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8/14/2019 A Legislao Urbanstica Enquanto Ferramenta para a Gesto do Patrimnio Arqueolgico O Estudo de Caso par
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A LEGISLAO URBANSTICA ENQUANTO FERRAMENTA PARA A GESTO
DO PATRIMNIO ARQUEOLGICO O ESTUDO DE CASO PARA A CIDADE DE
GOIS/GO
Autora: Renata de Godoy arquiteta e urbanista, mestre em gesto do
patrimnio cultural pela UCG. Bolsista do CNPq, doutorado pleno no exterior,
Departamento de Antropologia da Universidade da Florida/EUA.
Endereo eletrnico: [email protected], [email protected]
Endereo para correspondncia: Rua R-15, n 86, apto 903, setor Oeste. CEP:74140-090, Goinia/GO. Ou 3611SW, 34th street, 39. Gainesville, FL 32608, EUA.
RESUMO: Usando como exemplo o estudo de caso na cidade de Gois,
pretende-se comprovar a eficiente atuao que as leis de uso do solo urbanas,
planejadas especialmente visando a preservao do patrimnio arqueolgico, podem
representar para a gesto deste bem cultural.
PALAVRAS-CHAVE: gesto do patrimnio cultural, arqueologia pblica,
arqueologia histrica, planejamento urbano, zoneamento arqueolgico.
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INTRODUO
s vezes preciso ter coragem de dizer que construir no implica
necessariamente em fazer, que progresso no pressupe sempre
mudar, mas, muitas vezes, apenas conscientizar e conservar
Alosio Magalhes 1997, p. 218
sabido que a intensidade de uso dos espaos urbanos determina uma
constante transformao de sua paisagem. Porm, apesar de todas as construes,demolies, aterros e outras aes antrpicas que normalmente interferem no cotidiano
urbano, uma parcela considervel do subsolo ainda continua preservada, contendo
testemunhos materiais de ocupaes passadas, como j assinalou Juliani (1996).
Falando em restos materiais, estamos nos referindo especificamente aos vestgios
arqueolgicos, que podem ser encontrados em subsolos urbanos em duas categorias:
elementos mveis, ou seja, aqueles que foram depositados como refugo no subsolo
urbano ou que foram soterrados com o passar do tempo; e elementos fixos,
representados por estruturas que deixaram suas marcas na paisagem cultural domunicpio (TOCCHETTO ET AL., 2000). Preservar estes remanescentes e toda sua
carga informativa para futuras geraes papel da gesto do patrimnio arqueolgico.
Uma das maiores preocupaes de um gestor de patrimnio cultural simples: a
preservao dos dados. Considera-se que preservar evitar a perda, mas no se pode
congelar uma cidade. Por conseguinte, so necessrias tomadas de deciso muitas
vezes penosas. Nem todos os remanescentes so dignos de serem preservados ou
mesmo apresentam interesse na sua preservao, talvez este seja um dos maiores
dilemas da gesto patrimonial.Atualmente entende-se que o envolvimento do gestor do patrimnio
arqueolgico no s nos primeiros estgios de grandes obras impactantes, mas
tambm em questes que fazem parte do cotidiano da vida urbana, pode surtir efeitos
positivos na diminuio de impactos aos bens arqueolgicos (CLEERE, 1992, p. 12).
No h dvidas de que projetos de infra-estrutura e desenvolvimentos so inevitveis,
porm, em contrapartida, despertam preocupao quanto preservao do patrimnio
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arqueolgico presente em reas urbanizadas. Assim sendo, apresentaremos agora
uma das estratgias que pode proporcionar a efetiva preservao dos dados: o
Zoneamento Arqueolgico, que atrelado s leis de uso e ocupao do solo, em
resumo, significa a possibilidade legal de proteo dos bens culturais materiais, em
mbito municipal. Trata-se de uma ferramenta de gesto que pode ser aplicada em
praticamente todas as cidades, no mundo todo, uma verdadeira unanimidade entre
vrios autores, como Juliani (1996), MacManamon (1992), Schvelzon (2001),
Simmons (1992), Staski (1982), Tocchetto (1999), entre outros.
E no Brasil no poderia ser diferente. Aproveitando o estudo de caso realizado
para a Cidade de Gois, pretende-se evidenciar as vantagens da utilizao das
legislaes urbansticas, que em favor da preservao do patrimnio arqueolgico,
podem representar uma excelente estratgia para a gesto destes bens culturais emqualquer cidade, desde que a mesma contenha plano diretor ou leis especficas que
regulamentem o uso e a ocupao do seu solo urbano.
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O ESTUDO DE CASO
No objeto desta proposta, a cidade de Gois, a poltica de preservao a ser
proposta est direcionada para um patrimnio da humanidade, ttulo que lhe foi
concedido pela UNESCO em reconhecimento ao alto grau de preservao da
paisagem urbana desde sua fundao, no sculo XVIII, at os dias atuais. Esta cidade
foi a primeira capital implantada alm dos limites determinados pelo Tratado de
Tordesilhas, e a nica que sobreviveu intacta aps a conquista do territrio pertencente
Espanha (GODOY, 2003, p. 08).
Alm de ser um importante remanescente dos primeiros ncleos urbanos
nacionais, ao lado de Ouro Preto e Diamantina, em Minas Gerais, tambm patrimnios
da humanidade pela UNESCO, representa o exemplar consagrado mundialmente doconvencionado urbanismo minerador brasileiro (COELHO, 2001, p. 134). Para a
conquista do ttulo, alm desse carter remanescente, ela agrega caractersticas ainda
mais especiais, visto que, apesar de ser menos original ou menos exuberante que as
cidades mineiras, permaneceu mais prxima de suas condies de origem e, nesse
sentido, representa mais exatamente o que eram as cidades brasileiras nos sculos
XVIII e XIX.(DOSSI, ITEM B: ANLISE COMPARATIVA).
No caso da antiga Vila Boa podemos afirmar, embasados na cultura material,
que o passado est em todas as partes, s procurar pelas ruas, pelos becos e largos,os restos materiais remanescentes de tempos pretritos. A arqueologia est em todas
as partes na cidade de Gois, qualquer alterao no subsolo suficiente para
comprovar a permanncia de remanescentes materiais preservados. So testemunhos
do nosso passado, que receberam a nossa marca. So evidncias nicas, peas do
quebra-cabea que remonta a ocupao humana em um dado tempo e em
determinado espao fsico. Entendemos que no quebra-cabea da cidade de Gois
ainda h vrias peas nossa disposio em virtude de seu alto grau de preservao
patrimonial, na medida que seu desenvolvimento urbano no foi to intenso emdecorrncia da estagnao econmica que se abateu sobre ela.
Durante praticamente todo o sculo XVIII, a cidade de Gois foi sendo ocupada
de maneira desordenada, como a maioria dos arraiais brasileiros, com critrios
espontneos de assentamento, a partir das necessidades imediatas dos seus
habitantes. S posteriormente que surgiriam as primeiras preocupaes quanto
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organizao do espao, buscando direcionar ruas e becos e determinando as
caractersticas arquitetnicas dos edifcios (COELHO, 2001).
Atualmente, o municpio de Gois pode ser classificado como de mdio porte,
sendo a dimenso de sua rea tombada bem menor que o permetro total do municpio,
como pode ser observado na Planta 01. So 33 bairros, e somente sete tm pores
espaciais que integram a atual zona tombada. Suas edificaes em geral foram
construdas umas junto s outras, em um estilo colonial simples. Algumas de suas ruas
de pedras, assentadas por escravos, permanecem at hoje intactas.
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Foram observadas, durante o ano de 2002, ao longo do desenvolvimento de 10
etapas de campo na cidade de Gois, situaes distintas que vm determinando
diferentes tipos de geradores de impacto ao patrimnio arqueolgico existente em seus
limites urbanos. Constatamos que um elenco de fatores, naturais e antrpicos, vem
destruindo e descontextualizando esse patrimnio e colocando em risco a sua
preservao para geraes futuras, o que requer providncias em curto prazo. Tais
situaes variam desde grandes obras pblicas a pequenas aes cotidianas.
O fator de maior visibilidade e mais espetacular foi sem dvida a enchente de 31
de dezembro de 2001, sendo as cheias do rio Vermelho um fenmeno relativamente
freqente na regio. Foi possvel observar e registrar seu efeito devastador sobre o
patrimnio vilaboense, tanto o edificado quanto o arqueolgico. Obras pblicas
tambm se configuram como extremamente agressivas a esse patrimnio, cujaproteo vem sendo equivocadamente vista como um entrave aos grandes
empreendimentos.
Da mesma forma, s que com baixssima visibilidade, foi observado outro fator
gerador de impacto, proveniente das reformas e pequenas intervenes que ocorrem
diariamente nas residncias e nos pequenos estabelecimentos comerciais, na rotina da
cidade. E este tipo de causador de impacto que, silenciosamente, pode estar
causando os maiores prejuzos ao patrimnio arqueolgico na cidade de Gois.
Procedimentos rotineiros de reformas, restauraes ou demolies podem acarretarprejuzo ao patrimnio arqueolgico, e especialmente se utilizarem recursos de
escavao e aterramentos. A possibilidade iminente de perda expressiva deste
patrimnio em tais situaes incentiva a formulao de medidas que possam atenuar
ou mesmo eliminar tais riscos.
Assim, a fim de proteger esses vestgios materiais, a estratgia sugerida uma
legislao municipal complementar aos instrumentos disponveis, que assegure a
preservao desses remanescentes do passado histrico. Nossa pretenso protege-
los atravs de um dispositivo legal que assegure o monitoramento arqueolgico emzonas demarcadas pelo seu potencial, estratgia que atuaria como mitigadora para
previsveis perturbaes da camada arqueolgica, cotidianamente fruto de reformas,
restauraes, novas construes e demolies, ou seja, de qualquer interveno que
possa causar prejuzo ao patrimnio arqueolgico. Entendemos que a implementao
desta proposta cabe ao poder pblico municipal, devendo ento ser inserida como um
dos componentes primordiais da Lei de Uso e Ocupao do Solo Municipal,
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caracterizando a gesto cultural como um trabalho de administrao preventivo, que
deve ser includo no planejamento urbano.
Obviamente invivel propor monitoramento e pesquisa arqueolgica em cada
obra, em cada reforma, em cada interveno no subsolo de uma cidade de mdio porte
como Gois, que conta hoje com aproximadamente 28 mil habitantes. Portanto,
prope-se a elaborao de um zoneamento urbano especfico que delimite reas com
diferentes nveis de potencial arqueolgico, estabelecendo regras de uso do solo
especiais para cada zona de proteo, subdivididas entre alta, mdia e baixa, de
acordo com seus potenciais de preservao e o carter informativo das camadas
arqueolgicas. Este um trabalho que deve ser constantemente enriquecido, na
medida em que os pesquisadores esto sempre gerando novos dados sobre o
patrimnio arqueolgico da cidade. Enfim, entendemos que atravs do apoio legal proteo possvel a real preservao ao patrimnio arqueolgico, determinando com
exatido direitos e obrigaes para os cidados.
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A ARQUEOLOGIA URBANA E SUA PROTEO LEGAL
Sabe-se que atualmente o conceito de cidade tem sofrido reformulaes. Para a
arqueologia, segundo Salwen (1982), a cidade tem sido compreendida como uma
entidade, um sistema nico, como um todo arqueolgico, e no como uma coleo de
stios menores. Deve-se compreender a cidade como um documento, como o prprio
testemunho de vidas passadas, exigindo, portanto, anlises que produzam
conhecimento, e conduzam a novas formas de planejar sua preservao.
A problemtica arqueolgica no meio urbano complexa, ainda segundo Salwen
(OP. CIT.), seus praticantes sofrem presses por este ser um trabalho caro, que
perturba, e que tem alta visibilidade social, tornando difcil o planejamento lgico dos
estudos arqueolgicos. Estes fatores, aliados falta de visibilidade dos remanescentesarqueolgicos histricos, dificultam ainda mais a negociao e a prpria execuo de
polticas pblicas de preservao nas reas urbanas.
Para o exerccio da gesto, em termos do planejamento urbano, o grande
desafio manter o processo de transformao da cidade sem que ele invalide essa
herana, e que inclua o novo sempre em relao harmoniosa com o passado. Mesmo
que edifcios estejam demolidos, e caminhos estejam desfigurados, eles ainda podem
estar preservados em forma de vestgios materiais no subsolo. Assim, o que se procura
satisfazer as necessidades das geraes atuais sem comprometer as opes dasgeraes futuras. Isso significa que essas estruturas urbanas podem ser utilizadas e
transformadas no dia-a-dia da populao vilaboense, desde que no impeam que as
geraes futuras as conheam tal como foram no passado, e possam receber um
patrimnio em toda a sua integridade, assegurando sua liberdade de utilizao, sua
memria e sua identidade.
A cidade de Gois tem seu patrimnio edificado protegido pelo instrumento do
tombamento, o que teoricamente tambm assegura, em parte, a preservao do
patrimnio arqueolgico. Porm, o que foi avaliado como relevante foi o patrimnioedificado, e no necessariamente o stio arqueolgico que a cidade de Gois. O stio
arqueolgico urbano no est restrito aos limites demarcados para o chamado centro
histrico vilaboense. Alm disso, devemos reforar que o tombamento no prev
objetivamente impactos sobre patrimnio arqueolgico em reformas e procedimentos
cotidianos, procedimentos cabveis em nvel de legislao urbanstica.
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A Lei de Uso e Ocupao do Solo prev cuidados especiais para bens edificados
tombados, quase todos inseridos no convencionado centro histrico da cidade, na
tentativa de coibir qualquer tipo de interveno sem a autorizao prvia do Instituto do
Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, IPHAN. No entanto, observamos que o Plano
Diretor vigente (GOIS, 1996) no contempla, em nenhuma instncia, a preservao
do patrimnio arqueolgico, quando seria absolutamente desejvel e necessria a sua
insero. Afinal, de acordo com Tocchetto (1999, p. 94), o planejamento urbano deve
submeter-se ao rgo gestor do patrimnio arqueolgico evitando situaes
conflituosas e possibilitando a preservao e a pesquisa dos vestgios materiais
pretritos, considerando a rpida transformao da paisagem urbana e salientando o
carter interdisciplinar que o planejamento urbano deve ter.
Assim, entendemos que a principal estratgia de proteo do patrimnioarqueolgico deve estar diretamente relacionada ao planejamento urbano e territorial. A
criao de uma poltica de proteo arqueolgica nesses diferentes nveis
fundamental. De acordo com a Carta de Lausanne, de 1990, caso a legislao ampare
somente o patrimnio tombado ou inscrito em inventrio oficial, dever-se- criar
dispositivos legais que garantam a proteo temporria dos monumentos e dos stios
no protegidos ou descobertos recentemente, at que uma avaliao arqueolgica
tenha sido feita (CURY, 2000, p. 304).
nesta vertente que esta proposta de legislao complementar se apia. Enquantono h risco de destruio, o material arqueolgico deve continuar preservado in situ,
evitando-se que ele seja exposto desnecessariamente, inclusive por pesquisas, a
menos que elas sejam plenamente justificveis. Porm, na medida em que h
destruio de vestgios, o poder pblico municipal deve gerar mecanismos rigorosos
que possibilitem o salvamento, a guarda e o estudo deste patrimnio, em adio lei
federal, mitigando o impacto provocado e devolvendo as informaes produzidas para
a comunidade local e para a comunidade cientfica.
Em resumo, propomos que um dispositivo legal complementar seja criado, tendoem vista que os dispositivos legais no plano federal, encontram-se defasados em
relao aos stios arqueolgicos histricos (GODOY, 2003, p. 132), caberia
legislao complementar municipal dar a esse patrimnio o necessrio e imprescindvel
amparo legal, em carter complementar Lei Federal n 3.924/61, colocando-o sob a
proteo direta do poder pblico municipal. Destacamos que a rea de potencial
arqueolgico, experimentalmente definida atravs desta pesquisa, transcende os atuais
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limites do centro histrico. Uma proteo advinda por fora da prpria lei e
independente de processo e ato administrativo de tombamento asseguraria, no caso, a
preservao do patrimnio arqueolgico de Gois, reservando-se figura do
tombamento apenas os remanescentes merecedores de destaque pela sua imparidade
(OP. CIT.). Como afirma Pinheiro da Silva (1996), no caso, ambos os instrumentos
legais se reforariam mutuamente. E na ocasio de intervenes em sub-solo,
assegurar o acompanhamento por um profissional competente nas zonas de potencial
arqueolgico, tanto em reas pblicas quanto privadas, instituindo o monitoramento
permanente dessas zonas.
De tal modo, para este caso, foi proposta a delimitao das zonas de interesse
arqueolgico, ou seja, das reas que apresentam potencial arqueolgico, considerada
uma tarefa exeqvel e imprescindvel, pois permite trabalhar preditivamente no mbitodo planejamento urbano e evitar a destruio do patrimnio arqueolgico. Seguindo o
modelo proposto por Juliani (1996), o passo inicial a criao de uma Carta de
Potencial Arqueolgico, que consiste em definir as zonas de interesse arqueolgico por
meio de modelos preditivos, ou seja, atravs da sobreposio de informaes de
potencial com os processos que geraram perturbaes no solo.
Este modelo o indicado originalmente por Staski (1982), e estabelece critrios
amplos de uso e ocupao do solo, convencionados de acordo com o grau de
preservao arqueolgica para cada tipo de ocupao. Estas zonas especiais deproteo do patrimnio arqueolgico, as ZEPs, devem ser inseridas na legislao
urbana com normas especficas. Sua definio espacial deve obedecer a trs
caractersticas do patrimnio arqueolgico: significncia, potencial arqueolgico e risco
arqueolgico. Este ltimo representa a possibilidade de comprometimento e/ou
destruio do potencial informativo destas reas (JULIANI, 1996, p. 105). Estes trs
fatores aliados estabelecem as reas que devero ser contempladas pela legislao
especial. Conforme Juliani (1997, p. 74-75), devem ser considerados:
a) residncias unifamiliares. Estas so tidas como as categorias de ocupao
do solo urbano que tm menos probabilidade de apresentar modificaes em
sua superfcie, visto que a casa a maior estrutura presente no terreno.
Bairros destinados a este tipo de habitao tendem a apresentar excelente
conservao de vestgios arqueolgicos. Considerando que este tipo de
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ocupao majoritria na cidade de Gois, vislumbramos vrias possveis
reas com potencial arqueolgico;
b) edifcios multifamiliares. So estruturas mais complexas que as anteriores,
pois se configuram como edifcios residenciais onde o subsolo pode ter
sofrido impacto. Em geral o grau de preservao dos vestgios baixo. So
construes muito raras na realidade vilaboense;
c) reas de uso comercial. Podem caracterizar-se por edifcios simples ou
complexos. Em geral o terreno bastante utilizado, o que compromete a
preservao do subsolo. Considerando o porte deste tipo de edificao na
cidade de Gois, no entanto, podemos afirmar que o grau de preservao omesmo constatado no item a, visto que a maioria de residncias
adaptadas, variando de acordo com o aproveitamento do terreno;
d) reas de uso industrial: no h este tipo de ocupao na rea urbana;
e) reas de uso pblico: incluem todas as reas s quais a populao tem
acesso, desde ruas e praas at escolas e hospitais (semi-pblico). So
especficas, dependem de avaliao individual. Como j foi assinalado,sabemos, de acordo com informao oral de Callef (2002), que a cidade de
Gois apresenta uma peculiaridade quanto preservao do solo
arqueolgico em reas pblicas, visto que muitas ruas evidenciam estruturas
de antigos quintais, e os becos demonstram terem sido depsitos de lixo no
passado, muitos sem sada, geralmente atendendo parte posterior ou de
servio das residncias (COELHO, 1996, p. 34). Em geral esta categoria
apresenta grau de preservao varivel;
f) vazios urbanos: reas ainda no utilizadas. No caso de Gois, no so
somente vazios temporrios, localizados em reas de expanso urbana.
Entendemos que todas as reas delimitadas como zona de interesse
ambiental tambm se enquadram neste quesito, e representam uma boa
parcela do territrio municipal. Tendem a apresentar alto grau de
preservao da camada arqueolgica. Ateno especial deve ser dada, pois
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so reas de ocupao iminente, e devem ser tratadas de maneira especial
quando forem loteadas ou utilizadas para qualquer outro fim;
Ressaltamos que as reas rurais no esto contempladas, visto que o estudo
realizado em 2002 foi proposto visando proteger somente o patrimnio arqueolgico
existente dentro dos limites urbanos. Nesse sentido, foi indicada a elaborao do
Zoneamento Arqueolgico Urbano da cidade de Gois, que, como j foi reforado
anteriormente, pode se tornar uma estratgia bastante eficaz na gesto arqueolgica,
reforada pelo fato de que instrumentos legais podem introduzir o conceito de
significncia a fim de selecionar o que merece proteo.
Na atualidade, a gesto atrelada ao conceito de significncia cultural, que
expressa o valor histrico, social e cientfico de um determinado remanescentearqueolgico. Na classificao de significncia, o pesquisador enfrenta um dilema
moral: sabendo da impossibilidade de salvar todos os recursos ele obrigado a
estabelecer qual stio/vestgio o mais relevante e significativo e como deve ser salvo
para as futuras geraes. Decises de significncia em pesquisas acadmicas e em
projetos pblicos so bastante diferenciadas, visto que as primeiras privilegiam sempre
os interesses cientficos, que nem sempre dizem respeito a vestgios ameaados de
extino. Em projetos de gesto, segundo Madden (1983), deve-se considerar um
planejamento em longo prazo, que assegure a preservao de evidnciasarqueolgicas para futuras geraes.
As decises de significncia devem ser entendidas como decises de preservao
de amostras, j que estas representam o que est sendo privilegiado para ser
conservado para o futuro. Geralmente concorda-se que recursos arqueolgicos
adquirem maior significado cientfico quando seu estudo sistemtico pretende resolver
questes comuns da pesquisa cientfica, respeitando o tempo oportuno a tais
resolues. Na gesto do patrimnio o problema central a combinao entre
questes e recursos pesquisados, de modo a que estes rendam frutos e retornem paraa comunidade em forma de conhecimento.
Schiffer & House (1978) explicam detalhadamente quais so os critrios mais
comuns utilizados para definir a significncia do patrimnio arqueolgico. Eles
enfatizam que todo stio importante e pode apresentar potencial para ser objeto de
pesquisa. Se o arquelogo no encontra maneira de definir o potencial em cada caso,
as decises sero tomadas de maneira no satisfatria. Alm disso, eles afirmam que
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XIX e o sistema capitalista vigente, definido pelo momento de implantao da
industrializao de fato no Brasil, vale dizer, na dcada de 1930, quando as relaes
de produo capitalistas se tornaram de fato dominantes.(OP CIT, p. 07). Ou seja,
esta definio expande consideravelmente a poro arqueolgica urbana da antiga Vila
Boa.
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O ZONEAMENTO ARQUEOLGICO DA CIDADE DE GOIS/GO
O zoneamento proposto por este estudo contempla categorias diferenciadas de
uso e ocupao do solo, apresentando diferentes nveis de potencialidade de
preservao arqueolgica, identificadas como alta, mdia e baixa. Deve-se ressaltar
que se tratou apenas de um exerccio, de um esboo rudimentar do que dever ser
realizado posteriormente pelo poder pblico municipal, buscando preservar regies
com alta probabilidade de apresentar camadas arqueolgicas preservadas. Seu
aprimoramento depende dos dados ainda no publicados, mas j levantados pelo
Ncleo de Arqueologia da UEG.
Para tanto, a princpio, foi delimitada uma grande Zona de Potencial
Arqueolgico, aonde provvel a ocorrncia de vestgios arqueolgicos do perodohistrico, embasada nas delimitaes espaciais definidas pelo tombamento de 1996 e
pela proposta apresentada no Dossi (DOSSI GESTO, 1999). Posteriormente
foram demarcadas algumas vias que j foram estudadas e seu potencial arqueolgico
divulgado pelo Ncleo de Arqueologia da UEG. At o momento pblico que algumas
ruas apresentaram ou no remanescentes arqueolgicos, e foram classificadas de
acordo com o grau de preservao dos vestgios e com a densidade de material
registrado.
A Planta 02 apresenta um esboo da delimitao espacial das zonas propostas,embasadas nos poucos dados divulgados at o fim do ano de 2002 sobre a realidade
arqueolgica da cidade de Gois. Em suma, de acordo com Callef & Carvalho (2000;
2001a; 2001b; 2002), pudemos esboar a seguinte delimitao:
Zonas de Alto e Mdio Potencial Arqueolgico: diretamente relacionadas ao
centro histrico tombado, relativo s ocupaes nos sculos XVIII e XIX. Apresentam
potencial para anlise cientfica. As reas reconhecidas como de alto potencial so:
Praa Padre Arnaldo, Beco Vila Rica, Avenida Dom Prudncio, ruas Rui Barbosa, DomJoo e Joaquim Bonifcio. As diagnosticadas como tendo mdio potencial arqueolgico
at o momento so: Praa Joaquim Paulo, Travessa Marechal Abrantes, ruas Javars,
Tupy, Coronel Santa Cruz, da Conceio e Santa Brbara;
Zonas de Baixo Potencial Arqueolgico: em geral, devido a perturbaes da
camada arqueolgica e ocupaes relativas ao sculo XX. Apresentam poucos
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elementos para a anlise e interpretao de dados. So: Beco Cachoeira Grande, ruas
25 de Julho, 03 de Maio, So Pedro;
Zonas Estreis: no h remanescentes arqueolgicos. Nesta condio foram
consideradas vrias ruas do setor Rio Vermelho, em amarelo no mapa de zoneamento,
bem como em bairros fora da Zona de Potencial Arqueolgico.
O diagnstico e a avaliao destes nveis permite definir o tipo de interveno a
ser realizada em cada unidade convencionada, desde que esteja em risco o patrimnio
arqueolgico.
Esta proposta de insero do patrimnio arqueolgico na poltica de uso do solo
municipal depende de atualizaes constantes. A reviso permanente dos limitesespaciais da rea sob proteo legal fortemente indicada por Schvelzon (2001), que
realizou estudo semelhante para a cidade de Buenos Aires. Afinal, essas delimitaes
espaciais so decises passveis de erros e acertos, e que dependem de novas
informaes, do aporte e da publicao de novos dados, de novas opinies e pontos de
vista, que acabam por possibilitar a gerao de novos problemas e novos ideais de
preservao.
medida que novos dados relativos ao patrimnio arqueolgico forem sendo
agregados, ficaro mais visveis e mais claras as reas de maior concentrao deevidncias, permitindo propor, com maior segurana, nveis de preservao para
determinadas regies dentro da malha urbana, definidas legalmente como Zonas
Especiais de Proteo (ZEPs). Assim, alm de ao mitigadora, este monitoramento
constante se transformar em um incentivo para a criao de um banco de dados
sobre a realidade arqueolgica da antiga Vila Boa, contribuindo progressivamente para
o melhor conhecimento e preservao deste patrimnio cultural.
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CONCLUSO
A proposta aqui encaminhada est largamente amparada pelos critrios
explicitados na Carta de Lausanne, de 1990, que estabelece recomendaes relativas
proteo e gesto do patrimnio arqueolgico, e que tambm embasa a atual poltica
de preservao do patrimnio arqueolgico brasileiro adotada pelo IPHAN. Este
documento recomenda princpios fundamentais de gerenciamento, de alcance global.
Devemos ressaltar que esta uma proposta vivel, e que j est sendo
executada em prefeituras de algumas cidades no Brasil. Um trabalho pioneiro foi
proposto pela arqueloga Lcia Juliani (1996) para o municpio de So Paulo,
indicando diretrizes para a gesto de seu patrimnio arqueolgico, considerando que
esta uma cidade altamente urbanizada. Com esse trabalho, pela primeira vez no pasvislumbrou-se uma possvel soluo para a preservao, tendo como forte aliada
legislao de Uso e Ocupao do Solo, que dever agregar reas com potencial
arqueolgico especificadas como zonas de proteo especiais, limitando e impondo
regras de uso para estes locais pr-estabelecidos (JULIANI OP. CIT.).
Propostas de estratgias para a gesto do patrimnio arqueolgico do municpio
de Porto Alegre tambm se destacam no cenrio nacional, desenvolvidas pela
arqueloga Fernanda Tocchetto, em parceria da prefeitura municipal com o Museu
Joaquim Felizardo. Na capital gacha, tanto o patrimnio histrico quanto o pr-histrico tm sido alvos dos impactos decorrentes dos processos de ocupao e
transformao do solo urbano. Assim, foi entendida como necessria a criao de
estratgias preservacionistas que integrassem informaes provenientes de diferentes
pesquisas pontuais a fim de estabelecer critrios especiais de proteo e divulgao
destes bens pblicos, entre elas: a elaborao do mapa de valorizao arqueolgica de
Porto Alegre, estabelecendo zonas de interesse arqueolgico; a elaborao de uma
legislao municipal especfica de proteo ao patrimnio arqueolgico; a criao de
um arquivo arqueolgico municipal; a realizao de pesquisas arqueolgicassistemticas; a implantao de um programa de educao patrimonial
Alm destes exemplos prticos citados, sabemos da existncia de propostas
para a gesto do patrimnio arqueolgico em outras cidades brasileiras, como
Recife/PE, Santos/SP e Joinville/SC, todas contando com o mecanismo da legislao
urbana como alternativa possvel para a efetiva preservao patrimonial. interessante
ressaltar que todos os profissionais optaram por estratgias de gesto globais, que
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podem ser aplicadas em qualquer cidade do mundo, desde que apresente legislao
de uso e ocupao do solo urbano.
O que tentamos provar com este estudo que, preciso a mxima cautela com
o modelo de desenvolvimento vigente, que pode ter um carter predatrio. O
patrimnio arqueolgico um bem cultural passvel de destruio rotineira em reas
urbanas, especialmente considerado o caso da antiga Vila Boa de Gois, e deve ter
sua preservao como meta urgente das futuras polticas pblicas municipais, com
ateno especial para que a explorao econmica desse patrimnio no se
transforme em um fator a mais para a sua destruio.
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