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GRADAÇÃO DE AFETIVIDADE NOS FORMATIVOS -INHO (A) E -ZINHO (A) A PARTIR DO ESTUDO DE GRAMATICALIZAÇÃO
Carla Maria de Oliveira∗
RESUMO: Este artigo trata dos sufixos derivacionais do grau diminutivo -inho(a) e -
zinho(a) e de suas diferentes acepções, a partir de pressupostos teóricos de enfoque da
teoria da gramaticalização. A gramaticalização se estabelece no momento em que uma
unidade linguística começa a adquirir propriedades de formas gramaticais ou se já
possui este estatuto gramatical, tem sua gramaticalidade ampliada. O sufixo -zinho(a),
da forma como é usado na oração, pode indicar pejoratividade e o -inho(a), afetividade.
PALAVRAS-CHAVE: sufixos diminutivos -inho(a) e -zinho(a), acepções e
gramaticalização
ABSTRACT: This article deals with the derivational suffix -inho diminutive (a) and -
zinho (a) and its different meanings, from the theoretical focus of the theory of
grammaticalization and different concepts. The grammaticalization is established at the
time a language unit begins to acquire properties of grammatical forms or if you already
have this status grammar, has expanded its grammaticality. The suffix -zinho (a) the
way it is used in prayer and may indicate pejoratividade -inho (a), affection.
KEYWORDS: diminutive suffix -inho (a) and -zinho (a), meanings and
grammaticalization
∗ Mestranda em Língua Portuguesa pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo realiza um estudo sobre os sufixos derivacionais do grau
diminutivo -inho(a) e -zinho(a), e o uso destes, por falantes do português brasileiro,
além de verificar as gradações de afetividade dos formativos, a partir da teoria da
Gramaticalização. Com base em Gonçalves...[et al.] (2007), serão expostos conceitos
sobre Gramaticalização, bem como será analisada a gradação dos sufixos em -inho(a) e
-zinho(a).
O estudo tem o propósito de analisar se há diferença de significados quanto ao uso
dos formativos -inho (a) e -zinho(a); explicar como se manifesta o princípio da Não-
Sinonímia nesses formativos; relacionar os tipos de carga emocional que os sufixos -
inho(a) e -zinho(a) podem veicular; elucidar o uso destes formativos sob o enfoque
funcionalista.
Esta pesquisa é relevante na medida em que provoca questionamentos: a escolha
pelo uso de -inho(a) ou -zinho(a) envolve apenas uma adaptação fonológica, como é
explicado nos compêndios gramaticais? Eles possuem somente acepção de tamanho e
afetividade?
O artigo apresenta-se estruturado da seguinte forma: na seção 2, será feita uma
exposição sobre o diminutivo, explicação sobre a flexão e derivação e como são
apresentados por alguns autores. A mesma seção trata ainda do uso de -inho(a) e
zinho(a) pelos autores, bem como as diferentes acepções destes formativos. Na seção 3,
serão apresentados os pressupostos teóricos, em que serão trabalhadas as ideias de
Goldberg (1995) para explicar a Gramática das Construções e o Princípio da Não
Sinonímia. Ainda na seção 3, baseado em Gonçalves... [et al.] (2007), serão expostos
conceitos de gramaticalização. Na seção 4, será feita a apresentação de um continuum
de gradação de afetividade, dos usos dos formativos -inho(a) e -zinho(a), apresentação
dos questionários aplicados. Em seguida, será exposto através dos gráficos, o resultado
do questionário feito com estudantes de idade de 14 a 30 anos, com nível de
escolaridade, médio e superior. Por fim, serão apresentadas as principais conclusões do
estudo.
2. DIMINUTIVOS
2.1. FLEXÃO X DERIVAÇÃO
As gramáticas, de maneira geral, ainda não fizeram uma distinção necessária entre
a flexão e derivação, com características gerais de cada processo. De maneira
tradicional, as gramáticas tratam destes temas relacionados à estrutura de palavras e
estabelecem distinção entre desinência, como elemento indicador de flexão e afixo
(prefixo e sufixo), como elemento de derivação. No artigo em questão, será tratado o
sufixo do grau diminutivo como derivação, na forma como é visto pela maioria dos
autores.
Segundo Basílio (2004: 67) “o fato de a Nomenclatura Gramatical Brasileira
considerar o grau como flexão é devido à influência da gramática clássica, mas apesar
disso, a maior parte dos gramáticos de hoje tende a considerar o grau como derivação”.
Até a década de 1970, as gramáticas normativas classificavam como flexionais
tais formativos, mas, a partir dos anos 1980, algumas reviram a postura, deixando de
descrever o grau em seções destinadas às flexões do nome. As gramáticas escolares
voltadas para o ensino médio, mesmo as consideradas mais inovadoras, ainda
consideram o grau como uma das flexões dos nomes.
Para Gonçalves (2005: 1), “os livros didáticos, salvo poucas exceções, ainda
arriscam no nivelamento das categorias gênero, número e grau, considerando-as
equivalentes em termos de status morfológico”.
Almeida (1983: 125-126) apresenta as formas diminutivas e aumentativas como
as duas possibilidades de flexão de grau para os substantivos. Em contrapartida, autores
como Basílio (2004: 67), Câmara (2004: 83), Cunha & Cintra (2001: 88), Rocha (2003:
225) e Rosa (1982: 17), entre outros, consideram que se trata de derivação e não de
flexão.
Mattoso (1984: 81) esclarece com base no gramático Varrão, ao abordar sobre
derivatio voluntária (que cria novas palavras), que, “o diminutivo é um processo de
derivação, não de flexão, porque não ocorre de forma obrigatória e sistemática, mas sim
de maneira voluntária, em que a opção do uso será determinada por quem fala”.
2.2. VARIADAS ACEPÇÕES DE -INHO(A) E -ZINHO(A)
Muitos autores trabalham com análises dos sufixos diminutivos, sob perspectivas
diversificadas. Como analisa Gonçalves (2006: 9), o significado do formativo -inho(a) é
determinado pelo contexto sóciointeracional, sendo que esse sufixo conduz a uma carga
emocional variada, emprestando à mensagem maior força comunicativa: pode expressar
dimensão, apreço, desapreço e afeto. O sufixo -inho(a) admite usos bastantes variados e
só pelo contexto, é que poderá ser analisado seu significado, de acordo com a real
intenção do falante.
Simões (2005: 21) observa que os diminutivos -inho(a) e -zinho(a) mantêm a
categoria sintática da forma, tanto que, ao associá-los a um nome, a um adjetivo, ou a
um advérbio, a categoria é preservada, embora um valor semântico se manifeste na
palavra, seja de dimensão, pejoratividade e intensidade, como em fita – fitinha (nome),
bonito – bonitinho (adjetivo), cedo – cedinho (advérbio).
Nas gramáticas, de modo geral, os autores fazem menção aos sufixos -inho (a) e -
zinho (a), como formativos que indicam dimensão pequena. Celso Cunha (1979: 109-
110) apresenta uma lista dos principais sufixos diminutivos empregados em português,
além de explicar a origem dos sufixos -inho e -ino, provenientes do latim -inus. O autor
comenta sobre a dificuldade pela escolha do uso de -inho(a) e -zinho(a) e acrescenta
que, às vezes, a seleção se dá pelo ritmo da frase.
Para Ezarani (1989, p.52) “particularmente o substantivo assume função
diminutiva em sininhos, função positiva (o que agrada) em fazendinha e função
pejorativa em simpatiquinho”.
Além da divisão básica entre a diminuição do tamanho e a diminuição avaliativa.
Basílio chama atenção para a distinção entre a “função denotativa” e a “função
expressiva” do diminutivo.
A função denotativa (denominadora) do diminutivo pode ser observada nos seguintes exemplos: cafezinho, tesourinha, salgadinho, colherinha. Por outro lado, cita formações, nas quais a diminuição das dimensões do referente pode ser acompanhada de vários graus de expressividade, por exemplo: livrinho, pedacinho, vidrinho, moedinha. Essa função expressiva do diminutivo fica ainda mais evidente nos seguintes exemplos, nos quais a diminuição das dimensões deixa inteiramente de ser relevante: Será que você pode me dar uma mãozinha aqui? e É só preciso que você me dê um empurrãozinho. Pode ter ainda função de caráter discursivo, sendo de um lado, usado como um elemento de atenuação como em: Preciso de sua atenção. Pode me dar um momentinho só? Por outro lado, pode expressar afetividade como em: Eu fiz um franguinho especial para você? (BASÍLIO, 2004: 70).
A autora explica que o sufixo -inho(a), principal elemento formador do
diminutivo, alterna com o -zinho(a), este, sendo usado quando a base termina em
consoante, ditongo ou vogal acentuada como em paizinho, mãezinha, florzinha,
lençolzinho, tatuzinho. Além disso, -inho(a) e -zinho(a) parecem ser complementares, já
que -zinho (a) é utilizado em ambientes fonológicos em que -inho não é usado. Porém,
não se trata de uma restrição absoluta, pois no caso de ditongação há variações
regionais, como em painho e mainha; algumas terminadas em [r] ocorrem em -inho (a),
como colherinha, florinha e formações em -zinho (a) podem alternar com formações em
-inho (a), como em brinquedinho/brinquedozinho, Glorinha/Gloriazinha, etc.
Além disso, Basílio (2004: 72) considera “a característica ‘mais desconcertante’
do -zinho o fato de a sua adição não impedir a flexão de gênero e número na palavra
base”.
De fato, observa-se que com o sufixo -zinho o radical preserva a sua
independência apresentando flexão de gênero e número o que não acontece com -inho,
por exemplo: bonzinho – boazinha, coraçãozinho – coraçõezinhos. Essa posição
contraria a noção geral segundo a qual não existe flexão interna à derivação, e é este um
dos motivos para a polêmica questão de que -zinho deve ser considerado como um
sufixo independente, que é a posição adotada por Villalva (2000: 323), ou como uma
variante alomórfica de -inho, defendida por Câmara (1973: 44) e Cunha & Cintra (2001:
91).
Bechara (1999: 140) aborda a dimensão significativa do uso dos diminutivos de
acordo com “o caráter intencional do falante, fora da ideia de tamanho, as formas
diminutivas podem traduzir nosso desprezo, a nossa crítica, sentido pejorativo e a idéia
de pequenez associa-se à de carinho”.
Portanto, devido à complexidade da interpretação semântica das palavras em que
aparecem os sufixos -inho(a) e -zinho(a), por atribuírem valor de dimensão, de
intensidade, de afetividade, de pejoratividade, deve-se admitir que esses valores são
indicados pelo juízo de valor, expresso pelo locutor referente ao conteúdo semântico da
forma base.
Há também formas na língua que se cristalizaram pelo uso e são meramente
formais, não encerrando ideia de diminuição, tais como: folhinha, bondinho, escolinha.
Neste artigo serão trabalhadas as acepções de afetividade e pejoratividade dos sufixos
mencionados.
3. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
3.1. A GRAMÁTICA DAS CONSTRUÇÕES
O trabalho que mais contribuiu para a formulação de um modelo de análise da
Gramática das Construções foi o de Goldberg (1995), tendo como objeto de estudo,
construções envolvendo verbos e sua estrutura argumental. A autora estabeleceu outro
princípio: que os valores semânticos de uma sentença podem estar relacionados com
padrões sintáticos específicos. Dessa forma, a partir da Gramática das Construções, a
relação entre forma (tanto no sentido lexical quanto sintático) e significado é mais
integrada do que se acredita.
Para Nascimento (2006: 24), “a língua é um grande continuum, sem fronteiras
precisas entre morfologia, sintaxe, semântica e pragmática, sendo que a principal função
da linguagem é expressar significados”. A gramática em si é simbólica e significativa. O
autor explica a contribuição para a Gramática das Construções.
As construções formam uma rede e são ligadas entre si por relações de herança, como uma construção procedendo de outra, com características específicas, sendo que essas relações são regidas por alguns princípios: da Motivação Maximizada, do Poder Expressivo Maximizado, da Economia Maximizada e da Não-Sinonímia, princípio da Não Sinonímia, se duas construções são sintaticamente distintas (leia-se, aqui, o “sintaticamente” por “formalmente”), devem ser semântica ou pragmaticamente distintas. Corolário A – se duas construções são sintaticamente distintas e semanticamente sinônimas, então elas têm de ser pragmaticamente distintas. Corolário B – se duas construções são sintaticamente distintas e pragmaticamente sinônimas, então elas têm de ser semanticamente distintas (GOLDBERG, 1995 apud NASCIMENTO, 2006: 40).
Partindo para uma análise de acordo com o princípio da Não-Sinonímia,
Colorários A e B, as duas construções abaixo, em cada exemplo, são formalmente
distintas e, por isso mesmo, acredita-se, devem ser semanticamente distintas
(apresentam sentidos diferentes) e pragmaticamente sinônimas ou vice-versa:
semanticamente idênticas e pragmaticamente diferentes.
A menininha é um amor de pessoa.
Aquela meninazinha além de ser teimosa, é insuportável.
Nos exemplos, as formas menininha e meninazinha são diferentes, porém são
semanticamente distintas e pragmaticamente sinônimas.
3.2. GRAMATICALIZAÇÃO E DIFERENTES CONCEPÇÕES
Nos anos 70, o funcionalismo foi conceituado por vários autores como o estudo
do uso da língua que buscava explicar as proporcionalidades observadas nesse uso, a
partir da constatação das condições discursivas em que o mesmo se verificava e o termo
função, definia-se, como a tarefa, o papel.
Para os funcionalistas, os universais linguísticos ocorrem da universalidade de
usos, bem como sua aquisição acontece das necessidades comunicativas e de suas
habilidades.
Givon (1979 apud NOBRE, 2008) considera que no funcionalismo tudo começa
sem regularidade e depois se converte em norma.
Tudo nasce no discurso e morre na morfofonologia. Tudo começa sem regularidade alguma de uso, exatamente por estar no seu começo, mas se regulariza com o uso, na repetição, que passa a exercer uma pressão tal que faz com que o que no começo era casuístico se fixe e se converta em norma. O resultado das pressões de uso, bem como a transformação progressiva da formulação “nova” numa formulação que passa a ser sentida como “normal”, no sentido de comum, é inconsciente para os usuários da língua.
Pode-se trazer esta definição para o uso dos sufixos -inho(a) e -zinho(a), pois o
que até o momento não tinha muita regularidade de uso, logo passou a ser usado em
variados contextos comunicativos pelos falantes. Na verdade, estes formativos nas
gramáticas, somente eram considerados com acepções de dimensão e carinho,
atualmente, alguns autores já passaram a considerar outros sentidos para tais sufixos. Já
o -zinho(a) passou a ser mais utilizado e não somente para quando a base termina em
vogal, consoante ou vogal acentuada.
Para trabalhar com esses sufixos, sob o âmbito da gramaticalização, que é um
enfoque funcional, foi necessária uma breve introdução ao funcionalismo. Portanto, a
gramaticalização é definida como um processo em que a estrutura gramatical é
modificada por pressões de similaridade estreita entre os contextos comunicativos em
que é utilizada.
Como explicam Gonçalves et al (2007: 15), a constante renovação do sistema
linguístico devido ao surgimento de novas funções para formas já existentes e de novas
formas para funções já existentes traz à tona a noção de “gramática emergente”. O
autor, pautando-se em Hopper (1987), entende a gramática das línguas como constituída
de partes, cujo estatuto vai sendo negociado na fala, não podendo, em princípio, ser
separado das estratégias de construção do discurso. Com base no que foi exposto, pode-
se verificar que não há gramática como produto acabado, mas em constante
gramaticalização.
Esta teoria pode ser associada, também, aos sufixos -inho(a) e -zinho(a), pois
pode-se dizer que para os sufixos -inho(a) e zinho(a) existam novas funções para formas
já existentes. Embora estes formativos já existam, alguns autores reviram sua postura e
passaram a atribuir a estes sufixos, outras acepções, como de intensidade,
pejoratividade, afetividade, além daquela de tamanho, que adotavam anteriormente.
Desta maneira, o que se pode constatar em algumas gramáticas, é que há uma
nova função para eles, além do uso do sufixo -zinho(a) ter se tornado mais recorrente
entre os falantes, adquirindo outras funções. A opção por um ou outro sufixo vai sendo
negociada na fala de acordo com a necessidade do falante, quando quiser dar a sua
construção um tom pejorativo, apreciativo, de tamanho, etc.
Para alguns autores a gramaticalização pode ser paradigma, se o estudo da língua
focalizar a maneira como formas gramaticais surgem e como são utilizadas; ou
processo, se atentar na identificação e análise de itens que se tornam mais gramaticais.
Pode ser, ainda, observada de duas perspectivas: diacrônica, se o estudo estiver voltado
para como as formas gramaticais surgem e se desenvolvem na língua, ou sincrônica, se
estiver voltada para a identificação de graus de gramaticalidade que uma forma
linguística desenvolve a partir de deslizamentos funcionais a ela conferidos pelo uso da
língua, portanto sob um direcionamento discursivo-pragmático.
A gramaticalização se estabelece no momento em que uma unidade linguística
começa a adquirir propriedades de formas gramaticais ou se já possui este estatuto
gramatical, tem sua gramaticalidade ampliada.
Em relação à proposta do estudo pode-se dizer, por exemplo, que os sufixos -
inho(a) e -zinho(a) estão em processo de gramaticalização, pois apesar do sufixo -inho
ser uma forma gramaticalizada, passou a ter variadas acepções, o que tornou sua
gramaticalidade ampliada. Acrescenta-se ao sufixo -inho(a), o formativo -zinho(a) que
está adquirindo propriedades gramaticais, pois está fazendo parte dos usos em contextos
comunicativos em que não era utilizado, de acordo com o propósito do falante.
Portanto, o sufixo -zinho(a) que era usado somente quando a base terminava em
consoante, ditongo ou vogal acentuada como em paizinho, florzinha, tatuzinho, como
explica Basílio (2004), passou a ser usado em outros contextos dependendo da intenção
do falante, por exemplo ao optar por menininha ou meninazinha.
Segundo Gonçalves et al. (2007: 17), com o objetivo de tornar a exposição
didática, “é suficiente, por ora, entender a gramaticalização como as alterações de
propriedades sintáticas, semânticas e discursivo-pragmáticas de uma unidade linguística
que promovem a alteração em seu estatuto categorial”.
No que diz respeito ao processo de mudança, alguns autores pesquisam a
gramaticalização, tendo como ponto de partida o discurso até chegar à morfossintaxe.
Givon (1979), por exemplo, defende a existência de um processo cíclico: discurso >
sintaxe > morfologia > morfofonêmica > zero.
Em relação aos estágios de mudança, a redução fonológica costuma vir a eles
associada. O que acontece é que uma forma fonte perde traços semânticos na direção de
um conceito mais abstrato, como o das relações gramaticais, porque perde material
fonológico.
Sobre a redução fonológica argumenta-se que:
A repetição de uma forma desempenha um papel importante nas seguintes mudanças, que ocorrem durante o processo: a perda da transparência semântica que acompanha a separação entre os componentes da construção gramaticalizada e seus congêneres lexicais permite o uso da forma em novos contextos com novas associações pragmáticas, levando à mudança semântica; a autonomia da forma de uso frequente torna-a mais enraizada na língua. (BYBEE 2003 apud GONÇALVES et al. 2007: 35).
Aplicando esta teoria ao uso dos sufixos -inho(a) e zinho(a), verifica-se que o
sufixo -inho(a) está sendo usado com novas acepções, em novos contextos, com novas
associações pragmáticas, levando à mudança de sentido. Já em relação ao sufixo -
zinho(a), o seu uso mais frequente fez com se tornasse mais enraizado na língua, a fusão
da consoante z ligada ao -inho, fez com que o falante expressasse por exemplo, uma
acepção pejorativa no contexto comunicativo e não somente para fazer uma ligação com
a base, quando esta terminava em consoante, ditongo ou vogal acentuada.
4. ANÁLISE DOS DADOS
4.1 CONTINUUM DE AFETIVIDADE
Graus de afetividade + INHO (a) ZINHO (a) – |-------------------------------------|------------------------- -----|----------------------------------| Afetividade Neutro Afetividade (Mais afetivo e Diminutivo (Menos afetivo e menos pejorativo) Sem diminutivo mais pejorativo) MENININHA BONDINHO MENINAZINHA
O continuum acima está representado em graus de afetividade, em que os sufixos
-inho(a) e -zinho(a) têm acepções de afetividade tanto positiva quanto negativa. No
centro do continuum, encontra-se o uso de palavras que, embora estejam com o sufixo
diminutivo, não possuem tal valor, pois já se cristalizaram com o uso, por exemplo,
escolinha, folhinha.
Após a realização do questionário com estudantes de 14 a 30 anos, com níveis de
escolaridade médio e superior, verificou-se que o uso do sufixo -inho(a) está associado à
acepção mais afetiva e menos pejorativa, ao passo que o -zinho(a) está ligado ao sentido
de menor afetividade e maior pejoratividade.
4.2 QUESTIONÁRIOS APLICADOS
Informante – Nome: Sexo: Idade: Grau de escolaridade:
A) Complete a sentença com uma das palavras entre parênteses:
1) Esta --------------------------- é insuportável. (menininha, meninazinha, outras variações____________).
2) Reservei um ---------------------- para atender ao aluno atencioso.
(momentinho, momentozinho, outras variações______________).
3) A prova estava ---------------------- que tirei uma nota baixa. (muito difícil, dificílima, difiçona, outras variações____________).
4) Ele é um -------------------------- que pouco me ajuda financeiramente.
(maridinho, maridozinho, outras variações_______________).
5) A ----------------------------- de Pedro gosta muito de ajudar ao próximo. (cunhadinha, cunhadazinha, outras variações_______________).
6) Aquela ------------------------- é um amor de pessoa. (menininha, meninazinha,
meninona, outras variações____________).
7) A sala tornou-se um -------------------------- aconchegante. (espacinho, espaçozinho, outras variações___________).
8) A filha de João é ---------------------------, parece uma jogadora de basquete.
(altíssima, muito alta, altona, outras variações).
9) O meu vizinho tem um(a) --------------------------, dois cômodos. (casinha, casebre, casa pequena, outras variações______________).
10) A minha ---------------------- gosta de fazer intrigas. (cunhadazinha,
cunhadinha, outras variações____________________).
11) Sempre reservo um -------------------- (para os alunos desinteressados). (momentinho, momentozinho, outras variações______________).
12) O meu -------------------------------- preocupa-se muito comigo. (maridinho,
maridozinho, outras variações_______________).
13) O depósito de bebidas, além de garrafas tem um -------------------- cheio de ratos. (espacinho, espaçozinho, outras variações___________).
14) Mas o meu ------------------------ só me traz problemas, além de ser mentiroso.
(namoradinho, namoradozinho, outras variações_____________).
15) Ela contou-me uma ------------------------- para descontrair. (mentirinha, mentirazinha, outras variações____________).
16) Naquela rua -------------------------- ocorreu um acidente de carro gravíssimo.
(estreitinha, estreitazinha, outras variações_____________).
17) A ----------------------------- que a professora deu contribuiu para que os alunos fizessem uma boa prova. (ajudinha, ajudazinha, outras variações____________).
18) Lauro falou uma ------------------ que denegriu a imagem de Joana.
(mentirinha, mentirazinha, outras variações_____________).
19) Parece que a ------------------------- do prefeito em nada contribuiu para a melhoria da saúde no município. (ajudinha, ajudazinha, outras variações_______________).
20) A estrada é tão ---------------------, que só passa um carro por vez. (estreitinha,
estreitazinha, outras variações______________).
21) O --------------------------- da minha filha é um amor de pessoa. (namoradinho, namoradozinho, outras variações_____________).
B) Marque a frequência de uso das palavras de acordo com a legenda abaixo:
(P) Pouca frequência (M) Muita frequência (N) Não usa
( ) caminha ( ) baixinha ( ) canetinha ( ) historiazinha ( ) desconfiadinha ( ) bainho ( ) camazinha ( ) bonitinho ( ) alegrinha ( ) camazinha ( ) beijinho ( ) homenzinho ( )filhinho ( ) escolinha ( ) telhadozinho ( ) simpaticozinho ( ) magrozinho ( ) paizinho ( ) mãezinha ( ) bonitozinho ( ) alegrezinha ( ) mainha ( ) espertinha ( ) Mariinha ( ) professorazinha ( ) magrinho ( ) queridazinha ( ) Mariazinha ( ) simpatiquinho ( ) magrinho ( ) folhinha ( ) espertazinha ( ) brinquedinho ( ) vidrinho ( )desconfiadazinha ( ) banhozinho ( ) espertíssima ( ) rapidinho ( ) marmitinha grandinho ( ) apartamentozinho( ) agorinha ( ) pimentinha ( ) apartamentinho ( ) argumentinho ) ( ) rapidinho ( ) criancinha ( ) professorinha ( ) alegrinha ( ) grandinho ( ) queridinha ( ) cestinha ( ) comidinha ( ) aulinha ( ) comidazinha ( ) aulazinha ( ) feinho ( ) aumentozinho ( ) devagarinho ( ) feiozinho ( ) pequenininha ( ) devagarzinho ( ) pequeninazinha ( ) folhinha ( ) santozinho ( ) escolazinha ( )argumentozinho ( ) aumentinho ( ) painho ( ) santinho banhozinho ( ) historinha ( ) bondinho ( ) canetazinha ( ) pimentazinha
4.3 ANÁLISE DOS TESTES – GRÁFICOS
O objetivo é verificar o comportamento dos diminutivos dos questionários
aplicados, a fim de se visualizar as acepções dos sufixos -inho(a) e -zinho(a) recolhidos
a partir do teste, feito com 40 informantes, 20 homens e 20 mulheres, com idade de 14 a
30 anos. Sendo participantes que têm o grau de escolaridade diferenciado: 10 homens e
10 mulheres que possuem nível superior e 10 homens e 10 mulheres com nível médio.
O questionário foi distribuído aleatoriamente para os estudantes e foi solicitado que
respondessem as questões.
Os valores no eixo y do gráfico equivalem à porcentagem.
0
10
20
30
40
50
Homem - nívelsuperior
Homem - nívelmédio
Mulher - nívelsuperior
Mulher - nívelmédio
-inho (a) e -zinho (a)1. Afetividade
No gráfico um, constata-se que o uso do -inho(a) e -zinho(a) é mais elevado entre
as mulheres do nível superior e médio, que receberam respectivamente 29% e 48%. Em
menor proporção, os homens com nível superior, com 10 % e de nível médio, com 13%.
Como não houve ocorrência para o sufixo -zinho (a) afetivo, o gráfico de
afetividade dos formativos -inho (a) e zinho (a), será igual ao do sufixo -inho
afetividade.
O gráfico dois, apresenta a pejoratividade dos sufixos -inho(a) e -zinho(a) e
verifica-se que as mulheres ainda continuam com um percentual mais elevado em
relação aos homens. As mulheres com nível superior e médio receberam
respectivamente 41% e 36%. Ao passo que, os homens com nível superior, com 14 % e
de nível médio, com 9%.
0
10
20
30
40
50
Homem - nívelsuperior
Homem - nívelmédio
Mulher - níve lsuperior
Mulher - níve lmédio
- inho (a ) e -zinho (a)
2. Pejoratividade
0
10
20
30
40
50
Homem - ní velsuper io r
Ho mem - ní velméd io
M ulher - ní velsuper io r
M ulher - ní velméd io
-inho (a)3. Afetividade
O gráfico três é idêntico ao primeiro, pois não houve a ocorrência de -zinho(a)
afetivo.
Pelo gráfico quatro, percebe-se a pejoratividade do formativo -zinho(a) é elevado
em mulheres que têm nível superior, com 50%, seguido de 32% entre as mulheres com
nível médio. No entanto, apesar de ser menos freqüente, o uso deste sufixo entre os
homens, o percentual é maior entre os de nível superior em relação aos de nível médio,
respectivamente, 11% e 7%.
05
10152025303540
Homem - nívelsuperior
Homem - nívelmédio
Mulher - nívelsuperior
Mulher - nívelmédio
-inho (a)5. Pejoratividade
0
10
20
30
40
50
Homem - nívelsuperior
Homem - nívelmédio
Mulher - nívelsuperior
Mulher - nívelmédio
-z inho (a)4. Pejoratividade
O gráfico cinco apresenta a pejoratividade do sufixo -inho(a), entre homens e
mulheres do nível superior e médio. Pode-se constatar que o uso do formativo pelas
mulheres de nível médio, 39%, é maior do que o das mulheres de nível superior, com
32%. Da mesma forma, os homens com o nível médio, 16%, fazem uso do formativo
de maneira mais recorrente que os homens de nível superior, 13%.
Finalmente, o gráfico seis desta sequência apresenta o uso dos sufixos -inho(a) e
zinho(a) pelos informantes de uma maneira geral, e suas acepções pejorativas e afetivas.
Portanto, constata-se que o sufixo -inho(a) afetivo é bem mais recorrente, com 50%, no
entanto, não houve ocorrência do formativo -zinho(a) afetivo. Em relação à
pejoratividade dos sufixos, o -inho(a) teve 22% e o -zinho(a) apresentou 28%.
5. CONCLUSÃO
Pelo que foi discutido ao longo do artigo e apresentado nos gráficos, a partir do
questionário feito com os informantes, constata-se que a explicação das gramáticas
tradicionais e de alguns autores citados, em relação ao uso do -inho(a) e do -zinho(a)
carece de uma descrição mais detalhada.
0
10
20
30
40
50
-inho (a) afe tivo-zinho (a) afe tivo -inho (a)pe jorativo
-zinho (a)pe jorativo
6. -Inho (a) e -zinho (a)
Como foi dito anteriormente no decorrer do trabalho, os sufixos -inho(a) e -
zinho(a) estão em processo de gramaticalização, pois apesar do sufixo -inho ser uma
forma gramaticalizada, passou a ter variadas acepções, o que tornou sua gramaticalidade
ampliada. Acrescenta-se ao sufixo -inho(a), o formativo -zinho(a) que está adquirindo
propriedades gramaticais, pois está fazendo parte dos usos em contextos comunicativos
em que não era utilizado, de acordo com o propósito do falante. Portanto, o sufixo -
zinho(a) que era usado somente quando a base terminava em consoante, ditongo ou
vogal acentuada como em paizinho, florzinha, tatuzinho, passou a ser usado em outros
contextos dependendo da intenção do falante, por exemplo ao optar por menininha ou
meninazinha.
A partir do questionário realizado e dos gráficos, foi verificado que a opção de
uso de um ou de outro sufixo está associada à situação comunicativa, ao contexto em
que o formativo está inserido e com a real intenção do falante.
A pesquisa mostrou que é mais recorrente o uso do sufixo -inho(a) entre as
construções de maior afetividade e que a opção pelo formativo -zinho(a) está associada
à acepção de maior pejoratividade. Muitas vezes, o formativo -inho(a) também é
utilizado com sentido pejorativo, porém com mais frequência entre os falantes com
nível médio. Nota-se também que para o sufixo -zinho(a) com sentido afetivo, não
houve ocorrência.
O trabalho constatou que o sufixo -inho(a) é mais usado pelos homens e mulheres
do nível médio, no entanto as mulheres com nível superior também utilizam tal
formativo, porém com menos frequência. Contudo, é mais notável a ocorrência do
formativo -zinho(a) pelos homens e mulheres com nível superior. Percebe-se também
que as mulheres que apresentam o nível médio também usam o formativo -zinho(a),
porém com menor frequência, se comparada às mulheres com nível superior.
Recebido em setembro de 2009
Aprovado em outubro de 2009
6. REFERÊNCIAS
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NASCIMENTO, Mauro José Rocha do. Repensando as vogais temáticas nominais a partir da Gramática das Construções. Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006. NEVES, Maria Helena Moura. A gramática funcional. São Paulo: Martins Fontes. (1997). ROCHA, L.C.A. Estruturas Morfológicas do Português. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. ROSA, M.C.A.P. Formação de nomes aumentativos: Estudo da produtividade de alguns sufixos portugueses. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1982. SIMÕES, Fátima Maria Campos. Valor semântico dos diminutivos -inho e -zinho nas propagandas: representação e construção de identidades sociais. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2005. TURUNEN, Virpi Johanna. A descrição do diminutivo: dimensões semânticas e pragmáticas. Projeto de tese de doutorado, PUC-Rio, 2007. VOTRE, Sebastião Josué; CEZARIO, Maria Maura; MARTELOTTA, Mário. Gramaticalização. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras UFRJ, 2004.