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A encruzilhada afegã: como o Afeganistão mudou nossos entendimentos sobre as relações internacionais Pedro Henrique L. do Nascimento Wladimir S. Fernandes Caroline de Albuquerque Duarte Marcos Alexandre Rocha 1 1 Os autores prestam agradecimentos a Rodrigo Guerra Bergmann por revisar o pre- sente artigo. #13

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A encruzilhada afegã:como o Afeganistão mudou nossos entendimentos sobre as relações internacionais

Pedro Henrique L. do NascimentoWladimir S. FernandesCaroline de Albuquerque DuarteMarcos Alexandre Rocha1

1 Os autores prestam agradecimentos a Rodrigo Guerra Bergmann por revisar o pre-sente artigo.

#13

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1. Introdução

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, anunciou que as tropas estadunidenses deixariam o Afeganistão até o ano de 2014 (VOLKHONSKY, 2013). Ainda que existam dúvidas quanto ao tamanho e à escala desta retirada de tropas, os países da Ásia Central não poderiam deixar de preocupar-se com o futuro da re-gião (BOWEN, 2013). Com medo de que o egresso das forças nor-te-americanas signifique o crescimento da instabilidade regional, do tráfico de drogas e da propagação de ideologias fundamenta-listas; a Federação Russa está considerando voltar ao Afeganistão (BOWEN, 2013; STUSTER, 2013).

Mesmo após mais de uma década de ocupação estadunidense, o país centro-asiático continua instável devido à presença de gru-pos fundamentalistas (BOWEN, 2013). Tais grupos são produtos de diferentes conjunturas políticas e suas origens remontam ao período da Guerra Fria e, mais especificamente, à própria ocu-pação soviética ao país, que teve seu início em dezembro de 1979 (CHESSUDOVSKY, 2009).

Tal ocupação provocou reação imediata do bloco antagônico ocidental. O Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) se reuniu para debater vias de pôr um fim à invasão, mas não conseguiu alcançar consenso entre seus membros permanentes. A solução encontrada foi a convocação de uma Sessão Especial de Emergência da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), a sexta desde a aprovação da resolução Uniting for Peace1.1 Em 3 de novembro de 1950, a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) aprovou a resolução 377 (V), chamada Uniting for Peace. A resolução foi uma resposta à atitude so-viética de barrar, por meio de seu poder de veto, qualquer esforço de paz mais efetivo no conflito das Coreias. Estabeleceu-se que caso o CSNU falhe em suas funções primárias de manutenção da paz e segurança mundial por falta de consenso, a AGNU tomaria tais responsabilidades para si. Caso a AGNU não estivesse em seção, deveria ser convocada

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A Sessão de Emergência instaurada tampouco aprovou uma resolução suficientemente incisiva a ponto de conseguir terminar o conflito iniciado no Afeganistão. Com isso, o bloco ocidental, liderado pelos Estados Unidos, encontrou outras maneiras indi-retas de se opor à invasão. Tais maneiras convergiram no apoio à guerrilha mujahidin2, que se opunha ferozmente ao domínio sovi-ético (CHESSUDOVSKY, 2009).

O grupo guerrilheiro em questão recebeu treinamento da Agência Central de Inteligência (CIA, em inglês) e armamentos estadunidenses. Tal grupo era formado por afegãos e outros fun-damentalistas islâmicos provenientes de todo o Oriente Médio, entre eles Osama Bin Laden – membro fundador da al-Qaeda e, mais tarde, líder da mesma (CHESSUDOVSKY, 2009). O grupo terrorista organizado por Bin Laden clamou autoria pelo atenta-do terrorista às Torres Gêmeas do dia 11 de setembro de 2001, o maior da história dos Estados Unidos (CHESSUDOVSKY, 2009).

O ataque no território dos Estados Unidos que ceifou quase 3000 vidas e custou 11 trilhões à sua economia, segundo o jornal britânico The Guardian (LUMLEY; TEMPLETON, 2002), tornou necessário refletir como as relações internacionais são pensadas. Para Steve Smith (2003), existem vários aspectos das teorias pre-dominantes das Relações Internacionais que são falhos na expli-cação da realidade. Tais aspectos influenciam e são influenciados pela maneira como as pessoas enxergam as interações entre os Es-tados, incluindo os tomadores de decisão (SMITH, 2003). Smith (2003) defende que, por causa dessas falhas, o atentado às Torres Gêmeas foi um acontecimento que não poderia ser entendido ou previsto dentro do escopo teórico predominante nas Relações In-ternacionais. Assim sendo, a disciplina tem, de certa forma, con-tribuído para existência do mundo que fez o 11 de setembro ser possível (SMITH, 2003).

Visando desenvolver a ideia exposta acima por Steve Smith (2003), o presente artigo se organizará em cinco seções e em suas respectivas subseções. Primeiramente pretende-se definir alguns pontos teóricos sobre as Relações Internacionais que tiveram e ainda têm forte influência na maneira como as tomadas de decisão

uma sessão especial de emergência pelo CSNU, ou pela maioria dos membros da própria Assembleia. Nesse tipo de sessão, seria possível recomendar ações coletivas, como o uso de forças armadas. Além disso, dois corpos auxiliares foram criados, a Comissão de Observação da Paz e o Comitê de Medidas Coletivas; tais corpos no entanto não se con-solidaram tendo o primeiro sido abolido em 1960, e o segundo apenas dois anos depois de sua criação (UNITED NATIONS, 1950).

2 Termo que se refere a um grupo de muçulmanos que se autodeclaram guerreiros pela fé (ENCYCLOPÆDIA BRITANNICA, nd).

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se processam. Em seguida, por se considerar que não existe evento separado de um contexto histórico maior, se prosseguirá para uma breve descrição da história da Guerra Fria, do Afeganistão e do fundamentalismo islâmico. Logo após, será descrita a ocorrência da invasão do Afeganistão e suas dinâmicas internas e externas. Por fim, se descreverá o que aconteceu com o fim da invasão e os últimos condicionantes que culminaram no ataque terrorista de 11 de setembro e em seus desdobramentos, onde o argumento de Smith (2003) será mais claro.

2. Epistemologia e Teorias das Relações Internacionais

Antes de abordar considerações teóricas, será necessário apon-tar a diferença entre Relações Internacionais (em maiúsculas) e re-lações internacionais (em minúsculas). O primeiro termo se refere à disciplina, enquanto o segundo descreve o objeto de análise da disciplina (AYOOB, 2002). Ou seja, por “relações internacionais” se entende as interações políticas que existem além das fronteiras dos Estados, ao mesmo tempo em que a expressão “Relações In-ternacionais” dá nome à ciência social que busca explicar ou com-preender estas mesmas interações.

Relações Internacionais é um campo de estudo com uma gran-de diversidade de abordagens, com várias correntes teóricas prin-cipais e muitas perspectivas alternativas. Ao estudar estas diferen-tes teorias, é necessário agrupá-las em categorias para evitar uma confusão diante das várias contribuições existentes (JACKSON; SØRENSEN, 2007). Há várias maneiras de classificar as correntes de pensamento de Relações Internacionais; nenhuma delas, con-tudo, deve ser vista como uma verdade absoluta. Cada categori-zação é apenas um instrumento criado para estudar e descrever a disciplina e não um retrato exato e completo das discussões entre os diferentes teóricos (JACKSON; SØRENSEN, 2007).

A categorização adotada neste artigo é de que, desde a metade da década de 1980, as principais teorias de Relações Internacio-nais têm sido duramente criticadas por muitos acadêmicos com posições bastante difusas (SMITH, 1995; WÆVER, 1996). O pri-meiro a sublinhar essa tendência foi Robert O. Keohane (1988), que identificou a existência de um debate entre racionalistas, os quais possuíam um método de pesquisa incapaz de lidar com te-mas como identidade e cultura; e reflectivistas, os quais se propu-nham a estudar tais temas, porém sem um método rigoroso para apoiar suas ideias (KEOHANE, 1988; NOGUEIRA; MESSARI, 2005; SMITH, 2003). A mesma distinção foi descrita por Yossef

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Lapid (1989), porém este nomeou os racionalistas de positivistas e os reflectivistas de pós-positivistas. A interpretação e o vocabu-lário propostos por Lapid (1989) foram mais amplamente acei-tos por tornar clara a questão epistemológica3 por trás do debate (WÆVER, 1996).

2.1. A epistemologia positivista

A palavra “positivismo” foi cunhada por Auguste Comte no começo do século XIX. Seu propósito era desenvolver uma ciên-cia da sociedade baseando-se nos métodos das ciências naturais (SMITH, 1996). Ou seja, segundo a epistemologia de Comte, é possível que um sociólogo observe a sociedade e encontre regula-ridades, assim como químicos e físicos encontram regularidades ao observar a natureza (SMITH, 1996).

Max Weber (2001[1917]) também contribuiu para o desenvol-vimento do pensamento positivista nas ciências sociais. Ao dis-cursar sobre a vocação do cientista social a um grupo de estudan-tes da Universidade de Munique em 1917, Weber (2001[1917]) argumentou que a política deve se manter fora da sala de aula de matérias como sociologia, história, economia política, ciência po-lítica e filosofia da cultura. De acordo com o sociólogo,

A política não tem seu lugar nas salas de aulas das universidades. Primeiramente, não tem mesmo, no que se refere aos estudantes. [...] Mas a política não tem lugar também, no que compete os do-centes, principalmente quando eles tratam cientificamente de temas políticos [...] Certamente, uma coisa é tomar uma posição política prática, e outra coisa é analisar cientificamente as estruturas políti-cas (WEBER, 2001[1917], p. 45).

A contribuição epistemológica do trecho acima é a de dis-tanciar dois papeis: o de cidadão e o de estudioso de questões políticas. O objetivo é separar os fatos dos valores em trabalhos acadêmicos. Desta forma, os cientistas sociais podem retratar a si mesmos como meros relatores da política que não tomam uma posição normativa e produzem um trabalho científico livre de va-lores subjetivos (SMITH, 2003).

À época do começo da invasão soviética ao Afeganistão, em 1979, o pensamento positivista prevalecia nas Relações Interna-

3 Definida de uma maneira estreita, epistemologia é o estudo do conhecimento. Este ramo da filosofia se preocupa com questões como as fontes, as condições e os limites do conhecimento (STEUP, 2013).

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cionais. A disciplina se via envolta em um debate entre três corren-tes dentro do positivismo: realismo, liberalismo e estruturalismo4 (WÆVER, 1996). Ainda que o liberalismo se apresentasse como uma perspectiva forte e que o estruturalismo crescesse como uma teoria alternativa nos anos 1970, o realismo manteve uma posição de supremacia durante as décadas de 1960, 1970 e 1980 (BUR-CHILL; LINKLATER, 1996/2005; KRASNER, 2000; NOGUEIRA; MESSARI, 2005; WÆVER, 1996).

2.2. O pensamento realista nas Relações Internacionais

Existe uma variedade de autores realistas em Relações Inter-nacionais, os quais não necessariamente concordam uns com os outros em diversas questões. Entretanto, é possível traçar uma sé-rie de características comuns a essa linha teórica. A primeira delas é a inspiração em escritores clássicos como Tucídides5, Nicolau Maquiavel6 e Thomas Hobbes7 (JACKSON; SØRENSEN, 2007; NOGUEIRA; MESSARI, 2005).

Além da herança destes clássicos, duas premissas principais comuns ao pensamento realista foram identificadas pelos acadê-micos brasileiros João Pontes Nogueira e Nizar Messari (2005). A primeira delas é o estadocentrismo. Para esta corrente teórica, o Estado é o principal ator das relações internacionais, já que ele possui as funções primordiais de manter a paz dentro de suas fronteiras e de garantir a segurança de seus próprios cidadãos. Os processos e a política interna não são levados em consideração pelo realismo (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). Um estudo esta-docêntrico sobre a invasão soviética ao Afeganistão de 1979, por exemplo, centraria sua análise nas atitudes tomadas pelos Estados

4 Não há espaço, neste artigo, para uma discussão mais aprofundada sobre o liberalismo e o estruturalismo. No entanto, é possível afirmar que os liberais, também chamados de pluralistas, dão uma ênfase maior na cooperação em áreas não-políticas das relações internacionais e na possibilidade de progresso. Os estruturalistas, ou marxistas, focam nas características conflitivas da política e na dicotomia entre opressores e oprimidos que ocorre dentro e através dos Estados (WÆVER, 1996).

5 Tucídides era um historiador da Grécia Antiga que narrou a Guerra do Peloponeso e é famoso pela frase “os fortes exercem o poder e os fracos se submetem” (TUCÍDIDES, 431 a.C./1987, p. 348).

6 O teórico político florentino Maquiavel (1513/2002) descreveu uma ética política com base no mundo como ele é, não em como ele deveria ser (NOGUEIRA; MESSARI, 2005).

7 Do filósofo político inglês Hobbes (1651/2011) os realistas destacaram o estado de natureza caótico e o compararam com o estado do sistema internacional (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). Essa herança será mais bem clarificada quando for explicado, nesta subseção, o conceito de anarquia internacional.

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Unidos, pela União Soviética e pelo Afeganistão Democrático em detrimento das atividades de grupos não estatais que serão mais bem abordados na sessão 3.3.

O segundo conceito fundamental para os teóricos do realismo é a anarquia internacional. Este termo se refere à ausência de uma autoridade soberana e suprema mundial que possa garantir a so-brevivência de todos (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). Ainda que a Carta das Nações Unidas tenha tornado legalmente obrigatório que seus membros respeitem as decisões do CSNU (CLAUDE JR., 1988), os realistas interpretam que a falta de uma estrutura central de tomada e aplicação de decisões faz com que o direito interna-cional não desempenhe nenhum papel essencial e que o sistema seja anárquico (KRASNER, 2000).

O principal resultado deste segundo conceito fundamental é que, “na anarquia internacional, os Estados lutam permanente-mente por sua [própria] sobrevivência e desconfiam uns dos ou-tros” (NOGUEIRA; MESSARI, 2005, p. 26). A segurança, nesta situação, torna-se um jogo de soma zero; isto é, a segurança de um só pode ser alcançada levando em prejuízo a segurança dos outros (NOGUEIRA; MESSARI, 2005).

A partir destas duas premissas principais, é possível deduzir outras três características do comportamento dos Estados: (1) a sobrevivência como principal objetivo, (2) o próprio poder como elemento central e (3) a autoajuda. Segundo a teoria realista, o interesse fundamental de todos os Estados é a própria sobrevi-vência e sua manutenção como ator nas relações internacionais (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). É este objetivo a que todos os outros interesses nacionais se submetem. Já que não há uma auto-ridade central legítima a quem recorrer em caso de ameaça (anar-quia internacional), os Estados dependem do próprio poder – seja ele político, militar, econômico e/ou tecnológico – para garantir a própria sobrevivência (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). Pela des-confiança mútua existente, nenhum Estado pode contar com a ajuda de outros Estados para alcançar a própria segurança, restan-do apenas, portanto, a autoajuda (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). Isso não implicaria na inexistência de alianças, mas resultaria na vigilância permanente por parte de todos os Estados (NOGUEI-RA; MESSARI, 2005).

2.3. A crítica pós-positivista de Steve Smith

Como enunciado anteriormente, várias têm sido as críticas ao pensamento positivista nas Relações Internacionais. Ainda que

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Lapid (1989) e Keohane (1988) tenham agrupado todas essas te-orias com o rótulo de pós-positivismo – ou reflectivismo –, elas têm sido bastante plurais em suas suposições. Na verdade, a única semelhança dentre os vários pensamentos pós-positivistas é a crí-tica ao positivismo (SMITH, 1995). Não há espaço, neste artigo, para se discutir as várias contribuições pós-positivistas8, portanto, se focará aqui nas críticas de Steve Smith (2003) à epistemologia positivista e ao realismo nas Relações Internacionais.

Diferentemente do que Weber (1917/2001) defendia, Smith (2003, p. 503, tradução nossa) afirma que o “ato de qualquer cien-tista social nunca poderá ser relatar neutralmente um mundo pré-formado e separado dele ou dela”. Ou seja, a interpretação de qual-quer cientista ou teórico será influenciada pelo cenário político e social em que ele ou ela se encontra, não importando o quanto ele ou ela insista que sua pesquisa é isenta de valores. A própria teo-ria realista das Relações Internacionais, por exemplo, se apresenta como uma verdade descritiva, ainda que mascare premissas polí-ticas como sendo acadêmicas (SMITH, 2003).

O estadocentrismo é um exemplo disso. Ao focar no Estado como agente das relações internacionais, a sua segurança foi pri-vilegiada pelas Relações Internacionais em detrimento da segu-rança dos indivíduos (SMITH, 2003). Assim, a segurança dos in-divíduos é vista como um assunto de política interna, o que não concerne às Relações Internacionais ou às relações internacionais (SMITH, 2003).

A principal consequência disto está na visão de violência compartilhada tanto pelas Relações Internacionais, quanto pe-las relações internacionais e também criticada por Smith (2003). A definição de violência que permeia a disciplina é aquela ligada a conflitos entre Estados, incluindo guerras civis apenas quando elas ameaçam a sobrevivência do principal objeto de estudo das Relações Internacionais: o Estado. Esta definição é mantida ainda que as formas mais comuns de violência sejam aquelas ligadas à economia e à saúde (SMITH, 2003).

Outro aspecto da teoria realista criticado por Smith (2003) é o entendimento do interesse primordial dos agentes como dado. Essa premissa descarta questões de identidade e o papel que esta pode ter na formulação de preferências e interesses. Esta corrente de pensamento apenas supõe que todos os agentes das relações internacionais –como, por exemplo, Estados Unidos e União So-

8 Ainda assim, vale a pena citar correntes como a Teoria Crítica, o neomarxismo, a so-ciologia histórica, o feminismo, o pós-modernismo, o construtivismo social e o pós-co-lonialismo (NOGUEIRA; MESSARI, 2005; SMITH, 1995; 1996).

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viética – seguem uma única racionalidade universal, independen-temente de suas ideologias e definições de questões da política mundial (SMITH, 2003).

Por fim, a última observação de Smith (2003) que será subli-nhada neste artigo é a busca científica por explicar ao invés de entender. Ao buscar regularidades para explicar o mundo – como idealizado por Comte –, os cientistas da política internacional têm diminuído a importância de entender visões de mundo não-oci-dentais. As intenções de diversos atores têm sido atribuídas ao in-vés de enfatizadas e seus valores têm sido assumidos ao invés de compreendidos (SMITH, 2003). Estudar esses valores e introduzir preocupações normativas tem sido visto como um algo fora da ciência social “legítima”, por não ser uma explicação baseada em evidências neutras (SMITH, 2003). O principal problema é que tal visão é “absolutamente dependente da suposição prévia e oculta de que uma posição de valor-neutro é possível de fato” (SMITH, 2003, p. 507, tradução nossa).

Estas observações teóricas e epistemológicas tiveram efeito não só nas Relações Internacionais, mas também nas relações in-ternacionais. Para entender melhor esses efeitos, a próxima sessão descreverá o contexto mundial, regional e afegão às vésperas da invasão soviética.

3. O Contexto Histórico

3.1. Guerra Fria

A ordem internacional da Guerra Fria tem sua origem no seio da Segunda Guerra Mundial. A aliança entre Estados Unidos, Rei-no Unido e União Soviética, que havia se formado na luta contra a Alemanha Nazista de Hitler, já dava sinais de debilidade em reuni-ões como as conferências de Teerã (1943), Yalta (1945) e Potsdam (1945) (SARAIVA, 2008a). O líder soviético Josef Stálin ensaiava a reconstrução do país com base nas reparações de guerra e nas políticas de ocupação. Estas ações foram interpretadas pelos to-madores de decisão estadunidenses como um projeto expansio-nista que poderia questionar a superioridade norte-americana no Ocidente (SARAIVA, 2008a).

A partir de então, as duas superpotências passaram a tentar conter uma a outra a partir de doutrinas políticas voltadas para apoderar-se de espaços políticos, econômicos e ideológicos (SA-RAIVA, 2008a). No lado capitalista, essas políticas se traduziram no Plano Marshall, para a reconstrução da Europa Ocidental, e

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na aliança militar da Organização do Tratado do Atlântico Nor-te9 (OTAN). Já no lado comunista, essa doutrina era observada na remilitarização das fronteiras da Europa Oriental, no acelera-mento do projeto de desenvolvimento da bomba atômica soviética e na criação da aliança militar do Pacto de Varsóvia (SARAIVA, 2008a). Estava dada a situação em que a segurança de um só era atingida em detrimento da segurança do outro – um jogo de soma zero, na concepção realista.

Entretanto, é importante lembrar que o relacionamento entre as duas potências não foi completamente uniforme durante todo o curso da Guerra Fria. Os autores José Flávio Sombra Saraiva (2008a; 2008b) e Paulo Roberto de Almeida (2008) dividem-na em quatro períodos históricos. O primeiro, de 1947 a 1955, no-meada Fase “Quente” da Guerra Fria, foi caracterizado pelo acir-ramento das tensões entre Estados Unidos e União Soviética e marcado por crises como o Bloqueio de Berlim10 e a Guerra da Coreia11 (SARAIVA, 2008a).

O segundo período, ocorrido entre 1955 e 1968, chamado de Coexistência Pacífica, definiu-se pela gradual flexibilização da ordem bipolar (SARAIVA, 2008a). Apesar da Crise de Berlim de 196112, da Crise de Cuba de 196213 e da manutenção do antagonis-mo ideológico, a tensão militar entre as duas potências diminuiu (SARAIVA, 2008a; 2008b).

Esta fase de coexistência foi seguida pela Détente, nome dado ao 9 A OTAN foi criada em 04 de abril de 1949 como uma aliança de doze países da Europa Ocidental e América Anglo-saxã, incluindo os Estados Unidos, comprometidos com a defesa recíproca em caso de ataque a qualquer um deles. Ela servia como uma espécie de defesa contra uma potencial ameaça comunista (ALMEIDA, 2002; VIZENTINI, 2005).

10 Com o argumento de que a capital alemã não poderia ser um enclave ocidental e uma ameaça ao socialismo no interior da zona de ocupação soviética, Stálin determi-nou o Bloqueio de Berlim. Esse bloqueio consistiu em cortes no tráfego ferroviário e rodoviário do Ocidente (SARAIVA, 2008a). Observada como uma reação à Doutrina Truman, tal medida foi utilizada como um teste pelo presidente soviético ao grau de determinação dos seus adversários. Além de ser uma resposta soviética à política de contenção estadunidense, gerou consequências muito negativas para os europeus que acabavam de sair de uma guerra mundial (SARAIVA, 2008a).

11 Observada como a guerra mais típica do contexto da Guerra Fria e o primeiro con-flito internacional após o fim da Segunda Guerra Mundial, a Guerra da Coreia consistiu em uma demonstração do poder mundial de ambas as potências da época na península da Coreia (SARAIVA, 2008a).

12 A Crise de Berlim de 1961 ocorreu após tensões entre a Alemanha Ocidental e Ori-ental. Esta crise resultou na criação do Muro de Berlim pelos soviéticos para separá-las (GARTHOFF, 1991).

13 A Crise de Cuba de 1962 ocorreu devido à instalação de mísseis soviéticos na ilha de Cuba. Sendo um dos episódios mais intensos da Guerra Fria, houve medo de que ela pudesse escalar em um conflito direto entre as duas potências (ALLISON, 1969).

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momento da Guerra Fria evidenciado pelas novas acomodações en-tre Moscou e Washington que durou de 1968 a 1979. As principais marcas deste período foram o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) de 1968, Acordo Salt de 1972 e o Tratado Salt de 197314, todos assinados na intenção de frear o desenvolvimento e a produção de armamentos nucleares (SARAIVA, 2008b). Este período também se caracterizou pela retomada das relações comerciais e uma abertura econômica Leste-Oeste. Contudo, é importante notar que estes avan-ços em direção a uma convivência tolerante não significaram a total inexistência de tensões entre Estados Unidos e União Soviética, já que havia questões pendentes de períodos anteriores, como a Guerra do Vietnã15 e a questão do Muro Berlim16 (SARAIVA, 2008b).

De acordo com Almeida (2008), esta fase de entendimentos seria substituída por uma nova fase da Guerra Fria a partir de 1979. Neste quarto e último período, que durou até 1991, nego-ciações para frear a corrida armamentista ou para delimitar zonas de defesas antimísseis foram comprometidas pela tensão renovada (ALMEIDA, 2008). Os Estados Unidos voltariam a expandir seus gastos em defesa e a União Soviética se envolveria cada vez mais em conflitos internos no continente africano (ALMEIDA, 2008). É neste cenário denominado Nova Guerra Fria que se desenrola a ocupação soviética no Afeganistão.

3.2 Uma breve história do Afeganistão

No século XIX, a Ásia Central passou a ser disputada por duas grandes potências: o Império Britânico e o Império Russo. O Im-pério Russo desejava obter acesso ao Oceano Índico e, para isso, 14 O TNP foi um tratado que endereçava a redução da produção de armas nucleares no mundo e foi assinado em 1968 por vários países. Segundo o TNP, os Estados que possuíssem arsenais nucleares até 1967 deveriam reduzi-lo, enquanto os outros deveri-am abdicar do uso militar da tecnologia nuclear em troca do uso de tecnologia nuclear pacífica. Tanto o Acordo, quanto o Tratado Salt visaram o congelamento temporário da produção e desenvolvimento de armas estratégicas (SARAIVA, 2008b).

15 O Vietnã era uma ex-colônia francesa que foi dividida em duas zonas de influência no mesmo tratado que finalizou a Guerra da Coreia. A parte norte - socialista - iniciou a luta armada e ganhou bastante apoio popular nas áreas rurais do sul (KARNAL et al., 2007). Em resposta, os Estados Unidos se envolveram militarmente de forma acentuada. Com o apoio doméstico fragilizado devido a denúncias de massacres cometidos pelo exército estadunidense, a potência se viu forçada a retirar-se do país asiático (KARNAL et. al, 2007).

16 Completamente rodeada por domínio soviético, Berlim Ocidental tinha dificuldades em acessar o resto do território ao ocidente devido a questões pendentes desde a Se-gunda Guerra Mundial. Apesar da continuação da questão, a aceitação da autonomia de Berlim Ocidental pela União Soviética significou um grande passo para uma futura reconciliação entre as duas Alemanhas (SARAIVA, 2008b).

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visava dominar a área do atual Afeganistão, próxima da principal colônia inglesa da época, a Índia (BONTURI, 2001). Entretanto, isso significaria um crescimento enorme de poder para a Rússia, o que poderia se apresentar como uma ameaça ao Império Britânico (BONTURI, 2001). Com isso, o Afeganistão passou a ser envolvi-do no chamado “Grande Jogo” entre essas potências, tornando-se um estado-tampão – conceito criado pelo teórico realista Hans Morgenthau (1948/2003) para definir Estados que são criados para evitar um ganho excessivo de poder por uma ou outra po-tência –, o que evitava que ambos os impérios tivessem excesso de poder na Ásia. Entretanto, até a independência formal, tanto os russos quanto os britânicos apoiavam facções rivais que viviam naquela região. O Afeganistão chegou a se tornar um protetorado britânico por alguns anos (BEARDEN, 2001; THE LIBRARY OF CONGRESS, 2011).

A característica arbitrária de fronteiras criadas artificialmente em Estados como o Afeganistão é uma das razões para que países do Terceiro Mundo tenham sido acometidos por conflitos inter-nos (AYOOB, 2002). Ainda que a teoria realista consiga prever a criação de estados-tampão, ela é incapaz de endereçar ou capturar suas realidades internas (AYOOB, 2002). Essa incapacidade se ex-plica tanto pela centralidade atribuída a atores estatais – estado-centrismo –, quanto pelo entendimento de que os interesses dos atores são dados, deixando de lado questões como a identidade étnica e religiosa.

Ao se tornar independente em 1919, o Afeganistão passou, inicialmente, por um período monárquico. Durante o reinado de Muhammad Zahir Shah, começam a surgir as condições que geraram o golpe feito pelo Partido Democrático Popular do Afe-ganistão (PDPA) em 1979 e a invasão soviética (THE LIBRARY OF CONGRESS, 2011). Zahir Shah criou um sistema parlamentar de governo para o Afeganistão e governou com a ajuda de três primeiros-ministros até 1963. Após esse ano, Zahir tentou assu-mir um papel mais ativo no governo afegão. Depois de uma gran-de crise econômica causada por vários anos de secas desastrosas e uma crise política com denúncias de corrupção envolvendo a família real afegã, Daoud Khan – o último primeiro-ministro – realizou um golpe de Estado e assumiu o poder em 1973 (THE LIBRARY OF CONGRESS, 2011).

Daoud Khan extinguiu a monarquia no Afeganistão, procla-mando uma república. Ele tentou promover uma conciliação en-tre as várias facções existentes no Afeganistão na época, evitando, assim, uma revolta e tentou fazer, também, reformas na economia

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do país (HANNAH, 1980; VÄRYNEN, 1980). As reformas obti-veram algum sucesso; porém, as relações com a União Soviética e com os comunistas afegãos começaram a se deteriorar ao longo do regime devido ao crescente conservadorismo de Daoud e ao seu afastamento da população. Mesmo que durante o início de seu go-verno, o presidente tenha tentado retomá-las, chegando até a fazer uma frente diplomática com um setor mais moderado do PDPA, as relações com a superpotência não se recuperaram (HANNAH, 1980; VÄRYNEN, 1980). O presidente continuou exercendo a po-lítica externa de seu antecessor, que consistia em não-alinhamento e balanceamento entre as grandes potências. Durante uma visita de Daoud a Moscou, o líder soviético Leonid Brejnev teria tentado força-lo a seguir um “plano de segurança coletiva” para a Ásia. Ele, no entanto, recusou o convite, dizendo ser presidente de um país independente e não de um país da Europa Oriental. Brejnev, então, declarou que Daoud assinou sua sentença de morte (RU-BINSTEIN, 1982). Com isso, os partidários do PDPA começaram a se revoltar contra o governo, sendo duramente reprimidos. Essa repressão culminou, em 1978, na morte de Mir Akbar Khyber, um importante líder do PDPA. Como resposta, o partido primeira-mente fez protestos contra o governo e, após isso, armou um golpe de Estado e assumiu o poder. Daoud e sua família foram assassina-dos no palácio presidencial em 1978 (RUBINSTEIN, 1982).

Quando o PDPA assumiu o poder, ainda existiam rixas inter-nas entre suas diferentes facções sobre como o governo afegão de-veria ser conduzido. Parte do partido desejava que o Afeganistão se tornasse um país comunista – a facção Khalq – e parte deseja-va uma transição gradual do Afeganistão para o socialismo – a facção Parcham (VIZENTINI, 2001; GOLDMAN, 1988). Após o golpe, a facção Khalq assumiu o poder, mas as disputas internas resultaram em mortes de vários membros do partido. Além disso, o PDPA fez reformas radicais nas leis afegãs: decretou a obrigato-riedade do ensino para mulheres, a reforma agrária e nacionalizou várias empresas que operavam serviços importantes no país. Essas reformas fizeram o já impopular governo obter ainda mais a anti-patia da população (VIZENTINI, 2001; GOLDMAN, 1988).

O novo governo instalado não tinha apoio da maior parte da população e promoveu uma repressão em massa contra seus opositores. Com isso, a facção Parcham do PDPA e os setores re-ligiosos conservadores do Afeganistão formam uma oposição ar-mada ao governo Khalq, causando, assim, uma guerra civil. Esses acontecimentos no país, somados ao desejo da União Soviética de obter mais poder na Ásia, tornaram a conjuntura do Afeganistão

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favorável à invasão soviética em 1979 cujo objetivo era apoiar o regime instalado pelo PDPA (GOLDMAN, 1988).

3.3. Islamismo e fundamentalismo no mundo muçulmano até a década de 1980

Antes de iniciar qualquer discussão sobre religião e política no mundo muçulmano, é necessário clarificar três conceitos dis-tintos: islã, islamismo e fundamentalismo islâmico. O islã é uma religião que tem Muhammad como seu profeta e o Alcorão como seu principal livro sagrado. De acordo com o próprio Alcorão, Deus é único e incomparável e os seguidores da fé – que podem ser chamados de muçulmanos ou islâmicos – tem como propósito de sua existência amar e servir a Deus (SURAT ADH-DHĀRIYĀT, 51:56). Islamismo é uma ideologia que objetiva deter e reverter tendências seculares através da atividade política. A influên-cia do movimento islamista vem da política, não do terrorismo (BROWN; HAMZAWY; OTTAWAY, 2006). Por fim, o fundamen-talismo islâmico segue uma ideologia cujo objetivo último é lutar pela criação da umma – a grande nação que englobará todos os muçulmanos. Para os fundamentalistas islâmicos, é justificável utilizar-se de violência e técnicas suicidas para alcançar esta fina-lidade última (HELLMICH, 2005).

A primeira organização islamista, a Irmandade Muçulmana Egípcia, foi fundada em 1928 e outros movimentos similares se espalharam pela região entre 1950 e 1960 (BROWN, HAMZAWY, OTTAWAY, 2006). Entretanto, durante essas duas décadas, esta ide-ologia foi eclipsada por tendências seculares como o pan-arabismo e o socialismo. A derrota árabe contra Israel na Guerra dos Seis Dias em 1967, a Revolução Iraniana de 1979 e a falha de vários progra-mas de desenvolvimento dos governos seculares levou ao fortale-cimento do islamismo nos países muçulmanos (LAPIDUS, 1997).

Ao final da década de 1970, o islamismo tornou-se uma ide-ologia política claramente importante em muitos Estados árabes, rapidamente suplantando a dominância do pan-arabismo e do so-cialismo (BROWN, HAMZAWY, OTTAWAY, 2006). Alguns paí-ses árabes – como Marrocos e Jordânia – permitiram a formação legal de partidos islamistas, que puderam competir em eleições para os parlamentos nacionais. Entretanto, muitos outros países – como Egito, Síria e Tunísia –, baniram a participação legal de organizações islamistas ou até mesmo forçaram seus membros ao exílio (BROWN, HAMZAWY, OTTAWAY, 2006). Esta repressão política levou a uma cisão entre essas organizações. A maior par-

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te delas renunciou à violência e passou a defender a democracia como meio de participação política. Uma minoria recorreu ao ter-rorismo (BROWN, HAMZAWY, OTTAWAY, 2006).

Um bom exemplo da história da perseguição política a grupos islamistas e da atividade de fundamentalistas no Oriente Médio é a do Egito sob os governos dos presidentes Gamal Abdel Nasser (1956-1970) e Anwar Sadat (1970-1981). Os serviços secretos de Nasser organizaram uma forte repressão política contra a Irmandade Mu-çulmana Egípcia e seus membros, incluindo Sayyid Qutb, filósofo político islamista (CURTIS, 2004a). Durante sua prisão, Qutb sofreu uma série de torturas, as quais tiveram um efeito radicalizador sobre suas ideias. O filósofo passou a defender, em seus livros, que líderes como Nasser não eram verdadeiros muçulmanos e, portanto, pode-riam legitimadamente ser assassinados (CURTIS, 2004a). Ele tam-bém clamava por uma derrubada de regime feita por uma vanguarda revolucionária que pudesse guiar a sociedade para o caminho da re-ligião (CURTIS, 2004a). Por estas declarações, Qutb foi condenado à execução por traição em 1966 (CURTIS, 2004a).

Os pensamentos deste filósofo político seriam influentes para um jovem egípcio de então apenas 15 anos chamado Ayman al-Zawahiri, que, naquele mesmo ano, fundaria um grupo funda-mentalista nos moldes da vanguarda revolucionária idealizada por Qutb (CURTIS, 2004a; GUNARATNA, 2003). O seu desafeto com o governo do Egito encontraria o ápice durante a presidência de Sadat, quando, em 1978, o país árabe iniciou as negociações de paz com o Estado de Israel (CURTIS, 2004a). Interpretando a filo-sofia qutbista, al-Zawahiri e seu grupo – a Jihad Islâmica Egípcia – planejou e executou o assassinato de Sadat, no dia 06 de outubro de 1981. Nos dias que se seguiram a este atentado, os fundamen-talistas islâmicos foram capturados, julgados, presos e torturados (CURTIS, 2004a).

Portanto, em síntese, a conjuntura global na qual se inseriu a invasão soviética envolvia duas superpotências que voltavam a acirrar suas disputas (ALMEIDA, 2008). Já a situação política na-cional afegã envolvia um golpe de Estado e instabilidade interna devido ao começo de uma guerra civil e a brigas internas dentro do partido dominante (GOLDMAN, 1988). Por fim, o contexto ideológico regional se resumia a ditaduras seculares pan-arabistas e socialistas que reprimiam um islamismo crescente (BROWN, HAMZAWY, OTTAWAY, 2006; LAPIDUS, 1997). Uma minoria extremista começava a se organizar em seus próprios países antes de se lançarem a uma resistência antissoviética (CURTIS, 2004a; 2003b; GUNARATNA, 2003).

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4. A invasão do Afeganistão

4.1. A ocupação soviética.

Em 24 de dezembro de 1979, o governo da União Soviética decidiu pelo envio de suas tropas ao território afegão. Tal invasão visava ao reestabelecimento de um governo socialista, controlado pela potência (LAFETÁ et al., 2008). Além disso, o governo sovié-tico buscava auxiliar o regime de Cabul a resistir contra os grupos insurgentes, preservar a influência da potência na região garantindo a lealdade do regime a Moscou e garantir a segurança territorial. Também era um objetivo impedir que houvesse um efeito dissemi-nador de rebeliões anticomunistas em outras nações componentes da União Soviética na Ásia central islâmica (GOLDMAN, 1984).

Além dos pontos supracitados, diversos outros fatores influen-ciaram a União Soviética a desejar a manutenção do Afeganistão como parceiro e parte de sua zona de influência. Entre as justifi-cativas dadas pela União Soviética, estão os diversos pedidos do próprio governo afegão de apoio do exército vermelho e a defesa de interesses da potência socialista (LAFETÁ et al., 2008).

A invasão se deu tanto por meios aéreos quanto terrestres, com a passagem pela fronteira, através da cidade soviética de Ter-mez e a afegã Kushka, no noroeste do Afeganistão. As tropas se movimentaram em direção à capital Cabul e às cidades de Herat e Qandahar, visando à retomada da ordem baseada nos princípios socialistas nos locais (LAFETÁ et al., 2008).

Entretanto, cinco dias após a invasão, centenas de milhares de baixas já haviam ocorrido, entre elas, a do governante vigen-te no território afegão – Hafizullah Amin. Tendo esse fator como pretexto, Babrak Kamal foi imposto como o novo presidente da República Democrática do Afeganistão; dessa vez, com o suporte integral da União Soviética (BRITISH BROADCAST CORPORA-TION [BBC], 2009). No decorrer da ocupação, grupos mujahidins contrários a esse feito surgiram no Afeganistão (SUMI; LIMA, 2010). Estes guerrilheiros, bem como outros revolucionários sim-patizantes ou adeptos à causa, visavam principalmente à retirada das tropas soviéticas e ao fim do modelo socialistas no país; lu-tando, assim, contra os aliados do governo popular instaurado no Afeganistão (SUMI; LIMA, 2010).

Após os seis primeiros meses de conflito, a resistência foi in-tensificada, com as frentes mujahidin lutando contra a União So-viética e seus simpatizantes na República Democrática do Afega-

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nistão, recebendo o ainda forte suporte das nações previamente citadas. Além disso, as tropas soviéticas presentes no país já ultra-passavam os 80.000 homens (BBC, 2009).

Também é importante notar as ocorrências de violações aos direitos humanos durante a ocupação soviética. Apesar de pou-co divulgadas, é possível observar que a população afegã sofreu diversos abusos contra os seus direitos cometidos pela polícia se-creta (SARWARY, 2012). Devido a esses fatores, um grande con-tingente populacional se retirou da região, especialmente para o Paquistão e para o Irã, em busca de maior estabilidade social e política. Como pontuado por Rattner (2009, para. 6),

[e]m consequência desse conflito interminável, cinco milhões de pessoas fugiram para o Paquistão e o Irã, até a retirada das tropas soviéticas em 1989, que sofrerem pesadas perdas em homens e equipamentos, deixando o país dividido e convulsionado por con-flitos sangrentos entre facções rivais das diferentes tribos.

4.2. Reações da comunidade internacional e a retirada de tropas

Após o anúncio de que a União Soviética invadiria militarmen-te o Afeganistão, diversas respostas da comunidade internacional surgiram e as discussões nas Nações Unidas foram inevitáveis. No dia 3 de janeiro de 1980, o CSNU se reuniu para debater o fato, mas não obteve uma resolução. Seis dias após essa reunião, o orga-nismo internacional voltou a se encontrar e, baseado na resolução 337 da AGNU, determinou a reunião de uma Sessão Especial de Emergência deste órgão (LAFETÁ et al., 2008). Essa reunião ocor-reu em janeiro do mesmo ano e a AGNU decidiu pelo pedido de retirada das tropas soviéticas do Afeganistão, o que não foi acata-do pela potência comunista.

Apenas em 1985, quando Mikhail Gorbachev se tornou o novo líder da União Soviética, que uma retirada do Afeganistão come-çou a ser pensada. Isto se deveu a diversos fatores, como os expli-citados por Maia (2011, para. 40):

No final da década de 80, a ocupação soviética estava chegando ao fim. A forte resistência da jihad lançada pelos mujahedeen com apoio norte-americano e paquistanês somada às dificuldades financeiras e a própria obsolescência do regime comunista soviético que entraria em colapso poucos anos depois, levou à total retirada soviética do Afega-nistão no ano de 1989, conforme havia sido ordenado por Gorbachev.

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As baixas da invasão soviética também foram drásticas. Cerca

de 30 mil soldados soviéticos morreram, além de um milhão de cidadãos afegãos, sendo, dentre esses, cerca de 90% civis (MAIA, 2011). Em 1988, os Estados Unidos, a União Soviética, o Paquistão e a República Democrática do Afeganistão firmaram os Acordos de Genebra, que garantiam que as tropas soviéticas começariam a se retirar do território afegão (BBC, 2009). Dentre eles, cabe des-tacar um tratado entre o Paquistão e o Afeganistão, que afirmava que os dois países assinariam três instrumentos, os quais determi-navam a não-intervenção, não interferência, o retorno voluntário de refugiados afegãos e a retirada gradual de tropas estrangeiras (TERRA, 2013).

A retirada completa das tropas soviéticas do Afeganis-tão ocorreu no dia 15 de fevereiro de 1989, mas as consequências deixadas foram desastrosas. Além das mortes, tanto de militares e guerrilheiros quanto de civis, a situação política e social no país ficou desestabilizada de forma que diversas guerrilhas, sendo a maior parte dessas composta por mujahidins, buscaram alcançar o poder no país (TERRA, 2013).

5. Desdobramentos

5.1. A variável esquecida: os grupos fundamentalistas islâmicos Na intenção de que estes criminosos morressem enquanto en-

fraqueciam e lutavam contra a União Soviética, muitos dos gover-nos árabes do Oriente Médio – incluindo o do Egito pós-Sadat – começaram, a partir de 1984, a esvaziar suas prisões para permi-tir que os fundamentalistas islâmicos participassem da resistência mujahidin no Afeganistão (BEARDEN apud CURTIS, 2004b). Foi neste período que Al-Zawahiri e muitos dos membros da Jihad Islâmica Egípcia chegaram ao país ocupado pelos soviéticos, onde entraram em contato com Dr. Abdullah Azzam e Osama bin La-den, fundadores de uma resistência mujahidin chamada al-Mak-tab al-Khidmat (MAK) (CURTIS, 2004b; GUNARATNA, 2003).

Dr. Azzam era um professor na Universidade Internacional Islâmica em Islamabad, Paquistão, e membro da Irmandade Mu-çulmana Jordaniana; enquanto bin Laden era membro de uma importante e rica família saudita e usava dos seus recursos para financiar a luta contra o comunismo no Iêmen do Sul (GUNA-RATNA, 2003). Os dois, ao fundarem o MAK em 1984, tiveram um papel decisivo na resistência antissoviética. Bin Laden cedeu

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muito da própria fortuna para a causa mujahidin no Afeganistão, além de usar de sua influência para arrecadar fundos entre filan-tropos sauditas (CURTIS, 2004b; GUNARATNA, 2003). Azzam, por sua vez, recrutava e doutrinava dezenas de milhares de jovens muçulmanos para se juntar à luta contra a ocupação soviética (GUNARATNA, 2003). Além disso, o MAK contou com a ajuda logística do governo da Arábia Saudita e dos serviços secretos dos Estados Unidos e do Paquistão (GUNARATNA, 2003).

A chegada de fundamentalistas islâmicos teria um impacto re-levante no pensamento de bin Laden. Segundo o especialista em terrorismo internacional Rohan Gunaratna (2003), muitos infor-mantes de dentro do MAK concordam que bin Laden foi trans-formado de guerrilheiro em terrorista por influência de al-Zawa-hiri. Nos últimos estágios da campanha soviética no Afeganistão, a relação entre Azzam e bin Laden havia se deteriorado (CURTIS, 2004b; GUNARATNA, 2003). Ainda que os dois concordassem nos rumos que a organização deveria tomar após a saída sovié-tica – defender muçulmanos ao redor do mundo, onde quer que fossem perseguidos –, eles discordavam em quais táticas deveriam ser usadas (GUNARATNA, 2003). Dr. Abdullah Azzam interpre-tava os ensinamentos do profeta Muhammad de modo a entender que táticas terroristas eram contra a lei islâmica por envolver a morte de inocentes que não estavam envolvidos no combate (GU-NARATNA, 2003). Bin Laden, por outro lado, e por influência de al-Zawahiri, fazia uma interpretação ainda mais extremista das ideias de Qutb: aqueles que não se voltavam contra os líde-res falsamente religiosos do Mundo Islâmico também não eram verdadeiros muçulmanos e poderiam, portanto, ser assassinados legitimamente (CURTIS, 2004b). Apesar das suas diferenças, os dois mantiveram uma aparência pública de unidade (GUNARAT-NA, 2003).

Em 24 de Novembro de 1989, uma bomba contendo 20 quilos de TNT ativada por controle remoto matou Azzam e seus dois filhos17 (CURTIS, 2004b; GUNARATNA, 2003). Quando, então, os soviéti-cos foram expulsos do Afeganistão, bin Laden foi tido como respon-sável pela libertação do país centro-asiático entre os fundamentalistas islâmicos do MAK. Segundo Gunaratna (2003, p. 22, tradução nossa),

[e]le acreditava firmemente que foram as ações dos mujahidin es-sencialmente apoiadas pelo mundo muçulmano que levaram ao

17 Por quase uma década, a autoria do ataque permaneceu desconhecida, até que um integrante da al-Qaeda revelou, durante um interrogatório, que bin Laden havia pessoal-mente requisitado a morte de Azzam (GUNARATNA, 2003).

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colapso da União Soviética e ao fim da Guerra Fria. Ele também acreditava que os Estados Unidos haviam alcançado o seu objetivo de tornar-se a única superpotência global através do que ele e seus colegas mujahidin haviam atingido no Afeganistão.

Depois de tomar o MAK, bin Laden converteria esta organi-zação em uma frente global de terrorismo, contrariamente à visão idealizada por Dr. Azzam (GUNARATNA, 2003). Após o aten-tado do dia 11 de setembro, esta organização seria conhecida no Ocidente como al-Qaeda (CURTIS, 2004c).

5.2. O Afeganistão após a invasão soviética: um breve relato histórico de 1989 a 2001.

Após nove anos de guerra, a imagem pública soviética já se encontrava bastante desgastada; as tropas estavam desmotivadas e a invasão se tornava exponencialmente custosa à medida que os mujahidins conseguiam mais e mais armamentos ocidentais. Tais fatores foram essenciais para que as tropas soviéticas saíssem do Afeganistão (TERRA, 2013). Assim sendo, em 1988, a União Soviética iniciou a retirada de suas tropas do território afegão com base nos Acordos de Genebra (TERRA, 2013).

Com a saída soviética, o novo governo, comandado pelo presi-dente Muhammad Najibullah, teve que lidar com rebeldes mujahi-dins sem o apoio de sua antiga aliada (SANCHEZ, 2010). Com a dificuldade de o governo resistir aos movimentos rebeldes, os mu-jahidins finalmente tomaram o poder em 1992 (SANCHEZ, 2010).

Ao mesmo tempo, surgia no sul do Afeganistão um movimen-to rebelde liderado pelo grupo Taliban – palavra pashto para “es-tudantes” (BAJORIA; LAUB, 2013). Tal grupo era formado por participantes da jihad afegã e por líderes tribais que estudaram em escolas religiosas no Paquistão; tendo sido formado essencialmen-te como um grupo que queria um país cuja a organização esta-tal fosse preconizada pelo fundamentalismo islâmico (BAJORIA; LAUB, 2013).

Em 1996, o Taliban conseguiu tomar Cabul e o governo foi re-conhecido pela Arábia Saudita, pelos Emirados Árabes e pelo Pa-quistão (BAJORIA; LAUB, 2013). Estima-se que até 2001, o grupo conseguiu controlar 90% do território afegão (BAJORIA; LAUB, 2013). O governo então estabelecido foi conhecido por seus seve-ros desrespeitos aos direitos humanos, que foram impostos pelas Leis da Sharia18. Aspectos corriqueiros do cotidiano passaram a

18 As Leis da Sharia são baseadas em uma combinação de fontes, incluindo o Alcorão, os

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ser regulados; as mulheres perderam seus direitos civis, não po-dendo ser educadas ou trabalhar fora de casa; o tamanho da barba dos homens foi controlado, entre outras arbitrariedades (BAJO-RIA; LAUB, 2013).

Motivados por proximidades ideológicas, o Taliban concedeu abrigo para a organização terrorista al-Qaeda em território afe-gão (BAJORIA; LAUB, 2013). Essa aliança rendeu ao Taliban san-ções do CSNU já em 1999, que envolviam congelamento de seus fundos, transparência sobre o terrorismo e a exigência da entrega de bin Laden (UNITED NATIONS, 1999). Considerando que a presença da al-Qaeda no Afeganistão trouxe consequências para esse país, a próxima subseção retomará um pouco de sua história e mostrará como a organização voltou suas atividades terroristas para os Estados Unidos.

5.3. A difícil relação entre a al-Qaeda e os Estados Unidos.

Os Estados Unidos financiaram a jihad afegã contra a União Soviética mesmo que indiretamente (CHESSUDOVSKY, 2004). No entanto, tal financiamento não foi suficiente para garantir que os fundamentalistas se tornassem aliados americanos. Tais gru-pos eram favoráveis a uma comunidade mundial muçulmana, a umma, de modo que qualquer presença estrangeira que ameaças-se essa possível unidade, como foi a presença soviética no Afega-nistão, era mal vista por eles (GARTENSTEIN-ROSS, 2011). Um exemplo disso foi a al-Qaeda.

A princípio, a al-Qaeda não se preocupava com os Estados Unidos, mesmo estes sendo apoiadores do Estado judeu de Is-rael (GARTENSTEIN-ROSS, 2011). Seus esforços se concentra-vam em combater a ameaça que o comunismo impunha à umma (GARTENSTEIN-ROSS, 2011). A invasão do Kuwait pelo Iraque em 1990 veio a reverter esse quadro (GUNARATNA, 2003).

A al-Qaeda ofereceu proteção à Arábia Saudita, uma vez que esta se sentiu ameaçada pela presença do Iraque19 no país vizi-nho, o Kuwait (GARTENSTEIN-ROSS, 2011; GUNARATNA, 2003). No entanto, a Arábia Saudita declinou a oferta em favor da ajuda estadunidense. A presença militar dos Estados Unidos na península arábica foi vista pela al-Qaeda como uma ameaça e

dizeres e condutas do Profeta – Hadith – e as decisões de estudiosos islâmicos – Fatwa.

19 Vale ressaltar que o Iraque nessa época era governado pelo ditador Saddam Hussein. Um governo que, por ser secular, não seguia estritamente as diretrizes islâmicas em ter-ritório árabe e, portanto, não era bem quisto pela al-Qaeda (GARTENSTEIN-ROSS, 2011).

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uma violação ao Islã, porque o profeta Muhammad supostamente teria dito que duas crenças não poderiam coexistir em um mesmo território árabe (GARTENSTEIN-ROSS, 2011).

Nesse ínterim, o grupo terrorista se voltou contra os Estados Unidos para poder reestabelecer a supremacia muçulmana no Oriente Médio (GARTENSTEIN-ROSS, 2011). Quando a al-Qae-da declarou abertamente sua guerra contra os EUA, pouca atenção foi dada a ela (GARTENSTEIN-ROSS, 2011). Como mostrado na subseção anterior, algumas sanções chegaram a ser impostas ao Talibã por abrigar a al-Qaeda, mas estas não foram suficientemen-te expressivas (AL-QAIDA/AL-QAEDA..., nd.). A organização terrorista realizou ataques contra embaixadas estadunidenses na África em 1998; contudo, apenas no dia 11 de setembro de 2001, ela deu seu golpe mais ousado (GUNARATNA, 2003).

O grupo sequestrou quatro aviões que foram utilizados para atingir pontos estratégicos dos EUA. Dois deles foram utiliza-dos para atingir as Torres Gêmeas, símbolo do poder econômi-co estadunidense e outro foi utilizado para atingir o Pentágono, símbolo da supremacia militar (SANCHEZ, 2010). Acredita-se que um último avião teria sido utilizado para atingir algum mar-co político em Washington, como a própria Casa Branca, caso este não tivesse sido anteriormente derrubado pelos próprios passageiros do avião (SANCHEZ, 2010). Só então, a al-Qaeda e o terrorismo tomaram proeminência na agenda internacional (GARTENSTEIN-ROSS, 2011).

5.4. O ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 e algumas consequências.

Os ataques terroristas que chocaram a opinião pública mundial necessitaram de uma resposta imediata. George W. Bush anunciou (citação oral, 11 de setembro de 2001, tradução nossa): “ou estão conosco, ou estão com os terroristas. A partir de hoje, todo país que abrigue ou apoie o terrorismo será considerado pelos Estados Uni-dos um regime hostil”. Com isso, o presidente estadunidense pediu ao regime Talibã que entregasse Osama Bin Laden, que se abrigava em território afegão (SANCHEZ, 2010). Com a recusa do grupo em entregar o líder da al-Qaeda, os Estados Unidos iniciaram a Opera-ção Liberdade Duradoura, invadindo o Afeganistão para derrubar o regime Taliban e capturar o líder da al-Qaeda (SANCHEZ, 2010).

A reação contra o terrorismo, no entanto, não se restringiu apenas à superpotência ocidental. Pode-se dizer que houve uma reação coordenada e cooperativa em escala global contra o terro-

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rismo (MENDELSOHN, 2009). Barak Mendelsohn (2009) acre-dita que tal fenômeno foi possível na medida em que os países consideraram a al-Qaeda como uma ameaça sistêmica.

Mendelsohn (2009) estabelece quatro características para que uma entidade seja considerada uma ameaça sistêmica: ela deve negar os princípios constitutivos do sistema; deve rejeitar as ins-tituições e regras que derivam desses princípios; deve promover um princípio alternativo de sistema; e deve ter a força, ou pelo menos os meios de obter força suficiente, para derrubar o siste-ma presente (MENDELSOHN, 2009). Para tal autor, os Estados, sempre que enfrentados por uma ameaça sistêmica, sentem-se ameaçados, pois a organização dos povos em Estados da maneira como se conhece é um princípio fundamental do atual sistema in-ternacional e, portanto, os Estados agiriam de maneira conjunta, ordenada, liderados pelas grandes potências contra tais ameaças (MENDELSOHN, 2009).

Com isso, pode-se entender que a al-Qaeda nega as regras, princípios e instituições do sistema internacional - pois esse tem formação fundamentalmente ocidental, prega princípios organi-zacionais diferente e tem o potencial para destruir o sistema, como bem mostrado pelo atentado de 11 de setembro. Dessa forma, a al-Qaeda pode ser vista como uma ameaça sistêmica e, como tal, a reação que causou com seus atentados foi global, ordenada e li-derada pelas grandes potências – no caso, pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido, como constatado por Mendelsohn (2009).

Desse modo, o fim da Guerra Fria criou uma situação histó-rica que permitiu não apenas a ocorrência de um dos maiores atentados terroristas da história, que operou fortes mudanças no mundo, mas também criou condições para testar a epistemologia predominante das Relações Internacionais em diversos aspectos.

6. O que o Afeganistão pode nos ensinar sobre as relações internacionais

Retomando o argumento de Smith (2003), é possível notar várias aplicações ao caso afegão. O estadocentrismo e a visão de violência das Relações Internacionais resultaram em análises e, consequentemente, decisões de política externa que se voltavam unicamente para a segurança dos Estados, não dos indivíduos (SMITH, 2003). A determinação da potência socialista em ocu-par o país vizinho, por exemplo, envolvia evitar revoltas na Ásia Central soviética e garantir a sobrevivência e lealdade da Repúbli-ca Democrática do Afeganistão (GOLDMAN, 1984; LAFETÁ, et

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al., 2008). Pouca ou nenhuma preocupação foi dada às violações de direitos humanos cometidos pela polícia secreta (SARWARY, 2012). Ademais, o foco no Estado também ajuda a entender por que tão pouca atenção foi dada ao potencial perigo do MAK/al-Qaeda, tornando este grupo uma variável esquecida.

Esta visão da violência centrada no Estado também ocasionou um silêncio das Relações Internacionais em questões de violência relacionada à economia e à saúde. No ano de 2002, por exemplo, ainda que o número de mortes ocasionadas pela pobreza e por doenças fosse bem maior que as resultantes dos ataques às Torres Gêmeas, este último tinha um impacto muito maior na agenda internacional de segurança (SMITH, 2003). De acordo com o re-latório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) de 2002, 30.000 crianças morreram de doenças evitáveis diariamente, em um total de 11 milhões naquele ano; 300 mi-lhões casos de malária surgiam todo o ano; apenas 0,1% dos 28,5 milhões de pessoas infectadas com HIV/AIDS na África tinham acesso à medicação; e, durante a década de 1990, o número de pessoas vivendo em extrema pobreza na África Subsaariana subiu de 242 milhões para 300 milhões (PNUD, 2002). O número de mortes ocasionadas pelo atentado do dia 11 de setembro foi de aproximadamente 3.000 (SMITH, 2003).

Outro ponto muito importante da crítica de Smith (2003) é o fato de que o positivismo entende o interesse primordial dos atores como dado. Desta forma, quando cientistas sociais que se-guem esta epistemologia estudam grupos fundamentalistas, eles tendem a retratar “bin Laden e seus seguidores como um grupo de extremistas que intencionalmente utilizam o Islã como uma ferramenta para reunir apoio popular e legitimar o terrorismo na busca de seus objetivos puramente políticos” (HELLMICH, 2005, p. 40, tradução nossa). Até o próprio Departamento de Defesa dos Estados Unidos conduziu uma análise cujas descobertas de-claravam que “os terroristas da al-Qaeda não são compelidos por ideologia” (THE WASHINGTON TIMES, 2003, para. 1, tradução nossa). Tal análise está em completo desacordo com as pesquisas antropológicas, as quais mostram que fundamentalistas religiosos ao redor do mundo – incluindo aqueles associados à al-Qaeda – se autodeclaram e atuam como verdadeiros fiéis (BEEMAN, 2001 apud HELLMICH, 2005).

Justamente por entender o interesse dos atores como dado, os cientistas sociais positivistas também tem negligenciado a im-portância de entender visões de mundo não-ocidentais (SMITH, 2003). No entanto, é importante notar que compreender a ideolo-

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gia e a lógica interna de grupos fundamentalistas islâmicos pode trazer uma nova luz para a sua racionalidade. Assim, esse entendi-mento pode ajudar a clarificar os limites existentes – ou inexisten-tes – para potenciais ataques futuros, o que é imprescindível para definir uma estratégia de contraterrorismo (HELLMICH, 2005).

Neste ponto, é importante lembrar que os fundamentalistas não são simplesmente um grupo de lunáticos dementes e fanáticos religiosos que personificam a pura maldade (HELLMICH, 2005). Como visto na subseção 3.3., a ideologia fundamentalista é in-fluenciada pelos escritos de filósofos como Qutb. Contudo, é im-portante adicionar que este mesmo pensador foi influenciado por todo um contexto político, social e religioso (HELLMICH, 2005; CURTIS, 2004a) e por outros atores clássicos do mundo islâmico, como, por exemplo, Ibn Taymiyya – um pensador e teólogo mu-çulmano do século XIII (DORAN, 2002). Portanto, o pensamento fundamentalista islâmico é complexo demais para ser ignorado em prol de uma neutralidade weberiana, que, de todos os modos, seria inatingível.

A busca por uma ciência social isenta de valores tem produ-zido, na verdade, uma ciência social que serve alguns interesses, principalmente os dos mais poderosos (SMITH, 2003). A teoria realista e seus conceitos – como o estadocentrismo, a anarquia in-ternacional e a autoajuda – não têm apenas explicado as várias invasões que o Afeganistão sofreu através de sua história; eles têm, também, as justificado em nome da segurança – de Estados, não de indivíduos – e ignorado os problemas internos que elas geram.

Faz-se necessário ressaltar que a crítica aqui apresentada não nega a capacidade da teoria realista em prever resultados (SMI-TH, 2003). Ela é efetiva em prever o comportamento de muitos autores; contudo, ela tem centrado sua análise na violência ou po-tencial violência sofrida por grandes potências. Como as Relações Internacionais são uma disciplina desenvolvida majoritariamente nos Estados Unidos e no Reino Unido, ela tem adotado preocu-pações políticas destes países como se fossem as do mundo todo (SMITH, 2003).

Ao ignorar problemas internos e pontos de vista não-ociden-tais e ao justificar as ações de potências com base em uma defini-ção muito estrita de violência e segurança, as Relações Internacio-nais ajudaram a construir o mundo em que o atentado às Torres Gêmeas foi possível (SMITH, 2003). Assim, é necessário adicionar considerações éticas à disciplina.

Ainda que existam exemplos de teóricos que têm prestado mais atenção em questões subjetivas, a maioria tem mantido a

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epistemologia positivista em seus escritos (SMITH, 2003). Nas palavras de Smith (2003, p. 500, tradução nossa),

todos nós na disciplina precisamos refletir na possibilidade que am-bos os caminhos em que nós construímos teorias sobre o mundo político e conteúdo dessas teorias tem apoiado forças sociais espe-cíficas e, essencialmente, [...] tomado partido em grandes questões éticas e políticas.

7. Conclusão

A abordagem desenvolvida ao longo deste artigo foi utilizada para entender a origem de grupos fundamentalistas no Afeganis-tão tanto historicamente, remontando à época da proclamação da república e da invasão soviética; quanto ideologicamente, tra-çando suas origens filosóficas. Ao fazer isto, tentou-se ir além de meramente explicar o seu comportamento sem levar em conside-ração possíveis motivações ou precedentes. Vale ressaltar que ab-solutamente nada neste texto ou nas observações teóricas de Smi-th (2003) justifica os atentados do dia 11 de setembro de 2001. O objetivo da abordagem adotada é entender as razões destas ações e os motivos pelas quais elas foram aclamadas em diferentes partes do mundo (SMITH, 2003).

Dito isso, vale a pena ressaltar o fato de que as teorias das Relações Internacionais são majoritariamente escritas nos Esta-dos Unidos e no Reino Unido (SMITH, 2003). A maioria destes teóricos tenta seguir uma epistemologia weberiana, que afirma que é possível conceber uma ciência social isenta de valores. No entanto, por estarem envolvidos no contexto político britânico e estadunidense, eles acabam adotando focos e conceitos que refle-tem as principais preocupações políticas destes países e de outras potências como eles (SMITH, 2003). Justamente por acreditarem na isenção de valores de seus conceitos, estes acadêmicos os apre-sentam como sendo universais. Desta forma, eles acabam não ape-nas explicando, como também justificando as ações de potências em nome de uma segurança que é totalmente centrada no Estado (SMITH, 2003).

A proclamação da república afegã foi seguida por um perío-do de instabilidade que resultou no golpe do PDPA (HANNAH, 1980; RUBINSTEN, 1982; VÄRYNEN, 1980). Não sendo aceito pela maior parte de sua população, o PDPA passou a reprimir seus opositores, o que gerou uma guerra civil (GOLDMAN, 1988). Neste cenário, a União Soviética ocupa o Afeganistão na intenção

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de manter o socialismo e evitar um alastramento de rebeliões an-tissoviéticas na Ásia Central (LAFETÁ et al, 2008; GOLDMAN, 1988). Em razão da ocupação, reuniões do CSNU e da AGNU fo-ram convocadas. Contudo, a retirada das tropas se daria apenas em 1988 (BBC, 2009). Após esta data, o governo de Najibullah continuou a enfrentar uma guerra civil até que, em 1996, o Tali-ban conseguiu tomar a capital e ter seu governo reconhecido por alguns países da região (BAJORIA; LAUB, 2013). Mesmo com as continuadas violações aos direitos humanos (BAJORIA; LAUB, 2013), a situação no Afeganistão só voltou à agenda internacional após os atentados terroristas às Torres Gêmeas (GARTENSTEIN-ROSS, 2011).

Na verdade, ainda que este país tenha estado continuamente em guerra civil desde a década de 1970, sua situação só foi leva-da às pautas de segurança internacional quando uma potência se sentia ameaçada – seja ela a União Soviética ou os Estados Uni-dos. Com a retirada das tropas da potência ocidental prevista para 2014, o Afeganistão volta à discussão política internacional e a Rússia considera a possibilidade de enviar as suas próprias tro-pas para o Afeganistão por motivos de segurança estadocêntrica (BOWEN, 2013; STUSTER, 2013).

A abordagem e as críticas presentes neste artigo também são um apelo por uma disciplina de Relações Internacionais mais preocu-pada com as questões éticas destas posições políticas e intervenções militares (SMITH, 2003). Também é uma expressão de preocu-pação com os silêncios que a disciplina deixa em questões como identidade, cultura, atores não-estatais e tipos de violências ligados à economia e à saúde (SMITH, 2003). Estes objetivos só podem ser alcançados quando a disciplina estiver mais aberta a tratar de uma variedade de questões, não só àquelas ligadas aos poderes mundiais dominantes. Para tanto, será necessário superar o positivismo e ad-mitir várias rotas possíveis para o conhecimento e reconhecer as limitações da busca pela verdade científica (SMITH, 2003).

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