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UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO E IESDE BRASIL S.A PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL A POESIA COMO INSTRUMENTO CAPAZ DE DESENVOLVER A PRÁTICA DA LEITURA MAÍSY DE MEDEIROS FREITAS

A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

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A seguinte pesquisa pretende apontar o desinteresse pela leitura nas séries iniciais do Ensino Fundamental das instituições públicas brasileiras, investigando os principais motivos que geram este desinteresse. Enfatizando a importância da leitura para a construção de um sujeito crítico em nossa sociedade, sugere o desenvolvimento de atividades com base na prática da leitura de poesia, sendo este utilizado como instrumento capaz de reverter este quadro. Dado a sua capacidade lúdica e criativa, fazendo com que o ato de ler torne-se uma atividade prazerosa de maneira que as crianças nessa fase da escolaridade possam criar um vínculo positivo entre a aprendizagem e a prática da leitura, a poesia é aqui apontada como um recurso prático e eficiente na busca por uma dinâmica onde a leitura torne-se significativa.Palavras-chaves: desinteresse pela leitura; ensino fundamental; poesia.

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UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO E IESDE BRASIL S.A

PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL

A POESIA COMO INSTRUMENTO CAPAZ DE DESENVOLVER A PRÁTICA DA

LEITURA

MAÍSY DE MEDEIROS FREITAS

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RIO DE JANEIRO

2007

MAÍSY DE MEDEIROS FREITAS

PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL TURMA 021

A POESIA COMO INSTRUMENTO CAPAZ DE DESENVOLVER A PRÁTICA DA

LEITURA

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à Universidade Castelo Branco em parceria com IESDE BRASIL S.ª como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Psicopedagogia Institucional, sob orientação do Professor Luiz Cláudio Delefeu.

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RIO DE JANEIRO

2007

A POESIA COMO INSTRUMENTO CAPAZ DE DESENVOLVER A PRÁTICA DA

LEITURA

MAÍSY DE MEDEIROS FREITAS

PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial para

obtenção do título de Especialista em Psicopedagogia Institucional pela

Universidade Castelo Branco em parceria com IESDE BRASIL S.A.

Obteve o grau: ______________.

Professor Orientador: _________________________________ Prof.

Professor Avaliador: _________________________________ Prof.

Coordenador do CEAD – UCB: _________________________________ Prof.

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Rio de Janeiro <data de aprovação>

À Flora, minha filha e mais bela

composição poética.

Page 5: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Agradecimentos

À minha mãe – sem a qual seria

impossível ter dado mais esse grande

passo em minha formação acadêmica e

profissional;

Ao meu orientador, Profº Luiz Cláudio

Delefeu – pela paciência em orientar-me,

estando sempre pronto em ajudar-me

tornando a construção desta pesquisa

um trabalho significativo.

Page 6: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

RESUMO

A seguinte pesquisa pretende apontar o desinteresse pela leitura nas séries

iniciais do Ensino Fundamental das instituições públicas brasileiras, investigando

os principais motivos que geram este desinteresse. Enfatizando a importância da

leitura para a construção de um sujeito crítico em nossa sociedade, sugere o

desenvolvimento de atividades com base na prática da leitura de poesia, sendo

este utilizado como instrumento capaz de reverter este quadro. Dado a sua

capacidade lúdica e criativa, fazendo com que o ato de ler torne-se uma atividade

prazerosa de maneira que as crianças nessa fase da escolaridade possam criar

um vínculo positivo entre a aprendizagem e a prática da leitura, a poesia é aqui

apontada como um recurso prático e eficiente na busca por uma dinâmica onde a

leitura torne-se significativa.

Palavras-chaves: desinteresse pela leitura; ensino fundamental; poesia.

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A poesia é a palavra original, é a

palavra que cria novos significados,

que dá nova vida aos antigos, que

redescobre coisas muito bonitas que

estavam bem diante de nossos olhos e

nós não percebíamos.

Nílson José Machado

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO....................................................................................................09

2 A REALIDADE DO ENSINO FUNDAMENTAL NAS INSTITUIÇÕES PÚBLICAS

BRASILEIRAS.......................................................................................................11

3 O DESINTERESSE PELA LEITURA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL....................................................................................................17

3.1 A IMPORTÂNCIA DA LEITURA NA FORMAÇÃO DO SUJEITO CRÍTICO....17

3.2 PRINCIPAIS MOTIVOS QUE GERAM O DESINTERESSE PELA LEITURA.19

4 A POESIA COMO RECURSO – LEITURA COMO ATIVIDADE DE PRAZER..21

4.1 A POESIA EM FOCO.......................................................................................21

4.2 A POESIA E O JOGO......................................................................................22

4.3 A POESIA NA SALA DE AULA........................................................................23

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................28

6 REFERÊNCIAS..................................................................................................30

Page 9: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

1 - INTRODUÇÃO

A relevância de se estudar mecanismos com a finalidade de ampliar o

quadro de leitores brasileiros é sempre presente, pois sabe-se da importância da

leitura para o crescimento individual, cognitivo, social e político do sujeito. É a

partir da aquisição da leitura que ocorrerá a democratização do saber, como

reforça ZILBERMAN (1986, p. 13) “Com o domínio generalizado da habilidade de

ler, conseqüência da ação eficaz da escola, opera-se uma gradativa, mas

irreversível, democratização do saber”.

O desinteresse pela leitura tem sido cada vez mais discutido no contexto

educacional do Brasil, sendo constantemente apontado como um dos maiores

indicativos que geram o fracasso escolar e o grande índice de indivíduos que se

designou chamar de analfabetos funcionais – sujeitos que apreenderam a

decodificação do símbolo lingüístico, porém não apreendem o sentido do que foi

lido e tampouco fazem um juízo crítico acerca do que lêem. Como reforça Freire

(2006, p. 11): “[O ato de ler] não se esgota na decodificação pura da palavra

escrita ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência

do mundo”.

Muitas são as inferências pedagógicas nesse sentido, e o educador se

sente cada vez mais frente a um novo desafio, em tentar instigar os educandos a

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desenvolverem o hábito pela leitura travando uma batalha diária com os meios

tecnológicos e interativos que atraem cada vez mais as crianças desta geração.

Diante deste quadro, sugere-se aqui um elemento pouco explorado no

contexto educacional, como instrumento capaz de desenvolver a prática da leitura

nas séries iniciais do Ensino Fundamental, buscando no sujeito um prazer contido

que a ludicidade dos versos podem trazer à tona. “A razão da escolha se dá

porque a linguagem poética é, por excelência, portadora dos elementos lúdicos

que proporcionam prazer ao texto”. (AMARILHA, 1997, p.26).

Não há como desenvolver o hábito pela leitura se esta não proporcionar

prazer ao leitor, e é com base nessa afirmação que irá se buscar utilizar o recurso

do gênero poético no sentido de proporcionar ao pequeno leitor uma fruição entre

este e a leitura proposta pelo educador, que gradativamente irá trabalhar com o

educando no sentido de que este possa posteriormente selecionar sua própria

literatura, numa demonstração de autonomia frente ao conhecimento.

O objetivo central deste trabalho é investigar o desinteresse pela leitura nas

séries iniciais do Ensino Fundamental, propondo a prática da leitura de textos

poéticos no sentido de reverter esse quadro. Para isso foi realizada uma

pesquisa acerca da realidade do Ensino Fundamental nas séries iniciais das

instituições brasileiras. Fazendo-se necessário um estudo dos motivos que

causam o desinteresse pela leitura e ainda explicitar os aspectos em que a poesia

pode contribuir para reverter essa situação.

Page 11: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

A metodologia utilizada para este trabalho de pesquisa foi a pesquisa

bibliográfica, fazendo um levantamento teórico acerca do elemento central deste

trabalho – desinteresse pela leitura e a leitura de poesia – utilizando-se de

teóricos que tratam do tema escolhido e fazendo uma reflexão sobre as leituras

realizadas ao longo deste processo. Muitos foram os autores consultados e dentre

estes iremos aqui listar os mais significativos para a realização deste trabalho de

pesquisa: Amarilha, Averbuck, Barthes, Freire, Pinheiro e Zilberman.

Page 12: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

2 – A REALIDADE DO ENSINO FUNDAMENTAL NAS INSTITUIÇÕES

PÚBLICAS BRASILEIRAS

Ainda que a Educação adquira diferentes características de acordo com a

região em que está sendo estudada, este trabalho pretende debruçar-se acerca

da realidade do Ensino Fundamental oferecido pelo poder público,de uma

maneira mais ampla no âmbito nacional, pois sabe-se que é neste aspecto que se

dão as diretrizes que regem a educação no país de maneira geral. E muitas são

as modificações que essas diretrizes vêm sofrendo ao longo dos anos.

O fato de enforcar-se neste trabalho de pesquisa o Ensino Público deve-se

ao fato de que, segundo Lisete Arelaro (2005)

O Brasil, em 2003 - último ano com dados disponíveis consolidados - tinha cerca

de 34,4 milhões de alunos matriculados no ensino fundamental regular, dos quais

31,2 milhões em escolas públicas, ou seja, cerca de 90% do atendimento escolar

fundamental é feito pelo Poder Público.

As estatísticas negativas que o Brasil sofreu nos últimos quinze anos

fizeram com que as políticas públicas da educação voltassem suas preocupações

aos números, deixando em segundo plano as reais condições em que esse

ensino iria se dar. Arelaro (2005), em seus estudos voltados para a realidade do

Ensino Fundamental nas instituições brasileiras, corrobora este entendimento:

Page 13: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Esta febre estatística de alterar positivamente os resultados nacionais levou

governos a implementar políticas que - para além do entendimento pedagógico da

relação qualidade/quantidade educacional - significassem, em curto prazo,

aumento do número de alunos matriculados em escolas, quaisquer que fossem

suas condições de funcionamento.

Uma das ultimas modificações realizadas no sistema educacional de nosso

país se deu em garantir à criança seu ingresso na escola a partir dos seis anos de

idade, de forma que esta permanecerá nove anos no Ensino Fundamental (houve

então o acréscimo de um ano), na intenção de permitir ao educando um período

mais extenso em dedicar-se à alfabetização. Porém cabe aqui questionar a

verdadeira intenção de se incluir crianças que, segundo a Lei de Diretrizes e

Bases da educação - LDB em seu artigo 30, deveriam ser assistidas por creches

e pré-escolas onde seriam atendidas crianças de 0 a 6 anos de idade. Em tempo,

outro questionamento pode ser feito: será que as crianças que estão chegando no

ensino fundamental aos seis anos de idade estão recebendo o devido

acompanhamento e será que a escola dispõe de estrutura suficiente para lhe

fornecer uma possibilidade educativa de qualidade? Como afirma Arelaro (2005):

Atente-se a que número significativo de escolas de 1ª a 4ª séries ainda se

mantêm sob a responsabilidade estadual e precisarão, para cumprir essa

determinação legal, incorporar crianças da rede municipal de educação infantil,

hoje já atendidas, e incorporá-las em uma escola estadual, que não

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necessariamente possui vagas disponíveis, equipamento ou material pedagógico

indicado para crianças de 6 anos de idade”.

Um dos principais focos do Ensino Fundamental está voltado para a

alfabetização. Porém, a qualidade desta alfabetização tem sido cada vez mais

questionada. Não basta apreender os signos lingüísticos e relacioná-los a um

fonema, este é o primeiro passo de uma longa jornada que não se encerra,

partindo do princípio de que o sujeito é um ser inacabado sempre passível de

mudanças e disposto a construir ou reconstruir o seu saber. Importa mais nesse

processo que a criança, à medida que esteja apreendendo os códigos lingüísticos

que regem sua comunicação, possa compreender o mundo que a cerca, tecer um

juízo crítico e construir-se enquanto individuo e cidadão, numa busca incessante

por um convívio coletivo e prática social que reflitam a cooperação. Pois, segundo

Zilberman (1986, p. 16) “a conquista da habilidade de ler é o primeiro passo para

a assimilação dos valores da sociedade”.

Para reforçar este entendimento recorre-se aos Parâmetros Curriculares

Nacionais – PCN’S, de cada área do conhecimento voltada para o Ensino

Fundamental que diz ser um de seus objetivos gerais: “Posicionar-se de maneira

crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o

diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas”. (PCN –

Língua Portuguesa,1997. p. 7). O diálogo pode ser aqui entendido como um

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mecanismo lingüístico que o pequeno educando irá apropriar-se na tomada de

decisões que implicarão em sua construção pessoal.

Em contrapartida a esse objetivo geral, traçado pelos parâmetros

educacionais do Brasil, ressalta-se uma realidade que em certa medida anula as

propostas a serem trabalhadas nesse nível educacional, como por exemplo salas

de aula super-lotadas que dificultam o atendimento individualizado, muitas vezes

indispensável no processo de alfabetização em se tratando de crianças com

dificuldades de aprendizagem; professores trabalhando em condições precárias

(poucos recursos em materiais didáticos), sem o devido reconhecimento; crianças

vindas de lares com famílias desestruturadas, precisando de acompanhamento

psicológico, entre outros problemas detectados nas escolas públicas brasileiras.

Muitos são os obstáculos que vem sendo enfrentados por educandos e

educadores que fazem o quadro do Ensino Fundamental da realidade pública das

instituições brasileiras, porém o educador não deverá se deixar abater por essa

condição. A educação ainda é o único instrumento efetivo de mudança para a

construção de uma sociedade mais justa e digna. Então, cabe aos educadores

refletir sobre estas problemáticas e pensarmos mecanismos que possam diminuir

o índice de evasão e desinteresse dos alunos de nossas escolas.

A Constituição Federal (CF/1988, artigos 205 a 208), garante a educação

como direito de todos e dever do estado, e ainda especifica que a qualidade deste

ensino deve ser priorizada.

Page 16: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Uma escola com boas condições de funcionamento e de competência

educacional, em termos de pessoal, material, recursos financeiros e projeto

pedagógico, que lhes permita identificar e reivindicar a "escola de qualidade

comum" de direito de todos os cidadãos (ARELARO, 2005).

Os programas assistencialistas oferecidos pelo governo, têm garantido a

presença das crianças nas escolas, porém mudam o foco principal do “porquê”

elas estão ali. Vão no sentido de garantir o dinheiro que é oferecido, como se este

fosse o principal objetivo e não a vontade de saber, o conhecimento que poderá

ser construído.

Alguns outros elementos também podem ser citados como causa do

desestímulo contagiante dos alunos que preenchem as salas de aula do Ensino

Fundamental do Brasil. Um deles seriam ainda o uso das cartilhas de

alfabetização que estão longe de vincular qualquer modalidade de leitura com a

realidade da criança e tampouco preocupam-se em atender os critérios

mencionados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais. Limitam-se em apresentar

as letras que compõe o alfabeto, muitas vezes de maneira desgastante, afastando

a criança da leitura já no seu primeiro contato. É necessário ao educador que a

alfabetização seja vista como um trabalho coletivo onde o aprendente é partícipe

ativo deste processo. “A alfabetização é a criação ou a montagem da expressão

escrita da expressão oral. Esta montagem não pode ser feita pelo educador para

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ou sobre o alfabetizando. Aí tem ele um momento de sua tarefa criadora”.

(FREIRE, 2006, p.19).

A criança precisa tomar conhecimento de que ler é desvendar um mundo

novo, enxerga-lo com todas as suas belezas e mistérios, e querer cada vez mais

desvendá-lo e deixá-lo mais bonito ainda, querer crescer para o mundo também

crescer.

Também pode-se apontar outro aspecto pouco proveitoso nesse período

de escolaridade para a criança: os conteúdos desvinculados do todo,

fragmentados, que tornam-se um conhecimento vazio e sem sentido para as

crianças nessa fase do desenvolvimento.

Nessa fase que vai dos seis anos até aproximadamente os onze anos, a

criança sente maior prazer em estar experimentando novas sensações. E a

aquisição da leitura pode ser uma sensação prazerosa para o educando, vai

depender da maneira como ela será explorada no contexto educacional.

O avanço tecnológico em muito contribuiu para o abandono à leitura, pois

as crianças e adultos em sua maioria preferem estar frente à uma máquina

televisiva assistindo programações escolhidas por outros do que estarem

escolhendo suas próprias fontes de saber por meio da literatura. As crianças são

cada vez mais seduzidas por computadores e jogos interativos o que resulta

também no abandono aos livros.

Page 18: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

A escola não poderá ser encarada como instrumento único de salvação,

mas cabe a esta desenvolver estratégias e aplicá-las para que o aluno possa se

sentir seduzido pelo saber. Nas salas de aula percebe-se o desinteresse pela

maioria dos alunos, que esperam ansiosamente pela hora do recreio – onde eles

desenvolvem atividades que realmente desejam. É preciso resgatar nessas

crianças o mesmo desejo e prazer em estar na sala de aula (ou em outro espaço

físico onde possa se dar a construção do conhecimento), com os colegas,

edificando o saber que será seu alicerce para toda vida.

Page 19: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

3 – O DESINTERESSE PELA LEITURA NAS SÉRIES INICIAIS DO

ENSINO FUNDAMENTAL

3.1 – A importância da leitura na formação do sujeito crítico

O ato de ler é realizado desde os primeiros meses de vida, essa pode

acontecer através dos sentidos e percepções, ou seja, com os olhares, o tato,

etc... essa primeira leitura entende-se por Leitura de Mundo, que vai se evoluindo

com as aprendizagens.

Conforme Freire (2001, p. 20): “a leitura do mundo precede sempre a

leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leitura daquele”.

A leitura, quando já codificada, possui alguns níveis como diz Maria Helena

Martins (1994, p.40), que são três: o emocional, o sensorial e o racional.

A leitura sensorial é a leitura realizada através dos sentidos. “Leitura

sensorial não se trata de uma leitura elaborada; é, antes, uma resposta imediata

às exigências e ofertas que esse mundo apresenta. A leitura sensorial começa,

pois, muito cedo e nos acompanha por toda a vida”. (ibid.)

A leitura emocional lida com os sentimentos, está diretamente relacionada

às sensações que o indivíduo pode captar e sentir.

Page 20: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Na leitura emocional emerge a empatia, tendência de sentir o que se sentiria caso

estivéssemos na situação e circunstâncias experimentadas por outro, isto é, na

pele de outra pessoa, ou mesmo de um animal, de um objeto, de uma

personagem de ficção. Caracteriza-se, pois, um processo de participação afetiva

numa realidade alheia. (ibid.p. 51).

A leitura racional é a forma mais convencional de leitura, expressa por meio

da decodificação das letras. E além disso, é a capacidade de ler um texto e dar

sentido a ele. Perceber sua mensagem, a função do texto. A leitura se realiza de

forma conjunta onde o leitor e o texto mantém um diálogo durante a leitura.

Importa, pois, na leitura racional, salientar seu caráter eminentemente reflexivo,

dialético. Ao mesmo tempo em que o leitor sai de si, em busca da realidade do

texto lido, sua percepção implica uma volta à sua experiência pessoal e uma visão

da própria história do texto, estabelecendo-se, então, um diálogo entre este e o

leitor com o contexto no qual a leitura se realiza”. (ibid. p.65)

Dentre estes níveis acima comentados, este trabalho pretende deter-se

acerca da leitura racional e o desinteresse das crianças pela aquisição desta

habilidade e mais ainda pela falta de estímulo a desenvolver essa prática.

A leitura é uma atividade essencial a qualquer área do conhecimento e

mais essencial ainda à própria vida do ser humano. O ato de ler é uma das

Page 21: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

formas do homem se situar com o mundo de forma a dinamiza-lo, ou seja,

interagindo com o meio de forma consciente. Na concepção de Freire (1979, p.

61): “se a vocação ontológica do homem é ser sujeito e não objeto, só poderá

desenvolvê-la na medida em que, refletindo sobre suas condições espaço-

temporais, introduz-se nelas de maneira crítica”.

Para que a leitura possa ser utilizada como instrumento de mudança, de

intervenção, faz-se necessário esclarecer que ler não se resume apenas em

decodificação de letras, utilizadas como símbolos lingüísticos. Como reforçam

AGUIAR e CATTANI (1986. p.26): “Ler não é, então, apenas decodificar palavras,

mas converte-se num processo compreensivo que deve chegar às idéias centrais,

às inferências, à descoberta dos pormenores, às conclusões”.

É por meio da leitura que o indivíduo toma conhecimento acerca de sua

cultura, pois o registro escrito é o documento mais utilizado pelo homem que

convencionou utilizar este meio para que os seus descendentes possam ficar à

par de sua história e assim compreender a transformação cultural que as

gerações estão sempre sofrendo.

É necessário, assim, que a criança entre em contato com os bens culturais, entre

os quais aqueles conservados através da linguagem escrita. A aprendizagem da

leitura é fundamental, portanto, para a integração do indivíduo no seu contexto

sócio-econômico e cultural”. (ibid. p.24).

Page 22: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

A leitura também possui o seu lado particular e individual, como nos

apresenta Morais (1996), em seu livro “A arte de ler”, que a leitura, além de

pública, também se constitui em um deleite individual. É um bem adquirido pela

sociedade, mas não exclui as condições do prazer particular, valorizado pela

intimidade silenciosa que a leitura pode proporcionar.

3.2 – Principais motivos que geram o desinteresse pela leitura

A leitura é essencial ao crescimento do sujeito perante si e a sociedade em

que este se insere. Através deste instrumento o sujeito pode refletir sobre os

próprios valores e experiências relacionando com as dos outros. Ao final de cada

leitura há um enriquecimento de novas idéias. Eventualmente, conhece-se melhor

o mundo e um pouco melhor de si mesmo. Ler é ainda um momento de deleite,

onde o indivíduo pode, mesmo sozinho, estar com pessoas de vários lugares e

em outras épocas, conhecer culturas diferentes, desenvolver sua imaginação.

Pois a leitura ajuda a sonhar, faz pensar. Conduz a uma melhor visão do mundo.

Segundo Zilberman (1986, p. 11), todo e qualquer sujeito pode desenvolver

essa habilidade. Ela afirma que “a universalidade do ato de ler provém do fato de

que todo indivíduo está intrinsecamente capacitado a ele, a partir de estímulos da

sociedade e da vigência de códigos que se transmitem por intermédio de um

alfabeto”.

Page 23: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Mas não se encerra aí. Na verdade quando a criança apreende esses

códigos ela está apta a realizar a leitura, porém a sua prática vai depender de

fatores que podem ser externos e determinantes na construção de um novo leitor.

Faz-se necessário que a criança consiga apreender junto aos códigos lingüísticos,

o sabor que a leitura pode proporcionar.

No Brasil, o desinteresse pela leitura tem sido um problema constante. A

realidade está aí para mostrar a problemática existente na sociedade quando

Pinheiro (1988, p. 23 – 42) afirma que: ”o desinteresse pela leitura é um grave

problema, pois a falta de informação leva à preguiça mental e conduz a

humanidade ao caos social e cultural”.

Tomada como problema social se relacionada com “maus” leitores, a leitura

raramente é vista como leitura de prazer. Aí, evidentemente, algumas perguntas

surgem: é preciso ler? Por que? Para que? Muitas respostas existem, como por

exemplo: para estudar, para instruir-se, para “ser alguém na vida”, enfim, uma

série de respostas que têm como conseqüência a ação. Ação esta que

proporciona vantagens, não uma ação que resulte em prazer.

Dentre os principais motivos apontados que geram o desinteresse pela

leitura de uma forma geral, pode-se destacar aqui alguns deles:

Se o professor não é adepto da leitura terá maior dificuldade em

estimular no educando o hábito de ler.

Page 24: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

O professor que tem compromisso com a educação e deseja atribuir a seus

alunos o perfil de um leitor precisa, primeiramente, adquirir o hábito da leitura,

para a partir daí, dividir esse deleite com seus alunos, de maneira que os

educandos sintam o desejo de ler.

Em alguns casos os textos que são propostos aos educandos quase

nunca despertam o necessário prazer que deve presidir toda a atividade do leitor.

Fazendo leitura de textos de livros didáticos, que em muitos casos nada diz

respeito à vida social daquele educando, simplesmente para responder a

questões de estudo do texto, por exigências de uma avaliação.

Num mundo globalizado, em que as crianças estão expostas cada vez mais às

mídias e à tecnologia e menos à leitura, fazer um estudante que não tem o hábito

da ler começar sua aventura no mundo das palavras por textos mais rebuscados

pode ser desestimulante e acabar de vez por solidificar o conceito de que ler é

muito chato. (BARONI, 2007)

Quase nunca a leitura ocorre em um espaço socializado e aberto.

“Para que o estudante desenvolva o hábito da leitura e o gosto pelo estudo

é preciso que todo o ambiente que o cerca seja favorável”( BARONI, 2007).

Page 25: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Outro elemento que vêm afastando as crianças dos livros são os meios

audiovisuais a que estas crianças estão expostas grande parte de seu tempo. Na

atual conjuntura sócio-econômica, os pais estão ausentes na maior parte do

tempo, trabalhando, em virtude de melhores condições de vida para seus filhos.

Porém na maioria dos casos estas crianças ficam à mercê das programações

televisivas, tornando-as passivas diante um grande número de informações que

são jogadas a cada instante pela tela e sem que a criança, ou até mesmo os

familiares responsáveis, se dêem conta que o sujeito torna-se inerte e com sua

mente possuída por imagens em movimento que sequer permitem tempo para

que as criança estimule sua própria criatividade, como acontece no caso da

leitura, por exemplo.

Deu no jornal esses dias: os brasileiros despendem 18,4 horas assistindo à

televisão por semana e apenas 5,2 horas com leitura no mesmo período. Os

dados são de uma pesquisa que avaliou e comparou os hábitos em relação à

mídia em 30 países. (Abramo, 2005)

Sendo assim, a criança fica acostumada com as informações que chegam

até ela sem que esta necessite realizar nenhum esforço mental para construir

histórias ou fantasiar personagens, desenvolvendo assim sua capacidade

cognitiva.

Page 26: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Abramo (2005) ainda afirma que o motivo de a televisão ter mais espaço na

vida das pessoas que a leitura dá-se ao fato de ser esta última uma atividade

solitária e que necessita um envolvimento profundo entre leitor e leitura, diferente

do que assiste televisão, que em sua inércia fica com sua mente

desinteressadamente comprometida com as imagens em movimento que

“pensam” pelo sujeito.

Tudo o que se alega contra ler – dificuldade de concentração, de entendimento,

aridez, falta de tempo e paciência, chatice – remete um pouco à idéia de que a

leitura exige um comprometimento, um engajamento do sujeito com aquilo que se

lê, se pensa e se sente, por conseqüência. (Abramo, 2005).

Estes motivos que vêm gerando o desinteresse pela leitura devem ser

superados ainda na infância, quando as crianças estão se apropriando desta nova

habilidade. Sendo então o melhor momento para se iniciar um trabalho de

incentivo constante que deverá plantar na criança a semente de um novo leitor.

Page 27: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

4 – A POESIA COMO RECURSO – LEITURA COMO ATIVIDADE DE

PRAZER

4.1 – A poesia em foco

Falar de poesia implica tentar definir o que é poesia, porém esta não é uma

definição tão fácil assim.

Conforme Ferreira (2000, p. 541), poesia é: “Arte de criar imagens, de

sugerir emoções por meio de uma linguagem em que se combinam sons, ritmos e

significados”.

Segundo alguns dicionaristas, poesia é a arte de escrever em verso.

Poesia também pode significar uma composição poética de pouca extensão. Mas,

acima de qualquer conceito, o que mais diz a verdade, é que a poesia é a própria

inspiração do homem, despertando o sentimento do belo.

Moisés (1993, p. 84) afirma que: “é através da poesia que se expressa, de

forma subjetiva, as emoções e sensações do indivíduo”.

A poesia é uma arte ao mesmo tempo subjetiva e pessoal, porém, tem um

alcance objetivo e geral, definido, embora, nem sempre compreendido: a intenção

do poeta, ou seja, do indivíduo. E essa intenção, sendo pessoal, individual, nem

sempre é percebida da mesma forma por todos (nem deve ser), mas carrega

dentro de si uma força tão grandiosa, que abraça um mundo imenso, cheio de

Page 28: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

possibilidades. “A poesia tem por objeto o ‘eu’ de modo que o ‘eu’, que confere o

ângulo do qual o poeta vê o mundo, se volta para si próprio. Para o poeta,

somente há um centro: ele”. (ibid, p. 84).

A poesia é a forma especial da linguagem, mais dirigida à imaginação e a

sensibilidade do que ao raciocínio. Em vez de comunicar principalmente

informações, a poesia transmite sobretudo emoções.

A poesia carrega uma possibilidade de promover e desenvolver a

personalidade do indivíduo. Tornando-o sensível na busca de seu próprio “eu”.

Poesia é arte de comunicar imagens, sentimentos, idéias, por meio de

uma linguagem lúdica em que sons e ritmos se combinam com os significados. É

aquilo que desperta o sentimento do belo, a sensibilidade.

4.2 – A poesia e o jogo

A linguagem poética pode ser caracterizada pela liberdade de brincar com

as palavras, fazendo destas peças de um jogo, onde a crianças, ao unir uma a

uma vai desvendando o mistério nele contido, numa interação dinâmica.

Segundo Huizinga (1993, P.16) o jogo torna-se interessante pois

caracteriza-se pela luta, pela competitividade presente nos instintos do ser

humano. Numa luta em que o jogador precisa desvendar o sentido oculto do

poema, como uma brincadeira de esconde-esconde. Como reforça Marly

Page 29: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Amarilha (1997, p. 28): “O mesmo sentimento está presente no poema; o jogo de

linguagem se estabelece ao propor um desafio para o leitor descobrir o significado

do poema que, propositadamente, vem em linguagem obscura, cifrada,

enigmática”.

Em pesquisa realizada por esta mesma autora, sobre leitura nas séries

iniciais do ensino fundamental nas escolas da rede estadual de ensino do estado

do Rio Grande do Norte, no ano de 1993, foi constatado que 90% das crianças se

identificam por este gênero “pois na verdade é na poesia que o lúdico da

linguagem se faz mais notório” (ibid. p. 27).

Esse movimento lúdico se caracteriza ainda por ter nele contido, um jogo

de duplicidade onde a disciplina e a liberdade na criação se interpõe e se

completam. Para reforçar este entendimento, vejamos o que diz Amarilha (1997,

p. 34): “a poesia oferece esse treino ao leitor, mas sobretudo na forma lúdica ela

oportuniza ao indivíduo pensar simultaneamente com disciplina e liberdade”.

Pois, segundo esta autora, a criação poética é resultado de escolhas onde o

poeta seleciona palavras que podem traduzir uma “linguagem sensorial”, que

antes de serem palavras, remetem aos sentidos. “Sendo o processo de linguagem

poética não-narrativo, verifica-se que ele é antes de tudo sensorial, imagístico,

exatamente da maneira como as crianças primeiro recebem impressão do

mundo”. (AMARILHA 1997, p. 27).

Page 30: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Mas a escolha dos processos de construção textual não se dá

aleatoriamente, passando por rigorosos processos de seleção, a depender da

intenção do autor. Porém a liberdade de escolha das palavras que irá usar para

despertar este ou aquele sentimento no leitor e ainda a liberdade de interpretação

daquele que lê constroem o duplo lúdico contido na linguagem poética.

Tendo escolhido o tema, a idéia, a imagem sobre a qual vai falar, o poeta

estabelece para a sua composição rigorosos parâmetros sonoros, métricos,

semânticos. Isto é, escolhe os sons que irá explorar, número de sílabas que vai

usar e o sentido que quer atribuir e extrair das palavras nessa estrutura. O

resultado é uma composição rigorosamente ordenada, (...) mas põe também sua

liberdade na escolha das palavras, das imagens que quer sugerir.

(AMARILHA,1997, p. 31).

Ainda para reforçar este entendimento, vejamos o que diz Averbuck (1986,

p. 76): “O que a linguagem poética faz é jogar com as palavras. o jogo com o

poema é sua desconstrução e reconstrução, exercício de liberdade poética”.

Esse jogo da linguagem será então o principal responsável em instigar nas

crianças o prazer da leitura contida nos textos poéticos, tão pouco explorados no

contexto da sala de aula, uma vez que os professores têm preferido trabalhar com

textos informativos (AMARILHA, 1993), que são em geral construídos por uma

narrativa linear e sem uma proposta lúdica.

Page 31: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

A poesia possui então essa característica lúdica que permite à criança

tornar-se ativa no processo da leitura, em um deleite solitário – uma solidão a

dois.

4.3 – A poesia na sala de aula

A sala de aula ainda tem sido o espaço destinado por excelência à

aquisição do conhecimento, onde as crianças passam a maior parte do tempo

escolar, portanto este espaço precisa ser reconfigurado de maneira que possa

tornar o aprender em uma atividade prazerosa.

A poesia, como já foi dito, tem a capacidade de despertar esse prazer no

educando, pois a convida à participar do jogo da linguagem de uma maneira

interativa.

Por ser um tipo textual que se utiliza de metáforas e outros elementos

carregados de simbologias, faz-se necessário que o aluno tenha contato com

textos poéticos, subjetivos, o que vai fazê-lo não somente treinar a decodificação

do símbolo lingüístico, mas desenvolver uma leitura com capacidade cognitiva de

compreensão da linguagem figurada, ou seja, um maior desenvolvimento

intelectual para o indivíduo. Como reforça Averbuck (1986, p. 67-68)

Page 32: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Nessa possibilidade de expansão do próprio real reside, pois, o cerne do caráter

liberador de poesia, sua natureza de móvel da capacidade de associação, de livre

fluxo da fantasia, de elemento condutor de camadas do inconsciente, capaz de

enriquecer a vida interior do leitor (na medida em que ele participa do texto

poético). Pela alta carga de conotação do texto, toda leitura de poesia é um ato de

recriação. Ler o poema é, necessariamente, buscar um (dos) sentido(s). Este

exercício realizado em cada leitura, comporta a possibilidade de participação no

texto do outro, pelo jogo duplo de receber e refazer o texto, forma de ampliação

de um universo.

É o que se percebe, por exemplo, no poema a seguir:

Casa de gato

É no canto da rua

Mobília de vento

Tapete de lua

Casa de pássaro

É pendurada no azul

Casa sonora

De cantos e ventos

(MURRAY apud ABRAMOVICH, 1994. p.80)

Page 33: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Na poesia acima, percebe-se que o texto brinca com as diversas

possibilidades de construções imagéticas que a criança poderá construir a partir

da leitura do poema. Não se limitando a uma única interpretação, deixando então

o aluno mais livre em sua criação interpretativa.

Na poesia a criança pode dançar... A partir de uma leitura poética os

versos dançam, embalados por um ritmo produzido por meio das combinações de

palavras e rimas.

O ritmo é um outro elemento da poesia que o professor poderá explorar na

sala de aula, junto aos alunos. Realizar a leitura de textos poéticos, respeitando e

brincando com os diversos sons por ele sugeridos, poderá ser uma atividade

bastante proveitosa. Observe-se a poesia a seguir:

Valsinha

É tão fácil

dançar

uma valsa,

rapaz...

Pezinho

pra frente

pezinho

pra trás.

Pra dançar

uma valsa

é preciso

só dois.

Page 34: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

O sol

com a lua

feijão

com arroz.

(PAES apud ABRAMOVICH, 1994. p. 76)

A partir da leitura do poema “Valsinha”, pode-se constatar que há um ritmo

sugerido pelo autor. Esse ritmo se dá, não só pela escolha das palavras utilizadas

mas também pela forma que o texto está estruturado. Esse jogo com as

estruturas, também se constitui em um instrumento utilizado pelo poeta para

sugerir aquilo que ele deseja. Como reforça TREVISAN (1981, p. 16):

“Compreendi que a poesia era uma espécie de palavra com música”.

Segundo ABRAMOVICH citando PAES (1994, p.67): “Toda poesia tem que

ter uma surpresa. Se não tiver, não é poesia”. E isso principalmente quando

trata-se de poesias voltadas para crianças. A criança gosta da surpresa que a

poesia contém. O que será que esta vai ter? uma mensagem cifrada? Um ritmo

para dançar com os olhos? Uma maneira toda especial de dizer algo, que poderia

ser dito de outra maneira?

As formas em que se constituem a poesia devem ser sempre atrativas para

a criança, de forma que ela possa degustar cada verso, saborear. E que ela

possa perceber que a leitura é uma atividade gostosa, que pode ter sabor de

chocolate, pode ter cheiro de jasmins e que pode ser tão iluminada como o céu

em uma noite de lua cheia.

Page 35: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Pois a poesia tem esse poder de encantamento. Porém, cabe aqui

levantarmos uma questão: por quais motivos a poesia não é bem explorada no

contexto escolar? Segundo Amarilha (1997, p. 26) “A poesia ocupa um espaço

muito reduzido, sendo-lhes reservada, na maioria das vezes, uma função

ornamental nas datas festivas do calendário escolar ou cívico”. Ela atribui essa

“situação pouco estimulante da poesia, na escola, à precária atenção que temos

dado ao gênero poético enquanto provedor de estimulo intelectual, formação

cognitiva e estética ao aprendiz mirim, conseqüentemente, como provedor de

prazer”. (ibid.)

Como se só importasse à instituição escolar repassar para os educandos

regras gramaticais a serem cobradas posteriormente em avaliações que não tem

compromisso com o verdadeiro significado do processo de aquisição do saber. “A

sala de aula, antes de ser o território da inventividade, é , na maioria das vezes, o

lugar onde se anulam as possibilidades de criação e inovação” (AVERBUCK

1986, p. 65).

Como reforça DRUMMOND apud AVERBUCK (1986, p. 66):

a escola enche o menino de matemática, de geografia, de linguagem, sem, via de

regra, faze-lo através da poesia da matemática, da geografia, da linguagem. A

escola não repara em seu ser poético, não o atende em sua capacidade de viver

poeticamente o conhecimento e o mundo.

Page 36: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

A escola de hoje encontra-se inserida num contexto social, cada vez mais

pragmática e capitalista, sentindo-se na obrigação de preparar os sujeitos

unicamente para preencher o mercado de trabalho. Sem antes, prepará-lo para a

vida, a partir de uma exploração mais elaborada de suas capacidades criativas. “A

poesia e a arte em geral participam dessa área “não lucrativa” onde se inserem as

atividades prazerosas e lúdicas, excluídas do programas de vida de uma

sociedade voltada para o ganho”. (AVERBUCK 1986, p. 66).

A escola deve ser o espaço de inventividade, onde as crianças têm a

oportunidade de se inserir no contexto de criação, oferecido pelo professor. Pois,

a partir da leitura de poesias o professor pode ainda sugerir às crianças que estas

passem a produzir seus próprios textos poéticos. Elas então poderão conceber a

produção literária dentro do jogo antes mencionado, entre a liberdade e a

disciplina. E a poesia pode ser um elemento rico nesse processo.

No entanto, essa criação requer uma “atmosfera própria em que a meta é,

inicialmente, a de favorecer a predisposição, a sensibilização. A poesia requer

silencio e o espaço interior” (ibid. p.70)

O trabalho com a poesia pode ainda ter seu foco voltado para o

desenvolvimento da personalidade do sujeito. Pois que esse gênero tem como

característica retratar o interior das pessoas, o subjetivo, fazendo com que,

aquele que lê, possa também ter um pouco de seu interior (re)descoberto.

Page 37: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

Averbuck (1986, p. 69), enfatiza os diversos pontos positivos em que a

leitura da poesia pode atuar no processo de formação do sujeito

A poesia pode desenvolver a personalidade, formar o gosto e a sensibilidade,

possibilitar o conhecimento do próprio ‘eu’, ela auxilia a compreensão da

comunicação do irracional e do incomunicável, funcionando como ‘antídoto’ em

uma civilização urbana e técnica.

Page 38: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema educacional das instituições públicas brasileiras vem

enfrentando novos desafios com a contemporaneidade e os novos espaços

virtuais que estão se estabelecendo na realidade cotidiana de nossos educandos.

A prática da leitura, como atividade prazerosa, se caracteriza como um

problema que afeta crianças e jovens brasileiros. Muitos são os programas

oferecidos pelo governo para garantir assiduidade nas escolas, porém, cabe ao

professor tornar essa presença na sala de aula verdadeiramente significativa.

A realização deste trabalho de pesquisa veio contribuir no sentido de

perceber a prática de uma leitura significativa, na esfera escolar, dentro de uma

proposta onde o uso de poesias é utilizado na construção de um leitor sensível ao

texto poético, tendo em vista a importância de leitura de textos subjetivos que

estimulam o desenvolvimento cognitivo e pessoal do indivíduo.

Diante das leituras realizadas para a construção deste trabalho de

pesquisa, foi possível perceber a importância da utilização de textos poéticos

como instrumento a viabilizar uma prática de leitura voltada para educandos das

séries iniciais do Ensino Fundamental, tendo visto o grande índice de motivos que

vem gerando o desinteresse pela leitura nessa fase de escolarização, e para que

estas crianças possam deleitar-se com a leitura o que ainda poderá proporcionar

novas aquisição de saberes.

Page 39: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

A poesia poderá ser enfocada dentro de uma metodologia inovadora que

irá proporcionar uma abrangência intelectual do educando, que terá oportunidade

de vivenciar, no contexto escolar, por meio de uma concepção poética os

conteúdos que são propostos e não somente as disciplinas convencionais

(português, matemática, ciências, geografia, história) que têm maior ênfase nas

escolas, esquecendo, assim, da importância de interdisciplinar a leitura com a

arte. Posto que :

Associada a outras formas de dizer como o teatro, a declamação, a música, a

expressão visual e escrita, a poesia na escola pode cumprir, portanto, um papel

integrador na medida em que, apoiando-se na palavra do aluno e do poeta, busca

a essência da expressão do homem. (AVERBUCK, 1996, p. 82).

Muitos foram os obstáculos enfrentados ao longo do processo de

construção deste trabalho de pesquisa. Porém o que mais dificultou este processo

foi o tempo disponível para sua elaboração. Visto que o profissional da

contemporaneidade dispõe de pouco tempo para se dedicar aos estudos,

precisando dedicar-se com mais afinco à sua profissão, no caso, a sala de aula.

Porém este fator, ao mesmo tempo em que dificultou em certa medida, também

facilitou, visto que a sala de aula é sempre um espaço para experimentação de

novas propostas metodológicas, como foi o caso deste trabalho.

Um dos temas aqui desenvolvidos e que sugere-se um maior

aprofundamento posterior é o que diz respeito à relação entre a linguagem

Page 40: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

poética e o jogo, o que caracteriza o movimento lúdico facilitador no processo de

despertar no educando um maior interesse pela leitura.

Acredita-se que este trabalho possa ser útil para a utilização de

educadores de todo o país que, buscando alternativas e estratégias para ampliar

o quadro de leitores no âmbito nacional, possam propor a prática do trabalho com

poesias, sugerida por esta pesquisa.

Page 41: A Poesia Como Instrumento Capaz de Desenvolver a Pratica Da Leitura

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