16
A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR HOLLYWOOD ATRAVÉS DOS FILMES HANGMEN ALSO DIE! E THE NORTH STAR (1943) Maicon Alexandre Timm de Oliveira Mestre em História pela Universidade Federal de Pelotas [email protected] Resumo: O cinema desde seus primórdios esteve presente na vida dos cidadãos, toda essa penetrabilidade encontraria no decorrer das décadas uma nova função, os cinemas nacionais seriam utilizados pelos Estados, principalmente após a década de 1920, como arma ideológica para atingir seus objetivos, os Estados Unidos souberam utilizar toda a potencialidade da indústria de Hollywood a seu favor, no ano de 1943 as narrativas cinematográficas Hangmen Also Die! e The North Star, surgiram para cumprir esse objetivo de valorização ideológico, ao abordarem o inimigo nazista como cruel e fazer alusão a um elemento externo, no caso os Estados Unidos, como a nação que restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos. Palavras Chave: Cinema; História; Ideologia; Estados Unidos; Segunda Guerra Mundial. Introdução As formas artísticas estão presentes no percurso da humanidade. O final do século XIX, observou o surgimento de uma nova forma artística: o cinema, uma invenção em muito creditada aos irmãos Lumière e o seu aparelho chamado cinematógrafo “A primeira exibição dessa nova arte ocorreu em Paris em 28 de dezembro de 1895” (COUSINS, 2013, p. 23). As narrativas cinematográficas iniciais, apesar de conterem poucos segundos, modificariam a forma de ver o mundo. Esse cinema surgiu em uma época de transformações. Esse momento deu início a inúmeros processos que ainda marcam presença na sociedade contemporânea, todavia, não estão presentes da mesma forma de quando foram desenvolvidos, nitidamente receberam transformações ao longo das décadas, até assumirem a forma mais atual. A modernidade não pode ser entendida fora do contexto da cidade, que proporcionou uma arena para a circulação de corpos e mercadorias, a troca de olhares e o exercício do consumismo. A vida moderna parecera urbana por definição, contudo as transformações sociais e econômicas criadas pela modernidade remodelaram a imagem da cidade em plena erupção do capitalismo na segunda metade do século XIX (CHARNEY; SCHWARTZ, 2010, p. 19-20).

A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

  • Upload
    vudiep

  • View
    213

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR HOLLYWOOD

ATRAVÉS DOS FILMES HANGMEN ALSO DIE! E THE NORTH STAR (1943)

Maicon Alexandre Timm de Oliveira

Mestre em História pela Universidade Federal de Pelotas

[email protected]

Resumo: O cinema desde seus primórdios esteve presente na vida dos cidadãos, toda essa

penetrabilidade encontraria no decorrer das décadas uma nova função, os cinemas

nacionais seriam utilizados pelos Estados, principalmente após a década de 1920, como

arma ideológica para atingir seus objetivos, os Estados Unidos souberam utilizar toda a

potencialidade da indústria de Hollywood a seu favor, no ano de 1943 as narrativas

cinematográficas Hangmen Also Die! e The North Star, surgiram para cumprir esse

objetivo de valorização ideológico, ao abordarem o inimigo nazista como cruel e fazer

alusão a um elemento externo, no caso os Estados Unidos, como a nação que

restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses,

Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos.

Palavras Chave: Cinema; História; Ideologia; Estados Unidos; Segunda Guerra

Mundial.

Introdução

As formas artísticas estão presentes no percurso da humanidade. O final do século

XIX, observou o surgimento de uma nova forma artística: o cinema, uma invenção em

muito creditada aos irmãos Lumière e o seu aparelho chamado cinematógrafo – “A

primeira exibição dessa nova arte ocorreu em Paris em 28 de dezembro de 1895”

(COUSINS, 2013, p. 23). As narrativas cinematográficas iniciais, apesar de conterem

poucos segundos, modificariam a forma de ver o mundo.

Esse cinema surgiu em uma época de transformações. Esse momento deu início a

inúmeros processos que ainda marcam presença na sociedade contemporânea, todavia,

não estão presentes da mesma forma de quando foram desenvolvidos, nitidamente

receberam transformações ao longo das décadas, até assumirem a forma mais atual.

A modernidade não pode ser entendida fora do contexto da cidade, que

proporcionou uma arena para a circulação de corpos e mercadorias, a troca de

olhares e o exercício do consumismo. A vida moderna parecera urbana por

definição, contudo as transformações sociais e econômicas criadas pela

modernidade remodelaram a imagem da cidade em plena erupção do

capitalismo na segunda metade do século XIX (CHARNEY; SCHWARTZ,

2010, p. 19-20).

Page 2: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

Todas essas transformações surgiram em um âmbito bem defino as cidades, isto

principalmente porque elas viram “o nascimento de uma ‘sociedade de massa’ que

resultou, em parte, do crescimento do capitalismo industrial” (CHARNEY;

SCHWARTZ, 2010, p.21). O exemplo mais notório seria a própria Paris – centro de

grandes modificações e inovações, local esse onde os irmãos Lumière realizaram a

primeira exibição do cinema. O cinema surgiu como uma forma de diversão que foi

ganhando terreno na vida das pessoas até se tornar uma das principais artes.

Esse fazer cinematográfico foi evoluindo rapidamente de filmes baseados

inicialmente na forma teatral logo modificou sua postura, e as duas principais mudanças

a do sistema de preto e branco para o colorido e por fim a passagem do cinema mudo para

o cinema falado.

Certamente o cinema já não seria mais o mesmo de sua criação atingiria novos

pontos, toda essas transformações foram importantes para outro dois pontos que norteiam

esse trabalho, no caso a aproximação entre cinema e história e a tônica principal o cinema

como uma arma de valorização ideológica. Para observarmos essa dupla perspectiva o

historiador Marc Ferro nos apresenta algumas indicações.

A primeira delas diz respeito a aproximação entre o cinema e a história, uma

relação que iniciou conturbada isso talvez pelo seguinte fato:

Historiadores tradicionais, preocupados com o poder político e em mobilizar

os cidadãos para as guerras mundiais, e aos marxistas, que buscavam o

fundamento do processo histórico na análise dos modos de produção e da luta

de classes, essa arte era indiferente (NAVARRETE, 2008, p. 21).

Todavia, mesmo que a aproximação tenha demorado não perduraria por mais tanto

tempo seria em meados do século XX, que os primeiros historiadores se debruçaram sobre

o cinema. Marc Ferro seria um dos principais autores a realizar tal encontro isso e

observável em seu artigo “O filme: Uma contra análise da sociedade” (1970), no qual faz

uma explanação de como a fonte fílmica pode ser incorporada à história e qual seria a sua

função. O papel de Ferro não ficaria restrito apenas a este processo inicial, deu origem a

outros trabalhos.

Ferro deu início a um processo que levaria ainda alguns anos para ser introduzido,

e utilizado em uma escala maior, mesmo com esses primeiros processos, os filmes ainda

estavam sendo encarados com desconfiança, Hagemeyer afirma que:

Page 3: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

De um extremo a outro, nossa reação pode variar entre o deslumbramento

diante das potencialidades que abrem para o aprendizado humano, ou o terror

diante das implicações que esse tipo de artificio fantasioso poderia ter no

entorpecimento das consciências. Ao longo do século XX, essas duas posturas

marcaram os debates acadêmicos em torno do significado da produção

audiovisual na sociedade contemporânea (HAGEMEYER, 2012, p. 17).

A história após passar por modificações em sua forma de ser escrita e pensada

abriu o precedente para novas fontes, nesse exato momento o cinema encontrou o seu

espaço isso principalmente, pois:

Três eixos fundamentais cujo objetivo visa uma melhor avaliação do cinema

como: a) “agente da história”, b) “fonte histórica”, c) veículo para se construir

uma nova forma de “representação historiográfica” ou de transmissão do

conhecimento histórico. A partir destes eixos o cinema pode ser visto como

“agente histórico”, na medida em que interfere direta ou indiretamente na

História. Muito utilizado como difusor de ideologias o cinema se mostra um

campo investigativo extraordinário para pesquisadores das ciências humanas

de um modo geral (JESUS, 2011, p. 3).

Finalmente então a proposição inicial de Ferro encontrara o caminho para se

desenvolver. A nova fonte de estudo baseada nas narrativas cinematográficas daria acesso

a novas perspectivas isso porque “o poder da imagem se constituiu cada vez mais como

a janela para um mundo temporalmente extinto e que agregava diferentes instâncias de

tempo, entrecruzando passado, presente e futuro” (ROSSINI, 1999, p. 16). Em seus

primórdios o cinema foi comparado a uma janela que daria acesso ao mundo, contudo o

mesmo não teria essa mesma função para a história, apesar de parecer nos abrir caminhos

pela janelas do tempo, o que ele proporciona e uma nova forma de acessar arquivos do

tempo onde o historiador busque suas referências já que “[o] cinema não se constitui

fechado em si mesmo: ele permite o acesso a mundos diferentes, ao visível e ao não

visível” (FRANÇA, 2002, p. 63). Desse modo deve-se levar em conta que utilizar uma

narrativa cinematográfica como fonte de pesquisa vai além da simples observação do

mesmo, seria basicamente compreender como o filme representaria determinado período

ou acontecimento histórico, assim como a forma que foi realizado, se cumpria ou não um

objetivo para com a sociedade que o produziu.

O nascimento do cinema ideológico e um de seus principais exemplos.

Como já observamos anteriormente o cinema passou por transformações em sua

estrutura narrativa e estética, todavia não seria somente a estas que as incorporações

Page 4: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

ficariam restritas, pelo fato dos filmes estarem ganhando um destaque maior na vida dos

cidadãos, ele introduziria dessa forma uma nova maneira de se comunicar com as pessoas,

uma narrativa cinematográfica mesmo que produzida na Europa ou na Ásia ganhava com

o tempo um terreno maior que o local onde fora desenvolvido, novos horizontes estavam

sendo abertos para a sociedade moderna.

Com todo esse potencial os filmes logo chamaram a atenção de diferentes setores,

entre eles dos chefes de Estado e de seus políticos, Ferro destaca que, “os dirigentes de

uma sociedade compreenderam a função que o cinema poderia desempenhar, tentaram

apropriar-se dele e pô-lo a seu serviço” (FERRO, 1992, p. 13). Essa utilização se deu

graças a penetrabilidade dos longas-metragens na vida dos cidadãos em geral surgindo

inicialmente como meio de diversão e com o passar do tempo ganhando caráter

ideológico.

Essa correlação cinema e ideologia pode ser observada principalmente quando o

primeiro passou por mudanças ganhando novas formas e estilos e com isso trouxe novas

funções o próprio Nóvoa ressaltaria isso, “é preciso examinar a fundo o cinema como

veículo de ideologias formadoras das grandes massas da população e que pode ser

utilizado, com plena consciência de causa, como meio de propaganda” (NÓVOA, 2008,

p. 25), iniciasse assim a difusão de intenções políticas pelas narrativas cinematográficas.

Como asseverado por Pereira, “os filmes de propaganda desse período [1900 a

1925] não possuíam ainda o aperfeiçoamento técnico, o fascínio e a eficácia que teriam

os produzidos a partir da ascensão dos regimes nazifascistas e da Segunda Guerra

Mundial” (PEREIRA, 2004, p. 2). As dificuldades impostas ao cinema durante a Primeira

Guerra Mundial retardaram brevemente um avanço que logo seria notório, um dos

primeiros Estados a utilizarem essa proposição seriam os russos, estes que recém-saídos

de sua revolução socialista, procuravam novas formas para legitimar seu novo modo de

governo.

Essa ligação entre mídia e política é apontada por Pereira, quando esse afirma que

“a história da propaganda política moderna está intimamente ligada ao desenvolvimento

da política, da sociedade e da cultura de massas, consolidada a partir da década de 1920,

com o avanço tecnológico dos meios de comunicação” (PEREIRA, 2011, p. 2). O cinema

passaria a ser um dos construtores bem como legitimadores de novos regimes, já que “foi

Page 5: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

uma seção particularmente importante, sendo digno de atenção devido a sua grande

capacidade de penetração ideológica” (FAZIO, 2009, p. 294). Dessa forma os longas-

metragens e as pessoas envolvidas em sua produção teriam papeis a cumprir

principalmente com as novas causas que surgiam, sendo assim “o filme reproduz valores

e ideologemas que atingirão de forma direta ou indireta o público a que o assiste”

(VIANA, 2009, p. 7). De 1920 em diante o cinema seria invadido por diferentes

proposições ideológicas.

Se a União Soviética pode ser encarada como o principal berço da ideologia

política penetrada nos filmes. Ela não ficaria restrita a apenas esse local logo passaria a

ser observado em outros locais, e se tornaria mais destacável na Segunda Guerra Mundial,

Nóvoa considera que “o “nazi-fascismo” e o “stalinismo” seriam exemplos de fenômenos

históricos que utilizaram exaustivamente o cinema como instrumento difusor de sua visão

de mundo” (NÓVOA, 2008, p. 33). Se os russos deram origem ao cinema ideológico

moderno, o nacional-socialismo elevaria a utilização do cinema por um regime político a

um nível altivo, já que além dessa proposição inicial passou a ser usado para exaltar a

figura do líder, no caso Hitler. O fato de usar uma imagem central seria o elo para dar

legitimidade a uma causa.

Se o nazismo focou a utilização do cinema ideológico para dar origem a uma

consciência de causa, manter todos em volta da imagem do líder bem como referendar as

proposições políticas de Hitler, nos Estados Unidos os longas-metragens ideológicos

teriam um papel similar a cumprir, isso em relação as transposições ideológicas, pois

tentariam referendar a importância dos estadunidenses para manter a liberdade a todos,

ao contrário do nazismo que pretendia oprimir grande parte da população mundial.

Todavia o cinema hollywoodiano não passou de imediato a realizar tal proposição,

logo do início da guerra em 1939 os longas-metragens de Hollywood, mantiveram-se

afastados do conflito, não traziam em sua maioria filmes sobre a guerra, uma explicação

para isso pode ser o fato dos Estados Unidos mantiverem um certo afastamento para com

a guerra, visto que não se envolveram diretamente no conflito, apenas davam apoio aos

países Aliados, principalmente com o fornecimento de matérias primas e demais. A

postura apenas se transformaria com a chegada da guerra ao solo americano isso com o

ataque japonês a Pearl Harbor.

Page 6: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

Após esse fatídico dia para os Estados Unidos a máquina cinematográfica

hollywoodiana modificaria a sua postura de forma drástica. Isso porque agora os

estadunidenses entravam na guerra era necessário justificar essa nova postura frente aos

seus cidadãos, bem como referendar o permanente esforço de guerra que militares e não

militares seriam submetidos. Para atingir essas proposições Roosevelt se utilizou da sua

melhor arma: o cinema. Ferro afirma que “[u]ma vez declarada guerra, Roosevelt deu

instruções preciosas no sentido de desenvolver um cinema que glorificasse o justo direito

e os valores americanos” (FERRO, 1992, p. 32). A máquina cinematográfica começava a

se modificar e escolher seus inimigos.

No entanto, é importante apontar que no caso das democracias liberais houve,

em geral, a preocupação de orientar a instrumentalização política do cinema de

forma que a mensagem propagandística não fosse apresentada de forma tão

direta, explícita e agressiva, como ocorreu com o cinema de propaganda

produzido pelos regimes políticos de massas europeus e latino-americanos, já

que numa democracia moderna, de tipo ideal, os meios de comunicação

mantêm-se plurais, a fim de escapar a uma tutela política única, e o direito de

liberdade de expressão é garantido (PEREIRA, 2011, p. 4).

Desse momento em diante inúmeros foram os filmes que surgiram para dar

legitimidade a causa e construir esse inimigo que deveria ser combatido. Mesmo que os

Estados Unidos tenham entrado na guerra por causa do Japão, fora a Alemanha que

ganhou maior atenção do cinema de Hollywood. Com base na observação de todo esse

processo de desenvolvimento de cinemas nacionais como armas ideológicas, os estúdios

de Hollywood também seriam incumbidos de realizar narrativas cinematográficas que

valorizassem o estadunidense ao mesmo tempo que desmerecesse o inimigo alemão, disso

surgem dois filmes a serem analisados, Os Carrascos Também Morrem (Hangmen Also

Die!) e A Estrela do Norte (The North Star) eles surgiriam desse novo objetivo do cinema

hollywoodiano em construir uma valorização e divulgação da ideologia estadunidense.

Hangmen Also Die! e suas proposições ideológicas.

Primeira narrativa cinematográfica a ser analisada diz respeito a Hangmen Also

Die! e um filme estadunidense lançado em 1943, com direção do austríaco Fritz Lang,

escrito por Bertolt Brecht, o filme conta a história do assassinato de Reinhard Heydrich,

encarregado de comandar a região da Boémia e Morávia, entre o desenrolar da narrativa

iram surgindo diferentes conjecturas, duas delas de destaque, a constituição do nazista

Page 7: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

como um dos mais temidos dos inimigos já enfrentado pelos estadunidenses, bem como

exaltar ideologicamente os princípios dos Estados Unidos.

Fritz Lang o diretor do filme ao construir uma visão negativa para com os nazistas

utilizou diferentes processos para isso, o primeiro deles surge na abertura do filme

(LANG, 1943, 02’ 41” a 02’ 55”). Após uma tomada da cidade de Praga as imagens são

direcionadas para um castelo quando a câmera começa a mostrar o interior do mesmo,

surgiriam as primeiras referências aos nazistas, pois surgem flamulas e símbolos, contudo

a imagem ganha contornos de negatividade quando a imagem de Hitler surge em um

quadro, somado a imagem a música se torna angustiante, a constituição dessa sequência

visa demonstrar que aquele seria o mal a ser combatido.

A imagem do Führer marcaria presença em outros momentos do filme também,

essa imagem aparece sempre relacionado a algo ligado a ideologias nazista. “Admito que

seus trabalhadores talvez sejam mal pagos, mas como uma raça inferior, como escravos,

são muito bem pagos” (LANG, 1943, 03’ 28” a 03’ 36”). Enquanto um aliado dos nazistas

pronuncia tal frase atrás deles se encontra um quadro de Hitler observando tudo que

transcorre no salão. Note que nos diálogos o que se faz presente e a questão da

superioridade de raças pensadas pelos nazistas. Hitler se faz presente em outros momentos

com princípios parecidos.

Além da imagem do líder nazista outros dois processos construiriam essa imagem

negativa objetivada pelo filme, a primeira delas pode ser observada nos diálogos onde

duras são as constatações feitas pelos nazistas, como pode-se observar na fala do nazista

Heydrich; “Há 37 mil trabalhadores lá. E com uma sabotagem tão escandalosa apenas 50

foram executados. Porque não 500?” (LANG, 1943, 05’ 20” a 05’ 31”). A crueldade surge

na entonação da fala do personagem que parece incomodado com poucas mortes sua

satisfação viria com um extermínio em massa. Qual regime poderia criar tal atmosfera a

não ser os inescrupulosos nazistas, em decorrência desse pensamento e de outros fatores

que os estadunidenses passariam a lutar, para dar fim a estas proposições incabíveis dos

nazistas.

Interligando os pontos anteriores e adicionando uma nova forma de

desmerecimento Lang introduz uma característica própria na narrativa para desvalorizar

os nazistas, essa seria a sombra dos personagens, assim que um oficial ou soldado nazista

Page 8: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

surge atrelado a ele está sua sombra bem definida, enquanto os demais integrantes do

filme possuem sombras distorcidas. Analisemos um dos exemplos presente no filme

(LANG, 1943, 01’ 00” 23” a 01’ 01” 10”).

Nesse intervalo duas personagens encontram-se dentro de uma sala onde existem

aparelhos de tortura, uma das personagens encontrasse caída no chão com claro sinais de

tortura, a outra tenta acudir a esta senhora caída – ambas as sombras não são nítidas-,

entretanto já não era mais possível ajudá-la visto que estava morta, se esse primeiro

momento já causaria um impacto, tudo se torna mais tenebroso, quando a música ganha

contornos dramáticos e surge a sombra de um nazista que carrega um chicote em sua mão

ele para em frente a porta o que causa um forte impacto, pois este regime não pouparia a

ninguém se até mesmo uma senhora de idade foi submetida a processos de tortura, o que

esperar para com o resto da humanidade, algo deveria ser feito, os nazistas já não

poderiam seguir agindo dessa forma.

Com isso surge o elemento de valorização ideológico para com os Estados Unidos.

- Refém: “Compatriotas, é chegado o momento. Compatriotas, temos muito a

fazer. Ergam a tocha invisível e a repassem, mantenham-na acessa,

mantenham-na acesa pelo caminho sem volta. Morra se preciso, pela causa,

mas grite até o fim: Render-se jamais. Sempre adiante, sem retroceder até que

o carrasco irracional aprenda que a guerra não está ganha até a última batalha

ser travada. Continuem, quando já não estivermos. Nunca se rendam!”

(LANG, 1943, 1H 06’ 47” a 1H 07’ 21”).

A valorização para com os Estados Unidos surge no trecho “ergam a tocha

invisível e a repassem” (LANG, 1943, 01’ 06” 55”). Uma clara referência a um dos

principais símbolos da liberdade americana essa e: “The Statue of Liberty” (Estátua da

Liberdade). Isso pode ser observado, pois, na mão da estátua encontra-se uma tocha e em

seu nome está mencionado diretamente o termo liberdade. O segundo ponto, pode ser

observado quando retomamos o nome oficial do monumento: “Liberty Enlightening the

World” (“A Liberdade Ilumina o Mundo”). A presença dos Estados Unidos no conflito

mundial incorporou toda uma carga ideológica, a utilização da música referendado

anteriormente junto com a observação da proposição da estátua gera a valorização

ideológica pois na música e o ato do monumento demonstrar que seria os Estados Unidos

que iluminariam o mundo novamente com sua liberdade, uma clara valorização proposta

pelo filme.

Page 9: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

Outro momento ideológico do filme surgira da metade para o final do filme, os

diálogos a seguir melhor exemplificaram esse processo.

- Professor Novotny: O que quero lhe dizer agora, meu filho, é para quando

ficar adulto, para quando os poderosos invasores tiverem sido expulsos de

nossa terra há um longo tempo. Espero que esteja vivendo em uma terra livre

onde o povo governará para o povo e pelo povo. Serão grandes dias para viver

numa terra onde todos os homens, mulheres e crianças tem o que comer. E

tempo para ler e pensar e conversar com outros por sua própria vontade.

Quando chegar esse dia não se esqueça de que a liberdade não é algo que se

possui como um chapéu ou doce. A verdadeira questão é a luta pela liberdade.

E você se lembrará de mim não porque fui seu pai, mas porque eu também

morri nesta grande batalha. (LANG, 1943, 1H 17’ 26” a 1H 18’ 35”)

O primeiro ponto, a ser destacado na fala do professor, encontra-se em “Espero

que esteja vivendo em uma terra livre onde o povo governará para o povo e pelo povo”

(LANG, 1943, 1H 17’ 43” a 1H 17’ 50”); Uma frase que definira uma das constantes

lutas pelos direitos democráticos, defendidos e encabeçados pelos Estados Unidos. Todo

o contexto onde o personagem realiza uma fala a sua filha, ganha tons ideológicos com o

soar das frases, se inicialmente o ator e enfocado por planos e ângulos de filmagens mais

distantes, quando mais libertário vai se tornando seu discurso mais a câmera se aproxima

de seu rosto através de um close-up, isso revela a intenção do cinema em valorizar os

princípios estadunidenses.

Outro momento com destaque para a análise está no trecho “Quando chegar esse

dia não se esqueça de que a liberdade não é algo que se possui como um chapéu ou doce”

(LANG, 1943, 1H 18’ 11’ a 1H 18’ 22”). Essa observação revela que a luta pelos

princípios da liberdade constituiu-se como algo que exige sacríficos, que podem parecer

abomináveis como a morte de centenas de soldados, todavia para que essa guerra insana

fosse finalizada sacríficos teriam que ser posto a provas. E os Estados Unidos como nação

fundada sobre os preceitos da liberdade teriam que tomar a dianteira, já eu não poderia

deixar a humanidade ser encoberta pelas trevas nazistas, teriam estes o papel de iluminar

novamente o mundo com a chama da liberdade.

O filme Hangmen Also Die! constrói uma valorização ideológica forte para com

os estadunidenses pois mesmo que os personagens não sejam estadunidenses, eles

subitamente parecem ser arrebatados por esses princípios ideológicos dos americanos, e

suas falas parecem se dirigir a esta nação como uma espécie de apelo para que interviram

de forma definitiva.

Page 10: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

The North Star o paradigma ideológico de Hollywood.

Segunda narrativa cinematográfica, diz respeito a The North Star um filme

estadunidense lançado no ano de 1943, com direção do russo Lewis Milestone, o filme

aborda a invasão dos alemães em solo da União Soviética, na região próxima a Kiev, o

vilarejo a estrela do norte e duramente atacado, a tônica da narrativa gira em torno de um

grupo de jovens que tenta retornar ao vilarejo e levar as armas para a resistência soviética.

Entretanto dentro do filme existem assim como no anterior alguns aspectos fogem ao

enredo no caso percebemos três aspectos importantes: 1. O fato do filme ressaltar a União

Soviética como um povo digno, 2. Um desmerecimento para com a figura dos nazistas

como seres inescrupulosos, 3. Uma valorização ideológica de princípios estadunidenses.

Esses serão os pontos a serem analisados posteriormente.

A União Soviética desde sua constituição, passou a sofrer duros ataques,

principalmente pelos filmes hollywoodianos que tentavam desmerecer ao máximo esse

regime que concorria diretamente com os Estados Unidos, essa forma de agir dos estúdios

de Hollywood perduraram por anos, entretanto uma situação em específico mudaria essa

postura, a Segunda Guerra Mundial, levaria os estadunidenses a revisarem essa postura.

O nazismo transformara-se em um inimigo difícil de combater, os ingleses, os

franceses bem como os soviéticos estavam ou já haviam sofrido com o avanço das tropas

alemãs. Era necessária uma colaboração entre todos afim de vencer este inimigo, para

isso essa antiga postura de Hollywood não poderia persistir, como se aliar a alguém que

se desmerece a todo momento, revertendo então toda essa postura os estúdios

hollywoodianos passaram a produzir filmes que exaltavam a União Soviética, com ênfase

na sua população que era capaz de sofrer duros ataques como os implementados pelos

nazistas e mesmo assim mostrar uma força inestimável para defenderem as suas terras.

The North Star mostra isso em diferentes sequências onde as pessoas realizam

atos de coragem, ressaltamos duas partes, a primeira delas (MILESTON, 1943, 57’ 10 a

59’ 13”), referenda uma tática conhecida do povo russo, a destruição de todo material que

o inimigo possa usar em seu benefício, nessas sequências, as senhoras tomam a iniciativa

de atear fogo em suas casas e demais bens. Outra parte de grande impacto surge no final

do filme quando homens do vilarejo mesmo que desmunidos de armas de fogo lutam

incessantemente contra os nazistas para tentar manter sua terra livre das garras nazistas.

Page 11: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

Hollywood não ressalta o regime soviético, mas sim seu povo que em muito pode

ser observado como os estadunidenses, já que passam por constantes lutas na tentativa de

manter e reafirmar sua liberdade, The North Star foi um dos primeiros filmes a ressaltar

essa intenção, era preciso demonstrar aos espectadores estadunidenses que os soviéticos

poderiam receber um voto de confiança, e que eles seriam dignos de lutarem ao lado da

nação defensora dos princípios da liberdade.

Contudo a forma mais clara de tentativa de valorização dos soviéticos surge com

as canções que existem no filme, a seguir a análise de uma dessas canções.

- Crianças: Da Ucrânia à fronteira polaca. Do Atlântico ao mar Báltico. Há paz

onde antes havia guerra. Há luz onde antes havia trevas. Nem uma única voz

se lamenta, nem um único coração anseia já pela liberdade. Os povos da nossa

nação construíram um mundo de homens livres. Dá-lhes força para continuar

lutando. Lembraremos com orgulho. É fácil nós sentir ditosos. Teremos uma

vida plena. (MILESTONE, 1943, 10’ 26” a 10’ 26”).

No último dia de aula após o discurso final do professor as crianças iniciam uma

canção que em suas primeiras linhas destacaria as dimensões continentais da nação

soviética, revela aspectos também da formação da nação soviética e que agora deveria ser

observada como algo positivo e valorativo. Concluindo a música visa demonstrar que o

povo soviético teria que se manter firme em seus princípios pois ainda seriam longos os

anos de sacrifícios até a vitória final.

Se os cinemas nacionais ganharam funções ideológicas, uma das mais utilizadas

e a construção de inimigos inescrupulosos, a narrativa cinematográfica de Lewis não seria

diferente, o diretor utilizou-se de diferentes aspectos para referendar isso. No início do

filme essa proposição já pode ser observada conforme o dialogo seguinte:

- Voz em Off: Há movimentos de tropas alemãs na fronteira polaca. Tropas

alemãs estão na fronteira polaca. Desconhece-se o motivo. Foi declarada uma

epidemia de tifo Varsóvia.

Londres foi bombardeada ontem à noite pela Luftwaffe.

Morreram 112 crianças esta manhã resultado de transfusões de sangue

realizadas nos soldados alemães feridos.

- Boris Simonov:Crianças! Tiram-lhes o sangue! (MILESTONE, 1943, 07’

00” a 07’ 26”).

Enquanto uma família tomava seu desjejum tranquilamente surge esse

pronunciamento no rádio, essa seria a primeira forma de mostrar que os nazistas seriam

os mais cruéis dos inimigos, isso fica evidente quando a informação relata o ato de

transfusão de sangue de crianças para soldados nazistas, algo abominável de se pensar.

Page 12: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

Todavia isso não ficaria restrito apenas a este pronunciamento, no decorrer do filme após

a invasão nazistas na cidade essa prática e demonstrada (MILESTINE, 1943, 1H 16’ 24”

a 1H 17’ 15”) quando uma criança tem seu sangue retirado por completo, na tentativa de

salvar a vida de um soldado nazista ferido em combate.

Se essas sequências são impactantes, no decorrer do filme o processo tem

prosseguimento com o ataque propriamente dito ao vilarejo, onde os nazistas realizam

duros ataques, inicialmente com aviões que disferem inúmeras rajadas de metralhadoras

ou o despejar de bombas que destroem e matão inocentes, todavia a sequência que mais

proporciona angustia para esse aspecto de ataque cruéis que Lewis implementa em sua

narrativa cinematográfica decorre no intervalo (MILESTONE, 1943, 41’ 18” a 41’ 25”);

Nele uma menina – aparentemente com 6 a 8 anos de idade – que brincava com sua amiga

no pátio de casa, assustada com o barulho proporcionado pelo ataque nazista sai correndo

sem saber o que estava ocorrendo, quando a mesma adentra em uma rua um dos aviões

nazista a persegue e disfere uma rajada de tiros acertando a menina pelas costas, uma

morte cruel.

O atentado por si já seria forte, mas a construção do cenário dessa morte a torna

mais impactante, a menina ao correr pela rua parece estar sendo guiada por um corredor

– formado pelas casas – onde a única saída seria a morte, a sequência culmina com seus

pais lamentando a morte da menina, o desmerecimento implementado por Lewis e uma

das marcas do filme.

Último aspecto desse desmerecimento diz respeito a questão da tortura, imposta

pelos nazistas a população local. Os alemães ao tomarem conta da cidade buscam por

informações sobre a resistência, a mulher do líder do vilarejo e quem deve fornecer as

informações, nisso surgira a tortura, já que ela refutaria em fornecer o que lhe era pedido,

- Dr. Kurin: Eu sou médico.

- Soldado Nazista: Vão dar cabo dela. O braço direito e a perna direita devem

estar partidos. Deve aconselhar a sua gente a dar informação quando for

pedida.

- Dr. Kurin: Você é médico e é capaz?

- Soldado Nazista: Nesta nova ordem do mundo temos que fazer muitas coisas

que não aprovamos necessariamente. (MILESTONE, 1943, 1H 04’ 34” a 1H

04’ 52”).

Após a mulher desferir um grito de dor, o médico local tenta intervir, mas é

impedido por soldados nazistas que bloqueiam a porta, nisso surge a fala que cria toda

Page 13: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

essa atmosfera de alemães cruéis já que parece haver satisfação naquilo que havia sido

feito com a mulher. Lewis conseguiu transpor para sua narrativa de forma clara a

representação que se tinha sobre os soldados e lideres do nazismo que eram figuras

diabólicas e que deveriam ser combatidos.

Interligado a isso surgiria o último aspecto a ser analisado no filme a valorização

ideológica para com os estadunidenses o filme apresenta três sequências de caráter

ideológico, mas sobretudo a ultima que encerra o filme irá deter nossa análise.

(MILESTONE, 1943, 1H 44’ 46” a 1H 45’ 16”).

Dois aspectos são importantes para essa sequência: os diálogos e a constituição

fílmica, principalmente a forma de filmagem dos personagens. Quando mais ideológica

as falas das personagens vão se tornando mais a câmera se aproxima de seus rostos através

de um close-up, isso surge principalmente para revelar que algo externo estava entrando

em cena no caso os princípios ideológicos dos Estados Unidos conforme os diálogos iram

referendar:

- Marina: Acabou Sra.

- Nadya Simonov: Haverá outra, um dia.

- Marina: Mas será diferente para nós. A gente não deixa as pessoas como

eram. Todos aprenderão e verão que as guerras não têm razão de ser. Faremos

desta a última guerra, tornaremos o mundo livre para os homens. A terra nos

pertence ao povo, se lutarmos por ela. E nós lutaremos. (MILESTONE, 1943,

1H 44’ 46” a 1H 45’ 16”).

Alguns pontos devem ser analisados. Em primeiro, a questão da incerteza para

com o futuro, isso em decorrência da senhora não estar acreditando em um final promissor

para a humanidade, períodos difíceis vão e voltam. Outro aspecto que dialoga com esse

primeiro e a questão do pacifismo que Lewis tenta impor, onde é notória: “que as guerras

não têm razão de ser” (MILESTONE, 1943, 1H 44’ 58”). O diretor almejava a paz a

todos. O último aspecto a ser extraído dos diálogos diz respeito à valorização ideológica,

sim ela se encontra do meio para o final da fala de Marina: “faremos desta a última guerra”

(MILESTONE, 1943, 1H 45’ 03”). Quem repassa a informação é uma personagem

soviética, todavia, a intenção de dar um fim à guerra, pertence aos Estados Unidos, uma

vez que esta nação vinha trabalhando arduamente para que esse combate chegasse ao fim,

e a eles deveriam ser atribuídos o papel de defender todos das demais guerras evitando

mergulhar o mundo novamente em um caos como o provocado pelo nazismo.

Page 14: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

Este primeiro conjunto de palavras revela uma intenção por parte dos Estados

Unidos, o conjunto seguinte é a declaração e o compromisso com tal tarefa, isso por que:

“tornaremos o mundo livre para os homens” (MILESTONE, 1943, 1h 45’ 08”). Esse seria

o aspecto ideológico marcante do filme: os estadunidenses erguem sua principal bandeira

seja antes de conflitos ou no pós-guerra, visto que essa nação seria a escolhida há muito

tempo para guiar o mundo em busca de sua liberdade e em todos os momentos de

dificuldades ela ressurgira para levar ao cabo tal tarefa.

O filme The North Star, pode ser considerado um marco do cinema hollywoodiano

já modifica o paradigma de filmes negativos contra a União Soviética, passando agora a

uma exaltação, comedida sim, mas um grande avanço para estabelecer uma aproximação

entre Washington-Moscou.

Conclusão.

O cinema consolidou-se como uma das grandes armas ideológicas utilizados pelos

Estados modernos, isso pois a alta penetrabilidade do cinema na vida dos cidadãos

proporcionou tudo essa forma de utilização. A Segunda Guerra Mundial observou

claramente um dos grandes momentos da utilização do cinema ideológico, Hollywood

utilizaria todo o seu poderio para exaltar os estadunidenses, isso pode ser observado na

análise das duas narrativas cinematográficas anteriores.

Antes de exaltar a seu próprio povo os cinemas nacionais desmerecem sues

inimigos os filmes Hangmen Also Die! e The North Star, construíram nitidamente a visão

negativa para com os nazistas, ambos os diretores proporcionaram a utilização de imagens

fortes seja com uma senhora morta após um processo de tortura com Lang, ou com Lewis

na perseguição que uma avião realiza para com uma jovem menina terminando numa

trágica morte. Além dessa construção de mortes dramáticas os dois diretores impuseram

outras formas de desmerecimento, como a utilização de imagens do nazismo atrelado a

tons musicais de temor ou angústia. O elemento de denegrir constituiu-se como uma

forma marcante do cinema ideológico.

Mas certamente o principal elemento que preencheu os cinemas modernos foi a

valorização ideológico, os dois filmes aqui analisados constituem-se como exemplo, isso

pois em diferentes momentos das narrativas cinematográficas existem pequenos

elementos que referenciam essa prática, no filme Hangmen Also Die! dois são os

Page 15: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

momentos que os estadunidenses são demonstrados como salvadores do globo terrestre,

bem como a sequência final de The North Star que proporciona uma nítida demonstração

que os estadunidenses seriam os verdadeiros lideres mundiais. O cinema hollywoodiano

constituiu-se como uma das mais potentes armas ideológicas já utilizadas pelos Estados

Unidos.

Referências Bibliográficas.

CHARNEY, Leo. SCHWARTZ, Vanessa. O cinema a invenção da vida moderna.

Tradução de Regina Tompson. São Paulo: Cosac Naify, 2004. 464p.

COUSINS, Mark. História do cinema: Dos clássicos mudos ao cinema moderno.

Tradução de Cecília Camargo Bartalotti, São Paulo: Martins Fintes, 2013. 511p.

FAZIO, Andréa Helena Puydinger De. Crítica à Imagem Eurocêntrica: Uma reflexão

acerca das representações étnicas e culturais em Hollywood. Anais II Encontro

Nacional de Estudos da Imagem,12, 13 e 14 de maio de 2009, Londrina-PR. p. 293-298.

FERRO, Marc. Cinema e História. Tradução de Flavia Nascimento. Rio de Janeiro: Paz

e Terra, 1992.72p.

___________. O filme: uma contra análise da sociedade. In: LE GOFF, Jacques;

NORA, Pierre (orgs.). História: novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995, p.

199-215.

FRANÇA, Andréa. Paisagens fronteiriças do cinema contemporâneo. In: Alceu. São

Paulo, v.2, n. 4, p. 61-75, 2002.

HAGEMEYER, Rafael Rosa. História e Audiovisual. Belo Horizonte: Autêntica,

2012.159p.

JESUS, Altair Reis de. O cinema como registro histórico da sociedade.Anais do XXVI

Simpósio Nacional de História – ANPUH, São Paulo, julho 2011.p. 1–11.

NAVARRETE, Eduardo. O cinema como fonte histórica: diferentes perspectivas

teórico-metodológicas. Revista Urutágua – revista acadêmica multidisciplinar Nº 16 –

ago./nov. Maringá, p. 1–7. 2008.

NÓVOA, Jorge. Apologia da relação Cinema-História. In: NÓVOA, Jorge; BARROS,

José D´Assunção. Cinema-História: teoria e representações sócias no cinema. Rio de

Janeiro: Apicuri, 2008. p. 55 – 106.

Page 16: A IDEOLOGIA ESTADUNIDENSE REPASSADA POR … · restabeleceria a ordem mundial referendando práticas ideológicas dos estadunidenses, Hollywood cumpriria os objetivos a si propostos

PEREIRA, Wagner Pinheiro. Cinema e política na era Roosevelt: O “American Dream”

nos filmes de Frank Capra (1933 - 1945). Anais do XXVI Simpósio Nacional de

História – ANPUH, São Paulo, julho 2011. p. 1-17. 2011.

__________. Cinema e propaganda política no totalitarismo e na democracia:

tempos de Hitler e Roosevelt (1933 - 1945). Anais do XVII Encontro Regional de

História – O lugar da História. ANPUH/SPUNICAMP. Campinas, 6 a 10 de setembro

de 2004. p. 1–8. 2004.

ROSSINI, M. S. As marcas da história no cinema, as marcas do cinema na história.

Anos 90, Porto Alegre, n. 12, p. 118-128, dez. 1999.

VIANA, Nildo. A concepção materialista da história do cinema. 1° ed. Porto Alegre:

Asterisco, 2009.111p.