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PEDRO BRAGA GOMES
A BIOÉTICA NO ENSINO MÉDIO: UM CAMINHO PARA A REFLEXÃO DE PRÁTICAS DE HUMANIZAÇÃO DO SUJEITO
UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
2010
PEDRO BRAGA GOMES
A BIOÉTICA NO ENSINO MÉDIO: UM CAMINHO PARA A REFLEXÃO DE PRÁTICAS DE HUMANIZAÇÃO DO SUJEITO
Dissertação apresentada como exigência
parcial da obtenção do título de Mestre, ao
Programa de Mestrado em Educação, da
Universidade Cidade de São Paulo, sob a
orientação da Profa. Dra. Margaréte May
Berkenbrock Rosito.
UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
2010
COMISSÃO JULGADORA
______________________________
______________________________
______________________________
AGRADECIMENTOS
A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a elaboração desta
Dissertação, especialmente, aos professores e funcionários do Programa Mestrado
em Educação da Universidade Cidade de São Paulo.
À Profª. Drª. Margaréte May Berkenbrock-Rosito, orientadora desta pesquisa.
Aos professores Prof. Dr. Potiguara Acácio Pereira e Luís Carlos Dallier Saldanha,
pelas valiosas contribuições no exame de qualificação.
À Província de Santa Cruz da Ordem dos Frades Menores (OFM), que me
ensinaram, por mais de duas décadas, a indelével convivência fraterna da Paz e do
Bem.
À minha querida mãe, que, gentilmente, me acolheu na vida e no mundo.
RESUMO
O presente estudo focaliza a presença da Bioética, como eixo temático, da disciplina
de Filosofia para o Ensino Médio, a partir da implementação da proposta curricular
da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, 2008. No estudo, propõe-se,
como hipótese, que a presença da Bioética, na proposta curricular do Estado de São
Paulo, é um modo de educar para a responsabilidade, na esteira da revolução social
e biotecnológica. Aponta-se, aqui, a necessidade de princípios éticos em relação à
vida, para não converter a vida humana em mercadoria, nas mãos de cientistas ou
grupos econômicos. A partir de um estudo documental, procura-se discutir a
proposta curricular implementada na Rede Estadual do Ensino Público Paulista, no
ano de 2008, baseado no conteúdo dos princípios Bioéticos, na disciplina de
Filosofia, a partir do referencial teórico com base em Dussel (2002), Freire (1994;
1996) e Heidegger (2000). Adota-se a abordagem hermenêutica, para este estudo,
na perspectiva de Gadamer (1999), busca-se interpretar os significados explícitos ou
implícitos no documento, a construção de sentidos, a partir de inferências. O estudo
aponta que a presença da Bioética contribui para a reflexão do sujeito (Bio)ético,
como ser pessoa e ser sujeito, revelando o cuidado como valor no modo de educar
para a responsabilidade.
Palavras chave: Educação. Ensino da Bioética. Proposta Curricular. Direitos
Humanos
ABSTRACT
This study focuses on the presence of bioethics as subject of the discipline of
Philosophy for High School through the implementation of the curriculum
proposal the Secretary of State for Education of São Paulo, 2008. The study is
proposed as a hypothesis that the presence of Bioethics in the curriculum of the
State of São Paulo is a way of educating for responsibility in the wake of social
revolution and biotechnology, highlights the need for ethical standards in
relation to life, not to convert human life into a commodity in the hands of
scientists or economic groups. From a documentary study seeks to discuss the
proposed curriculum implemented in the state system of public education St.
Paul in 2008, based on the content of Bioethical principles in the discipline of
philosophy, from the theoretical basis of Dussel (2002), Freire (1994, 1996) and
Heidegger (2000). It adopts the hermeneutic approach to this study in view of
Gadamer (1999), we seek to interpret the meanings expressed or implied in the
document, the construction of meaning from inferences. The study indicates
that the presence of Bioethics contributes to the reflection of the subject (Bio)
ethics, as being a person and be subject, revealing how the care value in the
way of teaching responsibility.
Keywords: Education. Teaching of Bioethics . Proposed Curriculum. Human
Rights.
LISTA DE ABREVIATURAS
CONAE............Conferência Nacional de Educação ONU.................Organização das Nações Unidas
PCESP ............Proposta Curricular do Governo do Estado de São Paulo
UFLA ...............Universidade Federal de Lavras
UNESCO .........Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
10
SUMÁRIO INTRODUÇÃO__________________________________________________ 1 1. A EDUCAÇÃO EM BIOÉTICA: AS QUESTÕES E OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS. __________________________________________ 18 1.1 - Contextos e perspectivas da Bioética. __________________________ 18 1.2 - Aspectos filosóficos. ________________________________________ 23 1.3 - Considerações pedagógicas. _________________________________ 30 1.4 Educar na contemporaneidade._________________________________ 39 2. A BIOÉTICA: UM DESAFIO PARA O SISTEMA DE ENSINO MÉDIO. ___ 42 2.1 A educação bioética: um modismo ou uma necessidade no sistema de Ensino Médio? _________________________________________________ 42 2.2 As relações entre a Filosofia e a Bioética. ________________________ 50 2.3 O corpo: um elo entre a Bioética e a Filosofia._____________________ 54 2.4 As reflexões (bio) éticas: a prática educacional e a formação de professores. ___________________________________________________ 57 3. A PROPOSTA CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO DO ESTADO DE SÃO PAULO: FUNDAMENTOS DO SUJEITO (BIO) ÉTICO. _________________ 77 3.1 A Bioética: o desempenho entre ser pessoa e ser sujeito aprendente. __ 77 3.2 O sujeito (bio) ético: a construção de valores na escola e na vida. _____ 85 3.3 Os aspectos valorativos da formação do sujeito (bio) ético. ___________ 89 3.3.1 Os dois lados da realidade: a relacional e a comportamental. ________ 89 3.3.2 A equidade, a justiça e a autonomia. ___________________________ 90 3.3.3 O cultivo da identidade na alteridade. __________________________ 91 3.3.4 O cultivo do senso do mistério e da capacidade de admirar. ________ 92 3.3.5 A avaliação das perdas e dos ganhos, do bem e do mal. ___________ 93 CONSIDERAÇÕES FINAIS_______________________________________ 95 REFERÊNCIAS _______________________________________________ 102 ANEXOS ______________________________ Erro! Indicador não definido.
11
INTRODUÇÃO
Cursei Filosofia na Pontifícia Universidade São João de Latrão, Roma -
Itália. Minha licenciatura foi concluída na Faculdade Nossa Senhora da
Assunção, da Arquidiocese de São Paulo. Meu trabalho de conclusão de curso
foi uma abordagem de temas referentes ao Cuidado, em Martin Heidegger.
Neste percurso investigativo, surgiu a convicção de que a formação do cidadão
passa, necessariamente, pela reflexão filosófica.
No curso de especialização sobre Bioética, realizado na Universidade
Federal de Lavras/MG, houve a constatação de que o olhar bioético é sempre
voltado à saúde, à ciência ou aos aspectos jurídicos e ambientais. Geralmente,
este olhar não está voltado para o homem que, indiscutivelmente, deveria ser o
objeto do Cuidado e da educação.
Sou professor de Filosofia, no Ensino Médio, na escola pública,
vinculada à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Aqui, reflito
sobre o sentido do pensamento filosófico. Percebo que temas, como o Cuidado
do ser humano, diante do conhecimento produzido, tanto local como universal,
revela-se no ponto de encontro entre o pensar e o fazer dos cientistas, filósofos
e artistas de todos os tempos. Estes profissionais sempre inauguram formas de
compreender o homem, sua natureza e cultura. Esta compreensão traz à tona
o sentido do educar para a responsabilidade, visando à garantia da qualidade
de vida das pessoas e sujeitos.
Essas são as principais razões que me levaram a desenvolver um
estudo sobre o trabalho com Bioética e a sua inclusão, como eixo temático, na
Proposta Curricular do Estado de São Paulo, visando ao ensino de Filosofia,
para alunos do Ensino Médio. Leva-se em consideração a concepção de que a
filosofia é um questionamento intelectual, onde qualquer tema pode ser
desafiado, investigado e criticado. Neste processo, cria-se o ambiente
apropriado para o encontro educacional, de busca constante, conforme se
concebe a educação, como processo contínuo de aprendizagem e reflexão.
12
No Brasil, a Constituição de 1988 incluiu a Educação, no Capítulo III do
Título VIII. De acordo com o Art. 205 da Constituição, a educação é “um direito
de todos e dever do Estado e da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho”.
A LDB 9394/96, em diferentes Títulos e Capítulos, reforça a visão de
que a Educação deverá, em todos os momentos, visar ao pleno
desenvolvimento do indivíduo, seu preparo para a cidadania e sua qualificação
para o trabalho.
No Título II, “Dos Princípios e Fins da Educação Nacional”, afirma-se:
Art. 2º. A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos
princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por
finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício
da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (Lei 9394/96. Diretrizes e
Bases da Educação Nacional. Governo do Estado de São Paulo. Editora do
Brasil S/A p. 1).
No Título V, “Dos Níveis e das Modalidades de Educação e Ensino”, no
Capítulo II, “Da Educação Básica”, Seção I, “Das Disposições Gerais”, afirma-
se:
Art. 22. A educação básica tem por finalidade desenvolver o educando,
assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania
e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores. (Lei
9394/96. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Governo do Estado de São
Paulo. Editora do Brasil S/A. p. 9).
Quando a LDB9394/96 estipula os objetivos para o Ensino Médio, a
ênfase recai, entre outros itens, sobre a formação do cidadão, a preparação
básica para o trabalho, o aprimoramento do educando como pessoa humana,
incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do
pensamento crítico.
Em todos os níveis, as finalidades da educação abrangem o pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho
13
Em 2008, ocorreu a introdução da Bioética, como eixo temático, dentro
do campo da ética, vinculada à disciplina Filosofia, na Proposta Curricular do
Estado de São Paulo para o Ensino Médio.
Neste trabalho, estabelece-se, como objetivo principal, a reflexão e,
posteriormente, a demonstração de que a introdução da Bioética foi benéfica,
para que se cumpram as finalidades da educação e os objetivos para o Ensino
Básico e o Ensino Médio, estabelecidos, na Constituição de 1988 e na LDB
9394/96.
A introdução da Bioética, vinculada ao ensino da Filosofia, é relevante,
se houver a percepção de que uma reflexão profunda, sobre o seu campo de
atuação, conduz ao aprimoramento das relações e dos valores humanos.
Ainda, a presença da Bioética, nas propostas curriculares, é compatível com a
pedagogia libertadora e com a capacidade do próprio sujeito para se
humanizar.
As reflexões sobre o papel da Bioética ajudarão o aluno do Ensino
Médio a estar vigilante contra as práticas de desumanização. Elas contribuirão,
ainda, para a necessidade de uma leitura crítica das verdadeiras causas da
degradação humana.
A inserção da Bioética, nas propostas curriculares, não está voltada para
o ensino da virtude, na sociedade do conhecimento, mas para o
desenvolvimento das competências para ser virtuoso, para viver e conviver
com solidariedade.
A inserção da Bioética opõe-se à educação que privilegia o ensino
tecnicista e que desconsidera o valor da formação humana. Agora, é possível
que se direcione a educação para a sensibilidade e para o pensamento
reflexivo, crítico e criativo.
Propõe-se, como hipótese, que a presença da Bioética, na Proposta
Curricular do Estado de São Paulo, é um modo de educar para a
responsabilidade, na esteira da revolução social e biotecnológica. Aponta-se a
necessidade de critérios éticos, em relação à vida humana, para que ela não
seja convertida em mercadoria, nas mãos de cientistas ou grupos econômicos.
14
Uma das metas, neste estudo, é o registro das razões pelas quais a
presença da Bioética, nas Propostas Curriculares para o Ensino Médio, no
Estado de São Paulo, contribui para a reflexão do sujeito (bio)ético, como ser
pessoa e ser sujeito, revelando o Cuidado como valor, no modo de educar
para a responsabilidade.
Apesar de a Bioética ter sido, inicialmente, objeto de estudos das
Ciências Biológicas e Médicas, é possível que se perceba uma forte referência
à Bioética, na perspectiva ontológica do Cuidado. Foucault (2006) ao abordar o
“cuidado de si”, na perspectiva ontológica, contextualiza a construção histórica
do conceito de Cuidado, nos diálogos entre Sócrates e Alcebíades, aparecem
as idéias desenvolvidas relativas ao Cuidado de si, na obra de Platão.
Na perspectiva de Foucault, o texto de Platão apresenta Alcebíades, um
jovem ateniense que almeja governar a cidade, recebendo o conselho de
Sócrates: “cuida de ti mesmo” para bem governar os outros. O cuidado de si
aparece como o primeiro despertar, e o conhecer-se a si mesmo era o buscar o
Eu que se deve cuidar para bem governar os outros.
No século 5º a.C., Hipócrates, contra a crença milenar, afirma que as
doenças não são castigo dos deuses, mas fenômenos naturais. Ele define a
Medicina como ciência, cujo objetivo é a cura, baseada no conhecimento
filosófico, sobretudo, na ética, que envolve o respeito à vida, ao paciente e à
sua família.
A Bioética, é, hoje, um tema presente em todas as áreas do
conhecimento. No século XXI, mais que em outras épocas, é preciso aprender
a conviver e a aprender a Ser e, como adverte Heidegger, não esquecer o Ser.
A reflexão sobre a importância da Bioética propicia discussões sobre
valores, incentivando o diálogo a respeito de questões sobre a vida, a dor, a
morte, a desigualdade social e outros temas advindos dos cenários compostos
pela contemporaneidade. Estas questões discutidas e divulgadas atualmente,
estendidas a contextos sociais os mais diversos, estão entretecidas na vida
cotidiana.
A relevância desse estudo decorre da presença de um contexto, em
meio a um tempo de grande e acelerado avanço tecnológico. Não significa
15
parar o avanço científico, a questão central é, quando a vida se torna
mercadoria. Esse contexto histórico situa a necessidade de compreender a
qualidade da formação da juventude e do docente e o que contribui para essa
formação. É adequado, nas circunstâncias da contemporaneidade, que esta
formação seja apropriada para desenvolver e sustentar a relação
humanizadora, contemplando os princípios norteadores de uma atitude de
respeito e responsabilidade, na área da educação.
Adota-se a abordagem hermenêutica para este estudo, que se enquadra
na perspectiva da pesquisa qualitativa. Busca-se interpretar os significados
explícitos ou implícitos de um documento. Não se pretende a busca de alguma
verdade ou de informações específicas do texto, mas a construção de sentidos,
a partir de inferências.
Devechi e Trevisan (2010, p. 148), ao sublinhar as diferenças
epistemológicas entre as abordagens dialética, hermenêutica e positivista,
salienta que todas essas investigações se utilizam de procedimentos, tais
como: questionário, entrevista, observação participante, narração, História de
Vida, estudo de caso, etnografia, pesquisa participante e pesquisa ação.
Em Amaral (1994, p. 09), afirma-se que Schleiermacher, Dilthey,
Heidegger e Gadamer contribuíram para que a hermenêutica se tornasse uma
corrente filosófica e, não mais, apenas um método para o “correto acesso aos
textos, com o modo adequado de interpretar esses textos”.
Schleiermacher foi o primeiro a acentuar a genuína dimensão filosófica da hermenêutica na medida em que ele salientou o problema da correta compreensão e interpretação, não somente para os textos da tradição escrita, mas também de uma ampliação da tarefa hermenêutica para todas as formas de comunicação, especialmente o diálogo vivo. (AMARAL, 1994:10)
Assim, a partir de Schleiermacher, a hermenêutica é utilizada, não
apenas, para a interpretação dos textos bíblicos ou dos textos da tradição
escrita, mas ela é utilizada, em outras formas de comunicação que carregam
as marcas de um determinado contexto histórico.
A partir de um estudo documental, procura-se discutir a proposta
curricular implementada, na Rede Estadual do Ensino Público Paulista, no ano
16
de 2008, baseando-se, no conteúdo dos princípios Bioéticos, na disciplina de
Filosofia, a partir do referencial teórico com base em Dussel, Freire e
Heidegger.
Na perspectiva de Gadamer (1999), compreensão não significa,
necessariamente, estar de acordo com o que ou quem se compreende.
Significa, porém, refletir sobre o que o outro pensa, sendo o “outro”, aqui,
aplicado aos autores e teóricos da educação e do campo da Bioética. O estudo
desdobra-se em explicitações de conceitos, interpretações e apreensões,
constituindo-se o movimento dialógico da construção de sentidos.
A compreensão, para Gadamer (1999), é um processo de abertura de
horizontes, para se permitir encontrar, no texto, algo que diz por si mesmo.
Para esse autor, toda a compreensão tem caráter de aplicação, isto é, há uma
pergunta que o texto quer responder. Os conteúdos de sentido se apresentam
como algo presente, no texto da Proposta Curricular do Estado de São Paulo,
que necessita ser descoberto.
O pensar hermenêutico não desconsidera as tendenciosidades
ideológicas do texto, a crença de que não existe conhecimento puro. Para
SEVERINO (1997, p.65), “a lei conceitua, mas não obriga, não assegura seu
próprio cumprimento. Assim, tudo passa a depender das medidas que os
gestores do sistema venham a tomar.”
O processo exige o comando do intérprete que assume a subjetividade fundante de sentido, a interpretação (hermenêutica) dos fenômenos, recuperando os significados, o sentido ou vários sentidos (polissemia) dentro de seus contextos de significados. (Horizontes de compreensão) (GAMBOA, 1995, p.94).
São próprias do enfoque da hermenêutica filosófica, a análise e a
interpretação cuidadosa. A concepção positivista só admite como verdadeiro o,
empiricamente, verificável, enquanto a hermenêutica aponta para a
compreensão da verdade, levando em consideração o conhecimento do
sentido e do valor que há em contextos historicamente situados.
O tema da Bioética, como eixo temático na disciplina de Filosofia, no
Ensino Médio, na rede estadual de São Paulo, neste momento histórico, se
17
supõe necessário ser compreendido à luz das teorias e práticas da área da
educação e, em contextos do processo ensino aprendizagem dessa formação.
Esse ponto de vista orienta a investigação, voltada para a Proposta
Curricular do Estado de São Paulo como diretrizes do Ensino Médio.
Surgem questões, tais como: Como o conceito de Bioética é
compreendido pelos teóricos e autores aqui apresentados? Como os
conteúdos essenciais para o Ensino Médio se relacionam com todo o processo
de educar? Como ocorre a formação docente para sustentar as ações que
envolvem a Bioética? O que significa a formação do sujeito Bioético para o
Ensino Médio?
O presente estudo apresenta a seguinte estrutura.
No primeiro capítulo, apresenta-se uma reflexão sobre o papel da
Bioética no mundo contemporâneo. Sobre as marcas da contemporaneidade,
com indivíduos envolvidos com o avanço científico e tecnológico. A reflexão
sobre a importância da Bioética envolve discussões sobre valores, o diálogo a
respeito de questões sobre a vida, a dor, a morte, a desigualdade social e
outros temas advindos dos cenários compostos pela contemporaneidade.
No segundo capítulo, estabelece-se os vínculos entre a Bioética e a
educação, mais especificamente, a educação do Ensino Médio. Pelo prisma da
Bioética, os temas relacionados às consequências do avanço científico e do
avanço tecnológico, necessitam ser considerados na educação. A discussão
sobre estes temas são fundamentais, nos procedimentos de formação de
professores e de alunos, pela relevância que possuem.
No terceiro capítulo, a partir de um estudo documental procurou-se
discutir a proposta curricular implementada, na rede estadual do ensino público
paulista. As fundamentações desta reflexão recaem sobre o conteúdo dos
princípios bioéticos, na disciplina de Filosofia, a partir do referencial teórico com
base em Dussel, Freire e Heidegger.
18
1. A EDUCAÇÃO EM BIOÉTICA: AS QUESTÕES E OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS. 1.1 - Contextos e perspectivas da Bioética.
Na década de 70, o norte-americano, Van Rensselaer Potter, tornou-se
pioneiro na área da Bioética, com a obra “Uma Ponte para o Futuro”, cujo título
original é Bioethics: bridge to the future. A Bioética foi definida como sendo a
“ciência da sobrevivência humana”, a metáfora contida na palavra “ponte” –
aponta para a comunicação entre ciência biológica e ética.
O termo Bioética, etimologicamente, deriva do grego bios, vida e ethos,
ética, que significa Ética da Vida. Bios representa o conhecimento biológico, a
ciência dos sistemas viventes, e ethos o conhecimento dos valores humanos
(PESSINI 2006, p.21-22), evidenciando a amplitude que toma este saber, em
sua abrangência. Para MOSER (2006), a Bioética emergiu, no contexto da
necessidade de uma “ciência da sobrevivência”, diante dos avanços da
biotecnologia.
A Bioética, como campo de estudo, emergiu após a segunda metade do
século XX. Os avanços científicos e tecnológicos trouxeram uma necessária
tomada de consciência da responsabilidade com o poder suscitado pela
revolução social e biotecnológica. Os desdobramentos se encontram nas
“viradas históricas”, entre contextos sociais e culturais, trazidos pela Segunda
Guerra Mundial. Aqui, as questões sobre a vida e a morte, a saúde e a doença,
o sofrimento e a dor, e a qualidade de vida colocam-se, com características
culturais específicas da contemporaneidade: a velocidade das transformações
e a importância de suas repercussões para o ethos da vida humana.
Os temas, suscitados pela Bioética, estão presentes e integram o
cotidiano das pessoas de um país, que são atraídas para as reflexões que
devem ser realizadas. Estas reflexões abrangem as importantes descobertas
científicas e os modos de produzir ciência, que interferem no modo de vida de
cada ser humano, tais como: manipulação genética e transhumanismo;
19
transgenia e transsexualidade; reprodução assistida; clonagem reprodutora;
eutanásia; distanásia; cuidado paliativo; pesquisa com seres humanos;
transplantes de órgãos, aborto; pena de morte; meio ambiente.
Fatos surpreendentes como os transplantes de órgãos e tecidos, a
fertilização in vitro, diversos tipos de intervenções no corpo humano através de
técnicas e máquinas, a clonagem da ovelha Dolly, atestam que a humanidade
não é mais a mesma. É evidente que estamos vivenciando uma grande virada
histórica, há mais de três décadas. A vocação da Bioética se estabelece para
dialogar com as ciências aplicadas nos laboratórios, zelando pelo humanum da
humanidade.
Surgem necessidades diante de novas demandas: Comitês de Ética
para as pesquisas, o Biodireito e a Biossegurança, tratando de temas que
emergem a todo momento, entre outros, o início e fim da vida, que se
desdobram em temas polêmicos, tais como aborto, prolongamento da vida,
sofrimento, genoma, embriões congelados em laboratórios, pesquisas com
células tronco e outros tantos ligados ao corpo humano físico.
Foi criado, na década de 1970, o Instituto Kennedy de Bioética. A partir
daí, foram sendo delineados princípios, importantes, marcos de cunho
intelectual e reflexivo da Bioética: justiça, autonomia, beneficência ou não
maleficência. São princípios de uma nova consciência que, para decidir o
presente e o futuro, compreende a necessidade de critérios éticos,
esforçando-se para não deixar a vida humana ser transformada em
mercadoria, ficando nas mãos de alguns cientistas ou grupos econômicos.
Na visão de Beauchamp e Childress (2002), sobre a égide do
principialismo, se dá o desenvolvimento da bioética, a partir de eixos
norteadores de caráter (de) ontológico: não maleficência e a justiça e de
caráter (tele) ológico: beneficência e autonomia. Não sendo absolutos, do
ponto de vista filosófico, foram rapidamente difundidos, passando a ser parte
integrante e ferramentas utilizadas, na mediação e na solução dos conflitos
morais, pertinentes às temáticas bioéticas.
Há algumas vertentes teóricas, também denominadas linhas ou
paradigmas, para abordagens de questões, apresentando perspectivas
20
Bioéticas. O principialismo é uma linha de pensar a bioética, ou uma das
linguagens bioéticas. A contextualização é condição, sine qua non, para
possibilitar o processo do desenvolvimento dos princípios bioéticos, pois a
singularidade de cada caso deve ser analisada, sob o foco da dignidade
humana singular e particular, dentro do contexto social, econômico e cultural.
A vertente “libertária” apresenta, como valor central, a autonomia e o
individuo. Seu principal autor é TRISTAM ENGELHART (1998), que defende os
direitos e propriedades do individuo.
No paradigma das virtudes, reagindo à perspectiva individualista dos
modelos precedentes, apresenta-se o modelo da virtude defendido por
(EDMUNDO PELLEGRINO e DAVID THOMASMA, 1991).
Este modelo coloca a tônica no agente, particularmente, nos
profissionais de saúde, integrando o paciente em seu processo de decisão. O
paradigma casuístico, defendido por Albert Jonsen e Stephen Toulmin, em The
abuse of casuistry, incentiva a análise, caso por caso, num plano analógico. Os
paradigmas fenomenológico e hermenêutico enfatizam a necessidade de
reconhecer que toda experiência está sujeita à interpretação. Existem sempre
duas dimensões, em cada situação: uma subjetiva e outra objetiva.
A linha narrativa fornece outro caminho para abordar a experiência
humana e os dilemas morais que a caracterizam. O paradigma do Cuidado é
defendido por Carol Gilligan em In a different voice; parte da psicologia
evolutiva é mais de cunho psicológico do que filosófico. O paradigma do direito
natural, apresentado por Jonh Finnis (2007), estabelece a existência de alguns
bens fundamentais em si mesmos: o conhecimento, a vida, a vida estética, a
vida lúdica, a racionalidade prática, a religiosidade, a amizade. Estes são bens,
em si mesmos, fins e não meios, que não supõem nenhuma organização
hierárquica entre si.
O paradigma contratualista apresentado por Veatch (2006) tem, como
ponto de partida, a denúncia das insuficiências de fundo que a ética hipocrática
apresenta. Defende um triplo contato: entre médico e pacientes, entre médicos
e a sociedade, e um contato mais amplo com os princípios norteadores da
relação médico-paciente.
21
Nesta breve contextualização, pode-se acrescentar o paradigma
antropológico personalista, com vários autores que discutem a necessidade de
uma fundamentação antropológica para dar suporte às questões bioéticas.
Entre os autores, encontram-se E. Sgreccia, D. Tettamanzini, S. Leone, J.F.
Malherbe, C. Viafora, S. Spinsanti. Trata o sujeito em sua globalidade
(PESSINI; BERCHIFONTAINE, 2000).
No Brasil, a Bioética, como campo de estudos, adquire uma perspectiva
acadêmica, a partir dos anos 90. Tem se preocupado com a reflexão, com a
compreensão e com o tratamento dos desafios trazidos pela tecnociência, no
mundo da saúde humana, envolvendo ainda, o tratamento dos problemas
persistentes, advindos da desigualdade e da exclusão social. Estes problemas
são emergentes e afetam a vida das pessoas, em contextos latino-americanos.
Garrafa (2002) denominou “bioética dura” esta vertente teórica, em que há a
necessidade de intervenções práticas para os problemas sociais do entorno
comunitário.
Ségre e Cohen (1994) apresentam um prisma à “reflexão autônoma”,
sustentando que a prática da Bioética precisa vir de dentro para fora. Para
mudar o outro, preciso mudar o meu eu, o que implica em disposição interior
para aceitar mudanças. Neste ponto, já se desenham perspectivas
educacionais da bioética para a prática do magistério: a visão do professor que
compreende a necessidade de “olhar para si mesmo” e, a partir daí e a partir
de então, trazer as “contribuições necessárias para o mundo exterior”
(MONTAIGNE 2009, p. 101).
Pessini e Barchifontaine (2000) destacam as similitudes e as diferenças
entre vários modelos para trabalhar a Bioética, tendo em vista que as
dimensões morais da experiência humana não podem ser capturadas por uma
única perspectiva. Este é um apontar para a importância do diálogo necessário
entre as ciências, para que os avanços não sejam apenas técnicos, mas
profundamente humanos. Torna-se evidente o compromisso mais amplo da
Bioética com as relações humanas, envolvendo os ecossistemas e a vida do
planeta.
22
No Brasil, devido à extensão territorial e às desigualdades sociais, são
feitas adaptações adequadas aos contextos e às realidades aqui encontradas.
O paradigma tradicional ou principialista dos EUA é praticado, na maioria dos
dilemas a serem resolvidos. Os profissionais, principalmente da área de ciência
da saúde, têm seus pilares nos princípios básicos para as tomadas de
decisões, muitas vezes, de conflitos morais.
Temos a Bioética feminista, defendida por grupos, em Minas Gerais e
Distrito Federal, cujos movimentos a favor do aborto e da saúde preventiva
tomam proporções consideráveis. O paradigma anti-racista também se
apresenta como movimento social, com presença constante de militantes em
eventos nacionais e internacionais, em especial o Fórum Social Mundial e
Brasileiro, realizado em Belo Horizonte, em 2003.
O paradigma casuístico tem muitos seguidores no país e privilegia não
só a autonomia da vontade, como também a participação de pacientes e
familiares, na tomada de decisões terapêuticas, bem como a recusa da mesma
pelo paciente. Em 2002, no Congresso Mundial de Bioética, realizado na
capital federal, o seu presidente Professor Volnei Garrafa, disse o que se
denomina de “Bioética Dura”, contexto no qual o cidadão precisa agir mais, em
função dos problemas sociais apresentados e deixar um pouco a academia,
em outras palavras, partir para a prática.
Pessini e Barchifontaine (2000) concordam com a necessidade de
diferenças entre vários modelos para trabalhar a Bioética, entendendo que as
dimensões morais da experiência humana não podem ser capturadas por uma
única perspectiva. O que se pode constatar é que, os problemas bioéticos são
numerosos e complexos.
Durand (2007) salienta que entre os desdobramentos se encontra a
fragmentação da vida, priorizando os aspectos científicos, técnicos e
tecnológicos, em detrimento dos aspectos humanos. Esses avanços colocam
em pauta a reinvenção dos direitos humanos.
O enfoque peculiar da Bioética é a visão de interdisciplinaridade,
propondo desta forma integrar as disciplinas que compõem o conhecimento
humano. Desde que ela surgiu, há a pretensão de olhar para a vida, para todas
23
as áreas do conhecimento que, de uma forma ou de outra, têm implicações
sobre a vida, não podendo ficar restrita às Ciências da Saúde.
Quanto maior é a interferência no mundo, por meio do conhecimento,
tanto maior é a responsabilidade sobre as intervenções, na realidade do ser
humano, propriamente dito, e do meio ambiente. A urgência de uma ética para
o conhecimento situa os estudos da Bioética, delineando perspectivas por sua
proposta interdisciplinar. Neste sentido, a bioética se apresenta como reação
cultural ao conhecimento fracionado e reducionista especialmente no que se
refere ao ser humano.
1.2 - Aspectos filosóficos.
A Bioética ao propor uma reflexão sobre a vida, com seus princípios de
alteridade, justiça e beneficência, remete-nos ao Cuidado do “estar com”, de
Heidegger, na alteridade, condição humana para a construção do homem e de
uma morada mais justa, porque a participação que envolve, compromete e
oportuniza o exercício da responsabilidade. O homem, em seu mundo
indivisível, é o próprio responsável pelo rumo da sua raça, isto é, sua análise e
reflexão são: o problema e a solução. Ambas, a beneficência e a maleficência
são condições de escolhas inerentes do Ser e acarretam repercussões para a
manutenção da vida.
A civilização humana, historicamente, passou os séculos travando lutas
internas e externas, entre o poder técnico e o político, passando por culturas
que se diferenciam em costumes e valores como a Oriental e a Judaico-Cristã.
Refletindo sobre o cotidiano da sociedade atual, temos as pessoas dividas em:
clubes, times, símbolos, marcas, diferenças, disciplinas, diretor, professor,
aluno, partidos, etc. São divisões que nos confrontam e nos mantêm isolados.
O movimento do “Ser”, porém, pode acolher princípios éticos de “respeito e
justiça”, virtudes necessárias para os laços de amizade que garantem a
sobrevivência da raça humana.
Os meios do exercício do respeito e justiça somente podem ser
desenvolvidos pelos homens através do Diálogo, Cuidado e Compaixão. A
Bioética, como ciência (POTTER, 1970), estuda a moralidade da conduta
24
humana, no campo da ciência da vida. Assim, pela combinação do campo da
Biologia e da Ética, estabelecem-se elos entre ciência e política, tendo como
eixo central, para as tomadas de decisões, movimentos internos do Ser,
manifestados no respeito e na justiça.
O desenvolvimento tecnológico, os avanços em todas as áreas do
conhecimento e a informação veiculada, em tempo real, trazem aos homens,
como tarefa, a urgência de ações e o convívio com criatividade diante das
situações, como forma de garantir a sobrevivência.
Heidegger, pensador do existencialismo, traz à reflexão a questão da
imanência, isto é, nada existe, acima do humano, com que o homem possa
contar para ordenar e orientar suas ações no mundo. É somente à frente de si
mesmo, que o homem pode construir critérios e suas justificativas.
Sartre (1943) apresenta a concepção de que a existência vem antes da
essência. Isto significa dizer que o “o homem é condenado a ser livre”. O
homem é condenado a tomar decisões, fazer escolhas e opções. Como
enfrentar sem critérios absolutos de discernimento e de escolhas? A busca da
reflexão constante entre o bem e o mal, torna-se limitado entre o erro e o
acerto, que classifica e julga, é na consciência do respeito, na alteridade que o
Ser se constitui em Sujeito que, para cada ato em particular, desenvolve os
princípios de justiça e respeito.
A estética da sensibilidade vem substituir a repetição e a padronização,
a práticas hegemônicas. A criatividade, o espírito inventivo, a curiosidade pelo
novo, a afetividade que valoriza a leveza das relações, o acolhimento do outro
e o pensar sutil para conviver com o diferente, é superar os desafios
inquietantes da sociedade. O prazer da descoberta do fazer com o outro. Esta
estética não convive com as formas de exclusão, intolerância e intransigência.
Busca o aprimoramento do Ser, promovendo a critica contra a vulgarização e
embrutecimento das pessoas e dos inter-relacionamentos.
Essa reflexão convida-nos a pensar as relações com equidade, respeito
ao bem comum ao uso do senso de responsabilidade, forma de lidar com o
público e o privado e permitir possibilidades de “aprender a aprender”,
Identidade que substitui padrões morais abstratos, mas reconcilia o coração
25
humano, nas contradições entre o mundo moral e o mundo material, o corpo e
a mente, o publico e o privado, todos sujeitos a serem escolhidos pelo homem,
a partir dos fundamentos estéticos e políticos. Educar sob a inspiração da ética
não é transmitir valores morais, mas criar as condições para que as identidades
se “constituam pelo desenvolvimento da sensibilidade e pelo reconhecimento
do direito a igualdade” (DCEM/SP).
Para Dalai Lama (2000, p. 45) “criamos uma sociedade em que as
pessoas acham, cada vez mais difícil, demonstrar o mínimo de afeto aos
outros’. Em vez da noção de fazer parte, do sentimento de pertencer a um
grupo, encontramos um alto grau de solidão, pela perda de laços afetivos. Os
discursos contemporâneos reforçam uma noção de crescimento e
desenvolvimento econômico, que levam as pessoas, de modo intenso, à
competitividade e às disputas, fonte de problemas, tensões e infelicidade.
Estas questões implicam na perda da dignidade humana, apresentada sob
diversas formas.
Nunes (2002, p. 47) entende ser decorrente da dignidade, o principio da
intimidade, da vida privada, da honra e da imagem da pessoa humana. Para
ele, a dignidade é, inclusive, preceito norteador da solução de conflitos entre os
diversos direitos fundamentais tutelados na Carta Magna de 1988, concluindo-
se que “a estrela máxima do universo principio lógico, é a dignidade da pessoa
humana”.
O ser humano, como substância individual de natureza intelectual, é
uma pessoa; portanto, é capaz de agir por si e ser senhor dos seus atos. Com
o desenvolvimento contemporâneo da ciência, as fronteiras encobertas do
mistério humano, como sua reprodução e funcionamento biológico, são
desvendadas pelos avanços das pesquisas tecnocientíficas. São descobertas
sobre o corpo que facilitam a compreensão e o funcionamento dos órgãos,
revelações das pesquisas biológicas, como a fecundação in vitro, por exemplo,
e outras situações, antes,obscuras para o homem.
Há um mundo de criação e mistério, sobre o funcionamento da máquina,
chamada corpo. Assim, a pessoa, que é mais do que seu corpo, confronta-se
com este mundo, implicando cisões que geram crise de valores.
26
O termo grego para crise é “Krinein”, que significa: separar, crivar,
escolher; num sentido mais lato: julgar, ajuizar, avaliar, decidir. Todas essas
possíveis significações estão relacionadas à sua raiz “sânscrita, onde o termo
indica limpar e purificar” (BOLLNOW, 1971, p.43).
Avaliar, escolher, purificar e limpar, são ações que a sociedade do
século XXI é chamada a fazer, como tarefa necessária para pensar a vida, sob
a ótica de dignidade e equidade para todos os cidadãos, a partir do respeito e
direito de todos os Seres Vivos, de viverem. Os indivíduos, em coma
prolongado, ainda são pessoas humanas ou são seres vegetativos? A criança
existe como pessoa, no ovo, no estado de blástula, no momento da formação
do embrião, no terceiro mês, no sexto ou no nascimento? Perguntas como
estas podem ser respondidas pela ciência? Sob quais condições? Como serão
os critérios para nortear as respostas?
Ao lado destas indagações, surgem outras: que ser humano é desejado
e que ser humano dever ser evitado? Até em que momento os pais devem
decidir sobre como devem ser os filhos? Com a manipulação genética,
apresenta-se um outro problema Bioético, a respeito de como devem ser os
filhos? Como podem ou devem ser “metamorfoseados?”. Não foi discutida,
historicamente, a eugenia como sonho de raça perfeita e pura, em que a
imperfeição não tem lugar?
O saber da ciência e o ser humano se confrontam, pois, de fato, se
reconhece que foram criadas possibilidades de morte e de vida e, para superar
esta crise, a substância pensante deverá ter como premissa da ação humana,
o pensar, o ponderar, o escolher. Tomas de Aquino (apud CAMPOS, 1989,
pag. 61) ilumina a questão apontando “que a substância capaz de pensar é o
que chamamos de pessoa”. Para ele, “a riqueza, profundidade e beleza da
natureza humana se revelam de modo diferente em cada individuo, assim, na
multiplicidade dos indivíduos aparece a infinita riqueza e beleza da sempre
idêntica natureza humana”. Este ponto se torna balizador, tendo no
conhecimento e nas experiências do passado, pontos de reflexão para novas
abordagens, centradas na pessoa e no valor da vida, nas tomadas de
decisões.
27
A polêmica toma forma contundente, quando se remete ao conceito de
pessoa. Os diferentes enfoques de pessoa se originam de diferentes
interesses, desde o corpo como uma mercadoria, um produto de desejos ou
circunstâncias que possam definir condições de vida ou de morte. É possível
ou, não, considerar que “existe uma moralidade secular que justifica a compra
e venda de partes do corpo”?
Na perspectiva de Engelhardt (1998) e adeptos, sim. Na concepção de
autores como Andorno (1997, p.35), não, pois “a relação do sujeito com seu
corpo surge na realidade da ordem da natureza e não da ordem do direito”.
Ainda segundo este mesmo autor, a primeira posição “conduz a uma atitude
indiferente diante dos homens mais fracos”, ou seja, “o respeito dirige-se aqui
apenas a um número restrito de sujeitos, aqueles que têm chances de possuir
certas qualidades julgadas ‘essenciais”. Quanto à segunda posição, o autor
caracteriza como aquela que “conduz a uma atitude de respeito diante de todo
indivíduo, qualquer que seja sua idade ou seu estado de saúde”.
O saber da Bioética exige atenção para que seja problematizado,
metodologicamente. Pensar a Bioética dentro de uma definição cientifica com a
mesma lógica das ciências exatas é fragmentar a vida, porque ela pensa e
reflete a vida. Seu enfoque esta no campo da filosofia e refletir é atributo do
homem, da pessoa, do Ser, na complexidade do corpo e da sua subjetividade.
Husserl denomina “crise das ciências”, a toda forma de fazer ciência, tanto a
teórica como a prática, abandonando a importância total do Ser e, assim,
abordou a questão, em 1935, em uma conferencia em Le Nouvel Observateur:
Mas o cientista que estuda a natureza não percebe claramente que o fundamento permanente de seu trabalho subjetivo de pensamento é o mundo da vida; ele é que constantemente pressuposto como o terreno, o campo de trabalho sobre o qual apenas suas questões, seus métodos de pensamento adquirem sentido (1935, apud MOZER, 2004 p.12).
Para Husserl, o “pensamento adquire sentido”, porque ele não é uma
ciência, mas uma reflexão sobre os saberes disponíveis, interrogado pela
filosofia, interrogando internamente sobre os pensamentos dos outros, sobre o
mundo, a sociedade. Ela é uma dimensão constitutiva da existência humana,
28
seus objetivos são incontáveis, porque nada do que é humano ou verdadeiro
lhe é estranho.
Pensar filosoficamente é pensar adiante do tempo, explorar mais do
que sabemos, com a finalidade de manifestar, na corporeidade como morada,
a preservação, a dignidade e o respeito pela condição humana de si e do outro. Pensar filosoficamente sobre os aspectos que dignificam a vida, está entre os
temas mais significativos para a sociedade atual. Para Gianotti (2002 p.34) as
“Crises sucessivas e a perda dos referenciais levaram as sociedades à
cobrança moral e ética a partir de valores e compromissos considerados
válidos”. Assim, o debate sobre a ética tem sido um dos campos mais férteis da
filosofia, estendendo-se ao campo da saúde.
A valorização da reflexão ética encontra motivação ou justificativa na
mutabilidade dos valores. Os debates sobre ética são norteadores para as
ações humanas. A questão central da ética é sobre quais são os argumentos
que sustentam este ou aquele código moral, aceito como código de conduta.
Qual o sentido deste ou daquele valor? A ética quer compreender os fins e os
meios da ação humana, por isso, nas reflexões sobre a ética, faz-se a analise
reflexiva das ações práticas e particulares, das escolhas e das relações
construídas pelos seres humanos. É uma especificidade que exige do homem
investigação, vontade e decisão.
Dussel (2002) propõe que a vida humana não pode ser entendida de
forma abstrata, mas em sua materialidade externa. Materialidade esta situada
dentro da história, cultura, povo, língua, tempo e espaço. As circunstâncias
desta materialidade – a vida ou a morte dependem do corpo físico, da sua
história, do tempo histórico e cultural e das condições necessárias para o viver
com dignidade.
Para Vazquez (1997, p. 5-23), ética significa, analogamente, “modo de
ser” ou “caráter”, enquanto forma de vida também adquirida ou conquistada
pelo homem. Caráter e costume assentam-se em um modo de comportamento
que não corresponde a uma disposição natural, mas que é adquirido ou
conquistado, culturalmente, através de hábitos.
29
O esforço de superar a dualidade corpo e mente, ciência e filosofia,
parece ser o caminho da Bioética pelo seu transitar em diversos campos do
conhecimento humano. A tentativa de buscar o todo, o consenso, o ‘holos’,
perdido pela fragmentação do método cartesiano, são características da
bioética. Para Mozer (2006, pag.56), precisamos nos orientar para:
pensar a complexidade das relações sem, contudo, cair na doença
do intelecto, do idealismo, ou na doença do puro empirismo, que por sua vez cai na doença degenerativa da racionalidade instrumental, que propõe reduzir tudo e a todos a um processo tecnoburocrático.”
A Bioética ultrapassa o fundamentar-se em regras ou códigos de
conduta. Propicia, antes de tudo, o pensar a vida através de exercícios
filosóficos, questionando e investigando, até que ponto, os avanços científicos
têm o direito de afetar a vida, quais seus limites, o que significam condições
dignas para todas as pessoas.
Suas indagações se movem sobre temáticas relativas à conduta
humana, diante do poder tecnológico, sobre questões de direitos sobre o
corpo, seja em estado de vida ou de morte, se é justo manipular a vida e até
onde isto pode ser feito e sobre as responsabilidades de quem faz e de quem
recebe serviços que envolvem a vida humana. Em todos os questionamentos,
próprios da bioética, não se pode esperar por respostas fechadas, exatas, mas,
sim, por pistas que são sinalizadores para pensamentos e condutas
ponderadas e prudentes.
Segundo Hottois (2008 p. 612), a função do filósofo e da filosofia, dentro
de todas estas temáticas, não é a de “tomar posição em favor de uma
convicção moral determinada”. Ao filósofo, cabe o “esclarecimento do debate e
a explicitação dos valores e princípios em jogo”, colocando sob foco “os
pressupostos, análise dos argumentos e dos contra-argumentos”. Para ele, a
função filosófica é “velar pela ética da discussão, que exige que os pontos de
vista dos diferentes interessados possam expressar-se livremente e sem
pressão”, possibilitando que todos os argumentos sejam apreciados e
debatidos.
30
1.3 - Considerações pedagógicas.
A Educação é um termo cheio de significados que pode expressar
conteúdos, conceitos e aspectos culturais. Na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, educação é direito, desenvolvimento de competências,
aprendizagem para a formação do homem integral, a fim de prepará-lo para o
mundo do trabalho. Esta questão pode se apresentar como discussão Bioética:
a educação como processo de desenvolvimento de conteúdos, conceitos,
competências, habilidades, compreensão de mundo, é suficiente para formar o
homem?
O processo educacional é soma de todas as formas de aprendizagem
formal, informal e de valores humanos que se desenvolvem e se constroem
nas relações humanas, constituindo-se na moral e na dignidade da pessoa.
Desta forma, professores e alunos são aprendizes, pessoas em transformação,
participantes da condição humana do estar no mundo.
O Brasil e países vizinhos sofrem as conseqüências, no presente, do
processo de formação e colonização de suas nações e estão, na atualidade,
através de políticas públicas, buscando efetuar resgates sociais e de cidadania.
Para que as pessoas se tornem cidadãos com dignidade, é fundamental as
escolhas éticas. Torna-se necessário tratar problemas tais como a fome, o
analfabetismo, saneamento básico, moradia. Sem a possibilidade de voltar
para casa e ter um lugar digno para viver, poder construir hábitos e costumes
saudáveis, ter entendimento para fazer escolhas e ações preventivas de
saúde, o indivíduo é furtado em sua dignidade. Problemas como a prostituição
e o aborto, como opções puramente econômicas, doenças que levam as
pessoas a situações de exclusão, a morte em condições indignas, são algumas
das questões que esperam decisões e conhecimentos técnicos para serem
tratados.
A Lei Federal nº 9.394 LDBEN/1996 surge para a superação das
condições apresentadas acima e propõe-se estar em conformidade com o
projeto de uma educação que esteja à altura dos desafios contemporâneos. A
sociedade do século XXI é caracterizada pelo uso intensivo do conhecimento,
31
mas é preciso que o conhecimento não esteja dissociado do compromisso
ético, HEGEL (1844, apud MARX, 1974):
pedagogia é a arte de fazer ético os homens; considera o homem como natural e lhe mostra o caminho para nascer de novo, para converter sua primeira natureza em segunda natureza espiritual, de tal maneira que o espiritual se conversa em hábito.
Esta consideração sobre pedagogia nos auxilia a sintetizar a
interpretação do caráter flexível e reflexível da LDBEN de 1996. A Proposta
Curricular do Estado de São Paulo (2008) foi pensada na LDB e suas diretrizes
para o estado “laico”. Aqui se insere uma questão da Bioética, implicando a
necessidade de reflexões existenciais, amparadas por filósofos tais como,
Sartre, Heidegger e os da escola critica de Frankfurt, já que a relação do eu
com o próprio corpo não deixa de ser um dos pressupostos da subjetividade
contemporânea.
O processo educativo é essencial para o homem. Os cuidados, desde
seu inicio da vida, fazem parte do seu processo de desenvolvimento humano.
A educação começa de maneira informal, as relações pessoais de acolhimento
e afeto, no ambiente familiar, marcam as primeiras impressões sobre a vida.
Vamos buscar conhecer as definições da palavra “afeto” e da sua importância
para a vida, para o Filólogo HOLANDA FERREIRA (1994, p.154-155), affectuar
(afetar, tocar). Partindo desta definição, o outro já assume importância, na troca
entre pessoas, demonstra a disposição de ser afetado e tocado.
O termo “afeto” assume importância na educação formal e vem sendo
pesquisado e estudado nas teorias educacionais: como a de Skinner, Bruner,
Papert e Paulo Freire e também nas teorias das aprendizagens: Como
cognitivismo e construtivismo, a definição psicológica, nos dá dimensão da
importância deste verbete para a vida: “fenômenos psíquicos que se
manifestam em sentimentos e paixões, acompanhados sempre da impressão
de dor, insatisfação, de agrado e desagrado, de alegria ou tristeza”.
O estudo da psicologia relaciona a afetividade à formação das pessoas
felizes, éticas, seguras e capazes de conviver com o mundo. O processo
educacional tende a ser compreendido como preparação para a sociedade,
32
para a vida adulta, para o trabalho ou para ir seguindo adquirindo cultura,
quando, antes de qualquer coisa, como afirma BRUNER (1997, p.31), “é uma
forma de viver a cultura. O saber adquirido, nas relações familiares e na escola
prepara a pessoa para se manifestar diante da realidade social, e de toda a
herança cultural recebida dentro do seu desenvolvimento humano.
O processo educacional seja ele formal ou informal é cada vez mais
complexo na medida em que a vida torna-se mais complexa. Podemos concluir
que a expressão oral, corporal e visual e, mais, a comunicação com o mundo e
com o outro, precisam da atividade que caracteriza o ser humano: a
racionalidade e a linguagem expressa e manifesta no diálogo.
Vivemos, hoje, em uma sociedade informacional; isto requer uma
formação intercultural e global quanto aos conhecimentos e valores. A
Educação na sociedade da informação e do conhecimento deve basear-se na
utilização de habilidades comunicativas, de modo a capacitar a pessoa a
participar de forma critica e reflexiva, elaborando argumentos e formas de
interagir na sociedade.
Para Santos (2000) “a competitividade é a ausência da compaixão”. Esta
afirmação desafia a compreensão para perceber a educação formal mais do
que o preparo das pessoas, para serem consumidoras e competitivas, além de
entenderem a necessidade da relação humana, na compaixão, para superar a
globalização perversa.
Outro elemento relevante, hoje, para o sentido da educação é a
complexidade da ambiência cultural, das dimensões sociais, econômicas e
políticas, a presença maciça de produtos científicos e tecnológicos e a
multiplicidade de linguagens no cotidiano. Apropriar-se ou não desses
conhecimentos pode ser um instrumento da ampliação das liberdades ou mais
um fator de exclusão.
A educação não é neutra, mas política, e a decisão de acabar com a
exclusão das pessoas é devolver, antes de tudo, a dignidade humana negada.
Faz-se necessário reparar a dívida histórica da exclusão e da desigualdade
social, que fez vitimas, em um sistema construído sobre os interesses
econômicos e sociais. A Educação Nacional, através da Lei de Diretrizes e
33
Bases e o sistema educacional do Estado de São Paulo têm o objetivo de
implantar uma consciência reflexiva, que incorpore como práxis o
“reconhecimento do outro numa relação de seres naturais e necessitados, e
este reconhecimento não pode excluir ninguém” (DUSSEL, 2002, p. 530). Isto
se torna significativo para as políticas públicas.
Dussel (2002) traça concepções educacionais que implicam em tomar a
história como objeto de reflexão. A história, não como fatos ou dados
narrativos, mas como um processo importante de ponto de partida, para o
resgate histórico das conseqüências sociais e humanas de ações contra a vida
de todos aqueles que eram diferentes, ou melhor, desrespeitados na sua
condição de pessoa.
Dussel (2002) tece o seu pensamento não só pelas idéias, mas também
“pelas coisas em si”, coisas do concreto, da sua observação. É, na observação
da educação, de suas práticas pedagógicas e, na reflexão sobre os conceitos
pessoais dos seus atores, que se apresentam implicações Bioéticas enquanto
respeito à vida, à pessoa e à construção de relações humanas. Pensar o
conhecimento, pensar disciplinas integradas, e não compartimentadas, pode
indicar um sentido novo para a construção do sujeito que se modifica
constantemente e que, da mesma forma, pode transformar o processo
educacional em uma cultura de prazer.
A concepção de educação de Paulo Freire é pedagogia libertadora e
atribui ao sujeito a responsabilidade de modificar-se, capacidade para se
humanizar e conscientizar-se de que é um Ser em evolução e que é, através
do “Pensar Certo”, que se alcança a humanização. Esta fundamentação
coerente com a defesa da vida é debatida na Bioética. Chama para a vida
ideias, com finalidades de manter o olhar para o outro, com o desejo e o
respeito de contribuir, através da educação, para a preservação de ações e
concepções, ligadas à formação da consciência humana, coerente com a
concepção de vida existencial.
Freire (1967) afirma que é importante, na educação nacional assim
como na mundial, alguns princípios e práticas desenvolvidas, na educação de
adultos e nas camadas populares. Tais princípios abrangem mais do que a
34
redução ao aspecto marcado pela natureza política do seu pensamento. Ele
adverte para a necessidade de que se assuma uma postura vigilante, contra
todas as práticas de desumanização. Para tal, o saber da auto-reflexão crítica
e o saber-ser da sabedoria, exercitada permanentemente, de ajudar a fazer a
necessária leitura crítica das verdadeiras causas da degradação humana e da
razão de ser do discurso fatalista da globalização.
A proposta de Freire não é tratada como método ou, até mesmo, como
uma técnica de ensino. O objetivo inicial é a conscientização. A elevação social
e a transformação da realidade dos homens e das mulheres visando à
consecução da sua humanização. Aprende-se com Freire a esperança; a lutar
e a não desacreditar das possibilidades de mudanças na educação, como uma
atitude ética.
A Educação, como proposta pedagógica viva, clama por uma nova
ordem econômica e por solidariedade, a fim de que a humanidade se
conscientize de que o objetivo primeiro de toda a evolução não é o acúmulo
dos bens e da sua concentração, mas a da distribuição, e que todos usufruam
dos frutos do esforço e do progresso humano.
Para Morin, (2003, p.11) “Apesar da longa história da humanidade
“ainda não existe uma sociedade civil mundial e a consciência de que somos
cidadãos da Terra Pátria”. Este pensamento está disperso, “embrionário”.
Convencido da necessidade e da importância de construir uma concidadania
planetária, o autor sinaliza quais devem ser as cinco grandes finalidades
educativas: “a cabeça bem-feita que nos dê a aptidão para organizar o
conhecimento, o ensino da condição humana, a aprendizagem do viver, a
aprendizagem da incerteza, a educação cidadã” (MORIN 2003 p. 103).
As concepções da educação, no século XXI, e as concepções bioéticas
têm, na vida e na condição humana, o seu foco de atenção. Os avanços da
tecnologia que aproximam os homens também os colocam na condição de
fragilidade. Morin (2002), dentro das finalidades da educação, ressalta o
“ensino da condição humana”. Este conceito se alinha com a educação bioética
que se apresenta para somar e acrescentar, às discussões e reflexões
problemáticas, oriundas do avanço da ciência, tornados visíveis por uma mídia
35
que comunica, fartamente, as realidades das pessoas. Entre os temas sempre
presentes, encontram-se os assuntos sobre a saúde, posicionamento a favor
ou contra o aborto, gravidez indesejada, manipulação de órgãos, o aborto, a
violência - especialmente no meio escolar - denominada bullying. Há, ainda,
temas como células troncos, projeto genoma, alimentos transgênicos, entre
outros. São assuntos pertencentes à condição humana e são desafiadores por
sua complexidade, necessitando conhecimento e esclarecimentos para a
formação de opinião e decisão de escolhas do sujeito.
O avanço dos instrumentos de comunicação e informação, notadamente
a internet, que trazem, em tempo real, o problema, resulta na urgência de que
a escola cumpra o seu papel. Este papel supõe a participação, em tempo real,
da problematização, com a proposta de contribuir para a elaboração do
pensamento do educando, com autonomia, liberdade e responsabilidade, nas
discussões que, outrora, não eram feitas na escola. Todavia, hoje os temas
que se referem à vida, seja ela biológica, psicológica, social ou cultural, pela
relevância que possuem para a existência das pessoas, necessitam ser
discutidos e aprofundados.
A formação do homem foi, desde os tempos remotos, motivo de reflexão
e incertezas. Aristóteles (1965) nos ajuda a compreender a dificuldade de
escolhas para a aprendizagem e formação humana. Ele aborda os
questionamentos de escolha:
Fica claro, portanto que a legislação deve regular a educação e que essa deve ser obra da cidade não se deve deixar no esquecimento qual deve ser a educação e como se há de educar. Nos tempos modernos as opiniões sobre este tema se diferem, não há acordo sobre que os jovens devem aprender e nem no que se refere a virtude, e nem quanto ao necessário para uma vida melhor. Tampouco esta claro se a educação deveria se preocupar mais com a formação do intelecto do que do caráter. Do ponto de vista do sistema atual a investigação é confusa, e não há certeza alguma se devem ser aplicadas as disciplinas úteis para a vida ou as que detem a virtude ou as que se sobressaem do ordinário (pois todas elas tem seus partidários). No que diz respeito aos meios que conduzem a virtude não há acordo nenhum (de fato não honram, todos a mesma virtude de modo que diferem logicamente sobre seu exercício).
36
Escolher entre “a virtude e o necessário para a vida”, segundo o autor, é
uma disposição adquirida de fazer o bem. A Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, quando enfatiza a formação integral manifesta,
subjetivamente, a crença que é competência da educação fazer com que o
jovem adquira a virtude. Na Ética a Nicômaco, Aristóteles, afirma que as
virtudes se aperfeiçoam com o hábito.
Também em Sócrates, encontramos argumentos que referenciam a
escola, como espaço de construção de conhecimento e virtude, e possibilidade
de ensino. SHATTUCK (1998 p.20) apresenta o pensamento socrático, para
quem "tudo é conhecimento, inclusive a justiça, a temperança e a coragem - o
que tende a demonstrar que certamente é possível ensinar a virtude.”
Para Boff (2000 p.45), a exigência de superar a dicotomia entre corpo e
mente se realiza pela compreensão de que “o ser humano é a um só tempo
físico, biológico, psíquico, cultural, social e histórico.” Nesta compreensão, o
homem passa a ser o todo, e não há divisões nem escolhas que possam ser
priorizadas. Isto justifica a necessidade de instrução e educação formal que se
componha para explicar, ensinar e resolver problemas que se apresentam no
contexto da vida. As disciplinas, vistas como compartimentos, não podem
formar este todo, porque se apresentam, em fragmentos, com conceitos
descontextualizados, não representando o todo que permite a leitura de mundo
mais ampla e real.
Os debates e temas sobre valores reúnem-se em torno de um ser
humano inteiro, que vive e convive, portanto, são aspectos da existência que
se ligam e se amoldam, para responder e argumentar as mudanças, sejam elas
no campo das ciências medicas, das ciências sociais ou no campo filosófico.
Não se trata de ensinar virtude, na sociedade do conhecimento, mas de
desenvolver as competências para ser virtuoso, para viver e conviver com
solidariedade. A proposta da Bioética propõe a reflexão sobre o respeito e a
dignidade a todos os seres vivos, porque a existência, por si só, é condição de
respeito.
Pensar que as condições externas impõem as escolhas, sem que se
leve em conta os movimentos internos do sujeito, é diminuir o ser humano, sua
37
criatividade, sua autonomia e sua liberdade. O significado de escolher, na
sociedade do conhecimento, aponta para o pensar bioético, na educação, e se
apresenta como “esperança de que professor e aluno juntos podem aprender
e ensinar, inquietar-nos, produzirem juntos” (FREIRE, 1996 p.130).
Assim a esperança freireana é que se tragam possibilidades para o
conhecimento gerar e preservar condições de vida justa. Há, igualmente,
condição para reflexões e para o entendimento das conseqüências de todo o
pensar e do agir, que dependerá do contexto e das abordagens, nos aspectos
vitais. Como a educação pode, ao mesmo tempo, refletir a esperança e a
desesperança? Segundo Freire (1996) “o homem é um ser da esperança que,
por “n” razões, se tornou desesperançado”. E como pensar com esperança,
sem a reflexão e o comprometimento das escolhas, para a construção da
dignidade humana?
Voltaire, em uma carta a Frederico, o grande, em 1737, escreveu que "a
virtude, o estudo e a alegria são três irmãos que não devem ser separados”.
Encontramos, em autores como Voltaire, FREIRE (1996) e ASSMANN, (1998)
pontos de vista que ultrapassam conceitos técnicos ou científicos. Podemos
observar palavras que manifestam a disposição para caracterizar movimentos
internos de motivação, prazer e crença. Observamos, em seus escritos que é
possível acreditar, ter compromisso, pensar e agir dentro de processos de vida
e de ideal. Estas condições garantem que a educação faça parte da formação
para a vida. Constata-se também que, se na auto-educação há construções
que são elaboradas, através do pensar e do experimentar cotidiano, propiciado
em todos os espaços educacionais, configurando espaços de formação e de
escolhas de valores.
No Relatório da Comissão Internacional sobre Educação para o Século
XXI (UNESCO, 1998), afirma-se: em relação aos aspectos de formação e
educação contemporânea, elege os pilares: aprender a ser, aprender a
conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver. São importantes e difíceis de
serem abordados o aprender a ser e o aprender a conviver. São densos de
significados e desafiam a cada pessoa. Refletem o querer da vontade e dos
propósitos e exigem o conhecimento de ser dos sujeitos. Implicam viver a
38
“regra de ouro”, já enunciada por Confúcio (551 a.c - 489 a.c) "aquilo que não
desejas para ti, também não o faças às outras pessoas”.
Esta norma de conduta surge em épocas diferentes e culturas
diferentes, mas se constitui como um principio humano, simples, mas difícil
porque envolve a vontade e a humildade. A Bioética, ligando ética e vida,
aponta para a sensibilidade e Cuidado com o Ser. Diante de cenários de
intolerância e indignidade, aprender a ser e a conviver são desafios
permanentes para a educação. Ter uma visão para o bem, decidir para o bem
e conviver com respeito para com as diferenças é, nesta concepção, uma
proposta pedagógica imprescindível para que Educação Bioética seja uma
educação para a vida.
As crises do mundo moderno podem ser observadas pelos contrastes
que se desdobram, em formas de desrespeito à dignidade humana, afetando
desequilíbrios de muitas ordens. As questões que ameaçam a paz e a
sobrevivência humana ferem, igualmente, a dignidade do ser humano.
Verificam-se problemáticas na área da saúde, pouca importância dada às
questões educacionais, as condições indignas de moradia que apresentam
riscos à saúde, condições sociais que privilegiam uns em detrimento de outros
que não conseguem ter suas necessidades básicas atendidas.
Esses são temas de permanente inquietação, alvo de investigação e
reflexão (bio) ética. Nesta perspectiva, o Concílio Vaticano II, da Igreja Católica
sintetiza esses contrastes e dilemas que são também desafios da Educação a
serem enfrentados, a saber:
Ao longo da história o Gênero Humano, nunca se dispôs de tantas riquezas e possibilidades. O que se observa, com muita evidência que ainda uma boa parte padece de fome e muitos outros ainda são semi-alfabetizados. Os homens nunca tiveram um sentido de liberdade tão agudo como nos novos tempos, mas ao tempo surgem novas formas de escravidão social e psíquica. Enquanto o mundo percebe tão vivamente sua unidade e mútua dependência de todos numa necessária solidariedade, ei-lo, contudo dividido em partidos opostos por forças que lutam entre si. Com efeito, agudas distinções políticas, sociais, econômicas, raciais e ideológicas ainda continuam. E nem falta o perigo de uma guerra capaz de destruir tudo. Enquanto aumenta a comunicação de idéias, as próprias palavras, que exprimem conceitos de grande importância, revestem-se de sentidos bastante diversos segundo a variedade de ideologias. Enfim, procura-se com afã uma organização temporal mais perfeita sem que o
39
crescimento espiritual progrida ao mesmo tempo (Vaticano II Gaudium Spes 4, apud,FIORENZA 2001).
O que se pode apontar como contribuição da Bioética, para a construção
educacional de forma integral do ser humano? No esforço de buscar respostas,
esclarecendo conceitos e propondo caminhos, este saber apresenta seu papel
educacional instigando a reflexão e desenvolvendo a capacidade crítica.
1.4 Educar na contemporaneidade.
Educar, na contemporaneidade, é uma tarefa que apresenta
peculiaridades. Para se pensar a tarefa de formação, necessita-se de uma
onde haja a reflexão constante. Além de disposição e habilidade especiais.
Para refletir sobre a educação para a responsabilidade, é preciso que se
compreenda a sociedade contemporânea. As particularidades culturais
específicas do ethos da sociedade de nosso tempo, tais como a velocidade das
transformações provocadas pelo poder hegemônico das tecnologias e suas
repercussões para a vida humana, no presente e no futuro, pedem novas
formas de educação.
Uma das marcas do mundo contemporâneo é a “obsessão pela
produção desenfreada de novidades” (TELLES, 2007, p. 328). Essa atitude
leva ao modismo e, consequentemente, ao princípio de que tudo é transitório.
Porque são consumidos, vorazmente, os objetos artísticos e as mercadorias
têm curta duração. A movimentação desenfreada da tecnologia provoca a
rápida mudança de valores, causando a sensação de fragmentação: há a
fragmentação do homem – uma conseqüência da movimentação ininterrupta
dos fenômenos vinculados à ciência.
Inegáveis benefícios à humanidade foram proporcionados pelo
desenvolvimento tecnológico, que se inicia na Revolução Industrial,
fundamentada na ciência positivista. Entretanto, este novo momento suscita
uma contradição: a euforia provocada pela crença no progresso leva a uma
crise, provoca o surgimento dos grandes centros urbanos e provoca a indução
à fantasia do paraíso material e do consumismo, da produção em massa dos
40
objetos. Nesses centros urbanos, embora haja a exposição de riqueza e
agitação, há também a exposição de aglomerados humanos repletos de
miséria e de desrespeito à dignidade do homem.
O homem, devido à tomada de consciência dessa sua carência, é
levado à descrença, ao desalento. Além disso, tais circunstâncias fazem com
que o homem assuma uma postura de desprezo, em relação a tudo que lembra
o mundo burguês da luta, da operosidade, da conquista. Há um desconforto
com o mundo grosseiro e hostil.
Com as peculiaridades e as diversidades da vida moderna, além de
suas inadequações, surgem fenômenos como a vacuidade das relações
humanas, o tédio, a incomunicabilidade, a solidão, o exílio, o isolamento, o
abandono, a privação, a exclusão.
Segundo Telles (2007, p. 330), em sua crítica literária, Octavio Paz
analisa a obra de Baudelaire, um poeta francês. Baudelaire caracteriza o
homem moderno como um homem caído e uma alma dividida. Octavio Paz
afirma que a história do Ocidente pode ser vista como a história de um erro, um
extravio: o homem se distanciou de si mesmo e se perdeu no mundo.
Comenta, ainda sobre a contemporaneidade:
(...) ao extirpar a noção de divindade, o racionalismo reduz o homem. Nos liberta de Deus, mas nos encerra em um sistema ainda mais férreo. A imaginação humilhada se vinga e do cadáver de Deus brotam fetiches atrozes: na Rússia e em outros países, a divinização do chefe, o culto à letra das escrituras, a deificação do partido; entre nós, a idolatria do próprio eu. Ser um mesmo é condenar-se à mutilação, pois o homem é apetite perpétuo de ser outro. A idolatria do eu conduz à idolatria da propriedade; o verdadeiro Deus da sociedade cristã ocidental chama-se domínio sobre os outros. Concebe o mundo e os homens como minhas coisas. (PAZ, apud TELLES, 2007, p. 330)
O individualismo significa, ainda, a transição para uma nova ética e uma
nova política, descentrada, liberta do coletivo, em que o homem vale por si
mesmo, e não pelo estatuto que a comunidade lhe outorga. Emancipar implica
individualizar, desprender o homem das malhas do todo social.
41
Partindo das considerações acima, pode-se concluir que alunos e
professores, hoje, inserem-se em um contexto, onde há grandes desafios para
que a educação se concretize.. Nestas mudanças paradigmáticas, necessita-
se redescobrir os lugares da autonomia e da emancipação dos sujeitos, como
um uso peculiar da razão e da sensibilidade e uma ética comprometida com a
responsabilidade, perante o poder e o alcance das tecnologias.
A formação para a autonomia encontra o desafio que vem do contexto
cultural em que vivemos, onde o importante não são os compromissos e as
responsabilidades perante o mundo e a vida. A educação privilegia o ensino
tecnicista que desconsidera o valor da formação humana, voltada para a
sensibilidade e para o pensamento reflexivo, crítico e criativo.
O papel da educação é fundamental, quando se busca o pleno
desenvolvimento do indivíduo e das sociedades. No século XXI, amplia-se a
relevância do papel da educação, que aponta para a necessidade de
construção de uma escola voltada para a formação do sujeito.
42
2. A BIOÉTICA: UM DESAFIO PARA O SISTEMA DE ENSINO MÉDIO.
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo inseriu a Bioética,
como eixo temático, na disciplina de Filosofia. Tal medida proporciona o
aprimoramento de capacidades reflexivas que, ao lado do desenvolvimento de
capacidades técnicas, facilitam a introdução de discussões e de reflexões
necessárias para uma formação humanizadora.
2.1 A educação bioética: um modismo ou uma necessidade no sistema de Ensino Médio?
A defesa da vida é o foco da Bioética. Ela deve levar em consideração
a formação, pautada na reflexão que deve ultrapassar as considerações
mercadológicas e os valores culturais.
Um dos fundamentos que a escola pública deve desenvolver para a
construção da democracia cidadã é a compreensão de valores seculares ou
laicos, reconhecendo a importância de uma visão crítica, em relação ao mundo.
Ela reconhece, ainda, a importância da afirmação da liberdade humana,
porque, na democracia, os pressupostos básicos são a igualdade, em meio à
pluralidade e a liberdade. Da mesma forma que a liberdade religiosa deve ser
respeitada, a secularização do Estado deve ser reforçada.
A importância da Bioética se dá, justamente, na medida em que ela
imputa valores vitais, críticos e responsáveis sobre a vida, sobre a dor e sobre
a morte. Os tratamentos desses temas, na educação básica, veem, como uma
necessidade, que precisa ser considerada, como um dos fatores de formação.
Existem, na legislação federal e na estadual, princípios que direcionam a
reflexão para a importância da formação voltada para a humanização e para a
cidadania.
A base dessa discussão deve assentar-se em valores de liberdade e
igualdade, na pluralidade para a defesa da vida. Surge o problema: como
43
defender a vida e, ao mesmo tempo, defender a liberdade, a igualdade na
pluralidade? Para o estado secular, a defesa da vida deve estar ligada à
ciência e à reflexão crítica. A informação deve ser norteadora da liberdade, isto
é, quanto mais conhecimento as pessoas tiverem, terão maior liberdade, para
tomar decisões com autonomia e responsabilidade, para poder lutar pela
igualdade.
As dinâmicas dos avanços da biotecnologia e da crise do positivismo
contribuíram para o fortalecimento da proposta da Bioética em resgatar
parâmetros éticos e utilizar-se dos princípios basilares para resolver os dilemas
morais decorrentes do progresso cientifico, com vistas a torná-lo humanizado
(GAMA, 2003).
O primeiro, por ressaltar a importância da interpretação nas relações
subjetivas e por aceitar de forma democrática a existência do outro. O
segundo, por pretender praticar o humanismo na forma mais integral possível,
ao compreender o homem em todas as suas dimensões.
Os avanços científicos, nas áreas da saúde, não encerram apenas o
tratamento da saúde ou da conservação da mesma. Eles procuram chegar na
“melhoria” da condição física, psicológica ou, meramente, estética. A
engenharia genética não apenas produz células-tronco, mas também
desenvolve tratamento embrionário para que um indivíduo possa superar seus
possíveis “defeitos” genéticos. Já nos primeiros dias de gestação, é possível,
pôr diversos elementos nas células embrionárias, a fim de fazer com que o
novo ser que surgirá seja adequado à vontade dos genitores e, muitas vezes,
seguindo um padrão social muito restrito.
Essas produções de conhecimentos científicos podem ser dinamizadas,
para que o aluno do Ensino Médio saiba, através do debate interdisciplinar,
transformar as informações em objetos de análise e de compreensão, na
formação da sua opinião crítica, sobre os avanços da biotecnologia. Esta
discussão pode ser intermediada pelo professor de filosofia, trabalhando a
partir dos princípios da Bioética principialista e personalista, elevando assim a
capacidade de síntese e autonomia de escolhas do futuro cidadão.
44
A beneficência ou maleficência e os demais pressupostos da Bioética
principialista, dentro da tradição filosófica moral, quer dizer fazer o bem. É uma
manifestação da benevolência. Toda ação, na área de saúde, deve espelhar
esse principio que objetiva o bem da pessoa, evitando, portanto, danos
corporais e mentais. Na educação, é preciso que este princípio seja
reconhecido como um valor moral, tanto pelo aluno como pelo professor.
Remetendo à tradição hipocrática, reconhece-se o valor moral do outro,
considerando-se que maximizar o bem do outro supõe diminuir o mal.
A beneficência e não-maleficência devem ser entendidas tal como no
relatório de Belmonte, um único principio com dupla obrigação: a de maximizar
benefícios e minimizar malefícios. Na educação, como maximizar os
comportamentos e as atitudes dos personagens que se relacionam, no
quadrante escolar.
A autonomia na educação do aluno de Ensino Médio deve ser motivo de
preocupação. Este aluno deve saber gerenciar a sua vida de forma
responsável, usando o seu livre arbítrio nas ações e na convivência,
construindo regras para si, com base na razão. Assim, esse princípio poderá
ser objeto de trabalho para a capacidade de se autogovernar, avaliar sem
restrições internas e externas para fazer a escolha que lhe parecer mais
correta. Logo, a construção do sujeito (bio) ético é um desafio para a educação
básica que deve dar sua colaboração para o entendimento livre de coação, e
de fraude, de induzimento ou instigação.
Assim o principio da autonomia é legalmente concretizado com a
expressão do consentimento informado pela bioética, pois o Sujeito capaz,
legalmente, ou relativamente incapaz, terá a sua vontade, a sua
autodeterminação respeitada, conforme o seu discernimento.
Gama (2003) “lembra que o principio da justiça embora fosse visto como
parte da consciência da cidadania e luta pelo direito à saúde e à educação na
linha mais liberal do pensamento Bioético, tem sido desprestigiada”. Contudo,
adverte que os três princípios devem ser sempre considerados conjuntamente,
sob a ameaça de, não observado exclusivamente o principio da justiça, a
bioética se transforma na própria caricatura nas mãos da burocracia estatal.
45
Consagrado, na Constituição de 1988, o direito à vida é inviolável, não
podendo a legislação afastar-se dos postulados que garantem o pleno
exercício do viver, sob pena de serem destruídas as bases da convivência
humana.
A Bioética, conforme o artigo 205 dessa constituição, assim como a
LDB de 1996, o ECA de 1990 e o Plano de Desenvolvimento para Educação
Nacional (PDE, 2007), representam prioridades e critérios importantes para a
formação integral do Homem, o respeito aos princípios de cidadania e os
valores éticos e morais. Todos esses objetivos legais estão contemplados no
enfoque da discussão da Bioética. O direito à vida é o mais fundamental de
todos os direitos, já que sem ele, a existência, como afirma (Heidegger, 2000),
dos outros seria em vão.
Consagrado na Constituição de 1988, o direito à vida é inviolável, não
podendo a legislação afastar-se dos postulados que garantem o pleno
exercício do viver, sob pena de serem destruídas as bases da convivência
humana.
Os progressos da biotecnologia e a crise do paradigma positivista
contribuíram para o fortalecimento da proposta da Bioética, como resgate de
parâmetros éticos e uso de princípios basilares,como forma de tratar dilemas
morais e humanizar procedimentos, desafios decorrentes do progresso
cientifico. (Gama, 2003). Neste resgate, pode-se compreender a importância da
(Bio)ética, ao colocar em evidência o lugar das relações subjetivas de
aceitação do outro, de pratica de ações humanas democráticas e integrais,
considerando o ser humano em suas muitas dimensões.
Estes temas e problemáticas, estudados pela Bioética, podem ser
tratados em sala de aula, para o aluno do Ensino Médio. Estas produções do
conhecimento científico, como foco de estudos, têm, como objetivo,
proporcionar, a compreensão e a capacidade de análise. Os avanços
tecnocientíficos, principalmente, no campo da biomedicina, têm acarretado
inúmeros dilemas para a vida das pessoas.
Tornou-se imprescindível à educação, proporcionar espaços de debates
interdisciplinares que esclareçam conceitos e estimulem consistentemente o
46
desenvolvimento da capacidade critica diante de significativas questões. Para
Lolas (2005 p. 10) a bioética busca “formular, analisar e quem sabe atenuar os
dilemas que a pesquisa médica e biológica moderna suscita”. Para o autor, é
necessário que se gere a convicção de que todos compartilhem
responsabilidades pelo que acontece e acontecerá. E isto significa preparo
educacional para que os cidadãos interfiram nos debates e decisões pois, o
princípio de responsabilidade comum e comunitário é pressuposto Bioético.
De acordo com Junges (2006 p. 11) a Bioética se apresenta como um
“fórum de discussão pública numa sociedade democrática e pluralista”. As
problemáticas da Bioética, fecundas para debates filosóficos, intermediados
pelo professor de Filosofia, podem ser trabalhadas, a partir de princípios deste
saber elevando assim a capacidade de síntese e autonomia em escolhas
presentes e futuras do cidadão em formação.
Há, na atualidade, amplo consenso entre os estudiosos da Bioética, em
reconhecer os princípios de beneficência, responsabilidade, justiça e
autonomia como princípios bioéticos. O respeito à vida implica na visão de que
o ser humano seja tratado, assegurando o seu bem estar e sua autonomia.
Pretende-se que possua direitos e deveres, considerados justos.
A beneficência ou não- maleficência, assim como os demais
pressupostos da bioética principialista, dentro da tradição filosófica moral, quer
dizer fazer o bem. É a manifestação da benevolência. Toda ação na área de
saúde deve espelhar esse principio que objetiva o bem da pessoa, evitando,
portanto, danos corporais, emocionais e mentais. Isto implica o princípio de
responsabilidade. É preciso ter entendimento sobre a repercussão das ações,
evitando o dano; ponderando e avaliando, ao máximo possível, as
conseqüências que derivam das decisões e ações. O princípio de justiça
coloca em evidência a questão de administrar quem deve receber benefícios
diante de situações em que haja necessidade de repartir recursos.
É imprescindível que estes princípios sejam reconhecidos como valor
moral, tanto pelo aluno como pelo professor. Remetendo à tradição hipocrática,
reconhece-se o valor moral do outro, considerando-se que maximizar o bem do
outro supõe diminuir o mal. A beneficência ou não-maleficência, conforme
47
formulado no relatório Belmont (1978, apud CORTINA; MARTINEZ, 2005),
apresenta-se como dupla obrigação: a de maximizar benefícios e minimizar
malefícios. Este relatório foi elaborado em 1978, nos Estados Unidos, pela
Comissão Nacional para a proteção de pessoas que participavam de
experimentação biomédica (CORTINA, 2005)
Na educação, refletir sobre inter-relacionamentos, no contexto escolar, e
sobre a repercussão das atitudes e comportamentos no ambiente, na auto-
estima das pessoas, na participação comunitária, são aplicações importantes
destes princípios para o professor e para o educando.
Um ponto importante para a discussão bioética, dentro do princípio de
autonomia, é o termo de consentimento informado. O Sujeito capaz,
legalmente, ou aquele que possui sua autonomia reduzida precisa ser alvo de
proteção especial, em situações de participação, em pesquisa medica. Isto
supõe conhecimento e desenvolvimento educacional e incide na questão da
compreensão de que o indivíduo pode decidir, com responsabilidade, sobre o
que melhor lhe convém, tendo sua vontade, a sua autodeterminação
respeitada, conforme o seu discernimento, e sua dignidade considerada na
íntegra.
Gama (2003) afirma que o princípio de justiça é visto como parte da
consciência da cidadania e da luta pelo direito à saúde. Todavia, ainda falta,
por parte da linha mais liberal da bioética, maior consideração pela área da
educação.
Para este autor, os princípios da bioética não devem ser considerados
isoladamente, pois, fora de perspectiva, correm o risco de se perderem de
objetivos mais profundos e legítimos, transformando-se em caricatura nas
mãos da burocracia estatal.
A globalização e a sociedade altamente tecnológica trouxeram uma
visão de poder, de controle e conforto que desafiam o sistema educacional. O
mundo virtual configurou um novo modelo de vida, minimizando a importância
da reflexão e banalizando questões ontológicas fundamentais para o ser
humano. Isto tem exigido a compreensão de conceitos que necessitam ser
48
explicitados, imprescindíveis para uma educação que suporte as futuras ações
profissionais de cidadãos éticos e comprometidos com a comunidade humana.
Observa-se a realidade que Freire (1996) já apontava sobre o aprender
que está para além do acúmulo de conhecimentos, pois as informações são
voláteis. Verifica-se, facilmente, na contemporaneidade, o fenômeno da
abundância e da velocidade de informações. Ao lado disto, como seres
inacabados, há uma nova demanda: aprender com sentido, tendo como fio
condutor para a reflexão e para o debate, o diálogo, apontado como dimensão
bioética fundamental para resgatar o respeito para com as diferenças, a
autonomia e a liberdade intelectual.
Para Dussel (2002), a ética é sustentada por três princípios: reprodução,
manutenção e desenvolvimento da vida. Nessa perspectiva, cabe ao agente
educacional se perguntar: Vou reproduzir? Vou manter? Como estou
desenvolvendo as possibilidades da vida?
É preciso que o ensino superior receba uma formação reflexiva,
filosófica e social, para que a prática pedagógica se torne criadora de situações
de aprendizagens que desenvolvam as potencialidades, competências e
habilidades de aprender. Para Josso (2008, p. 35),
a experiência formadora na perspectiva da pesquisa/formação
singular-plural requer a pesquisa de nossa própria trajetória, na busca dos momentos que proporcionaram uma transformação. A tomada de consciência sobre a mudança de referenciais de vida são experiências formadoras constituintes de nossas identidades na reflexão sobre o que e como aprendeu.
As contradições e polarizações entre o bem e o mal, o certo e o errado
exigem preparo para pensar, argumentar e agir, para que os princípios
bioéticos de autonomia e justiça se tornem realidade.
O pensar bioético reconhece os avanços do conhecimento científico,
mas não perde de vista os fatores humanos e éticos, para a tomada de
consciência e decisão, em favor da vida, em uma ética de dimensões
planetárias.
49
A análise da formação dos professores, da realidade da escola, das
diretrizes oficiais e do currículo possibilita compreender o complexo mundo
educacional e sua relação com a ética e a bioética
Para Dussel, mais do que uma ética, é preciso princípios de respeito à
vida e à condição humana, responsabilidade e cuidado com a Terra, morada
de toda a humanidade, e com o próprio Ser.
O corpo é a materialidade, a parte visível do Ser. A consciência do
próprio corpo propicia acesso ao Ser inteiro [...], pois o corpo e espírito,
psíquico e físico, e até força e fraqueza, representam não a dualidade do ser,
mas a sua própria unidade (Bertherat,1997). Toda pessoa, dotada de
liberdade, naturalmente se descobre um ser de escolhas. A consciência desta
condição emerge dos processos neurofisiológicos e das relações entre
indivíduo e sociedade e nos diferencia dos demais seres.
Impondo assim e a todos o dever moral de assumir – se como pessoa
que precisa construir uma trajetória de vida pessoal e coletiva, afinada com os
princípios éticos e as leis que regem a vida em sociedade. O corpo é a expressão dos diversos estágios evolutivos. A linguagem
corporal permite ao homem identificar aspectos das emoções do Ser e decifrar
quem é o Ser que habita a morada do corpo.
Cabe à escola realizar a Paidéia, ou seja, educar para transformar e
superar o paradigma do positivismo, que fragmenta o ser e o conhecimento.
Na visão da Bioética, o bem comum depende das ações individuais e
coletivas, todas elas com conseqüências para o indivíduo e para os outros.
A vida não é apenas função orgânica, mas relação, sensibilidade,
criatividade, racionalidade e espiritualidade. Todos os fatores e direitos, como
honra, igualdade e identidade, estruturam-se a partir da dignidade fundamental
da pessoa humana.
50
2.2 As relações entre a Filosofia e a Bioética.
A Filosofia, como disciplina reflexiva, voltou oficialmente ao currículo, a
partir de 2005. A inserção da Bioética, como eixo temático de Filosofia, ocorreu
em 2008.
É uma questão, com repercussões pedagógicas importantes, onde se
discutem temas sobre os avanços da medicina e pesquisas que afetam a vida
humana. Estes assuntos não são exclusividades da área da saúde, pertencem
à humanidade, na sua condição existencial, e cabe a cada ser humano,
conhecer, refletir para fazer escolhas conscientes, levando em conta o princípio
do bem para si e para o outro. Os princípios de justiça e alteridade se mostram
como elementos pedagógicos fundamentais, para construir uma humanidade
consciente e que propicie a continuidade do planeta, como morada de todos
nós.
Isso significa uma aposta para que os alunos possam ter discernimento,
quando tomam decisões e que sejam tolerantes porque compreendem a
origem das diversidades, conforme documento final do Conselho Nacional de
Educação (CONAE 2010).
A importância da Filosofia está em ensinar a refletir metodicamente
sobre os fundamentos, a essência e a razão de ser das coisas, como expõe
Hegel (1988, p.85):
Só a Filosofia, em seu conjunto, nos dá o conhecimento do universo
como totalidade orgânica, totalidade que se desenvolve a partir de seu conceito e que sem nada perder do que dela faz um conjunto, um todo, no qual todas as partes estão ligadas umas às outras pela necessidade entra em si mesma e, nessa união com ela mesma, forma o mundo da verdade.
A história do ocidente nasce, a partir da aprendizagem, com os gregos,
sobre a vida e as normas da polis e a formação dos seus cidadãos. O homem
toma consciência de sua historicidade, percebendo que o passado e o futuro
estão implícitos no presente, aquele em forma de memória, este em forma de
preocupação e de projeto.
51
O objetivo da Filosofia não é a definição de normas e o disciplinamento
de condutas, visando à proteção de direitos individuais. Como afirma Sève
(1994 p.78), “uma real formação ética exige, antes de tudo, a sensibilização
pessoal para os problemas, o debate pluralista das questões, a
experimentação das noções e dos princípios sobre casos concretos”. Assim, a
bioética tem como objetivo empenhar-se em um projeto coletivo e social de
discussão sobre a vida, o homem e suas mais diversas expressões.
Para o autor, a Bioética deve ser um projeto coletivo, com
responsabilidades compartilhadas por todos, com “iniciativas transformadoras”,
não “disposições regulamentares”, o que configura a “antropoiética”, ou seja,
uma ética que se constrói a partir do mundo do homem, “uma ética da pessoa
compreendida como societária do gênero humano” que, pautada pelas
iniciativas civilizatórias, produz um “novo rosto da política. Ela vai da eticidade
– à eticização da cidade”.
Assim, a Filosofia constitui-se em um espaço privilegiado para o estudo,
a discussão e os projetos para a ação em prol da corporeidade, da vida e da
condição humana.
No final do século XIV, Bacon, prevendo o iminente salto tecnológico,
afirma que os gregos e romanos já tinham feito tudo pela elevação do espírito.
Faltava à ação, a aplicação do intelecto às coisas concretas, ao progresso da
indústria e melhoria de vida das pessoas.
Através de uma nova lógica de assimilação tecnológica, entre as formas
de vida míticas, mecânicas, cibernéticas e sintéticas, é criada uma nova
posição subjetiva e atua como uma prática rebelde na formação de novos
corpos.
Em um curto período do final do século XX, surgiram vários termos com
o objetivo de significar a expansão do humano, sobretudo devido à mistura
com algo de natureza não biológica. Porém, toda a condição para o surgimento
da necessidade de termos mais precisos para definir esse “novo” humano
estava posta.
Taylor, na Filadélfia, e Ford, em Detroit, propõem a especialização dos
trabalhadores pela repetição exaustiva de movimentos elementares; a
52
padronização dos produtos e dos processos de produção em série, a
sincronização e a coordenação das tarefas, até reduzir a fábrica a um imenso
relógio, no qual os homens e as máquinas desempenham o papel de
engrenagens programadas.
A ideologia impõe que o agora seja o mesmo sempre, aniquilando o
outro que se revela como sempre outro. A dialética do senhor e do escravo
ainda não é possível, pois o possível escravo desaparece do horizonte: morre.
É a totalidade impondo a injustiça, muitas vezes, institucionalizada.
Para Dussel (2002), o massacre ideológico oculta a dominação, não
permitindo ao outro ser distinto, exigindo o eterno retorno do mesmo. O ethos
do dominador tem conotação imperial, pernóstica e perversa.
A transformação dos espaços do conhecimento exige a participação e
o envolvimento de todos: empresários, comunicadores, formadores de opinião,
políticos, religiosos e outros. É preciso conscientizar-se de que os problemas
substantivos não serão enfrentados, enquanto não forem definidas as
propostas de articulação institucional. A vida não é uma sombra do mundo das
idéias, como quer Platão, mas é a ação da própria pessoa que caminha neste
mundo.
Para Dias (2002, p. 45), a reflexão bioética deve partir de alguns
princípios:
o princípio da autonomia (o respeito à vontade, crenças e valores morais das pessoas); o princípio da beneficência (a atenção aos riscos e benefícios, assegurando o bem-estar ou minorando o mal-estar das pessoas); o princípio da justiça (a exigência da eqüidade na distribuição de bens e benefícios.
Como questões Bioéticas na educação, o autor aponta: a) o desporto
competição, a partir de “uma lógica de projetos criadores de modelos de
preparação biológica e treinos, nem sempre, reveladores da verdade, da
lealdade e da solidariedade”; b) o uso de medicamentos e produtos hormonais
com efeitos energéticos e plásticos; c) a tolerância, “com a prática de não-
profissionais em diversos de seus setores no exercício direto com as pessoas,
oferecendo riscos e ameaças no âmbito da vida e da saúde humana”. O
53
Conselho Profissional, regido por “Princípios Bioéticos”, poderia contribuir para
a discussão e superação desses problemas.
Para o autor, as pesquisas que trabalham com a vida devem ter
posturas éticas, ou seja, ao escolher uma linha teórica para analisar o ser
humano, a vida, a saúde, o ambiente, estamos fazendo uma opção ontológica
e ética. A Bioética deve ser uma referência para o rigor científico, pois.
interessa a todos e é responsabilidade da sociedade em que vivemos como cidadãos socialmente inseridos na comunidade científica como membros da categoria profissional da Educação (Dias, 2002, p.53).
Na visão de Engelhardt (1998), para uma Bioética fundamentada apenas
em princípios norteadores, seria necessário que todos tivessem as mesmas
concepções morais de bem e de justiça. Nesse caso, a Bioética existiria
apenas naquelas comunidades que partilham a mesma moralidade. Como a
maioria das controvérsias e dilemas tem origem no conflito de diferentes
concepções morais, pautar a Bioética pelos princípios de autonomia,
beneficência e justiça é submetê-la a um fracasso anunciado.
A Bioética é a reflexão crítica sobre os comportamentos e ações que
envolvem a vida, a partir de juízos de valor. É teoria, investigação ou
explicação de um tipo de ação ou comportamentos que têm como foco a vida,
em suas múltiplas manifestações.
Já a moralidade tem como base a ação individual, procurando
estabelecer como se deve agir corretamente. O que fazer em cada situação
concreta é um problema moral, não Bioético. Assim, estabelecer normas de
comportamento para resolver ações individuais não é uma tarefa da Bioética e,
sim, da moral.
Quando as normas se referem a um grupo profissional específico,
configuram uma deontologia profissional, não tendo como objetivo resolver
problemas bioéticos, mas estabelecer regras para exercício da profissão.
Assim, parece que o Conselho Profissional não pode constituir-se em
referência bioética, porque se pauta em concepções morais específicas de um
grupo profissional, permeado de moralidades diferentes e, muitas vezes,
divergentes.
54
Para os gregos, o fundamento da ética é a natureza, à qual o homem se
vincula. Para Vasquez (2001, p. 61-82), a função da ética.
é a mesma de toda teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando conceitos correspondentes. Por isso, a ética é signatária do contexto social, histórico e político, pois é a teoria, investigação ou explicação de um tipo de experiência humana ou forma de comportamento do homem, o da moral, considerado, porém, na sua totalidade, diversidade e variedade.
O valor da ética está naquilo que explica, não em prescrever ou
recomendar ações ou comportamentos. Todos os temas éticos são
ontológicos, mas nem todos os ontológicos são éticos. É neste cenário de
disputas que a Filosofia deveria estar imersa, já que é uma área do
conhecimento que lida com o corpo e a vida.
2.3 O corpo: um elo entre a Bioética e a Filosofia.
Podemos identificar o corpo como elo entre a Filosofia e Bioética. A
condução do aluno ao questionamento e à crítica das diretrizes e ações dos
poderes instituídos, que chegam prontos e acabados é a proposta da Bioética.
A Bioética enfatiza a alteridade, o respeito à vida, a dignidade do ser para uma
convivência harmoniosa. O indivíduo que vive em uma ilha deserta não tem
necessidade de Ética ou Bioética. É ele que decide tudo, a seu modo,
buscando sobreviver, sem preocupar-se com os demais ou com a continuidade
da espécie.
A dimensão corporal da existência humana é o concreto, a
corporeidade, que, para Assmann (1998, p.70) “é uma categoria estratégica
para re-propor, sempre de novo, o ponto de partida das prioridades, nas mais
diferentes esferas da atividade humana”. A Filosofia, adotando os princípios e
pressupostos da ciência, procurando transformar-se em uma ciência autônoma
para adquirir legitimidade social ou pela dependência que estabeleceu com
outras áreas da ciência, deixou de lado o compromisso com a discussão e o
debate ético.
A cientifização da Filosofia deixou “marcas”, como a transformação do
corpo e do movimento em objetos epistemológicos, manipulados e
55
decompostos pela ciência; a desfiguração do corpo por um ordenamento
universal; a opção por uma cultura que entende o corpo como um ente vivo a
ser cultivado. Como denuncia BOIS (2008), ocorre a preocupação com a
“forma” do corpo e, nos últimos anos, sobretudo, com uma “fórmula”.
Na modernidade, o corpo se tornou alvo da pesquisa metafísica dos
filósofos e do estudo anatômico dos biólogos, sujeito a regulamentos e normas
em instituições, como o exército, o hospital e a família.
As denúncias de manipulação e exploração corporal são inúmeras e a
escola não tem apresentado soluções ou subsídios à sociedade para enfrentar
o problema.
Nesse contexto, é necessário não se submeter aos princípios e
pressupostos da racionalidade científica, instrumentalizar a sociedade com um
conjunto de saberes sobre a corporeidade humana e não se restringir a
produzir normatizações morais e éticas, de caráter genérico.
Bois (2008) propõe buscar a “sabedoria do corpo”, ampliar os
conhecimentos a seu respeito, para além dos saberes físico-químicos,
entendendo-o como um espaço de infinitas capacidades expressivas e
cognitivas. O autor, jogador de futebol, fisioterapeuta, cinesioterapeuta e
osteopata, relata como criou seu método:
Vivi, então, uma experiência extraordinária: no silêncio, durante um trabalho de interiorização que realizava na época, em torno de 10 horas por dia, descobri coisas extraordinárias. No início, não tive outra intenção a não ser a de aperfeiçoar meu gesto terapêutico. E eis que, numa noite às nove horas, toda a matéria do meu corpo fora estimulada por um movimento, um movimento de extrema lentidão! Não conseguia chegar a diferenciar o movimento determinado em mim do movimento indeterminado do que se nomeia o universo. Sentia-me presente em mim mesmo e percebia uma luz azul. Sou, antes de mais nada, de natureza pragmática e, entretanto, no dia seguinte, minhas mãos desencadeavam este mesmo movimento em meus pacientes ( Bois, 2006).
O Movimento Interno tornou-se conhecido como
somatopsicopedagogia, que inclui a terapia manual (fasciaterapia), a terapia
gestual (esquemas associativos, a harmonização gestual da ginástica
sensorial) e a pedagogia.
56
A somatopsicopedagogia (2008) procura responder às questões:
Estamos dispostos a reencontrar a parte sensível de nosso ser? A partir desse
reencontro estamos dispostos a modificar nossa concepção de mundo da qual
emergem nossas escolhas de vida? Estamos prontos a mudar a relação que
temos na nossa vida a partir do retorno ao nosso corpo?
Nesse sentido, o corpo está diretamente vinculado ao conceito de
pessoa, ou seja, a pessoa é corpo e à pessoa é que são dirigidos todos os
discursos e ações.
Seve (1994, p. 34-35) comenta: o termo pessoa é
estranhamente uno e duplo, ou seja, é uma proposição estranhamente ambígua, pois, ao mesmo tempo em que se mostra enquanto realidade e valor, com aspectos, muitas vezes, heterogêneos e discordantes, em sua plena acepção, a pessoa humana inclui manifestamente os dois.
Para o autor, “o indivíduo faz parte dos conceitos da ciência biológica; a
pessoa não. (...) Aquilo que visamos no ser humano, ao nomeá-lo pessoa, é de
ordem incorporal” (p. 35).
Engelhardt (1998) defende que somente a pessoa pode ser o sujeito de
preocupações éticas e bioéticas. Para Sève (1994), tal concepção reduz a
pessoa a uma característica “atribuída – e é aí que está a sua arbitrariedade”,
pois “não há pessoa “de direito” sem pessoa de “fato”.
A pessoa só se constrói, quando for, ao mesmo tempo, substância e
relação, produto das práticas individuais e coletivas e da experiência
compartilhada, em constante processo de evolução, adquirindo valor como
realidade humana. Para Sève (1994, p.34), pessoa é,
na sua acepção ética, a única em que a palavra não é substituível por nenhuma outra, a pessoa é a forma – valor igualmente escrita a todos os indivíduos, na sua qualidade de pertencentes ao gênero humano.
Nesse contexto, o corpo é o elemento que vincula e compromete a
Filosofia e a Bioética com a pessoa como forma-valor e referência de análise.
57
2.4 As reflexões (bio) éticas: a prática educacional e a formação de professores.
No século XXI, o interesse volta-se para o viver que envolva o diálogo
como desafio à cultura vigente, buscando a alteridade como forma de
transformar comportamentos e confrontar a hegemonia de normas e regras que
não respondem mais às necessidades dos novos tempos. Há necessidade de
normas, não com status de dogma, mas como um guia que possa conduzir a
caminhada humana.
A Proposta Curricular para os educadores envolve compreender o
desenvolvimento humano e sua relação com práticas e exemplos de vida, onde
o afeto e o seu mistério constituem-se em elementos de liga, na formação com
sentido para o viver com valores.
A história humana registra o esforço de muitos pensadores, ao longo do
processo de construção da civilização e da conquista da condição de cidadão.
O mover do ser humano, para encontrar respostas, se apresenta como
movimento de construção de conhecimento sobre questões naturais, sobre a
condição humana, sobre a morte e a vida. A existência do homem no mundo
complexo exige consciência de si e do outro, para a tomada de posição. Neste
processo os educadores, como participantes do mundo, têm como papel
existencial formar sujeitos éticos e responsáveis. É um chamado em termos de
abertura e responsabilidade para uma nova visão que reconhece e ouve a
surpreendente diversidade de vozes culturais.
O respeito pela dignidade do ser humano e a defesa da vida são
aspectos que se constituem em elos entre o processo educacional e a
bioética. Isto envolve questões como a preservação da natureza, o cuidado
com a vida que se manifesta no cotidiano, seja este cotidiano a manutenção
da visa física ou como, no caso da educação, a liberdade e a dignidade das
decisões. A morte pode significar situações de “morte simbólica” expressão
usada por Berkenbrock-Rosito (2008), para definir a perda da criatividade e a
perda da responsabilidade, por parte dos agentes educacionais que participam
58
do processo de formação. Neste sentido, se tornam pessoas não identificadas,
tornando-se anônimos no conjunto lembrados como “professores”.
Fazenda, (1984 p. 43) afirma que “a abertura provocada pelo dialogo
entre as disciplinas só pode ocorrer sob uma atitude interdisciplinar”. Para
refletir sobre a proposta educacional da Bioética, pode-se salientar o termo
“atitude”, pois é o homem que pode ter atitude. O conhecimento pode dialogar
através dos homens, em atitudes de inter-relações, com o objetivo de construir
estradas no meio das incertezas e inseguranças do viver no mundo. As
disciplinas são partes de um todo, e sozinhas não nos possibilitam dar um
passo no processo de libertação do mito do “porto seguro” das verdades que
são ditas, sem a possibilidade de questionamento, porque se apresentam
fragmentadas. A educação em bioética, pelo seu caráter interdisciplinar, se
apresenta como uma linguagem da transformação e não de conformismo.
Capra (2001) e Boff (2005) defendem a idéia de que o mundo atual está
passando por uma mudança de paradigma, na qual a visão de mundo
fragmentada de Descartes, ou seja, fragmentação do homem com o meio em
que vive, mente e corpo, estão sendo substituídos por uma visão holística, de
totalidade e de interconectividade entre tudo o que existe no universo.
No Brasil, as questões são complexas e interligadas com problemas
educacionais históricos. Na colonização, com objetivos de exploração, a
catequização cultural e interesses políticos de poder, os relacionamentos foram
construídos, pautados em lucro e desrespeito à cultura dos povos que aqui
viviam. Ao pensar esta situação histórica, com o olhar bioético do princípio de
justiça, pode-se perceber que o respeito pela vida não fez parte dos interesses
e decisões tomadas. Isto configura problemáticas educacionais que exigem
atenção e estudos específicos.
A Bioética, embora seja uma área do conhecimento bastante jovem, já
apresenta uma produção teórica bastante consistente e que possibilita
vislumbrar estudos e vertentes teóricas para temáticas em contextos sociais e
educacionais brasileiros. Pela produção existente, já é possível constatar que a
Bioética “não é, nem pode ser, monolítica” e que deve se construir respeitando
59
fundamentos morais e culturais encontrados em diferentes lugares (Engelhardt
apud, GARRAFA 1998, p. 42).
Existem posturas teóricas, muitas vezes contraditórias, mas os conflitos
tocam em diferentes perspectivas para as questões. Autores como Tristam
Engelhardt, Paul Singer, Helga Kuhse e Michael Lockwood, para citar alguns,
orientam estudos que defendem o pluralismo moral, baseado na diversidade
cultural e social. Nesse sentido, buscam preservar as diferenças culturais,
considerando-as, portanto, diferenças morais, que devem ser sustentadas para
que as identidades sejam mantidas. Por isso, advogam não a existência de
uma Bioética – no singular –, mas de Bioéticas – “substantivo plural” – que
compreendem esta diversidade cultural e moral.
Frente ao surgimento de conflitos decorrentes da pluralidade moral,
estes seriam resolvidos, através de duas possibilidades: o estabelecimento de
uma autoridade moral, cuja tarefa seria “resolver a falta de clareza (...) seja
com relação aos dados da situação, seja por causa da escuridão dos próprios
princípios morais”; ou a utilização do mercado como o mecanismo preferível
para a resolução de enigmas advindos da pluralidade moral.
Podemos citar autores como Volnei Garrafa, Giovanni Berlinguer, Jean
Bernard, Axel Kahn e Lucien Sève, para quem é possível se falar em “uma”
Bioética, no singular, ou, conforme este último autor, numa bioética pública,
que seja construída ao “redor de atitudes éticas fortes” e que busque as razões
dos conflitos no sentido de sua “real ultrapassagem”. Para realizar esta tarefa,
seria necessário, segundo Sève (1994), “compreender-se a ética, no triplo
sentido do verbo: a reciprocidade da escuta, o enriquecimento da competência,
a autenticidade do acordo” , questões educacionais da maior relevância.
O autor acredita que é possível um acordo público a respeito de conflitos
éticos e bioéticos concretos, sem necessariamente haver uma perda da
identidade cultural dos grupos sociais que participam deste consenso. Para ele,
as “divergências sobre o sagrado não impedem muitas vezes de concordarem
sobre o profano”. Além disso, a “universalização não é uniformização (...) pelo
contrário, é a emergência de equivalências, numa pluralidade mantida de
formas”. Neste sentido, a universalização é a partilha de valores, o que não
60
impede que se estabeleça um entendimento a respeito das obrigações da
humanidade em comum.
No campo da Bioética, se coloca em relevo os termos ser humano,
liberdade, dignidade, pessoa. São relevantes para a compreensão de
significados educacionais, pesquisas e produções do conhecimento. A
importância da compreensão de ser humano é referencial para investigações e
ações , e preciso explicá-lo, entender sua complexidade física, psíquica em
suas formas de relações educacionais, políticas e sociais.
O conceito de liberdade, no sentido ético, é o direito de escolha, em um
sentido mais amplo podemos questionar sobre seu sentido absoluto, dado os
condicionamentos que os limitam. A liberdade implica a condição de ser
responsável. Em uma perspectiva existencialista, Sartre, postula que “o homem
é livre, porque ele é aquilo que faz do que fizeram a ele”. Neste sentido, é
necessário a compreensão educacional das escolhas individuais e o
entendimento da aprendizagem autônoma sobre as questões do entorno
humano. Nesta questão de liberdade, de escolhas e de responsabilidade,
pode-se observar:
A diferença básica entre a responsabilidade e as outras posturas é que ela não se orienta somente, por princípios, mas principalmente pelo contexto e pelos efeitos que podem causar as nossas ações (JUNG, 1995 p. 50).
Dignidade é um conceito importante de ser entendido, na educação em
Bioética, como inerente e essencial a todos os seres humanos, pela condição
de existir. “Expressa uma condição que é exigência de nunca permitir que o ser
humano seja ou sirva de instrumentos, ou seja, a “não instrumentalização”. O
paciente assim chamado, dentro da visão da área médica, o aluno dentro da
visão da escola, não é mais "um caso" do qual deve se ocupar, mas, em
verdade, uma "pessoa", vale dizer, um ser único e valioso que precisa ser
ajudado e acompanhado, em sua enfermidade ou no seu processo de
desenvolvimento pessoal de formação. Na área médica ou na área
educacional, há um Sujeito, decidindo, com liberdade e responsabilidade.
61
A noção de dignidade humana desempenha o papel de ideia diretriz da
ética médica, quando usada na saúde e ética de direitos constitucionais,
quando a remetemos à educação. A dignidade humana necessita de noções
mais concretas, habitualmente, formuladas empregando-se a terminologia dos
“direitos”: “consentimento informado”, “integridade física”, “confidencialidade”,
“não descriminação”, entre outras. (Roberto Andorno – Instituto de Ética
Biomédica da Universidade de Zurique – Suíça). “O Ser Humano é uma
existência”, corpo espiritualizado, relacional, racional e singular, único. Estas
características definem um Ser no mundo, a pessoa. Assim, a pessoa que vive,
que existe é como que uma maravilhosa conexão entre o universal e o
particular.
Refletir sobre defender a vida é entender a singularidade da pessoa que
vive, que se desenvolve, que enfrentará a morte, porque esta também é a
certeza da existência humana. Mas a dignidade e a liberdade devem ser
princípios considerados como direitos. O homem deve ter as condições
objetivas e subjetivas, expressas através da liberdade de definir-se e formar-se
enquanto sujeito. Neste sentido, o núcleo de pesquisa da UNICID Pedagogia
do Sujeito compreende:
no espaço e no tempo todas as coisas mudam. Transformam-se. Nada tem forma permanente. A única forma permanente é a impermanência. Modificar-se é o inicio da sabedoria. O sujeito é quem sabe, logo, é ele quem se modifica. Saber, para mim, tem conotação mais forte do que conhecer. E digo isto, por-que o homem não tem monopólio da aprendizagem. Contudo, não há nenhuma outra forma de vida ou coisa artificial que tenha capacidade de aprendizagem comparável à capacidade humana (PEREIRA, 2007, p.191-192).
A racionalidade capacita o homem a apreender e a desenvolver sua
autonomia É Sujeito e assume o poder de, com sua racionalidade, modificar-
se, Por isso, a ênfase no “modificar-se”, quando da referência a Claret, alusão
clara à necessidade que temos, todos, de nos construir e nos reconstruir
sujeitos.
A revisão bibliográfica realizada sobre trabalhos desenvolvidos com o
enfoque da educação bioética, no Brasil, demonstra que este campo de saber
62
está em desenvolvimento e tem sido construído com a contribuição de um
numero crescente de pesquisas. Entre estas, encontramos o trabalho de Méri
Rosane Santos da Silva (2003): Universidade Federal do Rio Grande do Sul:
Educação Física e Bioética uma união necessária. Trabalho apresentado no
Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte, Caxambu/MG.
Telma Hussni Messias (2007): Tema de Mestrado - Centro Universitário
São Camilo: Bioética no ensino médio: uma análise sobre espaços da Bioética
no projeto educacional da escola Estadual Joaquim Ribeiro Rio Claro/SP.
Maria Luiza Santos Ribeiro (2008): Bioética e o ensino da Filosofia na
Educação Infantil. Estudo sobre a Contribuição do Ensino de Filosofia para
Crianças na Educação em Bioética.
Dumaresq (2009): Bioética a partir dos Parâmetros Curriculares
Nacionais e LDB, trabalho apresentado no fórum educacional ULBRA
TORRES.
Todas as pesquisas apresentadas convergem para a certeza da
importância da Bioética, como um saber instigador e formador dos valores
éticos, da sua importância para a natureza humana e da sua relação com o
planeta. A discussão cientifica e as pesquisas constatam a importância da
Bioética, na educação e na vida, conforme se percebe, como cenário de fundo,
na Constituição Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1999, no Estatuto do Menor e do Adolescente de 1990 e no
Estatuto do Idoso de 2005, entre outros documentos. O legal e o pensado,
convergindo para um encontro cultural onde a vida é a instância prioritária.
Pode-se apropriar da citação bíblica “a letra mata, o espírito vivifica”,
para apontar esta necessidade de ir para além do legal, ir para aquilo que
privilegia a vida das pessoas. Para Freire (1996) “escola é gente”, é um convite
à compreensão do conhecimento, como movimento de pessoas, em direção ao
pensar, ao mesmo tempo, em que esta direção se encontra com a vida
concreta, no mundo ao redor. O ser humano manifesta a vida, o espaço é vivo
pelo movimento e pelas ações das pessoas e isto não pode ficar perdido como
conhecimento estático, como “letra” somente.
63
Dallari (2004 p. 14) aponta que é “preciso ter sempre em conta que
todas as pessoas nascem com os mesmos direitos fundamentais. A vida é a
categoria de valor máximo. Não importa se é homem ou mulher, não importa
onde a pessoa nasceu nem a cor da sua pele, não importa se a pessoa é rica
ou pobre, como também não são importantes o nome da família, a profissão, a
preferência política, sexual ou a crença religiosa”. Como podemos observar os
direitos fundamentais são os mesmos para todos os seres humanos.
Neste sentido, a educação, formal e informal, dentro do espaço
denominado escola, se constitui em um ambiente rico em oportunidades para o
desenvolvimento do convívio humano e da consciência ambiental Os princípios
bioéticos precisam ser descobertos e discutidos em sua concepção cientifica,
no cotidiano educacional, para serem destacados e incorporados na vida de
sujeitos. Na educação, o agente que pode dar vida aos princípios e a
interiorização dos princípios, para poder não só ensiná-los, mas exemplificá-los
através da sua identidade, enquanto ser e pessoa, é o professor. A
preocupação de se dar vida existencial para a Bioética passa pelo
compromisso do professor que, segundo Oliveira (1997, p.123-124) deve:
Assegurar informações capazes de ajudar no exercício pleno da cidadania em tempos de DNA e a compreensão da relevância da Bioética para a Saúde publica, no próximo milênio tem incentivado os debates nos sentido de estruturar, implantar e implementar programas de educação em Bioética – em caráter formal e informal (...) Uma proposta de Bioética precisa ser examinada e debatida junto á sociedade, cientistas e sobretudo com os professores. É necessário estimular os debates entre os professores. (...) se o conhecimento recebido/transmitido é instrumental capaz, adequado e suficiente para iniciação das reflexões bioéticas.
A formação de professores é tão urgente quanto a de todos os
indivíduos comprometidos com a formação de seres humanos para a vida. A
formação bioética não se reduz a uma disciplina conceitual e técnica. De
acordo com OLIVEIRA (1997) e SGRECCIA (1980) deve se constituir em um
projeto de formação a todos os indivíduos. O professor, como elemento
importante para o processo educacional, deve fazer parte deste projeto,
compreendendo que a informação precisa envolver a formação de valores e
64
novas leituras de vida e de mundo, a partir de suas próprias disciplinas. Para
Sgreccia (1980, p. 95)
a partir do momento que a tutela da vida e da saúde depende em grande parte do comportamento dos indivíduos e não somente da medicina e da economia torna-se urgente uma transição da informação e da formação bioética no âmbito da educação, família, na escola e nos chamadas agencias educativas, ali compreendidas os meios de educação social.
Refletir é tarefa, não só do professor de filosofia, mas de todos que
compreendem a idéia de interdisciplinaridade. Os professores de todas as
áreas do conhecimento podem se relacionar com a Bioética, interagindo
através dos seus conceitos disciplinares, em dialogo com as concepções
bioéticas, envolvendo-se com seus pares para construir uma relação com o
saber que, segundo Dominicé (1986, apud NÓVOA, 2002, p.31) “encontra-se
no cerne da sua identidade pessoal.”
É importante que o professor faça a reflexão fluir na direção de sua
interação entre as dimensões pessoais e profissionais e que essas se
reencontrem no seu Ser. “O professor é a pessoa”. “E uma parte importante da
pessoa é o professor” NIAS, (1991, apud NOVOA, 2000 p.31). É impossível
que a Bioética possa contribuir para a vida, sua condição existencial, seus
propósitos, sem que haja interações vivenciais, relações inter pessoais. É o
tudo do todo. E a volta das disciplinas para estabelecer novas relações entre si.
O prefixo chave é o “In”, de integrar, interagir, interdisciplinar, intenção e por
ultimo interiorizar valores que são bens inerentes a todos os humanos.
A educação no Brasil tem três grandes desafios: o primeiro, histórico, é
eliminar o analfabetismo. O segundo é colocar gente dentro da universidade,
pois o acesso é precário. “E o terceiro é o Ensino Médio, que sempre foi o
primo pobre, encostado no Superior e no Fundamental.”, na análise (GADOTTI
1997, p. 76)
“Eu sou eu, mais as minhas circunstâncias”, afirmou o filósofo espanhol
Ortega y Gasset,(1929, apud Kujawski,1994 p.17). Entre as circunstâncias que
influenciam o indivíduo, na identidade pessoal, coletiva e profissional, estão as
do meio sócio-ambiental e as do sistema econômico em que vivemos, um
65
sistema em que se prioriza, cada vez mais, o distanciamento entre os
humanos, o desperdício com a “res-publica”. Os professores, em sua pratica
educacional, têm sido desafiados a mudar a postura de ensinar, para assumir a
condição de mediar. Esta mudança implica em transformações e reflexões das
ações e resultados obtidos em suas práticas. O professor que ensinava dentro
da educação conteudista e os alunos que, passivamente, aprendiam, fazem
parte de circunstâncias que estão mudando para outro modelo de sociedade,
que pede aprendizagens significativas, contextualizadas impossíveis de serem
alcançadas com a fragmentação disciplinar.
O conhecimento, o homem, a vida não se fragmentam, porque estão
interligados. Na medicina se busca a homeopatia, se busca a causa da
doença, não se trata a doença, mas o Ser. Na educação, os conceitos
disciplinares não dão conta de explicar os acontecimentos, é preciso,
compreender as causas. Os alunos não se interessam pelas partes, mas o todo
e o que podemos refletir sobre esse “todo”, O seu contexto de vida, sua
finalidade, sua capacidade de ler o mundo através do olhar da observação, do
ouvir, enfim estar capacitado para decifrar esta sociedade, suas linguagens e
seus símbolos. Ai reside o prazer libertador em aprender.
A identidade e a autonomia são aspectos relevantes da cidadania e
também parte dos princípios da Bioética, mas somente se edificarão se
construídos por um constante pensar existencial significativo e responsável,
pois ser é ético, é ser “responsável” (Berkenbrock-Rosito 2005). Atitudes e atos
impensados afetam a totalidade. A “responsabilidade pela vida do outro”,
expressão de Lévinas, na sua obra A Humanidade de outro Homem,
apropriada por Dussel (2002) oferece reflexões significativas sobre garantir a
possibilidade a toda humanidade de seres humanos.
Para Berkenbrock-Rosito (2005; 2007) a ética, como estudo crítico da
moralidade e da conduta humana, pode abarcar toda a atividade humana,
buscando conduzir o homem e levá-lo na direção de alvos adequados à sua
própria natureza, por meios adequados à sua própria natureza, adequando-os
para esses fins.
66
Muitas questões do nosso tempo são objetos de discussões éticas
relevantes para as práticas educacionais, para o aprender a ser: os direitos
humanos, e a retomada histórica da Declaração Universal, que emergiu dos
conflitos oriundos da Segunda Guerra Mundial, o racismo existente em muitos
países, a exploração das nações mais desenvolvidas, a corrida pelo
armamento bélico, que se prolifera no mundo, o aquecimento global, e tantos
outros temas que só serão compreendidos e mudados por meio de reflexões
que envolvam a alteridade, conduzindo o pensamento a olhar cada ser
humano – o outro, e vê-lo, como se visse a si mesmo.
O problema da fome, da saúde, deve ser alvo das reflexões em
educação. A escola esta sendo desafiada a mudar suas práticas, trabalhando
com textos sociais, significativos e praticas de leitura que possam dar
condições de enfrentamento da alienação que ocorre pela perda de autonomia
para o ato de pensar. As reflexões bioéticas podem contribuir para todos
aqueles que estão na condição de conhecer, de decidir, de pesquisar. Elas
contribuem, ainda, para as pessoas em formação, intelectualmente capazes e
responsáveis, que têm a possibilidade de intervir na realidade, criando novas
situações, para superar preconceitos que são empecilhos para a completude
da dignidade humana.
A frase bíblica, “aquele que muito sabe a este maior parcela lhe será
cobrada”, pode oferecer subsídios para a reflexão de todos: profissionais da
saúde ou profissionais da educação. Esta reflexão ocorre, diante de situações
que envolvem compromissos de vida, que implicam responsabilidades, diante
do conhecimento. O compromisso é ético, mas é bioético porque, todos os
dias, ao desempenhar a profissão, a oportunidade de decisão se faz presente:
vida ou morte; manter ou transformar, envolver-se com a vida ou alienar-se,
cuidado ou indiferença?
O ocidente recebeu a influência religiosa da ética judaico-cristã. A ética
judaica foi reinterpretada pela ética cristã e poderia ter construído uma norma
desejável, se não fosse pela intolerância.
A ética permanece sem alterações, na sua natureza, num duplo aspecto:
vertical e horizontal. Na vertical, ela vai em direção do divino, que deve ser
67
amado e desejado, acima de todas as coisas. No segundo aspecto, o
horizontal, ela encontra a expressão da igualdade, nas relações humanas de
uma convivência de Koinnonia (grego) “comunhão de eus” na perspectiva de
Buber, em que cada “eu” se afirma sem abafar ou usar ou outro “eu”.
É uma necessidade humana, que faz parte da busca de alguns,
estarmos envolvidos com a busca do divino. A atenção sobre a vida merece
exame constante em relação às respostas que nos são apresentadas pelas
ações individuais ou coletivas. Algumas destas respostas acabam tornando-se,
hábitos, princípios e valores que se pautam, na manutenção de formas
arbitrarias de determinadas sociedades. Tais formas, se permanecerem
reproduzidas mecanicamente, sem que haja o instante de parada e reflexão,
sobre a ação e na ação, terão sua continuidade por tempos suficientes para
afastarem o homem da responsabilidade que ele tem, enquanto ser racional,
que pensa na própria formação e na formação do outro.
Formar cidadãos, nos tempos modernos, requer a ação de repensar, os
novos desafios da contemporaneidade, os padrões educacionais, refletindo a
partir de fundamentos de cuidado e sensibilidade. A condição humana de
Cuidado com o outro é desencadeadora de motivação, afeto e experiências
importantes elementos do processo educacional.
Importantes aspectos educacionais foram trazidos do pragmatismo
norte-americano de Dewey (1945 apud SAVIANI, 1989, p.83). Suas teorias se
fundamentaram no empirismo de Bacon, onde a ética e as outras disciplinas
chamadas humanistas progrediam muito pouco, pois eram empregadas com
metodologias “envelhecidas”. Com este teórico, cresceu a ética individualista,
privilegiando-se assim as experiências educacionais gerando autonomia da
pessoa.
Dussel (2002) afirma que a inspiração para a educação libertaria,
“requer que se afirme e reconheça o homem como sujeito livre e centro do seu
mundo em permanente processo de construção e reconstrução”. Este é um dos
pressupostos bioéticos. Isto é fundamento educacional, considerando-se fonte
de inspiração para uma perspectiva latino-americana, onde é necessário tecer
algumas considerações a respeito da onde estamos falando e nos situamos
68
neste cenário. Autor da Ética da Libertação, Dussel considera o continente da
esperança. Mesmo marcado pela exclusão, pela morte, pela marginalização e
situações ultrajantes para a existência humana, podemos apontar para esta
esperança, ao pensarmos no papel critico e reflexivo, transformador da
realidade que a Bioética pode desempenhar na educação.
A Proposta Curricular do Estado de São Paulo tem o objetivo de inserir
discussões sociais e filosóficas para formar os alunos para uma cidadania
consciente e participativa. A Bioética na educação envolve esta perspectiva da
libertação, configurando as situações de aprendizagem de forma dialética, de
aulas dialogadas, colocando o educador como mediador e o educando em
situações de alteridade, de construção de identidades possíveis de agir com
autonomia dentro dos princípios de autonomia, responsabilidade e justiça.
A CONAE (2010), em seu documento base, que recentemente foi
divulgado, propõe as seguintes orientações: como função social, cabe
reconhecer o papel estratégico das instituições da Educação Básica e
Superior, na construção de uma nova ética, centrada na vida, no mundo do
trabalho e numa cultura da paz, superando as práticas opressoras. Isto
incluiria, efetivamente, os grupos historicamente excluídos: negros (as),
quilombolas, pessoas com deficiências, povos indígenas, trabalhadores do
campo, mulheres, LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, e transexuais),
entre outros.
Com este viés, a proposta da CONAE (2010) conclama a uma nova
ética centrada na vida. Para atender a esta proposta, é preciso que os cursos
de formação de profissionais e, especificamente, as licenciaturas de formação
de professores em primeiro lugar, superem a visão fragmentada do
conhecimento, em segundo lugar, que os cursos de formação convidem a
descobrir “Como nasce um professor?” FURLANETTO (2003) afirma que, para
que os professores possam se identificar, como em seu processo de
individuação, foi se dando a apropriação das concepções do que significa ser
professor, identificando e conhecendo-se como pessoa e como professor.
A Bioética, como campo de saber, parece ainda desconhecida dos
professores, da educação e em particular da educação básica, A visão
69
fragmentada não permite vislumbrar a Vida como construção humana, que
todos os conhecimentos se dão para a vida e pela vida. As publicações são
entendidas como um assunto exclusivo do campo da saúde e da medicina.
Os cursos de formação para professores da Educação Básica deverão
passar por uma séria analise com relação à formação humana de seus
profissionais porque, no caso do Estado de São Paulo, os eixos temáticos e as
disciplinas, dentro da proposta, exigem um conhecimento sobre aspectos
filosóficos e psicológicos e sobre sua importância no desenvolvimento da
prática pedagógica.
A introdução da Bioética na educação vem de encontro às necessidades
que se apresentam, ao professor, de tomadas de decisões conscientes e
éticas. Nas decisões que se apresentam, na gestão da sala de aula, ou na
escolha de formas de aprendizagem, que atendam a todos os aprendentes,
nas suas especificidades, a Bioética será útil. No posicionamento diante de
temas que exigem do professor uma visão humanista e interdisciplinar para o
desempenho de sua função de transformador e colaborador da sociedade do
conhecimento, há também a imprescindibilidade da Bioética.
A formação do professor pode parecer possuir uma conotação de uma
formação pontual, que se finaliza e se conclui ao término de uma graduação.
Quando inserimos a palavra “pensar”, logo surge a questão que requisitos que
são importantes para o processo de aquisição do pensamento crítico. Isto não
é uma decorrência só de conhecimentos conceituais ou de técnicas e
procedimentos pedagógicos. Com este olhar, é preciso dividir a formação em
dois momentos: a formação inicial e a formação contínua.
Refletir é, na atualidade, a palavra mais utilizada, nos cursos de
graduação, licenciaturas e capacitações, em todos os espaços que se propõem
a preparar professores. Schõn (2000, apud NÓVOA p. 54) propõem que
“formação de professores orientada para a indagação, reflexão –na –ação, o
professor como controlador de si mesmo”.
Para o professor reflexivo e as ações de formação, “o mero
conhecimento dos métodos não basta, pois é preciso que exista o desejo e a
vontade de empregá-los” (SAVIANI, 1989, p. 83). Se a vontade e o desejo são
70
importantes, os dois se manifestarão em atitudes que, para (SAVIANI, 1989, p.
43), é o tripé de sustentação para o processo de ensino através da reflexão. A
primeira atitude: mentalidade aberta, sem preconceitos e hábitos que limitem a
mente, disposição de escutar e acolher. A segunda atitude: Responsabilidade
“Ser intelectualmente responsável quer dizer considerar as conseqüências de
um passo projetado assegura a integridade, isto é coerência e harmonia
naquilo que se defende” (SAVIANI, 1989 p. 44) E a última atitude é o
entusiasmo, vontade de afrontar as incertezas com curiosidade, energia,
capacidade de renovação e luta contra rotina.
Até aqui, aparecem os movimentos internos da pessoa. Estes exigem o
pensar e a mobilização da atenção para tornar conscientes as indagações e
reflexões sobre si mesmo e sobre as suas ações. A palavra reflexão, assim,
assume um destaque conceitual. Sobre os níveis de reflexão, Zeichner & Liston
(1987) estabelecem a existência de três níveis diferentes: “reflexão técnica,
reflexão prática, reflexão critica”.
Refletir tecnicamente significa observar as ações explicitas que estão
acontecendo no presente. Os verbos se apresentam sempre no infinitivo como:
andar, fazer perguntas, motivar, olhar, escutar, etc. O segundo nível implica o
pensar no que se vai fazer; a intenção ao fazer e o que já foi feito. Destaca-se
aqui o caráter didático, seria pensar no conhecimento que se desenvolveu,
empiricamente - a prática. Uma palavra é usada por (Zeichner & Liston, 1987),
para definir esta forma de agir: planejamento. A reflexão critica, passa pelas
considerações éticas ou políticas da própria prática, suas repercussões no
contexto em que a prática foi desenvolvida. Este nível “traz a consciência sobre
as possibilidades de ação e as limitações de ordem social, cultural e ideológica
do sistema educativo” (Gimeno, 1990).
A formação inicial dos professores passa, assim, a ter dois aspectos
importantes a serem pensados: suas atitudes e como entende e pensa as
práticas educacionais, como são as representações sobre o que significa ser
professor. Os autores Piconez, (1991); Pimenta, (1994); Leite, (1995) nos
trazem dados importantes, para a analise do que significa “o distanciamento do
currículo formal com conteúdos e atividades distanciados da realidade das
71
escolas”. Os formandos, em sua grande maioria, por estar longe da realidade
da escola e do público, com quem vão desempenhar a profissão de professor,
recebem, na sua formação inicial, uma concepção que já os coloca em
desvantagem em relação ao novo paradigma, da “Era digital e da informação”.
Este novo pensar estabelece que o conhecimento seja uma construção
“coletiva feita pelos estudantes e o professor, os estudantes são ativos, tomam
decisões, transformam e o professor é aquele que sabe que ensinar é
complexo e requer considerável formação” (FERRETI, 1996, p.75). Os
objetivos do professor no paradigma antigo, da era industrial de avaliar para
classificar, selecionar, não mais atendem às necessidades porque o aluno tem
direito de apreender.
As contradições presentes, na gestão da sala de aula e na prática
pedagógica, são desafiadoras e angustiantes. É preciso saber lidar com o
imprevisto, com a curiosidade, mas também com a apatia, são desafios que
necessitam de conhecimentos que adentram ao campo da psicologia e
precisam ser explorados e desvendados aos graduandos da educação.
Para Assmann (1996, p. 67), o que entra em jogo nesta busca é a “auto-
estima do viver docente”. A renovação pedagógica, que privilegia as
experiências de aprendizagem e a oferta de utilização de práticas,
humanamente, prazerosas, são os objetivos que motivam a formação.
Entretanto, é preciso urgência na resposta de como fazê-las e alcançá-las. A
atitude do “entusiasmo” que Dewey (apud SAVIANI, 1989) usar para a palavra
curiosidade, a capacidade de inovar, são requisitos para a formação continua,
porque ela é objeto do prazer pelo conhecimento que se constitui como matéria
prima da profissão professor.
A busca em fazer o certo, o empurra para a formação contínua, um
processo de desenvolver as habilidades, procedimentos, atitudes e valores,
que venham acrescentar eficiência ao seu trabalho. A sua identidade como
profissional da educação, é o princípio do comprometimento com o outro, com
responsabilidade e beneficência. Esta é uma ação que “refere-se a uma ação
realizada em beneficio de outros” (BEAUCHAMP, CHILDRESS, 2002).
72
Compromete-se com a vida, seus saberes e sua habilidade para viver a
realidade de agente de construção e transformação.
A beneficência assim assume para o professor um caráter de ideal. O
ideal que o mantém, mesmo que inconscientemente, se construindo enquanto
Ser, porque sua existência é significativa. É pouco provável que a afirmação de
Giddens (2002, p. 16) se apresente para esta pessoa que é o professor “a falta
de sentido pessoal, a sensação de que a vida não tem nada a oferecer, torna-
se um problema psíquico fundamental na contemporaneidade”.
A reflexão, na realidade das ações pedagógicas, a analise dos
comportamentos, atitudes, chamadas reflexão na ação e sobre a ação, têm, na
não maleficência, sua intenção de achar respostas às formas de formar,
ensinar e com o seu agir não causar danos, ao outro. Sua intencionalidade e
compromisso é com a moral, seu instrumento é a consciência. A pesquisa
conceitual é uma exigência para a formação do professor, é principio da
autoformação, comprometida com a formação do outro. A reflexão sobre a
ação é um momento de infusão, conceito de Santo Agostinho (1984) para
meditar, avaliar, pensar e se construir na solidão - que segundo SAUTET,
(1992) é a Ágora.
O significado do conhecimento, na sociedade contemporânea, passa
pela percepção da relação entre conhecimento e vida. Na sociedade do
conhecimento, o significado pode estar entre possibilidade de vida ou de morte.
Os saberes pedagógicos, a desarticulação entre o processo ensino e
aprendizagem, as implicações de relacionamento professor/aluno e a
fragmentação das disciplinas, podem comprometer a formação do aluno.
Para Assmann (1998, p 27) “é preciso (re) encantar a educação”. O (re)
encantamento do educador e do educando, dentro dos processos cognitivos e
processos vitais, que significam pensar as experiências da vida na
corporeidade viva e situada. A redefinição significativa do conceito de vida, nas
biociências e na informática, não consegue ultrapassar o aspecto fundamental,
que nunca a humanidade deverá deixar de entender “é que toda vida só é vida
enquanto é uma cadeia ininterrupta de aprendizagens” (ASSMANN, 1998 p.
27).
73
A equidade, igualdade, inclusão e direitos, são comportamentos que o
professor precisa manifestar perante seus alunos e, neste momento, o princípio
da justiça é o alvo da formação contínua, envolvendo a disposição de acolher,
a humildade em descobrir-se e perceber-se nas suas relações pessoais,
profissionais, valores, pré-conceitos e representações adquiridas, no seu
percurso humano. É exigência legal, moral e humana ser justo. Ter justiça é
tratar com igualdade a todos, é como pensar, ao mesmo tempo, em direitos
iguais, entre aqueles que não são iguais, por condições econômicas, sociais,
morais, físicas ou biológicas.
Moreira Filho (2003, p.45) afirma que a resposta para a exigência
formativa é “o principio da justiça”, que “propõe, a imparcialidade na
distribuição dos riscos e dos benefícios, levando-se em conta as desigualdades
entre as pessoas, a dignidade da pessoa humana e a recusa total a qualquer
tipo de violência”. Podemos concluir que a justiça na educação assim como na
Bioética esta relacionada a critérios de comportamentos morais e éticos: a
imparcialidade, o respeito às diferenças e a dignidade humana, são ações de
justiça no sentido de coerência com o outro enquanto ser humano.
Santo Agostinho (1984) coloca o pensar e agir pelo respeito do mundo
e, em especial, respeito ao “Ser” (M. Heidegger). Pensar é o ingrediente, o
desafio diário para a continuidade da formação do professor. A curiosidade
diante da vida, E o que significa pensar a Vida para os professores? Que
profissão é esta que, de maneira subjetiva, pode definir a morte ou a vida e a
sua qualidade para aqueles que dela dependem?
Existem atitudes que exigem espírito de aventura, para acompanhar a
trajetória humana na terra. Para Morin (2002), esta trajetória não é mais
teleguiada por deus, pela ciência, pela razão ou até mesmo pela lei da História.
Faz-nos digredir o sentido grego da palavra: astro errante. Para os gregos estar
vivo significava estar vendo, e não perder a honra, para o período medieval
estar vivo significava não perder a alma e no século XXI, qual é a
representação de vida?
Pensar em formação de professores é refletir sob a perspectiva humana
individual, pessoal, suas concepções de vida, seu ideal enquanto sujeito
74
participante na sociedade, sua relação com os demais seres humanos, sua
saúde.
A visão do ser total que é o professor, suas competências, suas
habilidades, é importante para determinar um perfil adequado ao público alvo.
Esta visão está, no foco de buscar despertar, no futuro professor, a premissa
de se conhecer a si mesmo, de observar sua interação com a vida e, por
conseqüências, suas esperanças e sonhos.
A educação na visão de Candau (1995, p. 46) é “ter uma formação
sólida em ciências sociais e humanas.” Isto é importante, porem, cabe recortar
e entender o que significa uma “sólida formação.” Envolve conhecimento e
atualização para contextualizar argumentos, desenvolver a
interdisciplinaridade, mas esta sólida formação deve ter como intencionalidade,
compreender a sua participação, seu envolvimento e seu olhar para a vida que
tem aspectos sociais e humanos, que são também histórias de vida (Josso,
2008). A formação do professor bioético abrange a compreensão de que a
sólida formação e os conhecimentos, são como meio de realização para o
principal fim de todos os seres humanos: a qualidade de vida. Para CANDAU
(1995, p.47) trata de uma visão em que:
A educação é vista como uma prática social em intima conexão como sistema político-econômico vigente. Somente a partir deste pode ser compreendida e analisada. Portanto, o educador deve possuir uma sólida formação em ciências sociais e humanas. Sua prática não é jamais neutra. Está a serviço da manutenção do Status Quo ou da transformação social. Analisar e propor, a partir das condições concretas da realidade, uma prática educativa transformadora constitui uma questão fundamental. Questão esta que somente pode ser trabalhada na interpretação da teoria e prática, que devem ser consideradas como uma unidade. Esta dinâmica deve estar presente em todo o processo formativo. Só a partir desse tipo de análise é que se adquire sentido e preocupação com as dimensões do processo educativo. (...) A educação de fato é um processo multidimensional.
Vemos que o autor apresenta dimensões humanas, técnicas e a
dimensão político – social. As dimensões não podem ser visualizadas, como
partes que se justapõem ou que são acrescidas, umas às outras, sem
guardarem entre si uma articulação dinâmica e coerente.
75
Rubem Alves (apud BRANDÃO, 1982 p.18) trata, em sua obra,
“Educador: vida e morte”, da formação dos professores como uma necessária
transformação. As novas tecnologias, e as relações dos alunos com a
informação desafiam a formação dos professores a assumir o compromisso de
transformar os procedimentos e o enfoque do processo de ensino e
aprendizagem, sob pena de se extinguir. A formação do professor passa pelo
entendimento de sua profissão, como mediador. Aquele que, intencionalmente,
promove situações de aprendizagem, situações problemas, portanto, desloca o
foco do ensino, para o enfoque, apreender.
Freire (1996, p. 96) pondera que é possível ser professor sem que “haja
uma aproximação cada vez maior entre o que eu digo e o que eu faço entre o
que pareço ser e o que realmente estou sendo.”
Segundo Freire (1996, p. 67), “não podemos exercê-la mal, a prática
pedagógica, não posso (dês) amá-la.” A reflexão é acordar a mágica e o prazer
para a profissão professor porque “não é possível ficar nela e aviltá-la, com o
desdém de mim mesmo e dos educandos” Freire, (1996, p. 67).
Piaget ao tratar a questão da autonomia, destaca que ela não é possível
sem a democracia, pois, para ele, as relações sociais baseadas na cooperação
- intercâmbio de pontos de vista são imprescindíveis para a construção da
autonomia. ( apud BRANDÃO DA LUZ, 1994)
Aliado à vivência da cooperação e do respeito mútuo, o exercício do
autogoverno possibilita, para esse autor, a construção de personalidades
autônomas, aptas a viver e fazer democracia. Nessa perspectiva, a autonomia
é, então, a constituição de uma razão, intelectual e/ou moral para
Estabelecer suas certezas, liberando-se do que a tradição procura
pura e simplesmente impor às diversas consciências. (...) O ‘herói’ piagetiano é, portanto, aquele que pode dizer ‘não’ quando o resto da sociedade, possível refém das tradições, diz ‘sim’ (DE LA TAILLE, DANTAS & OLIVEIRA, 1991, p. 63).
Assim, a constituição da autonomia se dá numa perspectiva piagetiana,
na interação com o outro. Entretanto, essa interação efetiva-se, com vistas a
uma mudança, nas estruturas cognitivas do sujeito, a uma maturação biológica
76
e uma equilibração das estruturas mentais do indivíduo. Nesse sentido, a
construção da autonomia pressupõe que o conteúdo, seja ele intelectual ético
ou moral, "tenha sido obtido por um comportamento ativo da razão e que a
própria razão esteja em condições de controlar o acordo ou o desacordo de
seus julgamentos com a realidade" (BRANDÃO DA LUZ, 1994 p.298). Ou seja,
é preciso que ele tenha sido incorporado pelo sujeito e que ele faça parte
efetiva da razão. Essa abordagem compreende autonomia como um estágio de
desenvolvimento da moralidade, o que a restringe a processos individuais
muito mais relacionados à constituição da "personalidade". Entretanto, o estudo
sobre autonomia não pode ficar limitado a essa dimensão, sob pena de
restringir autonomia ao desenvolvimento do juízo moral do indivíduo.
Para Freire (1996) há que se reconhecer a autonomia na relação com as
experiências coletivas. São as vivências, as iniciativas, as decisões,
oportunizadas pelos contextos sociais nos quais se inserem, assim como as
relações que se estabelecem nesses contextos, que vão permitindo a
constituição de práticas mais, ou menos, autônomas. Coragem é autonomia,
autonomia coerente, com a formação de valores humanos e técnicos.
A formação do educador passa pela aprendizagem da tomada de
decisão, da expressão das idéias, coerentes com princípios desenvolvidos na
sua formação contínua. Passa, ainda, pela busca do bem formar o outro, de
intencionalmente não o prejudicar, seja no falar, no agir, na disposição de
acolher as diferenças e de ser justo. Passa, ainda, pelo conhecimento das
linguagens do agir professoral, que estará exposto ao aluno, demonstrando
como enxerga a profissão, a vida e sua existência.
A autonomia nunca será total, todos nós sofremos limitações, mas elas
não podem ser mecanismos de imobilidade diante da vida, das situações que
se apresentam, exigindo o posicionamento de cada pessoa ou profissional.
Pode a autonomia ajudar a divergir sem concordar, o humano aceitando o
outro humano, com o dialogo, diferencial do ser vivo, homem e sua
racionalidade.
77
3. A PROPOSTA CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO DO ESTADO DE SÃO PAULO: FUNDAMENTOS DO SUJEITO (BIO) ÉTICO.
Neste capítulo focaliza-se a inclusão da Bioética, como eixo temático, no
ensino de filosofia, conforme sugestão da Proposta Curricular do Ensino Médio
do Estado de São Paulo. A educação é concebida, como processo contínuo de
aprendizagem e reflexão, na busca dos princípios e dos fundamentos do
sujeito (bio) ético.
Os fundamentos estéticos, políticos e éticos das Diretrizes Curriculares
do Ensino Médio pedem a reflexão, em todas as esferas de organização,
sejam administrativas ou pedagógicas ou as formas de convivência no âmbito
escolar. Os valores estéticos, políticos e éticos inspiram a Constituição de 1988
e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e são organizados de forma a
desenvolver: a sensibilidade, a igualdade e a identidade.
3.1 A Bioética: o desempenho entre ser pessoa e ser sujeito aprendente.
A Proposta Curricular do Estado de São Paulo, 2008, é reflexiva e
filosófica, porque busca a materialidade do pensamento e da prática
pedagógica. O sujeito, a corporeidade HEIDEGGER (2000), o desenvolvimento
cognitivo, suas relações e interações com o meio são priorizadas na totalidade
das ações pedagógicas. A capacidade de ler para a construção da cidadania é
o pilar da libertação, da condição de vitimas, dentro do sistema globalizado,
indecifrável para a camada mais pobre da sociedade. O interesse
governamental é incluir esta camada, conduzindo-a à participação, na
sociedade globalizada, como cidadãos, através da democratização do ensino.
O homem é fruto da evolução que produziu a vida, da qual ele é
expressão consciente e inteligente, criador de cultura.
Por natureza, o homem é um ser biologicamente carente, sendo
obrigado a conquistar o seu sustento, modificando o meio e criando seu próprio
hábitat.
78
O Homo Erectus, surgido na África, há, aproximadamente, 7 milhões de
anos, pôs-se a conquistar o espaço, começando pela Eurásia, passando pela
Ásia e América até à Oceania. Com o crescimento do seu crânio, evoluiu para
o Homo Habilis, aproximadamente, há 2,4 milhões anos atrás, ampliando ainda
mais sua capacidade de conquista.
Com o desenvolvimento da linguagem, a principal atividade humana
para a formação do mundo cultural, este homem passa a estabelecer, através
da palavra, ideias que podem tornar presentes os objetos que estão distantes.
Assim, há o estabelecimento, através do convívio e da troca de experiências,
de possibilidades de conquistas representativas, que racionalmente se
desenvolvem e ganham uma dimensão universal.
Como um ser inteiro, mas inacabado (não é um defeito, mas uma
marca), o paradigma da conquista pertence à (auto) compreensão do ser
humano, que nomeia caracteriza e forma consciência de si e de sua história.
Descartes, Locke, Hume e outros, no século XVII, enfatizando a razão,
criam o dualismo psicofísico, ou seja, a separação corpo-mente. O corpo é uma
realidade física, sujeita às leis deterministas da natureza, objeto de estudo da
ciência e a mente é objeto da reflexão filosófica.
A questão metafísica foi posta em questão, reiteradas vezes, por várias
razões, a saber: pelos céticos, em virtude da sua desconfiança da capacidade
cognoscitiva do homem; pelos empiristas, pela redução da consciência à
experiência sensitiva; pelos positivistas, materialistas e marxistas, pela
redução de toda realidade à ordem material.
Neste sentido, a reflexão filosófica, como uma questão epistemológica,
vem dando importante contribuição ao estudo sobre os métodos científicos e,
sem dúvida, essa contribuição é ainda mais necessária na atual fase de
aprimoramento da pesquisa educacional em “face dos riscos de tecnicismos”
(GAMBOA, SANTOS FILHO 2000, p. 65).
O Ser sujeito é único, singular e autônomo, mas o ser pessoa constrói-
se na interação com o meio ambiente, comum a todos, a Terra. O Ser Sujeito é
um ser de relações: ele existe como pessoa, torna-se pessoa, à medida que se
relaciona consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com a dimensão
79
transcendente da vida. Como ser inacabado e em construção, a possibilidade
de errar e acertar é condição de estar no mundo.
A partir do movimento interno o ser reconhece seus atos e assume a
responsabilidade, condição de transformação e mudança. Classificar ou
condenar é exercício de respeito. Para Dussel (2002), a vítima não é apenas o
outro, mas também o Eu, quando lhe falta justiça e responsabilidade. Para
Heidegger, o Cuidado não é viver “para os outros”, mas estar “com o outro”, o
que configura a atitude libertadora.
É necessário conviver com diferentes culturas, formas de pensar a
vida, escolhas pessoais que divergem da “normalidade”, relações de hierarquia
e aspectos institucionais. O respeito acolhe o outro e suas características,
sendo necessária a disposição para estar com.
Para Buber (2001), “tudo passa pelo outro, fora dele não há solução
nem salvação para a humanidade”. No outro, está a possibilidade de agir
eticamente, reconhecer-se e, segundo Freire (2006), o desafio de “Ser Mais”.
A EDUCAÇÃO é permanente não porque certa linha ideológica ou certa posição política ou certo interesse econômico o exijam. A EDUCAÇÃO é permanente razão, de um lado da finitude do ser humano do outro, da consciência que ele tem de sua finitude. Mais ainda, pelo fato de, ao longo da História, ter incorporado à sua natureza não saber que vivia, mas saber que sabia e, assim, saber que podia saber mais. A EDUCAÇÃO e a formação permanente se fundem (...), o ser humano jamais pára de Educar-se (...). A melhora na qualidade da EDUCAÇÃO implica na formação permanente dos Educadores. E a formação permanente se funde na prática de analisar a prática. É pensando a sua prática que, naturalmente com a presença de pessoal altamente qualificado, que é possível perceber embutida na prática uma teoria não percebida ainda, pouco percebida ou já percebida, mas pouco assumida ( GADOTTI, 1997).
É nesse contexto, que a Proposta Curricular do Governo do Estado de
São Paulo (2008) – PCE-SP estabelece as competências indispensáveis ao
enfrentamento dos desafios sociais, culturais e profissionais dos jovens em
formação para a cidadania do século XXI, o que aponta a importância do
80
pensamento filosófico, assim como o retorno das disciplinas chamadas
“ciências humanas”.
A PCE-SP (2008) entende o desenvolvimento pessoal do aluno como
um processo de aprimoramento das “capacidades de agir e pensar, atuar sobre
o mundo e lidar com a influência do mundo, assim como atribuir significados,
situar-se e pertencer” (Proposta Pedagógica Filosofia, 2008, p 8). Um tempo de
discussões e esse tempo sendo compreendido como o momento único,
gerador de novos significados e mudanças de idéias e de pensamento nas
preocupações oficiais da educação publica, com a liberdade, com a tolerância,
com a sabedoria, no convívio com o diferente e na adversidade.
A educação deve possibilitar, ao jovem, a aquisição da competência
necessária para se conduzir como Ser humano pensante, criador, capaz de
escolhas conscientes e coerentes.
Como política pública, propõe-se a contribuir para a formação integral do
jovem, entendendo o processo educacional, não como mera transmissão de
conhecimentos, mas aprendizagem de diferentes formas de leitura de mundo,
para a compreensão da sociedade e de suas relações.
As Diretrizes Curriculares do Estado de São Paulo do Ensino Médio em
Filosofia, no item Competência e Habilidades Específicas, dispõem:
O professor de Filosofia deverá possuir, também, competências técnico-cientìficas, éticas-políticas, sócio-educativas contextualizadas que permitam: (...) gerenciar o processo de trabalho na Filosofia com princípios de Ética e de Bioética, com resolutividade tanto em nível individual como coletivo em todos os âmbitos de atuação profissional.
Para Arendt (2004), é preciso “pensar e agir pelo amor do mundo”, o que
é possível pelas situações de aprendizagem de Filosofia e o eixo temático
Bioética, que privilegiam o diálogo e a linguagem.
Nas Situações de Aprendizagem I, II e III, as estratégias de ensino
levam em consideração a reflexão e o diálogo. A sensibilização, através de
recursos, como filmes, músicas e situações-problema, tem o objetivo de
provocar o pensamento filosófico e a formação de valores éticos e morais.
A Situação de Aprendizagem I introduz a Bioética, discutindo os temas:
saúde pública, conceito de vida humana, meio ambiente, ética médica,
81
medicalização da existência e planejamento familiar, evitando o senso comum
ou o julgamento pelas opções religiosas das pessoas. As matrizes teóricas das
reflexões existenciais estão em Sartre, Foucault, Heidegger e a Escola de
Frankfurt, com ênfase em Adorno.
A Bioética, como eixo temático, nesta situação de aprendizagem, parece
fragmentada, pois propõe reflexões existenciais juntamente com problemas
relacionados à medicina e à mercantilização do corpo, o que é difícil cumprir
em apenas quatro horas-aula mês com uma duração de cinqüenta minutos
cada. Estando na contradição da garantia de uma justa possibilidade da
liberdade humana, colocando a fronteira do tempo com empecilho para que
todos possam usufruir com um mínimo de dignidade e decência no pensar,
inferir e julgar.
A aula dialogada, a exposição, o encadeamento das idéias e as
evidências lógicas e empíricas não são suficientes para desenvolver o
raciocínio argumentativo sobre os problemas da condição humana e sua
relação com a vida.
Na Situação de Aprendizagem II, a aula expositiva, com duração de
quatro horas/aulas, introduz o debate sobre a tecnologia e sua relação com as
pessoas, a partir da pergunta: Para que serve a tecnologia? O texto Razão
Instrumental (Adorno, 1986) enfatiza a racionalidade para atingir o progresso.
Com base em Heidegger, no Caderno do Professor (p. 22), a pergunta o
que é? visa levar o aluno ao encontro com o misterioso Ser presente em todos
os entes e desenvolver estas competências e habilidades:
compreender a importância da bioética na condução das pesquisas cientificas, compreender a estreita relação entre medicina e política, exercitar o raciocínio argumentativo sobre problema em esfera pública e democrática, além de apresentar reflexões sobre a condição humana. (p. 18). Apresentar um conceito altamente crítico em relação à sociedade tecnológica, apresentar um conceito altamente abstrato e interessante do ponto de vista existencial. (p. 26).
Na Situação de Aprendizagem III, propõe-se discutir A condição humana
e a banalidade do mal (quatro aulas), a partir de Arendt, com os procedimentos
de sensibilização, diálogo e leitura.
82
Os debates e reflexão enfocam o labor, os prazeres biológicos, bulimia,
anorexia, anabolizantes, a sobrevivência, o mal, o tráfico de drogas, a falta de
segurança e de hospitais, professores mal pagos, empresas que adulteram
remédios e alimentos, cadeias superlotadas, o risco de morrer e outros
problemas, visando desenvolver as competências:
refletir sobre o mal e reconhecer a importância da teoria política em
Hanna Arendt, obter uma visão geral discutidos sobre a obra de Arendt e compreender a vitória do labor em Arendt ( PCE-SP 2008. P. 30).
A Educação no Estado de São Paulo (2008), através do seu documento
curricular insere a disciplina Filosofia, que acolhe a Bioética como eixo
temático, no 2º Ano do Ensino Médio, estabelecendo uma aula por semana. O
documento aponta a necessidade de preparar os seus alunos para enfrentar e
conviver com os desafios da sociedade do conhecimento. Encontramos a
definição de escola, como espaço da cultura e de articulação de competências
e habilidades. Tal concepção pedagógica se fundamenta no direito de o aluno
apreender. Desloca o foco para a aprendizagem, coloca a educação a serviço
do desenvolvimento, que deve coincidir com a construção da identidade, da
autonomia e da liberdade.
Para alcançar este objetivo, propõe procedimentos pedagógicos de
aproximação cultural, diálogo e resoluções de problemas e o agir de forma
solidária e cooperativa. As políticas educacionais propostas pelo governo do
estado de São Paulo reconhecem a “Educação Básica para a vida”, a
quantidade e a qualidade do conhecimento devem ser determinadas por sua
relevância para a vida.
O Caderno IV apresenta questões e temas bioéticos, sem aprofundar e
detalhar os conceitos necessários para a discussão dos problemas. O Caderno
do Professor é insuficiente, obrigando a recorrer a outros meios para
complementar e esclarecer dúvidas.
Em 2005, a Secretaria da Educação desenvolveu o projeto Pós-
Graduação “Filosofia e Vida”, com aulas presenciais, videoconferências e
ambiente virtual Teleduc, para os professores de Filosofia da rede estadual de
83
ensino. Em que pese a boa intenção, o projeto configurou-se como um
instrumental inócuo, pois é impossível ensinar Filosofia sem um texto filosófico,
tempo e diálogo para passar da consciência ingênua, do senso comum para a
consciência conceitual, que pode “desenvolver a consciência crítica”,
importante para a construção da autonomia e da identidade.
Não basta promover um debate sobre questões da Bioética. Cabe à
filosofia exercitar a reflexão crítica sobre a vida, o ser e sua dignidade. Assim,
é necessário despertar e desenvolver a consciência crítica dos professores de
Filosofia, para que contribuam para o aperfeiçoamento da PCE-SP pela análise
dos objetivos, temas, vocabulário, carga horária, metodologia, validade,
adequação e condições de trabalho em sua disciplina.
As discussões devem ocorrer com distanciamento crítico para a
construção dos valores, competências e habilidades em cada situação de
aprendizagem.
A reflexão, a consciência coletiva, a integração, solidariedade,
cooperação e colaboração entre as pessoas e o diálogo entre as disciplinas
são essenciais para organizar e decifrar o todo e o holo. Como afirma
SANTOS (2000) criar uma nova globalização, já que o processo é irreversível,
só não será perverso “com a consciência humana de ações humanizadas”.
Com a atitude, o jovem vai entender o seu papel na história e saber que ele
pode ser um agente transformador na sociedade, para que, de maneira
autônoma, possa tomar parte nesta construção para identificar, pensar e julgar.
FINNIS (2007, P. 134) aponta:
a existência de alguns bens fundamentais em si mesmos: o
conhecimento, a vida, a vida estética, a vida lúdica, a racionalidade prática, a religiosidade, a amizade, bens em si mesmos, fins e não meios, que não supõem nenhuma organização hierárquica entre si.
No PCE-SP, os princípios não são explicitados para orientar o
planejamento, ocorre a compartimentalização das disciplinas, os cadernos
levam à ação isolada, a grade curricular privilegia saberes, colocando as
disciplinas reflexivas em desvantagem, com apenas uma aula semanal.
84
Assim, parece que a PCE- SP 2008 é insuficiente para a compreensão e
debate dos desafios éticos, da condição humana e escolhas conscientes do
cidadão do século XXI, o que mostra, segundo Adolfo Lima (1915 Apud
NÓVOA 1992, p. 360), que “o poder público é , por definição, incompetente
para exercer a função educadora e tratar de assuntos doutra técnica que não
seja a política”.
É preciso salvaguardar a autonomia da prática docente, como afirma
Tamagnini (1930, apud NÓVOA, 1992 p.94):
O Estado organiza o plano geral dos estudos, formula os objetivos a
realiza, mas aos professores e só a eles compete a organização dos programas dos cursos, isto é, a seleção das matérias, a concretização dos exemplos e a escolha dos métodos e processos adequados à realização dos fins que se têm em vista.
Para Rogers (1976, p.192), “a ciência apenas existe nas pessoas”. O
projeto científico tem o seu impulso criador, o seu processo e fim provisório
numa pessoa ou em várias pessoas.
É imprescindível que cada um de nós se construa e se reconheça
sujeito. Construir-se sujeito nada mais é do que se construir em todas as suas
dimensões. Reconhecer-se sujeito é ser autônomo, livre e responsável, em
todas as suas ações. Sobre a dimensão do sujeito é preciso considerar uma
interioridade e uma exterioridade. Interioridade: os aspectos psíquicos relativos
ao conhecer/saber, ao fazer, ao sentir e ao querer. Exterioridade: o que diz
respeito ao corpo, à família, à sociedade e ao espiritual (o se voltar para um ser
superior, não necessariamente religioso). Daí as dimensões do sujeito: a
psicocorporal, a psicofamiliar, a psicosocial e a psicoespiritual. Há algumas
funções do dinamismo psicológico, consideradas importantíssimas, na sala de
aula. São elas a introspecção, a extrospecção, a atenção, a memória, o
pensamento, a linguagem, a imaginação, a percepção, a intuição, dentre
outras. Observa-se que os aspectos psíquicos interpenetram-se entre si, como
se interpenetram os aspectos constituintes da exterioridade. E ambas, a
interioridade e a exterioridade, interpenetram-se entre si. É então por esse viés,
que se considera a formação de professores em nova perspectiva, isto é, numa
real e radical perspectiva interdisciplinar na condução de suas pesquisas e na
85
maneira de encarar, principalmente, seus alunos como sujeitos, isto é,
colocando-os frente à realidade, teórica e praticamente, elevando-os, cada um,
a se construir e a se reconhecer sujeitos (PEREIRA, 2007 p.193).
3.2 O sujeito (bio) ético: a construção de valores na escola e na vida.
O ensino da Bioética deve contribuir para o desenvolvimento da
cidadania, que é uma preocupação da educação mundial. Para que os
estudantes possam aprender e assumir os princípios bioéticos, são
necessários pelos menos dois fatores: 1) que os princípios se expressem em
situações reais, que possam ter experiências e possam conviver e colocá-las
em prática; 2) desenvolver sua capacidade de autonomia moral, isto é,
capacidade de analisar e eleger valores para si, consciente e livremente.
Os sujeitos da aprendizagem, estudantes e docentes, interpretam e
conferem sentido aos conteúdos com que convivem na escola, a partir de seus
valores previamente construídos e de seus sentimentos e emoções. Tal
premissa está de acordo com a visão bioética de que os valores e princípios
éticos são construídos, a partir do diálogo, na interação estabelecida entre
pessoas imbuídas de razão e emoções e um mundo constituído de pessoas,
objetos e relações multiformes, díspares e conflitantes.
A promoção de uma educação com valores e princípios bioéticos deve
partir de temáticas significativas do ponto de vista ético, propiciando condições
para que os alunos desenvolvam sua capacidade dialógica, tomem consciência
de seus próprios sentimentos e emoções (e dos sentimentos das demais
pessoas) e desenvolvam a capacidade autônoma de tomada de decisão em
situações conflitantes do ponto de vista ético/moral.
A melhor forma de ensinar é estimular reflexões e vivências. Mais do que
os discursos, são a prática, o exemplo, a convivência e a reflexão, em
situações reais, que farão com que os alunos desenvolvam atitudes coerentes
em relação aos valores que queremos ensinar.
O convívio escolar é um elemento-chave na formação ética dos
estudantes, o instrumento mais poderoso que a escola tem para cumprir sua
tarefa educativa. Daí a necessidade de os adultos reverem o ambiente escolar
86
e o convívio social que ali se expressa, a partir das próprias relações que
estabelecem entre si e com os estudantes, buscando a construção de
ambientes mais democráticos.
É, também necessário considerar o acolhimento dos estudantes – de
suas diferenças, potencialidades e dificuldades – e o papel reservado a eles na
instituição. O cuidado e a atenção com suas questões e problemáticas de vida
precisam concretizar o respeito mútuo, o diálogo, a justiça, a beneficência e a
não maleficência que queremos ensinar.
Os eixos temáticos e conteúdos da bioética devem perpassar as ações
cotidianas nas salas de aula e nos demais espaços e tempos dos quadrantes
escolares.
No livro, “Educação: um tesouro a descobrir”, UNESCO (1999)
destacam-se algumas idéias que ajudam a compreender o papel da bioética na
educação. Pela leitura, vê-se a relevância do papel da Bioética na construção
da democracia e da cidadania, à luz do que está sendo discutido até aqui, a
educação surge como um triunfo indispensável da humanidade, na construção
dos ideais de paz, liberdade e justiça social. Com a educação pode-se fazer
frente à exclusão social, às incompreensões, às opressões e às guerras:
• Escolas em que são evocados princípios como respeito mútuo, solidariedade, justiça e diálogo e em que os alunos e as alunas se apropriam de canais de participação na vida escolar e são incentivados pelos educadores a fazê-lo são aquelas em que se cria um espaço democrático, do qual emergem as características de uma cidadania plena. • Os educadores devem sempre estar atentos à coerência entre o discurso e a ação: respeitar para ser respeitado, assumir e cumprir suas responsabilidades, como forma de ensinar aos estudantes a importância da responsabilidade. • A participação dos estudantes na escola e na comunidade ajuda a formar seu caráter como cidadão e como cidadã. Em particular, a participação dos diferentes atores da comunidade educativa nas tomadas de decisão é uma prática cívica – uma atuação no espaço público democrático – que possibilita um conhecimento prático dos processos que caracterizam a vida cívica e política na comunidade. A participação nas decisões vai de simples contribuições à manutenção e à organização do espaço, por exemplo, possível desde a mais tenra idade, até a participação em decisões gerenciais e acadêmicas, por meio dos Conselhos de Escola e das Assembléias Escolares. • A disposição para a mudança e para a transformação da escola (incluindo formação de docentes, trabalho com os estudantes, participação dos demais funcionários e articulação com a comunidade) potencializa a capacidade de atuação e fortalece todo o
87
trabalho educativo escolar. A escola tem mais força para atingir suas metas educativas com os estudantes, o que reforça a própria instituição e produz um efeito cumulativo, proporcionando transformações cada vez mais profundas e duradouras.
A Bioética, como eixo temático da disciplina de Filosofia, deve trabalhar
por meio de situações e resolução de conflitos, visando preparar os alunos
para a vida, nas dimensões cognitivas e afetivas, para conhecerem-se a si
mesmos e aos colegas, as causas e conseqüências das ações e escolhas da
vida.
Como se vê, a educação pulsa no coração da cada um dos princípios,
que se constituem o Paradigma do Desenvolvimento Humano. À medida que
este compromisso avança e se fortalece, a educação deixará de ser vista
apenas como uma política setorial e ser assumida pelas nações como força
estratégica da qual dependerá, cada dia mais, o desenvolvimento econômico,
social e político dos povos do século XXI.
Nesse contexto, a PCE-SP – 2008 propõe quatro eixos temáticos: ética,
convivência democrática, direitos humanos e inclusão social.
A cidadania como conceito expressa um conjunto de direitos e de
deveres dos cidadãos, como votar e ser votado, exercer funções públicas e
participar da elaboração das leis e sobretudo lutar por condições que garantam
uma vida digna às pessoas.
Não se pode reduzir a cidadania às relações sociais e políticas, dada a
multidimensionalidade e complexidade do mundo e do ser que o habita, o que
envolve a cultura, a ideologia, a ciência e muitos outros aspectos.
A educação deve visar ao desenvolvimento de competências para lidar
com a diversidade e conflitos, sentimentos e emoções nas relações do sujeito
consigo mesmo e com o mundo.
À escola cabe ensinar não apenas matérias ou disciplinas, como Língua
Pátria, Matemática, História, Física, Geografia, Artes e outras, mas também
proporcionar formação ética e moral, para construir o cidadão participante e
crítico, o que exige que seja democrática, inclusiva e de qualidade, para todos,
não só para uns poucos eleitos.
88
Valores não se ensinam nem são inatos, mas construídos pelo sujeito,
nas interações, situações e ações do dia a dia, tendo o professor como
mediador.
Na Filosofia, o campo que se ocupa da reflexão sobre a moralidade
recebe a denominação de ética. Os dois termos, ética e moral, têm significados
próximos, indicando o conjunto de princípios ou padrões de conduta que
regulam as relações dos seres humanos com o mundo em que vivem.
Entre esses princípios, Beuchamp e Childress (2002) colocam a
beneficência, a não-maleficência, a justiça e a autonomia, a partir dos quais
pode-se iniciar a reflexão e análise crítica da realidade e das normas sócio
morais, visando propor e implementar formas mais justas e adequadas de
convivência.
Para Cortina (2003), a educação deve levar em conta a dimensão
comunitária, os projetos e responsabilidades pessoais e a universalização, a
fim de contribuir na construção do melhor mundo possível. Puig (1998) entende que uma escola democrática define-se pela
participação do aluno e do professor no trabalho, na convivência, nas
atividades de integração. A participação deve ser baseada no diálogo Sègre, e
Cohen (1994), com acordos e projetos coletivos, esforçando-se para entender
e intervir.
Pelo diálogo, um dos pilares da bioética, e participação nas atividades
curriculares e não-curriculares, estudantes, docentes e gestores tornam-se
atores da construção da cidadania participativa.
De acordo com Tugenback (1999, p.362), Dallari (2004, p.14), ao que
considera como razoável quanto ao respeito aos diretos fundamentais dos
seres humanos que comportamento moral e ético consiste em reconhecer que
todos, independentemente de suas peculiaridades e papéis específicos na
sociedade, têm direitos simplesmente porque são seres humanos. Tais direitos,
segundo Benevides (2004), são universais, naturais e históricos.
Em 1948, a Organização das Nações Unidas – ONU – promulgou a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, que envolve as liberdades
individuais, os direitos sociais e os direitos coletivos, tornando-se uma
89
referência para a análise e elaboração de programas de defesa e
conscientização de valores bioéticos.
De acordo com Barth, (1990, p. 514-515), as diferenças representam
grandes oportunidades de aprendizado. Para Stainback (1999), a inclusão de
pessoas diferentes facilita o desenvolvimento do respeito e de apoio mútuo.
Para a construção de sociedades e escolas inclusivas, abertas às
diferenças, à igualdade e à justiça, é preciso garantir melhores condições de
vida e oportunidades para todos. Cabe aos educadores trabalhar a convivência
democrática, os direitos humanos e a inclusão social a partir das diferenças.
3.3 Os aspectos valorativos da formação do sujeito (bio) ético. 3.3.1 Os dois lados da realidade: a relacional e a comportamental.
Em um contexto de grandes e profundas transformações, a perspectiva
ética resgata valores que podem parecer obsoletos, mas que adquirem
importância e significado: responsabilidade para com o presente e para com o
futuro; aprender a conviver com o diferente; não sonhar com soluções fáceis
para problemas difíceis; não ter medo do novo, mas não esquecer os
ensinamentos do passado; estabelecer limites; democratizar os benefícios e
outros. (MOSER, 2004 p. 347).
Na mesma linha, a PCE – SP propõe a equidade, justiça e autonomia,
como eixos temáticos na disciplina Filosofia: o cultivo da identidade na
alteridade; a redescoberta do senso do mistério e da capacidade de admirar; o
desenvolvimento do senso crítico: avaliando perdas e ganhos e o bem e o mal, buscando, uma forma de se alcançar a justiça social e do aprendizado da
participação cidadã nos destinos da sociedade.
90
3.3.2 A equidade, a justiça e a autonomia.
Para Demo (2002, p. 85), a aquisição da autonomia passa pelos
processos de aprender a aprender, questionar de modo crítico e criativo. O
treinamento pode oferecer ao aprendiz ferramentas para aprender mais
eficazmente e tornar-se autônomo e independente. Para o autor,
“independência vai além de uma visão simplista de liberdade de estudar
quando e onde o sujeito desejar, desconsiderando a interação”
A autonomia não deve ser confundida com o autodidatismo, onde a
pessoa seleciona os conteúdos, sem uma proposta pedagógica. Já na
modalidade à distância, a pessoa decide sobre o espaço e tempo para o
estudo, porém, com uma proposta, conteúdos, atividades e orientações.
A escola é o espaço ideal para produção de conhecimento e cultura,
privilegiando os valores humanos, fornecendo contextos e saberes para tornar
o aluno autônomo e capaz de obter e interpretar a informação em outras fontes
e lugares.
A autonomia representa perda para quem está no poder, como detentor
do saber e das decisões. Na relação pedagógica, significa reconhecer no outro
sua capacidade de ser, participar, decidir, oferecer e partilhar; assumir sua
própria formação.
Contribui para alcançar a autonomia o suporte técnico, a competência
técnica do aprendiz e do professor, responsabilizar-se pelo próprio
desenvolvimento, metodologias e estratégias de interação apropriadas,
atenção ou sensibilidade para detectar os obstáculos psicológicos, sociais e
técnicos do processo ensino-aprendizagem.
Não existem receitas, fórmulas prontas que garantam o sucesso. Deve-
se levar em consideração que professor e aluno trazem consigo experiências
educacionais que não proporcionaram a autonomia. Os alunos esperam ser
ensinados e os professores esperam ensinar. É no próprio processo de
participação que se aprende a participar.
A autonomia e a autoaprendizagem supõem a capacidade de
91
autoeducar-se, sem recorrer, a todo instante, a um superior. Se o professor
encara a si próprio como “quem ensina” no sentido instrucionista, dificilmente,
conseguirá ajudar o aluno a emancipar-se. Como Libâneo (1995, p. 36) alerta:
“a tarefa de ensinar a pensar (aprender a aprender) requer dos professores o
conhecimento de estratégias de ensino e o desenvolvimento de suas próprias
competências de pensar”. 3.3.3 O cultivo da identidade na alteridade.
Os acontecimentos particulares tendem a repercutir no contexto global,
o que aponta que tudo deve ser pensado em termos macro. Daí a importância
de orientar as pessoas, para que não se percam na massa nem cedam à
ditadura do pensamento único. Num mundo que tende à massificação, cultivar
a identidade pessoal é um grande desafio.
As experiências de laboratório manipulam genes, criando seres
transgênicos, modificados, visando a maior beleza, produtividade, resistência e
produtividade. A clonagem já é um fato no mundo científico, restrita, ainda, ao
mundo animal e vegetal. No mundo dos homens, já se propõe a clonagem
terapêutica, para suprir a sempre maior demanda de órgãos para transplantes,
o que coloca grandes interrogações para todos que vêem o ser humano como
algo único, irrepetível, sagrado, isto é, não manipulável. Toda clonagem remete
à idéia de intervenção radical, “cópia”, padronização e produção em série. Já
sofremos a padronização operada pelos tratores das culturas dominantes, que
roubam a originalidade das culturas consideradas mais fracas. Surge, agora, a
tentativa de uniformização do pensamento, sentimentos e dos corpos.
Criado em laboratório, o “homem máquina” aponta que caminhamos a
passos largos para a robotização de todos os seres, conjugada com a
padronização e o que ela significa em termos de mercado (OLIVEIRA, 2003).
No mercado da biotecnologia, quanto mais se padroniza, mais se vende.
O alerta é que as mesmas empresas que manipulam a genética animal
poderão vir a explorar corpo humano. O tráfico de órgãos é uma pequena
92
amostra daquilo que poderá acontecer. Claro que o que se tem a temer não é a
tecnologia, nem a biotecnologia, mas a ideologia perversa que as comanda.
No quadro das espécies, os seres, apesar de semelhantes, mantêm uma
irredutível originalidade. Assim, para enfrentar os novos desafios, é preciso
cultivar a alteridade e atentar para a originalidade das pessoas, aí inclusas as
culturas, as religiões e a biodiversidade. Nada justifica a anulação daquilo que
é próprio de cada um. A busca da comunhão só será verdadeira na medida em
que forem mantidas as diferenças para que todos sejam o que são e o que
querem ser.
Nesse sentido, o ethos da ética propõe engajar-se na luta pela
emancipação e autonomia, ouvir o outro, não repetir irracionalmente os
costumes, mas buscar caminhos novos. Como afirma Dussel (2002) a ética da
alteridade entende a libertação como condição para a transformação.
3.3.4 O cultivo do senso do mistério e da capacidade de admirar.
Para Heidegger (2000), no instante em que os seres humanos passam a
ter maior conhecimento da realidade e capacidade para modificá-la, começa o
processo de dessacralização e secularização. Entretanto, até o advento da
biotecnologia de ponta, sobrava um reduto cercado de mistérios. O Projeto
Genoma Humano e seus desdobramentos rasgaram essa última cortina do
santuário da vida, esquadrinhando tecidos e órgãos por sofisticados
aparelhos.
O deslumbramento diante do belo e inefável e o prazer da surpresa
podem desaparecer. Os pais, hoje, podem escolher o sexo, traços e
características para seus filhos. A biotecnologia mergulha tão profundamente
no mundo das emoções, que já se fala em inteligência emocional e inteligência
artificial (LÉVY, 1994; GOLEMAN,1995; GUITTA, 1992; LEDOUX, 1998).
É claro que nem a inteligência nem as emoções remetem simplesmente
aos genes. Contudo, quando as máquinas, mais do que instrumentos, passam
a ser modelos de ação, os riscos se tornam evidentes.
93
O homem está perdendo a capacidade de admirar e prostrar-se diante
do mistério. Segundo Assman (1998), o desafio não consiste em re-encantar a
educação, mas redescobrir as maravilhas que se escondem por trás das
manifestações da vida. Francis Collins, diretor do projeto Genoma Humano,
afirma: “É para mim motivo de humildade e admiração perceber que captamos
o primeiro vislumbre de nosso livro de instruções, antes só conhecido por
Deus”. E o presidente Clinton arrematava: “Hoje estamos aprendendo a
linguagem em que Deus criou a vida. Estamos cada vez mais admirados diante
da complexidade, beleza e maravilha do dom mais divino e sagrado de Deus”.
(DAVIES, 2001, p. 361).
3.3.5 A avaliação das perdas e dos ganhos, do bem e do mal.
As experiências no campo da biotecnologia, noticiadas com entusiasmo,
levam a um extremado otimismo ou pessimismo. É preciso ser realista, saber
avaliar com isenção, por todos os ângulos, levando em consideração os
mecanismos sociais e seu impacto sobre a consciência e a personalidade. Daí
a necessidade da dúvida metódica, do questionamento e análise.
A partir dos anos 1960, no contexto da ditadura militar, surgem
conceitos e chaves de leitura para se fazer um levantamento adequado da
realidade, uma avaliação à luz de valores fundamentais. Movimentos de
conscientização levam as massas, até há pouco, alienadas, a entender o
contexto social e político e assumir atitudes para reverter a situação
(AGOSTINI, 1990).
Tais movimentos, porque incomodavam, acabaram sendo abafados.
Hoje, parece mais necessário do que nunca, despertar a consciência
adormecida em setores vitais, como educação, sociedade e política,
dispensando maior vigilância no campo das manipulações e experiências da
biotecnologia. É preciso impedir que um pequeno grupo decida pelo presente e
futuro da humanidade no silêncio dos laboratórios. Alterar os mecanismos vitais
significa anular processos evolutivos que demoraram milhões de anos para
chegar aonde estão. O senso crítico saberá acolher aquilo que poderá
94
beneficiar a todos e detectar as investidas do biopoder, para evitar a criação
de bioentes (MOSER, 2006). Quem detém o biopoder poderá dominar a
agroindústria, a farmacologia, a economia e outros setores vitais, uma ditadura
mais danosa que a militar.
95
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No percurso de elaboração deste trabalho, foi possível cumprir os
objetivos propostos. Demonstrou-se que a introdução da Bioética, em 2008,
como eixo temático, dentro do campo da ética, vinculada à disciplina Filosofia,
na Proposta Curricular do Estado de São Paulo para o Ensino Médio, foi
benéfica. Os benefícios que adviriam da introdução da Bioética, no currículo do
Ensino Médio, estão circunscritos ao âmbito das possibilidades do
cumprimento das finalidades da educação e dos objetivos para o Ensino
Básico e o Ensino Médio, estabelecidos, na Constituição de 1988 e na LDB
9394/96.
Na Constituição de 1988, preconiza-se que a educação deve visar ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho.
A LDB 9394/96, em diferentes Títulos e Capítulos, reforça estas
finalidades da educação. Tanto na estipulação dos objetivos para a Educação
Básica, em geral, como, especificamente, para o Ensino Médio, a ênfase recai
sobre o exercício da cidadania, a preparação para o trabalho e o
aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética
e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.
Assim, estabeleceu-se como uma das metas, neste estudo, o registro
das razões pelas quais a presença da Bioética, nas Propostas Curriculares
para o Ensino Médio, no Estado de São Paulo, contribui para a reflexão sobre
a formação do sujeito (bio) ético. Sem dúvida, a formação do sujeito (bio) ético
é de suma importância, porque há a necessidade de critérios éticos, em
relação à vida humana, para que ela não seja convertida em mercadoria, nas
mãos de cientistas ou grupos econômicos.
Pesquisas minuciosas sobre as questões contemporâneas; sobre as
relações entre a Bioética e a Educação; sobre os processos de formação dos
professores e sobre a Proposta Curricular do Ensino Médio, no Estado de São
Paulo, foram realizadas. Estas pesquisas buscaram, sempre, a constatação da
96
relevância da inserção da Bioética, em 2008, como eixo temático, dentro do
campo da ética, na disciplina Filosofia, na Proposta Curricular do Estado de
São Paulo para o Ensino Médio, no sentido de formar o ser humano integral.
Refletiu-se, minuciosamente, sobre a hipótese proposta. Concluiu-se
que, com a presença da Bioética, na Proposta Curricular do Estado de São
Paulo para o Ensino Médio, é possível que se aprimore a reflexão, no sentido
de buscar a educação, voltada para atitudes responsáveis, na esteira da
revolução social e da revolução biotecnológica.
Existem empecilhos burocráticos e conjunturais para que haja
transformações significativas, no ensino público do Estado de São Paulo.
Entre esses empecilhos, alegou-se, neste estudo, que, em 2008, a
inserção da disciplina Filosofia, que acolhe a Bioética como eixo temático, no
2º Ano do Ensino Médio, estabeleceu, para esta disciplina, apenas uma aula
por semana. O documento apontou a necessidade da preparação dos alunos
para enfrentar e conviver com os desafios da sociedade do conhecimento,
mesmo contando com um tempo tão exíguo.
Define-se a escola como sendo o espaço da cultura e da articulação de
competências e habilidades. Tal concepção pedagógica se fundamenta no
direito de o aluno aprender. Há o deslocamento da aprendizagem: a educação
é colocada a serviço do desenvolvimento, que deve coincidir com a construção
da identidade, da autonomia e da liberdade.
No documento, propõe-se, para alcançar este objetivo, procedimentos
pedagógicos de aproximação cultural, diálogo e resoluções de problemas e a
ação, de forma solidária e cooperativa. As políticas educacionais propostas
pelo governo do Estado de São Paulo reconhecem a “Educação Básica para a
vida”, a quantidade e a qualidade do conhecimento devem ser determinadas
por sua relevância para a vida.
O professor pôde recorrer a cadernos, como subsídios para as aulas de
Bioética. Em um desses cadernos, apresentaram-se questões e temas
bioéticos, sem aprofundar e detalhar os conceitos necessários para a
discussão dos problemas. O Caderno do Professor é insuficiente; assim, é
97
necessário que se recorra a outros meios para complementar e esclarecer
dúvidas.
Além disso, houve instrumentos ineficientes, no processo de formação
de professores. Em 2005, a Secretaria da Educação desenvolveu o projeto de
Pós-Graduação “Filosofia e Vida”, com aulas presenciais, videoconferências e
ambiente virtual Teleduc, para os professores de Filosofia da rede estadual de
ensino. Apesar da tentativa bem intencionada, o projeto configurou-se como
um instrumental quase inócuo, pois é impossível ensinar Filosofia sem um texto
filosófico, sem tempo e sem diálogos suficientes para proporcionar o trânsito da
consciência ingênua, do senso comum, para a consciência conceitual, que
pode desenvolver a consciência crítica, importante para a construção da
autonomia e da identidade.
Apenas a promoção de um debate sobre questões da Bioética é
insuficiente. Cabe à filosofia exercitar a reflexão crítica sobre a vida, o ser e sua
dignidade. Assim, é necessário despertar e desenvolver a consciência crítica
dos professores de Filosofia, para que contribuam para o aperfeiçoamento da
PCE-SP, pela análise dos objetivos, temas, linguagem, carga horária,
metodologia, validade, adequação e condições de trabalho em sua disciplina.
As discussões deveriam ocorrer com distanciamento crítico para a
construção dos valores, competências e habilidades em cada situação de
aprendizagem.
Entre as dificuldades encontradas pelos professores de Filosofia da rede
pública estadual, nota-se que, na PCE-SP, os princípios não são explicitados
para orientar o planejamento. Ainda ocorre a compartimentalização das
disciplinas, os cadernos levam à ação isolada, a grade curricular privilegia
saberes científicos, colocando as disciplinas reflexivas, em desvantagem.
Isto faz com que as sugestões, contidas, na PCE- SP, 2008, pareçam
insuficientes para a compreensão e para o debate dos desafios éticos, da
condição humana e escolhas conscientes do cidadão do século XXI.
Apesar de tais empecilhos, há resultados satisfatórios
provenientes da inserção da Bioética. Eles se vinculam à possibilidade da
percepção da necessidade de que haja uma reflexão profunda, sobre o seu
98
campo de atuação. Esta reflexão conduz ao aprimoramento das relações e dos
valores humanos. Ainda, a presença da Bioética, nas propostas curriculares, é
compatível com a pedagogia libertadora e com a capacidade do próprio sujeito
para se humanizar.
No decorrer deste estudo, foi possível perceber que as reflexões sobre o
papel da Bioética, no Ensino Médio, contribuem para que o aluno esteja
vigilante, contra as práticas de desumanização. Tais reflexões contribuem,
ainda, para a necessidade de uma leitura crítica das verdadeiras causas da
degradação humana.
Percebeu-se também que a inserção da Bioética, nas propostas
curriculares, não se volta para o ensino da virtude, na sociedade do
conhecimento, mas para o desenvolvimento das competências para ser
virtuoso, para viver e conviver com solidariedade.
Foi, ainda, possível, no percurso desta reflexão, concluir que a inserção
da Bioética opõe-se à educação que privilegia o ensino tecnicista e que
desconsidera o valor da formação humana. Com esta nova proposta é possível
que se direcione a educação para a sensibilidade e para o pensamento
reflexivo, crítico e criativo.
Este trabalho é constituído por três capítulos: A educação em Bioética:
as questões e os desafios contemporâneos; A Bioética: um desafio para o
sistema de Ensino Médio; A proposta Curricular do Ensino Médio: os
fundamentos do sujeito (bio) ético.
No primeiro capítulo, reflete-se sobre o papel da Bioética. No mundo
contemporâneo, considerando-se que, hoje, ela um tema presente em todas as
áreas do conhecimento. No século XXI, mais que em outras épocas, é preciso
aprender a conviver e a aprender a Ser.
Neste capítulo, estabeleceu-se uma reflexão sobre as marcas da
contemporaneidade, com indivíduos que se submetem ao avanço científico e
tecnológico e que, em função dessa nova conjuntura, adquirem hábitos que
seriam impensados em outras épocas.
A reflexão sobre a importância da Bioética propiciou discussões sobre
valores, incentivou o diálogo a respeito de questões sobre a vida, a dor, a
99
morte, a desigualdade social e outros temas advindos dos cenários compostos
pela contemporaneidade. Estas questões são discutidas e divulgadas. Conclui-
se que, atualmente, elas são estendidas, aos mais diversos contextos sociais,
e estão entretecidas na vida cotidiana.
No segundo capítulo, estabeleceram-se os vínculos entre a Bioética e a
educação, mais especificamente, a educação do Ensino Médio.
Pelo prisma da Bioética, os temas relacionados às consequências do
avanço científico e do avanço tecnológico, necessitam ser considerados na
educação. A discussão sobre estes temas são fundamentais, nos
procedimentos de formação de professores e de alunos, pela relevância que
possuem.
A relevância desse estudo reforça-se dentro de um contexto, em meio a
um tempo de grande e acelerado avanço tecnológico. Não significa parar o
avanço científico, a questão central é quando a vida se torna mercadoria.
Nesse contexto histórico, percebe-se a necessidade de compreender a
qualidade da formação do aluno e do docente, visando à adequação desta
educação, no desenvolvimento e na sustentação de uma relação
humanizadora.
No terceiro capítulo, a partir de um estudo documental procurou-se
discutir a proposta curricular implementada, na rede estadual do ensino público
paulista. As fundamentações desta reflexão recaem sobre o conteúdo dos
princípios bioéticos, na disciplina de Filosofia, a partir do referencial teórico com
base em Dussel, Freire e Heidegger.
No percurso de elaboração deste trabalho, adotou-se uma abordagem
hermenêutica, que se enquadra na perspectiva da pesquisa qualitativa, pois
não está voltado para a busca e análise de caráter positivista, como a
verificação de regularidade e previsibilidade, por processos técnicos de
mensuração. Buscou-se interpretar os significados explícitos ou implícitos de
um documento, a partir do qual não se pretende a busca de alguma verdade ou
de informações específicas do texto, mas a construção de sentidos, a partir de
inferências.
100
No processo de realização do trabalho, contou-se com um apoio teórico
bastante diversificado. Entre os teóricos estudados, estão:
Devechi e Trevisan, que sublinham as diferenças epistemológicas entre
as abordagens dialética, hermenêutica e positivista, enfatizando que todas
essas investigações se utilizam de procedimentos, tais como: questionário,
entrevista, observação participante, narração, História de Vida, estudo de caso,
etnografia, pesquisa participante e pesquisa ação.
Amaral, onde é possível que se compreenda que Schleiermacher,
Dilthey, Heidegger e Gadamer contribuíram para que a hermenêutica se
tornasse uma corrente filosófica e não, apenas, um método para o correto
acesso aos textos, com o modo adequado de interpretar esses textos.
Gadamer afirma que a compreensão não significa, necessariamente,
estar de acordo com o que ou quem se compreende. Significa, porém, refletir
sobre o que o outro pensa. Aqui, o “outro” refere-se aos autores e teóricos da
educação e do campo da Bioética. Assim, neste trabalho, o estudo desdobrou-
se em explicitações de conceitos, interpretações e apreensões, constituindo-se
o movimento dialógico da construção de sentidos.
Severino, que conduz o leitor à percepção de que o pensar
hermenêutico não desconsidera as tendenciosidades ideológicas do texto, a
crença de que não existe conhecimento puro e que a lei conceitua, mas não
obriga, não assegura seu próprio cumprimento.
Gamboa que sugere que o processo de leitura exige o comando do
intérprete que assume a subjetividade fundante de sentido. A hermenêutica, ou
seja, a interpretação dos fenômenos, recuperando os significados, o sentido ou
os vários sentidos dos textos polissêmicos, conta com a participação do sujeito,
receptor da mensagem.
A inserção da Bioética é um apoio, para a efetivação da construção do
sujeito, no âmbito da educação. O ser humano deve reconhecer-se como
sujeito. Isto envolve a autonomia, a liberdade e a responsabilidade, na prática
das ações cotidianas.
Portanto, é por esse viés, que se considera a formação de professores
em nova perspectiva, isto é, numa real e radical perspectiva interdisciplinar, na
101
condução de suas pesquisas e na maneira de encarar, principalmente, seus
alunos como sujeitos, isto é, colocando-os frente à realidade, teórica e
praticamente, elevando-os, cada um, a se construir e a se reconhecer sujeitos.
A promoção de uma educação com valores e princípios bioéticos deve
partir de temáticas significativas do ponto de vista ético. Isto propicia condições
para que os alunos desenvolvam sua capacidade dialógica, tomem consciência
de seus próprios sentimentos e emoções, além da percepção dos sentimentos
e emoções do outro. Assim, alunos e professores desenvolvem a capacidade
autônoma de tomada de decisão, em situações conflitantes, do ponto de vista
ético/moral.
Através da reflexão sobre a Bioética, há o estímulo a reflexões e
vivências. Mais do que os discursos, a prática, o exemplo, a convivência e a
reflexão, em situações reais, conduzirão os participantes do processo
educativo desenvolvimento de atitudes coerentes em relação aos valores,
sobre os quais se reflete. Os valores não podem ser ensinados. Também não
são inatos. Eles podem ser construídos pelo sujeito, nas interações, situações
e ações do dia a dia, tendo o professor como mediador.
102
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