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A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência Um estudo sobre a interacção entre alunos e módulos científicos participativos Agostinho Botelho Ana Maria Morais Departamento de Educação Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa Versão pessoal revista do texto final do artigo publicado em: Revista de Educação, XII (1) 5-23 (2004). Revista de Educação homepage: http://revista.educ.fc.ul.pt/

A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

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A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

Um estudo sobre a interacção entre alunos e módulos científicos participativos

Agostinho Botelho Ana Maria Morais Departamento de Educação Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa Versão pessoal revista do texto final do artigo publicado em: Revista de Educação, XII (1) 5-23 (2004). Revista de Educação homepage: http://revista.educ.fc.ul.pt/

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A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência Um estudo sobre a interacção entre alunos e módulos científicos participativos

Agostinho Botelho Ana Maria Morais

Departamento de Educação Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

1. INTRODUÇÃO

Hoje, mais do que nunca, os museus de todos os tipos sofrem uma enorme

pressão no sentido de se tornarem mais interactivos. Os visitantes querem fazer

algo nos museus - esperam encontrar actividades interactivas. O facto das

exibições interactivas atraírem visitantes faz com que módulos participativos e

interactivos figurem nas galerias de muitos museus (Swift, 1997; Reid, 1997).

Aqui os visitantes podem explorar fenómenos e princípios através do simples

pressionar de botões, puxando alavancas e girando rodas.

Os termos interactivo e participativo são permutativamente usados para

falar de módulos interactivos embora o seu significado seja diferente. Os

módulos participativos requerem algum envolvimento físico por parte do

visitante. Isto tanto pode ser, por exemplo, em ordem a tocar a pele de um animal

exposto numa galeria como a pressionar um botão para activar um sistema

mecânico. No primeiro exemplo, apesar da participação do visitante, o módulo

não reage (é passivo) e no segundo caso reage (é reactivo). Módulos interactivos

são aqueles que, apesar de responderem à acção do visitante isto é, serem

reactivos, convidam a uma resposta adicional do visitante - há uma relação de

dependência entre o visitante e o módulo (MacClafferty e Rennie, 1996).

As investigações realizadas mostram que os módulos participativos e

interactivos são um dos aspectos mais agradáveis e memoráveis da visita ao

museu (Swift, 1997) e possuem a capacidade de atraír visitantes (Hooper-

Greenhill, 1994). Entre estes contam-se as crianças, os seus familiares e

professores, os quais vêem neles oportunidade para aprender de uma forma

agradável. A sua popularidade é um importante factor para os museus, pois a

investigação mostra que as crianças são o público chave dos museus - 80%

dessas crianças têm entre dez e treze anos e 25% delas visitam-nos integradas em

visitas escolares (Davies, 1994). Os grupos escolares não só representam a maior

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proporção de visitantes, como também levam a que as crianças retornem com as

suas famílias. Um facto único que os museus apresentam é a oportunidade única

para interactuar com materiais, objectos e ideias que de outro modo os alunos

não poderiam ter contacto (Russel, 1995).

A crescente substituição dos museus tradicionais por novos museus de

ciência interactivos - os centros de ciência - remete para uma reflexão sobre as

implicações de tal substituição no ensino/aprendizagem das ciências. A maior ou

menor facilitação ou não da compreensão de conceitos científicos através do uso

de módulos científicos participativos constituiu o cerne do estudo aqui descrito.

A investigação aqui descrita foi realizada no âmbito do Grupo ESSA1 e

centrou-se, por um lado, na relação comunicacional existente entre alunos e

módulos participativos e sua caracterização sociológica e, por outro lado, na

relação entre as características sociológicas específicas dessa comunicação, e dos

microcontextos associados, e a aprendizagem de conceitos científicos. Embora

na interacção alunos-módulos tivessem sido analisados dois microcontextos

específicos, os procedimentos dos alunos e a compreensão de conceitos

científicos, apenas este último será aqui explorado.

A Teoria do Discurso Pedagógico de Bernstein (1990, 2000) forneceu os

conceitos para caracterizar essa interacção e analisar a influência das

características sociológicas na aprendizagem científica dos alunos. Utilizou-se

como principal instrumento de análise, o conceito de código expresso por este

sociólogo como regulador da relação entre contextos e gerador de princípios

orientadores da produção dos textos adequados a cada contexto. Estes princípios

são as regras de reconhecimento que permitem distinguir entre contextos e

reconhecer a especificidade de cada contexto, e as regras de realização, que

regulam a criação e produção de relações especializadas dentro do contexto.

Juntos eles informam sobre a orientação específica de codificação (OEC).

Concretamente neste estudo, averiguou-se o tipo de conhecimento que os

alunos possuíam acerca dos conceitos envolvidos nos módulos e se adquiriam

esses conceitos e em que grau durante a interacção com os módulos. A

investigação procurou dar resposta a duas questões: Em que medida o uso de

módulos participativos promove, por si só, a compreensão de conceitos

científicos? Existe ou não influência de factores de natureza sociológica,

relacionados com a família (nível sócio-económico e género) e de outros

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associados com a escola (resultados escolares) na compreensão de conceitos

científicos, através do uso de módulos científicos participativos?

Os resultados obtidos foram relacionados não só com variáveis

sociológicas relacionadas com a família e com a escola mas também com o

contexto em análise (relações de controlo e de poder). Além disso foram

comparados com os resultados obtidos num outro estudo sobre os procedimentos

dos alunos em centros de ciência (Botelho e Morais, 2003). Uma descrição

completa da investigação encontra-se em Botelho, 2001.

2. AMOSTRA

A amostra utilizada era formada por 8 alunos, 4 do sexo masculino e 4 do

sexo feminino pertencentes ao 7º ano de escolaridade. Na selecção da amostra,

foi tida em conta a escolha de igual número de alunos pertencentes à classe2

trabalhadora e à classe média baixa (NSEFB) e pertencentes à classe média alta

(NSEFE). No sentido de discriminar as famílias em termos de poder e prestígio

social, usou-se o índice compósito das habilitações académicas e das profissões

da mãe e do pai, representado na fórmula3

A caracterização da família de cada aluno levou a que, além das duas

classes inicialmente previstas para o estudo (classe trabalhadora e classe média)

se considerassem dentro da classe média duas subclasses. A classe II

correspondente à classe média de nível mais baixo (51-74%) e a classe III

correspondente à classe média de nível mais elevado (75-100%). À classe

trabalhadora (17-50%) atribuiu-se o grau I. Os alunos frequentavam todos a

mesma escola e a mesma turma. Pretendeu-se, ainda, que, tanto no grupo dos

rapazes como no grupo das raparigas e para as duas classes sociais (trabalhadora

e média), estivessem representados alunos com aproveitamento fraco/médio e

alunos com aproveitamento elevado/muito elevado. O quadro 1 representa a

distribuição dos alunos por género, classe social e aproveitamento escolar.

24PrP + HaP + PrM + HaM x 100.

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Quadro 1 - Caracterização geral da amostra no que se refere às variáveis género, idade, aproveitamento escolar e nível sócio-económico da família.

CARACTERÍSTICAS DA AMOSTRA

ALUNOS GÉNERO

(G)

IDADE

(I)

APROVEITAMENTO

(Ap)

NÍVEL SÓCIO ECONÓMICO DA FAMÍLIA

(NSEF)

Sofia GF 12 ApE II

Raquel GF 12 ApB I

Sara GF 12 ApE III

Sónia GF 13 ApB III

Miguel GM 13 ApE I

Carlos GM 13 ApB I

Nuno GM 12 ApE III

Paulo GM 12 ApB III

3. O CONTEXTO EM ANÁLISE

Consideram-se aqui, por um lado, a descrição dos módulos que foram usados

na investigação e uma breve caracterização da exposição e do centro de ciência onde

se encontravam e, por outro, a caracterização sociológica da relação alunos-

módulos.

3.1. Os Módulos

O trabalho empírico foi desenvolvido no Pavilhão do Conhecimento-Ciência

Viva, situado em Lisboa. De entre as exposições patentes, no momento da

investigação, seleccionaram-se dois módulos participativos – o Balão de Ar Quente

(figura 1.A e B) e o Foguetão de Hidrogénio (figura 1.C e D) - pertencentes à

exposição “Vê, Faz e Aprende”. Qualquer um dos dois módulos envolvia, apenas,

duas actividades de manipulação: carregar em dois botões, no caso do Balão de Ar

Quente, e rodar um manípulo e carregar num botão, no caso do Foguetão de

Hidrogénio.

Relativamente aos conceitos envolvidos em cada módulo, no caso do balão

identificou-se a Lei de Charles e no caso do foguetão, a constituição da molécula da

água, o conceito de combustível e o de electrólise da água.

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A

1 - Fio condutor; 2 - Balão; 3 - Painel de botões e informações.

B

1- Nome do Módulo; 2- Monitor da subida de temperatura; 3- Botão para fazer aquecer o ar; 4- Botão para desprender o balão; 5- Sequência de procedimentos; 6- Explicação do que acontece.

C

D

1- Fio condutor do projéctil; 2- Projéctil; 3- Monitor da contagem decrescente; 4- Recipiente com água; 5- Eléctrodos; 6- Painel de informações; 7- Roda com manípulo branco

1- Sequência de acontecimentos; 2- Nome do módulo; 3- Indicador de combustível; 4- Botão para disparar o projéctil; 5- Descrição do que acontece.

Figura 1 – O Balão de Ar Quente (A – Aspecto geral; B – Pormenor do painel n.º 3) e o Foguetão de

Hidrogénio (C – Aspecto geral; D – Pormenor do painel n.º 6).

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3.2. A relação sociológica aluno-módulo

Os centros de ciência possuem uma função pedagógica, à semelhança do

que acontece com a escola, embora distinta. O contexto das exposições

interactivas pode ser considerado, à semelhança do contexto de sala de aula,

como uma prática pedagógica, determinando uma relação particular entre os

sujeitos presentes nesse contexto. Diferentes modalidades de código pedagógico,

estão subjacentes a diferentes práticas pedagógicas, as quais serão mais ou

menos favoráveis aos alunos dos diferentes estratos sociais.

Em termos sociológicos, o modelo que orientou a caracterização desta

prática pedagógica foi extraído de Morais et al. (1993), de Morais, Neves et al.

(2000) e de Morais e Neves (2001). Segundo este modelo, uma prática

pedagógica pode ser analisada em termos de relações de poder e de relações de

controlo, ou seja, em termos de classificação (C) e de enquadramento (E). A

classificação refere-se às relações de poder e indica o grau de manutenção de

fronteiras entre categorias; é fraca quando as fronteiras estão esbatidas e forte

quando as fronteiras estão bem delimitadas. O enquadramento refere-se às

relações de controlo e indica o grau de comunicação entre categorias; é fraco

quando as categorias inferiores têm alguma forma de controlo nessa relação e

forte quando a categorias superiores têm o controlo na relação.

Foram usados quatro valores de classificação e de enquadramento, numa

escala que ia desde muito fraco a muito forte (C--, C-, C+, C++ e E--, E-, E+, E++)

em que os sinais (++) indicam graus relativos de muito forte

classificação/enquadramento e os sinais (--) referem-se a graus relativos de

muito fraca classificação/enquadramento. Os valores (+) e (-) indicam graus

intermédios daqueles. Tendo presente que um dos aspectos fulcrais desta

investigação assentou na relação entre os sujeitos envolvidos, mais propriamente

na forma de comunicação entre sujeitos (o transmissor e o aquisidor), a

caracterização do contexto foi, também, realizada neste âmbito.

Analisaram-se somente, as relações existentes entre os 8 alunos e os 2

módulos escolhidos, deixando de fora todos os outros módulos da exposição. No

entanto, convém frisar que, ao olhar para a exposição como um todo, se

verificava uma fronteira nítida entre os diferentes módulos expositivos que a

constituem, ou seja, cada módulo apresentava-se como único na exposição

encerrando um determinado poder específico distinto do dos outros. Isto

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verificou-se, quer entre os discursos presentes nos módulos quer entre os espaços

relativos a cada módulo, sendo, no entanto, mais acentuada a fronteira na relação

entre discursos. Os únicos critérios que presidiram à disposição dos módulos na

sala de exposições foram a sensibilidade estética dos organizadores e o grau de

atracção dos módulos, ou seja, os módulos foram distribuídos pela sala de acordo

com a sensibilidade da equipa que organizou a exposição, tendo-se a

preocupação de distribuir os módulos com menor capacidade de atracção por

pontos mais estratégicos da sala de exposições e os de maior capacidade de

atracção por locais mais discretos, não existindo nenhuma preocupação em

estabelecer qualquer conexão quando se passa de um módulo para outro - cada

módulo vale por si mesmo. Isto significa que, começar por visitar um módulo e

seguir um determinado percurso e começar por qualquer outro módulo e realizar

um outro percurso, não tinha qualquer significado para quem organizou a

exposição. Ao olhar a exposição no seu conjunto não se encontrava nenhum fio

condutor entre os diferentes módulos. As áreas científicas, os temas, os factos

e/ou os conceitos presentes em cada módulo não apresentavam interligação pré-

concebida. A classificação era forte entre os diferentes módulos da exposição.

Um aspecto peculiar da relação alunos-módulos é que o transmissor não

está visível aos olhos do aquisidor. O transmissor, enquanto indivíduo ou equipa

de especialistas, aparecia representado na forma de um módulo (de um objecto).

Trata-se de um transmissor invisível para o aquisidor - os alunos - da mensagem

que a equipa responsável pela concepção de cada módulo expositivo pretende

transmitir aos visitantes. Estes encontravam-se, aquando da visita ao museu de

ciência, em frente de módulos que não eram mais do que transmissores

invisíveis, possuidores de determinadas mensagens. Essas mensagens poderiam

ou não ser recebidas pelos visitantes, enquanto aquisidores, dependendo da sua

orientação específica de codificação. Contudo, era possível, através do “aspecto”

escolhido pelos transmissores para se “apresentarem em público”- o módulo

participativo -, inferir as características sociológicas da relação transmissor -

aquisidor.

No que se refere às relações de controlo e, em particular à selecção,

verifica-se que os alunos não têm qualquer participação na escolha dos

temas/conteúdos que aparecem nos módulos sendo essa selecção da total

responsabilidade da equipa que concebeu os módulos. Desta forma, o

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enquadramento é bastante forte (E++). Quando se considera a sequência dos

conceitos, verifica-se que os alunos não podem interferir nela. Isto deve-se ao

facto da sequência relativa aos conteúdos ser da responsabilidade da equipa que

concebeu o módulo. Contudo, os alunos têm algum controlo na ordem de

apropriação e integração mental dos diferentes conteúdos, o que significa que

esta regra é regulada por um enquadramento forte (E+). O tempo que os alunos

dispunham para compreender esses conceitos era, no entanto, gerido pelos

alunos, pelo que a ritmagem se caracterizou como sendo bastante fraca (E--).

Relativamente aos critérios de avaliação, tanto num módulo como noutro não

está explícito, para os alunos, o que é que se espera que aprendam com cada um

deles. Desta forma, o enquadramento é bastante fraco (E--).

Quando se consideram as relações de poder, verifica-se que é a equipa

responsável pela concepção dos módulos quem definiu, através das

características dos módulos, qual o controlo que os alunos possuem na relação

transmissão de conceitos-aquisidor (alunos). Isto quer dizer que as relações de

poder transmissor-aquisidor são reguladas por uma classificação forte (C+).

O quadro 2 apresenta, de forma esquemática, as características das

relações de poder e de controlo presentes neste microcontexto.

Quadro 2 - Caracterização sociológica do micro-contexto “Compreensão de Conceitos”.

MICRO-CONTEXTO COMPREENSÃO DE CONCEITOS

RELAÇÃO MÓDULO - ALUNO

MÓDULOS RELAÇÕES DE PODER

(C) RELAÇÕES DE CONTROLO (E)

REGRAS DISCURSIVAS

SELECÇÃO SEQUÊNCIA RITMAGEM CRITÉRIOS

Balão de Ar Quente C+ E++ E+ E- - E- -

Foguetão de Hidrogénio C+ E++ E+ E- - E- -

4. DESCRIÇÃO E APLICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS

Wagensberg (1998) considera que para que a interactividade seja total são

necessários três ingredientes: a interactividade manual, a interactividade mental e a

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interactividade emocional. Apesar de ser relacionada com os resultados obtidos ao

nível da interactividade manual e emocional, a parte da investigação aqui descrita,

refere-se à análise da interacção ao nível mental. Na concepção dos instrumentos,

considerou-se o conhecimento que os alunos revelam antes e depois da visita ao

centro de ciência, isto é antes e depois da interacção com os módulos ao nível mental.

No sentido de verificar o conhecimento que os alunos possuíam acerca dos

conceitos/fenómenos, envolvidos nos dois módulos, foram construídos dois

questionários. Visto que se pretendia trabalhar com alunos que não tivessem tido

aprendizagem formal dos conceitos/fenómenos envolvidos nos dois módulos, o

primeiro questionário tinha como finalidade obter informação acerca do

conhecimento que os alunos possuíam sobre os conceitos/factos presentes nesses

módulos. Tendo em conta o facto de terem sido identificados três conceitos, dois no

Foguetão de Hidrogénio e um no Balão de Ar Quente, o questionário incluiu três

grupos de questões. Cada grupo dizia respeito a um dos conceitos. O primeiro grupo

referia-se ao conceito de combustível, o segundo ao conceito de electrólise e o

terceiro à Lei de Charles.

As questões que apareciam neste questionário possuíam duas finalidades. Uma

era obter respostas que fornecessem dados para uma categorização posterior a ser

utilizada em quatro questões de resposta alternativa, que apareciam no segundo

questionário. Outra, além daquela que estava subjacente ao primeiro grupo de

questões, era averiguar, no geral, em que medida os alunos pertencentes ao 7º ano de

escolaridade possuíam ou não os conceitos presentes nos módulos, pois um dos

pressupostos deste trabalho era que os alunos não estivessem na posse da

compreensão desses conceitos. As respostas foram analisadas e foi possível

encontrarem-se as categorias que se usaram nas respostas fechadas do segundo

questionário e que aparecem enunciadas nos quadros 5 e 6.

No sentido de se averiguar o tipo de conhecimento que os alunos possuíam

antes e depois da interacção com os módulos, foi construído um segundo questionário

com três grupos de questões. O primeiro e o segundo grupos englobavam questões

relacionadas com os fenómenos/conceitos envolvidos no Foguetão de Hidrogénio

enquanto o terceiro grupo envolvia questões relacionadas com os

fenómenos/conceitos envolvidos no balão.

Tendo em conta que o objectivo do questionário era averiguar o tipo e o grau

de conhecimento que os alunos possuíam antes e depois de interactuarem com os

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módulos, cada grupo de questões continha duas partes distintas. A primeira consistia

numa questão de escolha múltipla, com quatro opções de resposta onde se prendia

averiguar, dentro das quatro categorias propostas, a categoria de resposta seleccionada

pelo aluno. A segunda parte consistia numa questão de resposta aberta onde se

pretendia que os alunos argumentassem o porquê da opção seleccionada, de forma a

verificar se os alunos compreendiam ou não os conceitos. A razão deste tipo de

questão prendeu-se com o facto dos alunos poderem expressar livremente a sua

justificação.

Em cada uma das questões de resposta fechada apresentavam-se quatro opções

que obedeciam a um mesmo padrão:

- resposta do senso comum que não envolvia a informação científica disponível nos

módulos (SC);

- resposta errada, que envolvia conhecimento científico emitido de forma incorrecta

(E);

- resposta incompleta que, embora envolvendo informação de natureza científica, não

continha toda a informação, disponível através da interacção com o respectivo

módulo, para ser considerada correcta (I);

- resposta correcta em que estava envolvida a informação de natureza científica

disponível no respectivo módulo, de um modo considerado completo e adequado

ao nível etário dos alunos (C);

Em cada uma das questões de resposta fechada o conjunto das quatro opções foi

apresentado com uma ordem diferente nos três grupos. Esta categorização foi

inspirada no trabalho de Afonso (1995).

As categorias incluídas no questionário, juntamente com as explicações dadas

pelos alunos, permitiram inferir acerca do tipo de conhecimento que os alunos

possuíam sobre os conteúdos presentes nos dois módulos. Além disso, permitiram

compreender o seu significado sociológico, em termos de orientação específica de

codificação. Quer as opções apresentadas na primeira parte de cada grupo de questões

quer a resposta livre presente na segunda parte, permitiram inferir da presença ou

ausência de regras de reconhecimento e/ou realização, tendo em conta o seu

significado sociológico em termos de orientação específica de codificação. Desta

forma, como na primeira parte de cada grupo de questões, os alunos, quando

respondiam, apenas tinham de seleccionar os textos adequados (escolher a opção

correcta), não lhes sendo pedido que produzissem os textos, apenas era possível

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averiguar acerca da posse de regras de reconhecimento e de realização passiva.

Quando era pedido aos alunos que, na segunda parte de cada grupo de questões,

produzissem os textos adequados (explicar o conceito) dentro dos respectivos

contextos, infere-se quanto à presença ou ausência da realização activa.

O quadro 3 evidencia a correspondência entre o tipo de questões e a sua

relação com a orientação específica de codificação. Os sinais (+) e (-) significam

presença e ausência, respectivamente, de cada uma das regras.

Quadro 3 – Correspondência entre o tipo de respostas dadas pelos alunos e a posse de regras de reconhecimento e de realização.

RELAÇÃO ENTRE TIPOLOGIA DE RESPOSTAS DOS ALUNOS E OEC

RESPOSTAS REGRAS DE

RECONHECIMENTO REGRAS DE REALIZAÇÃO

PASSIVA REGRAS DE

REALIZAÇÃO ACTIVA

OPÇÃO (SC) -

OPÇÃO (E) - / + -

OPÇÃO (I) + - -

OPÇÃO (C) + +

JUSTIFICAÇÃO CORRECTA

+ + +

Se o aluno seleccionava uma opção do senso comum (SC), isto

significava que, em termos sociológicos, não possuía regras de reconhecimento,

pois não conseguia identificar o contexto. Se escolhia a opção errada (E), ou ele

não reconhecia o contexto e não sabia qual o texto a produzir, ou então

reconhecia o contexto, mas não sabia qual o texto que devia produzir. Esta

última situação podia, também, verificar-se quando o aluno escolhia uma opção

que estava incompleta (I), ou seja, o aluno reconhecia o contexto e conseguia

seleccionar o texto, mas não de uma forma totalmente adequada. Caso o aluno

escolhesse a opção correcta, considerava-se que ele reconhecia o contexto e

conseguia seleccionar o texto adequado. Porém, neste caso, como em todos os

anteriores, nada indicava se o aluno produzia correctamente o texto, ou seja, se

as razões que o levaram a ter escolhido a opção correcta eram legítimas, dentro

do contexto, ou não. Assim, não se tinha a certeza de que o aluno, embora

possuísse regras de realização passiva, tivesse regras de realização activa. A

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justificação dada pelos alunos à escolha dessa opção foi o indicador da posse

dessas regras.

O questionário foi aplicado aos 4 alunos que participaram nas duas fases

da pilotagem, sofrendo, de cada vez, os ajustes necessários. Depois de pilotado,

foi aplicado aos 8 alunos da amostra experimental quer antes quer depois da

visita ao museu de ciência.

5. RESULTADOS

Na análise dos resultados considerou-se, por um lado, a interacção com o

balão e com o foguetão e, por outro, a influência de 3 características sociológicas

dos alunos nessa interacção.

5.1. Relativamente ao Balão de Ar Quente

A lei de Charles diz que, se a pressão se mantém igual, o volume de um

gás aumenta e diminui quando a sua temperatura aumenta e diminui,

respectivamente. Isto permite explicar o fenómeno de subida e descida de um

balão de ar quente. Através da energia libertada pela combustão do gás, o ar que

existe no interior do balão é aquecido. Assim sendo, o ar expande-se e ocupa

mais espaço, aumentando o volume, mas não a sua massa. A densidade do balão

é agora mais baixa que a densidade do ar envolvente, permitindo ao balão subir.

De modo a facilitar a compreensão desta lei, foram considerados dois

estádios: primeiro, a subida do balão e, segundo, a descida do balão.

Os alunos foram sujeitos ao questionário, antes e depois da visita ao

centro de ciência, baseado em quatro questões, duas relativas ao fenómeno da

subida do balão e outras duas relativas ao fenómeno de descida do balão. A

primeira questão consistia na escolha de uma de quatro opções, enquanto a

segunda consistia na justificação dessa escolha. As categorias incluídas na

primeira questão permitiam não só analisar a natureza das concepções que os

sujeitos apresentavam como também compreender o seu significado sociológico.

Para responderem ao questionário, os alunos tinham de reconhecer o contexto,

ou seja, ter regras de reconhecimento e, por outro lado, seleccionar os textos

adequados. Neste último caso, era então possível averiguar acerca da presença ou

ausência de regras de realização passiva. Apenas na segunda questão se pedia

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que os alunos produzissem o texto, sendo, neste caso, possível inferir acerca das

regras de realização activa. O quadro 4 exprime os resultados obtidos em termos

das respostas escolhidas pelos alunos (SC, E, I e C) e da sua justificação (errada

ou correcta), assim como o seu significado sociológico, em termos de orientação

específica de codificação.

Quadro 4 - Concepções dos alunos relativamente aos fenómenos de subida e descida do balão e seu significado sociológico em termos de OEC.

Legenda:

Tipos de concepções para a explicar a subida do balão: SC - ( Senso comum): O balão sobe porque é empurrado pelo vento. E - (Errada): O balão sobe porque tem um motor a trabalhar que o empurra. I - (Incompleta): O balão sobe porque tem, no seu interior, ar quente. C - (Correcta): O balão sobe porque tem, no seu interior, ar mais quente que o ar envolvente. Tipos de concepções para a explicar a descida do balão: SC - ( Senso comum): O balão desce porque perdeu o ar que tinha no seu interior. E - (Errada): O balão desce porque o motor parou de trabalhar. I - (Incompleta): O balão desce porque está cheio de ar frio. C - (Correcta): O balão desce porque tem, no seu interior , ar mais frio que o ar envolvente. Justificação: Er - Errada; Cr - Correcta; (OEC) Orientação específica de codificação: RR - Regras de reconhecimento; RRP - Regras de realização passiva; RRA - Regras de realização activa; Símbolos: (�) – Antes da visita ao Centro de Ciência; (�) – Depois da visita ao Centro de Ciência; (����) – Sentido da evolução.

No que respeita à subida do balão, antes da visita ao museu, verifica-se

que as raparigas, mais que os rapazes, possuíam concepções do tipo C. Três das

raparigas, a Sofia, a Raquel e a Sara, escolheram a opção correcta, enquanto no

grupo dos rapazes, apenas o Miguel escolheu a opção correcta. Por outro lado,

verifica-se que três dos alunos com aproveitamento elevado (a Sofia, a Sara e o

Miguel) escolheram a opção correcta, enquanto nos alunos com aproveitamento

baixo, apenas a Raquel escolheu a opção correcta. Relativamente ao nível sócio-

CONCEPÇÕES DOS ALUNOS E OEC

SUBIDA DO BALÃO DESCIDA DO BALÃO

CATEGORIAS JUSTIFIC. OEC CATEGORIAS JUSTIFIC. OEC ALUNOS

SC E I C Er Cr RR RRP RRA SC E I C Er Cr RR RRP RRA

Sofia � � � � � � � � − � � � � � � � � � − �

Raquel � � � � � � � � � � � � − −

Sara � � � � � � � � − � � � � � � � � �

Sónia � � � � � � − � − − � � � � − � − �

Miguel � � � � � � � � − � � � � � � � � � − �

Carlos � � � � − − � � � � − −

Nuno � � � � � � − � − � � � � � − � − −

Paulo � � � � � � − � − − � � � � � � � � − −

CONCEPÇÕES DOS ALUNOS E OEC

SUBIDA DO BALÃO DESCIDA DO BALÃO

CATEGORIAS JUSTIFIC. OEC CATEGORIAS JUSTIFIC. OEC ALUNOS

SC E I C Er Cr RR RRP RRA SC E I C Er Cr RR RRP RRA

Sofia � � � � � � � � − � � � � � � � � � − �

Raquel � � � � � � � � � � � � − −

Sara � � � � � � � � − � � � � � � � � �

Sónia � � � � � � − � − − � � � � − � − �

Miguel � � � � � � � � − � � � � � � � � � − �

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Nuno � � � � � � − � − � � � � � − � − −

Paulo � � � � � � − � − − � � � � � � � � − −

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económico, verifica-se que foram os alunos das classes mais desfavorecidas

(Sofia, Raquel e Miguel) os que mais seleccionaram concepções do tipo C. Deste

modo, todos os alunos, à excepção do Carlos, possuíam regras de

reconhecimento. No entanto, destes, apenas a Sofia, a Raquel, a Sara e o Miguel

possuem regras de realização passiva. Verifica-se, também, que nenhum dos

alunos soube justificar a subida do balão quando tem ar mais quente que o

envolvente, mostrando desta forma não possuir regras de realização activa.

Quando se observam os dados obtidos após a visita, verifica-se que foram

os alunos com aproveitamento elevado ou seja a Sofia, a Sara, o Miguel e o

Nuno, os únicos que evoluíram no sentido de revelarem ter adquirido o conceito,

e que as variáveis classe social e género não mostraram ter qualquer influência

nessa evolução. Em termos sociológicos, todos os alunos, depois da visita, à

excepção do Carlos, mostraram continuar estar na posse de regras de

reconhecimento e de realização passiva. Destes, apenas os alunos com

aproveitamento elevado, ou seja, a Sofia, a Sara, o Miguel e o Nuno mostraram

estar, ainda, na posse de RRA, o que quer dizer que justificaram correctamente

porque é que o balão subia.

Relativamente à descida do balão, verifica-se a inexistência de uma

evolução tão significativa como a observada em relação à subida do balão. Antes

da visita, verifica-se que o maior número de concepções do SC foi proveniente

dos alunos com aproveitamento baixo, concretamente da Raquel, da Sónia e do

Carlos, sendo apenas uma de um aluno com aproveitamento elevado, o Nuno.

Por outro lado, a maior parte das respostas C eram de alunos com

aproveitamento elevado, especificamente da Sofia, da Sara e do Miguel, sendo

apenas uma de um aluno com aproveitamento baixo, o Paulo. Em termos de

orientação específica de codificação, apenas a Sofia, a Sara, o Miguel e o Paulo

revelaram ter regras de reconhecimento e também de realização passiva. A

componente activa da realização não foi identificada em nenhum aluno.

Após a visita, destacaram-se a Sónia e o Nuno por terem alterado a sua

resposta para uma resposta do tipo C e I, respectivamente, e o Miguel e a Sofia

por terem justificado correctamente a descida do balão por acção do ar frio. Os

restantes alunos não demonstraram qualquer alteração em relação a antes da

visita. Isto significa que o Miguel e a Sofia revelaram, nesse momento, estar na

posse das regras de realização activa, a Sónia na posse de regras de

Page 16: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

15

reconhecimento e realização passiva e o Nuno, apenas, na posse de regras de

reconhecimento.

O quadro 5 representa os resultados globais obtidos quer antes quer

depois da visita ao centro de ciência, quando se considera a Lei de Charles como

um todo, ou seja as duas partes em que foi considerada neste estudo: a subida do

balão e a sua descida, posterior. Os resultados relativos às categorias das

respostas e à justificação dada foram designados por dois símbolos distintos. A

cruz (�) diz respeito aos resultados da primeira parte, ou seja, quando o balão

sobe e o círculo (•) diz respeito aos resultados da segunda parte, ou seja, quando

o balão desce. O significado sociológico destes resultados, ou seja a OEC, foi

atribuído a partir da soma da orientação específica de codificação de cada uma

das partes. Para esse efeito, consideraram-se dois graus em cada uma das regras:

quando o aluno tinha, por exemplo, RR na primeira parte e ausência de RR na

segunda, ou vice-versa, o grau de RR era I; caso tivesse RR nas duas possuía RR

de grau II. (I significa menor reconhecimento e II maior reconhecimento)

Quadro 5 - Concepções dos alunos relativamente ao balão e seu significado sociológico em termos de OEC, antes e depois da interacção.

INTERACÇÃO ALUNOS – BALÃO DE AR QUENTE AO NÍVEL DA COMPREENSÃO DE CONCEITOS

ALUNOS

ANTES DA INTERACÇÃO DEPOIS DA INTERACÇÃO

CATEGORIAS JUSTIFIC. OEC CATEGORIAS JUSTIFIC. OEC

SC E I C Er Cr RR RRP RRA SC E I C Er Cr RR RRP RRA

Sofia � � � � II II - � � � � II II II

Raquel � � � � I I - � � � � I I -

Sara � � � � II II - � � � � II II I

Sónia � � � � I - - � � � � II II -

Miguel � � � � II II - � � � � II II II

Carlos � � � � - - - � � � � - - -

Nuno � � � � I - - � � � � II I I

Paulo � � � � II I - � � � � II II -

Legenda:

Tipos de concepções para a explicar a subida do balão: SC - ( Senso comum): O balão sobe porque é empurrado pelo vento. E - (Errada): O balão sobe porque tem um motor a trabalhar que o empurra. I - (Incompleta): O balão sobe porque tem, no seu interior, ar quente. C - (Correcta): O balão sobe porque tem, no seu interior , ar mais quente que o ar envolvente.

Tipos de concepções para a explicar a descida do balão: SC - ( Senso comum): O balão desce porque perdeu o ar que tinha no seu interior. E - (Errada): O balão desce porque o motor parou de trabalhar. I - (Incompleta): O balão desce porque está cheio de ar frio. C - (Correcta): O balão desce porque tem, no seu interior , ar mais frio que o ar envolvente.

Justificação: Er - Errada; Cr - Correcta; (OEC) Orientação específica de codificação: RR - Regras de reconhecimento; RRP - Regras de realização passiva; RRA - Regras de realização activa; Símbolos: (�) – Subida do balão; (�)- Descida do balão.

Page 17: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

16

Relativamente ao enunciado na Lei de Charles, a análise das concepções

das crianças revela que, antes da visita ao museu de ciência, ambos os géneros

valorizaram as opções que envolviam concepções de natureza escolar, ou seja, E,

I e C. Foi de facto este tipo de concepções o mais valorizado, sendo as opções

que envolviam conhecimento de tipo C as mais escolhidas pelas raparigas em

relação a qualquer das outras categorias. Tanto nos grupos sociais de NSEFB

como nos de NSEFE, foram as raparigas que apresentaram maior número de

respostas de tipo C, quer antes quer depois da visita ao museu de ciência. Em

relação ao aproveitamento escolar, verifica-se que foram os alunos com ApE

aqueles em que predominaram as respostas do tipo C.

Analisando as justificações dadas, observa-se que, antes da visita ao

museu, nenhum aluno estava na posse da justificação correcta, ou seja, não sabia

porque é que o ar mais quente e mais frio que o ar envolvente fazia subir e

descer, respectivamente, o balão. Depois da visita, apenas os alunos com

aproveitamento elevado se distinguiram, no sentido de justificar correctamente a

sua opção.

Estes resultados sugerem que, antes da visita, as crianças provenientes de

família com nível sócio-económico elevado e baixo revelaram maior dificuldade

ao nível da realização do que ao nível do reconhecimento. Embora esta diferença

permaneça após a visita ao museu, verifica-se que se atenua. Nos alunos com

aproveitamento elevado, verificou-se um maior índice de reconhecimento e de

realização. Aliás, foi este grupo de alunos aquele que, após a visita, revelou

exclusivamente realização activa, mostrando, assim, a influência do uso do

módulo na aquisição deste tipo de regras. Por outro lado, foi nas classes mais

desfavorecidas que se verificou a maior ausência de reconhecimento e de

realização porque foram estas crianças que deram simultaneamente mais

respostas de senso comum e menos respostas correctas ao contexto da Lei de

Charles. As concepções e, em termos sociológicos, a orientação específica de

codificação revelam-se, deste modo, relacionadas com o contexto conceptual da

aprendizagem científica.

Embora este contexto da Lei de Charles seja de certo modo comum aos

alunos, os princípios responsáveis pela subida e descida do balão não faziam

parte do currículo escolar até ao momento da realização da investigação. A não

abordagem deste assunto nas aulas juntamente com a falta de informação ou

Page 18: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

17

mesmo a posse de informação incorrecta, podem estar na base dos resultados

obtidos. Da comparação dos dois momentos de avaliação de conhecimentos,

verifica-se que as concepções que envolviam conhecimento escolar foram mais

valorizadas do que as opções envolvendo conhecimento de senso comum.

Embora os resultados obtidos através das tabelas não seja significativo,

devido à amostra ser reduzida em termos quantitativos, verificaram-se diferenças

explícitas em relação ao aproveitamento escolar, e não tão explícitas, mas

perceptíveis, em relação ao género e ao grupo social. Estes resultados permitem,

em certa medida, apoiar a hipótese de existir uma relação entre a compreensão

de conceitos científicos e as três variáveis em estudo: classe social, género e

aproveitamento escolar. Por outro lado, apoiam, em certa medida, a hipótese de

os módulos participativos promoverem a compreensão de conceitos científicos.

5.2. Relativamente ao Foguetão de Hidrogénio

Foram três os aspectos considerados em relação a este módulo. Primeiro,

a constituição da molécula da água; segundo, o conceito de electrólise da água e,

por último, exemplos/definição de combustível.

Relativamente ao primeiro, pretendeu-se saber se os alunos sabiam a

constituição da molécula da água. Em relação ao conceito de electrólise,

questionaram-se os alunos sobre o modo de separar os seus elementos. Dentro

das quatro respostas alternativas encontrava-se a correcta - transportando

corrente eléctrica para dentro e fora da água. Ainda sobre este último item,

pediu-se aos alunos para explicarem o modo como os elementos podiam ser

separados por esse processo, pretendendo-se desta forma averiguar se sabiam o

modo como os elementos se separavam. No que diz respeito à definição de

combustível, questionaram-se, primeiramente, os alunos sobre exemplos de

combustível, fornecendo-lhes quatro alternativas, onde constavam uma que

continha um combustível corrente e outra um não corrente e que está

directamente relacionado com o módulo, o Hidrogénio. Em seguida, pediu-se

para justificar porque é que essas substâncias eram combustíveis.

Os resultados obtidos encontram-se expostos no quadro 6.

Page 19: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

18

Quadro 6 - Concepções dos alunos relativamente à constituição da molécula da água, exemplos de combustível e processo de electrólise da água e seu significado sociológico em termos de OEC.

Legenda: Concepções relativas à constituição da molécula da água

SC - (Senso comum) - Oxigénio E - (Errada) - Carbono e Hélio I - (Incompleta) - Hidrogénio C - (Correcta) - Hidrogénio e Oxigénio

Concepções relativas aos exemplos de combustível SC - Gasolina, E - Água e Dióxido de Carbono I - Hidrogénio C - Hidrogénio e gasolina

Concepções relativas ao processo de electrólise da água SC (Senso comum) - Deixando ferver a água E (Errada) - Utilizando calor I (Incompleta) - Transportando corrente eléctrica para dentro da água C (Completa) - Transportando corrente eléctrica para dentro e fora da água

Justificação: Er - Errada; Cr - Correcta; (OEC) Orientação específica de codificação: RR - Regras de reconhecimento; RRP - Regras de realização passiva; RRA - Regras de realização activa; A – Antes da visita; D – Depois da visita; Símbolos: (�) - Informação obtida antes da visita ao centro de ciência; (�) - Informação obtida depois da visita ao centro de ciência; (����) – Sentido da evolução.

No que respeita à constituição da molécula da água, verifica-se que, antes

da visita, foram os alunos com aproveitamento elevado, ou seja, a Sofia, a Sara,

o Miguel e o Nuno, que estavam na posse da resposta correcta e, em termos

sociológicos, na posse das RR e RRP. Apenas o Carlos, um aluno com

aproveitamento fraco, demonstrou estar na posse da resposta correcta.

Relativamente a este aluno, verificou-se que, depois da visita, a sua resposta foi

alterada no sentido retrógrado, ou seja, escolheu a alternativa do tipo SC. Ao ser

entrevistado sobre esta modificação, respondeu que “... o Hidrogénio estava

INTERACÇÃO ALUNOS – FOGUETÃO DE HIDROGÉNIO AO NÍVEL DA COMPREENSÃO DE CONCEITOS

CONSTITUIÇÃO DA MOLÉCULA DA ÁGUA

EXEMPLOS DE COMBÚSTIVEL

ELECTRÓLISE DA ÁGUA OEC

TIPOS DE RESPOSTA TIPOS DE RESPOSTA JUST. TIPOS DE RESPOSTA JUST. RR RRP RRA ALUNOS

SC E I C SC E I C Er Cr SC E I C Er Cr A D A D A D

Sofia � � � � � � � � � � I II I II - I

Raquel � � � � � � � � � � - - - - - -

Sara � � � � � � � � � � II II II II - -

Sónia � � � � � � � � – – I II - - - -

Miguel � � � � � � � � � � I III I II - I

Carlos � � � � � � � � � � I - I - - -

Nuno � � � � � � � � � � I II I I - -

Paulo � – � � � � � � � � � � - II - II - -

CONCEPÇÕES DOS ALUNOS E OECINTERACÇÃO ALUNOS – FOGUETÃO DE HIDROGÉNIO AO NÍVEL DA COMPREENSÃO DE CONCEITOS

CONSTITUIÇÃO DA MOLÉCULA DA ÁGUA

EXEMPLOS DE COMBÚSTIVEL

ELECTRÓLISE DA ÁGUA OEC

TIPOS DE RESPOSTA TIPOS DE RESPOSTA JUST. TIPOS DE RESPOSTA JUST. RR RRP RRA ALUNOS

SC E I C SC E I C Er Cr SC E I C Er Cr A D A D A D

Sofia � � � � � � � � � � I II I II - I

Raquel � � � � � � � � � � - - - - - -

Sara � � � � � � � � � � II II II II - -

Sónia � � � � � � � � – – I II - - - -

Miguel � � � � � � � � � � I III I II - I

Carlos � � � � � � � � � � I - I - - -

Nuno � � � � � � � � � � I II I I - -

Paulo � – � � � � � � � � � � - II - II - -

CONCEPÇÕES DOS ALUNOS E OEC

Page 20: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

19

relacionado com o ar...”. Esta confusão de ideias parece ter que ver com o facto

de, na questão que se referia aos combustíveis, aparecer o Hidrogénio e do aluno

o associar, exclusivamente, a um gás e não a um líquido, como referia na

entrevista: “como na resposta anterior eu disse que o Hidrogénio estava

relacionado com o ar...”. Também aqui, à semelhança do que já sucedeu no

Balão de Ar Quente, foi a variável aproveitamento que se destacou. Depois da

visita, apenas o Paulo registou uma evolução no sentido de passar de uma

resposta E para uma resposta C, pois, de resto, à excepção do caso já referido

com o Carlos, não se verificaram mudanças em relação a antes da visita.

Em termos de OEC, antes da visita ao museu, apenas a Raquel e o Paulo

demonstraram não possuir regras de reconhecimento e de realização. A aquisição

destas últimas está associada, maioritariamente, aos alunos com aproveitamento

elevado, ou seja, a Sofia, a Sara, o Miguel e o Nuno. Apenas o Carlos, um aluno

com aproveitamento fraco, demonstrou possuí-las. Após a visita, saliente-se o

caso do Paulo que revelou reconhecer e realizar.

No que se refere ao conceito de combustível, verifica-se que, antes da

visita, todos os alunos escolheram a resposta tipo SC, à excepção da Sara que

escolheu uma resposta do tipo C. Em relação à justificação, todos os alunos o

fizeram erradamente. Em termos sociológicos, isto significa ausência de RR em

todos os alunos, à excepção da Sara, que demonstra estar na posse de RR e RRP.

Depois da visita ao museu, verificou-se uma evolução positiva na Sofia, no

Miguel e no Paulo, os quais passaram de uma resposta do SC para uma resposta

tipo C, o que demonstra que adquiriram, com a visita, as RR. Dois deles, a Sofia

e o Miguel, justificaram, ainda, correctamente, evoluindo neste aspecto em

relação a antes da visita. Assim, estes dois alunos demonstraram estar, agora, na

posse de RRA.

No que se refere à electrólise da água, antes da visita ao museu, verificou-

se que todos os alunos escolheram respostas do tipo SC, o que significa ausência

de RR e RRP. Por outro lado, todos justificaram erradamente revelando não

possuir RRA. Depois da visita, apenas três alunos, a Sónia, o Miguel e o Nuno,

evoluíram no sentido da escolha de uma resposta I, o que demonstra estarem na

posse de RR.

Do ponto de vista da orientação específica de codificação (OEC),

verifica-se que, antes da visita ao museu, o grau de reconhecimento dos alunos

Page 21: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

20

foi muito reduzido. Isto significa que, em relação às concepções dos alunos, as

concepções do SC foram as mais valorizadas. Verificou-se, ainda, que a Raquel e

o Paulo não demonstraram, nesse momento, ter regras de reconhecimento. Em

relação às regras de realização passiva, verificou-se que, à excepção do Carlos,

que tem aproveitamento baixo, todos os alunos com aproveitamento elevado, ou

sejam, a Sofia, a Sara, o Miguel e o Nuno, estavam na sua posse, embora num

grau reduzido (grau I e II). Isto significa que neste grupo de alunos se situava o

maior número de concepções do tipo C. Verificou-se, ainda, uma ausência total

de realização activa em qualquer dos alunos.

Após a visita, a evolução registada não atingiu grande expressão, tendo

em conta que a maior parte das alterações se deu do grau I para o grau II e que o

grau III, o mais elevado, aparece apenas num dos registos. Destacaram-se a

Sofia, a Sónia, o Miguel e o Nuno, que revelaram, agora, um nível de

reconhecimento superior a antes da visita. No caso da Sofia, da Sónia e do Nuno,

verificou-se um incremento de um grau, passando de grau I para grau II e, no

caso do Miguel, um incremento de dois graus, passando de grau I para grau III.

No caso da realização passiva, destacaram-se a Sofia e o Miguel por registarem

um aumento de um grau, passando de grau I para grau II. E, no caso da

realização activa, somente nestes dois casos é que se verificou registo da sua

posse, embora num grau reduzido (grau I).

O Carlos, foi um caso particular, pelo facto já abordado em relação à

constituição da molécula da água. Ele revelou ter reconhecimento e realização

passiva, antes da visita ao museu, embora num grau reduzido (grau I). No

entanto, após a visita, pareceu “perdê-las”. Este facto, embora pareça insólito,

revela-se muito interessante porque demonstra a influência da interacção com os

módulos na alteração das concepções dos alunos. Neste caso, parece confirmar-

se a posição de alguns autores que defendem que os módulos participativos e

interactivos têm a capacidade de induzir à criação de concepções alternativas.

O Paulo, apesar de antes da visita, não revelar possuir nem regras de

reconhecimento nem regras de realização, destacou-se pelo facto de após a

interacção com o foguetão, demonstrar estar na posse quer de regras de

reconhecimento (grau II) quer de regras de realização passiva (grau II).

Analisando as justificações dadas, verificou-se que, antes da visita ao

museu, nenhum dos alunos justificou qualquer das opções relativas a cada um

Page 22: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

21

dos três conteúdos, o que significa ausência de realização activa. Contudo, após

a interacção com o foguetão, os resultados não se revelaram positivos. Apenas

dois alunos manifestaram saber justificar, mas somente em relação à definição de

combustível, demonstrando, desta forma, ter realização activa de grau I.

À semelhança do que se passou com o Balão de Ar Quente, também neste

caso se verificou que os conteúdos não faziam parte do currículo escolar dos

alunos até ao momento da investigação. A não abordagem destes assuntos nas

aulas juntamente com a falta de informação ou mesmo a posse de informação

errada podem estar na base dos resultados obtidos antes da visita. No entanto, as

características do próprio módulo poderão ter, aqui, um papel fundamental nos

resultados obtidos após a interacção. Embora neste caso os resultados não sejam

tão expressivos, eles permitem, em certa medida, apoiar a hipótese de existir

uma relação entre a compreensão de conceitos científicos e o uso de módulos

participativos.

No sentido de se perceber melhor a OEC de cada um dos alunos

relativamente à compreensão dos dois conceitos construíram-se os gráficos da

figura 2 que expressam as situações descritas nos quadros 5 e 6. Neles se pode

observar o número de vezes (grau) em que os alunos demonstraram estar na

posse de cada uma das regras.

A análise dos gráficos permite verificar que, após a interacção com os módulos, se

deu uma evolução positiva em relação ao reconhecimento. Nas raparigas, essa

evolução foi mais acentuada na Sónia; nos rapazes, no Nuno, no Miguel e no Paulo.

No que respeita à realização passiva, também se observou uma evolução semelhante.

A Sónia foi a rapariga na qual se manifestou mais eficazmente a interacção com os

módulos e, nos rapazes, foi no Paulo.

Em relação à realização activa, tendo em consideração que antes da visita não

se observou este tipo de realização, verifica-se uma evolução positiva explícita. A

Sofia distinguiu-se no grupo das raparigas e o Miguel no dos rapazes.

Page 23: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

22

A

0

1

2

3

4

5

Sofia Raquel Sara Sónia Miguel Carlos Nuno Paulo

Alunos

Graude

Reconhecimento

B

0

1

2

3

4

5

Sofia Raquel Sara Sónia Miguel Carlos Nuno Paulo

Alunos

Graude

RealizaçãoPassiva

C

0

1

2

3

4

5

Sofia Raquel Sara Sónia Miguel Carlos Nuno Paulo

Alunos

Graude

RealizaçãoActiva

Figura 2 – Comparação do (A) grau de reconhecimento; (B) grau de realização activa; (C) grau de

realização activa, obtidos antes e depois da visita ao centro de Ciência.

Antes da visita

Depois da visita

Page 24: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

23

Quer antes quer depois da interacção com os módulos, os melhores resultados

foram obtidos pela Sofia, pela Sara, pelo Miguel e pelo Nuno. Nestes alunos é que se

verificaram, no geral, maiores níveis de reconhecimento e de realização. Tendo em

conta que estes alunos incluem tanto rapazes como raparigas ambos provenientes de

famílias de NSEF tanto baixo como elevado, a variável aproveitamento escolar (Ap)

manifestou-se aqui interferir significativamente. A interacção com os módulos foi

facilitada pelo aproveitamento escolar elevado (ApE).

5.3. Influência de três características sociológicas na relação entre a

compreensão de conceitos científicos e uso de módulos participativos.

No sentido de averiguar de uma forma mais explícita se existia ou não alguma

relação entre características sociológicas relacionadas com a família (nível sócio-

económico familiar - NSEF e género - G) e com a escola (Ap) e o uso dos módulos

participativos, agruparam-se as crianças em três grupos, de acordo com as três

variáveis enunciadas: nível sócio-económico, género e aproveitamento escolar.

Dentro de cada grupo, consideraram-se dois subgrupos, de acordo com as

características das crianças.

Nível sócio-económico

Em relação ao NSEF, agruparam-se as crianças de nível sócio-económico

familiar baixo (NSEFB) num grupo e as de sócio-económico familiar elevado

(NSEFE), noutro. Assim sendo, no grupo de NSEFB, incluem-se a Sofia, a Raquel, o

Miguel e o Carlos e, no grupo de NSEFE, a Sara, a Sónia, o Nuno e o Paulo.

O quadro 7 apresenta a distribuição percentual do grau de reconhecimento e

de realização obtidos em relação ao balão e ao foguetão, de acordo com o NSEF dos

alunos. Na sua construção consideraram-se os valores obtidos nos quadros 5 e 6,

fazendo corresponder a cada grau de reconhecimento ou de realização um ponto.

Como cada elemento do grupo podia obter no máximo dois pontos, o máximo de

pontos a obter por grupo seria oito. A percentagem de reconhecimento e de realização

foi calculada a partir da fracção da soma dos valores obtidos em cada grupo pelo

máximo de pontos que se pode atingir, ou seja, oito.

Relativamente ao balão, verifica-se que, antes da visita, ambos os grupos

apresentaram um reconhecimento bastante próximo (NSEFB = 63% e NSEFE =

75%), embora o grupo de alunos de NSEFE apresentasse um valor mais elevado. A

Page 25: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

24

seguir à visita ao museu, o grupo de alunos de NSEFB não experimentou nenhuma

evolução, mantendo o valor que possuía antes da visita (63%). No entanto, o grupo de

alunos de NSEFE evoluiu positivamente para um valor de 100% de reconhecimento,

registando-se 25% de aumento em relação a antes da interacção. Da análise dos

resultados verifica-se que foi o grupo de alunos de NSEFE que melhor reconheceu,

quer antes quer depois da visita ao museu. Isto significa que o impacto da interacção

com o balão se evidenciou, apenas, neste grupo, permitindo-lhe melhorar o grau de

reconhecimento.

No que se refere à realização passiva, verificou-se que, antes da visita, foi o

grupo de alunos de NSEFB que melhor realizou (63%) quando comparado com o

grupo de alunos NSEFE (25%). Contudo, depois da visita, verificou-se que foi o

grupo de NSEFE que melhor realizou (88%), evoluindo 63%, não existindo nenhuma

alteração, em relação a antes da visita, nos alunos do grupo de NSEFB. À semelhança

do que se passou no reconhecimento, a este nível de realização, verificou-se também a

influência do uso do Balão de Ar Quente na alteração das concepções dos alunos.

Ao nível da realização activa, verifica-se uma ausência total de realização em

ambos os grupos, antes da visita. Depois da visita, e a contrapor a tendência

observada no reconhecimento e na realização passiva, verifica-se uma evolução

positiva no grupo de alunos de NSEFB. Se estes alunos, antes da visita, mostraram

não realizar activamente, depois da visita, mostraram ter realização activa na ordem

dos 38%. O mesmo se passou com o grupo de alunos de NSEFE, embora numa

percentagem inferior (25%).

Estes dados sugerem, então, a existência de uma mediação do NSEF nos

resultados obtidos no balão.

Quadro 7 - Distribuição percentual do grau de reconhecimento e de realização para o Balão de Ar

Quente e para o Foguetão de Hidrogénio de acordo com o NSEF dos alunos.

VALORES DE RECONHECIMENTO E DE REALIZAÇÃO DE ACORDO COM O NSEF DOS ALUNOS

RR RRP RRA

NSEFB NSEFE NSEFB NSEFE NSEFB NSEFE

Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois

Balão de Ar Quente

5/8 (63%)

5/8 (63%)

6/8 (75%)

8/8 (100%)

5/8 (63%)

5/8 (63%)

2/8 (25%)

7/8 (88%)

0/8 (0%)

3/8 (38%)

0/8 (0%)

2/8 (25%)

Foguetão de Hidrogénio

3/12 (25%)

5/12 (42%)

4/12 (33%)

8/12 (67%)

3/12 (25%)

4/12 (33%)

3/12 (25%)

5/12 (42%)

0/8 (0%)

2/8 (25%)

0/8 (0%)

0/8 (0%)

Page 26: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

25

No que respeita ao foguetão, como cada elemento do grupo podia obter no

máximo três pontos, no caso das regras de reconhecimento e de realização passiva, o

máximo de pontos a obter por grupo era 12. A percentagem de reconhecimento e de

realização foi obtida a partir da fracção da soma dos valores obtidos em cada grupo

pelo máximo de pontos que se podiam obter, ou seja, 12. Para as regras de realização

activa, como cada elemento do grupo conseguia obter, no máximo, 2 pontos, cada

grupo atingia, no máximo, 8 pontos. Neste caso, a percentagem de realização activa

foi obtida a partir da fracção da soma dos valores obtidos pelo grupo pelo máximo de

pontos que se podia obter, ou seja, 8.

Antes da interacção, verificou-se que o nível de reconhecimento de ambos os

grupos se situava em valores pouco distanciados. O grupo de alunos de NSEFB

obteve 25%; o grupo de alunos de NSEFE, 33%. Após a visita ao museu, verificou-se,

em ambos os grupos, uma evolução positiva. Contudo, essa evolução foi muito mais

acentuada no grupo de alunos de NSEFE (34%) do que no grupo de alunos de NSEFB

(17%). Isto significa que, após a interacção, foi o grupo de alunos de NSEFE que

melhor reconheceu, enquanto o grupo de alunos de NSEFB foi o que revelou mais

dificuldade em reconhecer.

Na realização passiva, verificou-se não existir, antes da visita, qualquer

diferença entre os dois grupos. Ambos os grupos obtiveram os mesmos valores

(25%). No entanto, após a visita ao museu, verificou-se, à semelhança do que

acontecera com o reconhecimento, uma evolução positiva em ambos os grupos,

sendo, todavia, no grupo de alunos de NSEFE que essa diferença se acentuou. Em

relação ao grupo de alunos de NSEFB, a diferença em relação ao conhecimento

determinado antes da visita foi de 8%, enquanto no grupo de alunos de NSEFE, foi de

17%. Isto significa que, a este nível, foi também o grupo de alunos de NSEFE que

melhor realizou, em comparação com o de NSEFB que apresentou mais dificuldade

em realizar.

No que se refere à realização activa, verificou-se que, antes da visita, nenhum

dos grupos demonstrou realização. Depois da interacção, somente o grupo de alunos

de NSEFB conseguiu uma evolução positiva, não havendo qualquer alteração no

grupo de alunos de NSEFE.

Page 27: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

26

Género

O quadro 8 apresenta a distribuição percentual do grau de reconhecimento

e de realização em relação ao balão e ao foguetão, de acordo com o género (G) dos

alunos. Os dados foram obtidos dos quadros 5 e 6. No grupo de crianças do género

feminino (GF), encontram-se a Sofia, a Raquel, a Sara e a Sónia e, no grupo de

crianças do género masculino (GM), encontram-se o Miguel, o Carlos, o Nuno e o

Paulo.

Relativamente ao balão, antes da visita verificou-se que foram as raparigas

que melhor reconheceram (75%), embora a diferença em relação aos rapazes

(63%) não fosse muito acentuada. Depois da visita, verificou-se uma evolução

positiva em ambos os grupos. No entanto, essa diferença não parece ser tão

explícita como antes da visita pois, se no grupo de alunos do GF a evolução foi de

13% em relação a antes da visita, no grupo de alunos do GM essa evolução foi de

12%, ou seja, semelhante. Verificou-se assim que, ao nível do reconhecimento, a

variável género pareceu não influenciar os resultados obtidos durante a interacção

com o Balão de Ar Quente.

Relativamente à realização passiva, antes da visita, verificou-se que foram

as raparigas que melhor realizaram (63%) quando comparadas com os rapazes

(25%). Esta diferença na realização parece estar relacionada com o grau de

reconhecimento verificado anteriormente. Na verdade, para que as crianças

realizem, é necessário que, antes, reconheçam. Depois da visita, verificou-se que

foi no grupo dos rapazes que se deu uma evolução mais acentuada (38%) quando

comparada com o grupo das raparigas (25%).

Antes da visita, verificou-se que nenhum dos grupos revelou realização

activa. Contudo, após a visita, ambos os grupos manifestaram realização activa

idêntica (38%).

Da análise global dos resultados ao nível do reconhecimento, verifica-se

que antes da visita, existia uma diferença entre os dois géneros, embora, depois da

visita, não se verificasse diferença entre o grupo dos rapazes (GM) e o grupo das

raparigas (GF). Contudo, ao nível da realização, foi nos rapazes (GM) que melhor

se observou o impacto positivo do uso do balão.

Page 28: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

27

Quadro 8 - Distribuição percentual do grau de reconhecimento e de realização para o Balão de Ar Quente de acordo com o género dos alunos.

VALORES DE RECONHECIMENTO E DE REALIZAÇÃO DE ACORDO COM O GÉNERO DOS ALUNOS

RR RRP RRA

GF GM GF GM GF GM

Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois

Balão de Ar Quente

6/8 (100%)

7/8 (88%)

5/8 (63%)

6/8 (75%)

5/8 (63%)

7/8 (88%)

2/8 (25%)

5/8 (63%)

0/8 (0%)

3/8 (38%)

0/8 (0%)

3/8 (38%)

Foguetão de Hidrogénio

4/12 (33%)

6/12 (50%)

3/12 (25%)

7/12 (58%)

3/12 (25%)

4/12 (33%)

3/12 (25%)

5/12 (42%)

0/8 (0%)

1/8 (13%)

0/8 (0%)

1/8 (13%)

Relativamente ao foguetão, antes da visita ao museu, verificou-se que o

reconhecimento, embora de valores muito próximos, foi mais elevado no grupo de

alunos do GF (33%) do que no do GM (25%). Depois da visita ao museu, observou-se

uma evolução positiva em qualquer dos grupos, sendo, no entanto, no grupo de

alunos do GM que a evolução foi mais acentuada. Enquanto no grupo de alunos do

GF se deu uma subida de 17%, no grupo de alunos do GM a subida foi de 33%. Isto

significa que o uso do Foguetão de Hidrogénio foi, a este nível, mais eficaz, no grupo

de alunos do GM que no grupo de alunos do GF. Deste modo, verificou-se que o

grupo de alunos do GM reconheceu ligeiramente melhor que o grupo de alunos do

GF.

Relativamente à realização passiva, verificou-se algo semelhante ao que se

passou com o reconhecimento. Antes da visita ao museu, ambos os grupos

apresentaram realização semelhante (GF = GM = 25%). Contudo, depois da visita ao

museu, embora se verificasse uma evolução positiva em ambos os grupos, foi no

grupo de alunos do GM que essa evolução se acentuou com um aumento de 17% em

relação à realização anterior à visita ao museu, contra um aumento de 8% no grupo

de alunos do GF.

Na realização activa, observou-se algo semelhante nos dois grupos. Antes da

visita ao museu nenhum dos grupos apresentou este tipo de realização, embora,

depois da visita, ambos sofressem um aumento de 13%.

Aproveitamento escolar

O quadro 9 apresenta a distribuição percentual do grau de reconhecimento e

de realização, de acordo com o aproveitamento escolar dos alunos. Os dados foram

Page 29: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

28

obtidos dos quadros 5 e 6. De acordo com o Ap, consideraram-se dois grupos: o grupo

ApB, com alunos com aproveitamento escolar baixo, onde se incluem a Raquel, a

Sónia, o Carlos e o Paulo; e o grupo ApE, com alunos com aproveitamento escolar

elevado, onde se incluem a Sofia, a Sara, o Miguel e o Nuno.

Relativamente ao balão, antes da visita verifica-se que, em relação ao

reconhecimento, os alunos com ApE reconheceram melhor (88%) face aos alunos

com ApB (50%). Após a visita, deu-se uma evolução positiva em ambos os grupos.

Contudo, esta evolução não foi discriminatória, mas semelhante (ApB = 13% e ApE

=12%).

Quadro 9 - Distribuição percentual do grau de reconhecimento e de realização para o balão e o foguetão, de acordo com o aproveitamento escolar dos alunos.

VALORES DE RECONHECIMENTO E DE REALIZAÇÃO DE ACORDO COM O APROVEITAMENTO ESCOLAR DOS ALUNOS

RR RRP RRA

ApB ApE ApB ApE ApB ApE

Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois

Balão de Ar Quente

4/8 (50%)

5/8 (63%)

7/8 (88%)

8/8 (100%)

2/8 (25%)

5/8 (63%)

6/8 (75%)

7/8 (88%)

0/8 (0%)

0/8 (0%)

0/8 (0%)

6/8 (75%)

Foguetão de Hidrogénio

2/12 (17%)

4/12 (33%)

5/12 (42%)

9/12 (75%)

1/12 (8%)

2/12 (17%)

5/12 (42%)

7/12 (58%)

0/8 (0%)

0/8 (0%)

0/8 (0%)

2/8 (25%)

Na realização passiva, as diferenças foram óbvias entre os dois grupos. Antes

da visita, verificou-se que foram os alunos com ApB que mais dificuldade tiveram em

realizar (25%) quando comparados com os alunos com ApE (75%). O impacto da

visita manifestou-se, de forma inequívoca, nos alunos com ApB com uma diferença

de realização, entre o antes e o pós visita, igual a 38%. No grupo de alunos com ApE,

essa diferença (13%) não foi tão acentuada. No entanto, deve ter-se em conta que,

antes da visita, o grau de realização já era bastante elevado. Estes resultados parecem

sugerir que o uso dos módulos participativos pode ajudar a esbater as diferenças entre

alunos socialmente favorecidos (NSEFE e ApE) e alunos socialmente desfavorecidos

(NSEFB e ApB).

Relativamente à realização activa, verificou-se que, apenas no grupo de alunos

com ApE, se observou este tipo de realização e, somente depois da visita ao museu.

Convém, no entanto, salientar que o valor atingido foi elevado (75%).

Page 30: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

29

No que respeita ao foguetão, verifica-se que antes da visita ao museu foi o

grupo de alunos com ApE que mais facilidade teve em reconhecer (42%) e que o

grupo de alunos com ApB apresentou maior dificuldade no reconhecimento (17%).

Após a visita ao museu, apesar de se verificar uma evolução positiva nos dois grupos,

observou-se que, no grupo de alunos com ApE, a evolução foi mais acentuada (33%)

do que em relação ao grupo de alunos com ApB, que evoluiu 16% em relação a antes

da visita. Isto significa que, tanto antes como depois da visita ao museu, foi o grupo

de alunos com ApE que melhor reconheceu.

No que respeita à realização passiva, observou-se algo semelhante ao que se

passou com o reconhecimento. Antes da visita, foi o grupo de alunos com ApE que

melhor realizou (42%) enquanto o grupo de alunos com ApB revelou grande

dificuldade em realizar (8%). Depois da visita ao museu, foi também o grupo de

alunos com ApE que mais revelou realizar, registando um aumento de 16%, em

relação a antes da visita. O grupo de alunos com ApB sofreu apenas um incremento

de 9%, em relação a antes da visita ao museu.

Em relação à realização activa, verificou-se que, antes da visita ao museu,

nenhum dos grupos demonstrou possuí-la. Após a visita, observou-se, todavia, uma

evolução positiva no grupo de alunos com ApE que revelou realizar na ordem dos

25%.

6. A RELAÇÃO ENTRE O QUE FAZEM E O QUE APRENDEM OS ALUNOS

Para se proceder à análise da relação entre os resultados obtidos neste estudo,

que incidiram na interactividade mental, e os obtidos ao nível dos procedimentos

(Botelho e Morais, 2003), que incidiram na interactividade manual, recorreu-se ao

grau de orientação específica de codificação (OEC) de cada aluno, o qual se calculou

a partir da fórmula OEC =

RC + RL

Total x 100, onde RC é a pontuação obtida nas

situações que pretendem testar a utilização das regras de reconhecimento e RL é a

pontuação relativa às regras de realização; o total é 38 para o desempenho ao nível

dos procedimentos e 15 para o desempenho ao nível da compreensão de conceitos. A

classificação (o número de pontos conseguido por cada criança) foi convertido numa

escala de 4 níveis: de 0 a 25 - nível 1; de 26 a 50 - nível 2; de 51 a 75 - nível 3; e de

76 a 100 - nível 4.

Page 31: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

30

A figura 3 apresenta, em termos comparativos, o grau de OEC obtido nos dois

níveis em estudo.

Figura 3 - Comparação do desempenho obtido (OEC) ao nível dos procedimentos e da compreensão de conceitos, quando se consideram, simultaneamente, os resultados obtidos com os dois módulos.

A análise do gráfico permite verificar que, embora com alguns alunos pareça

existir uma relação linear entre os procedimentos efectuados e a compreensão de

conceitos, como é o caso da Sofia, da Sara e do Miguel, no geral, essa relação não se

verifica. Observa-se que os alunos obtiveram, ao nível da compreensão de conceitos,

resultados inferiores aos atingidos com os procedimentos, o que significa que estes

últimos não correspondem, linearmente, aos obtidos na compreensão de conceitos.

Por outras palavras, poder-se-ia dizer que o facto de os alunos reconhecerem,

seleccionarem e produzirem correctamente os procedimentos esperados para cada

módulo não significa que, só por isso, compreendam os conceitos envolvidos nesses

módulos.

Um facto que sobressai da análise do gráfico é que não se verifica nenhum

caso em que os resultados obtidos com a aprendizagem sejam superiores aos obtidos

com os procedimentos. Uma das razões da origem desta dicotomia tão acentuada pode

encontrar-se nas diferenças sociológicas dos módulos ao nível dos procedimentos e da

compreensão de conceitos. Enquanto no contexto da compreensão de conceitos, os

0

1

2

3

4

Sofia Raquel Sara Sónia Miguel Carlos Nuno Paulo

Alunos

Graude

OEC

Procedimentos

Compreensão de Conceitos

Page 32: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

31

critérios de avaliação eram regulados por um enquadramento fraco (E--), no contexto

dos procedimentos, eram regulados por um enquadramento forte (E++). Isto significa

que, ao nível dos procedimentos, os critérios de avaliação, encontram-se mais

explícitos para os alunos, o que pode facilitar o desenvolvimento e resultados da

actividade. Ao nível da compreensão de conceitos, os critérios já não eram tão

explícitos, ou seja, para os alunos não é claro o que se esperava que compreendessem,

que aprendessem. Não é assim de estranhar que os resultados obtidos ao nível da

compreensão de conceitos ficassem aquém dos obtidos nos procedimentos.

7. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

Da análise dos resultados obtidos, a partir das respostas dadas aos dois

questionários, verificou-se a existência, por um lado, de uma relação entre o uso de

módulos participativos e a compreensão de conceitos científicos e, por outro, da

influência de factores de natureza sociológica relacionados com a família (NSEF e G)

e de outros relacionados com a escola (Ap) nessa relação. Confirmou-se ainda a

existência de uma relação entre essas características sociológicas e a aquisição pelos

alunos de regras de reconhecimento e de realização necessárias à compreensão de

conceitos científicos e, também, uma relação entre a posse de regras de

reconhecimento e de realização e a compreensão de conceitos científicos.

As diferenças entre os resultados obtidos nos questionários e nas entrevistas,

antes e depois da visita, apontam no sentido de se poderem considerar os módulos

participativos como potenciais instrumentos a utilizar na compreensão de conceitos

científicos e na diminuição do fosso que existe entre alunos socialmente

diversificados.

Após a interacção com o Balão de Ar Quente, foi visível uma evolução nítida

nos resultados obtidos, com a amostra em geral. À excepção de dois alunos, todos os

outros revelaram tirar proveito da interacção com o Balão. Isto foi visível, através da

alteração das concepções reveladas antes da visita ao museu. Depois da visita, muitas

das concepções de tipo SC e I foram substituídas por concepções do tipo C. Em

termos sociológicos, isto significa que a interacção com o Balão permitiu aumentar o

grau de reconhecimento e de realização dos alunos. Em relação às justificações dadas

pelos alunos, através das quais era possível averiguar a compreensão dos conteúdos,

Page 33: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

32

verificou-se também uma evolução positiva em relação a antes da visita. Isto foi

visível nos resultados obtidos com a Sofia, a Sara, o Miguel e o Nuno, podendo

significar que os módulos encerram pontencialidades no âmbito da alteração de

concepções e da compreensão de conceitos científicos.

Com o Foguetão de Hidrogénio, verificaram-se resultados similares, embora

as diferenças obtidas, entre antes e depois da interacção, não fossem tão acentuadas

quanto as do Balão de Ar Quente. Antes da interacção com o foguetão, as concepções

mais valorizadas pelos alunos foram do tipo SC. Nos alunos cujas concepções

demonstraram ser do tipo C, verificou-se a incapacidade de todos eles em justificar

correctamente o conceito. Depois da interacção com o foguetão, a alteração foi no

sentido de substituir concepções SC por concepções I e C, embora não se tenham

obtido resultados significativos em relação às justificações. Apenas dois alunos

souberam justificar a sua opção em relação ao conceito de combustível.

Em termos sociológicos, antes da visita ao museu, verificaram-se níveis de

reconhecimento e de realização bastante reduzidos e, após a interacção, um aumento

muito discreto desses níveis. Em relação à realização activa, ela não se manifestou

antes da visita e, depois, foi esporádica.

O facto dos resultados obtidos com o balão e o foguetão não serem muito

positivos parece estar relacionado com as dificuldades sentidas pelos alunos, em

geral, na identificação e selecção das concepções científicas correctas. Possíveis

explicações para este facto podem estar na falta de conhecimento que os alunos

tinham sobre estes conteúdos, dado que ainda não os tinham aprendido na escola, e no

elevado nível de abstracção que encerravam.

Considerando os resultados obtidos pelos dois grupos sociais, depois da visita

ao museu, onde se verificou que, tanto em relação ao balão como em relação ao

foguetão, foi o grupo de alunos de NSEFE que melhor reconheceu e realizou. Nas

crianças de NSEFB a interacção com os módulos apenas se manifestou em dois

alunos com aproveitamento escolar elevado. Pode-se, assim, concluir que o uso destes

módulos se revelou mais eficaz no grupo de alunos de NSEFE.

O facto das crianças de NSEFE terem revelado, após a interacção com os

módulos e relativamente às crianças de NSEFB, uma maior tendência para optarem

por concepções correctas e justificarem acertadamente essas opções, pode ser

explicado pelo acesso a uma maior diversidade de contextos que estas crianças têm,

normalmente, na família, que as preparam para reconhecer e realizar noutros

Page 34: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

33

contextos. Segundo Morais et al. (1993), tal acesso parece interferir diferencialmente

no desenvolvimento de competências cognitivas que envolva conhecimento científico

de nível mais elevado de abstracção.

Em relação ao género, para o Balão de Ar Quente, verificou-se que, antes da

visita ao museu, foram as raparigas que melhor reconheceram e realizaram. No

entanto, após a interacção, foram os rapazes que obtiveram os melhores resultados.

No Foguetão de Hidrogénio, verificou-se, antes da visita, não existirem diferenças

significativas entre os dois grupos. No entanto, após a interacção com os módulos,

constatou-se que foi entre os rapazes que os resultados obtidos foram mais positivos,

quer ao nível do reconhecimento quer ao nível da realização. Estes resultados podem

ser explicados se se tiver em conta que os conteúdos exibidos nos módulos parecem

estar, à primeira vista, mais relacionados com os interesses/motivações dos rapazes do

que com o das raparigas.

Quando se considerou o aproveitamento escolar, observou-se que o grupo de

alunos com ApE foi o que melhor reconheceu e realizou, quer antes quer depois da

visita, e que o grupo de alunos com ApB foi o que mais dificuldade teve em

reconhecer e em realizar. Em relação à realização activa, verificou-se que ela só foi

conseguida, após a interacção com o módulo, pelo grupo de alunos com ApE.

Um aspecto interessante que ressalta da análise dos resultados diz respeito ao

facto dos alunos com ApB não revelarem, após a interacção com os módulos, regras

de realização activa. Estes resultados informam sobre a limitação do uso destes

módulos na compreensão de conceitos científicos. A realização activa informava,

neste estudo, sobre a compreensão dos conceitos por parte dos alunos. Face aos

resultados obtidos, só os alunos com aproveitamento elevado é que revelaram ter

realização activa, após a interacção com os módulos. Explicações para este facto

podem residir no facto de estes alunos serem aqueles que, antes da visita, revelavam

possuir níveis mais elevados de reconhecimento e de realização passiva. Por outro

lado, foram também estes quatro alunos que revelaram os maiores níveis de

reconhecimento e de realização, após a interacção. Isto pode apoiar a hipótese de

existir uma relação entre a posse de regras de reconhecimento e de realização e a

compreensão de conceitos científicos, recorrendo ao uso de módulos participativos.

Deste modo, a posse, quer de reconhecimento quer de realização passiva, parece

revelar-se fundamental para a aquisição de realização activa por parte dos alunos. Isto

revela-se de fulcral importância, pois implica que, tanto da parte da equipa que está

Page 35: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

34

por detrás da concepção módulo e da equipa do centro de ciência onde o módulo se

insere como da parte dos professores que levam as suas turmas a visitar as exposições

científicas, haja uma preocupação em perceberem as razões porque é que o aluno não

produz o texto esperado (realização activa) e em arranjarem estratégias que permitam

ao aluno reconhecerem o contexto e saberem como produzir esse texto.

No que se refere ao esbatimento das desigualdades frequentemente apontadas

nos estudos entre os alunos das classes sociais baixas e elevadas, verifica-se que, nos

alunos socialmente mais desfavorecidos (de nível sócio-económico mais baixo e com

resultados escolares reduzidos), a interacção com os módulos não se revelou muito

eficaz. Os resultados obtidos com os dois alunos mais desfavorecidos socialmente (a

Raquel e o Carlos), onde não se verificam alterações entre antes e depois da

interacção, confirmam essa ideia.

Os alunos socialmente mais favorecidos (ApE e NSEFE) atingiram os

melhores resultados, tanto antes como depois da visita, enquanto os alunos

socialmente mais desfavorecidos (ApB e NSEFB), registaram piores resultados. Nos

alunos de NSEFB, mas com ApE, os resultados foram similares aos dos alunos com

ApE e de NSEFE, o que realça a importância da variável Ap na obtenção dos

resultados positivos. Contudo, nos alunos de NSEFB, mas com ApB, o efeito desta

variável foi atenuado, verificando-se resultados positivos com a interacção, mas não

ao ponto de se verificar realização activa, o que significa ausência de compreensão

dos conceitos.

Comparando os resultados obtidos neste estudo com os obtidos no estudo

realizado ao nível dos procedimentos dos alunos (Botelho e Morais, 2003) verifica-se

que os alunos que tiveram índices de OEC mais elevados ao nível dos procedimentos,

foram os que, ao nível da compreensão de conceitos, atingiram os piores resultados.

Deste modo, verifica-se que a relação entre a OEC ao nível dos procedimentos e a

compreensão dos conceitos científicos não é linear. Não tendo sido possível

aprofundar de um modo sistemático esta relação, pensa-se que ela deverá ser

analisada em investigações futuras de modo a poder ser clarificada.

Apesar de os resultados obtidos sugerirem que o uso dos módulos científicos

participativos revelam potencialidades ao nível do desenvolvimento conceptual,

verificaram-se grandes limitações quando considerámos os diferentes grupos sociais.

Deste modo, verifica-se a necessidade de estudos aprofundados que, por um lado,

analisem a sua potencialidade na aprendizagem de conceitos específicos por alunos

Page 36: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

35

desfavorecidos socialmente e, por outro, apontem caminhos no sentido da concepção

de módulos que visem colmatar as dificuldades sentidas pelos alunos, especialmente

pelos mais desfavorecidos socialmente.

Notas

1. O Grupo ESSA- Estudos Sociológicos de Sala de Aula do Departamento de Educação da Faculdade de

Ciências da Universidade de Lisboa, desenvolve investigação em educação, numa abordagem fundamentalmente sociológica e na sua interface com outras abordagens.

2. A classe social foi entendida no estudo como um conceito nominal, descritivo e não como um conceito

analítico, na medida em que ele é tomado apenas para evidenciar o seu papel como categoria reguladora dos códigos diferenciais da família e da escola.

3. Tanto para a ocupação como para a qualificação académica dos pais e mães construímos escalas de 1-6. O máximo de pontos obtidos seria consequentemente 24.

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Page 38: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

37

A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência Um estudo sobre a interacção entre alunos e módulos científicos participativos

Resumo Analisa-se o modo como os alunos interagem com 2 módulos participativos presentes num

centro de ciência. O estudo centra-se, por um lado, na relação comunicacional existente entre

alunos e módulos participativos e sua caracterização sociológica e, por outro, na relação entre

as características sociológicas específicas dessa comunicação e o desempenho dos alunos. A

teoria do discurso pedagógico de Bernstein (1990, 2000) forneceu os conceitos para

caracterizar essa interacção e analisar a influência das características de cada microcontexto

na aprendizagem científica dos alunos. Estiveram envolvidos 8 alunos do 7º ano de

escolaridade com características sociológicas diferentes e usaram-se dois módulos – o Balão

de Ar Quente e o Foguetão de Hidrogénio. Os resultados sugerem que o desempenho dos

alunos é influenciado tanto pelas características sociológicas dos alunos como pelas

características sociológicas específicas da interacção que se estabelece entre alunos-módulos

(e dos microcontextos estudados).

Palavras-chave:Centro de Ciência; Módulo Participativo; Orientação Específica de Codificação; Compreensão de Conceitos

Page 39: A aprendizagem de conceitos científicos em centros de ciência

38

Learning scientific concepts at a science centre Study about interactions between students and participatory exhibits

Abstract

The paper describes a study which aims at investigating the relation between the use of

science centres exhibits and the learning of scientific concepts. The study is focused on the

communicational relation between students and also on the relation between the specific

sociological characteristics of communication (and of the microcontexts studied), and the

learning of scientific concepts. Two specific microcontexts were analised – student’s

procedures and student’s understanding of scientific concepts. Theoretically, the study is

mainly based on Bernstein’s theory of pedagogic discourse (1990, 2000) which gave the

concepts to characterize the interaction and to analyse the influence of the characteristics of

each micro-context on student’s scientific learning. The sample was made up 8 students (ages

12-13) with distinct sociological characteristics. Two exhibits of a scientific exhibition were

used for the study – the Hot Air Balloon and the Hydrogen Rocket. The results obtained

showed that the use of scientific exhibits promove the understanding of scientific concepts

and are influencied by both of the sociological characteristics of students and specific

sociological characteristics of communication (and of the microcontexts studied).

Key-words: Science Center; Participatory exhibits; Specific orientation codification; Concept understanding