 A educao na era da informao..................................................................... 1286.3 A leitura na era da informao.......................................................................... 1296.4 Informtica Porta aberta comunicao........................................................ 131
7- Concluses................................................................................................................. 1367.1 Algumas limitaes deste trabalho..................................................................... 1377.2 Sugestes para trabalhos futuros....................................................................... 137
8- Referncias Bibliogrficas......................................................................................... 138
9- Anexos........................................................................................................................ 141
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Onde o esprito vive sem medo e a fronte se mantm erguida;onde o saber livre;onde o mundo no foi dividido em pedaos por estreitas paredesdomsticas;onde as palavras brotam do fundo da verdade;onde o esforo incansvel estende os braos para a perfeio;onde a clara fonte da razo no perdeu o veio no triste deserto de areia dohbito rotineiro;onde o esprito levado Tua presena, em pensamento e ao sempre
crescentes;dentro desse cu de liberdade, meu Pai, deixa que se erga minha Ptria.
(Rabindranath Tagore-Gitanjali)
... para que todos ns possamos ser sbios,para que todos ns possamos ser felizes.
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo questionar sobre a leitura,
principalmente na escola, alm de colher informaes a respeito da formao de
leitores.
Trata-se de uma reflexo sobre o ato de ler e a educao em geral,
frente s novas tecnologias.
Para isto, foi feita uma retrospectiva sobre a leitura no mundo
ocidental, esclarecendo-nos diversos comportamentos sociais frente ao universo
do livro, alm de delinear algumas hipteses sobre o futuro da leitura no mundo
informatizado.
O trabalho faz tambm referncia leitura, segundo os Parmetros
Curriculares Nacionais, ou seja, como devem ser organizadas as prticas
pedaggicas em torno dos textos orais e/ou escritos.
Ele relata ainda uma experincia vivenciada no ano 2000, fruto de
um projeto de incentivo leitura.A importncia de conquistar o aluno leitor preocupao constante,
sempre procurando ressaltar as inmeras possibilidades que a leitura traz para o
indivduo.
Questiona o papel da escola na formao de leitores e aponta a
leitura como caminho que pode levar cidadania.
Por fim, apresenta os resultados de uma pesquisa realizada em
vrias escolas, a qual, prazerosamente, fornece subsdios para o enriquecimento
do uso da leitura como prtica diria em nossas instituies escolares.
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ABSTRACT
This work intends to question about reading, specially at school,
besides gathering information about formation of readers.
It deals with a reflection over the act of reading and education in
general, in the presence of new tecnologies.
Because of this, it was done a review about reading in the ocidental
world, clarifying to us several social behaviors in the presence of book universe,
besides outlining some hipothesis about the future of reading in a computerized
world.
This work makes reference to reading, according to PCNs, it
means, how the pedagogical prectices around oral and/or written texts must be
organized.
It still tells an experience lived in the 2000 year, result of a project of
incentive to reading.
The importance of conquesting the reader student is a permanent
worry, always trying to expose the uncountable possibilities that the act of reading
brings to a person.
It questions the duty of school in readers training and shows reading
as a way which can take to citizenship.
Finally, this work presents the results of a research made in severalschools, which pleasurably, gives subsidies to enrichment of reading uses asdaily practice in our educational institutions.
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1. INTRODUO
A histria humana no se desenrola apenas nos campos de batalha e nosgabinetes presidenciais. Ela se desenrola tambm nos quintais, entre plantas e galinhas, nas ruas de subrbios, nas casas de jogos, nosprostbulos, nos colgios, nas usinas, nos namoros de esquinas.
(Ferreira Gullar Jornalista, poeta e escritor brasileiro)
1.1 Justificativa
No h dvida de que a leitura um caminho muito importante para a
informao e, principalmente, para a formao do educando. Cabe aqui uma pergunta:
Todo aluno gosta de ler? A resposta mais provvel deve ser no. Ento, como despertar no
aluno o gosto pela leitura? Nem sempre essa uma das tarefas mais fceis. Ela apresenta
dificuldades e prope muitos desafios, os quais exigem dos adultos, pais e educadores, no
apenas boa vontade, mas tambm esforo e dedicao constantes. Como se v, no basta
apenas querer, preciso perceber e distinguir os vrios obstculos com que se defrontam, e
buscar mecanismos que possibilitem ultrapass-los. Tentar super-los a meta prioritria
para qualquer um que queira enfrentar essa barreira e, com isso, ajudar a mudar o rumo da
histria de cada educando, fazendo-o entender que quem l transcende o tempo e se
permite uma viagem de prazer indescritvel, visto que a leitura uma experincia pessoal,
mpar.
Para que essa tarefa possa ser executada, urge que se tenha em mente o que
disse um professor francs, a capacidade de ficar na janela olhando as pessoas passarem e
passar, ao mesmo tempo, junto com elas.
Segundo Marisa Lajolo ( 1993),
Ningum nasce sabendo ler: aprende-se a ler medida em que se
vive. Se ler livros geralmente se aprende nos bancos da escola, outras
leituras se aprendem por a, na chamada escola da vida. (Lajolo, 93)
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Da se conclui que, alm de despertar no aluno o gosto pela leitura, preciso
antes de mais nada despertar nele a sensibilidade, a capacidade de se situar frente ao texto
lido num
processo que envolva uma compreenso crtica do ato de ler que no
esgota na decodificao pura da palavra escrita, mas que se antecipa e se
alonga na inteligncia do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da
palavra, da que a posterior leitura desta no possa prescindir da
continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem
dinamicamente. A compreenso do texto a ser alcanada por sua leitura
crtica implica a percepo das relaes entre o texto e o contexto. (Paulo
Freire, 1981)
Segundo Paulo Freire, bom salientar que a leitura do mundo particular do
leitor de fundamental importncia para despertar-lhe o interesse pela leitura da palavra.
Ademais, a aprendizagem da leitura deve ser um ato de educao
fundamentalmente tico e poltico. A leitura de hoje em dia deve levar em conta a histria
das pessoas e das sociedades: seus hbitos, costumes, modos de viver e de pensar. Deve
colocar o homem como agente da histria e no como mero sujeito dela, onde alguns
poucos so enaltecidos por quaisquer fatos que os destacam no meio social, poltico,
econmico, militar ou religioso.
Cabe, principalmente aos educadores proporcionar aos educandos
oportunidades para observar e analisar o contexto no qual esto inseridos e, mais do que
isso, oferecer-lhes condies para que tenham vontade poltica para propor alternativas
pertinentes que visem melhoria da qualidade de vida da sua coletividade. Agindo assim,
os indivduos deixaro de ser apenas um nmero a mais nas pesquisas e estatsticas para
serem cidados capazes de respeitar direitos, cumprir deveres, reivindicar melhorias,
preservar e difundir cultura, enfim, construir a Histria.
A educao deve ter como prioridade formar o cidado e, para isso, precisa
estar afinada com as novas tendncias manifestadas na sociedade e estas indicam a
necessidade de uma formao geral slida, a capacidade de manejar conceitos, o
desenvolvimento do pensamento abstrato. (Saviani, 1994:103) e de uma aprendizagem
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contnua atravs de processos de formao. Assim, a escola precisa formar o leitor que
questiona, que esteja conectado com o mundo e disposto a ler muito e sempre.
A formao desse leitor depende da adoo de novas metodologias e de
novos materiais favorveis na sala de aula, o que significa descartar certas prticas
antiquadas que tm revelado resultados poucos satisfatrios. Essas questes apontam para
a necessidade de formao continuada tambm para o professor que, doravante, deve ser
um eterno aprendiz, consciente de que as palavras de ordem do momento so:
aprendizagem permanente.
Mas como formar o aluno incutindo-lhe o esprito crtico, transformando-o
num cidado participativo e atuante numa sociedade que est totalmente voltada para a
tecnologia? Ser possvel promover o entrosamento perfeito da modernidade com os
antigos valores que sempre regeram a mente humana? A resposta mais conveniente aponta
que isso, alm de ser possvel, necessrio. A tecnologia no nenhum bicho-papo. Os
tempos mudaram e preciso se adaptar s novidades e delas tirar proveito. Nada avanou
tanto no mundo como as comunicaes e esse processo no vai regredir. bem verdade
que a fora da mdia inquestionvel, todavia isso no quer dizer que todos precisam se
render aos seus apelos. Deve-se ter em mente que a capacidade educativa atribuio e
responsabilidade das famlias e da escola. Teremos de lidar com o sculo XXI, carregando
problemas muito antigos que tiveram suas razes nos primrdios da Histria do Brasil e por
que no dizer, nos primrdios da Histria das Civilizaes? Segundo afirma Umberto
Eco: Toda modificao dos instrumentos culturais, na histria da humanidade, se
apresenta como uma profunda colocao em CRISE do mundo cultural precedente.
Com o aparecimento da fotografia, temeu-se pela pintura; acreditavam que o
cinema seria extinto quando surgiu a televiso. Falou-se da morte do livro com o
advento dos textos eletrnicos. Por ltimo, aparece o computador e a TV que redefiniram
as caractersticas que marcaram o sculo XX. Como se no bastasse, surgiu a Internet que,
embora ainda atinja um nmero reduzido de pessoas, cresce assustadoramente a cada dia.
Com a introduo da informtica, do computador e da Internet na sala de
aula, obviamente que o professor precisa se policiar e tentar sair da mesmice que por muito
tempo vem regendo nossas escolas.
certo que a escola uma instituio que h cinco mil anos se baseia no
falar/ditar do mestre, na manuscrita do aluno e, h quatro sculos, em um
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uso moderado da impresso. Uma verdadeira integrao da informtica
(como do audiovisual) supe, portanto, o abandono de um hbito
antropolgico mais que milenar, o que no pode ser feito em alguns anos.
(Levy,l993)
Conforme prope o autor, no resta a menor dvida de que a informtica, o
computador e, sobretudo a Internet, alteraram e alteram totalmente o nosso fazer
pedaggico. No obstante, no h mais como negar a necessidade da utilizao desses
meios em nossas vidas.
Como tudo o que novo, a Internet chegou, aguou a curiosidade de todos,
causou impacto, provocou elogios e foi () alvo de especulaes dos mais cticos.
1.2 Estabelecimento do Problema
Como resgatar o prazer da prtica da leitura como uma prtica crtica e
reflexiva?
Os alunos de hoje, por vrios motivos, no tm contato sistemtico com a
leitura de qualidade e com adultos leitores. A escola torna-se ento o nico veculo de
interao desses alunos com textos, cabendo a ela oferecer leituras de bom nvel,
diversidade de textos, modelos de leitores e prticas de leituras eficazes e,
conseqentemente, formar leitores competentes.
Um leitor competente aquele que, por iniciativa prpria, seleciona, de
acordo com as suas necessidades e interesses, o que ler entre os vrios tipos de textos que
circulam socialmente.
Para que isto se efetue, a escola deve promover uma prtica constante de
leitura organizada em torno de uma diversidade de textos. O ideal que o professor seja
um bom leitor e que esteja sempre atualizado em relao a novas publicaes e crie com
seus alunos uma interao capaz de estimul -los a falar sobre o assunto. Cabe tambm ao
professor proporcionar-lhes um convvio estimulante com a leitura, assim como permitir
que ela cumpra o seu papel, ou seja, o de ampliar, pela leitura da palavra, a leitura do
mundo.
Literatura um jeito de se ler a vida. Ler no sentido de interpretar,
observar, descobrir, e refletir. Nela a vida pulsa. (Kupstas & Campos,
1992)
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As autoras atribuem literatura e ao ato de ler a tarefa de descobrir a vida.
Como agir daqui para frente?
Seguir envolvido na emoo da descoberta, aprender errando, sentir medo,
encontrar sadas?
O papel do educador desbravar caminhos, estimular e administrar a
curiosidade, tanto a prpria, como a curiosidade de seus alunos. mister que haja perfeita
interao entre aluno e professor porque, na era da informao somos todos aprendizes do
futuro, aprendizes permanentes na busca de um mundo melhor e na busca da prpria
felicidade.
Nesse mundo de transio no qual estamos vivendo, tudo est mudando
muito depressa. Tudo est sendo reavaliado. Pouco, muito pouco deve ficar como sempre
foi. Urge buscar uma nova prtica pedaggica que atenda a contento o novo aluno que
recebemos a cada ano. nosso dever prepar-lo bem para a vida e conscientiz-lo das
novas e rpidas mudanas. S o fato de querer mudar com elas j pode ser um bom
comeo.
1.3 Objetivos
Os objetivos deste trabalho esto relacionados ao questionamento de formas
eficazes que possam despertar nos alunos o gosto pela leitura e compreenso da
importncia do uso de novas tecnologias no ensino como forma de superar o ensino
tradicional, alm de refletir sobre a insero de um fazer-pedaggico mais ligado
realidade social e/ou vivncia do aluno. Relacionam-se, principalmente a uma longa
trajetria pessoal ligada educao lingstica que aponta mais do que nunca a
necessidade de um olhar criterioso para traduzir a importncia do novo ensino e a sua
relao com o conhecimento.
Hoje em dia j no se concebe mais a comunicao sem tecnologia, pois,
como j foi dito anteriormente, segundo McLuhan, o mundo se transformou, realmente, em
uma enorme Aldeia Global.
Como objetivos, esta dissertao se prope a:
[ Formar leitores capazes de extrair dos textos, tanto prazer quanto conhecimento, dentro
de um contexto informatizado.
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[ Propor a prtica da leitura constante de forma que o leitor estabelea relaes entre o
texto que l e outros textos j lidos; que saiba identificar os elementos implcitos; que
consiga validar a sua leitura a partir da localizao de elementos discursivos que
permitam faz-lo.
[ Enfatizar que o trabalho com a leitura deve ser uma prtica constante e que constitui a
matria-prima para o ato de escrever.
[ Despertar no aluno a sensibilidade, mostrando-lhe que ela no precisa ser um dom
inato, mas algo que se cultiva e se desenvolve e que o torna apto a degustar o que l.
[ Ressaltar o valor da interatividade, da intertextualidade, do paratexto e do hipertexto.
[ Desenvolver no aluno as habilidades lingsticas bsicas para ler, analisar e interagir
com a realidade em que vive, inserindo-se, assim, no seu contexto social, lembrando-
lhe de que hoje a leitura deve ser prazer, mas que, alm de requerer interpretao clara,
requer tambm conhecimento tecnolgico.
1.4 Metodologia
A leitura , sem dvida, um campo de pesquisa que tem muito a ser
explorado.
Sendo assim, formar o aluno leitor ser um processo longo que exigir do
pesquisador um acompanhamento paulatino de um grupo de alunos que sero escolhidos
de forma aleatria.
A princpio, ser necessrio um teste de sondagem e os alunos, atravs de
depoimentos pessoais, entrevistas, questionrios (e formulrios) devero mostrar suas
experincias com a leitura.
Tal procedimento tambm ser aplicado a um grupo de professores que,
voluntariamente, quiserem colaborar com a pesquisa.
Para anlise dos casos, podero ser seguidos alguns passos que direcionaro
o trabalho e garantiro, sem dvida, a formao do aluno leitor competente que o
principal objetivo desse trabalho (ou dessa dissertao).
Dentre outros, tais passos podero ser:
1) Sugesto de leituras considerando alguns fatores como: sexo, idade, nvel
socioeconmico, desenvolvimento psicolgico, grau de escolaridade.
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2) Envolvimento da maioria dos professores da escola num projeto de leitura
extraclasse, o qual, alm de incentivar a leitura, diminuir gastos com a aquisio
de livros, facilitar a interao e a interdisciplinaridade , possibilitar tambm o
crescimento pessoal e profissional.
Aps esta primeira fase que a pesquisa de campo propriamente dita, a qual
requer pacincia e, sobretudo, persistncia, ser feita a tabulao e apresentao dos dados
coletados.
Em seguida, ser feita uma anlise para interpretar os dados apresentados na
fase anterior e, por ltimo, os resultados desta experincia sero relatados no presente
trabalho, bem como as principais concluses e algumas sugestes de aperfeioamento.
1.5 Estrutura dos captulos
Esta dissertao est estruturada em sete captulos. No primeiro captulo
encontra-se a introduo que consta da justificativa, onde feita uma ampla reflexo sobre
a leitura e a educao em geral, frente s novas tecnologias; encontram-se tambm o
estabelecimento do problema, os objetivos, a metodologia e a estrutura do trabalho.
No segundo captulo, vemos um histrico da leitura no mundo ocidental.
Essa retrospectiva mostra-nos os caminhos pelos quais a leitura trilhou, desde a Grcia e
Roma antigas, at ns. Esclarece-nos tambm os diversos comportamentos sociais frente
ao universo do livro, alm de delinear algumas hipteses sobre o futuro da leitura no
mundo informatizado.
No terceiro captulo fazemos referncia importncia de conquistar o jovem
leitor, ressaltando as inmeras possibilidades que a leitura traz para o indivduo,
Questionamos ainda o papel da escola na formao de leitores. Por fim, apontamos a
leitura com um caminho que leva cidadania.
No quarto captulo, observamos a leitura frente aos Parmetros Curriculares
Nacionais, ou seja, como devem ser organizadas as prticas pedaggicas em torno dos
textos orais e/ou escritos. So apresentadas algumas sugestes didticas que orientam a
formao de leitores. Esse captulo relata tambm uma experincia vivenciada no ano
2000, fruto de um projeto de incentivo leitura.
No quinto captulo so apresentados os resultados da pesquisa realizada, os
grficos com o levantamento dos dados e a interpretao desses grficos.
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No sexto captulo dissertamos sobre as novas mdias e os impactos destas
sobre os hbitos de leitura, alm de refletirmos sobre a educao na era da informao.
Finalmente apresentamos, no stimo captulo as concluses, em um dilogo
com os objetivos pretendidos, e as sugestes para futuros trabalhos, referindo-nos s
limitaes do presente estudo.
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2 HISTRICO DA LEITURA NO MUNDO OCIDENTAL
Antes de serem escritores, fundadores de um espao prprio, herdeirosdos lavradores de outrora, porm, no solo da linguagem, escavadores de
poos e construtores de casas, os leitores so viajantes; circulam pelas
terras alheias, nmades caando furtivamente pelos campos que no
escreveram, arrebatando os bens do Egito para deles gozar. A escrita
acumula, estoca, resiste ao tempo pelo estabelecimento de um espao e
multiplica sua produo pelo expansionismo da reproduo. A leitura no
se previne contra o desgaste do tempo (esquecemo-nos dele e de ns
prprios), ela no conserva ou conserva mal o que adquiriu e cada um doslugares por onde ela passa a repetio do paraso perdido.
(Certeau, v.1,p.247)
O autor enfoca a novidade sempre inerente leitura, declarando-a imune ao
desgaste do tempo. Ele afirma que os leitores so viajantes onipotentes e onipresentes a
quem sonhar permitido.
As diferentes formas de ler sempre caracterizaram as sociedades desde a
Antigidade. Antes de mais nada, cumpre-se lembrar que a leitura no nasce j inscrita em
determinado texto, pois h grande distncia entre os sentidos atribudos a um texto pelo seuautor, pelo editor, pelo crtico e pela interpretao que o leitor faz dele. Alis, o leitor a
razo de ser todos os textos. bom que promova um encontro entre o mundo do leitor e
o mundo do texto. Por qu? Pelo simples fato de que cada leitor l um mesmo texto de
maneiras variadas. Alm disso, cada momento da histria tambm determina processos
interpretativos diferentes. muito importante que, antes de se ler um texto, o leitor situe-se
no tempo e no espao. Esse procedimento lhe dar melhores condies para fazer uma boa
interpretao do que foi lido
Quer se trate do jornal ou de uma tese, o texto somente tem significao por
seus leitores; com eles o texto se transforma; ordena-se segundo cdigos de percepo que
lhe escapam. Ele somente se torna texto em sua relao com a exterioridade do leitor, por
meio de um jogo de implicaes e de astcias entre dois tipos de espera combinadas:
aquela que organiza um espao lisvel (uma literalidade) e aquela que organiza uma
abordagem necessria feitura da obra ( uma leitura).
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preciso considerar que as formas produzem sentido e que um texto se
reveste de uma significao e de um estatuto inditos quando mudam os suportes que o
propem leitura. Toda histria das prticas de leitura , portanto, necessariamente uma
histria dos objetos escritos e das palavras leitoras.
preciso observar que a leitura sempre uma prtica encarnada por gestos,
espaos e hbitos. preciso identificar as disposies especficas que distinguem as
comunidades de leitores, as tradies de leitura, as maneiras de ler. Todos aqueles que
podem ler os textos no os lem da mesma forma, h aqueles que possuem mais
competncia de leitura e h os leitores menos hbeis. Todavia, as comunidades de leitores
transformam-se em comunidades de interpretao. Cada uma dessas comunidades partilha,
em relao com o escrito, um mesmo conjunto de competncias, de usos, de cdigos, de
interesses e permite estabelecer limites e localizar as tradues culturais das diferenas
sociais. Para cada comunidade de interpretao formada, a relao com o escrito efetua-se
com tcnicas, gestos e diferentes maneiras de ler. A leitura no apenas uma operao
intelectual abstrata: ela o uso do corpo e uma ateno especial deve ser dada s maneiras
de ler que desapareceram ou que, pelo menos, foram marginalizadas no mundo
contemporneo. A leitura no deve limitar-se apenas maneira de ler
contemporaneamente, ela deve, sobretudo, reencontrar os gestos esquecidos, os hbitos que
desapareceram e, alm de manter o homem intelectualizado, deve tambm servir de deleite
e prazer para o homem moderno que vive diariamente a revoluo eletrnica.
2.1 - A diversidade das prticas de leitura no mundo grego e helenstico
Cada logos, a partir do momento em que foi escrito, rola para todos os
lados, tanto na direo dos que o compreendem quanto na daqueles com os
quais nada tem a ver, no sabendo a quem deve ou no deve falar.
( Plato)
O trecho de Plato suscita, direta ou indiretamente, outras questes
fundamentais para a histria da leitura na Grcia clssica. preciso pensar nas relaes
entre os sistemas de comunicao no somente por meio da oposio oral / escrito, mas
tambm no prprio interior do oral que assume formas diferentes, quer se trate de um
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discurso simplesmente falado, quer se trate de uma reconstituio oral de um texto escrito
feito por um indivduo leitor. O discurso falado, que Plato considera um discurso de
verdade, escolhe seus interlocutores, pode estudar suas reaes, esclarecer suas perguntas,
responder a seus ataques. O discurso escrito, pelo contrrio, como uma pintura: se lhe
indagamos alguma coisa, ele no consegue responder, apenas se repete eternamente.
Difundido para um suporte material inerte, o escrito no sabe onde encontrar aquele que
ser capaz de compreend-lo nem consegue evitar quem no tem competncia para acolh-
lo. Cada leitura constitui, portanto, uma interpretao diferente do texto, diversa paracada leitor. No entanto, o escrito goza da liberdade de rolar livremente em todas as
direes e se presta a uma leitura livre, a uma interpretao e a um uso do texto com total
liberdade.O livro que veicula um logos escrito, destinado leitura, traz outras
implicaes at mesmo contraditrias: pois enquanto havia uma escassa presena do livro,
havia uma alfabetizao bastante ampla, capaz de capacitar at as camadas inferiores da
sociedade urbana a lerem inscries oficiais ou privadas.
Os gregos se preocupavam tambm com a conservao do texto. A Grcia
antiga teve ntida conscincia de que a escrita fora inventada para fixar os textos e traz-
los assim novamente memria, na prtica, para conserv-los. Nessa poca, havia
fronteiras que delimitavam entre o livro destinado fixao e conservao do texto e olivro destinado leitura. Certos livros eram utilizados como textos escolares, com
finalidades educativas de um certo grau, e outros se prestavam leitura de entretenimento,
com cenas de leitura propriamente dita, em que os leitores so inicialmente figuras
masculinas, depois seguidas por figuras de mulheres-leitores. Esses leitores no eram
solitrios, aparecem, em geral em grupos representativos de conservao e de atividade
ldica, sinal de que a leitura era vista como a prtica de vida em sociedade.
Nota-se que havia, nesse tempo, uma certa primazia da modalidade da
leitura em voz alta, alis, a mais difundida. preciso considerar ainda uma outra dimenso da leitura: os gregos da
poca clssica no desconheciam leituras de viagem e, portanto, de entretenimento e
lazer, fora de quaisquer obrigaes profissionais. desse tempo a notcia do surgimento
das primeiras coletneas de livros, a princpio do tipo profissional e, em seguida, do tipo
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textos e cada uma das sees. Surge uma nova organizao da produo literria e uma
nova disciplina tcnico-livreira, ambas ligadas no s a criao de grandes bibliotecas, mas
tambm a novas prticas de leitura.
As grandes bibliotecas helensticas, todavia, no eram bibliotecas de leitura.
Eram, ora sinais das dinastias que estavam no poder; ora, instrumento de trabalho para um
crculo de eruditos e de literatos. Os livros eram mais acumulados do que realmente lidos.
As bibliotecas continham coletneas de livros das escolas de filosofia e de cincias, e eram
reservadas a um nmero muito restrito de mestres, discpulos e alunos. Excetuando as
grandes bibliotecas, pouco se conhece sobre outras bibliotecas pblicas da poca
helenstica. Porm, preciso perguntar: qual era a sua funo? E quem realmente as
freqentava? Parece que a leitura era praticada, de preferncia, na intimidade, por aqueles
que a dominavam. Nesse perodo, assiste-se tambm ao florescer de manuais de carter
tcnico, como textos de crtica filosfica e literria ou tratados de uso meramente prtico
(ttica militar, agricultura).
Tambm, nessa ocasio houve a ampliao da leitura, quando o novo papel
assumido pelo livro vem marcado na composio de epigramas de dedicatria e de
apresentao editorial em que ele objeto de alguma alocuo ou, melhor, o livro fala. A
leitura em voz alta d alma ao livro. O livro entra, ento, com sua prpria personalidade,
num jogo de relaes com os leitores, com todos aqueles que a ele se dirigem e lhe
emprestamvoz.
No por acaso que surge ento uma verdadeira teoria da leitura, que
manuais de retrica e tratados gramaticais oferecem detalhados preceitos sobre a
expressividade da voz no ato de ler. Sem esta arte de ler, o escrito no passaria de traos
incompreensveis depositados no papiro. Cada leitura individual ou na presena de um
auditrio, deve ser uma interpretao vocal e gestual que se esfora o mais possvel para
expressar gnero literrio e as intenes do autor. Nasce da a arte oratria, por sua vez
ligada prxis teatral. Nasce daqui a procura , por parte dos antigos, de uma metodologia
hermenutica capaz de decifrar os indcios oferecidos pelo prprio texto, observ-los, com
o objetivo de conseguir uma leitura correta.
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2.1.1- Novos textos e novos livros: a leitura em Roma
A partir de que momento possvel falar de uma presena real do livro e do
surgimento de prticas de leitura em Roma?
No h a menor dvida de que Roma herdou do mundo grego a estrutura
fsica do livro e certas prticas de leitura. Na Roma dos primeiros sculos os usos da
cultura escrita limitavam-se substancialmente casta sacerdotal e nobreza, sendo difcil
acreditar que houvesse outros livros alm dos anais compilados pelos pontfices, isto ; os
livros de interpretao de pressgios e as coletneas de orculos, juntamente com outros
poucos conservados em locais secretos. Entre as famlias nobres, mais do que livros o que
havia eram documentos de arquivos, relatos de funes exercidas pelos magistrados e
elogios fnebres. Portanto, no se pode pensar que a prtica da leitura fosse alm dessasinscries e desses documentos.
Mais tarde, o uso do livro se expande porque a sociedade romana tambm
est em expanso. Entretanto, trata-se sobretudo de livros gregos, de uso profissional. O
prprio nascimento de uma literatura latina est ligado, nessa poca, aos livros gregos.
Em princpio, a literatura mostra-se uma prtica exclusiva das classes
elevadas e se faz de maneira privada. As bibliotecas eram formadas por livros gregos que
chegavam a Roma como despojos de guerra. Tais livros, eram guardados nas residncias
dos que os conquistaram e depois transformavam-se em bibliotecas particulares em torno
das quais rene-se a restrita sociedade culta. Grandes amizades se firmaram atravs de
emprstimos de livros e de conversas provocadas por tais emprstimos. As bibliotecas dos
romanos ricos, aos poucos se transformaram em um espao para viver.
A poca imperial marca uma nova etapa nas prticas de leitura, devido,
antes de tudo, ao progresso na alfabetizao. O mundo, doravante greco-romano, torna-se
um mundo de vasta circulao de cultura escrita. Ao lado de inscries de todos os tipos
das epgrafes oficiais aos grafites circula uma multido de produtos escritos: cartazes
erguidos em cortejos, libelos e prospectos em verso ou em prosa distribudos em lugares
pblicos, fichas com legendas, tecidos escritos, calendrios, documentos com reclamaes,
cartas, mensagens. preciso levar ainda em considerao a documentao civil e militar e
a ligada prtica jurdica.
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Nesse cenrio em que muitas pessoas sabem ler e no qual circulam
numerosos produtos escritos, manifesta-se uma crescente demanda de livros que se
encontra uma resposta em trs planos: na criao de bibliotecas pblicas e incremento das
particulares; na oferta de textos novos (ou refeitos) destinados a novas faixas de leitores; na
produo e distribuio de um tipo diferente de livro, o codex, o livro j com pginas, mais
adequado s necessidades desses novos leitores e das diferentes prticas de leitura.
A notcia sobre a funo das bibliotecas pblicas como espaos de leitura
em Roma so poucas. Certamente no eram bibliotecas como as helensticas, reservadas a
pequenos crculos, mas deve-se pensar, preferencialmente, em bibliotecas eruditas,no
sentido de serem abertas a qualquer pessoa que as quisesse freqentar. Na realidade, eram
freqentadas por um pblico de leitores de classe mdia alta, a mesma que, muitas vezes,
j dispunha de bibliotecas particulares. O aumento do nmero de bibliotecas no pode ser
atribudo diretamente ao crescimento das necessidades de leitura. s vezes, construam-se
bibliotecas por deciso do imperador com a finalidade de conservar as memrias histricas
e de selecionar e codificar o patrimnio literrio. Tambm a benemerncia privada ergueu
bibliotecas pblicas para serem locais de entretenimento culto de vida urbana.
A seleo realizada pelas bibliotecas pblicas podia, s vezes, configurar-se
como a verdadeira censura dos textos que desagradavam ao poder.
O desenvolvimento das bibliotecas particulares correspondem, sem a menor
duvida, a uma expanso das necessidades de leitura; e, mesmo nos casos em que essas
bibliotecas foram prova de ostentao de poder econmico, elas indicam que, no mundo
das representaes da sociedade greco-romana da poca, livros e leituras tinham seu lugar
na abastana e nos comportamentos de uma vida opulenta.
2.1.2 - As modalidades de leitura
A leitura de uma obra literria exigia um grande domnio tcnico e
intelectual. Para os outros textos, um nvel menor de competncia j era suficiente:particularmente, a leitura de cartazes, documentos ou mensagens era facilitada pela
repetio de certas frmulas.
As condies da aprendizagem da leitura so diversas segundo as pocas, o
estatuto social, as circunstncias. Geralmente, ela se realiza no mbito familiar, junto a
professores particulares ou na escola pblica. Vrios eram tambm os nveis e as suas
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fases da aprendizagem da prpria leitura a qual se iniciava com vrios caracteres,
comeando pelos maiores. Mas antes de aprender a ler, aprendia-se a escrever. As crianas
em idade escolar tinham, antes de mais nada, de aprender as formas e os nomes das
letras em ordem alfabtica. Os estgios posteriores eram constitudos pelo traado das
slabas, de palavras completas e, finalmente, de frases.
A aprendizagem da leitura, separada da aprendizagem da escrita, era
realizada num segundo momento, de modo que havia certamente indivduos, com pouco
grau de escolaridade capazes de escrever, mas no de ler.
O fato dos exerccios iniciais da leitura comear pelo conhecimento das
letras isoladas, depois pelo das slabas e, em seguida, pelo domnio de palavras completas
exigia muita habilidade do leitor para que chegasse a ler com rapidez e sem incorrer em
erros. O exerccio era feito em voz alta e, enquanto se pronunciava a ltima palavra j lida,
os olhos deviam olhar as palavras seguintes, o que era considerado dificlimo, visto que
exigia um desdobramento de ateno. Quando a leitura se mostrava rpida e segura, o
olho precedia a boca: tratava-se, em ltima anlise, de uma leitura ao mesmo tempo oral e
visual. Ler um livro com os olhos alude capacidade do olhar hbil ser capaz de decifrar
imediatamente a escrita nasce ento a leitura silenciosa.
De qualquer forma, a maneira mais habitual de ler era em voz alta. A leitura
podia ser pessoal ou tambm feita por um leitor que assegurava a mediao entre o livro, o
ouvinte ou ainda todo um auditrio. A leitura feita diante de grandes auditrios deveria ser
uma leitura expressiva, modulada por tons e cadncias de voz conforme o gnero do texto
e os pretendidos efeitos de estilo. No por acaso que o verbo que indica a leitura da
poesia freqentemente cantare e canora, o termo que designa a voz do intrprete. Ler um
texto literrio era, em suma, quase executar uma partitura musical. J na escola, o jovem
romano aprende quando reter a respirao, em que ponto dividir a linha com uma pausa,
onde concluir o sentido e onde comear, quando se deve erguer ou abaixar a voz, com que
inflexo se deve articular cada elemento, o que deve ser dito lenta ou rapidamente, com
maior mpeto ou maior suavidade. Ler em profundidade um autor complexo, segundo a
medicina da poca, exigia tanto esforo do leitor que a leitura em voz alta era colocada
entre os exerccios fsicos benficos sade.
Excetuando o caso de leitores bastante hbeis ou profissionais, a leitura era
uma operao lenta. Uma primeira dificuldade provinha do tipo de letra adotada pelo
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copista , s vezes livreira, caligrfica, mas s vezes semicursiva ou cursiva e rica em
ligaes que originavam confuso: nem todos os que tinham prtica de uma escrita eram
capazes de ler com facilidade (ou mesmo decifrar) outra.
Um dos grandes recursos utilizados pelos romanos teria sido a leitura
pblica. O prprio lanamento das obras literrias se prestava a uma cerimnia social que
acontecia em locais pblicos: auditrios, crculos, teatros e a sua durao era varivel.
importante insistir no carter de vnculo social, de cumplicidade mundana e de hbito
intelectual dessas leituras pblicas, as quais, justamente enquanto ritos literrios e
sociais, contavam com a presena no somente de indivduos interessados e cultos ou at
menos preparados e, por isso mais atentos audio do que leitura, mas tambm de
ouvintes desatentos e entediados. Graas a esses ritos, havia uma efetiva participao de
um pblico mais vasto do que o dos verdadeiros leitores.
No mbito da vida privada, alm da prtica da leitura individual, ntima, era
muito difundida tambm a leitura ancilar, mediada por um leitor, escravo ou liberto: uma
figura bastante presente nas casas dos romanos ricos.
2.1.3- Os novos leitores
Nos primeiros sculos do Imprio, o novo leitor no mais aquele
obrigado a ler por fora de suas funes; um leitor livre, que l por prazer, pelohbito ou pelo prestgio da leitura. Trata-se de um novo pblico formado por pessoas que
cultivam os gestos de leitura.
Na poca imperial o aumento do nmero de leitores se deve ao
aparecimento de uma literatura de grande consumo ou de entretenimento, no
enquadrada nos gneros tradicionais: poesia de evaso, parfrases de obras picas,
biografias, pequenos tratados de culinria e de esportes, livretos sobre jogos e
passatempos, obras erticas, horscopos, livros de magia ou interpretao dos sonhos, mas
principalmente de fico, contendo situaes e esquemas psicolgicos banais, episdioscomplicados e intrigantes, de efeitos dramticos, inseridos numa trama de fundo amoroso e
de aventura. Nesta literatura destinada a uma ampla circulao, deve-se incluir tambm a
chamada literatura panfletria que tratava de temas subversivos e que circulava, talvez
clandestinamente.
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Havia barreiras culturais entre os leitores, mas isto nem sempre implicava
uma escolha diferenciada de leituras; todo mundo lia as mesmas as obras: as diferenas
estavam nas maneiras de ler, de compreender, de apreciar texto. Tratava-se, portanto, de
uma frmula de leitura marcada por uma circulao transversal, na qual a fico ocupa
um lugar importante, sobretudo por causa de certos romances gregos que serviam, alm do
mais, para seduzir leitores e leitoras medianamente alfabetizados. O que mais atraa nesse
tipo de leitura eram as histrias de amor, com episdios emocionantes e cheios de
peripcias em que um casal de amantes acossado pelos acontecimentos se desencontrava e
reencontrava em meio a ardis, traies e reconciliaes que ocorriam quer em clima de
comdia, quer em clima de tragdia.
Em suma, a poca imperial assinala a difuso de uma leitura para
alfabetizados diferente da literatura para os mais instrudos. Tinha-se acesso, pelas
diferentes camadas, a vrios tipos de textos. Trata-se de um mundo de leitores do qual os
autores da poca tomam conscincia pouco a pouco e procuram escrever obras destinadas a
conquist-lo. Houve um grande esforo para aproximar os livros de seus leitores
potenciais, tornando-lhes mais fcil o acesso leitura. Para auxiliar ainda mais essa
aproximao, os romanos inventaram o cdice de contedo literrio. O cdice era um
livro-caderno com pginas. De confeco mais fcil, ele abreviava o tempo, permitindo
uma mais vasta circulao do livro. Ele representava tambm uma grande economia de
papel, visto que se escrevia dos dois lados, de forma que os seu custo era bem menos
elevado do que o de um volumen (livro em forma de rolo). Outra vantagem do cdice era
que, por sua forma, ele permitia ao leitor ficar com uma mo livre o que comprovava a
maior facilidade de manej-lo.
O sucesso do cdice entre os cristos foi igualmente assegurado pela sua
organizao em pginas, o que permitia colocar uma quantidade de texto muito mais
extensa e possibilitava o agrupamento de textos cannicos da nova religio e facilitava o
encontro de sees e trechos especficos a que se faziam referncias.
2.2- Prticas monsticas na Alta Idade Mdia: Ler, escrever, interpretar o texto.
A alta Idade Mdia herdou da Antigidade uma tradio de leitura que
abarcava as quatro funes dos estudos gramaticais:
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1. Lectio: o leitor tinha que decifrar o texto, respeitando tambm a pontuao exigida pelo
sentido.
2. Emendatio: exigia que o leitor ou professor corrigissem o texto no seu exemplar,
chegando a melhor-lo.
3. Enarratio: consistia na tarefa de reconhecer ou comentar as caractersticas do texto para
poder interpretar o contedo.
4. Juridicum: correspondia ao exerccio de avaliar as qualidades estticas ou o valor
moral e filosfico do texto.
Para ajudar nessas tarefas, o leitor dispunha de um conjunto de preceitos
gramaticais cuja funo era mais facilitar o processo da leitura do que promover o
interesse pela linguagem. Esse enfoque redutor da lngua ir durar muito tempo em virtude
da crena de que o homem deveria preocupar-se somente com a linguagem da Palavra
divina. Para isto, as gramticas ofereciam substancial ajuda para o leitor na anlise do texto
e na identificao dos elementos do latim.
Para o homem desta poca, a leitura garantia a salvao da alma.
Professores e escritores cristos haviam aplicado a tradio de conhecimento gramatical na
interpretao das Escrituras que visavam educao religiosa. No havia dvida: a razo
de ser da leitura era, incontestavelmente, a salvao da prpria alma.
Outra mudana diz respeito nova atitude com relao ao ato de ler. Na
Antigidade, a nfase recaa sobre a declamao do texto uma leitura oral. Na Alta Idade
Mdia, a antiga arte de leitura em voz alta sobreviveu apenas na liturgia.
Contudo, j se podia observar um grande interesse pela leitura silenciosa,
um tipo de leitura individual, muda, de modo a no incomodar os outros. Ela revelava uma
certa necessidade de ler para si mesmo, alm de assegurar melhor compreenso do texto e
exigir menos esforo fsico.
Surgiram tambm, nessa poca, novas tcnicas de apresentao do texto
com a finalidade de facilitar o acesso dos leitores, alm de trazerem progressos
significativos nas tcnicas de disposio do texto na pgina.
Outra preocupao da poca se refere sobretudo leitura da Bblia, cujas
etapas preliminares levavam ao exerccio da hermenutica crist para produzir
interpretaes pessoais ou exegeses do texto. Segundo intelectuais cristos, a leitura,
sobretudo da Bblia, deveria ser um dilogo com o texto. Da mesma forma que, ao
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identificar o rosto de uma pessoa, no significa conhec-la e apenas falando com ela
poderemos saber o que pensa, somente entrando em conversa com a Bblia pode-se chegar
a compreender os pensamentos que esto por trs da superfcie do texto.
Com o aumento do nmero de leitores, a preocupao com sentido ou
significado de um texto, levou a modificaes no uso da pontuao, a qual pode permitir
ao leitor diferentes reaes quanto forma ou ao contedo. A aplicao de sinais de
pontuao permitiu transportar a anlise hermenutica para a pgina com o objetivo de ser
entendida pelo leitor como sendo parte do processo de leitura em si mesmo.
Em nenhum outro campo a histria se repete tanto com no caso da evoluo
da leitura, visto que cada nova gerao de leitores tem de passar pelos mesmos estgios de
aprendizagem e de experincia do processo como seus predecessores.
Possivelmente, as principais caractersticas desta poca so:
impacto de nova motivao para a leitura;
a demanda por acesso mais fcil informao contida nos textos por
parte dos leitores para os quais o latim era lngua estranha;
a influncia dos princpios encontrados nas obras dos antigos gramticos
nas tentativas de desenvolver um padro de convenes para atender tal
demanda.
2.3- O Modelo Escolstico da Leitura
O estudo da leitura na poca escolstica apresentou profundas
transformaes. A leitura vai tornar-se um exerccio escolar, depois universitrio, regida
por leis que lhe so prprias. O principal lugar onde se exercer essa atividade ser
portanto a escola, seguida pela universidade. Enquanto na Alta Idade Mdia, a leitura se
situava nos mosteiros, durante o perodo escolstico constatamos uma renovao radical da
prpria concepo de ler. Constatamos que essa poca corresponde a uma tomada deconscincia do ato de ler. Da em diante, a leitura no ser mais concebida sem uma certa
organizao. A partir da no se aborda mais um livro de qualquer modo. Existe a
necessidade de se compreender o mtodo seguido para realizar a leitura de um texto. Essa
organizao da leitura vai criar necessidades novas. preciso que o leitor possa encontrar
facilmente o que procura em um livro, sem ter de folhear as pginas. Por isto, comea-se a
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estabelecer as divises , as marcas, os pargrafos, a dar ttulos aos diferentes captulos a
criar tabelas e ndices alfabticos que facilitem a consulta rpida de uma obra . Essa leitura
escolstica vai de encontro ao mtodo monstico orientado para uma compreenso lenta e
rigorosa do conjunto da Escritura.
Durante a Alta Idade Mdia, a leitura da Sagrada Escritura constitua a base
da espiritualidade monstica e era verdadeiramente o alimento espiritual dos monges.
Alguns autores chegaram a chamar de ruminatio a este tipo de leitura que objetivava a
assimilao e meditao dos ensinamentos bblicos. O ruminatio era um tipo de leitura
lenta e regular, feita em profundidade. Havia, ainda, em certas ocasies, a prtica da leitura
em voz alta.
Nessa poca, distinguiam-se trs tipos de leitura: a leitura silenciosa, a
leitura em voz baixa, chamada murmrio ou ruminao e a leitura em voz alta que se
aproximava muito do canto.
A grande modificao que ocorre no quadro da leitura escolstica reside na
importncia que essa prtica ter no ensino. Toda a pedagogia medieval baseia-se na
leitura de textos, e a escolstica universitria institucionaliza e amplia este trabalho.
A aquisio de uma cultura pessoal permanece ao lado da formao
pedaggica. Com efeito, as condies de produo do livro vo mudar, a difuso das obras
vai intensificar-se e modificar profundamente a relao com os textos. Pode-se falar de
leitura escolstica como sendo diferente de todas aquelas vistas at ento.
Como a produo literria no cessa de crescer, preciso encontrar outros
mtodos de leitura mais rpidos que permitam aos intelectuais tomar conhecimento de um
grande nmero de obras. Para isto, os medievais sempre recorreram s auctoritates em suas
prprias composies literrias. Trata-se de frases, de citaes ou de passagens extradas
da Bblia, dos padres da Igreja ou dos autores clssicos, destinadas a dar mais peso sua
prpria argumentao. Para ajud-los na busca desses trechos, compem-se florilgios ou
coletneas de textos destinados memorizao e que permitem encontrar facilmente as
passagens procuradas. Alm desses florilgios, surgem outros tipos de instrumentos de
trabalho que permitem ao leitor localizar-se facilmente em um manuscrito e descobrir
certos trechos sem ler a totalidade do texto. A leitura contnua e lenta de uma obra dar
lugar agora a uma leitura fragmentria que ter a vantagem de permitir a apreenso rpida
de trechos escolhidos. A utilidade passar frente do conhecimento.
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Recorrer s auctoritates respondia a necessidades diversas tais como: ter
acesso ao essencial de uma obra que um intelectual no pudesse adquirir e diminuir o custo
elevado dos manuscritos, j que as auctoritates ofereciam a essncia de uma obra ou de um
assunto em frases curtas e de fcil memorizao. Todavia, essas coletneas serviam
unicamente como reservatrio de textos e no estimulavam a criatividade e, por mais que
tenham sido teis, nunca substituiriam a consulta das prprias obras.
Outro aspecto a ser considerado: esses florilgios ou coletneas eram feitos
base de seleo. O compilador que os realizava podia excluir deles as passagens que
pudessem levar a uma interpretao ambgua, que no estivessem de acordo com os
ensinamentos da doutrina crist, ou que no satisfizessem os objetivos a que se
propunham.
No se deve falar de passagem da Idade Mdia ao Renascimento no que
concerne aos florilgios. O que aconteceu com essas coletneas nessa transio? Elas
continuaram a ser usadas, embora o mtodo de trabalho tenha mudado em alguns casos.
A evoluo apresentada no se situa no nvel das coletneas de textos que devem ser
explicados e comentados, mas sobretudo na maneira de abord-los e de discuti-los.
Os humanistas restauraram todo o prestgio da leitura pessoal e
recomendaram o contato direto com os originais.
Concluindo: Os florilgios no desapareceram com a chegada do
Humanismo, muito pelo contrrio. O gnero evolui em alguns casos, mas no se extingue.
Nota-se que a produo se diversifica. So utilizados tanto por letrados quanto por
pregadores ou docentes. Servem como coletneas documentrias prticas e de abordagem
fcil, alm de continuarem a ser empregadas no ensino.
2.3.1- O desaparecimento do modelo escolstico
A evoluo da maneira de ler no perodo escolstico autoriza que se distinga
o tipo de leitura adotado daqueles praticados anteriormente. A aquisio do saber tornou-se
mais importante do que a dimenso espiritual. A direo tomada pela leitura dos textos
indica que o ensino e a cultura obtida o mais rapidamente possvel vo substituir o
conhecimento aprofundado das obras.
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Na maior parte do tempo, os universitrios no lem por prazer, mas
unicamente com a finalidade de conhecer os elementos indispensveis a uma a uma cultura
utilitria.
Para que o saber no ficasse fechado nos mosteiros e deixasse de ser
individualizado, intelectuais da poca tentaram torn-lo acessvel coletividade. Embora
essa iniciativa no conduza aos resultados esperados, a leitura tcnica passa frente da
leitura espiritual. O ponto de vista enciclopdico substituir em todos os nveis a leitura e a
meditao. A lgica que estava destinada a formar os espritos seduzir os intelectuais e
invadir os meios universitrios. O mtodo de trabalho ir mudar. A criatividade pessoal,
em muitos casos, ceder lugar a uma composio bem estruturada. Uma linguagem de
grande tecnicidade marcar o incio do declnio inevitvel do mtodo escolstico.
Ao lado das tcnicas universitrias que exerceram influncia fundamental
sobre a prtica da leitura, preciso, no entanto, assinalar que existia m outros acessos aos
textos praticados por intelectuais cultos, por biblifilos que haviam conservado os gosto
pelos livros. Sabe-se tambm que os conventos compraram grande quantidade de livros
para alimentar suas bibliotecas e oferecer a seus irmos uma bagagem intelectual
indispensvel, no aceitando que eles perdessem tempo copiando textos.
Convm acrescentar que o problema da penria de livros e de instrumentos
de trabalho, indispensveis ao estudo nos diferentes meios, ir encontrar uma soluo
natural aps a grande Peste Negra que ir dizimar a Europa. As cidades sero as principais
atingidas. Ora, a concentrao de intelectuais que a se achavam reunidos por motivos de
estudo ir provocar um desaparecimento macio de professores e de estudantes, deixando
dessa forma uma grande quantidade de livros disponveis. Os problemas de aquisio e de
difuso dos textos mudaro radicalmente a partir desse momento. Os livros iro se tornar
acessveis , devolvendo o gosto pela leitura aos universitrios que haviam perdido em
proveitos de um contato utilitrio com o saber.
Na Itlia, os humanistas iro procurar os textos da Antigidade e recoloc-
los em circulao. Essa mudana de atmosfera, a introduo da imprensa e o gosto pelas
letras modificaro novamente as relaes com o livro. O desenvolvimento das cidades,
assim como a democratizao do ensino, iro a partir da diversificar os interesses dos
leitores que sero tanto burgueses, quanto comerciantes ou intelectuais.
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2.4- A leitura nos finais da Idade Mdia
Se o sculo XII, na Europa do Norte, foi um perodo difcil para as
inovaes nos campos do direito, da teologia, da filosofia e da arte, para a leitura ele foiantes de tudo um sculo de continuidade e consolidao. Surgiro novos hbitos de leitura
silenciosa, embora houvesse testemunhas que relatassem que nesse tipo de leitura os
demnios atrapalhavam o leitor, forando-o a ler em voz alta, privando-o assim do
entendimento interior e da espiritualidade. Todavia, a preferncia para a leitura silenciosa
estava totalmente de acordo com a psicologia espiritual, uma vez que os monges
consideravam o corao como a sede da mente e viam a leitura como o principal
instrumento para tocar os sentidos do corao. A leitura individual estava estreitamente
ligada meditao e, na verdade, era pr-requisito dela. Uma prova do carterexcepcionalmente adiantado das prticas de leitura visual da poca foi a introduo das
coletneas que continham sofisticados ndices baseados na numerao das pginas e no
uso de letras do alfabeto para separar as partes do texto.
Em vez da leitura oral dominante na Antigidade, o final da Idade Mdia se
caracterizou pela leitura visual de textos, os quais eram criados em silncio e seus autores
esperavam que fossem lidos em silncio. Alguns intelectuais da poca, quando escreviam,
se dirigiam a um leitor e no a um ouvinte e suas obras, redigidas em escrita cursiva, eram
caracterizadas por um novo vocabulrio visual o qual indicava que tanto o autor quanto o
leitor deveriam estar com o texto diante dos olhos.
No obstante a leitura silenciosa e ntima, nos sculos XIV e XV, as leituras
pblicas continuavam a ter importante papel na vida universitria. Contudo, em vista da
complexidade dos temas, a leitura visual era essencial para a compreenso. Enquanto o
professor lia em voz alta e fazia os seus comentrios, os alunos acompanhavam
silenciosamente o texto com seus prprios livros. Isso representava significativa mudana
no final da Antigidade e no incio da Idade Mdia. As mudanas na leitura afetavam a
organizao das bibliotecas por paredes de pedra, onde os monges podiam ler em voz alta e
decorar textos bblicos ou ler em voz baixa para si mesmos.
Na Inglaterra e na Frana, as bibliotecas comearam a funcionar em sales e
eram mobiliadas com escrivaninhas, estantes de leitura e bancos onde leitores se sentavam
uns prximos aos outros. Os grandes livros de referncia eram acorrentados a estantes de
modo que pudessem estar sempre includos dicionrios e ndices alfabticos. Em suma, a
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biblioteca, a partir de ento, era considerada claramente local para se ler, escrever e
estudar.
A transio para a leitura e composio silenciosas permitiu uma nova
forma de privacidade. Do ponto de vista psicolgico, a leitura silenciosa era muito
estimulante para o leitor, visto que possibilitava manter a fonte de sua curiosidade sob seu
controle pessoal. Alm disso, a leitura escrita visual encorajava o pensamento crtico
individual que acabou contribuindo para o desenvolvimento do ceticismo e da heresia
intelectual. Apesar da difuso da leitura silenciosa, a leitura em voz alta no desapareceu e
era bastante usada para ler as crnicas, as canes de gesta, os romances e as poesias, obras
que geralmente eram escritas em verso e lidas nos palcios.
A intimidade da leitura e da escrita silenciosas talvez tenham encorajado as
manifestaes de ironia e cinismo, alm de oferecer meios para expressar pensamentos
polticos subversivos. Essa nova privacidade propiciou ainda o retorno literatura ertica e
comearam a surgir textos picantes e ilustrados, mostrando as escapulidas sexuais de reis,
frades e monges.
A liberdade de expresso que a leitura silenciosa privada trouxe s
reprimidas fantasias sexuais tambm, paradoxalmente, permitiu aprofundar a experincia
religiosa dos leigos, oferecendo-lhes os meios de buscar um relacionamento individual
com Deus, enfatizando a importncia da leitura e do silncio para alcanar o bem-estar
espiritual, alm de declarar que a palavra falada era evanescente e fugidia, enquanto a
escrita era permanente e duradoura.
2.5- A leitura nas comunidades judaicas da Europa Ocidental na Idade Mdia.
No plano poltico, o problema colocado pela prtica da leitura configurava-
se, tanto para os judeus como para os cristos, na percepo de um dever, e
todos que aspiravam ao exerccio da autoridade e no poder deveriam impor um controle
na difuso das idias. No caso das leituras, esperava-se que fossem, de um lado, um
conjunto de enunciados repressivos e, de outro, um conjunto de enunciados de carter
criativo, s vezes educativo, de verdadeira e prpria doutrinao. Em sntese: proibir o que
nocivo, promover o que til.
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Entre os judeus o livro compreendido mais como um objeto mgico-
religioso com carga sobrenatural do que como instrumento de comunicao e reservatrio
de contedos a serem atingidos livremente.
Nesse perodo, o ato da leitura pertencia a minsculas elites de eleitos-aos-
quais-todas-as-leituras-so-permitidas e no se tem notcia de exerccio de nenhum tipo
de censura.
A histria da leitura nas comunidades judaicas da Idade Mdia apresenta um
ulterior e particular componente: os dos textos importados do espao cultural no-
judaico e oportunamente hebraizados isto , filtrados e manipulados. Uma constante de
longa durao, caracterstica do judasmo dessa poca e, s vezes, presente at mesmo
em nossos dias em determinados crculos chamados ortodoxos consistia talvez mais
imagem e semelhana do Isl do que do Cristianismo em mostrar a convergncia de tudo
que era percebido como religiosamente positivo. Mais tarde, a comunidade judaica passou
por um processo de rpida urbanizao e as camadas da sociedade camponesa
desapareceram e quase se pode afirmar que a figura do judeu (do sexo masculino, claro)
totalmente analfabeto, incapaz de ler um livro de orao, tornou-se cada vez mais rara.
Todavia, havia um desafio grande para as elites: manter sempre firme o
controle sobre a sociedade atravs da vigilncia das leituras, fonte potencial de
desequilbrio. A idia de uma poltica repressiva em relao ao livro estava associada
idia do efetivo exerccio do poder. A fraqueza da estrutura do autogoverno hebraico foi
mais amplamente comprovada com o primeiro grande boom da imprensa, acusada de
colocar em circulao muitos livros potencialmente perigosos, na tica de quem se
considerava responsvel pelo comportamento da sociedade. Foi nessa poca que os
dirigentes judaicos decidiram recorrer arma da excomunho contra todos aqueles que
lessem determinados livros.
Entre os povos da Idade Mdia, e tambm entre os judeus estava
definitivamente enraizada a idia de uma necessidade de uma mediao das autoridades
entre o sagrado e o profano. Como conseqncia, entre os judeus a transmisso oral do
texto dominar a outra, e os dois mtodos de acesso ao texto apresentam normas
igualmente rgidas:
No lcito transmitir oralmente o que deve ser escrito, nem lcito
escrever o que deve ser transmitido oralmente. (T.B. Ghittin,60b).
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Por volta do ano 1000, a prtica da leitura individual nas sinagogas do
Ocidente apresenta aspectos de surpreendente modernidade. Uma caracterstica vlida para
esta prtica que, embora o seu pano de fundo fosse religioso, observavam-se claramente
elementos profanos, o que demostrava que a sinagoga, alm de ser local de orao,
desempenhava tambm as funes de verdadeiro centro social judaico e, entre outras
coisas, de biblioteca pblica. Encontrava assim, no seu mbito, a gesto de colees de
livros, mantida pela cultura judaica. Da nasceu a idia de colocar os livros de propriedade
privada disposio de outras pessoas com a finalidade de difundir a prtica do estudo
individual que , antes de mais nada, a leitura.
Na virada do sculo XI, lia-se o axioma, que os livros no so feitos para
serem armazenados, mas sim para serem emprestados. A questo dizia respeito ao caso de
um emprstimo concedido sobre penhor de livros:
com esta condio concedi-te o emprstimo sobre penhor daqueles livros -
com a condio de poder estudar e ensinar com eles e tambm emprest-
los a outras pessoas. (Rabbi Meir , Praga,n.179).
Nos sculos XII e XIII, j se encontrava uma seo inteira de uns sessenta
pargrafos dedicada maneira de tratar os livros; como conserv-los numa bela e
decorosa arca, como no estrag-los e assim por diante. So todos testemunhos do
desenvolvimento de uma sensibilidade em relao ao livro visto como objeto de uso,
certamente digno do maior respeito, porque contm a mensagem divina, mas tambm
porque extremamente caro e de difcil acesso aos menos abastados.
2.6- O leitor humanista
No dia 10 de dezembro de 1513, Nicolau Maquiavel escreve uma carta ao
seu amigo Francesco Vettori. Por motivos polticos, Maquiavel fora preso, torturado e
exilado em sua fazenda fora de Florena. Ali ele ansiava por qualquer tipo de ocupao
poltica, brigava ou tagarelava com seus vizinhos e lia. Ele descreve para Vettori sua
atividade mental com pormenores vvidos e inesquecveis.
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Saindo do bosque, vou a uma fonte e de l a um viveiro de pssaros. Levo
comigo um livro embaixo do brao, de Dante ou Petrarca, ou de um desses
poetas menores como Tbulo, Ovdio ou qualquer outro: mergulho na
leitura de seus amores e seus amores lembram os meus; pensamentos que
me recrio no momento certo. Em seguida, ganho a longa estrada:
entretenho-me com os que passam, peo notcias de seu pas, imagino tantas
coisas, observo a variedade de gostos e a diversidade de caprichos dos
homens {...} A noite cai, retorno aos meus aposentos. Entro em meu quarto
e, j na soleira, despojo-me do hbito de todo dia, coberto de lodo e lama,
para vestir os mantos da realeza e do pontificado; assim, adornado com
todo o respeito, entro nas cortes antigas dos homens da Antiguidade. L,
acolhido por eles com afabilidade, sacio-me do alimento que meu por
excelncia e para o qual nasci. Nenhuma vergonha de falar com eles e
perguntar-lhes sobre os motivos de suas aes e eles, em virtude de sua
humanidade, me respondem. E, durante quatro horas, no sinto o menor
tdio, esqueo meus tormentos, deixo de acreditar na pobreza e nem mesmo
a morte j me assusta.
(N. Machiavelli, Opere, iii: Lettere, org. F Gaeta, Turim, 1984, p. 425-6)
Essa carta citada freqentemente pelos historiadores, porque ela descreve
a composio da obra mais conhecida de Maquiavel, O Prncipe. Todavia, eles no a
utilizam como documento da histria da leitura. Isto uma pena, porque esta carta nos d
uma viso clara do tipo de leitura praticada na Renascena. Maquiavel descreve a si
mesmo como leitor de dois tipos de livros. O primeiro descrito com preciso e ressalta as
caractersticas fsicas e textuais da obra. Impressos em itlico, condensavam textos
completos em poucas centenas de pginas, traziam prefcios, algumas ilustraes, mas sem
comentrios. Ele utilizava esses livros de maneira simples, pois era um meio porttil para
fugir dos problemas. Esses livros serviam de estmulo, no para o pensamento, mas para o
devaneio, entre os quais o leitor poderia deixar se perder.
O segundo tipo de livro e leitura so descritos por Maquiavel de forma
alegrica. Ele personifica os autores e personagens como grandes homens que se dignam a
lhe dirigir a palavra no seu escritrio. Podemos identific-los como estadistas ou generais
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gregos ou romanos, cujas aes Maquiavel via como modelo de sabedoria prtica para o
seu prprio tempo. Esses textos no estavam mais nas jeitosas edies de bolso, mas em
grandes livros que ocupavam as estantes dos gabinetes de leitura dos estudiosos da
Renascena. Ele se aproximava dessas obras com um estado de esprito bem diferente
daquele com que lia as poesias de amor junto a uma fonte. A esses textos ele pedia no
distrao, mas instruo.
So dois conjuntos de textos antigos, duas maneiras de ler: dessas maneiras
de ler, uma parece bastante reconhecvel e a outra, curiosamente remota. Todavia,
Maquiavel praticava os dois tipos de leitura aparentemente sem esforo ou dificuldade.
O caso de Maquiavel indica que os humanistas liam os textos clssicos de
muitos modos diferentes. Quem quisesse fazer da leitura um passatempo, levaria uma
edio de bolso para o campo e se deliciaria com poemas de amor. Mas quem quisesse
lidar com a filosofia, deveria permanecer em seu escritrio e, platonicamente, conversar
no s com o poeta, mas tambm com os personagens por ele criados.
Maquiavel se demonstrou um leitor que no apenas interpretava os textos,
mas tambm que manuseava os livros: objetos especficos, que obedeciam a determinadas
convenes de formato e de tipografia, e que ele utilizava em circunstncias bem definidas.
2.6.1- O texto e sua moldura
Os humanistas produziram manuscritos para atender a todo o tipo de
necessidade. Grandes in-flios para serem presenteados, com esplndidas iluminuras, com
bordas decoradas e livros menores e menos formais.
As bibliotecas privadas ou pblicas, nessa poca, passaram por grandes
transformaes. Eram grandes salas abertas e pequenos gabinetes que chegavam a ser
verdadeiras preciosidades arquitetnicas. Eram planejados para facilitar o estudo e a
conversa, com luz entrando pelas janelas e em nada pareciam com os aposentos escuros
com livros presos por correntes do estilo antigo. Os encontros dos novos leitores com os
textos agora disponveis transcendiam os limites tradicionais. As leituras ocorriam em
cenrios ainda mais inesperados que a fonte de Maquiavel.
Os prncipes do sc. XV gostavam de sublinhar o papel importante que os
livros a leitura exerciam em sua vida. Aconteciam duelos literrios pblicos em que se
competiam para explicar e corrigir os trechos mais difceis de certas obras. Eles gostavam
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de serem retratados com um livro na mo. Definitivamente a leitura certa passou a fazer
parte do novo estilo da corte renascentista e isto era to importante quanto a contratao de
bons arquitetos ou a correta maneira de se vestir.
Alm disso, medida que os livros impressos substituam os manuscritos, as
novas formas dos livros e as novas experincias de leitura difundiam-se pelo mundo do
conhecimento europeu. Talvez mais importante, o livro impresso oferecia bem mais
atividades que o livro manuscrito. Um dos primeiros clientes de Aldo Mamcio (clebre
livreiro da poca), escreveu de Budapeste, em 1501, que os novos livros de bolso de Aldo
tinham lhe dado um novo alento, seno na vida, ao menos em seu modo de viver a
literatura:
Visto que as minhas vrias atividades no me deixam tempo livre para ler
em casa os poetas e oradores, vossos livros to cmodos que posso
manuse-los caminhando e, sempre que possvel, enquanto desempenho o
papel de homem da corte - transformaram-se em motivo de especial alegria
para mim.
(P. de Nolhac, Les correspondants dAlde Manuc, Roma, 1888, p.26)
O novo livro, austero e elegante, prtico e porttil, tornara-se padro. No
resta dvida de que os humanistas realmente abordaram os clssicos de um modo novo e
bem mais direto. Isso fez com que os escritores, livreiros e impressores se esmerassem na
produo e confeco das suas obras. Qualquer escritor sabia perfeitamente bem que
determinada aparncia fsica de sua obra poderia assegurar um mercado e preparar o leitor
para o que havia escrito. Os impressores sugeriam que o leitor de boa cultura no iria
simplesmente comprar um livro j pronto e utiliz-lo como tal. Iria personaliz-lo.
Mandaria encadern-lo com tecidos luxuosos e durveis. O leitor culto sabia que deveria
pagar por esse gasto adicional. A boa encadernao tornou-se uma especialidade e
mesmo uma obsesso dos livreiros da Renascena. O livro de um grande homem poderia
ser reconhecido pela capa. Mesmo pessoas comuns ou intelectuais assalariados
consideravam falta de gosto manter um livro encadernado em papel. O leitor culto
aprendeu ainda que o corpo da obra tambm deveria ser adornado tanto quanto a capa. Os
clientes mais sofisticados gastavam muito para produzir um visual apropriado para seus
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textos. O livro comprado com tanto cuidado, decorado com meticulosa ateno para os
pormenores, tornava-se muito mais que um mero texto. Servia como registro da vida de
seu proprietrio, mapa da rede de suas ligaes literrias e confidente de seus sentimentos.
Em certas ocasies, as colaboraes entre o escritor, o leitor e o artista
tornavam-se mais sistemticas e complicadas, pois o escritor no concordava com as
ilustraes criadas pelo artista, temendo que o leitor pudesse interpret-las de modo
diferente daquilo que o texto queria transmitir.
Outra inovao da poca foi que vendedores e compradores passaram a
compartilhar a crena de que a transferncia de livros era uma atividade importante e
valiosa, uma transao emocionante, tanto cultural quanto financeiramente, que
demandava quase o mesmo nvel de gosto e conhecimento quanto o de escrever os livros.
Certamente os leitores da Renascena levavam muito a srio os momentos em que
adquiriam os seus livros. Com freqncia registravam nos prprios o local, a data e
circunstncia da aquisio.
2.6.2- O professor e o leitor
Em 1435, Guarino de Verona escreveu uma famosa carta para seu aluno
Leonello deste:
Seja o que for que estiver lendo comea a carta tenha sempre mo
um caderno de anotaes {...} no qual voc possa escrever o que quiser e
listar os tpicos que voc juntou. Ento quando decidir reler as passagens
que mais o impressionaram, no ter de folhear um grande nmero de
pginas. Isto porque o caderno de anotaes estar prximo como um
empregado diligente e atento para lhe dar aquilo de que vier a necessitar
{...} Pode ser que voc considere motivo de muito tdio ou de excessivas
interrupes copiar tudo em tal caderno. Se for esse o caso, tal tarefa deve
ser confiada a um menino aplicado e culto e muitos deles podem ser
encontrados. ( Guarino, Epistalario, org. R. Sabbadini, Veneza, 1915-
1919, II, p.270)
Essa carta revela como eram as estratgias profissionais de Ensino na
Renascena um conjunto de tcnicas que deixaram marca em todo leitor educado.
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Obviamente o sentido do texto tambm tinha um papel vital em sua
interpretao, a qual era alcanada esmiuada e vagarosamente com a mediao de um
professor. Uma outra estratgia que beneficiava o entendimento do texto era que os
impressores deixavam grandes margens, sobretudo nas partes iniciais dos textos, onde os
estudantes anotavam comentrios tcnicos, geralmente com caligrafia to clara que
revelava terem sido transcritas de um rascunho. O jovem leitor gravava na memria dados
histricos, mitolgicos e geogrficos medida que avanava nos textos do currculo. Mais
importante, desenvolvia um atitude e dominava um conjunto de instrumentos. O jovem
leitor aprendia a compreender as escolhas verbais e as imagens do escritor como exemplos
das regras da retrica formal. Aprendia a buscar aluses e a entender os subtextos com que
o escritor pretendera compartilhar com os seus leitores de educao similar. Todos os
escritores humanistas esperavam que seus leitores fossem mestres na arte de decodificao.
A principal inovao identificada ocorria quando o estudante passava da
anlise e interpretao para a tarefa mais elevada da aplicao colocar o texto em uso.
Nesse ponto, a histria das idias, a histria do livro e a histria da leitura, at ento
separadas, passam a convergir de forma significativa na Renascena. O texto humanista
exaltava seu editor e seus patrocinadores de forma to eloqente quanto seu autor. Induzia
o leitor a buscar dois tipos de narrativa em um s livro.
Outro fato importante a leitura no cessava ao final da escola. Indivduos
maduros podiam utilizar as habilidades tcnicas aprendidas no colgio para fins
imprevisveis, como bem ilustra o caso de Maquiavel. Os leitores humanistas adquiriam e
apreciavam uma grande variedade de textos e os liam tambm de modo informal, como
fazemos hoje. Freqentemente liam com a pena na mo, escrevendo conforme avanavam
no texto. Eles tinham prazer em consultar a obra e afiavam a sua pena para outros
propsitos mais analticos. Vez por outra manifestavam por escrito suas reaes sobre a
qualidade literria e filosfica dos textos. A existncia dessas anotaes bastante
sugestiva. Os leitores muitas vezes insistiam em anotar nas encadernaes e pginas de
rosto dos seus livros que deviam servir tambm aos amigos. Tais anotaes serviam para
determinar o nvel intelectual do leitor e os crculos literrios que freqentava. Eram feitas
em caligrafia to limpa e decorativa que se justifica sugerir que ele lhes atribua um valor
permanente. por isto que os colecionadores, no final do sculo XVI, davam grande valor
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aos livros impressos que trouxessem anotaes de estudiosos e competiam entre si para
consegui-los.
Finalmente, a leitura, fosse privada ou pblica, com freqncia era dirigida
para fins concretos tanto polticos, quanto intelectuais. O dilogo com os textos antigos
visava ao mesmo objetivo: ao e resultados prticos no presente. A leitura dos antigos
poderia ser um ato fortemente inserido nas vicissitudes do momento, na poltica do incio
da era moderna. Esse tipo de leitura, pragmtica em vez de esttica, merece lugar histrico
destacado em qualquer relato sobre o uso do livro na Renascena.
2.6.3- O fim de uma tradio
Em meados do sculo XVII, os filsofos tinham comeado a defender a
idia de que apenas a leitura no poderia dar certos tipos de conhecimento sobre histria
natural e humana. Descartes comeou o seu Discours de la methode contando a histria de
sua insatisfao com a educao humanista que havia recebido dos jesutas. Havia chegado
concluso de que a leitura sobre o passado poderia proporcionar apenas um nvel
modesto de sofisticao que tambm poderia ser obtido com viagens. O leitor -diligente,
do mesmo modo que o turista diligente, aprendia que cada povo vive com um cdigo moral
diferente e que considera os demais , com a mesma falta de razo, como brbaros. Somente
o raciocnio rigoroso, tendo a matemtica como modelo, poderia alcanar verdades mais
profundas. Os humanistas mostraram-se dispostos, de imediato, a aceitar tais crticas ou,
pelo menos, a admitir que a maior parte dos jovens de boa educao as aceitava. Leitores
de grande habilidade e editores de textos clssicos puseram mos obra com desnimo,
conscientes de que a era da filosofia havia passado e uma nova poca da matemtica a
tinha substitudo.
2.7- Reformas Protestantes e Leitura
J no sculo XVI acreditava-se que a imprensa teria desempenhado papel
fundamental na difuso das idias reformistas. clssico citar uma conversa de mesa de
Lutero:
A imprensa o ltimo dom de Deus e o maior. Efetivamente, por meio dela
Deus quer dar a conhecer a causa da verdadeir