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A Alienação Parental no quadro das mudanças na família 1 Ricardo Simões Presidente da Direção da Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos Introdução Para compreendermos o fenómeno da Alienação Parental, temos que olhar para a origem das diferentes visões, análises sociológicas e dinâmicas das famílias no mundo atual. Além disso, é igualmente relevante, à luz de algumas discussões críticas sobre os diferentes modelos familiares, entendermos, antes demais, os grandes grupos de métodos de investigação, bem como, para a discussão em causa, as perspetivas feministas sobre a família. Só assim poderemos compreender o papel que a ideologia (enquanto conjunto de crenças, representações e símbolos, que refletem uma determinada mundividência) em todo o Direito da Família e das Crianças e em particular, na doutrina e jurisprudência portuguesa. Ao mesmo tempo leva-nos a olhar para o significado do conflito parental e dos processos de gatekeeping que lhes estão associados. Esta análise permitir-nos-á, então, enquadrar adequadamente um pequeno resumo das diferentes linhas de investigação e práticas na área do fenómeno da Alienação Parental. 1. Métodos Compreender os métodos de investigação nas Ciências Sociais é fundamental para aferir da credibilidade dos estudos que nos são apresentados. Devemos sempre ser críticos de qualquer estudo, olhar para as partes que o compõem, perceber a sua construção, consistência e validade interna. Só assim poderemos saber ler com rigor um estudo, sob pena de retirarmos conclusões erradas sobre o que estamos a ler. Uma das partes fundamentais de qualquer investigação são os métodos utilizados e os princípios metodológicos que os orientam. Podemos dividir em 2 grandes grupos de investigação em Ciências Sociais: Métodos de investigação quantitativos Métodos qualitativos / compreensivos 1 Este artigo foi escrito com base na apresentação realizada no âmbito da ação de formação intitulada “O fenómeno "alienação parental" - mito(s) e realidade(s)” realizada no dia 9 de fevereiro de 2018 no Centro de Estudos Judiciários

A Alienação Parental no quadro das mudanças na família · para aferir da credibilidade dos estudos que nos são apresentados. Devemos sempre ser críticos de qualquer estudo,

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A Alienação Parental no quadro das mudanças na família1

Ricardo Simões

Presidente da Direção da Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e

Direitos dos Filhos

Introdução

Para compreendermos o fenómeno da Alienação Parental, temos que olhar para

a origem das diferentes visões, análises sociológicas e dinâmicas das famílias

no mundo atual. Além disso, é igualmente relevante, à luz de algumas

discussões críticas sobre os diferentes modelos familiares, entendermos, antes

demais, os grandes grupos de métodos de investigação, bem como, para a

discussão em causa, as perspetivas feministas sobre a família. Só assim

poderemos compreender o papel que a ideologia (enquanto conjunto de crenças,

representações e símbolos, que refletem uma determinada mundividência) em

todo o Direito da Família e das Crianças e em particular, na doutrina e

jurisprudência portuguesa. Ao mesmo tempo leva-nos a olhar para o significado

do conflito parental e dos processos de gatekeeping que lhes estão associados.

Esta análise permitir-nos-á, então, enquadrar adequadamente um pequeno

resumo das diferentes linhas de investigação e práticas na área do fenómeno da

Alienação Parental.

1. Métodos

Compreender os métodos de investigação nas Ciências Sociais é fundamental

para aferir da credibilidade dos estudos que nos são apresentados. Devemos

sempre ser críticos de qualquer estudo, olhar para as partes que o compõem,

perceber a sua construção, consistência e validade interna. Só assim poderemos

saber ler com rigor um estudo, sob pena de retirarmos conclusões erradas sobre

o que estamos a ler.

Uma das partes fundamentais de qualquer investigação são os métodos

utilizados e os princípios metodológicos que os orientam. Podemos dividir em 2

grandes grupos de investigação em Ciências Sociais:

• Métodos de investigação quantitativos

• Métodos qualitativos / compreensivos

1 Este artigo foi escrito com base na apresentação realizada no âmbito da ação de formação intitulada “O fenómeno "alienação parental" - mito(s) e realidade(s)” realizada no dia 9 de fevereiro de 2018 no Centro de Estudos Judiciários

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Os métodos de investigação quantitativos são usados essencialmente para

compreender as práticas e comportamentos humanos, o peso dessas práticas,

valores, atitudes e perceções. Enquanto o método qualitativo / intensivo procura

os significados dos contextos, as realidades múltiplas e as ações e interações

(comportamentos).

Será igualmente importante entender o processo de investigação para podermos

de alguma maneira avaliarmos com objetividade os textos científicos que se nos

apresentam. O rigor das investigações é fundamental para que sejam validadas

pelos pares e possam ter credibilidade, para serem usadas não só na definição

das políticas públicas, como na doutrina e jurisprudência. Marinho (2017),

socióloga e investigadora no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de

Lisboa apresenta-nos um esquema esclarecedor sobre este processo de

investigação e que devemos ter sempre em mente quando lemos textos sobre

estas matérias:

No entanto, estes grupos de métodos, como ciência viva, são objeto de reflexão

constante. O método a usar está ligado ao que queremos saber e aos caminhos

para lá chegar (Augusto, 2014). É logo nesta fase, que se levantam alguns vieses

na investigação e que nesta temática da Alienação Parental devemos ter

especial cuidado. A escolha do método não pode ter por base a preferência

individual do investigador, mas antes as questões que se colocam ao fenómeno

em estudo. Por exemplo, preferir usar inquéritos e análises estatísticas para

investigar a realidade não pode menorizar ou excluir a opção pelo uso de

histórias de vida e entrevistas em profundidade. Pesquisa, métodos e técnicas

de investigação não devem, assim, ser confundidas. Num exemplo prático, não

podemos partir para uma investigação já com a intenção de querer provar, a

título de exemplo, que a Alienação Parental não existe. Isso não é cientificamente

honesto. Temos é que levantar a questão se determinados comportamentos

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podem conformar um determinado padrão comportamental, sujeito a

interpretação e assim contribuir para uma determinada teoria (seja nova ou

existente).

Aliás, esta discussão, na literatura, tem sido realizada com alguma profundidade,

ao ponto de Pearce (2012) referir o aparecimento de um novo paradigma, o

pragmático, que defende o uso de métodos mistos, diminuindo a tensão entre

estes grupos (Augusto, 2014). Devemos, no entanto, ter em conta que os

estudos qualitativos podem dar conteúdo aos quantitativos (por exemplo, por que

é que o individuo responde de determinada maneira). Assim, na voragem dos

tempos atuais, dominados pelas caraterísticas próprias do capitalismo atual,

frequentemente dá-se mais valor a investigações muito centradas em métodos

quantitativos. A reemergência do paradigma positivista é mais resultado de um

clima político (Navarro, 2005) e de “forças políticas e institucionais que

estruturam as políticas de investigação e financiam a pesquisa” (Gwyther e

Possani-Inesedi, 2009; Brinkmann, 2012; cite in Augusto, 2014).

2. O que são famílias?

De forma genérica, as famílias são um grupo social ligado por laços de

parentesco, aliança, afetos e afinidade. A família é também um espaço de

relações interindividuais específicas. Considera-se, assim, que é a base do

sistema social. Enquanto construção social, histórica e culturalmente

determinada, encontra diferentes abordagens ao estudo deste grupo social, que

tem influenciado as práticas de certos atores sociais, como seja os da Justiça.

3. Perspetivas teóricas e resultados de estudos sobre a família

Para se compreender as representações e práticas de alguns atores na área da

justiça da família e das crianças temos que compreender as diferentes

perspetivas teóricas que lhe deram origem. Podemos identificar 3 grandes

perspetivas teóricas sobre a família desde o pós-II Guerra Mundial2. Assim,

deparamo-nos logo com o conceito de família conjugal de Parson e Bales (1955),

que é uma perspetiva estruturalista e funcionalista, sendo esta focada nas

funções da família, apontado para um único modelo de família.

Este modelo é assente nos estatutos da “autoridade do chefe de família”, na

função de socialização das crianças e estabilização da personalidade do adulto,

diferenciação de papeis sociais segundo o sexo (complementaridade dos papeis

masculinos e femininos) e no uso de funções expressivas e instrumentais3.

Assim, apresenta-se como um casal fechado em si mesmo e isolado do

2 Deixaremos de lado a perspetiva de Goode (1963;1969) 3 O papel feminino era remetido a funções expressivas (cuidados, trabalho emocional, gestão doméstica) e o papel masculino a funções de sustento, integração moral das crianças na sociedade).

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parentesco (Marinho, 2017). Podemos ainda hoje observar que muitas das

representações estereotipadas de vários atores na área da Justiça se coadunam

com este modelo, criando necessariamente um choque entre as suas práticas

profissionais e a realidade social contemporânea.

Como explica Marinho (2018, 2011, p.33-34) surge, então, nos anos 60 o

conceito da chamada “família conjugal companheirista” (Burguess e Locke 1960)

ou a primeira família moderna (Singly, 2000). Este modelo parte de uma

perspetiva interacionista. Vem afirmar que afinal existem outros modelos de

família, desde as décadas de 30/40 (EUA/Europa), que a família é uma “unidade

de personalidades em interação existindo primordialmente para o

desenvolvimento e gratificação mútua dos seus membros (…) unidos mais por

coesão interna do que por pressões externas” (Burguess e Locke, 1960),

fundada pelo casamento livre (escolha dos cônjuges) e na valorização dos afetos

em substituição da valorização dos estatutos.

Assim, diz-nos que estamos antes perante uma atenuação das hierarquias e

diferenças entre sexos e gerações, existindo uma negociação das decisões e

tarefas (o incorporar no seio familiar de normas e valores de igualdade e de

democracia) e de uma gestão de recursos emocionais, sociais e materiais pelos

dois cônjuges (Marinho, 2017).

Tal como refere Marinho (2018, 2011), nos anos 70 e 80 surgem então os

conceitos de família relacional ou a 2ª família moderna (Singly 2000; Giddens

1997). Nesta mudança de paradigma surge a análise da família caraterizada pela

privatização, sentimentalizada, democrática e igualitária. Assiste-se, assim, ao

distanciamento em relação a papéis sociais pré-definidos, através da negociação

no casal: duplo emprego e duplo cuidar. A família passa a ser um lugar central

da construção identitária e da revelação de si (adultos e crianças), um espaço

da autenticidade. A igualdade entre os sexos é refletida na autoridade partilhada

no casal, quer nas práticas e na Lei (a exemplo disso é a reforma legal de 1977).

Assiste-se a mudanças na maternidade e na paternidade, onde a paternidade

assume caraterística relacional e envolvida, ou seja, a inclusão do homem nos

cuidados e nas tarefas domésticas (ex: Licença Parental), bem como uma

maternidade inclusiva do pai e igualitária. A autoridade deixa de ser imposta e

passa a ter uma caraterística “sedutora” na relação educativa com os filhos

(Singly, 2000).

De forma sintética, são estas as perspetivas teóricas e os resultados dos estudos

que olham para as famílias do mundo ocidental e que nos permitem

compreender melhor algumas práticas dos diferentes atores na área das famílias

e das crianças. Se analisarmos a doutrina jurídica portuguesa dominante, as

práticas e as normas, podemos observar que ainda seguem, de alguma maneira,

a abordagem de Parsons. Na reforma de 2008 não eliminou de todo a ideia de

um modelo único de família, ainda que as sucessivas reformas, desde o

casamento de casais do mesmo sexo à gestação de substituição, se tenham

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imposto no plano político-legislativo. No entanto, o Direito como um corpo de

conhecimentos que estuda as normas que regulam o comportamento social,

tende a olhar para a família como uma instituição estática, desconsiderando, por

demasiado tempo, as práticas e dinâmicas que lhes estão subjacentes4. Esta

visão funcionalista da família, que vem de Parsons, é uma visão instrumental,

dos anos 50 do Séc. XX, pelo que ultrapassada.

Antes de avançarmos para o que se deve entender como conflito parental e as

suas dimensões sociais subjacentes, tendo em conta o âmbito da discussão

jurídica e mesmo sociológica da Alienação Parental, convém abordamos as 3

grandes perspetivas feministas sobre a família, na medida em que elas

subsidiam muito do atual discurso de alguns dos atores anteriormente referidos.

De forma concisa abordarei as três.

4. Perspetivas feministas sobre a família

O feminismo, desde os anos 50, tem criticado os papeis de género da chamada

“família tradicional”. Afirmavam que a “família tradicional” tinha duas funções na

opressão das mulheres:

▪ Socialização das raparigas para terem papéis de género

subservientes em relação aos rapazes;

▪ O papel da mulher na família e outras esferas da vida social seria

igualmente limitado pela socialização, promovendo-se a mulher

como “dona de casa”.

Desde os anos 50 até aos dias de hoje surgiram diferentes correntes dentro do

próprio movimento feminista. Mas, na sua essência, teve e tem a validade de

refletir sobre o papel da mulher na família e da condição da mulher (em especial

na dimensão dos seus direitos).

Alison Jaggar (1983) dividiu as perspetivas feministas sobre a família em 3

grandes correntes: a Liberal; a Marxista e a Radical5, que veremos de seguida.

O feminismo liberal

Para o feminismo liberal as causas da desigualdade nas relações devem-se à

combinação de dois fatores: a cultura do trabalho de longas horas associada à

figura do homem/progenitor provedor e a recusa dos homens em ceder o seu

peso nas relações de poder na conjugalidade. A solução apresentada, por

autoras de referência desta corrente, como Jennifer Somerville, assenta numa

4 Ainda que alguns autores de Direito ressaltem o papel de “sensor da geografia e da cronologia social, das conceições de vida, políticas e apolíticas, religiosas e laicas” do Direito de Família (Pinheiro, 2016, pp.347-348). 5 Sem prejuízo de outras classificações dentro das chamadas das teorias das desigualdades de género, da opressão de género ou ainda das diferenças de género.

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posição mais moderada que as outras correntes, sustentada em reformas legais

que visem o acesso das mulheres à educação, salário igual, fim das

desigualdades de género nas carreiras, etc.. Um exemplo prático desta

abordagem tem sido as políticas públicas de conciliação da vida profissional com

a vida familiar.

O feminismo marxista

A perspetiva do feminismo marxista afirma que a principal razão da opressão da

mulher na família não são os homens, mas o Capitalismo. Argumenta que a

opressão da mulher na família cumpre várias funções:

▪ Reproduz a força de trabalho (através do trabalho não pago e

socialização da geração seguinte);

▪ As mulheres absorvem o sentimento de revolta do proletariado em

vez de a direcionarem para a burguesia;

▪ As mulheres são o “exército de reserva do trabalho de baixo custo”.

A solução passaria pelo fim do Capitalismo como forma de eliminar o patriarcado.

Entre muitas autoras, refira-se os nomes de Margaret Benston e Fran Ansley,

associadas a esta corrente.

O feminismo radical

A perspetiva do feminismo radical defende que todas as relações entre homens

e mulheres têm por base o patriarcado, significando isso que o homem é a fonte

da exploração e opressão da mulher. Nesse sentido, o patriarcado necessita de

ser derrubado e em particular a família, vista como o centro da opressão. Não

vêm a entrada da mulher no mercado de trabalho como positiva, pois a mesma

assume uma tripla jornada: o trabalho pago, o trabalho não pago (doméstico) e

o “trabalho emocional”. Esta corrente afirma igualmente que existe um lado

“negro da família”, nomeadamente quanto à violência doméstica e abusos

sexuais. A solução para a desigualdade passaria pela abolição da família

tradicional e patriarcal, sendo substituída por uma família de novo tipo, com

estruturas e relações sexuais alternativas. Algumas das principais referências

desta corrente são, entre outras, Kate Millet, Shulamith Firestone, Carol Hanisch,

Grace Atkinson e Germaine Greer.

Estas diferentes perspetivas vão-nos permitir compreender melhor algumas das

críticas que são feitas ao construto da Alienação Parental, ao papel do conflito

parental e mesmo a ação política exercida quanto às perspetivas da família.

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5. O que são conflitos parentais?

Quando olhamos para os conflitos parentais há uma tendência para o fazer de

forma individualizada, ignorando a sua dimensão social e histórica. Essa visão

individualizada, muito presente por via da Psicologia6, tende a ignorar o papel da

estrutura, dos significados e contextos. A pergunta que devemos levantar é por

que é que um pai ou mãe entram em conflito? A visão habitual tende a procurar

explicações individuais ou mesmo ancorar-se em patologias. No entanto, mesmo

em situações patológicas, estas têm por base um processo complexo, entre as

quais, processos sociais identitários.

Os processos de “gatekeeping”

O aumento dos conflitos parentais nestes últimos 20 anos tende a confirmar a

investigação de autores como Beck e Beck-Gernsheim (1995) e Castelain-

Meunier (2002) onde apontam para a criança como centro de jogos de poder

genderizados. Trata-se de uma “competição afetiva, simbólica, prática e

identitária no casal em relação aos filhos” (Marinho, 2011, p.50). Esta abordagem

é útil para compreender as dinâmicas de liderança e de resistência feminina e

masculina (Marinho, 2011). Estes processos históricos refletem uma

reconfiguração ou enfraquecimento da dominação masculina. No entanto, os

papeis tradicionais de género deram à mulher a predominância dos afetos e

cuidados parentais, constituindo a base da identidade materna, afastando o pai

das mesmas e remetendo-o para o espaço público (Marinho, 2014).

Se o duplo emprego do casal fez com que esta relação de género se torne cada

vez mais minoritária, na verdade não eliminou o “protagonismo materno na

parentalidade”, acumulando essa função com o trabalho formal. É aqui que surge

a figura de gatekeeping materno, ou seja, o protagonismo feminino tem sido

impeditivo do envolvimento paterno, na medida em que a mulher resiste à perda

de liderança na parentalidade.

Clarificando conceitos, designa-se por gatekeeping materno a “um conjunto de

crenças e comportamentos definidos como tendo três dimensões: a relutância

da mãe em renunciar à responsabilidade sobre os assuntos da família,

estabelecendo padrões rígidos, a validação exterior de uma identidade de mãe

e conceções diferenciadas dos papéis na família (…) que inibem principalmente

o esforço de colaboração entre homens e mulheres nas tarefas familiares ao

limitarem as oportunidades dos homens aprenderem e crescerem na área das

atividades domésticas e do cuidar dos filhos” (Allen e Hawkins 1999, 200; citado

por: Marinho, 2014, p. 51)”.

6 Não ignorando as abordagens mais interdisciplinares da Psicologia.

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No entanto, encontramos também resistências masculinas, principalmente

naquelas relações ditas mais tradicionais, onde o homem resiste à mudança das

áreas que considera como suas, como o da figura do pai provedor e da sua

autoridade sobre a criança (Marinho, 2014). Ou seja, se olharmos para o conflito

parental vamos observar resistências em homens e mulheres, caraterizando-se

por uma relação de poder em relação à criança. Tais resistências tornam as

mudanças no sentido da igualdade mais difíceis. É nestas resistências que

igualmente observamos a dificuldade de separar os papeis identitários na esfera

conjugal e parental. No gatekeeping encontramos assim uma desvalorização da

parentalidade do outro (muito presente nas petições iniciais apresentadas em

tribunal), ligadas às relações de poder e papeis de género no casal, mas também

por via de patologias. Assiste-se, assim, ancoradas ainda por uma visão mais

conservadora sobre a família (como já vimos), por parte de algumas instituições,

como a da Justiça, a uma desvalorização das novas práticas e dinâmicas

parentais, exatamente porque o papel mais tradicional do pai fazia parte das

masculinidades dominantes. Dadas as transformações sociais nas famílias,

como já vimos anteriormente, observamos à chamada “parentalização das

identidades” (Singly, 1996) e a uma negociação nas relações de poder no casal

que influenciam igualmente os processos identitários. O divórcio pode assim

levar ao esvaziamento identitário (onde as relações de poder desiguais

desempenham um papel relevante) e como tal é social (“como os outros nos

veem”) e pode levar ao aparecimento de patologias (e.g. ansiedade patológica,

depressão, etc.).

Assim, o conflito parental é um processo simultaneamente interno, na medida

em que pais e mães se confrontam com atividades mutuamente exclusivas e que

resultam de valores incompatíveis, sujeição a pressões do grupo de pertença

(ex: família paterna ou materna) ou ainda o desempenho inconciliável de

múltiplos papeis (ex: papel de provedor vs papel de cuidador). Estes elementos

subjetivos podem gerar explicações de cariz psicológico. Mas também se trata

de um processo externo, pois há que analisar a respetiva estrutura (elementos

que mantêm as relações de dependência relativamente uns aos outros) e a

situação que a origina, ligada com a desigualdade da distribuição de recursos.

É nesse sentido que temos que olhar para o conflito parental com outros

olhos e enquadrá-lo nas mudanças sociais da sociedade portuguesa e que

necessitam de políticas públicas que tenham em conta estas relações de

poder e de género. A presunção jurídica da residência alternada é um

exemplo de política pública exatamente direcionada para a natureza destas

relações.

Como veremos mais à frente, temos que olhar então para a intervenção sobre

os conflitos parentais também sob a ótica das relações de poder e papeis de

género do casal, na sua relação com a criança e perceber em que medida

podemos ajudar nos processos identitários de género que se operam nas

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situações de divórcio/separação (e.g. o pai ausente, por ser um pai provedor;

para um pai presente e cuidador).

6. O papel do conflito

Na medida em que temos famílias mais igualitárias e democráticas, a negociação

torna-se num elemento central nas relações familiares, tornando a discordância

como algo normal. Ou seja, é a negociação que permite a coesão. Nesta

perspetiva, o conflito não é necessariamente negativo, mas um elemento sempre

presente, quer na conjugalidade quer na parentalidade.

As mudanças sociais têm trazido consigo uma maior atenção sobre os conflitos

parentais, enquanto problema que a comunidade enfrenta. Mas quais as razões

sociais que levaram ao aparecimento deste fenómeno a uma escala nunca antes

observada?

Existem mudanças sociais significativas na sociedade portuguesa, a saber: o

decréscimo da nupcialidade e dos casamentos católicos; a crescente expressão

das uniões de facto; a queda da fecundidade e aumento dos nascimentos fora

do casamento; o crescimento das taxas de atividade feminina; o aumento

significativo da taxa de divórcio e configuração de novas realidades parentais

nas famílias monoparentais e reconstituídas (Marinho, 2017); a privatização das

relações familiares (separação entre a esfera privada e a pública); a afirmação

dos valores da igualdade e de processos de individualização

institucionalizada (Aboim, 2008 e Marinho, 2017), que Inclusive dão ao individuo

uma maior margem de escolha, mas ao mesmo tempo exige deles uma

autorregulação, colocando em causa processos de solidariedade (por exemplo,

o casamento não é mais visto como uma instituição de sobrevivência). Mas

também se verificam mudanças quanto ao lugar dos filhos na família levando a

processos de sentimentalização parental (Marinho, 2017), mudanças no

capitalismo que contribuíram para o aparecimento das famílias de dupla jornada

de trabalho e mudanças nos papeis de género no seio familiar (Wall e Amâncio,

2007; cite in Marinho, 2017).

Assim, mais do que caprichos individuais, ou caraterísticas de personalidade, os

conflitos parentais devem ser vistos à luz das mudanças sociais que as famílias

têm tido de forma significativamente acelerada. Essas mudanças trazem consigo

resistências e contradições que urge compreender, de forma a se contextualizar

o momento histórico em que se vive.

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7. Conflitos parentais e Alienação Parental

Como já podemos ver, conflito parental não é sinónimo de Alienação Parental.

No entanto, nas relações de poder, especialmente de gatekeeping, poderemos

observar comportamentos muito rígidos, contendo elementos patológicos, em

que os filhos/as são o pilar identitário, já não só da conjugalidade, mas da sua

própria individualidade. A ausência de um envolvimento parental equilibrado

(como é o exemplo do modelo 26/4) pode ser visto como um esvaziamento da

identidade e uma incapacidade de reposicionamento nas relações com o outro.

E é exatamente neste ponto que podemos encontrar o germe para os

comportamentos ditos “alienantes”.

Este fenómeno social tem sido objeto de investigação, nos últimos 30 anos, por

parte de diferentes áreas do saber, como a Psiquiatria e a Psicologia. Neste

quadro podemos identificar 2 correntes de investigação:

O construto da Alienação Parental tem realizado um caminho complexo, muito

por não ser, ainda, consensual, mesmo na comunidade de investigadores e

profissionais da área. Assim, a diversidade estratégica na abordagem a este

fenómeno tem sido uma caraterística a nível internacional. Alguns países, como

o Brasil e vários Estados do México, têm optado pela criação de uma legislação

específica para prevenir este fenómeno, outros defendido a intervenção

terapêutica (com diferentes abordagens na área da Psicologia e Psiquiatria) e

outros, ainda, como Edward Kruk e Linda Nielsen, o estabelecimento da

presunção jurídica da residência alternada como instrumento verdadeiramente

preventivo, não só dos conflitos parentais como da Alienação Parental. Se há

divergências quanto à estratégia de combate ao fenómeno, também assistimos

a diferentes abordagens, umas centradas no “progenitor alienador”, outras na

“criança alienada” e ainda outras na dinâmica familiar que contribuí para a

Alienação Parental, abordagem esta devedora à corrente sistémica da

Psicologia.

•Concentrada à volta do Parental Alienation StudyGroup

•Figuras mais relevantes: William Bernet e Karen Woodall

A linha de R. Gardner

•Surge como reação ao não reconhecimento do construto de Alienação Parental por parte dos alguns setores profissionais de psicologia e psiquiatria.

•Figuras relevantes: Craig Childress e Dorcy Pruter(Conscious Co-parenting Institute)

A linha de C. Childress

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Estas diferentes abordagens ao fenómeno da Alienação Parental têm sido

recentemente corporizadas por algumas figuras relevantes:

- Uma linha de investigação associada ao Parental Alienation Study Group, que

tem no psiquiatra forense William Bernet a sua figura principal7. Este liderou o

movimento que tentou incorporar a “Perturbação da Alienação Parental” no

DSM-5, mas tem-se aproximado, nos últimos tempos, da posição de Craig

Childress, falando em “efeitos do distress parental na criança”, tal como previsto

nesse Manual, tratando-se de um problema relacional com consequências

negativas para a saúde mental da criança. Não deixa, no entanto, de ir beber à

herança dos últimos 30 anos de investigação iniciada por Richard Gardner e que

foi multiplicada não só nos países anglo-saxónicos, como em muitos outros.

- Craig Childress, psicólogo clínico, protagoniza uma outra linha de investigação,

equivalendo o fenómeno da “Alienação Parental” ao de violência doméstica e

aborda-o numa perspetiva de relações de poder que podem gerar patologias, na

linha da abordagem sociológica aos conflitos parentais que anteriormente

referimos:

“A violência doméstica ocorre num contexto mais lato de poder, controlo e

dominação e estas características interpessoais de poder, controlo e

dominação são traços de personalidade com perturbação narcísica, do

progenitor «alienador», que ganham relevância no processo de «Alienação

Parental»” (Childress, 2016). Sustenta ainda o construto da “Alienação Parental”

socorrendo-se da teoria da vinculação e outros construtos académicos e

profissionalmente aceites.

Embora saliente o papel de Gardner para chamar à atenção para este tipo de

comportamentos, Childress afirma que o modelo de “Alienação Parental” deste

autor representa um paradigma falhado em quatro domínios gerais: legal,

teórico, diagnóstico e tratamento (Childress, 2013). No entanto, para ele,

Gardner estava certo ao identificar estes comportamentos no âmbito clínico,

social e jurídico, mas os seus críticos também estavam certos ao criticar a falta

de validação do seu construto pelos pares. Segundo este psicólogo, podemos

então afirmar que Richard Gardner estava incorreto a identificar sintomas como

uma nova forma de patologia – um novo síndrome – mas correto a identificar

uma perturbação familiar associada ao divórcio (em algumas situações, pré-

divórcio), onde a criança é induzida por um progenitor a rejeitar o outro (Childress

e Pruter, 2017).

A sua principal obra é o livro “Foundations”, que propõe criar uma base de

entendimento com todos os profissionais. No seu trabalho publicado não se

propõe resolver todas as situações de “Alienação Parental”, mas uma situação

específica. No entanto, segundo ele, cria as condições para que outros

7 Ao qual podemos ainda juntar a Amy Baker, Karen Woodall e Nick Woodall

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profissionais possam criar diagnósticos de outros comportamentos de “Alienação

Parental” com segurança científica e clínica.

Procurando afastar-se da polémica político-ideológica em que o trabalho de

Richard Gardner acabou por cair, propõe novas terminologias para o mesmo

fenómeno (Childress, 2017):

▪ Nível semiformal: Obstáculos à vinculação

▪ Nível profissional: Luto complicado e aliança inter-geracional

▪ Nível de proteção da criança: parentalidade patogénica

▪ Especialistas: Transferência transgeracional de uma vinculação

traumática

Dorcy Pruter tem trabalhado com o psicólogo Craig Childress durante vários

anos, como conselheira familiar e consultora em casos de custódia. Como

fundadora e CEO do Conscious Co-Parenting Institute, nos EUA, elaborou um

protocolo de 8 passos para a resolução de conflitos de elevada intensidade:

1. Remover os obstáculos mentais;

2. Reeducar os progenitores para a coparentalidade;

3. Recuperar a autenticidade da criança;

4. Restabelecer a relação de vinculação;

5. Restabelecer as interações normais entre a família da criança;

6. Reintegrar o novo paradigma da família;

7. Satisfação e recompensa – celebrar a família;

8. Workshop para manter o cuidado à criança.

De forma sintética tentei apresentar as principais linhas de investigação e

práticas clínicas que hoje se posicionam em relação ao fenómeno.

Independentemente destas abordagens, torna-se consensual para a maioria da

comunidade clínica que o chamado fenómeno da “Alienação Parental” existe e

tem que ser tratado com profissionalismo e rigor, visto estarmos perante um

problema social grave que afeta as crianças e seus pais e mães. Assim, as

discussões sobre a sua existência ou não encontram-se no campo político-

ideológico e não no campo clínico ou mesmo na análise sociológica. Para

compreender estas resistências político-ideológicas no reconhecimento e na

definição de políticas públicas de combate a este fenómeno temos que voltar

atrás no nosso texto e recordar as mudanças sociais no seio familiar, em especial

Page 13: A Alienação Parental no quadro das mudanças na família · para aferir da credibilidade dos estudos que nos são apresentados. Devemos sempre ser críticos de qualquer estudo,

nas relações de poder e papéis de género, quer na conjugalidade quer na

parentalidade. Se a isso juntarmos a visão sobre a família por parte do feminismo

radical poderemos compreender que as críticas realizadas ao conceito de

Alienação Parental em nada se fundamentam na análise clínica e sociológica,

mas antes em conceções de ação política dos movimentos sociais, em particular,

numa visão muito específica do feminismo sobre a sociedade.

8. Visões em Portugal sobre a Alienação Parental

Em Portugal, o estudo do fenómeno da Alienação Parental ainda se encontra

numa fase muito incipiente e as posições tomadas pelos diferentes profissionais

tendem a ser de reserva, sem com isso se vislumbrar um entendimento entre

estes e os investigadores para uma verdadeira discussão sobre os protocolos

que devem ser construídos. Daí que o que observamos vai desde as posições

mais prudentes, baseadas no DSM-5, até a algum voluntarismo na tentativa de

desbravar um caminho até aqui ainda não realizado. Sem prejuízo de outras

abordagens em Portugal, apresentamos duas das posições com maior

relevância.

a) Da psicologia forense

No âmbito da Psicologia Forense, frequentemente chamada para perícias

forenses no âmbito das regulações do exercício das responsabilidades

parentais, Rute Agulhas e Alexandra Anciães têm uma posição bastante clara

sobre o fenómeno, que reconhecem, mas que o enquadram da seguinte forma8:

“Existem múltiplas razões que podem relacionar-se com a resistência às visitas

como, por exemplo, processos de desenvolvimento (…), casamento e/ou

divórcio com elevado conflito (…), resistência face ao estilo parental de um

progenitor (…), resistência devido à percepção da fragilidade de um progenitor

(…) e resistência devido a uma nova relação do progenitor (…). Nestas

situações, o processo de avaliação pericial tem como principal objetivo situar a

relação entre a criança e os pais num continuum relacional (Kelly & Johnston,

2001, cite in Agulhas e Anciães, 2015, p.80) (…)”.

Agulhas & Anciães (Agulhas e Anciães, 2015) referem que “esta rejeição pode

justificar-se devido a uma vivência real negativa prévia (…), que deve ser

despistada num primeiro momento. Pode também ocorrer no contexto de um

processo de alteração dos vínculos afetivos entre a criança e o progenitor

rejeitado, bem como por outro tipo de processos sistémicos (e.g., triangulação

da criança no conflito conjugal, vivência de um processo de separação ou

divórcio muito litigioso). (…) Estas dinâmicas familiares surgem já reconhecidas

pelo DSM-5 (APA, 2013a), em Other Conditions That May be a Foccus of Clinical

8 Afastando-se assim da linha do Gardner

Page 14: A Alienação Parental no quadro das mudanças na família · para aferir da credibilidade dos estudos que nos são apresentados. Devemos sempre ser críticos de qualquer estudo,

Attention, onde são sistematizadas diversas problemáticas relacionais que,

embora não sejam consideradas perturbações mentais, podem ser tidas em

atenção num processo de avaliação. Destas destacamos a categoria Problems

Related to Family Upbringing, que deve ser usada quando o principal foco da

atenção clínica for a avaliação da qualidade da relação progenitor/cuidador-filho

ou quando a qualidade desta relação afetar o curso, prognóstico ou tratamento

de uma perturbação mental ou de outra perturbação médica. (…) Salientamos

ainda a categoria Child Affected by Parental Relationship Distress, que deve ser

usada quando o foco da atenção clínica forem os efeitos negativos da discórdia

parental (e.g., elevandos níveis de conflito, desprezo) na criança “.(p.80).

b) Uma abordagem da experiência clínica (ecológico-construtiva)

Eva Delgado Martins, psicóloga educacional e doutorada em Educação Parental,

tem, de alguma forma, tentado conceptualizar e criar protocolos de intervenção

para os comportamentos alienantes presentes em certas dinâmicas familiares.

Propõe 9 princípios para a intervenção terapêutica na transformação construtiva

de conflitos parentais/Alienação Parental (Martins, 2017):

1 – O foco da intervenção são os filhos/as crianças;

2 – Equidade no atendimento dos pais;

3 – Pais como participantes ativos na resolução dos seus próprios problemas;

4 - Procura e uso de pontos fortes e positivos como forma de ultrapassar os

negativos;

5 – Avaliação e intervenção contextualizada – trabalho no terreno;

6 - Regularidade e follow-up (seguimento sistemático e disponibilidade

permanente para atender);

7 - Proximidade entre intervenientes - cooperação interdisciplinar;

8 - Equilíbrio entre urgência e a segurança física e psicológica das crianças;

9 – Mediação como prevenção de conflitos parentais.

9. Conclusões

Os conflitos parentais e a Alienação Parental, em particular, surgem num

contexto de transformações sociais e especificamente ao nível da família. Os

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conflitos parentais não são um problema em si, mas antes o resultado de

transformações sociais significativas e como tal um processo normal, que deve

ser encarado como tal. De acordo com a investigação, os conflitos parentais não

são o problema para as famílias, mas sim resultado das transformações desta

última. Com estas transformações surgem então processos de gatekeeping que

se assumem como resistências às mudanças das relações de poder desigual.

Assim, as estruturas de desigualdade de género alimentam também estas

lógicas no interior da família, ao mesmo tempo que atrasam processos de

igualdade no espaço público.

No conteúdo desta comunicação, pensamos que ficou claro que a Alienação

Parental existe enquanto realidade social, clínica e jurídica, até pela produção

científica das duas grandes linhas de investigação internacional. Quanto à

realidade portuguesa, a investigação e intervenção sobre o fenómeno da

Alienação Parental ainda está aquém da qualidade e exigência que o problema

impõe.

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