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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A DEFICIÊNCIA ESTRUTURAL DOS PRESÍDIOS E PENITENCIÁRIAS BRASILEIRAS COMO FATOR DE
OBSTRUÇÃO AO PROCESSO DE RESSOCIALIZAÇÃO DO PRESO
MARCELLA FERREIRA
Itajaí(SC), Novembro de 2008.
i
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A DEFICIÊNCIA ESTRUTURAL DOS PRESÍDIOS E PENITENCIÁRIAS BRASILEIRAS COMO FATOR DE
OBSTRUÇÃO AO PROCESSO DE RESSOCIALIZAÇÃO DO PRESO
MARCELLA FERREIRA
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Mdo. Carlos Roberto da Silva
Itajaí(SC), Novembro de 2008.
II
AGRADECIMENTO
Aos meus pais, por tudo o que fizeram,
especialmente porque acreditaram na minha
capacidade para a conclusão do Curso de Direito,
sempre participando, ativamente, de todos os
momentos da minha vida.
Ao meu Orientador, pela presença segura e
disponível, quando precisava; pela ajuda e
conhecimento imprescindíveis para eu descobrir o
meu rumo; pela amizade e contribuições
enriquecedoras.
Aos meus colegas de faculdade e de trabalho,
que contribuíram direta ou indiretamente para a
realização deste trabalho.
III
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais, pelo apoio e
carinho oferecidos durante todos os momentos
difíceis da minha vida.
Ao meu namorado Fernando, por ter sido
compreensível e paciente comigo durante toda a
elaboração do presente trabalho.
IV
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí(SC), Novembro de 2008.
Marcella Ferreira Graduanda
V
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Marcella Ferreira, sob o título A
deficiência estrutural dos Presídios e Penitenciárias brasileiras como fator de
obstrução ao processo de ressocialização do preso, foi submetida em 18 de
novembro de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:
Carlos Roberto da Silva (Orientador e Presidente) e Renato Domingues Massoni
(Examinador), e aprovada com a nota 10,0 (dez).
Itajaí(SC), Novembro de 2008.
Professor Mdo. Carlos Roberto da Silva Orientador e Presidente da Banca
Professor Mestre Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
VI
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. Artigo Arts. Artigos Amp. Ampliada Atual Atualizada § Parágrafo PL Privativa de Liberdade CAPUT Cabeça do Artigo Ed. Edição Inc. Inciso Nº Número p. Página Vol. Volume CP Código Penal LEP Lei de Execuções Penais CF Constituição Federal CFRB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. CPP Código de Processo Penal UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí DEAP Departamento de Administração Prisional DEPEN Departamento Penitenciário Nacional. STJ Superior Tribunal de Justiça SSP Secretaria de Segurança Pública MEC Ministério da Educação ONU Organização das Nações Unidas SC Santa Catarina
VII
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Ressocialização
Consiste em fazer o delinqüente aceitar as normas básicas e geralmente
vinculantes que regem a sociedade em que está inserido. Para esse fim
ressocializador na execução da pena, visa-se restabelecer no delinqüente o
respeito por essas normas básicas, fazendo-o corresponder, no futuro, às
expectativas nelas contidas, evitando, assim, a prática de novos delitos, em
outros termos, a reincidência1.
Execução Penal
É a atividade desenvolvida pelos órgãos judiciários para dar atenção à sanção,
que se realiza através dos processos de igual nome, mediante os atos
executórios de aplicações jurídicas e práticas nele contidas2.
Apenado
Indiciado condenado em processo penal e que cumpre regularmente a sanção
aflitiva em estabelecimento penal3.
Prisão
Prisão é a pena privativa de liberdade imposta ao delinqüente, cumprida,
mediante clausura, em estabelecimento penal para esse fim destinado4.
Pena (Sanção Penal)
1 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 138/140. 2 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito penal. São Paulo: Atlas, 2002, p. 30. 3 SOIBELMAN, Leib. Dicionário Geral de Direito. São Paulo: J. Bushatsky, v. 2, p. 526.
VIII
A pena é uma sanção aflitiva imposta pelo Estado, através da ação penal, ao
autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na
diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar novos delitos5.
Penitenciária
Destina-se ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado6.
Cadeia Pública
Destina-se ao recolhimento de presos provisórios7.
Superlotação
Excesso de lotação permitida de um estabelecimento prisional. Considerado
como uma das causas frustradoras do objetivo da segregação, a ressocialização8.
4 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v. IV. Rio de Janeiro: Forense, 1965. p. 21. 5 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, 2002. p. 246, apud SOLER, Sabastian. Derecho penal argentino. Buenos Aires: Tipográfica Editora Argentina, 1970, v. 2,p. 342. 6 Art. 87 da Lei 7.210/84. 7 Art. 102 da Lei 7.210/84. 8 SADDY, André. Trabalho do preso à luz da previdência social. Jus Navegandi. Ago. 2001 Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3912>. Acesso em: 21 out. 2008.
I
SUMÁRIO
RESUMO............................................................................................ 3 INTRODUÇÃO ................................................................................... 5 CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 7 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E OBJETIVOS DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE....................................................................................... 7 1.1 HISTÓRICO E CONCEITO DA PENA.............................................................. 7 1.1.1 NOÇÕES PRELIMINARES ....................................................................................7 1.1.2 VINGANÇA PRIVADA...........................................................................................8 1.1.3 VINGANÇA DIVINA............................................................................................10 1.1.4 VINGANÇA PÚBLICA .........................................................................................11 1.1.5 PERÍODO HUMANITÁRIO DA PENA......................................................................12 1.1.5.1 Humanização da pena....................................................................................... 13 1.1.5.2 Surgimento das Prisões.................................................................................... 15
1.2 EVOLUÇÃO DA PENA NO BRASIL .............................................................. 16 1.2.1 ORDENAÇÕES AFONSINAS ..............................................................................17 1.2.2 ORDENAÇÕES MANUELINAS ............................................................................17 1.2.3 ORDENAÇÕES FILIPINAS .................................................................................18 1.2.4 PERÍODO IMPERIAL .........................................................................................19 1.2.5 PERÍODO REPUBLICANO..................................................................................21 1.2.6 CÓDIGO PENAL DE 1940 - O NOSSO ATUAL ORDENAMENTO JURÍDICO ................22 1.3 SISTEMAS PENITENCIÁRIOS E TEORIAS DA PENA ................................. 25 1.3.1 SISTEMA PENSILVÂNICO OU CELULAR ..............................................................25 1.3.2 SISTEMA AUBURNIANO....................................................................................26 1.3.3 SISTEMA PROGRESSIVO ..................................................................................27 1.3.4 TEORIA ABSOLUTA OU RETRIBUTIVA DA PENA..................................................28 1.3.5 TEORIA RELATIVA OU PREVENTIVA DA PENA ....................................................29 1.3.5.1 Prevenção Geral ................................................................................................ 30 1.3.5.2 Prevenção Especial........................................................................................... 31
1.3.6 TEORIA MISTA OU UNIFICADORA DA PENA........................................................32 CAPÍTULO 2 .................................................................................... 34 PREVISÃO LEGAL RELATIVA ÀS CONDIÇÕES DE CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E A REALIDADE BRASILEIRA .............................................................. 34
II
2.1 LEGISLAÇÃO PÁTRIA E ESPÉCIES DE PENA ........................................... 34 2.1.1 CLASSIFICAÇÃO DAS PENAS SEGUNDO A CRFB/88 E CÓDIGO PENAL ................34 2.1.2 RECLUSÃO E DETENÇÃO .................................................................................36 2.1.3 PRISÃO SIMPLES ............................................................................................37 2.2 REGIMES PENITENCIÁRIOS ........................................................................ 38 2.2.1 REGIME FECHADO ..........................................................................................39 2.2.2 REGIME SEMI-ABERTO....................................................................................40 2.2.3 REGIME ABERTO ............................................................................................41 2.2.4 REGIME ESPECIAL ..........................................................................................42 2.3 ESTABELECIMENTOS PENAIS.................................................................... 43 2.3.1 PENITENCIÁRIA...............................................................................................45 2.3.2 COLÔNIA AGRÍCOLA, INDUSTRIAL OU SIMILAR ..................................................46 2.3.3 CASA DO ALBERGADO ....................................................................................47 2.3.4 HOSPITAL E TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO .........................................................48 2.3.5 CADEIA PÚBLICA (PRESÍDIO) ...........................................................................49 2.4 LEI DE EXECUÇÃO PENAL: OBJETIVOS E APLICABILIDADE ................. 50 2.4.1 DA ASSISTÊNCIA ............................................................................................52 2.4.1.1 Assistência Material .......................................................................................... 53 2.4.1.2 Assistência à Saúde.......................................................................................... 54 2.4.1.3 Assistência Jurídica.......................................................................................... 55 2.4.1.4 Assistência Educacional................................................................................... 55 2.4.1.5 Assistência Social ............................................................................................. 57 2.4.1.6 Assistência Religiosa........................................................................................ 58 2.4.1.7 Assistência ao Egresso .................................................................................... 58
2.4.2 DOS DIREITOS DOS PRESOS ............................................................................59 2.5 PRINCÍPIOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS INERENTES AO PRESO.64 2.5.1 LEGALIDADE ..................................................................................................64 2.5.2 IGUALDADE OU ISONOMIA ................................................................................65 2.5.3 INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA ............................................................................66 2.5.4 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA .....................................................................67 CAPÍTULO 3 .................................................................................... 69 AS DEFICIÊNCIAS ESTRUTURAIS DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO.................................................................................... 69 3.1 DADOS ESTATÍSTICOS DOS PRESÍDIOS E PENITENCIÁRIAS BRASILEIRAS...................................................................................................... 69 3.2 DADOS ESTATÍSTICOS DOS PRESÍDIOS E PENITENCIÁRIAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA ........................................................................ 73 3.3 EVOLUÇÃO DA SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA...................................... 77 3.4 AS DEFICIÊNCIAS ESTRUTURAIS .............................................................. 80 3.4.1 ESTRUTURA FÍSICA DAS INSTITUIÇÕES PENAIS - SUPERLOTAÇÃO .......................80 3.4.2 ATIVIDADES DE ENSINO...................................................................................84 3.4.3 ESCASSA ASSISTÊNCIA AO PRESO E À SUA FAMÍLIA .........................................87 3.4.4 TRABALHO PRISIONAL ....................................................................................90 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 95 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 98 ANEXOS......................................................................................... 104
3
RESUMO
Em tempos passados, a aplicação das sanções eram as
mais severas de todas já vivenciadas pela humanidade, porquanto a pena era
executada de forma cruel sem qualquer proporção ou parâmetro para sua
aplicação. Utilizava-se da lei de talião e da pena de morte, que eram expostas em
espetáculo público, sendo os condenados submetidos a todo tipo de tortura a fim
de reprimir a população para o não cometimento de crimes.
Posteriormente, com a necessidade de implantar uma
política criminal, as tribos, assim chamados naquela época, elegeram um
representante seu, para que executasse essas penalidades de acordo com os
anseios da comunidade.
Já com a figura do Estado implantado pelos soberanos, o
poder estatal começou a notar que com o aumento significativo de crimes de
diversas naturezas, não adiantava mais pregar a punição severa para todos os
tipos penais, razão por que a pena ficou mais branda e os condenados, em
alguns casos, não eram mais punidos com a morte, mas sim eram utilizados para
as atividades laborais que o Estado necessitava, e assim, satisfaziam seus
interesses políticos e econômicos.
Com a situação precária, vexatória e lastimável que os
condenados estavam submetidos, alguns filósofos chegaram a conclusão de que
era melhor prevenir o crime do que remediá-lo, projeto esse que consistia na
radicalização das penas, bem como na sua individualização.
No Brasil, tentou-se implantar vários ordenamentos que
disciplinassem o sistema criminal, sendo que cada Código Penal promulgado com
as respectivas Leis foram relevantes para se chegar ao diploma legal até hoje
vigente, que adequou os propósitos da pena, ou seja, punindo o delinqüente pelo
mal praticado, e ressocializando-o para que, quando lançado novamente na
sociedade, não pratique mais crimes.
4
Sabe-se, no entanto, que não obstante a Lei de Execuções
Penais seja quase perfeita na teoria, é notória que as deficiências estruturais
sempre existiram, embora as derivações destas na época sejam completamente
diferentes das dos dias atuais. Entretanto, o foco que se pretende chegar é que
sempre os presos viveram em ambientes propícios à violência e revolta,
circunstâncias que fogem do objeto ressocializador da pena. Os dados
estatísticos comprovam o resultado dessa deficiência com o aumento da
reincidência a cada dia, o crescimento desproporcional da população carcerária
para o número de vagas disponíveis no sistema penitenciário.
Portanto, considerando a pena aplicada na idade média e as
técnicas utilizadas nos dias atuais, conclui-se que estamos regredindo no tempo,
haja vista que se fazia com que os presos passassem por circunstâncias
humilhantes, quando expostos ao público em condições subumanas, ao passo
que em hodierno, o preso também está vivenciado as mesmas condições
indignas.
É preciso mudar o caráter totalmente punitivo da pena,
devendo-se buscar, na atualidade, a ressocialização do condenado, a fim de
prepará-lo para as exigências básicas da competição social: formação e
profissionalização.
Nessa perspectiva, esta pesquisa busca analisar as
deficiências existentes no sistema penitenciário nacional, com enfoque no Estado
de Santa Catarina, bem como apontar os princípios da execução penal e os
direitos dos presos dispostos pela Lei de Execução Penal.
5
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto “a deficiência
estrutural dos Presídio e Penitenciárias brasileiras como fator de obstrução ao
processo de ressocialização do preso”.
O seu objetivo é a análise da deficiência do sistema
penitenciário nacional, com enfoque no Estado de Santa Catarina, destacando as
principais deficiências, o crescimento desproporcional da demanda carcerária e o
déficit no número de vagas.
Para tanto, principia-se, o Capítulo 1, tratando da evolução
histórica da sanção penal no mundo e no Brasil, bem como dos objetivos da pena
privativa de liberdade, conhecendo-se os tipos de sistemas penitenciários e
teorias da pena.
O Capítulo 2, trata do ordenamento legal relativo às penas,
regimes e execução penal no Brasil. Abordar-se-á, também, os princípios da
execução penal, bem como as assistências e direitos dos presos dispostos pela
Lei de Execução Penal.
O Capítulo 3, trata de dados estatísticos do Brasil e Santa
Catarina, abordando-se as deficiências estruturais dos estabelecimentos penais e
suas conseqüências.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a caótica deficiência e possíveis soluções para o sistema penitenciário.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
6
O sistema prisional está comprometido, porquanto a
população carcerária a cada ano cresce de forma desproporcional ao número de
vagas.
Em face da superpopulação carcerária, o preso não
consegue alcançar os benefícios abrangidos pela Lei de Execuções Penais.
Atualmente, o preso é submetido ao mesmo tipo de situação
humilhante do passado, vivenciado em condições insalubres, precárias junto ao
ergástulo público.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo; na Fase de Tratamento de Dados,
o Método Cartesiano; e o Relatório dos Resultados expressos na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
7
CAPÍTULO 1
EVOLUÇÃO HISTÓRICA E OBJETIVOS DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE
1.1 HISTÓRICO E CONCEITO DE PENA
1.1.1 Noções Preliminares
Pena é a sanção consistente na privação de determinados
bens jurídicos, que o Estado impõe contra a prática de um fato definido na lei
como crime9.
Para Soler, “a pena é uma sanção aflitiva imposta pelo
Estado, através da ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição
de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar
novos delitos”10.
Segundo o conceito de Fernando Capez “sanção penal de
caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado
pela prática de uma infração penal [...] cuja finalidade é aplicar a retribuição
punitiva do delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas
transgressões pela intimidação dirigida à coletividade”11.
Conclui-se, então, que a pena é uma sanção aplicada pelo
Estado visando à punição do autor do delito, servindo, ao mesmo tempo, como
prevenção para a prática de novos crimes.
9 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal: parte geral. V. 1, 2004. p. 433, apud Aníbal Bruno, Direito penal, cit., v. 1, t. 3, p. 22. 10 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, 2002. p. 246, apud SOLER, Sabastian. Derecho penal argentino. Buenos Aires: Tipográfica Editora Argentina, 1970, v. 2,p. 342. 11 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 357.
8
1.1.2 Fase da Vingança Privada
A autora Oliveira12 leciona que a fase da vingança privada
consistia na satisfação da vítima em fazer justiça com as próprias mãos,
geralmente com excessos e sem parâmetros de proporção na sua execução.
Explicou que na referida fase inexistia uma autoridade que viesse a regular a
aplicação das sanções penais. Discorreu que com a evolução das tribos, que
ainda eram muito primitivas, tomavam o espírito vingativo da vítima e exerciam
uma vingança coletiva, com o firme propósito de proteger a coletividade.
Por outro lado, Foucault13 acrescenta em sua obra que a
morte era exposta em espetáculo público, com os condenados sendo submetidos
a todo tipo de tortura e humilhação antes de morrer, certamente para mostrar à
população local que, em caso de cometimento de qualquer delito, o delinqüente
deveria sujeitar-se a situações amplamente vexatórias.
O condenado poderia também ser punido com “a perda da
paz”, resumindo-se na sua expulsão da tribo, sem qualquer utensílio para o
auxílio da sua defesa, ficando dessa forma à míngua dos animais na floresta.
Destaca-se que seu patrimônio também era atingido14.
Dotti15 em seu trabalho relata de forma semelhante:
O infrator também poderia ser condenado à perda da paz que se
caracterizava pela expulsão do clã e a impossibilidade de
sobrevivência diante das forças hostis da natureza, da agressão
dos animais ou da dificuldade na colheita de alimentos.
Mirabete sob o mesmo ponto de vista histórico, confirma que
o banimento, também conhecido como a “expulsão da paz”, era uma das
12 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. Florianópolis: UFSC, 1984,p. 3. 13 FOUCALT, Michel. Vigiar e Punir. 16 ed. São Paulo: Vozes, 1977, p. 16-17. 14 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 3-4. 15 DOTTI, René Ariel. Bases alternativas para o sistema de penas. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p.30.
9
modalidades de pena aplicadas na vingança privada. Descreveu que a penalidade
não atingia tão somente ao ofensor, mas sim todo o seu grupo16.
Com a evolução da pena, essa punição sem limites passou
a ser limitada, conhecida como “lei de talião”, cujo objetivo principal era fazer com
que o agressor fosse punido nos moldes do dano que causou. Por exemplo, se
ele havia cometido um homicídio, sua pena, certamente, seria a de morte. O
mesmo doutrinador salientou que a referida lei teve grande eficácia, visto que
reduziu a abrangência da ação punitiva17.
Segundo o renomado doutrinador Magalhães Noronha18:
[...] o revide não guardava proporção com a ofensa, sucedendo-
se, por isso, lutas acirradas entre grupos e famílias, que, assim, se
iam debilitando, enfraquecendo e extinguindo. Surge, então, como
primeira conquista no terreno repressivo, o talião. Por ele,
delimita-se o castigo; a vingança não será mais arbitrada e
desproporcionada.
Na opinião de Cezar Roberto Bitencourt19, a lei de talião foi a
primeira tentativa de humanização da sanção penal, tanto foi que a mencionada
lei foi adotada por outros povos como, por exemplo, no Código de Hamurábi.
Com o passar dos séculos, surgiu um novo meio de
aplicação da pena através da composição que tinha por fim a reparação do dano
pelo agressor à vítima ou à sua família, oferecendo-lhes dinheiro ou outros
objetos como forma de pagamento. Percebe-se que, com essa perspectiva de
abrandamento da pena, foi desaparecendo o sofrimento físico, que era imposto
pela vítima20.
16 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 35. 17 Ibidem. 2002, p. 36. 18 NORONHA, Magalhães. Direito Penal. 31 ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 20. 19 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 37. 20 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 6-7.
10
Destaca Mirabete21 que a forma de penalidade denominada
composição também fora adotada por outros códigos, dando-se espaço no
ordenamento jurídico para as indenizações no âmbito cível e à multa como
sanção penal.
Portanto, observa-se que a vingança privada foi a fase mais
cruel da história das penas, pois sequer havia a figura de uma autoridade para
regulamentar a aplicação das penas, incumbindo ao ofendido imputar ao infrator
qualquer penalidade que lhe achasse devida. Após, verificou-se o surgimento de
algumas leis e organizações que determinaram a proporcionalidade na execução
das sanções penais, tais como a organização dos grupos e a lei de talião, todavia
as penas ainda estendiam-se por castigos físicos.
1.1.3 Fase da Vingança Divina
Nessa nova fase, no entanto, a legitimidade para punir era a
dos Deuses por meio dos seus sacerdotes, que aplicavam penas cruéis com o
objetivo de causar repúdio e reprimir a sociedade para que os indivíduos não
praticassem ilícitos penais. O direito aparece revestido de prescrições e
ensinamentos religiosos, em conexão com o sistema de talião e da composição22.
O autor Mirabete23 tem a mesma visão, ou seja, que o
caráter predominantemente místico nesta fase era para combater a criminalidade
através da intimidação dos povos, cujas penas aplicadas pelos fiéis eram
extremamente cruéis.
Nos mesmos moldes, leciona o autor Bitencourt24:
[...] tinha como finalidade a purificação da alma do criminoso, por
meio do castigo. O castigo era aplicado, por delegação divina,
pelos sacerdotes, com penas cruéis, desumanas e degradantes,
cuja finalidade maior era a intimidação. Pode-se destacar como
legislação típica dessa fase o Código de Manu, embora
21 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, 2002, p. 36. 22 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984,p. 6-7. 23 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, 2002, p. 36. 24 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 2006, p. 36.
11
legislações com estas características tenham sido adotadas no
Egito (Cinco Livros), na China (Livro das Cinco Penas), na Pérsia
(Avesto), em Israel (Pentateuco), e na Babilônia.
O misticismo era o ponto principal para que a população
respeitasse os ditames da religião e para que não viessem a delinqüir.
Obviamente os sacerdotes da época, que se revestiam de autoridades
regulamentadoras, aplicavam as penalidades que achassem corretas, isto porque
inexistia qualquer legislação disciplinando o que se deveria aplicar ao caso
concreto. Por outro prisma, conclui-se que as penas ainda eram muito desumanas
e cruéis.
1.1.4 Fase da Vingança Pública
Nessa fase, desapareceu a figura da vítima, assim como das
tribos para a aplicação das penas aos delinqüentes, sendo nomeado uma única
autoridade (Estado) para que pudesse cuidar da execução dessas penalidades.
Ressalta-se que se perdeu a figura religiosa da pena, passando-se a ser
absolutamente política. Tal perspectiva foi observada através da modalidade de
composição, que à época da vingança privada era facultativa, e que passou a ser,
neste período, obrigatória. Além disso, as penas passaram a ser acompanhadas
de castigos acessórios como a perda da paz, que era procedido pela exposição e
pela marcação de ferrete25.
Nesse rumo, o autor René Ariel Dotti26 também entende que
a vingança pública surgiu da evolução política da comunidade, sendo outorgado a
uma autoridade o direito e dever de castigar os condenados. A pena era imposta
de acordo com os anseios dos povos que pleiteavam justiça juntamente com os
parâmetros adotados pelas leis de talião e da composição. Por exemplo, a
expulsão da comunidade foi substituída pela morte, mutilação, banimento
temporário e perdimento de bens.
25 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 15-16. 26 DOTTI, René Ariel. Bases alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 30.
12
Ao decorrer desta fase, observou-se que Aristóteles e Platão
contribuíram de forma incisiva para a sua evolução. Platão sustentou que a pena
deveria ser interpretada como uma forma de defesa social para a repressão aos
crimes, enquanto Aristóteles implantou a necessidade do livre-arbítrio que obteve
êxito primeiramente no campo filosófico e, após, no jurídico27.
A pena tomou um cunho extremamente político, pois além
da indenização pelo dano penal causado pelo acusado que tinha que pagar à
vítima, ele era ainda submetido à torturas físicas ou a castigos cruéis. Embora até
então predominassem os suplícios, houve uma enorme suavização deles na sua
aplicação.
1.1.5 Período Humanitário da Pena
Este período surgiu diante da necessidade do Estado em
reformar o direito penal, com a adoção de novas penas e modos de execução
destas, deixando, assim, aquelas torturas anteriormente empregadas pelas
autoridades como forma de espetáculo para a sociedade28.
O doutrinador Bitencourt29 leciona que naquela época os
filósofos, moralistas e juristas revoltosos com a situação no que se refere ao
cumprimento das penas, bem como a falta de tipificação de outras condutas
penais, passaram a criticar aquela legislação criminal, passando a enaltecer os
princípios inerentes ao ser humano.
Giza-se que na mencionada fase começaram a aparecer
desigualdades entre as classes sociais em razão do acréscimo dos bens móveis e
imóveis das famílias, motivo pelo qual deu-se maior ênfase quanto à repressão
aos crimes contra o patrimônio alheio. Diante dessas circunstâncias, implantou-
se, também, a segurança pública através do policiamento30.
27 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2006, p. 37-38. 28 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 23. 29 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, p. 47, apud Garrido Guzman. Manual de Ciência Penitenciária, Madrid. Edersa, 1983, p. 86. 30 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 23-24.
13
Segundo Foucault31, naquela época o Estado começou a
notar que em razão do aumento expressivo da prática de crimes de diversas
naturezas, não mais adiantava a simples aplicação de penas severas. Constatou-
se que ao executar um apenado, a sociedade tinha prejuízo do ponto de vista
econômico. Por isso, os criminosos passaram a prestar trabalho ao Estado e,
dessa forma, satisfazer às necessidades da sociedade.
Infere-se neste estágio, que as penas se tornaram mais
brandas em face do surgimento das garantias inerentes ao ser humano. Os povos
também começaram a perceber que a repressão à criminalidade através da
aplicação de rígidas penas não trazia nenhuma eficácia do ponto de vista
sociológico, razão por que começaram a refletir que era necessário um novo
tratamento através da execução de atividades laborais para o Estado.
1.1.5.1 A Humanização da Pena
Sob os fundamentos dos filósofos mais prestigiados da
época, César Beccaria elaborou uma obra que mistificou a humanização no
processo ressoalizador do preso sob o prisma de que era melhor prevenir o crime
do que castigá-lo. Esse autor defendia que o caráter preventivo da pena não
precisava ser obtido através do medo, da vingança como fundamento da pena,
mas sim de outra forma que trazia a certeza necessária de que o condenado seria
efetivamente punido.
Sem dúvida, John Howard32 foi um dos revolucionários da
época que estava absolutamente descontente com as condições do sistema
carcerário, tanto foi que propôs idéias quanto à humanização, para fins de
ressocialização do detento. Na Inglaterra, foi registrado um movimento
revolucionário a fim de suavizar as regras disciplinares da segregação, assim
como o regime prisional daquele período.
31 FOUCAULT. Vigiar e Punir, 1977, p. 16-17. 32 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 35.
14
Destaca a autora Maria José Moutinho Santos33, que John
Howard enfatizou as condições precárias vivenciadas pelos condenados ao
encarceramento, pleiteando a introdução de melhoria nas condições de vivência
nas celas, a separação dos presos quanto à natureza dos delitos, sexos e idade,
assim como a segurança e facilidade de supervisão dos edifícios mais conhecidos
hoje, como presídios.
O filósofo Bentham implantou um modelo de
estabelecimento prisional conhecido como panótico, que consistia no isolamento
completo do delinqüente. Essa medida de punição pretendia a prevenção de
novos crimes, já que para ele o delito que o apenado cometeu já não tinha mais
importância, pois o que deveria ser priorizado era a reinserção social do mesmo,
fazendo com que ele não mais retornasse a delinqüir34.
Maria José Moutinho Santos35 relata que o sistema da velha
prisão de Walnut Street, na Filadélfia em 1790, adotou normas de classificações
dos presos quanto aos delitos cometidos. Além disso, buscava a ressocialização
do apenado através do trabalho, e quando estes fossem reincidentes, aplicava-se
o confinamento isolado dos demais detentos.
Adveio, posteriormente, o sistema espanhol de Montesinos,
destacando a abolição dos castigos corporais, e disciplinando que o trabalho do
preso seria remunerado. Trouxe uma inovação para a execução penal, cuja a
duração da pena não consistia naquela que era determinada pela sentença,
podendo-se levar em consideração, para a redução da reprimenda corporal, a boa
conduta do preso e seu trabalho, enquanto estivesse cumprindo pena36.
Surgiu, então, a prisão semi-aberta na Suíça, que se
estribava no trabalho dos condenados, longe de qualquer vigilância. Entretanto,
logo se percebeu uma grande deficiência desse sistema, visto que apenas
abrangia os detentos provenientes das zonas rurais, já que as pessoas que
33 SANTOS, Maria José Moutinho. A Sombra e a Luz: as prisões do Liberalismo. Porto: Edições
Afrontamento, 1999, p. 39. 34 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2006, p. 53. 35 SANTOS, Maria José Moutinho. A Sombra e a Luz: as prisões do Liberalismo, 1999, p. 40. 36 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 43-44.
15
residiam no centro da cidade não se adaptaram a este modo de vida. Além disso,
esse instituto ensejava grande facilidade de fuga devido à vigilância reduzida37.
1.1.5.2 Surgimento das Prisões
O autor Alexandre Marino Costa38 frisa que a prisão na
antigüidade tinha finalidade diversa da qual encontramos nos dias de hoje.
Naquela época, servia, apenas, para resguardar o acusado da aplicação da pena,
ou seja, era uma forma de detenção para que este não viesse a empreender fuga,
até porque as penas se restringiam em sanções corporais e à capital. Observa-se
que também usavam a custódia preventiva contra os devedores.
A mais velha prisão da sociedade foi na Idade Média, em
Roma. Os cárceres primitivos eram das mais variadas espécies, porquanto o
Estado não possuía poder aquisitivo suficiente para a construção de
estabelecimentos prisionais adequados. Ademais, o objetivo da prisão era a
exposição do criminoso para a sociedade em condições desumanas, como uma
forma de lição para a exterminação dos crimes39.
No mesmo sentido, o autor René Ariel Dotti40 esclarece a
idéia que as civilizações tinham da prisão:
A detenção como “verdadeira antecâmara de suplícios” onde se
depositava o acusado à espera do julgamento era prática utilizada
em diversos países orientais. Igualmente em civilizações incas e
astecas se empregavam “jaulas e cercas” para confinar os
acusados antes da decisão e do sacrifício.
Veja-se que, principalmente, os germanos e os eslavos
ignoravam a pena de prisão, apenas em Atenas era utilizada como pena especial.
Destaca-se que esta idéia somente começou a se propagar depois que os
37 Ibidem, 1984, p. 45. 38 COSTA, Alexandre Marino. O trabalho prisional e a reintegração social do detento. Florianópolis: Insular, 1999, p. 14. 39 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 29-30. 40 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 32-33.
16
filósofos Sócrates e Platão exprimiram as suas idéias em busca de sanções mais
brandas41.
Observa-se que ainda na Idade Média, em meados dos
séculos XVII e XVIII, surgiram diversos tipos de prisões, as quais tinham um
caráter extremamente punitivo. As celas eram subterrâneas e os condenados lá
viviam em condições subumanas, não se obedecendo a qualquer regra quanto à
higiene, tampouco insalubridade. Salienta-se que os condenados ainda eram
submetidos a torturas cruéis e lá esquecidos42.
Observa-se que a deficiência já estava presente desde o
próprio surgimento das prisões, sendo os condenados submetidos a tratamentos
desumanos e considerados, efetivamente, uma parcela da sociedade que deveria
ser excluída da camada social.
1.2 A EVOLUÇÃO DA PENA NO BRASIL
Segundo Gonzaga43, há registros de que aqui no Brasil,
antes do descobrimento, já se aplicava a pena corporal em suas diversas
modalidades como forma de punição:
As penas corporais foram comumente empregadas, embora não
se tenha notícias de métodos torturantes. A pena de morte era
executada com o uso de tacape, recorrendo-se também a
venenos, sepultamento de pessoas vivas, especialmente crianças,
e enforcamento. Menciona ainda como forma de execução capital,
o enforcamento. A pena de açoites é também referida, mas a
privação de liberdade existia como forma de prisão semelhante à
atual “prisão processual”, destinando-se à detenção de inimigos,
em seguida à captura, ou como recolhimento que antecipava a
execução da morte.
41 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 30-31. 42 Ibidem. 1984, p. 33. 43 GONZAGA, João Bernardino. O direito penal indígena: à época dos descobrimentos do Brasil. São Paulo: Max Limonad, s.n., p. 171.
17
1.2.1 Ordenações Afonsinas
Após o descobrimento do Brasil, passou-se a aplicar as
Ordenações Afonsinas, a qual era fundada em regime jurídico dos portugueses
entre 1446 e 1514. Nesta época, a prisão, na maioria das vezes, tinha caráter
provisório até o julgamento definitivo do detento. Ademais, em raros casos, a
prisão era uma medida coercitiva para obrigar o devedor ao pagamento da pena
pecuniária44.
Para Bitencourt45, essa foi a época mais obscura da história
da humanidade, visto que as pessoas exerciam livremente o direito de sancionar
e punir os acusados, sempre de acordo com os seus interesses.
Para o autor Romeu Falconi46, as Ordenações Afonsinas
foram implantadas ainda em uma fase muito prematura, razão por que não há
muitos registros históricos de sua permanência no Brasil.
1.2.2 Ordenações Manuelinas
Logo após, as ordenações Afonsinas foram substituídas
pelas Manuelinas por determinação de D. Manuel I, entretanto vigorou por pouco
tempo no Brasil (1514 a 1603). A referida Ordenação manteve o mesmo sistema
de legislação anterior, ou seja, a segregação do cárcere até o julgamento
definitivo do réu.
Para Pierangelli47, as ordenações afonsinas não tiveram
aplicabilidade na Brasil, haja vista que ao mesmo tempo em que vigiam aqui,
apresentava-se o regime das capitanias, por isso, os donatários aplicavam as
regras jurídicas que bem entendiam, especialmente porque as cartas de doação
lhes outorgavam competência para o exercício de toda a justiça de forma informal
e personalista dentro dos seus domínios.
44 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998. p. 41-42. 45 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2006, p. 57. 46 FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. São Paulo: Ícone, 1995, p. 76. 47 PIERANGELLI, José Henrique. Códigos Penais do Brasil: evolução histórica. 2 ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 7.
18
1.2.3 Ordenações Filipinas
De todas as ordenações, as Filipinas foram as que mais
obtiveram aplicação. Foram editadas em 1603 e perduraram por mais de três
séculos, entretanto salienta-se que as punições ainda continuaram severas e
cruéis.
[...] era contida nos 143 títulos do Livro V das Ordenações
Filipinas, promulgadas por Filipe II, em 1603. Orientava-se no
sentido de uma ampla e generalizada criminalização, com severas
punições. [...] Não se adotava o princípio da legalidade, ficando ao
arbítrio do julgador a escolha da sanção aplicável. Esta rigorosa
legislação regeu a vida brasileira por mais de dois séculos. O
código Filipino foi ratificado em 1643 por D. João IV e em 1823 por
D. Pedro I48.
No mesmo sentido, Dotti49 leciona:
O regime era fantástico e terrorista como se verifica pela enorme
variedade dos tipos de autores, das infrações e do arsenal
punitivo: hereges, apóstatas, feiticeiros, blasfemos (contra Deus
ou contra os santos), benzedores de cães e outros bichos sem
autorização do Rei; sodomia, o infiel que dormisse com alguma
cristã e o cristão que dormisse com infiel; entrada em mosteiro ou
retirada de freira “ou dorme com ella, ou a recolhe em casa”;
vestir-se o homem com trajes de mulher ou a mulher com trajes
de homem dos que trazem máscaras [...].
Consoante a obra de Magalhães Noronha50, na vigência das
Ordenações Filipinas havia muitas desigualdades entre as classes quanto aos
crimes cometidos. Determinava-se que o juiz deveria aplicar a pena caso a caso,
isto é, a injustiça era predominante, pois as pessoas com maiores condições
aquisitivas eram punidas com multa e os mais humildes com penas mais severas.
48 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2006, p. 57. 49 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 45. 50 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal: Parte geral. 34 ed. São Paulo: Saraiva, vol. 1, 1999, p. 56.
19
Consagravam amplamente as Ordenações a desigualdade de
classes perante o crime, devendo o juiz aplicar a pena segundo a
graveza do caso e a qualidade da pessoa: os nobres, em regra,
eram punidos com multa; aos peões ficavam reservados os
castigos mais pesados e humilhantes [...]. Foi o Código de mais
longa vigência entre nós: regeu-se de 1603 a 1830, isto é, mais de
duzentos anos.
Dotti51 nos ensina que, nesta fase, a execução da pena
poderia ser procedida de três formas: pela morte cruel consistente em meios de
suplícios, pela morte atroz sem que o delinqüente tivesse direito aos rituais, ou
pela morte simples, que era a perda dos direitos de cidadania. Esta última
modalidade, às vezes, vinha cominada com outros tipos de pena.
A grande maioria dos delitos era combatida através de sanção
capital, cujas execuções se procediam de três formas: 1.ª – morte
cruel (a vida era lentamente tirada em meio aos suplícios); 2.ª –
morte atroz (a eliminação era agravada com especiais
circunstâncias, como a queima do cadáver, o esquartejamento
etc.); 3.ª – morte simples (limitada à supressão da vida sem rituais
diversos e aplicada através de degolação ou do enforcamento,
modalidade esta reservada às classes inferiores por traduzir a
infamação). A morte civil era a perda dos direitos de cidadania.
Aparecia como previsão autônoma para algumas infrações ou
como pena acessória de outras cominações como a deportação, a
relegação ou a prisão perpétua.
1.2.4 Período Imperial
Nota-se que desde aquela época, com a promulgação da
Constituição de 1824, havia a idéia de uma reforma nas cadeias objetivando as
condições dignas para o delinqüente como higiene e segurança nas celas, a fim
de que o detento ao cumprir a pena pudesse se ressocializar. A carta magna
também deu ênfase aos direitos individuais do cidadão, onde seria necessária a
51 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p.46.
20
formulação de um novo Código Penal que atendesse aos princípios
constitucionais com a abolição das penas cruéis52.
Por fim, o mesmo autor acima mencionado explicou que o
Código Criminal do Império foi sancionado em 1830, por D. Pedro I, cujo foco
central era a extinção da pena de morte para alguns delitos, e a inserção da pena
privativa de liberdade, a qual deixava de ser apenas um meio para assegurar a
aplicação do julgamento.
Em 16.12.1830 foi sancionado pelo Imperador D. Pedro I o Código
Criminal do Império do Brasil. [...] O movimento do sistema
criminal teve como característica básica no quadro das sanções a
redução das hipóteses da pena de morte, a eliminação da
crueldade de sua execução, bem como a supressão das penas
infames, exceto a de açoites, aplicada aos escravos. [...] A
privação da liberdade passaria a ser uma autêntica e própria
sanção penal para substituir as penas corporais, de largo espectro
nas ordenações. E assim ocorreu também no Código Penal
português de 1825 como em tantos outros sistemas fundados na
doutrina do Iluminismo53.
Mirabete54 acrescenta que o referido Código Criminal foi o
único diploma legal que teve a iniciativa do Poder Legislativo, que fora elaborado
pelo Congresso. As peculiaridades baseavam-se na implantação das
circunstâncias atenuantes e agravantes dos crimes, bem como o julgamento
especial para menores de 14 anos.
Bitencourt55 entende que o Código Criminal de 1830 foi um
dos melhores, devido a sua utilidade e adaptação ao caso concreto, destacando-
se que trouxe como noção para o ordenamento jurídico o sistema de dias-multa.
Tanto foi que influenciou fortemente a elaboração do Código Penal Espanhol, de
1848 e Português, de 1852.
52 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 50. 53 Ibidem. 1998, p. 51-53. 54 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, 2002, p. 43. 55 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2006, p. 58.
21
1.2.5 Período Republicano
Com a proclamação da República, que se deu em 1889,
somado com a abolição da escravidão, verificou-se a necessidade da elaboração
de um novo Código Penal devido à existência de lacunas no que tange à
tipicidade das condutas56.
Em 1890, foi criado um novo diploma penal, o qual implantou
algumas modalidades para as penas privativas de liberdade. Além disso, também
foi estipulado, pela primeira vez, que a segregação não poderia ultrapassar trinta
anos, e que os condenados deveriam ser adaptados ao trabalho de acordo com
suas aptidões.
O Código de 1890 previa as seguintes modalidades de penas
privativas de liberdade: a) prisão celular, aplicável, para quase
todos os crimes e algumas contravenções, constituindo a base do
sistema penitenciário. Caracterizava-se pelo isolamento celular
com obrigação de trabalho, a ser cumprida “em estabelecimento
especial” (art. 45); b) reclusão, executada em fortalezas, praças
de guerra ou estabelecimentos militares (art. 47); c) prisão com
trabalho obrigatório, cominada para os vadios e capoeiras a serem
recolhidos às penitenciárias agrícolas para tal fim destinadas ou
aos presídios militares (art. 48); d) prisão disciplinar destinada aos
menores até a idade de 21 anos, para ser executada em
estabelecimentos industriais especiais (art. 49). [...] a privação da
liberdade individual não poderia exceder de trinta anos (art. 41).
[...] A preocupação em se individualizar a execução da pena de
prisão era demonstrada na regra do art. 53, segundo a qual os
condenados deveriam ter, nos estabelecimentos onde cumpriam a
sanção, trabalho adequado às suas habilitações ou ocupações
anteriores57.
Contudo, este ordenamento jurídico de 1890 foi alvo de
fortes críticas pelas lacunas que apresentava devido à ligeireza com que foi
elaborado. Nesta etapa, denota-se, principalmente, a completa abolição da pena
56 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 54. 57 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 55-56.
22
de morte, assim como a implantação de um regime prisional de cunho
correcional58.
1.2.6 Código Penal de 1940 – O nosso atual ordenamento jurídico
Este diploma surgiu através do projeto de Alcântara
Machado que fora elaborado em meados de 1938 e submetido a uma comissão
revisora. Destaca Mirabete que o Código Penal sancionado em 1942 foi
aprimorado com sustentáculo nas legislações suíças e italianas, especialmente
porque eram consideradas as mais modernas de todos os tempos.
Para o autor Falconi59, o Código Penal de 1940 incluiu a
subdivisão das penas em reclusão, detenção e multa, que se resume na perda da
função pública e publicação das sentenças. Observa-se que, além das
subdivisões das penas, surgiu o sistema progressivo, estribando-se no
isolamento, trabalho, remoção para a colônia agrícola e livramento condicional,
como uma forma de execução penal. Esse código foi respeitado por outros
países, devido ao seu alto nível de modernismo, tendência que tinha quanto à
nitidez nos seus conceitos, tipificações, assim como dos regimes prisionais.
No entendimento de Teles60, a privação da liberdade, que
até então era desconhecida pela população, passou a ser uma pena principal,
inserindo em nosso ordenamento a prisão simples para as contravenções, a
reclusão e detenção para os crimes, e a medida de segurança para os incapazes
e perigosos, orientando-se pelos princípios das escolas clássica e positiva
concomitantemente.
Em meados da década de 40, surgiu a necessidade de criar
leis que viessem a restringir o poder sancionador do Estado. Em razão disso,
foram editadas muitas leis ao decorrer dos anos, todavia o doutrinador Dotti61
mencionou a Lei 3.274 como uma das mais importantes, a qual disciplinava as
regras do regime carcerário através da individualização da pena, defendendo a
58 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, 2002, p. 43. 59 FALCONI, Romeu. Sistema presidial: reinserção social?. São Paulo. Íncone, 1998, p. 65. 60 TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1998, p. 51.
23
separação dos presos provisórios e condenados, a realização de trabalho com
remuneração, a educação, assistência social no processo de cumprimento da
pena.
Observa-se que na década de 60, os juristas estavam
descontentes com a legislação até então vigente, motivo pelo qual o Ministro
Nélson Hungria, através de projeto de sua autoria, ensejou uma nova reforma ao
Código Penal com amparo aos valores fundamentais do homem e da
comunidade. Porém, desta vez as alterações eram relativas à execução da pena
privativa de liberdade em estabelecimentos penais apropriados para cada tipo de
sanção que o condenado viesse a sofrer. Implantou, também, o regime aberto,
aplicável apenas para condenados a pena inferior a cinco anos, assim como
deveria ponderar os critérios subjetivos do acusado como sua primariedade,
personalidade e conduta social62.
Dotti63 vê o Código Penal de 1969, como uma das inúmeras
tentativas de melhorar a legislação penal, entretanto não chegou sequer a entrar
em vigor em nosso ordenamento jurídico devido aos grandes embaraços
morosos, tendo sido revogado pela Lei 6.578/78. O suposto diploma legal, em
resumo, materializava-se somente para segregação dos delinqüentes
considerados perigosos.
Com o passar das décadas, observou-se que o sistema
carcerário encontrava-se com grandes problemas, dentre os principais a
superlotação dos presídios, e os mandados de prisão encontravam-se sem o
devido cumprimento em razão da falta de espaço nos estabelecimentos prisionais
para abrigar todos os meliantes64. Nota-se que o dilema da falta de infra-estrutura
e de investimento nesta área que já começou a aparecer na década de 80,
perdura até os dias atuais.
Salienta-se que a lei de nº 7.209, promulgada em 1984,
trouxe algumas novidades ao Código Penal, como o repúdio à pena de morte,
61 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 71. 62 Ibidem. 1998, p. 72-73. 63 Ibidem. 1998, p. 72-83.
24
novas penas quanto aos delitos contra o patrimônio, mantendo-se a pena
privativa de liberdade, em suas modalidades de reclusão e detenção65.
Acrescenta o doutrinador Teles66 que a lei acima declinada
objetivou também a implantação de uma nova sistemática quanto à execução da
pena, como a progressão de regime, a aplicabilidade da regressão de regime por
falta grave, e as modalidades de substituição da pena pelas “restritivas de
direitos”. Mencionou que a lei 7.210, também promulgada na mesma data, deu
total modificação aos regramentos da execução penal, lei que, até hoje vigente,
tem grande eficácia e contribuição no processo ressocializador.
Observa-se que em 1995 sobreveio a Lei 9.099/95 que
transmitiu um novo tratamento para as infrações de menor potencial ofensivo,
mais precisamente para as contravenções penais e crimes cuja pena máxima não
ultrapassasse a um ano (atualmente dois anos). A promulgação desta lei
pretendia a celeridade dos processos no Poder Judiciário, estribando-se nos
benefícios da transação penal e suspensão condicional do processo, os quais
restaram amplamente admitidos na justiça criminal67.
Por conseguinte, verificou-se que a evolução da pena em
nosso país, em seus primórdios, passou por condições desumanas e totalmente
injustas, especialmente porque a prisão era desconhecida. Contudo, com o
decorrer das décadas, buscou-se ampliar o ordenamento jurídico, enquadrando
as várias condutas que se entendia por serem ilegais, tipificando-as em lei.
Por outro lado, foi demonstrada a evolução dos
pensamentos dos cidadãos quanto à urgente necessidade de transformar o
objetivo da pena, que até então era meramente de caráter repressivo. O povo
percebeu que era essencial a ressocialização do réu, pois sabia que um dia ele
seria posto em liberdade, e que ao chegar o momento, precisaria que este
estivesse preparado para os ditames da vida comum. No entanto, ainda que
estejamos na perquirição da melhor modalidade para ressocializá-lo, não
64 TELES, Ney Moura. Direito penal, 1998, p. 52. 65 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998. p. 93-100. 66 TELES, Ney Moura. Direito penal, 1998. p. 52.
25
podemos sequer fingir que não existem problemas, visto que estamos diante da
caótica situação carcerária, na sua deficiência estrutural que está obstruindo o
objetivo comum.
1.3 SISTEMAS PENITENCIÁRIOS E TEORIAS DA PENA
É sabido que diante do surgimento das penas e das prisões,
sobrevieram três sistemas penitenciários para a execução da pena privativa de
liberdade68, quais sejam, o Pensilvânico, o Auburn e o Progressivo.
1.3.1 Sistema Pensilvânico ou Celular
Foi construído em 1776, em Walnut Street Jail, na
Pensilvânia, o qual foi iniciado pela influência dos cidadãos da Filadélfia que
objetivavam a reforma das prisões.
Explica o mesmo autor que o sistema em estudo focalizava
o isolamento dos presos em celas, oração e abstinência total de bebidas
alcoólicas69.
Muakad70 acrescenta que:
o sentenciado permanecia em isolamento constante, sem trabalho
ou visitas, permitindo-se, quando muito, passeios isolados pelo
pátrio celular e leitura da Bíblia como estímulo arrependimento. O
trabalho era proibido, para que a energia e todo o tempo do preso
fossem utilizados na instrução escolástica e serviços religiosos,
acreditando ser esta a forma mais fácil de domínio sobre os
criminosos.
67 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, 1998, p. 94. 68 MUAKAD, Irene Batista. Pena Privativa de Liberdade. São Paulo: Atlas, 1996, p. 43. 69 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 126, apud Dario Melossi e Massimo Pavarini, Cárcel y fábrica – los orígenes del sistema penitenciário, 2 ed, México, 1985, p. 168. 70 MUAKAD, Irene Batista. Pena Privativa de Liberdade, 1996, p. 43-44.
26
Frisa-se que esse sistema foi duramente criticado diante da
severidade e à impossibilidade de readaptação social do condenado por meio do
isolamento71.
Ademais, o referido sistema não prosperou devido a dois
motivos: crescimento da população carcerária, impossibilitando dessa forma, a
segregação do preso sem a comunicação com os demais, e a ineficiência das
regras atribuídas aos detentos, já que não estava em conformidade com os
objetivos da pena72.
1.3.2 Sistema de Auburniano
Este sistema surgiu em meados de 1818 na cidade de
Auburn, nos Estados Unidos. Elam Lyns como um dos dirigentes do sistema,
aplicou-o em 80 celas, disciplinando que, inicialmente, os presos poderiam
trabalhar em celas, passando posteriormente, a fazê-lo em grupos, impondo-se,
porém, a regra do silêncio, o que na prática acabou não funcionando. Esse
mesmo dirigente acabou com o isolamento absoluto, determinando-se a
obrigação ao trabalho dos presos durante o dia e a segregação noturna, a fim de
evitar a corrupção moral dos costumes73.
No entanto, Foucault74 posiciona-se da seguinte forma no
que tange ao sistema em análise:
Este jogo de isolamento, de reunião sem comunicação e da lei
garantida por um controle ininterrupto deve readaptar o criminoso
como indivíduo social: educa-o para a atividade útil e resignada, e
lhe restitui alguns hábitos de sociedade.
O sistema foi intensamente censurado pela população em
face da aplicação dos castigos cruéis e excessivos. Esses castigos refletiam na
exacerbação do desejo de impor um controle estrito, uma obediência irreflexiva
71 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, 2002, p. 250. 72 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 126. 73 MUAKAD, Irene Batista. Pena Privativa de Liberdade, 1996, p. 45.
27
por parte do Estado. No entanto, considerava-se justificável esse castigo,
porquanto acreditava-se que propiciaria a recuperação do delinqüente75.
Contra os sistemas Pensilvânico e Auburniano insurgiram os
autores Ferri e Roeder, ponderando-se pela urgente necessidade de modificar o
regime vigente, haja vista que aquele pretendia a ressocialização do delinqüente
pelo arrependimento através da reflexão de seus atos, ao passo que este apenas
obrigava o apenado ao trabalho e isolamento. Constatou-se que em ambos os
sistemas eram proibidas as visitas, o lazer e a atividade física, demonstrando,
dessa forma, o descaso com a aprendizagem e profissionalização do condenado.
Giza-se que o sistema filadélfico predominou na Europa, enquanto o Auburniano,
nos Estados Unidos76.
1.3.3 Sistema Progressivo
O regime progressivo significou um avanço penitenciário, já
que deu importância à própria vontade do recluso por meio de privilégios que ele
poderia usufruir de acordo com sua boa conduta social. Além de diminuir
significativamente o rigorismo na aplicação da pena privativa de liberdade,
possibilitou a ressocialização do condenado77.
Já a autora Irene78 leciona que a origem desse sistema deu-
se através de Maconochie, possibilitando ao detento a redução da pena privativa
de liberdade irrogada por ocasião da sentença condenatória. Acrescenta,
também, que Crofton completou o sistema com uma série de estágios de
progressividade, fazendo com que o preso cumprisse sua pena em regime de
meia-liberdade e, após, o livramento final sob vigilância.
Nesse sentido, o autor Fernandes79 explicita:
74 BITENCOUT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 128, apud Michel Foucault, Vigilar y castigar, cit., p. 241. 75 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 129. 76 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: Um paradoxo social, 1984, p. 40-42. 77 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 130-131. 78 MUAKAD, Irene Batista. Pena Privativa de Liberdade, 1996, p. 53. 79 FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia Integrada. 2. ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 663.
28
Mais brando que os regimes Pensilvânico e Auburniano é o
sistema penitenciário progressivo, que tende a tornar a vida
prisional cada vez menos rigorosa, à medida que a sentença se
aproxima de seu término. Inicialmente, foi adotado nas prisões da
Irlanda. Nesse sistema, tudo fica condicionado ao binômio
conduta-trabalho. Compreende 4 etapas: período inicial ou de
prova, com prazo indeterminado, em que o condenado fica
enclausurado na cela; período de encarceramento noturno
combinado com trabalho coletivo durante o dia; trabalho em semi-
liberdade, extramuros; liberdade condicional sob fiscalização.
Este sistema foi o que mais contribuiu para a readaptação
do segregado à liberdade, estimulando-o à boa conduta social e a adequação ao
regime aplicável para que assim pudesse se livrar, o quanto antes, da punição
que lhe havia sido irrogada.
1.3.4 Teoria Absoluta ou Retributiva Da Pena
Para Mirabete80 as teorias absolutas têm a pena como uma
espécie de exigência de justiça, devendo-se aplicar a punição para aquele que
cometeu o crime.
Para o doutrinador Bitencourt81, a teoria em discussão nada
mais é do que o reconhecimento do Estado como guardião da justiça terrena e
como conjunto de idéias morais, na fé, na capacidade do homem para se
autodeterminar e na idéia de que a missão do Estado perante os cidadãos deve
limitar-se à proteção da liberdade individual.
Já Monteiro de Barros82 acrescenta que de acordo com essa
teoria a pena não tem qualquer finalidade prática, uma vez que não visa à
recuperação social do criminoso, que é punido simplesmente porque cometeu o
crime.
80 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, 2002, p. 244. 81 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 83. 82 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal, 2004, p. 434.
29
Destacam-se os filósofos Kant e Hegel como sustentadores
dessas teses absolutistas, contudo são divergentes no que toca à fundamentação
da teoria, pois enquanto este dá ênfase para uma ordem ética, aquele busca a
fundamentação da tese em uma ordem jurídica.
O filósofo Kant ensina que o agente deve ser punido
somente porque cometeu o delito, não se levando em consideração quanto à
utilidade da aplicação da pena para ele ou para a sociedade, ou seja,
desconsiderava qualquer espécie de repressão ao crime para a população local
ou preventiva para o réu83.
Enquanto isso, Hegel defendia que a imposição da pena
implica no restabelecimento da ordem jurídica que restou quebrada pela violação
da norma penal pelo delinqüente. Na opinião do renomado filósofo, somente
através da aplicação da sanção penal poderia o delinqüente ser considerado um
ser racional e livre84.
1.3.5 Teoria Relativa ou Preventiva Da Pena
O escólio de Odete Maria de Oliveira acerca da teoria
relativista é no sentido que a pena deve ser aplicada por ser útil e necessária à
segurança da sociedade e à defesa social. O delito já não é mais fundamento da
pena, mas seu pressuposto. Não se castiga porque pecou, mas para que não
peque. Explica, ainda, que a pena se impõe porque é eficaz e deve ser levada em
conta pelos seus resultados prováveis e seus efeitos político-social utilitários85.
Na mesma linha de pensamento, o autor Jorge Vicente
entende que a teoria relativa detém cunho exclusivamente preventivo,
enaltecendo que a segregação seria uma forma de proteção à sociedade, além da
oportunidade de ressocializar o criminoso86.
83 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 84-85. 84 Ibidem. 2007, p. 86-87. 85 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, 1984, p. 64. 86 SILVA, Jorge Vicente. Execução Penal. 2 ed. Juruá, 2002, p. 12.
30
No mesmo rumo, o autor Cezar Roberto Bitencourt87, em
sua obra “Falência da Pena de Prisão”, enfatiza o objetivo dessa teoria, qual seja,
a inibição tanto quanto possível à prática de novos fatos delitivos, e não mais a
idéia de que a pena serve simplesmente para realizar justiça como anteriormente
visto na teoria absolutista.
Destaca-se que a função preventiva da pena divide-se em
duas direções bem definidas: prevenção geral e especial, as quais foram
atribuídas por Feuerbach.
1.3.5.1 Prevenção Geral
A teoria da coação psicológica, idealizada por Feuerbach,
sustentava a exterminação da criminalidade por meio da cominação traduzida
pela ameaça da pena e da aplicação dela, quando houvesse transgressão da lei
penal. No entendimento do idealizador, esse foi o caminho que encontrou para
provocar receios quanto da prática de novos crimes e por isso, chamado de
coação psicológica88.
No mesmo norte, Flávio Augusto Monteiro de Barros89
explica:
A prevenção geral atua antes mesmo da prática de qualquer
infração penal, pois a simples cominação da pena conscientiza a
coletividade do valor que o direito atribui ao bem jurídico tutelado.
As idéias preventivas foram influenciadas pelo Iluminismo,
sob o enfoque de que o castigo não serve para a repressão à criminalidade, mas
sim sob a psique humana já que com o seu livre-arbítrio poderá analisar as
vantagens e desvantagens do cometimento do delito, podendo, se for o caso,
desistir de seguir adiante90.
87 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 121. 88 Ibidem. 2007, p. 89. 89 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal, 2004, p. 435. 90 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 90.
31
1.3.5.2 Prevenção Especial
A prevenção especial detém caráter retributivo, pois atua
durante as fases de imposição e da execução da pena91.
Segundo Bitencourt92, essa prevenção visa com que o
indivíduo que já delinqüiu não volte mais a fazê-lo, pois aqui se busca a
ressocialização do delinqüente, com a sua futura reinserção à sociedade.
Leal destaca93:
É possível que a ameaça de uma pena possa evitar que muitos
indivíduos venham a praticar crimes. Essa eficácia preventiva no
entanto, somente funciona em relação aos indivíduos que se
encontrem integrados na sociedade, para os quais a prática de um
crime representaria apenas um episódio ocasional. Para os
marginalizados, injustiçados e infratores habituais, é lógico que a
função preventiva da sanção criminal torna-se praticamente
inócua.
A prevenção especial trouxe ao nosso ordenamento jurídico
uma nova concepção quanto à função punitiva da pena, na qual o Estado que
aplica a sanção penal passou a tomar cautelas na aplicação dessa sanção,
atentando-se ao caráter mais humanista da pena.
O doutrinador Damásio94 diferencia as duas prevenções,
destacando que a geral visa a impedir que os membros da sociedade pratiquem
crimes, ao passo que na especial foca a ressocialização somente (especialmente)
para aquele delinqüente que cometeu o crime.
Desse modo, verifica-se que o caráter da pena está, em
muito prejudicado em razão da caótica situação estrutural dos presídios e
penitenciárias brasileiras, pois os presos, amontoados em verdadeiros depósitos
de “lixo” humano, sentem-se não somente castigados, mas também humilhados
91 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal, 2004, p. 435. 92 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 91. 93 LEAL, João José. Direito Penal Geral. São Paulo. Editora: Atlas, 1998, p. 317. 94 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal, 2003, p. 519.
32
em razão do desprezo à sua dignidade mínima como ser humano. Esse
sentimento, é sabido, é um dos fomentadores da reincidência.
1.3.6 Teoria Mista ou Unificadora Da Pena
Segundo o entendimento de Fernando Capez, “a pena tem a
dupla função de punir o criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação
e pela intimidação coletiva”.
Ensina Bitencourt95:
Em resumo, as teorias unificadoras aceitam a retribuição e o
princípio da culpabilidade como critérios limitadores da
intervenção da pena como sanção jurídico-penal. A pena não
pode, pois, ir além da responsabilidade decorrente do fato
praticado.
Após, o mesmo autor cita96:
Inicialmente essas teorias unificadoras limitaram-se a justapor os
fins preventivos, especiais e gerais, da pena, reproduzindo, assim,
as insuficiências das concepções monistas da pena.
Posteriormente, em uma segunda etapa, a atenção da doutrina
jurídico-penal fixa-se na procura de outras construções que
permitam unificar os fins preventivos gerais e especiais a partir
dos diversos estágios da norma (cominação, aplicação e
execução). Enfim, essas teorias centralizam o fim do Direito Penal
na idéia de prevenção. A retribuição, em suas bases teóricas, seja
através da culpabilidade ou da proporcionalidade (ou de ambas ao
mesmo tempo), desempenha um papel apenas limitador (máximo
e mínimo) das exigências de prevenção.
Para o autor José Vicente da Silva, “a sanção penal por sua
própria natureza é castigar o infrator pelo mal praticado, porém tem a finalidade,
também, de prevenir educando e corrigindo-o”.
95 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 96. 96 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 96, apud Quintero Olivares, Curso de Derecho Penal, p. 129.
33
Observa-se que as teorias mistas/unificadoras tentam
associar em um único conceito a finalidade da pena, sendo de cunho correcional
e, ao mesmo tempo, ressocializar. Por conseguinte. Essa é a teoria adotada pelo
Brasil.
Após resumida a explanação da origem e histórico da pena
privativa de liberdade, explanar-se-á, no próximo capítulo, os regimentos que
envolvem esse tipo de pena no direito brasileiro, assim como os princípios a ela
inerentes.
34
CAPÍTULO 2
PREVISÃO LEGAL RELATIVA ÀS CONDIÇÕES DE CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E A
REALIDADE BRASILEIRA
Superada a etapa histórica e conceitual da pena, adentra-se
ao estudo das principais normas do ordenamento jurídico que disciplinam a
execução da pena, em especial os benefícios compatíveis com o processo de
individualização do preso.
2.1 LEGISLAÇÃO PÁTRIA E ESPÉCIES DA PENA
2.1.1 Classificação das penas segundo a CRFB/88 e Código Penal
O inciso XLVI do art. 5º da Constituição da República
Federativa do Brasil disciplina as modalidades da pena prevendo que “a Lei
regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a)
privação ou restrição de liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social
alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos”.
Já o Código Penal por intermédio do art. 32 elege os tipos
de penas em “I – privativas de liberdade; II – restritivas de direitos; III – de multa”.
O escólio de Barros97 é pertinente à diferenciação da pena
privativa de liberdade da restritiva de liberdade:
Pena privativa de liberdade: é a que limita o poder de locomoção
do condenado, mediante prisão. Admite-se a privação temporária
da liberdade, pois o tempo máximo de prisão é de trinta anos,
para crime, e de cinco, para contravenção (art. 75 do CP e art. 10
da LCP). [...] Pena restritiva de liberdade: é a que limita o poder de
35
locomoção do condenado, sem submetê-lo a prisão. Exemplos:
banimento (expulsão do brasileiro do território nacional); desterro
(expulsão da comarca da vítima); degredo ou confinamento
(fixação da residência em local determinado pela sentença [...].
Quanto às penas restritivas de direitos é importante salientar
que estão regulamentadas através do art. 43 do Código Penal, podendo ser
classificadas em: prestação pecuniária; perda de bens e valores; prestação de
serviços à comunidade ou entidades públicas; interdição temporária de direitos;
ou limitação de fim de semana. Acrescenta Eugênio Raúl Zaffaroni que esta
modalidade de pena tem a mesma duração da pena privativa de liberdade
substituída98.
Mirabete99 leciona que a pena de multa nada mais é do que
o pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em
dias-multa, sendo no mínimo, de 10 e, no máximo, de 360 dias-multa (art. 49, do
Código Penal).
Sobre a pena de perda de bens e valores Bitencourt100
menciona:
A outra nova pena, “restritiva de direitos”, é a perda de bens e
valores pertinentes ao condenado, em favor do Fundo
Penitenciário Nacional, considerando-se – como teto – o prejuízo
causado pela infração penal ou o proveito obtido pelo agente ou
por terceiro (aquele que for mais elevado) (art. 45, §3º). Trata-se,
na verdade, da odiosa pena de confisco, que, de há muito, foi
proscrita do Direito Penal moderno.
Cabe ressaltar que a pena privativa de liberdade é
conceituada por Monteiro de Barros na seguinte condição: “a que restringe o
direito de ir e vir do condenado, infringindo-lhe um determinado tipo de prisão”101.
97 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 2004, p. 438. 98 ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Direito Penal Brasileiro: Parte Geral. 5 ed. Ver. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 765. 99 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal, 2002, p. 284. 100BINTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 489. 101 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral, 2004, p. 439.
36
Em face da vasta possibilidade de argumentação das
espécies de penas atribuídas pelo nosso ordenamento jurídico, dedica-se este
Capítulo, especificamente, às penas privativas de liberdade.
2.1.2 Reclusão e Detenção
As penas de reclusão e detenção já vêm descritas nos
próprios artigos do Código Penal.
Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime
fechado, semi-aberto, ou aberto. A de detenção, em regime semi-
aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime
fechado.
Em que pese a pena de prisão simples não esteja
disciplinada no Código Penal, é certo afirmar que a Lei de Contravenções Penais
a trouxe para o ordenamento jurídico, mormente para regulamentar o tipo de
sanção quando a prática da infração for cometida no âmbito dessa lei.
A pena de reclusão poderá ser cumprida em regime fechado
(art. 34), semi-aberto (art. 35) ou aberto (art. 36), portanto evidencia-se que nem
sempre a pena iniciará em regime fechado, dependerá da análise dos requisitos
previstos no §2º, do art. 33, do Código Penal.
Com relação à pena de detenção, esta deverá ser cumprida
em regime semi-aberto ou aberto, ou seja, nunca será iniciada em regime
fechado, salvo em caso de regressão102 de regime.
Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime
fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-
aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência para o
regime fechado.
102 Haverá a regressão de regime quando o apenado cometer algum fato definido em lei como falta grave, em conformidade com o que prescrevem os artigos 50 e 118 do Estatuto de Execução Penal.
37
As regras para a aplicação do regime prisional na concepção
de Monteiro de Barros103 são as seguintes:
a) O reincidente sempre iniciará o cumprimento no regime
fechado, qualquer que seja a quantidade da pena a que tenha
sido condenado;
b) o não-reincidente condenado à pena superior a oito anos
deverá começar a cumpri-la no regime fechado;
c) o não-reincidente, cuja condenação seja superior a quatro anos
e não exceda a oito anos, poderá, desde o princípio, cumpri-la em
regime semi-aberto;
d) o não-reincidente condenado à pena igual ou inferior a quatro
anos poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.
Porém, é possível que o condenado não-reincidente comece
o cumprimento de sua pena em regime fechado, pois o §3º do art. 33 do CP
expõe que: “a determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á
com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código”. Logo, o juiz
imbuído nas circunstâncias judiciais, e com motivação idônea poderá aplicá-lo,
com base na súmula 719 do STF.
2.1.3 Prisão Simples
A hipótese da prisão simples vem expressa no inciso I, do
art. 5º do Decreto-Lei nº 3.688, de 03 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções
Penais).
É considerada uma pena privativa de liberdade, expressa e
exclusivamente cominada para as contravenções penais. Essa categoria
sancionatória é um dos critérios previstos no art. 1º da LICP para distinguir crime
de contravenção104.
103 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal, 2004, p. 441. 104 DOTTI, René Ariel. Curso de Direito Penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 451.
38
Observa-se que a pena de prisão simples é tipificada em lei
especial e só é utilizada para alguns crimes previstos por aquelas leis. Em que
pese não esteja prevista no Código Penal, é também uma modalidade
enquadrada como pena privativa de liberdade.
Considerando tudo o que fora destacado sobre a reclusão, a
detenção e a prisão simples, percebemos que essas espécies de penas nos dão
os regimes penitenciários para o caso concreto, a qual detém grande influência na
ressocialização do condenado. Portanto, agora é necessário explanar a
individualidade de cada tipo de regime prisional, fazendo-se na seqüência que
segue.
2.2 REGIMES PENITENCIÁRIOS
Destaca-se que os regimes prisionais são regulamentados
pelo art. 33, do CP, observando que a aplicação do regime prisional deverá ser
fixado com observância aos critérios do art. 59 do Código Penal.
O nosso diploma penal adota o sistema progressivo,
prevendo três regimes para o cumprimento da sanção penal: aberto, semi-aberto
e fechado. O apenado que começa a execução da pena em regime fechado,
poderá progredir para o semi-aberto e, em seguida, para o aberto, até que
obtenha a liberdade completa, se demonstrar que está apto à recuperação moral
e social105.
Segundo o art. 33, §1º do Código Penal, considera-se:
a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de
segurança máxima ou média;
b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola,
industrial ou estabelecimento similar;
c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou
estabelecimento adequado.
105 LEAL, João José. Direito Penal Geral, 2004, p. 328.
39
Os regimes são determinados fundamentalmente pela
espécie e quantidade da pena, assim como pela reincidência, aliadas ao mérito
do condenado, em um autêntico sistema progressivo.
2.2.1 Regime Fechado
O regime fechado consiste no cumprimento da pena em
estabelecimento de segurança máxima ou média, quais sejam, a penitenciária
(art. 87, da Lei de Execução Penal), as casas de detenção (art. 112, Dec.
13.412/79), os presídios (art. 116, do Dec. 13.412/79), ou mesmo cadeias
públicas, embora consideradas recolhimentos de presos provisórios.
O caput, do art. 34 do CP, determina a realização do exame
de criminológico no início do cumprimento da pena, o qual visa a classificar o
condenado, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a
individualização da execução penal (art. 5º, da LEP).
Giza-se que é o regime mais rigoroso para o cumprimento
da pena, sendo o condenado totalmente recolhido à prisão. Aqui ele estará
obrigado ao trabalho em comum dentro do estabelecimento penitenciário, na
conformidade de suas aptidões ou ocupações anteriores, desde que compatíveis
com a execução da pena. Nesse regime, o condenado, em tese, ficaria sujeito ao
isolamento durante o repouso noturno (art. 34, §1º, do CP), todavia sabemos que
é impossível o isolamento, já que é por todos conhecida a superlotação
carcerária106.
Conforme art. 88 da LEP, a pena em regime fechado será
cumprida em unidade celular individual, ambiente salubre e com áreas mínimas
de seis metros quadrados, situação que igualmente não se verifica aplicável na
prática do sistema penitenciário brasileiro.
106 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 446
40
De fato, como bem frisou Bitencourt107, “os reclusos,
geralmente, vivem em cubículos, amontoados, nas piores condições possíveis,
dificultando a adequada vigilância e supervisão interna”.
[...] a clássica prisão fechada cria um ambiente adequado para a
existência de relações e comportamentos homossexuais. São
freqüentes as rivalidades étnicas ou grupos distintos. Todas essas
condições favorecem um elevado índice de conflitividade, razão
pela qual a maior parte dos motins carcerários se produz nas
prisões fechadas.
2.2.2 Regime Semi-aberto
Aplica-se aos condenados não reincidentes, cuja pena seja
superior a quatro anos e não exceda a oito (art. 33, §2º, alínea “b”, do CP). Nesse
regime, não há previsão para o isolamento durante o repouso noturno.
Deve ser cumprido em colônia agrícola, industrial ou similar,
alojando-se o condenado em compartimento coletivo, atentando-se para o limite
da capacidade máxima que atenda aos objetivos de individualização da pena
(arts. 91 e 92 da LEP). Nesse regime semi-aberto, o condenado fica sujeito a
trabalho comum durante o período diurno. O trabalho externo é admissível, bem
como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de
segundo grau ou superior (§2º do art. 35 do CP). O art. 92 da LEP, prevê que as
colônias contenham, facultativamente, compartimento coletivo para o alojamento
dos condenados108.
Quanto à obrigatoriedade do exame criminológico Capez109
leciona:
[...] exame criminológico: [...] Diante da indisfarçável contradição
entre o art. 35 do Código penal – que estabelece ser compulsório
107 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 229 108 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal, 2004, p. 444. 109 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral: vol. 1. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 336.
41
e imprescindível o exame crimonológico para que o detento
ingresse no regime semi-aberto – e o parágrafo único do art. 8º da
Lei 7.210/84 – que dispõe, expressamente, ser facultativo tal
procedimento, ao usar o vocabulário “poderá” -, deve prevalecer a
regra da Lei de Execução Penal, que é posterior, dado que o
direito material sempre precede o formal;
Consoante o art. 120 e seguintes da LEP, quando o
condenado estiver gozando deste regime, poderá obter autorizações de saídas
temporárias.
O autor Rosa110 demonstra que os estabelecimentos penais
que os condenados estão cumprindo o regime semi-aberto são mais prósperos à
ressocialização.
[...] oferecem condições muito mais favoráveis à saúde física e
moral, bem como à readaptação do condenado. [...] o detento tem
mais contato com o mundo exterior; readquire mais facilmente
confiança em si mesmo e em suas possibilidades de levar, um dia,
uma via social normal.
Aqui se busca, gradativamente, o contato do apenado com o
mundo exterior através de saídas temporárias em datas comemorativas para que
possa visitar sua família, assim como há dentro da prisão espaço físico
determinando para que possam circular e manter contato com outros reclusos.
2.2.3 Regime Aberto
O objetivo do regime aberto é manter o condenado em
contato com a sua família e com a sociedade, permitindo que o mesmo leve uma
vida útil e prestante. Reside na responsabilidade e na auto-disciplina, pois só
permanecerá recolhido (em casa de albergado ou em estabelecimento adequado)
110 ROSA, Antônio José Miguel Feu. Execução Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 223
42
durante o repouso noturno e nos dias de folga111. Contudo, essa visão difundida
pelo doutrinador ora mencionado, está bem distante da realidade prisional.
A obtenção do trabalho é condição elementar e
imprescindível para a concessão do regime aberto, pois não se compreende que
o condenado seja beneficiado sem que disponha de trabalho. O trabalho é parte
integrante da ressocialização (art. 35, §2º, do CP)112.
Segundo Paulo Lúcio Nogueira113, os requisitos objetivos do
regime aberto são:
1) condenação não superior a quatro anos ou cumprimento pelo
menos de um sexto da pena quando ultrapassar aquele limite; 2)
obtenção de trabalho pelo condenado; 3) aceitação, pelo
condenado, do sistema de disciplina e das condições impostas
pelo juiz. Já os requisitos subjetivos do regime aberto são: 1)
ausência de periculosidade ou de reincidência em crime doloso
punido com pena privativa de liberdade; 2) compatibilidade do
condenado com o regime aberto.
Assim, podemos notar que a Lei de Execução Penal em
nosso ordenamento jurídico está em perfeita harmonia para a ressocialização do
condenado, o que fica bem distante da realidade do sistema prisional, visto que
as grandes maiorias dos estabelecimentos oferecem diversas deficiências
estruturais para o alcance do objetivo da execução penal em face da falta de
orçamentos públicos e projetos de investimento para a melhoria nas condições de
salubridade, educação, saúde e higiene dos estabelecimentos prisionais.
2.2.4 Regime Especial
Disciplinado no art. 37 do Código Penal, o regime especial é
para mulheres que cumprem pena em estabelecimento próprio, observando-se os
deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal.
111 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2007, p. 446. 112 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 183. 113 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 183.
43
Costa Júnior114 ensina que:
Impõe os mesmos direitos e deveres: o trabalho durante o dia e o
isolamento noturno no regime fechado; ou ainda o trabalho
externo em obras públicas, nesse mesmo regime; o direito à
freqüência em cursos profissionalizantes ou de instrução de
segundo grau ou superior, no regime semi-aberto; o trabalho
externo desprovido de qualquer vigilância, no regime aberto; a
progressão ou regressão no cumprimento da pena, segundo o
mérito ou demérito da conduta carcerária.
Embora as mulheres tenham previsão legal para o
cumprimento de pena em estabelecimento diferenciado, direito esse que também
vem amparado pela nossa Constituição Federal por meio do art. 5º, inciso XLVIII,
deverão ser obedecidas às mesmas regras, direitos e deveres do preso comum,
assim como observados os princípios atinentes à espécie da pena.
2.3 ESTABELECIMENTOS PENAIS
Denomina-se estabelecimento penal o local físico apropriado
para o cumprimento da pena nos regimes fechado, semi-aberto e aberto, bem
como para as medidas de segurança. Servem, ainda, exigindo-se a devida
separação, para abrigar os presos provisórios. Mulheres e maiores de sessenta
anos devem ter locais especiais115.
Art. 82. Os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado,
ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao
egresso.
§1º A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão
recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição
pessoal.
114 COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Direito Penal objetivo: comentários ao Código Penal e ao Código de Propriedade Industrial. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003, p. 90. 115 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 968.
44
§2º O mesmo conjunto arquitetônico poderá abrigar
estabelecimentos de destinação diversa desde que devidamente
isolados.
Conforme sua destinação, os estabelecimentos deverão
contar com áreas e serviços voltados à assistência, educação, trabalho,
recreação e prática esportiva dos presos. Os que forem destinados às mulheres
terão, ainda, berçário, onde elas poderão amamentar seus filhos (art. 83, LEP).
Determina a lei que os presos provisórios fiquem separados
dos condenados definitivos e, dentre estes, deve haver divisão entre primários e
reincidentes. O preso que, ao tempo da prática da infração penal, era funcionário
da administração da justiça (policiais, agentes de segurança de presídios,
funcionários do fórum, carcereiros, juízes, promotores etc.) ficará sempre
separado dos demais (art. 84, LEP)116.
Reza o art. 85 da referida Lei, que o estabelecimento penal
deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade, havendo a
fiscalização por parte do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária,
determinando o limite máximo da capacidade do estabelecimento.
Sobre o artigo acima mencionado, colhe-se do escólio de
Guilherme Nucci117:
Esse é outro ponto extremamente falho no sistema carcerário
brasileiro. Se não houver investimento efetivo para o aumento do
número de vagas, respeitadas as condições estabelecidas na lei
de Execução Penal para os regimes fechado, semi-aberto e
aberto, nada de útil se poderá esperar do processo de
recuperação do condenado. Na verdade, quando o presídio está
superlotado a ressocialização torna-se muito mais difícil,
dependente quase que exclusivamente de boa vontade individual
de cada sentenciado.
116 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal, 2007, p. 968. 117 Ibidem, 2007, p. 968.
45
Por conseguinte, já analisadas as condições para a
subsistência e requisitos dos estabelecimentos carcerários, examinar-se-á cada
um de forma individualizada.
2.3.1 Penitenciária
Dispõe o art. 87 que “a penitenciária destina-se ao
condenado à pena de reclusão, em regime fechado”, ou seja, para aquele que foi
condenado à pena de reclusão superior a oito anos, ou por que já era reincidente,
quando sofreu a condenação ora executada.
Tem por objetivo a punição retributivamente, prevenir pela
intimação e regenerar através da ressocialização. Exige a lei que propicie aos
convictos o isolamento, durante o repouso noturno, e trabalho remunerado – o
que implica, ipso facto, na obrigação de dispor de cubículos individuais, quanto a
acomodações e permissão de circulação intramuros, para os internos, quanto ao
regime de operação118.
Disciplina o art. 88 que “o condenado será alojado em cela
individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório”. Destaca o
mesmo artigo que “são requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do
ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento
térmico adequado à existência humana; b) área mínima de seis metros
quadrados”.
Não obstante haja previsão legal de que o condenado deva
ser alojado em cela individual com os requisitos básicos quanto à salubridade e
área mínima, sabe-se que na maioria das instituições carcerárias acumulam-se
vários presos numa única cela, vivendo em promiscuidade e total falta de higiene,
pois existe um só banheiro, assim mesmo aberto, para todos fazerem suas
necessidades, o que é deprimente119.
118 THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 100. 119 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 135.
46
Os requisitos básicos mencionados no art. 88 devem ser
obedecidos também quanto às penitenciárias femininas, as quais, além disso,
poderão contar, facultativamente, com seção para gestantes e parturientes e de
creche, as quais têm a finalidade de assistir ao menor desamparado cuja
responsável esteja presa, direito que está assegurado no art. 89, da LEP120.
O art. 90 determina a construção da penitenciária em local
afastado da cidade, entretanto que não tenha o condão de restringir as visitas.
Esse dispositivo existe em razão da possibilidade de motins
e fugas, circunstâncias que poderão frustrar a segurança da comunidade caso a
construção seja feita dentro da cidade. Entretanto, a localização do
estabelecimento não deve restringir a possibilidade de visitação aos presos, que é
fundamental no processo de sua reinserção social121.
2.3.2 Colônia Agrícola, Industrial ou Similar
É o local que se destina ao cumprimento da pena em regime
semi-aberto, ou seja, aquele que fora condenado à pena superior a quatro e
inferior a oito anos (art. 91, da LEP), salvo se o condenado, cumprindo parte da
pena no regime fechado, passar para o semi-aberto ou, estando neste, progredir
ou regredir122.
Art. 92. O condenado poderá ser alojado em compartimento
coletivo, observados os requisitos da letra a, do parágrafo único,
do artigo 88, desta Lei.
Parágrafo único. São também requisitos básicos das
dependências coletivas:
a) a seleção adequada dos presos;
b) o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos da
individualização da pena.
120 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 271. 121 Ibidem, 2007, p. 272. 122 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 137.
47
Os estabelecimentos semi-abertos têm configuração
arquitetônica mais simples, uma vez que as precauções de segurança são
menores do que as previstas para as penitenciárias. Funda-se o regime
principalmente na capacidade de senso de responsabilidade do condenado,
estimulado e valorizado, que o leva a cumprir com os deveres próprios de seu
status, em especial o de trabalhar, submeter-se à disciplina e não fugir.
Permite-se o alojamento coletivo de menor custo, porém
deve ser rigorosamente observado “o limite de capacidade máxima que atenda os
objetivos de individualização da pena”, exigência necessária para que se evite o
surgimento de problemas de segurança, disciplina, violência e constrangimento
comuns nos estabelecimentos superpovoados123.
A prisão semi-aberta deve estar subordinada, apenas, a um
mínimo de segurança e vigilância. Nela, os presos devem movimentar-se com
relativa liberdade, a guarda do presídio não deve estar armada, a vigilância deve
ser discreta e o sentido de responsabilidade do preso enfatizado.
2.3.3 Casa do Albergado
É o estabelecimento de cumprimento de pena em regime
aberto, bem como para a pena de limitação de fim de semana (art. 93, da LEP). O
prédio deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais
estabelecimentos, sem obstáculos físicos impeditivos de fuga (art. 94, da Lei
acima citada)124.
Tratando-se de estabelecimento que recolhe os condenados
à pena Privativa de Liberdade em regime aberto, e também aqueles que cumprem
pena de limitação de final de semana, há necessidade de conter, além dos
aposentos para acomodar os presos, local apropriado para cursos e palestras
(art. 95, da LEP). Deverá ter, também, instalações para os serviços de
fiscalização e orientação aos condenados.
123 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 274. 124 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal, 2007, p. 969.
48
Determina que o condenado que estiver gozando do regime
aberto, cumprirá pena em liberdade, sem vigilância, poderá trabalhar, freqüentar
cursos ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o
período noturno e nos dias de folga125.
A casa de albergado tem uma estrutura simples e de baixo
custo, visto que a mesma se caracteriza pela existência de grandes alojamentos,
onde os condenados só se recolhem nos períodos de folga. Assim, não exigindo
uma estrutura de segurança máxima. Sua construção é muito mais barata, mas,
curiosamente, são poucas as casas de albergado construídas no País126.
É sabido que não há muitas casas do albergado em nosso
País, circunstância essa que causa grande revolta à população e aos verdadeiros
interessados na efetividade da Lei de Execução Penal, propagando-se a idéia de
que o regime aberto nada mais é do que o regime da impunidade, melhor
dizendo, uma etapa do objetivo da Lei que não está sendo cumprido.
2.3.4 Hospital e Tratamento Psiquiátrico
Destina-se aos apenados que foram condenados à medida
de segurança de internação (inimputáveis ou semi-imputáveis). Nesses locais,
periodicamente, realizam-se os exames psiquiátricos para o acompanhamento
dos internados127.
Aqui se aplicam as regras de salubridade e área mínima de
seis metros quadrados, dispõe o art. 99, parágrafo único da LEP.
Poderão ser de duas espécies as medidas de segurança: a)
detentiva, que consiste na internação em hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico, fixando-se o prazo mínimo de internação entre um e três anos (CP,
art. 97, §1º); b) restritiva, que consiste na sujeição do agente a tratamento
125 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 276. 126 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, 1999, p. 176. 127 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal, 2007, p. 969.
49
ambulatorial, cumprindo-lhe comparecer ao hospital nos dias que lhe forem
determinados pelo médico a fim de ser submetido a tratamento128.
A internação ou tratamento ambulatorial será por tempo
indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada mediante perícia médica
a cessação da periculosidade, que deve ser realizada ou repetida de ano em ano,
ou a qualquer tempo, se o determinar o juiz da execução129.
É um hospital-presídio, um estabelecimento penal que visa a
assegurar a custódia do internado. Embora se destine ao tratamento, que é o fim
da medida de segurança, pois os alienados que praticam crimes assemelham-se
em todos os pontos a outros alienados, diferindo essencialmente dos outros
criminosos, não se pode afastar a coerção à liberdade de locomoção do
internado, presumidamente perigoso em decorrência da lei130.
2.3.5 Cadeia Pública (Presídio)
É o local de recolhimento do preso provisório (art. 102 da
LEP), ou seja, aquele que teve sua prisão decretada por força de uma decisão
judicial ou o preso em flagrante, tendo por finalidade a separação destes que
ainda não foram condenados, por inexistência de sentença condenatória
transitada em julgado, dos que já sofreram condenação criminal e, apenas, estão
a cumprir a sanção penal que lhes foi imposta.
É recomendável que haja uma cadeia pública, pelo menos
em cada Comarca (art. 103 da LEP), em face da necessidade do preso estar
segregado próximo ao local onde está tramitando seu processo para facilitar o
seu deslocamento para eventuais audiências. Ademais, o preso não deve ficar
longe do seio familiar131.
Na cadeia o preso não está submetido ao regime carcerário,
quais sejam, a não utilização de uniformes; a não submissão a horários certos e
128 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 152. 129 Ibidem, 1999, p. 152. 130 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 282. 131 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 287.
50
predeterminados; poderá receber visitas constantemente, ou pelo menos mais
freqüentes; poderá receber alimentos, rádio, televisão, jornais, revistas, livros e
outros confortos que sua família, seus amigos ou sua condição social possam
proporcionar-lhe132.
O regime estabelecido ali é o regime celular, quer dizer,
aprisionamento dia e noite. Os detentos, entretanto, podem ser reunidos para
atividades coletivas ou dirigidas, tais como banhos de sol, exercícios físicos,
conferências, espetáculos ou cultos religiosos, aulas, etc., considerando-se, não
sem razão, que o isolamento absoluto dificulta a readaptação.
Atualmente, no lugar das cadeias públicas, surgiram os
centros de detenção provisória, que possuem maior número de vagas e estrutura
semelhante a do presídio133.
Lamentavelmente, esses estabelecimentos vivem
superlotados e às vezes ali os detentos estão em pior situação do que na
penitenciária. Mas, de regra, deveria ser o contrário, já que a maioria delas é
utilizada para o cumprimento de penas privativas de liberdade de curta e média
duração, assim como para presos de baixa periculosidade.
2.4 LEI DE EXECUÇÃO PENAL: OBJETIVOS E APLICABILIDADE
O art. 1º, da Lei nº 7.210/1984 especifica o seu objetivo, que
é “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar
condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.
Para Mirabete “a execução penal é uma atividade complexa,
que se desenvolve nos planos jurisdicional e administrativo”134.
O renomada autora Ada Pellegrini Grinover135 explana:
132 ROSA, Antônio Miguel Feu. Execução Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995, p. 255. 133 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal, 2007, p. 370. 134 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 28.
51
Na verdade, não se nega que a execução penal é atividade
complexa, que se desenvolve, entrosadamente, nos planos
jurisdicional e administrativo. Nem se desconhece que dessa
atividade participam dois Poderes estatais: O Judiciário e o
Executivo, por intermédio, respectivamente, dos órgãos
jurisdicionais e dos estabelecimentos penais.
Defronte da grande importância da execução penal para um
preso que fora condenado, Paulo Lúcio Nogueira136 discorre que nada serve uma
condenação criminal sem que haja a respectiva execução da pena imposta.
Portanto, daí exsurge o primordial objetivo da execução, tornar exeqüível a
sentença criminal.
A Lei também deve se atentar à individualização da pena,
obedecendo ao regramento do art. 5º, mormente porque a classificação do
apenado é um desdobramento lógico do princípio da personalidade da pena, o
qual está introduzido entre os direitos e garantias constitucionais137.
Prescreve o referido artigo:
Art. 5º. Os condenados serão classificados, segundo os seus
antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da
execução penal.
Em cada estabelecimento deve existir a Comissão Técnica
de Classificação, constituída por dois chefes de serviço, um psiquiatra, um
psicólogo e um assistente social, e presidida pelo diretor do estabelecimento, para
fazer o exame de classificação, consoante art. 7º da referida lei.
A concepção de Mirabete138 a respeito da individualização
da pena é que a execução penal não pode ser igual para todos os detentos, bem
como a execução pode ser homogênea durante todo o seu período de
135 GRINOVER, Ada Pellegrini. Natureza jurídica da execução penal, in Execução penal (vários autores), Max Limonad, 1987, p. 7 136 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 03. 137 Ibidem, 1999, p. 10. 138 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 04.
52
cumprimento, portanto deverá ser graduada de acordo com a reação de cada
preso no processo de reinserção social.
Assim, ressalta-se que a Lei de Execução Penal precisa ter
aplicação social com a participação da população, pois se assim não acontecer
como de fato não ocorre, ela perderá como também já perdeu sua eficácia. A
sociedade deve estar altivamente presente na empreitada ressocializadora do
apenado, estimulando-lhe a recuperação.
2.4.1 Da Assistência
Observa-se que existem duas modalidades de assistência
para o detento, que poderia ser classificada como essenciais para a sobrevivência
do preso, e aquelas complementares que o ajudam no processo de
ressocialização.
Os meios de que o tratamento penitenciário dispõe são
fundamentalmente, de duas classes: conservadores e
reeducadores. Os primeiros atendem à conservação da vida e da
saúdo do recluso (alimentação, assistência médica, educação
física) e a evitar a ação corruptora das prisões (já foi visto que a
prisão é um dos fatores criminógenos). Os meios educativos
pretendem influir positivamente sobre a personalidade do recluso
e modelá-la. São os clássicos: instrução e educação, formação
profissional, assistência psiquiátrica, assistência religiosa, postos
sob a tônica das técnicas e diretrizes mais recentes139.
Estabelece o art. 10 e 26, da LEP, dando definição ao
egresso e a quem é concedido tal benefício:
Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado,
objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em
sociedade.
Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.
Art. 26 (...)
139 Ibidem, 2007, p. 62.
53
I – o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da
saída do estabelecimento;
II – o liberado condicional, durante o período de prova.
O benefício do egresso encontra-se amparado pelo anseio
do Estado em fazer com que o preso, ao ser posto em liberdade, sinta-se
familiarizado com o seu antigo ambiente, reajustando-o à vida digna.
Quando o preso volta para o seu antigo ambiente, este não lhe
parecerá o mesmo, o que certamente lhe causará dificuldade de
ambientação e reajustamento. Necessária, pois, a assistência ao
egresso, visando continuar ou promover o reajustamento consigo
mesmo e com os outros, numa adaptação racional a seu meio
sociocultural. Esse processo técnico-científico de assistência foi
definido pelas regras mínimas do Conselho de Europa como o
tratamento que se proporciona ao sujeito, uma vez que obtém sua
liberdade, e deve ser considerado como um prolongamento do
tratamento a que esteve sujeito durante a prisão, já que formam
uma unidade independente, constituindo, portanto, a continuação
ou a seqüência do tratamento intramuros140.
É sabida a dificuldade do preso em se ressocializar, quando
colocado em liberdade. Deriva-se esse fato da falta de contribuição da população
e Estado em dar amparo ao mesmo. Por isso, foi criado esse tipo de instituto para
tentar exterminar com o problema, visando à reinserção do preso ao convívio
social.
2.4.1.1 Assistência Material
O art. 12 da LEP rege a assistência material que consistirá
no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.
Destaca Mirabete141 que, segundo as regras mínimas da
ONU, todo preso deverá receber da administração nas horas usuais, uma
alimentação de boa qualidade, bem preparada e servida, cujo valor seja suficiente
para a manutenção da saúde de forças físicas. No mesmo sentido, são os casos
140 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 64.
54
em que o preso não tenha permissão para usar roupas pessoais, devendo o
estabelecimento fornecer uniformes apropriados para o clima. Quanto à higiene
pessoal e o asseio da cela é um dever do preso manter o local limpo, desde que
os produtos sejam fornecidos pelo estabelecimento prisional.
No caso de não fornecimento de produtos ao preso, deverá
o estabelecimento propiciar a venda de produtos lícitos e permitidos ao recluso
(art. 12, 2ª parte, da LEP).
Com relação ao que reza o art. 13, 1ª parte, os alojamentos
dos presos durante à noite devem corresponder às exigências de higiene, de
iluminação, calefação e ao arejamento. Além disso, as instalações sanitárias
devem, ser tais que o preso possa satisfazer a suas necessidades naturais,
quando quiser e, bem assim, limpos e decentes, ao passo que os chuveiros
devem ter temperatura adequada ao clima, em número suficiente para que cada
preso possa fazer o uso freqüente deles142.
2.4.1.2 Assistência à Saúde
Esse tipo de assistência compreende tratamentos médicos,
odontológicos e farmacêuticos, tanto de caráter preventivo como curativo,
segundo o que preceitua o art. 14, da LEP143.
O regulamento menciona no §2º que incumbe ao
estabelecimento prisional prestar auxílio ao apenado, e em caso se não
possuírem condições físicas para prestá-lo, poderão conduzi-lo até outro local
para tanto, desde que na posse de autorização do diretor do local da
segregação144.
Conclui-se que a assistência à saúde é extremamente
importante para o detento, sobretudo porque o condenado pode contrair vários
tipos de doenças ao ser recolhido no estabelecimento penal.
141 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 66. 142 Ibidem, 2007, p. 68. 143 MARCÃO, Renato. Curso de Execução penal. 2 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p. 20. 144 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 71.
55
2.4.1.3 Assistência Jurídica
Deve ser prestada não somente aos presos e aos
internados, mas principalmente aos acusados, na fase probatória ou instrutória de
processos-crimes, quando, talvez, mais necessitem de defesa criminal bem feita,
pois caso contrário estará fadado a ser condenado145. Ressalta-se que a
assistência aqui analisada é destinada aos presos que não possuem recursos
financeiros para constituir advogado.
Com a possibilidade da progressão de regime prisional
aplicado ao condenado, saídas temporárias, remição e livramento condicional,
mister se faz a presença de um advogado para pleitear em seu nome, em juízo,
requerendo os benefícios a ele disposto pela Lei de Execução Penais, mormente
quando se trata de instituições com grande demanda carcerária146.
Frisa Mirabete147 que ao que tange o art. 16, é certo concluir
que o serviço de assistência jurídica deixa muito a desejar, pois deveria o Estado
possibilitar com eficiência, a nomeação de advogado dativo ao condenado no
transcorrer da execução para que pudesse acompanhar-lhe a cada momento do
cumprimento da pena.
2.4.1.4 Assistência Educacional
Focando ainda mais a ressocialização e a exterminação da
ociosidade do detento, foi introduzida na LEP a possibilidade do preso estudar
enquanto estiver recluso, consoante art. 17 e seguintes:
Art. 17. A assistência educacional compreenderá a instrução
escolar a formação profissional do preso e do internado.
Art. 18 O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no
sistema escolar da unidade federativa técnico.
Art. 19. O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação
ou de aperfeiçoamento técnico.
145 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 24. 146 Ibidem, 1999, p. 25. 147 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 74.
56
Art. 20. As atividades educacionais podem ser objeto de convênio
com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou
ofereçam cursos especializados.
Art. 21. Em atendimento às condições locais, dotar-se-á casa
estabelecimento de uma biblioteca, para uso de todas as
categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e
didáticos.
É sabido que a maioria da população carcerária é formada
de indivíduos provenientes de classes menos favorecidas, sem qualquer instrução
escolar, com grande índice de analfabetos148.
Disciplina a CF, no art. 205 sobre o tema que “educação,
direito de todos de dever do Estado e da família, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa,
seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
A obrigatoriedade de fornecimento de ensino de 1º grau,
preceito estabelecido pelas Regras Mínimas da ONU, encontra-se respaldado na
ação educativa, enquanto possível, com o sistema de instrução pública, a fim de
que os presos, ao serem posto em liberdade, possam continuar, sem dificuldades,
sua preparação (art. 18 da LEP)149.
O ensino profissional compreendido pelo art. 19, poderá ser
em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico para aqueles que já tiveram
a formação básica profissional antes da prisão. Por isso, ao iniciar o cumprimento
da pena, o recluso será avaliado quanto às suas aptidões profissionais, iniciando
um trabalho a fim de desenvolver essa sua facilidade com a área que mais se
identifica aliado ao tempo em que permanecerá segregado150.
Poderá o Estado, ainda, promover convênios com entidades
públicas ou particulares que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados.
148 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 27. 149 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 76. 150 Ibidem, 2007, p. 77.
57
Giza o autor Paulo Lúcio Nogueira151 que é totalmente
viável, até nas pequenas cadeias públicas, destacar um professor para ministrar
aulas diárias aos presos, entretanto não tem havido interesse das próprias
autoridades em melhorar a situação. Defende, ainda, que a instauração de uma
biblioteca com diversos tipos de literatura no estabelecimento carcerário não seria
apenas uma fonte de instrução, mas também de recreação para os segregados.
2.4.1.5 Assistência Social
Disciplinado no art. 22, e o rol de competência do assistente
social no art. 23, há quem defenda que é um dos institutos mais importantes neste
processo de reinserção social do internado.
Art. 22. A assistência social têm por finalidade amparar o preso e
o internado e prepará-los para o retorno à liberdade.
Art. 23. Incumbe ao serviço social de assistência social:
I – conhecer os resultados dos diagnósticos e exames;
II – relatar, por escrito, ao diretor do estabelecimento, os
problemas e as dificuldades enfrentados pelo assistido
III – acompanhar o resultado das permissões de saídas e das
saídas temporárias;
IV – promover, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, a
recreação;
V – promover a orientação do assistido, na fase final do
cumprimento da pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu
retorno à liberdade;
VI – providenciar a obtenção de documentos dos benefícios de
previdência social e do seguro por acidente no trabalho
VII – orientar e amparar, quando necessário, a família do preso,
do internado e da vítima.
Compete ao assistente social acompanhar o recluso durante
todo o período de segregação, investigar sua vida com vistas na redação dos
151 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 28.
58
relatórios sobre os problemas do preso, promover a orientação do assistido na
fase final do cumprimento da pena etc. Por meio dos laudos dos exames de
personalidade, criminológicos e outros, o serviço social tomará conhecimento da
personalidade do sentenciado, do ambiente (familiar, social, de trabalho etc.), de
onde provieram os seus possíveis problemas pessoais, familiares, sociais, entre
outros. Após esta minuciosa análise, imcumbir-lhe-á a emissão de um prognóstico
inicial para o desenvolvimento de um trabalho assistencial pedagógico e social em
relação à personalidade do condenado ou internado152.
2.4.1.6 Assistência Religiosa
A tentativa de reformar o preso por meio da religião é muito
antiga, está devidamente comprovada que tem influência altamente benéfica no
comportamento do homem encarcerado e é a única variável que contém, em si
mesmo, em potencial, a faculdade de transformar o homem encarcerado ou
livre153.
Em todo estabelecimento prisional haverá local apropriado
para cultos religiosos, mormente porque é de suma importância para a
reeducação, servindo-lhe de conforto, de bem-estar e de incentivo154.
A religião é necessária e imprescindível no tratamento de
reintegração do internado, pois é o melhor instrumento moral, inclusive é um
direito fundamental que está devidamente amparado por meio do art. 5º, inciso VI,
da nossa Constituição Federal, prevendo a plena liberdade de consciência de
crença.
2.4.1.7 Assistência ao Egresso
É uma assistência assegurada ao condenado que cumpriu a
pena na sua totalidade, ou para aquele que encontra-se beneficiado pelo
livramento condicional da pena.
152 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 81. 153 Ibidem, 2007, p. 84. 154 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 33.
59
Art. 25. A assistência ao egresso consiste:
I – na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade;
II – na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação,
em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses.
Parágrafo único. O prazo estabelecido no inciso II poderá ser
prorrogado uma única vez. Comprovado, por declaração do
assistente social, o emprego na obtenção de emprego.
Segundo ao que rege o art. 26, considerar-se-á egresso o “I
– o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do
estabelecimento; II – o liberado condicional, durante o período de prova”.
Descreve o autor Marcão155 que o serviço do assistente
social é indispensável para o egresso do condenado à sociedade.
O trabalho dignifica o homem, já se disse. Cabe ao serviço social
colaborar com o egresso para a obtenção de trabalho, buscando,
assim, prevê-lo que recursos que o habilitem a suportar sua
própria existência e a daqueles que dele dependem.
É evidente que a principal assistência é aquela fornecida
depois que o detento deixa o cárcere, pois se essa for somente durante o
cumprimento da sanção penal, não será suficiente já que é necessário que o
detento consiga sua real reinserção na sociedade. Sustenta o autor que para a
reintegração social do egresso é necessária a participação da população, pois se
não houver suporte, não haverá condições de o Estado, sozinho, dar-lhe a devida
assistência156.
2.4.2 Dos Direitos dos Presos
Primeiramente, cabe salientar que se devem conservar
todos os direitos do sentenciado atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a
todos as autoridades o respeito à sua integridade física e moral, segundo o que
155 MARCÃO, Renato. Curso de Execução penal. 2 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p. 24.
60
reza o dispositivo do art. 38, do Código Penal e art. 5º, inciso XLIX, da Carta
Magna.
No mesmo sentido, o art. 3º da Lei 7.210/84 estabelece que
ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos
pela sentença ou pela lei.
O art. 40, ainda do Código Penal nos remete à Lei de
Execução Penal, por ser mais específica sobre a matéria inerente aos direitos,
deveres, dentre outras modalidades em que o segregado deverá submeter-se.
Art. 41. Constituem direitos do preso:
I – alimentação suficiente e vestuário;
II – atribuição de trabalho e sua remuneração;
III – Previdência Social;
IV – constituição de pecúlio;
V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o
descanso e a recreação;
VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e
desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da
pena;
VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e
religiosa;
VIII – proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em
dias determinados;
XI – chamamento nominal;
XII – igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da
individualização da pena;
156 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 35.
61
XIII – audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV – representação e petição a qualquer autoridade, em defesa
de direito;
XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência
escrita, da leitura e de outros meios de informação que não
comprometam a moral e os bons costumes;
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena
da responsabilidade da autoridade judiciária competente;
No tocante à alimentação e vestuário, além de ser um direito
do preso, também está previsto na modalidade de assistência material (art. 12 da
LEP) já mencionada neste capítulo.
Deve a administração, assim, de um lado, proporcionar ao
preso alimentação controlada, conveniente preparada e que corresponda em
quantidade e qualidade às normas dietéticas e de higiene. De outro lado, o
vestuário tem que ser apropriado ao clima, para que não lhe cause tortura ou ferir
sua dignidade157.
O trabalho e a remuneração além de ser um direito inerente
ao segregado, também está previsto no art. 6º da CRFB/88, pois o trabalho é um
dos “direitos sociais”, incumbindo ao Estado o dever de atribuir-lhe ao condenado
que será realizado no estabelecimento prisional. Sustenta, ainda, que ocupação
laborativa preserva a dignidade humana do condenado158.
No que tange ao direito do condenado em usufruir dos
benefícios da Previdência Social, é sabido que a Lei de Execução Penal não
prevê o desconto coercitivo da remuneração do preso para a contribuição
previdenciária. Tal direito somente poderá ser exercido pelo preso que,
voluntariamente, contribuir para a referida instituição social, nos termos da
legislação específica, no que se refere ao seu trabalho prisional159.
157 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 121. 158 Ibidem, 2007, p. 121. 159 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 121.
62
O inciso IV determina a possibilidade do preso em acumular
suas economias para, posteriormente, quando vir a ser solto, utilizá-la. Entretanto,
somente poderá usufruir de tal direito quando já estiver ressarcido as obrigações
maiores que lhe cabia, como a reparação do dano e a assistência à família160.
Terá o condenado direito ao descanso e à recreação, pois o
descanso difere-se do ócio, porquanto aquela visa ao repouso, a fim de se
readquirirem as condições necessárias para a atividade interrompida. Por isso,
compreende-se o período de descanso para o sono, o intervalo da jornada normal
de trabalho, assim como nos domingos e feriados, como determina a lei161.
A recreação extermina com a ociosidade dos condenados, já
que ocupa o tempo livre do preso através do lazer-distração, atividade que
repousa ou que proporciona salutar fadiga propícia para o repouso por excelência
que é o sono. Entre os meios de recreação ganha vulto o esporte, incluindo-se a
ginástica, que não é apenas meio para manter o físico ou psíquico, mas contribui,
também, para a disciplina e a elevação moral do preso, suscitando ou
desenvolvendo virtudes individuais e sociais, tais como lealdade, serenidade,
espírito de equipe ou colaboração etc162.
O mesmo doutrinador traz à baila o direito do preso do lazer-
cultura, previsto no inc. VI, frisando a finalidade por meio da satisfação do
enriquecimento intelectual ou artístico, do aperfeiçoamento ou refinamento da
personalidade163.
Haverá sempre proteção ao segregado contra o
sensacionalismo, ou seja, a divulgação e, principalmente, a exploração, em tom
espalhafatoso, de acontecimentos relacionados ao preso, que possam
escandalizar ou atrair sobre ele as atenções da comunidade, retirando-o do
anonimato, que, eventualmente, o levarão a atitudes anti-sociais, dificultando a
sua ressocialização após o cumprimento da pena164.
160 Ibidem, 2007 p. 122. 161 Ibidem, 2007 p. 122. 162 Ibidem, 2007, p. 122. 163 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 123. 164 Ibidem, 2007, p. 123.
63
O direito de entrevista pessoal e reserva com o advogado
não é um direito somente do preso, mas sim também do advogado, que se
encontra disciplinado no Estatuto da OAB, prevendo a comunicabilidade com
seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando se
achem presos, detidos ou recolhidos165.
A visita de familiares é tanto um direito como um objetivo na
ressocialização do apenado já que o mesmo não deve romper seus contatos com
o mundo exterior, mormente com a família, levando-o a sentir que mantendo
contatos, embora com limitações, com as pessoas que se encontram fora do
presídio, não foi excluído da comunidade. Quanto à visita íntima, em que pese
não esteja prevista na Lei de Execução Penal, pois somente está expresso o
direito à visita de companheira, a tendência moderna é de considerá-la como um
direito também166.
Estão proibidas dentro do estabelecimento outras formas de
tratamento e designação, como a fundada em números, alcunhas de presos, pois
o sentido de ressocialização do sistema penitenciário exige que o preso seja
tratado como pessoa e não como coisa, com rótulos que têm, por si mesmos,
conteúdo vexatório e humilhante167.
É vedada a limitação ou tratamento diferenciado aos presos
que não se refira às medidas e situações referentes à individualização da pena
previstas na própria legislação. Portanto, procede-se a um correto
desenvolvimento da execução da pena diante das necessidades decorrentes do
processo que deve levar à inserção social do preso (regime de pena, assistência,
normas de disciplina etc.)168.
Deverá ser permitido que o preso entre em contato direto
com o diretor da prisão em qualquer dia da semana para qualquer reclamação ou
comunicação. Referido direito tem grande eficácia, pois o diretor terá melhores
165 Ibidem, 2007, p. 124. 166 Ibidem, 2007, p. 125. 167 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 127. 168 Ibidem, 2007, p. 127.
64
condições de coibir eventuais abusos e diligenciar no sentido de cumprirem-se as
normas pertinentes à execução penal169.
É muito comum, nas prisões, a elaboração de petições de
habeas corpus, de pedido de revisão ou de benefícios, muitos deles atendidos
pela autoridade judiciária (inc. XIV). Tem o preso o direito de ser intimado de toda
as decisões judiciais que ensejam alterações da pena que lhe foi imposta. Pode,
também, a qualquer tempo, requerer certidão relativa a sua exata situação no
curso da execução, inclusive quanto ao tempo de pena a cumprir (inc. XVI)170.
O preso tem direito à liberdade de informação e expressão,
ou seja, de estar informado dos acontecimentos familiares, sociais, políticos e de
outra índole, pois sua estadia na prisão não deve significar marginalização da
sociedade. Os contatos que pode manter com o mundo exterior, são por meio de
correspondência, imprensa escrita e outros meios de comunicação, como o rádio,
o cinema, a televisão171.
2.5 PRINCÍPIOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS INERENTES AO PRESO
Considerando a diversidade de princípios previstos na
doutrina, bem como aqueles que regram o processo e a execução penal, abordar-
se-á no presente tópico apenas aqueles relativos ao estudo em apreço.
Pretende-se interpretar as garantias e direitos básicos
criados pelo legislador que todo preso, provisório ou condenado, detém quando
ao ingresso e permanência por tempo determinado nos estabelecimentos
penitenciários.
2.5.1 Legalidade
O princípio da legalidade encontra-se amparado pela Carta
Magna através do art. 5º, inc. XXXIX, regulamentando que “não há crime sem lei
169 Ibidem, 2007, p. 127.. 170 Ibidem, 2007, p. 128. 171 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 128.
65
anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, e também no art. 1º
do Código Penal o qual é frisado nos mesmos moldes da Carta Maior.
Como leciona Damásio Evangelista de Jesus172:
O Princípio da legalidade (ou de reserva legal) tem significado
político, no sentido de ser uma garantia constitucional dos direitos
do homem. Constitui a garantia fundamental da liberdade covil,
que não consiste em fazer tudo o que se quer, mas somente
aquilo que a lei permite. À lei e somente a ela compete fixar as
limitações que destacam a atividade criminosa da atividade
legítima. Esta é a condição de segurança e liberdade individual.
Não haveria, com efeito, segurança ou liberdade se a lei atingisse,
para os punir, condutas lícitas quando praticadas, e se os juízes
pudessem punir os fatos ainda não incriminados pelo legislador.
Nogueira173, em sede de execução penal, leciona que o
princípio da legalidade é de se entender que enquanto o cumprimento da pena, a
autoridade judicial ou diretor do presídio deverá atentar-se aos fundamentos nas
normas estabelecidas pela Lei 7.210/84, assim como nos regulamentos das casas
de albergado ou conselhos comunitários, de modo que o poder discricionário seja
restrito.
2.5.2 Igualdade ou Isonomia
O art. 5º, caput da CFRB/88, disciplina que “todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros, residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]”.
No mesmo rumo, o parágrafo único, do art. 3º da Lei de
Execução Penal predispõe que “Não haverá qualquer distinção de natureza racial,
social, religiosa ou política”.
172 DE JESUS, Damásio E. Direito Penal, 2001, p. 97. 173 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, 1999, p. 07.
66
Ora, o legislador nada mais fez do que transportar uma
garantia constitucional a todos que estão sujeitos à lei brasileira, para aqueles que
estão cumprindo pena em instituição prisional na forma da Lei 7.210/84.
Esse preceito de que todos são iguais perante a lei, não
deixa qualquer margem de dúvidas de que está diretamente ligada aos
legisladores e aos aplicadores da lei, ao passo que este aplicará a sanção
adequada às situações iguais, enquanto aquele editará leis que possibilitem
tratamento igual a situações iguais ou tratamento desiguais a situações desiguais
por parte da Justiça174.
Já Mirabete175 entende como princípio da igualdade,
conhecido também como da isonomia em face da execução penal, a vedação
para qualquer tipo de discriminação entre apenados, e não pode esse princípio
ceder às determinações fundadas apenas nas alegações de necessidade de
individualização da pena e do tratamento do sentenciado.
2.5.3 Individualização da pena
Ressalta-se que tal princípio tem berço em norma
constitucional prevista no art. 5º, XLVI, da CF, a qual disciplina que “a lei regulará
a individualização da pena, entre outras, as seguintes: a) privação de liberdade;
b)perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão e
interdição de direitos”.
Em complemento ao inciso anterior, o legislador,
efetivamente preocupado com o objetivo do princípio, preceituou no inciso XLVII
que “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a
natureza do delito, a idade e o sexo do apenado” 176.
174 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 1999, p. 24. 175 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 40. 176 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal, 1999, p. 31.
67
Está também determinado no art. 5º, da Lei 7.210/84, que
“os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e
personalidade, para orientar a individualização da execução penal”.
Portanto, é válido afirmar que a individualização busca evitar
a reunião de presos de pequena com os de elevada periculosidade177.
Sabiamente, Mirabete178 leciona quanto à individualização
da pena:
[...] A execução pena não pode ser igual para todos os presos –
justamente porque nem todos são iguais, mas sumamente
diferentes – e de que tampouco a execução pode ser homogênea
durante todo o período de seu cumprimento. Não há mais dúvida
que nem todo preso deve ser submetido ao mesmo programa da
execução e de que, durante a fase executória da pena se exige
um ajustamento desse programa conforme a reação observada no
condenado, podendo-se só assim falar em verdadeira
individualização no momento executivo.
Acrescenta o mesmo autor que a individualização da pena,
na execução, consiste em dar a cada preso as oportunidades e os elementos
necessários para lograr sua reinserção social.
Destaca-se que a aplicação da pena é o momento
processual mais importante, pois cabe ao magistrado observar a cominação legal
prevista para o fato típico praticado, avaliando todos os critérios expressos pelo
legislador no art. 59, do Código Penal para a fixação da pena.
2.5.4 Dignidade da Pessoa Humana
Esse princípio consagrado pela nossa Carta Magna, é
considerado como o princípio norteador dos direitos fundamentais, e está
devidamente regulamentado pelo art. 1º, inc. III, da Constituição Federal.
177 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal, 1999, p. 30. 178 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, 2007, p. 48.
68
Buscando definir uma conceituação sobre o tema dignidade
da pessoa, destaca Alexandre de Moraes179:
A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral
inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na
autodeterminação e que traz consigo a pretensão ao respeito por
parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo
invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo
que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao
exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem
menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas
enquanto seres humanos.
É qualidade integrante e irrenunciável da condição humana,
devendo ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida. Não é criada, nem
concedida pelo ordenamento jurídico, motivo por que não pode ser retirada, pois é
inerente a cada ser humano.180
No entanto, em que pese o juiz da execução tente cumprir e
zelar pela fidelidade na aplicação da Lei de Execução do preso no processo
ressocializatório, é notória a deficiência estrutural dos estabelecimentos penais
em nosso país, que não oferecem ao detento condições de sobreviver com
dignidade ao cumprimento de sua pena, subtraindo-lhe oportunidade de trabalho,
educação, saúde e higiene.
Explanadas as diversas modalidades de pena privativa de
liberdade, assim como sobre os pontos principais da execução penal,
acrescentando-se a sua legítima finalidade, embora não cumprida na prática, no
próximo capítulo abordar-se-á as diversas deficiências do sistema penitenciário,
sobretudo a estrutural, que em muito é sentida pelos segregados no cumprimento
da sanção penal.
179 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002, p. 128-129. 180AZEVEDO, Antônio Junqueira. Réquiem para uma certa dignidade da pessoa humana. In: CUNHA PEREIRA, Rodrigo da (Coord.). Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família –
69
CAPÍTULO 3
AS DEFICIÊNCIAS ESTRUTURAIS DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
3.1 DADOS ESTATÍSTICOS DOS PRESÍDIOS E PENITENCIÁRIAS
BRASILEIRAS.
O Brasil tem a oitava maior população carcerária do mundo,
com um total de 440 mil presos181, sendo que São Paulo é o Estado que mais tem
pessoas segregadas, contando com 141.609 presos. Se fossem contabilizados os
mandados de prisão expedidos e não cumpridos, o país disputaria com Cuba, a
terceira posição mundial182.
Ora, não é novidade que o sistema penitenciário no Brasil
apresenta uma situação extremamente preocupante, pois os números de presos
em nosso país é alarmante, e os dados estatísticos comprovam que a deficiência
estrutural tem sido uma característica marcante do descaso político vigente.
Observa-se na tabela abaixo que a população carcerária se
compõe mais de homens do que mulheres:
Modalidades Masculino Feminino TOTAL Presos Provisórios 124892 5853 130745 Regime Fechado 155742 8852 164594 Regime Semi Aberto 57012 3283 60295 Regime Aberto 9779 1747 21526 Medida de Segurança -Internação 3019 394 3413 Méd. de Seg.Tratamento ambulatorial 406 133 539
Família e cidadania. O novo CCB e a vacatio legis. Belo Horizonte: Del Rey, IBDFAM, 2002, p. 329-351. 181 BRASIL tem 130 mil presos indevidamente. Ministério Público Federal, Brasília – DF, 23 jun. 2008. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/junho-2008/brasil-tem-130-mil-presos-indevidamente/>. Acesso em: 18 out. 2008. 182 BRASIL têm a oitava maior população carcerária do mundo. O Norte On-Line. 18 set. 2007. Disponível em: <http://www.onorte.com.br/noticias/?69226>. Acesso em: 18 out. 2008.
70
Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Brasil. Referência: 6/2008.
Verifica-se, por meio destes dados, que a população
carcerária masculina é infinitamente superior à feminina. Este fato pode se dar por
diversos fatores: maior discriminação masculina, menos oportunidades de
empregos, etc. Além disso, verifica-se que nas camadas mais pobres, a maioria
das mulheres mantém-se com subempregos como domésticas, faxineiras etc.,
tendo como principal ocupação o zelo pela família, casa, filhos etc., o que as
afasta de certo modo da criminalidade183.
Por outro lado, a tabela acima somente demonstrou os
segregados nos estabelecimentos prisionais, ou seja, sem contar aqueles
segregados em delegacias, cujo número chega a cerca de 13 mil presos184.
Os homens, ao contrário, estão mais expostos ao problema
da marginalização, tendo em vista a necessidade de seu sustento e o de sua
família, aliado às ilusórias “facilidades” que a ilicitude traz.
Percebe-se, também, que a maioria dos presos está na faixa
etária entre 18 a 24 anos, tanto para homens como mulheres185. A autora Fracieli
A. Correa Bizatto186 entende que nos casos de jovens delinqüentes os fatores
estão intimamente ligados aos problemas familiares e sociais enfrentados pelo
mesmo e sua família. Explica, ainda, que o fato é que, mesmo que estas causas
não justifiquem a criminalidade e a reincidência, é fato notório que os homens e
mulheres provenientes de famílias mais abastadas e estruturadas são número
mínimo nas estatísticas das cadeias e presídios.
183 BIZATTO, Francieli A. Correa. A pena privativa de liberdade e a ressocialização do apenado: uma reavaliação das políticas existentes no sistema prisional. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós Graduação em Direito. Universidade do Vale de Itajaí, 2005. p.52. 184 Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF: Brasil. Referência: 6/2008. 185 Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF: Brasil. Referência: 6/2008. 186BIZATTO, Francieli A. Correa. A pena privativa de liberdade e a ressocialização do apenado: uma reavaliação das políticas existentes no sistema prisional. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós Graduação em Direito. Universidade do Vale de Itajaí, 2005. p.52.
71
É importante ressaltar que o investimento na abertura de
novas vagas não tem sido a única despesa dos cofres públicos, pois cada preso
que está segregado no estabelecimento prisional custa em torno de 01 (um) mil
reais mensais187.
De outro banda, do total de presos brasileiros, 10,5% são
analfabetos e 70% deles não concluíram o ensino fundamental. Apenas 18% dos
detentos estão envolvidos em atividades educacionais – e há uma combinação de
explicações para este índice tão baixo. Entre as principais causas estão a falta de
infra-estrutura para acolher salas de aula, o baixo interesse dos detentos em
estudar, entre outras188.
Outro fator que impossibilita que o preso tenha acesso ao
estudo é porque maioria das escolas prisionais funcionam durante o dia, no
mesmo horário das atividades laborais de que podem participar os detentos. Por
isso, tendo o preso que escolher entre o trabalho e a escola, este prefere o
trabalho189, pelas diversas vantagens, dentre as quais a remuneração e remição.
Seguem as tabelas comprovadoras do alegado:
187 Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF: Brasil. Referência: 6/2008. 188 O caminho do bem. Revista Educação, edição 118. Disponível em: <http://revistaeducacao.uol.com.br/textos.aps?codigo=12037>. Acesso em: 18 out. 2008. 189O caminho do bem. Revista Educação, edição 118. Disponível em: <http://revistaeducacao.uol.com.br/textos.aps?codigo=12037>. Acesso em: 18 out. 2008.
Trabalho Interno Masculino Feminino TOTAL
Artesanato 13669 900 14569 Apoio ao Estabelecimento Penal 30711 2718 33429 Atividade Rural 3228 60 3288 Outros 18436 1886 20322 TOTAL 71608
Trabalho Externo Masculino Feminino TOTAL
Empresa Privada 12114 459 12573 Administração Direta 3811 323 4134 Administração Indireta 2620 348 2968 Outros 401 29 430 TOTAL 21439
72
Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Brasil. Referência: 6/2008.
Cerca de 23% dos detentos brasileiro estão envolvidos em
alguma atividade laboral, isto porque, como já dito, o trabalho lhe assegura um
percentual de um salário mínimo, todo mês, e ainda lhe proporciona a redução de
um dia de pena a cada três dias trabalhados, a chamada remição. Ainda assim, a
representatividade de 23% da população carcerária é um número pequeno que
está longe a conduzi-los à ressocialização.
Esse foco de todos os presos não terem a oportunidade de
estar exercendo qualquer atividade enquanto delito, completa o nosso
entendimento do porquê de só no 2º semestre de 2008 aconteceram 6.331
reinclusões. Isto quer dizer que esse número refere-se aos presos que retornaram
ao sistema penitenciário, gerando um grau de reincidência altíssimo em face das
justificativas das deficiências já discutidas anteriormente.
Outra estatística no tocante aos presos primários e
reincidentes, nos leva a crer que os atualmente segregados lá estão porque já
tiveram ao menos uma condenação e estão respondendo por outro crime,
consoante tabela abaixo:
Quantidade de Primários e Reincidentes Masculino Feminino TOTAL
Presos Primários com uma Condenação 90635 6971 97606 Presos Primários com Mais de uma Condenação
5108 2526 54034
Presos Reincidentes 72388 2348 74736 TOTAL 226376 Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Brasil. Referência: 6/2008.
Por isso, embora se entenda que a maioria são presos
primários, deve-se levar em consideração que os tipos de crimes mais violentos
estão sendo praticados por primários, consubstanciado com a vedação da lei para
fins de concessão de liberdade para estes crimes.
Logo, verificando o caos do sistema penitenciária em nível
nacional, nota-se que a estrutura real das prisões não se encontra em acordo com
73
os objetivos da pena, tampouco da Lei de Execuções Penais, tanto que todos os
anos muitos presos retornam aos estabelecimentos prisionais e lá ficam à mercê
do Estado.
3.2 DADOS ESTATÍSTICOS DOS PRESÍDIOS E PENITENCIÁRIAS DO
ESTADO DE SANTA CATARINA
O nosso Estado conta, atualmente, com quase 12 mil
presos, possuindo apenas 6.308 vagas nos 36 estabelecimentos penais aqui
existentes190, conforme o quadro demonstrativo abaixo:
População Carcerária
Masculino Feminino TOTAL Presos Provisórios 3843 410 4253 Regime Fechado 3528 200 3728 Regime Semi Aberto 2327 148 2475 Regime Aberto 1294 91 1385 Medida de Segurança-Internação 97 0 97 Med. Seg – Tratamento Ambulatorial 4 1 5 TOTAL 11943 Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Brasil. Referência: 6/2008.
Frisa-se que a população carcerária atualmente vigente em
nosso país é constituída de 440 mil presos, e considerando que o Estado de
Santa Catarina possui cerca de 12 mil presos, é certo concluir que aqui
encontram-se segregados quase 3% da totalidade de detentos dos 27 estados da
nossa federação.
Dentre os 36 estabelecimentos penais, registra-se em nosso
Estado a presença de 05 (cinco) penitenciárias, 01 (uma) colônia agrícola, 02
(duas) casas de albergado, 26 (vinte e seis) cadeias públicas (Presídios) e 01
(um) hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico. Não há Centro de
Observações em Santa Catarina191.
190 Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF: Santa Catarina. Referência: 6/2008. 191 Departamento Penitenciário Nacional. Dados Estatísticos de Santa Catarina. Referência: 6/2008.
74
A pesquisa realizada pela Secretaria da Segurança Pública
e Defesa do Cidadão no 3º trimestre de 2007 demonstra a incidência de entradas
e saídas de presos, assim como de mortes, e a população carcerária de cada
regime em todos os estabelecimentos no nosso Estado, conforme se verifica na
tabela abaixo:
Preso População Regiões/ Municípios Entrada Saída Morto Fechado Semi-Aberto Aberto
Grande Florianópolis 915 805 5 2.268 369 272 Presídio Masculino 186 140 0 272 25 0 Pen. S. Pedro de Alcântara 161 216 2 1037 0 0 Penit. Florianópolis 335 312 3 719 296 0 Casa do Albergado 94 21 0 0 0 256 Presídio de Biguaçu 51 33 0 71 18 16 Presídio Feminino 62 58 0 33 30 0 HCTP 26 25 0 136 0 0
Sul 561 528 2 757 309 133 Presídio Criciúma 299 279 2 506 161 0 Presídio Tubarão 37 22 0 155 66 24 Presídio Araranguá 164 156 0 39 41 76 UPA Imbituba 49 58 0 50 5 0 UPA Laguna 12 13 0 7 36 33
Norte 818 741 3 1054 386 62 Penit. Joinville 52 12 0 223 135 0 Presídio Joinville 446 429 2 500 67 0 Presídio Jaraguá do Sul 34 34 0 97 36 4 Presídio Mafra 120 112 1 62 80 14 UPA Porto União 50 32 0 47 24 4 UPA Canoinhas * * * * * * Presídio Caçador 116 122 0 125 44 40
Vale do Itajaí 1283 1030 0 1400 381 612 Presídio Blumenau 230 285 0 428 62 288 Presídio Itajaí 405 305 0 480 95 106 Presídio Baln. Camboriú 319 297 0 53 100 144 Presídio Rio do Sul 141 135 0 155 26 42 UPA Indaial 46 40 0 73 40 22 UPA Brusque * * * * * * UPA Ituporanga 23 20 0 18 13 10 Presídio Tijucas 119 48 0 193 45 0
Planalto 326 284 0 368 291 230 Penit. Curitibanos 95 72 0 311 186 0 Presídio Lages 213 193 0 55 101 223 UPA Correia Pinto 18 19 0 2 4 7 UPA Campos Novos * * * * * *
Oeste 612 696 0 761 505 122 Presídio Joaçaba 118 85 0 88 26 21 Presídio Concórdia 20 22 0 29 34 22 Presídio Xanxerê 171 147 0 144 44 16 Presídio Chapecó 167 319 0 91 35 50 UPA S. Miguel do Oeste 83 92 0 36 15 13 Penitenciária Chapecó 53 31 0 373 351 0 TOTAIS 4515 4184 10 6608 2241 1431
75
Fonte: Secretaria do Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão. Diretoria de Informações
e Inteligência. Gerência de Estatísticas referente ao 3º trimestre de 2007.
Diante da tabela acima, ficou amplamente comprovado que
em Santa Catarina há mais presos entrando do que saindo dos estabelecimentos
penais. Segundo as críticas do diretor da DEAP, Carlos Roberto dos Santos192, é
impossível seguir à risca os ditames pregados pela LEP em razão da escassez de
recursos financeiros. Sugere que é necessário, em primeiro lugar, um agente
prisional para cuidar de cada 10 presos, o que provocaria a necessidade um total
de 980 servidores para o desempenho dessa tarefa. No entanto, atualmente
existem apenas 680 servidores a serviço do Estado, por isso, verifica-se com
clareza mais uma deficiência estrutural.
Outro dado estatístico demonstra a semelhança do problema
estadual com o de nível nacional, no sentido que quase 70% da população sequer
completou o ensino fundamental:
Escolaridade Grau de Instrução Masculino Feminino TOTAL
Analfabeto 438 20 458 Alfabetizado 1524 104 1628 Ensino Fundamental Incompleto 5221 369 5590 Ensino Fundamental Completo 1907 139 2046 Ensino Médio Incompleto 1061 121 1182 Ensino Médio Completo 784 82 866 Ensino Superior Incompleto 105 11 116 Ensino Superior Completo 45 6 51 Acima de Superior Completo 1 0 1 Não Informado 7 1 8
Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Santa Catarina. Referência: 6/2008.
Destaca-se que o grau de escolaridade do preso deriva da
condição social, que tem suas raízes na desigualdade social e na péssima
distribuição de renda que a política neoliberalista impõe, fato este confirmado pela
maioria dos presos não ter concluído o ensino fundamental, ou por nenhum jovem
192 SISTEMA prisional catarinense enfrenta superlotação. O Judiciário. Especial. Disponível em: <www.amc.org.br/new/download.php?codigo=1539>. Acesso em: 19 out. 2008.
76
estar estudando quando detido, ou ainda, pelo alto índice de profissionais
trabalhando como autônomo em trabalhos temporários ou desempregados.
Quanto à idade dos segregados, examine-se o quadro
abaixo:
Faixa Etária Idade Masculino Feminino TOTAL
18 a 24 anos 2797 200 2997 25 a 29 anos 2515 173 2688 30 a 34 anos 1614 99 1713 35 a 45 anos 1366 110 1476 40 a 60 anos 641 53 694 Mais de 60 anos 116 5 121 Não Informado 48 0 48
Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Santa Catarina. Referência: 6/2008.
Os presos, em sua maioria, são jovens oriundos das
camadas sociais mais pobres, negros e já marginalizados socialmente, filhos de
famílias desestruturadas, que não tiveram e não têm acesso à educação nem à
formação profissional. São, portanto, pessoas que estão numa situação social já
delicada e, se não encontrarem condições mínimas necessárias nos presídios
para sua recuperação, jamais poderão voltar à sociedade como cidadãos de bem.
É oportuno frisar que a maioria dos segregados nos
estabelecimentos são primários e possuem apenas uma condenação, em um total
de 2.974 presos, enquanto são 2.772 presos já reincidentes. Todavia, justifica-se
que a maioria dos segregados primários são aqueles que cometeram crimes mais
graves, aos quais a lei veda a concessão de qualquer benefício legal que os
isente do cárcere.
Outro dado alarmante é do trabalho interno e externo,
conforme tabela abaixo especificada:
Trabalho Externo Empresas fornecedoras de trabalho Masculino Feminino TOTAL Empresa Privada 114 13 127 Administração Direta 137 13 150
77
Administração Indireta 7 1 8 Outros 0 0 0 TOTAL 285 Fonte: Departamento Penitenciário Nacional. Informação da InfoPen. UF: Santa Catarina.
Referência: 6/2008.
Trabalho Interno Tipos de Atividade Masculino Feminino TOTAL Artesanato 1709 144 1853 Apoio ao Estabelecimento Penal 963 126 1089 Atividade Rural 0 0 872 Outros 2573 272 2845 TOTAL 6659 Fonte: Departamento Penitenciário Nacional. Informação da InfoPen. UF: Santa Catarina.
Referência: 6/2008.
Diferentemente do que foi constatado, o trabalho externo foi
reduzido, pois em 2007 contava-se com 486 detentos exercendo atividade laboral,
e agora, no 2º semestre de 2008, temos apenas 285 trabalhando, ou seja, ao
invés do Estado buscar incentivos com iniciativas privadas, estão sendo fechadas
as portas para a ressocialização.
3.3 EVOLUÇÃO DA SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA
É sabido que a superlotação carcerária é o principal e
crônico problema do sistema penal, porquanto a cada ano que passa a
construção de novos locais de segregação, com o surgimento de novas vagas,
não é suficiente para o abastecimento dos segregados. Colhem-se dos dados a
seguir:
Quantidade de Estabelecimentos Penais Masculino Feminino Total Penitenciárias ou Similares 400 43 443 Colônias Agrícolas, Indústrias ou Similares 44 2 46 Casas de Albergados ou Similares 39 7 46 Centro de Observações ou Similares 13 1 14 Cadeias Públicas ou Similares 1036 96 1132 Hospitais de Custódia e Tratamento Psiq. 23 5 28 Outros Hospitais 3 4 7 Total de Estabelecimentos 1716
Número de Vagas Masculino Feminino TOTAL
78
Polícia 21818 972 22790 Sistema Prisional 240954 14103 255057 Total 277847 Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Informações da InfoPen. UF:
Brasil. Referência: 6/2008.
Considerando, apenas, os estabelecimentos prisionais para
a segregação dos condenados, vejamos que temos 278 mil vagas para abrigar
mais de 440 mil presos.
Dessa forma, temos um déficit de 277 mil vagas, um número
assombroso, que tende somente a crescer, haja vista a proporção entre a média
mensal de inclusões e liberações do sistema carcerário, resultando em uma
superpopulação carcerária nos presídios, nas cadeias públicas e delegacias de
polícia.
Dados Estatísticos da População Carcerária entre os Anos de 2003 / 2007. Erro!
Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Dados Consolidados de
Dezembro de 2003 / 2007.
Observa-se dos dados consolidados a clara tendência de
aumento da população carcerária a cada ano que passa, uma vez que no ano de
2007 já contávamos com 366.574 presos somente no sistema penitenciário, isto
sem contar com os que estão atualmente segregados nos departamentos de
polícia.
Segundo o diretor-geral do Depen. Maurício Kuehne193, o
número de presos aumentou consideravelmente nos últimos 12 anos, justificando
193 BRASIL têm a oitava maior população carcerária do mundo. O Norte On-Line. 18 set. 2007. Disponível em: <http://www.onorte.com.br/noticias/?69226>. Acesso em: 18 out. 2008.
79
que isso dificultou que a criação de vagas acompanhasse o ritmo de crescimento
da população carcerária. O mesmo diretor afirma que para exterminar o déficit de
cerca de 200 mil vagas do sistema penitenciário nacional seriam necessários R$
6 bilhões, contudo frisou que para amenizar o problema não basta, apenas,
viabilizar investimentos e aumentar o número de vagas, mas sim investir em
penas alternativas.
Os dados são preocupantes, pois em 1995 eram 148.760 mil
presos no país. Até junho de 2007, havia 419.551 mil detidos em penitenciárias e
delegacias. Ora, em 1995, a proporção era de 95 presos para cada 100 mil
habitantes, ao passo que hoje esse número simplesmente passou para 227
presos para cada 100 mil habitantes, de acordo com dados da Depen194.
Os gráficos abaixo demonstram o aumentos descomunal da
população carcerária nos últimos anos:
Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Dados Consolidados de Dezembro de 2003 / 2007.
Os dados são assustadores, restando, evidente, o aumento
em 37% da população carcerária entre 2003 até 2007, isto é, gradativamente
estamos alcançando o rank dos países que mais aprisionam no mundo,
consubstanciado com o que possui as condições mais precárias para o processo
194 BRASIL têm a oitava maior população carcerária do mundo. O Norte On-Line. 18 set. 2007. Disponível em: <http://www.onorte.com.br/noticias/?69226>. Acesso em: 18 out. 2008.
80
ressocializatório, segundo a condenação nos relatórios anuais pela Human Rights
Watch195.
Portanto, é certo que há somente duas formas de enfrentar a
superlotação: através da construção de novos estabelecimento ou através do
livramento dos presos em excesso. Ambas estratégias, até certo ponto, são
utilizadas no Brasil, entretanto, como podemos perceber, nenhuma tem sido
suficiente para amenizar os níveis extremos de superpopulação que assombram o
sistema pena do país196.
Por isso, algumas alternativas têm que ser lançadas para as
autoridades no sentido de maior aplicação das penas alternativas ou a melhoria
dos locais de segregação, oportunizando a reinserção do preso na comunidade.
3.4 AS DEFICIÊNCIAS ESTRUTURAIS
3.4.1 Estrutura Física das Instituições Penais – Superlotação
Sabe-se que o objetivo primordial do sistema penal brasileiro
seria, em suma, efetivar as disposições de sentença ou decisão judicial,
proporcionando condições de integração social do condenado, segundo ao que
dispõe o art. 1º LEP.
Contudo, a realidade carcerária está bem distante ao que
vem expresso em lei, pois os alojamentos penais são considerados como
verdadeiros “depósitos de presos”, eivados de várias violações dos direitos
fundamentais e aos direitos humanos. São considerados também ambientes
propícios à violência, elevado consumo de substâncias tóxicas, tratamento
195 BRASIL, Eventos de 2007. Human Rights Watch. New York – NY, EUA. Disponível em: <http://hrw.org/portuguese/docs/2008/01/31/brazil17926.htm> Acesso em: 18 out. 2008. 196 O Brasil atrás das grades. Human Rights Watch. New York – NY, EUA. Disponível em: <http://www.hrw.org/portuguese/reports/presos/superlot2.htm>. Acesso em: 23 out. 2008.
81
médico inadequado ou inexistente, ausência de acompanhamento jurídico, falta
de qualificação dos funcionários que atuam no sistema carcerário197.
A autora Francieli acredita que muito desses problemas,
como também a má alimentação dos presos, a falta de assistência educacional,
moral, social e profissional estão intimamente ligados ao excesso de
encarcerados, haja vista que diante da demanda de segregados superior ao
número de vagas, não se pode oferecer uma instalação sanitária satisfatória, uma
alimentação adequada, tampouco as assistências necessárias198.
Devido à superlotação, muitos detentos dormem no chão de
suas celas, às vezes no banheiro, próximo ao buraco do esgoto. Nos
estabelecimentos mais lotados, onde não existe espaço livre nem no chão, presos
dormem amarrados às grades das celas ou pendurados em redes. A maior parte
das instituições penais conta com uma estrutura deteriorada, algumas de forma
bastante grave199.
A LEP prevê que os detentos sejam mantidos em celas
individuais de pelo menos seis metros quadrados. De acordo com essa norma,
muitos presídios brasileiros possuem celas individuais em toda ou em boa parte
de suas áreas de reclusão. Mesmo assim, com o advento da superlotação, ao
invés de se manter um preso por cela, as alas ocupam dois ou mais detentos.
Além das celas individuais, grande parte dos presídios possui celas grandes ou
dormitórios que foram especificamente planejados para a convivência em grupo.
As delegacias policiais, normalmente possuem celas pequenas ou médias
197 SANTOS JÚNIOR, Antônio Carlos. A situação penitenciária brasileira. Trinolex. 19 nov. 2005. Disponível em: <http://www.trinolex.com.br/artigoInternaDetalhes.php?id_item=27422>. Acesso em: 18 out. 2008. 198 BIZATTO, Francieli A. Correa. A pena privativa de liberdade e a ressocialização do apenado: uma reavaliação das políticas existentes no sistema prisional. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós Graduação em Direito. Universidade do Vale de Itajaí, 2005. p.52. 199 BOTELHO, Jéferson. Estabelecimento Prisional Provisório. Disponível em: <www.jefersonbotelho.com.br/wp-content/uploads/2007/03/estabelecimento-prisional-provisorio.doc.> Acesso em: 18 out. 2008.
82
desenhadas para manter entre cinco a dez detentos, entretanto, chegam a alojar
quarenta200.
Uma pesquisa efetuada pela Comissão de Direitos Humanos
da Câmara dos Deputados por diversos presídios do país, aponta um quadro
trágico, humilhante do ponto de vida humanístico, que invariavelmente atinge
gente pobre, jovem e semi-alfabetizada. Consta no Estado do Ceará, que presos
se alimentavam com as mãos, e a comida, “estragada”, era distribuída em sacos
plásticos – sacos plásticos que, em Pernambuco, serviam para que detentos
isolados pudessem defecar201.
A mesma reportagem mostra que no Rio de Janeiro, em
Bangu I, penitenciária de segurança máxima, não havia oportunidade de trabalho
e de estudo, pois acreditavam que o fornecimento desses direitos ameaçavam a
segurança do estabelecimento. Enquanto isso, no Paraná, defrontaram com um
preso recolhido em cela de isolamento (utilizada para punição disciplinar) pelo
período de sete anos sem ter recebido visitas ou banho de sol. Já no Rio Grande
do Sul, na Penitenciária do Jacuí, com 1.241 detentos, apesar de progressos,
havia a assistência jurídica de um único procurador do Estado e, em dias de
visitas, o “desnudamento” dos familiares dos presos, com “flexões e
arregaçamento da vagina e do ânus”.
Pode-se perceber que o Estado de Santa Catarina em sua
situação caótica, não discrepa com a de nível nacional, pois para o Presídio de
Itajaí(SC) antigamente abrigava delinqüentes perigosos que a sociedade isolava
para não comprometer a ordem pública. Agora, a grande maioria dos
delinqüentes que lá se encontram segregados, são jovens das diversas classes
sociais que apresentados às drogas na adolescência, quando a personalidade
ainda está em formação, desistiram da família, estudos, e de uma carreira202.
200 BOTELHO, Jéferson. Estabelecimento Prisional Provisório. Disponível em: <www.jefersonbotelho.com.br/wp-content/uploads/2007/03/estabelecimento-prisional-provisorio.doc.> Acesso em: 18 out. 2008. 201 CRIMINALISTA mostra que as prisões brasileiras falham. Folha On Line. Publieditorial, 22 fev. 2008, Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/folha/publifolha/ult10037u351830.shtml>. Acesso em: 18 out. 2008. 202 PRESIDIÁRIOS revelam como viraram fregueses do cadeião. Diarinho, Polícia, 17 set. 2008. Disponível em: <www.diarinho.com.br/exclusivo/2008/1709/policia.html>. Acesso em: 17 set. 2008.
83
O diretor desse Presídio, Maurílio Antônio da Silva, afirma
que todo dia entra mais gente do que sai, e que, atualmente, o estabelecimento
local abriga 635 detentos, quando a capacidade é para apenas 120 presos, razão
por que o Ministério Público, em dezembro de 2007, ajuizou uma ação203 para
que fosse limitada a entrada de presos no denominado “cadeião”204.
Como afirmação dessa preocupação, destaca-se que em
20/10/2008 ocorreu um princípio de rebelião no Presídio de Itajaí, onde os presos
reivindicavam os seus direitos à progressão de regime, saída temporária,
sustentando que já tinham cumprido os requisitos necessários para as
benesses205. Este, com certeza, é outro fator de extrema relevância que faz elevar
o crescimento da população carcerária, porquanto o art. 112 da LEP disciplina
que um preso condenado inicialmente em regime fechado deveria ser transferido
para um estabelecimento de regime semi-aberto, após o cumprimento de ano
menos um sexto de sua pena e, assim, sucessivamente, até o preso pudesse
retornar à sociedade, o que não ocorre na realidade prisional tanto regional como
nacional206.
No que tange ao Presídio de Balneário Camboriú, a situação
já não discrepa, pois lá há estrutura para apenas 104 presos e hoje está com 397.
Afirma o gerente do Presídio Leandro Kruel, que não há mais espaço físico para
alojar nenhuma pessoa, tanto que desde 2006 o pátio fica aberto 24 horas e seu
espaço começou a ser ocupado por colchões e foi aumentando cada vez mais207.
As cadeias públicas, ou presídios, servem para abrigar os
presos que aguardam o julgamento de seus delitos. No caso de Balneário
Camboriú, dos 392 presos, 64 deles são condenados a regime fechado, 74 a
semi-aberto e 213 são provisórios, sendo que deveriam estar ali apenas os
referidos 213. Desta forma, houve a transgressão de pelo menos dois artigos da
203 Processo nº 033.07.039225-3, que atualmente está em grau de recurso no Tribunal de Justiça. 204 PRESIDIÁRIOS revelam como viraram fregueses do cadeião. Diarinho, Polícia, 17 set. 2008. Disponível em: <www.diarinho.com.br/exclusivo/2008/1709/policia.html>. Acesso em: 17 set. 2008. 205 PRESIDIÁRIOS revelam como viraram fregueses do cadeião. Diarinho, Polícia, 17 set. 2008. Disponível em: <www.diarinho.com.br/exclusivo/2008/1709/policia.html>. Acesso em: 17 set. 2008. 206 A situação Penitenciária Brasileira. Trinolex, 29 mar. 2008. Disponível em: <http://www.trinolex.com.br/artigoInternaDetalhes.php?id_item=27422>. Acesso em: 18 out. 2008.
84
LEP, o art. 84, que diz que o preso provisório ficará separado do condenado, e o
art. 85, que disciplina que o estabelecimento penal deverá ter lotação compatível
com a sua estrutura e finalidade.208.
Entretanto, podemos destacar que aqui em nosso Estado
temos, pelo menos, uma penitenciária que serve de exemplo para muitas outras
dispersas por todas as regiões, que é o Complexo Penitenciário de São Pedro de
Alcântara, devido a sua estrutura, equipe, bem como a sua eficiência para a
aplicação da execução penal. Esse sistema prisional possui capacidade para
1200 presos, sendo que cada cela é composta por 3 presos. Foi demonstrado que
a assistência jurídica é elaborada no próprio local da administração, que conta,
atualmente, com dois estagiário para o controle dos benefícios, bem como
psicólogas, assistentes sociais, dois médicos, um enfermeiro e dois técnicos.
Salienta-se que lá há um rígido tratamento penitenciário consistente com apenas
duas horas de banho de sol ao dia, e a grande parcela dos presos é oportunizado
o trabalho durante o dia209.
3.4.2 Atividades de Ensino
A LEP prevê a obrigatoriedade do ensino de 1º grau
integrado ao ensino estatal para todos os presos, não descartando a possibilidade
de convênios com entidades públicas ou particulares, que estalem escolas ou
ofereçam cursos especializados210.
É sabido que além da falta de organização da educação em
presídios no País, há um impasse bastante conhecido de quem trabalha com a
educação prisional: a difícil relação entre a educação e a segurança. A educação
é vista pelos agentes prisionais como algo que fragiliza a segurança do presídio,
207 BALDO, Jéferson. Presídio de Balneário está muito acima da capacidade. Redel, 29 mar. 2008. Disponível em: <www.redel.com.br/print.php?acao=ler&id=1872>. Acesso em: 24 de set. 2008. 208 BALDO, Jéferson. Presídio de Balneário está muito acima da capacidade. Redel, 29 mar. 2008. Disponível em: <www.redel.com.br/print.php?acao=ler&id=1872>. Acesso em: 24 de set. 2008. 209 Conforme informações obtidas junto ao Diretor da Penitenciária Everton Medeiros, em visita ao Complexo Penitenciário de São Pedro de Alcântara em: 19 set. 2008. 210 MARCÃO, Renato. Crise na Execução Penal III – Da assistência jurídica e educacional. Direitonet, 22 abr. 2005. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/20/08/2008>. Acesso em: 18 out. 2008.
85
e, por outro lado, diz-se que o agente tem má vontade e que desmerece os
estudos dos presos, explica o técnico educacional do MEC, Carlos Teixeira.
Para o presidente do Conselho da Pastoral Carcerária,
Carlos Antônio Magalhães, a ausência de programas que trabalhem a reinserção
do preso na sociedade torna árdua a tarefa de reabilitar o interno, e favorece à
reincidência. Acrescenta que “cursos profissionalizantes, quando bem
direcionados, aplicáveis ao mercado de trabalho, são fundamentais para a
reabilitação”.
Outro fator já mencionado anteriormente, reside no fato do
ensino ser oferecido durante o dia, ou seja, no mesmo horário em que o preso
está exercendo suas atividades laborais, sendo esta última modalidade a mais
vantajosa para o recluso, já que, com a benesse, advém a remuneração e
remição da pena211.
Fortalecendo o entendimento de que a educação é tão
importante quanto o trabalho, e que o empecilho de que não há lei dando
incentivo ao preso em aplicar-lhe a remição na educação, o Superior Tribunal de
Justiça brilhantemente editou a súmula 341, disciplinado a possibilidade do ensino
fornecido pela instituição carcerária ser também uma forma de remição da pena.
A FREQUENCIA A CURSO DE ENSINO FORMAL É CAUSA DE
REMIÇÃO DE PARTE DO TEMPO DE EXECUÇÃO DE PENA EM
REGIME FECHADO OU SEMI-ABERTO [DJ-U de 13/8/2007].
No Recurso Especial 445.942/RS, Relator Min. Gilson Dipp,
julgado em 10/6/2003, publicado no DJ em 25/8/2003, p. 352,
ficou muito bem posta a fundamentação desta súmula: “A
interpretação extensiva ou analógica do vocábulo “trabalho”, para
abarcar também o estudo, longe de afrontar o caput do art. 126 da
Lei de Execução Penal, lhe deu, antes, correta aplicação,
considerando-se a necessidade de se ampliar, no presente caso,
o sentido ou alcance da lei, uma vez que a atividade estudantil,
tanto ou mais que a própria atividade laborativa, se adequa
perfeitamente à finalidade do instituto. III – Sendo um dos
211 O caminho do bem. Revista Educação, edição 118. Disponível em: <http://revistaeducacao.uol.com.br/textos.aps?codigo=12037>. Acesso em: 18 out. 2008.
86
objetivos da Lei, ao instituir a remição, incentivar o bom
comportamento do sentenciado e a sua readaptação ao convívio
social, a interpretação extensiva se impõe in casu, se
considerarmos que a educação formal é a mais eficaz forma de
integração do indivíduo à sociedade”.
No Estado de Santa Catarina, o complexo penitenciário de
São Pedro de Alcântara é deficiente apenas na área da educação, pois inexistem
projetos relacionados a área. O complexo possui cinco salas de aula com
capacidade para 40 detentos, porém por problemas considerados como de
segurança (como falta de grades, dificuldades de locomoção dos detentos dentro
do complexo) não estão sendo utilizadas212. Registra-se, ainda, que o complexo
implantou em setembro de 2008, uma biblioteca com livros de diversas categorias
derivadas de várias doações.
Quanto ao presídio de Itajaí, não temos biblioteca, tampouco
salas de aula para o aprendizado. Contudo, foi lançado pelo Conselho da
Comunidade da Comarca de Itajaí junto com a empresa Fisiomar, um curso
profissionalizante da massoterapia às presas, a qual foi realizada no período de
09 de agosto a 14 de setembro de 2008. Destacou a presidente do Conselho que
a intenção dessa instituição é buscar recursos para implementação dos próximos
módulos, cujo financiamento parcial poderá vir de outras empresas interessadas
na profissionalização dos presos213.
Portanto, embora não exista como se considerar nada
expresso em lei que faça o apenado ter sua pena diminuída, os nossos tribunais
vêm se posicionando pela admissibilidade do instituto para fins de redução de
pena, dando ao preso um incentivo ao estudo para que esse diploma a ser
alcançado, enquanto estiver segregado, possa ser de grande valia, quando
alcançada sua liberdade.
212 TRISOTTO, Sabrina. O Trabalho Prisional Como Instrumento De Reabilitação Social: Uma Perspectiva Crítica. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2005. 213 CONSELHO da Comunidade de Itajaí busca profissionalização das presas. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. 21 jul. 2006. Disponível em: <http://www.direito2.com.br/tjsc/2006/jul/21/c-comunidade-de-itajai-busca-profissionalizacao-das-presas>. Acesso em: 25 set. 2008.
87
3.4.3 Escassa Assistência ao Preso e à sua Família
O apenado quando privado de sua liberdade, fica sob aos
cuidados do Estado que tem por dever dar-lhe assistência, seja ela material,
jurídica, educacional, social, religiosa, ou à saúde.
A assistência ao preso condenado e internado é uma
exigência legal e elementar, quando se vê a pena como um processo construtivo
com o propósito de fazer com que seu destinatário possa sair do sistema
penitenciário um cidadão reeducado para o convívio social214.
Sobre o importante papel desempenhado pela família,
convém ressaltar que a ressocialização não se dá só com o preso. Não adianta
reabilitar uma pessoa, se a família não dá o suporte necessário. A pessoa que
vem de um meio sem a mínima condição, volta para o mesmo meio sem
nenhuma condição de trabalho, pois não aprendeu nada e agora ficou numa
condição ainda mais difícil, pois se tornou um ex-detento215.
Quanto à assistência material216, destaca-se que a gerência
operacional é responsável por toda a manutenção do Complexo Penitenciário de
São Pedro de Alcântara, pois é esse departamento quem faz as compras de
produtos permitidos, e que o estabelecimento prisional não oferece ao detento.
Esses produtos vêm disponíveis em uma tabela, como por exemplo, cigarros,
isqueiros, guloseimas entre outras217. Igualmente, é o procedimento no Presídio
de Tijucas/SC. No presídio de Itajaí, essa modalidade não está disponível,
porquanto o dinheiro adquirido pelo preso por força do trabalho, é destinado para
a família do mesmo.
214 BIZATTO, Francieli A. Correa. A pena privativa de liberdade e a ressocialização do apenado: uma reavaliação das políticas existentes no sistema prisional. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós Graduação em Direito. Universidade do Vale de Itajaí, 2005, p. 119. 215 REINCIDÊNCIA de presos é de 85% em SE. Jornal da Cidade. 25 mai. 2008. Disponível em: <http://2008.jornaldacidade.net/2008/noticia.php?id=4184>. Acesso em: 25 set. 2008. 216 Lei 7.210/84. Art. 13. O estabelecimento disporá de instalações e serviços que atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração. 217 TRISOTTO, Sabrina. O Trabalho Prisional Como Instrumento De Reabilitação Social: Uma Perspectiva Crítica. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2005, p. 37.
88
Tocante á assistência à saúde218, apresenta-se como um
dos grandes dramas nas penitenciárias, pois o estabelecimento fechado, com
excesso de lotação, possibilita freqüentes moléstias contagiosas e transtornos
mentais, agravando-se pelo fato da grande parte da população prisional ser
proveniente de classes pobres, e não terem sido adequadamente assistidos.
No mesmo prisma, é notório que as penitenciárias
normalmente não possuem tais serviços à saúde, quando muito, o disponibilizam
de forma precária. O Complexo Penitenciário de São Pedro de Alcântara possui
um médico, um enfermeiro e dois técnicos para aproximadamente 1200 presos. O
Presídio de Itajaí oferece tratamento médico, todavia, limitado; em caso de
urgência o detento poderá ser conduzido aos serviços da UNIVALI ou ao Hospital
Marieta Konder Bornhausen219.
No que tange ao direito à assistência jurídica, observa-se
que é garantido pelo artigo 5º LXXIV, da Constituição Federal a todos os
brasileiros e estrangeiros, que não possam pagar as custas processuais e os
honorários dos advogados, sem prejuízo para o sustento da sua família ou até de
si próprio. Portanto, em muitas hipóteses, o advogado do serviço de assistência
jurídica nos presídios pode contribuir para uma adequada execução da pena
privativa de liberdade, de modo a reparar erros judiciários, evitar prisões
desnecessárias, diminuir o número de internações e preservar a disciplina com o
atendimento dos anseios da população carcerária220.
Atualmente, o órgão responsável pela execução penal em
nossa cidade (Itajaí) é a 3ª Vara Criminal, sem descartar as atribuições do
representante do Ministério Público quanto à fiscalização da pena e eventuais
benefícios, podendo, inclusive, pleitear junto ao juízo competente. Eventualmente,
poderá, ainda, o apenado contratar ou solicitar a assistência jurídica de advogado
se assim entender conveniente. Na Penitenciária de São Pedro de Alcântara
218 Lei 7.210/84. Art. 14. A assistência à saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico. [...] §2º Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento. 219 Consoante visita aos dois estabelecimentos penais. 220 MIRABETE, Júlio Fabbrini,. Execução Penal, 2007, p. 73.
89
existe um departamento na área Administrativa privativa para a apuração desses
benefícios, controlando o tempo de pena que cada preso incumbe a cumprir.
O trabalho de assistência ao egresso221 é de suma
importância, pois, após a liberação do estabelecimento penal, o preso retornará
ao convívio social livre (art. 26, LEP). Desta forma, os efeitos da prisão e a
rejeição social praticamente inviabilizam o egresso de viver em sociedade,
contribuindo, decisivamente, para os alarmantes e notórios índices de
reincidência. Para evitar tais incongruências, estabelece-se a assistência ao
egresso de forma a viabilizar sua reinserção social, a obtenção de trabalho e até
de recursos materiais (art. 25 e 27, LEP)222.
Quanto às entrevistas realizadas, dentro do Complexo
Penitenciário de São Pedro de Alcântara, pondera-se que dificilmente os presos
são contratados pelas empresas que prestaram serviços, enquanto
segregados223:
A grande comprovação da falta de programas consistentes de
ressocialização de acompanhamento do egresso é que as
empresas presentes na penitenciária não têm interesse nenhum
em contratar seus ex-funcionários detentos quando estes saírem,
muito embora esta seja uma esperança destes, conforme
observado e já apontado em seus discursos. Ao perguntar ao
diretor se existe algum plano da empresa em contratar essa mão-
de-obra quando sair, ele é enfático em responder: “Não, não vai
contratar; não existe essa possibilidade, aqui dentro ele é uma
coisa, lá fora o que será esse cara?” (Diretor). Ao que acrescenta
o chefe de segurança: “As empresas querem a mão de obra com
o detento aqui dentro, lá fora não. Seria necessário que os presos
recebessem um diploma pelo que fizeram, pelo que aprenderam,
mas as empresas não querem criar vínculos, não querem que o
221 Considera-se egresso segundo a LEP, artigo26 o “liberado definitivo, pelo prazo de 1 ano a contar da saída do estabelecimento” (inc.I) é o liberado condicional, durante o período de prova (inc.II) . 222ADORNO, Rodrigo dos Santos. Uma análise crítica à Execução Penal. Jus Navegandi. Out. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/DOUTRINA/texto.asp?id=5115>. Acesso em: 20 out. 2008. 223 TRISOTTO, Sabrina. O Trabalho Prisional Como Instrumento De Reabilitação Social: Uma Perspectiva Crítica. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2005, p. 37.
90
cara saia e vá procurá-las com um diploma que ela deu” (Chefe de
segurança).
Dados de uma pesquisa sobre o egresso, demonstram que
ao perguntarem sobre quais foram os dois maiores problemas para encontrar
trabalho, ao saírem da prisão, 70% apontou o preconceito como o principal
problema para obterem emprego224.
Não subsiste atualmente em Santa Catarina nenhum tipo de
ação voltada para o egresso. Apesar de existir uma gerência na SSP,
denominada de gerência de apoio ao egresso, ela tem, na realidade, a função de
efetivação dos convênios entre as prisões e as empresas interessadas em utilizar
a mão-de-obra prisional, nada relacionado com assistência ao egresso. Assim,
informações sobre egressos são praticamente inexistentes e, dificilmente, alguém
sabe como está se desenvolvendo a vida de quem foi posto em liberdade225.
Tanto na penitenciária de São Pedro de Alcântara como em
todos os presídios da região, quando postos em liberdade, os presos são levados
até o Fórum e, em seguida, deixados no centro. Sendo assim, ao sair muitos
detentos não possuem, sequer, um documento de identidade e não são
oferecidos a eles, o menor tipo de auxílio.
Por isso que o egresso, logo “ex-presidiário” quando se livra
da prisão, sofre diversos tipos de humilhação, pois a população, que em sua
grande parte é preconceituosa, não lhe dá oportunidades para sua reinserção e
ao convívio comum.
3.4.4 Trabalho Prisional
Além de tratar da questão da assistência ao apenado e ao
egresso, é importante falar, também, da questão da profissionalização como
224 WAUTERS, Edna. A reinserção social pelo trabalho. Monografia (Especialista em Direito). Curso de Pós Graduação. Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2003, p. 37. Disponível em: <http://www.depen.pr.gov.br/arquivo/File/monografia_ednaw.pdf>. Acesso em 26 de out. 2008.
91
forma de ressocialização. Se para alguém que nunca teve problema com a justiça
está difícil conseguir um emprego com observância às leis trabalhistas, que dirá
para o egresso que, nesta condição, não conseguirá mais do que trabalhos
informais, como autônomo, fazendo trabalhos temporários e recebendo parca
remuneração226.
Exatamente esta é a pretensão do trabalho prisional, ou
seja, fazer com que o preso se profissionalize com as oportunidades que lhe são
cedidas dentro do ergástulo público e, conseqüentemente, diminua as chances de
voltar à criminalidade, quando sair da prisão.
No mesmo norte, o trabalho do preso é fundamental por uma
série de outros fatores: do ponto de vista disciplinar, evita os efeitos corruptores
do ócio e contribui para manter a ordem; do ponto de vista educativo, o trabalho
contribui para a formação da personalidade do indivíduo; do ponto de vista
econômico, permite ao preso dispor de algum dinheiro para suas necessidades e
para subvencionar sua família; do ponto de vista da ressocialização, um homem
com profissão tem mais chances de levar uma vida honrada227.
É cediço que o trabalho será remunerado mediante prévia
tabela, não podendo ser inferior a três quartos do salário mínimo (art. 29 da LEP),
que dispõe, ainda, que a remuneração poderá ser revertida à indenização dos
danos causados à vítima, para a assistência da família ou de pequenas despesas
pessoais.
É lamentável que a grande maioria das empresas, hoje em
dia, não utiliza a mão de obra presidiária, e nem querem pensar no assunto
225 TRISOTTO, Sabrina. O Trabalho Prisional Como Instrumento De Reabilitação Social: Uma Perspectiva Crítica. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2005. 226BIZATTO, Francieli A. Correa. A pena privativa de liberdade e a ressocialização do apenado: uma reavaliação das políticas existentes no sistema prisional. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós Graduação em Direito. Universidade do Vale de Itajaí, 2005, p. 120. 227 ALEXANDRE, Sérgio Luiz. Os direitos do preso na Execução Penal: o trabalho do preso como fator ressocializador. Monografia (Bacharel em Direito). Curso de Graduação em Direito da UNIVALI, Itajaí, 2006.
92
devido à desconfiança que as mesmas têm em relação às cadeias. As poucas
que apostam no trabalho dos reclusos costumam se beneficiar da situação.
Segundo os regramentos do Complexo Penitenciário de São
Pedro de Alcântara, convém anotar que:
Todos os presos que se encontram na penitenciária de São Pedro
recebem uma quantia fixa por mês denominada de “diária” – além
do salário recebido pelo trabalho nas oficinas e nas celas. O valor
da “diária” varia de acordo com a ocupação dos detentos. Os que
trabalham nas oficinas e também os que estão nas celas,
recebem R$30,00 por mês, já os que estão no pavilhão industrial
recebem R$60,00, pois não recebem pelo seu trabalho um “salário
extra”, como os que trabalham nas oficinas e nas celas. Tanto da
quantia recebida pelas diárias como pelo “salário extra” são
descontados 25% que são encaminhados ao fundo rotativo da
prisão Como não é permitido que os presos recebam dinheiro em
espécie, recebem em forma de pecúlio, que é o nome dado ao
salário recebido pelos mesmos, que se reverte na compra de
mercadorias, depósito em poupança, ou ainda pode ser destinado
à família. Convém ressaltar que todos os detentos recebem a
remissão de pena, prevista na LEP para os detentos que
trabalham, ou seja, em São Pedro considera-se que todos os
presos realizam alguma atividade.
Das cinco oficinas em funcionamento na penitenciária, todas
são frutos de convênios com empresas privadas, com exceção da oficina da
Fesporte (oficina de confecção de bolas) que faz parte de um projeto nacional
entre o Ministério do Esporte e a Secretaria de Justiça do Estado. As outras
oficinas são: uma de montagem de equipamentos telefônicos; uma de fabricação
de varões de cortinas e redes de descanso de madeira; e uma de montagem de
prendedores de roupa.
Quanto à destinação da remuneração dos presos dentro do
Complexo, o diretor afirma que metade do que o detento recebe fica guardado em
uma poupança como uma forma de “egresso”, já que a hora que sair do ergástulo
público, pode utilizá-lo para sua mantença, e a outra parte do dinheiro é para o
93
preso desfrutar dos bens que podem ser adquiridos, quando não disponíveis no
estabelecimento prisional228.
Segundo o diretor daquele estabelecimento, há trabalho
para presos em diversos ramos. Atualmente, contam com dez empresas
conveniadas com a penitenciária, e as atividades se subdividem nos ramos acima
citados, bem como trabalhos esporádicos de marceneiros, pinturas, conserto de
carros. É preciso destacar que, recentemente, os detentos dessa penitenciária
começaram a fabricar seus próprios uniformes, e que apenados catarinenses dos
Presídios de Rio do Sul e Presídio Regional de Joinville estão fabricando cadeiras
de rodas, aproveitando sucata de bicicletas doadas pelas comunidades locais. Os
internos selecionados nesses presídios para o trabalho, são beneficiados pelo
Projeto Liberdade Sobre Rodas, uma parceria entre a Secretaria da Justiça e a
Cidadania de Santa Catarina e Departamento Penitenciário Nacional do Ministério
da Justiça229.
Com o sucesso do projeto, ele acabou de chegar ao Presídio
Regional de Itajaí, onde oito presos estão direcionados para este trabalho com o
auxílio do instituto IEPES230. Esse Presídio também fornece em média 30 redes
por mês à empresa Redesport, fruto do trabalho do preso que ganha a quantia de
R$ 17 (dezessete reais), além de ganhar um dia de desconto da pena por três de
trabalho231.
Segundo a LEP, todos os presos condenados no Brasil
deveriam ter oportunidades de trabalho, educação e treinamento profissional.
Apesar disto estar claramente estabelecido pela lei, apenas a menor parte dos
presos brasileiros têm a oportunidade de trabalhar, conforme já expresso em
dados estatísticos. Além de prejudicar claramente o objetivo proposto pela lei de
reintegração do condenado, onde o trabalho juntamente com a educação são
considerados fatores decisivos, os presos que trabalham têm o benefício legal da
228 Conforme informações obtidas junto ao Diretor da Penitenciária Everton Medeiros, em visita ao Complexo Penitenciário de São Pedro de Alcântara em: 19 set. 2008. 229 DETENTOS de Santa Catarina fabricam cadeiras de rodas. Avança Brasil. Disponível em: <http://www.abrasil.gov.br/noticia.asp?id=249>. Acesso em: 18 out. 2008. 230 IEPES – Instituto de Estudos e Pesquisas Sobre a Violência e Criminalidade.
94
redução de suas penas. Conclui-se, assim, que a escassez de trabalho, as
deficiências da assistência jurídica, de ensino e com o aumento da taxa de
reincidência, são fatores contributivos para a superlotação, porque retardam a
saída dos presos do sistema prisional232.
231 PRESIDIÁRIOS revelam como viraram fregueses do cadeião. Diarinho. Polícia. Disponível em: <www.diarinho.com.br/exclusivo/2008/1709/policia.html>. Acesso em: 17 set. 2008. 232 TRISOTTO, Sabrina. O Trabalho Prisional Como Instrumento De Reabilitação Social: Uma Perspectiva Crítica. Dissertação (Mestrado em Direito). Curso de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2005, p. 15.
95
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao término da pesquisa proposta, restou confirmado que a
pena de caráter meramente punitivo passou a ser utilizada nos dias atuais,
porquanto é notório o descaso político para os investimentos públicos a fim de
efetivar as construções de novos estabelecimentos penais, hipótese que
diminuiria o caos da superlotação.
A procura das respostas para as hipóteses mencionadas na
introdução da presente monografia, foram de grande importância para que se
viabilizassem os objetivos a que se pretendia chegar com este estudo, que foi
subdividido em três capítulos.
No primeiro capítulo, podemos perceber que antigamente a
pena era aplicada sem parâmetros, pois a vítima era quem satisfazia o seu direito,
incumbindo-lhe sancionar o detento da forma que quisesse. Observou-se que
com a evolução da política criminal, tal poder foi centralizado, surgindo o Estado
como o responsável pela aplicação de tais medidas. Na seqüência, o estudo de
alguns filósofos mistificou a humanização da pena, sob o enfoque de que era
melhor prevenir do que remediar, ou seja, melhor ressocializar o preso do que
aplicar-lhe sanções cruéis que fizessem criar um espírito de revolta e retornar à
delinqüência.
Desse modo, foram ofertadas diversas propostas acerca da
individualização da pena, como a separação dos condenados, a adoção da teoria
mista da pena pelo Brasil, a edição de leis penais que adentrassem nos objetivos
da sanção penal (educar e punir). Contudo, ao mesmo tempo em que as leis se
aprimoravam, as deficiências do sistema penitenciário começaram a aparecer,
como a superlotação, a falta de investimentos e incentivos para o trabalho e
estudo nas prisões, e outras.
Na mesma esteira, o segundo capítulo adentrou nas
previsões legais de todo o ordenamento jurídico no que tange à pena, que fora
96
construído pelos costumes da população brasileira, especialmente pelo
surgimento dos princípios constitucionais e norteadores da execução penal, a fim
de que a sanção não fosse executada de forma injusta, garantindo ao condenado
os seus direitos e dignidade enquanto pessoa. Gizou-se também a forma
progressiva da execução penal, destacando individualmente, os tipos de
assistências e direitos do segregado, bem como os estabelecimentos em que
cada qual cumprirá sua pena.
Já no terceiro capítulo, a autora pretendeu demonstrar a
realidade prisional, a qual está bem distante do que dispõe a Lei de Execuções
Penais. Foram apresentados os problemas através de dados estatísticos, que
levam à conclusão de que a demanda da população carcerária está infinitamente
superior ao número de vagas que é disponibilizado pelo Estado. Explanaram-se,
ainda, algumas deficiências estruturais dos estabelecimentos penais, que em
muito dificultam o processo de ressocialização do preso.
Por isso, após término do presente trabalho de conclusão de
curso, é possível concluir que os presos sofrem tratamento desumano,
constituindo uma verdadeira afronta aos preceitos normativos, pois quando
levados ao cárcere, são esquecidos pelo Estado e pela sociedade. Nada se faz
para recuperar seus valores, tampouco sua dignidade humana. Assim, quando
são postos em liberdade, aqueles indivíduos voltarão ao convívio social e os seus
comportamentos serão o reflexo do tratamento a que foram submetidos sob o
patrocínio do Estado e pela indiferença da sociedade.
Além disso, cabe salientar que o objetivo e os problemas
sobre as deficiências aqui abordadas, nos trouxeram à baila que houve o retorno
da crueldade da pena, aquela que era aplicada na Idade Média. Observa-se que,
os condenados nos dias atuais também estão expostos às situações humilhantes
quando do cumprimento da reprimenda, em face da promiscuidade das celas e do
escasso auxílio para a ressocialização que lhes são ofertados.
Uma das soluções para o problema, provavelmente, seria a
contribuição da comunidade, fazendo com que o ex-presidiário seja reinserido na
sociedade, consubstanciado com o apoio familiar e dos responsáveis pela
97
possibilidade de melhoria neste setor público, que se encontra tão desamparado e
despreparado para o cumprimento da sua tarefa, aquela de ressocializar o preso
para que então não volte mais ao cárcere.
Por outro lado, considerando a complexidade da temática
aqui abordada, é necessário que outros pesquisadores, estudantes, autoridades
das diversas esferas da nossa sociedade procurem, de forma humanitária, refletir,
questionar e propor mudanças para a questão da ressocialização do preso. Dessa
forma, cada um poderá estar contribuindo para uma sociedade mais justa, mais
solidária e mais feliz e, por conseguinte, dizer para si mesmo: Não vou resolver o
problema em sua totalidade, mas estou fazendo a minha parte!
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104
ANEXOS
FOTOS DO COMPLEXTO PENITENICÁRIO DE SÃO PEDRO DE ALCÂNTARA
Corredor Vista das celas Vista das celas e pátio Escada de acesso ao pátio
105
PRESÍDIO REGIONAL DE ITAJAÍ
Entrada da Galeria Feminina Entrada para celas
Celas
Dentro do pátio das celas
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Vista das Celas Celas
Presos Produzindo Redes Esportivas
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CELAS DO PRESÍDIO DE ITAJAÍ
108
Foto do Princípio de Rebelião no Presídio de Itajaí em 15-10-2008
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ALGUNS PRESÍDIOS CATARINENSES
Presídio de Balneário
Camboriú (vista de cima do pátio)
Presídio de Joinville (vista de cima do pátio)