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A inclusão do aluno cego em aulas de música: relatos e observações. Rafael Moreira Vanazzi de Souza-UEM [email protected] Raphael Ota-UEM [email protected] Resumo Por meio de partituras musicais em braille a pessoa cega consegue ler e escrever todos os elementos da grafia musical em tinta. No entanto, devido ao seu pouco conhecimento por parte de educadores musicais, mesmo no meio acadêmico, a inclusão da pessoa cega nas aulas de música não ocorre de forma efetiva seja em um curso técnico de conservatório ou no ensino superior. Recentemente, profissionais da educação musical vêm se interessando pelo assunto e se especializando para atender essa crescente demanda de alunos. Nesse sentido, este artigo tem por objetivo levantar questões sobre a inclusão dos alunos cegos na aula de música, apontando as dificuldades encontradas pelos mesmos para se preparar e realizar a prova de aptidão musical em braille no vestibular. O trabalho também traz um relato sobre o projeto de extensão de educação inclusiva do Departamento de Música da Universidade Estadual de Maringá, a fim de exemplificar uma tentativa de inclusão do aluno cego no ensino superior de música. Palavras chave: musicografia braille; inclusão social; deficiência visual. Introdução Para cursar a graduação em musica é necessário ser aprovado em uma prova de aptidão musical, cujo objetivo é avaliar se o aluno possui os conhecimentos mínimos para entrar no curso. Esses conhecimentos podem ser estudados freqüentando escolas de música ou aulas particulares, pois são simples para um músico experiente. Sendo assim, é possível uma boa realização da prova para a maioria dos candidatos, mesmo se são relativamente iniciantes em um instrumento musical. Dentro desse cenário, a pessoa cega 1 que pretende prestar essa mesma prova de vestibular se depara com um panorama bem diferente ao buscar adquirir esses mesmos 1 Deficiência visual é uma categoria que inclui pessoas cegas e pessoas com visão reduzida. Na definição pedagógica, a pessoa é cega, mesmo possuindo visão subnormal, quando necessita ser instruída

A Inclusão Do Aluno Cego Em Aulas de Música- Relatos e Observações

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A inclusão do aluno cego em aulas de música: relatos e observações.

Rafael Moreira Vanazzi de Souza-UEM

[email protected]

Raphael Ota-UEM

[email protected]

Resumo

Por meio de partituras musicais em braille a pessoa cega consegue ler e escrever todos os elementos da grafia musical em tinta. No entanto, devido ao seu pouco conhecimento por parte de educadores musicais, mesmo no meio acadêmico, a inclusão da pessoa cega nas aulas de música não ocorre de forma efetiva seja em um curso técnico de conservatório ou no ensino superior. Recentemente, profissionais da educação musical vêm se interessando pelo assunto e se especializando para atender essa crescente demanda de alunos. Nesse sentido, este artigo tem por objetivo levantar questões sobre a inclusão dos alunos cegos na aula de música, apontando as dificuldades encontradas pelos mesmos para se preparar e realizar a prova de aptidão musical em braille no vestibular. O trabalho também traz um relato sobre o projeto de extensão de educação inclusiva do Departamento de Música da Universidade Estadual de Maringá, a fim de exemplificar uma tentativa de inclusão do aluno cego no ensino superior de música.

Palavras chave: musicografia braille; inclusão social; deficiência visual.

Introdução

Para cursar a graduação em musica é necessário ser aprovado em uma prova de

aptidão musical, cujo objetivo é avaliar se o aluno possui os conhecimentos mínimos

para entrar no curso. Esses conhecimentos podem ser estudados freqüentando escolas de

música ou aulas particulares, pois são simples para um músico experiente. Sendo assim,

é possível uma boa realização da prova para a maioria dos candidatos, mesmo se são

relativamente iniciantes em um instrumento musical.

Dentro desse cenário, a pessoa cega1 que pretende prestar essa mesma prova de

vestibular se depara com um panorama bem diferente ao buscar adquirir esses mesmos

1 Deficiência visual é uma categoria que inclui pessoas cegas e pessoas com visão reduzida. Na definição pedagógica, a pessoa é cega, mesmo possuindo visão subnormal, quando necessita ser instruída

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conhecimentos. Ela constatará escolas de música e professores despreparados para lhes

atender de forma satisfatória; recusando-os ou criando adaptações em relevo das

partituras e métodos em tinta. Raras exceções são os professores que os recebem já com

as partituras em braille.

Isso se deve a musicografia braille ser assunto desconhecido até mesmo entre o

meio acadêmico. Fato que torna a inclusão desse aluno especial no ensino superior algo

ainda distante. Embora haja relatos de professores universitários empenhados na

inclusão desse aluno, a escassez de estudos e o desconhecimento sobre o assunto é uma

barreira que dificulta a sua concretização.

Ainda assim, hoje temos casos de alunos cegos que cursaram, cursam e outros

que pretendem cursar a graduação, mestrado ou doutorado em música nas universidades

públicas brasileiras. “Prova disso tem sido o crescente número de alunos deficientes no

ensino superior” (CAIADO, 2003, p. 30). Sendo essas pessoas cidadãos e com direitos

de educação, as instituições públicas têm o dever de atender à demanda de alunos cegos

já existentes e se preparar de acordo com a crescente demanda2. “Na legislação atual, a

pessoa deficiente ganhou o status de cidadã. Hoje, olha-se para ela como alguém com

direitos e capacidades. Resta o movimento social avançar ao patamar da conquista

desses direitos” (CAIADO, 2003, p.31).

A musicografia braille na aula de música

Sendo a universidade um pólo formador de profissionais com licenciatura em

música, ela poderia, além de promover a formação de profissionais capazes de dar aulas

eficientes para alunos cegos, proporcionar a inclusão do aluno cego através de pesquisas

nesse campo. Essa questão é mais ampla se considerarmos a arte não apenas como uma

terapia ocupacional para o deficiente visual (d.v.), mas sim como uma habilidade

passível de ser desenvolvida a nível profissional. Dessa forma ela contribuiria gerando

materiais didático-musicais especializados, estudos e novas ações nessa área,

em braile; a pessoas com visão subnormal pode ler tipos impressos ampliados ou com o auxílio de potentes recursos ópticos (INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT, 2002)

2 “A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) obriga o poder público a ampliar o atendimento aos alunos com necessidades especiais na rede pública regular de ensino” (art. 60, parágrafo único) (COLOMBO, 2004, p. 44).

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favorecendo a inclusão de uma parcela de cidadãos que buscam seus direitos na

educação pública e gratuita.

Nesse sentido Caiado aponta “a necessidade da formação de pessoal

especializado em educação especial, em níveis de graduação e pós-graduação. Tarefa

especialmente indicada às universidades públicas” (2003, p.30). A partir de relatos

apontamos que quando um candidato no vestibular é cego, entre os docentes do curso

que o receberia, surgem questões relativas à inclusão e falta de preparo em que se

encontram para atendê-lo.

Mesmo as universidades não estando efetivamente preparadas, cada uma ao

seu modo, tem se mobilizado para atender essa demanda. No entanto, essa mobilização

acontece a partir do momento em que se deparam com o aluno especial, e não antes

disso. O ideal seria já estarem preparadas para receber qualquer aluno com deficiência

visual, entre as outras deficiências físicas, chegando a até mesmo oferecer uma

habilitação especial para graduandos cegos. Sendo assim, devido às características da

educação especial, “é necessário que haja oferta permanente de serviços de apoio

especializado na escola regular para que esse alunado possa se incluir na escola”

(CAIADO, 2003, p. 23).

Deve-se ressaltar que o ensino de música para deficientes visuais só se difere do ensino para demais pessoas, no que diz respeito ao método de leitura e escrita utilizado. Desse modo, para que o aluno com deficiência tenha acesso aos mesmos conhecimentos musicais disponíveis aos outros alunos, faz-se necessário que eles contem com um atendimento educacional especializado. (BONILHA, 2006, p.20).

Muitas das matérias de um curso de graduação em música podem ser

acompanhadas por alunos cegos se disponível para ele o material usado pelo professor

impresso em braille, seja ele texto ou partitura. Seria conveniente que o professor

conhecesse a leitura em braille para entender o que o aluno escreveu na sua grafia de

pontos, assim corrigindo seus exercícios de aula e de casa. De outra forma, a presença

de um transcritor para acompanhar esse aluno se mostra útil, intermediando aluno e

professor. “Quando necessário, as escolas deverão contar com serviços de apoio

especializados, para atender os alunos da educação especial” (COLOMBO, 2004, p. 44).

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Recentemente foi lançado um programa de computador chamado Musibraille3

pelo Instituto Benjamim Constant. Com ele é possível escrever uma linha melódica em

braille e automaticamente ver seu correspondente em tinta, o que facilitaria o trabalho

de um professor em aula. No entanto, sinais avançados na musicografia infelizmente

ainda não são compreendidos pelo programa4, pois ainda está nas suas primeiras

versões.

Prova de aptidão musical em braille

No segundo semestre de 2009, Rafael Souza foii convidado para fazer a

transcrição da prova de aptidão em música do vestibular da UEM para o curso de

música. Essa seria uma tarefa complicada por causa das questões apresentadas

anteriormente, no entanto, essa também seria uma oportunidade para levantar novas

questões sobre a inclusão do aluno cego na graduação em música.

Uma alternativa discutida entre a comissão de vestibular e professores do curso

de música foi fazer a prova de forma oral, com uma pessoa para ler a prova e escrever

as respostas do aluno em tinta. Por fim optaram pela transcrição da prova para o braille.

A transcrição de partituras da tinta para o braille de forma automática ou

computadorizada atualmente é impossível de ser realizada de modo integral e fiel.

Como exemplo, cito que as claves existem em braille apenas para informar ao leitor

cego, sendo de nenhuma utilidade para a leitura de uma partitura braille, pois nela não

há pentagramas ou similar. Portanto, questões da prova que envolveu o conhecimento

de leitura em diferentes claves foram prejudicadas.

Em contrapartida, exercícios que são muito simples de serem realizados em

tinta, se tornavam complexos em braille. Alguns deles poderiam até ser considerados

avançados devido à maneira como eram apresentados e pela resposta escrita esperada do

aluno. Houve casos em que o enunciado teve que sofrer alterações em benefício do

entendimento e coerência com a grafia braille. Todas as alterações foram feitas com a

aprovação dos elaboradores da prova em tinta.

3 Dolores Tomé, juntamente como professor Antônio Borges do Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lançaram um software gratuito chamado Musibraille, o primeiro programa para computadores em língua portuguesa para escrita da linguagem musical em Braille. 4 Sinais braille para intervalos (no visor em tinta e execução MIDI), em acorde total e parcial, nota móvel, pautas simultâneas escritas em linhas diferentes, são exemplos a que me refiro. Para detalhes sobre essa grafia, consultar o Manual Internacional de Musicografia Braille.

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As questões da prova em braille foram apresentadas em um caderno, cada uma

ocupando uma página. As respostas eram dadas pelo aluno em uma outra folha

utilizando uma máquina perkins5, sendo uma folha para cada questão da prova.

Para a prova de leitura à primeira vista foi transcrito todos os trechos em tinta

disponíveis, sorteando qual o aluno iria ler. Nesse momento ficou claro que a

dificuldade dos solfejos em tinta aumentava quando estavam em braille. Por causa das

particularidades dessa musicografia, é exigido que o aluno decore a sua parte ao invés

de acompanhar o canto com a leitura da peça, como é feito pelo candidato com visão

normal. Os examinadores perceberam a situação e, com a intenção de serem justos, foi

dado um tempo extra para o candidato ler e decorar seu solfejo.

A prova de instrumento foi excelente, pois o candidato é excelente músico.

Contudo, a nota final não foi suficiente para sua aprovação.

Considerações sobre o vestibular

As provas de aptidão nos vestibulares cobram que o candidato tenha noções

musicais básicas para ele iniciar a graduação. Dessa forma os cursos de graduação

conseguem ter um nivelamento dos conhecimentos e vivências musicais dos seus

alunos, evitando haver diferenças acentuadas nas turmas. Essas noções básicas, teóricas

e práticas, do ponto de vista musical também deveriam ser básicas para o candidato

cego. No entanto, a problemática é a dificuldade desse aluno em adquirir esses

conhecimentos para prestar essa mesma prova, seja pela ausência de professores

especializados, seja pela ausência de material didático-musical para pessoas cegas.

Mesmo se um professor conhecedor da musicografia braille ensinasse as

noções básicas para o candidato em questão, ainda assim, o material didático disponível

para essa tarefa é escasso. Dessa forma seria preciso aulas por um tempo maior, pois

sem indicações metodológicas a serem seguidas, as aulas somente teriam forma à

medida que as dificuldades do aluno forem aparecendo. O candidato com visão normal

possui um leque de possibilidades para se preparar para o vestibular, ao contrário do

candidato cego.

Dessa forma, as faculdades de música poderiam oferecer cursos de pré-

vestibular para o candidato cego, devido a seu papel na sociedade e a carência aqui

5 Máquina que escreve diretamente no papel as celas braille em relevo.

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citada neste campo de conhecimento. Sendo assim a inclusão pode acontecer ainda não

da forma ideal, mas sim da forma possível para nossa realidade brasileira.

Breve histórico da musicografia braille na Universidade Estadual de

Maringá (UEM)

No ano de 2008 dois alunos cegos procuraram o departamento de música da

UEM em busca de aulas de música. Na época, a coordenadora Juciane Araldi aceitou o

desafio e, junto com alguns acadêmicos do curso de graduação, iniciou o projeto de

extensão: Vivências Musicais para Deficientes Visuais. Nenhum dos envolvidos tinha

alguma experiência neste campo da educação. Nesse início também desconheciam a

musicografia braille.

Por isso, todo o planejamento e materiais didáticos criados para uso em sala de

aula, naturalmente, foram confeccionados baseados na notação em tinta. Por exemplo,

partituras com as linhas do pentagrama em relevo. Devido à falta de estudos acadêmicos

para orientar essa tarefa, os planejamentos precisavam ser criados antecedendo cada

aula. Os participantes do projeto discutiam sobre as dificuldades de cada aluno e juntos

decidiam o que seria feito para alcançar seus objetivos de musicalização.

O objetivo desse grupo foi proporcionar vivências musicais que explorassem o

canto e a percussão corporal, dessa forma, internalizando os princípios musicais

básicos. Um repertório foi escolhido de forma que um recital interativo no fim do ano

fosse realizado. Nesta ocasião a platéia foi vendada para experimentar os materiais

utilizados pelos alunos durante o curso, participando das músicas e assistindo às peças

apresentadas.

No decorrer desse mesmo ano os acadêmicos conheceram a notação musical

braille por meio do livro Introdução à Musicografia Braille, de Dolores Tomé. Somente

em 2009 as aulas abordando essa notação especial foram iniciadas, quando os

acadêmicos se sentiram mais aptos a essa tarefa.

O curso teve por base o tripé proposto Keith Swanwick. Segundo Swanwick

(1979) há três maneiras de vivenciar a educação musical: por meio da composição,

execução e apreciação. Para isso, foram trabalhadas atividades que continham estes três

elementos. Na prática, cada um desses elementos complementa o outro, ou seja, a

apreciação influencia na composição, na execução e vice-versa.

Paralelamente, aulas de instrumento foram oferecidas. O projeto teve alunos

deficientes visuais estudando teclado, piano, violão erudito e popular. No primeiro

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semestre as aulas eram individuais, já no segundo foi seguido com a prática em

conjunto. Segundo Oliveira, “o aprendizado em grupo tem como conseqüência um

estímulo adicional ao desenvolvimento do aluno, diminuindo consideravelmente o

tempo gasto no aprendizado dos princípios básicos da técnica instrumental”

(OLIVEIRA, E. 1998, p.20). Um recital interativo também foi realizado ao fim deste

ano.

Em 2010 as aulas tiveram novamente um novo rumo, sendo abertas diferentes

turmas para atender a diversos interesses. Atualmente são oferecidas: vivência musical,

introdução à musicografia braille, pré-vestibular para aluno cego e para baixa visão,

aula individuais de instrumento e participação em coral.

A turma de vivência musical é destinada para alunos que nunca tiveram contato

com música. Nela busca-se desenvolver o senso rítmico-melódico, assim como noções

musicais básicas teóricas e práticas em instrumentos de percussão, voz e xilofone. O

material utilizado nessas aulas é desenvolvido voltado para o universo da grafia braille,

assunto que está sendo pesquisado pelos envolvidos. Com isso, a finalidade é

futuramente encaminhar o aluno para o uso da grafia braille. Com esta turma também é

desenvolvido o estágio de graduação do acadêmico Raphael Ota, com supervisão do

professor de extensão e bolsista de apoio à licenciatura Rafael Souza. Juntamente com

outros acadêmicos do curso, as outras modalidades também são planejadas e

ministradas.

A aula de introdução à musicografia braille é a continuação do trabalho que já

procedia nos anos anteriores. Pesquisas sobre como trabalhar de forma coerente e

eficiente com a escrita braille também é aqui desenvolvido. Notoriamente, o

desenvolvimento da memória musical dos alunos é um ponto importante trabalhado

nessas aulas. Para essa finalidade, o embasamento da utilização do solfejo tem sido

inspirado pelo método musical de Maurice Martenot.

Para Martenot (1970, 1979 [1957]), a audição interior está no centro dos exercícios de solfejo. O desenvolvimento desta desde o início do aprendizado musical contribuirá para o aprimoramento da memória auditiva. Por isso Martenot defende a exploração do canto livre e do canto consciente para que a prática seja realmente apreendida e possa resultar, futuramente, no bom entendimento e realização do solfejo (Fialho e Araldi, 2010, s/p).

O pré-vestibular para cegos atende dois alunos extremamente musicais. Eles

vão se candidatar para o curso de violão erudito. Nessas aulas abordamos tanto o

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conteúdo teórico da prova de aptidão quanto a leitura de partituras para violão. Dessa

forma, os tópicos estudados da grafia são inseridos nas partituras para serem

compreendidos na prática. O resultado tem sido muito positivo e, todo o estudo e

material gerado nas aulas citadas acima, estão sendo aproveitados nesse curso

preparatório.

O pré-vestibular para baixa visão é um campo novo no projeto. O único aluno

dessa turma pretende a licenciatura em música e, sendo baixa visão, ou seja, não faz uso

da escrita braille, possui outros recursos para proporcionar a sua inclusão. A leitura das

partituras é perfeitamente feita com recursos de ampliação, pois o aluno já sabe ler

partituras em tinta com certa facilidade. No entanto, a escrita se torna um problema

grave. A alternativa que estamos tentando é o aluno estudar a musicografia braille.

Dessa forma, ele conseguiria escrever com clareza e rapidez linhas musicais, assim

como ser capaz de transcrever partituras em tinta para o braille.

As aulas de instrumento são individuais. Na medida do possível, fazem uso das

partituras em braille utilizadas nas aulas teóricas. Os acadêmicos voluntários são os

professores dessas aulas. A participação em coral é estimulada a todos, tendo algumas

opções de coros para participar. O apoio de transcrição de partituras do coral para o

braille, caso o maestro do coro necessite, é feito pela própria equipe do projeto.

Considerações finais

Outras universidades também já se empenharam nesse processo de inclusão.

Como iniciativa inclusiva, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte previa para

o primeiro semestre de 2009 a “criação da primeira turma de musicografia braille na

Escola de Música” (OLIVEIRA, D. 2008, p.4) dessa universidade. Outro exemplo: em

2010 a Universidade Estadual de Campinas aprovou o doutorado da pesquisadora

Fabiana Bonilha, que também cursou nessa mesma universidade a graduação em piano

e o mestrado, sendo esta aluna cega congênita.

Observamos que a inclusão do aluno com deficiência visual é um processo que

podemos, grosso modo, considerá-los em duas etapas: a inclusão sendo implantada e a

inclusão efetivamente estabelecida.

Com isso, constatamos que a educação musical inclusiva plenamente

estabelecida em uma instituição não é de fato uma realidade brasileira, mas sim um

objetivo possível de ser alcançado. Nesse sentido, todo material relacionado a esse

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campo da inclusão, em suas várias possibilidades, se mostram importantes, pois

incentivam o desenvolvimento das esparsas iniciativas nesse campo e no surgimento de

novas.

Observamos neste artigo pontos relevantes apontando para a realização do

processo dessa inclusão em particular na graduação ou cursos de música, que seriam:

necessidade de materiais didático-musicais para a musicalização, baseados na grafia

musical em braille; cursos para professores de música, habilitado-os a darem aulas para

pessoas com deficiência visual usando partituras em braille; cursos para formar

transcritores de partituras em tinta para o braille; escolas, conservatórios e faculdades

deveriam buscar serviço de apoio especializado para a transcrição de provas, partituras e

adaptações de cursos para a inclusão de alunos cegos; cursos pré-vestibulares para

pessoas com deficiência visual (cegas e baixa visão); matérias específicas sobre o

assunto nos cursos de graduação e pós, especialmente nas licenciaturas.

Com esse artigo pretendemos ampliar as questões e discussões sobre o campo,

contribuindo de algum modo para as iniciativas já existentes e futuras. Dessa forma

colaborando para que a musicografia braille seja mais conhecida, assim tornando a

inclusão de alunos com deficiência visual uma ação mais eficiente e duradoura do que a

encontramos atualmente.

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