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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR CAMPUS DE CACOAL Departamento do Curso de Direito A INSTABILIDADE JURÍDICA E POLÍTICA DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS E A POSSIBILIDADE DE UMA NOVA CONSTITUINTE Paula Daiane Rocha Cacoal/RO 2007

A INSTABILIDADE JURÍDICA E POLÍTICA DAS EMENDAS ... INSTABILI… · PARECER DE ADMISSIBILIDADE A acadêmica PAULA DAIANE ROCHA desenvolveu o Trabalho de Conclusão do Curso de Direito

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR CAMPUS DE CACOAL

Departamento do Curso de Direito

A INSTABILIDADE JURÍDICA E POLÍTICA DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS E A POSSIBILIDADE DE UMA NOVA

CONSTITUINTE

Paula Daiane Rocha

Cacoal/RO 2007

PAULA DAIANE ROCHA

A INSTABILIDADE JURÍDICA E POLÍTICA DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS E A POSSIBILIDADE DE UMA NOVA

CONSTITUINTE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal De Rondônia – Unir – Campus de Cacoal, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da Professora Mestre Maria Priscila Soares Berro.

Cacoal/RO 2007

PARECER DE ADMISSIBILIDADE

A acadêmica PAULA DAIANE ROCHA desenvolveu o Trabalho de

Conclusão do Curso de Direito com o tema “A INSTABILIDADE JURIDICA E POLITICAS DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS E A POSSIBILIDADE DE UMA NOVA CONSTITUINTE”, obedecendo aos critérios do Projeto de Monografia

apresentado ao Departamento do Curso de Direito da Universidade Federal de

Rondônia – campus de Cacoal.

O acompanhamento foi efetivo, tendo desenvolvido o trabalho,

observado os prazos fixados por este departamento.

Assim sendo, a acadêmica está apta para a apresentação expositiva

de sua monografia junto à banca examinadora.

Cacoal, 5 de agosto de 2007.

Professora Mestre Maria Priscila Soares Berro

PAULA DAIANE ROCHA

A INSTABILIDADE JURÍDICA E POLÍTICA DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS E A POSSIBILIDADE DE UMA NOVA

CONSTITUINTE

90 Presidente – Profª. Ms. Maria Priscila Soares Berro

90 Prof. Antônio Paulo dos Santos 90 Prof. José de Moraes

90 Média Final

Dedico ao meu filho, Pedro Rocha Miranda, doce criança e meu

amável companheiro.

Minha sincera gratidão:

A Telmo de Moura Passareli, meu marido,

grande presente na minha vida, a quem amo de todo o coração.

A Delci Ferreira Rocha, velho amigo, pai, lá de Minas Gerais,

grande batalhador, saiba que sou uma grande admiradora sua.

A Nika Costa, querida mãe, quem me amou verdadeiramente

e me ensinou a amar assim também.

A Stella e Natachah Rocha, gêmeas siamesas, queridas irmãs,

que, sempre juntas, me fizeram falta em dobro neste último semestre.

A Júlio Santos, mente brilhante, violeiro, doador de grandes idéias,

que muito colaborou na busca desse projeto de estudo.

A Agneta, Credival, Daniella, Jackcilene e Joyce,

não apenas amigos, mas verdadeira fonte de alegria e acalento.

A todos os professores, que venceram o desafio

de lecionar com ilimitada valentia, valorizo-os demais por todas as lições.

Um agradecimento especial à minha orientadora, a Mestre da alegria

Maria Priscila Soares Berro, quem de pronto aceitou a minha proposta de estudo,

e que tornou mais leve esse trabalho.

A Deus, por todas belas coisas que tem feito por nós.

Diligite iusti tiam, vos que iudicaste Terram.

Amai a justiça,

Vós que governais a Terra. Sabedoria 1, 1.

RESUMO

O trabalho intitulado A Instabilidade Jurídica e Política das Emendas Constitucionais e a Possibilidade de uma Nova Constituinte tem por objetivo o estudo sistemático da formação do Estado Democrático de Direito, passando pelas variadas instituições que culminou na teoria do constitucionalismo moderno, que é o pilar da formação da República Federativa do Brasil. O foco se concentra na análise da redemocratização pela qual passou o país, que lapidou uma das mais modernas cartas políticas do mundo, a Constituição de 1988. A Constituição brasileira é rica em detalhes, ativando vários setores políticos e sociais, em virtude da amplíssima garantia oferecida por esta carta. A conseqüência disso é de grande relevância para a sociedade atual. A indagação que se faz nessa pesquisa é: A Constituição da República precisa ser prolixa e exacerbadamente analítica como a atual? Em resposta, tem-se que para acompanhar a evolução social terá de se modificar e muito o texto constitucional, e essa constante alteração gera a instabilidade política e jurídica discutida nessa monografia. A delimitação da mudança legislativa se dará no estudo da utilização das Emendas Constitucionais como instrumento de modificação Sabe-se que as mudanças são permitidas no limite da fixação pela própria Constituição, que põe a salvo as cláusulas pétreas, imutáveis, salvo por outra Assembléia Constituinte. Assim, cria-se no âmbito jurídico e político um terreno incerto no que diz respeito à governabilidade, que gera aos olhos de outros países desconfiança para quaisquer tipos de investimentos financeiros, culturais, e da realização de negócios jurídicos, classificando o Brasil na posição de centésimo lugar em estabilidade jurídica. PALAVRAS-CHAVE: Emendas Constitucionais, Estabilidade, Governabilidade,

Constituinte.

ABSTRACT

The term paper entitled The Political And Juridical Instability Of The Constitutionals Amendments And The Possibility Of A New Constitution aims the systematic studying of the formation of the Democratic State of Law, going through the main institutions that has come to the modern constitutionalism theory, which is the base of the Federative Republic of Brazil. The focus of the studying will be the analysis of the reconstruction of democracy process that the country has suffered, which originated one of the most modern Constitutions of the world, The 1988 Constitution, also known as the Citizen Constitution. The Brazilian Constitution is very rich in details, and for this reason it activates many society sectors, because of the great guarantee offered by this Bill. The consequence is extremely important for the present society. The question here can be: Does the Constitution really need to be prolix and exaggerated analytics as this one? In answer it is shown that for the due evolution of the law it will be necessary to modify the Constitution, what bounds to the instability caused by the constitutional amendments that is the focus of this term paper. The delimitation of the legislative changing will be the constitutional amendments as an instrument. It is also known that changing is in the limit of the Constitution itself, which save the unchangeable clauses, unless there is another National Constitutor Assembly. This way, comes to the juridical world a very unknown path, that touches the governability, and for other countries Brazil is classified as an untruthful country for any kind of new investment such as economics, cultural taking the hundredth position in juridical assurance. KEY-WORDS : Amendments to Constitution, Instability , Governability , Constitutor

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO………………………………………………………………….. 12 1. TEORIA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO......................... 15

1.1 FORMAÇÃO DO ESTADO.............................................................. 15 1.1.1 Evolução do Estado ................................................................... 17 1.2 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO ESTADO .............................. 18 1.3 SOBERANIA ................................................................................... 22 1.4 DEMOCRACIA E ESTADO-A LEGITIMIDADE DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.......................................................... 23

2. CONSTITUIÇÃO E CONSTITUCIONALISMO...................................... 27 2.1 CONCEPÇÕES DE CONSTITUIÇÃO ............................................. 29 2.2 CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES ..................................... 30 2.2.1 Quanto ao conteúdo ................................................................... 30 2.2.2 Quanto à forma ........................................................................... 31 2.2.3 Quanto à elaboração................................................................... 32 2.2.4 Quanto à origem ......................................................................... 32 2.2.5 Quanto à estabilidade................................................................. 32

3. FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO......................................... 36

3.1 POR QUE A CONSTITUIÇÃO É A SUPREMA LEI? ...................... 36 3.2 NORMATIVIDADE DA CONSTITUIÇÃO......................................... 39

4. PODER CONSTITUINTE ...................................................................... 42

4.1 CONCEITO ..................................................................................... 42 4.2 AS ACEPÇÕES DO PODER CONSTITUINTE................................ 43 4.3 NATUREZA DO PODER CONSTITUINTE...................................... 48 4.4 O TITULAR DO PODER CONSTITUINTE....................................... 50 4.5 VEÍCULO DO PODER CONSTITUINTE ......................................... 53 4.6 LIMITAÇÕES AO PODER CONSTITUINTE ................................... 54

5. A EVOLUÇÃO CONSTITUCIONAL NO BRASIL................................. 56

5.1 A PROCLAMAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA NO BRASIL................. 57 5.2 A CONSTITUIÇÃO IMPERIAL......................................................... 57

5.3 A CONSTITUIÇÃO DE 1981............................................................. 58 5.4 A CONSTITUIÇÃO DE 1934............................................................. 59 5.5 A CONSTITUIÇÃO DE 1937............................................................. 60 5.6 A CONSTITUIÇÃO DE 1946............................................................. 60 5.7 A CONSTITUIÇÃO DE 1967 e 1969 ................................................ 61

6. A REDEMOCRATIZAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO DE 1988 .................. 62

6.1 CIRCUNSTÂNCIAS DE ELABORAÇÃO DA MAGNA CARTA.......... 62 6.2 CRÍTICAS À ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE................ 65

7. REFORMA CONSTITUCIONAL ............................................................ 69

7.1 EMENDAS À CONSTITUIÇÃO ......................................................... 70 7.1.1 Conceito ....................................................................................... 71 7.1.2 Histórico ........................................................................................ 72 7.1.3 Procedimento ................................................................................ 72 7.2 A INTANGIBILIDADE DA CONSTITUIÇÃO ...................................... 74 7.3 AS EMENDAS CONSTITUCIONAIS NO ORDENAMENTO

BRASILEIRO...................................................................................... 75 7.4 A PARTICIPAÇÃO POPULAR COMO FONTE LEGITIMADORA

DAS EMENDAS À CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.............................. 77 8. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E A INSTABILIDADE........... 79

8.1CONCEITO DO PRINCIPIO DA SEGURANÇA JURIDICA ................ 79 8.2 MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL E INSTABILIDADE.......................... 81 8.3 SENTIMENTO CONSTITUCIONAL ................................................... 83

9. OBSERVAÇÕES AO PROJETO DE EMENDA CONSTITUCIONAL N. 157/2003............................................................................................. 86

CONCLUSÃO..................................................................................................... 93

REFERÊNCIA .................................................................................................... 96

ANEXO .............................................................................................................. 100

12

INTRODUÇÃO

Atualmente é lugar comum se falar em crise, é tão freqüente a

investida das mesmas que se percebe a sua institucionalização. Ela está presente

em todos os lugares, crise ética, política, crise social.

O que não se pode perder de vista é que crise e crítica devem ser

inseparáveis. Basta partir do ponto de que a análise crítica de uma crise pode ser a

porta de saída pela qual se expurgará a mesma da vida dos cidadãos trabalhadores,

a porta da redenção.

Vê-se falar de reformas políticas e tributárias como instrumento de

viabilização de governabilidade, como a solução das mazelas da sociedade,

visualiza-se, por meio da possibilidade de solução, uma gota de esperança, e tão

logo, desaparece como Fênix que morre e renasce das cinzas, espera-se um dia

melhor para o cidadão, o destinatário do poder, que não o exerce de pleno.

O respeito por si mesmo deve voltar a existir no seio social, a pátria

deve ser como a família, o destinatário do amor. O Estado voltado para atender seus

cidadãos, deve antes de tudo ensinar seus filhos a amá-lo. Talvez essa seja a única

forma de devolver, ou quiçá entregar pela primeira vez, o valor da dignidade, de ser

filho de um país, de um solo que nos caracteriza como povo, que possa nos impor

um destino melhor.

13

Os valores que um Estado defende, está inserto em uma Constituição.

Cabe ao direito, mais especialmente ao direito constitucional trazer à práxis as

promessas encontradas ao longo deste texto, promessas que por sua vez não saem

do papel e que se tornaram a maior fonte de descrédito da população em relação à

organização do Estado.

É necessária uma crítica no sentido de impedir a instalação da crise

como instituição, é necessário sonhar, não com uma pátria perfeita, que é imprópria

aos humanos, mas, sonhar com o palpável, com a instalação da cidadania real que

pode ser consubstanciada na eticização da política, no pagamento justo dos tributos,

na punição e no aprofundamento da responsabilidade pessoal daqueles que

sufocam os valores morais, na desburocratização da administração pública, Esta

deveria ser a grande reforma do Estado.

Embora muitas vezes o espírito universitário se afaste da realidade,

não se pode conceber a idéia de engessamento dos conceitos e tabus, e com base

nesse espírito que nasceu o objetivo desse estudo, buscar, [ainda que

superficialmente, pois, seria este estudo tema para um belo livro como fez Niccolò

Machiavelli quando escreveu il príncipe,como presente ao rei] uma análise científica

ao sistema constitucional atual, perceber as possíveis falhas e os efeitos e, logo

depois uma possível solução a situação que se vive hoje.

As teorias que embasam o estudo é em muitos pontos a pedra de

toque da critica que aqui se faz, e ainda se vai mais longe a afirmar que o estudo

histórico se faz fundamental para entender a fórmula constitucional adotada hoje.

O constitucionalismo brasileiro nunca foi um tema pacífico, ou

conservado. O Brasil já passou por sete modelos constitucionais, vale salientar a

característica de transição e a Constituição de 1988 está reformada e emendada em

vários pontos.

O que chama a atenção do mundo acadêmico é a reiterada maneira

com que são editadas novas disposições constitucionais, esse fato provoca dois

14

sentimentos, o primeiro se dá acerca do discutível teor das mudanças, do grau de

importância das referidas emendas, e logo após, o sentimento de instabilidade no

seio jurídico incluindo o meio universitário. Entretanto, é junto à sociedade que se

encontra o efeito mais danoso de uma Constituição, a falta de credibilidade.

Responsável, pelo menos indiretamente, pela sua falta eficácia.

Não se pretende buscar uma explicação epistemológica à conjuntura

atual das crises associadas com as infindáveis modificações do legislador derivado.

Quer-se discutir, a instabilidade política e jurídica e pesquisar com bases teóricas -

científicas à possibilidade de convocação de uma nova Assembléia Constituinte para

a produção de uma nova Carta Constitucional. Apesar de que esse debate estar

ocorrendo muito discretamente julga-se muito importante a busca cientifica dessa

resposta, superar o senso comum é o maior foco desse projeto.

Muitas discussões, ainda tímidas, dão a pista de que no centro do

grande poder político há a discussão acerca da instalação da Nova Constituinte.

Opiniões muito divididas, porém, podem ser classificadas em dois grandes grupos

que comportam certa oscilação cada um deles. Aqueles que compõem o setor

privado, como empresários e grandes intelectuais são favoráveis à trazer o debate

acerca da possibilidade de uma Nova Constituinte, ao passo que, aqueles políticos

tradicionais e conservadores, muito deles no exercício do poder legislativo, ou

executivo até certo ponto são completamente desfavoráveis ao debate.

A Constituição é uma tradução dos valores adotados pela sociedade,

deve ter em mente que a Constituição não será um instrumento hábil e eficaz à

transformação social, se não tiver diretamente ligada com a realidade da sociedade.

Ante o exposto, a proposta aqui é entender o modelo constitucional,

encontrar a problemática das Emendas constitucionais e oferecer as possíveis

soluções para o que se determinou como um problema, a instabilidade jurídica e

política.

15

1.TEORIA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

1.1 FORMAÇÃO DO ESTADO

A primeira distinção da palavra Estado nasceu com Maquiavel, em O

Príncipe, onde o autor celebrou o vocábulo na frase “Todos os Estados, todos os

domínios que têm tido ou têm império sobre os homens são ESTADOS, e são

república ou são principados” 1 entretanto, a palavra Estado como se conhece hoje

não é engessada, ou seja, nem sempre fora revestida com a noção que se tem

atualmente. Seja objetiva ou subjetivamente, O Estado conheceu várias facetas.

A noção de Estado como instituição passou somente a ser aceita em

meados do século XVI, quando os filósofos, baseados nas idéias culturais, com

fulcro no Iluminismo, passaram a discutir a relação entre o povo e a força superior

que o subjugava. Neste aspecto, surgiram várias teorias acerca, não da Constituição

do Estado, mas do seu conceito.

Foi em Rousseau2, em sua obra O Contrato Social de 1762, que se

encontra a teoria mais ajustada ao conceito de Estado. Ao inaugurar a concepção

moderna de Estado, este autor incorporou sociedade e Estado interligando seus

fatores de Constituição, e concluiu a mais famosa teoria de formação do Estado,

qual seja a do pacto social.

1 Nicolau Maquiavel, O Príncipe, p. 3. 2 Rousseau, JJ. O Contrato Social. p 22

16

Segundo o autor, o ser humano não sobreviveria se não fosse pela

mudança do modo humano que faria perecer o próprio gênero, e por essa razão, os

homens agregam-se formando uma grande força, que resulta na vontade geral,

agindo em comum acordo3. A solução para a manutenção da liberdade é o pacto

social, que se reduz a uma importante cláusula, vejamos “Cada um de nós põe em

comum sua pessoa e todo seu poder sob a suprema direção da vontade geral;

recebemos coletivamente, cada membro como parte indivisível o todo”.4 Funda-se a

teoria deste autor, na concepção do homem livre, que passa do Estado primitivo à

sociedade civil, esta conceituada como a substituição em sua conduta do instinto

pela justiça, a troca justa da liberdade individual pela propriedade e liberdade civil,

esta qual limitada.

Thomas Hobbes, filósofo inglês, escreveu em 1648 a Obra O Leviatã5,

em que propõe a teoria que justificaria a legitimação da revolução inglesa,

impulsionando a burguesia e a propriedade, revela a teoria de Hobbes, que o

homem é um ser muito egoísta para sozinho dominar seus impulsos de destruição,

destarte, os homens celebram um contrato que cria um Estado absoluto, dono de

todas as forças, de poderes absolutos. A diferença entre Hobbes e Rousseau, é

entendida no aspecto da legitimidade do poder, enquanto aquele o passa

interinamente ao Estado, na pessoa do Absoluto, aquele dá ao povo a soberania do

governo, e, este passa a governar não por sua própria vontade, mas pela vontade

geral6.

3 Idem ib. p. 13. 4 Idem ib p. 20/1 5 Hobbes apud Dallari. Teoria Geral do Estado, p. 33. 6 Rousseau, JJ. O Contrato Social, p. 22.

17

1.1.2 Evolução do Estado

O Estado antigo é fortemente marcado pela teocracia, a população

vivia me torno de um deus, ou vários, obedeciam à doutrina com medo da punição

divina. Um poder superior e estranho ao povo, entretanto, não havia unidade, cada

grupo submetia-se a um deus diferente.

No Estado grego, ou seja, nas polis a população era dividida em

castas, os escravos mantinham a força motora da vida na Grécia, enquanto os

representantes exerciam a administração das polis como se estivessem

representando, havia diversos e pequenos burgos a serem administrados pelos

cidadãos.

No Estado romano, há as civitas, também com estrutura de cidade

Estado, porém a base da administração é a família, representados pelos gens, que

descendiam diretamente dos fundadores do Estado. Quem governava diretamente

eram os magistrados. Com a ascendência da nobreza romana, findou-se a

organização familiar.7

No Estado medieval fortemente marcado pelo cristianismo, e pela

busca da igualdade e universalidade do cristianismo. A crença cristã revelou a

imperiosa necessidade de ser fazer todo o mundo cristão, sempre em busca da

dominação. Essa razão culminou em uma sociedade política organizada, o Estado

nesse momento confundia-se com a igreja, que estimulava o poder do império,

tornando sagrado certos ensinamentos, como exemplo as Cruzadas. A mesma

busca de um poder universal imputa ao Estado uma luta, uma disputa entre igreja e

império, que culminou no nascimento do Estado Moderno.

7 Coulanges, Fustel de. A cidade Antiga, p. 54.

18

1.2 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO ESTADO

O Estado moderno foi o período em que primeiro se falou em

elementos, se findando nesse momento a discussão acerca da origem do Estado e

passando a legitimar os elementos essenciais e fundamentais para a organização

política. Os elementos são: povo, território e soberania e finalidade.

O primeiro elemento a ser analisado é o povo. A designação povo

conta com inúmeras acepções, e no decorrer do tempo muito se mudou neste

conceito. Herança romana, a palavra povo àquela época referia-se aos cidadãos, ou

seja, parte da sociedade abastada que fazia parte das decisões organizacionais da

sociedade. Com o advento da democracia, o conceito de povo mudou. A

Constituição Federal do Brasil não conceitua, entretanto, preceitua “Todo poder

emana do povo, e em seu nome será exercido”

O que importa é o conceito de povo enquanto elemento constitutivo do

Estado. Jellinek conceitua povo sob dois aspectos. O subjetivo, que diz respeito ao

poder público que ao povo é dado, ou seja, a titularidade do poder é deste ainda que

o exerça indiretamente. E o outro aspecto por Jellinek abordado é o aspecto

objetivo, que significa para este autor o povo ser objeto da atividade do Estado. A

instituição Estado existe em função da população que nela habita, sem distinções de

quem o exerça o receba os comandos. 8

Jellinek encontra em Rousseau a teoria que justifica a submissão da

população ao poder do Estado quando este reconhece a pessoa humana, pois

participam da Constituição do Estado, exercem a função de sujeitos de direitos e

deveres, corroborando com a teoria de Rousseau quando este diz que a associação

de pessoas que compõe a sociedade pode ser denominada de povo.

8 Jellinek apud Dallari. Elementos da Teoria Geral do Estado, p 23.

19

Povo é o fator que proporciona ao Estado a possibilidade de externar

sua vontade com autonomia por meio de cidadãos. Quando deste conceito jellinek

faz distinções, para este autor, cidadão são todas as pessoas reunidas sob uma

mesma égide jurídica. Entretanto, apenas os políticos, que representam o povo

possuem a cidadania ativa, de forma que estes exercem atribuições típicas do

Estado, e assim são tidos como órgão do Estado.

A Constituição brasileira consagra a cidadania pelo conceito jurídico de

povo estabelecendo, por meio do sufrágio o conjunto de população demonstra o

vínculo de cada individuo em relação ao Estado. Segundo Rousseau9 a análise de

conceito de povo diretamente no aspecto jurídico. Diz que, para que a legislação da

nação seja sólida e eficaz, é necessário a maturidade do povo enquanto

governados, senão por nada adiantaria a busca por leis justas se o povo não exerce

sua maturidade

Que povo é, pois, mais apropriado às leis? Aquele que, achando-se ligado por algum vinculo de origem, de interesse, ou de convenção, não tenha ainda suportado o verdadeiro jugo das leis; aquele que não tem costumes nem superstições bem arraigados.

O povo é a fonte da democracia, e o receptor da mesma instituição

segundo MULLER10 adianta a idéia

O povo não é apenas - de forma mediata - a fonte ativa da instituição de normas por meio de eleições bem como de forma imediata - por meio de referendos legislativos; ele é de qualquer modo o destinatário das prescrições, em conexão com deveres e direitos e funções de proteção.

Tal corrobora com a idéia de legitimidade do Estado democrático de

direito, baseado exclusivamente na idéia de democracia, em que as pessoas em

união, por meio de aprovações que considerem essenciais formarão um bloco

jurídico e estável, visto que a lei obriga a todos a mesma conduta.

9 Rousseau, JJ. O Contrato Social, p. 54-6. 10 Friedech Muller. Quem é o povo, p. 61.

20

Há, também, o entendimento de povo em uma acepção sociológica,

sendo esta confundida com a nação que engloba todas as pessoas e gerações que

em algum momento constituiu o Estado.

O território é elemento essencial à Constituição do Estado. Por

exclusão tem-se território de um Estado como aquela porção geográfica em que há

somente a força da soberania daquele Estado, em função de seu povo. O conceito

assim posto tem cunho jurídico, pois não há Estado sem território, e o contrário é

possível um território sem Estado.

Há discussão, em especial na legislação brasileira em que a condição

sine qua non a titularidade da cidadania é a nacionalidade, que está diretamente

ligada ao conceito de território. A nacionalidade é medida por meio de linhas

imaginárias denominadas fronteira, a depender do espaço geográfico em que

nasceu a pessoa dependerá viverá em democracia ou em regime ditatorial.

Como poderá haver um Estado constituído e soberano sem que haja

território? Nessa indagação surgiram várias teorias para explicar território. Kelsen11

considera em sua obra Teoria Geral do Estado, que a única possibilidade de

vigência de várias ordens legislativas num determinado Estado, é a delimitação

geográfica do território, justificando que a soberania em um determinado território é

a única maneira de frear ordens alienígenas.

A visão apertada normativista de Kelsen limita severamente o conceito

de território por meio da acepção jurídica, resumida nas leis. Descarta a unificação

política, e inclui a unificação jurídica. Para este autor, não há outra forma de se

estabelecer a ordem em uma sociedade senão em virtude da lei, aplicável a todos

de um mesmo território.

11 Kelsen apud Dallari. Idem, p. 36

21

Opôs-se Jellinek12, a essa concepção, pois para ele o território é tão

somente um direito reflexo do Estado em decorrência da dominação deste sobre a

população. É a sombra da força das pessoas unidas para a formação de um Estado.

Essa força garante a todos o espaço para exercer seus direitos e deveres, pois, se

assim não fosse, inviável seria o exercício da cidadania. Assim, conclui esse autor

que as invasões em um Estado não se tratam de questão real, de propriedade sobre

o espaço geográfico, mas sim de ofensa à soberania, à personalidade jurídica do

Estado.

Paulo Bonavides, em sua obra Ciência Política, facilitou e sintetizou o

entendimento das teorias acerca da concepção do território como elemento de

Constituição do Estado, dividindo da seguinte maneira:

a) território - patrimônio: próprio do Estado medieval, caracterizado

pelo direito real, ou seja, o Estado é proprietário do imóvel sobre o qual vive a sua

população.

b) território - objeto: a única relação do Estado com o território é o

domínio.

c) território - espaço: o território é a materialização da soberania.

Sobressaltada por Jellinek, essa teoria finda a concepção de espaço territorial como

direito real, valorizando nesse momento a personalidade jurídica do Estado;

d) território - competência: maior expressão dessa corrente é Kelsen,

que liga a competência do território ao espaço vigente das leis, o território é

elemento terminante da validade no espaço das normas. 13

12 Jellinek apud Dallari. Elemento da Teoria Geral do Estado, p.39 13 Bonavides, Paulo. Ciência política, p.20/1.

22

1.3 SOBERANIA

Para Rousseau14 a distinção que se faz em relação à soberania é a

conseqüência do que o autor chama de vontade geral. A comunhão de interesses,

ainda que antagônicos aos que fazem a parte de uma sociedade é que a tornou

possível de ser governada. Nas palavras de Rousseau: “A soberania, sendo apenas

o exercício da vontade geral, nunca pode alienar-se, e que o, soberano, não

passando de um ser coletivo, só pode ser representado por si mesmo.”

Assim, Rousseau15 foi o primeiro filósofo a passar para o povo a

titularidade da soberania, e em nome deste o soberano exerce a vontade geral.

Caracteriza a soberania como indivisível, tendo em vista a necessidade de toda a

coletividade, e inalienável, pois quem a detém é a comunidade, sendo limitada

apenas pela vontade geral, que pode não coincidir com a vontade de todos. O pacto

social dá ao governante um poder, denominado Soberania.

O legado de Rousseau foi muito questionado no que tange à sua

qualidade como elemento essencial à Constituição do Estado. Nos dias atuais,

negando as afirmações dos publicistas, a mais abalizada voz de Jelinek prima pela

teoria de que a soberania é a “qualidade do Estado de autovinculação e

autodeterminação jurídica exclusiva” 16. Conclui-se então que a soberania não é um

poder como preconizava Rousseau, e sim, uma qualidade do Estado, o mais alto

poder dentro de um Estado, acima do qual não haverá forças alheias à vontade do

povo.

Quanto à titularidade do poder, há constantes de vários estudos duas

teorias principais, quais sejam: a teoria teocrática e a democrática.

14 Op. Cit., p. 61. 15 Idem ib, p. 63-5. 16 Jelinek apud Paulo Bonavides. Ciência política, p. 125.

23

A doutrina teocrática advém do poder divino. Assenta-se nessa teoria

que o poder de administração do Estado é investido no soberano como meio de

expressão do poder de Deus. Os reis são apenas instrumentos de Deus. Ao passo

que a teoria da titularidade da soberania democrática vem da força popular, a cada

ser vivente em uma sociedade corresponde-lhe sua fração de poder soberano,

mesmo que o exercício seja indireto por meio do sufrágio.17

Nessa esteira, forma - se a soberania da nação englobando o povo, e

a personalidade jurídica do Estado, possuindo por sua vez a vontade própria que

está acima do entendimento pessoal de cada pessoa, um corpo político,

diversamente da teoria da soberania com legitimidade teocrática.

A soberania contida na Constituição da República Federativa do Brasil,

é exercida indiretamente por meio do sufrágio universal que de fato confere a

titularidade da soberania popular ao povo Este é soberano, tem o poder de escolha

imediata e mediata. Tornam-se poderosos quando cidadãos eleitores, pois entregam

aos que os representam a sua vontade, como deveria ser a ambiência em que se

vive, provocando a estabilidade das relações jurídicas, a saber, que situações de

fato não podem ser mudadas ao alvitre de qualquer soberano, senão daquele

escolhido para exercê-lo. O povo soberano, detentor de um poder soberano, sem o

qual nenhum Estado poderia receber uma Constituição.

1.4 DEMOCRACIA E ESTADO - A LEGITIMIDADE DO ESTADO

DEMOCRÁTICO DE DIREITO

“Se houvesse um povo de deuses, haveria de governar-se

democraticamente. Um governo tão perfeito não convém aos homens” 18 é com tal

pessimismo que Rousseau descreve a democracia.

Tema que gera dentro da ciência política a maior controvérsia visto que

seu objetivo é a busca pela perfeição da governabilidade, pelo povo em nome do

povo. A despeito do povo, que é o cerne da democracia, é a forma eleita pelos

17 Bonavides, Paulo. idem,p.124. 18 Rousseau, JJ. O Contrato Social, p. 84.

24

Estados modernos para gerir a sociedade. Etimologicamente a palavra democracia

refere-se a poder do povo, em sua origem remonta à antiga cidade-estado de

Atenas, na Grécia Antiga.

Os cidadãos das polis gregas deliberavam acerca do destino da

sociedade em praça pública, e as decisões eram sujeitas a aprovação de todos os

cidadãos, assim entendidos como aquele que poderia gozar de direitos políticos, não

podia dever ao Estado, ser casado, ter bons costumes, honrar os pais, e participar

das guerras quando convocados. 19

A democracia em tal momento toma a forma de democracia direta, ou

seja, exercida diretamente pelo povo. É com base nessa democracia que o Estado

moderno culminou na teoria da democracia clássica, que se aproxima da

democracia atual com característica, principalmente, de liberdade política, calcada

na plena soberania popular, na separação dos poderes, na existência de uma

Constituição que limite os poderes dos órgãos do Estado, garantia de direitos

individuais, ordem pública, igualitária, a essa concepção de democracia clássica que

se deve o estabelecimento do Estado Democrático de Direito.

No Estado contemporâneo, não se faz menção à estabilização de tal

conceito, o de democracia.Há, sobretudo uma tendência à profunda reelaboração do

conceito que seja coeso com a máxima hoje conhecida como democracia: governo

do povo e para o povo.

A crítica atual é principalmente a falta de acesso das pessoas aos

princípios basilares do Estado democrático de direito, e o acesso à política não se

equilibra como acesso às condições sociais, em aspectos cotidianos tais como

saúde educação

e trabalho. Ao homem, pelo Estado democrático de direito é garantido

todos esses poderes, entretanto o Estado não é eficaz em proporcionar - lhes tal

direito.

19 Coulanges, Fustel. A cidade Antiga. P 179.

25

Essa é a primeira problemática da atual Constituição: garantir direitos

políticos e sociais. A busca pela igualdade política e econômica é o pilar atual da

real democracia, podendo até se preterir a efetiva participação da política em favor

do social, que a continuidade da democracia indireta busque modos de tornar a

todos o Estado cumpridor de suas obrigações.

Em segundo plano, é a própria limitação do Estado sobre o direito dos

governados, A Constituição, que é o diploma que consagra o exercício do Estado

democrático de direito, ou seja, que as instituições consideradas órgãos do Estado

não podem ser opressoras, o Estado deve manter-se honesto em estabilizar as

condições de todos segundo as suas aptidões naturais. Este é o mister do Estado

democrático de direito.

A Constituição Brasileira em seu texto preambular institui a democracia

indireta e constitui o Brasil como República Federativa, Estado Democrático de

Direito, que vem significar que o povo é soberano politicamente, jamais podem ser

oprimidos pelo Estado.

Conclui-se dessa maneira que o povo, em sentido político - cientifico é

dotado de poder constituinte, pois a Constituição diz que o poder emana do povo, e

não obstante não testifica qual é o poder que o povo possui.

Todo poder emana do povo. E quais as condições de aplicação desse

poder? A resposta se dá por meio da democracia representativa, o poder do povo

denomina-se voto. Seja anterior na escolha dos representantes, seja na fase ulterior

em que pese à aprovação nos produtos dos trabalhos dos escolhidos pelo povo.

A Constituição ao invocar o povo, o faz para legitimá-la: “A democracia

é dispositivo de normas especialmente exigentes, que diz respeito a todas as

pessoas em

seu âmbito de demos de categorias distintas [quer seja quanto à

instância de atribuição quer seja como povo destinatários e graus distintos. 20

20 Muller, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental da democracia, p. 76.

26

Desta forma, é forçoso admitir que a dominação existente sobre os

governados é anterior à existência de um Estado democrático de Direito. É próprio

das relações entre homens, pois a dominação necessária jamais poderia ser

exercida por todos os homens, e, em decorrência disso, se invoca o povo para a

legitimação da Constituição do Estado.

Aceitar que são dominados, por meio do próprio consenso. Este é o

coração da democracia: a aceitação pelo povo de sua condição de dominados, com

a característica peculiar de que esse domínio, ao menos em tese representa a

vontade geral, como preceituado pelo maior democrata dos filósofos, Jean Jacques

Rousseau.21

21 Rousseau. JJ. O Contrato Social, p. 126

27

2. CONSTITUCIONALISMO E CONSTITUIÇÃO

A palavra Constituição pode ser utilizada em vários aspectos, dentre

eles se diz, em sentido lato, a forma com que um Estado é organizado de se

estabelecer ou de constituir, de forma que a Constituição de um Estado diz respeito

diretamente à sua formação. A Constituição em sentido estrito é na definição de

CANOTILHO:22 “Estatuto Jurídico do fenômeno político”, sintetizou o

mestre,.contrapondo-se , ao conceito de LASSALE que preceitua: a Constituição

como “Lei Fundamental da Nação, básica. É o fundamento das outras leis, deve,

portanto existir”. Fato é que a Constituição como se conhece hoje é fruto da

revolução, da luta pela liberdade, pela negação da opressão autoritária que era o

sistema de governo predominante até a idade moderna.

A Constituição pode ser conceituada como a lei fundamental, na qual

erige todo o ordenamento jurídico.É o meio pelo qual a soberania popular limita os

poderes de seus representantes e limita o poder do chefe de Estado, com a

finalidade precípua de estabelecer a segurança jurídica.

Essa é condição sine qua non para a convivência em sociedade. É

também o modo pelo qual se organiza o Estado de Direito, entre seus elementos:

soberania, povo e território. Este é o conceito jurídico de Constituição. Para

CANOTILHO23 a Constituição ainda pode ser caracterizada pelo aspecto ideal,

22 Canotilho, JJ. Direito Constitucional p. 68 23 Idem ib , p. 36.

28

Esse conceito ideal identifica-se fundamentalmente com os postulados político-liberais, considerando-os como elementos materiais e caracterizadores e distintivos os seguintes: a) Constituição deve consagrar um sistema de garantia de liberdade e b) a Constituição contém o principio da separação dos poderes, no sentido de que garantia orgânica contra os abusos dos poderes estaduais; c) a Constituição deve ser escrita.

Assim o autor considera completa a Constituição, a lei suprema ideal,

que torna possível a consecução do bem comum e da pacífica convivência em

sociedade. Esse pilar da lei suprema tem como corolário a liberdade dos indivíduos,

ou seja, não basta que a liberdade esteja protegida por lei, sendo necessário que

essa mesma liberdade seja instituída por uma.

Eis o caráter de uma Constituição: constituir liberdade, com o perdão

da redundância. Há que se questionar, então, na sociedade moderna qual é o

referente de uma Constituição?A quem esta se dirige? À sociedade ou ao Estado?

A Constituição tem o condão de organizar e instituir um esquema de

organização política. Entretanto, cabe a discussão acerca do que se pretende

organizar. A sociedade em si, pode se dizer, já é uma Constituição, o próprio

agrupamento humano traz em seu bojo o cerne da Constituição da sociedade, daí a

expressão de Constituição da República, ou seja, da res publica.

A gerência desse agrupamento que tornou comuns fatores da

sociedade, ou seja, tornou público. Houve, a partir do inicio do século XIX, uma

mudança de referencial, a Constituição passa de República a referir se ao Estado,

pois esta é lei proeminente do Estado, só se compreende a Constituição através do

Estado. 24

24 Canotilho, Direito Constitucional p. 89.

29

2.1 CONCEPÇÕES DE CONSTITUIÇÕES

A Constituição refere-se ao Estado, e por ser este democrático deve

obrigatoriamente existir uma Constituição de Estado. Entretanto qual é a concepção

de Constituição tendo como cerne a sociedade atual?

A Constituição pode ser entendida sob o aspecto sociológico ou

jurídico. Para LASSALE 25eminente doutrinador, a Constituição é em sua essência

sociológica, pois é “A soma dos fatores reais de poder que regem um país . Esse

autor diz que a Constituição escrita não passa de uma folha de papel, esta deve ser

sobretudo real e efetiva no limite da necessidade da própria sociedade. 26

A outra corrente, de cunho jurídico tem como maior expressão Hans

Kelsen, para quem, a Constituição é a norma pura, a lei fundamental, que nasceu de

uma lei superior é um dever - ser do Estado, a norma fundamental hipotética que dá

validade à Constituição positivada. 27

Tanto uma como a outra teoria falham por serem demasiadamente

unilaterais, é necessário mais que um conceito individualista para justificar essa

magnitude legal que é a Constituição.Busca-se um conceito estrutural de

Constituição que esteja inserida no aspecto jurídico e sociológico, haja vista do fator

teleológico da Constituição.

Para José Afonso da Silva a Constituição deve ser entendida e

concebida como um produto da realidade social com suporte legal normativo

positivado de conteúdo fático e axiológico, pois esses elementos não se separam

em blocos, o contrário, estes se fundem formando os elementos constitucionais. Nas

palavras do eminente doutrinador:

A Constituição é algo que tem como forma, um complexo de normas escritas ou costumeiras; como conteúdo, a conduta humana motivada

25 Lassale apud José Afonso da silva. Curso de direito constitucional positivo, p. 44 26. Op. Cit. p.43 27 Kelsen, apud Paulo Bonavides. Curso de Ciência Politica39.

30

pelas relações sociais (econômicas, políticas, ou sociais); como fim, a realização de valores que apontam para o existir da comunidade; e, finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder emana do povo.28

Por conseguinte, deve se ter a Constituição no vértice do ordenamento

jurídico, sendo o fundamento de validade das leis vigentes.Aqui tem-se o aspecto

jurídico, e nessa vereda a Constituição é a maior da soberania popular, encartando

nesta a organização política e limitação de poderes e competências, constituidora de

segurança e liberdade.

2.2 CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES

O constitucionalismo é fruto inexorável da sociedade moderna,

baseada no novo espírito que dominou o pensamento político a partir da sociedade

moderna. A Constituição é presente na maioria dos Estados mundo afora, pois ante

ao princípio da democracia, para se ter um Estado democrático e gozar das

benesses do mundo globalizado há de se ter obrigatoriamente uma Constituição do

Estado garantidora dos direitos individuais e dos princípios de um Estado

democrático, e da separação dos poderes.

Assim, várias são as classificações, e inúmeras são as modalidades

que se assentam Nessa esteira pode se classificar as Constituições quanto ao

conteúdo, quanto a forma, quanto ao modo de elaboração, quanto a origem, quanto

a estabilidade, quanto a extensão, e quanto a finalidade.

2.2.1 Quanto ao conteúdo

Segundo ALEXANDRE DE MORAES29 quanto ao conteúdo as

Constituições podem ser classificadas em materiais ou formais. A Constituição 28 Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, p.43. 29 Curso de Direito Constitucional, p. 47.

31

material pode ser concebida em sentido amplo e estrito. Em sentido amplo diz

respeito à organização do Estado, em sentido estrito, são as normas constitucionais

inseridas em um documento ou não que regulam a estrutura do Estado, a

organização de seus órgãos e direitos fundamentais, em conclusão, é Constituição

toda a matéria que for de importância para o Estado.

A Constituição formal diz respeito ao conteúdo que se insere em uma

Constituição ser apenas formal, ou seja, é constitucional apenas do ponto de vista

da localização do dispositivo no ordenamento, pois, seu conteúdo poderia ter sido

objeto de lei ordinária.

Nesse aspecto, vale salientar a característica peculiar atribuída às

constituições escritas, pois somente estas comportam a modalidade formal aqui

descrita, uma vez que as constituições consuetudinárias não são escritas guardam

sem eu bojo apenas normas constitucionais materiais30.

2.2.2 Quanto à forma

Quanto à forma divide-se em escritas e não escritas. As escritas são

aquelas positivadas sistematizadas em um único texto, elaborado por um órgão

constituinte. Diversamente na Constituição não escrita as normas não constam de

um documento escrito, solene. É fruto dos costumes da sociedade à qual essa

Constituição se dirige, baseia-se, sobretudo em princípios e jurisprudências.

Justifica-se a Constituição não escrita pela natureza das coisas, disse

um constitucionalista: “Não se faz uma Constituição como um relojoeiro faz um

relógio.” 31 Esse pessimismo ante as Constituições escritas se dá em torno da sua

não estabilidade, ou da segurança de uma Constituição não escrita, pois, diz-se que

não há formula pronta de se estabelecer um Estado organizado.

30 Idem ib p 66. 31 Jorge Xifra Heras apud Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional, p. 67.

32

2.2.3 Quanto à elaboração

A elaboração de uma carta constitucional pode se dar de duas formas,

quais sejam: dogmáticas ou históricas.

Dizem dogmáticas aquelas que foram elaboradas, que são fruto de

uma produção por um poder constituinte e deve ser sempre escrita. Em

contrapartida, a Constituição histórica é resultado da transformação gradual dos

fatos políticos, e sempre não escritas.

Dessa maneira, são conexas essas classificações quanto à forma,

enquanto a dogmática está para a escrita assim a histórica está pela não escrita. 32

2.2.4 Quanto à origem

Promulgada se diz da Constituição que se origina de uma força

constituinte, com membros dos representantes do povo. No Brasil houve

Constituições promulgadas em 1891, 1934, 1946 e 1988. As constituições

outorgadas são impostas ao povo por meio de golpe e tomada de poder por meio

ditatoriais, foram as brasileiras de 1824, 1937,1967 e 1969.

2.2.5 Quanto à estabilidade

Consoante os ensinamento do insigne jurista Paulo Bonavides33

quanto ao aspecto da estabilidade há de se ressaltar a importância que tem um

Estado juridicamente estável, pois a segurança jurídica é princípio fundamental da

democracia. Para os teóricos, as constituições podem ser classificadas em: rígidas,

flexíveis e semi-rígidas.

32 Bonavides, Paulo. Curso de Direito Constitucional, p. 61 33 Idem ib, p. 68-9.

33

Rígida se entende aquela Constituição que não pode ser modificada,

senão por um processo legislativo mais complexo, e compreende-se processo

legislativo como o mecanismo adotado por dada organização política para a

produção de leis que integram o ordenamento jurídico. Em verdade, essa

modalidade prevê no próprio corpo jurídico estabilidade.

Nota que essa é a ambição de uma carta política entretanto, a crítica

que se faz a essa meta constituinte é deveras árdua, haja vista que a sociedade está

em constante mudança, que fatos circunstanciais que dominaram o pensamento à

época de elaboração da lei, se se tiver em vista que a validade da norma

constitucional é ad perpetum, pelo menos em tese, é de se questionar a validade

dessa rigidez, ou ainda mais apropriado, a validade dessa característica, em uma

sociedade moderna.

Afonso Arinos, proeminente doutrinador questionava a instabilidade da

Constituição de países latinos, França, Itália, Espanha, Portugal e Brasil, em

comparação com a estabilidade secular das constituições saxônias, como a

costumeira inglesa e a Americana escrita.

Segundo o autor, as Constituições saxônias adaptam-se

inerentemente à evolução da sociedade de forma pertinaz e constante. Interpretam-

se as mutações econômicas e sociais trazidas pelo decorrer do tempo, não se

adotam princípios, e sim, resolvem-se problemas. 34

Ao passo que as constituições latinas abstraem-se em busca de

aplicação de princípios genéricos, do que solucionar situações concretas. Disse o

doutrinador: “Quando os problemas se modificam, prefere-se adotar,

revolucionariamente, um princípio novo, em vês de adaptar interpretativamente uma

disposição antiga.”

É nesse cerne que se discute a estabilidade de uma Constituição. É

preciso, sobremaneira, que a sociedade encontre segurança, quer jurídica, quer

34 Porto, Walter Costa. O constitucionalismo de D. Pedro I, p. 5.

34

material. Ainda nesse sentido, vale salientar a posição de um país na comunidade

internacional, aqueles que fabricam muitas leis e as revogam todo o tempo não

demonstram estabilidade. Note-se o exemplo do Brasil: já houve sete Constituições

desde a outorga da primeira que ocorreu em 1824, conhecida como Constituição do

Império, e que fora a mais duradoura, haja vista de que mantinha certa flexibilidade,

como preceituava o artigo 178, eis o teor:

Art. 178 - É só constitucional o que diz respeito aos limites atribuições respectivas dos poderes políticos, e aos direitos políticos, e individuais dos cidadãos. Tudo o que não é constitucional, pode ser alterado sem as formalidades referidas, pelas legislaturas ordinárias.

Essa Constituição perdurou por setenta e cinco anos, sendo apenas

revogada pelo advento da Proclamação da República, que instaurou o sistema

presidencialista e conseqüentemente, o fim da monarquia imperialista. Essa nova

Constituição da República, foi o texto mais breve da história do constitucionalismo

brasileiro: com apenas 91 artigos organizou o Estado republicano, também de

caráter rígido, recebeu apenas uma revisão. O anteprojeto teve a participação do

ilustre jurista, Rui Barbosa35.

As Constituições flexíveis correspondem ao oposto daquela, pois não

exigem nenhum requisito especial a sua reforma. Utiliza-se o mesmo mecanismo

legislativo das leis ordinárias,e o exemplo mais evidente é a Constituição inglesa. Há

ainda, uma classificação quanto à estabilidade, as constituições semi-flexíveis

[nessa modalidade, o próprio texto constitucional dispõe que algumas regras

poderão ser modificadas ordinariamente], e outras em um processo legislativo mais

dificultoso.

Cumpre salientar, ante o exposto que a Constituição não pode ser

imutável. Impossível seria haja vista de que a vida social, tem seu caráter

inerentemente cambiante, mutante.

É importante dispor ao Estado meio de se atualizar por de sua mais

alta expressão legal, em conformidade com os institutos, estes não podem ser 35 Idem ib, p. 10.

35

reformados a cada novo passo que dá a sociedade. Deve-se assegurar aos

jurisdicionados o progresso social conjugado com a estabilidade constitucional. O

ilustre José Afonso da Silva assinala;“É preciso perfeita adaptação das constituições

às exigências do progresso e da evolução e do bem estar social”.36

É necessária uma técnica que torne válido uma rigidez relativa,

permitindo essa abertura de adaptação, que seja por um meio legislativo especial,

desde que seja um instrumento hábil à perseguição dessa finalidade, e não um meio

reformador inócuo e institucional.

36 Silva, José Afonso, Curso de Direito Constitucional Positivo, P 9.

36

3. FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO 3.1 Por que a Constituição é a suprema lei?

O subtítulo deste tópico demonstra uma indagação por vezes

impensada pelos destinatários da Constituição. O senso comum, aqui tomado como

a opinião geral da população sem qualquer técnica cientifica - metodológica, diz ser

a Constituição a maior lei que se tem vigente em um ordenamento. Não há qualquer

questionamento acerca da validade da Constituição. A supremacia da Constituição é

fato. Sem delongas acerca desse axioma, quer-se saber a razão e legitimidade

dessa qualidade suprema.

A Carta Magna é dita como o vértice de todo o ordenamento vigente

em uma nação, é dizer que acima desta não há nenhuma outra, e ainda, que para

qualquer outra lei existir e ser legitima é de suma necessidade que seu fundamento

de validade esteja recepcionado pela Constituição.

José Afonso da Silva37, um dos maiores constitucionalistas que tem a

nossa literatura jurídica, assume a posição de que a supremacia da Constituição se

reveste sob dois aspectos, quais sejam: material e formal.

O aspecto material cabe em modalidades diferentes de Constituição,

ora na rígida, ora na flexível, e diz respeito ao conteúdo que porta a carta. Ao passo 37 Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 47-50.

37

que, formalmente falando, a supremacia se dá tão somente nas Constituições

escritas e rígidas, e inserindo no próprio seio constitucional a previsão de mudança

da mesma, dando nascimento a duas categorias de lei: ordinárias e constitucionais. 38

Toma-se a Constituição como fato político, rígido e revestido de

democracia conjugada com a supremacia, e mesmo que esta carta esteja emendada

com dispositivos inseridos sem controle quantitativo, tampouco, qualitativo, esta

ainda é o vértice da pirâmide legal.

A razão se baseia em qual princípio, ou regra? Princípio em que foi

erigida a Constituição, que consagrou a mesma é o principio da soberania popular,

mas este deve ser intrinsecamente ligado ao principio da segurança jurídica. Como

se explica uma carta política, escrita, rígida ser emendada a todo o tempo? A

insatisfação da categoria representativa é tamanha em relação ao texto maior, que

não se sabe, se é a Constituição “de fato” rígida, ou flexível.

O princípio da segurança jurídica não pode ser isento de apreciação,

este, sim, é o fundamento da rigidez, e se a supremacia é alicerçada na rigidez39,

que dizer da nossa atual carta política brasileira? Esta é realmente suprema? A

quem cabe tutelar a Constituição?

O problema do destinatário da lei suprema é combatido por KELSEN40,

resolvendo a questão em uma única palavra: imperatividade. E essa qualidade da

Constituição deriva da norma hipotética fundamental, e cabe a lei apenas descrever

os axiomas contidos na mesma. Assim, a norma descrita dirige-se a todos e a

ninguém ao mesmo tempo.

38 Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 49. 39 Hesse, Conrad. Força Normativa da Constituição, p. 15. 40 Kelsen apud Paulo Bonavides, idem, p. 214.

38

Outra discussão acerca da destinação das normas parte de Santi

Romano, combatendo a opinião de Kelsen, negando a concepção imperativa e

voluntarista da carta política, atribuindo à destinação àqueles que devem aplicar a

lei. Justifica ainda que há uma parcela de pessoas que não podem ser destinatários

da lei. Em suas palavras:

A unidade mais ou menos compacta do ordenamento jurídico é a íntima conexão que se estabelece entre as distintas normas, de modo a não consentir se possa isolar de modo completo nenhuma delas, donde a inteira impossibilidade de especificar-lhes os destinatários. 41

Admite-se, então, que, devido ao complexo sistema de aplicabilidade

das normas constitucionais, esta é destinada a todos, não apenas aos legisladores,

tampouco apenas à parcelas da população42. Incluem-se nesse momento todos os

brasileiros e residentes no país como preceitua a Constituição.

Destarte, verifica-se que a Constituição é suprema pela própria

natureza, considerando cada cidadão como parte legitimadora da lei. Pois, se assim

não o fosse, a segurança de qualquer sistema constitucional estaria completamente

fadado ao insucesso. Deve-se ter a sustentação da Constituição suprema e segura

na defesa da mesma para que o abismo que separa a Constituição real da ideal não

seja absurdo.

Concluindo que a Constituição é suprema, não apenas pelo caráter

imperativo como quis KELSEN, é, com efeito, a proposta de conciliação de vontades

da soberania popular a si mesmo dada e ratificada, sem importar com destinatários

específicos. Vale salientar que esta a todos se dirige, a todas as relações jurídicas

que o Estado empresta legalidade, é suprema pela adoção dos princípios basilares

do constitucionalismo moderno.

41 Idem ib. p. 215. 42 Bonavides, Paulo. Idem, p. 216.

39

3.2 NORMATIVIDADE DA CONSTITUIÇÃO

Em linhas gerais, a normatividade da Constituição decorre da força

cogente que se impõe a todos. Resta assinalar de onde vem essa força impositiva.

Em primeiro plano, deve-se saber qual é o caráter das normas contidas na magna

carta. As Constituições liberais fruto da evolução da instituição do Estado de direito

inserem a proposta de normas programáticas a fim de cristalizar uma nova

perspectiva legal.

A norma programática é dita como os comandos e valores que dão ao

ordenamento constitucional elasticidade, mas, não tem aplicabilidade imediata, isto

é, não pode ser invocada tão logo a carta política seja promulgada. Pode se dizer

que esta tem um destinatário especial, pois tem no seu centro o legislador que toma

a norma programática como diretriz a ser cumprida, portanto vinculante, ou seja, um

programa a ser implementado.

É bem verdade que a nova face constitucional são as normas

programáticas, como fora inserido na magna carta, direitos como os sociais, dentre

outros, até então desconhecidos.

O constitucionalismo moderno se deparou com a dificuldade de

transformar esse programa social em ordem cogente, em direito subjetivo. Nessa

esteira criou-se uma barreira para que a Constituição acompanhasse a realidade

emergente.

Têm-se, em verdade, uma Constituição de normatividade mínima e

programaticidade máxima, que, obviamente culminou na queda do grau de

juridicidade das Constituições.43

43 Bonavides, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 208.

40

Por isso, nota-se uma carta muito mais política que jurídica Em remate,

chega-se a uma Constituição que contém, em verdade, um sistema de valores

morais e culturais e não apenas um conjunto de leis e regras.

O mais salutar a essa observação, é não fugir do centro gravitador da

Constituição, qual seja, a direção do Estado. A nosso ver, a Constituição

democrática é o documento formal da celebração do grande pacto social com fulcro

na soberania popular.

E este não deve escapar a seu objetivo da positivação suprema, pois

não há nenhuma Constituição sem força cogente. Ademais, deve também absorver

a programaticidade das normas constitucionais. Na lição do insigne jurista RUI

BARBOSA:

Não há nenhuma Constituição, cláusulas a que se deva atribuir meramente o valor moral de conselhos, avisos ou lições. Todas têm a força imperativa de regras, ditadas pela soberania popular aos seus órgãos. Muitas, porém, não revestem do meio de ação essenciais ao seu exercício os direitos que outorgam, ou os encargos que impõem: estabelecem competências, atribuições, poderes cujo uso tem de aguardar que a legislatura, segundo seu critério, os habilite a se exercerem. 44.

Nessa vereda não se pode olvidar que a simples declaração da

juridicidade das normas programáticas a dará responsabilidade à engrenagem do

Estado. Entretanto, não se pode esquecer que a legitimidade decorre da política,

assim, em epítome, deve entender as normas programáticas como normas jurídicas

fundindo os conceitos de Constituição jurídica e política, de forma a se ter a força

cogente que uma Constituição deve ter.

A força normativa da Constituição pode ser baseada sobre três pilares:

a) condicionamento recíproco entre a Constituição jurídica e realidade político-social;

b) limites e as possibilidades da atuação jurídica; c) pressupostos de eficácia da

Constituição. O primeiro tópico diz respeito à união entre os dois fatores citados, não

se podendo elidir apenas uma característica, mas deve-se, ao contrário, unir as duas

44 Rui Barbosa apud Paulo Bonavides, idem p. 209.

41

facetas, que são a realidade social e política em face da vigência formal da lei.

Dessa forma obtêm-se um significado amplo de Constituição. 45

Os limites da Constituição jurídica focam-se na auto-limitação dos

poderes do Estado pelo princípio da legalidade. O Estado nada pode agir sem que a

lei autorize, de forma que o contrário nega a principal fonte de poder da

Constituição, que é a democracia da soberania popular.46

Os pressupostos de eficácia da Constituição é o corolário da mesma, a

segurança jurídica em sentido amplo, que a Constituição deve lograr. Sabe-se que a

freqüente revisão tende a corromper esses elos entre segurança e efetividade dados

à Constituição, e assim, por via reflexa a força normativa da Constituição resta

mitigada.

A eficácia de uma Constituição está fadada a forte pretensão desta.

Pois, graças ao elemento normativo, a Constituição organiza e coordena a realidade

social, e por essa razão, a amplitude de sua força normativa é seu elemento

principal. Compete ao direito constitucional a guarda e proteção da Constituição, e,

sobretudo a sua defesa. Essa é a maior garantia de que a Constituição será fruto da

realidade histórica revestida de juridicidade e politicamente legítima para o

fortalecimento da força normativa da Constituição.

Conclui-se que a força normativa da Constituição é uma rede complexa

de elementos em que pesem os princípios que norteiam essa força, a segurança

jurídica, legalidade bem como a fonte de poder da Constituição. Apenas, vale

ressaltar que a Constituição subjetivamente em nada valerá se não houver o

elemento da íntima convicção individual de que está é a lei maior de um Estado, e é

esse fator que garante a força normativa da Constituição. 47

45 Hesse,Conrad. A força Normativa da Constituição.,p.21. 46 Hesse.Conrad. A força Normativa da Constituição.,p.28. 47 Idem ib,p. 16.

42

4. PODER CONSTITUINTE

4.1 CONCEITO

Poder constituinte é o poder competente para elaborar uma

Constituição. Sabe-se que em qualquer regime de governo, em qualquer tempo,

sempre houve um poder constituinte tácito. Não como se conhece hoje, mas com a

força de originalidade. Basta analisar as sociedades antigas, em que o rei era o

detentor do poder constituinte, e por meio dessa faculdade criava e constituía o

Estado antigo.

É inegável que a Constituição é a lei suprema, que está acima de todo

o ordenamento jurídico, e ainda mais, é na Constituição que se encontra toda a

validade do sistema legal de um Estado. Nessa esteira, vale salientar a importância

de se conhecer o poder constituinte.

Pode-se dizer que a origem deste poder está diretamente ligado ao

conceito moderno de Constituição, no sentido de que a aceitação de um poder

distinto dos que se estabelecem, e tendo a característica de fonte da Constituição e

via reflexa dos poderes constituídos difere do poder constituinte clássico das cidades

antigas em razão da distinção da supremacia.

43

Para aqueles que eram o berço da civilização ocidental, os gregos e

romanos, não havia hipótese de uma lei superior, e sim de leis emanadas de um

estrato social superior , o rei. Não havia distinção formal48.

Assim cabe o questionamento, donde, então, surgiu o fundamento

lógico do poder constituinte?

De fato, a lógica do pode constituinte está diretamente ligada ao

reconhecimento da lógica, haja vista de que o poder que se impõe aos órgãos do

Estado é um poder distinto daquele que criou o Estado, de forma que o poder

constituinte estabelece a organização jurídica fundamental, é dizer que essa

organização é que gerará as estruturas sobre as quais a sociedade viverá. 49

Por seu turno o poder constituinte pode ser tido como poder único em

que erige toda a organização estatal com características constitutivas e impositivas,

com efeitos erga omnes. Entretanto ao se analisar dessa maneira, pode-se cair na

característica de um Estado déspota, contrário à atuação de qualquer outro poder, e,

para se evitar tal mazela, há que se dividi o Estado constituído racionalmente. Neste

momento nasce, surge a teoria da tripartição dos poderes destinada a propiciar a

organização do Estado, princípio sumamente importante, haja vista de ser a única

maneira de limitar os poderes políticos.

4.2 AS ACEPÇÕES DO PODER CONSTITUINTE

A idéia inicial ao se falar em poder constituinte, é a idéia de que este é

uma assembléia constituinte, um grupo, um colegiado para elaborar uma

Constituição. Muito embora, o termo “poder constituinte” seja muito mais amplo, vale

salientar a idéia de que a palavra “constituinte” traz em seu bojo a noção de

processo, pois sempre se refere ao constituinte, mudando-se o gênero, o

constituinte doravante é o legislador identificado como feitor da magna carta.

48 Machado, Raul Horta. Curso de Direito Constitucional, p. 25. 49 Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p.22.

44

O processo de constituinte é amplo e complexo, envolve diretamente o

processo político de uma sociedade. A constituinte [assembléia] é composta de

representatividade em que se discutem os vários temas fundamentais a um Estado

democrático de direito.

O ápice da constituinte é a promulgação da Constituição que revela o

modo pelo qual o representante adotou, em nome dos representados, a organização

jurídico - política de uma sociedade, não há limites para esse poder constituinte.50

Posto isto, a análise dessa característica ilimitada da força do poder

constituinte pressupõe que antes da constituinte, não houve Constituição. A nova é

completamente independente e impositiva à anterior, quando esta existe.

Assim, nessa esteira, fala-se em ruptura com a ordem anterior. Essa

ruptura se dá em âmbito integral, englobando os poderes constituído e

organizacional. Esse é a chama do poder constituinte originário, quando rompe com

a ordem anterior deixando aquele apenas como dado histórico sem, contudo, deixar

de ser um Estado, pois pela teoria da recepção, toda a norma infraconstitucional que

encontrar validade na nova Constituição será valida.

De outro modo, é de se verificar que, se naquele poder originário não

se encontra limites para o seu exercício, no poder constituinte derivado, em que a

acepção deste se dá nas limitações impostas pelo poder originário, e este poder

derivado se dá pela regulamentação do próprio poder originário. A condição para a

legitimidade deste poder constituinte derivado é este ser eleito pelo povo, e assim,

pode aplicar, propor, estabelecer mudanças na carta política de um país. Nas

palavras do insigne jurista TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR:

Para que exista poder constituinte derivado, é necessário que o poder constituinte estabeleça limites as alterações da própria Constituição. Esses limites podem ser formais, como o quorum especial, ou materiais, expressamente constantes do texto constitucional como as clausulas pétreas 51

50 Lopes, Mauricio Antônio Ribeiro. Poder Constituinte Reformador, p. 134 51 Constituinte: Assembléia, poder, p. 30.

45

Posta assim essa questão, é de se concluir que a Constituição

brasileira não tem uma instituição que estabeleça o poder constituinte como uma

corporificarão de estabilidade e legitimidade, haja vista de que as normas

constitucionais podem ser modificadas na vontade do legislador constituinte

derivado.

Cumpre ratificar, nesse momento, que a Constituição do Brasil está

sujeita a um problema interminável, pois ao eleger um congresso com poderes

modificadores [poder constituinte derivado] institucionaliza-se a prerrogativa de

instabilidade jurídica e mesmo política, vendo que os legisladores mundo afora se

pautam por meios legitimamente modificadores, havendo aqueles que põem a salvo

os direitos fundamentais, porém, rompem com toda uma estrutura.

Nessa hipótese tem-se que a revolução cria uma nova faceta ao

Estado. Contudo, não se pode olvidar que, um Estado mais estável do ponto de vista

jurídico é mais facilmente governável, haja de vista que não se insurge a revolta

populacional. 52

Registre-se, ainda, que o poder constituinte, tomado na acepção de

assembléia, só pode ser válido se for determinado no tempo, por se tratar de um

processo, pois se assim não fosse estaria fadado ao acontecimento ad eterno e

nunca haveria uma Constituição positiva.

52 Ferraz Junior, Tércio Sampaio, p.132.

46

Cumpre assinalar que este não é o problema isolado do poder

constituinte. Resta saber a problemática mais aproximada da teoria política, saber o

que é o poder constituinte e seu emblema no seio da organização social do Estado.

O poder constituinte está diretamente ligado ao poder, poder capaz,

hábil de mudar uma determinada condição jurídica constitucional em determinado

período no tempo. A detenção deste poder deve ser entendida e atribuída ao povo,

grupo populacional formado pelo conjunto de indivíduos regidos pela mesma égide

jurídica.

Para o insigne jurista português, o poder constituinte em sua gênese

pode subsumir três formas, quais sejam: revelar, dizer e criar a Constituição.

Vale salientar a dupla finalidade de uma Constituição, a primeira de

estabelecer regras jurídicas, ou seja, um texto jurídico, e pela própria natureza

constitutiva fixa a “Constituição política de um Estado” 53.

Eis, o sincretismo da Constituição. A par disso, a evolução da gênese

do poder constituinte muito se vale de todas as experiências constitucionais que se

conhece. Ao se falar em poder constituinte que se revela, remete - nos a experiência

inglesa, em que nunca houver uma assembléia constituinte reunida, deliberando

acerca das leis que regeriam aquele país, tampouco, houver um poder ditador capaz

de subjugar a população inglesa.

A Constituição inglesa se deu em âmbito de proclamas, é dizer que o

povo, não apenas revelaria a quem interessa se a condição de homens livres e

limitar o poder do império que já existiam em leis muito antigas, como estabilizaram

o constitucionalismo histórico, que via reflexa expurgam a possibilidade de um poder

constituinte para reorganizar a nação. Nas palavras do proeminente jurista luso:

“neste sentido se pode afirmar que o constitucionalismo histórico repugna a idéia de

um poder constituinte com força e competência, para, por si mesmo, desenhar e

planificar o modelo político de um povo.”

53 Canotilho, Op Cit.p. 68.

47

De outra forma, há segundo JJ CANOTILHO54, a experiência jurídica

de dizer a norma constitucional, e exemplifica essa modalidade por meio do

constitucionalismo americano em que uma assembléia constituinte criou um corpo

de normas superiores e invioláveis.

O povo americano não aceitava a idéia de que pudesse haver um

poder que criasse a organização de seu Estado. A idéia de poder constituinte na

experiência americana tem o foco na garantia. A garantia de que os direitos

fundamentais fossem validados e efetivados e de limitação ao poder, essa limitação

ao poder é tão elevada que o próprio poder constituinte é severamente limitado, no

sentido de que o poder constituinte é apenas um instrumento funcional para de fato

DIZER a norma constitucional, e não se pode negar que essa experiência

constitucional atinge bem o seu objetivo principal no sentido de dar ordem política e

social àqueles que exercem o poder político, e estabilizando o sistema jurídico.

De resto, tem-se o constitucionalismo que cria a norma, por meio da

revolução, no caso francês, como exemplo. Acerca da revolução surge a nação

como titular do poder constituinte, que rompe com a ordem anterior sobrestada ao

futuro que tem por características principais ser originário, autônomo e onipotente,

como definido pelos próprios revolucionários franceses: “a Constituição é um acto

imperativo da nação, tirado do nada e organizando a hierarquia dos poderes.” 55

Cria-se um novo Estado, que transcende os conceitos de outrora

aplicando aos poderes constituídos a nova e querida dimensão ao

constitucionalismo revolucionário, em razão disso a forma de legitimação do poder

transfigurou-se pelo sufrágio renovando e acelerando a transformação do Estado

moderno em república e integrando a população em uma nova ordem social.56

54 Idem ib. p. 69 55 Boutmy apud Canotilho, p. 71. 56 Canotilho, op.cit,p. 71.

48

4.3 NATUREZA DO PODER CONSTITUINTE

Em linhas gerais, pode-se dizer que o poder constituinte é a expressão

política que tem por escopo convolar os preceitos de uma sociedade, que, por

alguma razão, está modificada. Resta saber, entretanto, qual a natureza desse

poder. Em tempos remotos, sabe-se que o poder constituinte advinha dos céus, de

divindades, e por meio dos escolhidos, as leis eram elaboradas.

Entretanto, o poder constituinte originário representado pela

Assembléia Constituinte assume que posição? Que natureza pode-se atribuir a esse

poder? Segundo JJ CANOTILHO57, o poder constituinte no plano teorético-

constitucional pode ser analisado no que tangencia a qualidade de poder de fato ou

poder jurídico. Entretanto, essa questão se assenta em saber se o poder constituinte

é um limite imposto à Constituição.

A grande questão que se coloca acerca desse assunto diz respeito ao

fato de não se considerar o poder constituinte como uma categoria, instituto ou

mesmo um conceito, este não pode ser reduzido a esse termo ante a sua ruptura

com o direito positivo constitucional vigente58. Nessa esteira, poder-se-ia dizer que o

poder constituinte originário é uma força liberta de regulamento jurídico, um fato

puro, como assumido por KELSEN pela teoria da norma hipotética fundamental, é

dizer que o poder constituinte é anterior ao Estado.

O poder constituinte clama sob o ponto de vista jurídico por validade

das normas, e no aspecto político está diretamente ligada à maneira de auto-

organização da coletividade, imbricando seus dois elementos, político e jurídico,

colidindo com a legitimidade e legitimação do poder constituinte, que será objeto de

análise aprofundada em outro capítulo.

O fundamento lógico do poder constituinte localiza-se no momento de

diferençar este dos poderes constituídos, vez que a existência de uma Assembléia

Constituinte requer, necessariamente, a ruptura com a ordem em que se organiza o

57 Op. Cit, p. 72. 58 Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p. 22.

49

Estado, terreno incerto em que se localizam as origens deste poder originário. Assim

tem-se que a admissão de um direito anterior ao Estado é o poder constituinte é um

poder jurídico, haja vista a inerente condição humana de agrupamento e

necessidade de ordem.

Em contrapartida, há aqueles que não admitem a existência de um

direito anterior ao Estado. O poder constituinte, é em verdade um poder apenas de

fato, puro isolado, que por si é capaz de estabelecer e impor a ordem.

É preferível a adoção da natureza do poder constituinte, como de

ordem hibrida. O poder constituinte revolucionário rompe com a ordem a esta

anterior, com uma força de rebeldia para instituir a profunda mudança social que a

revolução pode alcançar , este poder invade a esfera individual de forma penetrante

e incisivo como nas palavras do publicista espanhol:

O poder constituinte não pode ser localizado pelo legislador, nem formulado pelo filósofo, porque não cabe nos livros e rompe o quadro das constituições. Surge como um raio que atravessa a nuvem, inflama a atmosfera, fere a vitima e desaparece.59

Poeticamente descreve o publicista espanhol, visto que não é a

comunidade que requer a assembléia constituinte, e sim, a ordem de mudança

instalada no seio da sociedade que clama pela positivização de tais mudanças.

Essa teoria é parte da clássica da Revolução Francesa que acendeu

mundo afora a liberdade, atributo este que deveria estar garantido pela legitimação

dada pelo povo, destinatário da mesma liberdade. Para Sieyes, o grande doutrinador

da revolução francesa atesta magistralmente o valor maior de uma revolução e via

reflexa, a poder constituinte, qual seja, a liberdade.

O poder constituinte pode tudo. Ele não está submetido a uma determinada Constituição. A nação que exerce o maior e mais importante dos poderes deve ficar no exercício dessa função, livre de qualquer constrangimento

59Agesta apud Raul Machado Horta. Direito Constitucional p.26.

50

A mais acertada, então, forma de se conceber o poder constituinte é

tê-lo como o elo entre política e direito. Daí a natureza hibrida, defendida pelos

constitucionalistas contemporâneos, com a qualidade de ser inicial, autônomo e

incondicionado.

Portanto, não se pode negar a natureza jurídica do poder constituinte,

ainda que não haja seu fundamento de validade em norma positivada. É nessa

esteira que, se prova a existência de um direito natural, anterior ao Estado capaz de

coexistir com a ordem política.

4.4 O TITULAR DO PODER CONSTITUINTE

A titularidade do poder constituinte em um Estado democrático só pode

ser uma: o povo. Assim, em análise político-histórica, retornamos em SIEYS o

grande mentor da revolução francesa, quem realizou a primeira distinção entre

titularidade e legitimidade. Para ele a soberania popular era a origem de tudo, é a

própria lei.60

Por muitas vezes, esses dois elementos são confundidos no que

tange ao poder constituinte. Não basta, entretanto, que haja consenso no que diz

respeito ao detentor deste poder, o povo, se não se conceitua esse povo dono do

poder constituinte.

Segundo JJ CANOTILHO61 o conceito de povo é um conceito

plurívoco, é o conjunto de pessoas deliberando sobre suas vidas em comum. A

colaboração dessa afirmação se dá no momento em que há de se considerar as

forças atuantes em uma Constituição, tais como partidos políticos, igreja forças

culturais. Assim, conforme CANOTILHO, povo é acima de tudo uma grandeza

pluralística.

60,Sièyes. apud Canotilho. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 141. 61 Canotilho idem, p. 74

51

Desse modo, partindo do ponto de que o povo é formado por várias

grandezas de todas as ordens, é preciso saber qual a natureza que circunda esse

conceito pluralístico-moderno de povo. Superada a antiga acepção de povo, como

somente um povo ativo, ou seja, dono de capacidade eleitoral ativa; e passiva, como

queriam os jacobinos, tampouco é povo o conceito liberal, em que os proprietários

impunham o sufrágio censitário.

Chega-se ao consenso de que a natureza do povo é tomada no

sentido de povo político, no espírito da democracia em que os grupos que compõe a

grande ordem pluralística, agem em conformidade com interesses de natureza,

também, política.

É plurisubjetiva a titularidade, pois encontramos o titular isoladamente

entre as grandezas pluralísticas que compõe o todo, forças hábeis a definir e discutir

constituindo todos os aspetos necessários á formação do Estado.

Vale salientar a idéia de que o conceito de povo está sujeita à idéia de

povo político, normativa e real. Em uma analise filosófico-sociológica, o povo

normativo é aquele que a lei o define como povo, há, todavia, nessa concepção a

tomada da exclusão de tantos quanto a lei não expressar como povo, por uma razão

exterior ao próprio povo.

E o povo real, segundo JJ CANOTILHO62, é a comunhão de opiniões

que trazem à tona a capacidade de instituir e constituir uma Constituição

demonstrando dessa maneira, donos soberanos do poder constituinte, havendo para

si a capacidade de contratar e pactuar a ordem-politico social.

62 Canotilho, Curso de Direito Constitucional, p. 74

52

O supremo poder do Estado, o exercício do governo, está, sobretudo,

ligado ao fato de determinado poder haver-se estabelecido por meio da dominante

opinião da maioria. Ou seja, entra em tela, nesse momento, o conceito de

consensus que é definido como a aceitação da prática governista constituído

legitimamente. Entretanto, esse consensus não se confunde com legalidade, pois

pode haver legalidade, sem, contudo, haver consensus.63

Assim, o poder que não seja baseado no consensus tem natureza

instável, tem a governabilidade cerceada pela constante ameaça de que pode-se

insurgir uma revolução ante a imposição sistêmica de um governo.

Assim, para que o poder constituinte alcance a máxima eficácia é

necessário que repouse sobre o consensus que o legitimará. Assim, conclui-se que,

se a soberania repousa na legitimidade, via reflexa, alcança-se a justificativa de que

o poder constituinte originário pertence ao povo.

O povo na acepção de povo real supracitado, como dono do poder

constituinte, não é o agente desse poder. Ou seja, o exercício desse poder é

delegado aos representantes do próprio povo em um sistema democrático, de forma

que o agente desse poder é costumeiramente denominado Assembléia Nacional

Constituinte.

O poder desse referido ente é na medida exata da aceitação do povo,

que pode ser expressa quando ocorre o referendo, ou tácita quando posta em vigor

e por si ganha eficácia pela prática de suas disposições.

Resulta desse fato duas conseqüências importantes, a primeira a de

que o poder constituinte não é eterno, ou seja, este se esgota tão logo a obra seja

realizada, e a segunda é que a obra estará sempre sujeita a uma condição de

eficácia. 64

63 Ferreira Filho Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p. 25. 64 idem ib,p. 27

53

4.5 VEÍCULO DO PODER CONSTITUINTE

O poder constituinte originário é pensado como um poder que atua em

campo livre, vazio. Em outras palavras, o poder constituinte ocorre onde não há

qualquer manifestação política, de forma que este seria a primeira existência de uma

atuação política. Entretanto, é ponto pacifico que no plano fático, o poder constituinte

atua em lugares em que já existem até instituições e poderes constituídos. Aqui se

encontra o questionamento de qual é o veículo capaz de modificar essa instituição já

existente e criar uma nova ordem.

No momento em que o poder constituinte se manifesta, este rompe

com a ordem anterior, fazendo-a com que esta perca a eficácia necessária à

governabilidade de um Estado. Nessa esteira, o povo real, por meio de seus agentes

insurge-se e nasce a revolução, que é o veículo do poder constituinte.

É por meio da revolução que o poder constituinte originário responde

ao anseio da população insatisfeita, as grandezas pluralística como no conceito de

CANOTILHO65 atuam buscando dar resposta às necessidades mais relevantes e

comuns à população. Pode-se concluir que a revolução “tem” poder constituinte 66

Todavia, isso não é um axioma. Basta saber quantas constituições

nasceram sem que houvesse uma revolução, v.g. a própria Constituição de 1988

que fora realizada de acordo com as normas da Constituição de 1969. Ocorre que

devido à profunda reforma, esta se logrou como Nova Constituição realizada pela

Assembléia Nacional Constituinte de 1987. A par disso, vale indagar se é a

revolução é um direito. A Constituição democrática instituída e consolidada garante

esse direito?

65 Canotilho, apud Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p. 26. 66 Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p. 25

54

A liberdade é a garantia fundamental que responde a essa indagação, tendo em

vista que o exercício desta é que gera em uma população o direito de insurgir-se, de

afrontar a lei positiva, que não satisfaz aos anseios daquela sociedade.

Assim, a sociedade pode como ultima ratio recorrer à força bruta para

opor-se ao sistema vigente. Em epítome, a revolução é o veículo para se

estabelecer o poder constituinte, seja ele no terreno cru e vazio, seja para revogar a

ordem anterior, qualquer que seja o plano de atuação da força revolucionária, vale

salientar que esta é feita sempre por uma minoria, entretanto, só se legitima com a

adesão da maioria 67

4.6 LIMITAÇÕES AO PODER CONSTITUINTE

O poder constituinte, como outrora caracterizado, é permeado

essencialmente pela liberdade de constituir um Estado nos moldes da realidade

fática em que vive a sociedade. Assim, para saber a limitação do poder constituinte

é necessário, em primeiro lugar, distinguir as duas facetas de poder constituinte.

De fato, o poder constituinte pode ser classificado de duas maneiras o

poder constituinte originário e o poder constituinte derivado. Ambos surgem como

garantia de estabilizar a governabilidade. Assim, o poder constituinte originário pode

ser conceituado como a expressão política que tem a função de positivar segundo

os ideais que norteiam o momento histórico-constitucional, as regras que

constituirão o Estado. Esse poder constituinte originário possui elementos que o

caracterizam, como ilimitado e incondicionado.

É inicial, em razão da função que exerce, o de criar os demais poderes.

Os poderes constituídos só existem em razão da autorização expressa pela Magna

Carta. O poder constituinte originário é o poder de elaborar, votar e promulgar a

Constituição. Ele é exercido privativamente pela Assembléia Nacional Constituinte

67 idem Ib,p. 31.

55

Assinala o magnífico GODOFREDO TELLES JÚNIOR, em trecho da

carta enviada ao Presidente da República e Congresso Nacional durante a

constituinte de 198768, que elemento caracterizador seguinte diz respeito à ilimitação

deste poder, isto é, este é capaz de criar, adotar e derivar vários outros poderes

dessa sua ilimitação. Vale salientar que essa limitação, apenas, está presente na

invocação do jusnaturalismo, e nessa esteira, dá a essa característica a nome de

autonomia, que quer significar que o direito positivo não é bastante para limitar a

instituição de um Estado, entrementes, direito natural está apto a esse exercício.

A par disso, tem ainda que o poder constituinte é incondicionado, ou

seja, está isento de cumprir requisitos pré-fixados a fim de manisfestar-se. Em suma,

o poder constituinte originário é a prova maior do exercício da soberania do povo em

um sistema de governo.69

68 Godofredo Telles Júnior, apud Pérsio Henrique Barroso. Constituinte e Constituição,p.92. 69 idem Ib, p. 21.

56

5. A EVOLUÇÃO CONSTITUCIONAL NO BRASIL

O presente capítulo de cunho histórico, será muito importante para o

esclarecimento de como se chegou ao constitucionalismo atual, de forma que a

Constituição Cidadã alcançou sua natureza analítica e a razão de seu número de

emendas que traz à tona a discussão desse trabalho.

Com a chegada da família real em 1808 no Brasil, a figura de colônia

explorada começa a ganhar contornos de uma nação autônoma, pois, a partir de

então tratava-se da sede do Reino, e com isso, tornou-se necessário instalar na

Colônia as repartições necessárias à organização do governo.

O grande problema enfrentado pela instalação da família real no Brasil

foi a descentralização do poder que, todavia, era a forma estabelecida em três

séculos de vida dos moradores dali. Havia um grande abismo entre o poder real e o

poder efetivo, esse fator trouxe a discussão de um novo modelo de governo.

Nasceu assim, o primeiro movimento com natureza constitucional,

fortemente influenciado pela Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos dos

Homens e Cidadãos de 1789. Os princípios que norteavam essa mudança no

pensamento político buscaram inserir, no âmbito do sistema de governo, os

fundamentos do liberalismo, parlamentarismo, e constitucionalismo Essa influência

ideológica trouxe a possibilidade de se outorgar a Constituição do Porto.

57

5.1 A PROCLAMAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA E O CONSTITUCIONALISMO

Após o grito de D. Pedro I, que colocou o Brasil como um país

independente da Colônia passando a ser uma nação livre. O maior problema, nesse

momento, foi o de tornar o Brasil governável ante sua estrutura coronelista e

descentralizada. Assim, nasce a necessidade de se adotar uma política fundamental

capaz de açambarcar toda a estrutura equiparar todas entre si, e a partir daí, realizar

a unificação do país.

Surgiu a idéia do constitucionalismo inicial no Brasil, que teve por

pretensão massificar todas as províncias em torno de uma única fonte de poder

central, como expressou Benjamin Constant, “nada escapa, nem o mais remoto

povoado do interior, à sua compressão poderosa “70, referindo-se a Constituição do

Império.

5.2 A CONSTITUIÇÃO IMPERIAL

Surge, a Constituição do império em 1824, e após três séculos de

dominação a ex-colônia tem sua própria organização política positivada, seguindo os

mais modernos princípios à época.

A Constituição Imperial não nasceu de uma Assembléia Constituinte,

pois, D. Pedro I a havia dissolvido arbitrária e autoritariamente, e outorgou a

Constituição de projeto elaborado pelo Conselho de Estado71. A Magna Carta

Imperial possuía 179 artigos e instituiu a divisão do império em províncias, o governo

hereditário e monárquico, a divisão dos poderes, inclusive o poder moderador que

era exclusivamente exercido pelo próprio imperador.

70 Benjamin Constant, apud José Afonso da Silva. Op. Cit.p. 76 71 Porto.Walter Costa. O constitucionalismo de D. Pedro I, p. 38.

58

Vale salientar que o poder moderador era um poder incomum a outros

Estados. Assim, a adoção desse sistema moderador se deu por sistematização por

Benjamim Constant, que o definia como “La clef de toute organisation politique”, que

em livre tradução para a língua portuguesa significa: “a chave de toda a organização

política”.

A instituição do poder moderador dividia a opinião partidária. Aqueles

conservadores tinham o exercício do poder moderador como uma imposição, ao

passo que os liberais percebiam o poder moderador como uma força de

composição. Fato é que de acordo com estudos históricos realizados, conclui-se que

os escritos de Constant foram o que de fato o que inspirou a Constituição imperial, e

que o poder moderador foi o que saciou a sede de autoridade que D. Pedro I

aspirava.

Dentre a peculiar característica da Constituição Imperial ao instituir o

poder moderador, esta colaborou para a imposição da democracia representativa

indireta bem como do sufrágio censitário, além de ter sido uma Constituição escrita e

semi-flexivel, em que se estabeleceu como constitucional, ou seja, aquilo que não

está sujeito a reforma, tão somente matérias que tratavam da organização política.

De forma que tudo o que não fosse constitucional como disposto na

própria carta, poderia ser modificado por leis ordinárias. A maior singularidade dessa

carta imperial, entretanto, diz respeito a sua durabilidade, foi a Constituição que por

mais tempo vigeu na história constitucional pátria até o momento.

5.3 A CONSTITUIÇÃO DE 1891

A Constituição de 1891 foi fruto da Assembléia Nacional Constituinte, e

rompeu com o sistema monárquico. Foi a primeira Constituição brasileira atestando

a República, o federalismo e o presidencialismo. A Carta Magna de 1891 é a carta

59

de distribuição de competências e poderes, e a primeira a garantir os direitos

fundamentais.72

É o texto mais breve da história constitucional brasileira, com apenas

91 artigos, e durou trinta e nove anos. Vale salientar que foi nesse momento

constitucional, que se abandonou o modelo Europeu de monarquia, passando os

autores do Anteprojeto a inspirar-se no modelo Norte Americano e de todas as

características de organização daquele Estado.

5.4 A Constituição de 1934

A promulgação da Constituição de 1934 foi um marco na história da

evolução constitucional do Brasil, haja vista de que a inspiração advém do

constitucionalismo pós-guerra. O modelo constitucionalista a ser seguido nesse

momento, era o modelo de Constituição social, e a conseqüência trazida por essa

adoção foi o alargamento da matéria constitucional, introduzindo a ordem

econômica, a proteção à família e a referência ao Direito do Trabalho.

Em uma breve classificação, têm-se a Constituição de 1934, como uma

Constituição ampla, ou seja, expansiva, com 187 artigos e recebeu três emendas e

vigeu por apenas três anos, três meses e vinte e seis dias.73

Por motivos de ordem política, conflitos regionais levaram a

Constituição de 1934 a sucumbir ante a um golpe de Estado que desfechou as

instituições democráticas. Um verdadeiro retrocesso institucional.

72 Machado. Raul Horta. Curso de Direito Constitucional, p. 52/3. 73 idem ib,p. 53/54.

60

5.5 A Constituição de 1937

É considerada como a máscara do poder, ou seja, uma Constituição

utilizada e feita ao detentor do poder. A competência para legislar era ato privativo

do Presidente da República, sem qualquer respeito às garantias fundamentais.

Foi o mais puro exercício do autoritarismo pelo chefe do governo, que

até para reformar decisões judiciárias tinha competência. Confundia-se no mesmo

poder instituído, o poder executivo, todos os demais poderes, legislativo e

judiciário.74

5.5 A CONSTITUIÇÃO DE 1946

A Carta Política que veio restaurar os valores democráticos, pode-se

dizer que fora uma forma de ratificar a Constituição de 1934. Alargou os limites da

proteção do Estado, reverteu a divisão dos poderes nos padrões democráticos.

Conservou o federalismo, presidencialismo e regime democrático. Além de garantir a

inviolabilidade dos direitos fundamentais. Completou a constitucionalização da

Justiça do Trabalho.

Classificada como Constituição expansiva, contava com 218 artigos, fora

submetida a um profundo processo de revisão, possuiu 21 emendas.

Essas emendas resultaram em um abalo na estrutura da carta política,

como, principalmente, a prática reiterada dos Atos Institucionais que paralisavam os

efeitos das normas constitucionais, ou seja, suspendiam a eficácia da Constituição.

74 idem ib p. 55/6.

61

Essa prática destruiu a Constituição de 1946, que fora fruto de um

amadurecimento constitucional. Os Atos Institucionais se sobrepuseram à

Constituição de forma que esta sucumbiu como obra de equilíbrio político.

5.6 AS CONSTITUIÇÕES DE 1967 e 1969

Convocada por Ato Institucional, a Constituição de 1967, não se deu

por poder constituinte, uma assembléia baseada na vontade popular. Foi, antes de

qualquer coisa, uma forma encontrada para solucionar, em curto prazo, a

desorganização que se encontravam as normas constitucionais esparsas entre um

ato institucional e nas Emendas constitucionais.

Assim, a Constituição de 1967 teve como poder constituinte o próprio

Congresso Nacional por ato convocatório do Presidente da República. O Brasil era

comandado por militares, que governavam por Atos Institucionais. A Carta de 1967

deu mais poderes a União e ao Presidente da República através da emenda

constitucional número 1 outorgada pelos Ministros da Marinha e Aeronáutica para

governar 75

Teve duração muito curta, e por meio do Ato Institucional n. 5 de 13 de

dezembro de 1968 rompeu com a ordem constitucional vigente. E por meio de uma

emenda constitucional, outorgaram a Constituição de 1969, que fora modificada por

outras 25 emendas, e que cabalmente a emenda de número 26 convocou a

Assembléia Constituinte de 1987, um ato político com o intuito de reformar o sistema

político brasileiro76

75 Idem ib, p. 54/5 76 Ferraz Junior, Tércio Sampaio, 48/9.

62

6. A REDEMOCRATIZAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO DE 1988 6.1 CIRCUNSTÂNCIAS DE ELABORAÇÃO DA MAGNA CARTA

O presente capítulo tratará dos momentos mais significantes acerca da

elaboração da Magna Carta de 1988. De como nasceu a idéia de uma Nova

Assembléia Constituinte levando em conta as circunstâncias históricas bem como a

crítica que sofreu a Constituição.

Vigia no Brasil até a data de 5 de outubro de 1988 a Constituição de

1969, que segundo a crítica doutrinária77 tratava-se apenas de uma emenda à

Constituição de 1967, que por sua vez possuía um cunho autoritário que cedia mais

poderes a União, dominava o país um comando militar. A governabilidade era

praticamente realizada por meio dos Atos Institucionais, e com a edição do Ato

Institucional n. 5 rompeu com a ordem constitucional, estabeleceu um acentuado

exercício do poder antidemocrático.

A sociedade trava para uma luta em busca do retorno à liberdade,

assim em 1982 houve as eleições para governadores e a população embuída no

espírito político manifestou-se em prol das eleições diretas, que tinha o famoso

slogan: diretas já!

77 Ferraz Junior, Tércio Sampaio. Op. Cit .p. 88.

63

Em 1984, foram instaladas as eleições para Presidente, que seria a

última eleição indireta a para a escolha do chefe do poder executivo. É lançada a

candidatura de Tancredo Neves, então governador de Minas Gerais.

A ideologia dominante na população era livrar-se do que chamavam de

“lixo autoritário” que se tornou praticamente um axioma, tomou forma incontestável

para a necessidade de modificação do sistema78.

Vale salientar que, supunha a população que o problema do Brasil

residia na eleição indireta do presidente, este era o maior dos males da República

no entendimento geral.

Nessa conjuntura, em 15 de janeiro de 1985 foi eleito indiretamente

para Presidente da República Tancredo Neves e para Vice-Presidente José Sarney.

Na véspera da data marcada para a posse faleceu o Presidente eleito, arrasando

todo o país.O medo e a insegurança da continuidade de um regime autoritário

pairaram no seio da população uma vez que o Vice-Presidente demonstrava grande

simpatia pelo regime militar, tendo sempre militado a favor daquele regime.

Entretanto, para a surpresa de todos, o Vice-Presidente da República

enviou ao Congresso Nacional a proposta de emenda constitucional n. 43

convocando uma Nova Assembléia Constituinte. Segue a transcrição do documento

por entender a importância histórica:

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N. 43 DE 1985, Convoca a Assembléia Nacional Constituinte. Art. 1º. Os membros da Câmara dos deputados e do Senado Federal, sem prejuízo de suas atribuições constitucionais, reunir-se-ão unicameralmente em Assembléia Nacional constituinte, livre e soberana, no dia 31.08.87 na sede do Congresso Nacional. Art. 2º. O presidente do Supremo Tribunal Federal instalará a Assembléia Nacional Constituinte e dirigirá a sessão de eleição de seu presidente. Art. 3º. O projeto de Constituição será promulgado no curso da primeira sessão legislativa da 48ª Legislatura, depois de aprovado, em dois turnos de discussão e votação, pela maioria absoluta dos membros da Assembléia Nacional Constituinte.

78 Barroso, Pérsio Henrique.Constituinte e Constituição, p. 89.

64

É esse é o texto da proposta de Emenda à Constituição que se tornou

a Emenda constitucional n.26, que convocou a Assembléia Nacional Constituinte.

Nesse momento foca-se a aberração escondida por detrás dessa

convocação. A Constituição Cidadã de hoje, não foi elaborada por uma Assembléia

Nacional Constituinte exclusiva, como em tese, se conhece a teoria do

constitucionalismo. Foi adotada pelo Presidente da República a Assembléia

Nacional Constituinte Congressual, ou seja, aqueles que já compunham o

Congresso Nacional, como representantes do povo e dos Estados, agora também

“sem prejuízos” como consta no texto oficial, exerceriam o papel de poder

constituinte originário.

Fato eivado de críticas, a sociedade como um todo reagiu à decisão

negando-a. Não houve concordância acerca da idéia de se ter uma Constituição

elaborada pelos mesmos formadores do congresso já existente, e vale ressaltar,

conivente com o regime anterior.79

A propugnação por uma assembléia exclusiva moveu diversos setores

da sociedade, GODOFREDO TELLES JÚNIOR, em carta enviada ao Presidente da

República e ao Congresso Nacional exterioriza a indignação dos juristas à época,

vejamos:

Partimos da afirmação que Poder Constituinte não é poder legislativo, em conseqüência, sustentamos que o Poder Legislativo não pode ser promovido a Poder Constituinte. Em outras palavras: não pode o Congresso Nacional ser convertido em Assembléia Nacional Constituinte. O ato que o fizer é arbitrário e ilegítimo. Queremos lembrar que o Poder Legislativo é poder constituído. Constituído por um poder constituinte originário, e este é o poder-fonte: dele é que derivam os demais poderes80

Com brilhantismo que o jurista supracitado defende a verdadeira

democracia, veemente em acreditar que o poder constituinte originário, só será

legitimo se for exclusivamente para esse fim.

79 Corrêa, Oscar Dias. Contribuições Críticas à Constituição de 1988, p. 27. 80 Godofredo Telles Junior apud Herkenhoff, João Batista. Como participar da constituinte. P. 59.

65

Assim,foi votada e aprovada a nova emenda constitucional com termo

inicial em 1º de fevereiro de 1987. Porém, até que se organizasse a Assembléia

Nacional Constituinte foi estabelecida a Comissão Provisória de Estudos

Constitucionais, também conhecida como a Comissão dos Notáveis, composta por

50 juristas e presidida por Afonso Arinos de Melo Franco, cuja missão era elaborar

um anteprojeto para a Constituição.81

Instalados os trabalhos, a marca predominante para a nova ordem

constitucional era a de romper completamente com o sistema anterior, de forma que

as comissões e subcomissões permitiram a adoção de uma linha ideológica voltada

para a reforma institucional do país.

Entretanto, a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, que,

vale ressaltar teve participação popular maciça por meio das audiências publicas,

não foi adotada como texto base. A elaboração da Constituição resultou dos relatos

e idéias das subcomissões. [vide anexo]

A compilação inicial da Constituição resultou em 551 artigos, que por

tamanha aberração fora apelidada de Frankestein.82

Sucederam-se as emendas, sem homogeneidade, e uma longa e

exaustiva discussão acerca do projeto deixou o povo, antes em polvorosa,

entediado, incrédulo, até que se chegasse ao texto final. O que resultou em um

enorme alívio, visto que atingiram o objetivo a que se propuseram: romper com a

ordem anterior, sensação de alma lavada, em palavras coloquiais.

6.2 CRÍTICAS À ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE

Após a longa e exaustiva espera pela Nova Constituição, o Brasil está

frente à revolucionária Constituição Cidadã, longa, prolixa, detalhada. Elaborada sob

81 Corrêa, Oscar Dias. Op. Cit. p. 59. 82 Idem ib, p. 59.

66

a cúspide da transição, aliás característica das constituições brasileiras. O

constituinte elaborou um documento que afastava qualquer espírito da ordem até

então vigente.

A ausência de uma linha ideológica que formasse a unidade da

Constituição resultou na enorme quantidade de dispositivos dependentes de

regulamentação, ante a complexidade que tentou o constituinte acobertar pela lei

constitucional83.

A amplitude e minudência da Constituição é outro aspecto a ser

analisado. Exterioriza a pretensão de se regular tudo e prever todas as

possibilidades, incluiu no texto matérias que sempre foram de ordem de leis

ordinárias.84

Resultou, assim, a Magna Carta de 1988 em 250 artigos, mais de

setenta Atos das Disposições Constitucionais Transitórias [muitas perduram até

hoje], e atualmente com 52 Emendas constitucionais, sem, contudo, esquecer-se da

quantidade de dispositivos que até no ano de 2007 ainda não foi regulamentado a

rogo do constituinte.

Outra análise que merece um breve comentário diz respeito ao caráter

acentuadamente programático de muitos dispositivos. Sem a força obrigatória

necessária para a obtenção de eficácia, volta-se para o pressuposto que parece

integrar a cultura jurídica do país: o fetichismo da lei. É como se no Brasil bastasse a

edição de uma lei para que a solução a um problema seja efetivo. Tentou o

constituinte regulamentar todas as áreas da vida em sociedade pela disposição

normativa para trazer a ordem.85

Vale dizer que, com a promulgação da Constituição em 5.10.1988 o

Brasil estava livre do viver em um sistema autoritário. Porém, estava aos poucos

instalando a intranqüilidade, a insegurança no país, e os fatores podem assim ser

83 Barroso, Pérsio Henrique. Op. Cit. p. 74. 84 Côrrea, Oscar Dias. Op. Cit. p. 60-63 85 Idem ib. P. 65-68.

67

conhecidos: a) a prolixidade constitucional; b) a enorme gama de matérias

programáticas a depender de regulamentação; c) e a sucessão de eleições, neste

momento diretas, de 1988,1989,1990 e 1992, sem, contudo, esquecer da anunciada

revisão constitucional após cinco anos. O plebiscito república- monarquia e

parlamentarismo-presidencialismo com data marcada para 1993.

Nessa esteira, surge o questionamento sobre como se elabora e

promulga uma carta constitucional com tantas dúvidas de cunho geral, nacional e

por que não dizer internacional, como os fatores acima citados, sem perguntar aos

maiores interessados, o povo? Sem se passar pela aprovação. Aceitação expressa

da população?

Nasce daí a celeuma que se torna a Constituição. Por um lado há a

Constituição que é um exemplo para toda a comunidade internacional, e de outra

sorte abre-se a fonte da insegurança jurídica.

Inicia-se uma árdua tarefa de se chamar a Constituição à realidade, de

fazê-la eficaz. A Assembléia Nacional Constituinte se entendeu soberana e tudo

tentou solucionar, de forma que os efeitos eram ainda desconhecidos, Oscar Dias

Corrêa, dois anos após a promulgação da Constituição previu dois riscos:

Ou não durará ele, íntegro, retalhando-se em emendas que o modificarão em muitos pontos, menos suscetíveis de prender-se a fórmulas constitucionais, e sua revisão começará em breve, com a alteração da realidade, tão logo lhe repugne a fórmula que prende; “Ou, para permanecer íntegro, será desprezado, em muitos pontos, esquecidos, caírá em desuso, “não pegará” – como se diz de muitas leis, no Brasil - e será o princípio do fim, perdida a credibilidade do texto 86

O citado autor com propriedade e procedência previu o ingresso de

emendas no ordenamento constitucional, e a conseqüência clara: a instabilidade.

Também vale dizer que a segunda hipótese em muitos momentos na experiência

constitucional brasileira desde 1988 também se tornou real.

86 Op. Cit., p.23, 1991.

68

Não acostumaram a defender a Constituição, tampouco a aplicação

eficaz, sempre que se quer realizar um plano de governo, absurdamente, muda-se a

Constituição.

69

7. REFORMA CONSTITUCIONAL

O fenômeno do constitucionalismo escrito, inaugurado pelos Estados

Unidos da América em 1787 ao editar a Lei Suprema que regerá a Nação, tem por

pressuposto que esta perdurará no tempo indefinidamente.

Partindo dessa premissa, a Constituição em si, envolve vários fatores

que dependem de atualização para que haja uma ponte entre o papel escrito e a

realidade, e dentro desse contexto a reforma constitucional ganha destaque e foca-

se como objeto central desse estudo.

As primeiras técnicas de rigidez à mutação da Constituição foram

introduzidas pela revolução francesa, na tentativa de se tutelar a grande conquista

burguesa. Os países latinos aderiram à idéia de Constituição durável rígida e

intangível em determinadas normas de conteúdo, portanto, a idéia de supremacia

passa a repousar na criação de um processo mais dificultoso, para modifica - lá. 87

Surge assim, um sistema normativo para realizar as mudanças na

Constituição, acrescentar ou corrigir pequenas falhas no texto constitucional.

Vale salientar que a reforma constitucional que não se confunde com

mutação constitucional. É ponderoso a distinção. Segundo JOSÉ AFONSO DA

SILVA 88reforma constitucional diz respeito à alteração formal das constituições

rígidas, por meio de órgãos competentes para tanto instituídos pelo poder 87 Silva, José Afonso. Op. Cit p. 74 88 Idem ib. P. 45.

70

constituinte originário, que é o poder constituinte derivado, ao passo que, mutação

constitucional implica uma mudança não formal da Constituição rígida por vários

fatores, como: interpretação judicial, alterações empíricas sociológicas, tradição,

costume. Operando rumo à evolução, o que demonstra a insatisfação ante a Carta

vigente.

Do ponto de vista formal a alteração à Constituição pode-se dar de

duas formas, a saber: a emenda à Constituição e a revisão constitucional.

No Brasil, ambas são ou já formam utilizadas. Na promulgação da

Constituição de 1988, o artigo 3º dos Atos das Disposições Transitórias

Constitucionais institui a obrigação de se realizar a Revisão Constitucional, em cinco

anos a contar da promulgação da Constituição. E, no capítulo que trata do processo

legislativo, incluiu as emendas à Constituição como o processo cabível e próprio à

alteração da Constituição.

7.1EMENDAS À CONSTITUIÇÃO

7.1.1 Conceito

A Emenda à Constituição está prevista no sistema constitucional

brasileiro como forma de alteração. Essa alteração pode ser aditiva, extintiva ou

mesmo revogadora de normas. Assim partindo do ponto que a Carta Política de

1988, tem como característica a rigidez, e que por sua vez, a supremacia da

Constituição repousa na técnica de sua modificação, conforme lição de José Afonso

da Silva89 o sistema brasileiro tem como critério de alteração as emendas, que

consubstanciam-se em um método mais dificultoso de aprovação, no que diz

respeito à votação, pois a elaboração é simples.

89 Idem, ib p. 65.

71

7.1.2 HISTÓRICO

Desde a outorga da primeira Constituição brasileira, a Constituição

Imperial de 1824, houve a previsão de alteração da Constituição. Primeiramente, a

Constituição de 1824 era semi-flexível, pois a sua alteração podia realizar se por

modos ordinários, reservando apenas as matérias intangíveis.

A primeira Constituição Republicana de 1891, utilizava o termo

reforma, contudo, o procedimento era de emenda, e assim surgiram as primeiras

cláusulas pétreas.

A Constituição de 1934 alargou o poder de reforma e inseriu as duas

modalidades, a Emenda à Constituição e revisão constitucional, e delimitou assuntos

que não poderiam ser objetos de deliberação. E distinguiu as matérias a serem

modificadas via Emenda Constitucional e via revisão. A esta última caberia as

discussões acerca da estrutura jurídica do país, a tripartição dos poderes, a

coordenação dos poderes, declaração dos direitos, defesa do Estado, sistema

proporcional de votação, e voto secreto. Os demais Assuntos poderiam ser tratados

por Emendas constitucionais90.

A Constituição de 1937 inseriu a competência do Presidente da

República para propor Emendas à Constituição, e seria votado em sessão

unicameral, que caso fosse rejeitada pelo Congresso Nacional seria submetida a um

plebiscito popular.

Com o advento da redemocratização de 1946, a iniciativa das

emendas retorna às mesas do Congresso Nacional e instituíram-se as cláusulas

pétreas.

Com o golpe de 1964, e a outorga da Constituição de 1967 a iniciativa

às Emendas constitucionais volta a ser concorrente sempre votada pelo Congresso

90 Bonavides, Paulo. Curso de Direito Constitucional, p. 35-37.

72

Nacional em sessão unicameral. Vale salientar, que na vigência dessa Constituição,

as emendas à Constituição constituíram verdadeiras armas para o alargamento do

poder ditatorial, que de emenda em emenda transformou a Constituição em uma

carta de submissão do povo brasileiro.

Finalmente, a Constituição de 1988 manteve a Emenda à Constituição

como via de modificação, preservando as cláusulas pétreas e com procedimento

previamente instituído pela própria Constituição, esculpido no artigo 60 e parágrafos.

7.1.3 PROCEDIMENTO

A Emenda à Constituição tem o procedimento bastante simplificado. A

iniciativa disposta no art. 60, rol taxativo:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;

II - do Presidente da República;

III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.

Entretanto a discussão que se toma em torno da iniciativa da

proposição de Emendas à Constituição tomam proporção significativa, no que diz

respeito à participação popular quanto ao uso dos institutos de referendo e

plebiscito.

Igualmente, há quem entenda como Ilustríssimo José Afonso da Silva,

que por meio de uma interpretação sistemática é plenamente possível à adoção

desses institutos no que se refere à aprovação de emendas pelo povo. Busca

respaldo à sua teoria, no artigo 1º da Constituição Brasileira, ao preceituar que todo

poder emana do povo, e em seu nome será exercido.

73

A alteração da Constituição deveria ser um rito, já que é essa a lei

suprema capaz de regulamentar a vida de todos os que vivem sob sua guarda, e o

que se vê, no entanto, é a profusão de Emendas à Constituição, há emendas que

até alteram o que já houvera sido alterado, o que demonstra a profunda falta de

sentimento constitucional, e o agravamento junto à sociedade, que ocorre no

momento em que o cidadão, titular da soberania, fica alheio a discussão acerca das

Emendas Constitucionais, este fator abala a estrutura democrática[ainda que parece

imperceptível], e a adoção da participação popular nessa matéria seria uma forma

de resgatar o valor democrático, de se reinstalar desenvolver e concretizar os

princípios da soberania popular e segurança jurídica como fundamento do Estado

Democrático de Direito.

Após a iniciativa, em projeto escrito, daqueles elencados no rol acima,

passa-se à fase de tramitação, que passa à discussão e votação em cada das casas

que compõe o Congresso Nacional. As discussões se dão em dois turnos

obrigatoriamente, assim, é remetida a casa revisora após a segunda votação na

primeira casa. Considera-se aprovado o projeto de emenda à Constituição aquele

que obtiver três quintos em cada casa.

Depois de votada e aprovada, segue a fase de promulgação da

Emenda à Constituição. A competência para a promulgação é sempre das mesas da

Câmara Federal e do Senado Federal. Vale ressaltar que no processo legislativo de

emenda à Constituição inexiste a possibilidade de sanção ou veto do Presidente da

República91.

91 Lenza, Pedro. Direito Constitucional, p. 33.

74

7.2 A INTANGIBILIDADE DA CONSTITUIÇÃO

A idéia de Constituição que se conhece é a de que este documento,

haja vista da importância de sua existência foi feito para durar no tempo.92 Assim,

para assegurar a durabilidade da Constituição e, via reflexa, assegurar a supremacia

e estabilidade do Estado de Direito, houve por bem organizar a defesa contra

mudanças arbitrárias no Texto Maior, por meio de um processo dificultoso, a

Emenda Constitucional.

Desta feita, o poder constituinte originário instituiu o poder constituinte

derivado com a finalidade precípua de exercer legitimamente os atos legais e

necessários à alteração da Constituição.

Entretanto, esse poder constituinte derivado não é absoluto, sofre

limitações. Essas limitações correspondem diretamente com a tangibilidade da

Constituição, vale dizer, aquilo que seja objeto de plausibilidade e compatibilidade

com a mudança, sem contudo, alterar a estrutura do Estado e as conquistas

democráticas.93

No sistema brasileiro são reconhecidas duas formas de se estabelecer

a mudança, a primeira é a revisão constitucional, prevista no art. 3º dos Atos e

Disposições Transitórias Constitucionais, que tinha realização marcada a partir de

cinco anos a contar da promulgação, realizada a revisão, resultou em seis emendas

de revisão, que passaram a integrar a Constituição. Foi nesse único momento que o

poder constituinte originário previu a hipótese de realização de revisão

constitucional, e deixando ao poder constituinte derivado o uso das Emendas.

A intangibilidade da Constituição decorre da sua permanência para

servir à estabilidade e da necessidade de proteger a Constituição, bem como as

instituições democráticas. Ao vedar que o poder constituinte derivado intente

92 Bonavides, Paulo. Curso de direito Constitucional , p. 22. 93 Machado, Raul Horta. Direito Constitucional, p 70-2.

75

modificar determinadas disposições constitucionais denominadas de cláusulas

pétreas, está se determinado o que é intangível pelos poderes constituídos.94

É de fato, muito acertada a escolha do poder constituinte originário de

limitar e instituir a intangibilidade da Constituição, pois mesmo ante a crise e sob a

interrupção da vigência por força alheia à vontade popular, a intangibilidade da

Constituição corresponde à sua continuidade, de forma que não se poderá abolir, ou

transformar, qualquer estrutura do Estado sem que se tenha que interferir na Carta

Política. As matérias consideradas intangíveis estão dispostas no § 4º da

Constituição Federal, a saber:

4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a

abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais

Todos os itens acima elencados não poderão ser objetos de

deliberação, dentro do Estado de Direito, sob nenhuma hipótese.

7.3 AS EMENDAS CONSTITUCIONAIS NO ORDENAMENTO BRASILEIRO

O presente capítulo tratará brevemente acerca das Emendas

constitucionais que sofreu A Constituição do Brasil. A Constituição da República do

Brasil promulgada em 5.10.1988 conta até o mês atual com 53 emendas aprovadas

e promulgadas pelas mesas do Senado Federal e Câmara dos Deputados Federais.

No corrente ano de 2007 ainda não foi promulgada nenhuma, apesar de tantas em

tramitação.

94 Idem ib., p. 72

76

O que se observa nas Emendas constitucionais, é que várias são as

modalidades utilizadas pelo poder constituinte derivado. Há emendas que alteram os

Atos das Disposições Constitucionais Transitórias repetidamente, com se percebe

pela leitura da ementa a seguir:

Emenda Constitucional 10 de 04 de março de 1996, altera os artigos 71 e 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, introduzidos pela Emenda Constitucional de Revisão. Emenda Constitucional de 22 de novembro de 1997 altera os artigos 71 e 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, introduzidos pela Emenda Constitucional de Revisão.

Observa-se que um dispositivo, constantes no artigo 71 e 72 foi

inserido no texto constitucional na parte que corresponde ao ADCT, Atos das

Disposições Constitucionais Transitórias, por uma Emenda Constitucional de

Revisão no ano de 1993. Três anos depois, o poder constituinte de outra sessão

legislativa modificou o mesmo dispositivo que foi inserido, e um ano e oito meses

depois, aquela alteração realizada em um dispositivo, que em tese seria transitório e

que, entretanto, não foi previsto pelo constituinte originário, foi alterado novamente

por meio da Emenda à Constituição.

Desta feita, torna-se forçoso concluir que esta Emenda não obteve

êxito em nenhum momento de sua vigência, haja vista a necessidade de sua

alteração constante que resulta aquela matéria especifica em uma matéria instável.

Aqueles que são diretamente afetados pela normatização estão sempre sujeitos à

próxima mudança.

Resta saber qual é a natureza das Emendas Constitucionais, qual é o

seu objetivo? Qual é, também o objetivo dos componentes do Congresso Nacional

ao emanar Emendas Constitucionais referentes a matérias que poderiam ser objeto

de lei ordinária?

Difícil resposta, quiçá impossível. As conclusões que se pode ter

acerca do uso indiscriminado das Emendas Constitucionais são apenas do resultado

dos efeitos destas no seio da sociedade. O que se percebe facilmente, é a

instabilidade jurídica e política causada pelas emendas, em especial no que tange

77

às reformas estruturais como a tributária, política, previdenciária e até econômica

que o País já deveria ter realizado.

Estas também são objetos de Emendas constitucionais, e são as que

realmente deveriam ser realizadas, mas são sempre preteridas por matérias de

ordem vazias e inócuas no que dizem respeito à efetividade constitucional para a

população.

[Vide anexo.]

7.4 A PARTICIPAÇÃO POPULAR COMO FONTE LEGITIMADORA DAS EMENDAS

NO BRASIL

O Estado Democrático de Direito brasileiro tem como fonte do poder o

povo, como preceitua a Constituição Federal de 1988. Esse exercício do poder se dá

indiretamente por meio do sistema representativo. Ao poder legislativo brasileiro é

dado a faculdade de reformar a Constituição. Porém, em uma analise jurídico-

politico acerca das mudanças, nota-se que o povo, que é o titular do poder

constituinte, como já ressaltado nesse trabalho, não exerce seu poder no que tange

à reforma constitucional. É dizer que a alteração constante que sofre a Magna Carta

desloca a origem do poder constituinte.

A classe política brasileira nega essa possibilidade ao povo, apesar da

própria Constituição prever a participação política do povo no processo legislativo. O

art. 14 da Magna Carta prevê o uso dos institutos do plebiscito – que tem o condão

de aprovar a priori a elaboração de determinada lei. Ao passo que o referendo

consiste na aprovação popular após a aprovação parlamentar vinculando o

legislador. Ambos os institutos forma utilizados no Brasil apenas uma vez: o

plebiscito de 1993 - para tratar da escolha da forma e sistema de governo e o

referendo em 2006 para referendar a lei que tratava sobre o Estatuto do

Desarmamento.

78

Aponta-se uma incoerência no que diz respeito à participação popular

e a promulgação de leis no Brasil. A própria Constituição, apesar de ser uma

proposta, passou por um referendo, tampouco passaram quaisquer das 53 emendas

vigentes no Brasil. As disposições acerca das mudanças constitucionais formais se

dão em um aspecto de mistério, pouco divulgado. Isso põe o cidadão, o verdadeiro

titular deste poder, em condição de ignorância. Não se leva o cidadão para o debate.

Assim, a adoção de participação popular como fase legislativa das

emendas seria uma forma de resgatar a idéia de soberania do povo, e de exercício

da democracia. Pois, pergunta-se: quando o cidadão exerce a democracia? De dois

em dois anos em períodos eleitorais. A democracia brasileira acaba por se perder.

O mais apaixonante dos constitucionalistas democratas do mundo,

PAULO BONAVIDES, acerta mais uma vez, corroborando essa afirmação: Em verdade, as instituições sairiam da consulta populares mais limpas, o regime mais fortalecido, o País mais democratizado, a Constituição mais obedecida e a soberania popular mais respeitada. Democracia restituta! Eis o caminho, eis a meta. Eis a bandeira que se insculpe no parágrafo único do artigo 1º da Constituição, ou seja, por via do plebiscito, do referendo, e da iniciativa popular. Poder implícito, que não consta do art. 60, mas nem por isso deixa de existir! 95

Nosso ilustríssimo mestre deixa claro que apesar de o poder

constituinte originário não explicitar a participação popular no que tange ao processo

legislativo de alteração constitucional, este é plenamente possível na medida de

uma interpretação lógico-sistemática, em que a conclusão que o poder emana do

povo é a de que este apenas delega a faculdade legislativa ao representante. O

povo pode de forma contundente aprovar o que se faz em seu nome.

Inconstitucional é o povo estar ausente da condução decisória de seu

próprio País. O momento de se emendar a Constituição é a hora mais correta de

legitimar as alterações constitucionais por meio do povo, somente o povo pode

conferir esse efeito legitimador. 96 Ademais, a proposta de participação popular

alargaria a democracia e encerraria as mudanças constitucionais casuísticas

responsáveis pela desordeira instabilidade jurídica do Brasil.

95 Constituição Aberta, p. 278. 96 Idem ib, p. 275-278.

79

8. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURIDICA E A INSTABILIDADE 8.1 CONCEITO DE PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

A partir da metade do século XIX, o Estado, com a intervenção da

nova doutrina do Estado social em contraposição ao Estado Liberal, passa a ser

considerado como Estado de Direito, que quer significar a ação direta do Estado

realizar as garantias democráticas e humanas a que se propõe.

Sem embargos acerca da afirmação acima, o Estado de Direito tem

como fundamento o princípio da segurança jurídica com o escopo de estabilizar as

relações jurídicas, uma vez, que é o Direito o meio idôneo para regular as relações

entre os sujeitos.

Nessa vereda, o princípio da segurança jurídica se encontra pelo texto

constitucional em vários setores, tutelando vários interesses. É considerado como

um sobre princípio sendo limitado apenas, pelo princípio da justiça.97

Portanto, é óbvio reconhecer que o homem, ao viver em sociedade,

necessita de segurança e estabilidade para planejar e desenvolver a própria vida de

seus familiares, bem como das futuras gerações. É pacífico reconhecer que cabe ao

97 Costa, Judith Martins, in: a re-significação do princípio da segurança jurídica, p. 111.

80

Estado promover tal segurança. Com rara maestria o raro doutrinador lusitano

expõe98

Partindo da idéia de que o homem necessita de certa segurança para conduzir e planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida, desde cedo se considerou como elementos constitutivos do Estado de Direito os dois princípios seguintes: a) Princípio da segurança jurídica; b) Princípio da segurança do cidadão.

Esses dois princípios demonstram a necessidade de concatenar material

e formalmente a faculdade legislativa. É dizer que as leis devem preencher duas

idéias bem límpidas e volumosas, qual seja: a lei deve ser determinada, clara e

densa, e a proteção da confiança que corresponde à exigência, mesmo que implícita

dos cidadãos, em se ter leis estáveis e que apresente uma calculabilidade mínima

em relação aos efeitos jurídicos.99.

Pois, se assim não o for, o processo legislativo em linhas gerais não

cumprirá a função social de alicerçar as decisões pessoais dos cidadãos, bem como

a fiscalização em relação à atuação parlamentar. Conclui-se que o princípio da

segurança jurídica, inserto na Magna Carta, confere ao jurisdicionado a não

modificação da situação concreta, por ação legislativa casuística.

Por seu turno, o princípio da segurança jurídica alcança três aspectos:

como princípio, como valor e como direito fundamental. Acerca do aspecto de

princípio, a segurança jurídica implica a garantia prometida pelo Estado em

assegurar a segurança consoante texto preambular.

Acerca da segurança jurídica como valor, busca-se respaldo na teoria

de HESSE que consubstancia o princípio da segurança jurídica como valor

indissociável da justiça. É afirmar que uma condiciona a outra. Assinala o autor a

pretensa eficácia da Constituição somente pode ser realizada se se levar em conta

essa realidade 100 .

No tocante a segurança jurídica sob o aspecto de direito fundamental

que vem explicitado no texto constitucional no art. 5º, caput, Essa inserção diz

98 Canotilho,. Op. Cit. 375 99 Canotilho,. Op. Cit .p. 375-6 100 Hesse, conrad. Op. Cit. P. 24.

81

respeito ao princípio da segurança jurídica em sentido estrito, o de não prejudicar

ato jurídico perfeito, coisa julgada e direito adquirido.

Vencido o momento conceitual acerca do princípio da segurança,

adotar-se-á este princípio no sentido lato para englobar, além daqueles três

aspectos supra, a necessidade que tem o homem de viver em estabilidade e

segurança, com o escopo de executar aquilo que Canotilho explanou como

segurança.

8.2 MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL E INSTABILIDADE

Não se pretende concluir que pelo princípio da segurança jurídica as

normas não mudarão, jamais. “Mas a segurança não é imutabilidade, pois esta é da

própria morte. A vida rege-se pelo movimento, que é próprio do de tudo o que vive.” 101. O que a sociedade clama é apenas a certeza jurídica, a certeza do direito, que

pode ser tida como o entendimento intersubjetivo pessoal do destinatário da lei.

Assim, pode se concluir, não axiomaticamente, que a segurança jurídica proporciona

ao destinatário a certeza do direito. Pois a desordem impossibilita esse

reconhecimento, para assim se chegar à justiça. Mais uma vez corroborando a idéia

de ordem e justiça, avessa a instabilidade Miguel Reale102 que com maestria ensina:

A idéia de justiça liga-se intimamente com a idéia de ordem. O próprio conceito de justiça é inerente uma ordem, que não pode deixar de ser reconhecida como valor mais urgente, o que está na raiz da escala axiológica, mas é degrau a qualquer aperfeiçoamento ético.

Politicamente falando a democracia moderna remete a um problema

mais severo ainda. Fatores ligados às contradições internas que decorrem do

elemento sobre o qual se apóiam as massas e a hipótese de desvirtuamento do

101 Rocha ,Carmem Lúcia, apud COSTA, Judith Martins, in: a re-significação do princípio da segurança jurídica, p. 111. 102 Filosofia do Direito, p. 61

82

poder por parte dos governantes e legisladores, uma vez que são estes que têm o

controle da função social, daí a desvantagem vivida pelo sistema, a tentação de

utilizar desse poder em favor próprio – o caminho da corrupção e plutocracia – ou

ainda para o caminho do autoritarismo103

Desta feita, a constante alteração constitucional e infraconstitucional

que inflam o ordenamento vigente põe em xeque a estabilidade jurídica e política,

não apenas do país e jurisdicionados, mas também como Estado soberano na

sociedade internacional, que abala a confiabilidade do País em nível sócio-

desenvolvimentista, e, principalmente econômico.

A instabilidade pode culminar até na ruptura do sistema, uma vez que

a hipótese de governabilidade esteja ameaçada ante a abundância de alterações e

edições legais, que enfraquecem o regime democrático, deixando-o vulnerável à

revelias em que se externa o poder. Pode até haver a substituição da Constituição

cidadã, tão sonhada pelo constituinte de 1987.104

Adentrando um pouco mais à seara da mudança constitucional, CARL

SCHIMIT105t elaborou em 1927 a Teoria da Constituição, e por oportuno vale

salientar a classificação que o autor deu às formas históricas de alteração

constitucional. Para o autor, pode haver a mudança “da” Constituição e “na”

Constituição, identificadas da seguinte maneira: destruição da Constituição,

supressão da Constituição, reforma constitucional, quebra da Constituição e

suspensão constitucional.

A supressão e destruição da Constituição são maneiras radicais de

alteração que resulta na substituição da Constituição. Em contrapartida a quebra da

Constituição, reforma da Constituição e suspensão da Constituição são formas de

mudança parcial e, muito embora esta característica, se não for limitada, pode

acarretar na substituição da Constituição.

103 Bonavides, Paulo. Constituição Aberta, p.61. 104 Machado, Raul Horta. Direito Constitucional, p. 102/3 105Schimitt apud Bonavides, idem, p. 13/23.

83

Nessa esteira, ao se proclamar a reforma constitucional como gênero

das quais são espécies a Emendas à Constituição e a Revisão Constitucional, no

caso em tela, qual seja, as emendas à Constituição de 1988, trata-se obviamente de

um limiar muito tênue no que diz respeito ao limite que o autor supra se refere106.

A par disso, vale salientar que as reformas de que tratam as emendas

deste estudo correspondem a Constituição como a decisão de conjunto sobre o

modo e a forma de exercício político-organizacional, leis constitucionais são as leis

que não imprimem as características do Estado e que, no entanto, encontram-se no

corpo da Constituição.

No caso brasileiro as duas categorias da classificação segundo o autor

são modificadas por meio das emendas, salvo as limitações materiais, quais sejam:

as cláusulas pétreas elencados o artigo 60 § 4º da Constituição Federal. Mister se

faz ressaltar que as mudanças são necessárias na medida da observância fática, eis

o motor da evolução do direito, para alcança o fim da auto regeneração,

autoconservação.

8.3 SENTIMENTO CONSTITUCIONAL

Convém ressaltar que se torna insuficiente para a durabilidade de uma

Constituição estável a edição de normas dificultosas às emendas. Mais do que isso,

é necessário a adoção de um sentimento constitucional.

E este sentimento constitucional revela-se no acatamento e valorização

da Constituição pela população em geral. Vale lembrar que não basta o mundo

jurídico para conduzir a Constituição à supremacia e imperatividade. É necessário,

antes de tudo, a adesão que gera na alma da Nação o amor e obediência

constitucional.

106 Machado, Raul Horta. Op. Cit.p. 102.

84

Seara um tanto quanto parcial em se falar de obediência e sentimento,

KARL LOWENSTEIN107 diz que a Constituição de valoriza na medida em que

favorecer mudanças na estrutura social sem alteração do processo político. 108

Pode-se atribuir o sucesso e estabilidade das constituições Norte

Americana, Holandesa, dentre outros países nórdicos, a mínima quantidade de

Emendas à Constituição, de forma que há, no seio da população o prestígio da

Carta Magna.

Ainda, assinala o autor alemão, que a validez da Constituição é

diretamente condicionada ao existencialismo político que reporta à crítica

sociológico- filosófica, ou seja, com diferença popular, o conhecimento e o respeito à

Constituição acaba por torná-la válida.O contrário, todavia, opera a substituição da

estabilidade pela fragilidade 109.

Para o autor alemão, qualquer mudança na Constituição, ainda que de

natureza técnica resulta na depreciação do sentimento constitucional, há um vínculo

moral entre os homens e as instituições, é sobre este vinculo que se apóia o

sentimento constitucional.

RAUL HORTA MACHADO, em referência a LASSALE, adverte que a

ausência e presença da estima constitucional acarreta duas possibilidades

respectivamente, a Constituição folha de papel e a Constituição verdadeira e real.

Aquela se transforma em objetos de fragmento do poder, povoado de pluralidade de

idéia, ao passo que esta comunga junto à sociedade a correlação das forças reais

do país. Afirma o autor

Não é a Constituição que controla e institucionaliza o poder, submetendo-os às competências e normas preordenadas. É o poder através de seus fragmentos – o soberano, sua Armada e canhões, a Nobreza, os grandes produtores, os banqueiros e as bolsas – que domina e faz a Constituição.Basta projetar essas relações reais, esses fragmentos, em uma folha de papel, dar-lhes forma escrita e redação jurídica para surgir a Constituição escrita.

107 Lowestein apud Machado Raul Horta Op. Cit.p. 97. 108 Machado, Raul Horta. Direito Constitucional, p. 98. 109 Lowestein apud Raul Horta Machado. Direito Constitucional p. 98.

85

Capcioso, no entanto, afirmar que a Constituição não merece

existência, ousa discordar que esta merece toda a estima, porém, dotada de

consciência constitucional junto à sociedade para que não se torne um instrumento

inútil e que sirva apenas aos interesses mutáveis dos fragmentos do poder. O

contrário deve ocorrer, cumpre-nos assinalar que se não houver a defesa de fato da

Constituição, esta servirá de instrumento mitigador da democracia, entretanto, pode

ser a única maneira democrática de se estabelecer um Estado de Direito.

Não se pode perder de vista que, as Constituições latino-americanas,

tomaram uma tendência prolixa, dilatou a Constituição em sentido material,

transformando as Constituições em depósitos de promessas, um tratado para o

futuro. Assim, forçoso é concluir que esse é o fator de grande importância no que diz

respeito à contribuição à instabilidade. 110

110 Burdeau apud Raul Horta Machado, p 98.

86

9. OBSERVAÇÕES AO PROJETO DE EMENDA CONSTITUCIONAL N. 157/2003- DA PROPOSTA DE REVISÃO CONSTITUCIONAL

Tramitou na Câmara dos deputados federais, [mais] uma proposta de

Emenda à Constituição n.157/2003 que convoca Assembléia Nacional Constituinte

revisora. A emenda é motivo de polêmica entre a sociedade política e jurídica e na

sociedade civil como um todo.

Foi apresentado em plenário no dia 4 de setembro de 2003 pelo

Deputado Federal Luiz Carlos Santos Partido Democrata (antigo PFL). Foi enviada a

Comissão de Constituição e Justiça onde permaneceu por aproximadamente 18

meses a espera de um parecer que foi apresentado pelo Deputado Federal Michel

Temer [vide anexo] como favorável à instalação de uma Assembléia Constituinte

Revisora em maio de 2005. O parecer foi aprovado de forma unânime pela comissão

referida.

Foi criada pelo presidente da mesa diretora da Câmara dos Deputados

uma comissão especial de estudos acerca da Revisão Constitucional, no entanto a

comissão passou a funcionar apenas em 25 de janeiro de 2006.

Vale salientar que a proposta de Emenda à Constituição n. 157 nasceu

já com as limitações materiais para a Revisão, termos em que permaneceria

intocável o núcleo do art. 60 da Constituição da República. Urge assinalar os termos

da Convocação: Convoca a Assembléia de Revisão Constitucional e dá outras providências.

87

A mesa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termo do § 3º do artigo 60 da Constituição Federal, promulga a seguinte emenda; Art. 1º será instalada no dia primeiro de fevereiro de 2007. Assembléia de Revisão Constitucional com os membros da Câmara dos Deputados e Senado Federal com o objetivo de revisar a Constituição. Art.2º A revisão Constitucional, consubstanciada em apenas um ato, será promulgada após a aprovação em dois turnos de discussão e votação pela maioria da absoluta dos membros da Assembléia de Revisão Constitucional. Parágrafo único. A revisão Constitucional observará o disposto no § 4º do art. 60, da Constituição Federal. Art. 3º A Assembléia de Revisão Constitucional extinguir-se-á no prazo máximo de doze meses contados da data de sua instalação. Art. 4º Esta emenda constitucional entre em vigor na data de sua publicação.

Em outro parecer em agosto de 2005 o Deputado Federal Michel Temer propõe um texto substitutivo À emenda:

Art. 1º. Será instalada, no dia 1º de fevereiro de 2007, Assembléia de Revisão Constitucional, formada pelos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o objetivo de revisar a Constituição. § 1º. O parlamentar mais idoso instalará a Assembléia de Revisão Constitucional no dia 1º de fevereiro de 2007 e dirigirá a sessão de eleição de seu Presidente. § 2º. A discussão da matéria objeto da revisão será feita no sistema unicameral previsto neste artigo. § 3º. A Assembléia de Revisão Constitucional elaborará o Regimento Interno de seus trabalhos. Art. 2º. A revisão constitucional, consubstanciada em ato único, será promulgada após aprovação do seu texto, em dois turnos de discussão e votação, por maioria absoluta de votos de cada Casa integrante da Assembléia de Revisão Constitucional e de referendo popular a ser realizado no primeiro domingo de junho de 2007. Parágrafo Único. A revisão constitucional observará o disposto na Constituição Federal, art. 60, § 4º e não modificará o seu Título II, Capítulo II. Art. 3º. A Assembléia de Revisão Constitucional terá prazo máximo de 12 meses de duração, contados da data de sua instalação. Art. 4º. A cada dez anos é autorizada Revisão Constitucional nos moldes estabelecidos nesta Emenda Constitucional. Art. 5º. Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação

Muitas foram as mudanças proposta pelo Ilustre Deputado e

Constitucionalista, dentre elas, a mudança do quorum tradicional bicameral para

unicameral previsto no § 2º do art. 1º, o § 3º obriga a Assembléia de Revisão a

elaborar um regimento interno para evitar as dificuldades enfrentadas pela

Assembléia de 1993.

88

O art.2º traz a mudança mais salutar ao instituir o referendo popular para

a aprovação dos trabalhos, o que não existiu na proposta original, conquanto a

aprovação será expressa.

O Deputado relator inclui outra modificação à proposta de Emenda

Constitucional que é a inalterabilidade do art.6º da Constituição que trata dos

Direitos Sociais.

A emenda à Emenda Constitucional também inclui a instituição da

Revisão Constitucional a cada 10 anos.

No congresso Nacional a proposta de Emenda à Constituição provoca

muita polêmica e oposição, vale salientar que as emendas apresentadas após o

parecer do relator são de políticos desfavoráveis à Revisão Constitucional. O

Deputado Federal Henrique Fontana apresentou a primeira emenda ao projeto de

Emenda à Constituição

Art. 1º. Será instalada, no dia 1º de fevereiro de 2011, Assembléia de Revisão Constitucional, formada pelos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o objetivo de revisar a Constituição. §1º. “O parlamentar mais idoso instalará a Assembléia de Revisão Constitucional no dia 1º de fevereiro de 2011 e dirigirá a sessão de eleição de seu Presidente.

Essa primeira emenda apenas modifica a data de instalação da

Assembléia Revisora de 1º de fevereiro de 2007 para 1º de fevereiro de 2011, tendo

por justificativa um maior prazo para a discussão, esta emenda foi rejeitada pela

Comissão Especial.

Uma segunda emenda foi apresentada pelo mesmo deputado: Art. Único

Suprima-se o art. 4º do substitutivo adotado pela CCJC à Proposta de Emenda

Constitucional nº157, de 2003.

Essa emenda foi parcialmente aceita uma vez que o art. Não foi

eliminado, mas transformado na emenda modificativa n. 2

89

Em outro ato, o Deputado Henrique Fontana do PT [partido dos

trabalhadores] ofereceu outra emenda ao projeto, era a terceira emenda, com o

seguinte teor:

Dê-se ao parágrafo único, do art. 2º, do substitutivo adotado pela CCJC à Proposta de Emenda Constitucional nº157, de 2003, a seguinte redação: Parágrafo Único. A revisão constitucional observará o disposto no art. 60, §4º, da Constituição Federal e está limitada exclusivamente aos Capítulo III, do Título II; Seção II, do Capítulo V, do Título III; Seções III e IV, do Capítulo VII, do Título III; Seção IX, do Capítulo I, do Título IV; Seção V, do Capítulo II, do Título IV; Seção VII, do Capítulo III, do Título IV; Capítulos II e III, do Título V; Capítulo I, do Título VI e Título IX.”

A tentativa do Deputado foi o de limitar materialmente o alcance da

Revisão Constitucional. De forma que restaria apta a modificações apenas os

capítulos da Nacionalidade, dos Militares, Regiões, Fiscalização Contábil e

financeira e orçamentária, Conselho da República, Sistema Tributário Nacional,

Conselho da Defesa Nacional, Tribunais e Juizes Militares, Forças Armadas e as

Disposições Gerais.

Houve a quarta emenda proposta pelo Psol [partido da solidariedade e

liberdade] é muito rígida quanto à Revisão Constitucional:

Art. 1º. Será instalada, no prazo de até um ano da autorização obtida mediante plebiscito nacional, Assembléia de Revisão Constitucional, formada pelos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o objetivo de revisar a Constituição. § 1º. A instalação da Assembléia de Revisão Constitucional dependerá de autorização do povo brasileiro, mediante plebiscito que será realizado até o dia 31 de dezembro de 2007. § 2º. No plebiscito de que trata o § 1º, os cidadãos brasileiros opinarão se são a favor ou contra a convocação de Assembléia de Revisão Constitucional. § 3º. O parlamentar mais idoso instalará a Assembléia de Revisão Constitucional e dirigirá a sessão de eleição de seu Presidente. § 4º. A discussão da matéria objeto da revisão será feita no sistema unicameral previsto neste artigo. § 5º. A Assembléia de Revisão Constitucional elaborará o Regimento Interno de seus trabalhos. Art. 2º. A revisão constitucional, consubstanciada em ato único, será promulgada após aprovação do seu texto, em dois turnos de discussão e votação, por três quintos dos votos de cada Casa integrante da Assembléia de Revisão Constitucional e de referendo popular. § 1º O referendo de que trata o caput deste artigo será realizado no prazo de até 6 (seis) meses após a aprovação do texto pela Assembléia de Revisão Constitucional.

90

§ 2º A revisão constitucional observará o disposto na Constituição Federal, art. 60, § 4º. § 3º A revisão constitucional respeitará o princípio da proibição do retrocesso, sendo vedadas modificações que visem eliminar, diminuir ou restringir qualquer dos direitos e garantias assegurados pelo texto constitucional atual. Art. 3º. A Assembléia de Revisão Constitucional terá prazo máximo de 12 meses de duração, contados da data de sua instalação. Art. 4º. Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

A proposta do partido tem três pontos fundamentais que são a

exigência de um plebiscito popular para saber se o povo aprova a instalação da

Assembléia Revisora, a incisiva proteção à democracia §3º do art.2º, e a realização

do referendo popular para a aprovação da produção da Assembléia.

Em agosto de 2005 foi apresentado em plenário pelo Deputado

Federal Alberto Goldman a proposta de Emenda à Constituição n. 447 que foi

apensada em 2006 à PEC 157, nos seguintes termos:

Art. 1o Será instalada, no dia 15 de fevereiro de 2007, Assembléia Nacional para Revisão da Constituição, com prazo improrrogável de duas sessões legislativas para conclusão dos seus trabalhos.

Art. 2o Os representantes à Assembléia Nacional para Revisão da Constituição serão eleitos no primeiro domingo de outubro de 2006, para um mandato de dois anos, vedada a eleição para o Congresso Nacional para o pleito de 2010.

Parágrafo único. O número de representantes à Assembléia Nacional para Revisão da Constituição será de um quarto do total de membros do Congresso Nacional e será repartido proporcionalmente à população de cada Estado e do Distrito Federal, garantido, no mínimo, um representante por Estado.

Art. 3o A Assembléia Nacional para Revisão Constitucional promulgará uma única Emenda Constitucional de Revisão aprovada, em turno único de discussão e votação, pela maioria absoluta dos seus membros.

Parágrafo único. A Assembléia Nacional para Revisão Constitucional observará o art. 60, § 4o, da Constituição da República.

Art. 4o Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data da sua publicação.

91

A Emenda à Constituição n. 157 tramitou no ano de 2006 com

realizações de audiências públicas e exposições de grandes juristas como Fábio

Konder Comparato e com o então Ministro do STF Nelson Jobim.

Até o fechamento dessa pesquisa o Projeto de Emenda à Constituição

estava pronto para a pauta.

A Revisão Constitucional é um instituto valioso na busca do

aperfeiçoamento da Constituição. O que não se pode perder de vista é que para a

realização da assembléia revisora dois elementos são essenciais: a necessidade

prevalente e a impossibilidade de se realizar por outro instrumento.

E o que se observa é que a revisão constitucional é realizada pelo

poder constituinte derivado e, portanto limitado, torna forçoso concluir é que

qualquer mudança que poderia ser realizada em sede de Revisão Constitucional

também pode ser realizada via Emenda à Constituição, de forma que a convocação

de uma Assembléia Revisora seria muito custosa ao Brasil.

Vale salientar que ante a atual conjuntura política e ética, a votação do

texto final em sessão unicameral pode ser um passo para manobras políticas

ardilosas de algumas forças partidárias, o que tornaria o trabalho ineficaz e viciado.

Não há registros oficias de convocação de uma Nova Assembléia

Constituinte, exclusiva e determinada. Foi encontrado apenas referências à Revisão

Constitucional e apesar de ser um debate sutil sem a participação da população,

essa possibilidade esta tomando contornos magnos. E, se essa não pode ser a

solução, o que se torna perceptível e que vários setores estão se mobilizando na

busca de tornar o Brasil um país plenamente governável.

Sobre governabilidade é incisivo o comentário de MANOEL

GONÇALVES FERREIRA FILHO111:

111 Constituição e Governabilidade, p. 142.

92

A superação da crise de ingovernabilidade não prescinde, ao invés, reclama, uma nova Constituição. Para estabelecer nova Constituição, não é indispensável nem uma revolução, nem mesmo um golpe de Estado. Deixe-se de lado a teoria do Poder Constituinte, utópica e metafísica, que aponta apenas um paradigma (rarissimamente seguido). Pode o Congresso Nacional fazer agora o que fez em 1985: adotar uma Emenda que, alterando o processo de mudança formal da Constituição, permita o estabelecimento de uma outra. Mas que desta vez sejam os mais sábios os incumbidos de estabelecê-la.

O que se deve manter em mente é a necessidade urgente de

mudanças [seja por meio da revisão ou por uma Nova Constituinte] profundas a fim

de sanar o problema da instabilidade jurídica de maneira contundente exterminando

de vez a insegurança e o caos político, fazendo o Brasil emergir da crise política,

ajustar os erros da Constituinte de 1987 e estabilizar o país, sempre em defesa da

democracia e cidadania.

93

CONCLUSÃO

O modelo constitucional nascido em 1988 teve por objetivo transformar

o país da violência moral causada pelo regime ditatorial, e por essa razão a

Constituição brasileira tomou certas características casuísticas, ou seja, prevê todas

as situações possíveis como se os problemas sociais do país pudessem ser

resolvidos pela simples inserção no texto constitucional - não souberam divisar

anseio de direito. Moldando por fim a Constituição como uma carta intervencionista.

Pode se dizer que a Constituição passou de instrumento constituinte e organizador,

a um instrumento paternalista, justiceiro, por que não dizer produtor de recursos?

Os efeitos dessas características são o verdadeiro óbice ao

desenvolvimento da Nação para a consecução dos objetivos – não há noticias de

outro modelo constitucional que assumisse tal caráter – a crise instalou-se de tal

maneira, o excesso de benesses e prerrogativas dadas aos exercitores do poder

político – seja qual for o âmbito – assola a credibilidade da população em relação à

política.

A Constituição de 1988 já nasceu permeada de vícios de origem, de

funcionalidade e de segurança, nasceu de um congresso constituinte resultado de

uma emenda à Constituição anterior. Uma grande promessa, mas sem eficácia

alguma, um bom exemplo é tomarmos a extensa proporção que a Constituição

tomou em relação ao Direito do Trabalho, exacerbadamente protecionista, impeditiva

de crescimento econômico, extremamente oneroso aos empregadores e aos

empregados que pagam à custa do altíssimo nível de desemprego.

94

Em decorrência de tal falha, de tal caráter analítico e protecionista, que

a Constituição com apenas 19 anos passou por 53 emendas, que descontrola a

governabilidade e a segurança política e jurídica.

Vale salientar que se o princípio da segurança jurídica não fosse

crucial na boa administração, não estaria este inserto na própria Carta Magna. É

sabido que o homem, não apenas quer a segurança, como também, precisa dela

para planejar a própria vida.

A ausência da segurança jurídica afronta o direito à cidadania, em

especial no modelo adotado na legislação pátria, em que as modificações ocorrem

ao alvitre do cidadão, e com fortíssimos indícios de conveniência política.

PAULO BONAVIDES já alertou que “se a Constituição pode ser refeita

a cada instante, então não é Estado de Direito”. Em uma análise mais aprofundada,

temos que o Estado de Direito é caracterizado como aquele que além de garantir por

artifício legal o direito, ainda o proporciona. Então, se se muda a todo o tempo uma

Constituição, está se mudando a todo tempo o direito, e pergunta-se como garantir

esses direito, se amanhã ou depois será modificado. Deve-se pensar a segurança

jurídica como um direito fundamental.

Ante o exposto, uma conclusão parece irrefutável, que a mudança é

necessária e urgente. Uma mudança estrutural que preserve as cláusulas

petrificadas, que são, de fato, uma grande conquista democrática.

A solução à problemática da instabilidade poderá se dar por meio de

uma convocação de uma Assembléia constituinte exclusiva, com bases em estudos

que atinjam o cerne da instabilidade que conjugue realidade social e eficácia

expurgando do ordenamento constitucional dispositivos sem eficácia e aplicação,

que a Constituição passe a ser uma moldura à concretização do Estado

Democrático de Direito afastando os vícios dos deslumbramentos vividos pelos

constituintes de 1987.

95

Acredita-se ainda, como solução à convocação de uma Assembléia

Constituinte, livre de anacronismos que produza uma nova Constituição,

simplificada, seja esta liberal ou social democrata, mas que constitua um

instrumento de desenvolvimento e proteção ao cidadão.

Considerando a maturidade da democracia vivida, a convocação de

uma nova assembléia constituinte, é plenamente possível do ponto de vista jurídico.

E sob a ótica sociológica pode ser realizada desde que preserve as cláusulas

pétreas, e que a população tenha participação efetiva. Que os poderes constituídos

sejam destilados, e que o poder soberano seja popular.

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LENZA, Pedro. Curso de direito constitucional esquematizado.10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

LOPES, Maurício Antônio Ribeiro. Poder Constituinte Reformador: limites e possibilidades.da revisão constitucional brasileira. São Paulo: editora Revista dos tribunais,1993.

ANEXO

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Anexo I Emendas à Constituição

A Constituição foi promulgada em 05.10.1988, pelo congresso constituinte.

Resultado de quase dois anos de feitura e com 250 artigos e 94 dispositivos no ADCT – Atos

das Disposições Constitucionais e Transitórias.

Segue uma breve analise de todas as emendas a essa Constituição até a data de

30.07.2007

Todas as emendas foram analisadas dentro de um período legislativo que

segundo a Constituição art. 57 corresponde ao período que se inicia em 02 de fevereiro e é

encerrado no dia 22 de dezembro de cada ano.

48ª Legislatura

3ª Sessão legislativa 1, de 31.03.1992 - Dispõe sobre a remuneração dos Deputados Estaduais e dos Vereadores. 2, de 25.08.1992 - Dispõe sobre o plebiscito previsto no art. 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 4ª Sessão Legislativa 3, de 17.03.1993 - Altera os arts. 40, 42, 102, 103, 155, 156, 160, 167 da Constituição Federal. 4, de 14.09.1993 - Dá nova redação ao art. 16 da Constituição Federal. Emendas de revisão 1, de 01.03.1994 - Acrescenta os arts. 71, 72 e 73 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 2, de 07.06.1994 - Altera o caput do art. 50 e seu § 2º, da Constituição Federal. 3, de 07.06.1994 - Altera a alínea "c" do inciso I, a alínea "b" do inciso II, o § 1º e o inciso II do § 4º do art. 12 da Constituição Federal.

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4, de 07.06.1994 - 1994 Altera o § 9º do art. 14 da Constituição Federal. 5, de 07.06.1994 - Altera o art. 82 da Constituição Federal. 6, de 07.06.1994 - Acrescenta o § 4º ao art. 55 da Constituição Federal.

49ª legislatura 1ª Sessão legislativa 5, de 15.08.1995- Altera o § 2º do art. 25 da Constituição Federal. 6, de 15.08.1995 - Altera o inciso IX do art. 170, o art. 171 e o § 1º do art. 176 da Constituição Federal. 7, de 15.08.1995 - Altera o art. 178 da Constituição Federal e dispõe sobre a adoção de Medidas Provisórias. 8, de 15.08.1995 - Altera o inciso XI e a alínea "a" do inciso XII do art. 21 da Constituição Federal. 9, de 09.11.1995 - Dá nova redação ao art. 177 da Constituição Federal, alterando e inserindo parágrafos. 2ª Sessão legislativa 10, de 04.03.1996 - Altera os arts. 71 e 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, introduzidos pela Emenda Constitucional de Revisão nº 1, de 1994. 11, de 30.04.1996 - Permite a admissão de professores, técnicos e cientistas estrangeiros pelas universidades brasileiras e concede autonomia às instituições de pesquisa científica e tecnológica. 12, de 15.08.1996 - Outorga competência à União, para instituir contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira. 13, de 21.08.1996 - Dá nova redação ao inciso II do art. 192 da Constituição Federal. 14, de 12.09.1996 - Modifica os arts. 34, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e dá nova redação ao art. 60 do Ato das Disposições constitucionais Transitórias. 15, de 12.09.1996 - Dá nova redação ao § 4º do art. 18 da Constituição Federal. 3ª Sessão Legislativa 16, de 04.06.1997 - Dá nova redação ao § 5º do art. 14, ao caput do art. 28, ao inciso II do art. 29, ao caput do art. 77 e ao art. 82 da Constituição Federal. 17, de 22.11.1997 - Altera dispositivos dos arts. 71 e 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, introduzidos pela Emenda Constitucional de Revisão nº 1, de 1994.

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4ª Sessão legislativa 18, de 05.02.1998 - Dispõe sobre o regime constitucional dos militares. 19, de 04.06.1998 - Modifica o regime e dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública, servidores e agentes políticos, controle de despesas e finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito Federal, e dá outras providências. 20, de 15.12.1998 - Modifica o sistema de previdência social, estabelece normas de transição e dá outras providências

50ª legislatura 1ª Sessão legislativa 21, de 18.03.1999 - Prorroga, alterando a alíquota, a contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e de direitos de natureza financeira, a que se refere o art. 74 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 22, de 18.03.1999 - Acrescenta parágrafo único ao art. 98 e altera as alíneas "i" do inciso I do art. 102 e "c" do inciso I do art. 105 da Constituição Federal. 23, de 2.09.1999 - Altera os arts. 12, 52, 84, 91, 102 e 105 da Constituição Federal (criação do Ministério da Defesa). 24, de 9.12.1999 - Altera dispositivos da Constituição Federal pertinentes à representação classistas na Justiça do Trabalho. 2ª Sessão legislativa 25, de 14.2.2000 - Altera o inciso VI do art. 29 e acrescenta o art. 29-A à Constituição Federal, que dispõem sobre limites de despesas com o Poder Legislativo Municipal. 26, de 14.2.2000 - Altera a redação do art. 6o da Constituição Federal. 27, de 21.3.2000 - Acrescenta o art. 76 ao ato das Disposições Constitucionais Transitórias, instituindo a desvinculação de arrecadação de impostos e contribuições sociais da União. 28, de 25.5.2000 - Dá nova redação ao inciso XXIX do art. 7o e revoga o art. 233 da Constituição Federal 29, de 13.9.2000 - Altera os arts. 34, 35, 156, 160, 167 e 198 da Constituição Federal e acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde. 30, de 13.9.2000 - Altera a redação do art. 100 da Constituição Federal e acrescenta o art. 78 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, referente ao pagamento 31, de 14.12.2000 - Altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, introduzindo artigos que criam o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.

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3ª Sessão legislativa 32, de 11.9.2001 - Altera dispositivos dos arts. 48, 57, 61, 62, 64, 66, 84, 88 e 246 da Constituição Federal, e dá outras providências. 33, de 11.12.2001 - Altera os arts. 149, 155 e 177 da Constituição Federal. 34, de 13.12.2001 - Dá nova redação à alínea c do inciso XVI do art. 37 da Constituição Federal. 35, de 20.12.2001 - Dá nova redação ao art. 53 de Constituição Federal. 4ª sessão legislativa 36, de 28.5.2002 - Dá nova redação ao art. 222 da Constituição Federal, para permitir a participação de pessoas jurídicas no capital social de empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens, nas condições que especifica. 37, de 12.6.2002 - Altera os arts. 100 e 156 da Constituição Federal e acrescenta os arts. 84, 85, 86, 87 e 88 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 38, de 12.6.2002 - Acrescenta o art. 89 ao ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incorporando os Policiais Militares do extinto Território Federal de Rondônia aos Quadros da União. 39, de 19.12.2002 - Acrescenta o art. 149-A à Constituição Federal (Instituindo contribuição para custeio do serviço de iluminação pública nos Municípios e no Distrito Federal).

51ª legislatura 1ª Sessão legislativa 40, de 29.5.2003 - Altera o inciso V do art. 163 e o art. 192 da Constituição Federal, e o caput do art. 52 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 41, de 19.12.2003 - Modifica os arts. 37, 40, 42, 48, 96, 149 e 201 da Constituição Federal, revoga o inciso IX do § 3 do art. 142 da Constituição Federal e dispositivos da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, e dá outras providências. 42, de 19.12.2003 - Altera o Sistema Tributário Nacional e dá outras providências. 2ª Sessão legislativa 43, de 15.4.2004 - Altera o art. 42 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, prorrogando, por 10 (dez)anos, a aplicação, por parte da União, de percentuais mínimos do total dos recursos destinados à irrigação nas Regiões Centro-Oeste e Nordeste. 44, de 30.6.2004 - Altera o Sistema Tributário Nacional e dá outras providências.

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45, de 8.12.2004 - Altera dispositivos dos arts. 5º, 36, 52, 92, 93, 95, 98, 99, 102, 103, 104, 105, 107, 109, 111, 112, 114, 115, 125, 126, 127, 128, 129, 134 e 168 da Constituição Federal, e acrescenta os arts. 103-A, 103-B, 111-A e 130-A, e dá outras providências. 3ª Sessão legislativa 46, de 5.5.2005 - Altera o inciso IV do art. 20 da Constituição Federal. 47, de 5.7.2005 - Altera os arts. 37, 40, 195 e 201 da Constituição Federal, para dispor sobre a previdência social, e dá outras providências. 48, de 10.8.2005 - Acrescenta o § 3º ao art. 215 da Constituição Federal, instituindo o Plano Nacional de Cultura. 4ª Sessão Legislativa 49, de 8.2.2006 - Altera a redação da alínea b e acrescenta alínea c ao inciso XXIII do caput do art. 21 e altera a redação do inciso V do caput do art. 177 da Constituição Federal para excluir do monopólio da União a produção, a comercialização e a utilização de radioisótopos de meia-vida curta, para usos médicos, agrícolas e industriais. 50, de 14.2.2006 - Modifica o art. 57 da Constituição Federal. 51, de 14.2.2006 - Acrescenta os §§ 4º, 5º e 6º ao art. 198 da Constituição Federal. 52, de 8.3.2006 - Dá nova redação ao § 1º do art. 17 da Constituição Federal para disciplinar as coligações eleitorais. 53, de 19.12.2006 - Dá nova redação aos arts. 7º, 23, 30, 206, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e ao art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. ANEXO II

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COMISSÃO ESPECIAL DESTINADA A PROFERIR PARECER À PROPOSTA DE MENDA À CONSTITUIÇÃO N. 157-A, DE 2003,DO SENHOR LUIZ CARLOS SANTOS, “QUE ONVOCA ASSEMBLÉIA DE REVISÃO CONSTITUCIONAL E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”. (REVISÃO CONSTITUCIONAL) PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO No 157-A, DE 2003 (Apensa a PEC no 447, de 2005) Convoca Assembléia de Revisão Constitucional e dá outras providências. Autor: Deputado LUIZ CARLOS SANTOS E OUTROS Relator: Deputado ROBERTO MAGALHÃES I - RELATÓRIO A Proposta de Emenda à Constituição no 157-A, de 2003, de autoria do Deputado LUIZ CARLOS SANTOS e outros, visa a convocar Assembléia de Revisão Constitucional a ser instalada no dia 1o de fevereiro de 2007, formada pelos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal (art. 1o). A revisão constitucional, consubstanciada em apenas um ato, será promulgada, nos termos daquela proposta, após a aprovação de seu texto, em dois turnos de discussão e votação, pela maioria absoluta dos2 membros da Assembléia de Revisão Constitucional, e observará o disposto no art. 60, § 4o, da Constituição Federal (art. 2o). As discussões serão unicamerais e as deliberações bicamerais, devendo a Revisão Constitucional extinguir-se no prazo máximo de doze meses, contado da data de sua instalação (art. 3o). Na Justificação, os Autores argumentam que o caráter excessivamente analítico da Carta Política de 1988 produziu o inconveniente de exacerbar a imposição de limites aos poderes públicos, transformando-se, assim, em poderoso instrumento de ingovernabilidade, bem como de instabilidade jurídica, devido as suas freqüentes emendas. Argumentam, por isso, ser necessário extirpar do alentado texto da Constituição – que à época já havia sofrido mais de quarenta emendas constitucionais, além das seis emendas de revisão –, as matérias que comportariam, sem maior prejuízo, disciplina em normas infraconstitucionais. Aduzem que, conforme ensina KONRAD HESSE, “sem prescindir das disposições puramente técnico-organizativas, a Constituição deve limitar-se, na medida do possível, a uns poucos princípios fundamentais”. A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania manifestou-se pela admissibilidade da proposta, nos termos do parecer, com Substitutivo, do Relator, Deputado MICHEL TEMER. O Substitutivo altera o processo de formação de emenda à Constituição em três aspectos: “a) a discussão será feita em sistema unicameral, b) finda a discussão, a votação se dá em cada Casa do Congresso Nacional por maioria absoluta; c) o projeto de revisão será submetido a referendo, para ser promulgado apenas depois da aprovação popular, e d) a 3 impossibilidade de modificação das cláusulas pétreas como também dos direitos sociais”. Finalmente, o Substitutivo propõe que se autorize revisão constitucional a cada dez anos, nos moldes por ele propostos. Apensada posteriormente, tramita a Proposta de Emenda à Constituição no 447, de 2005, de autoria do Deputado ALBERTO GOLDMAN e outros, que trata de matéria análoga.Propõe uma “Revisão Exclusiva”, eleita especificamente para esse fim, em número de representantes revisores correspondente a um quarto da Câmara dos Deputados. Sugere, também, que os representantes revisores sejam eleitos proporcionalmente à população de cada Estado e do Distrito Federal, garantido-se, no mínimo, um representante por Estado. Tais representantes serão eleitos para um mandato de dois anos, vedada a eleição para o Congresso Nacional no pleito de 2010. Foram realizadas audiências públicas para instrução da matéria, com as presenças do professor da Universidade de São Paulo - USP,Prof. Dr.

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FÁBIO KONDER COMPARATO, do professor da Universidade de Brasília, Prof. Mestre JOSÉ GERALDO DE SOUZA JÚNIOR, e do Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro NELSON JOBIM. Os dois primeiros manifestaram-se em sentido contrário à aprovação da matéria. O Prof. Dr. FÁBIO KONDER COMPARATO iniciou sua exposição estabelecendo a distinção acadêmica existente entre emenda constitucional, revisão constitucional e reconstitucionalização. O citado mestre 4 lembrou que essa distinção foi, inclusive, consignada no texto da atual Carta constitucional venezuelana, art. 340 e seguintes. Em seguida, o Prof. COMPARATO lembrou “que as normas de alteração da ordem de uma constituição representam a garantia de sua vigência e força vinculante.” Ou seja, de acordo com o citado professor, as normas que regulamentam as alterações constitucionais “são de interpretação estrita e vinculam todos os poderes constituídos e até mesmo o povo soberano” (grifo nosso). Citou, em seguida, diversos limites que a ordem constitucional brasileira impõe ao poder soberano do povo. Em razão destas limitações, o professor concluiu que o referendo popular não convalida a inconstitucionalidade, nem de leis, nem de emendas à Constituição. Por conseguinte, admite que emendas constitucionais, regularmente votadas e aprovadas no Parlamento venham a ser declaradas pelo Poder Judiciário como: “emendas inconstitucionais por carência e por abuso de poder” de reforma da Constituição. Já o Prof. JOSÉ GERALDO DE SOUZA JÚNIOR iniciou sua palestra declarando compartilhar o pensamento do Prof. COMPARATO. Assim sendo, para não repetir o expositor anterior, declarou que gostaria de centralizar sua exposição “resgatando um elemento importante” que é o “que diz respeito à sua legitimidade”. O Prof. JOSÉ GERALDO lembrou que a Constituinte de 1988 “foi um momento extremamente singular e especial” em razão da “entrada do povo na cena constitucional”. Declarou que essa direta participação popular no processo constituinte – “e não mais a representação delegada, diferida, a representação autoconstituída por processos de legitimação problemáticos” – mostrou os limites da tradição jurídica liberal. Mostrou seus “limites”, “seu ponto de esgotamento”. Em seguida, o expositor declarou que não encontrava, no atual momento político nacional, nada comparado com o movimento popular que existiu no processo constituinte de 1988. Como qualquer reforma constitucional de vulto, para ser legítima, necessitaria do respaldo popular, inexistente no caso por falta de debate, o professor se posicionou contra qualquer revisão neste momento. “Esse debate não está colocado na sociedade”, afirmou o professor.Já o Ministro NELSON JOBIM, cuja palestra se deu na audiência seguinte, começou lembrando “algumas peculiaridades do processo constituinte brasileiro”. Conforme as palavras do expositor: “todas as constituições brasileiras foram sempre processos de transição, ou seja, não tivemos rompimentos na história brasileira. Quando o regime anterior se esboroava, logo a seguir apresentava-se uma solução à situação. Portanto é difícil, na história política brasileira, utilizar-se de instrumento ou de linguagem importada de outros países, como, por exemplo, os conceitos de constituinte originário e constituinte derivado.” Em seguida, com a autoridade de quem participou ativamente dos eventos narrados, fez um rápido histórico da última Constituinte, situando as “peculiaridades do processo” constituinte brasileiro dentro da conjuntura política de cada momento. Lembrou a questão de ordem suscitada pelo DeputadoPLÍNIO DE ARRUDA SAMPAIO, na sessão de instalação da Constituinte, presidida pelo então presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro MOREIRA ALVES, segundo a qual não deveriam participar da Assembléia Nacional Constituinte os senadores que integravam aquele colegiado e que haviam sido eleitos em 1982. O presidente resolveu a questão de ordem dizendo que a emenda constitucional que havia convocado a Assembléia estabelecia que os membros da Câmara dos Deputados e os membros do Senado Federal se reuniriam na Assembléia Nacional Constituinte, e que os 6 senadores eleitos em 1982 integravam o Senado Federal, por conseguinte, também integravam a Assembléia Constituinte, por força da emenda que a convocou.” Lembrou também que quando do debate da emenda que convocava a Constituinte, enviada ao Parlamento pelo Presidente JOSÉ SARNEY, o então relator, Deputado FLÁVIO FLORES

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DA CUNHA BIERRENBACH, tentou fazer passar substitutivo que convocava uma assembléia constituinte exclusiva, modelo a época defendido pela OAB, e que foi rejeitado, restaurando-se a proposta original que consagrava o modelo congressual nacional constituinte. Declarou que os debates que acompanharam o pleito eleitoral da Constituinte de 1988 cingiram-se, basicamente, a assuntos estaduais, pois as eleições foram casadas com a dos governadores estaduais. Ou seja, a Constituinte foi eleita sem que o tema principal que ela teria de abordar – a constituição a ser elaborada – fosse alvo dos debates. Lembrou que o modelo de trabalho adotado pela Constituinte, e, indiretamente, o responsável pelo texto que dela resultou, foi fruto de contendas políticas que surgiram já nos primeiros dias da Constituinte. Afirmou que se a Constituição de 1988 é ampla, o é por uma simples razão histórica: “era mais fácil aprovar um texto na constituição de que aprovar um texto de lei. A lei dependia de votação na Câmara, no Senado, do veto da Presidência da República e da rejeição do veto. Para o texto constitucional, bastavam dois turnos por maioria absoluta”. Por fim, declarou o Ministro, em razão de todos os percalços de sua redação, o texto foi o que conhecemos e que “a Constituição de 1988 precisa, necessariamente, de uma lipoaspiração”(grifo nosso). Frisando, ainda, a título de advertência, que: “Todas as vezes em que V. Excias. constitucionalizam temas que são da competência, 7 historicamente, de lei complementar ou lei ordinária; todas as vezes em que V. Excias. transformam essas pretensões em texto constitucional, outorgam poder à magistratura nacional. V. Excias. estão transferindo para a magistratura nacional o poder de fiscalizar os textos infraconstitucionais de V. Excias.” Eis “a razão de ser da grande emergência de ações diretas de inconstitucionalidade”. Tudo isso, o Ministro declarou para embasar a seguinte conclusão: “Acabei me estendendo em questões meramente históricas para dizer que não vejo problema da perspectiva de votação desse texto” (grifo nosso). Antes de encerrar ainda condenou o fato de que para muitos dos críticos da Constituição de 1988, seus atuais maiores defensores,“tudo virou cláusula pétrea”. É a “hiperinflação de princípios constitucionais”.Em suma, posicionou-se favoravelmente à proposta principal, mas considerou de constitucionalidade discutível a proposta apensada de uma “Revisão Exclusiva”, em virtude de estabelecer, com a proporcionalidade, distinção entre os Estados brasileiros. Nesta Comissão, findo o prazo regimental, foram apresentadas quatro emendas: Emenda no 1/2006-CE, datada de 13 de fevereiro de 2006, tendo como primeiro signatário o líder do PT, Deputado HENRIQUE FONTANA. Esta primeira emenda visa alterar os textos do art. 1o e seu § 1o, do Substitutivo aprovado pelo plenário da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Emenda no 2/2006-CE, datada de 13 de fevereiro de 2006, cujo primeiro signatário também é o líder do PT, Deputado HENRIQUE 8 FONTANA. A emenda propõe a supressão do art. 4o do Substitutivo aprovado pelo plenário da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Emenda no 3/2006-CE, também datada de 13 de fevereiro de 2006, igualmente ostentando como primeiro signatário o líder do PT, Deputado HENRIQUE FONTANA. O escopo desta terceira emenda é alterar a redação do art. 2o aprovado pelo plenário da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Por fim, a Emenda no 4/2006-CE, datada de 14 de fevereiro de 2006, que tem como primeiro signatário o Deputado JOÃO ALFREDO do PSOL. A emenda propõe nova redação ao Substitutivo da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. O Parecer do Relator subscrito em 20 de fevereiro de 2006 foi apresentado e lido perante esta Comissão Especial, tendo havido pedidos de vista conjunta concedida aos Deputados ALCEU COLLARES, ANTÔNIO CARLOS BISCAIA, INALDO LEITÃO, JOÃO ALFREDO, LUIZ EDUARDO GREENHALG, ODAIR CUNHA, RICARDO BARROS, VICENTE ARRUDA E VILMAR ROCHA. Em Sessão posterior, já vencido o prazo da vista concedida, quando deveria ter ocorrido a discussão da matéria visando a posterior votação, houve um acordo no sentido de que fossem realizadas novas audiências públicas.Assim é que foram ouvidos, sucessivamente, o Dr.REGINALDO OSCAR DE CASTRO, Membro Honorário Vitalício do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, representando o Presidente daquela instituição; os

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Presidentes Nacionais dos seguintes Partidos Políticos: Deputado RICARDO BEZOINI, Presidente do PT; JOSÉ RENATO RABELO, Presidente do PC do B; Deputado INALDO LEITÃO, representando o Presidente do PL; Deputado MIRO TEIXEIRA, Líder do PDT; Senador TASSO JEREISSATI, Presidente do PSDB que, impedido de 9 comparecer, designou o Deputado ALBERTO GOLDMAN, Primeiro Vice- Presidente do Partido para representá-lo; Deputado EDUARDO CAMPOS, Presidente do PSB, representado pelo Deputado PAULO BALTAZAR, Líder do Partido; JOSÉ LUIZ DE FRANÇA PENNA, Presidente Nacional do PV; Senadora HELOISA HELENA, Presidente Nacional do PSOL, representada pelo Deputado JOÃO ALFREDO, Vice-Líder do Partido na Câmara; e Deputado PEDRO CORRÊA, Presidente do PP, representado pelo Deputado BENEDITO DE LIRA, Vice-Presidente do Partido.Na última dessas audiências, realizada em 4 de abril de 2006, o Relator anunciou, oficialmente, que apresentaria um novo parecer, em seqüência ao anterior, oferecendo modificações ao texto do Substitutivo aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e submetido, com emendas, à apreciação dos ilustres membros desta Comissão Especial. É o relatório. II - VOTO DO RELATOR A) Considerações sobre as Revisões Constitucionais De acordo com o art. 202, § 2o, do Regimento Interno, cabe a esta Comissão Especial o exame do mérito da Proposta de Emenda à Constituição no 157-A, de 2003, bem como da Proposta de Emenda à Constituição no 447, de 2005, apensada, e das emendas apresentadas nesta Comissão Especial. As propostas dizem respeito à convocação de Assembléia para proceder à revisão da Carta Política de 1988. 10 O tema da revisão constitucional e seus limites despertam polêmica entre os doutrinadores, e remete à clássica discussão em torno dos conceitos de Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado. Em feliz síntese, o Prof. RICARDO ARNALDO MALHEIROS FIUZA ensina que o Poder Constituinte é “inicial, porque sempre cria uma nova ordem jurídica; é autônomo, porque não depende dos órgãos do Poder (ou ‘poderes’ constituídos) porventura já existentes; e é incondicionado ou ilimitado, porque não sofre restrições do Direito Positivo, só podendo ser influenciado pelo Direito Natural”1. Tal poder, no sentido de soberania, tem como seu titular o povo. É o princípio consagrado na Constituição Federal: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos de sta Constituição” (Parágrafo único do art. 1o). O exercício direto do poder se faz por intermédio de plebiscito, referendo e iniciativa popular (art. 14, I, II e III) A Constituição é obra do Poder Constituinte Originário e nela está contida a idéia de perenidade, de permanência, de estabilidade. Mas, como bem salienta EMMANUEL JOSEPH SIEYÈS, “o Poder Constituinte não desaparece com sua obra realizada. Ele permanece depois dela. É isso o que se chama de permanência do Poder Constituinte. A nação não fica submetida à Constituição que ela estabeleceu, pelo seu Poder Constituinte. Só os poderes constituídos por ela é que ficam submetidos à Constituição. Decorre disso que a nação pode mudar a Constituição sempre que bem lhe parecer. O estabelecimento de uma Constituição não esgota o 1 Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza, “Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado”, in “Revista do Curso de Direito da Universidade Federal de Uberlância”, 22 (1,2) 239-254, 1993 11 Poder Constituinte da nação. Ele pode sempre refazer a Constituição,estabelecer uma nova Constituição”2.Vale lembrar que SIEYÈS, abade e contemporâneo de NAPOLEÃO BONAPARTE, foi o autor da Teoria da Soberania Popular como fonte do Poder Constituinte. Antes, considerava-se o poder de origem divina, o que legitimou durante muito tempo a monarquia absoluta. De modo que a dinâmica da vida política e dos costumes sociais exige que a Constituição de um Estado seja alterada, a fim de adaptá-la a novas necessidades, sem que para isso seja preciso recorrer ao Poder Constituinte Originário. Na lição de JORGE MIRANDA, “a modificação das Constituições é um fenômeno inelutável da vida jurídica imposta pela tensão com a realidade constitucional e pela necessidade de efetividade que as tem de marcar. Mas do que modificáveis, as Constituições são modificadas”, e é obra do Poder Constituinte Derivado (ou Instituído) 3.

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O direito de emendar a Constituição , que alguns autores preferem chamar de poder de revisão, já estava previsto pelos convencionais de 1787, ao elaborarem a Constituição dos Estados Unidos da América do Norte (art. V). Diferentemente do Poder Constituinte Originário, o Poder Constituinte Derivado é secundário, subordinado e limitado, e é exercido pelos congressistas, representantes do povo. 2 Emmanuel Joseph Sieyès (1748-1836), in “Qu’est-ce que le tiers État?, apud Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “O Poder Constituinte”, Ed. Saraiva, 1999, p.13. 3 Jorge Miranda, “Manual de Direito Constitucional”, vol. 2: constituição e inconstitucionalidade, 3a ed., Coimbra, 1991 12O poder de revisão constitucional – o poder de ”permitir a modificação da Constituição dentro da ordem jurídica, sem uma substituição da ordem jurídica, sem ação, quase sempre revolucionária, do Poder Constituinte originário” 4 não é estranho à tradição do Direito brasileiro. JOSÉ AFONSO DA SILVA, em seu “Comentário Contextual à Constituição”, ensina com a segurança e clareza que lhes são próprias: “PODER CONSTITUINTE REFORMADOR. A Constituição, como se vê, conferiu ao Congresso Nacional a competência para emendá-la. Deu-se, assim, esse poder a um órgão constituído. Por isso se lhe dá a denominação de ‘poder constituinte instituído’ ou ‘constituído’. Por outro lado, como esse seu poder não lhe pertence por natureza, primariamente, mas, ao contrário, deriva de outro (isto é, do poder constituinte originário), é que também se lhe reserva o nome de ‘poder constituinte derivado’, embora pareça mais acertado falar em ‘competência constituinte derivada’ ou ‘constituinte de segundo grau’. Trata-se de um problema de técnica constitucional, já que seria muito complicado ter que convocar o constituinte originário todas as vezes em que fosse necessário emendar a Constituição. Por isso, o próprio poder constituinte originário, ao estabelecer a Constituição, instituiu um poder constituinte reformador, ou poder de reforma constitucional, ou poder de emenda constitucional. No fundo, contudo, o agente ou sujeito da reforma é o poder constituinte originário, que, por esse método, atua em segundo grau, de modo indireto, pela outorga de competência a um órgão constituído para, em seu lugar, inserir na Constituição as modificações requeridas 5.” A Carta Imperial de 1824 sofreu apenas uma reforma constitucional regularmente votada e duas modificações: a que daria forma ao 4 Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “O Poder Constituinte”, Ed. Saraiva, 1999, p.124. 5 José Afonso da Silva, “Comentário Contextual à Constituição”, Malheiros Editores Ltda., 04-2005, p. 439 13 Ato Adicional de 1834, seguida da Lei de Interpretação de 1840 e do chamado “Golpe da Maioridade”. A Constituição de 1891, inspirando-se na Constituição estadunidense, atribuindo a iniciativa também aos Estados-membros da Federação, simplificou a adoção de emendas à Constituição (art. 90). A única alteração que sofreu em sua longa trajetória foi a emenda de 1926, que não se mostrou suficiente para evitar a queda da ordem institucional que sustentava. A Constituição de 1934 optou pela solução técnica da revisão (cujo processo não chegou a ser posto em prática) ou emenda, esta menos rígida do que aquela (art. 178). A Constituição de 1937, outorgada ditatorialmente, regulou a matéria no art. 174. Pela primeira vez, uma Constituição brasileira prevê a iniciativa do Presidente da República em matéria de emenda constitucional. Durante sua existência foram editadas 21 leis constitucionais. A Carta de 1946, votada por Assembléia Nacional Constituinte, previa sua alteração no art. 217. A iniciativa era atribuída a um quarto da Câmara dos Deputados ou um quarto do Senado Federal e à metade das Assembléias Legislativas estaduais. O projeto estaria aprovado se obtivesse maioria absoluta nas duas casas do Congresso em duas discussões, em duas sessões legislativas ordinárias e consecutivas. Todavia, se obtivesse a maioria de dois terços, em duas discussões, a proposta seria aprovada na mesma sessão legislativa. Na Emenda Constitucional no 1, de 1969, à Constituição de 1967, continua deferida ao Presidente da República e aos membros do Congresso Nacional a iniciativa de emenda constitucional. Suprimiu-se, porém, a

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iniciativa por parte das Assembléias Legislativas Estaduais. 14 Importa lembrar que, durante sua vigência, a Emenda Constitucional no 26, de 17 de novembro de 1985, regularmente votada pelo Congresso Nacional, modificou o processo de alteração da Carta, previsto na Emenda Constitucional no 1, de 1969, para convocar uma Assembléia Nacional Constituinte, que elaborou a Constituição ora vigente.A Constituição de 1988 em vigor defere ao Presidente da República, aos membros do Congresso Nacional e às Assembléias Legislativas Estaduais a iniciativa de emenda constitucional, no art. 60, I, II e III. O quorum de aprovação exigido, no Senado e na Câmara, é de três quintos.O art. 3o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias previu fosse realizada revisão constitucional após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. O processo resultou em seis emendas constitucionais de revisão. Na revisão de 1993, os revisores, congressistas titulares do Poder Constituinte Derivado, agiram com quorum menos rígido (maioria absoluta) do que nas emendas avulsas e, portanto, mais fácil de ser obtido.O propósito da proposta sob exame é permitir uma revisão sistemática do texto constitucional de modo a resolver a questão da avalanche de propostas de emenda em tramitação, que hoje somam mais de mil, na Câmara e no Senado. A discussão da matéria em sistema unicameral e sua aprovação após dois turnos de discussão e votação pelo quorum de maioria absoluta de votos em cada Casa integrante da Assembléia de Revisão Constitucional e de referendo popular se, à primeira vista, pode parecer processo mais simplificado, em verdade não o é. 15 O ilustre Relator da matéria na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, Deputado MICHEL TEMER, em seu irretocável parecer, assim se pronuncia: “Reconheço que as modificações são de razoável monta. Mas o núcleo conceitual da cláusula pétrea implícita, referente à modificação constitucional, continuará intacto. Isto porque adiciona-se ao processo de modificação, ora facilitado, enorme dificuldade: a submissão do projeto de Emenda Constitucional a referendo popular, mantendo-se assim, a idéia de um processo diferenciado para a formação de Emenda (grifo nosso). Confesso que, não fosse a possibilidade de o povo,diretamente, como titular e, agora, exercente do poder Constituinte originário, manifestar-se por meio de referendo, jamais ousaria apoiar a tese da revisão tal como posta no projeto ora em exame.”O professor LUÍS ROBERTO BARROSO, organizador de “A Nova Interpretação Constitucional”, em ensaio subscrito também por ANA PAULA BARCELOS, tratando do tema, aclara com proficiência: “Mesmo no quadro da dogmática jurídica tradicional, já haviam sido sistematizados diversos princípios específicos de interpretação constitucional, aptos a superar as limitações da interpretação jurídica convencional, concebida sobretudo em função da legislação infraconstitucional, e mais especialmente do direito civil. A grande virada na interpretação constitucional se deu a partir da difusão de uma constatação que, além de singela, sequer era original: não é verdadeira a crença de que as normas jurídicas em geral – e as normas constitucionais em particular – tragam sempre em si um sentido único, objetivo, válido para todas as situações sobre as quais incidem. E que, assim, caberia ao intérprete uma atividade de mera revelação do conteúdo preexistente na norma, sem desempenhar qualquer papel criativo na sua concretização. 16 A nova interpretação constitucional assenta-se no exato oposto de tal proposição: as cláusulas constitucionais, por seu conteúdo aberto, principiológico e extremamente dependente da realidade subjacente, não se prestam ao sentido unívoco e objetivo que uma certa tradição exegética lhes pretende dar. O relato da norma,muitas vezes, demarca apenas uma moldura dentro da qual se desenham diferentes possibilidades interpretativas. À vista dos elementos do caso concreto,dos princípios a serem preservados e dos fins a serem realizados é que será determinado o sentido da norma,com vistas à produção da solução constitucionalmente adequada para o problema a ser resolvido6.” Não poderia ser esquecida, também, a lúcida defesa da Revisão Constitucional, nesta quadra do processo político brasileiro, que é feita pelo Deputado ALBERTO GOLDMAN com apoio inclusive em

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PAULO BROSSARD, na justificação da PEC no 447, de 2005, in verbis: “Nada impede – do ponto de vista político-jurídico – seja renovado o poder de revisão constitucional. Ao contrário: a experiência o recomenda para o bem e para a vitalidade do próprio processo democrático. Neste exato sentido é a sempre lúcida lição de PAULO BROSSARD DE SOUZA PINTO: ‘(...) creio que nesta matéria é preciso haver um pouco de modéstia para não pretender transformar um legislador, o constituinte do ano tal, como dotado de poderes mais ou menos sobre-humanos, porque capaz de imobilizar o poder da sociedade, o poder da Nação, que, no curso dos anos e na sucessão das gerações, pode ter concepções e interesses profundamente distintos daqueles que eram dominantes quando a lei tal ou qual tivesse sido elaborada. Afinal de contas, são leis humanas e se trata de instituições humanas.’ (Voto do Ministro Paulo Brossard no STF, ADI no 833-1/DF, Tribunal Pleno, Relator Ministro Moreira Alves, DJ de 16.09.1994). 6 Luís Roberto Barroso, “A Nova Interpretação Constitucional”, Ed. Renovar, 2006, p. 331. 17 Com efeito, nenhuma maioria deve ter o direito, moral ou constitucional, de obstar as decisões das futuras maiorias (DAHL, Robert. Quanto è democratica la costituzione Americana? Roma-Bari: Laterza, 2003, p. 103). Vale registrar que não é estranho ao constitucionalismo brasileiro modificações constitucionais flexibilizando o processo de emenda à constituição. A Constituição de 1967, em seu art. 48, com a redação da Emenda Constitucional no 1, de 1969, exigia maioria de dois terços dos membros das Casas do Congresso Nacional para que fosse considerada aprovada uma proposta de Emenda Constitucional. Por sua vez, a Emenda Constitucional no 11, de 13 de outubro de 1978, ao alterar o mesmo art. 48 da Constituição de 1967, reduziu a exigência em causa para maioria absoluta. Ademais, a própria Constituição de 1988 é fruto de Assembléia Nacional Constituinte convocada por uma Emenda Constitucional, a de no 26, de 27 de novembro de 1985! O Direito comparado também registra importantes exemplos de constituições que permitem sejam — ou que permitiram fossem — as suas disposições revisadas, até mesmo periodicamente, por meio de um processo simplificado, que surge e se esgota no tempo. É o caso da Constituição de Portugal, de 1976, que, em seu art. 282, no 1 (cf. numeração da Revisão Constitucional de 1989 e texto da Revisão Constitucional de 1992), prevê: ‘A Assembléia da República pode rever a Constituição decorridos cinco anos sobre a data da publicação da última lei de revisão ordinária.’” B) Da Necessidade e Oportunidade da Revisão 18 Cabe a esta Comissão Especial apreciar o mérito das PEC no 157-A, de 2003, e no 447, de 2005. Já demostramos nas considerações sobre as Revisões Constitucionais, que é da tradição brasileira a reforma das Constituições e até mesmo a convocação de Assembléia Nacional Constituinte, caminho trilhado para a elaboração e promulgação da Carta de 1988, em vigor. Daí, o Ministro NELSON JOBIM ter feito longa exposição perante esta Comissão, comprovando que a nossa tradição não tem sido a de reconstitucionalizações mediante ruptura, mas sim pela transição. Entendemos, assim, que o fulcro da questão de mérito se situa nos aspectos da necessidade ou conveniência e oportunidade da Revisão objeto das duas Propostas de Emendas à Constituição. A justificação da PEC no 157-A, de 2003, pelo Deputado LUIZ CARLOS SANTOS e outros parlamentares, é convincente. Lembra que a significativa mudança dos rumos políticos do País, simbolizada pela Constituição de 1988, contrasta com as dificuldades técnicas e políticas que o seu texto introduziu, chegando a afirmar que a nossa Constituição exacerba a tarefa de impor limites aos poderes públicos, constituindo-se em poderoso instrumento de ingovernabilidade. Por sua vez, o Relator na CCJC, Deputado MICHEL TEMER, cita o saudoso jurista CELSO BASTOS, que assim lecionou com a sua autoridade: “Não se pode admitir que a Constituição fique atrasada e aprisione o desenvolvimento em virtude de uma fragilidade política de determinada época. 19 Se naquele tempo não se pode implementar uma verdadeira revisão, que se faça outra.” E, mais adiante (ainda CELSO BASTOS): “Se é a vontade popular que legitima a inalterabilidade de algumas cláusulas constitucionais, ela (e somente ela) pode autorizar alterações. Uma vez aprovada uma nova Revisão, através de consulta popular, não há argumentos que sustentem a ilegitimidade de tal feito.” No caso presente — é indispensável

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ressaltar —, o Relator na CCJC propôs em seu Substitutivo mais do que autorização popular, um referendo que possibilite ao eleitorado, já conhecendo o teor da Revisão, aprová-la ou negar-lhe aprovação, como requisito de validade e eficácia. Mas há um argumento de grande valia em favor da Revisão Constitucional, que é a urgente necessidade de eliminar a insegurança jurídica que se instalou neste País após a Carta de 1988. Ela foi emendada mais de cinqüenta vezes, além das Emendas Revisionais de 1993. Atualmente, mais de mil Propostas de Emendas à Constituição tramitam na Câmara e no Senado. Essa situação contrasta com a de países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Certamente, muitos não percebem que este ciclo interminável de emendas constitucionais leva o Estado a se omitir naquilo que foi uma das principais razões de sua existência: o monopólio da autoridade e 20 da força para manter a segurança do cidadão e assegurar a estabilidade da ordem social. Não pode haver estabilidade e paz social sem segurança jurídica. A Revisão Constitucional poderá estancar a enxurrada de mudanças pontuais da Carta, buscando introduzir alterações importantes de forma sistêmica e racional. São muitos os problemas que permanecem sem solução e assim vão continuar, se não tivermos a coragem e a determinação de reformar a Constituição de modo pacífico, com a tutela e a aprovação da soberania popular. Só para lembrar alguns desafios: o excesso de poder do Executivo, que legisla e tranca diuturnamente as pautas da Câmara e do Senado; o problema da fragilização da Federação brasileira, cuja maioria dos estados-membros vivem em situação de penúria; o sistema tributário injusto, irracional e perverso; a possibilidade de desconstitucionalização de órgãos e procedimentos que deveriam ser regidos pela legislação infraconstitucional. Desde 1988, tivemos cinco Presidentes da República, dos quais um sofreu impeachment e os demais tentaram ou conseguiram aprovar emendas constitucionais visando reformas extensas, abrangendo o sistema tributário, o sistema previdenciário e capítulos e seções da Carta Política em diferentes áreas, relacionadas a monopólios, exploração do subsolo, cabotagem, conceito de empresa nacional e muitas outras. Mas essas reformas, sem a visão sistêmica do ordenamento constitucional visando apenas equacionar questões setoriais, não têm resolvido o problema institucional do País. Bastaria citar a falta de uma 21 reforma política ampla, eleitoral e partidária, que há várias legislaturas é discutida, mas não chega a se realizar. Pode-se dizer que vivemos a partir de 1988 uma silenciosa crise institucional que infelizmente muitos não percebem. Coragem e determinação não têm faltado ao povo brasileiro para reformar ou instituir a Carta Política do País, desde o Império (1834 e 1840) e na República (1926, 1963 e 1985). Esta a mesma conduta de outros povos em tempos de crise e de obsolescência de suas instituições, como a França em 1958 e a Espanha em 1978. Por fim, cabe realçar que sempre seria possível a objeção de que uma reforma da Constituição não obstaria que, no seu dia imediato, voltasse o Parlamento a submergir sob uma nova onda de emendas constitucionais. A esse respeito, posso apenas responder que o Congresso Revisor, que vier eventualmente a ser eleito, poderá perfeitamente impor um período dentro do qual será impedida a tramitação de qualquer emenda constitucional nova, ou então poderá adotar a sistemática de revisões constitucionais periódicas, com intervalos regulares. Qualquer uma das duas medidas evitaria que a incerteza jurídica constitucional que hoje vivemos viesse a se repetir nos anos futuros. C) Das Emendas ao Substitutivo da CCJC à PEC no 157-A, de 2003 Passamos a emitir parecer sobre as quatro emendas apresentadas e já referidas no Relatório. Preliminarmente, deve ser dito que todas elas atendem aos requisitos de admissibilidade. 22 É nosso parecer, portanto, pela sua admissibilidade. Quanto ao mérito, focalizaremos cada uma delas, ainda que suscintamente, a seguir: A Emenda no 01/06-CE pretende circunscrever a Revisão apenas a alguns capítulos e seções da Carta, como “Da Nacionalidade”, “Dos Territórios”, “Dos Militares dos Estados, Distrito Federal e dos Territórios”, “Das Regiões”, “Fiscalização Contábil, Financeira e Orçamentária”, “Do Conselho da República e do Conselho de Defesa Nacional”, “Dos Tribunais e Juízes Militares”, “Das Forças Armadas”, “Da Segurança Pública”, ”Do Sistema Tributário Nacional” e “Das Disposições Constitucionais Gerais”. Tal emenda, se aprovada, esvaziaria a Revisão,

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que ficaria impedida de tratar de temas relevantes, como pacto federativo, o regime das medidas provisórias, as relações entre os Três Poderes, a índole e o perfil do nosso presidencialismo e assim por diante. Na verdade, não se justificaria uma Revisão tão restrita, praticamente sem contraditório, e que jamais poderia levar à convocação de um referendo. Somos, assim, pela rejeição da referida emenda. A Emenda no 02/06-CE, que pretende suprimir o art. 4o do Substitutivo à PEC no 157-A, de 2003, aprovado pela CCJC, que objetiva retirar a previsão de revisões periódicas, a cada dez anos, estará em parte atendida por emenda do Relator que pretende deixar essa matéria para ser decidida pelos futuros parlamentares que deverão realizar a Revisão em 2007. Quanto à Emenda no 03/06-CE, que tem por objeto adiar a data de início da Revisão de 12 de fevereiro de 2007 para 1o de fevereiro de 23 2011, levaria os legisladores atuais a ignorarem a próxima legislatura a iniciarse em 2007. Se a Revisão for considerada mais conveniente para 2011, que sobre ela decidam os futuros legisladores a serem eleitos em outubro de 2006. Somos pela rejeição dessa emenda. A Emenda Substitutiva Global no 04/06-CE, também referente à PEC no 157-A, de 2003, oferece as seguintes inovações: a) plebiscito de autorização da convocação da Assembléia de Revisão Constitucional, a realizar-se em 31 de dezembro de 2007; b) quorum de dois terço para a aprovação das matérias; c) a Revisão respeitaria o “principio da proibição do retrocesso”; e d) são vedadas modificações que visem eliminar, diminuir ou restringir qualquer dos direitos e garantias asseguradas pelo texto constitucional atual. Quanto a essa Emenda, temos várias considerações a fazer, começando pela exigência de plebiscito de autorização para a Revisão e, após, o referendo para a sua aprovação ou rejeição. Entendemos que o referendo é muito mais eficaz do que o plebiscito. Na autorização plebiscitária o povo não terá idéia do conteúdo e alcance das modificações a serem introduzidas na Constituição. É um “cheque em branco”. No referendo, aí sim, a soberania popular decide em última instância a sorte de todo trabalho revisional. Portanto, se já é previsto o mais, que é o referendo, não seria perda de tempo realizar também o plebiscito? No tocante à alegada impossibilidade de redução do quorum de dois terços para as deliberações da Assembléia de Revisão, reconhecemos ser uma questão polêmica, sobre a qual não existe ainda, em tese, jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 24 Mas a CCJC aprovou a proposta da maioria absoluta e os argumentos do Relator, Deputado MICHEL TEMER, são convincentes e respaldados em brilhante parecer. O plenário desta Comissão Especial deverá discutir o tema e sobre ele deliberará. Em relação ao “principio da proibição do retrocesso”, cuja inclusão no Substitutivo é pretendida, lembramos que se trata de conceito doutrinário ainda não recepcionado pelo ordenamento jurídico, o que traria muitas dificuldades de interpretação se convertido em norma constitucional. Motivaria, na prática, muitas controvérsias, gerando grande número de demandas e trazendo instabilidade para a matéria resultante da Revisão. AIém do mais, a eficácia do “princípio da proibição do retrocesso”, tal como discutido na doutrina, aplicar-se-ia apenas à legislação infraconstitucional voltada a regulamentar dispositivo constitucional programático. Finalmente, quanto à proposta de proibição da eliminação, diminuição e restrição das garantias asseguradas pelo texto constitucional, nos parece que será atendida com a norma do Substitutivo que determina o respeito às cláusulas pétreas, garantias individuais e direitos sociais, e ainda, aos mecanismos de participação popular referidos no art. 14, incisos I, II e III, e no art. 61, § 2o , da Constituição. D) Do Substitutivo do Relator Têm sido levantadas dúvidas quanto à constitucionalidade da revisão e manifestado receio quanto à extensão da matéria a ser revisada. 25 Não têm faltado, inclusive, vozes que preconizam, com a revisão, retrocesso nas conquistas que teriam sido concretizadas com a Assembléia Nacional Constituinte de 1987/1988. A questão da inconstitucionalidade já não cabe discutir, porque é matéria vencida, aprovada que foi a PEC nº 157-A, de 2003, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Mas não custa lembrar que já rebatemos os argumentos contrários, com apoio de juristas do porte de EMMANUEL JOSEPH SIEYÈS, JORGE MIRANDA, LUÍS ROBERTO BARROSO, PAULO BROSSARD, NELSON JOBIM, CELSO BASTOS e MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, entre

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outros. Observe-se a profundidade da modificação que se introduz na sistemática da revisão constitucional proposta. Inicialmente, pretendia-se uma revisão ampla com ressalvas específicas de cláusulas pétreas ou de relevante interesse social. Agora se propõe uma revisão restrita a uma pauta de matérias preestabelecidas, a saber: I – a organização dos Poderes; II – o sistema eleitoral e partidário; III – o sistema tributário nacional e as finanças públicas; IV – a organização e as competências das unidades da federação; e 26 V – o sistema financeiro nacional. Por tudo que ouvi, nesta Comissão, li e pesquisei, chego à conclusão deste parecer, propondo aos ilustres parlamentares que integram este Colegiado: 1) que seja adotado por esta Comissão Especial o Substitututivo aprovado pela CCJC, e de autoria do então Relator, Deputado MICHEL TEMER, na forma do Substitutivo ora apresentado por esta Relatoria; e 2) a não aprovação da PEC no 447, de 2005, não obstante seus elevados intuitos e brilhante defesa da Revisão Constitucional, pela impossibilidade de se criar, data venia, um terceiro órgão legislativo federal, a lattere do Senado e da Câmara, com poder constituinte derivado privativo de deputados e senadores, nos termos expressos da Constituição. De ser esclarecido que se impõem a ressalva ao art. 60, § 4º, e a vedação de supressão ou restrição dos instrumentos de participação popular, disciplinados, em parte, pelo art. 61, § 2º, da mesma Carta, que trata da iniciativa popular no âmbito legislativo. Quanto aos direitos sociais dos cidadãos, também ressalvados na Emenda nº 01, constante do parecer anterior, permanecem ressalvados, porque poderiam ser alcançados em razão da natureza e amplitude das questões relacionadas com o Sistema Eleitoral e o Sistema Tributário, constante da pauta de revisão. O quorum de maioria absoluta ficou mantido, apesar de ter havido reivindicações no sentido do quorum de três quintos, porque, em face da nova sistemática, que prevê uma revisão restrita, se o quorum for elevado para três quintos, não haverá diferença entre a revisão pretendida e as emendas constitucionais já previstas no art. 60. 27 Deve ser lembrado que essa matéria, por ser jurídica, já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Por último, ficou ainda mantido, no contexto do Substitutivo, o teor da Emenda nº 02 oferecida pela Relatoria no parecer anterior, e que objetiva substituir o comando de autorização de Revisões da Carta a cada dez anos, transferindo tal deliberação, se for o caso, para a própria Assembléia de Revisão. E) Da Conclusão Por tudo quanto acima foi exposto, votamos pela admissibilidade das emendas apresentadas nesta Comissão Especial, pelo acolhimento do Substitutivo da CCJC, pela aprovação da PEC no 157-A, de 2003, pela aprovação parcial da Emenda no 02-CE, e pela rejeição da PEC no 447, de 2005, e das Emendas de no 01-CE, 03-CE e 04-CE, nos termos do Substitutivo desta Relatoria, que segue anexo a este parecer. Sala da Comissão, em de de 2006. Deputado ROBERTO MAGALHÃES Relator 28 COMISSÃO ESPECIAL DESTINADA A PROFERIR PARECER À PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 157-A, DE 2003, DO SENHOR LUIZ CARLOS SANTOS, QUE CONVOCA ASSEMBLÉIA DE REVISÃO CONSTITUCIONAL E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”. (REVISÃO CONSTITUCIOAL) SUBSTITUTIVO À PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 157-A, DE 2003 (Apensa a PEC nº 447, de 2005) Convoca Assembléia de Revisão Constitucional e dá outras providências. Autor: Deputado LUIZ CARLOS SANTOS E OUTROS Relator: Deputado ROBERTO MAGALHÃES As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional: Art. 1º Será instalada, no dia 1º de fevereiro de 2007, Assembléia de Revisão Constitucional, formada pelos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o objetivo de revisar a Constituição. § 1º O parlamentar mais idoso instalará a Assembléia de Revisão Constitucional no dia 1º de fevereiro de 2007 e dirigirá a sessão de eleição de seu Presidente. § 2º Na Revisão Constitucional, as discussões e os encaminhamentos de votação serão feitos em sistema unicameral. § 3º A Assembléia de Revisão Constitucional elaborará o Regimento Interno de seus trabalhos. Art. 2º A Revisão Constitucional, consubstanciada em ato 29 único, será promulgada após a aprovação do seu texto, em dois turnos de discussão e votação, por maioria absoluta de votos de cada Casa integrante da

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Assembléia de Revisão Constitucional e de referendo popular a ser realizado no primeiro domingo de abril de 2008. Parágrafo único. A Revisão Constitucional observará o disposto no art. 60, § 4º, desta Constituição, sendo-lhe vedado suprimir ou restringir os direitos sociais e os instrumentos de participação popular previstos no art. 14, incisos I e II, e no art. 61, § 2º. Art. 3º A Revisão Constitucional terá por objeto as seguintes matérias: I – a organização dos Poderes; II – o sistema eleitoral e partidário; III – o sistema tributário nacional e as finanças públicas; IV – a organização e as competências das unidades da federação; e V – o sistema financeiro nacional. Art. 4º A Assembléia de Revisão Constitucional terá prazo máximo de doze meses de duração, contado da data de sua instalação. Art. 5º A Assembléia de Revisão Constitucional decidirá sobre a possibilidade de autorização de Revisões periódicas da Constituição, com intervalos não inferiores a cinco anos. Art. 6º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação. Sala da Comissão, em de de 2006. Deputado ROBERTO MAGALHÃES Relator.