111
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ-UNIOESTE CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM EDUCAÇÃO NÍVEL DE MESTRADO/PPGE ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO A INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA NAS ESCOLAS LATINO-AMERICANAS DE AGROECOLOGIA DA CLOC-VIA CAMPESINA NO BRASIL E VENEZUELA JOAO CARLOS DE CAMPOS CASCAVEL/PR 2014

A Intgracao Latino-americana nas Escolas Latino-americanas de Agroecologia da Cloc-Via Campesina no Brasil e Venezuela.pdf

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARAN-UNIOESTE CENTRO DE EDUCAO, COMUNICAO E ARTES PROGRAMA DE PS-GRADUAO STRICTO SENSU EM EDUCAO NVEL DE MESTRADO/PPGE REA DE CONCENTRAO: SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAO A INTEGRAO LATINO-AMERICANA NAS ESCOLAS LATINO-AMERICANAS DE AGROECOLOGIA DA CLOC-VIA CAMPESINA NO BRASIL E VENEZUELA JOAO CARLOS DE CAMPOS CASCAVEL/PR 2014 JOAO CARLOS DE CAMPOS A INTEGRAO LATINO-AMERICANA NAS ESCOLAS LATINO-AMERICANAS DE AGROECOLOGIA DA CLOC-VIA CAMPESINA NO BRASIL E VENEZUELA DissertaoapresentadaaoProgramadePs-graduao StrictuSensuemEducaoPPGE,daUniversidade Estadual do Oeste do Paran UNIOESTE, como parte dos requisitosparaobtenodottulodeMestreemEducao. readeconcentraoSociedade,EstadoeEducao. Linha de pesquisa: Educao, Polticas Sociais e Estado. Orientadora: Profa. Dra. Francis Mary Guimares Nogueira CASCAVEL/PR2014 ii Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP) C198i Campos, Joo Carlos de Aintegraolatino-americananasescolaslatino-americanasde agroecologiadaCloc-ViacampesinanoBrasileVenezuela./JooCarlosde Campos. Cascavel, 2014. 110p. Orientador: Prof. Dr. Francis Mary Guimares Nogueira Dissertao (Mestrado) Universidade Estadual do Oeste do Paran. Programa de Ps-graduao Strictu Sensu em Educao 1.EscolasdeagroecologiaIntegrao.2.Estruturacurricular.3. Movimentosocial.4.Socialismo.I.UniversidadeEstadualdoOestedo Paran. II. Ttulo. CDD 21.ed. 370

Ficha catalogrfica elaborada por Helena Soterio Bejio CRB 9/965 iii CAMPOS, Joo Carlos de AIntegraoLatino-AmericananasEscolasLatino-AmericanasdeAgroecologiada Cloc-Via Campesina no Brasil e Venezuela. DissertaoapresentadaaoProgramadePs-graduaoStrictuSensuemEducaoPPGE,da UniversidadeEstadualdoOestedoParan UNIOESTE,comopartedosrequisitosparaobteno dottulodeMestreemEducao.reade concentraoSociedade,EstadoeEducao.Linha de pesquisa: Educao, Polticas Sociais e Estado. Aprovado em: 29/08/2014 BANCA EXAMINADORA ____________________________________________________ Prof. Dr. Alexandre Felipe Fiuza (Unioeste) Coordenador Apresentada Comisso Examinadora, integrada pelos Professores: ____________________________________________________ Prof. Dr. Nilson Arajo de Souza (Unila) Membro Efetivo ____________________________________________________ Profa. Dra. Maria Lucia Frizon Rizzotto (Unioeste) Membro Efetivo ____________________________________________________ Profa. Dra. Francis Mary Guimares Nogueira (Unioeste) Orientadora iv Ao povo Latino Americano e Caribenho, entendido como as diferentes fraes da classe trabalhadora. Em especial a toda a militncia do MST e da CLOC-Via Campesina, com quem tenho aprendido a indignar-se e a lutar contra toda forma de injustia. v AGRADECIMENTOS Aprender com o coletivo tem sido uma realidade desde que me inseri na coletividade da luta do MST, desde o primeiro Tempo Escola na Turma Antnio Gramsci at aos diasatuais,emquetenhooprivilgiodesomarmeusesforosaestalindaluta pedaggica,dopovoSemTerraporReformaAgraria,justiasocialesoberania popular.PortantoagradeoaoMSTeatodososcompanheirosecompanheiras quecontriburamparaestaconquista.Conquistaquefazsentirmaior responsabilidadeenquantosermilitanteformador;pedagogodocampo;educador popular e militante orgnico da classe trabalhadora em nossa prtica social.UniversidadeEstadualdoOestedoParaneaequipedoPPGEquetemse empenhado em garantir a ps-graduao na universidade pblica e gratuita.AosprofessoresdoPPGEpelosimportantesdebatesecontribuioformativanas aulas do mestrado.Aoscolegasdeturmapelasinmerasconversas,intercmbiodeideias,dicase pelos momentos de alegria compartilhados, pelas amizades construdas ao longo da caminhada.Jos,Juliana,Celso,Andr,Sil,Andressa,Silvia,Sandra,Leonardo, camaradas que no esquecerei. CAPES pela bolsa de estudos. Francis por ter confiado e orientado este trabalho. Maria Lucia pela contribuio desde a banca de qualificao. AoNilsonquetambmtrouxecontribuiesfundamentaisdesdeabancade qualificao deste trabalho.AocamaradaRamonCasanovaesuafilhaJavierapelaacolhidaecuidadocom minhapessoanaestadaemCaracas,pelostragosepelasanlisescomRamon sobrearealidadevenezuelana,pelasdicasdepesquisa,pelaajudasolidria,meu muito obrigado companheiro.vi DenirSosaporaportarelementosimportantessobreoprocessode implementaodoIALAPauloFreire,peladisponibilidadeepelaboaconversa, meus agradecimentos companheiro.AoscompanheirosdabrigadainternacionalistaApolniodeCarvalho,aoMaicon, Marinho,Elias,Tairi,pormeacolherememvossacomunaecontribudonomeu deslocamentoataoInstituto,pelalindapraiadeChoronieaviajemdevoltaa Caracas. EquipedecoordenaodoIALAPauloFreirequemerecebeuefacilitou informaes sobre a conjuntura do Instituto.Aos educandos que se disponibilizaram a dialogar sobre o processo de formao. educandaLizMeirepeloacompanhamentoduranteaestadanoIALAemBarinas, sendo minha embaixadora em diversos momentos, muito obrigado.Ao camarada Francisco Javier por contribuir com elementos de analise do processo de implementao e processo pedaggico no IALA Paulo Freire. AocompanheiroJosMariaTardimqueaportouelementosimprescindveisparaa compreenso do processo na ELAA. comisso de Educao e formao da CLOC-Via Campesina, que contribuiu para a compreenso do desafio internacionalista da formao e educao nos IALAs para os Movimentos Sociais e se constituiu um importante espao de formao militante. AoscompanheirosecompanheirasdoIALAGuarani,acompanheiraFatimaPego pelosaprendizadoscompartidos,pelosmomentosdetensoedealegria compartidosemtrsanosdemilitncianoParaguaiquemuitocontriburampara minha formao poltica e que me encaminharam a este objeto de pesquisa. AocompanheiroRobertoBaggio,pelacontribuiocomelementosdaconjuntura poltica de implementao das Escolas de Agroecologia na Amrica Latina.AoNcleoCascaveldoSetordeEducao,Sandra,Alex,Mari,Janaine,Fatima, Valter,TatieMaicon,companheirosquesempreestiverammuitoprximosnessa trajetria de estudo e militncia no espao da universidade. vii Aos meus Familiares, meu pai Afonso e minha me Romalina, exemplos de pessoas batalhadorasederesistncia,minhasrazescampesinas,minhagratido.s minhasirmsSuzana,VeraLucia,AdelinaeSilvana,porteremsempreapoiadoe acreditado que eu conseguiria. Aos meus irmos, Jos Renato, Francisco, Moiss e Tiagopeloapoioeincentivoepelosmomentosdefuteboledecomemorao.Ao meu av Joo pelas boas conversas e exemplo de simplicidade.Aossobrinhosquejsomamdezefazemdestafamliaaindamaisgrandiosa. EstefanyMarcondes,aTaniaShardozin,Everaldo,Joarez(pexinho),Valdire Claudinei, cunhadosque passaram a conviver e aportar importantes conversas nos nossos momentos de convvio no circulo familiar.Afinal, ao povo latino-americano e caribenho ao qual perteno e me identifico. viii Debemos vencer los divisionismos y las conspiraciones, derrotando en 1000 batallas a quienes pretenden desde dentro y desde fuera debilitar y echar abajo a la Patria y su Independencia. Debemos derrotarlos y derrotarlos en paz. Hugo Chvez Fras "Ptria es algo ms que opresin, algo ms que pedazos de terreno sin libertad y sin vida, algo ms que derecho de posesin a la fuerza. Ptria es comunidad de intereses, unidad de tradiciones, unidad de fines, fusin dulcsima y consoladora de amores y esperanzas. Jos Mart ix A INTEGRAO LATINO-AMERICANA NAS ESCOLAS LATINO-AMERICANAS DE AGROECOLOGIA DA CLOC-VIA CAMPESINA NO BRASIL E VENEZUELA RESUMO:O presente trabalho permite uma reflexo sobre o processo histrico da criaoeimplementaodasEscolasLatino-AmericanasdeAgroecologiada CoordenadoraLatino-AmericanadeOrganizaesdoCampoeViaCampesina (Cloc-Via Campesina) como uma estratgia de formao de militantes na construo daintegraocamponesalatino-americana.Esteprojetodeescolateveinciona metadedaprimeiradcadadosculoXXI,orienta-sedesdeaperspectivada AlianaBolivarianaparaosPovosdeNossaAmricaTratadodeComrciodos Povos(Alba-TCP),quepartedaconcepodeintegraocomocooperao, solidariedadeecomplementaridade,portanto,aproblemticanestetrabalho analisarcomoseexpressaaintegraolatino-americananaestruturacurricular destasescolas.Apartirdeumaabordagemqualitativaeanalticaoobjetivogeral destadissertaofoianalisarcomoseexpressaaintegraolatino-americanana formao dos estudantes da Escola Latino-Americana de Agroecologia (Elaa-Brasil) edoInstitutoUniversitrioLatino-AmericanodeAgroecologiaPauloFreire(Iala PauloFreire-Venezuela),pormeiodaorganizaocurricularedoscontedos inscritos nas disciplinas. Para concretizar esse objetivo foram definidos os seguintes objetivosespecficos:a)apresentaraspectosdealgumasteoriasqueorientamo conceitodeintegraolatino-americanaesuasliesnaconformaotericada integraonaregio;b)apresentaroprocessohistricodecriaoeda implementao das escolas de agroecologia da Cloc-Via Campesina no Brasil e na Venezuela,comoconstitutivocentraldaconstruodocurrculodessasescolas;c) destacarnoscurrculosdasreferidasescolasoscontedosquetratam especificamentesobreaintegraolatino-americana;d)identificareanalisara concepodeintegraoexpressanaorganizaocurriculareseuscontedos.A partirdapesquisabibliogrfica,documentaledecampo,sedepreendeuqueas Escolas Latino-americanas de Agroecologia da Cloca-Via Campesina se inserem no contexto de disputa de projetos de classe com contedos antagnicos, e expressam nas orientaes tericas do currculo e nos contedos das disciplinas que compem oscursosministrados,comotambmpelocarterinternacionalista,queestona direocontrriadosprojetosquedefendemaintegraocomoprocessode incorporao de novos mercados. Trata-se de um projeto poltico, educativo e social quepretendeirradiarsualuzaosdistintosrincesdaAmricaLatina,poisos sujeitosformadosnaElaaenoIalaPauloFreireretornaroaosseuspasesde origemondecontinuaroalutaporumavidadignaparaasfuturasgeraes,na construo e fortalecimento de um novo modo deproduo orientado ao socialismo e apoiado na agroecologia, que se vincula necessidade de uma integrao que se realizaentrepaseslatino-americanosporconstituiraPtriaGrandelatino-americana com base nos valores de igualdade e solidariedade. . Palavras-chave: Integrao. Estrutura Curricular. Movimento Social. Socialismo. x LATIN AMERICAN INTEGRATION IN LATIN AMERICAN SCHOOLS OF THE AGROECOLOGIA CLOC - VIA CAMPESINA IN BRAZIL AND VENEZUELA Abstract:Thisworkallowsareflectiononthehistoricalprocessofcreationand implementationoftheLatinAmericanSchoolsofAgro-ecology,underthe responsibilityofCLOC-ViaCampesina(LatinAmericanCoordinationofRural Organizations and Via Campesina), as an established strategy to carry on formation ofactiviststobuilduptheintegrationofpeasantsofLatinAmerica.Thisschool projecthaditsbeginonthefirstyearsofthe21stcentury.Itisrootedinthe perspectiveofBolivarianAlliancetoPeopleofOurAmericaALBA(Commerce Trade of the People), out of the concept that integration is cooperation, solidary and complementarity.Therefore,theprobleminthispaperistoanalyzehowtoexpress the Latin American integration in the curriculum of these schools. From a qualitative analytical approach the general goal of this dissertation was to analyze how the Latin American integration expresses itself in the formation process of the students of the LatinAmericanSchoolofAgro-ecology(ELAA-Brasil)andoftheLatinAmerican CollegeInstituteofAgro-ecologyPauloFreire(IALA-PauloFreire/Venezuela), throughout the curricular framing and syllabus of the disciplines. In order to come to truethisobjectivethefollowingspecificgoalswereestablished:a)topresentsome aspects of theories that guide the concept of Latin American integration in the region; b) to present the historical process of creation and implementation of the schools of Agro-ecology of the CLOC-Via Campesina in Brasil and Venezuela; c) highlight from thecurriculumsofthoseschoolslistedabovethementionofLatinAmerican Integration;d)identifyandanalyzetheconceptofintegrationexpressedinthe curricularframinganditscontends.Fromtheliterature,documentaryandfield research , which was gathered from the Latin American School of Agroecology Cloca -ViaCampesinafitintothecontextofadisputeofclassprojectswithantagonistic content,andexpressthetheoreticalorientationsofcurriculumandcontentthe disciplines that make up the courses , as well as the internationalist character, which areintheoppositedirectionoftheprojectsthatadvocatetheintegrationand incorporation of new markets. It is a political , educational and social project that aims to shine their light to the different corners of Latin America, since the subjects trained in Elaa Iala Paulo Freire and return to their countries of origin where they continue to struggle for a decent life for future generations , to build and strengthen a new mode of production oriented to socialism and supported in agroecology , which is linked to theneedforanintegrationthattakesplaceamongLatinAmericancountriesto constitutea"PatriaGrande"LatinAmericabasedonvaluesofequalityand solidarity. Key words: integration, curriculum Frame, social movement and socialism. xi LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Aladi Associao Latino-Americana de Integrao Alalc Associao Latino-Americana de Livre Comrcio Alba Aliana Bolivariana para os Povos de Nossa Amrica Alba TCP AlianaBolivarianaparaosPovosdeNossaAmrica-Tratado de Comrcio dos Povos Alca rea de Livre Comrcio das Amricas Bird Banco Interamericano de Desenvolvimento CAN Comunidade Andina de Naes CelacComunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos Cepal Comisso Econmica Para a Amrica Latina e o Caribe Cloc CoordenadoraLatino-AmericanadeOrganizaesdo Campo CPP Coordenao Poltico Pedaggica Elaa Escola Latino-Americana de Agroecologia ENFF Escola Nacional Florestan Fernandes EUAEstados Unidos da Amrica FMI Fundo Monetrio Internacional IALA Instituto Universitrio Latino-Americano de Agroecologia IDE Investimento Direto Estrangeiro IFPRInstituto Federal do Paran xii Incra Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agraria MCCA Mercado Comum Centro-Americano Mercosul Mercado Comum do Sul MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MSPsdoCMovimentos Sociais Populares do Campo Odeca Organizao dos Estados Centro-Americanos OEA Organizao dos Estados Americanos ONU Organizao das Naes Unidas Otan Organizao do Tratado do Atlntico Norte PRONERA Programa Nacional de Educao na Reforma Agraria Sela Sistema Econmico Latino-Americano e do Caribe Sica Sistema de Integrao Centro-Americano Sucre Sistema nico de Compensao Regional TC Tempo Comunidade TE Tempo Escola UFPR Universidade Federal do Paran Unasul Unio de Naes Sul-Americanas URSS Unio das Repblicas Soviticas Socialistas SUMRIO

INTRODUO .................................................................................................................... 14 CAPTULO I ........................................................................................................................ 18 ASPECTOS TERICOS DA INTEGRAO LATINO-AMERICANA .................................. 18 1.1 A integrao latino-americana nos marcos da descolonizao poltica .............. 20 1.2 As travas imperialistas integrao latino-americana ........................................ 23 1.3 Avanos e limites na integrao latino-americana .............................................. 26 1.5 A integrao latino-americana sob a influncia das polticas neoliberais ............ 32 1.6 Lies do processo de integrao latino-americana ........................................... 34 1.7 Elementos do contexto poltico latino-americano atual ....................................... 42 CAPTULO II ....................................................................................................................... 45 PROCESSO DE CRIAO E IMPLEMENTAO DA ESCOLA LATINO-AMERICANA DE AGROECOLOGIA E INSTITUTO AGROECOLGICO LATINO-AMERICANAO PAULO FREIRE ................................................................. 45 2.1 Marco histrico da rede de Escolas Latino-Americanas de Agroecologia ........... 46 2.2 Processos implicados na origem das Escolas Latino-Americanas de Agroecologia ............................................................................................................. 49 2.3. O MST e as Escolas de Agroecologia ........................................................................... 54 2.4 Processo de implementao da Escola Latino-Americana de Agroecologia ....... 55 2.4.1 Uma escola internacionalista dos trabalhadores ......................................................... 57 2.5 Instituto Agroecolgico Latino-Americano Paulo Freire Barinas, Venezuela .... 65 2.5.1 Primeiros passos na construo poltico-pedaggica do Iala Paulo Freire .................. 71 2.5.2 Proposta pedaggica inicial do Iala Paulo Freire ......................................................... 78 CAPTULO III ...................................................................................................................... 84 O CURRCULO DAS ESCOLAS LATINO-AMERICANAS DE AGROECOLOGIA DO BRASIL, VENEZUELA E A INTEGRAO CAMPESINA LATINO-AMERICANA .... 84 3.1 A pedagogia do movimento e o mtodo pedaggico na Elaa e no Iala Paulo Freire ............................................................................................................... 85 3.2 Programas de Estudos ........................................................................................ 96 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................... 101 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................. 107 14 INTRODUO OpresentetrabalhotemcomotemticageralaIntegraonasEscolas Latino-AmericanasdeAgroecologia1 daCoordenadoraLatino-Americanade OrganizaesdoCampo-ViaCampesina(CLOC-ViaCampesina)2 doBrasile Venezuela.Apartirdesterecorteoobjetivogeralfoianalisarcomoseexpressaa integraolatino-americananaformaodosestudantesdaEscolaLatino-AmericanadeAgroecologia(Elaa-Brasil)edoInstitutoUniversitrioLatino-AmericanodeAgroecologiaPauloFreire(IalaPauloFreire-Venezuela).Esse objetivogeraldesdobra-senosseguintesobjetivosespecficos:a)Identificaros elementostericosqueorientamoconceitodeintegraolatino-americanaesuas liesnaconformaoterico-prticadaintegraonaregio;b)Analisaro processohistricodecriaoedaimplementaodasescolasdeagroecologiada Cloc-ViaCampesina(Cloc-VC)noBrasilenaVenezuela,comoconstitutivocentral daconstruodocurrculodessasescolas;c)Destacaroscontedosquetratam especificamentesobreaintegraolatino-americananoscurrculosdasreferidas escolas;d)IdentificareanalisaraconcepodeIntegraoexpressana organizao curricular e seus contedos. EstasescolassoprojetodaCloc-VC:articulaointernacionalde movimentossociaiscamponeses.ACloceaViaCampesinaarticuladasemnvel internacionalerepresentantesdemovimentossociais,agregamcamponeses, trabalhadoresagrcolas,indgenaseafrodescendentes,pequenosemdios produtores, migrantes etrabalhadoresagrcolasdetodo omundo, com maisde20 anos de existncia, representam um coletivo de mais de 200 milhes de pessoas e temrealizadoalutaemfavordaagriculturasustentvelempequenaescalacomo

1 Para expressaro conjunto de experincias construdas pelaCloc-Via Campesina,que sededica formao em agroecologia, denominaremos neste trabalho, os Institutos e Escolas, apesar de terem nveis e nomes diferentes, como Escolas de Agroecologia. 2 Estes dois movimentos, um latino-americano e outro mundial, a partir de 2011, decidem se unificar na Amrica Latina, pois j vinham compartindo dos mesmos objetivos e lutas desde as suas origens, quesomuitoprximas,porisso,apartirdeento,essasorganizaespopularespassamase expressar como Cloc-VC. 15 um modo de promover a justia social e a dignidade, resistindo ao modelo capitalista de agricultura, desenvolvimento e sociedade.AsescolasdeagroecologiadaCloc-VCestovinculadasaumprocessode integraolatino-americanapropostopelasorganizaescamponesas,quese vinculamnaperspectivadaAlba-TCP,criadaem14dedezembrode2004,eque temdadoprioridadeaocarterdejustiasocialdoprocessointegracionista,tem comopropostaumaintegraoenraizadaemseisconceitos-chave(princpios)e antagnicos Alca, como solidariedade, cooperao, complementaridade, respeito soberania dos pases e povos, justia social e equidade. Apesquisatevecomofontes:bibliografiassobreodebatetericoda integraolatino-americana,incorporandopossveisliesdesteprocessode integrao, que so relevantes para explicar a formao dos estudantes nas escolas deagroecologiadaCloc-VCnaVenezuelaenoBrasil,cartaserelatriosde congressos destas duas organizaes populares e das escolas, tais como o Projeto PedaggicodoIalaPauloFreireedaElaa;oProtocolodeIntenesdeTapes (2005);oAcuerdodeCooperacinenMateriaTecnico-AgrcolaVegetalentreaVia Campesina, o MST e a Repblica Bolivariana de Venezuela, assinado em setembro de2005naVenezuela;outrasbibliografiasquetratamdotema.Naaproximao comoobjetodeestudo,aindanocampodaempiriafoirealizadapesquisade campo,tendocomotcnicaaobservaoecomoformaderegistroodiriode campo.Almderegistrosdoautorpessoais,emseutrabalhocomointegranteda Cloc-Va Campesina e como um dos responsveis da implantao doIala-Guarani, no Paraguai.A exposio da pesquisa estar organizada em trs captulos. No primeiro e o segundo captulos apresentam-se os elementos tericos, tributrios e critrios para a snteseprovisriaapresentadanoterceirocaptulo.Noprimeirocaptulo apresentam-se os aspectos tericos sobre a integrao latino-americana. Com base nos seguintes autores Ruy Mauro Marini; Fernando Martinez Heredia; Nilson Arajo de Souza e de Wilson Cano. Estas bibliografias contriburam para a discusso sobre aspectosdaintegraolatino-americana,esobreaconfiguraodosdiversos mecanismosintegracionistasforjadosnalutadeclassesaolongodahistriade independnciapolticadospaseslatino-americanos.Almdisso,foipossvel 16 explicitarocarterdistintodosvriosprojetospolticosemdisputanocontinente que para alm de distintos so antagnicos, onde o fortalecimento de um inviabiliza a construo de outro. Com isso fica claro que a construo de uma nova sociedade latino-americana no se efetivaria sem rupturas.Osegundocaptulotratadoprocessodecriaoeimplementaodas EscolasdeAgroecologiadaCloc-VC,voltadaparaaformaodemilitantesdos MovimentosSociaisPopularesdoCampo(MSPsdoC)eparaaconstruoda integraocamponesalatino-americana.Nessaperspectiva,aeducaoescolar deveriapropiciaraosestudantesaapropriaodaproduoculturalede conhecimentos universais produzidos pela cincia.Oterceirocaptulo,tendocomorefernciaaconcepodecurrculoescolar deNewtonDuarte(2010),analisam-seoscurrculos,ondeestocontempladasas histrias,aspropostaspedaggicaseoscontedosdefinidosnasdisciplinasdas gradescurricularesdasescolaslatino-americanasdeagroecologiadaCloc-VC. Comosnteseapresentam-seoslimitesepossibilidadesdessasescolasde agroecologiaseincorporaremaoprojetodeintegraolatino-americana,mediante osdiversosespaosetemposeducativos,queconstituemadinmicapoltico-pedaggica dessas escolas.Apartirdesteacmuloasconsideraesfinaissintetizamosachados, apresentampossveisdesdobramentosefuturosestudossobreEscolasLatino-AmericanasdeAgroecologiaqueestoemprocessodeconstruobemcomoos seus limites para a concretizao da integrao latino-americana. Comoreferencialtericoadotou-seomaterialismohistricodialtico, entendidocomoacinciadoproletariado,classesocialempenhadacoma superaodasociedadedeclasseseinstauraodasociedadesocialista (FRIGOTTO,1987p.85),rompendoassimcomafilosofiadecartermeramente interpretativa, pois mais que interpretar a realidade necessrio transform-la. NessamesmadireoVendramini(2007,p.1396),ressaltaocarterde disputahistricaquetemmarcadoapesquisaemcinciashumanasnoquese refere objetividade da cincia e a sua capacidade de apreenso da dinmica e o 17 movimento social, de compreender os fatos sociais de forma totalizadora,e no que se refere anlise histrica e suas determinaes, da articulao do presente com o processo histrico que o engendrou, bem como suas perspectivas futuras. Aautorareafirmaanecessidadedeanalisarosmovimentossociaisatuais, tomando-os no como experincias desconectadas do seu conjunto social, mas de compreenderseusentido,tendoemvistaastradiespassadas,asuaorigem histrica, para no incorrermos no duplo erro de subestim-los ou supervaloriz-los (VENDRAMINI, 2007, p. 1400).Assim a experincia das Escolas Latino-Americanas de Agroecologia da Cloc-VC,foivistacomoprocessosqueestonomarcodalutainternacionalistados trabalhadores, experincia que est permeada por avanos e recuos, determinados pelas condies objetivas e subjetivas, pelas possibilidades histricas j construdas pelostrabalhadores,pelassuastradiese,especialmentepelalutadeclasses (VENDRAMINI, 2007, p. 1407). O que motivou essa temtica e seu recorte foi o percurso realizado pelo autor noInstitutoAgroeolgicoLatino-AmericanoGuarani(IalaGuarani)Paraguai,de 2009 a 2012, por meiodo acompanhamento poltico-pedaggicodesta escola. Que inclusiveeraparaseruma dasescolasestudadasnestetrabalho, masqueporser umprocessoquesedistancioudascaractersticasdaquelasduasescolascitadas acima,preferimosnoinclui-la,ficandoapossibilidadedeanalisa-laemfuturos estudos.Essaexperinciapossibilitouaaproximaoaodebateacercadasaes naCloc-VCesobreaintegraocamponesalatino-americana,emumcontexto polticoemqueoinimigodeclassenoestlimitadopelasfronteirasnacionaisde cadapas,aocontrrio,estarticuladointernacionalmente.apartirdessa realidadeedaslieshistricasdalutadaclassetrabalhadoraquesebusca construiraesqueestejamnomarcodalutainternacionalista,parapoliticamente se contrapor ao movimento conservador. Assim como o capital exerce seu domnio emnvelmundial,anossalutatemqueserinternacionalista,anti-imperialista,em defesadasoberaniadospovos,pelaconstruodeumasociedadesocialista (Escola Nacional Florestan Fernandes, 2007, p. 56). 18 CAPTULO I ASPECTOS TERICOS DA INTEGRAO LATINO-AMERICANA Nestecaptulosoanalisadasasdiversasperspectivasdaintegraolatino-americanaeaconfiguraodosmecanismosintegracionistas,nosmarcosdo desenvolvimentodependentedaseconomiaslatino-americanas,assimcomoso apontadas lies histricas a partir de determinados processos de integrao. Essa discussosedeuapartirdosseguintesautoreserespectivasobras:RuyMauro MariniADialticadaDependncia;FernandoMartinezHerediaPoltica revolucionariaeintegracinlatino-americana;NilsonArajodeSouzaAmrica Latina:asondasdeintegrao;LusaMariaNunesdeMouraeSilvaeNilson ArajodeSouzaATeoriadaDependnciaeasnovasformasdeintegraona Amrica Latina: o caso da ALBA;Wilson Cano Amrica Latina, Integrao Virtuosa ou Subordinada? Aolongodemaisde200anosdeconstruopolticaedebatetericoda integraolatino-americana,forammuitososembatesnocampoprticoeterico, poisasprimeirasaesparaaintegraoforamforjadasnatrajetriahistricade independnciapolticadospaseslatino-americanos.Osprojetosintegracionistas atualmenteemdisputanocontinentealmdedistintossoprojetosdeclasses antagnicasemqueofortalecimentodeuminviabilizaaconstruodeoutro, portanto,oavanonessaconstruosocietriaobjetivandoaintegraolatino-americanacomnfasenajustiasocial,nasolidariedade,nacomplementaridadee na soberania dos povos no pode-se efetivar sem rupturas.Importantedestacarqueintegraonopodeserconfundidacom incorporaoeconmica;osesforosdoimprioestadunidensenaAmricaLatina tm sido no sentido de soldar esta regio ao seu mercadoeconmico. Zuck, (2011, p. 20) afirma que,Aincorporaocolonialdaseconomiasamericanascorrespondeua umadesintegraodospovosindgenas,africanosporqueo sistema vigente imps uma identidade e a utilizou para que parte da sociedadepudessedominaroutraeaumanointegraodas 19 novassociedadesapsaindependncia,mesmoencontrando-se uma ao lado das outras. Estetrabalhoseorientaporestesentidolatodequeaintegraolatino-americanaumprocessoqueabrangedistintosmbitos,comoosocial,o econmico, o poltico, o cultural, o educacional e no simplesmente uma integrao comercial.Destamaneiraosentimentosuperadordascondiesreaisnasquais padecemospovoslatino-americanos,atravessadospeladependncia,sefaz unitrio. (ZUCK, 2011, p. 21). Constituiumgrandedesafiopensaraintegraoemumaregiocomoa Amrica Latina, regio do planeta que tem mais que o dobro do tamanho da Europa, 21.069.501kme10.180.000km,respectivamenteecom20pases.Semcontar todaatrajetriahistricadesubordinaoseconomiascentraiseaosimpriosa regio vem desde o colonialismo sendo enquadrada no mapa mundi do capitalismo comosubalternaeemexplorao,oquetornaosconceitosdecolonialismoe neocolonialismo como chaves para compreender os aspectos polticos, econmicos e culturais latino-americanos (HEREDIA, 2008 s/p, traduo livre).Asmarcasdacolonizaosoexpressasnagrandedesigualdadesocial.A atualidadedopassadocolonialseconcretizaesereproduznasestruturasda sociedade,pormeiodolatifndio,dasuperexploraodaforadetrabalho,da industrializaodependente,dasdeformaesnodesenvolvimentoeconmico,do carterantinacionaleantipopulardaclassedominanteedadesvalorizaodos elementos da cultura popular.Porm,nosltimosanosaAmricaLatinatemvivenciadoexperinciasque favorecemaintegraoemumaperspectivaautnoma,umaintegraopensada desdearegioenocomoaquelahistoricamentedeterminadapelosinteresses imperialistaspredominantes,quehistoricamentetembuscadoaincorporaoda Amrica Latina a seus mercados.Diversos movimentos sociais se mobilizaram, nas ltimasdcadas,contraasnefastasexperinciasdegovernosneoliberaisque aprofundaramdeformasubstantivaadependnciadaseconomiaslatino-americanas, no contexto de outra fase da internacionalizao capitalista. 20 Portanto,apresentaraspectostericosdaemergncia,desenvolvimentoe concretizaodaintegraolatino-americanaajudaaexplicarasrelaese implicaesdesseprocessohistricoqueresultanasexperinciasdasEscolas Latino-Americanas de Agroecologia. 1.1 A integrao latino-americana nos marcos da descolonizao poltica Aintegraolatino-americanaumdebatehistricodelongadata. Correspondeaoprocessodeindependnciadospaseslatino-americanosdas metrpolesespanholaeportuguesa.Muitosdosprceresindependentistasforam tambmoslderes,comoafirmaNilsonArajodeSouza,daprimeiraondade integraolatino-americana,comaindependnciaeformaodosEstados nacionais e a proposio de construo da Ptria Grande3, que segue na atualidade sendo horizonte de futuro para os povos em luta por uma Amrica Latina unitria e justa. Nesteprimeiromomentohistricodaintegraolatino-americana,houve vriastentativasdeintegraoregionalquenolograramseusobjetivos.Buscava-seretomarasideiasintegracionistasdosprecursoresdaslutasindependentistas, como as propugnadas pelo venezuelano Francisco de Miranda, Foramretomadas,aolongodasduasprimeirasdcadasdosculo XIX,pelosprincipaislderesdaindependnciadospasesda AmricaHispnica,taiscomoSimnBolvar,GasparRodrguezde Francia, Bernardo OHiggins, Miguel Hidalgo, Mariano Moreno, Jos de San Martin (SOUZA, 2012, p. 89). Sovriasasquestesquetmimplicaesnoinsucessodasiniciativas integracionistas,umdelesoprpriocarterdependenteesubalternodas economias da regio, herdado das colnias.

3 Ptria Grande um conceito que faz referncia possvel unidade poltica da Amrica Latina e est ligadoaoconceitodeunidadelatino-americana,ideaisdefendidospeloslibertadoresdaAmrica Espanholanaguerradeindependncia,especialmenteSimnBolvareJosdeSanMartnque propunham a unificao poltica das naes hispano-americanas. O termo foi criado pelo argentino ManuelUgarte,em1922,comottulodelivroLaPtriaGrandequebuscavapromoveraideiade unidade latino-americana.21 Tambmpode-seafirmarque,nestesprimeirospassosdeindependnciae perspectivadeintegrao,estoprojetoscomcontedosantagnicosemdisputa, poisaconstituiodaPtriaGrandelatino-americana,preconizadaporSimon Bolvar,SanMartn,entreoutros,noseconcretizou,poisoslimiteshistricos tenderam a consolidar Estados nacionais de acordo com os interesses da Inglaterra, grande potncia capitalista da poca, como aponta Marini (2005, p. 141). A revoluo industrial, que dar incio a ela, corresponde na Amrica Latinaindependnciapolticaque,conquistadanasprimeiras dcadasdosculoXIX,farsurgir,combasenaestrutura demogrficaeadministrativaconstrudaduranteacolnia,um conjuntodepasesquepassamagiraremtornodaInglaterra.[...] ignorando uns aos outros, os novos pases se articularo diretamente comametrpoleinglesae,emfunodosrequerimentosdesta, comearoaproduzireaexportarbensprimrios,emtrocade manufaturasdeconsumoequandoaexportaosuperaas importaes de dvidas. a partir dessa relao de dependncia e subordinao que a Amrica Latina se insere no mercado mundial. AAmricaLatinasedesenvolveemestreitaconsonnciacoma dinmicadocapitalismointernacional.Colniaprodutorademetais preciososegnerosexticos,aAmricaLatinacontribuiuemum primeiromomentocomoaumentodofluxodemercadoriasea expansodosmeiosdepagamentoque,aomesmotempoemque permitiamodesenvolvimentodocapitalcomercialebancriona Europa, sustentaram o sistema manufatureiro europeu e propiciaram o caminho para a criao da grande indstria (MARINI, 2005, p. 140). Ospaseslatino-americanospassaramapautarseudesenvolvimentonos marcosdocapitalismodependente.apartirdessemomentoqueasrelaesda AmricaLatinacomoscentroscapitalistaseuropeusseinserememumaestrutura definida:adivisointernacionaldotrabalho,quedeterminarosentidodo desenvolvimento posterior da regio (MARINI, 2005, p. 141).Segundooautorsupracitado,esteperodoummarconahistrialatino-americana, pois: a partir de ento que se configura a dependncia, entendida como umarelaodesubordinaoentrenaesformalmente independentes, em cujo marco as relaes de produo das naes subordinadassomodificadasourecriadasparaassegurara reproduoampliadadadependncia.Aconsequnciada dependncianopodeser,portanto,nadamaisdoquemaior 22 dependncia,esuasuperaosupenecessariamenteasupresso das relaes de produo nela envolvida. (MARINI, 2005, p. 141). Dentre as vrias tentativas de integrao neste perodo, a pioneira dentre elas foi a realizao do Congresso Anfictinico do Panam, em 1826, entre 22 de junho e 15dejulho,convocadoporSimnBolvar.Paraesteeventoforamconvidadas todasasjovensnaesdaAmricaLatina,inclusiveoBrasilcomexceodo HaitieEstadosUnidos,mas,aofinal,participaramdelegaesdoPeru,Centro Amrica,MxicoeGranColmbia(SOUZA,2012, p. 89).Resultandonos acordos deUnio,LigaeConfederaoPerptuaostratadospropunhambasicamentea integraodaAmricaHispnica.Aofinal,apenasaGranColmbia4 assinou[...]. Posteriormente(1830),aprpriaColmbiasedesagregouemvriasnaes. (SOUZA, 2012).As tentativas de integrao se seguiram ao longo do sculo XIX, como expe Souza (2012, p.89) em 1839, o governo peruano solicitou ao congresso constituinte do pas autorizao para convidar as demais repblicas hispano-americanas para a celebrao de um tratado de aliana defensiva.Ainda segundo este autor, Ainiciativaperuanade1839foiretomadaentre1846e1848, quando, com a participao do Peru, Chile, Bolvia, Equador e Nova Granada,realizou-seemLimaoprimeirocongressohispano-americanodepoisdoCongressodoPanam,aprovando-seo TratadodeConfederao.Em1856,poriniciativadaVenezuela, firmou-seoTratadoContinentalentreChile,Peru,Equador,Bolvia, CostaRica,Nicargua,Honduras,MxicoeParaguai.Namesma poca,firmava-seemWashington,poriniciativadaGuatemala,o Tratado de Aliana e Confederao entre Nova Granada, Guatemala, El Salvador, Mxico, Peru, Costa Rica e Venezuela. Entre novembro de 1864 e maro de 1865, por convite do governo peruano, realizou-seoquepodeconsiderar-secomoltimograndecongresso hispano-americano[...],quando,comaparticipaodaColmbia, Chile, Venezuela, Equador, El Salvador e Peru, aprovaram-se quatro tratados,dentreelesodeUnioeAlianadefensiva.Umpouco antes (1857), os intelectuais Francisco Bilbao (chileno) e Jos Maria Caicedo(colombiano)haviamutilizado,pelaprimeiravez,onome Amrica Latina. (SOUZA, 2012, p. 89-90).

4 Criado em 1821 e extinto em 1831, o pas Gran Colmbia compreendia os atuais territrios da Colmbia, Panam, Equador e Venezuela. 23 Comessasiniciativassedemonstrouoanseioemconstruiraintegraoa partirdeumpensamentoprprio,nomaismarcadoporconcepesexternas,e quedefendesseosinteressesdasjovensnaes.Estepensamentobuscava desatar-sedasconcepeseurocentristas,buscandoconstruirumpensamentoe uma identidade latino-americana.AsaesquebuscaramaconstruodaPtriaGrande,comoobjetivode superarlimitespolticos,econmicoseregionais,atravsdeumauniopoltico- econmica para contrapor-se aos possveis ataques imperialistas regio, conforme Marini (2005), no se concretizou. Oprojetoquehegemonizoufoiasujeiodaseconomiaslatino-americanas aosditamesdomercadomundial,dominadopelagrandeeconomiaimperialista,a Inglaterra,ouseja,aconservaodomodeloagroexportadordependente,em benefcio de uma pequena parte da sociedade e em detrimento do fortalecimento de economiasenaesindependentesesoberanas.Destamaneira,oprojetode independncia esbarrouem muitos limites e a independncia poltica no significou o fim da subordinao econmica da regio s grandes metrpoles capitalistas. 1.2 As travas imperialistas integrao latino-americana AinserosubordinadadaAmricaLatinaaomercadomundiallevou incorporaoeconmicadaregiopelaspotnciascapitalistas.Emumprimeiro perodopredominaramosinteressesdaInglaterra,quedisputoucomosEstados UnidosdaAmricaainflunciasobrearegio,disputaentreEstadosUnidose Inglaterra pela diviso da regio em suas reas de influncia ou mesmo de domnio direto(SOUZA,2012,p.90).Estejogodeinteressesimpactariadiretamentena polticaregionallatino-americana,criandobarreiraspolticaseeconmicassua integrao. ProferidapelopresidenteJamesMonroenodia2dedezembrode1823,no Congressonorte-americano,comolemaAmricaparaosAmericanos,a 24 declaraoemfavordaindependnciadospaseslatino-americanosseopunha influncia e intromisso de pases europeus sobre quaisquer aspectos, se colocando contraocolonialismoemterrasamericanas.ADoutrinaMonroenadadiziasobre uma possvel expanso do territrio dos prprios Estados Unidos na Amrica Latina, na prtica se constituiu na base da poltica intervencionista estadunidense na defesa de seus interesses e de suas empresas.OcapitalismonascentenosEstadosUnidosrompeufronteirase, depoisdecompraraFlrida,aLousianaeoOregon,promoveua guerracontraoMxico,em1845,eanexouosestadosdoTexas, Califrnia,Colorado,Arizona,NovoMxico,NevadaeUtah.Aps essebatismodefogonaguerradeconquistaterritorial,o expansionismoestadunidenseavanoupordoiscaminhos:abusca de ocupao territorial ou controle dos governos da regio com base em aes militares e a tentativa de avano econmico com base na promoo de acordos comerciais (SOUZA, 2012, p. 91). Estasaesocorreramnomarcodoquepassouasechamarpan-americanismo,dirigidasdesdeumaperspectivaexternaregio,buscando consolidarocontroledoimprioestadunidensesobreocontinentepormeios polticos,ideolgicosemilitar.Omarcohistricodestacorrenteestnas conferncias pan-americanas; a primeira foi realizada em 1889-1890 a partir da qual se fundou a Unio Pan-Americana sediada em Washington, que posteriormente deu origemOrganizaodeEstadosAmericanos(OEA)em1948,equeathojese constituieminstrumentodaaodoimprio,realizandoataquesagovernos legtimos e apoiando o intervencionismoe golpes de estado, uma marca da poltica estadunidense. AestratgiaaplicadanaAmricadoSulparaodomnioestadunidensefoi distintadaquelaempregadanasAmricasdoNorteeCentral;aoinvsde intervenomilitar,buscou-seestabeleceracordoscomerciais.Durantea1 ConfernciaPan-Americanarealizadaem1889foipropostaaformaodeuma amplacomunidadecomercialqueabrangessetodosospasesdaAmrica,algo parecido com a rea de Livre Comrcio proposta um sculo depois.A proposta no prosperou,entreoutrosfatores,emrazodosfortesinteressesinglesesquese contrapuseramaela.Acorridaimperialistaestadunidenseseexplicapelo desenvolvimentocapitalista,quedesdeaexpansoindustrialdemandavaabusca denovosmercadosedefontesdematriasprimas,estandonaorigemdeseu 25 expansionismo(SOUZA,2012,p.92),equeposteriormentesetornouuma necessidade estrutural a partir da centralizao e monoplio do capital. ComaconsolidaododomnioimperialistadaInglaterrasobreaeconomia mundialnosculoXIXeinciodoXX,aseconomiasmaisfrgeis,comoasda AmricadoSul,foramforadasaaceitaraaberturadesuaseconomiasaos produtosdaindstriaestrangeiraemdetrimentododesenvolvimentodeuma indstria local. Osistemaimplicavabasicamentenumadivisointernacionaldo trabalhoemqueaInglaterrareservavaparasiaproduoe exportaodeprodutosindustriais,cabendoaosdemaispasesa produo e exportao de produtos primrios (SOUZA, 2012, p. 93). Como triunfou, sobretudo na Amrica Latina, a perspectiva econmica voltada aos interesses ingleses, o papel assumido pela regio foi o de fornecer alimentos e demaismatrias-primasparaodesenvolvimentodaspotnciasmundiais capitalistas.ConformeMarini(2005),ainserosubordinadadaAmricaLatina economiamundialasubmeteuaumintercmbiodesigualcomaseconomias centrais,poisexportabensprimrioseimportaprodutoscomaltovaloragregado. As naes desenvolvidas se beneficiam, por meio desse intercmbio desigual com a AmricaLatina,deumamais-valiaextraordinriadevidoaoseumaiorgraude produtividade.Almdisso,comafortepresenadocapitalestrangeiroemseu interior,transferemmais-valiapormeiodaremessadelucrosedeencargos financeiros da dvida externa. (SILVA e SOUZA, 2010, p. 3).Diantedaincapacidadeemimpediressatransfernciademais-valia,os capitalistaslatino-americanosbuscamcompens-laatravsdasuperexploraoda fora de trabalho no processo de produo interna. A consequncia da dependncia ageraodeumcrculoviciosoemqueseaprofundaadependncia,comoa ciso na esfera da circulao em que se restringe o mercado interno para bens de consumo-salrio,aomesmotempoemque,comaconcentraoderenda decorrente,aumentaademandaparabensdeconsumocapitalista.(SILVAe SOUZA, 2010, p. 3). 26 ParaMarini(1992,p.116-117apudSOUZA;SILVA,2010,p.3),ainsero internacionaldependentedaeconomialatino-americanaacarretartambm,por isso mesmo, a impossibilidade de integrao das economias latino-americanas entre elasmesmas.Portanto,nosurpreende,assim,queaafirmaodaeconomia capitalistadependentelatino-americana,sobsuaformadeexportaodeprodutos primrios, faa declinar o esprito integracionista. Esta relao de explorao e subordinao das economias latino-americanas noimpediuodesenvolvimentodaregio,masolimitou,gerandoumtipode desenvolvimentoquereproduziaascondiesgeradorasdaexplorao,da dependnciaexternaedadesigualdade,ouseja,dependnciaspoderiagerar mais dependncia, como afirma Marini (2005).Apartirdessaconfiguraopoltico-econmica,aorientaoprodutivana AmricaLatinanasceparaatendersexignciasdacirculaocapitalista internacionalenodependedacapacidadedomercadointernoparaasua realizao. NaspalavrasdeSouza(2012,p.93),aoconsolidar-seodomnioexterno sobre a regio e sua diviso internacional do trabalho, malograram as tentativas que vinham se realizando para a integrao latino-americana, no que elas deixaram de existir, mesmo com menos fora elas continuaram. 1.3 Avanos e limites na integrao latino-americana Nessetipodeorientaoeconmica,atinciodosculoXX,houvepoucas excees regra. Uma dessas poucas excees, pouco conhecida, pelo menos na historiografia brasileira, o caso do Paraguai. A partir da construo de um modelo autnomodedesenvolvimentoopasemaproximadamente50anosde independncia,haviaconstrudoumanaoverdadeiramenteindependenteea maisavanadaemdesenvolvimentoeconmicoesocialnaAmricadoSul.At 1864, 27 [...]seponaalamismaalturaquelospaseseuropeosms desarrolladosdelapoca,constituyendouna formidablemaquinaria productora.En1860,cuatroaosantesdela guerra,produca7mil toneladas de tabaco, ms de 10 millones de kilos de yerba mate y ya posea 7 millones de cabezas de ganado vacuno para una poblacin menoraunmillndehabitantes.[]EnlaFbricadehierrode Ybycu, que trabajaba las 24 horas y tena 250 obreros, se produca unatoneladadiariadehierro,fabricndosedesdearmasparael ejrcito hasta implementos agrcolas para los campesinos. Construa suspropiosbuquesdeultramarquetransportabanproductosalos mercadoseuropeos.Sutecnologaeramuysuperioraladesus vecinos. (CORONEL, 2011, p. 79). Aguerragenocida(1864-1870)perpetradapelosinteressesimperialistasna regioelevadaacabopeloBrasil,ArgentinaeUruguai,destroouopas economicamenteeoconverteuemmaisumafonteparaextraoderiquezas naturais,comoeraasituaoaqueestavamsubmetidasvriasoutrasnaes latino-americanas. ComoexpeMarini(2005,p.167),apenascomacrisedaeconomia capitalista internacional entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, que o eixo daproduosedeslocaparaaindstria,dandoorigemmodernaeconomia industrialqueprevalecenaregio.ConformeSouza(2012),esteperodoquese estendeatadcadade1970marcaumasegundaondadeintegraolatino-americana.Apartirdapolticadesubstituiodeimportaesedacriaodeuma indstria debase,importantesprogressos naindustrializao foramimplementados em pases como Mxico, Brasil e Argentina, principalmente,e pode-se ainda incluir neste grupo o Chile, o Uruguai e a Colmbia. Estes pases alcanaram avanos no desenvolvimento industrial e por consequncia uma determinada extenso dos seus mercados internos.Osgovernosdospasesquemaisavanaramnesseprocesso procuraramimplementar,comocaminhoparaconsolid-lo,uma crescente autonomia em relao s potncias econmicas[...]. Para isso, fomentaram, entre outras coisas, a realizao de processos de integraoregional.Onacionalismonaperiferiaensejaaintegrao regional (SOUZA, 2012, p. 94). ExperinciasnacionalistasdesenvolvidasnoBrasilenaArgentina,nas dcadasde1930e1940,respectivamente,levaramaproximaoecooperao 28 entreestespases,quejtinhamesboadoumprojetodeintegraoqueinclua tambmoChile.Portantoonacionalismodesenvolvidoemalgunspaseslatino-americanos,aoinvsdeisolar-seemsi,emdeterminadoscontextoshistrico-polticos, buscaram ampliar a integrao e a cooperao com seus vizinhos. Com o processo de desenvolvimento da indstria e diversificao produtiva, a atenovoltou-separaasrelaesentrepaseslatino-americanos,jque em nvel mundial houve grandes obstculos ao comrcio, devido s duas grandes guerras. A consequncia disso foi que houve um significativo aumento no intercmbio comercial entre distintos pases da referida regio.AArgentinaeoBrasildesenvolveram,nesseperodo,importantepapelnos processosintegracionistaslatino-americanos,tantopelassuasdimenses geogrficasedemogrficas,quantopelaimportnciaeconmica,poisforamestes doispasesquemaisavanaramnoprocessodedesenvolvimentoindustrial.Efoi justamentedessespasesaprimeirainiciativadeintegraonessanovaonda. Brasil e Argentina, a partir da Conferncia da Bacia do Prata, realizada entre 27 de janeiro e 6 de fevereiro de 1941, assinaram vrios acordos de integrao comercial (SOUZA,2012,p.95).Comonamaioriadosprojetosdeintegrao,apretenso inicialeraumacordoparaformarumareadelivrecomrcioparaavanar posteriormentecriaodeumaunioalfandegria,inclusive,comospases vizinhos do Cone Sul latino-americano e regio andina.PorpressoeinflunciadosEstadosUnidosnoseconcretizaramgrandes avanosnoprocessointegracionista,queseriaretomadocomacriaopela Organizao das Naes Unidas (ONU), em 1948, da Comisso Econmica para a AmricaLatina(Cepal)comoobjetivodequeestaComissoestudasseos problemasdaregioeapontassesolues.Lideradapeloeconomistaargentino Ral Prebisch e composta por uma srie de jovens economistas e cientistas sociais epolticos,dentreeles,obrasileiroCelsoFurtado,cumpriuumpapeldecisivona formulao do pensamento econmico latino-americano (SOUZA, 2012, p. 96).Umdosproblemashistricosidentificadosnaregiofoiobaixo desenvolvimento econmico dos pases latino-americanos, e entre os meios para a superaodesseslimites,estavaodegarantiraindustrializaoeo 29 desenvolvimento econmico. A Cepal props um projeto integracionista, queseria, portanto,acondioparaodesenvolvimentoautnomoeendgenodaregio (SOUZA, 2012, p. 97). OMercadoComumCentro-Americanoseconstituiunaprimeiraexperincia integracionistasobinspiraodaCepal,compostoporElSalvador,Guatemala, Honduras,CostaRicaeNicargua,eem1951foicriadooComitdeCooperao Econmica do Istmo e a Organizao dos Estados Centro-Americanos (Odeca), que setransformarianoMercadoComumCentro-Americano(MCCA)em1960,eno Sistema de Integrao Centro-Americano (Sica), na dcada de 1990. Em termos de intercmbiocomercial,esseblocoproduziuresultadossignificativosemsuaetapa inicial (SOUZA, 2012, p. 97). Apesar dos contratempos que constantemente malograram a integrao entre estespases,edapressoestadunidense,comoumadasmaioresbarreirasao processo de integrao autntica e soberana dos pases latino-americanos, o projeto integracionistanuncasaiudepauta,oracommaisintensidadeoracommenos,e sempre ressurgia a partir de determinada conjuntura poltica da regio.OprojetomaisambiciosoidealizadonesteperodofoiaAssociaoLatino-Americana de Livre Comrcio (Alalc), integrada por Argentina, Brasil, Chile, Mxico, Paraguai, Peru e Uruguai, sua proposta consistia naideia de integrar o conjunto da Amrica Latina e cujo tratado foi assinado em 1960 (SOUZA, 2012). Nessemomentofavorvelintegrao,chegou-seconclusodeque,em lugardoalinhamentoautomticocomqualquerdasduassuperpotnciasmundiais da poca (EUA e URSS), deveriam buscar um caminho prprio, de no alinhamento. Assim,[...]oslderesdevriospasesdoTerceiroMundodecidiramcriaro MovimentodePasesNoAlinhados[1961],quecomeoua congregarospasesquequeriamseguirumcaminhoindependente. O crescimento desse movimento fortaleceu a tendncia unidade de pases mais pobres (SOUZA, 2012 p. 99). MasmaisumavezosinteressesdosEstadosUnidos,queapsaIIGuerra Mundial,setornouhegemnicocomoaprincipalpotnciacapitalistamundial, 30 entravam em choque com esse projeto integracionista.Essa hegemonia se deu em todos os campos. No econmico, convertendo o dlar em dinheiro mundial, controlando asinstituiesmultilaterais(FMI,Bird)epromovendooavanode suastransnacionais;nomilitaregeopoltico,mantendosuastropas naEuropa,patrocinandoacriaodaOrganizaodoTratadodo AtlnticoNorte(Otan)etentandoevitaroavanodosocialismona sia(guerracontraeCoria);e,nopoltico-ideolgico,erigindoo anticomunismoadoutrinacentraldasuapropagandaideolgica, deflagrando a chamada Guerra Fria. (SOUZA, 2012, p. 100). Umagigantescacombinaodedomnioeconmico,poltico,cooptaes, represses,ofensivasculturais,consumouopredomnionorte-americanosobrea AmricaLatina.Pormaisqueencontraramalgumadificuldadenoincioparao avanodesuastransnacionaisdevidoaodesenvolvimentismoeintegrao propostospelospasesdaregio,osEstadosUnidosretomaramopan-americanismo, com a realizao a partir de 1944, das Conferncias Interamericanas. Na de 1948, criou-se a OEA, que substituiu as conferncias.Para a poltica de avano das transnacionais estadunidenses na regio,[...]passouaserdefundamentalimportnciaasubstituiode governoslatino-americanosquenoestivessemdeacordocoma aberturadesuaseconomiasparaaentradadecapitalestrangeiro. Sucederam-se,apartirda,osgolpesmilitaresnaregio.(SOUZA, 2012, p. 102).Este fator foidecisivo paraque osacordos deintegraonoconseguissem passar de acordos comerciais, e mesmo esse estgio foi muito limitado. E, como a essa poltica e a esse avano econmico no interessava a efetivao da integrao latino-americana, os acordos firmados para a criao da Alalc no saram do papel (SOUZA, 2012, p. 102). Assim,combaseemMarini(2005),pode-seafirmarqueapartirdeuma redivisointernacionaldotrabalho,aindustrializaonaAmricaLatinaocorre tambmdentrodoslimitesdadependnciaedodesenvolvimentoassociados economias capitalistas centrais, pois no h ruptura das relaes que a configuram. 31 1.4 Crises do imprio e a integrao latino-americana Uma terceira onda de integrao apontada por Souza (2012) corresponde ao declnio do poderio estadunidense na regio a partir da dcada de 1970, com a crise mundialdeflagradapeladesvalorizaododlarepelaelevaodospreosdo petrleo em nvel mundial. Deste perodo consta a criao, nos marcos da Alalc, do PactoAndinoconstitudoinicialmenteporBolvia,Chile,ColmbiaePeru,que receberia, em 1973, a adeso da Venezuela e, posteriormente, a sadado Chile .OSistemaEconmicoLatino-Americano(Sela),impulsionadopelogoverno mexicano e com o apoio do governo civil-militar brasileiro, foi criado em 1975, como medidadecombateaosubdesenvolvimento,criseedependnciaexterna.O fortalecimentodomovimentodospasesnoalinhados,nadcadade1970, possibilitouaretomadadoprojetodeintegraolatino-americana,quese materializounoTratadodeMontevidu,quetransformouaAlalcnaAssociao Latino-Americana de Integrao (Aladi) (SOUZA, 2012, p. 104). Somando-sesaesquefortaleceramoprocessodeintegraotambm estaformaodoGrupodeApoioaContadora,em1983,compostopor Venezuela,Mxico,ColmbiaePanam,recebendoaadesoem1985doPeru, Brasil, Argentina e Uruguai. Tratou-se de um grupo para discutir questes polticas, em um primeiro momento, a pacificao da Amrica Central (que estava em guerra civil)eposteriormente,comaampliaodeseusobjetivos,passouasechamar GrupodoRio,tratandoapartirdadeumconjuntodequestesreferentes problemtica latino-americana. Este mecanismo transformou-se recentemente, como setratarmaisadiante,naComunidadedeEstadosLatino-Americanose Caribenhos (Celac).Detodasasiniciativasrealizadasparaaintegraolatino-americana,o MercadoComumdoSul(Mercosul),celebradoem1991paraintegraroBrasil, Uruguai,ArgentinaeParaguai,foiumadasmaisimportantes.Essaaproximao entre Brasil e Argentina marcaria um dos eixos da integrao latino-americana.OantecedentemaisimediatodaformaodesseblocofoiaAtade IntegraoBrasil-Argentinafirmadaem1986entreospresidentes 32 JosSarney(Brasil)eRalAlfonsin(Argentina),oseguintefoia assinatura,em1988,doTratadodeIntegrao,Cooperaoe Desenvolvimento entre Brasil e Argentina. (SOUZA, 2012, p. 105). Porenvolverosdoispasesquemaissedesenvolveramindustrialmentena AmricadoSul,oMercosulsetornariaumdosblocoseconmicosdegrande importncianaeconomiamundial,napocadesuatransformaoemUnio Aduaneira(1995);eraoquartomercadoconsumidordomundo,comumsetor industrial dos mais importantes entre os pases em desenvolvimento.ApropostaconhecidacomoIniciativaparaasAmricas,lanadaem1989 pelopresidenteestadunidenseGeorgeHerbertWalkerBushquebuscavainstalar uma rea de livre comrcio entre as Amricas e oCaribe com exceo de Cuba, contraditoriamentecontribuiuparaoprocessodeintegraolatino-americana. Mesmo sendo favorveis proposta estadunidense, os governantes sul-americanos da poca, orientados por seu corpo diplomtico, preferiram formar um bloco regional como forma de fortalecer sua posio na negociao com os EUA (SOUZA, 2012, p. 106-107).Ao que parece, quanto mais o imprio se ocupa em resolver seus problemas internoseseocupamenoscomasintervenesnospaseslatino-americanosa integrao entre estes se faz mais dinmica. 1.5 A integrao latino-americana sob a influncia das polticas neoliberais Adcadade1990correspondetambmaoperododoavanoe aprofundamentodaspolticasneoliberaisnaAmricaLatina.Oliberalismocomo polticaeconmicaecomoideologiadominanteconsumouoretrocessodas formaeseconmicasdosEstadosnacionais,acolossaldeterioraodas sociedadeseaentregadopatrimniopblicoedosrecursosnaturaiss corporaestransnacionais.Amaiorpartedosinvestimentosdiretosdoexterior (IDE)foialocadaemcomprasdeempresaspblicaseprivadasnacionais, predominantementeemservios(CANO,2008,p.90).Ocorreramcomissoa 33 debilitaodasconquistassociaishistricasedasinstituiescidads,eo fortalecimento das corporaes e do capital.OMercosulfoipensadoemsuaorigemparaseruminstrumentode desenvolvimentoautnomodaregio,fortalecendoointercmbioeacooperao entreospasesassociados,visandosuperaroproblemahistricodo subdesenvolvimento.Apartirdoprocessodeaberturadaseconomiasaomercado internacionaledacirculaodecapitaislevadoacabopelosgovernosliberaisde FernandoCollor,ItamarFrancoeFernandoHenrique,servisaosinteresses imperialistas, o Mercosul passou a priorizar o livre comrcio. O abandono do projeto dedesenvolvimentonacionaleregionalporpartedegovernosque,pressionados pelos Estados Unidos e pelo FMI, deixou de proteger a incipiente indstria nacional, beneficiandoocapitalfinanceiroeascorporaesmonopolistas,resultouem processo de desindustrializao, aprofundando a crise e a debilidade econmica da maioria dos pases latino-americanos.O conjunto dessas polticas e reformas neoliberais constituiu um todo articuladoparapermitirafuncionalidadedomodeloneoliberalna AmricaLatina,qualseja:amplaliberdadeparaocapital, necessidadedasreformasdossistemasfinanceirosnacionais, abertura comercial e de servios, flexibilizao das relaes trabalho-capital,paradiminuirojbaixocustodotrabalho,reformasdos sistemasprevidencirios,paracriarmaisumimportantemercado paraocapitalfinanceiro,reformasdoEstadonacional,para desmantelar suas estruturas. [...] Assim, no difcil entender que o neoliberalismoimpostodeteriorouaindamaisnossascondies econmicas,polticasesociais,jdebilitadasnadcadaanterior (CANO, 2008, p. 8990). Pode-se afirmarque oprocesso deintegraolatino-americanatem ocorrido semprenosmarcosdacontradiodalutadeclasses,enoestalheia conjunturapolticamundial.Empocasdehegemoniaestadunidensesobrea regio,esteschegaramaconsideraraAmricaLatinacomoseuptiotraseiro, regio que no poderia ousar em desafiar o destino colonial imposto por eles. Como resultadodalutaporumaintegraoautntica,desdeopontodevistasocial, poltico e econmico para o desenvolvimento da regio, no foi possvel ao imprio bloquearoprocessodeintegraolatino-americana,masomoldousegundoos interessesdesuascorporaes,aoprovocaranfasenasrelaesdecomrcioe no regionalismo aberto (SOUZA, 2012, p. 113). 34 Nestes dois sculos de independncia sul-americana, o projeto de integrao implementadofoigeralmentelimitadopelosinteressesexternosregioque conseguiramsubordin-losgrandesmetrpolesdocapitalismo.Oprojetode desenvolvimentosoberanoeintegradodaseconomiaslatino-americanas,mesmo quemantidoempautaporvriosmovimentossociaisegovernosprogressistas, todavianoseconcretizou.Estasdeformaesnoprocessointegracionistalatino-americano e caribenho suscitaram vrios problemas e desafios, um destes consiste noqueapontaMarini.Comodesenvolvimentoindustrialbrasileiro,dirigidoao mercadointernacionaldeexportaes,opaspodeassumiropapelde subimperialista, reproduzindo na relao com outras naes a mesma lgica qual est submetido em nvel internacional (MARINI, 2005, p. 179 -180). O intercmbio embasado no processo de concorrncia pode afetar o processo de integrao, na perspectiva de rompimento com o modelo hegemnico.[...] h uma diviso regional do trabalho em que o Brasil o principal beneficirio:exportaprincipalmenteprodutosindustriaiseimporta preferencialmenteprodutosprimrios;oBrasilvemsendo crescentementesuperavitrio:seusupervitcomercialemrelao aosdemaispasesdoMercosulsubiudeUS$2,5bilhesem2004 para US$ 6,8 bilhes em 2008 (SOUZA, 2012, p. 109). necessrio, desde uma perspectiva de construo autentica e autnoma de integrao,pens-laapartirdeoutrosprincpios,quenoaquelesligados competioeaocomrcio,diametralmentedistintoasexperinciasemmarcha comoaAlba,quepropugnaumaintegraoembasadanosprincpiosde solidariedade,complementariedade,cooperao,justiasocialerespeito soberaniadospovosenaes.Estaseconstituinatarefarevolucionriadaslutas dentro dos marcos do latino-americanismo popular no sculo XXI. 1.6 Lies do processo de integrao latino-americana apartirdasliesdoprocessodeintegraolatino-americana, quejtem maisde200anos,queseproduziroexperinciascomoasEscolasLatino-AmericanasdeAgroecologia.Pois,apesardoslimitesnosprocessos 35 integracionistas,notranscursodosdoisltimossculostem-semantidoideias favorveisintegraolatino-americana.Comoapresentadoanteriormente,os interessesexternosregiointerferiramnosprocessosdeintegraoeno desenvolvimento econmico dos paseslatino-americanos, criando deformaes e limites ao processo integracionista. de longa data o interesse dos Estados Unidos emsoldaromercadolatino-americanossuasfinanasesuamquinade produo (CANO, 2008, p. 103). EfoiemoposioamaisumaofensivaimperialistasobreasAmricaseo Caribequeseinaugurouumnovoperodonahistriadaintegraolatino-americana.Opontodeinflexofoiaconstituiodegovernosprogressistasna Amrica do Sul (SOUZA, 2012, p. 113). No final do sculo passado e incio deste, aspolticasimpostaspeloFMIafundaramaindamaisnossaseconomias posteriormentesuaaplicao,persistiramainflao,odesempregoea estagnaoeconmica(CANO,2008,p.87).Comograndesbeneficiriosda liberalizaodaseconomiaslatino-americanas,estoascorporaes estadunidensesesuastransnacionais,quepuderamapartirdessaspolticas, superexplorar as economias latino-americanas. Porm, isso no era tudo: NaAmricaLatinaaaltadependnciadenossaeconomia,as grandesdiferenasentreaseconomiasnacionaiseasinmeras crises que nos afetam debilitaram ainda mais nossas potencialidades dedecisoecrescimento,porconsequnciaosEstadosnacionais. Nobastasseisso,desdealtimadcadadosculopassadoos EstadosUnidosdaAmricatentamnosimporumaintegrao subordinada, a Alca (CANO, 2008, p. 86). Lanadaem1994,pelopresidenteBillClinton,duranteaCpuladas Amricas, realizada em Miami e com a presena de 34 pases do continente, aAlca pretendia ser uma grande rea de livre comrcio, buscando para isso a remoo de obstculoslivrecirculaodeempresasecapitaisemtodoocontinente americano.Desdeoincio,osEstadosUnidosexigiramaexclusodeCubaea permanncia da imposio do bloqueio econmico ao pas socialista.Desde esta constatao fica evidente, conforme Souza e Silva (2010, p. 1), que, QuantomaioradependnciaexternadaAmricaLatina,menores suaspossibilidadesdeintegraoou,ditodeoutromodo,maiora desintegraodaregio;e,aoinverso,osprocessosdeintegraoda 36 regio avanam nos momentos em que sua dependncia externa entra emcriseecrescemascondiesparaummaiorgraudeautonomia regional.Aintegraoregionalseria,ademais,uminstrumentopara enfrentar a dependncia externa. Depois de mais de uma dcada de implementao de polticas neoliberais, a respostaveioatravsdaeleiodevriosgovernosquerepresentavamnaquele perodoorechaoquelaorientaopoltico-econmica.Comamudanade governosem2003naArgentinaenoBrasil,somando-semudanaocorridana Venezuelaem1999,algicadasnegociaessofreufortealterao(SOUZA, 2012,p.115-116).OBrasil,comoumadasprincipaiseconomiasdaregio, cumpriupapelfundamentalparaaquedadaAlca,poisvriosestudos demonstravam que o pas teria mais ameaas que oportunidades com a instaurao dolivremercado.AltimatentativaemdiscutirotemaocorreunaCpuladas Amricas,emMarDelPlata,noanode2005,masospasesdoMercosulsequer aceitaram colocar o assunto em pauta; foi o enterro da Alca, como declarou poca opresidenteHugoChaves.ComaeleiodeEvoMoralesnaBolviaeDaniel OrtegaemNicargua,noanode2006,RafaelCorreanoEquadorem2007,se ampliou oblocode paseslatino-americanoscomgovernosque buscarampolticas deafirmaonacional,anti-imperialistasedefortalecimentodaregioperantea economia mundial.Portanto,apartirdaexperinciadeintegraonaAmricaLatina,amaioria dospaseslatino-americanosretoma,naltimadcada,projetosintegracionistas que buscam construir a autonomia poltica e econmica da regio, surgindo projetos deintegraoqueseopemaoprojetoimperialistadedominao,comoaUnio dasNaesSul-Americanas(Unasul),aAlianaBolivarianadosPovosdeNossa Amrica(Alba)eaComunidadedosEstadosLatino-AmericanoseCaribenhos (Celac),comdestaqueparaaAlbacomoainiciativaquemaistemavanadona perspectiva socialista. AUnasul,criadaem2008,comoobjetivodeimpulsionaraintegrao regionalemmatriadeenergia,educao,sade,ambiente,infraestrutura, seguranaedemocracia,buscatambmaprofundaraunioentreasnaessul-americanas.EstcompostanaatualidadeporArgentina,Bolvia,Brasil,Colmbia, Chile,Equador,Guiana,Paraguai,Peru,Suriname,UruguaieVenezuela;soos 37 dozeestadosmembros.PanameMxicopermanecemcomoobservadores.Os idiomasoficiaissooespanhol,ingls,portuguseneerlands.Destaca-secomo objetivonotratadoconstitutivo,firmadoemBraslia,em23demaiode2008,a construodeumespaodeintegraoeunionosaspectosculturais,sociais, econmicos e polticos entre os povos. A Unasul criada a partir de vrias tentativas deintegraroMercosuleaComunidadeAndinadeNaes,conseguindoprogredir apenasapartirde2003comaassinaturadoAcordodeComplementao Econmica.Masosacordosvisandocriaodonovoblocoregional,a ComunidadeSul-AmericanadeNaes,sseriamformalizadosem dezembrode2004emCuzco(Peru),comseudesenhofinalsendo aprovadopelaICpuladaComunidadeSul-AmericanadeNaes, realizada nos dias 29 e 30 de setembro de 2005 em Braslia (Brasil). Nessaltimareunio,oblocopassariaasechamarUniodas NaesSul-Americanas(Unasul).Massuacriaodefinitivas ocorreriaa23demaiode2008emBraslia,mediantetratado assinado por representantes dos 12 pases integrantes, o qual ainda necessita ser ratificado pelos congressos nacionais5. (SOUZA, 2012, p. 117-118). Oobjetivo,comojfoidito,noserestringecriaodeumareade mercado comum, como ocorreu em discusses anteriores.Nasdiscusses,ogovernodaVenezuelainsistiuqueaintegrao meramente pelo comrcio poderia significar desintegrao, medida que,naconcorrncia,ospasesmaisfrgeissairiamperdendo.Por isso,oeixodeveriaserarealizaodeparceriasprodutivasena rea de infraestrutura particularmente em energia como forma de desenvolveroconjuntodaregioefortalec-lanocenrio internacional.Ocritriobsicoseriaacooperao,enoa competio. (SOUZA, 2012, p. 118). Defundamentalimportnciaemperseguiraconstruodaintegraolatino-americanafoiacriaodaComunidadedosEstadosLatino-Americanose Caribenhos (Celac), durante a Cpula da Unidade da Amrica Latina e do Caribe, realizada em fevereiro de 2010, em RivieraMaya, Mxico e, sem dvida, significou mudanasprofundasnaconjunturapolticadaregio.Nesteevento,convergiram doisprocessosdeaproximaodospasesdaregio:aXXICpuladoGrupodo

5 SegundopaginaoficialdoMinistriodasRelaesExterioresdoBrasil,dez pases j depositaram seus instrumentosderatificaoArgentina,Brasil,Bolvia,Chile,Equador,Guiana,Peru,Suriname, UruguaieVenezuela.Disponvelem:http://www.itamaraty.gov.br/temas/america-do-sul-e-integracao-regional/unasul, acessado em 09/10/2014.38 Rio, de natureza poltica, e a II Cpula da Amrica Latina e Caribe (Calc), que trata deintegraoedesenvolvimento(SOUZA,N.A.,2012,p.119),eseefetivouo consenso,nestaocasio,daconstruodeumnovomecanismodeconcertao poltica e integrao, que abrigaria os 33 pases da Amrica do Sul, Amrica Central, Caribe e o Mxico. DessamaneiraaCelacresultadodaunificaodoGrupodoRio (concertaopoltica),edaCalc(desenvolvimentoeintegrao),herdandoo patrimniohistricoepoltico,representadosporestasorganizaes.Essa convergncia ocorreria de forma gradual, com a manuteno de agendas e mtodos de trabalho do Grupo do Rio e da Calc at a concluso do processo de constituio da Celac, que ocorreu na III Calc, convocada para julho de 2011, na Venezuela, com o objetivo de concluir o processo de formao da Celac.Nosdias27e28dejaneirode2013,celebrou-seemSantiago,Chile,a primeiraConfernciadaComunidadedeEstadosLatino-AmericanoseCaribenhos (Celac).Nestaocasiosecomemorouumanodeseufuncionamentoalmde reafirmaremoscompromissosdestacomodesenvolvimentodaregio,apaz mundialeumasriedetemasquesopreocupaesnocenriointernacional.Se expressaaindanadeclaraodeSantiagooagradecimentoRepblicadeCuba poracolherapresidnciaprotemporedaCelac,noanode2013,assimcomoa celebraodaIIConfernciaqueserealizounosdias28e29dejaneirode2014, nesse pas. Para o ano de 2014, a Costa Rica assumir a presidncia pro tempore e a realizao da III Conferncia da Celac, e no ano de 2015 ser a vez do Equador. importanteressaltarqueestepareceserummomentoestratgiconaconjuntura latino-americana para a integrao.Emprimeirolugar,porqueaprimeiravez,desdequeseiniciaram asnegociaesparacriaodaAlca,queserenemos33Chefes deEstadoedeGovernolatino-americanosecaribenhossema presena dos Estados Unidos e Canad, e com a presena de Cuba, paradiscutiroprocessodeintegraoregional.(SOUZA,2012,p. 120) DuranteascelebraesdaIIConfernciadaCelac,emjaneirode2014,foi inaugurado um moderno porto em Cuba, fruto da cooperao entre o Brasil e aquele pas.Estaaodogovernobrasileirocontoucomforteoposiodesetores 39 conservadoresdaburguesiabrasileiraeelogiadaporsetores do empresariadoque veemcombonsolhosacrescenteinflunciaeinserodopasnaeconomia regional.ACelacseconstituiemumadasmaisimportantesaesdeconstruoda integrao latino-americana. a iniciativa de integrao mais abrangente de toda a histriadaintegraolatino-americana.AcriaodaCelacsignifica, simbolicamente,odistanciamentodaAmricaLatinaemrelaoaopan-americanismoeseuretornoaolatino-americanismo(SOUZA,2012,p.120). Inclusive se cogita a viabilidade de a Celac substituir as funes da Organizao dos Estados Americanos (OEA). Tambmsedesenvolvenaregiooutrobloco,aAlba,quetemdelineado desde seu incio uma postura radical anti-imperialista e de carter socialista. A Alba rene pases da Amrica do Sul (Venezuela, Bolvia e Equador), da Amrica Central (Nicargua)eCaribe(Cuba,SoVicenteeGranadinas,Dominica,Antguae Barbuda) (SOUZA, 2012, p. 118-119); juntos estes pases abarcam umasuperfcie de2.513.230km2eumapopulaode71.479.532habitantes,representandoum PIB de aproximadamente 700 bilhes de dlares. AAlbafoipropostapelopresidenteHugoChvezFrias,em2001,masa declarao conjunta entre Chvez e Fidel Castro que a instituram, foi assinada em 14 de dezembro de 2004 em Havana. Num primeiro momento surge como oposio instalao da Alca e posteriormente se afirma que as razes histricas da Alba so muitomaisprofundas,estomaisbeminseridasnahistricadisputaentreo monroismoeobolivarianismo.Osacordosiniciaisparaimplementaodobloco foram assinados em Havana, nos dias 27 e 28 de abril de 2005, entre os presidentes FidelCastroeHugoChaves(SOUZA,2012,p.118-119),daseucarteranti-imperialista, solidrio e socialista.Pode-se afirmarqueaAlba resultadotambm doprocessodecooperao solidariaentreVenezuelaeCuba,comofornecimentoporpartedaVenezuelade petrleosubsidiado a Cuba eoutrosprodutosindustrializados,eCubacontribuindo comoenviodemdicos,educadores,eoutrosprofissionais,quealavancaram diversos programas sociais e de desenvolvimento de tecnologias na Venezuela. Por 40 sugestodopresidenteEvoMoralesnaVIICpuladaAlba,realizadaem Cochabamba, na Bolvia nos dias 16 e 17 de outubro de 2009, a denominao inicial deAlternativaBolivarianaparaasAmricastransformou-seemAlianaBolivariana paraosPovosdeNossaAmrica.Foiinstitudonessaoportunidade,oTratadode ComrciodosPovos(TCP).TambmfoinessaocasioqueoEquadoraderiuao bloco e aos seus princpios. HseisprincpiosfundamentaisnaformulaodaAlba: complementaridade, cooperao, solidariedade, respeito soberania dospases,justiaeequidade.Ouseja,oobjetivopromovera integrao por meio da cooperao, e no da competio. Por outro lado,oobjetivonoapenasviabilizarodesenvolvimento econmico,masigualmenteodesenvolvimentosocial,polticoe cultural (SOUZA, 2012, p. 119). NaVIICpula,tambmfoiaprovadacomomecanismodeintegraoe iniciativaparaasuperaodosproblemaseconmicosesociaisdospases membrosacriaodeprojetosgrannacionais,queimplicamnacriaode empresas de dupla ou mais nacionalidade dos pases que integram a Alba nas reas deenergia,ferro,ao,prospecogeolgica,minerao,metalurgia,alumnio, processamentodealimentos,turismo,alfabetizao,ps-alfabetizao,sade, trabalho, habitao, cultura e esporte. Tambm se props a criao de moeda nica regional,oSucreSistemanicodeCompensaoRegional(ALBA-TCP, Declarao da VII Cpula, 17 out. 2009).TantoaAlba-TCP,comoaUnasuleaCelac,sepropem,pelaviada cooperao, a superar os problemas histricos do desenvolvimento dependente e da inserosubordinadadaAmricaLatinanomundo,buscamdesenvolvera integrao no mais fundadanosprincpiosdacompetioese opem sprticas histricas imperialistas.Enfrentando as presses de grandes blocos econmicos hegemonizados por potnciasimperialistas,quepretendemaanexaoporpartesdetodaAmrica Latina,odesafioatualseriaacriaodeumamploespaoeconmico,queno representasse apenas ilhas de desenvolvimento como ocorreu no passado.A construo de uma nova economia, embasada na incorporao de amplocontingentedepopulaoaotrabalhoeaoconsumo, medianteumacorretadistribuiodeinvestimentos,umaverdadeira 41 revoluoeducacional,asupressodaselevadastaxasde superexplorao do trabalho e,portanto, uma melhor distribuio de renda (MARINI, 1993, p. 7, traduo livre). A Alba o bloco que mais conseguiu avanar em uma proposta de integrao que considere as lies tericas, principalmente aquelas formuladas por Marini, um dosfundadoresdaTeoriadaDependncia.ConformeMarini,nocontextoda economiamundialcontempornea,osprojetosestritamentenacionaisparecemj notercabida,sendomisterbuscaraconstituiodeentidadesmaispoderosas (Marini 1992). Nestecontextopolticoqueemergemasescolaslatino-americanasde agroecologia,umaexperinciaque,enraizadanosMSPsdoC,compreendequea integraolatino-americanapodeserumadasprincipaisarmasnalutacontraa dependnciaebuscadodesenvolvimento,masparaissonodeveser compreendidacomodeinteressesomentedegovernos,deempresrioseda economia. Ela tem que ser entendida como uma grande empresa poltica e cultural, capaz de convocar participao ativa todos os setores do povo (MARINI, 1992).Acriaoem2008,porocasiodaVICpularealizadaemCaracas,do Conselho dos Movimentos Sociais, assinalaria o papel protagonista dos povos nos processos de construo do bloco, ou seja, concebe a los pueblos como el principal motordelaunidad(SILVAeSOUZA,2010,p.6).AAlba-TCPnoestlimitada, assim,sesferasdegovernoseempresariado,masconclamaosmovimentos sociaislatino-americanosecaribenhosaassumirempapeldeterminantenessa construo.UmdosconselhosdaAlba-TCPjustamentedosmovimentossociais, portanto eles compem a estrutura orgnica do bloco. Para alm deste existem mais trs conselhos, o Conselho Social, Conselho Poltico e o Conselho Econmico. Foinestemarco,queem2005foipossvelaoGovernodaVenezuelafirmar acordosdecooperaocomoMSTeaViaCampesinaeportanto,na implementaodoIalaPauloFreireedaElaaconcretizarem-seaespolticasda Alba-TCP, com o protagonismo dos povos camponeses latino-americanos.Conformeexpressa o documento fundacional doIALA Paulo Freire (2010), a AlbaquesurgiuparacontribuircomauniodospovosdaAmricaLatinaedo 42 Caribecriticaadependnciaeasiniciativasintegracionistasdecarter comercialista, colocando a nfase na ofensiva contra a pobreza e a excluso. uma propostaquehavendonascidoemoposioAlcaecomoseuavanose distingue substancialmente dela ao colocar a nfase nos aspectos sociais, polticos eculturais,maisquenoscomerciais,adotandooutrosprincpiosquenooda competio,nocasodosintercmbiosdestetipo,tomaemconsideraoas assimetriaseconmicasexistentesentreospases,porqueseusprincpiossoa solidariedade, a complementaridade e a cooperao (IALA PAULO FREIRE, 2010, p. 9). A partir do exposto. Pode-se reafirmar, agora nas palavras de Hobsbawn que a Amrica Latina, no ser mais a mesma em face de que h um contexto favorvel integrao,emoutrosparmetrospolticos.Diantedosprojetosmencionados (Unasul,AlbaeCelac),secompreendequeaintegraonecessriasomenteser possvelapartirdoesforocoletivodetodosospasesdaregio,comativa participao dos movimentos sociais e das organizaes da classe trabalhadora. 1.7 Elementos do contexto poltico latino-americano atual Antesdepassaraabordarpropriamenteoselementosquecompema estruturacurriculardasexperinciasemtela,destacam-sealgunselementosdo contexto poltico latino-americano, que de certa maneira so tambm contedos das EscolasLatino-AmericanasdeAgroecologiadaCloc-VC.Comojressaltado anteriormente,ocaminhopolticoediplomticotomadoporumconjuntodepases latino-americanosfavoreceuaintegraoregionalnasltimasdcadas.Aponta-se, inclusive, a possvel conformao de um novo quadro poltico, com constante perda delegitimidadedeorganismosquehistoricamenteestiveramalinhadosaos interessesdosEUA,comoocasodaOEA.Emcontrapartida,seconsolidam instituies latino-americanas sem a participao de potncias extrarregionais, como aUnasuleaCelac(BARROS,2014,s/p),demonstrandoqueaAmricaLatina parece j no aceitar mais ser tutelada. 43 EmanlisesobreaVenezuela,OEA,Unasuleapolticaexternabrasileira, Barros(2014)pontuaoamplorechaoviolnciadesenvolvidaporsetoresda direita venezuelana no incio de 2014 e a sanha estadunidense de uma interveno naquelepas.Aposiodoscaribenhoselatino-americanosfoioamplorepdio violncia, o respaldo ao governo democraticamente eleito, a exigncia de respeito ordemdemocrtica,eadefesadasoberaniaeindependnciadaVenezuela. AlinhadosaosinteressesdaburguesiavenezuelanaficaramosEstadosUnidosda Amrica,oCanadeoMxico,queforamvotovencidonaOEAemsuassesses extraordinrias para tratar da situao interna da Venezuela. A OEA declarou apoio ao presidente Nicols Maduro e condenou as aes desestabilizadoras promovidas nopasporforassociaisinternaseexternas.Talvezamemriadeintervenes, comoasinvasesdaGuatemala,RepblicaDominicanaeGranada(Nicargua, Panam,Cuba,PortoRico)nosculopassado,eoapoioaosgolpescontra Aristides,ZelayaeLugo,nestesculo,ajudemaexplicar(BARROS,2014,s/p)o posicionamentodesolidariedadeerespaldodospaseslatino-americanose caribenhos Venezuela, a condenao s desestabilizaes polticas e violncia, assim como qualquer ataque soberania venezuelana.Portanto,apartirdessesdadospossvelafirmarquenaAmricaLatinae Caribe se pode verificar uma maior proximidade e intercmbio entre pases, como o caso do Brasil que desenvolveu, em parceria com Cuba, um dos maiores portos da AmricaLatina,oPortodeMariel,inauguradoemjaneirode2014,nosdiasque antecederam a II Cpula da Celac. Em contrapartida o governo brasileiro desenvolve atualmenteumamploprograma,comaparticipaodeprofissionaiscubanos,de assistnciamdicacomunidadesempobrecidas,periferiasdascidadeseou localizadasemlocaisremotosdoterritriobrasileiro,oProgramaMaisMdicos, quecontacomumamaioriadeprofissionaisdeorigemcubana,contratadospelo governobrasileiropormeiodeconvniocomogovernocubano.OBrasiltambm criou a Universidade Federal da Integrao Latino-Americana (Unila) com o objetivo deatenderestudantesdetodaaAmricaLatinaemdiversoscursosecombolsas deestudoemtempointegral,assimcomoCubaeVenezuelamantmumaEscola Latino-AmericanadeMedicina(ELAM)quetemformadomdicosadvindosde diversos pases latino-americanos, africanos e at dos EUA.44 ComoafirmaBarros(2014,s/p)comaCelacseconsolidaoesforode aproximao dos pases do,CaribeAmricadoSuleLatina,GuianaeSurinamese reconhecemcomo sul-americanos;h quinzeanos,seviamapenas comocaribenhos.OBrasilestmaisprximodaRepblica Dominicana, a Argentina mais prxima de Cuba, o Uruguai est mais prximo do Haiti. AVenezueladesenvolveimportanteprocessodecooperaocomospases caribenhosporintermdiodaPetrocaribe,uminstrumentodecooperaocriado peloGovernoChvez,quetemcomopropostatornaropetrleoumfatorde desenvolvimentoenodedominaoeconmica,portanto,opetrleoadquirido pelospasesmembros(atualmente18)daPetrocaribepodesercompensadoem produtos ou servios.Essesvrioselementosapontamparaumcontextodefortalecimentoda integrao latino-americana. O contexto favorvel consolidao de experincias prticasnaperspectivaintegracionista.Somadasaestasaesdosdiversos governoslatino-americanosparaaintegrao,estacontribuiodosmovimentos sociaisque,aolongodedcadasdeluta,tmacumuladoexperincianoscampos daformaopolticaetambmnosprocessosformativosdecartertcnicoe cientfico.Esteprocessovemsematerializandona experincia dasEscolas Latino-AmericanasdeAgroecologia,principalmentearealizadanoBrasil(Elaa)ena Venezuela(IalaPauloFreire),cujaestruturaocurricularepedaggicaser detalhada a seguir. 45 CAPTULO II PROCESSO DE CRIAO E IMPLEMENTAO DA ESCOLA LATINO-AMERICANA DE AGROECOLOGIA E INSTITUTO AGROECOLGICO LATINO-AMERICANAO PAULO FREIRE EstecaptulotratadaemergnciaedesenvolvimentohistricodasEscolas Latino-AmericanasdeAgroecologia(ELAA)daCloc-VCcomoumespaode formao acadmica e poltica, mediante apresentao e discusso da organizao curricularedoscontedosqueintegramasdisciplinasdefinidasnoprojetodas escolas,comoexpressoounodeumprojetopopulardeintegraolatino-americana.As concepes de currculo que as orienta, esto definidas tanto no projeto de currculodoIalaPauloFreirequantodaElaa,evoaoencontrodoreferencial terico de Duarte (2010), que define o currculo como parte da totalidade da cultura humana,entendidacomooprocessohistricodeobjetivaodognerohumano. Portanto,opapeldaescolaseriaatransmissodeconhecimentossistematizados, os mais desenvolvidos que j tenha sido produzido pela humanidade. De acordo com o projeto popular de integrao da regio, este se constitui na propostadedesenvolvimentoeconmico,socialeculturaldospaseslatino-americanoscomjustiasocialesoberaniapopular,eparaissonecessita-se democratizaroacessoaterra,aeducaoemtodosseusnveis,osmeiosde comunicaoeaimensariquezaexistente,quedevemestaraserviodospovos. Tambmser abordado neste captulo, o processo histricode constituio dessas escolaseseusdesdobramentosquedaroformaaestescurrculos.Desdeesta perspectivaaformaoencaradacomoumaferramentadelutanaconstruo internacionalista da cooperao e solidariedade entre os povos. AsEscolasLatino-AmericanasdeAgroecologiadaCloc-VCsoasescolas que se dedicam formao de tcnicos e engenheiros em agroecologia que foram e esto sendo criadas desde 2005, a partir da assinatura do Protocolo de Intenes de 46 Tapes municpio do Estado do Rio Grande do Sul, e das linhas polticas de luta da Cloc-VC. 2.1 Marco histrico da rede de Escolas Latino-Americanas de Agroecologia Em2005,aCloc-VC,apartirdastrajetriashistricasdesuaslutas, articulada a outros movimentos sociais populares do campo e a alguns governos da Amrica Latina, se prope a criar uma rede de escolas de agroecologia, a princpio uma no Brasil e outra na Venezuela. Esses movimentos encontraram eco poltico no Governo da Venezuela Hugo Chvez. Por esse caminho diplomtico-poltico a Via Campesina,oMovimentodosTrabalhadoresRuraisSemTerra(MST-Brasil),o GovernodoestadodoParanRobertoRequio(2002-2006)eaUniversidade Federal do Paran assinaram o Protocolo de Intenes de Tapes, com o governo venezuelano,emumassentamentodoMSTnomunicpiodeTapes/RS,em30de janeiro de 2005. Este momento se constituiu como marco histrico da fundao das escolas de agroecologia, no Brasil e na Venezuela. Nesse contexto de luta e disputa deprojetosdeclasse,tambmnaformaoescolar,arededeescolas agroecolgicasemergiunadireocontrriadosprojetosquedefendemuma integraosomentecomoprocessodeincorporaodenovosmercados.A integraodeveserumaaoconjuntadosdiversospasesdaregiopara,em comumacordo,buscaremsuperarosproblemassociais,fsicos,polticose econmicosdaregio,ultrapassandoavisoeconomicistadosprocessos integracionistas.Porissodevetercomobaseasolidariedade,a complementariedade e a cooperao. As organizaes nucleadas na Cloc-VC a partir de 2005 iniciam um processo de cooperao solidaria, no intuito de defender os princpios dasoberania alimentar que parte, segundo Carvalho e Stedile (2012, p. 722), da compreenso de que cada comunidade,municpio,regio,povotemodireitoeodeverdeproduzirseus prprios alimentos, no local onde vive e a partir da biodiversidade existente.47 Esse conceito de soberania alimentar embasa o objetivo da busca de formar e capacitartcnicosemagroecologia,dacriaodeescolasagroecolgicasque contribuam para prticas de agricultura adequadas ao meio ambiente e promoo da qualidade dos alimentos. Conceito que pauta as aes daCloc-VC Internacional eadefesadeummodelodeagriculturademdioepequenoporte,como protagonismodaagriculturafamiliarcamponesa,jqueestaagrandeprodutora dealimentosparaasociedade.NoBrasil,segundooCensoAgropecuriodo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) de 2006, a agricultura familiar a responsvel por aproximadamente 70% da produo de alimentos consumidos no Pas.NaVenezuela,quetemcomobasedesuaeconomiaaatividadepetroleirae ondepredominaaestruturalatifundiriadeorganizaodocampoedaproduo agropecuria, importa aproximadamente 70% do alimento consumido naquele pas, porisso,produziralimentosseconstituiumdesafiohistricoparaopovo venezuelano, que desde o primeiro Governo Chvez vem construindo sua poltica de segurana e soberania alimentar. Junto com a criao de escolas de agroecologia e por meio destas, tambm est o objetivo de ampliar e popularizar o debate em torno da soberania alimentar, da multiplicao e democratizao das sementes, inclusive, comaproduodemateriaispedaggicosaudiovisuaisquesubsidiemoacessoa estesconhecimentosporpartedasociedadeemgerale,emespecial,pelos camponeses e indgenas. Nestemarco,objetivandoasuperaodoslimiteseconmicosepolticosna construodeumprojetopopularlatino-americanoecaribenho,querompacoma lgicaimpostapelocapitalismo,comoafirmaaAssembleiaPopular6,oucomo expressaBenjamim(s.d.)onossoprojetopopular[...]porqueelepretende organizar a sociedade em torno dos interesses, do potencial humano e dos valores dos grupos sociais que vivem do trabalho e da cultura [...], quese tem realizado aesnosentidodepressionarosEstadosparaapromooeimplantaode polticassociaisquecontribuamcomoprocessodeintegrao.Comopartedeste tensionamentoecooperaoestacriaodeInstitutosAgroecolgicosLatino-Americanos(Ialas),umarededeescolasqueatuanareadeeducaosuperior

6 AAssembleiaPopularumaarticulaodeforassociaisquepromovelutasecampanhas, construindo um Projeto Popular para o Brasil. Sua organizao se d a partir de movimentos sociais e populares, pastorais sociais, redes e fruns, e setores organizados da sociedade, nos municpios eestados,etambmemmbitonacional,tantonocampoquantonacidade.Disponvelem: . 48 possibilitando o acesso aos camponeses a esse grau de ensino, tendo em vista que na maioria dos pases latino-americanos estes se encontram excludos da educao universitria.Ametainicialfoicriar,noanode2005,umcursolatino-americano,denvel superior, de formao de tcnicos em agroecologia, que seria desenvolvido em dois grupos,umnaUniversidadeFederaldoParaneoutroemumauniversidadeda Venezuela.ApretensofoiatenderdemandanaregiodoConeSullatino-americano, Regio Andina, Amrica Central e o Caribe. Neste mesmo ano foi criada noBrasilaEscolaLatino-AmericanadeAgroecologia(Elaa),noestadodoParan, municpiodaLapa,eem2006,foicriadonaVenezuelaoInstitutoAgroecolgico Latino-Americano Paulo Freire (Iala).Estasescolasquesoobjetodapresenteinvestigaoforamfundadasno marcodacooperaoentregovernosdaregioeaCloc-VC,tendoessas organizaescamponesaspapelfundamentalparaoinciodosprocessos,que sempre comearam sem as melhores condies materiais, inclusive parte do projeto pedaggico de formao nestas escolas forjar as condies de formao e estudo apartirdaluta.NoParan,em2005,inaugurou-seaEscolaLatino-Americanade Agroecologiacomoapoiodoentogovernadordoestado,RobertoRequio, localizada no municpio da Lapa,no assentamento Contestado um assentamento coordenadopeloMST.OInstitutoAgroecolgicoLatino-americanoPauloFreirefoi fundadoem2006noestadodeBarinas,Venezuela.Estasduasexperinciasse constituemnaspioneirasdeumaredequesepretendeconstruirnombitoda AmricaLatina,e,posteriormente,foraminauguradasescolasnoParaguai,na regio amaznica brasileira (Par), na Argentina (Santiago del Estero) e outras que esto em discusso na Bolvia, no Equador, na Guatemala e na Colmbia.Odesafioqueassumemasorganizaesquesepropemaconstruiressas escolaslatino-americanasconcretamentesevinculaaoobjetivodaintegrao camponesa,apartirdacapacitaopoltica,tcnico-cientficaedeumprojeto popularquesearticulanasdiversasregiesepasesdaregio.Asbandeirasque unificamessaconstruosocialso:adefesadabiodiversidadeedosrecursos hdricos; a soberania alimentar dos povos;a defesa da agricultura camponesa e da reformaagrriaeadefesadassementescrioulas,comopartedodireito 49 autodeterminao e soberania nacional (VIA CAMPESINA, 2005, p. 2). 2.2 Processos implicados na origem das Escolas Latino-Americanas de Agroecologia AorigemdasEscolasLatino-AmericanasdeAgroecologiaestna organizaodossujeitoscamponesesecamponesasparagarantirsuareproduo socialematerialapartirdotrabalhonaterra,numalutaqueatravessa,tambm,o campododireitoeducao,desdeaeducaoinfantilatauniversitria, historicamentenegadaaoscamponeses.ComoafirmadoanteriormenteasEscolas Latino-AmericanasdeAgroecologiafazempartedeumprojetodaCloc-VCI, articulaodeorganizaesdembitointernacionalederepresentantesde movimentos sociais que agregam camponeses, trabalhadores agrcolas, indgenas e afrodescendentes,pequenosemdiosprodutores,emigrantesetrabalhadores agrcolasdetodoomundo.Essaarticulaodemaisde20anosdeexistncia representaumcoletivodemaisde200milhesdepessoasetemrealizadoaluta emfavordaagriculturasustentvelempequenaescala,comoummodode promoverajustiasocialeadignidade,resistindoaosmodeloscapitalistasde agricultura,dedesenvolvimentoedesociedade.ACLOC-VCIestorganizadaem 70pasesnosquatrocontinentesefoicriadaapartirdanecessidadedos camponesesecamponesasdeseorganizarememamplitudeinternacionalnaluta contra as polticas neoliberais, que afetam o campo e a sociedade em geral.Portanto,aCloc-VCIdesde1993/1994temorganizadoedinamizado,em mbito internacional, lutas camponesas, que se expressam nas diversas campanhas globais como a Campanha Global pela Reforma Agrria, lanada em 1999, pela Via CampesinaepelaRededeInformaoeAopeloDireitoaseAlimentar(Fian, sigla em ingls: Food First Information and Action Network), com o objetivo de apoiar ereforarconjuntamentealutapelareformaagrriaepeloacessoaterracomo condioprviaparacumprirodireitoaumaalimentaoadequadaaos camponeses sem terra. 50 ACloc-VCIdesde1996temdefendidoa soberaniaalimentar,comouma formaquepermiteaospovosemtodomundo planejarsuasprpriaspolticas agroalimentares, que favoream a produo camponesa e sua distribuioem nvel localequepermitamabastecerasdemandasdapopulao.Pois,comoafirmam MarxeEngels(2009,p.41),Parafazerhistriaprecisoexistiremindivduos humanos vivos e o primeiro ato histrico , portanto, a produo dos meios para a satisfao dessas necessidades, a produo da prpria vida material. A campanha pelasoberaniaalimentardefendeodireitoaoalimentocomoumdosprimeiros direitosdoserhumano,poisaenergiavital,umadasnecessidadeshumanas bsicas.O conceito desoberania alimentar foi criado pela VCI em 1996, no contexto daCpulaMundialsobreaAlimentao(CMA),realizadaemRomapelaFAO (CARVALHOeSTEDILE,2012,p.721-722),e,desdeento,secontrapeao conceitodeseguranaalimentar,entendendoque,seaproduoeadistribuio dealimentosfazempartedasoberaniadeumpovo,elassoinegociveiseno podemdependerdevontadespolticasouprticasconjunturaisdegovernosou empresasdeoutrospases.Contrapondo-seaoquevinhaocorrendoapartirdas polticasdeseguranaalimentarque,emsintoniacomahegemonianeoliberal,a OrganizaoMundialdoComrcio(OMC)eosgovernospretendiamfazerda alimentaoummercadorentvelparaasmultinacionais,associandoodireito alimentao liberalizao do comrcio de alimentos.ParaCarvalhoeStedile(2012,p.723),aconcepodesoberaniaalimentar defendeamplamenteosinteressesdospovos,sejadasgeraesfuturasouasdo presente, a partir da estratgia de resistncia ao modelo do livre comrcio proposto pelasempresastransnacionaiscomonicaformadegarantirasegurana alimentar.Defendeaproduolocaldealimentosetrataaindadaproduo, distribuio,consumoedomodelotecnolgicoaserimplementado,quedeveter comobaseasustentabilidadeambiental,socialeeconmica.Apartirdesse conceito,oalimentonocompreendidocomoumamercadoria,eleumdireito humano, uma questo de sobrevivncia, sendo por isso uma questo de soberania popular nacional. Devido a estes aspectos asoberania alimentar tem se constitudo comoumtemaquedidentidadearticulaodestescamponeses,indgenas, 51 comunidadesafrodescendentesetrabalhadoresassalariados,portanto,umalinha geral vinculada aos processos de formao poltica a serem construdos pela Cloc-VCI (BATISTA, 2013, p. 100). ACampanhaPermanenteContraosAgrotxicosePelaVidatambmse vinculacomalutapelareformaagrriaepelasoberaniaalimentar.Lanadaem 2011, tem o objetivo de sensibilizar a populao para os riscos que os agrotxicos representa