15
XIII POLITICOM São Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014 1 A comunicação do segundo Governo Lula: os princípios dialógicos e a guerra com a imprensa 1 Ana Paula Costa de Lucena 2 Heitor Costa Lima da Rocha 3 Patrícia Rakel de Castro Sena 4 Universidade Federal de Pernambuco RESUMO Esse artigo pretende contribuir com a discussão sobre as representações sociais percebidas nos princípios de comunicação pública desenvolvidos pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República (SECOM/PR) durante o segundo mandato do Governo Lula, especialmente quanto ao conjunto de significados que fazem compreender a sua prática comunicacional diante do “cabo de guerra” que enfrentou com a grande imprensa. Para o desenvolvimento deste projeto, foi analisada a palestra Comunicação Social, que foi proferida pelo ministro da SECOM, na época, Franklin Martins, a partir das concepções teóricas de autores como Serge Moscovici, Sandra Jovchelovitch, Murilo Soares, Pedrinho Guareschi, entre outros. Com metodologia qualitativa, a análise constatou que, embora com objetivos modestos, a estratégia comunicativa garantiu altos índices de aprovação ao governo no período. PALAVRAS-CHAVE: Representação social; Governo Lula; Esfera pública INTRODUÇÃO A elaboração deste artigo coincidiu com o período de mudanças na Secretaria de Comunicação da Presidência da República (SECOM/PR). A ministra Helena Chagas deixava o cargo com muitas polêmicas, pois seguia um modelo de gestão bastante conservador e bem distinto do que havia sido desenvolvido pelo ex-ministro Franklin Martins, no governo Lula (2007 a 2010). Para o blogueiro Eduardo Guimarães (2014), existe uma diferença abismal entre a SECOM de Lula e a de Dilma, por entender que a “SECOM, naquele tempo, aproximou-se dos diversos grupos que travavam, na internet, a guerra de informação contra a artilharia oposicionista da grande mídia” (GUIMARÃES, 2014). 1 Trabalho apresentado no GT 5 Comunicação Política, Pós-eleitoral e Governamental do XIII Congresso Brasileiro de Comunicação Política e Marketing Eleitoral São Paulo (SP). 2 Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Mestre em Gestão Pública pela UFPE, pós-graduada em Marketing Estratégico pela UFPE, graduada em Administração pela Universidade Católica de Pernambuco. Docente da Faculdade Senac de Pernambuco. E-mail: [email protected]. 3 Professor adjunto do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: [email protected]. 4 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: [email protected].

A Comunicação Do Segundo Governo Lula, Os Princípios Dialógicos e a Guerra Com a Imprensa

Embed Size (px)

DESCRIPTION

A comunicação do segundo Governo Lula, os princípios dialógicos e a guerra com a imprensa

Citation preview

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    1

    A comunicao do segundo Governo Lula:

    os princpios dialgicos e a guerra com a imprensa 1

    Ana Paula Costa de Lucena2

    Heitor Costa Lima da Rocha3

    Patrcia Rakel de Castro Sena4

    Universidade Federal de Pernambuco

    RESUMO

    Esse artigo pretende contribuir com a discusso sobre as representaes sociais percebidas nos

    princpios de comunicao pblica desenvolvidos pela Secretaria de Comunicao da Presidncia

    da Repblica (SECOM/PR) durante o segundo mandato do Governo Lula, especialmente quanto

    ao conjunto de significados que fazem compreender a sua prtica comunicacional diante do cabo de guerra que enfrentou com a grande imprensa. Para o desenvolvimento deste projeto, foi analisada a palestra Comunicao Social, que foi proferida pelo ministro da SECOM, na poca,

    Franklin Martins, a partir das concepes tericas de autores como Serge Moscovici, Sandra

    Jovchelovitch, Murilo Soares, Pedrinho Guareschi, entre outros. Com metodologia qualitativa, a

    anlise constatou que, embora com objetivos modestos, a estratgia comunicativa garantiu altos

    ndices de aprovao ao governo no perodo.

    PALAVRAS-CHAVE: Representao social; Governo Lula; Esfera pblica

    INTRODUO

    A elaborao deste artigo coincidiu com o perodo de mudanas na Secretaria de

    Comunicao da Presidncia da Repblica (SECOM/PR). A ministra Helena Chagas deixava o

    cargo com muitas polmicas, pois seguia um modelo de gesto bastante conservador e bem

    distinto do que havia sido desenvolvido pelo ex-ministro Franklin Martins, no governo Lula

    (2007 a 2010). Para o blogueiro Eduardo Guimares (2014), existe uma diferena abismal entre a

    SECOM de Lula e a de Dilma, por entender que a SECOM, naquele tempo, aproximou-se dos

    diversos grupos que travavam, na internet, a guerra de informao contra a artilharia

    oposicionista da grande mdia (GUIMARES, 2014).

    1 Trabalho apresentado no GT 5 Comunicao Poltica, Ps-eleitoral e Governamental do XIII Congresso Brasileiro de Comunicao Poltica e Marketing Eleitoral So Paulo (SP). 2 Doutoranda em Comunicao Social pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Mestre em Gesto Pblica pela UFPE,

    ps-graduada em Marketing Estratgico pela UFPE, graduada em Administrao pela Universidade Catlica de Pernambuco.

    Docente da Faculdade Senac de Pernambuco. E-mail: [email protected]. 3 Professor adjunto do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail:

    [email protected]. 4 Doutoranda do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail:

    [email protected].

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    2

    As notcias recentes e as leituras sobre o trabalho da SECOM, no governo Lula, foram

    importantes para determinar o objetivo deste estudo: discutir as representaes sociais que

    nortearam os princpios de comunicao desenvolvidos pela SECOM, durante o segundo

    mandato do presidente Lula. O artigo fez uma contenda terica sobre representaes sociais,

    representaes na esfera pblica, o papel representativo dos meios de comunicao na esfera

    pblica, bem como analisou a palestra Comunicao Social, que foi proferida pelo ministro da

    SECOM, na poca, Franklin Martins. Essa exposio traz sete princpios que podem representar

    as polticas de comunicao seguidas pela presidncia, naquele perodo.

    Representaes sociais: conceito, funes e processos

    Os matizes que formam o conhecimento do homem partem das representaes sociais; so

    geradas na esfera pblica e consolidadas na dinmica dialgica (comunicao). Desde a

    antiguidade, o poder, o conhecimento e a crena estiveram regulados pela Igreja e pelo Estado.

    Hoje, percebe-se que os atores regentes predominantes so o Estado, grupos hegemnicos e a

    mdia.

    O conceito representao social foi introduzido por Moscovici, na Frana, em 1961, quando

    escreveu o trabalho La Psicanalyse: Son image et son public. Para o autor, representaes sociais

    so uma srie de proposies que possibilita que coisas ou pessoas sejam classificadas, que seus

    caracteres sejam descritos, seus sentimentos e aes sejam explicados e assim por diante

    (MOSCOVICI, 2009, p. 209-210). Na edio de 1976, o estudioso amplia o conceito destacando

    que o sistema de valores, ideias e prticas tem como funo possibilitar que a comunicao seja

    possvel entre os membros de uma comunidade, fornecendo-lhes um cdigo para nomear e

    classificar, sem ambiguidade, os vrios aspectos de seu mundo e da sua histria individual e

    social (MOSCOVICI, 2009, p. 21). Dessa maneira, a representao social viabiliza a dinmica

    da comunicao entre pessoas oferecendo estruturas interpretativas para significar aspectos da

    sociedade. Ou seja, sem representao no h comunicao.

    As funes das representaes so duas. A primeira afirma que elas convencionalizam

    objetos, pessoas ou acontecimentos que encontram. So dadas formas definitivas, localizam em

    uma especfica categoria e aos poucos as colocam como um modelo de determinado tipo, distinto

    e aceito por um grupo de pessoas (MOSCOVICI, 2009). A segunda funo atribui s

    representaes sociais uma fora irresistvel, pois se impem sobre as pessoas. Essa fora

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    3

    combina estrutura e tradio que, respectivamente, significam estar presente antes mesmo do ser

    humano comear a pensar e a determinar o que deve ser pensado (MOSCOVICI, 2009).

    Nas relaes estabelecidas com pessoas ou objetos, circula um cabedal de informaes que

    carregam significados e sentimentos. Quando o homem interage com o outro, por exemplo, numa

    conversa, so estabelecidas circunstncias variadas que quase sempre agrada ou desagrada. O

    entender dessas informaes e percepes, durante a interao, classificado a partir do cdigo

    de interpretao que o homem cria e guarda at hoje. Ou seja, atravs das representaes que

    organizam e formam conceitos, constituindo o senso comum. Assim, as representaes sociais

    devem ser vistas como uma maneira especfica de compreender e comunicar o que ns j

    sabemos (MOSCOVICI, 2009, p. 46). Sobre isso, vale indagar: o que a sociedade j compreende

    sobre as polticas de comunicao dos governos? Quais representaes sociais predominam na

    comunicao de governo? Essas questes sero retomadas na ltima sesso deste artigo.

    Segundo Moscovici (2009), o conhecimento popular d condies de acessar diretamente

    as representaes sociais. Ele argumenta que so as representaes sociais que, at certo ponto,

    combinam nossa capacidade de perceber, inferir, compreender e que vm a nossa mente para dar

    um sentido s coisas, ou para explicar a situao de algum (MOSCOVICI, 2009, p. 201). As

    ideias so construdas atravs das elaboraes discursivas, que sancionam percepes sobre

    coisas, pessoas, ideias, estados e processos. As sociedades instaurariam consensos mais ou menos

    amplos, podendo entrar em conflito com formulaes concorrentes (SOARES, 2009, p. 15). Em

    meio a estas divagaes, observa-se a dificuldade que seria do cidado assistir a palestra de um

    poltico sem ter a mnima ideia representativa sobre poltica, o expositor (palestrante) como

    tambm a sua rea de trabalho. Diante deste exemplo, entende-se que a dinmica estabelecida

    pelas representaes sociais funciona como uma rede de ideias, metforas e imagens, mais ou

    menos interligadas livremente e, por isso, mais mveis e fluidas que teorias (MOSCOVICI,

    2009, p. 210).

    Os processos que geram as representaes sociais bailam entre os mundos do pensamento e

    o da vida real. Alguns filsofos defendem que esses mundos no so o mesmo nem um s. Neste

    nterim, Moscovici (2009) acastela que a ancoragem e a objetivao geram as representaes

    sociais. Para ele, o mecanismo de ancorar corresponde aos movimentos de classificar e nominar

    alguma coisa que no existe, no tem nome. Isso leva a categorizar as ideias estranhas,

    colocando-as em um contexto mais familiar. Quando se d nome ao que no tinha, ns somos

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    4

    capazes de imagin-lo, de represent-lo. De fato, representao , fundamentalmente, um sistema

    de classificao e de denotao, de alocao de categorias e nomes (MOSCOVICI, 2009, p. 62).

    Portanto, a nominao de algo tira o nome do anonimato, insere-o no compndio de palavras e

    nas bases da nossa cultura como tambm se torna uma imagem comunicvel (MOSCOVICI,

    2009).

    J a objetivao, segundo o estudioso, est relacionada transformao do abstrato em

    alguma coisa quase concreta, ou seja, transferir o que est na mente em algo que exista no

    mundo fsico (MOSCOVICI, 2009, p. 61). Seria materializar a ideia que no existia na essncia

    da realidade e que, com o tempo, vai sendo amadurecida atravs das geraes. Este segundo

    mecanismo ajuda a entender, por exemplo, porque a sociedade levou dcadas para tornar crvel

    que o acesso informao de interesse pblico no algo restrito ao mbito dos polticos e dos

    funcionrios pblicos. Ao mesmo tempo, percebe-se que a materializao de uma abstrao pode

    ser empregada para subjugar pessoas. Infelizmente, esta uma prtica cometida pela grande

    maioria das autoridades polticas. Com base nestas explanaes, fica claro que ancoragem e

    objetivao so,

    pois, maneiras de lidar com a memria. A primeira mantm a memria em movimento

    e a memria dirigida para dentro, est sempre colocando e tirando objetos, pessoas e

    acontecimentos, que ela classifica de acordo com um tipo e os rotula com um nome. A

    segunda, sendo mais ou menos direcionada para fora (para outros), tira da conceitos e

    imagens para junt-los e reproduzi-los no mundo exterior para fazer as coisas

    conhecidas a partir do que j conhecido (MOSCOVICI, 2009, p. 78).

    Os meios de comunicao no constituem a nica instituio que participa do processo de

    construo das representaes sociais, porm uma das que mais influencia a sua formao e

    disseminao. A comunicao formal, como jornais, revistas, documentos etc., por sua vez,

    um receptculo privilegiado de representaes sociais (GUARESCHI, 2000, p. 253). Ao longo

    do sculo XX, os meios de comunicao ganharam enorme importncia como produtores e

    disseminadores de representaes e definies de realidade para amplas audincias (SOARES,

    2009, p. 264). De acordo com Murilo Soares (2009), as sociedades passaram a depender dos

    meios para edificarem sua imagem do mundo, para se orientarem e se colocarem perante as

    situaes. No mbito poltico, os meios aparecem enquadrando situaes, representando

    acontecimentos para a sociedade, de modo a situ-los numa constelao de valores, ideologias,

    interpretaes e imaginrios que sero utilizados como referncias para o pensamento e

    julgamento pelas pessoas (SOARES, 2009, p. 264).

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    5

    Representaes sociais na esfera pblica

    Na obra Mudana Estrutural da Esfera Pblica, Habermas (2003) defende que a

    representao no tem condies de ocorrer fora da esfera pblica. Esta ideia corroborada pela

    pesquisadora Sandra Jovchelovitch quando afirma que a esfera pblica o terreno no qual as

    representaes sociais so geradas, se cristalizam e se transformam (2000, p. 175). Este espao

    d condies para que objetos, pessoas, sentimentos e aes ganhem um sentido possvel de ser

    classificado e explicado na comunidade de comunicao. Ou seja, nascem na esfera pblica e

    adquirem forma atravs da comunicao entre pessoas, que visam legitimar o sentido

    (individual ou coletivo). Dessa forma, neste espao comum que ocorre a manifestao para

    criar e consolidar novos significados representativos que iro, quase sempre, acompanhar o status

    mental de uma sociedade por muito tempo. Com base nestas reflexes, define-se esfera pblica

    como uma rede adequada para a comunicao de contedos, tomada de posio e opinies; nela

    os fluxos comunicacionais so filtrados e sintetizados, a ponto de se condensarem em opinies

    pblicas enfeixadas em temas especficos (...) (HABERMAS, 1997, p. 92). Segundo Hannah

    Arendt (2007), a esfera pblica, enquanto mundo comum, rene os homens na companhia uns

    dos outros, evitando que venhamos a colidir uns com os outros.

    neste espao que so construdos inmeros saberes sociais, valendo-se do dilogo e da

    ao comum. Segundo Jovchelovitch (2000), quando os atores sociais se encontram e se renem

    para falar e dar sentido ao cotidiano, acontece a formao das representaes sociais. Eles,

    ativamente, constroem e reconstroem discursivamente a realidade dos significados e das imagens

    formando no espao pblico uma nova instncia para o sujeito social. Os alicerces dessa

    construo tomam por base as estruturas culturais e sociais. Portanto, nossas representaes no

    so independentes: tm a ver com nossa concepo de ser humano e de sociedade

    (GUARESCHI, 1995, p. 200). Dessa maneira, as representaes sociais fazem parte da essncia

    do ser-humano vivente e esto acopladas no agir dirio, mas nem sempre visitam o campo da

    razo.

    A esfera pblica um espao de todos; um territrio plural onde o cidado exerce (ou

    deveria) o dialogismo capaz de transformar o pensar. Aqui, ele reflexiona, age para promover

    mudanas almejadas como tambm assimila os rtulos, as nomenclaturas sociais. Neste espao,

    deparam-se similaridades e divergncias de ideias que convivem lado a lado da intolerncia

    impedindo os atos de vez e voz de muitos. Para ilustrar, vale analisar alguns pensamentos da

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    6

    poltica brasileira que, quase sempre, impem ao cidado o gueto da privao e o mantm na

    posio de inbil no pensar e no agir. O exemplo, a seguir, uma das entrevistas narrativas de

    parlamentares realizadas pela estudiosa Sandra Jovchelovitch, que elucida, precisamente, a ideia

    anterior. Um deputado do PFL, da regio Norte do Brasil acredita que

    os polticos no devem ser desafiados, porque o papel de um lder liderar; o

    parlamento um espelho da sociedade e, portanto, est representada; as difceis

    condies de vida do povo brasileiro o desqualificam para entender o que ocorre ele no tem estabilidade emocional (...) (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 165).

    No livro Representaes sociais e esfera pblica, a autora Sandra Jovchelovitch

    demonstrou que as representaes sociais so formas de mediao simblica firmemente

    radicadas na esfera pblica (2000, p. 175). Portanto, a esfera pblica oferece o contexto

    adequado para o desenvolvimento das representaes sociais, alm de conter um elemento central

    para a sua formao que so as relaes substantivas da vida pblica (JOVCHELOVITCH,

    2000). Estas ideias levaram a estudiosa a concluir que as representaes sociais, que nascem na

    esfera pblica, se constituem das representaes sociais da esfera pblica.

    De acordo com Jovchelovitch (2000), a estrutura e o funcionamento social das

    representaes sociais esto galgados em seis postulados: 1) Para compreender o

    desenvolvimento das representaes sociais faz-se necessrio entender os processos que lhes do

    origem; 2) As representaes so organizadas em campos, de acordo com os conjuntos de

    significados. Esses campos mantm-se constantes em relao s caractersticas histricas das

    sociedades e so inseparveis dos estoques culturais, que em cada sociedade definem os sentidos

    e as prticas que circunscrevem a ao e a fala de sujeitos sociais; 3) Construir representaes

    envolve dois movimentos simultneos que so propor uma identidade e interpretar a realidade; 4)

    A cognio, os afetos e a ao so elementos constituintes das representaes sociais. A cognio

    est relacionada ao conhecimento do mundo, significa formas de saber e fazer que circulam em

    uma sociedade que so parte da cultura popular, erudita e cientfica, que se mesclam e penetram

    umas nas outras, e emergem como recursos que uma comunidade dispe para dar sentido a sua

    realidade e entender o seu cotidiano (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 177). Neste processo de

    autoconstruo social dos sujeitos tambm so fundamentais os afetos, pois a busca do saber ou

    no saber movida por desejo. Representar no corresponde apenas ao lado cognitivo, pois

    fazem parte, tambm, as motivaes, intenes e aes. A ao tambm faz parte porque a

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    7

    cognio e os afetos so atividades que envolvem sujeitos que falam, relacionam-se, engajam-se

    e assim por diante" (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 177); 5) As representaes sociais so

    processos de mediao social que, todavia, emergem e circulam nos espaos entre o eu e o outro

    (realidade intersubjetiva); 6) O ltimo postulado diz respeito relao estrutural entre as prticas

    comunicacionais praticadas pela esfera pblica, as representaes sociais e os usos do poder. Os

    relatos dos grupos sociais jamais so construdos em bases neutras, eles expressam verses cujo

    produto est alicerado nas lutas simblicas que convivem com lutas maiores na sociedade.

    O papel representativo dos meios de comunicao na esfera pblica

    Os meios de comunicao constituem uma instituio central e estratgica na formao das

    representaes sociais, o que os habilitam a desempenhar o papel de disseminador de ideias e

    smbolos. Este agente poltico, assim como os demais existentes na sociedade, se vale da prtica

    comunicar para construir e desenvolver as representaes na esfera pblica. Assim,

    inconcebvel, na atualidade, pensar nos processos objetivao e ancoragem sem levar em

    considerao os veculos de comunicao de massa porque estes, (...) como qualquer outra

    instituio social, so uma arena que permite narrativas contraditrias e interaes contraditrias

    com o pblico que eles ajudam a formar (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 87).

    Na ancoragem e na objetivao, a mdia participa enquadrando pessoas, objetos e

    acontecimentos a conceitos criados ou s categorias/rtulos existentes, que interessam aos

    veculos perpetuar ou no com finalidades, muitas vezes, particulares. A partir desse esforo, o

    corpus em questo ganha um significado, um lugar conceitual e identificvel para ser

    representado de acordo com a realidade. Tomando esta reflexo, nota-se que a mdia participa

    desses processos que geram as representaes sociais. Dito de outra forma, a atuao da mdia

    est a servio do que ainda no existe para existir, ou modificar, como tambm atualizar

    significados que venham a ser comuns sociedade. O conceito enquadrar est posicionado de

    acordo com a definio do pesquisador Robert Entman (apud SDABA, 2007, p. 11):

    enquadrar selecionar alguns aspectos de uma realidade percebida e torn-los mais

    proeminentes em um texto que se comunica, de modo que se promova uma definio

    particular do problema, uma interpretao causal, uma valorao moral e/ou uma

    recomendao para o tratamento do item que se descreve.

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    8

    A representao social ganha significado e lastro quando passa a ser enquadrada pela mdia

    ou da mdia. Portanto, nomina, classifica, busca referncia dentro do que j existe na realidade

    que o homem vive e, em seguida, chega o momento de enquadrar para dar-lhe um lugar no

    mundo da vida e ser vista/sentida da maneira determinada, que com o tempo vai modificando.

    Lugar este que atender um compndio de interesses sociais e polticos de uma minoria para ser

    internalizada pela maioria. Estabelece uma forma determinada de ver, assimilar e acreditar sobre

    uma pessoa, coisa, cheiro, msica, imagem, sentimento, situao, smbolos.

    Os meios de comunicao enquadram os fatos a partir das experincias pessoais dos

    jornalistas e dos interesses polticos, econmicos, sociais, culturais, tnicos, de gnero, etc. Desta

    maneira, no se pode restringir as questes ideolgicas sobre o poder s disputas polticas e

    econmicas. Assim, a preocupao com a atuao da mdia no deve ser reduzida apenas a estes

    mbitos da realidade. Tambm devem ser levados em considerao os movimentos de quebra de

    barreiras entre a esfera pblica e privada, pois impulsionam discusses/atitudes transformadoras.

    Por exemplo, quando casos e mais casos de violncia domstica (arena particular) contra a

    mulher vem ganhando espao nos noticirios, isso leva a sociedade indignao demandando

    providncias dos rgos competentes para criar polticas pblicas.

    Este tema saiu dos lares para os movimentos sociais e entidades governamentais. O assunto

    ganhou grande proporo e todos se lembram de um marco histrico bastante conhecido: Maria

    da Penha levou o seu grito de socorro Comisso Interamericana de Direitos Humanos OEA (o

    socorro ganhou a dimenso pblica mundial) quando teve a coragem de denunciar o Brasil por

    negligncia e omisso, j que inmeras mulheres eram violentadas e assassinadas sem o

    escrutnio do poder pblico. Deste modo, ao tornar-se a forma mais difundida de comunicao

    social das sociedades contemporneas, os meios de comunicao de massa informam e formam a

    esfera pblica (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 86).

    A mdia tem a habilidade de trazer, ao mesmo tempo, significados distorcidos para induzir

    ao conformismo e alienao, mas tambm significados revolucionrios para o debate na esfera

    pblica. E so com estas habilidades que participam da formao das representaes sociais, que

    so entendidas como uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, tendo

    uma viso prtica e concorrendo para a construo de uma realidade comum a um conjunto

    social (JODELET, 1988, p. 36). Mas, o conhecimento construdo e partilhado pela mdia, que

    vem a fazer parte da realidade social, na maioria das vezes no procede de uma conversao

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    9

    dialgica e participativa com outros atores da sociedade. Alm do mais, h a questo de em que

    medida a mdia impe definies sobre a vida pblica quando apoia abertamente algumas

    polticas e seus defensores e exclui outros (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 91).

    Estas ponderaes lembram o comportamento da grande mdia durante as campanhas

    presidenciais de Luiz Incio Lula da Silva, nos anos de 1989, 1994, 1998 e 2002. Nestas

    tentativas de chegar Presidncia da Repblica, o posicionamento dos meios de comunicao era

    contrrio ao candidato, embora isto fosse velado. Mas, em 2002, para surpresa de todos, Lula, no

    dia em que foi eleito presidente, participou da bancada do Jornal Nacional (TV Globo), tendo

    sido entrevistado pelo jornalista William Bonner. Este fato leva o leitor a pensar mais

    profundamente sobre o papel representativo dos meios de comunicao na esfera pblica.

    Sete princpios da comunicao do Governo Lula

    As referncias tericas desenvolvidas at agora, no nosso entendimento, podem viabilizar

    uma anlise consistente das representaes sociais que embasam os princpios de comunicao

    do governo Lula, no perodo de 2007 a 2010. O corpus da anlise a palestra do Ministro da

    Secretaria de Comunicao Social da Presidncia da Repblica (SECOM/PR), Franklin de Souza

    Martins5, que foi proferida em Braslia no dia 02 de setembro de 2010, no ltimo ano de governo

    do presidente Lula.

    A escolha do corpus se deu porque a palestra um dos poucos materiais impresso que

    explicita as diretrizes prticas da comunicao da Presidncia da Repblica do segundo governo

    Lula. De forma didtica, a narrativa de Franklin Martins pontua os sete princpios que nortearam

    esta comunicao, possibilitando a investigao sobre a estratgia comunicativa que se pretendeu,

    efetivamente, colocar em prtica no segundo governo Lula, uma vez que, de acordo com Sandra

    Jovchelovitch, as narrativas constroem um campo representacional que refora alguns sentidos e

    ao mesmo tempo erradica outros (2000, p. 168).

    A metodologia adotada para analisar a palestra foi inspirada na anlise de contedo e no

    mtodo desenvolvido pela pesquisadora Sandra Jovchelovitch, quando pesquisou as

    representaes sociais de onze narrativas sobre o impeachment de Collor, produzidas por

    parlamentares do Congresso Nacional. A estudiosa fez uma anlise das principais representaes

    5 Ocupou a funo durante todo o segundo mandato do presidente Lula.

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    10

    que circularam nas narrativas dos polticos sobre o impeachment, identificando os pensamentos

    norteadores e seus significados.

    A anlise de contedo est adequada por ser um mtodo das cincias humanas e sociais

    destinados investigao de fenmenos simblicos (...)" (FONSECA JNIOR, 2006, p. 280).

    Alm do mais, as expresses, sejam elas escritas ou proferidas, quase sempre esto carregadas de

    ideias, sentidos. Assim, de acordo com Martin Bauer () os textos, do mesmo modo que as

    falas referem-se aos pensamentos, sentimentos, memrias, planos e discusses das pessoas, e

    algumas vezes nos dizem mais do que seus autores imaginam (BAUER, 2008, p. 189).

    Os atores da sociedade, quando se expressam, formam e disseminam representaes

    sociais. Estud-las, atravs da anlise das narrativas, significa compreender que, ao colocar a si

    mesmo e sua vida social em uma estria, sujeitos sociais apresentam imagens que adquirem vida,

    engajam-se em dilogos mltiplos e redefinem o mundo social (JOVCHELOVITCH, 2000, p.

    144). Neste mesmo vis, o analista de contedo, muitas vezes, tem o papel de trazer tona o

    sentido que se encontra em segundo plano (FONSECA JNIOR, 2006). Com base nestes

    mtodos, a anlise da palestra versou por identificar as representaes que circularam na

    narrativa de Franklin Martins sobre a comunicao do governo Lula, 2007 a 2010, procurando

    observar os pensamentos norteadores e seus significados.

    Os princpios explicados, pelo ministro, demonstram os alicerces polticos que embasaram

    a prtica da comunicao durante o segundo mandato do presidente Lula. Em nenhum momento,

    esses princpios so mencionados como polticas de comunicao da SECOM/PR. No entanto, os

    contedos postos sobre cada um deles levam o cidado a assimil-los como bases polticas que

    regeram o trabalho comunicacional da presidncia. Assim, os princpios, de acordo com Franklin

    Martins (2010), foram: 1) a comunicao deve ser integrada, ou seja, precisa ter unidade para no

    haver mensagens contraditrias; 2) a relao com a imprensa constitui o eixo de comunicao do

    governo; 3) a liberdade de imprensa para opinar sobre o que quer que seja; 4) a comunicao de

    governo precisa atender a todas as imprensas, sem privilegiar a ou b; 5) a publicidade do governo

    deve obedecer a critrios tcnicos, devem ser claros e acessveis sociedade; 6) relacionar-se

    com todos os meios de comunicao de forma igual e transparente; e, por fim, 7)

    institucionalizao da comunicao, criando instrumentos e marco legal (MARTINS, 2010).

    Antes de avaliar os princpios assumidos por Martins, vale lembrar que as representaes se

    desenvolvem para interpretar a realidade, organizar conceitos e formar identidades que, quase

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    11

    sempre, so impostas para serem adotadas pela sociedade como modelo. Na palestra, Franklin

    Martins preocupou-se em passar todos os caracteres que embasaram os esforos de comunicao

    da SECOM naquele perodo. Atravs dos princpios, foi possvel compreender o sistema de

    classificao no qual estava enquadrada a comunicao da presidncia.

    No incio da palestra, vem a primeira caracterizao. O governo tem que falar a mesma

    linguagem, no pode ficar passando mensagens contraditrias (MARTINS, 2010). Caso

    contrrio, denotaria uma gesto enfraquecida, sem organizao, sem unidade para informar a

    sociedade. Portanto, nota-se que havia a preocupao de integrar a comunicao para garantir que

    as ideias da fora de governo no chegassem deturpadas ou refns de disputas e brigas que antes

    eram comuns entre trs reas do governo porta-voz, Secretaria de Imprensa e Secretaria de

    Comunicao (SECOM) quando estas faziam, ao mesmo tempo, a comunicao do governo.

    Hoje, tudo est na mesma estrutura, obedece a uma mesma diretriz, tem um comando apenas,

    todos falam a mesma linguagem (MARTINS, 2010, p. 9).

    Um segundo aspecto chama ateno porque se configura um movimento similar a uma

    gangorra que busca equilibrar-se, apresentando, de um lado, a relao conturbada com a imprensa

    e, do outro, a crena de que a publicidade resolve tudo. De acordo com o ministro, a publicidade

    no resolve todas as coisas, ela serve para consolidar certas realizaes. Evidentemente h muita

    gente que prefere fazer publicidade a manter relao com a imprensa, porque esta incomoda, at

    quando faz um bom trabalho (MARTINS, 2010, p. 11). Durante a era Lula, a grande mdia

    brasileira enquadrava os assuntos do governo de maneira totalmente negativo se comparada com

    a imprensa internacional quando falava do mesmo tema.

    O noticirio era absolutamente contrrio ao governo, e a minha meta foi a de passar a

    perder de menos. Em vez de perder de cinco a zero, perder de quatro a um, de trs a

    dois, de vez em quando at ganhar de um a zero, ou seja, disputar todos os dias, dar a

    nossa verso todos os dias, responder a perguntas sem p nem cabea todos os dias e responder com todo o charme e entusiasmo possveis porque deixar pergunta sem resposta sempre pior (MARTINS, 2010, p. 12).

    Esta circunstncia levou a SECOM a mudar sua conduta com a mdia. Apesar dos

    noticirios no estarem refletindo a realidade, procurou-se motivar as pessoas a fazerem um

    contraponto entre o que saa nas manchetes e o que estava de fato acontecendo. Pois, somente

    assim comeariam a ter viso crtica em relao a quem escreveu a manchete e as matrias

    (MARTINS, 2010, p. 12). Nesta mesma fala, quando explica o segundo princpio, percebe-se a

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    12

    preocupao de deixar claro o quanto o governo est aberto a falar com a imprensa e responder s

    perguntas. Franklin Martins (2010) ressalvava que no teria havido, at aquele momento, um

    chefe de Estado ou de governo no mundo que tenha tido uma relao to intensa com a imprensa

    quanto o presidente Lula. O que tambm chama ateno a significao da mdia por parte do

    governo porque a SECOM reconhece-a como um caminho mediador para se comunicar com a

    sociedade, apesar das batalhas travadas. O presidente passou a falar muito mais e a relao com

    a imprensa organizou a comunicao do governo com a sociedade (MARTINS, 2010, p. 15).

    A garantia absoluta da liberdade de imprensa fez parte da identidade comunicacional da

    SECOM. De acordo com Vencio Lima, o termo liberdade de imprensa est relacionada (...)

    liberdade da sociedade e/ou de empresas comerciais a imprensa ou a mdia de tornar pblico

    o contedo que consideram informao jornalstica e entretenimento (LIMA, 2010, p. 21). O

    governo Lula atentou em garantir a liberdade de imprensa, mas no se disps a criar mecanismos

    legais para a sociedade criticar a mdia, principalmente quando calunia ou dissemina informaes

    deturpadas. A ausncia de leis que a regulem no quer dizer que a mdia no possa ser

    questionada e responsabilizada pelo que divulga. Sobre o assunto, questionou Franklin Martins

    (2010, p. 16): engraado o estardalhao que fazem quando o presidente Lula critica tal rgo

    ou tal matria. Por que a imprensa no pode ser criticada? Ela est em algum Olimpo, por

    acaso? Assim, vale lembrar que a imprensa livre para divulgar, mas tambm responsvel pelo

    que propaga.

    O quarto princpio destaca a comunicao do governo com todas as imprensas, sem

    privilegiar qualquer que seja. Ou seja, o ministro reconheceu um erro que se cometia antes era

    ver a imprensa como nica, como se ela fosse formada apenas pelos grandes jornais, as grandes

    redes de televiso, as rdios de maior impacto e algumas agncias de notcias (MARTINS, 2010,

    p. 16). A partir desse reconhecimento, a SECOM voltou-se para atender e pautar jornais

    populares, jornais regionais, rdios do interior, a internet, portais, blogosfera e imprensa

    internacional. Portanto, diante do entendimento de uma imprensa plural, a Secretaria passou a

    tratar os veculos de maneira distinta e criou uma poltica que atendesse de forma diferenciada a

    quem diferente (MARTINS, 2010, p. 17).

    Durante a explanao desse princpio, Franklin Martins deixou clara a disputa poltica

    (cabo de guerra) que existia entre o governo Lula e a grande mdia para comunicar a opinio e as

    informaes do governo. Percebe-se, na sua fala, que a imprensa era ctica e antipatizava as

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    13

    iniciativas governamentais. Para Martins, um bom exemplo desse cabo de guerra da imprensa

    com o governo Lula foi o lanamento do Programa Minha Casa Minha Vida. Sobre este

    acontecimento, ele revelou: j sabamos que no haveria simpatia da grande imprensa nacional e

    a cobertura seria politizada. No dia seguinte ao do lanamento, as manchetes dos jornales foram

    nessa linha: Governo diz que vai fazer um milho de casas, mas no d prazo (MARTINS,

    2010, p. 19). Logo, entende-se que a grande mdia estava mais preocupada em contradizer o

    governo do que informar a populao. As crticas ao governo so importantes, afinal existe

    democracia, mas o papel dos veculos no pode se restringir somente a isto.

    A SECOM procurava informar toda a sociedade sobre as aes do governo e seu ponto de

    vista. Para esse alcance, ampliou a sua relao com todas as mdias existentes, desenvolveu

    materiais diferenciados e criou produtos como a coluna O presidente responde (156 jornais do

    pas publicaram); o programa Caf com o Presidente (600 a 800 rdios divulgaram de forma total

    ou parcial); e o Blog do Planalto. Durante a gesto Lula, este blog tinha o papel de informar tudo

    que o governo estava fazendo, evidenciar a opinio e a informao do governo, alm de corrigir o

    que havia sido divulgado pela imprensa de maneira incorreta (MARTINS, 2010).

    O quinto princpio est relacionado com a publicidade do governo. A publicidade do

    governo deve obedecer a critrios tcnicos, claros, transparentes, acessveis por todos, para que

    todos possam acompanh-la (MARTINS, 2010, p. 8). Ou seja, foi adotado o critrio chamado

    mdia tcnica determinando que o investimento de publicidade nos veculos jornal, rdio e

    televiso deveria ser proporcional sua audincia ou circulao. Antes dessa poltica, o ministro

    denunciou que existiam lacunas para o apadrinhamento, a subjetividade e a perseguio,

    acrescentando que o objetivo do governo no financiar a imprensa, comunicar suas aes

    (MARTINS, 2010, p. 23). Consequentemente, os critrios da mdia tcnica permitiram a

    distribuio equitativa do investimento de publicidade e mais veculos passaram a participar da

    divulgao do governo. Logo, a propaganda governamental passou a alcanar mais cidados

    (MARTINS, 2010). Esta medida colocou o governo na posio de um ator social preocupado em

    empregar os esforos de publicidade a servio da sociedade e no para atender os interesses das

    agncias de propaganda ou dos grandes veculos.

    Neste sentido, o penltimo princpio preocupava-se em tornar a comunicao transparente e

    disponibilizar as informaes do governo sem fazer qualquer distino entre a emissora A ou B.

    Para isso, garantiu que no existia a orientao de dar a informao primeiro para a TV Globo

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    14

    ou para a Record. Todos so jornalistas e o critrio a transparncia (MARTINS, 2010, p. 25).

    Estes aspectos ajudam a formar a identidade de uma comunicao governamental dialgica e

    bastante preocupada em chegar a todos, por meio de todas as formas de expresso. O stimo e

    ltimo princpio defendia a institucionalizao do relacionamento do governo com a imprensa.

    Argumentou o ministro que a institucionalizao possibilita definir metas, criar instrumentos de

    trabalho e desenvolver um marco legal para que os prximos governos conseguissem fluir bem

    nos seus esforos de comunicar (MARTINS, 2010).

    Consideraes finais

    A comunicao do governo Lula, durante o segundo mandato, rene um conjunto de

    significados que pode versar um compndio das suas polticas comunicacionais. Logo, as

    representaes identificadas, na palestra de Franklin Martins, convencionam a comunicao deste

    governo como democrtica e preocupada em dialogar com todas as mdias, visando assim

    aumentar o alcance das informaes de interesse pblico para todos os cidados.

    A identidade da comunicao da SECOM, no perodo de 2007 a 2010, pode ser

    sintetizada da seguinte forma: a) comunicao integrada para garantir que as informaes no

    chegassem deturpadas ou contraditrias; b) preocupada em mostrar sempre a viso do governo

    sobre qualquer assunto; c) disposto a falar e dialogar com todas as mdias; d) a relao com a

    imprensa constitui-se como um eixo de comunicao do governo com a sociedade (apesar de ter

    sido ferrenha tanto nos erros como nos acertos do governo - relao aguerrida com a imprensa);

    e) a mdia est identificada como hostil, informa mal, age com m vontade (em relao a divulgar

    as aes do governo), ctica com relao ao governo Lula; f) governo no financiador da

    imprensa, nem das agncias de propaganda; g) o governo contra a censura, mas a favor da

    regulao dos meios de comunicao.

    Naturalmente, este trabalho no pretendeu esgotar a anlise das polticas de comunicao

    do segundo governo Lula, sobretudo pela limitao de seu corpus restrito s proposies do

    jornalista Franklin Martins. Apesar disso, esta gesto presidencial foi, at hoje, a que mais se

    preocupou com a prtica do registro de suas concepes e aes comunicativas. Ainda cabe a esta

    pesquisa percorrer outros caminhos que iro possibilitar maiores investigaes. Por exemplo,

    entender porque estes princpios nunca chegaram ao conhecimento mais amplo do cidado

    brasileiro.

  • XIII POLITICOM So Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014

    15

    Referncias ARENDT, Hannah. A condio humana. Traduo: Roberto Raposo. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense

    Universitria, 2007.

    FONSECA JNIOR, Wilson Corra da. Anlise de contedo. In: DUARTE, Jorge; BARROS, Antonio.

    Mtodos e tcnicas de pesquisa em Comunicao. 2. ed. So Paulo: Atlas, 2006. Cap. 18, p. 280-304.

    GUARESCHI, P. A. Representaes sociais: avanos tericos e epistemolgicos. In: Temas em

    Psicologia da SBP, So Paulo, n. 03, Vol. 08, 2000, pp. 249-256. Disponvel em: <

    http://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v8n3/v8n3a04.pdf>. Acesso em: 17 jan. 2014.

    GUARESCHI, P. A. Sem dinheiro no h salvao: ancorando o bem e o mal entre neopentecostais. In:

    GUARESCHI, P. A; JOVCHELOVITCH, S. (orgs.). Textos em representaes sociais. 8ed. Petrpolis:

    Vozes, 1995. Cap. 6, p. 191- 225.

    GUIMARES, Eduardo. Helena Chagas sai e Franklin Martins ressurge no programa Contraponto.

    Disponvel em: < http://nogueirajr.blogspot.com.br/2014/02/helena-chagas-sai-e-franklin-martins.html>.

    Acesso em: 1 fev. 2014.

    HABERMAS, J. Mudana estrutural da esfera pblica: investigaes quanto a uma categoria da

    sociedade burguesa. 2ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003.

    HABERMAS, J. Direito e democracia: entre facticidade e validade, volume II / Jrgen Habermas;

    traduo: Flvio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.

    JODELET, D. Reprsentations sociales: phnomnes, concept et thorie. In: Moscovici, S. (ed.)

    Psychologie sociale. 2 ed. Paris: Presses Universitaires de France, 1988.

    JOVCHELOVITCH, S. Representaes sociais e esfera pblica: a construo simblica dos espaos

    pblicos no Brasil. Petrpolis: Vozes, 2000.

    LIMA, Vencio A. de. Liberdade de expresso x Liberdade de imprensa: Direito comunicao e

    democracia. So Paulo: Publisher Brasil, 2010.

    MARTINS, Franklin de Souza. Ciclo de palestras: comunicao social/Franklin Martins. Braslia:

    Presidncia da Repblica, Secretaria de Assuntos Estratgicos SAE, 2010.

    MOSCOVICI, S. Representaes sociais: investigaes em psicologia social. Petrpolis: Vozes, 2009.

    SDABA, Teresa. Framing: el encuadre de las noticias. El binmio terrorismo-medios. Buenos Aires: La

    Cruja, 2007.

    SOARES, Murilo Csar. Representaes, jornalismo e a esfera pblica democrtica. So Paulo:

    Cultura Acadmica, 2009. Disponvel em: <

    http://www.ucg.br/ucg/unati/ArquivosUpload/1/file/Representa%C3%A7%C3%B5es,%20jornalismo%20

    e%20esfera%20p%C3%BAblica%20democr%C3%A1tica.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2014.