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Alexandre Carlos Araújo de Santana A EXPERIÊNCIA DO PROJETO DOM HELDER CÂMARA, COM UNIDADES DEMONSTRATIVAS DE PISCICULTURA EM TANQUES-REDE EM ASSENTAMENTOS E PEQUENAS COMUNIDADES RURAIS DO SEMI-ÁRIDO NORDESTINO Trabalho de Conclusão apresentado ao Departamento de Administração e Economia da Universidade Federal de Lavras, como parte das exigências do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Administração Rural, para a obtenção do título de Especialista em Administração Rural. Orientador Prof. Arnaldo P. Vieira LAVRAS MINAS GERIAS – BRASIL 2006

A experiência do Projeto Dom Helder Camara, com unidades

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Alexandre Carlos Araújo de Santana

A EXPERIÊNCIA DO PROJETO DOM HELDER CÂMARA, COM UNIDADES

DEMONSTRATIVAS DE PISCICULTURA EM TANQUES-REDE EM

ASSENTAMENTOS E PEQUENAS COMUNIDADES RURAIS DO SEMI-ÁRIDO

NORDESTINO

Trabalho de Conclusão apresentado ao

Departamento de Administração e Economia da

Universidade Federal de Lavras, como parte das

exigências do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em

Administração Rural, para a obtenção do título de

Especialista em Administração Rural.

Orientador

Prof. Arnaldo P. Vieira

LAVRAS

MINAS GERIAS – BRASIL

2006

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Alexandre Carlos Araújo de Santana

A EXPERIÊNCIA DO PROJETO DOM HELDER CÂMARA, COM UNIDADES

DEMONSTRATIVAS DE PISCICULTURA EM TANQUES-REDE EM

ASSENTAMENTOS E PEQUENAS COMUNIDADES RURAIS DO SEMI-ÁRIDO

NORDESTINO

Trabalho de Conclusão apresentado ao

Departamento de Administração e Economia da

Universidade Federal de Lavras, como parte das

exigências do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em

Administração Rural, para a obtenção do título de

Especialista em Administração Rural.

APROVADA em __ de _________ de _____.

Prof. ________________

Prof. ________________

Prof. Arnaldo P. Vieira

UFLA

(Orientador)

LAVRAS

MINAS GERAIS – BRASIL

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a toda equipe do Projeto Dom Helder Camara, que me deu a oportunidade de conviver

como especialista em piscicultura com uma experiência pioneira e enriquecedora em comunidades e

assentamentos rurais. Experiência esta que relato nessa monografia.

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SUMÁRIO

1.LISTA DE FIGURAS ......................................................................................................... 5 2.LISTA DE TABELA ........................................................................................................... 6 3.INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 4 4. OBJETIVO ......................................................................................................................... 6 5. JUSTIFICATIVA ............................................................................................................... 7 6. REVISÃO DE LITERATURA .......................................................................................... 8

6.1 O NORDESTE SEMI-ÁRIDO ..................................................................................... 8 6.2 SEGURANÇA ALIMENTAR ..................................................................................... 9 6.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL ............................................................... 13

7. MATERIAL E MÉTODO ................................................................................................ 20 7.1 ABORDAGEM DOS ASPECTOS FÍSICOS E TÉCNICOS PARA MONTAR AS UD´S DE PISCICULTURA ............................................................................................. 20 7.2 MANEJO E COMERCIALIZAÇÃO ......................................................................... 21

8. RESULTADOS ................................................................................................................ 26 9. DISCUSSÃO .................................................................................................................... 29

9.1 IMPLANTAÇÃO DAS UD´S: OBSTACULOS E MEDIDAS DE SUPERAÇÃO .. 29 9.1.1 Dificuldades ......................................................................................................... 29 9.1.2 Aspectos positivos. .............................................................................................. 29 9.1.3 Problemas de gestão ............................................................................................ 30 9.1.4 Problemas de manejo ........................................................................................... 32 9.1.5 Concorrência Pela Ração ..................................................................................... 32 9.1.6 Fugas .................................................................................................................... 33 9.1.7 Dificuldades na Comercialização ........................................................................ 34 9.1.8 O Passo Seguinte ................................................................................................. 35

10. CONCLUSÃO ................................................................................................................ 36 11 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................ 37 11. ANEXO ......................................................................................................................... 40

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1.LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Comissão do grupo de interesse de compras de material ....... Erro! Indicador não definido.

Figura 2. Montagem das estruturas (berçário) ....................... Erro! Indicador não definido. Figura 3. Modelo de TR utilizado em Sergipe. ..................... Erro! Indicador não definido. Figura 4. Modelo de TR utilizado em Sergipe. ..................... Erro! Indicador não definido. Figura 5. Alevinos embalados, prontos para viagem. ........... Erro! Indicador não definido. Figura 6. Alevinos embalados, prontos para viagem. ........... Erro! Indicador não definido. Figura 7. Coleta dos peixes para biometria. .......................... Erro! Indicador não definido. Figura 8. Coleta dos peixes para biometria. .......................... Erro! Indicador não definido. Figura 9. Gráfico Estados X Números .................................. Erro! Indicador não definido. Figura 10. Gráfico: Resultados obtidos X Resultados Esperados ......... Erro! Indicador não

definido. Figura 11. Gráfico: Produção de pescado em Kg .................. Erro! Indicador não definido. Figura 12. Gráfico: Avaliação dos Grupos ............................ Erro! Indicador não definido. Figura 13. Reunião de replanejamento e avaliação ............... Erro! Indicador não definido.

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2.LISTA DE TABELA

Tabela 1. Programa Fome Zero: Projeção da necessidade quantitativa de alimentos......................11

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3.INTRODUÇÃO

Este trabalho de conclusão foi feito com base em uma experiência pioneira, em Unidades

Demonstrativas (UD´s) de Piscicultura em Tanque-rede (TR), do Projeto Dom Helder Câmara

(PDHC) que é uma Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT) do Ministério do

Desenvolvimento Agrário (MDA). O PDHC surgiu a partir de um acordo de empréstimo,

financiado 50% pelo Governo Federal e 50% pelo Fundo Internacional para o Desenvolvimento

Agrário (FIDA). O Projeto desenvolve um programa de ações referenciais para o desenvolvimento

sustentável do semi-árido, buscando garantir a inserção competitiva, não subordinada, segurança

alimentar e o empoderamento de trabalhadores assentados e agricultores familiares na formação,

implementação e controle social de políticas públicas. È missão do Projeto Dom Helder Camara,

contribuir para o desenvolvimento humano-local-sustentável-integrado, contemplando o

fortalecimento da cidadania e as perspectivas de gênero, geração e etnia.

A Unidade Demonstrativa, é uma estrutura de aprendizado que prioriza o caráter educativo

ao econômico, nessa, a escala da experiência deve ser apenas suficiente para os agricultores

familiares se apropriarem dos conhecimentos pertinentes a prática produtiva e/ou organizativa de

dado cultivo ou cultura. Na Unidade Demonstrativa, as experiências produtivas devem constituir

módulos replicáveis cujo tamanho possa ser multiplicado, caso a caso, para a posterior constituição

de áreas produtivas com o objetivo de gerar ocupação produtiva, renda e segurança hídrica e

alimentar. A Unidade Demonstrativa, no âmbito do PDHC, tem dois objetivos complementares

entre si. Primeiro, a UD serve como um instrumento metodológico do trabalho da assessoria técnica

visando uma ação mais eficaz de mobilização de conhecimentos, especialmente no que concerne à

troca de saberes entre assessor técnico e agricultores. Segundo, a UD objetiva propiciar à

comunidade meios para a experimentação e aprendizado de propostas técnicas e/ou organizativas

promissoras para a solução de problemas e/ou para o melhor aproveitamento de potencialidades.

A tecnologia escolhida para trabalhar nas Unidades foi o cultivo em tanque-rede. Piscicultura

em tanque-rede é um confinamento construído em tela, e que é imerso em um sistema aquático

(tanques, açudes, rios, etc.), onde os peixes podem ser cultivados (Schmittou, H.R 1995). A

piscicultura em tanques-rede apresenta diversas vantagens: Baixo custo de implantação (dispensa

escavações, aquisição de sistema hidráulico, etc.), Pode ser estocado com um grande número de

peixes por unidade de volume , Implantação de sistema intensivo em locais onde não é possível

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fazer o esvaziamento total (grandes represas, rios, açudes, etc.), Facilidade na despesca, Maior

controle da população (Schmittou, H.R 1995).

A espécie utilizada nas UD´s é a Tilápia Nilótica, variedade Chitralada (Oreochromis

niloticus). Pois, apresenta varias qualidades desejáveis para o cultivo em TR´s como: Boa aceitação

e bom valor no mercado, Facilidade de produção de alevinos em cativeiro, fácil adaptação à

alimentação com rações secas, boa tolerância às condições de cultivo intensivo, crescimento rápido

e bom desempenho produtivo além de boa tolerância a doenças e parasitoses.(Carro-Anzalotta, A.E,

1986).

Este trabalho a relata a experiência do Projeto Dom Helder Câmara, com Unidades

Demonstrativas de piscicultura em tanques-rede, implantadas em assentamentos e pequenas

comunidades rurais do semi-árido nordestino, descritos na visão do técnico especialista em

piscicultura, responsável pela montagem, gerenciamento e acompanhamento técnico destas UD´s.

A base de dados discutidos, são as 17 Unidades Demonstrativas de Piscicultura implantadas

em nos estados de Pernambuco, Paraíba, Sergipe e Ceará. Que atendeu a 175 famílias resultando

num total de 850 pessoas beneficiadas.

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4. OBJETIVO

Este trabalho de conclusão tem como objetivo, sistematizar a experiência do Projeto Dom

Helder Camara, com 17 Unidades Demonstrativas de Piscicultura, implantadas nos estados de

Pernambuco, Paraíba, Sergipe e Ceará, que beneficiou 175 famílias, trazendo uma avaliação técnica

/ metodológica e as soluções construídas pelos grupos para a superação dos entraves encontrados.

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5. JUSTIFICATIVA

A implantação de um programa sustentável e participativo de piscicultura nas áreas de

atuação do Projeto Dom Helder Câmara - PDHC, justifica-se pelo caráter da região apresentar

contundentes crises econômicas e sociais, decorrentes da escassez de recursos produtivos e da falta

de opções de renda, além de apresentar altos índices de pobreza e insegurança alimentar. Na

intenção de se modificar esse quadro, surgiram experiências que visam desenvolver propostas

sustentáveis de diversificação produtiva para a melhoria das condições de vida dessas comunidades,

uma destas é a piscicultura.

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6. REVISÃO DE LITERATURA

6.1 O NORDESTE SEMI-ÁRIDO

A Região Nordeste ocupa 18,27% do território brasileiro, com uma área de 1.561.177,8

km². Deste total, 962.857,3 km² situam-se no Polígono das Secas, delimitado em 1936, através da

Lei 175, e revisado em 1951. O Polígono abrange oito Estados nordestinos - o Maranhão é a única

exceção -, além da área de atuação da ADENE em Minas Gerais, com 121.490,9 km², e compreende

as áreas sujeitas repetidamente aos efeitos das secas. Já o Semi-Árido ocupa 841.260,9 km² de área

no Nordeste e outros 54.670,4 Km² em Minas Gerais e caracteriza-se por apresentar reservas

insuficientes de água em seus mananciais, (IBGE 1980)

Em 1980, o censo do IBGE apontou uma distribuição eqüitativa da população do Nordeste,

em que 50,46% viviam na zona urbana e 49,54%, na rural. No entanto, entre 1980 e 1991, houve

uma redução na população rural, que emigrou para as grandes cidades, devido às secas ocorridas

neste período. De acordo com o censo de 1991, 60,35% dos nordestinos estavam nas áreas urbanas

e 39,35% permaneciam no interior. De acordo com o IBGE, em 1996, mais de 27 milhões de

pessoas moravam na Região do Polígono das Secas e mais de 18 milhões, no Semi-Árido.

Estudos indicam que o fenômeno das secas remonta há milhares de anos, antes mesmo da

ocupação humana no Nordeste brasileiro, (SUDENE 1990). De acordo com dados da Coordenação

de Defesa Civil da extinta Sudene, a ocorrência de secas na Região se verifica desde antes da

chegada dos europeus ao continente. Alguns vestígios de barragens foram encontradas em rios no

Estado do Ceará, o que, segundo relato do historiador Pompeu Sobrinho, mostra que o homem

nativo do Nordeste já utilizava pedras para represar a água dos rios.

As causas das secas têm proporção planetária e são influenciadas por diversos fatores,

dentre os quais vale destacar: diferença de temperatura superficial das águas do Atlântico Norte,

que são mais quentes, e do Sul, frias; deslocamento da Zona de convergência intertropical para o

Hemisfério Norte, em épocas previstas para permanência no Sul; e o aparecimento do fenômeno

conhecido como El Niño, caracterizado pelo aumento da temperatura no Oceano Pacífico

Equatorial Leste. A topografia acidentada do Nordeste e alta refletividade da crosta são os

principais fatores locais inibidores da produção de chuvas, (SUDENE 1990).

O Nordeste do Brasil é talvez a região do país sobre a qual mais se escreveu até hoje. Ao

longo da história, a região tem sido tratada como uma questão a ser resolvida – a questão Nordeste

–, ganhando o estigma de “região problema”, já que guarda em seu conjunto os piores índices de

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desenvolvimento econômico e social do país. Ao lado disso, a região possui características naturais

singulares no Brasil, tendo em boa parte de seu território a ocorrência do clima semi-árido (ADENE

2000).

Característica natural deste clima, a seca compõe o principal elemento do imaginário

regional veiculado e difundido nacionalmente através dos meios de comunicação e da bibliografia

acadêmica. Nestes trabalhos, além da ligação forte entre a sociedade e a natureza, na maior parte

deles, a natureza é trabalhada discursivamente como a causa principal do atraso regional. A seca,

bem como a escassez de água no sertão, são apontadas, na maioria dos discursos, como as grandes

responsáveis pela miséria que atinge a região.

Uma simples comparação com outras regiões semi-áridas do globo revela o falseamento

dessa questão. O clima árido da Califórnia ou de Israel não lançou suas populações em um estado

de miséria. A existência de populações miseráveis ou ricas em diferentes regiões semi-áridas do

globo aponta para os diferentes padrões de ocupação ao longo da história como a principal razão

dos desníveis regionais existentes no semi-árido (CASTRO, 1994, 1996). Essa associação entre

clima e pobreza revela um tratamento determinista da questão que contamina, mesmo que

inconscientemente, boa parte da produção intelectual e cultural sobre a região.

Dessa forma, do ponto de vista do discurso regional, podemos falar na existência de um

determinismo geográfico nordestino, que acompanha até hoje o imaginário da região, apesar de

teorias deterministas há muito serem rechaçadas por grande parte dos geógrafos.

Alguns autores, em especial CARVALHO (1988) e CASTRO (1992), mostram como a

permanência desse discurso está ligada às estratégias da elite regional conservadora para conseguir

maior participação na divisão das verbas federais. Tal fato evidencia a importância da interpretação

do discurso, na medida em que este é um forte instrumento de legitimação da atuação dos diferentes

grupos sobre o espaço.

6.2 SEGURANÇA ALIMENTAR

A segurança alimentar sempre implica na necessidade de produção de alimentos em

quantidade e com qualidade, assim como na possibilidade de acesso da população aos alimentos

produzidos. Ainda que se reconheça a relevância do segundo aspecto, este artigo trata apenas do

primeiro, por entender que a oferta de alimentos na quantidade necessária, de forma permanente,

requer uma agricultura ambientalmente sustentável e capaz de produzir alimentos com elevada

qualidade, pois somente com alimentos de qualidade biológica superior ao que se produz hoje é

possível garantir alimentação saudável.

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A expressão segurança alimentar, como conceito orientador para políticas públicas,

apareceu em 1974, durante a Conferência Mundial da Alimentação promovida pela FAO. Em 1996,

a FAO estabelecia um conceito mais ambicioso, ao afirmar que se trata de assegurar o acesso aos

alimentos para todos e a todo o momento, em quantidade e qualidade suficientes para garantir uma

vida saudável e ativa. A partir do estabelecimento deste conceito, ficou mais patente a importância

de uma agricultura que produza alimentos básicos (e não apenas commodities), com adequada

qualidade biológica. Ademais, o conceito alerta para a necessidade de que a agricultura seja mais

respeitosa com o meio ambiente, de modo a assegurar a conservação da base de recursos naturais

indispensável para a produção ao longo do tempo. Esta preocupação se justifica quando a FAO, que

é a organização das Nações Unidas encarregada de zelar pela agricultura e pela alimentação dos

povos, diagnostica que, ao longo das décadas de Revolução Verde, houve um crescimento

significativo da fome no mundo. No mesmo período cresceu o êxodo rural e aumentou a pobreza

tanto rural como urbana. Hoje existem no mundo mais de 800 milhões de pessoas passando fome.

No Brasil, apesar de não haver consenso sobre os números apresentados nas estatísticas, há pelo

menos 44 milhões de habitantes sem as condições alimentares adequadas.

Se por um lado estamos diante de um problema de acesso aos alimentos, por outro estamos

diante de uma carência na produção de comida para atender as necessidades de todos os brasileiros,

quer em quantidade quer em qualidade. No que tange à qualidade dos alimentos que estão sendo

ofertados à população, cabe registrar que pesquisa realizada pela Agência Nacional de Vigilância

Sanitária, por exemplo, mostrou que 81,2% das amostras de alimentos analisadas continham

resíduos de agrotóxicos, sendo que 22,17% apresentavam contaminação acima dos limites máximos

permitidos pela legislação. Além disso, a Agência identificou a presença de resíduos de agrotóxicos

não autorizados para determinadas culturas (ANVISA, 2002). Sobre a questão da quantidade, o

padrão agrícola dominante no país tem deixado a desejar quando o assunto é a produção de

alimentos básicos. Assiste-se, atualmente, a um camuflado desconforto e evidente constrangimento

por parte daqueles que, nos últimos anos, rezaram acriticamente pela bíblia dos agroquímicos e que,

agora, estão podendo observar o início de um verdadeiro bombardeio de notícias e resultados de

pesquisa que divulgam o descobrimento de impactos nada desprezíveis de insumos e tecnologias

agrícolas convencionais sobre o meio ambiente e a saúde da sociedade. Observe-se que, ainda que

muitos não queiram admitir, As denúncias formuladas por (RACHEL CARSON, 1962), no início

dos anos 1960, mantêm grande atualidade e deveriam servir como referência para tomadas de

decisão sobre o uso de determinados insumos ou tecnologias. As estimativas da Super Safra de

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2002/2003 ilustram bem o aumento da produção de alguns grãos, especialmente soja e milho, mas

não mostram a debilidade na produção e na oferta de alimentos básicos para a dieta dos 44 milhões

de brasileiros que ainda não têm acesso aos alimentos em quantidade suficiente. Observe-se que,

segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB, 2003), das 120,2 milhões de

toneladas de grãos produzidas no ano agrícola 2002/2003, 52,209 milhões de toneladas

correspondem à produção de soja, sendo que cerca de 37,2 milhões de toneladas de produtos do

complexo soja destinam-se à exportação. Em relação ao volume total de produção, o consumo

nacional de soja em grão na alimentação humana é pouco expressivo, até porque a ingestão desta

leguminosa não faz parte dos hábitos alimentares da maioria da população. Por outro lado, na

mesma safra assiste-se a uma redução no volume de arroz produzido, a produção de arroz caiu de

10,626 milhões de toneladas, colhidas na safra 2001/2002, para 10,441 milhões de toneladas, na

safra 2002/2003 (CONAB, 2003), este sim um produto plenamente incorporado na dieta nacional.

No que se refere ao trigo, apesar da variação positiva esperada, cabe salientar que o país produz

apenas 4,514 milhões de toneladas das 10,691 milhões de toneladas que consome. A resultante

dessa situação é óbvia: o país precisará importar alimentos básicos, como arroz, trigo, feijão, batata

e leite, pois as quantidades atualmente produzidas são insuficientes para atender a demanda dos 170

milhões de habitantes; e poderão ser ainda mais insuficientes caso o Programa Fome Zero obtiver

sucesso.

O quadro abaixo ilustra a deficiência na produção de alimentos básicos quando o objetivo é

a inclusão dos 44 milhões de brasileiros que hoje passam fome.

Tabela 1. Programa Fome Zero: Projeção da necessidade quantitativa de alimentos*

Alimentos Provisão mínima (1) Decreto Lei 399/38

Necessidade quantitativa anual (2)

mil t/l

Consumo brasileiro em 2002

mil t (3)

Acréscimo no consumo Unidade Quantidade

1. Carnes kg 6,0 2.014,0 1.1. bovina kg 3,0 1.007,0 6.459.8 16% 1.2. frango kg 3,0 1.007,0 5.862,8 17% 2. Leite l 15,0 5.035,0 22.100,0 23% 3. Feijão kg 4,5 1.510,5 2.712,7 56% 4. Arroz (benef.) kg 3,0 1.007,0 8.076,8 12% 5. Batata kg 6,0 2.014,0 2.864,0 70% 6. Tomate kg 9,0 3.021,0 3.076,0 98% 7. Café em pó kg 0,6 201,4 780,0 26% 8. Óleo de soja kg 1,5 503,5 2.935,0 17%

(1) Necessidade mínima de alimento/mês. O Decreto Lei 399/38 ainda inclui o pão

francês (6 kg), banana (90 unidades), açúcar (3 kg) e manteiga (90 g);

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(2) Para 44,04 milhões de pessoas. De acordo com o Projeto Fome Zero, os 44 milhões de

pessoas correspondem a 9.324 mil famílias com renda familiar per capita de até US$ 1,08 por dia.

Conforme o Dieese, uma família é constituída de 2 adultos e duas crianças, considerando para fins

de quantidade que o consumo de uma família corresponde a de 3 adultos;

(3) Fontes: carnes, feijão e arroz (CONAB), óleo (ABIOVE), batata e tomate –

produção (IBGE), leite – milhões litros (CNA).

* Fonte: Pernambuco (2002). Elaboração: Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

Os dados até aqui apresentados indicam que, para que o Brasil possa alcançar o objetivo de

Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável, para toda a população brasileira, é necessário que

sejam implementadas políticas públicas que: a) disponibilizem mais recursos para estimular e bem

remunerar a produção de alimentos básicos compatíveis com os hábitos alimentares predominantes

em cada região do país; e b) destinem recursos para implementar um amplo processo de

reconversão da agricultura, ou seja, um processo de transição do sistema convencional, baseado na

agroquímica, para uma agricultura sustentável, baseada nos princípios da Agroecologia. A

implementação destas políticas, fundamentais para a Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável

dos brasileiros, ainda carece de decisão política dos governos federal, estaduais e municipais.

Nesta perspectiva, cabe salientar ainda a importância da Reforma Agrária e da Agricultura

Familiar na construção de estratégias de desenvolvimento rural sustentável e de aumento e

consolidação da produção nacional de alimentos básicos. Conforme tem sido defendido ao longo de

décadas, o desenvolvimento rural brasileiro carece de uma vigorosa reforma da estrutura fundiária e

de políticas consistentes de fortalecimento da Agricultura Familiar. Como se sabe, existem no

Brasil 4.139.369 estabelecimentos rurais familiares que, embora ocupando apenas 30,5% da área

total e dispondo de 25,3% do financiamento, respondem por 37,9% do Valor Bruto da Produção

(VBP) e por 76,85% da mão-de-obra ocupada na agricultura. Segundo MDA/INCRA (2000), os

agricultores familiares produzem 24% do VBP total da pecuária de corte, 52% da pecuária de leite,

58% dos suínos e 40% das aves e ovos. Além disso, respondem pela produção de 33% do algodão,

31% do arroz, 72% da cebola, 67% do feijão, 97% do fumo, 84% da mandioca, 49% do milho, 32%

da soja, 46% do trigo, 58% da banana, 27% da laranja, 47% da uva, 25% do café e 10% da cana-de-

açúcar, o que demonstra a grande importância estratégica deste setor. Logo, uma vez estabelecidas

como meta a busca de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável e a incorporação de um

contingente enorme de brasileiros como consumidores de alimentos, seria pouco inteligente

desconsiderar a relevância do segmento familiar rural. Vale ressaltar, ademais, que a agricultura de

base familiar é mais apropriada para o estabelecimento de estilos de agricultura sustentável, tanto

pelas características de maior ocupação de mão-de-obra e de diversificação de culturas, que são

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próprias desta forma de organização da produção, quanto pela sua maior capacidade de proceder o

redesenho de agroecossistemas mais acordes aos ideais de sustentabilidade (TOLEDO, 2002).

6.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL

O conceito de desenvolvimento sustentável surgiu a partir dos estudos da Organização das

Nações Unidas sobre as mudanças climáticas, no início da década de 1970, como uma resposta à

preocupação da humanidade, diante da crise ambiental e social que se abateu sobre o mundo desde

a segunda metade do século passado. Esse conceito, que procura conciliar a necessidade de

desenvolvimento econômico da sociedade com a promoção do desenvolvimento social e com o

respeito ao meio-ambiente, hoje é um tema indispensável na pauta de discussão das mais diversas

organizações, e nos mais diferentes níveis de organização da sociedade, como nas discussões sobre

o desenvolvimento dos municípios e das regiões, correntes no dia-a-dia de nossa sociedade.

O ano de 1968, segundo Camargo (2003), foi o primeiro sinal de grave descontentamento

popular com o modelo de capitalismo industrial no final do seu ciclo, com a eclosão do protesto

estudantil em cadeia, iniciado em Paris, em maio de 1968, passando por Berkeley, Berlim e Rio de

Janeiro.

Aquele primeiro surto de globalização dos movimentos sociais, segundo a autora, apontava

para mudanças radicais que iriam se estender a vastos domínios, influenciando não apenas a

economia e a sociedade como também o próprio modelo civilizatório, com seus usos e costumes. A

falsa idéia de uma evolução sem limites e a ingênua crença na continuidade do progresso, se

constituíam no inimigo comum de todas as frentes, e a grande questão que se levantava era: Para

onde vamos?

Em meio aos movimentos estudantis e hippies dos anos 60, emerge o novo ambientalismo,

com objetivos e demandas bem definidos e consciente da dimensão política dos mesmos, chamando

a atenção para as conseqüências devastadoras que um desenvolvimento sem limites estava

provocando.

Rompendo as muralhas da cidadela econômica, o ecologismo passa a questionar a

racionalidade econômica em termos de seus próprios critérios. Mais concretamente, o novo debate

evidencia que, frente aos diversos impasses e problemas que o desenvolvimento industrial coloca, a

solução ou superação dos mesmos pode exigir não uma nova arrancada, mas a adoção de medidas

restritivas ao aumento da produção econômica, o que coloca a idéia de racionalidade ecológica

como o princípio balizador e limitante da racionalidade econômica e do próprio desenvolvimento.

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O Clube de Roma, entidade formada por intelectuais e empresários, que não eram militantes

ecologistas, foi uma iniciativa que surgiu das discussões a respeito da preservação dos recursos

naturais do planeta Terra. Ele produziu os primeiros estudos científicos a respeito da preservação

ambiental, que foram apresentados entre 1972 e 1974, e que relacionavam quatro grandes questões

que deveriam ser solucionadas para que se alcançasse a sustentabilidade: controle do crescimento

populacional, controle do crescimento industrial, insuficiência da produção de alimentos, e o

esgotamento dos recursos naturais. (CAMARGO, 2002)

Após a publicação da obra “Os Limites do Crescimento”, pelo Clube de Roma em 1972,

este conceito toma um grande impulso no debate mundial, atingindo o ponto culminante na

Conferência das Nações Unidas de Estocolmo, naquele mesmo ano.

A partir daí, desenvolvimento e meio ambiente passam a fundir-se no conceito de

ecodesenvolvimento, que no início dos anos 80 foi suplantado pelo conceito de desenvolvimento

sustentável, passando a ser adotado como expressão oficial nos documentos da ONU, UICN e

WWF.

A evolução do pensamento

A idéia de um novo modelo de desenvolvimento para o século XXI, compatibilizando as

dimensões econômica, social e ambiental, surgiu para resolver, como ponto de partida no plano

conceitual, o velho dilema entre crescimento econômico e redução da miséria, de um lado, e

preservação ambiental de outro. O conflito vinha, de fato, arrastando-se por mais de vinte anos, em

hostilidade aberta contra o movimento ambientalista, enquanto este, por sua vez, encarava o

desenvolvimento econômico como naturalmente lesivo e os empresários como seus agentes mais

representativos. (CAMARGO, et. al, 2004)

Em 1987, a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento da Organização

das Nações Unidas, na Noruega, elaborou um documento denominado “Nosso Futuro Comum”

também conhecido como Relatório Brundtland, onde os governos signatários se comprometiam a

promover o desenvolvimento econômico e social em conformidade com a preservação ambiental.

(CMMAD, 1987)

Nesse relatório foi elaborada uma das definições mais difundidas do conceito: “o

desenvolvimento sustentável é aquele que atende as necessidades do presente sem comprometer as

possibilidades de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades”.

Este documento chamou a atenção do mundo sobre a necessidade urgente de encontrar

formas de desenvolvimento econômico que se sustentassem, sem a redução dramática dos recursos

naturais nem com danos ao meio ambiente. Definiu também, três princípios essenciais a serem

cumpridos: desenvolvimento econômico, proteção ambiental e eqüidade social, sendo que para

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Santana, A.C.A A experiência do Projeto Dom Helder câmara,com unidades demonstrativas de piscicultura..

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cumprir estas condições, seriam indispensáveis mudanças tecnológicas e sociais. Este relatório foi

definitivo na decisão da Assembléia Geral das Nações Unidas, para convocar a Conferência sobre o

meio Ambiente e Desenvolvimento, dada à necessidade de redefinir o conceito de desenvolvimento,

para que o desenvolvimento sócio-econômico fosse incluído e assim a deterioração do meio

ambiente fosse detida. Esta nova definição poderia surgir somente com uma aliança entre os países

desenvolvidos e em desenvolvimento.

Tanto o Relatório Brundtland quanto os demais documentos produzidos pelo Clube de

Roma, sobre o Desenvolvimento Sustentável, foram fortemente criticados porque creditaram a

situação de insustentabilidade do planeta, principalmente, à condição de descontrole da população e

à miséria dos países do Terceiro Mundo, efetuando uma crítica muito branda à poluição ocasionada

durante os últimos séculos pelos países do Primeiro Mundo.

Segundo Castro (1996), o repto imposto pelo novo ambientalismo ao desenvolvimento foi o

prelúdio de um questionamento ainda mais radical: o da nova questão social, amadurecida no final

dos anos 80.

A dimensão de sustentabilidade social inerente ao conceito, não diz respeito apenas ao

estabelecimento de limites ou restrições à persistência do desenvolvimento, mas implica na

ultrapassagem do econômico: não pela rejeição da eficiência econômica e nem pela abdicação do

crescimento econômico, mas pela colocação dos mesmos a serviço de um novo projeto societário,

onde a finalidade social esteja “justificada pelo postulado ético de solidariedade intrageracional e de

equidade, materializada em um contrato social”. (SACHS, 1995:26). É esta a abordagem de

desenvolvimento social que adota-se neste trabalho.

De acordo com Castro (1996), esse novo paradigma conhecido como desenvolvimento

sustentável surge através de um esforço de reconceptualização do conceito de desenvolvimento,

abalado pela crise ambiental e social.

A teoria do desenvolvimento sustentável, ou ecodesenvolvimento, parte do ponto em que a

maior parte das teorias que procuraram desvendar os mistérios sociais e econômicos das últimas

décadas não obteve sucesso. O modelo de industrialização tardia ou modernização, que ocupou o

cerne de diversas teorias nos anos 60 e 70, é capaz de modernizar alguns setores da economia, mas

incapaz de oferecer um desenvolvimento equilibrado para uma sociedade inteira. De acordo com

Brüseke (2003), a modernização, não acompanhada da intervenção do Estado racional e das

correções partindo da sociedade civil, desestrutura a composição social, a economia territorial, e seu

contexto ecológico. Emerge daí a necessidade de uma perspectiva multidimensional, que envolva

economia, ecologia e política ao mesmo tempo, como busca fazer a teoria do desenvolvimento

sustentável.

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Para o autor, o conceito desenvolvimento sustentável sinaliza uma alternativa às teorias e

aos modelos tradicionais do desenvolvimento, desgastadas numa série infinita de frustrações.

Segundo Cavalcanti (2003), sustentabilidade significa a possibilidade de se obterem continuamente

condições iguais ou superiores de vida para um grupo de pessoas e seus sucessores em dado

ecossistema. Tal conceito equivale à idéia de manutenção de nosso sistema de suporte da vida.

Basicamente, trata-se do reconhecimento do que é biofisicamente possível em uma perspectiva de

longo prazo.

Para o autor, o tipo de desenvolvimento que o mundo experimentou nos últimos duzentos

anos, especialmente depois da Segunda Guerra Mundial, é insustentável. O desenvolvimento

econômico não representa mais uma opção aberta, com possibilidades amplas para o mundo. A

aceitação da idéia de desenvolvimento sustentável indica que se fixou voluntariamente um limite

para o progresso material, e a defesa da idéia de crescimento constante não passa de uma filosofia

do impossível. Entretanto, adotar a noção de desenvolvimento sustentável corresponde a seguir uma

prescrição de política. O dever da ciência é explicar como, de que forma, ela pode ser alcançada,

quais são os caminhos para a sustentabilidade.

De acordo com Bezerra e Bursztyn (2000), a sustentabilidade emerge da crise de

esgotamento das concepções de desenvolvimento, enquadradas nas lógicas da racionalidade

econômica liberal. Uma racionalidade eufórica associada ao movimento incessante para frente da

razão, da ciência, da técnica, da indústria e do consumo, na qual o desenvolvimento – uma

aspiração imanente da humanidade – expurgou de si tudo o que o contraria, excluindo de si a

existência das regressões que negam as conseqüências positivas do desenvolvimento.

Em 1992, 172 governos reuniram-se na cidade brasileira do Rio de Janeiro, para a

Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), que ficou

conhecida como Conferência da Terra, um evento singular que se tornou um marco histórico para a

humanidade. Os objetivos fundamentais da Conferência eram conseguir um equilíbrio justo entre as

necessidades econômicas, sociais e ambientais das gerações presentes e futuras e firmar as bases

para uma associação mundial entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, assim como

entre os governos e os setores da sociedade civil, enfocadas na compreensão das necessidades e os

interesses comuns.

Nesta Conferência, os representantes dos governos, incluindo 108 chefes de Estado e de

Governo, aprovaram três acordos que deveriam erigir a Agenda 21, a Declaração do Rio sobre o

Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que define os direitos e as obrigações dos estados sobre os

princípios básicos do meio ambiente e desenvolvimento.

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É importante lembrar que não foi somente de chefes de Estado e de representantes oficiais

que se constituiu a Rio-92, pois foi a participação da sociedade civil, de organizações não-

governamentais de centenas de países, que fez do Rio a verdadeira “Babilônia”, e foi graças a eles

que um importante documento deixado de lado na conferência oficial, continuou vivo, passou por

reavaliações, comissões internacionais nunca antes pensadas, foi ratificada pela Unesco, e

finalmente aprovado pela ONU em 2002: A Carta da Terra, um documento de importância singular,

equivalente à Declaração Universal dos Direitos Humanos para a área de Meio Ambiente, cujo

preâmbulo traz os seguintes dizeres:

Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a

humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais

interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas.

Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e

formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum.

Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela

natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar

a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns

para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações. (A Carta da

Terra, 2004)

A Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (CDS) organizou

para dez anos depois da Conferência do Rio a Conferência Mundial sobre Desenvolvimento

Sustentável em Johannesburgo, África do Sul. Essa conferência reuniu chefes de Estado e de

Governo, organizações não-governamentais e empresários, que revisaram e avaliaram o progresso

do estabelecimento da Agenda 21, um plano de ação mundial para promover o desenvolvimento

sustentável a uma escala local, nacional, regional e internacional. A meta geral da Conferência foi

revigorar o compromisso mundial a fim de um desenvolvimento sustentável e a cooperação Norte-

Sul, além de elevar a solidariedade internacional para a execução acelerada da Agenda 21. Um dos

êxitos desta reunião foi o estabelecimento da necessidade de se criarem metas regionais e nacionais

para o uso da energia renovável.

De acordo com Camargo et. al (2004), em uma análise sobre os dez anos que se passaram

desde a Rio-92, muitas foram as frustrações quanto as perspectivas positivas que foram lançadas,

mas muito também se avançou, e o maior ganho da última década foi o reconhecimento de que a

solução para os problemas ambientais reside na noção de “desenvolvimento sustentável”, tal como a

havia proposto o relatório Brundtland em 1987, sacramentado pelas Nações Unidas em 1992.

Depois de uma fase experimental e delicada, hoje podemos considerá-lo vitorioso e atribuir ao

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Brasil um papel importante em sua consolidação como conceito operacional e pragmático para os

países em desenvolvimento.

Os desafios

Segundo Bezerra e Bursztyn (2000), em um trabalho preparatório para a Agenda 21

brasileira, o desenvolvimento sustentável é um processo de aprendizagem social de longo prazo,

balizado por políticas públicas orientadas por um plano nacional de desenvolvimento inter-

regionalizado e intraregionalmente endógeno. As políticas de desenvolvimento são processos de

políticas públicas de Estados nacionais. Os estilos de desenvolvimento estão sustentados por

políticas de Estado que, por sua vez, respaldam padrões de articulação muito determinados dos

diversos segmentos sociais e econômicos com os recursos disponíveis na natureza.

O Estado brasileiro tem lugar nuclear na promoção e na regulamentação de políticas

nacionais de desenvolvimento sustentável. Notadamente, na coordenação dos conflitos sociais

implicados nas divergências de interesses e lógicas de desenvolvimento, entre a pluralidade de

atores sociais presentes na sociedade nacional e transnacional. O gerenciamento das escolhas

tecnológicas atreladas aos processos produtivos é essencialmente um problema de política pública

de ciência e tecnologia para o desenvolvimento sustentável.

Para os autores, podemos conceber o desenvolvimento sustentável como uma proposta que

tem em seu horizonte uma modernidade ética, e não apenas uma modernidade técnica (BUARQUE,

1994), pois a proposta do desenvolvimento sustentável implica incorporar o compromisso com a

perenização da vida ao horizonte da intervenção transformadora do ‘mundo da necessidade’.

Se a modernidade técnica faz dos meios fins em si, a modernidade ética do ‘princípio

sustentabilidade’ recoloca os fins como referência primordial, num quadro complexo de múltiplas

dimensões (econômica, ambiental, social, política, cultural, institucional, etc.).

Para Furtado (1992), o desafio que se coloca no umbral do século XXI é nada menos do que

mudar o curso da civilização, deslocar o seu eixo da lógica dos meios a serviço da acumulação, num

curto horizonte de tempo, para uma lógica dos fins em função do bem-estar social, do exercício da

liberdade e da cooperação entre os povos. Devemos nos empenhar para que essa seja a tarefa maior

dentre as que preocuparão os homens no correr do próximo século: estabelecer novas prioridades

para a ação política em função de uma nova concepção do desenvolvimento, posto ao alcance de

todos os povos e capaz de preservar o equilíbrio ecológico.

Essa mudança de rumo, segundo o mesmo autor, exige que abandonemos muitas ilusões,

que exorcizemos os fantasmas de uma modernidade que nos condena a um mimetismo cultural

esterilizante. Devemos assumir nossa situação histórica e abrir caminho para o futuro a partir do

conhecimento de nossa realidade, assumir a própria identidade.

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Ainda segundo o mesmo autor, nesse novo quadro que se configura, o destino dos povos

dependerá menos das articulações dos centros de poder político e mais da dinâmica das sociedades

civis. Não que o Estado tenda a deliqüescer, conforme a utopia socialista do século XIX, mas a

possibilidade de que ele seja empolgado por minorias de espírito totalitário se reduzirá, se a

vigilância da emergente sociedade civil internacional se fizer eficaz.

Para Cavalcanti (2002), a noção atual de desenvolvimento sustentável representa uma

vindicação do pensamento de Furtado: não é qualquer taxa de crescimento da economia que pode

ser perseguida; há que se pensar antes naquilo que é (ecologicamente) sustentável, ou seja, possível,

durável, realizável.

Quanto a isso vale mencionar o questionamento feito por Furtado em 1974:

“Por que ignorar na medição do PIB, o custo para a coletividade da destruição dos recursos

naturais não-renováveis, e o dos solos e florestas (dificilmente renováveis)? Por que ignorar a

poluição das águas e a destruição total dos peixes nos rios em que as usinas despejam seus

resíduos?” (FURTADO, 1974).

Ramos (2003) alerta que o problema de insustentabilidade não está apenas no

desenvolvimento, é preciso reconhecer que o nosso modo de vida se tornou insustentável, e este é

muito mais difícil de mudar, pois implica, como discutimos, aperfeiçoamento individual e coletivo,

simultaneamente. Segundo o autor, parece não haver saída: ou acreditamos que o ser humano, tal

como é, pode construir um mundo melhor para si, para seus semelhantes, no presente e no futuro,

ou cabe reconhecer o fracasso de nossa existência, e admitir que a busca de um desenvolvimento

sustentável seja ilusória, apenas uma forma de adiar o inevitável fim. É preciso iniciar um

aprendizado individual e coletivo que nos leve a outras formas de manifestação concreta de nossa

natureza e que possibilite uma perspectiva de mudança em nosso modo de viver.

É possível afirmar que chegamos ao início do século XXI com um conceito de

desenvolvimento sustentável bem mais amadurecido, que não está mais restrito as discussões

acadêmicas e políticas, de defensores e contestadores, mas que se popularizou por todos os

continentes, passando a fazer parte da vida cotidiana das pessoas. Um conceito que está presente

desde as pequenas atitudes diferenciadas de comportamento, como a separação e a reciclagem do

lixo doméstico, tomadas pelo cidadão comum, até as grandes estratégias e investidas comerciais de

algumas empresas as quais se especializaram em atender um mercado consumidor em franco

crescimento, que hoje cobra essa qualidade diferenciada tanto dos produtos que consome, quanto

dos processos produtivos que o envolvem; uma verdade que abre grandes perspectivas para o

futuro. Uma forma de desenvolvimento que não está mais no plano abstrato, e que se mostra cada

dia mais real e possível, principalmente no plano local.

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7. MATERIAL E MÉTODO

Ao todo foram implantadas 17 Unidades Demonstrativas, em cincos estados da região

nordeste, estas atenderam a 175 famílias. Desde a implantação até a venda dos peixes, vários

profissionais das mais variadas formações se envolveram para que essa experiência pudesse se

desenvolver da melhor forma possível. Podemos quantificar os profissionais envolvidos mais

diretamente: foram 12 técnicos de assistência técnica permanente (ATP), e 2 Engenheiros de Pesca

(Especialista em Piscicultura), representando além do PDHC, outras 8 ONG´s parceiras.

7.1 ABORDAGEM DOS ASPECTOS FÍSICOS E TÉCNICOS PARA MONTAR AS UD´S DE PISCICULTURA

Antes de iniciar o trabalho social, primeiro eram avaliados aspectos físicos, técnicos e

financeiros nas localidades, afim de que as unidades pudessem ser montadas sem entraveis que

pudessem inviabilizar o processo.

Primeiramente foram estudados as condições de recursos hídricos disponíveis. Quando o

local escolhido era um açude ou barragem, os aspectos analisados eram: profundidade, qualidade da

água, acessibilidade, e principalmente o nível de água mais baixo atingido nos últimos, pois se

tratando de um cultivo de peixes no semi-árido, a água é um fator limitante, e dependendo do

manancial essa pode se esvair rapidamente, acabando com o cultivo antes do tempo. Ao passo que

quando o cultivo era em rio, mas especificamente o São Francisco, procurou-se identificar a área de

melhor acesso, locais protegidos de corredeiras, e saber o nível mais alto atingido pelas águas nos

últimos anos, pois uma enxurrada, poderia cobrir e até afundar os TR´s.

A demanda local pelo produto, no caso o peixe (Tilápia), era pesquisada, consultando os

moradores da localidade, visitando os mercados locais e em conversas com membros da futura

equipe técnica responsável pelo acompanhamento do cultivo. Nessa hora também já eram feitas as

primeiras sondagens a respeito dos possíveis compradores, melhores locais de venda, preços

praticados no comercio local e o tamanho e/ou peso do pescado que melhor aceito pelos

compradores.

Superados os primeiros passos e constatado que a UD não sofreria de entraves físicos e

financeiros, o próximo passo foi iniciar as discussões com o grupo de interesse, preparatórias para o

inicio dos trabalhos de montagem da UD. Esses momentos foram difíceis já que as pessoas

envolvidas, achavam que a montagem poderia começar imediatamente, pois a ansiedade tomava

conta do grupo. Nesse momento o papel do especialista (consultor) foi de estrema importância,

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tornando-se o facilitador no processo de aprendizagem, tanto para o grupo de interesse quanto para

o técnico que acompanharia semanalmente a comunidade. Foram tratados e discutidos no grupo, a

gestão da unidade e planejamento do cultivo entre outros assuntos, todos de forma coletiva. Mas o

grande aprendizado estava apenas começando, pois a principal intenção da UD, é a construção

participativa de alternativas e soluções a partir da vivência prática (planejamento – avaliação –

replanejamento), ou seja “aprender fazendo e fazer aprendendo”.

O aspecto demonstrativo e multiplicador da UD é o que chama mais a atenção, pois essa é

uma oportunidade única do pequeno produtor aprender uma atividade lucrativa vivenciando

diariamente na prática a teoria, e adaptando o cultivo a sua realidade local, sem medo de possíveis

prejuízos e por isso com bem mais chances do resultado final ser prazeroso e lucrativo. Uma grande

vantagem do trabalho em grupo na piscicultura é que a atividade tem um grande potencial como

geradora de renda complementar, sem necessidade de dedicação integral por parte do piscicultor.

Concomitantemente ao aprendizado do grupo, os técnicos locais de assistência técnica permanente

(ATP), foram capacitados no cultivo de Tilápia em TR, tornando o processo sustentável, na medida

que o especialista não precisasse estar semanalmente presente em todos os locais que tinham UD de

piscicultura.

7.2 MANEJO E COMERCIALIZAÇÃO

Após elaborados e debatidos, os projetos partiram para a etapa principal: o aprender

fazendo. Inicialmente, o material da UD precisava ser comprado, para isso o grupo já havia

decidido no planejamento quais pessoas fariam parte da comissão responsável pela compra do

equipamento e da ração dos peixes. Essa comissão, guiada pelos técnicos e especialista, fez a

pesquisa de preço e a negociação de compra de quase todo o material. Mesmo com todo esse

cuidado para conseguir os melhores preços, o custo e a qualidade de alguns itens variou muito entre

os assentamentos, podemos destacar a qualidade das canoas (barco), e o preço da ração.

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Figura 1. Comissão do grupo de interesse de compras de material

O próximo passo foi a montagem de toda a estrutura da UD: costura dos berçários,

construção das ancoras, montagem dos TR. Todo esse processo era totalmente novo para técnicos

de ATP e todo grupo de interesse, o aprendizado de todos era fluente e constante. Montada a

estrutura esta precisava ser colocada dentro d´água, o local apropriado foi escolhido pelo conjunto

tomando como base questões técnicas, como, profundidade, locais protegido de correntezas, etc,

aliadas com as questões sociais, como por exemplo acessibilidade, local visível, dificultando assim

possíveis furtos, etc.

Figura 2. Montagem das estruturas (berçário)

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Figura 3. Modelo de TR utilizado em Sergipe. Figura 4. Fixação dos TR´s

Com os TR´s instalados em seus devidos lugares, e a ração já na comunidade, faltava agora

o principal: Os peixes. A compra dos alevinos, quando possível, foi feita em conjunto com um

representante do grupo, pois os locais de venda eram geralmente distantes das comunidades /

assentamentos, esse fato dificultou um pouco o processo, mas nada que tirasse o entusiasmo e a

vontade de aprender dos grupos. Para essa primeira experiência com piscicultura foram escolhidos

alevinos de 1 g, apesar do seu manejo ser mais trabalhoso, pois só desta forma as pessoas

aprenderiam todas as fazes do cultivo. No momento que os alevinos chegavam nas localidades, o

povoamento dos TR´s era feito na presença do especialista, do técnico e do grupo de interesse em

mais um momento de aprendizagem coletiva.

Figura 5. Alevinos embalados, prontos para viagem. Figura 6. Momento da chegada dos alevinos

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Após o povoamento dos TR, o especialista em conjunto com o técnico e o grupo de

interesse, organizaram uma tabela de alimentação, que deveria ser executada pelo grupo conforme

decidido no planejamento da gestão. Essa gestão variava muito entre os grupos. Em alguns uma só

pessoa alimentava o dia todo, em outros uma dupla se revezava. Os grupos ficavam livres para

adaptar os horários a sua realidade local.

As mudanças nas quantidades ração eram repassadas quinzenalmente aos técnicos de

ATP, por e-mail ou telefone. As visitas do especialista aconteciam no mínimo uma vez por mês,

nesse momento, uma amostragem dos peixes era pesada (biometria), para acompanhar o

crescimento e recalcular a quantidade de ração. Após os trabalhos de campo, todos se reuniam para

fazer uma avaliação do período, o resultado disso, foi que, a cada mês, era feito um re-

planejamento, pois com o passar dos dias de aprendizado o conhecimento aumentava e com isso

novas idéias amadureciam, transformando-se em propostas que via de regra surpreendiam o próprio

especialista, que tornava-se cada vez mais um “aluno” do que um “professor”.

Figura 7. Coleta dos peixes para biometria. Figura 8. Pesagem

A cada dois meses e meio a três meses de cultivo foi feita uma recontagem geral de todos os

peixes presentes nos TR´s, esses eram redistribuídos entre os 3 TR´s de acordo com o seu tamanho

e peso, de forma que as quantidades entre os TR´s ficassem equivalentes, a esse processo dar-se o

nome de repicagem. Essa ação é de extrema importância, pois a Tilápia é uma espécie de peixe que

tem o crescimento muito disforme, por isso no decorrer de um cultivo deve-se tentar ao máximo, ter

os TR´s povoados com peixes de tamanho similar para que a concorrência pelo alimento seja uma

disputa leal, o que não aconteceria se um peixe muito grande disputasse com um pequeno, o maior

sempre comeria mais, o que só aumentaria a desproporção entre eles. Mesmo assim sempre ao final

de um cultivo, uma faixa de 20% dos peixes, não atingem o peso final projetado (refugo).

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Ao final de seis meses de cultivo era chegada a hora da despesca. Estas foram feitas de

formas diferentes entre as UD´s, variando de acordo com a forma de comercialização.

O momento da comercialização, foi de extrema importância para o aprendizado, pois a

maioria dos grupos, não tinham experiência com comercialização de peixes e apesar de toda a

equipe técnica se envolver para ajudá-los, a forma de como onde e qual preço venda, era o próprio

grupo que determinava.

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8. RESULTADOS

No total participaram do projeto 17 grupos, constituídos de 175 famílias, resultando num

total de 850 pessoas beneficiadas.

Estados X Números

4 1 39

32

8

34

101

123

9

27

0

20

40

60

80

100

PE PB SE CEEstados

Qu

an

tid

ad

es

N° gruposFamílias N° de TR

Figura 9. Gráfico Estados X Números

Os resultados numéricos, obtidos das Unidades Demonstrativas, foram um pouco

diferentes, dos quais uma piscicultura economicamente viável precisa alcançar, pois esse primeiro

momento, foi apenas um aprendizado, e como tal, erros e ajustes ao longo do cultivo, já eram

esperados. Podemos fazer uma breve comparação dos dados esperados com os obtidos nas UD´s, e

desses com os de uma piscicultura já com experiência de cultivo.

Os valores máximos e mínimos, demonstrados na tabela abaixo foram coletados entre todas

as UD´s, as variáveis positivas e/ou negativas não são necessariamente de uma mesma Unidade.

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Resultados obtidos X Resultado Esperados

1,78

4,5

2,78

1,4 1,5

2

1,5

3

1,7

00,5

11,5

22,5

33,5

44,5

5

C.A dividido por 1 Preço de venda R$/Kg Custo de Produção

R$/Kg

Variaveis

Valo

res

MaxMinEsperada

Figura 10. Gráfico: Resultados obtidos X Resultados Esperados

Produção de pescado em Kg

1300

300

900

433

1800

600

0200

400600800

1000

120014001600

18002000

Por TR Por UD

Kg

MaxMinEsperada

Figura 11. Gráfico: Produção de pescado em Kg

Os dados financeiros e quantitativos são os que menos importam ao final de uma Unidade

Demonstrativa, pois o objetivo principal é o resultados qualitativo, ou seja o grau de satisfação e

principalmente aprendizado do grupo.

Ao final de todo trabalho, foi feita uma avaliação com cada grupo. Nesse momento

analisou-se todo o processo de construção e desenvolvimento das UD´s, discutiu-se as falhas e os

acertos de todos os envolvidos.

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O preço de venda do quilo de peixe variou muito, em decorrência de vários fatores como:

local, quantidade de quilos comprados por vez , peso e tamanho do peixe. O preço mínimo

registrado foi de R$ 1,50 / Kg e o máximo R$ 4,50 / Kg. O custo de produção também variou

muito, sem incluir no calculo mão de obra, só com base nos preços de compra de ração e na

conversão alimentar (Conversão Alimentar, C.A, é por definição o consumo de ração do animal em

um período de tempo, dividido pelo seu ganho de peso neste mesmo período), que por sua vez

variou entre 1,78:1 e 1,4:1 , o custo de produção ficou entre, R$ 2,78/kg e R$ 1,54/kg.

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9. DISCUSSÃO

9.1 IMPLANTAÇÃO DAS UD´S: OBSTACULOS E MEDIDAS DE SUPERAÇÃO

9.1.1 Dificuldades

Comercialização: Alguns grupos não realizaram a seleção prévia dos peixes conforme o

peso, não realizaram a pesquisa de preço e venderam ao atravessador na comunidade, também não

se organizaram para vender na feira local.

Outros grupos destacaram a chegada em horário impróprio dos alevinos na comunidade.

Citaram também dificuldades no inicio da organização dos grupos de interesse.

9.1.2 Aspectos positivos.

Os grupos destacaram a importância da organização e força de vontade para realizar a

experiência com sucesso. A maioria dos grupos aprenderam o manejo em todas as etapas,

corretamente.

Alguns grupos destacaram que aprenderam com os próprios erros, por não ter seguido

corretamente as orientações técnicas.

Todos os grupos perceberam que a criação de peixes em tanques-rede proporciona retorno

financeiro a curto prazo. A maior parte da produção foi comercializada. Além de que as famílias

também consumiram peixe.

Os grupos aprenderam a calcular os custos e o lucro obtido com a produção de peixe.

Pode-se demonstrar o grau de satisfação dos envolvidos graficamente como ilustrado

abaixo.

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Avaliação dos Grupos

100

77,7 77,7

100 100100 100

0

100

0

100

0

88,8

50 5033,3

0

20

40

60

80

100

120

Avaliação Positiva Continuariam e

ampliariam se possível

Tem condições técnicas

e financiamento

disponivel para

continuar

Em processo de

ampliação (FISP)

Valo

res e

m %

CE PE

SE PB

Figura 12. Gráfico: Avaliação dos Grupos

9.1.3 Problemas de gestão

A falta de tradição na atividade foi o primeiro obstáculo a ser superado, pois 50% dos

grupos nunca tinham ouvido falar em criação de peixes em gaiolas, outros 40% já tinham visto a

atividade em algum local, e só 10% já haviam estado em contato com alguma criação ou com um

conhecido que lhe explicou o processo. Para superar a falta de intimidade dos grupos com a

piscicultura em tanque-rede (TR), primeiramente foi providenciado uma visita de intercambio em

uma comunidade ou cooperativa que já tinha experiência com criação de Tilápia em TR, nesta os

próprios piscicultores locais se encarregaram de explicar para o grupo como é o funcionamento e as

divisões de trabalho de uma piscicultura. Esperávamos com isso que, transmitido por pessoas que

tinham entendimento de vida e cultura parecidas, a mensagem fosse melhor assimilada pelo grupo,

como realmente foi.

Os grupos de interesse, eram compostos por jovens, mulheres e homens, variando muito as

proporções entre as localidades, mas sempre com mais homens. O numero de participantes também

era muito diferente, o menor tinha 6 pessoas e o maior 24. Os grupos grandes tinham a vantagem de

dividir melhor as tarefas, ou seja, um participante tinha mais tempo para realizar outras atividades,

porém em termos de decisão e planejamento a questão geralmente prolongava-se por muito tempo

devido ao grande numero de pessoas opinando diferentemente, ao passo que nos grupos pequenos o

problema ocorria de forma totalmente inversa . Esses grupos em sua maioria eram muito

heterogêneos. Apesar do interesse final entre os participantes, ser parecido, que era o aprendizado

que futuramente lhes garantissem uma fonte de renda, os desentendimentos internos eram

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constantes, principalmente decorrente da divisão e do comprimento de tarefas feitas nos

planejamentos. As principais reclamações eram a respeito do não cumprimento dos horários de

arraçoamento (ofertar ração aos peixes), por parte de alguns membros, outro assunto muito

discutido entre todos os grupos onde tinham mulheres participando, era que elas se negavam a fazer

parte do rodízio da vigília a noite, alegando que era muito perigoso para elas, e que mesmo que o

rodízio fosse feito por duplas ou em grupos maiores, seus maridos e ou pais não lhes permitiam.

Algumas vezes nas reuniões de avaliação, os ânimos entre os membros do grupo, ficaram um pouco

exaltados. Para resolver esses impasses foi necessário muito jogo de cintura, sensibilidade as vezes,

firmeza. Em alguns casos de atraso na alimentação, a causa era exatamente os horários escolhidos

que não eram adequados com a realidade do local, a solução encontrada foi de reorganizar os

intervalos de tempo, de uma forma que não prejudicasse o cultivo, nem as pessoas envolvidas. Nos

casos, onde o não cumprimento nos horários, aconteciam em conseqüência de relaxamento ou

irresponsabilidade de algumas pessoas, o grupo era orientado a tomar uma atitude que resolvesse o

problema, pois era repassado para eles que a falta de comprometimento de poucas pessoas podia

prejudicar a todo restante do grupo.

Figura 13. Reunião de replanejamento e avaliação

O caso das mulheres que não podiam vigiar a noite, os grupos resolveram de duas formas

distintas. No primeiro caso, um parente delas tinha que substituí-las, nas vigílias noturnas. Ao passo

que uma outra parte dos grupos aceitou que as mulheres fossem retiradas das escalas de vigília, no

entanto tinham que trabalhar em dobro nas tarefas de alimentação. É importante ressaltar que todas

as decisões eram resolvidas pelos próprios grupos, sendo o técnico de ATP e o especialista apenas

moderadores das discussões.

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9.1.4 Problemas de manejo

A mortalidade de alevinos nas UD´s, já havia sido prevista, pois, para criação de Tilápias

em tanque-rede uma perda de 10% dos peixes por mortalidade é totalmente plausível, porém em

algumas UD´s a mortalidade ultrapassou 70%. Pode-se apresentar algumas explicações para isso:

Nas unidades do território do sertão do Pajeú por exemplo, o transporte dos alevinos foi muito

demorado, e quando esses chegaram no local de destino, já estavam muito debilitados e/ou mortos.

Esses peixes mortos foram repostos em outra oportunidade, não resultando em prejuízo para os

grupos. No sertão sergipano ocorreu um problema parecido, só que ao contrario dos alevinos do

Pajeú, o transporte foi rápido e no horário de pouco sol, e mesmo assim os peixes chegaram muito

debilitados e / ou mortos, fato esse que demonstrou que o problema foi proveniente do manejo mal

feito na piscicultura que fez a venda, essa por sua vez admitiu o erro e repôs todos peixes mortos.

Em algumas UD´s do Ceará outros fatores influenciaram na mortandade: A casos, em que a

qualidade da água do açude não permitia a população de alevinos por TR, ou seja a renovação de

água dentro dos tanques não era suficiente, para manter vivos os quase 1300 alevinos por TR (nesse

caso, berçário, pois os alevinos estavam muito pequenos para ser colocados diretamente nos TR,

então foi feita uma estrutura de tela mais fina para alojar os peixes até que atingissem de 25 a 30

gramas, tamanho esse que não permitia mas a fuga dos mesmos, entre as aberturas de malhas dos

tanques), a solução encontrada foi fazer outros berçários com uma abertura de malha um pouco

maior, permitindo dessa forma uma maior renovação de água, conseqüentemente aumentado o nível

de oxigênio dentro do tanque. Com isso conseguiu-se que os peixes parassem de morrer e

crescessem numa velocidade maior. Um caso em especial chamou atenção, uma UD já montada e

povoada, teve que ser transferida para outro açude, pois a noite o nível de oxigênio dissolvido na

água caia de uma forma muito brusca, que mesmo com a troca de malha dos berçários a mortalidade

com certeza continuaria. Nesse caso os alevinos restantes foram deixados no açude, e foi feito um

novo povoamento no segundo açude.

9.1.5 Concorrência Pela Ração

Um problema muito comum em algumas UD´s foi a quantidade de piaba (lambri) Astyanax

sp, presente em alguns açudes, pois devido ao seu tamanho reduzido conseguiam passar pela malha

do TR, e pular para dentro dos berçários. Com isso tornavam-se competidores da ração

(principalmente a ração em pó) com os alevinos de tilápia, além de aumentar a concorrência de

oxigênio dentro dos berçários. Para solucionar esse problema algumas medidas foram tomadas,

primeiramente os berçários foram esticados, de forma que as suas margens ficassem o mais alto

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possível da lâmina d`água, reduzindo o número de piabas que conseguiam pular para o berçário.

Segundo, a troca para a ração granulada foi feita o mais rápido possível, pois esta era maior e

conseqüentemente mais difícil de ser engolida pelas piabas. Em uma UD, em especial onde a

quantidade de piabas era extremamente grande, além dessas ações acima citadas, tentou-se outras

medidas, como: retardar ao máximo, o momento de transferir os alevinos, do berçário para o TR

propriamente dito (onde as piabas tinham livre acesso). Quando os alevinos estavam num tamanho

que era impraticável mantê-los nos berçários, estes foram transferidos para o TR, porém, os tanques

foram envolvidos com uma tela fina, para evitar uma invasão de piabas. Essas medidas não

apresentaram resultados satisfatórios, pois o tempo que os alevinos passaram a mais dentro dos

berçários somados a dificuldade de renovação da água dentro do TR devido a tela no entorno do

mesmo, inibiu o crescimento dos peixes significativamente. O impacto da concorrência de

alimentação com as piabas, no crescimento, provavelmente seria bem, menor.

9.1.6 Fugas

Problemas com fuga, eram constantes. Em algumas UD´s, muitos peixes fugiram logo nos

primeiros dias de cultivo, pois as bombonas (estruturas que permitem os TR´s flutuem), vinham

furadas, ou foram mal vedadas, estas se encheram d`água, afundando um dos lados do TR,

permitindo assim as fugas. Ciente que desses fatos, sugeriu-se, que futuramente, os tanques fossem

colocados em água, no mínimo 2 dias antes de povoá-los com alevinos, pois dessa forma, se

ocorresse esse tipo de problema, as bombonas poderiam ser substituídas sem acarretar maiores

prejuízos. Algumas fugas também ocorreram momentos após a transferência dos alevinos para os

TR, pois além da transferência era feita a primeira repicagem, para isso todos os tanques eram

trazidos para a margem do açude, com profundidade máxima de 1,5 m. No momento da contagem

alguns poucos escapavam, o problema maior era no momento de puxar os TR, de volta para o meio

do açude, pois ocasionalmente, estes enganchavam-se em arbustos e/ou pedras submersos, que por

sua vez aumentavam o tamanho da abertura de malha, permitindo assim que os peixes passassem

por elas. Esse tipo de fuga era muito raro, pois, os TR´s, eram geralmente puxados com muito zelo e

cuidado.

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9.1.7 Dificuldades na Comercialização

É importante ressaltar, que nem todo o pescado foi comercializado. Uma parte da produção

foi destinada para o consumo dos próprios grupos. A forma de consumo interno variou entre as

UD´s. Alguns grupos só permitiam a divisão para o consumo no momento da despeça, outros,

consumiam o pescado mesmo durante a faze de cultivo. As duas formas de divisão tiveram o seu

lado positivo e o negativo: Os grupos que consumiam peixe durante o cultivo, puderam desfrutar de

um alimento de qualidade, por um bom tempo, no mínimo durante os dois meses finais, porém o

controle sobre as quantidades de peixe, retiradas pelos diversos participantes era precária, em

decorrência disso os cálculos finas de produção não foram exatos. Ao passo que os grupos que

consumiram o pescado só no momento da despesca, não desfrutaram bem do alimento produzido

por eles, pois mesmo que armazenassem em geladeiras e os peixes fossem consumidos aos poucos,

além da capacidade de armazenamento ser pouca e inadequada (geladeiras com muitos anos de uso

e pouca capacidade de resfriamento), o pescado está entre os alimentos mais perecíveis, por tanto é

aconselhável que seja consumido o mais rápido possível. Por outro lado os cálculos de custo, de

produtividade e lucro, puderam ser feitos com o máximo de realismo, o que foi de grande valia para

o aprendizado e para projeções de ampliação do sistema de UD, para se transformar futuramente em

um sistema produtivo que sirva realmente como fonte de renda.

As táticas de comercialização utilizadas, foram diferentes entre as UD´s, como também

variaram os resultados obtidos. Alguns grupos optaram por vender todos os peixes de uma só vez a

um comprador (atravessador) no próprio local, outros grupos preferiram tirar os peixes aos poucos e

vendê-los em feiras locais, e ainda houve grupos que venderam a diferentes compradores

(atravessadores), porém no próprio local do cultivo, esses últimos tiveram os melhores resultados

no aspecto geral da comercialização.

No geral os grupos não tinham experiência, com venda de pescado e muito menos traquejo

para lidar com atravessadores. O que explica os baixos preços de venda dos peixes conseguidos por

alguns. Houve casos em que o comprador agiu de forma desonesta. Antes da despesca foi acertado

que pagaria um preço “X” pelo peixe, porém depois da despesca pagou um preço menor que o

combinado, o grupo teve que aceitar pois não tinha como armazenar os peixes e o prejuízo seria

maior.

Para poder driblar os atravessadores seria preciso que cada grupo contasse com uma

pequena estrutura para deslocamento, conservação, um ponto de venda, ou contatos para

distribuição dos peixes nos domicílios. Porém nos projetos de Unidade Demonstrativa não existem

recursos destinados para infra-estrutura, pois aumentaria muito os custos e o recurso que o PDHC

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dispõe para UD´s é limitado. Os grupos tiveram dificuldade em assumir estratégias que facilitaria a

venda diretamente ao consumidor, pois não tinham um produto que pudesse ter uma oferta

continua, os peixes das unidades foram vendidos no prazo de um mês. Os preços praticados

variaram muito conforme o local, como também a forma de ofertar o produto ao consumidor, por

exemplo nos estados da Paraíba, Pernambuco e Sergipe, o peixe era primeiro pesado inteiro e

depois do preço acertado, era tratado (retirado o intestino e guelrras), e vendido ao consumidor, ao

passo que no Ceará as pessoas exigiam que o peixe antes de pesar já estivesse tratado, reduzindo

assim o lucro do produtor.

9.1.8 O Passo Seguinte

Para dar continuidade e ampliar a piscicultura, afim de que ela passe a ser uma atividade

lucrativa, o Projeto Dom Helder Camara, disponibiliza aos grupos que já passaram pela experiência

das UD´s e estão dispostos a ampliar seus cultivos, um recurso chamado de FISP (fundo de

investimento social e produtivo), esse é um empréstimo a fundo perdido, ou seja não é necessário o

pagamento, e tem como objetivo:

Apoiar investimentos na conservação e uso racional da água, principalmente na

irrigação;

Apoiar investimentos em agricultura, valorizando a agrobiodiversidade e as práticas

agroecológicas;

Apoiar investimentos em comercialização de produtos agrícolas e não agrícolas;

Apoiar micro e pequenas empresas comerciais das comunidades, ligadas a

atividades agrícolas e não agrícolas.

Apoiar agroindústrias familiares, agregando valor aos produtos das comunidades;

Promover as iniciativas produtivas que sejam alternativas inovadoras de renda,

agrícola e não agrícola, contribuindo para a diversificação da produção; e,

Proporcionar às comunidades condições de acessar outros recursos disponíveis em

instituições financeiras.

Além do FISP, o PDHC também incentiva os grupos a procurarem outras fontes

financiadoras como o PRONAF, pois o recurso do FISP, é limitado (R$ 1.035,00 por família) e para

alguns projetos esse valor é insuficiente.

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10. CONCLUSÃO

Podemos concluir que o processo de aprendizagem nas Unidades Demonstrativas de

Piscicultura foi um sucesso, tendo em vista que das 17 unidades implantadas, todos os 17 grupos

avaliaram que o processo foi enriquecedor, 15 (88%) responderam que se tivessem condições de

continuar e ampliar a piscicultura o fariam, foi analisado que 11 (64,7%) unidades tem condições

técnicas e recursos financeiros disponível para continuar/ampliar a produção e que 9 grupos (53%),

já se encontram em processo de elaboração de projetos FISP, para ampliar sua produção.

Partindo para o âmbito de desenvolvimento do semi-árido, sugere-se ainda, que o PDHC,

torne-se uma Secretaria Executiva e permanente, do MDA, dado a sua relevante contribuição para o

desenvolvimento do nordeste do Brasil e em especial o semi-árido, pois essa região é carente de

instituições que trabalhem de forma responsável, competente e acima de tudo ágil, como atua o

PDHC, objetivando sempre o fortalecimento da cidadania e o desenvolvimento humano-local-

sustentável-integrado.

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11 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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11. ANEXO

O custo e os materiais presentes na Unidade Demonstrativa:

Orçamento: Unidade Demonstrativa piscicultura (3 tanques-rede)

Discriminação

Unidade

Quantidade

Preço Unitário

Preço Total

Infra-estrutura Sub total 3730,00

Berçário Unidade 02 50,00 100,00 Corda Nylon seca metro 150 0,50 75,00

Âncora Unidade 03 15,00 45,00

Puçá Unidade 02 30,00 60,00

Balança (150 Kg) Kg 01 500,00 500,00 Balança de regua (20Kg) Kg 01 130,00 130,00

Balde Plástico (10 l) Unidade 02 10,00 20,00 Balde Plástico (20l) Unidade 02 15,00 30,00

Barco de manejo Unidade 01 1000,00 1000,00 Monoblocos Unidade 10 15,00 150,00 Tanque-rede Unidade 03 550,00 1650,00

Insumos * Sub total 3008,21 Ração Nutriplex AL 45 Kg 100 2,00 200,00 Ração Nutriplex TR 36 Kg 225 1,25 281,25

Ração Nutriplex TR 32 4-5 Kg 450 1,16 522,00 Ração Nutriplex TR 32 6-8 Kg 1.550 1,11 1.720,50

Alevinos MILHEIRO 3.4 80,00 272,00 Sal Kg 72 0,18 12,96

Serviços ** CONTRAPARTIDA CUSTO TOTAL DO

PROJETO 6.738,21

* Considerando Uma mortalidade de 5%. ** A mão de obra deve ser dada pela comunidade como contrapartida ao investimento. Projeto orçado com valores referentes ao primeiro semestre de 2005.