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A ACADEMIA REAL DA HISTÓRIA PORTUGUESA Na construção da majestade joanina 5 DE MAIO DE 2014 GIL MANUEL GANDARELA GONÇALVES Nº 37996

A Academia Real Da História Portuguesa Na Construção Da Imagem de D. João V

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A Academia Real da História Portuguesa na construção da imagem de D. João V

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A Academia real da Histria Portuguesa

A Academia real da Histria Portuguesa Na construo da majestade joanina

O barroco assim uma cultura animada de um intenso esprito de propaganda, que ignora a arte pela arte e a busca intelectual das mais insondveis essncias. Consegue-o, na forma mais elevada, recorrendo utilizao simblica, declaradamente poltica, do espetculo e da festa. Neste sentido pode, como se ver, falar com segurana de uma concepo barroca da prctica poltica.BEBIANO, Rui, D. Joo V poder e espetculo, Livraria Estante, Aveiro, 1987, p.43.

ndice: Nota de leitura...3; Escolha do Tema e da Documentao..........4; Levantamento Bibliogrfico.........5; Levantamento de documentos ou corpos documentais..8; Esquema analtico...12; Desenvolvimento do tema...13; Bibliografia.17; Resumo Palavras-Chave..19;

Nota de Leitura:Para a escolha do tema que aqui pretendo desenvolver foi decisiva a leitura da obra de Isabel Ferreira da Mota, A Academia Real da Histria os intelectuais, o poder cultural e o poder monrquico no sc. XVIII. Ainda que seja uma obra de um mbito mais geral, em relao ao que foi a Academia Real da Histria no perodo em causa, e que explore temticas que em muito excedem aquelas que sero o enfoque da minha exposio (como as presentes nos captulos dedicados ao prprio processo de constituio e metodologias de trabalho da mesma Academia e o papel do Historiador nela, tratadas de forma mais exaustiva), foi a referncia que faz forma como esta alicerava a figura do monarca e a enquadrava na Histria que me levou a procurar aprofundar a relao que existia, de facto, entre a produo e proliferao das obras produzidas pela Academia e a construo da imagem de D. Joo V enquanto um monarca absoluto (com as devidas restrices inerentes a esta nomenclatura) que procurava afirmar esse seu trao com a maior veemncia possvel.Essa anlise feita na parte IV (As representaes e a construo do estado moderno) e ltima da obra e, para o perodo em causa, mais especificamente no primeiro e segundo captulos (intitulados O cerimonial e A imagem do rei e processos de identificao ao rei respectivamente). Ser a partir desse tema de fundo que se desenrolar a minha reflexo que, partindo essencialmente dos prlogos e da parentica, procurar estabelecer a ligao entre a produo destes acadmicos e a majestade de D. Joo V, fazendo ao mesmo tempo uma comparao com outros modelos desenvolvidos por seus congneres europeus, nomeadamente o francs, apontando semelhanas e particularismos.Em suma, no se tratando de um trabalho inteiramente dedicado a este tema, deixa importantes notas nesse sentido, sem as quais me seria muito mais trabalhoso encontrar as bases documentais de interesse e, dentro delas, o contedo mais relevante ao tema que ento me propus a tratar. Sendo a nica obra que trata em exclusivo a temtica da Academia Real da Histria Portugueza nos sculos em questo, pode-se afirmar com total convico que se trata de um texto historiogrfico inultrapassvel nessa matria sendo por isso, sem dvida, aquele a partir do qual comecei a construir este trabalho.

Escolha do Tema e da Documentao:Aps a leitura dos captulos da obra de Isabel Ferreira da Mota, j referidos anteriormente, o interesse pela anlise e interpretao da natureza propagandstica da produo historiogrfica setecentista levou-me a optar por explorar mais aprofundadamente o tema, tendo para isso de travar um contacto mais directo com as fontes.Assim, e procurando trabalhar, em especfico, a presena desse carcter marcadamente ideolgico nas obras produzidas pelos acadmicos ao servio da coroa nos prlogos e na parentica, a base documental que se revelou indispensvel analisar em maior detalhe foi a Collecam dos Documentos, Estatutos, e Memorias da Academia Real da Historia Portugueza. Nos desaseis volumes que a compem, figuram para alm de todas as obras editadas at 1736 (o que permite a consulta dos seus respectivos prlogos, um dos objectos principais deste trabalho), mltiplas oraes e discursos dos acadmicos perante o monarca tambm eles indispensveis para compreender a forma como a Academia e os Acadmicos revelavam a finalidade ltima do trabalho que tinham em mos, a concretizao do projecto real joanino.De que forma que a produo destes acadmicos foi relevante para a criao e difuso de verdadeiros monumentos panegricos da imagem joanina e perceber como que o ideal barroco de monarca se queria transmitir so as questes que sero alvo da reflexo que me propus a fazer.Para alm da j referida coleco h outro documento que, ainda que tendo dimenses menos monumentais, de enorme relevncia para entender os propsitos da Academia, sejam os que esto explcitos ou aqueles que possvel descobrir aps uma leitura mais atenta e que leve em linha de conta o pensamento poltico-institucional da poca. Trata-se da Histria da Academia Real da Histria Portugueza de Manuel Teles da Silva. Sero essas as duas fontes de maior relevncia contudo, tornou-se tambm importante a consulta de oraes soltas de perodos j posteriores publicao da Collecam dos Documentos, Estatutos e Memrias e mesmo ulteriores ao prprio reinado de D. Joo V para se perceber at que ponto houve uma continuidade a nvel do estilo discursivo e uma permanncia do quadro ideolgico.Foi ainda consultada documentao francesa do mesmo gnero para perceber at que ponto houve influncias (ou no) do seu modelo na construo dos trabalhos portugueses.Levantamento Bibliogrfico:- Sobre a Academia Real da Histria:MOTA, Isabel Ferreira da, A Academia Real da Histria os intelectuais, o poder cultural e o poder monrquico no sc. XVIII, Coimbra, Minerva, 2003;Obra que aborda de forma ampla o que era a real Academia, trabalhando os aspectos mais variados que a ela dizem respeito inclusive aquele que nesta reflexo tratado. Relata o processo de construo e colocao da Academia ao servio dos interesses da coroa e as figuras que nele estiveram envolvidos, analisando igualmente as suas caractersticas formais e metodolgicas. Dedica tambm parte da obra ao papel do historiador, realando a sua autonomia face a demais meios de produo literria, dado que estes no se encontravam sujeitos censura praticada pela Inquisio. Os ltimos 3 captulos so j dedicados anlise politico-ideolgica da produo acadmica sendo reforada a sua associao clara s concepes de Estado Moderno. Trata igualmente de temas como o mecenato rgio e a redefinio de redes clientelares com a fundao das academias. No aprofundarei mais a sua descrio depois de j ter tratado a obra na nota de leitura e por o continuar a fazer no corpo do trabalho.- Influncias francesas no pensar majesttico joanino:BEBIANO, Rui, D. Joo V poder e espetculo, Aveiro, Livraria Estante, 1987;Estudo inultrapassvel para a compreenso da sociedade monocrtica de D. Joo V, onde o cerimonial ganha particular preponderncia, cerimonial esse muito presente no funcionamento da Academia, sobretudo quando os acadmicos se apresentavam perante o rei num verdadeiro acto de submisso colectiva. No entanto, aquilo que de maior relevncia foi retirado desta obra ter sido a comparao com o modelo francs que, ainda que tinha sido um dos maiores inspiradores do pensar poltico nacional, no fez a sua influncia chegar a grande parte da produo literria. Sobre a relevncia do modelo francs para a construo da imagem real pretendida por D. Joo V o autor diz o seguinte: O caso francs interessa-nos mais especificamente, no apenas por ser aquele que revestiu formas mais ousadas mas, especialmente, pela clara ressonncia que teve em Portugal, independentemente de certos aspectos do gosto artstico revelarem tambm entre ns o prestgio de quanto vinha de Itlia. A partir deste trabalho ficou claro que esta notria influncia francesa no passou ao campo da produo literria. O classicismo francs manteve sempre um carcter mais sbrio paradoxalmente ao que acontece em Portugal onde cresce ainda com maior efervescncia um estilo de ostensiva sublimao do monarca e as notas deixadas por Bebiano no que concerne a essa matria marcaram tambm a minha forma de abordar esse sub-tpico do meu trabalho, uma anlise comparativa entre os prlogos portugueses e franceses no perodo joanino. Esse assunto tratado nas pginas 48 a 53 da obra com particular inciso.- De carcter mais geral, lgicas de poder e construo de imagem real:Dicionrio da Arte Barroca em Portugal (Dir. Jos Fernandes Pereira) Lisboa, Editorial Presena, 1999;Importante para a consulta de determinados termos, relevantes para o tratamento do tema em questo. Na entrada (Absolutismo) de Rui Bebiano que procura, de forma sucinta, definir um conceito to vago e sujeito s mais variadas interpretaes como o de absolutismo, encontramos importantes notas tambm sobre o papel que as academias desempenharam na construo do poder rgio: () A partir daqui se atinge o terceiro plano, o do prprio Poder que se ostenta e que pela ostentao se comprova e se refora. Sublinha-se ento a importncia de todos os modos de representar ou de o expor, cumprindo aqui os seus smbolos, na interpretao de L. Marin, a funo de o reforar e de o intensificar, quer pelo facto de se destinarem a ocupar o seu lugar, substituindo-o na sua ausncia, quer devido a serem apresentados como a comprovao das capacidades imensas que detm. Esta operao concretizada pela exploso da monumentalidade arquitectnica e das artes plsticas e musicais, pelo apoio produo literria e historiogrfica claramente hiperblica e laudatria 8quase sempre enquadrada por Academias), pelo espaventoso abuso dos cerimoniais polticos pblicos (entradas rgias, cortejos, viagens, recepes, ofcios divinos, inauguraes, embaixadas), pela teatralizao dos divertimentos (festas, bailes, ballets de corte, peras, jogos de salo, caadas, touradas, autos de f), pelo luxo excessivo de decoraes interiores, dos jardins, dos enfeites pblicos, dos fatos e das cabeleiras, dos coches, das ddivas que se ostentam.p.16 PIMENTEL, Antnio Filipe, Arquitectura e Poder - Real edifcio de Mafra, Coimbra, Instituto de Histria da Arte Faculdade de Letras - Universidade de Coimbra, 1992;Neste trabalho, que no se relaciona directamente com o tema sob anlise, encontramos, apesar de tudo, interessantes reflexes sobre o crescimento do papel mecentico da coroa com D. Joo V que quer uma imagem que esteja altura das suas ambies, algo que por de mais constatvel no caso, no s do Real Edifcio de Mafra mas tambm no da Real Academia. Afirma tambm que o poder real da poca se queria sacralizado, salientando tambm a importncia que a circulao avulsa e em grande nmero de literatura que enfatiza o iderio do monarca barroco bem como de insgnias da sua soberania, que remetiam tambm para uma caracterizao imperial do monarca dada a inspirao clara nos motivos clssicos. O excerto que se segue explana justamente esse ponto de vista:No admira, pois, que o retrato rgio tenha conhecido uma significativa expanso como grnero artstico no tempo de D. Joo V, preocupado em dotar a Monarquia portuguesa com uma imagem altura das suas ambies, ao mesmo tempo que o incremento do papel mecentico da Coroa favorecia a integrao da imagtica entre os mecanismos de liturgia sacralizadora do Poder. Representaes do Magnnimo elaboradas numa linguagem enftica, anloga que se utiliza na literatura ulica, circulam avulsas em grande nmero, por intermdio da gravura, ou ornamentam os frontispcios de obras que aspiram ao patrocnio rgio. Os elementos da composio esforam-se por realar a dignidade da pessoa real, quer pelo recurso s insgnias da sua soberania, que mesmo, no emaranhado do discurso alegrico, a personificaes de virtudes, deuses do antigo Olimpo, ou continentes que simbolizam a vassalagem das quatro partes do mundo.- Para a anlise dos prlogos poca:LEPECKI, Maria Lcia, PIRES, Lcia Gonalves, MENDES, Margarida Vieira, Para uma histria das ideias literrias em Portugal, Lisboa INIC,, 1980;A leitura desta obra revelou-se importante para melhor perceber a forma como eram construdos os prlogos no perodo barroco em Portugal, deixando notas sobre o seu estilo e a sua finalidade enquanto panegricos da figura real, como desde logo deixa claro o seguinte excerto, que parte da anlise a um desses textos introdutrios:Dado que esta declarao constitui uma contestao da existncia da dedicatria como gnero, nega-se a este texto a classificao de dedicatria. Mas a funo panegrica que a caracteriza transposta para este texto e associada funo introdutria prpria do prlogo. p.48. Esta nota sobre a mistura de gneros (prlogos com dedicatrias) deixada no ponto 5 do captulo da autoria de Luclia Gonalves Pires, Prlogo e Antiprlogo na poca Barroca (pp.31 57), intitulado Contaminao de gneros ou prlogos hbridos (p.47).De resto, analisa com maior detalhe aspectos formais lingusticos que no so de to grande relevncia para o tratamento do tema em questo.Levantamento de documentos ou corpos documentais:- Oraes Acadmicas:Oraa Academica que no dia da sua recepa na Academia Real da historia Portugueza, pronunciou Fr. Joaquim Forjs, Lisboa, na Officina de Miguel Rodrigues, 1768;Esta orao mostra que a ideia de utilizao da produo historiogrfica para o cultivar da imagtica real barroca transcende o perodo joanino, marcador do incio desta iniciativa. Durante o reinado de D. Jos, documentos como este mostram que o projecto da Academia Real da Histria continuava associado de forma indelvel ao processo de construo da figura real e excertos como o seguinte transmitem-no claramente: Assim entre vs, Senhores, os que transmitirem posteridade os successos deste Reino, se suspendera sobre a grande alma do nosso Augusto Protector: em hum Rey elles pintar hum homem com a Patria diante dos seus olhos, a Justia de hum lado, do outro a humanidade, e a sabedoria colocada sobre o seu throno: em hum Rey pintar hum Xefe de huma Naa guerreira, amigo da paz; e que na guerra, quando na pode dispensalla, poem o calculo do sangue dos vassalos ao lado dos seus projectos: em hum Rey elles pintar hum Sabio, que honraria tanto as Academias como Protector, que como Socio: pintar em fim hum Rey, de quem a historia s contar huma injustia, que ser esta de consentir que o meu nome se escreva entre os vossos. Explcita fica ento a tarefa destes acadmicos da forma mais literal possvel, a de pintar as virtudes do monarca que os apoia e protege. Oraa que na primeira conferencia da Academia Real da Histria Portugueza, em o anno de 1756 recitou o illustrissimo, e excelentssimo conde de S. Loureno sendo censor della na casa, que sua Magestade destinou no Pao de Belem, para as Conferencias da mesma Academia, Lisboa, na Officina de Joz da Silva da Natividade, 1757;Nesta orao, e ainda que seja j feita durante o reinado de D. Jos, o conde de So Loureno no se priva de deixar o seu tributo a D. Joo V, o grande impulsionador dos trabalhos da Academia. Ao faz-lo, d-nos um pequeno sumrio do que, no seu entender, foi a importncia poltica da Academia Real da Histria no perodo joanino explicando assim que interesse teria o prncipe em continuar a proteger os trabalhos do grupo de acadmicos: Era vontade do Principe, que se fizesse; era gloria da Naa, que a nica Academia nella estabelecida se conservasse; era hum monumento do glorioso Reynado de D. Joam o V., devia durar para sempre; devia sempre luzir; devia conservar hum rayo do esplendor daquelle brao, que a fundou, e que em todas as suas obras se conhece: mas ns, Senhores, estamos em caso muito diverso: na s se interessa a gloria da Naa, e do Principe, no aumento desta Academia, por ser hum congresso litterario; a gloria dos nossos Principes, a gloria dos nossos heroes, a de tantas ilustres aces de nossos maiores, tudo depende do progresso desta Academia.- Produo documental da Academia:Collecam dos Documentos, Estatutos, e Memorias da Academia Real da Historia Portugueza, que neste anno de 1721, se compuzera, e se imprimira por ordem dos seus Censores, dedicada a ElRey nosso senhor, seu augustssimo protector, e ordenada pelo Conde de Villarmayor, secretario da mesma Academia, Lisboa, na Officina de Pascoal da Sylva, 1721;Este seria o primeiro volume de uma coleco que teria um total de 16 (ltimo volume que sai em 1736). Neles podemos encontrar todas as obras desenvolvidas pelos acadmicos bem como suas oraes e elogios fnebres (entre 1720-36) algo que nos permite, para alm de analisar os vrios processos de construo da Majestade rgia, avaliar os ritmos de produo historiogrfica e suas metodologias. Nela constam tambm as notcias de cada uma das conferncias da Academia. Os volumes da coleo eram publicados anualmente (excepo feita ao ano de 1728 que assistiu edio de 2 volumes). A monumentalidade desta coleco em si um trao significativo o bastante para o reforo da figura do monarca, como desde logo acontece em casos como o da Biblioteca Lusitana de Barbosa Machado. Foram consultados todos os tomos tendo sido no entanto dado mais enfase aos primeiros dado que, medida que vamos avanando, a produo vai diminuindo e as matrias que para este trabalho interessam vo-se, como seria de esperar, repetindo.SYLVA, Manoel Telles da, Historia da Academia Real da Historia Portugueza, Lisboa, Officina de Joseph Antonio da Sylva, 1727;Obra que nos mostra os propsitos da criao da Academia, deixando bem explcito o servio que esta deveria prestar ao monarca. Para alm de conter nas suas notas introdutrias e prlogo exemplos muito relevantes para a reflexo que se seguir, trs consigo os decretos da instituio da Academia (p.22) estatutos (p. 45), lista dos acadmicos (p.55), cartas, pareceres, dissertaes, discursos e elogios realizados pelos mesmos at data e ainda alguns decretos reais., a par com a coleco de memrias, uma das fontes indispensveis se se quer fazer um estudo sobre o papel da produo da Academia Real da Histria Portuguesa enquanto obra de majestade joanina. No irei deixar nesta fase remisses a excertos da obra dado que estes aparecero repetidamente, enquadrados no desenvolvimento do trabalho.- Produo documental da Academia Francesa:Histoire de la Academie Royale des Inscriptions et Belles Lettres, Paris, LImprimerie Royale, 1717;eMemoirs de Litterature tirez des Registres de lAcademie Royale des Inscriptions et Belles Lettres, La Haye, Chez la venue dAbr. Troyel, 1719;Recorrendo base de dados online da Bibliothque Nationale Franaise (Gallica) foi possvel consultar estas obras (no na sua integridade uma vez que compreendem vrios volumes que, semelhana dos congneres portugueses contm muita informao que fica fora do campo desta anlise) o que permitiu constatar directamente a existncia de diferenas de fundo em termos da construo formal e lingustica dos prlogos nos trabalhos da Academia francesa, reflexo tambm de diferenas na forma de encarar este meio como cultivador da imagtica real. Uma vez tendo-se tomado clara esta disparidade avanou-se para a consulta de historiografia que tambm a analisasse, algo que encontramos com o trabalho de Rui Bebiano que sobre este tpico diz-nos o seguinte: () certo que o classicismo francs se afirma com aspectos originais, de uma natureza mais sbria, que, de um ponto de vista formal, o distinguem.(...) A influncia francesa instalar-se-ia porm, ainda que limitada formao cultural dos grupos dominantes (nomeadamente ao nvel da criao e do consumo literrios) e a um genrico ascendente no campo da moda e da etiqueta.[footnoteRef:1] [1: BEBIANO, Rui, D. Joo V poder e espetculo, Aveiro, Livraria Estampa, 1987, p.53 - 107;]

Esquema Analtico:1 Obras de Majestade de D. Joo V1.1 Academia Real da Histria Portuguesa1.1.1 Fundao1.1.1.1 Papel de Manuel Caetano de Sousa;1.1.1.2 - Proximidade ao monarca;1.1.1.3 - Parceria;1.1.1.4 - Reais propsitos da Academia;1.1.1.5 - Semelhanas com o processo francs;1.1.2 Carcter propagandstico1.1.2.1 Frontispcios;1.1.2.2 - Gravuras e Medalhstica;1.1.2.3 - Prlogos;1.1.2.4 Proliferao dos escritos;1.1.2.5 Criao de elos entre os sbditos e monarca;1.1.2.6 Semelhanas e particularidades Portugal/Frana;1.1.2.7 - Construo Imperial;1.1.3 Parentica 1.1.3.1 Sesses Acadmicas no Pao Real realizadas por ocasio dos aniversrios do Rei e da Rainha;1.1.3.2 - Submisso/Reverncia;1.1.3.3 - Reforo da importncia do apoio rgio e da bondade que o monarca revelava ao concede-lo;1.1.3.4 - Enaltecimento dos trabalhos da Academia;

A Academia Real da Histria Portuguesa na construo da majestade joanina:

A publicao regular de historiografia que fizesse a apologia do rei, colocando-o num pedestal face a todas as figuras suas predecessoras na histria do Reino, por muito valorosas que tivessem sido, legitimando-o, era algo que se impunha, claramente merecedor do investimento da coroa[footnoteRef:2], e que conheceu certamente retorno. Foi esse o papel que a Academia Real da Histria desempenhou no reinado de D. Joo V. [2: Porque reconhecendo ElRey quanto concorreria para a exaltaao do seu nome, escreverem- se successos tao memorveis, como os que acontecerao no seu Reyno, e Dominios, em toda aquella idade, de que nao ha sufficientes noticias, quiz por meyo de huma nova Historia, que as proezas dos seus Augustos Predecessores, e as de nossos antepassados, nao s servissem de exemplo para se imitarem, mas tambem de parallelo para se excederem pelas do seu tempo; e incitado do seu magnanimo espirito, e insciavel amor da fama, determinou tomar debaixo do seu Real patrocinio todo o corpo Literario, que organizado pela sua providncia, e animado pela sua inspiraca, fosse dirigido por huma so Cabea, e por hum so Congresso. Cf. Manuel Teles da Silva, Histria da Academia da Histria Portugueza Lisboa Occidental, Joseph Antonio da Sylva, 1727,p.4;]

Na gnese da sua fundao ter estado proximidade entre D. Manuel Caetano de Sousa[footnoteRef:3] (apenas um exemplo da ampla presena de teatinos na academia) e o rei. Barbosa Machado na Bibliotheca Lusitana revela-nos a sua importncia quando nos diz que este a alertara D. Joo V para a imortal gloria que resultaria a esta Monarchia com a formao daquelle Corpo Litterario[footnoteRef:4]. Vemos j aqui o real propsito do projecto. Certo que Caetano de Sousa tinha como grande ambio a produo de uma monumental histria eclesistica de Portugal, tarefa esta que seria facilitada se instituda com selo real (s a ordem do rei permitia abrir os arquivos) e apoiada por um Congresso/Academia capaz de executar com promtida as suas ordens. Estabelece-se ento um acordo de certa forma quid pro quo com o monarca que, tornando-se patrono do seu projecto, receberia em troca mais um meio de construo da sua majestade. Em Frana assiste-se a um processo muito semelhante na fundao, em 1701, da Acadmie des inscriptions et belles-lettres. Foi Jrme Phlypeaux a defender a sua criao junto de Lus XIV, tendo beneficiado para isso do cargo que ocupava de secrtaire d'tat la Maison du Roi. [3: o primeiro movel , que a Soberana intelligencia de Sua Magestade animara , para principiar a mover a erudita esfera da Academia com a harmona da sua voz , pois que como seu Protector lhe tinha ordenado , que nella propozesse em hum discurso o fim, para que se convocava aquelle Congresso , e quanto seria do seu Real agrado o exercicio para que a erigia. Cf. Ibidem, p.20;] [4: Barbosa Machado, Bibliotheca Lusitana, Lisboa, Officina de Ignacio Rodrigues, 1759, Tomo III, p 201;]

Feita esta breve introduo, necessria para compreender o processo e os interesses que permitiram ligar a coroa produo historiogrfica de ento, passemos quele que o real enfoque deste trabalho. Uma anlise ao carcter iminentemente propagandstico e declaradamente poltico desta produo documental, que dedicava seces das vrias obras inteiramente exaltao do monarca.O primeiro momento onde isso palpvel encontra-se nos frontispcios[footnoteRef:5] onde, para alm de figurar o nome do monarca, constam outros elementos iconogrficos smbolos do poder rgio, nomeadamente insgnias reais e institucionais. O campo da produo de gravuras foi tambm sobejamente dinamizado (a primeira oficina conhecida regida por estatutos prprios, onde artistas de renome trabalham em conjunto sob orientao e regras definidas[footnoteRef:6]surge com a Academia) bem como o da medalhstica[footnoteRef:7]. Para alm disso, fosse nos compndios de maiores dimenses ou nos simples folhetos, de disseminao muito mais alargada, a dedicatria ao rei era indispensvel, sendo esta desenvolvida nos prlogos, e longo de toda a obra (ainda que em menor escala), naquele que era um processo francamente ostensivo de sublimao do Estado Moderno e do monarca. Convm lembrar tambm que cresce, em grande nmero, nestes anos, o pblico capaz de adquirir e ler estas obras. O mercado do livro dinamiza-se e cresce a par com o aumento da produo histrica encetado pela Academia Real. A difuso das obras produzidas pelos sbditos tornava-a, por transmitir todo o iderio do poder rgio de ento, um importante intermedirio, uma ponte entre todos os sbditos e o soberano, isto , coloca os sbditos na presena do rei e vice-versa.[footnoteRef:8] Para isso foi de crucial importncia a interpretao evolutiva do processo histrico. Tomemos por exemplo os estudos realizados sobre oos monarcas que precederam a D. Joo V. Poderiam ser louvadas as suas virtudes e mritos mas estes nunca poderiam tomar uma dimenso que fosse superior do Magnnimo. D. Joo V era ento visto como uma soma de todos os seus antecessores naquela que era uma construo cumulativa de qualidades e virtudes, isto , todas as que tiveram os seus antecessores, D. Joo V tinha tambm, mais aquelas que lhe eram nicas. Essa forma de encarar a majestade joanina est explicita num dos prlogos panegricos de que fiz meno, no qual Manoel Telles da Silva diz o seguinte: () a este tao insigne Congresso, a quem o Regio espirito de V. Magestade formou e dispoz para officina da sua gloria pois nelle se renovao as estatuas de tantos Heroes , que ou felizmente se descobrem , ou novament se Ihes erigem para se fabricar a de V.Magestade sendo cada huma dellas parte somente do Modelo , formado pela Heroica imitao com que V. Magestade exceder a todos os seus famosos Predecessores y fazendo se singular objecto do respeito, e do amor pelo exerccio das mais relevantes virtudes e louvaveis acoens, as quaes s poder dignamente avaliar o primoroso , e efficaz, artificio da Rhetorica, e comprehender de algum modo a larga diffusa da Historia.[footnoteRef:9] [5: Mas como nao he menor effeito da generosidade aceitar benvolamente hum pequeno obsequio, que demonstraao de grandeva conferir e ampliar hum grande benefcio; espero que V. Magestade permitta, que o frontespicio desta obra se orne m o elegante titulo do gloriosissimo nome de V. Magestade pois se este primeiro parto do engenho abrir os olhos na luz do Mundo debaixo da mais benigna Estrella qual he a proteca de V. Magestade , e m o mais feliz auspicio na certeza de merecer o seu Real agrado; que isenao e que privilegios Ihe nao conceder a mais invejosa, e severa Critica em f do patrocinio y e credito do assumpto? cf. ibidem;] [6: Maria Augusta Arajo, Gravadores Estrangeiros na Corte de D. Joo V, in III Congresso Internacional de Histria de Arte, Porto, 17 a 20 de Novembro, 2004, APHA Boletim (n 4), 2006, p.2;] [7: Offerece, Senhor, a V. Magestade esta Real Academia a sua primeira Medalha, e nella da parte principal figurado o decoroso aspecto de V. Magestade com o gloriosos titulo do seu Augusto nome nestes termos, Joannes V. Lusitanorum Rex. Da outra parte da Medalha se representa V. Magestade em p revestido da Real purpura, dando a mo ao simulacro, ou figura da Historia, para que se levante, com ta Soberano arrimo do abatido estado, em que de muito tempos a esta parte jazia, dizendo a inscrio Historia Resurges.() cf. Manuel Teles da Silva, ob cit, p.372;] [8: Mota, Isabel Maria Ferreira da, A Academia da Histria, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Coimbra, Universidade de Coimbra, 2001, p.326;] [9: Manoel Telles da Silva, ob cit, sem pgina (texto introdutrio);]

Na Frana de Lus XIV assistiu-se a um processo de construo da imagem real em tudo semelhante a este, tambm ao encargo de eruditos, nesse caso, da Petite Acadmie ou da Acadmie des inscriptions. De resto, o modelo majesttico de D. Joo V era, em certos aspectos, um decalque do francs. Para alm da criao da Academia (para nunca ficar atrs do seu congnere, ainda que a Academia francesa tenha sido criada 20 anos antes), muito do trabalho que os seus eruditos realizavam ia tambm beber fonte de inspirao que era a Frana do rei Sol. Exemplo disso, e retomando o caso das gravuras, o retrato do monarca portugus, feito pelo gravador Franois Harrewyn (ao servio da Academia) num enquadramento cnico em tudo semelhante ao do Retrato de Lus XIV de Hyacinthe Rigaud, datado de c. 1700. A produo documental portuguesa vai tambm encontrar constantes paralelos com a francesa. Se em 1727 est a ser publicado o primeiro tomo da Historia da Real Academia da Histria, em 1717 tinha sido publicada a Histoire de la Academie Royale des Inscriptions et Belles Lettres, se em 1720 se publica o primeiro tomo da Collecam dos Documentos, Estatutos, e Memorias da Academia Real da Historia Portugueza, em 1717 publicado o primeiro tomo das Memoirs de Litterature tirez des Registres de lAcademie Royale des Inscriptions et Belles Lettres. Apesar das inegveis semelhanas metodolgicas, h particularidades nos trabalhos dos acadmicos nacionais que no podemos deixar de identificar. Uma delas passa pela ostensiva utilizao de referncias ao mecenas da Academia nos prlogos, algo que no acontece em Frana, onde poucas vezes (pelo menos em comparao) se refere directamente a figura de Lus XIV[footnoteRef:10] ou se exalta o seu papel mecentico. [10: No entanto, a funo que a Academia desempenharia e sua importncia no esto necessariamente menos explcitas: Le Roy reagarda donc comme un avantage pour la nation, lestablissement dune Acadmie qui travailleroit aux Inscriptions, aux Devises, aux Mdailles, & qui rpandroit sur tous ces monuments le bom goust & la noble simplicit qui en font le vritable prix. Il forma dabord cette Compagnie dun petit nombre dhommes choisis dans lAcadmie Franoise, que commencrent sassembler dans la Bibliothque de M. Colbert, par qui ils recevoient les ordres de Sa Majest. Cf. Histoire de la Academie Royale des Inscriptions et Belles Lettres, Paris, LImprimerie Royale, 1717, p.2;]

Esta produo historiogrfica tambm parte integrante de um amplo processo de construo imperial que explica, em grande medida, as constantes reminiscncias ao mundo Romano. Num discurso do Marqus de Abrantes, este compara-se a Plnio e D. Joo V a Trajano (colocando num plano superior o primeiro), isto para alm das inmeras remisses para divindades e imagens da Roma Antiga na medalhstica produzida pela Academia.[footnoteRef:11] Que melhor maneira de afirmar a majestade do rei que retrat-lo ostentando essa fortssima imagem que nos transmitida pelo envergar do manto prpura. [11: Sobre a gravura Joannes V. Lusitanorum Rex o marqus de Abrantes diz o seguinte: Medalha semelhante publicou o Senado Romano em tempo do Emperador Vespasiano, com a diferena porm, que a figura, a quem o Emperador dava a ma, era a de Roma; tanto inferiores huma, e outra, quanto sa mais estimveis o simulacro da Histria que o symbolo de Roma, a imagem de V. Magestade, que o retrato de hum Emperador dos Romanos. Manuel Teles da Silva, ob. Cit. P..]

Como ltimo exemplo do papel da Academia enquanto edificadora do poder real resta ainda referir as oraes acadmicas, realizadas por ocasio dos anos do rei ou da rainha, no Pao. Nesses discursos, verdadeiras odes ao ideal setecentista de monarca (veja-se os excertos presentes no levantamento documental), realado o papel do monarca enquanto protector da instituio, sendo isso exemplo da sua bondade mas tambm da sua viso, capacidade de percepcionar o servio que ali lhe poderia ser prestado. Pautados por uma clara submisso face majestosa figura do monarca, todos os meios de enaltecer os trabalhos da Academia eram usados, na esperana de que o mecenato real se mantivesse, algo que nos reinados seguintes iria deixar de acontecer.Em suma, se a construo do discurso historiogrfico era tendencialmente isenta, o conjunto da obra nunca o seria. O carcter propagandstico e marcadamente poltico dos prlogos demostra a impossibilidade de uma historiografia despida do aparelho ideolgico que servia e de que necessitava para a continuidade dos seus trabalhos. Remetendo para a epgrafe do trabalho, no h arte pela arte. A arte (neste caso a produo historiogrfica) estaria sempre, em ltima anlise, subordinada aos interesses do monarca.Bibliografia:Documentos Consultados (fontes impressas): Collecam dos Documentos, Estatutos, e Memorias da Academia Real da Historia Portugueza, Lisboa, na Officina de Pascoal da Sylva, 16 vol. 1721-36; Description de la Ville de Lisbonne o lon traite de la Cour, de Portugal, de la Langue Portugaise, & des Moeurs des Habitans; du Gouvernement, des Revenues du Roi, & de les Forces par Mer & par Terre; des Colonies Portugaises & du Commerce de cette Capitale, Annimo, Paris, Chez Pierre Prault, Quay des Gestres au Paradis, 1730, pp.43-44; SYLVA, Manoel Telles da, Historia da Academia Real da Historia Portugueza, Lisboa, Officina de Joseph Antonio da Sylva, 1727; MACHADO, Diogo Barbosa, Bibliotheca Lusitana, Lisboa, Officina de Ignacio Rodrigues, 1759, Tomo III, pp. 200-211; Memoirs de Litterature tirez des Registres de lAcademie Royale des Inscriptions et Belles Lettres, La Haye, Chez la venue dAbr. Troyel, 1719; Histoire de la Academie Royale des Inscriptions et Belles Lettres, Paris, LImprimerie Royale, 1717; Oraa Academica que no dia da sua recepa na Academia Real da historia Portugueza, pronunciou Fr. Joaquim Forjs, Lisboa, na Officina de Miguel Rodrigues, 1768; Oraa que na primeira conferencia da Academia Real da Histria Portugueza, em o anno de 1756 recitou o illustrissimo, e excelentssimo conde de S. Loureno sendo censor della na casa, que sua Magestade destinou no Pao de Belem, para as Conferencias da mesma Academia, Lisboa, na Officina de Joz da Silva da Natividade, 1757;Historiografia Consultada:Instrumentos de Pesquisa: Dicionrio da Arte Barroca em Portugal (Dir. Jos Fernandes Pereira), Lisboa, Editorial Presena, 1999;

Estudos: ARAJO, Maria Augusta, Gravadores Estrangeiros na Corte de D. Joo V, in III Congresso Internacional de Histria de Arte, Porto, 17 a 20 de Novembro, 2004, APHA Boletim (n 4), 2006, p.2; BEBIANO, Rui, D. Joo V poder e espetculo, Aveiro, Livraria Estante, 1987; LEPECKI, Maria Lcia; PIRES, Lcia Gonalves, MENDES, Margarida Vieira, Para uma histria das ideias literrias em Portugal, Lisboa, INIC, 1980, pp. 31-57; MOTA, Isabel Ferreira da, A Academia Real da Histria os intelectuais, o poder cultural e o poder monrquico no sc. XVIII, Coimbra, Minerva, 2003; PIMENTEL, Antnio Manuel Filipe, Arquitectura e Poder - O Real Edifcio de Mafra, Coimbra, Faculdade de Letras Universidade de Coimbra, 1990;

Resumo:Trabalho que procura encontrar na produo documental da Academia Real da Histria um meio de construo da imagem real joanina. Perceber como esta se materializa (partindo da anlise a prlogos e oraes dos acadmicos durante episdios cerimoniais) ao mesmo tempo que faz uma anlise comparativa com o modelo francs (tantas vezes imitado) que permite observar semelhanas e traar particularidades.Palavras-chave:Majestade, D.Joo V, Academias, Histria, Prlogos, Parentica

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