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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA – MESTRADO
A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DA CIDADE DE PATOS/PB: DO BNH AO
PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA
Wilma Guedes de Lucena
Orientadora: Doralice Sátyro Maia
Coorientadora: Eliana Freitas Calado
João Pessoa – PB
Agosto de 2014
Wilma Guedes de Lucena
A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DA CIDADE DE PATOS/PB: DO BNH AO
PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA
João Pessoa – PB
Agosto de 2014
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Geografia, da Universidade
Federal da Paraíba, como parte dos requisitos
para a obtenção do título de Mestre em
Geografia, sob a orientação da Profª. Doralice
Sátyro Maia e coorientação da Profª. Eliana A.
de Freitas Calado.
A produção do espaço urbano da cidade de Patos/PB: do BNH ao Programa Minha
Casa, Minha Vida
Wilma Guedes de Lucena
Dissertação apresentada ao Corpo Docente do Programa de
Pós-graduação em Geografia do CCEN-UFPB, como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Geografia.
Arguidores:
_________________________________________________
Profª. Dr.ª Doralice Sátyro Maia
(Orientadora)
_________________________________________________
Profª. Dr.ª Eliana A. de Freitas Calado
(Coorientadora)
_________________________________________________
Profª. Dr.ª Marcele Trigueiro de A. Morais
(Examinadora interna)
_________________________________________________
Prof. Dr. Jan Bitoun
(Examinador externo)
Universidade Federal da Paraíba
Centro de Ciências Exatas e da Natureza
Programa de Pós-graduação em Geografia
Curso de Mestrado em Geografia
Agosto/2014
AGRADECIMENTOS
Esse momento tão particular da escrita da dissertação é repleto de uma imensa
satisfação e de sentimentos que tenho a sensação de que as palavras são insuficientes para
descrever. Mas, se as palavras são a forma pela qual tenho que agradecer toda a ajuda e o
apoio que recebi na construção deste projeto, não as pouparei. Afinal, agradecer é o mínimo
que posso fazer por todos os que estiveram presentes, de uma forma ou de outra, nos
momentos das conquistas e das dificuldades.
Em primeiro lugar, agradeço e sempre o farei incansavelmente à minha mãe (Maria
de Fátima), que enfrentou muitas dificuldades para que eu pudesse chegar até aqui, pois, além
de ter sido o pai (que deixou muito cedo a vida terrena) e a mãe capaz de tudo por suas filhas,
tem sido uma grande amiga. Sou grata também à minha irmã Wilmara, pela confiança que
sempre depositou nos meus poucos projetos profissionais e pessoais, além de sempre ser
companheira nas minhas jornadas, como esta que concluo;
Agradeço à orientadora da graduação, a mestra e amiga Nirvana (Nir), que não só
abriu, mas também escancarou portas e janelas no percurso da minha vida acadêmica,
compartilhou e compreendeu lágrimas e sorrisos;
À Professora Doralice Maia (Dora), quero agradecer imensamente, por ter aceitado
orientar este trabalho e, conseguintemente, pela confiança depositada, por sempre ter sido tão
prestativa, mesmo quando distante fisicamente. Pelas sugestões sempre tão preciosas, pelo
apoio sempre ofertado e pelos novos caminhos que esse apoio me proporcionou;
À Professora Eliana Calado, também agradeço pela coorientação, pelas palavras de
incentivo, pelos encontros sempre tão agradáveis e pela amizade que pudemos construir nesse
período:
A Ana Bernadete, que, como professora e amiga, me incentivou a fazer a seleção
para o Mestrado e contribuiu lendo e corrigindo o projeto;
Ao Professor Edilson, que sempre confiou em seus alunos-amigos, além de me
ajudar recentemente, devido a minha dificuldade de lidar com alguns programas de
computador;
A Erickson, cuja ajuda e amizade foram imensuráveis e pelos quais serei
imensamente grata;
Agradeço às meninas da Residência Universitária Feminina Elizabeth Teixeira
(RUFET), em especial, à Lilly, à Juliana e à Pollyanna, que me acolheram, me abrigaram e
fizeram o possível para me sentir em casa;
A Danielle, que me ajudou a sentir com menos intensidade o peso das primeiras
adversidades no percurso trilhado;
A Jarissa, Regiane e Thaynara, por terem tornado o nosso quarto na RUFET um
verdadeiro lar, por me fazerem sentir uma geógrafa com um dedinho na antropologia
(responsabilidade de Anny também) e por terem sido tão presentes nos momentos de alegria e
de tristeza. Delas eu nunca esquecerei;
Aos colegas do Grupo de Pesquisa (GEURB) e do Laboratório de Estudos Urbanos
(LEU), tanto os que se afastaram quanto os que permaneceram, Chrislayne, Rebeca, Camila,
Rafaela, Luciana, Rachel, Eliana e, especialmente, à Sonale e Leornado, que são sempre
atenciosos e socorrem todo mundo que precisa de ajuda (principalmente na produção dos
mapas) e à Marina, cuja amizade nasceu e cresceu entre cafés, conversas, encontros
(acadêmicos ou não) e viagens. Faço gosto nessa amizade, pela qual tenho um carinho
especial, pois, nesses diversos momentos em que estivemos juntas, compartilhamos angústias,
esperanças e diversão. Essas pessoas, definitivamente, contribuíram para meu
amadurecimento acadêmico e pessoal;
Aos professores do PPGG, que ministraram as disciplinas que cursei nesse período,
porque contribuíram para que minha bagagem teórica chegasse até aqui bem mais recheada; a
alguns professores de outros programas de pós-graduação, em que tive a oportunidade de
participar de algumas aulas e atividades e que acrescentaram bastante à minha formação.
Entre eles, destaco as contribuições dos Professores Anieres e Josias, no seminário de
dissertação; ao Professor Renato Pequeno da Universidade Federal do Ceará, que participou
da qualificação, dando valiosas sugestões para a pesquisa, além de ceder um banco de dados
da CEF que dispunha sobre o PMCMV na Paraíba;
À Professora Marcele Trigueiro do PPGAU/UFPB, por participar da construção
deste trabalho, desde a qualificação e cuja avaliação muito contribuiu para a conclusão da
pesquisa e da escrita. Ao Professor Jan Bitoun da UFPE, por ter aceitado o convite para
participar dessa etapa final do trabalho, e ao Professor Pedro Vianna, pela preocupação e
pelas palavras de incentivo;
A todos os colegas de Mestrado, principalmente os da turma de 2012, pois os nossos
encontros antes, durante e após as aulas sempre foram muito agradáveis. Dessa turma guardo
na memória, com afeto e carinho, os gestos atenciosos de Marina, Deusia, Pâmela, Flávia,
Rose, Verônica, Diego, Nielson e Jonathas. Desejo a todos que a fase que se inicia após a
conclusão do Mestrado seja repleta de novas conquistas;
Ao pessoal da graduação, que conheci quando começamos a nos mobilizar para
participar do ENG de 2012, em especial, Raíssa, Rodrigo e Francisco (o qual conheci
posteriormente), que compartilhavam comigo seus conhecimentos geográficos e seus
momentos de descontração nos corredores do DGEO;
Aos amigos que fui agregando, ao longo da vida, e que, de uma forma ou de outra,
me acompanharam na estrada, serei eternamente grata;
A Amanda, por sempre acreditar em mim, mesmo quando eu estava no auge do
pessimismo. Aqui as palavras são insuficientes para descrever a importância da nossa relação
fraterna;
A Allison, pelas constantes palavras de apoio;
A Veruza, por me fazer enxergar novos caminhos, por me estimular sempre, pela
amizade tão preciosa e pela revisão de texto com tanto empenho;
A Ângelo, pelos “puxões de orelha”, desde a graduação, e pela amizade que nasceu
em algum momento longínquo da infância;
A Mariana, Sara (Sarinha), Ana Caroline (Carol), José Everton (Sauron), Aurino,
Erick, Rafaela, Tayse (Tay), Arthur, George e Roland, por mostrarem a leveza da vida e me
fazerem esquecer a ansiedade e as preocupações, e a todos do Coletivo Espinho Branco, com
os quais compartilho planos, ideais e o desejo de mudar para melhor (nem que seja um
pouquinho) o lugar em que vivemos;
A Juan, pela força, pelo carinho, pela leitura e pelas sugestões tão importantes no
momento da qualificação;
A Eripetson sou grata, por ter me ajudado com a escrita do abstract. Espero que logo
possa retribuir o seu esforço e a sua atenção;
Ao setor de geoprocessamento e à Secretaria de Desenvolvimento Econômico e
Habitação do município de Patos, que cederam alguns dados durante a pesquisa;
A Vânia, que trabalha no arquivo da Câmara dos Vereadores e que foi extremamente
prestativa e atenciosa quando tive que fazer a pesquisa documental dos projetos de Lei;
Aos moradores do Conjunto Residencial Vista da Serra I, que me receberam em suas
casas e contribuíram de todas as formas possíveis (respondendo ao questionário, oferecendo
lanches, água, café e uma enorme atenção). Graças a essas pessoas, pude concluir esta
pesquisa e conhecer um pouco mais sobre a cidade onde nasci e cresci;
A Capes, pelo financiamento através da bolsa de estudos, que é de fundamental
importância para a pesquisa.
Concluo dizendo que ainda há muitas outras pessoas que foram fundamentais para
que eu conseguisse concluir este trabalho, às quais reservarei meus muitos abraços e algumas
palavras a serem ditas pessoalmente.
A todos os que fizeram parte disso tudo, muito obrigada!
“E a cidade se apresenta
Centro das ambições
Para mendigos ou ricos
E outras armações
Coletivos, automóveis,
Motos e metrôs
Trabalhadores, patrões,
Policiais, camelôs
A cidade não para
A cidade só cresce [...]”
(Chico Science)
RESUMO
O presente trabalho objetivou analisar as implicações do Programa Minha Casa, Minha Vida
(PMCMV), na cidade de Patos - PB, sobretudo em seus espaços de moradia. A discussão
centrou-se na compreensão de como a política habitacional influiu (e ainda influi) na
produção do espaço urbano, especialmente nas cidades médias. Para tanto, buscou-se entender
a produção do espaço urbano da cidade de Patos/PB, através das políticas passadas (período
de vigência do Banco Nacional de Habitação) e no momento atual de implantação do
PMCMV. Nessa perspectiva, analisou-se a política habitacional considerando a relação
Estado-capital imobiliário, as formas de promoção dos projetos habitacionais do referido
programa, bem como as características urbanísticas desses projetos. Assim, foi possível
discutir sobre os efeitos dos projetos de habitação financiados pelo Estado em suas diversas
escalas de atuação, sobretudo na escala da cidade. Ao longo da pesquisa, as leituras realizadas
sobre as noções de (re) produção do espaço urbano, sobre os agentes produtores desse espaço
e de questões mais específicas referentes aos processos de periferização e
produção/valorização desigual da cidade foram de suma importância para o debate teórico
desenvolvido neste trabalho. Além do referencial bibliográfico, fez-se um levantamento de
dados, informações e bases cartográficas nos setores de administração pública da cidade de
Patos (setor de geoprocessamento, secretarias de infraestrutura e de habitação) e em órgãos e
instituições das demais esferas da ação estatal, como a CEHAP, o IBGE, entre outros, com o
intuito de apreender com mais profundidade a realidade pesquisada. Apesar de o PMCMV ter
modalidades de financiamento para famílias de diferentes faixas de renda, o foco da pesquisa
foram os projetos habitacionais para a população que tem rendimento mensal de zero a três
salários mínimos. A pesquisa de campo foi realizada no Conjunto Residencial Vista da Serra
I, porque, entre os projetos propostos e em avaliação pela CEF, esse tinha sido, até a
conclusão desta pesquisa, o único conjunto habitacional que havia sido entregue às famílias
sorteadas para serem atendidas pelo PMCMV em Patos. Durante a pesquisa de campo,
procedeu-se à observação/descrição da paisagem e aplicaram-se os questionários aos
moradores do local. Com o levantamento dos dados e das informações obtidos no decorrer da
pesquisa, o arquivamento deles e sua posterior análise, foram alcançados os objetivos
específicos traçados e, conseguintemente, o objetivo geral. Com a conclusão da pesquisa,
levantaram-se questões concernentes aos impasses para a implantação de uma política
habitacional que, efetivamente, atenda às demandas habitacionais locais, tanto quantitativas
como qualitativas, bem como questões relacionadas à reprodução e à intensificação das
desigualdades socioespaciais nas cidades médias, especificamente na cidade de Patos-PB -
onde identificamos a atuação de agentes que têm produzido duas periferias bem distintas: uma
em que se observa a provisão de habitação de interesse social voltada para a população de
baixa renda em locais onde há pouca infraestrutra e serviços, e outra em que há um grande
número de loteamentos e empreendimentos imobiliários destinados aos grupos de renda mais
elevada e que se localizam onde há grande pressão dos agentes imobiliários em relação ao
poder público local para a implantação da infraestrutura e dos serviços necessários para a
valorização desses espaços.
Palavras-chave: Programa Minha Casa, Minha Vida – Cidades médias – Periferização
Desigualdades socioespaciais – Patos/PB.
ABSTRACT
The present work aimed to analyse the implications of the “Minha Casa Minha Vida” social
housing Program (PMCMV) in Patos – PB, above all, regarding their spaces for housing. The
discussion was based on the perception of how housing policy influenced (and still
influences) the construction of the urban space, mainly in medium-sized cities. For this
purpose, it was pursued to understand the construction of the urban space in Patos-PB through
previous housing policies (under the policy of the National Bank of Housing) as well as the
current moment of implementation of the PMCMV. From this perspective, the housing policy
was analysed, the ways of promoting the housing projects of the Program, as well as its
urbanistic characteristics. Thereby, it was possible to discuss the effects of the housing
projects funded by the government on its various areas of activities, especially in the city.
Hence, throughout the study, the bibliographical research on (re) construction of urban spaces,
the agents which promote these spaces and more specific issues on the periphery formation
and unequal production/valorization of the city, was essential for the theoretical debate of this
work. Besides the bibliographical reference, a data research was carried out including a
collection of information and cartographic scales in the public sector in Patos – PB
(geoprocessing, infrastructure and housing departments) and in organs and institutions from
other areas of the government such as CEHAP, IBGE, among others, in order to profoundly
comprehend the studied reality. Although PMCMV offers funding for families from different
income levels, the research focused on those aiming at families whose income varies from 0
to 3 minimum wages. Field research was carried out at Vista da Serra I residential area, as
among the projects which were proposed and were being evaluated by CEF, this one was
actually, the only one which had been delivered to the families enrolled at the programme in
Patos, when this research was concluded. During field research, landscape
observation/description and application of questionnaires to locals were carried out. The
specific purposes and, consequently the general purpose were achieved through data
collection, information gathered during the research and its filing, as well as its posterior
analysis. With the conclusion of the research, it were taken into account some issues
concerning obstacles to the implementation of a housing policy which actually meets the
population needs, qualitative and also quantitative, as well as issues related to reproduction
and intensification of the socio spatial inequalities in medium-sized cities, specifically in the
municipality of Patos – PB. It was identified in this city the performance of agents which has
been forming two different sorts of periphery, one of them in which social housing aiming at
low income population in places with poor infrastructure and service is provided; and the
other one in which division into lots and state ventures aiming at higher income population
are present, this kind of periphery is located in places where there is great pressure from state
agents regarding its local public power due to have infrastructure and essential services
properly implemented to increase the value of these spaces.
Key words: Minha Casa, Minha Vida housing Program – Medium-sized cities – Periphery
formation – Socio spatial inequalities – Patos/PB
LISTA DE SIGLAS
AESA – Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado
BNDS – Banco Nacional do Desenvolvimento
BNH – Banco Nacional de Habitação
CAGEPA – Companhia de Água e Esgotos da Paraíba
CEF – Caixa Econômica Federal
CEHAP – Companhia Estadual de Habitação Popular
CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CGFHIS – Conselho Gestor do Fundo de Habitação de Interesse Social
CGMHIS – Conselho Gestor Municipal do Fundo de Habitação de Interesse Social
COHABS – Companhias de Habitação Popular
CSU – Centro Social Urbano
CURA – Projeto de Comunidades Urbanas de Recuperação Acelerada
DFI – Danos Físicos do Imóvel
EC – Estatuto das Cidades
EPEA – Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada
FAC/PB – Fundação de Ação Comunitária da Paraíba
FAR – Fundo de Arrendamento Residencial
FCP – Fundação da Casa Popular
FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FICAM – Financiamento para Construção Ampliação e Melhoria
Fimaco – Financiamento de Material de Construção
Finansa – Financiamento para o Saneamento
FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos
FIP – Faculdades Integradas de Patos
FJP – Fundação João Pinheiro
FMI – Fundo Monetário Internacional
FNHIS – Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
FPM – Fundo de Participação dos Municípios
FRN – Financiadora de Estudos e Projetos
FUNASA – Fundação Nacional de Saúde
GEURB – Grupo de Estudos Urbanos
HIS – Habitação de Interesse Social
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBMEC – Banco Nacional do Desenvolvimento
ICM – Imposto de Circulação de Mercadoria
IES – Instituições de Ensino Superior
INOCOOP – Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais
IPASE – Aposentadoria dos Servidores do Estado
IPEP – Instituto de Previdência do Estado da Paraíba
ISO - Organização Internacional para Padronização
MEC – Ministério de Educação e Cultura
MHU – Ministério de Habitação e Desenvolvimento Urbano
OGU – Orçamento Geral da União
ORTN – Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PBQP-H – Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat
PDI – Plano de Desenvolvimento Integrado
Planasa – Plano Nacional de Saneamento
PlanHab - Plano Nacional de Habitação
PLHIS – Plano Local de Habitação de Interesse Social
PMCMV – Programa Minha Casa Minha Vida
PMP – Prefeitura Municipal de Patos
PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
PNH – Política Nacional de Habitação
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PRODEEM – Programa de Desenvolvimento Energético dos Estados e Municípios
ReCiMe – Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias
RVS I – Residencial Vista da Serra I
SBPE – Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
SEDEHAB – Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Habitação
SEINFRA – Secretaria de Infraestrutura
SERFHAU – Serviço Federal da Habitação e Urbanismo
SFH – Sistema Financeiro de Habitação
SNHIS – Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social
SNHM – Sistema Nacional de Habitação de Mercado
SUPLAN – Superintendência de Obras do Plano de Desenvolvimento do Estado
UFPB – Universidade Federal da Paraíba
UH‟s – Unidades Habitacionais
UPC – Unidade Padrão de Capital
USF – Unidade de Saúde Familiar
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Localização e distinção das Unidades Habitacionais (UHs) onde foram aplicados
os questionários na pesquisa de campo
Figura 02: Estabelecimentos comerciais na Rua Grande (Atual Solon de Lucena)
Figura 03: Localização do Conjunto Bivar Olinto (1), construído em 1982, e do Conjunto
Noé Trajano (2), concluído no início dos anos de 1970
Figura 04: Circuito de Promoção Pública dos projetos habitacionais na estrutura da Política
Nacional de Habitação (PNH)
Figura 05: Circuito de Promoção Privada de projetos habitacionais nos moldes do Programa
Minha Casa Minha Vida (PMCMV) Política Habitacional
Figura 06: Propaganda dos Condomínios Jardim Floresta – empreendimento com casas
financiadas pelo PMCMV
Figura 07: Propaganda de venda de casas localizadas no Distrito Industrial e financiadas pelo
PMCMV
Figura 08: Painel exposto na entrada do escritório da JGA Engenharia Ltda, localizado ao
lado das obras do Residencial Vista da Serra II em Patos
Figura 09: Limites da área de expansão urbana da cidade de Patos estabelecidos pela PMP
Figura 10: Condomínio Villas do Lago
Figura 11: Loteamento no Bairro Novo Horizonte
Figura 12: Casa à venda no Jardim Magnólia
Figura 13: Casas dos Condomínios Jardim Floresta
Figura 14: Outdoor do projeto do EcoShopping que vai ser construído
Figura 15: Localização dos conjuntos habitacionais do PMCM na cidade de Patos – PB
Figura 16: Estrutura do Sistema Nacional de Habitação (SNHIS)
Figura 17: Localização da área do RSV I e dos demais conjuntos habitacionais localizados em seu
entorno
Figura 18: Unidades Habitacionais (UHs) do Residencial Vista da Serra I
Figura 19: Unidades Habitacionais (UHs) do Conjunto dos Sapateiros (Projeto PAC)
Figura 20: Venda de terrenos, no ano de 2013, do loteamento Hardman Cavalcanti, onde se
localizam os Conjuntos Habitacionais Residencial Vista da Serra I e II (PMCMV)
Figura 21: Barracos construídos pelas famílias sem teto nos arreadores do terreno destinado à
construção do Residencial Vista da Serra II e do conjunto habitacional conhecido
popularmente como “Conjunto dos Sapateiros”
Figura 22: Via do Bairro Monte Castelo que dá acesso ao RSV I e aos demais conjuntos
habitacionais de seu entorno
Figura 23: Unidades Habitacionais dos Conjuntos Novo Monte Castelo II e Residencial Vista
da Serra II e da infraestrutura de pavimentação inacabada que dá acesso ao RSV I
Figura 24: Fossa que transbordou em uma das casas do RSV I e localização do Rio Farinha
próximo a essa área
Figura 25: Bocas de lobo para as quais alguns moradores canalizaram as fossas para o Rio
Farinha
Figura 26: Localização dos serviços e do comércio em relação ao Bairro Monte Castelo e ao RSV I
Figura 27: Pequeno comércio estabelecido em Unidade Habitacional do RSV I
Figura 28: Pequeno comércio estabelecido em Unidade Habitacional do Conjunto Novo
Monte Castelo II, localizado nas imediações do RSV I
Figura 29: Placa de venda de terreno entre o RSVI e o RSV II
Figura 30: Usos e apropriações do Loteamento Hardman Cavalcanti, localizado no Bairro
Monte Castelo
LISTA DE MAPAS
Mapa 01 – Situação geográfica do Município de Patos em relação à ferrovia e às rodovias na
Paraíba
Mapa 02: Expansão da malha urbana da cidade de Patos/PB desde 1960 até 2010
Mapa 03: Estado da Paraíba – Quantidade de unidades habitacionais (UHs) aprovadas nos
municípios através do PMCMV
Mapa 04: Áreas loteadas e em oferta no mercado imobiliário da cidade de Patos/PB
Mapa 05: Localização dos novos empreendimentos imobiliários na cidade de Patos/PB e que
têm provocado o aumento do preço/m² nas áreas em que se localizam
Mapa 06: Áreas de ocorrência de problemas habitacionais como adensamento excessivo,
caracterização de assentamento precário e risco de inundações
Mapa 07: Áreas de intervenções habitacionais através da construção de novas unidades e
regularização fundiária
Mapa 08: Densidade demográfica por setores censitários na cidade de Patos em 2010
Mapa 09: Densidade habitacional por setores censitários na cidade de Patos em 2010
Mapa 10: Distribuição de renda por setores censitários na cidade de Patos em 2010
LISTA DE TABELAS
Tabela 01: Crescimento populacional do município de Patos entre as décadas de 1960 e 2000
Tabela 02: Quantidade de empreendimentos, por faixa de renda, contratados até o ano de
2012 nos municípios de João Pessoa, Campina Grande, Patos e Sousa
Tabela 03: Déficit habitacional total e relativo, por componente, no estado da Paraíba e no
município de Patos - 2010
Tabela 04: Déficit habitacional urbano por classe de rendimento domiciliar no estado da
Paraíba e em Patos - 2010
Tabela 05: Déficit habitacional, por inadequação de domicílios urbanos, total e nas classes até
três salários mínimos em Patos - 2010
Tabela 06: Conjuntos habitacionais financiados pelo PMCMV propostos para a cidade de
Patos até o ano de 2013
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01: Perfil etário dos moradores de RVS I
Gráfico 02: Renda familiar mensal dos moradores entrevistados no RSV I
Gráfico 03: Quantidade de famílias por valor pago nas parcelas do financiamento das casas
do RSV I
Gráfico 04: Avaliação dos moradores sobre os serviços básicos oferecidos no RSV I
Gráfico 05: Avaliação dos moradores sobre os serviços básicos oferecidos no RSV I
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Aumento do teto para financiamento de imóveis pelo PMCMV em 2012
Quadro 02: Matriz dos eixos estratégicos e diretrizes específicas do PLHIS do Município de
Patos – PB
Quadro 03: Matriz das Linhas Programáticas e Programas de ação do PLHIS de Patos/PB
Quadro 04: Procedência dos moradores do RSV I (onde moravam antes)
Quadro 05: Avaliação dos moradores sobre a localização do RSV I em relação à cidade
Quadro 06: Média de m² por quantidade de moradores nas Unidades Habitacionais do RSV I
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................................... 21
CAPÍTULO 1
A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DA CIDADE PATOS/PB: A QUESTÃO
URBANA E HABITACIONAL DURANTE O SFH/BNH..................................................
34
1.1 O problema habitacional: abordagens teóricas e históricas.......................................... 35
1.2 A questão da habitação no Brasil: as estratégias e o papel do Estado.......................... 41
1.2.1 A Política de Desenvolvimento Urbano no âmbito das Políticas de
Desenvolvimento Regional.....................................................................................................
45
1.2.2 Política e Planejamento Urbano na cidade de Patos – PB.......................................... 49
1.3 A estruturação da cidade de Patos-PB............................................................................ 53
1.4 O Sistema Financeiro de Habitação: a gestão do BNH e seus efeitos socioespaciais.. 62
1.4.1 O Projeto de Comunidade Urbana de Recuperação Acelerada (CURA) e os
Programas Específicos para as cidades de porte médio na cidade de Patos/PB..............
68
1.5 A política habitacional Pós-BNH..................................................................................... 75
CAPÍTULO 2
DETERMINAÇÕES POLÍTICAS E ECONÔMICAS DO PMCMV: UMA ANÁLISE
ENTRE ESCALAS...............................................................................................................
81
2.1 Da articulação de escalas espaciais à produção do espaço intraurbano: a criação e
a implantação do PMCMV.....................................................................................................
82
2.1.1 Os fatores econômicos e políticos para a criação do PMCMV.................................. 84
2.1.2 Do BNH ao PMCMV: o que mudou para as cidades médias?................................... 90
2.2 A produção da habitação e do espaço urbano na cidade de Patos/PB......................... 99
2.2.1 O PMCMV e o processo de periferização em Patos/PB............................................. 107
2.2.2 O papel dos governos municipais e estaduais na implantação do PMCMV............. 121
2.3 A Política Nacional de Habitação (PNH) e o PMCMV: passos e descompassos......... 124
2.4 Da elaboração do PLHIS à implantação do PMCMV em Patos – ações
convergentes e divergentes......................................................................................................
129
CAPÍTULO 3
ESPAÇO INTRAURBANO E O PMCMV EM PATOS-PB: O RESIDENCIAL
VISTA DA SERRA I...............................................................................................................
137
3.1 Caracterização do conjunto habitacional Residencial Vista da Serra I – RVS I e de
seus moradores.................................................................................................................
138
3.2 Das diferenças às desigualdades socioespaciais: algumas considerações.................... 145
3.3 Incorporação, construção e ocupação do Residencial Vista da Serra I: o uso do solo
como reprodução do capital e como reprodução da vida....................................................
154
3.4 Características urbanísticas do Residencial Vista da Serra I: o onde e o como
morar......................................................................................................................................
163
3.4.1 Inserção urbana do RVS I........................................................................................... 164
3.4.2 Implantação do RVS I.................................................................................................. 177
3.4.3 Unidades habitacionais no RVS I............................................................................... 181
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 188
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 194
SUPORTE ELETRÔNICO
APÊNDICE
ANEXOS
21
INTRODUÇÃO
O processo de urbanização brasileira foi marcado, principalmente a partir da década
de 1970, pela desconcentração industrial, pela difusão cada vez maior de comércios e serviços
especializados e pela reconfiguração das relações cidade/campo com a expansão das
atividades ligadas ao agronegócio. Agora esse processo passa por um novo momento, em que
se observa um padrão de acumulação de capital baseada nas finanças especulativas, como
aponta Paiva (2007), em que se impõe o comando do capital financeiro internacional.
Sobre a capacidade do capitalismo de criar novas oportunidades de reprodução e
acumulação do capital, David Harvey (2005) destaca um elemento fundamental: a expansão
geográfica. Diante disso, corroboramos a assertiva de Carlos (2011), ao afirmar que, tendo o
espaço como seu elemento determinante, a acumulação realiza-se em outras escalas, além do
plano global, portanto, também na escala da cidade.
Nesse contexto, entendemos a complexidade que configura o atual momento do
processo de urbanização no Brasil, em que, no movimento de reprodução e expansão
capitalista, têm se destacado não só as metrópoles e as grandes cidades, como também as
cidades médias, porque também têm se constituído como espaços promissores nesse
movimento. Assim, é sobremaneira importante que os estudos urbanos se voltem também
para os espaços não metropolitanos, pois, como questiona Sobarzo (2008, p.270), será que o
que acontece nas chamadas cidades médias ou pequenas não nos auxilia a compreender o
urbano hoje? Há um número crescente de pesquisas direcionadas para as cidades médias, seja
no campo dos estudos regionais, seja com foco na produção do espaço intraurbano, além de
outras abordagens.
Por isso, a proposta deste trabalho surgiu, inicialmente, dos questionamentos que
resultaram das leituras realizadas durante a graduação, entre 2008 e 2011, nas Faculdades
Integradas de Patos (FIP), sobre os trabalhos e as pesquisas desenvolvidas pela Rede de
Pesquisadores de Cidades Médias (ReCiMe), que nos ofereceram subsídios teóricos e
metodológicos para analisarmos como a cidade de Patos-PB pode ser entendida no processo
de urbanização brasileira e como, através disso, tem se dado a produção de seu espaço. Assim,
a pesquisa realizada, na época, sobre a centralidade que Patos exerce no sertão da Paraíba,
com a oferta de cursos oferecidos em faculdades particulares e universidades públicas, ajudou
a perceber as recentes transformações que têm ocorrido no espaço urbano patoense. Dentre
elas, destacamos a rápida expansão da malha urbana com o aumento significativo da
22
quantidade de novos loteamentos, de conjuntos habitacionais e do surgimento de condomínios
fechados, bem como uma elevada valorização de terrenos em determinados bairros da cidade.
Ressalte-se, contudo, que, apesar de a presença de Instituições de Ensino Superior
(IES) ser um fator relevante para a vinda de consumidores desses novos espaços, supúnhamos
haver outros determinantes para esses processos, como a criação e a implantação de
programas federais de urbanização e habitação e suas implicações socioespaciais no espaço
urbano de Patos-PB. Nesse caso, destacam-se o Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC) e o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), que compõem a atual Política
Nacional de Habitação (PNH).
O PAC foi instituído em 2007, com o objetivo principal de promover o crescimento
econômico, através de medidas que estimulassem o investimento privado, a ampliação de
investimentos públicos em infraestrutura, voltadas para a melhoria da qualidade do gasto
público e para o controle da expansão dos gastos correntes no âmbito da Administração
Pública Federal1. O PMCMV surgiu, por sua vez, no escopo desse projeto mais abrangente,
instituído no ano de 2009 e criado como medida anticíclica em um momento de crise
econômica internacional. O objetivo desse Programa é de estimular e promover a produção
habitacional, com ampla repercussão entre famílias de diferentes faixas de renda, para atender
desde as que recebem de zero a três salários mínimos (famílias da Faixa 01 do PMCMV), até
as famílias que recebem de três a seis s/m (Faixa 02) e de seis a dez s/m (Faixa 03).
Nesse contexto, presencia-se uma acelerada expansão de investimentos imobiliários
por todo o país, marcada por uma gradual associação entre capital imobiliário e capital
financeiro, favorecida pelas garantias de crédito, segurança no mercado e pelo aumento de
investimentos de grupos internacionais. Observa-se que, além das metrópoles, as cidades de
menor porte também passam a atrair esses investimentos cada vez mais. O município de Patos
começou a participar do PMCMV já no ano de 2009, dando início ao cadastramento das
famílias que se enquadravam na Faixa 01 de renda, ao mesmo tempo em que a Caixa
Econômica Federal (CEF) passava a ser procurada por construtoras e, de maneira individual,
por famílias de renda média para realizar os financiamentos que atendiam a esses grupos.
Nesse mesmo período, foram assinados contratos de projetos de grandes obras de urbanização
e de habitação para a cidade com recursos do PAC, dos quais se destacaram a obra do
contorno viário – a Alça Sudeste, a obra de macrodrenagem de águas pluviais – o Canal do
Frango e a construção do Conjunto Habitacional Novo Monte Castelo II.
1 Ver o Decreto nº 6.025/2007, que institui o Programa.
23
Além disso, um pouco antes desse período, no ano de 2008, davam-se os primeiros
passos para a contratação da empresa que seria responsável pela elaboração do Plano Local de
Habitação de Interesse Social (PLHIS), que consiste em um instrumento de planejamento
urbano que incorpora as diretrizes traçadas na PNH e no Plano Nacional de Habitação
(PlanHab). Concomitante ao cenário descrito, observa-se um crescimento de empresas e de
investimentos no mercado imobiliário de Patos, inclusive com a vinda de incorporadoras e
construtoras da capital estadual, João Pessoa e da capital pernambucana, Recife.
Portanto, é nessa conjuntura que se configuram as transformações pelas quais tem
passado o espaço urbano patoense, em que se percebe a produção desigual desse espaço
através da articulação entre vários agentes, principalmente o Estado e o mercado imobiliário,
e que se dá através das diversas escalas espaciais. Nesse movimento, produz-se um espaço
intraurbano, marcado por intensas desigualdades socioespaciais, acentuando a distância social
entre a periferia pobre e a periferia rica, como discutem Rodrigues (2001) e Maia (2010). O
debate sobre produção do espaço urbano (e aqui nos referimos à produção capitalista do
espaço) tão bem desenvolvido por autores como Lefebvre (1974; 1999; 2008), Gottdiener
(1993), Harvey (2005), Carlos (2008; 2011), entre outros, em que nos aprofundamos através
das discussões2 realizadas nos encontros do Grupo de Estudos Urbanos (GEURB) da UFPB,
trouxe-nos uma valiosa contribuição teórica para entendermos os processos ora apresentados.
Essa contribuição está nas análises dos conflitos delineados na relação dialética entre
sociedade e espaço inerente ao modo de produção capitalista, o que possibilita compreender
as estratégias e as ações dos agentes produtores do espaço e de que maneira esse espaço
produzido reproduz as relações sociais vigentes. Nessa perspectiva, a escolha por se fazer a
análise a partir da implantação do PMCMV se justifica pelo fato de que o programa foi criado
e vem servindo para expandir investimentos imobiliários no país, onde se têm observado
rápidas transformações nos espaços não metropolitanos, sobretudo nas cidades médias. Além
disso, o processo de implantação do referido programa conduz e reproduz os conflitos que se
configuram com as diferentes formas de apropriação da habitação e de sua localização na
cidade por parte agentes produtores do espaço.
Diante do exposto, chegamos ao objetivo geral deste estudo - o de analisar os efeitos
da implantação do PMCMV na cidade de Patos, principalmente as que se referem aos espaços
2 Destacamos aqui as discussões realizadas com base na obra “A produção do espaço”, de Lefebvre (1974). A
partir daí, pudemos estabelecer relações com leituras de outras obras e contribuir para aprofundarmos e
ampliarmos a nossa compreensão do espaço social e das diversas maneiras sob as quais esse espaço pode ser
entendido. Além das leituras discutidas no GEURB, os debates desenvolvidos nas disciplinas do Programa de
Pós-graduação da UFPB, nas aulas de que participei no Programa de Pós-graduação da Unesp e da UECE, foram
de suma importância para o aprofundamento teórico do presente trabalho.
24
de moradia. Dessa propositura, traçamos alguns objetivos específicos, a saber: a) entender
como as políticas habitacionais anteriores ao PMCMV, principalmente na época do BNH,
repercutiram nos espaços não metropolitanos, como as cidades médias, particularmente, na
produção do espaço intraurbano de Patos; b) identificar as mudanças que ocorreram na atual
política habitacional, através da criação do PMCMV, e suas implicações territoriais nas
diversas escalas espaciais; c) averiguar o PMCMV como política habitacional na cidade de
Patos; d) observar e apontar os efeitos desse programa sobre a produção das desigualdades
socioespaciais na referida cidade; e) caracterizar e desvelar o primeiro projeto habitacional
para a população de baixa renda implantado em Patos, com o intuito de verificar os resultados
obtidos frente às demandas habitacionais dessa cidade.
A discussão do texto foi dividida em dois momentos. O primeira, composto pelo
capítulo 1, aborda questões relacionadas ao papel do Estado na produção do espaço, através
das políticas habitacionais e de desenvolvimento urbano; ao papel que as cidades médias
exerciam no contexto em que se elaborou, pela primeira vez no Brasil, uma estrutura
institucional para a implantação de uma política habitacional com ampla repercussão, ocasião
em que foram criados o Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e o Banco Nacional de
Habitação (BNH), e questões relacionadas à produção do espaço intraurbano da cidade de
Patos nesse período. O segundo momento, capítulos 2 e 3, trata das recentes transformações
observadas nas cidades médias, especialmente em Patos-PB, e traz à tona questões referentes
à maneira como tem sido a relação Estado-capital imobiliário na atual política habitacional; às
convergências e divergências da implantação do PMCMV com o planejamento urbano local;
e aos processos de expansão da malha urbana, aumento de investimentos imobiliários,
periferização e intensificação das desigualdades socioespaciais a partir da criação desse
programa.
Assim, no decorrer deste trabalho, discute-se sobre os processos de periferização da
cidade e produção desigual do espaço, bem como sobre a relação do Estado com a reprodução
e a acumulação do capital, através da produção habitacional, devido à sua importância na
configuração do espaço urbano, não apenas porque o uso residencial é predominante na
cidade, mas também porque a habitação se constitui, segundo Farret (1985), como um fator
social e uma fonte de conflito e de barganha entre os diversos grupos de poder. Portanto, em
Patos, a produção habitacional foi analisada tomando-se como instrumentos iniciais os
projetos de habitação popular do PMCMV, observando-se os seguintes aspectos e conteúdos:
o atendimento da demanda local, o tamanho do projeto, no que diz respeito à área a ser
ocupada; a localização; as ações dos agentes envolvidos nos processos de elaboração e
25
execução da proposta do PMCMV e dos seus projetos habitacionais em nível local; conflitos
inerentes a esses processos; e os elementos urbanísticos da área delimitada para o estudo,
tendo em vista que nos mostram as condições de moradia das áreas em que foram/serão
implantados os conjuntos habitacionais.
Embora façamos menção a alguns dados sobre os projetos de habitação popular na
cidade de Patos, tanto os que já foram aprovados quanto os que ainda estão sendo avaliados,
elegemos um conjunto habitacional, o Residencial Vista da Serra I, para ser analisado com
mais profundidade, utilizando instrumentos da pesquisa qualitativa, como as entrevistas. A
escolha dessa área, em específico, justifica-se em razão de ter sido o primeiro e único
conjunto habitacional proposto no PMCMV entregue até o momento. Tal fato nos possibilitou
observar a paisagem e os aspectos morfológicos e entender os seus conteúdos por meio da
dinâmica local e das avaliações dos próprios moradores sobre ela.
Os caminhos metodológicos desenvolvidos no decorrer desta pesquisa foram se
delineando de acordo com os questionamentos e as demandas oriundos dos objetivos
específicos e do objetivo geral. Assim, realizamos os procedimentos da documentação
indireta, que é a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental, e documentação direta, nesse
caso, a pesquisa de campo que, ora desenvolvemos em momentos diferentes, ora
concomitantemente.
A pesquisa bibliográfica foi fundamental, pois nos possibilitou eleger o método de
análise e nos capacitou a escolher as noções mais adequadas para a leitura da realidade
estudada, fornecendo dados atuais e passados sobre a problemática abordada. Também nos
ajudou a enxergar as diversas facetas do objeto de estudo e as inúmeras maneiras como foi
estudado, além de contribuir para a construção da metodologia da pesquisa. Assim, como
afirmam Villaça (2004), Marconi e Lakatos (2003), foi necessária uma exaustiva investigação
bibliográfica, o que nos levou a buscar leituras de livros, monografias, dissertações, teses,
revistas acadêmicas, jornais, além de um material cartográfico sobre a realidade estudada,
referencial que foi acessado tanto através de materiais impressos quanto virtuais (sites de IES,
de revistas e links de anais de eventos).
Buscamos um acervo bibliográfico com o qual pudéssemos compreender questões
relacionadas à configuração da política habitacional no Brasil, em diversos períodos, e suas
implicações socioespaciais e territoriais, de questões sobre as noções de produção e
reprodução do espaço urbano e sobre as estratégias e as ações dos agentes produtores desse
espaço. Através dessas leituras, obtivemos a orientação teórica para compreender o papel do
Estado na produção do espaço intraurbano, a partir da questão da habitação; o processo de
26
periferização da cidade e suas implicações e as determinações e a configuração das
desigualdades socioespaciais. Vale salientar que as contribuições não vieram apenas da
produção geográfica, mas também de estudos no âmbito da Sociologia, da História, da
Arquitetura e do Urbanismo e da Economia Política. Com as leituras de autores como Henri
Lefebvre (1974; 1999; 2008), Carlos (2008; 2011), Rodrigues (2001; 2007), David Harvey
(2005; 2011), Villaça (1986; 2001), Engels (1983; 1985), Bonduki (2004; 2008) entre outros,
foi possível discutir sobre a cidade com uma visão crítica da produção do espaço no
capitalismo, pautada nas questões levantadas pelo método materialista histórico-dialético.
É fundamental ressaltar, ainda, que tivemos a preocupação de associar o
levantamento bibliográfico à realidade empírica estudada, contextualizando-a ao todo em que
se insere, posto que, assim como Santos (1994), entendemos que os processos globais se dão
seletivamente, de maneira ímpar, ainda que comandado pela totalidade.
A pesquisa documental, por sua vez, possibilitou-nos obter dados estatísticos e
informações e de um material cartográfico que nos aproximou ainda mais da área de estudo,
subsidiando sua caracterização e contextualização mais completa. Contudo, foram muitas as
dificuldades de acesso a esse acervo, das quais as principais foram a burocracia dos órgãos
públicos e a desarticulação entre eles, o que tornou essa etapa da pesquisa bastante
fragmentada e dispendiosa no que diz respeito ao tempo de sua realização.
Para realizá-la, foi necessária a consulta em sites de instituições, como o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e a Fundação João Pinheiro (FJP), com o intuito
de acessar dados econômicos, demográficos, habitacionais, entre outros, sobre a cidade de
Patos, em sites locais que divulgam informações acerca dos projetos habitacionais
desenvolvidos na cidade e a visita a órgãos públicos, como a Fundação de Ação Comunitária
da Paraíba (FAC), a Companhia Estadual de Habitação Popular (CEHAP), a Secretaria de
Desenvolvimento Econômico e Habitação de Patos (SEDEHAB), a Secretaria de
Infraestrutura (SEINFRA) do referido município, o Setor de Geoprocessamento da Prefeitura
Municipal de Patos (PMP) e o Arquivo da Câmara Municipal, onde obtivemos dados sobre
projetos de habitação popular e de urbanização na cidade, tanto do período de vigência do
BNH quanto do atual momento de implantação dos projetos do PMCMV. A visita a esses
órgãos também nos possibilitou o acesso a uma base cartográfica que continha informações
sobre a expansão urbana e os espaços de moradia da cidade em estudo.
A necessidade de ir aos órgãos públicos se justifica, em primeiro lugar, por causa do
pouco referencial bibliográfico a respeito do processo de estruturação urbana de Patos e de
27
sua produção habitacional, e devido à necessidade de verificar, de maneira mais objetiva, os
dados sobre os atuais projetos.
Devido à escassez de referencial sobre a conformação do espaço urbano da cidade de
Patos e sobre sua participação na política habitacional e de desenvolvimento urbano no
período do BNH, tivemos que conseguir documentos que dispusessem dessas informações, o
que nos levou ao Arquivo da Câmara Municipal de Patos, mais especificamente, aos Projetos
de Lei do Poder Executivo do período de 1964 a 1999. Para ler e analisar mais
detalhadamente esses projetos, tivemos que fotografá-los, visto que não se encontravam
digitalizados, o que nos custou pouco mais de um mês, tendo em vista o grande número de
projetos entre os anos analisados e considerando que, no período em que realizamos essa
etapa da pesquisa, o arquivo municipal ficava aberto apenas durante o turno matutino.
Com esse procedimento, obtivemos informações sobre as estratégias dos governos
locais para inserir a cidade nas políticas de âmbito nacional, no período de vigência do BNH,
bem como sobre os recursos que foram disponibilizados para os projetos que propunham
obras de habitação e urbanização nesse mesmo período. A leitura das justificativas de muitos
dos Projetos de Lei também foi importante, porque, através disso, verificamos como se
encontravam a economia e as condições sociais da população local diante do contexto
nacional e regional daquela época.
Vale destacar que sabemos das limitações desse procedimento de leitura dos Projetos
de Lei, visto que, mesmo não havendo dúvidas quanto aos dados fornecidos nos documentos
oficiais, como apontam Marconi e Lakatos (2003), eles dizem mais sobre os anseios e as
iniciativas do governo local e não nos permitem afirmar se, realmente, houve a efetivação das
obras propostas. Apesar disso, ressaltamos sua importância, porque nos revelaram
informações sobre política urbana e habitacional da cidade, na época da elaboração dos
projetos e, ao mesmo tempo, permitiu-nos identificar o papel que a cidade exercia no âmbito
dessas políticas.
Por último, destacamos que foi na fase da pesquisa documental em que descobrimos
a existência do projeto do Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS), que, na
época, estava em fase de avaliação pela CEF e que foi aprovado recentemente (final de 2013).
Isso nos levou a e entender como foi a relação e quais as implicações da implantação de uma
política de planejamento urbano local, concomitante à implantação de um programa
habitacional, o PMCMV, que, em alguns momentos, convergia e, em outros, divergia dessa
política. Além disso, a busca infrutífera pela legislação local cuja atualização o PLHIS
mencionava, também nos mostrou os problemas relacionados à desarticulação entre as
28
secretarias do governo municipal relacionadas às questões de urbanização e habitação, bem
como os problemas relacionados ao descaso no arquivamento dos referidos documentos
legislativos, cujas consequências discutiremos no decorrer do texto.
Vale salientar que, embora os diversos momentos da pesquisa se confundam,
optamos por dividir as etapas em documentação indireta (pesquisa bibliográfica e
documental) e documentação direta (pesquisa de campo), como sugerem Marconi e Lakatos
(2003), para apresentar cada passo com mais detalhamento. Assim, tendo apresentado a etapa
da documentação indireta, faremos a descrição da documentação direta. Sobre a pesquisa de
campo, Minayo (2007, p. 26) afirma que “consiste em levar para a prática empírica a
construção teórica elaborada”. De acordo com a autora, essa fase combina instrumentos como
observação, entrevistas e outras maneiras de comunicação e interlocução com os pesquisados.
Nesse sentido, realizamos a pesquisa de campo através de diversos instrumentos, a saber:
a) Observação
Desde as primeiras leituras desenvolvidas já no início da pesquisa bibliográfica e
documental, iniciamos também o exercício de observação direta nas áreas delimitadas para a
pesquisa que, inicialmente, tratava-se de um conjunto habitacional popular (o Residencial
Vista da Serra I – RVS I) e de pequenos condomínios fechados (os Condomínios Jardim
Floresta), ambos financiados pelo PMCMV. Posteriormente, optamos por estudar apenas o
conjunto habitacional, tendo em vista as dificuldades de obter dados acerca dos condomínios
fechados, por serem de imóveis financiados pelo PMCMV de maneira individual, ou seja, de
acordo com o interesse da família, o que também exigiria uma reavaliação da metodologia
elaborada, principalmente no que diz respeito à elaboração e à aplicação de questionários.
A observação direta ou observação simples, como define Gil (2008, p. 101), é
“espontânea, informal, não planificada, coloca-se no plano científico, pois vai além da
simples constatação dos fatos. Em qualquer circunstância, exige o mínimo de controle na
obtenção dos dados”. Durante o andamento da pesquisa, foram necessários procedimentos
como as visitas in loco, com o intuito de reconhecer a área de estudo, de registrar (através de
fotografias e notas de campo) as mudanças que ocorriam na paisagem e na dinâmica do
espaço analisado, o que nos permitiu verificar informações divulgadas oficialmente e por
meio da mídia local, bem como trazer novos elementos para a discussão inicialmente
proposta. Também é importante enfatizar que, em alguns momentos, a observação ocorreu
combinada com outros instrumentos, como a aplicação de entrevistas e de questionários.
b) Entrevistas
29
De acordo com Marconi e Lakatos (2003, p. 196), a entrevista tem como objetivo
principal “a obtenção de informações do entrevistado sobre determinado assunto ou
problema”. Dentre os tipos de entrevistas frequentemente aplicadas nas pesquisas sociais,
optamos pela não estruturada. Segundo os autores supracitados, é através dela que o
entrevistador tem mais liberdade para desenvolver cada situação em qualquer direção que
considere adequada e que permite explorar mais amplamente uma questão. Gil (2008, p. 112)
denomina esse mesmo tipo de instrumento de entrevista por pautas. Esse tipo de entrevista
apresenta certo grau de estruturação, faz poucas perguntas diretas e “deixa o entrevistado falar
livremente à medida que se refere à pauta assinalada”.
Assim, realizamos entrevistas com o Secretário da SEDEHAB (Gestão com início
em 2013), com um funcionário da CEHAP, com um construtor e um corretor, atuantes na
cidade de Patos, e com o engenheiro residente responsável pela obra do Conjunto
Habitacional RVS I onde realizamos a pesquisa de campo. Dessas, exceto as entrevistas com
o construtor e com o representante da CEHAP não puderam ser gravadas, pois eles não
permitiram a gravação, inclusive esse último solicitou as anotações realizadas durante a
entrevista e enviou as correções que achou que fossem pertinentes.
É importante ressaltar que, assim como as primeiras observações de reconhecimento
da área de estudo, logo no início da pesquisa, também realizamos conversas informais de
cunho exploratório, com o intuito de confirmar informações que não haviam sido divulgadas
oficialmente e de encontrar pistas sobre a que fontes recorrer, na busca por informações da
produção habitacional por parte do Estado no período do BNH e do atual PMCMV. Nesse
sentido, os dados e as informações obtidos nas conversas com a secretária da SEDEHAB em
gestão no ano de 2012 e com outro funcionário da CEHAP foram muito valiosos.
c) Questionários
Segundo Gil (2008, p. 121), “construir um questionário consiste basicamente em
traduzir objetivos da pesquisa em questões específicas. As respostas dessas questões é que
irão proporcionar os dados requeridos para descrever as características da população
pesquisada”. A aplicação de questionários foi a nossa última etapa da presente pesquisa e foi
importante exatamente por trazer dados que subsidiaram a discussão acerca da produção das
desigualdades socioespaciais, com a implantação de projetos de habitação popular nos moldes
do PMCMV e referente ao atendimento das demandas habitacionais na cidade de Patos, tendo
como ponto de partida o estudo na área do conjunto RSV I.
As questões foram elaboradas considerando-se a necessidade de analisar as
características urbanísticas e as condições de moradia do conjunto RSV I, as quais foram
30
verificadas sob a perspectiva das escalas espaciais propostas por Ferreira (2012) para
apreender as implicações de empreendimentos imobiliários no espaço intraurbano. Essas
escalas são: inserção urbana, implantação e a unidade habitacional, a partir das quais
levantamos questões referentes à acessibilidade da área pesquisada, à presença de
infraestrutura, aos serviços e aos equipamentos urbanos, à sua repercussão na demanda local,
relação do tamanho da casa com o tamanho da família, ao perfil socioeconômico dessas
famílias e à sua satisfação em relação aos elementos listados.
Assim como foi feito na pesquisa de Leite (2011), o conjunto de perguntas que
compõem o questionário pode ser divido em três tipos: fechadas ou dicotômicas, com apenas
duas alternativas (sim ou não); de múltipla escolha, que também são fechadas, mas têm um
número maior de alternativas, em que o entrevistado pode optar por mais de uma resposta.
Há, inclusive, a alternativa de acrescentar outra resposta que não tenha sido prevista no
questionário e perguntas “de avaliação”, que possibilitam uma apreciação por parte do
entrevistado sobre o conteúdo da questão. Dentre as perguntas “de avaliação”, tanto há
questões estruturadas da mesma maneira que as perguntas fechadas e as de múltipla escolha
quanto aquelas em que o entrevistado avalia atribuindo valores com diversos graus de
intensidade (ótimo, bom regular, ruim ou péssimo).
Nas pesquisas em que se aplicam questionários, é comum o estabelecimento de uma
amostragem, ou seja, o recorte de uma parte dos elementos que compõe o universo analisado.
Contudo, tendo em vista o número de unidades habitacionais (UHs) existentes no conjunto
RSV I e a comparação com outros trabalhos de pesquisa em que também se usou o
questionário e se estabeleceu uma amostragem, como a dissertação de Leite (2011),
consideramos possível entrevistar todas as famílias do conjunto habitacional em questão,
posto que ele tem 136 UHs. Os questionários foram aplicados sem uma equipe de campo, por
isso tal procedimento durou pouco mais de uma semana e foi realizado nos turnos matutino e
vespertino. Verificamos que, no decorrer da semana, muitas casas estavam fechadas. E como
supomos que isso ocorria por ser horário de trabalho, decidimos retornar às casas fechadas no
final de semana. Isso aconteceu em dois finais de semana, o que aumentou significativamente
o número de moradores entrevistados, somando um total de 98 questionários aplicados (entre
as 136 UHs visitadas). O controle sobre as casas às quais deveríamos retornar foi feito através
de um mapa do conjunto habitacional (Figura 01, p. 31)
31
Legenda
Unidades habitacionais onde foram aplicados questionários
Unidades habitacionais onde não foram aplicados questionários
Figura 01: Localização e distinção das Unidades habitacionais (UHs) onde foram aplicados os
questionários na pesquisa de campo - Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Imagem:
Google Earth, 2014. Elaboração própria
Escala
32
É mister relatar que o espaço reservado no questionário para anotações de
comentários e observações dos moradores entrevistados foi sobremaneira importante para
registrarmos características, informações e problemas, bem como outros elementos que não
foram previstos na elaboração do questionário e que contribuíram muito para complementar a
análise dos dados oficiais e dos próprios dados levantados nessa etapa da pesquisa.
Todo o material adquirido e produzido no decorrer da pesquisa, como documentos,
matérias de jornais, folders de propaganda de empreendimentos imobiliários, fotos, caderno
de campo e questionários, foi arquivado e organizado em pastas, virtuais e materiais, o que
facilitou o acesso às informações sempre que necessário. Para a análise e a interpretação dos
dados, foi preciso produzir tabelas e gráficos e reorganizar a base cartográfica cedida pela
Prefeitura Municipal de Patos, através do setor de geoprocessamento.
O conjunto de informações e de dados, reunidos a partir da metodologia acima
descrita, forneceu-nos subsídios para alcançar os objetivos específicos e, consequentemente, o
propósito maior desta pesquisa. Entendemos que, em se tratando de analisar o processo de
produção do espaço urbano, nesse caso, da cidade de Patos, a diversidade e a complexidade
desse processo exigiam o uso de procedimentos metodológicos também diversos, daí a
necessidade de realizar, além da pesquisa bibliográfica e documental, a pesquisa de campo
com vários instrumentos, como a observação, as entrevistas e os questionários.
No momento da escrita, tentamos contextualizar a realidade empírica estudada e
relacioná-la à base teórica construída na pesquisa bibliográfica. Assim, não foi escrito um
capítulo unicamente teórico, ora se sobressaem as noções e a discussão teórica, ora se destaca
a contextualização, no tempo e no espaço, dos processos analisados e, ainda, ora se enfatizam
os dados empíricos e o local de estudo, mas sempre de maneira correlacionada.
Assim, o texto completo ficou dividido em três capítulos: no primeiro, intitulado “A
produção do espaço urbano de Patos – PB: a questão urbana e habitacional durante o
SFH/BNH”, discutimos, conceitualmente, sobre o problema habitacional, para entender qual
tem sido o papel do Estado e da política habitacional no Brasil. Também analisamos como as
cidades médias, especificamente a cidade de Patos, inseriram-se nos Programas Habitacionais
e na Política de Desenvolvimento Urbano, a partir do período de criação do SFH/BNH, e
como, a partir desses programas, projetos e políticas urbanas, aconteciam a configuração
territorial e a produção desses espaços urbanos.
No segundo capítulo, que intitulamos “Determinações econômicas e políticas do
Programa Minha Casa Minha Vida: uma análise entre escalas”, fazemos uma abordagem
sobre os papéis que as cidades médias assumem na atual política habitacional, em que se
33
destaca o PMCMV, visando entender como esses papéis se configuram através da relação do
Estado com os demais agentes produtores do espaço que se dá, por sua vez, entre as diversas
escalas espaciais. Essa discussão também nos levou a compreender os rebatimentos do
PMCMV frente à implantação do PlanHab e, conseguintemente, aos PLHIS. Ainda nessa
parte do texto, fazemos o debate tomando como base a inserção da cidade de Patos nessa
conjuntura mais ampla.
O terceiro e último capítulo, que denominamos de “Espaço intraurbano e o PMCMV
em Patos-PB: o caso do Residencial Vista da Serra I”, discutimos sobre questões relacionadas
à reprodução das desigualdades socioespaciais no espaço intraurbano, através da maneira
como vêm sendo atendidas as demandas habitacionais e dos conflitos de interesse que
permeiam a atual política habitacional. Nessa parte do texto, a caracterização detalhada de um
espaço de moradia, o conjunto Residencial Vista da Serra I, buscou subsidiar a compreensão
de como têm se reproduzido as diferenças entre esses espaços na cidade.
Por fim, apresentamos as considerações finais, em que destacamos a importância
cada vez maior, considerando o momento atual do processo de urbanização, dos estudos sobre
as cidades médias, bem como as dificuldades que permeiam esses estudos; a atuação do
Estado e do capital imobiliário na cidade de Patos, para a conformação de duas periferias bem
distintas, no que concerne à paisagem e, principalmente, ao seu conteúdo social; e alguns
questionamentos que surgiram com a conclusão desta pesquisa e que ficam como proposta
para estudos futuros.
34
CAPÍTULO 1 – A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DE PATOS – PB: A
QUESTÃO URBANA E HABITACIONAL DURANTE O SFH/BNH
Neste trabalho, partimos da noção de produção do espaço discutida por Lefebvre
(1974; 2008), a partir da qual se compreende o espaço como produto e produtor das relações
sociais de produção que se configuram no decorrer do tempo histórico. Essa noção, por sua
vez, importa conteúdos e determinações que nos obrigam a considerar os diversos níveis da
realidade como momentos diferenciados da reprodução geral da sociedade em sua
complexidade, como discute Carlos (2011).
Essas considerações nos trazem a necessidade de entender a sociedade e seu espaço
em sua relação entre as diversas escalas geográficas (espaciais e conceituais) e, ao mesmo
tempo, de considerar os agentes produtores do espaço. Mas quem são esses agentes? Segundo
Corrêa (1989), são os proprietários dos meios de produção, os proprietários fundiários, os
promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos. Ressaltamos, segundo esse
autor, que essa tipologia é mais de natureza analítica do que efetivamente absoluta, visto que
um agente pode assumir a condição de outro, como o Estado, por exemplo, que também pode
ser proprietário de meios de produção, proprietário fundiário etc.
Na produção do espaço urbano capitalista, a ação dos agentes mencionados deriva
“da dinâmica de acumulação de capital, das necessidades mutáveis de reprodução das relações
de produção e dos conflitos de classe que dela emergem” (CORRÊA, 1989, p. 11). Nesse
movimento, a ação do Estado é crucial, posto que, segundo Corrêa (2011), esse agente
desempenha múltiplos papéis, e isso é uma arena onde diferentes interesses e conflitos se
enfrentam.
Neste capítulo, procuramos entender como foi feita a produção do espaço urbano de
Patos – PB, considerando a ação do Estado em suas três esferas político-administrativas-
federal, estadual e municipal - frente à problemática urbana e habitacional. O recorte temporal
consiste no momento em que a ação estatal foi mais enfática diante dessas problemáticas no
Brasil, ou seja, o período de vigência do Banco Nacional de Habitação - BNH - e do Sistema
Financeiro de Habitação – SFH - criados em 1964, não obstante também seja necessário
avançarmos um pouco mais à frente desse período, para discutirmos sobre as implicações
socioespaciais observadas no atual momento de reconfiguração da Política Nacional de
Habitação, com destaque para o Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV.
O Estado age por meio das políticas públicas, elaborando Planos e implantando
programas que produzem efeitos econômicos, sociais e espaciais. Nesse sentido, realizar uma
35
pesquisa tendo como primeiro objeto de análise uma política pública não é uma tarefa fácil,
pois, como afirmam Azevedo e Andrade (1982), ela busca, muitas vezes, realizar não apenas
um, mas vários objetivos, serve a numerosos propósitos e, frequentemente, conduz a efeitos e
a resultados não antecipados. Para se compreenderem os seus efeitos na produção do espaço
urbano, é preciso considerar o conjunto social e econômico em que a política pública foi
elaborada e se insere, porque ela não é atemporal, mas carregada de interesses de relações de
poder entre os agentes sociais e reflete os conflitos inerentes a esses interesses. Contudo, antes
de nos remetermos diretamente à política pública, nesse caso, à habitacional, especificamente,
bem como aos seus efeitos socioespaciais, precisamos compreender o problema a que ela se
detém, em suas diversas dimensões, sejam elas conceituais e/ou práticas.
Esse exercício de pensar, histórica e conceitualmente o problema habitacional no
Brasil, ajuda-nos a identificar quais características da política habitacional ainda permanecem
e quais se modificaram, considerando o novo contexto político, social e econômico em que se
encontra o atual desenho dessas políticas, e a entender a (re) configuração dos processos,
como o da urbanização brasileira, inerentes a esses momentos. Inicialmente, discutiremos
sobre algumas questões teóricas, no que concerne ao problema habitacional e, em seguida,
faremos um retrospecto histórico, buscando entender como a cidade de Patos/PB foi se
inserindo na política habitacional do país e como foi feita a produção de seu espaço urbano
nos dois momentos de mais articulação dessa política, ou seja, no período do regime
ditatorial, com o Sistema Financeiro de Habitação – SFH - e o Banco Nacional de Habitação –
BNH - e no atual contexto em que foram criados o Ministério das Cidades, o Estatuto da
Cidade e programas de ampla repercussão nacional, como o Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) e, mais especificamente, o Programa Minha Casa Minha Vida
(PMCMV).
1.1 O problema habitacional: abordagens teóricas e históricas
A habitação, tendo em vista sua apropriação no modo de produção capitalista, pode
ser analisada sob diversos enfoques. De acordo com Véras e Bonduki (1986), ela pode ser
vista como “problema”, crise, espaço privado de liberdade, direito fundamental do cidadão,
mercadoria e investimento ou, ainda, ser símbolo de status e ascensão social. Um estudo que
parte da questão habitacional não pode negligenciar nenhum desses aspectos, pois eles não se
dissociam na realidade concreta, eles originaram-se nos mesmos processos e refletem as
relações sociais vigentes no tempo histórico em que se inserem. No entanto, devido à
36
complexidade da temática, elegemos para esse momento as discussões teóricas que abordam o
“problema” da habitação, pois, a partir dessa questão, podemos focar nossa análise na ação do
Estado e em como ela se esboçou e se espacializou nas cidades brasileiras.
As abordagens acerca do problema habitacional, tanto no que diz respeito às de
cunho socioeconômico e político, em seus diversos momentos históricos, quanto às
discussões teóricas propriamente ditas, não são recentes. No Século XIX, vários trabalhos se
dedicavam a discutir, direta ou indiretamente, sobre essa questão, como os escritos de Engels
(1983; 1985), os textos a que ele se refere em seu trabalho intitulado “Para a questão da
habitação”, os inúmeros relatórios oficiais e matérias de jornais aos quais ele também faz
menção no livro “Situação da classe trabalhadora na Inglaterra”, como até mesmo as inúmeras
obras literárias mencionadas por Bresciani (1982), que se detinham ao cenário de cidades
como Londres e Paris.
Em estudos mais recentes, como os de Peruzzo (1984), Villaça (1986), Rodrigues
(2001), Victor Martins (2007), entre outros, também é marcante o debate acerca do que é o
problema habitacional e quais as formas de solucioná-lo, o que demonstra que essa questão
ainda está bem presente na sociedade. Ao se referir à falta de habitação, Engels (1983 [1873]),
já em fins do Século XIX, afirmava que esse não era um sofrimento próprio do moderno
proletariado, mas de todas as classes oprimidas de todos os tempos, visto que, em muitos
casos, a habitação, além de ser precária, servia para reforçar a condição de opressão e
subordinação, como era, por exemplo, a senzala em relação ao escravo.
Nessa perspectiva, é fundamental entendermos o que é o problema habitacional. Para
Engels (1983), a falta de habitação, como se refere ao que hoje entendemos como problema
da habitação, consistia no
agravamento particular que as más condições de habitações dos operários
sofreram devida a repentina afluência da população às grandes cidades; [no]
aumento colossal dos alugueres, [de] uma concentração ainda maior dos
inquilinos em cada casa e, para alguns, [na] impossibilidade de em geral
encontrar um alojamento. (ENGELS, 1983, p. 10. Grifo nosso)
Esses, de acordo com o autor, são alguns dos inúmeros males que resultaram do
avanço do modo de produção capitalista. Assim, compreendemos que a questão da habitação
não está dissociada do processo de acumulação e reprodução do capital, em que a cidade
assume um papel fundamental concentrando atividades e pessoas, como se observou na fase
do capitalismo industrial, quando a concentração das atividades produtivas nas grandes
cidades atraía uma “multidão”, como destaca Bresciani (1982), que aumentava a demanda por
37
terra urbana e favorecia a ação especulativa dos proprietários fundiários e do capital
incorporador.
Entendemos que o espaço urbano de Patos se conforma num momento em que passa
a exercer um poder de concentração de capital, de serviços e de pessoas, consequentemente.
É importante ressaltar que, como Patos (Mapa 01, p. 38) foi elevada à categoria de cidade
somente no Século XX, precisamente no ano de 1903, só entrou, efetivamente, no circuito de
produção industrial de grandes empresas com os investimentos no cultivo do algodão para
exportação e, de acordo com Cavalcante (2008), pelas condições especiais oferecidas pelo
governo estadual de Argemiro Figueiredo (1935-1940), as quais atraíram empresas como
Anderson Clayton & Cia Ltda. (estadunidense) e a SANBRA (argentina)3. A chegada da
linha férrea da Rede Viação, que fez da cidade de Patos uma “ponta de trilho”, como afirma
Botelho (1965), também foi de suma importância nesse momento.
Apesar disso, a atividade industrial não foi o principal vetor no processo de expansão
urbana de Patos. Sua população urbana só teve um crescimento expressivo na década de 1970,
tendo como principais fatores: o êxodo da população do campo para a cidade, provocado,
principalmente, pelas secas que comprometeram as condições de vida no campo e as pragas
que atingiram as lavouras, sobretudo a algodoeira; a ampliação da oferta de serviços
educacionais, com a instalação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Patos, a Escola
de Agronomia e Medicina Veterinária, mantida pela Fundação Francisco Mascarenhas e
acompanhada, na época, pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB; e o crescimento das
atividades comerciais, favorecido pela realização de obras de infraestrutura, entre elas, a
construção da faixa da rodovia BR -230 (fazendo o contorno pela cidade), que liga o litoral ao
interior do estado da Paraíba e intensifica a relação comercial com os estados do Rio Grande
do Norte e de Pernambuco.
Nessa época, já havia uma preocupação do governo local em suprir a demanda por
habitação, como constatamos em justificativas de Projetos de Lei e em projetos que firmavam
a participação da cidade na Companhia Estadual de Habitação Popular – CEHAP. Contudo, a
compreensão que se tinha do que seria o problema habitacional restringiu a ação do governo
local a apenas possibilitar à população mais pobre o acesso a terrenos para que pudesse
construir sua casa por conta própria, ou seja, promover a autoconstrução, sem nenhuma ajuda
técnica e disponibilidade de materiais adequados.
3Cavalcante (op. cit.) mostra que, embora a colheita de algodão tenha decrescido na década de 1940, devido à
conjuntura nacional, às pragas e às secas, o ciclo do algodão se estendeu até 1970.
38
Mapa 01 – Situação geográfica do Município de Patos em relação à ferrovia e às rodovias na
Paraíba
A atuação do governo do estado, por sua vez, não foi muito mais além, limitando-se
a proporcionar o acesso à casa própria, restringindo a compreensão do que seria o problema
habitacional. Vale ressaltar, ainda, que tanto a doação de terrenos pelo governo local (como
foi proposta através do Projeto de Lei 64/89) quanto a construção de casas unifamiliares,
Fonte: Base cartográfica da AESA – PB, 2006 e do IBGE - 2007
39
como fez a CEHAP, na cidade de Patos, localizavam-se em áreas totalmente carentes de
infraestrutura e muito distantes do centro da cidade, assim como foi nas demais cidades
brasileiras nesse período.
Entendemos, então, que o Estado, engendrado pelas relações do modo de produção
capitalista, agia distorcendo a compreensão do problema habitacional em sua essência,
colocando-o como algo a-histórico, desfazendo a necessidade de questionarmos o porquê de
ser um problema ou para quem seria o problema e qual seria sua origem. E, sendo
compreendido como a-histórico, seria como algo que sempre existiu e que, portanto, seria um
problema insolúvel. Por esses motivos, Villaça (1986, p. 04) destaca a importância de se
avançar na definição, afirmando que a “formulação da questão da habitação não pode ser
desvinculada das determinações fundamentais que historicamente as engendram”. A partir
dessa concepção, entendemos que “o problema habitacional não pode ser visto de maneira
uniforme e genérica, pois ele decorre da história onde marcam presença os três elementos
básicos: o capital, a força de trabalho e o Estado”. Essa combinação varia historicamente e
emana do processo constitutivo de nossa sociedade (PERUZZO, 1984, p. 22).
Nesse sentido, concordamos com Maricato (2003) e Peruzzo (1984), ao afirmarem
que, no Brasil, o problema habitacional nasce com a emergência do trabalho livre. Sobre essa
questão, Soares (2007) afirma que o problema da moradia para as camadas pobres brasileiras
data das últimas décadas do Século XIX, período em que ocorreu uma série de mudanças
sociais: abolição da escravatura, em 1888; uma incipiente industrialização; uma renovação do
contexto político com a República e uma inversão populacional (que sai do campo para a
cidade e que se reforça com a vinda dos imigrantes na primeira metade do Século XX).
Com o avanço do modo de produção capitalista, os bens essenciais para atender às
necessidades humanas, entre eles, a habitação, foram assumindo a forma de mercadoria, ou
seja, o trabalhador passou a arcar com as despesas necessárias à sua sobrevivência. Dentro
dessa lógica de mercado, os detentores dos meios de produção e os proprietários fundiários
não podiam oferecer habitações a todos, visto que, segundo Rodrigues (2001, p. 12), “para
quem conta com recursos limitados, a oferta de imóveis no mercado não é compatível com
seus salários”. Há que se ressaltar que problema não se limitava ao acesso à habitação, mas
também à terra urbana, que se concentrava como propriedade nas mãos de poucos, e com a
especulação imobiliária, cujos preços eram bastante elevados. Essa realidade, no caso do
Brasil, não se fazia presente apenas nos grandes centros, mas também nas cidades de menor
porte, como Patos, fato que podemos observar em um trecho da justificativa do Projeto de Lei
64/89 (ano 1964), que dizia:
40
[...] como todo pobre deseja construir o seu rancho e os terrenos cada vez
mais estão sendo vendidos por preços exorbitantes, decorrência natural do
desenvolvimento da cidade e da desvalorização da moeda, encontra-se
justificativa para que o Poder Público facilite o crescimento da cidade
ajudando a pobreza [sic] doando terreno, em lugar apropriado, para a
construção de suas residências.
É certo que soluções como as apontadas no Século XIX para a construção de
habitações operárias e, como no caso de Patos, com doações de casas ou terrenos, não só não
resolviam o problema como também reforçavam os já existentes, como as péssimas condições
de moradia, as dificuldades de acesso aos serviços básicos e os equipamentos urbanos, a
distância cada vez maior do centro da cidade, entre outros. Além disso, os efeitos dessas
“soluções” eram ínfimos diante da demanda, que era (como ainda é) bastante elevada.
Nesse contexto, a ação do Estado foi, como é no momento atual, bastante relevante e
ainda está mais presente quando os interesses da classe dominante o exigem (PERUZZO,
1984). Martins (2007) mostra que, já em 1847, existia uma Lei no Brasil que, entre outras
responsabilidades, incluía a de construir habitações populares. A Lei de Terras, de 1850,
também se constituiu como outra intervenção estatal que favorecia a classe dominante,
restringindo o direito e o acesso a terra para os que não dispunham de recursos. As medidas
higienistas4 também representavam a intervenção do Estado em favor da elite, como
exemplifica Villaça (1984), ao mencionar que, no Brasil, a classe dominante precisava de um
discurso que lhe permitisse ora demolir os cortiços, quando isso fosse necessário, ora mantê-
los e tolerá-los quando precisasse abrigar a classe trabalhadora.
Portanto, percebemos como o Estado, progressivamente, vai assumindo a
responsabilidade de prover habitações para aqueles trabalhadores que não podem pagar por
uma, agindo, no entanto, em detrimento dos interesses dos detentores dos meios de produção
e, principalmente, dos proprietários fundiários, como vimos no discurso de que o
encarecimento dos terrenos na cidade de Patos é “decorrência natural do desenvolvimento da
cidade”. Contudo, ao mesmo tempo em que assume efetivamente essa obrigação, o Estado
não consegue cumpri-la de forma satisfatória, no âmbito social, e acaba por disseminar uma
ideia distorcida do que é o problema habitacional e condizente com os interesses do mercado
imobiliário. É nesse sentido que Martins (2007) discorre sobre o caráter ideológico e sobre o
que seria o falso problema da habitação popular.
4 Ver Bonduki (2004) – A origem da habitação social no Brasil
41
Entendemos que o problema da habitação surge e se reproduz, inicialmente, no
campo ideológico, não porque o problema não exista na realidade concreta, mas, como
escreve Villaça (1986), porque a burguesia - nesse caso, os proprietários fundiários e
capitalistas que investiam no mercado imobiliário - não podia enunciá-lo corretamente, pois,
se o fizesse, teria que assumir sua incapacidade de resolvê-lo. Bastos (2012) explica essa
“incapacidade” mostrando que a escassez da mercadoria habitação funciona para garantir a
demanda e controlar sua distribuição, de modo a constranger os trabalhadores livres a
venderem sua força de trabalho ao capital na produção de valor. Portanto, segundo esse autor,
o déficit habitacional não advém, necessariamente, da falta de produção, o que existe, na
verdade, é a falta de habitações não precárias e disponíveis, como valor de uso a preços
compatíveis com os recursos daqueles que vivem do trabalho.
Entendemos, assim como afirma Engels (1983), que o capital não quer suprimir o
problema da habitação, mesmo podendo fazê-lo, portanto, restam à classe trabalhadora apenas
duas saídas: a mutualidade operária e a ajuda do Estado. Vale ressaltar que, destacando-se a
ação estatal, foram as formas de solucionar o problema habitacional que se difundiram no
Brasil ao longo do Século XX.
1.2 A questão da habitação no Brasil: as estratégias e o papel do Estado
Ao fazer um retrospecto histórico das origens da intervenção estatal na habitação
social no Brasil, considerando o período que se estende das últimas décadas do Século XIX ao
governo Vargas, Bonduki (2004), em vários momentos de sua obra, deixa explícito que essa
intervenção atendia, principalmente, aos interesses ideológicos da classe dominante. Lefebvre
(1974) afirma que é preciso admitir que os produtores do espaço, nesse caso, os que detêm o
poder, o saber formal e a propriedade dos meios de produção especificamente, sempre agiram
segundo uma representação do espaço, e que os “usadores”5 desse espaço tendem a suportar o
que lhes é imposto, inserido e/ou justificado em seu espaço de representação. Ao questionar
sobre como se efetuariam essas manipulações do espaço, o próprio autor responde, partindo
da noção de ideologia, que o que se denomina de ideologia só adquire consistência intervindo
5Os tradutores (Margarida Maria de Andrade e Sérgio Martins) do texto de Lefebvre (2008) esclarecem o uso do
termo da seguinte forma: “[...] a palavra usager foi ora traduzida como „usador‟, ora como „usuário‟. A distinção
refere-se ao conflito entre uso e troca [...], o uso não coincide com o valor de uso, pois esse corresponde aos
termos implicados pela mercadoria, especialmente as relações de propriedade, ao passo que aquele corresponde
ao domínio do que é vivido sob os termos da apropriação (na acepção conferida ao termo por Marx nos
manuscritos econômico-filosóficos, de 1844), portanto fora, e quiçá contra, os pressupostos da valorização” (p.
181).
42
no espaço social. Foi assim com as medidas higienistas em fins do Século XIX, quando o
Estado (de caráter liberal) se limitou a criar uma legislação urbanística, planos de saneamento
básico e estratégias de controle sanitário, e foi assim nas primeiras décadas do Século XX,
quando os interesses da elite precisavam ser protegidos diante da pressão social cada vez
maior que a classe trabalhadora vinha exercendo e manifestando, período em que o Estado
teve que agir mais energicamente.
A partir da década de 1930, o problema habitacional ganhou uma força ideológica
ainda maior. No contexto do projeto nacional-desenvolvimentista de Vargas, a habitação
passou a ser vista sob dois aspectos:
primeiro, [...] como condição básica de reprodução da força de trabalho e,
portanto, como fator econômico na estratégia de industrialização do país;
segundo, [...] como elemento na formação ideológica, política e moral do
trabalhador, e, portanto, decisiva na criação do “homem novo” e do
trabalhador-padrão que o regime queria forjar, como sua principal base de
sustentação política. (BONDUKI, 2003, p. 73)
Nesse mesmo período, foi constante a ocorrência de seminários, congressos e
encontros que se detinham à questão habitacional, além da atenção maior que passou a
receber da imprensa e das instituições acadêmicas. A intervenção estatal assumiu, então, a
concepção keynesiana que se disseminava por todo o mundo. Assim, na década de 1940, foi
criada a Lei do Inquilinato, que consistia no congelamento dos aluguéis sob a justificativa de
combate aos efeitos sociais emergentes da Segunda Guerra Mundial. Além disso, nessa
mesma época, difundia-se a preferência pela casa própria, quando as discussões passaram a
ocorrer sempre no sentido de viabilizá-la, principalmente para a classe trabalhadora. Nessa
perspectiva, Bonduki (2004, p. 83) faz o seguinte questionamento: “Por que isto era tão
importante para a ideologia dominante num momento em que 70% dos domicílios eram
alugados?”, que ele mesmo responde:
A questão da moradia assume papel fundamental no discurso e nas
realizações do Estado Novo, como símbolo da valorização do trabalhador e
comprovação de que a política de amparo aos brasileiros estavam dando
resultados positivos. No centro dessa concepção estava a ideia do que o
trabalho dignifica e gera frutos, os quais compensariam décadas de
sacrifício. [...] Nesse sentido, nada era mais eloquente do que o acesso do
trabalhador à casa própria.
43
Ainda segundo Bonduki (2004), o trabalhador acreditaria que a possibilidade de
acesso à propriedade (através da moradia) demonstrava que a sociedade estava valorizando o
seu trabalho, o que faria aceitar a moral e a lógica burguesa passivamente e manteria estável o
regime vigente, posto que um trabalhador que tivesse uma casa própria, ao invés de uma
moradia precária em um cortiço, não se revoltaria contra o governo e não engrossaria o
movimento esquerdista. Nessa perspectiva, a propriedade da casa é divulgada para os
trabalhadores como uma conquista e uma consequente independência econômica, como uma
reserva em tempos de adversidades e como uma possibilidade de acesso ao crédito, entre
outras “vantagens”. Essa concepção foi bastante criticada por Engels (1983), que destacou a
ineficácia das reformas sociais que partiam dessas premissas, porquanto tinham a finalidade
harmonizar os antagonismos de classe.
É importante destacar que as discussões até então levantadas acerca do problema
habitacional nos possibilitam esclarecer algumas questões bastante pertinentes para
discutirmos sobre a política habitacional no Brasil, das quais destacamos: 1) Qual a origem
desse problema? Surge, principalmente, com a propriedade privada da terra, que se encontra
concentrada em pequenos grupos, o que, por sua vez, não garante o acesso a todos; 2) Por que
é problema? Porque, no contexto em que prevalecem os interesses das diversas frações do
capital, em que o Estado atua contraditoriamente, e a população de mais baixa renda possui
apenas o necessário à sua sobrevivência, a habitação vai se tornando um bem caro e
inacessível a uma grande parte da população que, quando a obtém, geralmente, é em
condições precárias; 3) Problema para quem? Podemos concluir que se trata de um problema
para a população pobre, que, por ter uma renda que mal consegue custear as necessidades
básicas para sua reprodução, não pode ter acesso à habitação como forma de mercadoria.
Assim, elucidar essas questões nos permite chegar ao cerne do problema a que nos
detivemos, ou seja, a entender o problema da habitação como resultante do processo de
consolidação das relações de produção capitalistas. Além disso, esse exercício teórico nos
leva a compreender como e por que se disseminou a ideologia da casa própria, como serviu ao
Estado e, principalmente, ao capital imobiliário. Vale ressaltar que essa compreensão
contribui sobremaneira para a discussão que nos propusemos a fazer acerca da atual política
habitacional e seus efeitos socioespaciais, posto que um esforço de periodização se impõe
“para que o estudo possa alcançar os seus objetivos, isto é, interpretar o presente como
resultado de um processo e indicar possíveis linhas de evolução” (SANTOS, 1994).
Sabemos que, de meados da década de 1940 até 1964, várias foram as intervenções
do Estado brasileiro no que diz respeito ao problema da habitação, principalmente para
44
atender às famílias de baixa renda. Foram criados os Institutos de Aposentadorias e Pensões –
IAPs - que construíam conjuntos e financiavam casas apenas para seus associados
(RODRIGUES, 2001). Posteriormente, foi criada a Fundação da Casa Popular – FCP - entre
muitas outras ações. Porém, nenhuma delas repercutiu como a política urbana e habitacional
desenvolvidas no decorrer dos anos de 19606. Sabendo que, a partir desse período, a questão
habitacional ganhou outra dimensão, tanto no campo ideológico como na realidade concreta,
perguntamos: Quais foram essas mudanças? Como influenciaram no processo de produção
das cidades brasileiras e da cidade de Patos/ PB, mais especificamente?
Com o governo ditatorial, que se implantou a partir de 1964, a ideologia da casa
própria não só permaneceu, mas também se fortaleceu. Também não servia somente como
estratégia para legitimar e estabilizar esse novo arranjo de poder, mas também para atender,
além das demandas sociais, às necessidades que se apresentavam diante da conjuntura
econômica do país e do mercado imobiliário precisamente. A política habitacional que se
implantava nesse período visava alavancar a construção civil e gerar novos empregos para
amenizar os efeitos da crise econômica. Essas condições teriam papel fundamental no quadro
do que se entendia, na época, como desenvolvimento urbano do Brasil (AZEVEDO e
ANDRADE, 1982). Contudo, é preciso questionar se houve mesmo coerência entre as
políticas de habitação e de desenvolvimento urbano nesse período e considerar que elas foram
esboçadas num momento em que se configuravam as políticas de desenvolvimento regional e
integração nacional, com vistas a promover uma industrialização que se integrasse com os
mercados externos.
Para compreender o processo de produção do espaço urbano de cidades como Patos/
PB e como suas características sociais econômicas e políticas influíram nesse processo, é
preciso entender, antes de tudo, como esse tipo de cidade estava inserido tanto na conjuntura
nacional quanto na política habitacional da época, segunda metade do Século XX. Sabemos
que as cidades médias foram alvos das políticas de desenvolvimento regional e que serviram
de base para a articulação de uma política urbana nacional que estava intimamente ligada à
questão habitacional. Nesse sentido, buscaremos entender, através de uma contextualização
histórica, como essas políticas se relacionaram e como a cidade de Patos se inseriu em sua
conformação.
6 Nosso objetivo aqui não foi de avaliar se essas intervenções foram ou não bem sucedidas, mas de discorrer
brevemente sobre como o problema habitacional se configurou e surgiu no Brasil, para compreender, a partir de
então, como vem atuando o Estado frente às consequências desse problema e diante dos interesses dos grupos
dominantes que foram se apropriando dele a seu favor.
45
1.2.1 A Política de Desenvolvimento Urbano no âmbito das Políticas de Desenvolvimento
Regional
O Brasil, em meados da década de 1950, foi marcado pelo intenso processo de
urbanização, pelo agravamento dos problemas e dos desequilíbrios urbano-regionais; pela
perda da qualidade de vida nos grandes centros oriundos da concentração de pessoas e
atividades produtivas, acelerando as discrepâncias e os problemas sociais, além de manter
uma já frágil organização hierárquica das cidades7, que acabava por configurar um fluxo
insuficiente de informações e, consequentemente, das relações econômicas entre as várias
regiões do país (AMORIM FILHO e SERRA, 2001). Diante da necessidade de superar esses
problemas, de minimizar os seus efeitos e de, ao mesmo tempo, promover o crescimento
econômico – este último considerado condição necessária frente ao contexto mundial da
época (período pós-guerra) - muitos foram os projetos, os programas e as instituições criados8
para atender a essas necessidades.
Esse processo de urbanização acelerada pelo qual passou o Brasil foi, segundo
Maricato (2001, p.19), baseado em um modelo de industrialização e de desenvolvimento
altamente dependente do capital externo, fato que ampliou “a inserção subalterna do país na
divisão internacional do trabalho”. Nesse período, passou-se a aumentar a importância de uma
planificação urbano-regional no território nacional.
Com a implantação do Regime Militar em 1964, as Políticas de Desenvolvimento
Regional foram planejadas priorizando a industrialização, com vistas à integração competitiva
com os mercados externos. Para tanto, implantou-se uma política de incentivos fiscais e
financeiros, bem como investimentos em infraestrutura, principalmente energia e transporte.
Nesse contexto, foram as metrópoles regionais que absorveram a maior parte dos recursos.
Amorim Filho e Serra (2001) mostram que esses centros passaram a ser temas privilegiados
de estudos no Brasil e em muitas partes do mundo e é nesse momento em que se ampliam os
domínios do planejamento urbano-regional.
7De acordo com os autores Amorim Filho e Serra (2001), essa fragilidade pode ser descrita pelo formato primaz
do sistema urbano, caracterizado pela insuficiência de centros intermediários dinâmicos que contribuíssem para a
interiorização do desenvolvimento. 8Leonides A. da Silva Filho publicou um texto pelo Instituto Nacional de Administração e Desenvolvimento –
INAD - intitulado “Sudene: 50 anos – uma abordagem política, institucional e administrativa”, que mostra que,
nesse contexto mundial, foram criados, em decorrência da Conferência de Breton Woods em 1944, o Banco
Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento – o BIRD - que, mais tarde, foi dividido em Banco
Mundial e Banco para investimentos internacionais, e também o Fundo Monetário Internacional – FMI. Eles
tinham o objetivo principal de regular a política econômica internacional. Além dessas instituições, foi criada,
em 1948, a Comissão Econômica para a América Latina – a CEPAL.
46
Assim, vários foram os planos criados que estabeleciam as diretrizes de uma política
de desenvolvimento regional e de integração nacional, contudo, pouca atenção foi dada à
temática urbana. Pereira et. al (1967, p. 86) asseveram que os estudos que estavam sendo
realizados na época davam “uma visão integrada das potencialidades das diferentes áreas dos
país, tendo em vista a maximização do seu desenvolvimento econômico”. Esses autores
mostram que alguns órgãos, como o Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada (EPEA), o
BNH e a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), entre outros, estavam equacionando
um sistema que, com recursos nacionais e internacionais, criariam condições objetivas para a
montagem de escritórios de pesquisas e planejamento microrregional. Esse debate serviu de
base para a estratégia de integração nacional nos PNDs I e II e para uma política de
desenvolvimento urbano que, posteriormente, foi incorporada nesse último Plano.
Vale ressaltar que, apesar de a temática urbana ter sido negligenciada, pelo menos até
o PND I, Steinberger e Bruna (2001) afirmam que havia uma preocupação indireta com essa
questão, através das abordagens sobre a redistribuição populacional, migrações, habitação e
saneamento, embora priorizassem as regiões metropolitanas e seus problemas. Assim, as
cidades de porte médio ainda não se constituíam foco de interesse da política urbana e
habitacional, a não ser de forma muito pontual. Essa realidade também foi observada na
cidade de Patos. Não obstante, já na década de 1960, a cidade se configurava, segundo
Botelho (1965), como um “importante empório comercial do sertão paraibano, concentrando a
produção de algodão proveniente do Alto Sertão”. A autora afirma que essa prosperidade se
dava pela sua posição de entroncamento rodoviário (Rodovia central da Paraíba e
Transnordestina) e por ter sido ponta de trilhos da ferrovia vinda do Ceará. Atualmente, a
cidade dá acesso a duas rodovias estaduais, a PB – 275 e a PBT – 110 e duas federais, as BR-
230 e BR-36 (mapa 01). Essa condição favorece ainda mais a dinâmica comercial na cidade,
posto que facilita a circulação de mercadorias, o mercado consumidor e a força de trabalho
entre as cidades circunvizinhas e com os estados do Rio Grande do Norte, Pernambuco e
Ceará, bem como a capital, João Pessoa (localizada no litoral).
Magnanini (1965) também escreve que, em meados dos anos de 1960, Patos já era
um centro de convergência da produção agrícola e que, assim como os municípios de
Alcântara, Cajazeiras, Caicó, Sertânia, Caruaru, Amargosa e Jequié, tinha, nesse período, de
16 a 26% de sua população ativa no setor de serviços e até 14% na indústria. Apesar disso,
acreditamos que, no âmbito da atuação de Planos como o Paeg o Decenal, por exemplo, a
cidade apresentava pouca relevância, porquanto não contemplava seus objetivos e
especificidades, já que centros como Patos, denominados por Coelho (1992, p. 89) de capitais
47
regionais, apresentavam, na época, uma “fraca base produtiva para atender à demanda que
[partia] dos inúmeros centros de hierarquia inferior, incluídos em suas extensas áreas de
influência”.
Somente na década de 1970 o Governo Municipal da cidade de Patos teve a
possibilidade de receber recursos dos cofres do Governo Federal, por meio de projetos de
iniciativa local, com o intuito de atender à configuração da política urbana que se articulou
nesse momento, como veremos mais adiante. Nesse período, o sistema urbano nacional era
marcado pela insuficiência de centros intermediários dinâmicos, como afirmam Amorim Filho
e Serra (2001), o que não só dificultava a interiorização do desenvolvimento econômico como
também provocava um acúmulo de funções econômicas e políticas nas metrópoles. Esse fato
apontava, portanto, para a necessidade de sistematizar uma política urbana conciliada com a
política de desenvolvimento regional. O primeiro passo dado para isso foi através da Política
Nacional de Desenvolvimento Urbano, cuja elaboração foi contratada pela Secretaria de
Planejamento da Presidência da República (Seplan/PR). Segundo Steinberger e Bruna (2001,
p. 41), esse documento considerava que a política urbana deveria ir além da problemática do
funcionamento interno das cidades e ao encontro com a problemática regional, o que
“significa propugnar pela implantação de uma política nacional de organização territorial”. As
autoras destacam, ainda, que o documento também buscava a compatibilização de um modelo
de ocupação do território com o processo econômico e social, através de investimentos
públicos e privados, tarefa que caberia aos organismos responsáveis pelo planejamento, pela
coordenação e pela implantação da política de desenvolvimento nacional.
Esse documento foi incorporado, em 1974, ao II Plano Nacional de Desenvolvimento
(II PND), em que se encontra um capítulo inteiro que trata da problemática urbana. De acordo
com Steinberger e Bruna (op. cit.), a proposta desse plano tinha como base as seguintes
questões: o acelerado processo de urbanização, que gerou uma sociedade predominantemente
urbana; o desequilíbrio do sistema urbano provocado por uma metropolização prematura, pela
propagação de grandes aglomerados urbanos e pela pulverização de pequenas cidades, com
um número insuficiente de cidades médias9 para equilibrar esse “conjunto”, além de uma
9Muitos autores, como Soares, Melo (2010) e Branco (2006), bem como os estudiosos que compõem a Rede de
Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe), vêm elencando inúmeros critérios para definir o que é uma
cidade média. Corrêa (2007) mostra que, para esse tipo de cidade, é necessário considerar a relação entre
tamanho demográfico, funções urbanas e espaço intraurbano. Além disso, o autor afirma que as cidades médias
devem ter interações espaciais complexas com direções diversas e que ocorram em múltiplas escalas. Portanto,
tendo como referência o texto “Construindo o conceito de cidade média”, de Corrêa (op. cit.), e as demais
referências supracitadas aqui, faremos menção à cidade de Patos como sendo uma cidade média. Nos casos em
que nos remetermos a cidades de porte médio, estaremos nos referindo apenas ao aspecto populacional. No caso
das autoras Steinberg e Bruna (op. cit), percebemos que elas não se preocupam em diferenciar o uso dos termos
48
concentração espacial no litoral; e, por último, as cidades como núcleos concentradores de
riqueza que, consequentemente, geravam problemas urbanos que adquiriam grandes
dimensões. A partir disso, foram elaboradas estratégias que consistiam na desconcentração
intrar-regional no Sudeste, na ordenação do sistema urbano do Sul, na dinamização
econômica das metrópoles regionais no Nordeste e na promoção da urbanização das áreas de
ocupação recente no Norte e Centro-oeste. As cidades médias tiveram papel fundamental,
como focos de atração de algumas atividades industriais, transformaram-se em áreas de
contenção de fluxos migratórios, assumiram a posição de polos de desenvolvimento regional,
adquiriram determinadas especializações e originaram as denominadas “ilhas de
prosperidade” de que trata Araújo (1999).
Na década de 1970, o II PND se constituiu como um marco na sistematização de
uma política urbana nacional. Esse plano expressou, de acordo com Tavares (2002, p. 238), a
intenção de se avançar no processo de industrialização, substituindo importações e
consagrando em definitivo a estratégia de polos de desenvolvimento. Contudo, Maria Adélia
de Souza (1999) observa que as discussões acerca da urbanização brasileira e as diferentes
interpretações do urbano, entre os profissionais que se detinham a essa problemática, geraram
duas concepções distintas, no sentido de implantar a política urbana: uma globalista e uma
setorialista. Segundo a autora, a primeira tratava o espaço brasileiro como uma totalidade que
se manifestava no território. Essa concepção foi denominada por ela de visão geográfica,
enquanto a segunda era uma visão segmentada do urbano, entendido como a somatória da
habitação, do transporte, do saneamento básico, da gestão administrativa e das finanças. Foi
essa última concepção que prevaleceu e que definiu as bases de implantação da política
urbana na época. Assim, é importante ressaltar que, embora as bases dessa política urbana
tenham sido os modelos de ordenamento territorial francês (aménagementduterritoire)10
e
inglês, ela foi de caráter estritamente setorial (SOUZA, 1999). Essa política urbana, segundo
Steinberger e Bruna (2001), além de servir como um mecanismo de desconcentração
geográfica, principalmente populacional, surgiu como uma política de atendimento de
carências, isto é, "antidéficit” de serviços coletivos, que serviriam justamente para suprir, do
cidades médias e cidades de porte médio, embora esse uso se refira mais às cidades, tendo em vista a presença de
atividades produtivas, comerciais, bem como a oferta de serviços. Sendo assim, ao reproduzirmos as assertivas
dessas autoras, a diferenciação entre os termos descrita nessa nota não se aplica necessariamente. 10
Segundo Tavares (2002), a teoria dos polos de desenvolvimento de Perroux, difundida nos países europeus e
também nos países ditos “periféricos”, serviu como base teórica para muitos dos discursos que sustentaram as
Políticas de Desenvolvimento Regional e Integração Nacional implantadas nesse período.
49
ponto de vista da infraestrutura, centros específicos como as cidades médias, o que
contribuiria para desconcentrar e interiorizar as atividades econômicas e a população.
1.2.2 Política e Planejamento Urbano na cidade de Patos - PB
Na década de 1970, o crescimento econômico da cidade de Patos foi impulsionado
pelo comércio e pela indústria (CAVALCANTE, 2008). A leitura e a análise dos Projetos de
Lei Municipal elaborados pelo Executivo, nos governos desse período, mostraram-nos que
houve uma intensa busca pelo governo municipal para a obtenção de recursos em todas as
instâncias de governo, tanto estaduais, quanto federais, com o objetivo de investir em obras de
urbanização voltadas para a infraestrutura, o sistema de transportes e outros serviços urbanos.
A seguir, detalharemos os recursos obtidos e/ou pretendidos, bem como as respectivas obras
que iriam custear11:
- As taxas municipais, que foram destinadas aos gastos referentes à indenização do
proprietário de uma casa de taipa, localizada na Rua Horácio Nóbrega, e ao crédito
suplementar, destinado aos Departamentos de Finanças, de Educação e Cultura, à Câmara
Municipal e ao Serviço Municipal de Estradas para obras de calçamento12 (esse crédito
também teve como fonte de recurso o Fundo Rodoviário Nacional - FRN e o Imposto de
Circulação de Mercadorias - ICM);
- o Imposto de Circulação de Mercadoria – ICM, que foi destinado para os custos
com a obtenção de empréstimo com o Banco do Estado da Paraíba S/A; para a construção de
uma estação rodoviária; para abrir crédito suplementar e especial destinado à construção de
calçamento e galerias de diversas ruas e crédito especial para a edificação do Centro Social
Urbano – CSU, localizado no Bairro do Jatobá;
- do Departamento de Estradas e Rodagem, que destinou verbas para a construção
de faixas de rodovia que, fazendo o contorno na cidade pelo Bairro da Vitória, liga à BR 230
no sentido leste-norte;
- o Fundo de Participação dos Municípios – FPM, cujos recursos se destinaram ao
custeio dos serviços técnicos contratados para elaboração do Plano Diretor do Município
11
Projetos de nº: 18/70; 29/70; 07/71 (Lei 934/71); 21/71 (LEI 948/71); 31/71 (LEI 958/71); 32/71 (LEI 959/71);
32/71 (LEI 959/71); 36/71 (LEI 963/71); 39/71 (LEI 969/71); 43/71 (LEI 970/71); 32/72 (LEI 999/72); 40/72;
03/73; 11/73; 12/73; 25/73; 31/73; 36/73; 44/73; 17/74; 20/74; 21/74; 24/74; 08/75; 09/76; 03/77; anteprojeto
004 /77; 09/77; 19/77; 24/77 (que institui o Plano de Organização do Espaço Urbano da cidade de Patos); 90/78;
03 /79 – C; 04 /79 – C. 12
As obras que foram custeadas por mais de um recurso serão mencionadas no texto apenas uma vez para evitar
repetições.
50
(1970); a construção de três lavanderias nos Bairros do Monte Castelo, Vila Cavalcante e Juá
Doce (tendo recursos também do ICM); a construção de um cemitério localizado na Vila
Cavalcante (obra que também teve recursos das taxas municipais e do ICM); a obtenção de
empréstimo com o Banco do Nordeste do Brasil S/A para complementação de recursos para a
construção da rede de distribuição de energia elétrica na cidade; obtenção de crédito
suplementar destinado ao Departamento de Urbanismo, Viação e Obras e ao Serviço
Municipal de Estradas (também com recursos do FRN), crédito suplementar para a construção
de calçamentos e galerias de diversas ruas (também com recursos do ICM, através de excesso
de arrecadação) e, por último, a obtenção de empréstimo com o Banco do Nordeste de Brasil,
tendo em vista a construção de um mercado modelo e uma ponte que ligaria a cidade ao
Bairro São Sebastião (que contaria com recursos do FRN e, em caso de necessidade, também
do ICM);
- o Fundo Rodoviário Nacional, que proporcionou a restauração e a pavimentação
do calçamento da Rua Horácio Nóbrega, que liga o centro da cidade à BR 230; forneceu
crédito suplementar ao Departamento de Urbanismo, Viação e Obras e ao Serviço Municipal
de Estradas, além de outras obras mencionadas antes, que também receberam verbas desse
recurso.
Além desses, outros projetos de Lei mencionavam obras a serem realizadas, mas não
especificavam de onde vinham os fundos. Contudo, dispunham desses recursos, baseando-se
em dispositivos do Artigo 43 da Lei 4.320 de 196413, em que se admitia a anulação de
algumas dotações orçamentárias e/ou permitia o uso de fundos oriundos do excesso de
arrecadação tributária. Nesse caso, foram disponibilizados créditos suplementares e especiais
para a construção de calçamento, galerias, ampliação e instalações do Gabinete do Prefeito e
dos Departamentos de Educação e Cultura e Urbanismo, Viação e Obras; bolsas de estudo;
equipamentos e instalações para iluminação elevada; reforço de dotação orçamentária;
complementação de verba do Ministério da Educação e Cultura – MEC – para a construção de
cinco grupos escolares e para a realização de serviços urbanos; construção do canal do Bairro
da Palmeira; serviços técnicos de elaboração e implantação do cadastro imobiliário do
município; complementação de recursos da SUPLAN/CAGEPA para a implantação de
abastecimento de água em Santa Gertrudes (distrito de Patos) e, posteriormente, do Bairro do
Morro, bem como a construção de um hipódromo.
13
Essa Lei se encontra disponível no link <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm>.
51
É importante enfatizar que esses recursos e projetos propostos para a cidade de Patos,
nos anos de 1970, estavam inseridos na “onda” do planejamento urbano pela qual passava o
Brasil, sob a influência da conjuntura política e do acelerado processo de urbanização que se
alastrava por todo o país, além de atender às expectativas geradas pelo II PND, implantado
nesse mesmo período. Segundo Deák (1999), da mesma forma como se pensara na criação de
grandes planos de desenvolvimento integrado para o Plano Decenal14, também o foi para todas
as cidades brasileiras, exceto para as poucas que ficavam à margem do processo de
urbanização. Tais planos abarcavam “todos os aspectos possíveis e imagináveis da vida das
cidades, desde obras de infraestrutura física até a renovação e o desenho urbanos, ordenação
legal do uso do solo e da paisagem urbana”, bem como o fornecimento de serviços “tão pouco
espacial-específicos quanto saúde e educação pública” (DEÁK, 1999, p. 13). Podemos
constatar esse fato com as propostas de obras na cidade de Patos, contidas nos Projetos de Lei
que mencionamos anteriormente.
É importante destacar que essa grande quantidade de projetos, elaborados nesse
período, resultou dos estímulos governamentais que eram feitos para que se promovesse o
planejamento urbano em nível local. Deák (1999, p. 13) assevera que esse estímulo se
manifestava de várias formas. Assim, apesar de as cidades não serem obrigadas por lei a ter
seu plano de desenvolvimento, como passaram a ser a partir da Constituição de 1988,
“certamente não poderiam esperar obter financiamento para obras de infraestrutura se não o
tivessem”. Nesse contexto, a Prefeitura Municipal de Patos contratou os serviços técnicos de
uma firma, a PROVESP 15, para elaborar o Plano Diretor do município; instituiu o sistema
tributário da cidade; contratou os serviços técnicos para a elaboração e a implantação do seu
cadastro imobiliário e m instituiu o Plano de Organização do Espaço Urbano da cidade. Foi
com o objetivo de estimular esse tipo de iniciativa que vários programas, como o Plano
Nacional de Saneamento (Planasa), passaram a oferecer „fundos‟ para a urbanização na forma
de crédito subsidiado. Foram criados também vários órgãos, em nível ministerial, em que o
Serviço Federal da Habitação e Urbanismo (Serfhau) estava à frente para administrar os
recursos alocados à atividade, bem como prestar assessoria às cidades menores, “cujos
governos locais não saberiam nem o que exatamente era um „plano urbanístico‟, muito menos
tinham condições de conhecer os meandros entre os fundos disponíveis e os escritórios
especializados que por eles fariam os planos” (DEÁK, 1999, p. 13).
14
Ver Pereira et. al. (1967) em “Estudos básicos para a definição de polos de desenvolvimento no Brasil”. 15
No documento analisado, não é mencionado o nome da empresa, mas apenas sua sigla.
52
Sabemos, no entanto, que tanto a SERFHAU quanto o Planasa eram subjugados pela
política centralizadora do BNH. No que diz respeito à vasta quantidade de planos elaborados
pelos governos locais, para atender à demanda do planejamento urbano, Deák (1999) afirma
que poucos deles foram efetivamente implantados. Nesta pesquisa, não dispomos de nenhuma
fonte documental que confirme se todas as obras propostas para a cidade de Patos foram
realizadas efetivamente. Contudo, sabemos que as que se concretizaram não só foram
responsáveis pela expansão de algumas áreas da cidade como também atraíram um
contingente populacional, seja como mão de obra seja como consumidor dos serviços que, a
partir de então, a cidade passou a ofertar.
Outro fato importante para destacar é que esses projetos elaborados na cidade de
Patos refletiam o caráter setorialista que a Política Urbana tinha assumido em nível nacional.
Ao se referir à política urbana que se desenvolvia no país e que tinha esses efeitos locais,
Souza (1999) afirma que essa visão setorialista não proporcionava o desenvolvimento da
totalidade do território brasileiro, visto que caminhava no sentido estrito de “não prejudicar”
os interesses dos setores econômicos hegemônicos, ou seja, das regiões metropolitanas,
principalmente as do Sul e do Sudeste, já que propiciava a ação de distintos grupos de
interesse, principalmente do setor privado. Em escala local, supomos que, para o setor
privado, os efeitos foram positivos, na medida em que observamos a constante menção aos
Projetos de Lei analisados para recursos oriundos de excesso de arrecadação tributária,
diferentemente dos projetos das décadas posteriores, quando era constante a referência às
dificuldades de obter recursos através de arrecadação, por causa da inflação que assolava a
economia e que atingia, de forma mais severa, as cidades menores.
Nessa perspectiva, quais eram as consequências da produção do espaço intraurbano?
Santos (1985, p. 76) afirma que determinada decisão de arruamento, por exemplo, pode levar
a uma separação entre pessoas e entre elas e os equipamentos na cidade, criando uma espécie
de segregação socioeconômica, cuja reprodução “supõe uma ação especulativa assim
estimulada, mesmo que involuntariamente, pelo poder público”. Segundo o autor, o Estado
passa a presidir, até em escala local, um aspecto da lógica capitalista que leva à reprodução
cumulativa das diferenças.
Sabemos que é assim que se dá a produção do espaço no modo de produção
capitalista. Não por acaso, discutimos anteriormente sobre como a busca pelo crescimento
econômico do país orientou as políticas de desenvolvimento regional e urbano no Brasil. No
caso da produção da cidade, não seria diferente. É fato que a atuação do Estado, em suas
diversas instâncias, ocorre dialeticamente, ou seja, agindo para atenuar os problemas sociais e,
53
ao mesmo tempo, reproduzindo-os, visto que também atende aos interesses de acumulação e
reprodução do capital. Singer (1982) mostra que o Estado, que é responsável pelo
fornecimento de boa parte dos serviços urbanos, essenciais tantos às empresas quanto aos
moradores, exerce importante papel na determinação das demandas pelo uso de cada área
específica do solo urbano e, portanto, do seu preço. E sempre que o poder público dota uma
zona da cidade de serviços públicos, ele atrai demandas específicas de empresas e moradores
para essa área que, até então, não se dirigiam para ela e que possam pagar um valor maior
adquirido pelo solo com a implantação dos serviços.
Ao analisar as implicações do acelerado processo de urbanização, da explosão
demográfica e da terceirização, nas cidades brasileiras, na segunda metade do Século XX,
Santos (1993, p. 09) alerta para os problemas oriundos do “modelo geográfico de crescimento
espraiado”, adotado não só pelas grandes cidades, mas também pelas cidades intermediárias e
locais. Esse modelo, segundo o autor supracitado, é causa e é efeito da especulação favorecida
pela atuação do Estado descrita por Singer (1982). Assim, como nas demais cidades
brasileiras, em Patos também se adota esse mesmo modelo geográfico de crescimento.
1.3 A estruturação da cidade de Patos - PB
Segundo Eliseu Sposito (2008, p.35), “como a cidade é estruturada por processos
contraditórios, não se deve encará-la como uma totalidade fechada. Ao contrário, ela deve ser
compreendida como uma totalidade em constantes transformações”. Para compreendermos
como se dão essas transformações e como a cidade cresce, o autor afirma que é preciso
considerar as determinações históricas características de cada cidade.
Diante do pressuposto, percebemos que, assim como a maioria dos núcleos urbanos
do Nordeste, Patos se constituiu a partir das relações que envolviam tanto os interesses da
elite fundiária local, como também um “processo histórico mais amplo, relacionado à
formação do perfil territorial brasileiro que, a partir do Século XVI, situa-se no bojo da
configuração do mundo americano, atrelado às relações de formação e reprodução do capital”
(CAVALCANTE, 2008, p. 21). O núcleo urbano em que hoje se encontra a cidade de Patos
surgiu, segundo Cavalcante (op. cit.), em meio às fazendas de gado que se encontravam nos
percursos denominados por Maia e Cardoso (2007) de “caminhos de boiada” e que serviam
54
como ponto de apoio aos tropeiros16
que buscavam água e pastagens. Esse núcleo urbano foi
elevado à categoria de Vila no ano de 1833 e à categoria de Cidade somente em 1903.
Durante todo esse período, até os anos de 1940, a economia local teve como base a
agricultura, principalmente a pecuária, apesar de o algodão, entre as décadas de 1930 e 1940,
despontar como uma nova possibilidade de crescimento econômico local (CAVALCANTE,
2008).
Cavalcante (op. cit) também destaca algumas mudanças que começaram a ocorrer na
cidade e que foram configurando o modo de vida urbano em Patos, como: a da localização da
igreja Matriz da Padroeira Nossa Senhora Daguia, que influenciou a expansão dos
estabelecimentos comerciais para a Rua Grande17
(Figura 02, p. 54); a instalação de alguns
equipamentos urbanos e serviços como a Estação Telegráfica em 1908; o surgimento de
meios de comunicação impresso (jornal) em 1914 e, na década de 1940, a ampliação do
número de escolas estaduais na zona urbana (e também rural); a inauguração de uma agência
do Banco do Brasil em 1941; a chegada da ferrovia vinda do Ceará em 1944; a doação de um
terreno para a construção do Hospital Regional e a implementação do novo conjunto elétrico
para iluminação urbana, adquirido pela Prefeitura Municipal em 1948, entre outras.
Figura 02: Estabelecimentos comerciais na Rua Grande (Atual Solon de Lucena). Fonte:
<http://www.patosemrevista.com/home.html> Acesso em dezembro de 2013
Assim, vemos que esse movimento histórico da sociedade demanda funções urbanas
que se materializam nas formas espaciais e sabemos que elas são socialmente produzidas por
16
Viajantes que transitavam do litoral ao sertão e vice-versa que, em geral, eram os responsáveis por transportar
o gado por esse percurso. Para tanto, estabeleciam alguns pontos de parada que originaram uma série de núcleos
urbanos no interior da Paraíba, entre eles, enfatiza-se o município de Patos (Gonçalves, 1999). 17
O comércio se localizava, inicialmente, na praça da primeira Igreja de Nossa Senhora Daguia (denominada
posteriormente de Praça João Pessoa e hoje, Praça Edvaldo Motta) e aos poucos foi se expandindo para a Rua
Grande (atual Solon de Lucena), onde passou a se localizar a nova igreja matriz e hoje é uma das principais
avenidas da cidade.
55
agentes sociais concretos, cuja ação inclui práticas que conduzem a um constante processo de
reorganização espacial, como afirma Corrêa (1989). No entanto, Sposito (2008, p. 27) mostra
que, com base nessas explicações, “podemos acrescentar mais algumas características para
compreender como a cidade cresce”. O autor destaca que, sem nos esquecermos de considerar
essas determinações históricas de cada cidade, é possível compreendê-las a partir de três tipos
de crescimento: o populacional, o horizontal e o vertical. Segundo Sposito (op. cit), o
primeiro é de fácil apreensão, posto que o número de habitantes é um dos principais fatores
para se identificarem as cidades, tanto no nível do senso comum quanto no estatístico; o
segundo tipo é definido pelo perímetro da cidade, com sua planta urbana, que vai se
desdobrando com a incorporação de novas áreas, de forma descontínua ou não à malha
urbana, através da ação dos agentes sociais e onde o traçado das ruas e das avenidas irá
orientar a circulação de pessoas, a implantação de infraestrutura e de equipamentos de
consumo coletivo; o terceiro e último tipo, o vertical, pode ser caracterizado pelas mesmas
estratégias dos agentes que propiciam o crescimento horizontal, destacando-se os mecanismos
da especulação imobiliária etc.
Observando o mapa 02 (p. 56), que mostra a expansão do perímetro urbano de Patos,
percebemos que, até a década de 1960, a cidade se encontrava bastante adensada em seu
núcleo original, embora já houvesse, na época, vazios urbanos ao norte e ao sul, que existiam
devido à formação de áreas mais distantes do centro e descontínuas da malha urbana que
foram ocupadas pela população mais pobre. As atividades comerciais se concentravam no
centro da cidade, localização resultante da sua própria conformação histórica e da
proximidade com a linha férrea.
56
Mapa 02: Expansão da malha urbana da cidade de Patos/PB desde 1960 até 2010
Fonte: Setor de Geoprocessamento da Prefeitura Municipal de Patos/PB - 2012
Entre os anos de 1960 e 1970, o crescimento da cidade seguiu os caminhos que ligam
Patos às regiões vizinhas, destacando-se as estradas de ligação ao litoral, ao sertão da Paraíba,
57
a Pernambuco e ao Rio Grande do Norte, “cujos caminhos lançaram-se sobre os cumes,
fugindo das cheias no período do inverno” 18
. Vale destacar que, já nesse período, o poder
público tentou ordenar o espaço urbano no que diz respeito ao uso e à ocupação do solo, como
observamos no Projeto de Lei 63/50, que definia os loteamentos onde não poderiam ser
construídos prédios industriais, como oficinas mecânicas, serrarias e beneficiamento de
algodão, milho e outros cereais. Em outros projetos, também constatamos que, nas áreas mais
distantes, não havia, minimamente, os serviços básicos necessários às famílias que ali
habitavam, como sistema de abastecimento de água e rede de distribuição de energia elétrica,
entre outros.
Essas condições, políticas e sociais, já demonstram uma primeira diferenciação no
espaço urbano da cidade de Patos, em termos de uso e ocupação do solo e de distribuição de
equipamentos e serviços urbanos. Além disso, acreditamos que, nesse contexto, havia a
concentração de vastas terras nas mãos de proprietários fundiários e a ação de especuladores
imobiliários, visto que há documentos desse período que o mencionam, mesmo que
indiretamente, como o Projeto de Lei 64/89, em que consta que a Prefeitura de Patos “não
dispõe de mais terrenos para construções, desde que as administrações anteriores fizeram
desordenadamente a distribuição de todo o patrimônio territorial pertencente à
Municipalidade”. As plantas dos loteamentos19
desse período também mostram que vastas
áreas se encontravam em propriedade de empresas como a Anderson Clayton Ltda e a CO
S/A, que parcelou algumas de suas terras com o intuito de fazer dessas áreas um espaço
residencial.
Entre os anos de 1970 e 1989, ampliou-se a oferta de serviços na cidade de Patos,
principalmente o educacional, como demonstra Cavalcante (2008), destacando-se as
instituições de nível superior, com a criação da Faculdade de Ciências Econômicas de Patos e
da Escola de Agronomia e Medicina Veterinária, o que atraiu um contingente populacional
cada vez maior.
Observando o mapa da expansão urbana de Patos (Mapa 02, p. 56), vimos que, ainda
nesse período, permaneceram vazios urbanos nas áreas mais centrais, ao mesmo tempo em
que se expandiam as áreas mais distantes do centro, muitas delas descontínuas da malha
urbana. Algumas dessas últimas foram ocupadas, inicialmente, através de ações do poder
público, como na Zona Norte, com a construção do Conjunto Habitacional Noé Trajano (em
1967), promovida pela CEHAP, e a construção do matadouro municipal, no atual Bairro
18
Informações obtidas através do Plano Local de Habitação de Interesse Social do Município de Patos. 19
Essas plantas foram obtidas na Secretaria de Infraestrutura (SEINFRA) do Município de Patos.
58
Jardim Magnólia e na Zona Sul, com a construção de um conjunto habitacional no Bairro
Nova Conquista, através da Fundação de Ação Comunitária (FAC), em regime de mutirão.
No entanto, nessas mesmas áreas, uma parte da população também construía suas habitações,
muitas vezes, de forma irregular, como foi o Bairro Nova Conquista, por exemplo. Além
dessa, a população de áreas como Alto da Tubiba (ao sul), Sete Casas (a leste), Morro (a
oeste) e uma significativa parte do São Sebastião (a leste) e imediações construiu suas
moradias através da autoconstrução (casas de taipa, a princípio), onde muitos obtinham o
terreno ocupando-o irregularmente. Nessas localidades, o acesso aos serviços básicos, à
infraestrutura e a equipamentos urbanos era quase inexistente. Além disso, o deslocamento
para as áreas mais centrais era bastante difícil, visto que a cidade, até então, não dispunha de
um sistema de transporte coletivo.
Vimos que, na década de 1970, o município de Patos, impulsionado pela “onda” de
planejamento que caracterizava a política urbana da época, teve o seu espaço urbano como
alvo de inúmeros Projetos de Lei, com vistas à realização de obras de infraestrutura e
urbanização. Destacamos, nesse caso, o Projeto de Lei 24/77, que dispõe sobre o Plano de
Organização do Espaço Urbano de Patos, que visava “orientar e controlar seu
desenvolvimento físico”, com a definição de zonas funcionais (campus universitário, área
industrial, zona residencial, zona comercial de serviços e zonas especiais de preservação), o
que mostra a consolidação desse espaço como fragmentado e simultaneamente articulado,
assim como Corrêa (1989) caracteriza o espaço urbano e como demonstra Lefebvre (1974), ao
discutir sobre o espaço social no modo de produção capitalista, que é, ao mesmo tempo,
homogêneo, por métodos de gestão e controle, de vigilância e comunicação, entre outras
razões; fragmentado, na medida em que se produzem guetos, “pseudoconjuntos” etc., mal
ligados aos arredores e ao centro; e, por sua vez, hierarquizado, com os espaços residenciais,
de lazer, comerciais etc.
É importante destacar, também, que, mesmo com essa intervenção direta do poder
local, no sentido de ordenar o espaço urbano de Patos, e com a implantação de equipamentos
urbanos e de serviços que impulsionou a ocupação de determinadas áreas, os eixos de
expansão da cidade continuaram a seguir suas principais vias de circulação, que dão acesso às
diversas rodovias que, atualmente, cruzam a cidade, o que nos remete à afirmação de Villaça
(2001, p. 80) de que “as vias de transporte têm enorme influência não só no arranjo interno
das cidades, mas também sobre os diferenciais de expansão urbana”. Sobre o crescimento do
perímetro urbano de Patos, o atual PLHIS da prefeitura municipal sintetiza assim esse padrão
de crescimento: “a forma de ocupação resultou em uma área central adensada e expansões
59
radiais, deixando grandes vazios, de modo que a mobilidade urbana, obrigatoriamente, se dá
pela passagem pelo centro da cidade, movimento induzido também pela linha férrea que
contorna essa área central e pelos rios periféricos, com destaque para os rios da Cruz e
Espinharas”. Esse Plano ainda destaca que a construção do contorno rodoviário da BR-230,
que desviou o tráfego de ligação do litoral ao sertão, passando agora pelo lado leste/nordeste
da cidade, interviu na expansão dessa área.
Nessa perspectiva, entendemos que, assim como ressalta Villaça (2001), o espaço
urbano é estruturado, fundamentalmente, pelas condições de deslocamento do ser humano.
Não podemos nos esquecer das observações de Eliseu Sposito (2008) de que essa estruturação
interna da cidade, que é dinâmica e tem movimento próprio, também está relacionada à
implantação de equipamentos coletivos (conjuntos habitacionais, hospitais,
escolas, supermercados e centros comerciais etc.) [como à] aspectos que só
podem ser explicados socialmente, como a segregação espacial decorrente
da localização de distintas camadas das populações identificadas pelas
diferenças de poder aquisitivo, por exemplo. (SPOSITO 2008, p. 35, GRIFO
NOSSO)
Sposito (2008) observa, ainda, que as modificações que ocorrem em determinados
locais podem desencadear mudanças qualitativas em outras áreas. Esse é um aspecto que nos
leva a entender o porquê da diferenciação socioespacial existente no espaço intraurbano, bem
como visualizar suas possíveis consequências como, por exemplo, a intensificação das
desigualdades socioespaciais e a alteração do fluxo de veículos, com a implantação de uma
via de circulação, casos observados em Patos, entre outras implicações. Sobre a expansão da
malha urbana de Patos, vale ressaltar que o crescimento da cidade foi predominantemente
horizontal. Só foi possível verificar a presença de um número maior de prédios com grande
quantidade de pavimentos (crescimento vertical), localizados nas áreas centrais, a partir de
meados da primeira década dos anos 2000.
Já sabemos que outra informação necessária para compreendermos o crescimento de
uma cidade diz respeito ao seu número de habitantes. O contingente populacional de Patos
tem crescido continuamente, exceto na década de 1960, quando houve uma baixa
populacional resultante do desmembramento dos distritos de Salgadinho, Santa Terezinha,
Passagem, Areia de Baraúna, Cacimba de Areia e São José de Espinharas, no ano de 1961, e
Jerimum, em 1964 (IBGE, 2013). Além disso, as secas rigorosas que assolavam o sertão,
somando-se às pragas que destruíam as lavouras de algodão e à concentração de terras nas
60
mãos de latifundiários, provocavam o êxodo rural, o que explica o aumento da população
urbana.
A oferta de serviços, cada vez mais diversificados, o emprego de mão de obra na
realização de obras viárias e de implantação de infraestrutura, bem como a incorporação de
terras rurais à urbana (como observamos na pesquisa documental) para a construção de
conjuntos habitacionais e a instalação de equipamentos urbanos foram os fatores responsáveis
pelo crescimento da população patoense, a partir da década de 1970, principalmente da
população urbana. Entre 1970 e 1980, a população do município de Patos teve um
crescimento de 18.746 habitantes (Tabela 01), o que representa um aumento de 40,3%, sendo
que a população urbana apresentou um crescimento ainda maior de 47,2 % (18.916
habitantes). Desde então, a população desse município tem se caracterizado como
predominantemente urbana, que segue, portanto, um padrão nacional, sobre o qual Santos
(1993) afirma que “a urbanização se tornou praticamente generalizada a partir do terceiro
terço do Século XX”, em que “a residência do trabalhador agrícola é cada vez mais urbana”.
Assim, concomitantemente ao crescimento da população urbana, cresciam as demandas por
habitação, serviços básicos, infraestrutura etc., gerando um déficit desses serviços e, ao
mesmo tempo, uma pressão não só das esferas do poder local, como também estadual e,
principalmente, federal, no sentido de apontar caminhos para “solucionar” os problemas
oriundos desse momento.
Tabela 01: Crescimento populacional de Patos entre as décadas de 1960 e 2000
Ano População
Urbana
% População
Rural
% Total %
1960 28.922 47,3 32.256 52,7 61.178 100
1970 40.105 86,4 6.309 13,6 46.414 100
1980 59.021 90,6 6.139 9,4 65.160 100
1990 76.708 94,3 4.590 5,7 81.298 100
2000 87.949 95,8 3.812 4,2 91.761 100
Fonte: IBGE20
- Elaboração própria
20
Dados obtidos na sede do IBGE, localizada na cidade de João Pessoa/ PB.
61
Partindo de uma apreensão, na escala nacional, da combinação entre a atuação do
Estado, através da implantação de equipamentos coletivos e da infraestrutura na lógica do
planejamento urbano (criação de leis e programas), do favorecimento da especulação
imobiliária e do crescimento populacional, em que se observa um modelo de crescimento
geográfico espraiado, como define Milton Santos (1993), observado praticamente por todas as
cidades brasileiras, como Patos, por exemplo, é fundamental destacar que os setores que mais
absorveram recursos públicos e foram alvo de investimentos privados foram o de habitação e
o de transporte.
Já referimos que a articulação de uma política de desenvolvimento urbano surgiu no
âmbito das políticas de desenvolvimento regional e se consolidou com a elaboração e a
implantação do II PND. Também essa política atuou no sentido de investir em setores
específicos, como habitação, transporte, saneamento etc., priorizando os dois primeiros, com
vistas a atender ao ideal do crescimento econômico. Contudo, é fundamental mostrar que,
antes mesmo de se elaborar uma política de desenvolvimento urbano de forma mais efetiva, já
se havia implantado, em escala nacional, um sistema que visava atender a esses setores. Esse
era o Sistema Financeiro de Habitação – SFH (criado nos primeiros anos da década de 1960),
que tinha como objetivos promover uma distribuição geográfica dos investimentos,
diminuindo as disparidades regionais (referente principalmente à habitação) e que
consequentemente diminuísse os fluxos migratórios para as metrópoles; eliminar a
“promiscuidade” nas favelas e aumentar os investimentos nas indústrias de construção civil,
de materiais de construção e bens de consumo duráveis (SANTOS, 1999).
No âmbito desse sistema, foi instituído, segundo a Lei nº 4.380, o Banco Nacional de
Habitação – BNH, cuja função era de órgão central do SFH, orientando-o, disciplinando-o e o
controlando. A criação dessas instituições, a princípio, fazia parte de uma estratégia de
“esfriar as massas” e obter apoio delas21, tendo em vista as tensões sociais oriundas das
condições sociais e econômicas do período. Nessa perspectiva, a ideologia da casa própria foi
um importante discurso adotado pelo BNH, assim como foi para os governos anteriores a ele.
Além disso, Andrade e Azevedo (1982, p. 41) afirmam que houve uma subordinação da
política urbana à habitacional através da liderança institucional desse banco, “que faria do
Serfhau um órgão a reboque dele, em uma inversão de papéis”. Esses autores afirmam, ainda,
que a política habitacional regida pelo SFH não partiu de uma visão compreensiva do
21
Autores como Véras e Bonduki (1968) e Andrade e Azevedo (1982), entre outros, justificam essa afirmação
tendo como base trechos da carta de Sandra Cavalcanti, ao propor a criação do BNH, e da fala do antigo ministro
Roberto Campos. Essas falas estão transcritas nos referidos textos.
62
“problema urbano”, mas, ao contrário, assumindo, desde o início de sua implantação, um
caráter fragmentário. Contudo, Bonduki (2008) entende que, apesar de seu forte papel
ideológico, foram os efeitos esperados que essa política habitacional exercesse na economia
do país, um dos seus elementos centrais.
A seguir, elegemos alguns elementos que, embora não cubram todas as dimensões
que assumiu essa política, ajudam-nos a entender como a cidade de Patos se inseriu nela e
também contribuem para compreendermos e analisarmos, posteriormente, as constantes
relações que vários autores – Compans (2012); Cardoso e Aragão (2013); Bastos (2012);
Paulo Neto et al. (2012), entre outros, fazem do atual Programa Minha Casa Minha Vida –
PMCMV com o antigo BNH.
1.4 O Sistema Financeiro de Habitação: a gestão do BNH e seus efeitos socioespaciais
Uma política pública22, seja qual for o problema e objeto material ao qual ela se
detém, não responde apenas a condicionantes localizados no ambiente externo, identificados
no âmbito econômico, político e social em que se insere e dos quais surge, como vimos até
agora. De acordo com Andrade e Azevedo (1982), os fatores internos, ligados tanto ao
planejamento quanto à execução, podem afetar o sentido e a direção que assume a política.
Devem, portanto, ser considerados em uma análise. Nessa perspectiva, os autores levantam
alguns questionamentos bastante pertinentes para o debate aqui proposto, como: de que
maneira se configuram no tempo os problemas para os quais a política é o remédio? Que
efeitos advêm dos êxitos e dos fracassos percebidos? Como evolui o quadro institucional da
política? Quais são os agentes principais? Como se compõem internamente?
Tendo em vista que nossa análise parte do problema habitacional e da ação do Estado
frente a esse problema, através da política habitacional, em um primeiro momento desta
produção textual, tivemos a preocupação de entender como se configurou o problema da
habitação no Brasil, partindo do pressuposto de que ele surge com a consolidação da
propriedade privada da terra nesse momento histórico. Em seguida, buscamos compreender de
que forma se foi configurando a política habitacional no país, principalmente a partir da
década de 1960, no âmbito das demais políticas públicas, como as relacionadas ao
desenvolvimento regional e à própria política urbana, considerando os interesses econômicos
e políticos que as norteavam. Nesse momento, analisaremos os efeitos socioespaciais
22
Para entender a construção conceitual sobre política pública, suas dimensões de análise e os conflitos e as
disputas que permeiam o processo pelo qual ela se estabelece, consultar Melazzo (2006).
63
oriundos da atuação do SFH, juntamente com o BNH, nas cidades brasileiras, e entender
como as cidades médias, por exemplo, Patos-PB, foram alvo da atuação dessas instituições.
Vale ressaltar que os questionamentos aqui propostos e a análise desenvolvida são um ponto
de partida para analisarmos a configuração da atual política habitacional que se consolida no
país através do PMCMV.
Um aspecto importante a ser destacado quanto ao SFH/BNH é o fato de esse ter sido
o primeiro momento em que o país teve, de fato, uma Política Nacional de Habitação, cujo
sistema, o SFH, estruturava-se através dos recursos arrecadados do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço (FGTS, criado em 1967), obtido através da poupança compulsória dos
trabalhadores, inseridos formalmente no mercado de trabalho, e da poupança voluntária, que
constituiu o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Dessa forma, definiu-se
uma estratégia de intervir no problema habitacional no Brasil, nos anos de 1960, baseada
numa estrutura institucional de abrangência nacional, com a administração direta de um banco
– o BNH - e de sua rede de agentes promotores e financeiros (privados e/ou estatais), como as
Companhias de Habitação Popular - as COHABS - e os Institutos de Orientação às
Cooperativas Habitacionais – os INOCOOPs - entre outros. Segundo Araújo (2006), na
Paraíba, essa política se intensificou depois de 1968, com parcerias das esferas do poder
público com órgãos-gestores, como os já referidos, além da Companhia Estadual de
Habitação (CEHAP), do Instituto de Pensões e Aposentadoria dos Servidores do Estado
(IPASE) e do Instituto de Previdência do Estado da Paraíba (IPEP).
Segundo Bonduki (2008), do ponto de vista quantitativo, a ação desenvolvida por
esse sistema foi bastante expressiva, porquanto foi construído cerca de 4,3 milhões de
unidades novas no período de existência do BNH (1964-1986). O destaque a esse
desempenho é praticamente consensual na literatura sobre esse tema, como afirma Santos
(1999), ao mostrar que, no período de auge do SFH (1976 a 1982), foi financiado em torno de
400 mil habitações anualmente. Esses números também foram expressivos no estado da
Paraíba, no entanto, concentraram-se na capital (João Pessoa), em que foi construído, entre os
anos de 1968 e 1983, um total de 17.965 unidades habitacionais (ARAÚJO, 2006; LAVIERI
e LAVIERI, 1999). Em outras cidades, a produção habitacional teve números bem inferiores
para o mesmo período, como Campina Grande que, somente na década de 1980, teve o
primeiro conjunto habitacional construído pela CEHAP (MAIA, 2010), e Patos, que teve dois
conjuntos propostos e construídos pela CEHAP - o primeiro, em 1967, o Conjunto Noé
64
Trajano, que dispunha de 305 unidades habitacionais, e o segundo, em 1982, o Conjunto
Bivar Olinto, com 400 unidades23
(Figura 03).
Figura 03: Localização do Conjunto Bivar Olinto (1), construído em 1982, e do Conjunto Noé Trajano (2),
concluído no início dos anos de 1970. Imagens: Google Earth, 2014. Fonte: CEHAP - Elaboração Própria
Ainda no período de vigência do SFH, na cidade de Patos, foram construídas 81
casas, financiadas pelo Programa denominado de Financiamento para Construção Ampliação
e Melhoria (FICAM), e outras financiadas também pelo Instituto de Previdência do Estado da
Paraíba (IPEP). Contudo, o grande problema está no fato de que, do total de unidades
habitacionais que foram produzidas no período de vigência do BNH, em escala nacional,
23
Dados fornecidos pela CEHAP.
1 2
65
somente 33%24foram destinadas às habitações de interesse social, segundo revela Cláudio
Santos (1999). Além disso, se considerarmos que os financiamentos para esse tipo de
habitação, a partir de 1975, realizados pelas Companhias de Habitação Popular – as COHABS
- atingiram e até priorizaram as famílias de faixa de renda entre três e cinco salários mínimos,
esse percentual seria ainda menor. Diante disso, Villaça (1986) considera a expressão
“interesse social”, utilizada para as habitações financiadas pelas COHABS, de um eufemismo
utilizado pelo BNH que, de forma alguma, deve ser entendido como habitação para as
camadas de mais baixa renda.
Portanto, apesar de a produção habitacional, nesse período, ter sido
quantitativamente expressiva, ela esteve muito distante das necessidades geradas pelo
acelerado processo de urbanização pelo qual passou o país, na segunda metade do Século XX,
e que acentuou os inúmeros problemas urbanos. Segundo Bonduki (2008), a população
urbana brasileira que vivia em cidades com mais de 20 mil habitantes passou de 11 para 125
milhões. Apesar de o BNH ter financiado 25% do total de habitações construídas no país,
entre 1964 e 1986, essa produção foi insuficiente frente aos desafios que se faziam presentes
nesse processo de urbanização. Além disso, percebemos que, mesmo atuando numa
conjuntura em que se buscava a desconcentração de investimentos em nível nacional, a
produção habitacional pelo BNH concentrava-se nas metrópoles e nas grandes cidades, como
na Paraíba. O autor destaca que um dos grandes equívocos
foi voltar todos os recursos para a produção da casa própria, construída pelo
sistema formal da construção civil, sem ter estruturado qualquer ação
significativa para apoiar, do ponto de vista técnico, financeiro, urbano e
administrativo, a produção de moradias ou urbanização por processos
alternativos, que incorporasse por esforço próprio e capacidade organizativa
da comunidade. (BONDUKI, 2008, p. 74)
Como consequência, grande parte da população, principalmente a que estava com os
mais baixos níveis de renda, recorreu à produção informal de moradias, através da
autoconstrução em assentamentos urbanos precários, loteamentos ilegais, favelas, vilas etc.,
que se encontravam, geralmente, distantes das áreas onde havia infraestrutura e serviços
urbanos. Além disso, em pouco tempo de atuação, o BNH passou a exigir a comprovação de
uma renda de três salários mínimos, o que era uma medida excludente, segundo Martins
24
Apesar de alguns autores divergirem desse percentual, como Azevedo e Andrade (1982), que registram 35%, a
diferença entre eles não é tão relevante a ponto de provocar divergências também nas conclusões às quais esse
dado conduz.
66
(2007), já que deixava à margem a população que não estava inserida no mercado formal de
trabalho.
Outro elemento que também é importante ser observado diz respeito à localização
dos conjuntos habitacionais que foram financiados pelo BNH. Maia (2010) afirma que o
Estado foi agente ativo no processo de periferização, característico da maior parte das cidades
brasileiras nesse período, não só através da construção de conjuntos habitacionais, como
também com aplicações do BNH direcionadas à estruturação do espaço urbano, investindo
nos serviços de saneamento e transporte, em equipamentos urbanos etc. Essa intervenção do
BNH na política urbana, principalmente na década de 1970, resultou das incisivas críticas
direcionadas ao banco por não ter se preocupado, em seus primeiros anos de atuação, em
dotar os conjuntos habitacionais da infraestrutura mínima necessária para o uso das
habitações. Contudo, é fato que essa interferência acentuou ainda mais a desigualdade
socioespacial, já que ocorria de modo seletivo, induzindo a valorização de algumas áreas em
detrimentos de outras, o que, segundo Araújo (2006, p. 64), evidencia um “modelo
concentrado e excludente, típico da seletividade e da valorização dos diferentes espaços
intraurbanos pelo capital, sobretudo pelo capital imobiliário”. Essa autora assegura que “a
intervenção do Estado tem sido [ao longo dos tempos] decisiva no processo de crescimento
urbano, especialmente no que diz respeito ao processo de periferização planejada” (ARAÚJO,
2006, p. 65, grifo nosso). Assim o foi em João Pessoa25
, Campina Grande26
, Patos, bem como
em cidades paraibanas de porte menor, como Sousa e Cajazeiras27
.
Os resultados obtidos por essa política habitacional, empreendida através do
SFH/BNH, e suas implicações socioespaciais, mostram a nítida contradição com os diversos
objetivos a que se propunha. Se, de um lado, se buscavam “atacar os problemas sociais”,
como o déficit habitacional e seus efeitos, mesmo que fosse para amenizar as tensões sociais
oriundas deles, de outro, não se escondiam os interesses de mercado aos quais essa política
iria atender. Esse fato característico é denominado por Milton Santos (1993, p. 95) de
urbanização corporativa, “empreendida sob o comando dos interesses das grandes firmas”.
Não por acaso, Villaça (1986), Andrade e Azevedo (1982) mostram que, além da
“estabilidade social”, os outros efeitos perseguidos pelos governos da época eram a geração
de emprego e, principalmente, a mobilização da construção civil através de escritórios de
engenharia, de planejamento, de projetos, de arquitetura, das firmas e da indústria da
25
Araújo (2006) 26
Maia (2010), Lima (2010). 27
Em pesquisa documental, constatamos que, nessas cidades, também foram construídos conjuntos habitacionais
através da CEHAP.
67
construção civil, com o intuito de dinamizar a economia do país e atenuar a crise econômica.
Assim, não é difícil identificar os objetivos que foram priorizados, pois a estratégia do BNH
beneficiou a construção civil, que pôde contar com uma fonte de financiamento estável para a
produção de unidades prontas, contudo, pouco contribuiu para enfrentar o problema que o
órgão se propunha a resolver (BONDUKI, 2008). Como afirma Martins (2007, p. 42), “o
Estado vendeu uma utopia, evitando a redistribuição de renda e desviando a direção da tensão
social dos verdadeiros problemas sociais”.
Sabemos que esse estímulo ao setor da construção civil favorecia muito mais ao
mercado formal de produção habitacional do que à população que necessitava dessas
habitações. Some-se a isso a busca pela dinamização da economia e do consequente
crescimento dessa e o fato de a Política Habitacional da época não viabilizar rumos muito
diferentes para aqueles que mais necessitavam de uma moradia. Além disso, é preciso pensar
que uma política desse tipo surtia efeitos diretos e indiretos no mercado imobiliário e que,
nessa “corrida” pela ocupação do solo urbano, diante do vertiginoso crescimento
populacional, anteriormente citado, os investidores desse setor se apropriavam das áreas mais
bem servidas de infraestrutura e equipamento urbanos. Assim, o que restava à maior parte da
população era ocupar as áreas carentes de serviços e infraestrutura básicos e obter a casa
própria através do mercado informal. Essa relação de causa e efeito nos remete à afirmação de
Bastos (2012, p. 13) de que o mercado formal e o informal se retroalimentam no processo de
acumulação capitalista.
Entendemos que, além dos efeitos diretos da atuação do SFH e do BNH, no que diz
respeito aos financiamentos que, segundo Bonduki (2008), excluiu parcelas significativas da
população de mais baixa renda, e à construção das habitações uniformizadas, padronizadas e
localizadas em imensos conjuntos na periferia, que induziam ao processo de periferização,
também há aqueles que se dissimularam nos processos e na atuação dos agentes neles
envolvidos, como a especulação promovida pelo mercado imobiliário, por exemplo. Assim,
Santos (1993) enfatiza que,
[...] havendo especulação, há criação mercantil da escassez e o problema do
acesso à terra e à habitação se acentua. Mas o déficit de residências também
leva à especulação e os dois juntos conduzem à periferização da população
mais pobre e, de novo ao aumento do tamanho urbano. As carências em
serviços alimentam a especulação, pela valorização diferencial das diversas
frações do território urbano. A organização dos transportes obedece a essa
lógica e torna ainda mais pobres os que devem viver longe dos centros, não
apenas porque devem pagar caro seus deslocamentos como porque os
serviços e bens são mais dispendiosos nas periferias. (SANTOS, 1993, p. 96)
68
Portanto, concordamos com Santos (1994, p. 101), ao afirmar que há, “em todos os
casos, uma relação dialética entre o Estado e o mercado”. Nessa relação, entendemos que ora
o Estado age para surtir efeito no mercado ora para lidar com os efeitos de sua ação.
Nessa perspectiva, foram criados e implantados Programas como o Projeto de
Comunidades Urbanas de Recuperação Acelerada – CURA – que, através de medidas fiscais,
de planejamento e programas de obras, buscava reduzir os custos com serviços urbanos
onerados pela rápida expansão da malha das cidades, consequente da enorme quantidade de
grandes conjuntos habitacionais, localizados predominantemente em áreas periféricas bastante
afastadas e da presença de vazios urbanos que constituíam “bancos de terra” à espera da
valorização imobiliária. Diante do exposto, discutiremos, a seguir, sobre a configuração
desses programas e buscaremos entender como a cidade de Patos foi alvo deles.
1.4.1 O Projeto de Comunidade Urbana de Recuperação Acelerada (CURA) e os
Programas Específicos para as Cidades de Porte Médio na cidade de Patos/PB
Devido à falta de infraestrutura nas áreas de expansão das cidades, principalmente
onde se localizavam os conjuntos habitacionais de interesse social28, foram criados, a partir de
1967, muitos programas, com o objetivo de sanar esse problema. Programas como o de
Financiamento de Material de Construção (Fimaco) e o de Financiamento para o Saneamento
(Finansa) foram alguns deles, o que já indicava os primeiros passos do BNH, no sentido de
entrar efetivamente na política de desenvolvimento urbano. De acordo com Andrade e
Azevedo (1982, p. 64), esses programas foram justificados não porque o BNH desejasse
expandir suas atividades ou porque julgasse ineficiente financiar a construção de casas sem
que os governos estaduais tivessem recursos para dotá-las de instalação de água e saneamento
adequados. Segundo os autores, o BNH tinha necessidade de fazer girar o seu dinheiro, o que
o levou ansiosamente a procurar novos programas.
Além do Fimaco e do Finansa (embrião do Plano Nacional de Saneamento – Planasa,
criado em 1970), outro Programa que teve grande repercussão nacional e que veio se somar
aos demais programas de “atividades urbanas” desenvolvidas pelo BNH foi o Programa de
Comunidade Urbana para Recuperação Acelerada – CURA - criado e proposto pelo arquiteto
e urbanista Harry Cole, em 1972. O CURA tinha os objetivos de eliminar a capacidade ociosa
28
Esses conjuntos passavam por um rápido processo de deterioração exatamente por causa dessa ausência de
infraestrutura.
69
de investimentos urbanos, ou seja, a formação de vazios urbanos para especulação
imobiliária; racionalizar investimentos de infraestrutura, para controlar melhor os gastos
públicos; promover o adensamento da população urbana, para evitar a expansão desmedida da
malha urbana das cidades e integrar a execução de obras urbanas. De acordo com Lucchese
(2009), o criador do programa defendia que o que importava era o planejamento físico, cujo
objetivo seria de analisar um território delimitado no interior de uma cidade, com o intuito de
identificar suas carências, a capacidade de endividamento da população e realizar obras que
fossem compatíveis com essa capacidade de endividamento, para melhorar os aspectos
urbanísticos e comunitários daquele território.
Portanto, observamos um claro distanciamento entre a proposta do programa e as
reais demandas sociais que se faziam presentes na época, já que, em seu processo de
implantação, um fator a ser considerado seria a capacidade de endividamento da população,
mas que, contraditoriamente, as parcelas que mais necessitavam de serviços urbanos e
infraestrutura eram exatamente as de menor faixa de renda.
Embora, na década de 1970, a cidade de Patos tenha sido alvo de obras de
urbanização com fundos municipais, estaduais e federais, como vimos nos Projetos de Lei
elaborados nessa época, foi somente nos anos de 1980 que, juntamente com as cidades de
Sousa e Guarabira, Patos foi escolhida para a implantação de Projetos-cura, quando João
Pessoa, Campina Grande e Cajazeiras já haviam implantado esses projetos. Nesses períodos,
identificamos uma enorme preocupação em se ordenar o espaço urbano da cidade e de se
promover atividades que evitassem a migração da população local que, apesar de ter crescido
nessas duas décadas, apresentava índices de emigração que preocupavam os poderes locais.
Não por acaso, o Projeto de Lei nº 08/ 80, que tinha o objetivo de autorizar a instalação em
Patos de uma fábrica de refrigerantes com matriz em Fortaleza, traz, em sua justificativa, um
trecho que menciona a preocupação com os processos migratórios da população local:
Patos necessita fundamentalmente de investimentos que formem uma
camada de retenção do expressivo potencial de mão-de-obra em plena
capacidade produtiva, que se dilui cotidianamente e, é escoado de forma
migratória. Ao longo do período dessa gestão, tenho bateado
incansavelmente na busca de um tipo de ouro que venha satisfazer largas
escalas da população patoense. Inegável que é o melhor metal é a
implantação de fábricas, e a primeira a procurar aqui instalar-se, (Fortaleza
Refrigerantes S.A) significará para 300 famílias, substancial melhoria no seu
poder aquisitivo.
70
Claro que essa preocupação também fazia parte da política de desenvolvimento
regional do II PND, que desenvolvia programas específicos como os voltados para as cidades
de porte médio e cujo intuito era de conter os movimentos migratórios para os grandes
centros. No Sudeste, induziu-se a descentralização das atividades produtivas das regiões
metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro para centros de porte médio e se propôs a
desconcentração intrar-regional. Nesse sentido, atuavam os núcleos urbanos com mais de 50
mil habitantes. No Sul, priorizavam-se os centros que também tinham essa faixa populacional.
No Norte e no Centro-oeste, dinamizaram-se as funções urbanas das capitais estaduais e de
outras cidades estrategicamente selecionadas, e no Nordeste, priorizaram-se o crescimento das
atividades produtivas e o melhoramento da infraestrutura e dos equipamentos sociais, tanto
nas capitais estaduais quanto nos polos secundários regionais, e dinamizaram-se os “núcleos
urbanos regionais que exercessem ou viessem a exercer funções de polarização do
desenvolvimento regional” (STEINBERGER E BRUNA, 2001, p. 44).
Algo importante a ser ressaltado é que, de acordo com Amorim Filho e Serra (2001,
p. 19), além das funções de contenção dos fluxos demográficos, de dinamização da economia
em nível micro e macrorregional e da integração em nível nacional, entre outras funções,
essas cidades assumiam, como ainda hoje assumem, um papel muito importante no processo
de acumulação capitalista, como “válvulas de desconcentração” para diminuir o mau
funcionamento do modo de produção capitalista. David Harvey (2005), em seu livro, “A
produção capitalista do espaço”, afirma que, principalmente em épocas de crise, o modo de
produção capitalista usa como estratégia a reconstrução de espaços e/ou a “expansão
geográfica” para se manter, criando novos modos de vida e padrões de consumo que se
reproduzem a partir das novas “necessidades” produzidas pelo capital. Tendo em vista essa
concepção, podemos entender as cidades-alvo desses Programas como espaços capazes de
proporcionar a expansão geográfica da qual o capital necessita para sua acumulação.
No Brasil, oficialmente, só foram elaborados dois projetos desenvolvidos
especificamente para as cidades de porte médio. Um deles foi denominado de CPM/normal,
que direcionou recursos para cidades de todos os estados do Nordeste. No caso da Paraíba, as
cidades que foram alvos desse primeiro Projeto foram Bayeux, Cajazeiras, João Pessoa, Sousa
e Patos. O outro, denominado de CPM/bird, tinha um prazo de duração de cinco anos, e seria
concluído em 1985, embora tenha se estendido até 1986 (STENBIERG e BRUNA, 2001).
Esse, por sua vez, compreendia um total de 996 projetos de investimentos que eram dirigidos
considerando-se três critérios: emprego e renda, infraestrutura urbana e comunitária e
71
administração municipal. Em relação a esse segundo projeto (o CPM/Bird), não obtivemos
fontes que indicassem a participação de cidades paraibanas nele.
De acordo com Steinberger e Bruna (2001, p. 52), “os dois Programas pretendiam
localizar equipamentos terciários de alcance regional e oferecer incentivos, a fim de atrair
capitais industriais para as cidades selecionadas”. Concomitantemente se pretendia intervir em
escala intraurbana nas áreas carentes de tais cidades, supondo-se que haveria uma
redistribuição de renda. Também se preparavam as administrações locais para orientar o
crescimento físico-territorial e ser mais eficiente na prestação de serviços urbanos, fornecendo
às prefeituras assistência técnica e garantindo-lhes condições de se autogerenciar.
As autoras mostram que, para selecionar as cidades beneficiadas com o Programa em
questão, as superintendências regionais, junto com os estados, elaboravam estudos de
caracterização das respectivas redes funcionais urbanas para “indicar cidades de segundo
escalão” com potencial para integrar o programa. Tais estudos eram seguidos de discussões
para compatibilizar objetivos federais, regionais e estaduais.
Ainda segundo Steinberger e Bruna (op. cit.), houve a preocupação por adequar os
critérios de seleção às condições socioeconômicas e ao estágio de urbanização. Dessa forma,
o Programa alcançou desde cidades com população inferior a 50 mil habitantes e grau de
urbanização em torno de 50%, até outras com escala populacional de 600 mil habitantes e
grau de urbanização superior a 90%. Contudo, apesar de as autoras mencionarem a
participação da cidade de Patos nos referidos projetos voltados para as cidades de porte
médio, na análise dos Projetos de Lei do Executivo, do período em que esses Programas
foram implantados, não encontramos referência a alguma tentativa do governo federal de
fazer convênio com o Município, no que diz respeito aos Programas. Assim, nas fontes em
que nos baseamos, não há como identificar se houve alguma participação do governo local
nesse projeto e sua efetiva implantação na cidade.
No que concerne ao CURA, constatamos que, no ano de 1983, através do Projeto de
Lei nº 29, instituído como a Lei nº 2.443/ 83, o Poder Executivo do Município de Patos foi
autorizado a negociar com o BNH a abertura de um crédito de 200.000 UPC29 que seriam
destinados a obras de infraestrutura em bairros definidos pelo próprio BNH. Na justificativa
anexada ao projeto, segue o seguinte texto:
29
Andrade e Azevedo explicam de que se trata a UPC da seguinte maneira: A tradução operacional da correção
monetária para o Sistema Financeiro da Habitação é feita através da Unidade Padrão de Capital (UPC), uma
unidade monetária de poder aquisitivo constante, cujo valor expresso em cruzeiros é atualizado monetariamente
a cada trimestre civil, na mesma proporção da variação do Indicador de Preços, apurado pela Fundação Getúlio
Vargas. O processo é idêntico ao utilizado para calcular as chamadas Obrigações Reajustáveis do Tesouro
Nacional (ORTN). Uma UPC, a moeda oficial do BNH, equivale, em valor, a uma ORTN.
72
Tendo em vista a falta de infra-estrutura reinante em bairros de nossa cidade,
tencionamos proporcionar a essas populações mais carentes, melhores
condições no tocante à saúde e higiene. Não dispondo a Edilidade, no
presente momento, de recursos para fazer face a essas despesas a serem
efetuadas de imediato, pleiteamos através do BANCO NACIONAL DE
HABITAÇÃO (BNH), uma abertura de crédito no valor de 200.000,00
(duzentos mil) UPC, no denominado “PROJETO CURA”, recursos esses,
que serão destinados à aplicação em um ou mais bairros da cidade, a serem
escolhidos ou escolhido, pelo próprio BANCO NACIONAL DE
HABITAÇÃO (BNH), pois se conseguido como é de nosso desejo virá
trazer inúmeros benefícios principalmente à população mais pobre da cidade,
como sejam: construções de galerias, calçamento, creches, grupos escolares,
praças públicas e etc. Realizando tais obras, sentimo-nos felizes por
proporcionarmos ao povo mais humilde, melhores condições de vida dando-
lhes um bem estar à altura de suas necessidades. (Justificativa do Prefeito
Rivaldo Nóbrega Medeiros anexada ao Projeto de Lei 029 /83)
Em primeiro lugar, podemos supor que essa falta de infraestrutura de que trata o
texto pode ser explicada pela expansão da malha urbana da cidade, que apresenta áreas
periféricas distantes do centro, algumas circundadas de vazios urbanos na época (como
observamos no mapa 02), somadas ao aumento da população urbana desse período – que,
como observamos na tabela 01, foi de 18.916 habitantes entre as décadas de 1970 e 1980,
enquanto a população rural permaneceu praticamente a mesma. Além disso, é preciso
questionar se as obras do CURA para a cidade de Patos iriam mesmo beneficiar a população
de baixa renda. Vimos que Harry Cole considerava necessário avaliar não só as carências de
infraestrutura, mas também a capacidade de endividamento da população. Observamos
também que o(s) bairro(s) que receberiam as obras de infraestrutura era(m) escolhido(s) pelo
próprio BNH, que fazia um estudo das carências de todos os bairros da cidade, com o objetivo
de definir uma hierarquia para intervir. De acordo com Lucchese (2009), seriam atendidos,
primeiro, os bairros com menos carências onde o retorno dos recursos investimentos no bairro
seria mais rápido. Mas, como ocorreria esse retorno?
Um dos textos dos Projetos que analisamos (Anteprojeto30 de nº 014/ 83), referente à
implantação de um Projeto-cura em Patos, menciona que as ações de crédito mediante
convênio entre a Prefeitura Municipal de Patos e o BNH seriam contratadas de acordo com a
capacidade de pagamento do Município, e o Poder Executivo ficava autorizado a realizar
30
A menção somente ao anteprojeto foi devido ao fato de não termos encontrado o Projeto final durante a
pesquisa documental. Contudo, sabemos que o referido documento foi aprovado porque continha o carimbo de
aprovação.
73
essas operações com a garantia de qualquer item de sua receita, mais especificamente, o
Imposto Territorial Urbano que, nas áreas beneficiadas pela execução de Projetos-cura
aprovados e financiados pelo BNH, seria calculado tomando-se como base a alíquota de até
3% dos valores venais atribuídos a esses imóveis a partir do exercício de 1984. Também seria
calculado um acréscimo de 40% anual sobre essa alíquota. Esse acréscimo seria cumulativo,
aplicado durante cinco anos consecutivos, contados a partir do primeiro dia seguinte ao ano de
conclusão de 80% das obras financiadas. Assim, esse seria o mecanismo que a Prefeitura teria
para obter o retorno dos investimentos empreendidos e cumprir o pagamento das operações de
crédito realizadas com o BNH.
Podemos concluir que a população beneficiada pelas obras a serem realizadas seria a
de renda mais elevada ou, caso fosse uma população de menor faixa de renda, o governo
municipal não arrecadaria os recursos necessários para cobrir as operações de crédito
realizadas com o BNH. Outra conclusão possível seria de que essa população de menor renda
migraria para outras áreas da cidade onde a cobrança do imposto fosse menor, pois, como a
economia era marcada por uma alta inflação e baixos salários na década 1980, as condições
não eram favoráveis à população de baixa renda.
Como exemplo, no estado da Paraíba, podemos citar a cidade de João Pessoa, que,
segundo Lavieri e Lavieri (1999, p. 47), em apenas vinte anos – 1960/80 - passou a comportar
duas vezes o número de domicílios acumulados desde sua origem até 1960. Esse crescimento
correspondeu ao aumento das investidas do poder público na gestão do espaço urbano, entre
as quais se encontra a implantação do Projeto CURA. Na década de 1970, foram realizadas,
através desse projeto, obras nos bairros da orla - Manaíra, Cabo Branco e Tambaú - e no
Bairro Cristo Redentor, as que apresentavam elevado déficit de infraestrutura e equipamentos
urbanos. Esses investimentos acabaram atraindo a população de classe média e alta, que
migrou do centro tradicional para algumas dessas áreas localizadas na orla marítima, onde as
obras realizadas proporcionaram uma qualidade urbana desejada por essa população, que
podia arcar com os encargos tributários, e pelo insipiente mercado imobiliário (CASTRO,
2006). Andrade e Azevedo (1982, p. 65) destacam que os primeiros exemplos de aplicação
do Projeto sugerem que
a) poucas municipalidades terão condições de embarcar em programas
CURA plurianuais, como se supôs na “lógica” da política, pois o retorno dos
investimentos via tributação é duvidoso; b) os efeitos antiespeculativos são
também incertos, pois a recente valorização de terrenos nas grandes cidades
brasileiras – que seria com grande probabilidade, muito acrescida nas áreas
74
privilegiadas com o CURA – pode tornar bom negócio a retenção de lotes
para fins lucrativos: o provável aumento do imposto territorial, mesmo com
atualização cadastral e avaliação eficientes, seria ônus insignificante para o
especulador, diante do valor adquirido pelos lotes.
Apesar disso, os autores afirmam que, como são atraídas pela possibilidade de obter
recursos para a realização de obras, muitas prefeituras
[..] se veem levadas pelo BNH a aderirem ao Plano Nacional de Saneamento
(Planasa) como condição para ingressarem no projeto CURA. Esse requisito,
aliado às pesadas condições de financiamento que envolvem correção
monetária, tornam o CURA nem sempre vantajoso, especialmente para os
pequenos municípios, que não dispõe de base industrial de arrecadação.
(ANDRADE e AZEVEDO, 1982, p. 65)
Já vimos que foi no âmbito da onda de planejamento urbano disseminado pelos
Planos de Desenvolvimento Integrado (os PDI), na década de 1970, que o Poder Executivo do
Município de Patos elaborou inúmeros Projetos de Lei com vistas a obter os créditos
subsidiados para obras de urbanização e que, em 1983, foram aprovados projetos para a
implantação do CURA. Contudo, descobrimos que essas “pesadas condições de
financiamento que envolvem a correção monetária” 31, de que tratam os autores supracitados,
fizeram com que os projetos não fossem efetivamente implantados na cidade de Patos.
Podemos confirmar esse fato no texto da justificativa anexada ao Projeto de Lei 018 /86 (Lei
nº 1.596/ 86):
Os nobres vereadores são sabedores que as Velhas Repúblicas com
indexação da economia, estabelecimentos de vários parâmetros como moeda
e, principalmente, a implantação da extorsiva correção monetária, frustrou
vários empreendimentos, tanto no setor privado, como em obras públicas. A
correção, implacavelmente, alimentada mensalmente por uma espiral
inflacionária sufocante, inviabiliza a atividade do homem e seus
empreendimentos em forma de obras. Não foi sem motivo que esse Augusto
Poder em idos passados por bem entender a correção como intolerável e a
inflação como incontrolável, não atendeu os apelos para o projeto cura.
(Justificativa anexada ao Projeto de Lei 018 /86 – Lei nº 1.596/ 86 –
escrita pelo Prefeito Rivaldo Nóbrega Medeiros, 24 de abril de 1986, grifo
nosso).
31
Martins (2007) destaca que o mecanismo de correção monetária visava assegurar a não desvalorização dos
empréstimos realizados pelo BNH perante o processo inflacionário. Como, segundo o autor, esse mecanismo foi
aplicado em quase todos os ramos de atividades, negócios e contratos que envolvessem dívidas, com o Projeto
CURA não foi diferente.
75
Assim, constatamos que o Projeto CURA não foi um dos vetores do crescimento das
áreas de expansão da cidade de Patos, como o foi no caso de João Pessoa, onde o Programa
(entre outros investimentos) foi um grande vetor de seu processo de expansão urbana
(CASTRO, 2006). Contudo, consideramos de suma importância essa compreensão, no sentido
de nos fazer entender como cidades do mesmo porte de Patos eram o alvo da política urbana e
habitacional vigente na época e quais as possibilidades reais existentes para que essas cidades
os recebessem, além de contribuir para entendermos que elementos fizeram parte, ou não, na
produção de seus espaços urbanos.
Percebemos que, assim como o foi na maioria das cidades brasileiras e em cidades
paraibanas, o Estado foi (e veremos que ainda tem sido) um grande agente do par
urbanização/periferização, como ressalta Araújo (2006). Assim, apesar de o CURA não ter
sido implantado efetivamente na cidade de Patos, sabemos que os dois conjuntos
habitacionais construídos na cidade, a implantação de infraestruturas em determinadas áreas, a
construção do contorno viário para a BR-230 e a delimitação de zonas funcionais, incluindo o
distrito industrial, foram fatores que intensificaram o processo de expansão urbana da cidade
de Patos. Contudo, vale salientar que, com o fim do BNH em 1986, o processo de
periferização se intensificou ainda mais com as ocupações irregulares e o aumento do número
de loteamentos ilegais e de favelas.
1.5 A Política habitacional Pós-BNH
Com a recessão econômica, a inflação, a elevação dos índices de desemprego e a
queda dos níveis salariais que marcaram as décadas de 1980, principalmente a de 1990, houve
uma redução na capacidade de financiamentos habitacionais, uma interrupção das políticas
públicas federais por parte do governo federal e uma diminuição de investimentos do
mercado. Foi nesse contexto e nessa conjuntura política e econômica em que o Ministério de
Habitação e Desenvolvimento Urbano – MHU - decidiu não dar mais continuidade aos
Programas voltados para as cidades de porte médio e em que o BNH foi extinto (em 1986).
As atribuições do BNH foram transferidas para a Caixa Econômica Federal (CEF), sobretudo
no que diz respeito ao que Carrion (1990) chama de “segmento popular do mercado”. A partir
de então, seguiu uma maratona de reformulações nos órgãos responsáveis pela questão urbana
e habitacional que não obteve êxito.
76
Considerando a contextualização feita por Cláudio Santos (1999) e Bonduki (2008),
podemos dividir em três momentos o período que se estende do fim do BNH à reestruturação
de uma política de habitação em nível nacional, a saber:
a) O primeiro momento (1986-1989) foi marcado pela progressiva transferência de
atribuições do governo federal para os estados e os municípios, cujas ações ocorreram através
de programas habitacionais com fontes alternativas, particularmente os recursos
orçamentários, embora ainda houvesse empreendimentos de programas por parte do governo
federal. Nesse período, segundo Santos (1999), destacou-se o Programa Nacional de Mutirões
Comunitários;
b) O segundo momento (1990-1994) foi marcado por dois governos: o de Collor, em
que houve a desvinculação dos programas habitacionais com os programas de saneamento e
desenvolvimento urbano (relação essa que já era bastante frágil), bem como acusações de
corrupção na gestão dos recursos destinados a esse programa, e o de Itamar Franco, em que os
programas de habitação popular foram “redesenhados e passaram a exigir a participação de
conselhos com participação comunitária dos governos locais e uma contrapartida financeira
desses últimos aos investimentos da União” (SANTOS, 1999, p. 21). Nesse contexto,
destacam-se os programas Habitar-Brasil e o Morar-Município;
c) O terceiro e último momento (1995-2003) foi o do governo de Fernando Henrique
Cardoso, em que ocorreu uma retomada dos financiamentos, com base nos recursos do FGTS
para habitação e saneamento. Também foram criados os programas Carta de Crédito, Pró-
moradia (que permaneceram no início do governo Lula) e o Programa de Arrendamento
Residencial (PAR). Contudo, Bonduki (2008) afirma que se manteve, ou até mesmo se
acentuou a característica de privilegiar as camadas de renda média ao mostrar que, em todo o
período do governo FHC, 78,84% do total de recursos foram destinados às famílias com renda
superior a cinco salários mínimos, e apenas 8,47% foram destinados à população de
baixíssima renda, parcela em que se concentra a maior parte da demanda habitacional.
Com efeito, o quadro econômico que marcou o país, nesses três períodos, dificultava
a disponibilidade de recursos por parte do governo federal para as demais esferas de poder.
Por isso, os municípios com uma baixa arrecadação tributária e poucas fontes alternativas de
recursos, como era o caso de Patos, tinham chances mínimas de dar continuidade a uma
política de habitação e/ou de obras de urbanização. Apesar das críticas que muitos,
principalmente pesquisadores do tema, fizeram ao BNH, Bonduki (2008, p. 75) reconhece
que,
77
[...] com o fim do BNH, perdeu-se uma estrutura de caráter nacional que,
mal ou bem, tinha acumulado enorme experiência na área, formado técnicos
e financiado a maior produção habitacional da história do país. [...] Na
redemocratização, ao invés de uma transformação, ocorreu um esvaziamento
e pode-se dizer que deixou propriamente de existir uma política nacional de
habitação. Entre a extinção do BNH (1986) [...] e a criação do Ministério das
Cidades (2003), o setor do governo federal responsável pela gestão da
política habitacional esteve subordinado a sete ministérios ou estruturas
administrativas diferentes, caracterizando descontinuidade e ausência de
estratégia para enfrentar o problema.
No caso da cidade de Patos, no pós-BNH, quase não existiram obras de urbanização
e habitação advindas da iniciativa do governo do município que fossem realizadas
efetivamente na cidade. Com o seu crescimento populacional, principalmente a população
urbana, e com a rápida expansão de sua malha urbana, os problemas relacionados à habitação
e à infraestrutura se agravaram ainda mais, como podemos observar em inúmeras
justificativas de Projetos de Lei, que foram elaboradas na época, na tentativa de conseguir
empréstimos para a realização de algumas poucas obras. Em uma dessas justificativas,
constava o seguinte texto:
[...] a nossa cidade a exemplo do que ocorre com a quase totalidade das
cidades brasileiras, se ressente da carência de imóveis residenciais, problema
que se agrava a cada dia, em decorrência, principalmente, do grande êxodo
rural causado pela falta de assistência aos agricultores, os quais, se veem
forçados a fugir para a cidade, aumentando ainda mais o grave problema
social já existente pela falta de moradia. Os nossos governantes, tanto na
esfera federal quanto na estadual, pouco têm feito para minorar esse grave
problema. (trecho de mensagem anexada ao anteprojeto nº 42/ 90, assinada
pela prefeita Geralda Freire Medeiros).
Em nível do governo estadual, houve apenas as iniciativas de construir os Conjuntos
Nova Conquista, através da FAC; Vila Mariana, através da CEHAP, além dos financiamentos
de casas pelo Instituto de Previdência do Estado da Paraíba – IPEP. Porém, em decorrência da
crescente demanda, da ausência de recursos advindos da União e de programas de iniciativa
municipal, restava à população de mais baixa renda ocupar ilegalmente a periferia da cidade,
que dispunha de terrenos que, até então, não se encontravam como “bancos de reserva” para a
especulação imobiliária. Assim, surgiram e cresceram ocupações nas imediações dos
conjuntos habitacionais já construídos, como foi o caso da “Vila Teimosa” (localizada ao lado
78
do Conjunto Bivar Olinto, construído em 1982), que recebeu esse nome exatamente por todo
o processo de ocupação e pelos conflitos que ocorreram32
; as habitações construídas ao lado
do “Mutirão” (Conj. Nova Conquista) e as ocupações em áreas ainda mais distantes, como o
Alto da Tubiba, Sete Casas, “Placas”, nas imediações do Matadouro Municipal, no “Morro”,
entre outras áreas.
Analisando os Projetos de Lei desse período, observamos que, exceto as obras
realizadas de forma pontual, a maioria das áreas onde se localizavam esses conjuntos e essas
ocupações atravessou toda a década de 1990, enfrentando sérios problemas referentes à
ausência de infraestrutura e de oferta de serviços como abastecimento de água, atendimento
médico e transporte público (a proposta de instalação de um sistema de transporte público na
cidade só foi realizada, pela primeira vez, no ano de 1994). Vale ressaltar que, ainda hoje,
essas áreas são caracterizadas por esses mesmos problemas.
A partir de meados dos anos 2000, as ações do Governo Municipal de Patos, em
parceria com os governos estadual e federal, têm sido mais enfáticas no que diz respeito à
política habitacional. Foram construídas casas pelo Pró-Moradia33 (o Conjunto Geralda
Medeiros), em parceria com a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), que substituíram as
casas de taipa pelas de alvenaria, em combate à transmissão da doença de Chagas; e, mais
recentemente, conjuntos habitacionais, através do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC) e do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), além da regularização fundiária
em algumas áreas de ocupação irregular. Contudo, apesar de o município ir captando cada vez
mais recursos destinados à problemática habitacional, seus efeitos na (re) produção de seu
espaço urbano, particularmente no processo de periferização, não têm diferido muito dos
períodos analisados. Aprofundaremos essa questão no próximo capítulo.
Vimos até aqui que a política habitacional e urbana, vigente durante toda a existência
do BNH e do SFH, se preocupou com o problema habitacional no aspecto quantitativo,
induzindo e intensificando os processos de periferização em quase todas as cidades brasileiras
em que se produzia uma periferia carente de infraestrutura e serviços básicos, em detrimento
dos interesses do mercado imobiliário e acentuando, consequentemente, as desigualdades
socioespaciais.
32
Em conversa informal com o atual Gerente Externo de Regularização Fundiária da CEHAP, obtivemos
conhecimento desses conflitos. 33
Segundo Bonduki (2008), o Pró-Moradia foi criado ainda no governo FHC, e permaneceu no Governo Lula. A
princípio seu foco era a urbanização de assentamentos precários. De acordo com informações disponibilizadas
no site <http://www.fgts.gov.br/programa_promoradia.asp>, o programa, atende atualmente às seguintes
modalidades: urbanização e regularização de assentamentos precários; produção de conjuntos habitacionais e
desenvolvimento institucional. Os recursos para o programa advêm do FGTS.
79
Como já referido, o BNH teve êxito no aspecto quantitativo, mas deixou à margem
grande parcela da população que não possuía meios de obter, através do meio formal, a casa
própria, ou seja, não atendeu à real demanda habitacional do país. Além disso, contribuiu para
a (re) produção de cidades cada vez mais desiguais.
Acreditamos que, para não se produzirem efeitos indesejados, como os que
mencionamos, a política habitacional deve, antes de tudo, elucidar corretamente o problema a
que ela se detém. Para isso, não basta compreender a questão da habitação apenas como um
problema quantitativo, mas entender o que a casa representa em suas diversas dimensões -
econômicas, políticas, do trabalho, do cotidiano, do campo ideológico - ou seja, sobre como
garantir efetivamente o direito não só à moradia, mas também à cidade, considerando, nesse
contexto, as limitações que são impostas pela necessidade de reproduzir as relações sociais
tipicamente capitalistas. Conferimos, até aqui, uma vasta bibliografia que discorre sobre como
ocorreu a atuação do Estado frente ao problema habitacional e quais foram os seus efeitos na
produção das cidades brasileiras.
Atualmente, essas cidades têm passado por um novo momento de produção de seus
espaços, com a reelaboração da Política Nacional de Habitação (PNH), pensada e
reestruturada sob um novo marco jurídico até então inexistente no país, o Estatuto da Cidade
(o EC, criado em 2001), que, segundo Maricato (2010), trata de reunir, em um mesmo texto,
com uma visão holística, diversos aspectos relativos ao governo democrático da cidade, à
justiça urbana e ao equilíbrio ambiental.
Considerando que os documentos que dispõem do EC e da nova PNH ampliaram o
debate sobre como se constitui o problema habitacional, sentimos a necessidade de verificar a
coerência de programas como o PMCMV com os documentos referidos para analisar seus
efeitos socioespaciais. Justificamos essa necessidade pelo fato de esses serem programas que
têm tido ampla repercussão nacional, tanto nos aspectos sociais e econômicos quanto no
próprio processo de urbanização. Nessa perspectiva, alguns estudos recém-divulgados pelo
Observatório das Metrópoles (CARDOSO, 2013) têm apresentado diferenças no desempenho
do PMCMV entre as especificidades intraurbanas, particularmente no que se refere à relação
centro e periferia, e as diferenças entre as próprias metrópoles.
Para esses estudos, um dos elementos fundamentais nas análises é a localização dos
empreendimentos dos conjuntos habitacionais. Contudo, sabemos que, para perceber os
efeitos socioespaciais da atual política habitacional em nível nacional e, no caso dessa
pesquisa, em nível local, Patos-PB, é preciso ter em vista, também, elementos que outrora
foram mencionados para analisar a atuação do BNH, como os aspectos quantitativos e
80
qualitativos desses empreendimentos. Além disso, precisamos considerar os fatores externos,
ou seja, o contexto social, político e econômico, além da relação com outras políticas, como
também os fatores internos no que diz respeito ao planejamento e à execução da política
pública. Por último, devemos lembrar que, nesses processos, não atua somente o Estado, mas
também diversos outros agentes, como o capital fundiário e imobiliário, os mutuários e até
mesmo a parte da população que não é atendida diretamente, porque, ao buscar alternativas
para atender às suas necessidades de moradia, produz outros espaços na cidade, além dos
previstos pelo Estado, entrando na lógica do formal e informal se retroalimentando. Todos
esses processos e essas relações não se dissociam, eles são intrínsecos e produzem um espaço
que contém as contradições inerentes a esses mesmos processos e relações, que formam um
todo social complexo.
Nesse movimento, optamos por analisar a produção do espaço sob a ação do Estado,
através da política habitacional, por entender que, segundo Lefebvre (2008), o habitar se
reduz ao habitat em nome de uma prática baseada na burocracia estatista e no ordenamento do
espaço, segundo as exigências do modo de produção capitalista, ou seja, da reprodução das
relações de produção.
Acreditamos que as discussões até aqui empreendidas sobre a atuação do SFH/BNH
e de seus efeitos nos espaços urbanos das cidades brasileiras e da cidade de Patos nos
forneceram elementos que servem de parâmetros para enxergá-lo e analisá-lo no âmbito da
atual política habitacional, cujo principal ícone tem sido o PMCMV.
81
CAPÍTULO 2 DETERMINAÇÕES POLÍTICAS E ECONÔMICAS DO PMCMV:
UMA ANÁLISE ENTRE ESCALAS
Considerando o exposto no capítulo anterior, podemos antecipar que, entre a atuação
dos programas habitacionais implantados no âmbito do SFH/BNH e o PMCMV, há muitas
semelhanças e diferenças, referentes tanto ao contexto político e socioeconômico em que se
inseriram como, particularmente, no desenho dos programas, na implantação das estratégias,
no alcance territorial, quanto aos efeitos socioespaciais. A menção a essas semelhanças e
diferenças é feita com o intuito de entendermos a produção do espaço urbano nos dois
momentos, marcados por mais intervenção do Estado frente ao problema habitacional do país,
e as implicações decorrentes da política habitacional implantada nesses períodos. Destacam-
se, em especial, as mudanças ocorridas no processo de urbanização, em que os espaços não
metropolitanos assumem importante papel na expansão do capital imobiliário e na
implantação de uma política habitacional repleta de contradições.
Portanto, assim como fizemos na discussão sobre as políticas urbana e habitacional
no período do BNH, o enfoque principal deste capítulo são as implicações socioespaciais e
territoriais do PMCMV, com destaque do papel cada vez mais relevante das cidades médias
na configuração da atual política habitacional, como também enfatizando os efeitos na
produção do seu espaço intraurbano. Nessa discussão, inserimos os dados e as informações da
pesquisa que desenvolvemos na cidade de Patos, onde apenas dois conjuntos habitacionais
foram financiados pelo BNH, além de uma tentativa frustrada de implantar o projeto CURA, e
que, mais recentemente, adquiriu recursos para a elaboração do Plano Local de Habitação de
Interesse Social (PLHIS) e para a implantação de projetos financiados pelo Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC) e pelo PMCMV, com produção habitacional para famílias
de baixa renda nunca antes prevista na cidade.
Das semelhanças referidas entre os financiamentos do BNH e do PMCMV através da
CEF, destacamos que:
Nos dois momentos em que ambos foram criados, os programas habitacionais
surgiram com o intuito de atender às demandas econômicas do país, em que a
construção civil era o setor-chave para esse objetivo;
Tanto os financiamentos habitacionais, através do BNH, quanto os do PMCMV
fizeram/fazem parte de um momento de implantação de uma Política Nacional de
Habitação concomitante, mas efetivamente desvinculada das Políticas Urbana e
Fundiária;
82
O foco de ambos era, prioritariamente, a provisão de novas moradias, embora, na
década de 1970, a maioria dos financiamentos do BNH tenha sido direcionado para
obras de “desenvolvimento urbano”.
Quanto às diferenças, apontamos que:
O PMCMV foi criado e implantado em um momento em que o mercado imobiliário
tem passado por processo gradual de financeirização;
O volume de recursos (através de créditos e subsídios) mobilizados pelo PMCMV está
sendo bem superior aos que foram destinados pelo BNH. Além disso, enquanto no
SFH/BNH o agente promotor dos empreendimentos era o Estado, no PMCMV, o
agente promotor é o setor privado. Essas questões serão aprofundadas mais à frente;
Além das metrópoles, suas regiões metropolitanas e capitais estaduais, o programa
atual chega de forma quantitativamente mais expressiva nas cidades de menor porte.
Identificar essas semelhanças e diferenças é fundamental, porquanto nos possibilita
entender as implicações socioespaciais das mudanças sociais, políticas e econômicas que
ocorreram no decorrer do tempo e a permanência de práticas e estratégias dos diversos
agentes envolvidos nesses processos. Nesse sentido, direcionamos a discussão proposta para
este capítulo – a de entender a repercussão do PMCMV na produção da cidade a partir da
atuação do Estado, considerando a articulação entre suas esferas de poder (federal, estadual e
municipal) e, por conseguinte, seu rebatimento espacial em diversas escalas.
2.1 Da articulação de escalas espaciais à produção do espaço intraurbano: a criação e a
implantação do PMCMV
Já elucidamos que esta pesquisa foi concebida à luz do debate sobre produção do
espaço urbano e que nosso foco é a ação do Estado como produtor desse espaço através da
política habitacional. Sendo assim, partimos de uma das propostas elaboradas por Corrêa
(2011) para pesquisas que discutem sobre a relação entre os agentes sociais, as escalas e a
produção do espaço. Essa proposta se trata do estudo da ação (estratégias e práticas) de um
agente social em sua espacialidade. Sabemos que essa espacialidade é feita através da
articulação com outros agentes em diferentes escalas e, entre elas, o que traz à tona a escala
como uma forma de aproximação do real, como demonstra Castro (1992; 1995). Nesse
sentido, propusemo-nos a discutir brevemente sobre as concepções de escala nas quais nos
83
ancoramos sem, contudo, firmar o compromisso de esgotar essa discussão, ainda que carente
de reflexões por parte dos geógrafos, como destacam Corrêa (2011) e Castro (1992; 1995).
Para compreender como o PMCMV repercutiu nas diversas cidades brasileiras, em
especial, nas cidades médias, precisamos entender as sobreposições, as combinações e os
conflitos entre os interesses sociais, econômicos e políticos do Estado em suas diversas
esferas de poder. Não se trata, simplesmente, de ir mudando a escala, a partir da qual a
realização daqueles interesses vai sendo estudada, mas de entender como em sua articulação
produzem o espaço intraurbano. Sendo assim, evidenciamos que, do ponto de vista da ação do
Estado, através do PMCMV, faremos uma discussão partindo da articulação entre as diversas
escalas espaciais (local, regional, nacional, global) e que a análise da espacialidade dessa ação
se dará na perspectiva do espaço intraurbano como escala conceitual.
Segundo Corrêa (2011), a escala espacial é um traço fundamental da ação humana,
portanto, constitui parte integrante das práticas espaciais dos agentes sociais da produção do
espaço urbano, que se realizam em âmbitos espaciais limitados ou mais amplos, mas não
dissociados em si. Assim, esses agentes “atuam decisivamente na (re) produção e
transformação do espaço, fazendo isso em diversas escalas espaciais (a escala da habitação,
do bairro, a escala regional, nacional, global, etc.). Mais ainda, articulam essas escalas dando
coerência ao seu „espaço de atuação‟” (CORRÊA, op. cit, p. 43). Sabemos que essa
articulação ocorre, essencialmente, através das estratégias e das práticas dos agentes sociais e
se dá, consequentemente, nas circunstâncias em que elas se realizam, como, por exemplo,
quando o Estado age em momentos de crise internacional, restringindo gastos ou estimulando
determinados setores da economia através de instrumentos jurídicos, de isenção fiscal etc. ou
quando age para atender a demandas sociais se articulando com outros agentes sociais de
diversas instâncias políticas ou do mercado. Desse modo, queremos mostrar que a articulação
entre as diversas escalas espaciais nem sempre é explicitada ou evidenciada nos processos,
nos fenômenos ou na ação dos agentes, embora ela esteja sempre presente, como no caso da
criação e da implantação do PMCMV, que discutiremos mais adiante.
As escalas conceituais (espaço intraurbano e rede urbana) dizem respeito às relações
entre o objeto de pesquisa, os questionamentos e a base teórica pertinente e sua representação
cartográfica, como afirma Corrêa (2003, 2011). Portanto, está diretamente ligada à escolha
teórico-metodológica realizada pelo pesquisador de como abordar uma dada realidade, sem
nos esquecer do alerta de Corrêa (2003, p. 136) de que
84
[...] as duas escalas conceituais, a da rede urbana e a do espaço urbano não
estabelecem uma dicotomia, cindindo o urbano em duas partes que não se
tocam. Lembremo-nos que a dicotomia não é um dado do mundo real, mas
de uma deformação intelectual. A operação escalar não introduz essa visão
deformada, geradora de dicotomia, mas, ao contrário, ressalta as ricas
possibilidades de se analisar o mundo real, o urbano no caso, em dois níveis
conceituais complementares.
Sabemos que, apesar de analisarmos a produção do espaço intraurbano de Patos, com
a implantação do PMCMV na cidade, ela só foi alvo do programa por exercer um papel
econômico relevante na região onde se localiza, porque, dos 223 municípios do estado da
Paraíba, é considerado o terceiro mais importante economicamente, além de ter um mercado
imobiliário favorável e consolidado, contando com investimentos de empresas locais e
externas. Essas condições “exigidas”, como a localização em área dinâmica e a presença de
um mercado local satisfatório, são alguns dos diversos efeitos territoriais do PMCMV, que
ainda serão aprofundados.
2.1.1 Os fatores econômicos e políticos para a criação do PMCMV
Desde a criação do PMCMV, em 2009, tem sido produzida uma vasta bibliografia
com o intuito de verificar e analisar os fatores determinantes e os efeitos do programa, no que
concerne às demandas econômicas, sociais e territoriais, como também a estrutura e o
desenho do programa. Neste tópico, discutiremos apenas os momentos de criação e
implantação do PMCMV, que compreende as estratégias e as práticas dos diversos agentes
envolvidos nesses processos, bem como suas escalas de atuação.
As questões discutidas aqui começam com a crise de 2008 ou “crise das hipotecas
subprime”, como é chamada, que se originou no mercado imobiliário estadunidense até então
marcado pela intensa financeirização do setor. De acordo com Bastos (2012, p. 20), entre os
diversos efeitos dessa crise, está “a reorganização da propriedade financeira das principais
instituições bancárias e de crédito do mundo globalizado”. Harvey (2011) também mostra
que, nos EUA (inicialmente), “as perdas dos que estão na base da pirâmide social” foram
exorbitantes.
Nesse mesmo período, o Brasil se encontrava num momento de acelerado
crescimento econômico, resultante da implantação de medidas criadas pelo governo federal,
desde o início dos anos 2000, que impulsionaram diversos setores da economia. Dentre essas
medidas, Shimbo (2011) destaca as que provocaram a expansão do setor imobiliário e da
85
construção civil, como: 1) a aprovação da Lei Nº 10.931/2004, conhecida como Lei do
Patrimônio de Afetação, que constituía um mecanismo de proteção aos financiamentos
concedidos pelo capital financeiro, já que impedia a prática de livre ação dos capitais de
origem imobiliária e minimizava os impactos de inadimplência dos mutuários; 2) ainda em
2004, a resolução nº 3.259, do Conselho Monetário Nacional, cujo objetivo foi de buscar
segurança jurídica e ampliar recursos financeiros ao mercado privado, permitindo a liberação
de recursos da Caderneta de Poupança (SBPE) até então retidos no Banco Central; 3) o
anúncio de um pacote de medidas em 2006, com destaque para a flexibilização do uso da
Taxa Referencial (TR), com a Lei nº 11.734, que permitia a utilização de taxas de juros
prefixadas no SFH nos financiamentos imobiliários, o que corresponde a valores de parcelas
fixos ou decrescentes; 4) a ampliação do volume de crédito ofertado às incorporadoras pela
CEF, o aumento do percentual do financiamento do custo total das obras e a inclusão de
novos insumos da construção civil na lista de desoneração fiscal; 5) o lançamento do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em 2007, com a previsão de investimentos de
R$ 106,3 bilhões entre 2007 e 2010.
Essas medidas proporcionaram um aumento significativo na utilização de recursos
privados e públicos na produção habitacional, que, segundo Bonduki (2009), provocou uma
elevação no investimento em habitação de R$ 2,2 bilhões para 27 R$ bilhões, entre 2002 e
2008, isso só pelo SBPE, sem falar no aumento expressivo, principalmente a partir de 2005,
dos recursos advindos do Orçamento Geral da União (OGU) e do FGTS, também destinados à
habitação. Assim, com mais possibilidades de captar recursos e com instrumentos jurídicos
que davam mais segurança aos investimentos, o mercado imobiliário e o setor da construção
civil estreitaram relações com o capital financeiro, fato que se concretizou quando foi
anunciada a abertura de capital de alguns grupos empresariais nacionais na bolsa de valores
(Bovespa). Essas condições, somadas, ainda, à estabilidade econômica do país, atraíram
massivos investimentos internacionais para esse mercado. o Bastos (2008) assevera que outro
efeito foi o aumento considerável no número de postos de trabalho no mercado formal, o que
ocasionou mais arrecadação do FGTS e, consequentemente, aumentou o volume de recursos
destinados ao crédito habitacional.
Ressalte-se, contudo, que, com a crise de 2008, vieram incertezas em relação à
economia do Brasil e uma paralisia no mercado, então, não foi diferente com o mercado
imobiliário e com o setor da construção civil. Para Bonduki (2009, p. 11), “a situação pareceu
fugir ao controle, com baixa acentuada das ações das empresas na bolsa de valores, com
86
impactos nas atividades do setor, que sofreu forte queda”. Sobre os efeitos da crise em nível
mundial Harvey (2011) afirma que
[...] as respostas das populações e das autoridades do Estado variaram
bastante de um país para o outro de acordo com a profundidade e a natureza
do problema local, as predileções ideológicas, as interpretações dominantes
sobre as causas primárias, os arranjos institucionais [...] os costumes (com
relação à poupança pessoal, por exemplo) e a disponibilidades de recursos
locais (excedentes orçamentais, em particular) para lidar com os impactos
locais. (HARVEY, 2011, p. 118).
No caso do Brasil, Cardoso e Aragão (2011, p. 88) mostram que, para retrair os
efeitos da crise, o Governo Federal adotou as seguintes medidas: expandiu o crédito pelos
bancos públicos (Banco do Brasil, BNDS e Caixa Econômica) para compensar a retração do
setor privado; apoiou os setores que estavam sofrendo efeitos diretos da crise; mobilizou a
Petrobras no sentido de que também mantivesse os investimentos previstos e deu
continuidade aos investimentos em infraestrutura previstos no âmbito do PAC. Devido a essa
reação por parte do governo federal, tem sido consenso, na literatura, que o PMCMV, criado
inicialmente como medida provisória e depois estabelecido através da Lei 11.977/2009,
constituiu-se como uma medida nessa mesma linha, objetivando lidar com os efeitos da crise
de 2008. Ainda de acordo com Cardoso e Aragão (2011, p. 88), “o programa buscou
claramente impactar a economia, ampliando o volume de crédito e de subsídios para a
aquisição e produção de moradias”, através dos efeitos multiplicadores gerados pela indústria
da construção. Nessa perspectiva, Rolnik e Nakano (2009) discorrem que essa estratégia de
mobilizar investimentos públicos, especialmente em áreas de uso intensivo e mobilização de
mão de obra rápida, “tem sido uma das clássicas soluções Keynesianas para momentos de
crise”. Segundo esses autores,
[...] estimular a produção de moradias, [nesse] contexto, parece ser bastante
atraente, pois dinamiza a indústria, gera empregos e se enfrenta uma questão
candente na sociedade brasileira: a absoluta precariedade que caracteriza a
moradia da maior parte da população que vive nas favelas e periferias do
país. Será?(ROLNIK e NAKANO, 2009, p. 01, Grifo nosso).
87
Os próprios autores respondem ao questionamento que fazem ao afirmar que, no
PMCMV, “há algumas armadilhas e falácias”. Para averiguar essa assertiva, vejamos o que
vem acontecendo no Brasil pós-2008, particularmente com o referido programa. O Programa
estabeleceu um patamar de subsídio direto proporcional à renda da família; aumentou o
volume de crédito, tanto para aquisição como para produção das habitações; reduziu os juros
dos financiamentos e assegurou recursos para o pagamento das prestações, em caso de
inadimplência por desemprego ou outras adversidades, através do Fundo Garantidor da
Habitação. Desde sua criação (em 2009), contratou 3,2 milhões de moradias (o que
corresponde a 49,2% do déficit nacional em 2010), das quais 1,5 milhão foi entregue, com
investimentos no valor de R$ 193 bilhões34
. Desse modo, o PMCMV avançou
consideravelmente em relação à antiga política do BNH, no que diz respeito à mobilização de
recursos para subsídios e crédito habitacional, já que, em 15 anos de existência, o banco
financiou apenas 4,3 milhões de unidades habitacionais frente a um déficit, que entre as
décadas de 1960 e 1970, foi estimado em oito milhões de unidades habitacionais, segundo
dados do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC - 1974) citados por Cláudio
Santos (1999)35
. Além disso, no âmbito social do Programa, houve avanços importantes. Em
sua redação final, ele priorizou os municípios que adotassem a desoneração tributária para a
produção de Habitação de Interesse Social (HIS) e os instrumentos do Estatuto das Cidades,
para conter a especulação imobiliária, e incluiu um capítulo inteiro sobre Regularização
Fundiária36
.
No entanto, diante dessa realidade, é preciso trazer alguns contrapontos ao debate
para aprofundarmos a discussão. Alguns autores como Rolnik e Nakano (2009), Cardoso e
Aragão (2011), Shimbo (2011) e Campos (2011), entre outros, alertam para o fato de que o
PMCMV foi desenhado com base em uma lógica e uma racionalidade totalmente empresarial
- de só produzir e comercializar casas; de que o Programa não só foi criado para como
também pelo setor imobiliário, e que o volume de recursos mobilizados, ao garantir um
mercado consumidor sólido e seguro, ampliou a demanda por terra, elevou os preços
imobiliários e provocou, posteriormente, o aumento do teto dos financiamentos, como foi
34
Dados obtidos no site do Ministério das Cidades, 2014. 35
É importante trazermos o alerta de Andrade e Azevedo (1982) de que as estimativas do déficit habitacional
desse período eram bastante contraditórias, já que os documentos oficiais não utilizavam uma metodologia
constante. Assim, uns consideravam o problema da habitação rural, outros, não. Para termos noção do que isso
representava, basta lembrar que, enquanto o Instituto Brasileiro de Habitação estimava o déficit em 3,6 milhões
de habitações, em 1950 (governo de Jânio Quadros), o IBMEC estimava esse déficit em oito milhões, entre 1960
e 1970. Isso poderia ou não representar um grande aumento do déficit, dependendo de qual metodologia foi
utilizada para o levantamento dos dados. 36
Cf: Cartilha: Regularização Fundiária Urbana: como aplicar a Lei Federal nº 11.977/2009, BRASIL (2010).
88
anunciado em 2012 pelo Conselho Curador do FGTS e como podemos observar no quadro
01, a seguir. Observando os dados, podemos perceber que o percentual de acréscimo sobre os
valores iniciais dos financiamentos é bem expressivo, tendo em vista que esse acréscimo
ocorreu em apenas três anos depois da criação do PMCMV, ou seja, de 2009 a 2012.
Quadro 01: Aumento do teto para financiamento de imóveis pelo PMCMV em 2012
Localização e/ou porte
dos municípios
Valor anterior ao
aumento (R$)
Valor posterior ao
aumento (R$)
% de acréscimo no
valor do
financiamento
Região metropolitana
de Brasília, Rio de
Janeiro e São Paulo
170.000 190.000 11,8
Municípios com mais
de 1 milhão de hab. e
demais capitais
150.000 170.000 13,3
Municípios com mais
de 250 mil hab.
130.000 145.000 11,5
Municípios com mais
de 50 mil hab.
100.000 115.000 15,0
Demais localidades 80.000 90.000 12,5
Fonte: <http://www2.planalto.gov.br/imprensa/noticias-de-governo>. Acesso em: 30/01/2014.
Elaboração própria.
Aqui chegamos, portanto, à questão-chave dos problemas que rondam a atual política
habitacional, representada pelo PMCMV – a terra. Sabemos que as diferenças de renda se
traduzem no acesso desigual às infraestruturas e à terra urbana disponível e que esse tem sido
um grande entrave para se garantir o direito à moradia no Brasil. Assim, para as famílias de
menor ou nenhuma renda, o sonho da casa própria, mais ainda, de uma moradia digna, é
realmente um sonho. Sobre isso, Singer (1982, p. 33) afirma que
[...] a propriedade privada do solo faz com que a posse de uma renda
monetária seja requisito indispensável à ocupação do espaço urbano. Mas o
funcionamento normal da economia capitalista não assegura o mínimo de
renda a todos. Antes, pelo contrário, esse funcionamento tende a manter uma
parte da força de trabalho em reserva, o que significa que uma parte
correspondente da população não tem meios para pagar pelo direito de
ocupar um pedaço do solo urbano.
89
Podemos, então, inferir que a implantação de um programa baseado na lógica do
capital imobiliário está longe de atender concretamente às demandas sociais. A grande prova
é de que da mesma forma como o BNH financiou a construção de habitações e obras de
urbanização, totalmente dissociada de uma política fundiária, tem ocorrido com o PMCMV, e
os efeitos socioespaciais e territoriais de uma ação como essa nós já visualizamos no capítulo
anterior. A grande diferença é de que, agora, o avanço voraz da especulação imobiliária e seus
efeitos socioespaciais não têm acontecido somente nas metrópoles e nos grandes centros, mas
também nas cidades médias e de menor porte.
Já discutimos sobre como os grandes conjuntos habitacionais financiados pelo BNH
e as obras de urbanização eram construídos, prioritariamente, nas metrópoles, nas grandes
cidades e nas capitais estaduais e de forma inexpressiva nos centros de menor porte. Nesse
contexto, o agente promotor dos projetos era o Estado, portanto, era ele quem decidia em
quais cidades seriam aprovados e implantados os projetos. Aos agentes imobiliários cabia
somente executar as obras dos conjuntos habitacionais, e sua dinâmica de investimentos
restringia-se às capitais e às regiões metropolitanas.
Percebemos que o padrão de localização desses empreendimentos, em nível nacional,
vem se modificando e tendo expressividade também nos espaços não metropolitanos, pelo
fato de terem o setor privado como agente promotor e, portanto, serem regidos pelos
mecanismos de mercado que, ao buscar áreas onde haja terra abundante, a preços mais baixos
e com baixa concorrência, visualiza, em outros espaços, como as cidades médias, a
oportunidade perfeita para realizar seus investimentos e obter vastos lucros com rápido
retorno obtidos através dos financiamentos habitacionais.
Nessa perspectiva, observa-se a cidade de Patos, que, ao mesmo tempo em que tem
sido alvo de muitos Programas do Governo Federal, principalmente a partir de 2008, tem se
caracterizado por ter um mercado imobiliário cada vez mais dinâmico e promissor para os
agentes que nele investem. Assim, entendemos que esse pode ser um dos rebatimentos
espaciais da associação entre o Estado e o capital de que trata Corrêa (1989), tanto em escala
nacional como local, o que nos remete também à afirmação de Lefebvre (2008) de que o
espaço é político e estratégico, por isso é necessária uma análise crítica para entendermos
como e de acordo com qual estratégia determinado espaço foi produzido.
90
2.1.2 Do BNH ao PMCMV: o que mudou para as cidades médias?
Já constatamos que a Política Urbana implantada concomitante, mas desvinculada da
política habitacional do período do BNH, teve como base as políticas de desenvolvimento
regional, o que resultou em numerosos investimentos governamentais em cidades de porte
médio, com o intuito de dinamizar as regiões em que se inseriam e de descentralizar a
produção industrial concentrada na Região Sudeste. O BNH, por sua vez, financiava projetos
de habitação e urbanização, no entanto, concentrava seus financiamentos nas capitais
estaduais e nos grandes centros, o que tornava a produção habitacional pouco expressiva nas
demais cidades, como os exemplos já citados de Campina Grande e Patos (PB). Também é
importante lembrarmos que, em todas as cidades que receberam esses financiamentos, a
construção de conjuntos habitacionais ocorria dissociada de uma política urbana e fundiária
local, mesmo naquelas cidades em que havia um Plano Local de Organização do Espaço
Urbano ou Plano Diretor, que não eram obrigatórios naquele período.
No decorrer do tempo, mudanças ocorreram no que concerne às estratégias de
implantação de programas habitacionais, bem como às práticas dos agentes envolvidos nesses
processos. Da mesma forma, modificou-se também o seu rebatimento na articulação entre as
diversas escalas espaciais.
Quando o PMCMV foi criado, já estava encaminhado um projeto de longa data sobre
o desenho e a estruturação de uma nova Política Nacional de Habitação (PNH), que teve suas
raízes no Projeto Moradia e que se estruturou após a aprovação do Estatuto das Cidades
(aprovado em 2001), da criação do Ministério das Cidades (em 2003) e da ocorrência da 1ª
Conferência Nacional das Cidades (também em 2003), que estabeleceu a criação do Conselho
Nacional de Habitação (ConCidades, instalado em 2004). Essa nova PNH adotou como
componentes principais a integração e a inserção urbana de assentamentos precários, a
urbanização e a regularização fundiária deles, a provisão de habitação e a integração da
política de habitação à política de desenvolvimento urbano.
A elaboração e a implementação da PNH obedeceram a princípios e a diretrizes cuja
principal meta era “garantir à população, especialmente a de baixa renda, o acesso à habitação
digna”, e para atingir seus objetivos, traçou como linha mestra de sua atuação - a integração
entre as Políticas Habitacional e de Desenvolvimento Urbano. Além disso, considerava que a
Política Fundiária exercia um papel estratégico em sua implantação, visto que poderia
estabelecer as bases das políticas urbanas, no âmbito dos municípios, para a realização de
91
programas habitacionais, através de instrumentos como os Planos Diretores, regularização
fundiária e revisão de legislação urbanística e edilícia (BRASIL, 2006).
Dentre os instrumentos da PNH, destacamos: 1) o Sistema Nacional de Habitação
(SNH), que estabelece o desenho institucional da política, formado pelo Sistema Nacional de
Habitação de Mercado (SNHM) e pelo Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social
(SNHIS), que centralizava os recursos para HIS, através do Fundo Nacional de Habitação de
Interesse Social (FNHIS); e 2) o Plano Nacional de Habitação (PlanHab), que deveria
articular e potencializar os programas e as ações nos três níveis de governo. Com a criação
dos Conselhos Municipais de Habitação e a elaboração dos Planos Locais de Habitação de
Interesse Social (PLHIS), que preconizavam a participação popular e que era pressuposto da
PNH, foi desenhado um modelo de gestão dos recursos para HIS, participativo, democrático e
descentralizado (NASCIMENTO NETO et. al., 2012). Nesse desenho institucional, o Estado
era o promotor dos projetos de habitação, como podemos observar na Figura 04.
Figura 04: Circuito de Promoção Pública dos projetos habitacionais na estrutura da Política Nacional
de Habitação (PNH). Fonte: Aragão, 2010.
Assim, com o Estado como promotor dos projetos, através de suas diversas esferas
de poder, a construção de habitações ocorreria de acordo com as demandas dos municípios e
sob uma maior regulação dos gestores, no que diz respeito à localização dos conjuntos
habitacionais e à disponibilidade de infraestrutura. Além disso, sob esse desenho institucional,
os governos municipais poderiam regular mais fortemente os processos especulativos sobre o
solo urbano, oriundos das estratégias de mercado, por exemplo, implantando os instrumentos
dispostos no Estatuto das Cidades, visando contribuir para a produção de um espaço urbano
mais justo, do ponto de vista social.
92
Ressalte-se, no entanto, que o PMCMV surgiu como uma medida emergencial e
precisava, com urgência, evitar a retração no mercado imobiliário e manter o ritmo da
construção civil. O modo como esse programa foi elaborado e implantado acabou destoando
da estrutura da PNH, inclusive do PlanHab. Nesse momento, a política habitacional passou a
ter como principal promotor dos projetos o setor privado (Figura 05).
Figura 05: Circuito de Promoção Privada de projetos habitacionais nos moldes do Programa Minha
Casa Minha Vida (PMCMV) Política Habitacional. Fonte: Aragão, 2010.
Cardoso e Aragão (2011) afirmam que um dos efeitos territoriais causados pelo
modelo de produção de habitação cujo produtor é o mercado, principalmente na produção
HIS, é o fato de que a oferta só será realizada onde o mercado julgar lucrativo, ou seja, em
áreas dinâmicas. Assim, os municípios com economia estagnada que também poderão
apresentar necessidades habitacionais, provavelmente, não serão atendidos, uma vez que a
“mera ausência de construtoras na cidade já constitui uma grande barreira para a produção”.
Para ilustrar essas afirmações, podemos citar o caso da Paraíba que, além da capital
João Pessoa, que contratou até o ano de 2012 a construção 7.780 unidades habitacionais,
apenas três municípios dos 223 que compõem o Estado se aproximaram ou ultrapassaram o
valor de mil unidades contratadas até o referido ano, que foram Campina Grande, com 7.334
unidades contratadas; Patos, com 906, e Sousa, com 726 (Mapa 03, p. 93).
93
Mapa 03: Estado da Paraíba – Quantidade de Unidades Habitacionais (UHs)
aprovadas nos municípios através do PMCMV
Fonte: Caixa Econômica Federal (CEF). Base cartográfica: IBGE – 2010. Organização: Wilma G.
de Lucena. Elaboração: Leonardo B. Costa
Quanto ao mapa 03, observamos que, praticamente, todos os municípios do estado da
Paraíba tiveram projetos habitacionais aprovados pelo PMCMV. Contudo, esses projetos não
são expressivos em termos quantitativos, visto que quase todos têm projetos de, no máximo,
170 UHs, dos quais a maioria tem menos de 100 UHs. Sobre os municípios que se
destacaram, além da capital estadual, é importante perceber a grande diferença entre a
quantidade de UHs aprovadas em Campina Grande e os municípios de Patos e Sousa.
Ressaltamos que, embora Campina Grande, assim como as cidades desses municípios, não
tenha sido alvo de grandes projetos habitacionais no período do BNH, já nessa época, a cidade
exercia uma forte centralidade no estado da Paraíba, devido à sua intensa dinâmica econômica
oriunda das atividades comerciais, da oferta de serviços, e por ter se constituído como polo
industrial37
. Essa centralidade, por sua vez, fortaleceu-se ao longo do tempo, diferenciando a
cidade de Campina Grande das demais cidades paraibanas. As cidades de Sousa e Patos
37
Ver Maia et al (2013)
94
apresentam um nível de centralidade abaixo de Campina Grande, no entanto, constituem-se
como importantes polos na oferta de bens e serviços no sertão paraibano, porquanto
apresentam um contingente populacional bem acima dos demais municípios nessa
mesorregião, principalmente a cidade de Patos, fazendo com que, nessa última década dos
anos 2000, tenham sido alvos preferenciais para os investimentos imobiliários que vêm para o
sertão.
Sobre esses municípios, vale tecer mais algumas considerações. Sabemos que as
capitais estaduais são alvos dos programas habitacionais, tanto por serem a centralidade
administrativa, porque apresentam um índice maior de desigualdades sociais, o que ocasiona
uma maior demanda, quanto pela dinâmica econômica que esses centros apresentam, se
considerarmos, principalmente, os interesses dos agentes imobiliários na implantação
daqueles programas. Por outro lado, as demais cidades, especialmente as médias (excetuando-
se as capitais), só recentemente têm sido alvo de programas como o PMCMV de maneira
mais expressiva. Pesquisas em cidades como Londrina (PR), São José do Rio Preto (SP),
Marília (SP), São Carlos (SP), Uberlândia (MG), Passo Fundo (RS), Mossoró (RN), Campina
Grande (PB)38
, entre outras, mostram como o capital imobiliário tem se expandido a partir
de/nesses centros. Vale ressaltar que os financiamentos e a construção de unidades
habitacionais para famílias das três faixas de renda atendidas pelo PMCMV, nessa tipologia
de cidades, têm sido quantitativamente expressivos e bem vantajosos para o mercado.
Convém lembrar que essas faixas de renda dividem-se em faixa 01 (de 0 a 3 s/m), faixa 02 (de
3 a 6 s/m) e faixa 03 (de 6 a 10 s/m).
Dentre as cidades paraibanas mencionadas, destacamos Patos e Sousa, que foram
alvo do Programa Específico para Cidades de Porte Médio, na década de 1970, e que, no
entanto, obtiveram poucos financiamentos para a construção de conjuntos habitacionais
através do BNH. Nesse contexto, cabe mencionar também a cidade de Campina Grande.
Atualmente, essas cidades têm firmado um número maior de contratos para financiamento
habitacional devido às condições supracitadas – atrair, cada vez mais, investidores nas áreas
de incorporação, construção e comercialização de imóveis. Já sabemos que essa dinamização
do mercado resulta do aumento de crédito e de subsídios, da elevação dos tetos de
financiamento, da diminuição das taxas de juros, da aprovação de instrumentos jurídicos
estimuladores, entre outros. Cidades como Campina Grande, Patos e Sousa, que vão se
constituindo como centros polarizadores de atividades produtivas, comerciais e de oferta de
38
Pequeno e Elias (2010), Costa (2013), Maia et al (2013), Melazzo (2013), Melazzo (2012)
95
serviços, ou seja, de riquezas, tornam-se atrativas para investimentos do excedente do capital
imobiliário, portanto, como lugares atraentes para empreendimentos do PMCMV.
Em alguns trabalhos como os de Costa (2013), Maia et al (2013), entre outros,
percebemos o quão tem sido rentável o mercado imobiliário em Campina Grande, que conta
com investimentos em condomínios horizontais de grandes grupos, como o Alphaville, por
exemplo, além de estar atendendo cada vez mais às famílias de rendimento médio, como
constatamos com a quantidade de empreendimentos voltados para as faixa 2 e 3 do PMCMV,
o que representa 61,1% do total de projetos contratados na cidade até 2012 (Tabela 02).
Diante disso, entendemos o porquê da discrepância da quantidade de UHs aprovadas nos
projetos do PMCMV, em Campina Grande, em relação às cidades de Patos e de Sousa, bem
como sua aproximação em relação à quantidade de UHs aprovadas na capital, João Pessoa.
Tabela 02: Quantidade de empreendimentos, por faixa de renda, contratados até o ano
de 2012 nos municípios de João Pessoa, Campina Grande, Patos e Sousa
João Pessoa Campina Grande Patos Sousa
Faixa 01 10 07 02 02
Faixa 02 10 07 - -
Faixa 03 14 04 - -
Total 43 18 02 02
Fonte: Caixa Econômica - Elaboração própria
A cidade de Sousa tem apresentado um crescimento relevante no mercado da
construção, o que lhe tem conferido uma quantidade cada vez maior de investimentos, cerca
de 15% ao ano, de acordo com matéria divulgada em meio televisivo39
. Já Patos se caracteriza
por apresentar um mercado imobiliário já consolidado, cujos fatores mais gerais, de amplitude
nacional, já foram mencionados. Contudo, há alguns condicionantes mais particulares, como o
fato de a cidade ser um importante centro na Mesorregião do Sertão, no que se refere à oferta
de serviços, especialmente de educação superior, como podemos observar nesta fala dos
editores da Revista Empresarial (revista local):
A cidade de Patos vem gradativamente alcançando consideráveis índices de
crescimento em vários setores: no comércio, prestação de serviço e até
mesmo na indústria, mas visivelmente o que tem chamado mais a atenção, é
39
Matéria: “Paraíba vive momento de expansão do mercado imobiliário”. (Ver link no suporte eletrônico)
96
o elevado número de cursos universitários oferecidos pelas nossas
universidades (UEPB, UFCG e as FIP), que paralelamente desencadeou um
bombástico crescimento do setor imobiliário na capital do sertão. [...] O
mercado imobiliário, através de loteamentos e condomínios horizontais e
verticais, transformou Patos em um verdadeiro canteiro de obras. (Pedro
Alves e Soliandra Alves, trecho do texto “Um canteiro de obras”)40
Além da oferta de serviços, identificamos, em entrevista com um corretor que atua na
cidade, que, se somado à crescente demanda que tem se caracterizado pela procura de
produtos imobiliários cada vez mais diversos, a cidade de Patos torna-se atrativa para
investimentos imobiliários devido à grande disponibilidade de terrenos para o mercado. Tais
condições possibilitaram os investimentos recentes em pequenos condomínios fechados, o
aumento significativo de edifícios na cidade, a instalação do primeiro Eco Shopping da
Paraíba (ainda a ser construído pelo grupo Bollevard), o investimento do primeiro
condomínio horizontal da cidade, o Villas do Lago, que é direcionado para a população de
alta renda e a chegada de incorporadoras e construtoras vindas de outras localidades como
João Pessoa e Recife.
Nesse contexto, verificamos que, de um lado, tem sido expressivo o número de
empreendimentos propagandeados com as “vantagens” dos financiamentos do PMCMV
direcionados para as famílias de renda média (Figuras 06 e 07, p. 97) e, de outro, observamos
que, de acordo com a entrevista mencionada, há pouco interesse dos agentes locais em
investir no mercado que atende à população de renda mais baixa. Assim, a produção de HIS
tem ficado a cargo de empresas vindas de outras localidades, como a CRE Engenharia Ltda. e
a JGA Engenharia Ltda., ambas com sede na capital João Pessoa. Essas empresas são
responsáveis pelos dois empreendimentos para as habitações de faixa 01 do PMCMV na
cidade de Patos, contratados até 2012, e o Residencial Vista da Serra II, que foi contratado
posteriormente.
40
Ver Revista Empresarial, cujo link está disponível no suporte eletrônico da presente pesquisa.
97
Figura 06: Propaganda dos Condomínios Jardim Floresta – empreendimento com casas financiadas
pelo PMCMV. Fonte: <http://www.lagosconstrutora.com.br/condominios.php> Acesso: Julho de
2013.
Figura 07: Propaganda de venda de casas localizadas no Distrito Industrial e financiadas pelo
PMCMV. Fonte: Site <http://www.patos-pb.com.br/> Acesso em setembro de 2013
Além dessas particularidades apresentadas, vale destacar que, devido ao processo de
financeirização pelo qual tem passado o mercado imobiliário brasileiro41
, as cidades médias
têm sido ótimas oportunidades de investimentos lucrativos para esse mercado, por se
caracterizarem como áreas economicamente dinâmicas, a concorrência não ser tão acirrada
41
Para aprofundar as questões relacionadas a essa imbricação entre capital imobiliário e capital financeiro no
atual momento de reprodução e acumulação capitalista, em nível mundial, sugere-se a leitura da tese de Paiva
(2007), intitulada “A diáspora do capital imobiliário, sua dinâmica de valorização e a cidade no capitalismo
contemporâneo: a irracionalidade em processo”.
98
como nas metrópoles e nos grandes centros e por possibilitarem a formação de bancos de
terra, já que esses se constituem, nesse contexto, como ativos de valores. Melazzo (2013)
afirma que essa expansão dos investimentos imobiliários para as cidades em questão se insere
num momento em que a urbanização brasileira se encontra cada vez mais extensa, complexa e
diversa.
Poderíamos falar, então, de um novo tipo do que Santos (1993) chama de
urbanização corporativa, agora não só sob o comando do capital industrial, mas também da
ação do capital imobiliário associado ao capital financeiro, que se expande velozmente por
todo o território nacional? Esse é um questionamento que consideramos pertinente, já que o
“imobiliário” vem assumindo uma importância que, até então, não lhe era atribuída, como
enfatiza Bastos (2012). Nesse sentido, entendemos que o setor imobiliário adquiriu essa
importância pelo fato de assumir a função de lutar contra a tendência à baixa do lucro médio,
como discorre Lefebvre (2008), quando refere que
a construção (privada e pública) proporcionou e ainda proporciona lucros
superiores à média. A especulação não entra no cálculo, mas superpõe-se a
ele; nela e por ela, através de uma mediação – o espaço – o dinheiro produz
dinheiro. O que provoca, malgrado os riscos, o entusiasmo do capitalista
[...]. O investimento no imobiliário e nas construções privadas e públicas (na
produção do espaço) se revela proveitoso porque essa produção ainda
comporta, e comportará por muito tempo, uma proporção superior de capital
variável em relação ao capital constante. E isso apesar dos investimentos
consideráveis e dos progressos técnicos. As terraplanagens e trabalhos da
construção civil ocupam uma numerosa mão-de-obra [...]. De onde ocorre
uma taxa de lucro superior e a formação de uma massa de mais-valia da qual
parte retorna às “empresas”. (LEFEBVRE, 2008, p. 118-119, grifo do autor)
Destacamos, nesse contexto, que aquela realidade urbana diversa, complexa e
extensa exige, segundo Santos (1985), um olhar que busque alcançar as singularidades e a
estruturação de cada cidade, sem deixar de enxergar os processos mais amplos produzidos em
outras escalas geográficas que ali encontram suas particularidades. Nessa perspectiva,
trazemos o alerta de Pequeno e Elias (2010) sobre a importância dos estudos que tenham
como objeto os espaços não metropolitanos, no sentido de compreendermos a atual
complexidade urbana brasileira. Para tanto, os estudos empíricos e de realidades particulares
são fundamentais, não exatamente para relatar e discutir sobre os processos ímpares da
produção do espaço urbano, mas para, com base em suas particularidades, construir um
99
quadro extenso de leitura que nos permita esclarecer o contexto mais amplo em que estamos
inseridos (PULHEZ, 2012).
2.2 A produção da habitação e do espaço urbano na cidade de Patos/PB
O município de Patos tem uma área territorial de 473,056 km², dos quais 23 km² 42
constituem área urbana e têm uma densidade demográfica de 212,82 hab/km². No censo de
2010, foi contabilizada uma população de 100.674 habitantes, dos quais 97.278 (96,6%) se
encontravam na área urbana, e 3.396 (3,4%), na área rural. Para 2013, a estimativa foi de que
o município chegasse aos 104.716 habitantes43
. A cidade foi definida pela Regic (2008) como
“Centro Sub-regional A”, devido à centralidade que exerce através do comércio e da oferta de
serviços e por ser responsável pela população flutuante de cerca de 120 mil habitantes durante
a semana44
, visto que se tornou referência como local de consumo na região em que se insere.
Quanto às condições de moradia da população, no município, havia, em 2010,
segundo o IBGE (2010), 28.907 domicílios particulares permanentes, dos quais 27.988 se
encontravam na zona urbana, e 919, na zona rural. Seu déficit habitacional total, também em
2010, foi de 4.454 unidades habitacionais, o que representou cerca de 3,6% do déficit
estadual45
(Tabela 03, p. 100). Apesar de o déficit habitacional, em números absolutos, ser
bem menor do que o estadual, a situação muda se considerarmos o déficit relativo, ou seja, a
demanda em relação ao número de domicílios permanentes do município, o que constitui uma
condição preocupante em escala local. Além disso, enquanto o maior responsável pela
demanda habitacional, na Paraíba, é a coabitação familiar, em Patos, é o ônus excessivo com
aluguel que prevalece como principal componente do seu déficit. A respeito disso, a Fundação
João Pinheiro (2010) mostra que, “embora o ônus com aluguel seja um componente mais
expressivo nas áreas metropolitanas (35,8% do déficit), é forte também nas áreas não
metropolitanas (25,6%)”. No caso de Patos, percebemos que isso ocorre porque o aluguel tem
sido a solução mais frequente para aqueles que não possuem uma casa suprirem a necessidade
de moradia, contudo, como grande parte do déficit urbano se concentra na população cuja
renda é de até três salários mínimos (Tabela 04, p. 100), e como os preços dos aluguéis são
42
De acordo com o PLHIS aprovado em 2014, Patos tinha, em 1960, um perímetro urbano de, aproximadamente,
2 km², o que mostra que, em 40 anos, passou por um acelerado processo de expansão urbana. 43
Dados do Censo demográfico, IBGE (2010) 44
Dado de 2005 obtido na Associação Comercial de Patos e disposto no PLHIS (op. cit). 45
Fonte: Fundação João Pinheiro, 2010.
100
bastante elevados para a realidade local, os custos mensais com habitação também acabam se
elevando, o que compromete a provisão das demais necessidades básicas.
O censo demográfico de 2010 revela que “mais de 70% dos domicílios urbanos na
Região Nordeste afetados pelo déficit habitacional têm rendimento de até três salários
mínimos (incluindo, nesse montante, os domicílios sem rendimento)”46
, o que representa o
maior percentual do país, cujo déficit urbano é de 5,885 milhões de unidades.
Tabela03: Déficit habitacional total e relativo, por componente, no estado da Paraíba e no município
de Patos – 2010
UT*
Déficit
habitacional
Domicílios
precários
Coabitação
familiar
Ônus excessivo
com aluguel
Adensamento
em domicílio
alugado
Total Relativo Total Relativo Total Relativo Total Relativo Total Relativo
Paraíba 120.741 11,2 15.535 1,4 59.983 5,5 37.991 3,5 7.232 0,7
Patos 4.454 15,4 116 0,5 1.583 5,5 2.192 7,6 562 1,9
Fonte: Fundação João Pinheiro (2010) - Elaboração própria
* Unidade Territorial
Tabela04: Déficit habitacional urbano por classe de rendimento domiciliar no estado da Paraíba e em
Patos – 2010
UT Sem rendimento 0 a3 s/m 3 a6 s/m 6 a10 s/m 10 ou mais s/m Total
Paraíba 5.072 70.802 13.038 8.328 3.974 101.214
Patos 157 3.364 548 172 155 4.397
Fonte: Fundação João Pinheiro (2010) - Elaboração própria
Por último e não menos importante, é fundamental mencionar que, além dos gastos
excessivos com habitação, as famílias de menor renda mensal (sem rendimento e até três s/m)
têm que lidar com problemas ligados à falta ou à precariedade da infraestrutura urbana nos
locais onde habitam (Tabela 05, p. 101), o que nos leva a uma questão primordial para a
política habitacional, que é a da terra urbana. É fato incontestável que a especulação
imobiliária, que se dá através da valorização seletiva do espaço intraurbano, produz cidades
cada vez mais desiguais quando deixa à margem a grande parcela da população que não
46
Fundação João Pinheiro (2010, p. 39)
101
dispõe de recursos para adquirir uma casa em ótima localização, ou seja, em uma área com
boa oferta de serviços e infraestrutura.
Tabela05: Déficit habitacional por inadequação de domicílios urbanos, total e nas classes até três
salários mínimos em Patos – 2010 **
Infraestrutura urbana
UT
Abastecimento de
água
Esgotamento
sanitário
Iluminação
elétrica
Destino do lixo Banheiro
exclusivo
Total Até 3 s/m Total Até 3 s/m Total Até 3 s/m Total Até 3 s/m Total Até 3 s/m
Patos
512,6
424,9
2.881,7
2.300,60
202,7
202,7
608,8
541,1
439,8
431,6
Fonte: Fundação João Pinheiro (2010) - Elaboração própria
** Fizemos um somatório da classe sem rendimento mais a de 0 a 3 s/m.
Assim, elencar e relacionar os aspectos acima mencionados, tanto os referentes às
características demográficas quanto às condições de moradia da população - como aqueles
sobre o mercado imobiliário - é crucial para entendermos o contexto em que tem sido
implantado o PMCMV na cidade de Patos. A compreensão do déficit habitacional a partir de
como ele se configura, social e espacialmente, permite-nos analisar a efetividade da
implantação do Programa na cidade, no que concerne às demandas sociais e econômicas, bem
como entender seus rebatimentos espaciais.
As questões até aqui discutidas nos possibilitaram entender como se estruturou a
cidade de Patos e seu espaço urbano, como se configurou o seu crescimento e qual o papel
exercido pelo Estado, em seus diversos níveis de poder, no processo de produção desse
espaço. Observamos que, apesar de a cidade ter se inserido na “onda” de planejamento urbano
frente às políticas de desenvolvimento regional da segunda metade do Século XX, pouco se
efetivou no que diz respeito à produção habitacional e à implantação de uma política urbana.
Essas condições provocaram uma rápida e desregulada dispersão no espaço urbano de Patos,
principalmente no que concerne ao uso residencial, mas, ao mesmo tempo, manteve a área
central bastante densa, em termos de oferta de serviços e trabalho.
O modelo de cidade espraiada (SANTOS, 1993) incorporado nessa época não só por
Patos, mas também por todas as cidades brasileiras, evidenciou e intensificou as
desigualdades socioespaciais em seus espaços urbanos. Entretanto, mesmo que, ainda hoje,
essas desigualdades sejam mais perceptíveis nas metrópoles e nas grandes cidades,
entendemos que elas têm sido cada vez mais evidenciadas nas cidades médias, devido às
102
características já mencionadas do atual processo de urbanização brasileira. Vale lembrar os
papéis determinantes do capital imobiliário e do Estado nesse processo. O primeiro,
selecionando os lugares onde serão alocados os recursos públicos a fim de atender aos
próprios interesses, e não, aos do todo social, e o segundo, criando condições de realização,
acumulação e reprodução do primeiro.
Nessa perspectiva, identificamos que a maior diferença entre a produção habitacional
em Patos, financiada pelo governo federal, através do BNH e do PMCMV, diz respeito,
inicialmente, ao aspecto quantitativo. Antes a produção se resumiu à construção de 705
unidades habitacionais com recursos do BNH repassados pela CEHAP. Hoje, com o
PMCMV, o número aproxima-se das 3.260 casas, considerando tanto as dos projetos
contratados quanto as dos que estão em fase de avaliação pela CEF47
, todos para atender às
famílias que se enquadram na faixa 01 de renda (até R$ 1.600,00). Se retomarmos o que
Cardoso e Aragão (2011) mencionaram sobre a necessidade de haver um mercado local
dinâmico para que esse tipo de investimento seja atraído, podemos inferir o motivo pelo qual
Patos não só tem concentrado como também tem alcançado um número tão elevado de
projetos através do programa em relação aos demais municípios do sertão da Paraíba.
Certamente, em termos quantitativos, esse aumento da produção habitacional com
recursos públicos (subsídios) e através de financiamentos é de suma importância para a
cidade, visto que, se todos os projetos apresentados forem aprovados e as cerca de 3.260 casas
forem construídas, aquele déficit nas classes de até três s/m seria quase superado. Por outro
lado, é necessário atentar para a forma como tem se dado essa produção e para os seus efeitos
socioespaciais no espaço intraurbano. Nesse sentido, considerar as formas de obtenção do
lucro e de definição do preço da unidade habitacional, no processo de reprodução ampla do
capital imobiliário, é fundamental. Para tanto, enfatizaremos as condições relacionadas aos
custos com o projeto e com a construção e ao valor da terra.
Nessa discussão, Shimbo (2010; 2011) mostra como as construtoras têm investido na
padronização do processo produtivo e das tipologias habitacionais, através do emprego de
inovações tecnológicas provenientes das técnicas de projeto e de gestão e dos avanços
trazidos pelas tecnologias de informação. Vale salientar que essas inovações não se dão
exatamente no âmbito do processo construtivo, visto que, na execução da obra, as técnicas
47
Dados da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Habitação de Patos, obtidos,
respectivamente, no ano de 2012, em conversa informal com a secretária em gestão da época e atualizados em
2014 através de entrevista com o atual secretário de habitação.
103
continuam sendo tradicionais, mas se estabelecem na forma de gestão de processos, no
sistema de informações e no método de controle de produção48
.
Essas condições, somando-se à padronização dos materiais e até mesmo dos
fornecedores, o que diminui as despesas com matéria-prima, têm maximizado os lucros das
empresas, embora também seja preciso lembrar que, nesse processo de maximização dos
lucros do setor imobiliário (principalmente no caso das construtoras), o emprego de uma
numerosa mão de obra, devido ao fato de o processo construtivo ainda ser bastante
tradicional, é outro fator importante, pois, segundo Lefebvre (2008, p. 119), é de onde se
formam a taxa de lucro elevada e “uma massa de mais-valia da qual uma parte retorna às
„empresas‟.”
Em Patos, essa tendência à modernização já vem sendo adotada pelas empresas,
como a JGA Engenharia Ltda., responsável por dois empreendimentos do PMCMV na cidade
(Figura 08).
Figura 08: Painel exposto na entrada do escritório da JGA Engenharia
Ltda, localizado ao lado das obras do Residencial Vista da Serra II em
Patos. Fonte: Pesquisa de Campo em fevereiro de 2014.
De acordo com o engenheiro residente responsável pela execução das obras, além de
prezar pelos selos de qualidade exigidos pela CEF (o ISO e o PBQP-H), recentemente, a
48
Cardoso, Aragão (2011) e Shimbo (2010; 2011) contribuem para o entendimento sobre o funcionamento do
sistema online de controle do trabalho empregado no canteiro de obras e a formação de bancos de projetos
arquitetônicos responsáveis pela padronização das tipologias de unidades nos empreendimentos, bem como os
efeitos dos usos dessas técnicas.
104
empresa tem investido na modernização do processo construtivo, com a substituição do uso
de alvenaria por placas de isopor e de concreto, entre outros materiais, e com a padronização
dos projetos, e no sistema de gestão, inserindo o conceito de formação de lideranças, com o
intuito de estimular e aumentar a capacidade dos trabalhadores envolvidos na obra para
aumentar a produtividade e manter o padrão estabelecido no processo construtivo.
Em relação ao processo de valorização da terra, é preciso fazer algumas
considerações. Sabemos que, no movimento de reprodução do capital imobiliário e para a
análise dos rebatimentos espaciais desse processo, compreender a questão do valor da terra-
mercadoria é de suma importância. Karl Marx, em seu livro “Contribuição à crítica da
economia política” (1983 [1859]), afirma que toda mercadoria é uma cristalização da mesma
unidade [o trabalho], ou seja, toda mercadoria é a materialização do trabalho social, em que a
mercadoria é entendida como “objeto de necessidades humanas, um meio de subsistência no
sentido mais amplo do termo”. Essas mercadorias têm valor: o valor de uso e o valor de troca.
No modo de produção capitalista, o valor de troca se sobressai em detrimento do valor de uso.
Rodrigues (2001) afirma que a terra urbana é um equivalente de mercadoria ou um
equivalente de capital. Contudo, tem uma particularidade em relação às demais mercadorias:
[...] a terra é um equivalente de capital, porque se “valoriza” sem trabalho,
sem uso. Para produzir renda o ter e o usar não estão juntos. Pauta-se nas
regras do jogo de valorização capitalista, que se fundamenta na propriedade
privada. Mas, é uma falsa mercadoria e um falso capital. É um valor que se
valoriza pela monopolização do acesso a um bem necessário à sobrevivência
e tornado escasso e caro pela sociedade. (RODRIGUES, 2001, p. 17)
Justificamos o uso do termo “valorização”, baseado nas afirmações supracitadas da
autora Arlete Moysés Rodrigues (2001) e nas de Villaça (2001). Esse autor afirma que o valor
do espaço não se confunde com os valores dos objetos, pois o primeiro é maior do que a soma
desses valores, porquanto envolve o valor da força produtiva representada pela aglomeração e
oriunda dela. Ainda Segundo Villaça (op. cit), como o espaço urbano é produzido pelo
trabalho social dispendido na produção de algo socialmente útil, esse trabalho produz um
valor. Nesse sentido, uma pergunta é fundamental: “Qual o produto desse trabalho?”. O autor
destaca que há dois valores a considerar e que nos apontam respostas para esse
questionamento. O primeiro é o dos produtos em si, como os edifícios, as ruas, as
infraestruturas etc.; o segundo é o valor produzido pela aglomeração, o qual é dado pela
105
localização daqueles produtos. Nesses termos, a localização se apresenta como valor de uso
da terra que, no mercado, traduz-se em preço da terra.
No capítulo anterior, com base nas orientações de autores como Rodrigues (2001),
Villaça (1986), Peruzzo (1984), Bonduki (2004), entre outros, vimos como a constituição da
propriedade privada da terra agravou o problema da moradia no Brasil. A terra urbana, cujo
preço é definido pelo movimento de valorização do capital, em geral, e pelo trabalho social
empregado na/da produção da cidade, constituiu-se como uma mercadoria de custo cada vez
mais elevado, principalmente para as famílias de renda mais baixa. Nessa mesma discussão,
mencionamos sobre como essa mercadoria se valorizam através da ação dos agentes sociais,
entre eles, o Estado, as diversas frações do capital e a sociedade civil organizada (CORRÊA,
1989) e sobre como a valorização seletiva do espaço produz as desigualdades socioespaciais.
Diante disso, queremos afirmar que, frente à necessidade de maximizar os lucros
com a produção de HIS, não atuam somente as construtoras através das já mencionadas
inovações tecnológicas e da formação de mais-valia, mas também um agente fundamental – o
incorporador imobiliário, visto que tem a capacidade de definir a lógica de produção e o uso
da cidade. Assim,
[...] no processo de sua valorização, o capital incorporador atua sobre a
transformação dos usos do solo urbano, buscando internalizar sob a forma de
lucros de incorporação, aquela parcela do excedente que seria, de outra
maneira, apropriada pelo proprietário fundiário. [... Essa] transformação dos
usos do solo [...] não é representada apenas pela intensificação/verticalização
de parcelas e/ou áreas urbanas ou mesmo pela mudança de uso residencial
para comercial, tal como em alguns momentos deixa clara a literatura sobre
o tema, quase que exclusivamente voltada para a análise de áreas
metropolitanas. A análise sobre o mercado imobiliário das cidades
consideradas [as cidades médias], entretanto, tem identificado a
transformação do uso agrícola em urbano ou ainda a permanente presença de
grandes vazios urbanos bem como a intensiva comercialização e
recomercialização de terrenos (áreas parceladas) como elementos centrais e
definidores dessas realidades urbanas. (MELAZZO, 2013, p. 07, grifos
nossos)
Nesse processo de transformação de usos do solo, principalmente nos casos da
mudança do uso agrícola para o urbano, as melhores localizações são destinadas para os
empreendimentos de alto padrão, enquanto que os terrenos localizados nas áreas mais
distantes e desprovidos de infraestrutura, serviços, comércio etc. são destinados aos
empreendimentos que atendem à população de menos rendimentos. Rodrigues (2001) afirma
106
que os investimentos de incorporação ao espaço urbano que demandam trabalho são
acrescentados à renda da terra e produzem uma valorização diferencial no espaço urbano.
Esses investimentos são direcionados distintamente entre as diversas frações de classes
sociais. Para determinar o preço da habitação, são acrescentados à renda da terra (absoluta e
diferencial) os lucros dos investimentos de incorporação, da construção da casa e os juros do
capital financeiro.
Assim, nesse movimento de constante valorização do espaço da cidade, em que
atuam proprietários fundiários, incorporadores e construtores, produzem-se cidades cada vez
mais dispersas e fragmentadas, onde, segundo Rodrigues (2001), formam-se a “periferia
pobre” e a “periferia rica”. Sem dúvida, é preciso reconhecer que, no atual processo de
urbanização brasileira, a periferia tem adquirido um conteúdo cada vez mais diverso49
,
resultado da disseminação das “novas formas de morar” e das “novas formas de consumir”,
com os condomínios fechados, shopping centers e as grandes redes de mercado, como afirma
Costa (2013), ao se referir à cidade de Campina Grande. Contudo, pelo menos nas cidades
brasileiras, sabemos que a periferia ainda continua sendo predominantemente o “lugar do
pobre” ou, no mínimo, sinônimo de precariedade nas condições de moradia para as famílias
cuja fonte de renda é apenas o salário mínimo, motivo pelo qual buscam os lugares de menor
custo com habitação.
Maia (2010, p. 09) assinala a existência de dois tipos de periferias: uma construída
com condomínios residenciais para a população de alta renda, que não é reconhecida como
periferia, e outra produzida para a população trabalhadora, com habitações precárias e
insuficiência dos equipamentos urbanos. A autora enuncia que o segundo „tipo‟ de periferia
não se configura como um espaço homogêneo, posto que “há várias periferias que a
constituem: a dos conjuntos habitacionais populares, a dos loteamentos irregulares e a das
favelas”.
Neste trabalho, a periferia da classe trabalhadora, mais precisamente, a dos conjuntos
habitacionais, é o nosso foco. O vasto referencial bibliográfico sobre o qual nos debruçamos
mostra que a maioria dos empreendimentos para Habitação de Interesse Social ou Habitação
Social de Mercado, como denomina Shimbo (2011), do PMCMV tem acentuado o processo
de periferização nas cidades onde são implantados, posto que é na periferia onde estão os
terrenos mais baratos, condição que aumenta a margem de lucro dos incorporadores e das
construtoras. Essa prática, bem como seus efeitos socioespaciais, é um dos motivos
49
Para aprofundar o assunto, consultar “Novos conteúdos nas periferias urbanas das cidades médias do estado de
São Paulo, Brasil” (SPOSITO, 2004).
107
frequentemente mencionados pelos pesquisadores ao apresentarem as semelhanças entre a
construção de conjuntos habitacionais pelo BNH e pelo PMCMV. No entanto, como já
afirmamos, a grande diferença é de que, com o setor privado como promotor dos projetos,
essa lógica passa a se fortalecer e a ser velozmente implantada também nas cidades médias,
como é o caso de Patos.
2.2.1 O PMCMV e o processo de periferização em Patos/PB
Sabemos que a periferia das cidades brasileiras tem se reconfigurado ao adquirir
novas formas urbanas e, consequentemente, novos conteúdos. Isso revela, nesse processo,
uma fragmentação social e territorial da cidade cada vez maior. Nesse sentido, Maria
Encarnação Sposito (2004, p. 125) assevera:
[...] os interesses fundiários e imobiliários são, sem dúvida, os motores
principais da extensão da cidade. A lógica de produção do espaço urbano
tem sido orientada pela implantação de novos loteamentos e pelo contínuo
lançamento de novos produtos imobiliários [...]. Essa lógica tem levado os
espaços urbanos a cresceram mais territorialmente do que demográfica ou
economicamente, como atesta o crescente número de lotes não edificados,
em cidades de diferentes portes. Nesses termos, a cidade é, mais do que
nunca, um negócio e, contrariamente, às tendências anteriores, o que se tem
na cidade atual é o espaço planejado, resultado da intenção e das estratégias
de mercado e não da história.
A partir dessa perspectiva, podemos entender o processo de periferização da cidade
de Patos. Constatamos que, antes, a periferia urbana dessa cidade se expandia mais por fatores
históricos e demográficos, por exemplo, os movimentos migratórios em direção a essa cidade,
que, muitas vezes, aumentaram a parcela da população que produzia suas casas através da
autoconstrução ou das práticas políticas segundo os interesses de uma elite fundiária local,
que mantinha fortes relações com o campo, mas que, ao mesmo tempo, investia em negócios
na cidade50
. É fato que o Estado, através da política habitacional e de desenvolvimento
regional, também exerceu influência nesse processo, embora a primeira tenha sido
quantitativamente menos expressiva, como averiguamos no capítulo 1. Além disso, a
especulação imobiliária também já se fazia presente com a manutenção de vazios urbanos nas
50
Cf. Patos em Revista (2011) – 2ª edição versão impressa, ampliada e revisada.
108
áreas centrais e com a constante elevação dos preços imobiliários, situação que observamos
durante a pesquisa documental. Entretanto, à medida que se verifica uma intervenção cada vez
maior do Estado, que financia o processo de ampliação e reprodução do capital imobiliário,
através de programas como o PAC, o PMCMV, entre outros, a cidade de Patos também se
transforma em uma cidade-negócio, resultante das intenções e das estratégias do mercado
local, regido sob uma lógica nacional. Destaca-se o fato de essa cidade dispor de vastas áreas
para expansão urbana, condição favorecida, inicialmente, pelo relevo do município (que se
caracteriza por ser ondulado a suavemente ondulado, com declividade média à baixa, exceto
nas áreas de ocorrência de inselbergs51
e onde se localizam as serras, cuja declividade é média
a elevada52
), mas que se concretiza, principalmente, pelo interesse dos proprietários fundiários
locais e incorporadores de transformar o uso do solo de antigas fazendas. Constatamos esse
fato com a grande quantidade de loteamentos aprovados entre os anos de 2000 e 201053
, que
antes eram áreas de fazendas contíguas à cidade. Como a demanda na cidade de Patos tem
sido bastante alta nos últimos anos, os ganhos imobiliários tanto para os proprietários
fundiários quanto, principalmente, para os incorporadores, vêm sendo imediatos, tendo em
vista as facilidades de obtenção de crédito e a rápida comercialização dos imóveis ainda “na
planta”.
O Mapa 04 (p. 109) e a Figura 09 (p. 110) mostram que a oferta de terras para
expansão urbana em Patos continua crescente, ora expandindo ainda mais as áreas já loteadas
ora configurando novos eixos de expansão. Essa condição foi reforçada com a aprovação da
Lei municipal nº 3.717/2008, que redefiniu os limites de expansão da área urbana de Patos,
ampliando-a ainda mais.
51
Afloramentos rochosos constituídos de rochas graníticas ou gnáissicas da era geológica pré-cambriana. No
Brasil, ocorrem do Nordeste ao Rio Grande do Sul, e sua altura varia entre 150 e 1.000 m. (MARTINS, 2010). 52
A topografia do município de Patos revela cotas situadas entre 240 a 580 metros. Esses dados estão
disponibilizados em trabalho organizado por Mascarenhas et al (2005) referente a um Projeto de cadastramento
de fontes de abastecimento por água subterrânea desenvolvido pelo Ministério de Minas e Energia para o
Programa de Desenvolvimento Energético dos Estados e Municípios (PRODEEM). 53
Fonte: PLHIS do Município de Patos/PB.
109
Mapa 04: Áreas loteadas e em oferta no mercado imobiliário da cidade de Patos/PB
Legenda: Áreas a serem/ou já loteadas na cidade de Patos
Fonte: PLHIS, setor de geoprocessamento da PMP. Organização: Wilma G. de Lucena
110
Figura 09: Limites da área de expansão urbana da cidade de Patos estabelecidos pela PMP Fonte: Lei nº
3.717/2008 e estudos do Setor de Geoprocessamento da PMP. Imagens: Google Earth, 2014 - Elaboração
própria.
Vale ressaltar que essas terras estão concentradas nas mãos de poucos proprietários
fundiários locais, que as vendem ou as incorporam na expectativa de valorizá-las com a vinda
(mesmo que futura) de estabelecimentos comerciais e de serviços, bem como da infraestrutura
urbana54
. Também é interessante para o proprietário vendê-las ou incorporá-las, com vistas a
atender a uma demanda específica, como a construção de HIS. Se relacionarmos essas duas
práticas, teremos parte da resposta para os questionamentos de Martins (2007) sobre a
permanência da prática de construção de conjuntos habitacionais sem infraestrutura e longe
das áreas centrais, que foi típica do BNH, permaneceu durante toda a década de 1990 e início
dos anos 2000 e perdura até os dias atuais com o PAC e o PMCMV.
Trazemos, então, à tona este questionamento levantado por Milton Santos (2012, p.
132): “Pode-se falar, assim, como resultado, num enriquecimento planejado pelos que
enriquecem, mas também planejado pelos planejadores do espaço? Nesse caso, poder-se-ia
falar, também, num empobrecimento planejado”. Portanto, constatamos a produção de uma
periferia bem planejada na cidade de Patos, do ponto de vista do mercado. Uma direcionada
para o usufruto das classes de renda média e alta, e a outra destinada à população de baixa
54
Singer (1982).
111
renda. Sobre essas duas periferias, faremos algumas considerações, aprofundando-nos no
segundo caso.
Em Patos, ainda não se configurou um eixo de expansão bem definido para a
comercialização de habitações voltadas para as classes média e alta. Porém, algumas áreas
têm se destacado pela elevação do preço/m² de seus terrenos. A primeira que podemos
destacar é o Jardim Redenção, localizada no Bairro Maternidade (sudoeste), na qual houve
uma valorização resultante da implantação de um condomínio fechado horizontal – o Villas
do Lago (área 01 do mapa 05, p. 113) e da infraestrutura que o seguiu. Concomitantemente,
os terrenos e os imóveis do Bairro Novo Horizonte (área 02 do mapa 05) e de seu entorno
também tiveram seus preços elevados, resultado dos pretensos investimentos públicos em
infraestrutura, mas, principalmente, por ter se constituído como lugar preferencial para a
construção de casas passíveis de serem adquiridas com financiamentos da CEF, direcionados
para famílias de renda média.
Ressalte-se, contudo, que, no processo mais recente de valorização da terra urbana na
cidade de Patos, em que se percebe uma associação entre os massivos investimentos em obras
públicas e a localização de novos empreendimentos comerciais, destacam-se as áreas:
a) a norte, como o Distrito Industrial e o Jardim Magnólia (área 03 no mapa 05),
onde tem havido investimentos na construção de habitações financiáveis pela CEF, cujas
vendas - a maioria - são realizadas com os imóveis ainda em planta e propagandeadas com a
possibilidade de financiamentos com recursos do PMCMV para a faixa 02, além da
acessibilidade favorecida por se encontrar à margem da BR-230;
b) a leste/sudeste (áreas 04 e 05 no mapa 05), onde se encontram terrenos
favorecidos pela construção de uma obra realizada com recursos do PAC – a Alça Sudeste -
via que liga a BR-230 ao centro da cidade sem, necessariamente, ter-se que passar por dentro
dela; pelo anúncio da vinda do primeiro Eco-Shopping da Paraíba (investimentos do Grupo
Bollevard), pela expectativa da vinda de um supermercado da Rede Hiper Bom Preço e de
estabelecimentos públicos e filiais das principais lojas da cidade, todos a serem construídos
nessa área, além da proximidade com o Rodo Shopping, com a BR-230 e com o aeroporto.
Nessas áreas da cidade, bem como nas de mais centralidade, não é interessante para o
mercado adquirir terrenos para a construção de habitações populares, posto que a realização
de outros tipos de empreendimentos que auferem uma renda fundiária mais elevada é mais
rentável o que, por conseguinte, inviabiliza a construção de habitação para a população pobre,
já que o preço da terra é muito elevado.
112
É fato que, nessas localizações, também habita uma população pobre, que sofre com
diversos problemas habitacionais, dentre eles, o da coabitação. Contudo, entendemos que a
gradual valorização dessas áreas, ao invés de incluir e beneficiar essa população, afasta-a
socialmente, visto que os novos consumidores desses espaços chegam impondo padrões e
possibilidades de consumo diferenciado. Essas diferenças vão se apresentando de maneira
cada vez mais nítida na paisagem. Somadas a isso, estão as condições de acessibilidade e de
deslocamento para o consumo de bens e serviços, o que torna a moradia na periferia muito
mais dispendiosa para as famílias de baixa renda do que para aquelas cuja renda mensal é
mais elevada e que se deslocam predominantemente com transporte individual.
Assim, o que resta à população de baixa renda é a periferia desprovida de
infraestrutura e de serviços, que não é distante apenas fisicamente, mas também socialmente.
113
Mapa 05: Localização dos novos empreendimentos imobiliários na cidade de Patos/PB que têm provocado o aumento do preço/m² nas áreas em que
se localizam.
Fonte: PLHIS. Imagem: PLHIS. Organização: Wilma G. de Lucena
Legenda:
Condomínio Villas do
Lago
Loteamentos no entorno
do Novo horizonte
Jd. Magnólia e Distrito
Industrial
Jds. Floresta e novos
loteamentos
Alça sudeste e novos
loteamentos
1
2
3
4
5
114
Figura 10: Condomínio Villas do Lago
Fonte: skyscrapercity.com
Acesso em fev. de 2014
Figura 11: Loteamento no Bairro Novo
Horizonte. Fonte: site Patosonline.com
Acesso em fev. de 2014
Figura 12: Casa à venda no Jd. Magnólia
Fonte: Site Vivaanuncios.com. Acesso em fev.
de 2014.
Figura 13: Casas dos Condomínios Jd.
Floresta. Fonte: Pesquisa de Campo, março de
2013
Figura 14: Outdoor do projeto do EcoShopping
que vai ser construído. Fonte: Pesquisa de
Campo, set. de 2013
2 1
3 4
5
Áreas localizadas no Mapa 05
115
Em Patos, nota-se que, apesar de muitos dos componentes que configuram o
problema habitacional, tais como adensamento excessivo, assentamento precário, risco de
inundação, entre outros, apresentarem-se em áreas consolidadas e bem servidas ou próximas a
elas, a solução mais recorrente para o problema habitacional é “empurrar” as famílias de baixa
renda para a periferia, através da construção de conjuntos habitacionais populares nas
localidades distantes e precárias da cidade.
Em um mapeamento realizado para subsidiar a elaboração do PLHIS da cidade, foi
constatado que, embora as áreas que apresentam sérios problemas de adensamento ou que se
caracterizam como assentamentos precários estejam sob o risco de inundação, entre outros
problemas, elas estão localizadas em bairros bem servidos de infraestrutura e serviços de
saúde, educação, transporte e comércio, exceto, a nordeste, na área do matadouro, a leste (em
uma área do Bairro Sete Casas) e no extremo sul, no Alto da Tubiba (Mapa 06, p. 116).
Apesar disso, as intervenções para a produção habitacional que atende às famílias dessas
localidades as têm levado para áreas bem distantes (Mapa 07, p. 117), interferindo nas
condições de deslocamento para o trabalho e para o acesso a serviços básicos, já que, nas
áreas-alvo dos projetos, essas condições são escassas.
Nessas áreas, foram construídos alguns conjuntos habitacionais, através de
programas como o Pró-moradia, o PAC, um programa que contou com recursos da FUNASA,
entre outros. Todos esses conjuntos construídos, destinados a famílias de baixa renda e/ou que
moravam em casa de taipa e que estavam cadastradas na PMP, foram entregues com ausência
ou com sérios problemas de infraestrutura e/ou de oferta dos serviços básicos, sem contar os
problemas apresentados em alguns, no que se refere à estrutura física das unidades55
.
No que diz respeito aos conjuntos habitacionais financiados pelo PMCMV para
famílias da faixa 01 de renda (0 a 3 s/m), na cidade de Patos, segue-se a lógica de redução de
custos com a produção, ou seja, na gestão da obra, com a adesão à modernização dessa etapa
e, principalmente, na compra dos terrenos. Assim, esses conjuntos, junto àquelas casas que
atendem às famílias da faixa 02 de renda, cujos financiamentos têm se dado de forma
individualizada, têm reforçado o processo de periferização. No entanto, como já vimos, para
essas duas parcelas da população, que se diferencia por seus rendimentos mensais, morar na
periferia pode ter sentidos e efeitos diferentes concernentes à qualidade e aos custos de vida.
55
Consultar matéria que se reporta a denúncias sobre a péssima estrutura física das casas doadas pela prefeitura
municipal, em convênio com a Funasa. (Consultar suporte eletrônico deste trabalho).
116
Mapa 06: Áreas de ocorrência de problemas habitacionais como adensamento excessivo,
caracterização de assentamento precário e risco de inundação
Legenda: Áreas que apresentam problemas habitacionais.
Fonte: PLHIS e Setor de Geoprocessamento da PMP. Organização: Wilma Guedes de Lucena
117
Mapa 07: Áreas de intervenções habitacionais através da construção de novas unidades e regularização fundiária.
Fonte: PLHIS e Setor de Geoprocessamento da PMP
118
Atualmente, existem sete conjuntos habitacionais do PCMVM em Patos (Tabela 06),
entre os quais um foi entregue, dois estão em fase de execução da obra e os demais em fase de
avaliação pela CEF. Todos esses conjuntos se localizam em áreas periféricas da cidade
(Figura 15), alguns, inclusive, distanciados da malha urbana. A maior parte dessas áreas não é
servida pelas poucas linhas de transporte público existentes na cidade e são distantes dos
equipamentos de serviços básicos como saúde e educação.
Figura 15: Localização dos conjuntos habitacionais do PMCM na cidade de Patos – PB. Imagem: Google Earth,
2014. Fonte: Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Habitação de Patos (SEDEHAB). Elaboração própria.
Tabela 06: Conjuntos habitacionais financiados pelo PMCMV propostos para a
cidade de Patos até o ano de 2013
Denominação
do conjunto
Quantidade
de unidades
% em relação ao
total de domicílios
urbanos
Situação do
projeto
Faixa de
renda
Res. Vista da
Serra I
136 0,5 Entregue às
famílias
01
Res. Vista da
Serra II
109 0,4 Obra em execução 01
Res. Itatiunga 770 2,7 Obra em execução 01
119
S/d* - 1 500 Terreno em
negociação
01(entidades)
S/d – 2 1.114 Em avaliação pela
CEF
01
S/d – 3 500 Em avaliação pela
CEF
01
S/d – 4
132
0,5
Seleção de
construtora para
contratação
02
Total 3.261 11,6 ------ -------
Fonte: Prefeitura Municipal de Patos e CEHAP - Elaboração Própria
*Sem denominação. Esse Conjunto ainda não tem uma denominação definida pelo agente promotor.
Os Residenciais Vista da Serra I e II estão localizados no Bairro Monte Castelo. O
primeiro foi entregue às famílias em agosto de 2013, e o segundo tinha a conclusão da obra
prevista para janeiro de 2014, mas, até o mês de abril do referido ano (período de conclusão
da pesquisa de campo), a obra ainda não havia sido concluída. O término da obra do
Residencial Itatiunga, localizado no Loteamento Várzea de Jurema, às margens da BR-361,
estava previsto para abril de 2014, mas também não havia sido concluído até o momento da
conclusão deste trabalho56
.
Os demais conjuntos seguem sendo avaliados pela CEF, e de acordo com o atual
secretário da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e de Habitação de Patos
(SEDEHAB), o conjunto habitacional sem denominação 2 (s/d – 2)57
ainda não está
completamente aprovado porque estão sendo revistos alguns detalhes do projeto. O conjunto
s/d 4, localizado no Loteamento Cruz da Menina, foge às características dos demais
empreendimentos, no que diz respeito ao propositor do projeto e ao público-alvo, pois se trata
de um projeto elaborado pela CEHAP, que já tinha o terreno sob sua propriedade, além de ser
o único direcionado para famílias de 3 a 6 s/m.
Destacamos aqui a repercussão desses empreendimentos quanto:
a) ao total de unidades a serem construídas, representando 11,6% do total de
domicílios urbanos de Patos, contabilizados em 2010. Esse índice é bastante significativo,
tendo em vista a taxa de crescimento de domicílios entre os anos de 2000 e 2010, que foi de
20,8% (5.818 unidades), incluindo tanto as habitações de mercado quanto as habitações
populares construídas por programas governamentais.
56
Referimo-nos à redação final deste texto. 57
Como os projetos de alguns dos conjuntos habitacionais que ainda estão em avaliação pela CEF não têm
denominação, optamos por enumerá-los na mesma ordem em que se encontram na Tabela 06.
120
Considerando o déficit de 4.397 domicílios urbanos, a quantidade de unidades a
serem construídas é bastante representativa, contudo, reforça a ideia de que a solução para o
problema habitacional é unicamente a construção e a aquisição de novas unidades, em suma, a
obtenção da propriedade privada, o que afasta outras possibilidades de lidar com o problema.
Há muitas alternativas, já incansavelmente apontadas pelos movimentos sociais e por
pesquisadores sobre a questão, por exemplo, o aluguel subsidiado, a assistência técnica para a
promoção habitacional por autogestão ou para a compra de materiais de construção, entre
outras (ROLNIK e NAKANO, 2009; FERREIRA, 2012; LAGO, 2012), que, associadas à
aplicação de instrumentos de regulação e tributação para o uso e a ocupação do solo (SOUZA,
2010; MORAES NETTO e SABOYA, 2010), como os previstos no Estatuto da Cidade,
podem contribuir não apenas para o acesso à moradia, como também para oferecer as
condições mínimas de habitabilidade e sociabilidade. Em Patos, o recurso para essas
alternativas é inviabilizado por diversos motivos, a saber: a não efetivação da legislação local,
que se refere à aplicação dos instrumentos do Estatuto da Cidade; o fato de os agentes
imobiliários locais (que constituem uma elite fundiária local) influírem nessa legislação; e a
necessidade de legitimação de grupos políticos, evidenciada na quantidade de notas
divulgadas por meio de divulgação midiática a cada vez que um contrato é assinado ou um
empreendimento é entregue58
.
b) quanto ao porte dos empreendimentos, cujas dimensões físicas se assemelham
muito com os grandes conjuntos habitacionais construídos na época do BNH, principalmente
nas grandes cidades, ainda que o PMCMV tenha estabelecido um número máximo de
unidades habitacionais por empreendimento – 500 UH - ou a segmentação de condomínios
em 250 UHs. Isso ocorre porque as construtoras, ao tentarem viabilizar a racionalização do
processo produtivo, com o intuito de reduzir os custos da produção através dos ganhos com
produtividade, ampliam as dimensões físicas dos empreendimentos.
Sabemos que a maioria dos conjuntos habitacionais é construída nas áreas
periféricas, em muitos casos, distantes da malha urbana e, conseguintemente, desconectadas
das principais vias de transporte. Sendo assim, somando-se a essas condições a construção
desses conjuntos em grandes terrenos, isso dificulta uma ampliação da diversidade em termos
de usos, atividades comerciais, níveis de renda, etc., constituindo espaços homogêneos social
e fisicamente que, segundo Ferreira (2012), podemos denominar de espaços monofuncionais.
58
Esse meio, além do site da Prefeitura, os jornais locais (preferencialmente os de radiodifusão) e nos sites de
notícias locais. Sobre essa questão, ver Mercês (2011) para o caso da implantação de empreendimento pelo
PMCMV na região metropolitana de Belém.
121
Nesse caso, predomina o uso residencial, devido à sequência ininterrupta de casas e
quarteirões e à ausência de espaços que, proporcionalmente, possibilitem outros usos. Desse
modo, afastam-se as possibilidades de encontro, esvaziam-se as ruas, e o consumo de bens e
serviços é realizado em outros lugares. O comércio passa a existir nesses conjuntos, mas não é
mais do que pequenos e modestos estabelecimentos, cuja maioria é organizada no próprio
espaço da casa (em um dos quartos ou na sala) e surge com a demanda local e com a
necessidade de complementar a renda familiar.
Em Patos, tem sido recorrente a implantação de conjuntos habitacionais contíguos,
que formam esses espaços homogêneos social e fisicamente, caracterizados pela presença de
famílias de mesmo perfil socioeconômico, pelo mesmo padrão construtivo e tamanho das
casas e pelo uso predominantemente residencial. Exemplo disso é o Residencial Vista da
Serra I (RSV I - 136 UH), que foi construído ao lado de outros dois conjuntos (que somam
271 UH), cujos projetos foram realizados com recursos do PAC e ao lado do qual está sendo
construído o Vista da Serra II (RSV II - 109 UH). Há, ainda, a possibilidade de ser proposta a
construção do Vista da Serra III59
.
Desde 2012, temos acompanhado, através de pesquisas de campo, o dia a dia das
famílias que residem nessa localidade e constatado as condições referentes ao transporte
público e às atividades de comércio e serviço, o que será aprofundado e explorado no próximo
capítulo. É importante ressaltar que, além desse caso, há os demais projetos supracitados que,
devido à quantidade de unidades de cada um, podemos inferir que, possivelmente, a lógica de
produção será a mesma.
2.2.2 O papel dos governos municipais e estaduais na implantação do PMCMV
O setor privado tem sido o maior promotor dos projetos implantados pelo PMCMV.
Seus agentes têm mantido uma íntima relação com o Estado, que ao desempenhar seu papel
com a elaboração, a aprovação e a legitimação do programa em esfera nacional, bem como
facilitando a sua implantação nas demais escalas espaciais (estadual e municipal), vem
oferecendo garantias de viabilidade e lucratividade dos projetos para esse setor.
Desde quando passou a participar do PMCMV, em 2009, a Prefeitura Municipal de
Patos (PMP), através da SEDEHAB, vem realizando o cadastro das famílias que buscam
59
Essa informação sobre a intenção da construtora JGA de propor a construção da terceira etapa do Vista da
Serra foi obtida em entrevista com o engenheiro residente responsável pela obra. Data da entrevista: 27 de
setembro de 2013.
122
obter a casa própria através do programa. De acordo com essa Secretaria, atualmente, existe
cerca de 9 mil cadastros. Contudo, segundo o atual secretário de habitação, esse número não
corresponde à realidade, porque foram identificados vários casos de famílias duplamente ou
multiplamente cadastradas, pois, na ânsia de ser contemplados, todos os componentes da
família se cadastravam supondo aumentar as possibilidades de receber a casa mais rápido.
Assim, com o intuito de evitar esses problemas e gerir melhor essas informações, a
SEDEHAB passou a investir na informatização e na modernização do cadastro, o que
possibilitará mais precisão sobre qual é a real demanda habitacional de Patos.
Além do cadastro, a PMP tem tentado atrair um número maior de empreendimentos
por parte das construtoras para conjuntos populares pelo PMCMV, fato que levou o governo
municipal a elaborar e instituir o Programa Municipal de Desoneração Tributária, através da
Lei nº 4.055/2011. Em entrevista com o atual secretário de habitação, observamos que um dos
principais motivos por que a própria prefeitura não apresenta projetos é o fato de não dispor
de terrenos para a construção das casas nem de recursos para adquiri-los, tendo em vista os
elevados preços. Questionado sobre a possibilidade de utilização do instrumento jurídico da
desapropriação de terrenos vazios que não têm cumprido sua função social, o secretário não
apresentou nenhuma proposta concreta60
.
Nesse sentido, cabe questionarmos sobre qual tem sido o papel do governo municipal
na implantação do PMCMV em Patos. Sabemos que o programa pode ser acessado através de
diversas modalidades. Cardoso e Aragão (2011, p. 91) mostram que
[...] existem linhas de crédito para construtoras, para cooperativas (o MCMV
Entidades), para produção em áreas rurais e para cidades com menos de 50
mil habitantes. Os recursos do programa destinados às famílias com renda
entre zero e três salários mínimos são concentrados no Fundo de
Arrendamento Residencial (FAR) e distribuídos pela Caixa Econômica
Federal, a partir de avaliação dos projetos submetidos pelas empresas ou
entidades. Cabe ao poder público municipal, nesse modelo, a aprovação dos
projetos e organização da demanda, para as faixas de 0-3 SM, através da
realização de cadastros com o estabelecimento de prioridades de
atendimento. Os cadastros são encaminhados à Caixa que faz a distribuição
das unidades dentro dos empreendimentos aprovados para aquela faixa de
renda.
Os autores apontam, ainda, que há uma exceção e nesse modelo quando os governos
municipais ou estaduais doam o terreno ao FAR, o que contribui para que o poder público
60
Entrevista realizada com o Secretário de Desenvolvimento Econômico e Habitação de Patos, em 13 de
setembro de 2013.
123
defina, entre outros elementos, a localização do projeto. Às construtoras cabe, meramente,
executar a obra. No caso de Patos, o governo local tem se limitado a organizar a demanda e a
aprovar os projetos, com ressalva para o que foi proposto pela CEHAP que, dispondo de um
terreno, elaborou um projeto e lançou edital de licitação para a seleção da construtora
executora da obra. No entanto, não é porque o governo estadual foi o promotor do projeto,
nesse caso, que o conjunto habitacional terá uma localização melhor do que os demais, visto
que, da mesma forma que os outros, ele também será construído em área periférica da cidade,
carente, principalmente, da oferta de serviços básicos, principalmente transporte público.
Uma das exigências do PMCMV é a priorização de projetos cuja localização das
unidades seja a mais próxima possível de áreas urbanas já consolidadas e/ou contenham as
condições mínimas necessárias à moradia. Contudo, já vimos que, na prática, isso não
acontece. Em Patos, a infraestrutura mínima exigida pela CEF para a aprovação e a execução
dos projetos é disponibilizada, em sua maioria, com recursos do governo do estado, através da
CEHAP, que se propõe a construir os equipamentos comunitários, obras complementares de
pavimentação, drenagem, abastecimento de água, reservatórios elevados, adutoras ou
esgotamento sanitário etc. É o que expressa um funcionário da Companhia:
Assim, aconteceu, recentemente, com a implantação da Adutora que
alimentará o Conjunto Residencial Nossa Senhora da Penha em
Mamanguape (597 casas – PMCMV); está acontecendo em Campina
Grande, com a implantação de uma Adutora e de um Reservatório Elevado
que abastecerão as 1.948 unidades habitacionais em construção nos
loteamentos Acácio Figueirêdo e Raimundo Suassuna (PMCMV). Além
disso, nesses mesmos loteamentos serão construídos dois centros de saúde e
duas escolas. Também, na cidade de Patos, onde foi implantada a
Pavimentação de acesso e das vias internas do conjunto Residencial Vista da
Serra (132 casas), acontecerá, com a construção de um reservatório elevado
e a implantação de uma Adutora, para beneficiar o Conjunto Residencial
Itatiunga, onde estão sendo construídas 770 casas, através do Programa
MCMV, dentre outras cidades. (parte de um texto enviado por um
funcionário da CEHAP em outubro de 2013)
Sabemos, no entanto, que essas obras são muito mais onerosas do que deveriam ser,
porque aquela exigência acerca da localização dos conjuntos não vem sendo cumprida, o que
gera a necessidade de se implantar não uma infraestrutura complementar, mas uma
infraestrutura até então inexistente. Além das obras de infraestrutura, a CEHAP está
promovendo projetos de conjuntos habitacionais, doando terrenos próprios do governo do
Estado ou adquirindo esses terrenos e lançando editais de licitação para o chamamento de
124
empresas interessadas em realizar as obras. Essa necessidade de produzir habitação, que é
regida ora pela convergência ora pela divergência de interesses político-partidário, dissociada
de uma efetiva política de desenvolvimento urbano e de um controle e regulação da expansão
territorial da cidade, somando-se à legitimidade que assumiu o PMCMV em nível nacional,
“fizeram com que as administrações locais se tornassem meros coadjuvantes desse processo,
atuando mais no relaxamento dos controles do que de uma regulação efetiva” (CARDOSO e
ARAGÃO, 2011, p. 91).
A Constituição de 1988 conferiu aos municípios um papel muito importante, que é o
de conduzir a política territorial e urbana, através da elaboração de planos diretores e leis de
uso e ocupação do solo. Posteriormente, com o Estatuto da Cidade, foram criados os
instrumentos necessários para promover mais equidade social e territorial nas cidades, e a
PNH, através do SNHIS e do FNHIS, construiu a estrutura institucional e financeira
necessária para consolidar uma política habitacional que atendesse realmente à demanda
existente. Contudo, todas essas estratégias previstas e muito bem construídas foram pouco
consideradas na implantação do PMCMV. Se, de um lado, foram aceleradas as decisões do
governo federal sobre as propostas lançadas no PlanHab no eixo financeiro (BONDUKI,
2009), de outro, não foram adotadas as medidas consideradas indispensáveis na implantação
de uma política habitacional, ou seja, não foi promovida a integração dessa política com as
políticas fundiárias e de desenvolvimento urbano. Não por acaso, tem-se observado uma
intensificação do processo de periferização na maioria das cidades em que o PMCMV foi/está
sendo implantado.
2.3 A Política Nacional de Habitação (PNH) e o PMCMV: passos e descompassos
No decorrer deste trabalho, incorporamos a afirmação quase unânime, entre os
pesquisadores aqui referidos, que se detêm sobre o problema da habitação, de que o maior
entrave para garantir o acesso à moradia e o direito à cidade perpassa pela questão fundiária,
mais precisamente, pela propriedade privada da terra. Assim, acreditamos que uma política
habitacional que não tenha em vista essa concepção dificilmente promoverá a produção de
cidades mais justas social e territorialmente, no máximo, atenderá à demanda urgente pela
obtenção de uma casa que sirva de abrigo.
Já constatamos que, durante o período de vigência do BNH, houve o estabelecimento
de uma política habitacional e de planos que induziam ao planejamento urbano, além de
programas de urbanização como o Projeto CURA, contudo, elaborados e executados de forma
125
fragmentada, um (o BNH) subjugando os demais (AZEVEDO e ANDRADE, 1982).
Procurava-se solucionar os problemas sem partir das causas, mas das consequências. Nesse
contexto, incentivos de planejamento urbano aos municípios para ordenar o crescimento das
suas cidades eram promovidos ao mesmo tempo em que se promovia o acesso aos recursos
que financiavam a construção de megaconjuntos, que contribuíam, juntamente com outros
condicionantes, para expandir as cidades, mas sem urbanidade, vale ressaltar. Talvez a única
forma que o planejamento urbano e a política habitacional tinham para se „encontrar‟ era
dentro desse círculo vicioso repleto de relações de troca de interesses entre o Estado e as
diversas frações do capital.
No início do governo Lula (no ano de 2003), foi marcante a retomada da implantação
de uma política habitacional que tivesse ampla repercussão nacional. Esse processo pautava-
se na construção de uma política participativa, democrática e descentralizada e, embora
muitas ações fossem se concretizando no decorrer do tempo, o percurso foi longo. Entre a
elaboração do Projeto Moradia e a aprovação do PlanHab, passou-se cerca de uma década.
Diferentemente disso, o PMCMV foi criado e implantado em um curto espaço de tempo,
devido às condições em que foi instituído e aos objetivos a que vinha atender.
Em sua execução, o Programa incorporou muitas medidas adotadas pelo PlanHab,
como o aumento significativo dos subsídios e dos créditos habitacionais, a desoneração
tributária para incentivar a produção de HIS, o barateamento do seguro e o uso do fundo
garantidor. No entanto, Nascimento Neto et al (2012, p 92) mostram que “a forma de
efetivação das diretrizes do PlanHab por meio do PMCMV conduziu a uma série de
distorções entre a intenção inicial e o resultado efetivo”. Aqui destacaremos uma entre essas
distorções: a deficitária integração entre a política habitacional e a política fundiária. Para
explicar como e por que as ações do PMCMV têm divergido em muito das medidas previstas
pelo PlanHab, descreveremos brevemente o desenho institucional da PNH e o seu conjunto de
instrumentos. Posteriormente, discutiremos sobre as camadas de conflitos que se sobrepõem a
essas estruturas, trazendo à tona o caso da cidade de Patos.
Nascimento Neto et al (2012) referem que, do ponto de vista teórico, os princípios
mencionados da PNH (tópico 2.1.2,) têm uma visão calcada nos conceitos de produção social
do espaço urbano e do direito à cidade, tão debatidos amplamente por autores como Lefebvre
(1974), Harvey (2005) e Gottdiener (1993).
Portanto, em sua elaboração, a PNH trazia a compreensão da complexidade do
processo de produção do espaço urbano e da cidade, entendendo esse espaço não apenas como
substrato físico, mas também como, na concepção de Gottdiener (op. cit.), um componente
126
que estabelece uma relação dialética com a sociedade, na qual convergem e divergem os
interesses dos diversos agentes que produzem esse espaço. Nessa perspectiva, a PNH avançou
bastante em relação à política habitacional vigente no período do BNH.
O desenho institucional da nova política de habitação (Figura 16, p. 127), através do
SNH (subdividido em SHM e SNHIS), e o conjunto de instrumentos dispostos no SNHIS,
criaram as condições necessárias para a implantação de programas que atendessem aos
objetivos de universalizar o acesso à moradia digna; promover a urbanização, a regularização
e a inserção dos assentamentos precários à cidade; fortalecer o papel do Estado na gestão da
Política e na regulação dos agentes privados; tornar a questão habitacional uma prioridade
nacional, integrando, articulando e mobilizando os diferentes níveis de governo e fontes de
recursos; democratizar o acesso a terra urbanizada e ao mercado secundário de imóveis;
ampliar a produtividade e a qualidade na produção das habitações; incentivar a geração de
emprego e renda dinamizando a economia (BRASIL, 2006). O incentivo à integração, entre
as ações voltadas para o desenvolvimento urbano, para a habitação e para a implantação de
uma política fundiária foi fundamental, situação em que o PlanHab e os Planos estaduais e
municipais de habitação cumpriam importante papel. Além disso, esses planos eram condição
necessária para se acessarem os recursos disponibilizados, bem como se viabilizar, por meio
dos seus respectivos Conselhos, a construção de canais de interlocução entre os diversos
níveis de governo e entre eles e a sociedade civil. Todavia, com o PMCMV, a vinculação dos
financiamentos concedidos com instrumentos de planejamento municipal passou a não ser
mais necessária61
, portanto, dispensava-se a necessidade de integrar o programa com a
política fundiária e de desenvolvimento urbano.
61
Neto et al (2012)
127
Figura 16: Estrutura do Sistema Nacional de Habitação (SNHIS) - Fonte: Aragão (2010) apud
Cardoso e Aragão (2011).
Quanto à participação popular na elaboração e na implantação do programa, o que
restou foi a modalidade em que cooperativas, associações de moradores e os diversos grupos
de movimentos sociais podem ser os promotores dos projetos. Mesmo assim, de acordo com
Nascimento Neto et al (2012), a distribuição de recursos é significativamente desigual, visto
que, enquanto a modalidade denominada “PMCMV entidades” contratou nove mil unidades,
entre os anos de 2009 e 2011, o setor privado contratou, por meio do Programa, cerca de 449
mil.
No que concerne à captação de recursos para a PNH, era necessário construir fontes
de recursos estáveis, tanto para financiamentos habitacionais quanto para subsídios, ou seja,
Sistema Nacional de Habitação
SFH
FGTS
SBPE
Sistema Nacional de Habitação
de Interesse Social
Sistema Nacional de Habitação de
Interesse Social
Ministério das Cidades
Órgão Estadual Habitacional
Órgão Municipal Habitacional
OGU
Fundo Nacional de Habitação
de Interesse Social
Orçamento Estadual
Orçamento Municipal
Fundo Estadual de Habitação
de Interesse Social
Fundo Municipal de Habitação
de Interesse Social
Plano Nacional de Habitação
Plano Estadual de Habitação
Plano Municipal de Habitação
Conselho Nacional das Cidades
Conselho Nacional das Cidades
Conselho Nacional das Cidades
SBPE
128
de recursos onerosos e não onerosos, bem como ampliar a destinação desses últimos com o
intuito de atender à população de baixa renda, que corresponde à maioria no déficit
habitacional. A criação do FNH foi crucial, sobretudo a parte que cabe ao FNHIS, já que a
estruturação da política de subsídios prevê sua vinculação à condição socioeconômica do
beneficiário, e não, ao valor do imóvel ou do financiamento. Além disso, eram importantes “a
promoção e o apoio às medidas de estímulo à poupança, voltada para habitação e implantação
de novos mecanismos de captação de recursos no mercado de capitais, reduzindo a
participação do poder público no atendimento à classe média e garantindo segurança jurídica
ao investidor” (BRASIL, 2006, p. 32). Nesse caso, à medida que o setor privado se constitui
como promotor da maioria dos empreendimentos financiados pelo PMCMV e consegue uma
segurança jurídica obtida através das medidas tomadas pelo governo, ao longo dos anos 2000
(como discutimos no tópico 2.1.1), os recursos públicos são canalizados para os processos de
reprodução do capital imobiliário e do capital financeiro, e o setor imobiliário fica com riscos
reduzidos, pois, ao contrário do previsto no PlanHab, o PMCMV ampliou as faixas de renda a
serem atendidas pelos subsídios do governo federal.
Por último, cabe mostrar que a autonomia na condução das políticas setoriais
urbanas, garantida para os municípios na Constituição de 1988, foi reforçada na PNH.
Entretanto, exigia-se “uma ampliação das capacidades institucionais e administrativas
municipais para operar a oferta de serviços públicos que, em grande parte do território
brasileiro, jamais aconteceu a contento, sobretudo quando se trata de municípios de médio e
pequeno porte” (PULHEZ, 2012, p. 103). Nessa perspectiva, incentivar o desenvolvimento
institucional era uma das diretrizes fundamentais, com o objetivo de, entre outras metas,
promover e apoiar “as ações, visando à criação e o aprimoramento de mecanismos e práticas
de planejamento e gestão, da modernização organizacional, da capacitação técnica de agentes
públicos e privados e da atualização do quadro legal-normativo” (BRASIL, 2006, p. 31).
O PMCMV, por sua vez, foi implantado no mesmo período em que muitos
municípios estavam elaborando ou concluindo seus planos locais de habitação, que ainda
seriam executados. Contudo, com a vinda do MCMV, esse processo de construção dos planos
foi „atropelado‟, posto que, diante da pressão política e econômica de acelerar o processo de
produção habitacional, do acesso mais rápido aos recursos proporcionado pelo programa e da
ausência de uma cobrança de vinculação dos financiamentos aos instrumentos de
planejamento urbano, os planos “perderam a vez” de configurar uma política habitacional
local, e só coube aos municípios a função de identificar a demanda e criar as condições fiscais
e econômicas necessárias para a vinda dos empreendimentos.
129
2.4 Da elaboração do PLHIS à implantação do PMCMV em Patos – ações convergentes
e divergentes.
No ano de 2008, a Prefeitura Municipal de Patos (PMP) lançou um edital de
licitação62
para contratar a empresa que faria o trabalho de assessoria técnica para a
implantação de um projeto do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES). Esse
projeto era o Programa de Modernização da Administração Tributária e da Gestão dos Setores
Sociais Básicos (PMAT), cujo objetivo era de “apoiar projetos de investimento da
Administração Pública Municipal voltados à modernização da administração tributária e à
melhoria da qualidade do gasto público, a fim de proporcionar aos municípios uma gestão
eficiente, que gere aumento de receitas e/ou redução do custo unitário dos serviços prestados à
coletividade”63
.
Na época, a principal responsabilidade da empresa contratada pela PMP era de
elaborar a Planta Genérica de Valores do Município de Patos, contudo, com esse serviço
técnico, essa mesma empresa realizou o trabalho de recadastramento imobiliário da cidade
(em 2010) que, por sua vez, serviu de base para atualizar o Imposto Predial e Territorial
Urbano (IPTU) e resultou na elaboração dos mapas da nova divisão de bairros da cidade, das
áreas de expansão, entre outros. Esses podem ter sido os primeiros passos do governo local,
na tentativa de fazer um diagnóstico das principais demandas e caracterizar o território do
município de Patos, mais precisamente, seu espaço urbano, que se encontra em acelerada
expansão, bem como o início da formação de um banco de dados que, posteriormente, foram
utilizados na elaboração do PLHIS de Patos, o qual foi aprovado no final do ano de 2013.
Concomitante a esses processos, o governo local anunciava sua adesão ao PMCMV,
no ano de 2009, bem como o início do cadastramento das famílias que se enquadravam no
perfil de faixa de renda que recebiam de zero até três s/m. Como preconizado pelo Ministério
das Cidades, a elaboração do PLHIS foi dividida em três etapas: a apresentação de uma
proposta metodológica, o diagnóstico do setor habitacional e as estratégias de ação.
De acordo com o documento gerado a partir da conclusão dessas etapas, percebemos
que foram realizados encontros (no final de 2012 e início de 2013) com os diversos agentes
envolvidos, direta e indiretamente, com a questão habitacional, como, por exemplo,
representantes do Conselho Gestor do Fundo de Habitação de Interesse Social (CGFHIS), da
SEDEHAB, das Secretarias de Infraestrutura e Serviços Urbanos, de Planejamento, de Ação
62
Com homologação na data 04-11-2008 e Nº da licitação 000832008 63
Ver texto sobre o PMAT no site do BNDS, cujo link está disponível no suporte eletrônico desta pesquisa.
130
Social, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, União das Associações Comunitárias
de Patos e Região, sindicatos, entre outros, embora os anexos do PLHIS mostrem apenas o
encontro em que o documento foi apresentado depois de ser elaborado. O referido documento
afirma que, além do que foi levantado nos encontros, o diagnóstico se baseou nos dados do
censo 2010 do IBGE, do Déficit habitacional do ano 2000, divulgado pela Fundação João
Pinheiro, e nos dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
De acordo com o PLHIS, aprovado neste ano de 2014, os pressupostos adotados para
o tratamento das necessidades habitacionais em Patos são:
1. Reduzir de 11,9%, em 2011, para 6%, em 2023, o percentual de déficit
habitacional acumulado e a demanda demográfica futura por moradia;
2. Reduzir de 18,05%, em 2011, para 9%, em 2023, o percentual de inadequação
habitacional acumulado e a demanda demográfica futura por moradia;
3. Elevar de 69,9%, em 2011, para 85% o percentual de moradias adequadas em
Patos.
Os objetivos e as diretrizes gerais do Plano Local foram elaborados em concordância
com o que estava previsto no PlanHab, e as diretrizes específicas (Quadro 02, p. 130) foram
definidas considerando tanto os problemas e as demandas identificadas no diagnóstico
habitacional local quanto os eixos estratégicos definidos a partir dele. Para que os objetivos,
as diretrizes e os pressupostos fossem atendidos, foram elaboradas linhas programáticas a se
efetivarem a partir de seus elementos estruturadores – programas, metas e ações (Quadro 03,
p. 132).
Quadro 02: Matriz dos eixos estratégicos e diretrizes do PLHIS de Patos/PB
Eixo estratégico Diretriz específica
1. Estrutura institucional municipal
1.1. Fortalecer a gestão da política
habitacional, incluindo o planejamento
orçamentário e financeiro.
2. Bases de dados municipais
2.1. Melhorar e manter atualizada a base de
dados municipal voltada para o
reconhecimento dos problemas habitacionais
de interesse social, contemplando área
urbana e rural;
2.2. Constituir um banco de terras de áreas
131
públicas disponíveis no município e que, no
futuro, possam ser destinadas para HIS.
3. Legislação e normativos
3.1. Promover a capacitação dos técnicos
municipais no tocante à interpretação e
aplicação dos atuais dispositivos legais que
tratam da HIS e regularização fundiária;
3.2. Promover a revisão e atualização da
legislação municipal aplicável à HIS;
3.3. Regulamentar e operacionalizar os
instrumentos da política urbana previstos no
Estatuto das Cidades.
4. Demandas habitacionais de interesse social
4.1. Estabelecer metas de investimento
municipal para a produção de novas
habitações e equacionamento do déficit
habitacional, voltadas principalmente ao
atendimento de famílias com renda até 3 s/m;
4.2. Promover a regularização fundiária e
urbanística dos assentamentos e
parcelamentos passíveis de legalização;
4.3. Promover a melhoria das habitações
existentes, e
4.4. Estimular parcerias com empresas,
entidades do terceiro setor, instituições de
ensino e pesquisa e outras afins.
5. Aspectos relacionados à habitabilidade
5.1. Constituir programas voltados à
melhoria dos bairros, incluindo
investimentos em infraestrutura e
equipamentos sociais e comunitários.
6. Transparência e participação popular
6.1. Promover oficinas comunitárias visando
estimular a organização social voltada
especificamente para as questões
habitacionais;
132
6.2. Promover e estimular a participação da
sociedade civil nos órgãos de deliberação e
controle da política municipal de habitação.
Fonte: Documento final do PLHIS de Patos, ano 2013 - Adaptação própria
Quadro 03: Matriz das Linhas Programáticas e Programas de ação do PLHIS de
Patos/PB
Linha Programática Programa
1. Desenvolvimento institucional 1.1. Desenvolvimento institucional
1.2. Cadastro e gestão de informação
2. Aprimoramento legal 2.1. Revisão e atualização da Legislação
2.2. Implementação dos instrumentos da
política urbana
3. Provisão, melhoria e requalificação urbana
e habitacional
3.1. Regularização fundiária
3.2. Melhoria das condições de
habitabilidade
3.3. Fomento à produção habitacional de
interesse social
3.4. Provisão e melhoria habitacional
Fonte: Documento final do PLHIS de Patos, ano 2013
A elaboração de um PLHIS para a cidade de Patos é um grande avanço para a
implantação de uma política habitacional local, que busque, efetivamente, sanar o déficit
habitacional. Primeiro, do ponto de vista cultural, já que o planejamento não é recorrente em
cidades do mesmo porte de Patos, embora, na década de 1970, tenha se disseminado uma
“onda” de planejamento urbano que, segundo Déak (1999), realizou-se mais no papel do que
na prática. Segundo, do ponto de vista da concepção de planejamento propriamente dita e de
sua prática que, na década de 1970, caracterizava-se por ser “setorialista” e fragmentada, mas
que, atualmente, traz à tona a compreensão de que é extremamente necessária a integração
entre as políticas habitacional, urbana e fundiária, e, por último, do ponto de vista social, visto
que busca integrar a sociedade civil nos processos decisórios, aproximando-se ainda mais das
133
necessidades e das particularidades locais, além de não tratar o espaço urbano apenas em sua
dimensão física, mas também social.
Observamos que a adesão ao PMCMV, concomitante à preparação do PLHIS,
antecipou algumas ações previstas nesse plano para a cidade de Patos, principalmente no que
concerne à melhoria das condições de habitabilidade e ao fomento à produção habitacional de
interesse social (Quadro 03). Porém, o programa vem distorcendo os objetivos a serem
alcançados a partir das diretrizes traçadas (Quadro 02). Como exemplo, vê-se que, no que se
refere às melhorias habitacionais e à implantação de infraestrutura, o foco tem sido a
realização de projetos de grandes obras, como o Canal do Frango (considerada pelos gestores
locais a maior obra de macrodrenagem da cidade), a Alça Sudeste (novo acesso que liga a
BR-230 ao centro de Patos), entre outras. Porém, como a revisão e a atualização da legislação
municipal (também previstas no plano) ainda não foram concretizadas, essas obras acabaram
impactando os preços de terrenos mesmo nas áreas periféricas da cidade.
Durante a pesquisa documental, constatamos que podem ser muitas as dificuldades
de se implantarem os programas de “Revisão e atualização da Legislação” e a
“Implementação dos Instrumentos da Política Urbana”, posto que algo simples como o acesso
à documentação a que se referem esses programas é dificultado pela falta de organização e de
armazenamento desses documentos e pela desarticulação entre o setor administrativo e o
legislativo. Isso se justifica pelo fato de não encontrarmos em nenhuma secretaria, arquivo ou
setor jurídico da PMP algumas das leis que o PLHIS propunha que fossem revisadas, como a
Lei de Uso e Ocupação do Solo e a Lei de Zoneamento, que são de 1979. Esse fato só reforça
a afirmação sobre a desarticulação entre os setores administrativo e legislativo da PMP.
Das leis que foram listadas pelo PLHIS para serem revisadas, destacamos o último
Plano Diretor de 2006, que prevê a aplicação de instrumentos regulatórios e compensatórios
dispostos no Estatuto da Cidade, mas que os deixa a cargo de leis complementares e a Lei do
Perímetro Urbano de Patos (Lei 3.717/2008) já mencionada. Sobre o Plano Diretor, sabemos
que, até o momento, nenhum dos instrumentos previstos foram aplicados efetivamente.
Quanto à Lei do Perímetro Urbano, caso seja realizada a proposta de sua revisão, com o
objetivo de ampliar as áreas de expansão urbana, serão reforçados ainda mais os processos de
periferização e dispersão da cidade.
Assim, observa-se que a hierarquização do espaço urbano de Patos vem se
intensificando cada vez mais, através da especulação e da valorização seletiva desse espaço.
Essa condição é favorecida não só pela ausência de uma legislação local que impeça as ações
especulativas sobre o solo urbano, como também pelas circunstâncias desfavoráveis para o
134
aprimoramento legal que é necessário frente a essa realidade e que é prognosticado pelas
diretrizes referentes ao eixo estratégico, denominado de “legislação e normativos” (Quadros
02 e 03). Diante disso, vê-se que propostas como a de se formar um banco de terras público a
ser destinado à produção de HIS são praticamente inviabilizadas.
No que concerne à provisão de habitações, o governo municipal, na ânsia por ampliar
a produção habitacional, estimulou a vinda de empresas privadas através de isenção fiscal e
tributária com a Lei nº 4.005/201164
. Assim, devido ao acesso aos financiamentos para a
produção e a aquisição de casas pelo PMCMV serem bem menos burocráticos do que o
acesso aos recursos do FNHIS, principalmente pelo fato de não se exigir uma vinculação dos
projetos ao PLHIS, todas as propostas de projetos para a cidade até agora foram feitas pelo
PMCMV. Isso mostra o quanto esse programa tem absorvido os recursos voltados para a
questão habitacional, resultado de uma política de unificação de todos os programas sociais de
habitação que existiam na esfera do governo federal65
.
Outro fato que nos chama a atenção é que o PLHIS tem como referência, para os
valores das unidades a serem produzidas para as famílias de baixo rendimento, os mesmos
valores definidos para as casas do PMCMV para a faixa 01. Portanto, à medida que o teto dos
financiamentos sobe, devido, entre outros fatores, à especulação imobiliária, supõe-se que o
valor de referência para a produção de casas através do FNHIS também se eleva, o que
equivale à reprodução de uma lógica de mercado que, a princípio, deveria ser combatida pelo
próprio PLHIS.
É importante ressaltar que o eixo comum a todas essas questões diz respeito à
precária capacidade administrativa do município, à falta de integração entre as diversas
secretarias que, direta e indiretamente, lidam com a política urbana, habitacional e fundiária; à
falta de um quadro técnico que assuma efetivamente a responsabilidade de gerar e atualizar
informações, mapeamentos, banco de dados etc. que contribuam para a gestão de recursos e
do espaço urbano; à falta de uma legislação local condizente com a atual realidade e que
atenda, principalmente, às demandas sociais e aos princípios pressupostos na Constituição de
1988, no Estatuto das Cidades e no PlanHab. Somando-se a esses, ainda se apresentam outros
obstáculos, que foram discutidos por Marcelo Lopes de Souza (2010), como o imediatismo da
64
A Lei isenta as empresas privadas, as cooperativas e as associações que queiram executar projetos
habitacionais para famílias de 0 a 3 s/m do pagamento dos seguintes tributos: Imposto Sobre a Transmissão Inter
Vivos de Bens Imóveis (ITBI); gastos com a escrituração, parcelamento e demais trâmites para regularização e
registro do imóvel pelo empreendedor inicial; Imposto Sobre Serviços (ISS); Imposto Predial e Territorial
Urbano (IPTU), pelo menos até a conclusão do projeto e a entrega das unidades. O projetos devem estar ligados
ao PMCMV e/ou a programas habitacionais implementados pelo Governo do Estado da Paraíba. 65
Fato constatado na fala da Presidenta Dilma Rousseff, no lançamento do PMCMV 2, transcrita por Campos
(2011, p. 75).
135
maior parte da elite; a ausência de continuidade entre as administrações; as dificuldades
econômico-financeiras com que se depara a maioria dos municípios brasileiros e a ação dos
lobbies e de grupos de pressão de setores da elite local.
Assim, não há entraves para a implantação dos empreendimentos do PMCMV na
forma como estão sendo realizados hoje, ou seja, desvinculados de uma política urbana e
fundiária, porque, como referem Nascimento Neto et al (2012), evidencia-se uma fragilidade
no alcance do poder público municipal em coordenar a política habitacional e urbana, mesmo
existindo o CGMHIS e o PLHIS.
Vê-se que o próprio governo federal, através da criação do PMCMV, enfraqueceu a
participação e a intervenção do Estado em suas diversas esferas, na execução das políticas
mencionadas. Da mesma forma que o antigo Planasa e a SERPHAU ficaram a reboque do
BNH, vemos acontecer com o SNHIS e o PlanHab em relação ao PMCMV. Esse fato pode
ser observado com a diferença gritante entre o volume de recursos direcionados para ambos,
pois, enquanto o SNHIS movimentou cerca de R$ 2,4 milhões em 2009, o montante destinado
ao referido PMCMV superou os R$ 34 milhões. Convém enfatizar que a maior parte foi
destinada à produção de novas unidades habitacionais, pois, mesmo prevendo ações
destinadas à regularização fundiária, o programa não as tem realizado a contento.
Nessa perspectiva, vemos que a mesma pressão da agenda governamental, em nível
federal (sobretudo na meta quantitativa da produção habitacional), que se realiza também em
nível local, tem se chocado com toda a estrutura da PNH, em que o aspecto quantitativo tem
sido o principal indicador do desempenho da política habitacional. Já vimos que, nessa
conjuntura, as construtoras e as incorporadoras têm adquirido o papel de protagonistas em
relação ao Estado, o que tem resultado em efeitos socioespaciais preocupantes. Assim,
segundo Pulhez (2012), permanecemos diante daquilo que já se tornou típico da ação do
Estado na produção do espaço intraurbano no Brasil, isto é, a cisão entre o discurso e a
prática, entre o planejamento e a gestão66
.
Não é demais lembrar que essas ações de cunho econômico e político, tendo como
pano de fundo as demandas sociais, têm um rebatimento espacial em diversas escalas, (re)
produzindo os conflitos de interesses que regem os processos decisórios. Na escala do espaço
intraurbano, é possível nos aproximar dessa realidade de maneira que possamos compreender
as implicações no processo de produção do espaço e das práticas socioespaciais, bem como
66
Para uma breve discussão sobre a diferença entre Planejamento e Gestão, ler “Planejamento urbano e
ativismos sociais”, de Souza (2004).
136
entender de que forma os seus efeitos são percebidos e vividos pelos demais agentes sociais
envolvidos nesses processos.
Vimos, neste capítulo, alguns dos efeitos territoriais do PMCMV na cidade de Patos.
Contudo, propomo-nos a ir além. Precisamos compreender de que maneira o programa tem
repercutido não somente na demanda habitacional local, como também nas condições de
moradia da sua população e quais as suas implicações no que concerne às desigualdades
socioespaciais. É o que apresentaremos no capítulo 3, ao eleger como objeto de análise o
Conjunto Residencial Vista da Serra I.
137
CAPÍTULO 3 – ESPAÇO INTRAURBANO E O PMCMV EM PATOS-PB: O
RESIDENCIAL VISTA DA SERRA I
No final do Século XX e primeira década dos anos 2000, presenciamos, no Brasil, o
que se denominou de “boom econômico” nos espaços não metropolitanos, principalmente nas
cidades médias. Dentre os fatores que têm contribuído para a constituição desse fenômeno,
destacam-se a desconcentração espacial da atividade industrial, a difusão do comércio e dos
serviços especializados e o desenvolvimento do agronegócio, o que reforça a ideia de que as
referidas cidades têm sido focos importantes para a reprodução capitalista global, como
afirma Sobarzo (2008).
Nesse mesmo período, constatou-se, no país, um estreitamento das relações entre o
capital financeiro e o capital imobiliário67
, cuja tendência adveio das transformações da
dinâmica de acumulação do capital, que, no decorrer das últimas décadas, vinha conduzindo a
uma nova ordem econômica sob o comando hegemônico do sistema financeiro global
(PAIVA, 2007). Essa associação entre o capital imobiliário e o financeiro, no caso brasileiro,
foi favorecida pela ação do Estado, através das medidas jurídicas e políticas públicas já
mencionadas no capítulo anterior (tópico 2.1.1), e pela conjuntura econômica do país.
A necessidade de expandir o capital imobiliário e a busca por oportunidades de
valorizá-lo, ambos inseridos nesse processo de gradual financeirização, transformaram as
cidades médias em alvos promissores para investimentos imobiliários. O PMCMV, por sua
vez, consolidou as condições já favoráveis para essa expansão e valorização do capital
imobiliário, ao mesmo tempo em que, repetindo práticas da política habitacional passada
(BNH), contribuiu para intensificar problemas urbanos típicos das metrópoles também nas
cidades de menor porte.
As pesquisas que vêm se dedicando a investigar o espaço intraurbano das cidades
médias, por exemplo, Almeida Júnior e Withacker (2007), Melazzo (2013), Vieira (2011),
Pequeno (2009), entre outros, têm demonstrado que, nesses tipos de cidades, o “boom
econômico” intensificou problemas urbanos que, até então, eram típicos das grandes cidades e
das metrópoles. Nesse contexto, observa-se uma intensificação das desigualdades
socioespaciais oriunda, entre outros fatores, da diferenciação de acesso a serviços e
67
Para aprofundar as questões relacionadas a essa imbricação entre capital imobiliário e capital financeiro, no
atual momento de reprodução e acumulação capitalista em nível mundial, consultar a tese de Paiva (2007),
intitulada “A diáspora do capital imobiliário, sua dinâmica de valorização e a cidade no capitalismo
contemporâneo: a irracionalidade em processo”.
138
infraestrutura básicos à terra urbana, que acentua processos como a periferização, a dispersão
territorial da cidade e a segregação socioespacial.
Tendo em vista essas observações e as discussões realizadas nos capítulos anteriores,
nesse capítulo, analisamos os efeitos socioespaciais do PMCMV na produção do espaço
intraurbano de Patos. Contudo, com o intuito de aprofundar a análise na perspectiva de
entender o espaço não só como condição, meio e produto da reprodução do capital, mas
também como meio de consumo coletivo, ou seja, como forma de atender às necessidades de
se morar, habitar e viver em determinado lugar (CARLOS, 2008), desenvolvemos essa
discussão considerando as informações obtidas em pesquisa de campo, realizada em um dos
conjuntos do PMCMV da cidade de Patos – o Residencial Vista da Serra I (Figura 15, p. 118).
A escolha por esse local para o desenvolvimento da pesquisa se justifica por ter sido o único
conjunto habitacional para famílias com rendimento de zero a três s/m entregue até o
momento na cidade de Patos, enquanto, desde 2009, os financiamentos individuais pelo
PMCMV para famílias de faixa de renda maior (faixa 02 – de 3 a 6 s/m) têm sido bastante
numerosos, como verificamos nas propagandas dos novos empreendimentos imobiliários na
cidade.
Nesse momento, trazemos à tona a questão da produção do espaço urbano sob o nível
do habitar68
que, de acordo com Lefebvre (2008), reduz-se ao habitat por razões que estão
calcadas na ação da burocracia estatista e no ordenamento do espaço segundo as exigências
do modo de produção capitalista, ou seja, de reprodução do espaço social à escala planetária.
Assim, o “habitat foi instaurado pelo alto, aplicação de um espaço global homogêneo e
quantitativo obrigando o „vivido‟ a encerrar-se em caixas, gaiolas, ou „máquinas de habitar‟”
(LEFEBVRE, 1999, p. 79).
3.1 Caracterização do conjunto habitacional Residencial Vista da Serra I – RVS I e de
seus moradores
68
Carlos (2011, p. 56) afirma que “o espaço do habitar é [...] real e concreto, é aquele dos gestos do corpo, que
constrói a memória, porque cria identidades, reconhecimentos, pois a vida se realiza criando, delimitando e
exibindo a dimensão do uso. [...] Nesse espaço, coabitam os objetos e o corpo. O sentido do termo habitar está
na base da construção do sentido da vida, no modo de apropriação dos lugares a partir da casa, no emaranhado
dos lugares comuns, habitados, usados por sujeitos comuns, na vida cotidiana”. Sobre essa concepção a autora
tem como fonte Lefebvre (1999; 1978). Segundo esse autor: “A casa e a linguagem são os dois aspectos
complementares do „ser humano‟. [Esse] só pode habitar como poeta. Se não lhe é dado [...] uma possibilidade
de habitar poeticamente ou de inventar uma poesia, ele inventará à sua maneira. Mesmo o cotidiano mais
irrisório retém um vestígio de grandeza e de poesia espontânea, exceto, talvez, quando não passa de aplicação da
publicidade e encarnação do mundo da mercadoria, a troca abolindo o uso, ou o sobredeterminando”
(LEFEBVRE, 1999, p. 79).
139
O conjunto RVS I localiza-se no Bairro Monte Castelo, na cidade de Patos, e tem um
total de 136 UHs (Figuras 18), todas unidades residenciais unifamiliares. Foi construído ao
lado de outros dois conjuntos habitacionais, um denominado pela PMP de Polo Coureiro
(conhecido popularmente como Conjunto dos Sapateiros), com 50 UHs, e o outro chamado de
Novo Monte Castelo II, com 221 UHs (Figura 19), ambos construídos com recursos do PAC.
Além desses conjuntos, existe mais um que está sendo construído no mesmo loteamento do
RVS I, também financiado pelo PMCMV, denominado de Residencial Vista da Serra II –
RSV II. A obra do RVS I foi iniciada no primeiro semestre de 2012 e estava prevista para ser
entregue em fevereiro de 2013. No entanto, só foi entregue no mês de agosto do mesmo ano,
devido às mobilizações organizadas por famílias sem teto.
Legenda
Res. Vista da Serra I Res. Vista da Serra II Novo Monte Castelo II
Conjunto dos Sapateiros Área de ocupação por famílias sem teto
Figura 17: Localização da área do RSV I e dos demais conjuntos habitacionais localizados em seu entorno
Fonte: PLHIS – Setor de Geoprocessamento. Imagem: Google Earth, 2014 - Elaboração própia
140
Figura 18: Unidades Habitacionais (UHs) do Residencial Vista da Serra I
Fonte: Pesquisa de campo em setembro de 2013. Autora: Wilma G. de
Lucena
Figura 19: Unidades Habitacionais (UHs) do Conjunto dos Sapateiros
(Projeto PAC) - Fonte: Pesquisa de campo em setembro de 2013 -
Autora: Wilma G. de Lucena
O valor total da obra do RSV I foi pouco mais de R$ 6 milhões69
, e a construtora que
propôs o projeto, a JGA Ltda., tem sua sede principal localizada na capital do estado, João
Pessoa. Cada UH do RSV I tem 32 m², exceto as casas de esquina denominadas de PNE, que
são destinadas às pessoas idosas ou cadeirantes e que têm 36 m². É importante mencionar que
o valor total do imóvel, após de entregue pela empresa construtora, foi de R$ 45.000,00. No
69
Para obter outras informações do projeto, consultar o Apêndice D.
141
financiamento das casas realizado pela CEF, grande parte desse valor é subsidiada pelo
Governo Federal, e o restante é pago pelas famílias em parcelas mensalmente em 10 anos.
De acordo com dados coletados na pesquisa de campo, identificamos uma média de
três moradores por domicílio, o que se pode considerar razoável tendo em vista a quantidade
de cômodos (sala, cozinha, dois quartos e um banheiro) da casa. Contudo, se ponderarmos as
dimensões desses cômodos (ver Anexo C) e se considerarmos que houve casos em que
encontramos seis, oito e nove moradores habitando em uma mesma UH, as condições de
moradia tornam-se bastante precárias. Com a referida pesquisa e com a utilização de
questionários para colhermos informações sobre as famílias, no conjunto habitacional em
questão, foi possível observar e identificar algumas características sobre os seus moradores e
as condições de vida no local.
O perfil etário da população do RSV I é predominantemente jovem, como podemos
observar no Gráfico 01. Nesse caso, entendemos que, mesmo priorizando e atendendo a
famílias com idosos, como afirmou o secretário de habitação do município de Patos, a
população jovem e adulta é maioria pelo fato de constituir uma grande parcela na demanda
habitacional.
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
Do total de moradores entrevistados, 20 pessoas são do sexo masculino, e 78, do
sexo feminino. A maior parte dessas mulheres (66,7%) se apresentou como domésticas, ou
seja, “donas do lar”. Essa parcela da população do conjunto tem sua renda mensal composta
142
pelo salário do cônjuge e/ou por algum auxílio governamental (na maioria dos casos, o Bolsa
Família).
Considerando a renda familiar mensal (Gráfico 02), os habitantes do RVS I
caracterizam-se como população de baixa renda, porque a maior parte das famílias recebe, no
máximo, até um salário mínimo (s/m) por mês.
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
Além do caso das domésticas, cuja fonte de renda é o salário do cônjuge ou o auxílio
governamental, 21,4% dos entrevistados obtêm seu rendimento mensal através de trabalhos
temporários, por exemplo, as pessoas que apresentaram como profissão os trabalhos de
pedreiros ou de ajudantes de construção, carpinteiros, costureiras (corte e costura de tecidos,
sapatos de couro e bolas esportivas), pintores e catadores (as) de lixo. No percentual de
famílias cuja renda mensal é acima de um s/m, incluem-se os moradores entrevistados que
obtêm sua renda através de trabalhos fixos (tanto no mercado formal de trabalho, quanto no
informal), como os que trabalham como motoristas, cabeleireiras, auxiliares de escrita,
cozinheiras, vigilantes, padeiros, recepcionistas, garis, técnicas odontológicas ou que são
aposentados ou são autônomos.
Esse perfil socioeconômico justifica os elevados valores dos subsídios, recebidos
através do PMCMV por parte das famílias atendidas. Nesse sentido, embora as casas não
sejam 100% subsidiadas, o pagamento de boa parte do valor do imóvel, realizado pelo
Governo Federal com recursos não onerosos, faz com que o valor das parcelas a serem pagas
para o financiamento diminua bastante. Vale salientar que o valor do subsídio e,
consequentemente, das parcelas, são definidos de acordo com a renda familiar mensal
declarada no período do cadastramento (ver Anexo D – Ficha de cadastramento) das famílias
no PMCMV. Nesta pesquisa, identificamos parcelas que vão desde R$ 25,00 até R$ 70,00
143
(Gráfico 02). As parcelas no valor de R$ 25,00 representam um subsídio de R$ 42.000,00, ou
seja, quase o valor total do imóvel.
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
Como mostra o gráfico 03, o valor da parcela de R$ 25,00, ou seja, o subsídio de R$
42.000,00, é acessado por um grande número de famílias do RSV I, no entanto, segundo
depoimentos de alguns moradores, mesmo nesses casos em que os valores das parcelas são
mais baixos, há casos de inadimplência.
Ao serem questionados sobre o motivo que os levou a irem morar no conjunto RVS
I, os entrevistados concentraram suas respostas em dois dos motivos listados no questionário
utilizado (Apêndice A). Assim, 52% dos 98 entrevistados afirmaram que foram morar no
referido conjunto porque não tinham casa e receberam a em que estavam residindo, e 48%
falaram que pagavam aluguel e que essa foi a oportunidade de obter a casa própria. Essas
afirmações reforçam os dados sobre a composição do déficit habitacional do município de
Patos (Tabela 03, p. 100), que mostram que os dois componentes responsáveis por uma parte
considerável de sua demanda habitacional são a coabitação familiar e o ônus excessivo com
aluguel.
Sobre a procedência (cidade/bairro) dos moradores (Quadro 04, p. 144), do total de
98 entrevistados, 37 moraram quase dois anos em uma ocupação realizada em terreno público,
localizado próximo ao loteamento onde foi construído o RSV I e ao lado de onde está sendo
construído o RSV II. Portanto, no Quadro 04, estão relacionados os bairros onde essas
pessoas residiam antes de irem morar nos barracos construídos naquele terreno público. Nessa
ocupação, moraram 49 famílias, que receberam casas do RSV I. De acordo com moradores
que acompanharam todo o processo da ocupação do terreno público até o cadastramento das
144
famílias no PMCMV, essa conquista só foi garantida à custa de muita pressão e mobilização,
que culminaram com a tomada de posse das casas por essas famílias sem ter ocorrido a
assinatura do contrato dos financiamentos da CEF e a entrega das chaves. O processo da
ocupação e posterior assinatura dos contratos e a entrega das chaves das casas serão
discutidos nas páginas que seguem.
Quadro 04: Procedência dos moradores do RSV I (onde moravam antes)
Cidade/Bairro Nº de moradores
Patos - Monte Castelo 46
Patos – Jatobá 25
Patos – Mutirão 04
Patos - Santo Antônio 03
Patos - Santa Clara 03
Patos - São Sebastião (Beiral*) 03
Patos – Centro 02
Patos - Centro (Beco do Coloral*) 01
Patos - Belo Horizonte 02
Patos - Liberdade (Rua do Meio) 01
Patos - Bairro da Vitória 01
Patos - Jardim Queiroz 01
Patos - Bivar Olinto 01
Patos - Cruz da Menina 01
Catingueira – Zona Rural 01
Natal (RN) – Zona Urbana 01
Não informaram 02
Total 98
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
*Áreas caracterizadas pela presença de muitos becos e vielas e por um elevado adensamento
populacional
É importante observar que a maior parte dessas pessoas já morava ante no mesmo
bairro onde se localiza o conjunto RVS I, o Bairro Monte Castelo, e no Bairro vizinho, o
Jatobá, o que pode justificar o percentual de 67,3% de pessoas que destacaram que a vinda
para o RVS I não alterou suas relações com amigos e familiares.
145
No que se refere aos moradores que afirmaram que a relação com amigos e
familiares se modificou depois de irem para o conjunto habitacional, o que compreende
32,7% dos entrevistados, são dois os motivos principais: a distância do local e o fato de a área
em que se localiza o conjunto ser considerada perigosa e violenta. Esse discurso é reproduzido
por muitos dos próprios moradores do conjunto RVS I, que apontam como causa a
proximidade com os outros conjuntos habitacionais que já existiam no entorno, apontando
principalmente o Conjunto dos Sapateiros de ser o foco da violência no local. Quanto aos
problemas relacionados à localização, esses serão discutidos no tópico sobre as características
urbanísticas do referido conjunto.
Aqui é importante frisar que essas características referentes ao perfil socioeconômico
dos moradores do RSV I e à implantação do projeto no que concerne à localização, ao entorno
do conjunto e às unidades habitacionais, bem como outras características referentes à
paisagem, aos usos, ao consumo desse espaço e à intervenção estatal, nos ajudam a entender
os efeitos socioespaciais do PMCMV em Patos, onde se observa a intensificação das
desigualdades socioespaciais e do processo de periferização na cidade.
3.2 Das diferenças às desigualdades socioespaciais: algumas considerações
Segundo Carlos (2007), a diferenciação espacial é, historicamente, um tema central
da Geografia. Essa afirmação pode ser facilmente confirmada com apenas um breve passeio
pela própria história do pensamento geográfico. No entanto, de acordo com Souza (2007),
grande parte dos estudos (de geógrafos e de outras áreas do conhecimento) voltados para esse
tema privilegia mais o espaço do que sua produção e negligencia ou banaliza os estudos sobre
os produtores do espaço. Nesse sentido, concordamos Carlos (op. cit), ao demonstrar a
necessidade de se incorporar à questão da diferenciação o termo socioespacial, pois introduz
uma qualidade ao tema e nos obriga “a realizar o deslocamento da análise em direção à
compreensão do processo espacial, em sua determinação social” (CARLOS, 2007, p. 45).
Segundo a autora supracitada, no modo de produção capitalista, a produção do
espaço como momento da reprodução social apresenta uma contradição que revela outras - a
referente ao processo de produção social do espaço em conflito com sua apropriação privada.
Nessa perspectiva, Carlos (op. cit) afirma que a desigualdade70
e um centro explicativo da
70
A autora se baseia na noção de “desenvolvimento geograficamente desigual” sobre a qual discorreram Harvey
(2005) e Soja (1993). Ela afirma que essa noção traz uma contribuição indiscutível na atualização do debate
realizado no âmbito da Geografia, pois potencializa o plano social. Além disso, no centro do processo
146
diferenciação que, por sua vez, é imanente à produção espacial, “tanto em seu sentido real e
concreto (vivido, percebido praticamente, gerando segregações), quanto possível (a ideia de
que a desigualdade vivida pode produzir a diferença como negatividade)” (p. 48).
Dentre os muitos níveis em que se assenta essa primazia da desigualdade sobre a
diferença, Maria Encarnação Sposito (2011) discorre sobre dois: 1) A produção da
desigualdade é condição e expressão dos processos em que se observam a constituição da
sociedade ocidental e os esforços (tanto políticos como ideológicos) para a imposição de seus
valores sobre todos os outros através de padrões, da escala internacional à local; 2) Esse
movimento de constituição de uma unicidade é orientado pela ideia da possibilidade de justiça
e busca da igualdade ou da participação de todos na sociedade de consumo. Assim, “as
diferenças se transmutam em desigualdades, enquanto as desigualdades, assim observadas,
revelam as diferenças de poder de consumo ou de capacidade de decisão ou de possibilidade
de apreensão do espaço” (SPOSITO, 2011, p. 129). Entendemos que, embora essa produção
das desigualdades, através das diferenças do poder de consumo, de capacidade de decisão e de
apreensão do espaço seja bastante presente na relação entre as diversas escalas espaciais, ela
se evidencia ainda mais no espaço citadino, no espaço intraurbano.
Sobre a compreensão e a análise das desigualdades e da diferenciação socioespacial,
Sposito (2011) alerta que o estabelecimento de critérios e parâmetros como instrumentos
metodológicos, nos estudos que se atêm a essas questões, são adequados para tratar das
desigualdades, mas não para ler as diferenças. Além disso, ela afirma que, mesmo sobre as
desigualdades, os instrumentos de mensuração e suas variáveis não podem se tornar centrais
na leitura e no desvendamento do mundo, pois comprometeria (do ponto de vista intelectual) a
compreensão, já que não entraria no mérito das determinações das desigualdades.
Assim, como o objetivo principal deste trabalho é de analisar os efeitos
socioespaciais do PMCMV na produção do espaço urbano, no âmbito da discussão sobre as
desigualdades socioespaciais, buscamos não só compreender a composição dessas
desigualdades, como também entender os processos de sua produção.
Pensando nisso, realizamos, até o momento, uma análise com foco nas
determinações dessas desigualdades de poder de decisão sobre o espaço urbano e citadino,
como também de seu consumo e apropriação por parte da sociedade capitalista. No entanto,
reconhecemos que nossa abordagem tenha sido apenas de “sobrevoo”, do ponto de vista da
constitutivo da diferenciação, ilumina-se a noção de desigualdade que esclarece, por sua vez, a existência de uma
sociedade de classe que “diferencia seus membros a partir do lugar onde ocupam tanto na produção como na
distribuição da riqueza gerada. Trata-se, também, de considerar o papel da divisão espacial do trabalho como
elemento articulador/diferenciador dos lugares” (p. 47).
147
ação dos diversos agentes produtores do espaço, já que enfatizamos a ação do Estado e o seu
favorecimento à reprodução do capital imobiliário e financeiro. Mesmo assim, buscamos
contribuir intelectualmente para uma leitura crítica da realidade urbana brasileira. Por outro
lado, do ponto de vista dos sujeitos sociais, principalmente daqueles que passam por carências
diversas, também é importante entendermos como se compõem e se espacializam as
desigualdades.
Nesse sentido, trazemos Rodrigues (2007, p. 74), ao afirmar que “a desigualdade
socioespacial exprime formas e conteúdos da apropriação, da mercadoria e da espoliação da
força de trabalho, da acumulação desigual no espaço, da presença e da, aparentemente
paradoxal, ausência do Estado capitalista no urbano”. Essas formas são facilmente visíveis na
paisagem urbana, mesmo nas cidades de menor porte. Nessa perspectiva, entendemos que
analisar elementos como densidade populacional e habitacional e a distribuição das classes
sociais no espaço nos possibilita entender como se apresentam as desigualdades na cidade e
como se configura essa acumulação desigual no espaço de que fala a autora supracitada.
Observando os mapas 08, 09 e 10, que mostram a distribuição de classes por rendimento
mensal, o adensamento habitacional e populacional de Patos e associando esses elementos,
podemos entender como essas desigualdades se espacializam na cidade.
No mapa 08, a densidade demográfica se concentra em áreas mais centrais e já
consolidadas, portanto, há lugares que permitem mais acessibilidade aos seus moradores71
.
Por outro lado, apresentam uma taxa de ocupação bastante elevada, por serem áreas
constituídas de pequenos lotes e que formam extensos becos e vilas, o que compromete a
qualidade de vida e deixa a infraestrutura e os serviços oferecidos sob pressão, devido à
elevada demanda.
As áreas periféricas em que há uma densidade demográfica média surgiram com a
implantação de conjuntos habitacionais e com ocupações irregulares de terrenos públicos,
como os Conjuntos Vila Mariana e Noé Trajano – ao norte, Conjunto Bivar Olinto e a
ocupação na área denominada Vila Teimosa – a oeste, o Conjunto Nova Conquista ao
extremo sul, que se adensaram com o decorrer do tempo, principalmente por serem áreas que
também apresentam elevada densidade habitacional. Destaca-se também o Bairro São
Sebastião (a nordeste), por ter, em relação aos demais bairros, um grande número de setores
censitários com elevada densidade demográfica e que apresentam as características citadas
sobre as áreas mais próximas do centro.
71
Ver Villaça (2001).
148
Mapa 08: Densidade demográfica por setores censitários na cidade de Patos em
2010
149
Mapa 09: Densidade habitacional por setores censitários na cidade de Patos em 2010
150
Mapa 10: Distribuição de renda por setores censitários na cidade de Patos em 2010
151
O Mapa 09 (p. 149) nos mostra que é predominantemente nas áreas periféricas que se
verifica o problema do adensamento habitacional, onde estão os conjuntos habitacionais
construídos na última década, bem como os loteamentos mais recentes, portanto, são áreas
que ainda apresentam uma baixa taxa de ocupação. Contudo, são áreas precárias, quando não
ausentes de infraestrutura e serviços urbanos. Esse mapa se torna ainda mais revelador de
como as desigualdades se apresentam no espaço patoense se o associarmos ao Mapa 10, que
mostra a distribuição de classes por rendimento mensal. Através dele, vemos que é
exatamente nessas áreas em que há grande adensamento habitacional, onde habita a população
de mais baixa renda - os mais pobres.
Devemos, no entanto, esclarecer que o mapa (Mapa 09), que mostra a densidade
habitacional e de distribuição de renda (Mapa 10), representa uma média, e não, a totalidade
de cada área (setor censitário) em destaque no mapa. Nesses locais, principalmente ao norte,
nordeste e sudeste, também habitam famílias de rendimento médio, como apresentamos no
capítulo 02 (Mapa 05, p. 113 – áreas valorizadas na cidade), pois têm se constituído
recentemente como áreas de expansão devido ao grande número de loteamentos implantados
nessas localizações.
Podemos afirmar que, em Patos, ainda não se evidencia um processo de segregação
socioespacial, porquanto ainda não há um eixo de expansão de determinada classe,
especificamente das classes média e alta, como define Villaça (2001), ao discutir sobre como
se configura a segregação no espaço intraurbano. Contudo, com base nos mapas ora
analisados e nos dados sobre a produção habitacional na cidade de Patos, podemos inferir que
há uma intensificação das desigualdades socioespaciais na referida cidade. Essa constatação é
possível ao evidenciarmos que é a população mais pobre que se encontra morando nas áreas
periféricas e que enfrenta o problema do adensamento habitacional e porque vimos que é nas
áreas (sul e oeste) com menor número de loteamentos voltados para os consumidores de renda
média e alta, portanto, áreas com pouca pressão por parte do mercado para a implantação de
infraestrutura, onde se encontram os conjuntos habitacionais construídos recentemente e os
que ainda serão construídos, em especial, os do PMCMV.
Observando os bairros na cidade, aproximamo-nos ainda mais dessa realidade, onde
as desigualdades socioespaciais se materializam, devido às diferenças no padrão construtivo
das casas, no arruamento, na presença ou não de infraestrutura e serviços. Nos bairros onde
habitam, majoritariamente, pessoas de renda mais elevada, os lotes são maiores, as casas têm
uma fachada ampla, há garagens, muros, ruas largas e geralmente arborizadas. Essas áreas se
caracterizam por uma boa acessibilidade, que proporciona fácil acesso ao comércio e aos
152
serviços especializados, bancos, shopping centers, restaurantes, praças públicas etc., condição
reforçada pela possibilidade de deslocamento para esse grupo social através do automóvel.
Por outro lado, onde a população de baixa renda habita, ou seja, a periferia pobre, encontram-
se favelas, loteamentos clandestinos, ocupações e conjuntos habitacionais implantados pelo
Estado. Nessas áreas, a maioria das casas é precária e com baixo padrão construtivo, as ruas
são estreitas e com péssima infraestrutura, e os prédios onde funcionam escolas, creches,
postos de saúde etc. também são precários. No primeiro caso, a apropriação do espaço, tanto
físico (terra e edificações) quanto social (no que concerne à reprodução das relações sociais
vigentes) é feita, predominantemente, pelo valor de troca. No segundo caso, esses mesmos
espaços são apropriados pelo seu valor de uso, ainda que essa apropriação seja mediada pela
realização do valor de troca.
Quanto à presença e à ausência do Estado nesses espaços, corroboramos Rodrigues
(2007), ao afirmar que
[...] a presença e aparente ausência do Estado aprofunda contradições
inerentes ao modo de produção capitalista. A presença diz respeito, entre
outras dinâmicas, à definição do salário mínimo, às normas jurídicas de
apropriação da terra, à legislação de uso da terra e edificações, à implantação
de infra-estrutura e equipamentos de uso coletivo. O Estado parece ausente
ao definir salários insuficientes para a reprodução da vida, não prover o
acesso universal aos meios e equipamentos de uso e consumo coletivo.
(RODRIGUES, 2007, p. 74)
Essa presença e paradoxal ausência de que trata a autora pode ser análoga ao
processo de implantação do PMCMV. O Estado se faz presente na elaboração e no desenho
da política pública, na criação de meios jurídicos, favorecendo o capital, e na provisão de
infraestrutura necessária para sua reprodução e para a obtenção de rendas fundiárias. Mas, ao
mesmo tempo, há uma aparente ausência desse mesmo Estado, tanto no que se refere à
participação direta na promoção dos projetos dos conjuntos habitacionais quanto à
viabilização da produção habitacional que proporcione acesso às áreas urbanizadas por parte
da população mais pobre.
Assim, ao se produzir o espaço como meio de reprodução do capital e como meio de
reprodução da vida (CARLOS, 2008), produzem-se as desigualdades socioespaciais que, no
atual momento em que se encontra a urbanização brasileira, têm se intensificado e se
expandido além dos espaços metropolitanos. Desse modo, vê-se, cada vez mais, o
agravamento dos problemas urbanos nas cidades menores, que, em muitos casos, já se
153
observam os processos de segregação e de fragmentação socioespacial72
. No caso da cidade
de Patos, percebe-se uma acentuação cada vez maior dessas desigualdades, resultante dos
processos que têm sido discutidos ao longo deste texto.
Aqui enfatizamos a (re) produção das desigualdades socioespaciais na cidade de
Patos, no atual momento de implantação de projetos do PMCMV. Para tanto, é mister
discutirmos sobre o que caracteriza o espaço intraurbano. Villaça (2001, p. 24) afirma que os
“produtos específicos resultantes da produção do espaço intraurbano não são os objetos
urbanos em si; as praças, as ruas ou os edifícios, mas suas localizações”. Então, a “produção
dos objetos urbanos só pode ser entendida e explicada se forem consideradas suas
localizações. A localização é, ela própria, também um produto do trabalho e é ela que
especifica o espaço intraurbano” (p. 24). A localização urbana é determinada, segundo o autor
citado, por dois atributos: uma rede de infraestrutura - vias, redes de água, esgotos,
pavimentação, energia etc. - e possibilidades de transporte de produtos de um ponto a outro,
de deslocamento de pessoas e de comunicação. Sobre a localização, Singer (1982) destaca o
quanto ela é importante na definição do preço dos imóveis, mostrando que, muitas vezes, as
benfeitorias (infraestrutura, por exemplo) realizadas no local são negligenciáveis nesse caso.
Concordamos com os autores Singer (1982) e Villaça (2011) sobre a importância da
localização nesse debate, contudo, entendemos que a existência de serviços e de infraestrutura
também seja um elemento importante na análise do espaço intraurbano, visto que reflete a
ação desigual do Estado no provimento das condições mínimas de moradia e, ao mesmo
tempo, favorece a especulação imobiliária, mesmo nos casos em que essas benfeitorias ainda
estão por vir, pois servem à prática denominada por Corrêa (2007) de antecipação espacial.
Essa prática consiste na transformação anterior da terra em reserva de valor e gera
expectativas de “valorização” sobre determinada localização. Além disso, a necessidade de
consumir bens e serviços traz à tona questões como a acessibilidade, o deslocamento na
cidade, o que, ora ou outra, remete ao tema da localização. Nessa perspectiva, buscaremos
analisar a produção do espaço intraurbano desvendando não apenas o „onde morar‟, mas
também o „como morar‟.
Nesse movimento, não atua somente o Estado, mas também os agentes
incorporadores73
, construtores, as imobiliárias que propagandeiam as “vantagens” de
determinados bairros em relação aos demais, além dos sujeitos que ali habitam/habitarão.
72
Para ver uma discussão sobre o novo padrão de segregação na realidade brasileira e sobre a noção de
fragmentação socioespacial, consultar Lago (1986).
154
3.3 Incorporação, construção e ocupação74
do Residencial Vista da Serra I: o uso do solo
como reprodução do capital e como reprodução da vida
De acordo com Carlos (2008), a cidade, como materialização do trabalho social e
instrumento na criação de mais-valia, é condição e meio para que se estabeleçam relações
sociais diversas. Nesse sentido, esse espaço apresenta um modo determinado de apropriação
que se expressa através do uso do solo, o qual constitui o modo de se ocupar determinada área
da cidade, a partir da necessidade de se realizar determinada ação, como produzir, consumir,
habitar ou viver.
Singer (1982) afirma que, como a cidade concentra grupos e indivíduos que exercem
as mais diversas atividades, o solo urbano passa a ser disputado para inúmeros usos. Essa
disputa se configura nas regras do jogo capitalista, que se fundamenta na propriedade privada
do solo. Portanto, “o uso do solo na economia capitalista é regulado pelo mecanismo de
mercado, no qual se forma o preço dessa mercadoria sui-generis que é o acesso à utilização do
espaço” (SINGER, 1982, p. 23, grifo do autor). Esse acesso ocorre através da compra de um
direito de propriedade ou do pagamento de um aluguel periódico. Ainda existem as formas de
acesso que não estão inseridas diretamente na lógica do mercado, como as ocupações de
terrenos/prédios públicos ou privados, por exemplo.
Percebemos, então, que, na disputa pelo solo urbano, não estão apenas as diversas
frações do capital (seja o industrial, o comercial, o incorporador ou outros), mas também os
demais agentes sociais que atuam na produção do espaço. Nesse movimento, o uso do solo
ora serve à reprodução do capital ora à reprodução da vida que, baseada nas relações sociais
capitalistas, configura-se como reprodução da força de trabalho. No jogo de interesses que se
faz presente nesse contexto, Smolka (1987) destaca o papel do incorporador, embora
saibamos que a separação entre a ação dos incorporadores e dos demais agentes do mercado
imobiliário não se apresenta nitidamente porque muitas vezes constituem o mesmo grupo.
O Estado, por sua vez, age como mediador no conflito de interesses entre esses
agentes e a sociedade, principalmente a população de renda mais baixa, pois, para ela, o que
prevalece não é o valor de troca da terra-mercadoria ou da casa, mas o valor de uso, embora
esse seja mediado pelo primeiro.
73
Para aprofundar algumas questões sobre o papel do capital incorporador, ver Smolka (1987), no texto “O
capital incorporador e seus movimentos de valorização”, e Melazzo (2013). 74
Sem entrar no mérito da discussão do uso dos termos invasão ou ocupação, aqui esclarecemos somente que
utilizamos o termo ocupação para nos referirmos a uma mobilização de famílias sem-teto que ocuparam
informalmente as casas que já estavam construídas e prontas para ser entregues. Esse movimento foi realizado
com o intuito de pressionar o poder público a garantir moradia a essas famílias e agilizar a entrega das casas.
155
Assim, procuramos entender a produção da cidade no movimento de uso do solo para
a reprodução do capital (nesse caso, o imobiliário e o incorporador) e para a reprodução da
vida. Para ambos, a ação do Estado é fundamental. Nesse sentido, a discussão será realizada
com base em dada realidade empírica - o conjunto RSV I na cidade de Patos – considerada
como materialização da ação do Estado (através do PMCMV), nesse processo de produção da
cidade ao qual nos referimos. Vale ressaltar, ainda, que realizar a discussão partindo de uma
realidade particular não implica dizer que serão destacadas as singularidades em detrimentos
dos processos mais gerais. Aqui retomamos o alerta de Pulhez (2012), mencionado no
capítulo 2, de que esses estudos empíricos e de realidades particulares possibilitam a
construção de um quadro extenso de leitura que nos permite compreender o contexto mais
amplo em que se inserem.
No capítulo anterior, vimos que se têm intensificado os processos de periferização e
dispersão territorial da cidade de Patos. Dentre os fatores, identificamos a presença de um
mercado imobiliário consolidado e a vinda de construtoras e incorporadoras de outras cidades,
o que tem aumentado cada vez mais a disputa pelo solo urbano nessa cidade, não só nas áreas
centrais, como também na periferia; a vinda de programas governamentais, através da política
habitacional, em especial, o PMCMV; problemas de gestão pública, no que concerne à
política urbana e fundiária; e a legislação local, que favorece a expansão do espaço urbano de
Patos. Em uma conjuntura como essa, o capital incorporador encontra muitas possibilidades
de atuar livremente e de comandar o processo de transformação do ambiente construído,
como demonstram Smolka (1987) e Melazzo (2013).
O processo de implantação do RSV I, localizado na cidade de Patos, reflete vários
aspectos da atual política habitacional, discutidos antes, principalmente no que diz respeito à
promoção do projeto, à determinação de sua localização, ao atendimento de serviços e
infraestrutura urbanos e às características urbanísticas dos projetos. O referido conjunto
habitacional, assim como a maioria dos projetos implantados nas demais cidades do estado da
Paraíba e do país, que teve como promotor o setor privado, localiza-se em área periférica da
cidade, e a participação do poder público em sua implantação limitou-se a organizar a
demanda, a aprovar o projeto, no que diz respeito à realização da obra (atribuições do poder
municipal) e prover a infraestrutura mínima necessária (realizada pelo governo do Estado).
Se observarmos a execução do projeto do conjunto RVS I, desde a aquisição do
terreno, é possível identificar uma lógica empreendida em escala nacional, no que concerne às
estratégias do capital incorporador, que foi favorecida, entre outros fatores, pela ação estatal.
Essa questão já foi bastante discutida e apresentada no capítulo 2.
156
Figura 20: Venda de terrenos, no ano de 2013, do loteamento Hardman Cavalcanti, onde se
localizam os Conjuntos Habitacionais Residencial Vista da Serra I e II (PMCMV). Fonte:
<http://issuu.com/alexsouto/docs/empresarial28>. Acesso em: janeiro de 2014
Para a realização do projeto do RVS I, o proprietário da construtora já possuía o
terreno, que foi adquirido em um momento anterior. Segundo o engenheiro responsável pela
obra, o processo de loteamento ocorreu da seguinte forma: foi realizado um primeiro
loteamento, no qual o proprietário desmembrou alguns lotes e os deixou como suas
propriedades; em seguida, juntou os demais terrenos novamente e loteou pela segunda vez,
agora com as características mínimas exigidas pela CEF para aprovar o projeto através do
PMCMV. Quando as unidades do RSV I estavam praticamente prontas, foi promovida a
venda dos lotes desmembrados daquele primeiro loteamento, cujos preços dos terrenos foram
estabelecidos em torno de R$ 18.000,00 (Figura 20). Vale salientar que essa mesma estratégia
de venda de lotes, pouco antes da entrega das unidades habitacionais às famílias sorteadas, foi
adotada também no terceiro conjunto a ser entregue na cidade no ano de 2014 - o Residencial
Itatiunga.
Sobre essas estratégias, Smolka (1987) faz algumas observações bem pertinentes, das
quais destacamos dois pontos: a realização de ganhos imobiliários dos empreendimentos e sua
157
relação com a formação e transformação das rendas fundiárias e a associação da dinâmica do
imobiliário com a estruturação interna da cidade.
Sobre o primeiro ponto, enfatizamos a questão relacionada à natureza dos ganhos
imobiliários. Esses, segundo o autor supracitado, são eminentemente fundiários, embora
dependam muito da conjuntura do mercado (pois, nesse momento, os primeiros proprietários
fundiários exercem certo poder de negociação). Além disso, esses ganhos também podem ser
decompostos em ganhos oriundos de economias de escala ou de ganhos financeiros e ganhos
de incorporação propriamente dita. Há, ainda, os ganhos de natureza mercantil, apoiados nas
estratégias de marketing, e o ganho financeiro, oriundo da expectativa de valorização futura.
“O importante, contudo, é que essas diferentes modalidades de ganhos, associadas ao
processo de valorização de diferentes capitais, não se realizariam isoladamente, mas tão
somente na operação imobiliária como um todo” (SMOLKA, 1987, p. 57).
No caso do RVS I, observamos a realização desses ganhos em diversos momentos:
na aquisição do terreno em que ainda não havia ocorrido uma valorização potencial, ou seja, a
terra-mercadoria ainda não havia se constituído como reserva de valor; na alteração do uso, o
que permitiu a expansão e a intensificação das condições sobre as quais incidem as rendas
fundiárias, e nas situações em que se buscava ampliar o número de usuários sobre os quais
recai a cobrança de tais rendas. Nesses termos, o Estado, através de suas diversas esferas de
atuação, criou não só as condições para reproduzir o capital incorporador, mas também os
diversos capitais envolvidos nesse processo.
O aumento do volume de crédito e, principalmente, de subsídios garantiu segurança e
um rápido retorno do capital investido. Além disso, a garantia da implantação de uma
infraestrutura mínima e da vinda de serviços urbanos dada pelo Estado proporciona ao
mercado imobiliário e aos incorporadores mais liquidez da valorização futura da área em que
se localiza o empreendimento, possibilitando a venda dos imóveis por antecipação espacial,
como denomina Corrêa (2007), por conseguinte, reforçando o discurso da compra do imóvel,
não por seu valor de uso, mas como um investimento, como podemos observar no folder de
vendas do Loteamento Hardman Cavalcanti.
Quanto ao segundo ponto, isto é, a associação da dinâmica do imobiliário com a
estruturação interna da cidade, enfatizamos, entre tantas questões abordadas por Smolka
(1987), a necessidade de mobilizar o Estado para seguir os empreendimentos, geralmente
através de inversões no ambiente construído. Essa necessidade se faz presente no movimento
de valorização dos empreendimentos, mesmo que seja apenas para gerar a expectativa da
valorização futura. No empreendimento do RSV I, essa situação fica muito clara, pois, ao
158
deixar reservado alguns lotes para venda posterior, o incorporador/construtor contava com a
garantia dada pelo próprio programa (o PMCMV) e pelos poderes públicos de que haveria a
implantação de uma infraestrutura urbana.
É preciso, no entanto, retomar a afirmação de Corrêa (1989) de que o Estado
constitui uma arena em que diferentes interesses e conflitos se enfrentam. Portanto, se, de um
lado, criam-se as condições de reprodução das diversas frações do capital, de outro, o Estado
é cobrado pelos demais grupos sociais a criar as condições de reprodução da vida através dos
meios de consumo coletivo, questões que abordaremos no próximo tópico.
É importante enfatizar que, mesmo representando um empreendimento que se insere
numa lógica maior de reprodução do capital, principalmente o incorporador e de reprodução
da força de trabalho, o RSV I, antes de tudo, tem, essencialmente, um valor de uso para as
famílias que lidam com os problemas oriundos do ônus excessivo com o aluguel, a
coabitação, as condições precárias de moradia ou mesmo a falta de um abrigo. Assim, para
atender a essa demanda, o Estado, através da política habitacional, cria meios para que a
população de baixa renda tenha acesso à moradia.
Recordemos, contudo, que, no âmbito do PMCMV, vivencia-se o paradoxo da
aparente ausência do Estado, sobre o qual discorre Rodrigues (2007) que, nesse caso,
configura-se enquanto o mercado imobiliário assume cada vez mais a responsabilidade de
promover os projetos, de fortalecer os processos de homogeneização nas diversas áreas da
cidade e de intensificar a diferenciação e as desigualdades socioespaciais com a dinâmica de
valorização seletiva do espaço. E mesmo no cumprimento de suas atribuições, como a entrega
das UHs, o Estado se mostra, muitas vezes, negligente, afirmação que levamos adiante tendo
como base não só o caso do RSV I, mas também do RSV II e do Residencial Itatiunga, pois
nenhum foi entregue no prazo previsto.
Sabemos que a intervenção estatal para atender às demandas sociais, na maioria dos
casos, ocorre somente sob pressão, seja através de reivindicações pontuais, seja através da
organização da sociedade civil por meio dos movimentos sociais. O processo de seleção das
famílias a serem contempladas e de entrega das casas do RSV I ilustra bem essa afirmativa.
Sabendo da grande demanda habitacional existente na cidade de Patos, das falhas
decorrentes da conferência dos dados cadastrais do PMCMV por parte do governo municipal
e com receio de que a entrega das unidades habitacionais fosse recurso para a prática do
clientelismo político, famílias que não possuíam casas ou que viviam em condições precárias
de moradia decidiram ocupar um terreno da PMP, ao lado da área onde seriam construídos os
159
conjuntos habitacionais RVS I e II (Figura 21). Essas famílias exigiam a garantia de que
receberiam casas mediante algum programa habitacional, fosse o PAC ou o PMCMV.
Figura 21: Barracos construídos pelas famílias sem teto nos arreadores do terreno
destinado à construção do Residencial Vista da Serra II e do conjunto habitacional
conhecido popularmente como “Conjunto dos Sapateiros”. Fonte: Pesquisa de campo
no 2º semestre de 2012. Autor (a): Wilma G. de Lucena
O descumprimento do prazo da entrega dos conjuntos habitacionais às famílias75
tem
sido recorrente. A situação não foi diferente com a entrega do RSV I. Embora a conclusão das
obras estivesse marcada para o mês de fevereiro de 2013, as unidades habitacionais só foram
entregues no mês de agosto. Segundo relatos dos atuais moradores do RVS I, a CEHAP, que é
o órgão público responsável pela entrega das casas, só entregou as chaves nesse período
porque, no mês de julho do mesmo ano, as famílias sem-teto, que moravam na ocupação ao
lado da obra, bem como em outras ocupações espalhadas pela cidade, decidiram tomar posse
das casas do RVS I sem ter ocorrido à assinatura dos contratos e à entrega das chaves. Esse
fato foi amplamente divulgado nos meios de comunicação via internet76
.
Devido às pressões ocasionadas por esse fato, as casas foram entregues no mês de
agosto de 2013 e foi garantido às 49 famílias que moravam na ocupação que cada uma teria
acesso à sua casa no RVS I.
75
Como foi o caso dos dois conjuntos propostos pelo governo municipal – o Conjunto dos Sapateiros e o Novo
Monte Castelo II. O primeiro foi ocupado por famílias sem-teto, devido à paralisação na obra e consequente
demora na entrega das casas. Ver link sobre essa notícia no suporte eletrônico deste trabalho. 76
Ver os links do site patosonline disponíveis no suporte eletrônico desse trabalho.
160
Diante da observação e da breve descrição do ocorrido, que não é um caso isolado na
realidade brasileira, vale retomar a questão sobre quem são os agentes produtores do espaço
urbano. Para Corrêa (1989), esses agentes são os proprietários dos meios de produção, os
proprietários fundiários, os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos. A
respeito desses últimos, o autor afirma que, no momento em que esses grupos buscam como
possibilidade de acesso a moradia os conjuntos habitacionais produzidos pelo Estado, eles não
se constituem como agentes “modeladores” do espaço urbano, porque aquela possibilidade
“pressupõe uma vinculação a um agente social, como o proprietário de imóveis [...], o
proprietário fundiário da periferia e o Estado”77
(CORRÊA, 1989, p. 30).
Nessa perspectiva, o que representam as mobilizações reivindicatórias, semelhantes à
que ocorreu no RVS I, no âmbito da produção da cidade? E da política habitacional vigente?
É fundamental ressaltar que essas reivindicações não contestam a lógica vigente de
produção do espaço, que tem no comando o setor privado e conta com o reforço do Estado.
Contudo, ao distinguir a ação do cidadão e do morador, Véras e Bonduki (1986, grifo dos
autores) fazem uma importante observação sobre o morador:
Essa luta por sua sobrevivência na cidade, ancorado na casa própria e no
trabalho, em um processo de luta individual e de “integração” urbana.
Procura obter serviços e equipamentos e, mesmo obtendo níveis mínimos de
sobrevivência, sente-se um “vencedor que ganhou o primeiro round de sua
batalha urbana”. Embora essa categoria possa, por vezes, ter limitado o
aparecimento do cidadão, que supõe a consciência da cidade como palco da
vida pública e da política e não apenas local de consumo, esse processo de
conquista das mínimas condições urbanas é essencial (VÉRAS e
BONDUKI, 1986, p. 44).
Quanto à atual política habitacional, essas reivindicações não contestam o desenho
institucional, a forma de promoção dos projetos, a distribuição dos recursos (créditos e
principalmente subsídios), bem como os efeitos socioespaciais já constatados. Nesses casos,
as exigências são no sentido de acelerar o atendimento da demanda de habitação de interesse
social e de realizar a implantação de equipamentos e serviços urbanos, visto que ainda
permanecem a lógica de produção e a entrega de conjuntos habitacionais localizados na
periferia desprovida de serviços básicos de saúde, educação, transporte etc. Vale lembrar a
77
Segundo Corrêa (op. cit., p. 30), é “na produção da favela, em terrenos públicos ou privados invadidos, que os
grupos sociais excluídos tornam-se, efetivamente, agentes modeladores, produzindo seu próprio espaço”, pois,
na maioria dos casos, é independente e a despeito de outros agentes.
161
observação de Véras e Bonduki (1986) de que, mesmo não chegando ao cerne do problema da
habitação, essas lutas são essenciais na conquista das condições mínimas de moradia.
Durante as pesquisas de campo realizadas no RVS I, no período após a entrega das
UHs do conjunto, percebemos que há um nível de organização mínimo não só entre os
moradores do RVS I, como também dos demais conjuntos habitacionais vizinhos. O principal
articulador das reuniões e das mobilizações é o presidente da associação de moradores, que
foi criada à medida que os conjuntos vizinhos (o dos Sapateiros e o Novo Monte Castelo II)
foram sendo entregues. Dentre as reivindicações, destacam-se a exigência do atendimento do
transporte público para a população dessa área e a construção de uma Unidade de Saúde
Familiar (USF), que são responsabilidades do governo local. Com a entrega das casas no RVS
I, essas mobilizações continuaram. Fato constatado em conversas com os moradores e quando
presenciamos a convocação da população a participar de reuniões na associação, cuja pauta
era anunciada através de um carro de som.
Rodrigues (2001) mostra, no entanto, que, ao se organizarem para obter serviços
públicos necessários à sobrevivência e, através do seu trabalho, conseguir “melhorias” para
seus locais de moradia, as mobilizações organizadas pelos moradores favorecem também a
valorização da terra-mercadoria. Nesse caso, entendemos que isso não ocorre só no caso dos
loteamentos irregulares, que a referida autora menciona, mas também nos conjuntos
habitacionais localizados nas áreas periféricas desprovidas de infraestrutura e de serviços.
Essas mobilizações reivindicatórias contribuem para aumentar o preço da terra, beneficiar os
proprietários fundiários, como Rodrigues (op. cit) destaca, e o capital incorporador, já que,
como aponta Smolka (1987), esse agente obtém ganhos com a prática de antecipação espacial
através da expectativa de valorização futura. Vê-se, portanto, a conformação do processo de
socialização capitalista sobre o qual Santos (2012) discute, em que o espaço, como produto do
trabalho social, é apropriado de maneira privada e desigual.
No movimento de valorização seletiva da terra urbana, empreendido pelo capital
incorporador, pelo mercado imobiliário e com a ação do Estado promovendo, desigualmente,
a produção dos meios de consumo coletivo e se fazendo ausente na aplicação de instrumentos
regulatórios do uso e da ocupação do solo, socializam-se os custos e o trabalho, mas não se
socializa o acesso a terra e aos serviços e aos equipamentos urbanos produzidos.
Retomando o foco da discussão, lembremos que essa produção das desigualdades
socioespaciais nas cidades médias, como no caso de Patos, não é uma reprodução fiel de
como se processa nas metrópoles e grandes centros, pois, assim como afirma Sobarzo (2004),
aquelas cidades não são minimetrópoles. Em Patos, as possibilidades de expansão do tecido
162
urbano ainda são muitas, e as relações entre os agentes produtores do espaço e o papel que
exerce no processo de urbanização e de globalização se manifestam em seu espaço
intraurbano de maneira diferente de como ocorre nos grandes centros urbanos.
Nessa perspectiva, entender, por exemplo, como o “longe” e o “perto” são
apreendidos, como as desigualdades se apresentam na paisagem e como, a partir dessas
questões, configuram-se os problemas urbanos e suas respectivas demandas, é fundamental
para os estudos sobre a cidade e o urbano. Para entender essas relações, partimos de três
escalas espaciais, no espaço intraurbano, elencadas em uma proposta metodológica
desenvolvida por Ferreira (2012): a inserção urbana, a implantação dos empreendimentos e as
unidades habitacionais. A partir dessas escalas, o autor define parâmetros de qualidade
urbanística e arquitetônica para detalhar e analisar os projetos definidos pelo pesquisador
durante a realização do estudo. Aqui, chamaremos esses parâmetros de características
urbanísticas dos conjuntos habitacionais, e a análise será desenvolvida sob o ponto de vista
social, porquanto foge às nossas atribuições e objetivos o olhar arquitetônico de maneira
técnica.
Assim, lembramos o alerta de Sposito (2011), já mencionado, de que essa escolha
metodológica ajuda-nos a entender mais a espacialização e a materialização das desigualdades
socioespaciais do que seu processo de produção propriamente dito, e é exatamente por isso
que as destacaremos a partir desse momento, visto que já discutimos, em outros momentos,
sobre as determinações sociais desse processo.
Sabemos que, ao analisar as condições de moradia de uma população e os efeitos
socioespaciais de um programa habitacional, como o PMCMV, que se restringem a alguns
elementos ou características, arriscamos deixar lacunas em questões que dizem respeito ao
cotidiano e às diversas outras formas de se apropriar do espaço. Contudo, essa escolha
metodológica nos permitiu focar o olhar em algumas questões pertinentes à discussão sobre a
produção do espaço intraurbano, a partir da questão habitacional - as relacionadas à
localização na cidade e ao consumo de bens e serviços.
3.4 Características urbanísticas do Residencial Vista da Serra I: onde e como morar
As características urbanísticas de um empreendimento imobiliário, como a
localização, a disponibilidade de infraestrutura e de serviços, a acessibilidade, entre outras
mais específicas, relacionadas aos usos do espaço e à paisagem, são fundamentais para se
compreender como determinado bairro ou empreendimento imobiliário se insere no processo
163
de valorização seletiva da terra urbana numa dada realidade. Essas características também nos
levam a entender como e onde moram as diversas frações das classes sociais que habitam a/na
cidade.
Os diversos estudos, já mencionados neste trabalho, como o de Campos (2011),
Cardoso e Aragão (2011), Pequeno e Freitas (2013), Rolnik e Klink (2011), entre outros,
sobre empreendimentos imobiliários financiados pelo PMCMV e suas implicações na
produção do espaço intraurbano, mostram que ainda permanece a lógica de periferização dos
conjuntos habitacionais, embora Cardoso e Lago (2013) destaquem a necessidade de se
realizarem pesquisas complementares que analisem os problemas reais desses novos
empreendimentos. Esses autores constataram que, ao longo das últimas décadas, a literatura
tem apontado para uma maior complexificação das periferias, com a criação de novas
centralidades fora dos núcleos centrais. Apesar de se referirem à realidade metropolitana,
sabemos que a mesma assertiva se estende também aos espaços não metropolitanos.
No caso da cidade de Patos, todavia, já observamos antes que se segue a lógica de
periferização dos conjuntos habitacionais financiados pelo PMCMV. Esse processo ocorre
tanto com os conjuntos habitacionais direcionados às famílias com renda mensal de 0 a 3 s/m
(faixa 01) quanto com aqueles cuja renda era acima dessa faixa (de 3 a 6 s/m – faixa 02),
como observa Ferreira (2012). Esse autor destaca que tanto as habitações de interesse social
quanto as destinadas ao segmento econômico (famílias que se enquadram na faixa 02 do
PMCMV) têm passado por problemas urbanísticos resultantes do espraiamento urbano, da
formação de bairros monofuncionais, da formação de áreas desarticuladas da malha urbana,
da padronização dos projetos, da ausência de áreas públicas de lazer e de equipamentos de
serviços públicos, da péssima qualidade construtiva das unidades habitacionais, entre outros
fatores.
Apesar disso, entendemos que é para os grupos de mais baixa renda - os
trabalhadores - que os impactos são maiores. Fato que constatamos quando presenciamos a
conformação daqueles problemas, concomitante à disseminação de um modelo urbano
baseado no uso do automóvel e no consumo de serviços ofertados nos espaços privados e/ou
ligados às grandes redes comerciais de hipermercados e shopping centers.
Diante do exposto, vê-se mais uma justificativa para que a pesquisa empírica deste trabalho
tenha sido realizada no Conjunto RSV I, por ser um conjunto direcionado a famílias de mais
baixa renda. A análise a partir das escalas espaciais de inserção urbana, implantação do
projeto e das unidades habitacionais desse conjunto, tendo como base suas características
urbanísticas, contribui para que se discuta sobre quais os efeitos socioespaciais do PMCMV e
164
sobre a reprodução das desigualdades na produção do espaço intraurbano de Patos,
principalmente no que concerne aos espaços de moradia da população pobre.
3.4.1 Inserção urbana do RVS I
De acordo com Ferreira (2012), os parâmetros ou variáveis que podem caracterizar
um empreendimento na escala da inserção urbana são: a localização e a acessibilidade; a
infraestrutura e os serviços urbanos e a fluidez urbana. Neste tópico, enfatizaremos os dois
primeiros pontos.
Sobre a inserção urbana, Ferreira (op. cit, p. 68) destaca que
[...] a adequada inserção urbana de um empreendimento habitacional é
garantida por boa localização na malha urbana, em regiões com
infraestrutura instalada e providas de serviços e equipamentos urbanos.
Além disto, o conjunto habitacional bem inserido na cidade deve estar
próximo de estabelecimento de comércio e serviços e equipamentos de
educação, saúde, cultura e lazer. A acessibilidade em tempo adequado a
centralidades regionais e locais e a integração à rede de transporte público
também são necessárias.
Já vimos, brevemente, como a localização se transforma também em mercadoria. De
acordo com Villaça (2001, p. 74), “a localização [...] é o valor de uso produzido pelo trabalho
coletivo, dispendido na construção da cidade” e, mais ainda, pelo trabalho dispendido na
produção da e na cidade. Portanto, a localização tem valor, e seu preço é a expressão
monetária desse valor. Ainda segundo esse autor, a terra urbana só interessa como “terra-
localização”, porquanto é um meio de acesso a todo o sistema urbano. Nessa perspectiva, a
acessibilidade
[...] é o valor de uso mais importante para a terra urbana, embora toda e
qualquer terra o tenha em maior ou menor grau. Os diferentes pontos do
espaço têm diferentes acessibilidades a todo o conjunto da cidade. A
acessibilidade de um terreno ao conjunto urbano revela a quantidade de
trabalho socialmente necessário dispendido em sua produção.
Podemos verificar a relevância da acessibilidade com as propagandas de
empreendimentos imobiliários que enfatizam a proximidade, com vias que facilitam o
deslocamento (preferencialmente de carro) e/ou a economia de tempo gasto no deslocamento
até o trabalho e lugares de consumo de bens e serviços. A partir disso, remetemo-nos à
165
afirmação de Leite (2011, p. 43) de que “uma das medidas básicas da acessibilidade é dada
pela disponibilidade de espaços viários ou de sistemas adequados à circulação”.
Na análise da localização de um conjunto habitacional, também é importante
considerar o porte do município e a extensão da área urbana, porque, quanto menor for essa
área, menor será a distância entre as áreas periféricas e as centrais, e menor será o tempo gasto
no deslocamento do lugar de moradia para os lugares de trabalho e de consumo de bens e
serviços.
Tendo em vista as considerações de Ferreira (2012) sobre como se constitui uma
adequada inserção urbana de um conjunto habitacional e as contribuições de Villaça (2001) e
Leite (op. cit), concluímos que os conjuntos habitacionais do PMCMV, na cidade de Patos
(tanto os que vão ser entregues quanto o que já tem moradores – o RVS I), não apresentam
condições favoráveis no que concerne à localização e à acessibilidade para sua população.
Essa afirmação se baseia nos dados e nas informações obtidos com a pesquisa empírica que
realizamos no RVS I e com a aplicação de questionários com os moradores.
O conjunto RVS I dista 4 km do centro da cidade. Sabemos que, se comparada com a
realidade de cidades de porte maior e com uma maior extensão de área urbana, essa distância
é relativamente pequena. Contudo, devido às condições de acessibilidade, essa distância se
amplia consideravelmente, como confirma a opinião dos moradores sobre a localização do
conjunto habitacional em relação à cidade como um todo, mas, principalmente, em relação ao
centro.
No que diz respeito à avaliação dos moradores sobre a localização do RSV I em
relação à cidade (Quadro 05, p. 166), percebemos que fatores como o deslocamento para o
consumo de bens e serviços e as condições desse deslocamento não foram considerados no
momento da avaliação. Nessa, embora tenham sido mencionados fatores como distância do
local de trabalho e a acessibilidade, prevaleceram opiniões com justificativas mais subjetivas,
voltadas para as relações interpessoais (principalmente familiares) e com o lugar ou que
tinham como parâmetro a comparação com outros conjuntos habitacionais que estão para ser
entregues na cidade.
Essas justificativas são um indicativo de que não é somente o consumo de bens e de
serviços ou as condições de deslocamento na cidade, mas também as possibilidades de manter
relações no/com os diversos espaços da cidade que levam esses moradores a perceberem o
espaço que habitam de diferentes maneiras. Contudo, sabemos que é através da lógica
capitalista de produção do espaço que as localizações são projetadas e vividas, portanto, é sob
166
essa lógica, em que o habitar transforma-se em habitat, que a riqueza socialmente produzida
na cidade é distribuída desigualmente.
Quadro 05: Avaliação dos moradores sobre a localização do RSV I em relação à cidade
Avaliação Justificativas Nº de moradores %
Outro Local bom para morar/ Bairro
tranquilo/ Perto da família/
Acostumou-se com o local
21 21,4
De difícil acesso As dificuldades com transporte 22 22,4
Bem localizado Comparação com a localização do
Residencial Itatiunga*/ Perto da
família
19 19,4
Longe de onde mora a
família
A distância de onde moram os
familiares
11 11,2
Isolado Distante de tudo/ Lugar sem
movimento
9 9,2
Longe do trabalho Distância do local de trabalho 9 9,2
Perto do trabalho Distância do local de trabalho 3 3
Afastado, mas perto do
centro
Distância do centro e dos demais
bairros da cidade
4 4,2
Área excluída - 0 0
Total - 98 100
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
* Conjunto habitacional localizado no Bairro Bivar Olinto (saída de Patos para Piancó - PB) que será
entregue neste ano de 2014.
Tendo em vista a discussão sobre como as localizações são produzidas na cidade,
chegamos à avaliação dos moradores sobre a localização do RSV I em relação ao centro da
cidade. Do total de moradores entrevistados, 64,3% afirmaram que o referido conjunto
habitacional é longe do centro e de difícil acesso, o que se verifica, principalmente, pelas
condições de deslocamento, pois grande parte da população depende do transporte público ou
de outro transporte, como mototáxi ou bicicleta. Nesse sentido, é fundamental destacar a
precariedade da oferta do serviço de transporte78
, uma vez que a principal reclamação
mencionada pelos moradores é a falta de circulação dos ônibus dentro dos conjuntos (tanto no
RSVI quanto no Novo Monte Castelo II e no Conjunto dos Sapateiros), o que levou 67,3%
dos moradores a mencionarem as dificuldades de acesso ao transporte público.
78
Existia apenas uma linha de ônibus cuja parada ficava próxima aos conjuntos habitacionais. Contudo, ela
deixou de existir logo após a conclusão da aplicação dos questionários durante a pesquisa de campo.
167
Além da falta de parada de ônibus dentro dos conjuntos, outras reclamações dos
moradores foram em relação ao tempo de espera, que chega a uma hora, em média (mesmo
nos horários de maior demanda), ao péssimo estado de conservação dos ônibus e aos horários
de funcionamento, visto que, de segunda a sexta-feira, a partir das 18:00 horas, os ônibus não
circulavam até o conjunto; no sábado, o serviço era oferecido somente até às 13:00, e nos
domingos e feriados, não havia prestação do serviço.
Contudo, ao serem questionados sobre o que achavam do serviço de transporte
público, 29,6% dos moradores avaliaram como regular, 23,5% o consideraram bom, e 21,4%
o apontaram como péssimo. Os demais ficaram divididos entre ótimo, ruim ou sem opinião. É
necessário esclarecer que esse grande percentual concentrado entre as avaliações de regular e
bom ocorreu porque as pessoas não consideraram em seu julgamento os problemas apontados
anteriormente e só se detiveram no fato de que existia a oferta do serviço, visto que elas
comparavam com a realidade de outros bairros que não dispunham de transporte público.
Segundo alguns moradores, os problemas relacionados à acessibilidade,
principalmente à falta de pontos de ônibus nos conjuntos habitacionais, era assunto constante
na pauta de reuniões da associação de moradores desses conjuntos, com o intuito de exigir
providências do poder público local. No entanto, apesar de se organizarem para exigir
melhorias nesse serviço, a única linha de ônibus que atendia a essa população foi retirada
(poucos dias depois de aplicarmos os questionários) pela empresa responsável, cuja
justificativa foi de que o local não dispunha de infraestrutura (pavimentação) adequada para
realizar o tráfego naquela área do bairro.
Entendemos que, exceto nos casos em que os moradores afirmaram que o RSV I é
longe do centro sem mencionar a acessibilidade do local, e nos casos em que afirmaram que é
perto, mas de difícil acesso, a fácil acessibilidade do local para os demais moradores ocorre
porque eles possuem transporte particular. Constatamos, diante da relativa proximidade do
percentual entre as pessoas entrevistadas que mencionaram a facilidade de acesso (perto/fácil
acesso; longe/fácil acesso – Gráfico 04), que foram 26,5% dos casos e as pessoas que
possuíam transporte motorizado (motocicleta na maioria dos casos), que corresponde a
32,6%.
168
Fonte: Pesquisa de campo realizada em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
Isso nos remete à afirmação de Villaça (2001, p. 79-80) de que as acessibilidades
variam de acordo com os veículos que são utilizados. Variam, por exemplo, com a distinção
entre a acessibilidade para quem depende de transporte público e para quem possui transporte
individual. Essa distinção se acentua ainda mais quando nos deparamos com as diferenças de
deslocamento entre as diversas classes sociais. O autor assegura, ainda, que, como os
transportes intraurbanos são os maiores determinantes das transformações dos pontos (das
localizações)79
, as vias de transportes têm grande influência não só no arranjo interno das
cidades, como também sobre os diferenciais de expansão urbana.
Além da localização e da acessibilidade, que são produzidas de acordo com o jogo de
interesse do mercado imobiliário, há outro elemento a ser observado nesse processo de
produção e intensificação das desigualdades socioespaciais, através dos projetos habitacionais
do PMCMV, como a disponibilidade de infraestrutura e de serviços urbanos. Ferreira (2012)
afirma que a infraestrutura urbana é um dos mais importantes parâmetros de qualidade na
escala da inserção urbana.
Sobre essa questão, identificamos os seguintes problemas no RSV I:
A descontinuidade das vias de transporte em relação às demais existentes no
Bairro Monte Castelo (Figura 26, p. 172);
O fato de a pavimentação da via de acesso ao RSV I ter ficado incompleta e
descontínua dos demais conjuntos e da via principal que dá acesso a eles (Figuras 22 e 23).
79
É fundamental esclarecer que essa afirmação não se dá na perspectiva do determinismo tecnológico sobre o
qual Gottdiener (1993) discorre no livro “A produção social do espaço”. Esse alerta também feito por Villaça
(2001).
169
Quanto a isso, muitos moradores reclamaram que, no período de chuva, o acesso fica ainda
mais difícil, pois essa via principal é cortada por um córrego que transborda e alaga toda a
área de entrada para os conjuntos habitacionais.
Figura 22: Via do Bairro Monte Castelo que dá acesso ao RSV I e
aos demais conjuntos habitacionais de seu entorno. Fonte: Pesquisa
de campo em março de 2014
170
Figura 23: Unidades habitacionais dos Conjuntos Novo Monte Castelo II
e Residencial Vista da Serra II e da infraestrutura de pavimentação
inacabada que dá acesso ao RSV I. Fonte: Pesquisa de campo em
fevereiro de 2014
A não extensão da rede de esgotamento sanitário até às unidades habitacionais
do RSV I. De acordo com relatos coletados na pesquisa de campo, as fossas-sumidouros
enchem muito rápido e transbordam, fazendo com que a água suja se acumule no solo e
chegue à superfície (ver Figura 24), provocando mau cheiro em frente às casas. Além disso, o
preço cobrado por donos de carros-pipa para realizar a limpeza das fossas é muito alto (cerca
de R$ 150,00 para a fossa e mais essa mesma quantia para o sumidouro) se considerarmos a
média de renda mensal das famílias que moram nessas casas.
Assim, como os moradores não têm condições financeiras de arcar com essa despesa
regularmente, têm criado “soluções” que podem causar futuros problemas, do ponto de vista
ambiental. Uma dessas soluções foi a canalização improvisada de uma fossa para outra até às
“bocas de lobo” (estruturas para drenagem de águas pluviais) que há na rua que, por sua vez,
deságuam no Rio Farinha, que passa ao lado do RSV I e do Conjunto Novo Monte Castelo II
(Figura 25).
Figura 24: Fossa que transbordou em uma das casas do RSV I e
localização do Rio Farinha, próximo a essa área - Fonte: Pesquisa de
campo em fevereiro de 2014
171
Figura 25: Bocas de lobo para as quais alguns moradores canalizaram
as fossas para o Rio Farinha. Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de
2014
Por último, identificamos a ausência da oferta de bens e serviços básicos que
realmente atendam às necessidades dos moradores dessa área. Observando a figura 26,
podemos verificar que, de serviços públicos, há apenas uma USF e duas escolas para
atenderem a toda a população do Bairro Monte Castelo, que, de acordo com o censo em 2010,
era de 2.923 moradores.
172
Legenda
Escola Pública Municipal Ponto de ônibus próximo ao RSV I Pequeno comércio
Escola Privada Praça de mototáxi Unidade de Saúde Familiar – USF
Padaria CRAS Escola Pública Estadual
Limites do Bairro Monte Castelo Principais vias do Monte Castelo
Área do RVSI
Figura 26: Localização dos serviços e do comércio em relação ao Bairro Monte Castelo e ao RSV I. Fonte:
Pesquisa de campo, abril de 2014. Imagens: Google Earth, 2014. Elaboração própria
Relatos durante a aplicação dos questionários do RSV I nos informaram que, para
atender à demanda dos moradores por atendimento médico, desse e dos demais conjuntos
habitacionais do entorno, foi contratado um médico (advindo do programa social “Mais
Médicos”) para atender uma vez por mês no casarão onde fica a sede da associação de
moradores. Além desse atendimento, há um acompanhamento regular do agente de saúde que
atende a essa área, principalmente nas casas onde moram idosos e pessoas com alguma
deficiência física. Assim, mesmo não havendo equipamentos para que seja mais bem ofertado
esse serviço no RSV I e para a população de seu entorno imediato, esse atendimento médico
mensal e a presença regular do agente de saúde justificam a satisfação de 24 dos 98
entrevistados em relação ao serviço de saúde oferecido no conjunto habitacional em questão
173
(Gráfico 05). Contudo, a maioria (63) dos moradores pesquisados reclamou que esse
atendimento era insuficiente e que, quando buscavam o serviço na USF do bairro, raramente
conseguiam marcar uma consulta, tendo em vista que essa USF atendia a todo o Bairro Monte
Castelo tornando a demanda relativamente maior80
. Os 11 entrevistados que não responderam
afirmaram que não avaliariam o serviço porque ainda não haviam necessitado dele.
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014 - Elaboração própria
Sobre o serviço de educação, a maioria dos moradores está insatisfeita (68), porque
não há escolas no RSV I nem em seu entorno imediato e devido à quantidade de vagas e à
infraestrutura das escolas existentes no Monte Castelo ser insuficiente perante a demanda. Em
campo, verificamos que é disponibilizado pelo governo municipal um ônibus para transportar
as crianças que estudam nas escolas municipais localizadas em outros bairros. No entanto,
alguns moradores relataram que, esporadicamente, os adolescentes que estudam na rede
estadual de ensino são impossibilitados de entrar no ônibus, pois o motorista afirma que “eles
fazem bagunça no ônibus”81
. De todos os que foram questionados sobre o serviço de
educação, 11 não responderam por não haver pessoas que estudem ou que estejam em idade
escolar residindo na casa.
80
Inclusive os problemas referentes ao serviço de saúde no bairro já foi motivo de mobilizações dos moradores
do Conjunto dos Sapateiros. De acordo com um site de notícias locais, “os representantes do Conjunto dos
Sapateiros alegam que estão enfrentando desafios constantes em virtude da distância entre a comunidade e o
PSF, além disso, existe um agravante que é o número de habitantes do referido conjunto que é em média de
1.000 pessoas e tende a aumentar, pois ainda está sendo construídas novas casas do Programa Minha Casa Minha
Vida”. (Consultar o suporte eletrônico desta pesquisa). 81
Fala de uma moradora que tem três filhos em idade escolar.
174
Em relação à insatisfação dos entrevistados (91,8%) sobre os espaços de lazer, a
principal justificativa é de que não há praças ou espaços públicos para as crianças brincarem
e/ou para que haja mais interação entre os moradores do RSV I e entre eles e os demais dos
conjuntos do entorno. Assim, nas horas vagas e nos fins de semana, as famílias se deslocam
para as casas de familiares que ficam em outros bairros, para o centro da cidade, onde há
praças e está localizado o shopping center, para igrejas, casas de amigos ou até mesmo para
sítios localizados na zona rural de Patos.
Como as ruas são pouco movimentadas, no decorrer do dia e também nos finais de
semana, e alguns moradores se sentem inseguros para circular nas ruas ou ficar na calçada de
casa no turno da noite, que é o horário em que não estão trabalhando. Apesar de 60,2% dos
entrevistados afirmarem que se sentem seguros no RSV I, 55,5% do total pesquisado
desejavam que fosse instalado um posto policial no local. Além disso, a sensação de
segurança foi afirmada por causa da presença de um guarda-noturno, pago pela própria
população, e é reforçada com a construção de (ou pelo menos o desejo de fazê-lo) muros ou
cercas no entorno das casas.
Ao retomar a Figura 26 (p. 172), podemos constatar que a presença de
estabelecimentos comerciais que sejam diversificados, em termos de oferta de bens e serviços,
mesmo no entorno dos conjuntos, é inexpressiva. Isso levou alguns moradores do conjunto
RSV I e dos demais conjuntos vizinhos a instalarem pequenos comércios (Figuras 27 e 28),
vendas de lanches e bares no local, o que, no entanto, só atende às necessidades mais básicas.
Então, quando os moradores do RSV I necessitam consumir determinados bens ou serviços,
como produtos farmacêuticos ou dos serviços bancários, deslocam-se para o centro da cidade
ou para o Bairro Jatobá, que tem assumido, gradativamente, as características de um
subcentro na cidade de Patos.
175
Figura 27: Pequeno comércio estabelecido em Unidade Habitacional do RSV
I. Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014. Autora: Wilma G.
de Lucena
Figura 28: Pequeno comércio estabelecido em Unidade Habitacional do
Conjunto Novo Monte Castelo II, localizado nas imediações do RSV I. Fonte:
Pesquisa de campo em setembro de 2013
Todas as observações até aqui descritas justificam as expectativas dos moradores
acerca do que ainda pode ser feito no RSV I - a construção de uma USF, a instalação de um
posto policial, a construção de uma escola, uma creche e uma praça, melhorias no serviço de
transporte público e na infraestrutura existente e acesso mais fácil ao comércio.
176
Sabemos que, no passado, durante a existência do BNH, a prática de entrega de casas
em conjuntos habitacionais, ainda desprovidos de infraestrutura e serviços urbanos, foi
recorrente. Bonduki (2008) mostra, ainda, que os problemas relacionados às deficiências no
acesso à infraestrutura, bem como ao adensamento excessivo, agravaram-se ainda mais no
período pós-BNH. Nesse caso, incluem-se não só os conjuntos habitacionais, mas também as
favelas, os cortiços, os loteamentos direcionados à população de baixa renda, entre outros. O
que nos chama a atenção é a permanência daquela referida prática do Estado em reproduzir
espaços precários no que concerne à moradia. Essa prática é questionada por Martins (2007).
Assim, ao descrever a produção dos conjuntos habitacionais do BNH, é como se Rodrigues
(2007) estivesse descrevendo o momento atual do PMCMV:
Os conjuntos habitacionais, edificados e financiados pelo Estado,
“destinados à chamada população de baixa renda”, foram construídos em
descontinuidade com o tecido urbano, em áreas sem infra-estrutura e
equipamentos de consumo coletivo. A organização dos moradores
possibilitou a implantação de serviços urbanos necessários à reprodução da
vida. Contraditoriamente, assim, os conjuntos construídos para
trabalhadores, num mercado específico e financiados com recursos públicos,
acentuam a desigualdade social e espacial. Num aparente paradoxo, quando
os conjuntos são inseridos no tecido urbano, o preço aumenta, expulsando os
moradores que continuam aprisionados pelo financiamento em 25 anos82
.
Convém enfatizar que esse tipo de ação do Estado é reforçado pela ausência de uma
associação entre uma política fundiária e a política habitacional, como foi apresentado no
decorrer do capítulo 2 e observado no caso da cidade de Patos. Nessa perspectiva, o processo
de periferização, ocasionado pela implantação dos conjuntos habitacionais pelo PMCMV, não
só implica a expansão acelerada da malha urbana, como também induz a uma extensão da
rede de infraestrutura, o que, segundo Ferreira (2012), é muito mais oneroso do que investir
em áreas já urbanizadas. Contudo, sabendo que o atendimento dessa necessidade é bastante
oneroso, o Estado o promove de maneira desigual na cidade, e os grupos de rendimento mais
baixo ficam à margem desses benefícios, tendo em vista que as elites locais (SOUZA, 2010) e
os agentes que vislumbram os lucros da especulação imobiliária (SINGER, 1982) influem na
legislação e nas decisões do poder público local quanto às áreas que serão beneficiadas com a
expansão dos serviços e da infraestrutura.
82
O financiamento das unidades habitacionais do PMCMV para a faixa de renda 01 (0 a 3 s/m) é em 10 anos.
177
Como na cidade de Patos tem sido priorizada a realização de projetos de grandes
obras urbanas (por exemplo, o Canal do Frango e a alça sudeste, mencionados no tópico 2.4),
os mais beneficiados com essas obras são as famílias de alta e média renda, muitas das quais
têm realizado “o sonho da casa própria”, através dos financiamentos individuais do PMCMV
para as faixas de renda 02 e 03. Nesses casos, os imóveis também se localizam em áreas
periféricas (Mapa 05, p. 113 tópico 2.4), no entanto, a acessibilidade para essa parcela da
população é muito maior em relação à observada no caso do RSV I, devido ao fato de o
deslocamento ser predominantemente por transporte individual e de haver mais possibilidades
de deslocamento.
Concluímos que os conjuntos habitacionais do PMCMV reproduzem, em certa
medida, os problemas referentes à inadequação de domicílios, à péssima acessibilidade para a
população de baixa renda, entre outros fatores, pois se ver acontecer o que Rolnik e Klink
(2011) discutem sobre a produção de cidade sem urbanidade.
3.4.2 Implantação do RVS I
Na escala da implantação do RSV I, destacamos uma das características sobre as
quais discutimos anteriormente, dos empreendimentos do PMCMV - a de padronizar os
projetos. Veem-se, em todo o país, as incorporadoras e as construtoras adotarem e
disseminarem seus projetos, que vão se constituindo como imensos “carimbos” nas cidades
brasileiras, como denomina Ferreira (2012). Esse autor afirma que, nesse caso, são muitos os
problemas concernentes à (in)adequação dos projetos para a topografia natural do terreno; à
disposição das edificações ao lote; à despreocupação com o paisagismo; à generalização do
padrão dos “condomínios-clube”; aos espaços de lazer coletivo, que, no caso dos conjuntos
habitacionais populares, seriam a ausência dos espaços públicos de lazer e os problemas que
dizem respeito à relação adensamento demográfico/adensamento construtivo.
Nessa perspectiva, Ferreira (2012) aponta como parâmetros de qualidade para se
analisar um empreendimento, na escala da implantação do projeto, a adequação à topografia
do terreno; paisagismo e impacto ambiental; formas de ocupação do terreno; áreas comuns e
de lazer e densidade e dimensão. Tendo em vista os objetivos do presente trabalho, bem como
o arcabouço teórico que conduziu às análises empreendidas até o momento, propomos
analisar o RVS I, no âmbito da escala da implantação sob os dois últimos parâmetros ou
características citadas, não sob o ponto de vista arquitetônico, mas entendendo as condições
178
sociais e de moradia dos sujeitos que habitam o espaço ora analisado. Também
mencionaremos brevemente os usos desse espaço.
Observando a Figura 30 (p. 179) e retomando o processo de incorporação do
loteamento, Hardman Cavalcanti, descrito no tópico 3.2, percebe-se que, além dos lotes
destinados à construção das unidades habitacionais, de equipamentos públicos e das áreas de
preservação, há vários terrenos que foram comercializados antes mesmo da entrega das
primeiras casas desses conjuntos. A propaganda dessas vendas (Figura 20, p. 156), em que se
divulgava a possibilidade de o comprador construir tanto uma casa quanto um prédio
comercial (ambos tido como um investimento), indica-nos a possibilidade de
estabelecimentos comerciais se instalarem nessa área, para torná-la mais dinâmica, conquanto
se suponha que esse ainda seja um futuro distante, visto que até mesmo os terrenos vendidos
nessa época já estão sendo novamente comercializados pelos atuais proprietários (Figura 29).
Figura 29: Placa de venda de terreno entre o RSVI e o RSV II. Fonte: Pesquisa
de campo em março de 2014 - Autora: Wilma G. de Lucena
179
Legenda
Lotes das UHs do RSV I
Lotes das UHs do RSV II
Lotes vendidos antes da entrega das UHs do RSV I
Lotes reservados pela JGA durante a obra do RSV II
Áreas remanescentes
Lotes reservados para PMP
Lotes do RSV I onde há pequeno comércio
Figura 30: Usos e apropriações do Loteamento Hardman Cavalcanti, localizado no Bairro Monte Castelo.
Fonte: Escritório da JGA Ltda. e pesquisa de campo em fevereiro de 2014. Imagem: Google Earth.
Elaboração própria.
Como o uso desse espaço é predominantemente residencial e ainda se caracteriza
pela quase completa ausência de outros usos, essa localidade, juntamente com seu entorno, é
uma área monofuncional. Assim, a sequência de casas formando extensos quarteirões, a
ausência de comércio e de espaços públicos de lazer (que ainda serão instalados nas áreas a
eles destinados) esvaziam as ruas e induzem ao deslocamento para o consumo em outros
locais. Durante a pesquisa de campo, percebemos a monotonia das ruas (mesmo nos fins de
semana) e a ausência de pessoas nas calçadas (exceto as poucas crianças que se encontravam
brincando no canteiro de obras do RSV II), até mesmo as poucas bodegas (pequenos
comércios improvisados) existentes se encontravam fechadas na maior parte do tempo em que
realizamos a pesquisa.
Escala
180
Sob o ponto de vista da densidade e do dimensionamento dos projetos habitacionais
do PMCMV na cidade de Patos, vemos claramente a impressão dos “carimbos” das
construtoras que chegam à cidade. Ao RSV I, seguem-se o RSV II, o Residencial Itatiunga e
os demais projetos que ainda estão em fase de avaliação, sendo que pouco são os elementos
que os diferenciam um do outro. Entre essas poucas diferenças, observamos que, enquanto no
RSV I as casas são de 32 m², no RSV II, por ser um projeto da fase 2 do PMCMV, as casas
são de 36 m², são conjugadas e têm placas de captação de energia solar. Se considerarmos que
o RSV I tem 136 UH, poderíamos inferir que, em termos de dimensionamento, trata-se de um
pequeno projeto. Todavia, é preciso considerar as características do entorno desse conjunto
habitacional, porquanto ele se encontra distante da malha urbana e da dinâmica da cidade; tem
uma paisagem da zona rural, está ao lado de dois conjuntos já habitados e de outro que está
sendo construído, e todas as famílias que ali habitam têm mesmo perfil socioeconômico.
Ao questionarmos os moradores sobre quais eram suas expectativas em relação ao
entorno do RSV I, muitos (36,7%) afirmaram que não tinham nenhuma expectativa. Porém,
os demais disseram desejar a vinda de infraestrutura (principalmente a ligação à rede de
esgoto e a conclusão da pavimentação) e mais segurança, tendo em vista que moradores de
outros bairros se referem ao local como um “lugar perigoso”. Além disso, os próprios
moradores não se sentem seguros e apontaram como causa disso a vegetação existente ao
redor de todo o conjunto e a ausência de mais casas no entorno83
. Entendemos que o RSV I
contribui não só para o isolamento físico, mas também social de quem habita esse local, visto
que intensifica o processo de homogeneização social desse espaço, fazendo com que a
desigualdade na escala da cidade seja vivida de modo a produzir a diferença como
negatividade (CARLOS, 2007).
Nas metrópoles, sabemos que a implantação de grandes empreendimentos,
principalmente nas áreas periféricas da região metropolitana, forma o que comumente se
denomina na literatura de cidades-dormitório, o que, obviamente, não se verifica em Patos,
devido ao porte da cidade. Entretanto, no local em que se insere o conjunto RSV I, ocorre o
que Villaça (2001, p. 335) descreve sobre o processo de homogeneização do espaço, em que
se perdem as características de cidade (diversidade) e se adquirem as de bairro
(homogeneidade), porque, na área referida, habita, predominantemente, a população de baixa
renda. Na própria paisagem do conjunto habitacional em questão e de seu entorno, traduzem-
se o distanciamento físico e o processo de homogeneização social desse espaço. Nesse
83
Esses relatos foram anotados durante a aplicação dos questionários no decorrer da pesquisa de campo.
181
sentido, tomamos a afirmação de Leite (2011) de que a paisagem urbana revela as
desigualdades evidentes entre a apropriação do espaço pelos ricos e pelos pobres.
Retomando Shimbo (2010; 2011), percebemos que a produção padronizada dos
conjuntos habitacionais por parte das empresas construtoras necessita de áreas maiores e de
preços mais baixos, já que buscam mais solvabilidade e lucratividade dos investimentos.
Assim, formam-se imensos conjuntos monofuncionais e superdimensionados. Mesmo no caso
de projetos de pequena dimensão, como o RSV I, ocorre esse mesmo processo, visto que
possibilita a implantação de outros de mesmo porte em etapas sequenciais, como aconteceu
com a implantação do RSV II e a pretensão do proprietário da construtora de implantar o RSV
III.
Nesse sentido, percebemos um espaço que assume as características elencadas por
Lefebvre (1974) do espaço dito “moderno”, do espaço do capitalismo avançado. Essas
características são muito precisas - a homogeneidade, a fragmentação e a hierarquização. Essa
homogeneidade não é somente de planos e projetos, mas também de falsos “conjuntos”
isolados84
, pois, paradoxalmente, esse espaço homogêneo se fragmenta em lotes, parcelas, em
pedaços, em guetos isolados e pseudoconjuntos mal ligados aos arredores e aos centros. Com
a hierarquização estrita desse espaço (espaços residenciais, comerciais, de lazer, dos
“excluídos” etc.), predomina uma lógica do espaço em que se ocultam, sob sua
homogeneidade, as relações “reais” e os conflitos.
Diante disso, entendemos que, como a habitação assume a forma de mercadoria e
tem, ao mesmo tempo, o papel de fixar a mão de obra na cidade, sendo o espaço de sua
reprodução e constituindo a possibilidade de expansão urbana e de obtenção de renda da terra
por parte do capital imobiliário, entendemos que, assim como afirma Martins (2007, p. 21), “o
conjunto habitacional é onde se realizam todas as relações sociais”.
3.4.3 Unidades Habitacionais no RVS I
Dentre os parâmetros sugeridos por Ferreira (2012), para se analisar um
empreendimento imobiliário do ponto de vista da escala da unidade habitacional (UH),
consideramos apenas o referente ao dimensionamento da UH, incluindo na discussão as
características referentes aos aspectos construtivos.
84
Tendo em vista a discussão sobre o que e como se constitui o espaço social, subentende-se que, nesse
momento, o autor não se refere aos conjuntos apenas em termos de espaço físico, mas, e principalmente, aos
grupos ou classes sociais.
182
Desde a política habitacional do período do BNH, tem sido recorrente a construção
de conjuntos habitacionais caracterizados pela uniformização das UHs, pela padronização dos
projetos, que, na maioria dos casos, são de grandes dimensões em relação ao porte da cidade e
pela localização predominante nas periferias, desprovidas de serviços urbanos e de
infraestrutura. Já constatamos que essas mesmas características, que dizem respeito às escalas
da inserção urbana e à implantação dos empreendimentos, permaneceram nos projetos do
PMCMV. Assim, vemos que, nesse contexto, repetem-se os mesmos erros e problemas
urbanísticos produzidos na época do SHF/BNH, como ressalta Campos (2011).
As implicações dessa padronização cada vez maior dos projetos habitacionais, por
parte das construtoras, e a formação de espaços socialmente homogêneos se apresentam
nitidamente na paisagem, pois, como ressalta Rodrigues (2001; 2007), as desigualdades
socioespaciais são visíveis até para os olhares menos atentos. Esse fato se confere no conjunto
RSV I, onde a paisagem é monótona e repetitiva, tendo em vista a ausência da diversidade de
usos do espaço e a presença de casas idênticas na forma e nos aspectos construtivos. Vale
salientar que essa mesma paisagem também se verifica em seu entorno imediato, já que nele
se apresentam os mesmos elementos descritos, como podemos observar nas Figuras 18 e 19
(p. 139, tópico 3.1).
Como já discutimos no Capítulo 02 (tópico 2.2), corroborando Shimbo (2011, p. 53),
essas características advêm da padronização das tipologias habitacionais, das medidas delas e
dos materiais e dos componentes construtivos empregados, que definem a lista de
fornecedores, também padrão. Lembremos que esse processo de padronização chega até o
processo de gestão da produção. Desse modo, mesmo a terra-mercadoria sendo responsável
pela maior parte do valor imóvel, as construtoras maximizam seus lucros através dos
processos construtivos, incluindo, é claro, a obtenção da mais-valia com o emprego de
numerosa mão de obra.
Vale salientar que essa padronização não representa, necessariamente, mais
qualidade construtiva das UHS. No RSV I, identificamos casas que, com menos de um ano de
uso, já apresentaram rachaduras nas paredes, no gesso do teto e na cerâmica do piso, além das
reclamações dos moradores em relação às esquadrias (portas e janelas), que não ofereciam
segurança. Assim, não por acaso, a modificação mais frequente realizada nas casas pelos
moradores foi a substituição das portas.
Quanto ao dimensionamento das UHs, 82,6% dos moradores entrevistados no RSV I
afirmaram que estão satisfeitos com o tamanho das casas, contudo, paradoxalmente, esses
mesmos moradores expressaram o desejo de ampliar a casa e o número de cômodos, bem
183
como a insatisfação específica com algum desses, sendo a cozinha o mais mencionado.
Entendemos que a maioria dos que se mostraram satisfeitos moram em casas com número
reduzido de pessoas, e a insatisfação em relação à cozinha partiu, predominantemente, das
mulheres, “donas de casa”, que reclamaram que não havia espaço para algo mais além da
geladeira e do fogão, fato que levou alguns moradores a quebrarem o balcão que dividia o
espaço entre a sala e a cozinha, mesmo não sendo permitido pela CEF, pelo menos nos cinco
primeiros anos de uso85
.
Baseando-se nos questionários aplicados durante a pesquisa de campo, vieram à tona
duas suposições oriundas da relação que fizemos da quantidade de moradores com o tamanho
das UHs, bem como dos relatos obtidos no momento em que perguntamos sobre a renda
mensal da família e sobre a satisfação com o tamanho da casa. A primeira suposição é de que
o problema do adensamento habitacional se reproduz também nos conjuntos habitacionais, e a
segunda é de que o PMCMV tem promovido diretamente a reprodução do capital imobiliário
e financeiro e outras frações do capital através da criação do cartão “Minha Casa Melhor”.
No que diz respeito à reprodução do problema de adensamento habitacional no
RSVI, alguns dados são pertinentes. No referido conjunto habitacional, calculamos uma
média de três habitantes por domicílio. No entanto, essa média camufla a realidade, na medida
em que se observam os números absolutos, visto que quase metade das UHs (43 das 98) onde
realizamos entrevistas havia de quatro a nove moradores86
. Segundo seus relatos, um dos
principais motivos apontados para o elevado número de pessoas em uma mesma casa era a
coabitação familiar87
. Nesses casos, a família residente recebia parentes que estavam
aguardando também ser atendidos pelo PMCMV, já que haviam feito o cadastro no programa
há muito tempo. Assim, há uma reprodução de um dos componentes do déficit habitacional
brasileiro no conjunto habitacional em questão. Esse problema agrava-se ainda mais devido
ao tamanho das casas em que vivem essas famílias.
No RSV I, embora os lotes sejam de 200 m², as UHs construídas têm 32 m² de área
interna. Assim, se considerarmos a média de 3 hab./domicílio, teremos a disponibilização de
10,7 m² para cada morador. Contudo, se projetarmos essa mesma realidade para as casas em
85
Para a faixa 01 do Programa Minha Casa Minha Vida, que usa os recursos do OGU, FDS e FAR, não há
cobrança de seguro, no entanto há coberturas por morte ou invalidez permanente (MIP) e danos físicos do
imóvel (DFI). Daí a importância de não realizar nenhuma modificação na estrutura do imóvel por um período de
tempo. Sobre as disposições acerca desses seguros, consultar o suporte eletrônico do presente texto. 86
Identificamos 22 casas com quatro moradores; nove, com cinco; oito, com seis; três, com oito; e uma, com
nove. 87
De acordo com o IBGE (2010), a partir de 2007, passou-se a considerar coabitação apenas as famílias
conviventes secundárias que declararam intenção de constituir um domicílio exclusivo.
184
que há uma quantidade maior de moradores (Quadro 06), a situação torna-se ainda mais
preocupante. Primeiro, porque há restrições por parte da CEF para fazer modificações na casa,
onde só é permitido realizar alguma modificação nas paredes internas depois dos cinco anos
do seguro ou da cobertura por danos físicos do imóvel (DFI), garantido pelo referido banco.
Segundo, porque as condições econômicas das famílias não possibilitam a ampliação da casa
imediatamente, embora tenhamos verificado que, em algumas delas, já houve ampliação com
a construção de novos cômodos, situação em que a mão de obra utilizada é a do próprio dono
e/ou dos familiares.
Quadro 06: Média de m² por quantidade de
moradores nas Unidades Habitacionais do
RSVI
Quantidade de
moradores
Morador/m²
01 32 m²
02 16 m²
03 10,7 m²
04 8 m²
05 6,4 m²
06 5,3 m²
08 4 m²
09 3,5 m²
Fonte: Pesquisa de campo em fevereiro de 2014.
Elaboração própria.
Essa situação nos remeteu à leitura de Engels (1985 [1845], p. 117), que, ao
mencionar os problemas oriundos do adensamento da classe trabalhadora em vilas operárias e
em cortiços, afirma que, “se, em geral, a população das cidades já é demasiado densa, é a eles
[aos pobres], sobretudo, que forçam a concentrarem-se num pequeno espaço”. Mesmo que
essa realidade descrita se refira ao contexto europeu do Século XIX, ainda hoje é possível
observá-la nas cidades brasileiras, onde se localizam as favelas, as vilas, os cortiços, e nos
conjuntos habitacionais. Não por acaso, observamos que, em Patos, os locais de maior
densidade habitacional coincidem com as áreas onde habitam as famílias de rendimento mais
baixo (Mapas 09 e 10, p. 148 e 149).
185
Em relação à segunda suposição, em que afirmamos que o PMCMV tem promovido
também a reprodução de outras frações do capital, além do financeiro e do imobiliário, vale
salientar que alguns relatos de moradores do RSV I, somando-se ao apelo midiático88
em
meio televisivo para o uso do cartão “Minha Casa Melhor”89
, foram fundamentais. Essas
informações nos permitiram entender a relação que o PMCMV tem assumido com diversos
capitais e nos ajuda a compreender quais os seus efeitos até à escala da UH. Também nos
indica o papel cada vez mais importante desse programa na economia nacional, ao mesmo
tempo em que mostra como o problema habitacional tem sido percebido, visto que, nesse
caso, as péssimas condições de moradia são associadas estritamente às possibilidades de
consumo de bens, e não, às dificuldades de acesso a terra e aos serviços urbanos.
Alguns moradores do RSV I nos revelaram que todos os que assinaram o contrato do
financiamento da casa na CEF receberam a proposta para fazer o cartão “Minha Casa
Melhor”, o que permite que o morador vá a alguma loja de móveis e eletrodomésticos, que
seja credenciada no PMCMV, e compre o que considere necessário para melhorar suas
condições de moradia. Muitos moradores assim o fizeram. Contudo, foram várias as
reclamações feitas após a realização das compras, entre elas, uma estava relacionada à entrega
dos boletos de pagamento, pois os moradores afirmaram que, na CEF, foram informados de
que receberiam o boleto na própria casa. A questão é que a área ainda não é atendida pelo
serviço de Correios, o que ocasionou a não entrega dos boletos por cerca de três meses (em
alguns casos, por mais tempo), o que resultou no acúmulo de parcelas e, consequentemente,
em juros. De acordo com os moradores, os boletos só foram entregues quando cada um que se
encontrava nessa situação compareceu ao banco, solicitando a impressão e a entrega dos
boletos atrasados. Até o período em que concluímos a pesquisa de campo, alguns desses
moradores ainda não haviam comparecido à CEF para solicitar o boleto, justificando que, com
o acúmulo de parcelas, não tinham condições de realizar o pagamento no momento, inclusive,
muitos deles demonstraram ter receio de perder a casa devido ao ocorrido.
Sabemos que o problema da impressão e do recebimento do boleto poderia ser
facilmente resolvido com o acesso ao site da CEF no link90
que dispõe as informações sobre o
88
Consultar o suporte eletrônico deste trabalho. 89
O cartão Minha Casa Melhor é um crédito oferecido pela CEF à pessoa que comprou uma casa através do
PMCMV, a ser utilizado em lojas de móveis e eletrodomésticos que estejam devidamente cadastradas no
Programa. Com esse cartão, a pessoa que já adquiriu uma casa pelo PMCMV pode realizar compras no valor de
até R$ 5.000,00 a ser pago em 48 meses (quatro anos). No site da CEF, pode ser encontrada a lista dos 14 tipos
de móveis e eletrodomésticos que podem ser financiados. 90
Consultar o suporte eletrônico deste trabalho.
186
cartão. Porém, as observações feitas pelos moradores nos indicam que eles desconheciam esse
recurso.
Entendemos que a criação e a difusão do cartão “Minha Casa Melhor” inserem-se em
um contexto em que a forma, o tamanho e as funções da habitação têm sido redefinidos pelas
transformações ocorridas com o avanço do capitalismo. Sobre essa questão, Villaça (1986)
destaca que a diversificação e a especialização cada vez maior das atividades econômicas
difundidas pelo avanço tecnológico e movidas pela crescente necessidade do consumo
também transformam a habitação. Assim,
[...] a habitação vem sendo crescentemente esvaziada das inúmeras funções
que abrigava [...] nos primórdios do capitalismo. Assim serviços que outrora
eram prestados sem servirem para extrair mais valia produzida nos setores
produtivos, passam a sê-lo, e produtos que eram domesticamente produzidos
como valores de uso, passaram a ser produzidos como valores de troca,
como mercadorias. (VILLAÇA, 1986, p. 38)
O autor assegura, ainda, que, embora essas mudanças tenham ocorrido mais
rapidamente na classe média, “processo semelhante, mesmo que por razões diversas, tende
também a ocorrer nas classes subalternas” (VILLAÇA, op. cit, p. 38). Nessa perspectiva,
Abramo (1986), ao discutir sobre os efeitos da mudança da acumulação concorrencial para a
produção fordista nos padrões de consumo de modo geral e no acesso à terra urbana, assevera
que
[...] a potencialização da capacidade de produzir bens e o crescimento da
massa salarial e dos salários reais permitiu o surgimento de um mercado de
consumo de massa onde a relativa estandardização dos bens permitiu
produzir mais a custos mais baixos. Esse verdadeiro círculo virtuoso entre a
produção e o consumo massivo de bens modificou os padrões de consumo
dos assalariados com a introdução de uma quantidade significativa de novos
objetos no cotidiano doméstico identificados como bens duráveis familiares.
Porém, a possibilidade de acumulação familiar desses bens impunha uma
modificação importante nas formas tradicionais de moradia. [Assim] O
espaço da moradia deveria ampliar-se91
para obrigar a acumulação privada
de bens de consumo. (ABRAMO, 1986, p. 182, grifo nosso)
Como mostram os autores supracitados, a necessidade de consumir bens duráveis
atinge o trabalhador assalariado, que vive, unicamente, de sua força de trabalho. Apesar disso,
91
O autor menciona essa necessidade de ampliação do espaço da moradia em relação aos imóveis de aluguel que
foi a forma rentista predominante no capitalismo concorrencial.
187
sabemos que ele não tem a possibilidade de ter acesso a uma moradia condizente com essa
necessidade imposta pela sociedade de consumo, já que Abramo (1986) fala sobre a
necessidade de uma moradia de espaço amplo. As casas dos conjuntos habitacionais, por
exemplo, que abrigam famílias mais numerosas, as quais também são inseridas nessa lógica
de consumo, são construídas de maneira subdimensionada, portanto, não condizem com o
padrão de consumo que passam a adotar.
Se tomarmos como exemplo a realidade pesquisada do RSV I, em que a renda
mensal das famílias é muito baixa (Gráfico 02, p. 142), compreende-se que esse modo de
consumir a moradia descrito por Abramo (op. cit), estimulado mundialmente e reforçado pela
associação entre capital e Estado, é insustentável para a classe trabalhadora, cuja fonte de
renda provém, unicamente, de sua força de trabalho, porque, nesse caso, a única forma é
comprometer a renda mensal da família por um longo período de tempo, já que, tomando o
caso do PMCMV, somando-se às parcelas do financiamento da casa, têm-se as parcelas do
financiamento dos bens duráveis adquiridos. Entendemos que, nessa lógica, “somente os que
desfrutam de determinada renda ou salário podem morar [...] em casas com certo grau de
conforto” (RODRIGUES, 2001, p. 12) sem comprometer o atendimento das demais
necessidades básicas.
Um fato que também nos chamou a atenção foram as reclamações de alguns
moradores em relação a outros, relacionadas ao uso indevido do cartão “Minha Casa Melhor”.
Segundo os relatos obtidos em campo, entre os que fizeram o cartão, alguns moradores
realizaram a compra de móveis e eletrodomésticos depois de terem recebido a proposta por
parte de outras pessoas para trocar esses bens por uma motocicleta. Isso nos indica que, nesse
caso, obter um meio de transporte para locomoção, ao invés de equipar ou melhorar as
condições de vida no interior da casa, era mais importante. O que nos remete novamente ao
debate sobre acessibilidade como ponto de suma importância a ser considerado na questão
habitacional.
Assim, essas questões relacionadas à escala da unidade habitacional reforçam a ideia
discutida no capítulo 1 do que é o problema da habitação e de como ele é tratado,
principalmente pelo Estado. Percebemos que, mesmo depois de tantos avanços na
compreensão do que é esse problema, com a estruturação da PNH e suas diretrizes, bem como
a criação do PlanHab, que entendem a moradia como um direito à cidade e não apenas a um
abrigo, a provisão apenas da casa tem sido o principal termômetro de eficiência da atual
política habitacional, através do PMCMV. Além disso, o cartão Minha Casa Melhor vem
reforçar um padrão de consumo condizente com as novas formas de morar que surgem com a
188
diversidade cada vez maior de produtos imobiliários, mas que não condizem com a moradia e
as condições socioeconômicas dos moradores de conjuntos habitacionais voltados para a
população de baixa renda.
Nessa conjuntura, esquece-se que o problema da habitação, na verdade, é a cidade,
pois, afinal, como afirma Maricato (2004, p. 54), “ninguém mora apenas na sua casa, mas
mora na cidade. A cada unidade corresponde um pedaço de cidade. O problema da moradia é
o problema da cidade, da infraestrutura, dos serviços e, em especial, do solo urbano”.
Entendemos que a ação estatal desenvolvida a partir da compreensão distorcida do problema
habitacional acentua as desigualdades socioespaciais, que se tornam visíveis nas diversas
escalas sob as quais se pode analisar o espaço intraurbano. Esse rebatimento é resultado de
processos mais gerais, principalmente quando se trata de reprodução do capital global, mas
que também encontra particularidades em nível local, o que nos faz entender que os efeitos
socioespaciais de um programa de alcance nacional, como PMCMV, repercute de maneira
diferente nos diversos tipos de cidade, como analisamos a partir de algumas cidades
paraibanas, em especial, Patos.
189
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Terminada esta pesquisa, temos a certeza de que ainda há muito a ser investigado
sobre a realidade urbana de que tratamos e sobre as questões teóricas levantadas. Portanto, a
conclusão deste trabalho nos proporcionou muito mais que a constatação e a análise dos
processos de conformação das cidades médias, de configuração da atual política habitacional
e da produção do espaço urbano da cidade de Patos. Apontou novas possibilidades de se
investigar sobre esse tipo de cidade, principalmente no contexto paraibano, à medida que
identificamos a atuação de diversos agentes, além do Estado e do capital imobiliário, as
particularidades dessa atuação nos espaços urbanos em questão e suas implicações nas
práticas socioespaciais e no espaço que produzem.
Como já foi mencionado logo no início desta dissertação, para alcançar o objetivo
geral da pesquisa, que consistiu em analisar os efeitos da implantação do PMCMV na cidade
de Patos referente às recentes transformações desse espaço urbano, sobretudo no que diz
respeito aos espaços de moradia, o texto ora concluído foi dividido em três capítulos. Cada
um foi construído com o intuito de atender a objetivos específicos, contudo, completam-se na
medida em que permitem a apreensão da realidade pesquisada nos momentos históricos sobre
os quais nos detivemos (período de vigência do BNH e de criação e implantação do PMCMV)
e sob a perspectiva da discussão teórico-conceitual empreendida.
Apesar de a problemática centrar-se no momento atual (implantação do PMCMV), a
discussão teórica desenvolvida no primeiro capítulo, por meio do debate sobre o problema
habitacional e como sua compreensão regeu (como ainda rege) a ação estatal frente a esse
problema, forneceu elementos para apreendermos o papel e a ação do Estado como agente
produtor do espaço e subsidiou a compreensão de como se desenhou a política habitacional no
Brasil, sobretudo na segunda metade do Século XX. Por meio dessa discussão, foi possível
entender como se deu a produção do espaço urbano patoense nesse período e de que maneira
o Estado atuou nesse processo. Para isso, foi preciso discutir não só sobre as políticas
habitacional e urbana, mas também sobre as políticas de desenvolvimento regional, devido ao
papel que a cidade de Patos apresentava naquela época, frente ao processo de urbanização,
por causa de sua centralidade regional no sertão paraibano.
Ao analisar a produção do espaço urbano de Patos no período supracitado,
considerando o modelo geográfico de crescimento dessa cidade e os fatores e agentes que
influíram nesse processo, pudemos vislumbrar que estratégias permaneceram na política
habitacional vigente, quais as que se modificaram ao longo do tempo e as implicações
190
socioespaciais das lógicas de produção do espaço, tanto as que permaneceram como as que se
transformaram. Essas questões foram discutidas e analisadas nos capítulos 2 e 3.
Vale salientar que a análise desenvolvida ao longo do texto não só permitiu que
entendêssemos a cidade de Patos, em particular, como também possibilitou a apreensão de um
cenário que se conforma em nível nacional e que se insere no atual momento do processo de
urbanização brasileira e de reprodução do capital. Nesse sentido, as pesquisas que têm se
dedicado aos estudos das cidades médias têm sido muito importantes para aprofundar a
compreensão do quadro que se forma. Contudo, algumas características típicas de muitas
dessas cidades trazem algumas dificuldades para a realização das pesquisas acadêmicas, por
exemplo, o que identificamos na/sobre a cidade de Patos, como o escasso material
bibliográfico, no que diz respeito ao espaço urbano, à pouca preocupação (em alguns casos)
com o arquivamento de sua história e documentos oficiais por parte dos órgãos públicos de
administração, além dos problemas relacionados à sistematização e à disponibilização de
dados e informações, como os relacionados à produção habitacional.
No caso de Patos, esses problemas ocasionaram um dispêndio de tempo maior em
algumas etapas da pesquisa, principalmente no que diz respeito ao levantamento da produção
habitacional passada (na época do BNH) e atual, como a falta de sistematização dos dados e
informações existentes. Apesar dessas dificuldades, entendemos que os dados e as
informações levantadas sobre a referida cidade se constituem relevantes não apenas para se
compreender a formação do espaço urbano patoense, mas também para se somar aos estudos
já desenvolvidos sobre cidades médias, principalmente as paraibanas, tanto no que concerne
aos dados específicos da realidade pesquisada quanto à discussão teórica e metodológica.
As questões aqui analisadas sobre os processos de periferização e de expansão
territorial da cidade, a reprodução das desigualdades socioespaciais e sobre a política
habitacional no Brasil, não são apenas um debate, em que se discute mais sobre ele, mas uma
discussão em que se procuram entender esses processos em realidades urbanas (as cidades
médias), que têm passado por rápidas transformações, com implicações, muitas vezes, tão
severas quanto nos grandes centros e nas metrópoles.
Assim, com a presente pesquisa, pudemos perceber como essas transformações
aconteceram e seus efeitos na cidade de Patos. Constatamos que, até o início dos anos 2000, a
produção habitacional, na cidade de Patos, por parte do Estado, foi quantitativamente pequena
em relação à demanda, mas aumentou significativamente, sobretudo depois da criação de
programas como o PAC e o PMCMV. Além de obras de habitação, esses programas
contemplaram as obras de grandes infraestruturas, principalmente nas áreas periféricas. Nesse
191
sentido, tem-se atendido cada vez mais à demanda habitacional local com a provisão da casa,
o que nos mostra que, do ponto de vista quantitativo, o PMCMV tem sido de suma
importância para o atendimento dessa demanda, fato constatado com o número de projetos e
de unidades habitacionais de cada um deles que foram ou serão entregues, além dos que estão
em fase de avaliação pela CEF.
Nesse momento, a cidade de Patos vem passando por um rápido processo de
expansão da malha urbana e por um “boom” no mercado imobiliário local, situação em que se
têm verificado mais possibilidades de acesso à casa própria também por parte das famílias de
rendimento médio mensal. É importante relembrar que o PMCMV representou, no âmbito da
PNH, um repasse de “responsabilidades” do Estado para o setor privado, no que concerne à
produção habitacional, com destaque para a elaboração e a promoção dos projetos a serem
financiados.
Para entendermos bem mais esse momento, fizemos algumas associações bastante
pertinentes entre a relação Estado-capital imobiliário, que se consolidou com o PCMVM, a
necessidade de expansão e maximização desse capital no âmbito nacional e na escala da
cidade e suas consequências quanto aos processos de periferização e reprodução das
desigualdades socioespaciais. A partir disso, percebemos que, apesar de não se configurar um
quadro bem definido de segregação socioespacial em Patos, pelo menos na maneira como
define Villaça (2001) e que é observado nas metrópoles, nos grandes centros e em algumas
cidades médias, vê-se, cada vez mais, a conformação e, em certa medida, o planejamento de
duas periferias bem distintas: a dos conjuntos habitacionais, em que habitam,
predominantemente, os pobres, e a dos pequenos condomínios fechados e grandes
loteamentos direcionados para a população de renda mais elevada. Esses espaços se
diferenciam, principalmente, pela disponibilidade de infraestrutura, por sua morfologia, pela
acessibilidade e por seu conteúdo social.
Assim, inferimos que o processo de valorização seletiva da periferia patoense é
resultado, entre outros fatores, dos efeitos que o PMCMV provocou no mercado imobiliário
nacional, regional e local, alimentando a especulação imobiliária, que se constituiu como
influente fator na lógica de financiamento (por exemplo, na definição do teto de
financiamento por faixa de renda) e de localização dos empreendimentos do PMCMV. Assim,
de um lado, existem os conjuntos habitacionais localizados em áreas desprovidas de
infraestrutura e, de outro, os pequenos condomínios e loteamentos, cujas casas financiadas
pelo referido programa localizam-se em áreas em que há pressão por parte do mercado
imobiliário e da elite local para a implantação de infraestrutura e serviços urbanos. Nessa
192
perspectiva, observa-se, em escala local, na escala da cidade, a estratégia de expansão
geográfica do capital imobiliário sendo empregada.
As possibilidades de expansão territorial que as cidades médias apresentam de
formação de imensos “bancos de terras” pelas incorporadoras e construtoras, além dos baixos
preços da terra-mercadoria em suas áreas periféricas têm sido um dos fatores responsáveis
pelo aumento significativo dos investimentos imobiliários nessas cidades. Porém, como
observamos no caso de Patos, mesmo nas áreas mais distantes, na periferia, há uma
valorização seletiva do espaço. Assim, como o mercado imobiliário e a elite local pressionam
e até influem diretamente nas decisões sobre a localização da implantação de serviços urbanos
e infraestrutura nas áreas periféricas, a maneira como os espaços de moradia das diferentes
classes sociais que habitam essas áreas são vividos e percebidos são bastante distintas.
Já vimos que é exatamente o problema do acesso à terra urbana, caracterizada por
uma boa localização, acessibilidade e pela presença de equipamentos urbanos e infraestrutura
o principal entrave para o atendimento qualitativo da demanda habitacional. O planejamento e
a produção de duas periferias que, cada vez mais, diferenciam-se no espaço citadino de Patos,
possibilitado pelo desenho de atuação dos agentes produtores do espaço no âmbito do
PMCMV, mostra que, apesar de se verificar um atendimento expressivo em termos
quantitativos da demanda habitacional, o referido programa tem deixado a desejar, no que diz
respeito ao atendimento qualitativo dessa demanda, como, por exemplo, o que observamos
através dos elementos urbanísticos dos projetos de habitação de interesse social.
Nesse sentido, entendemos que os avanços obtidos com a PNH e com o PlanHab
estacionaram devido ao fato de o PMCMV divergir mais do que convergir da compreensão de
que uma política habitacional e um programa que faça parte de sua estrutura só podem
alcançar o objetivo de oferecer acesso a uma moradia digna e garantir o direito à cidade se
estiver intimamente ligado a uma política urbana e fundiária que vise atender a esses mesmo
objetivos. Não há novidade nessa constatação, percebem-se velhas estratégias que
reproduzem antigos problemas, entre os quais, a periferização da cidade, em que se produz
cidade sem urbanidade e a intensificação das desigualdades socioespaciais e dos conflitos a
elas inerentes. O que é novo, nesse caso, é a forma como tem se dado a relação Estado-capital
imobiliário, a conjuntura política e econômica do país, as formas e as estratégias de expansão
e reprodução do capital em geral e suas implicações no processo de urbanização brasileira.
Assim, a lógica da cidade-negócio vai além dos grandes centros, ela invade as
cidades médias, as cidades pequenas e o campo, em seus respectivos espaços de moradia. Não
por acaso, existe a modalidade rural do PMCMV. Assim, ditado pelas regras do mercado, e
193
não, pelas reais demandas habitacionais, o PMCMV insere-se e favorece essa lógica, como
podemos observar com o protagonismo que o capital imobiliário assumiu no programa,
elaborando e executando os projetos, com as possibilidades de financiar tanto a produção
como a compra de produtos imobiliários até então típicos do setor privado, por exemplo, a
construção de condomínios fechados, como também pela segurança e pelos lucros obtidos no
mercado.
Nessa perspectiva, retomamos a afirmação de que mais do que apresentar algumas
constatações e afirmações acerca da produção do espaço urbano patoense, do papel que as
cidades médias têm exercido no momento atual do processo de urbanização no Brasil e dos
rumos da atual política habitacional que se formou com o PMCMV, este trabalho aponta
novas possibilidades de pesquisa, portanto, deixam lacunas, questões em aberto, a saber:
a) Estamos presenciando um novo momento da urbanização corporativa de que fala
Santos (1993), em que se destaca não mais apenas o capital industrial (as firmas), mas, muito
fortemente, o capital imobiliário financeirizado?
b) O crescente número de financiamentos habitacionais e de conjuntos habitacionais,
nas cidades médias paraibanas e no caso de Patos, tem acompanhado seu crescimento
econômico e habitacional ou tem se sobressaído a eles, como alerta Sposito (2004)? Quais as
consequências?
c) Qual a natureza das dificuldades de se efetivar um planejamento urbano local
nessas cidades no atual momento da política habitacional?
d) Como têm atuado os movimentos sociais nas cidades médias, frente às demandas
habitacionais locais e à elaboração de planos e programas urbanos e habitacionais no atual
momento de implantação do PMCMV? Há uma participação efetiva desses movimentos na
construção dos PLHISs?
Muitas outras questões podem ser levantadas a partir dos dados e da discussão
empreendida no decorrer deste trabalho e que, nesse momento de conclusão, não levantamos.
Nesse sentido, acreditamos ter contribuído para fomentar o debate ora apresentado. Também
acreditamos e desejamos ter subsidiado esse debate não apenas para o meio acadêmico, mas
também para o campo de atuação da gestão pública e da sociedade civil, pois acreditamos que
esse também deve ser o papel da produção científica.
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APÊNDICES
APÊNDICE A
ROTEIRO DE ENTREVISTA ESTRUTURADA PARA OS MORADORES DO RVS I
Nome do entrevistador: Instituição: UFPB
Local: Data: __/__/2013
Tipo de moradia: Formal – unidade
unifamiliar
Quadra: Nº:
1. IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO E SUA FAMILIA
Idade: Sexo: F ( ) M ( ) Profissão:
Número de moradores: Renda familiar aproximada: R$______________________
2. HISTÓRICO DA MORADIA
2.1 Procedência (onde morava antes). Bairro: ___________________Comunidade:
___________________
Outro município: _______________________ ( ) Zona Urbana ( ) Zona Rural
2.2 Primeiro morador? ( ) SIM ( ) NÃO 2.3 Tempo de moradia:
______________________________
2.4 Relação de propriedade do imóvel:
( ) Proprietário ( ) Cedida/emprestada
( ) Alugada ( ) Outros __________________________________________________
2.5 Uso:
( ) Domiciliar
( ) Estabelecimento – empresa, prestador de serviços etc.
( ) Misto – domicílio/estabelecimento. Tipo de estabelecimento: _______________________________
2.6 Como a casa foi adquirida?
( ) Comprada pronta, com recursos próprios, sem financiamento pela CEF
( ) Comprada pronta com financiamento:
a) Orçamento Geral da União (OGU) b) FGTS c) MCMV / 100% d) MCMV /x% R$?_______
( ) Outros ____________________________________________________________
2.7 Por que veio morar aqui?
( ) Não tinha casa e recebeu a que está residindo.
( ) Pagava aluguel e essa foi a possibilidade de ter a casa própria.
( ) Bairro seguro e tranquilo
( ) Estrutura oferecida (comércio/ transporte/escola/creche/ posto de saúde)
( ) Boa localização
( ) Pelo baixo valor da habitação ( ) Removido (não teve escolha)
3. ACESSIBILIDADE SOBRE O CONJUNTO VISTA DA SERRA I
3.1 O que você acha da localização do Conjunto Vista da Serra I em relação ao centro da cidade?
( ) longe do centro ( ) perto do centro ( ) perto e de fácil acesso
( ) longe e de difícil acesso ( ) perto, mas de difícil acesso
Outro:______________________________________________________________________________
3.2 O que você acha da localização do Conjunto Vista da Serra I em relação à cidade?
( ) longe dos bairros onde mora a família ( ) bem localizado
( ) de difícil acesso ( ) afastado, mas perto do centro
( ) isolado ( ) Outro ________________________________________
( ) uma área excluída
3.3 Você tem acesso fácil ao transporte coletivo? ( ) SIM ( )NÃO
O serviço de transporte é: ( ) ótimo ( ) bom ( ) ruim ( ) regular ( ) péssimo
Se existir, qual o principal problema do transporte coletivo local?
_____________________________________________________________________________________
3.4 Você possui transporte particular: ( ) SIM ( ) NÃO
Qual? ________________________________________________________________________________
3.5 Qual o meio de transporte que você utiliza para ir ao trabalho?
( ) Transporte público? Antes de morar aqui, você precisava usar o transporte público para ir trabalhar?
( ) SIM ( ) NÃO
( ) Transporte particular
( ) Transporte alternativo (bicicleta, carroça etc.)
( ) Outro ___________________________________________
4. ASPECTOS SOCIAIS
4.1 Os serviços/equipamentos básicos oferecidos no Conjunto Vista da Serra I atendem às suas
necessidades e de sua família referentes à:
SAÚDE: ( ) SIM ( ) NÃO Caso NÃO, e nas proximidades? ( ) SIM ( ) NÃO
EDUCAÇÃO: ( ) SIM ( ) NÃO Caso NÃO, e nas proximidades? ( ) SIM ( ) NÃO
LAZER: ( ) SIM ( ) NÃO Caso NÃO, para onde vocês costumam sair nas horas
vagas?_______________________________________________________________________
4.2 O fato de ter vindo morar no Conjunto Vista da Serra I alterou suas relações com os amigos e os
familiares?
( ) SIM ( ) NÃO
Caso SIM, qual o principal fator ? ___________________________________________________
4.3 Você está satisfeito em morar aqui?
( ) SIM ( ) NÃO
Por quê? _____________________________________________________________________________
4.4 Você se sente seguro aqui? ( ) SIM ( ) NÃO
Por quê?____________________________________________________________________
4.5 Quais as suas expectativas em relação ao Conjunto Vista da Serra I?
( ) Nenhuma
( ) Transporte público
( ) Infraestrutura (pavimentação, saneamento, iluminação pública)
( ) Comércio ( ) Escolas ( ) Creche ( ) Praças ( ) Posto de saúde
4.6 Quais as suas expectativas em relação ao entorno do Conjunto Vista da Serra I?
( ) Nenhuma
( ) Transporte público
( ) Infraestrutura (pavimentação, saneamento, iluminação pública)
( ) comércio ( ) Escolas ( ) Creche ( ) Praças ( ) Posto de saúde
4.7 Como a família paga as despesas da casa e da família desde que veio morar no Conjunto Vista da Serra
I?
( ) Renda própria - mercado formal de trabalho
( ) Renda própria - mercado informal de trabalho
( ) Trabalhos temporários – “bicos”
( ) Salário do cônjuge Outro:
_________________________________________________
( ) Auxílio governamental
5. ASPECTOS DA UNIDADE HABITACIONAL
5.1 Tipologia: ( ) casa ( ) apartamento
5.2 Número de pavimentos: _________
5.3 Quantos cômodos existem no imóvel? _______ ( ) Sala ( ) Cozinha ( ) Banheiro ( )
Quarto
( ) Área de serviço Outro: ______________________
5.4 Você está satisfeito com o tamanho dos cômodos?
SIM ( ) NÃO ( )
5.5 Você realizou alguma modificação no imóvel depois que foi morar nele?
SIM ( ) NÃO ( ) Caso SIM, qual? ____________________________________________
5.6 Área construída: _______________ Área total do lote: ________________
5.7 Material de construção:
Telhado:________________________________
Piso:___________________________________
Teto:___________________________________
Banheiro:_______________________________
Há jardim ou quintal? _____________________ ( ) murado ( ) cercado ( ) outro ________________
Comentários do entrevistado:
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________
Observações do entrevistador:
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________
APÊNDICE B
Entrevistado – Secretário da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Habitação do Município
de Patos/PB
POLÍTICA HABITACIONAL DO MUNICÍPIO
1. Sabemos que o PLHIS foi concluído e está sendo avaliado pela CEF. Quando começou o processo de
elaboração desse documento e quem participou dele? A partir desse Plano, quais as principais metas a
serem atingidas?
2. O Programa de Desenvolvimento Institucional constitui uma das linhas programáticas do PLHIS
destacada como elemento central entre as demais intervenções propostas pelo Plano. Como se
configura esse Programa de Desenvolvimento Institucional? Quais os agentes envolvidos na
implantação desse Programa?
3. Entendemos que as intervenções, através de obras de urbanização e habitação, favorecem também os
agentes imobiliários, visto que provocam o aumento do preço da terra urbana em algumas áreas da
cidade. Que mecanismos ou instrumentos têm sido utilizados, ou serão utilizados, para conter a
especulação imobiliária na cidade de Patos?
O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA
1. O Município de Patos aderiu ao Programa desde 2009. Quantos projetos já foram aprovados até
agora? Quantos estão em fase de avaliação? Como tem sido a participação do município frente a
esses projetos? Qual a participação do governo do Estado? Houve alguma contrapartida?
2. Quantas famílias foram cadastradas no programa até o ano de 2013? Quais os critérios para a
realização do cadastrado? Como foram/são escolhidas as famílias que recebem essas unidades
habitacionais? Qual o valor total desses imóveis?
3. No caso do Residencial Vista da Serra I, em que as famílias já assinaram os contratos e já receberam
as casas, quem propôs o projeto foi a construtora ou a prefeitura? De que forma ocorreu a aquisição
da gleba ou loteamento? Qual a participação da secretaria na escolha da localização do conjunto?
Quais os equipamentos urbanos e de infraestrutura já existentes nesse conjunto? E de serviços
básicos? E quais ainda serão instalados?
4. De que maneira a prefeitura acompanhou o processo de implantação do projeto no que diz respeito ao
cumprimento de prazos, execução das obras etc.?
5. No que diz respeito à habitação de mercado (que atende a famílias com renda acima de três salários
mínimos) no PMCMV, a Prefeitura tem promovido algum tipo de incentivo para a promoção desses
empreendimentos? Há algum tipo de monitoramento por parte da secretaria para aplicação da
legislação local nesses empreendimentos? E para a localização dos imóveis, há restrições?
6. De modo geral, como o secretário avalia o PMCMV hoje na cidade de Patos, no que diz respeito à
política habitacional local? Quais as perspectivas futuras?
APÊNDICE C
Entrevistado – Funcionário da CEHAP responsável pelos projetos do MCMV implantados através
da Companhia
POLÍTICA HABITACIONAL DO ESTADO
1. Quais os Programas de Habitação através dos quais a CEHAP tem mais atuado no estado da
Paraíba?
2. Quais os desafios para a implantação desses programas? Como esses desafios são enfrentados?
No que diz respeito ao PMCMV:
1. Sabemos que a Lei Federal 11.977/2009 (cria o MCMV) também dispõe de instrumentos e
procedimentos para promover a regularização fundiária urbana. A CEHAP tem atuado baseando-
se nos mecanismos de que dispõe essa lei? Caso, sim, quais foram os instrumentos e os
procedimentos promovidos até agora? Caso não, por quê?
2. Existe ou já existiu algum problema enfrentado pela CEHAP na elaboração e na implantação de
projetos propostos pela Companhia? Foram solucionados? Como?
3. Em quais municípios paraibanos a CEHAP já construiu conjuntos habitacionais com recursos
direcionados para esse programa? Como a CEHAP realiza o cadastramento das famílias que
podem ser atendidas e como ocorre a entrega das unidades? Quantas famílias já foram atendidas
em nível de estado? Em quais municípios a Companhia ainda pretende atuar através desse
programa?
Caso Patos seja um desses municípios:
4. Já houve algum projeto proposto pela CEHAP implantado na cidade?
- Caso não, por quê? Há algum projeto a ser proposto? Com quantas unidades, qual a localização
e como ocorrerá a implantação no que diz respeito à escolha do terreno, à execução da obra e à
implantação de infraestrutura e de equipamento urbanos?
- Caso sim, qual a localização, quantas unidades foram construídas, como as famílias foram
escolhidas e quem executou as obras? Há infraestrutura e equipamentos urbanos ou ainda serão
implantados? Quais?
5. A CEHAP também tem incentivado a produção de moradias para as famílias de faixa de renda
entre seis e dez s/m, ou seja, tem estimulado a produção de habitação de mercado? Caso sim, de
que forma? Caso não, por quê?
APÊNDICE D
Fotos das placas com informações dos projetos dos Residenciais Vista da Serra I e II
Fonte: Pesquisa de campo no segundo semestre de 2012 - Autora: Wilma G. de Lucena
Fonte: Pesquisa de campo no segundo semestre de 2012 Autora: Wilma G. de Lucena
Fonte: Pesquisa de campo em setembro de 2013 - Autora: Wilma G. de Lucena
Fonte: Pesquisa de campo em setembro de 2013 - Autora: Wilma G. de Lucena
APÊNDICE E
Fotos dos barracos construídos em terreno público ocupado pelas famílias sem teto localizado ao
lado dos conjuntos habitacionais RSV I e II
Fonte: Pesquisa de campo no segundo semestre de 2012 - Autora: Wilma G. de Lucena
Fonte: Pesquisa de campo no segundo semestre de 2012 - Autora: Wilma G.de Lucena
ANEXOS
ANEXO A
Mapa da divisão de bairros da cidade de Patos-PB - 2010
Fonte: Setor de Geoprocessamento da PMP
ANEXO B
Projeto do Loteamento Hardman Cavalcanti
ANEXO C
Projeto arquitetônico das unidades habitacionais do Residencial Vista da Serra I
1. Projeto para casa convencional
2. Projeto para casa PNE – casas destinadas a famílias com idosos e/ou deficientes físicos
A
ANEXO D
Ficha de cadastro no PMCMV da PMP para famílias de rendimento mensal de 0 a 3
s/m
ANEXO E
Dados dos conjuntos habitacionais financiados pelo BNH na cidade de Patos-PB