7439621 Cardiologia Fisiopatologia Das Arritmias Cardiacas

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Revista da FML 5 (Supl. 1) 13-21

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NOTA DE ABERTURA

Fisiopatologia das arritmias cardacas

Daniel Bonhorst*

I - A ACTIVIDADE ELCTRICA DO CORAO

1 - Potencial de aco:Com a utilizao de microelctrodos capilares foi possvel registar o potencial de membrana das fibras musculares miocrdicas. Assim, verificou-se existir uma diferena de potencial elctrico entre o interior e o exterior da membrana celular, cujo valor varia constantemente ao longo do ciclo cardaco. O registo grfico destas variaes foi designado por potencial de aco . O potencial de membrana devido diferente distribuio de cargas elctricas entre o interior e o exterior da clula e a sua variao resulta dos movimentos dos ies ao longo do tempo. Os principais so o sdio e o clcio, predominantemente extracelulares e o potssio, que o io intracelular mais importante, transportando todos eles cargas positivas. Tambm o cloro, que transporta uma carga negativa tem alguma influncia na determinao do potencial de aco. A distribuio e os movimentos destes ies so determinados pela permeabilidade da membrana celular assim como pelos seus

* Assistente Graduado de Cardiologia. Servio de Cardiologia. Hospital de Santa Cruz.

gradientes qumicos e elctricos e tambm pela voltagem da membrana, factores estes que variam ao longo do tempo. A permeabilidade selectiva para cada io, dependendo da funo de protenas da membrana celular designadas por canais inicos, que so especficos para cada um deles, controlando assim as suas entradas e sadas. Quando a membrana permevel para um determinado io surge um fluxo designado por corrente inica , dependente da concentrao desse io de um e outro lado da membrana ( gradiente qumico ), assim como da diferente distribuio das cargas elctricas ( gradiente elctrico ). Em repouso existe uma situao de equilbrio em que no h praticamente trocas de ies, cuja distribuio determina que o interior da fibra muscular seja electricamente negativo em relao ao exterior (mais cargas positivas no exterior do que no interior da clula). Existe portanto um potencial de repouso , que conforme o tipo de miocitos, varia entre os -70 e os -100 mVolts. Quando se d a activao da clula, este estado de equilbrio subitamente alterado, tornando-se a membrana permevel ao sdio, surgindo assim uma inverso da sua polaridade (Fig 1). O brusco aumento da condutncia a este io, por abertura dos respectivos canais, leva sua entrada macia para o interior da clula, tornando-se o potencial de membrana positivo

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Figura 1. Potencial de aco de uma clula muscular cardaca. A - Fibra muscular contrctil (de resposta rpida); B - Clula automtica (de resposta lenta).

(cerca de +30 mV). Este fluxo passivo, devendo-se no s ao elevado gradiente qumico para este io, que como dissemos muito mais abundante no meio extra-celular, mas tambm ao gradiente elctrico, que tende a deslocar os ies positivos para zonas mais negativas. Esta fase de subida brusca do potencial de aco designada por Fase 0, traduzindo a despolarizao celular rpida. Segue-se a Fase 1, em que h diminuio desta positividade inicial do potencial de aco, que se aproxima do valor zero, sendo devida essencialmente a uma diminuio rpida da condutncia da membrana para o Na +; o fim desta fase marca o comeo da repolarizao celular . Segue-se o planalto da curva do potencial de aco, tpica das fibras musculares miocrdicas, designado por Fase 2. Corresponde a um perodo em que h um equilbrio entre os ies que entram (Na + , Ca ++) e os que saem da clula ( K + ). Com efeito nesta fase que se d a abertura dos chamados canais lentos de clcio, com entrada deste io para dentro da clula compensada pela activao de vrios canais de K +, que se desloca no sentido contrrio. A Fase 3 corresponde repolarizao rpida , inflectindo a curva para valores negativos do potencial de membrana, devido ao aumento da condutncia ao K + e interrupo do movimento do Ca ++ . O potencial de membrana atinge assim em breve o potencial de repouso . No entanto esta nova situao de equilbrio difere da inicial, na

medida em que ao contrrio da primeira agora o interior que rico em Na + e o exterior em K + . Segue-se a fase de repouso elctrico ( Fase 4 ) durante a qual o potencial se mantm estvel a nveis muito negativos, mas em que h uma troca do Na + que expulso da clula pelo K + que regressa ao seu interior. Este processo activo e necessita de energia, fornecida pelo ATP, sendo levado a cabo por uma protena designada por bomba de sdio-potssio (ATPase sdico-potssica).

2 - Automatismo cardacoDeterminadas fibras musculares especializadas, localizadas ao nvel do sistema especfico de conduo, possuem uma propriedade designada por automatismo , isto tm capacidade de gerar estmulos elctricos. Esta propriedade deriva das caractersticas da fase 4 do seu potencial de aco, que diferem das do miocrdio comum. Assim, enquanto que nestas ltimas o potencial de membrana se mantm estvel durante toda a distole, nas clulas automticas ele apresenta uma curva lentamente ascendente, tornando-se progressivamente menos negativo. Ocorre assim uma despolarizao diastlica espontnea, at ser atingido um potencial (-65 a -75 mV), designado por limiar de excitao , a partir do qual se desencadeia a despolarizao rpida (Fase 0 do potencial de aco). Estas caractersticas do potencial diastlico dependem

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de um desequilbrio das correntes inicas durante a distole, que no existe nas clulas miocrdicas comuns (Fig 2). As clulas automticas dos ndulos sinusal e aurculo-ventricular apresentam um potencial de aco diferente do das clulas contrcteis. O seu potencial diastlico alm de ascendente parte de valores menos negativos, a despolarizao rpida apresenta uma menor pendente, sendo a curva menos ampla, com vrtice de forma arredondado (Fig 1 - B) . As fibras com este potencial de aco, so designadas por clulas de resposta lenta - a sua despolarizao depende da abertura dos canais lentos de clcio, enquanto que nas clulas do miocrdio comum depende dos canais de sdio, de cintica muito mais rpida - clulas de resposta rpida . O automatismo normal do corao comandado pela despolarizao das clulas do ndulo sinusal pois so as que apresentam o maior pendente de despolarizao diastlica. Ao atingirem mais rapidamente o limiar de excitao so as primeiras a despolarizar-se, determinando uma frequncia de descarga entre 60 e 100 pulsaes por minuto em repouso, superior de qualquer outra estrutura cardaca. As restantes clulas automticas, so em condies normais, dominadas pelas sinusais, no tendo tempo para

manifestar o seu automatismo na medida em que antes que isso possa acontecer so despolarizadas por correntes provenientes das clulas vizinhas. As clulas do Sistema His-Purkinge so tambm capazes de automatismo, por apresentarem despolarizao diastlica, mas ao contrrio das clulas nodais conduzem rapidamente na medida em que a sua despolarizao depende dos canais de sdio. As clulas contrcteis, sendo incapazes de gerar estmulos em condies normais, so despolarizadas pelo fluxo de corrente que se propaga ao longo das diferentes membranas celulares a partir do sistema especfico.

3 - Excitabilidade, perodo refractrioA excitabilidade a capacidade que todas as clulas cardacas apresentam responderem aos estmulos elctricos desde que estes tenham uma intensidade suficiente. Esta resposta consiste no desenvolvimento de um potencial de aco que secundariamente desencadeiam uma contraco muscular atravs de um processo designado por coupling excitao-contraco . Em condies normais as clulas automticas autoexcitam-se ou respondem a um estmulo

Figura 2. A - Clula automtica; B - Clula contrctil. As clulas automticas apresentam despolarizao diastlica dado terem em distole uma curva de permeabilidade para o potssio (gK) descendente e de nvel inferior ao das clulas contrcteis e uma condutncia para o CaNa (gCaNa) ascendente e de nvel superior.

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propagado a partir das clulas vizinhas, enquanto que nas clulas contrcteis s este ltimo mecanismo funciona em condies normais. A voltagem a partir da qual h possibilidade de se induzir a resposta de uma fibra muscular designa-se por limiar de excitao . Todas as clulas cardacas aps terem sido estimuladas demoram um certo perodo de tempo a recuperar a sua excitabilidade - perodo refractrio . Este perodo de inexcitabilidade total ou parcial corresponde sensivelmente durao do potencial de aco. Distinguem-se vrias fases na recuperao da excitabilidade (Fig 3): Perodo refractrio absoluto - as fibras mantm-se inexcitveis, por maior que seja a intensidade do estmulo que sobre elas seja aplicado Perodo refractrio relativo - as fibras s so excitveis por estmulos de intensidade acima do limiar, determinando uma resposta caracterizada por condutibilidade reduzida. Designa-se por perodo refractrio efectivo o intervalo de tempo entre o incio da inexcitabilidade e o momento em que possvel produzir respostas propagadas, mediante estmulos supra-limiares. Na transio para a excitabilidade normal est descrito ainda um curto perodo de

supra-normalidade caracterizado por responderem a estmulos sub-limiares. 4 - Conduo cardacaUma vez excitada uma determinada zona de uma clula miocrdica, ela capaz de despolarizar as zonas celulares vizinhas, percorrendo a onda de excitao toda a fibra muscular. O estmulo elctrico propaga-se em seguida s clulas vizinhas, propriedade que se designa por condutibilidade . Esta propagao deve-se a um mecanismo puramente elctrico, efectuando-se ao longo das membranas celulares, passando de clula para clula sem nenhum mediador qumico. influenciada entre outros factores pelas catecolaminas, acetilcolina e frmacos antiarrtmicos. A propagao do estmulo elctrico segue em geral a direco longitudinal das fibras miocrdicas, cujas conexes com as clulas vizinhas se situam predominantemente nos topos celulares. A conduo lateral (anisotrpica) fibra a fibra em condies normais mnima ou inexistente. A velocidade de conduo varia conforme o tipo de clulas miocrdicas, dependendo da fase 0 do potencial de aco. Assim, mxima no sistema His-Purkinge que tem a maior pendente de despolarizao rpida (atingindo 1,5 a 4 m/s) e mnima no ndulo AV em que a despolarizao clcio-dependente e portanto lenta (0,05m/s). No ndulo AV a despolarizao das fibras especficas tem caractersticas decremenciais, isto a sua velocidade vai diminuindo medida que se propaga.

II - MECANISMO DAS ARRITMIAS CARDACAS

As arritmias cardacas so devidas a alteraes da actividade elctrica normal das fibras miocrdicas, podendo considerar-se trs mecanismos bsicos:Figura 3. Fases na recuperao da excitabilidade. PRA - Perodo Refractrio Absoluto; PRE - Perodo Refractrio Efectivo; PRR - Perodo Refractrio Relativo; TRT - Tempo de Refractoriedade Total.

Alteraes do automatismo Alteraes da conduo Combinao dos dois mecanismos anteriores

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1 - Arritmias por alterao do automatismo cardacoA frequncia da descarga de estmulos por uma clula automtica depende do tempo que a curva de despolarizao diastlica demora a alcanar o limiar de excitao, o qual determinado por trs factores (Fig 4): Pendente da curva - quanto maior for a inclinao da curva de despolarizao diastlica mais rapidamente alcanado o limiar de excitao Nvel do limiar de excitao - quanto mais negativo for esse limiar mais rapidamente ser atingido Nvel do potencial diastlico - a sua influncia varia no sentido inverso da do factor anterior A modificao de um ou vrios destes factores pode conduzir a uma alterao do automatismo cardaco. As arritmias relacionadas com alteraes do automatismo podem ser de dois tipos: Aumento do automatismo dos pacemakers subsidirios Aparecimento de automatismos anormais (em clulas em geral sem essa propriedade) O automatismo dos pacemakers subsidirios s se manifesta em geral se houver uma diminuio crtica da actividade sinusal ou aparecimento de bloqueio aurculo-ventricular. Uma reduo do automatismo sinusal pode levar a que

o pacemaker cardaco se desloque para o ndulo aurculo-ventricular, que regio do sistema especfico que a seguir sinusal tem maior frequncia de descarga espontnea (40 a 60 por minuto). Neste caso o ritmo cardaco designado por ritmo juncional . Se por sua vez o ndulo AV falhar, sero as fibras de Purkinge das vias de conduo intra-ventriculares a determinarem o ritmo cardaco, com frequncias entre 20 e 40 por minuto (ritmo idioventricular). Estas caractersticas do sistema especfico representam um mecanismo de defesa passivo mantendo a contraco ventricular caso falhe o automatismo ou a conduo a um nvel superior. As sstoles isoladas resultantes deste mecanismo designamse por sstoles de escape e se forem sucessivas determinam um ritmo de escape . Quando existe aumento do automatismo de um pacemaker subsidirio, com uma frequncia superior ao sinusal, esse ritmo ectpico passa a comandar o corao. Os impulsos que resultam do aumento do automatismo de um foco ectpico so prematuros, podendo ocorrer de forma isolada ou repetitiva. No primeiro caso designamse por sstoles prematuras ou extra-sstoles , no segundo por taquicardias automticas . As arritmias relacionadas com alteraes do automatismo podem resultar de uma variao do automatismo normal ou do aparecimento de automatismos anormais , isto que surgem em clulas que no apresentam normalmente essa propriedade. o caso de miocitos contrcteis comuns, em geral incapazes de gerar estmulos, mas que em certas circunstncias adquirem

Figura 4. Factores que influenciam o aumento do automatismo (expresso pela linha ponteada). A - Despolarizao diastlica mais rpida; B - Diminuio do limiar de excitao (LE); C - Potencial diastlico (PD) menos negativo.

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capacidade automtica. Um mecanismo relativamente frequente de arritmognese por aumento do automatismo consiste numa despolarizao parcial de fibras miocrdicas comuns, o que acontece por exemplo durante a isquemia. O potencial de repouso sendo nesse caso menos negativo, atinge de forma mais rpida o limiar de excitao desencadeando um ritmo rpido ectpico. Nestas circunstncias, a despolarizao destas fibras, que depende em condies normais da abertura dos canais de sdio, torna-se clcio dependente, podendo este mecanismo contribuir para a gnese de arritmias no ps enfarte ou durante episdios isqumicos. Outras formas de automatismos anormais so as dependentes dos chamados os ps-potenciais , responsveis por um mecanismo arritmognico automtico designado por actividade desencadeada ( triggered activity ), cuja importncia clnica no est ainda bem esclarecida. Esta designao deriva do facto de que o desencadeamento da arritmia requer a existncia de um potencial de aco prvio que ao despolarizar a

fibra em causa leva ao aparecimento desses potenciais anormais. Os ps-potenciais so oscilaes do potencial de membrana que surgem aps uma despolarizao e que so por vezes suficientemente amplos para atingirem o limiar de excitao, originando-se actividade repetitiva (Fig 5). Podem sobrepor-se s fases de repolarizao ventricular ( ps-potenciais precoces ) ou surgirem j na fase de repouso ( ps-potenciais tardios ). Parecem estar na base de algumas arritmias clnicas como as torsades de pointes ou certas arritmias da intoxicao digitlica.

2 - Arritmias por alterao da conduo cardacaBLOQUEIO CARDACO Considera-se que existe um bloqueio cardaco quando h um atraso ou impossibilidade de conduo dos estmulos elctricos nalguma regio do corao. Consideram-se trs tipos de bloqueio, descritos em regra para a conduo na juno aurculo-ventricular, mas que podem

Figura 5. Ps-potenciais precoces e tardios. A - A linha descontnua corresponde a um potencial precoce sublimiar (seta); B - O ps-potencial precoce origina um potencial de aco desencadeado; C - Observam-se trs potenciais de aco desencadeados antes que se complete a repolarizao; D - A seta indica um ps-potencial tardio; E - Aumentando-se a frequncia do estmulo, aumenta a amplitude do ps-potencial tardio, surgindo actividade repetitiva desencadeada (seta mais grossa).

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ocorrer a nvel sino-auricular ou em qualquer outra regio do sistema de conduo cardaco (Fig 6): Bloqueio de 1 grau - todos os estmulos se transmitem regio vizinha, se bem que com atraso. Bloqueio do 2 grau - alguns estmulos no so transmitidos; consideram- se dois subtipos: Mobitz I - em que a conduo se atrasa de forma progressiva, at que um estmulo no conduzido (fenmeno de Wenckebach). Mobitz II - em que a conduo dos estmulos prvios ao no conduzido apresenta uma durao fixa. Bloqueio do 3 grau - nenhum impulso transmitido regio adjacente. Quando as actividades elctricas auricular ou ventricular so independentes diz-se que existe uma dissociao aurculo-ventricular . Esta pode ser devida a um bloqueio da via de conduo

normal ou interferncia de um ritmo mais rpido com origem juncional ou ventricular - dissociao interferencial . Neste ltimo caso vrios ou todos os estmulos de origem sinusal no conseguem passar para os ventrculos porque encontram os tecidos em perodo refractrio, devido s despolarizaes de origem ectpica. A presena de um bloqueio obriga ao aparecimento de um ritmo de escape com origem na zona abaixo da interrupo da conduo - juncional ou idioventricular.

3 - Arritmias por alterao simultnea do automatismo e da conduo cardacaREENTRADA Na origem de muitas arritmias cardacas sabe-se hoje estar o fenmeno de reentrada . O conceito de reentrada implica que um determinado impulso elctrico possa persistir em determinadas regies do miocrdio, onde circula durante um intervalo de tempo maior ou menor, e de onde emerge ciclicamente, re-excitando as

Figura 6. A-D - Bloqueios AV, fde primeiro, segundo e terceiro grau; E-G - Bloqueios sino-auriculares de primeiro e segundo graus.

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restantes regies do corao. Para que haja reentrada so necessrias vrias condies: existncia de um circuito celular, anatmico ou fisiolgico, que um determinado estmulo possa percorrer, voltando ao seu ponto inicial. existncia nesse circuito de uma zona de bloqueio unidireccional, isto com possibilidade de conduo num sentido, mas no no sentido oposto. conduo lenta pelo menos num dos ramos do circuito, de modo a que o tempo que o estmulo o leva a percorrer seja maior que seu perodo refractrio dos tecidos de conduo. So de diversas dimenses os circuitos susceptveis de manter uma reentrada - o sndrome de Wolff-Parkinson e White ou o flutter auricular so exemplos tpicos de macro-reentrada ; a existncia de dupla conduo no ndulo aurculo-ventricular ou as micro-reentradas ao nvel da bifurcao das fibras de Purkinje, esto no extremo oposto. Podem haver ainda circuitos de reentrada a nvel auricular, envolvendo ou no a juno sino-auricular, a nvel dos ramos ou dos fascculos do His, volta de cicatrizes existentes nos ventrculos ou ainda em fibras de Purkinge patologicamente alteradas. Na Figura 7 mostramos esquematicamente como se pode produzir uma taquicardia por reentrada. Vemos neste esquema que uma via de conduo se bifurca em dois ramos, que em condies normais so igualmente invadidos por um estmulo que lhes chegue atravs o tronco comum. Se numa dessas ramificaes se criar um bloqueio unidireccional no sentido antergrado, os estmulos so obrigados a descer apenas pela outra via. No final do circuito podero progredir retrogradamente pela primeira ramificao, que nesse sentido no apresenta bloqueio. Se a conduo for suficientemente lenta, ao ser atingido o ponto inicial, o estmulo encontra as clulas j fora do perodo refractrio, percorrendo novamente o circuito. Este fenmeno pode dar-se uma s vez, originando uma extra-sstole ou repetir-se, produzindo-se uma

Figura 7. Esquema de um circuito de reentrada.

taquicardia. O fenmeno de reentrada depende portanto da velocidade de conduo e do perodo refractrio dos diversos componentes do circuito - as condues lentas e os perodos refractrios curtos facilitam as reentradas. A conduo lenta poder depender da existncia de correntes clcicas, por exemplo a nvel do ndulo aurculoventricular ou de correntes sdicas deprimidas, por exemplo reas de isquemia ventricular em que existe despolarizao parcial das clulas musculares. A reentrada favorecida em situaes em que ocorra heterogeneidade dos perodos refractrios em tecidos vizinhos. Nestas circunstncias, que podem surgir por exemplo na isquemia, poder haver reentrada mesmo sem circuitos anatmicos definidos. As extra-sstoles tm um papel primordial no desencadear das reentradas, pois um impulso prematuro tem muito maior probabilidade de encontrar fibras miocrdicas em diferentes estadios de recuperao dos seus perodos refractrios e activar portanto um circuito reentrante. Por fim, ao influenciar de forma diferente a conduo e refractoriedade das diversas regies do corao, o sistema nervoso vegetativo pode desempenhar um importante papel na gnese das reentradas quer favorecendo-as (caso do simptico), quer dificultando-as (caso do parasimptico).

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